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História da Contabilidade

APRESENTAÇÃO

Nesta Unidade de Aprendizagem você estudará a história da contabilidade, principalmente no


período do Renascimento. Uma das formas de conhecer esses procedimentos e hábitos é
entender que eles se formaram com o tempo, ao longo da história. Estudar contabilidade é
também aprender uma nova linguagem: a linguagem dos negócios, e, para conhecer uma nova
língua, é importante conhecer a cultura e as influências folclóricas e sociais ao longo do tempo.

Bons estudos.

Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

• Relembrar episódios importantes da história mundial.


• Identificar o desenvolvimento da contabilidade ao longo do tempo.
• Demonstrar aspectos históricos que influenciaram na contabilidade tal como é hoje.

DESAFIO

Você é o gerente de uma empresa de logística que conta com estrutura sofisticada, como
caminhões, guindastes, galpões e navios. Essa empresa é muito bem administrada, com
planejamento e disciplina. Depois de um mês de trabalho, você está preocupado e quer saber se
o orçamento de vendas do mês foi alcançado. Você sabe que se não conseguir alcançar as metas,
terá que explicar o que houve e não poderá cumprir com uma série de compromissos já
estabelecidos. Você liga para o contador da empresa e tem acesso às demonstrações contábeis
do mês.

Agora, imaginemos que você está no ano de 1490. Você é o comandante de um navio mercantil.
Para ter condições de comprar e revender mercadorias em outro país, você precisou contrair um
empréstimo com um agiota.
Explique qual a importância dos livros contábeis e que tipo de informações eles podem lhe dar
para ajudar a verificar se vai precisar de mais um empréstimo.

INFOGRÁFICO

Veja neste infográfico a época de efervescência no comércio, nas artes e na vida social: o
período renascentista. São navios entrando e saindo com mercadorias, caravanas circulando, um
mercado frenético, dinheiro e riqueza sendo acumulados com os lucros desses negócios. É nesse
ambiente que a contabilidade começa a se popularizar, graças ao trabalho do Frei Luca Pacioli.
CONTEÚDO DO LIVRO

A contabilidade era ensinada de geração para geração, de comerciante para comerciante, como
uma valiosa técnica.

Acompanhe o capítulo História da Contabilidade, base teórica desta Unidade de Aprendizagem


e leia sobre a origem da contabilidade.

Boa leitura.
CONTABILIDADE
BÁSICA

Alexandre Saramelli
História da Contabilidade
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:
„„ Relembrar episódios importantes da história mundial.
„„ Identificar o desenvolvimento da contabilidade ao longo do
tempo.
„„ Demonstrar aspectos históricos que influenciaram na contabili-
dade tal como é hoje.

Introdução
Neste texto você estudará a história da contabilidade, principalmen-
te no período do Renascimento. Uma das formas de conhecer esses
procedimentos e hábitos é entender que eles se formaram com o
tempo, ao longo da história. Estudar contabilidade é também apren-
der uma nova linguagem: a linguagem dos negócios, e, para conhe-
cer uma nova língua, é importante conhecer a cultura e as influências
folclóricas e sociais ao longo do tempo.

Primeiros passos da contabilidade


Não é possível determinar a origem da contabilidade no tempo, nem apontar
uma pessoa ou grupo que tenha “inventado” a contabilidade. Historiadores
afirmam que na Idade da Pedra alguns rudimentos de contabilidade já teriam
sido praticados. Com a evolução da humanidade, torna-se necessário controlar
bens e mercadorias. É assim que surge a contabilidade, junto com o aperfeiço-
amento das artes, da matemática, da engenharia, das línguas e da escrita
Epstein (2002, p. 12), reconhecido autor e livreiro nos Estados Unidos,
muito ligado às artes gráficas, comentou que

[…] os antigos comerciantes do Oriente Próximo numeravam os seus


sacos de grãos e frascos de vinho com entalhes acompanhados por
pictogramas incisos ou demarcados sobre tabuletas de barro e de
pedra e, presumivelmente, também de madeira. Na língua ingle-
sa, uma vintena de tais incisões ainda é chamada de um score, e os
scorekeepers, aqueles que fazem a contagem, ainda a anotam sobre
tabuletas. Estas incisões demarcadas, os ancestrais dos adjetivos e
substantivos, deram origem à linguagem escrita. Com o passar do
tempo, os pictogramas, reduzidos aos seus fonemas alfa, beta e assim
por diante tornaram-se alfabetos, e uns quinhentos anos atrás essa
poderosa tecnologia foi imensamente engrandecida pela invenção
do tipo móvel, que em sua versão europeia trouxe à luz a Reforma,
o Iluminismo, as revoluções científica e industrial e as sociedades daí
resultantes: em outras palavras, o nosso mundo atual, e com todas as
suas maravilhas e pesares. Os livros nos quais as histórias são guarda-
das para uso futuro podiam ser carregados aos confins do mundo e
acabariam se transformando em mercadoria para os livreiros.

Epstein (2002) escreveu sobre o que foi a grande saga para a criação da
linguagem escrita. Na esteira desse processo, havia interesses de negócios,
ou seja, os comerciantes, em seu trabalho de aproximar produtores, artesãos
e consumidores, precisavam de algum controle para suas mercadorias e es-
toques. O decorrer do tempo tornou necessário contar histórias com letras e
símbolos, que eram guardadas em livros para serem difundidas e lidas.
A contabilidade era ensinada de geração para geração, de comerciante
para comerciante, como uma valiosa técnica. De acordo com Andrade (2009,
p. 22), descobertas arqueológicas mostram que a contabilidade teria surgido
há cerca de 4.000 a.C. na Suméria (sul da Mesopotâmia, região onde atual-
mente se encontra o Iraque) e no Antigo Egito, como uma forma simples de
“inventariar mercadorias, identificar o seu proprietário e definir o seu valor
de troca”.
Andrade (2009, p. 22) comenta que, no ano de 1228, a obra Liber abaci
(Livro do ábaco) chegou à Europa. Tratava-se de um livro cujo teor era essen-
cialmente a matemática, de autoria do matemático Leonardo Pisano (ou Leo-
nardo Fibonacci). Foi ele que introduziu os caracteres arábicos na Europa e a
“sequência de Fibonacci” ou o “número de Fibonacci”, já apresentando alguns
conceitos e cálculos comerciais.
Saiba mais
Os números arábicos (sobretudo os números negativos) foram amaldiçoados na Eu-
ropa durante muito tempo. Por causa da praticidade de uso – muito mais fácil que os
caracteres romanos –, era usado secretamente pelos comerciantes.
Você talvez já tenha notado que, em alguns relatórios, números negativos são demons-
trados entre parênteses, não com o sinal negativo na frente. Pois bem! Este é um cos-
tume comercial derivado dessa época, em que se evitava o uso de números negativos
porque poderiam ser “maléficos”. Por exemplo, ao invés de –100,00, utiliza-se (100).

Após Liber abaci, chegou à Europa o livro Hisbah (Verificações de cál-


culos), do autor árabe Ibn Taymiyyah (ANDRADE, 2009, p. 22). Esta obra
trazia o que se entendia como “uma busca pela segurança de práticas econô-
micas e comerciais corretas entre as comunidades muçulmanas”. O livro con-
tinha “um detalhado sistema contábil que era utilizado pelos muçulmanos,
cujas práticas contábeis haviam sofrido influências da civilização romana e
persa”. Hisbah descrevia, por exemplo, o sistema de contabilidade governa-
mental, “onde se registravam todas as receitas, despesas e pagamentos, du-
rante o califado de Omar, o segundo Califa do Islamismo”.

Saiba mais
Os livros Liber abaci e Hisbah, além das práticas contidas neles, eram muito restritos
à época de sua publicação. A contabilidade era uma técnica secreta, conhecida por
pouquíssimos homens!
Personagens históricos no desenvolvimento
da contabilidade
Decorridos 200 anos do conhecimento das obras Liber abaci e Hisbah, o
monge franciscano e matemático Luca Pacioli se interessou por contabili-
dade. Pacioli viveu em Veneza, cidade-estado que era um grande centro co-
mercial europeu no século XIV. Veneza viveu um processo muito conhecido
na História, o Renascimento. Enquanto a Europa estava envolta em trevas
– com relação à evolução do conhecimento –, Veneza teve grande desenvolvi-
mento e acumulação de riquezas, por conta de seu comércio frenético, o que
fez efervescer as artes e a ciência.
Luca Pacioli foi considerado o “pai da contabilidade moderna”. Ele buscou
saber como os comerciantes da época controlavam seu patrimônio e percebeu
que usavam controles sofisticados para dominar o patrimônio, os ganhos e as
perdas. Pacioli compilou esses conhecimentos e publicou-os em 1494, no livro
Summa de Arithmetica, Geometria, Proportioni et Proportionalitá. Esta obra
foi tão importante para a contabilidade que chegou a ser reconhecida com a
criação de um selo comemorativo a seus 500 anos de publicação.

Saiba mais
Luca Pacioli era amigo de Leonardo da Vinci, uma das figuras mais importantes do
Renascimento. Acredita-se que Pacioli teria ensinado a “sequência de Fibonacci”, a Da
Vinci, o qual a utilizou em muitas de suas obras, incluindo A última ceia e Mona Lisa.

Sá (2004, p. 135) comenta que Pacioli descreveu em detalhes quais eram


as informações que os comerciantes deveriam registrar como ações nos livros
contábeis:

Todo o dinheiro em espécie de tua propriedade, que ganhares em


qualquer época, ou que te for deixado por parentes falecidos, ou
doados por qualquer príncipe, farás credor a ti mesmo e devedora
a Caixa.
Todas as joias e mercadorias de tua propriedade, que ganhaste ou
deixadas por testamento, ou doadas, e que devem ser avaliadas cada
uma de per si, em expressão monetária, quantas sejam, tantas regis-
trarás no Razão, fazendo-as cada uma devedoras; e dirás: por tanto
que avalio neste dia para tal bem, no valor tal... tudo levando a teu
crédito, de cada uma de tais referidas contas.
Observe, todavia, a exatidão de cada partida, ou seja, que nem duca-
dos faltem nos registros, mas, lembrando que coisas irrelevantes em
valor no Razão não se registram.
Todos os bens imóveis que possuíres, como casas, possessões, Lojas,
deves fazer dos mesmos devedores, avaliando-os a teu modo, em
moeda e fazendo-te credor na tua supra referida conta. Assim, cada
possessão debitarás e avaliarás uma por uma, tudo a ti creditado. Isto
renova a lembrança de que cada lançamento deve ter: o dia, o valor
e o histórico ou explicação do motivo.
O que comprares, sejam mercadorias ou quaisquer outras coisas, de-
ves debitar tais mercadorias e coisas e creditar à Caixa.

Saiba mais
As informações aqui dispostas, a respeito dos primeiros passos da contabilidade, datam
de 1490. Nessa época, não havia máquinas que facilitassem o trabalho em escritórios,
embora alguns utilizassem ábacos (espécie de calculador manual, formado por um
quadro com fios paralelos). O que havia para escrever era apenas papel, item difícil de
obter. Evidentemente, já se contava com um bom nível de conhecimento e tecnologia,
mas a população em geral sequer sabia ler e escrever.

Você percebeu que as orientações dadas por Pacioli (citadas por Sá) são
as mesmas que utilizamos hoje? Porém, será que o trabalho descrito era real-
mente praticado pelos comerciantes da época? De acordo com historiadores,
como Sá (2004, p. 59), e pesquisadores (como Vincenzo Masi e Joseph H. Vla-
émminck), os comerciantes naquela época praticavam mesmo a contabilidade
(alguns casos apresentando, inclusive, impressionante nível de sofisticação).
A inquietação de Luca Pacioli rompeu a tradição oral do conhecimento
contábil, difundindo esta área para o mundo. Esse feito encerrou um período
medieval da contabilidade e deu início a um período moderno. O mérito de
Pacioli não foi o de ter criado a contabilidade – pois isto ele não fez – nem de
ter compilado o conhecimento, mas ter oportunizado a difusão desse conhe-
cimento.
CONTABILIDADE: DO PARTICULAR
PARA O PÚBLICO
Eugen Schmalenbach, no livro Dynamische Bilanz (O balanço dinâmico), de
1955, relatou que até a Idade Média, a contabilidade era produzida para o
empresário, como um assunto particular, secreto, íntimo. Nessa época, os de-
monstrativos contábeis eram apurados somente em períodos especiais, sem
preocupação em fazer uma apuração periódica.
O autor comenta também sobre as navegações e caravanas. Sempre que
uma viagem chegava ao fim, era apurado um balanço contábil com o que
havia sido ganho; descontavam-se despesas, perdas de animais, mercadorias,
roubos e estragos, atingindo um resultado. Isso se chamava contabilidade de
“ganhos e perdas”.
Ganhava-se dinheiro com caravanas e navegações, pois eram viagens mo-
tivadoras e que levavam muita gente a transportar mercadorias por lugares
perigosos, objetivando-se os lucros. Então, surgiram na Europa as rotas co-
merciais, e Veneza, neste aspecto, era um importante ponto de ligação que
atraía pessoas de diferentes culturas e origens.

Exemplo
Como exemplo de personagem que utilizou muito a contabilidade para manter e con-
trolar suas riquezas, Schmalenbach (1955) cita o banqueiro Jacob Fugger, que ficou
conhecido como “o rico”. Fugger aprendeu o método das partidas dobradas, que co-
nheceu em Veneza, e desde então manteve uma contabilidade para seus negócios.
Sabe-se que era muito organizado e mantinha uma estrutura contábil, além de uma
estrutura gerencial e administrativa muito bem desenvolvida.

Uma atitude comum na época (e até mesmo hoje), e que Jacob Fugger
praticava, era manter a contabilidade restrita apenas a seus interesses, ou seja,
privada e secreta. Fugger é um exemplo de comerciante que não publicava
seus balanços.
Luca Pacioli começou a incentivar os comerciantes a apurar balanços
contábeis periodicamente e divulgar esses balanços. Schmalenbach (1955,
p. 11) conta que, para justificar o porquê de orientar esse comportamento,
Pacioli argumentava:
[…] é sempre uma boa coisa fechar os balanços uma vez por ano,
particularmente para aqueles que negociam por parceiros e tercei-
ros. É como o provérbio diz: “ragio spessa, amista longa” [isto é, “uma
contabilidade frequente favorece amizades sólidas e duradouras”].

Ou seja, o comerciante que publicava balanços ou demonstrações contá-


beis de forma rotineira e frequente conseguiria atrair potenciais investidores,
fornecedores, clientes e pessoas em geral que se interessassem pelo negócio.
É neste momento que se inicia, então, a contabilidade financeira, uma con-
tabilidade feita tanto para uso interno – como era comum até então – quanto
para o chamado “usuário externo”.

Saiba mais
Jacob Fugger foi o primeiro investidor estrangeiro no Brasil. Soube do descobrimento
das terras brasileiras por meio de seu representante comercial em Portugal, Fernão de
Noronha, e, ainda em 1503, investiu dinheiro para a exploração do novo território.

ESCOLAS DO PENSAMENTO CONTÁBIL


O desenvolvimento da contabilidade não parou com o trabalho de Luca Pa-
cioli. Outros cientistas e contadores descobriram novos conhecimentos de
acordo com a evolução dos costumes e da complexidade da humanidade. Veja
a seguir um breve resumo desse desenvolvimento, que ocorreu ao longo do
tempo por meio das chamadas escolas contábeis. As escolas foram movi-
mentos nos quais se reuniam contadores com a mesma linha de pensamento.

Escola contista
A escola contista foi o primeiro movimento que atraiu os contadores em torno
de uma linha de pensamento comum. Segundo Andrade (2009, p. 24), que es-
tudou Hermann Júnior (1996, p. 35), é uma escola que “tal qual se depreende
pelo seu nome, teve como ideia central a fundamentação no mecanismo das
contas, subordinando-as aos modelos de escrituração”.
Schimidt (2008, p. 18) explica que, conforme essa escola, “a contabilidade
deveria se preocupar especialmente com o processo de escrituração e com as
técnicas de registro através do sistema de contas”.

Escola personalista
A escola personalista surgiu na segunda metade do século XIX. Conforme
Andrade (2009, p. 25), as contas deveriam ser abertas para as pessoas em sua
materialização física ou jurídica, “entendendo-se que o dever e o haver repre-
sentariam débitos e créditos para essas mesmas pessoas”. Participaram desse
movimento Francesco Marchi, Guseppe Cerboni e Giovanni Rossi.
As contas contábeis apresentam uma personalidade. De acordo com Fran-
cesco Marchi, há a figura de um gestor entre o ativo e o passivo de um em-
preendimento. Assim,

[…] a entidade seria confiada a um administrador e que esse seria


devedor do proprietário do estabelecimento por todo o ativo que
lhe fosse confiada administração, e, por outro lado, credor de todo o
passivo e das contas do capital que faziam contrapartida dos ativos.

É possível você observar, então, que existe uma dinâmica ou um me-


canismo ativado a partir das decisões de um gestor ou administrador. Esse
mecanismo traz consequências diferentes ao patrimônio de uma entidade, o
que Francesco Marchi dividiu em três grupos:

„„ Contas do proprietário – capital, lucro e perdas. A conta de “lucro e


perdas” compreendia as contas de receitas e de despesas.
„„ Contas dos agentes consignatários – dinheiro, mercadorias, bens mó-
veis, entre outros.
„„ Contas dos correspondentes – devedores e credores; essas contas re-
presentavam as relações com terceiros.

Andrade (2009, p. 24) afirma que a teoria personalista foi refutada por
Fábio Besta (nome importante na escola descrita a seguir), que

[…] explicitou as falhas do método logismográfico, argumentando


que a substância contábil é essencialmente econômica e não pode-
ria estar relacionada apenas pela natureza das contas que circunscre-
viam relações jurídicas entre pessoas.
Escola neocontista ou controlista
A escola tem como maior representante Fábio Besta, que deu uma visão fun-
damentalmente econômica ao estudo da contabilidade. Como expõe Andrade
(2009, p. 26), Besta direcionou a contabilidade para a análise da riqueza das
entidades. Ele dividiu as contas contábeis em dois grandes grupos:

a) Principais: correspondentes aos bens patrimoniais;


b) Derivados: relativos ao patrimônio líquido e suas variações.

O termo “controlista” é devido ao seguinte pensamento: como essa escola


entende que há uma visão fundamental econômica do estudo da contabili-
dade e para a análise da riqueza das entidades, entende-se que a contabilidade
exerce um controle sobre as fases do processo de geração de riqueza de uma
entidade.
A doutrina da escola neocontista deu lugar ao conceito de “aziendalismo”,
promovido por Gino Zappa.

Escola aziendalista
Gino Zappa observou que há uma interdependência entre organização, ad-
ministração e contabilidade. Assim, como aponta Andrade (2009, p. 26),
Zappa formou uma ciência econômica aziendal que “significa, num olhar,
uma abordagem científica da administração econômica das aziendas”.

Saiba mais
“Azienda” é uma palavra italiana que significa “empresa” no português, mas com
atenção ao patrimônio. Entende-se como “patrimônio” o conjunto de bens, direitos
e obrigações, ou seja, em outras palavras, propriedades, direitos a receber e dívidas.
Aziendas são então estruturas que podem ser administradas, gerenciadas de acordo
com as decisões de um gestor.
Em analogia à área militar, “azienda” seria um exército ou um batalhão equipado, com
limitações e habilidades, tendo poder de empreender ações. Esse exército ou batalhão
pode ser direcionado de acordo com as ordens de um general.
Escola patrimonialista
Os fundamentos da escola patrimonialista foram lançados por Vincenzo Masi
em 1923. De acordo com Andrade (2009, p. 26), a escola patrimonialista ”co-
loca o patrimônio como o objeto de estudo da Contabilidade, observado como
um conjunto de riquezas que, em constante circulação nas aziendas, é admi-
nistrado para o seu crescimento econômico”.
Assim, a contabilidade estuda o patrimônio não apenas sob uma abor-
dagem para dar-lhe valor, mas também como o patrimônio é administrado,
de forma a produzir ações e resultados. Nesse sentido, Andrade (2009, p. 26)
aponta que essa condição patrimonial pode ser estudada sob os seguintes as-
pectos:

„„ Estático (a situação do patrimônio em dado momento);


„„ Dinâmico (os resultados econômicos de sua aplicação).

Andrade (2009, p. 26) traz ainda a explicação de Hermann Júnior (1996, p.


49), que afirma: “o patrimônio é uma grandeza real, cuja constituição íntima
deve ser reconhecida e que se transforma e evolui sob o influxo da atividade
humana”. A escola patrimonialista é uma das mais importantes, aplicadas e
estudadas atualmente.

Escola americana
Na escola americana, há um foco de preocupação na questão da informação
econômica e financeira (ANDRADE, 2009, p. 27). Devido à riqueza da eco-
nomia norte-americana, do incentivo ao mercado de capitais e da cultura nor-
te-americana, houve grande preocupação com o controle e a regulamentação
das operações financeiras das entidades.
As outras escolas citadas neste texto fomentam uma identificação com
pesquisadores que difundiram os movimentos que traziam uma linha de pen-
samento comum. Já nos Estados Unidos, fortes instituições cumpriram esse
papel como associações de profissionais, como a American Association of
Public Accountants, e grandes agências governamentais, como a Securities
and Exchange Commision.
NORMAS INTERNACIONAIS DE
CONTABILIDADE
Ao longo do tempo, cada país formou normas contábeis de âmbito jurisdi-
cional, limitadas àquele país. Com a evolução dos mercados e a globalização,
já na década de 1950 sentiu-se a necessidade da formação de normas inter-
nacionais.
Na década de 1970, a International Federation of Accountants realizou um
esforço para formar as primeiras normas internacionais de contabilidade, que
seriam as International Accouting Standards (IAS). No entanto, os Estados
Unidos mantinham forte influência nos mercados, o que, na prática, fazia das
Normas Contábeis Norte-americanas as normas de uso internacional, porém,
indevidamente, pois essas normas estavam preocupadas com a realidade dos
Estados Unidos, não com a de outras jurisdições.
Após a criação das IAS, definiu-se a criação de um órgão específico para
a geração de normas internacionais, a International Accounting Standards
Board (IASB), sediada em Londres. A IASB entrou em acordo com a Finan-
cial Accounting Standards Board (o departamento norte-americano respon-
sável pelas normas contábeis), sendo possível, então, a adoção das Normas
Internacionais também nos Estados Unidos.
Após a crise financeira internacional de 2008, o G20 (grupo que reúne os
20 países com as maiores economias do planeta) exigiu que as Normas Inter-
nacionais fossem adotadas como uma das formas para evitar crises, como a
de 2008 e anteriores.
As Normas Internacionais ainda não são consideradas uma “escola” na
literatura, mas alteraram doutrinas contábeis e trouxeram mudanças, como a
adoção de conceitos como o fair value (“valor justo”) e a “essência sobre a
forma”. O grande objetivo das Normas Internacionais é proporcionar hones-
tidade aos mercados.

A CONTABILIDADE E AS NORMAS
INTERNACIONAIS NO BRASIL
Os contadores brasileiros sempre tiveram grande admiração pelas escolas
europeias, sobretudo as italianas, como a escola patrimonialista. Entre as dé-
cadas de 1960 e 1970, o Brasil se alinhou à escola norte-americana por meio
da publicação da Lei das Sociedades Anônimas, nº 6.404/76, cujo objetivo
era o desenvolvimento do mercado de capitais. Essa influência da escola nor-
te-americana foi muito incentivada por grandes nomes da contabilidade, que
denominaram esse alinhamento de revolução contábil.
Posteriormente, o Brasil se alinhou às Normas Internacionais de Contabi-
lidade da IASB, sendo um dos primeiros países a adotar as Normas Interna-
cionais para o setor privado, entre os anos de 2008 e 2011.
Conforme Andrade (2009, p. 27), houve o desenvolvimento de uma escola
brasileira de contabilidade, ou a introdução de uma escola contábil brasileira
pelo contador e pesquisador Antônio Lopes de Sá, que formou as bases da
escola neopatrimonialista. Lopes de Sá utilizou-se dos conhecimentos de
Vincenzo Masi com a escola patrimonialista, mas introduziu conceitos que
complementam o estudo do fenômeno patrimonial.

Referência
HASTINGS, D. F. Contabilidade em contexto: uma novela contábil. São Paulo: Saraiva,
2012.

PADOVEZE, C. L. Manual de contabilidade básica: contabilidade introdutória e inter-


mediária. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2017.

SCHMIDT, P. História do pensamento contábil. Porto Alegre: Bookman, 2000.


Conteúdo:
DICA DO PROFESSOR

O vídeo a seguir foi elaborado para apresentar a você um breve relato da história contábil.
Confira!

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EXERCÍCIOS

1) O monge franciscano frei Luca Pacioli, considerado o “pai da contabilidade


moderna” disse a seguinte frase: “Ragio Spessa, Amista Longa”. O que ele orientava
aos comerciantes ao usar essa frase?

A) Orientava a não ter contabilidade.

B) O frei Luca Pacioli ressaltava nessa frase a necessidade de não apurar a contabilidade de
forma frequente, apenas quando havia a necessidade de expor o patrimônio a possíveis
interessados em realizar negócios com a entidade.

C) Essa frase não é de autoria de Luca Pacioli nem era utilizada por ele, era um ditado
popular na época.

D) Orientava os comerciantes a manterem e publicarem uma contabilidade para atrair pessoas


dispostas a colaborar com o negócio, o que chamou de “amizades”.

E) Luca Pacioli utilizava essa frase para comentar que os comerciantes não podem ser
interesseiros e buscar auxílio de amigos. Mesmo que sejam pacíficos, devem evitar o
envolvimento de terceiros no negócio.

2) O historiador José Maurício comentou, em um artigo científico apresentado em um


importante Congresso Internacional de contabilidade e administração, que a
contabilidade foi criada por Vincenzo Masi e pela Escola Contábil Patrimonialista.
Dias depois, o próprio José Maurício, ao ver as gravações da sua apresentação,
comentou que estava equivocado e disse isso porque estava pensando em outro
assunto naquele momento, portanto, foi um ato falho! Qual foi o equívoco cometido
pelo historiador?

A) O equívoco foi que a contabilidade não foi criada por Vincenzo Masi, mas por Fabio
Besta.

B) O equívoco foi ter apontado um criador para a contabilidade.

C) O equívoco foi que a contabilidade não foi criada por Vincenzo Masi, mas por Giuseppe
Cerboni.

D) Não houve equívoco por parte do historiador.

E) O equívoco foi que a contabilidade não foi criada por Vincenzo Masi, mas por Luca
Pacioli.

3) Sabe-se que, dentro da escola aziendal, Gino Zappa formou uma ciência econômica
aziendal que “significa, num olhar, uma abordagem científica da administração
econômica das aziendas”. Qual é o conceito de “azienda”?

A) Aziendas são estruturas que podem ser administradas, gerenciadas de acordo com as
decisões de um gestor.

B) Aziendas são empresas sem fins lucrativos.

C) "Azienda" é uma expressão separada da figura pessoal do sócio ou dono da empresa;


representa a entidade com sua própria personalidade jurídica, que não depende de gestores
para funcionar.
D) Aziendas são empresas rurais ou que participam do agronegócio.

E) Azienda é o mesmo que uma empresa sadia, bem administrada.

4) A auditora Regina estava conversando com Sandra, uma importante empresária que
acabou de conhecer. Sandra comentou que o patrimônio de uma de suas empresas
aumentou, apesar de o mercado em que atua estar em queda. Regina percebeu então
que a empresária estava se referindo a “patrimônio” como apenas os bens que a
empresa dispõe. Está correta essa abordagem ou é interessante que Regina explique
para Sandra qual é o conceito correto?

A) Não há necessidade de Regina dar alguma explicação, pois entende-se que o patrimônio
são os bens de uma entidade.

B) Não há necessidade de Regina explicar algo, pois foi uma operação atípica, para a qual não
há nenhuma consequência ao patrimônio.

C) É necessário que Regina comente que “patrimônio” é entendido como bens, direitos e
obrigações de uma entidade, não apenas os bens.

D) Não há necessidade de Regina explicar algo, pois não existe patrimônio nas empresas,
apenas capitais.

E) É necessário, pois deve-se excluir do patrimônio os bens ainda não pagos totalmente.

5) A Lei nº 6.404/76, das Sociedades Anônimas, introduziu no ordenamento jurídico


brasileiro as Normas Internacionais de Contabilidade. Esta afirmação está correta?

A) Sim. A Lei nº 6.404/76 introduziu no ordenamento jurídico brasileiro as Normas


Internacionais de Contabilidade.
B) Não. A Lei nº 6.404/76 inseriu no Brasil as Normas Contábeis Norte-americanas, as US
GAAPs.

C) A afirmação está correta em parte, pois a Lei nº 6.404/76 introduziu as Normas


Internacionais relacionadas às grandes empresas, mas não as leis internacionais referentes
às normas internacionais para pequenas e médias empresas.

D) Não, pois o Brasil não se alinhou às Normas Internacionais de Contabilidade.

E) Não. A Lei nº 6.404/76 foi um alinhamento do Brasil à Escola Americana de


Contabilidade.

NA PRÁTICA

O que é mais importante em uma entidade?

Wanderley é um comerciante de alimentos, o que o mercado chama de “atacadista”. Sua


empresa é bem menor em comparação a grandes grupos nacionais e multinacionais que atuam
no Brasil nesse mesmo ramo. Ao contrário dos grandes atacadistas, Wanderley costuma ter uma
rede de relacionamento muito sólida com micro, pequenas e médias empresas em todo o Brasil.

É possível encontrar em seu atacado, em uma quantidade razoável, doces típicos fabricados em
Minas Gerais e produtos indígenas produzidos em tribos de índios no Centro-Oeste. A empresa
é muito procurada por donos de bares, restaurantes sofisticados e outros negócios que procuram
variedade e produtos de qualidade, sendo, portanto, altamente rentável, gerando muito caixa.
Porém, de acordo com a contabilidade, teria o seguinte:

Como bens e direitos intangíveis, podemos ter a marca da empresa, o local onde ela está
instalada, os softwares que utiliza, a rede de relacionamentos com fornecedores e,
principalmente, os métodos de trabalho que utiliza. Tudo isso são capitais financeiros, humanos,
intelectuais, naturais e de relacionamento.

Assim, de acordo com as normas, é possível reconhecer contabilmente os valores intangíveis. O


método das partidas dobradas é da Idade Média, mas isso não significa que a ciência contábil
parou no tempo. Pelo contrário, há uma evolução constante para acompanhar e, em alguns
casos, até antever as necessidades do mercado.

SAIBA MAIS

Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do
professor:

História da contabilidade

No link abaixo você vai ler um pouco mais sobre a evolução e a história da contabilidade.

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Normas internacionais de contabilidade

No link abaixo você vai ler um estudo sobre as normas internacionais de contabilidade aplicadas
ao setor público.

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