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A generosa acolhida dos leitores fez esgotar-se a quarta edição desta obra
em pouco mais de dois meses depois de publicada. Porque preparada a
anterior com grande zelo e cuidado durante mais de três anos, esta sai
somente com pequenos ajustes e correções. Além disso, a necessidade
urgente de nova edição faz com que se deixem os acréscimos a verbetes
existentes ou a inserção de novos para uma próxima oportunidade.
Importa, a esta altura, num primeiro plano, lembrar os seguintes
aspectos dos Decretos 6.583, 6.584 e 6.585, todos de 29.09.2008: (i) o
Acordo Ortográfico de 2008 produziria efeitos no Brasil a partir de
1º.01.2009; (ii) seria observado um período de transição entre 1º.01.2009 e
31.12.2012; (iii) nesse interregno, coexistiriam, ambas com validade, a
norma ortográfica antiga e a nova norma estabelecida; (iv) a contar de
1º.01.2013, entretanto, a escrita haveria de obedecer somente à nova norma
estabelecida.
Ora, poucos dias depois de publicada a edição anterior deste Manual, foi
editado o Decreto 7.875, em 27.12.2012, o qual alargou para 31.12.2015, o
período de transição entre os regimes ortográficos, de modo que, durante
esse tempo, “coexistirão a norma ortográfica atualmente em vigor e a nova
norma estabelecida.”
Do cotejo entre os decretos de 2008 e 2012, é possível concluir com
facilidade para esse tempo que se abre à frente: (i) o decreto de 2012 em
nada modificou as regras do Acordo Ortográfico de 2008; (ii) apenas se
alargou de 2012 para 2015 o período de transição entre os sistemas
ortográficos; (iii) durante esse lapso temporal, hão de coexistir validamente
a norma ortográfica antiga e a nova norma estabelecida; (iv) por expressa
previsão da norma por último editada, a partir de 1º.01.2016 somente será
correto escrever pela nova norma estabelecida.
Em última análise, isso quer dizer que a regra editada sobre o assunto
no fim do ano de 2012 em nada alterou a validade e a eficácia do conteúdo
desta obra.
O autor.
josemaria@ajmadvogados.com.br
1 KEMPIS. Omnis speculatio nostra quadam caligine non caret.
APRESENTAÇÃO
EVANILDO BECHARA
Membro da Academia Brasileira de Letras
SÍMBOLOS E SINAIS
&
Ampersand, 798
’
Apóstrofo, 798
“”
Aspas duplas, 799
‘’
Aspas simples, 800
*
Asterisco, 800
¸
Cedilha, 800
ANEXO
Uso do hífen com base no prefixo e na letra inicial da palavra seguinte, 803
A
A alface ou o alface?
1. Uma leitora afirma que tem ouvido, com certa frequência, em
restaurantes, pessoas pedindo o alface em vez de a alface. Como até ela
ficou na dúvida, pergunta se o correto é dizer e escrever o alface ou a
alface.
2. Ora, sempre é bom lembrar – até para criar no leitor o hábito de um
salutar raciocínio que se repete – que, quando se quer saber se uma
palavra existe ou não em português, ou mesmo qual é seu gênero, grafia
e/ou pronúncia, ou qual o seu plural quando foge à normalidade, deve-se
tomar por premissa o fato de que a autoridade para listar oficialmente os
vocábulos pertencentes ao nosso idioma e para definir-lhes as demais
peculiaridades e circunstâncias, é a Academia Brasileira de Letras.
3. E essa autoridade, a ABL a exerce por via da edição do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa.
4. Uma simples consulta ao VOLP (2009, p. 37) mostra que alface é
palavra pertencente ao gênero feminino (a alface, e não o alface).
5. Assim, em reposta à leitora, confiram-se os seguintes exemplos, com a
indicação de sua correção ou erronia entre parênteses: a) “Ele pediu um
alface com tomate” (errado); b) “Ele pediu uma alface com tomate”
(correto).
A baixo ou Abaixo?
1. Em lição bem prática, observa Domingos Paschoal Cegalla: “Escreve-se
a baixo (locução adverbial) em oposição a de cima, em frases como: A
cortina rasgou de cima a baixo.”
2. Acrescenta tal autor que, “nos demais casos, grafa-se abaixo (antônimo
de acima)”. Ex.: “O plano foi por água abaixo” (CEGALLA, 1999, p.
1).
3. Veja-se este exemplo de correção quanto ao emprego do vocábulo
adequado em artigo de lei: “No caso da existência dos dispositivos de
proteção a que este artigo se refere, não deverá a diminuição ser tal que
faça o iluminamento cair abaixo dos mínimos prescritos no art. 159”
(CLT, art. 162, parágrafo único, revogado).
Abalroamento
1. Pode-se dizer que abalroamento é o “choque de dois veículos em terra,
águas ou no ar” (Encyclopaedia Britannica do Brasil, 1995, p. 10).
2. Atente-se, por primeiro, a que a grafia de tal vocábulo é com apenas um
r, como convém o som de duplo erre entre uma vogal e uma consoante,
como se dá, similarmente, com enredar e enrolar.
3. Para Celso Pedro Luft (1999, p. 21), pode tal substantivo ser usado com
as preposições com e entre: “O abalroamento de um barco com outro.
Um abalroamento entre barcos.”
4. Francisco Fernandes, porém, vê a possibilidade de construção para esse
substantivo com uma de três preposições: com, de e entre. Exs.: a) “Não
foi possível evitar o abalroamento com o cargueiro”; b) “Causou grande
prejuízo o abalroamento dos dois navios”; c) “O abalroamento entre as
duas barcas não teve graves consequências” (1969, p. 1).
Abater
1. Na consonância com lição de Vitório Bergo, “considera-se galicismo o
emprego do verbo abater no sentido de derrubar, atirar por terra, como
em abater a tiros, a facadas etc.” (1944, p. 9).
2. Caldas Aulete, todavia, sem condenação alguma, traz exemplo
exatamente nesse sentido, sendo abonado por Francisco Fernandes, que
o cita: “Abateram hoje no matadouro cinquenta bois” (FERNANDES,
1971, p. 35).
3. Celso Pedro Luft (1999, p. 22-3) também lhe confere a acepção de
matar, como em abater reses.
Abdicar
1. Tem o sentido de renunciar voluntariamente, de abandonar, de desistir.
2. Quanto à regência verbal, admite indistintamente duas sintaxes: pode ser
construído como transitivo direto ou como transitivo indireto
(preposição de). Exs.: a) “O réu abdicou sua versão inicial sobre o
crime” (transitivo direto). b) “O réu abdicou de sua versão inicial sobre
o crime” (transitivo indireto).
3. A. M. de Sousa e Silva, em observação bem prática, resume a questão:
“Tanto é lícito dizer, por exemplo, ‘abdicou dos seus direitos’ como
‘abdicou os seus direitos’” (1958, p. 17).
4. Observando que “a construção primitiva é com objeto direto” e que, para
Mário Barreto, “alguns dizem abdicar de, sem dúvida por causa da ideia
de separação que o verbo encerra”, reitera Domingos Paschoal Cegalla
(1999, p. 2) que abdicar pode ser usado como intransitivo (à semelhança,
de um modo geral, de todos os verbos normalmente transitivos), como
transitivo direto ou como transitivo indireto. Exs.: a) “Pressionado pelo
povo, o rei decidiu abdicar”; b) “O rei abdicou a coroa em favor de seu
filho”; c) “O imperador Dom Pedro I abdicou da coroa portuguesa em
favor de sua filha”.
5. Essas possibilidades de sintaxe também são referidas por Celso Pedro
Luft (1999, p. 23).
Abençôo ou Abençoo?
Ver Enjôo ou Enjoo? (P. 319)
Abolir
1. Quanto à conjugação verbal, trata-se de verbo defectivo, caracterizando-
se por não ter as formas em que, de acordo com a conjugação normal do
modelo da terceira conjugação, ao l do radical se seguiria a ou o,
defectividade essa que ocorre no presente do indicativo e nos tempos
dele derivados.
2. Em outras palavras, conjuga-se “nas formas em que a terminação
começa pela vogal e ou pela vogal i” (REIS, 1971, p. 145).
3. Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade (1999, p. 29) também
o inserem no rol dos verbos defectivos, conjugado apenas nas formas
cuja terminação começa com e ou i.
4. Vitório Bergo, de igual modo, sintetiza a conjugação desse verbo do
seguinte modo: “repelem-se as desinências em o, a; admitem-se as em e;
usam-se naturalmente as em i; … como se vê, não há presente do
subjuntivo e, em consequência, imperativo negativo” (1943, p. 81).
5. Em termos bem práticos, não tem ele a primeira pessoa do singular do
presente do indicativo, mas apenas as demais: tu aboles, ele abole, nós
abolimos, vós abolis, eles abolem.
6. No imperativo afirmativo, tem somente as pessoas derivadas do presente
do indicativo: abole tu, aboli vós.
7. Como os problemas mencionados ocorrem apenas no presente do
indicativo e nos tempos daí derivados, já referidos, a defectividade
mencionada não se dá nos outros tempos, que são normalmente
conjugados em todas as pessoas: eu abolia (imperfeito do indicativo), eu
abolirei (futuro do presente), eu aboliria (futuro do pretérito), abolindo
(gerúndio), abolido (particípio), eu aboli (pretérito perfeito do
indicativo), eu abolira (pretérito mais-que-perfeito do indicativo),
quando eu abolir (futuro do subjuntivo), se eu abolisse (imperfeito do
subjuntivo).
8. Para não sobejar dúvida alguma e para que se tenha a real ideia da
frequência com que surgem dificuldades na conjugação, Sousa e Silva
observa que “não se usam, portanto, formas como abulo, abula, abulas”
(1958, p. 17).
9. Por esse verbo, conjugam-se, entre outros, adimplir, banir, colorir,
demolir, extorquir, haurir, delinquir e usucapir.
Abordar
1. Insurge-se Júlio Nogueira contra seu emprego no sentido de aproximar-
se, acercar-se de alguém para falar-lhe, reputando galicismo.
2. Assim, em vez de abordou o amigo, entende tal gramático se deva dizer:
Ele aproximou-se, acercou-se do amigo, dirigiu-se ao amigo.
3. De igual modo, tal autor (NOGUEIRA, 1959, p. 54) reputa galicismo
seu emprego com o significado de tratar, versar, como em abordar um
assunto, abordar uma questão.
4. Cândido Jucá Filho (1981, p. 38) também tem por galicismo o emprego
desse verbo em expressões como abordar uma pessoa e abordar uma
questão.
5. Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 20), em mesma esteira,
lembrando que o termo português é versar, cuidar, tratar, discorrer,
observa que o verbo abordar nesse sentido é estrangeirismo léxico muito
encontrado na linguagem forense.
6. Nessas acepções de achegar-se a alguém ou de tratar (um tema, um
assunto, uma questão), Domingos Paschoal Cegalla, embora
reconhecendo tratar-se de galicismo, procura ter posicionamento mais
flexível, dirigindo-se, todavia, apenas à linguagem coloquial, não àquela
que obedece ao padrão culto.
7. Para ele, em tal caso, “abordar é galicismo de uso corrente, não devendo,
por isso, ser condenado” (CEGALLA, 1999, p. 3).
8. Referindo-se, por sua vez, ao torneio abordar uma questão, anota
Francisco Fernandes que “alguns puristas condenam de galicismo o
verbo abordar quando empregado em frases semelhantes”; mas
complementa que “há exemplos abonados por escritores de boa nota”
(1971, p. 38).
9. De igual modo, Celso Pedro Luft (1999, p. 24), sem comentários
adicionais e sem reservas outras, abona-lhe o emprego, assim no
significado de chegar-se a alguém para interrogá-lo, como na acepção de
versar.
10. Ante a divergência entre os estudiosos – uns aceitando, outros
condenando – invoca-se a liberdade linguística para aceitar como
válidas e corretas as construções em que o verbo abordar tanto tem o
sentido de “achegar-se a alguém”, como a acepção de “tratar um
assunto”.
Abreviatura, Abreviação e Sigla – O que é e Como usa?
1. Abreviatura é a representação de uma palavra por uma ou algumas de
suas letras: art. por artigo, inc. por inciso, par. por parágrafo, decr. por
decreto.
2. Desde logo e para registro, anota-se a lição de José de Nicola e Ernani
Terra: “Não devemos confundir abreviação” (um processo de formação
de palavras que consiste na redução da palavra até o limite que não
prejudique a compreensão) “com abreviatura, que é uma representação
de uma palavra por meio de algumas de suas sílabas ou letras” (2000, p.
14).
3. Quando a abreviatura se dá pela utilização das iniciais das palavras, tem-
se a sigla. Assim, DASP era o antigo Departamento Administrativo do
Serviço Público; I.N.S.S., o Instituto Nacional de Seguridade Social.
4. O Formulário Ortográfico oficial, que traz registradas as reduções mais
correntes, com a explicação de que “uma palavra pode estar reduzida de
duas ou mais formas” (ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2009,
p. 865), não mostra, por seu lado, uniformidade. É confuso e deficiente
nesse campo, deixando sem solução diversos problemas.
5. Bem por isso, ante a própria visão oficial mais permissiva, quando se
tiver que abreviar, dever-se-á ter em mente a advertência de Napoleão
Mendes de Almeida: “o que a abreviatura, contração ou sigla deve
objetivar é a clareza; alcançada esta, não cabem objeções” (1981, p. 6).
6. Em outras palavras, o melhor é concluir que ao usuário do idioma assiste
certa liberdade para abreviar as palavras e expressões, guardados
determinados parâmetros e princípios.
7. Estabelecidas tais premissas, algumas regras são de grande utilidade
nessa tarefa de abreviar.
8. Por primeiro, deve-se ter a cautela de, sempre que possível, terminar a
abreviatura em consoante, não em vogal. Ex.: filosofia há de ser
abreviada como filos. ou fil., mas não filo.
9. Se a palavra é cortada num grupo de consoantes, todas estas devem
aparecer na abreviatura. Ex.: a forma abreviada de geografia há de ser
geogr., e não geog.
10. Apesar de ser este o posicionamento tradicional, Regina Toledo
Damião e Antonio Henriques (1994, p. 244), após observarem que, por
“via de regra, substituem-se as letras por um ponto colocado após a
consoante, e após a última consoante dos encontros consonantais”,
como adj. para adjunto e antr. para antropônimo, lembram que “a
ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) determinou o
ponto nas abreviaturas técnicas modernas após a vogal ou depois da
primeira consoante do encontro: ago. (agosto), anu. (anuário), téc.
(técnica), fáb. (fábrica)”.
11. Se na parte constante da abreviatura aparece o acento gráfico da
palavra, deve ele continuar na abreviatura. Ex.: em página, tem-se a
abreviatura pág., jamais pag.
12. Além disso, pelo Decreto-lei 592, de 4/8/38, mantido e seguido pelo
Formulário Ortográfico, as abreviaturas de unidades de medidas de
peso, extensão e tempo hão de ser escritas com inicial minúscula, sem
ponto final e sem o s indicativo do plural. Ex.: grama é g, metro é m, e
hora é h; o plural de gramas é g, de metros é m e de horas é h.
13. O Pequeno Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, em seu
registro de abreviaturas, traz diversos casos, dos quais a expressão
“Departamento Administrativo do Serviço Público” é exemplo típico:
anota-se lá que sua sigla pode ser “D.A.S.P. ou Dasp”; e Napoleão
Mendes de Almeida (1981, p. 6), adicionalmente e com total razão, não
vê inconveniente algum em aceitar também a abreviatura “DASP”.
14. Nas siglas, o mais lógico é não usar o ponto de separação, se as letras
são pronunciadas formando nova palavra, como ARENA (Aliança
Renovadora Nacional, antigo partido político dos tempos da ditadura);
se, todavia, a leitura da sigla se dá em soletração, então o mais
adequado é usar o ponto de separação entre as letras, como em I.N.S.S.
(Instituto Nacional de Seguridade Social).
15. Essa, aliás, é a lição de Cândido de Oliveira: “se lemos letra por letra
(ene, gê, bê), entre elas há ponto (N. G. B.); se as letras formam um
todo significativo, não há ponto: DEA”.
16. Do primeiro caso, para o mesmo autor (OLIVEIRA, C., 1961, p. 77),
são exemplos I.N.S.S. (Instituto Nacional de Seguridade Social) e
P.V.O.L.P. (Pequeno Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa),
enquanto do segundo são MEC (Ministério da Educação e Cultura),
PETROBRAS (Petróleo Brasileiro), SESI (Serviço Social da Indústria)
e UBE (União Brasileira dos Escritores). Observa-se, por importante,
que as siglas não têm acento, motivo por que PETROBRAS e SESI se
escrevem sem ele.
17. Apesar de lição tradicional anterior, Luciano Correia da Silva anota que
o uso constante vem contrariando a regra segundo a qual se utilizam
pontos nas siglas cujas letras se pronunciam separadamente: I.N.P.S.,
O.A.B., segundo tal autor, passou-se a escrever INPS, OAB.
18. Em outra passagem, acrescenta tal autor (SILVA, L., 1991, p. 182 e
323) que “há uma tendência crescente para a eliminação dos pontos nas
siglas em geral: MP (Ministério Público), CPC (Código de Processo
Civil), TJ (Tribunal de Justiça), RT (Revista dos Tribunais), STF
(Supremo Tribunal Federal), STJ (Superior Tribunal de Justiça), CLT
(Consolidação das Leis do Trabalho), MP (Medida Provisória), PM
(Polícia Militar)”.
19. Em mesmo sentido, para Regina Toledo Damião e Antonio Henriques,
as siglas, em casos dessa natureza, podem vir, indiferentemente,
acompanhadas ou não de ponto – MEC ou M.E.C., CIC ou C.I.C. –
acrescentando tais autores que “a tendência moderna é o uso de siglas
sem pontuação” (1994, p. 245).
20. Aires da Mata Machado Filho (1969h, p. 1.453) aconselha a que não se
empregue o ponto nas abreviaturas usadas em matemática: log
(logaritmo), cot (cotangente). Talvez aqui se possa especular tal
ausência pelo fato de que o próprio ponto tem o seu próprio significado
em Matemática.
21. Quanto ao plural das abreviaturas – feita a ressalva já apontada para as
unidades de medida, de peso, extensão e tempo, que são escritas sem
ponto final e sem o s indicativo do plural – a própria ortografia oficial,
em alguns casos, emprega a mesma forma abreviada, sem modificação
alguma, no singular e no plural: assim, determina o uso de ex. por
exemplar ou exemplares, esc. por escudo ou escudos; em outros casos,
porém, usa uma forma para cada número: assim, registra p. ou pág.
para o singular e pág. ou págs. para o plural.
22. Ante tal indefinição oficial, também aqui parece aceitável que, nos
casos comuns, se pluralize ou não a forma abreviada, de acordo com a
melhor conveniência do usuário, que poderá, por exemplo, abreviar
artigos como art. ou arts, incisos como inc. ou incs., colaboradores
como colab. ou colabs.
23. Ainda no que concerne à pontuação, anote-se que, se a palavra
abreviada aparecer em final de período, este não receberá outro ponto
(SACCONI, 1979, p. 236).
24. Parece integralmente aceitável a lição de Napoleão Mendes de Almeida
(1981, p. 298) de que se pluralizam as siglas pelo acréscimo de um s
minúsculo às letras já integrantes delas: CEPs, CICs, RGs.
25. Desse entendimento também é Arnaldo Niskier, para quem “não há
motivos para não marcar o plural das siglas com um s minúsculo”
(1992, p. 111).
26. Regina Toledo Damião e Antonio Henriques também partilham do
mesmo entendimento de que, “com respeito ao plural das siglas, aceita-
se o uso do s (minúsculo) para efeito de pluralização: PMs, INPMs,
MPs” (1994, p. 245).
27. Tal uso de um s minúsculo ao final da sigla, no entendimento de
Edmundo Dantès Nascimento, “é uma solução gráfica sem aprovação
de convenção acerca do assunto, mas que resolve o caso” (1982, p.
208).
28. A junção do s minúsculo à sigla visa a levá-la ao plural. Isso significa
que se deve unir o s sem mais nada, o que seria o caso do apóstrofo.
Aliás, pluralizar pelo acréscimo de um s é como se faz em nosso
idioma. Além disso, só para exemplificar, ninguém pensaria em
escrever o plural de caneta como caneta’s.
29. Não se pode dizer que essa mania seja uma tentativa de americanizar o
modo de escrever o vocábulo, uma vez que, no próprio inglês, quando
o s representa o plural, vem ele unido diretamente ao vocábulo (terms,
translations), e só se emprega o apóstrofo, quando se pretende
expressar a posse entre dois substantivos, com referência a pessoas ou
animais, hipótese em que se usa o esquema “possuidor + apóstrofo (’)
+ possuído”. Exs. a) The country of John > John’s country (O país de
John); b) The car of Mary > Mary’s car (O carro de Mary).
30. Parece interessante sintetizar o que há de mais importante nessa
questão com as seguintes observações: a) uma palavra pode ser
abreviada de uma ou mais formas; b) o modo de tratar o assunto pela
autoridade respectiva não mostra uniformidade, além de ser confuso e
deficiente; c) guardados determinados parâmetros e princípios, fica ao
usuário a liberdade nessa tarefa, desde que haja objetividade e clareza;
d) quando uma sigla é pronunciada como nova palavra, normalmente
não se usa ponto (PETROBRAS), ao contrário do que ocorre quando há
soletração (I.N.S.S.); e) essa regra, porém, não é rígida, e se pode
escrever DASP ou D.A.S.P, e I.N.S.S. ou INSS; f) ressalvadas as
unidades de medida, de peso, extensão e tempo, que são escritas sem
ponto final e sem o s indicativo do plural, as demais abreviaturas
podem ser com s ou sem ele (pode-se abreviar artigos como art. ou
arts, incisos como inc. ou incs., colaboradores como colab. ou
colabs.); g) as siglas podem, sem obrigatoriedade, ser pluralizadas pelo
acréscimo de um s minúsculo (CEPs, CICs), mas sem apóstrofo algum
(CEPs [e não CEP’s] e CICs [e não CIC’s]).
Ver Abreviatura no processo (P. 57) e Sociedade Anônima (P. 706).
Abreviatura no processo
1. Repetindo nesse particular norma do art. 15 do ordenamento processual
anterior, o art. 169, parágrafo único, do Código de Processo Civil, ao
regrar a forma dos atos do processo, estatui de modo taxativo: “É vedado
usar abreviaturas”.
2. No conceito de Pontes de Miranda, “abreviatura é toda grafia que
diminui a palavra, ou locução, ou frase, com elementos dela mesma”,
acrescentando tal autor que o proceder de quem abrevia “indica, sempre,
pressa, economia de tempo, de fadiga”, e, “às vezes, simples amor a
símbolos, a sinais, sem que a intensidade da vida social ou individual a
justifique” (1974, p. 94).
3. Pondera Egas Dirceu Moniz de Aragão, para o caso da determinação do
ordenamento processual em vigor, que “a vedação do uso de
abreviaturas não é absoluta, sendo elas admissíveis nos casos comuns,
como a indicação dos números e datas, assim como, por exemplo, do
mês, pela ordem numérica”.
4. Asseverando que “o que se proíbe é o emprego da abreviatura de
palavras, por tornar difícil, senão impossível, a compreensão, no futuro,
do texto”, justifica ele que “os autores medievais, incluídos os
glosadores, assim como os praxistas portugueses, valiam-se muito das
abreviaturas, que dificultam o entendimento”, adicionando que, “se isso
se aplicasse aos autos de qualquer processo, surgiriam inadmissíveis
dúvidas de interpretação” (ARAGÃO, 1974, p. 62).
5. Por sua vez, Antônio Dall’Agnol – com a ponderação de que a regra
deve “ser interpretada cum grano salis”, já que seu escopo é “evitar
obscuridade” – realça que “existem abreviaturas, no entanto, que já
ganharam foros de cidade na atividade forense, não havendo porque
deixar de usá-las”, uma vez que, “na maioria das vezes, representam
economia de tempo”.
6. E exemplifica o referido autor: “Assim, v. g., Rh (recebi hoje); D.R.A.
(distribua-se, registre-se, autue-se) etc.”.
7. Por fim, complementa: “O que não merece admissão é o uso de
abreviaturas comuns em outras áreas, como na bancária ou na de
contabilidade, por não serem de domínio geral ou específico dos
profissionais do direito e partes” (DALL’AGNOL, 2000, p. 277).
8. Acresce dizer que o art. 15 do Código de Processo Civil de 1939, além
de vedar as abreviaturas, também determinava deverem “ser escritos por
extenso os números e as datas”, regra essa não repetida pelo
ordenamento processual em vigor; assim, não mais existe
obrigatoriedade alguma nesse sentido, devendo o usuário apenas zelar no
sentido de ser claro e de dificultar eventual fraude.
9. Anote-se, por fim, o ensino de Pontes de Miranda, no que concerne à
transgressão do disposto no art. 169, parágrafo único, do Código de
Processo Civil: “o defeito, aparecendo as abreviaturas em atos e termos,
não é sem eventuais remédios: o dos arts. 243 e 245” (1974, p. 94).
10. Isso quer dizer, por um lado, que, “quando a lei prescrever determinada
forma, sob pena de nulidade, a decretação desta não pode ser requerida
pela parte que lhe deu causa” (CPC/1973, art. 243); por outro lado,
quer significar que “a nulidade dos atos deve ser alegada na primeira
oportunidade em que couber à parte falar nos autos, sob pena de
preclusão” (CPC/1973, art. 245).
11. E se acrescente o vetusto princípio de processo segundo o qual não se
decreta nulidade sem prova do prejuízo.
Ver Abreviatura, Abreviação e Sigla – O que é e Como usa? (P. 55)
Abrigo
Ver Estar ao abrigo de – Galicismo? (P. 334)
Ab-rogação ou Abrogação?
1. Vulgarmente, tem o sentido de desuso, anulação, supressão.
2. Em termos de técnica jurídica, com acepção mais específica, quer dizer a
“revogação total de uma lei ou decreto, de uma regra ou regulamento,
por uma nova regra, lei, decreto ou regulamento” (DE PLÁCIDO E
SILVA, 1989, p. 13).
3. Não confundir com derrogação, que quer dizer revogação parcial, nem
com revogação, que é palavra genérica, abrangente de ambos os termos
considerados.
4. Quanto à ortoepia, Evanildo Bechara (1974, p. 46) doutrina que o r deve
ser pronunciado múltiplo e separado, isto é, sem fazer grupo com a
consoante anterior (ab-ro-ga-ção).
5. Desse mesmo sentir é Cândido Jucá Filho (1963, p. 24).
6. No que concerne à ortografia, há de ter o hífen após o prefixo, como,
aliás, se registra no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de
determinar a grafia dos vocábulos em nosso idioma, em sua edição
posterior ao Acordo Ortográfico de 2008, portador de alterações no que
tange ao emprego do hífen (2009, p. 9).
7. Quanto a sua regência, Francisco Fernandes (1969, p. 5) registra deva
ser construído tal vocábulo com a preposição de. Ex.: “A administração
reputa conveniente a ab-rogação total da lei”.
8. Nesse campo, também para Celso Pedro Luft (1999, p. 24), tal vocábulo
rege a preposição de.
Ver Ab-rogar ou Abrogar? (P. 58)
Ab-rogar ou Abrogar?
1. Com hífen é a sua grafia, como, aliás, se registra no Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
órgão incumbido oficialmente de determinar a grafia dos vocábulos em
nosso idioma, em sua edição posterior ao Acordo Ortográfico de 2008, o
qual trouxe alterações no que concerne ao emprego do hífen (2009, p. 9).
2. Quanto à ortoepia, à semelhança de ab-rogação, Evanildo Bechara
(1974, p. 46) doutrina que o r deve ser pronunciado múltiplo e separado,
isto é, sem fazer grupo com a consoante anterior (ab-ro-gar).
3. Desse mesmo sentir é Cândido Jucá Filho (1963, p. 24).
4. Quanto a sua exata acepção no campo jurídico, já lembrava Modestino,
jurisconsulto do Direito romano: “ab-roga-se a lei, quando se suprime
inteiramente” (“Abrogatur legi cum prorsus detrahitur”).
5. Não confundir com derrogar, que quer dizer revogar parcialmente, nem
com revogar, que é palavra genérica, abrangente de ambos os termos
considerados.
6. Quanto à regência verbal, Francisco Fernandes (1971, p. 40) preconiza
seu emprego como transitivo direto, com consequente possibilidade de
emprego na voz passiva, tornando-se o objeto direto daquela em sujeito
desta última: “Falamos de sacrifícios abolidos, usanças ab-rogadas, leis
de sangue mudadas em leis de misericórdia” (Camilo Castelo Branco).
7. Conferindo-lhe a possibilidade de emprego com a acepção de fazer
cessar, anular, cassar, revogar, suprimir, abolir, também Celso Pedro Luft
prega a possibilidade de seu emprego como transitivo direto: “Não há
costume que o tempo não ab-rogue” (1999, p. 26).
Ver Ab-rogação ou Abrogação? (P. 58)
Abrupto ou Ab-rupto?
1. Trata-se de adjetivo que tem o significado de íngreme, ou de inopinado,
repentino. Exs.: a) “A cordilheira ali se levanta abrupta”; b) “O
advogado interrompeu o magistrado de modo abrupto”.
2. Apesar de Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 7) enfatizar se deva
pronunciar a-brup-to, e Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 4) também
proponha a mesma pronúncia, por “mais cômoda e natural”, porquanto a
outra, apesar de mais correta, seja “áspera e difícil”, o certo é que
Evanildo Bechara (1974, p. 46), quanto à ortoepia, doutrina que o r deve
ser pronunciado múltiplo e separado, isto é, sem fazer grupo com a
consoante anterior (ab-rupto).
3. Desse último sentir também é Cândido Jucá Filho (1963, p. 24).
4. E, espancando toda e qualquer dúvida, o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras (2009, p. 9), que é
o veículo oficial indicador das palavras existentes em nosso idioma, de
sua maneira de grafar e mesmo de pronunciar, registra abrupto e ab-
rupto, razão pela qual ambas as formas estão autorizadas, por força do
velho princípio de que essa é a determinação legal.
Absolutizar – Existe?
1. Nos dizeres de Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade, trata-
se de invenção não registrada pelos dicionários, assim como diversos
outros pretensos neologismos, “criados por influência do economês,
como oportunizar, otimizar, calendarizar etc.” (1999, p. 66).
2. Nem dicionaristas mais liberais, como Aurélio Buarque de Holanda
Ferreira, acolhem tal verbo.
3. É conveniente registrar, todavia, que o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras – que é o veículo
oficial para listar os vocábulos existentes em nosso idioma – registra
normalmente o verbo absolutizar (2009, p. 9), o que implica concluir que
seu uso está perfeitamente autorizado entre nós.
Absoluto
Ver Mais absoluto – Está correto? (P. 453)
Abster-se
Ver Ter (P. 730).
Abuso
Ver De que (P. 269) e Uso abusivo – Está correto? (P. 752)
Abuso do gerúndio
Ver Gerúndio abusivo (P. 373).
Acabamento final – Está correto?
Ver Pleonasmo – O que é e Quando pode? (P. 565)
Academia ou Acadimia?
1. Uma leitora pergunta se, quanto à pronúncia, o correto é academia ou
acadimia.
2. Fixa-se uma primeira regra: a Academia Brasileira de Letras detém a
autoridade para definir qual a escrita correta dos vocábulos pertencentes
ao idioma pátrio. E ela exerce sua autoridade por via da edição do
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa. Nesse ponto, não parece
haver dúvida quanto à extensão do que assim se determina.
3. E se aponta uma segunda regra, segundo a qual também assiste à ABL
estabelecer os aspectos adicionais referentes aos vocábulos pertencentes
ao nosso léxico: pronúncia, categoria gramatical (substantivo, adjetivo,
verbo…), gênero (masculino ou feminino), número (singular ou plural).
4. De modo específico no que concerne à correta articulação das palavras,
entretanto, a indicação vem depois dos respectivos vocábulos, mas
apenas naqueles casos em que possa haver reais dúvidas: adrede (ê),
ileso (ê ou é), obeso (ê ou é), socorros (ó).
5. Não se deve confundir, entretanto, essa questão de erros de pronúncia
(como nos casos apontados, em que é obrigatório seguir o quanto
definido pela ABL por via do VOLP) com a diversidade de enunciação
de determinados sons pelos rincões de toda a extensão territorial do País
(e nisso não há erro algum).
6. Vejam-se alguns exemplos dessa diversidade de pronúncia de certos sons
pelo extenso território nacional, o que não constitui erro algum de
pronúncia ou de Gramática, mas apenas avulta a existência de
peculiaridades locais ou regionais: a) a porta do interior do Estado de
São Paulo não é a mesma porta do carioca; b) o leite quente do paulista
não terá a mesma pronúncia do leite quente do gaúcho; c) a titia do
interiorano de São Paulo não será a mesma titia do paranaense
tradicional; d) a academia pronunciada por um sulista há de virar
acadimia na boca de um célebre maranhense; e) na boca do mesmo
maranhense, poder viraria pudêr.
Acamar
1. Por um lado, é certo que Ronaldo Caldeira Xavier (1991, p. 89), ao
inserir a expressão guardar o leito no rol dos galicismos sintáticos,
aconselha sua substituição por acamar, estar de cama.
2. Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 24), por outro lado, observa que
“acamar significa dispor em camadas” e que a expressão correta, para
aquilo que normalmente se pretende dizer, é estar enfermo, estar de
cama.
3. Apesar da referida lição, o certo é que nossos dicionaristas registram tal
verbo com ambas as acepções, como se pode ver, por exemplo, em
Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (s/d, p. 16).
Ver Guardar o leito – Galicismo? (P. 380)
Ação
Ver Contra ou a favor (P. 228).
Ação contra
Ver Contra ou a favor (P. 228).
Ação em face de
Ver Contra ou a favor (P. 228).
A capela ou À capela?
1. Um leitor pergunta se o correto é escrever “Cantar o hino a capela” ou
“Cantar o hino à capela”.
2. Esclareça-se, de início, que, com a mencionada expressão, quer-se dizer
daqueles cantos em coro, que são executados sem acompanhamento
algum de instrumentos musicais.
3. Ao depois, num primeiro aspecto, importa anotar que o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, veículo pelo qual a Academia
Brasileira de Letras exerce sua função de listar oficialmente as palavras
que integram nosso idioma, registra, de modo expresso e taxativo, o
vocábulo capela e lhe confere a condição de substantivo feminino
(VOLP, 1999, p. 156).
4. Como, todavia, seguindo o que é usual, não se fixa ali o respectivo
significado, não há certeza se o registro feito se refere à palavra no
sentido da dúvida ora apreciada, ou se capela apenas fica com o
significado de pequena igreja de um só altar.
5. Mas não é só: nesse panorama, a dúvida se torna ainda mais pertinente,
porque nossos dois mais importantes dicionaristas da atualidade se põem
em divergência quanto ao assunto.
6. Assim, Antônio Houaiss não considera o vocábulo já aportuguesado e,
por isso, confere à locução a grafia italiana, tal como é escrita na língua
de origem: a capella (2001, p. 42).
7. Já Aurélio Buarque de Holanda Ferreira aportuguesa a expressão e a
torna parte integrante do vernáculo, escrevendo-a a capela (2010, p.
418).
8. Com essas ponderações, parece possível e oportuno extrair as seguintes
ilações: a) a ABL, que tem autoridade para resolver a questão por meio
do VOLP, deixou-a sem definição, contrariando posição dela própria em
diversos outros vocábulos; b) e, nesse ponto, espera-se da Academia
uma melhor definição sobre a matéria em uma próxima edição do
VOLP; c) ante essa indefinição do órgão oficialmente incumbido, é
possível aceitar as duas posições, tanto a do aportuguesamento da
expressão, como a da sua manutenção no idioma de origem; d) assim,
em primeira possibilidade, pode-se considerar a expressão ainda
estrangeira e não integrada ao vernáculo; e) nesse caso, deve ela ser
escrita como na língua de origem (a capella); f) e, como expressão não
integrante do português, deve ser grafada em itálico, ou negrito, ou entre
aspas, ou sublinhada, para destacá-la das demais que integram nosso
idioma; g) também pela indefinição do órgão oficialmente incumbido de
solucionar a questão, é defensável seu emprego na forma já
aportuguesada; h) nesse caso, porém, contrariamente ao dicionarista que
defende essa posição, deve haver o sinal indicativo da crase no a (à
capela); i) e isso porque o sinal indicativo da crase é obrigatório em toda
locução adverbial formada por palavra do feminino (exatamente o caso
apreciado).
9. De modo prático e direto para a indagação do leitor: ante as
circunstâncias já explicitadas na fundamentação, admitem-se as grafias a
capella e à capela, mas não a capela.
Acareação
1. Trata-se da confrontação entre acusado e testemunhas, entre
testemunhas, entre acusado ou testemunha e a pessoa ofendida, ou entre
pessoas ofendidas, sempre que divergirem, em suas declarações, sobre
fatos ou circunstâncias relevantes (SIDOU, 1990, p. 17).
2. Quanto à regência de tal vocábulo, Francisco Fernandes vê a
possibilidade de ser construído com uma de três preposições: com, de e
entre. Exs.: a) “Teresinha fez um movimento para evitar a acareação
com os soldados”; b) “O tribunal julgou necessária a acareação de
algumas testemunhas” (Caldas Aulete); c) “O juiz procederá à
acareação das testemunhas entre si…” (1969, p. 8).
3. Celso Pedro Luft (1999, p. 26), que lhe dá por sinônimo menos usado
acareamento, também vê a possibilidade de emprego das três citadas
preposições: com, de e entre.
4. Vejam-se alguns exemplos de emprego do mencionado vocábulo em
nossas leis: a) “O juiz pode ordenar, de ofício ou a requerimento da
parte: … II – a acareação de duas ou mais testemunhas ou de alguma
delas com a parte, quando, sobre fato determinado, que possa influir na
decisão da causa, divergirem as suas declarações” (CPC/1973, art. 418,
II); b) “Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a
autoridade policial deverá: … VI – proceder a reconhecimento de
pessoas e coisas e a acareações” (CPP, art. 6º, VI); c) “Aplica-se o
disposto nos §§ 2º, 3º, 4º e 5º deste artigo, no que couber, à realização
de outros atos processuais que dependam da participação de pessoa que
esteja presa, como acareação, reconhecimento de pessoas e coisas, e
inquirição de testemunha ou tomada de declarações do ofendido” (CPP,
art. 185, § 8º).
Acento diferencial
Ver Acento diferencial de número (P. 65), Acento diferencial de timbre (P.
66) e Acento diferencial de tonicidade (P. 66).
Acento prosódico
Ver Acentuação gráfica (P. 67).
Acentuação gráfica
1. Uma primeira regra que se pode estabelecer nesse assunto é lembrar a
lição de Luiz Antônio Sacconi no sentido de que “todas as palavras que
apresentam sílaba tônica possuem acento prosódico, que é o acento da
fala. Não se confunde com acento gráfico, que é o sinal usado para
indicar o acento prosódico. As únicas palavras em português que não
possuem acento prosódico são os monossílabos e dissílabos átonos”
(1979, p. 4).
2. Com fundamento em tal observação, anota-se, assim, que júri e juro, por
exemplo, têm ambas o acento prosódico, já que a penúltima sílaba de
cada uma delas é pronunciada com mais força (sílaba tônica); por
convenção que criou as regras de acentuação, todavia, apenas a primeira
das palavras tem acento gráfico.
3. Os acentos gráficos em português são o agudo (´), o grave (`) e o
circunflexo (^).
4. O acento grave, atualmente, serve apenas para indicar a ocorrência de
crase.
5. Veja-se também que o trema (¨) e o til (~), entre outros, não são
chamados acentos, mas sinais diacríticos.
6. A essa altura, importa fazer duas ponderações, frutos da oportuna
observação de Pasquale Cipro Neto e Ulisses Infante: a) em nosso
idioma, “a maioria das palavras não recebe acento gráfico”; b) “o
princípio que presidiu à elaboração das regras de acentuação do
português foi justamente o da economia, reservando os acentos gráficos
para as palavras minoritárias da língua”.
7. Em outra passagem, em levantamento feito em um texto que analisaram,
tais autores traçam o perfil básico da tonicidade das palavras da língua
portuguesa, exemplificando: “as proparoxítonas são pouco comuns, as
paroxítonas são maioria, e as oxítonas ocupam a vice-liderança”.
8. E continuam eles dizendo ser possível “observar que todas as
paroxítonas do texto terminam em a, e e o, e nenhuma recebe acento
gráfico”, o que prova “que as regras foram feitas para evitar a
acentuação das palavras mais comuns na língua”.
9. E conduzem o leitor à própria conclusão, ao asseverarem: “aliás, você
deve ter percebido que, das 106 palavras do texto, apenas oito recebem
algum tipo de acento, incluindo o til, e que só a palavra você apareceu
quatro vezes” (CIPRO NETO; INFANTE, 1999, p. 49 e 54).
10. As regras específicas sobre o emprego dos acentos gráficos estão
espalhadas por verbetes específicos: acento diferencial, acento
diferencial de número, acento diferencial de timbre, acentuação dos
monossílabos, acentuação gráfica das maiúsculas, ditongo, hiato,
monossílabos tônicos e átonos, oxítona, paroxítona, proparoxítona.
Ver também Acentuação gráfica das maiúsculas (P. 68) e Paroxítonas –
Quando acentuar? (P. 551)
Acentuação gráfica das maiúsculas
1. Interessante e oportuna observação faz Antonio Henriques (1999, p. 6),
de grande valia para todos, mas que deveria ter maior penetração
sobretudo nos meios publicitários e na imprensa: “há de se lembrar que
as letras maiúsculas também são acentuadas”: JOSÉ, AUTÓDROMO.
2. E não escapa a tal regra a letra, quando se trata da primeira da palavra,
mesmo que as demais sejam grafadas com minúsculas: Átila, Édson.
Ver Acentuação gráfica (P. 67).
Acerto ou Asserto?
1. Acerto é, em suma, o antônimo de erro, de equívoco. Ex.: “Procurava o
advogado demonstrar o acerto de sua afirmação em prol do
constituinte”.
2. Já sua parônima asserto significa proposição afirmativa, asserção,
assertiva, e sua sílaba tônica também tem pronúncia fechada (ê). Ex.:
“De acordo com o asserto daquele autor, o interesse processual se forma
de dois elementos: necessidade e adequação.”
Acho
Ver Primeira pessoa do plural (P. 600).
Aconselhar
1. É verbo de comportamento peculiar quanto à regência verbal.
2. Com ele, tanto a coisa quanto a pessoa podem ser, indiferentemente,
objeto direto ou objeto indireto.
3. Assim, são corretas as duas construções seguintes: a) “Aconselharam ao
magistrado maior cautela em sua conduta”; b) “Aconselharam o
magistrado da cautela necessária”.
4. Para Artur de Almeida Torres, assim se resume a lição: “na forma
bitransitiva admite, indiferentemente, acusativo (objeto direto) de coisa e
dativo (objeto indireto) de pessoa ou dativo de coisa e acusativo de
pessoa” (1967, p. 28).
5. O que, entretanto, não se admite é a coexistência de dois objetos diretos
ou dois objetos indiretos em mesma oração (ou seja: a pessoa e a coisa
não podem ser objetos diretos, assim como não podem ser objetos
indiretos em mesma oração). Não são corretas, assim, as seguintes
estruturas: a) “Aconselharam ao magistrado de maior cautela em sua
conduta”; b) “Aconselharam o magistrado maior cautela em sua
conduta”.
6. Nesse sentido é a lição de Domingos Paschoal Cegalla, que recomenda
evitar o cruzamento das duas regências permitidas; vale dizer, não se
devem usar, por exemplo, dois objetos indiretos simultaneamente, como
na seguinte frase por ele citada: “Os médicos lhe aconselharam a mudar
de ares” (1999, p. 8). Equivocado, também, será o emprego
concomitante de dois objetos diretos.
7. E especifica tal autor, em mesma obra e local, as duas regências “que
mais importa conhecer”: a) aconselhar alguém a fazer alguma coisa; b)
aconselhar alguma coisa a alguém. Exs.: i) “Aconselhei Andrião a que
não falasse muito” (Graciliano Ramos); ii) “Rompia em exclamações
contra a mulher que lhe aconselhara dar maior publicidade à sua
desonra” (Camilo Castelo Branco).
8. Também na lição de Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade
(1999, p. 89), há dupla construção possível: a) aconselhar alguém de
alguma coisa; b) aconselhar alguma coisa a alguém.
9. Quanto à preposição a ser usada em sua construção, lecionam Antonio
Henriques e Maria Margarida de Andrade que podem ser em, acerca de e
sobre, arrolando, em abono da segunda, exemplo do art. 135, IV, do
Código de Processo Civil: “Reputa-se fundada a suspeição de
parcialidade quando… aconselhar alguma das partes acerca do objeto
da causa…” (1999, p. 2).
10. Francisco Fernandes (1971, p. 48) também vê a possibilidade de
construção com para ou para que: “… aconselhando-o para que se
dirigisse a Pedro” (Alexandre Herculano).
11. Tal transformação do a em para, nos dizeres de Celso Pedro Luft
(1999, p. 32), resulta da conotação final que o contexto adquire.
12. Seguem a mesma estrutura e construção os verbos avisar, certificar,
informar e prevenir.
13. Vale a pena observar, todavia, a lição de Mário Barreto (1954b, p. 177)
no sentido de que possível uma terceira construção com o verbo
aconselhar, a saber, aquela “em que se omite a preposição, e se usa o
acusativo da pessoa” (isto é, deixa-se de usar a preposição também
com a pessoa), isso, normalmente, quando se tem uma oração
subordinada que deveria vir precedida de preposição, mas esta, por
questão de mero estilo, não de regência, é omitida. De tal emprego traz
o referido autor exemplos de autores insuspeitos: a) “Não faltou quem
o aconselhasse que se valesse do Santo” (Frei Luís de Sousa); b)
“Aconselharam-no que intentasse ação judiciária contra os sócios”
(Camilo Castelo Branco).
14. Esse também é o lembrete de Francisco Fernandes, para quando se
omite a preposição e se usa a pessoa como objeto direto:
“Aconselharam-no que ao menos com os grandes se mostrasse mais
tratável” (1971, p. 48).
15. Vejam-se alguns casos de emprego do verbo estudado em dispositivos
de nossa legislação: a) “A requerimento de qualquer interessado e se
graves razões o aconselharem, pode o juiz determinar a divisão da
coisa comum antes do prazo” (CC, art. 1.320, § 3º); b) “No caso de
execução pelas dívidas referidas neste artigo, o saldo existente será
aplicado em outro prédio, como bem de família, ou em títulos da dívida
pública, para sustento familiar, salvo se motivos relevantes
aconselharem outra solução, a critério do juiz” (CC, art. 1.715,
parágrafo único); c) “Reputa-se fundada a suspeição de parcialidade
do juiz, quando: … IV – receber dádivas antes ou depois de iniciado o
processo; aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa, ou
subministrar meios para atender às despesas do litígio” (CPC/1973,
art. 135, IV); d) “O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá
ser recusado por qualquer das partes: … IV – se tiver aconselhado
qualquer das partes” (CPP, art. 254, IV); e) “São prerrogativas dos
vogais das Juntas, além das referidas no art. 665: … b) aconselhar às
partes a conciliação” (CLT, art. 667, “b”).
Acórdão ou Acordam?
1. O vocábulo acórdão constitui forma gráfica da substantivação de
acordam, que é a terceira pessoa do plural do presente do indicativo do
verbo acordar, que quer dizer resolver, estar de acordo. Ex.: “O acórdão,
de ofício, fez o réu responder por litigância de má-fé”.
2. Significa decisão proferida em grau de recurso por tribunal coletivo, e a
denominação deriva do fato de que as decisões desses órgãos colegiados,
em sua disposição final, vêm precedidas pela forma verbal acordam.
3. Como toda paroxítona terminada em ão ou com ditongo na última sílaba,
recebe acento gráfico no singular e no plural: acórdão e acórdãos.
4. Antonio Henriques (1999, p. 8-9) conceitua acórdão como “forma verbal
substantivada; trata-se da 3ª pessoa do plural (forma arcaica) do presente
do indicativo do verbo acordar (concordar), cujo significado é
‘julgamento feito pelos tribunais superiores’ (CPC/1973, art. 163, CPP,
arts. 556, 563, 564 e 619)”.
5. Oportuno é diferenciar o substantivo acórdão do verbo acordar na
terceira pessoa do plural do presente do indicativo (acordam), com a
especificação de que os verbos terminados em am são sempre
paroxítonos e se destinam a significar o presente ou o passado dos
verbos, enquanto os terminados em ão são oxítonos e indicam sempre o
futuro. Exs.: a) “O acórdão que decidir por maioria recurso de apelação
sujeita-se a embargos infringentes”; b) “Os integrantes da Turma
Julgadora acordam, nesta oportunidade, em dar pelo provimento do
recurso”; c) “Os integrantes da Turma Julgadora acordaram, na sessão
de ontem, em dar pelo provimento do recurso”; d) “Não se sabe se os
integrantes da Turma Julgadora acordarão, na sessão de amanhã, em
dar pelo provimento do recurso”.
6. Por fim quanto à grafia de sua inicial, veja-se que o inciso XVI, item 49,
do Formulário Ortográfico da Academia Brasileira de Letras – a qual,
nesse campo, age por delegação legal, em cumprimento à vetusta Lei
Eduardo Ramos, de n. 726, de 8/12/1900 – em observação aos § 12,
manda escrever, de modo expresso, com inicial maiúscula, “os nomes
que designam atos das autoridades da República quando empregados em
correspondências ou documentos oficiais”, os quais passa a
exemplificar: “a Lei de 13 de maio, o Decreto-lei 292, o Decreto 20.108,
a Portaria de 15 de junho, o Regulamento 737, o Acórdão de 3 de
agosto, etc.” Mas isso apenas quando se tratar de um acórdão específico
e individuado.
Ver Acórdão ou Aresto? (P. 70)
Acórdão ou Aresto?
1. Embora diversos escritores deem por sinônimas as palavras acórdão e
aresto, o certo é que Antonio Henriques as diferencia e dá a aresto o
conceito de “decisão judicial irreformável tomada pelos tribunais
superiores” (1999, p. 8-9), o que faz concluir que, enquanto passível de
reforma, a decisão colegiada seria acórdão, mas ainda não aresto.
2. Em mesma direção, Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 238)
observa que “tecnicamente não são sinônimos acórdão e aresto,
trazendo, em abono de sua tese, lição de Mendes Júnior: ‘Chamam-se
arestos as decisões judiciais não suscetíveis de reforma, proferidas em
forma de julgamento definitivo pelos tribunais superiores’”.
Ver Arresto ou Aresto? (P. 135)
Acórdão recorrido
Ver Acórdão ou Acordam? (P. 70) e Sentença recorrida – Está correto? (P.
690)
Acordo
1. Francisco Fernandes (1969, p. 13) vê diversas possibilidades de
construção com tal vocábulo: acerca de, com, em, entre, no tocante a,
sobre. Exs.: a) “… recomendei… que diligenciasse, com a maior
brevidade, chegar a acordo com os proprietários, acerca do preço por
que estivessem dispostos a cedê-los…” (Rui Barbosa); b) “Seria
aumentar consideravelmente os vocabulários, o que não está de acordo
com os princípios dominantes da linguagem” (Júlio Nogueira); c)
“Estávamos, portanto, de acordo nos princípios. Onde o não estávamos
era na aplicação” (Rui Barbosa); d) “Nogueira, moderado, desejava um
acordo entre vencedores e vencidos” (Graciliano Ramos); e) “Nem todos
os gramáticos estão de acordo no tocante aos preceitos que a regulam”
(Rui Barbosa); f) “Não existe ainda perfeito acordo entre os autores
sobre a maneira de nomear as ciências que têm seus domínios na
linguagem” (Júlio Nogueira).
2. Vejam-se alguns exemplos de emprego do vocábulo aqui estudado em
dispositivos de nossas leis: a) “Se o título deferir a opção a terceiro, e
este não quiser, ou não puder exercê-la, caberá ao juiz a escolha se não
houver acordo entre as partes” (CC, art. 252, § 4º); b) “Não haverá
compensação quando as partes, por mútuo acordo, a excluírem, ou no
caso de renúncia prévia de uma delas” (CC, art. 375); c) “Ainda que se
não alegue prejuízo, é obrigado o devedor aos juros da mora que se
contarão assim às dívidas em dinheiro, como às prestações de outra
natureza, uma vez que lhes esteja fixado o valor pecuniário por sentença
judicial, arbitramento, ou acordo entre as partes” (CC, art. 407); d) “As
sebes vivas, as árvores, ou plantas quaisquer, que servem de marco
divisório, só podem ser cortadas, ou arrancadas, de comum acordo
entre proprietários” (CC, art. 1.297, § 2º).
Ver Acordo amigável (P. 71).
Acordo amigável
1. Embora de uso frequente nos meios forenses, trata-se de tautologia, de
pleonasmo vicioso a ser evitado, e isso porque configura redundância de
termos, a qual não tem emprego legítimo, por não conferir mais vigor ou
clareza à expressão.
2. Para que se entenda adequadamente o problema, o acordo já traz em si a
ideia de combinação, de ajuste, de acomodação, de conciliação, ideia
essa que também não deixa de residir no vocábulo amigável.
3. E, se verdade é que nem sempre a parte consegue todo o seu intento num
acordo, nem por isso deixa de estar presente nele a ideia de prevenção ou
término de litígio “mediante concessões mútuas” (art. 840 do Código
Civil), o que pressupõe necessariamente ajuste, conciliação.
4. Diga-se, assim, simplesmente alcançar um acordo, e não alcançar um
acordo amigável.
5. Nesse equívoco incidem até mesmo dispositivos de lei, como é o caso do
art. 13, parágrafo único, da Lei 3.924, de 26/6/61, que trata das
desapropriações, ao determinar de modo literal: “À falta de acordo
amigável com o proprietário da área onde situar-se a jazida, será esta
declarada de utilidade pública e autorizada a sua ocupação pelo
período necessário à execução dos estudos…”
Ver Acordo (P. 70).
A cores ou Em cores?
1. Para Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 2), “é erro grosseiro dizer
televisão a cores”, admitindo tal autor em cores, mas revelando
preferência pelo adjetivo colorido, em expressões como imagens
coloridas, TV colorida, filme colorido, cinema colorido.
2. Já na conformidade com o ensinamento de Domingos Paschoal Cegalla,
“ambas as locuções são corretas: televisor a (ou em) cores, gravura a (ou
em) cores”. Acrescenta tal autor haver “nítida preferência pela primeira
variante”. E pondera, em conclusão: “Há quem afirme que a forma a
cores é galicismo, o que não procede, porquanto o francês, neste caso,
usa a preposição en e não a: une carte postale en couleurs, télévision en
couleurs” (CEGALLA, 1999, p. 9).
3. Em casos dessa natureza, pelo vetusto princípio de que, na dúvida entre
os gramáticos, há liberdade de emprego para o usuário do idioma,
aceitam-se como corretas ambas as expressões.
4. Observa-se, todavia, não parecer adequada a expressão TV colorida
(para significar transmissão em cores), ante a possível confusão com a
cor do próprio aparelho.
Acostar
1. Verbo de frequente emprego nos meios jurídicos e forenses, tem o
sentido de juntar, anexar, e constrói-se com objeto direto (sujeito na voz
passiva) e indireto, este com a preposição a – acostar algo (documentos,
etc.) a. Exs.: a) “Acostou novos documentos aos autos”; b) “A defesa
acostou ao processo as razões recursais, alegando nulidade”
(KASPARY, 1996, p. 35).
2. Reforce-se o entendimento de que, exatamente por ter objeto direto na
voz ativa, é verbo passível de emprego na voz passiva, tornando-se o
objeto direto da voz ativa em sujeito da voz passiva. Ex.: “Foram
acostadas dezenas de depoimentos ao processo de indenização”.
Acredito
Ver Primeira pessoa do plural (P. 600).
Acudir
1. Verbo bastante usado em textos jurídicos e forenses, deve ser observado
pelo prisma da regência verbal, já que é sempre transitivo indireto e se
constrói de acordo com os modelos “acudir a alguém” ou “acudir a
alguém com algo” (no sentido de ajudar, socorrer), ou simplesmente
“acudir a algo” (no significado de atender, assumir). Exs.: a) “O usufruto
extingue-se: … VII – Por culpa do usufrutuário, quando aliena,
deteriora, ou deixa arruinar os bens, não lhes acudindo com os reparos
de conservação” (CC/1916, art. 739, VII); b) “Aplica-se, outrossim, a
disposição do artigo antecedente, quando a gestão se proponha acudir a
prejuízos iminentes, ou redunde em proveito do dono do negócio, ou da
coisa…” (CC/1916, art. 1.340).
2. Pelo primeiro dos exemplos da legislação civil, vê-se que admite tal
verbo que seu objeto indireto seja substituído pelos pronomes lhe, lhes, o
que também se corrobora pelo exemplo de Camilo Castelo Branco: “…
com o propósito de se acolher ao valimento do vizinho, se o pai lhe não
acudisse”.
3. Para registro, porém, anotem-se dois exemplos de abalizados autores, em
que tal verbo se acha no sentido de prestar socorro e vem usado como
transitivo direto (FERNANDES, 1971, p. 50): a) “Acudiam-no os
companheiros” (Euclides da Cunha); b) “Se o não acudissem, tinha-se
afogado” (João Ribeiro).
4. Celso Pedro Luft anota que, nos dias atuais, tal verbo “também ocorre,
mais raro, com objeto direto” (1999, p. 34).
5. Sintetiza-se a questão com duas observações: a) o melhor, em se tratando
de textos que devam submeter-se ao padrão culto, é que se observe a
orientação tradicional da Gramática, usando-o como transitivo indireto;
b) inegável é observar, todavia, que há exemplos respeitáveis de seu
emprego como transitivo direto.
6. Lembra-se, a esse respeito, que os textos de lei costumam obedecer a
essa postura de emprego de objeto indireto como seu complemento:
“Incorrerá na mesma multa o perito que, sem justa causa, provada
imediatamente: a) deixar de acudir à intimação ou ao chamado da
autoridade” (CPP, art. 277, parágrafo único, “a”).
7. Observa-se, contudo, que há casos de opção do legislador por seu
emprego como transitivo direto: “Não constitui crime a entrada ou
permanência em casa alheia ou em suas dependências: … II – a
qualquer hora do dia ou da noite para acudir vítima de desastre ou
quando alguma infração penal está sendo ali praticada ou na iminência
de o ser” (CPM, art. 226, § 3º, II).
Ver Prejuízos acudidos – Está correto? (P. 593)
Acusado
1. Lembra Luís A. P. Vitória que “os puristas não aceitam o termo acusado,
no sentido de réu” (1969, p. 18).
2. Tal, entretanto, não é o que se tem visto nos textos jurídicos e forenses,
em que o mencionado emprego se dá normalmente.
3. E esse emprego indistinto, ao que parece, dá-se com razão, até porque,
se, em termos genéricos, acusação é a “imputação criminal feita a uma
pessoa” (DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p. 80), essa pessoa a quem se
imputa um procedimento desse jaez não deixa de ser o acusado.
4. E, considerado tal fato, não se há de olvidar que tal pessoa contra quem
se move uma ação com o precípuo intuito de atribuir conduta criminal é
também mencionada nos autos e normalmente conhecida como réu.
5. Vejam-se alguns exemplos de emprego do referido vocábulo nesse
sentido por dispositivos de nossa legislação: a) “A denúncia ou queixa
conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas
circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos
quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando
necessário, o rol das testemunhas” (CPP, art. 41); b) “No caso de morte
do acusado, o juiz somente à vista da certidão de óbito, e depois de
ouvido o Ministério Público, declarará extinta a punibilidade” (CPP, art.
62); c) “Reconhecida inicialmente ao júri a competência por conexão ou
continência, o juiz, se vier a desclassificar a infração ou impronunciar
ou absolver o acusado, de maneira que exclua a competência do júri,
remeterá o processo ao juízo competente” (CPP, art. 81, parágrafo
único); d) “No processo por crimes praticados fora do território
brasileiro, será competente o juízo da Capital do Estado onde houver
por último residido o acusado. Se este nunca tiver residido no Brasil,
será competente o juízo da Capital da República” (CPP, art. 88).
Acusar recebimento
1. Com abono de exemplos de autores insuspeitos, observa Antonio
Henriques (1999, p. 9) ser correto o emprego do verbo acusar na
acepção de confessar, avisar, dizer, além do que, para ele, “a
legitimidade da expressão [acusar recebimento] vem de longe com
Garrett e Camilo”. Exs.: a) “Ilustríssimo senhor – acuso a recepção do
ofício de vossa senhoria…” (Almeida Garrett); b) “Os sobrinhos não
acusaram logo o recebimento da carta” (Camilo Castelo Branco).
Adaptar
1. No que concerne à conjugação verbal, é preciso atentar às formas
rizotônicas desse verbo (aquelas em que a sílaba tônica está no radical, e
não na terminação, como adapt-o, adapt-as, adapt-a, adapt-am). Nelas,
o radical permanece o mesmo, em conduta típica de verbo regular, sem
qualquer acréscimo de i ou alteração de posicionamento da sílaba tônica.
Essa ocorrência se patenteia no presente do indicativo e tempos
derivados (SACCONI, 1979, p. 21): adapto, adaptas, adapta,
adaptamos, adaptais, adaptam (presente do indicativo); adapte, adaptes,
adapte, adaptemos, adapteis, adaptem (presente do subjuntivo); adapta,
adapte, adaptemos, adaptai, adaptem (imperativo afirmativo); não
adaptes, não adapte, não adaptemos, não adapteis, não adaptem
(imperativo negativo).
2. Mesmo entre as pessoas cultas, há uma tendência equivocada para
introduzir, quer na escrita, quer na pronúncia, a vogal i logo antes do t
que encerra o radical, nas formas rizotônicas, com o deslocamento da
sílaba tônica, pronunciando-se adapito, adapitas…
3. Tal proceder, todavia, é errado, e, quanto a sua conjugação, deve-se
atentar às judiciosas palavras de Otelo Reis (1971, p. 70): além de ser
este um verbo regular, o grupo pt deve ser pronunciado sem vogal
intercalada.
4. Como tal problema se dá somente nas formas rizotônicas, e estas
ocorrem apenas no presente do indicativo e tempos derivados, as
dificuldades não se repetem nos demais tempos e formas.
5. No que tange à regência verbal, os dispositivos de lei mostram, em
realidade, dois verbos: a) um pronominal (adaptar-se), que pede um
objeto indireto (quem se adapta, adapta-se a alguma coisa); b) um outro
não pronominal (adaptar), que pede um objeto direto e um objeto
indireto (quem adapta, adapta algo a alguma coisa). Exs.: i) “Os
interditos referidos nos incisos I, III e IV do art. 1.767 serão recolhidos
em estabelecimentos adequados, quando não se adaptarem ao convívio
doméstico” (CC, art. 1.777); ii) “As associações, sociedades e
fundações, constituídas na forma das leis anteriores, bem como os
empresários, deverão se adaptar às disposições deste Código até 11 de
janeiro de 2007” (CC, art. 2.031); iii) “A petição inicial será indeferida:
… V – quando o tipo de procedimento, escolhido pelo autor, não
corresponder à natureza da causa, ou ao valor da ação; caso em que só
não será indeferida, se puder adaptar-se ao tipo de procedimento legal”
(CPC/1973, art. 295, V); iv) “O memorial descritivo indicará mais: I – a
composição geológica, a qualidade e o valor dos terrenos, bem como a
cultura e o destino a que melhor possam adaptar-se” (CPC/1973, art.
975, § 2º, I); v) “O juiz, antes de suprir a aprovação, poderá mandar
fazer no estatuto modificações a fim de adaptá-lo ao objetivo do
instituidor” (CPC/1973, art. 1.201, § 2º).
Adequado
1. Quanto às possibilidades de sintaxe, Celso Pedro Luft (1999, p. 33)
entende que se pode construir com a preposição a e com a preposição
com (menos usada). Exs.: a) “A única coisa que não era adequada à
normalidade de meus pulmões era o escritório” (Gustavo Corção); b)
“Isto é adequado aos meus negócios (ou com os meus negócios)”
(Cândido Jucá).
2. A essas estruturas, Francisco Fernandes (1969, p. 15) acresce a
possibilidade de construção com a preposição para. Exs.: a) “As leis
devem ser adequadas ao povo para que são feitas” (Mário Barreto); b)
“Linguagem adequada com o assunto”; c) “… a (região) mais adequada
para constituir o poderoso núcleo da futura união” (Visconde de Porto
Seguro).
3. Uma leitura dos nossos principais diplomas legais revela seu emprego
com uma de duas preposições: a ou para. Exs.: a) “O dever do Estado
com a educação será efetivado mediante a garantia de: … VI – oferta de
ensino noturno regular, adequado às condições do educando” (CF, art.
208, VI); b) “A taxa judiciária, se devida, será calculada com base no
valor atribuído pelos herdeiros, cabendo ao fisco, se apurar em processo
administrativo valor diverso do estimado, exigir a eventual diferença
pelos meios adequados ao lançamento de créditos tributários em geral”
(CPC/1973, art. 1.034, § 1º); c) “São requisitos de admissibilidade da
cumulação: … III –que seja adequado para todos os pedidos o tipo de
procedimento” (CPC/1973, art. 292, § 1º, III); d) “A medida cautelar
poderá ser substituída, de ofício ou a requerimento de qualquer das
partes, pela prestação de caução ou outra garantia menos gravosa para
o requerido, sempre que adequada e suficiente para evitar a lesão ou
repará-la integralmente” (CPC/1973, art. 805).
Ver Adequar (P. 76).
Adequar
1. Anote-se, desde logo, que não há uniformidade entre os gramáticos
quanto a sua conjugação, principiando por Eduardo Carlos Pereira
(1924, p. 113), que insere adequar no rol dos verbos defectivos, mas sem
outras explicações ou minúcias.
2. Em posição mais restrita, posta-se Luís A. P. Vitória, para quem “este
verbo só se emprega no particípio passado. Ex.: ‘É este o termo
adequado’” (1969, p. 18). Embora sem invalidar em nada o raciocínio
feito, apenas se observa que, no exemplo dado pelo ilustre gramático,
adequado tem a forma oriunda do particípio passado, mas o vocábulo
está sendo empregado como adjetivo.
3. Para Otelo Reis, também é verbo defectivo, “quase exclusivamente
usado no infinitivo e no particípio. Contudo, entendem alguns autores
que pode ser empregado em todas as formas arrizotônicas” (1971, p. 53).
Explicita-se, para maior facilidade de entendimento, que formas
rizotônicas são aquelas em que a sílaba tônica está no radical (eu
caminho); já formas arrizotônicas são aquelas em que a sílaba tônica
situa-se na terminação, na desinência (nós caminhamos).
4. Em postura ligeiramente menos liberal, Vitório Bergo leciona ser tal
verbo passível de conjugação “nas formas de desinência em a” (1943, p.
80), ensinamento esse que eliminaria a possibilidade de uso das formas
arrizotônicas com desinência em e, como adequei, adequemos…
5. Avançando para maiores possibilidades de seu emprego, Luiz Antônio
Sacconi refere ser possível conjugá-lo em todas as formas arrizotônicas,
muito embora realce tal autor seja ele empregado mais frequentemente
“nas formas nominais: adequar, adequando, adequado” (1979, p. 87).
6. Pasquale Cipro Neto e Ulisses Infante veem-no como passível de
conjugação apenas nas formas arrizotônicas do presente do indicativo
(adequamos, adequais), de modo que, no imperativo afirmativo, só seria
possível conjugar a segunda pessoa do plural (adequai vós);
acrescentam, todavia, que “alguns autores admitem a conjugação do
verbo adequar nas formas arrizotônicas do presente do subjuntivo
(adequemos, adequeis), o que permitiria também a conjugação dessas
mesmas formas do imperativo negativo e da primeira do plural do
imperativo afirmativo” (1999, p. 172).
7. Nessa última esteira de maiores possibilidades, de maneira bem didática,
lembra Geraldo Amaral Arruda (1997, p. 66) que tal verbo “não se usa
nas formas em que o acento incide sobre a sílaba de, que pertence ao
radical”, conjugando-se nas demais formas.
8. José de Nicola e Ernani Terra (2000, p. 20) sintetizam do seguinte modo
as regras acerca desse verbo: a) “no presente do indicativo só apresenta a
primeira e a segunda pessoa do plural: nós adequamos, vós adequais”; b)
“não possui o presente do subjuntivo e o imperativo negativo”; c) “o
imperativo afirmativo só apresenta a segunda pessoa do plural
(adequai)”; d) “nas formas faltantes desse verbo, deve-se utilizar um
sinônimo (adaptar, ajustar, apropriar, etc.) ou uma locução verbal
(estou adequando, vou adequar, etc.)”.
9. Em termos práticos, ante a divergência entre os gramáticos, há de se
adotar a alternativa mais abrangente, permitindo-se que seja empregado
em todas as formas arrizotônicas: adequamos, adequais (presente do
indicativo); adequemos, adequeis (presente do subjuntivo); adequemos,
adequai (imperativo afirmativo); não adequemos, não adequeis
(imperativo negativo).
10. Por não se permitir sua conjugação nas formas rizotônicas, atente-se,
por conseguinte, a que são errôneas determinadas construções de uso
muito corrente nos meios jurídicos, como se dá no seguinte exemplo:
“A solução proposta pelo advogado não se adéqua ao caso concreto”.
11. Em casos desse jaez, sendo defectivo, o verbo deve ser substituído por
um sinônimo: adaptar, aplicar, harmonizar: a) “A solução não se
adapta ao caso concreto”; b) “A solução não se aplica ao caso
concreto”; c) “A solução não se harmoniza com o caso concreto”.
12. Registre-se, contudo, que, apontando em direção mais liberal,
Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 11), por um lado, observa que
“não existem as formas adéqua, adéquam, adéque, adéquem, com e
tônico, que às vezes se ouvem de pessoas que, para evitar uma
discutível cacofonia, estropiam o verbo”; por outro lado, questionando
que, “se dizemos recua, por que não adequa?”, acrescenta tal autor que
“não constitui erro usar as formas rizotônicas adequo, adequas,
adequa, adequam; adeqúe, adeqúes, adeqúem”.
13. Por um lado, a postura do ilustre gramático não se sustenta em termos
científicos, porque não há como colocar em mesmo molde os verbos
adequar (em que o encontro vocálico ua se pronuncia em uma só sílaba
e, assim, tem natureza de ditongo) e recuar (em que o encontro
vocálico se pronuncia em sílabas distintas e, desse modo, tipifica um
hiato) e daí extrair conclusões idênticas; por outro lado, tal dúvida e tal
posicionamento isolado não devem ser seguidos nos textos que devam
submeter-se aos padrões da norma culta, os quais hão de obedecer à
ortodoxia tradicional, que manda não empregar esse verbo nas formas
rizotônicas.
14. Como tais problemas apenas ocorrem no presente do indicativo e
tempos derivados (presente do subjuntivo, imperativo afirmativo e
imperativo negativo), o usuário terá reduzida sua faixa de problemas, já
que a conjugação há de ser regular e integral nos demais tempos e
formas.
15. Esclareça-se, por fim, que, mesmo sendo o u pronunciado em todas as
formas da conjugação – não importando a abrangência com que esta
deva ser considerada – o certo é que o Acordo Ortográfico de 2008
aboliu o trema dos vocábulos vernáculos, de modo que simplesmente
não será empregado tal sinal diacrítico na conjugação de forma alguma
do verbo adequar.
16. Observe-se, adicionalmente, que uma busca em dez das principais
codificações pátrias revela a inexistência de emprego de tal verbo em
regular conjugação; o que normalmente se tem é o adjetivo adequado
(como em estabelecimento adequado) ou no particípio passado (sejam
adequadas ao…).
Ver Adequado (P. 76).
Aderir
1. Quanto à conjugação verbal, aparece um i na primeira pessoa do
presente do indicativo e nas formas dela derivadas: adiro, aderes, adere,
aderimos, aderis, aderem (presente do indicativo); adira, adiras, adira,
adiramos, adirais, adiram (presente do subjuntivo); adere, adira,
adiramos, aderi, adiram (imperativo afirmativo); não adiras, não adira,
não adiramos, não adirais, não adiram (imperativo negativo).
2. Tal verbo não é defectivo, e não apresenta problemas ou irregularidades
nos demais tempos e modos, em que é conjugado normal e regularmente.
3. Na observação de José de Nicola e Ernani Terra, “o e do radical muda
para i na primeira pessoa do singular do presente do indicativo e nas
formas daí derivadas” (2000, p. 20).
4. Como os tempos derivados do presente do indicativo são o presente do
subjuntivo, o imperativo afirmativo e o imperativo negativo, os
problemas apontados não aparecem nas demais formas, tempos e modos,
que são regulares.
5. Por esse verbo se conjugam aferir, advertir, assentir, auferir, compelir,
conferir, consentir, deferir, discernir, divertir, expelir, ferir, impelir,
inserir, investir, preferir, repetir, sentir, servir, vestir, etc.
6. Uma busca nos principais diplomas legais pátrios mostra, por um lado,
seu raro emprego na feitura das leis; por outro lado, vê-se que, quando
usado, normalmente vem no infinitivo, em locução verbal, sem mostrar
flexão alguma. Ex.: “Cada parte interporá o recurso,
independentemente, no prazo e observadas as exigências legais. Sendo,
porém, vencidos autor e réu, ao recurso interposto por qualquer deles
poderá aderir a outra parte” (CPC/1973, art. 500).
7. Garimpou-se, todavia, um raro caso de uso do referido verbo em efetiva
flexão: “Os credores que não comparecerem a alguma reunião para que
tenham sido competentemente convocados, entende-se que aderem às
resoluções que tomar a maioria de votos dos credores que comparecerão;
contanto que, para a concessão ou negação da concordata, se ache
presente o número dos credores exigidos no artigo 848” (CCo, art. 844).
Ad exitum
1. Trata-se de locução latina, que se traduz como “tendo em vista o êxito”,
ou “tendo em vista o sucesso”, muito usada para indicar, nos contratos
de prestação de serviços profissionais de advocacia, a parcela de
remuneração ou ganho do advogado que se vincula ao risco e ao
consequente sucesso da demanda, a qual ele receberá ou não, conforme o
resultado da causa e, eventualmente, na proporção dos resultados
auferidos pelo cliente. Ex.: “Não se pode reputar excessivo aquele
percentual de ad exitum fixado no contrato”.
2. Nesse sentido, contrapõe-se à expressão pro labore, que, em tais
contratos, expressa aquela parcela fixa de honorários, a ser paga pelo
trabalho efetivamente realizado pelo patrono, independentemente do
sucesso da causa.
3. Por se tratar de expressão latina, obrigatório é o uso de aspas, negrito,
itálico, sublinha ou grifo indicador de tal circunstância, além de proibida
a utilização de acento gráfico e de hífen, que não existiam no idioma
original.
4. Não se olvide, nesse sentido, a lição de Edmundo Dantès Nascimento de
que expressões como essa não eram hifenizadas em latim, razão pela
qual “não podem ser em língua nenhuma”, acrescentando tal autor que,
“para quem pretende grafar escorreitamente, não é permitido o hífen em
expressões do latim clássico”.
5. Diversa, estranha e equivocadamente, entretanto, José de Nicola e
Ernani Terra observam que, exatamente por se tratar de uma expressão
latina, uma locução como essa “dever ser grafada com hífen” (2000, p.
122).
6. Ora pela simples razão de que se trata de expressão latina e de que não
havia hífen na língua originária, o melhor é seguir o ensino de Domingos
Paschoal Cegalla, o qual, após observar que “não há consenso quanto ao
uso do hífen” em expressões latinas dessa natureza, realça que “é
preferível dispensá-lo” (1999, p. 188).
Ad hoc – com hífen ou sem?
Ver Post mortem – com hífen ou sem? (P. 585)
Adimplir
1. Originário do latim adimplere (encher, cumprir), é verbo de largo uso
nos meios jurídicos e forenses, assim como seus cognatos inadimplir,
(in)adimplemento, (in)adimplência e (in)adimplente.
2. Quanto à conjugação verbal, é defectivo e se conjuga como abolir, vale
dizer, não tem as formas em que, de acordo com a conjugação normal do
modelo da terceira conjugação, ao l do radical se seguiria a ou o
(HENRIQUES; ANDRADE, 1999, p. 33).
3. Essa também é a lição de Adalberto J. Kaspary (1996, p. 40), o qual
lembra que tal defectividade ocorre no presente do indicativo, no
presente do subjuntivo, no imperativo afirmativo e no imperativo
negativo.
4. Em outras palavras, conjuga-se “nas formas em que a terminação
começa pela vogal e ou pela vogal i” (REIS, 1971, p. 145).
5. Na prática, não tem a primeira pessoa do presente do indicativo mas
apenas as demais: adimples, adimple, adimplimos, adimplis, adimplem.
6. Não é conjugado em pessoa alguma do presente do subjuntivo, que
haveria de derivar da inexistente primeira pessoa do presente do
indicativo.
7. No imperativo afirmativo, apenas tem a segunda pessoa do singular e a
segunda pessoa do plural, derivadas do presente do indicativo: adimple
tu, adimpli vós.
8. Também não tem pessoa alguma do imperativo negativo, que viria
integralmente do presente do subjuntivo.
9. Como tais problemas de defectividade ocorrem apenas no presente do
indicativo e nos tempos daí derivados, é normalmente conjugado nos
outros tempos: eu adimplia (imperfeito do indicativo), eu adimplirei
(futuro do presente), eu adimpliria (futuro do pretérito), adimplindo
(gerúndio), adimplido (particípio), eu adimpli (pretérito perfeito do
indicativo), eu adimplira (pretérito mais-que-perfeito do indicativo),
quando eu adimplir (futuro do subjuntivo), se eu adimplisse (imperfeito
do subjuntivo).
10. Normalmente, tem o significado de cumprir, executar, satisfazer, e, no
que concerne à regência verbal, constrói-se normalmente com objeto
direto: adimplir alguma coisa. Ex.: “Cumpre ainda ao credor: … IV –
provar que adimpliu a contraprestação, que lhe corresponde, ou que
lhe assegura o cumprimento…” (CPC/1973, art. 615, IV).
Adir
1. Em Direito das Sucessões, é verbo usado com o sentido de aceitar.
2. Assim, dizer que o herdeiro adiu a herança significa o mesmo que
mencionar que ele aceitou a herança.
3. Vitório Bergo (1944, p. 13) observa que se trata de verbo defectivo, que
só se conjuga nas formas de desinência em i: adimos, adis (presente do
indicativo); adi vós (imperativo afirmativo); não tem, por conseguinte,
presente do subjuntivo nem imperativo negativo.
4. Não é outra a lição de Luís A. P. Vitória, para quem se trata de “verbo
defectivo, restringindo-se seu emprego apenas às formas em que a
desinência do verbo modelo apresenta i” (1969, p. 18).
5. Alfredo Gomes, com visão mais restritiva acerca de seu emprego,
leciona que esse verbo – que “só tem infinitivo e particípio passado (este
mais usado que aquele) na linguagem corrente” – junta-se a outros,
como delir, empedernir, espavorir, inanir, renhir, revelir, alguns dos
quais “estão quase irremissivelmente perdidos como arcaísmos
pretensiosos” (1924, p. 121).
6. Nesse âmbito da conjugação verbal, o melhor é ter visão mais
ampliativa, seguindo as primeiras lições apontadas, e empregá-lo nas
formas em que aparece i no início da desinência.
7. Como, porém, esses problemas de defectividade apenas ocorrem no
presente do indicativo e tempos derivados (presente do subjuntivo,
imperativo afirmativo e imperativo negativo), é ele normalmente
conjugado nos demais modos, tempos e pessoas: adia (imperfeito do
indicativo), adirei (futuro do presente do indicativo), adiria (futuro do
pretérito do indicativo), adi (pretérito perfeito do indicativo), adira
(pretérito mais-que-perfeito do indicativo), adir (futuro do subjuntivo),
adisse (imperfeito do subjuntivo), adindo (gerúndio), adido (particípio
passado).
8. No que concerne à regência verbal, lembra Eliasar Rosa seu caráter de
transitivo direto, sendo “erro pensar que o verbo adir significa aderir. Por
pensarem assim, muitos escrevem: o herdeiro adiu à (com acento de
crase) herança; os herdeiros não adiram à herança etc.” (1993, p. 21).
9. Em lição adicional, Francisco Fernandes (1971, p. 52) anota a
possibilidade de ser ele empregado como transitivo direto e indireto,
obedecendo à construção “adir uma coisa a outra”. Ex.: “A estas funções
é de mister adir a de reciprocidade” (M. Maciel).
A disposição ou À disposição?
1. Quando se quer saber se o correto é a disposição ou à disposição, deve-
se partir do princípio de que crase é a fusão de duas vogais idênticas, e o
encontro mais corriqueiro dessa natureza é o da preposição a com o
artigo feminino a ou as, com o resultado de à ou às.
2. Mas não se esqueça que, quando se fala em preposição, pensa-se em
uma estrutura sintática, com as partes da oração relacionadas entre si, de
modo que, no caso, não é possível solucionar a indagação posta, por não
se conhecer em que contexto se encontra a expressão discutida.
3. Por isso, para permitir resposta adequada à indagação, formulam-se dois
exemplos: a) “A disposição dele já não era a mesma…”; b) “Ele sempre
estava a disposição dos companheiros…” (O acento indicativo da crase,
em um dos exemplos, foi eliminado de propósito, para efeito de
raciocínio).
4. Ora, na prática, quando se quer saber se há crase antes de um substantivo
comum feminino (como é o vocábulo disposição no caso da consulta), o
melhor é substituir mentalmente tal substantivo feminino por um
correspondente masculino, como, por exemplo: a) “O entusiasmo dele já
não era o mesmo…”; b) “Ele sempre estava ao dispor dos
companheiros…”
5. Feito esse raciocínio simples, então se aplica a seguinte regra geral de
crase: Se, com a substituição, aparece ao ou aos no masculino, há crase
no feminino; se não aparece ao no masculino, não há crase no feminino.
6. E se conclui com as formas corretas para o caso da consulta: a) “A
disposição dele já não era a mesma…”; b) “Ele sempre estava à
disposição dos companheiros…”
Adjetivação desnecessária
1. Na apropriada lição de Eliasar Rosa, seria bom eliminar da linguagem
jurídica uma adjetivação “cheia de mesuras e que soa falso sem nada
acrescentar às peças forenses: digna autoridade; douta Curadoria ou
Procuradoria; ilustrado órgão do Ministério Público; egrégia Câmara;
colendo Grupo; venerando acórdão; respeitável decisão ou despacho;
excelso Pretório ou Pretório excelso”.
2. Segundo tal autor, “tudo isso são salamaleques, hoje vazios de
significação verdadeira. Autênticos preciosismos são essas postiças
reverências, sem as quais em nada fica sacrificada a cortesia do
advogado, nem a majestade da Justiça e a dos que a servem com
elevação e dignidade”.
3. E, finalizando sua admoestação, aduz ele que a linguagem forense deve
ser “sóbria e parcimoniosa, clara, nobre, correta e persuasiva, que bem
dispensa o data venia, o datissima venia (!), o concessa venia, o concessa
maxima venia, o permissa venia ou venia permissa etc.” (ROSA, 1993,
p. 98-9).
4. Em realidade, não há razão para se terem certas expressões como
sacramentais e solenes, a ponto de se pensar que, se não empregadas em
sua totalidade, estaria havendo um desrespeito para com a pessoa ou
órgão que se mencionam. Bem por isso, não há motivo para que um
relator seja tratado sempre e necessariamente como culto, um defensor
como nobre, um julgador como ínclito, umas razões de apelação como
doutas.
5. Nessa mesma esteira, sempre é bom não esquecer que se pode discordar
com reverência e polidez, e, por outro lado, a ofensa e o desrespeito
podem muito bem embutir-se em cumprimentos afetados, rapapés,
adulações e lisonjas.
6. Por outro lado, atento ao fato de que muitos conceitos, por seu conteúdo,
repelem um termo qualificador, já que este não os modifica, assevera
Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 229) que os adjetivos, em tais
casos, são inúteis, porquanto os conceitos têm sua própria conotação,
que lhes é conferida pela doutrina e pela lei; e cita ele exemplos dessa
inutilidade: cristalina e indefectível Justiça; apresentar contestação
válida.
7. No que toca especificamente ao linguajar das determinações dos
magistrados, acrescenta Geraldo Amaral Arruda que “não há
conveniência em que o juiz, ao manifestar oficialmente o seu
convencimento, peça licença às partes, usando a expressão data venia ou
outra equivalente, ou, pior, ainda, a aberrante expressão datissima venia”
(1997, p. 11).
8. Registre-se, em outro aspecto, que, quanto ao vocábulo egrégio, Antonio
Henriques o vê como composto do prefixo e (ex) denotador de
afastamento e grex-gregis (rebanho), significando, assim, aquele ou
aquilo “que sai do rebanho, do comum e se distingue da multidão”.
9. E, ressaltando que seu uso normal é antes do substantivo para realçá-lo,
complementa tal autor que ele “ocorre em expressões próprias do Direito
e, em geral, com maiúsculas e sentido superlativo: Egrégio Tribunal,
Egrégia Corte, Egrégio Juiz, Egrégia Câmara e outras” (HENRIQUES,
1999, p. 53).
10. Atente-se, por fim, a que, quanto ao vocábulo egrégio, o art. 3º, caput,
do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
assim estatui: “Têm o Tribunal e todos os seus órgãos o tratamento de
Egrégio…”.
Adjetivo
Ver Adjetivos compostos (P. 81) e Formação de adjetivos – Regras (P. 360).
Adjetivos compostos
1. Em adjetivos compostos (dois elementos unidos por hífen, que fazem,
como um todo, o papel de um adjetivo), o primeiro elemento é sempre
invariável, e o segundo elemento só varia para o plural ou para o
feminino, quando ele próprio é um adjetivo: tratado luso-brasileiro,
convenção luso-brasileira, tratados luso-brasileiros, convenções luso-
brasileiras (SACCONI, 1979, p. 48).
2. Carlos Góis afirma que “a razão da invariabilidade do primeiro elemento
é que o primeiro se acha em função adverbiada ao segundo: é como que
um advérbio acidental” (1943, p. 195).
3. Em outra obra, Carlos Góis e Herbert Palhano (1963, p. 167),
considerando, de igual modo, que o primeiro elemento tem função
adverbial em relação ao segundo, lecionam que deixa aquele de sofrer
qualquer variação: escola médico-cirúrgica, reação físico-química.
4. Como não é difícil concluir, se o segundo elemento do adjetivo
composto não é um adjetivo, fica invariável a expressão toda. Ex.:
vestuário verde-oliva, farda verde-oliva, vestuários verde-oliva, fardas
verde-oliva (SACCONI, 1979, p. 48).
5. Sintetizando as duas importantes regras até agora vistas, Silveira Bueno
assim se expressa: a) “Quando concorrem dois adjetivos, o primeiro
permanece invariável e só o segundo toma a flexão exigida: Olhos azul-
escuros, olhos azul-claros…”; b) “Quando a cor é expressa por
substantivos, claro está que permanecem invariáveis. Exs.: Vestidos
cinzento-pérola, gravatas verde-mar” (1938, p. 184).
6. Anote-se que, apesar de azul-celeste ser formado por dois adjetivos,
lecionam José de Nicola e Ernani Terra (2000, p. 41), muito embora sem
quaisquer outras justificativas, que “não deve ser flexionado nem em
gênero, nem em número”. Exs.: a) “Vimos um carro azul-celeste
estacionado em local proibido”; b) “Vários carros azul-celeste
permaneciam encalhados na concessionária”; c) “Sempre usava blusa
azul-celeste quando ia a festas”; d) “Compraram várias camisas azul-
celeste”.
7. Da mesma posição de invariabilidade desse adjetivo é Aurélio Buarque
de Holanda Ferreira (s/d, p. 170), que confere a azul-celeste os dois
gêneros e os dois números. E o próprio Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, órgão
oficialmente incumbido de dirimir dúvidas a esse respeito, também
registra posição em mesmo sentido (2009, p. 96).
8. Exceção à regra mencionada é também furta-cor, que faz, no plural,
furta-cores (ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 388).
9. Do quanto exposto, importa realçar, ante os equívocospráticos, que
vermelho é adjetivo, e violeta é substantivo; assim, mesmo em se
acoplando sem hífen os elementos desses adjetivos compostos, aplicam-
se-lhes as duas primeiras regras enunciadas, motivo por que a formação
de seus plurais é, respectivamente, (raios) infravermelhos e (raios)
ultravioleta (NISKIER, 1992, p. 87).
10. A. M. de Sousa e Silva (1958, p. 299) faz questão de firmar que a
flexão correta, em tais casos, é raios ultravioleta, e não raios
ultravioletas.
11. Ainda sobre ultravioleta e infravermelho, para Luiz Antônio Sacconi
tais vocábulos “não são propriamente adjetivos compostos, mas
derivados; o primeiro não sofre variação; o segundo sim” (1979, p. 48).
12. Já Artur de Almeida Torres (1966, p. 65) aceita, indiferentemente, raios
infravermelho ou infravermelhos e raios ultravioleta ou ultravioletas,
lembrando apenas que, quanto ao último, o professor Pedro A. Pinto,
em carta a ele dirigida, declarava preferir a flexão do plural,
observando tratar-se de “um plural analógico”.
13. Mais uma vez o VOLP (2009, p. 457 e 823), na qualidade de portador
da posição oficial sobre o assunto, indica a possibilidade de variação de
ambos, a saber: raio infravermelho e raios infravermelhos; raio
ultravioleta e raios ultravioletas.
14. Em continuação, se se subentende a expressão cor-de, ou mesmo se ela
vem expressa, o adjetivo, como um todo, fica invariável. Exs.: terno
cinza, capa cinza, ternos cinza, capas cinza; tecido cor-de-rosa, pasta
cor-de-rosa, tecidos cor-de-rosa, pastas cor-de-rosa.
15. O adjetivo azul-marinho é invariável. Ex.: terno azul-marinho,
moldura azul-marinho, ternos azul-marinho, molduras azul-marinho.
16. Para essas hipóteses em que o adjetivo não se flexiona de acordo com o
gênero e número do substantivo modificado, mas toma outra feição por
qualquer motivo, Carlos Góis (1943, p. 187-8), com perspicácia, anota
que, ao invés de concordância nominal, o que se tem é discordância do
adjetivo com o substantivo.
Ver Formação de adjetivos compostos (P. 359), Substantivos compostos –
Como levar ao plural? (P. 717) e Surdo-mudo (P. 723).
Adjudicar
1. Em termos de técnica jurídica, é o verbo para designar a adjudicação e
significa transferir, por sentença, do domínio de uma pessoa para o
domínio de outra os bens que a esta anteriormente pertenciam, seja em
consequência de execução, de sucessão ou de venda (DE PLÁCIDO E
SILVA, 1989, p. 87). Ex.: “Por fundamentado veredicto, o magistrado
adjudicou ao adquirente o imóvel compromissado pelo alienante
desidioso”.
2. Quanto à conjugação verbal, como todos os verbos terminados em car,
troca o c por qu antes de e; assim: adjudico, adjudicas, adjudiquemos,
adjudiqueis…
3. No que tange à regência verbal, Francisco Fernandes (1971, p. 52)
aceita-o como transitivo direto e indireto, exigindo objeto indireto com a
preposição a. Exs.: a) “Adjudicou a maior parte deles (bens) ao
tratamento de Leonor” (Camilo Castelo Branco); b) “Não havia a quem
adjudicar a sucessão” (Rui Barbosa).
4. Esse, também, é o ensinamento de Celso Pedro Luft (1999, p. 36). Exs.:
a) “O juiz lhe adjudicou imóveis e aluguéis do devedor”; b) “Adjudicou-
lhe a posse das terras”.
5. Vejam-se exemplos de emprego do referido verbo em dispositivos legais:
a) “Sendo confusos, os limites, em falta de outro meio, se determinarão
de conformidade com a posse justa; e, não se achando ela provada, o
terreno contestado se dividirá por partes iguais entre os prédios, ou, não
sendo possível a divisão cômoda, se adjudicará a um deles, mediante
indenização ao outro” (CC, art. 1.298); b) “Quando a coisa for
indivisível, e os consortes não quiserem adjudicá-la a um só,
indenizando os outros, será vendida e repartido o apurado, preferindo-
se, na venda, em condições iguais de oferta, o condômino ao estranho, e
entre os condôminos aquele que tiver na coisa benfeitorias mais
valiosas, e, não as havendo, o de quinhão maior” (CC, art. 1.322, caput).
A domicílio ou Em domicílio?
1. Lembra Laurinda Grion que “em domicílio e a domicílio são locuções
que têm emprego diverso; a primeira se usa com verbos ou nomes
estáticos; a segunda, com verbos ou nomes dinâmicos” (s/d, p. 10).
2. Vejam-se, assim, os seguintes exemplos, com a indicação de sua
correção ou erronia: a) “Levam-se compras a domicílio” (correto); b)
“Levam-se compras em domicílio” (errado); c) “Corta-se cabelo em
domicílio” (correto); d) “Corta-se cabelo a domicílio” (errado); e)
“Atende-se em domicílio” (correto); f) “Atende-se a domicílio” (errado).
3. Tendo por objeto de análise a expressão “Entregas em domicílio”, de
igual modo se expressam José de Nicola e Ernani Terra: “Trata-se de
uma expressão correta. Observe que dizemos: entregas em casa, no
escritório, no endereço solicitado. Devemos usar a expressão a
domicílio quando se emprega verbo que indica movimento: levar a
domicílio, enviar a domicílio, ir a domicílio, etc.” (2000, p. 97).
4. Atestando o que ocorre na linguagem coloquial, leciona Domingos
Paschoal Cegalla: “a locução adverbial a domicílio é hoje usada,
indistintamente, com verbos que indicam movimento (como levar,
enviar, etc.), ou não: Levamos encomendas a domicílio; Damos aulas de
violão a domicílio”.
5. E até mesmo acrescenta tal autor: “Embora correta, a locução em
domicílio se divorcia da língua corrente” (CEGALLA, 1999, p. 13).
6. Em outra passagem, todavia, muito embora lembre que “a língua
corrente não faz essa distinção”, mas “usa exclusivamente a domicílio”,
concorda o mencionado autor com o posicionamento doutrinário
anteriormente expendido por outros gramáticos, no que concerne aos
textos que devam submeter-se à norma culta: e leciona que, por um lado,
“a expressão a domicílio complementa verbos que pedem a preposição
a”; por outro lado, “se o verbo exige a preposição em, a expressão
adequada é em domicílio” (CEGALLA, 1999, p. 127). Exs.: a) “Levam-
se encomendas a domicílio”; b) “Leciona-se piano em domicílio”.
7. O melhor, em realidade, parece ser distinguir, de modo efetivo, entre
verbos ou vocábulos de significação estática ou dinâmica: com os
primeiros, usa-se em domicílio; com os segundos, a domicílio.
8. Importa ilustrar, por fim, que, contrariando o tradicional apuro da
linguagem da legislação codificada, o atual Código Civil incide em
equívoco nesse ponto: “Desembarcadas as mercadorias, o transportador
não é obrigado a dar aviso ao destinatário, se assim não foi
convencionado, dependendo também de ajuste a entrega a domicílio…”
(CC/2002, art. 752, caput). Corrija-se: … entrega em domicílio…
Ad quem ou Ad quam?
1. Um leitor indaga se o correto é instância ad quem ou instância ad quam.
2. Fixem-se, desde logo, três importantes premissas para a expressão: a) Ad
quem é o acusativo singular masculino do pronome relativo latino qui,
quae, quod; b) Tal expressão, embora continue latina, cristalizou-se no
uso vernáculo desse modo, e em geral vem precedida de um substantivo
(normalmente tribunal, instância ou juízo), e serve para indicar a corte de
justiça, o juízo ou tribunal para o qual se recorre; c) Contrapõe-se à
expressão a quo, que aponta o tribunal do qual se recorre. Ex.: “A
competência para analisar o mérito dos recursos, em regra, é do
tribunal ad quem, e não do juízo a quo”.
3. Nesse polêmico problema da flexão das palavras e expressões de outros
idiomas ainda não incorporadas ao vernáculo, desde logo se observa que
não há regramento específico por parte dos órgãos competentes, e,
assim, o que se tenta aqui é solucionar a questão por um raciocínio
cientificamente correto, com o acompanhamento do bom senso que deve
nortear soluções dessa natureza.
4. Parta-se do princípio de que palavras e expressões latinas podem
cristalizar-se no vernáculo de maneiras diversas: a) campus veio na
forma do nominativo (caso latino que serve para desempenhar a função
sintática de sujeito); b) quorum sedimentou-se aqui na forma do genitivo
(caso que serve para exercer a função do antigo complemento restritivo,
hoje adjunto adnominal na maioria dos casos); c) a quo veio na forma do
ablativo, por regência da preposição antecedente (caso que normalmente
serve para desempenhar a função sintática de complemento
circunstancial, hoje adjunto adverbial); d) ad quem, de igual modo por
regência da preposição antecedente, veio no acusativo (caso que
normalmente serve para a função de objeto direto, e aqui, por exigência
da preposição, serve para indicar complemento circunstancial).
5. Como não é de difícil compreensão, essa cristalização do vocábulo
estrangeiro em nosso idioma e seu emprego em estruturas sintáticas
vernáculas normalmente ocorrem: a) sem preocupação de qual seja sua
função sintática na oração em português, b) sem vínculo com a estrutura
sintática do latim, e c) sem ligação com a conduta do vocábulo ou
expressão no idioma de origem.
6. Para melhor didática, considerem-se, em português, os seguintes
exemplos: a) “O tribunal para o qual se recorre…”; b) “A instância
para a qual se recorre…”; c) “Os tribunais para os quais se recorre…”;
d) “As instâncias para as quais se recorre…”.
7. Em todos os exemplos, a estrutura sintática é a mesma em português: a)
qual (com suas variações) é um pronome relativo; b) por conceito e
comportamento, o pronome relativo relaciona-se a um nome
anteriormente mencionado e com ele concorda em gênero (masculino ou
feminino) e número (singular ou plural); c) se o antecedente é tribunal, o
pronome relativo concorda no masculino singular; d) se, porém, o
antecedente é instâncias, o pronome relativo vai para o feminino plural.
8. Se alguém quiser servir-se dos argumentos expendidos para defender
exatamente a variabilidade da expressão da consulta no latim, mesmo
aqui não se pode esquecer que, por coerência, haverá a flexão não
apenas para o feminino, mas também para o plural: a) “O tribunal ad
quem…”; b) “A instância ad quam…; c) “Os tribunais ad quos…”; d)
“As instâncias ad quas…”
9. E não é só: como em latim o vocábulo juízo é do gênero neutro
(judicium, judicii), o pronome relativo haveria de fazer flexão diversa
das já apontadas: a) “O juízo ad quod…”; b) “Os juízos ad quae…”.
10. Veja-se que não faz sentido redigir desse modo, e isso, no mínimo,
pelas seguintes razões: a) um emprego assim exige do usuário do
vernáculo informações que ele normalmente não tem; b) ou seja: exige
dele elementos razoáveis de latim, o que não mais se ensina, a não ser
em cursos de extrema especialização; c) não temos o gênero neutro em
português, o que constituiria dificuldade adicional quando quiséssemos
fazer a concordância com uma palavra que correspondesse a um
vocábulo neutro em latim; d) além disso, também não há
correspondência absoluta de gênero em ambos os idiomas; e) isso quer
significar que um vocábulo feminino em latim pode ter vindo para o
masculino em português, e vice-versa.
11. Assim, com o devido respeito pelos que pensam de modo diverso, a
melhor solução parece obedecer aos seguintes parâmetros, naquilo que
interessa ao caso vertente: a) as palavras e expressões latinas devem
desvincular-se de sua função sintática de origem para efeito de suas
flexões em português, quer quanto ao gênero (masculino e feminino),
quer quanto ao número (singular e plural); b) devem ser empregadas
como vieram sedimentadas para o uso no português, sem variações
como as pretendidas na consulta: i) “O tribunal ad quem…” (correto);
ii) “A instância ad quem…” (correto); iii) “Os tribunais ad quem…”
(correto); iv) “As instâncias ad quem…” (correto); v) “O juízo ad
quem…” (correto); vi) “Os juízos ad quem…” (correto).
12. Qualquer outra solução desrespeita a etimologia, fere os critérios
mínimos científicos e marginaliza o próprio bom senso.
13. Vejam-se exemplos de emprego da referida expressão em dispositivos
de nossas leis: a) “Os recursos serão apresentados ao juiz ou tribunal
ad quem, dentro de cinco dias da publicação da resposta do juiz a quo,
ou entregues ao Correio dentro do mesmo prazo” (CPP, art. 591); b)
“Publicada a decisão do juiz ou do tribunal ad quem, deverão os autos
ser devolvidos, dentro de cinco dias, ao juiz a quo” (CPP, art. 592).
Adquirir
1. Importante é anotar que, em tal verbo, o u não é pronunciado, como,
aliás, bem lembra Silveira Bueno (1938, p. 179).
2. A esse respeito, em lição bem significativa, lembra Vasco Botelho de
Amaral (1948, p. 173) dois aspectos de relevo: a) “algumas pessoas
esforçam-se por uma pronúncia algo complicada, que nada tem que ver
com a perfeita expressão”, já que a pronúncia normal e natural é adkirir;
b) aliás, em ensino mais abrangente, observa-se que a vogal u, precedida
de g ou q, “tende a deixar de proferir-se, tendência essa bem antiga”.
3. Além de não ser pronunciado o u em seu meio, também impensável usar
aqui o trema, mesmo porque tal sinal foi abolido das palavras de nosso
idioma por determinação do Acordo Ortográfico de 2008.
4. Em continuação, importa observar que não há outras dificuldades no que
concerne a sua flexão, já que é regular e conjugado em todas as pessoas,
tempos e modos.
5. Vejam-se alguns exemplos de emprego do mencionado verbo em
dispositivos de nossa legislação: a) “São brasileiros: … II –
naturalizados: i) os que, na forma da lei, adquiram a nacionalidade
brasileira, exigidas aos originários de países de língua portuguesa
apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral” (CF, art.
12, II, “a”); b) “Os partidos políticos, após adquirirem personalidade
jurídica, na forma da lei civil, registrarão seus estatutos no Tribunal
Superior Eleitoral” (CF, art. 17, § 2º); c) “Aquele que possuir como sua
área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco
anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia
ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja
proprietário de outro imóvel urbano ou rural” (CF, art. 183, caput); d)
“Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião” (CF, art. 191,
parágrafo único).
Ver Trema (P. 746).
Adrede
1. Advérbio de origem latina, quer dizer de caso pensado, de propósito.
Ex.: “Com um plano adrede elaborado, os réus chegaram a juízo para
depor”.
2. Quanto à ortoepia, Evanildo Bechara (1974, p. 45) leciona que seu e
tônico tem som fechado (adrêde).
3. Essa posição também é seguida por Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 18.).
4. Não é de outro entendimento Eliasar Rosa (1993, p. 23).
5. Também Antonio Henriques lembra que “a pronúncia é adrêde” (1999,
p. 10).
6. Atento aos frequentes equívocos da linguagem usual, assim se expressa
Domingos Paschoal Cegalla: “Palavra de uso raro. As poucas vezes que
ouvimos foi com a vogal tônica aberta (adréde), contrariamente ao que
ensinam os dicionários, que lhe registram a pronúncia adrêde” (1999, p.
13).
7. Afastando toda e qualquer possibilidade de dúvida, essa pronúncia
fechada também vem indicada pelo Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido
oficialmente de determinar a grafia e a pronúncia dos vocábulos em
nosso idioma (2009, p. 24).
Adredemente – Existe?
Ver Advérbios em “mente” (P. 85).
Ad-rogar
Ver Ortoepia (P. 532).
Advérbios em “mente”
1. Busca-se saber se estão corretos os seguintes advérbios: adredemente,
aliasmente, apenasmente, de repentemente, talqualmente,
amiudemente…
2. Parta-se do princípio de que o sufixo mente é formador de advérbios em
português, mas só pode ser acrescentado a adjetivos e que estejam estes
no feminino: a) satisfatória + mente = satisfatoriamente; b) clara +
mente = claramente.
3. Nesse sentido, João Ribeiro lembra que “o português formou advérbios
numerosos com a junção de ‘mente’ a adjetivos femininos… Essa
faculdade já existia com pequena extensão no latim clássico” (1923, p.
139).
4. E esclarece Eduardo Carlos Pereira, em duas passagens de sua obra, que
“a terminação adverbial mente é o substantivo feminino ‘mente’ com a
significação de maneira, intenção. Mais tarde se justapôs ao adjetivo,
perdendo o caráter de substantivo, conservando, entretanto, o adjetivo
sua flexão feminina” (1924, p. 151 e 174).
5. Com essas premissas, analisem-se os vocábulos e expressões
inicialmente referidos: a) “Adrede” é advérbio de origem latina e
significa de caso pensado, de propósito; b) “Aliás”, um vocábulo de
correção, também já é advérbio, sem conotação alguma de natureza
adjetiva; c) “Apenas” é advérbio e significa somente; d) “De repente” é
locução adverbial e significa de súbito; e) “Tal qual” é expressão
destinada a indicar comparação, sem laivo algum de natureza adjetiva; f)
“Amiúde” já é advérbio e tem o significado de repetidas vezes, com
frequência.
6. A partir da simples consideração de como se formam em português os
advérbios em “mente”, já se vê que não podem estar corretos os
pretensos advérbios empregados nos seguintes exemplos, e isso
exatamente porque não têm na base um adjetivo feminino: a) “Nos
fundos, adredemente construído, havia um túnel para a saída dos presos
fugitivos” (errado); b) “A vítima foi ameaçada por seis adolescentes,
aliasmente sete” (errado); c) “Havia apenasmente dois policiais”
(errado); d) “De repentemente, chegaram os policiais e surpreenderam
os larápios” (errado); e) “Ele agiu talqualmente em épocas passadas”
(errado); f) “Ele vinha amiudemente à minha casa” (errado).
7. Corrijam-se os exemplos: a) “Nos fundos, adrede construído, havia um
túnel para a saída dos presos fugitivos”; b) “A vítima foi ameaçada por
seis adolescentes, aliás sete”; c) “Havia apenas dois policiais”; d) “De
repente, chegaram os policiais e surpreenderam os larápios”; e) “Ele
agiu tal qual em épocas passadas”; f) “Ele vinha amiúde à minha casa”.
8. Acrescente-se que Cândido de Figueiredo, em resposta a um consulente
que lhe indagava acerca da correção de aliasmente, respondeu com fina
ironia, trazendo a propósito um outro vocábulo em que, de modo
indevido, foi adicionado mente a um advérbio: “Tire-lhe o sufixo
‘mente’… e o mais está bem: aliás. De outra forma, fica muito
malmente” (1943, p. 60).
9. Por fim, todavia, importa dizer que, em lição que não merece apoio,
obediência ou seguimento, o uso de um dos vocábulos aqui considerados
consta em frase do grande filólogo Mário Barreto: “Mas também se diz
comparar uma pessoa com outra, talqualmente sucedia em latim”
(1954a, p. 316). Corrija-se: … tal qual sucedia…
10. Às observações já feitas, é de se ver que a facilidade de formação de
advérbios com o sufixo mente tem sido causa de alguns exageros, os
quais, como lembra o desembargador e gramático Geraldo Amaral
Arruda, “caracterizam o pouco tirocínio de quem os emprega”.
11. O zelo no uso pode trazer o hábito da correção, como lembra o referido
autor (ARRUDA, 1987, p. 20). Exs.: a) “Requereu, derradeiramente, a
citação do réu” (uso inadequado); b) “Requereu, por derradeiro, a
citação do réu” (uso adequado); c) “Existe, contrariamente ao réu, a
palavra da vítima” (uso inadequado); d) “Existe, contra o réu, a
palavra da vítima” (uso adequado); e) “As testemunhas que depuseram
judicialmente…” (uso inadequado); f) “As testemunhas que depuseram
em juízo…” (uso adequado); g) “O acórdão foi recorrido
extraordinariamente” (uso inadequado); h) “Contra o acórdão se
interpôs recurso extraordinário” (uso adequado); i) “Ele possuía
precariamente o imóvel” (uso inadequado); j) “Ele possuía o imóvel a
título precário” (uso adequado).
Ver Advérbios em “mente” seguidos – Como resolver? (P. 86) e
Tocantemente – Existe? (P. 739)
Advertir
1. Quanto à conjugação verbal, segue a flexão de aderir, de modo que
aparece um i na primeira pessoa do presente do indicativo e nos tempos
dela derivados: advirto, advertes, adverte, advertimos, advertis,
advertem (presente do indicativo); advirta, advirtas, advirta,
advirtamos, advirtais, advirtam (presente do subjuntivo); adverte,
advirta, advirtamos, adverti, advirtam (imperativo afirmativo); não
advirtas, não advirta, não advirtamos, não advirtais, não advirtam
(imperativo negativo).
2. Não apresenta problemas ou irregularidades nos demais tempos e
modos, em que a flexão segue a conjugação regular.
3. Na observação de José de Nicola e Ernani Terra, “o e do radical muda
para i na primeira pessoa do singular do presente do indicativo e nas
formas daí derivadas” (2000, p. 20).
4. Quanto à regência verbal, Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 13-4) vê
três possibilidades de construção: a) como intransitivo: “Sua função não
é punir, mas advertir”; b) como transitivo direto, correspondendo à
construção advertir alguém ou alguma coisa: “O pai advertiu o filho”,
ou “O governo adverte que agirá com rigor”; c) como transitivo direto e
indireto, correspondendo à sintaxe advertir alguém de alguma coisa:
“Advertiu-a do perigo a que se expunha”.
5. Celso Pedro Luft (1999, p. 39), que se esteia em lição de Mário Barreto e
de Cândido Jucá Filho para admitir a construção advertir alguma coisa a
alguém, refere que tal construção secundária se pauta pelo padrão de
dizer algo a alguém, reforçando que “as construções primárias são
advertir/avisar/informar alguém de algo”.
6. E Francisco Fernandes (1971, p. 54), sem proceder a realce algum ou
restrição, simplesmente refere ambas as possibilidades de sintaxe,
fundado em exemplos de autores abalizados: a) “Mas advertimos ao
leitor que…” (Mário Barreto); b) “A religião advertia os cavaleiros da
vaidade das coisas humanas” (Camilo Castelo Branco).
7. Uma atenta leitura de alguns diplomas legais revela certa variedade de
construções, a começar por aquela que responde ao seguinte raciocínio:
quem adverte, adverte alguém de alguma coisa. Exs.: a) “As testemunhas
serão inquiridas cada uma de per si, de modo que umas não saibam nem
ouçam os depoimentos das outras, devendo o juiz adverti-las das penas
cominadas ao falso testemunho” (CPP, art. 210, caput); b) “O juiz
presidente também advertirá os jurados de que, uma vez sorteados, não
poderão comunicar-se entre si e com outrem, nem manifestar sua
opinião sobre o processo, sob pena de exclusão do Conselho e multa, na
forma do § 2º do art. 436 deste Código” (CPP, art. 466, § 1º); c) “O juiz
presidente advertirá as partes de que não será permitida qualquer
intervenção que possa perturbar a livre manifestação do Conselho e
fará retirar da sala quem se portar inconvenientemente” (CPP, art. 485,
§ 2º); d) “O juiz que conceder a suspensão lerá ao réu, em audiência, a
sentença respectiva, e o advertirá das consequências de nova infração
penal e da transgressão das obrigações impostas” (CPP, art. 703).
8. Nesse caso, se o verbo se emprega na voz passiva, a pessoa passa a ser o
sujeito: “O liberado será advertido da obrigação de apresentar-se
imediatamente à autoridade judiciária e à entidade de observação
cautelar e proteção” (CPP, art. 718, § 2º).
9. Uma segunda construção responde ao seguinte raciocínio: quem adverte,
adverte alguma coisa a alguém. Exs.: a) “O juiz advertirá à testemunha
que incorre em sanção penal quem faz a afirmação falsa, cala ou oculta
a verdade” (CPC/1973, art. 415, parágrafo único); b) “O juiz pode, em
qualquer momento do processo: … II – advertir ao devedor que o seu
procedimento constitui ato atentatório à dignidade da justiça”
(CPC/1973, art. 599, II).
10. Oportuno é registrar casos em que o legislador emprega a primeira
estrutura, mas omite a preposição que inicia o objeto indireto, o que é
comum, quando este é formado por uma oração: “Quando as
expressões injuriosas forem proferidas em defesa oral, o juiz advertirá
o advogado que não as use, sob pena de lhe ser cassada a palavra”
(CPC/1973, art. 15, parágrafo único). Em estrutura completa, assim
seria: … o juiz advertirá o advogado de que não as use…
Advogado ou Patrono?
1. Embora, num primeiro momento, possa parecer que advogado seja termo
mais técnico do que patrono, uma atenta leitura dos principais diplomas
legais mostra efetiva sinonímia entre ambos, apenas sendo muito maior o
número de ocorrências do primeiro do que do segundo.
2. Vejam-se alguns casos de emprego do vocábulo advogado em
dispositivos de nossas leis: a) “O preso será informado de seus direitos,
entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a
assistência da família e de advogado” (CF, art. 5º, LXIII); b) “Todos os
julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e
fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei
limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus
advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do
direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse
público à informação” (CF, art. 93, IX); c) “O sócio pode ser
representado na assembleia por outro sócio, ou por advogado, mediante
outorga de mandato com especificação dos atos autorizados, devendo o
instrumento ser levado a registro, juntamente com a ata” (CC, art.
1.074, § 1º); d) “É defeso às partes e seus advogados empregar
expressões injuriosas nos escritos apresentados no processo, cabendo ao
juiz, de ofício ou a requerimento do ofendido, mandar riscá-las”
(CPC/1973, art. 15, caput); e) “A sentença condenará o vencido a pagar
ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios.
Esta verba honorária será devida, também, nos casos em que o
advogado funcionar em causa própria” (CPC/1973, art. 20); f) “A parte
será representada em juízo por advogado legalmente habilitado. Ser-
lhe-á lícito, no entanto, postular em causa própria, quando tiver
habilitação legal ou, não a tendo, no caso de falta de advogado no lugar
ou recusa ou impedimento dos que houver” (CPC/1973, art. 36); g) “Nos
crimes de ação privada, o juiz, a requerimento da parte que comprovar
a sua pobreza, nomeará advogado para promover a ação penal” (CPP,
art. 32, caput); h) “Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem
constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo
prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das
provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão
preventiva, nos termos do disposto no art. 312” (CPP, art. 366).
3. Também se vejam casos em que, em mesma acepção, foi utilizada a
palavra patrono: a) “Contra o revel que não tenha patrono nos autos,
correrão os prazos independentemente de intimação, a partir da
publicação de cada ato decisório” (CPC/1973, art. 322, caput); b)
“Salvo nos casos previstos nesta Consolidação, a publicação das
decisões e sua notificação aos litigantes, ou a seus advogados,
consideram-se realizadas nas próprias audiências em que forem as
mesmas proferidas” (CLT, art. 834).
Ver Advogada, Patrona ou Patronesse? (P. 88)
Advogado – Que preposição usar?
1. No que concerne à regência nominal (ou seja, que preposição usar após a
palavra advogado), pode-se resumir com a lição de Francisco Fernandes,
para quem, conforme a acepção, há três preposições com as quais pode
tal vocábulo ser construído, a saber, contra, de e em: a) “Tornou-se o
maior advogado contra o totalitarismo”; b) “Procura o eleitor no
deputado o representante e advogado mais dos seus interesses
individuais, que das suas ideias” (Rui Barbosa); c) “Foi ele o incansável
advogado na causa dos oprimidos” (1969, p. 19).
2. Vale acrescentar que, conforme a necessidade e o sentido, nada impede o
uso de mais de um complemento com preposições distintas: a)
“Advogado dos pobres contra os exploradores”; b) “Advogado dos
trabalhadores na defesa dos interesses destes” (LUFT, 1999, p. 36).
A egrégia ou À egrégia?
1. Um leitor diz ter dúvida sobre a existência ou não de crase nos seguintes
exemplos: a) “Oficie-se a/à Egrégia 4ª. Vara”; b) “Oficie-se a/à
Meritíssima Juíza”. Não soube determinar se, no caso, há ou não
pronome de tratamento. Encontrou-os como adjetivos em dicionários;
mas também localizou definições como pronomes de tratamento na
internet.
2. Num primeiro aspecto, costuma-se dizer que não há crase antes de
pronomes de tratamento, e isso é verdade. Todavia os pronomes de
tratamento são aqueles típicos, normalmente iniciados por vossa ou sua,
como Vossa Senhoria, Vossa Excelência, Sua Senhoria, Sua Excelência.
Exs.: a) “Dirijo-me a Vossa Senhoria com todo o respeito”; b) “O
advogado dirigiu-se a Sua Excelência em seu gabinete”.
3. Nas frases trazidas pelo leitor, entretanto, o que se tem são palavras
indicativas de um tratamento respeitoso e até mesmo específicas para as
pessoas às quais são dirigidas; mas, tecnicamente falando, são meros
adjetivos e não constituem pronomes de tratamento em sua forma típica,
que venham a ser capazes de vedar o emprego da crase.
4. Feitas essas ponderações como premissas, tem lugar, no caso, a primeira,
geral e importante regra de crase, que manda substituir, no raciocínio
prático, o nome feminino, antes do qual se quer saber se existe ou não a
crase, por um correspondente do masculino (não necessariamente um
sinônimo, mas um vocábulo que mantenha a mesma estrutura sintática).
5. E se, com a substituição, aparece ao no masculino, então há crase no
feminino; se não aparece ao, não há crase no feminino.
6. Veja-se como ficam os exemplos com a substituição, nos casos trazidos
pelo leitor: a) “Oficie-se a Egrégia 4ª. Vara” (feminino); b) “Oficie-se ao
Egrégio 4º Cartório (masculino); c) “Oficie-se a Meritíssima Juíza”
(feminino); d) “Oficie-se ao Meritíssimo Juízo” (masculino).
7. Ou seja: a) com a substituição por um correspondente masculino,
apareceu ao em ambos os casos; b) então há crase no feminino em
ambas as frases; c) “Oficie-se a Egrégia 4ª. Vara” (errado); d) “Oficie-se
à Egrégia 4ª. Vara” (correto); e) “Oficie-se a Meritíssima Juíza”
(errado); f) “Oficie-se à Meritíssima Juíza” (correto).
À esquerda e À direita de
Ver Antes e depois (P. 120) e Com ou sem – Está correto? (P. 198)
A favor ou contra
Ver Antes e depois (P. 120).
Aferir
1. Quanto à conjugação verbal, aparece um i na primeira pessoa do
presente do indicativo e nos tempos dela derivados: afiro, aferes, afere,
aferimos, aferis, aferem (presente do indicativo); afira, afiras, afira,
afiramos, afirais, afiram (presente do subjuntivo); afere, afira, afiramos,
aferi, afiram (imperativo afirmativo); não afiras, não afira, não
afiramos, não afirais, não afiram (imperativo negativo).
2. Tal verbo não é defectivo, e não apresenta problemas ou irregularidades
nos demais tempos e modos, em que é conjugado normal e regularmente.
3. Na observação de José de Nicola e Ernani Terra, “o e do radical muda
para i na primeira pessoa do singular do presente do indicativo e nas
formas daí derivadas” (2000, p. 20).
4. Vejam-se alguns casos de emprego do referido verbo em dispositivos de
nossa legislação: a) “A partir da citação, a responsabilidade do
possuidor se há de aferir pelas regras concernentes à posse de má-fé e à
mora” (CC, art. 1.826, parágrafo único); b) “O valor da confissão se
aferirá pelos critérios adotados para os outros elementos de prova, e
para a sua apreciação o juiz deverá confrontá-la com as demais provas
do processo, verificando se entre ela e estas existe compatibilidade ou
concordância” (CPP, art. 197); c) “O fornecedor imediato será
responsável quando fizer a pesagem ou a medição e o instrumento
utilizado não estiver aferido segundo os padrões oficiais” (CDC, art. 19,
§ 2º).
Afetar
1. Por primeiro, não há dúvida acerca da vernaculidade desse verbo,
quando tem o sentido de fingir, simular. Ex.: “Afetei suma inclinação às
ciências”.
2. Nesse sentido é a lição de Silveira Bueno (1938, p. 104), o ensino de
Vitório Bergo (1944, p. 16) e a doutrina de Mário Barreto (1954a, p.
120-2), entre outros.
3. Na lição de Silveira Bueno (1938, p. 104), num segundo aspecto, é
completamente equivocado e constitui galicismo seu emprego no sentido
de atingir. Exs.: a) “A paralisação do metrô afeta a vida normal da
população” (errado); b) “A paralisação do metrô aflige a população”
(correto).
4. Domingos Paschoal Cegalla, porém, atesta-lhe a vernaculidade assim no
sentido de lesar, atingir, como no de fingir. Exs.: a) “A doença lhe afetou
o pulmão esquerdo”; b) “Falava alto, afetando destemor” (1999, p. 14-
5).
5. Por seu lado, Vitório Bergo (1944, p. 16), a par de insistir em que, em
português, tal verbo significa exagerar, fingir, requintar, simular, anota,
em sequência, que se vão vulgarizando as acepções francesas de afligir,
impressionar, interessar, tocar, trazendo em corroboração excertos de
autores insuspeitos: a) “O dinheiro é, na sociedade, em vésperas de
políticas revoluções, como o sangue nos organismos afetado por
grandes agentes mórbidos” (Latino Coelho); b) “Esse privilégio vai
afetar não só a fazenda pública mas direitos particulares” (Alexandre
Herculano); c) “Estão sempre prontos a declararem-se afetados da
cólera” (Camilo Castelo Branco).
6. Mário Barreto (1954a, p. 120-22) comunga do ensinamento acerca da
possibilidade de emprego de afetar na acepção de tocar, interessar,
afligir.
7. Um terceiro aspecto concerne ao emprego do verbo afetar (e, por
extensão, do particípio passado afeto) na acepção de incumbir, cometer,
dar comissão a, estar a cargo, pertencer, tocar.
8. Para Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 106), “tal uso não é
Português”, complementando esse autor a lição com exemplos em que
constam os efetivos sinônimos que entende devam ser usados: a) “A
questão foi cometida ao Ministro”; b) “Essa proposta está a cargo da
comissão da Fazenda”.
9. Em outra passagem de mesma obra, tal autor observa que, em Português,
o verbo afetar há de ser substituído, nesses casos, por submeter,
interessar, tocar, sujeitar, respeitar, e ainda pelas expressões dizer
respeito a, tocar a, etc.
10. Bem por isso, reputa viciosa uma construção como “O caso está afeto
ao Congresso”, estrutura essa que ele manda corrigir por “O caso está
sujeito ao Congresso” (NASCIMENTO, 1982, p. 106).
11. Também assim doutrina Luís A. P. Vitória (1969, p. 19) acerca do
particípio passado afeto nesses casos: “Como particípio passado, deve
ser substituído por submetido ou confiado: Assim, diga-se ‘Este
processo está confiado (e não afeto) ao juiz’”.
12. Coincidindo com ensinamento de Napoleão Mendes de Almeida e
Otelo Reis, entre outros, contudo, Francisco Fernandes (REIS, 1971, p.
56) observa, acerca de afetar e sobretudo do particípio passado afeto,
que, apesar da contrariedade dos compêndios em geral, tal forma “é
corrente e parece imprescindível, no sentido em que a impugnam:
‘Afetamos este caso ao tribunal’, ‘A questão foi afeta ao ministro’”.
13. Para resumir, ante a própria diversidade de posicionamentos entre os
gramáticos, há de se ter uma postura de sintaxe mais liberal, que
possibilite o emprego de afetar (e de afeto, adjetivo que é seu particípio
passado, por conseguinte), nas três acepções referidas: a) de fingir,
porque há unanimidade entre os gramáticos acerca da vernaculidade de
seu uso; b) de atingir e de submeter, por força do vetusto princípio de
que, na dúvida entre os gramáticos, o melhor é conferir liberdade de
emprego ao usuário.
14. Vejam-se alguns exemplos de emprego do verbo afetar em dispositivos
de nossas leis: a) “Qualquer alteração na estrutura jurídica da
empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados”
(CLT, art. 10); b) “Nos casos de urgência ou de acidente, capazes de
afetar a segurança ou regularidade do serviço, poderá a duração do
trabalho ser excepcionalmente elevada a qualquer número de
horas…” (CLT, art. 240, caput); c) “Ressalvadas as disposições legais
destinadas a corrigir as distorções que afetam o acesso da mulher ao
mercado de trabalho e certas especificidades estabelecidas nos
acordos trabalhistas, é vedado…” (CLT, art. 373-A, caput); d) “A
mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não
afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados” (CLT,
art. 448, caput); V) “As circunstâncias que modificam o crédito
tributário, sua extensão ou seus efeitos, ou as garantias ou os
privilégios a ele atribuídos, ou que excluem sua exigibilidade não
afetam a obrigação tributária que lhe deu origem” (CTN, art. 140).
15. E também se vejam alguns casos de emprego do adjetivo afeto por
nossas leis, exatamente no sentido de sujeito, submetido ou confiado:
a) “As custas e emolumentos serão destinados exclusivamente ao
custeio dos serviços afetos às atividades específicas da Justiça” (CF,
art. 98, § 2º); b) “Não adotada a providência descrita no § 1º deste
artigo, o relator no Superior Tribunal de Justiça, ao identificar que
sobre a controvérsia já existe jurisprudência dominante ou que a
matéria já está afeta ao colegiado, poderá determinar a suspensão,
nos tribunais de segunda instância, dos recursos nos quais a
controvérsia esteja estabelecida” (CPC/1973, art. 543-C, § 2º); c)
“Compete à secretaria das Juntas: … i) o desempenho dos demais
trabalhos que lhe forem cometidos pelo Presidente da Junta, para
melhor execução dos serviços que lhe estão afetos” (CLT, art. 711, i).
Afeto
Ver Afetar (P. 92).
A final ou Afinal?
1. A final é expressão bastante comum em linguagem jurídica, com o
significado de por último, ao final. Ex.: “O autor requereu, a final, a
condenação do réu ao pagamento de custas e honorários”.
2. Observam Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade que essa
expressão é empregada com o sentido de no final da demanda, por
último, concluído o processo, terminado o processo, e realçam ser ela
“expressão tipicamente restrita ao vocabulário jurídico” (1999, p. 61).
3. Em obra de exclusiva autoria, Antonio Henriques (1999, p. 11) volta a
observar que se trata de “expressão corrente na área jurídica e a ela
restrita” e lhe confere o significado de no final, por último, no fim, no
término da demanda.
4. Vejam-se alguns exemplos de emprego da expressão a final em textos
legais, com seu correto significado: a) “As despesas dos atos
processuais, efetuados a requerimento do Ministério Público ou da
Fazenda Pública, serão pagas a final pelo vencido” (CPC/1973, art. 27);
b) “Incumbe ao curador: … V – prestar contas a final de sua gestão”
(CPC/1973, art. 1.144, V); c) “Apresentados e vistos os embargos,
proferirá o Tribunal a sua sentença, rejeitando-os, ou recebendo-os e
julgando-os logo provados. Todavia, se ao Tribunal parecer que a
matéria dos embargos é relevante mas que não está suficientemente
provada, poderá assinar dez dias para a prova; e findo este prazo, sem
mais audiência que a do Fiscal, os julgará a final” (CCo, art. 851, 1ª
parte).
5. Por outro lado, afinal é advérbio e tem o significado de enfim,
finalmente. Ex.: “O divórcio, afinal, acabou sendo a melhor solução
para aquele casal”.
6. Vejam-se alguns casos de emprego do vocábulo afinal em nossa
legislação: a) “Se nenhum dos condôminos tem benfeitorias na coisa
comum e participam todos do condomínio em partes iguais, realizar-se-
á licitação entre estranhos e, antes de adjudicada a coisa àquele que
ofereceu maior lanço, proceder-se-á à licitação entre os condôminos, a
fim de que a coisa seja adjudicada a quem afinal oferecer melhor lanço,
preferindo, em condições iguais, o condômino ao estranho” (CC, art.
1.322, parágrafo único); b) “A justificação será afinal julgada por
sentença e os autos serão entregues ao requerente independentemente de
traslado, decorridas 48 (quarenta e oito) horas da decisão” (CPC/1973,
art. 866, caput).
7. No caso de alguns dispositivos de lei, fica-se em dúvida acerca da
correção do vocábulo ou expressão que se empregou – se a final ou
afinal: a) “Julgando suficientemente provada a posse, o juiz deferirá
liminarmente os embargos e ordenará a expedição de mandado de
manutenção ou de restituição em favor do embargante, que só receberá
os bens depois de prestar caução de os devolver com seus rendimentos,
caso sejam afinal declarados improcedentes” (CPC/1973, art. 1.051); b)
“Apresentado o preso à autoridade competente, ouvirá esta o condutor e
colherá, desde logo, sua assinatura, entregando a este cópia do termo e
recibo de entrega do preso. Em seguida, procederá à oitiva das
testemunhas que o acompanharem e ao interrogatório do acusado sobre
a imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva suas respectivas
assinaturas, lavrando, a autoridade, afinal, o auto” (CPP, art. 304); c)
“Se o interessado não souber ou não puder assinar as suas declarações,
será exigida a presença de três testemunhas, uma das quais assinará por
ele, a rogo, devendo o funcionário ler as declarações, feitas em voz alta,
atestando, afinal, que delas ficou ciente o interessado” (CLT, art. 17, §
2º, revogado).
Aforar
1. É verbo empregado com frequência em textos jurídicos e forenses na
acepção de propor uma ação em juízo, de protocolar um pedido para
apreciação judicial, de ajuizar. Ex.: “Não dando fruto as tratativas
amigáveis para o recebimento da dívida, o credor aforou ação de
execução contra o devedor”.
2. Por ser verbo transitivo direto, admite emprego na voz passiva. Exs.: a)
“As causas em que a União for autora serão aforadas na seção
judiciária onde tiver domicílio a outra parte” (CF/88, art. 109, § 1º); b)
“As causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção
judiciária em que for domiciliado o autor…” (CF/88, art. 109, § 2º).
3. Não traz problemas quanto à conjugação verbal, por ser regular e
conjugado em todas as pessoas, tempos e modos.
Aforisma ou Aforismo?
1. Aforisma é palavra inexistente com o sentido que pretendem dar-lhe,
muitas vezes empregada de modo errôneo em arrazoados forenses.
2. Já aforismo, palavra de origem grega, significa um dito, “máxima ou
sentença, que em poucas palavras contém uma regra ou um princípio de
grande alcance” (Encyclopaedia Britannica do Brasil, 1995, p. 67).
3. Anote-se que o vocábulo é masculino. Ex.: “É antigo o aforismo de que
não se há de condenar alguém sem o devido processo legal”.
4. Atente-se, também, ao erro muito comum de se dizer e escrever
aforisma, ao mesmo tempo em que se lhe atribui o gênero masculino (o
aforisma); tal palavra assim não existe.
5. O que, em realidade, existe, é aforisma, vocábulo efetivamente feminino,
de uso na veterinária, a indicar tumor, em regra sanguíneo, que se forma
nos animais, pela ruptura dos vasos.
6. Atento aos frequentes equívocos que se cometem a seu respeito, Eliasar
Rosa, com propriedade, adverte a que “não se diga aforisma, por
influência, talvez, de sofisma, aneurisma etc.” (1993, p. 23).
7. Anote-se, por fim, que o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa,
da Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de
determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma, registra a
existência tanto de aforisma (como substantivo masculino) como de
aforismo (também como substantivo masculino), sem, contudo precisar-
lhe o sentido ou especificar explicação (2009, p. 27), o que não é da
essência de sua atividade em casos dessa natureza.
Agente da passiva
1. Da oração “O réu foi condenado pela sentença”, podem-se extrair as
seguintes conclusões no plano da análise sintática: a) o sujeito é o réu; b)
o verbo está na voz passiva, porque o sujeito recebe a ação indicada por
aquele; c) tal voz passiva é analítica (e não sintética), porque o verbo não
é formado por uma só palavra, mas está em locução, e não tem a
partícula se; d) pela sentença é o agente da passiva, porque é o termo
que, na voz passiva, pratica a ação indicada pelo verbo.
2. É bem certo que, nos dias de hoje, é muito mais comum que se forme o
agente da passiva com a preposição por. Exs.: a) “O justo é amado por
Cristo”; b) “O boticário era aborrecido pelas damas”.
3. Anote-se, todavia, que é também correto o emprego – e em épocas
anteriores era muito mais comum – do agente da passiva com a
preposição de. Exs.: a) “O justo é amado de Cristo”; b) “O boticário era
aborrecido das damas” (BARRETO, 1954b, p. 181).
4. Sob o prisma da voz passiva analítica, lembra Artur de Almeida Torres
(1966, p. 94), por um lado, que “no português hodierno não se costuma
expressar o agente quando a passiva é feita com a partícula se. Tal
prática era comum até o tempo de Vieira: ‘Males que se executam pelas
mãos dos homens’”.
5. Em outra passagem, por outro lado, chega mesmo esse autor a afirmar
que “é arcaísmo dizer-se: ‘Constroem-se casas por operários
competentes’” (TORRES, 1966, p. 195).
6. Remate-se com a observação de que através de não serve para indicar o
agente da passiva. Exs.: “O gol foi feito pelo atacante” (correto); b) “O
gol foi feito através do atacante” (errado).
Ver Através de (P. 145), Voz passiva – Quando é possível? (P. 793) e Voz
passiva sintética (P. 794).
Agilizar – Existe?
Ver Verbos – Existem ou não? (P. 764)
Agradar
1. Trata-se de verbo que precisa ser observado pelo prisma da regência
verbal.
2. No sentido de acariciar, é transitivo direto. Exs.: a) “Ele agradou o
cãozinho”; b) “Ele agradou-o”.
3. Já no sentido de ser agradável, é transitivo indireto. Exs.: a) “O resultado
do processo não agradou ao perdedor”; b) “O resultado do processo não
lhe agradou”.
4. Com o verbo desagradar, observam-se as mesmas regências (SILVA, A.,
1958, p. 26). Exs.: a) “Ele desagradou o cãozinho”; b) “Ele desagradou-
o”; c) “O resultado do processo desagradou ao perdedor”; d) “O
resultado do processo lhe desagradou”.
5. Muito embora já tenha sido usado, no último sentido, também com
objeto direto, anota Francisco Fernandes que “a construção com objeto
direto é hoje desusada” (1971, p. 60).
6. Acerca dessa mesma questão, assim observa Celso Pedro Luft (1999, p.
43-4): a) também ocorre a construção como transitivo direto, “sintaxe
geralmente impugnada por gramáticos e puristas”; b) nesse sentido, “já
foi transitivo direto”, como se vê em Vieira (“o agradavam”) e Bernardes
(“agradá-lo”); c) “a velha regência está voltando por analogia com
contentar”, como o empregam Jorge Amado (“… sentia vontade de
agradar os outros negrinhos…”), José Lins do Rego (“… fez o possível
para agradá-la”) e Graciliano Ramos (“Preciso meter a cara no estudo
e agradar minha mãe”).
7. Apesar da divergência entre os gramáticos, o que melhor parece, no que
tange aos textos que devam submeter-se à norma culta, é obedecer à
distinção de regência inicialmente formulada.
Ver Voz passiva – Quando é possível? (P. 793) e O, Lhe e Dele? (P. 523)
Agradecê-lo ou Agradecer-lhe?
1. A dúvida que se põe é se, quando se quer agradecer a uma pessoa, diz-se
agradecê-lo ou agradecer-lhe?
2. Vale sempre lembrar, como princípio básico, que o estudo do
relacionamento entre as palavras na frase diz respeito a uma parte da
Gramática denominada sintaxe (do grego sin = conjunto + taxe =
construção).
3. E o capítulo específico da Gramática que trata das preposições exigidas
pelo verbo para iniciar seu complemento (ou mesmo ausência de
preposição) chama-se regência verbal.
4. Em nosso idioma, as questões de construção, ou seja, de sintaxe, são
solucionadas pelo uso que nossos melhores autores, desde Camões
(1524-80), fizeram do idioma pátrio. E a expressão melhores autores
deve abranger aqueles escritores que empregaram o vernáculo com
apuro e zelo.
5. Buscar, porém, na obra literária dos nossos melhores autores, como foi o
emprego da regência do verbo agradecer é como procurar agulha em
palheiro.
6. Mas isso não é necessário, pois, de um modo geral, estudiosos e
gramáticos já realizaram preciosos estudos nesse sentido, compilaram
milhares de exemplos e sistematizaram, em monografias merecedoras de
aplausos, grande parte da sintaxe de vocábulos dessa natureza.
7. De modo específico para os limites da indagação, ensina Domingos
Paschoal Cegalla que o verbo agradecer “constrói-se com objeto
indireto de pessoa” (e pede a preposição a). Ex.: “Ele agradeceu ao
doutor e saiu” (1999, p. 16).
8. Feita essa observação de que o verbo agradecer, nesse sentido, pede
objeto indireto com a preposição a, caminha-se mais um passo. Os
pronomes pessoais oblíquos átonos o, a, os e as servem para funcionar
como objetos diretos, enquanto os pronomes lhe e lhes servem para
substituir objetos indiretos. Exs.: a) “O juiz sentenciou o caso”; b) “O
juiz sentenciou-o”; c) “O documento pertence aos autos”; d) “O
documento pertence-lhes”.
9. Com essas premissas, parece não haver dúvida, assim, quanto ao acerto
ou erronia dos exemplos trazidos como dúvida, para quando se quer
agradecer a uma pessoa: a) “Ele quis agradecer o autor” (errado); b)
“Ele quis agradecê-lo” (errado); c) “Ele quis agradecer ao autor”
(correto); d) “Ele quis agradecer-lhe” (correto).
Ver O, Lhe e Dele? (P. 523)
Agravar
1. Verbo muito usado nos meios jurídicos com o sentido específico de
interpor recurso de agravo (KASPARY, 1996, p. 49), pode ser usado
como intransitivo (sem complemento), como transitivo indireto mais a
preposição de (quando se quer referir ao objeto do agravo), ou como
transitivo indireto mais a preposição para (quando se quer mencionar o
destino do agravo).
2. Além dessas possibilidades, nada impede seja ele construído com ambos
os complementos. Exs.: a) “Não satisfeito com a decisão, a parte
interessada agravou (intransitivo)”; b) “A parte interessada agravou da
decisão (o complemento é o objeto do agravo)”; c) “A parte interessada
agravou para o Tribunal competente” (o complemento é o destino do
agravo); d) “A parte interessada agravou da decisão para o Tribunal
competente” (os complementos são o objeto do agravo e o seu destino).
3. À semelhança de apelar e recorrer, deve-se condenar a regência agravar
a, como no exemplo: “A parte interessada agravou da decisão ao
Tribunal competente” (FERNANDES, 1971, p. 60-1).
4. Também por analogia com tais verbos e com aludir – os quais, embora
transitivos indiretos, admitem construção na voz passiva – é de se aceitar
a forma passiva do particípio de tal verbo em expressões como despacho
agravado, decisão agravada, ou mesmo parte agravada. Ex.: “O Tribunal
reformou o despacho agravado”.
5. Interessante anotar, num primeiro aspecto, que nossas leis, sobretudo os
códigos de processo, não empregam o verbo agravar nesse sentido, mas
preferem locuções tais como interpor agravo, caber agravo ou mesmo
haver recurso de agravo.
6. Também oportuno é observar que nosso legislador emprega, sim, com
frequência, tal verbo na acepção de piorar, de tornar mais oneroso ou
mais grave. Exs.: a) “Qualquer cláusula, condição ou obrigação
adicional, estipulada entre um dos devedores solidários e o credor, não
poderá agravar a posição dos outros sem consentimento destes” (CC,
art. 278); b) “O segurado perderá o direito à garantia se agravar
intencionalmente o risco objeto do contrato” (CC, art. 768); c) “Pelo
resultado que agrava especialmente a pena, só responde o agente que o
houver causado ao menos culposamente” (CP, art. 19); d) “Pelos
resultados que agravam especialmente as penas só responde o agente
quando os houver causado, pelo menos, culposamente” (CPM, art. 34).
Ver Agravar retidamente ou Interpor agravo retido? (P. 100)
Agravar retidamente ou Interpor agravo retido?
1. Agravar retidamente é expressão equivocada, que deve ser substituída
por interpor agravo retido.
2. A facilidade com que o sufixo mente se presta à formação de advérbios
de modo tem dado margem a abusos e equívocos, originando invenções
reprováveis como essa.
3. A esse respeito, lembra Geraldo Amaral Arruda: “importa que não se
considere que a concisão recomende sempre substituir as locuções por
verbos simples”, já que, “em muitos casos a substituição pode ser
inócua, em outros ela é menos expressiva e em outros ainda pode ser
inaceitável ou descabida”.
4. E continua tal autor: “esta última hipótese ocorre quando ao verbo segue
um nome a que se junta um adjetivo restritivo, formando ambos um
novo conceito, como é o caso de… agravar retidamente”.
5. Por fim, leciona ele, em síntese, não ser “cabível que se troque interpor
agravo retido por agravar retidamente” (ARRUDA, 1997, p. 65 e 80).
6. Aproveitando-se das mesmas premissas, diz o mencionado autor em
outra passagem: “não se pode substituir interpor recurso adesivo por
recorrer adesivamente” (ARRUDA, 1997, p. 65 e 80).
Ver Advérbios em “mente” (P. 85) e Agravar (P. 99).
Agravo retido
Ver Agravar (P. 99) e Agravar retidamente ou Interpor agravo retido? (P.
100)
Agredir
Ver Prevenir ou Previnir? (P. 599)
Agronomando – Existe?
Ver Alimentando – Existe? (P. 105)
Agro-pecuária ou Agropecuária?
1. Quando se quer saber se as palavras iniciadas por agro devem ser
escritas com hífen ou sem (agro-pecuária ou agropecuária?), deve-se
observar, por primeiro, porque é importante, que o radical agro (do
latim, ager, agri, que significa campo) forma, como primeiro elemento,
diversos vocábulos em nosso idioma.
2. Quanto ao mais, como geralmente ocorre com os prefixos e falsos
prefixos terminados por vogal, apenas em duas hipóteses se usa o hífen:
a) quando o elemento seguinte se inicia por h (agro-habitação, agro-
hegemonia, agro-humanidade); b) quando o elemento seguinte se inicia
pela mesma vogal com que se encerra o prefixo (agro-obsessão, agro-
oligarquia).
3. Desse modo, acopla-se diretamente à palavra seguinte, sem
intermediação de hífen, quando iniciada esta por outra vogal, que não a
que encerra o prefixo: agroaçucareiro, agroalimentar, agroecologia,
agroexportador, agroindústria.
4. Continua valendo a regra de junção direta, mesmo que o elemento
seguinte se inicie por consoante: agrobiologia, agroclimático, agrodoce,
agrofabril, agrogeografia, agrologia, agromanufatura,
agrometeorologia, agronegócio, agropecuária, agroquímica, agrovila.
5. Apenas para a hipótese de ser o segundo elemento iniciado por r ou s,
dobram-se tais consoantes para continuidade do som originário:
agrorreprogramação, agrorrepública, agrorressocialização, agrossocial,
agrosservidores.
Aguardamento – Existe?
Ver Existe em português? (P. 346)
Aguardo – É correto?
Ver Ficar no aguardo – É correto? (P. 356)
Ainda que
Ver Indicativo por Subjuntivo (P. 411).
Alavancar – Existe?
1. Para saber se o verbo alavancar existe, basta uma consulta ao
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia
Brasileira de Letras, e este vai mostrar que tal vocábulo integra
oficialmente nosso idioma (2009, p. 34).
2. Acresce dizer que a ABL, entidade que edita o VOLP, tem, por
delegação da lei, a autoridade oficial e a incumbência para listar as
palavras pertencentes ao nosso idioma, assim como para determinar-lhe
a grafia e fixar-lhe a pronúncia.
3. Em outros dizeres, se um vocábulo se encontra registrado na referida
obra, significa que ele existe oficialmente em nosso idioma e deve ser
empregado com a grafia e a pronúncia ali especificadas.
4. Por outro lado, se uma palavra lá não se encontra, não está autorizado
seu emprego nos textos que devam submeter-se à norma culta. Essa é a
lei, e qualquer problema adicional há de ficar para discussões teóricas,
no plano científico, sem interferência imediata no seu emprego.
5. Observa-se, em adição, que nada impede que, em determinada
oportunidade, a ABL altere posicionamento anterior e passe a incluir no
VOLP determinado vocábulo que, até então, ali não constava. Isso, aliás,
acontece a cada nova edição da mencionada obra.
Além e Aquém de
Ver Antes e depois (P. 120) e Com ou sem – Está correto? (P. 198)
Al – Existe?
1. Trata-se de variante neutra arcaica do pronome indefinido outro,
significando outra coisa.
2. Eduardo Carlos Pereira, que lhe dá por sinônima exatamente a expressão
outra coisa, insere esse vocábulo entre aqueles que “desapareceram do
uso vivo da língua”.
3. Em lição ministrada em outra passagem de sua obra, explicita o
mencionado autor que tal forma “arcaizou-se no falar comum; aparece
apenas nos prolóquios populares e na linguagem literária” (PEREIRA,
1924, p. 97 e 314).
4. Raramente utilizado, encontra-se, contudo, sedimentado em
determinadas expressões da linguagem forense. Ex.: “Solte-se o réu, se
por al não estiver preso”.
5. Nos dizeres de Laudelino Freire (1937b, p. 113), “al, pronome, que
significa outra coisa, é arcaico. Revivem-no, todavia, de quando em
quando escritores ilustres. No ‘Colombo’, escreveu Porto Alegre: ‘Mas a
vossa mudez al me desperta’. Nas ‘Cartas de Inglaterra’, Rui: ‘Quando
por al não valha (e creio que não vale), valerá pelo menos como voz de
rebate ao país acerca do perigo, a que o reduz o aniquilamento da sua
marinha de guerra’”.
6. De acordo com Sílvio Elia, “provém de alid, forma poética e popular por
aliud” (1967, p. 285).
7. Cândido Jucá Filho (1981, p. 40), lembrando sua natureza de pronome,
observa que Mário Barreto “usa este arcaísmo”, abonando-se com Rui
Barbosa, e acrescenta que “também Castilho o agasalha: ‘E o que al
fizer, que trema’”.
8. É curioso anotar que esse vocábulo constava do Vocabulário Ortográfico
da Língua Portuguesa, em sua quarta edição (2004, p. 30); foi,
entretanto, excluído da quinta edição, sem justificativa alguma ou
explicação.
Alguma cacofonia
Ver Cacófato – O que é? (P. 163)
Algures
1. É advérbio que significa em algum lugar, em alguma parte. Ex.: a)
“Posicionamento doutrinário divergente, você o encontrará algures”; b)
“Eu mesmo me lembro de já ter lido algures uma complexa exposição
sobre o fenômeno” (Vivaldo Coaraci); c) “Estimava mesmo que o filho
estivesse em Coimbra, ou algures, longe da quinta” (Eça de Queirós); d)
“Não foi este o próprio vocábulo empregado por ela; já lá disse algures
que D. Carmo não possuía o estilo enfático” (Machado de Assis).
2. Vasco Botelho de Amaral, realçando que se trata de vocábulo “ainda
muito empregado”, esclarece ser caso muito curioso “de muita gente não
reparar bem no significado deste advérbio” e empregar em algures, o que
é rematado erro, já que tal expressão em algures equivaleria a em em
alguma parte, com a preposição repetida indevidamente.
3. Complementa, todavia, tal autor ser perfeitamente correto dizer “venho
de algures” ou “foi para algures” (AMARAL, 1943, p. 14).
4. Contrapõe-se a nenhures, que quer dizer em nenhum lugar.
5. Não confundir com alhures, que tem o sentido de em outro lugar.
Alhures
1. É advérbio, que tem o sentido de em outro lugar. Ex.: a) “Se não estava
aqui, estava alhures”; b) “Estabeleci comigo mesmo o compromisso de
não mais, aqui ou alhures, mencionar-lhe o nome” (Ciro dos Anjos); c)
“Tornou ao piano; era a vez de Mozart, pegou de um trecho e executou-
o do mesmo modo, com a alma alhures” (Machado de Assis).
2. Muito embora alguns dicionários o ponham no rol dos arcaísmos, Vasco
Botelho de Amaral (1943, p. 14) observa que “este advérbio, apesar de
posto no rol dos esquecidos, bom serviço literário fará a quem gostar ou
necessitar de variar a expressão”, complementando que se trata de
expressão de real bom gosto.
3. Nesse sentido, é de se trazer a observação de que o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
órgão incumbido oficialmente de determinar a existência dos vocábulos
em nosso idioma, registra-o normalmente, sem restrição alguma, o que
implica concluir que seu uso continua sendo de integral regularidade
(2009, p. 39).
4. Não confundir com algures, que significa em algum lugar, nem com
nenhures, que quer dizer em nenhum lugar.
Aliás
1. Trata-se de advérbio que tem por significado primeiro de outro modo,
noutras circunstâncias. Ex.: “Foi o que eu fiz; aliás morreria”.
2. É muito mais usado, porém, como denotativo de correção, com o sentido
de digo, isto é, a saber, ou melhor. Ex.: “A vítima foi ameaçada por seis
adolescentes, aliás sete” (JUCÁ FILHO, 1963, p. 47).
Aliasmente – Existe?
Ver Advérbios em “mente” (P. 85).
Álibi
1. Álibi é advérbio oriundo do latim, que significa etimologicamente em
outro lugar e quer dizer basicamente uma prova de estar alguém em
lugar diverso daquele em que outrem afirma estar. Ex.: “Ante tão
comprovado álibi, o réu não teria como praticar o crime”.
2. Em técnica jurídica, basicamente com esse sentido, é a “prova exibida
por uma pessoa, mediante a qual se evidencia o seu afastamento ou
ausência de local determinado, na hora em que ali se consumou o delito
ou fato criminoso de que é acusado, demonstrando, assim, a
impossibilidade material de que o houvesse praticado e seja por ele
responsabilizado” (DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p. 132).
3. Evanildo Bechara (1974, p. 59) fixa uma primeira e importante
premissa: ela é proparoxítona, de modo que a sílaba pronunciada com
mais força é a antepenúltima.
4. Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 16) também a insere no rol das
proparoxítonas e lhe põe normalmente o acento gráfico: álibi.
5. Já para Eliasar Rosa (1993, p. 24): a) apesar de proparoxítono, tal
vocábulo é “inacentuado, pois se trata de um latinismo”; b) por pertencer
a idioma estrangeiro, deve-se escrever “sublinhando-o, ou em grifo, ou
aspado, ou em caracteres diferentes”; c) “já era tempo de ser
aportuguesado, escrevendo-se álibi, como se fez com ínterim, grátis,
récipe, réquiem, etc.”; d) entre outras vantagens, “decorreria disto o
evitar-se a silabada alibi” (com pronúncia forte na última sílaba).
6. Aires da Mata Machado Filho (1969h, p. 1.434) repete o entendimento
de que: a) é palavra latina, b) proparoxítona e, por pertencer a outro
idioma, c) deve ser sublinhada.
7. Observam Regina Toledo Damião e Antonio Henriques que, nos textos
submetidos aos padrões da norma culta, tal vocábulo “aparece com e
sem acento” (1994, p. 56).
8. Mais recentemente, assim leciona Arnaldo Niskier: “Escreva álibi
aportuguesado, isto é, com acento agudo no a” (1992, p. 8).
9. Para resumir, é importante dizer que, na atualidade, a questão encontra-
se oficialmente solucionada, porquanto o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras (2009, p. 39) –
órgão encarregado de registrar oficialmente quais os vocábulos que
integram o nosso léxico e qual sua correta escrita –, já o registra
incorporado ao nosso léxico e lhe atribui acento gráfico, como a toda e
qualquer proparoxítona (álibi).
10. E assim, porque o VOLP tem força de lei, fica resolvida a questão, não
havendo possibilidade alguma de discussões adicionais acerca da real
escrita do mencionado vocábulo.
Alimentando – Existe?
1. Alimentando é palavra formada como gerundivo latino e significa aquele
que há de ser alimentado, que é credor de alimentos. Exs.: a) “A pessoa
obrigada a suprir alimentos poderá pensionar o alimentando, ou dar-lhe
hospedagem e sustento, sem prejuízo do dever de prestar o necessário à
sua educação, quando menor” (CC, art. 1.701, caput); b) “É competente
o foro: … II – do domicílio ou da residência do alimentando, para a
ação em que se pedem alimentos” (CPC/1973, art. 100, II).
2. No que tange a esse e a outros vocábulos de estrutura similar, pode-se
dizer que alguns entraram em nosso léxico – quer na língua culta, quer
no linguajar jurídico – por influência erudita: colendo (de collere =
cultuar), despiciendo (de despicere = desprezar), dividendo, educando,
exequendo, interditando, multiplicando, vitando (de vitare = evitar).
3. Já outros deles se formaram por analogia, como bacharelando (de
bacharel, do francês bachelier, ou bacheler) e vestibulando (sem
correspondente em latim).
4. Luciano Correia da Silva (1991, p. 77) – que lembra a criação e a
existência de outras palavras “à imagem dos gerundivos latinos”, como
“intangendas roupas” de Castilho, “branco véu das confessandas” de
Alphonsus de Guimaraens e “não murchandas flores” de Machado de
Assis – transcreve lição de Gladstone Chaves de Melo, o qual “censura a
criação abusiva de gerundivos como farmacolando, engenheirando,
etc.”.
5. Também se posicionando contrariamente à vernaculidade e à
possibilidade de uso de um dos vocábulos assim formados, diz
Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 293), com referência a
odontolando, tratar-se de um “brasileirismo forjado para designar a
pessoa que vai se graduar em odontologia”, e acrescenta ser “palavra
formada por analogia com doutorando e bacharelando, que se justificam
por terem base verbal (doutorar-se, bacharelar-se). Mas conclui tal autor:
“Odontolando não deriva de verbo algum, pois não existe odontolar-se.
É, portanto, vocábulo mal formado, como também o são: farmacolando,
agronomando, vestibulando, etc.”.
6. Apesar da oposição de tal autor e de outros quanto à existência de
diversas dessas palavras e à própria possibilidade de seu uso no
vernáculo, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras (2009, p. 31, 40, 296, 316, 364, 544, 592
e 839), que é o veículo oficial indicador das palavras existentes em nosso
idioma, registra normalmente palavras como agronomando (aquele que
cursa Agronomia, ou está para nela graduar-se), alimentando (aquele que
é credor de alimentos), doutorando (aquele que cumpre créditos e
escreve tese para obter o título de doutor), engenheirando (aquele que
cursa Engenharia, ou está para nela graduar-se), farmacolando (aquele
que cursa Farmácia, ou está para nela graduar-se), mestrando (aquele
que cumpre créditos e escreve dissertação com vistas à obtenção do
título de mestre), odontolando (aquele que cursa Odontologia, ou está
para nela graduar-se), vestibulando (aquele que presta exames
vestibulares para ingresso em cursos universitários)…
7. Dessas lições, parece que se podem extrair duas importantes conclusões:
a) apesar da objeção de alguns, a autoridade oficial da ABL, por via do
VOLP, permite o normal emprego de todos esses vocábulos acima
listados; b) a própria premissa lançada por quem tem delegação oficial
para listar as palavras existentes em nosso idioma permite que,
respeitadas as regras da respectiva formação, se criem validamente
outros vocábulos em idênticas circunstâncias.
Aludido
Ver Despacho aludido – Existe? (P. 276) e Aludir (P. 106).
Aludir
1. Tal verbo é transitivo indireto e pede a preposição a. Exs.: a) “O
advogado aludiu ao cerceamento de defesa”; b) “Os traslados a que
aludem os dois artigos anteriores…” (Rui Barbosa).
2. Cândido Jucá Filho lembra que se encontram exemplos, “ainda que
raros”, de construção transitiva direta, como o seguinte, de Epifânio:
‘Camões alude os trabalhos que passou no mar’” (1981, p. 40).
3. Tal, contudo, é exemplo que não se há de seguir, por ser esporádico e
não contar com o aval da quase totalidade dos gramáticos.
4. Francisco Fernandes (1971, p. 69), aliás, refere que tal regência é “pouco
encontradiça hoje”, além de “condenada”.
5. Deve-se atentar, em acréscimo, à precisa lição de Vitório Bergo (1944, p.
20), que a corrobora com exemplo de Machado de Assis: “Não obstante
ser relativo (entenda-se transitivo indireto) e construir-se com a
preposição a, o verbo aludir não admite como objeto indireto o pronome
dativo lhe, que se substitui pelo caso reto preposicionado. Assim, em vez
de aludir-lhe, diz-se aludir a ele: ‘A mulher pensava na travessura do
filho; não a referiu ao marido, pediu à vizinha que não aludisse a ela e,
de noite, só pregou olho tarde’”.
6. Celso Pedro Luft (1999, p. 51), de igual modo, é categórico para dois
aspectos: a) conferir-lhe a natureza de transitivo indireto; b) vedar a
possibilidade de emprego do pronome lhe como seu complemento.
7. Em mesmo sentido é o ensino de Domingos Paschoal Cegalla (1999, p.
21): a) “é verbo transitivo indireto”; b) “não admite o pronome
complemento lhe”.
8. Vejam-se, dentre os muitos, alguns exemplos de emprego do referido
verbo em nossa legislação: a) “O Tribunal de Contas da União efetuará
o cálculo das quotas referentes aos fundos de participação a que alude o
inciso II” (CF, art. 161, parágrafo único); b) “Violado o direito, nasce
para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos
prazos a que aludem os arts. 205 e 206” (CC, art. 189); c) “O acordo,
porém, só produz efeito, quando constar de contrato escrito e aludir
expressamente a determinado negócio jurídico” (CPC/1973, art. 111, §
1º); d) “O juiz não admitirá a recusa: … II – se o requerido aludiu ao
documento ou à coisa, no processo, com o intuito de constituir prova”
(CPC/1973, art. 358, II); e) “Não se deferirá o compromisso a que alude
o art. 203 aos doentes e deficientes mentais e aos menores de 14
(quatorze) anos, nem às pessoas a que se refere o art. 206” (CPP, art.
208); f) “A intimação pessoal, feita pelo escrivão, dispensará a
aplicação a que alude o § 1º” (CPP, art. 370, § 3º); g) “Em igual prazo, o
empregador enviará cópia da aludida comunicação aos sindicatos
representativos da respectiva categoria profissional, e providenciará a
afixação de aviso nos locais de trabalho” (CLT, art. 139, § 3º); h) “A
duração de trabalho cumulativo a que alude o presente artigo não
poderá exceder de 10 (dez) horas” (CLT, art. 235, § 1º).
Ver Agente da passiva (P. 97), Despacho aludido – Existe? (P. 276), Ser
nascido – Está correto? (P. 694), Voz passiva – Quando é possível? (P. 793)
e Voz passiva sintética (P. 794).
Alugar
1. Trata-se de palavra bifronte, porque indica relações duplas, posições
recíprocas, com sentido ora ativo de dar em aluguel, ora passivo de
receber em aluguel.
2. Aires da Mata Machado Filho (1969f, p. 213) – que atribui tal
designação de bifronte a Mário Barreto – também vê em vocábulos dessa
natureza termos de significação ora ativa, ora passiva.
3. Na primeira hipótese, significa dar em aluguel. Ex.: “O proprietário
aluga o imóvel ao inquilino”.
4. No segundo caso, tem o sentido de receber em aluguel. Ex.: “O inquilino
aluga o imóvel do proprietário”.
5. Como se vê, o uso adequado da preposição salva os equívocos que
possam aparecer em tais casos.
6. Fundado em exemplos de autor insuspeito, Vitório Bergo (1944, p. 20)
repete essa lição de que “este verbo pode usar-se nos dois diversos
sentidos de dar ou tomar de aluguel”. Exs.: a) “E alugou uma mansarda,
que mobilou” (Camilo Castelo Branco); b) “O interesse grande que
punha em alugar as casas pelo dobro da sua renda” (Camilo Castelo
Branco).
7. Cândido Jucá Filho (1981, p. 40), em apreciação sobre a obra de Mário
Barreto, também confirma a existência e o emprego dos dois sentidos
para esse verbo no mencionado autor: “dar de aluguer” e “tomar de
aluguer”.
8. Regina Toledo Damião e Antonio Henriques (1994, p. 234) também
estão de acordo em que tal verbo é bifronte, vale dizer, assume o duplo
aspecto tanto no sentido ativo de dar em aluguel como no sentido
passivo de receber por aluguel.
9. Antonio Henriques (1999, p. 13), em obra que escreveu sozinho, de igual
modo dá esse verbo como bifronte: “significa dar de aluguel (sentido
ativo) e pagar de aluguel (sentido passivo)”.
10. Celso Pedro Luft (1999, p. 51) também lhe admite as duas
possibilidades de emprego: dar em aluguel ou tomar de aluguel.
11. Francisco Fernandes (1971, p. 69), por seu lado, embora lhe admita tal
dupla sintaxe – “dar ou tomar de aluguer” – atentando aos problemas
que podem surgir no dia a dia, preconiza outro modo de uso, fundando-
se em lição de Stringari: “Para evitar ambiguidade de sentido, usa-se o
circunlóquio dar de aluguel e tomar de aluguel em vez do simples
alugar, que tem dois sentidos opostos”.
12. Uma consulta aos principais códigos pátrios revela que o legislador
sempre emprega o verbo alugar na acepção de dar em aluguel – e não
no sentido de tomar em aluguel – como se pode constatar pelos
seguintes exemplos: a) “Deliberando a maioria sobre a administração
da coisa comum, escolherá o administrador, que poderá ser estranho
ao condomínio; resolvendo alugá-la, preferir-se-á, em condições
iguais, o condômino ao que não o é” (CC, art. 1.323); b) “Resolvendo o
condômino alugar área no abrigo para veículos, preferir-se-á, em
condições iguais, qualquer dos condôminos a estranhos, e, entre todos,
os possuidores” (CC, art. 1.338); c) “Quando o uso consistir no direito
de habitar gratuitamente casa alheia, o titular deste direito não a pode
alugar, nem emprestar, mas simplesmente ocupá-la com sua família”
(CC, art. 1.414); d) “Na mesma pena do § 1º incorre quem, com o
intuito de lucro direto ou indireto, distribui, vende, expõe à venda,
aluga … original ou cópia de obra intelectual ou fonograma
reproduzido com violação do direito de autor, … ou, ainda, aluga
original ou cópia de obra intelectual ou fonograma, sem a expressa
autorização dos titulares dos direitos ou de quem os represente” (CP,
art. 184, § 2º); e) “É unicamente considerada mercantil a compra e
venda de efeitos móveis ou semoventes, para os revender por grosso ou
a retalho, na mesma espécie ou manufaturados, ou para alugar o seu
uso…” (CCo, art. 191, segunda parte, revogado).
Aluguel ou Aluguer?
1. Conquanto aluguel seja mais recente, com seu plural aluguéis, também é
correta a forma mais antiga aluguer, que tem por plural alugueres.
2. Observam José de Nicola e Ernani Terra que “ambas as formas são
aceitas como corretas”, esclarecendo que aluguel “é de uso mais comum
no Brasil”, ao passo que aluguer “é muito empregada em Portugal e na
linguagem jurídica”.
3. E reiteram tais autores que “aluguel faz o plural aluguéis e aluguer,
alugueres” (NICOLA; TERRA, 2000, p. 29).
4. Luís A. P. Vitória (1969, p. 23), embora dê preferência, sem justificativas
adicionais, a aluguel, aceita que “são formas variantes, portanto
admissíveis ambas”.
5. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 21), entre aluguel e aluguer, faz
sua opção para o emprego cotidiano: “prefira-se a primeira forma. A
segunda (aluguer) é restrita à linguagem forense”.
6. Acresça-se que Rui Barbosa (1949, p. 329), ao fazer comentários acerca
da redação do art. 1.191 do Projeto do Código Civil, aceitou
indiferentemente ambas as variantes; por sugestão sua, entretanto,
acabou vingando aluguer na redação definitiva do art. 1.190 do Código
Civil de 1916.
7. E, sistematicamente, o Código Civil de 1916 emprega as formas aluguer
e alugueres (arts. 178, § 10, IV, 776, II, 1.192, II, 1.193, 1.195, 1.196,
1.201, 1.202, 1.205, 1.214, 1.252, 1.566, VI).
8. Nessa mesma esteira de dupla possibilidade de emprego, esclarece
Silveira Bueno que, assim como em outros vocábulos, as duas
consoantes finais, l e r, substituem-se indistintamente, e ambas as formas
são igualmente aceitas e corretas; apenas acrescenta ele que, no caso, “a
grafia com r já vai cedendo lugar à grafia com l” (1938, p. 25).
9. Dirimindo qualquer dúvida para a atualidade, registra ambas as formas o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia
Brasileira de Letras, órgão incumbido de atestar oficialmente quais os
vocábulos que integram nosso léxico (2009, p. 44), o que implica
asseverar que o emprego de ambas as formas está oficialmente
autorizado.
10. Quanto aos demais textos de lei – além do Código Civil de 1916 já
referido –, há alguns casos de emprego das formas aluguer e alugueres
(Decreto-lei 3.200, de 19/4/41, art. 7º, parágrafo único; Decreto-lei
7.661, de 21/6/45, art. 44, VII; Lei 5.478, de 25/7/68, art. 17; Lei
8.245, de 18/10/91, art. 69).
11. Quer em tempos antigos, todavia, quer em tempos modernos, tem-se
dado preferência às formas aluguel e aluguéis (Código Comercial, arts.
87, 96, 97, 99, 100, 113, 116, 228, 230, 470, 764; Código de Processo
Civil, arts. 585, IV, e 723; Lei 4.504, de 30/11/64, art. 91, XI, a; Lei
6.091, de 15/8/74, arts. 2º, caput, e 5º, IV; Estatuto da Criança e do
Adolescente, art. 77; Lei 8.245, de 18/10/91, arts. 6º, parágrafo único,
9º, III, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 23, 24, 25, 26, 32, 38, 42, 43, 44, 49, 50,
58, 59, 62, 64, 67, 68, 69, 70, 72, 73, 78, 85; Lei 8.383, de 30/12/91,
arts. 1º, 72 e 74).
12. Prova definitiva da preferência do legislador moderno pela forma
aluguel – em detrimento de aluguer – reside no Código Civil de 2002,
o qual, contrariamente a seu antecessor, registra, apenas e tão somente
as primeiras, jamais as últimas (cf. arts. 206, § 3º, I, 567, 569, II, 572,
574, 575, 582, 964, VI, 1.415, 1.467, II, 1.507, § 1º).
a. m.
1. É a abreviatura internacional da expressão latina ante meridiem, que
significa antes do meio-dia.
2. Contrapõe-se a p. m., que é forma abreviada de post meridiem, também
expressão latina, que quer dizer após o meio-dia.
3. As letras de tal abreviatura vêm sempre escritas em minúsculas.
Ver p. m. (P. 569).
Amámos ou Amamos?
1. Um leitor indaga se as recentes modificações na Ortografia passaram a
obrigar o uso do acento agudo na forma verbal amámos (pretérito
perfeito) para distingui-la de amamos (presente do indicativo).
2. Ora, contrariamente ao que muitos pensam, o Acordo Ortográfico de
2008 não veio para simplificar a escrita; seu objetivo maior foi justificar
as escritas de Brasil e Portugal, ou, talvez, sistematizá-las, mediante a
permissão de emprego de formas distintas usadas em ambos os países.
3. Assim, para acertar a duplicidade de pronúncias dos dois países, criou
ele a dupla possibilidade de grafia, mediante a diferenciação, pelo acento
agudo, da primeira pessoa do plural do pretérito perfeito do indicativo
dos verbos da primeira conjugação (louvámos, adorámos e falámos),
formas essas pronunciadas de modo aberto em Portugal, para opor-se à
primeira pessoa do plural do presente do indicativo (louvamos,
adoramos e falamos).
4. Vale lembrar que, no Brasil, com raras exceções de usuários que tiveram
contatos prolongados com Portugal, não se faz distinção de pronúncia
entre a primeira pessoa do plural do presente do indicativo e a primeira
pessoa do plural do pretérito perfeito do indicativo, de modo que ambas
são aqui pronunciadas com som fechado.
5. Mas, em termos do que é a situação após o Acordo Ortográfico de 2008,
sintetize-se a questão com duas observações: a) O acento ocorre no
pretérito perfeito, mas não no presente do indicativo; b) Tal acento é
facultativo, e não obrigatório.
6. Com essas premissas, confiram-se, quanto à grafia, os seguintes
exemplos, com a indicação de sua correção ou erronia entre parênteses:
a) “Será que hoje amamos os inimigos?” (correto); b) “Será que hoje
amámos os inimigos?” (errado); c) “Será que, no passado, amamos os
inimigos?” (correto); d) “Será que, no passado, amámos os inimigos?”
(correto).
Ambos
1. Em grego, latim e português, tal palavra significa dois, um e outro. Ex.:
“Quando passei, vi dois guardas; e, ao voltar, ambos ainda lá se
achavam”.
2. Nesse sentido, ensinam os gramáticos (RIBEIRO, João, 1923, p. 23) que
tal forma “indica a dualidade natural ou habitual: ambas as mãos, as
mãos ambas; os dous ambos (no italiano ambedue)”.
3. Verificada a dualidade natural ou habitual do vocábulo ambos, é de se
ver, em complementação, o ensino de José de Sá Nunes: “se alguém
empregou a frase ambos os dois ou ambos de dois, em vez de macular
seus escritos, o que fez foi ataviá-los com gemas clássicas do mais
subido valor” (1938, p. 192).
4. Ernesto Carneiro Ribeiro, em lição transcrita pelo filólogo referido,
também anota que “as expressões pleonásticas ambos os dois, ambos e
dois, ambos de dois, muito em voga entre os antigos, são ainda hoje […]
empregadas por alguns escritores de nota” (RIBEIRO, João, 1923, p.
193).
5. Heráclito Graça (1904, p. 446) defende a correção de tal sintaxe e anota
que a empregaram Herculano, Castilho e Garrett.
6. Quanto a ambos de dois, vale trazer a registro a lição de João Ribeiro, de
que se trata de “locução clássica, usada uma vez em Camões: ‘De ambos
de dous a fronte coroada’” (1923, p. 23).
7. E a expressão ambos os dois, para Laudelino Freire (1937b, p. 128),
“tida por muitos como indefensável tolice, é de cunho clássico, e usada
tem sido por escritores de primeira ordem”, arrolando ele próprio
exemplos de abalizados autores: … “O certo é que ambos os dois
monges caminhavam juntos” (Alexandre Herculano).
8. Sousa da Silveira complementa que “ambos os dois ainda em autores
modernos não é muito raro” (SILVEIRA apud NUNES, 1938, p. 192).
9. Veja-se, nesse sentido, o exemplo de Rui Barbosa, em sua Réplica:
“Ambas as formas são gramaticais? São-no ambas as duas” (BARBOSA
apud NUNES, 1938, p. 197).
10. Ressalvada a circunstância do pouco uso da expressão por último
referida em nossos dias, Sousa e Silva leciona, em acréscimo, que “não
é expressão condenável e dela fizeram uso grandes escritores” (1958,
p. 30).
11. Realce-se que, para Silveira Bueno (1938, p. 216), não apenas é correta
a expressão ambos os dois, mas também a expressão ambos de dois,
trazendo tal autor, para sua confirmação, o abono de escritores
abalizados. Exs.: a) “O certo é que ambos os dous monges caminhavam
juntos” (Alexandre Herculano); b) “De ambos de dous a fronte coroada
/ ramos não conhecidos e erva tinha” (Camões); c) “Quebradas tivesse
eu as pernas ambas de duas quando casei com este moinante” (Camilo
Castelo Branco).
12. Mesmo em nossos dias, Pasquale Cipro Neto e Ulisses Infante veem
perfeita possibilidade de utilização das “formas enfáticas ambos os
dois, ambos a dois, ambos de dois, a ambos dois” (1999, p. 313).
13. Em posição mais restritiva, após anotar que ambos “é dual, e traz, de
ordinário, a ideia de par”, Eduardo Carlos Pereira refere que “as
expressões clássicas de ambos os dois, ambos de dois, ambos e dois,
são arcaicas, se bem que em alguns escritores modernos se leia ainda
ambos os dois” (1924, p. 312).
14. Luiz Antônio Sacconi, após, de igual modo, realçar em ambos a
natureza de numeral dual, “porque sempre se refere a dois seres”, e
depois de anotar que se trata de locução pleonástica, aduz que ela,
ainda em nossos dias, “pode ser usada, porém, com discrição” (1979, p.
61).
15. Júlio Nogueira (1959, p. 31-2), por seu lado, juntando em mesma
observação as expressões ambos os dois, ambos de dois e ambos e
dois, anota que “vários autores têm justificado tais locuções
pleonásticas nesta ou naquela forma”; mas continua: “o melhor é não
usar nenhuma delas. Além do mais só as emprega hoje quem se quer
pavonear com indumentos clássicos extravagantes”.
16. Cândido de Oliveira lembra que o vocábulo ambos admite várias
construções – ambos dois, ambos os dois, ambos e dois, ambos a dois –
mas observa que, “na linguagem comum, todavia, tais expressões
foram abandonadas e somente empregamos ambos” (s/d, p. 25).
17. Também José de Nicola e Ernani Terra discordam da possibilidade de
emprego moderno da referida expressão pleonástica: “embora muito
utilizada, tanto pelo povo, quanto por escritores antigos, evite o uso das
expressões ambos os dois e ambos de dois, uma vez que o numeral
ambos, que significa um e outro, deve ser empregado para substituir a
expressão os dois” (2000, p. 30).
18. De modo muito específico para o campo jurídico, observam Regina
Toledo Damião e Antonio Henriques que, em Direito, emprega-se a
expressão ambos os dois, que conserva “o sentido antigo de reforço da
ideia para traduzir a unidade de propósito, v. g., na denúncia” (1994, p.
227).
19. Em resumo: quer por seu caráter enfático, que nem sempre faz parte da
expressão moderna, quer pela normal ausência de um polimento
estilístico maior de grande parte dos textos de nossos dias, ainda que
elaborados sob a orientação da norma culta, há de se cuidar para que,
no emprego da referida expressão – sem dúvida permitido pela
Gramática – não incida o usuário no pedantismo, quando não no
pernosticismo. Assim, mesmo se quiser usar de alguma das expressões
mais elaboradas, é melhor proceder a seu emprego com parcimônia.
20. Vale acrescer que uma busca nas dez codificações mais importantes do
país, incluindo o vetusto Código Comercial de 1850, mostra que o
legislador jamais quis fazer uso de qualquer das possibilidades mais
literárias e elaboradas do mencionado vocábulo, mas sempre o
emprega ou sozinho (ambos ou ambas), ou seguido de um substantivo
(ambos os cônjuges ou ambas as casas).
A mesma coisa
Ver O mesmo (P. 524).
Amiúde
1. Amiúde é advérbio de origem latina e significa frequentemente,
repetidamente. Ex.: “O réu ia amiúde divertir-se com os fregueses do
bar da esquina”.
2. Ora, em termos de técnica gramatical, é de se ver que, formador de
advérbios em português, o sufixo mente só pode ser acrescentado a
adjetivos no feminino: satisfatória + mente = satisfatoriamente;
criteriosa + mente = criteriosamente.
3. João Ribeiro lembra que “o português formou advérbios numerosos com
a junção de mente a adjetivos femininos… Essa faculdade já existia com
pequena extensão no latim clássico” (1923, p. 139).
4. Observa também Eduardo Carlos Pereira, em duas passagens de sua
obra, que “a terminação adverbial mente é o substantivo feminino mente
com a significação de maneira, intenção. Mais tarde se justapôs ao
adjetivo, perdendo o caráter de substantivo, conservando, entretanto, o
adjetivo sua flexão feminina” (1924, p. 151 e 174).
5. Com base em tais postulados, vê-se, assim, que, por já ser um advérbio,
amiúde não é passível de receber acréscimo desse sufixo adverbial,
sendo errôneo o emprego em formas como: “O réu ia amiudemente
divertir-se com os fregueses do bar da esquina”.
6. Dessa mesma categoria são erros como adredemente, apenasmente, de
repentemente.
7. Observando que tal vocábulo se origina da locução adverbial ad +
minute ou ad + minutum, lembra Sílvio Elia, a propósito de sua grafia:
“Pode-se escrever amiúde numa palavra só,… ou [com ligeira variação
gráfica] em duas palavras, a miúdo. O sentido é o mesmo” (1967, p. 200
e 297).
8. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, órgão incumbido de listar oficialmente as palavras
existentes em nosso idioma e sua respectiva grafia, corrobora esse último
entendimento e registra as duas possibilidades: a miúde e amiúde (2009,
p. 49).
Ver Advérbios em “mente” (P. 85) e Tocantemente – Existe? (P. 739)
Amiudemente
Ver Advérbios em “mente” (P. 85).
Amoral ou Imoral?
1. Amoral não tem acepção alguma de contrariedade aos bons costumes,
mas quer dizer algo simplesmente afastado de qualquer preocupação
com a moralidade. Ex.: “Não repassar às crianças e aos jovens
princípios de espiritualidade é criar uma geração de ateus e amorais”.
2. Já sua parônima imoral significa contrário aos bons costumes, desonesto,
devasso, libertino. Ex.: “Mesmo não sendo crime, o incesto é imoral”.
3. Nesse sentido é a síntese de Luís A. P. Vitória (1969, p. 24): a) “Amoral
– que é destituído de moralidade. Ex.: ‘Esse indivíduo é um amoral’.
Não confundir com imoral, cujo significado é: contrário à moral,
desonesto. Ex.: ‘À polícia compete reprimir as práticas imorais’”.
4. Essa também a lição de José de Nicola e Ernani Terra (2000, p. 30): a)
“utiliza-se amoral quando queremos fazer referência àquele que não é
nem contrário nem conforme à moral, ou para designar algo a que falta
moral”; b) “imoral deve ser empregado com o sentido de contrário à
moral”.
Ver Moral – A moral ou O moral? (P. 477)
Ampersand
1. Trata-se de palavra inglesa para designar o sinal gráfico &, abreviatura
do latim et (que significa e).
2. Observa Domingos Paschoal Cegalla que “Millôr Fernandes propôs a
denominação portuguesa sinal tironiano, por ter sido inventado por
Tirônio, secretário de Cícero, este último um político e orador latino”
(1999, p. 24).
3. Luciano Correia da Silva relata haver lido artigo de Fernando Sabino em
que havia a explicação de que o símbolo & significaria etc.
4. Explica, todavia, tal autor (SILVA, L., 1991, p. 159): “O sinal & não é
forma reduzida de etc., como lhe informaram. Na verdade, este símbolo
é apenas o entrelaçamento de et (e + t), herança latina de um costume
gráfico medieval. Daí é que veio a forma curiosa do nosso uso
comercial: Simões & Filhos, isto é, Simões e Filhos e não ‘Simões etc.
Filhos’”.
Analisar
1. Para bem se guardar a escrita em casos dessa natureza, duas regras de
ortografia devem ser consideradas: a) Se se tem de acrescentar a um
radical o sufixo izar inteiro para formar um verbo, grafa-se com z: fiscal,
útil (primitivas) fazem fiscalizar, utilizar (derivadas); b) No caso da
observação anterior, porém, se já existe s no radical, é ele aproveitado na
palavra nova: análise, pesquisa, catálise (primitivas) fazem analisar,
pesquisar, catalisar.
2. No vocábulo ora estudado, porque a palavra primitiva é análise, onde já
existe s, a derivada há de ser analisar.
Ver Ortografia (P. 533) e Regras de ortografia (P. 652).
Andaime
Ver Roraima (P. 675).
Anexo
1. Do prisma da concordância nominal, trata-se de adjetivo e, assim,
concorda em gênero e número com o substantivo modificado. Exs.: a)
“Segue anexo o documento”; b) “Segue anexa a fotocópia”; c) “Seguem
anexos os documentos”; d) “Seguem anexas as fotocópias”.
2. De Domingos Paschoal Cegalla é a preciosa síntese: “Esta palavra não é
advérbio e sim adjetivo, devendo, por isso, concordar em gênero e
número com o substantivo a que se refere” (1999, p. 25).
3. Os vocábulos apenso e incluso são seus sinônimos e obedecem à mesma
concordância.
4. Quanto a sua regência, Francisco Fernandes (1969, p. 36) o faz
construir-se com a preposição a. Ex.: “É justamente na edição anexa ao
meu parecer…” (Rui Barbosa).
5. Esse também o posicionamento de Celso Pedro Luft (1999, p. 51),
estampado facilmente nos exemplos que oferece: a) “Coisas anexas uma
à outra”; b) “Órgãos anexos à boca”; c) “Anexa à religião anda a boa
intenção”; d) “Parecer a que estão anexos os documentos”; e) “Livraria
anexa à Faculdade”.
6. De Domingos Paschoal Cegalla ainda vem a preciosa observação de que
anexo “não deve ser usado como particípio de anexar, em vez de
anexado. Diga-se, portanto: O documento foi anexado (e não anexo) ao
processo” (1999, p. 25).
7. Vejam-se alguns exemplos de emprego do mencionado adjetivo em
dispositivos de lei: a) “Enquanto lei complementar não disciplinar o
disposto nos incisos I e III do § 3º do art. 156 da Constituição Federal, o
imposto a que se refere o inciso III do caput do mesmo artigo: I – terá
alíquota mínima de dois por cento, exceto para os serviços a que se
referem os itens 32, 33 e 34 da Lista de Serviços anexa ao Decreto-Lei
406, de 31 de dezembro de 1968” (CF, art. 88, I); b) “O boletim
individual a que se refere este artigo é dividido em três partes
destacáveis, conforme modelo anexo a este Código, e será adotado nos
Estados, no Distrito Federal e nos Territórios…” (CPP, art. 809, § 3º,
primeira parte); c) “As repartições competentes do Ministério do
Trabalho, Indústria e Comércio manterão, para os fins do artigo
anterior, um registro especial, anexo ao dos jornalistas profissionais…”
(CLT, art. 313, § 1º); d) “As medidas de segurança são pessoais ou
patrimoniais. As da primeira espécie subdividem-se em detentivas e não
detentivas. As detentivas são a internação em manicômio judiciário e a
internação em estabelecimento psiquiátrico anexo ao manicômio
judiciário ou ao estabelecimento penal, ou em seção especial de um ou
de outro” (CPM, art. 110).
Ver Em anexo – Está correto? (P. 302)
Anglicismo
1. O nome genérico para o vício de linguagem consistente em usar
vocábulos, expressões e construções alheias ao idioma é barbarismo.
2. Quando a invasão de palavras provém do inglês, dá-se ao vício o nome
de anglicismo. É o caso de performance, de emprego não autorizado no
idioma pelo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (editado pela
Academia Brasileira de Letras, que tem a delegação para listar
oficialmente os vocábulos pertencentes ao idioma), palavra essa que
pode perfeitamente ser substituída por desempenho.
3. Tecnicamente, para João Ribeiro, anglicismos “são palavras tomadas
inutilmente da língua inglesa” (1923, p. 245).
4. Carlos Góis também dá, como exemplo desse vício de linguagem
consistente na imitação servil da língua inglesa, “a anteposição do
adjetivo qualificativo ao substantivo quando contrária ao gênio da
língua: Seleto Hotel por Hotel Seleto; Moderno Bar por Bar Moderno;
Parque Cinema por Cinema Parque” (1945, p. 40-1).
5. Esclareça-se que, quando regular e oficialmente recebida a palavra nova
de outro idioma pelo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa,
editado pela Academia Brasileira de Letras – onde se verifica a realidade
de existência aceita do vocábulo em nosso idioma – diz-se, estar diante
de um neologismo. Foi o que se deu recentemente com diversos
vocábulos de tecnologia e informática recolhidos pelo VOLP, como
acessar, deletar e inicializar.
Ver Estrangeirismos (P. 336).
Anos atrás
Ver Há cinco anos atrás – Pleonasmo? (P. 383) e Pleonasmo – O que é e
Quando pode? (P. 565)
Ansiar
1. Veja-se, de início, que, quanto à ortografia, há de se escrever ansiar,
sendo errada a forma anciar.
2. No que concerne à conjugação verbal, o certo é que, quando terminam
em iar, normalmente se têm verbos regulares, os quais seguem o modelo
anunciar.
3. São, todavia, exceções a essa regularidade de conjugação mediar, ansiar,
remediar, incendiar e odiar – pode-se guardar a sigla MARIO –, que
têm por modelo este último.
4. Tais verbos mudam o i da penúltima sílaba em ei nas formas rizotônicas:
anseio, anseias, anseia, ansiamos, ansiais, anseiam (presente do
indicativo); anseie, anseies, anseie, ansiemos, ansieis, anseiem (presente
do subjuntivo); anseia, anseie, ansiemos, ansiai, anseiem (imperativo
afirmativo); não anseies, não anseie, não ansiemos, não ansieis, não
anseiem (imperativo negativo).
5. Vale sintetizar os problemas de conjugação desse verbo com as
observações de Vitório Bergo: “recebe um e eufônico nas formas
rizotônicas, que só se manifestam no presente do indicativo e do
subjuntivo e, portanto, no imperativo” (1943, p. 142-3).
6. Como tais problemas ocorrem apenas nas formas rizotônicas, e estas
aparecem somente no presente do indicativo e tempos derivados, não
apresenta o mencionado verbo dificuldades de flexão nos demais tempos
(formas arrizotônicas), em que é regular: ansiava (imperfeito do
indicativo), ansiarei (futuro do presente), ansiaria (futuro do pretérito),
ansiei (pretérito perfeito do indicativo), ansiara (pretérito mais-que-
perfeito do indicativo), ansiar (futuro do subjuntivo), ansiasse
(imperfeito do subjuntivo), ansiando (gerúndio), ansiado (particípio).
7. Não confundir com os verbos terminados por ear, como nomear, os
quais recebem um i intermediário nas formas rizotônicas: nomeio,
nomeias, nomeia, nomeamos, nomeais, nomeiam (presente do
indicativo); nomeie, nomeies, nomeie, nomeemos, nomeeis, nomeiem
(presente do subjuntivo); nomeia, nomeie, nomeemos, nomeai, nomeiem
(imperativo afirmativo); não nomeies, não nomeie, não nomeemos, não
nomeeis, não nomeiem (imperativo negativo).
8. Quanto à regência verbal, no sentido de desejar ardentemente, Francisco
Fernandes ensina que esse verbo pode ser empregado como transitivo
direto ou como transitivo indireto (com preposições de e por). Exs.: a)
como transitivo direto: “O seu coração anseia um confidente” (Camilo
Castelo Branco); b) como transitivo indireto (de): “Fazia tempo que
ansiava de lhe falar à puridade” (Padre Stringari); c) como transitivo
indireto (por): “Anseia pela hora…” (Camilo Castelo Branco).
Ansiedade
1. Significa desejo ardente, inquietude. Ex.: “Em sua ansiedade, eles
acabaram atrapalhando o resgate”.
2. Atente-se a sua ortografia, pois é errada a forma anciedade.
3. A mesma observação vale para seus cognatos ânsia, ansiar, ansioso.
Anteceder
1. Quanto à regência verbal, Sousa e Silva (1958, p. 32) vislumbra dupla e
indiferente possibilidade de construção de tal verbo: como transitivo
direto e como transitivo indireto. Exs.: a) “… o diretor que antecedeu o
réu na empresa falida…”; b) “… o diretor que o antecedeu na empresa
falida…”; c) “… o diretor que antecedeu ao réu na empresa falida…”;
d) “… o diretor que lhe antecedeu na empresa falida…”
2. Celso Pedro Luft (1999, p. 57-8), com base em lembrete de Artur de
Almeida Torres, até mesmo traz à colação exemplo de Rui Barbosa com
as duas regências em mesma frase: “A criação de ‘honorável’ devia
anteceder a de ‘honorabilidade’, como natural é que a da raiz anteceda
à palavra dela resultante”.
3. Em mesmo sentido é a posição de Francisco Fernandes (1971, p. 79),
que se abona com autores abalizados: a) “As duas orações, a que se
refere aquele ‘o’, vêm após ele em vez de o antecederem” (Rui Barbosa);
b) “Outra coisa mui diversa é analisá-la (a frase) juntamente com a que
lhe antecede” (José de Sá Nunes).
4. Domingos Paschoal Cegalla também entende possível construí-lo tanto
com objeto direto quanto com objeto indireto, exemplificando tais
complementos com pronomes: “O prefeito criticou a gestão do que o (ou
lhe) antecedera”.
5. Quanto à frequência de seu emprego, todavia, realça o mesmo
gramático: “mais usado com objeto direto, mas também é lícito construí-
lo com objeto indireto” (CEGALLA, 1999, p. 27).
6. Nos textos de lei, na acepção de preceder, de vir antes, aparece
normalmente como transitivo indireto, sob a construção anteceder a
alguém em algo. Exs.: a) “O direito de nomear tutor compete ao pai, à
mãe, ao avô paterno e ao materno. Cada uma destas pessoas o exercerá
no caso de falta ou incapacidade das que lhes antecederam na ordem
aqui estabelecida” (CC/1916, art. 407); b) “… um deles tiver antecedido
aos outros na prática de algum ato do processo ou de medida a este
relativa…” (CPP, art. 83).
7. Atente-se, contudo, ao fato de que seu sinônimo preceder não segue a
mesma construção.
Antes e depois
1. É bastante comum, nos arrazoados jurídicos e nos julgados, como de
resto nos textos redigidos com obediência à norma culta, que neles se
encontrem frases como as seguintes: a) “Há nos autos elementos a favor
e contra a tese dos apelantes”; b) “O réu foi procurado antes e durante
as férias forenses”; c) “O réu foi procurado antes e depois das férias
forenses”.
2. Lembrando que tal modo de expressar-se “não é Português”, observa
Edmundo Dantès Nascimento que “o nome ou pronome regidos por duas
ou mais preposições devem estar claros junto de cada uma delas”,
motivo por que, no entender do referido autor, as frases corretas devem
trazer o nome repetido desta maneira: a) “Há nos autos elementos a
favor da tese dos apelantes e contra ela”; b) “O réu foi procurado antes
das férias e durante elas”; c) “O réu foi procurado antes das férias
forenses e depois delas”.
3. Essa, ainda na lição de tal autor (NASCIMENTO, 1982, p. 158-60), a
construção que normalmente se vê nos clássicos: a) “Os gritos da vítima
antes da luta e durante a luta continuavam a repercutir” (Machado de
Assis); b) “… o que em Deus e por Deus se começa…” (Tomé de Jesus).
4. Estabelecendo, em continuação, importante princípio, assinala tal autor
que “não há erro, quando se empregam locuções preposicionais
terminadas com a mesma preposição formadora da locução” –
geralmente a e de e, raramente, com – de modo que é correta a expressão
“… antes e depois das férias…” (as locuções preposicionais, no caso,
são antes de e depois de, ambas terminadas com a mesma preposição
de).
5. E complementa ele que, se, em tais casos, as locuções denotam certa
antinomia, usa-se a preposição final apenas no segundo nome: a) “Os
inimigos estavam além e aquém da fronteira”; b) “O réu foi procurado
antes e depois das férias”; c) “… que gozou de mais segura paz de
quantos houve dentro e fora de Israel” (Padre Antônio Vieira); d) “À
esquerda e à direita da praça, havia inúmeros manifestantes”; e) “Por
baixo e por cima do feno, havia sinais da violência dos policiais”; f) “Os
bombeiros passavam para baixo e para cima da ponte, à procura de
outros corpos” (NASCIMENTO, 1982, p. 158-60).
6. De modo específico para antes e depois de, o que se tem, em realidade,
são duas locuções preposicionais – antes de e depois de – ambas
terminadas pela mesma preposição de, hipótese em que o melhor é
permitir, sem discussões adicionais, o emprego da estrutura abreviada.
7. Já na expressão antes e durante, o que se tem é antes de (uma locução
preposicional terminada pela preposição de) e durante (uma preposição
já por si, sem nenhuma outra que a termine), hipótese em que o
ensinamento anterior, em tese, não se aplica, por não haver duas
locuções preposicionais terminadas por mesma preposição.
8. A esse respeito, Vitório Bergo teceu as seguintes observações: “Vê-se e
ouve-se com frequência esta expressão com um complemento comum.
Observe-se, porém, que não se diz durante da festa, e sim durante a
festa. Isto é sinal de que, para a preposição durante, não fica bem o
complemento da festa, bem empregado em relação a antes e depois.
Diga-se, portanto, antes e depois da festa e durante ela – ou – durante a
festa, antes e depois dela” (BERGO apud KASPARY, 1996, p. 366).
9. Apesar de todas essas procedentes observações e corretas proibições
técnicas, Adalberto J. Kaspary (1996, p. 366-7), em apreciando o que se
pratica na linguagem literária, observa que, independentemente de qual
ou quais sejam as preposições ou locuções preposicionais, há “uma
acentuada preferência pela construção abreviada, isto é, de complemento
comum para as preposições diversas, em que pese às críticas dos
gramáticos tradicionais”. E arrola tal autor exemplos de autores
insuspeitos: a) “Venho cansado demais para dizer tudo o que ali se
passou antes, durante e depois da comida” (Machado de Assis); b) “… o
país, decapitado moralmente, às mãos do governo, pela supressão do
escrutínio presidencial na metrópole brasileira, sob um assalto de
escruchantes, associados à política, antes, durante e após a infame
rapinagem” (Rui Barbosa).
10. As mesmas observações valem para outras expressões de mesma
estrutura, como a favor ou contra.
11. No que tange aos textos de lei, é interessante anotar que –
contrariamente à expectativa de obediência à regra mais conservadora
– a preferência se dá para a construção abreviada (mesmo
complemento para preposições ou locuções prepositivas de regências
diversas), e não para a construção desdobrada (cada preposição com
seu próprio complemento), muito embora haja casos de ambos os
empregos. Exs.: a) “Considera-se inexistente a aceitação, se antes dela
ou com ela chegar ao proponente a retratação do aceitante” (CC/1916,
art. 1.085); b) “A reconciliação em nada prejudicará os direitos de
terceiros, adquiridos antes e durante a separação, seja qual for o
regime de bens” (Lei 6.515, de 26/12/77, art. 46, parágrafo único); c)
“Os juízes e jurados que forem corrompidos para julgarem, ou
ordenarem, ou pronunciarem em matéria criminal, a favor ou contra
alguma pessoa, antes ou depois da acusação, serão condenados a
prisão maior de oito a doze anos…” (CP português, art. 319º); d) “É
proibida, sob pena de desobediência, a publicação não autorizada pelo
juiz de quaisquer atos ou documentos dum processo… antes, durante
ou depois da audiência de discussão e julgamento, quando esta for
secreta” (CPP português, art. 74º).
Ver Com ou sem – Está correto? (P. 198)
Antes e durante
Ver Antes e depois (P. 120).
Antiguidade
1. Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 19) arrola o vocábulo entre aqueles nos
quais o u é pronunciado ou não facultativamente, situação essa de que
resultava a conclusão de que o emprego do trema também era optativo:
antigüidade ou antiguidade.
2. Arnaldo Niskier traz síntese portadora de significativo relevo: “Existem
as duas formas: com e sem trema; consequentemente, pode-se
pronunciar ou não o u. Quando a referência for ao período histórico,
devemos grafá-las com a letra inicial maiúscula” (1992, p. 19).
3. Dirimindo qualquer dúvida para a atualidade, registra ambas as formas o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia
Brasileira de Letras, órgão incumbido de registrar ambas as pronúncias
oficialmente o modo de grafar as palavras em Português (2009, p. 64). O
trema, entretanto, foi abolido pelo Acordo Ortográfico de 2008.
4. Anota-se, apenas para registro, a profecia de Vasco Botelho de Amaral
de que, no futuro, “deve vir a prevalecer a pronúncia gui, e não güi”, até
porque “a vogal u, precedida de g, q, n, e seguida de vogal, tende a
deixar de proferir-se em português” (1943, p. 59).
Antitruste ou Antitrustes?
1. Um leitor indaga se, no plural, se deve dizer autoridades antitrustes ou
autoridades antitruste?
2. Uma consulta ao Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (2009,
p. 65) mostra os seguintes verbetes com as seguintes indicações: a)
antiprático – adj.; b) antipopular – adj. 2g.; c) antitraça – adj. 2g. 2n.
3. Essas especificações mostram que antiprático é um adjetivo, o qual, por
falta de outra indicação excepcional, tem sua normal variação em gênero
(masculino e feminino) e número (singular e plural). Ou seja: projeto
antiprático, medida antiprática, projetos antipráticos e medidas
antipráticas.
4. Já antipopular é também um adjetivo cuja forma serve para os dois
gêneros (ou seja, não varia, quanto à forma, do masculino para o
feminino), mas não há indicação específica quanto ao número, o que
implica dizer que varia do singular para o plural. Assim: projeto
antipopular, medida antipopular, projetos antipopulares e medidas
antipopulares.
5. Por fim, antitraça é um adjetivo que tem a mesma forma para os dois
gêneros e para os dois números. Assim: remédio antitraça, cortina
antitraça, remédios antitraça e cortinas antitraça.
6. Nesse raciocínio, você também constatará que os adjetivos com prefixo
anti, cujo elemento seguinte é um substantivo, têm todos a mesma forma
de comportamento: anticaspa, antichoque, antifurto, antigreve,
antirroubo, antirruído, antitanque, antitraça, antitruste…
7. Importa observar que o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa é
editado pela Academia Brasileira de Letras, a qual, em cumprimento à
vetusta Lei 726, de 8/12/1900, tem a responsabilidade legal de editá-lo e
a autoridade para definir tais aspectos gramaticais no idioma.
8. Vê-se, assim, que são corretas as seguintes formas: projeto antitruste,
autoridade antitruste, projetos antitruste, autoridades antitruste…
António ou Antônio?
1. Um leitor de nome Antônio ouviu dizer que António é a grafia correta do
seu nome após as recentes modificações em nossa ortografia e indaga se
isso corresponde à realidade ou não.
2. Não se deve esquecer, quanto aos fatos da língua, que uma palavra como
a da consulta, em que a sílaba tônica vem logo antes de um som nasal
(normalmente antes de m ou n), é pronunciada de modo fechado (ô) no
Brasil, mas com timbre aberto (ó) em Portugal.
3. Ante tal realidade, ao sistematizar a duplicidade de pronúncias dos dois
países, o Acordo Ortográfico de 2008, querendo legalizar a ambas
perante a ortografia, determinou que “levam acento agudo ou acento
circunflexo as palavras proparoxítonas, reais ou aparentes, cujas vogais
tônicas/tónicas grafadas e ou o estão em final de sílaba e são seguidas
das consoantes nasais grafadas m ou n, conforme o seu timbre é,
respectivamente, aberto ou fechado nas pronúncias cultas da língua”.
4. Vejam-se alguns exemplos dessa correta duplicidade de grafias:
acadêmico/académico, anatômico/anatómico, cênico/cénico,
cômodo/cómodo, fenômeno/fenómeno, gênero/género,
topônimo/topónimo, Amazônia/Amazónia, Antônio/António,
blasfêmia/blasfémia, fêmea/fémea, gêmeo/gémeo, gênio/gênio,
tênue/ténue.
5. Duas observações precisam ser fixadas: a) Em todas essas palavras,
sempre há um acento obrigatório; b) O que se põe ao usuário é a opção
de empregar o acento circunflexo (^) ou o acento agudo (´), conforme a
pronúncia do país.
Anuir
1. Trata-se de verbo de frequente emprego nos meios jurídicos, tendo o
sentido de concordar. Ex.: “Anuí de boa vontade ao pedido” (Rui
Barbosa).
2. É verbo de conjugação regular, de modo que não apresenta problemas
maiores quanto a sua flexão.
3. No que concerne à sintaxe, de acordo com a lembrança de Luís A. P.
Vitória, “esse verbo pede a regência a ou em. Ex.: ‘Ele anuiu ao meu
desejo; eu anuí em conversar’” (1969, p. 27).
4. Celso Pedro Luft também vê essa dupla possibilidade de uso de
preposições: “Anuir a (ou em) dar seu apoio” (1999, p. 58).
5. E Francisco Fernandes, que concorda com essa dupla possibilidade de
regência, acrescenta observação de real importância: “Este verbo não
admite a forma pronominal lhe; assim, não se diz anuir-lhe, mas anuir a
ele, a ela” (1971, p. 80).
6. Já Domingos Paschoal Cegalla, sem explicações adicionais ou
fundamentação maior, anota que “seu complemento requer a preposição
a, se for um substantivo, e as preposições em ou a, se for uma oração
infinitiva: ‘Anuí à solicitação dele’; ‘Todos anuíram ao nosso convite’;
‘Anuímos em adiar a viagem’; ‘Eles anuíram a repetir a música’” (1999,
p. 28-9).
Anunciar
1. Quanto à conjugação verbal, trata-se de verbo regular.
2. As dificuldades que poderia apresentar sua flexão encontram-se no
presente do indicativo e tempos derivados: anuncio, anuncias, anuncia,
anunciamos, anunciais, anunciam (presente do indicativo); anuncie,
anuncies, anuncie, anunciemos, anuncieis, anunciem (presente do
subjuntivo); anuncia, anuncie, anunciemos, anunciai, anunciem
(imperativo afirmativo); não anuncies, não anuncie, não anunciemos,
não anuncieis, não anunciem (imperativo negativo).
3. Serve de modelo para todos os verbos terminados por iar, menos mediar,
ansiar, remediar, incendiar e odiar, que têm regime próprio e seguem a
flexão deste último (pode-se pensar na sigla MARIO).
Ao abrigo de
Ver Estar ao abrigo de – Galicismo? (P. 334)
Ao encontro de ou De encontro a?
1. A expressão ir ao encontro de tem o sentido de encontrar-se com, sair ao
caminho, ir ter com quem vem. Ex.: “Os magistrados saíram ao
encontro do Presidente, que chegava”.
2. Num sentido figurado, quer dizer aproximar-se, concordar, entender de
mesmo modo. Ex.: “Esses argumentos vêm ao encontro da tese
defendida pela sentença”.
3. Já a expressão ir de encontro a significa colidir. Ex.: “Em trágico
acidente, o carro da princesa foi de encontro à coluna do túnel”.
4. Num sentido figurado, quer dizer contrariar, estar em contradição,
discordar, opor-se. Ex.: “A sentença haveria de ser reformada, uma vez
que a parte dispositiva ia frontalmente de encontro aos argumentos
expostos na fundamentação”.
5. Atento aos frequentes equívocos que ocorrem no uso dessas expressões,
assim observa Domingos Paschoal Cegalla: “Não confundir ir ao
encontro de com a expressão de sentido oposto ir de encontro a, como
fez certo acadêmico num de seus romances: ‘Ronaldo ia de encontro a
Uchoa bem preparado’. O escritor quis dizer que o moço Ronaldo ia
encontrar-se com o pai da namorada, bem preparado para pedi-la em
casamento” (1999, p. 221).
6. Comentando as palavras de um cronista desportivo, Sousa e Silva
também manda corrigir o exemplo “A Prefeitura fora de encontro ao
desejo do povo” para “A Prefeitura fora ao encontro do desejo do
povo”. E acrescenta com propriedade: “Ir de encontro ao desejo do povo
é contrariar a vontade do povo, o inverso, portanto, do que se quis
dizer” (1958, p. 113).
7. Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 83), em mesma esteira, faz a
distinção entre ambas as expressões, observando que são “empregadas
muita vez sem acerto”, e dá-lhes o exato significado: de encontro – em
sentido contrário; ao encontro – em sentido favorável”. E exemplifica: a)
“Vir ao encontro da tese –favoravelmente”; b) “Vir de encontro à tese –
desfavoravelmente”.
8. Atestando a existência de “frequentes vacilações no emprego de duas
locuções de sentido oposto” e atento ao que deva ser observado nesse
campo, nos dias de hoje, Celso Pedro Luft (1999, p. 201) adverte com
propriedade, no que concerne a textos que devam submeter-se às regras
da norma culta: “mantenha-se a rigorosa distinção”.
Ao fato
Ver Estar ao fato – Galicismo? (P. 334)
Ao par
Ver A par de ou Ao par de? (P. 125)
A ou Lhe?
Ver O ou Lhe? (P. 529)
A página dois
Ver A folhas vinte e duas – Como é a forma correta? (P. 94)
Apaniguar
Ver Averiguar – Pronúncia e Conjugação (P. 152).
Apaziguar
Ver Averiguar – Pronúncia e Conjugação (P. 152).
Apelação
1. No que concerne à regência nominal, Francisco Fernandes aponta para a
possibilidade de construção com as preposições de e para: com a
primeira se busca indicar a decisão da qual se recorre; com a segunda se
quer significar o órgão para o qual se recorre. Exs.: a) “A apelação da
sentença não deu o resultado que se esperava”; b) “O advogado não
aconselha a apelação para o Supremo Tribunal” (1969, p. 40).
2. Vale a pena anotar, nesse campo, a observação que, em outra obra, o
mesmo autor faz para o verbo de mesmo radical: “Apelar a alguém ou a
alguma coisa é regência condenada pelos mestres” (FERNANDES,
1971, p. 83).
3. De se observar, todavia, que, na primeira obra citada, o mesmo filólogo
(FERNANDES, 1971, p. 40-1), para apelo, preconiza exatamente as
mesmas preposições: a e para. Exs.: a) “O apelo à mendicidade dos
arruinados, ou dos ávidos, não lhe prostituirá o civismo” (Rui Barbosa);
b) “… não havia apelo senão para a toga judiciária” (Rui Barbosa).
4. Celso Pedro Luft, para apelação, também vê apenas a dupla
possibilidade de construção com as preposições de e para. Exs.: a)
“Apelação para a Santa Sé das sentenças interlocutórias injustas”
(Alexandre Herculano); b) “Apelação das penas para a Sé Apostólica”
(Camilo Castelo Branco).
5. Observe-se, todavia, que, em lição mais permissiva para o vocábulo
apelo, tal gramático vê diversas possibilidades de construção: a, para,
em favor de (LUFT, 1999, p. 56).
Apelar
1. O verbo apelar é transitivo indireto quer quando se refere ao objeto da
apelação (preposição de), quer quando concerne ao órgão para o qual se
recorre (preposição para), nada impedindo, até mesmo, que se usem
concomitantemente os dois objetos indiretos, ou, também, que seja o
verbo empregado intransitivamente: a) “A parte vencida apelou da
sentença”; b) “A parte vencida apelou para o tribunal”; c) “A parte
vencida apelou da sentença para o tribunal”; d) “O réu não poderá
apelar sem recolher-se à prisão…” (CPP, art. 594).
2. Acresça-se a lição de José de Sá Nunes (1938, p. 122), escudado em
exemplos de autores insuspeitos: “apela-se para alguém ou para alguma
coisa, e apela-se de alguém ou de alguma coisa para alguém ou para
algo. Apelar a alguém ou a alguma coisa é solecismo sáfio”. Exs.: a)
“Não faço escrúpulo em apelar deste decreto” (Rui Barbosa); b) “Viúvo
e órfão, apela para os últimos corações generosos da Espanha”
(Alexadre Herculano); c) “… apelando de uma corruta maioria
parlamentar para a nação” (Rui Barbosa); d) “Por que não apelar da
sentença para o mesmo rei?” (Padre Antônio Vieira).
3. Celso Pedro Luft, no sentido técnico jurídico de interpor recurso de
apelação, apenas vê a possibilidade de construção com essa estrutura
tradicional: “O advogado vai apelar da sentença para a instância
superior” (1999, p. 61).
4. Nesse mesmo sentido é a lição de Francisco Fernandes: “Apelar a
alguém ou a alguma coisa é regência condenada pelos mestres” (1971, p.
83).
5. Atento aos frequentes erros cometidos em sua regência, observa Luís A.
P. Vitória que “este verbo rege a preposição para e não como
comumente se vê, a preposição a. Ex.: ‘Apelo para Vossa Excelência’”
(1969, p. 28).
6. Também Arnaldo Niskier lembra que se há de dizer “apele para, e não
apele a, que é regência condenada pelos gramáticos” (1992, p. 101).
7. Vitório Bergo (1943, p. 211), de igual modo, insere tal verbo no rol
daqueles que merecem especial cuidado quanto à regência: apelar para, e
não apelar a.
8. Em lição válida para o emprego coloquial, mas não jurídico, do verbo
apelar, observa Domingos Paschoal Cegalla que “dar-lhe complemento
regido da preposição a é sintaxe considerada incorreta, porém frequente
na língua de hoje e já aceita por gramáticos de renome”, dentre os quais
Celso Pedro Luft e Cândido Jucá Filho.
9. O próprio Cegalla, porém, em lição que parece ser a mais apropriada,
complementa seu ensinamento: “Na linguagem jurídica se diz ‘apelar de
uma sentença para instância superior’, ou simplesmente, ‘apelar da
sentença’, isto é, interpor recurso, recorrer a um tribunal superior ao que
deu a sentença” (1999, p. 31).
Ver Sentença apelada – Está correto? (P. 689)
Apelido de família
Ver Nome (P. 497) e Plural de nomes próprios – Existe? (P. 566)
Apelo
Ver Apelação (P. 125).
Apenar ou Penalizar?
1. Apenar é verbo derivado do vocábulo polissêmico pena.
2. Este vocábulo pode ter os seguintes significados: a) castigo – sentido em
que forma o verbo apenar (condenar a pena, aplicar a pena). Ex.: “O juiz
apenou o réu”; b) dó, piedade – sentido em que forma o verbo penalizar
(causar pena). Ex.: “A situação das crianças penalizou o advogado”; c)
pluma – sentido em que forma os verbos empenar (criar penas ou
enfeitar com penas) e depenar ou despenar (tirar as penas ou, na gíria,
extorquir dinheiro astuciosamente). Exs.: i) “O frango, enfim, está
empenando”; ii) “Antes de ser trinchado, o peru deve ser despenado”;
iii) “Depenaram o coitado no cassino”; d) e ainda pode ter o significado
de sacrifício, como no maravilhoso poema de Fernando Pessoa: “Tudo
vale a pena / Se a alma não é pequena”.
3. É frequente o uso do verbo penalizar em lugar do verbo apenar, ambos,
como se pode observar, com significados diversos.
Ver Penalizar ou Apenar? (P. 556)
Apenasmente – Existe?
Ver Advérbios em “mente” (P. 85).
Apenso
1. Do prisma da concordância verbal, é palavra de valor adjetivo e, assim,
concorda em gênero e número com o substantivo modificado. Exs.: a)
“Segue apenso o documento”; b) “Segue apensa a fotografia”; c)
“Seguem apensos os documentos”; d) “Seguem apensas as fotocópias”.
2. Os vocábulos anexo e incluso são seus sinônimos e seguem a mesma
construção.
Apóia ou Apoia?
Ver Ditongos éi, ói, éu – Quando acentuar? (P. 292)
Apontar armas!
Ver Avançar! (P. 151)
Após
1. Ensina Sousa e Silva que “a este vocábulo não devemos associar a
preposição a”.
2. E continua: “É erro dizer ou escrever após ao jogo, após às refeições etc.
O correto é após o jogo, após as refeições” (SILVA, A., 1958, p. 35).
Apossínclise
Ver Se me não falha a memória ou Se não me falha a memória? (P. 684)
Apóstrofe ou Apóstrofo?
1. Um leitor pergunta se, após as recentes alterações em nosso sistema
ortográfico, continua existindo o apóstrofo e, em caso positivo, como
fica seu emprego em expressões como a seguinte: D’Os Lusíadas ou De
Os Lusíadas?
2. Ora, fixe-se, em termos genéricos, que o apóstrofo (’) é um sinal
diacrítico que continua existindo em nosso sistema após as recentes
alterações na ortografia.
3. De modo específico para o caso da consulta, ele é empregado para
separar graficamente as contrações ou aglutinações de preposições
referentes a nomes próprios (obras literárias ou artísticas, nomes de
empresas ou entidades…): d’Os Lusíadas, d’Os Sertões, n’O Estado de
São Paulo.
4. A par dessa possibilidade de grafia, é importante observar
adicionalmente que nada impede que essas escritas sejam substituídas
por empregos de preposições íntegras: De Os Lusíadas, de Os Sertões,
em O Estado de São Paulo.
5. Observa-se, contudo, com base em lição de Napoleão Mendes de
Almeida (1981, p. 204-5), que não há como fugir do apóstrofo, tal como
aparece nas combinações acima referidas, de modo que equivocadas as
grafias Dos Lusíadas, Dos Sertões ou Do Estado de São Paulo.
6. É importante, por fim, frisar e distinguir que o apóstrofo é um símbolo
gráfico empregado para indicar a supressão de uma vogal. Ex.: copo
d’água. Assim, cabe não confundi-lo com apóstrofe, que “é a
interrupção que faz o orador ou escritor para se dirigir a pessoas ou
coisas presentes ou ausentes, reais ou fictícias” (CEGALLA, 1990, p.
525).
A princípio ou Em princípio?
1. A princípio significa inicialmente, antes de tudo. Ex.: “A princípio,
quero alegar a inocência do acusado”.
2. Não confundir com a expressão em princípio, que quer dizer em tese.
Ex.: “Em princípio, todos devem ser considerados inocentes, nos termos
do art. 5º, LVII, da Constituição Federal” (NICOLA; TERRA, 2000, p.
12).
3. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 2) também faz essa diferença: em
princípio significa “em tese, teoricamente, antes de qualquer
consideração”, e tal expressão “não deve ser confundida com a locução a
princípio (= no começo, inicialmente)”. Exs.: a) “Com o seu pensamento
concordava, em princípio, a diplomacia inglesa” (Álvaro Lins); b) “A
princípio, tudo parecia um mar de rosas, mas não tardaram a surgir
dificuldades”.
Apud
1. Vocábulo latino, que significa junto de, em (um autor) e que se emprega
antes do nome de um autor e/ou de uma obra, para indicar que a citação
é indireta. Ex.: “Já lecionava Mário Barreto (apud Adalberto J.
Kaspary) que não se deve dizer com ou sem ardor, mas com ardor ou
sem ele”.
2. Muito embora não haja acento gráfico – exatamente porque não havia
acento no Latim – a pronúncia de tal vocábulo é paroxítona (ápud).
A quo ou A qua?
1. Um leitor relata que um estudioso do Direito e das Letras apontou como
erro o uso da expressão a quo, quando a referência se faz a uma palavra
do feminino. E indaga se assiste ou não razão a tal professor.
2. Fixem-se, desde logo, três importantes premissas para a expressão da
consulta, que significa, em síntese, a instância, o juízo ou tribunal do
qual se recorre: a) A quo é o ablativo singular masculino ou neutro do
pronome relativo latino qui, quae, quod; b) Tal expressão, embora
continue latina, cristalizou-se no uso vernáculo desse modo, e em geral
vem precedida de um substantivo (normalmente instância, juízo ou
tribunal); c) Contrapõe-se à expressão ad quem, que aponta o tribunal
para o qual se recorre. Ex.: “A competência para analisar o mérito dos
recursos, em regra, é do tribunal ad quem, e não do juízo a quo”.
3. Com essas ponderações, anota-se que o leitor traz à baila o polêmico e
tormentoso problema da flexão das palavras e expressões de outros
idiomas ainda não incorporadas ao vernáculo, para o que, desde logo se
observa, não há regramento específico por parte dos órgãos competentes,
e, assim, o que se tenta aqui é solucionar a questão por um raciocínio
cientificamente correto, com o acompanhamento do bom-senso que deve
nortear soluções dessa natureza.
4. Parta-se do princípio de que palavras e expressões de outros idiomas
podem cristalizar-se no vernáculo de maneiras diversas: a) campus veio
na forma do nominativo (caso latino que serve para desempenhar a
função sintática de sujeito); b) quorum sedimentou-se aqui na forma do
genitivo (caso que serve para exercer a função do antigo complemento
restritivo, hoje adjunto adnominal na maioria dos casos); c) a quo veio
na forma do ablativo por regência da preposição antecedente (caso que
normalmente serve para desempenhar a função sintática de complemento
circunstancial, hoje adjunto adverbial); d) ad quem, também por regência
da preposição antecedente, veio no acusativo (que normalmente serve
para desempenhar a função de objeto direto).
5. Como não é de difícil compreensão, essa cristalização do vocábulo
estrangeiro em nosso idioma e seu emprego em estruturas sintáticas
vernáculas normalmente ocorrem: a) sem preocupação de qual seja sua
função sintática na oração em português; b) sem vínculo com a estrutura
sintática do latim; c) sem ligação com a conduta do vocábulo ou
expressão no idioma de origem.
6. Para melhor didática, considerem-se, em português, os seguintes
exemplos: a) “O tribunal do qual se recorre…”; b) “A instância da qual
se recorre…”; c) “Os tribunais dos quais se recorre…”; d) “As
instâncias das quais se recorre…”.
7. Em todos os exemplos, a estrutura sintática é exatamente a mesma: a)
qual é um pronome relativo; b) o pronome relativo, por conceito e
comportamento, relaciona-se a um nome anteriormente mencionado e
com ele concorda em gênero (masculino ou feminino) e número
(singular ou plural), concordância essa que é perceptível quando o
pronome é qual, já que o que é invariável; c) assim, se o antecedente é
“tribunal”, o pronome relativo concorda no masculino singular; d) se,
porém, o antecedente é “instâncias”, o pronome relativo vai para o
feminino plural.
8. Se alguém quiser servir-se dos argumentos expendidos para defender
exatamente a variabilidade da expressão da consulta no latim, mesmo
aqui não se pode esquecer que, por coerência, haverá a flexão não
apenas para o feminino, mas também para o plural: a) “… o tribunal a
quo…”; b) “… a instância a qua…”; c) “… os tribunais a quibus…”; d)
“… as instâncias a quibus…”
9. E se vejam as implicações desse raciocínio: a) um emprego assim exige
do usuário do vernáculo uma informação que ele normalmente não tem;
b) ou seja: exige dele conhecimento razoável de latim; c) além disso,
além de não termos o gênero neutro em português, também não há
correspondência absoluta de gênero em ambos os idiomas; d) isso quer
significar que um vocábulo feminino em latim pode ter vindo para o
masculino em português, e vice-versa; e) nesse quadro, variar o
antecedente de um pronome relativo em latim por seu antecedente em
português pode ser equivocado, ante o fato de que o gênero em latim
pode ser outro.
10. Assim, com o devido respeito pelos que pensam de modo diverso, a
melhor solução parece obedecer aos seguintes parâmetros para o
emprego de expressões dessa natureza em português: a) as palavras e
expressões latinas não devem ter acentos gráficos ou hifens, já que
estes não existiam na língua de origem; b) devem ser grafadas em
itálico, negrito, com sublinha ou entre aspas; c) devem desvincular-se
de sua função sintática de origem para efeito de suas flexões em
português, quer quanto ao gênero (masculino e feminino), quer quanto
ao número (singular e plural); d) devem ser empregadas como vieram
sedimentadas para o uso no português, sem variações como as
pretendidas na consulta: i) “… o tribunal a quo…”; ii) “… a instância
a quo…; iii) “… os tribunais a quo…”; iv) “… as instâncias a quo…”
11. Qualquer outra solução desrespeita a etimologia, fere os critérios
mínimos científicos e marginaliza o próprio bom senso, além de tornar
o emprego em português um tormento adicional gravíssimo para o
usuário médio do idioma.
12. Vejam-se alguns exemplos de emprego da referida expressão em
artigos de lei: a) “Os recursos serão apresentados ao juiz ou tribunal
ad quem, dentro de cinco dias da publicação da resposta do juiz a quo,
ou entregues ao Correio dentro do mesmo prazo” (CPP, art. 591); b)
“Publicada a decisão do juiz ou do tribunal ad quem, deverão os autos
ser devolvidos, dentro de cinco dias, ao juiz a quo” (CPP, art. 592).
Árbitro ou Juiz?
1. Uma leitora indaga se quem apita uma partida de qualquer modalidade
esportiva é juiz ou árbitro.
2. Ora, para começo, importa observar que, num sentido genérico, as
palavras árbitro e juiz costumam ser sinônimas e intercambiáveis,
significando aquele que se põe ou é posto para dirimir questões, como se
pode ver em boas traduções da Bíblia. Exs.: a) “Pecando o homem
contra o próximo, Deus lhe será o árbitro” (1 Samuel 2:25); b) “Quem te
pôs por príncipe e juiz sobre nós?” (Êxodo 2:14).
3. Mesmo com essa ambivalência, porém, o certo é que, normalmente,
árbitro costuma ser um vocábulo mais empregado para as hipóteses em
que sua escolha se faz por vontade das partes para resolver uma questão,
enquanto juiz se reserva para designar aquele que tem o poder de julgar
por determinação da lei.
4. Já para a indagação da leitora, contudo, o certo é que, quando se faz
referência à pessoa que, em uma modalidade esportiva, é encarregada de
verificar a ocorrência de faltas e aplicar o regulamento, pode-se
empregar qualquer dos dois vocábulos, indistintamente, e essas duas
possibilidades podem ser verificadas em dois dos nossos mais
importantes dicionaristas da atualidade.
5. Assim, Antônio Houaiss, num primeiro aspecto, vê o árbitro como
“aquele que faz cumprir, numa competição ou disputa, as regras
estabelecidas para a modalidade de esporte que está sendo praticada”. Já
num segundo aspecto, quando trata do juiz, aplica exatamente as
mesmas palavras para designar encarregado de cumprir as regras em
uma modalidade esportiva (2001, p. 276 e 1.690).
6. E Aurélio Buarque de Holanda Ferreira também vê o árbitro como
“aquele que dirige um jogo ou prova esportiva, com direito de decisão
quanto ao seu desenvolvimento ou aos fatos disciplinares”. E, num
segundo aspecto, ao tratar do vocábulo juiz, fala, até mesmo, de maneira
específica do juiz de linha, para significar o bandeirinha de um jogo de
futebol (2010, p. 191 e 1.216).
7. Com essas ponderações, e agora respondendo diretamente à leitora,
pode-se dizer, em suma, que aquele que apita uma partida de qualquer
modalidade esportiva tanto pode ser árbitro como juiz.
Arcaísmo
1. Júlio Nogueira conceitua-o como o “uso de palavras e expressões que já
caíram em esquecimento: alhures, nenhures, a sabendas, sob color, al
etc.” (1939, p. 242).
2. Artur de Almeida Torres o inclui entre os barbarismos (“emprego de
palavras ou frases estranhas à língua, quer em sua forma, quer em sua
ideia”), conceituando-o como o “emprego de palavras ou expressões
antiquadas ou obsoletas: cuidança por cuidado; conteúdo (como
adjetivo); ‘Eu o perdoo’ por ‘Eu lhe perdoo’; ‘Ele o obedece’ por ‘Ele
lhe obedece’; ‘Eu me despido’ por ‘Eu me despeço’”.
3. Tal autor, entretanto, acrescenta que “o arcaísmo nem sempre é um vício
de linguagem”, e traz em corroboração significativo ensinamento de Rui
Barbosa: “Guardadas as leis, talvez indefiníveis, mas sentidas e
instintivas do bom gosto, as da propriedade e conveniência no escolhê-
los, as da moderação no usá-los, as da oportunidade no tentá-los, as do
tato no expô-los, de modo que a frase, onde se insinuam, ou encravam,
lhes alumie e patenteie o sentido, insigne serviço fazem os bons
escritores à sua língua, reempossando-a no gozo de vocábulos e torneios
antigos deixados esquecer por injustos desprezos” (TORRES, 1966, p.
221-2).
4. Indagando se o escritor pode valer-se de formas antiquadas, o Padre José
F. Stringari não hesita em responder logo que sim, justificando: “Não
raro imprime à frase sainete todo especial o emprego de palavras e giros
arcaicos, quando se faz dentro dos limites do bom gosto, com boa mão e
de jeito que o texto em que se eles metem os explique e faça logo
compreender. Louvor merece aquele que se esforça de ressuscitar e
reflorir fórmulas que andam reluzidas pelo mugre do olvido. Desoxidá-
las e dar-lhes novamente carta de correntias não é marear a pureza da
língua, senão aformoseá-la; não é desservir, senão servir, e bem, o
idioma pátrio. Não é outro o pensar de Rui Barbosa. E foi esta a prática
do nosso Coelho Neto” (1961, p. 9-10).
5. Trata-se do contrário de neologismo.
Arcar
1. Apesar de muitos dicionários apenas registrarem a acepção de arquear,
curvar-se, ou então lutar, pelejar, como o da Melhoramentos
(Encyclopaedia Britannica do Brasil, 1995, p. 178), Aurélio Buarque de
Holanda Ferreira (s/d, p. 127-8) refere a possibilidade de emprego do
verbo arcar com o sentido de fazer face, enfrentar, dando como exemplo
“Arcar com responsabilidades”.
2. O significado trazido pelo dicionarista por último citado justifica a
possibilidade do emprego que frequentemente se encontra na parte
dispositiva das sentenças judiciais: “Por vencido, arcará o réu com as
custas e despesas do processo”.
3. Importante observar, todavia, que, quanto à regência verbal, Celso Pedro
Luft (1999, p. 68), na acepção referida, apenas confere a tal verbo a
possibilidade de ser transitivo indireto, correspondendo à construção
arcar com, e Francisco Fernandes (1971, p. 92), em sua indispensável
obra, também lhe atribui, nessa acepção, a possibilidade de construção
como transitivo indireto.
4. Estabelecida tal premissa de sua transitividade indireta, pelas próprias
regras de passagem da voz ativa para a voz passiva (o objeto direto da
voz ativa torna-se o sujeito da voz passiva, de modo que somente verbos
transitivos diretos podem ter voz passiva), conclui-se que o verbo arcar,
no sentido de responsabilizar-se, por ser transitivo indireto, não pode ser
empregado na voz passiva.
5. São errôneas, assim, frases não raro encontradas em textos forenses: a)
“As custas e os honorários serão arcados pelo réu”; b) “As despesas
arcadas pelo autor serão reembolsadas pela parte vencida”.
6. Para a correção desses exemplos, ou se substitui o verbo arcar por um
sinônimo que admita voz passiva (pagar, desembolsar, reembolsar), ou
então se usa o próprio exemplo, mas na voz ativa: a) “Arcará o réu com
as custas e os honorários”; b) “As despesas com que o autor arcou serão
reembolsadas pela parte vencida”.
7. Por oportuno, anote-se que o Código de Processo Civil, ao tratar dos
ônus da litigância de má-fé e da sucumbência nos processos, não usa o
verbo arcar, mas emprega sistematicamente o verbo responder, também
aparecendo esporadicamente o verbo pagar: a) “Responde por perdas e
danos aquele que pleitear de má-fé como autor, réu ou interveniente”
(CPC/1973, art. 16); b) “Se um litigante decair de parte mínima do
pedido, o outro responderá, por inteiro, pelas despesas e honorários”
(CPC/1973, art. 21, parágrafo único); c) “Concorrendo diversos autores
ou diversos réus, os vencidos respondem pelas despesas e honorários em
proporção” (CPC/1973, art. 23); d) “Nos juízos divisórios, não havendo
litígio, os interessados pagarão as despesas proporcionalmente aos seus
quinhões” (CPC/1973, art. 25).
Aresto ou Acórdão?
Ver Acórdão ou Acordam? (P. 70)
Aresto ou Arresto?
Ver Arresto ou Aresto? (P. 135)
Armaram ou Armarão?
1. Um leitor, narrando que tem lido modos de escrita que contrariam o que
ele aprendeu, pergunta como se deve escrever no pretérito perfeito: “Eles
se amaram no passado” ou “Eles se amárão no passado”?
2. Duas observações devem ser feitas para os verbos da primeira
conjugação (terminados em ar), na terceira pessoa do plural do pretérito
perfeito do indicativo: a) são formas paroxítonas (ou seja, a sílaba forte é
a penúltima da palavra), e não oxítonas (vale dizer, a sílaba forte não é a
última da palavra); b) sua grafia é com am no final, e não com ão.
3. Vejam-se os seguintes exemplos: a) “Ontem eles armaram uma cilada
para o inimigo (correto); b) “Ontem eles armarão (ou mesmo armárão)
uma cilada para o inimigo” (errado).
4. Importa observar que já houve um tempo em que essas grafias se
confundiram no idioma. Veja-se, assim, o seguinte trecho da primeira
estrofe do poema Os Lusíadas, de Camões, tal como constou em sua
primeira edição (1572): “Passaram, ainda além da Taprobana / … / E
entre gente remota edificarão / Novo Reino, que tanto sublimarão.”
5. Quanto a esse trecho, podem-se tecer as seguintes considerações: a)
nessa época, era corrente, para o pretérito perfeito do indicativo, a grafia
com ão; b) coexistia ela com a grafia hoje aceita com exclusividade
(am); c) nos dias de hoje, a atualização ortográfica faz o trecho ser
escrito do seguinte modo: “Passaram, ainda além da Taprobana / … / E
entre gente remota edificaram / Novo Reino, que tanto sublimaram.”
6. Nosso Código Comercial, que já data de 1850, também mostra esse
mesmo aspecto: “Na prohibição do artigo antecedente não se
comprehende a faculdade de dar dinheiro a juro ou a premio, com tanto
que as pessoas nelle mencionadas não fação do exercicio desta
faculdade profissão habitual de commercio…” Atualize-se a indigitada
grafia, juntamente com as demais correções: “Na proibição do artigo
antecedente não se compreende a faculdade de dar dinheiro a juro ou a
prêmio, contanto que as pessoas nele mencionadas não façam do
exercício desta faculdade profissão habitual de comércio…”
7. Para complementar a resposta e eliminar, de uma vez por todas, a dúvida
do leitor, também se fazem duas observações para esses mesmos verbos
da primeira conjugação na terceira pessoa do plural, mas agora no futuro
do presente do indicativo: a) são formas oxítonas (ou seja, a sílaba forte
é a última da palavra), e não paroxítonas (vale dizer, a sílaba forte não é
a penúltima da palavra); b) sua grafia é com ão no final, e não com am.
8. Vejam-se os seguintes exemplos: a) “Tudo indica que esses dois se
amarão num futuro próximo” (correto); b) “Tudo indica que esses dois
se amaram num futuro próximo” (errado).
9. Apenas para refletir: a observação dos fatos demonstra que esse é um
erro cuja ocorrência vem crescendo com o passar dos tempos, bem
possivelmente devido à falta de cuidado com que vem sendo tratado o
ensino do português na educação de base.
Arqui-inimigo ou Arquiinimigo?
1. Antes de se resolver a indagação de qual a forma correta (arqui-inimigo
ou arquiinimigo), observa-se que o prefixo grego arqui tem o significado
de algo excelso ou posição superior e forma diversos vocábulos em
nosso idioma.
2. Quanto ao mais, como geralmente ocorre com os prefixos e falsos
prefixos terminados por vogal, apenas em duas hipóteses se usa o hífen:
a) quando o elemento seguinte começa com h, como em arqui-hipérbole;
b) quando o elemento seguinte principia com a mesma vogal que termina
o prefixo: arqui-inimigo, arqui-inteligente.
3. Desse modo, acopla-se diretamente à palavra seguinte, sem
intermediação de hífen, quando iniciada esta por outra vogal, que não a
que encerra o prefixo: arquiabade, arquiavô, arquiepiscopal,
arquiescriba, arquioligarca.
4. Continua valendo a regra de junção direta, mesmo que o elemento
seguinte se inicie por consoante: arquibactéria, arquichanceler,
arquidiocese, arquifonema, arquiginásio, arquimarechal, arquinave,
arquipirata, arquitesoureiro, arquivulgar.
5. Apenas para a hipótese de ser o segundo elemento iniciado por r ou s,
dobram-se tais consoantes para continuidade do som originário:
arquirrival, arquirromântico, arquissacerdote, arquissenador,
arquissinagoga.
Arras
1. Expressão que se introduziu no vocabulário comercial dos gregos
(arrabon) e dos romanos (arrhabo) pelos mercadores fenícios,
compreendem o dinheiro dado como sinal e garantia de um contrato,
notadamente o de compra e venda, assegurando a execução deste, e se
tendo a firmeza de seu ajuste definitivo (DE PLÁCIDO E SILVA, 1989,
p. 195). Exs.: a) “Chegando ao acordo quanto à promessa de compra, o
adquirente entregou as arras”; b) “O sinal, ou arras, dado por um dos
contraentes, firma a presunção de acordo final, e torna obrigatório o
contrato” (CC/1916, art. 1.094); c) “Podem, porém, as partes estipular o
direito de se arrepender, não obstante as arras dadas” (CC/1916, art.
1.095, 1ª parte); d) “Se o que deu arras der causa a se impossibilitar a
prestação, ou a se rescindir o contrato, perdê-las-á em benefício do
outro”.
2. Pertencendo ao rol dos nomes plurais, deve-se atentar às regras de
concordância verbal, pois, se tal termo funciona como sujeito, sempre
leva o verbo para o plural. Ex.: “Salvo estipulação em contrário, as
arras em dinheiro consideram-se princípio de pagamento” (CC/1916,
art. 1.096).
Arrazoar
1. Em Direito, tem o sentido técnico de expor as razões, explicitar os
motivos, ou justificar as alegações por meio de petição específica (em
geral um recurso), hipóteses em que é empregado, sem dificuldades
adicionais, ora como intransitivo, ora como transitivo direto. Exs.: a) “Se
houver assistente, este arrazoará, no prazo de três dias, após o
Ministério Público” (CPP, art. 600, § 1º); b) “Se o apelante declarar, na
petição ou no termo, ao interpor a apelação, que deseja arrazoar na
Superior Instância, serão os autos remetidos ao Tribunal ad quem…”
(CPP, art. 600, § 4º); c) “A parte poderá, ao arrazoar o recurso ou em
petição avulsa, requerer, fundamentadamente, que o julgamento obedeça
ao disposto neste artigo” (CPP, art. 476, parágrafo único).
Ver Contra-arrazoar o recurso ou Contra-arrazoar ao recurso? (P. 226) e
Contra-razões ou Contrarrazões? (P. 229)
Arrear ou Arriar?
1. Arrear tem dois significados principais: o de lançar arreios em um
animal e o de colocar enfeites em. Exs.: a) “O empregado arreou o
melhor cavalo para a viagem do patrão”; b) “A dama arreou-se com o
melhor vestido”.
2. Quanto à conjugação verbal, como todo verbo terminado por ear, recebe
um i intermediário nas formas rizotônicas: arreio, arreias, arreia,
arreamos, arreais, arreiam (presente do indicativo); arreie, arreies,
arreie, arreemos, arreeis, arreiem (presente do subjuntivo); arreia,
arreie, arreemos, arreai, arreiem (imperativo afirmativo); não arreies,
não arreie, não arreemos, não arreeis, não arreiem (imperativo
negativo).
3. Como as formas rizotônicas apenas aparecem no presente do indicativo e
tempos derivados, todos acima referidos, esse verbo não apresenta
dificuldades de conjugação nos demais tempos e modos, em que é
regular e onde não aparece vogal adicional alguma: arreava (pretérito
imperfeito do indicativo), arrearei (futuro do presente), arrearia (futuro
do pretérito), arreei (pretérito perfeito), arreara (pretérito mais-que-
perfeito), arrear (futuro do subjuntivo), arreasse (imperfeito do
subjuntivo), arreando (gerúndio), arreado (particípio).
4. Já sua parônima arriar significa abaixar, ceder. Ex.: “Por defeito no
alicerce, o prédio arriou”.
5. Quanto à conjugação verbal, como normalmente se dá com os verbos
terminados por iar, arriar é verbo regular, e as dificuldades que sua
flexão poderia apresentar encontram-se no presente do indicativo e
tempos derivados: arrio, arrias, arria, arriamos, arriais, arriam
(presente do indicativo); arrie, arries, arrie, arriemos, arrieis, arriem
(presente do subjuntivo); arria, arrie, arriemos, arriai, arriem
(imperativo afirmativo); não arries, não arrie, não arriemos, não
arrieis, não arriem (imperativo negativo).
6. Otelo Reis, em preciosa obra, faz questão de registrar ambos os verbos:
“arrear, que significa enfeitar, adornar, ou então pôr arreios a um animal,
e arriar, que significa abaixar, pôr abaixo a carga, etc. O segundo parece
ter provindo da linguagem técnica de náutica” (1971, p. 60).
7. Reputando necessário distinguir entre tais verbos e suas acepções, o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira
de Letras, fugindo a seu normal proceder e a suas finalidades, acaba por
precisar cada um dos sentidos: enquanto arrear significa aparelhar, arriar
quer dizer abaixar (2009, p. 79 e 80).
8. Por fim, embora alargando um pouco o fulcro dos verbetes aqui
considerados, fazem-se três observações importantes quanto à
conjugação verbal: a) os verbos terminados em ear recebem um i
intermediário nas formas rizotônicas; b) os verbos terminados em iar são
regulares, de modo que não recebem acréscimo algum dessa natureza; c)
desse último item excepcionam-se cinco verbos (mediar, ansiar,
remediar, incendiar e odiar [conhecidos pela sigla MARIO]), os quais,
embora terminem por iar, recebem um i intermediário nas formas
rizotônicas, como se, em tais formas, fossem terminados por ear
(medeio, anseias, remedeia, odeiam…).
9. Vale, adicionalmente, registrar a preciosa observação de Júlio Nogueira:
“Não há na língua um só verbo terminado em eiar. O que há são verbos
em ear e iar” (1959, p. 99).
10. Essa também é a posição de Carlos Góis e Herbert Palhano: em verbos
com essa terminação, “é erro grave escrever no infinitivo eiar” (1963,
p. 112).
11. Em mesmo sentido, a lição de Otoniel Mota: é errôneo em português
escrever-se passeiar, guerreiar, “porque não há um sufixo verbal eiar,
mas ear” (1916, p. 68).
Arrendar
1. Trata-se de palavra bifronte, porque indica relações duplas, posições
recíprocas, com sentido ora ativo, ora passivo.
2. Aires da Mata Machado Filho (1969f, p. 213), que invoca ensino de
Mário Barreto, também vê em tal vocábulo termo de significação ativa e
passiva.
3. Numa primeira hipótese, significa dar em arrendamento. Ex.: “O
proprietário arrendou o imóvel ao forasteiro”.
4. No segundo caso, tem o sentido de receber em arrendamento. Ex.: “O
forasteiro arrendou do proprietário o imóvel discutido nos autos”.
5. Como se vê, o uso adequado da preposição salva os equívocos que
possam surgir em tais casos.
6. Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade estão acordes quanto
à dupla significação que tem esse verbo: “dar de arrendamento, tomar de
arrendamento” (1999, p. 42).
7. Cândido Jucá Filho (1981, p. 44), em apreciação sobre a obra de Mário
Barreto, também confirma a existência e o emprego dos dois sentidos
para esse verbo: dar de renda e tomar de renda.
8. Regina Toledo Damião e Antonio Henriques (1994, p. 234) também
concordam em que tal verbo é bifronte, vale dizer, que assume ele tanto
o sentido ativo de dar em arrendamento como o sentido passivo de
receber por arrendamento.
9. A um consulente que lhe indagava se “arrendei umas casas” não
produziria “equívoco sobre se sou inquilino ou senhorio”, respondeu
Cândido de Figueiredo pela afirmativa, mas justificou: “o verbo tem essa
dupla significação “dar de arrendamento e tomar de arrendamento.
Quem quer evitar o equívoco, recorre ao circunlóquio: ‘dei ou tomei de
arrendamento’…” (1941, p. 46).
10. Francisco Fernandes, que, de igual modo, aceita a característica
bifronte de tal verbo, traz importante nota: “Para evitar ambiguidade,
costuma-se usar a expressão dar de arrendamento ou tomar de
arrendamento, conforme o caso” (1971, p. 97).
11. Não é diverso o posicionamento de Celso Pedro Luft (1999, p. 72): a)
pode ter o sentido de dar em arrendamento: “Arrendou as terras a uns
colonos”; b) também pode ser usado na acepção de tomar de
arrendamento: “Arrendei de um fazendeiro um sítio para os fins de
semana”; c) para o caso de haver ambiguidade, “a oposição regencial
a/de resolve o problema mais economicamente”.
Arresto ou Aresto?
1. Arresto é termo muito usado nos meios forenses e tem o significado de
apreensão autorizada pela Justiça. Ex.: “Em decisão fundamentada, o
juiz da causa determinou o arresto dos bens do devedor”.
2. Antonio Henriques (1999, p. 9), por um lado, considera-o “apreensão
judicial, como medida preventiva, de bens do devedor para garantir o
pagamento de dívida líquida e certa”; por outro lado, com supedâneo em
lição de José Pedro Machado, explicita que “o termo remontaria ao latim
tardio adrestare com possível influência do antigo francês arrester
(arrêter)”.
3. É importante não confundir com sua parônima aresto, que significa
acórdão, decisão coletiva de um tribunal. Ex.: “Com o retorno dos autos
do tribunal, o juiz da comarca determinou o cumprimento do venerando
aresto”.
4. Embora diversos autores afirmem a sinonímia entre aresto e acórdão,
Antonio Henriques conceitua aresto como a “decisão judicial
irreformável tomada pelos tribunais superiores” (1999, p. 8-9).
5. Em mesma direção, Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 238): a)
observa que “tecnicamente não são sinônimos acórdão e aresto”; b) traz,
em abono, lição de Mendes Júnior: “Chamam-se arestos as decisões
judiciais não suscetíveis de reforma, proferidas em forma de julgamento
definitivo pelos tribunais superiores”.
6. Assim, em síntese, enquanto acórdão é, genericamente, a decisão
colegiada dos tribunais, o aresto é a decisão colegiada de um tribunal
que não mais se apresente como suscetível de reforma.
7. Nem mesmo os textos de lei escapam ao cometimento de deslizes no
emprego de palavras dessa natureza, bastando ver que, para o art. 23 do
Decreto-lei 70, de 21/11/66, que instituiu a cédula hipotecária, a Coleção
das Leis da União registrou aresto, quando, em realidade, queria
significar arresto.
8. Quanto à pronúncia, além do fato de que o e é aberto (é) em ambos os
vocábulos, é oportuno acrescentar que, em aresto, o r é pronunciado
como em arisco (desconfiado), enquanto, em arresto, ele é pronunciado
como em arrisco (que significa eu ponho em risco).
Ver Acórdão ou Acordam? (P. 70)
Arriar ou Arrear?
Ver Arrear ou Arriar? (P. 133)
Arrizotônicas
Ver Formas arrizotônicas (P. 361).
Arrolar e Arrulhar
1. Um leitor indaga qual a melhor pronúncia para o verbo arrolar no
sentido de arrulhar na terceira pessoa do plural do presente do indicativo:
eles arrolam (ó) ou eles arrolam (ô)?
2. Observado o fato de que arrulhar não traz problema algum quanto à
conjugação ou à pronúncia, já que é integralmente regular, uma primeira
distinção a ser feita, em sequência, é que, normalmente, o verbo arrolar
significa fazer um rol, fazer uma relação, enquanto arrulhar quer dizer
produzir arrulhos, que é o som de alguns pássaros, como as pombas e as
rolas.
3. Ocorre, todavia, que arrolar também pode significar arrulhar. Ou seja:
arrolar tanto significa fazer um rol, fazer uma relação, como também
produzir arrulhos, como as pombas e as rolas.
4. O que se dá, porém, é que, independentemente do sentido que tenha,
arrolar, seguindo os demais verbos da língua portuguesa terminados em
olar, tem sempre o som aberto nas formas rizotônicas (ó). Exs.: a) “Os
advogados arrolam (ó) as testemunhas”; b) “Os pássaros arrolam (ó) no
beiral da casa”.
Arrostar
1. Verbo frequentemente usado em arrazoados jurídicos com o significado
de enfrentar, defrontar, admite regência variada.
2. Sousa e Silva (1958, p. 37) vislumbra a possibilidade de construí-lo ou
como transitivo direto, ou com a preposição a, ou com a preposição com,
ou, por fim, como pronominal, caso em que também exige a preposição
com. Exs.: a) “O réu arrostou o perigo”; b) “O réu arrostou ao perigo”;
c) “O réu arrostou com o perigo”; d) “O réu arrostou-se com o perigo”.
3. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 37), que o considera normalmente
transitivo direto (“Nas selvas eles arrostavam constantes perigos”),
observa que, “por ênfase, pode-se antepor ao complemento a preposição
com: arrostar com o perigo, arrostar com o inimigo”.
4. Francisco Fernandes (1971, p. 99) abre ainda mais as possibilidades de
construção: como transitivo direto, como transitivo indireto (com as
preposições a e com) e pronominal (com as preposições a e com). Exs.:
a) “O incêndio lavra por todas as classes, todos o evitam, e raros
ousarão arrostá-lo” (Rui Barbosa); b) “Arrostaram
desassombradamente àquele cometimento” (Caldas Aulete); c) “Arrostar
com os perigos” (Mário Barreto); d) “Arrostar-se ao inimigo” (Antônio
de Morais Silva); e) “Ousou ele arrostar-se com o imperador” (Rui
Barbosa).
5. Celso Pedro Luft (1999, p. 74) acrescenta dois aspectos ao ensino de
Francisco Fernandes: a) também vê a possibilidade de sua sintaxe com a
preposição contra: “Não teve forças para arrostar contra os inimigos”
(Laudelino Freire); b) “a forma despronominada é a mais usada hoje”.
Arruinar
1. Verbo regular, de frequente emprego no sentido de causar ruína a, de
estragar, de destruir, de causar perda ou dano. Exs.: a) “A bebida arruína
a saúde e a família”; b) “O jogo arruinou o milionário”.
2. Merece cuidado especial sua conjugação nas formas rizotônicas, em que
a vogal tônica é o i, o qual – de acordo com a 4ª alínea da observação 43
do Formulário Ortográfico – deve ser acentuado graficamente, por estar
sozinho na mesma sílaba, formando hiato com a vogal anterior.
3. Atente-se, assim, a sua conjugação no presente do indicativo e tempos
derivados: arruíno, arruínas, arruína, arruinamos, arruinais, arruínam
(presente do indicativo); arruíne, arruínes, arruíne, arruinemos,
arruineis, arruínem (presente do subjuntivo); arruína, arruíne,
arruinemos, arruinai, arruínem (imperativo afirmativo); não arruínes,
não arruíne, não arruinemos, não arruineis, não arruínem (imperativo
negativo).
4. Como tais formas rizotônicas apenas ocorrem no presente do indicativo
e tempos derivados, nem haverá hiato, nem o i será tônico, nem se fará
presente acento gráfico algum nas demais formas: arruinava (pretérito
imperfeito do indicativo), arruinarei (futuro do presente), arruinaria
(futuro do pretérito), arruinei (pretérito perfeito do indicativo),
arruinara (pretérito mais-que-perfeito do indicativo), arruinar (futuro
do subjuntivo), arruinasse (imperfeito do subjuntivo), arruinando
(gerúndio), arruinado (particípio).
Para maiores informações sobre sua acentuação gráfica, ver Hiato (P.
389).
Artigo
1. Num primeiro aspecto, quando há dois termos precedidos de uma
preposição que a ambos se refere, pode-se usar o artigo antes de ambos
os substantivos, ou deixá-los ambos sem artigo, conforme o desejo do
usuário e a própria especificação de sentido buscada na frase. Exs.: a)
“Entre o réu e a vítima, estava a testemunha”; b) “Entre réu e vítima,
estava a testemunha”.
2. Em tais casos, o que não se pode fazer é antepor o artigo apenas a um
dos substantivos, e isso porque, ante o paralelismo estabelecido entre
eles, ou se determinam ambos os elementos, ou se deixam ambos
indeterminados. Exs.: a) “Entre o réu e vítima, estava a testemunha”
(errado); b) “Entre réu e a vítima, estava a testemunha” (errado).
3. Sob um outro aspecto, é de se atentar na lição de Sousa e Silva: se ao
artigo definido se seguem dois ou mais substantivos, “e o primeiro está
no singular, vai o artigo no singular: ‘o segundo, terceiro e quinto
parágrafos’ (e nunca ‘os segundo, terceiro e quinto parágrafos’)”.
4. Em algum tratado científico, o referido gramático (SILVA, A., 1958, p.
22) pinçou uma passagem em que foi transgredida essa regra: “Note-se o
desenvolvimento desses elementos sempre no ângulo formado pelas
segunda e terceira porções do duodeno, na parte intrapancreática” (devia
ser “pela segunda e terceira porções”).
Ver Números – Como ler e Empregar? (P. 506), Omissão da preposição –
Está correto? (P. 526) e Preposição – Quando deve ser repetida? (P. 595).
Ascensão
1. Tem o sentido de elevação, promoção, subida. Ex.: “Comemorava-se,
naquela oportunidade, sua ascensão ao cargo de desembargador”.
2. Observe-se a ortografia desse vocábulo, assim como a de seus cognatos:
ascendência, ascendente, ascender, ascensorista.
Às custas de – Existe?
Ver À custa de ou Às custas de? (P. 75)
A ser ou A sermos?
Ver Para compor ou Para comporem? (P. 544)
A sós ou Às sós?
1. O adjetivo só pode variar em número. Exs.: a) “O réu estava só”; b) “O
réu e o advogado estavam sós”.
2. Já a locução adverbial a sós é invariável. Ex.: a) “O advogado tinha o
direito constitucional de ficar a sós com seu cliente por alguns
instantes”; b) “O advogado e o réu tinham o direito constitucional de
ficar a sós”.
Ver Só – Como concordar? (P. 706)
Aspas
1. Do gótico haspa, também conhecidas por comas ou vírgulas dobradas
(às vezes em forma de cunhas), são sinais (“” ou ‘’) com que,
normalmente, se abrem e fecham citações, sendo bastante oportunas
algumas considerações para seu uso.
2. Quando, dentro do trecho já entre aspas, há necessidade de novas aspas,
estas são simples (NADÓLSKIS; TOLEDO, 1998, p. 51). Ex.: Deu nos
jornais: “O articulista defende, como forma de melhoria nas relações
jurídicas, uma assim chamada ‘globalização’ das leis”.
3. Se o sinal de pontuação pertence à citação, fica ele dentro das aspas,
como o ponto de interrogação no seguinte exemplo: Por que você não
disse “Eu vou?”.
4. Se, porém, pertence o sinal de pontuação ao autor, fica ele depois das
aspas, como é o caso do ponto final no seguinte exemplo. Ex.: Como já
dizia Hipócrates, traduzido por Sêneca, “a arte é longa, e a vida é
breve”.
5. Nas palavras de Celso Cunha, “quando a pausa coincide com o final da
expressão ou sentença que se acha entre aspas, coloca-se o competente
sinal de pontuação depois delas, se encerram apenas uma parte da
proposição; quando, porém, as aspas abrangem todo o período, sentença,
frase ou expressão, a respectiva notação fica abrangida por elas” (1970,
p. 284).
6. Para Luiz Antônio Sacconi, “o ponto vem após as aspas”, se “não foram
estas que deram início ao período”. Ex.: Napoleão disse: “Do alto destas
pirâmides quarenta séculos vos contemplam”.
7. Complementa, todavia, tal autor (SACCONI, 1979, p. 244 e 248) com a
observação de que “as aspas aparecem depois da pontuação somente
quando abrangem todo o período”. Ex.: “O Brasil espera que cada um
cumpra o seu dever.”
8. Interessante lembrete ainda vem do mesmo gramático acerca dos trechos
de outros autores, empregados, por exemplo, na elaboração dos
arrazoados jurídicos: “se a citação ou a transcrição não começar com a
palavra inicial, colocar-se-ão reticências logo após a abertura das aspas.
Da mesma forma, devem ser usadas as reticências no final, antes do
fechamento das aspas, se a intenção é não terminar a referida citação ou
transcrição” (SACCONI, 1979, p. 247).
9. A esse respeito, assim se expressa Josué Machado: “Quando a pausa
coincide com o final da expressão ou sentença que se acha entre aspas,
coloca-se o competente sinal de pontuação depois delas, se encerram
apenas uma parte da proposição; quando, porém, as aspas abrangem todo
o período, sentença, frase ou expressão, a respectiva notação fica
abrangida por elas” (1994, p. 66).
10. Ainda para a ordem de colocação entre as aspas e o ponto, Cândido de
Oliveira estabelece duas regras: a) “Primeiro ponto final e por último
aspas, se toda a declaração (o período inteiro, da maiúscula inicial ao
ponto final) estiver entre aspas”; b) “Primeiro aspas e depois ponto
final, se somente a parte derradeira do período receber aspas” (1961, p.
67).
11. As palavras e expressões estrangeiras, de igual modo, devem vir entre
aspas, permitindo-se também explicitar tal circunstância com o uso de
grifo equivalente, sublinha, itálico ou negrito. Ex.: “O magistrado
negou liminar ao pedido, fundado na inexistência do ‘periculum in
mora’”.
12. Veja-se, nesse sentido, o ensino de Eduardo Carlos Pereira em
corroboração ao fato de que se escrevem “sublinhadas ou em grifo as
palavras de língua estrangeira, que se intercalam no discurso” (1924, p.
48).
13. Artur de Almeida Torres também observa a possibilidade de emprego
das aspas, “quando se deseja chamar a atenção do leitor para certos
vocábulos que devem ser postos em evidência: Aquele ‘sim’ me
confortou” (1966, p. 245).
14. Ensina, ainda, Luciano Correia da Silva que “não se usam aspas nas
atribuições nominais ou dos epônimos: Fundação Roberto Marinho,
Rodovia Castelo Branco, EEPSG Horácio Soares, Fundação
Educacional Miguel Mofarrej, Fórum João Mendes Júnior”.
15. Em critério aparentemente diverso, todavia, em outra passagem, manda
que se usem tais sinais “em nomes de livros, jornais, obras de arte…”,
como, por exemplo, “Folha de S. Paulo” (SILVA, L., 1991, p. 179 e
197).
16. Considere-se, também a observação de Hêndricas Nadólskis e Marleine
Paula Marcondes Ferreira de Toledo (1998, p. 51) no sentido de que,
em tais hipóteses, em vez de empregar aspas, pode-se optar pelo
destaque gráfico do negrito ou do itálico, a que se pode acrescer
também a sublinha. Exs.: a) Não se demonstrou o “fumus boni juris”;
b) Não se demonstrou o fumus boni juris; c) Não se demonstrou o
fumus boni juris; d) Não se demonstrou o fumus boni juris.
17. O ideal seria observar a questão das aspas duplas e aspas simples, com
o acréscimo de que, ante o elemento complicador dos nomes dos
órgãos de imprensa, sejam eles escritos em itálico. Ou, em termos mais
práticos: “Eu falei: ‘Mas me importa a restauração da minha honra. A
Veja está fazendo um verdadeiro linchamento.’ Ele respondeu:
‘Roberto, na Veja não tenho nenhuma ação, porque a Veja é tucana’.
Eu falei: ‘Mas O Globo e a Globo estão repetindo o linchamento.’ Ele
falou: ‘No Globo eu falo por cima. Dá para segurar.’ Retirar a
assinatura foi o meu maior erro. Depois que fiz isso, recrudesceu o
noticiário contra o PTB. Eu entendi que foi uma armadilha do Zé
Dirceu para mim. Recrudesceu o noticiário, e eu vi claramente a mão
do governo.”
Ver Parênteses e Ponto (P. 550).
Assembléia ou Assembleia?
Ver Ditongos éi, ói, éu – Quando acentuar? (P. 292)
Assente ou Assentado?
1. Para Edmundo Dantès Nascimento, o particípio passado assente,
frequentemente empregado na linguagem forense, não é forma correta,
mas apenas representa criação popular.
2. Segundo tal autor, “o verbo assentar tem um único particípio passado –
assentado”, já que “o particípio irregular – assento – substantivou-se”.
3. E ultima ele que “a frase correta é: ‘Ficou assentado que devolveria em
dobro…’” (NASCIMENTO, 1982, p. 105).
4. Já Vitório Bergo (1943, p. 181) insere o verbo assentar no rol daqueles
que têm dois particípios passados: assentado e assente.
5. Ante tal discussão entre os gramáticos, o melhor é ampliar a
possibilidade de expressão, viabilizando-se o emprego da forma em
epígrafe.
Assentir
Ver Aderir (P. 77).
Asserto ou Acerto?
Ver Acerto ou Asserto? (P. 69)
Assessor
1. Tem o significado de ajudante, assistente, auxiliar. Ex.: “Os assessores
procuravam resolver o embaraço que a situação causara ao
desembargador”.
2. Oportuno é atentar a sua ortografia, assim como à de seus cognatos:
assessoramento, assessorar, assessoria.
Assim como
Ver Bem como (P. 158).
Assinação
1. O verbo assinar tem corriqueiramente, em termos jurídicos e forenses, o
significado de marcar, de assinar prazo.
2. E o substantivo que corresponde a tal verbo, no exato sentido de
designação de prazo, de aprazamento, é assinação. Ex.: “Não havendo
preceito legal nem assinação pelo juiz, será de cinco (5) dias o prazo
para a prática de ato processual a cargo da parte” (CPC/1973, art.185).
Ver Assinar prazo (P. 140).
Assistir
1. É verbo que deve ser estudado sob o prisma da regência verbal,
devendo-se atentar, já de início, à sábia ponderação do Padre José F.
Stringari: “muito cuidado exige o emprego do verbo assistir, pois muda
de regência em se lhe mudando o sentido” (1961, p. 86).
2. Tem quatro significados, com peculiaridade de construção para cada
qual deles.
3. No sentido de prestar ajuda, é transitivo direto. Exs.: a) “A enfermeira
assiste o doente”; b) “A enfermeira assiste-o”.
4. No significado de presenciar, ver, é transitivo indireto, pede a preposição
a, e não admite lhe como complemento. Exs.: a) “O estagiário assiste a
vários debates e audiências”; b) “O estagiário assiste a eles”.
5. Vale ao caso a oportuna lição de Laudelino Freire: “Na língua
portuguesa existem verbos cujos complementos indiretos são
representados pela forma a ele em lugar de lhe. Isso ocorre, entre outros,
com assistir (estar presente), aspirar (desejar), recorrer (pedir auxílio),
que, recusando a forma lhe, têm os seus objetos indiretos expressos pela
forma a ele” (s/d, p. 7).
6. No sentido de pertencer, caber, é transitivo indireto e admite lhe como
complemento. Exs.: a) “Este direito assiste ao vencedor”; b) “Este
direito lhe assiste”.
7. Na acepção pouco usada de morar, residir, é intransitivo e pede por
complemento um adjunto adverbial de lugar. Ex.: “Os rapazes assistem
em humilde pensão”.
8. De Júlio Nogueira (1939, p. 192) é preciosa síntese acerca das regências
mais comuns de tal verbo: “no sentido de estar presente, requer a
preposição a: ‘assistirás à cerimônia’, ‘assistiremos ao baile’. No
sentido de prestar assistência, requer objeto direto: ‘qual o médico que
assiste este doente?’. No sentido de morar, residir, exige uma relação de
lugar: ‘el-rei assiste em Lisboa’. No sentido de ter um direito, atribuição
etc., pede a preposição a: ‘não assiste esta faculdade aos candidatos’
(ou a forma pronominal correspondente: ‘não lhes assiste…’)”.
9. Nos textos de lei, tem-se verificado a observância da distinção entre os
significados de tal verbo, correspondendo a uma igual distinção entre as
regências.
10. Assim, no significado de auxiliar, tem sido empregado como transitivo
direto (admitindo ser usado na voz passiva). Exs.: a) “O herdeiro do
depositário é obrigado a assistir o depositante na reivindicação…”
(CC/1916, art. 1.272); b) “Quando a prova do fato depender de
conhecimento técnico ou científico, o juiz será assistido por perito,
segundo o disposto no art. 421” (CPC/1973, art. 145); c) “Compete aos
pais, quanto à pessoa dos filhos menores: … V – Representá-los, até os
dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade,
nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento”
(CC/1916, art. 384, V); d) “O herdeiro do depositário, que de boa-fé
vendeu a coisa depositada, é obrigado a assistir o depositante na
reivindicação, e a restituir a comprador o preço recebido” (CC/1916,
art. 1.272); e) “O adquirente ou o cessionário poderá, no entanto,
intervir no processo, assistindo o alienante ou o cedente” (CPC/1973,
art. 42, § 2º); f) “São atribuições do Departamento Penitenciário
Nacional: … III – assistir tecnicamente as unidades federativas na
implementação dos princípios e regras estabelecidos nesta Lei” (Lei
7.210/84, art. 72, III).
11. Por outro lado, no sentido de ver, presenciar, tem-se observado a
construção como transitivo indireto (preposição a). Exs.: a) “A
anulação do casamento contraído com infração do n. XI do art. 183 só
pode ser requerida pelas pessoas que tinham o direito de consentir e
não assistiram ao ato” (CC/1916, art. 212); b) “É defeso a quem ainda
não depôs assistir ao interrogatório da outra parte” (CPC/1973, art.
344, parágrafo único); c) “São requisitos essenciais do testamento
público:… II – Que as testemunhas assistam a todo o ato” (CC/1916,
art. 1.632, II); d) “A certidão deve conter: … III – os nomes das
testemunhas, que assistiram ao ato, se a pessoa intimada se recusar a
apor a nota de ciente” (CPC/1973, art. 239, parágrafo único);
12. Na acepção de caber, pertencer, tem sido construído como transitivo
indireto (preposição a), estrutura essa que admite o emprego de lhe em
substituição ao nome. Exs.: a) “Ao possuidor de má-fé serão
ressarcidas somente as benfeitorias necessárias; mas não lhe assiste o
direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as
voluptuárias” (CC/1916, art. 517); b) “Ao proprietário prejudicado, em
tal caso, assiste o direito de indenização pelos danos, que de futuro lhe
advenham…” (CC/1916, art. 567, parágrafo único); c) “Apresentado o
laudo que reconheça a gravidez, o juiz, por sentença, declarará a
requerente investida na posse dos direitos que assistam ao nascituro”
(CC/1916, art. 878); d) “A toda empresa ou indivíduo que exerçam
respectivamente atividade ou profissão… assiste o direito de ser
admitido no Sindicato da respectiva categoria…” (CLT, art. 540).
13. Desse modo, vê-se que “Assisto ao filme” é regência correta e significa
que eu vejo o filme na qualidade de espectador; já “Assisto o filme”
também é regência correta, mas significa, em última análise, que
auxilio em sua produção, em sua confecção.
Ver, nesta ordem, Voz passiva – Quando é possível? (P. 793), Voz passiva
sintética (P. 794), Agente da passiva (P. 97), Concordância verbal –
Símbolo de indeterminação do sujeito (P. 213), O júri foi assistido – Está
correto? (P. 522), Ser nascido – Está correto? (P. 694), Voz passiva e
Pronome apassivador (P. 791) e Gosta-se de um bom vinho – Está
correto? (P. 375)
Assistir e Gostar de
Ver Verbos com regências diversas (P. 760).
Assistir razão
1. Quando se diz “assistir razão”, o verbo assistir tem o significado de
pertencer, caber.
2. Em oração com tal verbo na mencionada acepção, razão será o sujeito, e
o referido verbo será transitivo indireto, de modo que exigirá um
complemento preposicionado, um objeto indireto. Exs.: a) “A razão
assiste ao réu”; b) “O direito assiste ao vencedor”.
3. Em sentido prático, basta ver orações em que se empreguem os
sinônimos referidos: a) “A razão pertence ao réu”; b) “O direito cabe ao
vencedor”.
4. É importante acrescentar que, em tal sentido, diferentemente de outros
de seus significados, assistir admite lhe como complemento. Exs.: a) “A
razão assiste-lhe”; b) “O direito assiste-lhe”.
5. Ante tais ponderações conceituais, será equivocado o emprego de tal
verbo, no mencionado sentido, como transitivo direto: “Assiste razão o
requerente”. Corrija-se: “Assiste razão ao requerente”.
6. Acrescente-se, por fim, que a questão aqui estudada não concerne à
harmonização do verbo no singular ou no plural, adaptando-se ao
sujeito; em outras palavras, não se trata de concordância verbal. O
assunto diz respeito, isto sim, ao tipo de complemento que o verbo
exige: a) sem preposição?; b) com preposição? Vale dizer, a questão
concerne à regência verbal.
Atentar
1. Com tal verbo, no sentido de observar bem, Sousa e Silva (1958, p. 40)
vê três possibilidades de construção: a) como transitivo direto (“O réu
atentou o que lhe disse o magistrado”); b) com a preposição em (“O réu
atentou no que disse o magistrado”); c) com a preposição para (“O réu
atentou para o que disse o magistrado”).
2. No Código Civil, o que se vê é a construção atentar em, como se nota no
art. 1.456: “No aplicar a pena do art. 1.454, procederá o juiz com
equidade, atentando nas circunstâncias reais, e não em probabilidades
infundadas, quanto à agravação dos riscos”.
3. Celso Pedro Luft (1999, p. 82-3) também preconiza a possibilidade de
sua construção com a preposição a. Ex.: “Atentar aos pormenores”.
4. Além do sentido de observar bem, de prestar atenção, lembra Luís A. P.
Vitória (1969, p. 35) a possibilidade de seu uso na acepção de cometer
atentado, em que pede a regência contra. Ex.: “Atente no que diz; o
criminoso atentou contra a minha integridade física”.
5. Tal observação também é feita por Francisco Fernandes (1971, p. 107),
que lembra trecho de Rui Barbosa: “A renúncia ao direito de alegar a
nulidade por meio dos recursos ou ações competentes atenta contra a
ordem pública”.
Atenuar
1. Quanto a sua ortografia, como todo verbo terminado em uar, dá origem
à terminação ue. Assim: atenues, atenue.
2. Diferentemente dos verbos terminados em uir (como possuir), não tem
forma alguma com a terminação ui, sendo errôneas as flexões atenuis,
atenui.
3. Nas palavras de Cândido de Oliveira, alertado pelos comuns equívocos
cometidos nesse campo, “é com ue a primeira, segunda e terceira
pessoas do singular do presente do subjuntivo dos verbos em uar: cultue,
cultues, habitue, preceitues” (1961, p. 65).
4. Quanto à conjugação verbal, trata-se de verbo regular, flexionado em
todas as pessoas, tempos e modos.
A teor de – Existe?
1. Não registram os gramáticos e dicionaristas a possibilidade de emprego
vernáculo da expressão a teor de com o significado de conjunção
conformativa.
2. Deve ela ser substituída, em tais casos, por como, conforme, consoante,
nos termos de, de conformidade com…
3. Vejam-se, assim, os seguintes exemplos, com a indicação de sua
correção ou erronia: a) “A extinção do processo sem julgamento do
mérito é a solução adequada para o caso, a teor do art. 267 do Código
de Processo Civil” (errado); b) “A extinção do processo sem julgamento
do mérito é a solução adequada para o caso, de conformidade com o
art. 267 do Código de Processo Civil” (correto).
4. Geraldo Amaral Arruda assevera não conhecer justificativa alguma para
essa locução, que não lhe parece vernácula, nem é encontrada em
nenhum bom escritor, devendo ter sido criada, segundo ele, “à maneira
da condenada expressão a nível de, fora da língua portuguesa” (1997, p.
87).
5. Em anotações pessoais, fotocopiadas e entregues a novos juízes, quando
de uma de suas palestras, o mesmo desembargador e gramático refere
que “com frequência tem aparecido a locução a teor de, com força de
conjunção conformativa. Melhor substituí-la por como, conforme,
consoante, nos termos de, de conformidade com, etc.”
6. Reitera tal autor que “essa locução se assemelha à também reprovada
locução a nível de, que também não se ajusta à sintaxe portuguesa.
Nunca encontrei a locução a teor de em texto de bom autor vernáculo,
mas li em textos espanhóis a tenor de”.
7. Não foi encontrado exemplo algum de seu emprego quando consultados
os dez mais importantes códigos e compêndios da legislação pátria.
Ater-se
Ver Ter (P. 730).
À toa ou À-toa?
1. Quanto a saber se o correto, atualmente, é à toa ou à-toa, deve-se
observar, primeiro, que, antes do Acordo Ortográfico, assim era o ensino
acerca da referida expressão: a) Quando modificava um verbo, um
adjetivo ou um outro advérbio, tal expressão, que é uma locução
adverbial e tem o significado de a esmo, sem rumo, escrevia-se com
acento grave e sem hífen. Ex.: “O réu pôs-se a caminhar à toa, ainda
com a arma na mão” (OLIVEIRA, C., 1961, p. 84); b) Quando
modificava um substantivo, a expressão, que é locução adjetiva e tem o
sentido de frívolo, impensado, inútil, insignificante, de baixa moral,
escrevia-se com acento grave e com hífen. Ex.: “Era um filmezinho à-
toa, baseado em um livrinho também à-toa”.
2. Pois bem. Com a chegada do Acordo Ortográfico, que alterou
significativamente o emprego do hífen, ambas as expressões passaram a
ser escritas sem hífen, de modo que, na atualidade, não mais se escreve,
em caso algum, tal expressão com hífen.
3. Essa grafia sem hífen é a que traz o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa editado após referidas alterações em nosso idioma, quer para
a locução adverbial, quer para a locução adjetiva (2009, p. 89).
4. Verifiquem-se, portanto, os exemplos inicialmente dados, com a grafia
correta da mencionada expressão na atualidade: a) “O réu pôs-se a
caminhar à toa, ainda com a arma na mão” (locução adverbial); b) “Era
um filmezinho à toa, baseado em um livrinho também à toa” (locução
adjetiva).
Através de
1. A primeira observação que se há de fazer é que deve sempre haver, na
referida expressão, a preposição de, e até mesmo configura galicismo
sintático sua omissão, como, aliás, lembra Vitório Bergo em seu
ensinamento: “É francesa a construção de frase em que entre através sem
a preposição de” (1944, p. 36). Exs.: a) “A notícia se modificou através
dos tempos” (correto); b) “A notícia se modificou através os tempos”
(errado).
2. Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 268.) é de idêntico parecer, quanto à
obrigatoriedade de emprego da preposição de, sob pena de galicismo.
3. Em tal erro incidiu Eça de Queirós, quase sempre modelar no vernáculo,
ao dizer, em Bilhetes de Paris: “Através a folhagem copada… não logrei
perceber…”.
4. Ao comentar o vicioso hábito de empregar através sem o
acompanhamento da preposição de – como em através o século, através
a multidão, através o vidro… – Laudelino Freire observa que “tal modo
de escrever é inadmissível, por ser estranho à nossa língua. Próprio é da
francesa, onde a locução prepositiva à travers nunca pede a preposição
de, exceto se o de for partitivo… No português, pelo contrário, é de rigor
o emprego da preposição de depois de através…” (1937a, p. 81).
5. Também anotando que através o, com artigo e sem preposição, constitui
“inútil e intolerável galicismo, cópia servil do francês travers le”, Aires
da Mata Machado Filho acrescenta que o erro é prolífero, pois agora
surge, na fala comum, o através à, “com preposição e artigo fundidos no
a craseado”.
6. E esclarece tal autor que o vício inicial, em que marginalizada a
preposição, à semelhança de muitos outros em nosso idioma, ocorre
“pela falta da comezinha noção de gramática elementar de que a locução
prepositiva termina em preposição” (MACHADO FILHO, 1969b, p.
736).
7. Também Eliasar Rosa anota que “dizer através o, através a é falar como
os franceses. Em bom Português, usa-se a preposição de” (1993, p. 32).
8. Para Cândido de Figueiredo, “quem escreve através os campos, através
os séculos, etc., macaqueia o francês” (1943, p. 186).
9. Ronaldo Caldeira Xavier (1991, p. 89) também insere a expressão
através o no rol dos galicismos sintáticos e aconselha sua substituição
por através de.
10. Sousa e Silva, sem maiores preocupações teóricas, assim aconselha: “É
erro dizer através o Brasil, através os séculos, através a Idade Média
etc. Digam assim: através do Brasil, através dos séculos, através da
Idade Média etc.” (1958, p. 42).
11. Para Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 84), em interessante
aspecto, essa expressão, por um lado, “não rege nome de pessoa”; por
outro, “exige a preposição de”.
12. Num segundo aspecto, quanto a seu exato sentido, principia-se com
ensinamento de Antonio Henriques: a) “Empregar-se-á quando houver
ideia de penetração de um lado a outro, por dentro de, ao longo de, no
decurso de”; b) “Não havendo o sentido anteriormente mencionado,
não se deve usar através de, que se substituirá por mediante, por meio
de, com, por, por intermédio de” (1999, p. 26).
13. Em seu divertido modo de observar os lapsos veiculados pela mídia,
aponta Josué Machado que “ouvimos e lemos várias vezes que a
declaração do presidente (da República) foi feita através do porta-voz.
Para o presidente falar através do porta-voz terá de fazer mais um
orifício no pobre cidadão que porta a voz dele, porque a locução
prepositiva através de tem sentido de transpassagem, de travessia.
Através da vidraça, através de rios e montanhas, da cerração, do tempo,
dos anos, dos planos econômicos” (1994, p. 60).
14. Como se vê, por seu próprio significado, deve-se evitar sempre a
expressão para significar adjunto adverbial de meio ou de instrumento,
hipóteses em que pode ser substituída sem problemas e simplesmente
por mediante, por meio de, por ou de. Exs.: a) “Provou por
testemunhas” (correto); b) “Provou através de testemunhas” (errado);
c) “Deduz-se desses argumentos que o réu há de ser condenado”
(correto); b) “Deduz-se através desses argumentos que o réu há de ser
condenado” (errado).
15. De Afrânio do Amaral (apud NASCIMENTO, 1982, p. 115) advém
preciosa síntese sobre a questão: “É impróprio o emprego, entre nós
cada vez mais frequente, da locução prepositiva através de, para indicar
instrumento ou veículo, em lugar de mediante, por meio de, em frases
como estas: ‘Chegaram a termo através de um convênio’, ‘Pode violar
esses preceitos proibitivos através de atos de direito’, ‘O médico
salvou a cliente através de uma injeção’. Tal emprego não se estriba no
exemplo de nossos mestres. O sentido certo daquela locução, que
apenas denota passagem ou travessia, é de por entre, de lado a lado, ao
correr ou no decurso de. Exs.: a) ‘… laços que se prolongam através
das eras’ (Alexandre Herculano); b) ‘Muito longe, através da
montanha’ (Coelho Netto); c) ‘Os seres sucedem-se através das
vicissitudes’ (F. de Castro); d) ‘Através dos tempos, os vocabulários
sofrem modificações’ (Laudelino Freire)”.
16. Com supedâneo nessas premissas, extrai Edmundo Dantès Nascimento
a ilação de que “constitui vício usar através de regendo nome de pessoa
ou indicando meio”, como em “Conseguiu através do deputado”, ou
“Pagou através de cheque” (1982, p. 17-8).
17. Tal vício é bastante comum, e Vasco Botelho de Amaral observa
textualmente, no que toca ao emprego da expressão para iniciar
adjuntos adverbiais de meio ou de instrumento: “Esta mania do através
tenho-a notado em muita gente que fala e escreve difícil” (1943, p.
225).
18. Apenas para registro – já que se destina a observação à linguagem
coloquial, não merecendo extensão para o padrão culto, onde se há de
observar o posicionamento até agora explicitado – posta-se o
posicionamento mais liberal e até permissivo de Domingos Paschoal
Cegalla: “Está generalizado o emprego desta locução no sentido de por
meio de, por intermédio de. Por isso, não há senão legitimá-lo” (1999,
p. 43).
19. Análise gramatical das leis civil e processual civil, por seu lado,
confirma o adequado uso de outras preposições – jamais do emprego
errôneo da locução prepositiva considerada neste verbete – para os
adjuntos adverbiais de meio ou de instrumento.
20. Assim, o art. 530 do Código Civil de 1916 registra que se adquire a
propriedade imóvel pela transcrição, pela acessão, pelo usucapião e
pelo direito hereditário.
21. De igual modo, o art. 221 do Código de Processo Civil discrimina que
a citação se fará pelo correio, pelo oficial de justiça ou por edital.
22. Uma análise de outros dispositivos da lei processual confirma o
emprego reiterado da preposição por: arts. 222, 223, 231, 232 e 233 do
Código de Processo Civil, dentre outros (citação pelo correio, citação
por edital).
23. Também se utiliza a expressão por meio de, como no art. 224 (citação
por meio de oficial de justiça).
24. Já o art. 404 emprega a preposição com e fala em provar com
testemunhas.
25. E o art. 664 usa a preposição mediante, ao dizer: “Considerar-se-á feita
a penhora mediante a apreensão e o depósito dos bens…”
26. Acresça-se que através de não serve para indicar o agente da passiva.
Exs.: “O gol foi feito pelo atacante” (correto); b) “O gol foi feito
através do atacante” (errado).
27. Em apreciação de excertos de arrazoados jurídicos e textos forenses,
Geraldo Amaral Arruda colecionou uma série de exemplos de emprego
equivocado da expressão para introduzir agente da passiva ou adjunto
adverbial de meio ou de instrumento: através de escritura pública,
materialidade presente através dos autos, através de seu procurador,
através da avença, foi provado através do atestado, furto através de
arrombamento, aquisição de domínio através de usucapião, sentença
reformada através de apelação.
28. Tais expressões, em verdade, deveriam ser corrigidas do seguinte
modo: por escritura pública, materialidade presente nos autos, por seu
procurador, pela avença, foi provado pelo atestado, furto com
arrombamento, aquisição de domínio por usucapião, sentença
reformada em apelação (ARRUDA, 1997, p. 14-5).
29. Erro dessa natureza também se encontra na Resolução 18/2007, do
Conselho Nacional do Ministério Público, a qual, ao regulamentar o
art. 9º da Lei Complementar 75/93 e o art. 80 da Lei 8.625/93,
disciplinando, no âmbito do Ministério Público, o controle externo da
atividade policial, determinou, em seu art. 3º, b, que tal controle
externo será exercido, “em sede de controle concentrado, através de
membros com atribuições específicas…”. Corrija-se, apenas no que
concerne a tal aspecto: “por meio de membros…”, ou “por intermédio
de membros…”, ou, ainda, “por via de membros”, ou, ainda,
similarmente ao que consta na alínea imediatamente anterior: “por
membros…”
Atribuir
1. Quanto à ortografia, como todo verbo terminado em uir, só pode dar
origem à terminação ui na segunda e terceira pessoas do singular do
presente do indicativo: atribuo, atribuis, atribui.
2. Diferentemente dos verbos terminados em uar (como continuar), são
errôneas as grafias com e em tais situações: atribues, atribue.
3. Nas palavras de Cândido de Oliveira, atento aos frequentes equívocos
cometidos nesse campo, “é com i a segunda e terceira pessoas do
singular do presente do indicativo dos verbos terminados em uir: aflui,
fruis, retribui, retribuis, contribui, contribuis, influi, influis” (1961, p.
64).
Atualizar monetariamente
Ver Advérbios em “mente” (P. 85).
Auferir
1. Quanto à conjugação verbal, aparece um i na primeira pessoa do
presente do indicativo e nos tempos dela derivados: aufiro, auferes,
aufere, auferimos, auferis, auferem (presente do indicativo); aufira,
aufiras, aufira, aufiramos, aufirais, aufiram (presente do subjuntivo);
aufere, aufira, aufiramos, auferi, aufiram (imperativo afirmativo); não
aufiras, não aufira, não aufiramos, não aufirais, não aufiram
(imperativo negativo).
2. Não apresenta problemas ou irregularidades nos demais tempos e
modos: auferia (imperfeito do indicativo), auferirei (futuro do presente),
auferiria (futuro do pretérito), auferi (pretérito perfeito), auferira
(pretérito mais-que-perfeito do indicativo), auferir (futuro do
subjuntivo), auferisse (imperfeito do subjuntivo), auferindo (gerúndio),
auferido (particípio).
3. Para sintetizar os problemas de sua flexão, assim anotam José de Nicola
e Ernani Terra, “o e do radical muda para i na primeira pessoa do
singular do presente do indicativo e nas formas daí derivadas” (2000, p.
20).
Autenticar ou Autentificar?
1. Autenticar significa, em termos jurídicos, comprovar legalmente a
veracidade de alguma coisa ou de algum documento, conferindo-lhes o
valor de original. Ex.: “De posse dos documentos originais, o tabelião
autenticou as fotocópias”.
2. Embora possa parecer esdrúxulapara alguns, o Vocabulário Ortográfico
da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, órgão
que detém a delegação oficial para listar os vocábulos existentes em
nosso idioma, em sua recente edição de 2009, registra a palavra
autentificar (ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, p. 86).
3. De igual modo, a referida obra, em mesmo local, registra como
existentes e intercambiáveis os vocábulos autenticação e autentificação.
Ver Protocolar – Existe? (P. 627)
Autópsia ou Necrópsia?
1. Em termos de análise de seus elementos integrantes, autópsia (ou
autopsia) vem do grego: auto (por si mesmo ou pessoalmente – no caso,
não quer significar de si mesmo) + psia (ação de ver ou examinar).
Significa, em suma, analisar por si mesmo ou analisar pessoalmente. E
aqui já se verifica que não quer dizer examinar a si próprio.
2. Necrópsia (ou necropsia) também vem do grego: necro (morte, morto ou
cadáver) + psia (ação de ver ou examinar).
3. Para Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 46), autópsia é um “termo
usado impropriamente em Medicina Legal, em vez de necropsia, que é a
perícia feita em cadáver para apurar a causa do óbito (causa mortis)”.
4. Por outro lado, leciona Eliasar Rosa que necropsia é “neologismo criado
para substituir autópsia, que, entretanto, não vingou” (1993, p. 98).
5. Quanto à prosódia da primeira das palavras mencionadas – ou seja, no
que tange à correta pronúncia e localização da sílaba tônica no vocábulo
– veja-se que o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, em sua
edição de 2004, registrava autópsia, mas não autopsia (p. 87). Já em sua
edição de 2009, registra tanto autópsia como autopsia (p. 93), de modo
que ambas as formas são atualmente corretas.
6. Quanto ao segundo dos termos, o VOLP de 2004 registrava apenas
necropsia, mas não necrópsia (ACADEMIA BRASILEIRA DE
LETRAS, p. 549). De igual modo, em sua edição de 2009, há o registro
de ambas as formas – necropsia e necrópsia (ACADEMIA
BRASILEIRA DE LETRAS, p. 577) – e, assim, ambas as formas estão
igualmente autorizadas.
7. Sempre é bom lembrar que, ao editar o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, a Academia Brasileira de Letras age por delegação
legal, de modo que sua palavra é a própria lei, no que concerne aos
aspectos de sua incumbência.
8. Por outro lado, embora necrópsia (ou necropsia) tenha conteúdo
etimológico mais preciso, nada impede em nosso idioma o emprego de
autópsia (ou autopsia). Os vocábulos coexistem no idioma e se prestam a
expressar o mesmo significado e a mesma realidade.
Autorizar
1. No que tange à regência verbal, lembra Geraldo Arruda que esse verbo
pede objeto direto de pessoa e objeto indireto de coisa, razão por que
sintetiza: “O sujeito da ação autoriza alguém a algo, ou para algo” (1997,
p. 54). Ex.: “O juiz autorizou o réu a sair da audiência”.
2. Francisco Fernandes (1971, p. 112) repete tais caminhos de sintaxe e
acrescenta a possibilidade de seu emprego pronominal seguido pela
preposição com, no sentido de justificar-se, abonar-se, sempre devendo
ser lembrada a circunstância de que o objeto direto da voz ativa pode ser
empregado como sujeito da voz passiva. Exs.: a) “Uma palavra que a
autorizasse a caluniar-me” (Camilo Castelo Branco); b) “Autorizei o
soldado para sair da trincheira” (Stringari); c) “Herculano autoriza-se
com a Crônica dos Cônegos Regrantes” (Camilo Castelo Branco); d)
“Emendou o meu substitutivo, autorizando-se com o Código Civil
português, art. 1.588” (Rui Barbosa).
3. De modo bem didático, alinha Domingos Paschoal Cegalla algumas
construções corretas: a) “Ele autorizou a viagem do filho”; b) “Ele
autorizou o filho a viajar”; c) “Ele autorizou o filho a que viajasse”; d)
“Ele o autorizou a viajar”; e) “Ele o autorizou a que viajasse”.
4. Em continuação, aponta o mesmo autor algumas construções incorretas:
a) “Ele autorizou-lhe a viajar”; b) “Ele autorizou a que o filho viajasse”
(CEGALLA, 1999, p. 46).
5. Em realidade, o erro do primeiro de tais exemplos reside no fato de que
foram empregados dois objetos indiretos (lhe e a viajar), em
contrariedade à regra geral de que, normalmente, não há dois objetos
indiretos para um mesmo verbo; já o equívoco do segundo exemplo está
no fato de que, sendo o correto “Ele autorizou o filho a que viajasse”,
vê-se com facilidade que, no exemplo errôneo, o filho deixou de ser o
objeto direto de autorizou e passou a ser o sujeito de viajasse,
desfazendo, de modo indevido, a construção de complementos
preconizada pelos gramáticos para o verbo autorizar.
Autor ou autor? Réu ou réu?
1. Quando se busca saber se expressões como autor e réu, em autos de
processo, devem ser escritas com inicial maiúscula ou não, deve-se
dizer, em resposta, que uma leitura atenta do Formulário Ortográfico –
um conjunto de instruções para a organização do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, aprovadas unanimemente pela
Academia Brasileira de Letras na sessão de 12/8/43 – evidencia que ele
não traz regras específicas para o mencionado assunto.
2. Duas diretrizes sobre o emprego de maiúsculas, porém, podem ser
fixadas: a) Cada língua tem seu sistema de uso das maiúsculas iniciais
das palavras: no alemão, por exemplo, todo substantivo se escreve com
inicial maiúscula, o que não se dá no português; b) Em nosso idioma, o
Acordo Ortográfico de 2008 trouxe algumas regras para emprego de
maiúsculas ou minúsculas, mas nelas não há elementos que solucionem a
questão da consulta.
3. E, ante o que se acaba de dizer, conclui-se, por primeiro, que não há
obrigatoriedade de escrita com maiúsculas para os referidos vocábulos.
4. Luciano Correia da Silva, porém, assim aconselha: “é de boa ética tratar
as partes, no processo, escrevendo-se-lhes os nomes com inicial
maiúscula: o Requerente, o Exequente, o Executado, o Executado, o
Autor, o Réu, etc. (1991, p. 206)”
5. Em verdade, quando se escrevem tais nomes com inicial maiúscula, não
deixa de haver demonstração de um respeito adicional e uma
cordialidade para com a parte adversária.
6. Deve-se atentar, contudo, para não haver abuso de tal expediente, sob
pena de se tornar esse emprego corriqueiro e sem brilho, incapaz, assim,
de conferir a proeminência e o relevo pretendidos.
7. Por fim, acresce dizer que o Código de Processo Civil adota a regra de
iniciais minúsculas para os integrantes do processo, partícipes ou nele
envolvidos de alguma forma: juiz (art. 2º), autor (art. 4º), curador
especial (art. 9º), réu (art. 13), advogado (art. 15), opoente (art. 57),
oposto (art. 58), nomeado (art. 65), nomeante (art. 66), denunciado (art.
71), denunciante (art. 72), chamado (art. 78), recorrente, litisconsorte e
recorrido (art. 501)
8. Quanto às instituições, todavia, a lei as traz com iniciais maiúsculas,
como se pode ver em diversos dispositivos da Constituição Federal:
Assembleia Nacional Constituinte (preâmbulo), República Federativa do
Brasil, Estado, Município e Distrito Federal (art. 1º), Congresso
Nacional (art. 5º, LXX, “a”), União (art. 21), Defensoria Pública (art.
21, XIII), Distrito Federal (art. 21, XIV), Assembleia Legislativa (art.
27), Câmara Municipal (art. 28, XI), Supremo Tribunal Federal (art. 36,
XII), Poder Legislativo (art. 44), Poder Judiciário (art. 68), Câmara dos
Deputados (art. 70, IV), Tribunal de Contas da União (art. 73).
Ver Réu (P. 672).
Autor ou Requerente?
1. Quando se quer saber qual a diferença de uso entre os vocábulos
Requerente e Autor, deve-se observar, de início, que, por um lado, se
presencia, na atualidade, um crescente avanço da ciência processual, a
qual, em aprimoramento da técnica de redação, leva ao abandono de uma
terminologia genérica e à busca de vocábulos que indiquem, de modo
específico para o caso da consulta, uma real e específica posição do
interessado no processo.
2. Por outro lado, e até mesmo em decorrência da ponderação anterior, os
tempos modernos exigem o abandono de uma tradição anacrônica e
nitidamente extemporânea, como a que pretende perpetuar termos como
Suplicante e Suplicado, resquícios de uma vassalagem, oriundos dos
tempos da Casa de Suplicação, que os séculos já esqueceram.
3. Ante essas duas premissas, inegável é concluir desde logo que o
vocábulo Requerente é termo totalmente genérico e não guarda em si
elemento algum de técnica processual, que possa conferir-lhe sentido
específico ou posicionamento num determinado feito.
4. De modo mais claro, veja-se que, se Requerente é aquele que requer,
tanto o Autor como o Réu podem, numa específica petição, ser o
Requerente da providência a que visa o mencionado pedido. Vale dizer:
empregar Requerente numa petição não serve, de modo algum, para
clarear a situação, nem para indicar a efetiva posição processual da
pessoa referida.
5. Já Autor é aquele que promove uma ação judicial civil ou uma denúncia
penal; e Réu, em contraposição, “é aquele contra quem se promove ação
judicial (sentido civil) ou aquele contra quem se move denúncia por fato
criminoso (sentido penal)” (HENRIQUES, 1999, p. 175). São termos
genéricos e corretos para indicar os lados envolvidos em determinada
medida judicial.
6. Em outros dizeres: aquele que promove uma ação sempre pode ser
chamado de Autor; e aquele contra quem se ajuíza a demanda sempre
pode ser chamado de Réu, independentemente das especificidades. Não
importa, assim, que a ação seja de conhecimento, de execução ou
cautelar. Não importa, nem mesmo, se se trata de ação ou de contra-ação
(como autor de embargos à execução, ou autor de reconvenção). Trata-se
de terminologia genérica aceita sem problemas maiores.
7. Adicionalmente, é de se dizer que esse Autor pode ser especificado de
acordo com a modalidade da medida judicial manejada: em execução é o
Exequente; em ação desconstitutiva de título judicial ou extrajudicial é o
Embargante; em reconvenção é o Reconvinte; em mandado de segurança
é o Impetrante.
8. E aquele contra quem se manejam tais providências judiciais também
podem ser assim especificados: Executado, Embargado, Reconvindo,
Impetrado.
9. De modo específico para o caso da consulta, assim se resume: a)
Requerente é vocábulo que se deve evitar em petições judiciais, porque,
longe de se amoldar à técnica processual, constitui generalidade que
confunde (nada impede, por exemplo, que o próprio Réu de determinada
ação seja o requerente de alguma providência em certa petição); b) Autor
é termo técnico genérico, que pode ser usado para indicar todo aquele
que promove uma ação judicial civil (não importando sua
especificidade) ou uma denúncia penal; c) nada impede que haja o
emprego de termos mais específicos que se amoldem à medida judicial
manejada: Autor (para ações de conhecimento em geral), Exequente,
Embargante, Reconvinte, Impetrante.
Aval
1. Dado como vocábulo originário do francês valoir (valer, ter mérito),
restringe-se seu emprego à terminologia do Direito Cambiário, para
significar “a garantia que é dada por terceiro, estranho ao título (letra de
câmbio, nota promissória, duplicata, cheque), pela qual se prende à
obrigação cambial, isto é, fica vinculado solidariamente ao título
avalizado, pelo compromisso que assume de pagar a importância que
nele se contém, quando não a pague o devedor, que é por ele garantido”
(CEGALLA, 1999, p. 257).
2. Embora muitos façam grande confusão, não há sinonímia nem
equivalência entre aval e fiança, no mínimo pelas seguintes razões: a) o
aval é próprio do Direito Cambiário, constituindo garantia prestada por
terceiros em títulos cambiais (letra de câmbio, nota promissória,
duplicata, cheque), enquanto a fiança é um contrato acessório de
garantia, também prestada por terceiros, mas própria do Direito Civil,
pela qual “uma pessoa se obriga por outra, para com o seu credor, a
satisfazer a obrigação, caso o devedor não a cumpra” (CC/1916, art.
1.481); b) o aval só pode ser dado no próprio título cambiário, sob pena
de deixar de ser obrigação cambiária para o avalista, enquanto a fiança
pode ser dada em outro documento qualquer, que não aquele em que
haja a constituição da dívida garantida, apenas não se podendo olvidar
que imprescindível seja ela prestada “por escrito” (CC/1916, art. 1.483),
sob pena de invalidade; c) o garantidor casado pode prestar aval sem a
presença do cônjuge, mas não a fiança, que exige a anuência conjugal,
qualquer que seja o regime de bens (CC/1916, 235, III).
3. Também não se deve confundir aval com endosso, já que aquele é
sempre uma garantia, enquanto este “designa o ato pelo qual a pessoa,
proprietária de um título de crédito, o passa para outrem, conferindo-lhe
os direitos que lhe competiam” (DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p. 247).
4. No que concerne à forma de tal vocábulo, Carlos Góis e Herbert Palhano
(1963, p. 56), sem registrar o plural avais, dão-lhe avales por plural.
5. Luiz Antônio Sacconi, por seu lado, registra-lhe ambos os plurais avais e
avales – apenas observando que “avais corre no Brasil; avales em
Portugal” (1979, p. 34).
6. Espancando, contudo, toda e qualquer dúvida, o Vocabulário Ortográfico
da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras (2009, p. 93),
que é o veículo oficial indicador das palavras existentes em nosso
idioma, registra ambos os plurais – avais e avales – razão pela qual
ambos estão oficialmente autorizados, até por força do velho princípio
de que essa é a determinação legal.
Avançar!
1. Nessa expressão, o infinitivo está sendo usado em lugar do imperativo e
com o sentido de avancem!
2. É correto seu emprego, podendo-se apontar outros exemplos corriqueiros
da mesma estrutura: a) “Apontar armas!”; b) “Passar bem!”; c) “Nem
pensar nisso!”
Avaro ou Ávaro?
1. Quanto à prosódia, quando significa avarento, trata-se de vocábulo
paroxítono (BECHARA, 1974, p. 58).
2. Avaro, deve-se, assim, pronunciar com mais força a penúltima sílaba
(va), de modo que rima com raro e com preparo.
3. Não confundir com ávaro (proparoxítona e graficamente acentuada), que
tem por variante ábaro, como bem registra o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido
oficialmente de determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma,
além de sua grafia oficial (2009, p. 93), nome esse de um povo de
origem uralo-altaica, que assolou a Europa durante três séculos e foi
destruído por Carlos Magno no século VIII.
A ver ou Haver?
Ver Nada a ver ou Nada haver? (P. 483)
Avisar
1. Peculiar é sua construção, no que tange à regência verbal.
2. Tanto a coisa quanto a pessoa podem ser, indiferentemente, objeto direto
ou objeto indireto.
3. O que não pode ocorrer, entretanto, é a existência simultânea, em mesma
frase, de dois objetos diretos ou de dois objetos indiretos.
4. Por isso, são corretas as duas construções seguintes: a) “Avisaram ao
Corregedor o fato ocorrido”; b) “Avisaram o Corregedor do (ou sobre
o) fato ocorrido”.
5. Não são, todavia, corretas as seguintes estruturas: a) “Avisaram ao
Corregedor do fato ocorrido”; b) “Avisaram o Corregedor o fato
ocorrido”.
6. Tais frases são errôneas, porquanto a primeira tem dois objetos indiretos,
e a segunda, dois objetos diretos.
7. Para sintetizar, na lição de Antonio Henriques e Maria Margarida de
Andrade (1999, p. 89), tal como se dá com todos os verbos de sentido
afim de informar, há aqui dupla construção possível: a) avisar alguém de
alguma coisa; b) avisar alguma coisa a alguém.
8. É certo que Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 47) objeta que a
construção avisar a alguém alguma coisa, como em “Avisou aos pais
que ia pescar”, ou “Aviso-lhe que tome cuidado”, constitui sintaxe que
“não tem compromisso com a boa norma sintática” e apenas é admitida
“na linguagem despreocupada, informal”.
9. Tal, entretanto, não é o posicionamento de Celso Pedro Luft, que lança
as seguintes observações: a) “a construção originária é avisar alguém
(avisá-lo) de algo”; b) já a construção avisar algo a alguém (avisar-lhe
algo) “deve-se à semântica de dizer ou comunicar e já tem boa tradição
na língua”; c) “pesquisa de Lessa mostra a preferência dos modernistas
pela construção originária”; d) “ainda ocorre avisá-lo contra… e avisá-lo
sobre…, por interferência dos traços semânticos de cautela e assunto,
respectivamente” (1999, p. 90).
10. E Francisco Fernandes, abonando-se com exemplos de autores
insuspeitos, acrescenta que “a sintaxe mais usada é avisar alguém de
alguma coisa; todavia há exemplos autorizados de avisar alguma coisa
a alguém”. Exs.: a) “Não fazia senão avisar ao reino e ao rei que se
prevenissem” (Padre Antônio Vieira); b) “Avisei-lhe o sobredito meio”
(Stringari); c) “Já avisei a V. Sa. que a Mitra de Évora caiu sobre D.
Domingos de Gusmão” (Sousa Lima).
11. Também seguem a mesma construção os verbos aconselhar, certificar,
informar, notificar, prevenir.
Avo
1. Para significar “fração de unidade”, avo é nada mais nada menos do que
um substantivo fictício tirado da terminação de oitavo. Ex.: “A cada qual
dos herdeiros tocou um doze avo da fazenda”.
2. Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 88) realça essa natureza de
“substantivo fictício da terminação de oitavo”, lembrando que, em
castelhano, assume ele o caráter de sufixo, como em centavo e onceavo.
3. Só se usa com denominadores acima de 10 e que não sejam potência de
10: 21 trinta avos, 80 noventa e nove avos; porém oitenta décimos, cem
milésimos, um sétimo, um nono (e não um sete avo nem um nove avo).
4. Na conformidade com lição de João Ribeiro, “na ciência matemática
adotou-se na leitura das frações o sufixo avos, do termo oitavo, para
designar o divisor de 11 para cima: quinze avos” (1923, p. 22 e 137).
5. Para Otoniel Mota, essa terminação “se generalizou por se acreditar que
havia aí duas palavras: oito + avos” (1916, p. 38).
6. Apesar, entretanto, de se dizer um oitavo (e não um oitavos), autores há,
como o dicionarista Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (s/d, p. 167) e
os gramáticos Cândido Jucá Filho (1963, p. 87) e Gladstone Chaves de
Melo (1970, p. 127), que, mesmo quando o numerador é um, aceitam
pluralizar o denominador. Ex.: “A cada qual dos herdeiros tocou um
doze avos da fazenda”.
7. Em mesmo posicionamento, Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 312)
exemplifica com denominador plural, mesmo tendo apenas uma unidade
no numerador: um onze avos.
8. Por outro lado, lembrando que “a concordância com as frações
ordinárias se faz com o numerador”, observa Edmundo Dantès
Nascimento (1982, p. 8 e 64) que se diz um oitavo, um doze avo e dois
doze avos.
9. Também lembrando lição de Edmundo Dantès Nascimento no sentido de
que necessária a concordância com o numerador em tais casos, assevera
Antonio Henriques (1999, p. 124) que “haveria um erro no art. 1º, § 1º,
da Lei 4.090, de 13 de julho de 1962”, que registra: “A gratificação
corresponderá a 1/12 avos da remuneração devida em dezembro por
mês de serviço, do ano correspondente”.
10. E o próprio Edmundo Dantès Nascimento observa que “o descuido no
uso desta palavra ocorre na concordância de número”, acentuando que,
“evidentemente, se dizemos um terço, um quarto… um décimo, temos
de dizer um doze avo, um quinze avo, um quarenta avo”.
11. Em sequência, buscando conceito de Caldas Aulete, recorda que o
numerador numa fração “é o número que indica as partes da unidade
que nela se contêm”, e o “denominador indica em quantas partes está
dividida a unidade”, e que “a concordância é feita sempre com o
numerador da fração. Ex.: um décimo, dois décimos; um vinte avo, dois
vinte avos”.
12. Por fim, buscando a origem do vocábulo, repete tal autor lição já
mencionada de que “a palavra avo parece ser simplesmente o sufixo do
ordinal que por analogia se foi aplicando a todos; assim se dizia três
oitavos e pareceu que se devia dizer: doze avos, dezesseis avos, etc.;
por fim o sufixo adquiriu o valor de parte. Vem ao apoio desta
explicação o fato de os sufixos dos outros cardinais que se empregam
para significar parte não aparecerem com clareza, assim em quarto,
quinto, sexto, sétimo, nono, décimo, não há sufixos que se prestem a
formações analógicas: o contrário se dá com o sufixo avo em oitavo”
(NASCIMENTO, 1982, p. 116).
13. Nos textos legais encontrados – como o já referido art. 1º, § 1º, da Lei
4.090, de 13/7/62 – não tem havido a fixação na ideia de que, no caso,
o numerador é um e que a normal flexão seria avo, de modo que se tem
empregado no plural (avos) mesmo quando o numerador é um, como
se vê no próprio Código Civil de 1916: “Presume-se que a referência às
dimensões foi simplesmente enunciativa, quando a diferença
encontrada não exceder de um vinte avos da extensão total enunciada”
(CC/1916, 1.136, parágrafo único).
14. E, tendo escapado tal aspecto da própria polêmica entre Rui Barbosa e
Ernesto Carneiro Ribeiro, além de não se poder olvidar o uso
generalizado em meio aos usuários da norma culta, não parece haver
possibilidade de condenação de emprego dessa estrutura, devendo-se
aplicar o vetusto princípio de que, se há fundada discussão entre os
gramáticos, deve-se permitir liberalidade quanto ao uso.
15. Por fim, de oportuna lembrança é que tal vocábulo, em flexão normal
de número, tem sido empregado como substantivo, para significar coisa
pequena, insignificância, bagatela, pequena porção, quantidade
diminuta. Exs.: a) “Tenho mais amor e aferro ao meu avo de soberania,
que me dá o direito de julgar do que à outra fraçãozinha, que me
puder caber na repartição trimilionesimal da majestade legislativa”
(Almeida Garrett); b) “Aqui se surpreendia a fazer o cálculo rancoroso
dos avos de responsabilidade” (Fialho de Almeida).
Azul-celeste
Ver Adjetivos compostos (P. 81).
B
Bacharela – Existe?
1. Em obra mais antiga, Silveira Bueno (1938, p. 94) entende que bacharel
é comum de dois, de modo que a mesma forma seria usada no masculino
e no feminino, apenas se alterando o artigo: o bacharel, a bacharel.
2. Também optando por considerá-lo comum de dois gêneros, Geraldo
Amaral Arruda (1997, p. 145-6) vê no feminino bacharela uma “solução
inferior”, uma forma “de evidente formação popular e de caráter
jocoso”, lembrando que Caldas Aulete lhe dá o significado de mulher
palradora ou sabichona.
3. Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 31), por seu lado, sem comentários
adicionais, insere-o entre os vocábulos que têm um feminino próprio:
bacharela.
4. Cândido Jucá Filho (1981, p. 46), de igual modo, esclarece que Mário
Barreto emprega o feminino bacharela.
5. Também Luís A. P. Vitória (1969, p. 39) confere-lhe o feminino
bacharela.
6. Cândido de Oliveira (s/d, p. 34) tem igual proceder.
7. Em outra obra, Cândido de Oliveira, após observar que, até há pouco, a
maioria de nomes dessa natureza era considerada comum de dois
gêneros, acrescenta textualmente que é “de lei, assim para o
funcionalismo federal como estadual, e de acordo com o bom-senso
gramatical, que nomes designativos de cargos e funções tenham flexão:
uma forma para o masculino, outra para o feminino”.
8. Por essas razões, em seu exemplário, ao masculino bacharel contrapõe
ele o feminino bacharela (OLIVEIRA, C., 1961, p. 133).
9. Duas décadas após a obra acima referida, Silveira Bueno, por um lado,
traz antigo ensinamento de J. Silva Correia, diretor da Faculdade de
Letras de Lisboa: “Nos últimos tempos têm surgido numerosas formas
femininas, que a língua de épocas não distantes desconhecia, – e que são
como que o reflexo filológico do progresso masculinístico da mulher, –
hoje com franco acesso a carreiras liberais, donde outrora era
sistematicamente excluída”.
10. Por outro lado, também aduz tal autor curiosa lição de Lebierre: “Os
gramáticos preceituam que os substantivos designativos de certas
profissões, a maior parte das vezes exercidas por homens, conservem a
forma masculina para a maioria de tais substantivos”.
11. Em seguida, conclui ele próprio, alterando posição que esposara vinte
anos antes: “Os gramáticos, que defenderam a conservação, no
masculino, dos nomes de cargos outrora exercidos por homens e já
agora também por senhoras, não tinham razão porque tais nomes são
meros adjetivos como escriturário, secretário, deputado, senador,
prefeito, podendo concordar com o sexo da pessoa que tal cargo exerce
e não com o gênero dos nomes de tais profissões”. E preconiza que se
diga bacharela, se tal posto é entregue a uma senhora (BUENO, 1957,
p. 382-3).
12. Domingos Pachoal Cegalla (1999, p. 49) aceita tanto a existência de
uma forma específica para o feminino (o bacharel e a bacharela) como
a permanência do substantivo como comum de dois gêneros (o
bacharel e a bacharel): “Aurélio dá o feminino bacharela, forma usada
por Ciro dos Anjos, em seu romance Abdias… Todavia, não nos parece
incorreto não flexionar em gênero o substantivo em foco e escrever: ‘A
bacharel em Direito Eunice Paiva é viúva?’ (Luís Fernando Furquim)”.
13. Dirimindo dúvidas acerca da possibilidade de emprego do feminino
bacharela, é de se anotar que se encontra ele registrado no Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
que é veículo oficial indicador das palavras existentes em nosso
idioma, estando autorizado, por conseguinte, seu normal emprego
(2009, p. 98). Anote-se, todavia, que apenas se registram as formas
bacharel para o masculino e bacharela para o feminino, de modo que
não está formal e oficialmente autorizada a forma a bacharel para o
feminino (como se fosse comum de dois gêneros).
Bacharelando – Existe?
1. Apesar da oposição de alguns no que concerne a sua existência e a
possibilidade de seu uso, esse vocábulo vem registrado no Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
que é o veículo oficial indicador das palavras existentes em nosso idioma
(2004, p. 98).
2. Está oficialmente autorizado, por conseguinte, seu normal emprego,
quando se quer designar aquele que vai bacharelar-se.
Ver Alimentando – Existe? (P. 105)
Bahia
1. Nome de um estado brasileiro.
2. Muito embora o adjetivo seja baiano, e o substantivo comum seja baía,
permanece essa grafia estranha no substantivo próprio, que originou a
explicação indignada de Napoleão Mendes de Almeida: “O h é bastardo
à luz da ortografia de 43 e da de 45, e só um decreto de 1931 do estado
baiano e a pessoal injunção do chefe da delegação brasileira do sistema
de 45, natural desse estado, é que ainda nos impingem essa vileza
gráfica; tivesse ele nascido no Piauí, estaríamos até agora sujeitos a
‘Piauhy’…?” (1981, p. 37).
Para observar-lhe a ausência de acentuação gráfica, ver Hiato (P. 389).
Banir
Ver Abolir (P. 55).
Barato
1. É palavra que precisa ser observada quanto a concordância nominal.
2. Se modifica um verbo, tem valor de advérbio e é invariável. Exs.: a) “O
terno custou barato”; b) “A roupa custou barato”; c) “Os ternos
custaram barato”; d) “As roupas custaram barato”.
3. Se, porém, modifica um substantivo, tem valor de adjetivo e concorda
com a palavra modificada. Ex.: a) “Um terno barato sai com mais
facilidade da prateleira”; b) “Uma roupa barata sai com mais facilidade
da prateleira”; c) “Ternos baratos saem com mais facilidade da
prateleira”; d) “Roupas baratas saem com mais facilidade da
prateleira”.
4. As mesmas observações valem para caro.
Ver Bastante – Existe no plural? (P. 156)
Barbarismos
1. “Chamam-se barbarismos as expressões tiradas de outras línguas e que
constituem vício quando os vocábulos estranhos não são indispensáveis”
(RIBEIRO, João, 1923, p. 245).
2. Dando-lhe por um dos casos a hipótese de peregrinismo, que conceitua
como o emprego de “palavras estrangeiras, quando há na língua
expressão equivalente”, complementa Júlio Nogueira (1939, p. 240-1)
com outras modalidades de barbarismos: emprego de palavra com
significação que não possui (intemerato, que é íntegro, puro, por
intimorato, que significa destemido); pronúncia errônea (galfo por garfo,
bicicreta por bicicleta); prosódia errada (púdico por pudico).
3. Tal vocábulo tem por sinônimo, em determinada extensão, a palavra
estrangeirismos, que se especifica, conforme a língua, em anglicismo,
castelhanismo ou espanholismo, francesismo ou galicismo,
italianismo…
Bastar de
Ver Bastar e Faltar – Como concordar? (P. 156)
Bela caligrafia
1. Na conformidade com lição de Domingos Paschoal Cegalla, “a ideia de
belo já está expressa na palavra caligrafia, de origem grega, que significa
bela escrita”.
2. Bem por isso, complementa tal autor, “é redundante o adjetivo bela
aplicado a caligrafia. Embora o sentido etimológico esteja praticamente
obliterado, será melhor dizer bela escrita ou bonita letra em vez de bela
caligrafia”. (CEGALLA, 1999, p. 52)
3. No campo jurídico, ver equívocos similares em acordo amigável, pessoa
viva e sentença de primeira instância.
Ver Acordo amigável (P. 71), Pessoa viva – Redundância? (P. 563) e
Sentença de primeira instância – Pleonasmo? (P. 690)
Bel-prazer da vontade – Existe?
1. Tendo encontrado, na prática, uso que lhe parece equivocado, uma
leitora indaga se a expressão bel-prazer pode ser associada à palavra
vontade, como na expressão “a bel-prazer da vontade do prefeito”.
2. Ora, a expressão bel-prazer (bel, no caso, é forma apocopada de belo),
conforme lição dos dicionaristas, já significa arbítrio, talante, vontade
própria (FERREIRA, 2010, p. 300).
3. Cândido Jucá Filho realça seu uso mais comum em “expressões
possessivas como ‘a seu bel-prazer’”, mas também exemplifica com
caso de outro emprego, em que não se faz presente o pronome
possessivo: a) “Fi-lo a meu bel-prazer”; b) “Procedeu a bel-prazer de
Fulano” (1963, p. 100).
4. Com isso, já solucionando um aspecto da indagação da leitora, pode-se
dizer, com base no que já foi explicado, que estaria correto o exemplo
com a seguinte formulação: “Não podemos ficar aqui esperando, a bel-
prazer do Prefeito”.
5. Antes de ingressar no segundo aspecto, porém, com os olhos voltados
para a circunstância de que bel-prazer e vontade são sinônimas, fazem-se
algumas ponderações teóricas, a título de premissas: a) expressões que se
repetem quanto ao sentido são chamadas tecnicamente de pleonasmos
(do grego pleonasmós = superabundância); b) o pleonasmo pode ser de
estilo, quando usado intencionalmente para conferir à expressão mais
vigor, intensidade ou clareza; c) nesse caso, ele não apenas é aceito, mas
constitui verdadeiro ornamento do estilo; d) é o que se dá em casos como
“Isso eu vi com meus próprios olhos” e “Tinha a testa enrugada, como
quem vivera vida de contínuo pensar”; e) em outros casos, o pleonasmo
pode ser vicioso, quando significa uma repetição que em nada robustece
a expressão; f) é o que se dá em exemplos como “subir para cima”,
“descer para baixo”, “entrar para dentro” e “sair para fora”.
6. Com essas considerações teóricas e genéricas, podem-se extrair, em
segundo aspecto para o caso da consulta, as seguintes ilações: a) a
expressão “a bel-prazer da vontade” tem evidente conotação pleonástica
e redundante, até porque bel-prazer já significa vontade, arbítrio ou
talante; b) a repetição das expressões em nada robustece o vigor, a
intensidade ou a clareza do texto; c) sem necessidade de maiores
considerações, está-se diante de um pleonasmo vicioso; d) como tal,
constitui equívoco da linguagem e deve ser evitado.
Bem
Ver Mais mal ou Pior? (P. 454) e Bem como (P. 158).
Bem como
1. No que diz respeito a concordância verbal, lembra Artur de Almeida
Torres que, “quando dois sujeitos vêm ligados por bem como, o verbo
concorda, em regra, com o primeiro”. Exs.: a) “Este interessante
capítulo, bem como os subsequentes, encerra fatos conhecidos de
muitos” (Alexandre Herculano); b) “O Sol, bem como os outros corpos
celestes, não é imutável” (Camilo Castelo Branco).
2. O gramático referido realça o aspecto de que “são raros os exemplos em
que, no caso dessa regra, o verbo aparece no plural” (TORRES, 1966, p.
151).
3. Já Domingos Paschoal Cegalla, em lição mais liberal, que amplia para a
expressão assim como, anota, com respeito a uma expressão como essa,
a possibilidade de emprego optativo do verbo no singular ou no plural:
“no singular, quando se quer destacar o primeiro núcleo”; “no plural,
quando se quer referir o conteúdo verbal a ambos os núcleos do sujeito”.
4. E complementa: “Observe-se que no primeiro caso o segundo elemento
do sujeito é colocado entre vírgulas”. Exs.: a) “O urso-polar, assim como
outros animais marinhos, se alimenta de peixes”; b) “O urso-polar bem
como a foca se alimentam de peixes” (CEGALLA, 1999, p. 29).
5. O melhor entendimento parece ser o do gramático por último referido, o
qual, no plano da sintaxe, aceita, com a expressão bem como, a optativa
concordância do verbo no singular ou no plural.
6. Em lição para um outro aspecto da questão, no que tange a possibilidade
de uso das conjunções aditivas (que estabelecem mera ligação entre as
orações coordenadas), além das típicas e e nem, lembra Geraldo Amaral
Arruda a existência de várias outras que podem exercer essa função,
como é o caso de bem como e assim como. Ex.: “O possuidor de boa-fé
tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem
como, quanto às voluptuárias, se lhe não forem pagas, a levantá-las,
quando o puder sem detrimento da coisa…” (CC/1916, art. 516).
7. Observa, entretanto, tal autor, que, “embora útil, ou até necessário, o uso
dessas locuções na redação de textos de leis, esse recurso não parece
conveniente nos demais textos jurídicos, como alegações ou sentenças”.
8. E acrescenta que “principalmente é preciso cuidado em não se abusar de
um recurso cujo uso pode ser necessário à redação clara de dispositivos
legais mais complexos, mas nem sempre será estilisticamente
conveniente aos escritos do juiz ou do advogado” (ARRUDA, 1997, p.
107).
Ver E nem (P. 318) e Nem… nem (P. 493).
Bem no sei
Ver Não no sei – Está correto? (P. 486)
Bem ou Bom?
Ver Mau ou Mal? (P. 464)
Bem que
Ver Indicativo por Subjuntivo (P. 411).
Beneficência ou Beneficiência?
1. Beneficência é substantivo, que significa caridade, filantropia, como na
expressão Sociedade Portuguesa de Beneficência.
2. Observe-se que não há um i antes do e, sendo, desse modo, incorreta a
grafia beneficiência.
3. A mesma observação vale para o adjetivo, que é beneficente, e não
beneficiente, e significa aquele que beneficia, que favorece. Ex.: “As
senhoras da sociedade organizaram um chá beneficente”.
4. Para ambos, é assim sem o i intermediário o registro do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de
Letras (2009, p. 113) e veículo incumbido de fornecer a grafia oficial das
palavras em nosso idioma.
5. Equívocos como beneficiência e beneficiente, de acordo com Domingos
Paschoal Cegalla, são “barbarismos explicáveis por contaminação
fonética de benefício” (1999, p. 53). Importa explicitar que o fato de ser
explicável não justifica nem torna correto o barbarismo.
Beneficente ou Beneficiente?
Ver Beneficência ou Beneficiência? (P. 159)
Biografar
Ver Datilografar (P. 251).
Bitransitivos indiretos – O que são?
Ver Ingressar com ou Ingressar em? (P. 417)
Bloqueamento – Existe?
Ver Existe em português? (P. 346)
Bói
Ver Formação de adjetivos – Regras (P. 360) e Neologismo (P. 494).
Bolso
Quanto a seu plural, ver Plural de o tônico (P. 568).
Cacoepia
Ver Ortoepia (P. 532).
Cacófato – O que é?
1. Genérica e tecnicamente, cacófato ou cacofonia “é um vício resultante
do encontro de vocábulos que, no conjunto, se prestam à formação de
termo inconveniente” (RIBEIRO, João, 1923, p. 246).
2. Na visão rígida de Alfredo Gomes (1924, p. 471), basta o vocábulo
pouco fino, formado pelo encontro do final de uma palavra com o
começo da outra, para configurar o cacófato, como é o caso de fica cá,
cama minha, uma mão.
3. Em posição intermediária, para Júlio Nogueira (1939, p. 241), “é a
formação ocasional de palavras ridículas ou pouco decentes pelo
encontro de sílabas finais de uma com o começo de outra: ela trina, já
que tinhas, alma minha, já sinto, nunca pus, vez passada (vespa
assada)”.
4. Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 263) assevera que cacofonia “consiste
na junção de duas palavras de modo tal que se forme uma outra de
sentido torpe ou ridículo”.
5. Júlio Ribeiro (1908, p. 328), por seu lado, para a tipificação da
cacofonia, exige o “encontro de duas palavras que produza uma terceira
de significação baixa ou torpe”.
6. Independentemente dessa discussão – se há necessidade de formação de
uma palavra baixa e torpe, ou se basta um resultado sonoro pouco fino –
o certo é que, modernamente, só se considera cacófato o som ridículo ou
obsceno, verdadeiramente inaceitável, proveniente da união das sílabas
finais de uma palavra com as iniciais da que lhe vem a seguir. Ex.: “Vou-
me já, porque já está pingando” (em realidade, a pessoa do exemplo se
vai apenas porque a chuva já começou).
7. O que se entende modernamente é que, se o cacófato é erro, não se deve
cair no exagero da cacofatomania, que é o escrúpulo ridículo, que busca
espreitar sua ocorrência em qualquer trecho ou encontro de sílabas.
8. A gramática atual, em verdade, não considera erros dessa natureza
expressões como alguma cacofonia (macaco), alma minha (maminha),
ela tinha (latinha), fé de mais (fede mais), por cada (porcada), por tal
(portal), uma mão (mamão).
9. Com propriedade, lembra Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 270) que,
“modernamente, só se considera cacofonia se a palavra produzida for
chula, obscena, realmente ridícula e inaceitável”, acrescentando que “a
gramática atual já não condena, portanto, estes encontros: ela tinha,
nosso hino, por cada, uma mala”.
10. Nesse sentido, basta ver que o art. 183, VII, do Código Civil de 1916,
ao discriminar os impedimentos dirimentes absolutos, refere que não
pode casar “o cônjuge adúltero com o seu corréu por tal condenado”.
O encontro por tal nem sequer foi lembrado na polêmica entre Rui
Barbosa e Ernesto Carneiro Ribeiro.
11. Analisando a expressão por conveniente (porco) do art. 436 do Código
Civil de 1916, refere também Luciano Correia da Silva que, para a
existência do cacófato, “não basta que o encontro seja apenas
desagradável: é necessária a torpeza, a obscenidade, ou a contundente
grosseria”, razão pela qual “associações como a vista no destaque (por
+ con) não representam cacofonia”.
12. Nessa linha, para o referido autor – que lembra, de passagem, que “os
escritores portugueses nunca se preocuparam muito com certas
dissonâncias, que para muitos guardiões do vernáculo seriam
cacofonias” – de agrupamentos como intrínseca validade e por tal,
“uns podem ser malsoantes, desagradáveis; outros nem a isso chegam”.
E continua ele, em lição firme e sem meias palavras, que “cacofonia
mesmo haverá em vou-me já, lá trina, provoca gado, garfo deu, tifo
deu” (SILVA, L., 1991, p. 86).
13. Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade (1999, p. 139)
apontam como “malsoante colocação pronominal” a estrutura “se as
não satisfizer” existente no art. 45 do Código Civil brasileiro de 1916.
E ao comentarem a estrutura “a não possa guardar”, existente no art.
1.270 do Código Civil de 1916 – por eles reputada “infeliz colocação
pronominal” – observam também que “a questão do cacófato é relativa
e que muitos dos assim chamados cacófatos receberam a chancela do
uso, inevitáveis que são”, muito embora seja “preferível evitá-los”
(1999, p. 126).
14. Em outra obra escrita solitariamente, Antonio Henriques também anota
que “tempo houve em que a preocupação dos gramáticos
(gramatiqueiros) era colecionar cacófatos. Hoje, sabe-se de encontros
inevitáveis de sílabas que não mais despertam a atenção, e já disse
alguém que o cacófato e ridículo; mais ridícula é a caça ao cacófato”
(1999, p. 30).
15. Artur de Almeida Torres, por um lado, aduz para cacofonia o rígido
conceito de “encontro de palavras que formem outra de sentido torpe,
ridículo ou desagradável: ‘Já sinto as minhas aflições’; a boca dela;
‘Ele só tem uma mão’; ‘intrínseca validade’”. Por outro lado, ressalva
a existência de cacófatos “que não são passíveis de censura, já porque
aparecem em frases feitas, e sem sucedâneos perfeitos (da nação, de
balde, por tal), já pela sua habitualidade nas páginas de nossos maiores
escritores (alma minha, como elas, as não). Por fim, exatamente para
esses últimos casos, refere a advertência de Rui Barbosa, para quem
encontros dessa natureza têm de ser tolerados, porque “a lei da
necessidade obriga as exigências da eufonia à condição fatal de
transigir” (TORRES, 1966, p. 223).
16. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 60), por um lado, observa que
“evitar os cacófatos não deve tornar-se preocupação obsessiva de quem
fala ou escreve, tanto mais porque alguns há que são inevitáveis”; por
outro lado, como “convém evitá-los o mais possível”, aconselha três
estratégias simples para a vida prática: a) “substituir por sinônimos as
palavras geradoras de cacofonias”; b) “mudar essas palavras de lugar
na frase”; c) “alterar a estrutura da frase”.
17. Em mesma esteira, adverte Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 45
e 61) ser infundado o escrúpulo de se evitarem encontros tais como “no
novo processo”, “no nosso caso” ou “uma mão”, sendo totalmente
desnecessárias construções como “em o novo processo”, “em o nosso
caso” ou “u’ a mão”.
18. A respeito do último aspecto observado, entretanto, Cândido Jucá Filho
(1963, p. 233) fala tão somente em questão de preferência e aponta
exemplo de Ernesto Carneiro Ribeiro, que fala “em o número II do art.
46”.
19. Acresça-se que Rui Barbosa (1949, p. 437), em observações ao art.
1.675, II, do Projeto do Código Civil, intentando garimpar vício na
expressão última moléstia (mamo), dizia que ela não soava bem a
ouvidos afinados, mas receava fazer alegação nesse sentido, já que
poderia “ver invocada em honra do projeto a alma minha de Camões”.
20. Mesmo assim, a sugestão acabou acarretando mudança de redação,
como se vê do art. 1.668, II, do Código Civil de 1916: moléstia de que
faleceu.
21. No campo dos textos de lei, o art. 35, § 4º, do Código Civil de 1916, ao
tratar do domicílio das pessoas jurídicas, registra a passagem “no
tocante às obrigações contraídas por cada uma das suas agências”;
Rui Barbosa refutou todas as objeções de cacófato, e até mesmo
argumentou que não se pronuncia por (ô), mas pur, o que evita, no
caso, qualquer sonância incômoda (BARBOSA apud SILVA, L., 1991,
p. 86).
22. O mesmo Código Civil de 1916, no art. 1.270, também registra: “Ao
depositário será facultado, outrossim, requerer depósito judicial da
coisa, quando por motivo plausível, a não possa guardar”; não há
notícia de invectivas fundadas e frutíferas contra a expressão a não.
23. Por outro lado, o Código Comercial, no art. 43, de igual modo, estatui:
“A fiança será conservada por inteiro, e por ela serão pagas as multas
em que o corretor incorrer, e as indenizações a que for obrigado, se as
não satisfizer”. Também não há notícia de críticas à expressão as não
no referido dispositivo.
24. Partindo-se de um exemplo como havia dado, pode-se sintetizar a
questão do seguinte modo: a) O encontro de sons na expressão havia
dado não é dos mais agradáveis ao ouvido; b) É certo que dele resulta
uma sonoridade pouco elegante; c) Pode haver, até mesmo, quem
entreveja nesse encontro de sons alusão à homossexualidade; d)
Também indisputável que uma simples alteração de havia por tinha
bastaria para evitar a confusão; e) Em termos de um conceito moderno
do que seja cacófato, porém, não parece haver como condenar seu
redator por esse motivo cacófato.
Ver Alma minha – É cacófato? (P. 106)
Cada
1. Cada é pronome que só se deve usar acompanhado de substantivo, vale
dizer, que só deve ser empregado como pronome adjetivo: cada homem,
cada mulher (MELO, 1970, p. 132 e 279).
2. Na lição de Eduardo Carlos Pereira, configura “um distributivo
invariável, que se une com qual, para formar o pronome cada qual, e
com um na forma composta cada um, que raramente vem acompanhada
de substantivo claro” (1924, p. 315).
3. Evanildo Bechara, por seu lado, reforça que “é condenado o emprego de
cada em lugar de cada um nas referências a nomes expressos
anteriormente” (1974, p. 269).
4. Essa lição, de igual modo, é seguida por Luiz Antônio Sacconi (1979, p.
68). Exs.: a) “Os livros custam dez reais cada” (errado); b) “Os livros
custam dez reais cada um” (correto).
5. Também Cândido de Oliveira – lembrando que sempre se deve dizer
cada um, cada uma – exemplifica que o correto é: “Vendo frango a cem
cruzeiros cada um”; e não: “Vendo frango a cem cruzeiros cada” (s/d, p.
46).
6. De acordo com o ensinamento de Júlio Nogueira (1939, p. 224), dois
aspectos são de significativo relevo para o emprego do vocábulo aqui
considerado: por primeiro, “cada é sempre anteposto ao nome – cada
cousa em seu lugar”; ao depois, “não é correto o emprego de cada em
fim de frase – vendo a dez mil réis cada. Diga-se: cada um, cada par,
cada jogo, cada peça etc”.
7. Lembrando que “cada um é pronome e não se confunde com o adjetivo
cada”, reitera Edmundo Dantès Nascimento que o emprego de cada em
expressões como “Vendeu animais a Cr$ 1.000,00 cada” é erro,
devendo-se dizer cada um, ou usar um nome: “Vendeu a Cr$ 1.000,00
cada animal” (1982, p. 82).
8. Nessa mesma esteira se dá a lição de José de Nicola e Ernani Terra: “O
pronome indefinido cada não deve ser utilizado desacompanhado do
substantivo ou numeral, portanto é incorreto dizer: ‘Os livros custaram
vinte reais cada’; ‘Vendia frangos a dois reais cada’” (2000, p. 52).
9. Para Júlio Nogueira (1959, p. 56), seu uso é galicismo “no fim da frase,
com elipse de outra palavra: a Cr$ 5,00 cada (par, unidade, metro etc.).
É a tradução do chaque, já errôneo em francês, nessa construção. Diga-
se: a Cr$ 5,00 cada um (par, dúzia, jogo etc.)”.
10. Édison de Oliveira (s/d, p. 107) resume a questão em dois aspectos: por
um lado, “o normal é empregar a palavra cada seguida de substantivo”;
por outro, a locução cada um ou cada uma “não deve ser seguida de
substantivo”. Exs.: a) “Haverá um defensor para cada réu”; b)
“Haverá um defensor para cada um”.
11. “Pode referir-se a substantivo no plural, precedido de um numeral,
indicando nesse caso um conjunto, um grupo: cada dez pacotes, cada
cem pessoas” (MELO, 1970, p. 279).
12. Também observando que o pronome indefinido cada pode não apenas
referir-se à unidade num grupo de seres, mas também “a um conjunto
deles”, anota Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 60) que, em tal
caso, o verbo concorda no plural. Ex.: “Cada três livros custavam 60
reais”.
13. Com Sousa e Silva (1958, p. 51), pode-se fazer o seguinte resumo: a)
nunca se usa essa palavra como pronome (“Custa dez cruzeiros cada
um”, e não “Custa dez cruzeiros cada”); b) com o mesmo sentido de
cada um, emprega-se às vezes cada qual; c) é lícito dizer cada dois,
cada três; d) quando o substantivo está no singular, dispensa-se o
numeral, no português moderno (cada livro, cada pena, e não cada um
livro, cada uma pena; porém se diz cada dois livros, cada duas penas).
14. Em termos gramaticais, a combinação cada um ou cada qual vale como
substantivo. Exs: a) “Cada um é senhor de seus atos”; b) “Cada qual
tem o ar que Deus lhe deu” (Machado de Assis).
15. Quanto a concordância verbal, o verbo fica no singular, quando os
núcleos do sujeito vem determinados pelo distributivo cada (GÓIS,
1943, p. 39), até porque os substantivos assim designados normalmente
indicam gradação. Ex.: “Cada era, cada geração, cada povo exprime o
sentimento” (Rui Barbosa).
Cáiser – Existe?
1. Um leitor indaga qual a razão – se é que existe – para que o Dicionário
Aurélio inclua a forma cáiser como nome do imperador da Alemanha,
adaptação essa que não encontrou em outros dicionaristas, como
Michaellis, Caldas Aulete e Figueiredo. E resume: “o sr. Aurélio gosta
de neologismos, ou esse uso tem alguma base racional?”.
2. Veja-se, por primeiro, quanto à etimologia, que, entre os romanos, um
imperador ou príncipe tinha o título de caesar (pronuncia-se césar); na
Rússia, seu equivalente era czar; na Alemanha, kaiser.
3. Uma consulta ao Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa mostra
que nele se registram os três seguintes vocábulos como pertencentes ao
nosso léxico: cáiser, césar e czar (ACADEMIA BRASILEIRA DE
LETRAS, 2009, p. 144, 180 e 239).
4. Ora, a Academia Brasileira de Letras, entidade que edita o VOLP, tem,
por delegação da lei, a incumbência para listar oficialmente as palavras
pertencentes ao nosso idioma, assim como para determinar-lhes a grafia
e fixar-lhes a pronúncia. Desse modo, em termos oficiais, legem
habemus, razão pela qual está autorizado o uso do mencionado
vocábulo.
5. Importante acréscimo se há de fazer: nossos dicionaristas, por mais
respeitados que sejam e por melhores serviços que tenham prestado ao
idioma, não são autoridades oficiais no assunto da consulta. Bem por
isso, se suas lições contrariam o VOLP ou dele divergem, a este (e não
àqueles) se deve prestar obediência, independentemente, até mesmo, de
eventuais incoerências ou imperfeições que se possam apontar nos
critérios por ele seguidos. Vale aqui a observação que se faz acerca da
lei: pode-se, em tese e no plano da Ciência, discuti-la, questionar seus
critérios, sua própria justiça; mas, na prática, incumbe segui-la e prestar-
lhe obediência.
Cais – Qual é seu plural?
Ver Ônibus – Qual é seu plural? (P. 529)
Calcar
1. Consoante lição de Edmundo Dantès Nascimento, “constitui
estrangeirismo o emprego do verbo calcar no sentido de apoiar-se,
basear-se, fundar-se, abordoar, estear-se, fundar-se, firmar, estribar-se,
amparar-se, escorar, arrimar, encostar-se, suster, especar”.
2. Exemplifica tal autor erro dessa natureza, ao referir que se usam, de
modo inadequado, frases como convencimento “calcado no art. 158 do
Código de Processo Civil” (NASCIMENTO, 1982, p. 118).
3. A correção, segundo ele, se faz pela substituição do verbo por um dos
seus mencionados sinônimos: “convencimento apoiado no art. 158 do
Código de Processo Civil”.
Campus
1. Um leitor indaga qual deve ser o plural de campus: os campus ou os
campi?
2. Parta-se do princípio de que campus é palavra de origem latina, vinda até
nós pelo inglês, com o significado de conjunto de edifícios e terrenos de
uma universidade.
3. Um primeiro problema que apresenta esse vocábulo concerne à
acentuação gráfica: se considerado integrante de nosso idioma, leva
acento (câmpus), como os demais paroxítonos terminados em us (como
bônus, ônus e vírus); se, porém, tido como ainda integrante do latim,
então não tem acento, que não existia naquele idioma.
4. Um segundo problema em sua grafia concerne a seu plural: alguns,
independentemente de a considerar ou não palavra de nosso idioma,
querem que se subordine ao critério básico de pluralização do vernáculo,
de modo que, como já termina por s, então se reconhece seu plural pelo
emprego do artigo no plural – o campus (ou o câmpus) e os campus (ou
os câmpus); outros, porém, reputando o vocábulo ainda integrante do
latim, fazem seu plural como no latim (os campi).
5. Para mostrar a divergência que há entre nossos gramáticos nessa matéria,
veja-se, num primeiro sentido, a posição de Domingos Paschoal Cegalla
(1999, p. 63), aconselhando a que se prefira, no singular, a forma
aportuguesada câmpus e que se lhe dê por plural os câmpus, à
semelhança de bônus, ônibus e ônus.
6. Já como exemplo da segunda posição, atente-se às observações de José
de Nicola e Ernani Terra: “sem acento por se tratar de palavra latina. O
plural é campi” (2000, p. 53).
7. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela
Academia Brasileira de Letras, que é o órgão oficial para definir quais os
vocábulos que integram nosso léxico, em edição de 1999, considerava
tal palavra ainda integrando o latim, e a registrava sem acento (campus),
especificando-lhe, por plural, campi (p. 135).
8. Já sua quarta edição (2004) não repetiu a observação da edição anterior,
nem mesmo fez constar a palavra campus, ausência essa que obrigava
concluir que tal vocábulo continuava pertencendo ao latim, e não ao
nosso léxico, de modo que persistiam integralmente as observações já
formuladas.
9. Por fim, em sua edição de 2009, o VOLP voltou a registrar
expressamente tal vocábulo como integrante do latim, mas não lhe
especificou o plural (ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, p. 861).
10. Partindo dessa posição oficial da autoridade máxima do vernáculo para
questões dessa natureza, uma primeira conclusão é que, nos dias atuais,
o vocábulo ainda integra o latim, o que permite, desde logo, extrair
duas observações necessárias: a) não tem acento gráfico, que não existe
no idioma de origem; b) deve a palavra ser grafada entre aspas, em
negrito, itálico, com sublinha ou qualquer outro modo de realce,
indicador de tal circunstância.
11. Quanto ao segundo aspecto da questão, no que concerne ao polêmico e
tormentoso problema da pluralização de palavras e expressões de
outros idiomas, ainda não incorporadas ao vernáculo, desde logo se
observa não haver regramento específico por parte dos órgãos
competentes, e, assim, o que se tenta aqui é solucionar a questão por
um raciocínio cientificamente correto, com o acompanhamento do
bom-senso que deve nortear soluções dessa natureza.
12. Parta-se do princípio de que palavras e expressões de outros idiomas
podem cristalizar-se no vernáculo de maneiras diversas: a) campus veio
na forma do nominativo (caso latino que serve para vestir a função
sintática de sujeito); b) quorum sedimentou-se aqui na forma do
genitivo (caso que serve para exercer a função do antigo complemento
restritivo, hoje adjunto adnominal na maioria dos casos); c) a quo veio
na forma do ablativo por regência da preposição antecedente (caso que
normalmente serve para desempenhar a função sintática de
complemento circunstancial, hoje adjunto adverbial); d) ad quem,
também por regência da preposição antecedente, veio no acusativo
(que normalmente serve para desempenhar a função de objeto direto).
13. E, como não é difícil compreender nem observar, essa cristalização do
vocábulo estrangeiro em nosso idioma e seu emprego em estruturas
sintáticas vernáculas normalmente ocorrem do seguinte modo: a) sem
preocupação de qual seja sua função sintática na oração em português;
b) sem vínculo com a estrutura sintática do latim; c) sem ligação com a
conduta ou a flexão do vocábulo ou expressão no idioma de origem.
14. Em continuação, para melhor didática, considerem-se, em português,
os seguintes exemplos, com a especificação da função sintática da
palavra campus neles empregada: a) “O campus da universidade foi
fechado” (sujeito); b) “Visitei o campus daquela universidade” (objeto
direto); c) “A universidade precisa de um campus mais moderno”
(objeto indireto); d) “O perfil do campus não é o mais adequado para
as necessidades atuais” (adjunto adnominal); e) “Os campus da
universidade foram fechados” (sujeito); f) “Visitei os campus daquelas
universidades” (objeto direto); g) “As universidades precisam de
campus mais modernos” (objeto indireto); h) “O perfil dos campus não
é o mais adequado para as necessidades atuais” (adjunto adnominal).
15. Partindo do princípio de que não se pode pretender flexão pela metade
no idioma de origem, e considerando que, além da variação em gênero
e número para os substantivos, o latim ainda tem a flexão em caso (a
ser determinada pela função sintática que o vocábulo exerce na
oração), forçoso é concluir que, se alguém quer levar o vocábulo
campus para o plural, deve também, por coerência, alterá-lo quanto ao
caso, de acordo com a função sintática que o vocábulo exerce na
oração. E, assim, veja-se o resultado: a) “O campus da universidade foi
fechado” (sujeito); b) “Visitei o campum daquela universidade” (objeto
direto); c) “A universidade precisa de um campo mais moderno”
(objeto indireto); d) “O perfil do campi não é o mais adequado para as
necessidades atuais” (adjunto adnominal); e) “Os campi da
universidade foram fechados” (sujeito); f) “Visitei os campos daquelas
universidades” (objeto direto); g) “As universidades precisam de
campis mais modernos” (objeto indireto); h) “O perfil dos camporum
não é o mais adequado para as necessidades atuais” (adjunto
adnominal).
16. Não é difícil perceber as implicações desse raciocínio: a) um emprego
assim exige do usuário do vernáculo uma informação que ele
normalmente não tem; b) ou seja: exige dele conhecimentos razoáveis
de latim, que já não é ensinado em nossas escolas faz um bom tempo;
c) além disso, a par de não termos o gênero neutro em português,
também não há correspondência absoluta de gênero em ambos os
idiomas; d) isso significa que um vocábulo feminino em latim pode ter
vindo para o masculino em português, e vice-versa.
17. Por isso, com o devido respeito pelos que pensam de modo diverso, a
melhor solução parece obedecer aos seguintes parâmetros para o
emprego de expressões dessa natureza em português: a) as palavras e
expressões latinas não devem ter acentos gráficos, já que estes não
existem na língua de origem; b) devem ser grafadas em itálico, negrito,
com sublinha ou entre aspas, como é usual com respeito aos vocábulos
que integram outros idiomas; c) devem desvincular-se de sua função
sintática de origem para efeito de sua flexão em português, quer quanto
ao gênero (masculino ou feminino), quer quanto ao número (singular
ou plural); d) devem ser empregadas como vieram sedimentadas para o
uso no português, sem variações, adaptações ou tentativas de
acertamento em nosso idioma; e) sua pluralização em português deve
obedecer aos critérios de nosso idioma (normalmente com o acréscimo
de s); f) no caso de campus, como já existe o s no singular, o
reconhecimento do plural se dá pela flexão de outra palavra que se
agrega a tal substantivo (o campus, os campus).
18. Vejam-se, na prática, os exemplos anteriormente postos e a variação
adequada do substantivo observado: a) “O campus da universidade foi
fechado” (sujeito); b) “Visitei o campus daquela universidade” (objeto
direto); c) “A universidade precisa de um campus mais moderno”
(objeto indireto); d) “O perfil do campus não é o mais adequado para
as necessidades atuais” (adjuto adnominal); e) “Os campus da
universidade foram fechados” (sujeito); f) “Visitei os campus daquelas
universidades” (objeto direto); g) “As universidades precisam de
campus mais modernos” (objeto indireto); h) “O perfil dos campus não
é o mais adequado para as necessidades atuais” (adjunto adnominal).
19. Qualquer outra solução – sempre com o devido respeito pelos que
pensam de modo diverso – desrespeita a etimologia, fere os critérios
mínimos científicos e marginaliza o próprio bom-senso, além de tornar
o emprego de vocábulos e expressões dessa natureza, no vernáculo, em
um tormento adicional gravíssimo para o usuário médio do idioma.
Candidatos a
1. Interessante observação registra Luís A. P. Vitória acerca da referida
expressão: “Quando a essa expressão se seguir o nome designativo de
uma profissão, esse nome fica no singular. Ex.: ‘Estão chamando todos
os candidatos a motorista (e não motoristas)’”.
2. E complementa tal autor: “Da mesma forma dir-se-á: ‘Foram todos
promovidos a sargento’; ‘Estes capitães foram todos promovidos a
major’” (VITÓRIA, 1969, p. 47).
3. Também Luciano Correia da Silva observa que “os nomes indicativos
dos cargos ficam no singular: ‘candidatos a vereador’; ‘candidatos a
deputado ou a senador’” (1991, p. 176).
4. Observe-se que, em nenhum exemplo acima, ocorre a crase, por falta de
artigo. O a que antecede o designativo de profissão é tão somente
preposição. Além disso, os nomes que lhe vêm depois são masculinos,
circunstância essa que, por si só, impede a possibilidade de ocorrência da
crase.
Ver Crase – Regras gerais (P. 239).
Caneta-tinteiro
Ver Substantivos compostos – Como levar ao plural? (P. 717)
Capital
1. Este vocábulo é um substantivo que tem uma significação no masculino
e outra no feminino: a) “Para constituir a empresa, o capital não era
suficiente” (o capital-dinheiro); b) “A testemunha deixou a capital e
mudou-se para o interior” (a capital-cidade).
2. Ainda pode ser adjetivo com o significado de essencial, fundamental:
Isto é de capital importância.
Ver Maiúsculas (P. 455).
Captar
1. No que concerne à ortografia das formas de sua conjugação verbal, é
preciso atentar a suas formas rizotônicas, nas quais o radical permanece
o mesmo, em conduta típica de verbo regular que é, sem qualquer
acréscimo de i ou alteração de posicionamento da sílaba tônica
(SACCONI, 1979, p. 21): capto, captas, capta, captamos, captais,
captam (presente do indicativo); capte, captes, capte, captemos, capteis,
captem (presente do subjuntivo)…
2. Mesmo entre as pessoas cultas, há uma tendência equivocada a
introduzir, quer na escrita, quer na pronúncia, uma vogal logo após o t
que encerra o radical, nas formas rizotônicas, pronunciando-se capito,
capitas…
3. Como a ocorrência de formas rizotônicas apenas se dá no presente do
indicativo, presente do subjuntivo, imperativo, afirmativo e imperativo
negativo, a dificuldade apontada não acontece nos demais tempos.
Captar ou Capitar?
1. Há, em Português, um número considerável de palavras que têm grafia e
pronúncia parecidas, mas sentido totalmente diverso uma da outra. São
as palavras parônimas.
2. Para não sair da esfera do Direito, citam-se alguns exemplos: deferir
(conceder) e diferir (diferenciar, postergar); deferimento (anuência,
aprovação) e diferimento (adiamento, prorrogação); delatar (denunciar)
e dilatar (aumentar, prorrogar); eminente (ilustre) e iminente (que está
prestes a acontecer); flagrante (no ato) e fragrante (perfumado); infligir
(aplicar) e infringir (transgredir); ratificar (confirmar) e retificar
(corrigir).
3. Ainda como exemplos de palavras parônimas, citam-se captação (o ato
de obter) e capitação (que significa imposto), substantivos esses de que
derivam os respectivos verbos: captar (que significa apreender) e capitar
(que quer dizer impor capitação ou exigir imposto).
4. Derivada do latim (caput, capitis, que significa cabeça), capitação
constitui forma de tributo cobrada pelo número de cabeças, ou seja, pelo
número de pessoas dependentes de um senhor.
5. No Brasil colonial, a Lei de Capitação, de autoria de Alexandre de
Gusmão, irmão do Padre Bartolomeu de Gusmão, data de 1734/1735 e
foi revogada em 1750/1751. Acrescente-se que, entre os mais de cem
quilombos formados em Minas Gerais entre 1695 e 1790, diversos dos
povoados eram habitados não apenas por negros alforriados e escravos
fugidos, mas também por brancos pobres, que fugiam exatamente do
sistema tributário da capitação. E ainda se diga que, à época de
Tiradentes, a capitação coexistia com o sistema de cobrança de um
quinto do ouro processado nas casas de fundição, que tinha por endereço
os cofres do rei de Portugal.
Caráter ou Caractere?
1. Caráter pode ter diversos significados: a) conjunto de características de
alguém (“Seu caráter agressivo dificulta-lhe os relacionamentos”); b)
qualidade de alguma pessoa (“Ele é alguém de caráter”); c) cunho (“Ele
escreveu uma obra de caráter científico”).
2. Já caractere (é) significa qualquer dígito numérico, letra de alfabeto ou
código de controle (“Ele não conseguiu localizar o processo pela
internet, por falta de um caractere em seu número”).
3. Embora etimologicamente sejam variações de um mesmo vocábulo (do
grego caraktér pelo latim charactere), modernamente se passou a fazer a
distinção, conforme o sentido, sobretudo em decorrência de seu grande
uso advindo do progresso da informática.
4. Corroborando o fato de que essa distinção é recente, vale lembrar antiga
observação de Cândido de Figueiredo a um funcionário de escola que
exigia de seus inspecionados que fizessem sempre a distinção prosódica
entre caráter, para significar feição moral, e caracter (é), para indicar a
letra, obrigando também a distinção no plural – carácteres e caracteres
(é) – consoante as acepções: “Sob a forma de caráter, há apenas um
vocábulo, e as várias acepções de um vocábulo não influem
absolutamente nada na sua prosódia” (1943, p. 244).
5. Pois bem. Nos últimos tempos, tem-se a seguinte situação nas sucessivas
e recentes edições do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa,
publicado pela Academia Brasileira de Letras, que é o órgão
oficialmente incumbido de listar as palavras existentes em português,
bem como sua correta grafia e prosódia: a) em sua segunda edição
(1998), apresentava as formas carácter e caráter, mas não caracter (é)
nem caractere (é), e fazia remissão entre aquelas, como sinônimas,
apontando para ambas o plural caracteres (p. 141-2); b) em sua quarta
edição (2004), eliminou carácter, acrescentou caractere (é), mas indicou
o plural caracteres apenas na última (p. 154-5); c) em sua quinta edição
(2009), já em conformidade com o Acordo Ortográfico de 2008,
manteve exatamente a postura da edição anterior, a saber, não trouxe
caracter (é) nem carácter, e sim caractere e caráter, e apontou o plural
caracteres apenas nesta última (p. 160-1).
6. Ante um tal quadro, a questão pode ser assim sintetizada para os dias de
hoje: a) no singular, há caráter e caractere (é), mas não existem carácter
nem caracter (é); b) o plural de ambas é caracteres (SACCONI, 1979, p.
34.), com o e tônico também com timbre aberto (é), não importando a
acepção que o vocábulo possa ter; c) em caractere e em caracteres, o c é
regularmente pronunciado.
7. Adicionalmente, como interessante observação, vale anotar que o
substantivo composto mau-caráter faz, no plural, maus-caracteres,
como, aliás, registra o VOLP (2009, p. 534), não importando que o som
do vocábulo possa não ser dos melhores (NISKIER, 1992, p. 73).
Cardinal
Ver Números – Como ler e Empregar? (P. 506)
Carecer
1. Ao comentar o Projeto do Código Civil, Rui Barbosa insurgiu-se contra
o emprego de tal verbo na significação de precisar, necessitar, fazendo-o
ao menos quando teve em consideração duas passagens: a) “… sem ficar
privado dos meios de que carecer à sua sustentação” (art. 406, II); b)
“não carece o sócio do concurso dos outros…” (art. 1.388).
2. E ponderou: “É reprovável o uso de carecer toda vez que se não puder
substituir por não ter. Carece-se daquilo que se não tem” (BARBOSA,
1949b, p. 159 e 374).
3. Sua observação acabou sendo acatada pelo legislador, como se observa
da redação definitiva dos arts. 399 e 1.388 do Código Civil: a) “… sem
desfalque do necessário ao seu sustento”; b) “… não necessita o sócio
do concurso dos outros”.
4. Cândido Jucá Filho, também nessa esteira, por um lado, observa que
Mário Barreto “se mostra complacente com o barbarismo condenado,
aliás, por Cândido de Figueiredo”, complementando que tal mestre “cita
exemplos não muito valiosos de Arnaldo Gama”.
5. Em seguida, esclarece tal autor (JUCÁ FILHO, 1981, p. 49) que o
próprio Mário Barreto, porém, em outra obra, “censura uma escritora
patrícia por usar tal barbarismo numa tradução”.
6. Já Vasco Botelho de Amaral anota que, “apesar de um ou outro exemplo
em contrário, é predominante na prosa clássica antiga a acepção de não
ter não possuir”.
7. E, observando que Morais, em seu dicionário, registra o sentido
condenado por alguns, apenas acrescenta que, “evidentemente, não deve
abusar-se de carecer, a ponto de, como acontece hoje em dia, quase se
olvidarem as expressões precisar, ter precisão ou necessidade,
necessitar, haver mister, fazer preciso, etc.” (AMARAL, 1939, p. 15).
8. Francisco Fernandes (1971, p. 136), todavia, aponta para a integral
possibilidade do uso desse verbo nos sentidos apontados, colecionando
excertos de abalizados autores. Exs.: a) “Assim que robustecem, já têm
brios de seu, já do homem não carecem” (Antônio Feliciano de
Castilho); b) “O mais hábil dos homens carecerá sempre de um ‘quid’,
um fluido, alguma coisa” (Machado de Assis); c) “são os pobres os que
mais de vós carecem” (Ernesto Carneiro Ribeiro).
9. Segundo apropriada lição de Laudelino Freire (s/d, p. 35), “nada autoriza
admitir, como quer Cândido de Figueiredo, que carecer na acepção de
precisar é erro, visto que carecer de só se emprega quando pode ser
substituído por não ter. Tal restrição excluem-na a língua erudita e a
vulgar, ficando de pé a sinonímia, ainda reconhecida pela grande
autoridade de Carneiro Ribeiro”.
10. Artur de Almeida Torres (1967, p. 66), após referir o posicionamento
de Rui Barbosa e de Cândido de Figueiredo no sentido de que no
mínimo duvidosa a sinonímia entre carecer e precisar ou necessitar,
aduz lições contrárias de Ernesto Carneiro Ribeiro (que vê em tal
equivalência apenas uma “ampliação do sentido primitivo do
vocábulo”) e de João Ribeiro (para quem “falta e necessidade são
coisas que sempre andam juntas”), para, por fim, concordar, ele
próprio, com tal ensinamento mais abrangente, trazendo a corroboração
de abalizados autores, e isso ora com o emprego da preposição de, ora
sem ela: a) “Careço de ouvir-lhe a decisão final” (Antônio Feliciano de
Castilho); b) “Os manuscritos de Silvestre careciam de serem
adulterados para merecerem a qualificação de romance” (Camilo
Castelo Branco); c) “Carecendo instruir-me, procurei racionalizar o
meu espírito” (Monte Alverne).
11. Em um de seus escritos, João Ribeiro repreendeu, num primeiro
momento, a José de Alencar por haver empregado o verbo carecer na
acepção de precisar; ao depois, suavizou a repreensão, explicando, com
integral aplicação a nossos dias, a modificação semântica: “Como falta
e necessidade são coisas que sempre andam juntas, a translação do
sentido era inevitável” (RIBEIRO apud BARRETO, 1954b, p. 219).
12. Independentemente da polêmica entre os mestres, todavia, parece
aconselhável aceitar um posicionamento mais liberal e extensivo na
atualidade – quer por força da autoridade daqueles que assim pensam,
quer em virtude do uso, que não pode ser marginalizado em casos
desse jaez, quer pelo próprio princípio de que, na dúvida, deve-se
conceder liberdade ao usuário – e isso para ambas as finalidades: a)
para se aceitar o emprego de carecer também com o sentido de precisar
ou necessitar; b) para se darem por corretas suas estruturas como
transitivo direto ou transitivo indireto, construído, assim, tal verbo com
a preposição de, ou sem ela.
13. Acrescenta-se, nessa esteira, a lição de Francisco Fernandes, com
exemplo extraído do próprio Rui Barbosa: “Tendo por complemento
um verbo no infinitivo, pode usar-se com a preposição oculta”. Ex.:
“As companhias de transportes urbanos careciam duplicar os veículos
e as linhas para satisfazer às necessidades da população” (Rui
Barbosa).
14. Em mesmo sentido, a lição do Padre Jose F. Stringari (1961, p. 45-6),
para o qual também se pode dizer carecer algo ou carecer de algo
(sendo o verbo, portanto, assim transitivo direto como transitivo
indireto), assertiva essa para cuja corroboração tal estudioso da
linguagem traz exemplo de Antônio Feliciano de Castilho: “Nas
paredes, … pode o curioso menos instruído ler por cima os primeiros
capítulos da História portuguesa, pois que neles, à semelhança de
quadros, se representam os vários lanços da jornada de Ourique, sem
inscrições; nem as carecem, tanta é a viveza da pintura!”.
Caro
1. É palavra que precisa ser observada quanto a concordância nominal.
2. Se modifica um verbo, tem valor de advérbio e é invariável Exs.: a) “O
terno custou caro”; b) “A roupa custou caro”; c) “Os ternos custaram
caro”; d) “As roupas custaram caro”.
3. Se, porém, modifica um substantivo, tem valor de adjetivo e concorda
com a palavra modificada. Ex.: a) “Um terno caro não sai com
facilidade da prateleira”; b) “Uma roupa cara não sai com facilidade da
prateleira”; c) “Ternos caros não saem com facilidade da prateleira”; d)
“Roupas caras não saem com facilidade da prateleira”.
Ver Bastante – Existe no plural? (P. 156)
Carta Magna
1. Historicamente, Magna Carta (ou Carta Magna) foi um documento
imposto em junho de 1215 pelos nobres ingleses rebelados contra o rei
João Sem Terra, com o intuito de dar um basta aos atos arbitrários reais,
mediante a edição de um corpo de leis a que o rei deveria prestar
obediência. Tinha por alvo distinguir entre realeza e tirania. Significou
um símbolo da soberania e foi de fundamental importância para o
progresso constitucional da Inglaterra e de outros países cujo sistema de
lei e de governo tem base nas convenções inglesas.
2. Por significar a base legal de sustentação do ordenamento de um país, a
expressão passou a abranger, por extensão, o modo como são conhecidas
as diversas constituições em todo o mundo.
3. Em si mesma, a expressão Carta Magna quer apenas dizer diploma
maior ou suprema legislação. Por não se tratar de expressão técnica, seu
uso não se restringe necessariamente às constituições outorgadas, nem se
vincula com exclusividade à lei federal, de modo que não há problema
algum em se dizer, por exemplo, a Carta Magna do Estado de São Paulo,
querendo referir-se à Constituição do Estado de São Paulo.
4. Em termos gramaticais, denominar uma Constituição Federal de Carta
Magna é uma figura de linguagem, mais especificamente uma
antonomásia (espécie de metonímia, que consiste em designar um ser
por um seu atributo notório ou acontecimento a que se ligue).
5. Em razão da precisão técnica que deve ter a linguagem jurídica (Direito
é ciência, não arte), alguns autores criticam o que reputam emprego
desnecessário de figuras de linguagem, apontando que adornos dessa
natureza não significam correção do texto jurídico, mas apenas uma
quebra da rigidez do intelectivo dessa linguagem pelo emocional.
6. Assim, no entender desses autores, seria inconveniente substituir os
termos e as locuções técnicas e precisas de um texto dessa espécie por
sinônimos, a pretexto de evitar repetições. Mais precisamente, um uso
assim incorreria no risco da impropriedade de expressão e mesmo de
descambar para o pernosticismo.
7. Dessa mesma modalidade de equívoco, por exemplo, seria substituir as
expressões técnicas petição inicial (ou inicial) e denúncia por peça
inaugural, exordial, exordial acusatória, vestibular, peça depositária da
pretensão punitiva, peça denunciatória, requisitório ministerial, petição
de intróito, peça preambular, peça incoativa, peça increpatória, peça ovo,
etc.
8. Em termos bem práticos, parecem aconselháveis quatro aspectos: a)
lembrar que o Direito é uma ciência e tem uma linguagem técnica, à qual
sempre se deve procurar ater o usuário, de modo que os termos técnicos
devem ter preferência; b) lembrar que muitas dessas expressões são de
mau gosto (ou não o é peça ovo?) e que a maioria delas não expressa
efetivamente o que se quer dizer; c) observar que um texto cheio de
penduricalhos dessa ordem faz lembrar determinadas mulheres
preparadas para eventos, as quais estão longe de ser consideradas
bonitas, de bom gosto e bem produzidas; d) ter a certeza de que um
projeto de simplificação da linguagem jurídica, com o afastamento
excessivo de determinadas expressões e construções, é um objetivo que
todo usuário deve ter para a vida toda.
9. Com essas observações, não parece de mau gosto referir a Constituição
Federal como Carta Magna; o que se deve evitar é o excesso. Aconselha-
se ao usuário da linguagem jurídica, todavia, fixar, como meta de vida,
um projeto de simplificação de seu texto jurídico e de gradativa
obediência à terminologia técnica.
Carta precatória
Ver Precatória (P. 588).
Casar
1. Quanto a regência verbal, no sentido de unir-se a alguém por casamento,
pede necessariamente a preposição com, mas pode, indiferentemente, ser
pronominal ou não (SILVA, A., 1958, p. 53).
2. Assim, são igualmente corretos os seguintes exemplos: a) “O agente do
crime contra os costumes casou com a vítima, do que decorreu a
extinção de sua punibilidade”; b) “O agente do crime contra os
costumes casou-se com a vítima, do que decorreu a extinção de sua
punibilidade”.
3. Na origem, o emprego de tal verbo dispensava o pronome,
posicionamento esse também preferido pelos autores mais antigos, como
se vê nos provérbios, que são o “arquivo da linguagem castiça e natural”,
nos dizeres de Aires da Mata Machado Filho (1969b, p. 734). Ex.:
“Quem casa, quer casa”.
4. Rui Barbosa, em sua Réplica, faz extensa coletânea de tais brocardos,
sempre com a forma casar.
5. Acrescenta, ainda, Aires da Mata Machado Filho (1969a, p. 647) que,
“embora a segunda variante (uso do verbo pronominal) não mereça
censura, a outra leva a melhor na elegância e na vernaculidade genuína”,
realçando que, em tais casos, mesmo ocorrendo a possibilidade de
empregar verbos com o pronome ou sem ele, “a forma preferível é
sempre a que dispensa o pronome”, e isso porque “supera a concorrente
em elegância e concisão”.
6. Rápida análise de alguns dispositivos do Código Civil de 1916 revela,
por um lado, a predileção do codificador pela forma mais concisa, vale
dizer, sem pronome, bastando conferir os arts. 180, 181, 183, 196, 201,
258, 269 e 276; a par delas, porém, também se apresentam alguns casos
de emprego da forma pronominal, como atestam os arts. 214, 225 e 236.
7. Artur de Almeida Torres (1967, p. 67), após lecionar que, “na acepção
de ligar por meio do casamento, unir, reveste ou não, facultativamente, a
forma pronominal”, lembra que Rui Barbosa “gostava mais de usar o
verbo desacompanhado do pronome, pela superioridade, evidente ao
ouvido, que a sua brevidade lhe dá”, complementando que da mesma
opinião era Cândido de Figueiredo, o qual asseverava de forma taxativa:
“Por mim, dispenso o pronome”.
8. Atente-se a que namorar não lhe segue a regência: não admite
preposição alguma e é transitivo direto.
Casa vinte e um
Ver A folhas vinte e duas – Como é a forma correta? (P. 94)
Cassar ou Caçar?
Ver Caçar ou Cassar? (P. 162)
Castelhanismo
Ver Espanholismo (P. 330).
Catorze ou Quatorze?
1. A forma do numeral cardinal equivalente a um conjunto de uma dezena
de membros mais quatro membros tanto pode ser catorze quanto
quatorze. Exs.: a) “Oito mais seis são catorze”; b) “Seis mais oito
também são quatorze”.
2. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de determinar a
existência dos vocábulos em nosso idioma, além de sua grafia oficial,
registra ambas as formas como corretas (2009, p. 172 e 690).
3. Apenas por questão de uso mais frequente entre nós, observa Édison de
Oliveira (s/d, p. 22) que catorze é a forma preferida no Brasil.
Cavaleiro ou Cavalheiro?
1. Cavaleiro é aquele que cavalga, que anda a cavalo. Ex.: “Naquele
torneio de equitação, o cavaleiro passou por sobre o obstáculo, mas o
cavalo não”.
2. Seu feminino é cavaleira ou amazona.
3. Já sua parônima cavalheiro significa homem cortês, de sentimentos
nobres. Ex.: “As damas eram atendidas antes dos cavalheiros”.
4. Seu feminino é dama.
5. Talvez por reputar tão oportuna a diferenciação, o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
órgão incumbido oficialmente de determinar a existência dos vocábulos
em nosso idioma, além de sua grafia oficial, mesmo contrariamente a seu
proceder de não especificar o sentido das palavras, acaba por apontar de
modo expresso a distinção de sentido entre os vocábulos: cavaleiro é
montador, enquanto cavalheiro é homem bem-educado (2009, p. 173).
Cediço ou Sediço?
1. Um leitor relata haver encontrado, em texto de determinado jurista, a
grafia sediço – e não cediço, como é o costume – com o significado de
corriqueiro, e indaga acerca da maneira correta de escrever o vocábulo.
Acrescenta que um conhecido dicionarista, embora apontando cediço
como forma correta, defendeu também a possibilidade de emprego de
sediço.
2. Observe-se, por primeiro, que não há consenso acerca da origem do
mencionado vocábulo, e há base histórica para afirmar seu étimo com c
ou com s inicial, como bem explica Antônio Houaiss em seu dicionário
(2001, p. 665).
3. Não se esqueça, entretanto, que o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, ordena que se
escreva cediço (2009, p. 160) e não apresenta possibilidade alguma da
grafia sediço.
4. Acresça-se que a Academia Brasileira de Letras é o órgão que detém a
delegação legal para determinar oficialmente a grafia das palavras em
nosso léxico. Sua maneira de entender, assim, é a palavra oficial no
idioma, e, desse modo, descabe toda e qualquer discussão acerca de
outras possibilidades de uso dos mencionados vocábulos na atualidade.
5. Também é oportuno observar que os autores literários, por mais
considerados que sejam, podem eventualmente polemizar a grafia mais
adequada para um vocábulo e até mesmo aportuguesar a seu modo
palavras e expressões estrangeiras. Apesar de instigar a discussão
científica, sua postura, todavia, para nada servirá perante a posição
oficial manifestada pela ABL em seu VOLP. Quando muito, tal conduta
poderá servir para fornecer elementos para futura mudança de postura
por parte da ABL, que poderá, eventualmente, proceder à respectiva
inclusão em edição futura do VOLP.
Cedilha
1. E a forma diminutiva, em português, da forma espanhola ceda, a qual,
nos dizeres de Napoleão Mendes de Almeida, “é hoje representada por
um pequeno c virado para trás, que se sotopõe ao c, que então se
denomina cê cedilhado”.
2. Acrescentava o saudoso gramático que “não se deve dizer cê-cedilha”
(ALMEIDA, 1981, p. 51).
3. A 5ª edição do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado
pela Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de
determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma, além de sua
grafia oficial, no entanto, registra o vocábulo cê-cedilha, assim como cê-
cedilhado (2009, p. 174), motivo pelo qual se autoriza o emprego de
ambas as formas.
4. Importante é observar que apenas se emprega o cê cedilhado antes de a,
o e u (caçar, caçoar, açúcar), jamais antes de e ou de i (cacemos,
cacique), motivo por que, nos verbos da primeira conjugação terminados
em çar, o c perde a cedilha antes do e: abrace, cacemos.
5. Por outro lado, por idêntico motivo, nos verbos da segunda conjugação
terminados em cer, o c recebe cedilha antes de a e de o: mereça,
apareço.
Centigrama
Ver Grama (P. 376).
Certificar
1. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 68) assevera que “a regência
correta é certificar alguém de alguma coisa”, não recomendando tal autor
a regência certificar alguma coisa a alguém.
2. Francisco Fernandes (1971, p. 141), entretanto, em indispensável
monografia sobre o assunto, refere exemplo do Padre Antônio Vieira
exatamente com a estrutura condenada pelo gramático já referido:
“Quando Cristo apareceu a el-rei D. Afonso Henriques, e lhe certificou
que queria fundar e estabelecer nele e na sua descendência um novo
império”.
3. De igual modo, Celso Pedro Luft (1999, p. 113-4) aceita as duas
construções, e observa que certificar alguém de algo é a “sintaxe
originária”, enquanto certificar algo a alguém é a “sintaxe evoluída”.
4. Ante o princípio de que na dúvida se há de conferir liberdade de
emprego ao usuário, é de se seguir a lição de Antonio Henriques e Maria
Margarida de Andrade: quando tiver o sentido de avisar, informar, tornar
certo, o verbo certificar tem dupla construção possível: a) certificar
alguém de alguma coisa; b) certificar alguma coisa a alguém (1999, p.
89). Exs.: a) “O advogado certificou o juiz da impossibilidade de
comparecimento do réu”; b) “O advogado certificou ao juiz a
impossibilidade de comparecimento do réu”.
5. Desse modo, também se dirá, fazendo-se a substituição pelos pronomes:
a) “O advogado certificou-o da impossibilidade de comparecimento do
réu”; b) “O advogado certificou-lhe a impossibilidade de
comparecimento do réu”.
6. Observe-se, contudo, que não são corretas as seguintes estruturas, que
têm ou dois objetos diretos ou dois objetos indiretos: a) “O advogado
certificou o juiz a impossibilidade de comparecimento do réu”; b) “O
advogado certificou ao juiz da impossibilidade de comparecimento do
réu”.
7. Em outras palavras, com tal verbo, tanto a coisa quanto a pessoa podem
ser, indiferentemente, objeto direto ou objeto indireto (SILVA, A., 1958,
p. 53). Reitere-se, todavia, que o que não pode ocorrer é a existência
simultânea, em mesma frase, de dois objetos diretos ou dois objetos
indiretos.
8. Por isso, são corretas as duas construções seguintes: a) “Certificaram ao
Corregedor o fato ocorrido”; b) “Certificaram o Corregedor do fato
ocorrido”. Não são, todavia, corretas as seguintes estruturas: a)
“Certificaram ao Corregedor do fato ocorrido”; b) “Certificaram o
Corregedor o fato ocorrido”.
9. Também seguem a mesma construção os verbos aconselhar, avisar,
participar (no sentido de avisar), prevenir.
Chamar
1. Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 210), muito embora reconheça ser mais
frequente uma construção como “Chamei-o sábio”, observa ser comum
entre os clássicos a construção “Chamei-lhe sábio”.
2. Em realidade, em expressões dessa natureza, quatro são as possibilidades
de construção, todas corretas: a) “Chamei-o sábio”; b) “Chamei-o de
sábio”; c) “Chamei-lhe sábio”; d) “Chamei-lhe de sábio”.
3. Veja-se nesse sentido a lição de Laudelino Freire, para quem, com o
verbo chamar, além de outros, o predicativo pode vir ligado ao verbo por
preposição, como, no caso, de, consoante exemplo dado por ele mesmo:
“Chamei-lhe de fútil” (1937b, p. 52-3).
4. E Francisco Fernandes (1971, p. 142), com o respaldo de significativos
exemplos de autores abalizados, abona as quatro construções: a) “E
gostam… de que os homens os chamem mestres” (Cândido de
Figueiredo); b) “Chamou de ‘esperdiçado’ o idioma” (Rui Barbosa); c)
“Chama-se a isto vista dobrada” (Mário Barreto); d) “No norte do
Brasil chamam ao diabo de cão, o cão do inferno” (João Ribeiro).
5. Celso Pedro Luft (1999, p. 114-5) também defende a quádrupla
possibilidade de regência do verbo chamar nesse sentido, apenas
observando, esteado na autoridade de Antenor Nascentes, que “as formas
com lhe dão a fala um tom lusitano”, ao passo que “genuinamente
brasileiras são as formas com o, a”.
Chance – Galicismo?
1. Durante muito tempo, o vocábulo chance, de uso frequente entre nós, foi
considerado galicismo desnecessário, até porque podia ser perfeitamente
substituído por oportunidade.
2. Exatamente nessa consonância, o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, que é o órgão
oficial para definir quais vocábulos integram nosso léxico, até sua edição
de 1999, registrava-o como pertencente ao idioma francês (1999, p.
161).
3. A partir da edição de 2004 (p. 175), todavia, o VOLP passou a registrar
o vocábulo como incorporado ao português, o que se repetiu em edição
posterior (2009, p. 182), razão pela qual seu uso está perfeita e
oficialmente autorizado entre nós, e não se entremostra possibilidade
alguma de discussão a respeito.
Chantagear ou Chantagiar?
1. Um leitor indaga qual a forma correta: chantagear ou chantagiar?
2. Nunca é demais lembrar que o órgão encarregado de definir oficialmente
o modo de grafar as palavras em nosso idioma é a Academia Brasileira
de Letras, e ela exerce essa autoridade por via da edição do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa.
3. E uma consulta à última edição do VOLP, já posterior ao Acordo
Ortográfico de 2008, revela que nele se registra, como modo correto de
escrever, apenas a forma chantagear, não chantagear (2009, p. 182).
4. É oportuno esclarecer que, como ocorre com os demais verbos
terminados em ear, chantagear recebe um i intermediário nas formas
rizotônicas (ou seja, naquelas em que a sílaba tônica está no radical do
verbo, e não na terminação): chantageio, chantageias, chantageia,
chantageamos, chantageais, chantageiam (presente do indicativo);
chantageie, chantageies, chantageie, chantageemos, chantageeis,
chantageiem (presente do subjuntivo); chantageia, chantageie,
chantageemos, chantageai, chantageiem (imperativo afirmativo);
chantageies, chantageie, chantageemos, chantageeis, chantageiem
(imperativo negativo).
5. Como as formas rizotônicas apenas ocorrem nos tempos já referidos, a
mencionada peculiaridade não se repete nos demais tempos:
chantageava (pretérito imperfeito do indicativo); chantagearei (futuro
do presente do indicativo); chantagearia (futuro do pretérito do
indicativo); chantageei (pretérito perfeito do indicativo); chantageara
(pretérito mais-que-perfeito do indicativo); chantagear (futuro do
subjuntivo); chantageasse (imperfeito do subjuntivo); chantageando
(gerúndio); chantageado (particípio).
6. Acrescenta-se que, em mesmo local do VOLP, se registram outras
palavras com o mesmo radical, de modo que vale a pena transcrevê-las
para observação pelo leitor: chantageação, chantageado, chantageador,
chantageamento, chantageável, chantagem, chantagismo, chantagista,
chantagístico.
7. Uma última observação é importante e se faz necessária: como o VOLP
(editado que é pela ALB) é a palavra oficial em termos de grafia das
palavras em nosso idioma, é a ele que devemos prestar obediência, de
modo que a solução, na dúvida, é consultá-lo.
Chassi – Galicismo?
1. É transliteração do correspondente vocábulo francês, estando a palavra
já integrada a nosso linguajar comum.
2. Significa arcabouço, armação básica, estrutura. Ex.: “Encontrou-se o
chassi do automóvel furtado”.
3. Atente-se a que não se usa a forma chassis no singular. Ex.: “Encontrou-
se o chassis do automóvel furtado” (errado).
4. Forma regularmente seu plural chassis, assim como saci faz sacis.
5. Esta é a síntese de José de Nicola e Ernani Terra: “palavra proveniente
do francês (chassis), já devidamente aportuguesada. O plural é chassis”
(2000, p. 59).
6. Atento a frequência com que ocorre o erro, observa Arnaldo Niskier, de
modo específico, que se deve dizer “o chassi e não o chassis” (1992, p.
20).
7. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela
Academia Brasileira de Letras, órgão oficial para definir quais vocábulos
integram nosso léxico e qual sua possibilidade de flexão, faz constar
chassi como forma já aportuguesada da palavra, mas apenas
esclarecendo tratar-se de substantivo masculino (2009, p. 176).
Chegada
1. É substantivo que, do mesmo modo que o verbo chegar, pede a
preposição a, quando se quer indicar o destino. Ex.: “Fez um belo
discurso quando de sua chegada a São Paulo”.
2. Incorreta é a construção com a preposição em (SILVA, A., 1958, p. 55).
Ex.: “Fez um belo discurso quando de sua chegada em São Paulo”
(errado).
3. Esse é, sem qualquer concessão, o entendimento de Francisco Fernandes
(1969, p. 82) em sua preciosa monografia, em que alinha significativos
exemplos de autores insuspeitos: a) “Sebastião de Melo… aligeirou
quanto pôde a sua chegada a Lisboa” (Camilo Castelo Branco); b) “À
sua chegada a Lisboa, … o Imperador do Brasil não viu a roda de si
senão personagens de caráter oficial” (Fialho de Almeida).
4. É certo que Celso Pedro Luft (1999, p. 96-7) refere que “há também
chegada em algum lugar no português brasileiro”; o próprio autor,
todavia, complementa que tal se dá na fala, motivo por que, para o que
aqui interessa, sua lição nesse sentido não há de ser estendida para os
textos que devam submeter-se à norma culta.
Chegado ou Chego?
1. Chego não é o particípio passado de chegar, mas chegado.
2. É errôneo, assim, seu emprego no seguinte exemplo: “Eles tinham chego
ao fórum com atraso”; sua correção há de ser: “Eles tinham chegado ao
fórum com atraso”.
3. Pasquale Cipro Neto e Ulisses Infante (1999, p. 175) lembram
exatamente esse aspecto, de que tal verbo, na língua culta, apresenta
apenas o particípio passado regular (chegado).
Ver Chegar (P. 179).
Chegar
1. É verbo que possibilita algumas considerações sobre regência verbal.
2. No significado de atingir (lugar para onde se caminha), pede a
preposição a. Ex.: “Chegou ao tribunal para assistir ao julgamento”.
3. Apesar de muito usada, é incorreta, nesses casos, a construção com a
preposição em. Ex.: “Chegou no tribunal para assistir ao julgamento”
(errado).
4. Em preciosa observação para os verbos ir e chegar, assim leciona Júlio
Nogueira: “Existe a tendência viciosa de construir estes verbos com a
preposição em e suas combinações. O certo, porém, é fazê-lo com a
preposição a” (1959, p. 102).
5. Para Sousa e Silva também, chegar em casa “não é regência autorizada”
(1958, p. 55).
6. Atento aos frequentes erros que ocorrem em seu emprego, assim também
observa Luis A. P. Vitória (1969, p. 53): “Este verbo deve ser regido pela
preposição a. Exs.: a) ‘O automóvel chegou à barreira (e não na
barreira)’; b) ‘Chegando à estação, embarquei imediatamente (e não
chegando na estação)’; c) ‘Ela chegou tarde ao teatro (e não no teatro)’;
d) ‘O avião chegou tarde a S. Paulo (e não em S. Paulo)’”.
7. Esse, de igual modo, é o posicionamento de Francisco Fernandes (1971,
p. 143) em conhecida obra.
8. Celso Pedro Luft, por seu lado, aponta os seguintes aspectos: a) “no
Brasil, entretanto, usa-se muito a preposição em”, como, por exemplo,
chegar em casa, e não chegar a casa; b) tal fato é corroborado nos
escritores modernos por pesquisas de Antenor Nascentes, Cândido Jucá
Filho e Luís Carlos Lessa; c) consoante lição de Sílvio Elia, “já se tolera
o chegar em, na língua escrita”; d) mas conclui o próprio Celso Pedro
Luft: “mesmo assim, penso que em texto escrito culto formal melhor se
ajusta o chegar a” (1999, p. 116).
9. Acerca da observância da sintaxe clássica nos textos legais, assim é a
conclusão de Adalberto J. Kaspary: “A regência do verbo chegar com a
preposição a foi a única que encontramos nos textos legais pesquisados,
não nos aparecendo nenhuma com a preposição em” (1996, p. 80).
Ver Chegado ou Chego? (P. 179)
Chego ou Chegado?
Ver Chegado ou Chego? (P. 179)
Cientificar
1. Quanto a regência verbal, Francisco Fernandes (1971, p. 145) apenas
refere exemplos da estrutura cientificar alguém de algo.
2. Celso Pedro Luft, todavia, lembrando exemplo de Napoleão Mendes de
Almeida, observa, a par da sintaxe originária cientificar alguém de algo,
a possibilidade de existência da construção cientificar alguma coisa a
alguém, acrescentando tratar-se de “inovação sintática devida ao traço
semântico comunicar”, que admite tal estrutura.
3. Acrescenta que tal inovação “também atingiu os verbos avisar, certificar
e informar”.
4. E complementa: “em linguagem escrita culta formal, preferível a sintaxe
originária cientificá-lo de…” (LUFT, 1999, p. 119).
5. E Domingos Paschoal Cegalla, além da forma pronominal, que
corresponde a sintaxe cientificar-se de alguma coisa, admite a
possibilidade de ser a pessoa o objeto direto, enquanto a coisa, o objeto
indireto, de modo que há as duas construções possíveis: cientificar
alguém, cientificar alguém de alguma coisa. Exs.: a) “Devemos
cientificá-lo”; b) “Cientifiquei o diretor da minha decisão”.
6. Sem outras explicações, desaconselha ele a construção cientificar algo a
alguém (CEGALLA, 1999, p. 72).
7. Ante a divergência entre os doutos, o melhor é aplicar o vetusto
princípio in dubiis libertas e permitir ao usuário o emprego de qualquer
das sintaxes referidas: a) cientificar-se de alguma coisa; b) cientificar
alguém de algo; c) cientificar alguma coisa a alguém.
Cincoenta ou Cinquenta?
Ver Cinquenta ou Cincoenta? (P. 181)
Cingir
1. Verbo de larga utilização nos meios forenses, em seu sentido mais
comum significa limitar-se, restringir-se. Ex.: “Em sua sustentação oral,
o advogado cingiu-se aos argumentos já constantes dos autos”.
2. Em sua conjugação verbal, apresenta problemas de ortografia.
3. Diferentemente dos verbos cujo radical termina em j – consoante essa
que tem o mesmo som antes de todas as vogais (viajo, viajas, viajemos,
viajeis, viajem) – os verbos terminados em gir, para continuidade do som
da consoante final do radical, precisam da representação gráfica j antes
de a ou de o.
4. Assim: cinjo, cinges, cinge, cingimos, cingis, cingem (presente do
indicativo); cinja, cinjas, cinja, cinjamos, cinjais, cinjam (presente do
subjuntivo); cinge, cinja, cinjamos, cingi, cinjam (imperativo
afirmativo); não cinjas, não cinja, não cinjamos, não cinjais, não cinjam
(imperativo negativo).
5. Segue as mesmas regras de flexão de dirigir.
6. É conjugado em todas as pessoas, tempos e modos.
Cinquenta ou Cincoenta?
1. A forma correta do cardinal equivalente a cinco dezenas é cinquenta (o u
é pronunciado, mas não há trema, o qual foi abolido em tais casos pelo
Acordo Ortográfico de 2009).
2. Porque o u é pronunciado e sem trema, assim também acontece nas
formas derivadas: cinquentão, cinquentenário, cinquentona.
3. Observe-se que cinquenta é a única forma registrada pelo Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de
Letras, órgão oficialmente incumbido de definir quais vocábulos
integram nosso léxico, bem como seu modo correto de grafar (2009, p.
191.).
4. É errônea e inexistente, assim, a forma cincoenta, não havendo motivo
algum para seu emprego na grafia por extenso do referido numeral.
5. Veja-se um exemplo de emprego correto do vocábulo em nossa
legislação: “Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e
sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de
até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade
divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar,
utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o
domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel
urbano ou rural” (CC, art. 1.240-A).
Cinqüenta ou Cinquenta?
Ver Trema (P. 746).
Circuito ou Circuíto?
1. A força da pronúncia incide sobre o u, não sobre o i, e sua divisão
silábica é cir-cui-to (com ditongo), não cir-cu-í-to (com hiato).
2. Reitere-se, assim, que são incorretas a grafia e a pronúncia circuíto
(SACCONI, 1979, p. 18).
3. Não há razão alguma para acento gráfico, de modo que não se há de
grafar circuíto.
4. Idêntica observação pode ser feita para fortuito, gratuito e intuito.
Ver Fluido ou Fluído? (P. 358)
Circularização – Existe?
1. Um leitor, de tanto ver repetida a palavra em correspondência enviada a
sua empresa de advocacia, indaga se existe o termo circularização com o
sentido de relatório de processos para auditoria.
2. Ora, por força da mais que centenária Lei Eduardo Ramos, de n. 726, de
8/12/1900, a autoridade para listar oficialmente os vocábulos existentes
em nosso idioma está com a Academia Brasileira de Letras, e ela o faz
por intermédio da edição do Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, uma lista de tais palavras, com ligeiras especificações de
categoria gramatical, gênero e, muito raramente, de sentido ou outra
observação adicional.
3. No caso da consulta, uma leitura do VOLP revela que existe o vocábulo
circulação, bem como circularidade, mas não se arrola ali a palavra
circularização (2009, p. 192).
4. Como o VOLP – editado que é pela ABL, a qual tem a delegação legal
para listar oficialmente os vocábulos de nosso léxico – não registra
circularização, então só se pode concluir que ele não existe em nosso
idioma, e seu emprego não está, portanto, autorizado.
Citação
1. Em termos de técnica processual, citação é o “ato pelo qual o réu é
chamado a juízo para, querendo, defender-se da ação contra ele
proposta” (SIDOU, 1990, p. 101). Ex.: “Após acurada análise da
petição inicial, determinou o juiz a citação do réu”.
2. Não confundir com intimação ou notificação, atos processuais a ela
assemelhados, mas integralmente diversos em natureza.
3. É comum ver, nos meios forenses, o uso de expressões como procedida
a citação, procedida a intimação, procedido o inventário, procedida a
penhora.
4. A esse respeito, contudo, anota-se que o verbo proceder, dentre seus
significados, tem o sentido de dar início, em que é transitivo indireto,
exigindo a preposição a. Exs.: a) “O magistrado procedeu ao inventário
dos bens deixados pelo falecido”; b) “O juízo procedeu à citação do
réu”.
Ver A fazer – Está correto? (P. 91), Obra com dois autores (P. 512),
Palavras e Expressões latinas (P. 543) e Voz passiva – Quando é possível?
(P. 793)
Citação bibliográfica
Ver Obra com dois autores (P. 512).
Citação de latim
Ver Citar latim é perigoso (P. 183) e Palavras e Expressões latinas (P. 543).
Citação procedida
Ver Citação (P. 182).
Cível ou Civil?
1. De início, importa observar que o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, órgão oficial
para definir quais vocábulos integram nosso léxico, faz o normal registro
de cível e de civil, de modo que ambas as palavras existem oficialmente
em nosso idioma (2009, p. 195).
2. Com a atenção voltada para o primeiro vocábulo, leciona Napoleão
Mendes de Almeida (1981, p. 55-6) que, apesar de gramaticalmente
correta, a palavra cível é mal formada em português, por contrariar as
regras de derivação do latim.
3. Para Antonio Henriques, “forma-se por analogia com os paroxítonos
cultos em ível: crível, horrível, terrível; é, assim, forma divergente”.
4. Ensina tal autor (HENRIQUES, 1999, p. 33), com base em lição de
Franco de Sá, condenatória do vocábulo por barbarismo, que se trata “de
um termo de amplitude maior (do que civil), abrangendo o Direito Civil,
Comercial e Trabalho e distingue-se das ações criminais”.
5. Cândido de Oliveira faz outra distinção entre tais vocábulos: cível é o
“relativo ao Direito Civil”, e civil é o que “diz respeito às relações dos
cidadãos entre si” (1961, p. 33).
6. Nos textos jurídicos e forenses, cível é termo aceito como
gramaticalmente correto, indicador daquilo que respeita ao Direito Civil,
do que se julga estar de acordo com as leis civis: causa cível, juízo cível,
vara cível.
7. Já civil basicamente se emprega em oposição ao que é criminal: processo
civil, ação civil, condenação civil.
8. Também se usa este último vocábulo para distinguir alguém de um
militar, de um religioso, ou mesmo para desvinculá-lo de outrem com
caracteres, condições ou relações peculiares: guerra civil, exército civil,
casamento civil, emprego civil (não oficial, nem público).
9. Na consonância com ensino de Antonio Henriques (1999, p. 33), civil
“prende-se ao latim civilis, da raiz de civis (cidadão)” e “refere-se, pois,
aos cidadãos e ao que se relaciona com eles”, regulando-se “pelo Direito
Civil propriamente dito, excluindo-se o Direito do Trabalho, Direito
Comercial e Penal”.
Clítoris ou Clitóris?
1. Um leitor indaga qual das palavras é a correta, já que ambas são
largamente utilizadas no meio jurídico: clítoris ou clitóris?
2. Ora, sempre é bom lembrar – até para criar no leitor o salutar hábito de
um raciocínio que se repete – que, quando se quer saber se uma palavra
existe ou não em português, deve-se tomar por premissa o fato de que a
autoridade para listar oficialmente os vocábulos pertencentes ao nosso
idioma é a Academia Brasileira de Letras.
3. E essa autoridade, a ABL a exerce por via da edição do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa.
4. E uma simples consulta ao VOLP mostra que nele se registram ambas as
formas: clítoris e clitóris (2009, p. 197).
5. A forçosa conclusão, assim, é que ambas as formas existem em nosso
léxico, e o emprego de ambas está autorizado ao usuário do idioma.
Coação
1. Em sentido vulgar, significa o ato de coagir, constranger, forçar. Ex.: “A
Câmara de Vereadores aprovou a lei sob coação da comunidade”.
2. Em Direito privado, configura vício do consentimento, previsto pelo art.
147, II, do Código Civil de 1916, capaz de tornar anulável o ato jurídico,
podendo, nesse sentido, ser conceituado como “a pressão física ou moral
exercida sobre alguém para induzi-lo à prática de um ato” (MONTEIRO,
1983, p. 200).
3. Em Direito criminal, se irresistível, configura uma das hipóteses de
exclusão da culpabilidade, sendo punível, em tal caso, apenas o autor da
coação (cf. art. 22 do Código Penal).
4. Não se confunda – muito embora tal ocorra com frequência na prática –
com coerção, que implica não o ato de coagir, mas a capacidade de agir,
o poder de agir.
Co-autor ou Coautor?
Ver Co-réu, Corréu ou Coréu? (P. 231)
Coerção
1. Em sentido vulgar, significa o ato de coagir, a repressão.
2. No plano jurídico, porém, é a força que emana da soberania do Estado e
é capaz de impor o respeito a norma legal. Ex.: “Na possibilidade de
aplicar uma pena e que reside a força de coerção da lei”.
3. Não se confunda – apesar de sua intensa ocorrência no sentido vulgar –
com coação, que quer dizer não a capacidade de coagir, não o poder de
coagir, mas o próprio ato de coagir.
Cogitar
1. No âmbito da regência verbal, Sousa e Silva (1958, p. 58) vê como mais
comum a construção desse verbo com a preposição de, mas, fundado em
exemplo de Rui Barbosa, afiança ser igualmente correto o emprego da
preposição em. Exs.: a) “O magistrado ainda não cogitara do assunto”;
b) “A comuna de Paris cogitou em queimar a biblioteca da cidade”.
2. Além dessas duas possibilidades, Francisco Fernandes (1971, p. 150)
também observa seu emprego como verbo intransitivo: “Era assim que
João das Mercês ia cogitando” (Machado de Assis).
3. De igual modo, Celso Pedro Luft (1999, p. 122-3) preconiza a
possibilidade de uso de todas essas sintaxes, acrescentando também a
viabilidade de seu emprego com objeto direto: cogitei, cogitei isso,
cogitei disso, cogitei nisso.
4. Exatamente por admitir sintaxe como transitivo direto, admite
construção na voz passiva: “Delito nunca até agora cogitado” (Antonio
de Morais Silva).
Colação
1. Do latim collatio, de conferre (com o sentido de ajuntar, trazer
conjuntamente), é também conhecida como conferência. Exs.: a) “Só o
valor dos bens doados ou dotados entrará em colação” (CC/1916, art.
1.792, § 2º); b) “Não virão também à colação os gastos ordinários do
ascendente com o descendente” (CC/1916, art. 1.793); c) “As doações
remuneratórias de serviços feitos ao ascendente também não estão
sujeitas à colação” (CC/1916, art. 1.794).
2. No Código Civil de 1916 (arts. 1.785/1.795), indica o ato pelo qual o
herdeiro é obrigado a trazer à massa comum da herança, ou dos bens do
defunto, as doações por este feitas em vida, a fim de concorrer a eles
com os demais herdeiros, em condições de igualdade.
3. Sua finalidade é conferir tratamento igual aos herdeiros, sob o
pressuposto de que o ascendente, ao doar em vida, apenas pretendeu
antecipar ao herdeiro o quinhão que futuramente lhe tocaria na herança
(DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p. 453).
4. Advirta-se, por oportuno, que pode o autor da herança, cumpridos
determinados requisitos, dispensar a colação, se, de modo expresso,
quando da doação, declarar que os bens doados saiam de sua metade
disponível (CC/1916, art. 1.788).
Ver Trazer à colação (P. 746).
Colacionar
1. Muito embora seja vocábulo registrado no Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras (2009, p. 202),
órgão incumbido por lei para determinar quais vocábulos pertencem
oficialmente ao vernáculo, Geraldo Amaral Arruda insurge-se contra o
emprego desse neologismo, por ele reputado rebarbativo e desnecessário
para quem conheça a boa linguagem, “a qual tem recursos legítimos do
verbo conferir e da locução trazer à colação”.
2. E continua tal autor sob um outro aspecto: “O mau uso do neologismo
colacionar provocou um outro equívoco nos que costumam usar palavras
novas sem conferir o seu significado nos dicionários. De fato, tem
havido quem ‘corrija’ esse colacionar para colecionar, e diga que ‘nas
alegações a parte colecionou farta jurisprudência’, em vez de ‘a parte
trouxe à conferência (ou à colação) farta jurisprudência’” (ARRUDA,
1997, p. 82-3).
3. Apesar da objeção do ilustre gramático e jurista citado, o certo é que,
sendo o VOLP o órgão oficial para registro das palavras pertencentes ao
idioma, legem habemus, razão pela qual seu emprego está oficialmente
autorizado. Aliás, nesse sentido, os textos legais e forenses estão cheios
de exemplos conformes à norma culta e, portanto, plenamente
defensáveis.
Colchetes
1. No que concerne à pontuação, e de se anotar que, se se apresenta a
necessidade de emprego interno de parênteses, os parênteses externos
são substituídos por colchetes. Ex.: “A quantia pedida [R$1.000.000,00
(um milhão de reais)] acabou sendo o valor atribuído à causa.”
Colenda Câmara
Ver Adjetivação desnecessária (P. 80) e Egrégio (P. 296).
Coligir
1. Verbo de grande uso nos meios forenses, em seu sentido mais comum
significa reunir em coleção, ajuntar. Ex.: “Em sua sustentação oral, o
advogado coligiu ensinamentos dos melhores doutrinadores”.
2. Em sua conjugação verbal, apresenta problemas de ortografia.
3. Diferentemente dos verbos cujo radical termina em j – consoante essa
que tem o mesmo som antes de qualquer das vogais (viajo, viajas,
viajemos, viajeis, viajem) – os verbos terminados em gir, para
continuidade do som da consoante final do radical, precisam da
representação gráfica j antes de a ou de o.
4. Assim: colijo, coliges, colige, coligimos, coligis, coligem (presente do
indicativo); colija, colijas, colija, colijamos, colijais, colijam (presente
do subjuntivo); colige, colija, colijamos, coligi, colijam (imperativo
afirmativo); não colijas, não colija, não colijamos, não colijais, não
colijam (imperativo negativo).
5. Tais problemas ocorrem apenas no presente do indicativo e nos tempos
daí derivados, de modo que todos os demais tempos e modos são
grafados com g: coligia (imperfeito do indicativo), coligirei (futuro do
presente do indicativo), coligiria (futuro do pretérito do indicativo),
coligi (pretérito perfeito do indicativo), coligira (pretérito mais-que-
perfeito do indicativo), coligisse (imperfeito do subjuntivo), coligir
(futuro do subjuntivo), coligindo (gerúndio), coligido (particípio).
6. Feitas essas observações, é de se ver que coligir é conjugado em todas as
pessoas, tempos e modos.
Colocação de pronomes
1. Expressão também conhecida como topologia pronominal, significa, em
Gramática, o estudo da colocação do pronome pessoal oblíquo átono na
frase, considerado em relação ao verbo.
2. Por ser átono (sem autonomia sonora), tal pronome depende do verbo
por ele completado, cingindo-se a questão a verificar onde a sonoridade
melhor aconselha seu posicionamento.
3. Se o pronome átono vem antes do verbo, diz-se que há próclise. Ex.: “O
advogado não se conteve em audiência”.
4. Se o pronome átono vem no meio do verbo, diz-se que há mesóclise.
Ex.: “Realizar-se-á o júri de acordo com a designação anterior”.
5. Se o pronome átono vem depois do verbo, diz-se que há ênclise. Ex.:
“Conteve-se o advogado apesar das ofensas do causídico adversário”.
6. Porque o emprego desta ou daquela colocação depende da eufonia, há
quem diga, como Antenor Nascentes, que “o uso da próclise e o da
ênclise, isto é, da colocação anterior ao verbo e da posterior, no tocante
aos pronomes pessoais oblíquos, regula-se exclusivamente pelo ouvido”
(1942, p. 152).
7. Fundado em tal posicionamento, assevera, em sequência, o referido
gramático: “Em matéria de colocação de pronomes não há certo nem
errado; há elegante e deselegante” (NASCENTES, 1942, p. 153).
8. Em termos genéricos – até para se ter a real dimensão da divergência
que, nesse assunto, grassa entre os gramáticos, sobretudo pela
diversidade de entonação entre a pronúncia brasileira e a portuguesa para
alguns deles, a posição considerada normal dos pronomes átonos é a
ênclise (depois do verbo), mas J. Mattoso Câmara Jr., em lição transcrita
por Geraldo Amaral Arruda (1997, p. 60), tem opinião diferente, pois
afirma que “o gênio da língua, para o português (do Brasil) não favorece
a ênclise; e a próclise é geral, em princípio”.
Ver Atração pronominal remota (P. 144), Colocação de pronomes e Verbo
no infinitivo (P. 194), Ênclise (P. 317), Mesóclise (P. 471), Próclise (P. 603),
Próclise ou Ênclise? (P. 604), Pronomes e Locuções verbais (P. 617), Se me
não falha a memória ou Se não me falha a memória? (P. 684) e Verbo
seguido de pronome (P. 763).
Color
Ver Sob color de (P. 702).
Colorir
Ver Abolir (P. 55).
Como se lê 83,47%?
1. Há diversas regras importantes e interessantes para a leitura dos
numerais e para sua escrita por extenso, como, por exemplo, a que
determina a interposição da conjunção e entre as centenas e as dezenas e
entre estas e as unidades. Em decorrência dela é que o número 2.662.385
é lido e escrito por extenso do seguinte modo: dois milhões seiscentos e
sessenta e dois mil trezentos e oitenta e cinco.
2. No caso das consultas, o mais lógico é pensar, por primeiro, na
existência de um modo mais conceitual e apurado de dizer e escrever: a)
83,47%: oitenta e três inteiros e quarenta e sete centésimos por cento; b)
0,3%: três décimos por cento.
3. A par desse modo mais clássico, também se posta um outro mais
simples, direto e igualmente correto: a) oitenta e três vírgula quarenta e
sete por cento; b) zero vírgula três por cento.
4. Observe-se, porém, o que, de fato, se dá nesses casos: de cada cem
unidades, estou-me referindo a 83,47 delas no primeiro caso e a três
décimos de unidade no segundo caso. Por isso é que digo o número e
acrescento a expressão por cento. Vê-se, porém, com facilidade, que não
faz sentido substituir tal expressão pelo adjetivo percentual, o qual
serviria para dar uma qualidade e não para indicar que os números
referidos são extraídos de um lote de cem unidades.
5. Observe-se, por fim, que, obedecidas certas regras mínimas de correção,
não parece adequado entender que as normas de Gramática devam vir
para atrapalhar as questões e o próprio viver quotidiano, e sim, muito
mais, para ordenar o modo de escrever e falar, a fim de que a escrita e a
fala sejam efetivos instrumentos para transmissão das ideias
Companhia ou Compania?
1. Observa Silveira Bueno que “tanto a pronúncia compania quanto a
maneira de escrever compania sem h são inteiramente erradas” (1938, p.
57).
2. De igual modo, lembra Luiz Antônio Sacconi que, para a pronúncia de
tal palavra, “o nh soa” (1979, p. 18).
3. Pense-se nos cognatos acompanhar, companha, companheiro, e se
acertará, no caso, a pronúncia do dígrafo nh, tal como em grunhir e
renhido.
4. A razão do erro de pronúncia, em tal caso, parece ser o julgamento
equivocado das pessoas no sentido de que teria havido a supressão do h
na ortografia oficial, o que efetivamente não se dá, já que o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de
Letras, órgão oficial para definir quais vocábulos integram nosso léxico
e qual sua efetiva grafia, fez constar em seu rol apenas companhia, e não
compania (2009, p. 206).
5. E Júlio Nogueira (1959, p. 25), de modo técnico, registra, “nas classes
mais ignorantes”, a ocorrência desse erro de pronunciar essa palavra
“sem a palatização, quando tem de ser feita”.
6. Apesar da restrição do equívoco a um restrito número de usuários, feita
pelo referido gramático, o certo é que hoje parece tal equívoco de
pronúncia abranger um número muito maior de pessoas, não apenas nas
“classes mais ignorantes”.
Comparar
1. No que concerne à regência verbal, Mário Barreto (1954a, p. 316)
leciona que tal verbo pode ser construído tanto com a preposição a
quanto com a preposição com: a) “Neste sentido, o nosso idioma pode
comparar-se ao hebraico” (Camilo Castelo Branco); b) “Mas também se
diz comparar uma pessoa com outra”.
2. Celso Pedro Luft (1999, p. 127) concorda com a dupla possibilidade de
regência: a) comparar alguma coisa (ou alguém) a outra; b) comparar
alguma coisa (ou alguém) com outra.
3. Francisco Fernandes (1971, p. 154), por seu lado, não apenas admite as
construções referidas, mas adiciona a possibilidade da estrutura
“comparar alguma coisa (ou pessoa) e outra”, arrolando significativo
exemplo: “Vigília comparava a águia e o pavão, e elegeu a águia”
(Machado de Assis).
4. Atentando-se ao vetusto brocardo que confere liberdade de uso quando
os gramáticos divergem, é de se concluir que viável é o emprego de
qualquer das construções, vale dizer, com as preposições a ou com e com
a conjunção e.
Comparecer
1. Quanto à regência verbal, anota Domingos Paschoal Cegalla (1999, p.
79) que “o termo complementar do verbo comparecer é regido de uma
das preposições: a, em, ante e perante”, especificando tal autor: a) “usa-
se a preposição a antes de substantivos abstratos: comparecer a uma
reunião, a um encontro, às aulas, às sessões, etc.”; b) “a preposição em é
mais adequada antes de substantivos concretos (nomes de lugares):
comparecer no escritório, na escola, na secretaria”; c) “antes de tribunal
(órgão judicial) e de nomes de autoridades, empregar-se-á ante ou
perante: comparecer ante (ou perante) um tribunal; comparecer perante
o rei, o juiz, etc.”.
2. No que tange a seu emprego nos textos legais, Adalberto J. Kaspary,
após acurada pesquisa, observa que, se vem tal verbo seguido da palavra
juízo, o comum é que se construa com a preposição em. Exs.: a) “Além
dos deveres enumerados no art. 14, compete à parte: I – comparecer em
juízo, respondendo ao que lhe for interrogado” (CPC/1973, art. 340, I);
b) “O juiz, ao deferir o requerimento, ordenará a intimação do
interessado para comparecer em juízo, a fim de ser interrogado” (CPP,
art. 551).
3. Se, contudo, tal verbo não vem seguido pela palavra juízo, a regência
habitual é comparecer a. Exs.: a) “O réu será citado para comparecer à
audiência, que não se realizara em prazo inferior a dez (10) dias
contados da citação” (CPC/1973, art. 278); b) “Nenhum desconto será
feito nos vencimentos do jurado sorteado que comparecer às sessões do
júri” (CPP, art. 430).
4. O mesmo autor, todavia, localizou na legislação exemplos da sintaxe
comparecer em, muito embora não sendo tal verbo seguido da palavra
juízo. Exs.: a) “(Os presidentes das entidades sindicais)…
comparecerão nos locais onde se tornar necessária a sua presença”
(CLT, art. 282); b) “O réu não é obrigado a comparecer no
julgamento…” (CPP português, art. 547º); c) “Se o réu não comparecer
na audiência de julgamento…” (CPP português, art. 548º).
5. Também há, em textos legais, exemplos da construção comparecer
perante (KASPARY, 1996, p. 85/87). Exs.: a) “O interditando será
citado para, em dia designado, comparecer perante o juiz…”
(CPC/1973, art. 1.181); b) “… poderá o empregado comparecer,
pessoalmente ou por intermédio de seu sindicato, perante a Delegacia
Regional ou órgão autorizado, para apresentar reclamação” (CLT, art.
36).
Ver Comparecimento (P. 201).
Comparecimento
1. Quanto à exigência de complementação desse substantivo, Celso Pedro
Luft (1999, p. 105) vê as possibilidades de construção com a e com em.
2. Esse também é o entendimento de Francisco Fernandes (1969, p. 91).
3. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 79), por seu lado, anota que o
substantivo comparecimento “segue as regências do verbo comparecer”,
o que significa que seu complemento “é regido de uma das preposições
a, em, ante e perante”, com as seguintes especificações: a) “usa-se a
preposição a antes de substantivos abstratos: comparecimento a uma
reunião, a um encontro, às aulas, às sessões, etc.”; b) “a preposição em é
mais adequada antes de substantivos concretos (nomes de lugares):
comparecimento no escritório, na escola, na secretaria”; c) “antes de
tribunal (órgão judicial) e de nomes de autoridades, empregar-se-á ante
ou perante: comparecimento ante (ou perante) um tribunal;
comparecimento perante o rei, o juiz, etc.”.
4. A lição do gramático por último referido para o verbo comparecer,
todavia, no que tange às distinções e a especificação de uso, é
desmentida pelo próprio uso nos textos forenses.
5. Assim, parece mais adequado não proceder as distinções que ele faz,
aceitando apenas a ampliação das possibilidades de sintaxe para
construção com as preposições ante e perante.
Ver Comparecer (P. 200).
Compelir
1. Significando coagir, forçar, obrigar, quanto à conjugação verbal, é verbo
irregular, aparecendo um i na primeira pessoa do presente do indicativo e
nos tempos dela derivados: compilo, compeles, compele, compelimos,
compelis, compelem (presente do indicativo); compila, compilas,
compila, compilamos, compilais, compilam (presente do subjuntivo);
compele, compila, compilamos, compeli, compilam (imperativo
afirmativo); não compilas, não compila, não compilamos, não
compilais, não compilam (imperativo negativo).
2. Não apresenta problemas ou irregularidades nos demais tempos e
modos, nos quais sempre aparece um e, jamais um i: compelia
(imperfeito do indicativo), compelirei (futuro do presente), compeliria
(futuro do pretérito), compeli (pretérito perfeito), compelira (pretérito
mais-que-perfeito), compelir (futuro do subjuntivo), compelisse
(imperfeito do subjuntivo), compelindo (gerúndio), compelido
(particípio).
3. Na observação de José de Nicola e Ernani Terra, “o e do radical muda
para i na primeira pessoa do singular do presente do indicativo e nas
formas daí derivadas” (2000, p. 20).
4. Não confundir, em certas formas, com a conjugação do verbo compilar,
que tem o sentido de coligir, reunir.
Competente
1. Em crítica ao art. 110 do Projeto do Código Civil – onde se inseria a
expressão “representantes competentes do poder público” – Rui Barbosa
(1949, p. 64) sugeriu a supressão do adjetivo com a seguinte observação:
“Que aproveita o adjetivo competentes? Sem competência para
representar, ninguém juridicamente representa”.
2. Sua sugestão foi acatada pelo legislador, que suprimiu o mencionado
adjetivo, como se nota na redação definitiva do art. 105 do Código Civil
de 1916: “representantes do poder público”.
3. Geraldo Amaral Arruda (1997, p. 11) também vê como “modelo de
superfluidade” o emprego do adjetivo em expressões como competente
mandado ou competente formal de partilha, acrescentando ser melhor
“determinar a natureza do mandado (mandado de averbação, mandado
de retificação etc.)”.
4. Anote-se, todavia, que o Dicionário da Melhoramentos, seguido nesse
passo por Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, entre os significados do
vocábulo, arrola próprio, adequado, respectivo (Encyclopaedia
Britannica do Brasil, 1995, p. 455).
5. No caso apontado por Rui Barbosa, por um lado, poder-se-ia até mesmo
reputar desnecessário o adjetivo; mas, por outro lado, seria de se indagar
se o sentido intentado pelo Projeto do Código Civil não era exatamente o
outro apontado pelos dicionaristas, vale dizer, a significação de
respectivo.
6. Atente-se a que Gladstone Chaves de Melo (1970, p. 265), em passagem
de seus ensinamentos gramaticais, acaba por empregar o adjetivo na
última acepção, corroborando, assim, esse último entendimento: “É
bastante frequente na língua literária repetir-se, por meio do pronome
pessoal competente, preposicionado ou não, o objeto direto ou indireto
da frase”.
7. De Josué Machado também se pode alinhar significativo exemplo:
“Quando a pausa coincide com o final da expressão ou sentença que se
acha entre aspas, coloca-se o competente sinal de pontuação depois
delas, se encerram apenas uma parte da proposição; quando, porém, as
aspas abrangem todo o período, sentença, frase ou expressão, a
respectiva notação fica abrangida por elas” (1994, p. 66).
8. Ainda do próprio Rui Barbosa vem outro exemplo, anotado por
Francisco Fernandes (1971, p. 107): “A renúncia ao direito de alegar a
nulidade por meio dos recursos ou ações competentes atenta contra a
ordem pública”.
9. Em resumo, não parece ter maior fundamento a condenação de uso do
indigitado vocábulo em tais circunstâncias.
10. Nos textos de lei, encontramos, por vezes, o emprego do referido
vocábulo na acepção de respectivo, como se vê do art. 61, § 2º, da Lei
4.380, de 21/8/64, que regulamentou diversos aspectos dos contratos
imobiliários: “As escrituras no entanto consignarão obrigatoriamente
que as partes contratantes adotam e se comprometem a cumprir as
cláusulas termos e condições a que se refere o parágrafo anterior
sempre transcritas verbo ad verbum (o texto original traz,
erroneamente, verbum ad verbum) no respectivo cartório ou oficio
mencionado inclusive o número do livro e das folhas do competente
registro”.
11. O art. 32, caput, da Lei 4.591, de 16/12/64 (que dispõe sobre o
condomínio em edificações e incorporações imobiliárias), ao referir as
obrigações e os direitos do incorporados, também assim registra: “o
incorporador somente poderá negociar sobre unidades autônomas
após ter arquivado, no cartório competente de Registro de Imóveis, os
seguintes documentos…”
Compilar
1. Tem o sentido de coligir, reunir. Ex.: “O advogado compilou acórdãos
de todo o país, contrários àquela decisão”.
2. É verbo regular, devendo-se, para sua flexão, apenas acrescentar ao
radical compil as terminações próprias de um modelo da primeira
conjugação, como, por exemplo, amar.
3. Assim: compilo, compilas (presente do indicativo), compile (presente do
subjuntivo), compilei (pretérito perfeito), compilara (pretérito mais-que-
perfeito), compilar (futuro do subjuntivo), compilasse (imperfeito do
subjuntivo), compilava (imperfeito do indicativo), compilarei (futuro do
presente), compilaria (futuro do pretérito), compilando (gerúndio),
compilado (particípio).
4. As observações a seu respeito se fazem mais necessárias, para que não se
confundam certas formas com a conjugação do verbo compelir, que tem
o sentido de coagir, forçar, obrigar.
Comprimento ou Cumprimento?
1. Comprimento significa grandeza, tamanho, dimensão longitudinal de um
objeto, extensão de uma linha. Exs.: a) “O comprimento do tapete da
sala de audiências é assustador”; b) “As disposições deste artigo não
abrangem as aberturas para luz ou ventilação, não maiores de dez
centímetros de largura sobre vinte de comprimento e construídas a mais
de dois metros de altura de cada piso” (CC, art. 1.301, § 2º).
2. Já sua parônima cumprimento quer dizer gesto ou expressão, que se fala
ou escreve, como saudação ou cortesia, ou mesmo o ato de cumprir.
Exs.: a) “Em cerimonioso cumprimento, o advogado estendeu a mão ao
juiz”; b) “Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de
fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou,
se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o
resultado prático equivalente ao do adimplemento” (CPC/1973, art. 461,
caput).
3. Vejam-se alguns exemplos de emprego do vocábulo cumprimento em
nossa legislação: a) “Cada um dos credores solidários tem direito a
exigir do devedor o cumprimento da prestação por inteiro” (CC, art.
267); b) “O que estipula em favor de terceiro pode exigir o cumprimento
da obrigação” (CC, art. 436, caput); c) “É irrevogável o mandato que
contenha poderes de cumprimento ou confirmação de negócios
encetados, aos quais se ache vinculado” (CC, art. 686, parágrafo único);
d) “Considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de
dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em
cumprimento de ordens ou instruções suas” (CC, art. 1.198, caput); e)
“No silêncio do testamento, o cumprimento dos legados incumbe aos
herdeiros e, não os havendo, aos legatários, na proporção do que
herdaram” (CC, art. 1.934, caput); f) “As ações em que o ausente for réu
correm no foro de seu último domicílio, que é também o competente
para a arrecadação, o inventário, a partilha e o cumprimento de
disposições testamentárias” (CPC/1973, art. 97); g) “A carta tem caráter
itinerante; antes ou depois de lhe ser ordenado o cumprimento, poderá
ser apresentada a juízo diverso do que dela consta, a fim de se praticar
o ato” (CPC/1973, art. 204).
4. Não havendo discussões entre os gramáticos no que tange à distinção
entre tais vocábulos, anote-se, para significativo registro, com Júlio
Nogueira, que essa diferenciação constitui “distinção meramente
convencional, sem base etimológica” (1959, p. 33).
5. Melhor explicitando: a uma indagação que lhe era feita acerca da
diferença entre tais palavras, respondia Cândido de Figueiredo que “as
duas formas têm ambas a mesma origem. Veja o latim complere. Mas,
como há sempre conveniência em evitar homografias, adotou-se a forma
comprimento para designar a qualidade daquilo que é comprido; e
cumprimento, para designar o ato de cumprir qualquer preceito, qualquer
dever” (1948, p. 27-8).
6. De qualquer modo, não se pode deixar de ter em mente que o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira
de Letras, órgão incumbido oficialmente de determinar a existência dos
vocábulos em nosso idioma, além de sua grafia oficial, o qual
normalmente não traz o significado das palavras, faz questão de, no
caso, distinguir claramente: a comprimento confere o significado de
extensão; a cumprimento atribui o sentido de execução (2009, p. 207 e
236).
7. Dessa distinção oficial do VOLP decorre a certeza da necessidade de se
proceder obrigatoriamente à mencionada distinção nos dias atuais.
Computar
1. Domingos Paschoal Cegalla considera-o verbo defectivo, preconizando
que não seja ele conjugado nas “três pessoas do singular do presente do
indicativo” nem, por consequência de derivação, “na segunda pessoa do
singular do imperativo afirmativo” (1999, p. 80).
2. Otelo Reis (1971, p. 76) partilha do mesmo entendimento quanto à
defectividade nas referidas pessoas.
3. Tais autores, evidentemente, são levados a tal posicionamento por
questões de eufonia, para evitar um lembrete sonoro de prostituta, tanto
que ambos referem que os verbos disputar, imputar e reputar são
conjugados em todas as pessoas.
4. Razões de eufonia, entretanto, não devem ser acatadas, no caso, para
vedar- lhe a conjugação nas pessoas referidas, ausência de conjugação
essa que teria por supedâneo uma equivocada tentativa de ver um
cacófato inexistente, ante a evidente e fácil distinção a ser feita na
própria fala.
5. Se assim não se pensar, também o verbo disputar haveria de entrar no rol
de tal defectividade, já que, conforme anedota antiga dos tempos da
ditadura, em momento de descontração, em que os palacianos tentavam
formar uma mesa de jogo, alguém teria indagado ao Presidente da
República da época, conhecido por sua cultura não muito extensa: “O
senhor disputa, Presidente?”. E ele teria respondido: “Digo. E digo
palavrões muito piores, se os senhores insistirem!”
6. Em sequência de sua lição, lembra Otelo Reis que se encontra em alguns
livros que o verbo computar “faz cômputo, cômputas, etc. (com acento
tônico na primeira), o que não é verdade. O substantivo é que se
pronuncia cômputo” (1971, p. 77).
7. Em prol de sua conjugação integral, é de se anotar que os escritores
clássicos não ostentavam repulsa alguma ao emprego das formas
condenadas pelos gramáticos referidos, como se pode observar em
significativos excertos: a) “Oh! Em Corinto computa-os por legiões”
(Antônio Feliciano de Castilho); b) “Em uma carta ao rei o Duque de
Alba computa em oitocentas cabeças o número das execuções…”
(Ramalho Ortigão).
Com reserva ou Com reservas?
1. Quando empregada a expressão com o verbo substabelecer, é giro
errôneo no plural, devendo permanecer no singular. Exs.: a) “O
advogado firmou o substabelecimento com reserva de poderes”
(correto); b) “O advogado firmou o substabelecimento com reservas de
poderes” (errado).
2. O máximo que se pode entender com o plural é o caso de o advogado
substabelecente fazer restrições à conduta ou ao saber jurídico do novo
patrono: “Em se tratando daquele advogado a quem iria transferir a
condução da causa, o patrono originário substabeleceu com reservas”.
Ver Substabelecer (P. 716).
Comum de dois
1. Ou comum de dois gêneros, é o substantivo que tem uma só forma para
o masculino e para o feminino, fazendo-se a distinção pelo artigo que o
precede ou por outro determinativo acompanhante. Exs.: virtuoso
artista, virtuosa artista, o selvagem, a selvagem.
2. Para Eduardo Carlos Pereira, “é o apelativo, que, com uma só forma,
admite os dois gêneros gramaticais, determinados respectivamente pelo
sexo que se quer indicar” (1924, p. 68).
3. Nas palavras de Cândido de Oliveira, é o “substantivo que tem uma
única forma para ambos os gêneros, e a distinção é feita com a variação
do artigo, adjetivo ou pronome” (1961, p. 132).
4. Não confundir com o epiceno, que é o substantivo de um só gênero, em
que a distinção dos sexos se faz pelo acréscimo dos adjetivos macho e
fêmeo (cobra macha, jacaré fêmeo).
5. Também se faça a distinção do sobrecomum, que é o substantivo de um
só gênero, relativo a seres de ambos os sexos, sem distinção por artigo
ou por acréscimo de determinativo acompanhante (a criança, o
indivíduo, a testemunha).
Ver Macho – Qual o feminino? (P. 451) e Poeta – Qual o feminino? (P. 570)
Comunicar
1. No que tange à regência verbal, lembra Geraldo Arruda que esse verbo
“pede objeto direto de coisa e objeto indireto de pessoa”, razão por que
sintetiza: “Comunicar algo a alguém”.
2. Lembrando em seguida o próprio princípio que norteia a possibilidade
de flexão de exemplos para a voz passiva (segundo o qual o objeto direto
da voz ativa passa a ser sujeito na voz passiva), continua tal autor: “Com
o verbo comunicar ocorre que o objeto direto (de coisa) pode ser
transformado em sujeito; mas o mesmo não ocorre com o objeto
indireto, que deverá sempre continuar como objeto indireto”. Exs.: a)
“Quando o finado for estrangeiro, será também comunicado o fato à
autoridade consular” (CPC/1973, art. 1.152, § 2º); b) “Não sendo
encontrada a pessoa ou coisa procurada, os motivos da diligência serão
comunicados a quem tiver sofrido a busca” (CPP, art. 247); c) “…
documento que não tiver sido comunicado à parte contrária…” (CPP,
art. 475).
3. Por fim, observa o atento autor que um equívoco vem sendo cometido
com esse verbo (ARRUDA, 1997, p. 54-5): “Andam pondo o verbo
comunicar na voz passiva com o objeto indireto de pessoa transformado
em sujeito”. Exs.: a) “Os interessados foram comunicados da notícia”
(errado); b) “A notícia foi comunicada aos interessados” (correto).
4. Em mesma esteira, anota Arnaldo Niskier que a pessoa não pode ser o
objeto direto, motivo pelo qual “você pode comunicar algo a alguém,
mas é incorreto dizer ele comunicou o delegado…” (1992, p. 104).
5. Também Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 81) lembra que “a
construção correta é comunicar alguma coisa a alguém”, e que é
incorreta qualquer construção que torne a pessoa o objeto direto.
6. Os textos legais evidenciam a exata obediência a tais ditames da
Gramática: alguém comunica alguma coisa a alguém. Exs.: a) “Se a
aceitação, por circunstância imprevista, chegar tarde ao conhecimento
do proponente, este comunicá-lo-á imediatamente ao aceitante…”
(CC/1916, art. 1.082); b) “Passada em julgado a sentença, a que se
refere o parágrafo anterior o escrivão comunicará ao réu o resultado do
julgamento” (CPC/1973, art. 219, § 6º); c) “Qualquer funcionário
público federal, estadual ou municipal, ou representante legal de
associação sindical, poderá comunicar à autoridade competente do
Ministério do Trabalho as infrações que verificar” (CLT, art. 631); d) “O
piloto, quando julgar necessário mudar de rumo, comunicará ao capitão
as razões que assim o exigem…” (C. Com., art. 539).
7. Pela própria estruturação de passagem do exemplo da voz ativa para a
voz passiva, o objeto direto da primeira será o sujeito da segunda: Ex.:
“Na vigência do estado de defesa. I – a prisão por crime contra o
Estado, determinada pelo executor da medida, será por este comunicada
imediatamente ao juiz competente…” (CF/1988, art. 136, § 3º, 1).
Conceber – Galicismo?
1. Mário Barreto reprova, por galicismo, o emprego desse verbo no sentido
de expressar, assim doutrinando: “Com razão tacham os puristas de
afrancesada a aplicação do verbo conceber para denotar a forma com que
se expressa o conceito, ou seja, quando se emprega em vez de escrever,
redigir, expressar etc. Não se pode negar ser mui diferente o conceber
do expressar o conceito”.
2. E transcreve tal autor exemplo da “censurada acepção” encontrado em
Camilo Castelo Branco, “quando traduz irreflexivamente do francês” a
obra O Romance de um Rapaz Pobre: “… enquanto eu decifrava com
dificuldade as linhas tortuosas da carta, concebida nos seguintes
termos…” (BARRETO, 1955, p. 21-3).
3. Francisco Fernandes também observa que, “em construções como ‘Um
bilhete concebido nestes ou parecidos termos’, significando redigir,
expressar, o emprego do verbo conceber é considerado galicismo”
(1971, p. 156).
4. Este verbo ainda pode produzir um curioso cacófato: “Estes argumentos,
como os concebo, são irrefutáveis.”
Concernir
1. Lembra Domingos Paschoal Cegalla que tal verbo “segue a conjugação
de aderir” (1999, p. 81).
2. Também para Adalberto J. Kaspary, ele “flexiona-se como aderir; o e do
radical muda-se em i na primeira pessoa do singular do presente do
indicativo e derivados” (1996, p. 94).
3. Em termos práticos, assim fica a flexão dos referidos tempos: concirno,
concernes, concerne, concernímos, concernis, concernem (presente do
indicativo); concirna, concirnas, concirna, concirnamos, concirnais,
concirnam (presente do subjuntivo); concerne, concirna, concirnamos,
concerni, concirnam (imperativo afirmativo); não concirnas, não
concirna, não concirnamos, não concirnais, não concirnam (imperativo
negativo).
4. Não apresenta problemas ou irregularidades em outros tempos, em que é
verbo regular: concerni (pretérito perfeito), concernira (pretérito mais-
que-perfeito), concernir (futuro do subjuntivo), concernisse (futuro do
subjuntivo), concernia (imperfeito do indicativo), concernirei (futuro do
presente), concerniria (futuro do pretérito), concernindo (gerúndio),
concernido (particípio).
5. Por outro lado, atente-se à observação de Otelo Reis, que o conjuga
normalmente em todas as pessoas, tempos e modos, muito embora
complemente ser ele “quase exclusivamente usado nas terceiras pessoas”
(1971, p. 136).
6. Em posição um pouco diversa, não se olvide a lição de Celso Cunha
(1970, p. 214) no sentido de que tal verbo é desusado no particípio e,
consequentemente, nos tempos compostos.
7. Seu normal sentido é dizer respeito a, referir-se a, ter relação com. Exs.:
a) “Esta admoestação não lhe concerne, mas a seu colega”; b) “No que
concerne aos estudos, a situação não é muito boa”.
Concertar ou Consertar?
1. Indaga-se se existe equívoco na frase: “… concertando o que deve ser
concertado (p. ex. crédito imobiliário), mas sem aumentar impostos”.
Ou seja: seria concertando e concertado, ou consertando e consertado?
Em resumo: a) existem as formas concertar e consertar?; b) em caso
positivo, qual a diferença entre ambas?
2. Em termos históricos, lembra-se que concertar vem do latim concertare,
ou certare, que originalmente tinha a ideia de lutar, mas com vistas a pôr
em alguma ordem, enquanto em consertar residia com clareza a ideia de
restaurar, de reparar.
3. Apesar dessa clara diferença de significado na origem, passou a não
haver, no evolver de nosso idioma, distinção entre tais vocábulos, e essa
situação perdurou até 1913, quando se publicou a segunda edição do
dicionário de Cândido de Figueiredo (FIGUEIREDO apud HOUAISS;
VILLAR, 2001, p. 785).
4. Na atualidade, entretanto, o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras ordena que se
escreva concertar, quando se quer o significado de harmonizar, e se use
consertar, quando se pretende o conteúdo semântico de restaurar, de
reparar (2009, p. 208 e 212). Essa distinção se espraia para todos os
vocábulos pertencentes às respectivas famílias etimológicas:
concertabilidade e consertabilidade, concertado e consertado,
concertador e consertador, concertamento e consertamento, concertante
e consertante, concertável e consertável, concerto e conserto.
5. Vale a pena observar que a Academia Brasileira de Letras é o órgão que
detém a incumbência da lei para determinar oficialmente a grafia das
palavras em nosso léxico, de modo que sua maneira de entender é a
palavra oficial no idioma. Por isso descabe toda e qualquer discussão
acerca de outras propostas de uso dos mencionados vocábulos na
atualidade.
6. Com essas considerações, vejam-se as grafias corretas em exemplos
práticos: a) “Ouvi um esplêndido concerto de violões”; b) “O conserto
desse sapato é simplesmente inviável, ante seu estado de deterioração”.
7. Anote-se, adicionalmente, que, em determinadas situações, um mesmo
exemplo pode admitir as duas grafias, conforme o significado que se
queira atribuir ao vocábulo. Exs.: a) “O presidente precisa concertar o
discurso de seus ministros” (se é que precisa harmonizar a fala dos
ministros); b) “O presidente precisa consertar o discurso de seus
ministros” (se é que deve retificar ou reparar-lhes a fala).
8. Também se acrescente que palavras como concertar e consertar – que
têm a mesma pronúncia, mas grafias diversas – são denominadas
homófonas (homo = igual + fonas = som).
9. Não confundir com homógrafas, que são palavras de mesma grafia, mas
de pronúncia diferente. Exs: a) pôde (pretérito perfeito) e pode (presente
do indicativo); b) colher (verbo) e colher (substantivo).
10. De igual modo, também não confundir com as parônimas, que são
palavras de grafia e pronúncia apenas parecidas, mas de sentido
integralmente diverso, como arrear e arriar, deferir e diferir,
eminência e iminência.
Concessa venia
Ver Adjetivação desnecessária (P. 80).
Concluir
1. Quanto a sua ortografia, como todo verbo terminado em uir, só pode dar
origem à terminação ui na segunda e terceira pessoas do singular do
presente do indicativo: concluis, conclui.
2. Diferentemente dos verbos terminados em uar (como continuar), são
errôneas as grafias com e em tais situações: conclues, conclue.
3. Atentos aos frequentes equívocos que ocorrem nos meios jurídicos,
assim observam Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade: “Os
verbos em uir (concluir, possuir, estatuir etc.) têm um i na terceira
pessoa do singular do presente do indicativo e não e, como aparece até
em modelos de procuração” (1999, p. 53).
Ver Conclusão (P. 207) e Concluso ou Conclusos (P. 208).
Conclusão
1. Citando lição de Pedro Nunes, conceitua Adalberto J. Kaspary a
conclusão como “ato, consistente em termo, por meio do qual os autos
são submetidos ao juiz da causa, para que neles profira uma decisão”
(1996, p. 97).
2. De Plácido e Silva não diverge desse conteúdo, ao referir ser este um
vocábulo indicativo do “ato ou termo processual, mediante o qual o
escrivão envia os autos conclusos ao juiz, seja para despacho
interlocutório, seja para a sentença” (1989, p. 487-8).
3. Não se confunde com vista, que é a entrega dos autos a alguém dos
demais interessados no processo (advogados, representante do
Ministério Público). Ou seja: enquanto os autos seguem com vista para
os demais operadores do processo, como os advogados das partes e dos
terceiros (CPC/1973, arts. 40, II, 493, 518, 531, 542, 864, 1.000 e 1.002)
e o representante do Ministério Público (CPC/1973, arts. 83, I), seguem
eles em conclusão para o juiz da causa, quer em primeira instância, quer
em segunda (CPC/1973, arts. 141, IV, a, 159, § 2º, 323, 549, caput).
4. Releva notar, entretanto, que, nos tribunais, apenas se fala em conclusão
para o juiz relator do processo (CPC/1973, art. 549), enquanto os demais
integrantes de uma turma julgadora, quando não se sentem aptos a
proferir seus votos, têm vista dos autos (CPC/1973, art. 555, § 20).
5. Em mais de um dispositivo, é ele empregado por nossa legislação
processual: a) “Os termos de juntada, vista, conclusão e outros
semelhantes constarão de notas datadas e rubricadas pelo escrivão”
(CPC/1973, art. 168); b) “Distribuídos, os autos subirão, no prazo de
quarenta e oito (48) horas, à conclusão do relator, que, depois, de
estudá-los, os restituirá à secretaria com o seu visto” (CPC/1973, art.
549).
Ver Concluir (P. 207) e Concluso ou Conclusos (P. 208).
Concluso ou Conclusos?
1. Uma leitora indaga se, quando a secretária encaminha os autos do
processo à conclusão, usa-se concluso ou conclusos.
2. Ora, concluso, no caso, é apenas e tão somente um adjetivo, e este, como
tal, concorda em gênero (masculino ou feminino) e número (singular ou
plural) com o substantivo por ele modificado.
3. Assim, vejam-se os seguintes exemplos, todos corretos: a) “O feito foi
concluso ao Magistrado para sentença”; b) “Os autos foram conclusos
ao Magistrado para apreciação das preliminares”; c) “A carta
precatória foi conclusa ao Magistrado para determinar seu
cumprimento”; d) “As cartas precatórias foram conclusas ao
Magistrado para devolução à origem”.
4. Na linguagem do foro, embora particípio passado irregular de concluir,
tal vocábulo “especificou-se como adjetivo e tem curso na linguagem
jurídica na expressão ‘autos conclusos’, a saber, autos que sobem para o
despacho do juiz” (HENRIQUES, 1999, p. 36). Exs.: a) “Incumbirá ao
serventuário remeter os autos conclusos no prazo de vinte e quatro (24)
horas…” (CPC-1973, art. 190); b) “Conclusos os autos, o juiz mandará
processar a exceção…” (CPC-1973, art. 308); c) “Encerradas as
diligências, os autos serão conclusos ao juiz para homologação do
laudo” (CPP art. 528); d) “Impugnados os embargos, serão os autos
conclusos ao relator e ao revisor pelo prazo de quinze (15) dias para
cada um, seguindo-se o julgamento” (CPC-1973, art. 534, parágrafo
único); e) “Tratando-se de apelação, de embargos infringentes e de ação
rescisória, os autos serão conclusos ao revisor” (CPC-1973, art. 551).
5. No caso do exemplo trazido à apreciação pela leitora: “Os autos do
processo foram conclusos ao Juiz”.
Concordância com percentuais
Ver Por cento – Como concordar o verbo? (P. 576)
Concordância nominal
1. É a harmonização em gênero (masculino ou feminino) e número
(singular ou plural) entre o adjetivo ou palavra de valor adjetivo (artigo,
numeral, pronome adjetivo) e o substantivo a que se refere.
2. Para Carlos Góis (1943, p. 25), as primeiras (denominadas palavras
regidas ou subordinadas) acomodam- se à flexão da última (denominada
palavra regente ou subordinante). Exs.: a) “Apenas um alto morro ruiu”;
b) “Apenas uma alta montanha ruiu”; c) “Os dois altos morros ruíram”;
d) “As duas altas montanhas ruíram”.
3. Para os problemas mais corriqueiros, a primeira regra de capital
importância sobre o assunto é que, quando um mesmo adjetivo (a tanto
equivalendo as demais palavras de valor adjetivo) qualifica dois ou mais
substantivos e vem depois deles, pode o adjetivo ir para o plural ou
concordar com o substantivo mais próximo. Exs.: a) “O aluno e a aluna
estudiosos saíram” (correto); b) “O aluno e a aluna estudiosa saíram”
(correto); c) “A aluna e o aluno estudioso saíram” (correto).
4. Se a concordância se faz no plural, não se olvide a lição de Júlio
Nogueira de que, “havendo mais de um nome de gêneros diversos,
predomina, para o efeito da concordância, o masculino, como já
acontecia em latim: ‘pai e mãe carinhosos’, ‘amor e amizade
verdadeiros’” (1939, p. 201).
5. Ainda para os problemas mais frequentes, uma segunda regra que se
pode enunciar é a de que, quando um mesmo adjetivo qualifica dois ou
mais substantivos e vem antes deles, concorda, por regra, com o mais
próximo. Exs.: a) “Ele provocou intensa luta e desconforto” (correto); b)
“Ele provocou intenso desconforto e luta” (correto); c) “Ele provocou
intensos luta e desconforto” (errado); d) “Ele provocou intensos
desconforto e luta” (errado).
6. É preciso cuidado, já que muitas vezes, sobretudo porque distam um do
outro o vocábulo modificado e o adjetivo ou outra palavra modificadora,
esquecem-se equivocadamente alguns de proceder à regular
concordância, erro esse que se dá até mesmo com textos de lei.
7. Assim: “O direito à guarda de veículos nas garagens ou locais a isso
destinados nas edificações ou conjuntos de edificações será tratado
como objeto de propriedade exclusiva, com ressalva das restrições que
ao mesmo sejam impostas por instrumentos contratuais adequados, e
será vinculada à unidade habitacional a que corresponder…” (art. 2º, §
1º, da Lei 4.591, de 16/12/64, que dispôs sobre o condomínio em
edificações e as incorporações imobiliárias). Naquilo que tem interesse
para o caso concreto, corrija-se o texto para: “O direito… será tratado…
e será vinculado”.
8. Veja-se, em mesma esteira, um outro equívoco: “Nos contratos do
sistema de consórcio de produtos duráveis, a compensação ou a
restituição das parcelas quitadas, na forma deste artigo, terá
descontada, além da vantagem econômica auferida com a fruição, os
prejuízos que o desistente ou inadimplente causar ao grupo” (art. 53, §
2º, da Lei 8.078, de 11/9/90, que dispôs sobre a proteção ao
consumidor). Faça-se a correção do seguinte modo: “… a compensação
ou a restituição das parcelas quitadas… terá descontados… os
prejuízos”, porque, em última análise, terá os prejuízos descontados.
9. Também segue o mesmo molde de equívoco o seguinte dispositivo: “O
Banco Nacional da Habitação poderá operar em: I – prestação de
garantia em financiamento obtido, no país ou no exterior, pelas
entidades integrantes do Sistema Financeiro da Habitação, destinados a
execução de projetos de habitação de interesse social” (art. 24, I, da Lei
4.380, de 21/8/64, que regulamentou os contratos imobiliários). Assim
deve ser sua correção: “… prestação de garantia em financiamento…
destinado a execução…”.
10. Segue o mesmo modelo de erro um outro dispositivo: “Ficarão sujeitos
à prévia aprovação do Banco Nacional da Habitação: a) as alterações
dos estatutos sociais das sociedades de crédito imobiliário; b) a
abertura de agências ou escritórios das referidas sociedades; c) a
cessação de operações da matriz ou das dependências das referidas
sociedades” (art. 37 da Lei 4.380, de 21/8/64, que regulamentou os
contratos imobiliários). Se se antepuserem os núcleos do sujeito, será
fácil a correção: As alterações, a abertura e a cessação ficarão
sujeitas…
11. Mais um exemplo a ser evitado: “As modificações, os acréscimos e os
melhoramentos de edifício em construção, bem como os acabamentos
especiais e partes complementares das respectivas unidades
autônomas, Inclusive decoração permanente, serão consideradas
partes integrantes da obra, para efeito de tributação…” (art. 29 da Lei
4.864, de 29/11/65, que criou medidas de estímulo à construção civil).
Sendo modificações, acréscimos, melhoramentos, acabamentos e partes
os substantivos modificados, e havendo entre eles alguns nomes do
gênero masculino, determina a regra geral de concordância nominal
que o adjetivo vá para o masculino plural; por conseguinte, serão
considerados, e não serão consideradas.
12. Veja-se também: “Se o agente usa de violência, incorre também nas
penas a esta cominada” (art. 90, § 10, da Lei 5.471, de 1º/12/71, que
dispõe sobre proteção de bens imóveis financiados). A ordem direta
dirime dúvidas e determina o modo de concordância entre o adjetivo e
o substantivo (Se o agente usa de violência, incorre nas penas
cominadas a esta).
13. E não é só: “As diferenças apuradas nas revisões dos encargos mensais
serão atualizadas com base nos índices contratualmente definidos para
reajuste do saldo devedor e compensados nos encargos mensais
subsequentes” (art. 40, § 2º, da Lei 8.692, de 28/7/93, que definiu os
planos de reajustamento das prestações de financiamento de imóveis).
Uma simples busca pelo substantivo modificado por compensados
definirá sua concordância: “As diferenças apuradas… serão
atualizadas.., e compensadas…”
14. Mais ainda: “É vedada a aplicação de reajustes aos encargos mensais
inferiores aos índices de correção aplicadas à categoria profissional
do mutuário” (art. 8º, § 3º, da mesma Lei 8.692, de 28/7/93). Também
da junção entre o adjetivo modificador (aplicadas) e o substantivo
modificado (índices) deflui a automática correção: índices de correção
aplicados.
15. Observe-se, ainda, este outro dispositivo: “Descumprir, dolosa ou
culposamente, os deveres inerentes ao pátrio poder ou decorrente de
tutela ou guarda…” (art. 249 da Lei 8.069, de 13/7/90, que dispôs
sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente). Basta que, de igual
modo, se contraponham o adjetivo modificador e o substantivo
modificado, para que se tenha a automática correção: deveres…
decorrentes.
16. E mais: “… poderá o expropriando requerer o levantamento de oitenta
por cento da indenização depositada, quitado os tributos e publicados
os editais…” (art. 6º, § 10, da Lei Complementar 76, de 6/7/93, que
dispôs sobre desapropriação). Reflexão similar às anteriores
evidenciará a correção: quitados os tributos.
17. Mais um exemplo: “Quando o casamento se seguir a uma comunhão
de vida entre os nubentes, existentes antes de 28 de junho de 1977”
(art. 45 da Lei 6.515, de 26/12/77, que instituiu o divórcio). O sentido
do dispositivo revela que o adjetivo sublinhado refere-se a comunhão,
que é singular, e não a nubentes, que é plural; assim, existente, e não
existentes.
18. E outro: “O prazo dos contratos de parceria, desde que não
convencionados pelas partes, será no mínimo de três anos…” (art. 96,
I, da Lei 4.504, de 30/11/64, que dispôs sobre o Estatuto da Terra).
Atenta leitura do dispositivo revela que o substantivo modificado é
prazo, e não contratos; o adjetivo em flexão, assim, há de ser
convencionado, e não convencionados.
19. Mais outro: “Estas citações e intimações devem ser feitas pela
imprensa, publicadas no jornal oficial do Estado e no ‘Diário Oficial’
para o Distrito Federal, e nos periódicos indicados pelo juiz, além de
afixados nos lugares de estilo, e na bolsa da praça do pagamento” (art.
36, caput, segunda parte, do Decreto 2.044, de 31/12/1908, que definiu
e regulamentou a letra de câmbio e a nota promissória). Sendo citações
e intimações os substantivos modificados, o adjetivo há de ser, assim,
afixadas, não afixados.
20. Mais um: “Em qualquer caso de internação de toxicômanos em
estabelecimentos públicos ou particular, a autoridade sanitária
comunicará o fato à autoridade policial competente e bem assim ao
representante do Ministério Público” (art. 29, § 8º, do Decreto-lei 891,
de 25/11/38, que aprovou a lei de fiscalização de entorpecentes). Se
estabelecimentos é o substantivo, o adjetivo que o modifica há de ser
particulares, e não particular. Além disso, não se poderia pretender, no
caso, interpretar a sintaxe com a mesma estrutura de uma expressão
como justiças federal e estadual, quer porque o sentido do texto aponta
para mais de um estabelecimento público e mais de um
estabelecimento particular, diferentemente da hipótese de apenas uma
justiça federal e uma justiça estadual, quer porque, no caso da
expressão considerada, não haveria sentido em deixar públicos no
plural, e manter particular sem flexão de número, no singular.
21. Adicione-se mais um exemplo: “Enquanto não se criarem os
estabelecimentos referidos neste artigo, serão adaptados, na rede já
existente, unidades para aquela finalidade” (art. 9º, § 1º, da Lei 6.368,
de 21/10/76, que dispôs sobre medidas de prevenção e repressão ao
tráfico ilícito e uso indevido de substâncias entorpecentes ou que
determinem dependência física ou psíquica). A simples justaposição
mental entre o adjetivo modificador e o substantivo modificado
determina automática correção: … serão adaptadas… unidades…
22. E outro: “Os índios, enquanto não integrados, não estão obrigados a
inscrição do nascimento. Este poderá ser feito em livro próprio do
órgão federal de assistência aos índios” (art. 50, § 2º, da Lei 6.015, de
31/12/73, que dispôs sobre os registros públicos). Procure-se o
substantivo modificado (inscrição, e não nascimento), e se terá o modo
correto de dizer: Esta poderá ser feita.
23. Acrescente-se outro: “Nas escrituras, lavradas em decorrência de
autorização judicial, serão mencionadas, por certidão, em breve
relatório, com todas as minúcias que permitam identificá-los, os
respectivos alvarás” (art. 224 da mesma Lei de Registros Públicos). Tal
equívoco, existente na publicação oficial, pode ser facilmente corrigido
pela simples aproximação entre o adjetivo modificador (mencionadas)
e o substantivo modificado (alvarás): mencionados, portanto.
24. Observe-se mais este caso: “Às plantas serão anexadas o memorial e
as cadernetas das operações de campo, autenticadas pelo agrimensor”
(art. 278, § 2º, também da Lei de Registros Públicos). Ora, se memorial
e cadernetas são os substantivos modificados, havendo entre eles um
masculino, a soma só pode resultar um masculino plural; anexados, por
conseguinte.
25. Repete-se o problema no art. 13 do Decreto 61.867, de 7/12/67, que
regulamenta os seguros obrigatórios: “São excluídas da
obrigatoriedade prevista no artigo anterior os bens e mercadorias
objeto de viagem internacional”. Da soma dos substantivos
modificados (bens e mercadorias) só pode resultar o adjetivo excluídos.
26. Mais um: “A exigência constante do art. 22 da Lei 4.947, de 6 de abril
de 1966, não se aplica às operações de crédito rural proposta por
produtores rurais e suas cooperativas…” (art. 78, caput, do Decreto-lei
167, de 14/2/67, que dispôs sobre os títulos de crédito rural). O adjetivo
proposta modifica operações; corrija-se, então, para propostas.
27. E outro: “Nas ações possessórias, a participação do cônjuge do autor
ou do réu somente é indispensável nos casos de composse ou de ato
por ambos praticados” (art. 10, § 2º, do Código de Processo Civil). A
simples reflexão de qual seja o substantivo modificado por praticados
(que é ato) evidencia a necessidade de correção do texto oficial:
praticado.
28. E outro ainda: “No caso de serem instalados outros Tribunais
Regionais Federais, os seus presidentes escolherão os cinco que
integrarão o Conselho, observados a forma e o critério a serem por
este estabelecido” (art. 3º, § 2º, da Lei 8.472, de 14/10/92, que dispôs
sobre a composição e a competência do Conselho da Justiça Federal).
Referindo-se o adjetivo tanto a forma como a critério, forçosa é sua
concordância com a soma de ambos: estabelecidos.
29. Veja-se mais um exemplo: “O locatário fica obrigado ao pagamento
das despesas referidas no parágrafo anterior, desde que comprovadas
a previsão e o rateio mensal…” (Lei 8.245, de 18/11/91, art. 23, § 2º),
que dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos e os procedimentos a
elas pertinentes). Corrija-se, com a observação de que, no caso, o
adjetivo qualifica dois substantivos e vem antes deles: “… comprovada
a previsão e o rateio…”
30. E não se esqueça um próximo: “Os juízes que integrem os Tribunais de
Alçada somente concorrerão às vagas no Tribunal de Justiça
correspondente à classe dos magistrados” (art. 100, § 4º, da Lei
Complementar 35, de 14/3/79, que dispôs sobre a Lei Orgânica da
Magistratura Nacional). Verificado o substantivo modificado (vagas) e
o adjetivo modificador (correspondente), fácil é corrigir:
correspondentes.
Ver Alerta – Existe no plural? (P. 102), Cláusulas terceira e quarta – Está
correto? (P. 188), Concordância do particípio passado (P. 208),
Concordância do pronome de tratamento (P. 208), Dois adjetivos e um
substantivo (P. 292), Perdas e danos (P. 558) e Plural majestático (P. 568).
Concordância verbal
1. É a harmonização do verbo com o seu sujeito, o que se dá em número
(singular ou plural) e pessoa (primeira, segunda ou terceira).
2. Algumas observações gerais podem ser de grande utilidade.
3. Nesses casos, como lembra Carlos Góis (1943, p. 25), o verbo
(denominado palavra regida ou subordinada) acomoda-se à flexão do
sujeito (denominado palavra regente ou subordinante).
4. Assim, se o sujeito é simples, a concordância se faz em número e pessoa
com o núcleo do sujeito. Exs.: a) “Eu encontrei o livro”; b) “Os rebeldes
saíram às ruas”; c) “A pintura dos três prédios exigiu dois meses”; d)
“Aconteceram, por aqui casos interessantes”; e) “Os consertos do
edifício demoraram mais do que o previsto”.
5. Se o sujeito é composto e anteposto ao verbo, concorda este com a soma
daquele. Ex.: “A citação e a penhora foram anuladas”.
6. Se o sujeito é composto posposto, o verbo pode concordar no plural ou
com o núcleo mais próximo. Exs.: a) “Foram anuladas a citação e a
penhora” (correto); b) “Foi anulada a citação e a penhora” (correto); c)
“Foi anulado o edital e a citação” (correto).
7. Para esse último caso, vale observar com João Ribeiro que, “embora
concorram muitos sujeitos, sempre foi primor e liberdade de estilo deixar
o verbo no singular desde que este os precede na frase” (1923, p. 149).
8. Diversos casos peculiares, porém, exigem cuidados especiais, devendo-
se atentar para os verbetes específicos, nomeados ao final.
9. Muitas vezes, sobretudo porque o sujeito vem posposto ao verbo, ou dele
distante, ou mesmo porque se acoplam adjuntos no plural a um núcleo de
sujeito no singular, esquecem-se equivocadamente alguns de proceder à
regular concordância, como se dá até mesmo com textos de lei.
10. Assim, por exemplo: “Prescrevem em 6 (seis) meses, contados da
expiração do prazo de apresentação, a ação que o art. 47 desta lei
assegura ao portador” (art. 59 do Decreto-Lei 7.357, de 2/9/85, que
dispôs sobre o cheque e deu outras providências). Corrija-se o texto
para: “Prescreve.., a ação” (porque, na ordem direta, a ação prescreve).
11. Em mesma esteira: “A existência de ônus fiscais ou reais, salvo os
impeditivos de alienação, não impedem o registro, que será feito com
as devidas ressalvas…” (art. 32, § 50, da Lei 4.591, de 16/12/64, que
regulou o condomínio e as incorporações imobiliárias). Proceda-se à
seguinte correção: “A existência… não impede o registro…”
12. Em mesmo erro incide este outro dispositivo: “O valor nominal da
letra imobiliária, para efeitos de liquidação do seu principal e cálculo
dos juros devidos, será o do valor reajustado da Unidade-Padrão de
Capital no momento do vencimento ou pagamento do principal ou
juros, no caso do título simples, ou esse multiplicado pelo número de
Unidades-Padrão de Capital a que correspondem a letra, no caso de
título múltiplo” (art. 52, § 4º, da Lei 4.380, de 21/8/64, que
regulamentou os contratos imobiliários). A mera colocação do exemplo
em ordem direta determina automática correção: “… a que a letra
corresponde…”
13. E ainda: “Ao mutuário, cujo aumento salarial for inferior à variação
dos percentuais referidos no caput e § 1º do artigo anterior, fica
assegurado o reajuste das prestações mensais em percentual idêntico
ao do respectivo aumento salarial, desde que efetuem a devida
comprovação perante o agente financeiro” (art. 2º da Lei 8.100, de
5/12/90, que dispõe sobre reajuste de prestações em contratos de
financiamento de imóveis). Uma simples pergunta para se localizar o
sujeito de efetuem revelará que ele (o mutuário) desempenha tal função
sintática; assim, efetue, e não efetuem.
14. Veja-se este outro dispositivo: “Dentro do prazo marcado pelo juiz, os
credores comerciais e civis do falido e, em se tratando de sociedade, os
particulares dos sócios solidariamente responsáveis, são obrigados a
apresentar, em cartório, declarações por escrito, em duas vias, com a
firma reconhecida na primeira, que mencionem as suas residências ou
as dos seus representantes ou procuradores no lugar da falência, a
importância exata do crédito, a sua origem, a classificação que, por
direito, lhes cabe, as garantias que lhes tiverem sido dadas, e as
respectivas datas, e que especifique, minuciosamente, os bens e títulos
do falido em seu poder…” (art. 82, caput, do Decreto-lei 7.661, de
21/6/45, que instituiu a Lei de Falências). Uma simples procura por seu
sujeito (declarações) determinará automática concordância do verbo:
especifiquem.
Ver A gente foi ou A gente fomos? (P. 97), Bastar e Faltar – Como
concordar? (P. 156), Bem como (P. 158), Concordância do pronome de
tratamento (P. 208), Discordância verbal (P. 290), É muito (P. 316), É que (P.
326), Haver – Quando vai para o plural? (P. 386), Hoje é dois – Está
correto? (P. 391), Nem… nem (P. 493), Número fracionário (P. 505), Obra
com dois autores (P. 512), Ou – Como concordar o verbo? (P. 535), Perto de
(P. 562), Plural majestático (P. 568), Porcentagem ou Percentagem? (P. 575),
Por cento – Como concordar o verbo? (P. 576), Só – Como concordar? (P.
706), Todo ou Todo o? (P. 740), Um e meio (P. 749) e Viva os brasileiros! ou
Vivam os brasileiros!? (P. 784)
Condenação
1. É palavra de grande uso nos meios forenses, tanto no campo civil quanto
no campo penal, hipóteses em que surgem problemas quanto à regência
nominal.
2. Em conhecida obra, Francisco Fernandes mostra que tal substantivo se
constrói com a preposição a (1969, p. 96). Ex.: “Por nossas leis
normais, não pode haver condenação à morte nem à prisão perpétua”.
3. Para Celso Pedro Luft (1999, p. 113-4), o mencionado vocábulo se
presta à construção condenação de alguém a alguma coisa. Ex.: “A
condenação do criminoso a 10 anos de prisão, à morte”.
4. Não conta, como se vê, com o beneplácito dos referidos gramáticos a
construção com a preposição em, devendo dar-se, assim, por errôneo o
seguinte exemplo: “Ele sofreu condenação no pagamento das custas
processuais”.
5. Atente-se, por fim, à circunstância de que diferem condenação e
condenar no que tange às preposições que podem iniciar seus
complementos.
Ver Condenar (P. 214).
Condenar
1. É verbo muito usado nos meios jurídicos, como se dá no caso da parte
dispositiva das sentenças criminais que estipula a pena e das cíveis que
fixa os ônus da sucumbência processual.
2. Há problemas de sintaxe a serem resolvidos a seu respeito.
3. No que tange à regência verbal, conforme lição de Francisco Fernandes
em indispensável obra, o objeto indireto desse verbo pode ser construído
com as preposições a ou em (1971, p. 158), lição essa repetida, com
significativos exemplos, por Cândido Jucá Filho (1963, p. 156). Exs.: a)
“… condenarem… os hereges ao último suplício” (Alexandre
Herculano); b) “Condenado em quinze anos de degredo para Cabo
Verde”.
4. Nesse exato sentido também é a lição de Vitório Bergo (1944, p. 61), o
qual, de modo expresso, dá como corretas ambas as expressões
seguintes: condenar às custas e condenar nas custas.
5. No que concerne aos textos de lei, é de se dizer, por primeiro, que o
Código de Processo Civil emprega, indiferentemente, ora a, ora em,
como se pode verificar nos exemplos seguintes: a) “A sentença
condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou…”
(art. 20, caput); b) “O juiz, ao decidir qualquer incidente ou recurso,
condenará nas despesas o vencido” (art. 20, § 1º); c) “… o tribunal…
condenará o juiz nas custas” (art. 314); d) “A apelação será recebida…
só no efeito devolutivo, quando interposta de sentença que… condenar à
prestação de alimentos” (art. 520, II); e) “… o juiz… condenará o
devedor a constituir um capital…” (art. 602, caput); f) “… o juiz
mandará avaliar o custo das despesas necessárias e condenará o
contratante a pagá-lo” (art. 636, parágrafo único); g) “É defeso ao juiz
proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem
como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do
que lhe foi demandado” (art. 460).
6. Em outros diplomas legais também se encontra esse verbo com as
mesmas construções: condenar alguém em algo, condenar (alguém) a
algo, além de condenar alguém por algo. Exs.: a) “A sentença ou
acórdão, que julgar a ação, qualquer incidente ou recurso, condenará
nas custas o vencido” (CPP art. 804); b) “A sentença que condenar o
devedor à realização de uma prestação em dinheiro ou outra coisa
fungível é título bastante para o registro de hipoteca…” (CC português,
art. 710º, 1); c) “O Estado indenizará o condenado por erro
judiciário…” (CF/1988, art. 5º, LXXV); d) “Não podem ser eleitos para
cargos administrativos ou de representação econômica ou profissional,
nem permanecer no exercício desses cargos … IV – os que tiverem sido
condenados por crime doloso enquanto persistirem os efeitos da pena”
(CLT, art. 530, IV).
7. Atente-se, por fim, ao fato de que condenar e condenação diferem no
que concerne às preposições que podem introduzir seus complementos.
Ver Condenação (P. 214).
Conduzido
1. Geraldo Amaral Arruda observa ser de mau vezo dizer que “motoristas
de ônibus e caminhões, prevalecendo-se do tamanho e peso dos seus
conduzidos, dirigem displicentemente…”
2. De acordo com tal autor, “melhor será dizer veículos e deixar
conduzidos para a linguagem coloquial da Polícia” (ARRUDA, 1997, p.
9).
Conferir
1. Quanto à conjugação verbal, aparece um i na primeira pessoa do
presente do indicativo e nos tempos dela derivados: confiro, conferes,
confere, conferimos, conferis, conferem (presente do indicativo); confira,
confiras, confira, confiramos, confirais, confiram (presente do
subjuntivo); confere, confira, confiramos, conferi, confiram (imperativo
afirmativo); não confiras, não confira, não confiramos, não confirais,
não confiram (imperativo negativo).
2. Tal verbo não é defectivo e não apresenta problemas ou irregularidades
nos demais tempos e modos, em que é conjugado normal e regularmente.
3. Na observação de José de Nicola e Ernani Terra, “o e do radical muda
para i na primeira pessoa do singular do presente do indicativo e nas
formas daí derivadas” (2000, p. 20).
Conforme
1. Para Carlos Góis (1943, p. 206-7), tal palavra pode ser a) advérbio
(significando conformemente, em conformidade com), b) conjunção
(com o sentido de como), c) preposição (quando é sinônima de segundo)
e d) adjetivo (com a significação de resignado, conformado, concorde).
Exs.: i) “Os índios foram resgatados conforme a dita lei” (advérbio); ii)
“Conforme for a estação, tal será a colheita” (conjunção); iii) “Ele se
vestia conforme a moda” (preposição); iv) “As disposições contratuais
foram lidas e achadas conformes” (adjetivo).
2. O problema que pode surgir, normalmente, diz respeito ao caso em que
tal vocábulo se insere no rol dos “adjetivos usados eventualmente como
preposição” (PEREIRA, 1924, p. 153).
3. Importante é verificar que, quando empregado como adjetivo, pelas
regras da concordância nominal, harmoniza-se em gênero e número com
o substantivo modificado, podendo, assim, ir normalmente para o plural.
Ex.: “Sendo glosadas as despesas por ilegais ou por não conformes ao
testamento, remover-se-á o testamenteiro, perdendo o prêmio deixado
pelo testador” (CC/1916, art. 1.759).
4. Sob um outro aspecto, refere Celso Cunha (1970, p. 147) que, quando
preposição, talvez por sê-lo apenas acidentalmente, depois dela se
empregam as formas eu e tu. Ex.: “Conforme tu mesmo, a tese contrária
não tem condições de prosperar”.
5. Em mesmo sentido, para Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 9), essa
palavra, com função de preposição, pode reger eu e tu, observando tal
autor que a razão desse emprego está em que tal vocábulo não é
originariamente preposição.
6. Silveira Bueno, em interessante observação, esclarece um aspecto
adicional no sentido de que há “liberdade de usar a preposição simples
conforme ou a locução prepositiva conforme a” (1938, p. 65).
7. Nesse sentido também é a lição de Eliasar Rosa, para quem tal palavra
“pode ter, ou deixar de ter, após si, a preposição a. Tanto se pode dizer
que o juiz decidiu conforme a lei, como se pode dizer: conforme à lei”
(1993, p. 43).
8. Assim, estão igualmente corretos os exemplos a seguir: a) “O advogado
atuou conforme a lei”; b) “O advogado atuou conforme à lei”; c) “O
advogado atuou conforme o ordenamento jurídico”; d) “O advogado
atuou conforme ao ordenamento jurídico” (PEREIRA, 1924, p. 363).
9. Quando seguido de preposição, ampliando as possibilidades, Domingos
Paschoal Cegalla dá como corretas a construção com a preposição a
(preferível) ou com: “As cópias estavam conformes ao (ou com o)
original” (1999, p. 83).
10. Também estendendo o leque das opções de sintaxe, Carlos Góis e
Herbert Palhano (1963, p. 189) assinalam a possibilidade de construir
tal palavra com uma de duas preposições: a ou com. Exs.: a) “Cópia
conforme ao original” (Caldas Aulete); b) “Estar conforme com a sua
sorte” (Domingos Vieira).
11. Perfeita, nesse sentido, é a síntese de Cândido Jucá Filho (1954, p.
146), que exemplifica sua lição com significativas variações de um
mesmo e abalizado autor, Alexandre Herculano: “Conforme a alterna
com o simples conforme… Também existe conforme com”. Exs.: a)
“… para ser executado conforme os desejos do moribundo”; b)
“Brando o acho eu, e mais que conforme a direito”; c) “… no caso de
uma resolução conciliar conforme com as condições propostas”.
12. A tais possibilidades, Celso Pedro Luft (1999, p. 117) acrescenta a
sintaxe com a preposição em: a) “Resgatados conforme a lei”; b)
“Índios resgatados conforme à dita lei” (Padre Vieira); c) “Conforme
com a natureza das coisas e com o modo de conceber do entendimento
humano” (Mário Barreto); d) “Oráculos conformes em anunciar a sua
vinda” (Rebelo da Silva).
13. E Francisco Fernandes (1969, p. 99) ainda amplia para incluir a
possibilidade de construção com a preposição para: a) “Muitas vezes
me esforcei por averiguar que governo era mais conforme à razão”
(Mário Barreto); b) “É mais conforme, sim senhor, com o latim”
(Cândido de Figueiredo); c) “E também se formos diferentes na
afeição, ficaremos conformes nas vontades” (Dic. de Fr. D. Vieira); d)
“O braço mais robusto de Crimilde apenas era o instrumento cego
movido por todas as vontades, conformes para morrer” (Alexandre
Herculano).
14. Uma leitura dos dispositivos mais conhecidos da legislação revela a
preferência do legislador pela construção sem preposição: a) “conforme
as circunstâncias” (CC, art. 24); b) “conforme o disposto” (CC, art. 44,
§ 3º); c) “conforme a boa-fé e os usos do lugar” (CC, art. 113); d)
“conforme a natureza dela e as circunstâncias” (CC, art. 569, I).
15. Apenas excepcionalmente se encontra o emprego com a preposição a:
“conforme aos ditames de boa-fé” (CC, art. 128).
Ver De conformidade ou Em conformidade? (P. 253)
Conhecer
1. Em termos jurídicos, significa o ato pelo qual um juiz ou tribunal analisa
e examina a pretensão aforada, posta à sua apreciação, e profere decisão
interlocutória, sentença ou acórdão.
2. Em tais casos, o verbo é normalmente transitivo indireto e pede a
preposição de, como se verifica nos exemplos seguintes, extraídos do
Código de Processo Civil: a) “O juiz conhecerá de ofício, em qualquer
tempo e grau de jurisdição,… da matéria…” (art. 267, § 3º); b) “É lícito
formular mais de um pedido em ordem sucessiva, a fim de que o juiz
conheça do posterior, em não podendo acolher o anterior” (art. 289); c)
“São requisitos de admissibilidade da cumulação: …que seja
competente para conhecer deles o mesmo juízo” (art. 292, § 1º, II); d)
“Com exceção do compromisso arbitral, o juiz conhecerá de oficio da
matéria enumerada neste artigo” (art. 301, § 4º); e) “Depois da
contestação, só é lícito deduzir novas alegações quando: … competir ao
juiz conhecer delas de oficio” (art. 303, II) f) “O juiz conhecerá
diretamente do pedido, proferindo sentença..” (art. 330, caput).
3. Em outros diplomas legais, também se faz presente essa mesma sintaxe.
Exs.: a) “Além de outros casos previstos nesta Constituição, a Câmara
dos Deputados e o Senado Federal reunir-se-ão em sessão conjunta
para: … IV – conhecer do veto e sobre ele deliberar” (CF/1988, art. 57,
§ 3º, IV); b) “Só à autoridade judiciária brasileira compete conhecer
das ações relativas a imóveis situados no Brasil” (LICC, art. 12, § 1º); c)
“Todavia, o juiz ou o Tribunal do Comércio, que conhecer de uma
causa…” (C. Com., art. 19); d) “No processo criminal, não se conhecerá
de arguição de nulidade de sentença declaratória de falência” (CPP, art.
511); e) “E vedado aos órgãos de Justiça do Trabalho conhecer de
questões já decididas…” (CLT, art. 836).
4. Contrariando essa sintaxe praticamente unânime de verbo transitivo
indireto em tais casos, Adalberto J. Kaspary (1996, p. 103), em obra
indispensável, aponta, na legislação, exemplo de regime direto, em que o
objeto direto vem representado por pronome relativo: “E defeso ao juiz
exercer as suas funções no processo contencioso ou voluntário: … III –
que (de que conheceu…) conheceu em primeiro grau de jurisdição,
tendo-lhe proferido sentença ou decisão” (CPC/1973, art. 134, III). Com
a devida vênia do ilustre autor, entretanto, o exemplo dado também pode
ser interpretado como um daqueles casos de oração subordinada, em que
se omite a preposição inicial sem alteração do regime do verbo.
Conjugação verbal
1. É o conjunto de acidentes gramaticais que determinam as alterações do
verbo quanto à pessoa, número, tempo, modo e voz.
2. Para sua exata compreensão, importante é verificar os verbos quanto a
sua flexão.
3. Verbos regulares são aqueles que seguem um modelo, de modo que, se
se conhece, por exemplo, a conjugação de amar, vender e partir, sabem-
se todos os verbos regulares da língua portuguesa, já que, quanto a estes,
basta que se acrescentem aos radicais as terminações próprias de cada
tempo, conforme a conjugação.
4. Verbos irregulares são aqueles que se afastam do modelo, apresentando
alguma anormalidade no radical ou na desinência. São exemplos os
verbos pedir (peço, pedi), medir (meço, medi), fazer (faço, fazes, fiz),
ouvir (ouço, ouves), caber (caibo, cabes, coube).
5. Verbos anômalos são os que sofrem tantas irregularidades e se afastam
de tal modo do modelo, que não podem ser enquadrados em
classificação alguma. São eles: estar, haver, ser, ter, ir, vir e pôr. A rigor,
não deixam de ser irregulares, embora irregulares em excesso.
6. Verbos defectivos são os que não têm certas formas, não são conjugados
em todas as pessoas, tempos ou modos. Assim, por exemplo, o verbo
precaver-se, que não é composto de vir nem de ver, é regular, mas
apenas conjugado nas formas arrizotônicas. Atente-se, nesse campo, a
que cada verbo defectivo tem as razões próprias para sua defectividade,
a qual se dá, muitas vezes, por questões de eufonia.
7. Verbos abundantes são aqueles que têm duas ou mais formas
equivalentes. Assim, aceitar apresenta aceitado e aceito como
particípios passados.
Ver Amámos ou Amamos? (P. 108), Indicativo por Subjuntivo (P. 411),
Tempos primitivos (P. 729), Uso do infinitivo (P. 752) e Verbo seguido de
pronome (P. 763).
Conjunção
Ver Omissão da conjunção – Está correto? (P. 526)
Conjuntura
1. Significa reunião de circunstâncias, oportunidade, lance difícil. Exs.: a)
“Na atual conjuntura, em época de grande desemprego, fica difícil falar
em discussão por aumento de salários”; b) “Naquela conjuntura, a
perplexidade dominava-me o espírito”.
2. Não confundir com sua parônima conjetura, que quer dizer suposição,
maneira de prever, a qual também admite as variantes conjectura e
conjeitura.
Conosco
Ver Com nós – Existe? (P. 196), Conheço todos eles – Está correto? (P. 217)
e Pronome pessoal (P. 614).
Conquanto
Ver Indicativo por Subjuntivo (P. 411).
Consecutio temporum
Ver Consecução dos tempos verbais (P. 219).
Conseguir
1. Tendo o grupo gu, neste caso, a exclusiva finalidade gráfica de registrar
o som original do g antes de e e de i – até porque, em tais circunstâncias,
o u não é pronunciado – perde aquele o u antes de a e de o.
2. Assim: consigo, consegues, consegue, conseguimos, conseguis,
conseguem (presente do indicativo); consiga, consigas, consiga,
consigamos, consigais, consigam (presente do subjuntivo); consegue,
consiga, consigamos, consegui, consigam (imperativo afirmativo); não
consigas, não consiga, não consigamos, não consigais, não consigam
(imperativo negativo).
3. Tais problemas se apresentam apenas no presente do indicativo e tempos
derivados, de modo que a referida dificuldade não se estende aos demais,
em que o gu permanece intacto: conseguia (pretérito imperfeito do
indicativo), conseguirei (futuro do presente do indicativo), conseguiria
(futuro do pretérito do indicativo), consegui (pretérito perfeito do
indicativo), conseguira (pretérito mais-que-perfeito do indicativo),
conseguir (futuro do subjuntivo), conseguisse (imperfeito do
subjuntivo), conseguindo (gerúndio), conseguido (particípio).
4. Seguem o mesmo modelo todos os verbos terminados em guir, em que o
u não seja pronunciado (distinguir, extinguir, perseguir, prosseguir,
seguir).
5. A propósito, Carlos Góis e Herbert Palhano (1963, p. 113) lembram,
com propriedade, que, dos verbos terminados em guir, apenas arguir e
redarguir têm o u pronunciado.
Consentâneo
1. Quanto às possibilidades de sintaxe, para Sousa e Silva, tal vocábulo
“usa-se indiferentemente com as preposições com e a: ‘consentâneo com
os bons princípios’ ou ‘consentâneo aos bons princípios’” (1958, p. 82).
Considerando
1. Por um lado, aplica-se ao raciocínio, para a formação do plural do
vocábulo considerando, a observação de Júlio Nogueira, segundo quem
“os nomes de línguas estrangeiras fazem o plural como se fossem
portugueses” – os considerandos.
2. Por outro lado, é importante trazer à discussão o lembrete do referido
gramático, e sem outra condenação, de que algumas pessoas usam o
plural latino – os consideranda (NOGUEIRA, 1930, p. 167).
3. Em lição muito apropriada, Vitório Bergo acrescenta que “o plural deste
latinismo é consideranda; todavia, não há fortes razões para que se não
adapte ao português: o considerando, os considerandos” (1944, p. 64).
4. Como remate e síntese, entretanto, é de se ver que o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de
Letras, órgão oficial para definir quais vocábulos integram nosso léxico,
fez constar em seu rol apenas considerando, e não considerandum (2009,
p. 212).
5. Isso quer significar os seguintes aspectos: a) existe, em português,
apenas considerando, e não considerandum; b) o vocábulo considerando
está integrado oficialmente ao vernáculo; c) seu plural se forma como os
demais vocábulos de mesma terminação, a saber, considerandos; d) não
existe o plural consideranda.
6. Em termos de técnica gramatical, a par de aplaudir o posicionamento do
VOLP nesse campo, não se pode deixar, todavia, de anotar a incoerência
de tal posição, evidenciando a necessidade de uniformização de critérios,
uma vez que, diversamente dessa conduta, registrou, por exemplo,
memorândum.
Ver Campus (P. 166) e Plural de nomes estrangeiros – Existe? (P. 566)
Considerar
1. Considerar é vocábulo a ser observado sob o prisma da regência verbal.
2. É verbo transitivo, em cuja companhia, com frequência, aparece um
predicativo do objeto direto.
3. Tal predicativo pode vir ou não precedido de como ou por. Exs.: a)
“Consideraram-no o maior processualista vivo do país”; b)
“Consideraram-no como o maior processualista vivo do país”; c)
“Considero-o por meu melhor amigo”.
4. Abona Arnaldo Niskier esse posicionamento em relação às duas
primeiras construções, ao observar que “as duas formas estão corretas, o
uso de uma ou de outra vai depender do estilo de quem escreve” (1992,
p. 104).
5. Aires da Mata Machado Filho (1969a, p. 616) mostra sua preferência
pela simples justaposição das palavras, sem emprego de como,
justificando com a supremacia da elegância na fala.
6. Para Laudelino Freire, o predicativo pode vir ligado ao verbo por como
ou por, consoante exemplo dado por ele mesmo: “Considero-o como (ou
por) amigo” (1937b, p. 52-3).
7. Idêntica há de ser a construção com outros verbos que, de modo similar,
exijam predicativo do objeto: a) “Creio-o apto (ou como apto) para o
trabalho”; b) “Julguei-a incapaz (ou como incapaz) para a função”; c)
“Reconheço-a minha inspiradora (ou como inspiradora) daquela obra”;
d) “Reputo-o o maior processualista (ou como o maior processualista)
vivo do país”.
Consignar
1. Quanto a sua pronúncia, até mesmo entre pessoas cultas há uma
tendência a introduzir erroneamente uma inexistente vogal logo após o g,
nas formas rizotônicas, pronunciando-se consiguino, consiguinas…
2. É, contudo verbo regular, a que, após o radical (consign), apenas se
acrescentam as desinências próprias da conjugação: consigno, consignas,
consigna, consignamos, consignais, consignam (presente do indicativo);
consigne, consignes, consigne, consignemos, consigneis, consignem
(presente do subjuntivo)…
3. E, em tais formas rizotônicas, a sílaba tônica incide no i do radical,
jamais podendo ser tônica uma vogal que nem existe.
4. Por outro lado, como as formas rizotônicas apenas ocorrem no presente
do indicativo, presente do subjuntivo, imperativo afirmativo e
imperativo, não apresenta ele dificuldades nos demais tempos e formas,
quer quanto à grafia, quer quanto à pronúncia.
Consoante
1. Com tal palavra, a construção feita com a preposição a é tida por Vitório
Bergo (1944, p. 64) como “boa regência, frequente em bons escritores”,
citando ele exemplo abonador de Camilo Castelo Branco: “A força de
alma que gera as virtudes é consoante à pureza que as alimenta”.
2. Francisco Fernandes (1969, p. 104) preconiza a possibilidade de
construção com qualquer de três preposições: a, com e em. Exs.: a) “…
não segundo os fatos mas consoante aos próprios interesses” (Rui
Barbosa); b) “Linguagem consoante com o assunto”; c) “Excessos
consoantes no pretexto, no espírito, no aspecto, na subordinação ao
mesmo interesse partidário” (Rui Barbosa).
3. Valendo-se de três exemplos de Camilo Castelo Branco, Cândido Jucá
Filho (1963, p. 160) vê três possibilidades de sintaxe: sem preposição
alguma, com a preposição a e com a preposição com: a) “Aferiam o
quilate duma obra de fantasia, consoante os lances surpreendentes”; b)
“A mãe desejava que o rapaz fosse frade, consoante à vontade de seu
irmão”; c) “Expede a sua doutrina mais consoante com a Escritura”.
4. Essas três possibilidades de construção também são abonadas por Celso
Pedro Luft (1999, p. 123): a) “Agir consoante convicções e princípios”;
b) “Consoante ao gosto da época…” (Soares Amora); c) “Um traje
consoante com o ato” (Antenor Nascentes).
Consonância
1. Para Celso Pedro Luft (1999, p. 124), tal vocábulo admite ser construído
com as preposições com e entre: a) “Consonância da prática com a
teoria”; b) “Consonância entre teoria e prática”.
2. Francisco Fernandes (1969, p. 104) amplia o leque de possibilidades,
para aceitar também a sintaxe com a preposição de: a) “Consonância das
predições com os acontecimentos” (Constâncio); b) “Consonância de
vontades”; c) “Só o hábito, na opinião do autor, nos pode tornar cegos à
singularidade dessa consonância entre espíritos que se harmonizam em
torno de uma conclusão tão importante” (Rui Barbosa).
Ver Em consonância (P. 306).
Consorte
1. Tal vocábulo, que normalmente significa marido ou mulher, é comum de
dois, vale dizer, “é masculino ou feminino, conforme o sexo da pessoa: o
consorte (homem) e a consorte (mulher)” (SILVA, A., 1958, p. 81). A
distinção, assim, se faz pelo artigo.
2. Também Geraldo Amaral Arruda (1997, p. 36-7) lembra a natureza de
substantivo comum de dois gêneros de tal substantivo, de modo que sua
variação em gênero se dá pela simples alteração do artigo: o consorte e a
consorte.
3. Espancando toda e qualquer dúvida, também esse é o posicionamento do
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, órgão incumbido
oficialmente de determinar a existência e o comportamento dos
vocábulos em nosso idioma (2009, p. 212).
Ver Cônjuge – Comum de dois ou Sobrecomum? (P. 218), Esposo ou
Marido? (P. 331) e Nubente (P. 505).
Constante
1. Quanto à regência nominal, Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 228) apenas
aconselha se construa com a preposição de no sentido daquilo que
consta, reservando seu emprego com em para as hipóteses em que
significa firme, contínuo. Exs.: a) “As provas constantes dos autos não
são suficientes para a condenação”; b) “Ele foi constante na busca de
provas para defender seus direitos no processo”.
2. Embora não manifeste opinião alguma, Francisco Fernandes (1969, p.
105) registra apenas dois exemplos, ambos em perfeita consonância com
esse posicionamento. Exs.: a) “Bens constantes de prédios e apólices”;
b) “Constante nesse vezo irreprimível, comparava-se, e aos artistas, a
moedeiros obcecados” (Afrânio Peixoto).
3. Celso Pedro Luft admite a possibilidade de construção com ambas as
preposições, e claramente não faz diferença alguma no que tange ao
sentido que o texto possa apresentar, como se pode ver dos exemplos
que alinha: a) “Dados constantes de um (ou num) manuscrito”; b)
“Vocábulos não constantes em (ou de) dicionários e vocabulários”.
4. Apenas acrescenta tal autor: “a regência original é de; em se explica a
partir da sinonímia consistir e encontrar-se (registrado ou mencionado),
estar” (LUFT, 1999, p. 124).
5. Adalberto J. Kaspary (1996, p. 108), muito embora acate a possibilidade
de construção com as preposições de e em, observa que, nos textos legais
que pesquisou, só encontrou o regime com a preposição de. Exs.: a) “A
matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por
prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão
legislativa” (CF/1988, art. 60, § 5º); b) “As declarações constantes de
documentos assinados presumem-se verdadeiras em relação aos
signatários” (CC/1916, art. 131); c) “A representação tanto se dá na
sucessão legal como na testamentária, mas com as restrições constantes
dos artigos seguintes” (CC português, art. 2.040).
6. Podem-se alinhar ainda outros textos de lei em que a sintaxe se dá
exclusivamente com a preposição de: a) “Conceder-se-á habeas data: …
para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do
impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades
governamentais ou de caráter público” (CF/1988, art. 50, LXXII, a); b)
“Arguida, por escrito, a falsidade de documento constante dos autos, o
juiz observará o seguinte processo…” (CPP art. 145, caput).
Ver Constar (P. 223).
Constar
1. Verbo de largo uso na linguagem forense, significa chegar ao
conhecimento, estar escrito ou registrado, fazer parte de. Exs.: a) “O
patrimônio e a herança constituem coisas universais, ou
universalidades, e como tais subsistem, embora não constem de objetos
materiais” (CC/1916, art. 57); b) “A instituição deverá constar de
escritura pública transcrita no registro de imóveis e publicada na
imprensa local e, na falta desta, na da Capital do Estado” (CC/1916, art.
73); c) “A autorização do marido pode ser geral ou especial, mas deve
constar de instrumento público ou particular previamente autenticado”
(CC/1916, art. 244).
2. Já quanto à acepção em que pode ser empregado, vale transcrever a lição
de Luís A. P Vitória, segundo quem “os puristas condenam este verbo,
no significado de ser provável, uma vez que, etimologicamente, ele
significa haver certeza” (1969, p. 72). Exs.: a) “É o que consta neste
livro” (correto); b) “Consta que o réu teve sua fuga facilitada” (errado).
3. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 86), todavia, leciona que ele pode
ter o sentido de passar por certo, ou ser dito com aparências de verdade,
ou de chegar ao conhecimento: a) “Consta que o ditador se suicidou”; b)
“Consta que a jovem vai desfazer o noivado”; c) “Não me consta que
essa casa está à venda”.
4. Celso Pedro Luft (1999, p. 143-4) também lhe aceita a acepção de ser
comentado ou dito com aparências de verdade (o que é bem diverso de
haver certeza): a) “Constava-me que ele era contrabandista”; b)
“Consta-lhe que haverá demissões”.
5. O mais certo, nesse campo, em verdade, parece ser acatar ambos os
significados do mencionado verbo, até pelo princípio de que, na
divergência entre os doutos, deve-se conceder liberdade de emprego ao
usuário.
6. Sob um outro aspecto, firme-se o posicionamento de que, quanto à
regência verbal, admite ele ser construído indiferentemente com uma de
duas preposições: em ou de.
7. Assim, são igualmente corretas as construções seguintes: a) “Consta nos
autos que ele furtou”; b) “Consta dos autos que ele furtou”.
8. Assim é que Domingos Paschoal Cegalla leciona que, no sentido de estar
registrado ou mencionado, “pode-se dizer, indiferentemente, constar em
(preferível) ou constar de” (1999, p. 86).
9. Celso Pedro Luft, de igual modo, também acata ambas as possibilidades
de construção (1999, p. 143-4), entendimento esse também partilhado
por Francisco Fernandes (1971, p. 164).
10. No que concerne aos textos legais, no sentido de estar escrito ou
registrado em, de ser mencionado, de fazer parte, de incluir-se, observa
Adalberto J. Kaspary que constar de “é a regência quase que exclusiva,
atualmente, nos textos legais”, enquanto constar em é regência “de uso
raro” (1996, p. 106-7). Exs.: a) “O Presidente da República poderá
convocar Ministro de Estado para participar da reunião do Conselho,
quando constar da pauta questão relacionada com o respectivo
Ministério” (CF/1988, art. 90, § 10); b) “A aceitação da herança pode
ser expressa ou tácita; a renúncia, porém, deverá constar,
expressamente, de escritura pública, ou termo judicial’ (CC/1916, art.
1.581); c) “Os termos de juntada, vista, conclusão e outros
semelhantes constarão de notas datadas e rubricadas pelo escrivão”
(CPC/1973, art. 168); d) “Nenhum corretor pode dar certidão senão do
que constar do seu protocolo e com referência a ele” (C. Com, art. 46);
e) “Quando o réu estiver no território nacional, em lugar estranho ao
da jurisdição, será deprecada a sua prisão, devendo constar da
precatória o inteiro teor do mandado” (CPP, art. 289); f) “Os impostos
componentes do sistema tributário nacional são exclusivamente os que
constam deste título…” (CTN, art. 17); g) “… do que constara respeito
no Instituto Médico-Legal, no Instituto de Identificação e Estatística ou
em estabelecimentos congêneres…” (CPP, art. 541, § 2º, b).
Ver Constante (P. 223).
Constatar – Galicismo?
1. É verbo de largo uso nos meios jurídicos, com o significado de
comprovar, verificar estabelecer a verdade de um fato. Ex.: “A perícia
constatou a autoria do crime”.
2. Apesar de muito expressivo e de sua intensa utilização nesse sentido, é
vocábulo condenado por alguns, sob a acusação de galicismo.
3. Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 64), nessa esteira, reputa-o
inteiramente inútil, aconselhando sua substituição por verbos sinônimos,
que sejam efetivamente de nosso léxico: averiguar, certificar,
comprovar, demonstrar, notar, verificar.
4. Eduardo Carlos Pereira também o insere no rol dos galicismos léxicos,
daqueles que “são verdadeiras deturpações da língua, contra os quais
devemos estar premunidos” (1924, p. 260-261).
5. De igual modo para Vitório Bergo (1943, p. 117), é galicismo real e
inadmissível.
6. Muito embora esse radical esteja integrado na linguagem forense –
como, por exemplo, em “auto de constatação” – Edmundo Dantès
Nascimento (1982, p. 20), que inclui o vocábulo entre os estrangeirismos
léxicos encontrados na linguagem forense, anota que sempre haverá
ensejo para empregar as expressões portuguesas: verificar, certificar,
apurar, demonstrar, evidenciar.
7. Cândido Jucá Filho (1981, p. 55), por seu lado, o tem na conta de um
daqueles “galicismos inevitáveis”.
8. E Pedro A. Pinto – após noticiar idêntica condenação por Cândido de
Figueiredo como galicismo vitando, moderno e desnecessário, ao
responder a um consulente que lhe indagava se podia considerar tal
vocábulo um brasileirismo – anotava que se encontra tal verbo com o
sentido de certificar, mostrar, provar, em obras de vulto como as de José
Veríssimo e Ramalho Ortigão.
9. E rematava: “Não é o uso do galicismo constatar peculiaridade do falar
ou do escrever brasileiro, não é um galicismo brasileiro” (PINTO, 1924,
p. 272-5).
10. Retratando o pensamento vigente na atualidade e que parece o que
deva ser seguido nos próprios textos que devam submeter-se à norma
culta, assim se expressa Arnaldo Niskier: “Apesar de condenado como
galicismo pelos puristas, o verbo constatar é bastante difundido no
português moderno. Insistir em considerá-lo vício de linguagem não
leva a nada. Melhor é combater os anglicismos introduzidos
principalmente pela televisão e que hoje infestam nossa língua” (1992,
p. 9).
11. Aos que pretendem substituir esse verbo por verificar, Francisco
Fernandes resume com propriedade: “É pouco provável que a nossa
linguagem vulgar dispense este verbo. Sente-se que em constatar há
uma significação especial que não se encontra no português verificar…
Se… queremos exprimir não somente a ideia de verificar mas também
a de registrar, documentar para efeito ulterior, dizemos constatar. E
esta é a verdadeira acepção de constatar” (1971, p. 164).
12. Espancando quaisquer dúvidas acerca de sua existência entre nós, o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa – palavra oficial para
listar os vocábulos pertencentes ao nosso idioma – arrola o verbo
constatar entre as palavras de nosso léxico (2009, p. 212), motivo por
que está oficialmente autorizado seu emprego nos textos que devam
submeter-se à norma culta.
13. Há exemplos de seu emprego em dispositivos de lei entre nós: a)
“Constatando a ocorrência de nulidade sanável, o tribunal poderá
determinar a realização ou renovação do ato processual, intimadas as
partes…” (CPC/1973, art. 515, § 4º, incluído pela Lei 11.276, de
2006); b) “As penas de apreensão, de inutilização de produtos, de
proibição de fabricação de produtos, de suspensão do fornecimento de
produto ou serviço, de cassação do registro do produto e revogação da
concessão ou permissão de uso serão aplicadas pela administração,
mediante procedimento administrativo, assegurada ampla defesa,
quando forem constatados vícios de quantidade ou de qualidade por
inadequação ou insegurança – do produto ou serviço” (CDC, art. 58).
Constituir
1. Quanto à ortografia, como todo verbo terminado em uir, só pode dar
origem à terminação ui na segunda e terceira pessoas do singular do
presente do indicativo: constituo, constituis, constitui.
2. Diferentemente dos verbos terminados em uar (como continuar), são
errôneas as grafias com e em tais situações: constitues, constitue.
3. Nas palavras de Cândido de Oliveira, após verificação dos muitos erros
cometidos nesse campo, “é com i a segunda e terceira pessoas do
singular do presente do indicativo dos verbos terminados em uir: aflui,
fruis, retribui, retribuis, contribui, contribuis, influi, influis” (1961, p.
64).
4. Atentos aos frequentes equívocos que ocorrem nos meios jurídicos (veja-
se, por exemplo, a expressão nomeia e constitui, empregada em
instrumentos de mandato, que muitos escrevem nomeia e constitue),
assim observam Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade: “Os
verbos em uir (concluir, possuir, estatuir etc.) têm um i na terceira
pessoa do singular do presente do indicativo e não e, como aparece até
em modelos de procuração” (1999, p. 53).
5. No que concerne à regência verbal, há dois verbos: constituir e
constituir-se: “Constituir é transitivo direto; constituir-se rege a
preposição em” (NISKIER, 1992, p. 104). Exs. a) “Os fatos até agora
narrados constituem toda a atuação do réu”; b) “Os fatos até agora
narrados constituem-se em toda a atuação do réu”.
6. Muito embora tais estruturas sejam sinônimas e possam ser usadas
facultativamente, é preciso cuidado, para que não se proceda a uma
indevida mescla. Ex.: “Os fatos até agora narrados constituem em toda
a atuação do réu” (errado).
7. Para Celso Pedro Luft, “a construção originária é algo ou alguém
constitui algo”, e “constituir-se em algo é inovação sintática, já familiar
à nossa imprensa” (1999, p. 144-5).
8. Observa Domingos Paschoal Cegalla, sob outro aspecto, que a
construção reflexiva constituir-se em, no significado de arvorar-se em, é
geralmente censurada de galicismo.
9. Entende, todavia, tal autor que “a censura só é plausível quando, na
construção em apreço, se emprega a preposição em” (CEGALLA, 1999,
p. 146), motivo por que se há de atentar para os seguintes exemplos, com
a indicação de sua correção ou incorreção: a) “Ele se constituiu em chefe
do bando” (errado); b) “Ele se constituiu chefe do bando” (correto).
10. Exemplos registrados por Francisco Fernandes (1971, p. 164)
corroboram esse entendimento: a) “Constituiu-se chefe supremo”
(Constâncio); b) “Assistiu-lhe com a mais desvelada benquerença,
constituindo-se seu procurador” (Camilo Castelo Branco).
Constranger
1. Etimologicamente, vem do latim com o significado de apertar, ligar,
prender.
2. Na esfera jurídica, quer dizer obrigar uma pessoa a fazer o que ela não
pretende ou não quer fazer, ou, ainda, impedi-la de fazer o que quer
realizar.
3. Nesse sentido, o art. 50, II, da Constituição Federal de 1988 determina
taxativamente que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer
alguma coisa senão em virtude de lei”.
4. E, no âmbito criminal, o art. 146 do Código Penal assim tipifica o crime
de constrangimento ilegal: “Constranger alguém, mediante violência ou
grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio,
a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o
que ela não manda”.
5. Quanto à conjugação verbal, como todos os verbos terminados em ger,
para a continuidade do som original da última consoante do radical,
muda o g em j antes de o e de a. Assim: constranjo, constranges,
constrange… (presente do indicativo); constranja, constranjas (presente
do subjuntivo).
6. Feitas essas observações, anota-se que se trata de verbo conjugado em
todas as pessoas, tempos e modos, e – como essa modificação da última
letra do radical de g para j se dá apenas no presente do indicativo e
tempos daí derivados (presente do subjuntivo, imperativo afirmativo e
imperativo negativo) – é escrito com g em todos os demais tempos:
constrangia (imperfeito do indicativo), constrangerei (futuro do
presente), constrangeria (futuro do pretérito), constrangido (particípio),
constrangendo (gerúndio), constrangi (pretérito perfeito), constrangera
(pretérito mais-que-perfeito), constranger (futuro do subjuntivo),
constrangesse (imperfeito do subjuntivo).
7. Seguem as mesmas observações eleger, proteger, ranger, tanger.
Construir
1. Para José de Nicola e Ernani Terra, esse verbo, ainda hoje, “admite
também as formas construis, construi, construem no presente do
indicativo e construi no imperativo afirmativo” (2000, p. 73).
2. A um consulente que lhe perguntava qual a forma correta – ele construi
ou ele constrói – respondia Cândido de Figueiredo: “Construi é flexão
regular e legítima, mas desusada. Usado é constrói” (1948, p. 186).
3. Além da conjugação conhecida (construo, constróis, constrói,
constroem), vem de Vitório Bergo o seguinte ensinamento: “usa-se
também a forma regular, com u em todas as pessoas: construo,
construes, construe, construem…” (1943, p. 146).
4. Otelo Reis (1971, p. 134), em sua indispensável obra, registra, de igual
modo, a dupla possibilidade de uso: construis ou constróis, construi ou
constrói, e construem ou constroem. (Observe-se que a forma verbal
constroem não recebe acento gráfico, o que frequentemente ocorre por
contaminação da forma singular constrói).
5. Domingos Paschoal Cegalla, por sua vez, anota que “modernamente não
se usam as formas regulares construís, construi, construem” (1999, p.
87).
6. Quer pelo número de gramáticos favoráveis, quer pela divergência entre
eles, quer, ainda, pelo vetusto princípio de que, na diversidade de
posicionamentos, deve-se facilitar o uso, o melhor parece ser aceitar a
possibilidade de emprego de todas as formas mencionadas.
7. A questão, assim, cinge-se tão somente ao campo da preferência, sem
afastar a correção da forma preterida, apenas se observando a lição de
Francisco Fernandes (1971, p. 164-5), que transcreve ensino de Júlio
Nogueira: “Entre constróis, constrói e construis, construi, as primeiras
formas são vencedoras em quase todo o Brasil, pelo que devem ser
preferidas”.
Ver Verbos abundantes (P. 759).
Consulesa – Existe?
Ver Capitã, Capitoa ou A Capitão? (P. 168) e Poeta – Qual o feminino? (P.
570)
Consumerismo
1. Em inglês, consumer significa consumidor, o que, em termos de técnica
jurídica, quer indicar aquela pessoa que adquire produtos ou serviços
para seu próprio uso.
2. Também naquele idioma, de consumer deriva consumerism, palavra que
lá tem dois significados: a) mania ou excesso de consumo, que se
manifesta no hábito de comprar bens ou serviços em exagero, ou não
essenciais, ou desnecessários; b) estrutura jurídica que busca estabelecer
regras de proteção aos adquirentes de bens e serviços contra sua baixa
qualidade e alertar quanto aos perigos que alguns deles representam para
as pessoas.
3. Ora, entre nós, para representar a compulsão ao consumo, de há muito
existe a palavra consumismo. Todavia, para a estrutura de proteção ao
consumidor (preocupação antiga em países de língua inglesa, mas
recente em nosso meio), nosso idioma trouxe o vocábulo consumerism e
o aportuguesou normalmente: consumerismo (não é consumeirismo).
4. Essa, aliás, é a forma que consta no Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, que é o órgão
que tem a delegação legal para determinar oficialmente quais palavras
pertencem ao nosso léxico, bem como qual sua adequada grafia em
Português (2009, p. 212).
5. Por fim, se se quiser empregar não o substantivo, mas o adjetivo
referente ao consumidor em tais casos, dir-se-á consumerista (não,
porém, consumeirista).
Conter
Ver Ter (P. 730).
Conteste ou Inconteste?
Ver Inconteste ou Incontestável? (P. 406)
Continuar
1. Quanto à ortografia, como todo verbo terminado em uar, dá ele origem à
terminação ue: continues, continue.
2. Diferentemente dos verbos terminados em uir (como possuir), não tem
continuar forma alguma com a terminação ui, sendo errôneas as grafias
continuis, continui.
3. Nas palavras de Cândido de Oliveira, alertado pelos comuns equívocos
cometidos nesse campo, “é com ue a primeira, segunda e terceira
pessoas do singular do presente do subjuntivo dos verbos em uar: cultue,
cultues, habitue, preceitues” (1961, p. 65).
4. Quanto à conjugação verbal, é verbo regular, conjugado em todas as
pessoas, tempos e modos.
5. Oportuno é anotar que os verbos terminados em uar fazem a primeira
pessoa do singular sem qualquer irregularidade, jamais como pretendem
alguns: assim, suar faz suo, não soo.
Contraditar ou Contradizer?
1. A indagação que hoje se faz é se, em termos de técnica processual, o
correto é contraditar ou contradizer, já que ambos são encontrados nos
autores de obras de Direito e ambas são formas encontradiças na
linguagem forense.
2. Uma consulta ao Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa –
editado pela Academia Brasileira de Letras, órgão que recebeu a
delegação legal para dizer, com autoridade oficial, quais os vocábulos
pertencentes ao nosso idioma – revela que existem em nosso léxico
ambas as palavras: contraditar ou contradizer (VOLP, 2009, p. 214). Não
parece haver dificuldade alguma até aqui.
3. Além disso, uma busca nas origens vai demonstrar que ambas as formas
vêm do latim e do mesmo verbo e, assim, integram uma mesma família
etimológica, configurando aquilo que tecnicamente denominamos
cognatos: a) contradizer deriva de dicere, que é o infinitivo; b)
contraditar nasce de dictum, que é o supino; c) ambas as formas
pertencem ao verbo dico, dicis, dixi, dictum, dicere.
4. Quanto ao conteúdo semântico no campo do Direito, todavia, esses
verbos seguem caminhos um pouco diferentes.
5. Assim, contradizer, na esfera jurídica, costuma empregar-se para os
seguintes sentidos: a) Divergir de si próprio, em afirmativas feitas sobre
o mesmo caso ou sobre a mesma coisa: “Em seu depoimento, a
testemunha se contradisse em pontos importantes”; b) Divergir das
afirmativas ou da opinião de outrem: “A testemunha contradisse os
esclarecimentos do perito”.
6. Já contraditar, na terminologia forense, tem o significado técnico de
opor-se a que alguém sirva de testemunha em um processo, em razão de
sua incapacidade (por exemplo, o interdito por demência), impedimento
(quem é parte na causa) ou suspeição (inimigo capital ou amigo íntimo
de uma das partes). Exs.: a) “É lícito à parte contraditar a testemunha,
arguindo-lhe a incapacidade, o impedimento ou a suspeição”
(CPC/1973, art. 414, § 1º); b) “Antes de iniciado o depoimento, as partes
poderão contraditar a testemunha ou arguir circunstâncias ou defeitos,
que a tornem suspeita de parcialidade, ou indigna de fé. O juiz fará
consignar a contradita ou arguição e a resposta da testemunha, mas só
excluirá a testemunha ou não lhe deferirá compromisso nos casos
previstos nos arts. 207 e 208” (CPP, art. 214).
Contralto
1. Atente-se, de início, à observação de que é errôneo pensar que não há
homens contraltos; se não é tal voz normal em adultos, é, no entanto,
própria dos meninos.
2. No plano da concordância nominal, de conformidade com ensino de
Aires da Mata Machado Filho (1969a, p. 562), se tal substantivo vem
acompanhado de adjetivo, este fica formalmente no masculino,
ajustando-se ao substantivo modificado, sem qualquer reflexo sobre ele
do artigo determinador do gênero: a contralto lírico.
3. Já para Silveira Bueno, no que concerne aos qualificativos (incluindo o
artigo) de tal palavra, que ele iguala em tratamento a soprano, “não
devemos colocar no feminino os adjetivos que acompanham soprano
porque tais adjetivos modificam o substantivo oculto tom – tom soprano.
De acordo com isto, devemos dizer: Cantará hoje o grande soprano
Bidu Saião”.
4. Complementa tal autor (BUENO, 1938, p. 156-7) que se deve dizer meio
soprano, soprano lírico, soprano ligeiro, soprano dramático, devendo
todos os adjetivos e palavras referentes ao substantivo ir para o
masculino. E traz ele exemplo de Machado de Assis: “A vida é uma
grande ópera. O tenor e o barítono lutam pelo soprano, em presença do
baixo e dos comprimários, quando não são o soprano e o contralto que
lutam pelo tenor, etc.”.
5. Celso Cunha (1970, p. 99), sem explicações adicionais, recomenda a
preferência pelo gênero masculino.
6. Espancando toda e qualquer dúvida, o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, que é o veículo
oficial para dirimir dúvidas acerca da existência ou não de vocábulos em
nosso idioma, bem como acerca de sua classificação e seu gênero,
registra tal substantivo apenas como masculino (2009, p. 214), de modo
que legem habemus, devendo prestar obediência ao quanto assim
determinado.
7. Anote-se, ao longo dos tempos, apenas a diversidade de avaliação do
problema por parte do VOLP, o qual, para o vocábulo soprano,
registrava, até sua edição de 1999, a possibilidade de emprego nos dois
gêneros, masculino e feminino. Esse problema, no entanto, encontra-se
superado na edição atual, que registra o vocábulo apenas como adjetivo
ou substantivo masculino (2009, p. 765).
Ver Soprano (P. 710).
Contra ou a favor
1. Partindo da indagação “Você é contra ou a favor do aborto?”, Arnaldo
Niskier demonstra, por primeiro, uma posição mais liberal do que a
sustentada pela Gramática em vigor na atualidade: “Nesses casos,
quando dois ou mais nomes, ou verbos, que possuem diferentes
regências exigem lógica e estilisticamente o mesmo complemento, deve-
se abandonar o rigor gramatical (que exigiria você é contra o aborto ou a
favor dele?) em proveito do estilo. Consideremos, pois, correta a frase
do exemplo”.
2. Ao depois, todavia, acaba ele por pregar o respeito às normas
gramaticais em vigor: “Mas, em geral, devemos respeitar as diferentes
regências” (NISKIER, 1992, p. 99).
3. Ante tal posicionamento dúbio, deve-se indagar ao referido autor:
quando a Gramática deve ceder em favor do estilo, e quando deve este
último prevalecer? Ou ainda: quando se há de reputar mais proveitoso o
estilo, e quando se há de dar maior importância ao respeito às diversas
regências?
4. Em verdade, da lição do ilustrado autor, parece ser possível deduzir que
a posição mais liberal fica para a linguagem coloquial, devendo-se,
contudo, obedecer às regras tradicionais, quando se estiver diante de um
texto que deva submeter-se aos ditames da norma culta.
5. Lembrando que uma construção como essa “não é Português”, observa
Edmundo Dantès Nascimento que “o nome ou pronome regidos por duas
ou mais preposições devem estar claros junto de cada uma delas”,
motivo por que, no entender do referido autor, as frases corretas devem
trazer o nome repetido desta maneira: a) “Há nos autos elementos a
favor da tese dos apelantes e contra ela”; b) “O réu foi procurado antes
das férias e durante elas”; c) “O réu foi procurado antes das férias
forenses e depois delas”.
6. Essa, ainda na lição de tal autor (NASCIMENTO, 1982, p. 158-60), é a
construção que normalmente se vê nos clássicos.
7. Estabelecendo, em continuação, importante princípio, assinala tal autor
(NASCIMENTO, 1982, p. 158-60) que “não há erro, quando se
empregam locuções preposicionais terminadas com a mesma preposição
formadora da locução” – geralmente a e de e, raramente, com – de modo
que é correta a expressão “… antes e depois das férias…” (as locuções
preposicionais, no caso, são antes de e depois de, ambas terminadas com
a mesma preposição de).
8. No caso que se aprecia, contudo, o que se tem, em realidade, é uma
locução (contra) e uma locução prepositiva (a favor de), cada qual com
estrutura própria, diversa da outra, de modo que o melhor é afastar a
possibilidade de construção abreviada, não se admitindo, assim, um
mesmo complemento para ambas.
9. Vale, em realidade, lembrar aqui a interessante lição de Vitório Bergo
sobre a expressão antes, durante e depois da festa: “Vê-se e ouve-se com
frequência esta expressão com um complemento comum. Observe-se,
porém, que não se diz durante da festa, e sim durante a festa. Isto é sinal
de que para a preposição durante não fica bem o complemento da festa,
bem empregado em relação a antes e depois. Diga-se, portanto, antes e
depois da festa e durante ela – ou – durante a festa, antes e depois dela”
(BERGO apud KASPARY, 1996, p. 366).
10. Vale confirmar: não se diz contra do aborto nem a favor o aborto, o
que quer dizer que para a locução prepositiva a favor de não fica bem o
complemento o aborto, bem empregado em relação à preposição
contra. Diga-se, portanto, contra o aborto ou a favor dele.
Ver Antes e depois (P. 120) e Com ou sem – Está correto? (P. 198)
Contra-razões ou Contrarrazões?
1. Ante as recentes modificações quanto ao emprego do hífen, ocasionadas
pelo Acordo Ortográfico de 2008, diversos leitores indagam qual a
forma correta da expressão: Contra-razões de apelação ou Contrarrazões
de apelação?
2. Pelas regras do Acordo Ortográfico de 2008, apenas se emprega o hífen
com o prefixo contra em dois casos: a) quando o segundo elemento
começa por h (contra-habitual, contra-harmonia, contra-haste, contra-
homônimo); b) quando o elemento seguinte se inicia com a mesma vogal
que termina o prefixo (contra-acusação, contra-almirante, contra-
apelação, contra-arrestar, contra-ataque).
3. Desse modo, acopla-se diretamente à palavra seguinte, sem
intermediação de hífen, quando iniciada esta por outra vogal, que não a
que encerra o prefixo: contraescritura, contrainterpelar, contraoferta.
4. Continua valendo a regra de junção direta, mesmo que o elemento
seguinte se inicie por consoante: contrabalançar, contracapa,
contracheque.
5. Apenas para a hipótese de ser o segundo elemento iniciado por r ou s,
dobram-se tais consoantes para continuidade do som originário:
contrarreforma, contrarregra, contrarréplica, contrasseguro,
contrassenso, contrassistema.
6. De modo prático para o caso da consulta, vê-se que o correto, quando se
juntam os elementos contra + razões é contrarrazões, e não mais contra-
razões.
7. Adiciona-se ponderação importante: o ato de argumentar e escrever as
razões de apelação tanto pode ser razoar como arrazoar. Desse modo,
oferecer a respectiva resposta tanto pode ser contrarrazoar (resultado de
contra + razoar) como contra-arrazoar (resultado de contra + arrazoar).
Contrariamente ao réu
Ver Advérbios em “mente” (P. 85).
Contrarrazoar ou Contra-arrazoar?
Ver Contra-arrazoar o recurso ou Contra-arrazoar ao recurso? (P. 226) e
Contra-razões ou Contrarrazões? (P. 229)
Contribuir
1. Quanto à ortografia, como todo verbo terminado em uir, só pode dar
origem à terminação ui na segunda e terceira pessoas do singular do
presente do indicativo: contribuo, contribuis, contribui.
2. Diferentemente dos verbos terminados em uar (como continuar), são
errôneas as grafias com e em tais situações: contribues, contribue.
3. Nas palavras de Cândido de Oliveira, atento aos frequentes equívocos
cometidos nesse campo, “é com i a segunda e terceira pessoas do
singular do presente do indicativo dos verbos terminados em uir: aflui,
fruis, retribui, retribuis, contribui, contribuis, influi, influis” (1961, p.
64).
Controle
1. Com a mesma grafia, há o substantivo, que significa basicamente
fiscalização e há o verbo controle (de controlar), na terceira pessoa do
singular do presente do subjuntivo, com o sentido de fiscalizar.
2. Ambas são palavras de mesma grafia (homófonas) mas com pronúncia
diversa (heterófonas).
3. Apresentando-se, assim, um problema de ortoepia, é de se especificar
que o verbo (que eu controle) tem o som aberto (ó), ao passo que o
substantivo (o controle), contrariamente ao uso frequente nos meios
forenses e nos discursos dos políticos, tem som fechado (ô) tanto no
singular (o controle) quanto no plural (os controles).
4. Sem explicações adicionais, observa Domingos Paschoal Cegalla que “a
pronúncia corrente é contrôle, porém a mais coerente é contróle, com a
vogal tônica aberta, como em todas as palavras terminadas em ole: fole,
gole, prole etc.” (1999, p. 88).
5. Entretanto o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras, que é o veículo oficial para dirimir
dúvidas acerca da existência ou não de vocábulos em nosso idioma, bem
como acerca de sua grafia e pronúncia, manda pronunciar o substantivo
com o o fechado (ô), aspecto esse que, só por si, já determina o modo
oficial correto de articulação do referido vocábulo, já que, nesse caso,
legem habemus, e a tal determinação legal haveremos de prestar
obediência (2009, p. 216).
Convergir
1. Quanto à conjugação verbal, aparece um i na primeira pessoa do singular
do presente do indicativo e nos tempos dela derivados: convirjo,
converges, converge, convergimos, convergis, convergem (presente do
indicativo); convirja, convirjas, convirja, convirjamos, convirjais,
convirjam (presente do subjuntivo); converge, convirja, convirjamos,
convergi, convirjam (imperativo afirmativo); não convirjas, não
convirja, não convirjamos, não convirjais, não convirjam (imperativo
negativo).
2. Além disso, como é de fácil percepção, o g final do radical transforma-se
em j antes de a e de o, situação essa que se apresenta apenas no presente
do indicativo e nos tempos daí derivados.
3. Não aparecem tais dificuldades nos demais tempos: convergia (pretérito
imperfeito do indicativo), convergi (pretérito perfeito do indicativo),
convergira (pretérito mais-que-perfeito do indicativo), convergirei
(futuro do presente), convergiria (futuro do pretérito), convergir (futuro
do subjuntivo), convergisse (imperfeito do subjuntivo), convergindo
(gerúndio), convergido (particípio passado).
4. Não apresenta problemas ou irregularidades em outros tempos.
Convir
Ver Vir (P. 770).
Convosco
Ver Com nós – Existe? (P. 196), Conheço todos eles – Está correto? (P. 217)
e Pronome pessoal (P. 614).
Copiar
1. É verbo regular, sem alteração alguma, e serve de modelo para todos os
terminados em iar.
2. Pode trazer dúvidas no presente do indicativo e tempos derivados: copio,
copias, copia, copiamos, copiais, copiam (presente do indicativo); copie,
copies, copie, copiemos, copieis, copiem (presente do subjuntivo); copia,
copie, copiemos, copiai, copiem (imperativo afirmativo); não copies,
não copie, não copiemos, não copieis, não copiem (imperativo
negativo).
3. São errôneas as formas que as pessoas incultas proferem, confundindo
verbos terminados em iar com verbos terminados em ear: copeio,
vareia, apreceia.
4. Por esse verbo, conjugam-se todos os terminados em iar, menos mediar,
ansiar, remediar, incendiar e odiar (lembrar, com as iniciais de cada um
deles, a sigla MARIO), que têm por modelo o último nomeado e
recebem um i intermediário nas formas rizotônicas: odeio, odeias, odeia,
odiamos, odiais, odeiam (presente do indicativo); odeie, odeies, odeie,
odiemos, odieis, odeiem (presente do subjuntivo).
5. Vale a pena reiterar com a percuciente observação de Otelo Reis acerca
dos verbos em iar: “Pessoas incultas tendem a confundir estes verbos
com os terminados em ear, e dizem: copeio, vareia, apreceio, etc. Esta
pronúncia incorreta chega, em alguns lugares, a contaminar a própria
linguagem de algumas pessoas cultas” (1971, p. 63-4).
Coronela – Existe?
Ver Capitã, Capitoa ou A Capitão? (P. 168) e Poeta – Qual o feminino? (P.
570)
Correicional ou Correcional?
1. Um leitor pergunta qual a forma correta para designar uma das
atribuições das Corregedorias: atividade correicional ou atividade
correcional?
2. Diga-se, num primeiro aspecto, que o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa registra tanto correção como correição para designar o ato
de corrigir (ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 221).
3. Pela tradição do Poder Judiciário, porém, tem-se reservado o termo
correição (e não correção) para designar a visita e a fiscalização feitas
por autoridade competente aos estabelecimentos submetidos a seu
controle.
4. Acrescente-se, porém, que, embora o VOLP registre tanto correção
como correição, o certo é que, ao dar os respectivos adjetivos, não
apresenta a variante correicional, e sim, apenas, correcional
(ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 221).
5. Sempre é bom lembrar que o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa é uma espécie de dicionário que lista as palavras
reconhecidas oficialmente como pertencentes à língua portuguesa, bem
como lhes fornece a grafia oficial.
6. Também conhecido pela sigla VOLP, é organizado e publicado pela
Academia Brasileira de Letras, a qual tem a delegação oficial e a
responsabilidade legal de editá-lo, em cumprimento à Lei Eduardo
Ramos, de n. 726, de 8/12/1900.
7. Voltando ao caso da consulta: a) atividade correcional (correto); b)
atividade correicional (errado).
Correio ou Correios?
1. Um leitor pergunta qual a forma correta: correio ou correios?
2. Para bem situar a questão, importa observar que, na origem, correio era
um mensageiro, um indivíduo que portava mensagens.
3. No decorrer dos tempos, passou a significar também o sistema de
comunicação que pressupõe um intercâmbio de mensagens, feito
especialmente por meio da troca de correspondência entre as pessoas.
4. Em seguida, por metonímia, passou, de igual modo, a abranger a
repartição onde se operam as trasladações de correspondência entre os
usuários desse sistema.
5. Apenas para não estender em demasia estas considerações, anota-se que,
também por metonímia, passou a significar o prédio, o edifício que
abriga esse tipo de repartição.
6. Com essas considerações, com tantos significados, ora querendo dizer
uma unidade, ora com a acepção de uma pluralidade, vê-se que não há
como vedar a possibilidade de uso do vocábulo correio tanto no singular
quanto no plural, conforme o sentido que se lhe quiser dar.
Correlação temporal
Ver Consecução dos tempos verbais (P. 219).
Correspondência temporal
Ver Consecução dos tempos verbais (P. 219).
Cortou-se-a – Existe?
1. É expressão errada, já que, em Português, o pronome se jamais combina
na mesma frase com o pronome o, a, os, as.
2. O pronome por último referido, em estruturas desse jaez, há de ser o
sujeito (caso reto, portanto), e os pronomes o, a, os, as são do caso
oblíquo, jamais podendo funcionar como sujeito.
3. Corrija-se, assim, tal expressão, por um dos seguintes modos: a)
Coloque-se em lugar dos pronomes condenados uma palavra que possa
ser sujeito (“Cortou-se a frase”); b) Use-se o pronome do caso reto, de
indiscutível correção em tais casos, muito embora a muitos pareça
contrário à eufonia (“Cortou-se ela”); c) Elimine-se simplesmente o
pronome oblíquo, que é o ponto de discórdia no caso, mas isso apenas
quando tal é possível sem comprometimento do sentido do contexto
(“Cortou-se”); d) Transponha-se o exemplo para a voz passiva analítica,
situação essa em que errar é mais difícil (“Ela foi cortada”); e) Ponha-se
o verbo na primeira pessoa do plural, adotando-se uma forma
determinada, pessoal, com o que se elimina o se (“Cortamo-la”); f)
Empregue-se o verbo na voz ativa, na terceira pessoa do plural e sem
sujeito explícito (“Cortaram-na”).
Ver Cite-se-o – Está correto? (P. 184)
Cota ou Quota?
1. Para Domingos Paschoal Cegalla, ambas as formas são corretas: cota e
quota; apenas – observa ele – “a primeira é mais usada que a segunda”
(1999, p. 91).
2. Consoante ensino adicional de Luciano Correia da Silva, usa-se quota ou
cota, “no sentido de parte, quinhão, porção determinada… ou
manifestação do advogado e, na prática, geralmente do promotor, nos
processos, bem como dos representantes do fisco” (1991, p. 112).
3. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, órgão incumbido
oficialmente de determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma,
além de sua grafia oficial, registra ambas as formas (ACADEMIA
BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 224 e 697) e, até a edição de 1999
(ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, p. 215 e 667), procedia à
remissão recíproca, em evidência de que as reputava formas sinônimas e
intercambiáveis.
4. É certo que alguns vislumbram a possibilidade de conferir a quota o
significado de determinada porção, de quinhão, deixando para cota a
acepção de nota, apontamento, ou manifestação de pequena extensão nos
autos de um processo.
5. Não há, todavia, respaldo científico para tal diferenciação, pois ambas
vêm de mesma palavra no latim (quota), sendo, em nosso idioma, quota
mais antiga e cota mais moderna, ocorrendo com esta última o mesmo
que se deu com a palavra quatorze, que hoje convive com catorze, em
que a eliminação de pronúncia do u fez surgir a grafia do c.
6. Em corroboração, basta que se observe que o Dicionário da
Melhoramentos registra cota e lhe confere ambos os significados, e, ao
depois, simplesmente remete quota ao primeiro vocábulo mencionado;
adicionalmente, até mesmo fala em “fração do capital de uma sociedade
por cotas de responsabilidade limitada” (Encyclopaedia Britannica do
Brasil, 1995, p. 500 e 1.445).
7. Maria Helena Diniz (1998, p. 910), de igual modo, os reputa vocábulos
intercambiáveis, independentemente do sentido no contexto e vê em cota
ao menos duas acepções importantes: a) em Direito Civil, significa “o
quinhão de cada condômino”, ou a “porção da herança cabível a cada
herdeiro”, ou a “fração de bens de que o testador pode livremente dispor
por ato de última vontade”, ou, ainda, a “quantia com que cada devedor
se compromete numa obrigação”, ou, também, a “parcela com que se
contribui para a consecução de determinado fim”, ou mesmo a “parte
ideal de um todo”; b) em Direito Processual Civil, seu significado mais
conhecido seria a “anotação ou apontamento feito por advogado no
ventre dos autos, prestando esclarecimentos ou dando informações ao
juiz ou ao adversário, pois por lei é defeso neles lançar cotas marginais
ou interlineares”.
8. Em outra parte de sua obra, ao discorrer sobre quota, a mesma autora
(DINIZ, 1998, p. 24) reitera a possibilidade de ambos os significados, a
saber, porção determinada ou quinhão, e nota concisa no corpo dos
autos.
9. O Código Comercial de 1850 prefere quotas nos arts. 289, 292 e 302.
10. O Decreto-lei 3.708, de 10/1/19, que regulou a “constituição de
sociedades por quotas de responsabilidade limitada”, manteve a grafia
da epígrafe nos arts. 1º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 14 e 17.
11. Nessa mesma acepção, já a Lei de Falências, pelo Decreto-lei 7.661, de
21/6/45, preferiu outra escrita, ao referir, no art. 6º, “sociedade por
cotas”.
12. E, no sentido de nota concisa ou manifestação, o art. 161 do Código de
Processo Civil determina ser “defeso lançar, nos autos, cotas marginais
ou interlineares”.
13. Vejam-se exemplos do emprego de quota em dispositivos de lei: a)
“Quando o pagamento for em quotas periódicas, a quitação da última
estabelece, até prova em contrário, a presunção de estarem solvidas as
anteriores” (CC, art. 322); b) “Salvo estipulação em contrário, o sócio
participa dos lucros e das perdas, na proporção das respectivas
quotas, mas aquele, cuja contribuição consiste em serviços, somente
participa dos lucros na proporção da média do valor das quotas” (CC,
art. 1.007); c) “Quando, por lei ou pelo contrato social, competir aos
sócios decidir sobre os negócios da sociedade, as deliberações serão
tomadas por maioria de votos, contados segundo o valor das quotas de
cada um” (CC, art. 1.010, caput); d) “Na sociedade limitada, a
responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas
todos respondem solidariamente pela integralização do capital social”
(CC, art. 1.052); e) “O capital social divide-se em quotas, iguais ou
desiguais, cabendo uma ou diversas a cada sócio” (CC, art. 1.055,
caput); f) “Ressalvado o disposto em lei especial, integralizadas as
quotas, pode ser o capital aumentado, com a correspondente
modificação do contrato” (CC, art. 1.081, caput); g) “A penhora
observará, preferencialmente, a seguinte ordem: … ‘VI – ações e
quotas de sociedades empresárias’” (CPC/1973, art. 655, VI – em
redação conferida pela Lei 11.382/2006).
14. E também se vejam exemplos do uso da palavra cotas em outros
dispositivos: a) “É defeso lançar, nos autos, cotas marginais ou
interlineares; o juiz mandará riscá-las, impondo a quem as escrever
multa correspondente à metade do salário mínimo vigente na sede do
juízo” (CPC/1973, art. 161); b) “Nos trabalhos de campo observar-se-
ão as seguintes regras: … VI – tomar-se-ão por aneróides ou por cotas
obtidas mediante levantamento taqueométrico as altitudes dos pontos
mais acidentados” (CPC/1973, art. 960, VI); c) “Não se aplica o
disposto no inciso IV caso o sócio remanescente, inclusive na hipótese
de concentração de todas as cotas da sociedade sob sua titularidade,
requeira no Registro Público de Empresas Mercantis a transformação
do registro da sociedade para empresário individual, observado, no
que couber, o disposto nos arts. 1.113 a 1.115 deste Código” (CC, art.
1.033, parágrafo único)
CPI ou C.P.I.?
Ver Abreviatura, Abreviação e Sigla – O que é e Como usa? (P. 55)
Crase inexistente
1. Aires da Mata Machado Filho já teve oportunidade de afirmar que “a
crase é casca de banana em que tem escorregado muito cavalheiro
ilustre” (s/d, p. 10).
2. Essa advertência deve-nos estimular à busca das reais e efetivas regras
para seu uso: pela ordem, crase, crase proibida, crase obrigatória, crase
antes de pronomes, crase antes de pronomes relativos.
3. Com tais conceitos básicos, ver-se-á com clareza o equívoco existente no
dispositivo legal seguinte: “Os honorários periciais serão pagos em
valor fixo, estabelecido pelo juiz, atendida à complexidade do trabalho
desenvolvido” (art. 19, § 2º, da Lei Complementar 76, de 6/7/93, que
dispôs sobre desapropriação).
4. Ora, a aplicação da regra mais comum de crase – substituir mentalmente.
O nome feminino por um correspondente masculino – evidencia a
inexistência de preposição, e, por conseguinte, a impossibilidade de
crase no caso concreto. Assim: atendido o volume do trabalho; e, por
conseguinte, atendida a complexidade.
5. Veja-se este outro dispositivo: “Qualquer das Altas Partes Contratantes
reserva-se a faculdade de limitar à obrigação assumida, em virtude do
art. 1º da Convenção, exclusivamente às disposições relativas às letras,
não introduzindo no seu território as disposições sobre notas
promissórias constantes do Título II da Lei Uniforme”.
6. Ora, no que tange à regência verbal, o verbo limitar, no sentido do texto,
corresponde à construção limitar uma coisa a outra coisa. Vale dizer, em
correção do texto: … reserva-se a faculdade de limitar a obrigação
assumida… às disposições relativas às letras.
Crase obrigatória
1. Mesmo sem se estudar a crase quanto a suas regras gerais, em alguns
casos, desde logo, é sabido que ela deve ser utilizada.
2. Especificam-se, a seguir, quais são tais casos em que se emprega
obrigatoriamente a crase, sem quaisquer outros questionamentos: a) Se
há elipse da expressão moda ou moda de. Ex.: “Ele usava um penteado à
Castro Alves”. b) Nas locuções adverbiais, prepositivas ou conjuntivas,
formadas por palavras femininas (equivalem a advérbios, preposições ou
conjunções). Exs.: i) “Ele saiu às pressas” (locução adverbial); ii) “Ele
venceu à custa de muito esforço” (locução prepositiva); iii) “Ele
aprendia à medida que estudava” (locução conjuntiva).
3. Atente-se a que, do mesmo modo que, em alguns exemplos, é
obrigatória, também há casos de crase proibida.
Ver Crase antes de pronomes (P. 234) e Crase antes de pronomes relativos
(P. 236).
Crase proibida
1. Mesmo sem necessidade de estudo das regras gerais de crase, em alguns
casos, por seu próprio conceito e substância, vê-se que impossível é sua
ocorrência.
2. Alinham-se, assim, os casos em que a crase é proibida, mesmo sem
quaisquer outros questionamentos: a) Antes de nomes masculinos. Ex.:
“Andei a cavalo”. b) Antes de femininos genéricos. Ex.: “Jamais vamos
a festas pomposas” [Geralmente, nesse caso, ocorre um a (sem s)
precedendo um nome feminino no plural]. c) Antes de verbos. Ex.: “Ela
começou a chorar”. d) Em expressões formadas por palavras repetidas.
Ex.: “Ele estava face a face com seu desafeto”. e) Antes de pronomes de
tratamento. Ex.: “Dirijo-me respeitosamente a Vossa Excelência”
(Observa-se que senhora, senhorita e dona são pronomes de tratamento,
mas constituem exceção e admitem crase antes de si).
3. Do mesmo modo que, em algumas hipóteses é proibida, também há
casos de crase obrigatória.
Ver Crase antes de pronomes (P. 234) e Crase antes de pronomes relativos
(P. 236).
Crêem ou Creem?
1. Antes da recente reforma, os verbos crer, dar, ler e ver (e seus
derivados, como descrer, redar, tresler e antever) tinham, na primeira
letra do encontro ee, um acento circunflexo: crêem, dêem, lêem, vêem.
2. Agora, o Acordo Ortográfico passou a determinar: “Não se emprega o
acento circunflexo nas terceiras pessoas do plural do presente do
indicativo ou do subjuntivo dos verbos crer, dar, ler, ver e seus
derivados”.
3. Desse modo, as formas corretas passaram a ser creem, deem, leem e
veem.
Crenta ou Crente?
1. Um leitor indaga se, ao se permitir usar o vocábulo presidenta como
feminino de presidente, não se estaria criando uma regra geral, pela qual
também se poderiam empregar outros femininos como doenta, crenta e
ausenta.
2. Como regra, seguindo a mesma estruturação do latim, adjetivos
terminados em nte, ainda quando apresentam aparência substantivada,
têm uma mesma forma para o masculino e para o feminino, alterando-se
apenas o artigo que os antecede: o amante, a amante, o constituinte, a
constituinte, o doente, a doente, o estudante, a estudante, o ouvinte, a
ouvinte.
3. É tecnicamente o que se denomina comum de dois ou comum de dois
gêneros.
4. Para alguns desses vocábulos, contudo, tem-se admitido forma própria
terminada em a para o feminino: almiranta, infanta, presidenta.
5. Por um lado, pode-se dizer que essa tendência de começarem a ter
alguns vocábulos um feminino próprio em enta tende a acentuar-se,
sobretudo como resultado da inserção mais e mais intensa da mulher no
mercado de trabalho fora do lar, do que também resulta a criação de
vocábulos mais apropriados para indicar a profissão.
6. Dizer, contudo, que alguns vocábulos aceitam um feminino próprio em
enta não significa fixar uma nova regra geral, a ponto de, com base nela,
querer flexionar indistintamente os demais adjetivos e substantivos com
mesma terminação, como, por exemplo, adolescenta, adquirenta,
agenta, anuenta, ascendenta, cedenta, consulenta, contraenta,
dependenta, emitenta, escreventa, exequenta, gerenta, opoenta, pacienta,
pretendenta, promoventa, remetenta, requerenta, tenenta. Afirme-se,
para não haver dúvidas: tais femininos simplesmente não existem.
7. O que se tem a dizer nesse aspecto é que, nos casos de dúvida acerca
desses femininos, a solução é consultar o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, que é uma espécie de dicionário que lista as palavras
reconhecidas oficialmente como pertencentes à língua portuguesa, bem
como lhes fornece a grafia oficial e, às vezes, a variação em gênero e
número.
8. Também conhecido pela sigla VOLP, é organizado e publicado pela
Academia Brasileira de Letras, a qual tem a delegação oficial e a
responsabilidade legal de editá-lo, em cumprimento à Lei Eduardo
Ramos, de n. 726, de 8/12/1900.
9. Pois bem. Em sua quinta edição, de 2009, a primeira após o Acordo
Ortográfico, o VOLP registra, de modo expresso, almiranta, infanta e
presidenta (ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, p. 41, 456 e
674), mas não as demais acima referidas.
10. Com isso, é importante ressaltar: quando se diz que alguns dos nomes
em ente admitem no feminino a terminação enta, tal afirmação se
baseia no fato de que o VOLP registra essas formas. Por outro lado,
quando se nega existência a outras formas do rol acima, isso quer dizer
que o VOLP não as registra, e, por isso, elas não existem oficialmente
como vocábulos do idioma.
11. Como a língua é dinâmica (e o VOLP procura registrar e atestar essa
evolução linguística), não é impossível que o mencionado rol venha a
ampliar-se no futuro. A realidade presente, todavia, é a da aceitação
apenas da restrita relação referida, integrada por verdadeiras exceções
de vocábulos que podem formar o feminino em nta.
Ver Parenta ou Parente? (P. 550) e Presidenta ou A Presidente? (P. 596)
Cujo
1. Dentre algumas observações que podem ser de grande utilidade para o
correto emprego desse pronome, começa-se com a afirmação de que,
correspondendo ao genitivo latino, cujo contém em si, implícita, a
preposição de, indica a ideia de posse e equivale a do qual, jamais
significando, nos dias de hoje, o qual, a qual, motivo por que há de ter
sempre um antecedente e um consequente diversos. Exs.: a) “Esta é uma
lei, cujos dispositivos são de fácil compreensão” (correto); b) “Enfim
temos uma lei, cuja lei é de fácil compreensão” (errado).
2. Em outras palavras, como lembram Carlos Góis e Herbert Palhano,
“cujo corresponde a de que ou do qual. Ora, se encerra em si a
preposição de, não pode funcionar como sujeito, porque sujeito não pode
vir regido de preposição” (1963, p. 85).
3. Oportuno é o ensino de Alfredo Gomes (1924, p. 344-5): “Cujo encerra
em si a preposição de; equivale a do qual, da qual, etc.; mas pode vir
precedido da mesma preposição de, se esta vier regendo o consequente
relativo: ‘O menino de cuja inteligência falávamos, chama-se Henrique’
(isto é: da inteligência do qual falávamos etc.)”.
4. Atento a uma primeira aversão que já existe contra seu próprio emprego,
observa Domingos Paschoal Cegalla que “é erro grave usar que em vez
de cujo (a), como nas frases: ‘Fiquei feliz em rever a ponte que eu
acompanhara a construção, em criança’. ‘Difícil é abrir um cofre que
desconhecemos o segredo’. ‘O rio Amazonas, que a largura se estreita
em Óbidos, impressiona pelo volume e a força de suas águas’. O correto
é: ‘Fiquei feliz em rever a ponte cuja construção eu acompanhara, em
criança’. ‘Difícil é abrir um cofre cujo segredo desconhecemos’. ‘O rio
Amazonas, cuja largura se estreita em Óbidos, impressiona pelo volume
e a força de suas águas’” (1999, p. 96).
5. Reitere-se, por força das observações feitas, que não se pode empregar
tal pronome em lugar de o qual, devendo-se atentar, assim, ao
ensinamento de Gladstone Chaves de Melo: “Na língua atual, só se
emprega adjetivamente, seguido do substantivo, e tem valor possessivo”
(1970, p. 277).
6. Exatamente por não ser mero sinônimo de o qual, a qual, Eduardo
Carlos Pereira aponta como incorreto o seguinte exemplo de Filinto
Elísio: “Trata-se de batalha contra Filipe cuja nós perdemos”.
7. E tal gramático insiste (PEREIRA, 1924, p. 306) – com apoio em
ensinamento de Ernesto Carneiro Ribeiro e contra lição de Cândido de
Figueiredo – que, no referido trecho, o correto haveria de ser: “Trata-se
de batalha contra Filipe, a qual nós perdemos”.
8. Reitere-se que o fato de já conter em si a ideia da preposição de não
impede que se lhe anteponha tal preposição ou mesmo outra, a qual não
há de reger cujo, mas sim seu termo consequente.
9. E, nesse sentido, em complementação, em termos de regência verbal, se
funciona como complemento, cujo depende totalmente da regência do
verbo ao qual se liga, motivo por que, se vai ou não haver preposição
antes dele, ou qual vai ser a preposição, tudo depende do verbo que está
sendo complementado pelo referido pronome relativo.
10. Ou, como sintetiza Eduardo Carlos Pereira: “Cujo admite antes de si a
preposição de ou qualquer outra, reclamada pelo verbo que se lhe
segue” (1924, p. 307). Ex.: “Esta é uma lei em cujas disposições não
acreditamos, com cuja finalidade não simpatizamos e de cujos dizeres
discordamos, mas a cujas disposições obedecemos para a manutenção
do estado de direito”.
11. Não se usa artigo depois do relativo cujo. Ex.: a) “Comprei a casa cuja
proprietária faleceu” (correto); b) “Comprei a casa cuja a proprietária
faleceu” (errado).
12. Embora não seja hábito o cometimento de erros dessa natureza, vale a
pena observar com Carlos Góis que tal pronome relativo “concorda
sempre com o seu subsequente, e nunca com o antecedente” (1943, p.
233). Exs.: a) “Faleceu o advogado cujos livros adquiri” (correto); b)
“Faleceu o advogado cujo livros adquiri” (errado).
13. Em outra obra coescrita com Herbert Palhano (1963, p. 168), quando à
concordância, reitera tal autor essa regra de que o mencionado
pronome relativo se harmoniza sempre com o consequente, e não com
o seu antecedente. Ex.: “Pedro, cujas qualidades admiro…”.
14. A falta de hábito no emprego de cujo, pronome esse que muitos
teimam em evitar, ocasiona um erro frequente nos discursos, que se dá
logo na saudação de muitos oradores: “Senhor presidente dos trabalhos
desta noite, em nome de quem saúdo todas as autoridades
presentes…”. Embora seu significado seja do qual, de quem, o certo é
que cujo não lhes é palavra sinônima, de modo que a correção do
mencionado exemplo há de dar-se do seguinte modo: “Senhor
presidente dos trabalhos desta noite, em cujo nome saúdo todas as
autoridades presentes…”.
15. Buscando uma síntese para o assunto, Júlio Ribeiro anota: a) por ter
significação restritiva possessiva, tal vocábulo “quer sempre claro
depois de si o substantivo a que restringe”; b) ao depois, “ao invés do
que sucede com qual, o substantivo que segue a cujo é sempre diverso
do antecedente”; c) por fim, “o emprego de cujo sem antecedente e
subsequente imediatos, se bem que clássico – e correto – é arcaico”: i)
“Cujas são estas árvores?”; ii) “Eu sei cujo é o gado”.
16. E complementa: “O uso atual de cujo é fazê-lo servir de sujeito, de
objeto do verbo ou de regime de preposição, dando-lhe antecedente
claro e fazendo-o seguir imediatamente do nome com que concorda”
(RIBEIRO, Júlio, 1908, p. 248, 249 e 261).
17. Sob outro aspecto, em oportuna observação, lembra Luís A. P Vitória
que, “quando for seguido de dois substantivos, (cujo) concorda só com
o primeiro. Ex.: ‘Eis o homem cujo filho e filha tu conheceste’” (1969,
p. 81).
18. Ao anotar os dois principais erros cometidos nesse aspecto, leciona
Silveira Bueno que todo e qualquer emprego desta palavra, que não
seja o de complemento de posse, estará errado: a) assim, por primeiro,
estará errado seu uso em função de sujeito (“O advogado, cujo ajuizou
a ação, não mais se manifestou na causa”); b) em segundo lugar, estará
errado seu emprego em função de objeto direto (“A ação, cuja venceu
aquele velho advogado, não era das mais fáceis”).
19. E complementa tal gramático (BUENO, 1938, p. 36-9) que correto é
seu emprego, quando puder ser substituído por do qual, do que, de
quem. Ex.: “O advogado, cuja petição inicial foi indeferida, não se
abalou”.
20. Podem-se resumir algumas observações importantes a respeito desse
pronome com o ensinamento de Sousa e Silva (1958, p. 90-1): a) Não
pode ter como consequente o mesmo nome que figure como
antecedente: “A casa que foi condenada, cuja casa foi demolida”
(deve-se substituir cuja casa por que ou a qual); b) Embora seja
linguagem pouco usada em nossos dias, às vezes cujo vem sem
consequente, ligado diretamente a um verbo: “O pintor Eduardo Malta,
cujos são estes quadros” (isto é, de quem são estes quadros); c) Como
pronome interrogativo, caiu em completo desuso: “Cujos são estes
quadros?” (vale dizer, de quem são estes quadros?; d) É crasso erro
empregar artigo depois da palavra cujo (ou variações): “cujo o pai”,
“cuja a glória”.
Ver De cujus – Qual é o plural? (P. 254), Pronome relativo –
Concordância verbal (P. 615) e Pronome relativo preposicionado (P. 616).
Cumprimento ou Comprimento?
Ver Comprimento ou Cumprimento? (P. 203)
Currículo
1. É, por um lado, palavra já incorporada, completa e definitivamente, ao
nosso vocabulário, devendo-se adotar, assim, o singular aportuguesado
currículo e o plural currículos, em proceder idêntico a desiderato e a
veredicto.
2. A par da forma aportuguesada, todavia, o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras (2009, p. 237 e
862), órgão oficial para definir quais palavras integram nosso léxico,
também registra curriculum (forma latina, sem acento gráfico).
3. Deixando de lado o aspecto de que o VOLP é o veículo oficialmente
incumbido de determinar as palavras existentes e as que devem ter curso
em nosso idioma, motivo por que legem habemus e devemos prestar-lhe
obediência, e restringindo a questão ao aspecto científico, é de se ver que
o plural da língua mãe (curricula) – que era registrado no VOLP até a
edição de 1999 e não mais o é – deve ser evitado a qualquer custo, até
porque, em latim, os substantivos eram declinados, de modo que as
terminações do plural eram diversas, conforme a função sintática:
curricula (sujeito), curriculorum (adjunto adnominal), curriculis (objeto
indireto), curriculos (objeto direto).
4. Nesse sentido, a bem da verdade, não há como usar hoje pela metade o
vocábulo em latim: ou se considera o termo já integrado ao nosso idioma
para todos os efeitos, também para sua acentuação gráfica e sua flexão
no plural; ou se lhe conferem em plenitude feição e regime latinos,
hipótese em que há de ter o vocábulo uma específica terminação, de
acordo com a função sintática que a palavra venha a desempenhar,
proceder esse que, além de muito estranho, é simplesmente inviável ao
usuário médio do idioma, por exigir conhecimentos aprofundados de
análise sintática e de latim.
5. Vale lembrar, ainda no plano da discussão científica, a lição de Silveira
Bueno a um consulente que lhe indagava qual a melhor forma de
flexionar para o plural, em nosso idioma, a palavra memorandum: “As
palavras estrangeiras podem ter dois usos em nossa língua: ou o snr.
conserva a forma originária da língua donde provém o termo, ou aplica
às palavras as regras comuns do português. Se o snr. seguir a primeira
forma, deverá dizer no plural: memoranda – que este é o plural de
memorandum em latim. Se o snr. seguir a segunda maneira, dirá
memoranduns porque em português, os nomes terminados em m fazem o
plural mudando o m em ns. Há, porém, uma terceira forma, que achamos
melhor ainda que as duas expostas: é dar ao termo latino a forma
nacional: memorando e, no plural, memorandos” (1938, p. 49).
Ver Campus (P. 166).
Custar
1. É verbo que precisa ser observado no que respeita à regência verbal,
quando usado no sentido de ser difícil, ser penoso.
2. É indiscutivelmente correta a seguinte frase: “Custa-me crer que você
perdeu o prazo para recurso”.
3. Por outro lado, tem sido considerada incorreta por muitos gramáticos a
seguinte construção: “Custo a crer que você perdeu o prazo para
recurso”.
4. Na primeira sintaxe desse verbo, reputada correta, é objeto indireto a
pessoa a quem a coisa é difícil, sendo essa a posição firme dos nossos
gramáticos, como, por exemplo, Laudelino Freire (1937a, p. 25-6).
5. Registre-se que a lição de Silveira Bueno a esse respeito se dá no sentido
de que “o verbo custar na significação de ser difícil é impessoal,
aparecendo unicamente na terceira do singular. Assim, é erro dizer-se:
Custei muito a compreender a lição…” (1938, p. 86).
6. E complementa tal autor que “o erro comum que encontramos em tais
casos consiste em fazer o verbo custar concordar com a pessoa que está
falando” (BUENO, 1938, p. 199).
7. Concordando parcialmente com o ilustre gramático, é de se dizer que o
verbo, no caso, não é impessoal, mas pessoal (porque tem sujeito),
apenas ficando no singular, porquanto, ao se inverter o exemplo, vê-se
que seu sujeito é oracional: “Custou-me muito compreender a lição”
(compreender a lição é o sujeito; facilmente perceptível quando se
inverte o exemplo: “Compreender a lição custou-me muito”).
8. Ressaltando, nesse aspecto, que a expressão custou-me dormir teve a
preferência dos clássicos mais antigos, Aires da Mata Machado Filho
(1969a, p. 612) menciona, porém, a existência de numerosos exemplos
coligidos por Heráclito Graça, além da lição de Epifânio Dias, pugnando
pela vernaculidade da construção eu custei a dormir, explicando: a) na
primeira estrutura, o infinitivo é sujeito do primeiro verbo; b) na
segunda, tem-se uma locução verbal, cujo sujeito é eu.
9. Também se registre o ensinamento de Cândido Jucá Filho de que, “no
Brasil, a circunstância de interesse torna-se pronome pessoal reto, e
dizemos naturalmente, como fez Lobato: Custei a achar” (1981, p. 13);
ainda que se aceite tal lição, o certo é que esse modo de falar há de
restringir-se à linguagem coloquial.
10. Firmada a correção de custa-me crer, é de se anotar que, num aspecto
seguinte da sintaxe desse verbo – sobre a validade gramatical de custa-
me crer ou custa-me a crer – lembra Vasco Botelho de Amaral: “já está
dito e redito que não há pecado no emprego da preposiçãozinha em pós
do verbo custar”.
11. E justifica tal gramático sua assertiva: a) “Em primeiro lugar a
anteposição de a ao infinito já ocorre na própria língua antiga
portuguesa…”; b) “Em segundo lugar, a expressão custa a crer surge
na melhor escrita, como por exemplo nas páginas do clássico
Alexandre Herculano…”
12. E acaba por concluir: “Portanto, não se arreceiem de dizer ou escrever
custa a crer ou custa crer” (AMARAL, 1948, p. 194-5).
13. Heráclito Graça, num primeiro momento, transcreve lição de Cândido
de Figueiredo: “Chega a parecer-me que toda a gente diz custa a crer.
E, contudo, esta locução está fora das leis da gramática. O verbo custar
não pede, depois de si, preposição alguma”.
14. Num segundo momento, contudo, o gramático (GRAÇA, 1904, p. 131-
7) que cita o ensinamento traz a corroboração de diversos exemplos de
autores insuspeitos e observa que “fica, de todo, patente que o escritor
que empregar o verbo custar seguido da preposição a, regente de um
infinito, está em honrosa e insuspeita companhia, e muito a cômodo
dentro, e não fora, das leis da gramática”. Exs.: a) “Custa a crer como
um ente, que é metade da nossa espécie” (Antônio Feliciano de
Castilho); b) “Custa-me a crê-lo” (Alexandre Herculano); c) “Custa-
me a crer que exista um monstro” (Almeida Garrett); d) “Antes de
Almeida Garrett, custa a crer que passasse aí um talento de tantos
fôlegos a viajar na sua terra” (Camilo Castelo Branco); e) “Custando-
lhe a crer que essa ventura a tivesse conseguido” (Latino Coelho); f)
“Custou-me a conhecer-lhe as feições” (Alexandre Herculano).
15. Também nessa esteira, Laudelino Freire (1937a, p. 25-6), com o abono
de exemplos de Herculano, de Castilho e de Rui Barbosa, leciona que,
“ao verbo custar, quando seguido de infinitivo, pode juntar-se ou não a
preposição a”, acrescentando, até mesmo, tal gramático que, entre
todos, clássicos, antigos e modernos, “menos usual, ou raro, é o seu uso
sem a preposição em seguida ao infinitivo”. Exs.: a) “Custava crer que
aquelas pálpebras nunca mais se reerguessem” (Rui Barbosa); b)
“Custa a compreender que interesse nacional possa haver” (Rui
Barbosa).
16. Sintetizando com propriedade os diversos aspectos do problema, assim
se manifesta Artur de Almeida Torres (1967, p. 106-8): a) por primeiro
a construção “Custo a crer”, “de uso puramente popular, é acoimada de
errônea pelos nossos gramáticos”; b) ao depois, no que tange à
construção “Custa-me crer”, é ela “encontradiça nas obras dos nossos
melhores escritores”; c) por fim, quanto à estrutura “Custa-me a crer”,
tem ela dado motivo a larga discussão: i) Cândido de Figueiredo, que,
por primeiro, asseverou que “o verbo custar não pede, depois de si,
preposição alguma”, mais tarde mudou de opinião, para afirmar nada
ter “que objetar ao custar a crer”; ii) Heráclito Graça justificou
amplamente tal construção, ao afirmar que a preposição que se discute
“serve de termo de ação do verbo que a precede, e igualmente expressa
a duração ou excesso da mesma ação”; iii) para Carlos Góis, a
preposição que aí aparece é “mero expletivo ou partícula de realce”; iv)
bem por isso, conclui o próprio Artur de Almeida Torres ser verdade
incontestável “que esta maneira de construir o verbo custar (com a
preposição), em que possa contrariar os rigorosos preceitos da
gramática, já está consagrada pelo uso constante dos nossos mais
abalizados escritores”, trazendo para sua confirmação exemplos de
autores insuspeitos de nossa literatura: I) “Custa a crer que minha
mãe… me entregasse à corrente de um rio” (Camilo Castelo Branco);
II) “Custava-lhe a aceitar a ideia do bem” (Machado de Assis); III)
“Mas tanto, custava-me a crê-lo” (Alexandre Herculano); IV) “Custa a
crer que um escritor de primeira plana como Camilo tolerasse em seus
livros espantosas faltas de ortografia” (Mário Barreto); V) “Custava a
crer que ouvidos portugueses se acomodam àquela singular
posposição” (Ernesto Carneiro Ribeiro).
17. Vale ultimar com a síntese de Francisco Fernandes, que invoca a
autoridade de João Ribeiro e elabora rápida lição acerca da regência
desse verbo: “Conquanto o bom uso mande que se use custa crer, custa
fazer, e não custa a crer, custa a fazer, encontram-se nos melhores
escritores inúmeros exemplos desta última construção. Não há, porém,
exemplos autorizados de custo a crer” (1971, p. 177).
Custas
Ver À custa de ou Às custas de? (P. 75)
D
Dactilografar
Ver Datilografar (P. 251).
Dado o
1. Como particípio passado do verbo dar, em oração participial, no sentido
de admitir, verificar, concorda dado em gênero e número com o
substantivo a que se refere. Exs.: a) “Dado o clima criado, suspendeu-se
a audiência”; b) “Dada a situação criada, suspendeu-se a audiência”; c)
“Dados os acontecimentos, suspendeu-se a audiência”; d) “Dadas as
circunstâncias, suspendeu-se a audiência”.
2. Um primeiro erro que se comete no emprego de tal palavra é deixá-la
invariável. Ex.: “Dado as circunstâncias, suspendeu-se a audiência”
(errado).
3. Um segundo erro é adicionar a preposição a ao termo que a tal verbo se
liga. Ex.: “Dado ao acontecimento, suspendeu-se a audiência” (errado).
4. Para que não surjam dúvidas, Arnaldo Niskier sintetiza a observação,
asseverando num primeiro aspecto: “A expressão dado o é variável, isto
é, dado o problema, dadas as dificuldades”.
5. E continua tal autor, num segundo aspecto: “Esta expressão, embora
signifique devido a, não contém a preposição” (NISKIER, 1992, p. 24).
6. Assim, reitere-se que estão erradas as expressões dado ao problema,
dadas às dificuldades; corrijam-se tais exemplos para dado o problema,
dadas as dificuldades.
Da falência
1. Para Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 73), constitui latinismo
sintático a ser evitado o emprego da preposição de para encabeçar
capítulos de tratados, códigos ou leis.
2. Em seu entendimento, não se deve dizer, por conseguinte, nas rubricas,
da falência ou dos contratos, mas apenas falência e contratos.
3. Não parece, todavia, haver motivos para tal objeção, até porque, pela
doutrina do saudoso gramático, tais erros estariam pululando em nossas
leis, já que, por exemplo, bastaria uma rápida consulta ao índice do
Código Civil – tido por manancial de perfeição vernácula, até mesmo em
decorrência da polêmica travada a seu respeito entre Rui Barbosa e
Ernesto Carneiro Ribeiro – para se concluir que quase todos os seus
livros, títulos, capítulos e seções vêm encimados pela referida
construção.
4. Acresça-se a tanto que, muito ao contrário, Rui Barbosa (1949, p. 47), ao
observar que a redação original às vezes empregava a preposição, às
vezes a omitia, anotou que as Ordenações observavam seu uso, e que o
Código Civil português invariavelmente também segue essa orientação,
e reputou, por fim, seu emprego um “sinal de vernaculidade”, a ser
imitado nas leis pela boa linguagem, cujas regras eram filhas da tradição
e da herança.
5. E se observe, adicionalmente, que o mesmo Rui, em sua proposta de
correção do projeto, acatada pelo legislador, acrescentou sempre a
partícula prepositiva aos títulos e rubricas do Código, proceder esse que
tem origem entre os romanos, os quais nos legaram, por exemplo, “De
Senectute” (Da Velhice) por meio de Cícero e “De Bello Gallico” (Da
Guerra Gaulesa) por intermédio de Júlio César, e assim por diante.
6. Após lembrarem que, “em livros didáticos, às vezes, abrem-se capítulos
com a matéria a ser exposta precedida da preposição de”, esclarecem
Regina Toledo Damião e Antonio Henriques (1994, p. 56) que “dita
preposição nada mais é que a preposição latina de que se construía com
o ablativo”, exemplificando tais autores com o “De natura rerum” de
Lucrécio (sobre, a respeito da natureza das coisas) e “De bello gallico”
de César (sobre a guerra gaulesa).
7. E Cândido de Figueiredo assevera que tal construção é correta e que
sempre assim a usaram os portugueses “nas inscrições dos capítulos de
uma obra, e nos títulos dos livros”.
8. E continua tal gramático: “Abrindo qualquer cronista, lemos no alto de
um capítulo: ‘De como El-Rei se partiu para Santarém’; ou ‘Dos
sucessos que se deram na ponte de Alcântara’; ou ‘Das desavenças que
houve entre o Infante e seu pai’. E assim em títulos de livros: ‘Da
imortalidade da alma’; ‘Das proezas e virtudes de D. Garcia de
Noronha’; ‘Dos defeitos e contradições do sistema constitucional’”
(FIGUEIREDO, 1943, p. 20-9).
9. Com tais ponderações, o que parece melhor é não concordar com o
posicionamento de Napoleão Mendes de Almeida, de modo que se há de
ter por correto o emprego da preposição de para encabeçar capítulos de
tratados, códigos ou leis, como, por exemplo, em da falência ou dos
contratos.
Dar provimento
Ver Desprover ou Improver? (P. 278)
Datas
1. De início, anote-se o ensinamento da maioria dos gramáticos de que o
primeiro dia do mês é ordinal, não cardinal (GÓIS, 1943, p. 88).
2. Assim, seguindo exemplo de Celso Cunha (1970, p. 136), 1º de março (e
não 1 de março).
3. Por conseguinte, em forma compacta, de igual modo, escreve-se 1º, e
não 01 (1º/10/49 e não 01/10/49).
4. Anote-se, contudo, que Aires da Mata Machado Filho afiança ser correta
a construção “Hoje é um de dezembro” (1969a, p. 577).
5. Também muito embora observe que “hoje há preferência pelo ordinal”,
leciona Domingos Paschoal Cegalla que, “para designar o primeiro dia
do mês, pode-se usar o ordinal ou o cardinal: ‘O fato ocorreu no dia
primeiro (ou no dia um) de julho de 1990’” (1999, p. 121).
6. Para resumir esse aspecto, ante a divergência entre os gramáticos, deve-
se conferir liberdade ao usuário, de modo que se deve considerar correto
o emprego tanto do ordinal quanto do cardinal.
7. Em continuação, atente-se a que, em português, os nomes de meses se
escrevem com letra minúscula, porque o Formulário Ortográfico não os
inclui entre os nomes próprios, conforme esclarece observação do inciso
3º de sua regra 49: janeiro, março, outubro; jamais Janeiro, Março,
Outubro.
8. Sob outro aspecto, em oportuna observação, lembra Luiz Antônio
Sacconi (1979, p. 236) que, por um lado, “atualmente usa-se o ponto
também na separação de casas decimais: 15.245, 289.493, 1.648.396,
etc.”; por outro lado, “os números que identificam o ano não costumam
ganhar ponto: 1979, 1947, 1900, 1822, etc.”.
9. Quanto à concordância verbal, o verbo ser, nas datas, admite três
construções igualmente corretas: a) “Hoje é dia 30 de novembro”; b)
“Hoje é 30 de novembro”; c) “Hoje são 30 de novembro”.
Ver Hoje é dois – Está correto? (P. 391)
Data venia
Ver Adjetivação desnecessária (P. 80).
Datilografar
1. Quanto à ortografia, anota-se que o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido
oficialmente de determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma,
além de sua grafia oficial, registra tanto dactilografar como datilografar
(2009, p. 241 e 244), o que significa que o emprego de ambas as formas
está oficialmente autorizado.
2. Observe-se, contudo, que, em decorrência da lei do menor esforço, que
rege a dicção dos vocábulos na evolução das línguas, fala-se o que é
mais fácil, não o que é mais difícil (contato e não contacto, muito
embora ambas sejam formas corretas).
3. Bem por isso, mais no Brasil do que em Portugal, as consoantes inúteis,
determinadas pela etimologia, como o c do caso apreciado, tendem a cair
da pronúncia, com o consequente reflexo de sua eliminação na escrita, o
que, na prática, com o reforço do computador, em cuja linguagem se diz
haver digitação e não datilografia, põe dactilografar no baú de coisas
pouco usadas, apesar de sua integral correção.
4. Só por curiosidade, registre-se que, em pacto e rapto, as consoantes
intermediárias não são inúteis.
5. No que concerne à prosódia, as pessoas erram na pronúncia e na escrita
das formas rizotônicas desse verbo, nas quais a sílaba tônica é sempre
gra, não havendo formas proparoxítonas: datilografo, datilografas,
datilografa, datilografamos, datilografais, datilografam (presente do
indicativo); datilografe, datilografes, datilografe, datilografemos,
datilografeis, datilografem (presente do subjuntivo); datilografa,
datilografe, datilografemos, datilografai, datilografem (imperativo
afirmativo); não datilografes, não datilografe, não datilografemos, não
datilografeis, não datilografem (imperativo negativo).
6. Como as formas rizotônicas apenas ocorrem nos tempos referidos, não
há dúvidas de pronúncia e escrita nos demais tempos.
7. Veja-se, por fim, que o substantivo é que é proparoxítono: o datilógrafo,
a datilógrafa, os datilógrafos, as datilógrafas.
8. A questão se resolve pelas observações de Otelo Reis acerca das formas
verbais paroxítonas dignas de nota: “Certas formas rizotônicas,
paroxítonas, de verbos polissilábicos, possuem homógrafos
proparoxítonos, que são substantivos ou adjetivos. A distinção é feita, na
escrita, pela acentuação da palavra proparoxítona” (1971, p. 73-4).
9. Problema idêntico se dá com outros verbos, como biografar (o biógrafo
e eu biografo), dialogar (o diálogo e eu dialogo), estenografar (o
estenógrafo e eu estenografo), filosofar (o filósofo e eu filosofo),
fotografar (o fotógrafo e eu fotografo), interpretar (o intérprete e que eu
interprete), invalidar (ato inválido e eu invalido), logografar (o
logógrafo e eu logografo), maquinar (a máquina e ele maquina),
monologar (o monólogo e eu monologo), sindicar (o síndico e eu
sindico), subsidiar (o subsídio e eu subsidio), taquigrafar (o taquígrafo e
eu taquigrafo).
De
Ver Da falência (P. 246) e Preposição – Quando deve ser repetida? (P. 595).
De a
Ver É hora da onça beber água ou É hora de a onça beber água? (P. 296)
Decano ou Décano?
1. Quanto à prosódia, é palavra paroxítona, devendo ser pronunciada com
mais força sua penúltima sílaba (ca), rimando com soprano, sendo essa a
lição de Silveira Bueno, o qual realça que tal palavra “é daquelas que
não entram na aceitação geral. Há muita gente notável que diz
erradamente décano” (1938, p. 54).
2. Mário Barreto (1954b, p. 124), ao tratar das acentuações viciosas, alude
“aos que, contra a origem e prática, querem esdruxulizar” tal vocábulo,
pronunciando-o com acento na antepenúltima sílaba.
3. Em razão de sua adequada pronúncia paroxítona, não há motivo algum
para que se lhe ponha acento gráfico.
4. Júlio Ribeiro chama “esdrúxula asneira” a prosódia proparoxítona (dé) e
escreve: “O povo, que observa sempre, instintivamente, as leis da
glótica, do ablativo latino decano fez deão; os verdadeiros doutos
portugueses fizeram decano…” (RIBEIRO, Júlio, apud PINTO, 1924, p.
30).
5. E Pedro A. Pinto, que transcreve a lição de Júlio Ribeiro, invoca o
suporte de Mário Barreto, rematando: “Está hoje muito generalizada a
boa pronúncia da palavra, e somente pessoas completamente jejunas em
coisas da língua portuguesa serão capazes de dizer decano” (RIBEIRO,
Júlio, apud PINTO, 1924, p. 30).
6. Mais recentemente, Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 18), sem quaisquer
comentários ou formalidades adicionais, também lhe reitera a condição
de paroxítona.
7. Para Luís A. P. Vitória, “a pronúncia é, indubitavelmente, como
paroxítono (decâno), como bem o prova a forma evoluída de deão”
(1969, p. 85).
8. Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 259) encarta o erro prosódico da
pronúncia proparoxítona de tal vocábulo no rol dos barbarismos de
forma ou peregrinismos.
9. Em corroboração com o ensino de tais autores, o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
que é o veículo oficial para dirimir dúvidas acerca da existência ou não
de vocábulos pertencentes a nosso idioma, bem como acerca de sua
correta grafia e pronúncia, registra apenas a forma paroxítona decano
(2009, p. 245).
Decigrama
Ver Grama (P. 376).
Decisão
Ver Veredicto, Veredito ou Veredíctum? (P. 765)
Decisão recorrida
Ver Sentença recorrida – Está correto? (P. 690)
Declinar – Galicismo?
1. José de Sá Nunes, num primeiro momento, aponta lição de Cândido de
Figueiredo e de Mário Barreto no sentido de que se evite a expressão
declinar o seu nome em lugar de declarar o seu nome, por se tratar de
galicismo de frase.
2. A seguir, porém, contraria tal ensinamento, aduzindo: “Em que pese,
todavia, a esses filólogos insignes, é de bom aviso não condenar um
verbo que, naquela acepção, tem sido usado por escritores como estes: a)
“… declinar o nome de seus cúmplices” (Ernesto Carneiro Ribeiro); b)
“Tais condições me parecia reunirem-se, até, numa pessoa, cujo nome
declinei, e cujas provas em todos esses dotes são cabais: o conselheiro
Lafayette” (Rui Barbosa).
3. O Padre José F. Stringari (1961, p. 14) – que, de um lado, refere o ensino
de Mário Barreto no sentido de que se deva evitar o verbo no sentido de
declarar, e, de outro, contrapõe a lição de Rui Barbosa, que tem por
escorreito seu emprego nesse sentido – abona o emprego de tal verbo na
significação discutida, exarando a seguinte lição: “Eu de mim não ouso
refusar nem desaconselhar o emprego do verbo declinar no sentido que
um escritor do porte de Rui Barbosa subscreveu”. E traz dois exemplos
do mesmo autor cuja autoridade invocou: a) “Tais condições me parecia
reunirem-se, até, numa pessoa, cujo nome declinei”; b) “Coelho da
Rocha, Teixeira de Freitas e Carlos de Carvalho são os nomes que
declina”.
4. Quanto a sua regência, no sentido de recusar, rejeitar, trazendo exemplo
de Latino Coelho, anota Vitório Bergo (1944, p. 76) que, “embora pareça
preferida a construção deste verbo com a preposição de, clássica é
também a construção transitiva (isto é, sem preposição): “Aleguei
incompetência, declinei a jurisdição, sorrindo-me contudo a ideia de
aparecer escritor”.
5. Nessa esteira, Carlos Góis e Herbert Palhano (1963, p. 187) assinalam a
dupla regência desse verbo, conforme seja seu significado: como
transitivo direto, tem o sentido de declarar; como transitivo indireto
(preposição de), quer dizer desistir de. Exs.: a) “Ele declinou o favor
concedido” (declarou qual era o favor); b) “Ele declinou do favor
concedido” (desistiu do favor).
6. Na última acepção, todavia, Celso Pedro Luft (1999, p. 165) o tem por
transitivo direto ou por transitivo indireto. Exs.: a) “Declinar a honra”;
b) “Declinar da honra”.
7. Em termos bem práticos, pode-se sintetizar do seguinte modo: a) no
sentido de declarar, é transitivo direto (“Ele declinou os culpados”); b)
na acepção de recusar, pode ser, facultativamente, transitivo direto ou
transitivo indireto (“Ele declinou a honra” ou “Ele declinou da honra”).
De conformidade ou Em conformidade?
1. De conformidade e em conformidade são expressões sinônimas, que
significam de acordo. Exs.: a) “O juiz agiu, no caso, de conformidade
com a lei” (correto); b) “O juiz agiu, no caso, em conformidade com a
lei” (correto).
2. Os dispositivos das leis mais conhecidas revelam que, às vezes, o
legislador opta pela locução em conformidade com: a) “Os valores que
existirem em estabelecimento bancário oficial, na forma do artigo
antecedente, não se poderão retirar, senão mediante ordem do juiz, e
somente: … III – para se empregarem em conformidade com o disposto
por quem os houver doado, ou deixado” (CC, art. 1.754, III); b) “A
hipoteca legal dos bens do tutor ou curador, inscrita em conformidade
com o inciso IV do art. 827 do Código Civil anterior …, poderá ser
cancelada…” (CC, art. 2.040); c) “O juiz não receberá o recurso de
apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do
Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal”
(CPC/1973, art. 518, § 1º).
3. Outras vezes, porém, sem alteração alguma de sentido, prefere o
legislador a expressão de conformidade com: a) “Da decisão do órgão
que, de conformidade com o estatuto, decretar a exclusão, caberá
sempre recurso à assembleia geral” (CC, art. 57, parágrafo único, em
redação revogada); b) “A pessoa, nomeada de conformidade com os
artigos antecedentes, adquire os direitos e assume as obrigações
decorrentes do contrato, a partir do momento em que este foi celebrado”
(CC, art. 469); c) “O maior de dezesseis e menor de dezoito anos não
emancipado pode ser mandatário, mas o mandante não tem ação contra
ele senão de conformidade com as regras gerais, aplicáveis às
obrigações contraídas por menores” (CC, art. 666); d) “O comissário é
obrigado a agir de conformidade com as ordens e instruções do
comitente, devendo, na falta destas, não podendo pedi-las a tempo,
proceder segundo os usos em casos semelhantes” (art. 695, caput); e) “O
título de crédito, incompleto ao tempo da emissão, deve ser preenchido
de conformidade com os ajustes realizados” (CC, art. 891, caput); f) “O
portador de título representativo de mercadoria tem o direito de
transferi-lo, de conformidade com as normas que regulam a sua
circulação, ou de receber aquela independentemente de quaisquer
formalidades, além da entrega do título devidamente quitado” (CC, art.
894); g) “Não sendo cumprida a ordem, proceder-se-á à busca e
apreensão do testamento, de conformidade com o disposto nos arts. 839
a 843” (CPC/1973, art. 1.129, parágrafo único); h) “A parcela de que
trata o inciso I será distribuída proporcionalmente a um coeficiente
individual de participação, resultante do produto dos seguintes fatores:
… b) Fator representativo do inverso da renda per capita do respectivo
Estado, de conformidade com o disposto no art. 90” (CTN, art. 91, § 1º,
b).
4. Celso Pedro Luft (1999, p. 117-8) apenas entrevê a possibilidade de
construir qualquer das duas locuções seguida da preposição com: a)
“Agir de conformidade com a consciência”; b) “Os brasileiros que leem
de conformidade com a escrita… reagiram contra a novidade
ortográfica” (João Ribeiro).
5. Esse também é o posicionamento sustentado por Francisco Fernandes
(1969, p. 99): “Como, … de conformidade com eles, buscássemos… a
demão literária ali começada, para logo se viu negrejar a mais estranha
procela, que nunca escurecera por esses horizontes” (Rui Barbosa).
6. De Domingos Vieira, contudo, tem-se construção com a preposição a:
“Em conformidade às ordens recebidas” (VIEIRA apud LUFT, 1999, p.
118). E disso deflui a conclusão de que se devem aceitar ambas as
possibilidades de sintaxe.
Ver Conforme (P. 216).
Decreto
Ver Números – Como ler e Empregar? (P. 506)
Decreto-lei
1. Denomina-se decreto-lei, num primeiro sentido, o ato emanado do Poder
Executivo, quando, em seu fundo e sua forma, se equipara às próprias
leis, emanadas do Poder Legislativo (DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p.
17).
2. Às vezes, pode ser o ato que decorre de uma atribuição conferida pelo
ordenamento ao Poder Executivo, para, em relação a determinada
matéria ou durante circunstâncias previstas, expedir determinação
normativa, com a mesma força de lei, como se adviesse do Poder
Legislativo.
3. Outras vezes, pode ser resultado da junção da vontade do Poder
Executivo e do Poder Legislativo.
4. A Constituição Federal de 1988 não mais faz referência a tal modalidade
de norma.
5. Quanto a sua variação para o plural, independentemente de quaisquer
outras discussões doutrinárias sobre o assunto, o certo é que o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia
Brasileira de Letras, órgão oficialmente incumbido de fornecer a correta
grafia das palavras em nosso idioma, registra duas formas: decretos-leis
e decretos-lei (2009, p. 246).
6. Atenta aos frequentes equívocos que ocorrem a esse respeito, sobretudo
em meio a profissionais de nível universitário e executivos, adverte
Laurinda Grion que “é preciso tomar cuidado, pois estas palavras
causam dúvidas em muitas pessoas” (s/d, p. 25).
Ver Números – Como ler e Empregar? (P. 506)
Dedetizar ou Detetizar?
1. Em 1874, um estudante alemão sintetizou o Dicloro Difenil Tricloretano,
ou simplesmente DDT, substância que, inicialmente esquecida, acabou
por conferir o Prêmio Nobel de Medicina de 1948 a seu descobridor
moderno, o suíço Paul Müller. A substância foi muito usada na Segunda
Guerra Mundial para proteger soldados contra insetos. A partir daí,
tornou-se um popular pesticida em pó branco, tanto para combater
doenças transmitidas por insetos, como para ajudar fazendeiros no
controle das pestes agrícolas.
2. Sua reputação, contudo, durou pouco, pois, em 1962, Rachel Carson
publicou o livro Silent Spring, obra tida como uma das mais influentes
do século, em que mostrou que a referida substância estava contribuindo
para a extinção de algumas espécies, entre as quais o falcão peregrino e a
águia careca. Afirmava, ainda, tal autora que tal substância penetrava na
cadeia alimentar e acumulava-se nos tecidos gordurosos dos animais,
inclusive do homem, com o risco de causar câncer e dano genético.
3. Os opositores de seu uso ressaltam sua volatilidade, seu efeito residual
no organismo humano por até trinta anos e sua potencialidade
cancerígena. Em 1972, os Estados Unidos da América, depois de
acirrada disputa judicial e política, baniram o produto. Logo foram
seguidos pela maioria dos países industrializados. Nas lavouras do
Brasil, não pode ser usado desde 1985, e a Suíça não o permite desde
1939. Existia um projeto mundial, feito por ambientalistas, para bani-lo
totalmente do planeta até 2007.
4. Apesar de grande oposição em todo o mundo, também conta com
defensores de peso, em razão de sua eficácia e custo baixo na
higienização de ambientes contra o mosquito transmissor do parasita da
malária. Afirmam tais defensores que até hoje não existe prova definitiva
de que o DDT prejudique a saúde humana. No combate à malária,
continua sendo usado por cerca de vinte países.
5. Pois bem: da substância Dicloro Difenil Tricloretano, ou, mais
especificamente, de sua sigla DDT (ou D.D.T.), surgiram os neologismos
dedetê, dedetização, dedetizado, dedetizador, dedetizar, dedetizável,
todos hoje aceitos como palavras de nosso léxico pelo Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, elaborado pela Academia Brasileira
de Letras, que é quem tem a responsabilidade legal de editá-lo, em
cumprimento à vetusta Lei Eduardo Ramos, de n. 726, de 8/12/1900,
listando, assim, os vocábulos de nosso idioma, consolidando-lhes a
grafia e classificando-os por gênero e por categoria morfológica (VOLP,
2009, p. 246 e 247).
6. Observe-se, por fim, que, na esteira do que ocorreu com outros
neologismos, dedetizar, originariamente, significava aplicar DDT. Seu
conteúdo semântico, porém, extrapolou os limites de seu significado, e a
substância passou a representar toda e qualquer substância similar, a
exemplo do que se dá com gilete e cotonete. Assim, aplicar toda e
qualquer substância similar, ainda que não fundada no princípio ativo do
Dicloro Difenil Tricloretano, passou a ser dedetizar. É por isso que, hoje,
embora vedado seu uso em nosso país, veem-se, aqui e ali, as empresas
de dedetização, que podem aplicar diversas substâncias com idêntico
objetivo, mas seguramente não utilizam DDT.
Dêem ou Deem?
Ver Crêem ou Creem? (P. 240)
De eu – Está correto?
Ver É hora da onça beber água ou É hora de a onça beber água? (P. 296)
De facto ou De fato?
1. Um leitor, estranhando ter visto no noticiário a expressão de facto em
contraposição a de direito, indaga qual a razão desse c e se o correto não
seria de fato.
2. Ora, desde o começo do século XX, houve tratativas para acordos
ortográficos entre Brasil e Portugal, e elas acabaram, com o tempo,
abrangendo os países lusófonos que, gradativamente, se formaram a
partir da independência das antigas colônias portuguesas.
3. Tais tentativas de acordo, entretanto, invariavelmente malogravam e
sempre por um mesmo motivo: uma das partes buscava impor seu modo
de pronunciar ou de escrever, preconizando a consequente eliminação do
ponto de vista do outro.
4. Diferentemente, porém, do que se tentou em outras épocas, o Acordo
Ortográfico de 2008, discutido e trabalhado desde a década de 90 do
século passado, teve a sabedoria e o bom-senso de estabelecer que,
quando, considerada toda a extensão territorial de fala portuguesa,
houvesse duas pronúncias para um determinado vocábulo, então haveria
também duas escritas aceitas e válidas.
5. E essa é exatamente a situação do vocábulo trazido na dúvida do leitor:
enquanto no Brasil a pronúncia é de fato, já em Portugal se fala de facto.
6. Em tal caso, a conclusão só pode ser uma: se há duas pronúncias na
extensão territorial de fala portuguesa, ambas são consideradas válidas e
corretas.
7. Bem por isso, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado
pela Academia Brasileira de Letras, como autoridade oficial para
determinar a grafia e a pronúncia dos vocábulos existentes em nosso
idioma, registra, como existentes, válidos e corretos ambos os
vocábulos: facto e fato (2009, p. 361 e 365).
8. Assim, de modo direto para a indagação do leitor, tanto é correta a
expressão de fato, como também o é o circunlóquio de facto.
Defender – Galicismo?
1. Tal verbo é tido por alguns como galicismo na acepção de proibir,
sobretudo quanto à forma do particípio defeso. Ex.: “É defeso o emprego
de plebeísmos e gírias em autos de processos judiciais”.
2. Mário Barreto, todavia, com toda sua autoridade, reputa, juntamente com
outras construções, vernácula a referida sintaxe, esclarecendo que “a
circunstância de que são parecidas com as francesas não é razão, nem
sequer argumento para capitularmos tais palavras de galicismos”.
3. E esclarece que palavras como essas são “frequentemente empregadas
pelos nossos antigos escritores”, o que está a evidenciar que “as línguas
portuguesa e francesa, como nascidas ambas da latina, ramos do mesmo
tronco, deviam ter entre si, nos seus princípios, mais pontos de contato e
semelhança” (BARRETO, 1954b, p. 117-8).
4. Francisco Fernandes (1971, p. 183) também defende o uso de tal verbo
nesse sentido, abonando-se em autores insuspeitos: a) “Não comia peixe
contínuo, como manda a regra de S. Domingos, por lho defenderem os
médicos” (Frei Luís de Sousa); b) “Mas comer o gentio não pretende,
que a seita, que seguia, lho defende” (Luís de Camões).
5. Muito embora observe ser de pouco uso na atualidade, Celso Pedro Luft
(1999, p. 166), de igual modo, acata a integral possibilidade de seu
emprego na acepção de proibir, vedar: “Os regulamentos defendem a
caça em certas épocas do ano” (Cândido de Figueiredo).
Deferimento ou Diferimento?
1. Deferimento significa anuência, aprovação ou ato de deferir. Exs. a)
“Não se concedeu deferimento àquela solicitação, por ser
manifestamente ilegal”; b) “O autor, na petição inicial, requererá: I – o
depósito da quantia ou da coisa devida, a ser efetivado no prazo de 5
(cinco) dias contados do deferimento, ressalvada a hipótese do § 3o do
art. 890” (CPC/1973, art. 893, I).
2. Já diferimento quer dizer adiamento, o ato de diferir. Exs.: a) “Não se
atentou ao diferimento concedido pelas leis fiscais, para que fosse
recolhido o imposto”; b) “Ressalvado o disposto no § 3º do artigo 52, é
assegurada ao Município a cobrança do imposto nos casos em que da
lei estadual resultar suspensão ou exclusão de créditos, assim como a
antecipação ou o diferimento de incidências relativamente ao imposto
de que trata aquele artigo” (CTN, art. 62, em redação já revogada)
3. Atenta aos frequentes equívocos que se dão a esse respeito, sobretudo
em meio a profissionais de nível universitário e executivos, adverte
Laurinda Grion ser “preciso tomar cuidado, pois estas palavras causam
dúvidas em muitas pessoas” (s/d, p. 25).
4. Por reputar tão oportuna a diferenciação, o próprio Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
órgão incumbido oficialmente de determinar a existência dos vocábulos
em nosso idioma, além de sua grafia oficial, mesmo contrariamente a seu
proceder e a suas finalidades, acaba por apontar de modo expresso a
distinção entre ambos: deferimento é anuência, enquanto diferimento é
adiamento (2009, p. 247 e 285).
Deferir ou Diferir?
1. Deferir significa conceder, anuir a. Ex.: “O magistrado deferiu o
requerimento de suspensão do processo”.
2. Vejam-se alguns exemplos de seu emprego em nossa legislação: a) “A
herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os
herdeiros” (CC, art. 1.791, caput); b) “Nascendo com vida o herdeiro
esperado, ser-lhe-á deferida a sucessão, com os frutos e rendimentos
relativos à deixa, a partir da morte do testador” (CC, art. 1.800, § 3º); c)
“A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte…” (CC, art. 1.829,
caput); d) “Em falta de descendentes e ascendentes, será deferida a
sucessão por inteiro ao cônjuge sobrevivente” (CC, art. 1.838); e) “Não
havendo impugnação dentro de 5 (cinco) dias, o pedido do assistente
será deferido” (CPC/1973, art. 51, caput); f) “Se o autor desistir da ação
quanto a algum réu ainda não citado, o prazo para a resposta correrá
da intimação do despacho que deferir a desistência” (CPC/1973, art.
298, parágrafo único); g) “A propositura da execução, deferida pelo juiz,
interrompe a prescrição…” (CPC/1973, art. 617); h) “Havendo
impugnação pelo credor ou pelo devedor, o juiz deferirá, quando
necessário, a produção de provas e em seguida proferirá sentença”
(CPC/1973, art. 772, caput); i) “Produzidas as provas em justificação
prévia, o juiz, convencendo-se de que o interesse do requerente corre
sério risco, deferirá a medida, nomeando depositário dos bens”
(CPC/1973, art. 858, caput).
3. Deferir conjuga-se como aderir, de modo que recebe um i na primeira
pessoa do presente do indicativo e nos tempos dela derivados: defiro,
deferes, defere, deferimos, deferis, deferem (presente do indicativo);
defira, defiras, defira, defiramos, defirais, defiram (presente do
subjuntivo); defere, defira, defiramos, deferi, defiram (imperativo
afirmativo); não defiras, não defira, não defiramos, não defirais, não
defiram (imperativo negativo).
4. Na observação de José de Nicola e Ernani Terra, “o e do radical muda
para i na primeira pessoa do singular do presente do indicativo e nas
formas daí derivadas” (2000, p. 20).
5. Tal verbo não é defectivo e não apresenta problemas ou irregularidades
nos demais tempos e modos, nos quais é conjugado normal e
regularmente.
6. Desse modo, em termos práticos, assim se conjugam os outros tempos:
deferia (imperfeito do indicativo), deferirei (futuro do presente do
indicativo), deferiria (futuro do pretérito), deferindo (gerúndio), deferido
(particípio), deferi (pretérito perfeito), deferira (pretérito mais-que-
perfeito), deferir (futuro do subjuntivo), deferisse (imperfeito do
subjuntivo).
7. No que respeita à regência verbal, lembra Artur de Almeida Torres
(1967, p. 109) que “pode ser empregado como transitivo direto ou
indireto”. Exs.: a) “Deferiu logo aquela súplica… por isso não deferiu
estoutra” (Manuel Bernardes); b) “Deferiu um requerimento” (Cândido
de Figueiredo); c) “Deferiu este (juiz de direito) ao meu requerimento”
(Camilo Castelo Branco); d) “O pai não deferia à sua petição” (Antônio
Vieira).
8. Também Celso Pedro Luft (1999, p. 166-7) reputa válidas, com
possibilidade de uso facultativo, ambas as construções: deferir uma
petição ou deferir a uma petição.
9. Em mesmo sentido, leciona o Padre Stringari, em doutrina lembrada por
Francisco Fernandes (1971, p. 183): “dizemos deferir a súplica ou
deferir à súplica”.
10. Como parônima de deferir, existe o verbo diferir, que quer dizer
diferenciar, divergir, retardar. Exs.: a) “O ponto de vista do advogado
diferia integralmente do entendimento do magistrado”; b) “Diferir o
pagamento do imposto”.
11. As mesmas observações feitas para deferir, quanto à conjugação
verbal, servem para diferir: tem um i na primeira pessoa do presente do
indicativo e nos tempos dela derivados: difiro, diferes, difere,
diferimos, diferis, diferem (presente do indicativo); difira, difiras,
difira, difiramos, difirais, difiram (presente do subjuntivo); difere,
difira, difiramos, diferi, difiram (imperativo afirmativo); não difiras,
não difira, não difiramos, não difirais, não difiram (imperativo
negativo).
12. Não apresenta problemas ou irregularidades nos demais tempos e
modos, os quais assim se conjugam: diferia (imperfeito do indicativo),
diferirei (futuro do presente do indicativo), diferiria (futuro do
pretérito), diferindo (gerúndio), diferido (particípio), diferi (pretérito
perfeito), diferira (pretérito mais-que-perfeito), diferir (futuro do
subjuntivo), diferisse (imperfeito do subjuntivo).
13. E, por reputar tão oportuna a diferenciação entre ambos, o próprio
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira
de Letras, órgão incumbido oficialmente de determinar a existência dos
vocábulos em nosso idioma, além de sua grafia oficial, mesmo
contrariamente a seu usual proceder e a suas finalidades, acaba por
apontar de modo expresso a distinção de sentido entre os vocábulos:
deferir é atender, enquanto diferir é adiar (2009, p. 247 e 285).
Defeso
1. O art. 601 do Código de Processo Civil, em sua redação anterior a 1994,
hoje revogada, trazia exemplo de emprego desse vocábulo no sentido de
proibido, vedado: “Preclusa esta decisão, é defeso ao devedor requerer,
reclamar, recorrer ou praticar no processo quaisquer atos, enquanto não
lhe for relevada a pena”.
2. Apesar da pecha de galicismo que alguns intentam conferir ao vocábulo,
tal uso e tal significação são perfeitamente corretos, estando presentes
em diversos outros dispositivos da legislação pátria: a) “É defeso às
partes e seus advogados empregar expressões injuriosas nos escritos
apresentados no processo…” (CPC/1973, art. 15); b) “… Entre as
condições defesas se incluem as que privarem de todo efeito o ato, ou o
sujeitarem ao arbítrio de uma das partes” (CC/1916, art. 115, 2ª parte);
c) “A validade do ato jurídico requer agente capaz, objeto lícito e forma
prescrita ou não defesa em lei” (CC/1916, art. 82); d) “É defeso a quem
ainda não depôs assistir ao depoimento da outra” (CPC/1973, art. 344,
parágrafo único).
Ver Defender – Galicismo? (P. 256)
Degladiar ou Digladiar?
1. Digladiar, do latim digladiare, significa combater, contender, disputar.
Ex.: “Os advogados daquele processo digladiaram durante meses, em
polêmica inútil”.
2. Importa observar, porém, que o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão oficialmente
incumbido de listar as palavras pertencentes a nosso léxico, registra
digladiar (2009, p. 285), mas não repete tal proceder com respeito a
degladiar.
3. Isso significa que não existe em nosso idioma a palavra por último
referida, de modo que está vedado o uso de tal verbo em textos que
devam submeter-se à norma culta, muito embora alguns teimem em usá-
lo.
De há muito
1. O verbo haver, na acepção de tempo passado, às vezes entra na
formação de frases adverbiais. Ex.: “O advogado entrou há pouco na
sala de audiências”.
2. Em expressões adverbiais dessa natureza, haver não é visto como verbo,
mas, sobretudo, como preposição, razão por que se lhe podem antepor
de, desde e até, e isso, segundo o magistério de Napoleão Mendes de
Almeida (1981, p. 133), por analogia com outras expressões como de
então, desde ontem, até hoje.
3. São, portanto, corretas, frases como as seguintes: a) “Guarda integral
viço, embora seja uma lei de há três décadas”; b) “Desde há cinco anos,
a ação já podia ter sido proposta”; c) “Até há três anos, a mencionada
lei ainda não vigorava”.
4. Também para Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 105-6), de há muito
e de há pouco são “expressões da linguagem culta, referentes ao tempo
passado”, de integral correção, acrescentando tal autor que, “em vez de
muito e pouco, podem-se usar outras expressões de tempo”, como de há
cem anos, de há três décadas, de há mil anos. Ex.: “Ouve pela última
vez o rir que responde ao teu riso de há dez anos” (Alexandre
Herculano).
5. Vasco Botelho de Amaral (1939, p. 20), todavia, é do parecer de “que o
de superabunda em giros fraseológicos como este”, motivo por que julga
“mais correta a supressão daquele de, redigindo antes há muito”.
6. A posição divergente ao gramático por último citado não muda o
entendimento de que são corretas ambas as expressões – há muito e de
há muito – assim como de que não há diferença de sentido entre ambas.
Deixar
Ver Vi-o fechar o cofre ou Vi-lhe fechar o cofre? (P. 769)
Delapidar ou Dilapidar?
1. O Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa condena o uso de
delapidar, no sentido de arruinar, demolir, destruir, proceder esse que
também adota Aires da Mata Machado Filho (1969c, p. 464).
2. É, porém, forma de largo uso, e Napoleão Mendes de Almeida (1981, p.
7) a defende com sólidos argumentos.
3. Dilapidar, por seu lado, do latim dilapidare, é verbo que tem o
significado de destruir, arruinar, demolir. Ex.: “O pródigo dilapidou a
fortuna em poucos meses”.
4. Eliasar Rosa (1993, p. 57), de modo didático, observa que, em dilapidar,
“o sentido é de lançar pedra para um lado e para outro; para os dois (di)
lados, portanto. Como se vê, o di encerra o sentido fundamental da
dualidade”. E tal autor, acompanhado por outros gramáticos, não vê
razão, assim, para o emprego da variante delapidar.
5. Espancando, porém, toda e qualquer dúvida, o Vocabulário Ortográfico
da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, que é o veículo
oficial para dirimir dúvidas acerca da existência ou não de vocábulos em
nosso idioma, registra ambas as formas – delapidar e dilapidar (2009, p.
248 e 286), de modo que legem habemus, e o emprego de ambas está
oficialmente autorizado, como sinônimas e variantes gráficas de um
mesmo sentido.
Delatar ou Dilatar?
1. Delatar quer dizer acusar, denunciar, revelar (crime). Exs.: a) “Silvério
dos Reis delatou os conjurados” (Aurélio Buarque de Holanda Ferreira);
b) “Às onze horas Calisto Elói entrou na Câmara. Dir-se-ia que entrava
Cícero a delatar a conjuração de Catilina” (Camilo Castelo Branco); c)
“Um informante delatou o acusado à polícia”.
2. Já dilatar significa aumentar as dimensões, adiar, prorrogar. Exs.: a) “O
calor dilatou a madeira”; b) “O magistrado dilatou o prazo para a
apresentação dos memoriais”.
3. Talvez por reputar tão oportuna a diferenciação, o próprio Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
órgão incumbido oficialmente de determinar a existência dos vocábulos
em nosso idioma, além de sua grafia oficial, mesmo contrariamente a seu
proceder de não especificar o sentido das palavras, acaba por apontar de
modo expresso a distinção de sentido entre os vocábulos: delatar é
denunciar, enquanto dilatar é estender (2009, p. 248 e 286).
Delegada – Existe?
Ver Capitã, Capitoa ou A Capitão? (P. 168) e Poeta – Qual o feminino? (P.
570)
Delegar
1. Em linguagem comum, significa transmitir poderes a alguém com a
finalidade de que este último aja em nome daquele que lhe outorgou tal
faculdade de atuação. Ex.: “Aquele governante delega mal os cargos que
exigem maior competência”.
2. Em linguagem jurídica, exprime, em sentido amplo, conceder ou
transmitir alguém (outorgante) um poder, que originariamente era
atribuído ou inerente a uma pessoa, a qual os transfere a outrem
(outorgado), para que este pratique atos de incumbência originária
daquele, ou exerça função, que lhe era atribuída ou confiada. Ex.: “A lei
delegou ao chefe do Poder Executivo a faculdade de alteração da base
de cálculo sobre que haveria de incidir o imposto” (DE PLÁCIDO E
SILVA, 1989, p. 24).
3. Quanto à regência verbal, na conformidade com lição de Vitório Bergo
(1944, p. 79), “é mais corrente a sintaxe delegar poderes a, mas a par
desta também se usa delegar poderes em”, para o que dá exemplo de
abalizados escritores: a) “Delegou… à sua comissão especial poderes
arbitrais sobre a emenda formulada” (Rui Barbosa); b) “… delegou
inteiros poderes em Manuel Vieira, e estabeleceu a sua definitiva
residência nos arrabaldes de Londres” (Camilo Castelo Branco).
4. Francisco Fernandes (1971, p. 185), por sua vez, não apenas admite a
possibilidade de construção com as preposições a e em, mas também
reconhece a possibilidade de sintaxe com a locução conjuntiva para que:
“Delega os seus procônsules para que vão governar nas terras de África
e Ásia” (Latino Coelho).
5. Também Celso Pedro Luft (1999, p. 169) acata a tríplice possibilidade de
construção defendida por Francisco Fernandes.
6. Em face da autoridade dos defensores, o melhor é, conforme o caso e o
sentido, acatar todas as possibilidades alinhadas: delegar a, delegar em e
delegar para que.
Delinquir
Ver Abolir (P. 55).
Delistar – Existe?
1. Um leitor indaga se existe em nosso idioma o vocábulo delistar e
observa que ele é de uso comum no ambiente empresarial, quando se
quer indicar o sentido de excluir, como em “O fornecedor foi delistado
do cadastro”, “O chefe foi delistado do sorteio” e “A empresa foi
delistada da Bolsa de Valores”.
2. Ora, quando se quer saber se uma palavra existe ou não em português,
deve-se tomar por premissa o fato de que a autoridade para listar
oficialmente os vocábulos pertencentes ao nosso idioma é a Academia
Brasileira de Letras.
3. E essa autoridade, a ABL a exerce por via da edição do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa.
4. Uma simples consulta ao VOLP, contudo, mostra que nele não se
registra o verbo delistar, de modo que a forçosa conclusão é que essa
palavra não existe em nosso léxico e seu emprego não encontra guarida
nas regras que norteiam o uso da norma culta.
5. Em tais circunstâncias, se se quer usar um verbo com esse significado, a
solução é escolher um sinônimo entre as diversas palavras com essa
acepção em português: eliminar, expulsar, retirar. Ou, ainda, lançar mão
de um circunlóquio com o mesmo sentido, como excluir da lista, por
exemplo.
6. Empregar, porém, vocábulo inexistente, a pretexto de neologismo, não
constitui alternativa válida, que esteja ao alcance do usuário do idioma.
7. Parece oportuno observar, a esta altura, que, sobretudo nos meios
jurídicos e forenses, há uma equivocada tendência de alguns, com
pretensão de uma jamais alcançada erudição, para empregar vocábulos
arrevesados e barrocos, mas inexistentes, como esse que agora é trazido
para análise.
8. O máximo que conseguem, todavia, é um texto de difícil leitura e
compreensão, muito distante do ideal que só a simplicidade objetiva
consegue alcançar.
Demais ou De mais?
1. Num primeiro aspecto, demais pode ser advérbio de intensidade, com o
sentido de muito, caso em que intensifica um verbo, um adjetivo ou um
outro advérbio. Exs.: a) “O réu falou demais” (modifica o verbo falou);
b) “As testemunhas ficaram aborrecidas demais” (modifica o adjetivo
aborrecidas); c) “O réu estava bem demais” (modifica o advérbio bem).
2. Num segundo aspecto, também pode ser pronome indefinido, com o
significado de os outros, os restantes. Ex. “Um dos réus deixou os
demais nas mãos da polícia”.
3. Para diferenciar tal vocábulo da expressão de mais, lembram Pasquale
Cipro Neto e Ulisses Infante (1999, p. 549) que esta última “opõe-se a de
menos” e “refere-se sempre a um substantivo ou pronome”. Exs.: a)
“Não vejo nada de mais em sua atitude”; b) “Decidiu-se suspender o
concurso público porque surgiram candidatos de mais”.
4. Na lição de Domingos Paschoal Cegalla, por um lado, “escreve-se
demais, numa palavra só, quando significa: a) excessivamente: Não
convém comer demais; b) muitíssimo, extremamente: Ela é linda
demais; c) além disso: O cargo não lhe interessa; demais (ou demais
disso), falta-lhe tempo para exercê-lo; d) os outros, os restantes:
Entraram no banco três assaltantes; os demais ficaram esperando fora”.
5. Ainda segundo tal gramático, por outro lado, “grafa-se de mais, em duas
palavras, quando equivale a a mais, oposto de de menos: Bom guisado,
nem sal de mais, nem sal de menos. Não há nada de mais nisso”
(CEGALLA, 1999, p. 107).
De modos que
Ver De formas que – Está correto? (P. 258)
De molde ou De molde a?
1. Vitório Bergo (1944, p. 80) condena o uso de tal expressão e manda
substituí-la por de molde que.
2. De igual modo, Ronaldo Caldeira Xavier (1991, p. 89) insere a
expressão de modo (molde) a no rol dos galicismos sintáticos e
aconselha sua substituição por de modo (molde) que.
3. Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 138) também arrola tal
expressão entre as incorretas.
4. Vasco Botelho de Amaral (1939, p. 111), após observar que Camões
redigia de modo que, anota que, “como no francês a sintaxe admite de
manière à, no português descuidado de agora topa-se com de modo a
fazer, de maneira a acontecer, de forma a, de jeito a, de molde a”;
acrescenta que até mesmo se encontram de maneira a que, de modo a
que, etc., “formas resultantes do cruzamento das construções sintáticas
incorreta e correta”, as quais considera tal autor verdadeiros e reais
galicismos sintáticos.
5. Não confundir, todavia, com a expressão de molde, tomada da fundição
dos metais, a qual se aplica, segundo magistério de Mário Barreto, “às
coisas que se ajustam e acomodam perfeitamente entre si, à maneira que
o metal derretido enche as cavidades e toma a figura do molde em que
se infunde” (1954b, p. 121).
6. Nesse último sentido, de acordo com exemplificação colhida pelo
referido gramático, é construção muito usada por Camilo: a) “Aqui vem
de molde repetir as palavras…”; b) “Aqui vem de molde referir um
sucesso…”
7. Também Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 265) lembra que essa
expressão significa a propósito, no momento certo, oportunamente. Ex.:
“Seu telefonema veio de molde”.
8. Lembrando que a locução adverbial de molde significa a propósito, na
ocasião, no ensejo próprio, em conformidade, traz Edmundo Dantès
Nascimento significativo exemplo do modo correto de seu emprego:
“Vinha o encontro como talhado de molde para Humboldt” (1982, p.
138).
Ver De modo a ou De modo que? (P. 262)
Demolir
Ver Abolir (P. 55).
Dêmos ou Demos?
1. Um leitor pergunta se é verdade que, com as recentes mudanças em
nosso sistema de escrita, o verbo dar, na primeira pessoa do plural do
presente do indicativo, passou a ser acentuado.
2. Reitere-se que o Acordo Ortográfico de 2008 não veio para simplificar,
nem mesmo para unificar a escrita, e sim, em diversos aspectos, para
regularizar e justificar a duplicidade de grafias e de pronúncias entre os
usuários do idioma em Portugal (e países outros por ele colonizados) e
no Brasil.
3. Seguindo essa orientação, criou tal sistema a dupla e facultativa
possibilidade de grafia, mediante a diferenciação, pelo acento agudo, na
primeira pessoa do plural do pretérito perfeito do indicativo dos verbos
da primeira conjugação (louvámos, adorámos e falámos), formas essas
pronunciadas de modo aberto em Portugal, para opor-se à primeira
pessoa do plural do presente do indicativo (louvamos, adoramos e
falamos).
4. Em critério um pouco diverso – já que aqui a forma aberta é exatamente
a que não se acentua – quanto ao verbo dar, facultou o emprego do
acento circunflexo em dêmos (1ª pessoa do plural do presente do
subjuntivo) para se distinguir de demos (1ª pessoa do plural do pretérito
perfeito do indicativo).
5. Como tal acento é facultativo, confiram-se os seguintes exemplos, com a
indicação de seu acerto ou erronia entre parênteses: a) “Quando o
inimigo nos fere, é preciso que demos a outra face” (correto); b)
“Quando o inimigo nos fere, é preciso que dêmos a outra face” (correto);
c) “No passado, não demos a outra face” (correto); d) “No passado, não
dêmos a outra face” (errado).
Denegrir
1. Quanto à conjugação verbal, o e da penúltima sílaba transforma-se em i
nas formas rizotônicas bem como nas formas delas derivadas (REIS,
1971, p. 146-7).
2. Desse modo, assim é seu presente do indicativo: denigro, denigres,
denigre, denegrimos, denegris, denigrem.
3. Da primeira pessoa do singular se extrai o presente do subjuntivo:
denigra, denigras, denigra, denigramos, denigrais, denigram.
4. E de ambos os tempos formam-se o imperativo afirmativo e o imperativo
negativo.
5. Atente-se, porém, ao pretérito perfeito do indicativo, do qual derivam o
mais-que-perfeito do indicativo, o imperfeito do subjuntivo e o futuro do
subjuntivo, todos integrados por formas arrizotônicas, as quais não
sofrem influência alguma da observação referida: denegri, denegriste,
denegriu, denegrimos, denegristes, denegriram.
6. Seguem mesma conjugação outros verbos: agredir, progredir, regredir,
transgredir.
Dentre
1. Aglutinação de de e entre, esse vocábulo significa do grupo composto
de, do meio de. Ex.: “Dentre os candidatos, ele foi o escolhido”.
2. Exatamente por seu sentido, não serve para ser empregado após termo
que denote inclusão. Sousa e Silva (1958, p. 99), nesse sentido, aliás,
extrai excerto de equivocado emprego por parte de famoso jurista:
“Desde que o negócio jurídico… se considere incluído dentre os atos de
comércio” (e manda corrigir: “… incluído entre os atos de comércio”.
3. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 108) lembra a possibilidade de seu
emprego nas expressões dentre nós, dentre vós, dentre vocês.
Ver Dentro a, Dentro de ou Dentro em? (P. 264)
Dentro e fora de
Ver Antes e depois (P. 120) e Com ou sem – Está correto? (P. 198)
Denúncia
1. Por um lado, ao literato, que produz arte, confere-se liberdade de criação
para, em um jogo de palavras, encontrar a melhor forma de sugerir no
leitor um sentimento, o qual, por vezes, nem sempre foi pretendido ou
pensado pelo escritor; por outro lado, ao profissional do Direito, que
produz ciência, impõe-se a obrigatoriedade de emprego da linguagem de
padrão culto, correta quanto à gramática e apropriada quanto à
expressão.
2. Por pertencer à ciência, a linguagem do Direito é técnica e precisa, e,
assim, por via de regra, será inconveniente substituir seus termos e
locuções por sinônimos, a pretexto de evitar repetições, e isso sob pena
de se correr o risco da impropriedade de expressão e de se descambar
para o pernosticismo.
3. Apenas para exemplificar, é de se ver que pelo menos dezessete artigos
do Código de Processo Penal (arts. 12, 24, 25, 39, 41, 43, 46, 384, 505,
508, 509, 512, 513, 525, 556, 569 e 581) mencionam sempre a palavra
denúncia; nenhuma vez se dá, pela dicção da lei, sua substituição por
sinônimos.
4. Alguns operadores do Direito, porém, quer para evitar repetições, quer
para demonstrar pretensa erudição, quase nunca empregam, em Processo
Penal, a adequada palavra denúncia ou mesmo, em Processo Civil,
petição ou petição inicial, mas preferem dizer exordial, preambular,
prefacial, proemial, peça vestibular, petição de introito, esquecidos de
que singela consulta ao dicionário revela que denúncia ou mesmo
petição inicial não são exórdio, prefácio nem proêmio algum do
processo.
5. Em lição abrangente para o Processo Civil e para o Processo Penal,
observa Geraldo Amaral Arruda, nesse sentido, que denúncia e petição
inicial “são expressões técnicas às quais será difícil fugir de repetir na
sentenças”, motivo por que “convém evitar o mau gosto de substituí-las
por expressões como: peça inaugural, peça processual, exordial,
exordial acusatória, pretensão punitiva inaugural, inaugural acusatória,
vestibular, peça depositária da pretensão punitiva, peça denunciatória,
requisitório ministerial” (1997, p. 12).
De oitiva
Ver Oitiva (P. 521).
De onde em onde
Ver De quando em vez ou De vez em quando? (P. 269)
De onde ou Donde?
Ver Donde ou De onde? (P. 294)
De ou Da?
1. Uma leitora diz ter dúvidas quanto ao emprego da preposição de, quando
em contração com os artigos a e o. Assim: a) Secretaria de Educação ou
Secretaria da Educação?; b) Uso de pronome pessoal ou Uso do
pronome pessoal?
2. Uma primeira observação a ser feita nesse campo é que, como o próprio
nome demonstra, o artigo definido serve para particularizar o substantivo
que o segue. Entre Encontrei Carlos e Encontrei o Carlos, vê-se que o
segundo modo de expressão é mais determinado, mais específico e,
aparentemente, mais próximo de quem fala do que o primeiro.
3. E, se, em vez apenas do artigo, vem este antecedido de uma preposição,
a situação se repete em mesmos moldes, como não é difícil perceber
entre as expressões roupa de menina e roupa da menina.
4. Com essas observações como premissas, pode-se dizer, num primeiro
aspecto, em resposta à indagação da leitora, que o ensino se aplica às
expressões uso de pronome e uso do pronome, sem necessidade de
maiores comentários.
5. Por outro lado, quanto à primeira expressão trazida por ela, a questão
também é de mera opção, ora pelo emprego exclusivo da preposição, ora
pelo uso da contração da preposição + o artigo, podendo haver, apenas e
tão somente, ligeira diferença de sentido, conforme deflui do
apontamento inicial destes comentários: Secretaria de Agricultura,
Secretaria de Direitos Humanos e Secretaria de Desenvolvimento
Social, ou Secretaria do Meio Ambiente, Secretaria da Fazenda e
Secretaria da Receita Federal.
De ouvida
Ver Oitiva (P. 521).
Deparar
1. Por um lado, Artur da Almeida Torres anota que Cândido de Figueiredo
e João Ribeiro não consideram correto o emprego deste verbo na
acepção de achar por acaso, encontrar, topar.
2. Acrescenta, entretanto, que o primeiro deles inspirou-se “nos velhos
lexicógrafos, mas esqueceu-se das autoridades modernas, que ampliaram
a significação desse verbo”.
3. No que concerne à regência verbal, o gramático (TORRES, 1967, p. 117-
8) que cita a lição dos demais, fundando-se na autoridade de diversos
bons escritores, vê quatro possibilidades de construção: a) transitivo
direto no sentido de fazer aparecer, achar por acaso, encontrar, topar: i)
“Santo Antônio depara as coisas perdidas” (João Ribeiro); ii) “José
Barbosa, deparando-os, levantaria…” (Camilo Castelo Branco); b)
transitivo indireto no sentido de achar por acaso, encontrar, topar,
posição essa que, como ele próprio lembra, reputam “incorreta preclaras
autoridades”, mas que, para Rui Barbosa, “encontra amparo
frequentíssimo nos escritos de Filinto Elísio”: i) “Eles que digam que de
vezes não deparam… com as suas próprias ideias” (Antônio Feliciano
de Castilho); ii) “Deparei, não sem alguma emoção, com a sombria e
monstruosa mesa” (Camilo Castelo Branco); c) bitransitivo (ou
transitivo direto e indireto) no sentido de fazer aparecer, apresentar
inesperadamente: i) “Deparou-lhe o acaso uma mulher” (Camilo Castelo
Branco); ii) “Um magnífico espetáculo lhe deparou a bela constelação”
(Latino Coelho); d) pronominal no sentido de fazer aparecer, apresentar-
se inesperadamente, topar, com a preposição a ou com: i) “Depararam-
se ao viandante numerosos caminheiros” (Latino Coelho); ii) “Na obra
parlamentar… não se depara com um só vocábulo inovado” (Rui
Barbosa).
4. Resumindo a questão, anota Luiz Antônio Sacconi, por primeiro, que, no
sentido de achar por acaso, encontrar, topar, pode ser transitivo direto ou
transitivo indireto. Exs.: a) “Deparei um erro crasso na sentença”
(transitivo direto); b) “Deparei com um erro crasso na sentença”
(transitivo indireto).
5. No significado de aparecer inesperadamente, é usado como pronominal,
em construção que o referido gramático realça ser clássica. Ex.: “Ao se
lhe deparar crasso erro na sentença, interrompeu a leitura dos autos”
(SACCONI, 1979, p. 220).
6. Sem contrariar o que até agora foi dito, de Édison de Oliveira vem a
seguinte advertência: “Há autores que admitem o emprego do verbo
deparar acompanhado da preposição com. Devemos saber, entretanto,
que é também perfeitamente correto empregar esse verbo sem
preposição alguma” (s/d, p. 111).
7. Na lição de Heráclito Graça, “assim como se pode dizer topar ou topar-
se com alguém ou com alguma cousa, encontrar ou encontrar-se com
alguém ou com alguma cousa, podemos do mesmo modo dizer – e dizer
bem – deparar com alguém ou com alguma cousa, deparar-se com
alguém ou com alguma cousa. A analogia dos três verbos é perfeita”.
8. E, para a defesa de sua afirmação, cita tal autor (GRAÇA, 1904, p. 141-
58) diversos exemplos de autores insuspeitos: a) “Perguntar-lhes-íamos
se deparam com espetáculos semelhantes nas antigas Repúblicas
gregas” (Antônio Feliciano de Castilho); b) “Deparam com centos de
homens cevados na leitura da antiguidade” (Filinto Elísio); c) “Enfim
deparei com um pobre homem” (Almeida Garrett); d) “Aí deparei, não
sem alguma emoção, com a sombria e monstruosa mesa de granito”
(Camilo Castelo Branco).
9. De modo mais prático, veja-se que são corretos todos os seguintes
exemplos: a) “Quando decidimos escrever este livro de prática,
deparamos uma dificuldade…” (transitivo direto); b) “Quando
decidimos escrever este livro de prática, deparamos com uma
dificuldade…” (transitivo indireto com a preposição com); c) “Quando
decidimos escrever este livro de prática, deparamo-nos com uma
dificuldade…” (pronominal com a preposição com); d) “Quando
decidimos escrever este livro de prática, o estudo realizado deparou a
nós uma dificuldade…” (transitivo direto e indireto); e) “Quando
decidimos escrever este livro de prática, deparou a nós (ou deparou-nos)
uma dificuldade” (transitivo indireto com a preposição a); f) “Quando
decidimos escrever este livro de prática, deparou-se a nós (ou deparou-
se-nos) uma dificuldade” (pronominal com a preposição a).
Depois de o
Ver É hora da onça beber água ou É hora de a onça beber água? (P. 296)
Depor – Como conjugar?
Ver Pôr – Como conjugar? (P. 577)
Depor judicialmente
Ver Advérbios em “mente” (P. 85).
Deprecado e Deprecante
Ver Precatória (P. 588).
De propósito
1. Muito embora reconheça Vitório Bergo que haja autores que rejeitem as
formas propositalmente e propositadamente, anota o referido gramático
que a locução adverbial de modo de propósito é recomendada tanto por
uns quanto por outros.
2. E traz exemplo de Machado de Assis: “… levantaria os brindes… e
seria por um copo de ouro e diamantes que eu lhe mandaria fazer de
propósito” (BERGO, 1944, p. 81).
Ver Propositadamente ou Propositalmente? (P. 624)
Deputada – Existe?
Ver Capitã, Capitoa ou A Capitão? (P. 168) e Poeta – Qual o feminino? (P.
570)
De quando em quando
Ver De quando em vez ou De vez em quando? (P. 269)
De que
1. De integral propriedade a observação de Eliasar Rosa para uma situação
frequente nos discursos, a pretexto de erudição: “Há uma forma de errar
muito curiosa nas sustentações orais, ou em discursos forenses, ou
parlamentares. Consiste ela em usar-se a preposição de com verbos que
não a exigem. Exemplos: “O Dr. Promotor afirmou de que o réu matou
por motivo fútil; entretanto a defesa vai demonstrar de que isto não é
verdade, pois o que está provado, nos autos, é de que o réu matou
impelido por motivo de relevante valor social…”. Ora, os verbos
afirmar, demonstrar, provar não se constroem com a preposição de.
Logo o certo seria: “O Dr. Promotor afirmou que…; entretanto a defesa
demonstrará que…, pois está provado que…” (1993, p. 54-5).
Ver Omissão da preposição – Está correto? (P. 526) e Pronome relativo
preposicionado (P. 616).
De repentemente – Existe?
Ver Advérbios em “mente” (P. 85).
De resto – Galicismo?
1. Constitui expressão que tem sido empregada no sentido de em remate,
em suma, finalmente, por fim. Exs.: a) “Minha tática, de resto bem
simples, consistia em jamais pronunciar ou sugerir a palavra literatura”
(Carlos Drummond de Andrade); b) “De resto, acrescentou, não podia
ser o Messias!” (Eça de Queirós).
2. Observando que Rui Barbosa a chamou de “francês puro”, Júlio
Nogueira (1959, p. 70) leciona que se deve preferir finalmente, em suma,
por fim, em remate, conforme o caso.
3. Em outra obra, tal autor (NOGUEIRA, 1930, p. 53) a insere entre as
locuções, expressões e frases completas que conservam o “ar francês” do
galicismo, espécies das mais repreensíveis, “pois não correspondem a
uma necessidade da língua”.
4. Alfredo Gomes (1924, p. 469), de igual modo, a insere no rol dos
galicismos sintáticos.
5. Idêntico é o proceder de Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 23-4),
que a insere entre os estrangeirismos fraseológicos e de acepção, e
assevera que o correto é finalmente, por fim, em suma.
6. Luís A. P. Vitória (1969, p. 211) também lista a expressão entre as
“condenáveis” e aconselha sua substituição por aliás, além disso.
7. Em mesma obra, tal autor (VITÓRIA, 1969, p. 211), para quem tal
expressão “cheira a francesia”, aduz que “temos em português: demais,
além disso, quanto ao mais”.
8. Lembra também Ronaldo Caldeira Xavier (1991, p. 89) ser a expressão
de resto um galicismo sintático e aconselha, em substituição, por fim, em
suma, finalmente.
9. Vasco Botelho de Amaral, de igual modo, lança a expressão na vala dos
galicismos, não se convencendo com o argumento de ser ela semelhante
a outras expressões também muito correntes, como de fato e de verdade,
justificando textualmente: “Parece-me que se não pode considerar
correta uma expressão estranha só por ser comparável a outra ou outras
correntes” (1943, p. 208).
10. Contrariamente a esse posicionamento, contudo, na visão de Evanildo
Bechara, “os puristas, sem maiores exames, têm tachado de galicismo
essa expressão de resto (= quanto ao mais); todavia, além de usada por
grandes escritores, tem raízes no latim de reliquo” (1974, p. 291).
11. Com supedâneo em exemplos de Alexandre Herculano, Camilo Castelo
Branco e Machado de Assis, também reitera Vitório Bergo (1944, p.
81) que de resto constitui “locução acoimada de galicismo mas
defendida por Heráclito Graça e largamente empregada pelos melhores
escritores da língua. Corresponde semiologicamente ao latim de
reliquo, não obstante se identifique com o francês du reste”.
12. Na lição do Padre José F. Stringari (1961, p. 65), “eis aí uma locução
que se atirou para o muladar das coisas inúteis por cheirar a francês.
Mas milheiros de exemplos clássicos há que a absolvem da pecha que
lhe assacam. Vou citar dois apenas e de mestres de polpa, que valem
por todos os demais: “De resto, a agitação é sinal de vida” (Machado
de Assis); “De resto, é uma circunstância esta pouco importante”
(Antônio Feliciano de Castilho).
13. E Vasco Botelho de Amaral (1939, p. 21-2), apesar de posicionamento
condenatório já referido, anota que Camilo Castelo Branco a usou com
frequência, muito embora advirta, por seu lado, que é, “de fato,
revelador de incapacidade expressiva o largo abuso com que alguns se
apegam à locução,… olvidando as restantes correspondentes e,
porventura, mais portuguesas”.
14. Em lição que parece ajustar-se com perfeição ao entendimento atual,
assim se manifesta Arnaldo Niskier: “apesar da objeção de alguns, que
veem esta expressão como inerente ao francês e não ao português,
tanto o dicionário de Antenor Nascentes quanto o de Aurélio Buarque
de Holanda registram-na. Ficamos com os mestres” (1992, p. 26).
15. Opondo-se ao ensinamento de Cândido de Figueiredo – que considera
de resto uma expressão que é “francês puro” e manda substituí-la por
quanto ao mais ou em tudo mais – Heráclito Graça é também de
entender mais permissivo: “De resto, locução adverbial, recebemos
imediatamente do francês, não há negá-lo; pelo sentido, porém, a
introdução da locução no português justifica-se perfeitamente com o
latim de reliquo, empregado especialmente por Cícero, na acepção de
quanto ao mais, quanto ao resto, de mais”.
16. E argumenta tal gramático que “foi sem dúvida pela consideração de
que au reste e du reste correspondem perfeitamente a de reliquo, que
de resto se aforou na linguagem escrita portuguesa, como já estava na
linguagem oral”.
17. E, em confirmação de sua assertiva, traz Heráclito Graça (1904, p. 183-
6) a corroboração de exemplos extraídos de autores os mais abalizados:
a) “De resto pouca eloquência, muita fome, muito frio e muito medo”
(Camilo Castelo Branco); b) “De resto, nenhum outro vestígio se
encontra” (Alexandre Herculano).
18. Ante a divergência entre os doutos, o melhor é aceitar o uso da referida
expressão, guardando fidelidade ao princípio de que, na dúvida, há de
se ter um entendimento mais permissivo.
Derrogação
1. Derivado do latim (derogatio, querendo dizer anulação de uma lei), “é o
vocábulo especialmente empregado para indicar a revogação parcial de
uma lei ou de um regulamento” (DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p. 44).
2. Atente-se a sua grafia: uma só palavra e dois erres.
3. Não confundir com ab-rogação, que quer dizer revogação total de uma
lei, decreto, regra ou regulamento, nem com revogação, que é palavra
genérica, abrangente de ambos os termos referidos.
4. No que concerne à regência nominal, Francisco Fernandes (1969, p. 127)
aceita a possibilidade de sintaxe com as preposições a e de,
exemplificando com dois excertos de Rui Barbosa: a) “Tais derrogações
à regra se verificam, de ordinário, quando o ato… não costuma formar
hábito, predileção, ofício, estado especial, ou intensidade”; b) “As mais
dolorosas características morais, as mais sensíveis derrogações da
condição humana…”.
5. As mesmas possibilidades de construção são acatadas por Celso Pedro
Luft (1999, p. 153): derrogação a uma lei, derrogações à norma,
derrogações à regra, derrogação de uma lei, derrogações da norma,
derrogações da regra.
Desagradar
1. À semelhança de seu antônimo agradar, é verbo que precisa ser
observado pelo prisma da regência verbal.
2. No sentido de tratar mal, de deixar de acariciar, é transitivo direto. Exs.:
a) “Ele desagradou o cãozinho”; b) “Ele desagradou-o”.
3. Já no sentido de ser desagradável, é transitivo indireto. Exs.: “O
resultado do processo desagradou ao perdedor”; b) “O resultado do
processo lhe desagradou” (SILVA, A., 1958, p. 26).
4. Muito embora já tenha sido usado, no último sentido, também com
objeto direto, anota Francisco Fernandes que a construção com objeto
indireto “é hoje a mais empregada” (1971, p. 194).
5. Acerca dessa mesma questão, assim observa Celso Pedro Luft (1999, p.
177): a) na língua culta escrita de registro formal, “ainda preferem a
sintaxe desagradar a alguém, desagradar-lhe”; b) “mas desagradar
alguém, desagradá-lo foi uso clássico… e continuou sendo uso familiar e
popular, talvez por força dos sinônimos descontentar, desgostar,
contrariar”; c) “escritores brasileiros contemporâneos usam as duas
regências”.
6. Apesar da divergência entre os gramáticos, o que melhor parece, no que
tange aos textos que devam submeter-se à norma culta, é obedecer à
distinção de regência inicialmente formulada.
Ver Voz passiva – Quando é possível? (P. 793)
Desapercebido ou Despercebido?
1. Desapercebido quer dizer desprevenido, desguarnecido, desprovido. Ex.:
“O furtador disse haver-se apossado da carteira alheia, porque estava
desapercebido de dinheiro”.
2. Já despercebido significa o que não se vê, o que não é notado, aquilo em
que não se atenta. Ex.: “Passou despercebida à imprensa a notoriedade
do réu”.
3. Silveira Bueno (1938, p. 75) faz essa distinção entre desperceber (não
pressentir) e desaperceber (não estar preparado).
4. Também fazendo a distinção de significados entre os dois vocábulos,
Eliasar Rosa transcreve frase de Otoniel Mota, que serve para a fixação
dos dois sentidos: “O soldado tratou de passar despercebido perante o
inimigo, porque estava desapercebido para a luta”.
5. Bem por isso, critica tal autor a seguinte passagem de um acórdão: “No
vertente, a falta passou desapercebida ao ilustre Juiz, bem como às
partes litigantes…” (ROSA, 1993, p. 56-7).
6. Quanto ao emprego equivocado de um vocábulo em lugar do outro,
lembra Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 269) que se trata de barbarismo
semântico.
7. Eduardo Carlos Pereira denomina-o barbarismo de ideia e o conceitua
como o “uso desnecessário de termos estrangeiros e de termos em
acepção estranha à língua” (1924, p. 260).
8. Também é lição de Júlio Ribeiro (1908, p. 328) que constitui “vício
lexiológico” que se chama “barbarismo” o “dar às palavras significação
que elas não têm”, como, por exemplo, “desapercebido em vez de
despercebido”.
9. Vasco Botelho de Amaral (1939, p. 105) anota um cochilo de emprego
de desapercebidas por despercebidas em Camilo Castelo Branco.
10. Arnaldo Niskier também é dos que veem nítida diferença entre tais
vocábulos: “Despercebido é o que não foi notado: desapercebido é
desprovido, desaparelhado” (1992, p. 27).
11. Ronaldo Caldeira Xavier (1991, p. 85) caracteriza o emprego de
despercebido por desapercebido – e vice-versa – como cruzamento,
vale dizer, como “o emprego de uma palavra em lugar de outra”,
decorrente “da falta de discernimento entre vocábulos assemelhados
quanto à estrutura fonológica (parônimos), o que motiva a alteração da
mensagem tencionada, atentando contra a precisão terminológica”.
12. Importa ressalvar, todavia, que, para Júlio Nogueira, a distinção entre
ambas as palavras parônimas constitui “distinção útil, mas de criação
moderna” (1959, p. 34).
13. E Pedro A. Pinto – que vê em Cândido de Oliveira o autor e defensor
da distinção de significados entre tais vocábulos – anota serem
“correntes ambas as formas, e uma não é melhor que a outra”.
14. Em sequência, refere tal gramático que Heráclito Graça “demonstrou à
saciedade, que pode dizer-se, com o mesmo sentido, passou
desapercebido ou passou despercebido”.
15. Para corroborar seu pensamento, por fim, remata ele (PINTO, 1924, p.
98-9) com exemplo de Almeida Garrett: “Sr. Presidente, em toda a
minha vida tenho professado a liberdade, e por isso não podia deixar
desapercebido este fato injusto e altamente inconveniente à causa
pública…”.
16. Após todas essas ponderações, o que se pode dizer, em síntese, é que,
apesar de alguns entendimentos contrários mais antigos, a regra, na
atualidade, sobretudo nos textos que devam submeter-se à norma culta,
é fazer a distinção entre ambos os vocábulos: desapercebido é
desprevenido, desguarnecido, desprovido; já despercebido é o que não
se viu, o que não é notado, aquilo em que não se atentou. Vale, nesse
sentido, o conselho de Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 111), para
não se empregar um adjetivo em lugar do outro.
Desconcerto do mundo
1. Um leitor narra que encontrou um poema de Camões com o título “Ao
Desconcerto do Mundo” e lhe pareceu que o correto deveria ser
desconserto, já que a ideia é que o mundo precisaria de reparo.
2. Veja-se, num primeiro aspecto, que, no campo da ortografia, as palavras
que têm grafia e pronúncia parecidas, mas com sentidos diversos,
denominam-se parônimas.
3. Isso se dá com diversos vocábulos: arrear (pôr arreio) e arriar (baixar,
ceder); deferir (conceder) e diferir (diferenciar); delatar (denunciar) e
dilatar (aumentar, prorrogar); eminência (elevação, altura,
proeminência) e iminência (característica do que está prestes a
acontecer); flagrância (estado do que é flagrante, do que ocorre no ato) e
fragrância (perfume agradável); ratificar (confirmar) e retificar
(corrigir).
4. Nesse mesmo rol se podem inserir concerto (acordo, ajuste, convenção,
pacto) e conserto (remendo, reparo). Exs.: a) “Do concerto das vontades
em litígio, extraiu-se uma minuta de acordo”; b) “Para muitos, aquela
situação não tem conserto”.
5. Há um conhecido poema de Camões, que tem por título “Ao desconcerto
do mundo” com o seguinte teor: “Os bons vi sempre passar / No Mundo
graves tormentos; / E para mais me espantar, / Os maus vi sempre nadar
/ Em mar de contentamentos. / Cuidando alcançar assim / O bem tão
mal ordenado, / Fui mau, mas fui castigado. / Assim que, só para mim, /
Anda o Mundo concertado.”
6. Vejam-se os dois versos finais: “Assim que, só para mim, / Anda o
Mundo concertado.” A leitura nos faz entender que o que o poeta quer
dizer, em suma, é que apenas para ele o mundo anda estruturado e,
portanto, concertado.
7. Se, a par dessa conclusão, se pode extrair uma outra de que o mundo
também precisa de remendo, de reparo e, portanto, de conserto, isso é
outra questão, que não altera item algum do que já foi afirmado.
Descriminação ou Descriminalização?
1. Descriminação tem por sinônima descriminalização e, basicamente,
significa a exclusão da criminalidade, a retirada da antijuridicidade de
um fato. Ex.: “Até movimentos se organizam em prol da descriminação
da maconha”.
2. Não confundir com sua parônima discriminação, que é o ato ou efeito de
distinguir, discernir, separar.
3. Ronaldo Caldeira Xavier (1991, p. 85-6) caracteriza o emprego de
discriminar por descriminar – e vice-versa – como cruzamento, vale
dizer, como “o emprego de uma palavra em lugar de outra”, decorrente
“da falta de discernimento entre vocábulos assemelhados quanto à
estrutura fonológica (parônimos), o que motiva a alteração da mensagem
tencionada”, atentando contra a precisão terminológica.
4. Pela importância da distinção e para que não se cometam equívocos, o
próprio Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, órgão incumbido
oficialmente de determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma,
além de sua grafia oficial, o qual normalmente não se debruça em dar o
significado dos vocábulos que registra, acaba por especificar que
descriminação tem o sentido de inocentação (ACADEMIA
BRASILEIRA DE LETRAS, 2004, p. 251).
Descriminar ou Discriminar?
Ver Descriminalizar, Descriminar, Discriminar ou Discriminalizar? (P.
274)
Desde
1. É preposição que indica tempo ou espaço com noção de continuidade
desde seu ponto de partida. Ex.: a) “Desde a última segunda-feira, estão
abertas as inscrições para o concurso da Magistratura”; b) “Desde
Miguelópolis até aqui, viajamos de ônibus”.
2. Na lição de Júlio Ribeiro (1908, p. 309), tal preposição indica
“precisamente o ponto de partida, quer local, quer temporal”, do que o
referido gramático dá exemplos: a) “Desde Sevilha…”; b) “Desde ontem
à noite até hoje pelas cinco horas”.
3. Muito embora, entretanto, possa haver em tal vocábulo a acepção de
local, de ponto de partida, anotam Hêndricas Nadólskis e Marleine Paula
Marcondes Ferreira de Toledo (1998, p. 111) que não se deve empregar
tal preposição para indicar somente o local de origem, mas sem ideia de
continuidade no espaço, erro esse muito frequente, bastando que se
atente aos meios de comunicação. Exs.: a) “O julgamento foi transmitido
desde Brasília por aquela emissora de televisão”. Corrija-se para: “O
julgamento foi transmitido de Brasília por aquela emissora de
televisão”.
4. Para resumir: a preposição desde tem o conteúdo semântico de “tempo
ou espaço com noção de continuidade desde seu ponto de partida”, mas
não deve ser empregada “para indicar somente o local de origem, sem
ideia de continuidade no espaço”.
5. Confira-se, assim, a correção ou a erronia de seu emprego nos seguintes
exemplos: a) “O sinal de transmissão demora poucos segundos para vir
desde Atenas até o Brasil” (correto, porque, no caso, seu uso se dá com
noção de continuidade desde seu ponto de partida); b) “O jogo foi
transmitido desde Atenas, com exclusividade, por aquela emissora de
televisão” (errado, porque, no caso, seu uso se dá sem ideia de
continuidade no espaço).
Ver Desde que (P. 274) e Dês que – Está correto? (P. 279)
Desde que
1. Na lição de Laudelino Freire, “o emprego da conjunção desde que no
sentido conclusivo de assim que, uma vez que não é rigorosamente
vernáculo”.
2. Nos dizeres de tal autor (FREIRE, s/d, p. 30), o mencionado giro “tem
sabor afrancesado. Acertado é usá-la na sua legítima acepção temporal
como fizeram os clássicos antigos, segundo este exemplo do puríssimo
padre Manuel Bernardes: ‘Desde que o Monge saíra do Mosteiro até que
tornara para ele…’”.
3. Em complementação e síntese, Domingos Paschoal Cegalla (1999, p.
114) admite a possibilidade de que tal locução conjuntiva possa imprimir
à oração as ideias de tempo, condição ou causa: a) “Desde que ficou
famoso, nunca mais teve sossego” (tempo); b) “Poderá comprar o
imóvel, desde que tenha recursos” (condição); c) “Desde que o burro
empacou, só me resta andar a pé” (causa).
Ver Desde (P. 274), Dês que – Está correto? (P. 279) e Indicativo por
Subjuntivo (P. 411).
Desiderato ou Desideratum?
1. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela
Academia Brasileira de Letras, órgão oficialmente incumbido de definir
quais vocábulos integram nosso léxico, registra a forma desiderato (que
há de ter por plural desideratos) e também a forma desideratum,
considerando este último um vocábulo da língua latina (2009, p. 270 e
862).
2. Na lição simples, porém precisa, de Vitório Bergo, desideratum consiste
em latinismo, que “deve ser aportuguesado em desiderato” (1944, p. 85).
3. Asseverando ser ainda insuficiente a disciplina clássica no emprego de
nomes oriundos de outros idiomas, João Ribeiro (1923, p. 119)
reconhece haver “quem adote o plural das línguas originárias”, como
desiderata; acrescenta, entretanto, que “esse uso só se justifica em
palavras que se conservaram incorruptas e na sua forma etimológica”.
4. É oportuno na anotar que, se se reputa o vocábulo pertencente ao latim,
deve-se escrevê-lo, então, entre aspas, em itálico, em negrito ou com
sublinha, como se procede quando se emprega uma palavra de outro
idioma, e sem acento, que não existia em língua originária.
5. Ainda discutindo a questão em termos científicos, é de se dizer que o
plural latino deveria ser evitado a qualquer custo, até porque, na língua
mãe, os substantivos eram declinados, sendo diversas as terminações, co
forme a função sintática: desiderata (sujeito), desideratorum (adjunto
adnominal), desideratis (objeto indireto), dediderata (objeto direto).
6. Em realidade, não há como usar hoje pela metade o vocábulo em latim:
ou se considera o termo já integrado ao nosso idioma para todos os
efeitos, também para o de sua acentuação gráfica e de sua flexão no
plural; ou se lhe conferem feição e regime latinos em plenitude, hipótese
em que tem uma específica e diversa terminação, de acordo com a
função sintática que a palavra desempenhar, proceder esse que, além de
muito estranho, é simplesmente inviável ao usuário médio do idioma,
que nem mesmo teve acesso aos rudimentos da língua de origem.
7. Sempre com a atenção voltada para a discussão científica, vale lembrar,
por oportuno, a lição de Silveira Bueno, ministrada a um consulente que
lhe indagava qual a melhor maneira de formar, em nosso idioma, o plural
da palavra memorandum: “As palavras estrangeiras podem ter dois usos
em nossa língua: ou o snr. conserva a forma originária da língua donde
provém o termo, ou aplica às palavras as regras comuns do português. Se
o snr. seguir a primeira forma, deverá dizer no plural: memoranda – que
este é o plural de memorandum em latim. Se o snr. seguir a segunda
maneira, dirá memoranduns, porque, em português, os nomes
terminados em m fazem o plural mudando o m em ns” (1938, p. 49).
Ver Campus (P. 166), Currículo (P. 244) e Memorândum – Qual é o plural?
(P. 468)
Designar
1. Quanto a sua pronúncia, anota-se que, mesmo entre as pessoas cultas, há
uma tendência a introduzir uma vogal logo após o g que encerra o
radical, nas formas rizotônicas, pronunciando-se desiguino, desiguinas…
2. Trata-se, porém, de equívoco imperdoável, já que, sendo ele um verbo
regular, após o radical (design) apenas se acrescentam as desinências
próprias da conjugação: designo, designas, designa…; designe,
designes…, com a sílaba tônica incidindo no próprio radical (SACCONI,
1979, p. 20).
3. Tais dúvidas se dão apenas nas formas rizotônicas, situadas no presente
do indicativo, no presente do subjuntivo, no imperativo afirmativo e no
imperativo negativo, de modo que não há motivo para sobressaltos no
que concerne aos demais tempos: designei, designava, designarei,
designasse, designar, designando, designado…
Desincompatibilizar – Existe?
Ver Verbos – Existem ou não? (P. 764)
De somenos
Ver Somenos (P. 710).
Despacho saneador
Ver Esposo ou Marido? (P. 331)
Despautério
1. Veja-se, por primeiro, que se grafa com e na primeira sílaba
(ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 274).
2. Tem o significado de grande disparate, de asneira desmedida, de
despropósito grave. Ex.: “É um despautério afirmar que o juiz deve
sentenciar apenas buscando a justiça no caso concreto, sem se
preocupar com as disposições da lei”.
3. A palavra vem do francês (despautère), por sua vez proveniente do
antropônimo van Pauteren, gramático flamengo (1460-520), autor dos
Commentarii Gramatici, obra difusa e obscura, repleta de
excentricidades desprovidas de maiores fundamentos.
4. Das próprias circunstâncias históricas e da postura pessoal do indigitado
gramático se originou o significado que hoje se confere ao vocábulo
considerado.
Despender ou Dispender?
1. Despender é verbo normalmente registrado pelo Vocabulário Ortográfico
da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras
(órgão incumbido de listar oficialmente os vocábulos existentes em
nosso idioma), e significa fazer despesa, gastar, consumir (2009, p. 275).
Ex.: “O réu despendeu o produto do furto em diversões e viagens”.
2. É verbo muito empregado na redação de artigos de lei: a) “Prescreve …
em cinco anos … a pretensão do vencedor para haver do vencido o que
despendeu em juízo”. (CC/2002, art. 206, § 5º, III); b) “O mandatário
tem sobre a coisa de que tenha a posse em virtude do mandato, direito
de retenção, até se reembolsar do que no desempenho do encargo
despendeu” (CC/2002, art. 681); c) “Incumbem ao dono as reparações
extraordinárias e as que não forem de custo módico; mas o usufrutuário
lhe pagará os juros do capital despendido com as que forem necessárias
à conservação, ou aumentarem o rendimento da coisa usufruída”
(CC/2002, art. 1.404); d) “Se o dono não fizer as reparações a que está
obrigado, e que são indispensáveis à conservação da coisa, o
usufrutuário pode realizá-las, cobrando daquele a importância
despendida” (CC/2002, art. 1.404, § 2º); e) “O tutor … tem direito a ser
pago pelo que realmente despender no exercício da tutela…” (CC/2002,
art. 1.752, caput); f) “O testamenteiro é obrigado a … dar contas do que
recebeu e despendeu, subsistindo sua responsabilidade enquanto durar a
execução do testamento” (CC/2002, art. 1.980).
3. Observe-se, todavia, que não existe a palavra dispender.
4. A comprovar a frequência com que ocorrem erros com o emprego do
inexistente verbo por último citado, Josué Machado transcreve a falha de
um “redator que escreveu na primeira página do jornal que ‘O Banco
Central americano dispendeu US$ 2 bilhões…’” (1994, p. 38).
5. A um consulente que indagava a razão da grafia diferente de despender e
de dispêndio, já que há entre elas sentido aproximado, assim respondia
Cândido de Figueiredo: “Sim, o significado é análogo, mas as duas
palavras não têm a mesma derivação: despender veio-nos do latim
dependere, e dispêndio é o mesmo que o latim dispendium, derivado de
dispendere. Ora, se em latim havia dependere e dispendere, e se o
vocabulário português é, em grande parte, filho do vocabulário latino,
nada tem que estranhar” (1943, p. 29).
Ver Dispêndio (P. 291).
Despensa ou Dispensa?
1. Despensa significa compartimento de uma casa onde se guardam
mantimentos. Ex.: “Os alimentos furtados estavam acondicionados
normalmente na despensa da casa abandonada”.
2. Não confundir com sua parônima dispensa, que quer dizer desligamento
de um cargo ou função, licença para não se cumprir certa obrigação. Ex.:
“Por adoentado, o réu solicitou dispensa de comparecimento à
audiência”.
3. Talvez motivado pelos frequentes equívocos cometidos nesse campo, o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia
Brasileira de Letras, órgão oficialmente incumbido de definir quais
vocábulos integram nosso léxico, contrariamente a seu normal proceder
de não mencionar o significado das palavras, faz questão de especificar o
sentido de ambos os vocábulos: despensa significa lugar para guardar
mantimentos, e dispensa quer dizer licença (2009, p. 275 e 290).
Despercebido ou Desapercebido?
Ver Desapercebido ou Despercebido? (P. 271)
Desproceder – Existe?
1. Muito embora seja frequentemente empregado nos textos jurídicos e
forenses com o sentido de não ter procedência, ou de não ter a
consequência processual pretendida, o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, que é o órgão
oficialmente incumbido de listar as palavras existentes em nosso idioma,
não registra o verbo desproceder.
2. A forçosa e definitiva conclusão, assim, é que esse verbo não existe e,
portanto, não deve ser empregado em textos que devam submeter-se à
norma culta.
3. Acrescente-se, por oportuno, que, na referida lista oficial de palavras,
encontra-se um verbo de idêntico significado, que é improceder, o qual
pode tomar-lhe o lugar com escorreita perfeição (ACADEMIA
BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 451).
Despronunciar ou Impronunciar?
Ver Impronunciar ou Despronunciar? (P. 400)
Despropositadamente ou Despropositalmente?
Ver Propositadamente ou Propositalmente? (P. 624)
Desprover ou Improver?
1. Dois leitores indagam qual a forma correta: desprover ou improver? Em
caso de existência de ambos, há diferença de conteúdo semântico entre
ambas?
2. Quanto a desprover, trata-se de verbo empregado com frequência nos
meios jurídicos e forenses, normalmente com o sentido de recusar
provimento (a recurso), caso em que se emprega com objeto direto (que
pode ser sujeito na voz passiva), correspondendo à construção desprover
algo (agravo ou recurso, por exemplo). Exs.: a) “A Câmara julgadora
desproveu o recurso de apelação”; b) “O recurso de apelação foi
desprovido pela Câmara julgadora”.
3. É oportuno registrar que tal vocábulo se encontra listado no Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
que é o veículo oficial para dirimir dúvidas acerca da existência ou não
de vocábulos em nosso idioma (2009, p. 276), o que acarreta a forçosa
conclusão de que está oficialmente autorizado seu emprego.
4. Quanto a sua flexão, basta invocar os dizeres de Sousa e Silva: o verbo
desprover conjuga-se totalmente como prover (1958, p. 105), que é
verbete específico desta obra.
5. Anote-se, em sequência, em termos mais genéricos, que é comum, nos
meios forenses, em livros e em muitos acórdãos, a negação do verbo
prover por meio do prefixo in: “A turma julgadora, por maioria de
votos, improveu o recurso de apelação”; ou mesmo por emprego na voz
passiva: “O recurso de apelação, por maioria de votos, foi improvido
pela turma julgadora”.
6. Lembram, todavia, a propósito, Antonio Henriques e Maria Margarida
de Andrade que tal verbo “não encontra agasalho nos dicionários,
embora presente em textos jurídicos” (1999, p. 114).
7. Exatamente corroborando o ensino dos autores citados, o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de
Letras (órgão que tem delegação legal para listar, em caráter oficial, os
vocábulos pertencentes ao idioma), não o registra, o que significa que
seu emprego não está oficialmente autorizado entre nós.
8. Desse modo, em resposta aos leitores que fizeram a consulta, não é que
haja diferença semântica entre desprover e improver; o que há é que
desprover existe no vernáculo, mas não improver, do que deflui a
conclusão que o uso do primeiro está autorizado, mas não o do segundo.
9. Vale a pena observar, em teoria, que o in é um prefixo latino de valor
negativo, que tem função nominal (SARAIVA, 1993, p. 586), isto é,
pode servir para criar neologismos por via erudita, desde que estes sejam
advérbios, adjetivos ou substantivos, derivados de outros nomes já
existentes. Assim, imerecido, impagável, inaplicável, induvidoso,
inexigido.
10. Por se tratar de prefixo nominal, porém, não se presta, por via de regra,
à criação de verbos pelo processo já referido. Bem por isso, são
errôneos os vocábulos imerecer, impagar, improver, inaplicar,
induvidar, inexigir.
11. É certo que, excepcionalmente, aparecem alguns verbos que
apresentam o prefixo in com valor negativo, como imortalizar,
impronunciar, incapacitar, inutilizar, dentre outros que se discriminam
nos dicionários; tal elenco, porém, deve ser mantido como rol de
exceções, não se prestando ao estabelecimento de nova regra para a
formação genérica e ampla de palavras.
12. As mesmas observações feitas para os verbos desprover e improver
valem para os substantivos desprovimento (substantivo que existe e
cujo emprego está autorizado) e improvimento (substantivo inexistente
em nosso idioma).
13. Anota-se, por fim, que o VOLP registra como existente o vocábulo
improvido como adjetivo, e até mesmo lhe dá o significado: sem
provimento (ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 451).
Ver Prover – Como conjugar? (P. 629)
Desprovimento ou Improvimento?
1. Desprovimento e improvimento são dois substantivos empregados com
frequência nos meios jurídicos e forenses para indicar uma decisão
desfavorável de mérito em um recurso. E um leitor indaga se ambos são
corretos, ou não.
2. Ora, a autoridade oficial para dizer se um vocábulo existe ou não em
nosso idioma está com o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa,
editado pela Academia Brasileira de Letras, a qual tem a
responsabilidade legal de editá-lo, em cumprimento à vetusta Lei
Eduardo Ramos, de n. 726, de 8 /12/1900.
3. Em termos práticos para o caso, uma consulta à última edição do VOLP
(de 2009) mostra que existe o vocábulo desprovimento (ACADEMIA
BRASILEIRA DE LETRAS, p. 276), mas não improvimento.
4. E, se o VOLP atesta a existência oficial do primeiro vocábulo e nega a
do segundo, ele é a lei, e não há como levantar questionamento algum no
plano dos fatos e do direito. Eventual discussão só pode ser levantada no
plano científico do aspecto linguístico, mas não no âmbito de permitir o
uso de palavra ali não registrada, ou de vedar o emprego de um vocábulo
ali constante.
5. Resuma-se, portanto: Existe desprovimento; mas não existe
improvimento. Exs.: a) “O relator votou pelo desprovimento do recurso”
(correto); b) “O relator votou pelo improvimento do recurso” (errado).
Destacar – Galicismo?
1. Apesar das acusações de galicismo, trata-se de palavra da língua
portuguesa nos sentidos de enviar ou separar. Exs.: a) “Destacou-se
força policial para guardar o preso”; b) “Destacou a folha do código em
que estava o artigo observado”.
2. Mesmo com a significação de distinguir-se, sobrelevar-se (principal alvo
da pecha de galicismo), tal acusação não se sustenta, como demonstra o
exemplo de Rui Barbosa: “Cada individualidade, cada peripécia, cada
movimento destaca-se caracteristicamente na sua realidade e na sua
cor” (BARBOSA apud ALMEIDA, 1981, p. 81).
3. Atacando doutrina de Cândido de Figueiredo no sentido de que o
détacher francês não pode traduzir-se por destacar, devendo ser
substituído por separar, distinguir, sobrelevar, Heráclito Graça, por
primeiro, observa, no plano genérico, que “uma cousa é na língua um
galicismo inútil, e outra, muito diversa, deduzir de um vocábulo nosso
significações novas por semelhança ou analogia, como fatalmente
sucede em todas as línguas”.
4. Ao depois, lembra tal autor que “destacar é palavra antiquíssima
portuguesa” e que autores insuspeitos a empregaram no sentido de
sobressair. Exs.: a) “Destacou um olhar sub-reptício para o vão da
janela” (Almeida Garrett); b) “Em tanto relevo destaca da grosseria vilã
dessas notabilidades improvisadas” (Rebelo da Silva); c) “Destacai de
um sermão célebre de um dos nossos primeiros oradores sagrados as
frases com que rompe” (José Feliciano de Castilho).
5. E finaliza ele com respeito a tal verbo: “o fato é que em todos os
mencionados sentidos é geralmente empregado o verbo destacar,
aumentando a riqueza da língua sem desnaturá-la absolutamente”
(GRAÇA, 1904, p. 187-9).
6. Em síntese, ante a força dos entendimentos em seu prol, não há razão
para recusar o emprego de tal verbo no sentido impugnado por alguns.
7. E, se se aceita o verbo destacar, de rigor acatar também como integrante
do vernáculo o substantivo destaque. Ex.: “O conferencista desta noite
trata-se de autor de destaque na doutrina nacional”.
Ver Destaque – Neologismo? (P. 279)
Destaque – Neologismo?
1. Heráclito Graça, por primeiro, transcreve ensinamento de Cândido de
Figueiredo, a que vai opor-se em seguida: “Destaque não é palavra de
meu conhecimento. Sei de destacar e destacamento”.
2. Em seguida, relembra tal gramático que, ao ocupar-se do verbo destacar,
mostrara que sua significação primitiva se estendera a outras
significações por semelhança e analogia, e, entre elas, sobressair,
relevar, avultar, sobrelevar, realçar-se, distinguir-se.
3. Afirma a seguir, de modo textual: “Daí o substantivo destaque, no
sentido de relevo, saliência, realce, distinção, coisa que se destaca, que
atrai a atenção etc.”
4. Ressalva tratar-se certamente de um neologismo, mas lembra ser ele
“expressivo e bem derivado do verbo português destacar, como de
atacar o substantivo ataque, de embarcar, embarque, de resgatar,
resgate…”
5. E conclui com firmeza: “Não há, pois, fundamento para estranhar e
ainda menos para repeli-lo; é uma criação natural, e com ela varia e
enriquece a linguagem, como sucede semelhantemente em todos os
idiomas, desde que nascem até que morrem” (GRAÇA, 1904, p. 223-4).
6. Espancando dúvidas acerca de sua vernaculidade, o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
órgão incumbido oficialmente de determinar a existência dos vocábulos
em nosso idioma, além de sua grafia oficial, registra-o normalmente
(2009, p. 277), o que acarreta a forçosa conclusão de que está
integralmente autorizado seu emprego entre nós.
Ver Destacar – Galicismo? (P. 279)
Deste e Desse
Ver Pronome demonstrativo (P. 611).
Destituir
1. Quanto a sua ortografia, como todo verbo terminado em uir, só pode dar
origem à terminação ui na segunda e terceira pessoas do singular do
presente do indicativo. Assim: destituo, destituis, destitui.
2. Diferentemente dos verbos terminados em uar (como continuar), são
errôneas as grafias com e em tais situações: destitues, destitue.
3. Nas palavras de Cândido de Oliveira, após verificação dos muitos erros
cometidos nesse campo, “é com i a segunda e terceira pessoas do
singular do presente do indicativo dos verbos terminados em uir: aflui,
fruis, retribui, retribuis, contribui, contribuis, influi, influis” (1961, p.
64).
4. Atentos aos frequentes equívocos que ocorrem nos meios jurídicos (veja-
se, por exemplo, a expressão nomeia e constitui, empregada em
instrumentos de mandato, que muitos escrevem nomeia e constitue),
assim observam Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade: “Os
verbos em uir (concluir, possuir, estatuir etc.) têm um i na terceira
pessoa do singular do presente do indicativo e não e, como aparece até
em modelos de procuração” (1999, p. 53).
Destratar ou Distratar?
1. Destratar é verbo que significa insultar, ofender. Ex.: “Em momento de
fúria, o advogado destratou seu próprio cliente”.
2. Não confundir com sua parônima distratar, que significa desfazer um
trato, ou seja, proceder a um distrato. Ex.: “Por não haver vantagens
para nenhuma delas, as partes distrataram o acordo anteriormente
pactuado”.
3. Arnaldo Niskier assim resume a diferença entre ambos os vocábulos:
“Destratar é insultar, tratar mal; distratar é desfazer (um negócio),
romper um contrato” (1992, p. 27).
4. De destratar vem destrato, que significa insulto; de distratar vem
distrato, que quer dizer desfazimento do contrato. Ex.: “O distrato faz-se
pela mesma forma exigida para o contrato” (CC/2002, art. 472).
Destruir
1. Quanto às formas destrui e destruem, anota Cândido Jucá Filho (1981, p.
61), fundado em lição de Mário Barreto, que tais formas, empregadas
ainda por Camões e Vieira, encontram-se hoje arcaizadas.
2. Otelo Reis (1971, p. 134), todavia, em indispensável trabalho sobre
conjugação verbal, aceita ambas as formas como válidas ainda para os
dias de hoje: destruis ou destróis, destrui ou destrói, e destruem ou
destroem.
3. Observe-se que a forma verbal destroem não recebe acento gráfico, erro
esse que frequentemente ocorre por contaminação da forma singular
destrói.
4. Para os que, como Otelo Reis, aceitam como válidas as formas clássicas,
é de se dizer, quanto a sua ortografia, que, como todo verbo terminado
em uir, só pode dar origem à terminação ui na segunda e terceira pessoas
do singular do presente do indicativo. Assim: destruo, destruis, destrui.
5. Em verdade, diferentemente dos verbos terminados em uar (como
continuar), são errôneas as grafias com e em tais situações: destrues,
destrue.
6. Nas palavras de Cândido de Oliveira, após verificação dos muitos erros
cometidos nesse campo, “é com i a segunda e terceira pessoas do
singular do presente do indicativo dos verbos terminados em uir: aflui,
fruis, retribui, retribuis, contribui, contribuis, influi, influis” (1961, p.
64).
7. Atentos aos frequentes equívocos que ocorrem nos meios jurídicos (veja-
se, por exemplo, a expressão nomeia e constitui, empregada em
instrumentos de mandato, que muitos escrevem nomeia e constitue),
assim observam Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade: “Os
verbos em uir (concluir, possuir, estatuir etc.) têm um i na terceira
pessoa do singular do presente do indicativo e não e, como aparece até
em modelos de procuração” (1999, p. 53).
De + sujeito de infinitivo
Ver É hora da onça beber água ou É hora de a onça beber água? (P. 296)
Detalhar – Galicismo?
Ver Detalhe – Galicismo? (P. 281)
Detalhe – Galicismo?
1. Enquanto João Ribeiro afirma ser “galicismo muito usado” (RIBEIRO
apud ALMEIDA, 1981, p. 82), Vasco Botelho de Amaral assevera ter o
vocábulo real “feição portuguesa” (RIBEIRO apud ALMEIDA, 1981, p.
82).
2. Sobre o assunto, Heráclito Graça, por primeiro, transcreve lição de
Cândido de Figueiredo: “Detalhe e detalhar não são nossos, mas
franceses a valer, nem deles precisamos, possuindo, como possuímos,
pormenores, minúcias, particularidades, e especializar, particularizar,
individuar etc”.
3. Escrevendo na primeira década do século XX, o gramático que traz a
mencionada lição, por seu turno, assim continua: “Há mais de século e
meio detalhe e detalhar fizeram invasão no português. Decorreram os
anos e, com o tempo, longe de ficarem esquecidos como outros
estrangeirismos, que tentaram implantar debalde em nosso idioma,
detalhe e detalhar arraigaram-se entre nós”.
4. E finalizava tal autor (GRAÇA, 1904, p. 225-8) sua lição para observar
que não lhe ocorria ter encontrado em Castilho ou em Herculano; mas
Eça de Queirós “abusava de tais vocábulos”.
5. Ora, se há divergência entre as próprias autoridades da língua, sem
dúvida se autoriza o emprego do mencionado vocábulo no vernáculo, até
por aplicação do vetusto princípio de que, na dúvida, se há de conferir
liberdade ao usuário, e isso sobretudo porque vem tal palavra registrada
no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, que é o veículo oficial indicador das palavras
existentes em nosso idioma (2009, p. 279).
6. Idêntica a observação para o verbo detalhar.
Deter
Ver Ter (P. 730).
Deterioração ou Deteriorização?
1. Deterioração é vocábulo que existe oficialmente em nosso idioma e tem
o sentido de ruína, de degeneração. Ex.: “Era perceptível a deterioração
do relacionamento entre as partes daquele processo”.
2. Observe-se, todavia, que deteriorização é palavra equivocada e
inexistente, não registrada nem por nossos léxicos, nem pelo Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de
Letras, que é o órgão oficialmente incumbido de especificar a extensão
léxica das palavras integrantes do vernáculo.
3. Em preciosa observação, Arnaldo Niskier (1992, p. 28) traz exatamente
essa distinção entre tais palavras.
4. De igual modo, o verbo correspondente é deteriorar, e não deteriorizar.
Deteriorar ou Deteriorizar?
Ver Deterioração ou Deteriorização? (P. 281)
Deteriorização ou Deterioração?
Ver Deterioração ou Deteriorização? (P. 281)
Dever de
1. Vasco Botelho de Amaral – invocando, para tanto, exemplos de Camilo
Castelo Branco – faz uma distinção: por um lado, assevera ele, “afirmar
que, ao haver expressão de necessidade ou de obrigação, faz mister
suprimir a preposição de entre o verbo dever e o infinito seguinte, não
condiz com o encontro de um ou outro passo de bom autor inobservante
de tal regra”; por outro lado – continua – “se a ideia é de probabilidade
ou de incerteza, então convém realmente aconselhar o dever de, pois o
povo e os escritores fiéis ao seu falar assim praticam”.
2. E carreia exemplo de tal construção indicando dúvida ou possibilidade:
“A vida íntima devia de ser-lhe um continuado suplício” (AMARAL,
1939, p. 22-3).
3. Já Eduardo Carlos Pereira leciona que “alguns verbos transitivos,
seguidos de um infinitivo, assumem facultativamente a preposição de”.
4. E ele próprio exemplifica: “devo falar ou de falar, preciso estar ou de
estar, devo escrever ou de escrever” (PEREIRA, 1924, p. 241).
5. Em mesma esteira da lição por último referida, a uma consulente que lhe
indagava qual a forma correta – “Deve-se medir bem” ou “Deve-se de
medir bem” – Cândido de Figueiredo (1943, p. 233) assim respondia,
demonstrando reputar facultativo seu emprego: “Deve-se medir é
construção mais usual; mas deve-se de medir não é menos portuguesa,
como se vê da seguinte passagem do Padre Antônio Vieira: ‘Suposto que
o céu é pregador, deve de ter sermões e deve de ter palavras’”.
6. De igual modo, sem proceder a distinção alguma, Cândido Jucá Filho
(1954, p. 176) anota que “esta sintaxe, embora cheire a arcaísmo, ainda
se usa”, exemplificando com trechos de autores insuspeitos: a) “Deve de
ser a felicidade suprema” (Almeida Garrett); b) “Devia de ser, pois,
qualquer dos antigos adoradores” (José de Alencar).
Dever de indenidade?
1. Noticia um leitor que encontrou em diversas leituras a expressão dever
de indenidade com o sentido de dever de reparar o dano decorrente da
prática de algum ato. E observa que não encontrou a expressão com esse
sentido em dicionários, motivo por que concluiu que a expressão é
inadequada. Por fim, pede esclarecimentos.
2. Por um lado, uma consulta ao Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, revela a
existência de ambos as palavras em nosso idioma (2009, p. 454).
3. Ora, porque a ABL tem a delegação legal para listar no VOLP os
vocábulos que existem oficialmente em nosso idioma, não pode haver
dúvida acerca da existência oficial de ambas as palavras em nosso
léxico, de modo que a solução do problema se faz por uma consulta ao
dicionário, para verificação de seu real sentido.
4. Com essas ponderações, anota-se que indenidade e indenização têm a
mesma etimologia. Contudo, enquanto indenização significa reparação,
compensação de um prejuízo, os dicionários dão para indenidade o
sentido de isenção de dano, perdão, relevamento, absolvição de culpa.
5. Por esse simples cotejo de acepções nos dicionários, já se verifica que
não é possível empregar dever de indenidade para significar a própria
obrigação de indenizar.
De vez
1. Em nossa sintaxe, faz-se presente a locução adverbial de vez, que
significa quase boa para ser colhida, podendo-se dizer, por exemplo: “A
fruta está de vez”.
2. Lembra Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 132), ademais, a
possibilidade de emprego de tal locução adverbial com o sentido de
decisivamente, terminantemente, em boa razão, em boa disposição. Exs.:
a) “Rompeu de vez com o Governo”; b) “Não estou de vez para suportá-
lo”.
Ver De vez que (P. 283).
De vez em vez
Ver De quando em vez ou De vez em quando? (P. 269)
De vez que
1. Não é correta a expressão de vez que, empregada como locução
subordinativa causal, como sinônima de porque, porquanto, uma vez
que, em frases como a seguinte: “O réu foi absolvido, de vez que não
havia provas concretas contra ele”.
2. Em tais casos, deve-se usar uma conjunção ou locução conjuntiva causal
equivalente: porque, porquanto, já que, uma vez que, visto que.
3. Atente-se, a esse respeito, à lição de Aires da Mata Machado Filho:
“Essas conjunções causais formadas com o vocábulo vez não primam
pela vernaculidade. Salva-se, realmente, uma vez que” (1969h, p. 1.179).
4. Condenando-a como “locução inaceitável’, observa Domingos Paschoal
Cegalla que “não faltam expressões para indicar a ideia de causa: uma
vez que, porque, pois, por isso que, porquanto” (1999, p. 120).
5. Na lição de Sousa e Silva (1958, p. 107), de vez que configura
conjunção espúria, inexistente em nossa língua, embora “muito usada
presentemente”, a qual deve ser substituída por pois, porquanto ou
porque.
6. Para Edmundo Dantès Nascimento, essa expressão – que “constitui erro
de todos conhecido” – é completamente equivocada, já que se deve dizer
uma vez que. Observa ele, de igual modo, quanto à expressão vez que ser
ela errônea sem o acompanhamento do artigo uma. E acrescenta: “todas
as locuções preposicionais, conjuncionais ou adverbiais formadas com a
palavra vez têm a anteposição do artigo ou outra palavra”
(NASCIMENTO, 1982, p. 87-132).
7. Observando ser muito comum, tanto em peças redigidas por advogados
como em sentenças, o emprego de tal expressão, invoca Geraldo Amaral
Arruda (1997, p. 22) a lição de Silveira Bueno e assevera tratar-se de
“erro”, de “solecismo condenável”.
8. Deixando claro que se trata de solecismo e que “os srs. juízes e
advogados deveriam abster-se de tal novidade”, esclarece Silveira Bueno
que “não existe, em português, a locução conclusiva de vez que: é uma
inovação muito dos nossos dias, que, parece-me, foi criada pela
linguagem do fórum”.
9. E complementa: “não passa, porém, da confusão de duas outras muito
antigas na língua: desde que, uma vez que. Destas duas fizeram: de vez
que” (BUENO, 1957, p. 498).
10. Em resumo: é correta a locução conjuncional uma vez que; não são
corretas, porém, nem de vez que, nem, muito menos, vez que.
Ver De vez (P. 283) e Eis que (P. 298).
Dialogar
Ver Datilografar (P. 251).
Diferimento ou Deferimento?
Ver Deferimento ou Diferimento? (P. 256)
Diferir ou Deferir?
Ver Deferir ou Diferir? (P. 256)
Digladiar ou Degladiar?
Ver Degladiar ou Digladiar? (P. 259)
Digna autoridade
Ver Adjetivação desnecessária (P. 80).
Dignar-se
1. Quanto à pronúncia de certas formas desse verbo, é de se anotar que,
mesmo entre as pessoas cultas, há uma tendência a introduzir uma vogal
logo após o g que encerra o radical, nas formas rizotônicas,
pronunciando-se diguino, diguinas…
2. Trata-se, porém, de verbo regular, em que, após o radical (dign), apenas
se acrescentam as desinências próprias da conjugação: digno, dignas,
digna…; digne, dignes…, com a sílaba tônica incidindo no próprio
radical (SACCONI, 1979, p. 20).
3. Atento aos frequentes equívocos que ocorrem nesse campo, observa
Artur de Almeida Torres que “a vogal i do verbo dignar-se deve ser
fortemente proferida nas formas rizotônicas” (1966, p. 107).
4. Como as formas rizotônicas apenas ocorrem no presente do indicativo,
presente do subjuntivo, imperativo afirmativo e imperativo negativo, a
flexão desse verbo não traz dúvidas em outros tempos.
5. Quanto à regência verbal, trata-se de verbo transitivo indireto que pede a
preposição de. Ex.: “Espero que V. Exa. se digne de ouvir minhas
ponderações a respeito”.
6. Pode-se também usá-lo com a elipse da preposição, de modo que é
correta a frase: “Espero que V. Exa. se digne ouvir minhas ponderações
a respeito”.
7. Artur de Almeida Torres, fundando-se em diversos exemplos de autores
abalizados de nosso idioma, sintetiza a regência desse verbo asseverando
que é “essencialmente pronominal, seguido de infinitivo, com a
preposição de clara ou omissa, indiferentemente” (1967, p. 119).
8. Em estudo específico sobre a linguagem de Antônio Feliciano de
Castilho, cuja imitação recomenda, anota Vasco Botelho de Amaral
(1939, p. 64) que ele usa “a regência de sábio clássico dignar-se de, que
se vai olvidando injustamente”.
9. Luís A. P. Vitória (1969, p. 94) dá por corretas ambas as formas, vale
dizer, com ou sem a preposição de.
10. Na lição de Cândido de Oliveira, “reflexivo, aceita construção com de
ou sem ele” (1961, p. 276).
11. Para Cândido Jucá Filho, “a construção de dignar-se sem de não é
errada, mas geralmente usada, e de bom quilate” (1981, p. 61).
12. Vale, no caso, a tríplice observação de Domingos Paschoal Cegalla: a)
“Normalmente, constrói-se com a preposição de, seguida de
infinitivo”; b) Pode-se omitir a preposição”; c) “É inadequada a
preposição a” (1999, p. 122). Exs.: i) “O magistrado se dignou de
receber o impaciente advogado” (correto); ii) “O magistrado se dignou
receber o impaciente advogado” (correto); iii) “O magistrado se
dignou a receber o impaciente advogado” (errado).
13. Essa também é a observação de Arnaldo Niskier (1992, p. 104), o qual,
após repisar o entendimento de que tal verbo “usa-se com a preposição
de ou com a elipse dela”, adiciona o aspecto significativo de que “a
tendência verificada na oralidade – o uso com a preposição a – ainda é
condenada pela norma”.
14. Francisco Fernandes, de igual modo, refere a possibilidade de sintaxe
com a preposição de ou mesmo “com elipse da preposição”, mas não
refere a terceira possibilidade, que é o emprego da preposição a. Exs.:
a) “Vossa Excelência se dignou de ouvir-me a esse respeito” (Rui
Barbosa); b) “A valiosa esmola que Vossa Excelência se dignou
oferecer, aceitá-la-ei quando lhe aprouver” (Camilo Castelo Branco).
15. E adiciona tal autor (FERNANDES, 1971, p. 241-2) a possibilidade de
seu emprego “como fórmula de deferência para com as pessoas
gradas”. Ex.: “Digne-se Vossa Excelência aceitar os meus respeitos”
(Caldas Aulete).
16. Celso Pedro Luft (1999, p. 212) segue em igual caminho, resumindo:
a) “Dignar-se de + infinitivo é a sintaxe plena”; b) “a construção
dignar-se + infinitivo se explica por elipse da preposição”.
17. Também para Sousa e Silva, tal verbo “pode construir-se com a
preposição de ou sem preposição” (1958, p. 107).
18. Estabelecida a premissa comumente aceita de que, em tais casos,
facultativo é o emprego da preposição, de Adalberto J. Kaspary vem
oportuna e final observação acerca do emprego de tal verbo: “Em
requerimentos e petições em geral, sugere-se, em nome da simplicidade
e funcionalidade da linguagem, omitir o verbo dignar-se. Assim, em
vez de ‘Fulano de Tal requer a V. Exa. se digne (de) autorizar…’,
escreva-se apenas: ‘Fulano de tal requer a V. Exa. (que) autorize…’”
(1996, p. 137).
19. Vale a pena observar que não há registros, nos melhores autores, que
respaldem o emprego de dignar-se em, de modo que deve ser reputada
errônea a seguinte forma de expressão: “Requer-se a Vossa Excelência
digne-se em deferir…”
Dignatário ou Dignitário?
1. Costuma-se asseverar, com supedâneo no ensino tradicional, que o
correto é dizer dignitário, e não dignatário, como frequentemente se
ouve.
2. Silveira Bueno (1938, p. 110), para fixar a lição, lembra dois
significativos aspectos de tal realidade: a) ninguém diz dignadade, mas
dignidade; b) em latim, a palavra era dignitarius, e não dignatarius.
3. Josué Machado (1994, p. 81) refere exemplos colhidos em periódicos e
em falas de políticos – incluindo um ex-presidente da República,
Caçador de Marajás – do equivocado emprego de dignatário.
4. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 123), por um lado, lembra que “a
forma correta é dignitário, e não dignatário, pois o vocábulo é cognato
do latim dignitate”; por outro lado, observa tal autor que “a forma
incorreta se explica por dissimilação vocálica ou por influência do verbo
dignar-se”.
5. Estranhamente, porém, talvez em obediência ao vetusto princípio de que
o uso (ainda que muitas vezes equivocado) acaba sendo o senhor dessa
matéria, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, que é o veículo oficial indicador das palavras
existentes em nosso idioma, registra dignatário como sinônima de
dignitário (2009, p. 285).
6. Isso quer significar, em última análise, que, se o veículo oficial de
listagem das palavras de nosso idioma a registra, legem habemus, e está
oficialmente autorizado o normal emprego de ambas as formas.
Dilapidar ou Delapidar?
Ver Delapidar ou Dilapidar? (P. 260)
Dilatar ou Delatar?
Ver Delatar ou Dilatar? (P. 260)
Diminuir
1. Quanto à ortografia, como todo verbo terminado em uir, só pode dar
origem à terminação ui na segunda e terceira pessoas do singular do
presente do indicativo: diminuo, diminuis, diminui.
2. Diferentemente dos verbos terminados em uar (como continuar), são
errôneas as grafias com e em tais situações: diminues, diminue.
3. Nas palavras de Cândido de Oliveira, após verificação dos muitos erros
cometidos nesse campo, “é com i a segunda e terceira pessoas do
singular do presente do indicativo dos verbos terminados em uir: aflui,
fruis, retribui, retribuis, contribui, contribuis, influi, influis” (1961, p.
64).
4. Atentos aos frequentes equívocos que ocorrem nos meios jurídicos (veja-
se, por exemplo, a expressão nomeia e constitui, empregada em
instrumentos de mandato, que muitos escrevem nomeia e constitue),
assim observam Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade: “Os
verbos em uir (concluir, possuir, estatuir etc.) têm um i na terceira
pessoa do singular do presente do indicativo e não e, como aparece até
em modelos de procuração” (1999, p. 53).
Direito
1. Quanto ao modo de escrever tal palavra, lembra Édison de Oliveira (s/d,
p. 41) que as instruções para a organização do Vocabulário Ortográfico
da Língua Portuguesa preveem que os nomes que designam ciências,
artes ou disciplinas, bem como os que sintetizam, em sentido elevado, as
manifestações do engenho e do saber, sejam grafados com inicial
maiúscula.
2. Assim, quando se quer indicar a própria ciência, deve-se grafar Direito,
Medicina, Engenharia, Matemática, Arquitetura.
3. Quanto à regência nominal, trata-se de substantivo que, por primeiro,
permite ser complementado com as preposições a e de: com a primeira,
são correntes, nos meios forenses, as expressões direito a alimentos,
direito à assistência judiciária, direito à honra, direito à imagem, direito
à intimidade, direito à liberdade, direito ao nome, direito ao silêncio,
direito ao sossego, direito ao trabalho, direito à personalidade, direito à
privacidade, direito à propriedade; com a segunda preposição, não
menos usuais são os torneios direito da educação, direito das coisas,
direito das minorias, direito das obrigações, direito de ação, direito de
acrescer, direito de agir, direito de arrependimento, direito de defesa,
direito de família, direito de greve, direito de petição, direito de posse,
direito de preferência, direito de prelação, direito de regresso, direito de
resposta, direito de sequela, direito de uso, direito de usufruto, direito de
vizinhança.
4. Às vezes, é optativo o emprego de tais preposições, como em direito ao
usufruto e direito de usufruto, que acabam sendo expressões
equivalentes.
5. Essa dupla possibilidade de uso, em alguns casos em que facultativo o
emprego, facilita evitar a dureza de sons presente na repetição de
preposições, permitindo preferir, por eufonia, por exemplo, “direito à
liberdade de ir e vir” a “direito de liberdade de ir e vir”.
6. Nem sempre, todavia, é aleatória essa concomitância de sintaxes, já que
o sentido e a função das palavras regidas pela preposição podem ser
diversos.
7. Normalmente, a regência da preposição a (como em direito a alimentos)
indica que o termo por ela regido é o alvo, o objeto da ideia referida pelo
substantivo completado (configurando o que, quanto à sintaxe, se
denomina complemento nominal).
8. Já a regência da preposição de (como em direito das minorias), indica,
por via de regra, mas nem sempre, que a expressão que complementa o
substantivo não é alvo nem objeto da ideia representada por aquele, mas
apenas uma especificação indicadora do grupo a que pertence o nome
indicado (constituindo o que, em termos gramaticais, se chama adjunto
adnominal).
9. Quando seguido de um infinitivo, o vocábulo direito admite ser
construído, indistintamente, com qualquer das duas preposições. Exs.: a)
“Ele tem direito a exigir respeito ao contrato”; b) “Ele tem direito de
exigir respeito ao contrato”.
10. Francisco Fernandes (1969, p. 147), além da possibilidade de
construção com as preposições a e de, acrescenta ser viável a sintaxe
com as preposições em, para e sobre, conforme o sentido que se queira
dar ao contexto. Exs.: a) “O estudante envelheceu estudando, e tem
direito a não ver humilhada hoje a madureza dos seus anos” (Rui
Barbosa); b) “A liberdade é um direito que cada homem exerce de ser
igual a outro homem perante uma lei ilustrada” (Camilo Castelo
Branco); c) “Os pais têm direito sobre os filhos; os senhores, nos
escravos” (Morais); d) “Não vos acuso, porque não tenho direito
algum para tanto” (Camilo Castelo Branco).
11. Celso Pedro Luft (1999, p. 177) acrescenta a possibilidade de emprego
da preposição contra, trazendo em abono exemplo de autor insuspeito:
“… aceitando a candidatura… para afirmar os direitos do país contra
a usurpação” (Rui Barbosa).
12. Nos textos de lei, de igual modo, se verifica essa variedade de emprego
das preposições, com o acréscimo de que também há caso, em diploma
legal específico, de sintaxe com a preposição contra: a) “O preso tem
direito à identificação dos responsáveis por sua prisão…” (CF/88, art.
5º, LXIV); b) “O direito de queixa não pode ser exercido quando
renunciado expressa ou tacitamente” (CP, art. 106); c) “O fiador que…
perder o seu direito contra o devedor pode repetir do credor a
prestação feita” (CC português, art. 645, 2); d) “… direitos reais sobre
imóveis…” (CF/88, art. 156, II).
Ver Formulário Ortográfico (P. 361).
Dirigir
1. Em sua conjugação verbal, apresenta problemas de ortografia.
2. Diferentemente dos verbos cujo radical termina em j – consoante essa
que tem o mesmo som antes de todas as vogais (viajo, viajas, viajemos,
viajeis, viajem) – os verbos terminados em gir, para continuidade do som
da consoante final do radical, precisam da representação gráfica j antes
de a ou de o. Assim: dirijo, diriges, dirige, dirigimos, dirigis, dirijam.
3. Serve de modelo para diversos outros verbos: coligir, erigir, exigir,
impingir, infligir, infringir, insurgir-se, transigir.
4. No que tange à regência verbal, de Francisco Fernandes (1971, p. 243)
vem significativa anotação fundada em lição de Stringari: “Sinônimo de
endereçar (carta, memória, encomenda, etc.), dirigir requer a ante a
designação do destinatário, e para ante o nome do lugar”. Exs.: a)
“Dirijo a carta a Paulo, a Júlio”; b) “Dirijo-a para Roma, para
Londres”.
5. Esse entendimento é também partilhado por Celso Pedro Luft, que assim
especifica: “No caso de complemento de lugar, a preposição é para, e
não a” (1999, p. 213).
Discernir
1. Tendo o significado de ver distintamente, distinguir, quanto à conjugação
verbal, aparece um i na primeira pessoa do singular do presente do
indicativo e nos tempos dela derivados: discirno, discernes, discerne,
discernimos, discernis, discernem (presente do indicativo); discirna,
discirnas, discirna, discirnamos, discirnais, discirnam (presente do
subjuntivo); discerne, discirna, discirnamos, discerni, discirnam
(imperativo afirmativo); não discirnas, não discirna, não discirnamos,
não discirnais, não discirnam (imperativo negativo).
2. Não apresenta problemas ou irregularidades em outros tempos: discernia
(imperfeito do indicativo), discernirei (futuro do presente), discerniria
(futuro do pretérito), discernindo (gerúndio), discernido (particípio),
discerni (pretérito perfeito), discernira (pretérito mais-que-perfeito),
discernir (futuro do subjuntivo), discernisse (imperfeito do subjuntivo).
3. Anote-se, por oportuno, que, para Francisco Fernandes, tal verbo “só se
usa nas terceiras pessoas” (1971, p. 243).
4. Já Otelo Reis (1971, p. 136) não o reputa defectivo, mas o conjuga
normalmente em todas as pessoas, tempos e modos.
5. Celso Cunha (1970, p. 214), por seu lado, ensina que tal verbo é
desusado no particípio e, consequentemente, nos tempos compostos.
6. Ante a divergência entre tais gramáticos, quer porque o usual é que se
encontre empregado tal verbo no particípio e, por conseguinte, nos
tempos compostos, quer porque, em tais casos, deve-se conferir
liberdade ao usuário, o melhor é adotar uma visão mais ampliada de
possibilidades de construção e considerá-lo conjugável em todas as
pessoas, tempos e modos.
Discordância verbal
1. Concordância é a conformidade de flexão de certas palavras à flexão de
outras, de que dependem.
2. No que concerne à concordância verbal, por exemplo, a regra geral é que
o verbo concorda (vale dizer, harmoniza-se em flexão) com o seu sujeito
em número e pessoa.
3. Há certos casos, porém, em que o verbo não se conforma literalmente ao
número ou à pessoa de seu sujeito; assim, por exemplo, o pronome de
tratamento é sujeito da segunda pessoa (com quem se fala), mas leva o
verbo para a terceira pessoa (normalmente de quem se fala).
4. A essa “não conformidade literal da flexão do verbo ao número, ou à
pessoa de seu sujeito”, Carlos Góis (1943, p. 25) denomina, com
indiscutível propriedade, discordância do verbo.
Ver Concordância nominal (P. 209) e Concordância verbal (P. 212).
Discreção – Existe?
Ver Descrição, Discrição ou Discreção? (P. 273)
Discrição ou Discreção?
Ver Descrição, Discrição ou Discreção? (P. 273)
Discriminação ou Descriminação?
1. Discriminação, do latim discriminatione, significa o ato ou efeito de
discriminar, discernir, distinguir, especificar, separar. Exs.: a) “A
discriminação racial contraria os mais elementares princípios de nosso
ordenamento”; b) “Institui-se o condomínio edilício por ato entre vivos
ou testamento, registrado no Cartório de Registro de Imóveis, devendo
constar daquele ato, além do disposto em lei especial: … I – a
discriminação e individualização das unidades de propriedade
exclusiva, estremadas uma das outras e das partes comuns” (CC/2002,
art. 1.332, I).
2. Não confundir com sua parônima descriminação, que significa retirar a
antijuridicidade, a criminalidade de um fato. Ex.: “Muita gente, não se
sabe com que propósitos, luta pela descriminação da maconha”.
3. Com inteira aplicação ao caso, Ronaldo Caldeira Xavier (1991, p. 85-6)
caracteriza o emprego de descriminar por discriminar – e vice-versa –
como “cruzamento”, vale dizer, como “o emprego de uma palavra em
lugar de outra”, decorrente da falta de discernimento entre vocábulos
assemelhados quanto à estrutura fonológica (parônimos), o que motiva a
alteração da mensagem tencionada, atentando contra a precisão
terminológica.
Discriminar ou Descriminar?
1. Discriminar tem esse verbo o sentido de discernir, separar, diferençar.
Ex.: “Perante nosso ordenamento jurídico, discriminar pode ser crime”.
2. Atento aos equívocos comuns, quanto a seu emprego na linguagem
forense, Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 90) faz a exata distinção
entre esse verbo e descriminar, que tem a significação de absolver do
crime, tirar a culpa.
3. Ronaldo Caldeira Xavier (1991, p. 85-6) caracteriza o emprego de
descriminar por discriminar – e vice-versa – como “cruzamento”, vale
dizer, como “o emprego de uma palavra em lugar de outra”, decorrente
“da falta de discernimento entre vocábulos assemelhados quanto à
estrutura fonológica (parônimos), o que motiva a alteração da mensagem
tencionada, atentando contra a precisão terminológica”.
4. Talvez motivado pelos frequentes equívocos cometidos nesse campo, o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia
Brasileira de Letras, órgão oficialmente incumbido de definir quais
vocábulos integram nosso léxico, contrariamente a seu normal proceder,
faz questão de especificar o sentido de ambos os vocábulos: descriminar
significa tirar a culpa, e discriminar quer dizer diferençar (2009, p. 262 e
290).
5. De equívocos no emprego desses verbos nem mesmo escapam os textos
de lei, como se pode observar na publicação do texto oficial do art. 16,
II, do Decreto-lei 413, de 9/1/69, que dispôs sobre os títulos de crédito
industrial, ao especificar quais requisitos deve conter uma nota de
crédito industrial: “Data de pagamento; se a nota for emitida para
pagamento parcelado, acrescentar-se-á cláusula descriminando valor e
data de pagamento das prestações”.
Discursos
Ver De que (P. 269).
Dispender ou Despender?
Ver Despender ou Dispender? (P. 277) e Dispêndio (P. 291).
Dispêndio
1. Dispêndio é termo normalmente registrado pelo Vocabulário Ortográfico
da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras
(órgão incumbido de listar oficialmente os vocábulos existentes em
nosso idioma), e significa despesa, consumo, gasto (2009, p. 290). Exs.:
a) “Foi muito elevado o dispêndio de energia elétrica no mês passado”;
b) “Se para o melhoramento, ou aumento, empregou o devedor trabalho
ou dispêndio, o caso se regulará pelas normas deste Código atinentes às
benfeitorias realizadas pelo possuidor de boa-fé ou de má-fé” (CC/2002,
art. 242, caput); c) “Não sendo possível a separação das coisas, ou
exigindo dispêndio excessivo, subsiste indiviso o todo, cabendo a cada
um dos donos quinhão proporcional ao valor da coisa com que entrou
para a mistura ou agregado” (CC/2002, art. 1.272, § 1º).
2. Seu verbo correspondente é despender, e é oportuno anotar que não
existe a palavra dispender.
3. A um consulente que indagava a razão da grafia diferente de despender e
de dispêndio, já que havia entre elas sentido aproximado, assim
respondia Cândido de Figueiredo: “Sim, o significado é análogo, mas as
duas palavras não têm a mesma derivação: despender veio-nos do latim
dependere, e dispêndio é o mesmo que o latim dispendium, derivado de
dispendere. Ora, se em latim havia dependere e dispendere, e se o
vocabulário português é, em grande parte, filho do vocabulário latino,
nada tem que estranhar” (1943, p. 29).
4. No que concerne à regência nominal, Francisco Fernandes apenas indica
a possibilidade de seu emprego seguido pela preposição de: “Dispêndio
da saúde, das forças do corpo” (1969, p. 149).
5. Lembrando, contudo, a possibilidade de existência de outra acepção e
necessidade, Celso Pedro Luft (1999, p. 179) também observa a sintaxe
com a preposição em: a) “Dispêndio de esforço e energias em coisas
fúteis”; b) “Enorme dispêndio do tempo e talento em resolver
questiúnculas, destituídas de interesse” (Afonso Celso).
Ver Despender ou Dispender? (P. 277)
Dispensa ou Despensa?
Ver Despensa ou Dispensa? (P. 277)
Disponibilizar – Existe?
Ver Verbos – Existem ou não? (P. 764)
Disputar
Ver Computar (P. 204).
Dissílabos átonos – Existe?
1. A maioria dos vocábulos átonos são monossílabos. Alguns, porém, são
dissílabos: o artigo uma, as preposições para e pera (arcaica), as
conjunções como e porque (CEGALLA, 1990, p. 21).
Distância
1. Para solução do problema de crase antes da palavra distância, assim são
as palavras de Cândido de Oliveira (s/d, p. 24): a) “Sem acento no a
quando a distância não é conhecida: ‘Ponha-se a distância’”; b) “Com
acento, quando a distância é conhecida: ‘Ponha-se à distância de seis
metros’”.
Ver Crase antes de pronomes (P. 234), Crase antes de pronomes relativos
(P. 236), Crase obrigatória (P. 238), Crase proibida (P. 239) e Crase – Regras
gerais (P. 239).
Distinguir
1. Localizando-se seus problemas no campo da ortografia e da ortoepia, por
primeiro, anote-se que o u não é pronunciado em qualquer das formas de
sua conjugação verbal (SACCONI, 1979, p. 18).
2. Tendo o grupo gu, neste caso, a exclusiva finalidade de conferir ao g seu
som original antes de e e de i, este e todos os verbos terminados em guir
(quando o u não é proferido) perdem o u antes de a e de o. Assim:
distingo (e não distinguo), distingues, distinguimos, distingamos (e não
distinguamos).
3. Na síntese de Artur de Almeida Torres, nesse sentido, “perde o u antes
de o ou a: distingo, distinga” (1966, p. 118).
4. Ou, ainda, como resume Otelo Reis: “Se o u não é proferido, muda o gu
em g antes de o e antes de a” (1971, p. 129).
5. Serve de modelo para todos os verbos terminados em guir, desde que o u
não seja pronunciado (conseguir, extinguir, perseguir, prosseguir,
seguir).
6. Carlos Góis e Herbert Palhano (1963, p. 113) lembram, com
propriedade, que, dos verbos terminados em guir, apenas arguir e
redarguir têm o u pronunciado.
7. Atentos aos frequentes equívocos em sua pronúncia, observam Regina
Toledo Damião e Antonio Henriques que existe uma indevida tendência
a pronunciar o u nele existente (1994, p. 244).
8. Reitera esse entendimento Arnaldo Niskier, ao lecionar que, nesse verbo,
“o u não se pronuncia” (1992, p. 29).
9. Em apropriada lição, refere Vitório Bergo que, “em atenção à tendência
da língua para suprimir a vogal u depois das guturais, não se profere esse
fonema, nem no infinito nem nos outros modos e tempos” (1943, p. 68).
Distratar ou Destratar?
Ver Destratar ou Distratar? (P. 280)
Distrato ou Destrato?
Ver Destratar ou Distratar? (P. 280)
Do contrato – Latinismo?
Ver Da falência (P. 246).
Documentação
1. Atenta consulta aos dicionários atesta que o vocábulo documentação tem
dois sentidos: a) ação ou efeito de documentar; b) conjunto de
documentos.
2. Quando significa ação ou efeito de documentar, é difícil pensar na
possibilidade de passar o vocábulo ao plural, até por inadequação quanto
ao sentido: “A documentação dos atos processuais é de suma
importância”.
3. Por outro lado, quando seu sentido é um conjunto de documentos, tem a
palavra valor de um coletivo, e, como se dá com este, normalmente fica
no singular: “A documentação do caso discutido foi dolosamente
incinerada”.
4. Nesse último caso, porém, pode-se pensar na hipótese de haver mais de
um conjunto de documentos, hipótese em que não se vê objeção a seu
emprego no plural, a exemplo de as manadas, as constelações, os
cardumes…: “As documentações dos casos similares foram todas
dolosamente incineradas”.
5. Vê-se, porém, que não parece haver sentido em pluralizar o vocábulo
discutido, não importando qual seja seu sentido: “Deverá a parte juntar
todas as documentações necessárias” (errado). Em tal caso, ou a palavra
tem o sentido de documento ou, no máximo, quer dizer um conjunto de
documentos de um só caso. Se se quiser atribuir-lhe o sentido de
documento, estará errado o emprego de documentação, porquanto esta
não é sinônima daquele. Por outro lado, se se pensar em conjunto de
documentos, será inadequado o uso do plural, certo como é que se terá
apenas um único conjunto de documentos, referente a um único caso.
Dói ou Doi?
Ver Ditongos éi, ói, éu – Quando acentuar? (P. 292)
Dois terços
Ver Número fracionário (P. 505).
Dolo
1. Do latim dolus (que significa artifício, manha, esperteza, velhacaria),
tem sido empregado na terminologia jurídica, na acepção civil, “para
indicar toda espécie de artifício, engano, ou manejo astucioso promovido
por uma pessoa, com a intenção de induzir outrem à prática de um ato
jurídico, em prejuízo deste e proveito próprio ou de outrem” (DE
PLÁCIDO E SILVA, 1989, p. 120). Ex.: “Se ambas as partes
procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo, para anular o ato, ou
reclamar indenização” (CC/1916, art. 97).
2. Em sentido penal, é o “desígnio criminoso, a intenção criminosa em
fazer o mal, que se constitui em crime ou delito, seja por ação ou por
omissão” (DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p. 120).
3. Quanto à ortoepia (correta pronúncia do vocábulo), assim é o ensino de
Vitório Bergo (1944, p. 91): “De acordo com a quantidade latina da
vogal tônica, esta deve ser aberta em português (dó e não dô)”.
4. Também do entendimento de que seu timbre é aberto é Luiz Antônio
Sacconi (1979, p. 18).
5. Em perfeita harmonia com os autores já citados, Cândido Jucá Filho
(1963, p. 223) aponta-lhe, como pronúncia correta, o timbre aberto (ó).
6. Em idêntico modo de pensar, Domingos Paschoal Cegalla refere que a
pronúncia da vogal tônica do mencionado vocábulo é aberta, “como em
solo” (1999, p. 127).
7. Após noticiar a equivocada tendência à pronúncia do o tônico com o
timbre fechado (ô), observa Eliasar Rosa que, segundo os estudiosos da
etimologia, dólon era o mastro escondido de navio antigo, assim como
todo punhal que trouxesse a lâmina oculta, dissimulada em cabo de
chicote ou dentro de uma bengala.
8. E continua tal autor: “Por isso é que, em sentido amplo, fora do campo
estritamente penal, dolo significa astúcia, maquinação, vontade
consciente de induzir ou manter alguém em erro, a fim de lhe obter
vantagem para si mesmo, ou para outrem” (ROSA, 1993, p. 60).
Domicílio
Ver A domicílio ou Em domicílio? (P. 82) e Morar à Rua Tal ou Morar na
Rua Tal? (P. 477)
Dominialidade – Existe?
1. Um leitor pergunta se existe o termo dominialidade para expressar o
domínio que a União detém sobre lagos e rios que banhem mais de um
Estado, ou sirvam de limites com outros países, na forma do art. 20, III,
da Constituição Federal.
2. Uma consulta ao Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa mostra
que lá se registra o substantivo feminino dominialidade (ACADEMIA
BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 294).
3. Com essa premissa de fato, é oportuno acrescentar que a Academia
Brasileira de Letras, entidade que edita o VOLP, tem, por delegação da
lei, a incumbência para listar oficialmente as palavras pertencentes ao
nosso idioma, assim como para determinar-lhes a grafia e fixar-lhes a
pronúncia.
4. Isso quer dizer que, se uma palavra se encontra registrada em tal obra, tal
significa que ela existe oficialmente em nosso idioma, e seu emprego
está, assim, legalmente autorizado, o que há de dar-se com a grafia e a
pronúncia ali constantes.
Donde ou De onde?
1. Relacionado à forma latina unde, donde é o mesmo que de onde e indica
afastamento.
2. Acerca do emprego de onde, aonde e donde, Silveira Bueno assim
sintetizava a lição que dava a um de seus consulentes: “O snr. só pode
empregar onde com verbos que não marquem movimento, mas estado:
‘O lugar onde estamos nem sempre é aquele onde morremos’.
Empregará aonde com os verbos de movimento para ou movimento a: ‘A
terra aonde vou’; ‘A casa aonde te diriges’. Empregará donde com
verbos de movimento de: ‘O país donde chego’; ‘O jardim donde
venho’” (1938, p. 115).
3. Arnaldo Niskier (1992, p. 52), procedendo a uma observação conjunta
sobre onde, aonde e de onde, anota que seu uso “não é tão difícil” e
justifica: “com verbos que indicam permanência, como estar, usamos
onde; com verbos que indicam movimento, usaremos aonde quando se
referir ao destino (aonde você quer chegar?), e de onde (ou donde)
quando se referir à procedência (de onde você saiu?)”.
4. Para não haver dúvidas, observa-se que tanto se pode usar a forma
separada de onde, como se pode empregar a contração donde, como,
aliás, textualmente registra o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa em sua mais recente edição, já posterior ao Acordo
Ortográfico de 2008 (ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2009,
p. 294).
Ver Onde, Adonde ou Aonde? (P. 528)
Do o ou De o?
Ver É hora da onça beber água ou É hora de a onça beber água (P. 296).
Do ponto de vista
Ver Ponto de vista (P. 572).
Do que
Ver O de que – Está correto? (P. 517)
Douta Curadoria
Ver Adjetivação desnecessária (P. 80).
Doutorando – Existe?
1. Apesar da oposição de alguns no que concerne à existência desse
vocábulo e à possibilidade de seu uso, é de se anotar que essa palavra
vem registrada no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras, que é o veículo oficial indicador das
palavras existentes em nosso idioma, autorizando-se, por conseguinte,
seu normal emprego, para designar aquele que cursa doutoramento ou
está para doutorar-se (2009, p. 296).
2. Tal quer significar que seu emprego está oficialmente autorizado entre
nós.
Ver Alimentando – Existe? (P. 105)
Dupla atração
Ver Se me não falha a memória ou Se não me falha a memória? (P. 684)
Dupla negativa – Está correto?
1. Em latim, similarmente ao que se dá em outros idiomas, o advérbio non
aposto a outra palavra de força negativa destruía o sentido negativo da
frase.
2. Em português, todavia, é correto – e isso sem perder o cunho negativo –
repetir a ideia do não (anteriormente expresso na frase) em outras
palavras de significação negativa, que apareçam na sequência da
construção. Exs.: a) “Não encontrou nada naquele autor”; b) “Não
compareceu ninguém à audiência”; c) “Não encontrou nenhuma saída
para o caso”.
3. Em tais casos, dá-se o que se denomina negativa intensiva, e a segunda
palavra de valor negativo, conforme o caso, também pode ser substituída
por coisa alguma, pessoa alguma ou simplesmente por alguma (este
último vocábulo, desde que posposto ao substantivo). Exs.: a) “Não
encontrou coisa alguma naquele autor”; b) “Não compareceu pessoa
alguma à audiência”; c) “Não encontrou saída alguma para o caso”.
4. Os exemplos do item anterior hão de ser assim corrigidos: a) “Ele nada
encontrou naquele autor”; b) “Ninguém compareceu à audiência”. c)
“Nenhuma saída ele encontrou para o caso”.
5. Aires da Mata Machado Filho (1969i, p. 114-5) coleciona, nos melhores
autores, variadas formas de dupla negativa: a) “Nunca por nunca deparei
um homem que pudesse…” (Camilo Castelo Branco); b) “O sentimento
nunca em tempo algum lhe deixou brilhar no rosto o festival rubor da
mocidade” (idem); c) “Nunca dos nuncas poderás saber a energia e
obstinação que empreguei em fechar os olhos” (Machado de Assis); d)
“Nem tu não hás de vir” (Gil Vicente).
6. A um consulente que lhe indagava se era português legítimo dizer “não
vi nada”, Cândido de Figueiredo respondeu pela afirmativa, justificando:
“duas negativas, em latim, afirmam; em português, não”.
7. E continuava: “A língua portuguesa é considerada filha da latina, mas
não nos confundamos: o que temos do latim é grande parte do
vocabulário; quanto à sintaxe, temos muitas coisas que os latinos não
conheceram nunca e que portanto nos não vieram de lá” (FIGUEIREDO,
1941, p. 46 e 272).
8. De Silveira Bueno advém interessante lição nesse mesmo sentido: “Os
erros são como as doenças; fáceis de contrair, mas difíceis de curar. Este,
de que duas negativas juntas fazem uma afirmativa, é dos mais
renitentes. Algum gramático, fauna que não se extingue, tendo lido que,
em latim, duas negativas valem uma afirmativa, como non nullos =
ullus; non nihil = aliquid, transportou para o português a mesma doutrina
e errou. Em nosso idioma, duas ou duzentas negativas juntas são sempre
negativas” (1957, p. 311-2).
9. Para Cândido Jucá Filho (1981, p. 86), a negação dupla às vezes
efetivamente nega (“ninguém não diga”, “desinfeliz”) e às vezes afirma
(“não sem razão” = com razão, “nada anormal” = mui normal, “sem
desconhecer” = conhecendo).
10. Fundando-se em exemplo de Machado de Assis, Vitório Bergo (1944,
p. 171) atesta a regularidade da expressão e esclarece que “são
frequentes, especialmente com o advérbio nunca, as frases pleonásticas
em que se dá realce à negativa”.
Ver Não – Com hífen ou sem? (P. 484) e Nunca jamais – Está correto? (P.
509)
Duplicata
Ver Em duplicata ou Em duplicado? (P. 306)
Duplo particípio
Ver Verbos abundantes (P. 759).
É chegado
Ver Ser nascido – Está correto? (P. 694)
Eco
1. Vício de linguagem muito comum nos meios jurídicos e forenses, pode
ser conceituado como “a concorrência desagradável de palavras que
terminam nos mesmos fonemas” (PEREIRA, 1924, p. 263).
2. Em termos mais populares, trata-se de rima indevida na prosa. Ex.: “O
tenente Clemente sente frequentemente dor de dente”.
3. Rui Barbosa, em seu parecer sobre o Projeto do Código Civil, garimpou
diversos desses no texto que então criticava: a) “Contrato cujo valor não
for superior…”; b) “O instrumento do consentimento de casamento…”;
c) “É válida a disposição para a criação de uma fundação…”
(PEREIRA, 1924, p. 263).
4. Quando tocava nesse ponto, um professor dos antigos dizia aplicar-se a
esses casos um vetusto verso popular: “Quem rima sem querer, é burro
sem saber”.
Edição extra
Ver Extra (P. 349).
Educando – Existe?
Ver Alimentando – Existe? (P. 105)
Êem ou Eem?
Ver Crêem ou Creem? (P. 240)
e. g.
1. Trata-se de abreviatura internacional da expressão latina exempli gratia
(pronuncia-se grácia), que corresponde ao nosso por exemplo. Ex.:
“Várias foram as atitudes indevidas do réu naquele processo, e. g.
contestação manifestamente intempestiva, recurso protelatório, ausência
de respectivo preparo…”.
2. Escreve-se com letras minúsculas.
Ver v. g. (P. 768)
Egrégia Câmara
Ver Adjetivação desnecessária (P. 80).
Egrégio
1. Antonio Henriques vê tal vocábulo como composto do prefixo e (ex),
denotador de afastamento, e grex, gregis (rebanho), significando, assim,
aquele ou aquilo “que sai do rebanho, do comum e se distingue da
multidão”.
2. Por outro lado, ressaltando que seu uso normal é antes do substantivo
para realçá-lo, complementa que ele “ocorre em expressões próprias do
Direito e, em geral, com maiúsculas e sentido superlativo: Egrégio
Tribunal, Egrégia Corte, Egrégio Juiz, Egrégia Câmara e outras”
(HENRIQUES, 1999, p. 53).
3. Atente-se a que, em interessante determinação, o art. 3º, caput, do
Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo assim
estatui: “Têm o Tribunal e todos os seus órgãos o tratamento de
Egrégio…”.
Ver Adjetivação desnecessária (P. 80), Esposo ou Marido? (P. 331), Petição
inicial (P. 563) e Tribunal de Justiça – egrégio ou Egrégio? (P. 747)
Ei-lo
1. Trata-se de expressão correta em português, constituindo adaptação
formal de eis (advérbio com o significado de aqui está) mais o
(pronome). Ex.: “Quanto ao livro procurado, ei-lo bem a sua frente”.
2. Pela própria possibilidade de variação do pronome, a expressão admite
as formas ei-la, ei-los, ei-las.
3. Apesar das controvérsias sobre sua origem, a razão parece estar com
Otoniel Mota, que a vê derivar da expressão ecce illum, passando a
primeira palavra através da transformação esse, eice, eiz (MOTA apud
MACHADO FILHO, 1969a, p. 664).
Ver Verbo seguido de pronome (P. 763).
Éi – Ói – Éu ou Ei – Oi – Eu?
1. É muito comum, ante as recentes modificações em nossa ortografia,
indagar-se qual a extensão das mudanças, quanto à acentuação, no que
tange aos encontros vocálicos: éi – ói – éu ou ei – oi – eu.
2. Antes das mudanças em nossa ortografia, a regra era acentuar os
ditongos abertos éi – ói – éu sempre que se apresentassem com o som
aberto.
3. Não importava se as palavras eram monossílabas (como réis, dói e véu),
ou oxítonas (como papéis, herói e troféu), ou paroxítonas (como platéia,
heróico e jarandéua), ou, ainda, proparoxítonas (como alcalóidico); tais
ditongos abertos eram sempre acentuados.
4. Pois bem. O Acordo Ortográfico de 2008 manteve o acento referido nas
demais situações, mas o aboliu nos vocábulos paroxítonos. Observe-se,
assim, como ficam doravante as seguintes palavras paroxítonas: teteia,
jarandeua, jiboia, heroico, assembleia, ideia, alcaloide.
5. Permanecem, no entanto, como exceções à regra, as paroxítonas
terminadas em ditongo (esferóideo, tireóideo, xifóideo) ou em r
(destróier, Méier). Nesses casos, se fosse excluído o acento gráfico,
haveria mudança de posição da sílaba tônica.
6. Abolido que foi o acento apenas nas paroxítonas, continuam acentuadas
as demais já referidas, como se pode conferir: réis, dói e véu
(monossílabas), papéis, herói e troféu (oxítonas), alcalóidico
(proparoxítona).
Eis que
1. Trata-se de locução conjuntiva temporal, a qual pode aproximadamente
ser substituída por quando. Ex.: “A audiência seguia tranquila, eis que o
advogado resolveu tumultuá-la”.
2. É errôneo, porém, seu emprego no sentido de locução conjuntiva causal
(significando porque, uma vez que), ou mesmo como conjunção
explicativa ou conjunção condicional. Ex.: “O réu foi absolvido, eis que
não havia provas concretas contra ele” (errado).
3. Otoniel Mota lamenta o uso de tal expressão como locução conjuntiva
causal e lhe tece os seguintes comentários: “Segundo se diz e parece,
nasceu ela nos meios forenses, exatamente os que mais deviam, por
amor à precisão da linguagem, evitar, quanto possível, novidades dessa
natureza” (MOTA apud ALMEIDA, 1981, p. 91).
4. Após referir que as conjunções causais formadas com o vocábulo vez
não primam pela vernaculidade, com exceção de uma vez que, também
Aires da Mata Machado Filho leciona que, de todas essas expressões
errôneas, “a pior é mesmo eis que, tão encontradiça na linguagem dos
advogados. É um dos tiques da língua jurídica. Todavia os cultores do
Direito que escrupulizam em pontos de vernaculidade, costumam evitá-
la” (1969h, p. 1.179).
5. Atente-se, de igual modo, à ponderação de José de Sá Nunes, o qual
reconhece que muitas vezes se emprega tal locução conjuntiva com o
sentido de uma vez que, desde que, visto que, pois que, já que,
porquanto, porque: “mas não é esta a significação que ela tem no
português. Este sentido está desviado inteiramente do que lhe dão os
mestres da língua. Quem usa a locução eis que naquela acepção ignora o
seu legítimo significado, que é senão quando, improvisadamente, eis
senão quando, de repente, inopinadamente, quando subitamente”.
6. E continua o referido gramático, lecionando e exemplificando em
mesma obra e local: “Os deturpadores do idioma nacional têm à mão
uma dezena de locuções e vocábulos que lhes podem traduzir à justa o
que exprimem por meio da expressão eis que” (NUNES, 1938, p. 50-1).
7. Eliasar Rosa registra a ocorrência de uso e abuso dessa conjunção nas
petições, requerimentos, sentenças e acórdãos, como se fosse locução
causal e sinônima de uma vez que, porque, visto como, exemplificando o
erro: “O juiz julgou procedente o pedido, eis que ficou provada a mora
do devedor”.
8. Em continuação, transcreve oportuna advertência de Vitório Bergo para
todos os que militam nos meios forenses: “Evite-se, em tempo, a
confusão, a bem da genuinidade da linguagem, que, precisamente nos
domínios da lei e da justiça, se deve preservar de inovações descabidas”
(ROSA, 1993, p. 62).
9. Antonio Henriques (1999, p. 53), por um lado, observa o fato de que
“faz carreira no meio forense, entre advogados e até mesmo juízes, a
expressão eis que com sentido causativo (porque, uma vez que etc.)”; por
outro lado, assevera ele que “merece ser censurado e, até mesmo
condenado, tal procedimento”.
10. Atento aos frequentes erros cometidos no linguajar forense e jurídico,
observa Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 43) que o emprego de
eis que em lugar da conjunção causal uma vez que é errado.
11. Geraldo Amaral Arruda, por um lado, realça que se trata de “locução
adverbial que não se deve usar como conjunção”, e aconselha sua
substituição por uma vez que, visto que, porque etc.” (1997, p. 109).
12. Em outra passagem, de sua obra, observando tratar-se de locução
adverbial com o sentido de aqui está, o mesmo desembargador,
estudioso dos problemas gramaticais na linguagem jurídica e forense,
anota que “nenhum gramático ou dicionário autoriza o uso da locução
eis que na função de conjunção causal, como reiteradamente vem
sendo empregada na linguagem forense” (ARRUDA, 1997, p. 22).
13. Observando que se trata de “locução corretamente usada para abrir
frases anunciativas e também para exprimir surpresa, imprevisto”,
também recomenda Domingos Paschoal Cegalla “não usar eis que em
lugar de porque, porquanto, uma vez que ou pois” (1999, p. 131).
14. Sousa e Silva (1958, p. 110-1) recolheu passagem de uso equivocado
de tal expressão em um matutino carioca: “Os srs…. jamais exercerão
efetivamente a nova função, eis que já andam beirando os 60 anos de
idade” (e manda corrigir: porquanto já andam, ou visto que já andam,
ou porque já andam).
15. Em tais casos, em suma, deve-se usar uma conjunção ou locução
conjuntiva causal equivalente: porque, porquanto, já que, uma vez que,
visto que. Ex.: “O réu foi absolvido, porquanto não havia provas
concretas contra ele”.
Ver De vez que (P. 283) e Vez que – Está correto? (P. 767)
Ela tinha
Ver Cacófato – O que é? (P. 163)
Eleger
1. Do latim eligere, tem o significado de escolher e se aplica a diversos
ramos do Direito.
2. Em Direito Administrativo, opõe-se a nomear, significando
precisamente escolher uma pessoa por meio de votos colhidos entre
outras, para ocupar um cargo ou desempenhar uma função pública.
3. Em Direito Civil, fala-se em eleger domicílio, com o significado de
escolha do local para fixar residência com intenção definitiva, para todos
os efeitos jurídicos.
4. No âmbito do Direito Obrigacional, fala-se em eleger foro, o que quer
dizer escolherem os contratantes, dentro da faculdade que lhes assiste
de especificar domicílio, o local onde se exercitarão direitos e se
cumprirão obrigações.
5. Quanto à conjugação verbal, como todos os verbos terminados em ger,
para a continuidade do som original da última consoante do radical,
muda-se o g em j antes de a e de o. Assim: elejo, eleges, elegi, elejam.
6. Feitas essas observações, anota-se que se trata de verbo conjugado em
todas as pessoas, tempos e modos.
7. Além disso, é verbo abundante, apresentando duas formas no particípio
passado (elegido e eleito), estando no verbete específico (verbos
abundantes) as regras para seu emprego.
8. Quanto à regência verbal, em lição que abarca outros verbos de mesmo
regime, observa Laudelino Freire (1937b, p. 52-3) que o predicativo
pode vir ligado ao verbo por conetivos, como, no caso, por em. Exs.: a)
“Elegeram-me senador” (correto); b) “Elegeram-me em senador”
(correto).
9. Em tais casos, Francisco Fernandes (1971, p. 252) também vê como
autorizada a forma sem conjunção ou com conjunção (que pode ser por,
em, para ou como). Exs.: a) “O bispo de Ceuta não tardou a ser eleito
arcebispo de Braga” (Alexandre Herculano); b) “Eleger por procurador
das cadeias um irmão de grande autoridade” (Padre Antônio Vieira); c)
“Enviou aos Estados uma declaração pela qual desiste da regência no
caso que o elejam em rei” (Mário Barreto); d) “Os soldados elegeram-
me capitão (ou para capitão, ou por capitão, ou como capitão)” (Mário
Barreto).
Elegido ou Eleito?
Ver Verbos abundantes (P. 759).
Elencar – Existe?
1. Sempre é importante ter em mente que, para que uma palavra possa ser
tida como existente em nosso idioma, será preciso que conste do
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia
Brasileira de Letras, já que esse é o órgão que tem a incumbência legal
de listar os vocábulos oficialmente existentes em nosso idioma.
2. No caso vertente, uma consulta ao VOLP revela que nele se registram
ambos os vocábulos: elencar e elenco (ACADEMIA BRASILEIRA DE
LETRAS, 2009, p. 303). Tal quer dizer que as duas palavras existem
oficialmente em nosso idioma, de modo que podem ser regularmente
empregadas nos textos redigidos sob a égide da norma culta.
3. Por fim, se elenco tem em si o significado de catálogo, índice, lista,
relação, rol, o verbo elencar há de ser usado na acepção de catalogar,
listar, relacionar, arrolar. Ex. “Em sua decisão, o magistrado elencou seis
motivos pelos quais negava ao réu o benefício para recorrer em
liberdade”.
Elidir ou Ilidir?
1. Elidir tem o sentido de eliminar, fazer elisão, suprimir. Exs.: a) “Camões
elide, por aférese, o i de ‘imaginação’”; b) “E é por isso que Camões
pôde metrificar elidindo essa vogal” (Rui Barbosa); c) “O pagamento
dos tributos, para efeito de extinção de punibilidade… não elide a pena
de perdimento de bens…” (TFR, Súmula 92).
2. Com propriedade, no campo jurídico, o art. 11, § 2º, da antiga Lei de
Falências registra que, uma vez citado, o devedor comerciante, no prazo
para a defesa, poderá “depositar a quantia correspondente ao crédito
reclamado, … elidindo a falência”; e isso porque, como determina o
mesmo dispositivo em sequência, “feito o depósito, a falência não pode
ser declarada, e se for verificada a improcedência das alegações do
devedor, o juiz ordenará, em favor do requerente da falência, o
levantamento da quantia depositada, ou da que tiver reconhecido como
legitimamente devida”.
3. Já ilidir tem o significado de contestar, destruir refutando, impugnar,
rebater, refutar. Ex.: “Em sua defesa, o réu prontamente ilidiu as
acusações de que foi alvo”.
4. Observando que elidir significa eliminar, suprimir, fazer elisão, enquanto
ilidir quer dizer destruir, refutar, rebater, Eliasar Rosa complementa que,
“em suas sustentações escritas, ou orais, procura o advogado ilidir os
fundamentos, ou a argumentação que não lhe sejam favoráveis” (1993,
p. 63.).
5. É certo que o art. 343 do Código Civil de 1916 registrava: “Não basta o
adultério da mulher com quem o marido vivia sob o mesmo teto, para
elidir a presunção legal de legitimidade da prole”. Antonio Henriques e
Maria Margarida de Andrade (1999, p. 69), porém, observavam, durante
a vigência do mencionado dispositivo, e com total propriedade, que, em
indispensáveis anotações, Theotonio Negrão corrigia o verbo elidir
(suprimir, excluir) por ilidir (rebater, refutar, anular). E a nova
codificação civil veio a corrigir o equívoco: “Não basta o adultério da
mulher, ainda que confessado, para ilidir a presunção legal da
paternidade” (CC, art. 1.600).
6. Por outro lado, o art. 244 do Código Penal refere o verbo ilidir: “Nas
mesmas penas incide quem, sendo solvente, frustra ou ilide, de qualquer
modo, … o pagamento de pensão alimentícia judicialmente”; Damásio
de Jesus, todavia, em comentários ao mencionado dispositivo, anota que,
no caso, “o correto é elide” (JESUS apud HENRIQUES, 1999, p. 53).
7. O art. 757 do Código de Processo Civil registra: “O devedor ilidirá o
pedido de insolvência se, no prazo para opor embargos, depositar a
importância do crédito, para lhe discutir a legitimidade ou o valor”.
Observando que elidir significa eliminar, enquanto ilidir quer dizer
rebater, contestar, anota Theotonio Negrão (2001b, p. 796) que melhor
seria que a disposição legal, no caso, registrasse elidirá.
8. De igual modo, o texto oficial do art. 21, parágrafo único, da Lei 5.478,
de 25/7/68, que dispõe sobre a ação de alimentos, ao conferir nova
redação ao art. 244 do Código Penal, assim determina: “Nas mesmas
penas incide quem, sendo solvente, frustra ou ilide, de qualquer modo,
inclusive por abandono injustificado de emprego ou função, o
pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou
majorada”. O mesmo professor Theotonio Negrão (2001b, p. 53),
lembrando que o Pequeno Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, assim como Séguier e Aurélio Buarque de Holanda,
procedem a idêntica distinção, manda corrigir para elide.
Em 4 de julho ou A 4 de julho?
Ver A catorze de julho ou Em catorze de julho? (P. 64)
Em absoluto – Galicismo?
1. Vitório Bergo reconhece o fato de ser tal expressão tachada de galicismo.
2. Por outro lado, assevera que se lhe alarga o uso até na literatura, onde
“vai ela concorrendo com o advérbio absolutamente”.
3. Por fim, traz (BERGO, 1944, p. 96) a corroboração de exemplo de
Machado de Assis: “Já tenho lido que o conselho trabalha pouco, mas
não aceito em absoluto esta afirmação”.
4. Nesse mesmo sentido é a lição do Padre José F. Stringari: “Creio que
não havemos de escrupulizar no emprego da expressão – em absoluto –
embora paladinos da linguagem intemerata a estigmatizem com o ferrete
de galicismo”.
5. E acrescenta tal autor que “a locução de que se trata, abroquela-se com
textos que levam a chancela de autores exemplaríssimos”, passando a
citar diversos deles: a) “De passagem, aludirei apenas ao grave
inconveniente de se haver desprezado, quase em absoluto, a acentuação
gráfica” (Cândido de Figueiredo); b) “O certo é que o bloqueio obsta em
absoluto à saída ou introdução de todo e qualquer gênero de produtos”
(Rui Barbosa); c) “… pondo de banda as causas providenciais até
suprimir em absoluto o nome de Deus…” (Mário Barreto).
6. Por fim, aconselha o gramático citado: “Os autores são excelentes e os
exemplos são claros. Não hesitemos, pois, em lhes ir de companhia e
alegremo-nos por mais uma fórmula vir enriquecer o nosso já tão
alentado cabedal fraseológico” (STRINGARI, 1961, p. 69).
E-mail ou emeio?
1. O conjunto das palavras existentes em nosso vocabulário não é um sítio
arqueológico, em que nada de novo acontece e tudo se encontra
fossilizado. As palavras, na língua, têm vida, de modo que nascem, têm
sua existência, às vezes se modificam, quer em estrutura, quer em
sentido, e muitas vezes morrem.
2. Uma das razões do aparecimento de novos vocábulos é a tecnologia.
Palavras como televisão, telégrafo e telefone surgiram com a invenção
dos aparelhos conhecidos pelos respectivos nomes. Assim, de acordo
com a necessidade, novos termos vão surgindo, em razão da ausência de
vocábulo correspondente em Português. É o que se denomina
neologismo.
3. Quando, porém, surge o problema da ausência de vocábulo em nosso
idioma, como se deve resolver a questão: a) aportuguesa-se
simplesmente a palavra de outro idioma?; b) grafa-se a palavra tal como
em seu idioma de origem?; c) ou se emprega outra palavra em
Português, que seja a transliteração ou a adaptação da palavra de outra
língua?
4. Vale dizer: a escrita deve obedecer à grafia do inglês (e-mail), ou deve
haver a transliteração, ou seja, o registro em Português dos respectivos
sons, tais como pronunciados em inglês (emeio).
5. Ora, quando se confere forma nova a um vocábulo em Português, é
preciso verificar se ele consta da relação do Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, que é uma espécie de dicionário que lista as palavras
reconhecidas oficialmente como pertencentes à língua portuguesa, bem
como lhes fornece a grafia oficial. Esse VOLP é elaborado pela
Academia Brasileira de Letras, que tem a responsabilidade legal de
editá-lo, em cumprimento à vetusta Lei Eduardo Ramos, de n. 726, de
8/12/1900.
6. Assim, se consta do VOLP, então a palavra pertence ao nosso léxico; em
caso contrário, ela não existe para o idioma. A ABL é a autoridade
suprema para listar oficialmente as palavras existentes em nosso léxico.
7. Pois bem. Em termos concretos, em sua edição de 2009, em que listou
uma série de “Palavras Estrangeiras” usadas em nosso dia a dia, arrolou
entre elas o vocábulo e-mail, esclarecendo que ele pertence ao idioma
inglês (ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, p. 862), o que liquida
de uma vez por todas com o assunto, porquanto, como é sabido, o VOLP
é a lei sobre o assunto, a que todos devemos obediência.
8. E, quando isso acontece, então se deve citar a palavra no idioma de
origem, apenas com o cuidado de grafá-la em itálico, negrito, sublinha
ou entre aspas: e-mail, e-mail, e-mail ou “e-mail”.
9. Acresce dizer que, de longa data, já existe em nosso léxico o vocábulo
emeio (e o próprio VOLP a tem assim registrado); como é fácil perceber
nos dicionários, porém, não significa a transliteração do vocábulo aqui
discutido, e sim é palavra usada no idioma ao menos desde o começo do
século XIX, mas com o significado de oportunidade, ocasião, momento.
Embaixadora ou Embaixatriz?
1. Como é ensino de Celso Cunha (1970, p. 96), “de embaixador, há,
convencionalmente, dois femininos: embaixatriz (a esposa do
embaixador) e embaixadora (funcionária chefe da embaixada)”.
2. Nesse sentido é a lição de Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 31).
3. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 134) também faz a diferença:
embaixadora é a “mulher que exerce a função de representante
diplomática”; embaixatriz é “esposa de embaixador”.
4. Não destoa desse entendimento Arnaldo Niskier, ao lembrar que
“embaixador possui dois femininos com significados diferentes:
embaixatriz é a esposa do embaixador, embaixadora é a mulher que
exerce o cargo de embaixador”.
5. E “para mostrar que não é só o povo que comete erros”, tal autor lembra
[em 1992] que “o presidente Collor nomeou a apresentadora de TV
Angélica, que nem casada é, embaixatriz da criança” (NISKIER, 1992,
p. 30).
Embargo e Embargos
1. Em termos de técnica jurídica, o embargo traz em si a ideia de
impedimento, obstáculo, estorvo, embaraço, medida de oposição a
algum ato, como aquele que se faz extrajudicialmente, para que o
construtor não continue na execução de determinada obra (CPC/1973,
art. 935). Confira-se, nesse sentido, o conceito que lhe é dado por De
Plácido e Silva: “meio ou medida de oposição a ato ou ação de outrem,
para que os impeça ou seja suspensa a sua execução” (1989, p. 143).
2. Já em embargos se vê com nitidez a ideia de um recurso judicial para
oposição em diversas circunstâncias, como se dá em várias previsões da
legislação processual civil em vigor (DINIZ, 1998, p. 291).
3. No aspecto gramatical, embargo é palavra do singular e, quando
desempenha a função sintática de sujeito, pede o verbo em concordância
no singular, não havendo problema algum nesse campo. Ex.: “O
embargo extrajudicial foi feito na exata consonância com o disposto no
art. 935 do Código de Processo Civil”.
4. Em sequência, parta-se do princípio de que, em Português, há certos
substantivos que se empregam só no plural (e a eles se juntam aqueles
que têm sentido diferente no singular e no plural, como
embargo/embargos (CUNHA, 1970, p. 89): anais, arredores, esponsais,
núpcias, pêsames, víveres. Se essas palavras plurais exercem a função de
sujeito, o verbo há de concordar com elas no plural. Exs.: a) “Os
pêsames devem ser dados com parcimônia e sobriedade”; b) “Os víveres
não chegaram a tempo para a comemoração”.
5. E embargos, na significação de recurso processual, é exatamente uma
palavra plural, que, quando funciona como sujeito, exige o verbo no
plural, como é de fácil comprovação no Código de Processo Civil. Exs.:
a) “Cabem embargos infringentes…” (CPC/1973, art. 530); b) “Os
embargos serão restritos…” (CPC/1973, art. 530); c) “Cabem embargos
de declaração…” (CPC/1973, art. 535); d) “Os embargos serão
opostos…” (CPC/1973, art. 536); e) “Os embargos de declaração
interrompem o prazo…” (CPC/1973, art. 538); f) “O devedor poderá
opor-se à execução por meio de embargos, que serão autuados em
apenso…” (CPC/1973, art. 736); g) “Não são admissíveis embargos do
devedor antes de seguro o juízo” (CPC/1973, art. 737); h) “Na execução
fundada em título judicial, os embargos só poderão versar …”
(CPC/1973, art. 741); i) “Na execução por carta, os embargos serão
oferecidos no juízo deprecante ou no juízo deprecado…” (CPC/1973,
art. 747); j) “Os embargos podem ser de terceiro senhor e possuidor, ou
apenas possuidor…” (CPC/1973, art. 1.046, § 1º); k) “Admitem-se ainda
embargos de terceiro…” (CPC/1973, art. 1.047); l) “Os embargos podem
ser opostos a qualquer tempo …” (CPC/1973, art. 1.048); m) “Os
embargos serão distribuídos por dependência e correrão perante o
mesmo juiz que ordenou a apreensão” (CPC/1973, art. 1.049); n)
“Quando os embargos versarem sobre todos os bens…” (CPC/1973, art.
1.052); o) “Os embargos poderão ser contestados no prazo de dez (10)
dias…” (CPC/1973, art. 1.053); p) “No prazo previsto no artigo anterior,
poderá o réu oferecer embargos, que suspenderão a eficácia do
mandado inicial. Se os embargos não forem opostos…” (CPC/1973, art.
1.102c); q) “Os embargos independem de prévia segurança do juízo e
serão processados nos próprios autos, pelo procedimento ordinário”
(CPC/1973, art. 1.102, § 2º).
6. Outros diplomas legais seguem normalmente essa regra de que embargos
é palavra plural e, quando sujeito, leva o verbo a concordar no plural.
Exs.: a) “Os embargos infringentes, instruídos, ou não, com documentos
novos, serão deduzidos, no prazo de 10 (dez) dias…” (art. 34, § 2º, da
Lei 6.830, de 22/9/80, que dispôs sobre a cobrança judicial da Dívida
Ativa da Fazenda Pública); b) “Cabem embargos infringentes…”
(RISTJ, art. 260); c) “Os embargos serão fundamentados e entregues no
protocolo do Tribunal…” (RISTJ, art. 261); d) “Aos acórdãos proferidos
pela Corte Especial, pelas Seções ou pelas Turmas, poderão ser opostos
embargos de declaração…” (RISTJ, art. 263, caput); e) “Se os embargos
forem manifestamente incabíveis…” (RISTJ, art. 263, § 2º); f) “Os
embargos de declaração suspendem o prazo…” (RISTJ, art. 265); g)
“Das decisões da Turma, em recurso especial, poderão, em quinze dias,
ser interpostos embargos de divergência…” (RISTJ, art. 266); h) “Os
embargos serão juntados aos autos independentemente de despacho e
não terão efeito suspensivo” (RISTJ, art. 266, § 2º); i) “Cabem embargos
de divergência à decisão de Turma…” (RISTF, art. 330); j) “Cabem
embargos infringentes à decisão não unânime do Plenário ou da Turma”
(RISTF, art. 333); k) “Cabem embargos de declaração, quando houver
no acórdão…” (RISTF, art. 337); l) “Os embargos declaratórios serão
interpostos no prazo de cinco dias” (RISTF, art. 337, § 1º); m) “Se os
embargos forem recebidos, a nova decisão se limitará a corrigir…”
(RISTF, art.338); n) “Os embargos declaratórios suspendem o prazo
para interposição de outro recurso…” (RISTF, art. 339).
7. Por fim, nunca é demais repetir que descabido é querer dizer “segue
embargos”, a pretexto de que estaria subentendida a ideia de uma petição
de embargos. Também inviável raciocinar com a ideia de que em
embargos, não importando sua espécie, está ínsita a ideia de recurso, de
modo que se estaria, em última análise, dizendo: “segue (recurso de)
embargos declaratórios”. Em verdade, se se apresentarem essas novas
orações, ainda que o sentido possa ser o mesmo, a realidade gramatical e
sintática há de ser outra: petição ou recurso (palavras do singular)
passam a ser os núcleos dos sujeitos e exigirão a concordância do verbo
no singular.
8. Confira-se, assim, a correção dos seguintes exemplos: a) “Seguem
embargos”; b) “Segue a petição de embargos”; c) “Segue o recurso de
embargos de declaração”.
Embora
Ver Indicativo por Subjuntivo (P. 411) e Embora que (P. 305).
Embora que
1. Heráclito Graça (1904, p. 244) defende a correção de tal sintaxe e aponta
seu emprego em Padre Manuel Bernardes e Antônio Feliciano de
Castilho: a) “Embora que me custe…”; b) “Embora que me exponha…”.
Ver Indicativo por Subjuntivo (P. 411).
Em chefe – Existe?
1. A questão que se põe é saber se existem expressões como comandante-
chefe e comandante em chefe, médico-chefe e médico em chefe, redator-
chefe e redator em chefe.
2. Décadas passadas, Napoleão Mendes de Almeida lecionava que, em
expressões como redator-em-chefe (grafia da época, com hífen), o que se
tem é um substantivo composto, cujo segundo elemento tem a finalidade
de conferir qualidade ao primeiro, razão pela qual não havia motivo para
se antepor à palavra chefe a preposição em.
3. Para ele, seriam errôneas, assim, por configurarem galicismos,
expressões como comandante em chefe ou redator em chefe, as quais
deveriam ser substituídas simplesmente por comandante-chefe e redator-
chefe. (ALMEIDA, 1981, p. 94)
4. Nesse sentido também o ensino de João Ribeiro (1923, p. 249).
5. De igual modo, assim pensa Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 268), que
lança expressões como redator em chefe no rol dos galicismos.
6. Ao inseri-la também no rol dos galicismos fraseológicos ou sintáticos,
acrescenta Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 260-2) que esse modo de
dizer é um daqueles que “são verdadeiras deturpações da língua, contra
as quais devemos estar premunidos”.
7. Ao discorrer sobre a preposição em, Luiz A. P. Vitória (1969, p. 98)
observa que ela “entra em muitas construções erradas” e dá como
exemplos general em chefe e redator em chefe, expressões que manda
substituir por generalíssimo e redator-chefe.
8. Aparentando, contudo, aprovação à estrutura discutida, ao exemplificar
que a preposição em “às vezes é mero expletivo”, exemplifica Alfredo
Gomes (1924, p. 414), por primeiro, com a expressão general em chefe.
9. Em outra passagem, porém, diz ele (GOMES, 1924, p. 469) constituir
galicismo sintático frequente “o emprego da preposição em nos
compostos”, exemplificando com redator em chefe.
10. E, logo em seguida, assevera ser hoje corrente a expressão general em
chefe.
11. Domingos Paschoal Cegalla, no verbete específico, manda que se evite
a construção comandante em chefe, por ser “cópia do francês
commandant en chef” (1999, p. 77).
12. Ao lhe indagarem qual a diferença entre médico-chefe e médico em
chefe, Cândido de Figueiredo respondia de modo taxativo: “É que
médico-chefe é forma portuguesa, e médico em chefe, construção
francesa” (1943, p. 104).
13. Também demonstrando seu posicionamento no sentido de que errônea
é a expressão, observa Vasco Botelho de Amaral (1943, p. 177-8) ser
claro que, “além de se poder suprimir o em, traduz-se perfeitamente o
in chief inglês (ou o en chef francês) por supremo, mor, etc.”, e se pode
corrigir “cortando simplesmente o em: comandante-chefe”.
14. Evanildo Bechara, por seu lado, tem posição divergente: “Tem-se, sem
maior exame, condenado este emprego da preposição em como
galicismo…, mas é linguagem hoje comuníssima e corrente nas
principais línguas literárias modernas” (1974, p. 292).
15. Em mesma esteira, José Oiticica (1954, p. 23) arrola tal construção
entre aquelas que “parecem galicismos ou erros”, mas “não o são”.
16. E Mário Barreto (1954a, p. 247-248) traz diversos exemplos de
emprego de expressões como general em chefe, comandante em chefe,
comando em chefe em autores insuspeitos, como Rui Barbosa, Camilo
Castelo Branco, Ramalho Ortigão, Rebelo da Silva, Júlio Dinis.
17. Heráclito Graça (1904, p. 293), mostrando aprovar a sintaxe em
discussão, refere que, compulsando a legislação portuguesa do início
do século XIX, encontrou o art. 181 do Decreto de 21 de fevereiro de
1816 – diploma esse que regulamentou a organização do exército de
Portugal – o qual estava assim redigido: “O exército será composto de
um general em chefe, que o comandará”.
18. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, que é o veículo oficial para determinar quais as
palavras que pertencem ao nosso léxico, bem como qual sua adequada
grafia, em sua edição já posterior ao Acordo Ortográfico de 2008,
registra, por um lado, comandante-chefe e comandante em chefe; num
segundo aspecto, faz constar médico-chefe, mas não médico em chefe;
por fim, não traz redator-chefe, nem redator em chefe (2009, p. 205 e
535).
19. Assim, do que consta da palavra oficial do VOLP, podem-se extrair
duas conclusões importantes: a) ao registrar comandante-chefe e
médico-chefe, demonstra a clara possibilidade de criação de outros
substantivos compostos com estrutura semelhante, dentre os quais
redator-chefe; b) ao fazer constar comandante em chefe, fixa como
vernácula a expressão em chefe e permite a construção de outras
estruturas sintáticas similares, como médico em chefe e redator em
chefe (assim sem hífen, ante a nova sistematização trazida pelo Acordo
Ortográfico de 2008).
Em conformidade ou De conformidade?
Ver De conformidade ou Em conformidade? (P. 253)
Em consonância
1. Para essa expressão, que tem por sentido de acordo com, Celso Pedro
Luft (1999, p. 124) vê tríplice possibilidade de sintaxe: em consonância
a, em consonância com, em consonância de: a) “Em consonância ao que
ele diz ou prega”; b) “Agir em consonância com princípios morais”; c)
“Suas ações estão em consonância do que ele diz”.
Ver Consonância (P. 222).
Em cores ou A cores?
Ver A cores ou Em cores? (P. 73)
Em definitivo – Galicismo?
1. Vitório Bergo censura o emprego dessa locução, por corresponder ao
francês en définitive.
2. Para solucionar o problema, prega sua substituição por definitivamente
ou terminantemente (BERGO, 1944, p. 98).
Em domicílio ou A domicílio?
Ver A domicílio ou Em domicílio? (P. 82)
Em duplicata ou Em duplicado?
1. Existe em português o substantivo duplicata, que é “o título que se extrai
em consequência de uma venda mercantil, quando feita para pagamento
a prazo, entre comprador e vendedor, domiciliados no país”,
assemelhando-se, em natureza jurídica, à letra de câmbio, à nota
promissória e ao cheque (DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p. 130).
2. Quanto à expressão em duplicata, para significar “em dois exemplares de
mesmo teor”, todavia, Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 95)
assevera não haver registro de sua existência nos melhores dicionários,
aconselhando, nesse sentido, o uso da expressão em duplicado.
3. Vejam-se, assim, os seguintes exemplos, com indicação de seu acerto ou
erronia, na lição do referido autor: a) “O instrumento de venda e compra
foi juntado aos autos em duplicata” (errado); b) “O instrumento de
venda e compra foi juntado aos autos em duplicado” (correto).
4. O erro, contudo, encontra-se tão arraigado entre nós, que a própria
Convenção Ortográfica entre o Brasil e Portugal, um documento que
buscava estabelecer regras específicas para a língua portuguesa entre os
dois países, firmado pelos respectivos Plenipotenciários em 1943, para
significar que a convenção fora confeccionada em duas vias, uma para
cada qual dos signatários, registrava de modo literal: “Feita em
duplicata, em Lisboa, aos 29 de dezembro de 1943”.
Em epígrafe – Existe?
1. Um leitor indaga se é correta a expressão em epígrafe numa frase como
“nos autos do processo em epígrafe”.
2. Ora, epígrafe é palavra que existe de modo regular em nosso idioma,
como atesta o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado
pela Academia Brasileira de Letras, que é o órgão que detém a delegação
legal para listar oficialmente os vocábulos que pertencem ao vernáculo
(2009, p. 324).
3. Originária do grego (epi = em cima + grafe = escrever), tem, como um
de seus significados, o de uma palavra ou expressão posta no começo,
em destaque, em um texto ou documento. E, nessa acepção, será,
portanto, sinônima de destaque.
4. Assim, numa petição em que, no início do texto, foi posto em destaque o
número do processo, poderá haver, em seu meio, uma referência como a
da consulta, a saber, “nos autos do processo em epígrafe”, do mesmo
modo que se poderia dizer “nos autos do processo em destaque”.
Em folhas ou A folhas?
Ver A folhas vinte e duas – Como é a forma correta? (P. 94)
Em função de
1. Domingos Paschoal Cegalla insurge-se contra o emprego dessa
expressão como locução prepositiva causal.
2. É sua lição taxativa: “Não nos parece correto usar esta locução com
sentido causal, equivalente de por causa de, em virtude de”.
3. E acrescenta: “Entendemos que deve ser usada com sentido de finalidade
ou de dependência, correlação” (CEGALLA, 1999, p. 135).
4. Alinham-se, a seguir, alguns exemplos, com o apontamento de sua
correção ou incorreção, de acordo com a doutrina do referido gramático:
a) “Ele ficou doente em função do trabalho excessivo” (= por causa de –
errado); b) “Ele se afastou de algumas atividades em função do cargo
que passou a ocupar” (= em virtude de – errado); c) “Os jovens devem
escolher o caminho em função de suas tendências e habilidades” (=
tendo em vista – correto); d) “No Direito atual, os poderes do Estado
são estatuídos em função dos imperativos da sociedade civil” (= tendo
por finalidade – correto).
Em + gerúndio – É correto?
1. Um leitor observa que é muito utilizada a preposição em antes de verbos
no gerúndio, no início de frases, para estabelecer uma condição: em
ocorrendo, em havendo… E faz duas indagações: a) é correta uma
construção como essa?; b) não ficaria melhor dizer “se ocorrer” ou
“quando houver”?
2. Num primeiro aspecto, afirme-se a correção dessas construções em que o
gerúndio se faz preceder da preposição em. Exs. a) “Em se levantando,
saía”; b) “Em ocorrendo a condição prevista, o negócio estará
automaticamente desfeito”.
3. Carlos Henrique Rocha Lima anota que uma das funções da preposição
em é exatamente preceder o gerúndio, “exprimindo, sobretudo, tempo e
condição”. E exemplifica com excerto de Rui Barbosa: “A vida não tem
mais que duas portas: uma de entrar, pelo nascimento; outra de sair,
pela morte. Ninguém, cabendo-lhe a vez, se poderá furtar à entrada.
Ninguém, desde que entrou, em lhe chegando o turno, se conseguirá
evadir à saída” (1972, p. 345).
4. Cândido Jucá Filho, por sua vez, leciona que, nesses casos, a referida
preposição “introduz gerúndios, para insistir na ideia de concomitância”.
E exemplifica: “Em me vendo, ele logo se lembrará do prometido”
(1963, p. 233).
5. E Celso Cunha assim justifica a referida construção: “Precedido da
preposição em, o gerúndio marca enfaticamente a anterioridade imediata
da ação com referência à do verbo principal” (1970, p. 231).
6. Napoleão Mendes de Almeida ainda faz três observações: a) o gerúndio
“invade, nesse caso, a esfera do particípio presente latino”; b) “não se vá
julgar necessária a preposição em em tal caso”; c) “limita-se seu uso à
língua culta” (1981, p. 96).
7. Também interessante a ponderação de Domingos Paschoal Cegalla
(1999, p. 133-4): “É simplesmente enfática, portanto não necessária, a
preposição em antes de gerúndio, em orações que exprimem tempo ou
condição, como as frases: Em aparecendo febre, ela chama a vizinha. /
Em se tratando de casos graves, ele atende prontamente. / Em se
removendo a causa, cessarão os efeitos. / ‘Em chegando a hora, saberei
como agir.’ (Aurélio) / ‘Ande, aparente calma, mas, em chegando à
esquina, chispe.’ (Ciro dos Anjos, O Amanuense Belmiro, p. 80)”.
8. Gladstone Chaves de Melo (1978, p. 204-5) chega a afirmar que uma das
funções da preposição em é exatamente reger o gerúndio em
determinadas circunstâncias. E traz exemplos de abalizados escritores
para abonar seu ensino: a) “Ninguém, desde que entrou [neste mundo],
em lhe chegando o turno, se conseguirá evadir à saída” (Rui Barbosa);
b) “… ele, em se tratando da própria consideração, mentia sem
dificuldade” (Machado de Assis).
9. Por fim, respondendo diretamente à indagação do leitor: a) em casos
como os trazidos para análise, tanto é correto dizer o verbo no gerúndio
precedido pela preposição em (em ocorrendo, em havendo), como é
correta a supressão da preposição em antes do gerúndio, ou a extensão
do verbo, com o surgimento da conjunção e o desaparecimento da
preposição e do gerúndio (se ocorrer, quando ocorrer, se houver,
quando houver); b) como não é difícil perceber, nesses casos de um
gerúndio precedido pela preposição em, indica-se uma condição (se) ou
um tempo (quando); c) sintaticamente, as três construções se equivalem
quanto à correção gramatical, muito embora a construção com a
preposição em seja quase que exclusiva da norma culta; d) a escolha,
assim, fica ao talante do usuário; e) por fim, com o verbo no gerúndio e
manutenção ou não da preposição, estará correto qualquer desses
exemplos: (Em me levantando ou Levantando-me, Em ocorrendo ou
Ocorrendo, Em lhe chegando ou Chegando-lhe, Em me vendo ou Vendo-
me, Em aparecendo ou Aparecendo, Em se tratando ou Tratando-se, Em
se removendo ou Removendo-se, Em chegando ou Chegando).
Eminência ou Iminência?
1. Eminência significa elevação, altura, proeminência, ou, ainda, é o
pronome de tratamento reservado aos cardeais. Exs.: a) “A eminência de
seu cargo o autorizava a proceder daquela forma”; b) “Sua Eminência
fora chamado a Roma pelo papa, para um assunto muito importante”.
2. Já iminência quer dizer qualidade do que é iminente, do que está prestes
a acontecer. Ex.: “O réu estava na iminência de ser preso”.
3. Atento aos frequentes equívocos no emprego de ambas as palavras, o
próprio Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de determinar a
existência dos vocábulos em nosso idioma, além de sua grafia oficial,
mesmo fugindo a seu normal proceder e finalidade de apenas listar
palavras, acaba por precisar a exata significação de ambos os vocábulos:
eminência tem por conteúdo semântico alteza, e iminência quer dizer
proximidade (2009, p. 308 e 450).
Ver Eminente ou Iminente? (P. 308)
Eminente ou Iminente?
1. Eminente significa alto, elevado, ilustre, importante, nobre, notável,
sublime. Ex.: “O eminente magistrado proferiu a sentença”.
2. Já iminente quer dizer imediato, prestes a ocorrer, provável, próximo.
Exs.: a) “A prisão do réu estava iminente”; b) “O possuidor, que tenha
justo receio de ser molestado na posse, poderá impetrar ao juiz que o
segure da violência iminente, cominando pena a quem lhe transgredir o
preceito” (CC/1916, art. 501).
3. Talvez em decorrência dos frequentes equívocos no emprego de ambas
as palavras, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de
determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma, além de sua
grafia oficial, mesmo fugindo a seu normal proceder e finalidade de
apenas listar palavras, acaba por precisar a exata significação de ambos
os vocábulos: eminente é alto, e iminente significa próximo (2009, p.
308 e 450).
Ver Eminência ou Iminência? (P. 308)
Emissão ou Imissão?
1. Do latim emissione, emissão significa o ato de emitir, de expelir, de pôr
em circulação. Ex.: “A emissão de cheque sem fundos pode tipificar
estelionato”.
2. Também do latim immissione, imissão quer dizer o ato ou efeito de
imitir, de fazer entrar, de investir em. Ex.: “O autor requereu ao juiz a
imissão na posse do imóvel abandonado pelo réu”.
3. Em razão dos frequentes equívocos no emprego de ambas as palavras, o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira
de Letras, órgão incumbido oficialmente de determinar a existência dos
vocábulos em nosso idioma, além de sua grafia oficial, mesmo fugindo a
seu normal proceder e finalidade de apenas listar palavras, acaba por
precisar a exata significação de ambos os vocábulos: emissão significa
envio, enquanto imissão quer dizer entrada (2009, p. 308 e 450).
Ver Imissão na posse ou Imissão de posse? (P. 394)
Emitir ou Imitir?
1. Do latim emittere, emitir quer dizer lançar de si, pôr em circulação. Ex.:
“Emitir cheque sem provisão de fundos pode tipificar estelionato”.
2. Já do latim immittere, imitir significa fazer entrar, investir em. Exs.: a)
“O juiz imitiu o autor na posse do imóvel abandonado pelo réu”; b) “Os
herdeiros, para se imitirem na posse dos bens do ausente, darão
garantias da restituição deles, mediante penhores, ou hipotecas
equivalentes aos quinhões respectivos” (CC, art. 30, caput); c) “Se o
expropriante alegar urgência e depositar quantia arbitrada de
conformidade com o art. 685 do Código de Processo Civil (refere-se ao
Código de 1939), o juiz mandará imiti-lo provisoriamente na posse dos
bens” (Decreto-Lei 3.365, de 21/6/41, art. 15).
3. Em decorrência dos frequentes equívocos no emprego de ambas as
palavras, o próprio Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de
determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma, além de sua
grafia oficial, mesmo fugindo a seu normal proceder e finalidade de
apenas listar palavras, acaba por precisar a exata significação de ambos
os vocábulos: emitir tem por conteúdo semântico enviar ou fazer sair,
enquanto imitir quer dizer fazer entrar (2009, p. 308 e 450), exatamente
o oposto.
Em mão ou Em mãos?
1. Dois leitores querem saber qual a forma correta: em mão ou em mãos? E
um deles indaga qual o seu real significado?
2. Ora, a entrega de uma determinada carta ou objeto ao respectivo
destinatário pode ser confiada a alguém em particular, e não ao correio.
É exatamente desse modo de entrega de correspondência que se diz em
mão, ou em mãos, ou em mão própria, ou em mãos próprias.
3. E, no sobrescrito da carta, costuma-se abreviar E. M. ou E. M. P.
4. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (2010, p. 1.332-3) e Cândido Jucá
Filho (1963, p. 409) trazem apenas a forma no singular para ambas as
expressões; já Antônio Houaiss as registra no singular e no plural (2001,
p. 1.843). E todos sem comentário algum acerca de uma ou de outra
posição.
5. Domingos Paschoal Cegalla, por seu lado, justifica que “as duas formas
são corretas, mas no Brasil se emprega geralmente em mãos” (1999, p.
136).
6. Ante esse quadro, a postura mais adequada parece ser aquela que dá por
corretas todas essas formas de expressão.
Em nome de – É correto?
1. Um leitor indaga se é correto, por exemplo numa coluna de jornal,
saudar todos os aniversariantes de um determinado dia em nome de
alguém conhecido e ilustre. E, nesse caso, a pessoa especificamente
nomeada seria homenageante ou homenageada?
2. A dúvida do leitor deve ter surgido por haver ele atentado, apenas e tão
somente, ao fato de que a expressão em nome de pode significar, por um
lado, em lugar de, mas com a específica acepção de como se fosse
(alguém). Ex.: “Apresentou-se à delegacia em nome do irmão”
(HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 2.024).
3. O certo, contudo, é que, a par dessa possibilidade de sentido, também é
frequente e correto o emprego do referido vocábulo para indicar uma
representatividade de diversas outras pessoas em uma que é mais
conhecida, para simbolizar nesta a homenagem feita aos demais.
4. É o que se dá, por exemplo, num discurso, em que o orador saúda todos
os presentes no nome (ou na pessoa) do presidente da sessão. É também
o que se dá com a extensão dos cumprimentos a todos os aniversariantes
do dia, quando feitos expressamente no nome ou na pessoa de um
aniversariante mais conhecido.
5. Assim, de modo específico para as indagações do leitor, podem-se fazer
as seguintes considerações: a) por um lado, é correto o emprego da
expressão em nome de para significar em lugar de, com a específica
acepção de como se fosse alguém (“Apresentou-se ao delegado em nome
do irmão”); b) por outro lado, também é correto usar tal circunlóquio
para saudar ou homenagear diversas pessoas, tendo-as por representadas
em uma mais conhecida (“Saúdo os presentes no nome do Presidente
desta sessão solene”); c) nesse último caso, a expressão em nome de
também pode ser substituída pelo circunlóquio na pessoa de (“Saúdo os
presentes na pessoa do Presidente desta sessão solene”); d) uma
homenagem assim feita não se resume apenas à pessoa especificamente
mencionada, mas também se estende a todas as demais subentendidas na
referência.
Em nome ou Na pessoa?
Ver Cumprimentar em nome ou Cumprimentar na pessoa? (P. 243)
Em o
Ver Alma minha – É cacófato? (P. 106), Cacófato – O que é? (P. 163), Não
no sei – Está correto? (P. 486) e O Estado de S. Paulo (P. 519).
Em O Estado de S. Paulo
Ver O Estado de S. Paulo (P. 519).
Em ordem a – Anglicismo?
1. Esclarece Vasco Botelho de Amaral que, “atualmente, também se
emprega com frequência em ordem a, talvez por influência do in order to
inglês, que vale o nosso a fim de”.
2. Acrescenta que tal locução é “antiga em nossa língua”, alinhando
exemplo do Padre Manuel Bernardes, em Nova Floresta: “… em ordem
a formarmos mais nobre conceito de Eternidade…” (AMARAL, 1939,
p. 112).
Em ouro – Galicismo?
1. Para os gramáticos atuais, trata-se de galicismo a ser evitado o uso da
preposição em para explicitar a matéria de que é feito um objeto.
2. Essa é a lição de Júlio Nogueira (1959, p. 71), que dá como erradas as
expressões vestido em seda, estátua em bronze, casa em cimento
armado; e manda que se use vestido de seda, estátua de bronze, casa de
cimento armado.
3. Nas palavras textuais de Vitório Bergo, “constitui galicismo o emprego
da preposição em, no lugar de de, para designar a matéria de que se faz
algo” (1944, p. 163).
4. Também de acordo com essa lição, devem-se evitar, assim, expressões
como aliança em ouro, escultura em bronze, estátua em mármore, mesa
em jacarandá, que deverão ser substituídas, em escorreito português, por
aliança de ouro, escultura de bronze, estátua de mármore e mesa de
jacarandá.
5. Apesar desse entendimento da gramática normativa atual, todavia, colhe-
se em Camilo Castelo Branco a expressão “diversos bustos em mármore
e em bronze” (BRANCO apud JUCÁ FILHO, 1963, p. 233).
6. Ao lhe indagarem se um vestido em seda, uma estante em nogueira, um
broche em oiro não seriam galicismos, Cândido de Figueiredo respondia
que sim, “e dos mais charros. Vulgaríssimos todavia em lojas de modas e
domínios adjacentes. Em português, aquilo diz-se: um vestido de seda,
uma estante de nogueira, um broche de oiro” (1943, p. 139-40).
7. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 133) é taxativo para observar que
“não se usa em, mas de, para especificar a matéria de que alguma coisa é
feita” (estátua de bronze, sapatos de camurça, estante de cedro, casaco
de veludo, mesa de mármore, piso de granito).
8. O uso da preposição em nas expressões vestidos em seda, estátua em
mármore, é tido também por Edmundo Dantès Nascimento como
“construção fraseológica estrangeira”, que deve ser rejeitada, “porque
altera até a maneira de pensar em nossa língua”.
9. Acrescenta ele (NASCIMENTO, 1982, p. 15-7), em outra passagem,
contudo, que, “para indicar o modo, não é estrangeirismo”,
exemplificando com escada em caracol, braço em cruz, janela em arco.
10. Ronaldo Caldeira Xavier (1991, p. 89) insere a expressão estátua em
mármore no rol dos galicismos sintáticos e aconselha sua substituição
por estátua de mármore.
11. Também condenando, em tais casos, por galicismo, o uso da
preposição em, leciona Sousa e Silva que “a matéria de que é feito um
objeto indica-se com a preposição de: crucifixo de marfim, estátua de
mármore, mesa de jacarandá” (1958, p. 223).
12. Cândido Jucá Filho (1981, p. 63) reputa expressões como crucifixo em
marfim ou todo em ouro como galicismos, muito embora observe, com
fundamento em conclusões de Pinheiro Domingues, que “tal maneira
de falar já é vitoriosa em Portugal”.
13. Em sua tarefa de recolher exemplos equivocados frequentemente
publicados nos jornais, Josué Machado deu com um comentário sobre a
biografia de Da Vinci, em que se dizia haver ele imaginado
“escafandros feitos em couro impermeável”.
14. Bem por isso observa tal autor que “expressões como essa – feito em
couro, em madeira, em ferro, joia em ouro, vestido em seda e outras
semelhantes –, com o em no lugar do sadio de, são boas construções
francesas, que podem ser traduzidas em português com o de no lugar
do em”.
15. E questiona ele: “por acaso dizemos corpo em carne e osso?”
16. Ao depois, conclui: “Em português por enquanto as mesas são feitas de
madeira ou de qualquer outra coisa, as estátuas são de mármore, as
joias, de ouro, os copos, de vidro, de cristal, ou seja lá do que for. O em
no lugar do de nessas construções configura o que os especialistas
chamam de galicismo dispensável e indesejável, para não dizer coisa
pior. Não torna a expressão mais elegante nem mais clara nem mais
concisa nem mais nada” (MACHADO, 1994, p. 57).
17. Já Mário Barreto, dando mostras de aprovação a ambas as sintaxes, por
um lado, lembra que, nesses casos, “é um fato que presentemente está
no uso vivo da nossa língua a preposição em: rica mobília em
nogueira, camas em madeira e ferro”.
18. Por outro lado, em explicação de entendimento não muito fácil, assim
justifica as duas formas, reputando-as ambas defensáveis na língua
portuguesa: “Se digo relógio de ouro, quero dizer a matéria de que é
formado o relógio; se digo em ouro, o meu espírito contempla o estado,
a condição, o modo de ser do relógio” (BARRETO, 1954a, p. 317).
19. O solitário posicionamento de Mário Barreto, entretanto, não parece ser
suficiente para autorizar o uso da construção em ouro (ou similar) em
casos que tais, devendo-se preferir a sintaxe de ouro.
Em páginas ou A páginas?
Ver A folhas vinte e duas – Como é a forma correta? (P. 94)
Empasse – Existe?
1. Sabendo-se que é corriqueiro o emprego de impasse no sentido de
situação com dificuldade para uma saída favorável, a questão cinge-se a
saber se existe ou não a palavra empasse em nossa língua.
2. Ora, quando se quer saber se uma palavra existe ou não em português,
deve-se tomar por premissa o fato de que a autoridade para listar
oficialmente os vocábulos do nosso idioma é a Academia Brasileira de
Letras.
3. E essa autoridade, a ABL a exerce por via da edição do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa.
4. Feitas essa observações, verifica-se, a uma simples consulta ao VOLP,
que nele não se registra o vocábulo empasse, de modo que a forçosa
conclusão é que tal substantivo, por conseguinte, não existe em nosso
léxico.
Empecilho ou Impecilho?
1. Empecilho tem o significado de estorvo, impedimento, obstáculo. Ex:
“Não havia empecilho a que o condenado recebesse o indulto”.
2. Atente-se a sua ortografia, bem como à de seus cognatos (palavras
derivadas do mesmo radical): empecer, empeço.
3. Embora alguns teimem em usar, não existe a forma impecilho.
4. Observe-se, por fim, para que não haja confusão, que empecilho não
deriva de impedir, mas de empecer, que significa embaraçar, estorvar.
Empossando – Existe?
1. Um leitor, partindo do princípio de que o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, registra
outros vocábulos de mesma terminação, como doutorando e
vestibulando, indaga se existe empossando, que o VOLP não registra.
2. Ora, no que tange a esse e a outros vocábulos de estrutura similar, pode-
se dizer que alguns entraram em nosso léxico – quer na língua culta,
quer no linguajar jurídico – por influência erudita: colendo (de collere =
cultuar), despiciendo (de despicere = desprezar), dividendo, educando,
exequendo, interditando, multiplicando e vitando (de vitare = evitar).
3. Já outros se formaram por analogia, como bacharelando (de bacharel, do
francês bachelier, ou bacheler) e vestibulando (sem correspondência em
latim).
4. Luciano Correia da Silva (1991, p. 77) – que lembra a criação e a
existência de outras palavras “à imagem dos gerundivos latinos”, como
“intransigendas roupas” de Castilho, “brancos véus das confessandas”
de Alphonsus de Guimaraens e “não murchandas flores” de Machado de
Assis – transcreve a lição de Gladstone Chaves de Melo, o qual “censura
a criação abusiva de gerundivos como farmacolando, engenheirando,
etc.”
5. Também se posicionando contrariamente à vernaculidade e à
possibilidade de uso de vocábulos assim formados, diz Domingos
Paschoal Cegalla, com referência a odontolando, tratar-se de um
“brasileirismo forjado para designar a pessoa que vai se graduar em
odontologia”, e acrescenta ser “palavra formada por analogia com
doutorando e bacharelando, que se justificam por terem base verbal
(doutorar-se, bacharelar-se)”. Mas conclui tal autor: “Odontolando não
deriva de verbo algum, pois não existe odontolar-se. É, portanto,
vocábulo mal formado, como também o são farmacolando,
agronomando, vestibulando, etc. (1999, p. 293)”
6. Apesar da oposição de tal autor e de outros quanto à existência de
diversas dessas palavras e à própria possibilidade de seu uso no
vernáculo, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras (2009, p. 31, 40, 296, 316, 364, 544, 592
e 839), que é o veículo oficial indicador das palavras existentes em nosso
idioma, registra normalmente palavras como agronomando (aquele que
cursa Agronomia, ou está para nela graduar-se), alimentando (aquele que
é credor de alimentos), doutorando (aquele que cumpre créditos e
escreve tese para obter o título de doutor), engenheirando (aquele que
cursa Engenharia, ou está para nela graduar-se), farmacolando (aquele
que cursa Farmácia, ou está para nela graduar-se), mestrando (aquele
que cumpre créditos e escreve dissertação com vistas à obtenção do
título de mestre), odontolando (aquele que cursa Odontologia, ou está
para nela graduar-se) e vestibulando (aquele que presta exames
vestibulares para ingresso em cursos universitários).
7. Dessas lições, parece que se podem extrair duas importantes conclusões:
a) apesar da objeção de alguns, a autoridade oficial da ABL, por via da
edição do VOLP, permite o normal emprego de todos esses vocábulos
acima listados; b) mais do que isso, a própria premissa lançada por quem
tem a delegação oficial para listar as palavras existentes em nosso
idioma estabelece uma norma segundo a qual, respeitadas as regras da
respectiva formação, se podem criar validamente outros vocábulos em
idênticas circunstâncias.
8. Reitere-se, agora com especificidade para o caso da consulta: a)
costuma-se dizer – e com total verdade – que a ABL tem autoridade para
listar oficialmente as palavras existentes em nosso idioma; b) e ela o faz
por via da edição do VOLP; c) se um determinado vocábulo está nele
registrado, não há o que discutir quanto a sua existência em nossa língua;
d) ocorre, entretanto, que, para vocábulos formados à imagem dos
gerundivos latinos, o VOLP, por um lado, recepcionou aqueles que
entraram em nosso léxico por via erudita (como colendo, despiciendo,
educando, exequendo, interditando, etc.); e) por outro lado, o VOLP
aceitou, mesmo sem origem em gerundivos latinos, a formação de outros
vocábulos já em nosso idioma (como agronomando, farmacolando,
odontolando e vestibulando); f) mais do que avalizar a existência de tais
vocábulos, o que fez o VOLP foi fixar a regra da possibilidade de
formação de outros com mesma estrutura, desde que respeitadas as
regras da respectiva formação; g) nessa última permissão linguística,
reside exatamente a possibilidade de emprego de empossando,
significando aquele que toma posse.
Em princípio ou A princípio?
Ver A princípio ou Em princípio? (P. 128)
Em que pese a
1. Aires da Mata Machado Filho vislumbra em tal expressão uma locução
empregada no português antigo, em sentido concessivo, equivalendo a
ainda que.
2. Para ele, o verbo, na referida expressão, fica invariável na terceira
pessoa do singular do presente do subjuntivo e exige a preposição a,
tendo por correto o seguinte exemplo: “Em que pese ao parecer dos
entendidos…” (MACHADO FILHO, 1969c, p. 488).
3. Atente-se a seu real sentido nesse exemplo de Rui Barbosa: “… em que
pese a tais autoridades, sempre a praticaram os nossos melhores
escritores”.
4. Para Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 368), trata-se de locução
conjuntiva “de mais amplo uso no século de Gil Vicente”, mas ainda em
regular emprego nos dias de hoje.
5. Antenor Nascentes (1942, p. 111), de igual modo, vê em tal expressão
“um vestígio da antiga conjunção concessiva em que”, exemplificando
com Euclides da Cunha: “Assim se traçou limpidamente, em que pese ao
caráter da indeterminação que lhe davam três incógnitas…”.
6. Nessa mesma esteira se posta a lição de Vitório Bergo, para quem em
que pese ao é expressão de cunho clássico, em que a partícula em está
por ende, com o sentido de ainda, a qual fica invariável, vindo ultimada
por preposição: “… em que pese às injustiças d’el rei” (1944, p. 99).
7. Arnaldo Niskier é taxativo, para observar que, nesses casos, “a
preposição não pode ser omitida” (1992, p. 31).
8. Observando que, na referida expressão, “o primeiro elemento não é a
preposição”, mas “vale o mesmo que ainda”, esclarece Sousa e Silva,
por um lado, que, em tais casos, obrigatória é a construção com a
preposição a; por outro lado, realça ser um erro “converter o objeto em
sujeito, como fazem muitos”: “em que pese às razões” (e não: em que
pesem as razões); “em que pese às circunstâncias” (e não: em que pesem
as circunstâncias); “em que pese às dificuldades” (e não: em que pesem
as dificuldades).
9. E conclui tal autor seu pensamento: “O verbo pesar, nesse caso,
estereotipou-se no subjuntivo presente, havendo até quem registre em
que pese a como locução prepositiva” (SILVA, A., 1958, p. 112-3).
10. Para Silveira Bueno, na referida expressão, por um lado, “o verbo
permanece na terceira pessoa do singular, impessoalmente, sem
sujeito”; por outro lado, “o substantivo, que se lhe segue, não é o
sujeito como, erradamente, pensam, e sim, o complemento indireto”.
11. E complementa tal autor: “Portanto, escrever ‘em que pesem as
opiniões contrárias’ é sintaxe errada. O correto sempre foi ‘em que
pese às opiniões contrárias’” (BUENO, 1957, p. 393-4).
12. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 318), sem outras variantes,
também refere que a expressão correta, a ser empregada em tais casos,
é em que pese a.
13. Em observação não encontrada em outros autores e que não parece
autorizada ante o ensino de todas as demais lições, entretanto, afirma o
mesmo autor, em outra passagem, que “alguns gramáticos condenam
converter o objeto indireto em sujeito e construir: ‘A máquina estatal
mostra-se ineficiente, em que pesem os esforços do governo’. ‘Não
recuaremos diante desse desafio, em que pesem as dificuldades do
momento’. Convém observar que se trata de uma construção evoluída,
largamente usada na imprensa e abonada por bons escritores. Mas só é
admissível se o sujeito for nome de coisa. Havendo referência a nome
de pessoa, usar-se-á a construção original em que pese a” (CEGALLA,
1999, p. 138).
14. Atento aos frequentes equívocos que ocorrem nos arrazoados forenses,
textos jurídicos e julgados, Edmundo Dantès Nascimento (1982, p.
166-7) observa que a expressão em que pese a equivale a ainda que lhe
custe, mau grado seu, ainda que seja penoso, ainda que cause
aborrecimento, e manda corrigir a corriqueira frase “Em que pesem
estas razões, não aceitamos o argumento da sentença…” para “Em que
pese a estas razões, não aceitamos o argumento da sentença…”.
15. Num outro aspecto, acresça-se a lição de Evanildo Bechara (1974, p.
45), segundo quem, quanto à ortoepia, as autoridades recomendam o
timbre fechado em pese (ê).
16. Também nesse sentido o registro de Otelo Reis (1971, p. 87), que dá
exemplos sempre com a vogal tônica fechada.
17. Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 19), de igual modo, lhe aconselha a
pronúncia fechada.
18. Para Mário Barreto (BARRETO apud FERNANDES, 1971, p. 461), o
verbo pesar “em geral significa medir o peso de alguma coisa, ou ter
peso; mas, quando se aplica à significação de pesar, dor ou
arrependimento, é impessoal, pronuncia-se o e com som fechado ou
circunflexo (pésa-me a carga, mas pêsa-me muito de ouvir dizer isso a
Vossa Mercê)”.
19. Para Edmundo Dantès Nascimento, “quanto à pronúncia (pêse), está
justificada pela palavra pêsames”, com o acréscimo de que “a
pronúncia com e fechado é anotada na Beira Alta, Douro e
Extremadura (Leite de Vasconcelos) e por nós ouvida em Ouro Preto,
Sabará e a muitas pessoas de S. Paulo, Belo Horizonte e Rio”.
20. E complementa que, “se a pronúncia no sentido de dor moral fosse é
aberto, teríamos pésames, como de acordam temos acórdão”
(NASCIMENTO, 1982, p. 166-7).
21. Ainda quanto à pronúncia, taxativa a lição do Padre José F. Stringari:
“Quando pesar significa examinar o peso por meio de balança ou
avaliar, ponderar alguma coisa, tem o e aberto; quando significa afligir,
causar tristeza, arrependimento, ter remorso, tem o e fechado”.
22. E refere tal gramático ser dessa última pronúncia o vetusto ato de
contrição ensinado nas aulas de catequese: “Pesa-me, Senhor, de vos
ter ofendido…”. (STRINGARI, 1961, p. 18-9)
23. Registre-se, todavia, a observação de Domingos Paschoal Cegalla de
que, “segundo alguns gramáticos, a vogal tônica e de pese(m), nesta
expressão, é fechada, como em pêsames. A verdade é que, em geral, se
pronuncia aberta” (1999, p. 138).
24. E, em outra passagem, continua tal autor argumentando contra a lição
dos gramáticos de que se deve pronunciar pêse em tal expressão, com o
ensino de que parece ser “arbitrária e afetada tal pronúncia”
(CEGALLA, 1999, p. 318).
25. Juntando as observações desses dois aspectos, em síntese que parece
ser a mais adequada de acordo com o entendimento dominante, Eliasar
Rosa (1993, p. 63), por primeiro, esclarece, quanto à fala, que, em tal
expressão, “o correto é pronunciá-la com o e fechado”; ao depois, ele a
considera somente com a preposição – em que pese a – acrescentando
que jamais se usa tal expressão no plural.
26. No que concerne à pronúncia fechada nos casos referidos, talvez até
pelos comuns equívocos que acontecem na vida prática, o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
órgão incumbido oficialmente de determinar a existência dos vocábulos
em nosso idioma, em sua edição de 1999, contrariamente a seu usual
proceder e finalidade, asseverava de modo textual para o verbo pesar:
“como sentir desgosto, o e, se rizotônico, é fechado” (p. 582). Essa
observação não foi repetida nas edições de 2004 e de 2009, que nada
comentam a respeito (VOLP, 2009, p. 644).
Ver Pesar (P. 562).
Em questão – Galicismo?
1. No que concerne ao interesse destas observações, a locução tem o
significado daquilo que se trata, daquilo que se enfoca. Ex.: “Escapou,
única de muitas, a vara em questão” (Laet).
2. Júlio Nogueira (1959, p. 70) lembra a objeção de Epifânio Dias a seu uso
nesse sentido e manda substituir, por exemplo, a expressão crime em
questão por crime de que se trata ou crime em apreço.
3. Ronaldo Caldeira Xavier (1991, p. 89) a insere no rol dos galicismos
sintáticos e também aconselha sua substituição por em apreço, de que se
trata.
4. Vitório Bergo (1943, p. 119), de igual modo, insere-a no rol dos
galicismos de estrutura, daqueles “em que as palavras são portuguesas
mas a sintaxe (especialmente a colocação e a regência) é francesa”; e
manda substituir a expressão em questão por em apreço.
5. Em verdade, muito embora alguns vejam galicismo em seu emprego,
Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 95) defende-a como locução
justificável, trazendo argumentos importantes e o abono de autoridades
da língua portuguesa, como José Joaquim Nunes, Júlio Diniz, João
Ribeiro, Sousa da Silveira, Said Ali e Mário Barreto.
6. Sem outros comentários, também lhe defende a vernaculidade Cândido
Jucá Filho (1963, p. 526).
7. Evanildo Bechara ainda é mais categórico, observando que se tem
“querido evitar a expressão em questão, por se ter inspirado em modo de
falar francês; mas é linguagem hoje comuníssima e corrente nas
principais línguas literárias modernas” (1974, p. 292).
8. O melhor, ante a divergência entre os doutos, parece ser adotar o critério
que amplia as possibilidades de estruturação da frase em português e dar
como possível seu emprego no vernáculo, até mesmo por obediência ao
vetusto princípio de que, na dúvida, deve-se conceder liberdade de
expressão ao usuário.
Em regra – Existe?
Ver Por via de regra, Via de regra ou De regra? (P. 584)
Em sede de – Estrangeirismo?
1. Sede significa assento, cadeira e, por extensão, o centro de governo, de
diocese ou paróquia, o lugar onde funciona um governo ou
administração; diz-se, assim, sede administrativa de um banco, sede das
empresas.
2. Tem sido comum, porém, o emprego da expressão com o sentido de no
âmbito, na esfera de, no campo de, em, como, por exemplo, nas
construções em sede de mandado de segurança, em sede de habeas
corpus.
3. Tal uso, porém, não encontra abono nos autores clássicos nem nos
dicionaristas, configurando violência à sintaxe vernácula, muito embora
venha conseguindo indevida penetração no idioma pelo erudito caminho
das sentenças, dos acórdãos e dos livros de doutrina.
4. Vejam-se algumas correções possíveis para tais casos: a) “No âmbito do
mandado de segurança, não se discute questão dessa ordem”; b) “No
campo do mandado de segurança, não se discute questão dessa ordem”;
c)”Em mandado de segurança, não se discute questão dessa ordem”; d)
“Na esfera do mandado de segurança, não se discute questão dessa
ordem”.
5. Realçando tratar-se de italianismo, “que não se ajusta à índole da nossa
língua”, Geraldo Amaral Arruda (1997, p. 19) coleciona alguns
exemplos de uso equivocado por novéis juízes em sentenças, sobre as
quais longamente se debruçou tal autor para auxílio no aperfeiçoamento
da linguagem, fazendo-se acompanhar tais excertos pela devida
correção: a) “A culpa, em sede penal, precisa…” (poderia ser: “A culpa,
em matéria penal, precisa…”); b) “Na sede inquisitorial o réu disse…”
(poderia ser: “Na fase do inquérito…”); c) “… insuscetíveis de
apreciação em sede de arresto…” (poderia ser: “… insuscetíveis de
apreciação em caso de arresto”, ou “… em matéria de arresto…”).
6. Em anotações pessoais, fotocopiadas e entregues a uma turma de novos
juízes paulistas dos anos noventas, o mesmo desembargador, refutando o
indigitado modo de escrever e expressar-se, refere que, às vezes, “o vício
de linguagem penetra na redação das sentenças pela via erudita, que
violenta a sintaxe vernácula. Exemplo disso é a locução em sede de, cujo
sentido se pode encontrar no Lingarelli, que registra a locução in sede di,
com sentido de durante, no momento em que ocorre qualquer coisa (ex.
in sede di esami, di bilancio, di liquidazione). O dicionário italiano-
português do Porto registra estas expressões e mais ainda in sede storica,
politica, com a tradução do ponto de vista histórico, político”.
7. Em realidade, o erro é tão corriqueiro nos dias de hoje, que, facilmente
encontrável nos textos jurídicos, pode ser exemplificado com excerto de
brilhante processualista moderno, que, ao tratar da questão do acesso à
Justiça, o juntou, em mesma frase, a outro equívoco não menos sério (a
nível), lecionando que a expressão considerada, mais do que um
princípio, “é a síntese de todos os princípios e garantias do processo, seja
a nível constitucional ou infraconstitucional, seja em sede legislativa ou
doutrinária e jurisprudencial”.
8. Erro dessa natureza encontra-se na Resolução 18/2007, do Conselho
Nacional do Ministério Público, a qual, ao regulamentar o art. 9º da Lei
Complementar 75/93 e o art. 80 da Lei 8.625/93, disciplinando, no
âmbito do Ministério Público, o controle externo da atividade policial,
determina, em seu art. 3º, b, que tal controle externo será exercido, “em
sede de controle concentrado, através de membros com atribuições
específicas…”. Corrija-se, apenas no que concerne a tal aspecto: “na
esfera de controle concentrado”, ou “no âmbito de controle
concentrado”, ou, ainda, “quanto ao controle concentrado”.
9. E, mostrando que já não vivemos os tempos de apuro gramatical da
época de Rui Barbosa, que capitaneou batalha de anos com Ernesto
Carneiro Ribeiro pela correção do idioma naquele que veio a ser o
Código Civil de 1916, é de fácil constatação a incidência nesse equívoco
por parte do art. 1.585 da codificação civil de 2003, com reincidência do
mesmo dispositivo, quando alterado pela Lei 13.058/2014: a) “Em sede
de medida cautelar de separação de corpos, aplica-se quanto à guarda
dos filhos as disposições do artigo antecedente” (redação original); b)
“Em sede de medida cautelar de separação de corpos, em sede de
medida cautelar de guarda ou em outra sede de fixação liminar de
guarda, a decisão sobre guarda de filhos…” (redação dada pela Lei
13.058/2014).
Em se tratando de – Estrangeirismo?
1. Ante a acusação de alguns autores de que constitui essa uma sintaxe
alheia ao idioma nacional, para que não paire dúvidas acerca da integral
vernaculidade dessa construção, carreia-se a lição de Carlos Góis, para
quem “a regência do gerúndio pela preposição em não constitui
galicismo, e sim um arcaísmo luso”.
2. Para tal autor, em complementação, “no Brasil esta regência é inusitada
na linguagem familiar, mas de uso no estilo grandíloquo” (GÓIS, 1945,
p. 102).
Em torno ou Entorno?
1. Um leitor pergunta, em síntese, a diferença entre a expressão em torno e
o vocábulo entorno.
2. Ora, o circunlóquio em torno de ou em torno a tem como significado em
volta de, à volta de, em redor de ou à roda de, normalmente iniciando um
adjunto adverbial de lugar. Exs.: a) “Os jogadores permaneciam por
longas horas em torno da mesa, sem aparente cansaço”; b) “Em torno a
vivo incêndio, tudo arde em seus ardores” (Antônio Feliciano de
Castilho).
3. Já o substantivo entorno significa arredor, cercania, circunvizinhança ou
vizinhança. Exs.: a) “Enquanto esperava, ele resolveu passear pelo
entorno”; b) “Foi tombado não só o prédio antigo, mas também todo o
seu entorno”.
É muito
1. No que tange à concordância verbal, “quando o sujeito no plural encerra
ideia de preço, porção, quantidade (vindo neste caso o substantivo
sujeito modificado por adjetivo numeral cardinal ou quantitativo, e
estando o predicativo invariável em número)”, o verbo, “atraído pelo
complemento (predicativo) no singular, passa a concordar com o
complemento, deixando, pois, de concordar com o sujeito” (GÓIS, 1943,
p. 112). Exs.: a) “Seis anos era muito” (Camilo Castelo Branco); b)
“Duas colheradas é suficiente” (Alexandre Herculano).
2. Porque em tais casos não se procede à normal concordância do sujeito
com o verbo, Eduardo Carlos Pereira fala na ocorrência de “casos
autorizados de discordância” (1924, p. 228).
3. O gramático Carlos Góis, em outra passagem, observa, e com
propriedade, que, se “o predicativo se flexionar no plural, impõe neste
caso o plural ao verbo” (1943, p. 112). Exs.: a) “Duas colheradas são
suficientes”; b) “Dois mil reais são bastantes”.
4. Laudelino Freire, que invoca lição de Carlos Góis, também segue em
mesma trilha: “Se… o atributo vem no plural, impõe-se, neste caso, o
plural ao verbo”.
5. E exemplifica ele próprio (FREIRE, 1937b, p. 65): “Duas colheradas
são suficientes”; “Vinte mil contos são rios de dinheiro”; “Dois contos
são bastantes”; “Quatro meses são insuficientes”.
6. Também o mesmo caminho é palmilhado por Vitório Bergo (1943, p.
62), que assim leciona e exemplifica a respeito: “Nas expressões de
quantidade (medida, peso, valor, tempo), se não varia o predicativo,
também não varia o verbo: ‘Cinco mil libras é muito’ (Alexandre
Herculano); ‘Vinte cruzados é dinheiro’ (Camilo Castelo Branco); ‘Três
contos é já uma boa assinatura’ (Machado de Assis).
Ver Discordância verbal (P. 290).
Em vão
Ver Em anexo – Está correto? (P. 302)
Em vez de o
Ver É hora da onça beber água ou É hora de a onça beber água? (P. 296)
Encarregar
1. Mário Barreto leciona que, com tal verbo, tanto a pessoa quanto a coisa
podem ser objetos diretos ou objetos indiretos; não poderão coexistir,
entretanto, em mesma frase, dois objetos diretos ou dois objetos
indiretos.
2. Assim, vejam-se as seguintes construções e a assinalação de sua
correção ou erronia: a) “O magistrado encarregou o escrevente do
cumprimento da determinação” (correto); b) “O magistrado encarregou
ao escrevente o cumprimento da determinação” (correto); c) “O
magistrado encarregou o escrevente o cumprimento da determinação”
(errado); d) “O magistrado encarregou ao escrevente do cumprimento
da determinação” (errado).
3. Acrescenta o referido autor que tal estruturação sintática se repete com
outros verbos, como, por exemplo, impedir (BARRETO, 1954a, p. 271).
4. Essas sintaxes defendidas por Mário Barreto também se encontram nos
exemplos colhidos por Francisco Fernandes (1971, p. 270): a) “Cresça
primeiro, Jeremias, … e então se lhe encarregará uma missão e
comissão de tanta importância” (Padre Antônio Vieira); b) “Meu pai
encarregou-a do governo doméstico” (Alexandre Herculano).
5. Para Celso Pedro Luft, “encarregar algo a alguém é sintaxe antiga,
sobrepujada por encarregar alguém de algo” (1999, p. 238).
6. Nos textos de lei que pesquisou, em minuciosa análise, Adalberto J.
Kaspary (1996, p. 147) encontrou as duas sintaxes: a) “com objeto direto
(sujeito na voz passiva) de pessoa e indireto de coisa, com a preposição
de”, correspondendo ao modelo encarregar alguém de algo; b) “com
objeto direto de coisa (sujeito na voz passiva) e indireto de pessoa, com
a preposição a”, implementando o molde encarregar alguma coisa a
alguém. Exs.: a) “O testador pode encarregar o testamenteiro do
cumprimento dos legados e dos demais encargos da herança, quando
este seja cabeça de casal e não haja lugar a inventário obrigatório” (CC
português, art. 2.327º); b) “… salvo havendo estipulação diversa no
contrato, ou querendo os sócios, a aprazimento comum ou por
pluralidade de votos em caso de discórdia, encarregar a liquidação a
algum dos outros sócios não gerentes, ou a pessoa de fora da sociedade”
(CCom, art. 344). Atente-se ao fato de que, no último exemplo, o
primeiro a (a liquidação) é artigo, e o segundo (a algum) é preposição,
ocorrendo primeiramente o objeto direto e, depois, o indireto.
7. Para sintetizar, nos dias de hoje, as duas sintaxes são costumeiramente
encontradas nos textos que devam submeter-se à norma culta, e ambas
são igualmente defensáveis e vernáculas.
Encerrada a audiência
Ver Abstração feita a e Abstração feita de (P. 59).
Ênclise
1. Aspecto particular do estudo da colocação dos pronomes, a ênclise
abrange as hipóteses em que o pronome pessoal oblíquo átono deve vir
depois do verbo.
2. É a regra geral para a colocação dos pronomes, que é obrigatória, se o
período se inicia por verbo. Ex.: “Ateve-se o relator do acórdão à estrita
análise dos argumentos expostos pelo apelante”.
3. É errônea qualquer construção que inicie a frase por um pronome dessa
natureza: “Se ateve o relator à estrita análise dos argumentos expostos
pelo apelante.”
4. Em considerações teóricas sobre o assunto, lembra Carlos Góis, por um
lado, que “o francês, o espanhol e o italiano admitem o pronome pessoal
oblíquo átono no rosto do período; não o admite o português,
constituindo esse fato um de seus mais belos idiotismos” (lembre-se
sempre que idiotismo é peculiaridade, e não idiotice).
5. E continua tal autor com o lembrete de que (GÓIS, 1945, p. 109-10),
“por analogia, e como extensão deste caso, alguns autores puristas
evitam iniciar a oração pelo pronome pessoal oblíquo átono (ainda que
esta oração não seja a primeira do período), sobretudo quando antes dela
se faz sentir uma pausa ressalvada por vírgula, ou outro sinal”. Exs.: a)
“As portas da casa do capítulo estavam abertas: via-se dentro dela…”
(Alexandre Herculano); b) “Voltando sobre ele o boi enraivecido,
arremessou-o aos ares, esperou-lhes a queda nas armas…” (Rebelo da
Silva); c) “Aperfeiçoavam-se as aspas, cravavam-se os pregos,
aparafusavam-se as roscas” (Camilo Castelo Branco).
6. Em outra passagem, refere o mesmo autor que constitui um “barbarismo
de construção” iniciar o período por variação pronominal átona (GÓIS,
1945, p. 86).
7. Fixe-se, de igual modo, a regra de que também não se usa o pronome
átono logo após sinal de pontuação, ainda que antes deste haja palavra
atrativa (casos de próclise). Exs.: a) “Ali o encontrei” (correto); b) “Ali,
encontrei-o” (correto); c) “Ali, o encontrei” (errado); d) “Ali encontrei-
o” (errado).
8. Nesse aspecto, dupla é a lição de Carlos Góis (1945, p. 112): a) Quando
houver uma vírgula, indicadora de uma pausa, mesmo com a
antecedência de palavra atrativa, usa-se a ênclise, até porque “a pausa
faz cessar a atração”. Ex.: “Aqui, canta-se; ali, dança-se; acolá, bebe-
se”; b) “Sem a vírgula (ou pausa) será de rigor próclise”. Ex.: “Aqui se
canta, ali se dança, acolá se bebe”.
9. Oportuno, em continuação, é lembrar, com Luiz Antônio Sacconi (1979,
p. 231), que não exigem próclise, por não serem palavras atrativas, as
conjunções e, mas, porém, todavia, contudo, logo e portanto.
Ver também Atração pronominal remota (P. 144), Mesóclise (P. 471),
Próclise (P. 603), Próclise ou Ênclise? (P. 604) e Pronomes e Locuções
verbais (P. 617).
Ênclise e hífen
Ver Hífen e ênclise (P. 390).
É necessário
Ver Infinitivo como sujeito – Como concordar? (P. 414) e É proibido –
Como concordar? (P. 325)
E nem
1. Tais palavras só podem vir juntas em sequência, quando o e for
conjunção e o nem for advérbio, exercendo cada uma, assim, sua própria
função morfológica. Ex.: “O ordenamento jurídico busca a realização
da justiça e nem sempre consegue”.
2. Como conjunção, todavia, nem já significa e não, razão pela qual não se
lhe pode antepor e.
3. Em tais casos, ou se diz nem, ou se diz e não; mas não se pode dizer e
nem. Exs.: a) “O advogado não apresentou contestação, nem
apresentará” (correto); b) “O advogado não apresentou contestação e
não apresentará” (correto); c) “O advogado não apresentou contestação
e nem apresentará” (errado).
4. Acresça-se a lição de Eduardo Carlos Pereira, para quem “é arcaico e
plebeu o emprego conjunto…, o uso pleonástico de duas conjunções
como … e nem, o qual vai sendo evitado pelos escritores modernos”
(1924, p. 365-8).
5. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 140), em mesma esteira, confirma
três significativos aspectos: a) “A conjunção nem significa e não. Por
isso, é incorreto antepor-lhe a conjunção e em frases como as seguintes,
nas quais nem tem significado aditivo-negativo, equivalente de e também
não: ‘Não vi nem conheço este homem’. ‘Ele nunca viajava de navio
nem de avião’”; b) “O conjunto aditivo e nem só é cabível quando
equivale a mas não, e também nas expressões e nem sequer, e nem por
isso, e nem assim, e nem sempre”; c) Por fim, “bons escritores,
contrariando a norma exposta no item a, empregam e nem”, tentando
justificar tal gramático os referidos cochilos com a possibilidade de e
nem “ser mais enfático do que o simples nem”. Exs.: i) “Não queremos e
nem podemos entrar no exame de tamanha complexidade” (João
Ribeiro); ii) “Nunca se lembra do que lhe sucedeu na véspera e nem faz
planos para o amanhã” (Aníbal Machado).
6. Por fim, assim é a síntese de Luiz A. P. Vitória (1969, p. 171): a)
“ensinam os gramáticos que é erro empregar nem precedido de e”; b)
está errado, assim, o exemplo: “Não vem e nem me avisa”, que deve ser
corrigido: “Não vem nem me avisa”, ou “Não vem e não me avisa”; c)
Excepcione-se, contudo, que se pode dizer: “Não vem e nem sequer me
avisou”.
Ver Bem como (P. 158).
Ênfase – Um ou uma?
1. Uma leitora afirma ter ouvido, com certa frequência, frases como “Ele
deu um ênfase especial àquele aspecto”. Como lhe parece errada essa
forma, indaga qual a correta: um ênfase ou uma ênfase?
2. Ora, sempre é bom lembrar – até para criar no leitor o salutar hábito de
um raciocínio que se repete – que, quando se quer saber se uma palavra
existe ou não em português, ou mesmo qual é seu gênero, grafia e/ou
pronúncia, ou qual o seu plural quando foge à normalidade, deve-se
tomar por premissa o fato de que a autoridade para listar oficialmente os
vocábulos pertencentes ao nosso idioma e para definir-lhes as demais
peculiaridades e circunstâncias, é a Academia Brasileira de Letras.
3. E essa autoridade, a ABL a exerce por via da edição do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa.
4. Uma simples consulta ao VOLP (2009, 315) mostra que ênfase é palavra
pertencente ao gênero feminino (uma ênfase, e não um ênfase).
5. Em reposta ao leitor, confiram-se os seguintes exemplos, com a
indicação de sua correção ou erronia entre parênteses: a) “Ele deu um
ênfase todo especial àquele aspecto” (errado); b) “Ele deu uma ênfase
toda especial àquele aspecto” (correto).
Engenheirando – Existe?
Ver Alimentando – Existe? (P. 105)
Enjôo ou Enjoo?
1. Um leitor pergunta se houve alteração de grafia no seguinte vocábulo,
com a recente reforma ortográfica: enjôo ou enjoo?
2. Antes das recentes regras que alteraram nossa ortografia, os verbos
terminados em oar (como abençoar, abotoar, arrazoar, coroar, enjoar,
leiloar, voar…), na primeira pessoa do singular do presente do
indicativo, eram escritos com oo, e a primeira de tais vogais recebia um
acento circunflexo: abençôo, abotôo, arrazôo, corôo, enjôo, leilôo, vôo.
3. O Acordo Ortográfico, porém, alterou essa regra e determinou que “não
se emprega o acento circunflexo nas paroxítonas terminadas em oo”.
4. Desse modo, as formas corretas passaram a ser abençoo, abotoo,
arrazoo, coroo, enjoo, leiloo, voo.
Enquanto
1. Num primeiro aspecto, significa durante o tempo que, no tempo em que,
quando. Ex.: “Enquanto seguia a audiência, o advogado distraía-se,
olhando o horizonte”.
2. Num segundo aspecto, tem o sentido de ao passo que, podendo-se usar
com o sentido adversativo, de contrariedade. Ex.: “O advogado perdia
os olhos no horizonte, enquanto os demais atentavam ao que ocorria na
audiência”.
3. Josué Machado se posta de modo veemente contra o emprego de tal
vocábulo no sentido de considerado como ou sob o aspecto de.
4. E o fato de que o dicionário de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira
acata a mencionada palavra nesse sentido não comove tal autor, o qual
observa que, se o referido uso “viesse suprir alguma deficiência de
expressão, a descoberta seria ótima. Mas não. Essa história de enquanto
presidente, enquanto mulata, enquanto anta, enquanto ladrão significa
que se divide a pessoa em fatias para avaliar cada fatia em separado.
Serão acaso mortadelas?” (MACHADO, 1994, p. 46-7).
5. Arnaldo Niskier (1992, p. 32), todavia, mostra aceitar, ainda que não
totalmente, tal construção, dando, com relação ao exemplo “Eu,
enquanto tradutor…”, prudente conselho: “Tal construção, embora
abonada pelo Aurélio e por diversos gramáticos, tornou-se um modismo;
convém, portanto, evitar seu uso excessivo”.
6. Para resumir a questão, o certo é que, embora muitos queiram ver erro
em seu emprego na significação de como, de considerado como, de sob
o aspecto de, seu uso é abonado por autores de vernaculidade insuspeita,
como atesta o seguinte exemplo de Rui Barbosa: “Enquanto homem de
partido, pois, há de ser julgado”.
Ver Enquanto a mim ou Quanto a mim? (P. 319) e Enquanto que –
Galicismo? (P. 320)
Ensinar
1. Fundado em lição de Epifânio Dias, lembra Mário Barreto (1954b, p. 83)
que esse verbo pertence ao número daqueles que têm duas construções.
Exs.: a) “Ensinei-o a ler”; b) “Ensinei-lhe a leitura”.
2. Como se vê dos próprios exemplos, tanto aquilo que vai ser ensinado
como a pessoa a quem se vai ensinar podem ser objetos diretos ou
objetos indiretos, enquanto o outro complemento há de ser,
respectivamente, objeto indireto ou objeto direto. Exs.: a) “Mande
ensinar-lhe Medicina” (Machado de Assis); b) “O empenho de ensinar
os juízes a interpretar as leis” (Rui Barbosa).
3. Muito embora nesse campo vigore a proibição gramatical genérica da
concomitância de existência de dois objetos diretos ou de dois objetos
indiretos em mesma oração (como, por exemplo, seriam ensinei-o ler e
ensinei-lhe a ler), Francisco Fernandes (1971, p. 288), repercutindo o
que comumente vem ensinado pelos gramáticos e abonando-se com
autores insuspeitos, transcreve, em acréscimo, lição de Stringari:
“Quando a coisa ensinada é expressa por infinito regido da preposição a,
o nome da criatura, a quem se ensina, pôr-se-á, indiferentemente, no
dativo” (vale dizer, poderá ser objeto indireto) “ou no acusativo” (isto é,
poderá ser objeto direto). Exs.: a) “Esparta ensinava ao adolescente a
morrer pela glória” (Latino Coelho); b) “Ela mesma lhe ensinou a ler
mal, como ela sabia – e a coser e bordar” (Machado de Assis); c) “O
Espírito Santo o ensinava a recrear os outros religiosos” (Padre Manuel
Bernardes); d) “Ensinou o primeiro rei português a ser honrado”
(Camilo Castelo Branco).
4. Domingos Paschoal Cegalla sintetiza assim as três possibilidades
genéricas de sintaxe com esse verbo: a) ensinar algo a alguém; b) ensinar
alguém a fazer algo; c) ensinar a alguém a fazer algo.
5. Adverte, contudo, tal autor: “A construção c é abonada por bons
escritores. Todavia, deve-se dar preferência às duas primeiras”
(CEGALLA, 1999, p. 141).
Entrar
1. João Ribeiro lembra que Camões empregou tal verbo com construção
transitiva direta: “Primeiro entrando as portas da cidade”. (1923, p.
184)
2. Também Sousa e Silva (1958, p. 114) é do entendimento de que, no
sentido de transpor é transitivo direto e, na acepção de introduzir-se,
pode vir acompanhado de em ou de a. Exs.: a) “O navio entrou a barra”;
b) “Entramos no salão”; c) “Entramos ao salão”.
3. Carlos Góis e Herbert Palhano (1963, p. 187) ressaltam a possibilidade
de construí-lo tanto diretamente, isto é, sem preposição alguma (hipótese
em que lhe dão o sentido de invadir), como com a preposição em (caso
em que lhe conferem o significado de penetrar). Exs.: a) “O inimigo
entrou a cidade” (invadiu a cidade); b) “O inimigo entrou na cidade”
(penetrou na cidade).
4. Na síntese de Artur de Almeida Torres (1967, p. 129), por um lado, tal
verbo, “na acepção de passar para dentro, introduzir-se, penetrar,
constrói-se indiferentemente como transitivo direto (que se justifica pela
analogia com os verbos penetrar ou invadir, que lhe são sinônimos) ou
com as preposições em ou a: ‘Entrar o quarto’, ‘Entrar no quarto’ ou
‘Entrar ao quarto’”; por outro lado, esclarece que “a segunda regência é
muito comum; as outras duas estão circunscritas à linguagem literária,
sobretudo lusitana”.
5. Em Machado de Assis, também se vê a sintaxe entrar para: “Pensei em
dizer-lhe que ia entrar para o seminário”.
6. Dessa última construção também é exemplo o art. 1.377 do Código Civil
de 1916: “Se o sócio entrar para a sociedade com objeto determinado,
que venha a ser evicto, responderá aos consócios como o vendedor ao
comprador”.
7. Sem restrição alguma a qualquer das regências, parecendo ser a lição
que se deva seguir ainda na atualidade, Francisco Fernandes (1971, p.
292) traz abono de abalizados autores para todas as referidas
construções, acrescentando, ainda, a possibilidade de sintaxe com a
preposição por: a) “Entramos a porta da antiga cidadela” (Garrett); b)
“Entrar em casa” (João Ribeiro); c) “Estava pronto quando me entrou
por casa” (Machado de Assis); d) “Raiava a aurora quando entrou à
igreja” (Camilo Castelo Branco); e) “Às três horas da noite Vasconcelos
entrava para casa com a tranquilidade e regularidade do costume”
(Machado de Assis).
Entre-safra ou Entressafra?
1. Um leitor revela que, com a chegada das novas regras de ortografia, tem
dificuldades para empregar entre como prefixo: entre-safra ou
entressafra?
2. Ora, entre é um prefixo latino que traz a ideia de intervalo, de algo que
se põe de permeio, como em entreato ou entreligar.
3. Pelas regras trazidas pelo Acordo Ortográfico de 2008, apenas em dois
casos tal prefixo se une por hífen ao elemento que o segue: a) quando o
segundo elemento começa com a mesma vogal com que se encerra o
prefixo: entre-eixo, entre-escolher, entre-escutar; b) quando o segundo
elemento começa com h: entre-hostil.
4. Desse modo, acopla-se diretamente à palavra seguinte, sem
intermediação de hífen, quando iniciada esta por outra vogal, que não a
que encerra o prefixo: entreaberto, entreato, entreilha, entreunir.
5. Continua valendo a regra de junção direta, mesmo que o elemento
seguinte se inicie por consoante: entrebanho, entrecena, entredizer,
entrefala, entrejunta, entreligar, entrepasso, entreposto.
6. Apenas para a hipótese de ser o segundo elemento iniciado por r ou s,
dobram-se tais consoantes para continuidade do som originário:
entrerrealizado, entrerreclamar, entressafra, entresseio.
Entretanto
Ver No entretanto – Está correto? (P. 496)
Entreter-se
Ver Ter (P. 730).
E/ou
1. Às vezes se encontram exemplos como: “O concurso exigia
conhecimentos de Direito Civil e/ou Direito Penal”, em que se abre,
concomitantemente, tanto a possibilidade de soma dos elementos, como
a de sua alternância. E se fica na dúvida sobre a possibilidade de seu
emprego.
2. Vale, a respeito, a lição de Arnaldo Niskier: “A rigor, este recurso não
faz parte do repertório da língua portuguesa. Modernamente, porém, tem
sido muito usado para expressar a possibilidade de os elementos serem
tomados em conjunto ou separadamente. É conveniente, no entanto,
evitar o abuso desse recurso e, quando usá-lo, certificar-se de que está
sendo bem usado, isto é, que tanto a ideia de adição quanto a de
alternância (e não apenas uma delas) estão presentes” (1992, p. 111).
3. É claro que o exemplo aqui inicialmente dado tem por função expressar
exatamente a dupla possibilidade em mesmo contexto: a) de serem
tomados os elementos em conjunto; b) de serem tomados os elementos
separadamente.
4. Se, todavia, o intento for marcar ou a soma ou a exclusão, então se há de
dizer com clareza uma só das conjunções, exatamente com o sentido que
se quer conferir ao caso concreto: a) “O concurso exigia conhecimento
de Direito Civil e de Direito Penal” (a exigência é dupla e
concomitante); b) “O concurso exigia conhecimento de Direito Civil ou
de Direito Penal” (a exigência é alternativa e excludente).
5. Encontram-se exemplos de emprego da referida expressão em
dispositivos de lei: a) A Política Nacional do Meio Ambiente se destina
“à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar
e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela
utilização de recursos ambientais com fins econômicos” (Lei 6.938, de
31/8/91, art. 4º, VII); b) Constitui crime de prevaricação “deixar o
Diretor de Penitenciária e/ou agente público, de cumprir seu dever de
vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico, de rádio ou similar, que
permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo”
(CP, art. 319-A).
É ou São?
1. Um leitor indaga qual das construções a seguir é correta quanto à
concordância do verbo ser: a) “Essas testemunhas é o time do processo
cível”; b) “Essas testemunhas são o time do processo cível”.
2. Ora, a mais básica regra de concordância verbal diz que o verbo
concorda com o seu sujeito em número e pessoa. Exs.: a) “Eu vou ao
cinema” (singular e primeira pessoa); b)”Eles vão ao cinema” (plural e
terceira pessoa).
3. Com o verbo ser, entretanto, o que há de mais comum é sua tendência
para concordar com o termo que estiver no plural (seja sujeito, seja
predicativo), como comprovam os seguintes exemplos, ambos corretos.
Exs.: a) “O problema eram os meus projetos” (verbo no plural
concordando com o predicativo); b) “Os problemas eram o meu projeto”
(verbo no plural concordando com o sujeito).
4. Embora essa seja a tendência mais comum do verbo ser nessa situação,
vejam-se, entretanto, em seguida, exemplos de autores de peso que as
contrariam: a) “Os responsórios e os sinos é coisa importuna em Tibães”
(Camilo Castelo Branco); b) “Vestidos e modas é assunto para
mulheres” (Domingos Paschoal Cegalla).
5. Atentando, de modo específico, aos exemplos trazidos pelo leitor para
análise – a) “Essas testemunhas é o time do processo cível”; b) “Essas
testemunhas são o time do processo cível” – podem-se fazer as seguintes
afirmações: i) a regra geral de concordância é que o verbo concorda com
o seu sujeito em número e pessoa; ii) com o verbo ser, todavia, a
tendência mais comum é que ele concorde não necessariamente com o
sujeito, mas com o termo que estiver no plural; iii) por essa razão, pode-
se afirmar que o segundo exemplo trazido pelo leitor está em perfeita
sintonia com essa corrente; iv) como isso é uma tendência, e não uma
regra inflexível, também não é incomum que autores abalizados façam a
concordância de acordo com a regra geral, isto é, com o sujeito, ou
mesmo com o predicativo no singular, embora o sujeito esteja no plural;
v) com base nessa última observação, também se pode afirmar a
correção do primeiro de tais exemplos.
Epiceno
1. Também chamado de promíscuo por Eduardo Carlos Pereira (1924, p.
67), consiste no substantivo designativo de nomes de animais, que se
apresentam num só gênero gramatical para designar seres dos dois sexos,
sem alteração formal alguma, nem mesmo do artigo.
2. Para não confundi-lo com os sobrecomuns, interessante é atentar à
síntese de Luiz Antônio Sacconi: “os sobrecomuns e os epicenos têm
uma só forma e gênero para ambos os sexos, mas os sobrecomuns se
referem a pessoas; os epicenos, a animais e a insetos inferiores” (1979,
p. 33).
3. A discriminação dos sexos faz-se pelo acréscimo dos adjetivos macho e
fêmeo. Exs.: cobra macha, cobra fêmea, jacaré macho, jacaré fêmeo.
4. Júlio Nogueira, no plano histórico, após referir que, do latim ao
português, conforme a terminação, os nomes de animais se direcionaram
preponderantemente para o masculino, enquanto um pequeno número foi
para o feminino, assim completa seu relato: “O latim indicava os outros
nomes de animais ora pelo masculino, ora pelo feminino. Não os havia
neutros. Assim, corvus, piscis são masculinos, ao passo que vulpes,
aquila são femininos. Da mesma forma no português: tigre, jacaré etc.,
são masculinos, ao passo que cobra, serpente, abelha são femininos.
Quando havia necessidade de definir o sexo, o latim juntava ao
substantivo as palavras mas (macho) ou masculus (diminutivo de mas) e
femina (mulher). O português, igualmente, aplica os adjetivos macho e
fêmea a nomes de animais, no mesmo caso: a raposa macho, a raposa
fêmea” (1930, p. 140).
5. Carlos Góis e Herbert Palhano assim resumem a questão sobre o
conceito e o regramento do epiceno: “É o que apresenta a mesma forma
para ambos os gêneros, sendo que a distinção entre o masculino e o
feminino é feita pelas palavras macho e fêmea” (1963, p. 47).
6. Também oportuno é o ensino de José de Nicola e Ernani Terra (2000, p.
98): “é o substantivo que apresenta um único gênero para designar
animais ou vegetais de ambos os sexos: baleia, por exemplo, é um
substantivo feminino, quer se refira ao macho, quer à fêmea. O mesmo
ocorre com cobra, onça, borboleta, pulga, palmeira. Tubarão é um
substantivo masculino, quer se refira à fêmea, quer ao macho. O mesmo
ocorre com jacaré. Para se distinguir o sexo do animal, usam-se as
palavras macho e fêmea: o tubarão macho, o tubarão fêmea, a baleia
macho, a baleia fêmea”.
7. Não confundir com comum de dois ou comum de dois gêneros, em que a
forma do substantivo designativo de pessoas é a mesma, mas se altera o
artigo (o pianista, a pianista).
8. Também se reitere a distinção do sobrecomum, que é substantivo de um
só gênero, referindo-se a seres de ambos os sexos, sem distinção por
artigo ou por acréscimo de adjetivo (a criança, o indivíduo).
Para análise da flexão do adjetivo que especifica o gênero em tais
casos, ver Fêmeo – Existe? (P. 354)
É pouco
Ver É muito (P. 316).
É preciso
Ver É proibido – Como concordar? (P. 325)
É que
1. Caldas Aulete leciona que tal locução seria “uma espécie de advérbio,
que tem por fim particularizar e dar realce e força a uma afirmação”.
2. Carlos Góis, que cita a lição do dicionarista, anota, por sua vez, que se
trata de “um idiotismo de nossa língua” (1943, p. 93).
3. Para efeito de concordância verbal, considera-se como se não existisse
tal expressão na frase. Exs.: a) “Eu é que vou à audiência”; b) “Nós é
que vamos à audiência”.
Ver Concordância verbal (P. 212).
Era chegado
Ver Ser nascido – Está correto? (P. 694)
Eram passados
Ver Ser nascido – Está correto? (P. 694)
Erigir
1. Em sua conjugação verbal, apresenta problemas de ortografia.
2. Em verdade, diferentemente dos verbos cujo radical termina em j –
consoante essa que tem o mesmo som antes de todas as vogais (viajo,
viajas, viajemos, viajeis, viajem) – os verbos terminados em gir, para
continuidade do som da consoante final do radical, precisam da
representação gráfica j antes de a ou de o. Assim: erijo, eriges, erigimos,
erijam.
3. Esses problemas apenas ocorrem no presente do indicativo e seus
tempos derivados: erijo, eriges, erige, erigimos, erigis, erigem (presente
do indicativo); erija, erijas, erija, erijamos, erijais, erijam (presente do
subjuntivo), erige, erija, erijamos, erigi, erijam (imperativo afirmativo);
não erijas, não erija, não erijamos, não erijais, não erijam (imperativo
negativo).
4. Como esses problemas ocorrem apenas no presente do indicativo e
tempos derivados, não apresenta o verbo erigir problema algum de
flexão nos demais tempos: erigia (pretérito imperfeito do indicativo),
erigirei (futuro do presente), erigiria (futuro do pretérito), erigindo
(gerúndio), erigido (particípio), erigi (pretérito perfeito do indicativo),
erigira (pretérito mais-que-perfeito do indicativo), erigir (futuro do
subjuntivo), erigisse (imperfeito do subjuntivo).
5. Seguem as mesmas observações diversos outros verbos: coligir, exigir,
impingir, infligir, infringir, insurgir-se, transigir.
Ver Erigir-se em – Está correto? (P. 328)
Escola-modelo
Ver Substantivos compostos – Como levar ao plural? (P. 717)
Esculpido e encarnado
Ver Cuspido e escarrado – Está correto? (P. 244)
Esculpir ou Insculpir?
1. Qual a forma correta entre os seguintes exemplos, quanto ao sentido
figurado dos verbos esculpir e insculpir: a) “Como está esculpido em
nossa Constituição.”; b) “Como está insculpido em nossa Constituição?”
2. Veja-se, por primeiro, que tanto o esculpir como insculpir são verbos que
se encontram registrados no Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras (2009, p. 335 e
460).
3. Ante tal fato, porque a ABL tem a delegação legal para listar no VOLP
os vocábulos que existem oficialmente em nosso idioma, não pode haver
dúvida acerca da existência oficial de ambas as palavras em nosso
léxico, de modo que a solução do problema se faz por uma consulta ao
dicionário, para verificação de seu real sentido.
4. Os dicionaristas dão a mesma origem a ambos os verbos e lhes conferem
o mesmo sentido figurado de gravar, de inscrever. Exs.: a) “A vida de
sofrimentos esculpiu um ar de derrota em seu rosto”; b) “Insculpiu-se
um herói na estima do seu povo” (HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 1.212 e
1.623).
5. Ante tais ponderações, pode-se dizer que estão corretos, e ambos com o
mesmo sentido, os seguintes exemplos: a) “Como está esculpido em
nossa Constituição”; b) “Como está insculpido em nossa Constituição”.
Escusável ou excusável?
1. Uma leitora, ante o que consta do art. 172, II, do Código Tributário
Nacional, indaga qual a forma correta: escusável ou excusável?
2. Ora, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, que é a obra pela
qual a Academia Brasileira de Letras exerce sua função de listar as
palavras que integram oficialmente nosso léxico, registra escusável, que
tem por sinônima desculpável ou perdoável, mas não excusável (2009, p.
335).
3. E, como a palavra da ABL por via do VOLP é a autoridade oficial nesse
campo, a forçosa conclusão, assim, é que excusável não existe em nosso
idioma. A mesma lição vale para outros vocábulos oriundos do mesmo
radical: existem escusa, escusado e escusar, mas não excusa, excusado e
excusar.
4. Quanto a seu emprego, é de se dizer que o verbo escusar é de frequente
uso em dispositivos de nossas leis, mas não o adjetivo escusável, que
não foi encontrado em nossas principais codificações.
5. A única vez, aliás, em que foi encontrado, o adjetivo veio com erro de
grafia: CTN – Art. 172. “A lei pode autorizar a autoridade
administrativa a conceder, por despacho fundamentado, remissão total
ou parcial do crédito tributário, atendendo: … II – ao erro ou
ignorância excusáveis do sujeito passivo, quanto a matéria de fato…”
Corrija-se: escusáveis.
6. A equivocada tendência de nosso idioma ao erro, no caso, tanto para o
adjetivo como para as outras palavras oriundas de mesmo radical, bem
possivelmente se deva ao uso corriqueiro do inglês (excuse me = com
licença ou perdoe-me) e do francês (excusez-moi = perdoe-me), idiomas
esses em que tais vocábulos se escrevem com x.
Esmero
1. Com a mesma grafia, há o substantivo, que significa apuro, zelo,
cuidado, diligência, e há o verbo esmero (de esmerar-se), na primeira
pessoa do singular do presente do indicativo, com o sentido de apurar-se,
cuidar-se.
2. Ambas são palavras de mesma grafia (homógrafas), mas com pronúncia
diversa (heterófonas).
3. Apresentando-se, assim, um problema de ortoepia, é de se dizer,
conforme lição de Aires da Mata Machado Filho (1969g, p. 1.787), que
o verbo (eu me esmero) tem o som aberto (é), ao passo que o substantivo
(contrariamente ao uso frequente nos meios forenses) tem som fechado
(ê) tanto no singular (o esmero) quanto no plural (os esmeros).
4. Atento aos frequentes equívocos que ocorrem com respeito a esse
vocábulo, observa Domingos Paschoal Cegalla que o substantivo se
pronuncia esmêro, já que, “com o e tônico aberto, é forma do verbo
esmerar-se” (1999, p. 148).
5. Cândido de Oliveira (1961, p. 34) também lembra que a pronúncia da
vogal tônica do substantivo é fechada (ê).
6. Espancando toda e qualquer dúvida, o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras (2009, p. 338), que
é o veículo oficial indicador das palavras existentes em nosso idioma,
bem como sua grafia e sua pronúncia, manda que se pronuncie o e do
substantivo com timbre fechado (ê).
Espanholismo
1. O nome genérico para o vício de linguagem consistente em usar
vocábulos, expressões e construções alheias ao idioma é barbarismo.
2. Quando a invasão de palavras provém do espanhol, dá-se ao vício o
nome de espanholismo.
3. Esclareça-se que quando regular e oficialmente recebida a palavra nova
de outro idioma pelo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa,
editado pela Academia Brasileira de Letras, diz-se estar diante de um
neologismo.
Esperto ou Experto?
1. Esperto tem o significado de desperto, sagaz, vivo. Ex.: “Os litigantes
hão de estar espertos para a fiscalização dos atos processuais”.
2. Já experto é adjetivo com o sentido de exercitado, experiente, perito,
prático, versado. Exs.: a) “Eram advogados expertos na lida dos
processos”; b) “Perdoa, meu rico prelado, perdoa-me esses descuidos da
pena, tão pouco experta em matérias eclesiásticas” (Machado de Assis).
3. Como se vê pelo último exemplo, como adjetivo, experto pede
complemento regido pela preposição em, lição essa também registrada
por Francisco Fernandes (1969, p. 186), ao citar exemplo de Rui
Barbosa: “Qual seria o desfecho, perguntam os expertos nestes
assuntos”.
4. Com frequência e corretamente, também tem sido utilizado esse
vocábulo, nos meios forenses, como substantivo, para indicar o perito
nomeado pelo juízo para algum trabalho previsto pela legislação
processual. Ex.: “No prazo determinado pelo juiz, o experto apresentou
seu laudo pericial”.
5. Não se trata de palavra nova nessa acepção, porquanto já a empregava o
próprio Camões, em seu Os Lusíadas: “Que, posto que em cientes muito
cabe, / Mais em particular o experto sabe”.
6. Atento às dificuldades que normalmente ocorrem com a diferenciação
entre as duas palavras, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa,
da Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de
determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma, contrariamente
a seu usual proceder de não dar o sentido das palavras, acaba por fazer
ele próprio a distinção, explicitando que esperto quer dizer acordado,
enquanto experto tem a acepção de versado, perito (2009, p. 341 e 358).
Ver Peritagem – Está correto? (P. 561)
Espontâneo ou Expontâneo?
1. Espontâneo é adjetivo que significa voluntário, de livre vontade. Ex.: “O
homem, em comparecimento espontâneo, confessou o crime”.
2. Cuidado, porque é errônea a forma expontâneo.
Esponte própria
1. Existe em latim o substantivo desusado spons, que significa desejo,
vontade, cujo ablativo sponte significa por vontade ou por desígnio.
2. É frequente o emprego de tal palavra em expressões como sponte sua e
sponte propria, que se traduzem como por sua vontade e por própria
iniciativa. Exs.: a) “O funcionário subalterno agiu, no episódio, sponte
sua”; b) “O funcionário subalterno agiu, no episódio, sponte propria”.
3. Quanto ao emprego da expressão esponte própria, já aportuguesada,
porém, é importante observar que o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa não a registra como palavra de nosso idioma, o que significa
que não estamos autorizados a empregá-la na linguagem formal das
petições, arrazoados e pareceres.
4. É importante anotar que o VOLP é uma espécie de dicionário que lista as
palavras reconhecidas oficialmente como pertencentes ao nosso idioma e
lhes fornece a grafia oficial, muito embora não lhes dê, por via de regra,
o significado.
5. É elaborado pela Academia Brasileira de Letras, que tem a
responsabilidade legal de editá-lo, em cumprimento à velha Lei Eduardo
Ramos, de n. 726, de 8/12/1900.
6. Ante incumbência advinda de lei específica, o VOLP goza de autoridade
para, nesse campo, dizer o direito, motivo por que, ao consultá-lo, legem
habemus e devemos prestar-lhe obediência, como devemos fazer com
respeito aos demais diplomas legais.
7. Assim, sendo o VOLP a palavra oficial sobre a existência e a ortografia
das palavras da língua portuguesa no Brasil, a ausência da palavra
esponte em seu rol significa que o referido vocábulo simplesmente não
existe em nosso idioma.
8. Por essa razão, não se autoriza o emprego da expressão esponte própria
em português, de modo que deve ser substituída por expressão
vernácula, como por própria vontade, ou então por expressão latina –
sponte propria – a qual, como todo vocábulo de idioma estrangeiro por
nós empregado, deve vir ou em negrito, ou em itálico, ou entre aspas, ou
com sublinha.
Esposo ou Marido?
1. Se se atentar ao princípio de que a linguagem do Direito é técnica e
científica e de que cada termo, na ciência jurídica, tem seu próprio
significado, uma atenta leitura do Código Civil evidenciará que ali se diz
com simplicidade: pai, mãe, mulher, militar, e não genitor, progenitora,
esposa, miliciano.
2. E, se o Código Civil fala em marido e mulher, desde logo se vê que
desnecessário é o emprego de esposo, esposa, senhora ou dama.
3. Ampliando a lição, se a lei, por exemplo, ao tratar da variação do valor
pago a título de alimentos, fala em “majoração do encargo” (CC, art.
1.699), despiciendo há de ser o emprego de exacerbação de verba; se a
lei já cunhou a expressão despacho, saneador, conferindo-lhe conotação
privativa do Direito Processual, não se há de inovar, em estranha
sinonímia, com despacho alimpador.
4. Em verdade, é inconveniente, na linguagem jurídica, substituir termos e
locuções por sinônimos, ainda que a pretexto de evitar repetições, e isso
sob pena de correr o risco da impropriedade de expressão e de se
descambar para o pernosticismo.
5. A esse respeito, Edmundo Dantès Nascimento, após asseverar que “a
busca de termos sinônimos, muita vez com preciosismo, macula a
simplicidade da lei”, dá lição que merece incessante obediência:
“Busquemos a elegância e riqueza verbal nos argumentos das razões e
nos fundamentos da sentença” (1982, p. 225-6).
6. Em outro aspecto, fazem José de Nicola e Ernani Terra (2000, p. 28)
oportuna observação de que o vocábulo esposo “no plural mantém o
timbre fechado” (espôsos), de modo que “não ocorre metafonia nessa
palavra”.
Ver Adjetivação desnecessária (P. 80) e Petição inicial (P. 563).
Esse ou Este?
Ver Pronome demonstrativo (P. 611).
Estabelecer
1. Na lição de Eliasar Rosa (1993, p. 95), tal verbo, que inclui entre os de
quietação, exige a preposição em, e não a preposição a. Exs.: a) “A
empresa estabeleceu-se na rua principal da cidade” (correto); b) “A
empresa estabeleceu-se à rua principal da cidade” (errado).
2. Esse também é o ensino de Francisco Fernandes (1971, p. 322), que se
vale de exemplos de dicionaristas insuspeitos: a) “Nos rios de comum se
estabelecem os castores” (Morais); b) “Fulano estabeleceu-se em
Lisboa” (Aulete).
3. Já Celso Pedro Luft, que refere a usual regência com a preposição em,
acrescenta que “ocorre estabelecer-se a diante da palavra rua” (1999, p.
279).
4. Partindo do principio de que, quando os gramáticos divergem em seu
ensino, deve-se ter liberdade para optar, deve-se concluir que, sem que
haja erro algum ou mesmo diversidade de sentido, são, assim,
igualmente corretas as frases “A empresa estabeleceu-se na Rua
Miguelópolis, 123” e “A empresa estabeleceu-se à Rua Miguelópolis,
123”.
Estabilitário – Existe?
1. Um leitor indaga se existe em nosso idioma o vocábulo estabilitário,
segundo ele muito comumente utilizado na prática forense.
2. Observa-se, de início, que o subscritor destas linhas, antes de ler a
dúvida do leitor, jamais havia encontrado o mencionado vocábulo, nem
mesmo sabendo com que sentido ele vem sendo empregado.
3. Mesmo assim, é possível anotar que, quando se quer saber se uma
palavra existe ou não em português, deve-se tomar por premissa o fato
de que a autoridade para listar oficialmente os vocábulos pertencentes ao
nosso idioma é a Academia Brasileira de Letras.
4. E essa autoridade, a ABL a exerce por via da edição do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa.
5. Ora, uma simples consulta ao VOLP mostra que nele não se registra
estabilitário, de modo que a forçosa conclusão a ser extraída é que essa
palavra não existe em nosso léxico.
6. Em tais circunstâncias, se se quer usar um vocábulo com esse
significado, a solução é escolher um sinônimo entre as diversas palavras
com a acepção pretendida pelo usuário em português.
7. Usar, porém, um vocábulo inexistente, a pretexto de neologismo, não
constitui alternativa que esteja ao alcance do usuário do idioma.
8. Sempre é oportuno observar adicionalmente que, em circunstâncias
como essa, nos meios jurídicos e forenses, há uma equivocada tendência
de alguns, com pretensão de uma jamais alcançada erudição, para
empregar vocábulos arrevesados e barrocos, muitas vezes inexistentes,
como esse que agora é trazido para análise.
9. O máximo que conseguem, todavia, é um texto de difícil leitura e
compreensão, muito distante do ideal que só a simplicidade consegue
alcançar.
Estada ou Estadia?
1. Alguns autores, como Caldas Aulete, fazem diferença entre estadia e
estada, deixando a primeira para indicar a parada forçada que o navio faz
no porto, enquanto conferem à segunda o significado de parada de outras
coisas ou pessoas.
2. Cândido Jucá Filho (1963, p. 106 e 273), por seu lado, as dá por
sinônimas e reputa forçada a mencionada distinção, que diz parecer não
vigorar no Brasil.
3. Silveira Bueno (1938, p. 149), por sua vez, entende que o termo melhor
é estada para indicar permanência em algum lugar, reservando estadia
para designar o tempo em que um navio gasta no porto, significando
também a taxa portuária que se deve pagar.
4. Cândido Jucá Filho também reputa estadia um “termo de marinha”
(1981, p. 67).
5. Realçando haver frequentes equívocos quanto ao emprego desses
vocábulos nos meios forenses, Edmundo Dantès Nascimento faz
expressa distinção entre estada e estadia: “o primeiro: permanência em
um lugar (refere-se à pessoa); o segundo: permanência de navio no
porto; automóvel em garagem; animais em cocheiras” (1982, p. 90).
6. Para Regina Toledo Damião e Antonio Henriques, “não raro, bons
profissionais do Direito referem-se ao ato de estar em algum lugar por
certo tempo como estadia. Ora, estadia é a permanência de veículos em
garagem ou estacionamento, ou de navio no porto. Em referência a
pessoas (e também a animais) o correto é estada” (1994, p. 61).
7. De Arnaldo Niskier também é a diferenciação: “estada é a permanência
de animais ou pessoas em algum lugar. Estadia é para navios, carros,
etc.” (1992, p. 34).
8. Luiz A. P. Vitória (1969, p. 107), nessa esteira, também faz diferença:
estada (ato de estar, a demora, a permanência) e a estadia (tempo de
permanência de um navio no porto).
9. Após fazer tal distinção, o Padre José F. Stringari (1961, p. 55-6)
observa que “hoje em dia emprega-se a cada passo esta palavra (estadia)
na acepção de permanência, estada”. E complementa que, “enquanto os
puristas discutem, estadia vai ganhando terreno”, trazendo exemplos de
autores insuspeitos: a) “Eu decididamente não poderia recomeçar nova
estadia no estrangeiro” (Rui Barbosa); b) “Ocupou-se de todos os
autores nacionais que pôde conhecer e ainda de portugueses
abrasileirados pela sua estadia no Brasil” (José Veríssimo); c) “Durante
a estadia dos árabes na Península…” (Otoniel Mota).
10. A legislação tem observado, com apuro e rigor, a diferença semântica
entre ambos os vocábulos: a) “… correndo também por sua conta as
despesas de estada e alimentação do usuário…” (CC, art. 741); b) “…
terá o capitão a escolha, ou de resilir do contrato e exigir do afretador
metade do frete ajustado e primagem com estadias e sobrestadias…”
(C. Com., art. 592); c) “… Se o navio não for livre, o fretador pode
resilir do contrato, com direito ao frete vencido, estadias e
sobrestadias e avaria grossa…” (C. Com., art. 611).
11. Apesar da objeção de alguns, o melhor parece ser observar a efetiva
distinção entre ambos os vocábulos e conferir a cada qual sua
específica acepção, sobretudo porque o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido
oficialmente de determinar a existência dos vocábulos em nosso
idioma, além de sua grafia oficial, até mesmo fugindo a seu habitual
proceder e finalidade, acaba por fixar o real sentido do vocábulo
estadia: “demora, permanência de navio” (2009, p. 345).
Estádio ou Estágio?
1. Estádio significa fase, período, razão pela qual se há de dizer estádio de
tristeza, estádio de euforia, estádio de alegria. Ex.: “Passando por um
estádio difícil, a empresa precisou requerer concordata preventiva”.
2. Já estágio quer dizer aprendizado, situação transitória de preparação.
Ex.: “Os novos advogados faziam estágio em grandes escritórios”.
3. Atentos a essa diferença de significação entre os vocábulos e aos
constantes equívocos que se cometem na linguagem diária, assim
exemplificam José de Nicola e Ernani Terra seu uso correto: “No atual
estádio de sua vida, recomendaram-lhe fazer um estágio para se
aperfeiçoar” (2000, p. 100).
4. Observando que o primeiro significado de estágio é o período de
aprendizado prático para o exercício de certas profissões, Domingos
Paschoal Cegalla também anota o emprego comum desse vocábulo na
acepção de “cada uma das sucessivas etapas da realização de um
empreendimento, de uma obra”.
5. E, em seguida, ressalta ele ser esse um “erro enraizado” e que “alguns
gramáticos condenam, com razão, o emprego de estágio como sinônimo
de fase, etapa, estádio” (CEGALLA, 1999, p. 151).
6. Importa alertar que, na atualidade, alguns dicionaristas, de modo
equivocado, baralham ambos os vocábulos, atribuindo-lhes sinonímia
que verdadeiramente não têm.
Estado
Ver Maiúsculas (P. 455).
Estados Unidos
No que respeita à concordância verbal, ver Nomes próprios plurais (P.
500).
Estágio ou Estádio?
Ver Estádio ou Estágio? (P. 333)
Estandardizar – Anglicismo?
1. O adjetivo inglês é standard, e sua tradução é padrão. Exs.: preço
padrão, tipo padrão.
2. Para alguns, configuram desnecessários anglicismos tanto o verbo
estandardizar como outras palavras vindas do mesmo radical, como
estandardização, estandardizante, estandardizável, estandardizador.
3. O certo, contudo, é que, apesar da oposição de alguns no que concerne a
sua existência e à possibilidade de seu uso, todos esses vocábulos vêm
registrados no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras, que é o veículo oficial indicador das
palavras existentes em nosso idioma, motivo por que está autorizado, por
conseguinte, seu normal emprego (2009, p. 346).
Estande
Ver Formação de adjetivos – Regras (P. 360) e Neologismo (P. 494).
Estatuir
1. Quanto a sua ortografia, como todo verbo terminado em uir, só pode dar
origem à terminação ui na segunda e na terceira pessoas do singular do
presente do indicativo. Assim: estatuo, estatuis, estatui.
2. Diferentemente dos verbos terminados em uar (como continuar), são
errôneas as grafias com e em tais situações: estatues, estatue.
3. Nas palavras de Cândido de Oliveira, atento aos frequentes equívocos
cometidos nesse campo, “é com i a segunda e terceira pessoas do
singular do presente do indicativo dos verbos terminados em uir: aflui,
fruis, retribui, retribuis, contribui, contribuis, influi, influis” (1961, p.
64).
4. Oportuno é lembrar que se trata de verbo empregado com frequência nos
meios jurídicos e forenses com o sentido de determinar, estabelecer
como regra, regular por meio de norma legal. Exs.: a) “Aplica-se ao
sequestro, no que couber, o que este Código estatui acerca do arresto”
(CPC/1973, art. 823); b) “Esta Consolidação estatui as normas que
regulam as relações individuais e coletivas de trabalho, nela previstas”
(CLT, art. 1º).
Estendimento – Existe?
1. Um leitor traz os seguintes argumentos para análise: a) indaga, primeiro,
se existe a palavra estendimento no sentido de alargamento ou
ampliação; b) reconhece que o vocábulo não é registrado pelos
principais dicionaristas, nem pelo VOLP; c) mas observa que tais obras
registram atendimento e fornecimento; d) por fim, observa que, se os
verbos atender e fornecer podem gerar atendimento e fornecimento,
estender também poderia gerar estendimento.
2. Ora, quando se quer saber se uma palavra existe ou não em português,
deve-se tomar por premissa o fato de que a autoridade para listar
oficialmente os vocábulos do nosso idioma é a Academia Brasileira de
Letras.
3. E essa autoridade, a ABL a exerce por via da edição do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa.
4. Uma simples consulta ao VOLP mostra que, a par do verbo estender,
não se registra nenhum substantivo correspondente: nem estendimento,
nem estendição ou algo similar. Tais substantivos, por consequência
óbvia, não existem em nosso léxico.
5. Em tais circunstâncias, se se quer usar um substantivo com esse
significado, a solução é buscar um verbo sinônimo de estender, que
tenha um substantivo correspondente, exatamente como procedeu o
leitor, que trouxe alargamento e ampliação. Ou seja: a solução é
escolher, nesse rol, o vocábulo que mais se amolde à acepção pretendida
pelo contexto.
6. Por fim, quanto aos argumentos trazidos pelo leitor para justificar a
possível existência de estendimento, importa tecer as seguintes
considerações: a) por um lado, com o mesmo radical dos verbos, não é
incomum encontrar registrados pelo VOLP substantivos equivalentes de
ação, um acabado em ção, e outro, em mento (abreviação e
abreviamento, acomodação e acomodamento, acusação e acusamento);
b) por outro lado, também se encontram substantivos que apenas
admitem ser terminados em ção (abdicação, acentuação, aquisição); c) e
também se encontram outros que somente admitem término com o
sufixo mento (abastecimento, abatimento, acabamento); d) isso
significa, por um lado, que formar substantivos terminados em ção ou
em mento não é uma faculdade que assiste discricionariamente ao
usuário do vernáculo; e) por outro lado, isso faz forçosamente concluir
que a ABL, por meio do VOLP, continua sendo a autoridade para definir
oficialmente a lista dos vocábulos que integram o idioma pátrio; f) por
um lado, se o vocábulo se encontra listado na referida obra, então ele
existe em português; g) por outro lado, se ele não se encontra ali
registrado, então simplesmente não existe, e seu emprego não se acha
autorizado no vernáculo.
Estenografar
1. Tendo por sinônimos logografar e taquigrafar, significa escrever
estenograficamente, ou praticar a estenografia, que é “a escrita abreviada
e simplificada, na qual se empregam sinais que permitem escrever com a
mesma rapidez com que se fala” (FERREIRA, s/d, p. 580).
2. No que concerne à prosódia, há dúvidas na pronúncia e na escrita das
formas rizotônicas desse verbo, nas quais a sílaba tônica é sempre gra,
não havendo formas proparoxítonas: estenografo, estenografas,
estenografa, estenografamos, estenografais, estenografam (presente do
indicativo); estenografe, estenografes, estenografe, estenografemos,
estenografeis, estenografem, (presente do subjuntivo); estenografa,
estenografe, estenografemos, estenografai, estenografem (imperativo
afirmativo); não estenografes, não estenografe, não estenografemos, não
estenografeis, não estenografem (imperativo negativo).
3. Como as formas rizotônicas apenas ocorrem nos tempos referidos, não
há dúvidas de pronúncia e escrita nos demais tempos.
4. Veja-se, por fim, que o substantivo é que é proparoxítono: o estenógrafo,
a estenógrafa, os estenógrafos, as estenógrafas.
5. A questão se resolve pelas observações de Otelo Reis acerca das formas
verbais paroxítonas dignas de nota: “Certas formas rizotônicas,
paroxítonas, de verbos polissilábicos, possuem homógrafos
proparoxítonos, que são substantivos ou adjetivos. A distinção é feita, na
escrita, pela acentuação da palavra proparoxítona” (1971, p. 73-4).
6. Problema idêntico se dá com outros verbos, como biografar (o biógrafo
e eu biografo) datilografar (o datilógrafo e eu datilografo), dialogar (o
diálogo e eu dialogo), filosofar (o filósofo e eu filosofo), fotografar (o
fotógrafo e eu fotografo), interpretar (o intérprete e que eu interprete),
invalidar (ato inválido e eu invalido), logografar (o logógrafo e eu
logografo), maquinar (a máquina e ele maquina), monologar (o
monólogo e eu monologo), sindicar (o síndico e eu sindico), subsidiar (o
subsídio e eu subsidio), taquigrafar (o taquígrafo e eu taquigrafo).
Este ou Esse?
Ver Pronome demonstrativo (P. 611).
Estrangeirismos
1. São as expressões tiradas de outras línguas e que constituem vício
quando os vocábulos estranhos não são indispensáveis (RIBEIRO, João,
1923, p. 245).
2. Tem por sinônima a palavra barbarismo e, para especificação, toma o
nome da língua de onde procede: germanismo, se vem do alemão
(Germânia é o antigo nome da Alemanha); anglicismo, se vem do inglês;
italianismo, se do italiano; espanholismo ou castelhanismo, se do
espanhol (Castela foi um dos locais onde teve início a língua); galicismo
ou francesismo, se do francês (Gália foi um antigo nome da França);
hebraísmo, se do hebraico; helenismo, se do grego (heleno é sinônimo de
grego); latinismo, se do latim (PEREIRA, 1924, p. 260).
3. Esclareça-se que, quando regular e oficialmente recebida a palavra nova
de outro idioma pelo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa,
editado pela Academia Brasileira de Letras – onde se verifica a realidade
de existência aceita do vocábulo em nosso idioma – diz-se, estar diante
de um neologismo. Foi o que se deu recentemente com diversos
vocábulos de tecnologia e informática recolhidos do inglês pelo VOLP,
como acessar, deletar e inicializar.
Estratégia
1. Júlio Nogueira realça (1959, p. 21) que “causa impressão desagradável
ouvir dizer estrategia (gi) por estratégia”, erro esse bastante comum,
sobretudo entre pessoas pretensamente cultas.
2. Em verdade, é bastante triste ver pessoas que, em busca de equivocada
erudição, acabam por alterar o próprio modo de ser das palavras,
engodados pela própria ignorância.
3. Anote-se, por oportuno, que o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa publicado pela Academia Brasileira de Letras, órgão esse
que tem delegação legal para listar as palavras oficialmente existentes
em nosso idioma, bem como sua forma de pronunciar, reforça que a
pronúncia do vocábulo aqui considerado é estratégia e manda não
confundir tal forma com o presente do indicativo do verbo estrategiar
(2009, p. 351), este sim sem acento gráfico e com a vogal tônica no i,
que tem o sentido de agir ou operar com estratégia.
Estremar ou Extremar?
1. Estremar tem o significado de demarcar por meio de estremas, que são
marcos divisórios de propriedades, normalmente rústicas. Ex.:
“Estremado o terreno, voltou a paz a reinar entre os vizinhos”.
2. Exatamente com o sentido apontado, tem aplicação em dispositivos da
legislação vigente: a) “Não pode ser objeto de venda com reserva de
domínio a coisa insuscetível de caracterização perfeita, para estremá-la
de outras congêneres…” (CC, art. 523); b) “O proprietário que tiver
direito a estremar um imóvel com paredes, cercas, muros, valas ou
valados, tê-lo-á igualmente a adquirir meação na parede, muro, valado
ou cerca do vizinho, embolsando-lhe metade do que atualmente valer a
obra e o terreno por ela ocupado (art. 1.297)” (CC, art. 1.328); c)
“Cabe: I – a ação de demarcação ao proprietário para obrigar o seu
confinante a estremar os respectivos prédios, fixando-se novos limites
entre eles ou aviventando-se os já apagados” (CPC/1973, art. 946, I).
3. Já sua parônima extremar tem o sentido de tornar extremo, sumo,
máximo, ou assinalar, ou sublimar. Ex.: “Com tão extremada fúria do
réu, não havia como dominá-lo naquela hora” (intensa).
4. Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade lembram passagem
de Camões, em que se deveria usar extremado e não estremado:
“Quando chegado ao fim de sua idade / o forte e famoso húngaro
estremado”.
5. Lembram, de igual modo, um excerto de Frei Luís de Sousa, em que
ocorre estrema, quando deveria estar extrema: “E isto foi em estrema
necessidade…” (HENRIQUES; ANDRADE, 1999, p. 73).
6. Atento aos equívocos corriqueiros quanto a seu emprego nos meios
forenses, Edmundo Dantès Nascimento faz a expressa distinção entre o
sentido de estremar e de extremar: “o primeiro: delimitar, balizar,
demarcar; o segundo: exaltar, sublimar” (1982, p. 91).
7. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 155-6) também faz essa nítida
distinção e exemplifica: a) “Os Pireneus estremam a Espanha da
França”; b) “Ele estremará os bons dos maus”; c) “Luís de Camões
extremou-se na poesia épica”; d) “O dono do hotel extremava-se em
gentilezas”.
8. Atento às dificuldades e aos problemas que grafias tão similares podem
gerar, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de determinar a
existência dos vocábulos em nosso idioma, além de sua grafia oficial,
mesmo fugindo a seu normal proceder e finalidade, acaba fazendo
questão de distinguir: estremar é limitar, enquanto extremar é exceder
(2009, p. 351 e 359).
9. Oportuno é lembrar que art. 558 do Código Civil de 1916, cuja redação
teve grande contribuição de Rui Barbosa, trazia dicção que não se pode
tipificar como efetivamente precisa: “As raízes e ramos de árvores, que
ultrapassarem a extrema do prédio, poderão ser cortados, até o plano
vertical divisório, pelo proprietário do terreno invadido”. Como o
sentido do vocábulo é decisivamente o de limite, a codificação civil de
2002 empregou termo com significação mais precisa: “As raízes e os
ramos de árvore, que ultrapassarem a estrema do prédio, poderão ser
cortados, até o plano vertical divisório, pelo proprietário do terreno
invadido” (CC, art. 1.283).
Ver Estreme ou Extreme? (P. 337)
Estreme ou Extreme?
1. Deve-se atentar à grafia de estreme (com s e não x), a qual significa
puro, sem mácula, sem mistura, indiscrepante, indubitável, sem
contradições. Ex.: “A prova dos autos é estreme de dúvidas”.
2. Observe-se, ademais, que não existe o adjetivo extreme.
Ver Estremar ou Extremar? (P. 337)
Estresse
Ver Formação de adjetivos – Regras (P. 360) e Neologismo (P. 494).
Estupro ou Estrupo?
1. Do latim stuprum, estupro tem etimologicamente o significado de
afronta, desonra, infâmia.
2. O Código Penal brasileiro tipifica-o como crime contra os costumes,
inserindo-o no capítulo dos delitos contra a liberdade sexual,
conceituando-o especificamente, no art. 213, como o ato de “constranger
alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a
praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”.
3. Atente-se à circunstância de que, desde o latim, a ortografia manda que
se escreva estupro, não existindo, ao longo a evolução do idioma, a
forma estrupo, nem o verbo estrupar.
4. Arnaldo Niskier, aliás, em jocoso frasear, anota que “dizer ou escrever
estrupo é crime contra o vernáculo” (1992, p. 35).
5. É certo que o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras, órgão oficialmente incumbido de definir
a grafia dos vocábulos em Português, registra estrupo (2009, p. 352 e
353), o que poderia dar a ideia equivocada de dupla possibilidade de
grafia do vocábulo. Como, porém, lembra o dicionário Aulete on-line
(http://aulete.uol.com.br), diferentemente do vocábulo aqui considerado,
tal palavra tem o significado de tropel, tumulto, ruído.
Etc.
1. Trata-se de abreviatura da locução latina et coetera, que,
etimologicamente, significa e as outras coisas, ou e as coisas restantes,
tendo, na atualidade, o sentido de assim por diante, afora o mais, e ainda
outros, podendo abranger, além de coisas, também pessoas e animais.
Ex.: “Compareceram diversas pessoas do meio jurídico: juízes,
promotores, advogados, etc.”
2. Tem, como sinônimo pejorativo, et reliqua caterva, ou simplesmente et
caterva, literalmente e o bando restante, que se usa para indicar e os
demais da mesma laia (OLIVEIRA, C., s/d, p. 71).
3. Como não é difícil perceber, já na origem latina há uma conjunção
aditiva, razão por que é errado dizer e etc. Ex.: “Compareceram diversas
pessoas do meio jurídico: juízes, promotores, advogados e etc.” (errado).
4. Reforçando esse entendimento, traz-se a lição de Luiz A. P. Vitória:
“antes de etc., nunca se coloca a conjunção” (1969, p. 109).
5. Quanto à pontuação, a rigor, seria etimologicamente inconcebível o uso
da vírgula antes do etc., exatamente por considerada sua significação.
6. Nesses casos, tecnicamente, só se haveria de usar a vírgula antes de tal
palavra nas hipóteses em que tal sinal indicativo de parada existisse
antes do e, pela existência, por exemplo, de um termo intercalado. Ex.:
a) “Compareceram diversas pessoas do meio jurídico: juízes,
promotores, advogados, estes em maior número, etc.” (correto); b)
“Compareceram diversas pessoas do meio jurídico: juízes, promotores,
advogados, etc.” (errado).
7. Anote-se, todavia, que o acordo ortográfico em vigência determina que a
vírgula deve ser usada em tal caso, razão pela qual a referida vírgula se
torna, então, obrigatória.
8. A esse respeito, anota Arnaldo Niskier que “a questão da vírgula antes
do etc. é simples: deve ser usada! O argumento de que originalmente a
palavra já contém o e (et) não vale, pois o que conta é o acordo
ortográfico vigente, e, diga-se de passagem, já não falamos latim, mas
sim português” (1992, p. 35).
9. De Cândido de Oliveira, em seguida, vem outra importante observação:
“Sendo etc. a última palavra da frase, não colocamos dois pontos: um só
ponto indicará a abreviatura e o ponto final: São vales, serras, planícies,
etc.” (1961, p. 69).
10. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 156) sintetiza em três
observações os problemas referentes ao assunto: a) “Costuma-se usar
vírgula antes dessa abreviatura, embora contenha a conjunção e”; b)
“Não se deve usar a conjunção e antes de etc.”; c) “Pode-se empregar
etc., mesmo com referência a pessoas e animais”.
11. De fundamentados comentários de Edmundo Dantès Nascimento
(1982, p. 46-7), também assim se pode resumir seu ponto de vista sobre
a questão, com importantes reflexos para os textos jurídicos e forenses:
a) apesar de alguns autores – como Júlio Nogueira e Luiz Autuori – o
empregarem como sinônimo de outros ou de outrem, não é possível tal
uso na literatura jurídica; b) é hábito internacional fazer preceder de
vírgula tal abreviatura, apesar de repugnar a pontuação em uma série
terminada por e, sobretudo aos que não perderam a ideia do sentido
etimológico do vocábulo; c) o Vocabulário Ortográfico, aliás, sempre
coloca vírgula antes de etc.
12. Uma observação final: o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa – editado pela Academia Brasileira de Letras, a qual tem a
delegação legal para listar oficialmente os vocábulos existentes em
nosso idioma, em sua edição mais recente, a primeira na vigência do
Acordo Ortográfico de 2008 – omitiu, em seu corpo principal, o
registro do vocábulo etcétera, assim com acento gráfico, já em sua
forma aportuguesada e como vocábulo integrante de nosso léxico.
Trouxe, todavia, etc. no grupo das Reduções Mais Correntes (p. 832) e,
ao indicar-lhe o significado, ao lado da expressão latina et cetera,
também fez constar a fórmula aportuguesada etcétera, assim com
acento gráfico, que não existe em latim, e sem o emprego do itálico que
marca as palavras estrangeiras. Isso permite duas importantes
conclusões: a) embora não constante do corpo principal da listagem do
VOLP, a palavra etcétera é vocábulo pertencente ao nosso idioma; b)
por consequência, tanto o vocábulo etcétera como a respectiva redução
etc. se escrevem sem aspas, sem itálico, negrito ou sublinha,
circunstâncias essas próprias da escrita de vocábulos integrantes de
outros idiomas.
13. É interessante notar, para ilustração, que, no art. 232 da Lei 6.015, de
31/12/73, que dispôs sobre os registros públicos, de acordo com a
redação trazida pela Lei 6.216, de 30/6/75, que a modificou, constava
vírgula antes de etc.; na republicação da lei, inserida na Coleção das
Leis da União de 1975, vol. V, p. 61, todavia, acabou desaparecendo a
mencionada vírgula.
Eu
Ver Para eu ler ou Para mim ler? (P. 545)
Eu fêcho ou Eu fécho?
1. A pronúncia da primeira pessoa do singular do presente do indicativo do
verbo fechar é fechada (ê) ou aberta (é)?
2. Otelo Reis, em obra indispensável para resolver dúvidas sobre
conjugação verbal, soluciona com maestria a questão e observa que os
verbos terminados em echar devem ser pronunciados com som fechado:
fêcho, fêchas, fêcha, e não fécho, féchas, fécha. (Observe-se que o acento
gráfico foi aqui posto por questões didáticas, para fixar o som, embora
não exista na grafia).
3. E acrescenta o mesmo autor: “pessoas menos cultas manifestam a
errônea tendência de, nas formas rizotônicas, pronunciar o e com som
aberto: fécho, féche, etc.” (REIS, 1971, p. 80).
4. Essas mesmas observações valem para a pronúncia dos verbos
apetrechar, bochechar, desfechar, flechar…
Euforia ou Euforismo?
1. Euforia é substantivo feminino que significa alegria intensa. Não
empregar, nesses casos, euforismo, que, apesar de ter frequente emprego
nos meios jurídicos no sentido de euforia, é vocábulo inexistente, que os
dicionários não registram; não foi registrado no Vocabulário Ortográfico
de Júlio Nogueira, nem no de Gonçalves Viana, nem o é pelo
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira
de Letras, que atualmente é o veículo oficial para listar as palavras
existentes em nosso idioma.
2. Repita-se: para significar alegria intensa, a palavra correta é euforia.
Exs.: a) “Por causa da absolvição, o réu demonstrou justificado
euforismo” (errado); b) “Por causa da absolvição, o réu demonstrou
justificada euforia” (correto).
Eu gostaria… ou Eu quero…?
Ver Futuro do pretérito (P. 367).
Evidência ou Prova?
1. Voltando ao velho manual de Filosofia que me acompanhou durante o
curso clássico (para os mais novos, antigo colegial, ou segundo grau,
com destinação específica de preparo para a área das ciências humanas),
relembro, por um lado, que, para a Lógica Formal, evidente é o que está
claro para todos e é por todos aceito sem necessidade de demonstração
ou comprovação.
2. Por outro lado, consultando um livro de processo civil, observo que
prova é “o meio e modo de que usam os litigantes para convencer o juiz
da verdade da afirmação de um fato, bem como o meio e modo de que se
serve o juiz para formar sua convicção sobre os fatos que constituem a
base empírica da realidade” (MARQUES, 1997, p. 207). Em síntese feliz
de Mittermayer, prova é a soma dos meios produtores de certeza.
3. Só desse confronto de conceitos, já se conclui que não se pode ter algo
que precisa de prova, ou mesmo a prova em si, como uma evidência. No
máximo, o que se pode ter nos autos de um processo é a evidência como
o resultado de uma apreciação conjunta e conjugada da prova.
4. Desse modo, vê-se com facilidade que é equivocado o emprego de
evidência para significar prova, como se dá nos seguintes exemplos: a)
“A polícia colheu, no local, evidências de que o marido é o assassino”;
b) “As evidências produzidas pela acusação simplesmente fulminaram
os argumentos da defesa”.
5. Tais exemplos, como é de fácil percepção, devem ser assim corrigidos:
a) “A polícia colheu, no local, provas de que o marido é o assassino”; b)
“As provas produzidas pela acusação simplesmente fulminaram os
argumentos da defesa”.
6. No caso anterior, se o que a polícia colheu no local foram vestígios que
constituem princípio de prova e podem conduzir ao conhecimento de
elementos significativos do fato delituoso, então o que se tem é um
indício, uma prova indiciária. Jamais, porém, uma evidência.
7. A origem do equívoco é facilmente identificável: vem da errônea
tradução das legendas dos filmes policiais, pois, em inglês, evidence
significa prova, o que não se dá em Português.
8. Segue esse erro na esteira de muitos outros vocábulos traduzidos
equivocadamente pela aparência (tecnicamente denominados falsos
cognatos, ou seja, aparentam pertencer a um mesmo radical, mas não
pertencem em realidade): actually quer dizer na verdade, e não
atualmente, que é nowadays; audience tem o sentido de plateia, e não de
audiência (judicial), que é court appearance; compromise significa
entrar em acordo, e não compromisso, que é appointment ou date;
eventually é finalmente, e não eventualmente, que é occasionally; injury
quer dizer ferimento, e não injúria, que é insult; intoxication tem o
sentido de embriaguez, e não de intoxicação, que é poisoning; lecture
significa palestra, e não leitura, que é reading; motel é hotel de beira de
estrada, e não o nosso motel, que é love motel; parents são pais, e não
parentes, que são relatives; policy significa as diretrizes políticas de um
governo, e não polícia, que é police; preservative é conservante, e não
preservativo, que é condom; pretend quer dizer fingir, e não pretender,
que é to intend ou to plan.
Exacerbação de verba
Ver Esposo ou Marido? (P. 331)
Examinando – Existe?
1. Significa aquele que está sendo ou será examinado, ou, ainda, o
candidato que se apresenta para ser submetido a alguma modalidade de
exame. Ex.: “Os examinandos não podiam sair antes de completadas
duas horas de prova”.
2. Apesar da oposição de alguns no que concerne a sua existência e à
possibilidade de seu uso, esse vocábulo vem registrado no Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
que é o órgão oficial indicador das palavras existentes em nosso idioma,
estando autorizado, por conseguinte, seu normal emprego (2009, p. 356).
Ver Alimentando – Existe? (P. 105)
Exceção feita a
Ver Exceção feita de – Galicismo? (P. 341)
Exceção ou Excessão?
1. Exceção, em termos comuns, significa algo que se desvia da regra geral.
Ex.: “Seu caso, em realidade, configura exceção aos que aqui
normalmente aparecem”.
2. Juridicamente, quer dizer defesa indireta, em que o réu, sem negar o fato
afirmado pelo autor, alega direito seu com o intento de refutar ou
paralisar a ação (arguindo, por exemplo, exceção de suspeição, de
incompetência, de litispendência, de coisa julgada etc.).
3. Nesse sentido, opõe-se a defesa direta, que ataca o próprio mérito da
discussão.
4. Atente-se a sua grafia, porque é errada a forma excessão, possivelmente
por analogia inadequada com o vocábulo excesso.
5. Lembra Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 268) que a grafia equivocada
tipifica um barbarismo morfológico.
Ver Exceção feita de – Galicismo? (P. 341)
Exceder
1. Trata-se de vocábulo a ser observado sob o prisma da regência verbal.
2. Atenta análise de nossos melhores autores revela a possibilidade de sua
construção ora com objeto direto (com possibilidade de tornar-se sujeito
da voz passiva) ora com objeto indireto, ora com ambos os
complementos ao mesmo tempo. Exs.: a) “O preço da mão de obra
excedeu o preço da matéria-prima” (correto); b) “O preço da mão de
obra excedeu ao preço da matéria-prima” (correto); c) “O preço daquele
licitante excedia os demais em número e condições” (correto); d) “O
preço daquele licitante excedia aos demais em número e condições”
(correto); e) “O preço da matéria-prima foi excedido pelo preço da mão
de obra” (correto).
3. Para esse sentido mais corriqueiro de ir além de, ultrapassar, superar,
Artur de Almeida Torres (1967, p. 142), além da possibilidade de
construção indiferente – quer como transitivo direto, quer como
transitivo indireto (caso em que pede a preposição a) – ainda mostra que
ele pode ser construído com objeto direto e a preposição em. Exs.: a)
“Nenhum pescador o excede” (Ernesto Carneiro Ribeiro); b) “A renda
dos bens… excede a duzentos contos de réis” (Alexandre Herculano); c)
“Era feito que excedia em heroicidade todos os que haviam praticado
dois cavaleiros portugueses” (Alexandre Herculano).
4. Também se pode construir com um complemento precedido pela
preposição de. Ex.: “Presume-se que a referência às dimensões foi
simplesmente enunciativa, quando a diferença encontrada não exceder
de 1/20 (um vigésimo) da área total enunciada…” (CC, art. 500, § 1º).
5. Atente-se, todavia, a que, em apropriada explicação acerca da última
observação feita, leciona Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 158) que
“exceder não admite objeto indireto regido da preposição de”,
acrescentando que tal preposição “só é cabível antes da expressão que
denota o excesso”. Exs.: a) “É proibido exceder esse limite” (correto); b)
“É proibido exceder desse limite” (errado); c) “Como pôr o volume na
mala, se a excedia de dez centímetros?” (correto).
6. Em posição contrária, lembra Luiz A. P. Vitória que este verbo “não
admite de” iniciando seu complemento. Ex.: “Esta mesa excede uns
vinte centímetros a outra” (1969, p. 110).
7. Celso Pedro Luft (1999, p. 288) traça dois aspectos de significativo
relevo quanto à sintaxe desse verbo: a) pode ser transitivo direto ou
transitivo indireto; b) “o adjunto de medida do excesso pode exprimir-se
sem preposição”, ou, ainda, com as preposições em, de ou a: i) “Eu o
excedo em peso”; ii) “Eu lhe excedo em peso”; iii) “Os gastos não
excediam de cinquenta”; iv) “Os gastos excedem à receita”; v) “Os
gastos não excedem a receita”.
8. Outro não é o entendimento de Francisco Fernandes (1971, p. 333-4),
como se verifica nos exemplos dos abalizados autores que cita.
9. Atenta análise dos textos legais evidencia que tal verbo é empregado
indiferentemente ora como transitivo direto, ora como transitivo indireto,
permanecendo essa duplicidade de regência até em mesmo diplomas
legais, como se vê nos seguintes excertos do Código Civil: a) “O valor
da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da
obrigação principal” (art. 412); b) “O mandatário, que exceder os
poderes do mandato…” (art. 665); c) “Se o valor do seguro exceder ao
da coisa…” (art. 778); d) “Procede-se à declaração de insolvência toda
vez que as dívidas excedam à importância dos bens do devedor” (art.
955). Já se observava essa duplicidade indiferente de regência nos
dispositivos correspondentes do Código Civil de 1916 (arts. 920, 1.297,
1.438 e 1.554), cuja redação e apuro linguístico contaram com a decisiva
participação de Rui Barbosa.
Excelso pretório
Ver Adjetivação desnecessária (P. 80).
Exceto
1. A discussão sobre a variabilidade ou não desse vocábulo decorre do fato
de que, em última análise, tanto se pode tê-lo como adjetivo (e, portanto,
variável), como se pode tê-lo como preposição (e, assim, invariável), no
sentido de excetuado, posto de lado, salvo, com exceção de (FREIRE,
1937a, p. 97).
2. Se reputado um adjetivo, há de concordar normalmente com a palavra a
que se refere. Exs.: a) “Excetos os dicionários de Aulete e Adolfo
Coelho…” (Rui Barbosa); b) “Todas as cousas criadas, exceta uma
árvore…” (Padre Antônio Vieira).
3. Se considerado uma preposição, há de ser invariável, como palavra que
não acompanha a flexão do vocábulo que a segue, mesmo que este seja
feminino ou plural. Ex.: a) “As presidiárias, exceto as de bom
comportamento, foram removidas para outros locais”.
4. O que se deve observar desde logo é que os gramáticos e estudiosos não
estão acordes quanto à natureza desse vocábulo (e, assim, quanto a sua
possibilidade de variação), a começar por Eduardo Carlos Pereira (1924,
p. 153 e 363), que o insere no rol dos particípios que “no português atual
só funcionam como preposições”, ou forma nominal de verbo que foi
imobilizada entre as preposições, sendo como tal empregada, de modo
que arcaicas são as formas flexionadas excetos, exceta e excetas.
5. Também para Cândido Jucá Filho (1981, p. 68), tal vocábulo se firmou
como “preposição no português moderno”.
6. Em lição de Evanildo Bechara (1974, p. 302), por um lado, palavras
dessa natureza são formas verbais de particípio – e, assim, de valor
adjetivo – que “passaram a ter emprego equivalente a preposição e
advérbio… e, como tais, normalmente devem aparecer invariáveis”; por
outro lado, entretanto, para esse autor, não se perdeu de todo a
consciência de seu antigo valor, e muitos escritores procedem à
concordância regular, e, bem por isso, acrescenta tal gramático a lição de
Epifânio Dias, para quem flexionar um tal vocábulo “é expressar-se na
verdade com correção gramatical, mas de modo desusado”.
7. Laudelino Freire (1937b, p. 101), sem explicações adicionais, aconselha
seu emprego como adjetivo, fundando-se em exemplos clássicos: a)
“Todos os portugueses fazem o mesmo, excetos os mais ricos” (Vieira);
b) “… excetos, com efeito, os dicionários de Aulete e Adolfo Coelho”
(Rui Barbosa).
8. Lembra, por um lado, Artur de Almeida Torres (1966, p. 133) que “as
palavras exceto e salvo, consideradas outrora preposições acidentais, e
hoje como palavras denotativas de exclusão, empregam-se geralmente
como invariáveis, no uso atual da língua”; por outro lado, acrescenta tal
autor que “entre os clássicos… era comum fazer-se a concordância delas
com o substantivo seguinte, o mesmo se verificando entre alguns
escritores eruditos de hoje”.
9. Heráclito Graça, por primeiro, traz lição de Cândido de Figueiredo de
que exceto é preposição, e seria erro crasso flexionar tal vocábulo, para
fazê-lo concordar com o substantivo, como se fosse adjetivo. Em
seguida, entende tal autor ser absolutamente insustentável essa opinião
de privar tal adjetivo do direito de exprimir a ideia que lhe é própria e ao
mesmo tempo idêntica à da preposição em que se converte. Por fim,
expõe ele seu próprio posicionamento, em lição que abrange salvo e
exceto: “Tão correta é a sintaxe com qualquer dos referidos adjetivos
concordando com o substantivo, como com qualquer deles tornado
preposição. Vale o mesmo dizer: ‘Tudo lhe é indiferente, excetas as
mulheres’… e ‘Tudo lhe é indiferente, exceto as mulheres’”. E cita tal
autor (GRAÇA, 1904, p. 282-7) exemplos de autores insuspeitos: a) “A
paralisia tinha amortecido todos os membros de seu corpo, exceta a
língua” (Padre Manuel Bernardes); b) “Tudo chegou a salvamento,
excetas as partes líquidas” (Padre Antônio Vieira).
10. Faça-se constar também que, após referir que Padre Vieira escreveu
excetas as cartas, Aires da Mata Machado Filho é taxativo para, sem
outras explicações, dizer que “hoje cumpre escrever exceto as cartas”
(1969e, p. 991), lição essa que não parece dever ser aceita com o rigor
pretendido.
11. A possibilidade de aceitação de ambas as construções transparece da
lição de Carlos Góis (1943, p. 206), o qual, realçando o caráter de
preposição acidental, observa que tal vocábulo deve ficar invariável; a
seguir, entretanto, acrescenta que palavras dessa natureza, “no estilo
enfático, na língua enérgica e incisiva, reassumem a forma originária
de adjetivos participais, e, como tal, variam”.
12. Doutrina, por sua vez, João Ribeiro que “as preposições muitas vezes
derivam de particípios que se tornam momentaneamente invariáveis:
salvo, exceto, durante etc. Pode-se, contudo, dizer: ‘salvos os motivos’,
‘excetas as razões’”. E arrola tal gramático diversos exemplos de
concordância de tais palavras com os substantivos a que se referem,
retirados de Rui Barbosa, de Vieira e de Bernardes, contrariando,
assim, lição de Cândido de Figueiredo, que recusa foros de correção
vernácula para o exceto como adjetivo e, portanto, variável (RIBEIRO,
João, 1923, p. 205).
13. José de Sá Nunes, por sua vez, num primeiro aspecto, observa que, na
atualidade, o emprego normal tem sido a forma invariável, já que
exceto “se não emprega hoje como particípio passado, e sim como
preposição” (1938, p. 117). Exs.: a) “… processo que se encontra em
todas as línguas românicas, exceto o valáquio” (Mário Barreto); b)
“De exprimir, em orações subordinadas – exceto aquelas de que trata o
§ 279 – uma ação futura em relação a um momento do passado…”
(Epifânio Dias). Num segundo aspecto, lembra o mesmo autor: “Mas é
certo que nos melhores padrões da vernaculidade se nos depara o
emprego de exceto seguido de preposição, fazendo o papel de puro
advérbio de exclusão. E a razão disso é que… uma palavra substantiva
ligada a outra por uma partícula excetiva deve estar na forma
correspondente à função que exerce a palavra a que se liga” (NUNES,
1938, p. 117-8). Exs.: a) “Senhoreou-se de tudo, exceto dos dois sacos
de prata” (Camilo Castelo Branco); b) “Não falou nunca com pessoa
nenhuma de fora, exceto com o seu confessor” (Frei Luiz de Sousa).
14. Em termos práticos e em síntese, ante as fundadas divergências entre os
estudiosos, em lição válida para os dias de hoje, pode-se afirmar que ao
usuário se abrem duas opções igualmente corretas, sendo, assim,
optativo o uso desse vocábulo, quer como adjetivo, quer como
preposição, de modo que pode ficar invariável, ou pode concordar com
a palavra a que se refere. São, portanto, igualmente corretos os
seguintes modos de dizer e escrever: a) “Excetos os dicionários de
Aulete e Adolfo Coelho…” (Rui Barbosa); b) “Todas as cousas criadas,
exceta uma árvore…” (Padre Antônio Vieira); c) “As presidiárias,
excetas as de bom comportamento, foram removidas para outros
locais”; d) “Exceto os dicionários de Aulete e Adolfo Coelho…”; e)
“Todas as cousas criadas, exceto uma árvore…”; f) “As presidiárias,
exceto as de bom comportamento, foram removidas para outros
locais”.
15. Releva observar que, num outro aspecto, lembra Celso Cunha que,
exatamente pelo caráter de preposição acidental de tal palavra, depois
dela se empregam as formas eu e tu. Ex.: “Todos, exceto eu, sustentam
tese contrária” (1970, p. 147).
16. Também para Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 9), essa palavra,
com função de preposição, pode reger eu e tu, observando tal autor que
a razão desse emprego está em que tal vocábulo não é originariamente
preposição.
Ver Exceção feita de – Galicismo? (P. 341), Exceto com (P. 345) e Salvo (P.
678).
Exceto com
1. Interessante observação é feita por Domingos Paschoal Cegalla para a
palavra exceto, no que concerne à locução ora considerada: “Quando o
verbo ou o nome exigem complemento indireto, deve-se repetir a
preposição depois de exceto, palavra denotativa de exclusão”. Exs.: a)
“Falou com todas as colegas, exceto com Fátima”; b) “Gostava de todos
os irmãos, exceto do mais velho”; c) “Era carinhoso com todos, exceto
com a sogra”.
2. A mesma lição, tal autor a estende para o sinônimo menos (CEGALLA,
1999, p. 158).
Ver Exceto (P. 343) e Salvo (P. 678).
Excutir
1. É verbo que significa executar judicialmente os bens de alguém. Ex.:
“Vencida a prorrogação, o penhor será excutido, quando não seja
reconstituído” (CC/1916, art. 788, parágrafo único).
2. Não apresenta problemas quanto à conjugação verbal, quer por ser
regular, quer por ser conjugado em todas as pessoas, tempos e modos,
bastando que lhe sejam adicionadas as terminações do modelo da
terceira conjugação, como, por exemplo, partir.
Exempli gratia
1. Trata-se de expressão latina (pronuncia-se grácia), que corresponde ao
nosso por exemplo.
2. Sua abreviatura internacional é e. g., sempre com minúsculas.
3. Por se tratar de expressão latina, há de vir entre aspas ou com grifo
indicador de tal circunstância, como negrito, itálico ou sublinha; por
outro lado, vedado o uso do acento gráfico, que não existia naquela
língua.
Ver v. g. (P. 768)
Exequatur ou Exequátur?
1. Forma verbal latina substantivada, é o subjuntivo presente de exequor,
exsecutus sum, exsequi, em sua terceira pessoa do singular.
2. Literalmente, significa cumpra-se, execute-se, constituindo genérica
autorização ou ordem para que se cumpram determinados atos.
3. De acordo com ensino de Cândido Jucá Filho – que o aportuguesa e lhe
dá acento (exequátur) – trata-se de “um dos latinismos que, entre as
formas verbais, se adaptaram à categoria do substantivo, como veto,
déficit, lavabo, récipe” (1981, p. 68).
4. Na terminologia forense, trata-se de palavra “empregada para indicar a
autorização que é dada pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal
para que possam, validamente, ser executados, na jurisdição do juiz
competente, as diligências ou atos processuais requisitados por
autoridade judiciária estrangeira” (DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p.
243).
5. O exequátur se dá em cartas rogatórias, diferenciando-se, nesse aspecto,
da homologação, que se apõe às sentenças estrangeiras, para que possam
ser cumpridas em território nacional.
6. Por ter sido tratada, até recentemente, como palavra pertencente a outro
idioma, vinha obrigatoriamente entre aspas, em itálico, negrito, sublinha,
ou com grifo equivalente, indicador de tal circunstância. De igual modo,
vedava-se o uso do acento gráfico, que não existia em latim.
7. Em corroboração a esse entendimento, o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, que é o veículo
oficial indicador das palavras existentes em nosso idioma, até sua edição
de 1999, referia-se a esse vocábulo como um substantivo latino e, por
essa condição, lhe negava acento gráfico (p. 330). A edição de 2004,
todavia, incorporou-o ao léxico português, registrando-o com o devido
acento agudo sobre o a, como convém a um vocábulo paroxítono de
nosso léxico com essa terminação – exequátur (p. 343), no que foi
integralmente seguida pela edição mais recente (2009, p. 357).
Exequendo – Existe?
Ver Alimentando – Existe? (P. 105)
Eximir
1. Do latim eximere (etimologicamente significando tirar de, separar), tal
verbo tem o sentido de isentar, desobrigar, esquivar-se, escapar-se.
2. Artur de Almeida Torres (1967, p. 144), que sintetiza o que sobre o
assunto é aceito pelos gramáticos, vê nele as seguintes possibilidades de
construção: a) como pronominal mais a preposição a: “Nada se exime à
curiosidade” (Euclides da Cunha); b) como pronominal mais a
preposição de: “Não podíamos eximir-nos de chamar especialmente a
atenção do leitor” (Alexandre Herculano); c) como bitransitivo (ou
transitivo direto e indireto) mais a preposição a: “Nenhuma argúcia
metafísica pode eximir os ministros constitucionais a completa
responsabilidade”; d) como bitransitivo (ou transitivo direto e indireto)
mais a preposição de: “Dispensa muitos benefícios ao país, sem,
contudo, eximir os conselheiros da Coroa de sua solidária
responsabilidade” (Rui Barbosa).
3. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 159), para a hipótese de seu
emprego não pronominal, lembra que a pessoa há de ser sempre o objeto
direto, e não objeto indireto. Exs.: a) “A lei o (e não lhe) exime de
votar”; b) “O fato de serem menores não os exime de responsabilidade”.
Existe em português?
1. Com frequência, leitores perguntam se existe esta ou aquela palavra em
Português: interiocução, bloqueamento, hipotisar, hipotizar, prognose,
probabilitária, pregunta, preguntar, arrematar ou rematar,
aguardamento ou aguardo, temerável, perca ou perda, acróbata ou
acrobata, carroçaria ou carroceria, contraversão, páteo ou pátio,
lesionar, inexigir, infazer, impactante, imexível…
2. Para solucionar questões dessa natureza, é importante anotar, de início,
que, por força da mais que centenária Lei Eduardo Ramos, de n. 726, de
8/12/1900, a autoridade para listar oficialmente os vocábulos existentes
em nosso idioma está com a Academia Brasileira de Letras.
3. E a ABL exerce essa delegação por intermédio do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, que é a lista das palavras oficialmente
existentes em nosso idioma, com ligeiras especificações de categoria
gramatical, gênero e, muito raramente, de sentido ou outra observação
adicional. É editado de tempos em tempos, com o acréscimo de novas
palavras que passam, assim, a integrar oficialmente o nosso léxico.
Difere dos dicionários convencionais, por não explicar usualmente o
significado dos termos que registra.
4. Incumbida por lei específica para sua confecção, a ABL o elabora com
autoridade legal para, nesse campo, dizer o Direito, motivo por que, ao
consultar o VOLP, legem habemus e devemos prestar-lhe obediência, do
mesmo modo que devemos agir com respeito aos demais diplomas
legais.
5. Observa-se adicionalmente, por primeiro, que, apesar dos relevantes e
indiscutíveis serviços prestados ao idioma, os dicionários não têm
autoridade legal para dizer se uma palavra existe oficialmente em
Português, de modo que qualquer divergência entre eles e o VOLP deve
ser decidida em favor da autoridade legal deste último.
6. Em segundo aspecto, nem se pense em buscar no VOLP o registro de um
termo científico, como o nome da substância fenildimetilpirazolona, que
integra a fórmula de conhecido remédio.
7. Por fim, tenha-se um cuidado especial com os corretores de texto dos
programas dos computadores, já que, por uma série de motivos e
sobretudo imperfeições, acabam por dar como errados vocábulos
corretos e deixam passar como válidos outros que simplesmente não
existem em nosso idioma.
8. Após tais ponderações, que servem sempre à indagação “Existe em
Português?”, uma consulta ao VOLP revela, de modo específico para as
dúvidas apontadas na consulta que motivou este verbete, que: a)
simplesmente não existem os vocábulos interiocução, hipotisar ou
hipotizar, probabilitária, pregunta, preguntar, temerável, inexigir,
infazer; b) existem oficialmente em nosso idioma, estando, assim, seu
emprego autorizado na linguagem orientada pela norma culta as
seguintes palavras: bloqueio e bloqueamento, prognose (que é sinônimo
de prognóstico), pergunta, perguntar, rematar (que significa aperfeiçoar,
concluir ou terminar), arrematar (que, além dos sentidos do verbo
anterior, também quer dizer comprar bens em hasta pública, em leilão),
aguardamento e aguardo (de modo que são igualmente corretas as
expressões no aguardamento e no aguardo), contraversão (a que os
dicionários dão o sentido de versão contrária a outra ou posição inversa),
lesionar (exatamente no sentido de causar lesão), impactante, impactar e
imexível; c) de igual modo, são dadas como formas corretas e
equivalentes acróbata e acrobata, carroçaria e carroceria; d) o
substantivo feminino perca se encontra ali registrado, mas tal vocábulo
serve para indicar o nome de um peixe, de modo que seu emprego como
sinônimo de perda constitui um brasileirismo informal, e seu emprego
não tem curso permitido na linguagem que deva submeter-se à norma
culta; e) registra-se o vocábulo páteo, que tem o significado de relativo a
um tipo de cruz heráldica, mas não como sinônimo de pátio, a saber, um
recinto interno térreo não coberto (não parece ser esse último o
significado nas intimações do Tribunal de Justiça de São Paulo, com
respeito às seções que funcionam no Pátio do Colégio).
Existir
1. É verbo que precisa ser observado sob o aspecto da concordância verbal.
2. Diferentemente de seu sinônimo haver, tem sempre sujeito e com ele
concorda normalmente. Exs.: a) “Existiu um aluno interessado…”; b)
“Existiram vários alunos interessados…”
3. Se tem auxiliar, também este acompanha a concordância, ainda que seja
ele o verbo haver. Exs.: a) “Pode existir um aluno interessado”; b)
“Podem existir vários alunos interessados”; c) “Há de existir um aluno
interessado”; d) “Hão de existir vários alunos interessados”.
4. Por oportuno, anote-se, porém, que, com o verbo haver, o termo aluno
não seria sujeito, mas objeto direto, e, sendo o verbo impessoal, não teria
sujeito, motivo pelo qual haveria de ficar sempre no singular. Exs.: a)
“Havia um aluno interessado”; b) “Havia vários alunos interessados”; c)
“Pode haver um aluno interessado”; d) “Pode haver vários alunos
interessados”; e) “Há de haver um aluno interessado”; f) “Há de haver
vários alunos interessados”.
5. São comuns os equívocos de construção do verbo haver nesse sentido,
como se pode ver de um comunicado de um tribunal paulista, publicado
no Diário Oficial: “Comunicamos que, excepcionalmente, no dia 30 de
abril de 2002, terça-feira, não haverão as sessões ordinária e do
Juizado Especial da colenda 14ª Câmara”. Corrija-se com facilidade:
“Não haverá as sessões…”
6. E também se atente a esse excerto de um aresto de tribunal regional de
nosso país: “Se contribuições outras houveram, não houve comprovação
nos autos” (RT, vol. 748, p. 354). Corrija-se: “Se contribuições outras
houve, não houve comprovação nos autos”.
Ex officio
1. Trata-se de expressão latina com o sentido etimológico de em
decorrência da lei ou em virtude do próprio cargo, isto é, sem
provocação da outra parte, havendo, em português, como expressão
perfeitamente sinônima, de ofício. Ex.: “O oficial público que lavrar a
escritura de dote, ou lançar em nota a relação dos bens particulares da
mulher, comunicá-lo-á ex officio ao oficial do registro de imóveis”
(CC/1916, art. 839, § 1º).
2. Tecnicamente falando, o ato ex officio é aquele “que se pratica por
imposição ou por determinação legal, quando no desempenho do cargo”
(DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p. 248). Ex.: “Com fundamento no art.
9º do Código de Processo Civil, o juiz, ex officio, nomeou curador
especial ao réu preso”.
3. Atento à dicção dos vocábulos de origem latina, Luciano Correia da
Silva lembra que se pronuncia “eksofício” (1991, p. 112).
4. Por se tratar de expressão latina, há de vir entre aspas ou com grifo
indicador de tal circunstância, como o itálico, negrito ou sublinha; por
outro lado, vedado o uso do acento gráfico e do hífen, que não existiam
naquela língua.
5. Nesse sentido, não se há de olvidar a lição de Edmundo Dantès
Nascimento (1982, p. 145), o qual, após observar que expressões como
essa não eram hifenizadas em latim, assevera que “não o podem ser em
língua nenhuma”, acrescentando tal autor que, “para quem pretende
grafar escorreitamente não é permitido o hífen em expressões do latim
clássico”.
6. Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade (1999, p. 135), por
seu lado, apontam, em obra de Washington de Barros Monteiro, a
existência da grafia ex-officio, e lembram, de igual modo, que, em tal
caso, “não se deve usar o hífen”.
Ver De ofício (P. 266).
Exordial
Ver Petição inicial (P. 563).
Exordial acusatória
Ver Petição inicial (P. 563).
Expelir
1. Quanto à conjugação verbal, aparece um i na primeira pessoa do
presente do indicativo e nos tempos dela derivados: expilo, expeles,
expele, expelimos, expelis, expelem (presente do indicativo); expila,
expilas, expila, expilamos, expilais, expilam (presente do subjuntivo);
expele, expila, expilamos, expeli, expilam (imperativo afirmativo); não
expilas, não expila, não expilamos, não expilais, não expilam
(imperativo negativo).
2. Não apresenta problemas ou irregularidades nos demais tempos e
modos, e também não é verbo defectivo.
3. Na observação de José de Nicola e Ernani Terra, “o e do radical muda
para i na primeira pessoa do singular do presente do indicativo e nas
formas daí derivadas” (2000, p. 20).
4. Otelo Reis (1971, p. 136) lembra que, no particípio passado, é verbo
abundante, admitindo as formas expelido e expulso.
Ver Verbos abundantes (P. 759).
Expert – Existe?
1. Um leitor indaga se existe em nosso idioma o vocábulo expert, que ele
tem encontrado muitas vezes no meio jurídico com o significado de
perito.
2. Ora, em salutar raciocínio que se deve repetir sempre, quando se quer
saber se uma palavra existe ou não em português, deve-se tomar por
premissa o fato de que a autoridade para listar oficialmente os vocábulos
pertencentes ao nosso idioma é a Academia Brasileira de Letras.
3. E essa autoridade, a ABL a exerce por via da edição do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa.
4. Uma simples consulta ao VOLP mostra que nele não se registra a
palavra expert, o que implica dizer que tal vocábulo simplesmente não
existe no idioma e, assim, seu emprego não está autorizado ao usuário do
idioma.
5. Desse modo, deve ser substituído por perito, versado ou especialista, ou
mesmo experto, este sim com registro específico na mencionada obra
(ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 358). Exs.: a)
“Após a apresentação dos quesitos e a nomeação dos assistentes
técnicos, os autos foram ao expert designado pelo Juízo” (errado); b)
“Após a apresentação dos quesitos e a nomeação dos assistentes
técnicos, os autos foram ao experto designado pelo Juízo” (correto).
6. Aos que, mesmo depois dessas observações, insistirem em usar a palavra
expert, anota-se que ela é de origem francesa, e não inglesa, de modo
que sua pronúncia é oxítona, sem que se ouça o som da última letra
(pronuncia-se ecspér).
Expertise – Existe?
1. Um leitor indaga se existe em nosso idioma o vocábulo expertise, que
ele tem encontrado muitas vezes no meio jurídico, ao que parece com o
sentido de experiência.
2. Ora, em salutar raciocínio que se deve repetir sempre, quando se quer
saber se uma palavra existe ou não em português, deve-se tomar por
premissa o fato de que a autoridade para listar oficialmente os vocábulos
pertencentes ao nosso idioma é a Academia Brasileira de Letras.
3. E essa autoridade, a ABL a exerce por via da edição do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa.
4. Uma simples consulta ao VOLP mostra que nele não se registra a
palavra expertise, o que implica dizer que tal vocábulo simplesmente não
existe no idioma e, assim, seu emprego não está autorizado ao usuário da
língua portuguesa.
5. Desse modo, deve ser substituído por experiência ou outro sinônimo que
couber. Exs.: a) “A empresa de assessoria tinha expertise suficiente para
auxiliar no caso” (errado); b) “A empresa de assessoria tinha
experiência suficiente para auxiliar no caso” (correto).
6. Todavia, aos que, mesmo depois dessas observações, insistirem em usar
a palavra expertise, anota-se que ela é de origem francesa, e não inglesa,
de modo que sua pronúncia é paroxítona (com força no i), o r tem
pronúncia carioca, e o s tem o som de z (ecspertize).
Experto ou Esperto?
Ver Esperto ou Experto? (P. 330)
Expor – Como conjugar?
Ver Pôr – Como conjugar? (P. 577)
Expressões de tempo
1. De conformidade com lição de Júlio Nogueira (1930, p. 154-5) – que se
funda na justificativa de que, em latim, a relação de lugar onde às vezes
era expressa pelo caso ablativo, às vezes pelo genitivo, às vezes
acusativo, podendo, ainda, existir ou não a preposição – no português,
“na linguagem corrente, muita vez não se usa a preposição”.
2. Extrai-se daí a conclusão de que são, assim, igualmente corretos todos os
seguintes exemplos, extraídos do citado gramático: a) “Fui à Europa o
ano passado”; b) “Fui à Europa no ano passado”; c) “Isto se deu esta
semana”; d) “Isto se deu nesta semana”; e) “Esta noite não dormi”; f)
“Nesta noite não dormi”; g) “Mês que vem estaremos aqui”; h) “No mês
que vem estaremos aqui”.
3. Em mesma esteira, Sousa e Silva, por um lado, anota que “em
numerosos adjuntos adverbiais de tempo é lícito calar a preposição
inicial: chegaram domingo, embarcarei segunda-feira, dormi a tarde
toda, esteve aqui o mês passado”.
4. Por outro lado, complementa tal autor: “Pode usar-se a preposição, o que
é menos espontâneo: chegaram no domingo, embarcarei na segunda-
feira, dormi durante a tarde toda, esteve aqui no mês passado” (SILVA,
A., 1958, p. 223-4).
Expressões latinas
Ver Palavras e Expressões latinas (P. 543).
Expulsar
Ver Verbos abundantes (P. 759).
Extinguir
1. Verbo de larga utilização nos meios forenses. Ex.: “Em casos de
tipificação das hipóteses do art. 267 do Código de Processo Civil, deve
o juiz extinguir o processo sem julgamento do mérito”.
2. Por primeiro, anote-se que o u não é pronunciado em qualquer das
formas de sua conjugação verbal, razão por que não se escrevia esse
verbo com trema (SACCONI, 1979, p. 18), o qual, aliás, foi abolido pelo
Acordo Ortográfico de 2008 para os vocábulos pertencentes ao nosso
idioma.
3. Em apropriada lição, refere Vitório Bergo que, “em atenção à tendência
da língua para suprimir a vogal u depois das guturais, não se profere esse
fonema, nem no infinito nem nos outros modos e tempos” (1943, p. 69).
4. Por outro lado, tendo o grupo gu, em tal caso, a exclusiva finalidade de
conferir ao g seu som original antes de e e de i, como todos os verbos em
guir (quando o u não é proferido) perde o u antes de a e de o. Assim,
extingo (e não extinguo), extingues, extinguimos, extingam (e não
extinguam).
5. Seguem idênticas observações os verbos conseguir, distinguir, perseguir,
seguir.
6. Carlos Góis e Herbert Palhano (1963, p. 113) lembram, com
propriedade, que, dos verbos terminados em guir, apenas arguir e
redarguir têm o u pronunciado.
7. Em mesma esteira, atentos aos frequentes equívocos em sua pronúncia,
observavam Regina Toledo Damião e Antonio Henriques, mesmo antes
do Acordo Ortográfico de 2008, que tal verbo não é tremado, muito
embora haja “tendência de pronunciá-lo como se tremado fosse” (1994,
p. 244).
8. Com muita propriedade, lembra Otelo Reis (1971, p. 130) que dois são
seus particípios passados: extinguido e extinto.
9. Quanto ao emprego de tais formas, Domingos Paschoal Cegalla (1999,
p. 160-1) lança as seguintes observações: a) “Na voz ativa, usa-se, de
preferência, extinguido”, muito embora também admita o referido autor
a forma extinto. Exs.: i) “Os bombeiros tinham extinguido o incêndio”;
ii) “Os bombeiros tinham extinto o incêndio”; b) “Na voz passiva, usa-se
exclusivamente extinto”. Ex.: i) “O fogo foi extinto rapidamente pelos
bombeiros”; ii) “Esses privilégios serão extintos”; c) “Extinto pode usar-
se como adjetivo: vulcão extinto, lei extinta, costumes extintos,
associações extintas”.
Ver Verbos abundantes (P. 759).
Extorquir
1. Trata-se de verbo muito usado nos meios jurídicos com o sentido de
obrigar, forçar, constranger alguém, por violência ou grave ameaça, para
obter para si ou para outrem vantagem econômica. Ex.: “O réu foi
condenado por extorquir seu patrão ao longo de vários meses”.
2. O u não é pronunciado em nenhuma de suas formas, motivo pelo qual
não se usava trema (SACCONI, 1979, p. 18), que, aliás, foi abolido pelo
Acordo Ortográfico de 2008 para os vocábulos pertencentes ao nosso
léxico.
Quanto à conjugação verbal, ver Abolir (P. 55).
Extra
1. Como adjetivo, com o significado de extraordinário, é forma correta e
dicionarizada, podendo variar normalmente para o plural. Exs.: trabalho
extra, horas extras, edições extras.
2. Nesse caso, o som é fechado (ê), e não aberto (é).
3. A esse respeito, lembra com propriedade Édison de Oliveira (s/d, p. 96):
“Trata-se, no caso, da forma reduzida, abreviada de extraordinário. Ora,
como dizemos extraordinário (ê fechado), é sensato que, ao reduzirmos
a palavra, não modifiquemos a pronúncia”.
4. Arnaldo Niskier (1992, p. 91-2), realçando a natureza de adjetivo nesses
casos, observa que, em expressões como serviços extras, tal vocábulo
“concorda com o substantivo a que se refere”.
5. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 161) também observa tal vocábulo
como adjetivo, em “forma reduzida de extraordinário” – horas extras,
ônibus extras, serviços extras –, acrescentando também a possibilidade
de seu emprego como substantivo: os extras de um filme, os extras de
uma novela.
Extra-pauta ou Extrapauta?
1. Ante as recentes modificações em nossa ortografia, quanto ao hífen,
como fica a escrita da seguinte palavra: extra-pauta ou extrapauta?
2. Ora, extra é prefixo latino, que tem o significado de algo que está fora ou
algo que excede, como em extraconjugal.
3. Apenas em dois casos se usa o hífen: a) quando o elemento seguinte se
inicia pela mesma vogal que termina o prefixo: extra-alcance, extra-
amazônico, extra-atmosférico; b) quando o elemento seguinte se inicia
por h: extra-hispânico, extra-hospitalar, extra-humano.
4. Desse modo, acopla-se diretamente à palavra seguinte, sem
intermediação de hífen, quando iniciada esta por outra vogal, que não a
que encerra o prefixo: extraembrionário, extraestatal, extraordinário,
extraorgânico, extraurbano.
5. Continua valendo a regra de junção direta, mesmo que o elemento
seguinte se inicie por consoante: extrabíblico, extracelular, extraduro,
extragenital, extrajudicial, extramatrimonial, extranormal,
extraparoquial, extrapauta, extratemporal, extraveicular.
6. Apenas para a hipótese de ser o segundo elemento iniciado por r ou s,
dobram-se tais consoantes para continuidade do som originário:
extrarregimental, extrarrenal, extrasseco, extrassensível.
Extremar ou Estremar?
Ver Estremar ou Extremar? (P. 337)
Extreme ou Estreme?
Ver Estreme ou Extreme? (P. 337)
Fac-símile – Latinismo?
1. Trata-se de expressão vinda do latim, considerada em nosso léxico como
um substantivo masculino, significando a reprodução exata de uma
assinatura, de uma escrita, de uma estampa etc.
2. Já é palavra incorporada ao nosso léxico, regularmente registrada pelo
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia
Brasileira de Letras, órgão oficialmente incumbido de definir os
vocábulos que integram nosso idioma (2009, p. 361).
3. Por ser vocábulo já pertencente a nosso idioma, seu segundo elemento se
escreve com o acento gráfico que marca todas as palavras
proparoxítonas.
4. Seu plural é fac-símiles.
5. Anote-se, por oportuno, que o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, veículo oficial para tanto, até sua edição de 1999, não
registrava como palavra integrante de nosso léxico seu sinônimo fax. O
novo VOLP, entretanto, já traz como regularmente incorporado ao nosso
idioma, o vocábulo fax, bem como seus plurais faxes e os fax
(ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 366).
Ver Fax (P. 352) e Xerox ou Xérox? (P. 796)
Falecer
1. A par de seu sentido corrente de morrer, finar, perder a vida, emprega-se
tal verbo com a significação de faltar, carecer, não ter. Ex.: “Se qualquer
das partes alegar, no entanto, que falece ao assistente interesse jurídico
para intervir a bem do assistido…” (CPC/1973, art. 51, caput).
2. Anote-se, todavia, a observação de Mário Barreto de que caiu ele em
desuso no sentido de faltar, permanecendo apenas o conteúdo semântico
de morrer, finar, perder a vida, razão por que tal autor fala, nesse caso,
em arcaísmo parcial (BARRETO apud HENRIQUES; ANDRADE,
1999, p. 77).
3. Observa-se, todavia, no que concerne à esfera do Direito, que, por um
lado, nos dispositivos legais, normalmente se emprega tal verbo em seu
sentido próprio de finar, perder a vida; mas também se emprega no
sentido figurado de faltar, carecer, não ter. Exs.: a) “Se dois ou mais
indivíduos falecerem na mesma ocasião, não se podendo averiguar se
algum dos comorientes precedeu aos outros, presumir-se-ão
simultaneamente mortos” (CC/2002, art. 8º – sentido de finar, perder a
vida); b) “Não havendo impugnação dentro de 5 (cinco) dias, o pedido
do assistente será deferido. Se qualquer das partes alegar, no entanto,
que falece ao assistente interesse jurídico para intervir a bem do
assistido…” (CPC/1973, art. 51 – sentido de faltar, carecer, não ter).
Falir
1. Em termos jurídicos, significa quebrar, ir à bancarrota o comerciante
que, “sem relevante razão de direito, não paga no vencimento obrigação
líquida, constante de título que legitime a ação executiva” (art. 1º, caput,
do Decreto-lei 7.661, de 21/6/45).
2. Quanto à conjugação verbal, trata-se de verbo defectivo, apenas
conjugado nas formas em que, de acordo com o modelo normal da
terceira conjugação, ao radical se segue i (OLIVEIRA, C., 1961, p. 211).
3. Como bem lembra Sousa e Silva, “não se diz, por conseguinte, falo,
fales, fale, fala, etc., em se tratando, é claro, do verbo falir” (1958, p.
124).
4. Não é outra a síntese de Otelo Reis: “O verbo falir só se conjuga
naquelas formas em que ao l se segue a vogal i” (1971, p. 148).
5. Traz, assim, problemas no presente do indicativo e tempos derivados:
falimos, falis (presente do indicativo); fali (vós) (imperativo afirmativo).
6. Não tem presente do subjuntivo nem imperativo negativo.
7. Como essa defectividade apenas ocorre no presente do indicativo e
tempos derivados, dá-se sua conjugação normalmente, nos demais
tempos: fali, faliste, faliu… (pretérito perfeito do indicativo); falira,
faliras, falira… (pretérito mais-que-perfeito do indicativo); falisse,
falisses, falisse… (imperfeito do subjuntivo); falir, falires, falir…
(futuro do subjuntivo); falia, falias, falia… (imperfeito do indicativo);
falirei, falirás, falirá… (futuro do presente do indicativo); faliria,
falirias, faliria… (futuro do pretérito do indicativo); falindo (gerúndio);
falido (particípio passado).
8. As formas inexistentes desse verbo podem ser supridas por ir à falência,
fracassar, malograr-se.
9. Por este verbo se conjuga remir.
Falsos cognatos
Ver Evidência ou Prova? (P. 339)
Farmacolando – Existe?
Ver Alimentando – Existe? (P. 105)
Fato
Ver O fato de – Está correto? (P. 520)
Fax
1. É palavra que normalmente se emprega como sinônima, em certa
extensão, de fac-símile, para indicar a reprodução exata de uma escrita,
de uma folha impressa, de uma estampa, etc.
2. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 165) atribui a tal vocábulo a
natureza de “abreviatura de fac-símile” e assevera ser palavra “invariável
no plural: os fax”.
3. Também para José de Nicola e Ernani Terra, “o vocábulo fax, já
incorporado ao nosso vocabulário cotidiano, sujeita-se às regras de
flexão dos demais substantivos. Dessa forma, trata-se de um substantivo
uniforme: Enviei um fax; Enviei três fax. Não se justifica, portanto, a
forma plural faxes” (2000, p. 107).
4. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela
Academia Brasileira de Letras, órgão oficialmente incumbido de definir
quais vocábulos integram nosso léxico, não o registrava até sua edição
de 1999, razão pela qual era vocábulo tido como não incorporado ao
nosso idioma. A edição atual do VOLP, entretanto, já o traz como
regularmente incorporado ao nosso idioma; e mais: como seu plural,
faculta as duas formas – os fax ou os faxes (2009, p. 366).
5. Porque assim é, como esse vocábulo vem registrado no Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
que é veículo oficial indicador das palavras existentes em nossa idioma,
está autorizado, por conseguinte, seu normal emprego, como sinônimo
de fac-símile, tanto no singular (fax) quanto no plural (os fax ou os
faxes).
Ver Xerox ou Xérox? (P. 796)
Fazer
1. Em sua ortografia, merecem atenção seu pretérito perfeito e tempos
derivados, em cuja escrita aparece a letra z: fiz, fizeste, fez, fizemos,
fizestes, fizeram (pretérito perfeito do indicativo); fizera, fizeras, fizera,
fizéramos, fizéreis, fizeram (pretérito mais-que-perfeito do indicativo);
fizer, fizeres, fizer, fizermos, fizerdes, fizerem (futuro do subjuntivo),
fizesse, fizesses, fizesse, fizéssemos, fizésseis, fizessem (imperfeito do
subjuntivo).
2. Não confundir, nesse aspecto, com o verbo querer em tais tempos,
“cujas formas se escrevem com s” (CEGALLA, 1999, p. 345): quis,
quiseste, quis, quisemos, quisestes, quiseram (pretérito perfeito do
indicativo); quisera, quiseras, quisera, quiséramos, quiséreis, quiseram
(pretérito mais-que-perfeito do indicativo); quiser, quiseres, quiser,
quisermos, quiserdes, quiserem (futuro do subjuntivo); quisesse,
quisesses, quisesse, quiséssemos, quisésseis, quisessem (imperfeito do
subjuntivo).
3. Significando tempo passado, é verbo que precisa ser observado do ponto
de vista da concordância verbal.
4. Nesse sentido, é impessoal (não tem sujeito), motivo por que fica sempre
no singular. Exs.: a) “Faz um mês que cheguei”; b) “Faz dez meses que
cheguei”.
5. Em sentido de meteorologia, também é impessoal. Exs.: a) “Faz frio”; b)
“Faz dias quentes”.
6. Em ambos os casos, se a construção se dá com auxiliar, também este fica
no singular. Exs.: a) “Deve fazer dez meses que cheguei”; b) “Vai fazer
três meses que não chove”.
Ver Vi-o fechar o cofre ou Vi-lhe fechar o cofre? (P. 769)
Feiúra ou Feiura?
1. Com o Acordo Ortográfico de 2008, é pertinente a dúvida seguinte:
continua ou não o acento gráfico sobre o mencionado vocábulo?
2. Antes da recente reforma ortográfica, acentuavam-se o i e o u tônicos,
desde que formassem hiato com a vogal anterior (ou seja, estivessem os
sons vocálicos em sílabas distintas) e estivessem sozinhos ou seguidos
de s na mesma sílaba.
3. Assim: a) sa-í, sa-í-da, ba-ú, sa-ú-de (sozinhos na mesma sílaba); b) pa-
ís, sa-ís-te, ba-ús, ba-la-ús-tre (seguidos de s na mesma sílaba). Porém:
i) sa-ir, sa-ir-des, Ra-ul, de-mi-ur-go (seguidos de outra letra, que não s,
na mesma sílaba).
4. Também se ensinava que essa regra não valia quando a sílaba seguinte
começava por nh: ba-i-nha, ta-i-nha.
5. Pois bem. Em um primeiro lembrete, o Acordo Ortográfico de 2008
observa que “recebem acento agudo as palavras oxítonas cujas vogais
tônicas i e u são precedidas de ditongo: Piauí, tuiuiús”.
6. Em segundo lembrete, anota que “não recebem acento agudo palavras
paroxítonas cujas vogais tônicas i e u são precedidas de ditongo
decrescente: feiura, baiuca”.
7. A única explicação plausível para essa atitude do Acordo Ortográfico de
2008 talvez seja a vontade da reforma de diminuir o mais possível o
emprego dos acentos gráficos e outros sinais diacríticos.
8. Mas a abolição do acento, no caso, significou uma exceção sem
justificativa real, em determinação que veio mais para confundir do que
para simplificar. Mas regra fixada por acordo implantado por lei é lei.
Felicitar
1. No que tange à regência verbal, num primeiro aspecto, é de se observar a
lição de Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 167): “Constrói-se com o
pronome o (ou a), e não lhe”. Ex. “Felicito-o pela sua brilhante vitória”.
2. Num segundo aspecto, precisa é a lição de Mário Barreto (1954a, p.
293): “Usa-se, em portuguesíssima frase, o verbo felicitar com por ou de
para indicar o objeto, a causa da felicitação”, trazendo tal filólogo
exemplos das distintas construções, ambos de Camilo Castelo Branco: a)
“Os espectadores felicitaram-na pela sua destreza…”; b) “… um baile
de regozijo que o novo titular, estimulado pelo sogro, resolvera dar aos
seus colegas, e mais amigos, que o felicitaram da mercê”.
Fêmeo – Existe?
1. Em termos técnicos, como adjetivo biforme que é, variando
normalmente para amoldar-se ao nome a que se refere, faz fêmeo no
masculino e fêmea no feminino, devendo harmonizar-se pelas regras da
concordância nominal, em gênero e número com o substantivo por ele
modificado.
2. Por isso, Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 117) observa que,
assim como se diz javali gordo e javali alto, também se há de dizer
javali fêmeo, trazendo em corroboração exemplos adicionais de Antônio
Feliciano de Castilho (aerófago fêmeo) e Cândido Figueiredo (gado
fêmeo).
3. Em igual sentido, Vitório Bergo (1944, p. 118) aponta para a
possibilidade de concordância literal, variando para o masculino, se,
como adjetivo, estiver modificando substantivo desse gênero.
4. Também Carlos Góis e Herbert Palhano (1963, p. 47-50) fazem a
concordância literal, tornando masculino o adjetivo, se modifica
substantivo desse gênero: tigre fêmeo, jacaré fêmeo.
5. Na lição de Silveira Bueno (1957, p. 303-4), “macho, macha, fêmeo,
fêmea são adjetivos e como tais devem concordar com o substantivo a
que se referem”, motivo por que exemplifica tal autor: eloquência
macha, mamão fêmeo, jacaré fêmeo, cobra macha.
6. Em outra obra, o mesmo mestre observa que a concordância literal, com
a variação normal de tais adjetivos, “é fácil provar não só com bons
exemplos, mas com exemplos ótimos”, preconizando a possibilidade dos
dois usos: do invariável macho e fêmea, ou da regular concordância
nominal de tais palavras, como reais adjetivos que são.
7. E alinha diversos casos de escritores abalizados (BUENO, 1938, p. 62-
3): oliveira macha (Antônio Feliciano de Castilho); cousa macha (Bento
Pereira); palmeira macha (Morais); cobra macha (Domingos Vieira).
8. Cândido Jucá Filho (1963, p. 301), por sua vez, reputa compreensível
que o adjetivo fique, em silepse (concordância ideológica com o sexo do
substantivo modificado), na forma feminina, como em tigre fêmea,
fundando-se em exemplos de Raul Pompeia (“Para ele o mal era
fêmea”) e de Melo (“O costume de fazerem versos machos e fêmeas…”).
9. A invariabilidade de tal adjetivo, em oposição de gênero ao substantivo
modificado, também é defendida por Evanildo Bechara (1974, p. 85), e
Carlos Góis (1943, p. 240-1), aduzindo este último, para justificar tal
posicionamento, razões de silepse, no que é seguido por Celso Cunha
(1970, p. 97).
10. João Ribeiro (1923, p. 57), muito embora sem teorizar a questão, tanto
com macho quanto com fêmeo, faz, nos exemplos que dá, a
concordância de tais adjetivos por silepse, isto é, pelo sexo do animal
representado: o corvo macho, o javali fêmea, a cobra macho, a
codorniz fêmea.
11. Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 67-8), também sem explicação
alguma acerca das razões de concordância, traz exemplos em que faz
tão somente a concordância ideológica.
12. Artur de Almeida Torres (1966, p. 58) também faz a concordância
ideológica de tais adjetivos, usando sempre macho e sempre fêmea: o
jacaré macho, o jacaré fêmea, o macho da cobra, a fêmea da cobra.
13. Cândido de Oliveira (1961, p. 131), nos exemplos que dá de epicenos,
usa normalmente a concordância com a ideia do sexo e lembra, em
nota específica, que apenas raramente se emprega a forma fêmeo,
como em jacaré fêmeo.
14. Em outra obra, o mesmo autor, sem comentários outros, faz, com tal
adjetivo, a concordância ideológica, vale dizer, com o sexo do ser
retratado: o tatu fêmea (OLIVEIRA, C., s/d, p. 44).
15. Para Alfredo Gomes (1924, p. 354), fêmeo, em casos que tais, trata-se
de um daqueles “substantivos adjetivados”, os quais, exatamente por
esse motivo, “se tornam invariáveis: papagaio fêmea, cobra monstro”.
16. A questão é de tal forma polêmica, que um mesmo autor, Júlio Ribeiro
(1908, p. 83), por um lado, ensina que, em tais casos, se há de fazer a
concordância ideológica (macho será sempre masculino, e fêmea será
sempre feminino), sob o argumento de que a concordância gramatical
como reais adjetivos seria “exagero que se não justifica com bons
exemplos” (RIBEIRO, Júlio apud BUENO, 1938, p. 62-3); por outro
lado, ressalva, sem condenação alguma, que se encontra nos escritores
clássicos portugueses a concordância literal (o jacu fêmeo).
17. Ante a divergência entre os gramáticos e a própria ausência de causa
real proibitiva, quer para macho, quer para fêmeo, parece defensável
efetuar tanto a concordância literal de tais adjetivos (cobra macha,
jacaré fêmeo) como a concordância por silepse, ou ideológica (cobra
macho, jacaré fêmea).
Ver Epiceno (P. 324).
Ferir
1. Quanto à conjugação verbal, aparece um i na primeira pessoa do
presente do indicativo e nos tempos dela derivados: firo, feres, fere,
ferimos, feris, ferem (presente do indicativo); fira, firas, fira, firamos,
firais, firam (presente do subjuntivo); fere, fira, firamos, feri, firam
(imperativo afirmativo); não firas, não fira, não firamos, não firais, não
firam (imperativo negativo).
2. Tal verbo não é defectivo, e não apresenta ele problemas ou
irregularidades nos demais tempos e modos, em que é conjugado normal
e regularmente.
3. Na observação de José de Nicola e Ernani Terra, “o e do radical muda
para i na primeira pessoa do singular do presente do indicativo e nas
formas daí derivadas” (2000, p. 20).
Filosofar
Ver Datilografar (P. 251).
Fim de linha
Ver Partição silábica entre as linhas (P. 551).
Fiscala – Existe?
1. Estendendo ao vocábulo lição proferida a outra palavra, Geraldo Amaral
Arruda observa que melhor é a forma fiscal “tanto no masculino como
no feminino”, justificando que na linguagem culta são muitos os
substantivos com essa terminação que “variam no gênero com a simples
mudança do artigo e do adjetivo que os modifiquem”.
2. Acrescenta ele que adjetivos dessa natureza – de segunda classe – em
latim, tinham uma mesma forma para o masculino e para o feminino, e,
ao se formar o substantivo de tal adjetivo, “surgia um substantivo
masculino ou feminino, conforme fosse masculino ou feminino o
substantivo suprimido no ato da substantivação”.
3. E conclui que “o mesmo processo perdurou no português”, razão pela
qual, “se uma mulher entrar para os quadros da fiscalização de rendas do
Estado, chamar-se-á ela a fiscal”, sendo fiscala o que ele considera uma
“solução inferior”, portadora de “conotação depreciativa ou jocosa”
(ARRUDA, 1997, p. 145-6).
4. Também o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, que é o veículo oficial indicador das palavras
existentes em nosso idioma e da própria maneira de sua flexão, veículo
esse que não registra fiscala, atribui a tal substantivo os dois gêneros, o
que significa dizer que as formas autorizadas são o fiscal e a fiscal
(2009, p. 374).
Ver Oficiala – Existe? (P. 520)
Fiscalizar
1. Para bem se guardar a grafia de tal vocábulo, duas regras devem ser
consideradas: a) Se se tem de acrescentar a um radical o sufixo izar
inteiro para formar um verbo, grafa-se com z: fiscal, útil (primitivas)
fazem fiscalizar, utilizar (derivadas). b) No caso da observação anterior,
porém, se já existe s no radical, é ele aproveitado: análise, pesquisa,
catálise (primitivas) fazem analisar, pesquisar, catalisar.
Ver Ortografia (P. 533) e Regras de ortografia (P. 652).
Flagrância ou Fragrância?
1. Flagrância significa estado do que é inflamado ou manifestação de um
fato no mesmo momento em que se dá. Ex.: “É de total flagrância a
inverdade do que ele falou”.
2. Sua parônima fragrância quer dizer qualidade do que é odorífero,
perfumado, ou, ainda, que tem perfume agradável. Ex.: “Suave
fragrância vinha das roseiras do jardim”.
3. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de determinar a
existência dos vocábulos em nosso idioma, além de sua grafia oficial, o
qual normalmente não traz o significado das palavras, faz questão de, no
caso, distinguir claramente: flagrância é a condição do que é flagrante; já
fragrância significa aroma (2009, p. 375 e 383).
Flagrante ou Fragrante?
1. Um leitor indaga se é correto o vocábulo fragrante no seguinte trecho:
“Há uma fragrante inconstitucionalidade na composição da Corte, uma
vez que não estão sendo respeitadas as proporcionalidades dos quintos”.
2. Ora, flagrante é adjetivo, que pode significar acalorado, inflamado, ou
então evidente ou manifesto. Exs.: a) “O casal, sem dúvida, estava
tomado de flagrante paixão”; b) “Praticava-se, naquele caso, sem
dúvida, flagrante injustiça”.
3. Já sua parônima fragrante quer dizer odorífero, perfumado. Ex.: “Flores
fragrantes fresco aroma espargem” (José Albano).
4. Assim, não há dúvida: o certo é flagrante inconstitucionalidade, e não
fragrante inconstitucionalidade.
5. Importa acrescentar que o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido
oficialmente de determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma,
além de sua grafia oficial, o qual normalmente não traz o significado das
palavras, faz questão de, no caso, distinguir claramente: a flagrante
confere o significado de evidente; a fragrante atribui o sentido de
perfumado (2009, p. 375 e 383).
Fluido ou Fluído?
1. Fluido (sem acento gráfico e com a sílaba tônica no u) pode ser um
adjetivo (a significar fluente, flácido, frouxo). Ex.: “Em discurso fluido,
o mestre expôs com clareza suas ideias”.
2. Também pode ser um substantivo (querendo indicar corpo líquido ou
gasoso). Ex.: “Acondicionar fluidos exige técnica diferente do
armazenamento dos sólidos”.
3. Em ambos os casos, repita-se, a força de sua pronúncia incide sobre o u,
não sobre o i (SACCONI, 1979, p. 18).
4. Nesses sentidos: a) é incorreto grafar ou dizer fluído (com a força da
pronúncia no i); b) a pronúncia é em ditongo (ui) e não em hiato (u-í).
5. Não confundir, assim, com sua parônima fluído, que é forma do
particípio passado do verbo fluir e significa correr em estado líquido,
escoar, manar. Ex.: “O recurso era intempestivo, porque já havia fluído o
prazo processual”.
6. Já nesse caso – fluído – a pronúncia é em hiato (u-í) e não em ditongo
(ui).
Fluir ou Fruir?
Ver Fruir ou Fluir? (P. 366)
Folhas
Ver A folhas vinte e duas – Como é a forma correta? (P. 94)
Fora
1. Trata-se de palavra que pode ter função prepositiva, hipótese em que
Celso Cunha (1970, p. 147) observa ser preposição acidental, podendo
ser sinônima de afora. Exs.: a) “Fora a vítima, ninguém mais
permaneceu na sala de audiências”; b) “Afora a vítima, ninguém mais
permaneceu na sala de audiências”.
2. Nesse caso, não se há de acrescentar nenhuma outra palavra antes da que
tiver que ser efetivamente por ela regida, pois a preposição, em nosso
idioma, vem imediatamente acompanhada da palavra que a ela se
submete, sem interposição de nenhuma outra partícula de ligação. Exs.:
a) “Fora o caso de doença, as faltas serão descontadas” (correto); b)
“Fora do caso de doença, as faltas serão descontadas” (errado).
3. Exemplo de correção no vernáculo, nesse sentido, é o art. 1.096 do
Código Civil de 1916, o qual, ao falar das arras como princípio de
pagamento, complementa que, “fora esse caso, devem ser restituídas,
quando o contrato for concluído, ou ficar desfeito”.
4. Apesar disso, registre-se lição contrária de Antonio Henriques, no
sentido de que tanto se pode dizer “fora isto ou fora disto” (1999, p. 22).
5. Ainda para tal caso, muito embora seja preposição, talvez porque
acidental, depois dela se empregam as formas eu e tu, e não mim nem ti,
como normalmente haveriam de ser pronomes preposicionados. Ex.:
“Todos, fora tu, não serão convidados para a festa”.
6. Se, porém, sua função é adverbial, não pode haver substituição por
afora. Exs.: a) “O advogado jogou fora o código em sinal de protesto”;
b) “Enquanto durou a audiência, o advogado permaneceu fora”.
7. Também é palavra que se usa na consagrada expressão mar em fora, com
o sentido de mar largo.
8. Nesse sentido, de Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 354) é a lição de que
tal palavra, às vezes, pospõe-se ao substantivo, “com suma elegância,
exercendo função semelhante à dos adjetivos”, exemplificando: “Ele
saiu barra fora”.
9. Ainda nesse sentido adverbial, ressaltando a riqueza de nossa língua, o
Padre José F. Stringari (1961, p. 46-7) observa que há três maneiras de
dizer, isto é, fora, a fora e em fora, para o que traz a corroboração de
exemplos de autores insuspeitos: a) “Às onze horas saiu barra fora a
nau” (Camilo Castelo Branco); b) “Subiram todos para a carruagem,
que ruidosamente partiu pela rua a fora” (João Ribeiro); c) “… onde,
deixado o piloto do rio, entramos mar em fora no canal da Mancha”
(Almeida Garrett).
10. Em outros sentidos e funções, admite a estrutura fora de. Exs.: a) “Ele
dormiu fora de casa”; b) “Ele chegou fora de hora”; c) “Sua sugestão é
fora de propósito”; d) “Ele estava fora de si”; e) “Saindo do comum,
ele se comportou fora do natural”.
11. A pronúncia de seu o tônico é aberta (fóra), diferentemente da
pronúncia fechada de seu parônimo fora (fôra), forma verbal do
pretérito mais-que-perfeito simples do indicativo dos verbos ser e ir.
Observe-se que tanto a forma com o tônico aberto quanto a com
fechado não recebem acento diferencial de timbre (agudo ou
circunflexo).
Ver Afora (P. 96).
Fora da lei
1. Expressão de valor substantivo, empregada no sentido de marginal,
delinquente.
2. É invariável no plural: os fora da lei.
3. Anteriormente grafada com hifens (fora-da-lei), teve essa grafia alterada
pelo Acordo Ortográfico de 2008 (fora da lei), conforme registro
expresso do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela
Academia Brasileira de Letras, órgão oficialmente incumbido de listar as
palavras que integram nosso idioma, assim como para definir-lhes a
grafia e outras circunstâncias (2009, p. 379).
Formando – Existe?
1. Apesar da oposição de alguns no que concerne a sua existência e à
possibilidade de seu uso, essa palavra vem registrada no Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
que é o veículo oficial indicador das palavras existentes em nosso
idioma, autorizando-se, por conseguinte, seu normal emprego, para
designar aquele que está para formar-se (2009, p. 380).
Ver Alimentando – Existe? (P. 105)
Fôrma ou Forma?
1. Um leitor indaga se a escrita correta da palavra sinônima de molde, após
as recentes mudanças em nossa ortografia, é fôrma ou forma. Na
hipótese de ser a primeira delas, questiona o motivo, já que, antes da
reforma, a palavra não tinha esse acento.
2. Ora, pela Lei 5.765, de 18/12/71, que alterou, em seu tempo, algumas
regras de nossa ortografia, em simplificação nesse campo, determinou-se
que não mais se acentuariam e e o das palavras de timbre fechado, sinal
esse que, até então, era usado para diferenciá-las dos vocábulos que
apresentavam fonemas de timbre aberto: almôço/almoço,
comêço/começo, colhêr/colher.
3. E tal lei, àquela época, manteve, como única exceção, o acento em pôde
(pretérito perfeito do indicativo de poder – “Ele pôde no passado”) para
diferenciar de pode (presente do indicativo – “Ele pode nos dias de
hoje”).
4. Era clara a justificativa para a exceção: era necessário distinguir entre
formas de um mesmo verbo que se empregava em tempos diversos.
5. Por um lado, o Acordo Ortográfico de 2008 manteve, de modo expresso,
o acento circunflexo diferencial em pôde (terceira pessoa do singular do
pretérito perfeito do indicativo de poder) para diferenciá-la de pode
(terceira pessoa do singular do presente do indicativo de poder).
6. Por outro lado, não se pode esquecer que, já no sistema anterior, havia
autores, como Aurélio Buarque de Holanda Ferreira em seu conhecido
dicionário, que preconizavam a necessidade de excepcionar ao menos
um outro caso de fácil confusão, a saber, forma (ô), a significar modelo
para se conferir o molde desejado, de difícil distinção da palavra forma
(ó), com o sentido de feitio, configuração, aspecto particular.
7. E alinhava tal autor, já àquela época, uma quadra de Manuel Bandeira,
no poema Estrela da Vida Inteira, em que a ausência de acento
simplesmente impossibilitava perceber o sentido da estrofe: “Vai por
cinquenta anos / Que lhes dei a norma: / Reduzi a sem danos / A fôrmas
a forma” (FERREIRA, s/d, p. 645).
8. Pois bem. O Acordo Ortográfico de 2008 tomou as seguintes
providências nesse campo: a) manteve a abolição genérica do acento
diferencial de timbre; b) fez permanecer, com obrigatoriedade, a exceção
do acento sobre pôde (terceira pessoa do singular do pretérito perfeito de
poder) para diferenciar de pode (terceira pessoa do singular do presente
do indicativo de poder); c) em inovação, facultou o uso do acento
circunflexo em fôrma (substantivo de timbre fechado) para distingui-la
de forma (substantivo de timbre aberto ou verbo no presente do
indicativo ou no imperativo).
9. Ante essa novidade, faz-se importante observação: sendo facultativo o
acento, vejam-se os seguintes exemplos, com a indicação de sua
correção ou erronia entre parênteses: a) “Não quero moldar minha vida
em fôrmas rígidas e sem sentido” (correto); b) “Não quero moldar minha
vida em formas rígidas e sem sentido” (correto); c) “Mais importante é o
conteúdo do que a forma” (correto); d) “Mais importante é o conteúdo
do que a fórma” (errado).
Formas arrizotônicas
1. Diz-se das formas verbais em que o acento tônico (sílaba forte) não recai
na raiz, no radical, mas na desinência, na terminação: assim, am-amos,
am-ais.
2. Tais formas repetem-se na conjugação de todos os verbos: são todas as
outras pessoas, com exclusão da primeira, segunda e terceira do singular
e terceira pessoa do plural do presente do indicativo, do presente do
subjuntivo, do imperativo afirmativo e do imperativo negativo (com a
observação de que, nos imperativos, não existe a primeira pessoa do
singular).
3. Trata-se de conceito de grande importância para a conjugação de
diversos verbos defectivos, que podem apresentar ausência de
conjugação exatamente nas demais formas, isto é, nas formas
rizotônicas.
Formas de tratamento
Ver Pronome de tratamento – Diretor de escola (P. 612).
Formas rizotônicas
1. Diz-se das formas verbais em que o acento tônico (sílaba forte) recai na
raiz, no radical, e não na desinência, na terminação: assim, am-o, am-as,
am-a, am-am.
2. Tais formas repetem-se na conjugação de todos os verbos: neles todos,
são a primeira, segunda e terceira pessoas do singular e terceira pessoa
do plural do presente do indicativo, do presente do subjuntivo, do
imperativo afirmativo e do imperativo negativo (com a observação de
que, nos imperativos, não existe a primeira pessoa do singular).
3. É conceito de grande importância para a conjugação de muitos verbos
irregulares, cujas alterações ocorrem exatamente em tais formas, além de
diversos verbos defectivos, não utilizados exatamente nelas.
4. Contrapõem-se a formas arrizotônicas.
Formulário Ortográfico
1. Originalmente, significou um conjunto de instruções para a organização
do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, aprovadas
unanimemente pela Academia Brasileira de Letras, na sessão de
12/8/1943.
2. Estabeleceram tais instruções normas para ortografia, acentuação
gráfica, emprego do hífen, divisão silábica, uso de maiúsculas e de sinais
de pontuação.
3. Compõem-se tais normas de 53 regras, com diversas subdivisões e
observações.
4. A Lei 5.765, de 18/12/1971, veio a modificar alguns aspectos de
acentuação gráfica.
5. Mais recentemente, outras dessas determinações de 1943 foram alteradas
pelas regras advindas do Acordo Ortográfico de 2008, dentre as quais se
destacam a eliminação genérica do trema, a modificação de algumas
regras de acentuação gráfica e a diminuição no emprego do hífen.
6. Importante esclarecer que, como a Academia Brasileira de Letras age,
nesse campo, por delegação legal, em cumprimento à vetusta Lei
Eduardo Ramos, de n. 726, de 8/12/1900, o que resulta de sua atuação –
como a edição do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa e as
alterações do Acordo Ortográfico – tem força de lei, motivo por que suas
determinações são de obrigatória observância, como o são as leis em
geral. Basta ver que alterações mais recentes nas regras nesse campo
foram feitas por meio de diplomas legais, como é o caso da Lei 5.765, de
18/12/71, do Decreto Legislativo 54, de 16/12/90 e dos Decretos 6.583,
6.584 e 6.585, todos de 29/9/2008.
Fortuito ou Fortuíto?
1. A força da pronúncia incide sobre o u, não sobre o i, sendo sua divisão
silábica for-tui-to, e não for-tu-í-to (SACCONI, 1979, p. 18). Ou seja, a
pronúncia é em ditongo (ui) e não em hiato (u-í).
2. São incorretas, frise-se, a grafia e a pronúncia fortuíto.
3. Não há razão alguma para acento gráfico, em sua forma correta.
4. Na lição de Júlio Nogueira, “a tonicidade hoje recai no u, pouco
importando que o latim justifique a tonicidade no i” (1959, p. 24).
5. Fortuito (e não fortuíto) é também a forma registrada pelo Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
que é o veículo oficial indicador das palavras existentes em nosso
idioma, bem como de sua grafia e pronúncia (2009, p. 381).
6. Idêntica observação se pode fazer para circuito, gratuito e intuito.
Ver Fluido ou Fluído? (P. 358)
Fórum ou Foro?
1. Fórum é forma vinda diretamente do latim e significa, em termos
jurídicos, o próprio lugar onde funciona a Justiça, o prédio em que as
causas são julgadas. Nesse sentido, tem por sinônima pouco usada a
palavra foro (com pronúncia aberta no singular e no plural, mas sem
motivo algum de acento gráfico em qualquer dos casos). Exs.: a) “O
fórum cível central de São Paulo fica na Praça João Mendes”; b) “O
foro (ó) cível central de São Paulo fica na Praça João Mendes”.
2. Como todo vocábulo paroxítono terminado em um ou uns, fórum é
palavra acentuada tanto no singular quanto no plural: fórum, fóruns.
Todavia não recebem acento – repita-se – nem foro nem foros.
3. Não se encontrando exemplos de emprego de foro (ó) na legislação mais
conhecida, vejam-se alguns exemplos de emprego da palavra fórum na
legislação: a) “Considera-se prorrogado o prazo até o primeiro dia útil
se o vencimento cair em feriado ou em dia em que: I – for determinado o
fechamento do fórum” (CPC/1973, art. 184, § 1º, I); b) “A praça
realizar-se-á no átrio do edifício do fórum…” (CPC/1973, art. 686, §
2º); c) “O edital será afixado no átrio do fórum…” (CPC/1973, art. 687,
em redação revogada).
4. Com pronúncia fechada no singular (ô) e aberta no plural (ó), dentre
outros sentidos, significa a própria jurisdição, o âmbito, a alçada, o poder
de julgar. Ex.: “Mesmo havendo foro de eleição, normalmente não há
empecilho a que se ajuíze a demanda na comarca do domicílio do réu”.
5. Nesse sentido, também é palavra que, na atualidade, não tem razão
alguma para ser graficamente acentuada nem no singular (ô) nem no
plural (ó).
6. Com Arnaldo Niskier (1992, p. 39), vale reiterar “que o plural de foro,
como o de forno, é pronunciado com o tônico aberto (ó)”. A essa
alteração de timbre fechado no singular para aberto no plural, dá-se o
nome de metafonia.
7. Essa também é a lição de Artur de Almeida Torres (1966, p. 60), que
inclui tal vocábulo entre os “substantivos terminados em o átono que
fazem o plural com acréscimo de s, passando a aberto o timbre fechado
da vogal tônica” (fóros).
8. Nesse sentido se diz “foro de eleição”, “causa a ser discutida neste
foro”, “expressão usada na linguagem do foro”, e há diversos exemplos
de seu emprego na legislação: a) “A procuração geral para o foro,
conferida por instrumento público, ou particular assinado pela parte,
habilita o advogado a praticar todos os atos do processo, salvo para
receber citação inicial, confessar, reconhecer a procedência do pedido,
transigir, desistir, renunciar ao direito sobre que se funda a ação,
receber, dar quitação e firmar compromisso” (CPC/1973, art. 38); b) “A
ação fundada em direito pessoal e a ação fundada em direito real sobre
bens móveis serão propostas, em regra, no foro do domicílio do réu”
CPC/1973, art. 94); c) “Tendo mais de um domicílio, o réu será
demandado no foro de qualquer deles” (CPC/1973, art. 94, § 1º); d)
“Nas ações fundadas em direito real sobre imóveis é competente o foro
da situação da coisa” (CPC/1973, art. 95).
9. Para sintetizar, vale a pena trazer a lição de Antonio Henriques (1999, p.
70-1), que assim diferencia os vocábulos: a) fórum – “o termo, além de
outros significados, adquiriu o sentido de lugar de mercado, centro dos
negócios públicos e privados, lugar onde se resolviam as contestações e
processos”, daí advindo o sentido atual: “lugar, espaço físico, prédio
onde funcionam os órgãos do Poder Judiciário”; b) foro corresponde a
fórum, “com som aberto no singular e plural”; c) foro (som fechado no
singular e aberto no plural) – tem sentido de área de jurisdição, o raio de
ação do juiz, podendo significar, também, “juízo, julgamento (foro
íntimo, v. g.), costume, uso”.
Fotografar
Ver Datilografar (P. 251).
Fração
Ver Número fracionário (P. 505).
Fragrância ou Flagrância?
Ver Flagrância ou Fragrância? (P. 358)
Fragrante ou Flagrante?
Ver Flagrante ou Fragrante? (P. 358)
Francesia
Ver Galicismo (P. 368).
Francesismo
Ver Galicismo (P. 368).
Francesmente – Existe?
Ver Portuguesmente – Existe? (P. 583)
Freqüência ou Frequência?
Ver Trema (P. 746).
Fruir ou Fluir?
1. Fruir tem o significado de desfrutar, gozar. Exs.: a) “Ele fruiu todos os
benefícios que a herança do pai podia conceder-lhe”; b) “São direitos do
condômino: I – usar, fruir e livremente dispor das suas unidades” (CC,
art. 1.335, I); c) “O credor anticrético pode administrar os bens dados
em anticrese e fruir seus frutos e utilidades, mas deverá apresentar
anualmente balanço, exato e fiel, de sua administração” (CC, art. 1.507,
caput).
2. Já sua parônima fluir significa correr em estado líquido, escoar, manar e,
por extensão, decorrer. Exs.: a) “O néctar fluía das flores abertas”; b)
“Se houver atraso na imissão de posse no imóvel, atribuível ao
alienante, a partir dela fluirá o prazo de decadência” (CC, art. 501,
parágrafo único); c) “No caso de citação por edital, o prazo para a
defesa começará a fluir a partir do comparecimento pessoal do acusado
ou do defensor constituído” (CPP, art. 396, parágrafo único).
Frustrar ou Frustar?
1. É preciso atentar a sua ortografia, pois, desde o latim, é verbo que se
conjuga com tr em todas as pessoas, tempos e modos, não existindo o
verbo frustar.
Ver Estupro ou Estrupo? (P. 337)
Fui nascido
Ver Ser nascido – Está correto? (P. 694)
Fundamento
Ver Sob o fundamento – Está correto? (P. 703)
Furta-cor
1. Trata-se de adjetivo composto, que tem o significado de algo cambiante,
que muda de cor conforme a luz.
2. Aires da Mata Machado Filho lembra, por um lado, o posicionamento de
Antenor Nascentes no sentido de conferir a tal vocábulo a condição de
invariável, dando-o como caso análogo a azul-ferrete, azul-pavão, verde-
garrafa e outros compostos, situação essa que o faria ter a mesma forma
para os dois números: o linho furta-cor, a seda furta-cor, os linhos furta-
cor, as sedas furta-cor.
3. Por outro lado, trazendo lição de Gonçalves Viana, o autor por primeiro
referido realça a analogia com o adjetivo multicor, do que adviria a
possibilidade de grafar o termo até mesmo em um só vocábulo,
variando-se-lhe o último elemento (MACHADO FILHO, 1969a, p. 553):
o linho furtacor, a seda furtacor, os linhos furtacores, as sedas
furtacores.
4. Essa última posição é também adotada por Evanildo Bechara (1974, p.
81).
5. Para Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 177), há dupla possibilidade
de plural: furta-cor ou furta-cores – tecidos furta-cor ou tecidos furta-
cores.
6. A tendência entre os dicionaristas, como Cândido Jucá Filho (1963, p.
318), é a grafia em dois elementos, com a flexão do segundo deles
(furta-cores) – em exceção à normal regra do plural dos adjetivos
compostos, que o deixaria invariável.
7. Dirimindo toda e qualquer dúvida e espancando toda outra possibilidade
de grafia, esse também é o posicionamento do Vocabulário Ortográfico
da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, veículo oficial
indicador das palavras existentes em nosso idioma, bem como de sua
maneira oficial de grafar, o qual registra a palavra em dois elementos
(furta-cor) e lhe dá por plural furta-cores (2009, p. 388).
Ver Adjetivos compostos (P. 81).
Futuro do pretérito
1. É bastante comum que alguém indague qual a forma correta: a) “Eu
quero solicitar a atenção dos presentes”; b) “Eu gostaria de solicitar a
atenção dos presentes”.
2. Fixe-se, desde logo, que, no primeiro exemplo, o verbo está no presente
do indicativo, e, na mente do usuário, não parece haver dúvida acerca de
seu uso. A questão que com frequência se põe, em verdade, busca saber
se é correto ou não o emprego do verbo no segundo exemplo.
3. Ora, por largo período, entre nós, esse tempo verbal chamou-se
condicional (e ainda se chama, na linguagem do ensino de muitos
países). Em 1958, porém, ante um emaranhado de terminologias que
grassava nas escolas, uma comissão de estudiosos (dentre eles Antenor
Nascentes, Cândido Jucá Filho, Celso Cunha e Rocha Lima) propôs a
unificação das terminologias no ensino da Gramática. Em 28 de janeiro
de 1959, o Ministério da Educação e Cultura editou a Portaria 36, que
recomendou a adoção das conclusões de tais estudiosos, dentre elas a
sugestão de substituir o nome condicional por futuro do pretérito. Anote-
se que Portugal não participou dessa mudança.
4. Sem intenção alguma de perscrutar o intento da alteração, ou mesmo de
justificar a posição dos estudiosos, uma das hipóteses de sua ocorrência
pode ter sido o fato de que a condição, nesse caso, não reside no tempo
verbal sob análise, mas na estrutura sintática da outra oração como um
todo, como é fácil verificar no seguinte exemplo: “Eu compraria uma
casa, se tivesse dinheiro”.
5. Quanto à adequação de seu uso, diga-se, por primeiro, que Celso Cunha
(1970, p. 222) defende o emprego do futuro do pretérito “como forma
polida de presente, em geral denotadora de desejo”. Ex.: “Desejaríamos
ouvi-lo sobre o crime” (Carlos Drummond de Andrade).
6. Não é diverso o ensino de Gladstone Chaves de Melo (1970, p. 287):
“Empregam-se também as formas do futuro do pretérito, quando se quer
atenuar a expressão, por polidez ou timidez; portanto, eufemismo”. Exs.:
a) “Eu pediria que os senhores tivessem um pouco de paciência, e
aguardassem até amanhã”; b) “Eu sugeriria que daqui fôssemos à casa
do Governador expor-lhe pessoalmente o problema e nossas razões”.
7. Só pela lição desses gramáticos, pode-se assim resumir: em casos como
o desta indagação, tanto é gramaticalmente correto empregar o presente
do indicativo como o futuro do pretérito. Não há entre eles, todavia, uma
real equivalência de conteúdo semântico: enquanto o futuro do pretérito
traduz uma forma polida e atenuada de expressão, portadora de um
desejo não tão claro e determinado, já o presente do indicativo denota
uma postura mais firme e decisiva, uma manifestação de real intento,
que busca efetiva concretização no campo dos fatos.
8. Anote-se, por fim, que muitas pessoas acabam empregando o futuro do
pretérito, no intento de conseguir forma polida, mesmo quando querem
manifestar um real desejo, uma busca de resposta concreta. Para tal
hipótese, todavia, se o intuito é que os ouvintes prestem efetiva atenção
ao que está sendo falado, então que se diga “Eu quero solicitar a atenção
dos presentes”, e não “Eu gostaria de solicitar a atenção dos presentes”.
A busca de pretensa polidez, no caso, faz a comunicação perder força,
sem benefício algum correspondente.
G
Galicismo
1. Por primeiro, diga-se que barbarismo é o nome genérico para o vício de
linguagem consistente em usar vocábulos, expressões e construções
alheias ao idioma.
2. Quando a invasão de palavras provém do francês, dá-se ao vício o nome
de galicismo ou francesismo.
3. Esclareça-se, por outro lado, que, se regular e oficialmente recebida de
outro idioma a palavra nova pelo Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, que é o veículo
oficialmente incumbido dessa tarefa, diz-se estar diante de um
neologismo.
4. Quanto à excessiva aversão a que se incorporem palavras novas ao nosso
léxico, é de se meditar nas palavras judiciosas de Júlio Nogueira, que se
referia especificamente ao francês: “Acaso a nossa língua pode
apresentar palavras tiradas dos próprios celeiros para exprimirem todas
as ideias concernentes à arte da navegação, da guerra, das modas, do
esporte e tantas outras? Não sejamos, pois, intolerantes e,
principalmente, parciais como nos temos revelado em desfavor das
contribuições que recebemos desde tempos remotos de uma das mais
cultas línguas do universo, senão a mais culta” (1959, p. 53).
5. Adicione-se outra passagem desse gramático: “o que cumpre é combater
o propósito evidente em raros escritores de dar à sua frase um ar de
construção francesa, para que se tenha a impressão de que eles sabem
francês” (NOGUEIRA, 1959, p. 53).
6. Em critério pragmático, aconselha Luiz Antônio Sacconi que, “na falta,
em nossa língua, de palavra correspondente ao estrangeirismo, deve-se
aportuguesar a grafia da palavra estrangeira” (1979, p. 268).
7. Também a esse respeito, oportuna a lição de José Oiticica: “é natural
que, sendo a França um país de grande influência em todos os ramos da
atividade humana, seus termos técnicos, científicos, de moda, de trato
social, emigrem com suas criações, pensamentos e vida” (1954, p. 14).
8. Mário Barreto (1954, p. 251), ao referir-se a um glossário de
francesismos já com um século de idade à época em que escrevia,
lembrava que “o rodar dos anos, a influência do uso e a sanção que os
escritores modernos mais autorizados deram a muitas das palavras e
acepções condenadas” fazem com que “pareçam intransigentes demais,
muito demais às vezes, as censuras e sentenças” lançadas contra tais
vocábulos e construções.
9. Para João Ribeiro, quanto aos termos de origem francesa em uso em
nosso idioma, “muitos e vários foram necessitados pelo desenvolvimento
do progresso universal, ou pelo incremento das relações entre os povos
latinos que a França espiritualmente domina; outros, porém, foram
introduzidos por descuido, ignorância das fontes clássicas, pelo mau
gosto dos escritores ou ainda pelo capricho da moda” (1923, p. 247).
10. No que concerne ao eventual cometimento de erros dessa natureza,
oportuna a lição de Mário Barreto: “No capítulo de galicismos todos
pecamos. Nem os que mais se prezam de escrever bem, logram sair
imunes do tão extenso contágio francês que nos rodeia. Não é só aos
tradutores de folhetins que escapam galicismos: também eles escorrem
das mais autorizadas penas” (1954a, p. 38).
11. Citando lição de Cândido de Figueiredo, anota Heráclito Graça que,
nesse assunto, “o que se reprova são os galicismos ou estrangeirismos,
em geral, inúteis e grosseiros, perfilhados pela moda, pela ignorância
ou pela inépcia” (1904, p. 83).
12. Em interessante observação, anota com propriedade Artur de Almeida
Torres que “não são os galicismos em si mesmos o que se repele, mas a
superfluidade evidente” (1966, p. 222).
Ver Gerúndio abusivo (P. 373).
Ganhado ou Ganho?
1. Na lição de Otelo Reis (1971, p. 91), o verbo ganhar, quanto a seu
particípio passado, é usado só na forma irregular (ganho) com qualquer
auxiliar, construção essa que, no entendimento desse autor, predominou,
havendo-se conservado a forma regular apenas em determinadas
locuções, como “viver do ganhado”. Exs.: a) “O réu tinha ganho
indulto”; b) “O indulto fora ganho pelo réu”.
2. Reafirmando tais aspectos, Édison de Oliveira assevera que, na
linguagem contemporânea, “estão fora de uso as formas ganhado,
gastado e pagado, não só com o auxiliar ser, mas também com o
auxiliar ter”, motivo por que “estão, pois, superadas construções como:
a) ‘Nós teríamos ganhado a partida’; b) ‘Ele tinha gastado o tempo
inutilmente’; c) ‘Tínhamos pagado tudo o que devíamos’; devendo-se
preferir: i) ‘Nós teríamos ganho a partida’; ii) ‘Ele tinha gasto o tempo
inutilmente’; iii) ‘Tínhamos pago tudo o que devíamos’” (s/d, p. 121.).
3. Aires da Mata Machado Filho (1969b, p. 783) ainda transcreve
interessante lição de Antenor Nascentes, que resume definitivamente a
questão para essa corrente: “Na língua viva atual, quer com o auxiliar
ter, quer com ser, só se usam os particípios irregulares ganho, gasto e
pago, dos verbos ganhar, gastar e pagar. Na língua antiga, o regular
domina: Vintém poupado, vintém ganhado (nas antigas moedas de 40
réis)”.
4. Ainda nesse sentido, a doutrina de Celso Cunha também merece
transcrição: “De outrora se usavam normalmente os dois particípios. Na
linguagem atual preferem-se, tanto nas construções com o auxiliar ser
como naquelas em que entra o auxiliar ter, as formas irregulares ganho,
gasto e pago, sendo que esta última substituiu completamente o antigo
pagado” (1970, p. 216).
5. Na lição de Alfredo Gomes, “tendem a desaparecer ganhado, gastado”,
remanescendo seu emprego tão somente em “expressões que se tornaram
proverbiais: comer do ganhado, vintém poupado, vintém ganhado”
(1924, p. 389).
6. Adiciona Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 106) que o uso vem
consagrando o particípio ganho tanto para o sentido ativo como para o
passivo.
7. Para Domingos Paschoal Cegalla, “o particípio regular ganhado caiu em
desuso” (1999, p. 178).
8. Também para Regina Toledo Damião e Antonio Henriques, “ganhado
sobrevive, hoje, apenas em determinadas locuções, como viver do
ganhado” (1994, p. 242).
9. Não é outro o ensino de Sousa e Silva: o particípio ganhado caiu em
desuso, “empregando-se atualmente a forma ganho com qualquer
auxiliar” (1958, p. 136).
10. Para Vitório Bergo, “os particípios fortes ganho, gasto, pago, salvo
tendem a suplantar as formas em ado, pois que se usam normalmente
com os dois tipos de auxiliares” (1943, p. 182).
11. E se resuma, para os que defendem o entendimento até agora
demonstrado, que a tendência ao uso na forma participial irregular,
tanto na voz ativa quanto na passiva, é antiga, sendo raros os exemplos
em contrário.
12. Observe-se, porém, que Evanildo Bechara (1974, p. 110) admite a
coexistência atual de ambos os particípios passados.
13. Segue tal caminho Cândido Jucá Filho, o qual, sem quaisquer
explicações adicionais, especifica indiferentemente os particípios
ganho e ganhado (1963, p. 322), exemplificando: a) “O ladrão já tinha
ganhado o mato”; b) “Tínhamos ganhado bom dinheiro”.
14. Vitório Bergo (1944, p. 123-4) também reconhece a continuidade de
existência atual do particípio passado regular desse verbo, que se
deverá usar com os auxiliares ter e haver, muito embora realce que, na
linguagem moderna, o particípio passado irregular tenda a suplantar
aquele, “ainda nos casos em que tenha por auxiliares os verbos ter e
haver”. Exs.: a) “As faces pálidas do Lidador tinham ganhado a
imobilidade…” (Antônio Feliciano de Castilho); b) “Tendo ganhado
para si a vontade do povo…” (A. P. Figueiredo).
15. Para Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 141), por um lado, os particípios
irregulares pago, ganho e gasto “podem empregar-se na voz ativa com
os verbos ter e haver”; por outro lado, “muitas formas regulares”,
como, por exemplo, ganhado, gastado, “podem ser empregadas na
passiva com os verbos ser e estar”.
16. Vasco Botelho de Amaral (1939, p. 34-5), por um lado, anota que
ganhado é “um particípio que foge bastas vezes na escrita de bons
autores e na fala popular daquela determinação gramatical que dá por
convenientes aos verbos ter e haver os particípios regulares e guarda
para emprego adjetivo os que se costumam apelidar de irregulares”;
por outro lado, aponta exemplos de Camilo Castelo Branco, em que
usado tal particípio regular, quer com o verbo ter, quer mesmo em
função adjetiva: a) “Tens ganhado muitos corações com as tuas
palavras delambidas?”; b) “A vitória ganhada sobre o odioso
comissário…”.
17. Cândido de Figueiredo (1941, p. 161) admite para tal verbo tanto o
particípio passado regular como o irregular, estabelecendo duas regras,
que, aliás, são comuns aos verbos com dois particípios passados: a) “Se
o particípio é precedido do verbo ter ou haver, deve ser regular: ‘Eu
tinha ganhado 30 réis’; e ‘Se ele houvesse ganhado outro tanto…’”; b)
“Fora destes casos, é irregular: ‘Meteu no cofre todas as quantias
ganhas na véspera’”.
18. Júlio Nogueira (1939, p. 71) admite a possibilidade de emprego de
ambos os particípios – ganho ou ganhado – muito embora assevere que
“esta última forma já vai sendo esquecida”.
19. Para Cândido de Oliveira, “ganho, gasto, pago, pego são usados
indiferentemente para ambas as vozes (com qualquer auxiliar)”, muito
embora observe que “os particípios ganhado, gastado, pagado, pegado
tendem a desaparecer” (1961, p. 205).
20. Pasquale Cipro Neto e Ulisses Infante (1999, p. 175) consideram
ganhar um verbo abundante, sendo para tais autores perfeitamente
possível o emprego do particípio passado regular (ganhado), o qual
deverá ser usado com os auxiliares ter e haver.
21. Ante a divergência entre os gramáticos, o que reflete a própria
duplicidade de emprego pelos usuários da norma culta na atualidade,
não parece haver razão alguma para se restringir o emprego de
qualquer das formas, de modo que parecem perfeitamente aceitáveis o
particípio passado regular (ganhado) e o particípio passado irregular
(ganho), devendo-se conferir ao primeiro o uso com os auxiliares ter e
haver; ao segundo, deve-se destinar o emprego dos auxiliares ser e
estar.
22. Vejam-se os únicos exemplos de emprego do particípio em estudo,
encontrados após pesquisa nos mais importantes diplomas de nosso
sistema: a) “Mesmo após iniciada a construção, pode o dono da obra
suspendê-la, desde que pague ao empreiteiro as despesas e lucros
relativos aos serviços já feitos, mais indenização razoável, calculada
em função do que ele teria ganho, se concluída a obra” (CC, art. 623);
b) “As dívidas de jogo ou de aposta não obrigam a pagamento; mas
não se pode recobrar a quantia, que voluntariamente se pagou, salvo
se foi ganha por dolo, ou se o perdente é menor ou interdito” (CC, art.
814).
Ver Conjugação verbal (P. 217), Ganhar a rua – Galicismo? (P. 370) e
Verbos abundantes (P. 759).
Garagem ou Garage?
1. Trata-se de palavra vinda do francês, a exemplo de diversas outras:
folhagem, linguagem, maquilagem, personagem.
2. A adaptação adequada de tais vocábulos no vernáculo se faz
indispensavelmente pelo acréscimo da letra m, tal como registra o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira
de Letras, veículo oficial indicador das palavras existentes em nosso
idioma, o qual confere vernaculidade à forma garagem, mas atribui a
condição de palavra pertencente ao vocabulário francês à forma garage
(2009, p. 395 e 862).
3. Bem por isso, reitere-se que errônea é a forma garage, sendo garagem a
forma vernácula.
Gastado ou Gasto?
1. Para Otelo Reis (1971, p. 91), quanto a seu particípio passado, o verbo
gastar é usado só na forma irregular (gasto) com qualquer auxiliar,
observando tal autor que “na linguagem hodierna já não se usa a forma
regular”. Exs.: a) “O réu tinha gasto o produto do crime”; b) “O produto
do crime fora gasto pelo réu”.
2. Nos dizeres de Édison de Oliveira (s/d, p. 121), na linguagem
contemporânea, “estão fora de uso as formas ganhado, gastado e
pagado, não só com o auxiliar ser, mas também com o auxiliar ter”,
motivo por que “estão, pois, superadas construções como: a) ‘Nós
teríamos ganhado a partida’; b) ‘Ele tinha gastado o tempo
inutilmente’; c) ‘Tínhamos pagado tudo o que devíamos’; devendo-se
preferir: i) ‘Nós teríamos ganho a partida’; ii) ‘Ele tinha gasto o tempo
inutilmente’; iii) ‘Tínhamos pago tudo o que devíamos’”.
3. A doutrina de Celso Cunha também merece transcrição: “De outrora se
usavam normalmente os dois particípios. Na linguagem atual preferem-
se, tanto nas construções com o auxiliar ser como naquelas em que entra
o auxiliar ter, as formas irregulares ganho, gasto e pago, sendo que esta
última substituiu completamente o antigo pagado” (1970, p. 216).
4. Observa Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 106) que o uso vem
consagrando o particípio gasto tanto para o sentido ativo como para o
passivo.
5. Para Sousa e Silva, o particípio gastado caiu em desuso, “empregando-se
atualmente a forma gasto com qualquer auxiliar” (1958, p. 136).
6. Também para Vitório Bergo, “os particípios fortes ganho, gasto, pago,
salvo tendem a suplantar as formas em ado, pois que se usam
normalmente com os dois tipos de auxiliares” (1943, p. 182).
7. Para se resumir o entendimento até agora exposto, pode-se dizer que a
tendência ao uso do verbo gastar na forma participial irregular, tanto na
voz ativa quanto na passiva, é antiga, sendo raros os exemplos em
contrário.
8. Em posicionamento contrário, todavia, tem-se, na lição de Eduardo
Carlos Pereira (1924, p. 141), por um lado, que os particípios irregulares
pago, ganho e gasto “podem empregar-se na voz ativa com os verbos ter
e haver”; por outro lado, “muitas formas regulares”, como, por exemplo,
ganhado, gastado, “podem ser empregadas na passiva com os verbos ser
e estar”.
9. Evanildo Bechara (1974, p. 110) também admite a coexistência de
ambos os particípios passados.
10. Cândido Jucá Filho (1963, p. 324), sem quaisquer explicações
adicionais, especifica indiferentemente os particípios gasto e gastado.
11. Aires da Mata Machado Filho (1969b, p. 783), que, sem maiores
explicações, emprega normalmente o particípio passado gastado no
exemplo “Ele havia gastado o dinheiro”, acaba por transcrever
interessante lição de Antenor Nascentes: “Na língua viva atual, quer
com o auxiliar ter, quer com ser, só se usam os particípios irregulares
ganho, gasto e pago, dos verbos ganhar, gastar e pagar. Na língua
antiga, o regular domina: Vintém poupado, vintém ganhado (nas
antigas moedas de 40 réis)”.
12. Anota Vitório Bergo que se encontra em bons autores o emprego do
particípio passado regular, “precedido, segundo a regra geral, do
auxiliar ter ou haver” (1944, p. 124).
13. Para Cândido de Oliveira (1961, p. 205), “ganho, gasto, pago, pego são
usados indiferentemente para ambas as vozes (com qualquer auxiliar)”,
e “os particípios ganhado, gastado, pagado, pegado tendem a
desaparecer”.
14. Para Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 179), “usa-se gastado com
os auxiliares ter e haver”; já “com o auxiliar ser (voz passiva), usa-se
gasto”.
15. Pasquale Cipro Neto e Ulisses Infante (1999, p. 175) consideram gastar
um verbo abundante, sendo para tais autores perfeitamente possível o
emprego do particípio passado regular (gastado), o qual deverá ser
usado com os auxiliares ter e haver.
16. Ante a divergência entre os gramáticos, o que reflete a própria
duplicidade de emprego pelos usuários da norma culta na atualidade,
não parece haver razão alguma para se restringir o emprego de
qualquer das formas, de modo que parecem perfeitamente aceitáveis o
particípio passado regular (gastado) e o particípio passado irregular
(gasto), devendo-se conferir ao primeiro o uso com os auxiliares ter e
haver; ao segundo, deve-se destinar o emprego dos auxiliares ser e
estar.
Ver Conjugação verbal (P. 217) e Verbos abundantes (P. 759).
Generala – Existe?
Ver Capitã, Capitoa ou A Capitão? (P. 168) e Poeta – Qual o feminino? (P.
570)
Genitor ou Pai?
Ver Esposo ou Marido? (P. 331)
Gerir
1. Advirta-se, desde logo, que não se trata de verbo defectivo, e Antonio
Henriques e Maria Margarida de Andrade (1999, p. 80) lembram, de
modo oportuno, que “o paradigma de gerir é aderir” (giro, geres, gere,
gerimos, geris, gerem).
2. Com o sentido de administrar, gerenciar, governar, quanto à conjugação
verbal, atente-se a algumas de suas formas, para não ser confundido com
o verbo girar: giro, geres, gere, gerimos, geris, gerem (presente do
indicativo); gira, giras, gira, giramos, girais, giram (presente do
subjuntivo).
3. Não apresenta problemas ou irregularidades nos demais tempos.
4. É preciso atentar às desinências próprias da terceira conjugação, a que
ele pertence, para não confundi-lo com girar ou mesmo com gerar
(REIS, 1971, p. 136).
Germanismo
1. O nome genérico para o vício de linguagem consistente em usar
vocábulos, expressões e construções alheias ao nosso idioma é
barbarismo.
2. Quando a invasão de palavras ou de estrutura provém do alemão, dá-se
ao vício o nome de germanismo.
3. Esclareça-se, todavia, que, quando regular e oficialmente recebida a
palavra nova de outro idioma pelo Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, que é o órgão
oficialmente incumbido de fixar os vocábulos de nosso idioma, diz-se
estar diante de um neologismo, hipótese em que seu emprego passa a
estar oficialmente autorizado.
Gerúndio abusivo
1. Atente-se à lição de Júlio Nogueira (1959, p. 69) no sentido de emprego
inadequado do gerúndio em diversas situações: “É comum nos jornais:
‘Aluga-se uma casa tendo tantos quartos, tendo gás, luz etc.’ Na
linguagem vulgar: ‘Fulano é homem viajado falando muitas línguas
etc.’. A verdade, porém, é que alguns dicionários portugueses incidem
nesse hábito: ‘Dicionário da língua portuguesa, contendo…’
Ultimamente se tem procurado restaurar o particípio presente na
expressão água fervente, em vez de água fervendo.”
2. Veja-se também a lição de José Oiticica nas seguintes frases: a)
“Entregou-me um copo contendo vinho branco”; b) “Comprei uma casa
tendo quatro quartos”.
3. Tal autor, que as registra em sua obra, aponta tais casos como sendo
hipóteses de galicismos de sintaxe dos mais comuns.
4. Para ele, não é difícil a correção desses exemplos: a) “Entregou-me um
copo com vinho branco”; b) “Comprei uma casa com quatro quartos”.
5. Complementa tal autor, em mesma obra e local, que “só é legítimo,
nesse caso, o gerúndio, quando equivale a uma expressão progressiva”.
Ex.: “Vi um boi passando a ponte”, exemplo esse que equivale a “Vi um
boi que estava passando a ponte” ou “Vi um boi que estava a passar a
ponte” (OITICICA, 1954, p. 22).
6. Reafirmando o princípio de que, “quando o gerúndio não indica uma
continuidade de ação, seu uso é condenável, pois constitui galicismo”,
Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 144) estabelece valiosa regra de
cunho prático no sentido de que, quando indicar continuidade de ação,
pode tal gerúndio ser substituído pelo infinitivo regido da preposição a.
Exs.: a) “Vi o carro passando a curva do estádio” (correto, pois se pode
dizer: “Vi o carro a passar a curva do estádio”); b) “Estava o usuário
contando o dinheiro” (correto, pois se pode dizer: “Estava o usuário a
contar o dinheiro”); c) “Livro contendo estórias” (errado, pois não pode
ser substituído por “Livro a conter estórias”).
7. Registre-se, por fim, a observação de Artur de Almeida Torres (1966, p.
202), para quem, embora os puristas condenem por galicismo o emprego
de gerúndio com valor de oração adjetiva, “tal prática é defendida por
ilustres filólogos e gramáticos”, dentre os quais Eduardo Carlos Pereira,
Said Ali, Afonso Costa, Rodrigues Lapa e Sílvio Elia.
8. Acrescente-se que Geraldo Amaral Arruda, citando lição de Matoso
Câmara Júnior, observa que defeito de redação muito frequente no foro é
“o encadeamento de gerúndios, quando um se subordina ao outro”, tal
como se vê no seguinte exemplo: “O pesado caminhão, após parar no
cruzamento, pôs-se em marcha, desenvolvendo baixa velocidade,
levando a vítima a tentar a ultrapassagem, acelerando sua motocicleta,
a fim de passar pela frente do caminhão, esperando que ele parasse”.
9. O mau uso do gerúndio em encadeamentos dessa espécie se desfaz
exatamente com a alteração da estrutura e, se for o caso, com o emprego
do verbo em outro tempo. Ex.: “O pesado caminhão, após parar no
cruzamento, pôs-se em marcha, em baixa velocidade, o que levou a
vítima a tentar a ultrapassagem, acelerando sua motocicleta, na
expectativa de que ele parasse” (ARRUDA, 1987, p. 22-3).
Gerúndio de telemarketing
1. Nos últimos tempos, quer como tentativa de aparentar uma ilusória
erudição ou ilustração na fala, quer por influência do emprego dos
tempos compostos em inglês, surgiu uma nova praga no vernáculo, a que
se pode chamar de linguagem de telemarketing: as mocinhas
encarregadas das mensagens ao telefone são ensinadas a usar perífrases
verbais inexistentes no idioma, locuções compostas de diversos verbos a
rigor desnecessários, com pretensão de expressão polida e elevada. Exs.:
a) “Já que a dona da casa não se encontra, quando vou estar podendo
entrar em novo contato com ela?”; b) “Ou será que ela vai estar
podendo retornar a ligação?”
2. Veja-se a correção de tais exemplos: a) “Já que a dona da casa não se
encontra, quando poderei entrar em novo contato com ela?”; b) “Ou
será que ela poderá retornar a ligação?”
3. Longe de se buscar a correção de tais estruturas, paira no ar a impressão
de que as pessoas se muniram do sentimento de que quanto mais
alongam tais locuções verbais, mais se mostram eruditas e maior é o
peso e seu poder de convencimento.
Gerúndio encadeado
1. Geraldo Amaral Arruda, citando lição de Matoso Câmara Júnior,
observa que defeito de redação muito frequente no foro é “o
encadeamento de gerúndios, quando um se subordina ao outro”, tal
como se vê no seguinte exemplo: “O pesado caminhão, após parar no
cruzamento, pôs-se em marcha, desenvolvendo baixa velocidade,
levando a vítima a tentar a ultrapassagem, acelerando sua motocicleta,
a fim de passar pela frente do caminhão, esperando que ele parasse”.
2. O mau uso do gerúndio em encadeamentos dessa espécie se desfaz
exatamente com a alteração da estrutura e, se for o caso, com o emprego
do verbo em outro tempo. Ex.: “O pesado caminhão, após parar no
cruzamento, pôs-se em marcha, em baixa velocidade, o que levou a
vítima a tentar a ultrapassagem, acelerando sua motocicleta, na
expectativa de que ele parasse” (ARRUDA, 1987, p. 22-3).
Ver Gerúndio abusivo (P. 373).
Grã
Ver Grã-mestra, Grão-mestra, Grã-mestre ou Grão-mestre? (P. 377)
Grafia de porquê
Ver Por que, Por quê, Porque ou Porquê? (P. 581)
Grama
1. Trata-se de unidade de peso do sistema métrico decimal.
2. Como palavra neutra em grego, deriva para o masculino em português:
um grama, duzentos gramas.
3. Errôneo é o costume popular de atribuir-lhe o gênero feminino: “Ele
comprou duzentas gramas de queijo”.
4. Também errado é tentar garantir-lhe o gênero masculino pela adaptação
de seu final: “Ele comprou duzentos gramos de queijo”.
5. As mesmas observações valem para os compostos decigrama,
centigrama, miligrama.
6. Para resumir, atente-se à síntese de José de Sá Nunes (1938, p. 37):
“Unidade dos pesos do sistema métrico, é palavra masculina, e não pode
ser escrita com o final, porque a etimologia não o permite. Assim
também os seus compostos e derivados”.
7. Em busca de uma explicação para os erros comuns a seu respeito, assim
se pronuncia Cândido de Figueiredo: “Talvez por influência da grama
(nome de várias plantas gramíneas), há gente que fala de duas gramas de
retrós, quinhentas gramas de carne… E, contudo, grama (peso) é termo
masculino em francês, castelhano, italiano, português”.
8. E, quanto a gramo – que é assim usado em espanhol – continua o
referido gramático: “No Brasil também houve quem propusesse o
gramo, em vez de grama; mas em português, gramo, nunca vi, nem ouvi,
nem lucraríamos muito em o ter, a não ser pela vantagem de lhe não
trocarem tão facilmente o gênero. Deixemos a nuestros hermanos o
gramo, e fiquemo-nos com o grama, que não ficamos pior. Antes pelo
contrário” (FIGUEIREDO, 1943, p. 67).
9. Apenas para registro, mas sem laivo algum de anuência, anota-se a lição
de Sousa e Silva, em cujo entender “o povo, que é quem mais emprega o
termo, só lhe atribui o gênero feminino”, motivo por que “força é, por
conseguinte, que admitamos os dois gêneros, o que não será fato insólito
na língua portuguesa”.
10. Mesmo para tal autor, contudo, em lição que não deixa de ser
contraditória, “são sempre masculinas, entretanto, as palavras
decagrama, hectograma, quilograma, miriagrama, decigrama,
centigrama e miligrama” (SILVA, A., 1958, p. 140-1).
11. A lição solitária do referido autor, repita-se, até por desacompanhada
de maiores fundamentos, não há de prevalecer para textos que devam
submeter-se à norma culta, motivo por que se há de observar sempre o
gênero masculino da palavra, mantendo-se o seu final com a aparência
feminina, o que há de valer, de igual modo, para todos os vocábulos
dela derivados: o grama, o decagrama, o hectograma, o quilograma, o
miriagrama, o decigrama, o centigrama e o miligrama.
Ver Abreviatura, Abreviação e Sigla – O que é e Como usa? (P. 55)
Gramática: devemos prestar-lhe obediência?
1. A par da linguagem mais descuidada que se permite no plano coloquial,
na correspondência mais íntima e na conversa familiar entre as pessoas,
existe um modo de escrever e falar próprio dos profissionais de qualquer
área, em suas manifestações oficiais e formais, em que se deve manter
um nível mínimo e comum de fala e escrita, submetidos às normas de
Gramática, a que se dá o nome de linguagem formal ou norma culta.
2. De modo específico no que tange à existência, à grafia e ao gênero das
palavras em nosso idioma, a autoridade fica com a Academia Brasileira
de Letras, que edita regularmente o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, uma espécie de dicionário que lista as palavras reconhecidas
oficialmente como pertencentes ao nosso léxico, bem como lhes fornece
a grafia oficial, muito embora normalmente não lhes comente o
significado.
3. Ao agir assim, a ABL desincumbe-se de uma delegação legal, já que a
vetusta Lei Eduardo Ramos, de n. 726, de 8/12/1900, incumbiu-a de
editar regularmente essa lista oficial dos vocábulos de nosso idioma.
4. E, se temos uma lei, a ela devemos prestar obediência, como, aliás, se dá
com determinação legal de qualquer outra natureza. Basta ver que, em
época mais recente, para abolir o acento circunflexo diferencial de
timbre (com a única exceção de pôde) e os acentos circunflexo e grave
nas palavras com sufixo mente ou iniciado por z, tal se fez por via da Lei
5.765, de 18/12/71.
5. Mais recentemente, o Acordo Ortográfico de 2008, abolindo
definitivamente o trema das palavras em língua portuguesa e a maioria
dos acentos diferenciais, alterando regras de hifenização e de
acentuação, entre outras modificações, valeu-se do Decreto 6.583, de
29/9/2008.
6. Já quanto aos aspectos de construção ou sintaxe (concordância nominal,
concordância verbal, regência nominal, regência verbal, crase, colocação
de pronomes), a autoridade fica com os autores que cultuaram e cultuam
o idioma, em cujo rol raramente se incluem os modernistas, os quais, em
busca de maior comunicação, passaram a incorporar em seus escritos
uma linguagem coloquial, plebeísmos e equívocos gramaticais; a norma
culta, nesse aspecto, encontra-se hoje sedimentada nos bons livros de
Gramática.
7. No tocante à pontuação, apenas a partir da década de cinquenta do
século XX tomou significativo impulso e passou a orientar-se – além das
razões sintáticas tradicionais e dos impulsos subjetivos – pelas
recomendações e exigências mais apuradas da redação técnica, o que faz
concluir que os chamados clássicos de nossa literatura nem sempre lhe
atribuíram posição de relevo. Assim, não é incomum encontrar, mesmo
em abalizados escritores, exemplos de inadequação, nesse campo. Os
livros de Gramática, ademais, pouco trazem a esse respeito, sobretudo no
que concerne ao uso da vírgula.
8. Observa-se, por fim: não se pode dizer que a obediência a tais
parâmetros da norma culta signifique cerceamento à liberdade do
falante. Será difícil encontrar alguém que defenda a tese de que Padre
Vieira ou Rui Barbosa tenham sido cerceados ou feridos em sua
liberdade de expressão, por terem que obedecer às normas da Gramática.
As regras estão aí, e a arte de escrever está em encontrar a adequada
forma de expressão em seus moldes e limites. Mesmo grandes escritores
que têm um modo peculiar de escrever não ignoram tais regras.
Guimarães Rosa, que desconstruiu como raros o idioma em seu modo
peculiar de expressão, conhecia como poucos os meandros do vernáculo.
Grande
Ver Mais grande ou Maior? (P. 453)
Gratuito
1. A força da pronúncia incide sobre o u, não sobre o i, sendo sua divisão
silábica gra-tui-to, e não gra-tu-í-to (SACCONI, 1979, p. 18).
2. Reforce-se, assim, que são incorretas a grafia e a pronúncia gratuíto.
3. E, em sua forma correta, não há razão alguma para acento gráfico.
4. Na síntese de Júlio Nogueira, “a tonicidade hoje recai no u, pouco
importando que o latim justifique a tonicidade no i” (1959, p. 24).
5. A pronúncia em ditongo (ui) e não em hiato (u-í) é também realçada por
Arnaldo Niskier (1992, p. 1).
6. Para Cândido de Figueiredo, “gratuíto é facécia, seguramente” (1946, p.
76).
7. Outro não é o entendimento do Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, órgão
incumbido de definir os vocábulos que oficialmente integram nosso
idioma, o qual não lhe reserva acento gráfico algum (2009, p. 411).
8. Idêntica observação se pode fazer para circuito, fortuito e intuito.
Ver Fluido ou Fluído? (P. 358)
Guarda-comida
1. Partindo das regras gerais de flexão dos substantivos compostos,
oportuno é lembrar que, se entra em sua composição a palavra guarda,
esta pode ser substantivo (e então é variável) ou verbo (e então é
invariável).
2. Em termos práticos de identificação, quando o segundo elemento é
substantivo (como é comida no caso apreciado), guarda é verbo (e,
assim, invariável). Bem por isso, o plural de guarda-comida é guarda-
comidas, assim como guarda-barreiras, guarda-louças, guarda-portões
e guarda-roupas (VITÓRIA, 1969, p. 124).
3. Ainda em termos práticos, quando o segundo elemento é adjetivo (como
é florestal em guarda-florestal), guarda é substantivo (e, assim,
variável), bem como é variável o segundo elemento (que é adjetivo).
Assim, o plural de guarda-florestal é guardas-florestais, assim como
guardas-faceiras, guardas-menores e guardas-maiores.
4. Para memorizar o uso da palavra guarda na formação de compostos
dessa natureza, vale lembrar duas observações de Carlos Góis e Herbert
Palhano (1963, p. 59): a) “Nos substantivos compostos em que o
primeiro elemento é guarda, e o segundo, substantivo, guarda será
sempre verbo, e, deste modo, varia somente o último” (guarda-roupa,
guarda-roupas); b) “Nos substantivos compostos em que o primeiro
elemento é guarda e o segundo adjetivo, guarda será substantivo e ambos
variam” (guarda-noturno, guardas-noturnos).
5. Ou, ainda, que se resuma com a lição de Silveira Bueno (1938, p. 44):
“se guarda for verbo, só o último elemento tomará o sinal de plural”
(guarda-louça, guarda-louças); todavia, “se a palavra for substantivo,
então, tomará também o sinal de plural” (guarda-civil, guardas-civis).
Ver Substantivos compostos – Como levar ao plural? (P. 717)
Guarda-noturno
Ver Guarda-comida (P. 380).
Habeas data
1. Trata-se de expressão latina, composta pela segunda pessoa do singular
do presente do subjuntivo do verbo habere (habeas) e do substantivo
data, com o sentido etimológico de tenhas os dados ou tenhas as
informações.
2. O habeas data insere-se entre os direitos e garantias fundamentais
listados pelo art. 5º da CF/1988 (CF, art. 50, LXXII), e se concede nas
seguintes situações: a) “para assegurar o conhecimento de informações
relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de
dados de entidades governamentais ou de caráter público” (alínea a); b)
“para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo
sigiloso, judicial ou administrativo” (alínea b).
3. Na redação original de 1988, o constituinte atribuiu-lhe a grafia habeas-
data (com o hífen), como ainda consta nos arts. 5º, LXIX, LXXII e
LXXVII, 102, I, d; 102, II, a; 105, I, b; 108, I, c; 109, VIII e 121, § 4, V.
4. Em alterações posteriores, realizadas por duas emendas constitucionais,
a grafia passou a ser habeas data (sem o hífen): a) art. 105, I, b (em
redação atribuída pela EC 23, de 20/12/99); b) art. 114, IV (em redação
conferida pela EC 45, de 31/12/04).
5. É de relevo observar que, por se tratar de expressão latina, obrigatório é
o uso das aspas, negrito, itálico, sublinha ou grifo indicador de tal
circunstância, além de proibida a utilização de acentos gráficos e de
hífen, que não existiam no idioma original.
6. Não se olvide, nesse sentido, a lição de Edmundo Dantès Nascimento
(1982, p. 145) de que expressões como essa não eram hifenizadas em
latim, razão pela qual “não o podem ser em língua nenhuma”; e
acrescenta tal autor que, “para quem pretende grafar escorreitamente,
não é permitido o hífen em expressões do latim clássico”.
7. Diversa, estranha e equivocadamente, entretanto, José de Nicola e
Ernani Terra, a par de asseverarem a ausência de acento, por se tratar de
uma expressão latina, pela mesma razão observam que “deve ser sempre
grafada com hífen” (2000, p. 122).
8. Ora, pela simples razão de que se trata de expressão latina e de que não
havia hífen na língua originária, o melhor é seguir o ensino de Domingos
Paschoal Cegalla (1999, p. 188), o qual, após observar que “não há
consenso quanto ao uso do hífen” em expressões latinas desse jaez,
realça que “é preferível dispensá-lo”.
9. Acrescente-se que, nas palavras e expressões latinas, as vogais, mesmo
no fim das palavras, hão de ser pronunciadas claramente, até para se
evitarem confusões quanto a flexão das declinações; assim, diga-se
ábeas, e não ábias.
Habitar
1. Na lição de Vitório Bergo (1944, p. 129), que se funda em exemplos de
autores insuspeitos, esse verbo tanto pode ser empregado sem
preposição, como pode vir construído com a preposição em: a) “Que
terra é esta que habitais” (Camões); b) “… servos que habitavam nos
povoados principais…” (Alexandre Herculano).
2. Artur de Almeida Torres (1967, p. 165-6), além de confirmar-lhe a
possibilidade de construção como transitivo direto e com a preposição
em, ainda o vê como pronominal no sentido de povoar: “Olha essa terra
que se habita dessa gente sem lei” (Camões).
3. Nesse último caso, todavia, o que se tem é uma voz passiva sintética,
funcionando o se como partícula apassivadora, podendo-se transformar o
exemplo da seguinte maneira: “Olha essa terra que é habitada dessa (ou
por essa) gente sem lei”.
4. Porque assim é, continuaria sendo tal verbo transitivo direto, já que, na
voz ativa, assim haveria de ser a estrutura: “Olha essa terra que essa
gente sem lei habita”.
5. Francisco Fernandes (1971, p. 370) ensina que esse verbo pode ser
empregado como transitivo direto (sem preposição), assim como pode
ser construído com alguma das seguintes preposições: em, sobre e com.
Exs.: a) “Habita um palácio, habita uma choupana” (Constâncio); b) “O
homem é o animal mais disparatado e incongruente que habita na terra”
(Garrett); c) “Todos os que habitavam sobre a face de toda a terra”
(Padre Antônio P. Figueiredo); d) “Sem mais querer habitar com
Leovegildo, se fez viúva” (Morais).
6. Em nossa legislação, a maioria dos exemplos encontrados são no sentido
do emprego como transitivo direto (sem preposição), quer na voz ativa,
quer na voz passiva; mas há também casos, embora em número bem
menor, de seu uso com a preposição em: a) “Quando o uso consistir no
direito de habitar gratuitamente casa alheia, o titular deste direito não a
pode alugar, nem emprestar, mas simplesmente ocupá-la com sua
família” (CC, art. 1.414); b) “São terras tradicionalmente ocupadas
pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente…” (CF, art.
231, § 1º); c) “Aquele que habitar prédio, ou parte dele, responde pelo
dano proveniente das coisas que dele caírem ou forem lançadas em
lugar indevido” (CC, art. 938); d) “O proprietário ou o possuidor de um
prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à
segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela
utilização de propriedade vizinha” (CC, art. 1.277); e) “Quando o uso
consistir no direito de habitar gratuitamente casa alheia, o titular deste
direito não a pode alugar, nem emprestar, mas simplesmente ocupá-la
com sua família” (CC, art. 1.414); f) “Se o direito real de habitação for
conferido a mais de uma pessoa, qualquer delas que sozinha habite a
casa não terá de pagar aluguel à outra, ou às outras, mas não as pode
inibir de exercerem, querendo, o direito, que também lhes compete, de
habitá-la” (CC, art. 1.415); g) “Observar-se-á o procedimento
sumaríssimo: I – nas causas, qualquer que seja o valor: … j) do
proprietário ou inquilino de um prédio para impedir, sob cominação de
multa, que o dono ou inquilino do prédio vizinho faça dele uso nocivo à
segurança, sossego ou saúde dos que naquele habitam” (CPC/1973, art.
275, I, “j”, versão revogada).
Ver Voz passiva e Pronome apassivador (P. 791).
Habitat
1. É o lugar de vida de um organismo ou o total de características
ecológicas do lugar específico habitado por um organismo ou população.
2. Muito embora tenha chegado a nós por intermédio do francês, trata-se de
forma latina do verbo “habito, as, avi, atum, are”, é palavra
proparoxítona e tem a pronúncia adequada com maior força na
antepenúltima sílaba (ábitat), com o t final pronunciado, e não na última
(abitá), sem dicção do t.
3. Equivocada, assim, é a pronúncia afrancesada (abitá).
4. Se for ele entendido como vocábulo latino, obrigatório há de ser o uso
das aspas, negrito, itálico, sublinha ou grifo indicador de tal
circunstância, além de proibida a utilização de acento gráfico, que não
existia naquele idioma.
5. Ainda retomando sua etimologia e conceito, para Antonio Henriques,
trata-se de “forma verbal latina (terceira pessoa do singular do presente
do indicativo de habitare – habitar) substantivada em português e
corrente em ecologia: características do local habitado por organismos
ou população” (1999, p. 82).
6. Justificando a manutenção da grafia latina do vocábulo, sem acréscimo
final de qualquer letra, assim se expressa Arnaldo Niskier:
“Consideramos recomendável tal grafia, já que, se acrescentássemos o e
ao t mudo final, teríamos palavras biesdrúxulas (… hábitate), coisa que
não ocorre em nosso idioma” (1992, p. 8-9).
7. Complementando a lição de Arnaldo Niskier, Celso Cunha e Luís Filipe
Lindley Cintra (1985, p. 56) advertem que as palavras bisesdrúxulas (ou
biesdrúxulas) podem ocorrer em português somente quando se
combinam certas formas verbais com pronomes átonos, formando um só
vocábulo fonético e, nesses casos, é possível o acento recuar mais uma
sílaba além da antepenúltima. Ex.: “Amávamo-lo, faça-se-lhe”.
8. Cândido Jucá Filho (1963, p. 337) já a considera palavra incorporada ao
nosso léxico, liberando-a de aspas ou sinal equivalente e
providenciando-lhe acento: hábitat.
9. A seu respeito, assim é a lição de José de Nicola e Ernani Terra: “Esse
substantivo masculino, que significa o lugar de vida de um organismo, é
um latinismo. Sua forma aportuguesada é trissílaba e proparoxítona;
recebe, portanto, acento gráfico: há-bi-tat. Como você pode observar,
não se justifica a pronúncia oxítona nem a grafia sem o t final” (2000, p.
122).
10. Para Domingos Paschoal Cegalla, “é latinismo incorporado ao
português, devendo por isso ser acentuado” (1999, p. 188).
11. Inaceitável, porém, é o proceder de Aurélio Buarque de Holanda
Ferreira (s/d, p. 712), que a incorpora ao vernáculo como
proparoxítona, mas não a acentua graficamente, tipificando-a, assim,
como odiosa e desnecessária exceção de palavra dessa natureza que
não é graficamente acentuada.
12. Pondo fim a polêmicas, o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, que é o veículo
incumbido de determinar oficialmente a existência das palavras em
nosso idioma, bem como de ordenar o modo de sua grafia, determina,
sem outras possibilidades de discussão: a) trata-se de substantivo latino
(que, portanto, deverá vir entre aspas, negrito, itálico, sublinha ou com
outro sinal de pertencer a palavra a outro idioma); b) sua grafia é
habitat (sem acento gráfico); c) sua pronúncia é ábitat (2009, p. 862).
Habite-se
1. Nos dizeres de Antonio Henriques (1999, p. 82), trata-se de “forma
verbal usada como substantivo: o habite-se, isto é, documento emitido
pelo poder municipal que autoriza a ocupação e uso de um imóvel (casa,
edifício)”.
2. Seu plural se faz pela simples alteração do artigo: os habite-se
(ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 401). Essa, aliás, é
a posição do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, publicado
pela Academia Brasileira de Letras, órgão esse que tem delegação legal
para listar as palavras oficialmente existentes em nosso idioma, bem
como, se for o caso, sua maneira de formar plural, o qual registra que a
mesma forma (habite-se) há de ser observada para os dois números, isto
é, para o singular e para o plural (2009, p. 401).
Habituar
1. Trata-se de verbo regular, conjugado em todas as pessoas, tempos e
modos.
2. Não traz outras dificuldades, a não ser aquela que pode ser solucionada
pelas palavras de Cândido de Oliveira, alertado pelos comuns equívocos
cometidos nesse campo: “é com ue a primeira, segunda e terceira
pessoas do singular do presente do subjuntivo dos verbos em uar: cultue,
cultues, habitue, preceitues” (1961, p. 65).
3. Não existem, assim, as formas cultuis, cultui, habitui, preceituis.
Há de ou Há-de?
1. Apesar de Cândido Jucá Filho (1963, p. 339) registrar a presença do
hífen na referida forma verbal – e isso sem quaisquer comentários
adicionais, lembra Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 133) que o
hífen após o verbo haver, nesses casos, é invenção lusa, a fim de se
evitar o erro muito comum por lá de se dizer há des, em vez de hás de.
2. Por cá, todavia, nosso sistema ortográfico não o permite de forma
alguma, nem implícita, nem explicitamente. Exs.: a) “O advogado há-de
chegar a tempo” (errado); b) “O advogado há de chegar a tempo”
(correto).
3. Valem as observações para outras formas do verbo haver: hei de, hão de,
haverá de, haverão de.
Ver Haver – Quando vai para o plural? (P. 386)
Hão de
Ver Hei-de vencer ou Hei de vencer? (P. 389)
Há ou A?
1. Profunda distinção deve ser feita entre ambas as palavras, que têm
naturezas e significados diversos.
2. Há é forma do verbo haver e significa tempo passado. Ex.: “Há vários
dias não vejo aquele desembargador”.
3. A é preposição e serve, nos casos em que pode haver confusão, para as
expressões indicativas de tempo futuro. Ex.: “Daqui a dois dias o verei
novamente”.
4. Atente-se a que não se deve usar verbo haver (nem há, por conseguinte),
se o verbo é futuro, razão por que errado é o seguinte exemplo: “O
advogado chegará daqui há duas horas”.
5. Por todas essas razões, não se hão de confundir as seguintes frases: a) “O
advogado chegou a tempo para a audiência” (isto é, em tempo, com
tempo); b) “O advogado chegou há tempo para a audiência” (ou seja,
faz tempo).
6. A distinção que ora se faz não é supérflua, tanto assim que Josué
Machado (1994, p. 10), atento aos cochilos da imprensa, flagrou,
publicada num jornal de São Paulo, a expressão “daqui há algum
tempo”.
Ver Há ou Havia? (P. 385)
Há ou Havia?
1. Existem, em português, normas de correlação, de correspondência
temporal ou, ainda, de consecução dos tempos verbais (em latim, com
regras mais rígidas, consecutio temporum), determinadoras de
harmonização quanto ao uso das formas dos verbos.
2. Por essas normas é que, na prática, assim se redigem os seguintes
exemplos: a) “Se é clara, a lei dispensa interpretação”; b) “Se for clara,
a lei dispensará interpretação”; c) “Se fosse clara, a lei dispensaria
interpretação”.
3. Com o verbo haver, a situação não é diferente, de modo que, se, com o
verbo fazer, se diz “A lei vigorava fazia anos” (e não “A lei vigorava faz
anos”), o correto, com o verbo haver, também é “A lei vigorava havia
anos” (e não “A lei vigorava há anos”).
4. Precisa, nesse ponto, é a lição de Vasco Botelho do Amaral:
“Modernamente, contra a índole da língua dos melhores escritores, com
frequência se perde de vista o paralelismo das formas verbais, e redige-
se: ‘Há dias que se trabalhava’. Evite-se essa construção” (AMARAL
apud ALMEIDA, 1981, p. 133).
5. Júlio Nogueira (1939, p. 190) também lembra que, com o verbo haver,
“se a relação de tempo é no passado, o verbo deve ir também para tempo
passado: ‘Ele chegara havia dez minutos’ (e não: ‘há dez minutos’)”.
6. Vê-se, assim, que equivocado é o emprego do verbo haver na frase
“morava há 40 anos”, a qual deve ser corrigida para “morava havia 40
anos”. Comparem-se os exemplos, ambos corretos, mas indicadores de
épocas diversas: a) “Ele mora ali há dez anos”; b) “Ele morava ali havia
dez anos”.
Ver Consecução dos tempos verbais (P. 219) e Há ou A? (P. 385)
Hás de
Ver Hei-de vencer ou Hei de vencer? (P. 389)
Haurir
Ver Abolir (P. 55).
Haver mister
1. Trata-se de expressão de que Vieira fez uso frequente no sentido de
necessitar, precisar, desejar, como demonstram os dois seguintes
exemplos, ambos extraídos de seus “Sermões”: a) “Logo, há mister luz,
há mister espelho e há mister olhos”; b) “… as outras nações, para
crerem, hão mister entendimento e vontade”.
2. Nosso Código Civil de 1916 também a empregou: “Cabe ao tutor,
quanto à pessoa do menor: … II – reclamar do juiz que providencie,
como houver por bem, quando o menor haja mister correção” (CC/1916,
art. 424, II). Tal expressão é assim mantida na codificação atual (CC, art.
1.740, II).
3. Vasco Botelho de Amaral (1939, p. 16) afiança que tal expressão “é bem
português”, invocando exemplo de Antônio Feliciano de Castilho: “…
para historiador há-se mister uma grande filosofia…”.
4. Quanto à estruturação sintática da frase, lembra Laudelino Freire (1937a,
p. 61) que esse torneio tem força de verbo transitivo e pede objeto direto,
o que, aliás, é bem visível nos exemplos dados do Padre Vieira.
5. Eduardo Carlos Pereira, de igual modo, arrola a expressão entre aqueles
casos curiosos “em que o valor transitivo está numa frase equivalente a
um verbo transitivo, a qual pede por isso um objeto direto” (1924, p.
238).
6. De Mário Barreto (1954b, p. 186) também é a lição de que “a locução
verbal, neste caso, tem força de verbo transitivo e pede objeto direto”,
exemplificando fartamente: a) “Não havemos mister doutores”; b) “Não
as hei mister”; c) “Havíamos mister trezentos mil cruzados”; d) “Não há
Deus mister conselho”.
7. Em proveitosa lição adicional, Antonio Henriques e Maria Margarida de
Andrade (1999, p. 82) observam que “haver mister não é forma
defectiva; conjuga-se em todas as pessoas”. Ex.: “Muitos dos enfermos
bem haviam mister um hospital” (Vieira).
8. Em outra obra, escrita solitariamente, Antonio Henriques (1999, p. 114)
também realça aspectos de relevo quanto ao uso dessa expressão, que ele
considera “forma conjugável em todas as pessoas”, de modo que “não é
defectiva” e se apresenta: a) “sem preposição”, estrutura que é “mais
corrente na linguagem arcaica” – “Muitos dos enfermos bem haviam
mister um hospital” (Padre Vieira); b) “com a preposição de”, sintaxe
“mais recorrente na linguagem atual” – “Mas o seu amor da ciência e da
pátria havia mister de outros incentivos” (Rui Barbosa).
9. Cândido Jucá Filho (1981, p. 75) – que identifica em tal expressão um
“conglomerado transitivo” – lembra a possibilidade de construção com
objeto direto e com objeto indireto: a) “… quando os há mister…”; b)
“Há mister de uma humana providência” (Latino Coelho).
10. Lembrando que tal expressão tem por variantes haver mister de e haver
de mister, corrobora Laudelino Freire (1937b, p. 100) a ideia de que ela
tem força de verbo transitivo direto.
Ver Fazer-se mister – Está correto? (P. 353), Mister (P. 475) e Ser mister –
Está correto?(P. 694)
Haver ou A ver?
Ver Nada a ver ou Nada haver? (P. 483)
Havia ou Haviam?
Ver Concordância verbal (P. 212) e Haver – Quando vai para o plural? (P.
386)
Hebraísmo
Ver Estrangeirismos (P. 336).
Hei de
Ver Hei-de vencer ou Hei de vencer? (P. 389)
Helenismo
Ver Estrangeirismos (P. 336).
Herói ou Heroi?
Ver Ditongos éi, ói, éu – Quando acentuar? (P. 292)
Hiato
1. É o encontro de sons vogais na palavra, os quais, entretanto, na divisão
do vocábulo, permanecem em sílabas diferentes: sa-ú-de, ra-i-nha, sa-ir.
2. Não importando se a palavra é oxítona ou paroxítona, os hiatos se
submetem a regras especiais de acentuação gráfica.
3. Assim, se o i ou o u, seguidos ou não de s na mesma sílaba, são tônicos e
formam hiato com a vogal anterior, recebem acento gráfico: saí, saíste,
balaústre, saúde.
4. Nesse último caso, porém, se, na mesma sílaba, o i ou o u são seguidos
de outra letra que não s, não há acento: saiu, saindo, sair.
5. Por essa razão, acentuam-se país, países, juíza, juízes, ruína; não, porém,
juiz, ruim, Raul.
6. Por casuísmo injustificável, não se acentua Bahia (ALMEIDA, 1981, p.
37), mas se acentua baía.
7. De igual modo, pelo Acordo Ortográfico de 2008, “não recebem acento
agudo palavras paroxítonas cujas vogais tônicas i e u são precedidas de
ditongo decrescente: feiura, baiuca”.
8. Ultime-se com a observação de que tal regra de acentuação do hiato
também não se aplica, se a sílaba seguinte é começada por nh, como, por
exemplo, em rainha, bainha.
Ver Acentuação gráfica (P. 67) e Bahia (P. 155).
Hífen
1. Quanto à acentuação gráfica de tal palavra, sendo ela paroxítona, seu
singular há de ter acento agudo no i (hífen), de acordo com a 8ª regra do
§ 43 do Formulário Ortográfico, mantida pelo Acordo Ortográfico de
2008 (acentuam-se graficamente os vocábulos paroxítonos terminados
por n).
2. O plural, porém, não traz acento gráfico (hifens), de acordo com a 1ª
observação da 7ª regra do mesmo parágrafo, também mantida pelo novo
sistema de ortografia: “Não se acentuam graficamente os vocábulos
paroxítonos finalizados por ens: imagens, jovens, nuvens”.
3. Não confundir, nesse aspecto, com item (terminada por m), que não é
acentuada nem no singular, nem no plural (itens).
4. Vejam-se, portanto, as seguintes formas: hífen, hifens, item, itens.
5. Quanto a seu emprego, o hífen constitui um sinal diacrítico (-) usado por
simples convenção ortográfica, para ligar elementos de palavras
compostas (couve-flor, melro-de-pescoço-amarelo) ou formações
mediante alguns prefixos (pré-datar e pós-datar), ou para unir pronomes
átonos a verbos (ofereceram-me, vê-lo-ei), ou para, no fim da linha,
separar uma palavra em duas partes (ca-sa).
6. Esse assunto, inicialmente regulamentado pelo Formulário Ortográfico
da Academia Brasileira de Letras, publicado em 1943, foi, como um
todo, alterado pelo Acordo Ortográfico de 2008, embora mantido seu
emprego em diversos casos.
7. Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 138), com respeito ao sistema
anterior, observava, e com razão, que o emprego do hífen nos compostos
era incerto, já que às vezes se tinha uma regra, a qual era desfeita logo
após por uma nota, que remetia a questão para ser solucionada com base
no uso, estabelecendo, assim, um critério falho e contraditório.
8. Embora seja inegável e perceptível o esforço de melhoria nesse sentido,
a confusão ainda continua sendo grande em alguns aspectos, mesmo
após Acordo Ortográfico.
9. As novas diretrizes podem ser assim sintetizadas: a) diminuir ao máximo
seu emprego, quer pela junção dos elementos sem hífen (corréu e
contrarrazões), quer por sua separação em vocábulos distintos, mas sem
hífen (à toa, dia a dia e pôr de sol); b) especificar melhor as regras para
seu uso; c) conferir sistematização mais lógica a seu emprego.
10. Como suas maiores dificuldades estão em alguns prefixos e elementos
denominados falsos prefixos, remete-se o leitor para tais casos,
estudados nesta obra: ab, ad, agro, ante, anti, arqui, auto, co, contra,
entre, extra, hiper, infra, inter, intra, macro, micro, multi, neo, pós, pré,
pseudo, retro, sem, semi, sobre, sub, super, supra, ultra.
11. Observa-se, adicionalmente, por ser de grande interesse nos meios
jurídicos e forenses, a lição de Edmundo Dantès Nascimento: “No
latim clássico, as expressões ex cathedra, extra muros, ex officio e
outras não eram hifenizadas, portanto não o podem ser em língua
nenhuma” (1982, p. 145). Ou seja: o hífen não existia no latim, de
modo que não há motivo algum para seu emprego em expressões
latinas, hoje citadas nos textos jurídicos e forenses.
Ver Anexo: Uso do hífen com base no prefixo e na letra inicial da
palavra seguinte (P. 803).
Hífen e ênclise
1. Um leitor pergunta se, com as modificações trazidas pelo Acordo
Ortográfico de 2008, continua existindo hífen em aplicasse-lhe. Justifica
sua dúvida com o fato de que ele havia entendido que o hífen seria usado
apenas se o elemento seguinte fosse iniciado por h ou por vogal idêntica
à que terminasse o primeiro elemento.
2. E outro leitor indaga se há ou não hífen nas formas: a) “Vou-lhe
contar…”; ou b) ‘Vou lhe contar…”?
3. Em realidade, a dúvida do primeiro leitor se originou do fato de que ele
invocou uma observação feita para um prefixo que se antepõe a uma
palavra e quis aplicá-la à junção de um pronome átono ao verbo por ele
completado, o que constitui realidade totalmente diversa.
4. Explica-se. Quando se tem um prefixo terminado por vogal (contra, por
exemplo), a regra é que há hífen em duas situações: a) se o elemento
seguinte se inicia por h (contra-habitual); b) ou se o elemento seguinte
se inicia por vogal idêntica àquela que encerra o prefixo (contra-
arrazoado). Se não ocorre nenhuma das duas hipóteses, então a junção é
direta, sem hífen algum (contraindicar, contracheque), dobrando-se o r
ou o s por eufonia, para a continuidade do som (contrarrazões e
contrassenso).
5. O caso de ambas as dúvidas ora apreciadas, porém, não concerne a
prefixo, mas diz respeito à junção de um pronome pessoal oblíquo átono
ao verbo por ele completado.
6. E, para esse caso, aplicam-se as seguintes ponderações: a) se o pronome
átono vem antes do verbo (próclise), os vocábulos se separam sem hífen
algum (“Não nos comunicaram a novidade”); b) se, porém, o pronome
átono vem no meio do verbo (mesóclise), há hífen antes e depois do
pronome, para ligá-lo às duas partes em que se divide o verbo (“Dir-lhe-
ei toda a verdade”); c) por fim, se o pronome átono vem depois do verbo
(ênclise), junta-se ele por hífen ao verbo por ele completado (“Disseram-
me que você não viria”).
7. É muito comum ver equívocos de emprego em tais circunstâncias,
incluindo os casos em que, numa locução verbal, o pronome se encontra
em ênclise ao verbo auxiliar; mas o certo é que há uma só regra: se o
pronome vem em ênclise ao verbo (não importando se é auxiliar ou
principal, ou mesmo não há vinculação alguma com locução verbal), é
obrigatória sua conexão por meio de hífen.
8. Por essa razão, é oportuno verificar seu correto emprego (ou mesmo sua
ausência) nos exemplos a seguir, dentre os quais se incluem as dúvidas
trazidas pelos leitores: a) “Nessas situações, aplicasse-lhe a regra
geral…”; b) “Vou-lhe contar o que estou sabendo sobre o assunto”; c)
“Eu lhes estou mostrando meu trabalho”; d) “Eu estou-lhes mostrando
meu trabalho”; e) “Eu estou mostrando-lhes meu trabalho”; f) “As
situações estão-se desenvolvendo perpetuamente”; g) “Vou-lhe permitir
sair mais cedo”; h) “Quer-me fazer o favor de sair daí?”; i) “Quer fazer-
me o favor de sair daí?”; j) “Saiu, fazendo-me ameaças”.
Hipercorreção
1. No falar cotidiano, as pessoas, às vezes, são traídas pelo próprio
sentimento acerca do que seja falar e escrever bem o Português.
2. Em outras palavras, empregando determinada forma de se exprimir, “o
agente erra supondo estar certo, em oposição a outra, que na verdade é a
correta”.
3. Assim, por exemplo, emprega ele (SILVA, L., 1991, p. 169), de modo
equivocado, pégada (por pegada), rúbrica (por rubrica), súbida honra
(por subida honra), “fazem dois anos” (por faz dois anos), “eu não me
simpatizo com ele” (por eu não simpatizo com ele).
Hipotizar – Existe?
Ver Existe em português? (P. 346)
Hoje é 1º…
Ver Datas (P. 250).
Homófonas
1. Evidenciando aspecto que tem importância no campo da semântica e da
ortografia, homófonas são palavras de mesma pronúncia, mas de grafia
diversa.
2. Assim, para exemplificar, caçar significa apanhar vivo para prender ou
matar, enquanto cassar quer dizer anular, invalidar. Exs.: a) “Foram ao
pantanal para caçar jacarés”; b) “A Câmara cassou o mandato do
deputado por falta de decoro parlamentar”.
3. Não confundir com as homógrafas, que são palavras de mesma grafia,
mas de pronúncia diferente: pôde (pretérito perfeito) e pode (presente do
indicativo); colher (verbo) e colher (substantivo).
4. De igual modo, também não confundir com as parônimas, que são
palavras de grafia e pronúncia parecidas com as de outra, mas de sentido
totalmente diverso (arrear e arriar, deferir e diferir, eminência e
iminência).
Homógrafas
1. Aspecto que tem importância no campo da semântica e da ortografia,
homógrafas são palavras de mesma grafia, mas de pronúncia diferente:
pôde (pretérito perfeito) e pode (presente do indicativo); colher (verbo) e
colher (substantivo); o almoço (substantivo) e eu almoço (verbo); o
interesse (substantivo) e que eu me interesse (verbo). Exs.: a) “Por causa
de forte gripe, o advogado não pôde atuar no júri ontem; mas hoje ele
pode”; b) “O interesse do ordenamento jurídico é preservar a boa-fé”; c)
“É preciso que o autor, em suma, se interesse pela causa”.
2. Não confundir com homófonas, que são palavras de mesma pronúncia,
mas de grafia diversa; assim, caçar significa apanhar vivo para prender
ou matar, enquanto cassar quer dizer anular, invalidar.
3. De igual modo, também não confundir com as parônimas, que são
palavras de grafia e pronúncia parecidas com as de outra, mas de sentido
totalmente diverso (arrear e arriar, deferir e diferir, eminência e
iminência).
Hora
1. Na conformidade com lição de Domingos Paschoal Cegalla,
“recomenda-se usar o artigo em expressões do tipo: das 7 às 11 horas,
por volta das 21 horas, entre as 8 e as 9 horas, da zero às 5 horas, a
partir das 2 horas”.
2. Segue tal autor com a observação de que, “todavia, não constitui erro
omitir o artigo nestas expressões e construir: ‘O túnel ficará fechado a
partir de zero hora do dia 15’”.
3. Continua dizendo que se pode, “quando necessário, precisar a hora por
meio das expressões da madrugada, da noite, da tarde, da manhã:
‘Eram duas horas da madrugada’”.
4. Quanto à adequada escrita, anota que se deve “escrever: às 18h (e não às
18:00h), às 10h (e não às 10:00h), às 9h30 (ou às 9h30min)”; e que, no
plural, “grafa-se h (sem s nem ponto): às 5h, às 20h, etc.” (CEGALLA,
1999, p. 194).
5. Observe-se que, nas formas contraídas de preposição e artigo (das…às),
ocorre a crase: “das 7 às 11 horas”. Se, entretanto, preferirmos construir
“de 7 a 11 horas”, não ocorre o artigo (de…a), mas apenas preposição,
motivo pelo qual não há crase.
Ver Abreviatura, Abreviação e Sigla – O que é e Como usa? (P. 55) e Por
ora ou Por hora? (P. 580)
Hora extra
Ver Extra (P. 349).
Hum ou Um?
1. É comum encontrar, tanto em cheques, como na especificação por
extenso de números em documentos contábeis, a grafia hum para o
numeral cardinal um.
2. Vale, desde logo, lembrar a lição de José de Nicola e Ernani Terra a esse
respeito: “Trata-se de um equívoco injustificável. O numeral cardinal
admite apenas a forma um”.
3. E complementam tais autores: “existe a palavra hum: trata-se de uma
interjeição e, via de regra, indica desconfiança, impaciência, dúvida:
‘Hum! Isto me cheira a trapaça’” (NICOLA; TERRA, 2000, p. 126).
4. Observando que “entre os numerais cardinais nunca se fala em hum,
forma arcaica que bancários e banqueiros tentam ressuscitar para evitar
fraude”, lembra Antonio Henriques (1999, p. 196) que “nem mesmo a
Lei do Cheque (n. 2.591, de 7/8/1972) faz tal exigência”. E adverte esse
autor: “que se evitem fraudes, mas não atropelando a linguagem”.
5. Releva acrescentar que o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa,
da Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de
determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma, além de sua
grafia oficial, registra, sim, a forma hum, mas apenas o faz na qualidade
de interjeição (2009, p. 444), o que implica dizer que não existe no
vernáculo tal forma como numeral.
I
Ibero ou Íbero?
1. Quanto à prosódia, deve-se pronunciar tal palavra como paroxítona (bé)
e não como proparoxítona (í), rimando, assim, com bolero.
2. Esse é o entendimento de Silveira Bueno (1938, p. 16).
3. Tal é também o registro do Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, veículo oficial ordenador
do modo de pronunciar e grafar as palavras em nosso idioma, o qual faz
questão de sinalizar entre parênteses a sílaba tônica do vocábulo (2009,
p. 445).
4. Pedro A. Pinto lembra um verso dos Lusíadas, que estaria errado, se se
admitisse outra pronúncia: “Que o Ibero, o vio e o Tejo amedrontados”
(1924, p. 14).
Idéia ou Ideia?
Ver Ditongos éi, ói, éu – Quando acentuar? (P. 292)
Idem ou Ibidem?
1. Idem é pronome latino – e não adjetivo, como, entre outros, considera o
dicionarista Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (s/d, p. 738) –
correspondente à forma nominativa neutra do masculino isdem (com o
sentido de precisamente aquele) e à forma feminina eadem, com ideia
reforçativa, e tem tal vocábulo, em suma, o significado de o mesmo, a
mesma coisa.
2. É usado nas citações, para indicar o mesmo autor, da mesma forma, e
isso com o intuito de evitar repetições.
3. Sua pronúncia é paroxítona (ídem).
4. Sua abreviatura é id., assim com ponto.
5. Por pertencer a outro idioma, a rigor é palavra que deve vir entre aspas,
em itálico, negrito, sublinha ou com grifo indicador de tal circunstância.
6. Já ibidem é advérbio latino e tem o significado de aí mesmo, no mesmo
lugar.
7. Usado em citações, tem o sentido de na mesma obra, capítulo ou página
a que anteriormente se fez referência.
8. Sua pronúncia é paroxítona (ibídem), não proparoxítona (íbidem).
9. Sua abreviatura costuma ser ib., também assim com ponto.
10. Antonio Henriques (1999, p. 89) também lhe aceita ibid. por
abreviação.
11. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, que é o veículo oficialmente incumbido de
determinar quais as palavras que integram nosso idioma, refere-a como
advérbio latino, excluindo-a, desse modo, de nosso léxico (2009, p.
862).
12. Por pertencer a outro idioma, a rigor é palavra que, quando escrita por
extenso, deve vir entre aspas, em itálico, negrito, sublinha ou com grifo
indicador de tal circunstância.
13. Para distingui-la de idem, assim leciona Arnaldo Niskier (1992, p. 42):
“Essas palavras são encontradas com frequência em notas
bibliográficas. Normalmente, idem significa o mesmo, da mesma
forma, e ibidem no mesmo lugar; em notas bibliográficas, idem
significa o mesmo autor, ibidem na mesma obra (ou na mesma
página)”.
i. e.
1. Em português e em outros idiomas, é abreviação da expressão latina id
est.
2. Tem o significado das expressões explicativas isto é, ou seja, a saber, em
outras palavras. Ex.: “A vítima reagiu, i. e., voltou-se contra o agressor
e o dominou”.
3. As letras de tal abreviatura são escritas com minúsculas.
Ileso
1. Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 18) atribui a esse vocábulo o timbre
fechado na pronúncia (ê).
2. Domingos Paschoal Cegalla, todavia, preconiza que “a pronúncia correta
é iléso, com o e aberto” (1999, p. 197).
3. Essa também é a lição de Luís A. P. Vitória (1969, p. 132): “pronuncia-
se o e com som aberto (iléso)”.
4. Espancando dúvidas, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa,
da Academia Brasileira de Letras, que é o veículo oficial ordenador do
modo de grafar e pronunciar as palavras em nosso idioma, admite ambas
as pronúncias (2009, p. 448): com o e fechado (ê) e com o e aberto (é).
Ilidir ou Elidir?
Ver Elidir ou Ilidir? (P. 300)
Imerecer – Existe?
Ver In (P. 402).
Imexível – Existe?
Ver Existe em português? (P. 346)
Iminência ou Eminência?
Ver Eminência ou Iminência? (P. 308)
Iminente ou Eminente?
Ver Eminente ou Iminente? (P. 308)
Imissão ou Emissão?
Ver Emissão ou Imissão? (P. 309)
Imitir ou Emitir?
Ver Emitir ou Imitir? (P. 309)
Imoral ou Amoral?
Ver Amoral ou Imoral? (P. 114)
Impactante – Existe?
Ver Existe em português? (P. 346)
Impagamento – Existe?
1. Trata-se de palavra que não existe.
Ver In (P. 402).
Impagar – Existe?
1. Sem opinar no sentido da correção ou incorreção do vocábulo, Eliasar
Rosa (1993, p. 79) apenas observa que nossos dicionários não registram
esse verbo, muito embora o façam com os adjetivos pagável e
impagável, mas que, no meio jurídico, é comum que se prefixe o verbo
pagar com o negativo im, daí sendo criado o verbo impagar.
2. Em realidade, in é prefixo latino de valor negativo e tem função nominal
(SARAIVA, 1993, p. 586), isto é, pode servir para criar neologismos, por
via erudita, desde que estes sejam advérbios, adjetivos ou substantivos
derivados de outros nomes já existentes. Exs.: imerecido, impagável,
inaplicável, induvidoso, inexigido.
3. Por se tratar de prefixo nominal, porém, não se presta, por via de regra, à
criação de novos verbos pelo processo já referido, sendo, por
conseguinte, errôneos vocábulos como imerecer, impagar, inaplicar,
induvidar, inexigir, inocorrer.
4. Excepcionalmente, aparecem alguns verbos com o prefixo in tendo valor
negativo, como imortalizar, impronunciar, incapacitar, inutilizar, dentre
outros que se discriminam nos dicionários; tal elenco, porém, deve ser
mantido como rol de exceções, não se prestando ao estabelecimento de
nova regra para formação de palavras.
5. Observe-se, por fim, que o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido
oficialmente de determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma,
além de sua grafia oficial, muito embora registre o adjetivo impagável,
não faz constar o verbo impagar (2009, p. 450).
Ver In (P. 402).
Impecilho
1. Trata-se de palavra que não existe.
Ver Empecilho ou Impecilho? (P. 311)
Impedir
1. Mário Barreto leciona que, com tal verbo, tanto a pessoa quanto a coisa
podem ser objetos diretos ou objetos indiretos; não poderão coexistir,
entretanto, em mesma frase, dois objetos diretos ou dois objetos
indiretos.
2. Assim, vejam-se as seguintes construções e a assinalação de sua
correção ou erronia: a) “A testemunha impediu o réu de consumar o
crime” (correto); b) “A testemunha impediu ao réu consumar o crime”
(correto); c) “A testemunha impediu o réu consumar o crime” (errado);
d) “A testemunha impediu ao réu de consumar o crime” (errado).
3. Tal estruturação sintática se dá com outros verbos, como, por exemplo,
encarregar (BARRETO, 1954a, p. 271).
4. Os exemplos registrados por Francisco Fernandes (1971, p. 376)
confirmam a possibilidade dessa variação de complementos, podendo
tanto a pessoa quanto a coisa ser objeto direto ou objeto indireto: a)
“Quando for que a invernia impeça os camponeses de saírem do lar”
(Castilho); b) “Impeço-lhes sempre as diversões mais inocentes” (Mário
Barreto).
5. Para Domingos Paschoal Cegalla, a construção mais normal é impedir
alguém de alguma coisa, sendo “correta, porém menos usada, a regência
impedir alguma coisa a alguém” (1999, p. 198).
6. E Celso Pedro Luft (1999, p. 325) refere que, por cruzamento de ambas
as regências, ocorre impedir a alguém de algo, uma “construção
anômala, com objetos indiretos de coisa e pessoa, como no equivocado
exemplo de Camilo Castelo Branco: ‘Em boa razão nada lhes impedia
de serem imortais’”.
7. Os textos de lei, por via de regra, registram a construção impedir alguém
de algo, com objeto direto (às vezes sujeito na voz passiva) de pessoa e
objeto indireto de coisa, com a preposição de: a) “Essa vedação não
impede a União de condicionar a entrega de recursos ao pagamento de
seus créditos” (CF/88, art. 160, parágrafo único); b) “Reputa-se justa
causa o evento imprevisto, alheio à vontade da parte, o que a impediu de
praticar o ato por si ou por mandatário” (CPC/1973, art. 183, § 1º); c)
“O empregado eleito para cargo de administração sindical ou
representação profissional, inclusive junto a órgão de deliberação
coletiva, não poderá ser impedido do exercício de suas funções…”
(CLT, art. 543); d) “O penhor da ação não impede o acionista de exercer
o direito de voto…” (Lei 6.404, de 15/12/76, art. 113).
8. Adalberto J. Kaspary (1996, p. 177), todavia, em preciosa obra, observa
que se encontra no Código de Processo Civil “um exemplo da
construção impedir a alguém de, com o objeto que representa a pessoa
introduzido pela preposição a: “A sub-rogação impede ao segurado, se
não receber o crédito do devedor, de prosseguir na execução, nos
mesmos autos, penhorando outros bens do devedor” (CPC/1973, art.
673, § 2º).
9. De todo o exposto, todavia, decorre a conclusão de que o melhor é seguir
o ensinamento majoritário e fazer da coisa e da pessoa ou um objeto
direto ou um objeto indireto, indiferentemente; mas se deve proceder de
tal modo, que não coexistam, em mesma frase, dois objetos diretos ou
dois objetos indiretos.
Imperativo ou Indicativo
Ver Registre-se ou Registra-se? (P. 651)
Impingir
1. Basicamente significa fazer aceitar pela força ou fazer passar por
verdade uma mentira. Ex.: “O réu impingiu um logro à vítima”.
2. Em sua conjugação verbal, apresenta problemas de ortografia.
3. Diferentemente dos verbos cujo radical termina em j – consoante essa
que tem o mesmo som antes de todas as vogais (viajo, viajas, viajemos,
viajeis, viajem) – os verbos terminados em gir, para continuidade do som
da consoante final do radical, precisam da representação gráfica j antes
de a ou de o. Assim: impinjo, impinges, impinge, impingimos, impingis,
impingem (presente do indicativo); impinja, impinjas, impinja,
impinjamos, impinjais, impinjam (presente do subjuntivo); impinge,
impinja, impinjamos, impingi, impinjam (imperativo afirmativo); não
impinjas, não impinja, não impinjamos, não impinjais, não impinjam
(imperativo negativo).
4. Como essas dificuldades gráficas apenas ocorrem nas formas acima
referidas, não deve haver preocupação com a grafia em outros tempos:
impingia (pretérito imperfeito), impingirei (futuro do presente),
impingiria (futuro do pretérito), impingido (particípio), impingindo
(gerúndio), impingi (pretérito perfeito), impingira (pretérito mais-que-
perfeito), impingisse (imperfeito do subjuntivo), impingir (futuro do
subjuntivo).
5. Seguem as mesmas observações diversos outros verbos: erigir, exigir,
infligir, infringir, insurgir-se, transigir.
Implicar
1. De grande uso nos meios jurídicos, é palavra que precisa ser observada
quanto à regência verbal em certas acepções.
2. Tanto no sentido de acarretar, originar, produzir, ser causa de, como no
significado de dar a entender, fazer supor, é transitivo direto, “devendo
ser repelida a preposição em virtude da transitividade direta do verbo
nessa acepção” (DAMIÃO; HENRIQUES, 1994, p. 50). Exs.: a) “A
nulidade da obrigação principal implica a das obrigações acessórias”
(CC/1916, art. 153, e CC/2002, art. 184); b) “Os precedentes daquele
juiz implicam grande honestidade” (Caldas Aulete); c) “Considera-se
desmembramento a subdivisão de gleba em lotes destinados a
edificação, com aproveitamento do sistema viário existente, desde que
não implique a abertura de novas vias…” (art. 2º, § 2º, da Lei 6.766, de
19/12/79).
3. Não encontra respaldo sua utilização como transitivo indireto (com a
preposição em), sendo errôneos os seguintes empregos: a) “A nulidade
da obrigação principal implica na das obrigações acessórias”; b) “Os
precedentes daquele juiz implicam em grande honestidade”.
4. Corroborando sua natureza de verbo transitivo direto, Eliasar Rosa
(1993, p. 80) aconselha se evitem as construções com a preposição em,
como nos seguintes exemplos: a) “O concubinato não implica em
reconhecimento de uma sociedade de fato” (errado); b) “A revelia não
implica em confissão do réu” (errado); c) “A aprovação em concurso
implica em comprovação de que o candidato será um bom juiz” (errado).
5. Não destoa desse entendimento a lição de Édison de Oliveira (s/d, p.
106): “Temos encontrado frequentemente na imprensa, na
correspondência e, às vezes, até em livros didáticos, o verbo implicar
(significando supor, acarretar, requerer) seguido pela preposição em. De
acordo com a gramática, entretanto, tal verbo, nessa acepção, não exige
preposição alguma.” Estão, pois, gramaticalmente erradas frases como:
a) “Amor implica em renúncia”; b) “Construir casa própria implica em
muitos sacrifícios”; c) “A demissão do Diretor implicou na convocação
da assembleia”. Corrija-se, dizendo: i) “Amor implica renúncia”; ii)
“Construir casa própria implica muitos sacrifícios”; iii) “A demissão do
Diretor implicou a convocação da assembleia”.
6. Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 221), que também condena o emprego
da preposição em com tal verbo, lembra que ele pode ser transitivo
indireto no sentido de ter implicância. Ex.: “O chefe implica muito com
seus subordinados”.
7. Buscando resumir os aspectos de regência acerca desse verbo, anotam
Regina Toledo Damião e Antonio Henriques (1994, p. 50) que, no
sentido de acarretar, deve “ser repelida a preposição em virtude da
transitividade direta do verbo nesta acepção”; com a significação de ter
implicância, “é regido pela preposição com, não devendo ser empregado
como pronominal”, forma essa exclusiva do sentido de envolver-se com.
8. Em seu estilo leve de observar, assim se explicita Arnaldo Niskier: “O
verbo implicar, no sentido de envolver ou ter como consequência, é
transitivo direto, isto implica dizer que não aceita a preposição em; ou
seja, isto implica aquilo, e não naquilo” (1992, p. 105).
9. No sentido de ter como consequência, trazer como consequência,
acarretar, provocar, observam Pasquale Cipro Neto e Ulisses Infante
(1999, p. 522) que, “no Brasil, esse verbo é sistematicamente usado com
a preposição em (‘Sua decisão implica em cancelar o projeto’)”;
lembram, todavia, tais autores que “nenhum dicionário admite essa
construção no padrão culto”.
10. Para Sousa e Silva (1958, p. 156), implicar em “não é regência
autorizada, nos sentidos de fazer supor, ser causa de e tornar
indispensável”; em tais acepções, o verbo implicar é transitivo direto.
11. Quando significa trazer como consequência, acarretar, confirma
Domingos Paschoal Cegalla que “é censurada a regência indireta
(preposição em), como na frase: ‘A quebra de um compromisso implica
em descrédito, perda de credibilidade’” (1999, p. 199).
12. Os textos de lei, de um modo geral, obedecem a essa determinação da
Gramática de que se construa tal verbo como transitivo direto, sem a
preposição de. Exs.: a) “A não observância do disposto nos incisos II e
III implicará a nulidade do ato e a punição da autoridade responsável,
nos termos da lei” (CF/88, art. 37, § 2º); b) “A nulidade da obrigação
principal implica a das acessórias, mas a destas não induz a da
obrigação principal” (CC/1916, art. 153 e CC/2002, art. 184); c)
“Importa renúncia tácita ao direito de queixa a prática de ato
incompatível com a vontade de exercê-lo; não a implica, todavia, o
fato de receber o ofendido a indenização do dano causado pelo crime”
(CP, art. 104, parágrafo único); d) “A absolvição implicará o
restabelecimento de todos os direitos perdidos em virtude de
condenação…” (CPP, art. 627); e) “A distribuição de dividendos com
inobservância do disposto neste artigo implica responsabilidade
solidária dos administradores e fiscais” (Lei 6.404, de 15/12/76, art.
201, § 1º); f) “A revogação e a renúncia da procuração implicam
revogação do mandato” (CC português, art. 1.179º).
13. Apesar dessa normal observância do regime direto, tal como entendem
os gramáticos que deva ser, Adalberto J. Kaspary (1996, p. 178-9)
encontrou, em preciosa pesquisa sobre textos de lei, três exemplos em
que implicar se apresenta como transitivo indireto (com a preposição
em): a) “A falsificação de diploma ou outros quaisquer títulos…
implicará na instauração… do processo que no caso couber” (CLT, art.
345, parágrafo único); b) “… desde que… não tenha implicado em
falta de pagamento do tributo” (CTN, art. 106, II, b); c) “O
descumprimento injustificado dos deveres estabelecidos para as
unidades federativas implicará na suspensão de qualquer ajuda
financeira a elas destinada pela União…” (Lei 7.210, de 11/7/84, art.
203, § 4º).
Importar
1. Segundo observação de Eliasar Rosa, se tal verbo tem o significado de
ter como resultado, representar, reproduzir, será ele transitivo direto, não
admitindo preposição. Exs.: a) “O pagamento importa extinção da
obrigação”; b) “A concessão de prazo ao devedor não importa
novação”; c) “A prescrição interrompe-se: … V – por qualquer ato
inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do
direito pelo devedor” (CC/1916, art. 172, V, e CC/2002, art. 202, VI); d)
“Quando o dote importar alheação, o marido considerar-se-á
proprietário, e poderá dispor dos bens dotais…” (CC/1916, art. 292).
2. Se, porém, o significado é atingir certo preço, valor ou custo, então de
rigor é construí-lo com a preposição em. Ex.: “A dívida importa em
trezentos reais” (ROSA, 1993, p. 80-1).
3. Comunga desse posicionamento Mário Barreto, ao realçar que incorre
em erro quem emprega a preposição em depois de importar no sentido de
levar consigo, originar, representar, causar, produzir, ter como resultado
ou consequência, como se dá no seguinte exemplo: “As considerações
que acabo de fazer não importam em desestima a Teixeira de Melo”
(1954b, p. 93).
4. Assim resume Laudelino Freire a teoria sobre a regência de importar:
“Quando significa atingir certo preço ou custo, este verbo é transitivo
indireto, e pede, portanto, complemento regido da preposição em: ‘As
despesas importaram em cinco contos’. Noutra qualquer acepção –
trazer de fora, fazer vir de outra terra, ter como resultado, etc. – é
transitivo direto, e não pode ser seguido de preposição: ‘O que disse
importa grave acusação’; ‘Importou mercadorias de São Paulo’”
(1937b, p. 111).
5. No sentido de atingir preço, Vitório Bergo (1943, p. 212) insere tal verbo
no rol daqueles que merecem especial cuidado quanto à regência:
importar em.
6. Apesar dessa rigidez e uniformidade no que concerne aos escritores de
nossa língua, é de se ver que, nos textos de lei, tal verbo ora se apresenta
como transitivo direto, ora como transitivo indireto (com a preposição
em).
7. São exemplos de regência direta.: a) “Os atos de improbidade
administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos…” (CF/88,
art. 37, § 4º); b) “… Neste caso, o recebimento posterior da prestação
atrasada importa renúncia do credor ao seu direito de execução
imediata” (CC/1916, art. 762, III); b) “A conexão e a continência
importarão unidade de julgamento…” (CPP, art. 79); c) “O legatário é
parte legítima para manifestar-se sobre as dívidas do espólio… II –
quando o reconhecimento das dívidas importar redução dos legados”
(CPC/1973, art. 1.020, II); d) “A cassação da carta de reconhecimento
da entidade sindical não importará o reconhecimento de seu registro…”
(CLT, art. 556); e) “É vedado à União instituir tributo que não seja
uniforme em todo o território nacional, ou que importe distinção ou
preferência em favor de determinado Estado ou Município” (CTN, art.
8); f) “A prescrição interrompe-se… por qualquer ato inequívoco, ainda
que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo devedor”
(art. 172, V, do CC/1916, e CC/2002, art. 202); g) “O silêncio do
acusado não importará confissão, mas poderá constituir elemento para
a formação do convencimento do juiz” (art. 198 do CPP).
8. São exemplos de regência indireta: a) “Se for título de crédito a coisa
dada em pagamento, a transferência importará em cessão” (CC/1916,
art. 997, e CC/2002, art. 358); b) “A falta de cumprimento pelo
empregador do disposto neste artigo importará na lavratura de auto de
infração pelo agente da inspeção do trabalho” (CLT, art. 29, § 2º); c)
“Equipara-se à majoração do tributo a modificação de sua base de
cálculo, que importe em torná-lo mais oneroso” (CTN, art. 97, § 1º); d)
“A mulher não pode, sem autorização do marido: … IV – contrair
obrigações que possam importar em alheação de bens do casal”
(CC/1916, art. 242, IV).
9. Interessante é verificar que a Lei do Divórcio (Lei 6.515, de 26/12/77),
em dois de seus dispositivos, traz tal verbo como transitivo indireto: a)
“… qualquer ato que importe em grave violação dos deveres do
casamento…” (art. 5º, caput); b) “A separação judicial importará na
separação de corpos e na partilha de bens” (art. 7º, caput).
Diversamente, contudo, é transitivo direto no art. 27, parágrafo único, da
mesma lei: “O novo casamento de qualquer dos pais ou de ambos
também não importará restrição a esses direitos e deveres”.
10. Curiosas, a respeito, são as seguintes observações de Adalberto J.
Kaspary (1996, p. 179-1): a) nos textos legais que pesquisou, encontrou
noventa e seis vezes o mencionado verbo com tal significação, sendo
setenta e nove com objeto direto e apenas dezessete com objeto
indireto, evidenciando-se, assim, a preferência do legislador pela
construção com objeto direto; b) de acordo com lição de Ernesto
Carneiro Ribeiro, a observância do verbo como transitivo direto “é a
sintaxe que se observa em todos os escritores de nomeada, e nos que
timbram de escrever com pureza”; c) pela totalidade dos exemplos
colhidos no Código Civil de Portugal (trinta e nove), está ele
empregado invariavelmente como transitivo direto.
11. Por outro lado, uma vez aceita sua construção com a preposição em, o
certo é que, em determinados casos, pode tal sintaxe aclarar o sentido,
como é o caso do art. 1º, § 2º, do Decreto nº 3.079, de 15/9/38, que,
regulamentando o Decreto-lei 58, de 10/12/37, assim dispôs: “A
Prefeitura e as demais autoridades ouvidas disporão de 90 dias para
pronunciar-se, importando o silêncio a aprovação”. Bem mais claro
teria ficado o sentido do texto com a seguinte redação: “… importando
o silêncio em aprovação”. Aliás, menos ruim do que o texto em vigor
também seria: “… importando o silêncio aprovação”.
Impresso ou Imprimido?
1. A questão que se põe é saber qual a forma correta: “Ele já havia
imprimido” ou “Ele já havia impresso?”.
2. Há verbos – e com frequência no particípio passado – que apresentam
duas ou mais formas equivalentes: aceitado, aceito e aceite (aceitar),
imprimido e impresso (imprimir), pegado e pego (pegar). São
denominados verbos abundantes.
3. Nesses casos de verbos abundantes, a forma normal, mais longa e mais
de acordo com as regras de derivação constitui o particípio passado
regular (assim, entregado, benzido e extinguido); a outra forma, mais
compacta, é o particípio passado irregular (assim, entregue, bento e
extinto).
4. Quanto à sistematização do emprego das formas de tais verbos
abundantes, pode-se dizer que com os verbos ter e haver (formando
tempos compostos na voz ativa), usa-se normalmente o particípio
passado regular. Exs.: a) “Ele tinha acendido o fogo”; b) “Ele havia
acendido o fogo”.
5. Já com o verbo ser (formando voz passiva) e com o verbo estar, usa-se
normalmente o particípio passado irregular. Exs.: a) “O fogo fora aceso
por ele”; b) “O fogo estava aceso”.
6. Para não se radicalizar no assunto, vale lembrar a ponderada observação
de Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 76): “em alguns casos a língua
moderna tem mudado essa regra, preferindo o uso dos irregulares com
ter e haver”. Exemplifica tal autor com frito, ganho, gasto, pago e salvo,
com os quais tem havido completo desprezo dos particípios passados
regulares.
7. De modo especial para os exemplos inicialmente postos: a) “Ele já havia
imprimido a minuta” (correto); b) “Ele já havia impresso a minuta”
(errado); c) “Ele já tinha imprimido a minuta” (correto); d) “Ele já tinha
impresso a minuta” (errado); e) “A minuta foi imprimida por ele”
(errado); f) “A minuta foi impressa por ele” (correto); g) “A minuta já
estava imprimida” (errado); h) “A minuta já estava impressa” (correto).
Ver Concordância verbal (P. 212), Haver – Quando vai para o plural? (P.
386) e Verbos abundantes (P. 759).
Improceder – Existe?
1. Improceder é verbo empregado com frequência, nos meios jurídicos e
forenses, sempre com o sentido de não ter procedência, de não ter a
consequência pretendida, caso em que se emprega como intransitivo
(algo improcede). Exs.: a) “Como o autor não carreou aos autos as
provas necessárias, improcedem os pedidos feitos na inicial”; b)
“Apesar de tempestiva a apelação e de superadas as preliminares
arguidas, o recurso, no mérito, improcede”.
2. É oportuno registrar que esse vocábulo se encontra no Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
que é o veículo oficialmente incumbido de determinar quais palavras
integram nosso idioma (2009, p. 451), o que significa que seu uso está
oficialmente autorizado entre nós.
3. Anote-se, todavia, que tal situação não se repete com outro verbo muito
empregado em textos jurídicos e forenses, como se fosse seu sinônimo –
desproceder –, o qual ali não se acha arrolado e, assim, não deve ser
empregado em textos que devam submeter-se à norma culta.
4. Improceder não traz problemas quanto à conjugação verbal, já que tem
por modelo proceder, de fácil flexão.
5. Apegando-se ao fato de que é formado com o prefixo in (normalmente
formador de nomes e não de verbos), Geraldo Amaral Arruda (1997, p.
134) observa que esse verbo “constitui forma inferior de expressão”,
sendo melhor dizer julgar procedente ou julgar improcedente, ou
sentença de procedência ou sentença de improcedência.
6. Todavia a postura do Vocabulário Ortográfico de registrá-lo no rol das
palavras oficialmente existentes em nosso idioma, supera quaisquer
discussões dessa natureza e faz com que se devam desconsiderar
opiniões assim manifestadas.
Impronunciar ou Despronunciar?
1. É verbo usado com frequência em Direito Penal, especificamente em
processos que apuram crimes dolosos contra a vida, de competência do
Tribunal do Júri.
2. Tem o sentido de julgar, considerar inadequada uma denúncia, mesmo
antes de remeter o acusado para julgamento pelo Tribunal do Júri. Ex.:
“O juiz, como presidente do tribunal do júri, pode pronunciar,
impronunciar ou absolver sumariamente o acusado”.
3. Enquanto o verbo pronunciar tem aplicação mais ampla, não se
limitando à área penal, já impronunciar é um verbo específico da
terminologia criminal, não servindo para ser portador de qualquer outro
conteúdo semântico.
4. Acrescente-se, com Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade
(1999, p. 85), a profunda diferença entre impronunciar (“verificar, de
imediato, a ausência de provas para pronúncia”) e despronunciar (que
implica a “verificação posterior de dados insuficientes para a
pronúncia”, razão pela qual “esta deixou de existir”).
5. Em outra obra, Antonio Henriques (1999, p. 48) assim reforça a
diferença: a) impronunciar – “não houve pronúncia por falta de base, de
força, de fundamento; o indiciado não foi a julgamento”; b)
despronunciar – “houve pronúncia; o indiciado foi a julgamento que,
depois, se desfaz, acaba, cessa, sofre reforma”.
6. Também buscando diferenciar ambos os verbos, anota Adalberto J.
Kaspary (1996, p. 261) que despronunciar é “alterar um julgamento
anterior, em que o réu foi pronunciado”, enquanto impronunciar é
“julgar, desde logo, improcedente a denúncia ou queixa contra o
indiciado, determinando a sua soltura”.
7. Muito embora sejam empregados com frequência nos meios jurídicos e
forenses, raro é o uso de ambos os verbos – impronunciar e
despronunciar –nos textos legais: a) “A decisão que impronunciar ou
absolver o réu fará cessar a aplicação provisória da interdição
anteriormente determinada” (CPP, art. 376); b) “Quando, instaurado
processo por infração penal, o juiz, absolvendo ou impronunciando o
réu, reconhecer a existência de qualquer dos fatos previstos no art. 14
ou no art. 27 do Código Penal, aplicar-lhe-á, se for caso, medida de
segurança” (CPP, art. 555); c) “Caberá recurso, no sentido estrito, da
decisão, despacho ou sentença: … que pronunciar ou impronunciar o
réu” (CPP, art. 581, IV); d) “Mantém-se a culpa formada até à decisão
final, a não ser que em qualquer recurso o arguido seja despronunciado
ou absolvido” (CPP português, art. 308º, § 3º).
8. E se esclareça que ambos os verbos – despronunciar e impronunciar –
encontram-se registrados pelo Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, que é o veículo
oficialmente incumbido de determinar quais palavras integram, de modo
efetivo, nosso idioma (2009, p. 276 e 451), o que significa que o uso de
ambos está oficialmente autorizado entre nós.
Improver ou Desprover?
Ver Desprover ou Improver? (P. 278)
Impudico ou Impúdico?
1. Significa o que não tem ou revela pudor, o que não é casto nem recatado.
2. No campo jurídico, assim como seu antônimo pudico, é adjetivo muito
utilizado nas digressões acerca dos crimes contra os costumes: estupro,
atentado violento ao pudor, importunação ofensiva ao pudor.
3. Trata-se de palavra paroxítona, e não proparoxítona, sendo sua sílaba
tônica di e não pu, motivo por que inexiste razão para ser graficamente
acentuada (SACCONI, 1979, p. 19). Rima com rico e nanico.
4. Asseverando que tal questão “não se discute mais”, Silveira Bueno
(1938, p. 15) lhe afirma o caráter de palavra paroxítona.
5. Mário Barreto (1954b, p. 124), ao tratar das acentuações viciosas, alude
à existência daqueles que, “contra a origem e prática, querem
esdruxulizar” tal vocábulo, pronunciando-o com acento na
antepenúltima sílaba.
6. Ao apontar o correto emprego de tal palavra em Alexandre Herculano –
como paroxítona e não proparoxítona – lembra Vasco Botelho de Amaral
(1939, p. 86), em corroboração, que Camões lhe dá a correta acentuação,
ao rimar rica e rico, respectivamente, com pudica e pudico.
7. E de Cândido de Figueiredo é a taxativa observação: “Nunca houve
púdico nem impúdico em português: desde os latinos, através da Idade
Média, e através de todos os nossos dicionários, nunca se pronunciou
senão pudico e impudico, acentuando-se tonicamente o i” (1941, p. 220).
8. Espancando dúvidas, registra-a como paroxítona (di) o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
que é o veículo oficial para dirimir dúvidas acerca da pronúncia dos
vocábulos em nosso idioma (2009, p. 451).
9. Seu superlativo absoluto sintético é impudicíssimo.
Impugnar
1. Quanto a sua pronúncia, anota-se que, mesmo entre as pessoas cultas, há
uma tendência a introduzir uma vogal logo após o g que encerra o
radical, nas formas rizotônicas, pronunciando-se impuguino,
impuguinas…
2. Trata-se, porém, de verbo regular, em que, após o radical (impugn),
apenas se acrescentam as desinências próprias da conjugação: impugno,
impugnas, impugna…; impugne, impugnes…, com a sílaba tônica
incidindo no próprio radical (SACCONI, 1979, p. 20).
3. Quanto a vocábulos como impuguino e impuguinas, configuram eles
aquilo que Sousa e Silva (1958, p. 157) chama de formas disparatas.
4. Em realidade, ao contrário do que muitos pensam, nas formas
rizotônicas desse verbo (casos em que a sílaba forte cai no radical), o
acento tônico incide no u que precede o g, e não nesta última consoante,
até porque só vogal pode ser acentuada: não se diga, pois, impuguino, ou
coisa parecida, mas: impugno, impugnas, impugna… impugnam
(presente do indicativo); impugne, impugnes, impugne…, impugnem
(presente do subjuntivo); impugna, impugne, impugnem (imperativo
afirmativo), não impugnes, não impugne, não impugnem (imperativo
negativo).
5. Como as formas rizotônicas apenas ocorrem no presente do indicativo,
presente do subjuntivo, imperativo afirmativo e imperativo negativo, não
deve haver preocupação alguma, quanto à observação feita, no que diz
respeito aos demais tempos: impugnava (pretérito imperfeito),
impugnarei (futuro do presente), impugnaria (futuro do pretérito),
impugnado (particípio), impugnando (gerúndio), impugnei (pretérito
perfeito), impugnara (pretérito mais-que-perfeito), impugnasse
(imperfeito do subjuntivo), impugnar (futuro do subjuntivo).
Imputar
Ver Computar (P. 204).
In
1. Prefixo latino de valor negativo, tem função nominal (SARAIVA, 1993,
p. 586), isto é, pode servir para criar neologismos, por via erudita, desde
que estes sejam advérbios, adjetivos ou substantivos, derivados de outros
nomes já existentes. Assim, imerecido, impagável, inaplicável,
induvidoso, inexigido.
2. Exatamente nesses moldes, é que Carlos de Laet forja a palavra
inempregáveis, para significar que não podem obter emprego, por falta
de preparo ou de indolência: “Além disso, há, porém, um pessoal
completo de cavalheiros desempregados e… inempregáveis” (LAET
apud NOGUEIRA, 1939, p. 7-8).
3. Por se tratar de prefixo nominal, porém, não se presta, por via de regra, à
criação de novos verbos pelo processo já referido. Assim, são errôneos
os vocábulos imerecer, impagar, improver, inaplicar, induvidar, inexigir.
4. Excepcionalmente, aparecem alguns verbos com o prefixo in tendo valor
negativo, como imortalizar, impronunciar, incapacitar, inutilizar, dentre
outros que se discriminam nos dicionários; tal elenco, porém, deve ser
mantido como rol de exceções, não devendo estabelecer nova regra para
formação de palavras.
5. Invocando ensinamento de Torrinha, leciona Geraldo Amaral Arruda,
por primeiro, que tal prefixo “junta-se a adjetivos e advérbios, sendo em
regra desusado antes de verbos ou substantivos”.
6. Ao depois, após observar que “na verdade temos verbos em que aparece
o prefixo in de valor negativo”, tal autor adverte que “em todos esses
casos o verbo foi formado a partir de um adjetivo no qual o prefixo já
havia perdido o sentido correspondente à etimologia”, como é o caso de
imortalizar, importunar, impacientar.
7. Com tais premissas, fixa ele que “o fato de haver em português casos de
verbos com prefixo in negativo não justifica que alguém, sem
necessidade e com base em falsa analogia, se dê o direito de criar novos
verbos”, além do que, “nessa matéria de neologismos convém que o
usuário da língua proceda com cuidado, com prudência, sem se deixar
enganar por falsa analogia”.
8. Em realidade, ainda segundo ele, se, por um lado, é verdade que “o
prefixo in negativo se ajusta bem aos adjetivos”, não menos certo é que,
por outro lado, “soa estranho quando juntado a verbos ou até mesmo a
alguns substantivos”.
9. E exemplifica com propriedade o referido mestre: “Assim, temos o
adjetivo impagável, mas não temos o substantivo impagamento, e seria
esdrúxulo o verbo impagar; temos inalienável, mas não se pode pensar
em inalienar e inalienamento ou inalienação; temos inaplicável, não
inaplicar; temos infalível, não infalir” (ARRUDA, 1997, p. 132-3).
10. Registre-se, contudo, em objeção tópica e parcial ao ensino do grande
desembargador e gramático, que inalienar é de palavra regularmente
acolhida pelo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras, que é o veículo oficialmente incumbido
de determinar os vocábulos que integram nosso idioma (2009, p. 452),
motivo por que está plenamente autorizado seu emprego.
11. Acresça-se que, atentos a tal aspecto, nossos textos de lei não buscam,
em tais casos, criar neologismos e deixam, às vezes, até mesmo de
empregar palavras existentes, para expressar a ideia pretendida com a
anteposição da negativa, como se dá em não captada (art. 565 do
CC/1916), não fazer (art. 882 do CC/1916 e CC/2002, art. 250), não
interessado (art. 931 do CC/1916 e CC/2002, art. 305), não pagamento
(art. 808, § 1º, e 945, § 1º, do CC/1916, sendo, no último caso,
substituída a expressão por “falta de pagamento” no CC/2002, art. 324,
parágrafo único), não reincidente (art. 33, § 2º, b, do CP), não
cumulativo (art. 49 do CTN).
12. Também empregado (com o sentido latino de em) nas citações
bibliográficas, para referenciar parte ou capítulo de uma obra. Ex.:
FIGUEIREDO, Fidelino. “Romantismo”. In: História Literária de
Portugal. (Séc. XII-XX). Coimbra: Nobel, 1944, p. 414-415
(FERREIRA, 1986, p. 927).
Inacolher – Existe?
1. O prefixo in é de origem latina e tem valor negativo, servindo para dar
causa a derivação nominal (SARAIVA, 1993, p. 586).
2. Em outras palavras, pode servir para criar neologismos, por via erudita,
desde que estes sejam advérbios, adjetivos ou substantivos, derivados de
outros nomes já existentes. Exs.: imerecido, impagável, inaplicável,
induvidoso, inexigido.
3. Por se tratar de prefixo nominal, porém, não se presta, por via de regra, à
criação de novos verbos pelo processo já referido, motivo por que são
errôneos vocábulos como imerecer, impagar, inaplicar, induvidar,
inexigir.
4. Excepcionalmente, aparecem alguns verbos com o prefixo in tendo valor
negativo, como imortalizar, impronunciar, incapacitar, inutilizar, dentre
outros que se discriminam nos dicionários; tal elenco, porém, deve ser
mantido como rol de exceções, não se prestando ao estabelecimento de
nova regra para formação de palavras.
5. Tal, entretanto, não é o caso de inacolher, que haverá de ser tido como
verbo inexistente.
6. É oportuno observar que não registra tal verbo o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
órgão oficial de registro das palavras existentes em nosso idioma.
7. A forçosa e definitiva conclusão, assim, é que esse verbo não existe e,
portanto, não deve ser empregado em textos que devam submeter-se à
norma culta.
8. Com total razão, assim, o ensino de Geraldo Amaral Arruda (1997, p.
23), para quem, porque “não há em português o verbo inacolher”, devem
evitar-se invenções como “deve ser inacolhida a pretensão”.
Inadimplir – Existe?
1. Trata-se de verbo empregado com frequência nos meios jurídicos com o
sentido de não cumprir (a obrigação, o contrato, uma cláusula). Ex.: “O
locatário inadimpliu cláusula específica do contrato, que vedava a
sublocação do prédio”.
2. Atesta-lhe a existência em nosso idioma o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, que é o veículo
oficial para dirimir dúvidas acerca da existência ou não de vocábulos em
nosso idioma, bem como acerca de sua grafia e pronúncia (2009, p. 452).
3. É verbo defectivo, conjugando-se “nas formas em que a terminação
começa pela vogal e ou pela vogal i” (REIS, 1971, p. 145).
4. Na prática, não tem a primeira pessoa do presente do indicativo, mas
apenas as demais: inadimples, inadimple, inadimplimos, inadimplis,
inadimplem.
5. Não é conjugado em pessoa alguma do presente do subjuntivo, que
haveria de derivar da inexistente primeira pessoa do presente do
indicativo.
6. No imperativo afirmativo, apenas tem a segunda pessoa do singular e a
segunda pessoa do plural, derivadas do presente do indicativo, mas não
as demais, oriundas do presente do subjuntivo: inadimple tu, inadimpli
vós.
7. Também não tem pessoa alguma do imperativo negativo, que viria
integralmente do presente do subjuntivo.
8. Como tais problemas de defectividade ocorrem apenas no presente do
indicativo e nos tempos daí derivados, é normalmente conjugado nos
outros tempos: eu inadimplia (imperfeito do indicativo), eu inadimplirei
(futuro do presente), eu inadimpliria (futuro do pretérito), inadimplindo
(gerúndio), inadimplido (particípio), eu inadimpli (pretérito perfeito do
indicativo), eu inadimplira (pretérito mais-que-perfeito do indicativo),
quando eu inadimplir (futuro do subjuntivo), se eu inadimplisse
(imperfeito do subjuntivo).
Inadmitir – Existe?
1. É verbo empregado com frequência nos textos jurídicos e forenses na
acepção de não admitir, rejeitar, repelir, caso em que é empregado como
transitivo direto (inadmitir algo), sendo de se complementar, assim, que,
por ser transitivo direto, admite ser construído na voz passiva (algo foi
inadmitido). Exs.: a) “O recurso, inadmitido na origem, subiu a esta
Corte por efeito de provimento do agravo, depois de devidamente
processado”; b) “À vista do exposto, inadmito o recurso”.
2. É oportuno registrar que tal vocábulo se encontra no Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
que é o órgão oficial de registro das palavras existentes em nosso idioma
(2009, p. 452), motivo pelo qual está perfeita e oficialmente autorizado
seu emprego.
3. Não traz problemas quanto à conjugação verbal, já que tem por modelo
admitir, de fácil flexão.
Inafastável – Existe?
1. Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 148) – sintetizando o
entendimento de alguns – reputa o emprego desse vocábulo uma
extravagância e inovação desnecessária, que não enriquece o idioma.
2. Trata-se, entretanto, de palavra regularmente acolhida pelo Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
que é o veículo oficialmente incumbido de determinar os vocábulos que
integram nosso idioma (2009, p. 452), motivo por que está plenamente
autorizado seu emprego.
Inalienar – Existe?
1. Apesar da objeção de alguns, trata-se de palavra regularmente acolhida
pelo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, que é o veículo oficialmente incumbido de
determinar os vocábulos que integram nosso idioma (2009, p. 452).
2. Por essa razão, está plenamente autorizado seu emprego.
Inaplicar – Existe?
1. Sempre importa reiterar que o prefixo in é de origem latina e tem valor
negativo, servindo para dar causa a derivação nominal (SARAIVA,
1993, p. 586).
2. Em outras palavras, pode servir para criar neologismos, por via erudita,
desde que estes sejam advérbios, adjetivos ou substantivos, derivados de
outros nomes já existentes. Exs.: imerecido, impagável, inaplicável,
induvidoso, inexigido.
3. Por se tratar de prefixo nominal, porém, não se presta, por via de regra, à
criação de novos verbos pelo processo já referido, motivo por que são
errôneos vocábulos como imerecer, impagar, inaplicar, induvidar,
inexigir.
4. Excepcionalmente, aparecem alguns verbos com o prefixo in tendo valor
negativo, como imortalizar, impronunciar, incapacitar, inutilizar, dentre
outros que se discriminam nos dicionários; tal elenco, porém, deve ser
mantido como rol de exceções, não se prestando ao estabelecimento de
nova regra para formação de palavras.
5. Tal, entretanto, não é o caso de inaplicar, que haverá de ser tido como
verbo inexistente.
6. É oportuno observar, nessa esteira, que não registra tal verbo o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira
de Letras, órgão oficial de registro das palavras existentes em nosso
idioma.
7. A forçosa e definitiva conclusão, assim, é que esse verbo não existe e,
portanto, não deve ser empregado em textos que devam submeter-se à
norma culta.
Inaugural acusatória
Ver Petição inicial (P. 563).
Incendiar
1. Os verbos terminados em iar, quanto à conjugação verbal, normalmente
são verbos regulares e têm por modelo anunciar.
2. São exceções a essa regularidade de conjugação mediar, ansiar,
remediar, incendiar e odiar, que têm por modelo este último (as iniciais
desses verbos formam a sigla MARIO).
3. Tais verbos da relação mencionada mudam o i da penúltima sílaba em ei
nas formas rizotônicas: incendeio, incendeias, incendeia, incendiamos,
incendiais, incendeiam (presente do indicativo); incendeie, incendeies,
incendeie, incendiemos, incendieis, incendeiem (presente do subjuntivo);
incendeia, incendeie, incendiemos, incendiai, incendeiem (imperativo
afirmativo); não incendeies, não incendeie, não incendiemos, não
incendieis, não incendeiem (imperativo negativo).
4. Vale sintetizar os problemas de conjugação desse verbo com as
observações de Vitório Bergo: “recebe um e eufônico nas formas
rizotônicas, que só se manifestam no presente do indicativo e do
subjuntivo e, portanto, no imperativo” (1943, p. 142-3).
5. Não confundir os verbos terminados em iar com os que se encerram por
ear, como nomear, os quais, quanto à conjugação, recebem um i
intermediário nas formas rizotônicas: nomeio, nomeias, nomeia,
nomeamos, nomeais, nomeiam (presente do indicativo); nomeie,
nomeies, nomeie, nomeemos, nomeeis, nomeiem (presente do subjuntivo)
…
Incerto ou Inserto?
1. Incerto é adjetivo que significa duvidoso, indeterminado, e é muito
empregado no campo do direito processual. Ex.: “Nos termos do art. 231
do Código de Processo Civil, far-se-á a citação por edital, quando
incerto o lugar em que se encontrar o réu”.
2. Já inserto é particípio passado irregular de inserir, pouco usado, e tem
por sinônimo inserido. Ex.: “Insertas nos autos estavam todas as cartas
de ameaça que o réu enviara à vítima”.
3. Atento aos frequentes equívocos no emprego de ambas as palavras, o
próprio Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de determinar a
existência dos vocábulos em nosso idioma, além de sua grafia oficial,
mesmo fugindo a seu normal proceder e finalidade de apenas listar
palavras sem dar-lhes o sentido, acaba por precisar a exata significação
de ambos os vocábulos: incerto tem por conteúdo semântico duvidoso, e
inserto quer dizer inserido (2009, p. 453 e 460).
4. Não havendo emprego de inserto na legislação mais conhecida, alinham-
se alguns dos muitos exemplos de uso do vocábulo incerto: a)
“Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da
vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento
futuro e incerto” (CC, art. 121); b) “A consignação tem lugar: … III – se
o credor for incapaz de receber, for desconhecido, declarado ausente, ou
residir em lugar incerto ou de acesso perigoso ou difícil” (CC, art. 335,
III); c) “Sendo incerto ou desconhecido o domicílio do réu, ele será
demandado onde for encontrado ou no foro do domicílio do autor”
(CPC/1973, art. 94, § 2º); d) “Far-se-á a citação por edital: I – quando
desconhecido ou incerto o réu…” (CPC/1973, art. 231, I).
Ver Lugar incerto e não sabido (P. 450).
Incipiente ou Insipiente?
1. Incipiente é adjetivo, que tem o significado de iniciante, principiante.
Ex.: “Apesar de incipiente, a enfermidade lhe acarretava grande
desconforto”.
2. Sua parônima insipiente também é adjetivo, mas tem a acepção de
ignorante. Ex.: “Com advogados insipientes, ainda que velhos, muitas
vezes é difícil fazer justiça”.
3. Atento aos frequentes equívocos no emprego de ambas as palavras, o
próprio Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de determinar a
existência dos vocábulos em nosso idioma, além de sua grafia oficial,
mesmo fugindo a seu normal proceder e finalidade de apenas listar
palavras sem dar-lhes o sentido, acaba por precisar a exata significação
de ambos os vocábulos: incipiente tem por conteúdo semântico
principiante, e insipiente quer dizer ignorante (2009, p. 453 e 460).
Inciso
1. Derivado do latim incisus, com o significado etimológico de aberto,
cortado, “é geralmente empregado, na linguagem jurídica, para indicar
cada uma das divisões, feitas num artigo da lei, encabeçada por um
número ou por uma letra” (DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p. 446).
2. No que concerne a sua finalidade, observam Juarez de Oliveira e Marcus
Cláudio Acquaviva que “o item ou inciso serve para dividir o artigo ou o
parágrafo, atuando como elemento discriminativo daquele, quando o
assunto versado não possa ser condensado nem constituir parágrafos”
(1975, p. 6).
3. Num outro aspecto, quando se quer significar a especificação da ordem
ou série em que dispostos os seres e as coisas, é correto o uso do
numeral ordinal. Exs.: quarta oportunidade, inciso quinto, centésima
vez.
4. Por brevidade e simplificação, entretanto, tem-se defendido o uso dos
cardinais em vez dos ordinais na enumeração de séries de objetos,
capítulos, artigos, parágrafos, incisos. Exs.: inciso dois, artigo dez.
5. Plácido e Silva, aliás, é taxativo, em tal caso, para exemplificar ser
“costume dizer-se o inciso três do artigo 20, para exprimir o item ou a
alínea três do referido artigo” (1989, p. 446).
6. Anota-se, porém, por primeiro, que, em tais casos, não variam para o
feminino os números um e dois. Exs.: página vinte e um, lição trinta e
dois.
7. Também se verifica que, se anteposto o numeral ao substantivo, de rigor
é o emprego do ordinal. Exs.: vigésima primeira página, trigésima
segunda lição, quinto inciso.
8. Adicionalmente, quanto aos diplomas legais, na lição de Napoleão
Mendes de Almeida – o qual não deixa de realçar a circunstância de que
os algarismos romanos vêm perdendo a preferência em nossos dias – os
incisos são “indicados por letras minúsculas ou por números: inciso 2 do
§ 3 do art. 58” (1981, p. 209).
Ver Artigo (P. 136) e Números – Como ler e Empregar? (P. 506)
Incluído ou Incluso?
1. A questão que se põe é saber quando empregar incluso e incluído.
2. Observe-se que não é tão difícil encontrar verbos que têm dois
particípios passados. São eles denominados verbos abundantes.
3. Nesses casos, o particípio normal, que segue as regras de derivação, é
mais longo e chama-se regular; o outro, irregular. Assim, entregado,
benzido e extinguido são particípios passados regulares; já entregue,
bento e extinto são particípios passados irregulares.
4. Com os verbos ter ou haver (formando tempos compostos na voz ativa),
usa-se normalmente o particípio passado regular. Exs.: a) “Ele tinha
acendido o fogo”; b) “Ele havia acendido o fogo”.
5. Com o verbo ser (formando voz passiva) e com o verbo estar, usa-se
normalmente o particípio passado irregular. Exs.: a) “O fogo fora aceso
por ele”; b) “O fogo estava aceso”.
6. Atente-se, adicionalmente, a que chegar não faz chego no particípio
passado. Ex.: a) “O réu tinha chegado com atraso à audiência”
(correto); b) “O réu tinha chego com atraso à audiência” (errado).
7. Acrescente-se, por fim, que incluído e incluso não são formas
abundantes de particípio do verbo incluir, e sim apenas incluído, uma
vez que, como adverte com propriedade Otelo Reis (1971, p. 150), em
lição para diversos verbos (dentre os quais incluir), “as formas dadas
como seus particípios [irregulares] são hoje meros adjetivos”.
8. Com essa lição em mente, confiram-se, assim, os seguintes exemplos,
com a indicação de sua correção ou erronia: a) “O garçom tinha incluído
o serviço na conta” (correto); b) “O garçom tinha incluso o serviço na
conta” (errado); c) “O serviço já fora incluído na conta” (correto); d) “O
serviço já fora incluso na conta” (errado); e) “O incluso tíquete de
desconto não foi levado em consideração” (correto).
Inclusive
1. Luciano Correia da Silva (1991, p. 31) a tem por “palavra denotativa de
inclusão já incorporada ao nosso vocabulário”, anotando que,
“antigamente considerado advérbio, assim como o seu antônimo
exclusive, pertence hoje à classe das ‘palavras denotativas’, acrescentada
pela última reforma da nossa nomenclatura”.
2. Regina Toledo e Antonio Henriques observam não ser bom o emprego
do vocábulo referido antes da ideia que se diz incluída.
3. Em tal caso, segundo o magistério de tais professores, é correto o uso de
incluindo antes da ideia, ou o uso de inclusive após a ideia cuja inclusão
se intenta (DAMIÃO; HENRIQUES, 1994, p. 186). Exs.: a) “Todos
compareceram à audiência, inclusive o réu” (errado); b) “Todos
compareceram à audiência, o réu inclusive” (correto); c) “Todos
compareceram à audiência, incluindo o réu” (correto).
4. Em obra confeccionada em parceria com outra coautora, reforça Antonio
Henriques a mesma ideia (HENRIQUES; ANDRADE, 1999, p. 61):
“não é bom o emprego da expressão antes da ideia que se diz incluída”
(Ex.: “Todos estavam ansiosos com o resultado, inclusive os próprios
jurados”); “é correto, porém, o emprego da forma incluindo antes da
ideia a que se refere” (Ex.: “Todos estavam ansiosos com o resultado,
incluindo os próprios jurados)”.
5. Em outra obra, um de tais autores e outra coautora (HENRIQUES;
ANDRADE, 1999, p. 87) observa que “constitui erro usar-se inclusive
com o sentido de até (preposição)”. Exs.: a) “Peço para você copiar este
livro até o capítulo dez, inclusive” (correto); b) “O professor ficou
revoltado e ameaçou inclusive fisicamente” (errado).
6. Em lição mais liberal, quer quanto ao emprego, quer quanto a seu
posicionamento na estrutura da frase, pondera Domingos Paschoal
Cegalla (1999, p. 203) que tal vocábulo quer dizer inclusivamente, com
inclusão de, até e até mesmo, e complementa que “não se deve censurar
o uso de inclusive no sentido de até mesmo e de expressões equivalentes,
denotativas de inclusão”, de modo que, para tal autor, são corretos
ambos os seguintes exemplos: a) “Li o jornal todo, inclusive os
anúncios”; b) “Ele não lhe pagou a dívida, inclusive disse-lhe
desaforos”.
7. Ante a fundada divergência entre os estudiosos, assiste ao usuário a
maior gama de possibilidades de seu emprego.
8. Os textos legais, incluindo o próprio Código Civil de 1916 (de apuro
linguístico reconhecido, sobretudo por influência de Rui Barbosa),
trazem exemplos dessa consideração mais liberal do emprego do referido
vocábulo: a) “Consideram-se imóveis para os efeitos legais: I – os
direitos reais sobre imóveis, inclusive o penhor, e as ações que os
asseguram” (CC/1916, art. 44, I); b) “Os sindicatos representativos de
categorias econômicas ou profissionais e as empresas, inclusive as que
não tenham representação sindical…” (CLT, art. 616); c) “Ao sindicato
cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da
categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas” (CF, art.
8º, III); d) “São pessoas jurídicas de direito público interno: … IV – as
autarquias, inclusive as associações públicas” (CC, art. 41, IV); e) “Nas
ações de indenização por ato ilícito contra pessoa, o valor da
condenação será a soma das prestações vencidas com o capital
necessário a produzir a renda correspondente às prestações vincendas
(art. 602), podendo estas ser pagas, também mensalmente, na forma do
§ 2º do referido art. 602, inclusive em consignação na folha de
pagamentos do devedor” (CPC/1973, art. 20, § 5º); f) “Transitada em
julgado a sentença condenatória, a multa será considerada dívida de
valor, aplicando-se-lhes as normas da legislação relativa à dívida ativa
da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e
suspensivas da prescrição” (CP, art. 51); g) “O desconto, nos casos das
letras b e c, será feito mediante ordem ao empregador, à repartição
competente ou à administração da entidade paraestatal, e, antes de fixá-
lo, o juiz requisitará informações e ordenará diligências, inclusive
arbitramento, quando necessário, para observância do art. 37, § 3º, do
Código Penal” (CPP, art. 668, § 1º).
Incluso
1. Quanto ao sentido, em alguns casos significa incluído, mas os dois
vocábulos não têm a mesma natureza gramatical, o mesmo emprego,
nem uma total correspondência.
2. Do prisma da concordância verbal, é palavra de valor adjetivo e, assim,
concorda em gênero e número com o substantivo modificado
(MACHADO FILHO, 1969h, p. 1.278). Exs.: a) “Seguem inclusos os
documentos”; b) “Seguem inclusas as fotocópias”.
3. Os vocábulos anexo e apenso são seus sinônimos e seguem a mesma
construção.
Quanto ao emprego nas orações, ver Incluído ou Incluso? (P. 405)
Incontestável
Ver Inconteste ou Incontestável? (P. 406)
Inconteste ou Incontestável?
1. Incontestável é adjetivo de grande utilização no foro, sobretudo no que
concerne à análise das provas produzidas nos autos. Ex.: “A autoria e a
materialidade do delito são incontestáveis”.
2. Seu emprego não raro é equivocado, mas tal vocábulo significa, em
realidade, algo indiscutível, algo que não pode ser contestado,
independentemente de ter ou não havido objeção no caso concreto.
3. Assim, por exemplo, incontestável é a circunstância de que o exame
pericial hematológico que exclui a possibilidade de se atribuir a
paternidade a alguém – por residir valor absoluto e pleno em tal negativa
– acarreta a improcedência do pedido em ação de investigação de
paternidade. Apesar disso, no caso concreto, os interessados com
frequência teimam em tentar nulificar o valor de tal exame, buscando
remendar o conjunto de provas, por exemplo, com o depoimento de
testemunhas afirmadoras da ocorrência de namoro e de relacionamento
sexual entre a mãe e o suposto pai da criança (tal, em suma, significa,
que, apesar de incontestável, tal prova não é incontestada nos autos).
4. Já inconteste significa algo que diverge, que não pode ser abonado. Ex.:
“Os depoimentos foram incontestes e não convergiram para a formação
de convencimento sobre a real situação dos fatos”.
5. Nessa esteira, anota Cândido Jucá Filho (1963, p. 163 e 357) que
contestável é algo incerto, duvidoso, controverso; já conteste é algo
comprovativo, concorde. E, com relação a inconteste, complementa ele
que “muitos, por inadvertência, têm usado o termo em vez de
incontestável, ou de incontestado”.
6. Lembrando ser “comum o uso das palavras incontestável e inconteste
como sinônimos na linguagem jurídica, quando, até certo ponto, são
antônimos”, adiciona Edmundo Dantès Nascimento que também são
frequentes os equívocos entre “inconteste e incontestado, que
representam significâncias diferentes”.
7. Além disso, observa ele que incontestado quer apenas dizer não
contestado, acrescentando ele que “alguns dicionários dão como
sinônimo de incontestado o adjetivo incontestável, o que para a precisão
da linguagem jurídica é inaceitável”.
8. E finaliza tal autor, em distinção peculiar (NASCIMENTO, 1982, p.
189-1): a) provas incontestáveis traduzem o valor de algo “que não
admite contestação”; b) provas incontestadas têm o significado de algo
“que não foi contestado”, muito embora pudesse ser contestável,
conteste ou inconteste; c) provas incontestes, ao contrário do sentido que
muitos pretendem conferir à expressão, são “provas desarmônicas; que
não afirmam a mesma cousa, discrepantes, contradizentes”.
9. Também discorrendo sobre inconteste, observa Eliasar Rosa (1993, p.
81-3) que tal vocábulo “não é sinônimo de incontestável, de
indiscutível”, e que usar uma palavra por outra constitui erro que se
chama cruzamento. Assim, “testemunhas contestes – e não incontestes –
são aquelas cujos depoimentos são indiscrepantes, são uniformes,
incontrastáveis”.
10. Anota Luciano Correia da Silva (1991, p. 156) que “há muito quem
faça confusão entre as palavras conteste, inconteste, contestável,
incontestável e contestar. As testemunhas são contestes quando são
concordes em depoimento, quando não há divergência entre elas.
Conteste, em si, quer dizer afirmativo, comprovativo. Inconteste é o
contrário de conteste (testemunhas incontestes, ou seja, em
desacordo)”.
11. Em lição conjunta para três vocábulos, assim resume Antonio
Henriques (1999, p. 38) a questão: a) “O sentido de conteste é
(testemunha) concorde, conforme, igual. Trata-se, pois, de testemunha
que confirma, ratifica o depoimento de outrem”; b) já inconteste é
“antônimo de conteste: não concorde, discordante, discrepante,
contrário”; c) por fim, incontestável é antônimo de contestável;
significa, assim, não sujeito, não passível de contestação (sem
refutação, irrefutável, decisivo, irretorquível).
12. Em decorrência do quanto já observado, lembra Eliasar Rosa, em
continuação, que seria contraditória, sujeitando-se até mesmo a
embargos de declaração, uma sentença que pronunciasse o réu, em
processo de competência do júri, sob o argumento de que “a autoria e a
materialidade são incontestes”; no caso, a autoria e a materialidade só
poderiam ser contestes.
13. Ainda para o mesmo autor (ROSA, 1993, p. 81-3), Aurélio Buarque de
Holanda Ferreira – talvez levado por essa reiterada erronia ocorrente
nos meios forenses – “registra inconteste como sinônimo de
incontestado, contrariando, assim, os cânones da correção tradicional”.
14. Vejam-se exemplos de apurada correção quanto ao emprego de tais
palavras por nosso legislador: a) “Se as testemunhas forem contestes
sobre o fato da disposição, ou, ao menos, sobre a sua leitura perante
elas, e se reconhecerem as próprias assinaturas, assim como a do
testador, o testamento será confirmado” (CC, art. 1.878); b) “Faltando
até duas das testemunhas, por morte, ou ausência em lugar não
sabido, o testamento pode ser confirmado, se as três restantes forem
contestes, nos termos do artigo antecedente” (CC/1916, art. 1.648; o
CC/2002 evitou o vocábulo e substituiu-o pela explicação “se… houver
prova suficiente de sua veracidade” – art. 1.878, parágrafo único); c)
“Se pelo menos três testemunhas contestes reconhecerem que é
autêntico o testamento, o juiz, ouvido o órgão do Ministério Público, o
confirmará, observando-se quanto ao mais o disposto nos arts. 1.126 e
1.127” (CPC/1973, art. 1.133).
Incontinenti ou Incontinente?
1. Incontinenti é advérbio latino, que tem o sentido de sem demora,
imediatamente. Exs.: a) “Ante a fuga do réu, o juiz, incontinenti, acionou
a segurança do fórum”; b) “Quando o devedor pretenda vender o gado
empenhado, ou, por negligência, ameace prejudicar o credor, poderá
este requerer se depositem os animais sob a guarda de terceiros, ou
exigir que se lhe pague a dívida incontinenti” (CC/1916, art. 786; o
CC/2002 evitou a expressão e substituiu-a por uma genuinamente
vernácula, “de imediato” – art. 1.445, parágrafo único).
2. Por se tratar de vocábulo latino, não há acento gráfico, que não existia na
língua originária; de igual modo, deve ser grafado entre aspas, ou em
itálico, ou sublinhado, que é como se marcam palavras estrangeiras
empregadas em nossos textos.
3. Oportuno é a notar a diferença que Laurinda Grion (s/d, p. 43) faz entre
incontinenti e incontinente, fundada em lição de Luís A. P. Vitória:
“Incontinenti é um advérbio de forma latina e significa imediatamente.
Não confundir com o adjetivo incontinente, imoderado”.
4. De Domingos Paschoal Cegalla vem a seguinte observação:
“Recomendamos, por coerência, acentuar incontinênti, assim como se
acentuam os latinismos álibi, cútis, mapa-múndi, déficit, etc.” (1999, p.
204).
5. Em posição contrária a tal ensinamento, todavia, o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
que é o veículo oficial para dirimir dúvidas acerca da grafia e de quais
vocábulos existem ou não em nosso idioma, registra incontinenti como
advérbio latino, motivo por que oficialmente não está incorporado tal
vocábulo a nosso léxico, não devendo, por conseguinte, receber acento
gráfico, que não existia na língua originária (2009, p. 862).
6. No campo jurídico, dentre os termos que “gozam de predileção especial
por parte de alguns autores”, lembram Regina Toledo Damião e Antonio
Henriques (1994, p. 24) que incontinenti tem a preferência de emprego
pelo jurista Miguel Reale.
7. Observa-se, em continuação, que o Decreto 22.132, de 25/11/32, que
instituiu as Juntas de Conciliação e Julgamento e regulamentou suas
funções, em seu art. 19, foi assim redigido: “terminada a instância da
Junta, seu Presidente remeterá in-continenti os processos findos ao
funcionário incumbido de receber as reclamações”.
8. Por outro lado, a Lei 7.787, de 30/6/89, que dispôs sobre alterações na
legislação de custeio da Previdência Social, em seu art. 12, assim fixou:
“em caso de extinção de processos trabalhistas de qualquer natureza,
inclusive a decorrente de acordo entre as partes, de que resultar
pagamento de vencimentos, remuneração, salário e outros ganhos
habituais do trabalhador, o recolhimento das contribuições devidas à
Previdência Social será efetuado in continenti”.
9. Não se pode aceitar, todavia, como corretas e adequadas, nem a forma
in-continenti (com hífen) nem a grafia in continenti (separada por
espaço), e isso, no mínimo, por duas razões: a) o próprio Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa – veículo oficial da Academia
Brasileira de Letras para listar oficialmente a grafia das palavras (2009,
p. 862) – ao referir que se trata de vocábulo pertencente ao idioma latino,
fixa-lhe a grafia incontinenti (numa só palavra); b) na língua original, as
palavras pertencentes a essa mesma família etimológica – como
incontinens (impetuoso), incontinenter (excessivamente) e incontinentia
(intemperança) – seguem a grafia preconizada pelo VOLP (SARAIVA,
1993, p. 593).
Incumbir
1. Na lição de Vitório Bergo (1944, p. 137), esse verbo admite dupla
possibilidade de construção: tanto é correta a regência incumbir algo a
alguém, como incumbir alguém de algo. Exs.: a) “O mandante incumbiu
ao réu a execução do crime” (correto); b) “O mandante incumbiu o réu
da execução do crime”.
2. Não destoa desse entendimento Sousa e Silva: “Tanto vale dizer
‘incumbi José desse negócio’ como ‘incumbi a José esse negócio’. Se
usarmos pronomes átonos, as regências serão as mesmas: ‘incumbi-o
desse negócio’ ou ‘incumbi-lhe esse negócio’” (1958, p. 157).
3. Francisco Fernandes (1971, p. 382) registra exemplos de ambas as
sintaxes empregados por abalizados autores: a) “Resolvera o (papa)
incumbir este negócio aos auditores da câmara apostólica” (Alexandre
Herculano); b) “Quando o Governo passado incumbiu do Código Civil o
Dr. Clóvis Beviláqua…” (Rui Barbosa).
4. Acatando, de igual modo, a possibilidade de emprego de ambas as
construções, realça Domingos Paschoal Cegalla que, “embora seja
correta, é menos frequente, hoje, a regência incumbir algo a alguém”
(1999, p. 205).
5. Celso Pedro Luft, por seu lado, também aceitando a possibilidade de
ambas as construções, alerta para se “evitar o cruzamento das duas
construções: Incumbiram-lhe da revisão” (1999, p. 331).
6. Nos textos de lei, encontram-se ambas as construções: a) com objeto
direto (sujeito na voz passiva) de coisa e indireto de pessoa com a
preposição a (correspondendo à estrutura incumbir alguma coisa a
alguém); b) com objeto direto (sujeito na voz passiva) de pessoa e
indireto de coisa com a preposição de (correspondendo à estrutura
incumbir alguém de alguma coisa. Exs.: a) “Se a administração se
incumbir a dois ou mais sócios…” (CC/1916, art. 1.384); b) “Se os réus
forem dois ou mais, poderão incumbir das recusas um só defensor…”
(CPP, art. 461).
Indedutível – Existe?
1. É importante anotar, de início, que a autoridade para listar as palavras
oficialmente existentes em nosso léxico é o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, órgão
esse que tem a responsabilidade legal de controlar nosso vocabulário, em
cumprimento à velha Lei Eduardo Ramos, de n. 726, de 8/12/1900.
2. Isso significa, de um modo geral, que, se o VOLP não registra
determinado vocábulo, não estamos autorizados a empregá-lo na
linguagem formal das petições, arrazoados e pareceres.
3. Com essas observações iniciais, vê-se que, de fato, por um lado, o
VOLP, embora dê como existente em nosso idioma a palavra dedutível
(ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 247), não registra,
contudo, indedutível.
4. Ora, quando não existe oficialmente um vocábulo, mesmo assim é
possível seu emprego, se ele puder ser caracterizado como um
neologismo.
5. E, para se justificar um neologismo, é preciso haver a concorrência de
dois requisitos: a) estruturação adequada do novo vocábulo em nosso
idioma; b) ausência de sinônimo em nossa língua.
6. Quanto ao vocábulo que deu origem à consulta, nota-se que o prefixo in
tem significado negativo, e o próprio VOLP dá como regular e perfeita a
prefixação nesses moldes, tal como ocorre com diversos outros adjetivos
de igual formação: inapreensível, inatingível, inatribuível, inaudível,
incabível, incorruptível…
7. Além disso, não parece haver sinônimo adequado para significar a
mesma realidade semântica que se tem em indedutível.
8. Assim, preenchidos ambos os requisitos – estruturação adequada do
novo vocábulo em nosso idioma e ausência de sinônimo em nossa língua
– não parece haver motivo para negar curso regular, ainda que na
qualidade de neologismo, à palavra indedutível.
9. E, como a língua é um organismo vivo, em que as palavras vão nascendo
oficialmente com o correr dos tempos, espera-se que uma próxima
edição do VOLP registre essa regular existência de indedutível, já não
mais como neologismo, mas como vocábulo normalmente integrado ao
nosso léxico.
Indenizar
1. Verbo de largo uso nos meios forenses, exige cuidados quanto à regência
verbal.
2. Ernesto Carneiro Ribeiro, em suas observações às emendas propugnadas
por Rui Barbosa para o Projeto de Código Civil, refere que “não se diz
em português correto indenizar a alguém alguma coisa; mas indenizar
alguém por alguma coisa ou de alguma coisa”. E, para corroborar seu
entendimento, traz lição de Latino Coelho (Apud ROSA, 1993, p. 83-4),
além de três passagens do Código Civil Português (arts. 744, 1.521 e
2.361).
3. Artur de Almeida Torres (1967, p. 175-7), por sua vez, vê as seguintes
possibilidades de construção: a) como bitransitivo (ou transitivo direto e
indireto) mais a preposição de: “Era necessário que a sociedade me
indenizasse do patrimônio” (Camilo Castelo Branco); b) como
bitransitivo (ou transitivo direto e indireto) mais a preposição por: “O
governo obrigara-se, além disso, a indenizar a Câmara apostólica por
todas as despesas” (Latino Coelho); c) como transitivo direto: “Mas,
nesta hipótese, cumpre indenizar o expropriado” (Alexandre
Herculano); d) como pronominal mais a preposição de: “Buscam
indenizar-se da estreiteza na imensa amplidão das águas” (Latino
Coelho); e) como pronominal mais a preposição com: “Indenizar-se a
indigência deste homem de bem com a riqueza” (Camilo Castelo
Branco).
4. Cândido Jucá Filho (1981, p. 78) ainda observa a possibilidade de se
dizer tanto “Indenizaram-no de suas perdas” como “Indenizaram-no por
suas perdas”.
5. Para Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 205-6), “a construção correta
é indenizar alguém de (ou por) alguma coisa”, de modo que se deve
evitar “a construção indenizar alguma coisa a alguém”, e isso porque
“ninguém indeniza prejuízos, mas pessoas prejudicadas”.
6. Contrariamente a seu próprio modo de expor, que é simplesmente
alinhar exemplos autorizados das diversas sintaxes que um verbo possa
apresentar, Francisco Fernandes é taxativo: “Podemos dizer: Indenizar
alguém de (ou por) alguma coisa e Indenizar a alguém alguma coisa”
(1971, p. 382).
7. E Celso Pedro Luft (1999, p. 331) acrescenta duas observações: a) “A
regência primária é indenizar alguém (de, por algo)”; b) “A regência
inovada, indenizar algo (a alguém), se deve à analogia com dar, pagar, e
foi defendida por Rui Barbosa, na Réplica”.
8. Resuma-se, ainda, com lição de Sousa e Silva (1958, p. 157): “É verbo
de variada construção: ‘indenizou-o dos prejuízos’, ‘indenizou-o pelos
prejuízos’, ‘indenizou-lhe os prejuízos’”.
9. Sintetizando tais aspectos e ampliando a questão para outras
possibilidades de uso, leciona Aires da Mata Machado Filho que “é
igualmente correto dizer indenizá-lo de, por ou com alguma coisa e
indenizar-lhe alguma coisa” (1969f, p. 351), do que se conclui serem
também corretas as seguintes construções: a) “O réu indenizou o autor
pelos prejuízos que lhe causou”; b) “O réu indenizou o autor com
significativa importância”.
10. Acresça-se o ensinamento de Vitório Bergo (1944, p. 137), o qual, com
a corroboração de exemplos autorizados, refere que tanto é possível
indenizar alguém de algo como indenizar alguém por algo: a) “João
da Cunha… visitou-o, indenizando-o com afagos das asperezas que
precederam a sua entrada no colégio” (Camilo Castelo Branco); b) “O
governo obrigara-se a indenizar a Câmara Apostólica por todas as
despesas” (Latino Coelho).
11. Apenas para registro, já que contraria o que maciçamente lecionam os
gramáticos, vale lembrar que Antonio Henriques e Maria Margarida de
Andrade, fundando-se em lição de Kaspary, entendem que fazer da
pessoa um objeto indireto e da coisa um objeto direto é “regência
equivocada defendida por Rui Barbosa e condenada por Carneiro
Ribeiro e outros” (1999, p. 88).
12. O melhor em tais casos, ante a fundada divergência entre os doutos, é
acatar todas essas construções preconizadas aqui e acolá.
13. Em textos legais, encontram-se, por primeiro, exemplos da construção
indenizar alguém de alguma coisa, a alguma coisa, por alguma coisa
ou com alguma coisa (e se esse alguém é objeto direto, obviamente
pode tornar-se o sujeito da construção na voz passiva): a) “… as
partes… serão indenizadas com o equivalente” (CC/1916, art. 158. e
CC/2002, art. 182); b) “o Estado indenizará o condenado por erro
judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na
sentença” (CF, art. 5º, LXXV); c) “… as partes… serão indenizadas
com o equivalente” (CC, art. 182); d) “O juiz ou tribunal, de ofício ou a
requerimento, condenará o litigante de má-fé … a indenizar a parte
contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários
advocatícios e todas as despesas que efetuou” (CPC/1973, art. 18); e)
“… facultado… ao empregador, o direito de indenizá-lo (o empregado)
por rescisão do contrato de trabalho…” (CLT, art. 475, § 1º); f) “…
sob pena de ser obrigado (o funcionário) a indenizar o empregador
dos prejuízos que desse fato lhe resultarem” (CLT, art. 480, caput); g)
“O corretor… será obrigado a indenizar as partes dos prejuízos…”
(CCom, art. 51).
14. Também se encontram na legislações exemplos da construção
“indenizar alguma coisa a alguém” (e se essa coisa é objeto direto,
obviamente pode tornar-se o sujeito da construção na voz passiva): a)
“As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro”
(CF, art. 184, § 1º); b) “Se o adquirente tiver auferido vantagens das
deteriorações, e não tiver sido condenado a indenizá-las, o valor das
vantagens será deduzido da quantia que lhe houver de dar o alienante”
(CC, art. 452); c) “O litigante de má-fé indenizará à parte contrária os
prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as
despesas que efetuou” (CPC/1973, art. 18, em redação revogada); d)
“São efeitos da condenação: I – Tornar certa a obrigação de indenizar
o dano resultante do crime” (CP, art. 74, I – redação revogada).
15. É preciso cuidado, entretanto, para não fazer dos dois complementos
objetos de mesma natureza, como se deu com o art. 666 do Código
Comercial: “… o segurador… se obriga a indenizar ao segurado da
perda ou dano que possa sobrevir ao objeto do seguro…”. No caso,
“ao segurado” e “da perda ou dano” são ambos objetos indiretos. A
correção vem por fazer de um dos complementos um objeto direto e, de
outro, um objeto indireto: a) “… indenizar ao segurado a perda ou
dano…” (correto); b) “… indenizar o segurado da perda ou dano…”
(correto).
16. Adalberto J. Kaspary (1996, p. 191) tece, acerca do mencionado verbo
em textos de lei, interessantes observações: a) A construção indenizar
alguma coisa a alguém ocorre com extrema raridade, tendo-a
encontrado tal autor apenas quatro vezes em todos os textos que
pesquisou; b) Em nenhum dos trinta e quatro exemplos localizados no
Código Civil de Portugal aparece a mencionada regência, sendo mais
frequente a construção indenizar alguém de alguma coisa (vinte e
cinco vezes), seguida de indenizar alguém ou algo (seis vezes) e de
indenizar alguém por alguma coisa (quatro vezes).
Independentemente ou Independente?
1. Muito embora incomode a alguns a repetição de sons existente nesse
vocábulo, é de se atentar na lição de Domingos Paschoal Cegalla: “É
incorreto usar independente (adjetivo) em vez de independentemente
(advérbio)”. Exs.: a) “O contrato terminará no prazo estipulado,
independente de qualquer notificação” (errado); b) “O contrato
terminará no prazo estipulado, independentemente de qualquer
notificação” (correto).
2. O mesmo autor leciona o modo geral de correção de exemplos dessa
natureza: “Troque-se o adjetivo pelo advérbio, e a frase ficará correta”
(CEGALLA, 1999, p. 206).
3. Apesar de todo o cuidado na redação, oriundo da polêmica sustentada
por Rui Barbosa antes de sua aprovação, o CC/1916 traz um equívoco
dessa natureza no art. 1.001: “A novação, por substituição do devedor,
pode ser efetuada independente de consentimento deste”. O CC/2002, no
art. 362, todavia, acabou procedendo à respectiva correção: “A novação
por substituição do devedor pode ser efetuada independentemente de
consentimento deste”.
4. Mas esse não é o único equívoco da legislação codificada. O art. 596 do
vetusto Código Comercial (Lei 556, de 25/6/1850), por exemplo, assim
registra: “… o fretador … poderá … completar a carga por outros
carregadores, independente de consentimento do afretador”. Corrija-se:
“… o fretador … poderá … completar a carga por outros carregadores,
independentemente de consentimento do afretador”.
5. Também no mesmo Código Comercial, o art. 862: “Os administradores
da quebra, sem necessidade de outro algum título mais que a ata do
contrato da união, e independente da audiência do falido, procederão à
venda de todos os seus bens, efeitos e mercadorias, qualquer que seja a
sua espécie, e a liquidação das suas dívidas ativas e passivas”. Corrija-
se: “Os administradores da quebra, … independentemente da audiência
do falido, procederão à venda de todos os seus bens, efeitos e
mercadorias…”.
6. Veja-se, ainda o art. 267, § 1º, do Código Eleitoral (Lei 4.737, de
15/7/1965): “A intimação se fará pela publicação da notícia da vista no
jornal que publicar o expediente da Justiça Eleitoral, onde houver, e nos
demais lugares, pessoalmente pelo escrivão, independente de iniciativa
do recorrente”. Corrija-se: “A intimação se fará …, independentemente
de iniciativa do recorrente”.
7. E o art. 149, § 2º, do Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei 7.565, de
19/12/1986): “No caso do parágrafo anterior, o domínio fiduciário
transferir-se-á, no ato do registro, sobre as partes componentes, e
estender-se-á à aeronave construída, independente de formalidade
posterior”. Corrija-se: “… o domínio fiduciário transferir-se-á…
independentemente de formalidade posterior”.
8. E ainda o art. 156, § 2º, do mesmo Código Brasileiro de Aeronáutica: “A
função não remunerada, a bordo de aeronave de serviço aéreo privado
(artigo 177) pode ser exercida por tripulantes habilitados, independente
de sua nacionalidade”. Corrija-se: “A função … pode ser exercida por
tripulantes habilitados, independentemente de sua nacionalidade”.
9. Por fim, sem pretensão alguma de exaurir os equívocos da legislação
nesse campo, o art. 220 do mesmo Código Brasileiro de Aeronáutica:
“Os serviços de táxi-aéreo constituem modalidade de transporte público
aéreo não regular de passageiro ou carga, mediante remuneração
convencionada entre o usuário e o transportador, sob a fiscalização do
Ministério da Aeronáutica, e visando a proporcionar atendimento
imediato, independente de horário, percurso ou escala”. Corrija-se: “…
visando a proporcionar atendimento imediato, independentemente de
horário, percurso ou escala”.
Indicativo ou Imperativo?
Ver Registre-se ou Registra-se? (P. 651)
Indicativo ou Subjuntivo?
Ver Há quem garante ou Há quem garanta? (P. 385)
Indiscreção ou Indiscrição?
1. Indiscreção é palavra que não existe.
Ver Descrição, Discrição ou Discreção? (P. 273)
Inempregável – Existe?
Ver In (P. 402).
Inequivocamente ou Inequivocadamente?
1. Uma premissa a ser fixada neste assunto é que o sufixo mente, em
português, forma advérbios a partir de adjetivos no feminino. Assim:
criteriosamente (criterioso > criteriosa > criteriosamente),
satisfatoriamente (satisfatório > satisfatória > satisfatoriamente).
2. Por isso, para saber se estão corretos, como advérbios, os vocábulos
inequivocamente e inequivocadamente, deve-se verificar, por primeiro,
se equívoco e equivocado existem no idioma como reais adjetivos.
3. E uma consulta ao Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa –
editado pela Academia Brasileira de Letras, por delegação legal, para
fixar, com força de lei, quais vocábulos pertencem oficialmente ao nosso
léxico – revela que tanto equívoco como equivocado podem ser adjetivos
(2009, p. 326).
4. Apenas para esclarecer, os dicionários lhes conferem o sentido: equívoco
significa ambíguo ou aquilo que pode ter mais de um sentido; já
equivocado quer dizer errado ou que cometeu algum engano.
5. Ora, se equívoco e equivocado são adjetivos, podem seguir pela regra
geral e, assim, tornar-se advérbios nos moldes já referidos:
equivocamente e equivocadamente. Ou seja: os dois advérbios estão
formados de modo regular no idioma pátrio.
6. Em sequência, observa-se que in é um prefixo latino de valor negativo,
com função nominal, isto é, pode servir para criar neologismos, por via
erudita, desde que se junte a advérbios, adjetivos ou substantivos,
derivados de outros nomes já existentes, como imerecido, impagável,
inaplicável, induvidoso, inexigido.
7. Com essas premissas, pode-se concluir que nada impede que, em
português, também se diga tanto inequivocamente como
inequivocadamente, cada qual com seu específico significado, a partir
das acepções inicialmente esclarecidas. Ou seja: inequivocamente quer
dizer de modo não ambíguo; já inequivocadamente significa de modo
não errado.
Inexigir – Existe?
1. O prefixo in é de origem latina e tem valor negativo, servindo para dar
causa a derivação nominal (SARAIVA, 1993, p. 586).
2. Em outras palavras, pode servir para criar neologismos, por via erudita,
desde que estes sejam advérbios, adjetivos ou substantivos, derivados de
outros nomes já existentes. Exs.: imerecido, impagável, inaplicável,
induvidoso, inexigido.
3. Por se tratar de prefixo nominal, porém, não se presta, por via de regra, à
criação de novos verbos pelo processo já referido, motivo por que são
errôneos vocábulos como imerecer, impagar, inaplicar, induvidar,
inexigir.
4. Excepcionalmente, aparecem alguns verbos com o prefixo in tendo valor
negativo, como imortalizar, impronunciar, incapacitar, inutilizar, dentre
outros que se discriminam nos dicionários; tal elenco, porém, deve ser
mantido como rol de exceções, não se prestando ao estabelecimento de
nova regra para formação de palavras.
5. Para que não remanesça dúvida alguma, inexigir é vocábulo não
registrado pelo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de
determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma, além de sua
grafia oficial, o que significa que seu emprego não está oficialmente
autorizado entre nós.
Ver Existe em português? (P. 346)
Infarte ou Infarto?
Ver Enfarte, Enfarto, Infarte ou Infarto? (P. 319)
Infazer – Existe?
Ver Existe em português? (P. 346)
In fine
1. Expressão latina de grande uso nos meios jurídicos, sobretudo em
citações de artigos, parágrafos e incisos de textos legais, deve ser
traduzida como no fim, na parte final. Ex.: “Por determinação do art.
199, parágrafo único, in fine, do Código Civil de 1916, parentes
próximos não podem servir como testemunhas do casamento
nuncupativo”.
2. Por pertencer a outro idioma, é locução que, a rigor, deve vir entre aspas,
em negrito, itálico, com sublinha ou grifo indicador de tal circunstância.
3. Também não se há de olvidar a lição de Edmundo Dantès Nascimento
(1982, p. 145) no sentido de que expressões como essa não eram
hifenizadas em latim, razão pela qual “não o podem ser em língua
nenhuma”, acrescentando tal autor que, “para quem pretende grafar
escorreitamente não é permitido o hífen em expressões do latim
clássico”.
Infinitivo
Ver A fazer – Está correto? (P. 91), Agradável de se ler ou Agradável de
ler? (P. 99), Infinitivo na voz passiva (P. 415) e Uso do infinitivo (P. 752).
Inflição
1. Para Eliasar Rosa, “é o ato de infligir” (1993, p. 85), de aplicar pena ou
castigo.
2. Apesar de seu pouco uso, trata-se de palavra regularmente registrada
pelo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, que é o veículo oficialmente incumbido de
determinar os vocábulos que integram nosso idioma (2009, p. 457),
motivo por que está plenamente autorizado seu emprego.
Infligir ou Infringir?
Ver Infringir ou Infligir? (P. 417)
Influir
1. Quanto a sua ortografia, como todo verbo terminado em uir, só pode dar
origem à terminação ui na segunda e terceira pessoas do singular do
presente do indicativo: influo, influis, influi.
2. Diferentemente dos verbos terminados em uar (como continuar), são
errôneas as grafias com e em tais situações: influes, influe.
3. Nas palavras de Cândido de Oliveira, atento aos frequentes equívocos
cometidos nesse campo, “é com i a segunda e terceira pessoas do
singular do presente do indicativo dos verbos terminados em uir: aflui,
fruis, retribui, retribuis, contribui, contribuis, influi, influis” (1961, p.
64).
4. No que concerne à regência verbal, pode-se construir tal verbo com as
preposições em e sobre: a) “O fato superveniente influiu na decisão do
magistrado”; b) “O fato superveniente influiu sobre a decisão do
magistrado”.
5. Aos que intentam ver na construção influir sobre um galicismo, Mário
Barreto (1954a, p. 246-7) rebate com o argumento do uso e o abono dos
clássicos. Ex.: “A literatura atual é palavra, é o verbo ainda balbuciante
de uma sociedade indefinida, e contudo já influi sobre ela” (Almeida
Garrett).
6. Também para Sousa e Silva (1958, p. 161), influir sobre é regência tão
boa quanto influir em.
7. Francisco Fernandes, de igual modo, defende a possibilidade da
construção influir sobre, estribado até mesmo em exemplo de Rui
Barbosa: “Todas as autoridades que acabo de mencionar lhe são
posteriores, e sobre nenhuma influiu o exemplo de Paris” (1971, p. 385).
8. E Celso Pedro Luft é ainda mais específico: “A regência primária é
influir em… A preposição sobre, mais recente, se deve certamente à
analogia com atuar, exercer pressão, etc.” (1999, p. 334).
Informar
1. É interessante sua construção, no que respeita à regência verbal,
porquanto a coisa e a pessoa podem ser, indiferentemente, objeto direto
ou objeto indireto, apenas com a observação de que não pode haver, ao
mesmo tempo e em mesma oração, dois objetos diretos nem dois objetos
indiretos.
2. Assim, são corretas as construções: a) “Informaram ao Corregedor o
fato ocorrido”; b) “Informaram o Corregedor do (ou sobre o) fato
ocorrido”.
3. Pode-se sintetizar o assunto com as observações de Artur de Almeida
Torres (1967, p. 179-80): a) “Constrói-se, frequentemente, com objeto
direto de pessoa e indireto de coisa: informar alguém de alguma coisa”;
b) “Raramente aparece com objeto direto de coisa e indireto de pessoa:
informar alguma coisa a alguém”; c) “Não raro aparece seguido de
sobre, acerca de, a respeito de, contra, no sentido de dar parecer ou
informe, esclarecer”: i) “Em uma página útil e talvez a única proveitosa
aos viajantes, informa acerca dos hotéis” (Camilo Castelo Branco); ii)
“Ele informou contra” (Rui Barbosa).
4. Repita-se que não são, todavia, corretas as seguintes estruturas, que têm
ou dois objetos diretos ou dois objetos indiretos: a) “Informaram ao
Corregedor do fato ocorrido”; b) “Informaram o Corregedor o fato
ocorrido”.
5. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 210-1) admite, para tal verbo, as
seguintes construções: a) informar alguém de (ou sobre, ou acerca de)
alguma coisa; b) informar alguma coisa a alguém.
6. Na lição de Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade, “pode-se
ver que há dupla construção possível: a) informar alguém de alguma
coisa; b) informar alguma coisa a alguém” (1999, p. 89).
7. Também defendendo ambas as construções, Francisco Fernandes (1971,
p. 385) observa que, às vezes, a preposição vem subentendida, esteando-
se em lição de Sousa da Silveira: “Sou informado que o original da
transcrição de Arinos está na 8ª edição de Morais” (de que o original).
8. Corroborando a possibilidade de ambas as construções, Celso Pedro Luft
(1999, p. 334) traz observações interessantes: a) “a regência primária é
informar (-se) de algo”; b) “a preposição sobre (ou acerca de, a respeito
de) veio do traço ‘assunto, matéria’ ou ‘relação’, como ocorre em falar
de ou sobre, notícias de ou sobre, etc.”; c) “Informar algo a alguém é
regência secundária, devida a traços semânticos como levar (pela fala:
comunicar), ‘destinatário’, dos verbos dizer, comunicar, etc.”.
9. Nos textos jurídicos, aparece tal verbo, por primeiro, com a construção
informar algo a alguém (e o algo, sendo objeto direto da voz ativa, pode
aparecer como sujeito na voz passiva). Exs.: a) “Compete ao terceiro, em
relação a qualquer pleito: I – informar ao juiz os fatos e as
circunstâncias, de que tenha conhecimento…” (CPC/1973, art. 341, I);
b) “No relatório anual, os órgãos da administração da companhia
aberta informarão à assembleia geral as disposições sobre política de
reinvestimento de lucros e distribuição de dividendos…” (Lei 6.404, de
15/12/76, art. 118, § 5º).
10. Em outros dispositivos, aparece a construção informar alguém de algo
(e o alguém, sendo objeto direto da voz ativa, pode ser transformado
em sujeito na voz passiva). Exs.: a) “… o preso será informado de seus
direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada
a assistência da família e de advogado” (CF/88, art. 5º, LXIII); b) “…
o Ministério Público informará do fato o procurador-geral da
República, que tomará ou proporá as providências convenientes” (CPP
português, art. 337º, § 2º); c) “Os processos em que houver réus presos
serão apresentados aos magistrados pelo escrivão, que os informará
desse fato” (CPP português, art. 355º).
11. Como pronominal, aparece com as construções informar-se acerca de
algo ou informar-se de algo. Exs.: a) “Se o citando não estiver
presente, o oficial de justiça procurará informar-se das razões da
ausência…” (CPC/1973, art. 228, § 1º); b) “Ao Conselho Nacional de
Política Criminal e Penitenciária, no exercício de suas atividades, em
âmbito federal ou estadual, incumbe: … VIII – inspecionar e fiscalizar
os estabelecimentos penais, bem assim informar-se… acerca do
desenvolvimento da execução penal nos Estados, Territórios e Distrito
Federal…” (Lei 7.210, de 11/7/84, art. 64, VIII).
12. Na acepção de dar informe ou esclarecer, vem sob a construção
informar sobre. Ex.: “Compete à lei federal: I – regular as diversões e
espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a
natureza deles…” (CF/88, art. 220, § 3º, I).
13. Também seguem a mesma construção os verbos aconselhar, avisar,
certificar e prevenir.
Infringência
1. Como é de frequente emprego nos textos jurídicos e forenses, importa
saber se existe ou não o vocábulo infringência, até mesmo por motivo da
objeção de alguns.
2. Reafirme-se observação importante já referida mais de uma vez: no que
tange à existência, à grafia e ao gênero das palavras em nosso idioma, a
autoridade fica com a Academia Brasileira de Letras, que edita
regularmente o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, uma
espécie de dicionário que lista as palavras reconhecidas oficialmente
como pertencentes ao nosso léxico, bem como lhes fornece a grafia
oficial, muito embora normalmente não lhes comente o significado.
3. Ao agir assim, a ABL desincumbe-se de uma delegação legal, já que a
vetusta Lei Eduardo Ramos, de n. 726, de 8/12/1900, incumbiu-a de
editar regularmente essa lista oficial dos vocábulos de nosso idioma.
4. Ora, uma consulta à mais recente edição da mencionada obra revela a
expressa existência do vocábulo infringência como integrante de nosso
léxico (2009, p. 457), de modo que, apesar da objeção de alguns, que até
mesmo a consideram “criação totalmente sem fundamento”
(RODRÍGUEZ, 2000, p. 411), não há dúvida alguma acerca de sua
existência e da regularidade de seu emprego, com elevado interesse no
campo do Direito, onde há frequente uso.
5. Tem o mesmo significado de desobediência, transgressão, violação.
Exs.: a) “A infringência ao Código Penal está claramente tipificada no
caso em discussão”; b) “Não se pode falar em infringência à lei penal,
se não há previsão legal como conduta criminosa”.
6. Ao menos em um lugar, em nossa legislação, o referido vocábulo é
empregado: “É nulo o casamento contraído… por infringência de
impedimento” (CC/2002, art. 1.548, II)
Infringir ou Infligir?
1. Em sua conjugação verbal, infringir apresenta problemas de ortografia.
2. Diferentemente dos verbos cujo radical termina em j – consoante essa
que tem o mesmo som antes de todas as vogais (viajo, viajas, viajemos,
viajeis, viajem) – os verbos terminados em gir, para continuidade do som
da consoante final do radical, precisam da representação gráfica j antes
de a ou de o. Assim: infrinjo, infringes, infringe, infrinjam.
3. Seguem as mesmas observações diversos outros verbos: coligir, erigir,
exigir, impingir, infligir, insurgir-se, transigir.
4. Do latim frango (quebro) e tendo por infinitivo latino infringere,
etimologicamente quer dizer quebrantar, transgredir, violar. Ex.: “O
funcionário infringiu o regulamento”.
5. São seus cognatos frangível, frangalho, fratura, fração, infração,
infringência.
6. Não confundir com sua parônima infligir, que significa cominar ou
aplicar pena, castigo, repreensão.
7. Buscando diferenciar os dois vocábulos, assim se expressam Regina
Toledo Damião e Antonio Henriques: “Infringir (infringere) refere-se à
violação da lei ou não cumprimento de obrigações. Infligir (infligere)
tem o sentido de aplicar, impor, atirar. Em Direito, é aplicar pena ou
castigo à pessoa, em consequência de conduta criminosa ou lesiva por
ela praticada” (1994, p. 46).
Inglesmente – Existe?
Ver Portuguesmente – Existe? (P. 583)
Ingressar com ação – é correto?
Ver Entrar na Justiça – É correto? (P. 322)
Iniciar ou Iniciar-se?
1. Um leitor pergunta qual a forma correta: a) “O trabalho iniciou em 23 de
março de 2009”; b) “O trabalho se iniciou em 23 de março de 2009”.
2. Ora, dentre os diversos significados e construções com o verbo iniciar, o
que está efetivamente sob análise é aquele em que o seu sujeito (no caso,
o trabalho) é que tem um começo.
3. Com essas características, Francisco Fernandes (1971, p. 385) preconiza
que deve ser ele construído em forma pronominal, ou seja, acompanhado
do se, e traz em abono exemplos de abalizados autores de nosso idioma:
a) “… iniciando-se o povoamento do país…” (Euclides da Cunha); b)
“Pinto Monteiro… iniciou-se na maçonaria em 1830…” (Camilo
Castelo Branco).
4. Já Celso Pedro Luft, constatando usos outros por autores mais recentes
da língua, defende ambas as possibilidades: de construção como
intransitivo ou sem o pronome se. E exemplifica: a) “O curso inicia na
próxima segunda-feira” (correto); b) “O curso se inicia na próxima
segunda-feira” (correto).
5. Nesse caso, a conclusão que se deve extrair é aquela segundo a qual,
onde os estudiosos divergem, ficam permitidas ambas as construções.
6. Assim, respondendo diretamente ao leitor, são corretas ambas as formas
por ele trazidas para análise: a) “O trabalho iniciou em 23 de março de
2009” (correto); b) “O trabalho se iniciou em 23 de março de 2009”
(correto).
Inobstante – Existe?
1. Apesar de seu largo uso nos meios jurídicos, com o sentido de apesar de,
trata-se de palavra não dicionarizada, cuja criação é atribuída por
Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 157) à falta de amadurecimento
do usuário, comparável à que deu origem a palavras que de igual modo
não existem, como aliasmente, devendo, assim, ser evitada a todo custo.
2. São corretas, porém, as expressões nada obstante e não obstante, ambas
com o sentido buscado pelo referido vocábulo.
3. Observe-se que Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade
(1999, p. 100), sem qualquer condenação, apenas asseveram tratar-se tal
vocábulo de “forma encontradiça” em textos jurídicos.
4. Após referendar a correção das expressões equivalentes não obstante e
nada obstante, assim leciona Luciano Correia da Silva: “O que se tem
discutido é a legitimidade do neologismo inobstante, largamente usado
na linguagem forense. Nós, parece-nos que nada impede o emprego
desse vocábulo, uma vez que encontra amparo no processo histórico de
formação das palavras… A formação é regular e, a nosso ver, não
merece censurada, exceto como uma desnecessidade em face às locuções
sinônimas e irmãs: não obstante e nada obstante. O que não se deve é
criar monstrengos linguísticos, tais como: apenasmente, ad hocmente e
outros, produtos da meia ciência, que as mais das vezes é pior do que a
ignorância” (1991, p. 132).
5. Embora reconheça tratar-se de variante de não obstante “tida por
incorreta por alguns como Napoleão Mendes de Almeida”, Antonio
Henriques, em lição permissiva constante de obra escrita solitariamente,
anota ser “forma encontradiça na linguagem jurídica” (1999, p. 117).
Ex.: “Inobstante, o método tópico busca também lugares comuns…”
(Tércio Sampaio Ferraz Jr.).
6. Geraldo Amaral Arruda, por outro lado, é taxativo a seu respeito:
“nenhum dicionário autoriza esse neologismo, que circula nos meios
forenses a par de outras expressões de formação semelhante”.
7. E aconselha tal autor o uso de expressões vernáculas já consagradas,
como não obstante e nada obstante (ARRUDA, 1997, p. 23).
8. Em síntese: embora seja de largo uso na linguagem formal,
principalmente na redação jurídica, inobstante não existe em nosso
idioma.
9. Para espancar dúvidas acerca da impossibilidade de seu emprego, o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa – veículo oficial da
Academia Brasileira de Letras para apontar quais as palavras existentes
em nosso léxico – em sua edição de 2009, não a registra, o que obriga a
conclusão de que seu emprego não está autorizado em nosso idioma.
Inocorrer – Existe?
1. Eliasar Rosa (1993, p. 79) observa que nossos dicionários não registram
verbos como impagar, muito embora o façam com os adjetivos pagável
e impagável, mas que, no meio jurídico, é comum que se prefixem
verbos com o negativo im, como se dá neste caso.
2. Em realidade, in é prefixo latino de valor negativo e tem função nominal
(SARAIVA, 1993, p. 586), isto é, pode servir para criar neologismos, por
via erudita, desde que estes sejam advérbios, adjetivos ou substantivos
derivados de outros nomes já existentes. Exs.: imerecido, impagável,
inaplicável, induvidoso, inexigido.
3. Por se tratar de prefixo nominal, porém, não se presta, por via de regra, à
criação de novos verbos pelo processo já referido, sendo, por
conseguinte, errôneos vocábulos como imerecer, impagar, inaplicar,
induvidar, inexigir, inocorrer.
4. Excepcionalmente, aparecem alguns verbos com o prefixo in tendo valor
negativo, como imortalizar, impronunciar, incapacitar, inutilizar, dentre
outros que se discriminam nos dicionários; tal elenco, porém, deve ser
mantido como rol de exceções, não se prestando ao estabelecimento de
nova regra para formação de palavras.
5. Anota-se, por fim, que não registra o verbo inocorrer o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
órgão esse oficialmente incumbido de definir quais palavras compõem
nosso léxico, o que implica dizer que seu uso não está oficialmente
autorizado entre nós.
Inquérito
1. Em inquérito, inquirir, perquirir, o u não é pronunciado, como, aliás,
bem lembra Silveira Bueno (1938, p. 179).
2. A frequência com que ocorre o erro na pronúncia desse vocábulo fez
Arnaldo Niskier (1992, p. 3) anotá-lo em obra de profundo senso prático,
acompanhado pela devida correção.
3. Para que não remanesçam dúvidas, veja-se que essa é a posição do
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, publicado pela
Academia Brasileira de Letras, órgão esse que tem delegação legal para
listar as palavras oficialmente existentes em nosso idioma bem como sua
forma de escrever e pronunciar (2009, p. 459).
Ver Inventário (P. 428).
Inquirir
1. Em inquérito, inquirir, perquirir, o u não é pronunciado, como, aliás,
bem lembra Silveira Bueno (1938, p. 179).
Inserido ou Inserto?
1. Inserido é particípio regular do verbo inserir, e tem por sinônimo inserto.
Ex.: “Todas as provas foram inseridas nos autos”.
Ver Incerto ou Inserto? (P. 404) e Verbos abundantes (P. 759).
Inserir
1. Quanto à conjugação verbal, aparece um i no radical, na primeira pessoa
do presente do indicativo e nos tempos dela derivados: insiro, inseres,
insere, inserimos, inseris, inserem (presente do indicativo); insira,
insiras, insira, insiramos, insirais, insiram (presente do subjuntivo);
insere, insira, insiramos, inseri, insiram (imperativo afirmativo); não
insiras, não insira, não insiramos, não insirais, não insiram (imperativo
negativo).
2. Não apresenta problemas ou irregularidades nos demais tempos e
modos.
3. Na observação de José de Nicola e Ernani Terra, “o e do radical muda
para i na primeira pessoa do singular do presente do indicativo e nas
formas daí derivadas” (2000, p. 20).
Inserto ou Incerto?
Ver Incerto ou Inserto? (P. 404)
Insipiente ou Incipiente?
Ver Incipiente ou Insipiente? (P. 404)
Ínsito
1. Do latim insitu, é palavra muito usada nos meios jurídicos, e tem o
significado de inerente, inato. Ex.: “A ausência de dolo está ínsita no
conceito de crime culposo”.
2. Seu s intermédio, na lição de Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 19), tem
real som de s (como em subsolo), não de z (como em subzona).
3. A regra de pronúncia a ser seguida em tal hipótese é a de que o s apenas
tem som de z entre duas vogais, mas permanece com som de s entre uma
consoante e uma vogal.
4. A exceção a essa regra fica para o prefixo trans, quando se une a
vocábulo iniciado por vogal, situação em que o s adquire som de z:
transamazônico, transeunte, transitório, transoceânico, transuretral.
5. Cuidado, porém, porque, se o prefixo trans se une a palavras já
começadas por s, a pronúncia resultante é s, não z, independentemente
dos aspectos gráficos das palavras: transecular (trans+secular),
transiberiano (trans+siberiano), transubstanciação
(trans+substanciação).
6. À pronúncia equivocada do s intermediário desta palavra com o som de
z, Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 268) lembra tipificar-se um
barbarismo fonético.
Insolvabilidade – Galicismo?
1. Solvabilidade, insolvabilidade, solvável e insolvável eram vocábulos que
apareciam nos arts. 426, 914, 915, 955, § 4º, 1.003, 1.133, 1.300, § 2º,
1.389, 1.437, 1.492, 1.494, III, e 1.497, parágrafo único, do Projeto do
Código Civil.
2. Em suas apreciações, na Comissão de Redação do Senado, Rui Barbosa,
desde a introdução de seu Parecer (1949, p. 7), insurgiu-se contra eles,
reputando-os francesias, estrangeirismos desnecessários e reprovados.
3. Em comento ao art. 1.437 do Projeto, referiu que esses vocábulos e seus
cognatos nascem de solver, em sua acepção de quitar, de pagar a dívida,
enquanto os vocábulos com desinência em ável nascem de verbos
terminados em ar (reprovável, louvável); dos verbos terminados em er
nascem outros adjetivos: dissolvente, dissolúvel, resolúvel, resolvente,
resolvível (BARBOSA, 1949, p. 384).
4. Acrescentou que esse desacerto do Projeto escapou apenas uma vez aos
redatores do Código Civil português então em vigor, no art. 827; por ser
apenas uma vez, atribuiu a falha a um mero descuido (BARBOSA, 1949,
p. 262).
5. Por fim, aconselhou o uso de solvência ou insolvência, de solvente ou
insolvente, de solúvel ou insolúvel, conforme se trate da situação em si,
do próprio devedor, ou da obrigação (BARBOSA, 1949, p. 165, 281,
288, 196, 318, 356, 374, 384, 395, 396, 398 e 466).
6. Suas ponderações foram acatadas pelo legislador, conforme se comprova
pela redação definitiva dos arts. 913, 914, 954, parágrafo único, 1.002,
1.131, 1.300, § 2º, 1.389, 1.437, 1.492, III, 1.495, parágrafo único,
1.504, 1.798 e 1.804 do Código Civil.
7. Especificamente quanto ao vocábulo insolvabilidade, Vitório Bergo
(1944, p. 139) chama-o barbarismo gálico, ao mesmo tempo em que
preconiza o emprego de insolvência.
8. Em outra obra, o mesmo autor também o insere na lista dos galicismos,
daqueles que, “já por adaptação, já por coincidência, apresentam forma
portuguesa e, por isto, são menos notados” (BERGO, 1943, p. 118-9).
9. Na atualidade, porém, é de se anotar que tais vocábulos se encontram
registrados pelo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras, que é o veículo oficial incumbido de
determinar a existência ou não de palavras em nosso idioma (2009, p.
460 e 764), o que implica relevar que seu emprego está oficialmente
autorizado entre nós.
Insolvável – Barbarismo?
1. Na lição de Luís A. P. Vitória, tal vocábulo configura “barbarismo a
substituir por insolvente” (1969, p. 138).
2. Na atualidade, porém, é palavra que se encontra registrada pelo
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira
de Letras, que é o veículo oficial incumbido de determinar a existência
ou não de palavras em nosso idioma (2009, p. 460), o que implica dizer
que seu emprego está oficialmente autorizado entre nós.
Ver Insolvabilidade – Galicismo? (P. 420)
Insolvência
Ver Insolvabilidade – Galicismo? (P. 420)
Insolvente
Ver Insolvável – Barbarismo? (P. 420)
Instituir
1. Quanto a sua ortografia, como todo verbo terminado em uir, só pode dar
origem à terminação ui na segunda e terceira pessoas do singular do
presente do indicativo: instituo, instituis, institui.
2. Diferentemente dos verbos terminados em uar (como continuar), são
errôneas as grafias com e em tais situações: institues, institue.
3. Nas palavras de Cândido de Oliveira, após verificação dos muitos erros
cometidos nesse campo, “é com i a segunda e terceira pessoas do
singular do presente do indicativo dos verbos terminados em uir: aflui,
fruis, retribui, retribuis, contribui, contribuis, influi, influis” (1961, p.
64).
Interditando – Existe?
Ver Alimentando – Existe? (P. 105)
Interessado
1. No que concerne à regência nominal, Rui Barbosa (1949, p. 152 e 179),
ao comentar o art. 477, § 1º, do Projeto do Código Civil – que registrava
“interessados à sucessão” – insurgiu-se contra a construção referida,
assim como contra a que aparecera no art. 372 (“interessados para”),
asseverando que, num e noutro caso se há de dizer “interessados na”.
2. Suas críticas acarretaram a alteração de tais dispositivos, como se
verifica nos arts. 365 e 471, § 1º, do Código Civil de 1916.
3. Observe-se, adicionalmente, que, além da preposição em, Francisco
Fernandes (1969, p. 236) também coleciona outros casos de construção,
em que se veem as preposições com e por. Exs.: a) “… mui interessadas
com os dois cisnes negros” (Ferreira de Castro); b) “Sempre interessados
por tudo quanto se referisse à vida dos parentes” (Luiz Viana Filho).
4. Celso Pedro Luft (1999, p. 304), por seu lado, preconiza a possibilidade
de sua construção com as preposições em e por.
Ver Interesse (P. 421).
Interesse
1. Com a mesma grafia, há o substantivo, que significa atenção, cuidado,
proveito, lucro, e há o verbo interesse (de interessar), na terceira pessoa
do singular do presente do subjuntivo, com o sentido de afetar, tocar,
prender a atenção.
2. Ambas são palavras de mesma grafia (homófonas), mas com pronúncia
diversa (heterófonas). Quanto ao vocábulo de som fechado (o interesse),
todavia, não há mais sobre ele o acento diferencial de timbre, já que a
Lei 5.765, de 18/12/71, buscando simplificação da língua nesse campo,
determinou que não mais se acentua o e e o o das palavras de timbre
fechado, sinal esse que era usado para diferenciá-las dos vocábulos de
mesma grafia mas com pronúncia aberta (o começo e eu começo, o
almoço e eu almoço).
3. Apresentando-se, assim, um problema de ortoepia, é de se dizer,
consoante lição de Aires da Mata Machado Filho (1969g, p. 1.787), que
o verbo (que eu me interesse) tem o som aberto (é), ao passo que o
substantivo (contrariamente ao uso frequente nos meios forenses) tem
som fechado (ê) tanto no singular (o interesse) quanto no plural (os
interesses).
4. Resumindo a questão da pronúncia, assim é o ensino de Eliasar Rosa:
“Como substantivo, pronuncia-se com o e fechado. Como verbo, com o
e aberto” (1993, p. 87).
5. A manutenção do e fechado no plural do substantivo (ê) é realçada por
Arnaldo Niskier (1992, p. 1) em obra preciosa e prática.
6. Contrariamente a essa clássica diferença e à própria normal ocorrência
de oposição entre substantivo (som fechado) e adjetivo (som aberto) na
estrutura do vernáculo como um todo, entretanto, o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
órgão incumbido oficialmente de determinar a pronúncia oficial dos
vocábulos de nosso idioma, aponta-lhe a dupla possibilidade de
pronúncia para o substantivo: é ou ê (2009, p. 462). E essa é a palavra
oficial.
7. No campo jurídico, é palavra de largo uso para indicar uma pretensão
que se funda ou pode fundar-se em Direito, como se diz do interesse
processual como uma das condições da ação (cf. art. 267, VI, do Código
de Processo Civil).
8. Quanto à regência nominal, Celso Pedro Luft (1999, p. 304) vislumbra a
possibilidade de sua construção com as preposições de, em, para e por.
9. Exatamente essas possibilidades com as quatro preposições também são
preconizadas por Francisco Fernandes (1969, p. 236), que se vale de
exemplos de autores insuspeitos. Exs.: a) “Saberia, se tivesse a boa-fé de
saber, e não o interesse de errar” (Rui Barbosa); b) “Não têm os
príncipes interesse em fazer conquistas por esses meios; buscam
vassalos e não terras” (Mário Barreto); c) “Da civilização romana ao
ocidente da península Ibérica, que é a parte do mundo romano de maior
interesse para nós, … há inúmeros vestígios” (Sousa da Silveira); d)
“Disse a condessa, ansiosa de interesse por aquele homem
extraordinário” (Camilo Castelo Branco).
Ver Interessado (P. 421).
Ínterim
1. É substantivo que significa estado interino, entrementes, entretanto. Ex.:
“Nesse ínterim, chegaram ao magistrado dez outros processos conclusos
para sentença”.
2. Quanto à prosódia, de se atentar que se trata de palavra proparoxítona
(BECHARA, 1974, p. 59), razão por que recebe acento gráfico.
3. A pronúncia proparoxítona de tal vocábulo é também observada por
Arnaldo Niskier (1992, p. 2), talvez levado a tanto pelo número de vezes
que o encontrou escrito e pronunciado de modo errôneo, mesmo em
textos que devam submeter-se aos rigores da norma culta.
Interpor ou Opor?
1. Na prática processual do foro, alguns se veem em dificuldades ante
determinadas situações, quanto ao emprego dos verbos interpor e opor,
quando se trata de empregar certas expressões técnicas: opor embargos?,
interpor embargos?
2. Ora, num primeiro aspecto, a etimologia revela aspecto significativo, a
partir das preposições que integram os vocábulos. Assim, interpor (inter
+ ponere) traz a ideia de colocar entre, de pôr de permeio. Ex.: “Entre ti
e mim se interpôs um abismo”. Já opor (ob + ponere) reflete o sentido de
pôr diante de, de colocar como óbice, como impedimento. Ex.: “Ele opôs
uma barreira à invasão”.
3. Nosso sistema legislativo emprega usualmente interpor para referir-se
aos recursos, já que estes configuram um ato processual que se mete de
permeio entre um ato recorrido e os atos subsequentes, em mesmo feito.
Exemplifica-se: a) “Quando… forem interpostos simultaneamente
embargos infringentes e recurso extraordinário ou recurso especial…”
(CPC/1973, art. 498); b) “O recurso pode ser interposto pela parte
vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público”
(CPC/1973, art. 499); c) “Cada parte interporá o recurso…”
(CPC/1973, art. 500, caput); d) “(O recurso adesivo) será interposto
perante a autoridade competente para admitir o recurso principal”
(CPC/1973, art. 500, I); e) “Na apelação, nos embargos infringentes, no
recurso ordinário, no recurso especial, no recurso extraordinário e nos
embargos de divergência, o prazo para interpor e para responder é de
quinze (15) dias” (CPC/1973, art. 508); f) “Será, no entanto, recebida (a
apelação) só no efeito devolutivo, quando interposta de sentença que…”
(CPC/1973, art. 520, caput); g) “O recurso extraordinário e o recurso
especial, nos casos previstos na Constituição Federal, serão interpostos
perante…” (CPC/1973, art. 541, caput); h) “O recurso extraordinário,
ou o recurso especial, quando interpostos…” (CPC/1973, art. 542, § 3º);
i) “É da competência de cada uma das Turmas do Tribunal: […] b)
julgar, em última instância, os recursos de revista interpostos de
decisões…” (CLT, art. 702, § 2º, “b”); j) “Os recursos serão interpostos
por simples petição e terão efeito meramente devolutivo…” (CLT, art.
899); k) “Já tendo sido interposto recurso de despacho ou de sentença,
as condições de admissibilidade, a forma e o julgamento serão
regulados pela lei anterior” (LICPP, art. 11); l) “Os recursos … deverão
ser interpostos…” (CPP, art. 574, caput); m) “O Ministério Público não
poderá desistir de recurso que haja interposto” (CPP, art. 576); n) “O
recurso poderá ser interposto pelo Ministério Público, ou pelo
querelante, ou pelo réu, seu procurador ou seu defensor” (CPP, art. 577,
caput); o) “O recurso será interposto por petição…” (CPP, art. 578,
caput); p) “Interposto por termo o recurso…” (CPP, art. 578, § 3º); q)
“O recurso voluntário poderá ser interposto…” (CPP, art. 586, caput); r)
“As apelações poderão ser interpostas quer em relação a todo o julgado,
quer em relação a parte dele” (CPP, art. 599); s) “Se o apelante declarar,
na petição ou no termo, ao interpor a apelação, que deseja arrazoar na
Superior Instância…” (CPP, art. 600, § 4º); t) “Incumbe, ainda, ao
Ministério Público: […] III – interpor recursos de decisões proferidas
pela autoridade judiciária, durante a execução” (Lei 7.210, de
11/7/1984, art. 68, III).
4. A mesma lição vale para o adjetivo interposto e para o substantivo
interposição, como se pode ver no Código de Processo Civil (arts. 497,
500, 506, caput, 506, parágrafo único, 507, 509, caput, 509, parágrafo
único, 511, caput, 511, § 1º, 514, 518, caput, 523, § 2º, 523, § 3º, 525, §
2º, 526, 542, § 3º, 544, § 1º, 550, 551, § 3º) e no Código de Processo
Penal (arts. 578, § 2º, 579, caput, 580, 583, 588, 593, § 2º, 598).
5. Já o verbo opor costuma ser empregado com a significação etimológica
de colocar como óbice, de antepor como obstáculo, como é o caso de
impedimentos, compensação, exceções, dúvidas (no Código Civil),
irregularidades, embargos, exceções (Código de Processo Civil e
Consolidação das Leis do Trabalho). Exemplifica-se: a) “Nas mesmas
penas incorrerá o juiz: I – que celebrar o casamento antes de levantados
os impedimentos opostos contra algum dos contraentes” (CC/1916, art.
228, I); b) “Nas mesmas penas incorrerá o juiz: … III – que se abstiver
de opô-los (os impedimentos), quando lhe constarem…” (CC/1916, art.
228, III); c) “O devedor demandado pode opor ao credor as exceções
que lhe forem pessoais e as comuns a todos; não lhe aproveitando,
porém, as pessoais a outro codevedor” (CC/1916, art. 911 – o CC/2002,
art. 281, mantém a dicção); d) “O devedor que, notificado, nada opõe à
cessão, que o credor faz a terceiros, dos seus direitos…” (CC/1916, art.
1.021 – o CC/2002, art. 377, mantém a dicção); e) “Salvo os casos
previstos nos arts. 1.268 e 1.269, não poderá o depositário furtar-se à
restituição do depósito, alegando não pertencer a coisa ao depositante,
ou opondo compensação, exceto se noutro depósito se fundar”
(CC/1916, art. 1.273 – o CC/2002, art. 638, mantém a dicção); f) “Em
falta de estipulações explícitas quanto à gerência social: I – presume-se
que cada sócio tem o direito de administrar, e válido é o que fizer, ainda
em relação aos associados que não consentiram, podendo, porém,
qualquer destes opor-se, antes de levado o ato a efeito” (CC/1916, art.
1.386, I); g) “As sociedades sem personalidade jurídica, quando
demandadas, não poderão opor a irregularidade de sua constituição”
(CPC/1973, art. 12, § 2º); h) “Na execução por quantia certa contra a
Fazenda Pública, citar-se-á a devedora para opor embargos em dez (10)
dias; se esta não os opuser, no prazo legal, observar-se-ão as seguintes
regras…” (CPC/1973, art. 730, caput); i) “O devedor poderá opor-se à
execução por meio de embargos” (CPC/1973, art. 736); j) “Aos
embargos opostos na forma deste artigo, aplica-se o disposto nos
Capítulos I e II deste Título” (CPC/1973, art. 746, parágrafo único); k)
“O devedor será citado para, no prazo de dez (10) dias, opor
embargos…” (CPC/1973, art. 755); l) “Se o oficial opuser dúvidas ou
dificuldades à tomada do protesto…” (CPC/1973, art. 884); m)
“Compete, ainda, às Juntas de Conciliação e julgamento … d) julgar as
exceções de incompetência que lhes forem opostas” (CLT, art. 653, d); n)
“Nas causas da jurisdição da Justiça do Trabalho, somente podem ser
opostas, com suspensão do feito, as exceções de suspeição ou
incompetência” (CLT, art. 799); o) “É vedado à parte interessada
suscitar conflitos de jurisdição quando já houver oposto na causa
exceção de incompetência” (CLT, art. 806).
6. Com tais considerações, anota-se que o art. 536 do Código de Processo
Civil registra: “Os embargos (de declaração) serão opostos, no prazo de
cinco (5) dias, em petição dirigida ao juiz ou relator, com indicação do
ponto obscuro, contraditório ou omisso, não estando sujeitos a
preparo”. A uma análise do que costumeiramente ocorre em nosso
sistema, não se duvida de que os embargos de declaração configuram
um recurso, trazendo a inconfundível ideia de ato que se coloca entre,
que se põe de permeio. Daí porque, para guardar coerência com o
restante do sistema processual, o correto deve ser interpor, e não opor.
Por isso, quem usar interpor em tal caso não incorre em erro algum. A
par disso, ainda no caso específico dos embargos de declaração, o
emprego de opor também não pode ser inquinado de erro, porquanto,
embora seja flagrante um afastamento da etimologia e da diretriz
adotada pelo sistema, e apesar de não haver justificativa plausível para a
mudança, tal é a linguagem do próprio código.
7. Todavia, por mera questão de preferência pessoal, fico com interpor
embargos de declaração, o que, à falta de justificativa para o outro modo
de expressão, guarda coerência com as linhas gerais do ordenamento.
Interrogar
1. Para tal verbo, leciona Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 218) que a
estrutura do idioma “admite as regências acerca de, a respeito de ou
sobre, indiferentemente”. Exs.: a) “Interrogado acerca do acidente, o
motorista se contradisse”; b) “Interrogado a respeito do acidente, o
motorista se contradisse”; c) “Interrogado sobre o acidente, o motorista
se contradisse”.
2. Francisco Fernandes (1971, p. 390) ainda aduz a construção interrogar
alguém por, exemplificando com passagem de Camilo Castelo Branco:
“Na qualidade de amigo, interrogou-a pelos motivos da sua
melancolia”.
Intervir
Ver Vir (P. 770).
Intimação
1. Em termos de técnica jurídica, pode-se conceituar a intimação como o
conhecimento ou a “ciência, geralmente em caráter de ordem e de
autoridade, que deve ser dada à pessoa, parte ou interessada em um
processo, a respeito de despacho ou de sentença nele proferida, ou de
qualquer outro ato judicial ali promovido, a fim de que o intimado, bem
ciente do ocorrido, possa determinar-se segundo as regras prescritas em
lei, ou fique sujeito às sanções nesta cominadas” (DE PLÁCIDO E
SILVA, 1989, p. 508). Ex.: “O advogado protocolou recurso vinte dias
após intimação da sentença pelo Diário Oficial, motivo por que sua
apelação não foi recebida”.
2. Não confundir com citação ou notificação, atos processuais a ela
assemelhados, mas totalmente diversos em natureza.
3. Por comuns nos meios forenses, importa observar que são incorretas
certas expressões como procedida a citação, procedida a intimação,
procedido o inventário, procedida a penhora, de modo que, em seu
lugar, se deverá dizer feita a citação, ou efetivada a intimação, ou
realizado o inventário, ou lavrada a penhora.
Ver Intimação a efetivar(-se) – Está correto? (P. 425), Intimar (P. 425),
Proceder (P. 601), Procedeu-se aos inventários ou Procederam-se aos
inventários? (P. 601) e Voz passiva – Quando é possível? (P. 793)
Intimar
1. Para tal verbo, de frequente emprego nos textos jurídicos e forenses,
Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 218) vê as seguintes
possibilidades de construção: intimar alguém a alguma coisa; intimar
alguma coisa a alguém. Exs.: a) “O guarda o intimou a comparecer na
delegacia”; b) “O guarda intimou-lhe que comparecesse na delegacia”.
2. Francisco Fernandes (1971, p. 391), de igual modo, nos casos mais
problemáticos, vislumbra essa dupla possibilidade de construção:
intimar alguma coisa a alguém e intimar alguém a algo. Exs.: a) “Em
1641 lhe intimaram que para cá não viesse” (Júlio Ribeiro); b)
“Intimou-as em nome de Deus a que suspendessem o seu juízo” (Camilo
Castelo Branco).
3. Nos textos de lei, encontram-se ao menos duas outras construções:
intimar alguém para alguma coisa; intimar alguém de alguma coisa.
Exs.: a) “O réu será intimado… para responder” (CPC/1973, 296, § 2º –
redação já revogada); b) “Cada litisconsorte tem o direito de promover o
andamento do processo e todos devem ser intimados dos respectivos
atos” (CPC/1973, art. 49).
Intimem-se-as – Existe?
1. Se se diz “Intimem-se as partes”, o que se tem é uma frase reversível,
que também pode ser dita assim: “As partes sejam intimadas”.
2. E, numa frase assim, podem-se extrair as seguintes conclusões: a) o
exemplo está na voz passiva sintética; b) o “se” é partícula apassivadora;
c) o sujeito é “as partes”.
3. Por extensão, se houver a substituição do nome final (partes) por um
pronome, este também haverá de ser sujeito e, portanto, do caso reto
(elas), não do caso oblíquo (as, lhes).
4. A forma correta, assim, com a substituição pelo pronome, é “Intimem-se
elas”, jamais “Intimem-se-as” ou “Intimem-se-nas”, ou qualquer forma
semelhante.
5. Ante tais considerações, conclui-se, de igual modo, serem plenamente
equivocadas expressões de uso corrente, como não se o diz, para se o
conhecer, não se a vê, ouve-se-o com prazer, cortou-se-as.
6. Na lição de Eduardo Carlos Pereira, “o uso geral dos bons escritores
antigos e modernos não autoriza a combinação destas formas (o, a, os,
as) com o reflexivo se” (1924, p. 317).
7. A esse respeito, também lembra Evanildo Bechara que “a língua padrão
rejeita a combinação se o, apesar de uns poucos exemplos na pena de
literatos” (1974, p. 257).
8. Lembrando lição de Otoniel Mota, observa P. A. Pinto (1924, p. 56) que
à língua repugnam as formas se o e se a, porque não é possível,
logicamente, “encaixar um acusativo ao lado de outros, que é o reflexo
se”.
9. Embora simples, também é firme a lição de Antenor Nascentes a
respeito: “É incorreta a combinação de se com os pronomes o, a, os, as”
(1942, p. 90).
10. Não menos incisivo é o ensinamento de Júlio Nogueira: “Não se
pospõem as variações o, a, os, as, ao pronome se. São solecismos
grosseiros frases como: ‘Deve-se admirar aquele homem pelo cérebro;
não se o deve admirar como político’… A correção é simples: basta
suprimir as formas o, a, os, as, com o que nada perde a clareza da
frase: ‘Deve-se admirar aquele homem pelo cérebro; não se deve
admirar como político’… Pode-se igualmente adotar a forma
determinada, pessoal: ‘Devemos admirar aquele homem pelo cérebro;
não o devemos admirar como político’” (1959, p. 85).
11. Eduardo Carlos Pereira insere construções dessa espécie no rol dos
galicismos fraseológicos ou sintáticos, daqueles que “são verdadeiras
deturpações da língua, contra os quais devemos estar premunidos”
(1924, p. 260 e 262).
12. Também Mário Barreto (1954b, p. 275) assevera que tal construção,
por mais que se pretenda justificar, “é um grosseiro atentado contra a
índole da língua”, uma incorreção que não acha amparo nos
gramáticos.
13. Em complementação feita em outra obra, lembra o mesmo autor que há
determinadas frases francesas construídas com on que podem, em
princípio, conduzir o usuário a uma tradução errada, por meio da
junção que ora se repele: On la porte sur son lit, on le reconduisit chez
lui, on l’appela pour diner, on la traitait avec bonté, on ne le trouva pas,
on ne les voit pas comme ils sont. Nem por isso, todavia, o conhecido
filólogo incide nas construções vitandas (leva-se-a para a cama, levou-
se-o para casa…), mas manda traduzir assim tais frases: “levam-na
para a cama, levaram-no para casa, chamaram-na para jantar,
tratavam-na com bondade, não o encontraram, não se veem como eles
são” (BARRETO, 1954a, p. 115-6).
14. E, quanto à construção cite-se ele, vale lembrar a lição de Vitório
Bergo: “A muitos afigura-se errônea esta construção, em que o
pronome reto ele parece estar em função de objeto indireto. Tal não se
dá, entretanto, pois ele é sujeito paciente, apenas colocado em ordem
inversa” (1944, p. 168). Em realidade, “cite-se ele” equivale a “(que)
ele seja citado”.
15. Se pode parecer estranho dizer “Intimem-se elas”, afigurando-se
foneticamente repugnante a combinação, continua sendo inegável que,
no campo sintático, o verbo está na voz passiva, e o sujeito tem que ser
do caso reto; além disso, nada impede a utilização da forma analítica:
“Sejam elas intimadas”.
16. Por argumento de autoridade, acresça-se o lembrete de Aires da Mata
Machado Filho (1969i, p. 185) de que a questão ficou cabalmente
elucidada no sentido exposto após memorável polêmica entre Mário
Barreto e Melo Carvalho.
17. Em outra passagem, o mesmo gramático – após reiterar que “erro grave
é a combinação binária do pronome se aos oblíquos o, a, os, as (em
função de acusativo), em frases de voz reflexo-passiva” – transcreve
precisa lição do primeiro polemista: “sendo o pronome oblíquo o, a, os,
as objeto direto dos verbos transitivos diretos supra; sendo passiva a
voz verbal (se viu igual a foi vista; se esperava igual a era esperado,
etc.), tais construções levariam à absurdeza de revestir o sujeito da
oração o caso oblíquo (acusativo) o, a, os, as, perdendo a retilidade
(sua principal característica) inerente ao nominativo” (MACHADO
FILHO, 1969h, p. 1.361-2).
18. Vale observar que os clássicos evitam tal construção errônea de dois
modos: a) Ou omitem simplesmente o pronome o, a, os, as. Ex.: “Ou
não se busca o confessor, ou, se se busca…” (Padre Manuel
Bernardes); b) Não omitem o pronome, mas o levam, e corretamente,
ao caso reto (ele, ela, eles, elas). Ex.: “Um crime, só um crime, pode
unir-nos… E por que não se cometerá ele?” (Alexandre Herculano).
19. Sintetize-se tal processo de correção com o ensinamento de Gladstone
Chaves de Melo: “Nos casos em que supostamente tivesse cabida a
junção, ou se cala o pronome acusativo, ou emprega-se o pronome reto,
construção essa mais rara, porém certa, porque se terá entendido a frase
como passiva e, então, o ele ou ela serão sujeito da oração” (1970, p.
266). Exs.: a) “Venha esse pão e ponha-se na balança” (Padre Manuel
Bernardes); b) “Um crime, só um crime… e por que não se cometerá
ele?” (Alexandre Herculano).
20. Acresça-se a lição de Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 96) no sentido
de que se e o “não se encontram jamais na mesma frase”, motivo por
que “é incorreto dizer-se: Eles se o arrogam”.
21. E ultime-se com Silveira Bueno (1938, p. 136-7), cuja contundência, a
esse respeito, é perceptível em suas lições: “A combinação do reflexivo
se com as formas oblíquas o, a, os, as, é assunto completamente
liquidado por Mário Barreto em duas das suas ótimas obras: Novos
Estudos e De Gramática e de Linguagem. No primeiro livro aqui
citado, provou exaustivamente que frases como esta – Onde se o
encontra – são absolutamente contrárias ao cunho, à sintaxe
portuguesa. Houve um tal snr. Melo Carvalho que saiu a campo, a fim
de defender a vernaculidade, a correção de tal uso, citando em seu
abono Rui Barbosa. Foi muito infeliz porque teve pela frente não só
Mário Barreto, na segunda obra acima citada, não só o dr. Pedro Pinto,
mas o próprio Rui Barbosa que, em carta dirigida a Mário Barreto,
deserta da companhia de Melo Carvalho. Depois de tudo isto, quem
vier ainda com a pretensão de defender tal erro, que dê com a cabeça
na pedra para ver se a endireita”.
22. Veja-se, assim, de modo mais claro e analítico, o que é correto e o que
é errado nas seguintes frases: a) “Intimem-se as partes” (correto); b)
“As partes sejam intimadas” (correto); c) “Intimem-se-as” (errado); d)
“Intimem-se-nas” (errado); e) “Intimem-se” (correto); f) “Intimem-se
elas” (correto).
Intransitivo
Ver Objeto direto preposicionado (P. 511).
Intuito ou Intuíto?
1. A força da pronúncia incide sobre o u, não sobre o i, sendo sua divisão
silábica in-tui-to (com ditongo), e não in-tu-í-to (com hiato).
2. Reforce-se, assim, que são incorretas a grafia e a pronúncia intuíto.
3. Considerada sua forma correta, não há razão alguma para acento gráfico
nesse vocábulo.
4. Idêntica observação se pode fazer para circuito, fortuito e gratuito.
Ver Fluido ou Fluído? (P. 358)
Invalidar
Ver Datilografar (P. 251).
Inventário
1. Derivado do latim (inventarium), esse vocábulo vem do verbo invenire,
que, em última análise, significa achar, encontrar.
2. Em sentido estrito, no plano do Direito das Sucessões, “entende-se a
ação especial, intentada para que se arrecadem todos os bens e direitos
do de cujus, quer os que se encontravam em seu poder, quando de sua
morte, ou em poder de outrem, desde que lhe pertençam, para que se
forme o balanço acerca desses mesmos bens e das obrigações e encargos
ao mesmo atribuídos” (DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p. 515).
3. Muito embora genericamente se fale do inventário de alguém para
designar todo o processo sucessório, desde a arrecadação dos bens até a
atribuição dos quinhões, passando pelo processamento do feito, pela
citação dos interessados, pela avaliação dos bens, pelo cálculo e
pagamento dos impostos, pelas colações e pelo pagamento das dívidas, o
certo é que o inventário é ato preliminar, a que sucede a partilha, de
modo que a expressão completa e adequada de tal realidade haveria de
ser inventário e partilha dos bens de alguém.
4. Ainda nesse campo, apenas para lembrar, o inventário há de ser sempre
judicial (CPC/1973, art. 982), ainda que maiores e capazes todos os
herdeiros, ou mesmo quando há testamento, diferentemente da partilha,
que, cumpridos determinados requisitos, poderá ser extrajudicial
(CPC/1973, art. 1.029).
5. No campo gramatical, é comum ver, nos meios forenses, o uso de
expressões como procedida a citação, procedida a intimação, procedido
o inquérito, procedido o inventário, procedida a penhora.
6. A esse respeito, é de se anotar que o verbo proceder, dentre seus
significados, tem o sentido de dar início, em que é transitivo indireto,
exigindo a preposição a. Ex.: “O magistrado procedeu ao inventário dos
bens deixados pelo falecido”.
7. Tendo normalmente voz passiva apenas os verbos transitivos diretos, não
os transitivos indiretos, vale transcrever, nesse sentido, a lição de Aires
da Mata Machado Filho (1969a, p. 606): “Na acepção de instaurar ou
fazer, o verbo proceder é relativo (mais precisamente transitivo indireto
na nomenclatura em vigor) e rege a preposição a… Por ser relativo, não
pode ser apassivado; é, pois, errônea a construção: As análises foram
procedidas – em vez de: – procedeu-se às análises. Também em lugar de
exame procedido se deve dizer exame realizado, ou coisa parecida”.
8. Exatamente pelos aspectos referidos, incorretas são as expressões
procedida a citação, procedida a intimação, procedido o inquérito,
procedido o inventário, procedida a penhora.
9. Em seu lugar, dever-se-á dizer: feita a citação, ou efetivada a intimação,
ou realizado o inventário, ou lavrada a penhora.
Ver Voz passiva – Quando é possível? (P. 793)
Ir
1. Quanto à conjugação verbal, trata-se de verbo anômalo.
2. Importante é observá-lo no presente do indicativo e tempos derivados:
vou, vais, vai, vamos, ides, vão (presente do indicativo); vá, vás, vá,
vamos, vades, vão (presente do subjuntivo); vai, vá, vamos, ide, vão
(imperativo afirmativo); não vás, não vá, não vamos, não vades, não vão
(imperativo negativo).
3. Ainda no âmbito da conjugação verbal, lembram Carlos Góis e Herbert
Palhano (1963, p. 120) que tal verbo tem quatro tempos iguais ao verbo
ser: pretérito perfeito do indicativo (fui, foste, foi, fomos, fostes, foram),
pretérito mais-que-perfeito do indicativo (fora, foras, fora, fôramos,
fôreis, foram), pretérito imperfeito do subjuntivo (fosse, fosses, fosse,
fôssemos, fôsseis, fossem) e futuro do subjuntivo (for, fores, for, formos,
fordes, forem).
4. Pode-se dizer, quanto à regência verbal, que, significando encaminhar-
se, dirigir-se para algum lugar, pede a preposição a. Ex.: “Foi ao
tribunal para assistir ao julgamento”.
5. Apesar de habitual na fala, é incorreta, nesses casos, no que tange aos
textos que devam submeter-se à norma culta, a construção com a
preposição em. Ex.: “Foi no tribunal para assistir ao julgamento”.
6. Em preciosa observação para os verbos ir e chegar, assim leciona Júlio
Nogueira: “Existe a tendência viciosa de construir estes verbos com a
preposição em e suas combinações. O certo, porém, é fazê-lo com a
preposição a” (1959, p. 102).
7. Celso Pedro Luft (1999, p. 342) faz interessante distinção entre ir a e ir
para: a) ir a algum lugar “traduz a ideia de lá não se demorar, de não
assentar lá a sua residência, ou de voltar breve”; b) já ir para algum
lugar, por outro lado, revela o “intuito de lá estabelecer residência ou de
lá permanecer mais ou menos tempo”.
Ver Ao encontro de ou De encontro a? (P. 123)
Ir ao encontro de ou Ir de encontro a?
Ver Ao encontro de ou De encontro a? (P. 123)
Irreprochável – Galicismo?
1. Apesar de palavra dicionarizada por Aurélio Buarque de Holanda
Ferreira (s/d, p. 786), com o significado de impecável, Napoleão Mendes
de Almeida (1981, p. 160) a tem por galicismo grosseiro e preconiza sua
substituição pelos sinônimos incorrupto, irrepreensível, puro, são. Exs.:
a) “O réu tem passado irreprochável e, portanto, deve cumprir a pena
em liberdade”; b) “A humildade do monge é realmente irreprochável”; c)
“Contêm os autos prova irreprochável do parcelamento da dívida antes
do oferecimento da denúncia”; d) “O despacho lembrou a vida pregressa
irreprochável dos réus”.
2. Interessante anotar, porém, que tal autor por último referido, em outra
passagem de mesma obra, fundado em lição de João Ribeiro, assim se
manifesta: “Reprochar e assim reproche são vocábulos usados pelos
clássicos; são, pois, de bom uso” (ALMEIDA, 1981, p. 277): se
reprochar e reproche são de bom uso, não parece haver razão para
recusar reprochável e, assim, irreprochável.
3. Também em oposição a seu uso, tanto reprochar (censurar) como
reprochável (censurável) são vocábulos que Eduardo Carlos Pereira
insere no rol dos galicismos léxicos, daqueles que “são verdadeiras
deturpações da língua, contra os quais devemos estar premunidos”
(1924, p. 260-1).
4. Espancando, todavia, qualquer dúvida acerca da possibilidade de seu
emprego, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, que é o veículo oficialmente incumbido de definir
quais as palavras que integram o nosso léxico, registra normalmente
irreprochável (2009, p. 467), o que significa que seu uso está
oficialmente autorizado entre nós.
5. Em realidade, mesmo para o autor já referido, reitere-se que não parece
haver razão alguma para tanto elogio a reprochar e reproche,
contrastando com a condenação de irreprochável, e parece perfeitamente
adequado o uso de todas as três palavras em nosso idioma, assim como
de reprochável.
6. Atente-se, nesse passo, à lição de Pedro A. Pinto, o qual, mesmo
referindo opiniões adversas, não vê galicismo em tais palavras, muito
embora as veja simplesmente em desuso, acrescentando que todas elas
“são expressões a cada hora ouvidas e encontradas em escritores de
valia”.
7. E cita ele quase uma dezena de exemplos encontrados em Machado de
Assis, realçando três aspectos: por primeiro, Cândido de Figueiredo as
anota em seu dicionário; ao depois, Mário Barreto usou tais termos em
seus trabalhos; por fim, tais vocábulos se encontram em escritores do
porte de Camilo Castelo Branco (PINTO, 1924, p. 241-7).
Írrito
1. Adjetivo de uso frequente em textos jurídicos, tem o significado de nulo,
sem efeito, sem valor. Ex.: “Não se pode pretender o cumprimento de
uma cláusula contratual írrita, inserida em um contrato nulo”.
2. Atente-se à circunstância de que é palavra proparoxítona, diferente da
paroxítona irrito, que é primeira pessoa do singular do presente do
indicativo do verbo irritar.
Isso ou Isto?
Ver Pronome demonstrativo (P. 611).
Italianismo
1. O nome genérico para o vício de linguagem consistente em usar
vocábulos, expressões e construções alheias ao idioma é barbarismo.
2. Quando a invasão de palavras provém do italiano, dá-se ao vício o nome
de italianismo.
3. Esclareça-se, todavia, que quando regular e oficialmente recebida a
palavra nova de outro idioma pelo Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, que é o órgão
oficial para listar os vocábulos de nosso idioma, diz-se estar diante de
um neologismo, hipótese em que seu emprego passa a estar oficialmente
autorizado.
Item
1. Observe-se que, por força das regras de acentuação gráfica, este
vocábulo não é acentuado nem no singular (item) nem no plural (itens).
2. Não confundir, todavia, com hífen (terminada por n), que é acentuada no
singular, mas não no plural (hifens).
3. Observem-se, assim, as seguintes grafias: item, itens, hífen, hifens.
Ver Inciso (P. 405).
J
Jaime
Ver Roraima (P. 675).
Já… já
1. Às vezes se encontra um período em que tais vocábulos têm o nítido
caráter alternativo, e, nessas hipóteses, deve-se lembrar a lição de Sousa
e Silva (1958, p. 248): se se emprega a conjunção já no primeiro
membro disjuntivo, deve-se repeti-la no segundo. Exs.: a) “O advogado
falava da tribuna sem parar, já cansando os jurados, ora piorando a
situação de seu próprio cliente” (errado); b) “O advogado falava da
tribuna sem parar, já cansando os jurados, já piorando a situação de
seu próprio cliente” (correto).
2. Essa mesma observação vale para outras conjunções similares: ora…
ora, quer… quer.
Ver Quer… quer… quer… (P. 639)
Judiciário ou Justiça?
Ver Justiça ou Judiciário? (P. 440)
Juiz
1. Do latim judex (juiz, árbitro), tem por sinônimo magistrado e, no âmbito
jurídico, normalmente indica a pessoa que, investida de autoridade
pública e de jurisdição, administra a Justiça em nome do Estado.
2. Segundo a jurisdição que lhe é traçada e a competência que lhe é
atribuída, recebe as mais variadas denominações: juiz ad quem, juiz a
quo, juiz de direito, juiz de fato, juiz deprecado, juiz deprecante, juiz de
primeira instância, juiz de segunda instância, juiz singular, juiz
substituto, juiz titular.
3. No aspecto gráfico, pelas próprias regras que norteiam a acentuação do
hiato, tal palavra não é acentuada no singular (juiz), mas o é no plural
(juízes), no feminino singular (juíza) e no feminino plural (juízas),
bastando que se confira o Formulário Ortográfico, item 43, 4ª regra e
obs. 1: a) “Põe-se o acento agudo no i e no u tônicos que não formam
ditongo com a vogal anterior” (4ª regra); b) “Não se coloca o acento
agudo no i e no u quando, precedidos de vogal que com eles não forma
ditongo, são seguidos de l, m, n, r ou z que não iniciam sílabas” (obs. 1ª
da 4ª regra).
Ver Juíza (P. 432).
Juíza
1. Interessante a observação de Vitório Bergo (1944, p. 144) no sentido de
que, na linguagem clássica, o substantivo juiz, uniforme em gênero,
“dispensava a flexão feminina”. Hoje, porém, é normal a flexão juíza.
2. Ainda a respeito de sua flexão, Silveira Bueno, por um lado, traz antigo
ensinamento de J. Silva Correia, diretor da Faculdade de Letras de
Lisboa: “Nos últimos tempos têm surgido numerosas formas femininas,
que a língua de épocas não distantes desconhecia – e que são como que o
reflexo filológico do progresso masculinístico da mulher, – hoje com
franco acesso a carreiras liberais, donde outrora era sistematicamente
excluída”. Por outro lado, também aduz tal autor curiosa lição de
Lebierre: “Os gramáticos preceituam que os substantivos designativos de
certas profissões, a maior parte das vezes exercidas por homens,
conservem a forma masculina para a maioria de tais substantivos”. E
conclui ele próprio: “Os gramáticos, que defenderam a conservação, no
masculino, dos nomes de cargos outrora exercidos por homens e já agora
também por senhoras, não tinham razão porque tais nomes são meros
adjetivos…, podendo concordar com o sexo da pessoa que tal cargo
exerce e não com o gênero dos nomes de tais profissões” (BUENO,
1957, p. 382-3).
3. Para que se avaliem as profundas alterações em tempo exíguo acerca da
ascensão profissional da mulher, com a consequente necessidade de
emprego de novos vocábulos, basta que se veja que, mesmo na segunda
metade do século XX, ainda lecionava Artur de Almeida Torres (1966,
p. 59) haver “certos femininos que são meramente teóricos, e cujo
conhecimento não oferece nenhuma utilidade prática”, acrescentando tal
autor que “esses femininos só servem para sobrecarregar inutilmente a
memória do estudante”.
Quanto à acentuação gráfica, ver Juiz (P. 432).
Juiz ad quem
1. Quando se recorre de uma decisão a um órgão superior, apresenta-se o
recurso ao próprio magistrado que a proferiu (juiz a quo), para que ele,
após a regular tramitação, remeta os autos à segunda instância, ou
instância superior, para o respectivo julgamento.
2. Assim, juiz ad quem é expressão utilizada para identificar o juiz para
quem se remete o feito em grau de recurso.
Quanto à acentuação gráfica, ver Juiz (P. 432).
Juiz de direito
1. É o juiz togado, com jurisdição em primeira instância.
2. Conforme a matéria de sua competência, dentro da jurisdição que detém,
pode ser juiz cível, juiz criminal, juiz da infância e da juventude, juiz de
família… Também pode ser especificado, conforme a justiça em que
atua: juiz do trabalho, juiz federal…
3. Contrapõe-se à expressão juiz de fato, indicadora da pessoa que, mesmo
sendo leiga e não tendo o atributo de juiz togado, é chamada a compor
um tribunal (como o tribunal do júri) e pronunciar-se sobre fatos.
Quanto à acentuação gráfica, ver Juiz (P. 432).
Juiz de fato
Ver Juiz de direito (P. 433).
Juiz de fora
1. Conforme dão a entender as próprias palavras da expressão, era a
denominação dada ao magistrado que vinha de fora ou de lugar estranho
àquele em que ia servir, já que “era nomeado pelo rei para servir em
qualquer lugar como um administrador da justiça a mando dele próprio”
(DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p. 12).
2. Opunha-se ao juiz ordinário ou juiz eleito, que era escolhido entre as
pessoas do lugar, bem como ao juiz da terra.
3. Era, de regra, letrado e versado no Direito Romano, que normalmente
aplicava aos casos que lhe eram submetidos, ao contrário do que sucedia
com os juízes ordinários, que administravam a justiça com aplicação do
Direito Costumeiro.
4. Trata-se de classificação de cunho histórico, em terminologia que hoje
não mais se aplica, até por ausência de realidade de fato e de Direito.
Quanto à acentuação gráfica, ver Juiz (P. 432).
Juiz de paz
1. Também chamado juiz distrital, De Plácido e Silva (1989, p. 13) vê nele
os seguintes caracteres: a) foi implantado por lei de 15/10/1827; b) tinha
atribuições para conhecer e julgar pequenas demandas, que subiam em
grau de recurso aos juízes de direito; c) não se exigia dele a condição de
formado em Direito, para que pudesse exercer o cargo; d) elegia-se em
um município, para funcionar como magistrado em determinado distrito,
segundo a marcação feita pela Câmara Municipal.
2. Maria Helena Diniz (1998, p. 32) vê para ele duas funções principais: a)
“Leigo eleito para integrar, durante quatro anos, o quadro da Justiça de
paz”; b) “denominação que era dada ao encarregado da habilitação e
celebração de casamento”.
3. A atual Constituição do Estado de São Paulo lança luzes sobre a questão,
em seu art. 89: “A Justiça de Paz compõe-se de cidadãos remunerados,
eleitos pelo voto direto, universal e secreto, com mandato de 4 (quatro)
anos, e tem competência para, na forma da lei, celebrar casamentos,
verificar, de ofício ou em face de impugnação apresentada, o processo de
habilitação e exercer atribuições conciliatórias, sem caráter jurisdicional,
além de outras previstas na legislação”.
Quanto à acentuação gráfica, ver Juiz (P. 432).
Juiz distrital
Ver Juiz de paz (P. 433).
Juiz monocrático
Ver Juiz singular (P. 434).
Juiz singular
1. Também denominado juiz monocrático, ou juiz de primeira instância, é
aquele que administra a justiça singularmente, em oposição aos que
pertencem aos tribunais, cujas decisões normalmente são colegiadas.
2. Como regra, perante ele “se propõe ou se instaura a demanda, para que a
conheça e a julgue, e, depois que passe em julgado, para que dirija e
faça, igualmente, cumprir a execução” (DE PLÁCIDO E SILVA, 1989,
p. 13).
3. Em segunda instância, os magistrados dos Tribunais de Alçada são
denominados juízes; os dos outros tribunais regionais, desembargadores;
e os dos tribunais superiores, ministros.
Quanto à acentuação gráfica, ver Juiz (P. 432).
Juiz substituto
1. Juiz substituto é aquele recém-investido nas funções de magistrado e,
assim, no começo do exercício de seu cargo, pode substituir o juiz de
direito titular em sua falta ou impedimento. Pode-se dizer, de modo
simples, que é nomeado para ser suplente e auxiliar daquele, não tendo,
ainda, sua comarca ou vara própria.
2. Já o juiz titular, portanto, é aquele investido nas funções de magistrado,
quer para veredictos individuais, quer para julgamentos coletivos, com
comarca, vara ou juízo devidamente especificados, dos quais
vulgarmente se diz que ele é o dono. Eventualmente, tem a auxiliá-lo o
juiz substituto.
Quanto à acentuação gráfica, ver Juiz (P. 432).
Juiz titular
Ver Juiz substituto (P. 434).
Fulano de Tal
Julgar
1. Trata-se de vocábulo a ser observado sob o prisma da regência verbal.
2. É verbo transitivo direto, em cuja companhia, com frequência, aparece
um predicativo do objeto direto.
3. Tal predicativo pode vir ou não precedido de como. Exs.: a) “Julguei-a
incapaz para a função”; b) “Julguei-a como incapaz para a função”.
4. Aires da Mata Machado Filho (1969a, p. 616), por seu lado, mostra sua
preferência pela simples justaposição das palavras, sem emprego de
como, justificando com a elegância na fala.
5. Após observar que, na frase “Julgaram-no morto”, o sujeito é
indeterminado, o o é o objeto direto, e “morto” é o predicativo do objeto
direto, Mário Barreto (1954b, p. 196-7) também acrescenta que, com tal
verbo, o predicativo do objeto direto pode vir sem preposição ou com a
preposição por. Exs.: a) “Muita gente julgou o caso milagroso”; b)
“Muita gente julgou o caso por milagroso”.
6. Acresça-se, por fim, que é corriqueiro o emprego de frases como a que
segue: “Julgaram-no como sendo incapaz daquele procedimento”.
7. Muito embora seja de uso comum a expressão como sendo em casos que
tais – atente-se a que não é simplesmente como – é ela errônea e
desnecessária, devendo ser eliminada.
8. Proceder-se-á à correção, na prática, por um de três modos: a)
“Julgaram-no incapaz daquele procedimento”; b) “Julgaram-no como
incapaz daquele procedimento”; c) “Julgaram-no por incapaz daquele
procedimento”.
9. Idêntica há de ser a construção com outros verbos que, de modo similar,
exijam predicativo do objeto: a) “Creio-o apto (ou como apto) para o
trabalho”; b) “Consideram-no incapaz (ou como incapaz) para a
função”; c) “Reconheço-a minha inspiradora (ou como minha
inspiradora) daquela obra”; d) “Reputo-o o maior processualista (ou
como o maior processualista) vivo do país”.
Ver Nomear (P. 497).
Júnior
1. Parta-se, inicialmente, do princípio de que tal palavra já está incorporada
ao nosso léxico com o sentido de mais moço e é empregada com
frequência após o nome de alguém mais jovem, para distingui-lo de
pessoa mais velha, de mesmo nome. Ex.: “Plínio Cecílio Segundo Júnior
escreveu o ‘Panegírico de Trajano’”.
2. Fixe-se, por oportuno, que, ao contrário do que muitos supõem, seu
significado não é de filho, mas apenas de alguém mais jovem, quando
comparado a outrem mais velho. Comparando ambos os vocábulos,
lembra Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 165) que júnior “tem
significação mais lata; pode designar não só filho, mas qualquer parente
que, de igual nome, seja de nascimento mais recente; um sobrinho, um
neto pode ter júnior após seu nome, igual ao de um tio, ao de um avô”.
3. No plural, com largo uso no esporte, lembra Evanildo Bechara (1974, p.
80) que tal vocábulo tem o sentido de novato, e, por questões de
ortoepia, a sílaba tônica se desloca, fazendo juniores, tendo a vogal
tônica pronúncia fechada (ô). Ex.: “O Brasil não foi bem no campeonato
mundial de futebol de juniores deste ano”.
4. Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 34) também lhe ressalta estes dois
aspectos quanto a seu plural: a) é forma paroxítona; b) a vogal tônica é
fechada (ô).
5. Fique-se com a preciosa síntese de Vitório Bergo (1944, p. 144), para
quem, por um lado, por significar o mais moço, quando “posposto a um
antropônimo, pode assinalar não só o filho em relação ao pai, senão
também o sobrinho em face do tio, o neto relativamente ao avô etc.” Ao
depois, em continuação, tal gramático não apenas aponta o deslocamento
do acento tônico para a penúltima sílaba, mas também explicita que o
timbre da vogal tônica é fechado (ô).
6. De igual modo, na síntese de José de Nicola e Ernani Terra (2000, p.
134), esse vocábulo, “que se refere ao mais jovem entre duas ou mais
pessoas, é uma palavra trissílaba proparoxítona; recebe, portanto, acento
gráfico: jú-ni-or. A forma plural é paroxítona: ju-ni-o-res (com a vogal
tônica fechada: ô)”.
7. Veja-se, também, a síntese de Arnaldo Niskier: “O plural de júnior é
juniores, que se pronuncia juniôres” (1992, p. 73).
8. De Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 226) também procede a
apropriada observação de que se escreve, no plural, juniores, e “se
pronuncia juniôres e jamais júniores ou júniors”.
9. Não difere desse entendimento Luís A. P. Vitória (1969, p. 142), para
quem juniores é o correto plural de júnior em português, e se pronuncia
com o o fechado (juniôres).
10. Seu antônimo é sênior, que significa mais velho, mais experimentado.
11. Para resumir, oportuna a observação de Sousa e Silva: “Não se
justificam os plurais júniors e sêniors, de que fazem uso nas seções
desportivas de nossas gazetas. As formas corretas são juniores,
seniores, com o acento tônico deslocado para a terceira sílaba: juniôres,
seniôres” (1958, p. 165).
12. Observe-se, por fim, que, eliminando quaisquer dúvidas ou polêmicas,
o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, que é o veículo oficial ordenador do modo de
grafar as palavras pertencentes a nosso idioma, já faz tempo, fez
questão de fixar os três aspectos: a) a grafia do singular é júnior; b) o
plural é juniores; c) a pronúncia do plural é juniôres (1999, p. 437).
Fixados, porém, tais esclarecimentos na referida edição, o VOLP
passou a registrar apenas a forma do singular nas edições posteriores,
nada observando sobre seu plural.
Ver Ortoepia (P. 532).
Juniores
Ver Júnior (P. 435).
Juntada
1. Termo muito usado na técnica forense, significa “o ato pelo qual se faz
unir ao processo um documento ou uma peça, que lhe era estranha e que
passa a fazer parte dele, integrando-se em seus autos” (DE PLÁCIDO E
SILVA, 1989, p. 20). Ex.: a) “Os termos de juntada, vista, conclusão e
outros semelhantes constarão de notas datadas e rubricadas pelo
escrivão” (CPC/1973, art. 168); b) “O devedor oferecerá os embargos
no prazo de dez dias, contados: … da juntada aos autos do mandado de
imissão na posse…” (CPC/1973, art. 738, III).
2. Tipifica-se pelo assento ou termo de juntada, que é o escrito em que se
menciona o que se fez, com a indicação do que se juntou ou se uniu aos
autos e da data em que se executou, e é assinada pelo escrivão que
funciona no feito.
3. Trata-se de ato da mais elevada importância no andamento do processo,
bastando analisar o art. 241 do Código de Processo Civil, o qual
determina que o prazo para contestar uma ação começa a correr: a) da
juntada aos autos do aviso de recebimento, quando a citação for pelo
correio; b) da juntada aos autos do mandado cumprido, quando a citação
for por oficial de justiça; c) da juntada aos autos do último aviso de
recebimento ou mandado citatório cumprido, quando houver vários réus;
d) da juntada aos autos da carta de ordem, precatória ou rogatória,
quando o ato de citação se realizar em cumprimento a uma delas.
Junto
1. Junto é particípio passado irregular de juntar e pode funcionar como
adjetivo (com o significado de anexo, pegado, unido), hipótese em que,
variável, modifica um substantivo, com o qual há de concordar em
gênero e número. Exs.: a) “A certidão junta prova que o recurso é
intempestivo”; b) “Os documentos juntos provam que o recurso é
intempestivo”; c) “As certidões juntas provam que o recurso é
intempestivo”.
2. Tal vocábulo também pode ser um advérbio (com o sentido de
juntamente, ao mesmo tempo ou em companhia), caso em que modifica
um verbo, não sofrendo variação de espécie alguma. Ex.: “Apresentou-se
o advogado, e com ele os autos junto”.
3. Vejam-se alguns exemplos de emprego desse vocábulo em dispositivos
de lei: a) “Só poderá ser junto aos autos documento redigido em língua
estrangeira, quando acompanhado de versão em vernáculo, firmada por
tradutor juramentado” (CPC/1973, art. 157); b) “A carta será
registrada, com aviso da recepção, a fim de ser junto aos autos”
(CPC/1973, art. 223, § 1º); c) “Ao laudo, anexará o agrimensor a planta
da região e o memorial das operações de campo, os quais serão juntos
aos autos, podendo as partes, no prazo comum de 10 (dez) dias, alegar o
que julgarem conveniente” (CPC/1973, art. 957, parágrafo único); d)
“Junto aos autos o relatório dos arbitrad ores, determinará o juiz que as
partes se manifestem sobre ele no prazo comum de 10 (dez) dias…”
(CPC/1973, art. 965).
4. Observe-se, adicionalmente, que junto a e junto de são locuções
prepositivas, com o significado de ao lado de, nas cercanias de, nas
proximidades de, hipóteses em que não sofrem variação alguma. Exs.: a)
“As armas se encontravam junto ao corpo da vítima”; b) “A cadeira
junto da porta estava desocupada”.
Ver Junto a, Junto de ou Junto em? (P. 439)
Jurisprudência ou Jurisprudências?
1. A dúvida trazida busca saber qual o real sentido da palavra
jurisprudência e se é possível o seu emprego no plural.
2. Uma consulta aos manuais de Direito revela que o sentido da palavra
jurisprudência sempre foi o de um conjunto de decisões judiciais. Não
importando se são uniformes ou não, se se referem a uma matéria
específica ou não, o certo é que sempre se impregna do sentido de
conjunto de julgados.
3. O vocábulo pode trazer um sentido genérico, como a jurisprudência de
um país. Pode mesmo significar aquela que regula um relacionamento
entre países, como a jurisprudência internacional. Pode dizer respeito a
uma determinada área, como a jurisprudência administrativa. Pode
particularizar um determinado órgão julgador, como a jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal. Mas, repita-se, sempre se impregna da
acepção de um conjunto de julgados.
4. Tecnicamente, assim, num primeiro aspecto, não deve ser empregada
como sinônima de julgado, decisão, sentença ou precedente. Veja-se, por
isso, a correção ou incorreção dos seguintes exemplos: a) “Encontrei
uma jurisprudência que veste como luva o caso concreto” (errado); b)
“Encontrei um julgado (ou decisão, ou sentença, ou acórdão) que veste
como luva o caso concreto” (correto).
5. Por outro lado, entretanto, nada impede que venha a ser empregada no
plural, quando se quiser dizer a duplicidade de conjuntos de julgados.
Ex.: “As jurisprudências brasileira e americana divergem nesse assunto,
até em decorrência do tratamento diverso que a matéria recebe em
ambos os ordenamentos” (correto).
Justapor
Ver Pôr – Como conjugar? (P. 577)
Justiça ou Judiciário?
1. Um leitor parte do princípio de que os três Poderes são o Legislativo, o
Executivo e o Judiciário e verifica que, com frequência, fala-se não de
Judiciário, mas de Justiça: “… a Justiça prendeu, a Justiça soltou…”. E
indaga se não deveria ser empregado o termo Judiciário.
2. Em termos de terminologia técnica, como a própria Constituição Federal
faz questão de discriminar, os Poderes da União, independentes e
harmônicos entre si, são o Legislativo, o Executivo e o Judiciário
(CF/88, art. 2º).
3. É verdade que, se, no exercício de sua função de solucionar os casos
concretos e na aplicação da lei, o Judiciário tem por norte a busca de
distribuir a justiça (cf. Lei de Introdução ao Código Civil, art. 5º), esta
nem sempre aflora quando da solução dos casos concretos.
4. De todo modo, sendo a justiça um dos alvos precípuos do Poder
Judiciário e mesmo um de seus atributos ou possíveis consequências, o
certo é que, com certa frequência, se emprega o atributo em lugar do
nome técnico que identifica a entidade.
5. Dá-se o nome de metonímia a essa figura de linguagem que usa uma
palavra por outra, quando, entre elas, em decorrência de uma relação de
contiguidade, existe uma certa interdependência (LIMA, 1972, p. 466),
determinada por relação de: a) efeito e causa (“As cãs [em lugar de
velhice] inspiram respeito”), b) autor por obra (“Li Machado de Assis”),
c) continente por conteúdo (“Uma garrafa basta para ele se
descontrolar”), d) parte pelo todo (“Completou quinze primaveras”)…
6. De modo específico para o caso da consulta, embora se reconheça que o
sentido pode, eventualmente, vir a ficar tecnicamente comprometido, o
certo é que o emprego de Justiça em lugar de Judiciário está correto,
quando se atenta aos aspectos exclusivos da linguagem e da estilística, e
isso pelo emprego da já citada figura de linguagem denominada
metonímia. Exs.: a) “O Judiciário não pode ficar alheio a essa
discussão” (correto); b) “A Justiça não pode ficar alheia a essa
discussão” (correto).
Látex ou Latex?
1. Trata-se do suco leitoso, da seiva de certas plantas, como a seringueira.
2. Quanto à prosódia, é vocábulo paroxítono (BECHARA, 1974, p. 58),
devendo-se pronunciar com mais força a penúltima sílaba (lá).
3. Deve receber acento gráfico, por força da regra 43, alínea 8ª, do
Formulário Ortográfico, que manda sobrepor o acento agudo na vogal da
penúltima sílaba das palavras paroxítonas que acabem em x.
4. A pronúncia paroxítona de tal vocábulo é também observada por
Arnaldo Niskier em obra de elevado cunho prático (1992, p. 2).
5. Também não se há de esquecer que seu x final é pronunciado cs
(Academia Brasileira de Letras, 2009, p. 491).
6. Quanto à formação do plural (flexão de número), é palavra invariável,
como todos os demais vocábulos com terminação em x, conhecendo-se
sua flexão em número apenas pela variação do artigo: o tórax, os tórax;
o látex, os látex.
Latinismo
1. O nome genérico para o vício de linguagem consistente em usar
vocábulos, expressões e construções alheias ao nosso idioma é
barbarismo.
2. Quando a invasão de palavras ou de estrutura provém do latim, dá-se ao
vício o nome de latinismo.
3. Esclareça-se, todavia, que, quando regular e oficialmente recebida a
palavra nova de outro idioma pelo Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, que é órgão
oficialmente incumbido de fixar os vocábulos de nosso idioma, diz-se
estar diante de um neologismo, hipótese em que seu emprego passa a
estar oficialmente autorizado.
Ver Estrangeirismos (P. 336).
Latrocida – Existe?
1. Um leitor indaga se existe, em português, o vocábulo latrocida,
entendido como aquele que comete um latrocínio.
2. Ora, em vocábulos como homicida, tem-se um primeiro radical (homo =
semelhante) que se junta a outro radical (cida = aquele que mata).
3. Com idêntica formação, são palavras de uso corrente: bactericida,
espermicida, fungicida, herbicida, inseticida, raticida.
4. Em determinados casos, o assassino acaba tendo denominação
específica, conforme quem seja a pessoa que é morta: fratricida (que
mata o irmão), infanticida (que mata um infante), mariticida (que mata o
marido), matricida (que mata a mãe), parricida (que mata o pai),
regicida (que mata o rei), suicida (que mata a si próprio), uxoricida (que
mata a esposa).
5. De modo específico para o vocábulo latrocida, uma primeira observação
a ser feita é que, para que uma palavra possa ser tida como existente em
nosso idioma, será preciso que conste no Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, órgão
esse que tem delegação legal para listar os vocábulos oficialmente
existentes em nosso idioma. E, na hipótese vertente, uma consulta ao
VOLP evidencia que ali não se registra tal palavra.
6. Uma segunda observação, a partir da consideração dos demais vocábulos
com idêntica formação, é que, em tais palavras, o primeiro radical é
exatamente o alvo da morte. Ou seja: no caso, ainda que existisse o
vocábulo latrocida, só poderia ele significar aquele que mata um ladrão,
jamais aquele que comete um latrocínio.
Lêem ou Leem?
Ver Crêem ou Creem? (P. 240)
Legiferante ou Legisferante?
Ver Legiferar ou Legisferar? (P. 443)
Legiferar ou Legisferar?
1. Legiferar é a grafia correta do verbo, que significa fazer lei, e não
legisferar. Exs.: a) “A Câmara dos Deputados legifera” (correto); b) “A
Câmara dos Deputados legisfera” (errado).
2. De igual modo se há de dizer do Legislativo que é um Poder legiferante,
e não Poder legisferante.
3. Apenas para dar uma explicação à ocorrência de erro tão comum, lembra
Domingos Paschoal Cegalla que “por influência de outras palavras com
o radical legis (legislar, legislador, legislativo, etc.) é que se explica a
forma errônea legisferar” (1999, p. 231).
4. Trata-se, porém, de mera explicação, e não de justificativa que possa ter
o condão de dar o erro por aceitável, até porque tal forma não é
registrada pelo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de
determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma, além de sua
grafia oficial. A única forma registrada pelo VOLP é o verbo legiferar
(2009, p. 493).
Lei
Ver Números – Como ler e Empregar? (P. 506)
Leiaute
Ver Formação de adjetivos – Regras (P. 360) e Neologismo (P. 494).
Lêiser
Ver Formação de adjetivos – Regras (P. 360) e Neologismo (P. 494).
Ler
1. Apresenta problemas de conjugação verbal em diversos tempos, até por
apresentar sons não tão agradáveis ao ouvido: leio, lês, lê, lemos, ledes,
leem (presente do indicativo); leia, leias, leia, leiamos, leiais, leiam
(presente do subjuntivo); li, leste, leu, lemos, lestes, leram (pretérito
perfeito do indicativo).
2. Juntamente com crer, dar, ver e respectivos compostos, eram os únicos
verbos grafados com êe na terceira pessoa do plural, com acento
circunflexo no primeiro e. O recente Acordo Ortográfico, todavia, aboliu
tais acentos: creem, deem, leem, veem.
3. Serve de modelo para seus compostos: reler, tresler.
Ver Crer – Conjugação e Regência verbal (P. 241), Nomear (P. 497), Ver –
Como conjugar? (P. 764) e Vir (P. 770).
Lesionar – Existe?
Ver Existe em português? (P. 346)
Leso
1. É forma adjetiva com o significado de lesado, ferido.
2. Lembra Domingos Paschoal Cegalla que, “na acepção de lesado,
antepõe-se a certos substantivos, geralmente precedido da expressão
crime de, para indicar ofensa ou violação grave” (1999, p. 233).
3. Quanto à concordância nominal, é adjetivo que entra na formação de
compostos e varia normalmente, concordando com o substantivo a que
se refere em gênero e número: crime de leso-patriotismo, crime de lesa-
majestade, crime de lesos-sentimentos (PEREIRA, 1924, p. 295).
4. De oportuna transcrição o ensinamento de Carlos Góis: “Por falsa
analogia iludem-se alguns escritores incipientes, e usam escrever lesa-
patriotismo, lesa-sentimento, supondo que o primeiro elemento seja o
verbo lesar na terceira pessoa do singular do presente do indicativo,
quando é particípio passado irregular do referido verbo” (1943, p. 202).
5. Veja-se, de igual modo, a lição do Padre José F. Stringari (1961, p. 5):
“O adjetivo leso deve concordar com o substantivo a que se ajunta”,
exemplificando tal gramático com exemplo dos melhores de Alexandre
Herculano: “Mas nos crimes de lesa-arte e de leso-patriotismo
cometidos no meio das revoluções…”.
6. Para Vitório Bergo (1943, p. 58), “este adjetivo, a que se prende
etimologicamente o verbo lesar, concorda regularmente com o
substantivo a que se antepõe: ‘… prometera rasgar a folha deste
romance, ré de leso-matrimônio…’ (Camilo Castelo Branco); ‘A
supressão de cenas, árias, cavaletes etc. é … um crime de lesa-arte’
(Camilo Castelo Branco)”.
7. Em outro significativo aspecto, anota Luís A. P. Vitória (1969, p. 144)
com precisão: “pronuncia-se com e aberto”.
Letra maiúscula
Ver Direito (P. 287) e Letras maiúsculas e Acento gráfico (P. 444).
Letras
Ver Plural de letras – Existe? (P. 566)
Lêvedo ou Levedo?
1. Tal vocábulo pode significar o fermento, a levedura (e, assim, é um
substantivo), e também pode indicar a qualidade de fermentado (e, desse
modo, é um adjetivo).
2. Tradicionalmente, tem-se afirmado ser, em ambos os casos, um vocábulo
proparoxítono (BECHARA, 1974, p. 59), de modo que se tem
preconizado que se deve pronunciar com mais força a antepenúltima
sílaba (lê), o que, por consequência, gera a necessidade de acento
gráfico: lêvedo.
3. Cândido de Oliveira (1961, p. 34), em decorrência dos frequentes
equívocos acerca de sua pronúncia, reforça-lhe a condição de
proparoxítona, e Cândido Jucá Filho assim reitera (1963, p. 387), tanto
para o adjetivo (pão lêvedo) como para o substantivo (lêvedo de
cerveja).
4. Embora observe, quanto ao substantivo, que “a pronúncia corrente no
Brasil é levedo (vê)”, Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 233), quer
para o substantivo, quer para o adjetivo, quanto à norma culta, afirma ser
correta apenas a grafia e a pronúncia proparoxítonas (pão lêvedo, lêvedo
de cerveja).
5. Desse entendimento não destoa Napoleão Mendes de Almeida (1981, p.
172): “Quer substantivo, quer adjetivo…, é palavra sempre
proparoxítona”.
6. Contrariando, porém, a tradição, o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa (2009, p. 497), repetindo o que afirmou em suas edições
anteriores (de 1999 a 2009), tem apontado apenas a forma paroxítona
levedo (vê) para o substantivo (e, assim, levedo de cerveja), reservando a
forma proparoxítona lêvedo (lê) apenas para o adjetivo (e, assim, pão
lêvedo, massa lêveda).
7. Nunca é demais anotar que, sendo editado pela Academia Brasileira de
Letras, órgão incumbido oficialmente de determinar a existência dos
vocábulos em nosso idioma, além de sua grafia e pronúncia oficiais, o
VOLP é a autoridade nesse assunto.
8. Assim, apenas cabe lutar e esperar que, em próxima edição, se torne ao
remansoso e sadio caminho da tradição do idioma, no mínimo para
autorizar cumulativamente a grafia e a pronúncia proparoxítonas para o
substantivo.
Lhe
1. Os pronomes pessoais oblíquos átonos o, a, os, as funcionam como
objetos diretos; já os pronomes lhe e lhes, como objetos indiretos. Exs.:
a) “O juiz sentenciou o caso”; b) “O juiz sentenciou-o”; c) “O
documento pertence aos autos”; d) “O documento pertence-lhes”.
2. Oportuna a lembrança de João Ribeiro (1923, p. 176) no sentido de que,
nos tempos preliminares do período clássico, encontra-se o emprego do
pronome lhe equivalendo a o, como, por exemplo, em repreendeu-lhe
(em vez de repreendeu-o), sintaxe essa de equivalência em diversos
casos, que também é encontrada no castelhano.
3. Para os dias de hoje, entretanto, Sousa e Silva (1958, p. 168) aponta,
com propriedade, que, embora comum, é errôneo emprego de lhe e lhes
em lugar de o, a, os e as.
4. A frequência com que se dão equívocos dessa natureza fez com que
Arnaldo Niskier (1992, p. 51) tecesse a seguinte observação: “É um erro
muito comum a troca do pronome o (e variações) por lhe(s). Devemos
ter em mente que o (e variações) é utilizado como objeto direto
(conheço-o) e lhe(s) como objeto indireto (paguei-lhe cinco mil
cruzeiros)”.
5. E, para quem tiver dificuldade exatamente em reconhecer a
transitividade dos verbos, é bom lembrar, em termos bem práticos, que o
verbo transitivo direto, por via de regra, admite passagem para a voz
passiva, mas não o transitivo indireto.
6. Assim, no exemplo “O caso foi sentenciado pelo juiz”, o verbo está na
voz passiva, já que o sujeito caso sofre a ação de sentenciar, em
evidência de que o verbo é transitivo direto.
7. Já o exemplo “O documento pertence aos autos” não admite passagem
para a voz passiva, o que é sinal inconfundível de que pertencer não é
transitivo direto.
8. De suma importância, em adendo, é ver que lhe põe-se em lugar de um
nome do singular, enquanto lhes substitui um nome do plural. Exs.: a)
“O paletó pertence à vítima”; b) “O paletó pertence-lhe”; c) “O dinheiro
pertence às vítimas”; d) “O dinheiro pertence-lhes”.
9. Essa distinção, todavia, por equívoco, nem sempre é observada até
mesmo por textos de lei, como se verifica do seguinte exemplo: “O
Banco Nacional da Habitação e a SUMOC manterão sigilo com relação
a documentos e informações que as sociedades de crédito imobiliário
lhe fornecerem” (art. 41, § 3º, da Lei 4.380, de 21/8/64, que
regulamentou os contratos imobiliários). Corrija-se lhe para lhes, porque
tal pronome substitui tanto o Banco Nacional da Habitação como a
SUMOC.
Ver Lhe por Seu (P. 445), Pronome pessoal (P. 614) e Voz passiva – Quando
é possível? (P. 793)
Lho – Existe?
Ver Mo – Está correto? (P. 476)
Licença-prêmio
1. Também chamada licença especial, é a permissão dada ao funcionário
público para faltar ao serviço por determinado lapso temporal (às vezes
convertida em pecúnia, por necessidade do serviço), com todos os
direitos e vantagens do cargo efetivo, e isso após o cumprimento de
alguns anos de trabalho e desde que preenchidos determinados aspectos
adicionais atinentes à ausência de suspensões e de faltas injustificadas
(MASAGÃO, 1968, v. 375, p. 195-6).
2. Na conformidade com lição de Luís A. P. Vitória, seu plural há de ser
licenças-prêmio e não licenças-prêmios, uma vez que, em substantivos
compostos dessa natureza, “quando o segundo elemento exprime
finalidade ou espécie, só o primeiro vai para o plural” (1969, p. 149).
3. Cândido de Oliveira (s/d, p. 92), de igual modo, confere-lhe por plural
apenas licenças-prêmio.
4. Se, todavia, por um lado, irretocável é a lição dos autores citados, em
consonância com a doutrina tradicional, o certo é que a tendência da
Gramática, na atualidade, é conferir duplo plural aos nomes compostos
formados por dois substantivos, em que o segundo elemento indique a
finalidade do primeiro.
5. Assim, nos dias de hoje, em regra válida para textos que devam
submeter-se aos rigores da norma culta, o substantivo composto aqui
analisado pode, no plural, indiferentemente, fazer licenças-prêmio ou
licenças-prêmios, como, aliás, aponta o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa (2009, p. 498), editado pela Academia Brasileira de
Letras, entidade oficialmente incumbida de listar os vocábulos do nosso
idioma, bem como de apontar-lhes peculiaridades de flexão de gênero e
número.
Ver Substantivos compostos – Como levar ao plural? (P. 717)
Linguagem científica
1. Se, por um lado, o literato produz arte, com liberdade para empregar os
vocábulos que melhor sugiram seu estado de espírito e sua criatividade,
já o profissional do Direito (que frequentou um curso de ciências
jurídicas e sociais), por outro lado, produz ciência, cuja linguagem é
técnica e precisa.
2. Bem por isso, em termos práticos, é inconveniente, de um modo geral,
substituir termos e locuções por sinônimos, a pretexto de evitar
repetições.
3. Nessa esteira, lembrando que “a precisão da linguagem jurídica
desaconselha tais substituições”, observa Geraldo Amaral Arruda que,
“firmado o título do instituto jurídico com a função de determinado
adjetivo restritivo, será impróprio substituir substantivo e adjetivo por
sinônimos ou pretensos sinônimos”.
4. E alinha tal autor um rol dessas impropriedades, muitas vezes de mau
gosto: estatuto minorista, estatuto repressivo, estatuto adjetivo civil,
representante ministerial, fase inquisitorial, insuficiência probatória, em
vez de: Código de Menores, Código Penal, Código de Processo Civil,
representante do Ministério Público, fase do inquérito policial,
insuficiência de provas (ARRUDA, 1997, p. 40).
5. A questão é tão arraigada nos meios forenses, que até mesmo resvala
para o lado anedótico, como a história que se conta do causídico atuante
na Justiça Militar, que ao Código Penal Militar jamais atribuía esse
nome, mas sempre o rebatizava como pergaminho repressivo castrense;
ou do extremo a que chegou um representante do Ministério Público, o
qual, ao oferecer denúncia por lesões corporais em briga havida durante
um jogo de futebol, asseverou ter-se dado o evento durante pugna de
ludopédio.
6. Bem no estilo “seria cômico, se não fosse trágico”, prestigioso jornal,
em artigo no qual pretendia demonstrar que os jovens advogados tentam
modernizar o idioma jurídico, noticiou que um deles, para não repetir a
expressão Lei das Sociedades Anônimas, não teve dúvidas em chamá-la
de diploma do anonimato (Folha de S. Paulo, 5 jun. 1994, caderno 4, p.
2-3).
7. A necessidade de um vocabulário preciso e científico se faz evidente até
mesmo em determinados dispositivos legais.
8. Veja-se, por exemplo, o que segue: “Nos embargos infringentes e na
ação rescisória, devolvidos os autos pelo relator, a secretaria do
tribunal expedirá cópias autenticadas do relatório e as distribuirá entre
os juízes que compuserem o tribunal competente para o julgamento”
(art. 553 do Código de Processo Civil).
9. Sabido é pela praxe que tais cópias serão entregues tão somente aos que
haverão de participar de modo efetivo do julgamento, e não a todos os
integrantes do tribunal, o qual, como um todo, não deixa de ser
competente para o julgamento.
10. Desse modo, melhor seria dizer turma julgadora em lugar de tribunal.
Liquidação e Liquidar
Ver Líquido (P. 449).
Líquido
1. Em palavras como liquidação, liquidar, líquido, liquidificador, o u é ou
não pronunciado, conforme a região do Brasil.
2. Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 19) arrola esse vocábulo entre aqueles
nos quais o u é pronunciado ou não facultativamente.
3. De tais observações extrai-se a ilação de que, para todos os efeitos,
facultativo era o uso do trema em tais palavras.
4. Ocorre que o Acordo Ortográfico de 2008 aboliu o uso do trema em
palavras de nosso idioma.
5. Isso, contudo, não invalida a lição de que, no caso, o u pode ou não ser
pronunciado, exatamente como aponta o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras (2009, p. 503),
órgão incumbido oficialmente de determinar a existência dos vocábulos
em nosso idioma, que registra as duas formas de pronúncia (u ou ü),
mesmo em sua edição posterior ao mencionado acordo.
Localizado
1. De acordo com Francisco Fernandes (1971, p. 408), tal vocábulo admite
ser construído com as preposições em e entre. Exs.: a) “O terreno
discutido estava localizado em bairro distante”; b) “O terreno discutido
estava localizado entre uma padaria e um templo religioso”.
2. De mesma regência é o verbo localizar.
Ver Morar à Rua Tal ou Morar na Rua Tal? (P. 477)
Localizar
Ver Localizado (P. 449).
Locuções prepositivas
1. A análise dos bons autores revela que, se os elementos regidos por
locução prepositiva são unidos por e, pode haver a repetição da
preposição que finaliza a locução. Ex.: “Ele continua a culminar aí,
acima das letras e da magistratura”.
2. Se tais elementos se ligam sem conjunção, é costume repetir a
preposição que finaliza a locução. Ex.: “Ele continua a culminar aí
acima das letras, da política, da magistratura”.
3. Se o intuito é conferir ênfase à expressão, em elementos ligados sem
conjunção, pode-se repetir a locução prepositiva em sua totalidade. Ex.:
“Ele continua a culminar aí acima das letras, acima da política, acima
da magistratura” (Rui Barbosa).
4. Se os elementos se distanciam na frase, a ponto de dificultarem a
compreensão do leitor, nada melhor do que repetir a locução toda. Ex.:
“Ele continua a culminar aí acima da política e, também com igual
intensidade e vigor, acima da magistratura”.
5. Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 276) chama a atenção, para que
se evite o uso do artigo sem preposição antes do segundo elemento, o
que ele considera galicismo ou castelhanismo. Ex.: “Ele continua a
culminar aí acima das letras, e a política, e a magistratura” (errado).
Locuções verbais
Ver Pronomes e Locuções verbais (P. 617).
Logografar
Ver Datilografar (P. 251).
Longe
1. É palavra que precisa ser observada do ponto de vista da concordância
nominal.
2. Com ela, duas situações podem ocorrer: a) Se modifica um verbo ou um
adjetivo, tem valor de advérbio de lugar e é invariável. Ex.: “Os
magistrados moravam longe”; b) Se, porém, modifica um substantivo –
o que se dá excepcionalmente – tem valor de adjetivo e concorda com a
palavra modificada. Ex.: “O réu pensava em longes terras, onde não
pudessem alcançá-lo”.
3. Atente-se, a respeito, à lição de Mário Barreto (1954a, p. 296): a)
“Longe pode ser adjetivo plural com o substantivo terra”; b) “Longe
pode ainda ser advérbio: ‘A trovoada anda longe’”; c) Também pode ser
“adjetivo substantivado por preposição, equivalente a lugar longínquo:
Desde longe, venho de longe”; d) Pode ser, “finalmente, adjetivo
substantivado pelo artigo o: ao longe”.
Ver Bastante – Existe no plural? (P. 156)
Lustre ou Lustro?
1. Num primeiro sentido, lustre é a luminária de vários braços, suspensa no
teto. Ex.: “Até lustres do mais puro cristal foram levados a leilão, para
pagar as dívidas daquela tradicional família”.
2. Em segundo significado, lustre pode significar brilho, brilhantismo,
esplendor. Ex.: “A sentença foi proferida num estilo sem lustre”.
3. Nesse segundo sentido, é sinônima de lustro.
4. Já lustro, num primeiro significado, é o quinquênio, o período de cinco
anos. Ex.: “Uma posse contínua e sem oposição por seis lustros era mais
do que suficiente para configurar o usucapião”.
5. Em segundo sentido, lustro, assim como lustre, pode significar brilho,
polimento. Ex.: “A sentença foi proferida num estilo sem lustro”.
M
Macérrimo, Magérrimo ou Magríssimo?
1. A par da formação popular magríssimo, lembrada por Carlos Góis e
Herbert Palhano (1963, p. 76) para o superlativo absoluto sintético de
magro, a forma erudita de tal superlativo absoluto sintético, pela
derivação latina, é macérrimo.
2. Macérrimo, aliás, é a única forma de superlativo absoluto sintético que
Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 49) dá para o adjetivo magro.
3. Para Gladstone Chaves de Melo, o superlativo magérrimo, que circula na
linguagem coloquial, “não tem suporte na tradição da língua, nem em
raiz latina ou alatinada. É, portanto, inaceitável e errado” (1970, p. 124).
4. Também macérrimo é o superlativo absoluto sintético de magro dado por
Antenor Nascentes (1942, p. 79).
5. Mesmo na atualidade, lembra Arnaldo Niskier que “a língua falada ainda
não conseguiu impor a forma magérrima, que continua sendo
considerada errônea” (1992, p. 45).
6. Na lição de Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 241), “a forma
magérrimo é anormal. Prefira-se macérrimo (forma erudita) ou
magríssimo (forma vulgar)”.
7. Também Artur de Almeida Torres (1966, p. 77) refere os superlativos
macérrimo e magríssimo, mas não magérrimo.
8. Para José de Nicola e Ernani Terra, “embora as formas populares
magérrimo e magríssimo sejam de largo uso, uma pessoa muito magra é
uma pessoa macérrima” (2000, p. 143).
9. Registra, todavia, magérrimo o Dicionário da Melhoramentos
(Encyclopaedia Britannica do Brasil, 1995, p. 1.078).
10. Também nessa última vertente e contrariando o histórico do vocábulo,
para Silveira Bueno, “é possível, exista a forma macérrimo; está,
porém, contra as leis da fonética. Devemos, portanto, usar da outra
correta: magérrimo ou da vernácula magríssimo” (1957, p. 294).
11. Já Cândido de Oliveira (1961, p. 160) arrola três superlativos absolutos
sintéticos para magro: magérrimo, macérrimo e magríssimo.
12. Talvez para atender ao constante emprego popular, o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de
Letras – órgão oficial para determinar o que é correto ou não no campo
do léxico – veio a dirimir quaisquer controvérsias, acolhendo como
corretas as formas macérrimo e magérrimo (2009, p. 514 e 517),
motivo por que está oficialmente autorizado o emprego de ambas.
13. Observe-se, ademais, que o VOLP não registra a forma magríssimo, e
isso assim se dá, porquanto não se registram normalmente as formas
regulares do superlativo absoluto sintético. Isso, todavia, não quer dizer
que não seja forma correta e perfeitamente empregável.
Macro-economia ou Macroeconomia?
1. Ante as modificações advindas do Acordo Ortográfico de 2008, importa
observar como fica a questão do hífen, quando se emprega o falso
prefixo macro: assim, macro-economia ou macroeconomia?
2. O elemento grego macro (contrapondo-se a micro) tem o sentido de
grande e forma diversos vocábulos em nosso idioma.
3. Quanto à grafia, como geralmente ocorre com os prefixos e falsos
prefixos terminados por vogal, apenas em duas hipóteses se usa o hífen:
a) quando o elemento seguinte se inicia por h (macro-história); b)
quando o elemento seguinte se inicia pela mesma vogal com que se
encerra o prefixo (macro-organização, macro-organismo).
4. Assim, acopla-se diretamente à palavra seguinte, sem intermediação de
hífen, quando iniciada esta por outra vogal, que não a que encerra o
prefixo: macroanálise, macroeconomia, macroinstrução, macrouniverso.
5. Continua valendo a regra de junção direta, mesmo que o elemento
seguinte se inicie por consoante: macrobiótica, macrocultura,
macrodecisão, macrofauna, macromolécula, macronúcleo,
macroquímica, macrotórax.
6. Na hipótese de ser o segundo elemento iniciado por r ou s, dobram-se
tais consoantes para continuidade do som originário: macrorrinia,
macrossegmento, macrossocial.
Má-fé
1. Presumindo-se praticados de boa-fé os atos jurídicos de um modo geral,
sendo protegido por lei todo aquele que age sob o manto de tal intenção
–quer podendo resilir o ato em que se prejudicou, quer podendo manter
aquele que deve ser respeitado – a má-fé, seu oposto, exprime “tudo que
se faz com entendimento da maldade ou do mal, que nele se contém”
(DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p. 123).
2. E os atos praticados com tal intenção são inoperantes, não recebendo
força legal, quer sendo tidos como nulos por natureza, quer podendo ser
anulados, na conformidade com o interesse da parte prejudicada.
3. Quanto à estruturação gramatical de mau ou mal, é de se anotar,
genericamente, que, modificando um adjetivo ou um verbo, é advérbio e
se escreve mal: malcriado, mal-humorado, mal-intencionado.
4. Modificando, porém, um substantivo, escreve-se mau, que é como se
grafa o adjetivo: mau-caráter, mau-olhado.
5. Para facilidade de identificação, anote-se que, na prática, mau é o oposto
de bom, enquanto mal é o contrário de bem.
6. Por outro lado, se o advérbio é invariável (malcriada, mal-humorados,
mal-intencionadas), já o adjetivo sofre suas normais alterações para o
feminino e para o plural, conforme a variação do substantivo: mau-
olhado, maus-olhados, má-criação, más-criações.
7. De modo específico para o verbete considerado, o plural de má-fé é más-
fés.
8. Pelas regras oficiais do Formulário Ortográfico (obs. 1 do § 1º da regra
45), obrigatório é o uso do hífen, o que se corrobora pela verificação do
próprio Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela
Academia Brasileira de Letras (2009, p. 517).
9. Não se deve pensar que, no caso, haja dois acentos gráficos em mesma
palavra, uma vez que, para efeito de acentuação gráfica, os elementos
unidos por hífen são considerados palavras distintas. Exs.: ábaco-
mágico, café-solúvel, cará-de-são-tomé, cipó-café, pré-abdômen, pró-
britânico.
10. Não se esqueça, aliás, ser bem fácil encontrar formas verbais com a
conformação referida no item anterior: encontrá-lo-ás, fá-lo-íamos.
Ver Mau ou Mal? (P. 464), Muito (P. 481) e Pior má-fé (P. 564).
Maioria de
Ver Coletivo – Como concordar? (P. 191)
Maior parte
Ver Coletivo – Como concordar? (P. 191)
Mais de
Ver Perto de (P. 562).
Maiúsculas
1. Inicie-se a questão com a oportuna advertência de Hêndricas Nadólskis e
Marleine Paula Marcondes Ferreira de Toledo: “Cada língua tem seu
sistema de uso das maiúsculas iniciais de palavras. Assim, a língua
alemã grafa todo substantivo com maiúscula inicial, o que não ocorre na
língua portuguesa. Atualmente, nos textos empresariais, há um uso
exagerado de maiúsculas iniciais de palavras. Fique atento, evite
exageros, consulte as normas gramaticais. A ortografia, no Brasil, é
regulamentada por lei” (1998, p. 55).
2. E, de acordo com as normas gramaticais vigentes entre nós, podem-se
destacar os seguintes casos de uso obrigatório de maiúsculas,
determinado pelo Formulário Ortográfico: a) Nomes de vias e lugares
públicos: Avenida Rio Branco, Praça da Bandeira, Rua do Ouvidor,
Travessa do Comércio; b) Nomes que designam altos conceitos
religiosos, políticos ou nacionalistas: Igreja, Nação, Estado; c) Nomes
que designam artes, ciências ou disciplinas: Arquitetura, Direito,
Filologia Portuguesa, Gramática, Matemática; d) Nomes que designam
altos cargos, dignidades ou postos: Vigário, Bispo, Arcebispo, Cardeal,
Papa, Presidente da República, Governador do Estado, Prefeito,
Ministro da Educação, Secretário de Estado; e) Nomes de repartições,
corporações ou agremiações, edifícios e estabelecimentos públicos ou
particulares: Diretoria Geral do Ensino, Ministério das Relações
Exteriores, Presidência da República; f) Nomes de fatos históricos
importantes, atos solenes e grandes empreendimentos públicos:
Descobrimento da América, Reforma Ortográfica, Dia do Município; g)
Nomes de escolas de qualquer espécie e grau de ensino: Faculdade de
Filosofia, Grupo Escolar de Miguelópolis; h) Nomes, adjetivos,
pronomes e expressões de tratamento ou reverência, quer por extenso,
quer abreviados: Sr. (Senhor), V. Exª. (Vossa Excelência); i) Palavras que,
no estilo epistolar, se dirigem a um amigo, a um colega, a uma pessoa
respeitável, as quais, por deferência, consideração ou respeito, se queira
realçar por esta maneira: meu bom Amigo, meu prezado Mestre,
estimado Professor; j) Nomes dos diplomas legais, quando
personificados ou individuados: a Lei de 13 de maio, o Decreto 20.108,
a Portaria de 15 de junho, o Regulamento 737, o Acórdão de 3 de
agosto.
3. Pelas próprias observações também trazidas pelo mesmo Formulário
Ortográfico, também se podem observar os seguintes casos em que não
se empregam maiúsculas: a) Nomes dos povos: baianos, paulistas,
uruguaios; b) Nomes dos meses: janeiro, fevereiro, março; c) Nomes das
festas pagãs ou populares: entrudo, carnaval.
4. Apontando lacunas na sistematização oficial – que, além de dificultar
qualquer padronização nesse sentido, especificamente não prevê, por
exemplo, solução segura para o segundo elemento de nomes compostos
que tenham o primeiro elemento escrito com maiúsculas – Napoleão
Mendes de Almeida (1981, p. 181) anota que, de modo discrepante, o
Formulário Ortográfico de 1943, ao exemplificar a sétima regra do
capítulo XVI, registra Vigário-Geral (com ambas as iniciais maiúsculas)
e, ao dar nomes compostos na observação da regra 12 do mesmo
capítulo, refere Decreto-lei (com maiúscula apenas na inicial do primeiro
elemento).
5. Ora – continua o eminente gramático em mesma obra e local – se, ao
impor a inicial maiúscula na regra 15 do citado capítulo, o formulário
justifica com a necessidade de “deferência, consideração e respeito”, fica
difícil aceitar a incoerência para Decreto-lei, assim como para diversos
outros vocábulos: Ex-rei, Tenente-coronel, Vice-presidente.
6. Ainda de acordo com o referido gramático, não se há de olvidar que, se
os nomes comuns são tomados individualmente, com sentido especial,
escrevem-se com a inicial maiúscula. Exs.: a) “A Igreja católica condena
o divórcio”; b) “Em São Paulo, a Capital exige grandes cuidados”; c)
“O Estado só deve intervir onde há necessidade”.
7. Nesses casos, Igreja é a entidade católica, Capital, uma cidade
determinada, e Estado, a organização política.
8. Se, porém, tais palavras são empregadas em sentido geral e
indeterminado, iniciam-se com minúscula. Exs.: a) “Desapropriaram a
igreja”; b) “Há capitais que têm o mesmo nome do estado”.
9. Ante a frequência com que ocorrem erros com respeito às vias e
logradouros públicos, Arnaldo Niskier observa que os nomes de ruas,
praças, avenidas, etc. “apresentam inicial maiúscula: Rua Santo Amaro,
Avenida Brasil, etc.” (1992, p. 105).
10. É oportuno também atentar ao apropriado ensinamento de Artur de
Almeida Torres para um caso especial de emprego de minúsculas:
“Não se escrevem com maiúscula inicial as partículas monossilábicas
que se acham no interior de vocábulos compostos ou de locuções ou
expressões que têm iniciais maiúsculas: Queda do Império, O
Crepúsculo dos Deuses, Histórias sem Data, A Mão e a Luva, Festas e
Tradições Populares no Brasil, etc.” (1966, p. 230).
11. Em lição mais abrangente, Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 395)
lança a esse respeito duas importantes regras e uma recomendação: a)
“De acordo com a ortografia oficial, usa-se letra inicial maiúscula nos
títulos de livros, jornais, revistas, produções artísticas, literárias e
científicas”; b) “As palavras átonas, no interior dos títulos, grafam-se
com inicial minúscula”; c) “A bem do aspecto gráfico, não se usem
aspas para destacá-los, mas escrevam-se em itálico”.
12. O que se pode concluir, nesses casos, é que se devem grafar com
maiúsculas os vocábulos tônicos – sejam eles monossilábicos ou não –,
e com minúsculas os vocábulos átonos – sejam eles monossílabos ou
dissílabos.
13. Interessante e oportuna observação faz Antonio Henriques (1999, p. 6),
de grande valia para todos, mas que deveria ter maior penetração,
sobretudo nos meios publicitários: “há de se lembrar que as letras
maiúsculas também são acentuadas”: JOSÉ, AUTÓDROMO.
14. E não escapa a tal regra a letra, quando se trata da primeira da palavra,
mesmo que as demais sejam grafadas com minúsculas: Átila, Édson.
15. Por fim, com interesse significativo para as lides forenses, anota
Luciano Correia da Silva que “é de boa ética tratar as partes, no
processo, escrevendo-se-lhes os nomes com inicial maiúscula: o
Requerente, o Exequente, o Executado, o Autor, o Réu, etc.” (1991, p.
206).
Mal ou Mau?
Ver Mau ou Mal? (P. 464)
Maltrato – Existe?
1. Firme-se a premissa de que mau é adjetivo, tendo, na prática, bom por
antônimo, enquanto mal pode ser substantivo ou advérbio, tendo bem
por seu oposto.
2. Com base nessas simples observações, vê-se que maltratar, enquanto
verbo, se escreve com l em todas as pessoas, tempos e modos, até porque
facilmente se pensa em bem tratar.
3. Por outro lado, pensa-se em maus-tratos, porque se tem por contrário
bons-tratos.
4. Maltrato, porém, não pode ser substantivo e não é palavra que integre
nosso léxico, sendo errado seu emprego em frases como a seguinte: “A
solução pretendida pelo requerente há de configurar, em suma, maltrato
à Lei de Registros Públicos”.
5. O referido vocábulo há de ser substituído, em exemplos dessa natureza,
por algum de seus correspondentes: desrespeito, insulto, lesão,
transgressão, violação.
6. Apontando maus-tratos como a forma correta do substantivo, Vitório
Bergo refere que a forma incorreta maltrato (como substantivo) é
“determinada certamente por analogia com maltratar” (1944, p. 157).
7. Coerente com essa postura, o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido
oficialmente de determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma,
além de sua grafia oficial, (i) não registra em seu rol o substantivo
maltrato (ii) assim como não traz o vocábulo mau-trato, (iii) mas apenas
faz constar maus-tratos, especificando ser este um substantivo que se
emprega somente no plural (2009, p. 534), o que implica asseverar que o
emprego das demais não está oficialmente autorizado entre nós.
Mandado ou Mandato?
1. Mandado vem do latim mandatum, de mandare, é termo de largo uso nos
meios forenses e significa o ato escrito, emanado de autoridade pública,
judicial ou administrativa, em virtude do qual deve ser cumprida a
diligência ou a medida, que ali se ordena ou determina (DE PLÁCIDO E
SILVA, 1989, p. 131-2).
2. Se expedido por autoridade judiciária, diz-se mandado judicial, que
recebe denominações de acordo com sua finalidade ou com o conteúdo
da ordem dada: mandado de citação, mandado de intimação, mandado
de busca e apreensão, mandado de segurança, mandado de reintegração
na posse, mandado de imissão na posse, mandado de prisão, mandado
de penhora.
3. Mandato também tem origem no latim (manus data, ou seja de mãos
dadas) e tecnicamente significa dar poder por contrato, autorizar.
4. É termo muito usado no foro, sempre para exprimir o contrato que
designa duas vontades, uma dando à outra uma incumbência, e outra
recebendo e aceitando tal encargo, para realizar ou executar o desejo
daquela.
5. Bem por isso, De Plácido e Silva o conceitua, em sentido técnico-
jurídico, como “o poder dado ou outorgado a alguém, por quem o possa
dar, seja pessoa física ou jurídica, para representá-la em qualquer ato”
(1989, p. 137). Ex.: “Na consonância com o art. 1.288 do Código Civil,
a procuração é o instrumento do mandato”.
6. O vocábulo toma diversos sentidos específicos, conforme a expressão
em que se encontra e de acordo com o fim a que se destina: mandato ad
judicia, mandato ad litem, mandato ad negotia, mandato em causa
própria, mandato legal, mandato legislativo.
7. Na lição de Regina Toledo Damião e Antonio Henriques, “não há
confundir-se a palavra mandato com seu parônimo mandado. Originária
de mandare, mandar, a forma substantivada do particípio passado,
mandado, é na linguagem processual a ordem do juiz encaminhada ao
oficial de justiça” (1994, p. 160).
8. Na lição dos mesmos autores, “a palavra mandato origina-se da
expressão latina manus data (mãos dadas) que, a princípio, simbolizava
o gesto de firmar o acordo, evoluindo o vocábulo para mandatum, em
português, mandato” (DAMIÃO; HENRIQUES, 1994, p. 160).
9. O emprego de mandato por mandado – e vice-versa – caracteriza
“cruzamento”, vale dizer, tipifica “o emprego de uma palavra em lugar
de outra”, decorrente “da falta de discernimento entre vocábulos
assemelhados quanto à estrutura fonológica (parônimos), o que motiva a
alteração da mensagem tencionada”, atentando contra a precisão
terminológica (XAVIER, 1991, p. 85-6).
10. Atento aos equívocos que a imprensa comete no emprego de tais
parônimas, anota Josué Machado que “um assessor jurídico do
Itamarati, integrante do grupo que foi sequestrar o PC na Tailândia,
explicou pela tevê por que estava lá: ‘Há um mandato de prisão contra
ele.’ E repetiu mais duas vezes aos repórteres: mandato” (1994, p.
236).
11. Vejam-se alguns exemplos de correto emprego da palavra mandado em
nossa legislação: a) “Constituída a fundação por negócio jurídico entre
vivos, o instituidor é obrigado a transferir-lhe a propriedade, ou outro
direito real, sobre os bens dotados, e, se não o fizer, serão registrados,
em nome dela, por mandado judicial” (CC, art. 64); b) “O pai ou a mãe
que contrair novas núpcias não perde o direito de ter consigo os filhos,
que só lhe poderão ser retirados por mandado judicial, provado que
não são tratados convenientemente” (CC, art. 1.588); c) “Incumbe ao
escrivão: I – redigir, em forma legal, os ofícios, mandados, cartas
precatórias e mais atos que pertencem ao seu ofício” (CPC/1973, art.
131, I); d) “Incumbe ao oficial de justiça: I – fazer pessoalmente as
citações, prisões, penhoras, arrestos e mais diligências próprias do seu
ofício, certificando no mandado o ocorrido, com menção de lugar, dia
e hora…” (CPC/1973, art. 143, I); e) “O mandado, que o oficial de
justiça tiver de cumprir, deverá conter…” (CPC/1973, art. 225); f)
“Incumbe ao oficial de justiça procurar o réu e, onde o encontrar, citá-
lo: I – lendo-lhe o mandado e entregando-lhe a contrafé” (CPC/1973,
art. 226, I); g) “Começa a correr o prazo: … II – quando a citação ou
intimação for por oficial de justiça, da data de juntada aos autos do
mandado cumprido” (CPC/1973, art. 241, II).
12. Também se verifiquem alguns exemplos de uso adequado da palavra
mandato em artigos de lei: a) “Prescreve: … § 5º: Em cinco anos: … II
– a pretensão dos profissionais liberais em geral, procuradores
judiciais, curadores e professores pelos seus honorários, contado o
prazo da conclusão dos serviços, da cessação dos respectivos
contratos ou mandato” (CC, art. 206, § 5º); b) “Opera-se o mandato
quando alguém recebe de outrem poderes para, em seu nome, praticar
atos ou administrar interesses. A procuração é o instrumento do
mandato” (CC, art. 653); c) “Ainda quando se outorgue mandato por
instrumento público, pode substabelecer-se mediante instrumento
particular” (CC, art. 655); d) O mandato pode ser expresso ou tácito,
verbal ou escrito” (CC, art. 656); e) “A outorga do mandato está
sujeita à forma exigida por lei para o ato a ser praticado. Não se
admite mandato verbal quando o ato deva ser celebrado por escrito”
(CC, art. 657); f) “Os atos praticados por quem não tenha mandato, ou
o tenha sem poderes suficientes, são ineficazes em relação àquele em
cujo nome foram praticados, salvo se este os ratificar” (CC, art. 662);
g) “Sem instrumento de mandato, o advogado não será admitido a
procurar em juízo…” (CPC/1973, art. 37); h) “A parte, que revogar o
mandato outorgado ao seu advogado, no mesmo ato constituirá outro
que assuma o patrocínio da causa” (CPC/1973, art. 44); i) “O
advogado poderá, a qualquer tempo, renunciar ao mandato, provando
que cientificou o mandante a fim de que este nomeie substituto…”
(CPC/1973, art. 45).
13. Da confusão entre tais termos não escapam nem mesmo textos de lei,
bastando que se atente ao seguinte dispositivo: “Qualquer alteração
posterior do nome, somente por exceção e motivadamente, após
audiência do Ministério Público, será permitida por sentença do juiz a
que estiver sujeito o registro, arquivando-se o mandato e publicando-
se a alteração pela imprensa” (art. 57, caput, da Lei 6.015, de
31/12/73).
14. É óbvio que o que se quer dizer, no caso, é que se arquivará o
documento portador da ordem judicial, e não um acordo ou contrato
para que alguém pratique atos em nome de outrem: deve ser mandado,
por conseguinte, e não mandato.
15. Esclareça-se, apenas, que a redação primitiva da lei trazia,
corretamente, mandado; entre as alterações trazidas pela Lei 6.216, de
30/6/75, todavia, veio esse equivocado mandato.
16. De igual modo, o art. 127, VI, da mesma Lei de Registros Públicos
registrava, em sua redação primitiva, e corretamente, que, no Registro
de Títulos e Documentos será feita a transcrição “do mandado judicial
de renovação do contrato de arrendamento”; na republicação da lei,
inserida na Coleção das Leis da União de 1975, vol. V, p. 61, todavia,
constou equivocadamente mandato.
Mandamus – Estrangeirismo?
1. Geraldo Amaral Arruda combate o uso de tal vocábulo em lugar de
mandado de segurança, já que constitui estrangeirismo desnecessário,
por haver no vernáculo vocábulo ou giro equivalente.
2. E, estendendo a mesma observação para writ, complementa tal autor, de
modo explícito, em lição para ambos: “tenho dúvidas de que
correspondam com inteira propriedade ao nosso mandado de segurança”
(ARRUDA, 1997, p. 19).
3. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, órgão incumbido para determinar, de modo oficial,
quais as palavras que integram o nosso léxico, não o registra nem mesmo
como latinismo permitido, razão pela qual, para a hipótese de ser usado,
sendo reputado vocábulo latino, não recebe acento gráfico – que não
existia na língua originária – e deverá ser necessariamente grafado entre
aspas, com itálico, negrito ou sublinha, ou mesmo outro sinal indicativo
de tal circunstância.
Mandar
Ver Vi-o fechar o cofre ou Vi-lhe fechar o cofre? (P. 769)
Mandato ou Mandado?
Ver Mandado ou Mandato? (P. 457)
Manter
Ver Ter (P. 730).
Manteúda – Existe?
Ver Teúda – Existe? (P. 737)
Mapa-múndi
1. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela
Academia Brasileira de Letras, órgão oficial para definir quais vocábulos
integram oficialmente nosso léxico, registra o vocábulo mapa-múndi
como pertencente a nosso idioma, acentuando-o regularmente, como
deve ocorrer com todo vocábulo paroxítono, e lhe confere o plural
mapas-múndi (2009, p. 526).
2. Apenas se observa adicionalmente que não deixa de ocorrer certa
incoerência nos critérios da Academia, porquanto não há registro de
outras palavras como integrantes de nosso idioma, como, por exemplo,
modus vivendi, além do que a própria palavra modus é dada como
pertencente ao latim.
Ver Campus (P. 166), Currículo (P. 244) e Desiderato ou Desideratum? (P.
275)
Maquiar ou Maquilar?
Ver Maquiage, Maquiagem, Maquilage, Maquilagem ou Maquilhagem?
(P. 459)
Maquinar
Ver Datilografar (P. 251).
Marechala – Existe?
Ver Capitã, Capitoa ou A Capitão? (P. 168) e Poeta – Qual o feminino? (P.
570)
Marido ou Esposo?
Ver Esposo ou Marido? (P. 331)
Mas e a vírgula
1. Anotando ser frequente tal erro nos jornais e revistas, observa Josué
Machado que “alguns escribas não conseguem escrever o mas sem
grudar a ele uma vírgula; é como se a vírgula fizesse parte da conjunção
adversativa”.
2. Continuando a lição de que “essas vírgulas pegariam mal até em
composições escolares juvenis”, tal autor lembra que, “apesar de a
vírgula indicar pausa, nem sempre a pausa pode ser representada por
vírgula”. Exs.: a) “… mas, a testemunha se preparava para mentir em
juízo” (errado); b) “… mas a testemunha se preparava para mentir em
juízo” (correto).
3. E complementa que esse sinal “só vai bem depois de mas quando
antecede uma palavra ou grupo de palavras a que se quer ou se deve dar
destaque”. Ex.: “… mas, em atitude perceptível, a testemunha se
preparava para mentir em juízo” (correto); em justificativa mais técnica,
o uso da vírgula em tal circunstância pode ser explicado pela existência
de um termo ou expressão que se intercala entre o mas e a sequência
normal da oração em ordem direta (MACHADO, 1994, p. 231).
4. Em tais casos, porém, importante é observar que, pelo motivo de que tais
termos estão intercalados, haverá vírgula antes e depois deles.
5. Exemplos de Artur de Almeida Torres (1966, p. 134) comprovam o fato
de que, quando uma conjunção adversativa inicia uma segunda oração,
há vírgula antes dessa (para separar as orações), mas não após a
conjunção, se esta inicia uma oração em ordem direta: a) “Pedro é
trabalhador, mas Paulo é vadio”; b) “Estudou bastante, todavia foi
reprovado”.
6. Também Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 252) observa que se usa
a vírgula “antes de mas, entre duas orações. Não há vírgula depois de
mas, no início de período, em frases do tipo: ‘Mas como ele conseguiu
dominar a rebelião?’, ‘Mas que crimes cometera ela para ser tão
odiada?’”.
Ver, em complementação, nesta ordem: Vírgula (P. 772), Vírgula
obrigatória (P. 777), Vírgula proibida (P. 779), Vírgula entre orações (P. 773)
e Porém (P. 578).
Mas entretanto
Ver Mas porém (P. 463).
Mas e Porém
1. Ao enfatizar que a elegância e a energia podem resultar do emprego
pospositivo das conjunções, anota Alfredo Gomes que “entre estas
avulta a conjunção porém, que exatamente difere de mas em que esta
inicia a sua oração e aquela deve por elegância vir depois de uma ou
algumas palavras”.
2. E exemplifica ele próprio: a) “O estudo exagerado pode robustecer o
espírito, mas depaupera quase sempre o físico e arruína a saúde”; b) “O
estudo exagerado pode robustecer o espírito; quase sempre, porém,
depaupera o físico e arruína a saúde”.
3. E finaliza tal autor com propriedade, que, identicamente se pospõem por
elegância contudo, entretanto, todavia, nada obstante (GOMES, 1924, p.
418-9).
4. É de se ver, todavia, que tal lição se esteia na elegância e na energia da
frase, uma vez que, no que concerne à correção, observa Laudelino
Freire (1937b, p. 100) ser “usual o emprego das adversativas porém,
todavia, contudo, etc., no começo da frase”, trazendo ele a corroboração
de autores insuspeitos: a) “Porém cinco sóis eram passados” (Camões);
b) “Todavia o espírito do Imperador não se inquieta” (Rui Barbosa); c)
“Contudo eu não me firmo de todo nesta razão” (Vieira).
Ver Mas porém (P. 463).
Mas porém
1. Na lição de Vitório Bergo, o fato de ser encontrada nos clássicos a
construção com duas adversativas (mas porém, mas contudo, mas
entretanto) não é “motivo bastante para que se use na linguagem
moderna, em que, pela confusão semântica das duas partículas, passou a
constituir desgraciosa redundância o seu emprego concomitante” (1944,
p. 158).
2. Assim também pensa Silveira Bueno: “atualmente, mas porém não se
admitem juntos na mesma expressão adversativa, embora tenha sido
correto emprego de outros períodos do idioma” (1957, p. 280-1).
3. Em mesma esteira, anota Vasco Botelho de Amaral (1943, p. 130), sem
maiores explicações, que “tal junção deve evitar-se”, muito embora
ressalve que “constitui pleonasmo encontrável em bons autores”,
destacando ele citação de Camões: “Mas porém nesta vitória…”.
4. Para Domingos Paschoal Cegalla, “são redundâncias condenadas mas
porém, mas contudo, mas no entanto, mas entretanto” (1999, p. 252).
5. Por fim, nesse sentido, a lição de Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 365-
8), para quem “é arcaico e plebeu o emprego conjunto de mas porém”,
ou mesmo o uso pleonástico de duas conjunções como e porém, mas
contudo, e contudo, e mas ou e nem, o qual vai sendo evitado pelos
escritores modernos.
6. Se, porém, por um lado, observa que “os gramáticos condenam as
expressões mas contudo, mas entretanto”, Luís A. P. Vitória (1969, p.
160) complementa que “a expressão mas porém, além de clássica, é
popularíssima”.
7. Heráclito Graça (1904, p. 445) defende a correção de tal sintaxe, em que
se juntam duas conjunções adversativas, e anota que Camões a
empregou no seguinte trecho: “… mas porém de pequenos animais / Do
mar todo coberto cento e cento”.
8. Segundo Sílvio Elia (1967, p. 296), porém vem do latim pro inde, e mais
antiga é a forma porende ou por ende, cujo sentido originário é o de por
isso, daí porque, para tal gramático, se pode usar a expressão mas porém.
9. Édison de Oliveira (s/d, p. 127) também ressalta ser muito comum, na
linguagem popular atual, o uso dessa expressão.
10. Num primeiro momento, Júlio Nogueira observa que “tais associações
não devem ser feitas”, porquanto “duas adversativas se repelem, pois
cada uma, de per si, basta às necessidades do discurso”. Ao depois,
ressalva tal gramático que mas todavia “encontra-se em Bernardes”; e
mas porém foi expressão usada por Camões em mais de um lugar,
muito embora hoje só exista “como plebeísmo repugnante”. Por fim,
quanto a mas contudo e mas entretanto, esclarece tal autor que essas
associações “vão resistindo no discurso de alguns, porém a tendência
manifesta é no sentido de suprimir uma das duas palavras”
(NOGUEIRA, 1959, p. 29).
11. Oportuno, ainda, é lembrar João Ribeiro, o qual observa que, a certa
altura da língua, mas tomou o sentido de adversativa; originariamente,
entretanto, era reiterativa, isto é, acrescentava sem contradizer, do que
se vê remanescente em não só… mas também. Bem por isso, acata ele
a possibilidade da construção mas porém, justificando textualmente:
“não sendo de todo adversativa, é fácil que a deparemos conjuntamente
com porém nos escritores da idade clássica” (RIBEIRO, João, 1923, p.
209).
12. Em resumo, ante a fundada divergência entre os gramáticos, deve-se
dar ao leitor a gama mais ampla de possibilidades de emprego do
idioma, motivo por que, independentemente de se reputar ou não de
bom gosto qualquer de tais expressões reiterativas, o certo é que seu
emprego está autorizado nos textos que devam submeter-se à norma
culta.
Ver Mas e Porém (P. 463).
Massivo – Existe?
1. Indaga um leitor se existe massivo e acrescenta que, apesar de
empregado amiúde, tal vocábulo não é registrado em dicionário algum.
2. Observe-se, de início, que não se põe em discussão, nem de longe se
quer diminuir os relevantes serviços que os dicionaristas prestam ao
idioma.
3. Mas se deve dizer que, por delegação legal específica, incumbe à
Academia Brasileira de Letras a elaboração do rol dos vocábulos
pertencentes ao vernáculo, e ela o faz pela edição do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, uma lista das palavras que integram
oficialmente nosso idioma, com sua grafia oficial, seu gênero (masculino
ou feminino), categoria morfológica (substantivo, adjetivo), etc.
4. Adiciona-se que, nos primeiros meses de 2009, veio a lume a quinta
edição do VOLP, e nela se encontra regularmente registrado o vocábulo
massivo, com a especificação de que se trata de um adjetivo
(ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, p. 532).
5. Oportuno é fixar que, incumbida por lei específica para a confecção do
VOLP, a ABL goza de autoridade para, nesse campo, dizer o Direito,
motivo por que, ao consultá-lo, devemos prestar obediência a suas
determinações, como devemos fazer em relação aos demais diplomas
legais.
6. Ante um tal quadro, duas situações precisam ser diferenciadas: a) se o
VOLP não registra uma palavra, e um dicionário o faz, é de forçosa
conclusão que tal vocábulo não existe oficialmente em nosso idioma; b)
se o VOLP registra uma palavra, e os dicionários não o fazem, nem por
isso o vocábulo deixa de existir oficialmente em nosso idioma.
7. Feitas essas ponderações, especifica-se que o adjetivo aqui considerado
significa, em última análise, sólido ou maciço, como é de fácil percepção
nos seguintes exemplos: a) “O magistrado fez acompanhar sua sentença
de massivos argumentos doutrinários”; b) “Massiva jurisprudência
confirma a tese ora esposada”.
Mas todavia
Ver Mas porém (P. 463).
Matado ou Morto?
Ver Morto – Particípio passado de Matar ou Morrer? (P. 478)
Mau ou Mal?
1. Um leitor, tendo dúvida em discussão com colegas de escritório, indaga
qual a forma correta para os seguintes exemplos: a) “Nada mau para um
museu que começou modestamente”; ou b) “Nada mal para um museu
que começou modestamente”?
2. Inicia-se com algumas observações abrangentes e teóricas.
3. Mau só pode ser adjetivo (é, na prática, o contrário de bom), admitindo
emprego no plural e no feminino, conforme a necessidade da palavra
modificada. Exs.: a) “Trata-se de réu com maus antecedentes”; b)
“Trata-se de réu com más companhias”.
4. Mal pode ser: a) conjunção (sinônimo de apenas). Ex.: “Mal começaram
os debates, o jurado dormiu”; b) substantivo (antônimo de bem, fazendo,
no plural, males). Ex.: “Foi condenado, porque praticou o mal”; c)
advérbio (também antônimo de bem). Ex.: “O réu passou mal durante o
júri”.
5. Sem qualquer pretensão de teorizar o problema, mas apenas observando
os aspectos de ortografia, nos casos mais comuns basta reiterar: a) mau é
o oposto de bom (mau-caráter, mau humor); b) mal é o oposto de bem
(mal-humorado, mal-intencionado).
6. Essa, aliás, é a síntese de Vitório Bergo, a observar que é fácil “verificar-
se qual o termo que cabe na frase pelo uso do respectivo antônimo”
(1944, p. 156-9).
7. Josué Machado (1994, p. 21), atento aos erros cometidos pela imprensa e
pelos políticos, anota a existência de uma revista que publicou um artigo
com o equivocado título “O Mau das Pesquisas” (quando o correto
haveria de ser “O Mal das Pesquisas”).
8. Juntando o exemplo trazido pelo leitor e a ele adicionando outros,
listam-se alguns casos de emprego correto dos referidos vocábulos: a)
“Nada mau para um museu que começou modestamente”; b) “Ele nada
mal, como uma galinha que cai ao rio”; c) “O museu está mal das
pernas”; d) “Ele era um mal necessário para o museu”; e) “Ele era um
mau exemplo para o museu”; f) “Mal abriu, já se falava que o museu
iria fechar”; g) “Ele passou mal no museu”.
Maus-tratos
Ver Maltrato – Existe? (P. 457)
Mau-trato – Existe?
Ver Maltrato – Existe? (P. 457)
Máxime
1. Trata-se de advérbio de origem latina, mas já incorporado ao léxico
vernáculo por nossos dicionaristas, como atestam Aurélio Buarque de
Holanda Ferreira (s/d, p. 901) e Cândido Jucá Filho (1963, p. 415).
2. Assim sendo, porque é palavra proparoxítona, deve ser acentuada
graficamente, como todas dessa categoria.
3. Os dicionaristas mencionados atribuem ao x de tal vocábulo o som de cs,
no que são seguidos por Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 19).
4. Também para Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 253), sua pronúncia
é mácsime.
5. Já Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 187) lhe confere a pronúncia
mássime.
6. De igual modo, para Antonio Henriques (1999, p. 111), “pronuncia-se
como se houvesse dois ss (mássime)”.
7. Eliminando divergências e possibilidades de discussão, todavia, o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia
Brasileira de Letras – órgão incumbido de definir quais vocábulos
integram oficialmente nosso idioma, bem como seu modo de escrever e
pronunciar – registra-o com acento gráfico (o que significa que
incorporou o vocábulo ao nosso léxico) e manda, até a edição de 1999,
pronunciar o x como cs (p. 482). A mais recente edição de VOLP, no
entanto, assinala que o x dessa palavra, pode soar, indistintamente, como
cs ou ss (2009, p. 534), o que faz concluir que ambas as pronúncias estão
oficialmente autorizadas entre nós.
8. Tem o significado de especialmente, mormente, principalmente. Ex.:
“Essa posição é peculiar aos processualistas brasileiros, máxime de
nossa região”.
Máximo
1. Há dificuldades no que tange à pronúncia desse adjetivo.
2. Lembra Édison de Oliveira que, “por pedantismo ou por inconsciência,
há quem pronuncie ‘máksimo’. A pronúncia correta é, entretanto,
‘mássimo’” (s/d, p. 98).
3. Eliminando dúvidas, porém, o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, órgão oficial
para definir quais vocábulos integram oficialmente nosso léxico e qual
sua respectiva pronúncia, assinala que o x dessa palavra pode soar,
indistintamente, como cs ou ss (2009, p. 534), o que faz concluir que
ambas as pronúncias estão oficialmente autorizadas entre nós.
Meado ou Meados?
1. Particípio passado do verbo mear, empregado como substantivo, quer
dizer chegado ao meio, próximo ao meio. Ex.: “No meado deste século,
surgiu nova consciência acerca da preservação do ambiente”.
2. Também usada no plural com o mesmo sentido. Ex.: “Em meados do
mês passado, o réu se entregou à autoridade policial”.
3. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 254) confirma a possibilidade de
emprego do singular meado ou do plural meados, com o significado de
parte média, de meio, acrescentando serem errôneas as formas meiado e
meiados.
4. Sousa e Silva, realçando o caráter de particípio depoente de mear ou
mear-se, com o significado de chegar ao meio, observa que “pode fazer
de predicado em orações adverbiais reduzidas”, em elegante construção,
de que ele próprio fornece diversos exemplos: a) “Meado o mês de
junho, embarcaremos para a França”; b) “Meado aquele ano, falecia
meu pai”; c) “Meada a próxima semana, irei fazer-te uma visita”.
5. Advertindo para a forma feminina meada do terceiro exemplo, que
concorda com o sujeito a próxima semana, acrescenta tal autor que “a
oração reduzida ‘Meado o mês de junho’ corresponde à desenvolvida
‘Quando for meado o mês de junho’, equivalente a estas outras: ‘Quando
mear o mês de junho’, ‘Quando chegar ao meio o mês de junho’”
(SILVA, A., 1958, p. 179).
Mediar
1. Os verbos terminados em iar, quanto à conjugação verbal, normalmente
são regulares e têm por modelo anunciar.
2. São exceções a essa regularidade de conjugação mediar, ansiar,
remediar, incendiar e odiar – pode-se guardar a sigla MARIO –, os
quais têm por modelo este último.
3. Tais verbos da relação mencionada mudam o i da penúltima sílaba em ei
nas formas rizotônicas: medeio, medeias, medeia, mediamos, mediais,
medeiam (presente do indicativo); medeie, medeies, medeie, mediemos,
medieis, medeiem (presente do subjuntivo); medeia, medeie, mediemos,
mediai, medeiem (imperativo afirmativo); não medeies, não medeie, não
mediemos, não medieis, não medeiem (imperativo negativo).
4. Vale sintetizar os problemas de conjugação desse verbo com as
observações de Vitório Bergo: “recebe um e eufônico nas formas
rizotônicas, que só se manifestam no presente do indicativo e do
subjuntivo e, portanto, no imperativo” (1943, p. 142-3).
5. Não confundir com os verbos terminados por ear, como nomear, os
quais recebem um i intermediário nas formas rizotônicas: nomeio,
nomeias, nomeia, nomeamos, nomeais, nomeiam (presente do
indicativo); nomeie, nomeies, nomeie, nomeemos, nomeeis, nomeiem
(presente do subjuntivo); nomeia, nomeie, nomeemos, nomeai, nomeiem
(imperativo afirmativo); não nomeies, não nomeie, não nomeemos, não
nomeeis, não nomeiem (imperativo negativo).
Meia
Ver Meio (P. 466).
Meio
1. É palavra que precisa ser observada do ponto de vista da concordância
nominal.
2. Como numeral, significa metade e é variável. Ex.: “O réu sorveu meio
copo de cerveja e meia garrafa de aguardente”.
3. Como substantivo, normalmente vem precedido de artigo, significa
modo, maneira e flexiona-se no plural. Ex.: “Os detentos encontraram os
meios de fugir do presídio de segurança máxima”.
4. Como advérbio, significa um pouco e é invariável. Ex.: “A juíza estava
meio cansada àquela altura”.
5. Nesse último caso, são comuns os erros, fazendo as pessoas concordar
indevidamente o advérbio com o adjetivo que o segue, como no seguinte
exemplo: “A juíza estava meia cansada àquela altura” (errado).
6. São grandemente apropriadas as observações de Domingos Paschoal
Cegalla (1999, p. 255) a respeito desse vocábulo: a) “Usado como
advérbio, significa um pouco e permanece invariável”; b)
“Modernamente, não se flexiona meio, advérbio, como o têm feito
escritores de outros tempos: porta meia aberta; corpos meios nus, etc.”;
c) “É variável quando substantivo (os meios de comunicação), adjetivo
(meia garrafa de vinho) ou quando formador de substantivos compostos
(meia-estação, meia-idade, meia-noite, meias-direitas, meias-esquerdas,
… meios-fios, meios-termos, meios-tons)”; d) “Nesse último caso
(quando formador de substantivos compostos), os elementos são unidos
com hífen”.
Ver Bastante – Existe no plural? (P. 156) e Meio-dia e meia ou Meio-dia e
meio? (P. 467)
Meios suasórios
1. Trata-se de expressão de frequente emprego nos meios forenses, com o
sentido de meios de convencimento, de modos de persuasão. Ex.: “O
advogado usou todos os meios suasórios a seu dispor, para convencer
seu cliente de que deveria negar a autoria do crime”.
Melhor
1. Se modifica um substantivo, é adjetivo e, assim, é variável. Exs.: a) “Ele
é o melhor defensor da cidade”; b) “Eles são os melhores defensores da
cidade”.
2. Se, porém, modifica um verbo, um adjetivo ou um advérbio, funciona
como advérbio e, assim, é invariável. Exs.: a) “Já agora, o negócio vai
melhor na advocacia” (correto); b) “Já agora os negócios vão melhor na
advocacia” (correto).
3. Da verificação de sua função sintática, veja-se que incorreto é o seguinte
exemplo: “Já agora os negócios vão melhores na advocacia”.
Ver Mais mal ou Pior? (P. 454), Melhor boa-fé – Está correto? (P. 468) e
Melhormente – Existe? (P. 468)
Melhora ou Melhoria?
1. Da observação do que se fala e escreve no dia a dia, surge a indagação:
melhora ou melhoria?
2. Nunca é demais repetir que a Academia Brasileira de Letras, desde o
começo do século XX, é o órgão que tem a delegação legal para listar
oficialmente as palavras existentes em nosso idioma, e ela o faz pela
publicação, atualizada de tempos em tempos, do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa.
3. Pois bem, uma consulta ao VOLP mostra que lá se registram ambos os
vocábulos: melhora e melhoria (ACADEMIA BRASILEIRA DE
LETRAS, 2009, p. 539).
4. Com a premissa, assim, de que ambos os vocábulos existem oficialmente
no vernáculo, acrescenta-se que os dicionaristas os dão como sinônimos,
ambos com o significado de recuperação de um estado ruim, ou
apresentação de condições mais satisfatórias ou mais vantajosas.
5. Não é difícil, aliás, perceber essa sinonímia nos casos práticos: melhoria
salarial ou melhora salarial, melhora no quadro clínico ou melhoria no
quadro clínico.
Melhormente – Existe?
1. A um consulente que lhe indagava acerca da possibilidade de uso de tal
vocábulo, Cândido de Figueiredo optava pela afirmativa e assim resumia
sua lição: “Tão exato é o advérbio melhor, como o advérbio
melhormente. Melhor, como advérbio, é de uso corrente, e comparativo
de bem; e melhormente é formado do adjetivo comparativo melhor e do
sufixo mente, e vemo-lo em bons mestres, como Bernardes, Francisco
Manuel, Camilo, etc.” (1948, p. 100-1).
Ver Advérbios em “mente” (P. 85).
Memorial ou Memoriais?
1. Uma leitora indaga qual das duas palavras está correta para significar a
peça que se entrega aos julgadores de um recurso logo antes de um
julgamento: memorial ou memoriais?
2. Por um lado, o dicionarista Antônio Houaiss vê possibilidade expressa
de emprego da palavra memorial no sentido da indagação da leitora, ao
conceituá-lo do seguinte modo: “qualquer sustentação feita à autoridade
judiciária ou administrativa, geralmente no final do processo” (2001, p.
1.891). E não faz referência ao emprego de memoriais nessa acepção.
3. Inversamente a essa postura, o Código de Processo Civil de 1973 não
registra a palavra memorial nesse sentido, e sim memoriais: a) “Quando
a causa apresentar questões complexas de fato ou de direito, o debate
oral poderá ser substituído por memoriais” (CPC, art. 454, § 3º); b) “
Encerrado o debate ou oferecidos os memoriais…” (CPC, art. 456); c)
“…sendo-lhes assegurado o direito de apresentar memoriais ou de pedir
a juntada de documentos” (CPC, art. 482, § 2º).
4. O Código de Processo Civil de 2015 tem idêntico proceder ao anterior:
a) “Qualquer das partes poderá, no prazo de 5 (cinco) dias, apresentar
memoriais ou discordância do julgamento por meio eletrônico” (CPC,
art. 945, § 2º); b) “A parte legitimada à propositura das ações previstas
no art. 103 da Constituição Federal poderá manifestar-se, por escrito,
sobre a questão constitucional objeto de apreciação, no prazo previsto
pelo regimento interno, sendo-lhe assegurado o direito de apresentar
memoriais ou de requerer a juntada de documentos” (CPC, art. 950, §
2º).
5. Com essas ponderações, pode-se responder à leitora do seguinte modo:
a) por um lado, o dicionarista citado fala em memorial, mas não em
memoriais, no que tange ao sentido pretendido por ela; b) por outro lado,
as codificações processuais de 1973 e 2015 falam em memoriais, mas
não em memorial; c) ante essas circunstâncias, continua valendo o
princípio segundo o qual onde os estudiosos divergem, devem-se
permitir ambas as formas (“Ofereceu memorial antes do julgamento da
apelação” e “Ofereceu memoriais antes do julgamento da apelação”.
Menor impúbere
1. Um leitor indaga se a expressão menor impúbere é adequada para
descrever o absolutamente incapaz – aquele com idade inferior a
dezesseis anos – como comumente se vê em petições e outros
documentos de cunho jurídico.
2. Para explanar a questão de modo mais didático, veja-se que, na esteira
da legislação codificada anterior, o art. 3º, I, do Código Civil considera
absolutamente incapaz de exercer pessoalmente os atos da vida civil o
menor de dezesseis anos, e o art. 4º, I, tem por relativamente incapaz o
menor com idade entre dezesseis e dezoito anos.
3. A consequência imediata dessa distinção reside no fato de que (i) o
menor absolutamente incapaz não pode praticar ato algum por si, de
modo que é representado por seus pais ou responsáveis, enquanto (ii) o
menor relativamente incapaz pode praticar determinados atos da vida
civil e, neles, é assistido por seus pais ou responsáveis (CC, art. 1.634,
VI e art. 1.690, caput).
4. Embora a terminologia da consulta não tenha desfrutado da preferência
do legislador, o certo é que a doutrina, de longa data, sempre denominou
os menores absolutamente incapazes de menores impúberes, e deixou a
terminologia menores púberes para os menores relativamente incapazes.
5. Quanto à etimologia, o impúbere – também conhecido como infante – é
aquele que ainda não atingiu a puberdade, que não desenvolveu os pelos
pubianos. Já o púbere – ou adolescente – é aquele que atingiu a
puberdade, que já desenvolveu pelos pubianos. Como lembra De Plácido
e Silva, essa é uma “situação que se revela pelo desenvolvimento físico
da pessoa, em relação aos órgãos genitais” (1989, p. 179). E, assim, até
pela variabilidade com que se dá tal ocorrência, conclui-se que esse não
é um critério científico nem seguro.
6. Para não haver dúvidas, é importante resumir dizendo que, embora não
adotada por dispositivos de lei, essa é terminologia perfeitamente correta
e adequada, além de uniformemente aceita pela doutrina, como se vê
pela conceituação de Maria Helena Diniz (1998, p. 252), que não lhe faz
reparo algum ou ressalva: a) Menor impúbere: “Aquele que conta com
menos de dezesseis anos de idade, sendo absolutamente incapaz,
devendo ser representado em todos os atos da vida civil”. b) Menor
púbere: “Pessoa relativamente incapaz, maior de dezesseis anos…, que
pode praticar atos da vida civil desde que assistido pelo seu
responsável”.
Menos
1. Como adjetivo, modifica um substantivo, hipótese em que é o grau
comparativo de inferioridade de pouco: Ex.: “Havia menos pessoas do
que esperava o palestrante”.
2. Modificando um verbo, um adjetivo ou um advérbio, é ele próprio um
advérbio. Exs.: a) “O funcionário trabalhou menos do que costumava”;
b) “Ela é menos bonita que a irmã”; c) “Hoje ele trabalhou menos mal
do que ontem”.
3. Importante é anotar que, mesmo como adjetivo, é sempre invariável,
sendo, assim, errôneas as seguintes construções: a) “Tenha mais amor e
menas confiança”; b) “Havia menas pessoas do que esperava o
palestrante”; c) “Quanto menas pessoas houver, melhor”.
4. Carlos Góis, nesses casos em que tal palavra modifica um substantivo,
denomina-a adjetivo quantitativo e reconhece-lhe a invariabilidade – por
não se flexionar tal palavra nem gênero nem em número com o
substantivo modificado, mas por tomar outra feição – justificando que a
ausência de flexão tem por causa a circunstância de ser o vocábulo,
originariamente, um advérbio.
5. E a tal invariabilidade, por não haver a concordância literal da palavra
modificadora com o substantivo modificado, o referido gramático dá o
significativo nome de discordância do adjetivo com o substantivo
(GÓIS, 1943, p. 187).
Mercância ou Mercancia?
1. De tanto ver e ouvir um emprego que não lhe parece adequado, um leitor
indaga qual a forma correta do vocábulo: mercância ou mercancia?
2. Em nosso idioma, o ato de mercanciar, de mercadejar, de comerciar, de
comprar e vender, de ser um mercador ou um comerciante é mercancia,
com seu final pronunciado como freguesia, e não mercância, como se
rimasse com ganância. Ex.: “Paula Forgioni escreveu excelente obra:
‘A Evolução do Direito Comercial Brasileiro: Da Mercancia ao
Mercado’”.
3. Para dirimir dúvida desse teor, a solução é consultar o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, que é uma espécie de dicionário que
lista as palavras reconhecidas oficialmente como pertencentes ao
vernáculo, bem como lhes fornece a grafia oficial.
4. Também conhecido pela sigla VOLP, ele é organizado e publicado pela
Academia Brasileira de Letras, a qual tem a delegação legal e a
responsabilidade oficial de editá-lo, em cumprimento à vetusta Lei
Eduardo Ramos, de n. 726, de 8/12/1900.
5. Pois bem. Em sua quinta edição, de 2009, já após o Acordo Ortográfico
de 2008, o VOLP apenas fez constar como correto o vocábulo mercancia
(ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 541), e não há
registro algum da variante mercância. Essa é a lei do nosso léxico, e a
ela devemos prestar obediência.
Mês
Ver Datas (P. 250).
Mesmo
1. É palavra que precisa ser observada pelo prisma da concordância
nominal.
2. Acompanhando um substantivo ou palavra equivalente, tem valor
adjetivo e, assim, concorda com o substantivo modificado em gênero e
número. Exs.: a) “Ela mesma subscreveu a inicial”; b) “Eles mesmos
subscreveram a inicial”; c) “Elas mesmas subscreveram a inicial”.
3. Em tais casos, Luiz Antônio Sacconi vê esse vocábulo como evidência
“de caráter reforçativo” (1979, p. 68).
4. Sintetizando tal regra, assim leciona Eduardo Carlos Pereira: “quando
reforça os pronomes pessoais, recebe o gênero e o número da pessoa que
o pronome representa” (1924, p. 300).
5. A um leitor que lhe indagava qual a forma correta – “As portas abriram-
se por si mesmo” ou “As portas abriram-se por si mesmas” – assim
respondia Cândido de Figueiredo: “Por se ter usado e abusado de
mesmo, como advérbio, esse uso ou abuso poderá desculpar o abrirem-
se as portas por si mesmo, ou mesmo por si; mas a corrente dos clássicos
e dos bons mestres segue outra direção: As portas abriram-se por si
mesmas” (1943, p. 188).
6. Seu sinônimo próprio segue a mesma construção.
Ver O mesmo (P. 524).
Mesóclise
1. Aspecto particular do estudo da colocação dos pronomes, abrange as
hipóteses em que o pronome pessoal oblíquo átono vem no meio do
verbo.
2. É a regra geral para o futuro do presente e para o futuro do pretérito,
observando Otoniel Mota que a proibição de uso da ênclise nas formas
verbais do futuro do presente e do futuro do pretérito “é relativamente
moderna” (1916, p. 189). Exs.: a) “Vender-se-á o bem em hasta
pública”; b) “Vender-se-ia o bem em hasta pública”.
3. Oportuno é anotar que o futuro do presente e o futuro do pretérito, pelas
modernas regras de Gramática, não admitem ênclise em hipótese
alguma, razão pela qual são errôneas as seguintes construções: a)
“Venderá-se o bem em hasta pública”; b) “Venderia-se o bem em hasta
pública”.
4. De Carlos Góis (1945, p. 105-6) é a lição para o futuro do presente, que
ele próprio estende ao futuro do pretérito: “Em caso algum se coloca o
pronome pessoal oblíquo átono depois do futuro simples do indicativo:
Chamarei-te (seria ultradissonante)”.
5. Luiz Antônio Sacconi, por seu lado, sem condenação alguma ao uso
tecnicamente correto da mesóclise em tais casos, mas valendo-se de
outra possibilidade perfeitamente correta de construção, assevera,
todavia, que, “se a forma verbal não vier no rosto da oração, recomenda-
se a próclise, colocação mais eufônica” (1979, p. 232). Exs.: a) “Em
hasta pública se venderá o bem”; b) “Em hasta pública se venderia o
bem”.
6. Por fim, de oportuna observação é que, se houver antes do verbo alguma
das chamadas palavras atrativas, poderá a questão ser encartada em
algum dos casos de próclise. Exs.: a) “Não se venderá o bem em hasta
pública”; b) “Não se venderia o bem em hasta pública”.
Ver também Atração pronominal remota (P. 144), Ênclise (P. 317), Próclise
(P. 603), Próclise ou Ênclise? (P. 604) e Pronomes e Locuções verbais (P.
617).
Mestrando – Existe?
Ver Alimentando – Existe? (P. 105)
Metafonia
1. Da análise prática do que ocorre no idioma, verifica-se com facilidade
que palavras que tem um o fechado tônico no singular bifurcam-se em
seu comportamento no plural: algumas mantêm o timbre fechado (como
bolso [ô] e bolsos [ô]), enquanto outras mudam para o timbre aberto
(miolo [ô], miolos [ó]).
2. A esse fenômeno linguístico, chamamos tecnicamente metafonia.
Autores há que também denominam umlaut, que é o termo alemão para
essa ocorrência.
3. Vejam-se alguns exemplos de palavras com o fechado (ô) no singular, as
quais, por metafonia, passam ao plural com o aberto (ó): abrolho (ô),
abrolhos (ó), aposto (ô), apostos (ó), caroço (ô), caroços (ó), choco (ô),
chocos (ó), corno (ô), cornos (ó), coro (ô), coros (ó), corpo (ô), corpos
(ó), corvo (ô), corvos (ó), despojo (ô), despojos (ó), esforço (ô), esforços
(ó), fogo (ô), fogos (ó), forno (ô), fornos (ó), imposto (ô), impostos (ó),
miolo (ô), miolos (ó), olho (ô), olhos (ó), osso (ô), ossos (ó), ovo (ô),
ovos (ó), poço (ô), poços (ó), porco (ô), porcos (ó), porto (ô), portos (ó),
posto (ô), postos (ó), povo (ô), povos (ó), reforço (ô), reforços (ó),
socorro (ô), socorros (ó), tijolo (ô), tijolos (ó), torto (ô), tortos (ó), troço
(ô), troços (ó).
4. Atente-se, contudo, a outras palavras com o fechado no singular (ô), que
continuam com o fechado no plural (ô): acordo (ô), acordos (ô), almoço
(ô), almoços (ô), alvoroço (ô), alvoroços (ô), bolo (ô), bolos (ô), bolso
(ô), bolsos (ô), cachorro (ô), cachorros (ô), caolho (ô), caolhos (ô), coco
(ô), cocos (ô), contorno (ô), contornos (ô), esboço (ô), esboços (ô),
esposo (ô), esposos (ô), estorvo (ô), estorvos (ô), ferrolho (ô), ferrolhos
(ô), forro (ô), forros (ô), globo (ô), globos (ô), gosto (ô), gostos (ô), gozo
(ô), gozos (ô), morro (ô), morros (ô), rolo (ô), rolos (ô), sogro (ô), sogros
(ô), sopro (ô), sopros (ô), soro (ô), soros (ô), transtorno (ô), transtornos
(ô).
5. Essa mudança do timbre da vogal, presente nas línguas românicas, como
lembra J. Mattoso Camara Jr. (s/d, p. 259-60) “parece ter principalmente
ocorrido onde se fez sentir a necessidade de discriminação ou maior
diferenciação flexional”, “interferiu com a regularidade da mutação das
vogais longas e breves latinas para fechadas e abertas portuguesas”, e,
“na sincronia do português moderno, estabeleceu o processo morfêmico
ou submorfêmico da alternância vocálica”.
6. Se essa explicação técnica e histórica sobre as circunstâncias da
passagem dos vocábulos do latim para o português diz muito pouco ao
leitor, console-se ele, porque o autor destas linhas, que teve aulas de
filologia românica em sua faculdade de Letras, também absorve bem
pouco de tais considerações.
7. Em realidade, o que se dá é uma ocorrência linguística de fato, que
independe de regras e que impossibilita sistematização. Vale dizer: pelas
próprias circunstâncias em que a metafonia ocorre em nosso idioma, não
há como regrar ou sistematizar o assunto.
8. A solução para dúvidas dessa natureza é consultar o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, uma espécie de dicionário que lista as
palavras reconhecidas oficialmente como pertencentes à língua
portuguesa, bem como lhes fornece a grafia oficial e, em casos
complexos, esclarece adicionalmente a pronúncia.
9. Também conhecido pela sigla VOLP, é organizado e publicado pela
Academia Brasileira de Letras, a qual tem a delegação e a
responsabilidade legal de editá-lo, em cumprimento à Lei Eduardo
Ramos, de n. 726, de 8/12/1900.
Metro
Ver Abreviatura, Abreviação e Sigla – O que é e Como usa? (P. 55)
Micro ou Micros?
1. Com frequência se encontram frases como “Fomento às micro e
pequenas empresas”, em que micro, em forma abreviada e sem variação
para o plural, está em lugar da expressão completa microempresas.
2. É de se ter como forma correta tal forma de expressão, sobretudo se, em
similaridade de estrutura, se atentar a que Júlio Ribeiro (1908, p. 135),
em uma de suas lições, menciona “as tabelas retro”, em que se há de
entender que retro está em lugar de retromencionadas e que, muito
embora tenha função de adjetivo, não teve variação formal para sua
concordância com o substantivo modificado.
3. No caso apreciado, apesar de microempresas ser um substantivo,
enquanto retromencionadas é um adjetivo, não parece ser descabida a
analogia entre os vocábulos e suas estruturas de concordância.
4. Parece, de igual modo, plenamente defensável a outra concordância
“Fomento às micros e pequenas empresas”, em que micro varia para o
plural, à semelhança de extra, que é adjetivo, com o significado de
extraordinário, também normalmente variável para o plural: trabalho
extra, horas extras, edições extras.
5. Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade preferem a variação
normal em número de tal adjetivo, como se vê no seguinte excerto: “…
acabará aceito como acabam aceitos outros pleonasmos, como o de se
dividirem as empresas em grandes, micros e pequenas, classificação
distinta, expressa por termos linguisticamente equivalentes” (1999, p.
85).
6. Apenas para registro, anota-se que o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, órgão incumbido oficialmente de determinar a existência
dos vocábulos em nosso idioma, além de sua grafia oficial, não registra a
forma micro como adjetivo, mas como substantivo masculino. (VOLP,
2009, p. 548)
Ver Extra (P. 349) e Retro ou Retros? (P. 672)
Milhão
1. Trata-se de substantivo masculino – para alguns, como Antenor
Nascentes e Aires da Mata Machado Filho (1969f, p. 220), mais
especificamente um substantivo coletivo numérico – que não varia para
o feminino, ainda que desse último gênero seja seu especificador.
2. Vejam-se, assim, os seguintes exemplos: a) “Entre os quinze milhões de
crianças abandonadas…” (correto); b) “Entre as quinze milhões de
crianças abandonadas…” (errado).
3. Em interessante distinção, assim se manifesta Arnaldo Niskier: “Milhar
e milhão são substantivos masculinos; portanto, o artigo ou numeral que
os acompanhar deve ser do gênero masculino. Mas lembre-se que mil é
numeral, por isso, o artigo ou numeral que o acompanhe concordará com
o substantivo que é modificado” (1992, p. 85-6). Exs.: a) “Duas mil
pessoas”; b) “Dois milhões de pessoas”; c) “Dois milhares de pessoas”.
4. Para José de Nicola e Ernani Terra, “o substantivo milhão, que significa
mil milhares, é masculino (o milhão). O numeral ou adjetivo que o
acompanha deve, portanto, com ele concordar em gênero e número.
Portanto devemos dizer dois milhões de estrelas, e não duas milhões de
estrelas” (2000, p. 89).
5. Em continuação, para outro significativo aspecto da questão, doutrina
Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 261-2) que, “se o sujeito da oração
for milhões, o particípio ou o adjetivo podem concordar no masculino,
com milhões, ou, por atração, no feminino, com o substantivo feminino
plural”. Exs.: a) “Dois milhões de sacas de soja estão ali armazenados
(ou armazenadas)”; b) “Dezoito milhões de crianças vão ser vacinadas
este ano”; c) “Foram colhidos três milhões de sacas de trigo”; d) “Os
dois milhões de árvores plantadas estão altas e bonitas”; e) “Outros
cinco milhões de moedas serão cunhados (ou cunhadas) no próximo
mês”.
6. Por outro lado, quando, na imprensa, se escreve “O Brasil perde 1,4
milhão de reais em reservas em um só dia”, tal estrutura, vinda do
inglês, é usada em forma numérica por economia de espaço, e sua leitura
obrigatória há de ser: “O Brasil perde um milhão e quatrocentos mil
reais em reservas em um só dia”.
7. É interessante notar que os outros numerais da expressão acabam
flexionando-se normalmente para o feminino, como neste significativo
exemplo de Gladstone Chaves de Melo (1970, p. 126), que, na expressão
2.342.000 pessoas, manda ler dois milhões e trezentas e quarenta e duas
mil pessoas.
8. Em oportuna consideração, lembra Domingos Paschoal Cegalla que “o
numeral um não admite artigo” (1999, p. 285-6). Exs.: a) “Os 1,1 milhão
de servidores civis da União vão receber a primeira cota do reajuste
salarial” (errado); b) “Os servidores civis da União, cerca de 1 milhão e
100 mil, vão receber…” (correto).
9. Quanto à concordância verbal, por sua própria condição de palavra de
significado coletivo, se milhão está no singular e não vem seguido de
termo especificador, o verbo fica no singular; se, contudo, vem seguido
de termo especificador, fica, optativamente, no singular ou no plural.
Exs.: a) “Quanto aos refugiados, só naquele ano um milhão chegou ao
país vizinho” (correto); b) “Quanto aos refugiados, só naquele ano um
milhão chegaram ao país vizinho” (errado); c) “Um milhão de
refugiados chegou ao país vizinho” (correto); d) “Um milhão de
refugiados chegaram ao país vizinho” (correto).
10. Não confundir com mil, o qual, como numeral, com função adjetiva,
concorda normalmente com o substantivo modificado. Exs.: a) “Entre
os dois mil autores pesquisados…” (correto); b) “Entre as duas mil
autoras pesquisadas…” (correto).
Ver Milhar (P. 474).
Milhar
1. É substantivo masculino, não variando seu artigo antecedente para o
feminino, ainda que desse último gênero seja seu especificador. Exs.: a)
“Entre os milhares de crianças abandonadas…” (correto); b) “Entre as
milhares de crianças abandonadas…” (errado).
2. Nos dizeres de Domingos Paschoal Cegalla, “o artigo ou outra palavra
referentes a milhares devem concordar no masculino” (1999, p. 262).
Exs.: a) “Onde estão os milhares de árvores que havia ali?”; b)
“Plantaram-se dois milhares de mudas”; c) “Os milhares de crianças
que vivem nas ruas sofrem muito no inverno”; d) “Esses milhares de
aves para onde estariam indo?”; e) “Esqueceu os milhares de vezes que
o ajudamos?”; f) “Muitos dos milhares de vítimas do trânsito morrem
por imprudência”; g) “… por alguns dos milhares de forças interessadas
em eliminá-lo”.
3. Juntando três observações sobre o mesmo assunto, assim se expressa
Arnaldo Niskier (1992, p. 85-6): “Milhar e milhão são substantivos
masculinos; portanto, o artigo ou numeral que os acompanhar deve ser
do gênero masculino. Mas lembre-se que mil é numeral, por isso, o
artigo ou numeral que o acompanhe concordará com o substantivo que é
modificado: a) “Duas mil pessoas”; b) “Dois milhares de pessoas”.
4. Apenas para registro, em lição que não merece ser seguida, Silveira
Bueno (1957, p. 282) formula duas regras para o emprego do referido
vocábulo: a) “A palavra milhar pode ser substantivo quando precedida
de artigo, tomando então o gênero masculino: o milhar, um milhar”; b)
“Empregada, porém, como adjetivo numeral, toma o gênero do
substantivo a que se refere: os milhares de peixes, as milhares de
lagostas”.
5. Não confundir com mil, o qual, como numeral, por ter função adjetiva,
concorda normalmente com o substantivo modificado. Exs.: a) “Entre os
dois mil autores pesquisados…” (correto); b) “Entre as duas mil autoras
pesquisadas…” (correto).
Ver Milhão (P. 473).
Milheiro
1. É substantivo masculino, que não se flexiona para o feminino, ainda que
o termo especificador que o segue seja desse gênero. Ex.: “Na
conferência, havia uns dois milheiros de autoridades estrangeiras”.
Ver Milhão (P. 473), Milhar (P. 474) e Mil ou Um mil? (P. 474)
Miligrama
Ver Grama (P. 376).
Mil ou Um mil?
1. Quanto a seu uso nas quantificações – sobretudo em preenchimento de
cheques – lembra Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 324) que o
cardinal mil não vem precedido de um. Exs.: a) “Pague-se por este
cheque a quantia de mil reais” (correto); b) “Pague-se por este cheque a
quantia de um mil reais” (errado); c) “O Brasil foi descoberto em mil e
quinhentos” (correto); d) “O Brasil foi descoberto em um mil e
quinhentos” (errado).
2. Com propriedade, também lembram Pasquale Cipro Neto e Ulisses
Infante: “não se deve usar um antes de mil: ‘O serviço custaria mil
reais’” (1999, p. 313).
3. José de Nicola e Ernani Terra, de igual modo, advertem: “Não se utiliza
um antes do numeral mil: mil reais, mil dólares e não um mil reais, um
mil dólares” (2000, p. 149).
4. Atenta, ainda, aos frequentes equívocos da linguagem profissional nesse
campo, reforça Laurinda Grion: “apesar do seu uso bastante comum, não
se deve colocar um antes do numeral mil, … como se costuma fazer no
preenchimento de cheques” (s/d, p. 91).
5. E assim resume Domingos Paschoal Cegalla: “não se usa um antes de
mil. Diga-se ou escreva-se mil reais, mil e quinhentos dólares. No
preenchimento de cheques, evite-se escrever hum mil reais, hum mil e
oitocentos reais. Há meios tão seguros quanto esse para evitar
falsificações sem atropelar a língua” (1999, p. 404).
Ver Hum ou Um? (P. 392)
Mim
Ver Para eu ler ou Para mim ler? (P. 545)
Mini-carro ou Minicarro?
1. Ante as alterações trazidas pelo Acordo Ortográfico de 2008 quanto à
grafia, importa perguntar: mini-carro ou minicarro?
2. Ora, pelas diretrizes do recente Acordo Ortográfico, apenas em dois
casos mini se separa por hífen: a) quando o segundo elemento começa
por h: mini-habitante, mini-história; b) quando o segundo elemento
principia pela mesma vogal de término do primeiro elemento: mini-
indústria, mini-império.
3. Por consequência, juntam-se diretamente os elementos, se o segundo
deles começa com outra vogal, que não i: miniaparelho,
miniabotoadura, miniescada, minioratório, miniorganização,
miniumbigo.
4. A ligação também é direta, quando o segundo elemento é começado por
outra consoante, que não h: minibiblioteca, minicomputador,
minidicionário, miniquadro.
5. Apenas se observa que, se o segundo elemento se inicia por r ou s,
dobram-se tais consoantes para continuidade do som originário. Exs.:
minirretrospectiva, minissaia, minissubmarino.
Ministra – Existe?
Ver Capitã, Capitoa ou A Capitão? (P. 168) e Poeta – Qual o feminino? (P.
570)
Minuto
Ver Abreviatura, Abreviação e Sigla – O que é e Como usa? (P. 55)
Mister
1. Quanto à prosódia, anota-se, desde logo, que se trata de palavra oxítona,
de modo que a última sílaba é a mais forte; além disso, o e é aberto (é),
rimando, assim, com um conhecido utensílio de mesa, a colher, ou
mesmo com Ester (BECHARA, 1974, p. 58).
2. Essa é a lição de Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 19), e também do
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira
de Letras, órgão incumbido oficialmente de determinar a existência dos
vocábulos em nosso idioma, além de sua grafia oficial (2009, p. 555).
3. Tanto pode ser substantivo (significando necessidade, ocupação ou
trabalho) como adjetivo (com a acepção de necessário, preciso ou
urgente). Exs.: a) “Ocupava-se ele com os misteres da advocacia”
(substantivo); b) “Era mister coibir a deslealdade processual”
(adjetivo).
4. Oportuno, acerca da construção a ser seguida, é lembrar a lição de José
de Sá Nunes (1938, p. 198): “Esta é que é a sintaxe que me parece mais
segura, porque desde Morais até Figueiredo o vocábulo mister nunca
jamais deixou de ter o significado de necessidade, precisão, urgência. De
modo que, ainda se dizendo “não são mister sabedorias”, é necessário
subentender-se a preposição de”.
Ver Fazer-se mister – Está correto? (P. 353), Haver mister (P. 386) e Ser
mister – Está correto? (P. 694)
Modus agendi
Ver Modus vivendi (P. 476).
Modus faciendi
Ver Modus vivendi (P. 476).
Modus vivendi
1. Trata-se de expressão latina de estrutura muito corriqueira, em que a
palavra modus (nominativo singular) vem seguida de vivendi (um
genitivo de gerúndio), tudo com o significado de modo de viver.
2. Por se tratar de locução pertencente a outro idioma, obrigatório é o uso
das aspas, de negrito, itálico, sublinha ou de grifo equivalente indicador
de tal circunstância, e proibida a utilização do acento gráfico ou hífen,
que não existiam naquela língua.
3. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, veículo oficial da
Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido de definir quais
vocábulos pertencem efetivamente ao idioma, no entanto, registra como
palavra integrante do léxico latino apenas modus (2009, p. 863), e não os
demais vocábulos que, mais comumente, completam a expressão latina:
agendi, faciendi e vivendi.
4. Em corroboração, não se olvide a lição de Edmundo Dantès Nascimento
(1982, p. 145) no sentido de que expressões como essa não eram
hifenizadas em latim, razão pela qual “não o podem ser em língua
nenhuma”, acrescentando tal autor que, “para quem pretende grafar
escorreitamente não é permitido o hífen em expressões do latim
clássico”.
5. Quanto a seu plural, cabem integralmente as observações feitas para
outros vocábulos de origem latina, como campus.
Mo – Está correto?
1. Os pronomes pessoais oblíquos átonos me, te, lhe, nos, vos podem
juntar-se aos pronomes o, a, os, as, dando origem às formas mo, to, lho,
no-lo, vo-lo. Exs.: a) “Estes autos, ele mos entregou em confiança”; b)
“A causa, ele no-la confiou para defesa em segunda instância”.
2. Lembra Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 235) que “tais contrações
pronominais são exclusivas da linguagem culta” e “raramente as usam os
escritores brasileiros de hoje”.
3. Em aspecto de peculiar interesse nesse campo, não haveria dúvida
quanto a juntar lhe e os, do que resultaria facilmente lhos; mas, como
pode haver problemas quando o primeiro pronome é lhes, vale trazer a
lição de Júlio Ribeiro (1908, p. 106 e 257) no sentido de que tal
pronome, “em concurso com o, a, os, as, forma lho, lha, lhos, lhas”,
acrescentando tal autor que “o, a, os, as, em concurso com lhes exigem a
queda do s, absorvem o e, e formam lho, lha, lhos, lhas”.
4. Em mesmo sentido, Ronaldo Caldeira Xavier (1991, p. 111) anota que
“as formas pronominais lho, lha e plurais podem resultar,
indiferentemente, da combinação de lhe + o, lhe + a, ou de lhes + o,
lhes + a. Ex.: ‘Entregaste o recibo aos contribuintes?’ – ‘Entreguei-lho’
(lho = lhes + o)”.
5. Nessa mesma esteira, doutrina Sousa e Silva que, “no português antigo o
pronome lhe era invariável, permanecendo assim, modernamente,
quando se combina com o, a, os, as” (1958, p. 173-4).
6. Há diversas passagens dos textos de lei, em que se empregam pronomes
escritos dessa forma: a) “Antes de assumir a tutela, o tutor declarará
tudo o que lhe deva o menor, sob pena de não lho poder cobrar,
enquanto exerça a tutoria…” (CC, art. 430); b) “O credor pignoratício é
obrigado: … III – a entregar o que sobeje do preço, quando a dívida for
paga, seja por excussão judicial, ou por venda amigável, se lha permitir
expressamente o contrato, ou lha autorizar o devedor…” (CC, art. 774);
c) “Pode ser árbitro, não lho vedando a lei, quem quer que tenha a
confiança das partes” (CC, art. 1.043).
Ver Pronome pessoal (P. 614) e Verbo seguido de pronome (P. 763).
Monologar
Ver Datilografar (P. 251).
Montar
1. Leciona Luís A. P. Vitória que esse verbo, no sentido de importar,
atingir, de acordo com a maioria dos gramáticos, deve ser regido pela
preposição a. Ex.: “Os gastos montam a R$ 2.000,00”.
2. Complementa ele, todavia, sem condenação, que há “alguns exemplos
em que escritores empregam a preposição em” (VITÓRIA, 1969, p.
165).
3. Desse modo, também estaria correta a seguinte construção: “Os gastos
montam em R$ 2.000,00”.
4. Francisco Fernandes (1971, p. 426) não apenas aceita as duas
construções, mas também vê a possibilidade de construção do referido
verbo como transitivo direto, trazendo, para todas as hipóteses, exemplos
de autores insuspeitos: a) “Estes reforços, que montavam a 2.914
homens…” (Euclides da Cunha); b) “… cuja verba montava em 141
milhões de dólares” (Rui Barbosa); c) “Cinquenta talentos, que pelo
menos montavam trinta mil cruzados” (Padre Manuel Bernardes).
5. E Celso Pedro Luft, que também acata todas essas possibilidades de
estrutura, esclarece que a regência primária é montar a, comparável a
subir, elevar-se a, enquanto montar em “deve-se ao verbo importar”
(1999, p. 370-1).
Morgue – Galicismo?
1. Trata-se, para alguns, de galicismo integralmente desnecessário, já que,
em português, há um sinônimo perfeito, que é necrotério.
2. Muito embora se trate de vocábulo hoje quase desconhecido no Brasil,
observa Júlio Nogueira que ele subsiste em Portugal, “onde não querem
aceitar o termo necrotério, naturalmente por ter sido formado no Brasil,
onde o criou o escritor Alfredo d’Escragnolle Taunay”.
3. Apontando para a resistência pelo motivo já referido, tal gramático
lembra que Gonçalves Viana preferia ficar com o galicismo morgue, por
achar ‘longuíssimo’ o necrotério, muito embora tenha tal palavra
“apenas uma letra mais que cemitério e o mesmo número de sílabas…”
(NOGUEIRA, 1959, p. 64).
4. Espancando dúvidas, porém, o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido
oficialmente de determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma,
além de sua grafia oficial, registra a mencionada palavra como
pertencente ao nosso idioma e lhe confere o gênero feminino (2009, p.
563), o que significa que seu emprego é plenamente defensável entre
nós.
Morrido
Ver Morto – Particípio passado de Matar ou Morrer? (P. 478)
Mozarela, Muçarela, …?
1. Em recente concurso, indagou-se qual a forma correta em português para
aquele famoso queijo napolitano de leite de búfala ou de vaca, que se
talha com uma espécie de fungo conhecido por mozze no dialeto
napolitano.
2. A primeira observação a ser feita é que, em nosso idioma, a autoridade
oficial para dizer quais vocábulos pertencem ao vernáculo ou não é o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, uma espécie de
dicionário que lista as palavras reconhecidas oficialmente como
pertencentes à língua portuguesa, bem como lhes fornece a grafia oficial,
mas normalmente não lhe dá o significado.
3. É ele elaborado pela Academia Brasileira de Letras, que tem a
responsabilidade legal de editá-lo, em cumprimento à vetusta Lei
Eduardo Ramos, de n. 726, de 8/12/1900.
4. Por isso, dizer que tal ou qual dicionarista registra ou não registra
determinada forma não resolve a questão nesse campo, uma vez que a
palavra oficial não está com eles, mas com o VOLP; este, sim, é que diz
oficialmente o que se deve acatar nessa esfera. Ou seja: por mais
abalizados que sejam dicionaristas como Houaiss ou Aurélio, eles não
são a autoridade oficial nesse campo.
5. Uma segunda observação é que, se há palavras vernáculas, isso significa
que o vocábulo já sofreu aportuguesamento, de modo que, então,
normalmente não mais se emprega o termo tal como escrito no idioma
original, a não ser que haja expressa permissão do próprio VOLP.
6. Feitas essas ponderações, uma consulta do VOLP vai demonstrar que lá
não se encontram as seguintes grafias: moçarela, morzarela, mossarela,
mozzarela, murzarela, mussarela, muzzarela.
7. São apontadas, todavia, como formas corretas, em mesmo local,
mozarela, muçarela e muzarela (ACADEMIA BRASILEIRA DE
LETRAS, 2009, p. 566 e 572).
8. Esclareça-se que o que se tem, nesse campo da grafia, em última análise,
é uma lei: a Academia Brasileira de Letras tem a delegação legal para
elaborar o rol dos vocábulos oficialmente existentes em nosso idioma, e
o faz por intermédio do VOLP, de modo que qualquer discussão que se
queira travar sobre a questão haverá de situar-se no plano científico. Não
está, porém, no alvedrio de quem quer que seja adotar uma grafia não
consagrada por ela, de modo que grafar diferentemente da determinação
oficial será, em última análise, descumprir a lei.
9. Resolvida a consulta, quero, neste final, fazer três observações: a) se
fosse submetido a tal exame, no qual a questão foi formulada, eu
também erraria, pois ninguém sabe qual a grafia oficial de todos os
vocábulos em nosso idioma; b) uma questão como essa não verifica o
real conhecimento que um candidato tem do uso do idioma, nem mesmo
se sabe manejá-lo adequadamente; c) bem por isso, um teste como esse
não atinge o alvo nem seleciona, de modo efetivo, candidatos aptos para
cargo nenhum, nem mesmo se estiverem buscando um pizzaiolo ou um
garçom.
Mui
1. É forma apocopada do advérbio muito, usada, e corretamente, por
questão de eufonia, antes de adjetivos e advérbios. Exs.: a) “Em tom mui
respeitoso, ele dirigiu-se ao magistrado”; b) “O autor vem mui
respeitosamente requerer a V. Exa…”
2. De acordo com lição de Sousa e Silva, “esta forma apocopada de muito
só tem lugar quando se lhe segue um adjetivo ou advérbio, ou expressão
equivalente: mui belo, mui nobre, mui raro, mui longe, mui de propósito
etc.”; bem por isso, “não se diz mui dinheiro, gostei mui etc.”.
3. Continua tal autor com a observação de que, “no dicionário de Séguier
condena-se o uso de mui antes de palavra iniciada por vogal ou h”;
remata, todavia, ele próprio – após ressalvar que foi suprimida a nota na
última edição de tal léxico, em 1956 – com taxativa anotação: “se isto é
erro, não há escritor que o não tenha perpetrado…” (SILVA, A., 1958, p.
187).
4. Num outro aspecto, pelas regras de ortoepia, segundo o magistério de
Evanildo Bechara (1974, p. 44), sua pronúncia é anasalada.
5. Acrescenta, porém, Celso Cunha que “não se assinala na escrita a
nasalidade do ditongo” (1970, p. 17).
6. Já o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de estabelecer a
existência dos vocábulos em nosso idioma, além de sua pronúncia
oficial, determina que sua vogal tônica seja proferida em som oral, e não
nasal (ú), o que faz com que a palavra, por regra oficial, seja proferida
em rima com Rui (2009, p. 567).
Ver Ortoepia (P. 532).
Muito
1. É palavra que precisa ser observada do prisma da concordância nominal.
2. Se modifica um verbo ou um adjetivo, a palavra tem valor de advérbio e
é invariável. Exs.: a) “Ele trabalha muito”; b) “Ela trabalha muito”; c)
“Eles trabalham muito”; d) “Elas trabalham muito”; e) “Ele está muito
cansado”; f) “Ela está muito cansada”; g) “Eles estão muito cansados”;
h) “Elas estão muito cansadas”.
3. Se, porém, modifica um substantivo, tem valor de adjetivo e concorda
com a palavra modificada. Exs.: a) “Havia muita gente à espera do réu”;
b) “Havia muitas pessoas à espera do réu”; c) “Havia muitos repórteres
à espera do réu”.
4. Em observação abrangente dos vocábulos muito, pouco, bastante, tanto
e quanto, asseveram Carlos Góis e Herbert Palhano que tais palavras são
pronomes indefinidos, quando vêm modificando um substantivo; “neste
caso são variáveis em gênero e número”.
5. Acrescentam tais autores que são advérbios, quando vêm modificando o
verbo, o adjetivo, ou outro advérbio; “neste caso, são invariáveis”
(GÓIS; PALHANO, 1963, p. 123-4).
6. Num outro aspecto, quando se diz “Ele tem muito bom-senso”,
considera-se bom-senso uma só palavra, razão pela qual, vindo muito a
modificar o núcleo da expressão, que é senso, e não bom, tendo, assim,
valor adjetivo, há de ser ela variável, razão por que se há de atentar à
concordância nominal de muito nas frases em que são femininos os
substantivos modificados. Exs.: a) “O advogado agiu com muita má-fé”
(correto); b) “O advogado agiu com muito má-fé” (errado).
7. Pelas regras de ortoepia, segundo o magistério de Evanildo Bechara, sua
pronúncia é anasalada (1974, p. 44).
8. Acrescenta, porém, Celso Cunha que “não se assinala na escrita a
nasalidade do ditongo” (1970, p. 17).
9. Já o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de estabelecer a
existência dos vocábulos em nosso idioma, além de sua pronúncia
oficial, determina que sua vogal tônica seja proferida em som oral (ú), e
não nasal, o que faz com que a sílaba tônica de tal palavra, por regra
oficial, seja proferida em rima com Rui (2009, p. 568).
Ver Bastante – Existe no plural? (P. 156), Má-fé (P. 452), Muitíssimo – Está
correto? (P. 481), Muito poucos – Está correto? (P. 482) e Ortoepia (P. 532).
Muito obrigado
Ver Muitíssimo – Está correto? (P. 481) e Obrigado (P. 513).
Multi-culturais ou Multiculturais?
1. Após as alterações trazidas pelo Acordo Ortográfico de 2008 quanto ao
emprego do hífen, importa esclarecer: multiculturais ou multi-culturais?
2. Em português, com o significado de muitos, de diversos, de grande
quantidade, multi serve de primeiro elemento a uma série enorme de
vocábulos: multilateral, multimilionário.
3. Quanto à grafia, como geralmente ocorre com os prefixos e falsos
prefixos terminados por vogal, apenas em duas hipóteses se usa o hífen:
a) quando o elemento seguinte se inicia por h (multi-habilitado, multi-
habitação, multi-hermeneuta); b) quando o elemento seguinte se inicia
pela mesma vogal com que se encerra o prefixo (multi-invenção, multi-
inseticida).
4. Vale aqui observar que, em equívoco a ser corrigido em próxima edição,
o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia
Brasileira de Letras para ser o portador oficial da grafia das palavras em
nosso idioma, registra multinfecção (2009, p. 569), quando deveria trazer
multi-infecção.
5. Tal falso prefixo, ademais, acopla-se diretamente à palavra seguinte, sem
intermediação de hífen, quando iniciada esta por outra vogal, que não a
que encerra o prefixo: multiangular, multiembrionário, multiocular.
6. Continua valendo a regra de junção direta, quando o elemento seguinte
se inicia por consoante: multibilionário, multicultural, multidirecional,
multifuncional, multigrávida, multilateral, multimilionário,
multipartição, multitubular, multiviscosidade.
7. Apenas para adaptação gráfica, com vistas à continuidade do mesmo
som, dobra-se o r ou o s, quando principiam o segundo elemento:
multirracial, multirreligioso, multissecular, multissílabo.
Músico e Música?
1. Um leitor indaga qual se a mulher que é profissional da Música, em
contraposição ao músico, se chama música.
2. Vale lembrar, num primeiro aspecto, que há, em português, substantivos
que têm uma forma definida e específica para o masculino e outra para o
feminino: o operário, a operária.
3. Num segundo aspecto, há os chamados comuns de dois, ou comuns de
dois gêneros, que têm uma só forma para o masculino e para o feminino,
e a distinção se faz pelo artigo que o precede ou por outro determinativo
acompanhante: o artista, a artista.
4. Num terceiro aspecto, há o epiceno, que é o substantivo de um só
gênero, e a distinção se faz pelo acréscimo dos adjetivos macho e fêmeo:
cobra macha, jacaré fêmeo.
5. Por fim, lembre-se o sobrecomum, que é o substantivo de um só gênero,
relativo a seres de ambos os sexos, sem variação de forma e sem
distinção por artigo ou por acréscimo de determinativo acompanhante: o
bebê, a criança, o indivíduo, a pessoa, a testemunha, a vítima.
6. Respondendo diretamente à indagação do leitor: a) músico é um
substantivo normal, que tem masculino e feminino; b) pertence, assim, à
primeira categoria referida no início desta explanação; c) desse modo,
não se há de considerar com estranheza seu regular emprego. Exs.: i)
“Villa Lobos era um músico de categoria ímpar” (correto); ii)
“Chiquinha Gonzaga era uma música de categoria ímpar” (correto).
N
Na conformidade
Ver De conformidade ou Em conformidade?(P. 253)
Nada obsta
Ver Obstar (P. 516).
Náilon
Ver Formação de adjetivos – Regras (P. 360) e Neologismo (P. 494).
Não há de quê
1. Em relação à ocorrência do acento gráfico, observa Celso Pedro Luft
(1991, p. 102) que, muito embora o Acordo Ortográfico se refira ao que
acentuado apenas no fim da frase, o certo é que, exatamente pela igual
circunstância de que ele se torna tônico, “a rigor, pelo mesmo motivo, se
devia acentuar o que em qualquer pausa (vírgula, ponto e vírgula)”.
Ver De nada – Está correto? (P. 263) e Obrigado (P. 513).
Não sabido
Ver Lugar incerto e não sabido (P. 450).
Não se deve dizer tais coisas ou Não se devem dizer tais coisas?
1. A questão é saber qual a construção correta: “Não se deve dizer tais
coisas”, ou “Não se devem dizer tais coisas”?
2. De acordo com Vitório Bergo, “em frases deste modelo, o verbo dever
constitui, em regra, auxiliar do infinitivo que se lhe segue, sendo que a
partícula se apassiva o todo verbal. Destarte, concorda aquele com o
substantivo a que se refere o infinitivo e que é, em suma, o seu sujeito”
(1944, p. 191); em outras palavras, para tal autor a única forma correta
seria: “Não se devem dizer tais coisas”.
3. Anote-se, porém, que ambas as estruturas estão corretas, mas cada qual
delas tem uma explicação própria (BUENO, 1938, p. 123-4), devendo-se
realçar, desde logo, que ambas estão na voz passiva.
4. No primeiro exemplo (“Não se deve dizer tais coisas”), o verbo da
oração principal é deve, e o seu sujeito é oracional – dizer tais coisas –,
aspecto esse que facilmente se percebe, quando se põe o período em
ordem direta (“Dizer tais coisas não se deve”), ou mesmo quando se
passa o exemplo, que está na voz passiva sintética, para a voz passiva
analítica (“Dizer tais coisas não é devido”). Observa-se que, sendo
fraseológico o sujeito, deixa ele o verbo no singular, e se acrescenta,
apenas para complementar, que o se, no caso, é partícula apassivadora.
5. No segundo exemplo (“Não se devem dizer tais coisas”), a expressão
devem dizer é uma locução verbal (sendo devem o verbo auxiliar e dizer
o principal). O se aqui também funciona como partícula apassivadora, e
tais coisas é o sujeito de uma voz passiva sintética, cuja voz passiva
analítica assim se constrói: “Tais coisas não devem ser ditas”. Em ambas
as vozes passivas (sintética e analítica), o sujeito é tais coisas, e tal
sujeito, por estar no plural, leva também o verbo para esse número, quer
na passiva sintética, quer na passiva analítica.
6. Anote-se, todavia, para registro, a lição restritiva de Eduardo Carlos
Pereira no sentido de que, em frases como a considerada, quando o
verbo está no plural, as frases estão corretas, “manifestamente
apassivadas pela partícula se”, e tais coisas é o sujeito do verbo
perifrástico.
7. Para tal autor, entretanto, muito embora ressalve que o emprego do
verbo no singular se encontre, ainda que raramente, em alguns escritores,
“tal concordância, todavia, não é segura”, pois “só teria sua justificação
no caso de ser o se sujeito”.
8. Ultima ele suas observações com o lembrete de que, “em outras locuções
do infinitivo, em que se vê claramente ser este o sujeito do verbo no
modo finito, dá-se a concordância no singular”, alinhando, dentre outros,
dois exemplos de João Ribeiro: a) “Quer-se inverter as leis”; b)
“Intenta-se demolir aqueles muros” (PEREIRA, 1924, p. 220-1).
9. Ressalve-se, todavia, que o se jamais poderia ser sujeito em tal
expressão, já que, como acentuado, em ambas as estruturas é ele
partícula apassivadora.
10. Em continuação, o ensino de Júlio Nogueira (1959, p. 108) se dá no
sentido de que, muito embora se encontrem exemplos de construção no
singular, é preferível, sobretudo por eufonia, a concordância no plural,
além de mais habitual nos clássicos.
11. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 320), sem considerações teóricas
acerca do assunto, considera, por um lado, “boa concordância dizer
‘Podem-se colher as frutas’”; por outro lado, refere que “também é
lícito, em construções desse tipo, deixar o verbo auxiliar poder no
singular: Pode-se colher as frutas”.
12. Em observações ao art. 52 do Código Civil – que registra: “Coisas
divisíveis são as que se podem partir em porções reais e distintas,
formando cada qual um todo perfeito” – Luciano Correia da Silva,
atento aos aspectos até agora analisados, leciona que também se
poderia dizer: “Coisas divisíveis são as que se pode partir em porções
reais e distintas…”.
13. Segundo tal autor, entretanto, a frase assim dita haveria de ficar “sem o
mesmo vigor e propriedade” (SILVA, L., 1991, p. 34).
14. Reitere-se, por fim, ante a própria análise da divergência entre os
gramáticos e as aceitáveis justificativas para as duas sintaxes, que o
melhor parece ser validar, em tais casos, ambas as construções: ou com
o verbo no singular, ou com o verbo no plural.
Não se pode dizer tais coisas ou Não se podem dizer tais coisas?
Ver Não se deve dizer tais coisas ou Não se devem dizer tais coisas? (P.
488)
Na qualidade de – Galicismo?
1. Anota Vasco Botelho de Amaral que “tal modo de dizer recebemo-lo de
França”.
2. Acrescenta que “mais natural é o emprego de como, nas funções de, ou,
com circunlóquio, exercendo (eu, ele, etc.) o cargo de, etc.”.
3. Observa que, “se a imprópria expressão ganhar raízes, não há remédio
senão usá-la”, não sem realçar que “cumpre não esquecer ou não
postergar as equivalentes portuguesas”.
4. E, lembrando que Camilo Castelo Branco “lançou mão da locução pouco
ou nada vernácula”, traz dois exemplos do referido autor: a) “… na
qualidade de conselheiro de estado e guerra…”; b) “… na qualidade de
capitão-general do reino…” (AMARAL, 1939, p. 43).
5. As nossas leis, por seu lado, com frequência lançam mão desse torneio
de palavras exatamente no sentido apontado: a) “O endossatário de
endosso-mandato só pode endossar novamente o título na qualidade de
procurador, com os mesmos poderes que recebeu” (CC/2002, art. 917, §
1º); b) “O endossatário de endosso-penhor só pode endossar novamente
o título na qualidade de procurador” (CC/2002, art, 918, § 1º); c) “O
herdeiro pode, em ação de petição de herança, demandar o
reconhecimento de seu direito sucessório, para obter a restituição da
herança, ou de parte dela, contra quem, na qualidade de herdeiro, ou
mesmo sem título, a possua” (CC/2002, art. 1.824); d) “Presume-se
imputada na parte disponível a liberalidade feita a descendente que, ao
tempo do ato, não seria chamado à sucessão na qualidade de herdeiro
necessário” (CC/2002, art. 2.005, parágrafo único); e) “A pena é
aumentada de um terço, quando o agente recebeu a coisa… na
qualidade de tutor, curador, síndico, liquidatário, inventariante,
testamenteiro ou depositário judicial” (CP, art. 168, § 1, II); f) “Trair, na
qualidade de advogado ou procurador, o dever profissional,
prejudicando interesse, cujo patrocínio, em juízo, lhe é confiado” (CP,
art. 355); g) “Inutilizar, total ou parcialmente, ou deixar de restituir
autos, documento ou objeto de valor probatório, que recebeu na
qualidade de advogado ou procurador” (CP, art. 356); h) “É vedada
afiliação ao regime geral de previdência social, na qualidade de
segurado facultativo, de pessoa participante de regime próprio de
previdência” (CF/1988, art. 201, 5º, com a redação dada pela Emenda
Constitucional 20/98); i) “É vedado o aporte de recursos a entidade de
previdência privada pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios,
suas autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia
mista e outras entidades públicas, salvo na qualidade de patrocinador,
situação na qual, em hipótese alguma, sua contribuição normal poderá
exceder a do segurado” (CF/1988, art. 202, § 3º, incluído pela Emenda
Constitucional 20/98).
Nascido em ou Nascido a?
Ver A catorze de julho ou Em catorze de julho? (P. 64)
Nato ou Inato?
1. Um leitor ficou sabendo que o correto seria empregar a palavra inato
para significar uma qualidade de sempre de uma pessoa, como em
nadador inato. Conferiu depois, no dicionário, e constatou que nato e
inato são sinônimas. E indaga: são corretas ambas as construções?
2. Parta-se do princípio de que tais palavras não são efetivamente
sinônimas, mas, em realidade, até mesmo têm sentidos opostos: nato
significa nascido, enquanto inato significa não nascido.
3. E também se afirme, desde logo, que as confusões que podem surgir são
mais de entendimento equivocado de seu conteúdo semântico nos casos
concretos do que qualquer outra coisa.
4. Considere-se, por primeiro, o seguinte exemplo: “Ele é um político
nato”. O que se quer dizer, em tal caso, em suma, é que ele a) já nasceu
político, b) comportou-se como um político já em seus primeiros passos,
c) tinha muito jeito no trato com os colegas desde os bancos escolares,
etc. Em síntese: já nasceu político.
5. Considere-se outro exemplo: “A política é inata nele”. O que se quer
dizer não é que ele não tenha a política no sangue, e sim o contrário: a) a
política não se manifestou nele num determinado momento de sua vida;
b) em verdade, ela sempre esteve com ele. Ou seja: a política não nasceu
nele num certo momento, mas é congênita, nasceu com ele.
Necessitar
1. À semelhança de seu sinônimo precisar, quando tem o sentido de
carecer, sentir necessidade, quanto à regência verbal, pode,
indiferentemente, ter objeto direto (sem preposição) ou objeto indireto
(com a preposição de). Exs.: a) “As boas leis necessitam bons
executores” (Caldas Aulete); b) “O Pai de Famílias necessitava dos
jornaleiros para a vinha” (Padre Antônio Vieira).
2. Exatamente nesse sentido, acolhe Vasco Botelho de Amaral a
possibilidade de construção de tal verbo tanto como transitivo direto
quanto como transitivo indireto: “Permito-me acolher favoravelmente as
duas construções. E não se julgue que é bondade minha. A bondade é da
língua popular e também da língua literária” (1948, p. 247).
3. Na síntese de Sousa e Silva, “na acepção de precisar, constrói-se com de
ou sem preposição: necessito de dinheiro ou necessito dinheiro” (1958,
p. 189).
4. Francisco Fernandes (1971, p. 432,), em indispensável obra, acata as
duas construções, abonando-se com autores insuspeitos: a) “Não
necessitam defesa minha…” (Mário Barreto); b) “Este sentimento não
necessita… de outra nutrição” (Rui Barbosa).
5. Sem qualquer contestação, Celso Pedro Luft (1999, p. 377) também
acolhe ambas as possibilidades de sintaxe.
Ver Gosta-se de um bom vinho – Está correto? (P. 375), Necessitam-se
operários ou Necessita-se de operários? (P. 490) e Voz passiva e Pronome
apassivador (P. 791).
Necrópsia ou Autópsia?
Ver Autópsia ou Necrópsia? (P. 148)
Nem
Ver Bem como (P. 158), E nem (P. 318) e Nem… nem (P. 493).
Nem… nem
1. No que concerne à concordância verbal, lembra Artur de Almeida Torres
que “os sujeitos da terceira pessoa do singular, ligados pela conjunção
nem, repetida ou não, podem ter o verbo no singular ou no plural”. Exs.:
a) “Nem o estrépito do cavalo e do veículo, nem a minha entrada fez
levantar o dono do negócio” (Machado de Assis); b) “Até aí nem o
nome, nem a imagem de Leonor me tinha passado pelo espírito”
(Alexandre Herculano); c) “Nem o barão nem o pajem pregaram olho à
noite”; d) “São Paulo disse animosamente que estava certo que nem a
morte, nem a vida o podiam separar do amor de Deus” (Padre Manuel
Bernardes).
2. Fundado em lição de Epifânio Dias, complementa tal autor que “o verbo
vai para o plural, se quem fala pretende fazer sobressair a ideia da
pluralidade dos sujeitos; vai para o singular, se tem em vista dar realce à
referência do predicado a cada sujeito separado” (TORRES, 1966, p.
148-9).
3. Mais do que questão de preferência e estilo, porém, por um lado, quando
os elementos do sujeito vierem ligados pela conjunção nem, com ideia
de exclusão, o verbo ficará no singular. Ex.: “Nem Pedro nem Paulo
casará com Maria”.
4. Por outro lado, se não houver a ideia de exclusão, mas sim de
concomitância, de rigor será a concordância do verbo no plural (GÓIS,
1943, p. 38). Ex.: “Nem ele nem sua mulher ficaram contentes” (Padre
Antônio Vieira).
5. Ultimando com a síntese de João Ribeiro (1923, p. 150), quando se trata
de núcleos unidos por ou ou por nem, “o verbo, quando só se refere a
um, com exclusão de outro, fica no singular”; porém, se o verbo “se
refere à totalidade dos sujeitos, vai para o plural”.
Ver Nem um nem outro (P. 493).
Nem um ou Nenhum?
Ver Nenhum ou Nem um? (P. 493)
Nenhures – Existe?
1. Trata-se de advérbio que significa em nenhum lugar. Ex.: “Nenhures
poderá ser encontrado posicionamento doutrinário semelhante”.
2. Contrapõe-se a algures, que significa em algum lugar, em alguma parte.
3. Não confundir com alhures, que tem o sentido de em outro lugar.
4. Vasco Botelho de Amaral, defendendo-lhe o uso normal na estrutura
atual da língua, anota, de modo taxativo: “Se amanhã vir ou ouvir que
nenhures é arcaísmo desprezível, não me admirarei nada…” (1943, p.
14).
5. Porque já significa em nenhum lugar (em que se nota a presença da
preposição em), é totalmente incorreto o emprego de em nenhures.
Neologismo
1. Em termos práticos, é o contrário de arcaísmo.
2. Define-o Aurélio Buarque de Holanda Ferreira como a “palavra, frase ou
expressão nova, ou palavra antiga com sentido novo” (s/d, p. 969).
3. Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 208) o vê consistindo “no
emprego de palavras novas, criadas pela ciência, por organizações
modernas (telégrafo, autódromo, astronauta, telex, xerox) ou de palavras
antigas tomadas em sentido novo (computador, satélite)”.
4. Asseverando tratar-se o uso dos neologismos de mania “das mais
detestáveis” e que os neologistas “não passam de deturpadores da
língua”, Júlio Ribeiro doutrina que o neologismo “só se justifica pela
necessidade de uma denominação nova, para uma descoberta que
também é nova, para um novo instrumento; ou então quando vem
apadrinhado por um nome respeitado na língua” (1908, p. 353).
5. Anotam, por sua vez, Regina Toledo Damião e Antonio Henriques que
“o importante, na questão dos neologismos, é não tomar posições
extremadas, mesmo porque a oposição radical ao neologismo é inútil”
(1994, p. 54).
6. Não se há de esquecer, nessa esteira, como lembra Mário Barreto, que “o
romancista Camilo Castelo Branco, que entre os grandes artistas da
palavra sobressai pela inultrapassável riqueza de seu léxico, serviu-se
frequentemente de palavras expressivas, sugestivas e pitorescas, que não
estavam no Dicionário, ou que o não estavam na época em que ele
escreveu” (1954b, p. 133).
7. Também a esse respeito, leciona Evanildo Bechara que “o que se deve
combater é o excesso de importação de línguas estrangeiras, mormente
aquela desnecessária, por se encontrarem no vernáculo vocábulos e giros
equivalentes” (1974, p. 333).
8. Já para Rui Barbosa, “salvos os casos de necessidade ou utilidade, e boa
adaptação vernácula, voto contra o neologismo” (s/d, p. 570).
9. Buscando analisar outro aspecto, refere Júlio Nogueira que “o caráter do
neologismo é temporário. Conhecida a cousa, tornada familiar pelo uso
que dela fazemos, o nome que se lhe dá fica por tal forma ligado à sua
significação que dentro em pouco tempo a novidade do termo
desaparece. Assim já não podem ser consideradas neologismos palavras
relativamente novas, como: fotografia, telégrafo, telefone, fonógrafo,
gramofone, automóvel, cinematógrafo, radiografia, etc.” (1930, p. 54).
10. A dupla exigência para formação do neologismo (estruturação
adequada em nosso idioma + ausência de sinônimo em nossa língua)
encontra-se expressa em lição de Napoleão Mendes de Almeida: “Para
que se justifique, o neologismo deve, antes de tudo, ser necessário e,
depois, formado de acordo com o gênio da língua. Não sendo
conveniente nem corretamente formado, o neologismo passa a ser
barbarismo” (1981, p. 208).
11. Em mesmo sentido, repetindo lição de Júlio Ribeiro, assevera Artur de
Almeida Torres (1966, p. 222) que o neologismo “só se justifica pela
necessidade de uma denominação nova, para uma descoberta que
também é nova, para um novo instrumento, ou então quando vem
apadrinhado por nome respeitado na língua”, concluindo ele próprio
que, “fora desses casos, o neologismo deixa de ser uma riqueza da
língua e passa à caterva dos barbarismos”.
12. Mário Barreto também lembra os requisitos que hão de convergir para
a aceitação de um neologismo: “Para uma palavra ou uma locução de
formação recente serem aceitáveis hão de preencher as condições
seguintes: hão de observar-se na sua formação as leis morfológicas
relativas à estrutura das palavras simples e primitivas e à construção
das derivadas, compostas e justapostas; finalmente, hão de estar
autorizadas pelo uso de bons escritores” (1954a, p. 91).
13. Exatamente por causa dessa dupla exigência para a formação de um
neologismo – estruturação adequada no idioma + ausência de sinônimo
– foi que, anos atrás, apesar da defesa de alguns gramáticos, acabou
sendo condenado o emprego da palavra imexível, feito por um ex-
ministro. Por um lado, sua formação estava integralmente de acordo
com as regras de nossa língua, quer quanto ao prefixo, quer quanto ao
sufixo utilizados. Deu-se, porém, que já havia no idioma sinônimos
perfeitos para o vocábulo, representados pelas palavras intangível e
intocável.
14. Quanto à excessiva aversão a que se incorporem palavras novas ao
nosso léxico, é de se meditar nas palavras judiciosas de Júlio Nogueira,
o qual, então, falava especificamente do Francês: “Acaso a nossa
língua pode apresentar palavras tiradas dos próprios celeiros para
exprimirem todas as ideias concernentes à arte da navegação, da
guerra, das modas, do esporte e tantas outras? Não sejamos, pois,
intolerantes e, principalmente, parciais como nos temos revelado em
desfavor das contribuições que recebemos desde tempos remotos de
uma das mais cultas línguas do universo, senão a mais culta” (1959, p.
53).
15. Adicione-se outra admoestação do mesmo gramático: “o que cumpre é
combater o propósito evidente em raros escritores de dar à sua frase um
ar de construção francesa, para que se tenha a impressão de que eles
sabem francês” (NOGUEIRA, 1959, p. 53).
16. De Rui Barbosa também chega a advertência de que “todos os idiomas
vivos permutam uns com os outros. Seria desatino recusar esses
subsídios, tão inestimáveis quanto imprescindíveis, que se mutuam as
línguas, enquanto não fossilizadas” (BARBOSA apud TORRES, 1966,
p. 221).
17. Também não se olvide a lição de José Oiticica: “Se o neologismo
necessário é bem feito, enriquece a língua, aumentando-lhe o poder de
expressão e a maleabilidade; não assim o neologismo descabido, capaz
de usurpar as funções de boas palavras ou construções clássicas. Pior
ainda o vezo das novidades léxicas e sintáticas” (1954, p. 33-4).
18. Sobre a necessidade de acolhida de novos termos, atente-se ao
ensinamento de que “sem o neologismo as línguas ficariam
estacionárias; não teriam saído nunca da infância; não teriam nome
grande número de objetos novos, e seria impossível a manifestação de
muitas ideias por meio da palavra” (BARRETO, 1954a, p. 91).
19. Oportuna, no caso, a lição de Vasco Botelho de Amaral: “O combate ao
estrangeirismo não pode, não deve tomar o aspecto de intolerância, de
veto rígido, o que não quer dizer que perca a energia necessária diante
de invasões perigosas. Quem estuda, quem investiga os problemas
linguísticos precisa de procurar o equilíbrio, ou antes, a virtude do
meio termo” (1943, p. 24).
20. Também vale transcrever a advertência de Hêndricas Nadólskis e
Marleine Paula Marcondes Ferreira de Toledo: “Não podemos deixar
de importar palavras quando for necessário; mas, se já houver vocábulo
equivalente em português, é claro que devemos usá-lo. Por exemplo,
use desempenho em vez de performance. Se não houver, verifique se já
está aportuguesado. Se já estiver, não deixe de escrever a forma
dicionarizada” (1998, p. 67). Exs.: bói, estande, estresse, leiaute, lêiser,
náilon, turnê, uísque, xampu.
21. Faça-se ligeiro retoque a essa preciosa observação: pode haver forma
dicionarizada que não conste do Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, e vice-versa. Em caso de divergência assim, prevalecerá o
VOLP, editado pela Academia Brasileira de Letras, órgão esse que tem
a autoridade oficial para listar os vocábulos existentes em nosso léxico,
bem como sua grafia e outras circunstâncias de flexão e pronúncia. Os
dicionaristas, por mais relevantes serviços que prestem ao idioma, não
detêm a palavra oficial e final sobre a matéria.
22. De igual modo oportuna a lição de Mário Barreto (1954b, p. 131-2),
que, invocando lição de Vaugelas, lembra que o uso é o mestre, o rei e
o tirano nesse campo, sendo ele quem consagra, definitivamente e
soberanamente, decidindo se se abre ou não a porta do léxico aos novos
vocábulos; e, porque assim é, enquanto espera que em definitivo “se
pronuncie o veredicto do uso”, ao professor e ao gramático incumbe,
por dever, “ensinar não a língua de ontem e muito menos a de amanhã,
mas a língua de hoje”.
23. De modo muito especial para os arrazoados forenses e livros jurídicos,
imprescindível é meditar na apropriada admoestação de Geraldo
Amaral Arruda (1997, p. 64), para quem, se o profissional de Direito
“não dispuser de conhecimentos maiores da língua, não se aventure a
criar verbos novos”, pois “o exibicionismo é perigoso”.
24. Curioso observar que, para a criação dos neologismos verbais, a única
conjugação prolífica tem sido a primeira (-ar). Ex.: telefonar,
telegrafar, televisionar e inúmeros outros.
Ver Formação de adjetivos – Regras (P. 360).
Neo-pentecostal ou Neopentecostal?
1. Com as alterações encartadas no sistema pelo Acordo Ortográfico de
2008 quanto ao emprego do hífen, vale refletir sobre a escolha da grafia
correta: neo-pentecostal ou neopentecostal?
2. Esse elemento tem o significado de novo, como em neoimperialista e
neofascista e, em razão de seu largo uso como primeiro elemento de uma
nova palavra, acabou conhecido como um falso prefixo.
3. Pelas regras trazidas pelo Acordo Ortográfico de 2008, apenas em dois
casos tal elemento se une por hífen ao segundo elemento: a) quando o
segundo elemento começa com a mesma vogal com que se encerra o
prefixo: neo-orleanês, neo-ortodoxo; b) quando o segundo elemento
começa com h: neo-hebraico, neo-holandês.
4. Por conseguinte, liga-se diretamente ao segundo elemento, quando este é
iniciado por outras vogais, que não aquela que encerra o prefixo:
neoacadêmico, neoafricano, neoescocês, neoescolástico,
neoimperialismo, neoimpressionismo.
5. Também se liga sem hífen ao segundo elemento, quando este é iniciado
por consoante: neobarroco, neocapitalismo, neocristianismo,
neodarwinismo, neofascista, neogramático, neomodernismo,
neopentecostal.
6. E, se o segundo elemento se inicia por r ou s, tais consoantes se
duplicam para que haja continuidade do som originário:
neorracionalismo, neorrealista, neorrepública, neosserranense,
neossimbolismo, neossocialismo.
Neste ou Nesse?
Ver Pronome demonstrativo (P. 611).
Nível
Ver A nível de, Ao nível de ou Em nível de? (P. 116)
No aguardo – É correto?
Ver Ficar no aguardo – É correto? (P. 356)
No dia 4 de julho
Ver A catorze de julho ou Em catorze de julho? (P. 64)
No entanto
Ver No entretanto – Está correto? (P. 496)
No entretanto – Está correto?
1. Entretanto e no entanto são formas sinônimas e perfeitamente usáveis,
tendo o significado adversativo de mas, porém, todavia, contudo. Exs.:
a) “O advogado fez um trabalho primoroso, no entanto não conseguiu
êxito” (correto); b) “O advogado fez um trabalho primoroso, entretanto
não conseguiu êxito” (correto).
2. Já na expressão no entretanto, Evanildo Bechara (1974, p. 165) vê uma
locução adverbial de tempo, com o sentido de nesse ínterim, nesse
tempo, nesse intervalo, e observa que muitos puristas condenam o
acréscimo de no para fazê-la valer como conjunção adversativa.
3. Desse mesmo entendimento é Arnaldo Niskier, para quem “no entanto e
entretanto se equivalem, o erro está em mesclar as duas formas e obter
no entretanto” (1992, p. 33).
4. Luís A. P. Vitória também leciona que existe entretanto e também se
pode dizer no entanto, mas “não é correto dizer no entretanto” (1969, p.
103).
5. Pelo ensino de Eliasar Rosa (1993, p. 99-100), é de se evitar o uso de tal
expressão como sinônima de mas, porém, todavia…, por ser ela locução
temporal com o significado de no intervalo, nesse ínterim.
6. Além disso, como lembra Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 101),
mesmo nesse último sentido, trata-se de forma que caiu em desuso.
No fundo – Galicismo?
1. Júlio Nogueira (1930, p. 53) a insere entre as locuções, expressões e
frases completas que conservam o “ar francês” do galicismo, espécies
das mais repreensíveis, “pois não correspondem a uma necessidade da
língua”.
2. Rui Barbosa, em mesma linha de raciocínio, aconselha que se diga em
suma, na essência, em substância, conforme o caso (BARBOSA apud
NOGUEIRA, 1959, p. 64).
3. Citando, todavia, trecho em que Cândido de Figueiredo – que também se
insurgia contra a francesia da locução e mandava substituí-la por na
essência, em substância, no ponto capital, no âmago – Heráclito Graça
atesta-lhe plena vernaculidade e aponta, para exemplo, um excerto de
Latino Coelho: “Conformando um e outro no fundo da história, mas
dissentindo nas circunstâncias e episódios…”.
4. E lembra o referido gramático que “no fundo e na forma” é “expressão
corrente entre pessoas cultas” (GRAÇA, 1904, p. 363-6).
No-lo
Ver Mo – Está correto? (P. 476)
Nome
1. O nome de uma pessoa, genericamente considerado, em termos de
técnica jurídica, compõe-se de duas partes: a) o prenome, ou seja, o
nome próprio, ou nome de batismo, pelo qual geralmente a pessoa é
chamada ou conhecida, que pode ser simples (Rita, Ana, Carolina,
Ovídio) ou composto (José Maria, Rita de Cássia, José Saulo); b) o
sobrenome, também conhecido tecnicamente como apelido de família
(CC/1916, art. 240, parágrafo único, e Lei 6.015/73, art. 56), como nome
de família, sobrenome ou patronímico, que também pode ser simples
(Costa, Leite) ou composto (Leite da Costa, Rocha Barros).
2. O nosso prenome corresponde ao prénom dos franceses, aos forenames
dos ingleses e aos nombres de pila dos povos de língua espanhola.
3. Já o sobrenome corresponde ao nom dos franceses, ao family name dos
ingleses e ao apellido dos povos de língua espanhola.
4. Apesar da distinção técnica existente entre os termos, acaba por haver,
nos textos de lei e de doutrina, nos arrazoados forenses e nos acórdãos,
uma generalizada confusão em torno da denominação dos elementos
formadores do nome, quer pela ausência de precisão terminológica, quer
pela multiplicidade de vocábulos para significar uma mesma realidade.
5. Exemplo marcante dessa ocorrência é a falta de técnica e de
uniformidade registrada no próprio Código Civil de 1916, repositório de
tão grande apuro de ciência e de linguagem, em resultado das conhecidas
polêmicas travadas entre Rui Barbosa e o conhecido gramático Ernesto
Carneiro Ribeiro: a) assim, nome significa nome por inteiro nos arts.
271, I, 324 (hoje revogado pela Lei do Divórcio), 386, 487, 666, I, II e
VII (hoje revogado pela Lei 5.988/73), 698, 846, I, 931, 940, 1.289, § 1º,
1.307 e 1.510; b) a nomes se contrapõe o vocábulo prenomes no art. 195,
I, II, III e VI; c) já no art. 1.039, a contraposição se faz entre nomes e
sobrenomes; d) por fim, no art. 240, não se fala em nomes ou
sobrenomes, mas em apelidos.
6. A confusão continua existindo, de um modo geral, na redação da maioria
dos citados dispositivos, no Código Civil de 2002. Apenas o art. 1.536
(correspondendo ao art. 195 do anterior) substituiu “nomes” e
“prenomes”, respectivamente, por “prenomes” e “sobrenomes”. O art.
1.565 (correspondendo ao art. 240 do anterior) substituiu “apelidos” por
“sobrenome”. O art. 324 do Código Civil de 1916 (revogado pelo art. 17
da Lei do Divórcio), viu substituída a condenação da mulher vencida na
ação a “perder o nome do marido” por outro circunlóquio: “voltará a
usar o nome de solteira”.
Nomear
1. Quanto à conjugação verbal, como todo verbo terminado por ear, recebe
um i intermediário nas formas rizotônicas: nomeio, nomeias, nomeia,
nomeamos, nomeais, nomeiam (presente do indicativo); nomeie,
nomeies, nomeie, nomeemos, nomeeis, nomeiem (presente do
subjuntivo); nomeia, nomeie, nomeemos, nomeai, nomeiem (imperativo
afirmativo); não nomeies, não nomeie, não nomeemos, não nomeeis, não
nomeiem (imperativo negativo).
2. Como as formas rizotônicas apenas ocorrem nos tempos já referidos, a
mencionada peculiaridade não se repete nos demais: nomeava (pretérito
imperfeito do indicativo), nomearei (futuro do presente do indicativo),
nomearia (futuro do pretérito do indicativo), nomeei (pretérito perfeito
do indicativo), nomeara (pretérito mais-que-perfeito do indicativo),
nomear (futuro do subjuntivo), nomeasse (imperfeito do subjuntivo),
nomeando (gerúndio), nomeado (particípio).
3. Não confundir com os terminados em iar, como anunciar, que são
verbos regulares, com exceção de mediar, ansiar, remediar, incendiar e
odiar, que têm regime próprio, seguindo por modelo o último referido, e
que são conhecidos pela sigla MARIO.
4. Em adição, vale registrar a preciosa observação de Júlio Nogueira (1959,
p. 99): “Não há na língua um só verbo terminado em eiar. O que há são
verbos em ear e iar. Os primeiros, uniformemente, inserem um i nas três
pessoas do singular e na terceira do plural do presente do indicativo,
formas acentuadas no radical (rizotônicas)”.
5. Já os segundos, obviamente, são regulares, sem qualquer acréscimo ou
alteração. Como já observado, excetuam-se os da sigla MARIO, que são
irregulares.
6. Também preciosa a anotação de Carlos Góis e Herbert Palhano no
sentido de que, em verbos com essa terminação, “é erro grave escrever
no infinitivo ‘eiar’” (1963, p. 112).
7. Em mesma direção é o ensino de Otoniel Mota, para quem é errôneo em
português escrever passeiar, guerreiar, “porque não há um sufixo verbal
eiar, mas ear” (1916, p. 68).
8. Quanto à regência verbal, é de se ver que, numa frase como “O
governador nomeou-o comandante”, podem-se estabelecer as seguintes
funções sintáticas: a) O governador é o sujeito; b) o é o objeto direto; c)
comandante é o predicativo do objeto direto.
9. Com tal verbo, o predicativo do objeto direto pode vir sem preposição ou
com a preposição por ou para, motivo por que são corretos os três
seguintes exemplos: a) “O governador nomeou-o comandante”; b) “O
governador nomeou-o por comandante”; c) “O governador nomeou-o
para comandante” (BARRETO, 1954b, p. 197).
10. Celso Pedro Luft admite-lhe a construção com a preposição como: “Foi
nomeado como Pai dos Pobres” (1999, p. 378).
11. Francisco Fernandes (1971, p. 434) acrescenta a possibilidade de sua
sintaxe com a preposição em: “Não quis nomeá-lo em presidente da
seção” (Sandoval).
Ver Como sendo – Está correto? (P. 198) e Julgar (P. 435).
Nomeou-o depositário ou Nomeou-lhe depositário?
1. Uma leitora indaga qual das duas expressões está correta: “Nomeio-o
depositário” ou “Nomeio-lhe depositário”?
2. Quanto à regência verbal, é de se ver que, numa frase como “O
governador nomeou-o comandante”, podem-se estabelecer as seguintes
funções sintáticas: a) O governador é o sujeito; b) o é o objeto direto; c)
comandante é o predicativo do objeto direto.
3. Com tal verbo, o predicativo do objeto direto pode vir sem preposição ou
com a preposição por ou para, motivo por que são corretos os três
seguintes exemplos: a) “O governador nomeou-o comandante”; b) “O
governador nomeou-o por comandante”; c) “O governador nomeou-o
para comandante” (BARRETO, 1954b, p. 197).
4. Celso Pedro Luft admite-lhe a construção com a preposição acidental
como: “Foi nomeado como Pai dos Pobres” (1999, p. 378).
5. Francisco Fernandes (1971, p. 434) acrescenta a possibilidade de sua
sintaxe com a preposição em: “Não quis nomeá-lo em presidente da
seção” (Sandoval).
6. Como se pode ver, os estudiosos do assunto, nesse sentido de qualificar
ou considerar, admitem, então, as seguintes construções: a) objeto sem
preposição + complemento sem preposição; b) objeto sem preposição +
complemento com a preposição acidental como; c) objeto sem
preposição + complemento com a preposição por; d) objeto sem
preposição + complemento com a preposição para; e) objeto sem
preposição + complemento com a preposição em.
7. Desse modo, estão corretos os seguintes exemplos: a) “O juiz nomeou o
advogado síndico da falência”; b) “O juiz nomeou o advogado como
síndico da falência”; c) “O juiz nomeou o advogado por síndico da
falência”; d) “O juiz nomeou o advogado para síndico da falência”; e)
“O juiz nomeou o advogado em síndico da falência”. Mas em nenhum
dos casos se admite a construção “O juiz nomeou ao advogado…”
8. Ante essas considerações, com a forçosa observação de que o objeto,
nesses casos, pode ser direto, mas não indireto, estão corretas as
seguintes formas quanto ao exemplo trazido pela leitora: a) “Nomeio-o
depositário”; b) “Nomeio-o como depositário”; c) “Nomeio-o por
depositário”; d) “Nomeio-o para depositário”; e) “Nomeio-o em
depositário”.
9. Exatamente porque o objeto pode ser direto, mas não indireto, estão
errados os seguintes exemplos: a) “Nomeio-lhe depositário”; b)
“Nomeio-lhe como depositário”; c) “Nomeio-lhe por depositário”; d)
“Nomeio-lhe para depositário”; e) “Nomeio-lhe em depositário”.
Nomes compostos
Ver Substantivos compostos – Como levar ao plural? (P. 717)
Nomes comuns
Ver Maiúsculas (P. 455).
Nomes de família
Ver Grafia de nomes próprios (P. 376) e Plural de nomes próprios –
Existe? (P. 566)
Nomes de meses
Ver Datas (P. 250).
Nomes de pessoas
Ver Grafia de nomes próprios (P. 376).
Nomes estrangeiros
Ver Plural de nomes estrangeiros – Existe? (P. 566)
Nomes plurais
1. Há determinados substantivos comuns que são apenas usados em sua
forma plural, como, por exemplo, arras, exéquias, óculos.
2. Com eles, é preciso atentar a concordância verbal, porque, se estão na
função sintática de sujeito, sempre levam o verbo para o plural: “Meus
óculos caíram e se quebraram”.
3. É errônea, assim, a forma: “Meu óculos caiu e se quebrou”.
4. Interessante observar-se o caso do vocábulo anais, utilizado somente na
forma plural como substantivo sinônimo de registros, mas flexionado
normalmente como sinônimo de cerimônia realizada ao longo de um
ano ou como adjetivo.
Nomes próprios
Ver Grafia de nomes próprios (P. 376).
Nomes próprios personativos
Ver Plural de nomes próprios – Existe? (P. 566)
No que
Ver O de que – Está correto? (P. 517)
Norma culta
1. Em termos históricos, após um período fonético da grafia das palavras
(da fase inicial da língua até a metade do século XVI) e outro período
pseudoetimológico (marcado pelo eruditismo do período entre os séculos
XVI e XVIII, em que se inventavam símbolos extravagantes e se
duplicavam as consoantes intervocálicas, a pretexto de uma aproximação
artificial com o grego e o latim, em critério pretensioso, que contrariava
a própria evolução das palavras), adveio um terceiro período, marcado
pela renovação dos estudos linguísticos em Portugal, época em que surge
Gonçalves Viana. Este, após “algumas tentativas, consegue apresentar
um sistema racional de grafia, com base na história da língua”,
apresentando em 1904 sua Ortografia Nacional, obra que serviu de
roteiro à comissão de filólogos encarregada pelo governo português, em
1911, de elaborar um novo sistema ortográfico, que foi oficializado em
setembro do mesmo ano e adotado também em nosso país em 1931, por
acordo entre a Academia das Ciências de Lisboa e a Academia Brasileira
de Letras, com aprovação de ambos os governos. Após alterações nesse
sistema, foi elaborado pela Academia Brasileira de Letras, com base no
Formulário Ortográfico, com aprovação da Academia das Ciências de
Lisboa, o Pequeno Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa,
oficializado no Brasil em 1943 e revigorado pelo Congresso Nacional
em 1955, por intermédio da Lei 2.623, de 21/10/55 (TORRES, 1966, p.
225-6).
2. Pode-se dizer, em termos bem práticos, que o Vocabulário Ortográfico
da Língua Portuguesa é, assim, uma espécie de dicionário que lista as
palavras reconhecidas oficialmente como pertencentes à língua
portuguesa, bem como lhes fornece a grafia oficial.
3. Também conhecido pela sigla VOLP, seu objetivo é reconhecer a
existência e consolidar a grafia dos vocábulos, além de classificá-los
pelo gênero (masculino ou feminino) e categoria morfológica
(substantivo, adjetivo…), e, eventualmente, especificar-lhes a pronúncia,
ou mesmo outras peculiaridades de interesse.
4. Difere dos dicionários convencionais, por não explicar usualmente o
significado dos termos que registra.
5. É elaborado pela Academia Brasileira de Letras, que tem a
responsabilidade legal de editá-lo, em cumprimento à vetusta Lei
Eduardo Ramos, de n. 726, de 8/12/1900.
6. As primeiras instruções para sua efetiva organização vieram com o
Formulário Ortográfico, e foram aprovadas unanimemente pela
Academia Brasileira de Letras, na sessão de 12/8/43 (mais tarde,
modificadas pela Lei 5.765, de 18/12/71). Anote-se que “essas
instruções tiveram por base o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia das Ciências de Lisboa, edição de 1940”
(2000, p. 231).
7. A tais instruções, juntaram-se as diretrizes mais recentes da Lei 5.765,
de 18/12/71, cujo art. 2º assim determinou: “A Academia Brasileira de
Letras promoverá, dentro do prazo de dois anos, a atualização do
Vocabulário Comum, a organização do Vocabulário Onomástico e a
republicação do Pequeno Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa
nos termos da presente lei”.
8. Em sua edição de setembro de 1998, o VOLP incorporou à língua
aproximadamente 6.000 termos às 350.000 palavras já reconhecidas, em
geral relativos ao desenvolvimento científico e tecnológico, figurando
entre as novidades diversos termos de Informática. Essa postura vem-se
repetindo, em mesmos moldes, nas edições subsequentes.
9. Oportuno é reiterar que, incumbido por lei específica para sua
confecção, quem o elabora goza de autoridade para, nesse campo, dizer
o Direito, motivo por que, ao consultá-lo, legem habemus e devemos
prestar-lhe obediência, como devemos fazer com respeito aos demais
diplomas legais.
10. Em comunhão com esse pensamento, José de Nicola e Ernani Terra
afirmam que esse vocabulário “é a palavra oficial sobre a ortografia das
palavras da língua portuguesa no Brasil” (2000, p. 231), e não se pode
olvidar que também é a palavra oficial no que concerne à própria
existência dos vocábulos em nosso idioma.
11. Reitere-se: a Academia Brasileira de Letras, quando edita normas sobre
questões de sua competência, age por delegação legal do Congresso
Nacional, de modo que suas determinações são, em última análise,
normas jurídicas, e não meras normas técnicas da arte da comunicação;
são determinações a serem obedecidas, e não apenas conselhos, de
modo que ao usuário cumpre apenas acatar.
12. Veja-se bem: o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa é
palavra oficial sobre a existência, a pronúncia, a categoria gramatical, o
gênero e a grafia dos vocábulos. Assim, se não registra desproceder,
improver e inacolber, só se pode concluir que tais palavras não existem
em nosso léxico e, assim, não devem ser usadas. Se diz que adrede
deve ser pronunciada com o som fechado, não há como fazê-la soar de
modo diverso. Se diz que adrede e amiúde são advérbios, não há como
aceitar adredemente ou amiudemente, já que advérbios vêm de
adjetivos, não de outros advérbios. Se diz que cônjuge pode pertencer
ao masculino ou ao feminino, não há como condenar o emprego de o
cônjuge ou de a cônjuge. Se a Lei 5.765, de 18/12/71, dizia que o único
acento diferencial de timbre que perdurava era o que se usa em pôde
(pretérito perfeito) para diferenciar de pode (presente do indicativo),
não havia como pretender grafar fôrma, como fazia, por exemplo, o
Dicionário Aurélio. Qualquer divergência, discussão ou polêmica,
aqui, só pode perdurar no campo da doutrina, da ciência e de lege
ferenda, como subsídios para futuras modificações. Não mais do que
isso.
13. Mas não é só: se, com o advento do Acordo Ortográfico de 2008,
inclusive o que negava em edição anterior, só cabe acatar a nova
decisão legal. Veja-se, na prática: acolheu, de forma optativa, outros
dois casos de emprego do acento diferencial de timbre, incluindo o
vocábulo fôrma. Diz textualmente o Acordo: “Assinalam-se com
acento circunflexo: (…) b) Facultativamente, dêmos (1ª pessoa do
plural do presente do conjuntivo), para se distinguir da correspondente
forma do pretérito perfeito do indicativo (demos); fôrma (substantivo),
distinta de forma (substantivo; 3ª pessoa do singular do presente do
indicativo ou 2ª pessoa do singular do imperativo do verbo formar).
14. Já quanto aos aspectos de construção ou sintaxe (concordância
nominal, concordância verbal, regência nominal, regência verbal,
crase, colocação de pronomes), a autoridade fica com os autores que
cultuaram e cultuam o idioma, em cujo rol raramente se incluem os
modernistas, os quais, em busca de maior comunicação, passaram a
incorporar em seus escritos uma linguagem coloquial, plebeísmos e
equívocos gramaticais; a norma culta, nesse aspecto, encontra-se hoje
sedimentada nos bons livros de Gramática.
15. No que respeita à pontuação, observa-se que apenas a partir da década
de cinquenta do século XX, tomou significativo impulso e passou a
orientar-se – além das razões sintáticas tradicionais e dos impulsos
subjetivos – pelas recomendações e exigências mais apuradas da
redação técnica, o que faz concluir que os chamados clássicos de nossa
literatura nem sempre lhe atribuíram posição de relevo, e, assim, não é
incomum encontrar, mesmo em abalizados escritores, exemplos de
inadequação, nesse campo. Os livros de Gramática, ademais, pouco
trazem a esse respeito, sobretudo no que concerne ao uso da vírgula.
16. Se o usuário do idioma tiver que se expressar pela língua falada ou
escrita, em sua atividade profissional ou científica, é obrigatório que se
valha da norma culta, a cujo respeito podem ser fixados, em resumo, os
seguintes aspectos: a) a norma culta é o nível formal de expressão do
idioma, própria de todos os que assim devem expressar-se, sendo uma
só para todos os usuários; b) eventual vocabulário típico de certa gama
de usuários não faz nascer uma norma culta própria de determinada
categoria profissional, até porque seria impensável entender pela
existência de uma linguagem formal que fosse correta para uns e não
para outros; c) o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa é a
palavra oficial sobre a existência, a pronúncia, a categoria gramatical, o
gênero e a grafia dos vocábulos em nosso idioma, além de outras
peculiaridades; d) quanto aos aspectos de construção ou sintaxe, a
norma culta encontra-se, hoje, sedimentada nos bons livros de
Gramática.
Norrau – Existe?
Ver Know-how ou Norrau? (P. 441)
Nota de rodapé
Ver Obra com dois autores (P. 512).
Notário
Ver Tabelião (P. 724).
Notificação
1. Em sentido amplo, trata-se de vocábulo empregado para designar “o ato
judicial escrito, emanado do juiz, pelo qual se dá conhecimento a uma
pessoa de alguma coisa, ou de algum fato, que também é de seu
interesse, a fim de que possa usar das medidas legais ou das
prerrogativas, que lhe sejam asseguradas por lei” (DE PLÁCIDO E
SILVA, 1989, p. 253).
2. Não confundir com citação ou intimação, atos processuais a ela
assemelhados, mas totalmente diversos em natureza.
3. Quanto a seu emprego, é comum ver, nos meios forenses, o uso
equivocado de expressões como procedida a citação, procedida a
intimação, procedido o inventário, procedida a notificação, procedida a
penhora.
Ver Proceder (P. 601), Procedeu-se aos inventários ou Procederam-se aos
inventários? (P. 601) e Voz passiva – Quando é possível? (P. 793)
Notificar
1. Quanto à regência verbal, tanto a coisa quanto a pessoa podem ser,
indiferentemente, objeto direto ou objeto indireto.
2. O que não pode ocorrer é a existência simultânea, em mesma frase, de
dois objetos diretos ou de dois objetos indiretos.
3. Por isso, são corretas as duas construções seguintes: a) “Notificou o
Corregedor do que estava ocorrendo”; b) “Notificou ao Corregedor o
que estava ocorrendo”.
4. Não são, todavia, corretas, as seguintes estruturas: a) “Notificaram o
Corregedor o que estava ocorrendo”; b) “Notificou ao Corregedor do
que estava ocorrendo”.
5. Essas duas últimas frases são errôneas, porquanto a primeira tem dois
objetos diretos, e a segunda, dois objetos indiretos.
6. De igual modo e pelas mesmas razões, são errôneas: a) “Notificá-lo
que…”; b) “Notificar-lhe de que…” (NASCIMENTO, 1982, p. 154).
7. Celso Pedro Luft (1999, p. 378-9) sintetiza as duas possibilidades de
construção, resumindo com os modelos: a) notificar algo a alguém; b)
notificar alguém de algo.
8. Também seguem a mesma construção os verbos aconselhar, certificar,
informar, prevenir.
9. No âmbito do direito, em sentido amplo, “é empregado para designar o
ato judicial escrito, a mando do juiz, pelo qual se dá conhecimento a uma
pessoa de alguma coisa, ou de algum fato, que também é de seu
interesse, a fim de que possa usar das medidas legais ou das
prerrogativas que lhe sejam asseguradas por lei” (DE PLÁCIDO E
SILVA, 1989, p. 253).
10. Nos textos legais, empregado no sentido de comunicar, avisar, dar
conhecimento ou ciência de um ato judicial, tal verbo aparece, quanto à
regência verbal, com variada construção: com objeto direto (que, pelas
normais regras de transformação, pode ser sujeito na voz passiva), com
objeto direto (eventualmente sujeito na voz passiva) de pessoa mais
objeto indireto de coisa, regido este pela preposição de (notificar
alguém de algo), com objeto direto (possível sujeito na voz passiva) de
coisa e objeto indireto de pessoa, regido pela preposição a (notificar
algo a alguém), com objeto direto de pessoa mais a preposição para
(notificar alguém para ou a fim de que). Exs.: a) “O reclamante será
notificado no ato da apresentação da reclamação…” (CLT, 841, § 2º);
b) “Para poder exercitar o direito, que da evicção lhe resulta, o
adquirente notificará do litígio o alienante, quando e como lho
determinarem as leis do processo” (CC/1916, art. 1.116, e CC/2002,
art. 456, caput); c) “Por ocasião do respectivo lançamento, cada
contribuinte deverá ser notificado do montante da contribuição…”
(CTN, art. 82, § 2º); d) “Ao defensor oficiosamente nomeado será
notificada a nomeação, quando não estiver presente no ato dela” (CPP
português, art. 24º); e) “O advogado poderá, a qualquer tempo,
renunciar ao mandato, notificando o mandante, a fim de que lhe
nomeie sucessor…” (CPC/1973, art. 45).
11. Não apresenta problemas quanto à conjugação verbal, a não ser no
aspecto de que troca o c do fim do radical por qu antes de e: notifico,
notifique.
Ver Notificação (P. 503).
Noves fora
1. Josué Machado anota que, na substantivação, não há motivo para
abandonar os numerais sem flexão para o plural. Exs.: a) “As eleições
dos anos noventas serão diferentes com as urnas eletrônicas”; b) “Os
ladrões do Congresso transformavam cincos em cinquentas”; c) “Os
noves do baralho foram marcados”.
2. Excepciona tal autor, porém, que “só não se flexionam em número os
numerais cardinais terminados em s (dois, três, seis, dezesseis), em z
(dez) e mil” (MACHADO, 1994, p. 71).
3. De Vitório Bergo (1943, p. 191) também é a lição de que as palavras
substantivadas seguem geralmente as regras normais de flexão para o
plural, segundo a sua terminação, como é o caso de os noves.
4. Para Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 285), por um lado, “numerais
substantivados terminados por fonema vocálico formam o plural como
os substantivos: dois uns, quatro setes, prova dos noves fora, dois cens”;
por outro lado, ficam invariáveis os que finalizam por fonema
consonantal: “No teste, João tirou quatro seis e dois dez”.
Nubente
1. Derivado do latim nubens, de nubere (casar-se), trata-se de vocábulo na
terminologia jurídica, no mesmo sentido de noivo, para designar a
pessoa que está comprometida em casamento com outra.
2. Por sua própria etimologia, para De Plácido e Silva, “nubentes serão até
que, afirmando sua vontade de se tornarem marido e mulher, perante o
juiz oficiante do casamento, este os declara, em nome da lei, marido e
mulher” (1989, p. 258).
3. Em termos de Gramática, é comum de dois, vale dizer (SILVA, A., 1958,
p. 81), “é masculino ou feminino, conforme o sexo da pessoa: o nubente
(homem) e a nubente (mulher)”.
4. Trata-se de termo de uso frequente em nossa legislação, como se pode
verificar pela leitura dos capítulos do Código Civil que tratam do
casamento.
Ver Cônjuge – Comum de dois ou Sobrecomum? (P. 218) e Consorte (P.
222).
Número fracionário
1. Com frequência, o sujeito de uma oração é constituído por número
fracionário, o que acarreta problemas quanto à concordância verbal.
2. Em tais casos, como lembra Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 206), a
concordância é normal, vale dizer, deve dar-se com o próprio número
indicador da fração, que acaba sendo o núcleo do sujeito. Exs.: a) “Um
quarto dos bens cabe ao menor”; b) “Dois quartos da herança cabem ao
menor”; c) “No sistema político alemão, um terço dos senadores é
nomeado; dois terços são eleitos pelo povo”.
3. Arnaldo Niskier sintetiza a questão de modo prático: “um quinto, um
terço, um quarto, etc. – verbo no singular; dois quintos, três oitavos,
cinco décimos, etc. – verbo no plural” (1992, p. 97).
4. Na conformidade com lição de Domingos Paschoal Cegalla (1999, p.
404), “quando o sujeito é numeral fracionário, a concordância do verbo
se efetua normalmente com o numerador”. Exs.: a) “Um terço dos
funcionários recebeu aviso de dispensa”; b) “Dois terços dos
trabalhadores foram readmitidos pela empresa”.
5. Em outra passagem, contudo, complementa o mesmo autor (CEGALLA,
1999, p. 285): “todavia, parece-nos lícito usar o verbo no plural, quando
o número fracionário, seguido de substantivo plural, tem o numerador
um”. Ex.: “Um quinto dos homens eram de cor escura”.
6. Em tal permissão levantada pelo referido gramático, parece haver uma
analogia com os casos de coletivo seguido de termo especificador, em
que o verbo fica, optativamente, no singular ou no plural, lição essa
perfeitamente aplicável ao caso concreto, quando o numerador é
singular, de modo que estão igualmente corretas as seguintes
construções: a) “Um quarto dos bens cabe ao menor”; b) “Um quarto
dos bens cabem ao menor”.
7. Se, porém, não houver termo especificador, a concordância se fará com o
numeral fracionário. Exs.: a) “Um terço foi cancelado”; b) “Dois terços
foram cancelados”.
Ver também Porcentagem ou Percentagem? (P. 575) e Por cento – Como
concordar o verbo? (P. 576)
Nu-proprietário
1. No que diz respeito aos dispositivos legais, vejam-se dois aspectos
importantes: a) pela lei, “o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e
dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que
injustamente a possua ou detenha” (CC, art. 1.228, caput); b) por outro
lado, em disposição legal não repetida pela codificação em vigor, mas
com elementos integralmente válidos na atualidade, “quando todos os
seus direitos elementares se acham reunidos” na pessoa do proprietário,
“é plena a propriedade”; em caso contrário, a propriedade será limitada
(CC/1916, art. 525).
2. No caso do usufruto, por exemplo, o direito de usar e gozar dos bens se
desloca para a pessoa do usufrutuário, e fica ao proprietário, ainda que
temporariamente, apenas o direito de dispor deles, de modo que, sendo
ele um proprietário despido de alguns dos poderes inerentes ao domínio,
chama-se, tecnicamente, nu-proprietário.
3. Assim, nu-proprietário é aquele que tem a propriedade que não é plena,
que está despojado ou despido do gozo da coisa, tendo o que, no Direito
Romano, se conhecia como a nuda proprietas (DE PLÁCIDO E SILVA,
1989, p. 258).
4. A grafia de tal vocábulo se dá com hífen, como registra o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
que é o veículo oficial ordenador do modo de grafar as palavras em
nosso idioma (2009, p. 588).
5. Quanto à flexão de nu-proprietário para o feminino ou para o plural,
Antonio Henriques manda variar “só o último elemento. Daí: nu-
proprietário; nu-proprietários; nu-proprietária; nu-proprietárias” (1999,
p. 121).
6. Em mesma esteira, Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 209-10) vê
em tal expressão tão somente um adjetivo composto e, quanto à flexão,
manda dizer nu-proprietária e nu-proprietários.
7. Uma análise acurada da realidade efetiva, todavia, revela que tal
vocábulo pode ser um adjetivo composto ou um substantivo composto,
conforme a situação: a) “O nu-proprietário vendeu seus direitos sobre o
imóvel” (substantivo composto); b) “O casal nu-proprietário vendeu
seus direitos sobre o imóvel” (adjetivo composto).
8. E, porque a expressão nu-proprietário às vezes é um substantivo
composto e às vezes é um adjetivo composto, então o melhor é observar
as específicas regras de flexão aplicáveis a um e a outro.
9. Assim, quando se trata de um substantivo composto – como na frase “O
nu-proprietário vendeu seus direitos sobre o imóvel”, em que ambos os
elementos são variáveis (nu é adjetivo, e proprietário é substantivo) –
então se aplica a regra de flexão dos substantivos compostos segundo a
qual cada elemento individualmente variável sofre sua normal flexão
para o feminino ou para o plural, não importando seja ele o primeiro ou
o segundo elemento do substantivo composto (o nu-proprietário, a nua-
proprietária, os nus-proprietários, as nuas-proprietárias), a exemplo de
pública-forma (cujo plural é públicas-formas).
10. Quando, porém, é um adjetivo composto – como na frase “O casal nu-
proprietário vendeu seus direitos sobre o imóvel” – então se aplica a
regra de flexão dos adjetivos compostos, segundo a qual o primeiro
elemento é sempre invariável, e o segundo só varia para o plural ou
feminino, quando ele próprio é um adjetivo (casal nu-proprietário,
pessoa nu-proprietária, casais nu-proprietários, pessoas nu-
proprietárias).
11. Nessa esteira, veja-se a correção do Dicionário Houaiss, o qual, para o
substantivo nu-proprietário, registra o plural nus-proprietários
(HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 2.037).
12. Tal solução não é artificiosa, e seu acerto pode ser percebido, quando
se compara a questão aqui analisada com a flexão do vocábulo surdo-
mudo, com o qual guarda certa similitude, já que este último também
pode às vezes ser um substantivo composto e às vezes um adjetivo
composto.
13. Pois bem: Sousa e Silva, discutindo o problema de surdo-mudo, não
partilha do entendimento de alguns escritores, que têm laborado no
engano “de aplicar ao adjetivo as flexões do substantivo” (no caso ora
discutido a questão é inversa, pois se intenta aplicar ao substantivo as
flexões do adjetivo).
14. Bem por isso, doutrina tal gramático, em lição perfeitamente amoldável
ao caso concreto: a) “Empregado como substantivo, faz no plural
masculino surdos-mudos; no singular feminino, surda-muda; no plural
feminino, surdas-mudas”; b) “Como adjetivo, conserva inalterado o
primeiro elemento: meninos surdo-mudos, criança surdo-muda,
operárias surdo-mudas”.
15. Vale dizer (SILVA, A., 1958, p. 289): a) como adjetivo, conserva nu-
proprietário inalterado o primeiro elemento (casal nu-proprietário,
pessoa nu-proprietária, casais nu-proprietários, pessoas nu-
proprietárias); b) como substantivo, entretanto, já que seus elementos
componentes são variáveis, ambos sofrem sua normal flexão para o
feminino ou para o plural (o nu-proprietário, a nua-proprietária, os
nus-proprietários, as nuas-proprietárias).
16. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa não é claro a esse
respeito e, assim, não elimina as dúvidas, uma vez que: a) explicita a
possibilidade de seu emprego como substantivo e como adjetivo; b) dá
como plural apenas nus-proprietários; c) mas não especifica se tal
plural abrange o substantivo e o adjetivo, ou se se aplica apenas a um
deles (VOLP, 2009, p. 588). Parece salutar, na prática, seguir as
instruções anteriormente postas neste verbete.
Ver Adjetivos compostos (P. 81) e Substantivos compostos – Como levar
ao plural? (P. 717)
O
Obcecação, Obceção ou Obsessão?
1. Obcecação é o substantivo que significa o ato de obcecar, de turvar o
entendimento. Ex.: “Ele nada mais enxergava, numa obcecação própria
do fanatismo”.
2. Seu verbo é obcecar, bem com esse sentido de turvar o entendimento.
Ex.: “Obcecava-o a ideia de perder o amor da vítima para o desafeto”.
3. Já obsessão tem o sentido de ideia fixa, mania. Ex.: “Sua obsessão era
conseguir tirar a vida de seu desafeto”.
4. Não existe a forma obceção, que alguns grafam por contaminação do
vocábulo obsessão.
Obcecar
Ver Obcecação, Obceção ou Obsessão? (P. 510)
Obedecer
1. É verbo de posição peculiar no que concerne à regência verbal.
2. Na atualidade, é exclusivamente transitivo indireto e admite lhe como
complemento. Exs.: a) “O magistrado obedece ao ordenamento
jurídico”; b) “O magistrado obedece-lhe”.
3. Buscando-lhe a origem, assevera Otoniel Mota (1916, p. 221) que esse
verbo é transitivo indireto em português, assim como o era em latim, em
que regia o caso dativo.
4. De acordo com Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade
(1999, p. 99), ele “oscilava entre o objeto direto e o indireto, na época
quinhentista”, mas “prevalece, na linguagem literária moderna, o objeto
indireto… Por tal razão é que se explica a construção passiva: a lei é
obedecida”.
5. Por essa oscilação em séculos passados, época em que se lhe admitia a
construção como transitivo direto, é que, nos dias de hoje, constitui tal
verbo exceção à regra de que só tem voz passiva um verbo transitivo
direto, já que ele, embora transitivo indireto, pode ser usado na voz
passiva. Ex.: “O ordenamento jurídico é obedecido pelo magistrado”.
6. Nessa esteira, Amini Boainain Hauy (1983, p. 180), em interessante
monografia, corrobora o entendimento de que, no Português atual, o
verbo obedecer constrói-se “na voz ativa com objeto indireto de pessoa”,
mas admite voz passiva.
7. Francisco Fernandes (1971, p. 436), abonando-se com exemplos de
importantes autores, explicita que a estruturação desse verbo com voz
passiva “é construção universalmente aceita”: a) “A ordem foi
obedecida” (Eduardo Carlos Pereira); b) “Fazem com que sejam
obedecidas as leis” (Mário Barreto).
8. Aires da Mata Machado Filho (1969a, p. 599) reitera o entendimento de
que tal forma passiva fixou-se em época histórica em que o verbo era
usado como transitivo direto, do que adveio “a aparente contradição” de
ter voz passiva um verbo atualmente transitivo indireto.
9. No que tange aos textos de lei, por um lado, dá-se a observância normal
de sua regência como transitivo indireto; por outro lado, em diversas
passagens, apresenta-se construído na voz passiva. Exs.: a) “… caso em
que a homologação produzirá efeitos imediatos, obedecidas as
condições estabelecidas para a eficácia das sentenças estrangeiras no
País…” (LICC, art. 7º, § 6º); b) “Se não for obedecido imediatamente, o
executor convocará duas testemunhas e, sendo dia, entrará à força na
casa, arrombando as portas, se preciso…” (CPP, art. 392); c) “…
obedecidas as disposições estabelecidas na lei e nos seus estatutos”
(CLT, art. 549); d) “… obedecidas as seguintes regras, na ordem em que
enumeradas…” (CTN, art. 163).
Ver Agente da passiva (P. 97), Ser nascido – Está correto? (P. 694) e Voz
passiva sintética (P. 794).
Obeso
1. Cândido de Oliveira (1961, p. 34) lembra, quanto à pronúncia, que a
sílaba tônica desse vocábulo tem timbre aberto (bé).
2. Também de acordo com lição de Cândido de Oliveira (s/d, p. 109 e 129),
“a boa pronúncia é com é aberto (rima com eu peço)”.
3. Manda, de igual modo, Luís A. P. Vitória (1969, p. 175) “pronunciar e
aberto (obéso)”.
4. Não é outra a lição de Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 288), para
quem “a pronúncia correta, porém pouco seguida, é obéso, com o e
aberto”, lembrando tal gramático que “a pronúncia obêso deve-se
provavelmente à influência de outras palavras, em sua maioria com o e
tônico fechado: aceso, indefeso, peso, preso, surpreso, etc.”.
5. Espancando dúvidas, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa,
da Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de
determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma, além de sua
grafia oficial, e, eventualmente, sua pronúncia, registra a possibilidade
de ambas as pronúncias: com e fechado (ê) ou com o e aberto (é) (2009,
p. 589), o que implica dizer que ambas as pronúncias estão oficialmente
autorizadas.
Objeto(s) do contrato
1. Vale a pena observar uma expressão bastante corriqueira em textos
jurídicos e forenses, verificando quais são corretas entre estruturas como
as que seguem: a) “… serviços objeto do contrato…”; b) “… serviços
objetos do contrato…”; c) “… matérias que foram objeto de
apreciação…”; d) “… matérias que foram objetos de apreciação…”?
2. Quando se tem uma estrutura com verbo de ligação, nos moldes dos
exemplos dados, e o sujeito é plural, o complemento (predicativo do
sujeito) pode ficar no singular ou no plural, independentemente de haver
alguma variação no sentido.. Exs.: a) “Os escândalos do Congresso
foram assunto do dia”; b) “Os escândalos do Congresso foram assuntos
do dia”; c) “Os novos produtos foram sucesso instantâneo”; d) “Os
novos produtos foram sucessos instantâneos”.
3. E, quando no predicativo do sujeito se tem o vocábulo alvo ou a palavra
objeto, a situação não se altera, de modo que são corretos todos os
exemplos a seguir: a) “As matérias foram alvo de apreciação”; b) “As
matérias foram alvos de apreciação”; c) “As matérias foram objeto de
apreciação”; d) “As matérias foram objetos de apreciação”.
4. Vamos estender um pouco mais os exemplos por último referidos, em
estruturas sintáticas igualmente corretas: a) “As matérias que foram alvo
de apreciação não foram publicadas”; b) “As matérias que foram alvos
de apreciação não foram publicadas”; c) “As matérias que foram objeto
de apreciação não foram publicadas”; d) “As matérias que foram
objetos de apreciação não foram publicadas”.
5. Nos exemplos por último citados, para não repetir o verbo ser
desnecessariamente, vamos excluí-los e ver que são também corretas as
estruturas resultantes: a) “As matérias alvo de apreciação não foram
publicadas”; b) “As matérias alvos de apreciação não foram
publicadas”; c) “As matérias objeto de apreciação não foram
publicadas”; d) “As matérias objetos de apreciação não foram
publicadas”.
6. Voltemos aos exemplos inicialmente dados: a) “… executar os serviços
objeto desse contrato” (correto); b) “… executar os serviços objetos
desse contrato” (correto); c) “… imóveis objeto do contrato…”
(correto); d) “… imóveis objetos do contrato…” (correto); e) “… as
matérias foram objeto de apreciação…” (correto); f) “… as matérias
foram objetos de apreciação” (correto).
Obrigado
1. Expressando gratidão, é palavra que deve ser observada do ponto de
vista da concordância nominal.
2. Para se entender a concordância, importante é atentar no sentido da
expressão: a pessoa a quem se presta um favor, ao agradecer, diz que se
sente obrigada a retribuí-lo.
3. Bem por isso, não importa a quem é manifestado o agradecimento; o que
efetivamente interessa é a pessoa que o manifesta, pois é com ela que tal
palavra concorda: assim, se é um homem que fala, diz ele muito
obrigado; se é mulher, muito obrigada; se vários são os homens,
expressando-se, por exemplo, num discurso, por meio de orador, diz-se
muito obrigados; se várias as mulheres, muito obrigadas.
4. Para resumir, precisa é a lição de Silveira Bueno, que sintetiza os
aspectos significativos do emprego de tal vocábulo: “A expressão de
agradecimento muito obrigado não passa de uma oração abreviada: Eu
lhe estou muito obrigado pelo favor que me fez – ou qualquer outra
semelhante. Como se vê, obrigado é adjetivo que está qualificando o
sujeito da oração. Ora, sabemos que todos os adjetivos concordam em
gênero e número com o substantivo a que se referem. Logo, se o sujeito
for masculino, dirá: muito obrigado. Mas se for feminino, há de dizer:
muito obrigada” (1938, p. 122).
5. Acrescente-se a lição de Júlio Nogueira quanto ao equívoco
normalmente cometido com tal vocábulo: “É incorreção peculiar ao belo
sexo. Uma senhora não deve dizer, como forma de agradecimento:
Obrigado!, mas obrigada! Nenhuma diria: Eu fico obrigado. Assim:
Obrigada! ou Obrigadas, se há mais de uma” (1959, p. 32).
6. A uma leitora de nome Adelaide – cuja esclarecida amiga teimava em
dizer muito obrigado – que lhe indagava se não seria melhor que tal
dama dissesse obrigada, assim respondia Cândido de Figueiredo: “Não
só é melhor, é o que é, se a tal amiga de Adelaide é realmente do sexo
feminino” (1948, p. 202).
7. Por fim, se, como já se observou, obrigado é uma oração abreviada e
significa “Eu estou obrigado pelo favor que me fez”, não menos verdade
é que, a um obrigado como esse, alguém pode replicar com outra forma
abreviada e correta (“Obrigado eu”), com o exato sentido de “Eu é que
me sinto obrigado”.
8. E, assim, vejam-se as variações: a) “Obrigado eu” (se do masculino e
quem fala); b) “Obrigada eu” (se do feminino é quem fala); c)
“Obrigados nós” (se do masculino plural é quem fala); d) “Obrigadas
nós” (se do feminino plural é quem fala).
9. Num aspecto adicional muito significativo, não se pode esquecer que as
palavras, em português, embora pertençam originariamente a outra
categoria gramatical, podem ser substantivadas, ou seja, podem tornar-se
um substantivo. Exs.: a) “Não quero ouvir um mas de sua parte” (mas,
normalmente, é uma conjunção); b) “Não me venha com um não” (não,
originariamente, é um advérbio).
10. Assim também se dá com a palavra obrigado, a qual, se substantivada,
não sofre as influências até agora anotadas quanto à concordância.
Exs.: a) “Ele disse um obrigado muito significativo”; b) “Ela disse um
obrigado muito significativo”; c) “Eles disseram um obrigado muito
significativo”; d) “Elas disseram um obrigado muito significativo”.
Ver De nada – Está correto? (P. 263) e Muitíssimo – Está correto? (P. 481)
Obrigava-o ou Obrigava-lhe?
1. Ante os corriqueiros equívocos de troca do pronome pessoal oblíquo
átono o pelo pronome lhe, vale a pena observar qual a forma correta: a)
“… apresentava a forma com que o prefeito tinha recebido a liminar que
o obrigava…”; b) “… apresentava a forma com que o prefeito tinha
recebido a liminar que lhe obrigava…”
2. Antes de entrar no mérito da questão, vamos considerar dois exemplos:
a) “O juiz silenciou”; b) “O juiz quebrou o sigilo bancário”.
3. No primeiro exemplo – “O juiz silenciou” – vê-se que o sujeito é o juiz,
enquanto o verbo indica a ação de silenciar; já no segundo exemplo – “O
juiz quebrou o sigilo bancário” – tem-se por sujeito o juiz, enquanto o
verbo indica a ação de quebrar.
4. Ora, no primeiro caso, quando se diz o sujeito (o juiz) mais o verbo
(silenciou), verifica-se que, numa análise bastante rudimentar e própria
para o que aqui é necessário, a ação estanca no verbo, não passa (ou não
transita) para além dele. Por isso se diz que se está diante de um verbo
intransitivo.
5. Já no segundo caso, quando se diz o sujeito (o juiz) mais o verbo
(quebrou), também em análise bastante simplista, nota-se que a ação
passa, vai (ou transita) para além do verbo. Por isso se diz que se está
diante de um verbo transitivo.
6. Adicione-se um terceiro exemplo: “O documento pertence aos autos”.
Nele se tem o sujeito (o documento) e um verbo (pertence), cuja ação
também passa (ou transita) para além do verbo, de modo que também
aqui se está diante de um verbo transitivo.
7. Considere-se, em seguida, novamente, o primeiro dos exemplos com
verbo transitivo: “O juiz quebrou o sigilo bancário”. Uma análise visual
mostra que o complemento, que é o alvo (ou objeto) da ação de quebrar,
está sem preposição obrigatória. O raciocínio a ser feito é que quem
quebra, quebra algo (o verbo exige complemento sem preposição
obrigatória). E se conclui que a ação de quebrar passa diretamente para o
complemento (ou alvo ou objeto), isto é, sem auxílio obrigatório de
preposição.
8. Em tal caso, extraem-se duas conclusões de extrema importância: a) O
que se tem é um verbo transitivo direto; b) O complemento desse verbo,
por sua vez, é um objeto direto.
9. Considere-se, em seguida, o segundo dos exemplos com verbo
transitivo: “O documento pertence aos autos”. O complemento, que é o
destinatário (ou objeto) da ação de pertencer, está com preposição
obrigatória. O raciocínio a ser feito é que aquilo que pertence, pertence a
algo ou a alguém. E se conclui que a ação de pertencer passa
indiretamente para o complemento (ou destinatário ou objeto), isto é,
com o auxílio obrigatório de preposição.
10. E aqui também se extraem duas conclusões de extrema importância: a)
Tem-se, no caso, um verbo transitivo indireto; b) O complemento, por
sua vez, é um objeto indireto.
11. Considere-se, por fim, um terceiro exemplo com verbo transitivo: “O
juiz entregou os autos ao advogado”. Uma atenta observação revela
que há dois complementos: os autos (alvo da ação de entregar) e ao
advogado (destinatário da ação de entregar). O raciocínio a ser feito é
que quem entrega, entrega algo (complemento sem preposição
obrigatória) a alguém (complemento com preposição obrigatória). E se
conclui que, no caso, a ação de entregar passa diretamente para um
complemento (alvo ou objeto), isto é, sem o auxílio obrigatório de
preposição, e também passa indiretamente para outro complemento
(destinatário ou objeto), isto é, com o auxílio obrigatório de preposição.
12. E aqui também se extraem duas conclusões de extrema importância: a)
Tem-se um verbo transitivo direto e indireto (alguns ainda o
denominam verbo bitransitivo); b) Há dois complementos do verbo:
um objeto direto (os autos) e um objeto indireto (ao advogado).
13. Com essas premissas, acrescenta-se que os pronomes pessoais oblíquos
átonos o, a, os e as funcionam como objetos diretos, enquanto os
pronomes lhe e lhes se destinam a ser objetos indiretos. Exs.: a) “O juiz
quebrou o sigilo bancário”; b) “O juiz quebrou-o”; c) “O documento
pertence aos autos”; d) “O documento pertence-lhes”; e) “O juiz
entregou os autos ao advogado”; f) “O juiz entregou-os ao advogado”;
g) “O juiz entregou os autos ao advogado”; h) “O juiz entregou-lhe os
autos”.
14. Sousa e Silva (1958, p. 168) aponta, com propriedade, ser comum,
embora errôneo, o emprego de lhe e lhes em lugar de o, a, os e as.
15. A frequência com que ocorrem erros dessa natureza faz com que
Arnaldo Niskier (1992, p. 51) teça a seguinte observação: “É um erro
muito comum a troca do pronome o (e variações) por lhe(s). Devemos
ter em mente que o (e variações) é utilizado como objeto direto
(conheço-o) e lhe(s) como objeto indireto (paguei-lhe cinco mil
cruzeiros)”.
16. Para quem tem dificuldade exatamente para reconhecer qual há de ser a
transitividade de um verbo em tal caso, é bom lembrar, em termos bem
práticos, que o verbo transitivo direto admite passagem para a voz
passiva, enquanto o transitivo indireto, por via de regra, não a admite.
17. Assim, o exemplo “O juiz quebrou o sigilo bancário” admite
transformação: “O sigilo bancário foi quebrado pelo juiz”. Já o
exemplo “O documento pertence aos autos” não admite passagem para
a voz passiva, o que é sinal inconfundível de que pertencer não é
transitivo direto.
18. Voltando ao exemplo inicialmente dado, vamos alterá-lo ligeiramente,
para conferir-lhe um sentido prático, que possibilite análise sintática
mais fácil: “A liminar obrigava o Prefeito ao silêncio”. O termo a ser
substituído pelo pronome, sem dúvida, é o Prefeito. Sem maiores
dificuldades, verifica-se que ele é objeto direto. Assim, a substituição
fica fácil: “A liminar obrigava-o ao silêncio”. Ou, em termos literais
para o caso da consulta: “…apresentava a forma com que o prefeito
tinha recebido a liminar que o obrigava…”
Ver O, Lhe e Dele? (P. 523) e Regência verbal (P. 651).
Obsceno
1. Quer dizer desonesto, aquilo que fere o pudor. Ex.: “O gesto obsceno
feito pelo réu durante o interrogatório não foi levado em consideração
pelo juiz”.
2. Atente-se a sua correta grafia, já que é palavra que costuma ser escrita de
modo equivocado.
Obstar
1. É certo que, por um lado, Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 222) defende
seja tal verbo construído tão somente com objeto indireto. Exs.: a) “A
vontade da parte não obsta ao exercício do direito”; b) “A medida
protelatória do réu não obsta a que seja executada a sentença”.
2. Vitório Bergo (1943, p. 212), de igual modo, apenas lhe aponta a
possibilidade de construção com objeto indireto.
3. E, postando-se contrariamente aos gramáticos que lhe aceitam a sintaxe
transitiva direta – nomeia, entre eles, Pedro A. Pinto e Artur de Almeida
Torres – observa Cândido Jucá Filho (1981, p. 88) que os exemplos
dados por tais autores “não são convincentes, porquanto casos como
‘Obstar a chegada’ podem ser erros tipográficos, faltando o sinal da
crase. Em ‘Cumpria-lhe obstar que…’ está omissa a preposição, o que é
normal. Em ‘Nada obsta que ele seja igualmente estripado’(Machado de
Assis), ‘que ele seja…’ é o sujeito. Exemplos de Alencar e Euclides da
Cunha não o são de vernaculidade. Passagens como esta são decisivas
(para configurar-lhe a natureza de transitivo indireto): ‘Para lhe
obstarem, oferecem matéria mais ampla’ (Herculano)”.
4. Referindo, todavia, de um lado, posicionamento de Mário Barreto, para
quem tal verbo é transitivo indireto e pede a preposição a, e, do outro,
Pedro A. Pinto, que lhe defende a construção como transitivo direto,
Artur de Almeida Torres (1967, p. 204-5), fundado em exemplos de
autores abalizados, assevera, de modo taxativo, que “obstar pertence à
classe dos verbos que, mantendo inalterável o sentido, pedem
indiferentemente objeto direto ou indireto”: a) “… do velho doutor
obstara o duelo” (José de Alencar); b) “Nada obstaria, pois, em boa
razão, a que indicássemos…” (Rui Barbosa).
5. Na lição de Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 291-2), por um lado,
“constrói-se, de preferência, com objeto indireto”; por outro lado, “se
bem que não constitua erro, é menos recomendável a regência direta…, a
qual se explica por influência do sinônimo impedir, que se constrói com
objeto direto”.
6. Sousa e Silva (1958, p. 193), lembrando que também pode ser
empregado intransitivamente (“Isso não obsta”), leciona, de igual modo,
que esse verbo “pode construir-se com a preposição a ou com objeto
direto: obstou ao contrato e obstou o contrato”.
7. Em indispensável obra, Francisco Fernandes (1971, p. 437) admite
também optativamente sua sintaxe como transitivo direto ou como
transitivo indireto: a) “A lembrança de tamanho obséquio não teve força
para obstar que ele viesse a público enxovalhar o cunhado” (Machado
de Assis); b) “Os costumes obstam a essas consequências extremas”
(Rui Barbosa).
8. Celso Pedro Luft tem o mesmo entendimento, para admitir
facultativamente ambas as estruturas, justificando: “A sintaxe originária
é transitiva indireta – obstar a, mas a influência de impedir trouxe
transitividade direta” (1999, p. 381-2).
9. Ante a divergência entre os gramáticos, aplica-se ao caso o vetusto
princípio de que, na dúvida, tem o usuário liberdade para ambos os
empregos.
10. Nos textos legais, obstar aparece às vezes construído com objeto direto
(que pode, eventualmente, ser sujeito na voz passiva), às vezes com
objeto indireto (com a preposição a), às vezes com objeto direto e com
objeto indireto, às vezes sendo o objeto indireto representado por
oração objetiva indireta. Exs.: a) “Não obsta à partilha o estar um ou
mais herdeiros na posse de certos bens do espólio…” (CC/1916, art.
1.772, § 2º); b) “Reputa-se verificada, quanto aos efeitos jurídicos, a
condição, cujo implemento for maliciosamente obstado pela parte, a
quem desfavorecer…” (CC, art. 129); c) “Não obsta à manutenção, ou
reintegração na posse, a alegação de propriedade, ou de outro direito
sobre a coisa…” (CC, art. 1.210, § 2º); d) “Estende-se ao possuidor o
disposto quanto ao devedor acerca das causas que obstam… a
prescrição…” (CC, art. 1.244); e) “A despedida que se verificar com o
fim de obstar ao empregado a aquisição de estabilidade sujeitará o
empregador a pagamento em dobro da indenização prescrita nos arts.
477 e 478” (CLT, art. 449, § 3º); f) “A desistência da ação, ou a
existência de qualquer causa que a extinga, não obsta ao
prosseguimento da reconvenção” (CPC/1973, art. 317); g) “… A
aprovação das contas do caixa dada pela maioria dos compartes do
navio não obsta a que a minoria dos sócios intente contra eles as ações
que julgar competentes…” (C. Com., art. 495).
Obstruir
1. Verbo empregado com frequência em textos jurídicos e forenses com o
sentido de estorvar, impedir. Ex. “O advogado obstruía, a cada passo, a
tramitação do processo”.
2. Apesar da semelhança, não se flexiona como construir, e, para
Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 292), “conjuga-se como a maioria
dos verbos terminados em –uir (possuir, influir, instruir, etc.)”,
observação essa da qual emerge a necessidade de fixação do presente do
indicativo e de seus tempos derivados.
3. Otelo Reis lhe dá por modelo o verbo restituir (1971, p. 132-3).
4. Desse modo: obstruo, obstruis, obstrui, obstruímos, obstruís, obstruem
(presente do indicativo); obstrua, obstruas, obstrua, obstruamos,
obstruais, obstruam (presente do subjuntivo); obstrui, obstrua,
obstruamos, obstruí, obstruam (imperativo afirmativo), não obstruas,
não obstrua, não obstruamos, não obstruais, não obstruam (imperativo
negativo).
5. Não traz dificuldades maiores de flexão nos demais tempos: obstruía
(imperfeito do indicativo); obstruirei (futuro do presente do indicativo);
obstruiria (futuro do pretérito do indicativo); obstruindo (gerúndio);
obstruído (particípio); obstruí (pretérito perfeito do indicativo);
obstruíra (pretérito mais-que-perfeito do indicativo); obstruir (futuro do
subjuntivo); obstruísse (imperfeito do subjuntivo).
Obter
Ver Ter (P. 730).
Óculos
Ver Nomes plurais (P. 499).
Odiar
1. Os verbos terminados em iar, quanto à conjugação verbal, normalmente
são verbos regulares e têm por modelo anunciar.
2. São exceções a essa regularidade de conjugação mediar, ansiar,
remediar, incendiar e odiar, que têm por modelo este último e são
conhecidos pela sigla MARIO.
3. Tais verbos da relação mencionada mudam o i da penúltima sílaba em ei
nas formas rizotônicas: odeio, odeias, odeia, odiamos, odiais, odeiam
(presente do indicativo); odeie, odeies, odeie, odiemos, odieis, odeiem
(presente do subjuntivo); odeia, odeie, odiemos, odiai, odeiem
(imperativo afirmativo); não odeies, não odeie, não odiemos, não odieis,
não odeiem (imperativo negativo).
4. Como as formas rizotônicas apenas ocorrem nos tempos já referidos, não
há preocupações com a flexão dos demais tempos.
5. Não confundir com os verbos terminados por ear, como nomear, o qual,
nesse aspecto, como todo verbo terminado por ear, recebe um i
intermediário nas formas rizotônicas: nomeio, nomeias, nomeia,
nomeamos, nomeais, nomeiam (presente do indicativo); nomeie,
nomeies, nomeie, nomeemos, nomeeis, nomeiem (presente do
subjuntivo); nomeia, nomeie, nomeemos, nomeai, nomeiem (imperativo
afirmativo); não nomeies, não nomeie, não nomeemos, não nomeeis, não
nomeiem (imperativo negativo).
6. Por oportuno, vale registrar a preciosa observação de Júlio Nogueira
(1959, p. 99): “Não há na língua um só verbo terminado em eiar. O que
há são verbos em ear e iar. Os primeiros, uniformemente, inserem um i
nas três pessoas do singular e na terceira do plural do presente do
indicativo, formas acentuadas no radical (rizotônicas)”; os segundos,
obviamente, são regulares, sem qualquer acréscimo ou alteração, com
exceção dos que são observados no presente verbete.
7. Também nesse sentido preciosa é a anotação de Carlos Góis e Herbert
Palhano de que, em verbos com essa terminação, “é erro grave escrever
no infinitivo eiar” (1963, p. 112).
8. De modo específico para o verbo odiar, vale sintetizar os problemas de
conjugação com as observações de Vitório Bergo: “recebe um e eufônico
nas formas rizotônicas, que só se manifestam no presente do indicativo e
do subjuntivo e, portanto, no imperativo” (1943, p. 142-3).
9. Não apresenta problemas maiores de regência verbal, já que, nos casos
mais comuns, é transitivo direto (FERNANDES, 1971, p. 439): a)
“Odiar alguém” (Constâncio); b) “Odiar a tirania” (Séguier).
Odontolando – Existe?
Ver Alimentando – Existe? (P. 105)
O Estado de S. Paulo
1. Quando nomes próprios dessa natureza – como o do mais que centenário
jornal, em que se nota a existência de um artigo inicial – vêm precedidos
de uma preposição, surge a dúvida de como proceder à grafia: do
Estado, dO Estado, de O Estado, no Estado, nO Estado, em O Estado. E,
ainda: em tais casos, usa-se o apóstrofo ou não?
2. Apesar de conter o próprio Manual de Redação e Estilo desse jornal, por
diversas vezes, expressões como no Estado de S. Paulo ou o estilo do
Estado de S. Paulo, lembra Arnaldo Niskier que “o correto é sempre em
O Estado de S. Paulo, em O Globo, e nunca no Globo, ou pior, nO
Globo” (1992, p. 31). Exs.: a) “Ele é assistente da direção de redação do
Estado…” (errado); b) “Ele é assistente da direção de redação de O
Estado…” (correto).
3. Para Laurinda Grion (s/d, p. 47), que parte da expressão em O Estado de
S. Paulo, “a preposição, no caso, em, não se junta ao artigo o, quando
este faz parte de nomes de revistas, obras literárias”, complementando
tal autora com exemplos significativos: a) “Harrison Ford atuou em ‘A
Testemunha’”; b) “A notícia foi publicada em O Globo”.
4. Desse mesmo teor é a lição de José de Nicola e Ernani Terra: “Não se
deve unir com a preposição o artigo que faz parte de nome de revistas,
jornais, obras literárias” (2000, p. 138).
O fato de o
Ver É hora da onça beber água ou É hora de a onça beber água? (P. 296) e
O fato de – Está correto? (P. 520)
Oficiala – Existe?
1. Assim como o feminino de juiz de direito é juíza de direito, não há, em
tese, razão alguma para se estranhar que, se a função de oficial de justiça
é desempenhada por uma mulher, será ela uma oficiala de justiça, a
exemplo de consulesa, coronela, delegada, deputada, generala,
marechala, ministra, paraninfa, prefeita, primeiraministra, sargenta,
vereadora.
2. Acrescente-se, por oportuno, que o feminino oficiala é assim apontado,
sem outras observações, ressalvas ou reservas, por Aurélio Buarque de
Holanda Ferreira (s/d, p. 992).
3. Também Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 215), de modo
categórico, assevera que esse sempre há de ser o feminino.
4. Em mesma esteira, posta-se Evanildo Bechara (1974, p. 84).
5. Domingos Paschoal Cegalla, sem outros comentários ou ressalvas, dá
oficiala como o único “feminino de oficial: oficiala de modista, oficiala
da Marinha” (1999, p. 294).
6. Cândido de Oliveira (1961, p. 133), após observar que, até há pouco, a
maioria de nomes dessa natureza era considerada comum de dois
gêneros, acrescenta textualmente que “é de lei, assim para o
funcionalismo federal como estadual, e de acordo com o bom senso
gramatical, que nomes designativos de cargos e funções tenham flexão:
uma forma para o masculino, outra para o feminino”; e, em seu
exemplário, ao masculino oficial contrapõe ele o feminino oficiala.
7. Silveira Bueno, por um lado, traz antigo ensinamento de J. Silva Correia,
diretor da Faculdade de Letras de Lisboa: “Nos últimos tempos têm
surgido numerosas formas femininas, que a língua de épocas não
distantes desconhecia, – e que são como que o reflexo filológico do
progresso masculinístico da mulher, – hoje com franco acesso a carreiras
liberais, donde outrora era sistematicamente excluída”.
8. Por outro lado, também aduz tal autor curiosa lição de Lebierre: “Os
gramáticos preceituam que os substantivos designativos de certas
profissões, a maior parte das vezes exercidas por homens, conservem a
forma masculina para a maioria de tais substantivos”.
9. E conclui ele próprio: “Os gramáticos, que defenderam a conservação,
no masculino, dos nomes de cargos outrora exercidos por homens e já
agora também por senhoras, não tinham razão porque tais nomes são
meros adjetivos como escriturário, secretário, deputado, senador,
prefeito, podendo concordar com o sexo da pessoa que tal cargo exerce e
não com o gênero dos nomes de tais profissões”.
10. E preconiza ele que se diga oficiala, se tal posto é entregue a uma
senhora, acrescentando que Camilo Castelo Branco emprega tal forma
para designar a costureira de modista (BUENO, 1957, p. 382-3).
11. Para que se avaliem as profundas alterações em tempo exíguo acerca
da ascensão profissional da mulher, com a consequente necessidade de
emprego de novos vocábulos, basta que se veja que, mesmo na segunda
metade do século XX, ainda lecionava Artur de Almeida Torres haver
“certos femininos que são meramente teóricos, e cujo conhecimento
não oferece nenhuma utilidade prática”, acrescentando tal autor que
“esses femininos só servem para sobrecarregar inutilmente a memória
do estudante”.
12. E, dentre tais substantivos inúteis, elenca ele (TORRES, 1966, p. 59),
por exemplo, capitoa (de capitão), aviatriz (de aviador) e anfitrioa (de
anfitrião).
13. Cândido Jucá Filho (1963, p. 452), por sua vez, muito embora sem
indicar preferência nem prestar outros esclarecimentos, ressalta que o
uso de oficiala às vezes é irônico.
14. Édison de Oliveira (s/d, p. 158) insere tal palavra entre aqueles
diversos vocábulos femininos terminados por a, que o povo evita usar,
“quer em virtude de preconceito de que se trata de funções ou
características próprias do homem, quer por considerá-los mal sonoros
ou exóticos”, acrescentando, ademais, que se hão de empregar tais
femininos, “que a gramática já ratificou definitivamente”.
15. Geraldo Amaral Arruda (1997, p. 36-7), por sua vez, inclui o
mencionado substantivo entre os comuns de dois gêneros, mandando
que sua variação se dê pela simples alteração do artigo (o oficial e a
oficial).
16. Em outra passagem, o mesmo autor obtempera que “melhor é a forma
oficial tanto no masculino como no feminino”, justificando que na
linguagem culta são muitos os substantivos com essa terminação que
“variam no gênero com a simples mudança do artigo e do adjetivo que
os modifiquem”.
17. Acrescenta ele que adjetivos dessa natureza – de segunda classe – em
latim, tinham uma mesma forma para o masculino e para o feminino, e,
ao se formar o substantivo de tal adjetivo, “surgia um substantivo
masculino ou feminino, conforme fosse masculino ou feminino o
substantivo suprimido no ato da substantivação”.
18. E conclui que “o mesmo processo perdurou no português”, razão pela
qual “também é melhor solução falar o oficial de justiça e, em se
tratando de mulher, a oficial de justiça”, sendo oficiala uma “solução
inferior” (ARRUDA, 1997, p. 145-6).
19. Por fim, é interessante anotar que, diferentemente de coronela,
generala, marechala e sargenta, não registra o feminino oficiala o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira
de Letras, que é o veículo oficial para dirimir dúvidas acerca da
existência ou não de vocábulos em nosso idioma; deixa, contudo, o
assunto sem solução, porque registra oficial apenas como masculino (e
não comum de dois gêneros), sem se manifestar acerca da forma
feminina que se há de usar (2009, p. 221, 399, 528, 592 e 743).
20. Ora, se não é comum de dois gêneros, seu feminino não pode ser a
oficial, de modo que se há de cair na regra comum de flexão de gênero,
formando-se, de modo correto, a oficiala.
Ver Capitã, Capitoa ou A Capitão? (P. 168) e Poeta – Qual o feminino? (P.
570)
Oficial de registros
Ver Tabelião (P. 724).
Oficiar o ou Oficiar ao?
1. Um leitor viu em algum lugar que “Alguém oficiou o General de
Brigada”. Como essa construção lhe incomodou os ouvidos, indaga se o
correto não seria “Alguém oficiou ao General de Brigada”.
2. Ora, como é correntio e sem divergências entre os estudiosos da matéria,
para a autoridade ou pessoa a quem se dirige um ofício, Francisco
Fernandes, invocando exemplo de Euclides da Cunha, manda construir o
complemento com a preposição a: “Oficiou de novo ao prelado” (1971,
p. 439).
3. Celso Pedro Luft, também em mesma esteira, para o sentido de
comunicar por ofício, preconiza a construção com a preposição a: “O
secretário oficiou ao governador” (1999, p. 383).
4. Respondendo, então, de modo prático, ao leitor, pode-se dizer que lhe
assiste integralmente razão em seu incômodo aos ouvidos, bastando
conferir o acerto ou erronia dos exemplos por ele trazidos para análise:
a) “Alguém oficiou o General de Brigada” (errado); b) “Alguém oficiou
ao General de Brigada” (correto).
O Globo
Ver O Estado de S. Paulo (P. 519).
Oitiva
1. Oitiva é forma variante de outiva e significa o ato ou efeito de ouvir, a
ouvida, a audiência. Ex.: “O juiz designou data para a oitiva das
testemunhas de acusação”.
2. Antonio Henriques a considera “forma sincopada de ouditiva > outiva,
com alteração do ditongo” (1999, p. 128).
3. Geraldo Amaral Arruda, todavia, entende que tal palavra, fora da
locução de oitiva, “está praticamente em desuso” e “apenas na
linguagem forense alguns bacharéis com pretensões arcaizantes ainda
usam o substantivo oitiva”. Complementa tal autor que, mesmo em tais
casos, o emprego do vocábulo costuma estar “fora do significado
próprio”, motivo por que entende ele que tais operadores do direito
“procederiam melhor evitando-a”. Por fim, em outra passagem, volta ele
a afirmar que ela “é de uso restrito na linguagem contemporânea e de
duvidosa propriedade” (ARRUDA, 1997, p. 82 e 123).
4. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, que é o veículo oficial indicador das palavras
existentes em nosso idioma, registra ambos os substantivos femininos –
oitiva e outiva – remetendo um ao outro e sem proceder a qualquer
ressalva de uso ou observação (2009, p. 594 e 606), o que significa que o
emprego de ambos está oficialmente autorizado entre nós, nada se
podendo objetar contra eles em termos de atualidade e correção.
5. Em verdade, o uso, mestre e tirano nesse particular, parece ter selado a
sorte do vocábulo, permitindo-lhe o uso, de modo que não parece haver
motivos para restrições.
6. Contudo, para os que não gostarem da palavra tal como empregada, resta
substituí-la por audiência ou inquirição.
7. Já de oitiva, que tem por expressão sinônima de ouvida, significa por
ouvir dizer. Ex.: “A testemunha conhecia o caso apenas de oitiva”
(ARRUDA, 1997, p. 82).
8. Cândido Jucá Filho (1954, p. 243), ao referir-se à extraordinária
personalidade do poeta Antônio Feliciano de Castilho – que ficou cego
de sarampão aos cinco anos, mas mesmo assim adquiriu grande cultura,
vindo a morrer aos setenta e cinco anos, já então feito Visconde de
Castilho – emprega nesse sentido a mencionada expressão: “Possuía
peregrina memória, de que se gabava, e certamente graças a isso
marchetou suas poesias de mimosas descrições de aspectos que nunca
viu, reminiscências de leituras de oitiva”.
9. Por fim, de ouvida é expressão muito usada no foro, como em
testemunha de ouvida – ou testemunha de ouvida alheia, ou testemunha
de oitiva, ou testemunha auricular – que é aquela que depõe apenas
acerca do que ouviu dizer, nada sabendo de ciência própria, por
conhecimento direto, mas por informação alheia e se opõe a testemunha
ocular ou de ciência própria (DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p. 368).
10. Nosso Código de Processo Civil não se vale do emprego da expressão
de oitiva nem do vocábulo outiva, e sim de audiência: a) “Só em casos
excepcionais, expressamente autorizados por lei, determinará o juiz
medidas cautelares sem a audiência das partes” (CPC/1973, art. 797);
b) “O requerente poderá pedir que o juiz, ao despachar a petição
inicial e sem audiência do requerido, lhe arbitre desde logo uma
mensalidade para mantença” (CPC/1973, art. 854, parágrafo único); c)
“Contra as pessoas jurídicas de direito público não será deferida a
manutenção ou a reintegração liminar sem prévia audiência dos
respectivos representantes judiciais” (CPC/1973, art. 928, parágrafo
único); d) “Ocorrendo mora do comprador, provada com o protesto do
título, o vendedor poderá requerer, liminarmente e sem audiência do
comprador, a apreensão e depósito da coisa vendida” (CPC/1973, art.
1.071, caput).
11. Já o Código de Processo Penal usa oitiva e também audiência em tais
casos: a) “Durante o curso do processo judicial, é permitido às partes,
quanto à perícia: I – requerer a oitiva dos peritos para esclarecerem a
prova ou para responderem a quesitos…” (CPP, art. 159, § 5º, I); b)
“… a oitiva de testemunha poderá ser realizada por meio de
videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons
e imagens em tempo real…” (CPP, art. 222, § 3º); c) (a autoridade
competente) “… procederá à oitiva das testemunhas …, colhendo,
após cada oitiva, suas respectivas assinaturas, lavrando, a autoridade,
afinal, o auto” (CPP, art. 304, caput); d) “Depois de prestada a fiança,
que será concedida independentemente de audiência do Ministério
Público, este terá vista do processo a fim de requerer o que julgar
conveniente” (CPP, art. 333); e) “Se o juiz reconhecer desde logo a
existência de causa para a conversão, a ela procederá de ofício ou a
requerimento do Ministério Público, independentemente de audiência
do condenado…” (CPP, art. 689, § 1º).
O, Lhe e Dele?
1. Importa observar a realidade em nosso idioma acerca de que alguns
verbos não admitem o uso do pronome oblíquo lhe, mesmo quando
transitivos indiretos.
2. Ora, quanto aos pronomes pessoais oblíquos átonos, fixa-se uma
primeira regra: o, a, os e as funcionam como objetos diretos, enquanto
lhes e lhes servem para funcionar como objetos indiretos. Exs.: a) “O
juiz sentenciou o caso”; b) “O juiz sentenciou-o”; c) “O documento
pertence aos autos”; d) “O documento pertence-lhes”.
3. Nem todos os verbos transitivos indiretos, contudo, permitem que seus
objetos indiretos sejam substituídos por lhe.
4. Assim, como exemplo, o verbo assistir, no significado de presenciar,
ver, é transitivo indireto, pede a preposição a e não admite lhe como
complemento. Exs.: a) “O estagiário assiste a vários debates e
audiências”; b) “O estagiário assiste-lhes” (errado); c) “O estagiário
assiste a eles” (correto).
5. Para Laudelino Freire, “na língua portuguesa existem verbos cujos
complementos indiretos são representados pela forma a ele em lugar de
lhe. Isto ocorre, entre outros, com assistir (estar presente), aspirar
(desejar), recorrer (pedir auxílio), que, recusando a forma lhe, têm os
seus objetos indiretos expressos pela forma a ele” (s/d, p. 7). Exs.: a) “O
estagiário aspirava ao cargo”; b) “O estagiário aspirava-lhe” (errado);
c) “O estagiário aspirava a ele” (correto); d) “Naquele hora, recorreu a
Deus”; e) “Naquela hora, recorreu-lhe” (errado); f) “Naquela hora,
recorreu a ele” (correto).
6. Além da discriminação do ilustre gramático, outros verbos transitivos
diretos repelem os pronomes lhe e lhes, de modo que são construídos
com as formas preposicionadas: aludir, depender, referir-se. Exs.: a)
“Aludi ao autor”; b) “Aludi-lhe” (errado); c) “Aludi a ele”; d) “Dependo
da lei”; e) “Dependo-lhe” (errado); f) “Dependo dela” (correto); g)
“Referi-me a Deus”; h) “Referi-me-lhe” (errado); i) “Referi-me a ele”
(correto).
7. Os gramáticos não trazem as razões históricas para esse modo peculiar
de construção de alguns verbos transitivos indiretos. Nem precisariam
fazê-lo, assim como não precisam justificar o motivo de um determinado
verbo ser hoje transitivo direto e outro, transitivo indireto. Às vezes,
alguns verbos são sinônimos, mas apresentam diferentes transitividades.
Em verdade, a função primordial da Gramática não é fixar regras
impositivas de cima para baixo, mas sistematizar os fatos e as condutas
da língua como manifestação. E as peculiaridades que tomam certas
construções numa ou noutra direção nem sempre se submetem a regras.
Omelete – O ou a?
1. Um leitor afirma ter ouvido, com certa frequência, em restaurantes,
pessoas pedindo o omelete em vez de a omelete. Como até ele ficou na
dúvida, pergunta se o correto é o omelete ou a omelete.
2. Ora, sempre é bom lembrar – até para criar no leitor o salutar hábito de
um raciocínio que se repete – que, quando se quer saber se uma palavra
existe ou não em português, ou mesmo qual é seu gênero, grafia e/ou
pronúncia, ou qual o seu plural quando foge à normalidade, deve-se
tomar por premissa o fato de que a autoridade para listar oficialmente os
vocábulos pertencentes ao nosso idioma e para definir-lhes as demais
peculiaridades e circunstâncias, é a Academia Brasileira de Letras.
3. E essa autoridade, a ABL a exerce por via da edição do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa.
4. Uma simples consulta ao VOLP mostra que omelete é palavra que tanto
pode ser usada no masculino como no feminino (a omelete ou o
omelete). E mais: o VOLP registra adicionalmente a forma omeleta,
pertencente ao feminino (2009, p. 596).
5. Uma primeira observação: omelete tem som aberto (é), mas omeleta tem
som fechado (ê).
6. Uma segunda observação: Antônio Houaiss segue o VOLP e registra
omelete no masculino e no feminino (2001, p. 2.062); mas Aurélio
Buarque de Holanda Ferreira a registra apenas no feminino (2010, p.
1.506). E fica a dúvida sobre quem está com a razão. Ora, sem desprezo
algum pelo grande trabalho prestado pelos dicionaristas ao idioma, o
certo é que, quando há divergência entre algum deles e o VOLP, a razão
há de estar sempre com este último, que é a palavra de quem detém a
autoridade oficial para definir aspectos linguísticos dessa natureza.
7. Em reposta ao leitor, confiram-se os seguintes exemplos, com a
indicação de sua correção ou erronia entre parênteses: a) “Ele pediu um
omelete com queijo” (correto); b) “Ele pediu uma omelete com queijo”
(correto); c) “Ele pediu uma omeleta com queijo” (correto).
O mesmo
1. Quanto à sintaxe, constitui erro frequente usar tal pronome
demonstrativo sem acompanhamento de substantivo, não se podendo
olvidar que mesmo não tem por função substituir ele ou este. Exs.: a) “O
réu foi até à vítima e falou com a mesma” (errado); b) “Consultou tais
autores, e os mesmos lhe indicaram a adequada solução” (errado); c)
“Designada a audiência, compareceram à mesma todos os interessados”
(errado).
2. Tais erros se corrigem com facilidade, se há um pouco de atenção; a) “O
réu foi até à vítima e falou com ela”; b) “Consultou tais autores, e estes
lhe indicaram a adequada solução”; c) “Designada a audiência,
compareceram a ela todos os interessados”.
3. Atento à frequência com que equívocos dessa natureza são cometidos na
linguagem forense, observa Edmundo Dantès Nascimento que “mesmo
em Português não tem função de pronome pessoal, logo não pode ser
empregado por ele, ela, elas, dele, dela, para ele, nele, etc.”
4. E complementa tal autor ser erro crasso dizer (NASCIMENTO, 1982, p.
152): a) “E falei com a mesma”; b) “Li o livro e do mesmo tirei
ensinamentos”; manda, assim, corrigir tais frases do seguinte modo: i)
“E falei com ela”; ii) “Li o livro e dele tirei ensinamentos”.
5. Com a mesma preocupação de seu emprego equivocado nos textos
jurídicos, que hão de submeter-se ao padrão da norma culta, assim
adverte Geraldo Amaral Arruda: “O vocábulo mesmo comporta uso em
muitas funções gramaticais e não convém que seja usado nos contextos
em que seja mais expressivo o emprego de ele ou de este, esse, aquele”.
6. E acrescenta tal autor: “o uso de mesmo em substituição ao pronome
pessoal da terceira pessoa ou do demonstrativo este em nada melhora a
frase. Antes, a prejudica em clareza e elegância” (ARRUDA, 1997, p.
45-6).
7. Domingos Paschoal Cegalla, por um lado, lança a seguinte advertência:
“Evite-se empregar mesmo como substituto de um pronome”.
8. Em sequência, alinha diversos exemplos de emprego inadequado: a)
“Não suportando mais a dor, procurei o dentista, mas o mesmo tinha
viajado”; b) “Não dê carona a pessoas desconhecidas, porque as
mesmas podem ser assaltantes”; c) “Os donos dos armazéns se
obrigaram a estocar e manter os cereais em bom estado, mas os mesmos
não respeitaram o contrato”; d) “O pescador salvou o náufrago e ainda
ofereceu ao mesmo a sua cabana”.
9. Por fim, dá-lhes a respectiva correção (CEGALLA, 1999, p. 259): a)
“Não suportando mais a dor, procurei o dentista, mas ele tinha viajado”;
b) “Não dê carona a pessoas desconhecidas, porque elas (ou, ainda, a
simples supressão de as mesmas) podem ser assaltantes”; c) “Os donos
dos armazéns se obrigaram a estocar e manter os cereais em bom
estado, mas eles não respeitaram o contrato”; d) “O pescador salvou o
náufrago e ainda lhe ofereceu a sua cabana”.
10. É tão comum o cometimento desse deslize, que Aires da Mata
Machado Filho (1969e, p. 1.049), após asseverar não haver igualdade
entre ele e mesmo, aponta cochilo desse jaez até em Machado de Assis
(“Apareceu um relatório contra os mesmos e contra outros”).
11. Também de um gramático do porte de Júlio Nogueira advém o seguinte
emprego equivocado desse vocábulo: “Não há, pois, redigir frases em
que, sendo ‘tu’ a forma de tratamento, se usem em relação à mesma os
possessivos ‘seu’, ‘sua’ e as variações ‘o’, ‘a’, ‘lhe’” (1959, p. 75).
12. Não escapam desses equívocos até mesmo diplomas legais, como é o
caso do art. 6º, d, da Lei 4.380, de 21/8/64, que trata de imóveis
adquiridos pelas regras do Sistema Financeiro da Habitação: “Além das
prestações mensais referidas na alínea anterior, quando
convencionadas prestações intermediárias, fica vedado o
reajustamento das mesmas e do saldo devedor a elas
correspondentes”.
13. Nesse erro também incide a Lei do Divórcio (Lei 6.515/77), em seu art.
49, ao modificar o art. 7º, § 5º, da Lei de Introdução ao Código Civil
(lapso esse que não ocorre no Código Civil, que é de 1916, revisto e
discutido, entre outros, por Rui Barbosa e Ernesto Carneiro Ribeiro):
“O estrangeiro casado, que se naturalizar brasileiro, pode, mediante
expressa anuência de seu cônjuge, requerer ao juiz, no ato de entrega
do decreto de naturalização, se apostile ao mesmo a adoção do regime
de comunhão parcial de bens…”
14. Também dessa natureza é o equívoco encontrado no art. 2º, § 1º, da Lei
4.591, de 16/12/64, que dispôs sobre o condomínio em edificações e as
incorporações imobiliárias: “O direito à guarda de veículos nas
garagens ou locais a isso destinados nas edificações ou conjuntos de
edificações será tratado como objeto de propriedade exclusiva, com
ressalva das restrições que ao mesmo sejam impostas por instrumentos
contratuais adequados, e será vinculada à unidade habitacional a que
corresponder…” Melhor é que se diga: “… das restrições que lhe
sejam impostas…”
15. De tudo o quanto se expôs, vê-se que é incorreto o emprego de o
mesmo no art. 1º da Lei 12.722/98 do Município de São Paulo, quando
manda afixar o seguinte aviso nas proximidades dos elevadores nos
edifícios: “Antes de entrar no elevador verifique se o mesmo encontra-
se parado neste andar”. A correção há de dar-se do seguinte modo:
“Antes de entrar no elevador, verifique se ele encontra-se parado neste
andar”.
16. Veja-se, de igual modo, o equívoco do art. 2º do Decreto-lei 4.597, de
19/8/42, que dispôs sobre a prescrição das ações contra a Fazenda
Pública e deu outras providências: “O Decreto 20.910, de 6 de janeiro
de 1932, que regula a prescrição quinquenal, abrange as dívidas
passivas das autarquias, ou entidades e órgãos paraestatais, criados
por lei e mantidos mediante impostos, taxas ou quaisquer
contribuições, exigidas em virtude de lei federal, estadual ou
municipal, bem como a todo e qualquer direito e ação contra os
mesmos”. Corrija-se: “… bem como a todo e qualquer direito e ação
contra eles”.
17. O art. 114, § 2º, da Constituição Federal de 1988, com redação dada
pela Emenda Constitucional 45, de 2004, não escapou a tal vício de
redação: “Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou
à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar
dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do
Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais
de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente”.
18. Em mesma esteira de equívoco laborou novamente a Constituição
Federal de 1988, no art. 70 do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias: “Fica mantida atual competência dos tribunais estaduais
até que a mesma seja definida na Constituição do Estado, nos termos
do art. 125, §1, da Constituição”. Corrija-se: “… até que ela seja
definida…”
19. O art. 867 do Código de Processo Civil também errou: “Todo aquele
que desejar prevenir responsabilidade, prover a conservação e
ressalva de seus direitos ou manifestar qualquer intenção de modo
formal, poderá fazer por o seu protesto, em petição dirigida ao juiz, e
requerer que do mesmo se a quem de direito”. Corrija-se: “… e
requerer que dele se intime…”
20. Em mesmo equívoco incidiu a Lei 8.245, de 18/11/91, art. 23, § 2º, que
dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos e os procedimentos a
elas pertinentes: “O locatário fica obrigado ao pagamento das
despesas referidas no parágrafo anterior, desde que comprovadas a
previsão orçamentária e o rateio mensal, podendo exigir a qualquer
tempo a comprovação das mesmas.” Corrija-se: “… podendo exigir a
qualquer tempo a sua comprovação”. Ou, com maior estilo: “…
podendo exigir-lhes a comprovação a qualquer tempo”.
21. Veja-se, ainda, o art. 114, § 2º, da Constituição Federal, com a redação
conferida pela Emenda Constitucional 45/2004: “Recusando-se
qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é
facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de
natureza econômica…”. Corrija-se: “é-lhes facultado”, ou “é facultado
a elas”.
22. De equívocos dessa natureza não escapou o tão recente e moderno
Código Civil de 2002 em três dispositivos: a) “Se o adquirente deixar
de remir o imóvel, sujeitando-o a execução, ficará obrigado a ressarcir
os credores hipotecários da desvalorização que, por sua culpa, o
mesmo vier a sofrer, além das despesas judiciais da execução” (art.
1.481, § 3º) (Corrija-se: “… por sua culpa, ele vier a sofrer…”); b) “O
credor só poderá se opor ao pedido de desmembramento do ônus,
provando que o mesmo importa em diminuição de sua garantia” (art.
1.488, § 1º) (Corrija-se: “… provando que ele importa em…”); c) “Se o
legado for de coisa que se determine pelo gênero, será o mesmo
cumprido, ainda que tal coisa não exista entre os bens deixados pelo
testador” (art. 1.915) (Corrija-se: “… será ele cumprido…”).
23. Num outro aspecto de significativo interesse, conforme lição de
Epifânio Dias, não se há de olvidar que tal vocábulo pode vir, e de
modo correto, substantivado no singular, “precedido do artigo definido,
equivalendo a mesma coisa: ‘A caridade, pois, não é o mesmo que a
filantropia’” (DIAS apud MACHADO FILHO, 1969e, p. 1.055).
24. Em tais casos em que significa a mesma coisa, refere Eduardo Carlos
Pereira (1924, p. 301) que mesmo é pronome com forma neutra,
representando um predicado nominal. Exs.: a) “O mesmo se há de
dizer…” (João Ribeiro); b) “O mesmo se escreve…” (Frei Luís de
Sousa).
Ver Mesmo (P. 471).
Omissão da conjunção – Está correto?
1. Observa Luciano Correia da Silva, em lição apropriada, que “é de bom
gosto e até de requinte literário omitir a integrante que antes da oração
subordinada” (1991, p. 89). Exs.: a) “Espero não venhas tarde” (em vez
de “que não venhas tarde”); b) “O réu pleiteou lhe fosse concedida
liberdade condicional” (em vez de “que lhe fosse concedida…”).
2. Exatamente esse é o proceder do Código Civil de 1916 em algumas
passagens: a) “O excluído … poderá, justificando falta de meios,
requerer lhe seja entregue metade dos rendimentos do quinhão, que lhe
tocaria” (art. 478 – nesse caso, a expressão em realce está por “requerer
que lhe seja entregue”); b) “Quando o devedor pretenda vender o gado
empenhado, ou, por negligência, ameace prejudicar o credor, poderá
este requerer se depositem os animais sob a guarda de terceiros, ou
exigir que se lhe pague a dívida ‘incontinenti’” (art. 786 – nesse caso, a
expressão em realce está por “requerer que se depositem”); c) “Para que
a consignação tenha força de pagamento, será mister concorram, em
relação às pessoas, ao objeto, modo e tempo, todos os requisitos sem os
quais não é válido o pagamento” (art. 974 – nesse caso, a expressão
sublinhada quer dizer “será mister que concorram”).
Ôo ou Oo?
Ver Enjôo ou Enjoo? (P. 319)
O ou Lhe?
1. Os pronomes pessoais oblíquos átonos o, a, os e as funcionam como
objetos diretos; os pronomes lhe e lhes, como objetos indiretos. Exs.: a)
“O juiz sentenciou o caso”; b) “O juiz sentenciou-o”; c) “O documento
pertence aos autos”; d) “O documento pertence-lhes”; e) “O juiz decidiu
a questão”; f) “O juiz decidiu-a”; g) “O computador pertence à juíza”;
h) “O computador pertence-lhe”.
2. Oportuna a lembrança de João Ribeiro (1923, p. 176) de que, nos tempos
preliminares do período clássico, encontra-se o emprego do pronome lhe
equivalendo a o, como, por exemplo, em repreendeu-lhe, sintaxe essa de
equivalência em diversos casos, que também é encontrada no castelhano,
mas não válida para nosso idioma nos dias de hoje.
3. Sousa e Silva (1958, p. 168) aponta, com propriedade, ser comum o
errôneo emprego de lhe e lhes em lugar de o, a, os e as.
4. A frequência com que se dão os erros dessa natureza faz com que
Arnaldo Niskier (1992, p. 51) teça a seguinte observação: “É um erro
muito comum a troca do pronome o (e variações) por lhe(s). Devemos
ter em mente que o (e variações) é utilizado como objeto direto
(conheço-o) e lhe(s) como objeto indireto (paguei-lhe cinco mil
cruzeiros)”.
5. Para quem tiver dificuldade exatamente em reconhecer qual há de ser a
transitividade de um verbo em tal caso, é bom lembrar, em termos bem
práticos, que o verbo transitivo direto admite passagem para a voz
passiva, mas não o transitivo indireto.
6. Assim, o exemplo “O juiz sentenciou o caso” admite a transformação
para “O caso foi sentenciado pelo juiz”, em que o verbo está na voz
passiva, já que o sujeito caso sofre a ação de sentenciar, fato esse que
evidencia ser o verbo transitivo direto.
7. Já o exemplo “O documento pertence aos autos” não admite passagem
para a voz passiva, o que é sinal inconfundível de que pertencer não é
transitivo direto.
Operacionalizar – Existe?
Ver Verbos – Existem ou não? (P. 764)
Opor ou Interpor?
Ver Interpor ou Opor? (P. 422) e Pôr – Como conjugar? (P. 577)
Oportunizar – Existe?
1. Um leitor diz ter visto com frequência a palavra oportunizar em textos
oficiais. Parecendo-lhe estranha, indaga se é correto seu uso.
2. Sempre é bom lembrar – até para criar no leitor um raciocínio salutar
que sempre deve ser repetido em tal situação – que, quando se quer saber
se uma palavra existe ou não em português, deve-se tomar por premissa
o fato de que a autoridade para listar oficialmente os vocábulos
pertencentes ao nosso idioma é a Academia Brasileira de Letras.
3. E essa autoridade, a ABL a exerce por via da edição do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa.
4. Ora, uma simples consulta ao VOLP mostra que nele não se registra
oportunizar, de modo que a forçosa conclusão a ser extraída é que essa
palavra não existe em nosso léxico.
5. Em tais circunstâncias, se se quer usar um vocábulo com esse
significado, a solução é escolher um sinônimo entre as palavras
existentes em português com a acepção pretendida pelo usuário
(possibilitar ou ensejar, por exemplo), ou mesmo construir um torneio
com o mesmo radical da palavra pretendida (dar ou abrir oportunidade)
ou mesmo com outra palavra (dar ensejo).
6. Usar, porém, um vocábulo inexistente, a pretexto de neologismo, não
constitui alternativa que esteja ao alcance do usuário do idioma.
7. Sempre é oportuno observar adicionalmente que, em circunstâncias
como essa, nos meios jurídicos e forenses, há uma equivocada tendência
de alguns, com pretensão de uma jamais alcançada erudição, para
empregar vocábulos arrevesados e barrocos, muitas vezes inexistentes,
como esse que agora é trazido para análise.
8. O máximo que conseguem, todavia, é um texto de difícil leitura e
compreensão, muito distante do ideal que só a simplicidade consegue
alcançar.
Optar
1. No que concerne à ortografia e à ortoepia de sua conjugação verbal, é
preciso atentar a suas formas rizotônicas, nas quais o radical permanece
o mesmo, em conduta típica de verbo regular, sem qualquer acréscimo
de i ou deslocamento de posição da sílaba tônica, dificuldade essa que se
apresenta no presente do indicativo e tempos derivados (SACCONI,
1979, p. 21): opto, optas, opta, optamos, optais, optam (presente do
indicativo); opte, optes, opte, optemos, opteis, optem (presente do
subjuntivo); opta, opte, optemos, optai, optem (imperativo afirmativo);
não optes, não opte, não optemos, não opteis, não optem (imperativo
negativo).
2. Assim leciona Artur de Almeida Torres: “Nas três pessoas do singular e
na terceira do plural do presente do indicativo e do presente do
subjuntivo, a vogal o do radical é tônica, e portanto fortemente
pronunciada, juntamente com a consoante seguinte” (1966, p. 116).
3. Como as formas rizotônicas ocorrem apenas no presente do indicativo e
tempos derivados, as mencionadas dificuldades de ortoepia e ortografia
não se apresentam nos demais tempos.
4. Quanto a sua regência verbal, admite ser construído com as preposições
por ou entre, mas o uso de tais sintaxes não é aleatório: a) se se
mencionam, direta e explicitamente, os elementos integrantes do rol da
escolha, tem cabimento a preposição entre; se, porém, apenas consta o
elemento escolhido, mas não os demais do universo em que feita a
opção, elege-se a preposição por. Exs.: a) “Poderá o evicto optar entre a
rescisão do contrato e a restituição da parte do preço correspondente ao
desfalque sofrido” (Rui Barbosa); b) “Afirmavam que ela optara pelo
mais rico” (Camilo Castelo Branco).
5. Atente-se, porém, a que a sintaxe correta, na primeira modalidade, é
optar entre uma coisa e outra, e não optar entre uma coisa ou outra: a)
“PFL terá de optar entre ficar no Governo ou apoiar o ex-presidente do
Senado” (errado); b) “PFL terá de optar entre ficar no Governo e apoiar
o ex-presidente do Senado” (correto).
6. Além disso, de acordo com Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 297),
“a regência usual é a indireta (preposições entre e por)”, sendo “menos
comum a regência direta”. Exs.: a) “Ele tinha de optar entre pagar a
dívida ou perder o imóvel”; b) “Ela optou pelo pretendente mais rico e
deu-se mal”; c) “Os funcionários optaram continuar em greve”.
Ora
Ver Por ora ou Por hora? (P. 580)
Oração concessiva
Ver Indicativo por Subjuntivo (P. 411).
Ora… ora
1. Às vezes se encontra um período em que tais vocábulos têm o nítido
caráter alternativo, e, nessas hipóteses, deve-se lembrar a lição de Sousa
e Silva (1958, p. 248) de que, se se emprega a conjunção ora no primeiro
membro disjuntivo, deve-se repeti-la no segundo. Exs.: a) “O advogado
ora se inflamava, ou então ficava mudo” (errado); b) “O advogado ora
se inflamava, ora ficava mudo” (correto).
2. Essa mesma observação vale para outras conjunções similares: já… já,
quer… quer.
Ordinal
Ver Números – Como ler e Empregar? (P. 506)
O risco de o
Ver É hora da onça beber água ou É hora de a onça beber água? (P. 296)
Ortoepia
1. Muito embora Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (s/d, p. 1.007)
registre também a forma ortoépia, Napoleão Mendes de Almeida (1981,
p. 217) preconiza ortoepia, “com o acento tônico no i, de acordo com o
étimo grego”.
2. Já Gladstone Chaves de Melo (1970, p. 54) apenas registra ortoépia.
3. Júlio Nogueira (1939, p. 83), após asseverar que “alguns pronunciam
esta palavra como proparoxítona” (ortoépia), diz não haver razão para
tanto, porquanto, “além da quantidade grega, a própria analogia indica
que deve ser paroxítona” (ortoepia). Acresça-se que ortoépia pode ser
considerada uma paroxítona com ditongo crescente na última sílaba (ia).
4. Silveira Bueno (1957, p. 346) registra como correta a pronúncia
ortoépia.
5. Ainda quanto à pronúncia, Evanildo Bechara (1974, p. 59) também lhe
admite ortoépia.
6. Celso Cunha registra a oscilação de sua pronúncia, mesmo na língua
culta (1970, p. 26), divergência essa que, para ele, indica a possibilidade
de uso de ambas as pronúncias.
7. Pasquale Cipro Neto e Ulisses Infante referem a dupla possibilidade de
aceitação de ortoepia e ortoépia, e situam-na como “parte da Fonologia
que cuida da correta produção oral das palavras” (1999, p. 28).
8. A possibilidade de dupla prosódia de tal vocábulo também é observada
por Arnaldo Niskier (1992, p. 2).
9. Espancando toda possibilidade de dúvida a esse respeito, o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
que é o veículo oficial indicador das palavras existentes em nosso
idioma, bem como de sua maneira de grafar e pronunciar, registra ambas
as formas – ortoépia e ortoepia (2009, p. 602), de modo que está
oficialmente autorizado o emprego de ambas.
10. No que tange a seu significado, Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 17) a
conceitua como sendo a parte da Gramática que “trata da correta
enunciação dos fonemas de uma língua”, exemplificando: escrever e
não escrevê, psicologia e não pissicologia, abrrupto e não abrupto,
socorros (ó) e não socorros (ô).
11. Cândido de Oliveira lhe confere por função a “correta pronúncia do
vocábulo: clareza na emissão dos fonemas” (1961, p. 32).
12. Júlio Nogueira entende que ela “trata da pronúncia exata dos valores
literais” (1939, p. 83).
13. Em outra obra, Cândido de Oliveira (s/d, p. 31) refere que se dedica tal
parte da Gramática à “correta pronúncia do vocábulo”, à “boa emissão
do fonemas”, de modo que “quem diz bão em lugar de bom,
adevogado por advogado, comete erro de Ortoepia”.
14. Tratando-se da parte da Gramática que cuida da correta pronúncia das
palavras, e, por ter havido confusões com prosódia, Antenor Nascentes
faz questão de observar que “a pronúncia correta, isto é, a verdadeira
emissão das vozes e a verdadeira articulação das consonâncias, chama-
se tecnicamente ortoepia” (1942, p. 14).
15. Essa mesma distinção fazem Carlos Góis e Herbert Palhano: “A
ortoepia estuda a correta pronúncia dos sons dos vocábulos; a prosódia,
a sua exata acentuação” (1963, p. 23).
16. Artur de Almeida Torres (1966, p. 27) também faz diferença entre tais
vocábulos: “a ortoepia (ou ortoépia) ensina a exata pronúncia das
palavras”, vale dizer, “boa emissão das vogais e boa articulação das
consoantes”, enquanto “a prosódia trata da correta acentuação dos
vocábulos”.
17. De sua incumbência, por exemplo, é verificar e esclarecer que, em mui
e muito, o som é anasalado; que adrede e algoz se pronunciam com a
vogal tônica fechada (ê e ô); que caroço, coro, forno, poço, rogo e
torto, de som fechado no singular, passam a ter som aberto no plural,
em fenômeno conhecido tecnicamente por metafonia; que, porém, no
plural, permanecem com o mesmo som fechado do singular acordos,
almoços, caolhos, consolos, engodos, esboços, estorvos, rostos e
subornos; que, no plural de caráter, júnior e sênior, a sílaba tônica
muda de posicionamento, resultando caracteres, juniores e seniores;
que, em ab-rogar, ad-rogar, sub-rogar e derivados, o r deve ser
pronunciado múltiplo e separado, isto é, sem fazer grupo com a
consoante anterior; que, em sintaxe, o x tem som de ss (BECHARA,
1974, p. 44-6).
18. Quanto a todos esses aspectos, parece ser melhor extrair as seguintes
conclusões: a) aceitáveis são ambas as pronúncias do vocábulo –
ortoépia (é) e ortoepia (pi); b) o melhor é caracterizar ortoepia como a
parte da Gramática que trata genericamente da correta enunciação dos
fonemas e da adequada pronúncia dos vocábulos, deixando à prosódia
a específica tarefa da correta localização da sílaba tônica.
19. Apenas para registro, o antônimo de ortoepia é cacoepia.
Ver Prosódia (P. 626).
Ortografia
1. Em significativo escorço histórico, divide Artur de Almeida Torres a
história da ortografia portuguesa em três períodos bem distintos: o
fonético, o pseudoetimológico e o histórico.
2. No primeiro (do início da língua até a metade do século XVI), “as
palavras eram grafadas mais ou menos de acordo com a pronúncia, sem
nenhuma sistematização criteriosa”.
3. No segundo, “dominava a preocupação pseudoetimológica, fruto do
eruditismo dos séculos XVI a XVIII, e em que se duplicavam as
consoantes intervocálicas e se inventavam símbolos extravagantes, a
pretexto de uma aproximação artificial com o grego e o latim, critério
pretensioso que contrariava a própria evolução das palavras”.
4. No terceiro período, marcado pela renovação dos estudos linguísticos em
Portugal, surge Gonçalves Viana que, após “algumas tentativas,
consegue apresentar um sistema racional de grafia, com base na história
da língua”, dando a público, em 1904, sua Ortografia Nacional, obra que
serviu de roteiro à comissão de filólogos encarregada pelo governo
português, em 1911, de elaborar um novo sistema ortográfico. Esse novo
sistema ortográfico foi oficializado em setembro do mesmo ano e
adotado também em nosso país em 1931, por acordo entre a Academia
das Ciências de Lisboa e a Academia Brasileira de Letras, com
aprovação de ambos os governos.
5. Após alterações nesse sistema, foi elaborado pela Academia Brasileira
de Letras, com aprovação da Academia das Ciências de Lisboa, o
Pequeno Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, oficializado
no Brasil em 1943 e revigorado pelo Congresso Nacional em 1955, por
intermédio da Lei 2.623, de 21/10/55 (TORRES, 1966, p. 225-6).
6. Ainda no plano histórico, lembre-se, com Gladstone Chaves de Melo,
que “a ortografia da língua portuguesa passou por mil vicissitudes e
oscilações, até que se firmou o sistema resultante da reforma portuguesa
de 1911, modificado e compendiado entre nós pelo acordo luso-
brasileiro de 1943” (1970, p. 62).
7. Em lição de Júlio Nogueira, “as reformas gráficas, a partir da portuguesa
de 1911, têm procurado impor grande cópia de acentos, no desígnio de
ensinar, por esse meio, a pronúncia das palavras. O acento seria,
simultaneamente, um símbolo de tonicidade e de timbre” (1959, p. 126-
7).
8. Por seu lado, Pedro A. Pinto relata que, “no século 19, apesar de
tentativas de Castilho, de Garrett e de outros, não se logrou estabelecer
um sistema de ortografia, e cada escritor escreveu como quis. Camilo,
por exemplo, não tinha ortografia e grafava as palavras de várias
maneiras”.
9. Após tal fato, até mesmo indaga o citado gramático: “Em vista do que
ficou copiado, tem alguém o direito de falar em ortografia clássica, dos
Lusíadas, do Dicionário de Morais, de Camilo ou de nossos maiores?”
(PINTO, 1924, p. 125-6).
10. Feitas essas observações de ordem histórica, oportuno é anotar que um
sistema ortográfico é sempre uma convenção, e sua base pode ser de
caráter histórico (levando em conta a etimologia, isto é, a origem da
palavra para determinar sua grafia) ou de caráter fonético (levando em
conta o som para a grafia da palavra).
11. “O sistema ortográfico adotado, atualmente, no Brasil é o aprovado
pela Academia Brasileira de Letras na sessão de 12/8/1943 e
simplificado pela Lei 5.765, de 18/12/1971. É um sistema que pode ser
considerado misto, pois em alguns casos privilegia a etimologia e, em
outros, privilegia a fonética” (NICOLA; TERRA, 2000, p. 204).
12. De modo específico para o nosso idioma, quanto ao volume de erros
que cometem os usuários do vernáculo com um sistema de associação
de tão poucas letras, espantam-se Pasquale Cipro Neto e Ulisses
Infante: “Não é admissível que com um alfabeto tão restrito (apenas 23
letras!) se cometam tantos erros ortográficos pelo Brasil afora” (1999,
p. 33).
13. Pela necessidade de obediência do linguajar forense à norma culta,
alguns erros e vícios de linguagem, sobretudo no campo da grafia,
embora de aparência simples, acabam por desprestigiar quem os
comete, fato esse bem lembrado na síntese de J. Mattoso Câmara Jr.:
“as grafias errôneas, às vezes irrelevantes em si mesmas, ganham vulto
e importância, porque são tomadas como índices da cultura geral de
quem escreve, mostrando nele, indiretamente, pouco manuseio das
leituras e pouca sedimentação escolar” (s/d, p. 58).
14. Ainda sobre esse assunto, judiciosas são as palavras de Pasquale Cipro
Neto e Ulisses Infante: “A competência para grafar corretamente as
palavras está diretamente ligada ao contato íntimo com essas mesmas
palavras. Isso significa que a frequência do uso é que acaba trazendo a
memorização da grafia correta. Além disso, deve-se criar o hábito de
esclarecer as dúvidas com as necessárias consultas ao dicionário. Trata-
se de um processo constante, que produz resultados a longo prazo”
(1999, p. 33).
15. Apesar desse sábio conselho, que merece obediência, há, contudo,
algumas observações gerais que podem ser de grande utilidade para
alcançar a melhoria rápida nesse campo.
Ver Regras de ortografia (P. 652).
O(s) de cujus
Ver De cujus – Qual é o plural? (P. 254)
Os Estados Unidos
No que respeita à concordância verbal, ver Nomes próprios plurais (P.
500).
Otimizar – Existe?
1. Nos dizeres de Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade, trata-
se de invenção não registrada pelos dicionários, assim como diversos
outros pretensos neologismos, “criados por influência do economês,
como oportunizar, absolutizar, calendarizar etc.” (1999, p. 66).
2. Em sentido contrário a essa lição, todavia, Aurélio Buarque de Holanda
Ferreira (s/d, p. 1.010) acolhe tal verbo com o sentido de proceder à
otimização, tornar ótimo.
3. E o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras – que é o veículo oficial para listar os vocábulos
existentes em nosso idioma – registra normalmente o verbo otimizar
(2009, p. 605), o que implica concluir que seu uso está perfeitamente
autorizado entre nós.
Ou – Como concordar o verbo?
1. Quando os elementos do sujeito vêm ligados pela conjunção ou, com
ideia de exclusão, o verbo fica no singular. Exs.: a) “Pedro ou Paulo
casará com Maria”; b) “A União, o Estado, ou o Município, oferecerá
ao ex-proprietário o imóvel desapropriado, pelo preço por que o foi,
caso não tenha o destino, para que se desapropriou” (CC/1916, art.
1.150).
2. Se, porém, não há a ideia de exclusão, mas sim de concomitância, de
rigor é a concordância do verbo no plural. Ex.: “Pedro ou Paulo
comparecerão à audiência”.
3. De conformidade com João Ribeiro (1923, p. 150), em se tratando de
núcleos unidos por ou ou por nem, “o verbo, quando só se refere a um,
com exclusão de outro, fica no singular”; porém, se o verbo “se refere à
totalidade dos sujeitos, vai para o plural”.
4. Interessante, adicionalmente, a observação de Luiz Antônio Sacconi
(1979, p. 212-3) para as hipóteses de núcleos do sujeito unidos pela
conjunção ou, que sejam constituídos por pessoas gramaticais diversas:
“o verbo concorda com a mais próxima, se houver ideia de exclusão”;
se, porém, não há a ideia de exclusão, “o verbo pode concordar com a
pessoa mais próxima, ou ir ao plural, concordando com aquela que tem
primazia”. Exs.: a) “Eu ou ele será eleito presidente do clube”
(exclusão); b) “Ele ou eu serei eleito presidente do clube” (exclusão); c)
“Eu ou ele jantará (ou jantaremos) com Juçara hoje” (não exclusão); d)
“Ele ou eu jantarei (ou jantaremos) com Juçara hoje” (não exclusão).
Ou e Vírgula
1. Um leitor pergunta como se emprega a vírgula antes da conjunção ou nas
orações. Ante a importância do assunto, além da análise da vírgula entre
orações, também se estende aqui o estudo para os casos de vírgula entre
os termos de mesma oração.
2. Algumas observações se fazem neste início: a) a preocupação do leitor
foi bem posta, ao indagar sobre o emprego da vírgula antes da conjunção
ou, já que seu uso após ela se deve a diversos outros fatores, de difícil
unificação ou sistematização; b) a conjunção ou às vezes conecta termos
de mesma oração (como em “Preciso encontrar Pedro ou Paulo”) e,
outras vezes, liga duas orações (como em “No próximo final de semana,
não sei se trabalho ou descanso”); c) as observações que aqui se fazem
mostram mais uma tendência haurida nas regras de estruturação do
pensamento e nos melhores autores, de aconselhável emprego no ato de
redigir, do que um conjunto de regras inflexíveis; d) uma maior atenção
à pontuação – sobretudo na redação técnica – constitui tendência da
segunda metade do século XX, de modo que nem os melhores autores de
antes observaram com acuidade as respectivas regras ao longo dos
tempos.
3. Respondendo à indagação da consulta, é de se dizer que, quando o ou
une termos de mesma oração, o normal é não usar a vírgula antecedente,
e isso por não haver separação nem ruptura de encadeamento entre tais
termos, quer quanto ao pensamento, quer quanto à sintaxe: a) “Os bens
naturalmente divisíveis podem tornar-se indivisíveis por determinação
da lei ou por vontade das partes” (CC, art. 88); b) “As benfeitorias
podem ser voluptuárias, úteis ou necessárias” (CC, art. 96, caput); c)
“Nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o
interessado a requerer, nos casos e forma legais” (CPC/1973, art. 2º); d)
“Os incapazes serão representados ou assistidos por seus pais, tutores
ou curadores, na forma da lei civil” (CPC/1973, art. 8º); e) “Responde
por perdas e danos aquele que pleitear de má-fé como autor, réu ou
interveniente” (CPC/1973, art. 16); f) “O juiz, ao decidir qualquer
incidente ou recurso, condenará nas despesas o vencido” (CPC/1973,
art. 20, § 1º); g) “Concorrendo diversos autores ou diversos réus, os
vencidos respondem pelas despesas e honorários em proporção”
(CPC/1973, art. 23).
4. Embora essa seja uma regra básica, que não causa polêmica e que emana
das diretrizes filosóficas que norteiam a estruturação de um texto a ser
escrito em linguagem formal, da sintaxe e dos próprios fins dos sinais de
pontuação, o certo é que os melhores escritores e mesmo diversos textos
de lei acabam por transgredi-la a todo momento, e isso, bem
possivelmente, mais por descuido e desatenção do que por real
desconhecimento acerca de sua necessidade: a) “Cessará, para os
menores, a incapacidade: I – pela concessão dos pais, ou de um deles na
falta do outro…” (CC, art. 5º, parágrafo único, I); b) “Pode-se exigir que
cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade…” (CC, art. 12);
c) “É válida, com objetivo científico, ou altruístico, a disposição
gratuita do próprio corpo…” (CC, art. 14, caput); d) “… mantendo-se
os bens que lhe deviam caber sob a administração do curador, ou de
outro herdeiro designado pelo juiz…” (CC, art. 30, § 1º); e) “Em caso de
abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de
finalidade, ou pela confusão patrimonial…” (CC, art. 50); f) “… o
instituidor é obrigado a transferir-lhe a propriedade, ou outro direito
real, sobre os bens dotados…” (CC, art. 64); g) “Se (as fundações)
funcionarem no Distrito Federal, ou em Território, caberá o encargo ao
Ministério Público Federal” (CC, art. 66, § 1º); h) “… o órgão do
Ministério Público, ou qualquer interessado, lhe promoverá a
extinção…” (CC, art. 69); i) “São móveis os bens suscetíveis de
movimento próprio, ou de remoção por força alheia…” (CC, art. 82); j)
“Bens divisíveis são os que se podem fracionar sem alteração na sua
substância, diminuição considerável de valor, ou prejuízo do uso a que
se destinam” (CC, art. 87); k) “… salvo se o contrário resultar da lei, da
manifestação de vontade, ou das circunstâncias do caso” (CC, art. 94);
l) “São bens públicos:… III – os dominicais, que constituem o
patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de
direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades” (CC, art. 99, III);
m) “A procuração geral para o foro, conferida por instrumento público,
ou particular assinado pela parte, habilita o advogado a praticar todos
os atos do processo…” (CPC/1973, art. 38, caput); n) “Compete ao
advogado, ou à parte quando postular em causa própria” (CPC/1973,
art. 39, caput); o) “… não poderá ingressar em juízo, substituindo o
alienante, ou o cedente, sem que o consinta a parte contrária”
(CPC/1973, art. 42, § 1º); p) “A citação do alienante, do proprietário, do
possuidor … far-se-á:… b) quando residir em outra comarca, ou em
lugar incerto, dentro de 30 (trinta) dias” (CPC/1973, art. 72, § 1º, “b”);
q) “A sentença, que julgar procedente a ação, declarará, conforme o
caso, o direito do evicto, ou a responsabilidade por perdas e danos,
valendo como título executivo” (CPC/1973, art. 76).
5. Acresce dizer que, se o conetivo ou se repete antes de termos ou
expressões, com resultante caráter enfático, usa-se a vírgula antes dele,
em todas as ocorrências: “Em se tratando de morto, terá legitimação
para requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou
qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau” (CC, art.
12, parágrafo único).
6. Quando o ou une orações de pequena extensão, normalmente não se
emprega a vírgula antes de tal conetivo: a) “Far-se-á averbação em
registro público:… II – dos atos judiciais ou extrajudiciais que
declararem ou reconhecerem a filiação” (CC, art. 10, II); b) “… o juiz…
adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato
contrário a esta norma” (CC, art. 21); c) “… é mister que a reforma:…
II – não contrarie ou desvirtue o fim desta” (CC, art. 67, II); d) “…
ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor” (CC, art.
96, § 1º); e) “São úteis as que aumentam ou facilitam o uso do bem”
(CC, art. 96, § 2º); f) “São necessárias as que têm por fim conservar o
bem ou evitar que se deteriore” (CC, art. 96, § 3º); g) “Para propor ou
contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade” (CPC/1973, art.
3º); h) “… cabe às partes prover as despesas dos atos que realizam ou
requerem no processo…” (CPC/1973, art. 19, caput); i) “… naquelas em
que não houver condenação ou for vencida a Fazenda Pública…”
(CPC/1973, art. 20, § 4º); j) “… as despesas e os honorários serão
pagos pela parte que desistiu ou reconheceu” (CPC/1973, art. 26,
caput); k) “… salvo quando suprimirem o órgão judiciário ou alterarem
a competência…” (CPC/1973, art. 87); l) “A assistência não obsta a que
a parte principal reconheça a procedência do pedido, desista da ação ou
transija sobre direitos controvertidos…” (CPC/1973, art. 53).
7. Se as orações são de maior extensão, então se usa a vírgula antes do
conetivo: a) “Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição
do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da
integridade física, ou contrariar os bons costumes” (CC, art. 13); b) “A
autorização do marido e a outorga da mulher podem suprir-se
judicialmente, quando um cônjuge a recuse ao outro sem justo motivo,
ou lhe seja impossível dá-la” (CPC/1973, art. 11, caput); c) “O juiz dará
curador especial: I – ao incapaz, se não tiver representante legal, ou se
os interesses deste colidirem com os daquele” (CPC/1973, art. 9º, I); d)
“Quando o autor recusar o nomeado, ou quando este negar a qualidade
que lhe é atribuída, assinar-se-á ao nomeante novo prazo para
contestar” (CPC/1973, art. 67).
8. Como nem sempre é fácil definir o que seja oração de maior extensão, é
muito comum ver o emprego da vírgula antes do conetivo ou, mesmo
quando este liga orações que possamos classificar como de menor
extensão: a) “Se o ausente aparecer, ou se lhe provar a existência…”
(CC, art. 36); b) “O registro declarará:… V – se os membros respondem,
ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais” (CC, art. 46, V); c)
“Presume-se aceita a nomeação se:… II – o nomeado não comparecer,
ou… nada alegar” (CPC/1973, art. 68, II); d) “… se o denunciado for
revel, ou comparecer apenas para negar a qualidade que lhe foi
atribuída, cumprirá ao denunciante prosseguir na defesa até final”
(CPC/1973, art. 75, II).
9. Para tornar mais prática uma análise dessa natureza por parte do leitor,
tome-se um exemplo da própria lei: “Decai em três anos o direito de
anular as decisões a que se refere este artigo, quando violarem a lei ou
estatuto, ou forem eivadas de erro, dolo, simulação ou fraude” (CC, art.
48, parágrafo único).
10. Para o que aqui interessa, podem-se extrair as seguintes conclusões: a)
quando se diz a lei ou o estatuto, o conetivo está a unir termos de uma
mesma oração, o que explica a ausência de vírgula; b) essa também é a
explicação para a inexistência de vírgula na expressão simulação ou
fraude; c) o outro conetivo liga duas orações – “… quando violarem a
lei ou estatuto, ou forem eivadas de erro…”; d) como as orações por
ele unidas têm uma certa extensão, justifica-se a existência da vírgula
para separá-las.
11. Tome-se também outro exemplo: “Tornando-se ilícita, impossível ou
inútil a finalidade a que visa a fundação, ou vencido o prazo de sua
existência, o órgão do Ministério Público, ou qualquer interessado, lhe
promoverá a extinção, incorporando-se o seu patrimônio, salvo
disposição em contrário no ato constitutivo, ou no estatuto, em outra
fundação, designada pelo juiz, que se proponha a fim igual ou
semelhante” (CC, art. 69).
12. Dele se podem dizer os seguintes aspectos acerca do ou: a) quando se
diz impossível ou inútil e igual ou semelhante, o conetivo está a unir
termos de uma mesma oração, o que explica a ausência de vírgula; b) a
segunda ocorrência do conetivo mostra que ele está a unir duas orações
– “Tornando-se ilícita, impossível ou inútil a finalidade…, ou vencido
o prazo …” – e, como as orações por ele unidas têm uma certa
extensão, justifica-se a existência da vírgula para separá-las; c) nas
demais ocorrências – i) o órgão do Ministério Público, ou qualquer
interessado e ii) no ato constitutivo, ou no estatuto – volta a ocorrer a
união entre termos de mesma oração, e, assim, tais termos não
deveriam ser separados por vírgula.
Ou… ou
Ver Quer… quer… quer… (P. 639)
Ou seja
1. Trata-se de expressão explanatória ou explicativa, a qual, conforme o
caso, pode ser substituída por isto é, a saber, vale dizer. Exs.: a) “Ele
trabalhou dois meses, ou seja, sessenta dias”.
2. Anotando que “a conjunção é invariável”, não apresentando flexão para
o plural, observa Edmundo Dantès Nascimento ser erro escrever “Meia
saca, ou sejam, 30 quilos” (1982, p. 42).
3. Também desse posicionamento é Domingos Paschoal Cegalla (1999, p.
302): “Como equivalente de isto é, essa expressão é invariável”. Ex.: “O
trigo e o arroz, ou seja, os cereais mais consumidos no mundo, não
chegam a muitas bocas”.
4. Desse posicionamento, contudo, diverge Aires da Mata Machado Filho,
partindo de dois exemplos: a) “Um hectare de terra, ou sejam, dez mil
metros quadrados, é suficiente para um pequeno pomar”; b) “Um
hectare de terra, ou seja, dez mil metros quadrados, é suficiente para um
pequeno pomar”.
5. Reputa ele corretos ambos os exemplos: a) no primeiro, há duas orações,
sendo a segunda “ou sejam dez mil metros quadrados”, a qual tem por
finalidade ser “uma espécie de explanação da primeira”, devendo estar o
verbo no plural para concordar com seu predicativo; b) no segundo
exemplo, apenas haveria uma oração, configurando um aposto a
expressão “ou seja dez mil metros quadrados”, sendo, assim, ou seja
mero conetivo, que deve permanecer invariável (MACHADO FILHO,
1969e, p. 1.002).
6. Também na lição de Silveira Bueno, quando “a palavra que vier após a
expressão explicativa – ou seja – for singular ou plural, o verbo ser
concordará com ela em número e pessoa”, justificando tal autor que se
trata de “atração sintática do completivo predicativo sobre o predicado”.
7. E corrobora ele seu ensino com exemplos de autores insuspeitos
(BUENO, 1957, p. 432-3): a) “… que o número de 66.000 vocábulos foi
por este (dicionário) elevado aproximadamente ao duplo, ou sejam
cento e vinte mil e tantos” (Cândido de Figueiredo); b) “… monumentos
que a escultura e a pintura, ou sejam Miguel Ângelo e Rafael, Leonardo
da Vinci e Paulo Veronese e tantos outros, ornaram e constelaram de
maravilhas” (Trindade Coelho).
8. Ante tais posicionamentos, quer pela divergência entre os gramáticos –
caso em que vige o vetusto princípio de que, na dúvida, há liberdade
para o usuário – quer pela autoridade dos escritores que as empregaram
ambas, o melhor parece ser a aceitação das duas variantes, quando a
expressão vier seguida de plural: ou seja e ou sejam.
9. Quanto à pontuação, por sua natureza de locução explanatória, se
permanecer no singular, deve vir entre vírgulas. Nos casos em que se
defende a forma plural (ou sejam), observe-se que a quase totalidade dos
exemplos traz a vírgula apenas antes da expressão e não depois.
10. De qualquer modo, segundo ensino de Arnaldo Niskier (1992, p. 52), é
importante não confundir essa expressão com a locução qual seja, que,
sem discussão alguma, “é variável, formando no plural quais sejam”.
Ver Vírgula obrigatória (P. 777).
Outiva
Ver Oitiva (P. 521).
Outrem
1. Significa, basicamente, outra pessoa. Ex.: “O magistrado esperava que
outrem, não o réu, adentrasse na sala de audiências naquela
oportunidade”.
2. Trata-se de palavra paroxítona, sendo errôneas a grafia e a pronúncia
outrém, apesar de Napoleão Mendes de Almeida referir que “era
antigamente acentuado oxitonamente, como alguém, ninguém” (1981, p.
219.).
3. Nesse sentido, espancando dúvidas, o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, que é o veículo
oficial indicador das palavras existentes em nosso idioma e de sua
correta grafia e pronúncia, registra outrem, sendo, assim, essa a forma
que se há de observar (2009, p. 606).
4. Por sua própria pronúncia, vê-se inexistir razão para acento gráfico.
Outrossim
1. A palavra outrossim merece comentários sobre onde pode ser
empregada, já que é comum em petições, mesmo quando já se utilizou
ademais, por fim, etc.
2. Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 151) dá-lhe por significado
ademais, igualmente, ao mesmo tempo.
3. Anotando tratar-se de palavra que “transita, com abundância, em todos
os tratados de Direito”, conceitua-a Antonio Henriques como “elo de
coesão com ideia de continuidade cujo significado é igualmente,
também, bem assim” (1999, p. 133).
4. Para exemplificar, vejam-se alguns casos de seu emprego, garimpados
em nossa legislação: a) “Quando o seguro versar sobre dinheiro dado a
risco, deve declarar-se na apólice, não só o nome do navio, do capitão,
e do tomador do dinheiro, como outrossim fazer-se menção dos riscos
que este quer segurar…” (Código Comercial [Lei 556, de 25/6/1850],
art. 682); b) … “Indagará outrossim a causa ou causas verdadeiras da
falência, podendo para este fim perguntar as testemunhas que julgar
precisas e sabedoras…” (Código Comercial [Lei 556, de 25/6/1850], art.
818); c) “Ao depositário será facultado, outrossim, requerer depósito
judicial da coisa, quando, por motivo plausível, não a possa guardar, e o
depositante não queira recebê-la” (Código Civil [Lei 10.406, de
10/1/2002], art. 635); d) “Havendo recusa ou mora do devedor, a
obrigação pessoal do devedor converter-se-á em perdas e danos,
aplicando-se outrossim o disposto no art. 633” (Código de Processo
Civil [Lei 5.869, de 11/1/73], art. 638, parágrafo único); e) “Nos
ascensores de edifícios será obrigatória colocação de um banco
individual para o respectivo cabineiro, devendo, outrossim, ser provida
a cabine de um processo de renovação de ar facilitado pela ventilação
da respectiva torre” (Consolidação das Leis do Trabalho [Decreto-lei
5.452, de 1/5/43], art. 215 – redação original).
Ouvida
Ver Oitiva (P. 521).
Oxítona
1. Palavra oxítona é aquela em que se pronuncia com mais força a última
sílaba, não importando se o vocábulo tem ou não acento gráfico: ju-ri-ti,
ca-fe-zal, ca-fé.
2. Por determinação já antiga, mantida de modo específico pelo Acordo
Ortográfico de 2008, acentuam-se graficamente as oxítonas terminadas
por a(s), e(s), o(s), em, ens. Exs.: jacarandá(s), ipê(s), rapé(s), avô,
avós, refém, armazéns.
3. Quanto aos monossílabos, são acentuados os tônicos terminados por
a(s), e(s), o(s), como pá(s), pé(s), pó(s).
4. Em comparação com as oxítonas, vale observar que não se acentuam os
monossílabos tônicos terminados por em ou ens: bem, trem, nem.
5. Também vale acrescentar que um monossílabo pode vir a ser acentuado
por outra razão (como por exemplo, por motivo da existência de um
ditongo aberto): réis, véu, dói.
6. Por conclusão extraída da própria regra, se não houver outra razão, não
serão graficamente acentuadas as oxítonas terminadas por i(s) ou por
u(s): tupi, sacis, urutu, cajus.
7. Muito cuidado, porém, com as terminações i(s) e u(s), nos casos de
hiato, em que pode ocorrer acento: saí, jaú.
8. Oportuno é observar que são oxítonos os vocábulos recém, refém, ruim.
Ver Acento diferencial de número (P. 65), Acento diferencial de timbre (P.
66), Acento diferencial de tonicidade (P. 66) e Paroxítonas – Quando
acentuar? (P. 551)
P
Paço da Liberdade ou paço da Liberdade?
Ver Rua Caiubi ou rua Caiubi? (P. 675)
Pagado ou Pago?
Ver Pago ou Pagado? (P. 542)
Pagar
1. Quanto à regência verbal, tem tal verbo duas transitividades: a) é
transitivo direto, se o complemento é coisa. Exs.: i) “O perdedor pagou
o valor devido”; ii) “O perdedor pagou-o”; b) É transitivo indireto, se o
complemento é pessoa. Exs.: i) “O vencido pagou ao vencedor”; ii) “O
vencido pagou-lhe”.
2. Pode ser construído, ao mesmo tempo, com os dois complementos. Exs.:
a) “O vencido pagou o valor devido ao vencedor”; b) “O vencido pagou-
lho”.
3. Na síntese de Artur de Almeida Torres, ele “rege acusativo de coisa
(objeto direto) e dativo de pessoa (objeto indireto): pagar alguma coisa a
alguém” (1967, p. 213).
4. Após referir que alguns empregam tal verbo fazendo da pessoa o objeto
direto, Mário Barreto leciona ser essa uma “construção de todo
rejeitável”, porquanto “o regime de pessoa deve aqui aparecer como
complemento indireto” (BARRETO apud TORRES, 1966, p. 178).
5. Outra não é a lição de Cândido de Figueiredo: “É verdade que o nosso
velho Morais empregou as expressões: pagar as tropas, os criados, as
dívidas. As dívidas, bem está; mas pagar os criados parece-me que foi
precipitação ou lapso do respeitado dicionarista, tanto mais que,
aduzindo textos clássicos, não citou um único em abono daquela sintaxe:
pagar os criados” (FIGUEIREDO apud TORRES, 1966, p. 178).
6. Em oportuna observação para os meios jurídicos, lembram Antonio
Henriques e Maria Margarida de Andrade que “a boa sintaxe requer,
com o verbo pagar, objeto indireto de pessoa. Na linguagem dos códigos
não se acha exemplo do objeto direto de pessoa; este pode aparecer em
escritores modernos, no uso da linguagem coloquial, em determinados
contextos. A sintaxe clássica reponta no conhecido adágio: Quem deve a
Pedro e paga a Gaspar torna a pagar” (1999, p. 103).
7. Fundado em lição de Mário Barreto e atento aos deslizes da linguagem
forense, observa Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 109) que uma
frase como “Pagar o mestre”, em realidade, é “construção de todo
rejeitável. O regime de pessoa deve aqui aparecer como complemento
indireto”.
8. Na lição de Celso Pedro Luft, “puristas logicistas só aceitam objeto
indireto de pessoa com este verbo, condenando a sintaxe evoluída pagar
alguém, pagá-lo”.
9. E continua, esteando-se em exemplos apenas de autores do século XX:
“Esta, no entanto, é de uso frequente e, até literariamente, bem
documentada”.
10. Mas finaliza, nesse aspecto: “Pode-se dizer que, na língua escrita
formal, a sintaxe pagar a alguém, pagar-lhe é preferível a pagar
alguém, pagá-lo” (LUFT, 1999, p. 388).
11. Os textos legais, por via de regra, observam as determinações da
Gramática quanto à regência do verbo pagar, fazendo da coisa o objeto
direto (com possibilidade de ser sujeito da voz passiva) e da pessoa o
objeto indireto, nada impedindo que coexistam ambos os
complementos em mesma oração. Exs.: a) “Aquele que semeia… em
terreno próprio, com … materiais alheios… fica obrigado a pagar-lhes
o valor,… se obrou de má-fé” (CC/1916, art. 546); b) “Aquele que
semeia… de má-fé… poderá ser constrangido… a pagar os prejuízos”
(CC/1916, art. 547); c) “Se, porém, as referidas coisas forem avaliadas
no título constitutivo do usufruto, salvo cláusula expressa em
contrário, o usufrutuário é obrigado a pagá-las pelo preço da
avaliação” (CC/1916, art. 766, parágrafo único); d) “Ao credor por
esta caução compete o direito de: … II – fazer intimar ao devedor dos
títulos caucionados, que não pague ao seu credor, enquanto durar a
caução” (CC/1916, art. 792, II); e) “O depositante é obrigado a pagar
ao depositário as despesas feitas com a coisa, e os prejuízos que do
depósito provierem” (CC/1916, art. 1.278); f) “A matrícula deve ser
feita no porto do armamento da embarcação, e conter: … 4. As
quantias adiantadas, que se tiverem pago ou prometido pagar…” (C.
Com., art. 467, 4); g) “No caso de fraude da parte do segurado, além
de nulidade do seguro, será este condenado a pagar ao segurador o
prêmio estipulado em dobro…” (C. Com., art. 679).
12. Quanto aos exemplos inicialmente dados, será correto dizer: a) “Pagar
o passivo” (e, portanto, pagá-lo); b) “Pagar aos credores” (e, portanto,
pagar-lhes); c) “Pagar o passivo aos credores” (e, portanto, pagar-
lhos).
Ver Pagar contra recibo – Está correto? (P. 542), Pago ou Pagado? (P. 542),
Verbos abundantes (P. 759), Voz passiva – Quando é possível? (P. 793), Voz
passiva e Verbos não transitivos diretos (P. 792) e Voz passiva sintética (P.
794).
Pago ou Pagado?
1. Quanto à conjugação verbal e ao emprego de seu particípio passado, é de
comum ensino que se usa o verbo pagar apenas na forma irregular
(pago), e isso com qualquer auxiliar, lembrando mesmo Otelo Reis
(1971, p. 91) que, “quanto ao particípio regular pagado, não existe mais
na linguagem hodierna”, lição essa a que tal autor ainda acresce, em
outra passagem, que “a forma regular é absolutamente desusada”. Exs.:
a) “O réu tinha pago a pena”; b) “A pena foi paga pelo réu”.
2. Nos dizeres de Édison de Oliveira (s/d, p. 121), na linguagem
contemporânea, “estão fora de uso as formas ganhado, gastado e
pagado, não só com o auxiliar ser, mas também com o auxiliar ter”,
motivo por que “estão, pois, superadas construções como: a) ‘Nós
teríamos ganhado a partida’; b) ‘Ele tinha gastado o tempo
inutilmente’; c) ‘Tínhamos pagado tudo o que devíamos’; devendo-se
preferir: a) ‘Nós teríamos ganho a partida’; b) ‘Ele tinha gasto o tempo
inutilmente’; c) ‘Tínhamos pago tudo o que devíamos’”.
3. Tal tendência ao uso do verbo pagar na forma participial irregular, tanto
na voz ativa quanto na passiva, é antiga, sendo raros os exemplos em
contrário.
4. Aires da Mata Machado Filho (1969b, p. 783), a esse respeito, transcreve
interessante lição de Antenor Nascentes, que resume a questão: “Na
língua viva atual, quer com o auxiliar ter, quer com ser, só se usam os
particípios irregulares ganho, gasto e pago… Na língua antiga, o regular
domina”.
5. Também de oportuna transcrição o ensinamento de Celso Cunha: “De
outrora se usavam normalmente os dois particípios. Na linguagem atual
preferem-se, tanto nas construções com o auxiliar ser como naquelas em
que entra o auxiliar ter, as formas irregulares ganho, gasto e pago, sendo
que a última substituiu completamente o antigo pagado” (1970, p. 216).
6. Fundando-se em lição de Said Ali e anotando que pagado e pago são
“formas de particípio passado do verbo pagar correntes em antigos
documentos e na época clássica”, também Antonio Henriques (1999, p.
134-5) assegura que, “hoje, a forma pago suplantou a forma pagado”.
7. Em mesma esteira, para Cândido de Oliveira, “ganho, gasto, pago, pego
são usados indiferentemente para ambas as vozes (com qualquer
auxiliar)”, e “os particípios ganhado, gastado, pagado, pegado tendem a
desaparecer” (1961, p. 205).
8. Para Domingos Paschoal Cegalla, pagado é “forma obsoleta, suplantada
pela forma irregular pago” (1999, p. 304).
9. Para Regina Toledo Damião e Antonio Henriques (1994, p. 242),
“pagado está em desuso” na atualidade.
10. Para Vitório Bergo, “os particípios fortes ganho, gasto, pago, salvo
tendem a suplantar as formas em ado, pois que se usam normalmente
com os dois tipos de auxiliares” (1943, p. 182).
11. Quanto a pagado, Sousa e Silva observa que “vai caindo em desuso
este particípio, quase sempre substituído pela forma pago” (1958, p.
202).
12. Observe-se, porém, que Evanildo Bechara (1974, p. 110) acata para
esse verbo os particípios regular e irregular.
13. De igual modo, Cândido Jucá Filho (1963, p. 461), sem quaisquer
explicações adicionais, especifica indiferentemente os particípios pago
e pagado, exemplificando com autor de abalizada autoridade: a) “Estas
duas têm pagado bem seu tributo à asneira” (Camilo Castelo Branco).
14. Também para Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 141), por um lado, os
particípios irregulares pago, ganho e gasto “podem empregar-se na voz
ativa com os verbos ter e haver”; por outro lado, “muitas formas
regulares”, como, por exemplo, ganhado, gastado, “podem ser
empregadas na passiva com os verbos ser e estar”.
15. Pasquale Cipro Neto e Ulisses Infante (1999, p. 175) consideram pagar
um verbo abundante, sendo para tais autores perfeitamente possível o
emprego do particípio passado regular (pagado), o qual deverá ser
usado com os auxiliares ter e haver.
16. Muito embora até se possa dizer que a norma culta, na atualidade,
tenha preferência pelo particípio passado pago tanto para seu uso com
os verbos ter e haver quanto ser e estar, o certo é que ainda não se
pode dizer que o particípio pagado esteja em completo desuso ou que
seu emprego esteja errado; é ele certo e há de ser usado com os verbos
ter e haver.
Ver Pagar (P. 541), Verbos abundantes (P. 759) e Voz passiva e Verbos não
transitivos diretos (P. 792).
Paina
Ver Roraima (P. 675).
Paisano ou A paisano?
1. Um leitor parte do princípio de que paisano é um substantivo masculino
e indaga como aplicar tal vocábulo em expressões como a paisano.
2. Observa-se, num primeiro aspecto, que paisano pode ser um substantivo
ou adjetivo. Nesse caso, normalmente, tem o sentido de pessoa natural
de certa região, e não parece haver dificuldade no emprego ou
concordância do vocábulo. Exs.: a) “Os paisanos se diferenciavam dos
turistas quanto às vestes, ao modo de proceder e de se alimentar”
(substantivo); b) “As camponesas paisanas pareciam mais recatadas que
as turistas” (adjetivo).
3. Num segundo aspecto, importa anotar que existe a expressão invariável à
paisana, a significar militar em trajes civis (e, por extensão, qualquer um
que normalmente se vista de modo diferenciado e que, em certa situação,
esteja com vestes informais). Exs.: a) “Em seu dia de folga, os militares
desceram à paisana e foram divertir-se no clube da cidade”; b) “De
olhar, conheço um padre, ainda que à paisana”.
4. Resumindo para a indagação da consulta: a) A expressão é à paisana, e
não a paisano; b) Tal expressão, em português, tem normalmente o
significado de em trajes civis; c) Não importando outras variações
sintáticas na frase, permanece ela invariável; d) O correto é dizer
“Fulano estava à paisana” ou “Beltrano estava à paisana”, e não
“Fulano estava a paisano” ou “Beltrano estava a paisano”; e) Também
não é correto dizer “Fulano estava paisano” ou “Beltrano estava
paisano”.
Palavra
Ver Partição silábica entre as linhas (P. 551).
Palavra bifronte
Ver Alugar (P. 107).
Palavras atrativas
Ver Próclise (P. 603).
Palavras com regências diversas
Ver Verbos com regências diversas (P. 760).
Pane – Um ou uma?
1. Um leitor ouviu, em transmissão esportiva, a seguinte frase: “Deu um
pane na seleção brasileira”. E traz duas indagações: a primeira é se pane
é palavra do português; a segunda é se, em caso positivo, deve-se dizer
um pane ou uma pane.
2. Ora, sempre é bom lembrar – até para criar no leitor o hábito salutar de
um raciocínio que se repete em tal situação – que, quando se quer saber
se uma palavra existe ou não em português, ou mesmo qual é seu gênero,
grafia e/ou pronúncia, ou qual o seu plural quando foge à normalidade,
deve-se tomar por premissa o fato de que a autoridade para listar
oficialmente os vocábulos pertencentes ao nosso idioma e para definir-
lhes as demais peculiaridades e circunstâncias, é a Academia Brasileira
de Letras.
3. E essa autoridade, a ABL a exerce por via da edição do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa.
4. Uma simples consulta ao VOLP (2009, p. 614) mostra dois aspectos
quanto ao vocábulo da consulta do leitor: a) pane é palavra perfeitamente
registrada como integrante do vernáculo; b) pertence ao gênero feminino
(uma pane, e não um pane).
5. Em reposta ao leitor, confiram-se os seguintes exemplos, com a
indicação de sua correção ou erronia entre parênteses: a) “Deu um pane
na seleção brasileira” (errado); b) “Deu uma pane na seleção
brasileira” (correto).
Para
Ver No sentido de… – Está correto? (P. 502)
Parabenizar – Existe?
1. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (s/d, p. 1.032), em seu dicionário,
registra tal vocábulo.
2. Diverso, entretanto, é o entendimento de Napoleão Mendes de Almeida,
para quem, além da necessidade de uma palavra ser formada de acordo
com as regras previstas por nosso idioma – o que parece obedecido no
caso sob análise – a inserção de um neologismo em nosso léxico
vincula-se também à inexistência de outra palavra adequada para
expressar a ideia.
3. E, no caso, para tal autor, a existência de sinônimos perfeitos, como
cumprimentar e felicitar, tornaria desnecessária a inovação, reputada por
ele mera extravagância (ALMEIDA, 1981, p. 224).
4. Espancando, entretanto, toda dúvida acerca da possibilidade de emprego
do referido vocábulo, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa,
da Academia Brasileira de Letras, que é o veículo oficial para dirimir
dúvidas acerca da existência ou não de vocábulos em nosso idioma,
registra a mencionada palavra (2009, p. 618), o que implica dizer que
seu uso está plena e oficialmente autorizado entre nós.
Paralisar
1. Para bem guardar a escrita de tal vocábulo, duas regras de ortografia
devem ser consideradas: a) Se se tem de acrescentar a um radical o
sufixo izar inteiro para formar um verbo, grafa-se com z: fiscal, útil
(primitivas) fazem fiscalizar, utilizar (derivadas); b) No caso da
observação anterior, porém, se já existe s no radical, é ele aproveitado:
análise, pesquisa, catálise (primitivas) fazem analisar, pesquisar,
catalisar.
2. Porque no caso a palavra primitiva é paralisia, onde já existe s, a
derivada há de ser paralisar.
Ver Ortografia (P. 533) e Regras de ortografia (P. 652).
Paraninfa – Existe?
Ver Capitã, Capitoa ou A Capitão? (P. 168) e Poeta – Qual o feminino? (P.
570)
Pára ou Para?
1. Com as alterações de grafia trazidas pelo Acordo Ortográfico de 2008,
importa analisar se o acento agudo de pára (verbo) foi abolido, ou
continua existindo.
2. No passado, a regra era o emprego do acento agudo na forma verbal pára
(flexão do verbo parar – ele pára), a fim de diferenciá-la da preposição
para.
3. A explicação para essa ocorrência era que o verbo constituía forma
tônica, enquanto a preposição era forma átona, de modo que se
empregava, assim, na primeira, um acento diferencial de tonicidade.
4. O Acordo Ortográfico de 2008, porém, aboliu, de modo expresso, esse
acento agudo da forma verbal para, de modo que, hoje, o correto é
escrever sem acento algum tanto a forma verbal como a preposição,
como se confere a seguir: a) “Então, estranhamente, sem motivo algum,
ele para no semáforo aberto” (3ª pessoa do singular do presente do
indicativo do verbo parar); b) “Instruções para pouso na água”
(preposição).
Parecer
1. No que concerne à concordância verbal, se o verbo parecer vem
precedido de palavra no plural e seguido de outro verbo no infinitivo,
qualquer dos dois verbos pode ir para o plural (GÓIS; PALHANO, 1963,
p. 176). Exs.: a) “Os advogados pareciam estar preocupados” (correto);
b) “Os advogados parecia estarem preocupados” (correto).
2. No primeiro exemplo, tem-se a seguinte estrutura sintática: “Os
advogados (sujeito) pareciam (verbo de ligação) estar preocupados”
(predicativo do sujeito).
3. No segundo exemplo, o verbo parecer é intransitivo (não tem
complementos), e seu sujeito oracional é estarem preocupados; basta,
para conferir com facilidade tal afirmação, que se estenda a oração
reduzida de particípio: “Parecia (oração principal) que os advogados
estavam preocupados (oração subordinada substantiva subjetiva).
4. Anote-se, porém, que não podem ambos os verbos ir simultaneamente
para o plural, sendo errôneo o seguinte exemplo: “Os advogados
pareciam estarem preocupados”.
5. Pela própria estruturação sintática de tais períodos, se aparece o que
(conjunção subordinativa integrante), o verbo parecer fica
obrigatoriamente no singular, já que seu sujeito é oracional, não tendo,
por conseguinte, plural algum: a) “Os advogados parecia que estavam
preocupados” (correto); b) “Os advogados pareciam que estavam
preocupados” (errado). Para comprovar a correção dessa estrutura, basta
colocar o exemplo em sua ordem direta: “Parecia que os advogados
estavam preocupados.”
6. Resumindo a sintaxe desse verbo, assim se manifesta Laudelino Freire:
“O verbo parecer presta-se a duas construções (em realidade, ele mesmo
menciona três): ‘As montanhas parecem fugir’ ou ‘As montanhas parece
fugirem’. Ambas são corretas, o que se verifica pela análise: no primeiro
exemplo o sujeito de parecem é montanhas; no segundo, o sujeito de
parece é a oração fugirem, ou a oração integrante que fogem” (GÓIS;
PALHANO, 1963, p. 176).
7. Francisco Fernandes (1971, p. 449) transcreve exemplos de autores
insuspeitos para ambas as construções: a) “De cujo manto as vagas
parece roçarem ainda com respeito a fímbria do Adamastor” (Sousa da
Silveira); b) “As estrelas parecia sorrirem” (Carlos Góis); c) “Se
espancas os cães da vinha, pareces ser também ladrão” (Mário Barreto);
d) “Depois ficou por alguns instantes calada, com os olhos fitos no
rochedo fronteiro, em cuja face escabrosa as sombras pareciam dançar”
(Alexandre Herculano); e) “As palavras que ele disse parece que saíam
de uma alma que ia ser julgada por Deus” (Camilo Castelo Branco).
8. Bastante didático o resumo de Domingos Paschoal Cegalla (1999, p.
208) acerca das possibilidades de sintaxe correta do referido verbo: a)
“Parecer no plural e infinitivo no singular” (As estrelas pareciam sorrir
de minhas veleidades); b) “Parecer no singular e infinitivo no plural” (As
estrelas parecia sorrirem de minhas veleidades); c) “Usando-se a oração
desenvolvida em vez da infinitiva, parecer concorda no singular” (Os
dois homens parecia que estavam embriagados).
Ver Infinitivo como sujeito – Como concordar? (P. 414)
Parede-meia
1. Carlos Góis (1945, p. 40 e 41), sem maiores discussões, emprega, e mais
de uma vez, paredes meias.
2. Luís A. P. Vitória (1969, p. 181) quer que se diga e escreva paredes-
meia.
3. Mesmo lembrando haver quem prefira as formas parede meia, parede em
meio, Vasco Botelho de Amaral (1939, p. 45) observa que “parece bem
português o dizer paredes meias”, para o que traz exemplo garimpado
em Camilo Castelo Branco: “Do outro lado do pátio estava o quarto do
oficial da guarda, paredes meias com a residência e escritório do
carcereiro”.
4. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, que é o veículo oficial para dirimir dúvidas acerca
da existência ou não de vocábulos em nosso idioma, registra a palavra
parede-meia, assim com hífen, especificando-a como um substantivo
feminino (2009, p. 622); e, por se tratar de um substantivo composto em
que ambos os termos isoladamente já são variáveis (um substantivo e um
numeral), a regra de passagem para o plural determina que ambos
variem: paredes-meias.
Parenta ou Parente?
1. Assim como o feminino de juiz de direito é juíza de direito, não há razão
alguma para se estranhar que, se se refere a uma pessoa do sexo
feminino ligada a alguém pelos laços do parentesco, será ela uma
parenta, a exemplo de consulesa, coronela, delegada, deputada,
generala, ministra, paraninfa, prefeita, primeira-ministra, sargenta,
vereadora.
2. Essa formação normal do feminino é preconizada por Júlio Ribeiro
(1908, p. 86).
3. Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 32) confere ao vocábulo dois femininos:
parente e parenta.
4. Registra a palavra parenta como um substantivo feminino o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
que é o veículo oficial para dirimir dúvidas acerca da existência ou não
de vocábulos em nosso idioma; além disso, tal obra também registra
parente como substantivo comum de dois gêneros (2009, p. 622), o que
implica dizer que o uso de ambas está plena e oficialmente autorizado
entre nós: a parenta e a parente.
Ver Poeta – Qual o feminino? (P. 570) e Crenta ou Crente? (P. 240)
Parêntese ou Parêntesis?
1. Como se deve dizer: parêntese ou parêntesis?
2. Uma consulta ao Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa –
veículo da Academia Brasileira de Letras para listar oficialmente os
vocábulos existentes em nosso idioma – mostra que se acham ali
arrolados ambos os vocábulos como sinônimos e equivalentes: parêntese
e parêntesis.
3. Em termos gramaticais, todavia, uma observação mais apurada nos dois
registros mostra que parêntese é substantivo masculino, do singular, de
modo que seu plural se forma normalmente pela adição de um s (o
parêntese, os parênteses).
4. Já parêntesis faz-se acompanhar da anotação de que pertence aos dois
números (singular e plural), e, assim, sua variação apenas pode ser
conhecida pela presença de um outro vocábulo que modifique tal
substantivo (o parêntesis, os parêntesis).
5. Veja-se, assim, o correto emprego dessas palavras nos exemplos
seguintes: a) “Abriu um parêntese e passou a divagar”; b) “Abriu um
parêntesis e passou a divagar”; c) “O erro de grafia estava entre
parênteses”; d) “O erro de grafia estava entre parêntesis”.
6. No que concerne à pontuação, é de se anotar que, se se apresenta a
necessidade de emprego interno de parênteses, os parênteses externos
são substituídos por colchetes. Ex.: “A quantia pedida [R$1.000.000 00
(um milhão de reais)] acabou sendo o valor atribuído à causa.”
Parênteses e Ponto
1. Para a ordem de colocação entre o fechamento do parêntese e o ponto,
Cândido de Oliveira (1961, p. 68) estabelece duas regras importantes: a)
“Primeiro parêntese e depois ponto final, quando a declaração não é
autônoma” (ou seja, a frase, desde o ponto anterior, não se faz apenas
com o que está entre parênteses). Ex.: “Alguns vocábulos têm e (quase,
se, senão, sequer).” b) “Primeiro ponto final e depois parêntese, quando
a declaração é autônoma (tudo o que se escreve deve estar compreendido
dentro dos parênteses)”. Ex.: “Horácio não irá. (O rapaz anda às voltas
com os livros.)”
Parequema
1. Segundo Artur de Almeida Torres, “consiste em colocar ao lado de uma
sílaba outra sílaba com o mesmo som: corpo poroso, barco coberto de
lona” (1966, p. 224).
Ver U’a maneira – Está correto? (P. 747)
Parônima
1. Aspecto que tem importância no campo da semântica e da ortografia,
parônima é a palavra que tem grafia e pronúncia parecidas com as de
outra, mas sentido totalmente diverso.
2. Assim, é preciso atentar às seguintes palavras parônimas: arrear (pôr
arreio) e arriar (baixar, ceder); deferir (conceder) e diferir (diferenciar);
deferimento (anuência, aprovação) e diferimento (adiamento,
prorrogação); delatar (denunciar) e dilatar (aumentar, prorrogar);
eminência (elevação, altura, proeminência) e iminência (característica do
que está prestes a acontecer); eminente (ilustre) e iminente (que está para
acontecer); flagrância (estado do que é flagrante, do que ocorre no ato) e
fragrância (perfume agradável); flagrante (no ato) e fragrante
(perfumado); infligir (aplicar) e infringir (transgredir); ratificar
(confirmar) e retificar (corrigir); sortir (abastecer) e surtir (resultar);
vultoso (volumoso) e vultuoso (atacado de congestão na face).
3. Não confundir com as homógrafas, que são palavras de mesma grafia,
mas de pronúncia diferente (pôde – pretérito perfeito – e pode – presente
do indicativo; colher – verbo – e colher – substantivo).
4. Também não confundir com as homófonas, que são palavras de mesma
pronúncia, mas de grafia diversa (caçar e cassar; cessão e sessão).
Ver Acento diferencial de número (P. 65), Acento diferencial de timbre (P.
66) e Acento diferencial de tonicidade (P. 66).
Participar
1. Quando tiver o sentido de avisar, informar, na lição de Antonio
Henriques e Maria Margarida de Andrade (1999, p. 89), há dupla
construção possível: a) participar alguém de alguma coisa; b) participar
alguma coisa a alguém. Exs.: a) “O advogado participou o juiz da
impossibilidade de comparecimento do réu”; b) “O advogado participou
ao juiz a impossibilidade de comparecimento do réu”.
2. Desse modo, também se dirá, fazendo-se a substituição pelos pronomes:
a) “O advogado participou-o da impossibilidade de comparecimento do
réu”; b) “O advogado participou-lhe a impossibilidade de
comparecimento do réu”.
3. Observe-se, contudo, que não são corretas as seguintes estruturas, que
têm ou dois objetos diretos ou dois objetos indiretos: a) “O advogado
participou o juiz a impossibilidade de comparecimento do réu”; b) “O
advogado participou ao juiz da impossibilidade de comparecimento do
réu”.
4. Nos textos de lei, tais construções são obedecidas, com a observação
oportuna de que, quando transitivo direto, admite emprego na voz
passiva. Exs.: a) “O segurado deve sem demora participar ao
segurador.. todas as notícias…” (C. Com, art. 719); b) “A concessão de
férias será participada, por escrito, ao empregado, com antecedência
de, no mínimo, 10 (dez) dias…” (CLT, art. 135); c) “Se chegar ao
conhecimento do depositário que a coisa provém de crime, deve
imediatamente participar o depósito à pessoa a quem foi subtraída ou,
não sabendo quem é, ao Ministério Público…” (CCp, art. 1.192º, 3); d)
“Toda a pessoa que tiver notícia de qualquer infração penal poderá
participá-la ao juiz da comarca em que foi cometida…” (CPPp, art.
160º)
5. Também seguem a mesma construção os verbos aconselhar, avisar,
certificar, prevenir.
Ver Partilhar (P. 553).
Particípio duplo
Ver Verbos abundantes (P. 759).
Particípio passado
Ver Concordância do particípio passado (P. 208) e Verbos abundantes (P.
759).
Partícula apassivadora
1. É uma das diversas funções do pronome se, empregado com verbos
transitivos diretos ou bitransitivos, para a formação da voz passiva
sintética ou pronominal.
2. Também denominada pronome apassivador.
Ver Voz passiva e Pronome apassivador (P. 791), Voz passiva sintética (P.
794) e Vozes verbais (P. 791).
Partilhar
1. Retratando seu corrente emprego nos meios forenses, anota Edmundo
Dantès Nascimento que é “mais ou menos comum a sinonímia que se
observa nos arrazoados e julgados dos verbos partilhar com participar”.
2. Acrescenta, todavia, tal autor que “em linguagem escorreita não se deve
fazer esta conclusão”.
3. Para ele, aconselhável é usar partilhar no sentido de fazer partilha,
dividir, repartir, partir, separar, desunir, apartar e semelhantes, enquanto
o verbo participar deve ser empregado, além dos conhecidos, para a
significação de comunicar, avisar, tomar parte, ser participante, associar-
se, compartilhar, compartir.
4. Lembrando que apenas Heráclito Graça se posta em sentido contrário,
resume ele a opinião de “outros tratadistas de prol” – como Túlio Silva,
João Ribeiro e Cândido Figueiredo – com lição de Mário Barreto: “o
mais prudente e seguro é evitar-se o emprego de partilhar no sentido de
participar”.
5. E alinha, em abono, significativos exemplos de autores insuspeitos, no
que tange ao verbo a ser usado em tais casos (NASCIMENTO, 1982, p.
157): a) “Vale, porém, a estipulação do contrato que exima o sócio de
indústria de compartir as perdas sociais” (Rui Barbosa); b) “Viver sob
suas ordens e compartir de seus cuidados…” (Mário Barreto).
6. Francisco Fernandes (1971, p. 450), sem outras ressalvas, dá o verbo
partilhar como sinônimo de participar.
7. Desse mesmo modo de pensar é Celso Pedro Luft (1999, p. 392), que
exemplifica, admitindo duas regências: a) “Partilhar ideias”; b)
“Partilhar sentimentos com alguém”; c) “Partilhar das ideias”; d)
“Partilhar dos sentimentos de alguém”.
Ver Participar (P. 552).
Passim
1. Advérbio latino com o significado de aqui e ali, passim é de largo uso
nos meios jurídicos, sobretudo nas citações de livros, para indicar que as
passagens sobre o assunto em estudo se encontram aqui e ali, isto é, em
mais de um lugar.
2. Sua pronúncia é paroxítona (pássim).
3. De conformidade com Vitório Bergo, é “latinismo, equivalente a aqui e
ali, em diversos pontos” (1944, p. 184).
4. Em confirmação dos aspectos até agora observados, o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
órgão incumbido oficialmente de determinar a existência dos vocábulos
em nosso idioma, além de sua grafia oficial, registrava-o como advérbio
latino e lhe conferia a pronúncia pássim (1999, p. 567). As edições de
2004 e 2009 do VOLP, no entanto, apenas trazem o registro de advérbio
latino, nada comentando sobre a sua pronúncia (2009, p. 863). Isso,
contudo, não significa alteração alguma no que concerne à posição
oficial sobre o assunto, expressa na edição de 1999.
5. Por se tratar de vocábulo pertencente a outro idioma, obrigatória é a
utilização das aspas, negrito, itálico, sublinha ou grifo equivalente.
Passos perdidos
Ver Salão dos Passos Perdidos – O que é? (P. 677)
Páteo – Existe?
Ver Existe em português? (P. 346)
Patronímico
Ver Nome (P. 497).
Pedir para
1. No campo da regência verbal, a questão que surge com tal verbo é a
mesma que formulava Rui Barbosa em sua Réplica: será lícita, em
português, a construção pedir para ir, pedir para ler?
2. Observa-se, por primeiro, a circunstância de que Cândido de Figueiredo
condena liminarmente o uso de tal construção, e Silveira Bueno (1938,
p. 119), muito embora reconheça a existência de mestres que defendam o
contrário, por entenderem oculta a palavra licença em frases como
“Fulano pediu para falar” – no que veriam a significação de “Fulano
pediu licença para falar” – é do entendimento de que “a expressão pedir
para … não é correta justamente porque o verbo transitivo exige objeto
(direto) e a preposição para impede tal objetividade direta”.
3. Rui Barbosa, na sequência da indagação feita, restringia a possibilidade
de emprego da expressão pedir para ao caso em que, a seguir, ou vem
expressa, ou se subentende a palavra licença, como nos seguintes
exemplos: a) “Pediu ela licença para responder”; b) “Pediu ela para
responder”.
4. Do mesmo entendimento de Rui Barbosa é Artur de Almeida Torres
(1967, p. 221), ao observar que mostram “os exemplos dos bons
escritores que o verbo pedir admite após si a partícula para quando tem
elítico o objeto direto licença ou autorização”.
5. O certo, entretanto, é que, do cruzamento da primeira forma (com o
objeto direto expresso) com a segunda (com o objeto direto
indeterminado), resultou uma terceira – do verbo pedir seguido da
preposição para, sem nenhum adjunto adverbial de fim, mas com a ideia
de objeto direto: “Ela lhe pediu para responder”, sentença essa que
corresponde exatamente ao sentido de “Ela pediu que ele respondesse”.
6. É certo que Vitório Bergo admite “a construção do verbo pedir com
complemento regido da preposição para quando entre esta e aquele se
subentende licença, permissão, ordem” (1944, p. 185).
7. Na lição de José de Sá Nunes, todavia, “respectivamente ao verbo pedir
com objeto regido da preposição para, em que pese aos grandes mestres
que reprocham esta sintaxe, e só a admitem quando há elipse do
complemento direto, a mim não me é possível condená-la, pois os
aperfeiçoadores do nosso idioma escrevem desse jeito” (1938, p. 9).
8. E alinha tal gramático, em continuação, exemplos de abonados escritores
do nosso idioma: a) “Ia pedir ao nosso padre cura para me fazer alguma
rezazinha” (Antônio Feliciano de Castilho); b) “… pediu para falar a
sós com Atanagildo” (Alexandre Herculano); c) “Padre Antônio pediu
para ficar só comigo” (Camilo Castelo Branco); d) “Minha mãe ficou
perplexa quando lhe pedi para ir ao enterro” (Machado de Assis).
9. Trazendo à baila essa polêmica entre as correntes, Francisco Fernandes
(1971, p. 454) assim se manifesta: “Não obstante, é comum encontrar,
em escritores de boa nota, exemplos da construção condenada”. Exs.: a)
“Ao fim desse tempo, ela pretextou um livro, que estava em cima das
músicas e pediu-me para dizer se o conhecia” (Machado de Assis); b)
“Carlota vinha pedir a Augusta para ir cantar num concerto que ia dar
em casa” (Machado de Assis); c) “Um mouro viera aí pedir a sua
reverência para ir ver uma pobre mulher que se morria” (Alexandre
Herculano); d) “Peço para ser vogal do júri… mas declaro desde já que
não voto em gordas, nem tolas, nem beatas” (Garrett).
10. E Celso Pedro Luft, fundado em lição de Matoso Câmara Júnior, refere
que tal sintaxe é construção moderna e “é a mais usual no português do
Brasil” (1999, p. 395).
11. Do ensino de Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 312), podem-se
extrair os seguintes excertos: a) “De acordo com a gramática
tradicional, a construção pedir para alguma coisa só é correta quando
se pode subentender uma das palavras licença, permissão,
autorização”; b) “Vetado é também usar pedir para que (em vez de
pedir que)”; c) “Cabe observar, entretanto, que não há, entre os
gramáticos, consenso sobre a matéria, pois frequentemente se deparam,
em escritores de renome, abonações da sintaxe condenada”; d) “Como
se trata de um caso controvertido, recomendamos que, pelo menos na
linguagem culta formal, se siga, acerca do verbo pedir, a doutrina
tradicional, podendo-se usar as construções incriminadas na
comunicação familiar do dia a dia.”
12. Em linhas gerais, todavia, o que se nota é que, embora a estrutura
questionada receba a condenação de alguns, é defendida por outros,
que a respaldam com significativos exemplos de escritores os mais
autorizados; e, ante a divergência entre os gramáticos, o melhor é
seguir o princípio segundo o qual, na dúvida, deve-se conferir
liberdade de emprego ao usuário.
Pegado ou Pego?
Ver Pegar (P. 554).
Pegar
1. Na lição de Luiz Antônio Sacconi, “o verbo pegar é abundante na língua
familiar; não o é na língua culta” (1979, p. 76).
2. Pasquale Cipro Neto e Ulisses Infante (1999, p. 175) lecionam que esse
verbo, na língua culta, apresenta apenas o particípio passado regular
(pegado).
3. Antonio Henriques, de igual modo, preconiza pegado como a “única
forma aceitável do particípio passado de pegar” (1999, p. 141).
4. Silveira Bueno preconiza a continuidade de existência e a possibilidade
de uso normal de ambos os particípios – pegado e pego – de acordo com
as regras previstas para os verbos abundantes no particípio: “com os
verbos ter e haver usamos o particípio longo, invariável… Com os
verbos ser e estar usamos o particípio breve, variável” (1938, p. 88).
5. Na lição de Vitório Bergo, o particípio passado regular (pegado) é
“forma correta, usada pelos clássicos em vez de pego, que é moderna, e
nos diversos sentidos usuais, como seguro, medrado, rente, etc.” (1944,
p. 185).
6. Para Cândido de Oliveira, “ganho, gasto, pago, pego são usados
indiferentemente para ambas as vozes (com qualquer auxiliar)”, e “os
particípios ganhado, gastado, pagado, pegado tendem a desaparecer”
(1961, p. 205).
7. Em outra obra escrita com Regina Toledo Damião, anota Antonio
Henriques (1994, p. 243) que, “apesar do uso corrente da forma pego,
ainda sobrevive entre bons autores a forma pegado” na atualidade.
8. Para Sousa e Silva (1958, p. 208), que invoca a autoridade de Eduardo
Carlos Pereira e de José Oiticica, pego “é um dos particípios de pegar (o
outro é pegado), desconhecido, talvez, em Portugal, mas comuníssimo
no Brasil”.
9. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 313) assim resume a questão da
sintaxe desse verbo, no que tange ao uso de seu particípio passado: a)
Pegado “se usa com os verbos ter e haver” (Homens da vizinhança
tinham (ou haviam) pegado o animal); b) Pego é “forma contrata de
pegado” e “se usa, de regra, com os verbos ser e estar” (O cão foi pego
pelos moradores da vizinhança – O animal estava pego); c) “Há
tendência para se usar pego na forma ativa” (Um morador vizinho tinha
(ou havia) pego o animal).
10. Ante a divergência apresentada entre os gramáticos, podem-se extrair
as seguintes conclusões, de integral validade para o usuário da norma
culta: a) o verbo pegar é abundante, assim na língua familiar como na
língua culta, apresentando os dois particípios passados – pegado e
pego; b) com tais particípios, o normal é seguir as regras previstas para
os verbos abundantes e usar pegado com os verbos ter e haver, e pego
com os verbos ser e estar; c) empregar, todavia, pego com os auxiliares
ter e haver não pode ser considerado um erro; d) se pegado tende a
desaparecer, o certo é que ainda existe e é usado em nosso idioma nos
dias de hoje.
11. Ultime-se com a anotação de que a pronúncia do particípio passado
irregular pego é fechada (ê), e não aberta (é), como alguns teimam em
dizer (CEGALLA, 1999, p. 313), até porque pego “com a vogal e
aberta é forma do verbo pegar (eu pego)”.
Ver Verbos abundantes (P. 759).
Péla
Ver Acento diferencial de tonicidade (P. 66).
Pélo
Ver Acento diferencial de tonicidade (P. 66).
Pêlo ou Pelo?
Ver Acento diferencial de tonicidade (P. 66).
Pena
Ver Penalizar ou Apenar? (P. 556)
Penalizar ou Apenar?
1. Penalizar é verbo que usualmente tem o sentido de causar pena, afligir.
Exs.: a) “Penalizava-o o ar de tristeza das crianças pobres”; b)
“Penalizava-me assistir ao drama daqueles presos sem julgamento”.
2. Nos meios jurídicos e forenses, também tem sido empregado com
frequência na acepção de punir, impor penalidade. Exs.: a) “O Ibama
penalizou a madeireira”; b) “O juiz penalizou o réu com dois meses de
detenção”.
3. Nessa última significação, todavia, Domingos Paschoal Cegalla (1999,
p. 314) o considera um “neologismo dispensável”, preconizando sua
substituição por punir ou prejudicar, conforme o caso.
4. Apesar disso, Celso Pedro Luft (1999, p. 397) apresenta o referido verbo
exatamente no sentido de impor penalidade a, de sujeitar a penalidade,
de castigar, de punir, como no exemplo: “Penalizar os infratores da lei”.
5. Em verdade tais problemas decorrem de que este verbo é derivado de um
substantivo polissêmico: pena. Este vocábulo pode ter os seguintes
significados: a) castigo – sentido em que forma o verbo apenar
(condenar a pena, aplicar a pena). Ex.: “O juiz apenou o réu”; b) dó,
piedade – sentido em que forma o verbo penalizar (causar pena). Ex.: “A
situação das crianças penalizou o advogado”; c) pluma – sentido em
que forma os verbos empenar (criar penas ou enfeitar com penas) e
depenar ou despenar (tirar as penas ou, na gíria, extorquir dinheiro
astuciosamente). Exs.: i) “O frango, enfim, está empenando”; ii) “Antes
de ser trinchado, o peru deve ser despenado”; iii) “Depenaram o coitado
no cassino”; d) e ainda pode ter o significado de sacrifício, como no
maravilhoso poema de Fernando Pessoa: “Tudo vale a pena / Se a alma
não é pequena…”.
6. Resuma-se, por fim, que, ante a divergência entre os gramáticos –
Cegalla o considera um neologismo dispensável e Luft lhe defende
integralmente o emprego – deve-se aceitar indistintamente o uso de
penalizar ou de apenar no sentido de aplicar pena ou de impor pena.
Vale, nesse caso, o vetusto brocardo de que, na dúvida entre os
estudiosos, deve-se conferir liberdade ao usuário.
Penhora
1. Trata-se do “ato judicial de constrição, no processo executivo contra
devedor solvente, com a finalidade de alienar a coisa subtraída à
administração, desse, para, com o produto, satisfazer a dívida executada”
(SIDOU, 1990, p. 412). Ex.: “Pela penhora, o bem do devedor ficou
vinculado à execução que lhe foi movida pelo credor”.
2. Não se faça confusão entre penhor e penhora, institutos jurídicos que
claramente se distinguem: a) “O penhor é a garantia dada pelo devedor,
espontaneamente ou por imposição legal”; b) Já a penhora – ato sempre
determinado pelo juiz – “é a apreensão de bens, dados ou não em
garantia, para que por eles se cobre o credor do que lhe é devido pelo
executado” (DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p. 12).
3. No que tange ao verbo que precede tal vocábulo, é comum ver-se, nos
meios forenses, o uso de expressões como procedida a citação,
procedida a intimação, procedido o inventário, procedida a penhora.
4. A esse respeito, porém, é de se ver que o verbo proceder, dentre seus
significados, tem o sentido de dar início, em que é transitivo indireto,
exigindo a preposição a. Ex.: “O magistrado procedeu ao inventário dos
bens deixados pelo falecido”.
5. Tendo normalmente voz passiva, em nosso idioma, apenas os verbos
transitivos diretos, não os transitivos indiretos, vale transcrever, nesse
sentido, a lição de Aires da Mata Machado Filho: “Na acepção de
instaurar ou fazer, o verbo proceder é relativo (mais precisamente
transitivo indireto na nomenclatura em vigor) e rege a preposição a…
Por ser relativo, não pode ser apassivado; é, pois, errônea a construção:
As análises foram procedidas – em vez de: – Procedeu-se às análises.
Também em lugar de exame procedido se deve dizer exame realizado, ou
coisa parecida” (1969, p. 606).
6. Exatamente pelos aspectos referidos, incorretas são as expressões
procedida a citação, procedida a intimação, procedido o inventário,
procedida a penhora.
7. Em seu lugar, dever-se-á dizer: feita a citação, ou efetivada a intimação,
ou realizado o inventário, ou lavrada a penhora.
Ver Voz passiva – Quando é possível? (P. 793)
Pensamos
Ver Primeira pessoa do plural (P. 600).
Pênsil
1. Após referir que, em Portugal, tal vocábulo se insere entre os
paroxítonos, formando o plural em eis, Júlio Nogueira (1930, p. 165)
estranhamente observa que, no Brasil, a tendência da língua é tê-los por
oxítonos, fazendo, por conseguinte, o plural em is: portanto, pensil e
pensis.
2. O autor do presente trabalho, todavia, confessa jamais ter ouvido de
outrem semelhante lição, nem alguém pronunciar no Brasil tal vocábulo
com o acento oxítono (pensil), mas sim com o acento paroxítono
(pênsil).
3. Em corroboração a esse entendimento, o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras – que é o veículo
oficial para dirimir dúvidas acerca da existência ou não de vocábulos em
nosso idioma, bem como de sua correta pronúncia e acentuação gráfica –
registra, em sua edição de 1999, tão somente pênsil para o singular e
pênseis para o plural (p. 575). As edições de 2004 e 2009, no entanto,
nada trazem a respeito da pronúncia, mas registram o vocábulo apenas
entre as paroxítonas (2009, p. 636), motivo pelo qual assim devemos
considerá-lo, até porque essa posição é a lei.
Penso
Ver Primeira pessoa do plural (P. 600).
Pequeno
Ver Mais grande ou Maior? (P. 453)
Pequeno Vocabulário
1. Designação resumida do Pequeno Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, aprovado e publicado pela Academia Brasileira de Letras e
mandado adotar oficialmente no Brasil, em 1943 (BERGO, 1944, p.
188).
Ver Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (P. 785).
Per
Ver Preposição – Quando deve ser repetida? (P. 595).
Perca – Existe?
Ver Existe em português? (P. 346)
Percentagem ou Porcentagem?
Ver Porcentagem ou Percentagem? (P. 575)
Percentual ou Porcentual?
1. Nos dizeres de Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 315), ao considerar
os vocábulos percentual e porcentual, “ambas as formas são corretas,
mas a mais usada é a primeira”.
2. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, que é o veículo oficial para dirimir dúvidas acerca
da existência ou não de vocábulos em nosso idioma, também registra
ambas as formas, dando-as como variantes e sinônimas (2009, p. 638 e
667), o que implica asseverar que está oficialmente autorizado o
emprego de qualquer uma delas.
Ver Porcentagem ou Percentagem? (P. 575)
Perdas e danos
1. Expressão consagrada no ordenamento jurídico para significar
genericamente prejuízo, constitui a responsabilidade patrimonial do
devedor, quando este não cumpre a obrigação, ou deixa de cumpri-la
pelo modo e no tempo devidos (art. 1.056 do Código Civil); salvo as
exceções previstas pelo próprio Código, nos termos do art. 1.059, caput,
do mesmo diploma civil, as verbas devidas a tal título abrangem, além
do que o credor efetivamente perdeu (dano emergente), o que ele
razoavelmente deixou de lucrar (lucro cessante).
2. Apresenta a expressão uma peculiaridade quanto à concordância
nominal, observável facilmente no mencionado art. 1.059 do Código
Civil de 1916: “As perdas e danos devidos ao credor…”: o artigo as, que
antecede os substantivos, está no feminino, enquanto o adjetivo devidos,
que se refere a ambos os substantivos, está no masculino.
3. No caso, tanto o as (um artigo) como devidos (forma verbo-nominal de
particípio passado do verbo dever) são palavras de valor adjetivo, as
quais se referem concomitantemente a dois substantivos: perdas
(feminino plural) e danos (masculino plural).
4. Ora, pelas regras de concordância nominal, se o adjetivo ou palavra
equivalente modificam dois ou mais substantivos e a estes precedem,
concordam, por regra, com o mais próximo; no caso, o artigo as está no
feminino plural exatamente para concordar com o núcleo mais próximo,
a saber, com perdas.
5. Por outro lado, também pelas regras de concordância nominal, se o
adjetivo qualifica dois ou mais substantivos e vem depois deles, pode
concordar com a soma deles ou com o mais próximo; na hipótese sob
análise, o adjetivo devidos está no masculino plural, e isso se dá quer
porque o substantivo mais próximo é masculino plural, quer porque a
soma dos dois substantivos (feminino plural mais masculino plural) só
resulta em masculino plural.
6. Pelas próprias observações feitas, vê-se que tecnicamente inviável a
concordância “as perdas e danos devidas…”; em realidade, afastada a
possibilidade de tal significar concordância com o núcleo mais próximo,
não se há de olvidar que, se há um núcleo masculino em tais casos, a
resultante soma sempre será masculino plural.
7. Significativos exemplos de Eduardo Carlos Pereira demonstram o acerto
da construção as perdas e danos devidos, em que o artigo inicial
concorda com o substantivo mais próximo (perdas), enquanto o adjetivo
final concorda com a soma de ambos os substantivos (perdas + danos),
de que resulta o gênero masculino: “Seus temores e esperanças vãs” ou
“suas esperanças e temores vãos”, exemplos esses que são transcritos e
abonados por José de Sá Nunes (1938, p. 65-6).
Perdoar
1. Quanto à regência verbal considerada em sua forma ortodoxa, tem esse
vocábulo duas transitividades.
2. É verbo transitivo direto, se o complemento é coisa. Exs.: a) “O
Vencedor perdoou o débito”; b) “O vencedor perdoou-o”.
3. É transitivo indireto, se o complemento é pessoa. Exs.: a) “O vencedor
perdoou ao vencido”; b) “O vencedor perdoou-lhe”.
4. Admite também ser construído com os dois complementos. Exs.: a) “O
vencedor perdoou o débito ao vencido”; b) “O vencedor perdoou-lho”.
5. Em termos históricos, Pedro A. Pinto (1924, p. 232-5), sem outras
considerações, mas trazendo consigo exemplos de Francisco de Morais,
de Bernardim Ribeiro e de Machado de Assis, reputa igualmente correto
construí-lo com objeto direto, mesmo quando se trata de complemento
que seja pessoa, dando o exemplo: “Assim procedeu, porque sabia que o
governo havia de perdoá-lo”.
6. Otoniel Mota (1916, p. 214) chega a lecionar que a sintaxe com o objeto
indireto seria mais usual no português antigo, e que a tendência moderna
seria abolir tal construção, de modo que comum é que se ouça fora dos
meios cultos e da literatura “perdoei o homem”, e não “perdoei ao
homem”.
7. Lembra Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 316) que, “no português
moderno, é corrente a construção perdoar alguém, ainda que contrarie o
ensino dos gramáticos”. Exs.: a) “Bruna não a perdoaria nunca, se a
visse assim” (Lygia Fagundes Teles); b) “Queria perdoá-lo, embora com
dúvidas, pois sabia que esse homem era um enigma” (José Geraldo
Vieira).
8. Nos dizeres de Silveira Bueno (1957, p. 333), referindo-se a pessoas, “o
verbo perdoar tanto pode reger complemento indireto (perdoai-lhes)
como direto (perdoai-os)”.
9. Já Artur de Almeida Torres (1967, p. 224), em posicionamento mais
ortodoxo, após reconhecer que esse verbo “no português antigo regia
acusativo de pessoa” (vale dizer, permitia a construção da pessoa como
objeto direto), “atualmente só rege acusativo de coisa e dativo de pessoa:
perdoar alguma coisa a alguém” (isto é, a coisa só pode ser objeto direto,
e a pessoa só pode ser objeto indireto).
10. Em indispensável obra, Francisco Fernandes assim posiciona o
problema: a) “Nos clássicos antigos é comum encontrar-se o verbo
perdoar com o acusativo de pessoa” (objeto direto); b) “Otoniel Mota
aceita, ainda hoje, semelhante regência…, ao passo que E. Carlos
Pereira…, Júlio Nogueira… e outros a rejeitam por anacrônica…”
(FERNANDES, 1971, p. 457-8).
11. De Celso Pedro Luft (1999, p. 399) se podem extrair as seguintes
lições: a) “Perdoar algo a alguém é a construção primária, com objeto
direto de coisa e indireto de pessoa”; b) “Mas também ocorre objeto
direto de pessoa, perdoar alguém (perdoá-lo), construção derivada, nos
clássicos antigos e modernos” (Camões e Machado de Assis); c) A
construção com objeto direto de pessoa “é sintaxe usual no português
contemporâneo do Brasil”; d) “Essa alteração de regência tem
explicação semântica (influência de escusar ou desculpar, e poupar)…
e sintática: na ausência (por indeterminação) do objeto direto (de
coisa), pode o indireto tomar-lhe o lugar”; e) “Não há pois motivo para
gramáticas e dicionários… continuarem reprovando essa sintaxe”; f)
“O mais que se pode é aconselhar a sintaxe primária, lógica, para a
linguagem culta formal”.
12. De toda essa polêmica entre os doutos, o melhor, ainda para os dias de
hoje, parece ser dar preferência, nos textos que devam submeter-se à
norma culta, como é o caso dos jurídicos e forenses, à estruturação fixa
(objeto direto para coisa e objeto indireto para pessoa), muito embora
não se possa, ante a autoridade dos que defendem postura mais liberal,
condenar como errados exemplos que fazem da pessoa um objeto
direto.
13. De Portugal vêm dois exemplos de seu emprego no âmbito das leis: a)
“A doação não é revogável por ingratidão do donatário: […] c) Se o
doador houver perdoado ao donatário” (CCp, art. 975º, c); b) “O
marido não poderá querelar, se perdoou a qualquer dos corréus, ou se
reconciliou com a mulher” (CPp, art. 402º)
Ver O devedor foi perdoado – Está correto? (P. 518), Voz passiva –
Quando é possível? (P. 793) e Voz passiva sintética (P. 794).
Performance – Existe?
1. Mais uma vez se torne a uma observação importante: a autoridade para
fixar a existência das palavras em nosso idioma é da Academia
Brasileira de Letras, que edita regularmente o Vocabulário Ortográfico
da Língua Portuguesa, uma espécie de dicionário que lista as palavras
reconhecidas oficialmente como pertencentes ao nosso léxico, bem como
lhes fornece a grafia oficial, muito embora normalmente não lhes
comente o significado.
2. Ao editar regularmente o VOLP, a ABL desincumbe-se de uma
delegação legal, já que a vetusta Lei Eduardo Ramos, de n. 726, de
8/12/1900, incumbiu-a de editar regularmente essa lista oficial dos
vocábulos de nosso idioma.
3. Ora, uma consulta à edição de 2009 da mencionada obra revela a
ausência do vocábulo performance como integrante de nosso léxico,
registrando-o apenas entre as palavras estrangeiras (p. 863), de modo
que ele há de ser tido, para todos os efeitos, como palavra não
pertencente ao nosso idioma.
4. Os que poderiam pensar em ver no mencionado vocábulo um
neologismo não devem esquecer que, para a existência regular deste no
idioma, faz-se, tecnicamente, dupla exigência: estruturação adequada em
nosso idioma + ausência de sinônimo em nossa língua. Essa, aliás, é a
lição de Napoleão Mendes de Almeida: “Para que se justifique, o
neologismo deve, antes de tudo, ser necessário e, depois, formado de
acordo com o gênio da língua. Não sendo conveniente nem corretamente
formado, o neologismo passa a ser barbarismo” (1981, p. 208).
5. Para o caso específico de performance, tem-se um sinônimo perfeito,
que se enquadra em toda a ampla acepção do vocábulo considerado, que
é desempenho, o que torna injustificável a tese de um neologismo.
Pérfuro
1. Trata-se de adjetivo que tem o sentido de perfurante, servindo de
primeiro elemento para a formação de outros adjetivos.
2. Em Medicina Legal, é termo que serve para indicar os instrumentos ou
armas normalmente terminados em pontas agudas, que perfuram os
órgãos, distinguindo-se “dos contundentes, que somente batem ou
malham, e dos cortantes, que têm gume para cortar” (DE PLÁCIDO E
SILVA, 1989, p. 352).
3. Como primeiro elemento de adjetivo composto, pode associar-se a
outros, daí resultando perfurocontundente, ou perfurocontuso, e
perfurocortante, conforme tenha o instrumento ou arma a capacidade de,
ao mesmo tempo, perfurar e bater, ou de perfurar e cortar.
4. Ao longo dos tempos, quanto à grafia de adjetivos compostos assim
formados, havia divergência entre os doutos, a começar por Aurélio
Buarque de Holanda Ferreira (s/d, p. 1.069), que unia os dois elementos
em uma só palavra, registrando perfurocortante.
5. Já Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 231) e Cândido Jucá Filho
(1963, p. 479) uniam por hífen os dois elementos, obviamente
acentuando o adjetivo sob estudo, por proparoxítono: pérfuro-contuso,
pérfuro-cortante.
6. Registre-se que Silveira Bueno (1938, p. 218) se insurge contra a
pronúncia proparoxítona (pér) de tal adjetivo, aduzindo que o caso é de
simples justaposição, hipótese em que conserva cada termo a sua
primitiva prosódia; assim, para ele, a pronúncia do primeiro adjetivo há
de ser paroxítona (fu).
7. Observe-se, contudo, que o que se tem ouvido no foro é, apenas e tão
somente, a pronúncia pér.
8. Anote-se, por fim, quer quanto à grafia, quer quanto à pronúncia, que o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira
de Letras, órgão oficialmente incumbido de definir quais as palavras
integrantes de nosso léxico, além de sua correta grafia, pronúncia e
acentuação, em sua primeira edição após o Acordo Ortográfico de 2008,
repetindo o que fixara desde sua primeira edição (1999), não registra
autonomamente o elemento pérfuro nem perfuro, e, quanto aos
compostos, apenas faz constar perfurocortante, assim sem hífen e sem
possibilidade de verificação da prosódia adotada (2009, p. 639).
Perito ou Périto?
1. Quanto à prosódia, trata-se de palavra paroxítona, tendo maior força de
pronúncia sobre a penúltima sílaba (rí).
2. Não se sabe de onde se originou o erro comum de sua grafia e pronuncia
como proparoxítona (périto); talvez do desejo de demonstrar falsa
erudição nos meios jurídicos por parte de alguns despreparados.
3. Seu sinônimo muito usado, e corretamente, é experto.
Ver Peritagem – Está correto? (P. 561)
Permissa venia
Ver Adjetivação desnecessária (P. 80).
Perquirir
1. Em inquérito, inquirir, perquirir, o u não é pronunciado, como, aliás,
bem lembra Silveira Bueno (1938, p. 179).
Perseguir
1. Tendo o grupo gu, neste caso, a exclusiva finalidade de conferir ao g seu
som original antes de e e de i, os verbos em guir (quando o u não é
proferido) perdem o u antes de a e de o; assim: persigo, persegues,
perseguimos, persigamos.
2. Seguem o mesmo modelo todos os verbos terminados em guir, desde
que o u não seja pronunciado (conseguir, distinguir, extinguir, prosseguir,
seguir).
3. Em oportuna observação, Carlos Góis e Herbert Palhano (1963, p. 113)
lembram, com propriedade, que, dos verbos terminados em guir, apenas
arguir e redarguir têm o u pronunciado.
Personagem
1. Para Napoleão Mendes de Almeida, seu gênero fixo é o feminino, ainda
que se refira a pessoa do sexo masculino. Ex.: “Otelo é uma personagem
muito expressiva da criação de Shakespeare”.
2. Segundo tal autor, constituiria galicismo o uso de tal vocábulo com o
gênero masculino (ALMEIDA, 1981, p. 232).
3. Para Domingos Paschoal Cegalla, “com referência a mulheres deve-se
usar o feminino: Capitu é a personagem central do romance Dom
Casmurro” (1999, p. 317).
4. Cândido Jucá Filho, porém, embora reconheça ser mais regular o
feminino, aponta-a como palavra tanto masculina quanto feminina, cujo
uso independe do gênero do vocábulo a que se refere, como dá
testemunho o exemplo que cita: “Caxias foi uma grande personagem na
Guerra do Paraguai” (1963, p. 481).
5. Para João Ribeiro, “hoje se diz arbitrariamente: o ou a personagem”
(1923, p. 70), acrescentando tal gramático, em outra passagem de sua
obra, que tal vocábulo “ainda hoje tem gênero incerto” (p. 158).
6. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira também partilha do entendimento
desse último autor, exemplificando de modo expressivo: “A criança é
um dos personagens mais bonitos do quadro” (s/d, p. 1.075).
7. Júlio Ribeiro arrola-o entre os substantivos que “são indiferentemente
masculinos ou femininos” (1908, p. 88).
8. Também para Evanildo Bechara (1974, p. 87), a palavra tanto pode ser
masculina quanto feminina.
9. Celso Cunha, de modo taxativo, leciona: “Diz-se, indiferentemente, o
personagem ou a personagem com referência ao protagonista homem ou
mulher” (1970, p. 98).
10. Vasco Botelho de Amaral observa que “continua e continuará talvez a
hesitação acerca do gênero desta palavra, que nuns autores surge
masculina, noutros feminina e, às vezes, no mesmo ora masculina ora
feminina, como em Herculano”.
11. Acrescenta que, no início do século, dava-se preferência ao feminino,
muito embora em Camilo Castelo Branco predominasse o masculino
(AMARAL, 1939, p. 47).
12. Cândido de Oliveira (1961, p. 134) arrola-o entre os comuns de dois
gêneros: a) “Hamlet é um personagem difícil de interpretar”; b)
“Julieta é uma personagem romântica”.
13. Cândido Jucá Filho registra que, no português arcaico, “inúmeras
palavras que tinham o sufixo agem eram masculinas. Com o tempo,
todas vieram dar em feminino, apesar do castelhano e do francês terem
preferido o masculino. Personagem, porém, ficou indeciso, quer se
trate de homem, quer de mulher… No Brasil, tem predominado
porventura o masculino, mesmo tratando-se de mulher” (1954, p. 30).
14. Lembrando que se usa tal vocábulo, indiferentemente, como masculino
e como feminino, observa Sousa e Silva que “a condenação do
masculino é mero arbítrio, não se apoia nos fatos da linguagem” (1958,
p. 210).
15. Para Arnaldo Niskier, “apesar de os puristas insistirem em considerar
personagem como um substantivo exclusivamente feminino,
modernamente, ele pode também ser usado no masculino” (1992, p.
55).
16. Dirimindo quaisquer dúvidas, o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras e portador da
incumbência de listar oficialmente as palavras de nosso léxico, registra
personagem como um substantivo de dois gêneros (2009, p. 643), o
que permite extrair duas conclusões: a) a palavra pode ser empregada
no masculino ou no feminino, indiferentemente; b) tal uso facultativo
independe do gênero da palavra a que se refira, de modo que estão
corretas todas as seguintes expressões: a) “Capitu é a personagem
central do romance Dom Casmurro”; b) “Capitu é o personagem
central do romance Dom Casmurro”; c) “Caxias foi um grande
personagem na Guerra do Paraguai”; d) “Caxias foi uma grande
personagem na Guerra do Paraguai”.
Perto de
1. No que concerne à concordância verbal, de Laudelino Freire (1937b, p.
64) vem oportuna observação: “Se o atributo no plural vier regido de
locução prepositiva – cerca de, perto de, mais de, menos de, etc. –, o
verbo pode ficar no singular”. Exs.: a) “É perto de onze horas” (correto);
b) “São perto de onze horas” (correto); c) “Eram mais de dez horas”
(correto); d) “Era mais de dez horas” (correto).
2. Em tais circunstâncias, no ensino de Artur de Almeida Torres, “o verbo
ser, quando seguido das expressões perto de, cerca de e um numeral,
poderá ficar no singular ou no plural” (1966, p. 150). Exs.: a) “Era perto
de nove horas” (Machado de Assis); b) “Eram perto das duas horas”
(Alexandre Herculano); c) “Eram cerca de quatro horas” (José de
Alencar).
Pesar
1. Na conformidade com lição de Mário Barreto, este verbo tem um
primeiro sentido de medir o peso ou ter o peso, hipótese em que sua
pronúncia é aberta (é) nas formas rizotônicas. Ex.: “Pesa-me muito a
carga sobre os ombros”.
2. Na significação de dor, de arrependimento, todavia, ainda segundo
ensinamento do referido gramático, sua pronúncia é fechada (ê),
acrescentando ele que, em tal hipótese, o complemento se forma com a
preposição de (BARRETO, 1954b, p. 225), hipótese em que, no ensino
de Francisco Fernandes, a preposição serve para “indicar a causa do
pesar ou do arrependimento” (1971, p. 461). Exs.: a) “Pesa-me muito de
haver ofendido a Deus e aos homens”; b) “Pesa-nos, ó Deus, de tanta
ingratidão!” (Monte Alverne).
3. Para Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 318), entretanto, tal
pronúncia fechada do verbo é arbitrária e afetada.
4. No que concerne à pronúncia fechada no caso referido, talvez até pelos
comuns equívocos que acontecem na vida prática, o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
órgão incumbido oficialmente de determinar a existência dos vocábulos
em nosso idioma, em sua edição de 1999, contrariamente a seu usual
proceder e finalidade, asseverava de modo textual para o verbo pesar:
“como sentir desgosto, o e, se rizotônico, é fechado” (p. 582). Essa
observação não se encontra repetida nas edições de 2004 e 2009, que
nada comentam a respeito (2009, p. 644).
Ver Em que pese a (P. 313).
Pesquisar
1. Para bem se guardar a escrita de tal vocábulo, duas regras de ortografia
devem ser consideradas.
2. Por primeiro, se se tem de acrescentar a um radical o sufixo izar inteiro
para formar um verbo, grafa-se com z: fiscal, útil (primitivas) fazem
fiscalizar, utilizar (derivadas).
3. Se, porém, já existe s no radical, é ele aproveitado: análise, pesquisa,
catálise (primitivas) fazem analisar, pesquisar, catalisar.
Ver Ortografia (P. 533) e Regras de ortografia (P. 652).
Petição inicial
1. Por um lado, ao literato, que produz arte, confere-se liberdade de criação
para, em um jogo de palavras, encontrar a melhor forma de sugerir no
leitor um sentimento, o qual nem sempre foi sequer pretendido ou
pensado pelo escritor; por outro lado, ao profissional do Direito, que
produz ciência, impõe-se a obrigatoriedade de emprego da linguagem de
padrão culto, correta quanto à Gramática e apropriada quanto à
expressão.
2. Por pertencer à ciência, a linguagem do Direito é técnica e precisa, e,
assim, por via de regra, como em todas as demais ciências, será
inconveniente substituir seus termos e locuções por sinônimos, a
pretexto de evitar repetições, e isso sob pena de se incorrer na
impropriedade de expressão e de se descambar para o pernosticismo.
3. Para exemplificar, é de se ver que, apenas no capítulo respectivo que
trata do assunto, o Código de Processo Civil, em catorze artigos
(282/296), menciona nada menos do que nove vezes a palavra petição ou
a expressão petição inicial; nenhuma vez se dá, contudo, pela dicção da
lei, sua substituição por sinônimos.
4. Alguns operadores do Direito, porém, tanto para evitar repetições,
quanto para demonstrar pretensa erudição, quase nunca empregam a
adequada palavra petição ou a expressão petição inicial, mas preferem
dizer exordial, preambular, prefacial, proemial, peça vestibular, petição
de introito, esquecidos de que perfunctória consulta ao dicionário revela,
por exemplo, que petição inicial não é exórdio, nem prefácio, nem
proêmio algum do processo.
5. Incide nesse equívoco Luciano Correia da Silva ao observar, sem
qualquer reparo, que a petição inicial é “também chamada vestibular,
preambular, exordial, entre outras expressões sinônimas na linguagem
forense” (1991, p. 265).
6. Em lição abrangente para o Processo Civil e para o Processo Penal,
observa Geraldo Amaral Arruda que denúncia e petição inicial “são
expressões técnicas às quais será difícil fugir de repetir nas sentenças”.
7. E adiciona energicamente tal autor: “convém evitar o mau gosto de
substituí-las por expressões como: peça inaugural; peça processual,
exordial, exordial acusatória, pretensão punitiva inaugural, inaugural
acusatória, vestibular, peça depositária da pretensão punitiva, peça
denunciatória, requisitório ministerial” (ARRUDA, 1997, p. 12).
8. As mesmas observações, como se percebe, valem para a denúncia no
Processo Penal.
Ver Adjetivação desnecessária (P. 80) e Esposo ou Marido? (P. 331)
Pior má-fé
1. Quando se diz má-fé, a junção do adjetivo com o substantivo faz com
que se origine uma só ideia, de tal modo que a expressão passe a
significar deslealdade, resultando, psicologicamente, uma só palavra,
uma unidade lexicológica, o que, no caso, se reforça pela presença do
hífen, obrigatório, como se vê da grafia apresentada pelo Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
órgão oficialmente incumbido de definir quais as palavras integrantes de
nosso léxico, além de sua correta grafia e acentuação (2009, p. 517).
2. Ante tal consideração parece perfeitamente lícito dizer pior má-fé, como
ocorre com o seguinte exemplo de Camilo Castelo Branco: “Isso me
parece interessante – retorquiu a tia, deixando no ar um resquício da
pior má-fé” (BRANCO apud MACHADO FILHO, 1969i, p. 117-8).
3. Leciona, em verdade, Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 294) que, em
casos dessa natureza, “não assume o adjetivo a forma sintética do
comparativo”, porquanto “a língua tende a considerar essas expressões
como substantivos compostos”, e, assim, se deverá dizer: pior má-fé.
4. Significativa lição de Vitório Bergo para a expressão antônima melhor
boa-fé tem integral aplicação ao caso vertente: “Esta expressão soa hoje
como uma palavra composta, em que o adjetivo boa se tem na conta de
prefixo. Daí a frequência com que se ouve o superlativo a melhor boa-fé,
no qual parece ter havido esquecimento da redundância mais boa boa-
fé” (1944, p. 42).
5. Tais observações valem para expressões com mesma estrutura: bom-
senso, boa-fé.
Pleito
1. Significa basicamente concorrência, discussão, disputa, podendo-se
falar, por exemplo, em pleito judicial, pleito eleitoral. Exs.: a) “Em
pleito judicial de natureza meramente patrimonial e entre pessoas
maiores e capazes, não há motivo para a participação do Ministério
Público”; b) “No pleito de outubro, conheceremos os candidatos
vencedores”.
2. Não confundir com sua parônima preito, que quer dizer homenagem,
reverência, tributo.
Pleonasmo vicioso
Ver Pleonasmo – O que é e Quando pode? (P. 565)
Pletora
1. Do grego plethora (significando grande quantidade), é palavra usada em
português com o significado de demasia, excesso, superabundância. Ex.:
“O presidente do Tribunal de Justiça advertiu que essa pletora de
trabalho pode conduzir ao colapso do Poder Judiciário”.
2. Muito embora não haja razão para o uso de qualquer acento gráfico, não
surgindo dúvida alguma nesse sentido, oportuno é lembrar, quanto à
ortoepia, que a sílaba tônica tem o timbre aberto (ó).
3. O lembrete acerca da pronúncia aberta da vogal tônica também é feito
por Cândido de Oliveira (1961, p. 34), possivelmente em decorrência
dos frequentes equívocos a seu respeito nos meios jurídicos.
4. Atento à etimologia grega do vocábulo, lembra José Inez Louro, de
modo taxativo, quanto à prosódia: “A palavra pletora deve ser
paroxítona e não esdrúxula. Comete erro prosódico quem assim a não
pronunciar” (1941, p. 328).
5. Ante a possível dúvida – plétora ou pletora – Vasco Botelho de Amaral
assevera de modo decidido: “Que dúvida! Pletóra. Mas dispensa o sinal
de tônica: pletora” (1943, p. 126).
6. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, órgão oficialmente incumbido de definir quais as
palavras integrantes de nosso léxico, além de sua correta grafia e
acentuação, registra-a como paroxítona, o que se evidencia pela
inexistência de acento gráfico (2009, p. 658).
Plural de modéstia
Ver Plural majestático (P. 568).
Plural de o tônico
1. Silveira Bueno agrupa regras importantes para a pronúncia de
determinadas palavras em que o o é tônico e fechado no singular, mas se
tem dificuldade em sua pronúncia no plural.
2. Por primeiro, “quando a palavra tiver feminino, conservará no plural a
mesma pronúncia do feminino singular: bolso, bolsa, bolsos; lobo, loba,
lobos”.
3. Todavia, “quando o tônico for precedido (em realidade, o mestre quis
dizer ‘seguido’) de m ou n, a pronúncia será fechada: colono, colonos;
trono, tronos, pomo, pomos”.
4. Por fim, “quando substantivo e verbo forem homônimos, o substantivo
terá pronúncia fechada e o verbo, aberta” (BUENO, 1938, p. 140-1):
troco (substantivo), troco (verbo).
Ver Metafonia (P. 472).
Plural majestático
1. Também denominado plural de desigualdade social ou mesmo plural de
modéstia, consiste no emprego do pronome nós em lugar de eu, forma
essa pela qual reis, papas e pessoas de semelhante posição elevada se
referem a si próprios.
2. Quando autores, jornalistas e oradores assim procedem para evitar a
conotação egoística do emprego da primeira pessoa do singular, dá-se o
nome de plural redatorial.
3. Em tais casos, o verbo vai para o plural; se, porém, há algum adjetivo,
este, por silepse (concordância com a ideia, não com o termo aparente),
fica no singular. Ex.: “Nas palavras a seguir, seremos mais breve que
prolixo”.
4. A observação anterior também vale para quando se usa vós em lugar de
tu, com o intuito de deferência, de respeito. Ex.: “Vós sois justo,
Senhor”.
5. Resuma-se, nesse sentido, com o ensino de João Ribeiro (1923, p. 152),
para quem “muitas vezes se empregam os pronomes vós e nós para
designar uma pessoa única”, acrescentando tal autor que, em tal
hipótese, o adjetivo que se referir a tal pronome “fica no singular”:
‘estamos convencido’,’sois generoso’, ‘trabalhai e sereis abençoado’.
6. Júlio Ribeiro sintetiza assim a lição: “Em lugar do pronome da primeira
pessoa do singular eu, usam os escritores da forma da primeira pessoa do
plural nós. O verbo vai para o plural; os adjetivos em relação atributiva
ou predicativa com esse pronome ficam no singular” (1908, p. 252). Ex.:
“Nós ficamos perplexo com a atitude dele”.
7. Complementa, entretanto, Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 235) que
muitos preferem a concordância regular do adjetivo, carreando
significativos exemplos de abalizados autores: a) “Somos chegados ao
último sonho de Xavier” (Padre Antônio Vieira); b) “Estamos
persuadidos de que… a conversa era fingida” (Alexandre Herculano).
8. Em resumo de Alfredo Gomes, “o pronome nós emprega-se às vezes
para substituir eu, quando se quer dar autoridade às próprias palavras ou
quando se quer mostrar modéstia: Nós mandamos… Nós publicamos…”
(1924, p. 339).
9. Assim é a síntese de Júlio Nogueira a respeito dessa questão: “O
pronome nós pode ser empregado em relação à primeira pessoa do
singular. Na polêmica, na linguagem didática, nos discursos, quem fala
ou escreve pode atribuir-se o pronome do plural, como que desejando
dividir com outrem a responsabilidade do que diz, por uma espécie de
modéstia: ‘Nós mesmo (ou mesma), nós próprio (ou própria)’. Essa
concordância também existe quando tratamos a uma pessoa por vós:
‘Vós mesmo, sr. Presidente’, ‘Vós mesma, sra. Professora’” (1939, p.
204-5).
10. Acresça-se, todavia, a apropriada ponderação de Carlos Góis: “não é
boa sintaxe o uso promíscuo do eu e nós, no mesmo contexto, com
relação à pessoa que fala” (1943, p. 118).
Plural redatorial
Ver Plural majestático (P. 568).
Plus
1. Observam José de Nicola e Ernani Terra que se trata de “palavra latina,
que significa mais; originariamente advérbio, também aparece
empregada como substantivo”.
2. E acrescentam tais autores que “é justamente como substantivo que essa
palavra tem ocupado cada vez mais espaços no marketing de lançamento
de alguns produtos”, porque, “num mercado extremamente competitivo,
um novo produto precisa oferecer um plus, ou seja, algo mais em relação
aos concorrentes”.
3. Advertem, por fim, com toda propriedade, que, “no entanto, alguns
marqueteiros falam em ‘um plus a mais’, o que resulta numa expressão
redundante, num pleonasmo vicioso” (NICOLA; TERRA, 2000, p. 173).
Exs.: a) “Este novo produto oferece um plus: além da garantia de dois
anos, um seguro contra roubos” (correto); b) “Este novo produto oferece
um plus a mais: além da garantia de dois anos, um seguro contra
roubos” (errado).
4. Embora exista atualmente em diversos idiomas (como no inglês e no
francês), o certo é que tal vocábulo nos vem diretamente do latim, e,
assim, sua pronúncia entre nós deve ser a latina, rimando com cruz.
5. Por se tratar de vocábulo de língua estrangeira, deve vir entre aspas, em
itálico, em negrito, com sublinha ou outro traço indicativo de tal
circunstância.
p. m.
1. Abreviatura internacional da expressão latina post meridiem, que
significa após o meio-dia.
2. Contrapõe-se a a. m., que é forma abreviada de ante meridiem, com o
significado de antes do meio-dia.
3. As letras de tal abreviatura vêm em minúsculas.
Ver a. m. (P. 108)
Pôde ou Pode?
1. Com o Acordo Ortográfico de 2008, importa observar se está mantido ou
não o acento circunflexo em pôde (forma do verbo poder no passado),
para diferenciar de pode (também forma do verbo poder, mas no
presente).
2. Pela Lei 5.765, de 18/12/71, que alterou, em seu tempo, algumas regras
de nossa ortografia, buscou-se uma simplificação nesse campo, o que se
deu com a determinação de que não mais se acentuariam e e o das
palavras de timbre fechado, sinal esse que, até então, era usado para
diferenciá-las dos vocábulos que apresentavam fonemas de timbre
aberto: almôço / almoço, comêço / começo, colhêr / colher.
3. Tal lei, todavia, manteve, como exceção, o acento em pôde (pretérito
perfeito do indicativo de poder – “Ele pôde no passado”) para
diferenciar de pode (presente do indicativo – “Ele pode no presente”).
4. Sabia-se da justificativa para a exceção: era necessária a distinção entre
formas de um mesmo verbo, que apenas se empregava em tempos
diversos.
5. Pois bem. O Acordo Ortográfico de 2008 manteve, de modo taxativo, o
acento circunflexo diferencial em pôde (pretérito perfeito do indicativo
de poder) para diferenciá-la de pode (presente do indicativo de poder).
Ex.: “Ele pôde fazer no passado coisas que não mais pode realizar nos
dias de hoje”.
Polícia ou Policia?
1. Um leitor indaga se, após o Acordo Ortográfico de 2008, a palavra
polícia continua ou não acentuada.
2. Ora, quanto à acentuação gráfica (aqui abrangidos não apenas os acentos
– grave, agudo e circunflexo –, mas também os sinais diacríticos, como o
trema), o mencionado acordo alterou, fundamentalmente, alguns
aspectos.
3. Para o caso da consulta, porém, a única possibilidade que haveria para
gerar a dúvida trazida pelo leitor seria o caso de se pensar na existência
de um hipotético acento diferencial entre polícia (substantivo que rima
com primícia) e policia (terceira pessoa do singular do presente do
indicativo do verbo policiar – ele policia, que rima com freguesia).
4. Esse, porém, não é o caso, pois não se tem aqui uma hipótese de acento
diferencial. Em verdade, polícia (com a sílaba tônica li) tem acento
gráfico porque é um vocábulo paroxítono terminado em ditongo; já em
policia, a sílaba forte é ci, e esse fato não gera razão alguma para que
exista acento gráfico no mencionado vocábulo.
5. Assim, em resumo, pelas razões já expostas, mesmo após o Acordo
Ortográfico de 2008, polícia continua com acento gráfico, enquanto
policia continua sem acento gráfico. Tudo, aliás, como dantes.
Pólo
Ver Acento diferencial de tonicidade (P. 66).
Pombo-correio
Ver Substantivos compostos – Como levar ao plural? (P. 717)
Ponto
Ver Pontuação dos numerais (P. 574).
Ponto de vista
1. Tal expressão, em última análise, quer dizer, no sentido físico, o lugar
em que uma pessoa se coloca para ver ou observar alguma coisa; no
sentido figurado, indica o modo de entender ou considerar um assunto.
2. Quando se quer dizer sob o aspecto de, relativamente a, do ângulo,
lembra Domingos Paschoal Cegalla que se há de dizer do ponto de vista
e que “é incorreta a expressão sob o ponto de vista” (1999, p. 127). Exs.:
a) “Do ponto de vista político, o discurso dele foi um desastre” (correto);
b) “Sob o ponto de vista político, o discurso dele foi um desastre”
(errado).
3. Ante a frequência com que ocorrem erros em sua escrita, Arnaldo
Niskier (1992, p. 56) faz questão de observar que a grafia correta é sem
hífen.
Ponto e parênteses
Ver Parênteses e Ponto (P. 550).
Pontuação
1. De evidente utilidade, a pontuação é conhecida há séculos e já
presenciou a aparição e o desaparecimento de muitos sinais.
2. A partir da década de cinquenta do século XX, tomou significativo
impulso e passou a orientar-se – além das razões sintáticas tradicionais e
dos impulsos subjetivos – pelas recomendações e exigências mais
apuradas da redação técnica.
3. De um modo geral, é empregada para representar, na escrita, a dinâmica
da fala, marcando a entonação, as pausas respiratórias e enfáticas.
4. Oportuno é anotar que os chamados clássicos de nossa literatura nem
sempre lhe atribuíram posição de relevo, motivo pelo qual não é
incomum encontrar, mesmo em abalizados escritores, erros de
pontuação, tais como os cometidos por qualquer usuário da escrita.
5. As gramáticas, por seu lado, pouco trazem a seu respeito, sobretudo no
que concerne ao uso da vírgula.
6. Deve-se conferir, todavia, adequado valor à pontuação, até porque, em
certos casos, errar ou acertar é questão de vida ou morte.
7. Para ilustrar a necessidade de observância dos princípios de pontuação,
lembre-se que a lenda conta que Alexandre Magno, não querendo
prosseguir em suas conquistas, antes de voltar à Babilônia, mandou,
como era de praxe à época, fosse consultada uma pitonisa acerca do
futuro. A resposta veio em cinco palavras soltas, sem qualquer sinal de
separação; e sua leitura foi feita por Alexandre e seus generais do modo
como mais lhes convinha: “Vais. Voltas. Não morrerás lá.” Em
campanha, porém, febre aguda acometeu o grande conquistador, que
acabou morrendo aos trinta e três anos, em 323 a. C. Seus generais,
lembrando-se da pitonisa, mandaram buscá-la, para que fosse punida
pela errônea previsão. Qual não foi o espanto deles, contudo, quando
ouviram dela a adequada leitura do vaticínio: “Vais. Voltas? Não!
Morrerás lá.”
8. Da lenda, de igual modo, vem a história de que, na antiga Rússia, em
apelo extremo, um czar rejeitara as alegações de um condenado,
encimando o recurso com o lacônico veredicto: “Manter condenação.
Impossível absolver.” Tendo profundo e pessoal interesse no caso, mas
sem querer ostensivamente desafiar o czar, a czarina, durante a
madrugada, teria revertido a situação, valendo-se de pequenas
alterações: “Manter condenação impossível: absolver (COSTA, 2005, p.
348)”.
Ver Colchetes (P. 191), Parênteses e Ponto (P. 550), Ponto e vírgula –
Emprego (P. 573), Reticências (P. 671), Travessão (P. 746), Vírgula entre
orações (P. 773), Vírgula proibida (P. 779), Vírgula obrigatória (P. 777) e
Vírgula optativa (P. 777).
Por acaso
Ver Porventura ou Por ventura? (P. 584)
Porcentagem ou Percentagem?
1. Porcentagem é vocábulo de frequente aplicação nos textos jurídicos e
forenses. Ex.: “Consistirá a taxa de legitimação em porcentagens sobre
a avaliação que será feita por perito residente no foro rei sitae,
nomeado pelo juiz” (Decreto-lei 9.760, de 5/9/46, art. 166).
2. Silveira Bueno (1957, p. 380) reputa “pedantismo” o uso de
percentagem, argumentando que se trata de “importação inglesa”,
acrescentando que “a preposição latina per desapareceu do idioma
português substituída pela outra por” (remanescendo apenas nas
expressões de per si e de permeio), além do que “é velha na língua a
forma porcentagem”.
3. Em outra obra, o mesmo autor reitera não mais existir em nosso idioma a
preposição per, que foi absorvida pela preposição por, e acrescenta que
seria “pedantismo e vaidadezinha ingênua dizer-se percentagem e não
porcentagem” (BUENO, 1938, p. 81).
4. Inverso, entretanto, é o entendimento de Júlio Nogueira, que manda usar
percentagem, muito embora observe que “é muito provável que se fixe a
forma porcentagem, graças à influência da locução por cento” (1959, p.
27).
5. Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade dão notícia de que
Cândido de Figueiredo e Heráclito Graça polemizaram sobre o assunto;
Said Ali preferia porcentagem, enquanto Júlio Nogueira optava por
percentagem… (1999, p. 44).
6. Heráclito Graça, por seu lado, cita, por primeiro, lição de Cândido de
Figueiredo, que se mostrava maravilhado de que no Brasil se escrevia
porcentagem e aconselhava a eliminação de semelhante grafia, por se
opor às tradições da língua, enquanto percentagem tem per, que
“corresponde em todas as suas letras à preposição latina per”.
7. Observando, contudo, que os antigos escritores jamais confundiam as
preposições per e por, servindo-se da primeira para denotar meio e da
segunda para indicar causa, o referido gramático contraria a lição citada,
apadrinhando-se com Leoni: “Hoje, porém, empregamos indistintamente
a preposição por em ambos os casos, e só nos servimos da preposição
per em algum particular idiotismo, e como partícula inseparável dos
verbos e dos nomes”.
8. E conclui: “porcentagem, como se escreve no Brasil, … é grafia
moderna e lógica” (GRAÇA, 1904, p. 399-402).
9. Luís A. P. Vitória (1969, p. 184) assevera que percentagem é a forma
correta, por originar-se do latim per centum; acrescenta, todavia, que “a
forma porcentagem tem, a seu favor, o uso corrente”.
10. Por outro lado, dão-nas ambas como válidas e defensáveis os
dicionaristas Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (s/d, p. 1.066) e
Cândido Jucá Filho (1963, p. 478).
11. Tem-se, em realidade, entendido que percentagem prende-se à locução
latina per centum, forma que o inglês manteve sem alteração; já
porcentagem sofre nítida influência, em sua origem, da forma francesa
pourcentage.
12. Ao lhe porem em questão qual dos dois vocábulos usar, Cândido de
Figueiredo assim se pronunciou: “Porcentagem é forma brasileira,
moderna e inútil. A palavra percentagem formou-se na vigência da
preposição per, e como tal se tem mantido e se manterá” (1943, p. 129-
30).
13. Domingos Paschoal Cegalla considera percentagem e porcentagem
duas formas igualmente corretas: “a primeira provém do latim per
centum (por cento) + sufixo – agem; a segunda, mais usual, deriva da
locução portuguesa por cento” (1999, p. 315).
14. Para Cândido de Oliveira (s/d, p. 118), porcentagem “é a forma atual,
moderna”, lembrando tal autor, porém, que “também correta a forma
antiga percentagem”.
15. Para José de Nicola e Ernani Terra (2000, p. 171), “as duas formas são
corretas e equivalentes”, acrescentando tais autores que “percentagem é
uma forma erudita, que mantém a grafia da expressão latina per centum
(‘por cento’)”, enquanto “porcentagem é uma forma aportuguesada”.
16. Ante a divergência entre autores, que até mesmo defendem pontos de
vista diametralmente opostos, vigendo aqui o princípio de que, em caso
de dúvida fundada, confere-se liberdade ao usuário, defensável é o uso
indiscriminado de ambos os vocábulos: percentagem e porcentagem.
17. Esse, aliás, é o posicionamento do Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão oficialmente
incumbido de definir quais as palavras integrantes de nosso léxico, o
qual, sem observações adicionais ou ressalvas, registra ambas as
formas: percentagem e porcentagem (2009, p. 638 e 667).
18. Sendo corretas ambas as formas, e aceitas no léxico vernáculo, parece
desnecessária a postura do mestre Theotonio Negrão (2001a, p. 1.001),
que, muito embora anote constar porcentagem no texto oficial do art.
27, caput, da Lei 5.764, de 16/12/71, que instituiu o regime das
cooperativas, corrige, na transcrição do dispositivo, para percentagem,
talvez imbuído da ideia de que não se deva acatar no vernáculo a forma
que evitou.
19. O Código Civil de 2002 não emprega nenhuma das duas formas, e o
Código de Processo Civil, usando-a apenas uma vez, prefere
percentagem: “Se, quando for organizado o quadro geral dos credores,
os bens da massa já tiverem sido alienados, o contador indicará a
percentagem, que caberá a cada credor no rateio” (CPC/1973, art.
770).
Ver Número fracionário (P. 505) e Por cento – Como concordar o verbo?
(P. 576)
Porcentual ou Percentual?
Ver Percentual ou Porcentual? (P. 558)
Porém
1. É certo que diversos autores e diplomas legais preferem intercalar entre
vírgulas, no meio da oração, as conjunções adversativas a fazê-las iniciar
as orações, o que também é correto. Exs.: a) “Sucedeu, porém, que como
eu vinha cansado, fechei os olhos três ou quatro vezes” (Machado de
Assis); b) “A interrupção, porém, aberta por um dos credores solidários
aproveita aos outros” (CC/1916, art. 176, § 1º).
2. Não se sabe bem, todavia, de onde se originou um estranho ensino (mas
é certo que Cândido de Figueiredo, por exemplo, o repete), que pretende
não se poder começar uma oração com algumas conjunções
adversativas, sobretudo com porém. Para os gramáticos que defendem
esse ponto de vista, a conjunção adversativa jamais deve iniciar uma
oração, mas deve vir posposta ao primeiro ou aos primeiros termos do
segmento em que se insere. Vejam-se os seguintes exemplos, com a
indicação e a erronia para os seguidores dessa corrente: a) “O
magistrado inquiriu a testemunha; não foi, porém, bem sucedido”
(correto); b) “O magistrado inquiriu a testemunha, porém não foi bem
sucedido” (errado); c) “O réu podia estar na audiência; não podia,
porém, interferir” (correto); d) “O réu podia estar na audiência; porém
não podia interferir” (errado).
3. Indagando-se acerca da correção de principiar uma oração com tal
conjunção adversativa, contudo, Assis Cintra responde pela afirmativa,
argumentando que, “desde os mais velhos escritores da língua até os
mais modernos, todos eles iniciam frases com a conjunção citada”. E
refere exemplos dos mais abalizados mestres de nossa língua em todos
os períodos (CINTRA, 1922, p. 26-31): a) “Porém já cinco sóis eram
passados” (Camões); b) “Porém não se imagine o pecador estar
destituído de verdadeiro arrependimento” (Padre Manuel Bernardes); c)
“Porém, já neste tempo andava outro gênero de profecia mais temeroso”
(Frei Luís de Sousa); d) “Porém todos os clássicos de todos os tempos
ma deparam frequentemente assim colocada” (Rui Barbosa); e) “Porém
casos há em que a preposição que acompanha o complemento direto não
é expletiva” (Mário Barreto).
4. Ainda para refutar esse ensinamento, traz-se a lição de Silveira Bueno:
“O ensino geral de que as orações adversativas não podem começar pela
conjunção porém, devendo esta vir sempre depois das primeiras
palavras, é totalmente sem fundamento. Veja estes exemplos de Vieira,
que, por certo, ninguém me vai dizer que não sabia escrever
corretamente: ‘Porém, todas estas cousas verdadeiramente grandes…
etc.’; ‘Porém, nós como morremos?’; ‘Porém se sucedesse alguma vez
não ser assim…’. Pode-se, portanto, começar a oração adversativa com a
conjunção porém, tomando por exemplo o maior escritor da língua
portuguesa” (1957, p. 331).
5. Outra não é a lição de Luciano Correia da Silva: “Já se ensinou que não
se devem usar no início da frase as adversativas em geral (porém, no
entanto, todavia, contudo, etc.), que precisam ocupar, entre vírgulas,
posição intermediária… Todavia, essa regra não encontra respaldo
literário, uma vez que os melhores escritores nunca a observaram”. E
lista ele exemplos de autores insuspeitos no vernáculo (SILVA, L., 1991,
p. 47): a) “Porém, como ela (a sentença) foi pronunciada definitiva e
declaradamente…” (Padre Vieira); b) “Entretanto, vida diferente não
quer dizer vida pior” (Machado de Assis); c) “Contudo, certas formas de
encantamento que observamos na vida contemporânea parecem
confirmar a cediça verdade…” (Carlos Drummond de Andrade).
6. É oportuno acrescentar que, se, quanto ao estilo, pode ser mais fluente
pospor a conjunção em tais casos, essa já é outra questão, que escapa à
analise e ao questionamento acerca da correção de tal emprego, atestada
à farta pela autoridade dos exemplos citados.
7. Essas observações valem para outras conjunções igualmente
adversativas: todavia, contudo, entretanto.
8. Uma análise de nossa legislação permite extrair as seguintes ilações a
esse respeito: a) o mas, como é de regra, sempre inicia oração e não pode
ser intercalado; b) as demais conjunções adversativas às vezes começam
as orações, às vezes se intercalam entre seus termos; c) por questão de
estilo, contudo, é perceptível a preferência pela intercalação.
9. Vejam-se alguns exemplos de emprego das adversativas no início das
respectivas orações em nossa legislação: a) “A personalidade civil da
pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a
concepção, os direitos do nascituro” (CC, art. 2º); b) “A sentença que
determinar a abertura da sucessão provisória só produzirá efeito cento e
oitenta dias depois de publicada pela imprensa; mas, logo que passe em
julgado, proceder-se-á à abertura do testamento, se houver, e ao
inventário e partilha dos bens, como se o ausente fosse falecido” (CC,
art. 28, caput); c) “O dono ou o possuidor do prédio inferior é obrigado
a receber as águas que correm naturalmente do superior, não podendo
realizar obras que embaracem o seu fluxo; porém a condição natural e
anterior do prédio inferior não pode ser agravada por obras feitas pelo
dono ou possuidor do prédio superior” (CC, art. 1.288); d) “Todavia, os
casos fortuitos, ocorrentes no ato de contar, marcar ou assinalar coisas,
que comumente se recebem, contando, pesando, medindo ou
assinalando, e que já tiverem sido postas à disposição do comprador,
correrão por conta deste” (CC, art. 492, § 1º); e) “O juiz conhecerá de
ofício, em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não proferida
a sentença de mérito, da matéria constante dos ns. IV, V e VI; todavia, o
réu que a não alegar, na primeira oportunidade em que lhe caiba falar
nos autos, responderá pelas custas de retardamento” (CPC/1973, art.
267, § 3º).
10. Observem-se outros casos, em que as conjunções adversativas se
intercalam nos temos da oração: a) “As mulheres e os eclesiásticos
ficam isentos do serviço militar obrigatório em tempo de paz, sujeitos,
porém, a outros encargos que a lei lhes atribuir” (CF, art. 143, § 2º); b)
“O descendente, ascendente ou cônjuge que for sucessor provisório do
ausente, fará seus todos os frutos e rendimentos dos bens que a este
couberem; os outros sucessores, porém, deverão capitalizar metade
desses frutos e rendimentos, segundo o disposto no art. 29, de acordo
com o representante do Ministério Público, e prestar anualmente
contas ao juiz competente” (CC, art. 33, caput); c) “Se, porém, a
pessoa natural tiver diversas residências, onde, alternadamente, viva,
considerar-se-á domicílio seu qualquer delas” (CC, art. 71); d) “O dolo
do representante legal de uma das partes só obriga o representado a
responder civilmente até a importância do proveito que teve; se,
porém, o dolo for do representante convencional, o representado
responderá solidariamente com ele por perdas e danos” (CC, art. 149).
Porém e a vírgula
Ver Porém (P. 578).
Porém e Mas
Ver Mas e Porém (P. 461).
Pôr ou Por?
1. Após as mudanças que aconteceram por conta do Acordo Ortográfico de
2008 em nossa ortografia, importa analisar se ainda existe o acento
circunflexo na forma verbal pôr.
2. A regra, anteriormente, era acentuar a forma verbal pôr, para distingui-la
da preposição por.
3. A explicação para essa ocorrência era que o verbo configurava uma
forma tônica, enquanto a preposição, uma forma átona, de modo que se
empregava, assim, na primeira, um acento diferencial de tonicidade.
4. E esse acento foi expressamente mantido pelo Acordo Ortográfico de
2008, como se pode conferir nos seguintes exemplos: a) “O trabalho foi
feito por ele” (preposição); b) “É preciso pôr os pingos nos is” (verbo).
5. O acento continua existindo em palavras compostas, como pôr de sol ou
pôr do sol, mas não nos respectivos plurais: pores de sol ou pores do sol.
6. Oportuno é anotar, também, que esse acento não se faz presente nos
compostos de pôr: antepor, apor, decompor, depor, impor, justapor,
recompor, transpor…
Ver Pôr – Como conjugar? (P. 577)
Por si só
1. A palavra só de tal expressão tem função adjetiva, significando sozinho,
razão pela qual varia para o plural, se também do plural for a palavra a
que se referir. Exs.: a) “O réu tem um passado que por si só não o
recomenda”; b) “O réu tem antecedentes que por si sós não o
recomendam”.
Ver Só – Como concordar? (P. 706)
Portuguesmente – Existe?
1. Formador de advérbios em português, o sufixo mente só pode ser
acrescentado a adjetivos no feminino: satisfatória + mente =
satisfatoriamente.
2. João Ribeiro lembra que “o português formou advérbios numerosos com
a junção de mente a adjetivos femininos… Essa faculdade já existia com
pequena extensão no latim clássico” (1923, p. 139).
3. Observa também Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 151 e 174), em duas
passagens de sua obra, que “a terminação adverbial mente é o
substantivo feminino mente com a significação de maneira, intenção.
Mais tarde se justapôs ao adjetivo, perdendo o caráter de substantivo,
conservando, entretanto o adjetivo sua flexão feminina”.
4. A partir dessas observações, vê-se que, tecnicamente, o advérbio deveria
ser portuguesamente.
5. Como lembra Vitório Bergo (1943, p. 251), entretanto, em nossa língua,
originariamente “os adjetivos em ês eram uniformes, como ainda o é
cortês”, razão pela qual “ainda hoje se usa essa forma no advérbio de
modo (portuguesmente e não portuguesamente)”.
6. Bem por isso, a forma portuguesmente continua sendo correta na
atualidade e, como lembra Sousa e Silva (1958, p. 305), “é vestígio da
concordância arcaica ‘nação português’”, e a maneira uniforme de se
dizerem adjetivos com essa terminação ainda se dá entre nós, como em
mulher cortês.
7. Acrescente-se, com Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 324), que,
como essa regra de uniformidade em gênero (homem português, mulher
português) se espraiava para todos os adjetivos terminados em ês no
português antigo, também seguem essa regra os demais advérbios
formados de mesmo modo de adjetivos gentílicos terminados em ês:
francesmente, inglesmente e até burguesmente.
Pós-datar ou Posdatar?
1. Como único critério efetivamente objetivo, diz o Acordo Ortográfico de
1988 que se usa o prefixo pós com hífen e acento, quando o segundo
elemento se inicia por h: pós-hipófise, pós-homérico.
2. A par dessa observação, em critério fluido, volátil e de difícil
compreensão, diz que também se usa pós com hífen e acento, quando o
segundo elemento tem vida à parte: pós-adolescência, pós-apostólico,
pós-datar, pós-doutoramento, pós-escrito, pós-graduação, pós-guerra,
pós-kantiano, pós-nupcial, pós-operatório.
3. E complementa, dizendo que o prefixo se junta diretamente e sem hífen
ao segundo elemento, se este não tem vida à parte: poscefálico, posfácio,
posgênito, poslúdico, pospasto, pospor.
4. É importante frisar, todavia, que o conceito desse segundo critério é de
extrema fluidez, ao fincar a distinção para separar ou não por hífen os
elementos apenas no fato de ter ou não ter o segundo elemento vida à
parte. Para constatar a dificuldade de explicação para a respectiva grafia,
basta considerar o vocábulo pospor, em que apontaríamos um segundo
elemento com efetiva vida à parte, mas o VOLP, ao grafar os elementos
unidos sem hífen e sem acento, considera-o, no caso, como elemento que
não possui vida à parte.
5. Em casos como esse – em que se constata a ausência de critério fixo e
palpável para um raciocínio de convicção e certeza – a única saída
segura é consultar o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, uma
espécie de dicionário que lista oficialmente as palavras pertencentes à
língua portuguesa e lhes fornece a grafia oficial.
Possessivo
Ver Lhe por Seu (P. 445).
Possuir
1. Quanto a sua ortografia, como todo verbo terminado em uir, só pode dar
origem à terminação ui na segunda e terceira pessoas do singular do
presente do indicativo: possuo, possuis, possui.
2. Diferentemente dos verbos terminados em uar (como continuar), são
errôneas as grafias com e em tais situações: possues, possue.
3. Pelo próprio significado técnico de posse insculpido do Código Civil de
1916 (arts. 485 e seguintes), querem alguns que possuir não pode ser
usado no sentido genérico de ter; tal posicionamento restritivo, todavia,
parece não ter acolhida geral, como demonstra a seguinte passagem de
Mário Barreto: “Uma boa coleção de pleonasmos possui a língua
portuguesa na combinação das formas pronominais, tônicas e atônicas”
(1954a, p. 264).
Posto que
1. Lembrando tratar-se de conjunção concessiva (equivalendo a ainda que,
a embora), Geraldo Amaral Arruda (1997, p. 109) realça dois aspectos
de significativo relevo a respeito dessa locução: a) “não deve ser usada
como causal” (não equivale, assim, a porque); b) usa-se “com o verbo no
subjuntivo”. Exs.: a) “Posto que fosse tarde, o magistrado mesmo assim
continuou a audiência” (correto); b) “Posto que era tarde, o magistrado
mesmo assim continuou a audiência” (errado).
2. Sousa e Silva, por um lado, com muita propriedade, insere também tal
locução no rol das conjunções concessivas, “da mesma espécie de
conquanto, embora, ainda que, se bem que, etc.”
3. Exemplifica, a seguir, com excerto irretocável de Camilo Castelo
Branco: “Posto que o vosso sangue me não corra nas veias, sou vosso
neto pelo sacramento que me liga à mui nobre dama”.
4. Continua para explicar que o trecho significa: “Embora o vosso sangue
me não corra nas veias, sou vosso neto…”.
5. Em acréscimo, assevera que “é grave incorreção, assaz frequente no
Brasil, empregar posto que como conjunção causal ou como conjunção
explicativa”.
6. Por fim, exemplifica com trecho extraído de jornais, em que manifesto o
erro em seu emprego: “Discordamos do ilustre magistrado, posto que
seu juízo acerca da moral dominante no interior das emissoras é falho e
sem lastro na realidade”.
7. E manda corrigir: “Discordamos do ilustre magistrado, visto que seu
juízo (ou visto como seu juízo, ou porquanto seu juízo, ou porque seu
juízo…)” (SILVA, A., 1958, p. 213-4).
8. Eliasar Rosa (1993, p. 111) dá exemplo de erro corriqueiro nos meios
forenses, representado pelo uso de tal locução como causal (sinônima de
porque), quando, na verdade, só pode ser empregada como concessiva
(sinônima de embora); adicionalmente, dá ele um exemplo de seu
emprego escorreito: a) “Julgo procedente o pedido, posto que ficou
provada a necessidade do retomante” (errado); b) “A sentença poderá
ser reformada, posto que certa em sua fundamentação” (correto).
9. Exemplo de adequado emprego da expressão encontra-se em Heráclito
Graça: “Posto que ignore as razões da sua convicção, não me parece,
todavia, temeridade aventurar que, para gerá-la e mantê-la, Sua
Excelência dissentiu da autoridade dos exemplos do Visconde de
Santarém e de Latino…” (1904, p. 246).
10. Uma leitura atenta dos textos legais corrobora o modo correto de seu
emprego: a) “Equipara-se a terceiro a parte que, posto figure no
processo, defende bens que… não podem ser atingidos pela apreensão
judicial” (CPC/1973, art. 1.046, § 2º); b) “São suscetíveis do contrato
de hipoteca os navios, posto que ainda em construção” (CC/1916, art.
825); c) “A obrigação de dar coisa certa abrange-lhe os acessórios,
posto não mencionados…” (CC/1916, art. 863); d) “O que der a
fabricar alguma obra de empreitada poderá a seu arbítrio resilir do
contrato, posto que a obra esteja já começada a executar…” (C. Com.,
art. 236).
11. Idêntico é o uso nos arts. 130, 215, 340, 552, 2ª alínea, e 656, última
alínea, do Código Comercial, como também acontecia no art. 336 do
Regulamento 737, de 1850, assim como em diversas passagens das
Ordenações Filipinas.
Quanto à possibilidade de dizer “Posto que fosse tarde” ou “Posto que
era tarde”, ver Indicativo por Subjuntivo (P. 411).
Post scriptum
Ver Pós-escrito é o mesmo que Post scriptum? (P. 585)
Pouco
1. É palavra que precisa ser observada do prisma da concordância nominal.
2. Se modifica um verbo ou um adjetivo, a palavra tem valor de advérbio e
é invariável. Exs.: a) “Ele trabalha pouco”; b) “Ela trabalha pouco”; c)
“Eles trabalham pouco”; d) “Elas trabalham pouco”; e) “Ele está pouco
cansado”; f) “Ela está pouco cansada”; g) “Eles estão pouco cansados”;
h) “Elas estão pouco cansadas”.
3. Se, porém, modifica um substantivo, tem valor de adjetivo e concorda
com a palavra modificada. Exs.: a) “Havia pouca gente à espera do
réu”; b) “Havia poucas pessoas à espera do réu”; c) “Havia poucos
repórteres à espera do réu”.
4. Em observação abrangendo os vocábulos muito, pouco, bastante, tanto e
quanto, asseveram Carlos Góis e Herbert Palhano que tais palavras são
pronomes indefinidos, quando vêm modificando um substantivo; “neste
caso são variáveis em gênero e número”. Ex.: “Poucas razões indicavam
a absolvição do réu”.
5. Acrescentam que são advérbios, quando vêm modificando o verbo, o
adjetivo, ou outro advérbio; “neste caso, são invariáveis”. Ex.: “Pouco
aconselhadas eram as razões do recurso” (GÓIS; PALHANO, 1963, p.
123-4).
Prazeroso ou Prazeiroso?
1. Prazeroso significa algo cheio de prazer, algo que causa prazer. Ex.: “É
algo muito prazeroso estar aqui, neste congresso, em companhia de
Vossa Excelência”.
2. O advérbio, por sua vez, é prazerosamente.
3. Cuidado, porque não existe o adjetivo prazeiroso, nem o advérbio
prazeirosamente.
Prazo
Ver A curto prazo ou Em curto prazo? (P. 73)
Preambular
Ver Petição inicial (P. 563).
Precatória
1. Do verbo depoente latino precari (rogar, pedir), significa o pedido feito
por um juiz, denominado deprecante, a outro, que se denomina
deprecado, normalmente por meio de um documento denominado carta
precatória, a fim de que este último, no âmbito de sua jurisdição, cumpra
ato de interesse daquele.
2. Assim, um réu é citado por precatória em comarca diversa daquela em
que corre a demanda; também por ela se ouve uma testemunha, se
penhora, se avalia e se praceia bem em comarca diversa daquela do juízo
da causa.
3. Não confundir com precatório, que significa documentação expedida
pelo juiz ao Presidente do Tribunal, para que a Fazenda Pública pague,
na ordem cronológica de sua apresentação, as requisições de pagamento
de condenações transitadas em julgado.
4. Também não confundir carta precatória com carta de ordem ou carta
rogatória, que têm a mesma essência da precatória, mas a primeira é
remetida por um juiz superior a outro hierarquicamente inferior, e a
última é remetida por um juiz de um país a outro e se refere a atos que
devam ser praticados em território estrangeiro.
Precatório
1. Com o trânsito em julgado de uma sentença que condene a Fazenda
Pública ao pagamento de determinada importância, o juiz da causa
expede documentos ao Presidente do Tribunal, a fim de que, por
intermédio deste, se expeçam as necessárias ordens de pagamento às
respectivas repartições pagadoras. A tal procedimento se dá o nome de
precatório, vocábulo esse do masculino e com tal sentido específico.
2. Por determinação legal, a ordem cronológica de sua apresentação há de
ser obedecida, sob penas severas (CF/1988, art. 100).
3. Não confundir com precatória, que significa o pedido feito por um juiz
ao magistrado de uma outra comarca, a fim de que este pratique, por
meio de carta específica, um ato processual.
4. Também não confundir precatório com carta de ordem ou carta
rogatória, que têm a essência de uma carta precatória, mas a primeira é
remetida por um juiz superior a outro hierarquicamente inferior, e a
última é remetida por um juiz de um país a outro e se refere a atos que
devam ser praticados em território estrangeiro.
Precavejo – Existe?
Ver Precaver – Como conjugar? (P. 588)
Precavenham-se – Existe?
Ver Precaver – Como conjugar? (P. 588)
Precavenho – Existe?
Ver Precaver – Como conjugar? (P. 588)
Preceder
1. Com o significado de vir antes, ter preferência, ter primazia, quanto à
regência verbal, Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 223) observa que pode
ser transitivo direto ou transitivo indireto, indiferentemente. Exs.: a) “Os
descendentes precedem os ascendentes na ordem de vocação hereditária
do art. 1.603 do Código Civil de 1916” (correto); b) “Os descendentes
precedem aos ascendentes na ordem de vocação hereditária do art.
1.603 do Código Civil de 1916” (correto).
2. Em mesma esteira, leciona Artur de Almeida Torres: “mostram os
exemplos dos bons escritores que o verbo preceder pode ser construído,
indiferentemente, como transitivo direto ou indireto”; e remata tal
gramático: “entretanto, casos há em que, para maior clareza do sentido,
se deve preferir o regime indireto”. Exs.: a) “Na ordem cronológica, o
escritor precede o gramático” (Cândido de Figueiredo); b) “Nunca será
ocioso insistir em que a língua precedeu aos estudos gramaticais”
(Heráclito Graça).
3. E, para que não remanesça dúvida alguma, complementa tal autor com a
observação de que, em casos de construção com objeto indireto, pode ele
ser representado pelo pronome lhe: “… locução em si evidentemente
pleonástica, empregada pelos escritores que lhe precederam”
(TORRES, 1967, p. 226-7).
4. Quanto às possibilidades de regência desse verbo, ora como transitivo
direto, ora como transitivo indireto, foi que Rui Barbosa acabou
lecionando em frase que acaba sendo citada como exemplo de
possibilidade de emprego da expressão ambos os dois: “Ambas as
formas são corretas? São-no ambas as duas. Não mo puderam negar…
O verbo preceder tem uma e outra forma” (BARBOSA apud SILVA, L.,
1991. p. 73).
5. Reportando-se a ensino de Otoniel Mota e valendo-se de terminologia do
latim, leciona Francisco Fernandes: “o verbo preceder rege dativo ou
acusativo: preceder ao dia, ou preceder o dia” (1971, p. 471): vale dizer,
pode ser construído com objeto indireto ou com objeto direto.
6. Não é diverso o posicionamento de Celso Pedro Luft: “Mostram os
exemplos dos bons escritores que o verbo preceder pode ser construído,
indiferentemente, como transitivo direto ou indireto”.
7. E complementa tal autor (LUFT, 1999, p. 411), agora se valendo de
argumento de Artur de Almeida Torres: “Entretanto, casos há em que,
para maior clareza do sentido, se deve preferir o regime indireto”.
8. Nos textos legais, independentemente de ser coisa ou pessoa o alvo da
precedência, pode este ser objeto direto (podendo o objeto direto
aparecer como sujeito da voz passiva) ou objeto indireto introduzido
pela preposição a. Exs.: a) “Se dois ou mais indivíduos falecerem na
mesma ocasião, não se podendo averiguar se algum dos comorientes
precedeu aos outros, presumir-se-ão simultaneamente mortos”
(CC/1916, art. 11); b) “O reconhecimento pode preceder o nascimento
do filho…” (CC/1916, art. 357, parágrafo único); c) “Entre os
descendentes, os mais próximos precedem aos mais remotos, e, dentre os
do mesmo grau, os varões (precedem) às mulheres” (CC/1916, art. 459,
§ 2º); d) “A este recurso, que será regulado por lei processual,
precederá o depósito da importância da pena, ou prestação de fiança
idônea ao seu pagamento” (CC/1916, art. 1.046, parágrafo único); e) “A
arrematação será precedida de edital…” (CPC/1973, art. 686).
9. Com sua conhecida proficiência, observa Adalberto J. Kaspary que “a
construção transitiva direta é a única que aparece no Código Civil de
Portugal” (1996, p. 243).
10. Muito embora sinônimos, não se confundem, quanto à regência verbal,
anteceder e preceder.
Precisar
1. À semelhança de seu sinônimo necessitar, no sentido de carecer, sentir
necessidade, quanto à regência verbal, apesar de algumas controvérsias
entre os gramáticos, pode ter, indiferentemente, objeto direto (sem
preposição) ou objeto indireto (com a preposição de). Exs.: a) “Todo o
homem precisa revelação divina” (Cândido de Figueiredo); b) “A vítima
precisava de dinheiro, de assistência”.
2. Desse entendimento não discrepa Artur de Almeida Torres (1967, p.
228), o qual, após afiançar que, “na acepção de ter precisão ou
necessidade de, carecer, aparece ora como transitivo direto, ora com o
complemento regido de de”, remata, com Cândido de Figueiredo, que
“ambas as formas são portuguesas”.
3. Sousa e Silva (1958, p. 217), anotando que alguns gramáticos apenas o
aceitam construído como transitivo indireto (com a preposição de),
tachando de errônea a construção como transitivo direto, leciona que “os
fatos, porém, destroem tal modo de ver e demonstram que a segunda
maneira de construir é tão portuguesa quanto a primeira”.
4. Para Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 327), “na acepção de ter
necessidade, necessitar, constrói-se modernamente com objeto indireto,
quando este é substantivo ou pronome, e com objeto direto se o
complemento é um infinitivo”. Exs.: a) “As escolas precisam de bons
professores”; b) “O país precisou fazer empréstimos”.
5. Para Celso Pedro Luft (1999, p. 412), que se fixa apenas em termos do
que é mais corriqueiro, e não do que seria correto ou errado: a) Uma
pesquisa de Luiz Carlos Lessa mostra que no Brasil, pelo menos em
nossos dias, o mais usual é preposicionar-se o complemento, se este é
um substantivo; b) Por outro lado, o mais comum é omitir a preposição,
“se a precisar segue-se um infinitivo”.
6. Em realidade, o que parece de melhor senso é resumir a questão com o
seguinte excerto de Francisco Fernandes: “Significando ter precisão ou
necessidade, ensinam alguns gramáticos que só se deve dar a este verbo
complemento indireto, regido da preposição de, tachando de errônea a
construção com objeto direto… Os fatos, porém, destroem tal modo de
ver, e demonstram que a segunda maneira de construir é tão portuguesa
quanto a primeira” (1971, p. 471).
Ver Gosta-se de um bom vinho – Está correto? (P. 375), Precisam-se
operários ou Precisa-se de operários? (P. 590), Precisar de falar – Está
correto? (P. 590) e Voz passiva e Pronome apassivador (P. 791).
Precisar de
Ver Dever de (P. 283).
Precluir
1. Do latim praecludere, com o sentido etimológico de fechar, obstruir, é
verbo de frequente uso em Direito, estando regularmente registrado no
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira
de Letras, órgão oficial para determinar quais os vocábulos que integram
nosso léxico (2009, p. 672).
2. Significa ser atingido por preclusão, que é a “perda do exercício de ato
processual pela inércia da parte, no lapso de tempo prescrito por lei ou
ditado pelo juiz” (SIDOU, 1990, p. 434). Ex.: “Não arrolando o autor as
testemunhas no prazo de lei, precluiu a faculdade processual para fazê-
lo”.
3. Trata-se de verbo defectivo, conjugado apenas nas terceiras pessoas,
tendo por modelo atribuir (FERREIRA, s/d, p. 1.127).
4. Reitera esse entendimento Ronaldo Caldeira Xavier, para quem tal verbo
é defectivo e “só deve usar-se na terceira pessoa” (1991, p. 128).
5. Assim: preclui e precluem (presente do indicativo), preclua e precluam
(presente do subjuntivo), precluiu e precluíram (pretérito perfeito do
indicativo), precluíra e precluíram (pretérito mais-que-perfeito do
indicativo), precluía e precluíam (imperfeito do indicativo), precluirá e
precluirão (futuro do presente do indicativo), precluiria e precluiriam
(futuro do pretérito do indicativo), precluir e precluírem (futuro do
subjuntivo), precluísse e precluíssem (imperfeito do subjuntivo),
precluindo (gerúndio), precluído e precluso (particípio passado).
6. Nas demais formas, deve ser substituído, conforme o caso, por um
sinônimo (fechar, obstruir, proibir, vedar) ou por um torneio de palavras
(ser atingido por preclusão).
Precluso
1. Particípio passado irregular do verbo precluir, encontra emprego em
textos legais e jurídicos.
2. É exemplo desse uso o art. 601 do Código de Processo Civil, em sua
redação anterior a 1994, hoje revogada: “Preclusa esta decisão, é defeso
ao devedor requerer, reclamar, recorrer ou praticar no processo
quaisquer atos, enquanto não lhe for relevada a pena”.
Preeminente ou Proeminente?
1. Um leitor relata ter sido aluno de conhecido professor, e este sempre
insistia em que preeminente era a forma correta, enquanto proeminente
seria a forma errada. E indaga qual a forma correta da expressão.
2. Observe-se, num primeiro aspecto, que o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa registra ambas as palavras: preeminente e
proeminente (ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 673 e
677).
3. Ora, o VOLP é editado pela Academia Brasileira de Letras, e esta detém
a delegação legal para listar oficialmente os vocábulos existentes em
nosso idioma, de modo que não remanesce dúvida quanto à efetiva
existência de ambos os vocábulos no vernáculo.
4. Num segundo aspecto, uma consulta aos dicionários revela que
proeminente tem o sentido primário e físico daquilo que avança em
ponta, como maçãs do rosto proeminentes ou queixo proeminente.
5. Desse sentido físico, passou-se ao sentido metafórico, para indicar
aquele ou aquilo que se eleva acima do que está em volta, ou aquele que
se destaca por qualidades intelectuais ou morais em seu meio. Exs.: a)
“Falo aos cidadãos proeminentes desta cidade”; b) “Buscava garimpar
ideias proeminentes, que pudessem frutificar nas mentes dos
concidadãos”.
6. Já para preeminente, os dicionários referem a acepção daquilo que está
muito acima do que está em sua volta, ou superior, ou excelso, ou
sublime, ou que se distingue pelo mérito ou saber, ou nobre, distinto,
ilustre. Exs.: a) “Um saber assim preeminente não pode ficar
escondido”; b) “Ideias preeminentes foram explicitadas naquela
reunião”.
7. Da comparação entre as acepções e os exemplos, pode-se concluir em
síntese: a) proeminente, por um lado, tem um sentido físico, que não se
encontra em preeminente; b) no sentido metafórico, todavia,
proeminente é sinônimo de preeminente.
Prefacial
Ver Petição inicial (P. 563).
Prefeita – Existe?
Ver Capitã, Capitoa ou A Capitão? (P. 168) e Poeta – Qual o feminino? (P.
570)
Preferir
1. Quanto à conjugação verbal, aparece um i na primeira pessoa do
presente do indicativo e nos tempos dela derivados: prefiro, preferes,
prefere, preferimos, preferis, preferem (presente do indicativo); prefira,
prefiras, prefira, prefiramos, prefirais, prefiram (presente do
subjuntivo); prefere, prefira, prefiramos, preferi, prefiram (imperativo
afirmativo); não prefiras, não prefira, não prefiramos, não prefirais, não
prefiram (imperativo negativo).
2. Tal verbo não é defectivo, e não apresenta problemas ou irregularidades
nos demais tempos e modos, em que é conjugado normal e regularmente.
3. Na observação de José de Nicola e Ernani Terra, em verbos dessa
natureza, “o e do radical muda para i na primeira pessoa do singular do
presente do indicativo e nas formas daí derivadas” (2000, p. 20).
4. Como os tempos derivados do presente do indicativo são o presente do
subjuntivo, o imperativo afirmativo e o imperativo negativo, os
problemas apontados não aparecem nas demais formas, tempos e modos,
que são regulares.
5. Duas observações se hão de fazer, em continuação, quanto a sua
regência verbal: a) por sua própria etimologia (pre = antes; ferre = levar,
trazer), já traz em si a ideia de predileção, de preferência, motivo por que
não se lhe acrescenta palavra alguma ou expressão indicadora de
intensidade, como antes, mais, muito mais ou mil vezes (TORRES, 1967,
p. 230); b) o objeto indireto, nesse caso, é regido pela preposição a, e
não pela locução do que.
6. Observem-se, assim, os seguintes exemplos e a indicação de sua
correção ou erronia: a) “O réu preferiu calar a mentir” (correto); b) “O
réu preferiu mil vezes calar a mentir” (errado); c) “O réu preferiu calar
do que mentir” (errado); d) “O réu preferiu mil vezes calar do que
mentir” (errado).
7. Em elegante expressão, Vasco Botelho de Amaral (1939, p. 50),
comentando as formas errôneas, observa que “tal redundância não pode
admitir-se no escorreito frasear, posto que se explique o seu emprego”,
acrescentando que nesse erro, em real e efetiva “inadvertência de
redação” – a qual, no caso, é até “perdoável a quem tanto honrou o
idioma” – incidiu Camilo Castelo Branco: “… prefere antes matar a
vítima…”.
8. Referindo-se a dois exemplos – um de Camilo Castelo Branco e outro de
Almeida Garrett – em que se usou da expressão preferir antes, Rui
Barbosa assim a criticou: “Preferir antes não reflete o menor traço da
elegância paterna”, acrescentando que tal proceder “não encontraria,
entre os menos escrupulosos escrevedores, quem o imitasse”
(BARBOSA apud TORRES, 1967, p. 230).
9. Com supedâneo em lição de Mário Barreto, anota Cândido Jucá Filho
(1981, p. 93) que “preferir antes” é “expressão supérflua”.
10. E assim teoriza Laudelino Freire, de modo definitivo, a questão: “O
verbo preferir, além do complemento direto ou acusativo, pede dativo:
‘Prefiro morrer a matar’; ‘Prefiro ficar para almoçar a ficar para
jantar’; ‘Prefiro a irmã ao irmão’… Enfim, preferir a, e não preferir do
que” (1937b, p. 110).
11. Na apropriada observação de Cândido de Oliveira, “preferir significa
querer antes; daí ser erro ‘prefiro antes’, ‘prefiro mais’… Não se dirá,
igualmente: ‘preferir isto que aquilo’, ‘preferir tal do que qual’…”
(1961, p. 277).
12. Anotando a frequência com que ocorrem lapsos desse jaez nos meios
de comunicação, Josué Machado exemplifica com trechos equivocados
de jornais: a) “Gramsci preferia Stálin do que Palmiro Togliatti”; b)
“Chiarelli prefere CPI do que bloquear Bucchi”; c) “Ele prefere
competir com Lula no segundo turno, em vez de Brizola”.
13. Em outra passagem, complementa tal autor que, “enquanto o amor ao
popular não prevalecer, convém continuar preferindo uma coisa a
outra” (MACHADO, 1994, p. 41 e 206).
14. Ainda quanto a preferir antes, Cândido de Figueiredo (1948, p. 59-60)
– que assevera nunca ter visto “em português de lei” – observa que “é
pleonasmo inutilíssimo, resultante da influência de outra locução: antes
que. Aqui, está bem o antes; acolá está mal, porque já estava
implicitamente no preferir. Preferir é querer antes. ‘Eu antes quero’ é o
mesmo que ‘eu prefiro’.
15. Muito embora aponte uma ou outra abonação literária para preferir
mais ou preferir antes, sobretudo em escritores modernos e
contemporâneos, Celso Pedro Luft realça tratar-se de “sintaxe oral”,
acrescentando que “em linguagem culta formal cabe a sintaxe primária:
preferir algo ou alguém a…” (1999, p. 413).
16. Registre-se, contudo, em posição solitária, sem reflexo algum de
aceitação nos meios em que se deva empregar a norma culta, o ensino
de Silveira Bueno, que argumenta não existir em Português o verbo
ferir (não no sentido de machucar, mas, de acordo com a própria
etimologia, de suportar, levar, conduzir), motivo por que, em “preferir
do que, desde que o povo empregue o advérbio mais com o qual se faz
o comparativo de superioridade, corretamente virá a segunda parte da
comparação expressa por do que”.
17. E, para corroborar seu ensino, carreia tal autor exemplos de dois
escritores de proa de nossa língua (BUENO, 1957, p. 350-1): a)
“Nunca tive, certo, a balda de valentão, mas agora, sem a mínima
fanfarronada, prefiro antes e muito antes morrer de uma bala do que
estar mais tempo emigrado” (Almeida Garrett); b) “O menino repartia-
se bem com ambas, preferindo um pouco mais a mãe postiça”
(Machado de Assis).
18. Repetindo lição de Silveira Bueno – repita-se sempre que sem
aceitação nos meios em que obrigatório o padrão culto – assevera
Luciano Correia da Silva que se vai “incorporando à linguagem
moderna a construção ‘preferir do que’, nada obstante o ensino
tradicional em contrário”.
19. E encontra tal autor mais um fundamento para advogar o emprego da
locução do que: “Nos períodos longos, a regência com a pode tornar a
expressão obscura” (SILVA, L., 1991, p. 79).
20. Por fim, vale acrescer que, no âmbito jurídico, o mencionado verbo
pode ter o sentido de ter primazia, hipótese em que é intransitivo ou
transitivo indireto. Exs.: a) “Concorrendo à remição vários
pretendentes, preferirá o que oferecer maior preço” (CPC/1973, art.
789); b) “O crédito real prefere ao pessoal de qualquer espécie…”
(CC/1916, art. 1.560); c) “A Fazenda federal prefere à estadual, e esta,
à municipal” (CC/1916, art. 1.571).
Preferível
1. Lembrando ser “grave erro construir este adjetivo com a locução do que
(ou seu equivalente que)”, Sousa e Silva anota que “a regência vernácula
é com a preposição a, sintaxe igual à do verbo derivante”.
2. Arrola tal autor um exemplo a ser evitado, por gramaticalmente
incorreto: “Ele não pode fugir às penas da lei e, no caso, é preferível
enfrentá-las como homem normal do que fugir-lhe aos rigores, passando
por anormal”.
3. E manda corrigi-lo: “Ele não pode fugir às penas da lei e, no caso, é
preferível enfrentá-las como homem normal a fugir-lhe aos rigores,
passando por anormal” (SILVA, A., 1958, p. 221).
4. Francisco Fernandes (1969, p. 304) também é inflexível nessa lição,
abonando-se com exemplos de autores insuspeitos: a) “É preferível
retocar e ampliar os moldes de barro antigo a empreender novos
esboços” (Veiga Miranda); b) “O Conde de Santa Bárbara há de dar-lhe
quarenta contos, porque a vida é preferível a quarenta contos” (Camilo
Castelo Branco).
5. Lembrando a ocorrência de preferível do que na linguagem vulgar, Celso
Pedro Luft, no que concerne aos textos que devam submeter-se à norma
culta, observa, em mesma esteira, que o correto é “uma coisa preferível a
outra, que lhe é preferível” (1999, p. 399).
Prefixo negativo
Ver In (P. 402) e Não – Com hífen ou sem? (P. 484)
Preito
1. Quer dizer homenagem, reverência, tributo, sendo comum a expressão
preito de gratidão. Exs.: a) “De muitos modos os fiéis rendem preito aos
santos”; b) “A estátua em praça pública é um justo preito da cidade a
um de seus mais ilustres filhos”; c) “No início da sessão do júri, o
advogado rendeu merecido preito ao colega da defesa, recentemente
falecido”.
2. Não confundir com sua parônima pleito, que basicamente significa
concorrência, discussão, disputa.
Prenome
Ver Nome (P. 497).
Preposição
Ver Artigo (P. 136), Com ou sem – Está correto? (P. 198), Expressões de
tempo (P. 348), Omissão da preposição – Está correto? (P. 526) e
Preposição – Quando deve ser repetida? (P. 595).
Preposições acidentais
Ver Preposições essenciais (P. 595).
Preposições essenciais
1. Preposições são palavras que subordinam um termo da frase a outro – o
que vale dizer que tornam o segundo dependente do primeiro: livro de
Pedro, obediente a seus pais.
2. Dizem-se essenciais as preposições típicas, que normalmente funcionam
como tais, havendo, em português, dezessete delas: a, ante, após, até,
com, contra, de, desde, em, entre, para, por, sem, sob, sobre, trás e per
(usada somente na expressão de per si e nas combinações pelo, pela,
pelos, pelas).
3. Já as preposições não essenciais (ou acidentais) são originariamente
particípios ou adjetivos: durante (particípio presente do verbo durar),
mediante (de mediar), conforme etc.
Prequestionamento ou Pré-questionamento?
Ver Pré ou Pre? Com hífen ou sem? (P. 594)
Presidenta ou A Presidente?
1. Seguindo a mesma estruturação existente no latim, os adjetivos
terminados em nte, mesmo quando apresentam aparência substantivada,
têm geralmente, em nosso idioma, uma mesma forma para o masculino e
para o feminino, modificando-se apenas o artigo que os antecede: a
amante, o amante, a constituinte, o constituinte, a doente, o doente, a
estudante, o estudante, a ouvinte, o ouvinte.
2. É tecnicamente o que se denomina comum de dois ou comum de dois
gêneros.
3. Nos últimos tempos, porém, gradativamente, alguns desses vocábulos
vêm adquirindo forma efetivamente feminina, em nta.
4. Dentre eles está presidenta, que, segundo Celso Cunha (1970, p. 96),
constitui feminino ainda com curso restrito no idioma, pelo menos no
Brasil.
5. Antenor Nascentes (1942, p. 60) anota que o uso já passou a admitir o
feminino presidenta.
6. Essa também é a lição de João Ribeiro, para quem “o uso de formar
femininos em enta dos nomes em ente, como presidenta, almiranta,
infanta, tem-se pouco generalizado” (1923, p. 158).
7. Evanildo Bechara (1974, p. 84), de igual modo, é dos que admitem a
normal flexão desse substantivo para o feminino, e Luiz Antônio
Sacconi (1979, p. 32), sem outros comentários, confere ao vocábulo os
dois femininos: presidente e presidenta.
8. Mário Barreto admite-lhe a forma específica feminina (presidenta) e
esclarece tratar-se de “toda mulher que preside”, recusando, todavia, o
intento de alguns de conferir tal nome à mulher do presidente.
9. Ainda de acordo com esse gramático, a ojeriza de alguns para com o
emprego de forma feminina em tais casos talvez se explique pela
circunstância de que, “na língua jocosa, é que dos nomes de cargos sói
derivar-se um feminino para designar a mulher do que o desempenha,
como almiranta, generala, coronela, delegada…” (BARRETO, 1954b,
p. 188).
10. Édison de Oliveira (s/d, p. 158) inclui essa palavra entre os vocábulos
femininos terminados por a, que o povo evita usar, “quer em virtude de
preconceito de que se trata de funções ou características próprias do
homem, quer por considerá-los mal sonoros ou exóticos”; mas afirma
que se hão de empregar tais femininos, “que a gramática já ratificou
definitivamente”.
11. Observa Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 330) que presidenta “é a
forma dicionarizada e correta, ao lado de presidente”. E exemplifica: a)
“A presidenta da Nicarágua fez um pronunciamento à nação”; b) “A
presidente das Filipinas pediu o apoio do povo para o seu governo”.
12. Para Arnaldo Niskier, “o feminino de presidente é presidenta, mas
pode-se também usar a presidente, que é a forma utilizada em diversos
jornais” (1992, p. 58).
13. Sousa e Silva não vê desdouro algum nem incorreção linguística em se
dizer presidenta para o feminino.
14. E transcreve o posicionamento de Sá Nunes, para quem, ao se deixar
de flexionar tal vocábulo, “não pode haver contrassenso maior: contra a
Gramática e contra o gênio da Língua Portuguesa”, uma vez que “o
substantivo que designa o cargo deve concordar em gênero com a
pessoa que exerce a função. Sempre foi assim, e assim tem de ser”.
15. Continuando na exposição de seu próprio entendimento, complementa
Sousa e Silva (1958, p. 307) que, na esteira dos nomes terminados em
ente – e que são comuns aos dois gêneros – tanto se pode dizer a
presidente como a presidenta.
16. Silveira Bueno (1957, p. 382-3) preconiza que se diga presidenta, se tal
posto é entregue a uma senhora, acrescentando que Castilho emprega
tal forma.
17. E Cândido de Oliveira (1961, p. 133-4), após lecionar que “os nomes
terminados em ente são comuns de dois gêneros”, acrescenta
textualmente que “é de lei, assim para o funcionalismo federal como
estadual, e de acordo com o bom senso gramatical, que nomes
designativos de cargos e funções tenham flexão: uma forma para o
masculino, outra para o feminino”. E, em seu exemplário, ao masculino
presidente contrapõe ele o feminino presidenta.
18. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, veículo oficial para dirimir dúvidas acerca da
existência ou não de vocábulos em nosso idioma, ao lado de presidente
– que dá como substantivo comum de dois gêneros – registra a palavra
presidenta como um substantivo feminino (2009, p. 674), o que implica
dizer que o uso indistinto de ambas está plena e oficialmente
autorizado entre nós.
19. E assim se conclua e sintetize: sem desdouro algum e sem significar
ironia ou gracejo, pode-se dizer indiferentemente, portanto, a
presidente ou a presidenta.
20. Uma primeira observação adicional: o uso tradicional da língua de que
vocábulos terminados em nte tivessem a mesma forma para o
masculino e para o feminino apenas começou a ter um real início de
variação para um feminino em nta na primeira metade do século XX.
Bem por isso, a atribuição desse feminino específico é gradativa, sendo
ainda poucos os vocábulos que admitem essa possibilidade. Na dúvida,
convém consultar o VOLP.
21. Uma segunda observação adicional: dizer que alguns vocábulos
aceitam um feminino próprio em enta não significa fixar uma regra
geral a ponto de, com base nela, querer flexionar indistintamente os
demais adjetivos e substantivos com mesma terminação, como, por
exemplo, adolescenta, adquirenta, agenta, anuenta, ascendenta,
cedenta, consulenta, contraenta, dependenta, emitenta, escreventa,
exequenta, gerenta, opoenta, pacienta, pretendenta, promoventa,
remetenta, requerenta. Afirme-se, para não haver dúvidas: tais
femininos simplesmente não existem (ao menos por enquanto).
Ver Crenta ou Crente? (P. 240) e Parenta ou Parente? (P. 550)
Presidir
1. Quanto à regência verbal, admite, indiferentemente, ser construído com
objeto direto ou com objeto indireto (preposição a).
2. Assim, são corretas ambas as construções a seguir: a) “O magistrado
presidiu o júri”; b) “O magistrado presidiu ao júri”.
3. Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 224) observa que, quando se preferir seu
emprego como transitivo indireto, é de se dar preferência às formas
preposicionadas dos pronomes – a ele, a ela, a eles, a elas –
marginalizando as formas átonas lhe e lhes.
4. A esse respeito, contudo, vale transcrever lição de Francisco Fernandes
(1971, p. 475): “Entendem alguns gramáticos que este verbo recusa a
forma pronominal lhe, só admitindo a ele, a ela. Ambas as duas
construções, porém, são encontradas em escritores autorizados”. Exs.: a)
“Foram nomeados para presidirem a ela o provincial dos pregadores e o
guardião” (Alexandre Herculano); b) “Sacrifício que fiz à dignidade
coletiva dos que me tinham escolhido para lhes presidir” (Alexandre
Herculano).
5. Admitindo a dupla possibilidade de construção, esclarece Celso Pedro
Luft (1999, p. 416) que o mais comum é o objeto indireto analítico (a
ele, a ela, a eles, a elas), e que o lhe também ocorre, “se bem que
escassamente”.
6. Porque se aceita sua regência como transitivo direto, óbvio que pode ser
empregado na voz passiva. Ex.: “O júri foi presidido pelo magistrado”.
7. Resumindo as questões de regência desse verbo, leciona com
propriedade Domingos Paschoal Cegalla: “São portanto lícitas as
construções presidir a sessão, presidi-la, presidir à sessão, presidir a
ela, a sessão foi presidida por fulano” (1999, p. 330). Acrescente-se:
presidir-lhe.
8. Oportuno o registro da lição de Sousa e Silva (1958, p. 225), o qual,
embora confirme a dupla possibilidade de construção, já referida, assim
leciona: “constrói-se com a preposição a quando significa regular”. Ex.:
“As leis que presidem à gravidade”. Não parece haver sentido para a
distinção.
9. Nos textos legais, este verbo aparece às vezes como transitivo direto
(podendo o objeto direto aparecer como sujeito da voz passiva), às vezes
como transitivo indireto introduzido pela preposição a. Exs.: a)
“Compete privativamente ao Presidente da República: … XVIII –
convocar e presidir o Conselho da República e o Conselho de Defesa
Nacional” (CF/88, art. 84, XVIII); b) “A instrução contraditória é
sempre presidida pelo juiz…” (CPP português, art. 330º); c) “Celebrar-
se-á o casamento no dia, hora e lugar previamente designados pela
autoridade que houver de presidir ao ato…” (CC/1916, art. 192).
10. Após pesquisa levada a efeito em textos legais do Brasil e de Portugal,
Adalberto J. Kaspary concluiu que “ocorre com maior frequência a
construção com objeto indireto: doze entre dezenove exemplos” (1996,
p. 250).
Ver Voz passiva – Quando é possível? (P. 793)
Pressupor
Ver Pôr – Como conjugar? (P. 577)
Pretenção ou Pretensão?
1. Pretensão é o ato ou efeito de pretender, aspiração ou ambição. Ex.: “A
pretensão do rapaz era tornar-se magistrado”.
2. Atente-se a sua ortografia, pois é errada a forma pretenção.
3. Idêntica observação serve para pretensioso, pretenso, pretensor.
Pretencioso ou Pretensioso?
Ver Pretenção ou Pretensão? (P. 597)
Pretenso
Ver Pretenção ou Pretensão? (P. 597)
Pretensor
Ver Pretenção ou Pretensão? (P. 597)
Preterir
1. Embora seja composto de ir, não se assemelha a ele na conjugação
verbal, mas segue a conjugação “dos verbos da terceira, que têm um e
antes da última sílaba do infinitivo” (FERNANDES, 1971, p. 476).
2. Desse modo, aparece um i na primeira pessoa do singular do presente do
indicativo e nos tempos dela derivados, devendo-se observar não ser ele
verbo defectivo: pretiro, preteres, pretere, preterimos, preteris, preterem
(presente do indicativo); pretira, pretiras, pretira, pretiramos, pretirais,
pretiram (presente do subjuntivo); pretere, pretira, pretiramos, preteri,
pretiram (imperativo afirmativo); não pretiras, não pretira, não
pretiramos, não pretirais, não pretiram (imperativo negativo).
3. Não apresenta problemas ou irregularidades nos demais tempos.
4. Seu significado mais usual é deixar de parte, marginalizar. Exs.: a) “A
sentença era nula por preterir formalidades tidas por imprescindíveis
pelo ordenamento processual”; b) “Normalmente, o testador não pode
preterir os herdeiros necessários”.
5. No que concerne à regência verbal, leciona Sousa e Silva que “não se diz
preterir Fulano a Sicrano, e sim preterir Fulano por Sicrano”.
6. Lembra tal autor exemplo de errôneo emprego desse verbo: “… sempre
que F. preterir A., em alto estado de inspiração, a um suplente de menor
categoria”.
7. E manda assim corrigir: “… sempre que F. preterir A., em alto estado de
inspiração, por um suplente de menor categoria” (SILVA, A., 1958, p.
226).
8. Porque admite ser construído com objeto direto, pode ser empregado na
voz passiva: “Os herdeiros necessários normalmente não podem ser
preteridos pelo testador”.
Pretérito mais-que-perfeito
1. Um leitor relata que uma colega de trabalho, em suas peças jurídicas, usa
do pretérito mais-que-perfeito o tempo todo, nos lugares em que o
normal seria empregar o pretérito perfeito. E indaga se essa é uma opção
estilística válida, ou se há equívoco na utilização indiscriminada desse
tempo verbal.
2. Em termos de fixação de premissas, observe-se que o pretérito perfeito
indica uma ação terminada (“Fiz o trabalho”), enquanto o pretérito mais-
que-perfeito aponta uma ação passada em relação ao próprio perfeito
(“Quando ela chegou, eu já fizera [ou tinha feito] o trabalho”).
3. Para Evanildo Bechara, em seu emprego clássico, o pretérito mais-que-
perfeito “denota uma ação anterior a outra já passada” (1974, p. 275), e
isso se pode observar com facilidade em exemplo de autor
inquestionável: “No dia seguinte, antes de me recitar nada, explicou-me
o capitão que só por motivos graves abraçara a profissão marítima…”
(Machado de Assis).
4. Em segunda possibilidade de emprego, o pretérito mais-que-perfeito
pode, sem correlação com outra ação passada, denotar um fato
vagamente situado no passado, como se dá no seguinte exemplo:
“Nascera na senzala, de mãe escrava, e seus primeiros anos vivera-os
pelos cantos escuros da cozinha, sobre velha esteira e trapos imundos”
(Monteiro Lobato).
5. E, para o que interessa aqui, não há outra permissão para emprego do
pretérito mais-que-perfeito.
6. Vale dizer: se não ocorre nenhum dos casos citados – (i) nem ação
anterior a outra já passada, (ii) nem fato vagamente situado no passado,
mesmo sem correlação com outra ação passada – mas se lança mão do
pretérito mais-que-perfeito como simples equivalente do pretérito
perfeito, então o que há é um equívoco nesse indiscriminado emprego de
tempo verbal.
Pretexto
Ver A pretexto de ou Sob pretexto de? (P. 127)
Prevalente ou Prevalecente?
1. Do que se observa ser usado nos textos jurídicos e forenses, importa
saber qual a palavra correta para significar a qualidade daquilo que
prevalece: prevalente ou prevalecente?
2. Para tanto, de início, é importante reiterar que a autoridade para listar as
palavras oficialmente existentes em nosso léxico é o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de
Letras, órgão esse que tem a responsabilidade legal de controlar nosso
vocabulário, em cumprimento à velha Lei Eduardo Ramos, de n. 726, de
8/12/1900.
3. Isso significa, de um modo geral, que, se o VOLP não registra
determinado vocábulo, não estamos autorizados a empregá-lo na
linguagem formal das petições, arrazoados e pareceres. E tal autorização
para seu emprego encontra-se exatamente na existência do referido
vocábulo na lista do VOLP.
4. Com essas observações, é preciso dizer, que o VOLP, dá como existentes
em nosso idioma tanto prevalente como prevalecente (ACADEMIA
BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 675), o que significa dizer que
está autorizado o emprego de qualquer dos dois vocábulos na acepção
pretendida.
Prevenir ou Previnir?
1. Prevenir é a grafia correta da palavra, e não previnir.
2. Quanto à conjugação verbal, o e da penúltima sílaba transforma-se em i
nas formas rizotônicas e nas formas delas derivadas.
3. Desse modo, assim é seu presente do indicativo: previno, prevines,
previne, prevenimos, prevenis, previnem.
4. Da primeira pessoa do singular se extrai o presente do subjuntivo:
previna, previnas, previna, previnamos, previnais, previnam.
5. Desses dois se extraem seus derivados: previne, previna, previnamos,
preveni, previnam, (imperativo afirmativo); não previnas, não previna,
não previnamos, não previnais, não previnam (imperativo negativo).
6. Como as formas rizotônicas ocorrem apenas nos tempos já referidos, não
se dá irregularidade alguma nos demais: prevenia (imperfeito do
indicativo), prevenirei (futuro do presente do indicativo), preveniria
(futuro do pretérito), prevenindo (gerúndio), prevenido (particípio).
7. Serve de modelo para outros: agredir, denegrir, progredir, regredir,
transgredir.
8. Num segundo aspecto, trata-se de vocábulo que precisa ser observado,
por seus problemas de regência verbal.
9. Tanto a coisa quanto a pessoa que lhe servem de complementos podem
ser, indiferentemente, objeto direto ou objeto indireto.
10. O que não se permite é a coexistência de dois objetos diretos ou dois
objetos indiretos em mesma oração.
11. Com essas anotações, são corretas as duas construções seguintes: a)
“Preveniram ao Corregedor o fato que ocorreria”; b) “Preveniram o
Corregedor do (ou sobre o) fato que ocorreria”.
12. Não são, contudo, corretas as seguintes estruturas, em que se faz
presente o cruzamento entre as duas estruturas já mencionadas: a)
“Preveniram ao Corregedor do fato que ocorreria”; b) “Preveniram o
Corregedor o fato que ocorreria”.
13. Tais construções são errôneas, porque a primeira tem, ao mesmo
tempo, dois objetos indiretos, e a segunda, dois objetos diretos.
14. Francisco Fernandes (1971, p. 476-7), todavia, lembra que, quando o
objeto indireto é representado por uma oração, às vezes a preposição
vem subentendida. Exs.: a) “Devo prevenir-te que não venho disposto
para fazer via-sacra” (Camilo Castelo Branco). Curioso observar,
todavia, que, no exemplo dado, o pronome oblíquo te tanto pode ser
objeto indireto quanto objeto direto, o mesmo se aplicando à oração
subordinada. Entretanto, se entendermos o pronome como objeto
direto, a oração será obrigatoriamente subordinada objetiva indireta; se
classificarmos o pronome como objeto indireto, a oração será
subordinada objetiva direta. Construindo-se a oração com a preposição
expressa (“Devo prevenir-te de que não venho disposto para fazer via-
sacra”), a única possibilidade é o pronome ser o objeto direto e a
oração ser subordinada objetiva indireta. b) “Previne já os nossos
cavaleiro que vistam imediatamente as armas” (Alexandre Herculano).
15. De Celso Pedro Luft (1999, p. 417) vêm as seguintes observações: a) O
uso mais comum corresponde à estrutura prevenir alguém de algo; b)
Também ocorre a sintaxe prevenir algo a alguém; c) “Muito raramente
se nos apresentou construído com objeto indireto de pessoa e direto de
coisa, construção que não merece, por certo, a aprovação de
vernaculistas”.
16. Também seguem essa construção os verbos aconselhar, avisar,
certificar e informar.
Previlégio ou Privilégio?
Ver Privilégio ou Previlégio? (P. 600)
Primeira-ministra – Existe?
Ver Capitã, Capitoa ou A Capitão? (P. 168) e Poeta – Qual o feminino? (P.
570)
Primeiro e segundo
1. Em precisa lição, observa Artur de Almeida Torres que, “quando dois ou
mais numerais ordinais do singular modificam um mesmo substantivo,
este, se posposto, pode ficar no singular ou ir para o plural”. Exs.: a)
“Depois de bater repetidas vezes à porta do primeiro e segundo andar,
dispunha-se a fazer arrombar as portas” (Camilo Castelo Branco); b)
“Os preços de segunda e terceira classes eram os mesmos de outras
partes” (Machado de Assis).
2. Complementa tal gramático que “o substantivo ficará no plural se se
antepuser aos aludidos numerais” (TORRES, 1966, p. 162). Ex.: “As
cláusulas terceira, quarta e quinta” (Rui Barbosa).
Ver Cláusulas terceira e quarta – Está correto? (P. 188) e Segundos e
terceiros – É possível? (P. 684)
Primeiros e segundos
Ver Segundos e terceiros – É possível? (P. 684)
Privilégio ou Previlégio?
1. Comumente, privilégio significa a vantagem que se concede a alguém
em detrimento de outros. Ex.: “Por força do art. 100, I, do Código de
Processo Civil, a mulher goza do privilégio de ser autora ou ré no foro
de sua residência quanto às ações de separação judicial, divórcio e
anulação de casamento”.
2. Observe-se que se deve escrever com i a sílaba inicial, sendo errônea a
forma previlégio ou mesmo o verbo previlegiar, tudo como registra o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (2009, p. 676), editado
pela Academia Brasileira de Letras, entidade oficialmente incumbida de
listar os vocábulos existentes em nosso idioma, bem como sua correta
grafia.
3. A frequência do erro fez Arnaldo Niskier (1992, p. 3) anotá-lo em obra
de profundo senso prático, acompanhado pela devida correção.
4. Veja-se seu emprego em alguns dispositivos de lei: a) “A sub-rogação
transfere ao novo credor todos os direitos, ações, privilégios e garantias
do primitivo, em relação à dívida, contra o devedor principal e os
fiadores” (CC, art. 349); b) “O crédito do comissário, relativo a
comissões e despesas feitas, goza de privilégio geral, no caso de falência
ou insolvência do comitente” (CC, art. 707); c) “Os títulos legais de
preferência são os privilégios e os direitos reais” (CC, art. 958); d) “O
privilégio especial só compreende os bens sujeitos, por expressa
disposição de lei, ao pagamento do crédito que ele favorece; e o geral,
todos os bens não sujeitos a crédito real nem a privilégio especial” (CC,
art. 963).
Proceder
1. Inspira cuidados quanto à regência verbal, porquanto, em dois de seus
três significados, é verbo muito usado na linguagem forense.
2. No sentido de ter fundamento, é intransitivo. Ex.: “A argumentação
exposta na inicial não procede”.
3. Significando provir, originar-se, constrói-se com a preposição de. Ex.:
“Ele procede de Miguelópolis”.
4. No significado de dar início, é transitivo indireto e exige a preposição a.
Ex.: “O magistrado procedeu ao inventário dos bens deixados pelo
falecido”.
5. Nesse último sentido, os textos de lei têm obedecido regularmente às
normas de regência determinadas pela Gramática, empregando-o como
transitivo indireto, introduzido pela preposição a. Exs.: a) “Compete
privativamente à Câmara dos Deputados: … II – proceder à tomada de
contas do Presidente da República…” (CF/88, art. 51, II); b) “Autuado o
pedido e tomadas as declarações, o juiz procederá às diligências
necessárias para verificar se os contraentes podiam ter-se habilitado
para o casamento…” (CC/1916, art. 200, §1º); c) “… logo que passe em
julgado se procederá à abertura do testamento, se existir, e ao
inventário e partilha dos bens, como se o ausente fosse falecido”
(CC/1916, art. 471 – com a observação de que esse dispositivo foi
revogado e substituído pelo art. 1.165 do CPC/1973); d) “Todo
proprietário pode obrigar o seu confinante a proceder com ele à
demarcação entre os dois prédios…” (CC/1916, art. 569); e) “Compete
à autoridade judiciária brasileira…: … proceder a inventário e partilha
de bens, situados no Brasil, ainda que o autor da herança seja
estrangeiro…” (CPC/1973, art. 89, II); f) “… o juiz lhe ordenará que
proceda ao respectivo depósito em cartório…” (CPC/1973, art. 362); g)
“Compete ao juiz em especial: … proceder direta e pessoalmente à
colheita das provas” (CPC/1973, art. 446, II); h) “… o juiz procederá à
instrução…” (CPC/1973, art. 453, § 1º).
6. Idêntica construção se pode observar nos arts. 603, caput, 776, 1.007,
1.012, 1.045, parágrafo único, 1.060, caput, 1.068, § 2º, 1.071, § 1º,
1.183, caput e 1.207, caput, todos do Código de Processo Civil.
7. Apenas para significativo registro, em sua pesquisa sobre a legislação de
Brasil e de Portugal, encontrou Adalberto J. Kaspary (1996, p. 256)
cento e sessenta e sete exemplos desse verbo com o sentido de realizar;
nessa acepção, entretanto, não localizou um caso sequer de seu emprego
como transitivo direto.
Ver Gosta-se de um bom vinho – Está correto? (P. 375), Procedeu-se aos
inventários ou Procederam-se aos inventários? (P. 601), Voz passiva –
Quando é possível? (P. 793) e Voz passiva e Pronome apassivador (P. 791).
Processo
1. Vulgarmente, significa curso, marcha, sucessão de estados ou mudanças.
Ex.: “O processo inflamatório está melhorando”.
2. Em Direito, trata-se de instituto complexo, formado pela relação jurídica
processual que se estabelece entre as partes e o Estado-juiz e dos atos
por eles praticados na forma, sequência e prazos determinados na lei.
Ex.: “O juiz extinguiu o processo sem julgamento do mérito”.
3. Não é palavra sinônima de procedimento, que é apenas seu aspecto
formal, a maneira como se realiza o processo, mas que não abarca a
totalidade de seu conceito, que é mais abrangente, alcançando, além de
forma, a própria substância.
4. Também não se confunde com autos, que consistem na materialização
dos documentos, nos quais se corporificam os atos do procedimento.
Ver A fazer – Está correto? (P. 91)
Próclise
1. Aspecto particular do estudo da colocação dos pronomes, abrange as
hipóteses em que o pronome pessoal oblíquo átono vem posto antes do
verbo. Ex.: “Não te vás!”.
2. É obrigatória, entre outros casos, quando, logo antes do verbo, sem outra
palavra intermediária e sem vírgula ou sinal de pontuação, há uma das
chamadas palavras atrativas.
3. São palavras atrativas as de valor negativo, os advérbios, os pronomes
relativos, os pronomes indefinidos e as conjunções subordinativas.
4. Confiram-se, assim, os exemplos a seguir: a) “Não lhe importavam as
calúnias assacadas” (palavra negativa); b) “Hoje a encontrei de novo”
(advérbio); c) “O argumento que o convenceu foi o último mencionado”
(pronome relativo); d) “Alguém o convenceu” (pronome indefinido); e)
“Quando o encontrou, fugiu” (conjunção subordinativa).
5. Oportuno é anotar que não se usa, normalmente, pronome átono logo
após sinal de pontuação, ainda que antes deste haja palavra atrativa.
Exs.: a) “Ali o encontrei” (correto); b) “Ali encontrei-o” (correto); c)
“Ali, o encontrei” (errado); d) “Ali encontrei-o” (errado).
6. Nesse aspecto, apropriada é a síntese de Carlos Góis (1945, p. 112), em
dois aspectos: a) Quando houver uma vírgula, indicadora de uma pausa,
mesmo com a antecedência de palavra atrativa, usa-se a ênclise, até
porque “a pausa faz cessar a atração”. Ex.: “Aqui, canta-se; ali, dança-
se; acolá, bebe-se”; b) “Sem a vírgula (ou pausa) será de rigor próclise”.
Ex.: “Aqui se canta, ali se dança, acolá se bebe”.
7. Também essa é a lição de José de Nicola e Ernani Terra (2000, p. 36):
por um lado, “grande parte dos advérbios atrai o pronome oblíquo átono
para antes do verbo”; por outro lado, “caso haja vírgula depois do
advérbio, o pronome oblíquo deverá vir depois do verbo”. Exs.: a) “Aqui
se trabalha muito”; b) “Aqui, trabalha-se muito”.
8. Em interessante observação acerca do relacionamento entre a palavra
atrativa e o pronome em tais circunstâncias, anota Cândido de Oliveira
de modo taxativo: “havendo pausa (geralmente indicada por vírgula),
pronome depois: a) ‘Aqui, despedimo-nos’; b) ‘Agora, ajeite-se como for
possível’; c) ‘Não, arrume-se por aí’” (1961, p. 307).
9. Para o último tipo de palavras atrativas, assim é o ensino de Cândido de
Figueiredo: “A qualidade atrativa das conjunções, em relação aos
pronomes pessoais atônicos, reproduz-se naturalmente nas locuções
conjuntivas” (1937, p. 311).
10. Para o caso específico do pronome indefinido como palavra atrativa,
em tais hipóteses, anota Eduardo Carlos Pereira que “numerosas
exceções em bons escritores mostram que esta regra assinala uma
tendência, que ao ouvido educado compete determinar em cada caso”
(1924, p. 254).
11. Acresça-se que as palavras atrativas permanecem com sua força de
atração mesmo antes do futuro do presente e futuro do pretérito. Exs: a)
“Não lhe concederei benefício para o cumprimento da pena” (correto);
b) “Não conceder-lhe-ei benefício para o cumprimento da pena”
(errado); c) “Não lhe concederia benefício para o cumprimento da
pena” (correto); d) “Não conceder-lhe-ia benefício para o
cumprimento da pena” (errado).
12. Tal, aliás, é a lição de Carlos Góis (1945, p. 126), para quem, nas
construções com futuro do presente e futuro do pretérito, “se figurar na
frase qualquer fator de próclise…, dar-se-á esta, e não a mesóclise”, até
porque esta última construção “seria ultradissonante”. Exs.: a) “Não te
amaria”; b) “Certamente nos veríamos”.
13. A todos esses casos de próclise, oportuno é acrescentar a lição de
Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 255) no sentido de que as formas
proparoxítonas dos verbos repelem em geral a ênclise. Exs.: a) “Nós
amáramos-te mais que nossa vida” (errado); b) “Nós te amáramos
mais que nossa vida” (correto).
14. Interessante também a observação de Luiz Antônio Sacconi (1979, p.
230): é clássico o emprego do pronome antes do advérbio não, em
construção que tecnicamente recebe o nome de apossínclise. Ex.: “É
possível que o leitor me não creia” (Machado de Assis).
15. Ainda oportuno é lembrar com tal gramático que as conjunções e, mas,
porém, todavia, contudo, logo e portanto não exigem próclise
(SACCONI, 1979, p. 231), até porque são conjunções coordenativas e
não subordinativas.
16. Feitas essas observações, de grande adequação é lembrar as
apropriadas palavras de Eduardo Carlos Pereira: “é manifestamente
levar ao exagero a topologia pronominal o ensinar que o pronome reto,
as conjunções coordenativas, os adjetivos possessivos e numerais
atraem normalmente o oblíquo” (1924, p. 256).
Ver também Atração pronominal remota (P. 144), Ênclise (P. 317),
Mesóclise (P. 471), Próclise ou Ênclise? (P. 604), Próclise proibida (P. 605),
Pronomes e Locuções verbais (P. 617) e Se me não falha a memória ou Se
não me falha a memória? (P. 684)
Próclise ou Ênclise?
1. Resolvidas as questões gerais de colocação dos pronomes e observados
os casos de ênclise, mesóclise e próclise, deve-se anotar que em dois
casos é optativa a colocação do pronome em próclise ou em ênclise.
2. A primeira hipótese é a da frase que está na ordem direta (sujeito +
verbo + complementos), e não tem palavra atrativa.
3. Assim, são corretas ambas as formas: a) “O advogado se atrasou”; b) “O
advogado atrasou-se”.
4. A segunda hipótese de colocação pronominal optativa é a da frase em
que, antes do verbo, há uma conjunção coordenativa (e não
subordinativa, a qual haveria de configurar caso de atração obrigatória
do pronome para antes do verbo).
5. Por isso, também são corretas ambas as formas: a) “O promotor chegou
e se apresentou”; b) “O promotor chegou e apresentou-se”.
6. Atente-se, entretanto, a que, mesmo se coordenativa a conjunção, mas de
valor negativo, “será de rigor a próclise”. Ex.: “Nem Pedro nem Paulo se
viu eleito” (GÓIS, 1945, p. 120-1).
7. Essas observações também se aplicam ao verbo no futuro do presente ou
futuro do pretérito, caso em que, em vez de dar-se a facultatividade entre
a próclise e a ênclise, porém, ocorrerá ela entre a próclise e a mesóclise.
8. Vejam-se, então, os seguintes exemplos e a indicação de sua correção ou
erronia: a) “O advogado se atrapalhará” (correto); b) “O advogado
atrapalhar-se-á” (correto); c) “O advogado atrapalhará-se” (errado); d)
“O advogado se atrapalharia” (correto); e) “O advogado atrapalhar-se-
ia” (correto); f) “O advogado atrapalharia-se” (errado).
9. Carlos Góis (1945, p. 122), em oportuna observação, refere que, “sempre
que a colocação for facultativa, deve preferir-se a ênclise”, trazendo ele
próprio as justificativas: a) “sendo o pronome pessoal oblíquo átono uma
palavra sem acentuação própria, o seu lugar natural, como palavra
enclítica, é depois do verbo (e não antes)”; b) “sendo o pronome pessoal
oblíquo átono complemento do verbo (objeto direto ou indireto), o seu
lugar natural é também depois do verbo (e não antes)”.
10. Quando, no início da oração, há uma palavra daquelas que
normalmente atraem o pronome átono para antes do verbo (de valor
negativo, advérbio, pronome relativo, pronome indefinido ou
conjunção subordinativa), mas entre ela e o pronome se posicionam
outras palavras, querem alguns autores que seja a próclise obrigatória,
sob a justificativa de que, em tais casos, apesar da intercalação de
outros vocábulos, mantém-se a força de atração de tais palavras, em
verdadeira atração pronominal remota (OLIVEIRA, C., 1961, p. 310).
11. Ora, a força de atração de palavras desse jaez, nessas hipóteses, deve
restringir-se apenas aos casos em que estejam elas logo antes do verbo.
12. Em caso contrário, se houver, por exemplo, um sujeito entre a palavra
atrativa e o verbo, será possível tanto a próclise como a ênclise, mas
não pelas razões dadas pelos referidos gramáticos, e sim por força da
sequência sujeito + verbo + complemento, ordem direta essa que
permite ambas as estruturas.
13. Atente-se, assim, aos seguintes exemplos, todos corretos: a) “Ninguém
respondeu, porque dona Teresa ergueu-se imediatamente” (Alexandre
Herculano); b) “Ninguém respondeu, porque dona Teresa se ergueu
imediatamente”; c) “É verdade que meu pai aborrecia-me” (Camilo
Castelo Branco); d) “É verdade que meu pai me aborrecia”.
14. Vale, em continuação, transcrever a lição genérica de Carlos Góis:
“Constitui a próclise a mais enfática das formas sinclíticas; por isso o
seu emprego deve ser o mais moderado possível; não se pode
malbaratar a ênfase. Constituindo ela a regra geral no francês, no
espanhol e no italiano, constitui exceção em português: neste, sempre
que a colocação for facultativa (ou arbitrária), prevalecerá a ênclise”.
15. Mais à frente, já deixando o problema no patamar da preferência,
continua tal autor: “Sempre que a colocação for facultativa, deve-se
preferir a ênclise à próclise” (GÓIS, 1945, p. 106 e 117).
Ver também Atração pronominal remota (P. 144), Mesóclise (P. 471),
Próclise proibida (P. 605), Pronomes e Locuções verbais (P. 617) e Se me
não falha a memória ou Se não me falha a memória? (P. 684)
Próclise ou Mesóclise?
Ver Próclise ou Ênclise? (P. 604)
Próclise proibida
1. Diz-se haver próclise quando o pronome pessoal oblíquo átono vem
antes do verbo. Ex.: “O réu não se conformou com a sentença
condenatória”.
2. Existem, até mesmo, alguns casos em que tal posicionamento do
pronome em relação ao verbo é obrigatório.
3. Atente-se, porém, na lição de Carlos Góis (1945, p. 86), resumindo o
entendimento comum entre os gramáticos: constitui “barbarismo de
construção” iniciar o período por variação pronominal átona. Exs.: a)
“Me parece que…” (errado); b) “Parece-me que…” (correto); c) “Lhe
disseste tudo” (errado); d) “Disseste-lhe tudo” (correto).
4. A força de tal observação de não se começar oração com pronome átono
faz com que normalmente não seja ele empregado logo após sinal de
pontuação, ainda que antes deste haja palavra atrativa. Exs.: a) “Ali o
encontrei” (correto); b) “Ali, encontrei-o” (correto); c) “Ali, o encontrei”
(errado); d) “Ali encontrei-o” (errado).
5. Nesse aspecto, apropriada é a síntese de Carlos Góis (1945, p. 112), em
dois aspectos: a) Quando houver uma vírgula, indicadora de uma pausa,
mesmo com a antecedência de palavra atrativa, usa-se a ênclise, até
porque “a pausa faz cessar a atração”. Ex.: “Aqui, canta-se; ali, dança-
se, acolá, bebe-se”; b) “Sem a vírgula (ou pausa) será de rigor próclise”.
Ex.: “Aqui se canta, ali se dança, acolá se bebe”.
Ver também Atração pronominal remota (P. 144), Mesóclise (P. 471),
Pronomes e Locuções verbais (P. 617) e Se me não falha a memória ou Se
não me falha a memória? (P. 684)
Proemial
Ver Petição inicial (P. 563).
Pro forma
1. Expressão latina, significa “por mera formalidade” e é comumente
empregada para referir algo que não corresponde a uma efetiva realidade
de conteúdo. Ex.: “Apresentou-se um balancete pro forma da empresa,
com cifras financeiras hipotéticas, baseadas em operações comerciais
anteriores, para ser entregue ao banco, com vistas à obtenção do
financiamento”.
2. Por se tratar de expressão latina, obrigatório é o uso das aspas, negrito,
itálico, sublinha ou grifo indicador de tal circunstância, além de proibida
a utilização de acento gráfico e de hífen, que não existiam no idioma
original.
3. Não se olvide, nesse sentido, a lição de Edmundo Dantès Nascimento
(1982, p. 145) de que expressões como essa não eram hifenizadas em
latim, razão pela qual “não o podem ser em língua nenhuma”,
acrescentando tal autor que, “para quem pretende grafar escorreitamente,
não é permitido o hífen em expressões do latim clássico”.
4. Diversa, estranha e equivocadamente, entretanto, José de Nicola e
Ernani Terra observam que, exatamente por se tratar de uma expressão
latina, uma locução como essa “deve ser sempre grafada com hífen”
(2000, p. 122).
5. Ora, pela simples razão de que se trata de expressão latina e de que não
havia hífen na língua originária, o melhor é seguir o ensino de Domingos
Paschoal Cegalla (1999, p. 188), o qual, após observar que “não há
consenso quanto ao uso do hífen” em expressões latinas desses jaez,
realça que “é preferível dispensá-lo”.
Progenitor – Pai ou Avô?
1. Dicionaristas como Aurélio Buarque de Holanda Ferreira e Antonio
Houaiss, conferem a tal vocábulo dupla possibilidade de significados,
que há de fixar-se, quanto à semântica, no caso concreto: a) de pai, como
o ascendente direto e imediato de alguém; b) de qualquer ascendente que
procria antes do pai.
2. Rui Barbosa, ao comentar o art. 391 do Projeto do Código Civil de 1916,
em que originariamente se registrava tal palavra com o significado de
pai, já ressaltava que, em latim, progenitor é avô, e genitor é pai, mas
que “os dois nomes passaram para o português com o mesmo sentido”.
3. Aconselhava ele, todavia, que, tendo a lei à mão o vocábulo pai, que é
“termo específico e unívoco, não deve ir buscar o indeciso e multicor”,
motivo por que conclamava a que se usasse, “na fraseologia jurídica, da
expressão que se não preste a dois sentidos. Para indicar o genitor,
escrevamos pai, e, querendo abranger num só vocábulo o pai e a mãe,
digamos pais” (BARBOSA, 1949, p. 155).
4. De modo específico para o caso que então era questionado, a observação
do grande mestre foi acatada pelo legislador, como se nota pela redação
definitiva do art. 384 do Código Civil de 1916: “Compete aos pais,
quanto à pessoa dos filhos menores…”
5. Não se olvide, entretanto, que “a objeção de Rui Barbosa, defendendo a
acepção restrita do termo, foi brilhantemente refutada por Carneiro
Ribeiro, que trouxe à baila valiosos exemplos em sentido contrário,
embora não muito numerosos entre os clássicos” (SILVA, L., 1991, p.
75).
6. Luciano Correia da Silva também reputa “falso o ensino de que
progenitor é somente o avô ou outro ascendente que não o pai”.
7. E explicita tal autor: “De fato, etimologicamente, a palavra quer dizer, a
rigor, o que procria antes do pai, mas o uso, tanto o popular quanto o
jurídico, e o literário a consagraram como significativa de pai, ou, no
plural, de pais” (SILVA, L., 1991, p. 75).
8. Anota Antonio Henriques: “hoje, aceita-se que o termo pode ser usado
por pai desde que não haja ambiguidade” (1999, p. 158).
9. Da noticiada polêmica que precedeu nosso Código Civil de 1916, assim
concluem Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade: “Carneiro
Ribeiro tem razão: pai e progenitor usam-se um pelo outro e a
etimologia não elucida a questão. Rui Barbosa tem razão: em caso de
dúvida, ha que se optar pelo termo pai, mais claro e preciso” (1999, p.
52).
10. O próprio Código Civil de 1916 emprega progenitor em lugar de pai
por mais de uma vez: a) “Durante o casamento compete o pátrio poder
aos pais, exercendo-o o marido com a colaboração da mulher. Na falta
ou impedimento de um dos progenitores, passará o outro a exercê-lo
com exclusividade” (art. 380, caput); b) “Divergindo os progenitores
quanto ao exercício do pátrio poder, prevalecerá a decisão do pai,
ressalvado à mãe o direito de recorrer ao juiz para solução da
divergência” (art. 380, parágrafo único).
Progredir
1. Quanto à conjugação verbal, o e da penúltima sílaba transforma-se em i
nas formas rizotônicas bem como nas formas delas derivadas.
2. Desse modo, assim é seu presente do indicativo: progrido, progrides,
progride, progredimos, progredis, progridem.
3. Da primeira pessoa do singular se extrai o presente do subjuntivo:
progrida, progridas, progrida, progridamos, progridais, progridam.
4. E de ambos os tempos formam-se o imperativo afirmativo e o imperativo
negativo: progride, progrida, progridamos, progredi, progridam
(imperativo afirmativo); não progridas, não progrida, não progridamos,
não progridais, não progridam (imperativo negativo).
5. Atente-se, porém, a que nos outros tempos, cujas formas são todas
arrizotônicas, não há troca do e pelo i: progredi (pretérito perfeito),
progredira (pretérito mais-que-perfeito), progredia (pretérito
imperfeito), progredirei (futuro do presente), progrediria (futuro do
pretérito), progredisse (imperfeito do subjuntivo), progredir (futuro do
subjuntivo), progredindo (gerúndio), progredido (particípio).
6. Seguem idêntica conjugação os seguintes verbos: agredir, denegrir,
prevenir, regredir, transgredir.
Proibido
Ver É proibido – Como concordar? (P. 325)
Projétil ou Projetil?
1. Palavra de grande uso em Criminalística e Medicina Legal, significa
todo corpo ou objeto (pedra, seta, pedaço de pau ou, mais comumente,
bala de arma de fogo) que se arremessa ou se atira contra coisa ou
pessoa, com o intuito de dano ou destruição.
2. Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 248) a insere no rol das palavras
paroxítonas (sendo mais forte a penúltima sílaba) tanto no singular
quanto no plural: projétil e projéteis, tendo proceder idêntico Gladstone
Chaves de Melo (1970, p. 117).
3. Também Silveira Bueno a dá exclusivamente como paroxítona,
conferindo-lhe, por plural, tão somente projéteis (1938, p. 14),
acrescentando, até mesmo, que quem pronunciar tais vocábulos como
oxítonos e compuser o plural em is e não em eis “cometerá grave erro,
evidenciando que desconhece a história de sua própria língua” (1938, p.
45-6).
4. Em outra passagem de mesma obra, entretanto, tal gramático acrescenta
que a prosódia paroxítona é a mais correta, embora ressalve que a
pronúncia oxítona seja mais vulgar (BUENO, 1938, p. 111).
5. Cândido Jucá Filho (1963, p. 512), por sua vez, observa não ser rara a
pronúncia oxítona (sendo mais forte a última sílaba), tanto no singular
quanto no plural (projetil e projetis), fundando-se em exemplo de Camilo
Castelo Branco.
6. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (s/d, p. 1.144) registra projetil
(oxítona) como forma principal e refere projétil (paroxítona) como sua
variante.
7. Evanildo Bechara (1974, p. 78) e Celso Cunha (1970, p. 26 e 89)
admitem ambas as formas (projétil e projetil) assim como seus
respectivos plurais (projéteis e projetis), observando o último autor que a
pronúncia mais generalizada no Brasil é a paroxítona.
8. Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 19 e 34) também arrola o vocábulo entre
aqueles que podem ser oxítonos ou paroxítonos, conferindo-lhe
indiferentemente a condição de oxítono ou de paroxítono, e dando-lhe,
de igual modo, dois plurais: projetis e projéteis.
9. Júlio Ribeiro (1908, p. 12) defende a pronúncia paroxítona, muito
embora refira o posicionamento de alguns gramáticos e lexicógrafos que
lhe preguem a pronúncia oxítona.
10. Após mencionar que, em Portugal, tal vocábulo se insere entre os
paroxítonos, formando o plural em eis, Júlio Nogueira (1930, p. 165)
observa que, no Brasil, a tendência da língua é tê-lo por oxítono,
fazendo, por conseguinte, o plural em is.
11. Aires da Mata Machado Filho (1969c, p. 492), por sua vez, dá como
incorreta a pronúncia paroxítona e aconselha como correta a forma
oxítona, justificando seu posicionamento na origem francesa
(projectile) – e não latina, segundo seu entendimento, idioma esse em
que não haveria tal vocábulo – donde a razão da diferença tópica da
tonicidade.
12. Após observar que em Portugal é mais comum a pronúncia paroxítona,
enquanto no Brasil são vulgares a escrita e a pronúncia oxítonas, Júlio
Nogueira adverte – em observação também feita para réptil e para têxtil
– que “a pronúncia lusitana em tais palavras é mais fiel à latina, mas
seria demasiado rigor corrigir a brasileira nesses casos generalizados.
Somente nas escolas, em língua erudita, se pronunciam essas palavras à
maneira lusitana” (1959, p. 19-20).
13. Eduardo Carlos Pereira aceita tanto a forma oxítona quanto a
paroxítona, lembrando apenas que a primeira é mais comum e
encartando o vocábulo entre aqueles “de pronúncia dupla pela incerteza
da tônica” (1924, p. 28 e 31).
14. Cândido de Oliveira (1961, p. 34) admite-lhe a dupla pronúncia e
grafia, quer como oxítona, quer como paroxítona.
15. Ante a divergência entre os gramáticos e dicionaristas, até por
aplicação do princípio de que, na fundada dúvida entre os gramáticos,
há liberdade de uso, abre-se, na prática, a possibilidade de ambas as
pronúncias, anotando-se que, como paroxítona (projétil, projéteis), há
razão para acento gráfico; tal, entretanto, não se dá com a pronúncia
oxítona (projetil, projetis).
16. Esse, aliás, é o posicionamento do Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, veículo oficial para
dirimir dúvidas acerca da existência ou não de vocábulos em nosso
idioma, bem como acerca de sua correta grafia e pronúncia, o qual
registra tanto projétil como projetil (2009, p. 678), o que implica dizer
que o uso de ambas as formas está plena e oficialmente autorizado
entre nós, assim como de qualquer dos plurais: projéteis e projetis.
Pro labore
1. Trata-se de locução latina, que se traduz como “pelo trabalho”, ou “em
razão do trabalho”, muito usada para indicar a remuneração ou o ganho
que se tem como recompensa pela efetiva atuação do sócio na sociedade
e que se computa nas despesas gerais desta, diferentemente dos lucros
que possam advir como remuneração do capital, os quais são pagos a
todos os sócios, na proporção de sua parcela no capital social,
independentemente de trabalharem na empresa (DE PLÁCIDO E
SILVA, 1989, p. 470). Ex.: “Os valores de pro labore foram creditados
mês a mês na conta daquele sócio, enquanto durou a prestação de seus
serviços à sociedade”.
2. Por se tratar de expressão latina, obrigatório é o uso das aspas, negrito,
itálico, sublinha ou grifo indicador de tal circunstância, além de proibida
a utilização de acento gráfico e de hífen, que não existiam no idioma
original.
3. Não se olvide, nesse sentido, a lição de Edmundo Dantès Nascimento
(1982, p. 145) de que expressões como essa não eram hifenizadas em
latim, razão pela qual “não o podem ser em língua nenhuma”,
acrescentando tal autor que, “para quem pretende grafar escorreitamente,
não é permitido o hífen em expressões do latim clássico”.
4. Diversa, estranha e equivocadamente, entretanto, José de Nicola e
Ernani Terra observam que, exatamente por se tratar de uma expressão
latina, uma locução como essa “deve ser sempre grafada com hífen”
(2000, p. 122).
5. Ora, pela simples razão de que se trata de expressão latina e de que não
havia hífen na língua originária, o melhor é seguir o ensino de Domingos
Paschoal Cegalla (1999, p. 188), o qual, após observar que “não há
consenso quanto ao uso do hífen” em expressões latinas desse jaez,
realça que “é preferível dispensá-lo”.
6. Observa-se, por fim, que a expressão pro labore, nos contratos de
prestação de serviços profissionais de advocacia, expressa aquela parcela
fixa de honorários, a ser paga independentemente do resultado da causa,
como remuneração pelo trabalho efetivamente prestado, e contrapõe-se à
parcela ad exitum, a qual significa um valor de risco, quer o advogado
receberá ou não, dependendo do sucesso da demanda e, eventualmente,
na proporção dos resultados auferidos pelo cliente.
7. Exatamente nesse sentido, o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão oficialmente
incumbido de definir quais as palavras integram nossa léxico, registra
pro labore entre as palavras estrangeiras oriundas do latim. (VOLP,
2009, p. 863)
Prolatar
Ver Exarar, prolatar ou proferir sentença? E acórdão? E despacho? (P.
340)
Prolator
1. Etimologicamente, quer dizer proferidor, tendo origem no supino
prolatum do verbo latino profero (proferir).
2. Em Direito, tem o sentido especial e técnico de alguém que profere, de
alguém que é o autor de uma decisão, sentença ou despacho. Ex.: “O
ilustre prolator da respeitável sentença não se houve com o costumeiro
acerto”.
Ver Exarar, prolatar ou proferir sentença? E acórdão? E despacho? (P.
340).
Promovidos a
Ver Candidatos a (P. 168).
Pronome apassivador
1. Também denominado partícula apassivadora.
Ver Voz passiva e Pronome apassivador (P. 791), Voz passiva sintética (P.
794) e Vozes verbais (P. 791).
Pronome combinado
Ver Pronome pessoal (P. 614).
Pronome demonstrativo
1. Tanto no tempo quanto no espaço, este indica posição mais próxima da
pessoa que fala (primeira pessoa). Exs.: a) “Estou nesta sala”; b) “Saiu
neste minuto”.
2. Na prática, quando se fala em este, pode-se pensar em aqui. Assim:
“Estou nesta sala aqui”.
3. Já esse indica posição próxima da pessoa com quem se fala (segunda
pessoa), ou mesmo um certo distanciamento da pessoa que fala. Exs.: a)
“Já entrei nesse tribunal”; b) “Ano passado: esse, para mim, foi um dos
anos mais difíceis”.
4. Na prática, quando se fala em esse, pode-se pensar em aí. Assim: “Já
entrei nesse tribunal aí”.
5. Por sua vez, aquele indica posição próxima de quem se fala (terceira
pessoa) ou mesmo distante dos interlocutores (de quem fala e da pessoa
com quem se fala). Exs.: a) “Olhe aquele advogado no carro preto”; b)
“Eu era juiz de primeira entrância; naquela época, tudo era menos
complicado”.
6. Na prática, quando se fala em aquele, pode-se pensar em lá. Assim:
“Olhe aquele advogado lá no carro preto” (s/d, p. 71).
7. No que respeita à proximidade dos objetos ou das pessoas, vale resumir
a questão com o ensinamento de Júlio Ribeiro: “Este indica proximidade
em relação à pessoa que fala; é o demonstrativo da primeira pessoa:
‘esta espingarda’ indica a espingarda que está junto da pessoa que fala.
Esse indica proximidade em relação à pessoa com que se fala: é o
demonstrativo da segunda pessoa: ‘essa faca’ indica a faca que esta
perto da pessoa com quem se fala. Aquele indica distância absoluta ou
proximidade com relação a terceiro; é o demonstrativo da terceira
pessoa: aquele veado indica o veado que se vê ou que se supõe ao longe”
(1908, p. 63).
8. Num segundo aspecto, no interior da frase, este se refere ao elemento
anterior mais próximo; aquele, ao mais distante. Ex.: “O adulto e a
criança têm seus direitos, mas esta exige maiores cuidados do que
aquele”.
9. Ainda no interior da frase, isto, este e esta se referem ao que se vai dizer,
enquanto isso, esse e essa se relacionam ao que já se disse. Exs.: a) “A
nova Constituição traz este preceito: não há possibilidade de
discriminação entre filhos”; b) “Não há possibilidade de discriminação
entre filhos: esse é o preceito da nova Constituição”.
10. Finde-se com a judiciosa observação de Evanildo Bechara: “Nem
sempre se usam com este rigor gramatical os pronomes
demonstrativos; muitas vezes interferem situações especiais que
escapam à disciplina da gramática” (1974, p. 97).
11. Josué Machado (1994, p. 27-9) também deixa claras as funções do
pronome demonstrativo em tais circunstâncias: a) “este está sempre
mais perto de quem fala ou escreve do que esse, por mais perto que
esteja o esse”; b) “quando se usa este ou aquele para referência a
termos ou orações anteriores, este se refere ao mais próximo e aquele
obviamente ao mais afastado”; c) na diferenciação entre o que já se
disse e o que se vai dizer, “este se refere ao futuro, ao que vem abaixo,
a seguir”, e “esse sempre se refere ao passado, ao já dito, que ficou
para trás, ou está acima”.
12. Os textos de lei nem sempre fazem a adequada distinção entre
pronomes, em casos dessa espécie.
13. Veja-se, para exemplo: “Para os efeitos desse artigo, equipara-se ao
‘habite-se’ das autoridades municipais a ocupação efetiva da unidade
residencial” (art. 7º, § 1º, da Lei 4.380, de 21/8/64, que regulamentou
os contratos imobiliários).
14. Tratando-se de um parágrafo inserido no próprio artigo a que se faz
referência, óbvio que o pronome deve ser deste, e não desse.
15. Por fim, indaga-se qual o correto: a) “Nestes termos, pede
deferimento”; b) “Nesses termos, pede deferimento”? Trata-se de
expressão muito usada em petições dirigidas aos juízos e tribunais, e
nelas se pode pensar em dois significados: a) nos termos desta petição,
caso em que nestes termos seria expressão correta por aplicação do
item 1 destas reflexões; b) nos termos que ficaram ditos anteriormente,
hipótese em que nesses termos seria expressão correta por aplicação do
item 9 destas reflexões.
16. Em resumo: a) Nestes termos seria forma correta e significaria nos
termos desta petição; b) Nesses termos seria forma igualmente correta e
significaria nos termos que ficaram ditos anteriormente na petição.
Vale dizer: duas formas gramaticalmente corretas, mas com ligeira
alteração de significado.
Pronome pessoal
1. Como a própria expressão sugere, trata-se de palavra que serve para
substituir um nome, a fim de evitar repetições. Ex.: “O juiz decidiu o
caso: sentenciou-o e deu-lhe o tratamento adequado”.
2. Algumas observações, a seguir, são de extrema importância para o uso
diário de tais pronomes.
3. Pronomes do caso reto não funcionam como objeto. Exs.: a) “Vi ele no
fórum” (errado); b) “Vi-o no fórum” (correto).
4. Se preposicionados, os pronomes pessoais ele, ela, eles, elas podem
funcionar como objetos. Ex.: “Dei a ele a atenção que merecia”.
5. Se precedido de todo ou só, lecionam alguns que o pronome pessoal do
caso reto pode funcionar como objeto. Exs.: a) “Vi só ele no fórum”; b)
“Vi todos eles no fórum”.
6. Nesse sentido é o ensinamento de Evanildo Bechara: “o pronome ele, no
português moderno, … aparece como objeto direto, quando precedido de
todo ou só…” (1974, p. 254).
7. Em realidade, talvez por influência de um exemplo como “Ele falou com
nós todos”, em que a presença da palavra reforçativa todos faz com que
se diga com nós e não conosco, como seria normal, se esta última não
existisse (“Ele falou conosco”), alguns são levados a dizer algo como
“Conheço todos eles”.
8. Os casos, entretanto são diversos, e não se há de fazer confusão entre
eles, devendo permanecer o exemplo aqui apreciado na vala dos casos
comuns.
9. Siga-se a lição de Luís A. P. Vitória: “diga-se conheço-os todos.
Ocupando eles o lugar do objeto direto, deverá ser substituído pelo caso
objeto que é os” (1969, p. 58).
10. Também Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 397-8) – que, por um
lado, abre espaço para, na linguagem coloquial informal, “usar os
pronomes eles e elas como objeto direto, quando precedidos de
todos(as): Nós recolhemos todos eles” – observa que “tal permissão,
todavia, não se estende ao padrão mais elaborado de expressão”, pois
“na língua culta se dirá: Nós os recolhemos todos”.
11. Em continuação, os pronomes pessoais eu e tu não podem vir
precedidos de preposição. Exs.: a) “Nada mais há entre tu e eu”
(errado); b) “Nada mais há entre eu e tu” (errado); c) “Nada mais há
entre ti e mim” (correto); d) “Nada mais há entre eu e você” (errado);
e) “Nada mais há entre mim e você” (correto).
12. Em frases como “Ela trouxe os autos para eu ler”, a preposição não
está regendo o pronome eu, mas o verbo ler. Assim, a ligação sintática
é “Trouxe os autos para ler”, e não “Trouxe os autos para mim”.
13. Observe-se, assim, o uso adequado e correto nos exemplos a seguir: a)
“Trouxe os autos para mim” (correto); b) “Trouxe os autos para mim
ler” (errado); c) “Trouxe os autos para eu ler” (correto); d) “Para mim,
ler os autos é tarefa demorada” (correto); e) “Para eu ler os autos,
preciso de umas duas horas” (correto); f) “Ler os autos é tarefa
demorada para mim” (correto).
14. Os pronomes pessoais oblíquos átonos (me, te, se, o, as, nos, vos…)
podem funcionar como sujeitos do infinitivo. Exs.: a) “Deixe-me ler os
autos” (correto); b) “Deixe eu ler os autos” (errado).
15. Os pronomes pessoais si e consigo só podem funcionar como
reflexivos (isto é, só podem ser utilizados como pronomes referentes à
mesma pessoa do sujeito). Exs.: a) “Eu me dirijo a si” (errado); b) “Eu
me dirijo a você” (correto); c) “Ele voltou a si” (correto); d) “Quero
falar consigo” (errado); e) “O advogado reteve consigo os autos por
vários meses” (correto); f) “Quero falar com você” (correto).
16. É correta a repetição, em pleonasmo, de um pronome pessoal oblíquo
átono por um tônico. Ex.: “A mim me parece que o recurso é
intempestivo”.
17. Os pronomes pessoais oblíquos átonos me, te, lhe, nos, vos podem
juntar-se aos pronomes o, a, os, as, dando origem às formas mo, to, lho,
no-lo, vo-lo. Exs.: a) “Estes autos, eu lhos entrego em segundos”; b) “A
causa, ele no-la confiou para defesa em segunda instância”.
18. Os pronomes pessoais oblíquos átonos o, a, os, as funcionam como
objetos diretos; os pronomes lhe e lhes, como objetos indiretos. Exs.: a)
“O juiz sentenciou o caso”; b) “O juiz sentenciou-o”; c) “O documento
pertence aos autos”; d) “O documento pertence-lhes”; e) “Amo
Valquíria de todo o coração: amo-a com ardor” (correto); f) “Amo
Valquíria de todo o coração: amo-lhe com ardor” (errado).
19. Precedidos da preposição com, os pronomes nós e vós formam conosco
e convosco. Permanecem, contudo, as formas com nós e com vós, se
tais pronomes vêm precedidos de outros, todos, mesmos, próprios.
Exs.: a) “O juiz falou com nós” (errado); b) “O juiz falou conosco”
(correto); c) “O juiz falou com vós” (errado); d) “O juiz falou
convosco” (correto); e) “O juiz falou conosco outros” (errado); f) “O
juiz falou com nós outros” (correto); g) “O juiz falou conosco todos”
(errado); h) “O juiz falou com nós todos” (correto); i) “O juiz falou
conosco mesmos” (errado); j) “O juiz falou com nós mesmos” (correto);
k) “O juiz falou conosco próprios” (errado); l) “O juiz falou com nós
próprios” (correto).
Ver Com nós – Existe? (P. 196), Consigo ou Com você? (P. 221), Mo – Está
correto? (P. 476), Si (P. 696) e Voz passiva – Quando é possível? (P. 793)
Pronome reforçativo
Ver Seu dele – Está correto? (P. 695)
Pronúncia
Ver Amámos ou Amamos? (P. 108)
Pronunciar
Ver Exarar, prolatar ou proferir sentença? E acórdão? E despacho? (P.
340).
Propositadamente ou Propositalmente?
1. Fundado em lição de João Ribeiro, Napoleão Mendes de Almeida (1981,
p. 249) adverte que, para significar a expressão de propósito ou de caso
pensado, deve-se usar o advérbio propositadamente, não sendo
considerado de bom uso, nesse caso, nem o advérbio propositalmente,
nem o adjetivo proposital. Ex.: a) “O crime foi doloso, porque o réu agiu
propositadamente” (correto); b) “O crime foi doloso, porque o réu agiu
propositalmente” (errado).
2. Rui Barbosa (1949, p. 7), em suas críticas específicas, já observava a
ausência de analogia vernácula autorizadora de uso do advérbio
propositalmente, ao qual chamou de “desnecessária corruptela”, que
ganharia foro de sanção jurídica com sua inserção no Código Civil de
1916.
3. Em outro lugar de mesma obra, tal mestre lecionava textualmente que
“as regras da analogia não autorizam a formação de semelhante
neologismo”, estendendo longa lista de sinônimos para substituí-lo
(BARBOSA, 1949, p. 48).
4. Por fim, ao criticar o art. 96 do projeto original do código, sugeriu, para
o adjetivo proposital, três vocábulos substitutos: intencional, voluntário,
deliberado (BARBOSA, 1949, p. 61).
5. José de Sá Nunes, num primeiro aspecto, afiança não ser
propositalmente um vocábulo do léxico português, para o que traz abono
de Rui Barbosa e de Ernesto Carneiro Ribeiro.
6. Ao depois, transcreve lição de Said Ali, para quem propositalmente e até
mesmo propositadamente são vocábulos desnecessários.
7. Acrescenta, a seguir, que, em seu modo de ver, nem Rui Barbosa nem
Ernesto Carneiro Ribeiro se lembraram de “provar a vernaculidade do
adjetivo propositado e do advérbio propositadamente”.
8. Por fim, acaba trazendo citações de abalizados escritores, em que se
comprova o emprego do vocábulo discutido (NUNES, 1938, p. 242-3):
a) “Mas A. Herculano mui propositadamente escreveu…” (Rui Barbosa);
b) “Propositadamente neguei registo a vocábulos, que tinham a
abonação de Rui Barbosa e que eram do meu conhecimento” (Cândido
de Figueiredo); c) “Excluímos propositadamente desta secção os
escritores vivos” (João Ribeiro).
9. Para Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 336), propositadamente é
“melhor forma do que propositalmente”, assim como propositado é
forma “preferível a proposital”.
10. Cândido Jucá Filho, por um lado, lembra lição de Mário Barreto, de
importância para o caso: “Rui Barbosa, na sua brilhante Réplica,
provou a ilegitimidade vernácula de proposital e de propositalmente. O
que é português é propositado e propositadamente”.
11. Por outro lado, após tal transcrição, continua o referido autor: “Não
concordo. Rui não mostrou senão uma implicância pessoal. Diz-se
intenção, intencional, intencionalmente. Por que se não pode dizer
propósito, proposital, propositadamente?
12. Por fim, conclui ele: “Mas a verdade é que os clássicos, como o povo,
têm preferido a expressão de propósito. Quanto a propositado, não se
livra de ser pedante” (JUCÁ FILHO, 1981, p. 95).
13. Dirimindo, todavia, toda e qualquer dúvida acerca da possibilidade de
emprego de proposital e, por consequência, propositalmente, é de se
ver que o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, que é o veículo oficial para dirimir dúvidas acerca
da existência de vocábulos em nosso idioma, registra tanto propositado
quanto proposital (2009, p. 679), o que implica dizer que o uso de
ambos os adjetivos está plena e oficialmente autorizado entre nós, além
de estarem autorizados, de igual modo, propositadamente e
propositalmente, os quais nada mais são do que advérbios regularmente
formados dos dois referidos adjetivos.
Ver De propósito (P. 268).
Propositado ou Proposital?
Ver Propositadamente ou Propositalmente? (P. 624)
Próprio
1. Quanto à ortografia e à pronúncia, veja-se, por primeiro, que há um
generalizado descuido da parte de alguns, que teimam, de modo
equivocado, em escrever e falar própio, estendendo o erro para todos os
cognatos: apropiado, propiedade…
2. Por outro lado, é palavra que precisa ser observada pelo prisma da
concordância nominal.
3. E, nesse campo, anota-se que, acompanhando um substantivo, tem valor
adjetivo e, assim, concorda em gênero e número com o substantivo
modificado. Ex.: a) “Ela própria subscreveu a inicial”; b) “Eles próprios
subscreveram a inicial”; c) “Elas próprias subscreveram a inicial”.
4. Em tais casos, Luiz Antônio Sacconi vê esse vocábulo como um
demonstrativo “de caráter reforçativo” (1979, p. 68).
5. Seu sinônimo mesmo segue idêntica construção.
Prosódia
1. É a parte da fonética que trata da correta acentuação e entonação dos
fonemas, sendo sua preocupação maior o conhecimento da sílaba
predominante na palavra, vale dizer, da sílaba tônica (BECHARA, 1974,
p. 52).
2. No conceito de Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 23), prosódia “é a parte
da fonologia que trata da correta pronúncia dos fonemas combinados
para a formação dos vocábulos”. Complementa tal autor que o termo
grego prosódia (pros + ode) corresponde ao latino acento (ad + cantus), e
lembra “o caráter musical dessas duas línguas antigas, onde a altura do
som representava papel importante na prolação vocabular”.
3. Após conceituá-la como “o tratado dos sons articulados em relação à sua
intensidade comparativa, quando constituídos em palavras”, lembra Júlio
Ribeiro (1908, p. 12) que prosódia “é o mesmo que acentuação”, já que
ambos os termos, “etimologicamente considerados, referem-se à
modulação dos sons”.
4. Após atribuir-lhe a função de ocupar-se “essencialmente da correta
acentuação tônica das palavras”, Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 17)
exemplifica os resultados: gratuito(ú) e não gratuíto, filantropo(ô) e não
filântropo.
5. Ante as confusões feitas por alguns, que lhe dão o mesmo significado de
ortoepia, vale a pena lembrar a lição de Antenor Nascentes: “A parte da
fonética que se ocupa com a acentuação tônica dos vocábulos chama-se
prosódia. É este o verdadeiro emprego da palavra, dado pelos gramáticos
gregos e latinos, e não como equivalente de ortoepia, segundo fazem
alguns” (1942, p. 23).
6. Essa mesma distinção fazem Carlos Góis e Herbert Palhano: “A ortoepia
estuda a correta pronúncia dos sons dos vocábulos; a prosódia, a sua
exata acentuação” (1963, p. 23).
7. Artur de Almeida Torres (1966, p. 27) também faz diferença entre tais
vocábulos: para ele, “a ortoepia (ou ortoépia) ensina a exata pronúncia
das palavras”, vale dizer, “boa emissão das vogais e boa articulação das
consoantes”; já “a prosódia trata da correta acentuação dos vocábulos”.
8. Cândido de Oliveira atribui-lhe a função de cuidar “da correta
localização do acento tônico” (1961, p. 33).
9. Distinguindo-a inteiramente da ortoepia, Júlio Nogueira afirma que ela
“diz respeito à sílaba tônica da palavra” (1939, p. 83).
10. Também para Cândido de Oliveira, “é a correta colocação do acento
tônico” (s/d, p. 128).
11. Feitas essas observações, reforça a necessidade de atenção a esse
aspecto a seguinte circunstância lembrada por Luiz Antônio Sacconi:
“todas as palavras que apresentam sílaba tônica possuem acento
prosódico, que é o acento da fala. Não se confunde com acento gráfico,
que é o sinal usado para indicar o acento prosódico. As únicas palavras
em português que não possuem acento prosódico são os monossílabos
e dissílabos átonos” (1979, p. 4).
12. De seu encargo, por exemplo, é esclarecer que boêmia, estratégia e
maquinaria são formas corretas; que mister, Nobel, recém, refém e
ruim são palavras oxítonas; que avaro, látex, perito, pudico e rubrica
são palavras paroxítonas; que álibi, arquétipo e ínterim são
proparoxítonas; que certas palavras admitem duas pronúncias:
acróbata ou acrobata, hieróglifo ou hieroglifo.
13. O erro quanto à posição da sílaba tônica na palavra recebe o nome de
silabada.
14. Lembra Júlio Nogueira que a tendência coletiva para destacar
erroneamente a sílaba forte “ocorre em certas palavras que têm a
propriedade de sugerir pronúncia falsa por parecer mais natural que a
certa. Muitos indivíduos, à força de serem corrigidos porque não
pronunciam como esdrúxulas algumas palavras, fazem esdrúxulas
outras que o não são” (1959, p. 19).
15. Em mesma obra e local, assegurando que “em prosódia, como em
todos os demais aspectos, a linguagem é nimiamente convencional”, o
referido gramático, quanto ao vício de pronunciar erroneamente as
palavras, com enfoque tônico e sílaba inadequada, adverte que “cumpre
evitar essa má tendência. O remédio é consultar um vocabulário
prosódico ou pessoa de boas letras que possa esclarecer o caso”
(NOGUEIRA, 1959, p. 19).
16. Para os dias de hoje, o melhor é consultar o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão
oficialmente incumbido de listar as palavras pertencentes ao nosso
léxico bem como de definir-lhes a correta pronúncia e localização da
sílaba tônica.
Ver Ortoepia (P. 532).
Prosseguir
1. Tendo o grupo gu, neste caso, a exclusiva finalidade de conferir ao g seu
som original antes de e e de i, deve-se lembrar que os verbos em guir
(quando o u não é proferido) perdem o u antes de a e de o: prossigo,
prossegues, prosseguimos, prossigamos.
2. Seguem o mesmo modelo todos os verbos terminados em guir, desde
que o u não seja pronunciado (conseguir, distinguir, extinguir, perseguir,
seguir).
3. Oportuno é realçar a apropriada lembrança de Carlos Góis e Herbert
Palhano (1963, p. 113) no sentido de que, dos verbos terminados em
guir, apenas arguir e redarguir tem o u pronunciado.
Ver Pleonasmo – O que é e Quando pode? (P. 565)
Protagonismo – Existe?
1. Um leitor indaga se existe em nosso idioma o vocábulo protagonismo,
que ele tem ouvido com frequência nos meios de comunicação. E
indaga, em caso positivo, qual é o seu significado.
2. Ora, em raciocínio que se deve repetir sempre, até para criar no leitor o
hábito salutar de pensar de modo metódico sobre o assunto, quando se
quer saber se uma palavra existe ou não em português, deve-se tomar por
premissa o fato de que a autoridade para listar oficialmente os vocábulos
pertencentes ao nosso idioma é a Academia Brasileira de Letras.
3. E essa autoridade, a ABL a exerce por via da edição do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa.
4. Ora, uma simples consulta ao VOLP mostra que nele se registra, sim, o
vocábulo protagonismo (2009, p. 680), de modo que a forçosa conclusão
é que ele efetivamente existe em nosso léxico, e seu emprego está
integralmente autorizado ao usuário do idioma.
5. O significado desse vocábulo é de atuação como protagonista, vale
dizer, como ator ou personagem principal. Ex.: “Enfim, o Ministro da
Justiça assumiu o protagonismo naquele caso, como, aliás, deveria ter
feito desde o início”.
6. Dada a resposta específica ao leitor, acrescenta-se uma primeira
observação: é certo que nem Aurélio Buarque de Holanda Ferreira nem
Antônio Houaiss registram tal palavra em seus conhecidos dicionários.
Ante esse fato, importa anotar que não se põe em dúvida o elevado valor
da contribuição dos dicionaristas para o apuro da língua portuguesa;
mas, com todo o respeito devido, o certo é que eles não são a autoridade
no assunto. Isso significa que, em caso de divergência entre eles e o
VOLP quanto à existência ou algum outro aspecto de um vocábulo,
deve-se ficar com este último, que é a palavra da autoridade oficial na
matéria.
7. E se ultima com uma segunda ponderação: o fato de se constatar,
atualmente, um real abuso no emprego do vocábulo ora comentado,
capaz de aconselhar moderação em seu uso, não é motivo para sua
condenação, como se fosse um equívoco. Já os latinos diziam que o
abuso não pode impedir o uso (“abusus non tollit usum”), e o provérbio
se aplica ao caso com perfeição.
Proteger
1. Quanto à conjugação verbal, como todos os verbos terminados em ger,
para a continuidade do som original da última consoante do radical,
muda o g em j antes de o e de a: protejo, proteges, proteja, protegi.
2. Feitas essas observações, anota-se que se trata de verbo conjugado em
todas as pessoas, tempos e modos.
3. Flexionam-se de mesmo modo constranger, eleger, ranger, tanger.
Protocolar – Existe?
1. Trata-se de palavra existente e regularmente usada em nosso idioma,
sem resistência alguma. Ex.: “No prazo para a interposição do recurso,
a petição será protocolada, ou depois de despachada, entregue em
cartório” (CPC/1973, art. 514, parágrafo único).
2. Sua existência como verbo é atestada pelo Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, veículo oficial
para dirimir dúvidas acerca da existência ou não de vocábulos em nosso
idioma (2009, p. 680).
Ver Protocolizar – Existe? (P. 628)
Protocolizar – Existe?
1. Apesar das objeções de alguns autores, Napoleão Mendes de Almeida
(1981, p. 250) e Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (s/d, p. 1.150)
registram-na como forma vernácula, dando-a como normal sinônimo de
protocolar (esta sem resistência alguma), com o significado de levar ao
protocolo. Ex.: “O advogado protocolizou o pedido de relaxamento de
prisão de seu constituinte”.
2. Embora pouco usada no sentido de inscrever, de registrar em protocolo,
encontra-se exemplo de seu emprego por texto de lei: “Protocolizado o
título ou documento, far-se-á em seguida, no livro respectivo…” (Lei
6.015, de 31/12/73, art. 147).
3. Interessante é anotar, por um lado, que nossos textos de lei, de um modo
geral, evitam o emprego tanto de protocolar como de protocolizar, e
acabam dando preferência a locuções como lançados em protocolo (art.
50 do Código Comercial), apontado no protocolo (art. 154 do Decreto
4.857, de 1939 – Regulamento dos Registros Públicos), lançamento no
protocolo, apontamento no protocolo, entrada no protocolo e prenotados
no protocolo (respectivamente arts. 12, 151, 153 e 191 da Lei de
Registros Públicos).
4. Por outro lado, também se encontram as formas específicas dos
mencionados verbos, como o particípio passado de protocolar (art. 164,
§ 1º, do Decreto 4.857, de 1939), situação que se repete nos arts. 110, §
1º, e 156, parágrafo único, da Lei de Registros Públicos, e o particípio
passado de protocolizar (arts. 147 e 188 do texto legal por último
referido).
5. Em apreciação conjunta para ambas as formas, leciona Geraldo Amaral
Arruda (1997, p. 151) que “é preciso cuidado especial no uso desses
verbos, que, embora registrados nos dicionários, não consta que tenham
sido usados senão em formas nominais, fora da linguagem coloquial dos
cartórios”, motivo por que – acentuando o referido mestre tratar-se
“antes de uma questão de estilo e clareza do que de correção de
linguagem” – em seu entendimento, é “conveniente a opção pelas
locuções, das quais as leis oferecem vários exemplos”.
6. Com a devida vênia desse ensinamento, todavia, não parece haver razão
para tal emprego restritivo, porquanto, se se admite o uso das formas
nominais de ambos os verbos (infinitivo, gerúndio e particípio), e se não
há empecilho algum que determine ser defectivo qualquer deles no que
concerne à conjugação verbal, não parece haver razão impeditiva de seu
emprego nas demais formas, também não se apresentando visível
qualquer “questão de estilo e clareza” que justifique tal proceder
proibitivo.
7. Reforçando exatamente esse entendimento, o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, veículo oficial
para dirimir dúvidas acerca da existência ou não de vocábulos em nosso
idioma, registra o verbo protocolizar sem restrição alguma (2009, p.
680), o que implica dizer que seu emprego está oficialmente autorizado
entre nós.
8. Oportuno é acrescentar que o art. 147 da Lei 6.015, de 31/12/73, que
dispôs sobre os registros públicos, em sua redação primitiva, assim
registrava: “Protocolado o título ou documento, far-se-á, em seguida, no
livro respectivo, o lançamento…”; na republicação da lei, inserida na
Coleção das Leis da União de 1975, vol. V, p. 61, todavia, passou a
constar protocolizado.
9. De igual modo, o art. 277 da mesma lei (antigo art. 278), assim
registrava: “Requerida a inscrição de imóvel rural no registro Torrens, o
oficial protocolará e autuará o requerimento e documentos…”; a
republicação, com as alterações trazidas pela Lei 6.140 e pela Lei 6.216,
de 30/6/75, por sua vez, registrou protocolizará.
10. Nenhum problema, já que ambas as formas são aceitas como variantes
e igualmente corretas em nosso léxico.
Proveniente ou Proviniente?
1. Proveniente significa originário, oriundo. Ex.: “Proveniente de Minas
Gerais, o advogado guardava a entonação de voz típica de sua região de
origem”.
2. Muito embora seja palavra derivada de provir, atente-se a que
proviniente é grafia errada.
Provimento
Ver Números – Como ler e Empregar? (P. 506)
Pseudo-perito ou Pseudoperito?
1. Ante as alterações introduzidas em nosso sistema pelo Acordo
Ortográfico de 2008, importa saber qual a forma correta: pseudo-perito
ou pseudoperito?
2. Começa-se dizendo que pseudo é um elemento de origem grega,
empregado como adjetivo na formação de palavras no vernáculo, e
significa falso, suposto: pseudofruto, pseudocristianismo.
3. Por outro lado, é de se dizer que, frequentemente empregado em
português como primeiro elemento na formação de inúmeros vocábulos,
constitui aquilo que, em Gramática, se chama falso prefixo.
4. Pelas diretrizes do Acordo Ortográfico de 2008, apenas em dois casos se
junta ao elemento seguinte com hífen: a) quando o segundo elemento se
inicia por h: pseudo-hemofilia, pseudo-hérnia, pseudo-história; b)
quando o segundo elemento se inicia com a mesma vogal que encerra o
prefixo: pseudo-occipital, pseudo-osteose.
5. Desse modo, acopla-se diretamente à palavra seguinte, sem
intermediação de hífen, quando iniciada esta por outra vogal, que não a
que encerra o prefixo: pseudoálcool, pseudoametista, pseudoedema,
pseudoesfera, pseudoicterícia, pseudoimunização.
6. Continua valendo a regra de junção direta, mesmo que o elemento
seguinte se inicie por consoante: pseudobatismo, pseudocartilagem,
pseudodoutor, pseudofilosofia, pseudoglaucoma, pseudomártir,
pseudoperito.
7. Apenas para a hipótese de ser o segundo elemento iniciado por r ou s,
dobram-se tais consoantes para continuidade do som originário:
pseudorrainha, pseudorreação, pseudossensação, pseudossufixo.
Ver Pseudoprofessora ou Pseudaprofessora? (P. 630)
Pseudoprofessora ou Pseudaprofessora?
1. O primeiro elemento pseudo, que entra na composição de vários
vocábulos em português, é invariável ou não? Assim: pseudoprofessora
ou pseudaprofessora?
2. Ora, pseudo é elemento grego com o sentido de falso, e, de tanto usado
na formação de palavras em português, constitui o que se chama falso
prefixo.
3. É importante anotar que se trata de elemento invariável, tanto em gênero
quanto em número, sendo, portanto, errôneas as formas em que se usa tal
elemento no feminino: pseudaperita, pseuda-advogada (GÓIS, 1943, p.
195).
4. Na didática lição de Sousa e Silva, “não se diz pseuda, pseudos,
pseudas. O termo pseudo (do grego pseudes, ‘falso’) é invariável em
gênero e número e só se usa em composição, como elemento inicial”
(1958, p. 245).
5. Na esteira do correto emprego de tal vocábulo, lembra Cândido Jucá
Filho (1981, p. 95) que Mário Barreto empregou a expressão “letras
pseudoetimológicas”.
6. Para Silveira Bueno, “o adjetivo pseudo – inteiramente grego – é
invariável em gênero e número. Exs.: Os pseudoprofessores, as
pseudopoetisas” (1957, p. 334).
7. Para Vitório Bergo (1943, p. 58), “embora usado como adjetivo, na
acepção de falso, suposto, pseudo é prefixo e conserva-se, portanto,
invariável: ‘Prossegue… a crítica zombeteira dos médicos mezinheiros,
dos pseudomédicos, dos barbeiros, das benzedeiras’ (Camilo Castelo
Branco)”.
8. São bastante corriqueiros os equívocos nesse sentido, como se pode
verificar na minuta de um recurso dirigido a um tribunal paulista:
“Alegando pseudas infringências a dispositivos contratuais e legais…”.
Corrija-se: “Alegando pseudoinfringências a dispositivos contratuais e
legais…”.
Ver Pseudo-perito ou Pseudoperito? (P. 629)
Pública-forma
1. Para De Plácido e Silva, é a “denominação dada à cópia de um
documento, feita por um tabelião ou escrivão, na qual faz constar,
palavra por palavra, tudo o que está ou se encontra no original” (1989, p.
502).
2. Por ser cópia feita por pessoa estranha ou que não produziu o escrito
original, distingue-se do traslado ou da certidão, que são feitos ou
extraídos pelo serventuário do próprio cartório em que passada a
escritura ou produzido o ato.
3. Duas observações importantes, que podem ser extraídas do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa (2009, p. 686), editado pela Academia
Brasileira de Letras, entidade oficialmente incumbida de listar os
vocábulos existentes em nosso idioma, bem como sua grafia e sua
flexão: a) mesmo após as alterações introduzidas em nosso sistema pelo
Acordo Ortográfico de 2008, perdura o hífen entre os elementos; b)
substantivo composto que é, formado por um adjetivo e um substantivo,
seus dois elementos variam na passagem para o plural: públicas-formas.
Ver Substantivos compostos – Como levar ao plural? (P. 717)
Pudico ou Púdico?
1. Pudico significa o que tem ou revela pudor, o que é casto, recatado: um
jovem pudico, uma jovem pudica, uns jovens pudicos, umas jovens
pudicas.
2. No campo jurídico, assim como seu antônimo impudico, é adjetivo
muito usado nas digressões acerca dos crimes contra os costumes:
estupro, atentado violento ao pudor, importunação ofensiva ao pudor.
3. Quanto à prosódia, trata-se de palavra paroxítona, não proparoxítona,
sendo sua sílaba tônica di e não pu, de modo que não existe razão para
ser graficamente acentuada (SACCONI, 1979, p. 19).
4. Asseverando ser questão que “não se discute mais”, Silveira Bueno
(1938, p. 15) também lhe afirma o caráter de palavra paroxítona.
5. Mário Barreto (1954b, p. 124), ao tratar das acentuações viciosas, alude
“aos que, contra a origem e prática, querem esdruxulizar” tal vocábulo,
pronunciando-o com acento na antepenúltima sílaba.
6. Ao apontar o correto emprego de tal palavra em Alexandre Herculano –
como paroxítona e não proparoxítona – lembra Vasco Botelho de
Amaral, em corroboração, que, “em latim, pudicus era grave”,
acrescentando que Camões lhe dá a correta acentuação, ao rimar rica e
rico, respectivamente, com pudica e pudico (AMARAL, 1939, p. 86).
7. Espancando eventuais dúvidas, o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão oficialmente
incumbido de definir a pronúncia dos vocábulos pertencentes ao nosso
léxico, registra pudico, assim sem acento gráfico algum, como
paroxítona, portanto, e rimando com rico e nanico (2009, p. 686).
8. Seu superlativo absoluto sintético é pudicíssimo.
Pugilistico ou Pugilístico?
1. Um leitor, observando que em francês existe pugilistique e em italiano é
corrente pugilistico, pergunta se não existe pugilistico em português, já
que o corretor ortográfico de seu computador acusou irregularidade em
tal grafia.
2. Importa anotar, como premissa, que, desde o início do século XX, por
delegação legal, a Academia Brasileira de Letras é o órgão legalmente
incumbido de listar oficialmente os vocábulos existentes em nosso
idioma bem como determinar-lhes a correta grafia, e ela o faz por meio
da edição periódica do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa.
3. Pois bem: uma consulta à mais recente edição do VOLP mostra que, no
vernáculo, em correspondência com as palavras estrangeiras citadas,
existe o adjetivo pugilístico (ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS,
2009, p. 686), o qual, por ser vocábulo proparoxítono, traz em si o
acento gráfico.
4. Resolvida a questão, oportuno é acrescentar que dos corretores
ortográficos instalados nos computadores se pode dizer o mesmo que
dos dicionaristas: não importando a grande contribuição que prestam aos
usuários da língua portuguesa, se houver alguma desavença entre eles e
o VOLP, a razão há de estar sempre com este último, no que concerne à
existência, modo de ser e de escrever dos vocábulos em nosso idioma.
Pugnar
1. Quanto a sua pronúncia, é de se anotar que, até mesmo entre as pessoas
cultas, há uma tendência a introduzir uma vogal logo após o g, nas
formas rizotônicas, pronunciando-se puguino, puguinas…
2. Trata-se, porém, de verbo regular, em que, após o radical (pugn), apenas
se acrescentam as desinências próprias da conjugação: pugno, pugnas,
pugna, pugnamos, pugnais, pugnam (presente do indicativo); pugne,
pugnes, pugne, pugnemos, pugneis, pugnem (presente do subjuntivo);
pugna, pugne, pugnemos, pugnai, pugnem (imperativo afirmativo); não
pugnes, não pugne, não pugnemos, não pugneis, não pugnem
(imperativo negativo).
3. E não se há de introduzir, na fala, uma vogal que não existe na escrita.
4. Quanto a vocábulos como puguino e puguinas, configuram eles aquilo
que Sousa e Silva chama de formas disparatadas (1958, p. 157).
5. Em realidade, repita-se que, ao contrário do que muitos pensam, nas
formas rizotônicas desse verbo (casos em que a sílaba forte cai no
radical), o acento tônico incide no u que precede o g, e não nesta última
consoante, até porque só vogal pode ser pronunciada com força: não se
diga, pois, puguino, ou coisa parecida, mas: pugno, pugnas, pugna…
pugnam (presente do indicativo); pugne, pugnes, pugne…, pugnem
(presente do subjuntivo); pugna, pugne, pugnem (imperativo afirmativo),
não pugnes, não pugne, não pugnem (imperativo negativo).
6. Como as formas rizotônicas apenas ocorrem no presente do indicativo,
presente do subjuntivo, imperativo afirmativo e imperativo negativo, não
deve haver preocupação alguma, quanto à observação feita, no que diz
respeito aos demais tempos: pugnava (pretérito imperfeito), pugnarei
(futuro do presente), pugnaria (futuro do pretérito), pugnado
(particípio), pugnando (gerúndio), pugnei (pretérito perfeito), pugnara
(pretérito mais-que-perfeito), pugnasse (imperfeito do subjuntivo),
pugnar (futuro do subjuntivo).
Qual
1. Atentando-se à frase “Era uma herança de autores, que era preciso
salvar”, vê-se que ela é ambígua, com total prejuízo de sentido, pois não
há certeza acerca de qual seja o antecedente do que; isto é, na prática,
não se sabe com certeza o que era preciso salvar – se a herança, se os
autores.
2. Nesses casos, por necessidade de clareza, deve-se substituir o que por o
qual ou equivalente, definindo-se com precisão o antecedente e
desfazendo-se, desse modo, possível ambiguidade. Exs.: a) “Era uma
herança de autores, a qual era preciso salvar”; b) “Era uma herança de
autores, os quais era preciso salvar”.
3. Em outras palavras, embora técnica e gramaticalmente o exemplo
original esteja correto, o sentido exige que se altere a construção da
frase.
Ver Que (P. 635) e Qual de nós – sabe ou sabemos? (P. 633)
Qualidade
Ver Na qualidade de – Galicismo? (P. 489)
Qual seja
1. Ante as frequentes confusões que ocorrem com essa expressão e com
outras similares, observe-se a precisa lição de Arnaldo Niskier: “ou seja
é invariável, por ser, a exemplo de isto é, uma expressão explicativa.
Não devemos, no entanto, usar o mesmo raciocínio para qual seja, que é
variável, formando no plural quais sejam” (1992, p. 52).
2. Assim, é de se atentar à correção ou incorreção dos seguintes exemplos:
a) “Os tribunais superiores, qual seja, o Supremo Tribunal Federal e o
Superior Tribunal de Justiça, ainda não apreciaram a matéria” (errado);
b) “Os tribunais superiores, quais sejam, o Supremo Tribunal Federal e
o Superior Tribunal de Justiça, ainda não apreciaram a matéria”
(correto); c) “Os tribunais superiores, ou seja, o Supremo Tribunal
Federal e o Superior Tribunal de Justiça, ainda não apreciaram a
matéria” (correto); d) “Os tribunais superiores, ou sejam, o Supremo
Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, ainda não
apreciaram a matéria” (correto).
3. Para os que reputarem contrários à eufonia os sons daí resultantes, o
melhor é substituir a expressão por uma de suas sinônimas: a saber, isto
é, vale dizer.
Ver Ou seja (P. 538).
Quantum
1. Antonio Henriques (1999, p. 166) o conceitua como “advérbio latino
substantivado em português com o sentido de montante, indicador de
quantidade”. Exs.: a) “… agregam-se necessariamente à pena, influindo,
pois, na fixação do quantum da fiança” (Magalhães Noronha); b) “Por
isso mesmo, quer seja civil ou comercial, desde que a obrigação foi em
parte satisfeita, justo é se reduza o quantum da multa…” (Washington
de Barros Monteiro).
2. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras – que é o veículo oficial para registrar os vocábulos
pertencentes ao nosso idioma e ordenar o modo de grafar as palavras em
nosso idioma – considera-o palavra ainda pertencente ao idioma latino,
motivo por que não o acentua (o que seria obrigatório, se já estivesse
incorporado ao nosso léxico, à semelhança de álbum, como paroxítona
terminada em um), e lhe indica o plural quanta, desconhecido para as
palavras vernáculas (2009, p. 863).
3. Por ser vocábulo não pertencente a nossa língua, há de ser grafado entre
aspas ou por qualquer modo indicador de tal circunstância, como itálico,
negrito ou sublinha.
Quase
1. É advérbio que tem o sentido de perto, aproximadamente. Ex.: “A
sustentação oral durou quase vinte minutos”.
2. No âmbito jurídico, entra na composição de substantivos para indicar
aproximação da ideia expressa pelo nome: quase contrato, quase delito,
quase posse, compostos esses que têm sentido preciso e técnico.
3. Importante observar que o Acordo Ortográfico de 2008 aboliu o hífen
utilizado nos substantivos compostos com este advérbio.
4. Atente-se a que são incorretas as grafias quasi e quási.
Quatorze ou Catorze?
Ver Catorze ou Quatorze? (P. 174)
Que
1. Quanto às regras de estilo para o uso do que, leciona Antônio Albalat
que “é preferível não os multiplicar e servir-vos dele sobriamente; mas
não há que hesitar, quando a clareza e a originalidade se impõem”.
2. Aconselha, no entanto, tal autor sua supressão em muitos casos, em prol
da harmonia, com o auxílio de adjetivos (ALBALAT, 1934, p. 142-3).
3. Assim, devem-se evitar expressões como as seguintes: a) “Este costume,
que achavam ridículo…”; b) “O mancebo que avistara na véspera…”.
Há de expressar a ideia de outro modo: a) “Este costume julgado
ridículo…”; b) “O mancebo avistado na véspera…”
4. Por outro lado, fundado em lição de Guerreiro Murta, também observa o
desembargador Geraldo Amaral Arruda que as orações relativas
(iniciadas por um pronome relativo) às vezes desagradam ao ouvido pela
colisão ou repetição de sons, ou truncam o pensamento.
5. Bem por isso, aconselha ele diversos modos de melhorar a frase
(ARRUDA, 1987, p. 2-3.): a) Pela substituição da oração adjetiva por
um aposto: i) “Clóvis Beviláqua, que fez este projeto de código…” (frase
original); ii) “Clóvis Beviláqua, autor deste projeto de código…” (frase
melhorada). b) Pela substituição da oração adjetiva por um adjetivo: i)
“Era um juiz que estudava para decidir” (frase original); ii) “Era um juiz
estudioso para decidir” (frase melhorada). c) Pela substituição da oração
adjetiva por um possessivo: i) “O médico que cuida de mim…” (frase
original); ii) “O meu médico…” d) Pela substituição da oração adjetiva
por uma preposição: i) “Era um juiz que não tinha medo de decidir”
(frase original); ii) “Era um juiz sem medo de decidir” (frase melhorada);
e) Pela mudança da oração adjetiva, fazendo desaparecer o pronome
relativo: i) “O ladrão haveria de restituir os bens que havia roubado”
(frase original); ii) “O ladrão haveria de restituir os bens roubados”
(frase melhorada); iii) “O ladrão roubara os bens, mas haveria de
restituí-los” (frase melhorada).
Ver Omissão da conjunção – Está correto? (P. 526) e Qual (P. 632).
Quede – Existe?
1. Assim como cadê e quedê, trata-se de corruptela vocabular da expressão
que é de.
2. Ocorre que cadê é palavra aceita como existente em nosso léxico, mas,
nesse sentido, não existe quede nem quedê.
Ver Que é de (P. 636) e Cadê (P. 165).
Quedê – Existe?
1. Assim como cadê e quede, trata-se de corruptela vocabular da expressão
que é de.
2. Ocorre que cadê é palavra aceita como existente em nosso léxico, mas,
nesse sentido, não existe quede nem quedê.
Ver Que é de (P. 636) e Cadê (P. 165).
Que é de
1. Na expressão interrogativa “Que é de?”, subentende-se a palavra feito, e
seu uso é integralmente correto, ficando a locução invariável, mesmo
que acompanhada de palavra no plural. Exs.: a) “Que é da prova pericial
determinada pelo juízo?”; b) “Que é das provas técnicas, e que é dos
exames periciais?”
2. Atente-se à precisa lição de Vitório Bergo: “Fórmula exata de pergunta,
resumo de ‘que é feito de…?’, que se deve empregar em vez de quede”
(1944, p. 201). Ex.: “Que é dos tempos em que Aspásia ensinava
retórica aos oradores?” (Machado de Assis).
3. Jamais se deve dizer – e muito menos escrever – quéde, quedê.
4. Quanto a cadê, assim leciona Júlio Nogueira: “Esta palavra estranha, que
se ouve a cada momento, principalmente no falar nortista, é apenas uma
corrutela da frase interrogativa: Que é de?, a saber: Que é feito de? O
cadê já é uma segunda transformação, sendo a primeira quede. Quede o
livro? Que é de? Quanto ao grosseiro cadê, não deve ter representação
alguma, cabendo antes expungi-lo de vez da nossa linguagem” (1959, p.
27).
5. Para Arnaldo Niskier – que também vê como possível o emprego da
expressão onde está – “o correto é que é de; quede e cadê só na
linguagem oral ou na reprodução da mesma [sic] em textos literários”
(1992, p. 59).
6. Em efetiva condenação a seu uso – mormente no padrão culto –
Domingos Paschoal Cegalla sintetiza que cadê, quedê e quede “são
deturpações populares de que é de?, que é feito de?” (1999, p. 61).
7. Importa, todavia, observar que o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, detentora de
autoridade oficial para listar os vocábulos integrantes de nosso léxico, a
partir de sua edição de 2009, passou a registrar cadê, exatamente na
acepção de que é de (2009, p. 143). Isso significa que tal vocábulo, a
contar da referida edição, passou a integrar nosso idioma, e seu emprego
está integralmente autorizado.
Ver Cadê (P. 165).
Quem há de
Ver Há de ou Há-de? (P. 384)
Que ou De que?
1. Um leitor diz ter dúvidas quanto ao emprego da palavra que ou da
expressão de que em frases como as seguintes: a) “Uma das informações
que se colhe no noticiário é que o advogado …”; b) “Uma das
informações que se colhe no noticiário é de que o advogado …”?
2. Nesse campo, de integral propriedade é a observação de Eliasar Rosa
para uma situação frequente nos discursos a pretexto de suposta
erudição: “Há uma forma de errar muito curiosa nas sustentações orais,
ou em discursos forenses ou parlamentares”.
3. E especifica tal autor: “Consiste ele em usar-se a preposição de com
verbos que não a exigem”.
4. E cita ele o seguinte trecho como exemplo: “O Dr. Promotor afirmou de
que o réu matou por motivo fútil; entretanto a defesa vai demonstrar de
que isso não é verdade, pois está provado nos autos de que o réu matou
impelido por motivo de relevante valor social…”
5. Por fim, assim ele explica e conclui: “Os verbos afirmar, demonstrar,
provar não se constroem com a preposição de. Logo o certo seria: “O Dr.
Promotor afirmou que…; entretanto a defesa demonstrará que…, pois
está provado … que… (1993, p. 54-5)”
6. No caso da dúvida trazida pela leitora, tem-se o verbo ser, que é de
ligação e que pede predicativo do sujeito não precedido de preposição. O
correto, portanto, é “Uma das informações que se colhe no noticiário é
que o advogado …”
7. Acresce dizer que também é correta a seguinte construção: “Uma das
informações que se colhe no noticiário é a de que o advogado…”. Mas
ela corresponde exatamente à construção aqui abonada, na qual “a” é
objeto direto, e a estrutura restante é um complemento desse termo por
último referido.
Que ou Quê?
1. Como a palavra referida às vezes é acentuada, às vezes não, importa
observar qual a forma correta quanto à acentuação gráfica: “Requeira o
que de direito” ou “Requeira o quê de direito”.
2. É importante anotar que se acentua graficamente o vocábulo da consulta,
numa primeira hipótese, quando é um substantivo, caso em que significa
(i) o próprio nome da consoante ou (ii) alguma coisa. Exs.: a) “O quê
fica entre o pê e o erre” (nome da letra); b) “Valquíria tem um quê de
mistério no olhar”.
3. Também se acentua, quando se localiza no fim da frase (ou logo antes de
sinal de pontuação), e, então, se torna tônica. Ex. “Quê! Você por aqui?”
(fim de frase).
4. Com essas premissas, passa-se à análise dos exemplos inicialmente
dados.
5. Quando se observa o exemplo “Requeira o que de direito”, tem-se que:
a) o o é um pronome demonstrativo, com o significado de aquilo; b) o
que é um pronome relativo; c) veja como se pode substituir a referida
expressão – “Requeira aquilo o qual é de direito”; d) não há razão
alguma que justifique a necessidade de emprego do acento gráfico na
palavra que.
Querer
1. De início, merecem atenção seu pretérito perfeito e tempos derivados,
“cujas formas se escrevem com s” (CEGALLA, 1999, p. 345): quis,
quiseste, quis, quisemos, quisestes, quiseram (pretérito perfeito do
indicativo); quisera, quiseras, quisera, quiséramos, quiséreis, quiseram
(pretérito mais-que-perfeito do indicativo); quiser, quiseres, quiser,
quisermos, quiserdes, quiserem (futuro do subjuntivo); quisesse,
quisesses, quisesse, quiséssemos, quisésseis, quisessem (imperfeito do
subjuntivo).
2. Em sua ortografia, como se verifica com facilidade, faz oposição, nesses
tempos, ao verbo fazer, que é escrito com z: fiz, fizeste, fez, fizemos,
fizestes, fizeram (pretérito perfeito do indicativo); fizera, fizeras, fizera,
fizéramos, fizéreis, fizeram (pretérito mais-que-perfeito do indicativo);
fizer, fizeres, fizer, fizermos, fizerdes, fizerem (futuro do subjuntivo),
fizesse, fizesses, fizesse, fizéssemos, fizésseis, fizessem (imperfeito do
subjuntivo).
3. Também é palavra que precisa ser observada quanto à regência verbal.
4. Significando desejar, é transitivo direto. Exs.: a) “Eu quero o livro”; b)
“Eu o quero”.
5. No sentido de estimar, querer bem, é transitivo indireto. Exs.: a) “Eu
quero muito aos meus amigos”; b) “Eu lhes quero muito”.
6. Assim é a síntese de Artur de Almeida Torres: “É transitivo indireto no
sentido de ter amizade ou estima a, amar. Nas demais acepções, aparece
como transitivo direto, bitransitivo, intransitivo e pronominal” (1967, p.
241).
7. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 345) faz as seguintes ponderações:
a) “na acepção de desejar, pede objeto direto” (“Ele não a quis para
esposa”); b) “no sentido de amar, ter afeto a alguém, usa-se com objeto
indireto” (“Os tios queriam muito ao menino”); c) em frases do último
modelo, “está implícita a palavra bem” (“Os tios queriam muito bem ao
menino”).
8. De tais observações, oportuno é anotar que fundamentalmente diversas
em sentido são as seguintes frases, quando dirigidas a uma mulher: a)
“Eu a quero muito” (= Eu a desejo muito); b) “Eu lhe quero muito” (=
Eu a estimo muito).
9. É bem certo que Celso Pedro Luft (1999, p. 430) faz a seguinte
ponderação para os dias de hoje: “Para a linguagem culta formal, pode-
se recomendar a variante querer-lhe, sem condenar a outra (querê-lo).
10. O melhor, a esse respeito, entretanto, parece ser acolitar o ensino de
Francisco Fernandes: a) Há exemplos de seu emprego transitivo direto
em escritores de boa nota; b) Sem embargo de tal uso, entretanto, “a
regência mais recomendada para o verbo querer, na acepção de amar
alguém, ter-lhe amizade ou estima, é aquela em que ele aparece
seguido de objeto indireto”.
11. Bem por isso, o referido autor resume o melhor posicionamento nesse
sentido, fundado em lição de Otoniel Mota: “O verbo querer, com o
sentido de amar alguém, ter-lhe amizade, rege o pronome lhe; com o
sentido de desejar, rege o pronome o”.
12. E justifica: “O bem, ou o mal, que se quer, é, nesses casos, o
complemento direto do verbo; de sorte que a pessoa, ou coisa, a que se
quer o mal ou o bem, representará necessariamente um complemento
indireto. Em faltando, portanto, o complemento direto, nas frases cujo
torneio elíptico o subentende, a situação gramatical da coisa ou pessoa,
a cujo respeito se cogita em exprimir a disposição de ânimo do agente,
não mudará de natureza. Assim que diremos: “Quero bem a Pedro”.
“Quero muito a Pedro”. Ou, supresso o complemento direto: Quero a
Pedro” (FERNANDES, 1971, p. 487-8).
Quer… quer…
1. Ao dar com uma legenda de clichê “… quer corram ou andem
devagar…”, Sousa e Silva observa que, se se emprega a conjunção quer
no primeiro membro disjuntivo, deve-se repeti-la no segundo: “… quer
corram, quer andem devagar” (1958, p. 248).
2. Diversa, entretanto, é nesse sentido a lição de Luciano Correia da Silva:
“A alternativa ou pode estar uma vez só ou várias vezes numa frase ou
período: ‘Decifra-me ou devoro-te’; ‘Um advogado se distingue, ou pela
competência, ou pela dedicação, ou, o que é melhor, por essas duas
qualidades juntas’. Quer e já funcionam sempre repetidas, combinadas
com ou, ou várias vezes… conforme os exemplos: ‘Já falando, já
escrevendo, o advogado precisa respeitar a gramática’; ‘Quer falando,
ou escrevendo, o advogado precisa respeitar a gramática’” (1991, p.
144).
3. Da observação dos textos submetidos à norma culta, entretanto, o que
comumente se vê é a obediência à primeira lição referida, de lavra de
Sousa e Silva, de modo que, se se tem a conjunção quer na primeira
oração, deve ser ela repetida na segunda.
4. As mesmas observações valem para outras conjunções similares: ora…
ora, já… já.
Ver Quer… quer… quer… (P. 639)
Questão
1. Silveira Bueno manda omitir a pronúncia do u em tal vocábulo e diz que
“quem pronunciar cuestão errará vulgarmente” (1938, p. 13).
2. Em outra parte de sua obra, volta ele a negar a possibilidade de
pronúncia do u e assevera que o qu tem valor de k (BUENO, 1938, p.
71).
3. Por fim, ainda observa a erronia da pronúncia kestã (BUENO, 1938, p.
7).
4. Também para Domingos Paschoal Cegalla, “é insonoro o u de questão e
dos derivados questionar (contestar), questionário, questiúncula,
questor” (1999, p. 345).
5. Arnaldo Niskier, de igual modo, insiste em que não se há de pronunciar
o u dessa palavra, lição essa que ele estende para o verbo questionar
(1992, p. 3 e 81).
6. Todavia já o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela
Academia Brasileira de Letras, órgão oficial para definir quais vocábulos
e quais formas integram o léxico da língua pátria, em sua última edição
anterior ao Acordo Ortográfico de 2008, registrava qüestão a par de
questão (2004, p. 662), atestando a dupla possibilidade de pronúncia e de
grafia para o vocábulo.
7. Ora, firme-se a premissa de que o Acordo Ortográfico de 2008
simplesmente aboliu o uso do trema em palavras de nosso idioma, mas
não alterou a pronúncia de nenhum deles.
8. E, assim, nessa esteira, o VOLP, tentando trazer um pouco de luz ao
assunto, em sua primeira edição posterior às mudanças de grafia em
nosso idioma, a par de excluir o trema sobre tal vocábulo, teve o cuidado
de apontar, entre parênteses, a duplicidade de pronúncias possíveis, a
saber, com o u pronunciado ou não (ACADEMIA BRASILEIRA DE
LETRAS, 2009, p. 692).
9. E essa possibilidade de dupla pronúncia também se estende a todos os
seus cognatos: questionabilidade, questionação, questionador,
questionamento, questionante, questionar, questionário, questionável,
questiúncula.
Ver Trema (P. 746).
Questão a resolver(-se) – Está correto?
Ver A fazer – Está correto? (P. 91)
Questionamento
Ver Questão (P. 639).
Questionar
Ver Questão (P. 639).
Questionário
Ver Questão (P. 639).
Questiúncula
Ver Questão (P. 639).
Quinquênio
1. É o lapso temporal de cinco anos, tendo por sinônimo lustro. Ex.: “Em
um quinquênio, prescrevem as ações patrimoniais contra o Estado”.
2. No que concerne à pronúncia, lembra Luiz Antônio Sacconi (1979, p.
19) que, em tal palavra, o u soa nas duas vezes em que aparece.
3. Tal, aliás, era o posicionamento do Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido
oficialmente de determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma,
além de sua grafia oficial, o qual, em sua última edição antes do Acordo
Ortográfico de 2008 (2004, p. 665), registrava o vocábulo com dois
tremas (qüinqüênio).
4. É certo que Acordo Ortográfico de 2008 simplesmente aboliu o uso do
trema em palavras de nosso idioma, e hoje, por consequência, nem
mesmo se sabe, apenas pela escrita, se o u é ou não pronunciado em
determinado vocábulo.
5. O VOLP, todavia, tentando trazer um pouco de luz ao assunto, em sua
primeira edição posterior às mudanças de grafia em nosso idioma, tem
tido o cuidado de apontar, entre parênteses, a correta pronúncia do
vocábulo em análise, bem como de seus cognatos (ACADEMIA
BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 695).
Quite ou Quites?
1. Particípio passado do verbo quitar, tem problemas de concordância
nominal, até porque, sendo tempo verbo-nominal, também varia em
número.
2. Porque tem singular e plural, concorda normalmente com a palavra
modificada. Exs.: a) “O condenado está quite com a Justiça”; b) “Os
condenados estão quites com a Justiça”.
3. São errôneas as seguintes concordâncias: a) “Eu estou quites com a
Justiça”; b) “Nós estamos quite com a Justiça”.
4. Lembrando tratar-se de adjetivo variável em número (isto é, que tem
singular e plural), de modo bem prático observa Eliasar Rosa: “Assim:
uma pessoa está quite, duas estão quites. Dir-se-á: Os alunos estão quites
com a tesouraria. O candidato não estava quite com o serviço militar”
(1993, p. 118).
5. Atento aos frequentes deslizes da linguagem do foro, observa Edmundo
Dantès Nascimento (1982, p. 106) ser “erro comum o emprego de quites
no singular: ‘estou quites’”; e complementa tal autor que “o particípio
varia: ‘Estou quite; estamos quites’”.
6. Lembrando didaticamente que quite é o singular de quites, Sousa e Silva
(1958, p. 249) arrola, para ilustrar, interessante exemplo de Alexandre
Herculano: “Quite está convosco o rei que vo-los dá; quites estamos nós
que para isso repartimos com ele o fruto do nosso suor”.
7. Regina Toledo Damião e Antonio Henriques, em apropriada observação,
anotam que tal palavra “é, muitas vezes, tomada por invariável, o que
representa falácia sintática, por tratar-se de adjetivo, portanto, variável”
(1994, p. 62).
8. Nossos textos de lei usualmente fazem a regular concordância: a) “Dá-se
a novação: … II – quando novo devedor sucede ao antigo, ficando este
quite com o credor” (CC/1916, art. 999); b) “Em toda escritura de
transferência de imóveis, serão transcritas as certidões de se acharem
eles quites com a Fazenda Federal, Estadual e Municipal, de quaisquer
impostos a que possam estar sujeitos” (CC/1916, art. 1.137).
Ver Plural majestático (P. 568).
Quorum
1. Um ilustre leitor envia a seguinte consulta: a) não encontrou, no
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, o registro da palavra
quorum, nem com acento nem sem acento; b) no Dicionário Aurélio,
todavia, há quórum, em forma aportuguesada pelo acento; c) a partir do
fato de que quorum é genitivo plural do pronome relativo latino qui,
quae, quod, indaga: deve usar “quorum”, assim entre aspas e sem acento,
ou, como registra o Aurélio, quórum, sem aspas e com acento?
2. Fixem-se, desde logo, duas importantes premissas para o vocábulo da
consulta: a) Quorum é o genitivo plural do pronome relativo latino – qui,
quae, quod – cristalizado como substantivo, com o sentido de número
legal, “geralmente empregado na terminologia jurídica, para indicar o
número de pessoas que deve comparecer às assembleias ou reuniões,
para que estas, validamente, possam deliberar” (DE PLÁCIDO E
SILVA, 1989, p. 17); b) Tal vocábulo vem da expressão latina quorum
praesentia suffici, que significa “dos quais a (ou melhor, cuja) presença
baste” (para aprovar ou denegar).
3. Domingos Paschoal Cegalla assim observa: “Contrariamente ao que em
geral se ensina, julgamos conveniente acentuar este latinismo, por ser
palavra de largo uso e por haver outros com idêntica terminação, como
álbum, fórum e médium, unanimemente acentuados”.
4. E complementa que “há falta de critério e de coerência da parte de
dicionaristas e autores de manuais de ortografia, acerca da grafia dos
latinismos. Vemos, por exemplo, fórum acentuado e quorum sem acento,
múnus (latinismo de uso restrito) com acento, habitat (latinismo
generalizado) sem acento” (CEGALLA, 1999, p. 346).
5. Com todo o respeito pelo ilustre gramático, o certo é que, para
solucionar a questão, parte-se da premissa de que a Academia Brasileira
de Letras tem a responsabilidade legal de editar o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, também conhecido por VOLP e,
assim, de listar oficialmente os vocábulos que integram nosso idioma,
bem como consolidar-lhes a grafia, além de classificá-los pelo gênero
(masculino ou feminino) e categoria morfológica (substantivo,
adjetivo…).
6. Incumbida a ABL por lei específica para sua confecção em caráter
oficial, quem o elabora goza de autoridade para, nesse campo, dizer o
Direito, motivo por que, ao consultá-lo, legem habemus e devemos
prestar-lhe obediência, do mesmo modo como devemos fazer com
respeito aos demais diplomas legais.
7. Em comunhão com tal pensamento, afirmam José de Nicola e Ernani
Terra que esse vocabulário “é a palavra oficial sobre ortografia das
palavras da língua portuguesa no Brasil” (2000, p. 231). Complemente-
se: também é a palavra oficial no que concerne à própria existência dos
vocábulos em nosso idioma, além de outros aspectos que eventualmente
venha a mencionar (pronúncia, gênero, etc.).
8. Isso quer dizer, desde logo, que nossos dicionaristas (como os ilustres
Aurélio e Houaiss), por mais respeitados que sejam e por melhores
serviços que tenham prestado ao idioma, não são autoridades oficiais no
assunto. Desse modo, se suas lições contrariam o VOLP, a este (e não
àqueles) se deve prestar obediência, independentemente, até mesmo, de
eventuais incoerências ou imperfeições que se possam apontar nos
critérios por ele seguidos. Vale aqui a observação que se faz acerca da
lei: pode-se, em tese e no plano da Ciência, discuti-la, questionar seus
critérios, sua própria justiça; mas, na prática, incumbe segui-la e prestar-
lhe obediência, até que seja modificada por outra.
9. Com especificidade para o caso da consulta, anota-se que o VOLP, em
sua quinta edição, de 2009 (posterior, assim, ao Acordo Ortográfico de
2008), não arrola quorum entre as palavras da língua portuguesa. Mais
do que isso, registra-a entre as palavras estrangeiras, confere-lhe a grafia
quorum (sem acento) e especifica tratar-se de substantivo masculino
pertencente ao idioma latino (p. 863).
10. Por ser vocábulo pertencente a outro idioma, não deve ser acentuado
(já que não o era na língua mãe), e, assim, deve ser grafado entre aspas,
em itálico, negrito, sublinha ou qualquer outro modo indicador de tal
circunstância.
11. Importa anotar, em seguida, que nossos textos de lei não são uniformes
quanto ao modo de empregar (ou de deixar de empregar) tal vocábulo.
12. Assim, o Código Eleitoral (Lei 4.737, de 15/7/65), no art. 28, § 1º, traz
o acerto parcial do legislador, que grafa o vocábulo sem acento gráfico,
mas esquece o sinal indicador de estrangeirismo.
13. A Lei das Sociedades por Ações (Lei 6.404, de 15/12/76), não mostra
sequer uniformidade de uso do vocábulo: a) na rubrica que encima o
art. 125, emprega-o corretamente, sem acento gráfico e entre aspas; b)
acerta, de outro modo, o emprego no art. 136, caput, em redação
conferida pela Lei 9.457/97, quando deixa de empregar o acento
gráfico e escreve o vocábulo em itálico; c) no art. 129, § 1º, entretanto,
utiliza-o sem acento gráfico, mas também sem elemento algum
indicador de estrangeirismo, equívoco esse que se repetia na redação
original do art. 136 caput, hoje revogada, e que continua na redação do
art. 136, § 2º, ainda em vigor, e no art. 140, IV, e 141, § 5º (ambos com
redação conferida pela Lei 10.303/01).
14. A Constituição Federal de 1988, por seu lado, evitou seu uso e preferiu
expressões substitutivas (voto da maioria, por exemplo).
15. O Código Civil de 2002 (Lei 10.406, de 10/1/02) alterna critérios em
seu emprego: a) no art. 59, parágrafo único, acerta pela metade, ao
deixar de usar o acento gráfico, mas ao esquecer os elementos
indicadores de estrangeirismo (com redação dada pela Lei 11.127/05);
b) no art. 1.094, acerta integralmente, grafando o vocábulo sem acento
e em itálico; c) no art. 1.334, III, volta a acertar parcialmente, ao grafar
sem acento gráfico e sem aspas ou sinal indicador de estrangeirismo; c)
tal conduta de acerto parcial, em tais moldes, volta a repetir-se no art.
1.352 e 1.353.
16. Num outro aspecto, importa saber qual o plural que se lhe deve
conferir: quora (seu hipotético plural neutro em latim), quoruns (mero
acréscimo de s, como outras tantas em português, com mera adaptação
pela troca de m por n), quóruns (aportuguesamento pelo acento gráfico
e pluralização pelo critério do nosso idioma), quorums (mero
acréscimo de s, sem alterar o vocábulo originário, fugindo ao modo
habitual de pluralização em português)…?
17. Ainda a título de consideração preliminar no plano da Ciência, mas
sem alterar em nada o que aqui se explicitou, vê-se que a manutenção
do vocábulo como latinismo dificulta a formação de seu plural em
português, tal como, aliás, também se dá com campus, por exemplo,
dentre outros.
18. Com essas ponderações, anota-se que o leitor traz à baila o polêmico e
tormentoso problema de pluralização das palavras de outros idiomas
ainda não incorporadas ao vernáculo, para o que, desde logo, se
observa, não há regramento específico emanado dos órgãos
competentes, e, assim, o que se tenta aqui é solucionar a questão por
um raciocínio cientificamente correto, com o acompanhamento do bom
senso que deve nortear soluções dessa natureza.
19. Parta-se do princípio de que palavras e expressões de outros idiomas
podem cristalizar-se no uso vernáculo de maneiras diversas: a) campus
veio na forma do nominativo (caso latino que serve para desempenhar
a função sintática de sujeito); b) quorum sedimentou-se aqui na forma
do genitivo (caso que serve para exercer a função do antigo
complemento restritivo, hoje adjunto adnominal na maioria dos casos);
c) a quo veio na forma do ablativo por influência da preposição
antecedente (caso que normalmente serve para desempenhar a função
de complemento circunstancial, hoje adjunto adverbial); d) ad quem, de
igual modo por influência da preposição antecedente, veio no acusativo
(que normalmente serve para a função de objeto direto).
20. Como não é de difícil compreensão, essa cristalização do vocábulo
estrangeiro em nosso idioma e seu emprego em estruturas sintáticas
vernáculas ocorrem (i) sem preocupação de qual seja sua função
sintática na oração em português e (ii) sem vínculo com a estrutura
sintática do latim. Exs.: a) “O quorum qualificado serve para
determinadas decisões” (sujeito); b) “A decisão exigiu quorum
qualificado” (objeto direto); c) “A decisão precisava de quorum
qualificado” (objeto indireto); d) “A solução é um quorum qualificado”
(predicativo do sujeito); e) “A decisão de um quorum qualificado é a
melhor para esta questão” (adjunto adnominal).
21. Se alguém quer levar em conta essa preocupação de qual seja a função
sintática do vocábulo na oração em português e proceder à
correspondente adaptação em latim, então não apenas se deve observar
que quorum é genitivo (caso de adjunto adnominal), mas também que
tal palavra já está no plural, além do que os dicionários de latim não
fazem constar quorum como substantivo naquele idioma, e, assim, as
tentativas de sua pluralização ali também não passam de suposições.
22. Bem por isso, levando-se em conta a declinação do pronome relativo
em latim – qui, quae, quod – os exemplos dados deveriam ter outra
feição, conforme a função sintática desempenhada pelo pronome
relativo na oração, e jamais se usaria quorum nos exemplos dados, até
porque tal forma é plural: a) “O qui qualificado serve para
determinadas decisões” (sujeito); b) “A decisão exigiu quem
qualificado” (objeto direto); c) “A decisão precisava de cui
qualificado” (objeto indireto); d) “A solução é um qui qualificado”
(predicativo do sujeito); e) “A decisão de um cujus qualificado é a
melhor para esta questão” (adjunto adnominal).
23. Se você está perplexo com o resultado, então ainda se adicionam
algumas observações: a) as formas acima empregadas são do pronome
relativo no masculino; b) o pronome relativo, porém, como indica seu
próprio nome, relaciona-se a um nome anteriormente mencionado e
concorda com esse nome em gênero (masculino, feminino ou neutro);
c) como, nos exemplos dados, as formas usadas são do masculino, isso
equivale a dizer que, se o antecedente for de outro gênero, então o
pronome relativo terá ainda outra forma; d) apenas para o primeiro
exemplo, em que se usou qui no nominativo, a forma seria quae para o
caso de antecedente feminino e quod para o antecedente neutro; e)
ocorre, adicionalmente, que, além de não termos o gênero neutro em
português, pode acontecer que determinada palavra seja feminina em
latim e masculina em português (ou vice-versa), o que baralha ainda
mais a questão; f) assim, variar a palavra pelo antecedente em
português poderia ser equivocado, ante o fato de que o gênero em latim
poderia ser outro.
24. Com o devido respeito por aqueles que pensam de modo diverso, a
melhor síntese e solução para o emprego do referido pronome, quer no
singular, quer no plural, parecem obedecer aos seguintes parâmetros: a)
as palavras estrangeiras não devem ter acentos gráficos, se estes não
existiam na língua de origem (como é o caso específico do latim); b)
devem ser grafadas em itálico, negrito, com sublinha ou entre aspas; c)
devem desvincular-se de sua função sintática de origem para efeito de
suas flexões em português, seja de gênero (masculino e feminino), seja
de número (singular e plural); d) a pluralização em português deve dar-
se pela forma tradicional em nosso idioma, a saber, mediante a adição
de um s, com eventuais adaptações, como é o caso da mudança de m
em n no caso da consulta.
25. Veja-se, assim, a correta grafia do vocábulo da consulta, no singular e
no plural, nos exemplos seguintes: a) “O quorum qualificado serve
para determinadas decisões” (sujeito); b) “A decisão exigiu quorum
qualificado” (objeto direto); c) “A decisão precisava de quorum
qualificado” (objeto indireto); d) “A solução é um quorum qualificado”
(predicativo do sujeito); e) “A decisão de um quorum qualificado é a
melhor para esta questão” (adjunto adnominal); f) “Os quoruns
qualificados servem para determinadas decisões” (sujeito); g) “As
decisões exigiram quoruns qualificados” (objeto direto); h) “A decisão
precisava de quoruns qualificados” (objeto indireto); i) “As soluções
são quoruns qualificados” (predicativo do sujeito); j) “A decisão de
quoruns qualificados é a melhor para estas questões” (adjunto
adnominal).
26. Até por questão de regramento geral do assunto no vernáculo, essa
solução há de estender-se, em mesmos moldes e pelas mesmas razões,
para outras palavras e expressões vindas do latim: a) “O campus
daquela universidade é simplesmente exemplar”; b) “Os campus
daquela universidade são simplesmente exemplares”; c) “O tribunal a
quo deu-se por incompetente para o julgamento da causa”; d) “Os
tribunais a quo deram-se por incompetentes para o julgamento da
causa”; e) “Espera-se melhor solução do tribunal ad quem”; f)
“Esperam-se melhores soluções dos tribunais ad quem”.
27. Qualquer outra solução foge ao efetivo respeito à etimologia, aos
critérios mínimos científicos e ao próprio bom senso.
Quota ou Cota?
Ver Cota ou Quota? (P. 232)
R
R$ 0,045 – Como ler?
1. Uma leitora indaga como se deve fazer a leitura de R$ 0,045.
2. Ora, o sistema nacional prevê, para depois da vírgula, apenas duas casas,
e denomina a unidade monetária assim obtida como centavo: a) R$ 0,01
(um centavo); b) R$ 0,99 (noventa e nove centavos).
3. Na disputa pela preferência dos consumidores, entretanto, lojas e postos
de combustíveis, mesmo sem previsão específica pelo sistema
monetário, passaram a empregar uma casa a mais, por um lado para
tentar ganhar a preferência do consumidor e, por outro lado, para não
deixar de conseguir preciosas parcelas da moeda com esse terceiro dígito
após a vírgula.
4. Para solucionar o caso, à falta de específica previsão pelo sistema,
resolve-se a questão pelos modos normais de leitura, quando envolvidos
casos comuns de fragmentação da unidade.
5. E, assim, o que se tem no caso, em última análise, são milésimos de um
real.
6. Então assim há de ser a correta leitura e a adequada escrita do número
trazido pela leitora para análise: quarenta e cinco milésimos de real.
Radical
Ver Uso abusivo – Está correto? (P. 752)
Ranger
1. Quanto à conjugação verbal, como todos os verbos terminados em ger,
para a continuidade do som original da última consoante do radical,
muda o g em j antes de o e de a. Assim: ranjo, ranges, ranja, rangi.
2. Feitas essas observações, é de se anotar que se trata de verbo regular,
conjugado em todas as pessoas, tempos e modos.
3. Flexionam-se de mesmo modo constranger, eleger, proteger, tanger.
Raptar
1. Em nosso ordenamento jurídico, rapto era figura típica de crime prevista
pelos arts. 219/222 do Código Penal de 1940, em disposições que foram
revogadas pela Lei 11.106/2005. Raptar consistia, em síntese, em
subtrair mulher honesta de seu domicílio para fins libidinosos, mediante
violência, grave ameaça ou fraude (DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p.
22).
2. No que concerne à ortografia de sua conjugação verbal (SACCONI,
1979, p. 21), é preciso atentar a suas formas rizotônicas, nas quais o
radical permanece o mesmo, em conduta típica de verbo regular que é,
sem qualquer acréscimo de i ou alteração de posicionamento da sílaba
tônica, ocorrência essa que se patenteia no presente do indicativo e nos
tempos daí derivados: rapto, raptas, rapta, raptamos, raptais, raptam
(presente do indicativo); rapte, raptes, rapte, raptemos, rapteis, raptem
(presente do subjuntivo); rapta, rapte, raptemos, raptai, raptem
(imperativo afirmativo); não raptes, não rapte, não raptemos, não
rapteis, não raptem (imperativo negativo).
3. Como todos os demais tempos e modos verbais apenas têm formas
arrizotônicas, essa dificuldade não mais se apresenta neles.
4. Vale aqui a mesma lição de Artur de Almeida Torres para o verbo optar:
“Nas três pessoas do singular e na terceira do plural do presente do
indicativo e do presente do subjuntivo, a vogal o do radical é tônica, e,
portanto, fortemente pronunciada, juntamente com a consoante seguinte”
(1966, p. 116).
5. Ultime-se com a observação de que, mesmo entre as pessoas cultas, há
essa tendência equivocada para introduzir, quer na escrita, quer na
pronúncia, uma vogal logo após o t que encerra o radical, nas formas
rizotônicas, pronunciando-se rapito, rapitas, com o deslocamento da
sílaba tônica para esse i inexistente.
Ratificar ou Retificar?
1. Basicamente, ratificar quer dizer confirmar o que se afirmou
anteriormente. Ex.: “A testemunha, ratificando-se, confirmou a história
inicial”.
2. É bastante comum seu emprego nos textos de lei: a) “O pagamento deve
ser feito ao credor ou a quem de direito o represente, sob pena de só
valer depois de por ele ratificado, ou tanto quanto reverter em seu
proveito” (CC, art. 308); b) “Os atos praticados por quem não tenha
mandato, ou o tenha sem poderes suficientes, são ineficazes em relação
àquele em cujo nome foram praticados, salvo se este os ratificar” (CC,
art. 662); c) “O mandatário que exceder os poderes do mandato, ou
proceder contra eles, será considerado mero gestor de negócios,
enquanto o mandante lhe não ratificar os atos” (CC, art. 665); d)
“Quando alguém, na ausência do indivíduo obrigado a alimentos, por
ele os prestar a quem se devem, poder-lhes-á reaver do devedor a
importância, ainda que este não ratifique o ato” (CC, art. 871); e) “Se
qualquer dos cônjuges não comparecer à audiência designada ou não
ratificar o pedido, o juiz mandará autuar a petição e documentos e
arquivar o processo” (CPC/1973, art. 1.122, § 2º).
3. Já retificar significa corrigir, emendar. Ex.: “O magistrado, em novo
despacho, retificou ligeiros descuidos do anterior”.
4. Também é usual seu emprego nos textos de lei: a) “Se o teor do registro
não exprimir a verdade, poderá o interessado reclamar que se retifique
ou anule” (CC, art. 1.247); b) “Publicada a sentença, o juiz só poderá
alterá-la: … I – para lhe corrigir, de ofício ou a requerimento da parte,
inexatidões materiais, ou lhe retificar erros de cálculo” (CPC/1973, art.
463, I); c) “Julgando procedente a impugnação referida no n. I, o juiz
mandará retificar as primeiras declarações” (CPC/1973, art. 1.000,
parágrafo único); d) “Julgando procedente a impugnação, determinará o
juiz que o perito retifique a avaliação, observando os fundamentos da
decisão” (CPC/1973, art. 1.009, § 2º).
Reconhecer
1. Trata-se de vocábulo a ser observado sob o prisma da regência verbal.
2. É verbo transitivo, em cuja companhia, com frequência, aparece um
predicativo do objeto direto.
3. Tal predicativo pode vir ou não precedido de como. Exs.: a) “Reconheço-
a minha inspiradora daquela obra” (correto); b) “Reconheço-a como
minha inspiradora daquela obra” (correto).
4. Aires da Mata Machado Filho (1969a, p. 616), por seu lado, mostra sua
preferência pela simples justaposição das palavras, sem emprego de
como, alegando motivo de elegância na fala.
5. Acresça-se que é corriqueiro o emprego de frases como a que segue:
“Reconheço-a como sendo minha inspiradora daquela obra”.
6. Muito embora seja de uso comum a expressão como sendo em casos que
tais, é ela errônea e desnecessária, devendo ser eliminada.
7. Procede-se à correção, na prática, por um de dois modos: a) “Reconheço-
a minha inspiradora daquela obra”; b) “Reconheço-a como minha
inspiradora daquela obra”.
8. Idêntica há de ser a construção com outros verbos que, de modo similar,
exijam predicativo do objeto, como crer, julgar, considerar, reputar: a)
“Creio-o apto (ou como apto) para o trabalho”; b) “julguei-a incapaz
(ou como incapaz) para a função”; c) “Considero-a minha inspiradora
(ou como minha inspiradora) daquela obra”; d) “Reputo-o o maior
processualista (ou como o maior processualista) vivo do país”.
Ver Nomear (P. 497).
Reconvir
Ver Reconvir – Constrói-se com que preposição? (P. 647) e Vir (P. 770).
Recorde
1. Quanto à origem histórica do vocábulo, assim é a explicação de Silveira
Bueno: “Dava-se tal nome ao disco, nos jogos atléticos, que se colocava
no fim da meta, no estádio: aquele que primeiro o atingisse, o retinha
como troféu, como lembrança, como recordação do feito praticado”
(1957, p. 413).
2. Basicamente significa superação de marcas anteriores. Ex.: “Diversos
recordes foram batidos naquele torneio internacional”.
3. Apesar de generalizada a pronúncia proparoxítona (récorde), lembra
Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 264) ser mais apropriada a
pronúncia paroxítona, rimando com acorde, concorde e discorde.
4. Desse entendimento é também Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 19).
5. Assim também registra o Dicionário da Melhoramentos (Encyclopaedia
Britannica do Brasil, 1995, p. 1.472).
6. Silveira Bueno (1938, p. 201), de igual modo, é taxativo no sentido de
que se deve pronunciar a palavra como paroxítona e não proparoxítona.
7. Em realidade, embora seja palavra de origem inglesa e tenha, na língua
mãe, a pronúncia proparoxítona, o certo é que fogem às regras de grafia
e pronúncia quaisquer outras formas de passagem para nosso léxico:
récorde, récor, record, recor.
8. Trata-se, ademais, de palavra já perfeitamente integrada a nosso léxico,
sendo, assim, inaplicável a lição de Aires da Mata Machado Filho
(1969i, p. 173), no sentido do uso de grifo para indicar-lhe a procedência
estrangeira.
9. A pronúncia paroxítona – e não proparoxítona – desse vocábulo é
também realçada por Arnaldo Niskier, autor esse que, em outra
passagem, assevera que “se pronuncia recórdes e não récordes; nós não
falamos inglês” (1992, p. 3 e 66).
10. Assim é a síntese de José de Nicola e Ernani Terra: “O substantivo que
indica que uma marca máxima foi atingida apresenta uma forma
aportuguesada, já de uso consagrado: recorde (paroxítona). Evite,
portanto, a pronúncia proparoxítona (récorde) e a grafia inglesa record”
(2000, p. 193).
11. Eliminando toda possível dúvida sobre sua forma e pronúncia em
português, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras, que é o veículo oficial ordenador do
modo de grafar as palavras em nosso idioma, registra unicamente
recorde (com e final e sem acento gráfico), a significar que a considera
palavra já integrada a nosso idioma, e a faz ser pronunciada rimando
com acorde, concorde e discorde (2009, p. 709).
12. Em pertinente observação, anota Domingos Paschoal Cegalla (1999, p.
350) que recorde pode ser usada como substantivo ou como adjetivo: a)
“O Guinness é o livro dos recordes” (substantivo); b) “Fez o percurso
em tempo recorde” (adjetivo). A pronúncia continua a mesma.
Recorrer
1. Quanto à regência verbal, Francisco Fernandes (1971, p. 500), para o
significado de interpor agravo ou recurso judicial, apelar, admite seja ele
construído com duas preposições: de e para. Ex.: “Recorrer de um
tribunal para outro”.
2. Não é outra a lição de José de Nicola e Ernani Terra: “Na linguagem
jurídica utiliza-se o verbo recorrer no sentido de apelar ou interpor
recurso para instância superior. Nesse sentido exige a preposição para e
não a preposição a” (2000, p. 194).
3. Ressalvado o emprego técnico em textos jurídicos, vê-se, na consonância
com ensino de Domingos Paschoal Cegalla, que, no sentido comum de
buscar socorro, exige a preposição a. Ex.: “O réu recorreu a um
advogado famoso”.
4. Nessa acepção, para o autor mencionado, “como o verbo assistir, requer
o complemento pronominal a ele e não lhe” (CEGALLA, 1999, p. 350).
Exs.: a) “Lembrei-me de um advogado famoso e recorri a ele”; b)
“Refratário sou ao café. Nunca recorri a ele como a estimulante
cerebral” (Rui Barbosa); c) “Tem muitos amigos influentes mas não
recorre a eles nas horas difíceis”.
5. De Laudelino Freire, nesse aspecto, é idêntica lição: “Na língua
portuguesa existem verbos cujos complementos indiretos são
representados pela forma a ele em lugar de lhe. Isto ocorre, entre outros,
com assistir (estar presente), aspirar (desejar), recorrer (pedir auxílio),
que, recusando a forma lhe, tem os seus objetos indiretos expressos pela
forma a ele” (s/d, p. 7).
6. Nos textos de lei, de um modo geral, obedece-se às normas de
Gramática, empregando-se ora a construção recorrer de, ora recorrer
para, ora recorrer de… para. Exs.: a) “O réu não poderá recorrer da
pronúncia senão depois de preso, salvo se prestar fiança nos casos em
que a lei a admitir” (CPP, art. 585); b) “Ainda que o compromisso
contenha a cláusula sem recurso e pena convencional contra a parte
insubmissa, terá esta o direito de recorrer para o tribunal superior…”
(CC/1916, art. 1.046, revogado); c) “Da decisão do Delegado Regional
do Trabalho poderão os interessados recorrer, no prazo de dez (10)
dias, para o órgão de âmbito nacional competente em matéria de
segurança e medicina do trabalho…” (CLT, art. 161, § 3º).
7. Há, todavia, exemplos de emprego pelo legislador da construção recorrer
a, mas se vê claramente que seu exato sentido, em tais casos, é de buscar
socorro, e não na acepção técnica de interpor recurso: a) “A minoria
vencida na modificação dos estatutos poderá dentro de 1 (um) ano
promover-lhe a nulidade recorrendo ao juiz competente salvo o direito
de terceiros” (CC/1916, art. 29, em redação alterada pelo CC/2002); b)
“Os pais devem decidir em comum as questões relativas aos filhos e a
seus bens; havendo divergência, poderá qualquer deles recorrer ao juiz
para a solução necessária” (CC, art. 1.690, parágrafo único).
Ver Agravar retidamente ou Interpor agravo retido? (P. 100) e Sentença
recorrida – Está correto? (P. 690)
Recursar – Existe?
1. Trata-se de verbo empregado no sentido de recorrer, interpor recurso
judicial ou administrativo. Ex.: “Por preenchidos os requisitos legais o
réu poderá recursar em liberdade”.
2. Aos que possam vê-lo com estranheza, trata-se de palavra regularmente
registrada pelo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de
determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma (2009, p. 709), o
que implica concluir que seu emprego está oficialmente autorizado.
3. Atento ao linguajar jurídico, anota Adalberto J. Kaspary que, muito
embora se trate de neologismo já oficialmente aceito no vernáculo,
talvez até mesmo pela tradicional ausência de sua utilização, “em seu
lugar, recomenda-se, todavia, usar a forma recorrer, de longa tradição no
idioma e consagrada na linguagem técnico-jurídica” (1996, p. 279).
Recurso
Ver Interpor ou Opor? (P. 422)
Recurso adesivo
Ver Agravar retidamente ou Interpor agravo retido? (P. 100)
Redimir
1. Porque há pessoas que o confundem, quanto à conjugação verbal, talvez
por influência de seu problemático sinônimo remir, lembra Sousa e Silva
que ele “não é defectivo: emprega-se em todos os modos, tempos e
pessoas” (1958, p. 254).
2. Além disso, trata-se de verbo regular, que não apresenta dificuldade
alguma quanto à flexão: redimo, redimes, redime, redimimos, redimis,
redimem (presente do indicativo); redima, redimas, redima, redimamos,
redimais, redimam (presente do subjuntivo); redimi, redimiste, redimiu,
redimimos, redimistes, redimiram (pretérito perfeito do indicativo)…
Refém
1. “Do árabe rehén, entende-se a pessoa que é entregue ou fica em poder de
outrem, como garantia do cumprimento de um ajuste ou tratado, ou que
se entrega como penhor de fidelidade” (DE PLÁCIDO E SILVA, 1989,
p. 62). Ex.: “Os presos amotinados mantiveram o juiz de direito da
cidade como refém ao longo de toda a negociação”.
2. Atente-se a que, quanto à prosódia, é palavra oxítona, devendo por lei,
em virtude de sua terminação, receber acento gráfico.
3. Registre-se, a esse respeito, a lição de Silveira Bueno no sentido de que,
quanto à prosódia, não apenas se deve conferir ao vocábulo pronúncia
oxítona (BUENO, 1938, p. 10), mas, sendo ele oxítono e agudo, tem
acento na última sílaba, e rima com alguém, ninguém, porém (BUENO,
1938, p. 91).
Referendo ou Referendum?
1. Segundo o dicionário de Aurélio Buarque de Holanda, referendo é o
“direito que tem os cidadãos de se pronunciar diretamente a respeito das
questões de interesse geral” (1986, p. 1.470).
2. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras – que é o veículo ordenador do modo de grafar as
palavras em nosso idioma – registra referendo (VOLP, 2009, p. 711),
motivo pelo qual está autorizado o seu normal emprego.
3. Quanto a referendum, Antonio Henriques (1999, p. 171) o reputa
“sobrevivência do particípio futuro passivo latino (gerundivo) em
português como substantivo”, lembrando-lhe a “conotação jurídica”, e
conceituando-o como o ato de “levar alguma proposta, submetê-la à
decisão de outro poder”, como observa transparecer na expressão ad
referendum.
4. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa considera referendum
palavra ainda pertencente ao idioma latino (ACADEMIA BRASILEIRA
DE LETRAS, 2009, p. 863), motivo por que não o acentua (o que seria
obrigatório, se já estivesse incorporado ao nosso léxico, a semelhança de
álbum, como paroxítona terminada em um), e lhe indicava, até sua
edição de 1999, o plural referenda (p. 642), flexão não repetida nas
edições de 2004 e 2009.
5. Por ser vocábulo não pertencente a nossa língua, há de ser grafado entre
aspas ou de qualquer modo indicador de tal circunstância, como itálico,
negrito ou sublinha.
Para maiores observações sobre a conveniência de sua perfeita
integração ao vernáculo, incluindo a formação de seu plural, ver
Memorândum – Qual é o plural? (P. 468)
Reforço de próclise
Ver Se me não falha a memória ou Se não me falha a memória? (P. 684)
Refrega
1. Tem o sentido de luta, disputa, batalha. Ex.: “Em meio à árdua refrega
os dois advogados debatiam bravamente”.
2. Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 19) lembra que o timbre de sua vogal
tônica é aberto (é).
3. Ante a frequência com que ocorrem erros em sua pronúncia, também
Cândido de Oliveira (s/d, p. 33 e 129) lembra que sua sílaba tônica é
pronunciada com o e aberto (é).
Regências diversas
Ver Contra ou a favor (P. 228), Regência verbal (P. 651) e Verbos com
regências diversas (P. 760).
Regência verbal
1. Estuda o problema da complementação do verbo, da exigência ou não de
preposições antecedendo tais complementos e das construções
específicas relacionadas aos verbos.
2. Algumas observações gerais, explicitadas a seguir, podem ser de grande
utilidade.
3. Os pronomes o, a, os, as funcionam como objetos diretos: “Estimo os
amigos” (“Estimo-os”).
4. Os pronomes lhe, lhes funcionam como objetos indiretos: “O livro
pertence ao magistrado” (“O livro pertence-lhe”).
5. Alguns verbos, embora transitivos indiretos, não admitem lhe como
complemento: a) “Aludi a ele”; b) “Aspiro a ele” (no sentido de
pretender); c) “Assisti a ele” (no significado de ver, presenciar); d)
“Dependo dele”; e) “Recorri a ele”; f) “Referi-me a ele”.
6. Se não se sabe ao certo se um verbo é transitivo direto ou transitivo
indireto, caminho bastante prático é usá-lo na voz passiva: se tal for
possível, o verbo normalmente será transitivo direto; caso contrário, não
o será: a) assim, “Eu estimo os amigos” fica, na voz passiva, “Os amigos
são estimados por mim”; b) já “O livro pertence-lhe” não admite
passagem para a voz passiva.
7. O verbo obedecer é a exceção, pois, embora transitivo indireto, admite,
por questões históricas, ser empregado na voz passiva: a) “O magistrado
também obedece ao ordenamento”; b) “O magistrado também lhe
obedece”; c) “O ordenamento jurídico é obedecido também pelo
magistrado”.
8. Se um verbo, como aspirar, às vezes é transitivo direto (no sentido de
cheirar), às vezes é transitivo indireto (quando quer significar pretender),
na primeira acepção pode ser usado na voz passiva, mas não na segunda.
Exs.: a) “A moça aspira o perfume” (correto); b) “O perfume é aspirado
pela moça” (correto); c) “A moça aspira ao cargo” (correto); d) “O
cargo é aspirado pela moça” (errado).
Ver Aludir (P. 106), Contra ou a favor (P. 228), Em seis – Está correto? (P.
316), Omissão da preposição – Está correto? (P. 526), Pagar (P. 541), Pedir
para (P. 553), Perdoar (P. 559), Recorrer (P. 647), Só – Como concordar? (P.
706), Todo ou Todo o? (P. 740) e Verbos com regências diversas (P. 760).
Registar – Existe?
1. É importante anotar, mais uma vez, que a autoridade para listar as
palavras oficialmente existentes em nosso léxico é o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de
Letras, órgão esse que tem a responsabilidade legal de controlar a
existência de nossas palavras, em cumprimento à velha Lei Eduardo
Ramos, de n. 726, de 8/12/1900.
2. Isso significa, de um modo geral, que, se o VOLP traz determinado
vocábulo como integrante de nosso idioma, então essa palavra
oficialmente existe para nós; em caso contrário, se ele não a registra, não
estamos autorizados a empregá-la na linguagem formal das petições,
arrazoados e pareceres.
3. Com essas observações iniciais, é preciso dizer, de modo específico que,
a par de registrado, registrador, registradora, registrar, registrável e
registro, o VOLP também traz como formas existentes em nosso léxico
registado, registador, registadora, registar, registável e registo
(ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 712).
4. Isso quer dizer que tais palavras sem o r existem em nosso idioma e
apenas são variações daquelas com o r, delas sinônimas e passíveis de
emprego normal, sem outras preocupações.
Registre-se ou Registra-se?
1. Um leitor narra que é comum ler em petições “registre-se”, “frise-se” e
“note-se”. Mas lhe parece que, tais como escritas, essas formas misturam
um aspecto de imperativo, o que ele não sabe se está certo. E indaga se,
no sentido de que algum ponto apenas deva ser registrado, frisado ou
notado, o melhor não seria “registra-se”, “frisa-se” e “nota-se”.
2. Faça-se o seguinte raciocínio: a) o exemplo “O imóvel foi registrado”
está na voz passiva analítica; b) tem-se, no caso, voz passiva, porque o
sujeito (imóvel) recebe a ação indicada pelo verbo (registrar); c) seria
voz ativa, se o sujeito praticasse a ação indicada pelo verbo (O Cartório
registrou o imóvel); d) existe uma outra forma de voz passiva, que é a
voz passiva sintética; e) para formar a voz passiva sintética, põe-se o
verbo na forma ativa (registrou) e se acrescenta o se, que passa a ter a
função de partícula apassivadora; f) assim, a voz passiva analítica “O
imóvel foi registrado” tem, como voz passiva sintética, “Registrou-se o
imóvel”; g) se a voz passiva analítica fosse “Os imóveis foram
registrados”, a voz passiva sintética seria “Registraram-se os imóveis”.
3. Vejam-se as variações dessa expressão, conforme o tempo e o modo em
que se queira empregar o verbo registrar: a) se a voz passiva analítica é
“O imóvel é registrado”, a voz passiva sintética é “Registra-se o
imóvel”; b) se a analítica é “O imóvel era registrado”, a sintética é
“Registrava-se o imóvel”; c) para a analítica “O imóvel será registrado”,
tem-se a sintética “Registrar-se-á o imóvel”; d) para a forma imperativa
“O imóvel seja registrado”, tem-se a sintética “Registre-se o imóvel”.
4. Respondendo de modo prático à indagação do leitor, tem-se, num
primeiro aspecto, que, se o que se quer é uma forma imperativa,
resultante de efetiva determinação de autoridade, têm-se as seguintes
formas sintéticas no chamado modo imperativo: a) “Registre-se o
imóvel”; b) “Frise-se este ponto de vista”; c) “Note-se este aspecto
importante”. Correspondem elas às seguintes formas analíticas: i) “O
imóvel seja registrado”; ii) “Este ponto de vista seja frisado”; iii) “Este
aspecto importante seja notado”.
5. Se, porém, o que se quer é apenas indicar um fato que ocorre no
momento em que se fala, sem carga nenhuma de ordem ou
determinação, então se têm as formas sintéticas no chamado modo
indicativo: a) “Registra-se o imóvel”; b) “Frisa-se este ponto de vista”;
c) “Nota-se este aspecto importante”. Correspondem elas às seguintes
formas analíticas: i) “O imóvel é registrado”; ii) “Este ponto de vista é
frisado”; iii) “Este aspecto importante é notado”.
6. Por fim, embora não seja difícil perceber, parece oportuno realçar que a
voz passiva sintética (e, assim, o se como partícula apassivadora)
coexiste normalmente com a forma verbal no imperativo.
Registro ou Registo?
1. Registro é palavra de grande uso nos meios forenses, como nas
expressões Registro Civil, Registro de Imóveis.
2. São defensíveis, em português, as formas registro e registo.
3. A segunda, lembra Aires da Mata Machado Filho, com base em lição de
Leite de Vasconcelos, veio da primeira “pela dissimilação do r, o que
igualmente aconteceu em rosto, do português antigo rostro, do latim
rostrum” (1969i, p. 14).
4. Entre vocábulos como registro e registo, observa Silveira Bueno que
“não há diferença alguma; são formas paralelas igualmente corretas… A
forma antiga foi sempre: registro e registrar; no latim medieval o snr.
encontra registrum. Houve depois a dissimilação do r em s, dando a
forma registo e registar. Por antiguidade, pois, registro e registrar
deveriam ser preferidos. Mas o tempo caminha e as línguas o
acompanham e por isso muitos preferem registo e registar” (1938, p.
52).
5. Lembra Cândido de Figueiredo que a forma registro corresponde ao
francês registre, ao castelhano e ao italiano registro, mas observa que “a
etimologia da palavra não é registrum, que só existiu no latim bárbaro,
mas sim regestum, plural regesta, onde se não vê o segundo r de
registro” (1941, p. 294-5).
6. Ainda quanto à duplicidade de formas – registro e registo –, aduz
Silveira Bueno que “aquela é mais antiga do que esta porque o grupo tr
tende sempre a perder a vibrante: rostro, rosto; rastro, rasto”.
7. Estendendo a mesma lição para registrar e registar, assevera o referido
autor, em continuação, que “o fato de registro ser mais antigo não quer
dizer que seja errado: está em pleno uso ainda hoje”.
8. Por fim, dá ele um conselho útil: “o que se deve fazer é fixar uma das
variantes para se ter uniformidade” (BUENO, 1957, p. 411).
9. Em preciosa síntese, lembra Eliasar Rosa que, muito embora haja
pessoas que escrupulizam em usar alguma das duas formas, “os clássicos
antigos e modernos usam quer uma, quer outra dessas grafias” (1993, p.
121-2).
10. Eliminando possibilidades de dúvida, o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras – que é o veículo
oficial indicador das palavras existentes em nosso idioma – registra
ambas as variantes (registro e registo), sem restrição alguma ou
observação específica (2009, p. 712), o que implica dizer que ao
usuário se faculta o emprego indiferente de qualquer delas.
Regras de abreviatura
Ver Abreviatura, Abreviação e Sigla – O que é e Como usa? (P. 55)
Regras de ortografia
1. Ortografia é a parte da Gramática que ensina a escrever corretamente.
2. Algumas regras e observações podem ser preciosas para a concretização
de tal intento, como se verifica em seguida.
3. Os substantivos que derivam de adjetivos devem ser grafados com ez,
eza: macio, safado, belo (adjetivos) fazem maciez, safadeza, beleza
(substantivos derivados).
4. Os adjetivos que derivam de substantivos devem ser grafados com ês,
esa: monte, corte, França (substantivos) fazem montês, cortês, francesa
(adjetivos derivados).
5. Se é preciso acrescentar o sufixo izar inteiro para formar um verbo,
grafa-se com z: fiscal, útil (primitivas) fazem fiscalizar, utilizar
(derivadas).
6. No caso da observação anterior, porém, se já existe s no radical, deve ser
ele aproveitado: análise, pesquisa, catálise (primitivas) fazem analisar,
pesquisar, catalisar.
7. Os verbos em uir só podem dar origem à terminação ui na segunda e
terceira pessoas do singular do presente do indicativo: possuir, constituir,
restituir, (primitivas) fazem possuis, possui, constituis, constitui,
restituis, restitui (derivadas), sendo errôneas formas como possue,
constitue, restitue.
8. Os verbos em uar só podem dar origem à terminação ue, jamais ui:
continuar, atenuar, averiguar (primitivas) fazem continue, atenue,
averigúe (derivadas), e não continui, atenui, averigúi.
9. As palavras derivadas conservam, geralmente, os aspectos de grafia da
primitiva: deus, cruz, loja, brasa (primitivas) fazem endeusar,
encruzilhada, lojista, abrasar (derivadas).
10. Um aspecto a que poucos dão atenção, mas que configura item de
muitos erros, é observado por Pasquale Cipro Neto e Ulisses Infante
(1999, p. 131): “Compare a terceira pessoa do plural do pretérito
perfeito do indicativo com a terceira pessoa do plural do futuro do
presente: a primeira é paroxítona e termina em am (estudaram,
venderam, permitiram); a segunda é oxítona e termina em ão
(estudarão, venderão, permitirão)”.
Ver Mau ou Mal? (P. 464), Ortografia (P. 533), Parônima (P. 551) e Por que,
Por quê, Porque ou Porquê? (P. 581)
Regredir
1. Quanto à conjugação verbal, a irregularidade desse verbo consiste em
que o e da penúltima sílaba transforma-se em i nas formas rizotônicas
bem como nas formas daí derivadas.
2. Desse modo, assim é seu presente do indicativo: regrido, regrides,
regride, regredimos, regredis, regridem.
3. Da primeira pessoa do singular do presente do indicativo se extrai o
presente do subjuntivo: regrida, regridas, regrida, regridamos,
regridais, regridam.
4. E de ambos os tempos formam-se o imperativo afirmativo e o imperativo
negativo: regride, regrida, regridamos, regredi, regridam (imperativo
afirmativo); não regridas, não regrida, não regridamos, não regridais,
não regridam (imperativo negativo).
5. Atente-se, porém, ao pretérito perfeito do indicativo, do qual derivam o
mais-que-perfeito do indicativo, o imperfeito do subjuntivo e o futuro do
subjuntivo, todos integrados por formas arrizotônicas, nos quais não se
apresenta problema algum digno de nota, sendo, então, verbo regular:
regredi, regrediste, regrediu, regredimos, regredistes, regrediram.
6. De Francisco Fernandes, que lhe dá por modelo agredir, é interessante
síntese: “Muda o e em i em todas as formas rizotônicas” (1971, p. 61).
7. Seguem idêntica conjugação os seguintes verbos: agredir, denegrir,
prevenir, progredir, transgredir.
Regulamento
Ver Decreto-lei (P. 253).
Reinicializar – Existe?
Ver Verbos – Existem ou não? (P. 764)
Reintegração
1. Na consonância com lição de Luciano Correia da Silva, “‘reintegra-se
na posse’. Por isso é que se diz também ‘reintegração na posse’. O
mesmo ocorre com manutenção e imissão: ‘manutenção ou imissão na
posse’” (1991, p. 92).
2. Segue esse entendimento o art. 1.210, § 2º, do Código Civil: “Não obsta
à manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade, ou
de outro direito sobre a coisa…”
3. Levanta Francisco Fernandes (1969, p. 329), todavia, a possibilidade de
dupla construção, vale dizer, com de ou com em: a) “Reintegração de
bens” (Caldas Aulete); b) “Sua reintegração na sociedade carioca
coincidira infelizmente com o ofuscamento político do marido” (Veiga
Miranda); c) “Reintegração num cargo, num posto”.
4. Celso Pedro Luft ainda levanta a possibilidade de emprego de
complemento regido pela preposição a: “Acordo capaz de permitir a
reintegração do Brasil ao sistema internacional” (1999, p. 439).
Reintegrar
1. Quanto à regência verbal, Celso Pedro Luft leciona que, como transitivo
direto e indireto, corresponde à construção reintegrar alguém em alguma
coisa. Ex.: “O reitor reintegrou nas cátedras os professores demitidos”
(1999, p. 445).
2. Francisco Fernandes defende igual posicionamento, abonando-se com
exemplo de Rui Barbosa: “… reintegrasse os lentes nos quadros do
magistério” (1971, p. 508).
3. Atento ao linguajar jurídico, Adalberto J. Kaspary sintetiza de mesmo
modo sua regência: “constrói-se com objeto direto (sujeito na voz
passiva) de pessoa, ou com objeto direto de pessoa e indireto de coisa,
com a preposição em (reintegrar alguém, ou reintegrar alguém em
alguma coisa)”. Exs.: a) “Demitiram-no mas em obediência a ordem
judicial acabaram reintegrando-o”; b) “O novo diretor reintegrou nas
cátedras os professores demitidos”.
4. Acrescenta tal autor, entretanto: “Na Lei 7.210, de 11/7/1984 (Lei de
Execução Penal), art. 25, I, aparece a construção reintegrar alguém a
alguma coisa: ‘A assistência ao egresso consiste: I – na integração e
apoio para reintegrá-lo à vida em liberdade’” (KASPARY, 1996, p.
283).
Réis ou Reis?
Ver Ditongos éi, ói, éu – Quando acentuar? (P. 292)
Reivindicar ou Revindicar?
1. É preciso cuidado com a ortografia dessa palavra e de seus cognatos,
para não se inserir nelas um n inexistente: reivindicação, reivindicar e
reivindicatória, assim, são as formas corretas; jamais se há de dizer ou
escrever reinvindicação, reinvindicar ou reinvindicatória.
2. Trata-se de palavra cujo primeiro elemento, “rei” (genitivo de res, da
quinta declinação latina, significando da coisa), não se faz seguir de n no
idioma original.
3. Muito embora pela etimologia (“rei”) seja mais usual a escrita e a
pronúncia com o i intermédio (reivindicação, reivindicar,
reivindicatória), o certo é que o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão oficialmente
incumbido de listar as palavras pertencentes ao nosso léxico, também
registra revindicação, revindicar e revindicatória, o que significa estar
oficialmente autorizado o uso de ambas as grafias (2009, p. 713 e 721).
4. Com a acepção de reclamar judicialmente a coisa, é empregado por
mais de uma vez no Código Civil de 1916: a) “Na propriedade em
comum, compropriedade, ou condomínio, cada condômino ou consorte
pode: … II – Reivindicá-la de terceiro” (art. 623, II); b) “Aquele cujo
nome se acha inscrito no título presume-se dono e pode reivindicá-lo de
quem quer que injustamente o detenha” (art. 1.510, segunda parte).
5. Essa também a acepção em dispositivos do Código Civil de 2002: a)
“Cancelado o registro, poderá o proprietário reivindicar o imóvel,
independentemente da boa-fé ou do título do terceiro adquirente” (CC,
art. 1.247, parágrafo único); b) “Cada condômino pode usar da coisa
conforme sua destinação, sobre ela exercer todos os direitos compatíveis
com a indivisão, reivindicá-la de terceiro, defender a sua posse e alhear
a respectiva parte ideal, ou gravá-la” (CC, art. 1.314, caput).
Remarcável – Galicismo?
1. No sentido de notável, é vocábulo que Eduardo Carlos Pereira insere no
rol dos galicismos léxicos, daqueles que “são verdadeiras deturpações da
língua, contra os quais devemos estar premunidos” (1924, p. 260-1).
2. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, veículo oficial indicador das palavras existentes em
nosso idioma, registra-a, todavia, normalmente como adjetivo integrante
de nosso léxico (2009, p. 714), o que significa que seu uso está
regularmente autorizado em nosso idioma.
Remediar
1. Os verbos terminados em iar, quanto à conjugação verbal, normalmente
são verbos regulares e têm por modelo anunciar.
2. São exceções a essa regularidade de conjugação mediar, ansiar,
remediar, incendiar e odiar (mnemônico MARIO), os quais têm por
modelo este último.
3. Tais verbos da relação mencionada mudam o i da penúltima sílaba em ei
nas formas rizotônicas (isto é, no presente do indicativo, presente do
subjuntivo, imperativo afirmativo e imperativo negativo): remedeio,
remedeias, remedeia, remediamos, remediais, remedeiam (presente do
indicativo); remedeie, remedeies, remedeie, remediemos, remedieis,
remedeiem (presente do subjuntivo); remedeia, remedeie, remediemos,
remediai, remedeiem (imperativo afirmativo); não remedeies, não
remedeie, não remediemos, não remedieis, não remedeiem (imperativo
negativo).
4. Como nos demais tempos não há formas rizotônicas, neles não se dá a
referida alteração: remediei (pretérito perfeito do indicativo), remediara
(pretérito mais-que-perfeito), remediar (futuro do subjuntivo),
remediasse (imperfeito do subjuntivo), remediava (imperfeito do
indicativo), remediarei (futuro do presente), remediaria (futuro do
pretérito), remediando (gerúndio), remediado (particípio).
5. Não confundir com os verbos terminados por ear, como nomear, os
quais, nesse aspecto, como todo verbo terminado por ear, recebem um i
intermediário nas formas rizotônicas: nomeio, nomeias, nomeia,
nomeamos, nomeais, nomeiam (presente do indicativo); nomeie,
nomeies, nomeie, nomeemos, nomeeis, nomeiem, (presente do
subjuntivo); nomeia, nomeie, nomeemos, nomeai, nomeiem (imperativo
afirmativo); não nomeies, não nomeie, não nomeemos, não nomeeis, não
nomeiem (imperativo negativo).
6. Vale sintetizar os problemas de flexão do verbo aqui considerado com as
observações de Vitório Bergo: “recebe um e eufônico nas formas
rizotônicas, que só se manifestam no presente do indicativo e do
subjuntivo e, portanto, no imperativo” (1943, p. 142-3).
Remeter
1. No sentido de sujeitar, expor, exige tal verbo objeto direto e objeto
indireto, correspondendo à construção remeter algo a algo, ou remeter
alguém a algo.
2. Acata esse posicionamento Francisco Fernandes (1971, p. 511), que se
abona em exemplo de Filinto: “Tendo por incomportável remeter a um
funesto destroço tão abonada valentia”.
3. É comum, nesse sentido, dizer-se, em linguagem jurídica: “Remeter
alguém às vias ordinárias”.
4. Também se usa, em tal caso, a preposição para, como em “Remeter
alguém para os meios ordinários”, como preferiu o Código de Processo
Civil (arts. 984, 1.000, parágrafo único, e 1.016, § 2º).
5. Não encontra suporte nos modelos da língua, porém, o uso tomado pelo
art. 19, § 2º, da Lei 6.766, de 19/12/79, que dispôs sobre o parcelamento
do solo urbano, que assim determinou: “Ouvido o Ministério Público no
prazo de 5 (cinco) dias, o juiz decidirá de plano ou após instrução
sumária, devendo remeter ao interessado as vias ordinárias, caso a
matéria exija maior indagação”.
6. O correto, em tal caso, há de ser: “… devendo remeter o interessado às
vias ordinárias…”
Remir
1. Do latim redimere, tem por sinônimo redimir e significa resgatar, pagar,
liberar, livrar, trazendo em si a ideia de pagamento, de reaquisição a
título oneroso. Ex.: “Para remir o homem, precisou haver trabalho
divino”.
2. Com esse mesmo sentido no campo jurídico, fala-se, assim, em remir a
execução (depositar judicialmente o valor do débito, que extingue a
execução), em remir bens do executado (exonerar da penhora bens
gravados, mediante depósito do valor da avaliação). Ex.: “É lícito ao
cônjuge, ao descendente, ou ao ascendente do devedor remir todos ou
quaisquer bens penhorados, ou arrecadados no processo de insolvência,
depositando o preço por que foram alienados ou adjudicados”
(CPC/1973, art. 787, caput).
3. É verbo para indicar remição (resgate, liberação a título oneroso), e não
remissão, que significa perdão.
4. Não confundir com remitir, que significa perdoar.
5. Quanto à conjugação verbal, trata-se de verbo defectivo, o qual, para
Otelo Reis (1971, p. 148), apenas é conjugado nas formas em que, ao m
do radical, se segue a vogal i: remimos, remis, remia, remi, remira,
remirei, remiria, remisse, remindo, remido, devendo as formas que lhe
faltam ser supridas pelas do verbo redimir, que é conjugado em todas as
pessoas: redimo, redimes…
6. Cândido de Oliveira (1961, p. 212) também observa que tal verbo é
defectivo e que, nas formas faltantes, há de ser complementado por
redimir.
7. Desse entendimento também é Sousa e Silva (1958, p. 254).
8. Em lição que não afeta a estruturação prática, mas apenas influencia a
disciplina teórica da conjugação, Alfredo Gomes assevera que tal verbo
não é defectivo, porquanto “remir e redimir são formas diversas do
mesmo vocábulo latino (redimere); por isso remir tem as seguintes
formas no presente do indicativo: redimo, redimes, redime, remimos,
remis, redimem; no imperativo: redime, remi; no subjuntivo presente:
redima, redimas, redima, redimamos, redimais, redimam” (1924, p. 121).
Com a devida vênia do ilustre autor, não há como concordar com ele. Se,
em latim, remir e redimir eram formas do mesmo vocábulo, tal não se dá
em Português, em que devemos considerar a existência de dois verbos
distintos, cada qual com sua conduta e sua conjugação, e isso
independentemente da circunstância de um deles provir do outro.
9. Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 91), reconhecendo-lhe a defectividade,
assevera que ele “só possui as formas arrizotônicas”, complementando
que “as formas que lhe faltam são supridas com as do verbo sinônimo
redimir”.
10. Em termos práticos, outra não é a lição de Francisco Fernandes (1971,
p. 512), forte em lição de Ernesto Carneiro Ribeiro, que traz as
seguintes observações: a) “Emprega-se nas formas em que aparece a
vogal i após o m do radical”; b) “Para suprir as linguagens de que
carece o verbo remir, por se equivocarem com as do verbo rimar,
recorre nossa língua às formas do verbo redimir, de que é aquele
apenas uma síncope”.
11. Das lições lançadas, em termos práticos, vê-se que seus problemas de
conjugação restringem-se ao presente do indicativo e tempos daí
derivados.
12. No presente do indicativo, apresenta remimos e remis.
13. Não tem pessoa alguma do presente do subjuntivo.
14. No imperativo afirmativo, tem apenas remi (vós).
15. Por não ter presente do subjuntivo, não apresenta pessoa alguma do
imperativo negativo, que deriva na totalidade do primeiro, sem
alteração alguma.
16. Em todos os demais tempos, aparece um i após o radical: remi
(pretérito perfeito do indicativo), remira (pretérito mais-que-perfeito do
indicativo), remisse (imperfeito do subjuntivo), remir (futuro do
subjuntivo), remia (pretérito imperfeito do indicativo), remirei (futuro
do presente), remiria (futuro do pretérito), remindo (gerúndio), remido
(particípio). Nesses tempos, não há dificuldade para a conjugação.
17. Gladstone Chaves de Melo (1970, p. 165), todavia, mantém
ensinamento diverso dos anteriormente explicitados, e assevera que
falta ao verbo apenas a primeira pessoa do singular do presente do
indicativo e, por conseguinte, todas as pessoas do presente do
subjuntivo, motivo por que, para ele, no presente do indicativo, assim é
sua conjugação: rimes, rime, remimos, remis, rimem.
18. De acordo com essa lição, passaria a existir também a segunda pessoa
do singular do imperativo afirmativo (rime tu).
19. Em mesma esteira, observam Antonio Henriques e Maria Margarida de
Andrade que “há quem admite a conjugação integral”, coletando
significativos exemplos: a) “Almas e corpos se rimem, almas e corpos
se resgatam; mas as almas resgatam-se por amor de si mesmas, e os
corpos por amor das almas” (Padre Vieira); b) “Rime do infando
incêndio a pia armada / Poupa inocentes, nossa causa atende”
(Odorico Mendes).
20. Indo ainda além, recorda Adalberto J. Kaspary (1996, p. 286) a posição
de Albertina Fortuna Barros e Zélio dos Santos Jota, “que advogam o
emprego de remir em todas as suas formas, dando-lhe flexão idêntica a
do verbo agredir: rimo, rimes, rime, remimos, remis, rimem…”.
21. Por fim, é interessante observar que, nos textos de lei, tal verbo
aparece, invariavelmente, no infinitivo, como se pode observar nos
artigos 766 e 814 do Código Civil de 1916 (mantido o vocábulo no
caso do primeiro dispositivo, substituído pelo art. 1.429 do CC/2002),
651, 787 e 788 do Código de Processo Civil, 278 do Código
Comercial, 266 da Lei 6.015, de 31/12/73, 126 da Lei 7.210, de
11/7/84.
Remissão ou Remição?
Ver Remição ou Remissão? (P. 655)
Remisso
1. Observando que tal vocábulo “relaciona-se etimologicamente com
remitir, mas adquiriu significado diverso”, leciona Geraldo Amaral
Arruda que, “nas leis, aparece frequentemente o adjetivo remisso, mas
ele tem o sentido de descuidado, negligente, relapso”.
2. E exemplifica Geraldo Amaral Arruda (1997, p. 144) que “com esse
significado aparece ele no Código Comercial (arts. 278, 289 e 578), no
Código de Processo Civil (arts. 433, na sua redação original, e 695, § 3º)
e no Código de Processo Penal (art. 319, I)”.
3. É exatamente com esse sentido que também é empregado em outros
dispositivos de nossa legislação: a) “Verificada a mora, poderá a
maioria dos demais sócios preferir, à indenização, a exclusão do sócio
remisso, ou reduzir-lhe a quota ao montante já realizado, aplicando-se,
em ambos os casos, o disposto no § 1º do art. 1.031” (CC/2002, art.
1.004, parágrafo único); b) “Não integralizada a quota de sócio remisso,
os outros sócios podem, sem prejuízo do disposto no art. 1.004 e seu
parágrafo único, tomá-la para si ou transferi-la a terceiros, excluindo o
primitivo titular e devolvendo-lhe o que houver pago, deduzidos os juros
da mora, as prestações estabelecidas no contrato mais as despesas”
(CC/2002, art. 1.058); c) “Se remisso for o perito nomeado pelo juiz, este
o substituirá, impondo-lhe multa…” (CPC/1973, art. 433, em redação
revogada pela Lei 8.455, de 24/8/92); d) “Se o arrematante ou seu fiador
não pagar o preço no prazo estabelecido, o juiz impor-lhe-á em favor do
exequente, a perda da caução, voltando os bens a nova praça ou leilão,
dos quais não serão admitidos a participar o arrematante e o fiador
remissos” (CPC/1973, art. 695, em redação conferida pela Lei
11.382/2006).
Ver Remição ou Remissão? (P. 655), Remir (P. 656) e Remitir (P. 658).
Remitir
1. Do latim remittere, significa perdoar, dispensar, não exigir, renunciar, e
traz em si a ideia de graciosidade da liberação. Ex.: “Era preciso haver
divina liberalidade para remitir o pecado do homem”.
2. Com esse mesmo significado no campo jurídico, vê-se que remitir uma
dívida é perdoá-la, é renunciar ao direito de sua cobrança; remitir uma
pena é dispensar-lhe o cumprimento, no todo ou em parte, mediante
concessão de graça ou indulto. Exs.: a) “Se um dos credores remitir a
dívida, a obrigação não ficará extinta para com os outros; mas estes só
a poderão exigir, descontada a quota do credor remitente” (CC, art.
262); b) “O credor que tiver remitido a dívida ou recebido o pagamento
responderá aos outros pela parte que lhes caiba” (CC, art. 272).
3. Trata-se de verbo para indicar a ação de remissão, com o sentido de
perdão, e não de remição, que significa resgate.
4. Não confundir com remir, que significa resgatar, readquirir por título
oneroso.
5. Não apresenta problemas quanto à conjugação, já que se flexiona com
regularidade em todas as pessoas, tempos e modos.
Remontar
1. Indaga-se qual a forma correta: a) “Esta tradição remonta a quatro mil
anos”; b) “Esta tradição remonta há quatro mil anos”.
2. O verbo remontar, quando tem o sentido de ir buscar a origem ou a data,
pede um objeto indireto que seja começado pela preposição a. Exs.: a)
“As cruzadas remontam à Idade Média” (Cândido de Figueiredo); b)
“Remontemos à época dos visigodos” (Séguier); c) “É próprio do
historiador remontar ao passado”.
3. É certo que o verbo haver pode significar tempo passado em expressões
que guardam algum ponto comum de sentido com a ideia de remontar.
Exs.: a) “Há vários dias não leio os jornais”; b) “O advogado chegou há
duas horas”.
4. Veja-se, contudo, que o verbo haver, em tais casos, pode, normalmente,
ser substituído por fazer. Exs.: a) “Faz vários dias não leio os jornais”;
b) “O advogado chegou faz duas horas”.
5. Sem maiores dificuldades, é forçosa a conclusão de que, quando se
emprega o verbo remontar, inviável é tal substituição do a por alguma
forma do verbo fazer.
6. Ou seja, de modo específico para a indagação analisada: a) “Esta
tradição remonta a quatro mil anos” (correto); b) “Esta tradição
remonta há quatro mil anos” (errado).
Renomado – Galicismo?
1. Para Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 275), trata-se de galicismo
a ser evitado.
2. Tem por sinônimos acreditado, afamado, celebrado, conhecido,
nomeado.
3. Também Aires da Mata Machado Filho (1969h, p. 1.161-2) o reputa
“galicismo desnecessário, cópia fiel do francês renommé”, motivo por
que preconiza se usem seus sinônimos conceituado, famoso, célebre, ou
mesmo a locução de nomeada.
4. Silveira Bueno (1957, p. 408), de igual modo, considera “um dos
galicismos de mais feia catadura o tal renomado de que tanto gostam os
que não sabem ou não querem saber a nossa língua”; reputa-o “má
tradução do francês renommé, ao qual corresponde o legítimo afamado”.
5. Anote-se, para registro, que, em obra utilíssima para os operadores do
Direito, Antonio Henriques e Maria Margarida Andrade (1999, p. 49)
empregam normalmente o vocábulo discutido: “Vários e renomados
autores (Rui Barbosa, Cândido de Figueiredo, João Ribeiro et al.)
rejeitam o sentido de necessitar, precisar para carecer”.
6. E ultime-se com a observação de que o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras – que é o veículo
oficial indicador das palavras existentes em nosso idioma – registra-a
normalmente como adjetivo (2009, p. 715), o que significa que seu uso
está regularmente autorizado em nosso idioma, como palavra
perfeitamente integrada ao nosso léxico.
Renunciar
1. A um consulente que perguntava qual a forma correta – renunciar o
mandato ou renunciar ao mandato – Pedro A. Pinto respondia que, pelos
“sabedores da língua”, ambas as formas eram corretas, muito embora
inferisse ele ser mais corrente o primeiro uso, como transitivo direto.
2. Em termos históricos, lembra o citado gramático que “Rui Barbosa
escrevia de ambas as maneiras, quer o verbo significasse resignar,
abdicar, quer correspondesse a recusar, não aceitar, não querer”
(PINTO, 1924, p. 229).
3. Também na lição de Vitório Bergo, esse verbo, com o sentido de rejeitar,
pode ser transitivo direto ou transitivo indireto, muito embora seja “esta
última a regência preferida no português moderno” (1944, p. 206).
4. Em mesma esteira, Carlos Góis e Herbert Palhano (1963, p. 148-9), sem
indicação de preferência alguma, arrolam tal verbo entre aqueles que
admitem dupla regência, podendo ser construído ou com objeto direto ou
com objeto indireto. Exs.: a) “Renunciar o poder”; b) “Renunciar ao
poder”.
5. Desse posicionamento não destoa Artur de Almeida Torres, que é
taxativo para afirmar: “em qualquer das suas acepções, constrói-se,
indiferentemente, como transitivo direto ou indireto”.
6. Funda-se tal gramático (TORRES, 1967, p. 249), para assim afirmar, em
exemplos de regências distintas de um mesmo escritor modelar: a)
“Renunciar a missão oficial” (Rui Barbosa); b) “… uma das duas casas
do congresso teria de renunciar à sua participação legítima e
indispensável na redação do Código Civil” (Rui Barbosa).
7. Para Domingos Paschoal Cegalla, “no português de hoje prefere-se a
regência indireta: renunciar ao cargo; renunciar ao poder; renunciar à
violência; renunciar aos prazeres mundanos” (1999, p. 354).
8. Também Sousa e Silva é pela dupla possibilidade de regência desse
verbo: “quando tem objeto, vai com a preposição a ou sem preposição:
‘renunciou ao cargo’ ou ‘renunciou o cargo’”.
9. E complementa tal autor que esse verbo também pode ser empregado
intransitivamente. Ex.: “O prefeito renunciou” (SILVA, A., 1958, p.
255).
10. É interessante anotar que se encontram exemplos de seu emprego como
transitivo indireto, mas seguido da preposição de. Ex.: “…renunciando
com prazer dessa honra em quem melhor do que eu o representasse”
(Rui Barbosa).
11. Para Francisco Fernandes, independentemente de qual seja sua
acepção, é facultativo o emprego desse verbo como transitivo direto ou
como transitivo indireto, apenas observando tal autor que “a regência
com objeto indireto é a mais frequente hoje em dia” (1971, p. 514).
12. Essa também é a lição de Celso Pedro Luft: a) “Primeiro teria o verbo
surgido transitivo indireto”; b) “Depois, sem deixar de ser transitivo
indireto, tornou-se também transitivo direto por influência de verbos
como deixar, abandonar, resignar” (1999, p. 449).
13. Nos textos legais, tal verbo aparece construído ora com objeto direto
(que pode aparecer como sujeito na voz passiva), correspondendo à
construção renunciar alguma coisa, ora com objeto indireto
introduzido pela preposição a, correspondendo à construção renunciar
a alguma coisa, ora mesmo intransitivamente. Exs.: a) “Resolve-se o
penhor: … III – Renunciando o credor” (CC, art. 1.436, II); b) “Pode o
credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a
alimentos…” (CC, art. 1.707); c) “Se o testador ordenar que o
herdeiro, ou legatário, entregue coisa de sua propriedade a outrem,
não o cumprindo ele, entender-se-á que renunciou à herança, ou ao
legado” (CC, art. 1913 – interessante anotar que o CC/1916, art. 1.679,
de mesma redação, apenas tinha de diferente que o mencionado verbo
era transitivo direto, e agora é transitivo indireto); d) “O que renunciou
a herança, ou que foi dela excluído, deve, não obstante, conferir as
doações recebidas…” (CC, art. 2008 – interessante anotar que,
inversamente ao exemplo anterior, o CC/1916, art. 1.790, caput, trazia
o mencionado verbo como transitivo indireto, e agora é transitivo
direto); e) “O direito de queixa não pode ser exercido quando
renunciado expressa ou tacitamente” (CP, art. 104); f) “O advogado
poderá, a qualquer tempo, renunciar ao mandato…” (CPC/1973, art.
45).
14. Em interessante observação, assim se manifesta Adalberto J. Kaspary:
“No Código Civil Brasileiro, constata-se nítida preferência pelo regime
direto: dezenove entre vinte e dois exemplos anotados, ao passo que,
no Código Civil de Portugal, predomina o regime indireto: vinte entre
vinte e dois exemplos encontrados. Atualmente, nos textos jurídicos e
forenses em geral, prevalece o regime indireto” (1996, p. 289).
Repetição do artigo
Ver Artigo (P. 136).
Repor
Ver Pôr – Como conjugar? (P. 577)
Representação de letras
Ver Plural de letras – Existe? (P. 566)
Reprochador – Galicismo?
1. É vocábulo empregado por Mário Barreto, em seu Correio de
Consulentes, ao referir um “melindroso reprochador do emprego da
preposição a” (1954b, p. 38).
2. Embora alguns queiram lançá-la no rol dos galicismos, o certo é que o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira
de Letras – que é o veículo oficial para dirimir as questões acerca da
existência ou não de vocábulos em nosso idioma – registra a mencionada
palavra (2009, p. 716), razão pela qual é de se considerá-la como
perfeitamente integrada a nosso léxico.
Ver Irreprochável – Galicismo? (P. 430) e Reprochar – Galicismo? (P. 660)
Reprochar – Galicismo?
1. No sentido de censurar, trata-se de vocábulo que Eduardo Carlos Pereira
insere no rol dos galicismos léxicos, daqueles que “são verdadeiras
deturpações da língua, contra os quais devemos estar premunidos”
(1924, p. 260-1).
2. Na lição de Vitório Bergo (1944, p. 207), todavia, “parece galicismo,
mas é português de lei”, trazendo tal autor, para confirmar seu ensino,
significativo exemplo colhido em Machado de Assis: “Ia ao armazém
visitar o Palha; este, ao fim de cinco semanas, reprochou-lhe a
ausência”.
3. Cândido Jucá Filho (1981, p. 99), defendendo, de igual modo, a
vernaculidade do vocábulo, observa que o próprio Mário Barreto o
empregou: “Uma delas mais afoita que as outras reprochou-lhe a sua
má condição”.
4. Impecável, nesse sentido, é a advertência de Francisco Fernandes:
“Reprochar é pouco usado, e aos que o têm por galicismo lhes
recomendamos a leitura destas linhas do nosso Machado de Assis, que
sabia a língua destramente: ‘Reproche não é galicismo. Nem reproche,
nem reprochar’” (1971, p. 517-8).
5. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras – que é o veículo oficial para dirimir as questões
acerca da existência ou não de vocábulos em nosso idioma – registra a
mencionada palavra (VOLP, 2009, p. 716), razão pela qual é de se
considerá-la como perfeitamente integrada a nosso léxico.
Ver Irreprochável – Galicismo? (P. 430) e Reproche – Galicismo? (P. 661)
Reprochável – Galicismo?
Ver Irreprochável – Galicismo? (P. 430) e Reproche – Galicismo? (P. 661)
Reproche – Galicismo?
1. No sentido de censura, trata-se de vocábulo que Eduardo Carlos Pereira
insere no rol dos galicismos léxicos, daqueles que “são verdadeiras
deturpações da língua, contra os quais devemos estar premunidos”
(1924, p. 260-1).
2. Observando, todavia, que Machado de Assis gostava muito de lançar
mão desse termo, assim como do verbo reprochar, anota o Padre José F.
Stringari que, a um anônimo que certa vez lhe reprovou tal uso, nosso
ilustre escritor, invocando a autoridade dos exemplos do Dicionário de
Morais, em certo trecho de sua defesa, assim asseverou: “Reproche não é
galicismo, nem reproche nem reprochar”.
3. E tal padre gramático (STRINGARI, 1961, p. 75-6) acrescenta dois
exemplos de outras abalizadas autoridades do idioma: a) “Um dia que as
reunira a todas numa sala do serralho, uma delas mais afoita que as
outras reprochou-lhe a sua má condição” (Mário Barreto); b)
“Reprochar e assim reproche são vocábulos usados pelos clássicos; são,
pois, de bom uso” (João Ribeiro).
4. Observando, também, não ser galicismo tal vocábulo, Cândido Jucá
Filho (1981, p. 99) cita significativo exemplo de Machado de Assis: “D.
Miguel voltou para ele os olhos turvos de tristeza e reproche”.
5. Por fim, espancando as possíveis dúvidas, o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras – que e o veículo
oficial para dirimir as questões acerca da existência ou não de vocábulos
em nosso idioma – registra a mencionada palavra (2009, p. 716), razão
pela qual é de se considerá-la como perfeitamente integrada a nosso
léxico.
Ver Irreprochável – Galicismo? (P. 430) e Reprochar – Galicismo? (P. 660)
Réptil ou Reptil?
1. Na lição de José de Sá Nunes, “a verdadeira prosódia de réptil é com a
acentuação tônica em a primeira sílaba (re), e o seu legítimo plural é
répteis; mas o uso geral consagrou a pronúncia reptil (oxítona), bem
como o plural reptis. E ir de encontro ao uso é remar contra a maré”
(1938, p. 58-9).
2. E tal autor alinha exemplos de uso oxítono do vocábulo em Rui Barbosa
e Antenor Nascentes.
3. Em outra passagem de mesma obra, assim leciona tal autor: “A prosódia
latina reptilis com a tônica em a segunda, é errônea. Os melhores
dicionários latinos mandam pronunciar reptilis (proparoxítona), pois
marcam com o mâcron (sinal de longa) a primeira sílaba de reptilis. Se
eles assinalassem reptilis, com o sinal de bráquia no re, eu daria a mão à
palmatória e cantaria a palinódia. Mas em nossa língua o uso consagrou
a pronúncia oxítona” (NUNES, 1938, p. 145).
4. Silveira Bueno, por sua vez, a dá exclusivamente como paroxítona,
conferindo-lhe, por plural, tão somente répteis (1938, p. 14),
acrescentando que quem pronunciar tais vocábulos como oxítonos e
compuser o plural em is e não em eis – único plural que considera
correto, aliás – “cometerá grave erro, evidenciando que desconhece a
história de sua própria língua” (1938, p. 45-6).
5. Em outra passagem de mesma obra, tal gramático acrescenta que a
prosódia paroxítona é a mais correta, embora a pronúncia oxítona seja
mais vulgar (BUENO, 1938, p. 111).
6. Após observar que em Portugal é mais comum a pronúncia paroxítona,
enquanto no Brasil são vulgares a escrita e a pronúncia oxítonas, Júlio
Nogueira adverte – em observação feita para réptil, para projétil e para
têxtil – que “a pronúncia lusitana em tais palavras é mais fiel à latina,
mas seria demasiado rigor corrigir a brasileira nesses casos
generalizados. Somente nas escolas, em língua erudita, se pronunciam
essas palavras à maneira lusitana” (1959, p. 19-20).
7. Em outra obra, o mesmo gramático, após referir que, em Portugal, tal
vocábulo se insere entre os paroxítonos, formando o plural em eis,
observa que, no Brasil, a tendência da língua é tê-los por oxítonos,
fazendo, por conseguinte, o plural em is (NOGUEIRA, 1930, p. 165).
8. Eduardo Carlos Pereira aceita tanto a forma oxítona como a paroxítona,
lembrando apenas que a primeira é mais comum e arrolando o vocábulo
entre aqueles “de pronúncia dupla pela incerteza da tônica” (1924, p. 28
e 31).
9. Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 19 e 34) insere o vocábulo entre aqueles
que podem ser oxítonos ou paroxítonos, confere-lhe dois singulares –
como oxítona e como paroxítona – e lhe dá, de igual modo, dois plurais:
reptis e répteis.
10. Júlio Ribeiro (1908, p. 12 e 90), num primeiro momento, defende a
pronúncia paroxítona de tal vocábulo, muito embora refira o
posicionamento de alguns gramáticos e lexicógrafos que lhe preguem a
pronúncia oxítona; em outra passagem de mesma obra, todavia,
considera-o oxítono e manda fazer o plural pela queda do l e posterior
acréscimo de s.
11. Cândido de Oliveira (1961, p. 34) admite-lhe a dupla pronúncia e
grafia, quer como oxítona, quer como paroxítona.
12. Para Cândido de Figueiredo (1948, p. 116-7), “carregar no i de réptil, e
fazer o plural reptis, há de ser sempre disparate, ainda que não tenha
remédio”, acrescentando tal autor que tal pronúncia “é um destes
desconchavos, que nós aceitamos todos, por serem talvez
irremediáveis”.
13. Para Cândido Jucá Filho, “não há dúvida que a palavra é paroxítona.
Mas a verdade é que, em se tratando de palavra erudita, só tardiamente
se fez a correção prosódica. Todos disseram reptil, oxítono, até o século
passado, o que se vê pelo plural que se lhe dava (reptis)… Mas Bilac,
que a princípio seguia nas mesmas pegadas…, depois corrigiu-se para
répteis” (1981, p. 99).
14. Eliminando as possíveis dúvidas, o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras – que é o veículo oficial
para dirimir as questões acerca do modo de grafar e pronunciar os
vocábulos em nosso idioma – registra tanto réptil quanto reptil,
respectivamente com os plurais répteis e reptis (2009, p. 717) razão
pela qual está autorizado o emprego das duas prosódias bem como das
duas formas de plural.
Reputar
1. No que tange à conjugação verbal, Otelo Reis, por evidentes questões de
eufonia resultante de um pudor excessivo, manda não conjugar o verbo
computar nas três pessoas do singular do presente do indicativo.
2. Quanto a reputar, todavia, não lhe faz ressalva alguma e manda conjugá-
lo em todas as pessoas, tempos e modos (1971, p. 77).
3. Por outro lado, trata-se de vocábulo a ser observado sob o prisma da
regência verbal.
4. E, nesse aspecto, é verbo transitivo, em cuja companhia, com frequência,
aparece um predicativo do objeto direto.
5. Tal predicativo pode vir ou não precedido de como. Exs.: a) “Reputam-
no o maior processualista vivo do país”; b) “Reputam-no como o maior
processualista vivo do país”.
6. Aires da Mata Machado Filho (1969a, p. 616), por seu lado, mostra sua
preferência pela simples justaposição das palavras, sem emprego de
como, alegando por motivo a elegância na fala.
7. Francisco Fernandes (1971, p. 518) também acata a possibilidade de
construção do predicativo do objeto direto precedido pela preposição
por. Ex.: “Eu o reputo por homem, ou homem de bem”.
8. Acresça-se que é corriqueiro o emprego de frases como a que segue:
“Reputam-no como sendo o maior civilista pátrio”. Muito embora seja
de uso comum a expressão como sendo em casos assim, é ela errônea e
desnecessária, devendo ser eliminada. Corrija-se, portanto, por um de
dois modos: a) “Reputam-no o maior civilista pátrio”; b) “Reputam-no
como o maior civilista pátrio”.
9. Idêntica há de ser a construção com outros verbos que, de modo similar,
exijam predicativo do objeto: a) “Creio-o apto (ou como apto) para o
trabalho”; b) “Julguei-a incapaz (ou como incapaz) para a função”; c)
“Reconheço-a minha inspiradora (ou como minha inspiradora) daquela
obra”; d) “Consideram-no o maior processualista (ou como o maior
processualista) vivo do país”.
Ver Computar (P. 204) e Nomear (P. 497).
Requerente ou Autor?
Ver Autor ou Requerente? (P. 149)
Requerer
1. Quanto à conjugação verbal, é vocábulo que tem flexão própria, não
sendo composto de querer.
2. Vejam-se suas formas no presente do indicativo e tempos derivados:
requeiro, requeres, requere (ou requer), requeremos, requereis, requerem
(presente do indicativo); requeira, requeiras, requeira, requeiramos,
requeirais, requeiram (presente do subjuntivo); requere, requeira,
requeiramos, requerei, requeiram (imperativo afirmativo); não
requeiras, não requeira, não requeiramos, não requeirais, não
requeiram (imperativo negativo).
3. Lembra Otelo Reis que “a forma mais usada na terceira pessoa do
singular do presente do indicativo é requer, conquanto a correta seja
requere” (1971, p. 99).
4. Relembrando não ser ele composto de querer, veja-se o seu pretérito
perfeito do indicativo, do qual, como se sabe, derivam outros tempos:
requeri, requereste, requereu, requeremos, requerestes, requereram
(pretérito perfeito); requerera, requereras, requerera, requerêramos,
requerereis, requereram (pretérito mais-que-perfeito); requerer,
requereres, requerer, requerermos, requererdes, requererem (futuro do
subjuntivo); requeresse, requeresses, requeresse, requerêssemos,
requerêsseis, requeressem (imperfeito do subjuntivo).
5. Vale a pena lembrar o ensino de Vitório Bergo acerca da conjugação
deste verbo: “difere de querer na primeira pessoa do singular do presente
do indicativo, de que se deriva o presente do subjuntivo…; é regular nos
outros tempos…” (1943, p. 145).
6. Atentos aos frequentes equívocos que ocorrem em sua conjugação,
assim fixam Pasquale Cipro Neto e Ulisses Infante oportunos lembretes:
“O pretérito perfeito do indicativo desse verbo é regular…
Consequentemente, o pretérito mais-que-perfeito do indicativo, o
imperfeito do subjuntivo e o futuro do subjuntivo também são regulares:
eu requerera, se eu requeresse, quando eu requerer” (1999, p. 152).
7. Quanto à regência verbal, a construção mais comum é ‘requerer alguma
coisa a alguém’. Ex.: “Requeiro a Vossa Excelência que se digne deferir
o pedido”.
8. Veja-se, contudo, que é de igual modo correta a construção ‘requerer
alguma coisa de alguém’ (BUENO, 1957, p. 417). Exs.: a) “Requeiro de
Vossa Excelência que se digne deferir o pedido”; b) “Como cavalheiros
peço-vos justiça; como filhos do mesmo sangue, requeiro de vós ajuda”
(Rebelo da Silva).
9. Francisco Fernandes (1971, p. 519) também acata as três possibilidades
de construção: a) “Ante os barões e ricos-homens, na cúria, devera
requerer seu direito” (Alexandre Herculano); b) “Requereu ao Governo
a concessão de um terreno”; c) “Requereu deles mais prudência e tino”
(Cândido de Figueiredo).
Requisitar
1. Do latim requaesitare, significa pedir ou exigir legalmente. Ex.: “O
funcionário requisitou suas férias ainda para aquele ano”.
2. Não apresenta problemas quanto à conjugação verbal, em que é regular,
nem quanto à regência verbal, em que pode ser transitivo direto (para
significar a coisa requisitada) ou transitivo direto e indireto (para indicar
também a pessoa ou repartição a quem se requisita). Exs.: a) “O superior
hierárquico requisitou um documento” (transitivo direto); b) “O superior
hierárquico requisitou um documento ao setor de pessoal” (transitivo
direto e indireto).
3. Francisco Fernandes (1971, p. 519) também anota a possibilidade de
construção do objeto indireto com a preposição de. Ex.: “Requisitou do
general em chefe o número de cavalos necessários” (Barão do Rio
Branco).
4. Celso Pedro Luft (1999, p. 454), de igual modo, vê a possibilidade de
construção com todas essas estruturas.
5. Nos textos legais, vem empregado nas acepções de pedir, de exigir com
autoridade pública, de fazer requisição, de demandar, de requerer,
hipóteses em que é construído “com objeto direto (sujeito na voz
passiva) de coisa, ou com objeto direto de coisa e indireto de pessoa,
com a preposição a ou de”, correspondendo as construções requisitar
algo, ou requisitar algo a ou de alguém (KASPARY, 1996, p. 293-4).
Exs.: a) “O juiz requisitará às repartições públicas em qualquer tempo
ou grau de jurisdição…” (CPC/1973, art. 399, caput); b) “… o juiz
requisitará à autoridade policial que proceda à arrecadação e ao
arrolamento dos bens” (CPC/1973, art. 1.148); c) “No curso do
processo, e depois de subirem os autos conclusos para sentença, o juiz
poderá, dentro em cinco dias, requisitar de autoridades ou de
repartições todos os esclarecimentos para a restauração” (CPP, art. 544,
parágrafo único).
Ver Requisito (P. 664).
Requisito
1. É aquilo que se requereu, ou a condição necessária para a obtenção de
certo objetivo. Ex.: “Para se ajuizar uma ação, alguns requisitos
haverão de ser preenchidos”.
2. Quanto à ortografia, atente-se à lição de José de Sá Nunes: “Requisito
escreve-se com qui e não com que, pois vem do latim requisitum. Nada
tem que ver com a palavra quesito, que se grafa com que por vir de
quaesitum” (1938, p. 53).
3. Essa, aliás, é a grafia observada pelo Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, que é o veículo oficial
ordenar o modo de grafar as palavras em nosso idioma (2009, p. 717).
4. Reafirme-se, assim, que não existe requesito.
Ver Requisitar (P. 663).
Requisitório
Ver Petição inicial (P. 563).
Reserva
Ver Substabelecer (P. 716).
Residente à Rua Tal ou Residente na Rua Tal?
Ver Morar à Rua Tal ou Morar na Rua Tal? (P. 477)
Resilir
1. Antonio Henriques (1999, p. 174) dá, como origem de tal vocábulo, re +
salire, que significa saltar para trás, romper, extinguir contrato.
2. Em termos técnicos, para De Plácido e Silva, no que concerne aos
contratos, “resilir é empregado tanto para indicar ou exprimir dissolver
por acordo das partes contratantes, como dissolver o contrato por
vontade de uma das partes, quando firmado por tempo indeterminado”
(1989, p. 122).
3. Quanto à conjugação verbal, Antonio Henriques refere ser ele defectivo,
dando-lhe por modelo abolir (1999, p. 174), razão pela qual não tem as
formas em que, de acordo com a conjugação normal do modelo da
terceira conjugação, ao l do radical se seguiria a ou o, defectividade essa
que ocorre no presente do indicativo, presente do subjuntivo, imperativo
afirmativo, e imperativo negativo.
4. Na prática, não tem a primeira pessoa do presente do indicativo, mas
apenas: resiles, resile, resilimos, resilis, resilem.
5. Não tem pessoa alguma do presente do subjuntivo, que derivaria da
inexistente primeira pessoa do presente do indicativo.
6. No imperativo afirmativo, apenas tem a segunda pessoa do singular e a
segunda pessoa do plural, derivadas do presente do indicativo, mas não
as demais, oriundas do presente do subjuntivo: resile tu, resili vós.
7. Também não tem pessoa alguma do imperativo negativo, que se origina
integralmente do presente do subjuntivo.
8. Como tais problemas de defectividade ocorrem apenas no presente do
indicativo e nos tempos daí derivados, é normalmente conjugado nos
outros tempos: resilia (imperfeito do indicativo), resilirei (futuro do
presente), resiliria (futuro do pretérito), resilindo (gerúndio), resilido
(particípio), resili (pretérito perfeito do indicativo), resilira (pretérito
mais-que-perfeito do indicativo), quando eu resilir (futuro do
subjuntivo), se eu resilisse (imperfeito do subjuntivo).
9. Anotando que os dicionários comuns “apresentam o verbo resilir como
sinônimo de rescindir, romper, desfazer, dissolver” (contrato ou ajuste),
observa Adalberto J. Kaspary (1996, p. 297) que “os autores de obras
jurídicas fazem, em geral, questão de estabelecer diferença entre resilir e
rescindir um contrato”, para o que lembra lição de Orlando Gomes, o
qual, seguindo no particular a terminologia francesa, reserva o vocábulo
resilição “para designar o modo de dissolução do contrato que se realiza
mediante manifestação de vontade das duas partes contratantes, ou de
uma delas”.
10. Quanto à regência verbal, Celso Pedro Luft (1999, p. 455) preconiza a
possibilidade de sua construção, indiferentemente, como transitivo
direto (correspondendo à construção resilir algo) ou como transitivo
indireto (correspondendo à construção resilir de algo).
11. Nos textos legais, tendo sempre o mesmo sentido de dissolver um
contrato por mútuo consentimento ou por provocação de uma das
partes, aparece às vezes com objeto direto (que pode ser sujeito na voz
passiva), correspondendo à construção resilir algo, às vezes com objeto
indireto introduzido pela preposição de (resilir de algo), decorrendo a
construção indireta, certamente, “da regência adotada pelo verbo
originário latino: resilere a” (KASPARY, 1996, p. 298). Exs.: a) “Em
todos os casos em que o comprador tem direito de resilir o contrato, o
vendedor é obrigado não só a restituir o preço, mas também a pagar
as despesas que tiver ocasionado com os juros da lei” (C. Com, art.
213); b) “Se a demora exceder a dez dias, pode o passageiro resilir o
contrato, sendo-lhe restituída a passagem se a tiver pago” (C. Com.
português, art. 568º); c) “Sendo demorado o navio para se consertar,
pode o passageiro resilir o contrato, pagando a passagem em
proporção do caminho andado” (C. Com. português, art. 572º); d) “O
que der a fabricar alguma obra de empreitada poderá a seu arbítrio
resilir do contrato, posto que a obra esteja já começada a executar…”
(C. Com., art. 236); e) “… terá o capitão a escolha, ou de resilir do
contrato e exigir do afretador metade do frete ajustado e primagem
com estadias e sobrestadias, ou de empreender a viagem sem carga…”
(C. Com., art. 592); f) “… Se o navio não for livre, o fretador pode
resilir do contrato, com direito ao frete vencido, estadias e
sobrestadias e avaria grossa…” (C. Com., art. 611); g) “… Resilindo o
passageiro do contrato antes da viagem começada, o capitão tem
direito à metade do preço da passagem…” (C. Com., art. 630).
Resolução
Ver Números – Como ler e Empregar? (P. 506)
Responder
1. Verbo de grande utilização nos meios forenses, requer cuidados quanto à
regência verbal.
2. Alguns querem que se possa construir indiferentemente com objeto
direto ou objeto indireto, independentemente de seu sentido (GÓIS;
PALHANO, 1963, p. 148-9). Exs.: a) “Responder o quesito”; b)
“Responder ao quesito”.
3. A leitura dos bons exemplos da língua, entretanto, demonstra que a
melhor sintaxe é aquela que faz do conteúdo da resposta o objeto direto e
daquilo a que se responde o objeto indireto. Assim: a) “O réu respondeu
argumentos irrefutáveis” (conteúdo da resposta = objeto direto); b) “O
magistrado respondeu ao ofício da Corregedoria” (aquilo a que se
responde = objeto indireto).
4. Nesse sentido é a síntese de Artur de Almeida Torres: “Na acepção de
dizer ou escrever em resposta, constrói-se com acusativo (vale dizer,
objeto direto) do que se responde e dativo (isto é, objeto indireto)
daquele ou daquilo a que se responde: ‘Ao ofício do diretor respondeu
que cumpria ordens’” (1967, p. 255).
5. Contrariando lição de Carlos Góis, para quem “se pode construir
indiferentemente responder a carta ou à carta”, leciona Francisco
Fernandes, invocando ensino de Eduardo Carlos Pereira, que “a leitura
dos bons exemplares da língua demonstra que a melhor sintaxe é aquela
em que responder ‘rege acusativo (vale dizer, exige objeto direto)
daquilo que se responde, e dativo (isto é, faz objeto indireto) daquilo ou
daquele a que se responde’”.
6. E reforça seu posicionamento, em continuação, com a doutrina de
Cândido Lago: “Convém dizer corretamente – ‘Respondendo ao vosso
ofício’, ‘Respondendo à sua carta de’, etc., etc. Aquilo que a pessoa
responde é que é o objeto direto; mas o ofício ou a carta a que a pessoa
responde é o objeto indireto” (FERNANDES, 1971, p. 521-2).
7. Celso Pedro Luft (1999, p. 456-7) traz importantes observações para o
assunto: a) a regência primária é responder a algo, “com objeto direto
indeterminado, numa estrutura plena suposta (alguém responde algo a
uma pergunta, carta, etc.)”; b) “gramáticos e puristas só aceitam essa
regência, mas no português brasileiro está consagrada a regência TD que
eles condenam”; c) “A construção passiva deriva dessa regência”; d)
“Preserve-se a regência primária responder a… na linguagem culta
formal, sem condenar a regência evoluída, perfeitamente explicável”.
8. Dada a regra de que apenas tem voz passiva um verbo transitivo direto,
lembra-se a lição de Mário Barreto, que admite, de modo expresso, o
apassivamento de determinados verbos transitivos indiretos, como
aludir, obedecer, perdoar e responder, acrescentando, porém, Aires da
Mata Machado Filho (1969a, p. 599), que lhe citou a lição, que “as
formas passivas fixaram-se na vigência da construção transitiva direta”,
do que teria advindo “a aparente contradição”.
9. Atento ao que ocorre nos textos legais e no campo jurídico, observa
Adalberto J. Kaspary que, atualmente, “o verbo responder está tendendo
para a transitividade direta também no sentido de dar resposta a, o que se
comprova, inclusive, pela frequência das construções passivas, que,
aliás, há muito tempo, tem curso tranquilo no idioma” (1996, p. 302).
10. Oportuno é acrescentar que, no sentido de atribuir responsabilidade,
rege tal verbo a preposição por: a) “Se o usufruto recair em coisa
singular ou parte dela, só responderá o usufrutuário pelo juro da
dívida…” (CC/1916, art. 736, em disposição não repetida pelo
CC/2002); b) “O possuidor de boa-fé não responde pela perda ou
deterioração da coisa, a que não der causa” (CC, art. 1.217); c) “O
possuidor de má-fé responde pela perda ou deterioração da coisa,
ainda que acidentais…” (CC, art. 1.218).
Ver Agente da passiva (P. 97), Ser nascido – Está correto? (P. 694), Voz
passiva – Quando é possível? (P. 793) e Voz passiva sintética (P. 794).
Ressabido – Existe?
1. Palavra usada com frequência nos meios jurídicos, reveste-se de plena
correção, na consonância com lição de João Ribeiro, para quem “uma
das formas populares de grau ou ênfase é feita com o prefixo re: velho,
revelho” (1923, p. 165).
2. Em mesma esteira é a lição de Mário Barreto (1954b, p. 224-5), que
considera formas dessa natureza verdadeiros superlativos, e traz, em
acréscimo, diversos exemplos de Castilho: “tolo e retolo”; “minha e
reminha”; “seu e resseu”; “são, ressão e arquissão”.
3. Veja-se o seguinte exemplo extraído da introdução dos estudos de
linguagem do Padre José F. Stringari: “Se você tiver a coragem de dar-se
à leitura destas páginas, achará certamente nelas expressões e torneios
ressabidos de classicismo” (1961, p. 4).
4. Defendendo a integral viabilidade desse processo de formação de novas
palavras e invocando lição de Mário Barreto, assevera Cândido Jucá
Filho (1981, p. 98) que o re, em casos como refulgente e retolo, é
“prefixo enfatizante”.
5. Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 135) traz, em abono do emprego
desse processo de ênfase, um exemplo colhido em Castilho: “Nem que
ela à face do altar não fosse minha e reminha”.
Ressão – Existe?
Ver Revelho – Existe? (P. 673)
Ressarcir
1. Trata-se de verbo muito usado nos meios jurídicos, como na expressão
ressarcir os prejuízos, com o sentido de indenizar, reparar um gasto, um
dano. Ex.: “Os arts. 186 e 927 do Código Civil determinam que aquele
que causa dano a outrem, deve ressarcir-lhe os prejuízos”.
2. De Plácido e Silva (1989, p. 128) faz a diferença entre responder e
ressarcir: a) responder “é estar obrigado pelo dano causado, ou a
ressarcir o dano”, evidenciando-se em tal verbo o sentido de sujeitar-se à
obrigação ou a ela prender-se; b) já ressarcir “é pagar o dano ou
satisfazer a obrigação, resultante ou fundada na responsabilidade”, com a
real acepção de cumprir a obrigação.
3. Quanto à conjugação verbal, Otelo Reis o considera verbo defectivo, e
manda conjugá-lo apenas nas formas em que, após o radical, aparece a
letra i: a) no presente do indicativo, apenas tem ressarcimos e ressarcis;
b) daí se vê que o imperativo afirmativo apenas tem a segunda pessoa do
plural (ressarci vós); c) não tem, por conseguinte, as outras formas do
presente do indicativo nem do imperativo afirmativo; d) de igual modo,
não tem forma alguma do presente do subjuntivo nem do imperativo
negativo.
4. O mesmo autor, porém, em nota específica, observa que “alguns
admitem a conjugação integral: ressarço, ressarces…” (REIS, 1971, p.
148).
5. Os problemas de conjugação desse verbo, como se verifica, apenas se
situam nas formas rizotônicas (em que a sílaba forte está no radical), e
estas só existem no presente do indicativo, presente do subjuntivo,
imperativo afirmativo e imperativo negativo.
6. Bem por isso, não deve haver preocupação alguma, quanto à observação
feita, no que diz respeito aos demais tempos: ressarcia (pretérito
imperfeito), ressarcirei (futuro do presente), ressarciria (futuro do
pretérito), ressarcido (particípio), ressarcindo (gerúndio), ressarci
(pretérito perfeito), ressarcira (pretérito mais-que-perfeito), ressarcisse
(imperfeito do subjuntivo), ressarcir (futuro do subjuntivo).
7. Quanto à regência verbal, Eliasar Rosa (1993, p. 124-5) observa que Rui
Barbosa, em sintaxe seguida pelo Código Civil de 1916, o construía,
fazendo com que quem ressarcisse, ressarcisse alguma coisa a alguém –
vale dizer, como transitivo direto e indireto – com a consequente
possibilidade de transformar o objeto direto da voz ativa em sujeito da
voz passiva, tal como se vê no art. 517: “Ao possuidor de má-fé serão
ressarcidas somente as benfeitorias necessárias”.
8. Francisco Fernandes (1971, p. 522) acata esse posicionamento e se
abona com dois exemplos do próprio Rui Barbosa, num deles também
tornando o objeto direto da voz ativa sujeito da voz passiva: a)
“Adquirirá o proprietário as sementes, plantas e construções, com
encargo, porém, de ressarcir o valor das benfeitorias”; b) “Eu proporia
que esses sacrifícios fossem ressarcidos aos fazendeiros pelo fundo de
emancipação”.
9. Também em prol dessa ampla possibilidade de sintaxes é a doutrina de
Celso Pedro Luft (1999, p. 457).
10. Nos textos de lei, tal verbo aparece às vezes com objeto direto (que
pode ser sujeito na voz passiva), correspondendo à construção ressarcir
alguma coisa, às vezes com objeto direto de coisa e objeto indireto de
pessoa introduzido pela preposição a (ressarcir alguma coisa a
alguém), às vezes como pronominal, com objeto indireto introduzido
pela preposição de (correspondendo à construção ressarcir-se de algo).
Exs.: a) “… caso em que poderá determinar que o requerente preste
caução real ou fidejussória de ressarcir os danos que o requerido
possa vir a sofrer” (CPC/1973, art. 804); b) “O gestor envidará toda a
sua diligência habitual na administração do negócio, ressarcindo ao
dono o prejuízo resultante de qualquer culpa na gestão” (CC, art. 866);
c) “O credor que de boa-fé receber a prestação de coisa que o devedor
não pode alhear tem o direito de impugnar o cumprimento, sem
prejuízo da faculdade de se ressarcir dos danos que haja sofrido” (CC
português, art. 765º, 1).
Restar
1. Num primeiro aspecto, quanto à concordância verbal, é comum que o
sujeito plural venha posposto a esse verbo, caso em que é preciso
atenção, para não haver equívocos quanto à flexão deste último. Exs.: a)
“Restava ainda alguns processos sem sentença” (errado); b) “Restavam
ainda alguns processos sem sentença” (correto); c) “Resta-lhe poucos
familiares” (errado); d) “Restam-lhe poucos familiares” (correto).
2. Atento aos problemas daí advenientes, leciona Napoleão Mendes de
Almeida que “a concordância se impõe com verbos que significam
carência, falta, abastança, suficiência: Restavam apenas quinze mil
homens” (1981, p. 278).
3. No que tange à regência verbal, não encontra abono nos autores
clássicos e nos gramáticos seu uso como verbo de ligação seguido de
predicativo (com o sentido de ficar), construção frasal essa que se vem
vulgarizando na linguagem forense, apesar de errônea. Ex.: “A acusação
contra o réu não restou provada nos autos” (errado).
4. Nesse sentido, vale lembrar que, em suas indispensáveis obras sobre
regência verbal, nem Francisco Fernandes, nem Celso Pedro Luft fazem
menção à possibilidade da referida sintaxe.
5. Corroborando esse posicionamento, anota Geraldo Amaral Arruda que
“nenhum dicionário da língua portuguesa registra restar como verbo de
ligação” (1997, p. 21).
6. Lembrando que basta uma consulta aos melhores autores para se
comprovar que tal sintaxe “não é Português”, leciona Edmundo Dantès
Nascimento que o verbo restar é empregado erradamente na linguagem
forense, isto é, com predicativo do sujeito, em frases como “O decreto
restou revogado”.
7. Acrescenta tal autor que “a correção se faz com emprego de ficar,
remanescer, subsistir, conforme o caso” (NASCIMENTO, 1982, p. 177).
8. Pode-se acrescentar a esse ensinamento que mesmo o verbo ser pode ser
empregado como auxiliar na voz passiva, evidenciando a ideia da ação
verbal o sentido que se intenta obter com o predicativo: “O decreto foi
revogado”.
9. Reitere-se que, para evitar tal solecismo de sintaxe, basta, na maioria dos
casos, adotar a construção passiva, quer sintética, quer analítica, sem o
emprego do verbo restar, ou então usar o verbo próprio de ligação com o
adequado predicativo do sujeito. Exs.: a) “Não se provou nos autos, a
acusação contra o réu” (correto – voz passiva sintética); b) “Não foi
provada nos autos, a acusação contra o réu” (correto – voz passiva
analítica); c) “A acusação contra o réu não ficou provada nos autos”
(correto – verbo de ligação mais predicativo do sujeito).
10. Apenas para ilustrar, é de se ver que Adalberto J. Kaspary (1996, p.
307-8), dedicado estudioso do emprego dos verbos nos textos de lei, –
muito embora realce que uma construção como a discutida (“O decreto
restou revogado”) “tem trânsito cada vez mais livre na linguagem
forense” – não conseguiu localizar um só exemplo abonador de tal
emprego, assim nos diplomas legais do Brasil como nos de Portugal.
Restituir
1. É verbo de larga utilização nos meios jurídicos: a) a antiga Lei de
Quebras falava em restituir coisas entregues ao falido (art. 76) ou ao
concordatário (art. 166) nos quinze dias anteriores ao requerimento da
falência ou da concordata; b) os arts. 180 e 507 do Código de Processo
Civil falam em restituir prazo para a prática de algum ato processual,
para o qual houve impedimento sem culpa da parte que deveria praticá-
lo.
2. Quanto a sua ortografia, como todo verbo terminado em uir, só pode dar
origem à terminação ui na segunda e terceira pessoas do singular do
presente do indicativo. Assim: restituo, restituis, restitui.
3. Diferentemente dos verbos terminados em uar (como continuar), são
errôneas as grafias com e em tais situações: restitues, restitue.
4. Nesse Sentido, nas palavras de Cândido de Oliveira (1961, p. 64), atento
aos frequentes equívocos cometidos nesse campo, “é com i a segunda e
terceira pessoas do singular do presente do indicativo dos verbos
terminados em uir: aflui, fruis, retribui, retribuis, contribui, contribuis,
influi, influis”.
5. Além disso, é palavra que exige cuidados quanto à regência verbal.
6. Uma primeira possibilidade de uso é fazer da coisa que se restitui o
objeto direto e da pessoa a quem se restitui o objeto indireto introduzido
pela preposição a (correspondendo à construção restituir algo a alguém),
sintaxe essa preferida pelo Código Civil de 1916 nos artigos 300, 603,
1.256 e 1.272 (com exceção do primeiro, que tratava de matéria hoje
revogada, os demais dispositivos correspondem, respectivamente, aos
arts. 1.233, caput, 586 e 637 do CC/2002, com mesma estrutura
sintática). Exs.: a) “O réu restituiu ao autor o bem que lhe furtara”; b)
“O herdeiro do depositário que de boa-fé vendeu a coisa depositada, é
obrigado a assistir o depositante na reivindicação, e a restituir ao
comprador o preço recebido” (CC, art. 637).
7. Uma segunda possibilidade igualmente correta de construção é fazer da
coisa que se restitui objeto indireto introduzido pela preposição de, e da
pessoa a quem se restitui objeto direto (correspondendo à sintaxe
restituir alguém de algo). Ex.: “O réu restituiu o autor do bem que lhe
furtara”.
8. Celso Pedro Luft (1999, p. 458) acata essa dupla possibilidade de
regência: a) restituir alguma coisa a alguém; b) restituir alguém de
alguma coisa.
9. Também Francisco Fernandes (1971, p. 524) abona essa dupla
possibilidade de sintaxe.
10. Atento ao que ocorre nos textos legais e no campo jurídico, Adalberto
J. Kaspary entrevê, em acréscimo, a possibilidade de seu uso no
sentido de restabelecer, reintegrar (com a possibilidade de vir o objeto
direto da voz ativa a tornar-se sujeito da voz passiva), hipótese em que
corresponde à sintaxe restituir alguém a alguma coisa. Ex.: “No caso de
esbulho violento, pode o possuidor pedir que seja restituído
provisoriamente à sua posse, alegando os fatos que constituem a posse,
o esbulho e a violência” (CPC português, art. 393º).
11. E acrescenta tal autor que, no sentido de reintegrar-se, reempossar-se,
recuperar o perdido, esse verbo é construído pronominalmente
(restituir-se). Ex.: “O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-
se, ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo”
(CC, art. 1.210, § 1º, primeira parte).
Resto
Ver De resto – Galicismo? (P. 269)
Reter
Ver Ter (P. 730).
Reticências
1. “Os três pontos seguidos (reticências) empregam-se para deixar o
sentido suspenso, por ironia ou por antífrase” (NOGUEIRA,1959, p.
148).
2. Nada impede a combinação das reticências com outros sinais: …, ?…
?!… !… !?…
3. Interessante lembrete vem de Luiz Antônio Sacconi acerca dos trechos
de outros autores, empregados, por exemplo, na elaboração dos
arrazoados jurídicos: “Se a citação ou a transcrição não começar com a
palavra inicial, colocar-se-ão reticências logo após a abertura das aspas.
Da mesma forma, devem ser usadas as reticências no final, antes do
fechamento das aspas, se a intenção é não terminar a referida citação ou
transcrição” (1979, p. 247).
4. Importa adicionar que se usam apenas reticências em lugar do trecho que
foi suprimido, sem necessidade de pô-las entre parênteses ou entre
colchetes, ou mesmo de outro artifício qualquer, como é de fácil
verificação no ensino dos estudiosos, como Celso Cunha (1970, p. 283),
Rocha Lima (1972, p. 435) e Evanildo Bechara (1974, p. 336). Exs.: a)
“… galgos … e toda a demais cainçalha patrulhavam… por morros…”
(correto); b) “(…) galgos (…) e toda a demais cainçalha patrulhavam
(…) por morros (…)” (errado); c) “[…] galgos […] e toda a demais
cainçalha patrulhavam […] por morros […]” (errado).
Retificar ou Ratificar?
Ver Ratificar ou Retificar? (P. 644)
Retolo – Existe?
Ver Revelho – Existe? (P. 673)
Retribuir
1. Quanto à ortografia, como todo verbo terminado em uir, retribuir só
pode dar origem à terminação ui na segunda e na terceira pessoa do
singular do presente do indicativo: retribuo, retribuis, retribui.
2. Diversamente dos verbos terminados em uar (como continuar), que
terminam com e nessas situações, são errôneas as grafias com e:
retribues, retribue.
3. Nas palavras de Cândido de Oliveira, após verificação dos muitos erros
cometidos nesse campo, “é com i a segunda e terceira pessoas do
singular do presente do indicativo dos verbos terminados em uir: aflui,
fruis, retribui, restituis, contribui, contribuis, influi, influis” (1961, p.
64).
4. Atentos aos frequentes equívocos que ocorrem nos meios jurídicos,
assim também observam Antonio Henriques e Maria Margarida de
Andrade: “Os verbos em uir (concluir, possuir, estatuir etc.) têm um i na
terceira pessoa do singular do presente do indicativo e não e” (1999, p.
53).
Ver Constituir (P. 225).
Retro-mencionada ou Retromencionada?
1. Ante as inovações introduzidas quanto à escrita dos prefixos e falsos
prefixos em nossos sistema pelo Acordo Ortográfico de 2008, é oportuna
a indagação: retro-mencionada ou retromencionada?
2. O prefixo retro é latino e tem o significado de atrás ou para trás, como é
de fácil percepção na própria palavra da consulta.
3. Quanto à grafia, como geralmente ocorre com os prefixos e falsos
prefixos terminados por vogal, apenas em duas hipóteses se usa o hífen:
a) quando o elemento seguinte se inicia por h (retro-habilitação); b)
quando o elemento seguinte se inicia pela mesma vogal com que se
encerra o prefixo (retro-oclusão, retro-operar).
4. Desse modo, acopla-se diretamente à palavra seguinte, sem
intermediação de hífen, quando iniciada esta por outra vogal, que não a
que encerra o prefixo: retroagir, retroanálise, retroescavadeira,
retroespalhamento, retroinfecção, retroinjeção, retrouterino.
5. Continua valendo a regra de junção direta, mesmo que o elemento
seguinte se inicie por consoante: retrocarregador, retrodatar,
retrofoguete, retrogradação, retromencionada.
6. Apenas para a hipótese de ser o segundo elemento iniciado por r ou s,
dobram-se tais consoantes para continuidade do som originário:
retrorrefletor, retrorreflexão, retrosseguir, retrossinfoniano.
Ver Retro ou Retros? (P. 672)
Retro ou Retros?
1. Ante as frequentes dúvidas quanto ao referido falso prefixo, é oportuno
observar se se deve dizer citações retro ou citações retros.
2. Um estudioso da língua e de seus fenômenos, Júlio Ribeiro (1908, p.
135), em uma de suas lições, menciona “sobre as tabelas retro”.
3. Em tal exemplo, há de se entender que retro está em lugar de
retromencionadas e que, muito embora tenha função adjetiva, não teve
sua normal flexão para concordar com o substantivo modificado.
4. Com base em tal ensinamento, veja-se como ficam as estruturas:
dispositivo retro, citação retro, dispositivos retro, citações retro.
Ver Extra (P. 349), Micro ou Micros? (P. 473) e Retro-mencionada ou
Retromencionada? (P. 671)
Retrotrair
1. Quanto à conjugação verbal, Otelo Reis (1971, p. 130) manda que
retrotrair seja conjugado tendo por modelo sair.
2. Adalberto J. Kaspary lhe dá como modelo de flexão trair, com a
observação de que “a segunda e a terceira pessoa do singular do presente
do indicativo se grafam com i (e não com e): retrotrais, retrotrai” (1996,
p. 310-1).
3. Anota Luciano Correia da Silva que “o verbo retrotrair pode ser
considerado um peregrinismo de nossa língua, conservado na literatura
legal. Do latim retro (para trás) mais trahere (puxar, mover), significa
fazer voltar, retrogradar, fazer retroceder” (1991, p. 52).
4. Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade (1999, p. 131), que
lhe dão por paradigma o verbo trair, alinham lição de Artur de Almeida
Torres, que estranha o mau gosto desse verbo, de pronúncia difícil e
pouco condizente com o fraseado das leis, que deve ser singelo e avesso
ao pedantismo.
5. No que concerne à regência verbal, Rui Barbosa, ao comentar o art. 204
do Projeto do Código Civil – em observação que veio a repetir quando se
referiu ao art. 539 – ressaltava o caráter transitivo de tal verbo, anotando
que ele “não quer dizer recuar, mas fazer recuar”.
6. E, de maneira específica para o assunto tratado no dispositivo então sob
comento – que registrava “Este registro fará retrotrair os efeitos do
casamento” – continuava: “O registro não fará que os efeitos do
matrimônio retrotraiam: retrotrairá esses efeitos. A redação correta,
assim, seria: Este registro retrotrairá os efeitos do casamento”
(BARBOSA, 1949, p. 102 e 193).
7. As críticas redundaram em alteração das respectivas disposições, como
se vê na redação definitiva do art. 200, § 4º, do Código Civil de 1916:
“O assento assim lavrado retrotrairá os efeitos do casamento… à data
da celebração”. Tal redação foi mantida em mesmos moldes pelo
CC/2002, art. 1.541, § 4º.
8. A lição de Francisco Fernandes (1971, p. 527), quanto à regência verbal
desse vocábulo, dá-se em igual sentido, ensino esse que também é
repetido por Celso Pedro Luft (1999, p. 461).
9. Nos textos de lei, tal verbo se constrói às vezes com objeto direto e a
preposição a (retrotrair alguma coisa a), às vezes pronominalmente com
a preposição a (retrotrair-se a): a primeira estrutura foi a adotada pelo
nosso Código Civil de 1916, e a segunda, pelo Código Civil de Portugal.
Exs.: a) “O assento assim lavrado retrotrairá os efeitos do casamento,
quanto ao estado dos cônjuges, à data da celebração e, quanto aos
filhos comuns, à data do nascimento” (CC/1916, art. 200, § 4º, mantida
pelo CC/2002, art. 1.541, § 4º); b) “O que contraiu casamento, enquanto
incapaz, pode ratificá-lo, quando adquirir a necessária capacidade, e
esta ratificação retrotrairá os seus efeitos à data da celebração”
(CC/1916, art. 211, em redação alterada pelo CC/2002, art. 1.553); c)
“Invocada a usucapião, os seus efeitos retrotraem-se à data do início da
posse” (CC português, art. 1.288).
Réu
1. Em termos de técnica processual, autor é aquele que promove uma ação
judicial civil ou uma denúncia penal (HENRIQUES, 1999, p. 175); e réu
“é aquele contra quem se promove ação judicial (sentido civil) ou aquele
contra quem se move denúncia por fato criminoso (sentido penal)”.
2. Magalhães Noronha cita alguns nomes com que se designa o acusado no
campo penal: indiciado, imputado, perseguido, denunciado, réu;
ressalva, porém, que o termo réu deve ser usado após a instauração da
ação penal (NORONHA apud HENRIQUES, 1999, p. 175).
3. E, de conformidade com Antonio Henriques, termos como suplicante e
suplicado “vêm caindo em desuso, substituídos, respectivamente, por
autor e réu, ou, então, requerente – requerido” (1999, p. 186).
4. Essa postura se deve a dois aspectos pelo menos: a) por um lado, os
tempos modernos exigem o abandono de uma tradição anacrônica e
nitidamente extemporânea, como a que pretende perpetuar termos como
Suplicante e Suplicado, resquícios de uma vassalagem, oriundos dos
tempos da Casa de Suplicação, que os séculos já esqueceram; b) por
outro lado, o que se tem hoje é um crescente ranço da ciência processual,
a qual, em aprimoramento da técnica de redação, leva ao abandono de
uma terminologia genérica e à busca de vocábulos que indiquem uma
real e específica posição do interessado no processo.
5. Apesar da resistência dos leigos – para os quais o vocábulo réu tange as
raias do xingamento – esse é o termo técnico genérico, corretamente
empregado em processo civil para indicar aquele contra quem o autor
(também termo genérico) promove uma demanda, independentemente
do tipo e da espécie da medida judicial manejada: o exequente pode ser
chamado de autor da execução, enquanto o executado há de ser-lhe o
respectivo réu; quando este, em ação desconstitutiva específica, se torna
embargante, pode ser ele chamado de autor dos embargos à execução,
enquanto o exequente há de ser o réu da referida ação; o reconvinte pode
ser chamado de autor da reconvenção, enquanto o reconvindo há de ser-
lhe o respectivo réu.
Ver Autor ou autor? Réu ou réu? (P. 149)
Revelho – Existe?
1. Vocábulo bastante usado nos meios jurídicos no sentido de muito velho,
é de integral correção, na consonância com lição de João Ribeiro, para o
qual “uma das formas populares de grau ou ênfase é feita com o prefixo
re: velho, revelho” (1923, p. 165).
2. Em mesma esteira é a lição de Mário Barreto (1954, p. 224-5), que
considera formas dessa natureza verdadeiros superlativos, e traz, em
acréscimo, diversos exemplos de Castilho: “tolo e retolo”; “minha e
reminha”; “seu e resseu”; “são, ressão e arquissão”.
3. Veja-se, para ilustração, o seguinte exemplo extraído da introdução dos
estudos de linguagem do Padre José F. Stringari: “Se você tiver a
coragem de dar-se à leitura destas páginas, achará certamente nelas
expressões e torneios ressabidos de classicismo” (1961, p. 4).
4. Defendendo a integral viabilidade desse processo de formação de novas
palavras e invocando lição de Mário Barreto, assevera Cândido Jucá
Filho (1981, p. 98) que o re, em casos como refulgente e retolo, é
“prefixo enfatizante”.
5. Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 135) traz, em abono do emprego
desse processo de ênfase um exemplo colhido em Castilho: “Nem que
ela à face do altar não fosse minha e reminha”.
Ridicularizar ou Ridiculizar?
1. A língua é uma estrutura dinâmica, e com frequência é necessário criar
novas palavras para expressar novas realidades. Foi assim que surgiram
telégrafo, autódromo, astronauta, telex, xerox, etc.
2. Ora, é importante, num primeiro momento, observar que, quando se quer
formar uma nova palavra em português (tecnicamente se chama
neologismo), deve-se atentar se há real necessidade de criar novo
vocábulo, pois o neologismo só se justifica pela necessidade de algo
novo.
3. Um segundo aspecto é que a nova palavra deve obedecer aos ditames
normais para formação de novas palavras no idioma no caso, verificar se
o radical (ridículo) está correto e se realmente existe o prefixo
pretendido (izar), etc.
4. A exigência concomitante de ambos os requisitos era assim resumida por
Rui Barbosa, que opinava em sequência: “Salvos os casos de
necessidade ou utilidade, e boa adaptação vernácula, voto contra o
neologismo” (s/d, p. 570).
5. Feitas essas observações iniciais, acresce dizer que a autoridade para
listar oficialmente os vocábulos existentes em nosso idioma está com a
Academia Brasileira de Letras, e ela o faz por intermédio da edição do
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, que é uma lista imensa
de tais vocábulos, com ligeiras especificações de categoria gramatical,
gênero e, muito raramente, de sentido ou outra observação adicional.
6. No caso, uma consulta do VOLP (ACADEMIA BRASILEIRA DE
LETRAS, 2009, p. 722) vai revelar que, independentemente de boa ou
má formação em nosso idioma, existem ambos os vocábulos: um
formado de forma mais regular (ridiculizar) e outro formado de modo
menos convencional para as regras do idioma (ridicularizar). E, se o
VOLP atesta oficialmente a existência de ambos os vocábulos, legem
habemus, e não há como levantar questionamento algum no plano dos
fatos e do direito. Qualquer discussão só pode ser levantada no plano
científico do aspecto linguístico, mas não no âmbito de vedar o uso
prático do vocábulo como palavra oficialmente pertencente ao nosso
idioma.
Rizotônicas
Ver Formas rizotônicas (P. 361).
Rodapé
Quanto às anotações e citações que vão em tal lugar, ver Obra com dois
autores (P. 512).
Roraima
1. De Arnaldo Niskier (1992, p. 3) é a lição no sentido de que o ditongo
intermediário de tal vocábulo seja pronunciado ãi, e não ái (Rorãima, e
não Roráima).
2. Diversa, entretanto, é a solução apontada por Domingos Paschoal
Cegalla (1999, p. 360): a) “No português do Brasil, em geral, se nasaliza
o ditongo ai, quando seguido de sílaba que começa por m ou n”; b) “Mas
não é pronúncia incorreta proferir Roraima (ái), Jaime, andaime, paina
etc., sem nasalar o ditongo, como a gaita”.
3. Registre-se, por oportuno, todavia, que o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido
oficialmente de determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma,
além de sua grafia e pronúncia oficiais não registra a palavra Roraima,
em decorrência de ser nome próprio, assim como não aponta pronúncia
alguma para andaime; por outro lado, registra, entre parênteses, ãi como
a pronúncia adequada da sílaba tônica de paina (2009, p. 54 e 610).
Rubrica
1. Do latim rubrica, de ruber (vermelho), significa assinatura breve ou
firma abreviada, aposição de um visto ou atribuição de autenticidade.
Ex.: “O magistrado apôs sua rubrica nos documentos que remetia
naquela oportunidade”.
2. Nos pergaminhos do Direito antigo, significava tudo o que se escrevia
com tinta vermelha ou rubra; e, como era hábito grafar em vermelho os
títulos ou a inscrição nos livros jurídicos, passou a significar toda
denominação ou intitulação dos mesmos livros, assim como toda
inscrição, epígrafe ou título em que se inscrevem, se tratam ou se
registram certas coisas.
3. Assinalando o cunho etimológico de ruber (vermelho), Antonio
Henriques e Maria Margarida de Andrade (1999, p. 132) anotam que
com essa cor “se escrevia o título nos capítulos do Direito Canônico”,
complementando que “hoje se rubrica com qualquer cor”.
4. Por causa dessa etimologia, na atualidade, “quer exprimir o título, a
inscrição, a epígrafe, em que se anotam certas indicações ou se
inscrevem certas determinações” (DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p.
155).
5. Trata-se, desde o latim e sempre em português, de palavra paroxítona,
não proparoxítona, sendo sua sílaba tônica “bri”, e não “ru”, motivo por
que não há de ser graficamente acentuada (SACCONI, 1979, p. 19).
Rima, assim, com rica e nanica.
6. Aires da Mata Machado Filho (1969h, p. 1.436) lembra que a pronúncia
proparoxítona carece de apoio na etimologia.
7. Esse mesmo modo de localizar a sílaba tônica na palavra é também
observado por Arnaldo Niskier (1992, p. 2) em obra de elevado cunho
prático.
8. E Vasco Botelho de Amaral não destoa desse entendimento: “é evidente
que a pronúncia escorreita exige o acento tônico no i, donde fugiu talvez
por influência analógica das palavras terminadas semelhantemente”,
como súplica.
9. Em adendo, tal autor observa que, “afora o étimo latino rubrica, grave,
determina a tonicidade paroxítona a consideração da palavra como
derivada regressiva de rubricar”; e aduz um terceiro argumento em tal
favor, representado pela circunstância de que “dois terços das palavras
portuguesas são graves” (AMARAL, 1939, p. 87).
10. Espancando eventuais dúvidas remanescentes, também é rubrica (bri) a
grafia apresentada pelo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa,
da Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de
determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma, além de sua
grafia e pronúncia oficiais (2009, p. 730).
Ruim
1. É adjetivo que significa aquilo que é inútil, que não tem préstimo, que
não é bom. Ex.: “A situação processual do réu é muito ruim”.
2. Seu comparativo de superioridade é pior e seu superlativo absoluto
sintético é péssimo.
3. Quanto à prosódia, trata-se de palavra oxítona (SACCONI, 1979, p. 19).
4. Pelas regras da língua portuguesa, não tem razão alguma para receber
acento gráfico, conforme preceitua a primeira observação da quarta regra
de acentuação gráfica do Formulário Ortográfico: “não se coloca o
acento agudo no i e no u quando, precedidos de vogal que com eles não
forma ditongo, são seguidos de… m”.
5. Para Eliasar Rosa, “pronuncia-se ruim como rima de assim” (1993, p.
128).
6. Lembra Édison de Oliveira (s/d, p. 100), como estratagema de facilitação
de sua pronúncia, que tal palavra está na mesma linha de dicção do
vocábulo ruína.
7. A pronúncia oxítona de tal vocábulo é também observada por Arnaldo
Niskier (1992, p. 1) em obra de elevado cunho prático.
8. Lembrando que se trata de palavra que rima com Caim, transcreve-se a
lição de José de Nicola e Ernani Terra (2000, p. 197): “Esse adjetivo,
derivado de ruína (coisa destruída, acabada), é dissílabo oxítono. Sua
pronúncia correta é ru-im (o i nasal é a vogal tônica). Não se justifica,
portanto, a pronúncia popular que acentua o u (rúim).
9. Espancando qualquer possibilidade de dúvida, o próprio Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras –
que é o veículo oficial para registrar o modo de pronunciar as palavras
em nosso idioma – em sua edição de 2004 (p. 699), fazia questão de,
entre parênteses, indicar a separação das sílabas, sinalizando para o hiato
e indicando a localização da vogal tônica com um acento gráfico (u-ím).
S
Sair para fora – Pleonasmo?
1. Esta é mais uma daquelas expressões equivocadas e redundantes,
portadora de tautologia, ou pleonasmo vicioso.
2. Sair já significa movimentar-se para o exterior de algo.
3. Diga-se, portanto, tão somente, sair.
Salvante – Existe?
1. Trata-se de preposição empregada no sentido de exceto, senão, com
exceção de, menos. Ex.: “As criadas e o escudeiro já ancião foram
substituídos, salvante Maria Miguel” (Camilo Castelo Branco).
2. Como preposição, manda Napoleão Mendes de Almeida que se deixe
invariável tal palavra exatamente por força de sua categoria. Ex.:
“Salvante os menores…”
3. Para tal autor, que estende a lição para durante e tirante, “flexionar hoje,
com esta função, essas palavras é incorrer em arcaísmo” (ALMEIDA,
1981, p. 314).
4. Por outro lado, embora seja certo que as preposições normalmente rejam
caso oblíquo (sem mim, para mim, contra mim), anota Edmundo Dantès
Nascimento (1982, p. 9) que salvante rege eu e tu, observando tal autor
que a razão desse emprego está em que tal vocábulo não é
originariamente preposição. Ex.: “Salvante eu e tu, os demais se
dobraram àquelas propostas”.
Salvar
1. Em tese, esse verbo é abundante, apresentando salvado e salvo como
particípios passados, aquele regular, este irregular.
2. Para Vitório Bergo, todavia, “os particípios fortes ganho, gasto, pago,
salvo tendem a suplantar as formas em ado, pois que se usam
normalmente com os dois tipos de auxiliares” (1943, p. 182).
3. Otelo Reis, todavia, insere-o na relação dos verbos da primeira
conjugação “em que subsistem os dois particípios” (1971, p. 90).
4. E Domingos Paschoal Cegalla é ainda mais categórico nesse último
sentido: a) “Emprega-se o particípio regular salvado com os verbos ter e
haver nos tempos compostos da voz ativa: O bombeiro tinha (ou havia)
salvado muitas vidas”; b) “O particípio irregular salvo se usa com o
verbo ser, na voz passiva: O menino foi salvo pelo pai” (1999, p. 363).
Ver Salve! (P. 678), Salvo (P. 678) e Verbos abundantes (P. 759).
Salve!
1. Silveira Bueno, partindo do exemplo “Salvem os heróis!” – que, segundo
ele, equivale à frase optativa “Que os heróis sejam saudados”, até
porque salve está aqui com o sentido de saudar –, anota que, sendo
salvem um verbo, deve ele ir para o plural.
2. E justifica que, em latim, uma era a forma para o singular (salve) e outra
para o plural (salvete); assim: “Salve, puer!”; “Salvete, pueri!”
(BUENO, 1957, p. 459).
3. Na lição do Padre José F. Stringari, contudo, “o termo salve, embora seja
verbo em sua origem, é hoje interjeição pura”, motivo por que “não se
flexiona”.
4. E exemplifica com excertos dos mais autorizados escritores
(STRINGARI, 1961, p. 73): a) “Salve, florestas virgens!” (Fagundes
Varela); b) “Salve, florinhas símplices!” (Antônio Feliciano de Castilho).
5. Sousa e Silva reitera-lhe o caráter de interjeição (e, portanto, de palavra
invariável), transcrevendo significativo exemplo de Rui Barbosa: “Salve,
bravos jangadeiros do Norte; sede bem-vindos às nossas praias”.
6. E, por sua própria condição de interjeição, empregada quase sempre com
expressão vocativa, complementa tal gramático que não tem, pois,
cabimento o artigo que muitos lhe associam (SILVA, A., 1958, p. 260-1):
“Salve, Mestre!” (e nunca “Salve o Mestre”).
7. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, que é o veículo oficial para dirimir dúvidas acerca
da categoria gramatical a que pertencem os vocábulos de nosso idioma,
confirma-lhe, para o que aqui interessa, a natureza de interjeição, o que
lhe define a própria invariabilidade (2009, p. 738).
Ver Salvar (P. 678), Salvo (P. 678) e Viva os brasileiros! ou Vivam os
brasileiros!? (P. 784)
Salvo
1. Um primeiro aspecto a ser esclarecido concerne a saber se o correto é
dizer salvo o caso ou salvo no caso, isto é, se se usa ou não a preposição
após tal palavra.
2. Por um lado, diferentemente de exceto, a palavra salvo aí – embora sua
origem primeira seja o particípio passado irregular do verbo salvar – é
preposição, e a preposição, em nosso idioma, vem imediatamente
acompanhada pela palavra por ela regida, sem interposição de nenhuma
outra partícula de ligação, razão pela qual, em princípio, seria correto
dizer “Salvo o caso de doença, as faltas serão descontadas”, e seria
incorreto dizer “Salvo no caso de doença, as faltas serão descontadas”.
3. Lembra, todavia, José de Sá Nunes que, à semelhança de exceto, “é certo
que nos melhores padrões da vernaculidade se nos depara o emprego de
salvo seguido de preposição, fazendo o papel de puro advérbio de
exclusão. E a razão disso é que… uma palavra substantiva ligada a outra
por uma partícula excetiva deve estar na forma correspondente à função
que exerce a palavra a que se liga” (1938, p. 117-8). Exs.: a) “… não se
pinta ordinariamente o acento, salvo nos casos em que só o acento
distingue palavras escritas com as mesmas letras” (Mário Barreto); b)
“Ela o sentira e escondera sempre de todos, salvo de seu pai” (Camilo
Castelo Branco).
4. Num segundo aspecto, inserindo-se tal vocábulo no rol dos “adjetivos
usados eventualmente como preposição” (PEREIRA, 1924, p. 153), para
o magistério de Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 284), trata-se de
palavra invariável, que não acompanha a flexão da palavra que a segue,
mesmo que esta seja feminina ou plural. Exs.: a) “Salvo as hipóteses de
doença ou morte na família, as faltas serão descontadas” (correto); b)
“Salvas as hipóteses de doença ou morte na família, as faltas serão
descontadas” (errado).
5. Esclarece José de Sá Nunes, nesse sentido, que, a exemplo do que ocorre
com a palavra exceto, na atualidade, o emprego normal tem sido a forma
invariável, já que salvo “se não emprega hoje como particípio passado, e
sim como preposição” (1938, p. 117).
6. Já Sousa e Silva (1958, p. 263) lembra, por um lado, que tal palavra
“fica geralmente invariável em nossos dias”; por outro lado, ressalva que
“um ou outro escritor ainda emprega, às vezes, as formas flexionadas”.
7. Heráclito Graça, por primeiro, traz lição de Cândido de Figueiredo –
para depois contrariá-la – no sentido de que salvo é preposição, e seria
erro crasso flexionar tal vocábulo, para fazê-lo concordar com o
substantivo, como se fosse adjetivo.
8. Em seguida, entende o primeiro gramático ser absolutamente
insustentável essa opinião de privar tal adjetivo do direito de exprimir a
ideia que lhe é própria e ao mesmo tempo idêntica à da preposição em
que se converte.
9. E resume ele seu posicionamento, em lição que abrange salvo e exceto:
“Tão correta é a sintaxe com qualquer dos referidos adjetivos
concordando com o substantivo, como com qualquer deles tornado
preposição. Vale o mesmo dizer: ‘Tudo lhe é indiferente, excetas as
mulheres’…e ‘Tudo lhe é indiferente, exceto as mulheres’”.
10. E cita tal autor, apenas em Alexandre Herculano, três exemplos de uso
de salvo como adjetivo, variando de acordo com o substantivo
modificado: a) “Os árabes viram dentro em pouco os homens hispano-
godos irem-se amoldando aos seus hábitos e ideias, salvas as crenças
religiosas, última coisa que as nações abandonam”; b) “… salva a
diferença de limites…”; c) “… salvas aquelas quatro regalias…”
(GRAÇA, 1904, p. 282-7).
11. Laudelino Freire (1937b, p. 101), sem explicações adicionais,
aconselha o emprego de tal vocábulo como adjetivo, fundando-se em
exemplos clássicos: a) “Salvos os casos de necessidade, ou utilidade, e
boa adaptação vernácula, voto contra o neologismo” (Rui Barbosa); b)
“Salvas as alterações transitórias…” (Alexandre Herculano).
12. Em outra obra, o mesmo autor defende a duplicidade de emprego de
salvo – ora variável, ora invariável – asseverando com autoridade que
tal vocábulo “é de uso vulgar como preposição, mas também
empregado como adjetivo”, alinhando exemplos de autores abalizados
(FREIRE, 1937a, p. 97): a) “… matando todos os primogênitos, salvas
somente as casas dos israelitas” (Padre Manuel Bernardes); b) “… os
limites boreais e austrais de Portugal eram os mesmos…, salvas as
alterações transitórias” (Alexandre Herculano); c) “… o amor, salvas
as legítimas consequências do matrimônio, nunca pode ser ato sério”
(Camilo Castelo Branco).
13. Em mesma esteira, lembra, por um lado, Artur de Almeida Torres que
“as palavras exceto e salvo, consideradas outrora preposições
acidentais, e hoje como palavras denotativas de exclusão, empregam-se
geralmente como invariáveis, no uso atual da língua”.
14. Por outro lado, acrescenta tal autor que “entre os clássicos… era
comum fazer-se a concordância delas com o substantivo seguinte, o
mesmo se verificando entre alguns escritores eruditos de hoje”
(TORRES, 1966, p. 133).
15. A possibilidade de uso de ambas as construções emerge, de igual
modo, da lição de Carlos Góis, o qual, após defender a invariabilidade
de vocábulos dessa natureza, em virtude de seu aspecto de preposição
acidental, acrescenta, entretanto, que eles, “no estilo enfático, na língua
enérgica e incisiva, reassumem a forma originária de adjetivos
participiais, e, como tal, variam” (1943, p. 206).
16. Segundo lição de Evanildo Bechara, palavras desse porte são formas
verbais de particípio, que “passaram a ter emprego equivalente a
preposição e advérbio… e, como tais, normalmente devem aparecer
invariáveis”.
17. Acrescentando, contudo, que não se perdeu de todo a consciência de
seu antigo valor, adiciona que muitos escritores procedem à
concordância regular, e invoca lição de Epifânio Dias, para quem
flexionar um tal vocábulo “é expressar-se na verdade com correção
gramatical, mas de modo desusado” (BECHARA, 1974, p. 302).
18. Doutrina João Ribeiro que “as preposições muitas vezes derivam de
particípios que se tornam momentaneamente invariáveis: salvo, exceto,
durante etc.”
19. Em continuação, entretanto, complementa que se pode, contudo,
“dizer: ‘salvos os motivos’, ‘excetas as razões’”.
20. E arrola diversos exemplos de concordância de tais palavras com os
substantivos a que se referem, retirados de Rui Barbosa, de Vieira e de
Bernardes, contrariando, assim, lição de Cândido de Figueiredo, que
recusa foros de correção vernácula a construções dessa natureza
(RIBEIRO, João, 1923, p. 205).
21. Nos textos de lei, tal vocábulo às vezes vem invariável, às vezes
variável: a) “… O produto do seu trabalho assim auferido e os bens
com ele adquiridos constituem, salvo estipulação diversa em pacto
antenupcial, bens reservados…” (CC/1916, art. 246, 2ª parte, em
redação não repetida pelo CC/2002); b) “… salvo comprovada má-
fé…” (Lei 7.347, de 24/7/85, art. 18); c) “O locatário é obrigado: … IV
– a restituir a coisa, finda a locação, no estado em que a recebeu,
salvas as deteriorações naturais ao uso regular” (CC, art. 569, IV,
repetindo a redação do CC/1916, art. 1.192, IV).
22. Em abono dessa duplicidade de construções, é de se ver que, por um
lado, no art. 1.189, I, do Projeto do Código Civil, constava a estrutura
invariável “salvo cláusula expressa em contrário”, estrutura essa que
não mereceu questionamento algum de Rui Barbosa (1949, p. 329-30);
por outro lado, o art. 1.193, IV, do Projeto, apresentava o vocábulo com
flexão em regular concordância com o substantivo, o que também não
foi alvo de objeção alguma do ilustre erudito, de modo que assim se
cristalizou o art. 1.192, IV, do Código Civil de 1916: o locatário é
obrigado “a restituir a coisa… salvas as deteriorações naturais”.
23. Ante a divergência entre os conhecedores da Gramática, guardando
fidelidade ao vetusto princípio de que, na divergência, deve-se conferir
liberdade ao usuário, vê-se que estão autorizadas ambas as construções:
a) deixar invariável o vocábulo salvo em tais construções, realçando-
lhe o caráter de preposição; b) flexioná-lo normalmente, como se dá
com todo adjetivo, em regular concordância com o substantivo a que se
refere.
24. Adverte, por fim, Celso Cunha, apegado ao aspecto de preposição
acidental, que, depois de tal palavra, empregam-se as formas eu e tu,
jamais mim ou ti. Ex.: “Todos, salvo eu, sustentam tese contrária”
(1970, p. 147).
25. Nesse mesmo aspecto, para Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 9),
essa palavra, com função de preposição, rege eu e tu, observando tal
autor que a razão desse emprego está em que o mencionado vocábulo
não é originariamente preposição.
Ver Salvar (P. 678) e Salve! (P. 678)
Sanar ou Sanear?
1. Uma leitora indaga qual a forma correta de expressão: sanar as falhas
apontadas ou sanear as falhas apontadas?
2. Em realidade, existem em português ambos os verbos, sanar e sanear, o
primeiro, nascido ainda no latim, do verbo sanare, e o segundo já
formado em português, do radical san mais o sufixo ear (originariamente
iar).
3. Uma consulta aos nossos mais conhecidos dicionaristas da atualidade –
Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (2010, p. 1.884) e Antônio Houaiss
(2001, p. 2.508-9) – revela que, de um modo geral, têm ambos um
núcleo semântico comum; a) para sanar, conferem a acepção de curar,
sarar, tornar são, reparar, obstar e desfazer; b) para sanear, os
significados conferidos são curar, sarar, tornar são, reparar, coibir,
remediar e limpar.
4. Para sanar, mencionam tais dicionaristas as seguintes expressões: a)
sanar um enfermo; b) sanar uma injustiça; c) sanar um mal; d) sanar um
desequilíbrio fiscal; e) sanar um problema de desenvolvimento.
5. Já para sanear, conferem eles os seguintes exemplos: a) sanear os
pântanos; b) sanear as valas negras; c) sanear a população atingida
pela epidemia; d) sanear uma injustiça; e) sanear a corrupção; f) sanear
as finanças públicas; g) sanear os erros da administração anterior.
6. Da própria comparação entre os exemplos dados, vê-se, num primeiro
aspecto, que uma mesma acepção foi conferida, em um dos casos, para
ambos os verbos: sanar uma injustiça ou sanear uma injustiça.
7. Num segundo aspecto, vê-se que ora se empregou um verbo, ora se
empregou outro para expressões que podem ser tidas como sinônimas,
similares e intercambiáveis: sanar o desequilíbrio fiscal e sanear as
finanças públicas; sanar um mal e sanear a corrupção; sanar um
enfermo e sanear a população atingida pela epidemia. E o contexto
mostra que nada impediria fossem trocados tais verbos, sem perda ou
alteração de significado.
8. E, assim, em resposta específica à indagação da leitora, podem-se fazer
as seguintes afirmações: a) por um lado, talvez haja uma ou outra
expressão consagrada no idioma, em que esteja cristalizado emprego de
sanar ou de sanear; b) dificilmente, entretanto, se verá algum exemplo
em que ambos os verbos não possam ser tidos como sinônimos e
intercambiáveis; c) e, de modo específico para os exemplos trazidos para
análise, pode-se afirmar com segurança que é optativo o emprego de
qualquer deles: sanar as falhas apontadas ou sanear as falhas
apontadas.
Sargenta – Existe?
Ver Capitã, Capitoa ou A Capitão? (P. 168) e Poeta – Qual o feminino? (P.
570)
Sede
Ver Em sede de – Estrangeirismo? (P. 315)
Sedizente – Galicismo?
1. Encontra-se, em um ou outro autor nacional, a palavra sedizente,
tradução literal do francês soi-disant. Ex.: “O sedizente proprietário
pode, muito bem, não exercer o efetivo domínio sobre a coisa”.
2. É forte a censura de José de Sá Nunes contra o uso de tal palavra, a qual
assevera não haver logrado, até agora, “entrar em obra de escritor que
sabe a sua língua”.
3. E tal autor busca dar a causa dessa ocorrência: “Porque,
irredarguivelmente, só emprega neologices que tais quem não conhece
os maravilhosos recursos do nosso opulentíssimo idioma. Aquele que
tem vasta leitura dos clássicos e dos bons autores modernos não carece
de lançar mão de neologismos destrambelhados, feitos a machado e a
martelo, sem respeito às leis etimológicas e fonéticas, e sem obediência
aos mais comezinhos princípios da analogia e das regras de derivação
portuguesa” (NUNES, 1938, p. 223).
4. Para espancar eventuais dúvidas, anota-se que o Vocabulário Ortográfico
da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, que é o veículo
oficial para registrar as palavras existentes em nosso idioma, não a
registra, o que significa que seu uso não está autorizado entre nós, em
textos que devam submeter-se à norma culta.
5. Quanto a soi-disant, trata-se de galicismo a ser facilmente evitado, já
que, mesmo não tendo tradução ou equivalência gráfica em vernáculo,
pode, conforme o caso, ser substituído por um sinônimo: autointitulado,
falso, inculcado, pretenso, suposto…
Se eu vir ou Se eu vier?
1. A questão precisa ser analisada do ponto de vista da conjugação verbal.
2. Por primeiro, se se pensa no verbo vir, o futuro do subjuntivo é se eu
vier, se tu vieres, se ele vier, se nós viermos, se vós vierdes, se eles
vierem. Exs.: a) “Se eu vier de São Paulo em tempo, irei à solenidade”;
b) “Se nós viermos de São Paulo no mesmo voo, eu lhe darei uma
carona do aeroporto até sua casa”.
3. É muito importante tal distinção, pois seguem a conjugação de vir toda
uma série de compostos: advir, convir, desavir-se, intervir, provir,
reconvir, sobrevir.
4. Porém, se se pensa no verbo ver, o futuro do subjuntivo, então, é se eu
vir, se tu vires, se ele vir, se nós virmos, se vós virdes, se eles virem.
Exs.: a) “Se eu vir o responsável, direi a ele que você chegou”; b) “Se
nós virmos o responsável, diremos a ele que você chegou”. Evite-se,
portanto, a forma errônea bastante comum: “Se eu ver o responsável,
direi a ele que você chegou”.
5. Também aqui é muito importante a distinção, pois seguem a conjugação
de ver toda outra série de compostos: antever, entrever, prever, rever.
Conferir Ver – Como conjugar? (P. 764) e Vir (P. 770).
Se evadiu ou Evadiu-se?
1. Um leitor, dizendo-se policial, diz ter dúvidas sobre uma das frases mais
usadas pela polícia: “O meliante evadiu-se”. E indaga qual das formas é
correta: a) “O meliante evadiu”; b) “O meliante evadiu-se”; c) “O
meliante se evadiu”?
2. Uma atenta leitura dos exemplos trazidos pelo leitor mostra que ele, em
realidade, tem duas dúvidas: a) se o verbo evadir é pronominal (evadir-
se) ou não (evadir); b) em sendo pronominal, se o pronome pessoal
oblíquo átono vem antes do verbo ou depois do verbo.
3. Quanto à primeira dúvida, Francisco Fernandes, com base em exemplos
de abalizados escritores, confere a esse verbo, no sentido de escapar ou
fugir às ocultas, apenas a construção como pronominal, isto é,
acompanhado do pronome se (1971, p. 332). Celso Pedro Luft segue
exatamente em mesma esteira (1999b, p. 286). Confiram-se, assim: a)
“O meliante evadiu-se” (correto); b) “O meliante evadiu” (errado). Não
há necessidade de prolongar as discussões quanto a isso.
4. Quanto à segunda dúvida, referente à colocação do pronome, importa
observar, de início, que, em tese, um pronome pessoal oblíquo átono
pode-se colocar em três posições na frase: a) antes do verbo, ou seja, em
próclise (“Não me amole!”); b) no meio do verbo, ou seja, em mesóclise
(“Dir-se-á que não trabalhamos”); c) após o verbo, ou seja, em ênclise
(“Deram-me notícia falsa”).
5. E, ainda antes de discutir o mérito da questão, em raciocínio que sempre
deve ser repetido em tais circunstâncias, observam-se os seguintes
aspectos no exemplo dado: a) o verbo é evadir-se; b) o pronome, cuja
colocação está sendo discutida, é o se; c) o verbo está num tempo
simples (ou seja, não é composto, nem é locução verbal, o que
acarretaria observações um pouco diversas); d) o verbo não está no
futuro do presente, nem no futuro do pretérito (de modo que se descarta
totalmente a possibilidade de ocorrência de mesóclise), e, assim, restam,
na prática, apenas as possibilidades de próclise (pronome antes do verbo)
e de ênclise (pronome após o verbo).
6. Com essas premissas, deve-se atentar aos seguintes aspectos: a) o lugar
natural do pronome, nesses casos, é em ênclise; b) esse pronome apenas
é atraído, em próclise obrigatória, quando há, logo antes do verbo,
alguma das chamadas palavras atrativas; c) as palavras atrativas são (i)
as negativas, (ii) os advérbios, (iii) os pronomes relativos, (iv) os
pronomes indefinidos e (v) as conjunções subordinativas; d) no caso sob
análise, meliante é um substantivo e não se encaixa em nenhuma dessas
categorias; e) se é assim, conclui-se que não há palavra atrativa alguma;
f) então não há motivo para a próclise obrigatória, e a colocação natural
do pronome é em ênclise.
7. Tecem-se algumas ponderações adicionais: a) o sujeito é meliante, e o
verbo é evadiu-se; b) não há palavra atrativa logo antes do verbo; c) o
exemplo está na ordem direta (sujeito + verbo + complemento); d)
quando se tem essa duplicidade de condições – exemplo na ordem direta
e ausência de palavra atrativa antes do verbo – , então, além da ênclise,
também se faculta o uso do pronome em próclise.
8. Com essas considerações, responde-se ao leitor de modo direto e prático:
a) quanto à primeira dúvida, o verbo evadir-se, no sentido de escapar ou
fugir às ocultas, é pronominal, de modo que deve vir obrigatoriamente
acompanhado pelo pronome; b) desse modo, é correto o primeiro
exemplo (“O meliante evadiu-se”), mas errado o segundo (“O meliante
evadiu”); c) quanto ao segundo exemplo, por não haver palavra atrativa
antes do verbo, o lugar natural do pronome é após o verbo, em ênclise
(“O meliante evadiu-se”); d) se houvesse palavra atrativa antes do verbo,
seria obrigatória a próclise (“O meliante não se evadiu”); e) em mesma
esteira, porque não há palavra atrativa antes do verbo e porque o
exemplo está na ordem direta, também é correta a colocação do pronome
antes do verbo, em próclise (“O meliante se evadiu”).
9. Por facilidade, confiram-se os exemplos seguintes, com a indicação de
seu acerto ou erronia entre parênteses: a) “O meliante evadiu” (errado);
b) “O meliante se evadiu” (correto); c) “O meliante evadiu-se” (correto);
f) “O meliante não se evadiu” (correto); e) “O meliante não evadiu-se”
(errado).
10. Vale acrescer que, em casos como o trazido pelo leitor, de emprego
facultativo da ênclise ou da próclise, a ênclise é mais usada em
Portugal; no Brasil, a preferência é pela próclise.
Seguir
1. Tendo o grupo gu, neste caso, a exclusiva finalidade de conferir ao g seu
som original antes de e e de i, os verbos em guir (quando o u não é
proferido) perdem o u antes de a e de o. Assim: sigo, segues, seguimos,
sigamos.
2. Seguem o mesmo modelo todos os verbos terminados em guir, desde
que o u não seja pronunciado (conseguir, distinguir, extinguir,
perseguir, prosseguir).
3. A propósito, Carlos Góis e Herbert Palhano (1963, p. 113) lembram,
com propriedade, que, dos verbos terminados em guir, apenas arguir e
redarguir têm o u pronunciado.
Segunda-feira ou segundafeira?
1. Um leitor indaga qual das formas é correta: segunda-feira ou
segundafeira? E justifica sua dúvida com a explicação de que, pelas
novas regras do Acordo Ortográfico de 2008, não se usa mais o hífen
quando o primeiro elemento termina por vogal, e o segundo começa com
outra consoante que não seja h.
2. Em realidade, a dúvida do leitor resulta do fato de que ele se equivocou
ao tomar uma regra de uso do hífen nos prefixos e tentou aplicá-la à
formação dos substantivos compostos.
3. Nos prefixos, sim, existe uma regra segundo a qual não mais se emprega
o hífen, se o prefixo termina por vogal e o elemento que vem após ele se
inicia por consoante que não seja h. Assim, antedatar, contrapor,
seminovo.
4. Mas com os substantivos compostos, as regras são diferentes, e existe
uma determinação específica do Acordo Ortográfico para emprego do
hífen nas palavras compostas por justaposição, que contenham um
elemento numeral, e que constituam uma unidade semântica. É
exatamente o caso de segunda-feira e dos demais dias da semana com
mesma estrutura: terça-feira, quarta-feira, quinta-feira e sexta-feira.
5. É na forma segunda-feira que o vocábulo aparece no Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de
Letras, que é quem detém a autoridade para dizer oficialmente como se
grafam os vocábulos do nosso idioma (2009, p. 746).
6. Apenas para complementar com informação importante, seu plural é
segundas-feiras.
Sejam… sejam
Ver Seja… seja (P. 684).
Seja… seja
1. É vocábulo que pode ser usado em repetição, como conjunção
coordenativa alternativa. Ex.: “Seja réu, seja autor, todos são credores
de igual tratamento na estrutura do processo civil”.
2. Em tal caso, talvez pela própria categoria gramatical a que pertence (é
conjunção e não verbo), Gladstone Chaves de Melo a trata como palavra
invariável, não importando que venha seguida de termo no plural, como
se pode ver da seguinte passagem: “Para classificar corretamente as
conjunções, seja as coordenativas, seja as subordinativas, é necessário
sempre raciocinar” (1970, p. 175).
3. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 368) também afirma ser ela
palavra invariável. Ex.: a) “A abundância é o estado de fartura e riqueza
que possibilitaria a plena satisfação de todas as necessidades
econômicas, seja as de bens de consumo, seja as de serviços” (Paulo
Sandroni); b) “… seja um leitor, um cômico, um tocador de lira, seja os
três ao mesmo tempo” (Maria José de Queirós).
4. Já Rui Barbosa, por seu lado, leva em conta a forma verbal e faz a
concordância regular do vocábulo, como se vê no seguinte trecho de
seus Comentários à Constituição Federal Brasileira: “Sejam várias,
sejam muitas, ou seja uma só espécie, … tudo é um…” (BARBOSA
apud MENDES NETO, 1949, p. 64-5).
5. Ante a divergência entre autoridades da língua, deve-se aplicar o
princípio da liberdade de emprego, de modo que se hão de considerar
corretas ambas as estruturas.
Ver Ou seja (P. 538).
Seje – Está correto?
1. Trata-se de forma verbal que não existe, muito embora de uso bastante
como, assim como outra igualmente errada, que é esteje, entre pessoas
de menor cultura.
2. É correta apenas a grafia seja.
3. Não confundi-la com sua parônima sege com e aberto (sége), substantivo
que significa coche, carruagem.
Ver Ser (P. 693).
Sem-pão
Ver Sem-vergonha ou Sem vergonha? (P. 686)
Sem-partido
Ver Sem-vergonha ou Sem vergonha? (P. 686)
Sem-pátria
Ver Sem-vergonha ou Sem vergonha? (P. 686)
Sem-teto
Ver Sem-vergonha ou Sem vergonha? (P. 686)
Senador
1. Para muitos, inexiste justificativa para a construção “Ele foi eleito
senador ao congresso nacional”.
2. Entendem estes, em tal caso, que congresso nacional é simples adjunto
adnominal (ou complemento restritivo, que, em latim, é representado
pura e simplesmente por um genitivo), devendo-se dizer: “Ele foi eleito
senador do congresso nacional”.
3. E, aos vocábulos deputado e vereador, aplicar-se-iam as mesmas
observações: os vereadores da câmara municipal, os deputados da
assembleia legislativa.
4. Até mesmo contrariamente a essa lição, todavia, Francisco Fernandes
(1969, p. 348) apenas admite sintaxe com a preposição por: “A
nomeação de um senador pela Bahia fora motivo para sérios
aborrecimentos” (Luiz Viana Filho); b) “Ainda assim, não vimos tarde
para oferecer destas colunas à atenção dos nossos leitores a carta do
ex-senador pelo Estado do Rio de Janeiro” (Rui Barbosa).
5. Também Celso Pedro Luft (1999, p. 472) pugna pela sintaxe exclusiva
com a preposição por: “Senador por um Estado”; “Rui Barbosa foi
senador pela Bahia”; “senador pelo Estado da Bahia”.
6. Não parece, todavia, a uma análise mais aprofundada, haver motivo
algum diferenciação de sintaxe entre esses três cargos do Poder
Legislativo nos diferentes níveis, para que não se acatem as construções
com qualquer de três preposições: de, a e por: a) “Os senadores de São
Paulo insurgiram-se contra a providência pretendida”; b) “Ele foi eleito
senador ao congresso nacional”; c) “Ele foi eleito senador por São
Paulo”.
7. Interessante, também, é anotar a indevida diferença de tratamento entre
vocábulos de natureza similar, como deputado, senador e vereador, que,
apenas para exemplo, fazem Francisco Fernandes (1969, p 126) e Celso
Pedro Luft (1999, p. 152): para deputado, ambos admitem as sintaxes
com as preposições a e por, para senador, como visto, aquele apenas
admite complemento com a preposição por, em procedimento seguido
por este; e, para vereador, o primeiro continua admitindo tão somente a
construção com a preposição por, enquanto o segundo é mais liberal
para, além de por, pugnar adicionalmente pela possibilidade de sintaxe
com a preposição a.
Senão ou Se não?
1. Há de se escrever uma só palavra, quando significar do contrário, mas, a
não ser, mas também. Exs.: a) “Senhor advogado, não insista em
perguntas tendenciosas, senão elas serão indeferidas” (do contrário); b)
“A advertência do magistrado não teve por escopo cercear a defesa,
senão dar cumprimento às regras de processo em vigor” (mas); c)
“Ninguém havia, senão três das testemunhas arroladas” (a não ser); d)
“Era um magistrado não apenas culto, senão (ou senão também) justo”
(mas também).
2. Quando o significado não for algum dos quatro alinhados, duas serão as
palavras: o se exercerá a função de conjunção subordinativa condicional,
que admitirá até mesmo a substituição por conjunção sinônima (caso,
por exemplo); o não há de ser normalmente um advérbio de negação.
Ex.: “Se não fosse o patrono, a vítima teria agredido o réu” (caso não
fosse…).
3. Analisando o exemplo “Não o fez João, senão Pedro”, Mário Barreto
assim se expressa: “Este senão, com o sentido de mas, é conjunção
adversativa e escreve-se numa só palavra” (1955, p. 48).
4. Em apropriado resumo, lembram Regina Toledo Damião e Antonio
Henriques (1994, p. 229-30) que senão é “conjunção adversativa
significando em caso contrário, de outra forma, mas sim, a não ser”, ou
mesmo “substantivo com o sentido de falha, defeito”, enquanto se não é
aproximação de um se que é conjunção condicional e um não que é
advérbio de negação.
5. Como substantivo, o plural de senão é senões. Ex.: “Ele apontou vários
senões na tramitação do processo”.
6. Arnaldo Niskier, por um lado, assim resume o ensinamento a respeito
das grafias aqui consideradas: “Senão é usado quando significa: a) caso
contrário (Venha, senão vai se arrepender); b) mas sim (Não quero seu
amor, senão sua amizade); c) a não ser (Não faz nada senão beber). Se
não é usado em todos os outros casos.
7. Por outro lado, traz tal autor importante acréscimo: “Em alguns casos
pode-se usar uma ou outra forma, adaptando para isso a pontuação:
‘Tomara que chova, senão a safra será ruim’. ‘Tomara que chova; se
não, a safra será ruim’” (NISKIER, 1992, p. 63).
8. Vale trazer à lembrança a advertência de Laudelino Freire quanto à
diferença entre senão e se não: “Cumpre ter em atenção o emprego exato
destas expressões. Senão é conjunção adversativa, que tem o mesmo
sentido de mas ou porém; se não é expressão formada pela conjunção
condicional se seguida do advérbio não” (1937b, p. 102).
9. Os textos de lei têm empregado corretamente o vocábulo, de acordo com
sua real acepção: a) “A validade das declarações de vontade não
dependerá de forma especial, senão (a não ser) quando a lei
expressamente a exigir” (CC, art. 129); b) “Ninguém pode reclamar o
que, por uma obrigação anulada, pagou a um incapaz, se não
(conjunção condicional + advérbio) provar que reverteu em proveito
dele a importância paga” (CC, art. 157); c) “A interrupção operada
contra um dos herdeiros do devedor solidário não prejudica aos outros
herdeiros ou devedores, senão (a não ser) quando se trate de obrigações
e direitos indivisíveis” (CC, art. 176, § 2º).
10. Não se olvide que, conforme o sentido concreto da palavra ou
expressão num dado contexto, a questão vai ficar na dependência do
sentido, observando-se adicionalmente que o conteúdo semântico de
ambas as formas está muito próximo um do outro, de modo que não
será tão fácil a separação dos significados.
11. Assim, por exemplo, pode-se dizer “Se não, vejamos…”, querendo
significar o seguinte contexto: “Se ainda não está de acordo com o que
estou dizendo, vejamos os seguintes elementos adicionais…”
12. Por outro lado, pode-se dizer “Senão vejamos…”, querendo que o
conteúdo semântico seja: “Caso contrário, vejamos…”
Sendo que
1. Trata-se de locução conjuntiva causal, sinônima de desde que,
porquanto, porque, uma vez que. Ex.: “Sendo que terminara a audiência,
todos se retiraram do local”.
2. Esse é o seu único emprego correto, e será errôneo qualquer outro uso
dessa expressão, como se dá com o sentido de e ou de mas. Exs.: a) “Os
autores concordam com essa teoria, sendo que os nacionais são ainda
mais enfáticos” (errado); b) “O advogado contentou-se com duas
testemunhas, sendo que preferiria ter ouvido todas as arroladas”
(errado).
3. Tais frases podem ser assim facilmente corrigidas: a) “Os autores
concordam com essa teoria, e os nacionais são ainda mais enfáticos”; b)
“O advogado contentou-se com duas testemunhas, mas preferiria ter
ouvido todas as arroladas”.
4. O desembargador Geraldo Amaral Arruda, em contínua luta para a
melhoria da linguagem dos novos juízes paulistas, aponta a frequência e
a erronia de seu emprego nos meios forenses, quer como conjunção
adversativa, quer como conjunção aditiva, quer mesmo como pronome
relativo, e indica, por modo de correção, a substituição pela conjunção
adequada, se for o caso, “ou a sua supressão, com a colocação de ponto
final ou ponto e vírgula” (1987, p. 9-10).
5. Em outra obra, tal autor (1997, p. 109) – observando que vem sendo
empregada tal locução, de modo errôneo e frequente, como maneira fácil
e indevida de “esticar” a frase, e isso fora do sentido de relação causal,
em prejuízo da clareza e do estilo – reitera que “muitas vezes a elocução
ficará melhor com a simples supressão do sendo que e sua substituição
por ponto e vírgula. Outras vezes ficará melhor com o emprego da
conjunção e ou de uma adversativa. E outras vezes o sendo que pode ser
substituído pelo gerúndio do verbo principal da oração introduzida por
essa locução (ex.: “… sendo que ele deve…” por “… devendo ele…”).
6. Na lição de Domingos Paschoal Cegalla, essa “não é expressão
recomendável para unir orações. Em alguns casos, convém dispensá-la
por ser inútil; em outros, é preferível substituí-la por uma conjunção ou
por um pronome relativo”.
7. E ele próprio dá três exemplos, seguidos das respectivas correções
(CEGALLA, 1999, p. 370): a) “O pescador trouxe muitos peixes do rio,
sendo que alguns deles ainda estavam vivos” (errado); b) “O pescador
trouxe muitos peixes do rio, alguns deles ainda vivos” (correto); c) “O
rio invadiu parte da cidade, sendo que a violência das águas arrastou
mais de uma casa” (errado); d) “O rio invadiu parte da cidade, e a
violência das águas arrastou mais de uma casa” (correto); e) “Ele
escreveu mais de uma dezena de romances, sendo que três deles já
foram traduzidos em vários idiomas” (errado); f) “Ele escreveu mais de
uma dezena de romances, três dos quais já traduzidos em vários
idiomas” (correto).
8. Para Hêndricas Nadólskis e Marleine Paula Marcondes Ferreira de
Toledo, é “construção agramatical, não há necessidade de usá-la” (1998,
p. 115).
9. De cochilo dessa natureza nem mesmo escapam reconhecidas
autoridades da Gramática, como Celso Cunha, que manda usar as formas
de particípio passado irregular ganho, gasto e pago, acrescentando
textualmente: “sendo que a última substituiu completamente o antigo
pagado” (1970, p. 216).
10. Carlos Góis e Herbert Palhano também tropeçam no emprego de tal
expressão, ao conceituarem o substantivo epiceno: “É o que apresenta a
mesma forma para ambos os gêneros, sendo que a distinção entre o
masculino e o feminino é feita pelas palavras macho e fêmea” (1963, p.
47).
11. Em mesmo cochilo resvala Vitório Bergo, como se vê da seguinte
passagem de uma de suas lições: “Em frases deste modelo, o verbo
poder constitui, em regra, auxiliar do infinito, que se lhe segue, sendo
que a partícula se apassiva o todo verbal” (1944, p. 191).
12. Em interessante lição sobre o assunto, assim se manifesta o mesmo
gramático por último referido em outra parte de sua obra, corroborando
a lição inicial destas observações sobre o uso correto da construção:
“Aqui está uma expressão de que muitos abusam, afeando o estilo. Em
escritores modelares encontra-se geralmente como resultante da elipse
(sendo certo que) ou como equivalente de visto que” (BERGO, 1944,
p. 215).
Sênior
1. Registra tal palavra o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras, que é o veículo oficial indicador das
palavras existentes em nosso idioma, estando autorizado, por
conseguinte, seu normal emprego (2009, p. 449).
2. Tem o sentido de mais velho, mais experimentado, adicionado ao nome
de alguém mais velho, de mesmo nome, para distingui-lo de alguém
mais moço. Ex.: “Refiro-me ao Sebastião da Silva sênior, não ao
júnior”.
3. Em tal caso, o vocábulo há de ser acentuado graficamente, de
conformidade com a 8ª alínea do item 43 do Formulário Ortográfico:
sobrepõe-se o acento agudo ao e aberto da penúltima sílaba dos
vocábulos paroxítonos que acabem em r.
4. No plural, com larga utilização no esporte, a sílaba tônica, por questões
de ortoepia, se desloca, fazendo seniores, com o mesmo significado,
sendo fechada a pronúncia da sílaba tônica (ô). Ex.: “O Brasil não foi
bem no campeonato mundial de futebol de seniores deste ano”
(SACCONI, 1979, p. 34).
5. A tal vocábulo, Luís A. P. Vitória (1969, p. 218) dá por plural seniores e
ressalta o timbre fechado para a vogal tônica (seniôres).
6. Também José de Nicola e Ernani Terra anotam que o plural desse
vocábulo é se-ni-o-res, com a vogal tônica fechada: ô (2000, p. 134).
7. Para resumir, oportuna a observação de Sousa e Silva: “Não se
justificam os plurais júniors e sêniors, de que fazem uso nas seções
desportivas de nossas gazetas. As formas corretas são juniores, seniores,
com o acento tônico deslocado para a terceira sílaba: ‘juniôres’,
‘seniôres’” (1958, p. 165).
8. As mesmas observações valem para seu antônimo júnior, que tem o
sentido de mais moço.
Ver Ortoepia (P. 532).
Se o
1. Não é possível, em Português, a junção de se (como partícula
apassivadora) e o pronome o.
Ver Cite-se-o – Está correto? (P. 184)
Se-o – Existe?
1. Inadmissível, em português, a junção dos pronomes se + o.
Ver Cite-se-o – Está correto? (P. 184)
Se – Quando é desnecessário?
1. É frequente a indagação, quanto à redação das petições dirigidas aos
juízos e tribunais, se é correto ou não o uso do sujeito indeterminado
com o verbo conjugado na terceira pessoa do singular, mediante o uso,
por exemplo, das expressões “salienta-se” e “esclarece-se”.
2. Observa-se, por primeiro, que, quando se elabora uma petição, começa-
se por dizer que “Fulano de Tal, por seu advogado, vem à presença de
Vossa Excelência, para expor e requerer o que segue…”
3. Em seguida, é feita a exposição do fato e do direito, e, por fim, vem o
pedido que se faz ao juiz ou ao tribunal.
4. Ora, na sequência lógica de raciocínio, após a explicitação de quem
comparece a juízo e qual a finalidade de tal presença, nada impede que
se diga salienta e esclarece, com o verbo na terceira pessoa do singular,
caso em que se entende que o sujeito está oculto (ele, o Fulano de Tal).
Exs.: a) “Salienta que este pedido está sendo feito no prazo concedido
por Vossa Excelência”; b) “Esclarece que o réu não se manifestou nos
autos, conforme determinação de Vossa Excelência”.
5. Nesse caso, duas observações podem ser feitas: a) O sujeito de tais
verbos está oculto (ele ou o Fulano de Tal); b) Se forem diversos os
peticionários, o verbo deverá ir para o plural (salientam e esclarecem).
6. Por outro lado, é igualmente correto dizer salienta-se e esclarece-se,
como nos seguintes exemplos: a) “Salienta-se que este pedido está sendo
feito no prazo concedido por Vossa Excelência”; b) “Esclarece-se que o
réu não se manifestou nos autos, conforme determinação de Vossa
Excelência”.
7. Nesse caso, três outras observações devem ser feitas: a) A oração que
vem depois de salienta-se e de esclarece-se sempre pode ser substituída
pela palavra isto; b) Uma estrutura como essa é sempre reversível (“Isto
é salientado” e “Isto é esclarecido”); c) Quando há uma oração em tais
moldes, o verbo sempre ficará no singular, pois tem um sujeito
oracional.
8. Duas observações finais podem ser adicionadas: a) Contrariamente aos
exemplos inicialmente dados, o sujeito de salienta-se e de esclarece-se é
a oração que vem depois (como se pode ver pela substituição pela
palavra isto), motivo por que tal oração será chamada de oração
subordinada substantiva subjetiva; b) Porque o sujeito é exatamente a
mencionada oração, não se pode dizer que, em tal estrutura, o sujeito
seja indeterminado; c) O se, em tal caso, não é símbolo de
indeterminação do sujeito, e sim partícula apassivadora.
Seqüência ou Sequência?
Ver Trema (P. 746).
Sequer
1. É advérbio, que tem o significado de ao menos, pelo menos. Ex.: “As
testemunhas não trouxeram aos autos um elemento sequer de elucidação
da verdade”.
2. Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 296), com abalizada autoridade
e fundado em lição de outros dicionaristas e gramáticos, como Caldas
Aulete, Domingos Vieira e Laudelino Freire, observa que tal vocábulo
não tem, só por si, sentido negativo, devendo ser empregado apenas “em
orações em que já existe negação”, sendo errôneo emprestar-lhe
significação negativa em si mesmo. Exs.: a) “O patrono gastou quinze
minutos em sua sustentação oral e sequer abrangeu as preliminares do
caso” (errado); b) “O patrono gastou quinze minutos em sua sustentação
oral e nem sequer abrangeu as preliminares do caso” (correto).
3. Nessa esteira, Arnaldo Niskier (1992, p. 50) também observa que
“sequer significa ao menos e, para ter o sentido de negação, não pode
prescindir de uma palavra negativa (como nem, não, etc.)”.
4. De igual modo, Domingos Paschoal Cegalla, por um lado, anota que
“sequer não tem, por si mesmo, significado negativo”, motivo por que
“são por isso incorretas frases como as seguintes, a que falta a negativa
não ou nem”: a) “O pseudomédico sequer possuía diploma de curso
primário”; b) “Ela sequer olhou para mim”; c) “A escola sequer tinha
carteiras nas salas de aula”; d) “Sequer um carro de polícia
funcionava”.
5. Por outro lado, a par de dizer que se usa “mais frequentemente em frases
negativas”, tal gramático assevera que “ocorre menos frequentemente
em frases de sentido positivo”, exemplificando com Aurélio Buarque de
Holanda Ferreira: “Tudo se arranjaria se ambos tivessem sequer um
pouco de boa vontade” (CEGALLA, 1999, p. 371).
6. Atente-se a sua ortografia, pois são incorretas as formas siquer e se quer
(não se confunda esta última grafia errada com a soma de conjunção
condicional + verbo querer. Ex.: “Se quer pão, tome-o”).
Ser
1. Quanto à conjugação verbal, trata-se de verbo anômalo, e é preciso
atentar ao presente do indicativo e aos tempos dele derivados: sou, és, é,
somos, sois, são (presente do indicativo); seja, sejas, seja, sejamos,
sejais, sejam (presente do subjuntivo); sê, seja, sejamos, sede, sejam
(imperativo afirmativo); não sejas, não seja, não sejamos, não sejais,
não sejam (imperativo negativo).
2. Como se vê, não existe a forma seje, assim como não há a forma esteje,
para o verbo estar.
3. Ainda no âmbito da conjugação verbal, lembram Carlos Góis e Herbert
Palhano (1963, p. 120) que o verbo ser tem quatro tempos iguais ao
verbo ir: pretérito perfeito do indicativo (fui, foste, foi, fomos, fostes,
foram), pretérito mais-que-perfeito do indicativo (fora, foras, fora,
fôramos, fôreis, foram), pretérito imperfeito do subjuntivo (fosse, fosses,
fosse, fôssemos, fôsseis, fossem) e futuro do subjuntivo (for, fores, for,
formos, fordes, forem).
Ver Em seis – Está correto? (P. 316)
Servir
1. É vocábulo que precisa ser observado quanto à regência verbal.
2. No sentido de prestar serviços, é transitivo direto. Exs.: a) “O criado
servia o patrão nos afazeres da casa”; b) “O criado o servia nos
afazeres da casa”.
3. No significado de ser útil, convir, é transitivo indireto. Exs.: a) “Um
criado assim sem préstimos não servia ao patrão”; b) “Um criado assim
sem préstimos não lhe servia” (MACHADO FILHO, 1969g, p. 1.787).
4. Francisco Fernandes (1971, p. 546) invoca, nesse sentido, lição de
Stringari: “Note-se a diferença em ‘O criado não o serve’ e ‘O criado
não lhe serve’: servi-lo é prestar serviços, e servir-lhe é ser útil, convir”.
5. Concordando com esse posicionamento, Celso Pedro Luft (1999, p. 481)
lança as seguintes e oportunas observações: a) A transitividade originária
é a indireta; b) Depois, o verbo “tornou-se transitivo direto”, mas isso
“sem abandonar a transitividade indireta, de modo que hesita, desde os
clássicos, entre a regência direta e a indireta”; c) “Hoje parece firmada a
oposição servi-lo / servir-lhe como prestar serviços a / convir, agradar”.
6. Assim também é a lição sintética de Domingos Paschoal Cegalla: a) “Na
acepção de prestar serviço, ajudar, é preferível complementar servir com
objeto direto”; b) “No sentido de convir, ser útil ou bom, constrói-se com
objeto indireto”.
7. Complementa o gramático por último citado com duas interessantes
observações: a) “Constrói-se com objeto direto de coisa e indireto de
pessoa, no sentido de dar, oferecer” comida, bebida (“Serviram-lhe
biscoitos e vinho”; b) “Inversamente, dá-se-lhe objeto direto de pessoa e
indireto de coisa, na acepção de abastecer” (“O comando da guerrilha
servia-os de armas e alimentos” (CEGALLA, 1999, p. 373).
Se + se – Existe?
1. Um leitor diz não conseguir identificar o que significa o emprego, duas
vezes seguidas, do se em frases como a seguinte: “Há satisfação
dobrada se se oferece espontaneamente o que está faltando”.
2. Ora, uma primeira observação que se faz é que, numa sequência como
essa, o emprego seguido da palavra se está perfeitamente de acordo com
a norma culta e com as regras do uso do vernáculo. Não há erro algum
nessa repetição.
3. Uma segunda observação é que cada se tem sua própria função na
estrutura da frase, e sua identificação emerge da análise sintática que se
faz do exemplo.
4. No caso, como normalmente ocorre em tais situações, o primeiro se está
a indicar uma condição para a oração que introduz, a qual, então, é uma
oração subordinada adverbial condicional.
5. O segundo se pertence à oração “se oferece espontaneamente o”, e a
respeito dela se podem fazer as seguintes ponderações: a) o pronome o
pode ser substituído, para facilidade de análise, por aquilo; b) essa
oração pode ser posta em ordem direta, também para facilitar a análise
(“aquilo se oferece espontaneamente”); c) essa frase que tem tal se é
reversível, isto é, pode ser dita de outro modo, fazendo-se desaparecer o
se (“aquilo é oferecido espontaneamente”); d) em uma frase como essa
original, o exemplo está na voz passiva sintética; e) já o exemplo
transformado está na voz passiva analítica; f) em casos assim, o segundo
se é partícula apassivadora ou pronome apassivador.
Si
1. O pronome pessoal si só pode funcionar como reflexivo (isto é, só pode
ser utilizado como pronome referente à mesma pessoa do sujeito). Exs.:
a) “Eu me dirijo a si” (errado); b) “Eu me dirijo a você” (correto); c)
“Ele voltou a si” (correto); d) “Ele pensou apenas em si” (correto).
2. Em outras palavras, tecnicamente se há de dizer que as variações
pronominais se, si e sigo são sempre correlatas à palavra que representa
o sujeito da oração em que tais palavras se acham como complementos
(PEREIRA, 1924, p. 325).
3. Veja-se, nesse sentido, a firmeza da lição de Antenor Nascentes: “Os
pronomes se, si, consigo, referem-se sempre ao sujeito da oração; são
reflexivos. Exs.: Fulano se enganou. Fulano só cuida de si. Fulano é um
indivíduo metido consigo. Deve-se dizer: Estou muito zangado com
você. Há pouco falei de você. E não: Estou muito zangado consigo. Há
pouco falei de si” (1942, p. 90).
4. Nesse mesmo sentido, observa João Ribeiro (1923, p. 176) que si, sendo
reflexivo, refere-se “naturalmente ao sujeito da proposição”. E continua
dizendo não ser correto “Falei consigo”, mas “Falei com você”; nem ser
correto dizer “Falei de si”, mas “Falei de você”.
5. Lembra Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 66) que o uso não reflexivo de
tal pronome, muito embora seja comum em Portugal, contém solecismo.
6. Posicionando-se contrariamente a seu uso sem reflexividade, também
Júlio Nogueira (1930, p. 330) chama a tal emprego de “grosseiro
solecismo importado de Portugal”, não sem observar que se trata de
imperfeição que “até excelentes escritores portugueses já empregam”.
7. Não destoam desse modo de pensar Carlos Góis e Herbert Palhano: “As
formas si e consigo só podem ser usadas como reflexivas…, isto é,
quando o próprio sujeito pratica e recebe a ação… É, pois, erro empregar
si, consigo com referência ao interlocutor, quando a ação do verbo é
atribuída à pessoa que fala: ‘Nunca pensei isso de si’; ‘Ontem me
encontrei consigo’. Deve dizer-se: ‘Nunca pensei isso de você…’
‘Ontem me encontrei com você…’” (1963, p. 81).
8. Assim reforça o lembrete de Sousa e Silva no sentido de que, quando há
reflexividade, obrigatório é o uso desse pronome, e, nessa hipótese, “não
é correto empregar ele, ela, eles ou elas” (1958, p. 271-5). Exs.: a) “Ele
pensou apenas em si” (correto); b) “Ele pensou apenas nele mesmo”
(errado).
9. Júlio Nogueira (1939, p. 239-40) também é taxativo para rotular de
solecismo o uso de si sem reflexividade.
10. Observando que “se, si, sigo são meros reflexivos e não se podem
referir senão ao sujeito da oração, sendo este da terceira pessoa” –
como em “Antônio fala a si” ou consigo, isto é, “Antônio fala a si
próprio” ou consigo mesmo – leciona Alfredo Gomes (1924, p. 339)
que “é erro crasso empregar expressões como: “Fulano já falou a si
(ao senhor) acerca deste negócio? Gosto muito de si (de você)”.
11. De igual modo, para Cândido de Oliveira, se, si e consigo são formas
reflexivas e “só se podem usar em relação ao próprio sujeito do verbo”
(1961, p. 174).
12. Para Laudelino Freire (1937, p. 73), tal forma pronominal é “por
natureza reflexiva”, caráter que cumpre ter em vista para evitar erros
muito vulgarizados, como dizer uma pessoa a outra: … “Pedro deu-me
este recado para si”.
13. Apesar de posicionamento doutrinário firme nesse sentido por parte de
diversos e abalizados gramáticos, como Ernesto Carneiro Ribeiro, João
Ribeiro, Júlio Ribeiro, Carlos Góis e Assis Cintra, é de se anotar,
porém, que outros autores defendem o uso de si e consigo sem
significação reflexiva: Meyer Lübke, Leite de Vasconcelos, José Maria
Rodrigues e Eduardo Carlos Pereira.
14. Este último (PEREIRA, 1924, p. 325), após observar ser “antiga e geral
a tendência de se empregar no tratamento familiar” o si e o consigo
referindo-se à segunda pessoa, acrescenta que “não há nisso
inconveniência e há vantagem prática”, não explicitando, todavia, qual
seria o benefício, mas carreando o abono de Leite Vasconcelos e
citando exemplos de Alexandre Herculano e Eça de Queirós.
15. Nessa esteira, aduzindo que “não é só o povo que o usa, mas já muitos
letrados, o que não pode passar sem ser observado”, Silveira Bueno
(1938, p. 219) também acata o uso de tal pronome sem sua estrita
significação de reflexo.
16. Lembra, de igual modo, Artur de Almeida Torres que “em Portugal já
se admite o emprego de si e consigo não reflexivos, referindo-se à
pessoa com quem se fala” (1966, p. 83).
17. De extrema pertinência e propriedade, contudo, a síntese de Aires da
Mata Machado Filho: “O emprego de si… sem significação reflexiva,
mais usado em Portugal que no Brasil, destoa da boa tradição
vernácula e embaça a clareza do discurso” (1969i, p. 25).
18. Vale também anotar a advertência claríssima de Júlio Nogueira: “o que
não se deve admitir é o emprego de si e consigo sem reflexividade,
como se faz em Portugal”. Assim – continua tal gramático – não se há
de dizer ‘eu gosto de si’, ‘eu sonhei consigo’; dir-se-á: ‘eu gosto do
senhor, da senhora, de você’, ‘eu sonhei com o senhor, com a senhora,
com você”.
19. E, com integral propriedade, acrescenta (NOGUEIRA, 1959, p. 80):
“Além de o emprego de si e consigo sem reflexividade constituir feio
solecismo, ele traz ambiguidade de sentido”. Assim, o exemplo “A
moça falou de si”, para os que defendem a possibilidade do emprego de
tal pronome sem reflexividade, tanto pode ter seu sentido normal de “A
moça falou de si própria”, como pode significar que “A moça falou de
você, do senhor, de Vossa Excelência…”
20. Não se olvide, por conseguinte, a significativa lição de José de Sá
Nunes: “O pronome reflexivo sempre se refere ao sujeito da oração…”
(1938, p. 75).
21. Observa tal autor que o emprego de si e de consigo sem caráter
reflexivo, em Portugal, é defendido, entre outros, por Leite de
Vasconcelos e Epifânio Dias; “mas esse emprego só se nota na
linguagem familiar de lá. Na linguagem literária, raríssimo se nos
depara em bons escritores lusitanos o pronome si sem função
reflexiva” (NUNES, 1938, p. 76).
22. E continua: “No Brasil, houve um filólogo de alto mérito que se
abalançou a defender o uso do pronome si sem valor reflexo: Mário
Barreto. O certo é que, entre nós, o pronome si, despojado da função
que lhe é inerente, só se ouve na linguagem familiar e no linguajar da
gente inculta” (NUNES, 1938, p. 76-7).
23. Em outro trecho de sua obra, assim se expressa José de Sá Nunes:
“Felizmente, o uso errôneo de se empregar o si em valor reflexo é
quase exclusivo de Portugal, e, mesmo lá, somente na linguagem
popular e na de alguns modernistas… No Brasil, graças a Deus, todos
os filólogos e gramáticos dignos de tais nomes reprovam e condenam o
uso do pronome si com referência à pessoa com quem se fala. Este
pronome, quando reflexivo, não pode referir-se a outra palavra que não
seja o sujeito da oração. Desse parecer só discrepa, ao que me consta, o
dr. Mário Barreto” (1938, p. 149-50).
24. E também se veja a lição de Laudelino Freire: “Só é legítimo o
emprego do reflexivo nas frases em que se ele refere à terceira pessoa.
Estranhável é, portanto, que Camilo Castelo Branco o tivesse
empregado com referência à segunda pessoa, ainda quando fizesse
dialogar as suas personagens” (s/d, p. 7).
25. Para se fixar uma síntese, o certo é que, apesar de algumas divergências
entre os gramáticos, a defesa do uso de si sem reflexividade dá-se
basicamente para seu emprego na linguagem coloquial, de modo que,
no que concerne à norma culta, deve-se preservar a distinção: a) se há
reflexividade, emprega-se o si; b) se, porém, não se refere ao sujeito da
oração, outro é o pronome a ser usado.
26. As mesmas observações aqui feitas valem para consigo.
Ver Entre eles ou Entre si? (P. 322) e Pronome pessoal (P. 614).
Sic
1. Trata-se de advérbio latino, que significa assim.
2. De acordo com ensinamento de Vitório Bergo, é latinismo que,
geralmente, se encontra entre parênteses, “para indicar que um trecho
transcrito não foi alterado, mas se apresenta textualmente, ainda que com
ele não concorde o transcritor” (1944, p. 217-8).
3. Para Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 246), tal vocábulo tem por função
“demonstrar a fidelidade de algum trecho transcrito”. Ex.: “A república,
este sim, é o melhor regime” (sic).
4. No conceito de Domingos Paschoal Cegalla, constitui “latinismo que se
coloca entre parênteses, após uma palavra ou citação, para indicar que
são autênticas, embora erradas ou estranhas” (1999, p. 374).
5. Não destoa desse ensino Napoleão Mendes de Almeida: “Palavra latina
que significa assim. Emprega-se entre parênteses, antes ou depois de
uma citação, para indicar que o original vai ser ou foi reproduzido
fielmente, com as mesmas palavras, como foram proferidas ou escritas”
(1981, p. 298).
6. Em termos técnicos, usa-se com muita frequência antes, no meio ou
depois de uma citação, para indicar que houve fiel reprodução do
original, com as mesmas palavras, conforme foram escritas (geralmente
para eximir a quem cita da responsabilidade atinente a algum erro de
grafia ou de sintaxe). Ex.: a) “Registrava textualmente a sentença que
‘as testemunhas, talvez por medo ou coação, não deporam (sic)nos
termos previstos pela legislação civil em vigor’” (o correto é
depuseram); b) “Qualquer mudança deve vigir (sic)apenas a partir de
2002” (o correto é viger).
7. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, que é o veículo oficial indicador das palavras
existentes em nosso idioma, registra-o com a especificação de se tratar
de advérbio latino (2009, p. 864).
8. Assim, por se tratar de palavra pertencente a outro idioma, há de vir
entre aspas, em negrito, itálico, com sublinha ou grifo equivalente,
indicador de tal circunstância.
Sigla
Ver Abreviatura, Abreviação e Sigla – O que é e Como usa? (P. 55)
Sigla – Como escrever por extenso?
1. Uma leitora pergunta, em síntese, como fica melhor explicitar o
significado de uma sigla: entre travessões, ou com um travessão no
início e vírgula no final? Em termos práticos: a) “Foi considerada a
maior ONG – Organização Não-Governamental – da América Latina”;
b) “Foi considerada a maior ONG – Organização Não-Governamental,
da América Latina”?
2. Antes de ingressar no efetivo mérito da dúvida da leitora, observa-se,
num primeiro aspecto, que, pelas regras do Acordo Ortográfico de 2008,
não mais se usa o hífen, quando se quer negar uma palavra, dizendo o
seu contrário pela anteposição de um não. Vejam-se alguns exemplos:
não agressão, não cooperação, não cumprimento, não ficção, não
fumante, não pagamento, não proliferação, não violência. Assim, para o
caso, Organização Não Governamental.
3. No mérito da indagação, observa-se que o que a leitora quer, em última
análise, é saber como separar por sinais de pontuação a explicação
Organização Não Governamental, que é exatamente o significado da
sigla que antecede tal explicação. E, quando se extrai a expressão
indicadora do significado da sigla, percebe-se que não há sinal algum
adicional de pontuação que precise ser considerado (“Foi considerada a
maior ONG da América Latina), o que implica dizer que o único desafio
é realmente a expressão do significado da referida entidade.
4. Ora, quando se trata de pura intercalação, esta pode ser feita entre
travessões ou entre parênteses. Mas a intercalação acontece com sinais
idênticos, de modo que não se pode colocar um travessão no início e
uma vírgula depois.
5. Assim, em resposta à leitora, confiram-se os seguintes exemplos, com a
indicação de sua correção ou erronia entre parênteses: a) “Foi
considerada a maior ONG – Organização Não Governamental – da
América Latina” (correto); b) “Foi considerada a maior ONG
(Organização Não Governamental) da América Latina” (correto); c)
“Foi considerada a maior ONG – Organização Não Governamental, da
América Latina” (errado); d) “Foi considerada a maior ONG,
Organização Não Governamental – da América Latina” (errado).
Sigla e Ponto
1. Quando a abreviatura das palavras se dá pela utilização de suas iniciais,
tem-se uma sigla. Exs.: DASP (Departamento Administrativo do Serviço
Público), I.N.S.S. (Instituto Nacional de Seguridade Social).
2. A questão do regime das abreviaturas e, por conseguinte, das siglas, não
é pacífica, mas algumas ponderações podem ser feitas com proveito.
3. Uma primeira observação é que, nas siglas, o mais lógico é não usar o
ponto de separação, se as letras são pronunciadas formando nova
palavra, como ARENA (Aliança Renovadora Nacional, antigo partido
político dos tempos da ditadura de 1964); se, todavia, a leitura da sigla se
dá em soletração, então o mais adequado é usar o ponto de separação
entre as letras, como em F.N.M. (Fábrica Nacional de Motores).
4. Essa, aliás, é a lição de Cândido de Oliveira: “se lermos letra por letra
(ene, ge, bê), entre elas há ponto (N.G.B.); se as letras formam um todo
significativo, não há ponto: DEA”.
5. Do primeiro caso, para o mesmo autor (OLIVEIRA, C., 1961, p. 77), são
exemplos I.N.S.S. (Instituto Nacional de Seguridade Social) e P.V.O.L.P
(Pequeno Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa), enquanto do
segundo são MEC (Ministério da Educação e Cultura), PETROBRAS
(Petróleo Brasileiro), SESI (Serviço Social da Indústria) e UBE (União
Brasileira de Escritores).
6. Apesar da lição tradicional anterior, Luciano Correia da Silva anota que
o uso constante vem contrariando a regra segundo a qual se utilizam
pontos nas siglas cujas letras se pronunciam separadamente: de I.N.P.S.,
O.A.B., segundo tal autor, passou-se, na prática, a escrever INPS e OAB.
7. Em outra passagem, acrescenta ele (SILVA, L., 1991, p. 181 e 323) que
“há uma tendência crescente para a eliminação dos pontos nas siglas em
geral: MP (Ministério Público), CPC (Código de Processo Civil), TJ
(Tribunal de Justiça), RT (Revista dos Tribunais), STF (Supremo
Tribunal Federal), STJ (Superior Tribunal de Justiça), CLT
(Consolidação das Leis do Trabalho), MP (Medida Provisória), PM
(Polícia Militar)”.
8. Em mesmo sentido, para Regina Toledo Damião e Antonio Henriques
(1994, p. 245), as siglas, em casos dessa natureza, podem vir,
indiferentemente, acompanhadas ou não de ponto – MEC ou M.E.C.,
CIC ou C.I.C. E acrescentam tais autores que “a tendência moderna é o
uso de siglas sem pontuação”.
9. Com todas essas observações e posições dos nossos autores, vê-se que se
deve adotar uma postura mais abrangente e acatar ambas as posições: ou
seja, tanto se pode escrever uma sigla com pontos entre suas letras
componentes, como se pode suprimi-los. Acresce dizer que, embora o
ensino tradicional seja o de pontuar siglas dessa natureza, a moderna
tendência à simplificação faz com que mais e mais se dê preferência à
primeira grafia. Repita-se, porém, que ambas as formas estão corretas.
Siglas pluralizadas
Ver Abreviatura, Abreviação e Sigla – O que é e Como usa? (P. 55)
Sílaba
Ver Partição silábica entre as linhas (P. 551).
Silabada
Ver Prosódia (P. 626).
Símbolos
Ver, ao final, Símbolos e Sinais (P. 798).
Simpatizar
1. Esse verbo significa, em suma, ter afeição, interesse, afinidade ou
inclinação. Ex.: “O pai não simpatizou com o namorado da filha”.
2. A preocupação maior com esse verbo diz respeito à regência verbal, já
que é transitivo indireto e se constrói unicamente com a preposição com.
Exs.: a) “O país inteiro simpatizava com esse princípio” (Rui Barbosa);
b) “Seu pai, comerciante laborioso, simpatizou com o incansável
bastardo do titular” (Camilo Castelo Branco); c) “Desses homens e
dessas ideias com quem a minha natureza simpatizava sem saber por
quê” (Almeida Garrett).
3. Observada sua normal regência, vale acrescentar que ele não é
pronominal nem admite construção com qualquer outra preposição, de
modo que são equivocadas e errôneas as seguintes estruturas: a) “O pai
não se simpatizou com o namorado da filha”; b) “O pai não simpatizou
do namorado da filha”; c) “O pai não simpatizou pelo namorado da
filha”; d) “O pai não se simpatizou pelo namorado da filha”; e) “O pai
não se simpatizou do namorado da filha”.
4. A correção de todos esses casos de uso equivocado e errôneo do verbo
simpatizar deve dar-se por uma só forma: “O pai não simpatizou com o
namorado da filha”.
5. Nada impede que se empregue algum termo que indique intensidade
dessa ação de simpatizar: a) “O pai simpatizou muito com o namorado
da filha”, b) “O pai simpatizou pouco com o namorado da filha”.
Simplicista ou Simplista?
1. Um leitor relata que um professor seu sempre insistiu em que o correto é
simplicista, e não simplista. E indaga se isso é verdade.
2. Por um lado, realça-se que o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa registra ambas as palavras: simplicista e simplista
(ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 757).
3. Ora, o VOLP é editado pela Academia Brasileira de Letras, entidade esta
que detém a delegação legal para listar oficialmente os vocábulos
existentes em nosso idioma, de modo que não remanesce dúvida alguma
quanto à efetiva existência de ambos os vocábulos no vernáculo.
4. Num segundo aspecto, os dicionários dão tais palavras como sinônimas,
muito embora registrem que simplicista é forma pouco usada, e atribuem
a ambas o significado daquilo que se relaciona com a tendência de
considerar apenas uma face ou um aspecto das coisas, ou seja, aquilo
que tem a ver com uma simplificação exagerada. Exs.: a) “Essa opinião,
sem dúvida, é muito simplicista para a dificuldade do problema”
(correto); b) “Essa opinião, sem dúvida, é muito simplista para a
dificuldade do problema” (correto).
5. Acresce dizer que simplicista, numa segunda acepção, também pode
significar aquilo que se refere ao tratamento ou cura por meio de
símplices (ou seja, por meio de plantas medicinais em seu estado
natural). E, obviamente, nesse sentido simplicismo não é sinônimo de
simplismo, nem simplicista tem a mesma acepção de simplista.
Sinal
Ver Símbolos e Sinais (P. 798).
Sindicar
Ver Datilografar (P. 251).
Sisa
1. Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 300), fundado em ensinamento
de Fernão de Oliveira, dá por origem de tal vocábulo o idioma espanhol,
e o tem por existente em nosso idioma já ao tempo de D. João I, rei de
Portugal, no século XIV.
2. Sua origem mais remota é encontrada por De Plácido e Silva (1989, p.
241) no latim, mais especificamente no verbo excidere, que significa
cortar, separar.
3. Quanto à história, no período entre 1530 e 1808, em nosso país, já foi
imposto cobrado pelo Real Erário por cabeça de índio tornado escravo e
já era antigo imposto cobrado em Portugal sobre a venda e compra de
equinos, escravos e vinhos, além de imposto adicional cobrado de judeus
(judença). A partir do século XIX, as sisas passaram a ser cobradas no
Brasil, em negócios imobiliários.
4. Em termos jurídicos, é a denominação dada ao imposto de transmissão
de propriedade, calculado mediante porcentagem estabelecida sobre o
valor da venda.
5. Se se trata de imposto de transmissão em virtude do falecimento de
alguém (causa mortis) e de doação, a Constituição Federal de 1988
atribui a competência para sua instituição aos Estados e ao Distrito
Federal (art. 155, I, “a”); se, porém, se trata de transmissão por ato
oneroso entre vivos (inter vivos), a competência para sua instituição é
conferida aos Municípios (art. 156, II).
Só – Adjetivo ou advérbio?
1. Um leitor indaga se, na frase “Exército de um homem só”, “só” se
comporta como adjetivo (equivalendo a solitário), como o advérbio
(correspondendo a apenas) ou como ambos?” E outro leitor pergunta
qual a frase correta entre as seguintes: a) “Causas que, por si só,
produziriam o resultado…”; b) “Causas que, por si sós, produziriam o
resultado”.
2. Ora, a palavra só ora funciona como advérbio, ora, como adjetivo.
3. Por um lado, tem ela valor de advérbio: a) quando modifica um verbo ou
um adjetivo; b) nesse caso, equivale a somente, unicamente, apenas; c)
nessa situação, é invariável. Exs.: i) “O réu só queria protelar o
andamento do feito”; ii) “Os réus só queriam protelar o andamento do
feito”.
4. Por outro lado, tem valor de adjetivo: a) quando modifica um
substantivo; b) nesse caso equivale a sozinho, desacompanhado,
solitário; c) nessa situação, é variável. Exs.: i) “O réu ficou só”; ii) “Os
réus ficaram sós”.
5. Por oportuno, acresce dizer que a expressão a sós é invariável. Exs.: a)
“O réu ficou a sós”; b) “O réu e seu patrono ficaram a sós”.
6. Feitas essas considerações, passa-se a responder, de modo prático, ao
primeiro leitor: a) deixando de lado a teoria, quer porque nem sempre é
de fácil entendimento, quer porque dispensável na análise do caso
concreto, pode-se afirmar que só é advérbio quando significa somente ou
apenas; b) nesse caso, é invariável; c) por outro lado, é adjetivo quando
significa sozinho ou solitário; d) nessa hipótese, é variável; e) na
expressão trazida para análise – “Exército de um homem só”, o sentido
permite que a substituição se dê por qualquer dos vocábulos referidos
como sinônimos (somente ou apenas e sozinho ou solitário); f) é de fácil
percepção que a função de só será diferente, conforme o sentido que se
dê ao vocábulo no caso prático; g) quando o sentido for somente ou
apenas, então só será um advérbio; h) quando, porém, se quiser conferir
a tal palavra o sentido de sozinho ou solitário, então se estará diante de
um adjetivo; i) com os exemplos no plural, a expressão mostra com mais
clareza a diferença de sentidos e de funções de tal palavra – “Exército só
de homens” e “Exército de homens sós”.
7. Observadas as mesmas premissas para o segundo leitor, fazem-se as
seguintes ponderações: a) se o exemplo for “… causas que, só por si”,
então o só pode ser substituído por somente; b) nesse caso, só é um
advérbio e, portanto, invariável; c) o resultado correto é “… causas que,
só por si…”; d) se o exemplo é “… causa que, por si só”, a substituição
dá-se por sozinha; e) então tal palavra é adjetivo e é variável; f) no
plural, então, fica “… causas que, por si sós…”
Sob
1. Do latim, sob indica posição de uma coisa inferior a outra. Ex.: sobpé,
sobpor.
2. As diretrizes do Acordo Ortográfico de 2008 determinam que tal prefixo
se une ao segundo elemento por hífen em três casos: a) quando o
segundo elemento se inicia por h (faltam exemplos no VOLP); b)
quando o segundo elemento começa com r (sob-roda, sob-rojar); c)
quando o segundo elemento principia com a mesma letra que finda o
prefixo (faltam exemplos no VOLP).
3. Por conseguinte, a ligação se faz de modo direto, quando o segundo
elemento começa com outra consoante: sobcapa, sobdominante, sobpé,
sobpor.
4. Também direta é a ligação, quando o segundo elemento é iniciado por
vogal: sobalçar, sobestar.
Sob color de
1. Veja-se, por primeiro que color, na expressão referida, é palavra oxítona
(pronuncia-se colôr), não tendo, assim, a mesma pronúncia do
sobrenome de um ex-presidente da República, que caçava marajás.
2. Atente-se também a que, se o vocábulo latino colore deu origem à
palavra cor em português, não menos certo é que, desde a língua mãe,
por transmutação semântica, também passou a ter o significado de
aparência, pretexto.
3. E, assim, em termos formais, a forma arcaica color sobrevive
validamente na locução prepositiva sob color de, perfeitamente correta
em nosso idioma, com o significado de a pretexto de, sob aparência de.
Exs: a) “Sob color de legais, as medidas determinadas nos autos eram
efetivamente arbitrárias”; b) “Devia ser Serges o alugador das casas,
sob color de querer armazenar nelas os seus gêneros” (Camilo Castelo
Branco).
Sobrecomum
1. Diz-se do substantivo que tem um só gênero gramatical para designar
pessoas de ambos os sexos, sem distinção alguma, nem mesmo por
alteração do artigo. Exs.: o algoz, a criança, a criatura, o cônjuge, o
indivíduo, a pessoa, a testemunha, a vítima.
2. Como lembra Celso Cunha (1970, p. 97), quando se quer discriminar o
sexo, o máximo que se permite é o acréscimo de algum elemento
determinativo, como é o caso de um adjetivo. Ex.: o cônjuge feminino.
3. Não confundir com comum de dois ou comum de dois gêneros, em que a
forma do substantivo é a mesma, mas se altera o artigo (o pianista, a
pianista).
4. Também se faça a distinção do epiceno, que é o substantivo de um só
gênero, mas para normal diferenciação de animais ou plantas, em que a
distinção dos sexos se faz pelo acréscimo dos adjetivos macho e fêmeo
(cobra macha, jacaré fêmeo, palmeira macha).
5. Interessante, no sentido da última distinção, a síntese de Luiz Antônio
Sacconi no sentido de que “os sobrecomuns e os epicenos têm uma só
forma e gênero para ambos os sexos, mas os sobrecomuns se referem a
pessoas; os epicenos, a animais e a insetos inferiores” (1979, p. 33).
Sobrenome
Ver Nome (P. 497) e Plural de nomes próprios – Existe? (P. 566)
Sobrescritar ou Subscritar?
1. Sobrescritar quer dizer escrever sobre, escrever em cima de, escrever o
endereço no envoltório de uma carta. Exs.: a) “Meteu a folha de papel
em um envelope e sobrescritou-o” (Aluísio Azevedo); b) “Brotero releu
a carta, dobrou-a, encapou-a, sobrescritou-a” (Machado de Assis).
2. De Cândido de Figueiredo, sobre o que se escreve no envelope: “em
português, aquilo diz-se sobrescrito” (1948, p. 203).
3. Também Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 377), por um lado,
confere a tal verbo o sentido de pôr sobrescrito (endereço) em; por outro
lado, distingue-o de subscritar, que significa pôr a assinatura ou assinar
embaixo, ou subscrever.
4. Não confundir, assim, sobrescritar com subscritar ou subscrever, que
tem o sentido de assinar sob, escrever em baixo. Ex.: “O vendedor
subscritou o contrato na presença de duas testemunhas”.
5. Na lição do Padre José F. Stringari (1961, p. 52), quanto ao que se deve
escrever nos envelopes, “a subscritar prefira-se sobrescritar”, trazendo
tal estudioso da linguagem dois exemplos significativos: a) “O endereço,
com que o invólucro se sobrescrita, indica ao correio e ao carteiro
aonde há de levar a carta, a quem a deve entregar” (Rui Barbosa); b)
“Sabem que neste mês ganhei mais trinta e duas liras em sobrescritar do
que no mês passado?” (João Ribeiro).
Sobressair
1. Quanto à regência verbal, oportuno é anotar que esse verbo não é
pronominal, devendo-se atentar à correção de seu uso. Exs.: a) “O
advogado sobressaía em audiência, pela sua cultura” (correto); b) “O
advogado se sobressaía em audiência, pela sua cultura” (errado).
2. Atento aos frequentes equívocos e atentados à Gramática, que se
cometem no linguajar cotidiano, lembra Domingos Paschoal Cegalla ser
“um fato inequívoco da língua atual do Brasil o uso deste verbo na forma
pronominal, sem dúvida por influência dos sinônimos destacar-se,
distinguir-se, salientar-se” (1999, p. 377); tal emprego, todavia, comum
nas manifestações linguísticas informais, obviamente há de ser evitado
nos textos de padrão culto.
3. Celso Pedro Luft (1999, p. 484-5), nessa esteira, traz lições importantes:
a) Anota, por primeiro, ser “bastante frequente a pronominalização deste
verbo, por influência dos sinônimos salientar-se, destacar-se, distinguir-
se”; b) Acrescenta ser tão natural essa forma, que Napoleão Mendes de
Almeida, um purista, chega a escrever que “parecerá estranho, mas este
verbo não se constrói pronominalmente”; c) E ultima com a observação
de que, “na linguagem culta formal, aconselha-se a construção
originária, não pronominal”.
4. Quanto à regência verbal, Francisco Fernandes (1971, p. 550) lembra a
possibilidade de sua construção como transitivo indireto com as
preposições entre e a: a) “E esta (serra), apesar da sugestiva
denominação de Eschwege, mal sobressai entre aquelas lombadas”
(Euclides da Cunha); b) “O conde da Torre, cuja voz estrondosa
sobressaía a todas as outras…” (Corvo, apud Aulete).
Sobrevir
Ver Vir (P. 770).
Sociedade Anônima
1. Arnaldo Niskier observa que se deve abreviar S.A.; “nada de S/A nem
S.A” (1992, p. 113).
2. A abreviatura preconizada pelo mencionado autor é a que também
consta do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, órgão oficialmente incumbido de estabelecer a
grafia dos vocábulos e das respectivas formas abreviadas (2009, p. 875).
Sócio-gerente ou Sociogerente?
1. Com as alterações introduzidas em nosso sistema pelo Acordo
Ortográfico de 2008, quanto ao emprego do hífen, importa indagar qual
a expressão correta para designar o sócio que, além de integrante do
capital social, exerce uma função de comando na estrutura da empresa:
sócio-gerente ou sociogerente, sócio-administrador ou
socioadministrador, sócio-diretor ou sociodiretor?
2. Nunca é demais reforçar, como introdução desta resposta, que a maioria
dos gramáticos estavam acordes em que o emprego do hífen era assunto
que carecia de um sério e profundo trabalho de sistematização e
simplificação. Longe de melhorar a situação e de atender às
expectativas, todavia, o que o Acordo Ortográfico de 2008 fez foi
complicar ainda mais o que já era difícil.
3. Mas tentemos solucionar a questão trazida pelo atento leitor, usando as
ferramentas de que dispomos.
4. Pelo Acordo Ortográfico, quando se compõe nova palavra por
justaposição de dois elementos, emprega-se o hífen, se tais elementos
constituem uma nova unidade morfológica e de sentido, mantendo o
acento. Exs.: arco-íris, afro-luso-brasileiro.
5. Como se vê, o critério não é firme, além do que escapa à apreciação da
maioria dos usuários do idioma identificar quais os casos em que os
elementos se unem para constituir nova unidade morfológica e de
sentido, mantendo o acento.
6. Num caso como esse – em que se constata a ausência de critérios
palpáveis para um raciocínio de convicção e certeza – a única saída é
consultar o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, que é uma
espécie de dicionário que lista as palavras reconhecidas oficialmente
como pertencentes à língua portuguesa, bem como lhes fornece a grafia
oficial.
7. Também conhecido pela sigla VOLP, é organizado e publicado pela
Academia Brasileira de Letras, a qual tem a delegação e a
responsabilidade legal de editá-lo, em cumprimento à Lei Eduardo
Ramos, de n. 726, de 8/12/1900.
8. Pois bem. Em sua quinta edição, de 2009, a primeira após o Acordo
Ortográfico, o VOLP faz constar o substantivo composto sócio-gerente
(ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, p. 762).
9. É importante complementar com a observação de que nenhum outro
substantivo composto, formado pelo primeiro elemento sócio, foi
registrado pelo VOLP; não parece difícil, entretanto, concluir que os
demais da consulta sigam o mesmo rumo: sócio-administrador e sócio-
diretor.
Só – Como concordar?
1. É palavra que precisa ser observada pelo prisma da concordância
nominal.
2. Com ela, duas situações podem ocorrer: a) Se modifica um verbo ou
adjetivo, a palavra tem valor de advérbio, equivale a somente,
unicamente, apenas, e é invariável. Ex.: “Os réus só queriam protelar o
andamento do feito”. b) Se, porém, modifica um substantivo, tem valor
de adjetivo, corresponde a desacompanhado, desajudado, único, ermo,
solitário, e concorda com a palavra modificada. Ex.: “O réu e seu
patrono ficaram sós”.
3. A expressão a sós é invariável. Ex.: “O réu e seu patrono ficaram a sós”.
4. Sousa e Silva transcreve interessante exemplo de Rui Barbosa com o sós
anteposto ao substantivo: “Reduzir o recurso extraordinário àqueles sós
casos (quer dizer: àqueles únicos casos) seria atrofiá-lo e dar-lhe
proporções ínfimas e mesquinhas” (1958, p. 276-7).
5. Atente-se ao fato de que, se precedido de todo ou só, lecionam alguns
que o pronome pessoal do caso reto pode funcionar como objeto. Exs.:
a) “Vi só ele no fórum”; b) “Vi todos eles no fórum”.
6. Nesse sentido é o ensinamento de Evanildo Bechara: “o pronome ele, no
português moderno, … aparece como objeto direto, quando precedido de
todo ou só…” (1974, p. 254).
7. Em realidade, talvez por influência de um exemplo como “Ele falou com
nós todos”, em que a presença da palavra reforçativa todos faz com que
se diga com nós e não conosco, como seria normal, se esta última não
existisse (“Ele falou conosco”), alguns são levados a dizer algo como
“Conheço todos eles”, ou “Vi só ele no fórum”.
Ver Pronome pessoal (P. 614).
Só ele
Ver Pronome pessoal (P. 614).
Soer
1. Observando que tal verbo provém do latim solere (semidepoente, com o
sentido de costumar, ter por hábito), lembram Antonio Henriques e
Maria Margarida de Andrade que, “hoje, dito verbo permanece, apenas,
em obras mais antigas” (1999, p. 136).
2. Sobre sua conjugação, traz-se o ensinamento de Vitório Bergo: “usa-se
geralmente na terceira pessoa, especialmente no presente do indicativo:
como sói acontecer; admite-se, entretanto, em todas as pessoas do
pretérito imperfeito do indicativo: soía, soías, soía, soíamos, soíeis,
soíam; há também o particípio passado: soído” (1943, p. 81).
3. Domingos Paschoal Cegalla lembra ser ele “verbo defectivo e de uso
raro”, cujas “formas usadas são sói, soem, soía e soíam”.
4. Complementa tal gramático com importante observação: “distinguir
soem (ó), de soer, e soem (ô), de soar” (CEGALLA, 1999, p. 378),
distinção essa oportuna e necessária, já que, muito embora sejam
diversos os timbres de tais homógrafas, nenhuma delas recebe acento
gráfico pelas regras em vigor, daí decorrendo a possibilidade de
confusão.
5. Na lição de Regina Toledo Damião e Antonio Henriques (1994, p. 238),
“está vinculado ao verbo semidepoente latino soleo, soles, solitus sum,
solere (costumar, ter por hábito)”, e se trata de “um verbo, hoje,
completamente esquecido; em um ou outro jurista ainda aparece a forma
sói”.
6. Para Alfredo Gomes, tal verbo “só se conjuga hoje no presente do
indicativo – sói, soem – e no imperfeito – soía, soíam” (1924, p. 116).
7. Otelo Reis é mais minucioso e organizado para conferir-lhe uma
possibilidade mais ampla de conjugação, vedando-lhe a existência
apenas da primeira pessoa do singular do presente do indicativo e das
pessoas que daí derivam. Parece ser a melhor lição.
8. Assim, para tal autor, no presente do indicativo, apenas se omite a
primeira pessoa do singular: sóis, sói, soemos, soeis, soem.
9. Não tem, portanto, o presente do subjuntivo, que derivaria da inexistente
primeira pessoa do singular do presente do indicativo.
10. No imperativo afirmativo, tem apenas as pessoas derivadas do presente
do indicativo (tu e vós): sói, soei.
11. Não tem imperativo negativo, que vem integralmente do presente do
subjuntivo (REIS, 1971, p. 117-8).
12. Nos demais tempos e formas, tem conjugação normal e regular,
cumprindo adicionar-lhe as terminações do modelo da segunda
conjugação, como, por exemplo, de vender.
Soi-disant – Galicismo?
1. Trata-se de expressão francesa, a ser facilmente evitada, já que,
conforme o caso, pode ser substituída por uma das seguintes palavras:
autointitulado, falso, inculcado, pretenso, suposto.
2. Encontra-se, ademais, em um ou outro autor nacional, sobretudo de
processo civil, sua tradução literal sedizente, vocábulo esse não
dicionarizado, que não tem o mínimo respaldo para uso como
neologismo, no mínimo por haver no vernáculo os já referidos sinônimos
perfeitos, que o tornam integralmente despiciendo.
3. Nos dizeres de Cândido de Figueiredo (1928, p. 178), “embora não
tenhamos tradução rigorosamente literal do soi-disant, nem por isso nos
esquivamos ao dever de o substituir por expressões nossas”,
acrescentando haver mais de uma forma em português, por exemplo,
para a expressão soi-disant crítico: suposto crítico, que como crítico se
inculca ou até mesmo mofino critiqueiro.
4. Em confirmação do quanto até agora asseverado, o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
que é o veículo oficial indicador das palavras existentes em nosso
idioma, registra a circunstância de pertencer a indigitada expressão ao
léxico francês (2009, p. 864).
Soldada ou A Soldado?
Ver Capitã, Capitoa ou A Capitão? (P. 168) e Poeta – Qual o feminino? (P.
570)
Solecismo
1. “Solecismo é um vocábulo grego, oriundo de Soloi, nome de certa
colônia da Cilícia, cujos habitantes se caracterizavam pelo desmazelo
com que maltratavam o próprio idioma” (GÓIS, 1943, p. 134).
2. Conceitualmente, “é o erro de sintaxe” (OITICICA, 1954, p. 11), ou,
ainda, “qualquer erro sintático de concordância ou regência” (PEREIRA,
1924, p. 262).
3. Os que escrevem sem afetação acabam correndo menos riscos de
equívocos desse jaez, como bem lembrava Pedro A. Pinto a um
consulente, que lhe submetia à apreciação uma construção errônea, por
ele reputada solecismo pernóstico: “Há solecismos que se cometem por
equívoco, por desatenção. O de que se trata provém de ignorância de
rudimentos da língua e não seria cometido por quem escrevesse com
singeleza e naturalidade” (1924, p. 39).
4. Por se caracterizarem erros dessa natureza como equívocos de estrutura,
de construção, há solecismos de concordância (“Um de nós iríamos com
certeza”, quando o correto é “Um de nós iria com certeza”), solecismos
de regência (“Não lhe conheço”, quando o correto é “Não o conheço”),
solecismos de colocação (“Eu tinha dito-lhe a verdade”, quando o
correto é “Eu lhe tinha dito a verdade”, ou “Eu tinha-lhe dito a
verdade”).
Solerte
1. Usar um adjetivo sem conhecimento do real significado da qualidade por
ele indicada é algo de muito perigo e que pode causar situações no
mínimo constrangedoras.
2. Para exemplificar tal situação, é de se ver que é comum, em petições de
advogados que querem parecer agradáveis, que se apodem os juízes de
solertes, querendo dizer com isso que eles são inteligentes, perspicazes e
sabem buscar onde está o Direito no caso concreto.
3. Contrariamente ao significado pretendido, todavia, tal adjetivo tem
sentido pejorativo e quer dizer astucioso, velhaco, ardiloso, finório.
4. Cautela, portanto, e consulta a um bom dicionário não fazem mal a
ninguém; a não ser que, realmente, se queira dizer que o juiz é mesmo
solerte.
Solicitar
1. Em dois exemplos autorizados de Rui Barbosa, vê-se, quanto à regência
verbal, que se pode construir tal verbo com uma de duas preposições: a
ou de. Exs.: a) “De vós e do Senado solicitei me fizessem mercê
exonerar-me dos cargos de membro e presidente desta comissão” (Rui
Barbosa); b) “O ministério Lafayette, nos seus últimos dias, solicitara…
ao Imperador o título de conselheiro, alegando meus serviços ao
ensino” (Rui Barbosa).
2. Nessa esteira, doutrina Vitório Bergo (1944, p. 219) que tal verbo pode
ser construído com as preposições a ou de: solicitar a ou solicitar de.
3. Anota Francisco Fernandes que, na acepção de pedir com instância,
rogar com grande empenho, “pode dizer-se solicitar alguma coisa a
alguém, ou solicitar de alguém alguma coisa” (1971, p. 552).
4. Celso Pedro Luft (1999, p. 487), de igual modo, abona ambas as
construções.
5. E Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 379), também acatando as
mesmas possibilidades de sintaxe, acrescenta que, nesses casos, “a
regência mais usual é solicitar alguma coisa a alguém” e que “menos
comum é a regência solicitar de alguém alguma coisa”.
6. Nos textos de lei, aparecem ambas as construções: a) “As leis delegadas
serão elaboradas pelo Presidente da República, que deverá solicitar a
delegação ao Congresso Nacional” (CF/88, art. 68); b) “Quando por
ausência do consignatário, ou por não se apresentar o portador do
conhecimento à ordem, o capitão ignorar a quem deva competentemente
fazer a entrega, solicitará do Juiz de Direito do Comércio, e onde o não
houver da autoridade local a quem competir, que nomeie depositário
para receber os gêneros e pagar os fretes devidos por conta de quem
pertencer” (C. Com., art. 528).
Solvabilidade – Galicismo?
1. Solvabilidade, insolvabilidade, solvável e insolvável eram vocábulos que
apareciam nos arts. 426, 914, 915, 955, § 4º, 1.003, 1.133, 1.300, § 2º,
1.389, 1.437, 1.492, 1.494, III, e 1.497, parágrafo único, do Projeto do
Código Civil.
2. Em suas apreciações, na Comissão de Redação do Senado, Rui Barbosa
(1949, p. 7), desde a introdução de seu Parecer, insurgiu-se contra eles,
reputando-os francesias, estrangeirismos desnecessários e reprovados.
3. Em comento ao art. 1.437 do Projeto, referiu que esses vocábulos e seus
cognatos nascem de solver, em sua acepção de quitar, de pagar a dívida,
enquanto os vocábulos com desinência em ável nascem de verbos
terminados em ar (reprovável, louvável); dos verbos terminados em er
nascem outros adjetivos: dissolvente, dissolúvel, resolúvel, resolvente,
resolvível (BARBOSA, 1949, p. 384).
4. Acrescentou que esse desacerto do Projeto escapou apenas uma vez aos
redatores do Código Civil português então em vigor, no art. 827; por ser
apenas uma vez, atribuiu a falha a um mero descuido (BARBOSA, 1949,
p. 262).
5. Por fim, aconselhou o uso de solvência ou insolvência, de solvente ou
insolvente, de solúvel ou insolúvel, conforme se trate da situação em si,
do próprio devedor, ou da obrigação (BARBOSA, 1949, p. 165, 281,
288, 196, 318, 356, 374, 384, 395, 396, 398 e 466).
6. Suas ponderações foram acatadas pelo legislador, conforme se comprova
pela redação definitiva dos arts. 913, 914, 954, parágrafo único, 1.002,
1.131, 1.300, § 2º, 1.389, 1.437, 1.492, III, 1.495, parágrafo único,
1.504, 1.798 e 1.804 do Código Civil de 1916. Os mencionados
vocábulos foram mantidos, na exata conformidade com a sugestão, pelo
Código Civil de 2002 na redação dos arts. 283, 284, 333, parágrafo
único, 363, 495, dentre outros.
7. Especificamente quanto ao vocábulo insolvabilidade, Vitório Bergo
(1944, p. 139) chama-o “barbarismo gálico”, ao mesmo tempo em que
preconiza o emprego de insolvência.
8. Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 23), que arrola o vocábulo entre
os estrangeirismos de nosso léxico, após observar que se trata de termo
que vem aparecendo com frequência nos Exames de Ordem e na
linguagem do foro, aponta-lhe a origem no Francês solvabilité, e
acrescenta que, em Português, o termo é solvência.
9. Observe-se, entretanto, que esse substantivo – assim como seu sinônimo
solvibilidade – vem registrado no Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, que é o veículo oficial
indicador das palavras existentes em nosso idioma, motivo por que está
oficialmente autorizado, por conseguinte, seu normal emprego (2009, p.
764).
Ver Solvável – Galicismo? (P. 709)
Solvável – Galicismo?
1. Tem sido apontado como galicismo a ser evitado.
2. Afirma-se, como justificativa, que, em português, o que é possível pagar
é algo solvível, e não solvável.
3. Assim, para os autores que defendem esse ponto de vista, há de se falar
em dívida solvível, e não em dívida solvável.
4. Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 23), que arrola o vocábulo entre
os estrangeirismos de nosso léxico, após observar que se trata de termo
que vem aparecendo com frequência nos Exames de Ordem e na
linguagem do foro, aponta-lhe a origem no Francês solvable, e
acrescenta que, em Português, os termos são solvente, solvível, solúvel.
5. Observe-se, entretanto, que esse adjetivo – assim como seu sinônimo
solvível – vem registrado no Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, que é o veículo oficial
indicador das palavras existentes em nosso idioma, motivo por que está
oficialmente autorizado, por conseguinte, seu normal emprego (2009, p.
764).
Ver Solvabilidade – Galicismo? (P. 709)
Solvência – Galicismo?
Ver Solvabilidade – Galicismo? (P. 709)
Solvível – Galicismo?
Ver Solvável – Galicismo? (P. 709)
Somatória ou Somatório?
1. Lembram José de Nicola e Ernani Terra que “a soma dos termos de uma
sequência qualquer denomina-se somatório” (no masculino).
2. Observam adicionalmente tais autores (NICOLA; TERRA, 2000, p. 205)
que “não existe a forma somatória” (no feminino).
3. Observe-se, entretanto, que esse substantivo – exatamente no feminino
(somatória) – vem registrado, assim como somatório, no Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
que é o veículo oficial indicador das palavras existentes em nosso
idioma, razão pela qual está oficialmente autorizado, por conseguinte,
seu normal emprego (VOLP, 2009, p. 764).
4. O legislador, em caso único de emprego nas codificações mais
conhecidas, proferiu seu emprego no masculino: “O total da despesa do
Poder Legislativo Municipal, incluídos os subsídios dos Vereadores e
excluídos os gastos com inativos, não poderá ultrapassar os seguintes
percentuais, relativos ao somatório da receita tributária e das
transferências previstas no § 5º do art. 153 e nos arts. 157 e 159,
efetivamente realizado no exercício anterior” (CF/1988, art. 29-A,
incluído pela Emenda Constitucional 25/2000)
Somenos
1. Trata-se de adjetivo, que quer dizer baixo, inferior, de qualidade ou valor
menor. Ex.: “Em posse do réu, encontrou-se uma cartucheira de
somenos valia”.
2. Por ser sempre um adjetivo, é palavra que precisa fazer acompanhar-se
de substantivo, sob pena de não ter sentido a construção resultante. Ex.:
a) “Os rixosos se desentenderam por questões de somenos importância”
(correto); b) “Os rixosos se desentenderam por questões de somenos”
(errado).
3. Domingos Paschoal Cegalla, que lhe confirma a natureza de adjetivo,
acrescenta ser ele “invariável em gênero e número, como menos” (1999,
p. 380).
Soprano
1. Celso Cunha (1970, p. 99) manifesta a preferência pelo gênero
masculino.
2. Na lição de Silveira Bueno, “Machado de Assis escreveu sempre o
soprano, o contralto, que são dois tons de voz exclusivos do sexo
feminino. Fez, portanto, concordar o artigo com o tom de voz, e não com
o sexo de quem o possui”.
3. Com base nesse argumento, afiança tal autor que se deve dizer “o
soprano Bidu Saião” (BUENO, 1957, p. 456-7).
4. Para Cândido de Oliveira, tal vocábulo integra o rol dos “substantivos
que são só masculinos” (1961, p. 125).
5. Evanildo Bechara (1974, p. 87), por seu lado, leciona que o mencionado
substantivo tanto pode ser masculino quanto feminino, tratando-se,
assim, de substantivo comum de dois gêneros, de modo que apresenta a
mesma forma para o masculino e para o feminino, fazendo-se a
diferenciação do sexo pelo artigo ou pela determinativa acompanhante.
Exs.: a) “Os sopranos daquele coral desafinaram”; b) “A soprano Bidu
Sayão é uma das glórias de nosso país”.
6. Domingos Paschoal Cegalla, que menciona “a soprano Bidu Saião”,
observa que, “se o termo se referir a homens (geralmente meninos), dir-
se-á, evidentemente, o soprano” (1999, p. 380).
7. Na lição de Sousa e Silva, “em se tratando de cantora que tenha essa
voz, pertence aos dois gêneros”: o soprano Cláudia Muzio ou a soprano
Cláudia Muzio.
8. E procede tal gramático a importante observação: “Para semelhante
emprego de metonímia em português, nunca se fixou norma alguma
quanto ao gênero das palavras. Todos dizem, por exemplo: ‘O caixa do
banco deu um desfalque’ (mudando o gênero de caixa), mas
inversamente: ‘Rui Barbosa foi uma pena cintilante’ (conservando o
gênero de pena). Com o vocábulo soprano o uso estabeleceu alternação.
É legítima, portanto” (SILVA, A., 1958, p. 280).
9. Em termos práticos, também é oportuno atentar a que é errôneo pensar
que não há homens sopranos; se não é tal voz normal em adultos, é, no
entanto, própria dos meninos.
10. No plano da concordância nominal, se tal substantivo vem
acompanhado de adjetivo, mesmo para os que lhe conferem a natureza
de comum de dois gêneros, esse fica formalmente no masculino,
ajustando-se ao substantivo modificado, sem qualquer reflexo sobre ele
do artigo determinador do gênero: a soprano lírico (MACHADO
FILHO, 1969a, p. 562).
11. Apesar de observação contrária, feita linhas atrás, anote-se, para
registro, que Silveira Bueno, sem razão, refere, por primeiro, que “todo
soprano é mulher”.
12. Por outro lado, continua ele em sua lição, no que respeita aos
qualificativos que acompanham palavra dessa natureza: “Não devemos
colocar no feminino os adjetivos que acompanham soprano porque tais
adjetivos modificam o substantivo oculto tom – tom soprano”.
13. De acordo com isto, devemos dizer, para tal autor: Cantará hoje o
grande soprano Bidu Saião.
14. Complementa ele que se deve dizer meio soprano, soprano lírico,
soprano ligeiro, soprano dramático, devendo todos os adjetivos ir para
o masculino.
15. E traz exemplo de Machado de Assis: “A vida é uma grande ópera. O
tenor e o barítono lutam pelo soprano, em presença do baixo e dos
comprimários, quando não são o soprano e o contralto que lutam pelo
tenor, etc.” (BUENO, 1938, p. 156-7).
16. Apesar das alongadas discussões, o certo é que o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
órgão oficial para determinar os vocábulos que integram nosso léxico,
bem como sua natureza e gênero, fazia constar, até sua edição de 1999,
a dupla possibilidade: considerá-lo masculino ou pertencente aos dois
gêneros, masculino e feminino (p. 693). Essa dupla possibilidade de
emprego, todavia, encontra-se superada na edição atual, que registra o
vocábulo apenas como adjetivo ou substantivo masculino (2009, p.
765).
Ver Contralto (P. 228).
Sortir ou Surtir?
1. Sortir significa abastecer, prover, providenciar. Ex.: “O funcionário
sortiu o almoxarifado com materiais para consumo diário”.
2. Quanto à conjugação verbal, sortir é conjugado em todas as pessoas,
tempos e modos: apenas, nos dizeres de Otelo Reis (1971, p. 142), “tem
as formas rizotônicas em u”, e, obviamente, as formas daí derivadas.
3. Assim: surto, surtes, surte, sortimos, sortis, surtem (presente do
indicativo); surta, surtas, surta, surtamos, surtais, surtam (presente do
subjuntivo); surte, surta, surtamos, sorti, surtam (imperativo
afirmativo); não surtas, não surta, não surtamos, não surtais, não
surtam (imperativo negativo).
4. Como as formas rizotônicas apenas ocorrem nos tempos já
especificados, não apresenta problema algum nos demais: sorti (pretérito
perfeito), sortira (pretérito mais-que-perfeito), sortir (futuro do
subjuntivo), sortia (imperfeito do subjuntivo), sortisse (imperfeito do
subjuntivo), sortirei (futuro do presente), sortiria (futuro do pretérito),
sortindo (gerúndio), sortido (particípio).
5. Já surtir tem o sentido de resultar, ter como consequência. Exs.: a) “A
pena aplicada aos condenados, na maioria dos casos, não surte o efeito
desejado”; b) “É obrigado o mandante a pagar ao mandatário a
remuneração ajustada e as despesas da execução do mandato, ainda
que o negócio não surta o esperado efeito, salvo tendo o mandatário
culpa” (CC, art. 676).
6. Sem lhe conferir restrição alguma, nem considerá-lo defectivo, Otelo
Reis (1971, p. 141) manda proceder a sua conjugação como verbo
regular.
7. Já para Domingos Paschoal Cegalla, “é verbo defectivo, conjugável só
nas terceiras pessoas” (1999, p. 386).
8. O melhor, para esse verbo, é considerá-lo, quanto à conjugação, regular
e empregável em todas as pessoas, muito embora seja difícil encontrar
possibilidade de seu emprego em outras, que não a terceira pessoa do
singular e a terceira pessoa do plural. Exs.: a) “… a fim de que esse
adjutório surta o melhor dos resultados” (Rui Barbosa); b) “Esses
esforços, porém, não surtiram efeito” (Rui Barbosa).
Suar
1. Quanto a sua ortografia, como todo verbo terminado em uar, dá origem
à terminação ue. Assim: sues, sue.
2. Diferentemente dos verbos terminados em uir (como possuir), não tem
forma alguma com a terminação ui, sendo errôneas as flexões suis, sui.
3. Nas palavras de Cândido de Oliveira, alertado pelos comuns equívocos
cometidos nesse campo, “é com ue a primeira, segunda e terceira
pessoas do singular do presente do subjuntivo dos verbos em uar: cultue,
cultues, habitue, preceitues” (1961, p. 65), e, por consequência, sue.
4. Quanto à conjugação verbal, trata-se de verbo regular, conjugado em
todas as pessoas, tempos e modos.
5. Não confundi-lo com o verbo soar, de significado diverso. Assim, suar
faz eu suo e não soo, eles suaram e não soaram, ele sua e não soa.
Observe-se que a primeira vogal é sempre u e não o.
6. Conjuga-se, assim, como o verbo atenuar.
Ver Atenuar (P. 143).
Sub – Com hífen ou sem?
1. O prefixo sub se une ao segundo elemento por hífen em três casos: a)
quando o segundo elemento se inicia por h: sub-hepático, sub-
horizontal, sub-horizonte, sub-humanidade, sub-humano; b) quando o
segundo elemento principia com a mesma consoante que finda o prefixo:
sub-base, sub-bosque, sub-brigadeiro; c) quando o segundo elemento
começa com r: sub-ramo, sub-região, sub-reitoria, sub-rogação, sub-
rogar.
2. Por conseguinte, a ligação se faz de modo direto (em uma só palavra e
sem hífen), quando o segundo elemento começa com outra consoante,
que não seja alguma do item anterior: subclassificação,
subdesenvolvimento, subfamília, subgaleria, submaxilar, subnível,
subsalário, subseção.
3. Também direta é a ligação, quando o segundo elemento se inicia por
vogal: subabdominal, subadquirente, subemenda, subemprego,
subinfecção, subitem, subocular, suboficial, subunidade, subutilizar.
4. Interessante é observar que o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa – editado pela Academia Brasileira de Letras, a qual tem
delegação legal para listar oficialmente os vocábulos existentes no
vernáculo e para determinar-lhes a forma correta – , de modo equivocado
e confuso, adota critério triplo para vocábulos com o prefixo sub (2009,
p. 767-9), cujo segundo elemento se inicia por h: a) com alguns deles,
separa por hífen e mantém o h (sub-horizontal e sub-horizonte); b) com
outros deles, elimina o h e junta sem hífen os elementos (subarmônico,
subasta e subemisférico); c) com terceiros deles, permite as duas formas
(sub-hepático e subepático, sub-hidroclorato e subidroclorato, sub-
hirsuto e subirsuto, sub-híspido e subíspido, sub-humanidade e
subumanidade, sub-humano e subumano).
5. Espera-se que, em uma nova edição, o VOLP racionalize a questão e use
de critérios mais uniformes para solução da matéria.
Súbita honra
Ver Subida honra, Súbida honra ou Súbita honra? (P. 713)
Subjuntivo
Ver Indicativo por Subjuntivo (P. 411).
Subjuntivo ou Indicativo?
Ver Há quem garante ou Há quem garanta? (P. 385)
Sub-rogação ou Subrogação?
1. Com as inovações trazidas para o nosso sistema pelo Acordo Ortográfico
de 2008, importa analisar como se deve escrever atualmente: sub-
rogação ou subrogação?
2. Ora, o prefixo sub, de origem latina, normalmente traz o significado de
posição inferior, em sentido físico ou figurado, como em subtenente.
3. As diretrizes do Acordo Ortográfico de 2008 determinam que tal prefixo
se une ao segundo elemento por hífen em três casos: a) quando o
segundo elemento se inicia por h: sub-hepático, sub-horizontal, sub-
humano; b) quando o segundo elemento começa com r: sub-ramo, sub-
região, sub-reitoria, sub-rogação (e isso sob pena de ter a vogal que
inicia o segundo elemento o som de um só r, como em sobremesa); c)
quando o segundo elemento principia com a mesma letra que finda o
prefixo: sub-base, sub-bosque, sub-brigadeiro (e aqui também sob pena
de ter a vogal que principia o segundo elemento o som de um só b, como
em subir).
4. Desse modo, ligam-se diretamente os elementos, quando o segundo
deles principia por outra consoante, que não aquela que encerra o
prefixo: subclassificação, subdesenvolvimento, subfamília, subgaleria,
submaxilar, subnível, subsalário, subseção.
5. Também se ligam diretamente os elementos, quando o último deles
começa por vogal: subabdominal, subadquirente, subemenda,
subemprego, subinfecção, subitem, subocular, suboficial, subunidade,
subutilizar.
6. Interessante é observar que o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa – editado pela Academia Brasileira de Letras, a qual tem
delegação legal para listar oficialmente os vocábulos existentes no
vernáculo, determinando-lhes a forma correta – em critério
evidentemente duplo e equivocado de consideração do problema,
apresenta alguns vocábulos cujo segundo elemento é iniciado por h, mas
lhes suprime tal letra e faz a junção sem hífen, como se o segundo
elemento fosse iniciado por vogal: subarmônico, subemisférico,
subepático, subumano (2009, p. 767-9).
7. Todavia, como a Academia Brasileira de Letras, pela edição do VOLP, é
a autoridade para ditar as regras sobre a grafia das palavras em nosso
idioma, deve-se obedecer a tal determinação, até que, em edição futura, a
questão seja unificada.
Subscritar ou Sobrescritar?
Ver Sobrescritar ou Subscritar? (P. 704)
Substabelecer
1. Em termos de técnica jurídica, significa passar, outorgar a outrem, por
instrumento específico (substabelecimento), os poderes recebidos de
alguém em procuração. Ou, nos dizeres de De Plácido e Silva, “transferir
os poderes constantes de um mandato a outrem, para que substitua a
pessoa a quem o mesmo mandato foi conferido” (1989, p. 279). Ex.: “O
advogado, a pedido do cliente, substabeleceu os poderes recebidos”.
2. Quem outorga o substabelecimento chama-se substabelecente; quem
recebe poderes por ele chama-se substabelecido.
3. Substabelecer com reserva significa continuar o substabelecente com
poderes para atuar na causa; substabelecer sem reserva quer dizer
desvincular-se o substabelecente, de modo total e definitivo, da causa,
sem poderes para nela continuar atuando (em tal caso, é errado dizer com
reservas ou sem reservas, assim, no plural).
4. Quanto à sintaxe, é verbo que precisa ser observado no que tange à
regência verbal.
5. Apontando-o como transitivo indireto, Francisco Fernandes o
exemplifica com o pronome lhe, mas não esclarece a preposição que
deva ser usada: “Substabeleceu-lhe os poderes da procuração” (1971, p.
557).
6. Contrariando esse posicionamento e observando que há “nos
substabelecimentos um erro corrente”, Edmundo Dantès Nascimento
(1982, p. 85), com fundamento em lição de Lindolfo Gomes, assevera
que “quem substabelece não substabelece os poderes a alguém”, mas
“substabelece alguém nos poderes”.
7. Regina Toledo Damião e Antonio Henriques preconizam o uso da
preposição em em tais hipóteses: “A regência do verbo substabelecer é:
substabelecer em alguém os poderes conferidos” (1994, p. 165).
8. Adalberto J. Kaspary (1996, p. 329) dá como perfeita e correta a sintaxe
com um objeto direto de pessoa (que pode vir como sujeito na voz
passiva) e objeto indireto de coisa introduzido pela preposição em
(substabelecer alguém em algo). Ex.: “Fulano substabeleceu Beltrano
nos poderes da procuração que lhe foi outorgada”.
9. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, porém, em seu dicionário, dá
exemplo em que usa a preposição a: “A empresa em falência
substabeleceu a outra firma o trabalho contratado” (s/d, p. 1.332).
10. De acordo com lição de Eliasar Rosa, que transcreve doutrina de
Lindolfo Gomes, seria errada a construção “não se substabelecem
‘poderes a alguém’”, já que o que se dá é que se substabelece ‘alguém
nos poderes…’”
11. Por fim, anota tal autor ser erro comum dizer-se que se substabelece
com reservas ou sem reservas, já que tal substantivo deve ficar no
singular; assim, substabelece-se com reserva ou sem reserva de
poderes (ROSA, 1993, p. 132-3). Exs.: a) “O advogado substabeleceu
com reserva de poderes” (correto); b) “O advogado substabeleceu com
reservas de poderes” (errado).
12. Em realidade, ante a divergência entre os doutos, com supedâneo no
vetusto princípio de que, na dúvida, há de se ter um entendimento
liberal, são possíveis três construções: a) substabelecer poderes a
alguém; b) substabelecer alguém nos poderes; c) substabelecer poderes
em alguém. Exs.: i) “O antigo advogado substabeleceu os poderes da
causa ao novo patrono”; ii) “O antigo advogado substabeleceu o novo
patrono nos poderes da causa”; iii) “O antigo advogado substabeleceu
os poderes da causa no novo patrono”.
13. Em tais casos, como é de regra, também se pode empregar as referidas
construções, fazendo do objeto direto da voz ativa o sujeito da voz
passiva. Exs.: a) “Os poderes foram substabelecidos ao novo
advogado”; b) “O novo advogado foi substabelecido nos poderes”; c)
“Os poderes foram substabelecidos no advogado recém-contratado”.
14. Esse entendimento mais liberal é acolhido por Celso Pedro Luft (1999,
p. 492), que vislumbra a possibilidade das seguintes construções: a)
substabelecer algo a alguém; b) substabelecer algo em alguém; c)
substabelecer alguém + predicativo (como em substabelecer alguém
mandatário).
15. Nos textos de lei, tal verbo vem construído às vezes como intransitivo,
às vezes com objeto direto (que pode ser sujeito na voz passiva) de
coisa (substabelecer alguma coisa), às vezes com objeto direto de coisa
e objeto indireto de pessoa introduzido pela preposição a
(substabelecer alguma coisa a alguém), às vezes com objeto direto de
coisa e objeto indireto de pessoa introduzido pela preposição em
(substabelecer alguma coisa em alguém). Exs.: a) “Havendo poderes
de substabelecer, só serão imputáveis ao mandatário os danos…” (CC,
art. 667, § 2º); b) “Nos poderes que a lei presume conferidos ao
mandatário está incluído o de substabelecer o mandato” (CPC
português, art. 36º, 2); c) “O mandatário é obrigado a aplicar toda a
sua diligência habitual na execução do mandato, e a indenizar
qualquer prejuízo causado por culpa sua ou daquele a quem
substabelecer, sem autorização, poderes que devia exercer
pessoalmente” (CC, art. 667, caput); d) “Considera-se celebrado pelo
representante… o negócio realizado por aquele em quem tiverem sido
substabelecidos os poderes de representação” (CC português, art. 261º,
2).
Substabelecimento
Substituir
1. Quanto à ortografia, como todo verbo terminado em uir, só pode dar
origem à terminação ui na segunda e terceira pessoas do singular do
presente do indicativo. Assim: substituo, substituis substitui.
2. Diferentemente dos verbos terminados em uar (como continuar), são
errôneas as grafias com e em tais situações: substitues, substitue.
3. Quanto à regência verbal, Sousa e Silva, por um lado, valendo-se de
exemplos, lembra que “Substituíram a monarquia pela república” e
“Substituíram a república à monarquia” são frases equivalentes,
realçando que Alexandre Herculano emprega seguidas vezes a segunda
sintaxe, como no seguinte trecho: “Outros nomes, porém, havia,
sobretudo nas designações corográficas, tão completamente alterados,
que me repugnava o substituir o moderno ao antigo” (quer dizer:
substituir o antigo pelo moderno).
4. Completa, por outro lado, o referido gramático, valendo-se de exemplo
de Carlos de Laet, com a observação de que tal verbo admite o uso do
pronome lhe: “O século passado destruiu, sem algo lhes substituir, as
antigas corporações que protegiam tais classes” (SILVA, A., 1958, p.
286).
5. Veja-se também a lição de Silveira Bueno (1957, p. 430), que lhe admite
dupla regência: a) substituir alguma cousa por outra. Exs.: i) “O governo
substituiu o professor de português pelo assistente de inglês”; ii) “O
padre substituiu o sacristão pelo coroinha”; b) substituir alguma cousa a
outra cousa. Exs.: i) “… a revolução moral que substituiu as ideias
gregas às máximas antigas” (Mário Barreto); ii) “… que substituísse a
espiritualidade de um Deus ao materialismo dos ídolos” (Antônio
Feliciano de Castilho).
6. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 382) vislumbra as mesmas
possibilidades, vale dizer, de construir o objeto indireto com por ou com
a, posição essa também seguida por Celso Pedro Luft (1999, p. 492-3).
7. Francisco Fernandes (1971, p. 557) ainda adiciona a possibilidade de
construção do objeto indireto com a preposição com: “… substituir as
janeiras e maias com procissões mui devotas…” (Alexandre Herculano).
8. Em minucioso estudo sobre seu emprego nos textos de lei, Adalberto J.
Kaspary encontrou as seguintes construções: a) substituir alguém (com o
objeto direto da voz ativa podendo ser o sujeito da voz passiva): “Dá-se
a novação… Quando um novo devedor substitui o antigo e este fica
desobrigado” (C. Com., art. 438,2); b) substituir-se reciprocamente: “O
testador pode determinar que os co-herdeiros se substituam
reciprocamente” (CC português, art. 2.283º, 1); c) substituir-se por: “Se
o gestor se fizer substituir por outrem, responderá pelas faltas do
substituto” (CC, art. 867, caput); d) substituir alguma coisa: “A
concessão da pensão especial do inciso II substitui, para todos os efeitos
legais, qualquer outra pensão já concedida ao ex-combatente” (CF/88,
DCT, art. 53, parágrafo único); e) substituir alguma coisa por outra: “O
parceiro proprietário substituirá por outros, no caso de evicção, os
animais evictos” (CC/1916, art. 1.418); f) substituir alguém a: “O
testador pode substituir outra pessoa ao herdeiro, ou legatário…” (CC,
art. 1.947); g) substituir-se a: “Dá-se a novação… quando por uma nova
convenção se substitui um credor a outro…” (C. Com., art. 438, 3); h)
substituir alguém em algo: “A exceção de não cumprimento é oponível
aos que no contrato vierem a substituir qualquer dos contraentes nos
seus direitos e obrigações” (CC português, art. 431º); i)substituir-se em
algo: “Se, não obstante proibição do mandante, o mandatário se fizer
substituir na execução do mandato…” (CC, art. 667, § 1º); j) substituir a
alguém em algo: “A apólice de seguro é transferível e exequível por via
de endosso, substituindo o endossado ao segurado em todas as
obrigações, direitos e ações” (C. Com., art. 675); k) substituir-se a
alguém em algo: “Relativamente aos créditos, o mandante pode
substituir-se ao mandatário no exercício dos respectivos direitos” (CC
português, art. 1.181º, 2).
9. Observa especificamente o mencionado autor que, no item j, “ao
segurado exerce a função de objeto direto preposicionado, construção
usada para efeito de clareza” (KASPARY, 1996, p. 329-1).
Subsume ou Subsome?
1. Um leitor diz ter encontrado as seguintes frases em votos de ministros de
nossos tribunais superiores: a) “A conduta do paciente subsume-se ao
preceito”; b) “O tema da prescrição subsume-se ao âmbito das normas”.
Mas lhe parece que a flexão nesses casos deve ser subsome-se, e não
subsume-se. E indaga qual a forma correta.
2. Ora, subsumir é o verbo que indica o fato da subsunção e significa, em
síntese, realizar “a operação de diagnose do direito, consistente em
enquadrar o caso concreto no preceito legal abstrato a ele aplicável”
(SIDOU, 1990, p. 539). Ex.: “No caso concreto, o fato noticiado não se
subsumia à legislação benéfica atualmente em vigor”.
3. E, ainda, segundo Geraldo Amaral Arruda (1997, p. 125), significa
“pensar (um objeto individual) como compreendido em um conjunto (ou
indivíduo em uma espécie, uma espécie em um gênero)”.
4. Num primeiro aspecto, na apropriada lição de Luiz Antônio Sacconi
(1979, p. 19), seu s intermédio tem real som de s (como em subsolo), e
não de z (como em subzona).
5. Num segundo aspecto, quanto a sua conjugação, trata-se de assunto a
cujo respeito não se encontram grandes subsídios. Mas Vera Cristina
Rodrigues (2003, p. 238), em monografia de grande utilidade, junta-o ao
verbo sumir e manda conjugá-lo pelo modelo sacudir, com a observação
específica de que “a vogal –u- passa a –o- fechado /ô/ nas quatro formas
em que há abertura de timbre”).
6. Ora, para começar, veja-se o verbo sacudir no presente do indicativo:
sacudo, sacodes, sacode, sacudimos, sacudir, sacodem. Três das formas
referidas pela mencionada autora estão aí registradas; a outra é a segunda
pessoa do singular do imperativo afirmativo (sacode).
7. Passe-se ao verbo sumir, que ela junta com subsumir, em mesmo
paradigma de conjugação: sumo, somes, some, sumimos, sumis, somem.
8. Então se chega ao verbo subsumir: subsumo, subsomes, subsome,
subsumimos, subsumis, subsomem.
9. Com essas anotações teóricas, não é difícil solucionar a dúvida do leitor:
a) “A conduta do paciente subsume-se ao preceito” (errado); b) “A
conduta do paciente subsome-se ao preceito” (correto); c) “O tema da
prescrição subsume-se ao âmbito das normas” (errado); d) “O tema da
prescrição subsome-se ao âmbito das normas” (correto).
Subsumir
Ver Subsume ou Subsome? (P. 718)
Subsunção
1. Em preciosa monografia, em passado não muito distante, João Mendes
Neto (1949, p. 30) observava que “o termo subsunção não é encontrado
nos dicionários da língua portuguesa. Sumptio, em latim, é a (premissa)
menor do silogismo, derivando daí subsumptio, que é colocar debaixo de
um conceito mais amplo a (premissa) menor do silogismo.
Tecnicamente, pois, o termo subsunção é próprio do silogismo”.
2. Na atualidade, o termo já foi incorporado ao léxico, como se pode
observar pelo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras, órgão oficial para determinar os
vocábulos que integram nosso idioma (2009, p. 769).
3. Também o registra o Dicionário da Melhoramentos (Encyclopaedia
Britannica do Brasil, 1995, p. 1.636), que lhe mantém a significação
filosófica.
4. Seu s intermédio, na lição de Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 19), tem
real som de s (como em subsolo), não de z (como em subzona).
5. De largo uso nos meios forenses, tem-se-lhe atribuído a significação de
enquadramento de um fato a uma lei, de uma ideia específica em outra
ideia mais geral. Ex.: “Não se dá, no caso concreto, a subsunção do fato
noticiado à legislação benéfica atualmente em vigor”.
6. J. M. Othon Sidou, em utilíssima obra que coordenou, conceitua-a
tecnicamente como a “operação de diagnose do direito, consistente em
enquadrar o caso concreto no preceito legal abstrato a ele aplicável”
(1990, p. 539).
Suceder
1. No sentido de vir depois, seguir-se, observa Artur de Almeida Torres que
“regia, antigamente, acusativo” (isto é, objeto direto) “ou dativo” (vale
dizer, objeto indireto); “atualmente, porém, constrói-se como transitivo
indireto, com a preposição a”: “É erro que sucede ao erro” (Alexandre
Herculano).
2. Complementa tal gramático que o objeto indireto, em tais casos, admite
substituição pelo pronome lhe (TORRES, 1967, p. 272): “Sucedeu-lhe
Antônio Vaz, pai de Lopo Vaz de Camões” (Camilo Castelo Branco).
3. Sousa e Silva (1958, p. 287) corrobora integralmente a lição de Almeida
Torres, quer quanto ao único uso moderno (com a preposição a), quer
quanto à possibilidade de empregar com ele o pronome lhe.
4. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 382-3) confirma a tendência
moderna de usá-lo com objeto indireto regido da preposição a, à qual se
há de dar preferência, acrescentando tal gramático a observação de que,
“na acepção de ocorrer, não se diz suceder-se, mas suceder”. Exs.: a)
“Algo de parecido está sucedendo em nosso país” (correto); b) “Algo de
parecido está se sucedendo em nosso país” (errado).
5. Edmundo Dantès Nascimento (1982, p. 182), em mesma esteira, observa
que, “modernamente o verbo suceder deve ser construído com objeto
indireto em todos os sentidos”, trazendo à corroboração exemplos de
abalizados autores: a) “… o moço sucedia ao seu pai no governo…”
(Alexandre Herculano); b) “… codificação que tem de suceder às velhas
ordenações…” (Rui Barbosa).
6. Francisco Fernandes (1971, p. 558) reitera esse posicionamento, quer
para considerar tal verbo transitivo indireto que pede a preposição a,
quer para permitir o emprego do pronome lhe.
7. O ensino de Celso Pedro Luft (1999, p. 493) é mais ampliativo, para
aceitar sua construção também como pronominal: a) “Uma grande
bonança sucedeu à tempestade” (correta); b) “Uma grande bonança
sucedeu-se à tempestade” (correto).
8. Oportuno é acrescentar que a expressão suceder na herança significa ter
direito à herança.
9. Nos textos de lei, às vezes aparece empregado intransitivamente, às
vezes com objeto direto de pessoa, às vezes com objeto indireto de coisa
introduzido pela preposição em (suceder em algo), às vezes com objeto
indireto de pessoa introduzido pela preposição a (suceder a alguém), às
vezes com dois objetos indiretos, o de pessoa introduzido pela
preposição a e o de coisa, pela preposição em (suceder a alguém em
algo). Exs.: a) “A lei do domicílio do herdeiro ou legatário regula a
capacidade para suceder” (LICC, art. 10, § 2º); b) “São inelegíveis para
os mesmos cargos, no período subsequente, o Presidente da República,
os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os
houver sucedido, ou substituído nos seis meses anteriores ao pleito”
(CF/88, art. 14, § 5º); c) “A vocação para suceder em bens de
estrangeiro situados no Brasil será regulada pela lei brasileira em
benefício do cônjuge brasileiro e dos filhos do casal…” (LICC, art. 10, §
1º); d) “Quando os netos, representando seus pais, sucederem aos avós,
serão obrigados a trazer à colação, ainda que o não hajam herdado, o
que os pais teriam de conferir” (CC, art. 2.009); e) “A habilitação tem
lugar quando, por falecimento de qualquer das partes, os interessados
houverem de suceder-lhe no processo” (CPC/1973, art. 1.055); f) “Dá-se
a novação: … II – quando novo devedor sucede ao antigo, ficando este
quite com o credor” (CC, art. 360, II).
10. Pelas construções observadas nos textos de lei, vê-se que são
empregadas as construções suceder-lhe, suceder a ele e sucedê-lo.
Suicidar-se – Pleonasmo?
1. Atente-se à circunstância de que se perdeu, no fluir dos tempos, a ideia
de que, no vocábulo analisado, o sui inicial quer dizer de si, razão pela
qual, na atualidade, o correto e necessário é conjugar o verbo
acompanhado do pronome se. Exs.: a) “Ante a evidência das provas de
acusação, o réu suicidou-se na prisão” (correto); b) “Ante a evidência
das provas de acusação, o réu suicidou na prisão” (errado).
2. Respondendo a um consulente que lhe indagava se tal verbo, “pela sua
construção, não dispensa o pronome se”, afirmava taxativamente
Cândido de Figueiredo: “Não, senhor. Morfologicamente, em suicidar já
consideramos de fato uma ação reflexa; mas como esse verbo, sem o
pronome se, nunca existiu em português, pouco importam as nossas
filosofias, e temos de aceitar os fatos incontestáveis da linguagem.
Suicidar-se é fato corrente e constante nos vários períodos da nossa
língua, e não temos que corrigi-lo. Aquela suposta redundância não é
coisa insulada na história da língua” (1941, p. 197-8).
3. Reafirmando que, contrariamente à etimologia, o correto é suicidar-se,
Domingos Paschoal Cegalla lembra que “a língua nem sempre se
submete ao jugo da lógica” (1999, p. 383).
4. Francisco Fernandes (1971, p. 558), de igual modo, também o vê apenas
com a possibilidade de construção pronominal: a) “Só poderia resistir
suicidando-me” (Camilo Castelo Branco); b) “Suicidou-se levado pela
ambição”.
Superávit
1. É a terceira pessoa do singular do pretérito perfeito do indicativo do
verbo latino superare, e significa etimologicamente sobrou; ou, como
anota Vitório Bergo, trata-se de latinismo consagrado na linguagem
comercial, sendo “forma verbal latina (supero, superare) e significa
sobrou” (1944, p. 78).
2. Serve para designar, em suma, a diferença a mais entre a receita e a
despesa. Ex.: “Conseguiu-se um inesperado superávit na receita daquele
ano”.
3. Por se tratar de palavra já incorporada ao nosso léxico, além de dispensar
as aspas (normalmente dedicadas a vocábulos estrangeiros), também
recebe acento gráfico.
4. Napoleão Mendes de Almeida – possivelmente levado a equívoco pela
observação feita em conjunto com a palavra déficit – considera superávit
um vocábulo proparoxítono, quando é facilmente perceptível seu caráter
de paroxítona.
5. O mesmo gramático dá-lhe por plural superávits (ALMEIDA, 1981, p.
305).
6. Na feitura desse plural, tem o referido gramático o abono de Regina
Toledo Damião e Antonio Henriques, que preconizam apenas o
acréscimo da “desinência indicativa do plural” (1994, p. 56).
7. Já Cândido Jucá Filho (1963, p. 604) registra a forma superávites.
8. Lembrando tratar-se de forma latina substantivada, observam Regina
Toledo Damião e Antonio Henriques (1994, p. 56) que tal vocábulo hoje
aparece acentuado e com a desinência indicativa do plural (superávits),
sinal de que já se considera incorporado ao português.
9. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, que é o veículo oficial para dirimir dúvidas acerca
de pertencerem ou não os vocábulos a nosso idioma, bem como acerca
de sua correta grafia e pronúncia – em contrariedade aos critérios
adotados para seu antônimo déficit (para o qual, a par do
aportuguesamento défice, não permite outra forma) – aceita a forma
superávit como vocábulo integrante de nosso idioma (2009, p. 772).
Superurbanismo
Ver Hipercorreção (P. 391).
Supor
Ver Pôr – Como conjugar? (P. 577)
Surdo-mudo
1. Trata-se da pessoa que tem, ao mesmo tempo, deficiência total da
audição e da fala. Ex.: “São absolutamente incapazes de exercer
pessoalmente os atos da vida civil: … III – Os surdos-mudos, que não
puderem exprimir a sua vontade” (CC/1916, art. 5º, III).
2. Após estabelecer a regra normal de flexão dos adjetivos compostos por
dois ou mais elementos – segundo a qual “varia em regra apenas o
último” – Vitório Bergo complementa que, todavia, “foge à regra surdo-
mudo, empregado normalmente como substantivo, cujo plural é surdos-
mudos” (1943, p. 59).
3. Também na lição de José de Nicola e Ernani Terra, “nessa palavra, seja
empregada como substantivo, seja como adjetivo, ambos os elementos
variam em gênero e número” (2000, p. 209).
4. De igual modo para Napoleão Mendes de Almeida, “por exceção da
regra de flexão dos adjetivos compostos, surdo-mudo faz surda-muda,
surdos-mudos, surdas-mudas” (1981, p. 305).
5. Arnaldo Niskier, em mesma esteira, considera “surdo-mudo um adjetivo
que, excepcionalmente, faz o plural surdos-mudos” (1992, p. 74).
6. Sousa e Silva, porém – em lição que parece tecnicamente mais
apropriada, lembrando o princípio de que, para os adjetivos compostos,
“quando a palavra é composta de dois adjetivos, o primeiro não se
flexiona” – não partilha desse entendimento, motivo por que assevera
que alguns escritores têm laborado no engano “de aplicar ao adjetivo as
flexões do substantivo”.
7. E doutrina tal gramático acerca do giro em epígrafe (SILVA, A., 1958, p.
289): a) “Empregado como substantivo, faz no plural masculino surdos-
mudos; no singular feminino, surda-muda; no plural feminino, surdas-
mudas”; b) “Como adjetivo, conserva inalterado o primeiro elemento:
meninos surdo-mudos, criança surdo-muda, operárias surdo-mudas”.
Ver Adjetivos compostos (P. 81).
Surpresa inesperada – Pleonasmo?
1. Esta é mais uma daquelas expressões equivocadas e redundantes,
portadora de tautologia, ou pleonasmo vicioso.
2. Surpresa já traz em si a ideia de algo inesperado.
3. Diga-se, portanto, tão somente, surpresa; ou então se troque o
substantivo por outro que não tenha tal carga de significação:
acontecimento inesperado.
Surtir ou Sortir?
Ver Sortir ou Surtir? (P. 711)
Suso
1. De acordo com lição de Sílvio Elia, que insere o vocábulo no léxico
arcaico, vem “do latim susum, forma assimilada de sursum, que existia
desde Catão (século II a. C.). Significa em cima, para cima. A locução
de suso, análoga ao francês dessus, quer dizer em cima” (1967, p. 292 e
301).
2. Cândido Jucá Filho (1963, p. 606) não confere autonomia a tal vocábulo,
mas o apresenta compondo susodito, exatamente com a acepção de atrás
mencionado, supradito, acima citado, referido antes.
3. Já o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, que é o veículo oficial para questões dessa natureza,
até sua edição de 1999, não apenas conferia autonomia ao referido
vocábulo, mas lhe discriminava a qualidade de adjetivo, de substantivo
ou de advérbio, conforme o caso (p. 703). O VOLP, edição 2004, no
entanto, deixou de registrar tal vocábulo, o mesmo ocorrendo na recente
edição de 2009.
4. Anote-se, por fim, que se trata de vocábulo pouco usado em nosso
idioma e que, normalmente, integra a fala rebuscada de alguns, na
tentativa de demonstrar pretensa erudição, como se pode ver pelo
seguinte exemplo: “Impende aludir ao venerando argumento suso
mencionado…”. Até pela existência de outros equivalentes perfeitos,
aconselha-se não usá-lo.
Suspendido ou Suspenso?
Ver Verbos abundantes (P. 759).
Sustentação oral
Ver De que (P. 269).
Suster
Ver Ter (P. 730).
T
Tabelião
1. Do latim tabellio, tabellionis (tabelião, notário público), “entende-se o
oficial público, a quem se comete a missão de redigir e instrumentar os
atos e contratos ajustados entre pessoas, atribuindo-lhes autenticidade e
fé pública” (DE PLÁCIDO E SILVA, 1989, p. 312).
2. Quando especialmente encarregado da elaboração de escrituras ou
instrumentação dos atos jurídicos, que devam ser dados ou passados por
esse meio, chama-se tabelião de notas, ou notário.
3. Quando encarregado dos registros públicos, como o de nascimento, o de
óbitos ou o de títulos e documentos, recebe a denominação de tabelião
de registros ou oficial de registros.
4. No que concerne a seu plural, de Cândido de Figueiredo é a seguinte
observação: “O povo, pela generalização, que faz, do sufixo ões,
também diz tabeliões; mas a forma geralmente usada é tabeliães, não sei
bem por quê, visto que o latim tabelliones mandaria que, em português
se dissesse tabeliões, como se ouve entre o povo” (1948, p. 34-5).
5. José de Nicola e Ernani Terra (2000, p. 210) também dão como seu
plural tabeliães.
6. Para seu feminino, Napoleão Mendes de Almeida (1981, p. 307) e
Cândido Jucá Filho (1963, p. 608) registram apenas tabelioa.
7. Cândido de Oliveira (1961, p. 133), após observar que, até há pouco, a
maioria de nomes dessa natureza era considerada comum de dois
gêneros, acrescenta textualmente que “é de lei, assim para o
funcionalismo federal como estadual, e de acordo com o bom senso
gramatical, que nomes designativos de cargos e funções tenham flexão:
uma forma para o masculino, outra para o feminino”; e, em seu
exemplário, ao masculino tabelião contrapõe ele o feminino tabelioa.
8. Em outra obra, o mesmo autor reitera-lhe por feminino tabelioa
(OLIVEIRA, C., 1961, p. 130).
9. De igual modo, Alfredo Gomes (1924, p. 79) também lhe dá por
feminino tão somente tabelioa.
10. Também sem quaisquer comentários ou ressalvas, Sousa e Silva (1958,
p. 291) apenas lhe dá por feminino tabelioa.
11. Édison de Oliveira (s/d, p. 158) confere-lhe o feminino tabelioa,
inserindo tal palavra entre os vocábulos femininos terminados por a,
que o povo evita usar, “quer em virtude de preconceito de que se trata
de funções ou características próprias do homem, quer por considerá-
los mal sonoros ou exóticos”, acrescentando, ademais, tal autor que se
hão de empregar tais femininos, “que a gramática já ratificou
definitivamente”.
12. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (s/d, p. 1.344), porém, acrescenta
a possibilidade de tabeliã para seu feminino.
13. Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 32), de igual modo, confere-lhe o
feminino tabeliã, realçando que “tabelioa é arcaísmo”.
14. Artur de Almeida Torres (1966, p. 74) atribui a tal substantivo,
indiferentemente, os dois plurais: tabeliã ou tabelioa.
15. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 387) confere a tabelião os
femininos tabelioa e tabeliã, realçando que “tabeliã é a forma
geralmente usada e preferível”, já que, assim como também se dá com
anfitrião, ermitão e tecelão, “as formas em -oa desses substantivos são
de cunho vulgar”.
16. José de Nicola e Ernani Terra (2000, p. 210) dão como plural tabeliães
e, como feminino, tabelioa ou tabeliã, observando ser esta última a
forma mais utilizada.
17. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, veículo oficial ordenador do modo de grafar as
palavras em nosso idioma (VOLP, p. 777), registra duas formas para o
feminino (tabeliã e tabelioa), mas apenas uma para o plural (tabeliães).
18. Ante o vetusto princípio de que, na divergência entre os doutos, apesar
da posição do Vocabulário Ortográfico, parece que o mais adequado é
pensar que há liberdade para o usuário, de modo que se autorize o
emprego de ambos os femininos (tabeliã e tabelioa) e ambos os plurais
(tabeliães e tabeliões).
19. Por fim, anote-se que, quando empregado tal vocábulo como adjetivo,
Carlos Góis e Herbert Palhano (1963, p. 51) fazem sua flexão para o
feminino como tabelioa.
Tabeliã ou Tabelioa?
Ver Tabelião (P. 724).
Tachar ou Taxar?
1. Do francês tache, que significa mancha, tachar tem o sentido de pôr
defeito, de qualificar negativamente, de acusar, censurar, acusar de
mancha (CIPRO NETO; INFANTE, 1999, p. 36). Exs.: a) “O autor em
seu depoimento pessoal tachou o réu de desonesto”; b) “Com sua
crítica, o advogado pretendeu tachar o magistrado de insensível”.
2. Já taxar quer dizer lançar imposto ou taxa, impor uma taxa, ou onerar
com impostos (CIPRO NETO; INFANTE, 1999, p. 36). Exs.: a) “O
governo resolveu taxar mais pesadamente as importações”; b) “Há
projeto de lei em tramitação no Congresso para taxar as grandes
fortunas”.
3. Ante os frequentes equívocos com tais homófonas, lembra Cândido de
Oliveira (s/d, p. 131) que com x tal palavra quer dizer cobrar taxa,
imposto, e com ch significa denominar, alcunhar, apelidar,
exemplificando ele próprio: a) “A alfândega vai taxar a nossa
encomenda”; b) “Não me tache de ignorante”.
4. Talvez pela frequência com que ocorrem erros desse jaez em nossa
escrita, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, veículo oficial ordenador do modo de grafar as
palavras em nosso idioma, em proceder não muito usual, acaba por fazer
a expressa diferença: tachar quer dizer censurar, enquanto taxar tem a
acepção de impor tributo (2009, p. 778 e 784).
5. Quanto a taxar, na acepção de regular, fixar o justo preço de, estabelecer
ou determinar a taxa de preço, de Adalberto J. Kaspary (1996, p. 338),
em alongado estudo, vem a observação de que se constrói, nos textos de
lei, com objeto direto (que pode ser sujeito na voz passiva),
correspondendo à construção taxar algo: a) “Pode também cada fiador
taxar no contrato a parte da dívida que toma sob sua
responsabilidade…” (CC/1916, art. 1.494; o CC/2002, no art. 830,
alterou a redação para fixar); b) “Quando o testamenteiro não for
herdeiro nem legatário, terá direito a um prêmio que, se o testador o
não houver taxado, será de um a cinco por cento…” (CC/1916, art.
1.766; o CC/2002, no art. 1.987, alterou a redação para fixar); c)
“Enquanto se não fixarem definitivamente os alimentos, pode o tribunal,
a requerimento do alimentando, ou oficiosamente se este for menor,
conceder alimentos provisórios, que serão taxados segundo o seu
prudente arbítrio” (CC português, art. 2.008, 1).
Tal
Ver Que tal (P. 640) e Tal qual (P. 725).
Tal qual
1. Na lição de Édison de Oliveira (s/d, p. 141), em construções com essa
expressão, “temos duas orações, de modo que o termo tal concorda com
o sujeito da primeira, e o termo qual concorda com o sujeito da
segunda”. Exs.: a) “O filho é tal qual o pai”; b) “Os filhos são tais qual o
pai”; c) “O filho é tal quais os pais”; d) “Os filhos são tais quais os
pais”.
2. Em mesma esteira, na consonância com ensino de Domingos Paschoal
Cegalla, seguindo “a tradição da língua, os correlativos tal e qual devem
concordar com o substantivo ou pronome a que se referem: a) “A mãe
queria que a filha fosse tal quais as colegas”; b) “Eles querem ser tais
qual o pai”.
3. Atento aos equívocos corriqueiros a esse respeito e ao próprio
desconhecimento mínimo do idioma por muitos de seus usuários,
complementa o mesmo autor que “escritores modernos geralmente não
flexionam tal qual, por entenderem que a expressão equivale a como”
(CEGALLA, 1999, p. 388).
4. Um consulente propôs a Cândido de Figueiredo o exemplo “Sábio é o
indivíduo que vê as coisas tais como são” e indagou acerca da correção
da frase e da possibilidade de substituição de tais como são por tal como
são, ou tais quais são, ou tal qual são.
5. Assim foi a resposta do referido gramático, evidenciadora da
necessidade de concordância de tal com o termo anterior a que se refere
(coisas): “Tais quais são é forma portuguesíssima. Tais como são
também não oferece dúvidas. Tal como são é tolice; e tal qual são é
outra, pelo menos enquanto os mestres não fundirem o tal e o qual num
advérbio, juntando as duas partículas (talqual). Inda lá não chegamos”
(FIGUEIREDO, 1943, p. 181).
6. Vitório Bergo (1943, p. 58), em lição que não dissente das anteriores,
assim doutrina e exemplifica a questão: “Os correlativos qual e tal
concordam com o nome a que se referem: ‘Eis o homem tal qual a
memória mo relembra’ (Rui Barbosa); ‘Praticou ações tais quais nunca
foram praticadas’ (Garrett); ‘Mostra o P. Francisco naquela carta
quanto desejava fossem todos tais, qual ele era no zelo da salvação das
almas’ (Lucena)”.
7. Por fim, vale transcrever a admoestação de Laudelino Freire (1937b, p.
105) no que concerne à diferenciação entre essa expressão e outras
parecidas: “As expressões tal qual, tal e qual, tal ou qual têm sentidos
diversos. A primeira tem o sentido de como, e exprime comparação – ‘O
filho é tal qual o pai’ (= tal qual é o pai); a segunda resultou de se terem
copulativamente coordenado as duas palavras, como dois adjetivos, e
tem a ideia de exatidão, de rigor – ‘É tal e qual como ele informa’; a
terceira resultou também de se terem coordenado aquelas palavras
disjuntivamente, e exprime a ideia de aproximação – ‘Fala com tal ou
qual eloquência’”.
Ver Advérbios em “mente” (P. 85).
Talqualmente – Existe?
Ver Advérbios em “mente” (P. 85).
Talvez
1. Alfredo Gomes (1924, p. 377), em oportuna observação de estilo acerca
do modo verbal a ser empregado com tal vocábulo, lembra que “talvez
ora quer o subjuntivo, quando precede o verbo, ora o indicativo, quando
vem depois do verbo: a) ‘Talvez isto seja verdade’; b) ‘Isto é talvez
verdade’”.
2. Reiterando tal lição, Silveira Bueno (1957, p. 469) ministra duas
interessantes observações alheias, com as quais mostra concordância:
“Ensinam as gramáticas que, vindo talvez antes do verbo, deve este ir
para o modo subjuntivo: talvez eu vá ao cinema; talvez venha hoje, etc.”;
“Se vier depois, o verbo poderá ficar no indicativo: vou, talvez, ao
cinema; venho, talvez, hoje”.
Ver Indicativo por Subjuntivo (P. 411).
Tangentemente – Existe?
Ver Tocantemente – Existe? (P. 739)
Tanger
1. Quanto à conjugação verbal, como todos os verbos terminados em ger,
para a continuidade do som original da última consoante do radical,
muda o g em j antes de o e de a. Assim: tanjo, tanges, tanja, tangi.
2. Feitas essas observações, é de se anotar que se trata de verbo regular,
conjugado em todas as pessoas, tempos e modos.
3. Conjugam-se de mesmo modo constranger, eleger, proteger, ranger.
4. É importante observar-lhe a regência verbal, por se tratar de verbo que
muda a exigência de construção conforme o significado.
5. Assim, no sentido de executar um instrumento ou de tocar animais, é
transitivo direto. Exs.: a) “A moça tangia a harpa maravilhosamente”; b)
“O retireiro tangia o gado com maestria”.
6. Na acepção de dizer respeito, de referir-se, é transitivo indireto e exige a
preposição a. Ex.: “No que tange às preliminares, devem ser repelidas
desde logo”.
7. Esse é o entendimento de Francisco Fernandes (1971, p. 564), que se
abona com exemplos de autores insuspeitos: a) “Outros com vozes com o
que o céu feriam instrumentos altíssonos tangiam” (Camões); b) “Um
homem de carão sinistro… tangendo duas mulas de boa aparência”
(Camilo Castelo Branco); c) “Vós outros que sois principal parte neste
feito, e a que isto mais tange que a nós, devíeis dizer isto, e eu não”
(Alexandre Herculano).
Tanto… como
Ver Não apenas… como também… merece(m)…? (P. 484)
Tanto quanto
Ver À medida que, À medida em que ou Na medida em que? (P. 111)
Tão logo
1. Na referida expressão, num primeiro sentido, logo é advérbio, que vem
precedido de tão, outro advérbio, este último indicando a intensidade
daquele. Ex.: “Tão logo não haverá de terminar a audiência”.
2. Num segundo sentido, significa logo que assim que, caso em que é
locução conjuntiva subordinativa temporal. Ex.: “Tão logo terminou a
audiência todos se retiraram da sala”.
Taquigrafar
1. Tendo por sinônimos estenografar e logografar, significa escrever
taquigraficamente, ou praticar a taquigrafia, que é “a escrita abreviada e
simplificada, na qual se empregam sinais que permitem escrever com a
mesma rapidez com que se fala” (FERREIRA, s/d, p. 580).
2. No que concerne à prosódia, há dúvidas na pronúncia e na escrita das
formas rizotônicas desse verbo, nas quais a sílaba tônica é sempre gra,
não havendo formas proparoxítonas: taquigrafo, taquigrafas, taquigrafa,
taquigrafamos, taquigrafais, taquigrafam (presente do indicativo);
taquigrafe, taquigrafes, taquigrafe, taquigrafemos, taquigrafeis,
taquigrafem (presente do subjuntivo); taquigrafa, taquigrafe,
taquigrafemos, taquigrafai, taquigrafem (imperativo afirmativo); não
taquigrafes, não taquigrafe, não taquigrafemos, não taquigrafeis, não
taquigrafem (imperativo negativo).
3. Como as formas rizotônicas apenas ocorrem nos tempos referidos, não
há dúvidas de pronúncia e escrita nos demais tempos.
4. Veja-se, por fim, que o substantivo é que é proparoxítono: o taquígrafo,
a taquígrafa, os taquígrafos, as taquígrafas.
5. A questão se resolve pelas observações de Otelo Reis acerca das formas
verbais paroxítonas dignas de nota: “Certas formas rizotônicas,
paroxítonas, de verbos polissilábicos, possuem homógrafos
proparoxítonos, que são substantivos ou adjetivos. A distinção é feita, na
escrita, pela acentuação da palavra proparoxítona” (1971, p. 73-4).
6. Problema idêntico se dá com outros verbos, como biografar (o biógrafo
e eu biografo), datilografar (o datilógrafo e eu datilografo), dialogar (o
diálogo e eu dialogo), estenografar (o estenógrafo e eu estenografo),
filosofar (o filósofo e eu filosofo), fotografar (o fotógrafo e eu
fotografo), interpretar (o intérprete e que eu interprete), invalidar (ato
inválido e eu invalido), maquinar (a máquina e ele maquina),
monologar (o monólogo e eu monologo), sindicar (o síndico e eu
sindico), subsidiar (o subsídio e eu subsidio).
Tautologia
Ver Pleonasmo – O que é e Quando pode? (P. 565)
Taxar ou Tachar?
Ver Tachar ou Taxar? (P. 725)
Telex – Anglicismo?
1. Telex é palavra vinda do inglês e aparece no dicionário Houaiss, que
assim a define: “Modalidade de serviço telegráfico através do qual os
usuários podem comunicar-se direta e temporariamente entre si, por
meio de aparelhos teleimpressores. (…) Etimologia inglesa ‘redução da
expressão inglesa TELeprinter EXchange (service), ou seja, (serviço) de
troca de textos impressos a distância’” (HOUAISS; VILLAR, 2001, p.
2.687).
2. Por ser redução de uma expressão inglesa, sua pronúncia é oxítona,
contrariamente a quase totalidade dos vocábulos terminados em x, que
são paroxítonos.
3. No que concerne à vernaculidade atual da mencionada palavra, é de se
anotar que o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras, que é o veículo oficial indicador dos
vocábulos pertencentes a nosso idioma, registra normalmente telex como
substantivo masculino de nosso léxico (2009, p. 786), motivo por que
está perfeitamente autorizado seu emprego entre nós.
4. Do gênero masculino, seu plural se faz pela regra de pluralização das
palavras terminadas em x, a saber, sem variação alguma, a não ser pela
mudança do artigo ou da palavra acompanhante: os telex, dois telex,
telex surpreendentes. Essa é a posição do próprio VOLP (2009, p. 786).
5. Domingos Paschoal Cegalla corrobora seu caráter de vocábulo
“invariável no plural: um telex, vários telex” (1999, p. 390).
6. Nessa mesma esteira é a lição de Napoleão Mendes de Almeida: “o
plural, a seguir a regra de pluralização de palavras terminadas em x, é
invariável: dois telex” (1981, p. 310).
Têm ou Tem?
Ver Eles têm ou Eles tem? (P. 300)
Tempo
Ver Expressões de tempo (P. 348).
Tempos derivados
Ver Tempos primitivos (P. 729).
Tempos primitivos
1. Quanto à conjugação verbal, sobretudo para os verbos irregulares, é
importante anotar que a fixação de sua maneira de flexionar não se faz
por simples processo de memorização, mas há regras próprias de
derivação válidas praticamente para todos os verbos; e a observância
dessas normas facilita sobremaneira o entendimento das formas mais
difíceis.
2. Em outras palavras, há algumas formas e tempos dos quais outros se
originam: os primeiros são os tempos primitivos; os outros, tempos
derivados.
3. De modo mais específico, do presente do indicativo deriva o presente do
subjuntivo; e de ambos se originam o imperativo afirmativo e o
imperativo negativo.
4. Do pretérito perfeito do indicativo derivam o pretérito mais-que-perfeito
do indicativo, o futuro do subjuntivo e o imperfeito do subjuntivo.
5. E do infinitivo impessoal derivam os demais tempos e modos: pretérito
imperfeito do indicativo, futuro do presente do indicativo, futuro do
pretérito do indicativo, infinitivo pessoal, gerúndio e particípio.
Ver Tempos derivados do infinitivo (P. 729), Tempos derivados do
presente do indicativo (P. 729) e Tempos derivados do pretérito perfeito
do indicativo (P. 729).
Teor
Ver A teor de – Existe? (P. 143)
Ter
1. Ter, num primeiro aspecto, é verbo que traz problemas quanto à
acentuação gráfica, dificuldade essa que se espraia para seus compostos,
razão pela qual algumas observações são oportunas.
2. Assim, tanto ter quanto seus compostos são grafados, na terceira pessoa
do plural do presente do indicativo, com um acento circunflexo, e isso
para diferenciar da terceira pessoa do singular: eles têm, eles mantêm.
3. Seus compostos – e apenas seus compostos – na terceira pessoa do
singular, recebem um acento agudo: ele tem, ele mantém.
4. Atente-se, portanto, a como se grafam as seguintes formas verbais: ele
tem, ele mantém, eles têm, eles mantêm (a mesma observação vale para
todos os demais compostos do verbo ter).
5. Observe-se, por outro lado, que, na terceira pessoa do singular do
presente do indicativo, nem ter nem seus compostos apresentam dois ee,
encontro vocálico esse privativo de crer, dar, ler, ver e seus compostos.
6. Atento aos corriqueiros equívocos do linguajar cotidiano, lembra
Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 119) que “em jornais são
frequentes erros como este: ‘Forças de segurança eslovenas detiam um
comboio de blindados’” (o correto seria detinham).
7. Há diversos compostos, que lhe seguem integralmente a conjugação:
abster-se, ater-se, conter, deter, entreter, manter, obter, reter, suster.
8. O tempo que deve merecer grande atenção, porém, é o pretérito perfeito
do indicativo, do qual derivam outros tempos: tive, tiveste, teve, tivemos,
tivestes, tiveram (pretérito perfeito); tivera, tiveras, tivera, tivéramos,
tivéreis, tiveram (pretérito mais-que-perfeito); tiver, tiveres, tiver,
tivermos, tiverdes, tiverem (futuro do subjuntivo); tivesse, tivesses,
tivesse, tivéssemos, tivésseis, tivessem (imperfeito do subjuntivo).
9. Vejam-se alguns exemplos de emprego do composto abster-se: a) “O réu
se absteve de qualquer pronunciamento” (e não se absteu); b) “Os réus
se abstiveram de qualquer pronunciamento” (e não se absteram); c) “Se
o réu se abstiver de qualquer pronunciamento, talvez consiga
absolvição” (e não se abster); d) “Se o réu se abstivesse de qualquer
pronunciamento, talvez conseguisse absolvição” (e não se abstesse).
10. E também algumas formas corretas com o composto ater-se: a) “O réu
se ateve a sua própria versão” (e não se ateu); b) “Os réus se ativeram
a sua própria versão” (e não se ateram); c) “Se o réu se ativer à
verdade, talvez consiga absolvição” (e não se ater); d) “Se o réu se
ativesse à verdade, talvez conseguisse absolvição” (e não se atesse).
11. E, ainda, alguns casos de uso com o composto conter: a) “O réu não se
conteve e confessou o crime” (e não se conteu); b) “Os policiais
contiveram a rebelião” (e não conteram); c) “Se o réu se contiver,
talvez consiga absolvição” (e não se conter); d) “Se o réu se contivesse,
talvez conseguisse absolvição” (e não se contesse).
12. E, mais, com o verbo deter: a) “O policial deteve o assassino” (e não
deteu); b) “Os policiais detiveram o assassino” (e não deteram); c) “Se
o policial não o detiver, o assassino certamente cometerá outros
crimes” (e não deter); d) “Se o policial não o detivesse, o assassino
certamente cometeria outros crimes” (e não detesse).
13. E com o verbo entreter-se: a) “O ladrão se entreteve com o produto do
furto e foi preso” (e não se entreteu); b) “Os ladrões se entretiveram
com o produto do furto e foram presos” (e não se entreteram); c) “Se o
ladrão se entretiver com o produto do furto, certamente será preso” (e
não se entreter); d) “Se o ladrão não se entretivesse com o produto do
furto, certamente não seria preso” (e não se entretesse).
14. De igual modo, com o composto manter: a) “O réu se manteve calado”
(e não se manteu); b) “Os réus se mantiveram calados” (e não se
manteram); c) “Se o réu se mantiver calado, talvez consiga
absolvição” (e não se manter); d) “Se o réu se mantivesse calado,
talvez conseguisse absolvição” (e não se mantesse).
15. Em continuação, com o composto obter: a) “O assassino não obteve a
recompensa prometida” (e não obteu); b) “Os assassinos não
obtiveram a recompensa prometida” (e não obteram); c) “Se o réu
obtiver a recompensa, certamente fugirá” (e não obter); d) “Se o réu
obtivesse a recompensa, certamente fugiria” (e não obtesse).
16. Adicionalmente, com o composto reter: a) “O acusado reteve consigo
a real versão dos fatos” (e não reteu); b) “Os réus retiveram consigo a
real versão dos fatos” (e não reteram); c) “Se o réu não retiver consigo
a real versão dos fatos, talvez consiga absolvição” (e não reter); d) “Se
o réu não retivesse consigo a real versão dos fatos, talvez conseguisse
absolvição” (e não retesse).
17. Por fim, com o composto suster: a) “O réu não susteve a pressão do
interrogatório e confessou o crime” (e não susteu); b) “Os réus não
sustiveram a pressão do interrogatório e confessaram o crime” (e não
susteram); c) “Se o réu sustiver a versão dada na fase policial, talvez
consiga absolvição” (e não suster); d) “Se o réu sustivesse a versão
dada na fase policial, talvez conseguisse absolvição” (e não sustesse).
18. Vejam-se alguns exemplos de emprego dos compostos de ter nos textos
legais: a) “Só se considera perdida a posse para quem não presenciou
o esbulho, quando, tendo notícia dele, se abstém de retornar a coisa,
ou, tentando recuperá-la, é violentamente repelido” (CC, art. 1.224); b)
“Sob pena de nulidade, o estatuto das associações conterá…” (CC, art.
54); c) “Haverá simulação nos negócios jurídicos quando: … II –
contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não
verdadeira” (CC, art. 167, § 1º, II); d) “Considera-se inepta a petição
inicial quando: … IV – contiver pedidos incompatíveis entre si”
(CPC/1973, art. 295, parágrafo único, IV); e) “Se a petição contiver os
requisitos do art. 654, § 1º, o presidente, se necessário, requisitará da
autoridade indicada como coatora informações por escrito…” (CPP,
art. 662); f) “Aos contratos por prazo determinado, que contiverem
cláusula asseguratória do direito recíproco de rescisão antes de
expirado o termo ajustado, aplicam-se, caso seja exercido tal direito
por qualquer das partes, os princípios que regem a rescisão dos
contratos por prazo indeterminado” (CLT, art. 481); g) “Aquele que
detiver a coisa em nome alheio, sendo-lhe demandada em nome
próprio, deverá nomear à autoria o proprietário ou o possuidor”
(CPC/1973, art. 62); h) “Se o transportador mantiver a coisa
depositada em seus próprios armazéns, continuará a responder pela
sua guarda e conservação, sendo-lhe devida, porém, uma remuneração
pela custódia, a qual poderá ser contratualmente ajustada ou se
conformará aos usos adotados em cada sistema de transporte” (CC,
art. 753, § 4º); i) “Se um dos cônjuges ou companheiros adota o filho
do outro, mantêm-se os vínculos de filiação entre o adotado e o
cônjuge ou companheiro do adotante e os respectivos parentes” (CC,
art. 1.626, parágrafo único); j) “A empresa que mantiver empregado
não registrado nos termos do art. 41 e seu parágrafo único, incorrerá
na multa de valor igual a 1 (um) salário-mínimo regional, por
empregado não registrado, acrescido de igual valor em cada
reincidência” (CLT, art. 47, caput); k) “Se o juiz mantiver o nome
indicado, a impugnação deverá ser remetida ao Tribunal Regional que
a apreciará antes de decidir sobre a nomeação” (Código Eleitoral, art.
62, § 5º – revogado); l) “O julgamento contrário a um dos credores
solidários não atinge os demais; o julgamento favorável aproveita-
lhes, a menos que se funde em exceção pessoal ao credor que o obteve”
(CC, art. 274); m) “Aquele que, trabalhando em matéria-prima em
parte alheia, obtiver espécie nova, desta será proprietário, se não se
puder restituir à forma anterior” (CC, art. 1.269); n) “A sentença de
mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: … VII –
depois da sentença, o autor obtiver documento novo, cuja existência
ignorava, ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe
assegurar pronunciamento favorável” (CPC/1973, art. 485, VII).
Ter a – Galicismo?
1. Napoleão Mendes de Almeida reputa francesismos as construções “Nada
tenho a fazer”, “Há muitos pontos a esclarecer”.
2. Segundo tal autor, três seriam as formas para corrigir tal barbarismo
sintático (ALMEIDA, 1981, p. 1 e 312): a) “Nada tenho por fazer”; b)
“Nada tenho para fazer”; c) “Nada tenho que fazer”.
3. Carlos Góis, de igual modo, assevera que Nada tenho a fazer “acha-se
fora de qualquer cogitação de uso, por galicana” (1943, p. 185).
4. Júlio Nogueira (1959, p. 71) também se posta contra o uso de expressões
como “Tenho muitas coisas a fazer”; e preconiza o uso da preposição
que: “Tenho muitas coisas que fazer”.
5. De igual modo, anota Vasco Botelho de Amaral (1939, p. 75) que
“representa galicismo de construção a posposição de a ao verbo ter,
relacionado, por seu turno, com infinito seguinte”. Acrescenta que não
são para imitar redações como a do seguinte exemplo de Camilo Castelo
Branco, “autor que frequentes vezes apresenta semelhante francesismo”:
“Se me falas com o teu costumado juízo, tenho a dizer-te…”. Por fim,
afiança que “a boa norma idiomática está em Castilho”, de onde extrai
ele o exemplo que cita: “Nada tenho para acrescentar…”.
Ver A fazer – Está correto? (P. 91) e Ter de ou Ter que? (P. 732)
Teratológico ou Teratogênico?
1. Um leitor relata ser comum, na prática dos tribunais, o emprego da
expressão decisão teratológica. E indaga se o correto, sobretudo do
ponto de vista etimológico, não seria teratogênica.
2. Observe-se, num primeiro aspecto, que o Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa registra ambas as palavras: teratogênico e
teratológico (ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 788).
3. E se realça, nesse campo, que o VOLP é editado pela Academia
Brasileira de Letras, e esta detém a delegação legal para listar
oficialmente os vocábulos existentes em nosso idioma, de modo que não
há dúvida quanto à efetiva existência de ambos os vocábulos no
vernáculo.
4. Num segundo aspecto, vê-se que teratológico, originalmente, significa
aquilo que se refere à teratologia, ou seja, ao estudo das anomalias e
malformações do embrião ou feto. Ex.: “Naquela aula, em que os
estudantes de Medicina respiravam embriões e fetos, só se falou em
teratologia, em assuntos teratológicos”.
5. Desse sentido físico, por sinédoque, passou a significar o estudo das
monstruosidades em geral. Ex.: “Pretender a aplicação de um princípio
geral de direito com marginalização de lei infraconstitucional em vigor,
e isso sem que seja esta declarada inconstitucional, nada mais é do que
teratologia, do que interpretação teratológica da lei e do ordenamento
jurídico como um todo”.
6. Já teratogênico tem o sentido primário e físico daquilo que causa
teratogenia ou teratogênese, a saber, que causa formação e
desenvolvimento no útero de anomalias que levam a malformações. E
não há registro de aplicações do vocábulo com sentido figurado ou de
algum modo metafórico. Ex.: “Na análise daquele embrião doente, as
malformações foram expostas em todos os seus aspectos teratogênicos”.
7. Da comparação entre as acepções e os exemplos, pode-se concluir em
síntese: a) teratológico, por um lado, tem um sentido figurado, que os
dicionários não apresentam para teratogênico; b) no sentido físico, os
vocábulos apresentam alguma intersecção de sentido, mas, pelo que
mostram os dicionários, mas não uma real e efetiva sinonímia; c) de
modo específico para o caso da consulta, a forma correta é decisão
teratológica, e não decisão teratogênica.
Terceiro e quarto
Ver Primeiro e segundo (P. 600).
Terceiros e quartos
Ver Segundos e terceiros – É possível? (P. 684)
Ter por
Ver Ter a – Galicismo? (P. 732)
Testemunha
1. No plano gramatical, trata-se de substantivo que é sempre feminino (a
testemunha), não importando se designa um homem ou uma mulher.
2. É o que, tecnicamente, se denomina substantivo sobrecomum.
3. E, como lembram José de Nicola e Ernani Terra (2000, p. 214), “caso se
queira especificar o sexo da pessoa, deve-se dizer a testemunha do sexo
masculino (ou feminino)”.
4. Sem maiores dificuldades ou discussões, basta, nesse sentido, consultar
o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, publicado pela
Academia Brasileira de Letras, órgão esse que tem delegação legal para
listar as palavras oficialmente existentes em nosso idioma, bem como, se
for o caso, fixar seu gênero (2009, p. 791).
Testemunha a ouvir(-se) – Está correto?
Ver A fazer – Está correto? (P. 91)
Testemunha de oitiva
Ver Oitiva (P. 521).
Testemunha de ouvida
Ver Oitiva (P. 521).
Teúda – Existe?
1. De ter, é a forma antiga do particípio passado tido.
2. Em verdade, como ensinam Regina Toledo Damião e Antonio Henriques
(1994, p. 52), “no português arcaico, os verbos da segunda conjugação
tinham o particípio passado em udo (conhoçudo, vençudo, manteúdo,
conteúdo)”.
3. Nesse sentido é a lição de João Ribeiro (1923, p. 195), a lecionar que a
terminação dos particípios da segunda conjugação era em udo, como
estabeleçudo (estabelecido), sabudo (sabido), conhoçudo (conhecido),
reteúdo (retido), tendo remanescido alguns vestígios dessas formas
arcaicas em teúdo, conteúdo, manteúdo, posicionamento esse de que não
discrepa Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 173), ao apontar o sufixo udo
como o “particípio passado da segunda conjugação”.
4. Otoniel Mota, de igual modo, não dissente dessa lição, ao asseverar que
“o particípio passado dos verbos da segunda conjugação portuguesa era
antigamente em udo, não ido: perdudo, temudo, devudo, por perdido,
temido, devido” (1916, p. 49).
5. Na lição de Alfredo Gomes (1924, p. 387), outrora, “o particípio passado
dos verbos da segunda conjugação e alguns outros terminavam em udo
(teúdo). Houve um período de vacilância entre os particípios em udo e os
em ido; estes triunfaram, deixando aqueles vestígios nos termos: teúdo
(o que é tido); conteúdo (o que está contido); manteúdo (o que está
mantido)”.
6. Trata-se, hoje, de verbo empregado comumente, nos meios jurídicos e
forenses, na expressão teúda e manteúda, para exprimir aquela pessoa
que se tem e se mantém, como em concubina teúda e manteúda.
7. Embora antiquada quanto à forma, tal expressão “é ainda empregada em
questões de concubinato para indicar a mulher que é mantida à custa do
homem, com quem, igualmente, vive em relações permanentes”, não
sendo apenas aquela “que se tem em relações fugazes” (DE PLÁCIDO E
SILVA, 1989, p. 372).
8. Em terminologia atualizada, concubina teúda e manteúda é a mulher tida
e mantida por um homem como sua real e efetiva mulher, em verdadeiro
casamento não oficializado, tenha ele ou não outra família.
Têxtil
1. Para Napoleão Mendes de Almeida, a pronúncia da palavra têxtil é
paroxítona, sendo mais forte a penúltima sílaba.
2. O mesmo gramático refere a divergência existente quanto ao timbre do
vocábulo (ALMEIDA, 1981, p. 313): para Caldas Aulete, João Ribeiro e
Vasco Botelho do Amaral, a vogal tônica é aberta (é); para Cândido de
Figueiredo e para o Pequeno Vocabulário da Língua Portuguesa, é
fechada (ê).
3. Também para Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 19), sua pronúncia é
fechada (ê).
4. Silveira Bueno a dá exclusivamente como paroxítona, conferindo-lhe,
por plural, tão somente têxteis (1938, p. 14), referindo que quem
pronunciar tais vocábulos como oxítonos e compuser o plural em is e
não em eis – único plural correto para ele – “cometerá grave erro,
evidenciando que desconhece a história de sua própria língua” (1938, p.
45-6).
5. Para Cândido de Figueiredo, “têxtil é palavra grave ou paroxítona, isto é,
acentua-se tonicamente na penúltima sílaba, e forma o plural têxteis”
(1948, p. 116-7).
6. Após observar que em Portugal é mais comum a pronúncia paroxítona,
enquanto no Brasil são vulgares a escrita e a pronúncia oxítonas, Júlio
Nogueira adverte – em observação feita para réptil, para projétil e para
têxtil – que “a pronúncia lusitana em tais palavras é mais fiel a latina,
mas seria demasiado rigor corrigir a brasileira nesses casos
generalizados. Somente nas escolas, em língua erudita, se pronunciam
essas palavras a maneira lusitana” (1959, p. 19-20).
7. Em outra obra, após referir que, em Portugal, tal vocábulo se insere entre
os paroxítonos, formando o plural em eis, o mesmo gramático observa
que, no Brasil, a tendência da língua é tê-los por oxítonos, fazendo, por
conseguinte, o plural em is (NOGUEIRA, 1930, p. 165).
8. Espancando dúvidas acerca da possibilidade atual de uso, o Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,
veículo oficial ordenador do modo de grafar as palavras em nosso
idioma, registra apenas têxtil para o singular (2009, p. 792). Embora
silente esta quanto ao plural, é certo que, na edição de 1999, o VOLP
apontava, com exclusividade, o plural têxteis (1999, p. 721). Essa é a
regra que ainda se mantém. Isso significa que a forma oxítona não é
oficialmente aceita para tal vocábulo nem singular nem no plural.
Tirante
1. Para o que efetivamente aqui interessa, trata-se de “preposição acidental,
como exceto” (BERGO, 1944, p. 228). Ex.: “… tirante as quatro peças
náuticas que vira…” (Camilo Castelo Branco).
2. Segundo lição de Evanildo Bechara, palavras dessa natureza são formas
verbais de particípio – e, assim, de valor adjetivo – que “passaram a ter
emprego equivalente a preposição e advérbio… e, como tais,
normalmente devem aparecer invariáveis” (1974, p. 302).
3. Também de conformidade com Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 363),
trata-se de forma nominal de um verbo, que foi imobilizada entre as
preposições, sendo como tal empregada, de modo que arcaica é a forma
flexionada tirantes.
4. O certo, entretanto, é que não se perdeu de todo a consciência de seu
antigo valor, e muitos escritores procedem a sua concordância regular
com o substantivo modificado.
5. Acrescenta, por isso, Evanildo Bechara a lição de Epifânio Dias, para
quem flexionar tal vocábulo “é expressar-se na verdade com correção
gramatical, mas de modo desusado” (1974, p. 302).
6. Na esteira dessas lições, são, assim, tecnicamente corretos os seguintes
exemplos: a) “Tirante os adversários, todos aplaudiram o discurso”; b)
“Tirantes os adversários, todos aplaudiram o discurso”.
7. O melhor, contudo, é seguir a lição preconizada por Domingos Paschoal
Cegalla (1999, p. 394), que refere exemplo de autores insuspeitos, nos
quais tal vocábulo é usado sem variação para o plural: a) “Tirante os três
a que acabo de me referir, os nossos acadêmicos são literatos que falam
de linguística como amadores” (Mário Barreto); b) “O marido tirante as
horas de comer, não saía da livraria” (Camilo Castelo Branco).
8. Em lição adicional para outro aspecto, refere Celso Cunha (1970, p. 147)
que, por se tratar de preposição, mas de cunho acidental, e não essencial
– pertence normalmente a outra classe gramatical, mas funciona
esporadicamente, no caso, como preposição – depois dela se empregam
as formas eu e tu, e não mim nem ti, como, aliás, seria o normal ocorrer,
se fosse essencial a preposição. Exs.: a) “Todos tirante eu, sustentam tese
contrária” (correto); b) “Todos tirante mim, sustentam tese contrária”
(errado).
Título
Ver Números – Como ler e Empregar? (P. 506)
Título de obra
1. É oportuno atentar ao apropriado ensinamento de Artur de Almeida
Torres: “Não se escrevem com maiúscula inicial as partículas
monossilábicas que se acham no interior de vocábulos compostos ou de
locuções ou expressões que tem iniciais maiúsculas: Queda do Império,
O Crepúsculo dos Deuses, Histórias sem Data, A Mão e a Luva, Festas e
Tradições Populares no Brasil, etc.” (1966, p. 230).
2. Em lição mais abrangente, Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 395)
lança a esse respeito duas importantes regras e uma recomendação: a)
“De acordo com a ortografia oficial, usa-se letra inicial maiúscula nos
títulos de livros, jornais, revistas, produções artísticas, literárias e
científicas”; b) “As palavras átonas, no interior dos títulos, grafam-se
com inicial minúscula”; c) “A bem do aspecto gráfico, não se usem
aspas para destacá-los, mas escrevam-se em itálico”.
3. O que se pode concluir, nesses casos, é que se devem grafar com
maiúsculas os vocábulos tônicos – sejam eles monossilábicos ou não –, e
com minúsculas os vocábulos átonos – sejam eles monossílabos ou
dissílabos.
Tocantemente – Existe?
1. Para se formar um advérbio em português, de um modo geral se
acrescenta o sufixo adverbial mente ao adjetivo no feminino: satisfatório
+ mente = satisfatoriamente; criterioso + mente = criteriosamente.
2. Nos casos comuns, porém, o advérbio formado pelo acréscimo de tal
sufixo passa a significar o modo como o adjetivo acontece:
satisfatoriamente quer dizer de modo satisfatório; criteriosamente
corresponde a de modo criterioso.
3. E lembra Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 151 e 174), em duas
passagens, que “a terminação adverbial mente é o substantivo feminino
mente com a significação de maneira, intenção. Mais tarde se justapôs ao
adjetivo, perdendo o caráter de substantivo, conservando, entretanto, o
adjetivo sua flexão feminina”.
4. Ocorre que, em petições, pareceres e veredictos, encontram-se amiúde
expressões como tocantemente às preliminares, tangentemente ao mérito
ou mesmo meritoriamente, nas quais, embora haja advérbios
regularmente formados no que concerne à técnica, observa-se, a uma
análise, ainda que superficial, do sentido, que tais expressões não
querem significar de modo tocante, de modo tangente ou mesmo de
maneira meritória.
5. Bem por isso, tais advérbios, por errôneos, devem ser evitados nesses
exemplos, e se deve proceder à correção do seguinte modo: no que toca
às preliminares, no que tange ao mérito ou no que concerne ao mérito.
6. De fato, a facilidade com que o sufixo mente se presta à formação de
advérbios de modo tem dado margem a abusos e equívocos, originando
invenções reprováveis como essa.
7. A esse respeito, lembra Geraldo Amaral Arruda: “importa que não se
considere que a concisão recomende sempre substituir as locuções”, já
que, “em muitos casos a substituição pode ser inócua, em outros ela é
menos expressiva e em outros ainda pode ser inaceitável ou descabida”.
8. E continua tal autor: “nem sempre é apropriada a redução de uma
locução adverbial a um advérbio terminado em mente, pois os advérbios
com essa terminação têm significado claro (ou meio apagado) de modo”,
e “de qualquer maneira provocam uma distorção na ideia que deveria ser
expressada” (ARRUDA, 1997, p. 65 e 80).
9. Em outra passagem de sua obra, o mesmo autor – preocupado com a
falta de clareza e de precisão da linguagem dos jovens advogados e dos
novéis juízes, estes recrutados entre aqueles – atribui tais falhas à
deficiência do aprendizado da língua portuguesa no curso secundário,
mas observa que elas “são agravadas pelos defeituosos formulários a que
recorrem os iniciantes das lides forenses”.
10. E acrescenta tal autor que “um desses formulários destaca
corretamente, nos modelos de petições, as proposições preliminares das
de mérito e, como introduz as primeiras com o advérbio
preliminarmente, ao passar para as proposições de mérito, sem
vacilação, pespega um sonoro meritoriamente, que ficaria muito bem
na boca do ilustre Prefeito de Sucupira, o Coronel Odorico Paraguaçu,
o mesmo que pretende promover a abertura jogatícia” (ARRUDA,
1997, p. 6-7).
Ver Advérbios em “mente” (P. 85) e Advérbios em “mente” seguidos –
Como resolver? (P. 86)
Todo
Ver Pronome pessoal (P. 614), Regência verbal (P. 651), Só – Como
concordar? (P. 706) e Todo ou Todo o? (P. 740)
Todo ou Todo o?
1. Vejam-se os seguintes exemplos e o significado respectivo da expressão
todo ou todo o: a) “Todo o dia, o réu está no balcão do cartório, à
espera da sentença” (o dia inteiro); b) “Todo dia, o réu está no balcão
do cartório, à espera da sentença” (todos os dias).
2. Laudelino Freire é muito preciso em sua observação a respeito: “O todo
quando se lhe pospõe o artigo (todo o) significa a inteireza de uma coisa,
reservando-se a todo, sem o artigo, a significação de cada, qualquer, ou o
total de muitas. No primeiro caso indica-se o todo físico, o todo lógico,
por inteiro; no segundo, a coleção ou totalidade”.
3. Fundando-se em lição de Damião de Góis, continua tal gramático na
observação de que: a) na frase “Laranjeira que todo ano tem fruto”, deve
entender-se que essa árvore dá frutos todos os anos; b) se, porém, se
disser “Laranjeira que todo o ano tem fruto”, deve-se entender que ela
frutifica durante o ano inteiro.
4. E finaliza ele com propriedade: “O fato, portanto, ficará regularizado, se
se tomar por norma usar sempre de todo seguido de o, menos quando
todo tenha a significação de qualquer, ou de totalidade. As expressões
toda a parte, toda a vez, todo o momento, todo o caso, etc., melhor
exprimirão o que se quer dizer uma vez escritas sem o artigo (FREIRE,
1937a, p. 53).
5. De igual modo, em exemplo significativo, Silveira Bueno (1938, p. 65)
desfaz possíveis dúvidas: a) “Toda vida é uma dádiva de Deus” quer
dizer que qualquer vida é uma dádiva de Deus; b) já “Toda a vida é uma
dádiva de Deus” vem a significar que a vida inteira é uma dádiva de
Deus.
6. Vale também transcrever a preciosa síntese e acréscimo de Júlio
Nogueira (1959, p. 31): “Na linguagem do Brasil, faz-se judiciosa
distinção. Todo o diz-se quando equivale a inteiro, na totalidade,
completamente… Na acepção de qualquer não se usa o artigo”. E
continua tal gramático com sua observação: “No plural, porém, o artigo
aparece em qualquer acepção”.
7. E se reitere, quanto a última lição, com a observação de Édison de
Oliveira, para quem, “no plural, as palavras todos, todas sempre se farão
acompanhar pelos artigos os, as, independentemente do significado em
que tenham sido empregadas” (s/d, p. 143).
8. Buscando esquematizar o emprego exato de tais vocábulos, leciona
Laudelino Freire que se deve “usar sempre de todo seguido de o (todo o)
menos quando todo tenha a significação de qualquer. Todo o significa a
inteireza de uma coisa; todo, sem o artigo, significa cada, qualquer, ou o
total de muitos. A distinção é inconfundível. ‘Toda a casa foi queimada’,
isto é, a casa, toda ela, foi queimada. ‘Toda casa deve pagar impostos’,
isto é, todas as casas são sujeitas ao imposto. ‘Todo o dia’ = dia inteiro;
‘Todo dia’ = todos os dias” (1937b, p. 89).
9. Na lição de José de Nicola e Ernani Terra (2000, p. 215), “os pronomes
indefinidos todo e toda (no singular), quando desacompanhados de
artigo, significam qualquer”; porém, “quando acompanhados de artigo,
passam a dar a ideia de inteiro, totalidade”.
10. Para Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade (1999, p. 75),
todo “tem a ideia de totalidade numérica, de generalização” (toda
responsabilidade = qualquer tipo de responsabilidade), enquanto todo
o “tem ideia de totalidade das partes, especificação” (toda a
responsabilidade = responsabilidade total, inteira, completa).
11. Sousa e Silva (1958, p. 295), por um lado, lembra que há gramáticos,
como Eduardo Carlos Pereira, para os quais “é facultativo o uso do
artigo nas frases em que muitos o omitem presentemente”; por outro
lado, observa ele que essa moderna distinção entre toda a casa (“a casa
inteira”) e toda casa (“todas as casas” ou “qualquer casa”), por
exemplo, “tende a fixar-se em nossa língua, por influência do francês”.
12. Para Luciano Correia da Silva, os arcaicos e os clássicos usavam
indiferentemente uma forma pela outra, e “somente a partir do
Romantismo é que se passou a ensinar esta diferença: todo é sinônimo
de cada qualquer, e todo o quer dizer inteiro, na totalidade” (1991, p.
23).
13. Vale a pena teorizar com a lição de Alfredo Gomes: “a palavra todo
tem duas acepções: a de inteiro e a de qualquer. Apesar de confundidas
essas duas ideias no emprego…, convém fazê-lo seguir de artigo – todo
o, toda a – no sentido de inteiro, e usá-lo sem artigo quando significar
qualquer: a) ‘Todo homem é mortal’; b) ‘Nem toda a casa está
estragada’” (1924, p. 365).
14. Em caso muito particular, anote-se que, Silveira Bueno, por um lado,
observa que “a expressão todo mundo é galicismo que desde os tempos
de Gil Vicente entrou no uso português, mais velho, portanto que o
próprio Brasil”.
15. Por outro lado, mostra esse autor uma visão permissiva no emprego
dela: “Esta antiguidade da expressão já lhe deu foros de idioma e pode
ser empregada, sabendo-se, contudo, que é empréstimo” (BUENO,
1957, p. 476).
16. Antonio Henriques (1999, p. 191) refere lição de Said Ali e de Rui
Barbosa de que a equivalência de todo o (inteiro) e todo (qualquer)
“engenhosa e clara, mas falsa”, acrescentando que o primeiro dos
autores que cita “aduz inúmeros exemplos em que falha tal correlação”.
17. O Código Civil de 1916 nem sempre observa a distinção: a) “Todo o
ato lícito que tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir,
modificar ou extinguir direitos, se denomina ato jurídico” (art. 81 –
todo o ato lícito está por qualquer ato lícito; a redação conferida ao
CC/2002, art. 185, fez desaparecer o problema); b) “A mulher pode, em
todo o caso, reter os objetos de seu uso…” (art. 303 – todo o caso está
por qualquer caso; como se tratava do regime dotal, o dispositivo não
se repete no CC/2002); c) “Estão sujeitos à curatela: I – os loucos de
todo o gênero” (art. 446, I – todo o gênero está pela totalidade
completa; a redação conferida ao CC/2002, art. 1.767, I, fez
desaparecer a dificuldade); d) “A certidão negativa exonera o imóvel e
isenta o adquirente de toda responsabilidade” (art. 1.137, parágrafo
único – toda responsabilidade está por qualquer responsabilidade; o
dispositivo não se repete no CC/2002).
18. O Código Comercial, de igual modo, nem sempre faz a referida
distinção: a) “Todo documento de contrato comercial não ressalvada
pelos contraentes com assinatura da ressalva não produzirá efeito
algum em juízo…” (art. 134 – a distinção foi observada); b) “Todo o
corretor é obrigado a matricular-se no Tribunal de Comércio do seu
domicílio” (art. 38 – a distinção não foi observada).
19. A legislação portuguesa, de igual modo, não prima pela observância
rigorosa da distinção aqui noticiada: “Toda a pessoa que tiver notícia
de qualquer infração penal poderá participá-la ao juiz da comarca em
que foi cometida…” (CPPp, art. 160º). Corrija-se: “Toda pessoa que
tiver notícia de qualquer infração penal poderá participá-la ao juiz da
comarca em que foi cometida…”.
Ver Todos os dois – Galicismo? (P. 741) e Tudo o que ou Tudo que? (P.
747)
Todos eles
Ver Conheço todos eles – Está correto? (P. 217) e Pronome pessoal (P. 614).
To – Existe?
Ver Mo – Está correto? (P. 476)
Torna
1. É substantivo que indica um excesso a ser devolvido, ou o excesso a ser
reposto por quem tenha recebido, numa permuta ou adjudicação, bens
cujo valor ultrapasse o de seu quinhão, ou de sua parte. Ex.: “Como
houvesse significativa desigualdade entre os bens permutados, deu-se
torna, que superava vinte por cento o valor do bem da parte
favorecida”.
2. Exatamente nesse sentido é que está empregado o verbo tornar no art.
1.728, § 1º, do Código Civil de 1916 (em disposição que não se repete
no CC/2002): “Se não for possível a divisão, e o excesso do legado
montar a mais de um quarto do valor e do prédio, o legatário deixará
inteiro na herança o imóvel legado, ficando com o direito de pedir aos
herdeiros o valor que couber na metade disponível. Se o excesso não for
de mais de um quarto, aos herdeiros torná-lo-á em dinheiro o legatário,
que ficará com o prédio”.
Tornar-se
1. Segundo indicação de Caldas Aulete, quanto à regência verbal, esse
verbo, que significa fazer, converter-se em, tomar um outro estado ou
qualidade, vem seguido de um adjetivo ou substantivo, que, no caso,
funcionam como predicativo e dispensam preposição. Exs.: a) “Em
pouco tempo, a audiência tornou-se um tumulto” (correto); b) “Em
pouco tempo, a audiência tornou-se em um tumulto” (errado).
2. Aires da Mata Machado Filho, que refere o ensinamento do mencionado
dicionarista, anota que “bem pode ser que algum exemplo de autor
qualificado abone o emprego da preposição, explicável pela analogia
com o verbo transformar-se, de idêntica significação. Mas a lição de
Aulete é que parece a mais segura” (1969b, p. 733).
3. Pelos exemplos, que cita sem qualquer observação ou restrição, um
deles, aliás, do próprio Caldas Aulete, Francisco Fernandes (1971, p.
573) parece acatar ambas as construções: a) “Tornou-se mofo” (Morais);
b) “Tornar-se a ferida em fístula” (Caldas Aulete).
Ver Infinitivo como sujeito – Como concordar? (P. 414)
Trabalho extra
Ver Extra (P. 349).
Tráfego ou Tráfico?
1. Tráfego tem sido aplicada no sentido de trânsito, de movimento ou
circulação de veículos. Ex.: “O tráfego, à hora do acidente, era intenso e
perigoso”.
2. Não confundir com sua parônima tráfico, que tem sido destinada a
significar transporte, comércio. Ex.: “Aquele rapaz cumpre longa pena
por tráfico de drogas”.
3. Atenta aos frequentes equívocos que ocorrem na linguagem profissional,
assim se manifesta Laurinda Grion: “Trata-se de palavras às vezes
trocadas, mudando o sentido que se deseja dar a uma redação. Tráfico é
negócio ilícito ou indecoroso. Ex.: tráfico de entorpecentes. Não
confundir com tráfego, que deve ser empregado para designar trânsito:
tráfego aéreo, tráfego marítimo” (s/d, p. 88).
4. Também não confundir os substantivos tráfego e tráfico com os verbos
trafegar e traficar na primeira pessoa do singular do presente do
indicativo (trafego e trafico).
Tranqüilo ou Tranquilo?
Ver Trema (P. 746).
Transação
1. De conformidade com a expressa dicção do art. 1.025 do Código Civil,
transação é um negócio jurídico bilateral, pelo qual as partes
interessadas, fazendo-se concessões mútuas, previnem ou extinguem
obrigações litigiosas ou duvidosas.
2. Discorrendo sobre comum equívoco na expressão forense, Geraldo
Amaral Arruda observa ser caso de impropriedade de expressão o
emprego do termo transação no sentido de negócio, alertando tal autor,
assim, em livro dirigido sobretudo ao aperfeiçoamento do linguajar dos
juízes, a que não se use, “numa sentença, no sentido genérico que tem na
linguagem comum” (1997, p. 9-10).
3. Interessante, todavia, é observar a falta de técnica da própria legislação
nesse sentido, sobretudo da mais antiga, como é o caso do vetusto
Código Comercial de 1850, o qual, em seu art. 123, após estipular o
valor máximo de quatrocentos mil reis como teto para negócios passíveis
de prova exclusivamente testemunhal, acrescenta que, “em transações de
maior quantia, a prova testemunhal somente será admitida como
subsidiária de outras provas por escrito”.
4. Em mesma esteira de equívoco, o art. 29 da Lei 4.591, de 16/12/64 (que
dispõe sobre o condomínio em edificações e incorporações imobiliárias),
ao tratar da figura do incorporador, considera-o também aquele “que
meramente aceite propostas para efetivação de tais transações”, tomando
este último vocábulo no mero sentido de negócios.
5. Para Caio Mário da Silva Pereira, que vê na redação do mencionado
dispositivo erro de linguagem e pouco vernáculo, “quem o lê tem a
impressão de que foi redigido por pessoa que desconhece até as mais
comezinhas noções jurídicas, pois ali confunde o conceito de transação
com negócio jurídico” (1993, p. 247).
6. Transigir ou transacionar são os verbos para indicar a ocorrência de
transação.
Transacionar – Existe?
1. Tem por sinônimo transigir e serve para indicar a transação.
2. Nos termos do art. 840 do Código Civil, transigir significa prevenir ou
encerrar um litígio mediante concessões mútuas. Ex.: “Transacionando
as partes em audiência, o magistrado reduziu a termo o acordo”.
3. Diferentemente de transigir, entretanto, que tem o sentido técnico da
transação estampada no art. 840 do Código Civil, transacionar também
traz em si o sentido de negociar, como bem referem os dicionaristas.
4. Não apresenta problemas quanto à conjugação verbal.
5. A um consulente que lhe perguntava se se podia admitir tal verbo,
Cândido de Figueiredo respondeu com decisão: “Não há dúvida.
Compare-se ação e acionar, função e funcionar, impulsão e
impulsionar, impressão e impressionar, transação e transacionar”
(1943, p. 65).
Ver Subsídio – Como se pronuncia o s? (P. 715), Transação (P. 742) e
Transigir (P. 743).
Transatlântico
1. De Arnaldo Niskier é importante observação no sentido de que, “quando
trans se liga a outro elemento que comece por vogal, a separação de
sílabas se dará desta forma: tran-sa-tlân-ti-co” (1992, p. 68).
Para maiores observações acerca da pronúncia do s em tais
circunstâncias, ver Subsídio – Como se pronuncia o s? (P. 715)
Transgredir
1. Quanto à conjugação verbal, o e da penúltima sílaba transforma-se em i
nas formas rizotônicas bem como nas formas delas derivadas.
2. Desse modo, assim é seu presente do indicativo: transgrido, transgrides,
transgride, transgredimos, transgredis, transgridem.
3. Da primeira pessoa do singular se extrai o presente do subjuntivo:
transgrida, transgridas, transgrida, transgridamos, transgridais,
transgridam.
4. E de ambos os tempos formam-se o imperativo afirmativo e o imperativo
negativo.
5. Atente-se, porém, ao pretérito perfeito do indicativo, do qual derivam o
mais-que-perfeito do indicativo, o imperfeito do subjuntivo e o futuro do
subjuntivo, todos integrados por formas arrizotônicas, nas quais não se
apresenta a alteração do e pelo i: transgredi, transgrediste, transgrediu,
transgredimos, transgredistes, transgrediram (pretérito perfeito);
transgredira, transgrediras, transgredira, transgredíramos,
transgredíreis, transgrediram (pretérito mais-que-perfeito); transgredir,
transgredires, transgredir, transgredirmos, transgredirdes,
transgredirem (futuro do subjuntivo); transgredisse, transgredisses,
transgredisse, transgredíssemos, transgredísseis, transgredissem
(imperfeito do subjuntivo).
6. Também não apresenta problemas de conjugação nos demais tempos:
transgredia (imperfeito do indicativo), transgredirei (futuro do
presente), transgrediria (futuro do pretérito), transgredindo (gerúndio),
transgredido (particípio).
7. Seguem idêntica conjugação os seguintes verbos: agredir, denegrir,
prevenir, progredir, regredir.
Transigir
1. Verbo de grande uso nos meios forenses, em seu sentido técnico, tem
como sinônimo transacionar e serve para indicar a transação, a qual, nos
termos do art. 840 do Código Civil, pode ser conceituada como a
prevenção ou o término de um litígio mediante concessões mútuas. Exs.:
a) “Transigindo as partes em audiência, o magistrado reduziu a termo o
acordo”; b) “Extingue-se o processo com julgamento de mérito: …
quando as partes transigirem” (CPC/1973, art. 269, III); c) “Incumbe
ainda ao inventariante, ouvidos os interessados e com autorização do
juiz… transigir em juízo ou fora dele” (CPC/1973, art. 992, II).
2. Diferentemente, porém, do verbo transacionar, que também tem o
sentido vulgar de negociar, o verbo transigir não apresenta tal
significação.
3. Em sua conjugação verbal, apresenta problemas de ortografia.
4. Diferentemente dos verbos cujo radical termina em j – consoante essa
que tem o mesmo som antes de qualquer das vogais (viajo, viajas,
viajemos, viajeis, viajem) – os verbos terminados em gir, para
continuidade do som da consoante final do radical, precisam da
representação gráfica j antes de a e de o. Assim, transijo, transiges,
transigimos, transijam.
5. Seu modelo é dirigir.
6. Feitas essas observações, é de se ver que transigir é conjugado em todas
as pessoas, tempos e modos.
7. Quanto à regência verbal, pode-se sintetizar seu regime com exemplos
colhidos por Francisco Fernandes (1971, p. 577), que o vê com
possibilidade de construção intransitiva ou transitiva indireta, sendo o
objeto indireto introduzido pelas preposições em, com e sobre: a)
“Transigir não pode quem não possa dispor” (Rui Barbosa); b) “Nisso
não transigia João das Regras” (O. Martins); c) “E o tenente tirava a
cabeça, transigindo com o insultador por amor da sobrinha” (Camilo
Castelo Branco); d) “Só nos litígios de direito privado, só na ordem das
relações em que o Estado contrata, dispõe, renuncia, transige sobre
assuntos alheios” (Rui Barbosa).
Ver Subsídio – Como se pronuncia o s? (P. 715), Transação (P. 742) e
Transacionar – Existe? (P. 743)
Transitividade verbal
Ver Objeto direto preposicionado (P. 511).
Transladar ou Trasladar?
Ver Trasladar ou Transladar? (P. 744)
Translado ou Traslado?
Ver Traslado ou Translado? (P. 744)
Translineação
Ver Partição silábica entre as linhas (P. 551).
Transpor
Ver Pôr – Como conjugar? (P. 577)
Trasladar ou Transladar?
1. Para Adalberto J. Kaspary, “trasladar, que tem a forma variante
transladar, origina-se do verbo latino transferre (levar de um para outro
lugar, transferir, transportar), que, por sua vez, se compõe do prefixo
trans (através de, além de, para lá de) e do verbo ferre (levar ou trazer,
levar para diante, transportar, mover, dirigir, levar). Tra(n)sladar origina-
se, especificamente, do particípio (passado) do verbo transferre, que é
translatus. Daí que, etimologicamente, transferir e tra(n)sladar são
sinônimos, apenas as duas formas provindo de radicais diferentes do
mesmo verbo” (1996, p. 347).
2. Domingos Paschoal Cegalla dá como existentes em português e
sinônimas as formas transladar e trasladar, apenas realçando que “há
preferência pela forma trasladar” (1999, p. 400).
3. Francisco Fernandes (1971, p. 577 e 579) os registra ambos, dando-os
como sinônimos, com abono de exemplos de autores insuspeitos: a)
“Não deformemos, por falso acanhamento, o original que transladamos”
(Rui Barbosa); b) “Trasladaram-lhe os ossos para a sepultura”.
4. Celso Pedro Luft (1999, p. 512 e 514) também os reputa formas
variantes uma da outra.
5. Ambas as formas, em realidade, encontram-se registradas no
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira
de Letras, que é o veículo oficial indicador das palavras existentes em
nosso idioma, estando autorizado, por conseguinte, seu normal emprego
(VOLP, 2009, p. 805 e 806).
6. Em textos de lei consultados, apenas se encontrou a forma trasladar: a)
“O escrivão trasladará para os autos cópia autêntica do termo de
audiência” (CPC/1973, art. 457, § 3º); b) “O agravo de instrumento será
interposto no prazo de (5) dias por petição, que conterá: … III – a
indicação das peças do processo que devam ser trasladadas”
(CPC/1973, art. 523, III – redação revogada); c) “Se o juiz a reformar, o
escrivão trasladará para os autos principais o inteiro teor da decisão”
(CPC/1973, art. 527, § 5º).
7. Embora haja os verbos transladar e trasladar, importa observar que existe
em nosso idioma o substantivo traslado, mas não translado.
Traslado ou Translado?
1. Do latim trans (além de, através de) + latus (supino de ferre = levar),
significa “a cópia, o que foi tirado do original constituindo-se na cópia
fiel de documentos” (HENRIQUES, 1999, p. 193). Ex.: “Os traslados e
as certidões considerar-se-ão instrumentos públicos, se os originais se
houverem produzido em juízo como prova de algum ato” (CC, art. 218).
2. De Plácido e Silva (1989, p. 413), que lhe confere um sentido técnico
próprio na terminologia jurídica, conceitua-o como “a cópia imediata, ou
as cópias imediatas, passadas pelo próprio tabelião, ou escrivão, que
formulou a escritura, e entregues, ato contínuo, aos interessados, como
instrumentos autênticos da mesma escritura”, motivo por que “é tido
como o próprio original da escritura, cuja matriz está trasladada no livro
do tabelião, ou nos autos do processo, em que a fez o escrivão oficiante”.
3. Para Luciano Correia da Silva (1991, p. 44), tanto faz traslado ou
translado.
4. Anote-se, porém, que o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa,
da Academia Brasileira de Letras, que é o veículo oficial ordenador do
modo de grafar as palavras em nosso idioma, não registra a forma
translado, muito embora registre ambos os verbos: transladar e
trasladar (VOLP, 2009, p. 805 e 806). Isso significa que equivocada a
lição de ilustre gramático, posta no item anterior.
5. Vejam-se exemplos de emprego correto em artigos de nossa legislação:
a) “Terão a mesma força probante os traslados e as certidões, extraídos
por tabelião ou oficial de registro, de instrumentos ou documentos
lançados em suas notas” (CC, art. 217); b) “Os traslados e as certidões
considerar-se-ão instrumentos públicos, se os originais se houverem
produzido em juízo como prova de algum ato” (CC, art. 218); c)
“Cumprida a carta, será devolvida ao juízo de origem, no prazo de 10
(dez) dias, independentemente de traslado, pagas as custas pela parte”
(CPC/1973, art. 212); d) “Fazem a mesma prova que os originais: … II –
os traslados e as certidões extraídas por oficial público, de instrumentos
ou documentos lançados em suas notas” (CPC/1973, art. 365, II); e)
“Será de quinze (15) dias o prazo para a extração, a conferência e o
concerto do traslado, prorrogável por mais dez (10) dias, mediante
solicitação do escrivão” (CPC/1973, art. 525, caput); f) “Feita a
intimação, ordenará o juiz que, pagas as custas, e decorridas 48
(quarenta e oito) horas, sejam os autos entregues à parte
independentemente de traslado” (CPC/1973, art. 872); g) “Quando o
testamento for público, qualquer interessado, exibindo-lhe o traslado ou
certidão, poderá requerer ao juiz que ordene o seu cumprimento”
(CPC/1973, art. 1.128).
6. Há, todavia, um caso de uso equivocado na redação revogada do art.
1.089 do CPC/1973: “Se já estiver pendente a causa, o presidente ou o
árbitro, juntando o compromisso ou depois de assinado o termo (artigo
1.073), requererá ao juiz do feito que mande entregar-lhe os autos
mediante recibo e independentemente de translado”. Corrija-se:
independentemente de traslado.
Tratamento
Ver Pronome de tratamento ou Pronome de reverência? (P. 612)
Tratar-se de
1. Geraldo Amaral Arruda esclarece que o verbo tratar pode ter sujeito,
como na frase: “O autor, nesta ação, trata de seus direitos hereditários”.
2. Continua afirmando, todavia, que, em outro contexto, pode-se preferir
omitir o sujeito da oração, dizendo-se: “Nesta ação, trata-se de direitos
hereditários”.
3. E extrai ele as seguintes ilações: “O verbo continua na voz ativa e
continua a reger objeto indireto; somente desapareceu o agente, que
ficou indeterminado, servindo a partícula se precisamente como índice
de indeterminação do sujeito” (ARRUDA, 1997, p. 53).
4. Exatamente porque o sujeito é indeterminado com um direito ou com
vários direitos, é que a flexão de tal substantivo para o plural não influi
na concordância verbal: a) “Trata-se de um direito hereditário”; b)
“Trata-se de direitos hereditários”.
5. Em mesmo sentido, na lição de Domingos Paschoal Cegalla (1999, p.
400), o verbo tratar concorda obrigatoriamente na terceira pessoa do
singular, mesmo que o termo ou expressão seguinte esteja no plural: a)
“Trata-se de tarefas que exigem habilidade”; b) “Na verdade, tratava-se
de fenômenos pouco conhecidos na época”; c) “Durante o encontro dos
dois líderes políticos, tratou-se de problemas que afligem as populações
pobres”; d) “Não se trata de advogados, minha senhora; trata-se de
provas”.
6. Reitere-se, com Laudelino Freire, que, quando usado na terceira pessoa
com o pronome se, não vai para o plural tal verbo na passiva, “ainda que
o objeto no plural esteja” (1937a, p. 7).
7. Assim, o plural de “Trata-se de um bom negócio” há de ser “Trata-se de
bons negócios”, e não “Tratam-se de bons negócios”.
8. Francisco Fernandes (1971, p. 580) até mesmo se refere à expressão
tratar-se de, para que tal estrutura fique mais apartada das demais.
9. E Celso Pedro Luft (1999, p. 515) é ainda mais didático, para lecionar
que, com esse significado, “o verbo fica sempre na terceira pessoa do
singular”: “Trata-se de obras”, “Tratar-se-á de símbolos”, “Talvez se
trate de exceções”, “Quando se tratar de leis”.
10. Em oportuna observação, anota Adalberto J. Kaspary, por primeiro,
exemplos de uso correto do verbo tratar-se usado pronominalmente: a)
“Trata-se de meros casos de alçada policial”; b) “Trata-se de pessoas
falsas, insinceras”; c) “Tratava-se de questões que fugiam à nossa
competência”; d) “Talvez se trate de casos isolados”; e) “Trata-se,
agora, de evitar prejuízos maiores aos condôminos”.
11. Em sequência, realça tal autor que, com o verbo tratar-se, usado
pronominalmente, “são incorretas construções pessoais (com sujeito
expresso)”, alinhando ele próprio exemplos errôneos: a) “A presente
lide trata-se de ação possessória”; b) “É indiscutível tratarem-se de
entorpecentes as substâncias supramencionadas”; c) “O autor trata-se
de trabalhador rural”; d) “O caso trata-se de falsidade ideológica”.
12. Por fim, manda que se corrijam tais exemplos da seguinte forma
(KASPARY, 1996, p. 348): a) “Cuida-se, na presente lide, de ação
possessória”; b) “É indiscutível serem entorpecentes as substâncias
supramencionadas”; c) “O autor é trabalhador rural”; d) “O caso é de
falsidade ideológica” (ou “Trata-se, no caso, de falsidade ideológica”,
ou “O caso constitui falsidade ideológica”).
Ver Gosta-se de um bom vinho – Está correto? (P. 375), Voz passiva –
Quando é possível? (P. 793), Voz passiva e Pronome apassivador (P. 791).
Trata-se de embargos ou Tratam-se…?
Ver Junte-se as cartas ou Juntem-se as cartas? (P. 437)
Travessão
1. Observa Arnaldo Niskier que, “quando um travessão coincidir com uma
vírgula, deve-se usar os dois sinais” (1992, p. 70). Ex.: “Após o
pagamento das prestações – três de Cr$ 6.000 00 –, o consumidor
percebeu que fora logrado”.
2. Também utilizado nas narrativas para introdução do discurso direto
(assim como as aspas) e para isolar orações intercaladas.
Ver Orações intercaladas ou interferentes? (P. 532) e Vírgula (P. 772).
Trazer à colação
1. Em Direito Civil, colação é o ato de trazer o herdeiro ao acervo comum
hereditário os bens recebidos do de cujus quando ainda vivo este, a fim
de que haja igualdade na partilha, com a equiparação da legítima de
todos os herdeiros. Exs.: a) “Só o valor dos bens doados ou dotados
entrará em colação…” (CC/1916, art. 1.792, § 2º); b) “Não virão à
colação os gastos ordinários do ascendente com o descendente…” (CC,
art. 2.010); c) “As doações remuneratórias de serviços feitos ao
ascendente também não estão sujeitas a colação” (CC, art. 2.011).
2. Desse modo, a expressão trazer à colação tem o sentido de restituir ao
acervo hereditário os bens recebidos em vida como adiantamento de
herança. Ex.: “No caso do artigo antecedente, se ao tempo do
falecimento do doador, os donatários já não possuírem os bens doados,
trarão à colação o seu valor” (CC/1916, art. 1.787).
3. Lembrando lição de Eliasar Rosa, aduz Adalberto J. Kaspary que, a
partir de seu significado técnico no Direito das Sucessões, a palavra
colação passou a ter emprego mais amplo, de caráter conotativo: “Ela
significa, também, comparação, confronto, quando, por exemplo, se diz
que a parte trouxe à colação argumentos doutrinários, ou que, num
recurso, se trouxeram à colação acórdãos do mesmo ou de outro tribunal.
O que está dito aí é que argumentos e acórdãos foram trazidos para
comparação, ou confronto com o que se quer sustentar” (1996, p. 349).
4. De Geraldo Amaral Arruda é o ensinamento de que tal expressão “tem
curso na linguagem forense a partir das disposições legais que obrigam
os herdeiros a conferir as doações recebidas em vida do de cujus”.
5. Lembra tal autor que essa expressão é sinônima de conferir, assim como
o substantivo colação significa conferência, podendo-se verificar o bom
uso de colação e de conferir no art. 2.012 do Código Civil, repetindo a
redação do CC/1916, art. 1.795.
6. Por fim, insurge-se ele contra o emprego do neologismo colacionar, por
rebarbativo e desnecessário para quem conheça a boa linguagem, a qual
dispõe de outros recursos legítimos de expressão (ARRUDA, 1997, p.
82-3).
7. Oportuno apenas é lembrar que, apesar da lição contrária do ilustre
mestre, registra o verbo colacionar o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido por lei
para determinar quais vocábulos pertencem oficialmente ao vernáculo
(2009, p. 202), motivo por que está oficialmente autorizado entre nós seu
emprego.
Trema
1. Por conta das alterações introduzidas em nosso sistema pelo Acordo
Ortográfico de 2008, importa tecer algumas observações sobre o trema.
2. Num primeiro aspecto, pode-se transcrever o que diz o Acordo
Ortográfico: “O trema é inteiramente suprimido em palavras portuguesas
ou aportuguesadas”.
3. Pela grafia do sistema anterior, certas palavras recebiam o trema:
agüentar, argüição, cinqüenta, freqüência, tranqüilo. Agora, todavia,
veja-se como são grafadas: aguentar, arguição, cinquenta, frequência,
tranquilo.
4. Realce-se, contudo, que o próprio Acordo Ortográfico de 2008 deixa
uma exceção: “Conserva-se, no entanto, (o trema) em palavras derivadas
de nomes próprios estrangeiros: mülleriano, de Müller”; hübneriano, de
Hübner.
5. Reconhece-se, por um lado, que, antes do Acordo Ortográfico, as regras
para emprego do trema não eram tão simples, e, em determinados casos,
sua existência era questão que dependia até mesmo da pronúncia ou não
do u nos respectivos vocábulos, e isso podia variar de grupo para grupo,
de região para região.
6. A eliminação pura e simples do trema, contudo, não se deu sem efeitos
complicadores. Basta que se veja, por exemplo, que hoje, a abolição do
acento agudo em certas formas verbais e a eliminação do trema “dão
origem a novas homografias: argui, por exemplo, representa
graficamente a 3ª pessoa do singular do presente do indicativo (u tônico
em ele argui), a 2ª pessoa do singular do imperativo afirmativo (u tônico
em argui [tu]) e a 1ª pessoa do singular do pretérito perfeito (i tônico,
com o u sonante)” (INSTITUTO ANTÔNIO HOUAISS; 2008, p. 40). E
essas novas dificuldades, o Acordo não as resolve.
Turnê
Ver Formação de adjetivos – Regras (P. 360) e Neologismo (P. 494).
U
U’a maneira – Está correto?
1. Postar uma sílaba ao lado de outra de mesmo som é defeito que dificulta
a fluência da linguagem, ao qual os gramáticos chamam de parequema.
Exs.: gado doente, pato tonto, coxa chata.
2. Numerosos parequemas, porém, são inevitáveis, particularmente os
resultantes do emprego do vocábulo uma; e a prática, em casos que tais,
de suprimir o m e colocar apóstrofo (’), sobretudo nos dias de hoje, peca
pela base, pois é artificial, configurando, para muitos gramáticos,
invencionice a ser evitada, devendo-se observar que alguns acabam
chegando ao exagero de assim proceder em casos nos quais não haveria
problema em nenhuma hipótese, vindo a escrever, por exemplo, u’a
pessoa.
3. Em conselho válido para os dias atuais, se não houver possibilidade de
contorno do problema, escreva-se e pronuncie-se normalmente uma
matéria, uma menina, uma manhã, uma mata, uma madeira, até porque
a outra solução que alguns preconizam prejudica a naturalidade e
desfigura a pronúncia da palavra, sem realmente atingir o objetivo.
4. Aires da Mata Machado Filho (1969d, p. 847) – após referir lição de
Benedito Sampaio de que o motivo de conduta diversa é “esquisitice,
pruridos de eufonia, requinte de ouvido melindroso” – conclui que “o
melhor é nada mudar na grafia de uma antes da sílaba ma. Os
despreocupados de maus encontros silábicos lerão com toda
naturalidade. Os outros, refugiando-se em antiga pronúncia nasal, não
deixarão de cometer o indigitado vício, implicitamente. Como quer que
seja, é urgente largar mão de semelhante apóstrofo”.
5. Registre-se, por outro lado, a observação de Evanildo Bechara (1974, p.
51), o qual, muito embora condene a grafia u’a, acaba por aconselhar a
dicção anasalada do u, cancelando-se a pronúncia do m, posicionamento
esse que, com o devido respeito, é ainda mais artificial do que a conduta
preconizada anteriormente por outros gramáticos.
6. Também divergindo do entendimento majoritário, Eliasar Rosa, em lição
que merece a mesma advertência anterior, refere que uma “regra de
ortoépia diz que sempre que ao artigo indefinido ou ao numeral uma se
seguir vocábulo começado por m, não se deve pronunciar o m, e
nasaliza-se o u. A pronúncia será, então um a máquina; um a mão; um a
meta; um a mãe; um a minha, um a malha etc., escrevendo-se ua com o
til no u. Desnecessária, pois, a estranha grafia u’a” (1993, p. 138).
7. Mostrando aceitar o emprego da supressão do m em tais circunstâncias,
Silveira Bueno apenas esclarece a um de seus leitores que não se há de
indicar tal supressão por apóstrofo, mas por til: “Não há motivo algum
para que se escreva u’a com apóstrofo porque este sinal indica a
supressão de sons: ora, não há supressão de som algum, mas apenas a
substituição da nasal m pelo ressoo nasal indicado pelo til”.
8. Bem por isso, afiança tal autor, a forma correta e única é com til sobre o
u, “quando a palavra começar por m” (BUENO, 1957, p. 482).
9. Já Domingos Paschoal Cegalla, em ensinamento que parece mais
apropriado aos dias de hoje, assim leciona acerca de ua e u’a: “Evitem-
se estas formas artificiais, mesmo diante de palavras que possam gerar
cacófatos. É preferível grafar, por exemplo, uma mão, uma mata a
escrever ua (ou u’a) mão, ua mata” (1999, p. 403).
10. Transcrevendo lição de Matoso Câmara Jr., assevera Ronaldo Caldeira
Xavier (1991, p. 96) que “não convém exagerar o esforço contra o
cacófato a ponto de apelar para vocábulos obsoletos ou artificiais. Tal
é, em vez de uma, em contato com mão, manga etc., a forma u’a, em
que o apóstrofo pressupõe a supressão do m, quando na realidade se
trata de uma obsoleta desnasalação da forma arcaica ua (com til no u)”.
11. Ante o exposto, sempre é oportuno lembrar a observação muito
apropriada de Cândido de Oliveira: “não existe a forma u’a” (s/d, p.
131).
12. O proceder mais aconselhável, em realidade, parece ser aquele que vê
com naturalidade encontros dessa natureza e que não busca enxergar
defeitos e vícios de linguagem em todo canto, nessas hipóteses de
parequemas inevitáveis, e, assim, deve-se grafar normalmente uma
mão, uma mata.
Ver Cacófato – O que é? (P. 163)
U’a mão – Está correto?
Ver Cacófato – O que é? (P. 163) e U’a maneira – Está correto? (P. 747)
Uísque
Ver Formação de adjetivos – Regras (P. 360) e Neologismo (P. 494).
Uma e meia
Ver Um e meio (P. 749).
Um dos que
1. Trata-se de expressão que traz problemas quanto à concordância verbal.
2. Com ela no sujeito, o verbo pode concordar optativamente no singular
ou no plural. Exs.: a) “Dentre nossos juristas, Vicente Rao foi um dos
que mais abusou do talento e da cultura” (correto); b) “Dentre nossos
juristas, Vicente Rao foi um dos que mais abusaram do talento e da
cultura” (correto).
3. Após lembrar que tal expressão às vezes faz o verbo concordar no
singular, às vezes no plural, Júlio Nogueira observa o que sintaticamente
se dá: na segunda hipótese, “predomina o plural os, contido em dos; na
primeira, um”.
4. Em continuação, opina o referido gramático: “Parece-nos preferível o
verbo no plural, e usá-lo assim é a tendência mais generalizada”
(NOGUEIRA, 1959, p. 112).
5. Embora haja a condenação de alguns gramáticos ora a esta, ora àquela
construção, Laudelino Freire (1937a, p. 18-23), fundando-se em diversos
exemplos de abalizados autores e reforçado pela autoridade de
conceituados gramáticos, defende a concordância do verbo, em tais
casos, tanto no singular quanto no plural, refutando superiormente tais
invectivas adversárias.
6. Júlio Nogueira (1939, p. 212), de seu lado, assevera que, “com um dos
que é preferível o plural”; por outro lado, assevera que, “se, porém, vale
o exemplo dos clássicos, pode-se usar o singular”, passando a arrolar
exemplos abalizados de bons escritores: a) “Foi uma das primeiras
terras de Espanha que recebeu a fé de Cristo” (Frei Luís de Sousa); b)
“Uma das causas que derribou a Galba do Império foi…”.
7. Para Laudelino Freire (1937b, p. 97), “há dupla sintaxe para as orações
em que o pronome que vem precedido de um dos, uma das”, observando
tal gramático que, à semelhança do que ocorre na língua francesa, são
facilmente justificáveis ambas as concordâncias.
8. Em realidade, autorizadas que estão as duas construções em nosso
idioma, pode-se asseverar que, hoje, a questão é apenas de sentido: com
o verbo no singular, realça-se a ideia da ação individual; com o verbo no
plural, reforça-se o aspecto da ação coletiva.
Um e meio
1. São igualmente corretas, em nosso idioma, as expressões um metro e
meio e um e meio metro, muito embora a última seja menos usual.
2. Quando se dizem tais expressões, porém, é de se ver que ainda não se
chegou a duas unidades – hipótese em que, só então, obrigatório seria o
plural da palavra quantificada – de modo que é errada a concordância
nominal um e meio metros.
3. As mesmas observações valem para o feminino, sendo igualmente
corretas as expressões uma vez e meia e uma e meia vez, mas, pelas
razões já expostas, não uma e meia vezes.
4. Nessa exata esteira, afirmando que se há de dizer um e meio quilo e um e
meio litro, complementa Sousa e Silva que “o plural, em nossa língua,
começa em dois” (1958, p. 299).
5. Acrescente-se a lição de João Ribeiro, no que concerne à concordância
verbal: “nos casos em que se indicar a unidade e mais uma fração,
parece melhor conservar a concordância no singular: ‘Um e meio basta’”
(1923, p. 211).
Um e outro
1. É expressão a ser observada pelo prisma da concordância verbal.
2. Com ela no sujeito, o verbo concorda, indiferentemente, no singular ou
no plural. Exs: a) “Clóvis Beviláqua e Vicente Rao, um e outro abusou
do talento e da cultura” (correto); b) “Clóvis Beviláqua e Vicente Rao,
um e outro abusaram do talento e da cultura” (correto).
3. Segue igual concordância a expressão nem um nem outro.
4. Quanto à concordância nominal, anote-se que o substantivo que vem
depois fica no singular. Ex.: “Um e outro autor abusou (ou abusaram)
do talento e da cultura”.
5. Se, porém, tal substantivo se faz seguir de um adjetivo, este último vai
para o plural. Ex.: “Um e outro autor nacionais abusou (ou abusaram)
do talento e da cultura”.
Um mil ou Mil?
Ver Mil ou Um mil? (P. 474)
Um ou Hum?
Ver Hum ou Um? (P. 392)
Um terço
Ver Número fracionário (P. 505).
Uniformidade de tratamento
1. É de regra que, na fala e na escrita, o pronome escolhido para tratamento
das pessoas espraie seus efeitos para todos os elementos envolvidos.
2. Assim, se se trata o interlocutor por vós, além de concordarem os verbos
nessa pessoa, só se podem usar os pronomes oblíquos e os pronomes
possessivos que a ela correspondem (vos, convosco, vosso, vossa,
vossos, vossas); se, por outro lado, a pessoa for tratada por tu, os
pronomes oblíquos haverão de ser teu, tua, teus, tuas (jamais seu, sua,
seus, suas, não podendo, assim, haver mistura de pronomes). Exs.: a) “Se
você quer, vou até teu gabinete” (errado); b) “Se você quer, vou até seu
gabinete” (correto); c) “Se tu queres, vou até seu gabinete” (errado); d)
“Se tu queres, vou até teu gabinete” (correto).
3. Nesse exato sentido se dá a lição de Vasco Botelho de Amaral: “Misturar
pronomes ou formas verbais na segunda pessoa do plural com pronomes
ou formas verbais da terceira constitui um erro crasso” (1948, p. 287).
4. Em outra obra, o referido autor é ainda mais didático acerca do problema
analisado: “Certa carta de um conhecido ministro estrangeiro publicada
nos jornais portugueses, entre outros deslizes de tradução apresentava
este: ‘Foi com grande pesar que recebi a vossa decisão de não aceitar o
cargo que lhe ofereci na remodelação do Ministério…’. Onde se pôs
vossa, devia estar evidentemente – sua. O inglês your não corresponde
só a vosso, vossa, vossos, vossas; deve traduzir-se, não só às vezes por
teu, tua, teus, tuas, mas, como ali na carta, por seu, sua, seus suas, de V.,
de V. Exa., etc.” (AMARAL, 1943, p. 177).
5. Não menos clara é a lição de Júlio Nogueira: “Não há, pois, redigir
frases em que, sendo tu a forma de tratamento, se usem em relação à
mesma os possessivos seu, sua e as variações o, a, lhe” (1959, p. 75).
6. Situando geograficamente onde o problema se dá com maior gravidade,
anota Júlio Nogueira que, “no Rio de Janeiro e, por contágio, em alguns
estados vizinhos, baralham-se os tratamentos de tu e você, o senhor etc.,
empregando-se possessivos e variações pronominais de forma
disparatada” (1930, p. 330).
Usar
1. Com respeito a sua regência verbal, em seus casos mais comuns,
oportuna é a lição de Artur de Almeida Torres no sentido de que usar “é
verbo de dupla sintaxe. Aparece, numa mesma acepção, ora com regime
direto, ora com o complemento regido de de: usou algo e usou de algo”.
Exs.: a) “Os clássicos não raro usavam, nesse caso, o infinito pessoal”
(Rui Barbosa); b) “Erraria quem usasse desse pronome” (Rui Barbosa).
2. O mesmo gramático, por outro lado, adverte que “em alguns casos essa
preposição determina certa diferença de sentido, como em usou gravata
e usou de gravata” (TORRES, 1967, p. 285).
3. Cândido Jucá Filho (1981, p. 108) invoca lição de Mário Barreto e
defende a possibilidade de emprego desse verbo quer como transitivo
direto, quer como transitivo indireto, citando para tanto autores
insuspeitos: a) “Nem sempre usam as folhas verdes” (Camilo Castelo
Branco); b) “Mãos longas, descarnadas, mas são ossudas como usam de
ser mãos de velhas” (Almeida Garrett).
4. De igual entendimento é Sousa e Silva em suas lições: “no sentido de
servir-se, fazer uso, emprega-se com a preposição de ou sem preposição:
usei desta palavra ou usei esta palavra” (1958, p. 299).
5. Na lição de Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 405), “constrói-se
mais frequentemente com objeto direto”; mas “constrói-se também com
objeto indireto, sobretudo quando este é substantivo abstrato: usar de
franqueza, usar de muita cautela; usar de astúcia; usar de evasivas; usar
de diplomacia; usar de misericórdia com alguém”.
6. Francisco Fernandes (1971, p. 588-9), de igual modo, acata a dupla
possibilidade de sintaxe: como transitivo direto e como transitivo
indireto, posição essa também adotada por Celso Pedro Luft (1999, p.
523).
7. Nos textos de lei, observa-se uma preferência pelo uso do objeto indireto
introduzido pela preposição de, mas há frequentes exemplos de emprego
como transitivo direto, duplicidade essa, aliás, que segue à risca a
permissão da Gramática. Exs.: a) “… No caso de iminente perigo
público, a autoridade competente poderá usar de propriedade
particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver
dano” (CF/88, art. 5º, XXV); b) “Só podem usar da firma da sociedade
em nome coletivo, e, como tal, obrigá-la e aos respectivos associados, o
sócio ou sócios devidamente designados no contrato social” (C. Com.
português, art. 152º); c) “O comodatário é obrigado a conservar, como
se sua própria fora, a coisa emprestada, não podendo usá-la senão de
acordo com o contrato ou a natureza dela, sob pena de responder por
perdas e danos” (CC, art. 582, caput); d) “O proprietário ou ocupante do
imóvel é obrigado a tolerar que o vizinho entre no prédio, mediante
prévio aviso, para: I – dele temporariamente usar, quando indispensável
à reparação, construção, reconstrução ou limpeza de sua casa ou do
muro divisório” (CC, art. 1.313, I); e) “Cada condômino pode usar da
coisa conforme sua destinação, sobre ela exercer todos os direitos
compatíveis com a indivisão, reivindicá-la de terceiro, defender a sua
posse e alhear a respectiva parte ideal, ou gravá-la” (CC, art. 1.314,
caput).
Uso do infinitivo
1. De acordo com Said Ali, a escolha da forma infinitiva depende de
cogitarmos somente da ação ou do intuito ou da necessidade de pormos
em evidência o agente da ação: no primeiro caso, preferimos o infinitivo
não flexionado; no segundo, o flexionado (ALI apud CUNHA, 1970, p.
230).
2. Em lição similar, para Hêndricas Nadólskis e Outra, “muitas vezes, a
opção entre a forma flexionada ou não flexionada é estilística e não
gramatical. Quando mais importa a ação, prefere-se a forma não
flexionada; quando se realça o agente da ação, usa-se a forma
flexionada” (1998, p. 125).
3. Celso Cunha (1970, p. 230), que cita o primeiro autor, em
complementação, diz tratar-se, em verdade, de um emprego seletivo,
mais do terreno da Estilística do que, propriamente, da Gramática.
4. Com a atenção voltada para tal advertência, parece mais acertado falar
não de regras, mas de tendências que se observam no emprego de uma e
de outra forma do infinitivo, muito embora, em determinadas situações,
haja proibição ou obrigatoriedade de determinada construção.
5. Com essas premissas, passa-se às ponderações seguintes.
6. Emprega-se o infinitivo impessoal nas locuções verbais, e nelas “não é
lícito flexionar o infinitivo” (MACHADO FILHO, 1969b, p. 705). Exs.:
a) “Os magistrados não podem fazer sozinhos o trabalho de administrar
a justiça” (correto); b) “Os magistrados não podem fazerem sozinhos o
trabalho de administrar a justiça” (errado).
7. Erro muito comum é a utilização do infinitivo flexionado nesses casos,
sobretudo quando, entre o verbo auxiliar e o verbo principal, existem
outras palavras. Exs.: a) “Os magistrados não podem, sozinhos, sem a
participação de todos os segmentos envolvidos, fazerem o trabalho de
administrar a justiça” (errado); b) “Os magistrados não podem,
sozinhos, sem a participação de todos os segmentos envolvidos, fazer o
trabalho de administrar a justiça” (correto).
8. Cândido de Figueiredo (1941, p. 168), exatamente a esse respeito,
lembra o seguinte exemplo, encontrado “num livro moderno, premiado
oficialmente”: “Podem entretanto esses serviços serem
estabelecidos…”; e complementa: “Podem serem… não é linguagem de
cá”. Nem de cá, nem de lá, nem de lugar algum.
9. Reitere-se que, nesse caso, quando os verbos componentes da locução
estão próximos e o auxiliar é normalmente flexionado, é menos
corriqueiro o equívoco de flexão, sendo, assim, incomum um erro como
“As certidões deverão acompanharem o traslado da escritura”.
10. Todavia, quando os verbos da locução se distanciam, a possibilidade de
erro se acentua intensamente, como se dá no seguinte emprego
equivocado, modelo de outros tantos: “As certidões deverão, sob pena
de invalidade do ato e impedimento para o registro, acompanharem o
traslado da escritura” (corrija-se para: deverão… acompanhar).
11. Também se acentua grandemente a possibilidade de erro quando, na
locução verbal, o auxiliar se apresenta em forma invariável (como um
gerúndio, por exemplo).
12. Nesse campo, aliás, até dispositivos de lei acabam resvalando para o
abismo dos equívocos, como se vê no seguinte caso: “O tabelião fica
desobrigado de manter, em cartório, o original ou cópias autenticadas
das certidões mencionadas nos incisos III e IV, do art. 1º, desde que
transcreva na escritura pública os elementos necessários à sua
identificação, devendo, neste caso, as certidões acompanharem o
traslado da escritura” (art. 2º do Decreto 93.240, de 9/11/86, que
regulamentou a Lei 7.433, de 18/12/85, que dispôs sobre os requisitos
para lavratura de escrituras públicas).
13. Um simples exercício de junção dos termos da locução verbal revela a
necessidade de correção: … devendo acompanhar… as certidões o
traslado da escritura.
14. Também se emprega o infinitivo impessoal, se o sujeito do infinitivo é
pronome oblíquo átono. Ex.: “Deixei-os sair”.
15. De igual modo se aplica o infinitivo impessoal, se o infinitivo não se
refere a sujeito específico. Ex.: “Navegar é preciso”.
16. Por fim, usa-se o infinitivo impessoal, se tal infinitivo funciona como
complemento de adjetivo. Ex.: “Ordens difíceis de obedecer”.
17. Já o infinitivo pessoal é usado, se o infinitivo tem sujeito diferente do
sujeito da outra oração. Ex.: “O magistrado repreendeu os patronos,
por não procederem com urbanidade na audiência”. Essa, aliás, é a
velha regra lembrada por Rui Barbosa (1949, p. 5), formulada de há
muito por Jerônimo Soares Barbosa: “A língua portuguesa usa do
infinito pessoal, quando o sujeito do verbo infinito é diferente do do
verbo finito, que determina a linguagem infinita”.
18. Também se emprega o infinitivo pessoal como recurso para
indeterminar o sujeito. Ex.: “Ouvi falarem inverdades por aí”.
19. Silveira Bueno (1938, p. 96-100), com supedâneo em lição dada por
Soares Barbosa, resume algumas regras para o uso do infinitivo, quer
pessoal, quer impessoal. a) “Quando na frase o verbo principal e o
verbo infinito tiverem o mesmo sujeito, o infinitivo deve ser
impessoal”. Ex.: “Queremos ser felizes”. b) “Quando os dois verbos
possuem sujeitos diferentes, usa-se o modo pessoal”. Ex.: “Napoleão
viu caírem as armas das mãos de seus soldados”. c) Neste último caso,
porém, “quando a frase do infinito serve de objeto direto ao verbo
principal, podemos empregar o infinito impessoal ainda que ambos
tenham sujeitos diferentes”, opção essa que fica à escolha do usuário.
Ex.: “Napoleão viu cair as armas das mãos de seus soldados”.
20. Vale a pena também relembrar uma primeira regra de Soares Barbosa,
abrangente de elevado número de casos: “Usa-se o infinito pessoal
quando tem ele sujeito próprio, diverso do de seu verbo regente; e o
impessoal, quando os sujeitos são idênticos” (BARBOSA apud
PEREIRA, 1924, p. 338-9); em complementação do resumo, traga-se
uma segunda regra de Frederico Diez: “Só se emprega o infinito
pessoal quando é possível ser substituído por um modo finito, e, por
consequência, pode ele subtrair-se à relação de dependência que o
prende ao verbo principal” (DIEZ apud PEREIRA, 1924, p. 338-9).
21. Ensina Artur de Almeida Torres (1966, p. 251-2) que “o infinitivo
poderá variar ou não, a critério da eufonia, se vier precedido das
preposições sem, de, a, para ou em”. Exs.: a) “Vamos com ele, sem nos
apartar um ponto” (Padre Antônio Vieira); b) “… os levavam à pia
batismal sem crerem no batismo” (Alexandre Herculano); c)
“Careciam de obstar a que se escrevesse o que faltava do livro”
(Alexandre Herculano); d) “Os manuscritos de Silvestre careciam de
serem adulterados” (Camilo Castelo Branco); e) “Obrigá-los a voltar o
rosto contra os árabes” (Alexandre Herculano); f) “… obrigava a
trabalharem gratuitamente” (Alexandre Herculano); g) “… fanatizados
que aparecem sempre para justificar o bom quilate da novidade”
(Camilo Castelo Branco); h) “… tantos que nasceram para viverem
uma vida toda material” (Alexandre Herculano).
22. Resguardados determinados parâmetros mínimos de correção e de bom
senso, vale trazer à colação a frase de José Oiticica, de que Aires da
Mata Machado Filho lamentou não ter sido o autor, restando-lhe
apenas a satisfação de repetir: “Mandem os gramáticos às favas e
empreguem o infinitivo à vontade” (1969f, p. 324).
23. Oportuno é refletir sobre o fato de que, após indicar alguns caminhos
para o emprego de tal forma verbal, Júlio Nogueira assim conclui sua
lição a respeito: “Além das sumárias indicações que aí ficam, difícil
será estabelecer regras seguras. É este um dos assuntos que têm
dividido os competentes na matéria, dando lugar a fortes dissídios. Em
alguns casos a preferência entre a forma invariável e a variável é
apenas de intuição natural, por eufonia, orientação perigosa, pois o que
a uns parece agradável ao ouvido, a outros soa mal. Nisto, como no
mais, os clássicos não são acordes, nem podem, pela prática
generalizada, servir de modelo” (1939, p. 219-20).
24. E se remate com a observação de Pasquale Cipro Neto e Ulisses
Infante (1999, p. 491) de que “o infinitivo constitui um dos casos mais
discutidos da língua portuguesa”, e “estabelecer regras para o uso de
sua forma flexionada, por exemplo, é tarefa difícil”, e, “em muitos
casos, a opção é meramente estilística”.
25. Feitas essas considerações, vejam-se os seguintes exemplos: a) “Vi dois
pássaros voar” (correto – ver item 19, parte final); b) “Vi dois pássaros
voarem” (correto – ver item 19, parte intermediária); c) “Chamei duas
pessoas para analisar o projeto” (correto – ver item 21); d) “Chamei
duas pessoas para analisarem o projeto” (correto – ver item 21).
Ver A fazer – Está correto? (P. 91), Agradável de se ler ou Agradável de
ler? (P. 99), Infinitivo na voz passiva (P. 415), Para eu ler ou Para mim ler?
(P. 545) e Para lhe enviar ou Para enviar-lhe? (P. 547)
Usucapir
1. É verbo que significa adquirir o domínio de um bem móvel ou imóvel
por usucapião, ou receber por prescrição aquisitiva. Ex.: “Na
conformidade com o art. 183, § 3º, da Constituição Federal de 1988,
não se podem usucapir imóveis públicos”.
2. Está regularmente registrado pelo Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, órgão incumbido oficialmente de determinar a existência
dos vocábulos em nosso idioma, além de sua grafia oficial (ACADEMIA
BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 829).
3. Quanto à conjugação verbal, ver Abolir.
4. Quanto à regência verbal, Celso Pedro Luft (1999, p. 523) preconiza a
possibilidade de sua construção como intransitivo ou transitivo direto: a)
“Vinte anos são suficientes para usucapir”; b) “Vinte anos são
suficientes para usucapir um imóvel”.
5. Francisco Fernandes (1971, p. 589) também comunga do mesmo ensino:
a) “Tais cousas nem prescrevem, nem usucapem”; b) “Usucapir um
prédio”.
6. Não foram encontrados registros de seu emprego em textos de lei, e o
Código Civil de 1916, nos artigos 550 e 618, prefere empregar, em seu
lugar, a expressão adquirir o domínio. A Constituição Federal de 1988,
por seu lado, também não usa o referido verbo, e sim a expressão
“imóveis adquiridos por usucapião” (arts. 183, § 3º, e 191, parágrafo
único).
Utilizar
1. Para bem guardar a escrita de tal vocábulo, duas regras de ortografia
devem ser consideradas: a) Se se tem de acrescentar a um radical o
sufixo izar inteiro para formar um verbo, grafa-se com z: fiscal, útil
(primitivas) fazem fiscalizar, utilizar (derivadas). b) No caso da
observação anterior, porém, se já existe s no radical, é ele aproveitado
para formar o verbo: análise, pesquisa, catálise (primitivas) fazem
analisar, pesquisar, catalisar.
2. Quanto à regência verbal, no sentido de empregar, fazer uso, Francisco
Fernandes apenas traz exemplos de construção como transitivo direto:
“Já não podemos utilizar o imperfeito de ‘pôr’ e seus compostos?” (Rui
Barbosa).
3. Para tal autor (FERNANDES, 1971, p. 589), como pronominal e no
sentido de servir-se, de auferir proveito, de tirar vantagem, vem ele
construído com objeto indireto principiado pela preposição de: “Utilizar-
se da ignorância alheia” (Cândido de Figueiredo).
4. Tal entendimento é partilhado por Celso Pedro Luft (1999, p. 523), que o
faz corresponder a uma de duas sintaxes: utilizá-lo ou utilizar-se de.
Ver Ortografia (P. 533) e Regras de ortografia (P. 652).
V
Vai fazer dois meses ou Vão fazer dois meses?
Ver Fazer (P. 352).
Vantajosidade – Existe?
1. Um leitor indaga se existe em nosso idioma o vocábulo vantajosidade, o
qual, segundo ele, é de uso comum no Direito Administrativo, quando se
quer indicar uma vantagem obtida pela Administração Pública em
determinada contratação.
2. Ora, em salutar raciocínio, que sempre é bom repetir para acostumar o
leitor a tanto, lembra-se que, quando se quer saber se uma palavra existe
ou não em português, deve-se tomar por premissa o fato de que a
autoridade para listar oficialmente os vocábulos pertencentes ao nosso
idioma é a Academia Brasileira de Letras.
3. E essa autoridade, a ABL a exerce por via da edição do Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa.
4. Ora, uma simples consulta ao VOLP mostra que nele não se registra o
substantivo vantajosidade, de modo que a forçosa conclusão a ser
extraída é a de que ele não existe em nosso léxico.
5. Em tais circunstâncias, se se quer usar um substantivo com esse
significado, a solução é escolher um sinônimo entre as diversas palavras
com essa acepção em português: benefício, ganho, proveito ou
vantagem.
6. Usar, porém, vocábulo inexistente, a pretexto de neologismo, não
constitui alternativa dotada de validade, que esteja ao alcance do usuário
do idioma.
7. Parece oportuno observar, a esta altura, que, nos meios jurídicos e
forenses, há uma equivocada tendência de alguns, com pretensão de uma
jamais alcançada erudição, para empregar vocábulos arrevesados e
barrocos, muitas vezes inexistentes, como esse que agora é trazido para
análise.
8. O máximo que conseguem, todavia, é um texto de difícil leitura e
compreensão, muito distante do ideal que só a simplicidade consegue
alcançar.
Varoa ou Virago?
Ver Varão – Qual o feminino? (P. 757)
Vêem ou Veem?
Ver Crêem ou Creem? (P. 240)
Venerando
1. Do latim venerandus, é o mesmo que venerável, e, de acordo com De
Plácido e Silva, “refere-se ao que é respeitado, deve ser acatado ou
merece ser venerado” (1989, p. 479).
2. Trata-se de adjetivo que, por respeito, vem, com frequência, na
linguagem forense, acoplado aos substantivos acórdão e aresto, quer por
extenso (venerando acórdão, venerando aresto), quer na forma
abreviada (v. acórdão, v. aresto).
3. Apesar da oposição de alguns no que concerne a sua existência e à
possibilidade de seu uso, é de se anotar que esse vocábulo vem
registrado no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da
Academia Brasileira de Letras, que é o veículo oficial indicador das
palavras existentes em nosso idioma, autorizando-se, por conseguinte,
seu normal emprego (2009, p. 836).
Ver Adjetivação desnecessária (P. 80) e Alimentando – Existe? (P. 105)
Venia concessa
Ver Adjetivação desnecessária (P. 80).
Venia permissa
Ver Adjetivação desnecessária (P. 80).
Verbos abundantes
1. Verbos abundantes são aqueles com duas ou mais formas equivalentes,
ocorrendo com mais frequência tal situação no particípio passado.
Assim, por exemplo, aceitar apresenta aceitado e aceito como
particípios passados (e, para alguns, ainda aceite).
2. Muito embora seja mais comum a ocorrência desse fenômeno da
abundância no particípio passado, há algumas outras formas verbais
abundantes em outros tempos: a) haver na primeira pessoa do plural do
presente do indicativo (havemos ou hemos); b) comprazer em todo o
pretérito perfeito e tempos derivados (mais-que-perfeito, futuro do
subjuntivo e imperfeito do subjuntivo): comprazi, comprazeste,
comprazeu, etc., ou comprouve, comprouveste, comprouve, etc. (e,
assim, comprazera ou comprouvera…, comprazesse ou
comprouvesse…, comprazer ou comprouver…; c) construir na segunda
e terceira pessoas do singular e terceira pessoa do plural do presente do
indicativo: construis, construi, construem ou constróis, constrói,
constroem (e, pelo mesmo modelo, desconstruir, destruir, reconstruir);
d) entupir na segunda e terceira pessoas do singular e terceira pessoa do
plural do presente do indicativo (entupes, entupe, entupem ou entopes,
entope, entopem); e) ir na primeira pessoa do plural do presente do
indicativo (vamos ou imos); f) querer na terceira pessoa do singular do
presente do indicativo (ele quer ou ele quere – e, pelo mesmo modelo,
requerer); g) fazer na segunda pessoa do singular do imperativo
afirmativo (faze tu ou faz tu – e, pelo mesmo modelo, dizer, fazer, trazer
e traduzir).
3. No que se refere à abundância participial, é de se dizer que o particípio
normal, que segue as regras de derivação, é mais longo e chama-se
regular; o outro, irregular. Assim, entregado, benzido e extinguido são
particípios passados regulares; já entregue, bento e extinto são
particípios passados irregulares.
4. Primeira regra importante para escolher entre dois particípios de verbos
abundantes: com os verbos ter ou haver (formando tempos compostos na
voz ativa), usa-se normalmente o particípio passado regular. Exs.: a)
“Ele tinha acendido o fogo”; b) “Ele havia acendido o fogo”.
5. Segunda regra importante: já com o verbo ser (formando voz passiva) e
com o verbo estar, usa-se normalmente o particípio passado irregular.
Exs.: a) “O fogo fora aceso por ele”; b) “O fogo estava aceso”.
6. Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 76), por seu lado, observa que “em
alguns casos a língua moderna tem mudado essa regra, preferindo o uso
dos irregulares com ter e haver”, exemplificando com frito, ganho,
gasto, pago e salvo, com os quais tem havido completo desprezo dos
particípios passados regulares.
7. Terceira regra importante: nas orações reduzidas, o particípio utilizado
deverá ser obrigatoriamente o irregular. Exs.: a) “Entregue a
correspondência, o carteiro saiu” (e não entregada); b) “Bento o óleo, o
bispo encerrou a cerimônia” (e não benzido); c) “Extinto o processo sem
julgamento do mérito, não se produziu coisa julgada material” (e não
extinguido).
8. Anote-se a interessante observação de Otelo Reis no sentido de que o
verbo ser, como auxiliar temporal, ainda hoje é empregado “em verbos
que não admitem voz passiva: ‘Somos chegados’, ‘É chegado o
momento’, etc. Tais modos de dizer equivalem exatamente a
‘Chegamos’, ‘Chegou o momento’” (1971, p. 27).
9. Como regra normalmente estabelecida pela Gramática, os verbos pagar,
ganhar e gastar são usados só na forma irregular (pago, ganho, gasto)
com qualquer auxiliar. Exs.: a) “O réu tinha pago a pena”; b) “A pena
foi paga pelo réu”; c) “O réu tinha ganho indulto”; d) “O indulto foi
ganho pelo réu”; e) “O réu tinha gasto o produto do crime”; f) “O
produto do crime fora gasto pelo réu”.
10. Na lição de Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 141), porém, por um lado,
os particípios irregulares pago, ganho e gasto “podem empregar-se na
voz ativa com os verbos ter e haver”; por outro lado, “muitas formas
regulares”, como, por exemplo, ganhado, gastado, “podem ser
empregadas na passiva com os verbos ser e estar”.
11. Observe-se, porém, que Cândido Jucá Filho, sem quaisquer explicações
adicionais, especifica indiferentemente os particípios ganho e ganhado
(1963, p. 322), gasto e gastado (1963, p. 324) e pago e pagado (1963,
p. 461), exemplificando em alguns casos: a) “O ladrão já tinha
ganhado o mato”; b) “Tínhamos ganhado bom dinheiro”; c) “Estas
duas têm pagado bem seu tributo à asneira” (Camilo Castelo Branco).
12. Atente-se a que chegar não faz chego, e sim chegado, no particípio
passado. Ex.: a) “O réu tinha chegado com atraso à audiência”
(correto); b) “O réu tinha chego com atraso à audiência” (errado).
13. Observe-se, por interessante, o aspecto de que, contrariamente aos
verbos abundantes (que têm duplicidade de formas), outros há que têm
particípios pertencentes a dois verbos: morto é particípio passado de
matar e de morrer; expulso é particípio passado de expelir e de
expulsar (GÓIS; PALHANO, 1963, p. 92).
14. Contrariamente ao que se entende por verbos abundantes, há verbos
aos quais faltam algumas pessoas, tempos ou modos, que precisam de
complementação de um sinônimo ou de giro equivalente: são os verbos
defectivos.
Ver Conjugação verbal (P. 217), Pagar (P. 541) e Pegar (P. 554).
Verbos anômalos
Ver Conjugação verbal (P. 217).
Verbos defectivos
1. Tratando-se de questão atinente à conjugação verbal, anota-se que,
genericamente, defectivo é algo imperfeito, defeituoso.
2. Verbo defectivo, por sua vez, é aquele cujo defeito consiste em não ter
determinadas formas, em não ser conjugado em todas as pessoas, tempos
ou modos, normalmente por questões de natureza morfológica ou
eufônica.
3. Na conceituação de Vitório Bergo, “pode designar-se por defectivo
qualquer vocábulo que não se empregue em todas as formas regulares”.
4. Oportuno, desde logo, é lembrar significativa lição de Mário Barreto,
colhida por Cândido Jucá Filho: “A morfologia não tem leis especiais
para excluir de sua formação total nenhum dos verbos que se têm por
defectivos. Nenhuma lei de estrutura se opõe a que se forme abole,
colorem, pule, bane, dele, demulo. O empregá-los numa forma e deixar
de empregá-los noutra é coisa que toca ao uso” (1981, p. 108-9).
5. No que concerne especificamente à categoria gramatical considerada,
anota esse autor que a defectividade é o “caráter dos verbos a que faltem
algumas pessoas” (BERGO, 1943, p. 78-9).
6. Muito embora se deva a ausência de certas formas a questões de
natureza morfológica ou eufônica, o certo é que cada verbo defectivo
tem uma razão própria de defectividade, e esta se deve a diversas razões,
muito embora, em alguns casos, não se assente tal desvio de conjugação
em bases lógicas (BECHARA, 1974, p. 107).
7. Para Otelo Reis, em alguns verbos, “foi o uso que não consagrou certas
formas, as quais, nunca tendo sido vistas ou ouvidas, são
espontaneamente evitadas pelos que procuram falar corretamente. Em
outros, é a eufonia que faz omitir algumas desagradáveis ao ouvido, ou
geradoras de equívocos. Em outros, ainda, a defectibilidade resulta de
ser impossível conceber-se, aplicada a certas pessoas, ou em certos
tempos, a ideia expressa pelo verbo” (1971, p. 13-4).
8. Em termos práticos, para exemplificar, o verbo precaver-se apenas é
conjugado nas formas arrizotônicas; o verbo reaver, composto de haver,
apenas se emprega nas formas em que este último tem v no radical; o
verbo remir, apenas nas formas em que, ao m do radical, se segue a
vogal i.
9. Observando que, na linguagem forense, ocorre com alguma frequência o
errado emprego de alguns verbos dessa natureza, adverte taxativamente
Geraldo Amaral Arruda: “há que se ter cuidado com os verbos
defectivos, para não os empregar nos modos, tempos ou pessoas que lhes
faltam” (1997, p. 22).
10. Pasquale Cipro Neto e Ulisses Infante genericamente observam, por
um lado, e com muita propriedade, que “os verbos defectivos são
conjugados normalmente nos pretéritos e futuros. São mais do que
corretas formas como aboli, adequei, explodi, fali, precavi, demoli,
aboliu, adequou, explodiu, faliu, precaveu, demoliu”.
11. Sob um outro enfoque, lecionam que, “para suprir uma forma dada
como inexistente, costuma-se recorrer a verbos sinônimos ou a
expressões equivalentes. Em vez de dizer ‘Eu me
precavo/precavenho/precavejo’, diga ‘Eu me acautelo/previno’; em vez
de ‘A empresa fale’, diga ‘A empresa vai à falência/vai falir’; em vez
de ‘O texto se adequa’, diga ‘O texto se adapta/é adequado’” (CIPRO
NETO; INFANTE, 1999, p. 173).
Vereador
1. Para muitos, inexiste justificativa para a construção “Ele foi eleito
vereador à Câmara Municipal”.
2. Entendem estes, em tal caso, que Câmara Municipal é simples adjunto
adnominal (ou complemento restritivo, que, em latim, é representado
pura e simplesmente por um genitivo), devendo-se dizer: “Ele foi eleito
vereador da Câmara Municipal”.
3. E, aos vocábulos deputado e senador, aplicar-se-iam as mesmas
observações: os senadores do Congresso Nacional, os deputados da
Assembleia Legislativa.
4. Até mesmo contrariamente a essa lição, todavia, Francisco Fernandes
apenas admite sintaxe com a preposição por: “Um dos vereadores pela
cidade teve a eleição impugnada” (1969, p. 377).
5. Celso Pedro Luft (1999, p. 525) ainda é mais liberal e, além de citar o
próprio Francisco Fernandes no exemplo dado com a preposição por,
pugna adicionalmente pela possibilidade de sintaxe com a preposição a:
“Vereador à Câmara do antigo Distrito Federal”.
6. Não parece, todavia, a uma análise mais aprofundada, haver motivo
algum diferenciação de sintaxe entre os três cargos do Poder Legislativo
nos diferentes níveis, para que não se acatem as construções com
qualquer de três preposições: de, a e por: a) “Os vereadores de Ribeirão
Preto insurgiram-se contra a providência pretendida”; b) “Ele foi eleito
vereador à Câmara Municipal”; c) “Ele foi eleito vereador por um
pequeno partido”.
7. Interessante, também, é anotar a indevida diferença de tratamento entre
vocábulos de natureza similar, como deputado, senador e vereador, que,
apenas para exemplo, fazem Francisco Fernandes (1969, p. 126) e Celso
Pedro Luft (1999, p. 152): para deputado, ambos admitem as sintaxes
com as preposições a e por; para senador, aquele apenas admite
complemento com a preposição por (FERNANDES, 1969, p. 348), em
procedimento seguido por este (LUFT, 1999, p. 472); e, para vereador,
como visto, o primeiro continua admitindo tão somente a construção
com a preposição por, enquanto o segundo é mais liberal para, além de
por, pugnar adicionalmente pela possibilidade de sintaxe com a
preposição a.
8. Em resumo, voltando sempre ao princípio de que não se deve restringir o
emprego da língua, mas se deve atuar na amplitude aceita por seus
estudiosos, parece defensável admitir como corretas as três seguintes
construções: a) “Ele foi eleito vereador da Câmara Municipal de
Ribeirão Preto”; b) “Ele foi eleito vereador à Câmara Municipal de
Ribeirão Preto”; c) “Ele foi eleito vereador pela cidade de Ribeirão
Preto”.
Ver Candidatos a (P. 168), Capitã, Capitoa ou A Capitão? (P. 168), Poeta –
Qual o feminino? (P. 570) e Senador (P. 687).
Vereadora – Existe?
Ver Crenta ou Crente? (P. 240) e Parenta ou Parente? (P. 550)
Veredicto recorrido
Ver Sentença recorrida – Está correto? (P. 690)
Ver e gostar de
Ver Verbos com regências diversas (P. 760).
Versar
1. Tem o sentido de compulsar, constar, discorrer, estudar, examinar, tratar
e, quanto à regência verbal, pode ser empregado, indiferentemente, como
transitivo direto ou como transitivo indireto (com a preposição sobre).
Exs.: a) “Tal decisão versará unicamente a falsidade documental”
(Magalhães Noronha); b) “Os pontos sobre que versavam as
censuras…” (Ernesto Carneiro Ribeiro).
2. Sousa e Silva (1958, p. 309), por seu lado, é mais específico ao regrar-
lhe o regime de complemento: a) “É transitivo direto nas acepções de
compulsar, estudar, tratar: versei as obras clássicas, versou as três
ciências, versou bem o assunto”; b) “Quando significa ter por objeto,
constrói-se ordinariamente com a preposição sobre: versa o livro sobre
História”; c) “Também admite, neste sentido, as preposições em e acerca
de”.
3. Exemplo significativo se pode extrair de excerto de carta de Rui Barbosa
transcrita por Mário Barreto, em que se emprega a preposição sobre: “…
não podia conhecer o escrito do ilustrado filólogo, onde se me faz a
honra de citar os excertos meus, sobre que versa a pergunta do meu
eminente amigo e mestre entre mestres” (1955, p. 40).
4. Para Luciano Correia da Silva, tal verbo pode ser usado como transitivo
direto, embora sua sintaxe com sobre ou acerca de seja a mais utilizada
(1991, p. 115). Exs.: a) “A transação versou diversos direitos
Contestados”; b) “A transação versou sobre diversos direitos
contestados”; c) “A transação versou acerca de diversos direitos
contestados”.
5. Francisco Fernandes (1971, p. 596), no sentido indicado, admite-lhe as
seguintes sintaxes: ora como transitivo direto, ora como transitivo
indireto principiado pelas preposições em, sobre ou acerca de: a) “O
distinto professor Sousa da Silveira versa o assunto de certos
brasileirismos que constituem um episódio curioso” (Mário Barreto); b)
“O livrinho que versa neste assunto magnificamente, tem páginas belas”
(Camilo Castelo Branco); c) “A questão versa sobre matérias
filosóficas” (Constâncio); d) “As nossas discussões versam acerca da
moral” (Mário Barreto).
6. Além dessas possibilidades, Celso Pedro Luft acrescenta a viabilidade da
sintaxe com a preposição de: “O livro versa (de, sobre, acerca de)
problemas morais” (1999, p. 530).
7. Resuma-se com quadro das possibilidades de uso correto do verbo versar
quanto à regência verbal: a) “A questão apenas versa a falsidade
documental” (transitivo direto); b) “A questão apenas versa sobre a
faculdade documental” (transitivo indireto com a preposição sobre); c)
“O livro versa em História” (transitivo indireto com a preposição em); d)
“O livro versa acerca de História” (transitivo indireto com a locução
prepositiva acerca de); e) “O livro versa de História” (transitivo indireto
com a preposição de).
8. Os textos legais preferem usá-lo com objeto indireto principiado pela
preposição sobre: a) “Das decisões dos Tribunais Regionais Eleitorais
somente caberá recurso quando: … III – versarem sobre inelegibilidades
ou expedição de diplomas nas eleições federais ou estaduais…” (CF/88,
art. 121, § 4º, III); b) “Quando os embargos versarem sobre todos os
bens, determinará o juiz a suspensão do curso do processo principal;
versando sobre alguns deles, prosseguirá o processo principal somente
quanto aos bens não embargados” (CPC/1973, art. 1.052); c) “A doação
verbal será válida, se, versando sobre bens móveis e de pequeno valor,
se lhe seguir incontinenti a tradição” (CC, art. 541, parágrafo único); d)
“Quando a transação versar sobre diversos direitos contestados,
independentes entre si, o fato de não prevalecer em relação a um não
prejudicará os demais” (CC, art. 848, parágrafo único).
Versus – Como concorda o verbo?
1. Uma leitora parte do seguinte exemplo, que não sabe se está certo quanto
à concordância verbal: “Esta situação ‘versus’ aquela situação resulta
em…” E indaga se termos unidos pela palavra versus tipificam sujeito
composto ou não. Ou seja: em tais circunstâncias, o verbo vai para o
plural, ou fica no singular?
2. Ora, a uma simples observação do exemplo trazido pela leitora, começa-
se por tecer os seguintes comentários quanto à palavra versus
considerada isoladamente: a) versus é uma preposição e não uma
conjunção (contrariamente a outras palavras que unem núcleos de um
sujeito composto, como ou e nem); b) é vocábulo latino, ainda não
integrado ao vernáculo, como é fácil concluir a uma simples consulta ao
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia
Brasileira de Letras, que tem a delegação legal para listar as palavras
pertencentes ao nosso idioma; c) como vocábulo estrangeiro, ainda não
incorporado ao nosso idioma, deve ser escrito em itálico, ou negrito, ou
entre aspas, ou sublinhado, ou de algum outro modo que indique ser
alienígena a palavra empregada; d) seu sentido normal é de
contrariedade entre as palavras por ele ligadas.
3. No plano da concordância verbal, o mais adequado parece ser partir de
alguns exemplos: a) “Flamengo ‘versus’ Fluminense não entusiasmou a
torcida”; b) “Éder Jofre ‘versus’ Harada foi simplesmente empolgante”;
c) “Davi ‘versus’ Golias sempre traz lições importantes”; d) “Escola
particular ‘versus’ escola pública pode causar polarizações indevidas”;
e) “Marido ‘versus’ mulher quase nunca redunda em benefícios”.
4. E desses exemplos, então, parece lícito concluir do seguinte modo: a)
embora o vocábulo considerado não pertença ao idioma, parece
adequado, com as cautelas já indicadas, empregá-lo em tais
circunstâncias, com o escopo de unir elementos contrapostos; b) a ideia
de contraposição e/ou contrariedade entre os elementos por ele unidos
conduz instintivamente o usuário a concordar o verbo no singular; c)
como é de fácil percepção nas frases já modificadas do item a seguir, é
inevitável, diante de um exemplo desses, pensar em um termo inicial,
que seja a referência para tal contraposição; d) e é com a ideia desse
termo inicial pressuposto que, nessas situações, se faz a concordância
verbal por silepse (concordância ideológica); e) importa adicionar, como
se pode perceber pelo exemplo acrescido por último no próximo item,
que o verbo fica no singular, mesmo que ambos os termos contrapostos
estejam no plural.
5. Vejam-se os exemplos já modificados com o acréscimo de um termo
inicial instintivamente pensado: a) “(O jogo) Flamengo ‘versus’
Fluminense não entusiasmou a torcida”; b) “(O combate de) Éder Jofre
‘versus’ Harada foi simplesmente empolgante”; c) “(O duelo de) Davi
‘versus’ Golias sempre traz lições importantes”; d) “(A contraposição
de) Escola particular ‘versus’ escola pública pode causar polarizações
indevidas”; e) “(A disputa de) Marido ‘versus’ mulher quase nunca
redunda em benefícios”; f) “(A briga de) Corinthianos ‘versus’
palmeirenses resultou em mortes”.
Vestibulando – Existe?
Ver Alimentando – Existe? (P. 105)
Vestibular
Ver Petição inicial (P. 563).
Veto
Ver Opor veto – Está correto? (P. 531)
Via
Ver Em via de ou Em vias de? (P. 317)
Viabilidade – Galicismo?
1. Embora reconheça ser vocábulo de uso correntíssimo, encontrado até
mesmo em Camilo Castelo Branco, Vasco Botelho de Amaral o arrola
entre os galicismos.
2. Para substituí-lo, tal gramático aponta exequibilidade, tal como se vê no
seguinte exemplo de Antônio Feliciano de Castilho: “Os fundamentos de
ambos estes arbítrios, a sua exequibilidade suma, e os seus efeitos
prospérrimos…” (AMARAL, 1939, p. 79).
3. Em lado oposto, todavia, situa-se o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido
oficialmente de determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma,
que o registra normalmente (2009, p. 839), motivo pelo qual legem
habemus, estando, por conseguinte, integralmente autorizado seu
emprego.
Viemos ou Vimos?
1. Ante a frequência com que se baralham o exemplo correto e o exemplo
errado, vale a pena observar a diferença entre “Vimos à sua presença” e
“Viemos à sua presença”.
2. Ora, vimos é presente do indicativo do verbo vir, enquanto viemos é
passado do mesmo verbo. Exs.: a) “Vimos agora, nesta oportunidade,
para manifestar nosso apoio” (correto); b) “Viemos ontem, porque a
audiência começa muito cedo” (correto).
3. Porque vimos também é o passado do verbo ver, alguns tendem a evitar
seu uso como presente de vir e acabam cometendo erros como o
seguinte: “Viemos agora, nesta oportunidade, para manifestar nosso
apoio”.
4. A razão é que a primeira pessoa do plural do presente do indicativo do
verbo vir é unicamente vimos, sendo, por conseguinte, errônea a
construção que acaba de ser citada.
5. A correção de tal frase faz-se do seguinte modo: “Vimos agora, nesta
oportunidade, para manifestar nosso apoio”.
6. Como lembra Otelo Reis, “as pessoas menos cultas manifestam a
tendência para dizer viemos em vez de vimos na primeira pessoa do
plural do presente do indicativo” (1971, p. 123).
7. Tal falha de emprego da forma do pretérito perfeito pelo presente do
indicativo, Júlio Nogueira (1930, p. 201) a atribui à “falta de uso” da
forma correta.
8. Conta o anedotário político que Jânio Quadros – conhecido por seu
vernáculo escorreito – quando prefeito ou governador de São Paulo,
recebeu uma comissão de representantes de professores em greve. O
líder deles se levantou e disse algo assim: “Senhor Prefeito, viemos aqui
hoje para apresentar a Vossa Excelência nossa pauta de
reivindicações”. Antes que o representante continuasse, Jânio, também
conhecido por seus repentes e rompantes, levantou-se de imediato e
disse, saindo, para não mais voltar à reunião: “Vieram e não me
encontraram!”
9. Voltando aos exemplos inicialmente dados: a) “Vimos agora à sua
presença” (correto); b) “Viemos agora à sua presença” (errado); c)
“Viemos ontem à sua presença” (correto).
Para informações adicionais, conferir Ver – Como conjugar? (P. 764) e
Vir (P. 770).
Viger ou Vigir?
1. Para Eliasar Rosa, viger é verbo defectivo, que só se emprega “nas
formas em que o g é seguido de e”. Exs.: a) “A lei vigente”; b) “Não vige
mais aquele contrato.”
2. Para tal autor, assim, em decorrência de tal regra, não se pode dizer
“Esse contrato foi feito quando vigia a lei revogada” (ROSA, 1993, p.
140-1).
3. Também assim pensa Francisco Fernandes, ao registrar: “emprega-se nas
formas em que ao g se segue e” (1971, p. 597).
4. Essa, porém, não é a posição de Napoleão Mendes de Almeida, para
quem é verbo regular, embora defectivo, defluindo de sua lição uma
permissão maior de conjugação, permitindo-se que ao g do radical se
siga o i: “não se emprega na primeira pessoa do singular do indicativo
presente nem, portanto, nas do presente do subjuntivo”.
5. Exemplifica assim o autor por último citado (ALMEIDA, 1981, p. 336):
a) “Essa lei já não vige”; b) “Ao tempo em que vigia a ditadura…”; c)
“Lei vigente (e não viginte)”; d) “Lei que está vigendo (e não vigindo)”.
6. A seu respeito, traz Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 412) duas
ponderações: a) trata-se de verbo defectivo, que “só possui as formas em
que ao g se segue a vogal e”; b) “não existe a forma vigir”.
7. Atento à frequência com que ocorrem erros com esse verbo nos textos
jurídicos, reforça Ronaldo Caldeira Xavier que “a forma vigir, de curso
eventual em certas obras jurídicas, simplesmente não existe” (1991, p.
134).
8. De igual modo atentos aos erros cometidos com frequência a seu
respeito, observam José de Nicola e Ernani Terra que “o gerúndio desse
verbo é vigendo e não vigindo” (2000, p. 226).
9. Lembra Adalberto J. Kaspary que “os gramáticos e dicionaristas
divergem quanto à flexão de viger. Alguns dizem que deve empregar-se
apenas nas formas em que o g é seguido de e; outros, entre os quais nos
alinhamos, lhe admitem atualmente a conjugação também nas formas
com o g seguido de i, apenas excluindo as formas em que o g é seguido
de o ou a” (1996, p. 356).
10. Na oportuna lição de Antonio Henriques e Maria Margarida de
Andrade – que insistem ser o verbo viger e não vigir – “entende-se o
verbo como defectivo; usa-se, apenas, na terceira pessoa do singular e
do plural, nas formas em que ao g seguir-se e ou i” (1999, p. 149).
11. Observando ser verbo regular, “usado e abusado no Direito”, Regina
Toledo Damião e Antonio Henriques asseveram a seu respeito: “é
defectivo; na prática, aparece apenas na terceira pessoa, nos tempos
que conservam a vogal temática e” (1994, p. 239).
12. Sousa e Silva (1958, p. 311), anotando que vigindo é um falso
gerúndio, explica que “ao presente vige (“vigora”) corresponde o
infinito viger (não “vigir”) e, portanto, o gerúndio vigendo”, mandando
tal gramático que se comparem bebendo (de beber), sofrendo (de
sofrer) e morrendo (de morrer).
13. Reiterando a lição de que viger é um verbo defectivo, Geraldo Amaral
Arruda (1997, p. 67) acrescenta que, “na prática, usa-se mais o verbo
vigorar, ou locuções em que entram os substantivos vigência e vigor”,
do que dão testemunho exemplos extraídos da Lei de Introdução ao
Código Civil: a) “…a lei começa a vigorar…” (art. 1º); b) “… antes de
entrar a lei em vigor…” (art. 1º, § 3º); c) “… a lei terá vigor…” (art.
2º).
14. Nas poucas vezes, porém, em que dispositivos de lei se põem a
empregar o referido verbo, acabam por complicar-se, como se pode ver
no art. 3º, § 2º, da Lei 5.621, de 4/11/70, que regulamentou o art. 144, §
5º, da Constituição Federal então vigente: “Se no quinquênio posterior
ao da última alteração não for adotada modificação na divisão e
organização judiciárias do Estado, esta poderá ser realizada a
qualquer tempo, vigindo a 1º de janeiro do ano seguinte, quando se
iniciará a contagem do novo quinquênio”. Após as explicações dadas,
fácil é a correção: vigendo a 1º de janeiro do ano seguinte.
15. Em resumo, no que tange a sua flexão, por força do vetusto princípio
de que, na dúvida, há liberdade de emprego para o usuário, há de se ter
pela possibilidade mais ampla, devendo-se considerar tal verbo
defectivo apenas na primeira pessoa do singular do presente do
indicativo, razão pela qual também não há o presente do subjuntivo
nem as pessoas dos imperativos daí derivadas.
16. Por se excluírem de uso apenas as formas em que o g é seguido de o ou
a, são perfeitamente corretas vige, vigeu, vigendo, vigerá, vigesse,
vigia.
Vigindo ou Vigendo?
Ver Viger ou Vigir? (P. 768)
Vigiu ou Vigeu?
Ver Viger ou Vigir? (P. 768)
Vimos ou Viemos?
Ver Viemos ou Vimos? (P. 768)
Vinte – Existe no plural?
Ver Anos vinte ou Anos vintes? (P. 117)
Vir
1. Num primeiro aspecto, vir é verbo que traz problemas quanto à
acentuação gráfica, já que tanto ele quanto seus compostos são grafados,
na terceira pessoa do plural do presente do indicativo, com um acento
circunflexo, para diferenciar da terceira pessoa do singular: eles vêm,
eles intervêm.
2. Seus compostos, mas não ele próprio, na terceira pessoa do singular,
recebem um acento agudo, em razão de regra específica das oxítonas: ele
vem, ele intervém.
3. Atente-se, assim, às seguintes formas do presente do indicativo: ele vem,
eles vêm, ele intervém, eles intervêm.
4. Quanto à conjugação verbal, são as seguintes suas formas do presente do
indicativo e tempos derivados: venho, vens, vem, vimos, vindes, vêm
(presente do indicativo); venha, venhas, venha, venhamos, venhais,
venham (presente do subjuntivo); vem, venha, venhamos, vinde, venham
(imperativo afirmativo); não venhas, não venha, não venhamos, não
venhais, não venham (imperativo negativo).
5. “As pessoas menos cultas manifestam a tendência para dizer viemos em
vez de vimos na primeira pessoa do plural do presente do indicativo”
(REIS, 1971, p. 123). Aquela forma, porém, pertence ao pretérito
perfeito do indicativo, e tal falha de emprego da forma do pretérito
perfeito pelo presente do indicativo é atribuída por Júlio Nogueira (1930,
p. 201) à “falta de uso” da forma correta.
6. Em continuação, são as seguintes as formas do pretérito perfeito: vim,
vieste, veio, viemos, viestes, vieram.
7. Cuidado, assim, com os tempos derivados do pretérito perfeito do
indicativo: a) viera, vieras, viera, viéramos, viéreis, vieram (pretérito
mais-que-perfeito do indicativo); b) vier, vieres, vier, viermos, vierdes,
vierem (futuro do subjuntivo); c) viesse, viesses, viesse, viéssemos,
viésseis, viessem (imperfeito do subjuntivo).
8. Observe-se que o gerúndio e o particípio são iguais (vindo).
9. Por esse verbo se conjugam outros: advir, convir, desavir-se, intervir,
provir, reconvir, sobrevir.
10. Atenção para com a conjugação de vir e de seus compostos no pretérito
perfeito e tempos derivados: a) “Terceiros intervieram no processo” (e
não interviram); b) “O réu não apenas contestou, mas também
reconveio” (e não reconviu); c) “Quando sobrevier sentença…” (e não
“Quando sobrevir…”).
11. Falando de um dos compostos de vir, lembra Geraldo Amaral Arruda
(1997, p. 67) que “lamentavelmente muitos se confundem e escrevem
eu intervi, ele intervia, eles interviram”, acrescentando tal autor que
esse verbo nada tem com o verbo ver e que, em sua conjugação, não se
deve fazer tal confusão. Corrijam-se as formas apontadas: eu intervim,
ele intervinha, eles intervieram.
12. Grafias equivocadas, como interviu em lugar de interveio, lembra Luiz
Antônio Sacconi (1979, p. 268) que são barbarismos morfológicos.
13. Vejam-se alguns exemplos de uso adequado dos compostos de vir na
legislação: a) “A transação não aproveita, nem prejudica senão aos
que nela intervierem, ainda que diga respeito a coisa indivisível” (CC,
art. 844); b) “Aquele que, sem autorização do interessado, intervém na
gestão de negócio alheio, dirigi-lo-á segundo o interesse e a vontade
presumível de seu dono, ficando responsável a este e às pessoas com
que tratar” (CC, art. 861); c) “No caso deste artigo, aquele em cujo
benefício interveio o gestor só é obrigado na razão das vantagens que
lograr” (CC, art. 875, parágrafo único); d) “Sem prejuízo do direito de
fiscalizar a gestão dos negócios sociais, o sócio participante não pode
tomar parte nas relações do sócio ostensivo com terceiros, sob pena de
responder solidariamente com este pelas obrigações em que intervier”
(CC, art. 993, parágrafo único); e) “Transitada em julgado a sentença,
na causa em que interveio o assistente, este não poderá, em processo
posterior, discutir a justiça da decisão, salvo se …” (CPC/1973, art.
55, caput); f) “Correndo o processo perante outro juiz, serão os autos
remetidos ao juiz competente da Capital do Estado ou Território, tanto
que neles intervenha uma das entidades mencionadas neste artigo”
(CPC/1973, art. 99, parágrafo único); g) “Às partes, aos advogados,
aos órgãos do Ministério Público, aos peritos e às testemunhas é
facultado rubricar as folhas correspondentes aos atos em que
intervieram” (CPC/1973, art. 167, parágrafo único); h) (Está impedido
de depor como testemunha) “o que intervém em nome de uma parte,
como o tutor na causa do menor, o representante legal da pessoa
jurídica, o juiz, o advogado e outros, que assistam ou tenham assistido
as partes” (CPC/1973, art. 405, § 2º, III); i) “Se o interessado não
puder ser citado pessoalmente, intervirá no processo o Ministério
Público” (art. 862, parágrafo único); j) “O devedor em mora responde
pela impossibilidade da prestação, embora essa impossibilidade
resulte de caso fortuito ou de força maior, se estes ocorrerem durante o
atraso; salvo se provar isenção de culpa, ou que o dano sobreviria
ainda quando a obrigação fosse oportunamente desempenhada” (CC,
art. 399); k) “A indenização por ofensa à liberdade pessoal consistirá
no pagamento das perdas e danos que sobrevierem ao ofendido, e se
este não puder provar prejuízo, tem aplicação o disposto no parágrafo
único do artigo antecedente” (CC, art. 954, caput).
Ver Se eu vir ou Se eu vier? (P. 681) e Viemos ou Vimos? (P. 768)
Vir à baila ou Vir à balha?
Ver À baila, À balha ou À bailha? (P. 53)
Vir de – Galicismo?
1. Questiona-se com frequência o uso da mencionada expressão seguida de
infinitivo, no sentido de acabar, por suspeita de galicismo, como em “Ele
vem de formar-se em Direito”.
2. Para Cândido de Figueiredo (1943, p. 285), vir de, como em “vimos de
narrar”, é “francesia escurril”, pois, segundo ele, “diz-se em português
de lei: acabamos de narrar, ou narramos há pouco, ou deixamos
exposto, ou… o que quiserem, menos aquilo”.
3. Eduardo Carlos Pereira também insere tal expressão no rol dos
galicismos fraseológicos ou sintáticos, daqueles que “são verdadeiras
deturpações da língua, contra os quais devemos estar premunidos”
(1924, p. 260-2).
4. Ronaldo Caldeira Xavier (1991, p. 89), de igual modo, insere a
expressão vir de no rol dos galicismos sintáticos e aconselha sua
substituição por acabar de.
5. Para Vasco Botelho de Amaral (1939, p. 54), os usos de vir de, “sem
expressão clara de movimento e com equivalência significativa de
acabar de”, são passos que se devem considerar “como menos fiéis ao
gênio do idioma”, muito embora aponte seu emprego como tal em
Camilo Castelo Branco.
6. Em sua Réplica, porém, Rui Barbosa abona-lhe o uso, por se tratar de
expressão “irrepreensivelmente vernácula” (1949, p. 547).
7. E José de Sá Nunes (1938, p. 38), arrolando significativos exemplos, é
peremptório para corroborar o posicionamento de Rui: “Vir de mais
infinitivo, quer expresse movimento, quer o não expresse, nunca foi
galicismo, a não ser que por galicistas se tenham os mais seguros
padrões da vernaculidade em todas as idades do nosso idioma”. Exs.: a)
“Mas, se o invoco, é apenas em argumento adminicular, subsídio aos
outros, que venho de expender” (Rui Barbosa); b) “Eu, que vinha de
concluir o curso geral de matemática, natural era que aspirasse a
professar essa disciplina” (Laudelino Freire); c) “Eu, aos dez anos,
vinha de perder meu pai quando já não tinha mãe” (Camilo).
8. Heráclito Graça – arrolando posicionamento de Cândido de Figueiredo,
contrário à vernaculidade de tal expressão – funda-se em lição de Rui
Barbosa de que, “por efeito de mera parecença do português com o
francês ou coincidência, ora casual, ora gerada pela ação de causas
comuns aos dois idiomas, caíram na tacha de galicismo a locução vim de
perder minha mãe e outras semelhantes”.
9. E conclui tal gramático (GRAÇA, 1904, p. 460-2) que expressões como
essa são “irrepreensivelmente vernáculas”, para o que traz em
corroboração exemplos insuspeitos: a) “De amor dos lusitanos
incendidas / Que vem de descobrir o novo mundo” (Camões); b) “Vindo
um dia elrei D. João III, de Portugal, de ouvir missa na Anunciada”
(Manuel Bernardes); c) “… que vinham de tomar seu regabofe” (Filinto
Elíseo); d) “Vinha eu de assistir de Vesta ao culto” (Antônio Feliciano de
Castilho); e) “Vinha eu… de fazer as minhas mercancias” (Alexandre
Herculano).
10. Para Júlio Nogueira (1959, p. 69), vir de no sentido de acabar de,
acaba sendo combatida como galicismo por muitos, a tanto levados por
Cândido de Figueiredo, o qual, “sem exame sério, a condenou”.
11. Também para José Oiticica (1954, p. 23-4), arrola-se tal construção
entre aquelas que “parecem galicismos ou erros”, mas “não o são”.
12. Nos dizeres de Francisco Fernandes (1971, p. 599), por um lado, “vir
de, significando acabar de, é expressão condenada como francesismo
por alguns vernaculistas” (dentre os quais Otoniel Mota e Cândido de
Figueiredo); por outro lado, “todavia, tal modo de construir é
largamente abonado por escritores também de boa nota”. Exs.: a)
“Enquanto a mim, vens de ler as pieguices amoradas de algum ‘roué’
parisiense” (Camilo Castelo Branco); b) “De amor dos lusitanos… que
vêm de descobrir um mundo novo” (Camões); c) “Vinha de ler o seu
primeiro livro, ‘Canções Românticas’…” (Machado de Assis); d) “Não
tem algumas das qualidades que vimos de nomear” (Rui Barbosa).
13. Celso Pedro Luft (1999, p. 533) até mesmo se exalta para asseverar que
tal construção “é atacada por muitos puristas maníacos mas defendida
por um Heráclito Graça… e outros”.
14. Ante tais posicionamentos divergentes entre os gramáticos,
independentemente de eventuais preferências, por força do velho
princípio de que, na dúvida, deve-se conceder liberdade ao usuário, é
de se concluir que vir de mais infinitivo, no sentido de acabar de, é
expressão vernácula, que pode ser empregada sem escrúpulos. Ex.: “O
réu vem de praticar nos autos ato nitidamente configurador de
litigância de má-fé”.
Vírgula
1. Deve-se, desde logo, evitar a visão simplista de que a vírgula serve para
marcar as pausas da fala.
2. Para combater tal posicionamento, vale a lição proferida com muita
propriedade e humor por Josué Machado: “A lição simplificada de
alguns gramáticos de que a vírgula serve para marcar pausas é singela e
incompleta. Há pessoas que sofrem de bronquite e fazem pausas fora do
compasso. Outras soluçam e gaguejam. O fato é que a pausa oral nem
sempre corresponde à pontuação” (1994, p. 63).
3. Em realidade, muito embora seja comum a coincidência entre pausas e
vírgulas, o certo é que há pausas na fala que não correspondem a
vírgulas, e também há vírgulas que não correspondem necessariamente a
pausas.
4. Por outro lado, para ilustrar a importância que reside na pontuação como
um todo, aqui se incluindo a vírgula, lembre-se a lenda de que Alexandre
Magno, não querendo prosseguir em suas conquistas, antes de voltar à
Babilônia, mandou, como era de praxe à época, fosse consultada uma
pitonisa acerca do futuro. A resposta veio em cinco palavras soltas, sem
qualquer sinal de separação; e sua leitura foi feita por Alexandre e seus
generais do modo como mais lhes convinha: “Vais. Voltas. Não morrerás
lá.” Em campanha, porém, febre aguda acometeu o grande conquistador,
que acabou morrendo aos trinta e três anos, em 323 a. C., razão pela
qual, obviamente, não mais voltou a suas conquistas. Seus generais,
lembrando-se da pitonisa, mandaram buscá-la, para que fosse punida
pela errônea previsão. Qual não foi o espanto deles, contudo, quando
ouviram dela a adequada leitura do vaticínio: “Vais. Voltas? Não!
Morrerás lá.”
5. Da lenda, de igual modo, vem a história de que, na antiga Rússia, um
czar rejeitara o apelo extremo de um condenado, encimando o recurso
com o lacônico veredicto: “Manter condenação. Impossível absolver.”
Tendo pessoal interesse no caso, mas sem querer ostensivamente
desafiar o czar, nem pedir-lhe expressamente o favor, a czarina, durante
a madrugada, teria revertido em plenitude a situação, valendo-se de
pequenas alterações: “Manter condenação impossível; absolver”
(COSTA, 2005, p. 321-2).
6. Como se vê, a questão da vírgula não é supérflua, podendo resultar
equívocos sérios de seu mau emprego, como se comprovar da análise do
art. 54, § 7º, da Lei de Registros Públicos: a) o mencionado dispositivo
registra que “o assento de nascimento deverá conter: … 7º: os nomes e
prenomes, a naturalidade, a profissão dos pais, o lugar e cartório onde
se casaram, a idade da genitora, do registrando em anos completos, na
ocasião do parto, e o domicílio ou a residência do casal”; b) a vírgula
entre genitora e do registrando – incabível, como se observa pelo próprio
sentido – consta da redação original da Lei 6.015, de 31/12/73, da Lei
6.140, de 28/11/74, e foi reproduzida na retificação da Lei de Registros
Públicos; c) sem a vírgula – como deve ser – entende-se que devem
constar a idade e os demais dados apenas da genitora à época do parto;
d) se houver insistência na vírgula – tal como não se harmoniza com a
exegese do texto – deverá constar a idade da genitora e também a idade
do registrando, em anos completos, por ocasião do parto.
7. O descuido quanto ao emprego da vírgula é facilmente constatável a uma
simples leitura de alguns dispositivos legais, como se vê no art. 526 do
Código de Processo Civil, com a redação que lhe foi conferida pela Lei
9.139, de 30/11/95: “O agravante, no prazo de 3 (três) dias, requererá
juntada, aos autos do processo de cópia da petição do agravo de
instrumento e do comprovante de sua interposição, assim como a
relação dos documentos que instruíram o recurso”.
8. Uma simples leitura dos casos de vírgula proibida fará concluir que, no
caso, tem-se um complemento nominal (aos autos) e um termo por ele
completado (juntada), hipótese em que, para não haver separação nem
ruptura de encadeamento entre eles, que estão em total dependência
sintática, não se há de empregar a vírgula.
9. Para uma visão sistematizada sobre o assunto, ver, pela ordem, vírgula
proibida, vírgula obrigatória, vírgula optativa, vírgula entre orações, mas
e a vírgula.
Ver Orações intercaladas ou interferentes? (P. 532)
Vírgula e Etc.
1. Etc. é abreviatura da locução latina et coetera, que, etimologicamente,
significa “e as outras coisas” ou “e as coisas restantes”, tendo, na
atualidade, o sentido de “assim por diante”, “afora o mais”, e “ainda
outros”, podendo abranger, além de coisas, também pessoas e animais.
Ex.: “Compareceram diversas pessoas do meio jurídico: juízes,
promotores, advogados, etc.”
2. Tem, como sinônimo pejorativo, et reliqua caterva, ou simplesmente et
caterva, literalmente “e o bando restante”, que se usa para indicar “e os
demais da mesma laia”.
3. Como se vê, já na origem latina há uma conjunção aditiva, razão por que
é errado dizer e etc. Ex.: “Compareceram diversas pessoas do meio
jurídico: juízes, promotores, advogados e etc.” (errado).
4. Nesse sentido a lição de Luiz A. P. Vitória: “antes de etc., nunca se
coloca a conjunção”.
5. Quanto à pontuação, a rigor, seria etimologicamente inconcebível o uso
da vírgula antes do etc., exatamente por considerada sua significação.
6. Nesses casos, tecnicamente, só se haveria de usar a vírgula antes de tal
palavra nas hipóteses em que tal sinal indicativo de parada existisse
antes do e, pela existência, por exemplo, de um termo intercalado. Ex.:
a) “Compareceram diversas pessoas do meio jurídico: juízes,
promotores, advogados, estes em maior número etc.” (correto); b)
“Compareceram diversas pessoas do meio jurídico: juízes, promotores,
advogados, etc.” (errado).
7. Anote-se, todavia, que o acordo ortográfico em vigência determina que a
vírgula deve ser usada em tal caso, razão pela qual a referida vírgula se
torna, então, obrigatória.
8. Exatamente por essa razão, anota Arnaldo Niskier que “a questão da
vírgula antes do etc. é simples: deve ser usada! O argumento de que
originalmente a palavra já contém o e (et) não vale, pois o que conta é o
acordo ortográfico vigente, e, diga-se de passagem, já não falamos latim
mas sim português”.
9. De Cândido de Oliveira, em seguida, vem importante observação:
“Sendo etc. a última palavra da frase, não colocamos dois pontos: um só
ponto indicará a abreviatura e o ponto final: São vales, serras, planícies,
etc.”.
10. Domingos Paschoal Cegalla sintetiza em três observações os
problemas referentes ao assunto: a) “Costuma-se usar vírgula antes
dessa abreviatura, embora contenha a conjunção e”; b) “Não se deve
usar a conjunção e antes de etc.”; c) “Pode-se empregar etc., mesmo
com referência a pessoas e animais”.
11. De fundamentados comentários de Edmundo Dantès Nascimento,
também assim se pode resumir seu ponto de vista sobre a questão, com
importantes reflexos para os textos jurídicos e forenses: a) apesar de
alguns autores – como Júlio Nogueira e Luiz Autuori – empregarem
etc. como sinônimo de outros ou de outrem, não é possível tal uso na
literatura jurídica; b) é hábito internacional fazer preceder de vírgula tal
abreviatura, apesar de repugnar a pontuação em uma série terminada
por e, sobretudo aos que não perderam a ideia do sentido etimológico
do vocábulo; c) o Vocabulário Ortográfico, aliás, sempre coloca vírgula
antes de etc.
12. É interessante notar que, no art. 232 da Lei 6.015, de 31/12/73, que
dispôs sobre os registros públicos, de acordo com a redação trazida
pela Lei 6.216, de 30/6/75, que a modificou, constava vírgula antes de
etc.; na republicação da lei, inserida na Coleção das Leis da União de
1975, vol. V, p. 61, todavia, acabou desaparecendo a mencionada
vírgula. Trata-se, sem dúvida, de evidente equívoco.
Vírgula obrigatória
1. Com a anotação de que as regras nem sempre são tão rígidas para seu
emprego, a vírgula – etimologicamente uma varinha (SACCONI, 1979,
p. 243) – em mesma oração, é usada para: a) Separar os elementos de
uma enumeração. Ex.: “O réu era feio, magro, doente”; b) Isolar o
aposto. Ex.: “Clóvis Beviláqua, autor do projeto do Código Civil, é
considerado por muitos seu melhor intérprete”; c) Isolar o vocativo. Ex.:
“Nobre causídico, mantenha-se nos limites da cortesia e da urbanidade
de tratamento”; d) Indicar inversão ou intercalação de algum elemento
da frase, fazendo-a sair da ordem direta. Ex.: “Ao final da audiência, os
advogados requereram prazo para memoriais” (inversão); “Os
advogados requereram, ao final da audiência, prazo para memoriais”
(intercalação); e) Indicar a supressão do verbo. Ex.: “Depois da
tempestade, a bonança”; f) Isolar termos pleonásticos ou repetidos. Ex.:
“Com a presença de testemunha tão inesperada, o réu ficou branco,
branco de espanto”; g) Destacar as expressões explanatórias ou
corretivas (isto é, a saber, ou seja, além disso, por exemplo, vale
dizer…). Ex.: “A testemunha mentiu, isto é, não esclareceu aspectos
importantes”.
2. Mesmo com as regras apontadas, algumas considerações especiais se
fazem necessárias aos casos observados: a) No que respeita à inversão
entre os termos da oração, a posposição do sujeito ao verbo normalmente
não vem marcada pela vírgula. Ex.: “Não redundará em condenação a
sentença destes autos”; b) Quando a intercalação ou inversão se dão com
uma só palavra ou com expressão de poucas palavras, as vírgulas que
marcam tal ocorrência acabam sendo optativas. Exs.: i)
“Displicentemente, o réu segurava o queixo com a mão” (correto); ii)
“Displicentemente o réu segurava o queixo com a mão” (correto); iii) “O
réu segurava, displicentemente, o queixo com a mão” (correto); iv) “O
réu segurava displicentemente o queixo com a mão” (correto); c)
Observe-se, todavia, que, quando há intercalação com vírgula optativa,
ou se usam ambas as vírgulas, ou não se utiliza nenhuma delas. Exs.: i)
“O réu, displicentemente, segurava o queixo” (correto); ii) “O réu
displicentemente segurava o queixo” (correto); iii) “O réu,
displicentemente segurava o queixo” (errado); iv) “O réu
displicentemente, segurava o queixo” (errado); d) Se a conjunção inicia
oração, não há razão alguma para a existência de vírgula logo após, até
porque o exemplo há de estar na ordem direta, circunstância essa que
dispensa a vírgula. Ex.: “O réu falou muito, entretanto não convenceu o
magistrado”.
3. Mantém-se o posicionamento por último externado, apesar da lição
contrária de Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 239) de que seja
“facultativo, dependendo de ênfase ou não, o emprego da vírgula depois
de conjunções que principiem período”. Exs.: a) “Muitos processos
foram julgados. Todavia nem todos foram alvo de recurso”; b) “Muitos
processos foram julgados. Todavia, nem todos foram alvo de recurso”.
Ver Ponto e vírgula – Emprego (P. 573), Pontuação (P. 574), Rua tal,
número tal (P. 676), Vírgula entre orações (P. 773), Vírgula optativa (P. 777) e
Vírgula proibida (P. 779).
Vírgula optativa
1. Com a anotação de que as regras nem sempre são tão rígidas para seu
emprego, já se viu, no estudo da vírgula proibida, que ela, em mesma
oração, não é usada entre termos da oração que estejam em ordem direta,
a saber, entre sujeito e verbo, entre verbo e seus complementos.
2. Será ela, todavia, empregada para indicar inversão ou intercalação de
algum elemento da frase, fazendo-o sair da ordem direta. Ex.: a) “Ao
final da audiência, os advogados requereram prazo para memoriais”
(inversão); b) “Os advogados requereram, ao final da audiência, prazo
para memoriais” (intercalação).
3. Além disso, no que respeita à inversão entre os termos da oração, a
posposição do sujeito ao verbo normalmente não vem marcada pela
vírgula. Ex.: “Não redundará em condenação a sentença destes autos”.
4. Mais do que isso, quando a intercalação ou inversão se dão com uma só
palavra ou com expressão de poucas palavras, as vírgulas que marcam
tal ocorrência acabam sendo optativas. Exs.: a) “Displicentemente, o réu
segurava o queixo com a mão” (correto); b) “Displicentemente o réu
segurava o queixo com a mão” (correto); c) “O réu segurava,
displicentemente, o queixo com a mão” (correto); d) “O réu segurava
displicentemente o queixo com a mão” (correto).
5. Observe-se, todavia, que, quando há intercalação com vírgula optativa,
ou se usam ambas as vírgulas, ou não se utiliza nenhuma delas. Exs.: a)
“O réu, displicentemente, segurava o queixo” (correto); b) “O réu
displicentemente segurava o queixo” (correto); c) “O réu,
displicentemente segurava o queixo” (errado); d) “O réu
displicentemente, segurava o queixo” (errado).
6. Equívocos dessa ordem encontram-se com frequência, até mesmo em
textos de lei.
7. Considere-se o seguinte dispositivo de lei: “Tratando-se de registro fora
do prazo legal o oficial, em caso de dúvida poderá requerer ao juiz as
providências que forem cabíveis para esclarecimento do fato” (art. 52, §
2º, da Lei 6.015, de 31/12/73, que dispôs sobre os registros públicos).
8. Independentemente da falta de vírgula já após o adjetivo legal, sinal este
obrigatório por se tratar de oração subordinada adverbial temporal
reduzida de gerúndio e anteposta à principal (Ver Vírgula entre orações),
o certo é que a expressão em caso de dúvida está intercalada entre o
sujeito, que é oficial, e o respectivo verbo, que é a locução poderá
requerer.
9. Dessas considerações resulta a obrigatoriedade de colocação de vírgula
após a expressão intercalada; assim: “… o oficial, em caso de dúvida,
poderá requerer…”.
10. Anote-se, por oportuno, que a vírgula após dúvida, no caso, constava
do texto primitivo da lei, mas este apareceu sem ela, quando de sua
republicação.
11. Mais um dispositivo equivocado: “O juiz competente somente
processará o pedido, se tiver expressa concordância do companheiro, e
se da vida em comum houverem decorrido, no mínimo cinco anos ou
existirem filhos da união” (art. 57, § 3º, da já referida Lei de Registros
Públicos).
12. Uma observação mais atenta revela que no mínimo se intercala entre a
locução verbal houverem decorrido e seu sujeito cinco anos; e, com
expressões intercaladas dessa natureza, ou se empregam ambas as
vírgulas, ou não se emprega nenhuma delas.
13. Esclareça-se que, de igual modo, a vírgula aparecia regularmente no
texto da Lei 6.216, de 30/6/75, mas foi omitida pela republicação da
Lei de Registros Públicos.
14. Ainda um outro exemplo: “O financiador abrirá, com o valor do
financiamento conta vinculada à operação…” (art. 4º do Decreto-lei
413, de 9/1/69, que dispôs sobre os títulos de crédito industrial).
15. A expressão com o valor do financiamento encontra-se intercalada
entre o verbo abrirá e o objeto direto conta; se se emprega a vírgula
antes da expressão, a intercalação deve ser total, e deve haver a
segunda vírgula, ao final dela.
16. Corrija-se, por conseguinte: “O financiador abrirá, com o valor do
financiamento, conta vinculada à operação…”.
17. Outro equívoco dessa ordem surge pouco à frente, logo no art. 6º do
mesmo Decreto-lei 413, de 9/1/69: “O devedor facultará ao credor a
mais ampla fiscalização do emprego da quantia financiada, exigindo,
inclusive os elementos que lhe forem exigidos”.
18. Empregada a vírgula antes de inclusive, obrigatória é também a
segunda vírgula.
19. Mas não é só: o art. 227 do Código de Processo Civil, em certo trecho,
traz a seguinte redação: “…deverá, havendo suspeita de ocultação,
intimar a qualquer pessoa da família, ou em sua falta a qualquer
vizinho, que, no dia imediato voltará, afim de efetuar a citação…”.
20. Ora, a expressão “no dia imediato” está sabidamente intercalada. Por
se tratar de intercalação, assim, ou se usam as duas vírgulas, ou não se
emprega nenhuma. Corrija-se, portanto, para uma das duas seguintes
formas: a) “… que, no dia imediato, voltará…”; b) “… que no dia
imediato voltará…”. Jamais, porém, como consta no texto de lei: “…
que, no dia imediato voltará…”.
Ver Ponto e vírgula – Emprego (P. 573), Pontuação (P. 574), Rua tal,
número tal (P. 676), Vírgula entre orações (P. 773) e Vírgula proibida (P.
779).
Vírgula proibida
1. Por não haver separação nem ruptura de encadeamento entre termos que,
pela própria estruturação da frase, estão em total dependência sintática, a
vírgula – etimologicamente uma varinha (SACCONI, 1979, p. 243) –
não será usada nos casos seguintes: a) Entre sujeito e verbo. Ex.: a) “O
juiz proferiu uma sentença condenatória”; b) Entre verbo e objeto direto.
Ex.: b) “O juiz proferiu uma sentença condenatória”; c) Entre verbo e
objeto indireto. Ex.: “O réu depende da sentença”; d) Entre verbo e
predicativo. Ex.: “A sentença foi longa”; e) Entre verbo e agente da
passiva. Ex.: “Uma sentença condenatória foi proferida pelo juiz”; f)
Entre o adjunto adnominal e o substantivo modificado. Ex.: “A resposta
do réu provocou indignação”; g) Entre o complemento nominal e o
vocábulo por ele completado. Ex.: “A resposta ao magistrado provocou
indignação”.
2. Por força da própria observação anterior, vê-se que a vírgula também
não será usada entre as orações principais e aquelas que exerçam funções
sintáticas de sujeito, objeto direto, objeto indireto, predicativo do sujeito
e complemento nominal.
3. Vale dizer: não haverá vírgula entre as orações principais e as orações
subordinadas substantivas subjetivas, as objetivas diretas, as objetivas
indiretas, as predicativas e as completivas nominais. Exs.: “É importante
que se preserve o estado de direito” (subjetiva); “Os homens de bem
querem que se preserve o estado de direito” (objetiva direta); c) “Todos
necessitam de que se preserve o estado de direito” (objetiva indireta); d)
“O desejo de todos é que se preserve o estado de direito” (predicativa);
e) “Todos têm necessidade de que se preserve o estado de direito”
(completiva nominal); f) “Os homens de bem querem uma coisa
importante: de que se preserve o estado de direito” (apositiva).
4. Por outro lado, apesar de que um dos usos da vírgula seja marcar uma
inversão, o certo é que não se dá seu emprego para indicar posposição do
sujeito ao verbo, caso esse em que ela é proibida. Exs.: a) “Caminhavam
o pai e a filha calmamente”; b) “Saíram o advogado e seu cliente para
uma conversa particular”; c) “Conversavam animadamente o juiz, os
advogados e as testemunhas”.
5. Além de ser comum essa espécie de erro nos textos jurídicos, vê-se que
às vezes derrapam nesse campo até mesmo alguns dispositivos de lei,
como é o caso do art. 7º da Lei 9.790, de 23/3/99, que dispôs sobre a
organização da sociedade civil: “… serão assegurados, ampla defesa e o
devido contraditório…”.
6. Corrija-se: serão assegurados ampla defesa e o devido contraditório,
porque ampla defesa e o devido contraditório serão assegurados.
7. Confirme-se que os textos de lei, às vezes, equivocam-se nesse sentido,
lançando vírgula entre termos que não a permitem: a) “A novação por
substituição do devedor, pode ser efetuada independente de
consentimento deste” (CC/1916, art. 1.001. Tal vírgula, existente assim
no texto oficial, posta-se, de modo irregular, entre sujeito e verbo. O
CC/2002, art. 362, corrigiu o equívoco pela eliminação da mencionada
vírgula).
Ver Ponto e vírgula – Emprego (P. 573), Pontuação (P. 574), Vírgula entre
orações (P. 773), Vírgula obrigatória (P. 777) e Vírgula optativa (P. 777).
Vir ou Vier?
1. Um leitor indaga qual das duas formas é correta nos exemplos seguintes:
a) “Se você vir, nós sairemos”; b) “Se você vier, nós sairemos”.
2. Ora, o futuro do subjuntivo do verbo ver se conjuga do seguinte modo:
se eu vir, se tu vires, se ele vir, se nós virmos, se vós virdes, se eles
virem.
3. Já o verbo vir, nesse mesmo tempo, apresenta as seguintes formas: se eu
vier, se tu vieres, se ele vier, se nós viermos, se vós vierdes, se eles
vierem.
4. O leitor não estabeleceu com precisão qual verbo pretende ver
conjugado no caso concreto, e, com um pequeno esforço, podem-se
formular situações em que caiba ora um sentido, ora outro; a) “Se você
vir que realmente não temos razão, nós sairemos” (correto); b) “Se você
vier para nos atrapalhar, nós sairemos” (correto).
5. E, assim, respondendo diretamente à indagação feita, mas apenas
analisando os exemplos tais como trazidos pelo leitor, pode-se afirmar
genericamente que ambos são corretos: o primeiro, como forma do verbo
ver; o segundo, do verbo vir.
Visar
1. Quanto à regência verbal, na lição de Artur de Almeida Torres, “é
transitivo direto nas acepções de pôr o sinal de visto em; apontar arma
de fogo”. Exs.: a) “Visar um passaporte” (Caldas Aulete); b) “Visa
sempre o mesmo alvo” (Mário Barreto).
2. Complementa tal gramático com a lição de que, “no sentido de ter em
vista um fim, dirigir os seus esforços para, tender, constrói-se como
transitivo indireto, com a preposição a”. Ex.: “Os conspiradores presos
visavam provavelmente a estabelecer a internacional socialista”
(Camilo Castelo Branco).
3. Ultima o referido gramático (TORRES, 1967, p. 298-9), com
propriedade, que se observa, no Brasil, uma tendência a se usar do verbo
visar sem preposição, mesmo como transitivo indireto, quando seguido
de infinitivo. Ex.: “Esta doutrina é simplesmente didática e visa facilitar
a aprendizagem dos verbos fortes” (Otelo Reis).
4. Cândido Jucá Filho (1981, p. 110) lembra que, modernamente, tem sido
olvidado o uso da preposição com esse verbo, trazendo ele exemplos de
autores insuspeitos para corroborar seu ensino: a) “Se visaram este
alvo…” (Mário Barreto); b) “Medidas que a minha administração
visava…” (Rui Barbosa).
5. De Arnaldo Niskier vem a seguinte advertência para os dias atuais: “O
verbo visar, no sentido de ter por objetivo, rege, historicamente, a
preposição a; entretanto, no português moderno, seu uso como transitivo
direto já está mais do que difundido, sendo encontrado em bons autores,
independentemente da palavra que o segue. Assim, devemos considerar
as duas regências corretas, apesar do espernear daqueles que veem a
língua como um cadáver conservado em formol” (1992, p. 107).
6. Para esse seu emprego mais problemático, também assim leciona
Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 413-4): a) “na acepção de ter em
vista, ter como objetivo, pretender, constrói-se geralmente com objeto
indireto (preposição a)”; b) em tal acepção, todavia, “admite-se a
regência direta”.
7. Em nota bastante apropriada para tal significado, observa Francisco
Fernandes: “Neste caso o verbo visar regeu sempre complemento
indireto, introduzido pela preposição a; modernamente, porém, é comum
dar-se-lhe objeto direto, qualquer que seja sua acepção” (1971, p. 599).
8. Não é outro o posicionamento de Celso Pedro Luft (1999, p. 534), para
quem, “nesta acepção, a regência primária e transitivo indireto”,
correspondendo à construção visar a; todavia, “por causa da semântica
buscar, procurar, pretender, passou a aceitar também a transitividade
direta, dispensando a preposição”, o que “se deu, de início,
principalmente com o infinitivo”. Ex.: “O ataque visava cortar a
retaguarda da linha de frente” (Euclides da Cunha).
9. Nesse sentido de ter por fim ou objetivo, nos textos de lei, tal verbo, de
um modo geral, aparece com sua construção clássica com objeto indireto
com a preposição a (visar a alguma coisa), mas também há casos de
sintaxe com objeto direto (que pode aparecer como sujeito da voz
passiva), correspondendo à construção visar algo. Exs.: a) “A União, os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às
microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei,
tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela
simplificação de suas obrigações administrativas…” (CF/88, art. 179);
b) “Subordinando-se a eficácia do ato à condição suspensiva, enquanto
esta se não verificar, não se terá adquirido o direito, a que ele visa”
(CC, art. 118); c) “Quando a lei dispõe sobre as condições de validade
substancial ou formal de quaisquer fatos ou sobre os seus efeitos,
entende-se, em caso de dúvida, que só visa os fatos novos…” (CC
português, art. 12º, 2); d) “As penas aumentam-se de um terço, se ocorre
qualquer das hipóteses previstas no § 1º, n. 1, do artigo anterior, ou é
visada ou atingida qualquer das coisas enumeradas no n. II do mesmo
parágrafo” (CP, art. 251, § 2º).
Ver Fim visado – Está correto? (P. 356)
Vista
1. Juridicamente falando, é a entrega de autos a alguém interessado no
processo (advogados, representante do Ministério Público), a fim de que,
após análise do que neles se contém, se pronuncie como lhe competir.
Ex.: “Os autos foram com vista ao representante do Ministério Público”.
2. Não se confunde com conclusão, que é o “ato, consistente em termo, por
meio do qual os autos são submetidos ao juiz da causa, para que neles
profira uma decisão” (KASPARY, 1996, p. 97). Ou seja: enquanto os
autos seguem com vista para os demais operadores do processo, como os
advogados das partes e dos terceiros (CPC/1973, arts. 40, II, 141, IV, b,
196, caput, 493, caput, 518, 531, 542, caput, 864 e 1.000), os
procuradores dos órgãos públicos (arts. 141, IV, b, e 1.002) e o
representante do Ministério Público (CPC/1973, arts. 83, I, 141, IV, b),
seguem eles em conclusão para o juiz da causa (CPC/1973, arts. 141, IV,
a, 159, § 2º, 323, 549, caput).
3. Eliasar Rosa leciona que é erro frequentíssimo na linguagem do foro
dizer-se vistas, assim no plural, como, por exemplo: “O advogado
requereu vistas dos autos”; ou “Os autos estão com vistas ao Ministério
Público”.
4. Para tal autor, “o certo é vista, no singular” (ROSA, 1993, p. 141).
5. Modelo de correção, nesse sentido, é o Código de Processo Civil em
diversas passagens: a) “O advogado tem direito de: … requerer, como
procurador, vista dos autos de qualquer processo pelo prazo de cinco
(5) dias” (art. 40, II); b) “Intervindo como fiscal da lei, o Ministério
Público… terá vista dos autos depois das partes…” (art. 83, I); c) “É
facultado a qualquer juiz, que tiver assento na turma ou câmara, pedir
vista, por uma sessão, se não estiver habilitado a proferir imediatamente
o seu voto” (art. 555, parágrafo único).
Visto ou Vista?
1. Um leitor observa ter lido, no serviço público, avisos nos quais, junto à
assinatura do chefe, consta “Chefe – Visto” ou “Chefe – Vista”. E,
opinando pela primeira forma, por entender que, no caso, o que ocorre é
um visto da autoridade, indaga qual a forma correta.
2. Ora, juridicamente falando, vista é a entrega dos autos às partes ou
intervenientes de um processo judicial ou procedimento administrativo,
para que, após adequada análise, possam pronunciar-se como lhes
competir. Ex.: “Os autos foram com vista ao representante do Ministério
Público”.
3. Já visto quer dizer a declaração de uma autoridade ou funcionário num
documento, para validá-lo, significando que foi examinado, verificado e
achado conforme. Ex.: “Após adequada análise e verificação, a
autoridade apôs seu visto no documento”.
4. Importa observar que é erro frequentíssimo, na linguagem do foro, o
emprego de vistas em lugar de vista, razão pela qual é oportuna a
seguinte especificação: a) “O advogado requereu vista dos autos”
(correto); b) “O advogado requereu vistas dos autos” (errado); c) “Os
autos estão com vista ao Ministério Público” (correto); d) “Os autos
estão com vistas ao Ministério Público” (errado).
5. Voltando ao caso da consulta, tudo vai depender do sentido em que está
empregado o indigitado vocábulo: se o significado for de entrega dos
autos para que alguém neles se manifeste, será vista; se a acepção for de
atestado de correção de um documento após análise, então será visto.
6. As circunstâncias do caso trazido para análise e a própria observação do
leitor parecem indicar tratar-se de um visto.
7. Também aqui, por fim, parece importante acrescentar que não importa se
a autoridade é alguém do masculino ou do feminino, porque, além de
constituir um substantivo masculino, o visto se refere ao documento, e
não à autoridade.
Vistos etc., Vistos, etc… ou Vistos, etc.?
1. Em outros tempos, as sentenças judiciais começavam com um cabeçalho
mais ou menos redigido do seguinte modo: “Vistos e bem examinados
estes autos de ação civil em que figura como autor…”.
2. José Carlos Barbosa Moreira (2001, p. 287) ensina que uma fórmula
inicial como “vistos, relatados e discutidos estes autos…”, em realidade,
“pretende deixar certo que se cumpriram todos os trâmites necessários:
os autos foram vistos – isto é, examinados –, deles se fez um relatório, e
a matéria foi submetida à discussão do colegiado”.
3. Hélio Tornaghi lembra a origem da expressão: “O juiz antigo não estava
obrigado a dizer as razões que o haviam levado a concluir de
determinada maneira. Em Roma, a princípio, ele condenava escrevendo
a letra D (de damo = condeno) e absolvia com a letra L (de libero =
absolvo). Ainda na Idade Média, não se exigia a motivação da sentença.
O juiz limitava-se a dizer: visto o processo, condeno. Ou absolvo (viso
processu condemnamus; viso processu absolvimus). Fórmula que
corresponde ao nosso ‘vistos e examinados’, mas à qual, hoje,
acrescentamos a fundamentação” (1981, p. 171).
4. Nos dias de hoje, entretanto, um preâmbulo como esse não é essencial,
mas dispensável, até por força da disposição constitucional que
determina a obrigatoriedade de fundamentar as decisões judiciais (cf.
CF/1988, art. 93, IX).
5. Além disso, fórmulas sacramentais como essa perderam a relevância de
outros tempos, sobretudo porque a estrutura legal de uma sentença, na
atualidade, exige o relatório como requisito essencial, além dos
fundamentos e da parte final dispositiva (cf. CPC/1973, art. 458).
6. E não é só: ficaria difícil imaginar o que, na atualidade, se quereria
enfeixar no etc., certo como é que, pela estrutura hodierna de uma
sentença, o juiz ainda não fez o relatório, que deverá constar no corpo do
veredicto, nem discutiu com ninguém, pois ainda não se chegou ao cerne
do julgamento. E ainda pioraria a situação, na hipótese de um
julgamento de primeira instância, em que o juiz decide sozinho, de modo
que não há mais ninguém com quem discutir.
7. De qualquer modo, por tradição das sentenças e pela força do hábito no
jargão forense, a expressão perdura em uso, de modo que, para a
hipótese de seu emprego, analisam-se, a seguir, seus aspectos de
pontuação.
8. Veja-se por primeiro, nesse aspecto, que etc. constitui abreviatura da
locução latina et coetera, que etimologicamente significa e as outras
coisas, ou e as coisas restantes. Ex.: “Compareceram diversas pessoas
do meio jurídico: juízes, promotores, advogados, etc.”
9. Por já possuir, na origem latina, uma conjunção aditiva, é errado dizer e
etc. Ex.: “Compareceram diversas pessoas do meio jurídico: juízes,
promotores, advogados e etc.” (errado).
10. Quanto à pontuação, a rigor, seria etimologicamente inconcebível o uso
da vírgula antes do etc., exatamente por se considerar sua significação.
11. Anote-se, todavia, que o Formulário Ortográfico, expedido com força
de lei pela Academia Brasileira de Letras em 1943, emprega a vírgula
antes de etc., motivo por que, desse modo, a vírgula se torna
obrigatória. E se acrescente que o Acordo Ortográfico de 2008 não
alterou em nada o referido posicionamento das regras anteriores.
12. Em justificativa para essa posição, assim leciona Arnaldo Niskier: “A
questão da vírgula antes do etc. é simples: deve ser usada! O
argumento de que originalmente a palavra já contém o e (et) não vale,
pois o que conta é o acordo ortográfico vigente, e, diga-se de
passagem, já não falamos latim, mas sim português” (1992, p. 35).
13. Num outro aspecto, diga-se que após o etc. usa-se o ponto indicador da
abreviatura.
14. Não se devem usar as reticências (…) por uma razão simples: no caso,
esse sinal de pontuação serviria para indicar que se suspende a
discriminação de outros seres, mas essa suspensão, em última análise, é
exatamente o que se deixa implícito no vocábulo etc.
15. Por fim, nada impede o uso de outros sinais de pontuação após o ponto
indicador da abreviatura com o vocábulo etc. Ex.: “Vistos etc., em
decisão para a ação principal e para a medida cautelar.”
16. Para sintetizar, vejam-se os modos de grafia para a mencionada
expressão, com as devidas indicações de sua correção ou erronia: a)
Vistos etc. (errado); b) Vistos, etc. (correto); c) Vistos etc… (errado); d)
Vistos, etc… (errado).
Vi todos eles – Está correto?
Ver Pronome pessoal (P. 614).
Vo-lo
1. Os pronomes pessoais oblíquos átonos me, te, lhe, nos, vos podem
juntar-se aos pronomes o, a, os, as, dando origem às formas mo, to, lho,
no-lo, vo-lo. Exs.: “Estes autos, eu vo-los entrego em confiança”.
Ver Pronome pessoal (P. 614) e Verbo seguido de pronome (P. 763).
VOLP
Ver Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (P. 785).
Vôo ou Voo?
Ver Enjôo ou Enjoo? (P. 319)
Vós de cerimônia
1. Um leitor, ao dar com um erro que lhe apontaram em Rui Barbosa, no
emprego de pronome de tratamento, disse haver ficado em dúvida se tal
autor não estaria usando o vós de cerimônia.
2. Como primeira premissa, deixam-se de lado questões teóricas e se fixa
que um pronome de tratamento, como Vossa Majestade, Vossa Senhoria
ou Vossa Alteza, equivale, na prática, para efeito de concordância verbal,
a você (que nada mais é do que uma forma simplificada de outro
pronome de tratamento, Vossa Mercê).
3. Por isso, o correto é “Vossa Excelência dirigiu com firmeza os trabalhos
da sessão de hoje”, porque se diz também “Você dirigiu com firmeza…”.
4. Essa substituição prática também vale para a concordância nominal, no
que concerne ao pronome possessivo: o correto é “Vossa Excelência
dirigiu com firmeza seus funcionários”, porque se diz também “Você
dirigiu com firmeza seus funcionários”.
5. Feitas essas ponderações, conclui-se que contraria os princípios de
concordância do pronome de tratamento o seguinte trecho de Rui
Barbosa: “… augustos lábios de Vossa Majestade; e, escutando-o com a
reverência devida à vossa posição…”. Corrija-se: “… augustos lábios
de Vossa Majestade; e, escutando-o com a reverência devida à sua
posição…”.
6. Acresce dizer que uma detida análise dos exemplos e das situações
demonstra que as regras de concordância do pronome de tratamento
(verbal ou nominal) não se confundem com o que alguns gramáticos
chamam de vós de cerimônia, que é o emprego do pronome vós (que é
segunda pessoa do plural) com referência a uma só pessoa, e isso por
polidez, para marcar a distância ou o apreço social. Exs.: a) “Bem, bem!
Escusai-me vós. Tendes razão, Duque.”; b) “Pai nosso, que estais no
céu…”.
7. Em exemplos dessa natureza, embora a conversa se dirija a uma só
pessoa, põe-se o tratamento como um todo – pronome, verbo, etc. – no
plural, em razão da reverência. Mas a concordância continua correta,
sem indevida mescla de natureza alguma.
Votarão ou Votaram?
1. Um leitor, narrando que tem lido modos de escrita que contrariam o que
ele aprendeu, pergunta como se deve escrever no futuro: “Amanhã os
congressistas votarão a matéria” ou “Amanhã os congressistas votaram
a matéria”?
2. Duas observações devem ser feitas para os verbos da primeira
conjugação (terminados em ar), quanto à terceira pessoa do plural do
futuro do presente do indicativo: a) são formas oxítonas (ou seja, a sílaba
forte é a última da palavra), e não paroxítonas (vale dizer, a sílaba forte
não é a penúltima da palavra); b) sua grafia é com ão no final, e não com
am.
3. Vejam-se os seguintes exemplos: a) “Amanhã os congressistas votarão a
matéria” (correto); b) “Amanhã os congressistas votaram a matéria”
(errado).
4. Para complementar a resposta e eliminar, de uma vez por todas, a dúvida
do leitor, também se fazem duas observações para esses mesmos verbos
da primeira conjugação (terminados em ar), na terceira pessoa do plural,
mas agora no pretérito perfeito do indicativo: a) são formas paroxítonas
(ou seja, a sílaba forte é a penúltima da palavra), e não oxítonas (vale
dizer, a sílaba forte não é a última da palavra); b) sua grafia é com am no
final, e não com ão.
5. Vejam-se os seguintes exemplos: a) “Os congressistas deixaram ontem
de votar aquela matéria importante” (correto); b) “Os congressistas
deixarão ontem de votar aquela matéria importante” (errado).
6. Apenas para refletir: a observação dos fatos demonstra que esse é um
erro cuja ocorrência vem crescendo com o passar dos tempos, bem
possivelmente devido à falta de cuidado com que vem sendo tratado o
ensino do português na educação de base.
Vou ir – É correto?
1. Um leitor pergunta se são corretas expressões como vou ir, ou vou indo.
2. Embora alguns teimem em tachar de errônea uma construção dessa
natureza, o certo é que, no plano da Gramática, não há nela erro algum.
3. E é importante perceber que não se trata de pleonasmo, nem muito
menos de pleonasmo vicioso, até porque os verbos não se repetem em
função, mas o primeiro deles é auxiliar, enquanto o outro é o principal da
locução.
4. O que pode parecer estranho para alguns é o fato de que o verbo ir, que é
auxiliar em diversas outras expressões representativas da ideia de futuro
mediante locução verbal – como vou trabalhar, vou fazer, vou pensar –
está sendo empregado, no caso, como auxiliar de si mesmo (ir [auxiliar]
+ ir [principal]).
5. E uma atenta análise mostra que situação idêntica se dá com outros
verbos, que também acabam sendo empregados como auxiliares de si
próprios em locuções verbais de mesma estrutura: há de haver, tinha
tido, vinha vindo. E, ao que se sabe, ninguém pensa em condenar tais
expressões, ou ver nelas algum sinal de equívoco gramatical.
6. Como sinal de seu emprego por poetas e cultores de nosso idioma, é
interessante verificar que Paulinho da Viola, na canção Sinal Fechado,
assim diz em um certo verso: “Eu vou indo, correndo, pegar meu lugar
no futuro”.
7. E Vinícius de Moraes, na canção Você e Eu, que fez em parceria com
Carlos Lyra, também assim pôs seus versos: “Podem preparar / Milhões
de festas ao luar, / Que eu não vou ir. / Melhor nem pedir, / Que eu não
vou ir, não quero ir”.
Vou-me já – Cacófato?
Ver Cacófato – O que é? (P. 163)
Vozes verbais
1. Voz do verbo, segundo ensino de Domingos Paschoal Cegalla (1990, p.
185-8), é a forma que este assume para indicar que a ação verbal é
praticada ou sofrida pelo verbo. Três são as vozes do verbo: a ativa, a
passiva e a reflexiva.
2. Um verbo está na voz ativa quando o sujeito é agente, isto é, pratica a
ação expressa pelo verbo. Ex.: “O caçador abateu a ave”. O sujeito da
oração (o caçador) é agente (ou ativo), ou seja, pratica a ação de abater.
3. Um verbo está na voz passiva quando o sujeito é paciente, isto é, sofre,
recebe a ação expressa pelo verbo. Ex.: “A ave foi abatida pelo
caçador”. O sujeito da oração (a ave) é paciente (ou passivo), ou seja,
sofre, recebe a ação descrita pelo verbo abater.
4. Na voz reflexiva o sujeito é ao mesmo tempo agente e paciente: faz uma
ação cujos efeitos ele mesmo sofre ou recebe. Ex.: “O caçador feriu-se”.
O sujeito da oração (o caçador) é agente (praticou a ação) e, ao mesmo
tempo, paciente (sofreu a ação).
5. Uma variante da voz reflexiva é a que denota reciprocidade, ação mútua
ou correspondida, usada com o verbo geralmente no plural, já que
envolve mais de um elemento. Ex.: “Os dois pretendentes insultaram-
se” (ou seja, insultaram um ao outro).
Ver Voz passiva e Pronome apassivador (P. 791) e Voz passiva sintética (P.
794).
Vultoso ou Vultuoso?
1. Vultoso tem o sentido de considerável, polpudo, robusto, volumoso. Ex.:
“Apesar de envolverem vultosas importâncias, os crimes de colarinho
branco são de difícil apuração”.
2. Não confundir com sua parônima vultuoso, que significa atacado de
vultuosidade, de inchaço, de congestão na face. Ex.: “Com a aparência
vultuosa há meses, nem assim ainda havia procurado auxílio médico”.
3. Assim, atente-se ao fato de que é errada a frase: “O ladrão subtraiu
vultuosa importância dos cofres daquele banco”.
4. A um consultante, que lhe indagava se poderia dizer “um roubo
vultuoso”, Silveira Bueno respondia de modo taxativo: “Não se pode
dizer tal porque vultuoso diz-se do rosto enfermo, do rosto que está
inflamado. O que se deve dizer é: roubo vultoso, isto é, de vulto, de
grande tamanho” (1938, p. 114).
5. Eliasar Rosa observa não ser raro o equívoco de “ver-se o cruzamento
que resulta do uso de vultuoso por vultoso” (1993, p. 143).
6. Ainda quanto ao emprego equivocado de vultuoso em lugar de vultoso,
lembra Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 269) que se trata de barbarismo
semântico.
7. Ronaldo Caldeira Xavier (1991, p. 85) caracteriza esse emprego de
vultuoso por vultoso – e vice-versa – como “cruzamento”, vale dizer,
como “o emprego de uma palavra em lugar de outra”, decorrente “da
falta de discernimento entre vocábulos assemelhados quanto à estrutura
fonológica (parônimos), o que motiva a alteração da mensagem
tencionada”, atentando contra a precisão terminológica”.
W
Writ – Estrangeirismo?
1. Por um lado, De Plácido e Silva leciona que tal vocábulo, vindo do
inglês, deve ser entendido como mandado, “e se aplica comumente ao
mandado de segurança e ao habeas corpus” (1991, p. 85).
2. Por outro lado, Geraldo Amaral Arruda combate seu uso em lugar de
mandado de segurança, já que constitui estrangeirismo desnecessário,
por haver no vernáculo vocábulo ou giro equivalente.
3. E, estendendo a mesma observação para mandamus, complementa tal
autor, de modo explícito, em lição para ambos: “tenho dúvidas de que
correspondam com inteira propriedade ao nosso mandado de segurança”
(ARRUDA, 1997, p. 19).
4. Aos que insistirem em seu emprego, deve-se observar que, por se tratar
de palavra pertencente a outro idioma, há de vir entre aspas, em negrito,
itálico, com sublinha ou grifo equivalente, indicador de tal circunstância.
X
Xampu
Ver Formação de adjetivos – Regras (P. 360) e Neologismo (P. 494).
Xerox ou Xérox?
1. Trata-se de vocábulo que tem sido empregado como sinônimo de
fotocópia, indicando cópias idênticas obtidas por sistema fotográfico
instantâneo, a partir de um documento original.
2. No plano histórico, lembram José de Nicola e Ernani Terra: “Trata-se da
marca registrada de uma máquina de reprodução gráfica. O nome
popularizou-se a tal ponto que a marca do produto passou a designar o
próprio produto e o sistema de reprodução (xerografia). Fenômeno
semelhante ocorreu com a marca Gillette, que passou a designar
qualquer lâmina de barbear”.
3. No campo gramatical, continuam tais autores: “A palavra admite dupla
pronúncia: xérox (como paroxítona terminada em x, recebe acento
gráfico) ou xerox (como oxítona, não recebe acento gráfico)”.
4. E complementam que “xérox, paroxítona, prende-se à pronúncia inglesa;
a forma oxítona xerox segue uma tendência do português falado no
Brasil” (NICOLA; TERRA, 2000, p. 236).
5. Luiz Antônio Sacconi (1979, p. 31) lhe confere a condição de
paroxítona, e, portanto, acentuada por força das regras específicas,
dando-lhe o gênero feminino, sob o argumento de que se trata de “a
xerocópia”.
6. Domingos Paschoal Cegalla (1999, p. 418) a considera “palavra de
acento prosódico vacilante”, acentuando que “a pronúncia que se vem
impondo é xerox (oxítona)”.
7. Já o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de determinar a
existência dos vocábulos em nosso idioma, além de sua grafia oficial e
de seu próprio comportamento no vernáculo, arrola-a entre as palavras
pertencentes ao nosso idioma e a aponta como substantivo de dois
gêneros (masculino e feminino) e lhe confere a possibilidade de
pronúncia como oxítona e como paroxítona, de modo que está
oficialmente autorizado o emprego de um xerox, uma xerox, um xérox,
uma xérox (2009, p. 850).
8. Observe-se, apenas para registro, que mais de acordo com a formação da
língua estaria a pronúncia paroxítona xérox, à semelhança de outros
vocábulos, como tórax, látex, sílex, córtex; neste caso, se se prefere a
pronúncia paroxítona, por força da 8ª alínea da observação n. 43 do
Formulário Ortográfico, recebe acento gráfico, uma vez que se sobrepõe
o acento agudo ao e aberto dos vocábulos paroxítonos que acabem em x.
9. Se se prefere a pronúncia oxítona, não há razão alguma para acento
gráfico.
10. À semelhança de outros vocábulos com mesma terminação, como
tórax, fica invariável no plural, que se faz pela mera alteração do
artigo: os xérox, as xérox, os xerox, as xerox.
11. Acrescente-se que o VOLP também já registra como palavras
incorporadas oficialmente a nosso idioma diversos de seus cognatos:
xerocação, xerocado, xerocador, xerocar, xerocável, xerocópia,
xerocopiar, xerocopista, xerografado, xerografar, xerografia,
xerográfico, xerógrafo, xeroxar.
XPTO
1. Pronunciado por soletração (xispeteó), para Alfredo Gomes, esse é um
dos mais curiosos casos de arcaísmos gráficos da língua portuguesa,
representado por letras gregas maiúsculas, correspondentes a uma forma
abreviada de Cristo, com as quais “se marcava na caixa competente o
excelente e superior vinho – Lacryma Christi”.
2. Ocorre, porém, que “o negociante e o povo, ignorantes da significação
dessa marca registrada, lembrando-se apenas de que tal gênero era
excelente, estenderam a denominação XPTO do vinho a todos os
gêneros igualmente superiores: donde o absurdo de dizer-se carne seca
XPTO, bacalhau XPTO, etc., para significar a carne seca superior, o
bacalhau finíssimo”.
3. E finaliza o citado gramático: “insensivelmente entrou a expressão
errada na língua corrente” (GOMES, 1924, p. 279-80).
4. Artur de Almeida Torres (1966, p. 234) refere, de igual modo, sua
origem na linguagem popular, assinalando tratar-se da abreviatura de
Cristo, também relacionando tal palavra ao mencionado vinho, que a
usava em suas caixas, e lhe confere o significado daquilo que é de ótima
qualidade.
5. E o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, veículo oficial indicador das palavras existentes em
nosso idioma, registra esse vocábulo entre as reduções mais correntes,
com a acepção de “excelente, magnífico, sem-par” (VOLP, 2009, p.
877).
Z
Zero grau ou Zero graus?
Ver Zero hora (P. 797).
Zero hora
1. Com razoável frequência, ouvem-se expressões equivocadas, como zero
horas, zero graus, zero quilômetros.
2. A esse respeito, assim observa Laurinda Grion: “Quando precedidos de
zero, os vocábulos quilômetro, hora, dia ou qualquer outro
discriminativo de unidade de medida ficam no singular”.
3. Acrescenta tal autora que “zero não encerra pluralidade nem na forma
nem na significação”.
4. Por fim, com base em lição de Domingos Paschoal Cegalla e Napoleão
Mendes de Almeida, ela própria continua: “Digamos sem receio:
‘Participei à zero hora’. ‘Comprarei um carro zero-quilômetro’. ‘O
computador gera uma fila de saída zero erro…’. ‘As tarifas postais
estão mais caras desde a zero hora de hoje’. ‘O horário de verão
começou à zero hora de 16/10/94 e terminou à meia-noite de 18/2/95’”
(GRION, s/d, p. 94).
Ver Zero-quilômetro (P. 798).
Zero-quilômetro
1. Domingos Paschoal Cegalla, grafando a expressão com hífen, confere-
lhe a natureza de adjetivo.
2. E, em continuação, observa tal autor que tal adjetivo é invariável:
automóvel zero-quilômetro, automóveis zero-quilômetro (CEGALLA,
1999, p. 420).
3. Corroborando esse entendimento, o Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, veículo oficial indicador
das palavras existentes em nosso idioma, bem como de sua grafia e
comportamento, além de grafar com hífen tal palavra, registra-a como
adjetivo e ainda lhe confere ambos os gêneros e ambos os números, o
que equivale a dizer que a considera invariável (2009, p. 856). Vale
dizer: a) carro zero-quilômetro; b) bicicleta zero-quilômetro; c) carros
zero-quilômetro; d) bicicletas zero-quilômetro.
Ver Zero hora (P. 797).
SÍMBOLOS E SINAIS
&
’
1. Trata-se de um sinal gráfico em forma de vírgula suspensa, denominado
apóstrofo, que indica a supressão de letra ou letras.
2. O Formulário Ortográfico, aprovado unanimemente pela Academia
Brasileira de Letras, na sessão de 12/8/1943, ao estipular as instruções
para a organização do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa,
estabeleceu limites rígidos, em expressa dicção do item 44, a fim de que
seu emprego apenas se dê nos seguintes casos: a) indicar a supressão de
uma letra ou letras no verso, por exigência da metrificação (c’roa,
esp’rança, of’recer, ‘star); b) reproduzir certas pronúncias populares
(‘tá, ‘teve); c) indicar a supressão da vogal, já consagrada pelo uso, em
certas palavras compostas ligadas pela preposição de (copo-d’água, pau-
d’água, pau-d’alho, pau-d’arco).
3. De conformidade com observação acrescida ao referido item pelo
próprio Formulário Ortográfico, restringe-se o apóstrofo a esses casos
discriminados, de modo que não será permitido seu uso em nenhuma
outra hipótese, e, assim, seu emprego é vedado nos seguintes casos: a)
em contrações das preposições de ou em com artigos, adjetivos,
pronomes e advérbios (aqui-del-rei, duma, numa, dalguma, nalgum,
daqui, dele, nele, naquele, naquilo, daí, donde); b) nas combinações dos
pronomes pessoais (mo, ma, mos, mas, to, ta, tos, tas, lho, lha, lhos,
lhas, no-lo, vo-lo); c) nas expressões vocabulares que se tornaram
unidades fonéticas e semânticas (dessarte, destarte, homessa, tesconjuro,
vivalma); d) nas expressões de uso constante e geral na linguagem
vulgar: co, coa, cos, coas (com + o, com + a, com + os, com + as), pro,
pra, pros, pras (para o, para a, para os, para as).
4. Em decorrência dessa observação final do Formulário Ortográfico,
conclui-se que descabido é o intento manifestado por alguns gramáticos
de evitar o parequema (colocação de uma sílaba ao lado de outra de
mesmo som, como em gado doente, pato tonto, coxa chata) que se dá
com a palavra uma, quando se une a um substantivo iniciado pela sílaba
ma (uma matéria, uma manhã, uma mata, uma madeira), até porque, a
par da determinação legal proibitiva, a prática, em casos que tais, de
suprimir o m e colocar apóstrofo, sobretudo nos dias de hoje, peca pela
base, por sua artificialidade, constituindo invencionice a ser evitada, não
se podendo olvidar que alguns acabam chegando ao exagero de assim
proceder em casos nos quais não haveria problema de pronúncia em
nenhuma hipótese, como é o caso de u’a pessoa.
5. Em conselho válido para os dias atuais, decorrente da própria
determinação legal, se não houver possibilidade de contorno do
problema, escreva-se e pronuncie-se normalmente uma matéria, uma
manhã, uma mata, uma madeira, até porque, reforce-se, a outra solução
que alguns preconizam, além de sua ilegalidade gramatical, prejudica a
naturalidade e desfigura a pronúncia da palavra, sem realmente atingir o
objetivo.
6. Em ensino bastante apropriado para os dias de hoje, leciona Domingos
Paschoal Cegalla acerca de ua e u’a: “Evitem-se estas formas artificiais,
mesmo diante de palavras que possam gerar cacófatos. É preferível
grafar, por exemplo, uma mão, uma mata a escrever ua (ou u’a) mão, ua
mata” (1999, p. 403).
7. Por fim, é importante não confundir apóstrofo, que é o sinal em
observação, com apóstrofe, que é recurso de retórica, pelo qual o orador
ou escritor, fazendo ou não uma interrupção em sua fala ou texto, dirige-
se a seres reais ou fictícios. Exs.: a) “Andrada! arranca esse pendão dos
ares! / Colombo! fecha a porta dos teus mares!” (Castro Alves); b) “E
vós, Tágides minhas, … / Dai-me agora um som alto e sublimado!”
(Camões).
“”
1. São as aspas, ou aspas duplas, ou aspas dobradas, do gótico haspa,
também conhecidas por comas ou vírgulas dobradas (às vezes em forma
de cunhas), sinais cujo uso mais comum é abrir e fechar citações. Ex.:
Deu nos jornais: “O articulista defende, como forma de melhoria nas
relações jurídicas, uma globalização das leis”.
2. Importante é observar que, se o sinal de pontuação pertence à citação,
fica ele dentro das aspas, como o ponto de interrogação no seguinte
exemplo: Por que você não disse “Eu vou?”.
3. Se, porém, o sinal de pontuação pertence ao autor, fica ele depois das
aspas, como é o caso do ponto final no seguinte exemplo. Ex.: Como já
dizia Hipócrates, traduzido por Sêneca, “a arte é longa, e a vida é
breve”.
4. Na síntese de Celso Cunha, “quando a pausa coincide com o final da
expressão ou sentença que se acha entre aspas, coloca-se o competente
sinal de pontuação depois delas, se encerram apenas uma parte da
proposição; quando, porém, as aspas abrangem todo o período, sentença,
frase ou expressão, a respectiva notação fica abrangida por elas” (1970,
p. 284).
5. Para Luiz Antônio Sacconi, “o ponto vem após as aspas”, se “não foram
estas que deram início ao período”. Ex.: Napoleão disse: “Do alto destas
pirâmides quarenta séculos vos contemplam”.
6. E complementa tal autor (SACCONI, 1979, p. 244-8) com a observação
de que “as aspas aparecem depois da pontuação somente quando
abrangem todo o período”: “O Brasil espera que cada um cumpra o seu
dever”.
7. Interessante lembrete ainda vem do mesmo gramático acerca dos trechos
de outros autores, empregados, por exemplo, na elaboração dos
arrazoados jurídicos: “se a citação ou a transcrição não começar com a
palavra inicial, colocar-se-ão reticências logo após a abertura das aspas.
Da mesma forma, devem ser usadas as reticências no final, antes do
fechamento das aspas, se a intenção é não terminar a referida citação ou
transcrição” (SACCONI, 1979, p. 247).
8. Ainda sobre as aspas, assim se expressa Josué Machado: “Quando a
pausa coincide com o final da expressão ou sentença que se acha entre
aspas, coloca-se o competente sinal de pontuação depois delas, se
encerram apenas uma parte da proposição; quando, porém, as aspas
abrangem todo o período, sentença, frase ou expressão, a respectiva
notação fica abrangida por elas” (1994, p. 66).
9. Para a ordem de colocação entre as aspas e o ponto, Cândido de Oliveira
(1961, p. 67) estabelece duas regras: a) “Primeiro ponto final e por
último aspas, se toda a declaração (o período inteiro, da maiúscula inicial
ao ponto final) estiver entre aspas”; b) “Primeiro aspas e depois ponto
final, se somente a parte derradeira do período receber aspas”.
10. Palavras e expressões estrangeiras também devem vir entre aspas,
permitindo-se também explicitar tal circunstância com o uso de grifo
equivalente, sublinha, itálico ou negrito. Ex.: O magistrado negou
liminar ao pedido, fundado na inexistência do “periculum in mora”.
11. Veja-se, no sentido dessa última lição, o ensino de Eduardo Carlos
Pereira em corroboração ao fato de se escreverem “sublinhadas ou em
grifo as palavras de língua estrangeira, que se intercalam no discurso”
(1924, p. 48).
12. Artur de Almeida Torres (1966, p. 245) também observa a
possibilidade de emprego das aspas, “quando se deseja chamar a
atenção do leitor para certos vocábulos que devem ser postos em
evidência”: Aquele “sim” me confortou.
13. Ensina, ainda, Luciano Correia da Silva que “não se usam aspas nas
atribuições nominais ou dos epônimos: Fundação Roberto Marinho,
Rodovia Castelo Branco, EEPSG Horário Soares, Fundação
Educacional Miguel Mofarrej, Fórum João Mendes Júnior”.
14. Em critério aparentemente diverso, todavia, em outra passagem, manda
o mesmo autor que se usem tais sinais “em nomes de livros, jornais,
obras de arte…”, como, por exemplo, “Folha de S. Paulo” (SILVA, L.,
1991, p. 179-97).
15. Reitere-se, por fim, ensino já expresso, em observação de Hêndricas
Nadólskis e Marleine Paula Marcondes Ferreira de Toledo (1998, p.
51): em tais hipóteses, em vez de empregar aspas, pode-se optar pelo
destaque gráfico do negrito ou do itálico, a que se pode acrescer
também a sublinha. Exs.: a) A notícia saiu na “Folha de S. Paulo”
(correto); b) A notícia saiu na Folha de S. Paulo (correto); c) A notícia
saiu na Folha de S. Paulo (correto); d) A notícia saiu na Folha de S.
Paulo (correto).
Ver Parênteses e Ponto (P. 550).
‘’
1. Verificada a questão, resolvida logo antes, das aspas dobradas, também
conhecidas por comas ou vírgulas dobradas (“ ”), anota-se que as aspas
simples (‘ ’) não divergem das primeiras referidas, assim em natureza
como em uso.
2. E, para resumir o emprego de tais aspas simples, basta observar que o
que normalmente se emprega são as aspas dobradas; quando, porém,
dentro do trecho já entre aspas, há necessidade de novas aspas, estas são
simples (NADÓLSKIS; TOLEDO, 1998, p. 51). Exs.: a) Deu nos
jornais: “O articulista defende, como forma de melhoria nas relações
jurídicas, uma assim chamada ‘globalização’ das leis”; b) Consta
textualmente da decisão: “Nega-se liminar ao pedido, ante a
inexistência do ‘periculum in mora’”.
*
1. A palavra asterisco, do grego asteriskos, pelo latim asteriscu, significa
etimologicamente uma estrelinha, que é exatamente o que dá a entender
seu desenho.
2. Destina-se aos mais variados empregos: indicar uma nota no pé da
página, ou no fim do capítulo, ou no fim do volume; fazer ver a
existência de uma supressão no trecho que se transcreve; substituir um
nome que não se quer mencionar.
3. Atente-se para sua pronúncia, a fim de não se dizer asterístico, forma de
muito uso, mas efetivamente equivocada e sem registro nesse sentido no
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira
de Letras, órgão incumbido por lei de listar as palavras pertencentes a
nosso léxico.
¸
1. O nome desse sinal é cedilha, diminutivo, em português, da forma
espanhola ceda, a qual, nos dizeres de Napoleão Mendes de Almeida
(ALMEIDA, 1981, p. 51), “é hoje representada por um pequeno c virado
para trás, que se sotopõe ao c, que então se denomina cê-cedilhado”.
2. No que concerne a seu uso, importante é observar que apenas é possível
empregar o cê-cedilhado quando o c tem som de ss antes de a, o e u
(caçar, caçoar, açúcar), jamais antes de e ou de i (cacemos, cacique).
3. Em termos práticos, também é de se ver que, nos verbos da primeira
conjugação terminados em çar, o c perde a cedilha antes do e: abrace,
cacemos; por outro lado, por idêntico motivo, nos verbos da segunda
conjugação terminados em cer, o c recebe cedilha antes de a e de o:
mereça, apareço.
4. Atento ao aspecto de que cedilha é substantivo e que o adjetivo é
cedilhado, acrescenta o saudoso gramático que “não se deve dizer cê-
cedilha” (ALMEIDA, 1981, p. 51).
5. Todavia o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia
Brasileira de Letras, veículo oficial indicador das palavras existentes em
nosso idioma, além de cedilha, também registra cê-cedilha e cê-
cedilhado, de modo que o emprego de tais formas também está
legalmente autorizado (VOLP, 2009, p. 174).
ANEXO
Uso do hífen com base no prefixo e na letra inicial da palavra seguinte
Legenda
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