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RESENHA CRÍTICA1

BARTON, David. Linguagem online: textos e práticas digitais. David Barton 2, Carmen
Lee3; tradução Milton Camargo Mota. 1. ed. São Paulo: Parábola editorial, 2015.

A proposta para este texto é resenhar dois dos treze capítulos da obra Linguagem
online: textos e práticas digitais, de produção dos autores Barton e Lee que começam a
obra, com o capítulo intitulado Linguagem no mundo digital, a fim de apresentar
algumas mudanças contemporâneas no que diz respeito às inovações tecnológicas que
permeiam e direcionam vários aspectos da vida, influenciando de maneira significativa
as atividades cotidianas “digitalmente transformadas”, segundo os autores. E essas
transformações digitais de tão velozes e constantes, passam a ser vistas pelas pessoas
como normais. Elas atravessam as vidas, direcionam as ações, afeta as pessoas em todos
os lugares e em diferentes esferas de suas vidas, sem maiores estranhamentos,
impactando em muito a linguagem e as práticas comunicativas. Essa transformação
digital é chamada de domesticação da tecnologia
conceito que captura o processo pelo qual as tecnologias são
integradas à vida das pessoas e as medeiam; e ao mesmo tempo, os
usuários da tecnologia se reapropriam de tecnologias para facilitar
suas atividades cotidianas. Isto tudo tem acontecido num período
relativamente curto e se tornou rotineiro e despercebido na vida das
pessoas. (BARTON; LEE, 2015, p.12).

Além dos impactos na linguagem, a tecnologia também impacta na natureza das


instituições, das mídias, da economia e dos processos de globalização. Os autores,
citando Kress (2003), afirmam que esses avanços tecnológicos promovem quatro
processos de mudanças (nas relações de poder social, na estrutura econômica, na
comunicação e nas próprias virtualidades tecnológicas), os quais contribuem para as
transformações nas práticas comunicativas e na construção de sentidos.

1
Resenha desenvolvida por Josenéia Silva Costa, doutoranda do Curso de Pós-Graduação em Língua e
Cultura- Instituto de Letras, da Universidade Federal da Bahia, semestre 2017.2, para a disciplina Tópicos
de Linguística Aplicada II, ministrado pela docente Simone Bueno.
2
“David Barton é atualmente professor de linguagem e letramento do Departamento de Linguística da
Universidade de Lancaster e diretor do centro de pesquisa em letramento da mesma instituição. O livro
‘Linguagem Online’ é sua principal obra na área relacionada às tecnologias”.
(www.entrepalavras.ufc.br/revista/index.php/Revista/article/download/611/327).
3
“Carmen Lee é professora assistente do Departamento de Inglês da Universidade Chinesa de Hong
Kong. Seus temas de interesse, baseado nos artigos publicados disponíveis na rede, estão relacionados à
sociolinguística, linguagem da Internet, linguística da Internet, discurso digital. O livro em destaque na
presente resenha é sua principal publicação na área de linguagem e tecnologias.”
(www.entrepalavras.ufc.br/revista/index.php/Revista/article/download/611/327).
Todas essas mudanças, levam também os sujeitos a precisarem repensar vários
conceitos que permeiam as práticas cotidianas, como: o que seria, hoje, texto, variação,
contato e comunidade, noções de autor e público, uma vez que as relações online ainda
que facilitem a comunicação de muitos, não deixa de ser complexa. Essas relações
mudam as atividades de leitura e escrita e por sua vez, muda o papel da linguagem.
Os autores tomam a visão de linguagem como prática situada, como meio
importante de se entender a dinâmica de espaços online mediados por textos. E elenca
quais são as propostas temáticas da obra, enfatizando a discussão sobre letramentos e
internet, a fim de se compreender “o que acontece com a linguagem e as práticas
quando estão online” (BARTON; LEE, 2015, p.15).
Barton e Lee (2015) apresentam três abordagens da linguagem online no âmbito
da linguística, a saber: a) características estruturais da comunicação mediada por
computador, que tem como proposição saber se a “comunicação mediada por
computador baseada em texto (CMC) deveria ser tratada como fala ou como escrita, ou
como um híbrido de fala e escrita [...] ou como uma nova variedade de linguagem [...]”
(BARTON; LEE, 2015, p.16). Sobre essa questão, surgiram várias denominações (e-
mailismo, discurso escrito interativo, e-linguagem, chatspeak, textspeak, linguagem
cibernética e gíria de internet) para descrever as características peculiares discursivas
que foram identificadas. A segunda abordagem chamada b) variação social do discurso
mediado por computador compreende a ideia de que “gêneros escritos não podem ser
separados de seus usuários e textos sociais” (BARTON; LEE, 2015, p. 17 apud
HYLAND), e por isso as características do CMC são adequados a diferentes contextos.
A terceira abordagem, c) ideologias linguísticas e metalinguagem, adota uma visão
mais crítica dos dados da linguagem e se baseia em conceitos da sociologia e da
ideologia linguística para observar como as formas de comunicação são moldadas por
ideologias sociais e como tais ideologias são discursivamente construídas em novas
mídias. “Um tema recorrente é o modo como a linguagem é comentada online, muitas
vezes referido como metalinguagem”. (BARTON; LEE, 2015, p.18).
Ainda no primeiro capítulo, os autores se preocuparam em apresentar
terminologias que envolvem as discussões na obra em análise. Assim, expõem a noção
de online como o termo que serve para designar todas a s formas de comunicação
realizadas em dispositivos de rede e afirmam que não utilizam online-offline escrita
como dicotomia. E dessa forma, seguem apontando quais descritores e seus respectivos
sentidos, no contexto de ferramentas e atividades ligadas à leitura e escrita associadas à
linguagem online.
Quando usamos ‘comunicação mediada por computador’, ‘mídia
digital’, ‘comunicação digital’, ‘novas mídias’, ‘novas tecnologias’ ou
‘ferramentas digitais’, ‘sites’ e ‘plataformas’, estamos nos referindo às
ferramentas que as pessoas usam para realizar sua comunicação
online. Nesse sentido, mensagens de texto também estão incluídas em
nosso estudo como forma de comunicação mediada por computador,
pois telefone celular é, basicamente, um computador portátil e é, sem
dúvida, um aparato de comunicação digital. (BARTON; LEE, 2015,
p.20).

Em seguida, os autores discutem sobre o que é ser ‘novo’, uma vez que as
atividades virtuais eram novas na década de 1990 e, contudo hoje, com uma nova
geração crescendo/crescida se apropriando de tantas tecnologias, as virtualidades já
passaram a ser rotineiras e a ideia de mudança passa a ser aceita com mais naturalidade.
“Contudo, vale a pena identificar onde há continuidade nas práticas existentes e onde
existem práticas que possam ser consideradas novas” (BARTON; LEE, 2015, p.21),
pois as pessoas geralmente, segundo as pesquisas dos autores, se apropriam também de
velhas práticas fazendo uso de novas maneiras.
Ao abordar a dicotomia Web 1.0/ Web 2.0, Barton e Lee (2015) explicam que a
Web 2.0 se trata de aplicativos da web que permitem as pessoas criarem e publicarem
seus próprios conteúdos online, compartilhando com os outros, numa atividade de rede
em que há participação, colaboração nas comunidades de usuários que se conectam pela
palavra escrita e outros conteúdos multimodais. “Os usuários desses sites geralmente
compartilham seus interesses e experiências cotidianos, avaliando e reagindo à música
que ouviram, aos livros que leram e aos hotéis e restaurantes que visitaram” (BARTON;
LEE, 2015, p.22). E passa a ser importante também o posicionamento; fazer
comentários acerca do que é postado.
Há algum tempo se fala no conceito de nativo digital, atribuindo ao jovem uma
certa expertise para o uso das tecnologias, em oposição aos “imigrantes digitais”,
consideradas pessoas mais velhas que precisaram se adaptar às novas tecnologias.
Contudo, segundo os autores, hoje, é importante estudar as tecnobiografias das pessoas
para entender o impacto das mudanças no uso da linguagem online. Além dessa
discussão, os autores explanam também o que chamam de “o problema dos pânicos
morais” em que é alegado que as pessoas leem menos livros e têm pouco hábito de
leitura e concentração devido ao aumento do uso das novas mídias, chamados
tecnopânicos. Porém, afirmam que essas alegações tendem a ser infundadas e baseadas
em observações superficiais.
As práticas sociais em que a linguagem está inserida têm importância
particular quando se examina a linguagem online, especialmente por
causa das constantes mudanças, do aprendizado contínuo e da fluidez
dos textos. Uma parte crucial do contexto de textos online é situá-los
nas práticas de sua criação e utilização. (BARTON; LEE, 2015, p.25).

Com as palavras acima, os autores Barton e Lee (2015) começam a explorar o


que vem a ser estudos, práticas e evento de letramento, a fim de demonstrar que o
letramento é uma atividade social, uma configuração de práticas estável, coerente e
identificável. Compreende-se por estudos de letramento a área, uma teoria sociocultural
de leitura e escrita, que parte do que as pessoas fazem com a linguagem escrita em suas
vidas. Essa área debruça-se na materialidade da linguagem escrita, mediante a
fisicalidade dos textos.
No capítulo Estudar o mundo para compreender a linguagem, Barton e Lee
(2015) apresentam dez razões pelas quais pesquisadores e outras pessoas interessadas
devem considerar relevante a linguagem online, ou mais precisamente, o estudo dessa
abordagem, consideradas a seguir:

1- o mundo está cada vez mais mediado pelo texto, e a web é parte
essencial dessa mediação textual;
2- conceitos linguísticos básicos estão mudando de significado, sendo
necessário um novo conjunto de conceitos;
3- os novos encontros multilíngues online mudam as relações entre as
línguas;
4- recursos linguísticos são mobilizados para afirmar novas
identidades e representar o eu em espaço online;
5- as pessoas combinam recursos semióticos de novas maneiras e
inventam novas relações entre linguagem e outros modos de
construção de sentido;
6- a internet oferece espaços de reflexão sobre a linguagem e
comunicação;
7- a linguagem é fundamental para o aprendizado constate em espaço
online;
8- práticas linguísticas vernáculas estão se tornando cada vez mais
públicas e circulam mais amplamente;
9- a linguagem é central nas novas formas de criação de conhecimento
e novas formas de investigação;
10- novos métodos para pesquisar a linguagem tornam-se possíveis.

Assim, os autores retomam quais os objetivos do livro e enfatizam que a


proposta central é reunir ideias e conceitos que apresentem a linguagem online a partir
de abordagens teóricas e metodológicas, a fim de se compreender questões linguísticas
específicas, em que são incluídas práticas multilíngues, atos linguísticos de tomada de
postura, como os usuários online tratam sobre seus usos de linguagem, os discursos
sobre essas aprendizagens, dentre outros.
O livro em estudo é recomendado para todo professor da área de linguagens, que
se debruce a entender o que são letramentos digitais, assim como para aqueles que
tentam ressignificar suas práticas em sala de aula por meio de propostas que
vislumbrem enfocar a linguagem como prática cotidiana. Uma vez que as práticas de
letramento são as maneiras culturais gerais de utilização de letramento e o evento de
letramento são as atividades desenvolvidas pelos sujeitos em interações da escrita e da
fala. “Exemplos de eventos e práticas de letramento podem ser encontrados em todos os
campos da vida, online e off-line. Por exemplo, comentar uma notícia online, reservar
um ingresso [...] decidir [...] com quais estilos da linguagem usar [...].” (BARTON;
LEE, 2015, p.25). A análise de discurso tem sido muito importante para as pesquisas
sobre linguagem online, afirmam os autores.

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