Agradecemos ao comite organizador deste Colo quio, os membros do mesmo:
Apre s-Coup Psychoanalytic Association de New York, em colaboraça$ o com Associaça$ o Psicanalítica de Porto Alegre, Escuela Freudiana de Buenos Aires e Escuela de Psicoana lisis Sigmund Freud de Rosario, pelo esforço e entusiasmo colocados na realizaça$ o deste encontro, o que permite, mesmo nas circunsta ncias atuais, que o Movimento continue. Quando comecei a escrever as palavras que agora compartilho com voce s, devido a um erro, mudei a ordem das palavras no título do Congresso, ao inve s de "Bordas: psicana lise e deslocamento", foi-me imposto o seguinte lapsus: "Psicana lise, bordas e deslocamento". Seguindo o exemplo freudiano, na$ o quis desconsiderar esta nova afirmaça$ o, e foi isso que orientou estas palavras. Como laço social, a psicana lise nos permite estabelecer uma diferença entre dia logo e discurso, levando, neste u ltimo caso, ao que na$ o vai, ao que na$ o fecha. O encontro entre analista e analisante na$ o e dialo gico, ainda que pareça ser, devido a presença de um sujeito. Esta particularidade significa que, ao contra rio de outros discursos predominantes da e poca, a pra tica analítica permite, por sua pro pria estrutura, um lugar para a diferença. Um lugar inaugural para o surgimento de um sujeito. Esta habilitaça$ o e este lugar em que um sujeito pode surgir, entendo que eles constituem a aposta e a contribuiça$ o que nossa pra tica oferece face aos desafios do tempo presente. Ha uma frase que transcende como ma xima quando sa$ o apresentados os desafios da psicana lise em cada e poca. Todos nos lembramos do que Lacan propo$ e nos "Escritos": "Que antes renuncie a isso, portanto, quem na$ o conseguir alcançar em seu horizonte a subjetividade de sua e poca". Mas para grafos depois, ele acrescenta: "Que ele conheça bem a espiral a que o arrasta sua e poca na obra contínua de Babel, e que conheça sua funça$ o de inte rprete na disco rdia das linguas". Esta segunda frase, a meu ver, da -lhe um significado diferente da primeira, pois nos permite pensar sobre ela sem que pareça um imperativo. Tambe m e interessante, neste caso, tomar o significado da espiral em matema tica: e uma curva que começa em um ponto central e se afasta progressivamente do centro enquanto gira em torno dele. Quando Lacan afirma que a e poca arrasta o analista para a disco rdia das línguas, compreende-se que sua funça$ o - a do analista - na$ o e apenas considerar a subjetividade de sua e poca como um horizonte, mas tambe m ser um inte rprete na disco rdia das línguas. Entendo que e uma forma de dizer que Lacan expressa que temos que ser prevenidos do risco de afetar a Psicana lise em sua estrutura, gerando deslocamentos em termos que pertencem a outros discursos. Atualmente, as chamadas diversidades sexuais ou disside ncias de ge nero levantam questo$ es relacionadas a sua problema tica sobre a "identidade sexual". Estes coletivos sociais na$ o so conformam uma forma de vinculaça$ o na comunidade, mas tambe m representam uma forma de laço, um discurso, porque se fala "dele", e este discurso produz incide ncias nas esferas política, social e jurídica. E9 a partir desta posiça$ o discursiva que sa$ o feitas as demandas a psicana lise. A atualidade do assunto em reunio$ es, confere ncias e encontros de psicanalistas mostra claramente que o assunto nos preocupa e nos ocupa. A interlocuça$ o surge com outros discursos que, embora lidando com aspectos comuns aos de nosso campo, geralmente levantam críticas aos postulados psicanalíticos, particularmente no que diz respeito a relaça$ o entre os sexos. Embora seja verdade que discursos como as teorias de ge nero sa$ o efeitos, entre outros fatores, do impacto cultural que no se culo passado implicou a descoberta freudiana do inconsciente, uma interlocuça$ o entre esses discursos e o da psicana lise parece difícil no presente. Em uma entrevista em 2006, Joan Copjec diz que falar sobre sexualidade sem falar sobre psicana lise e como querer tirar uma fotografia sem uma ca mera. Uma frase interessante, mas pouco mais de uma de cada depois vemos que muitas fotos surgiram em relaça$ o a s sexualidades, que parecem ter sido tiradas sem essa ca mera. A ause ncia de uma argumentaça$ o que sustente a profusa$ o de ro tulos dentro do discurso de ge nero e a exige ncia o supereu de cobrir todo o campo fenomenal da sexualidade humana faz com que o discurso de ge nero se torne mais moralizante do que e tico. A confusa$ o e enta$ o produzida pela na$ o distinça$ o entre o que e classificado e a lo gica a partir da qual esta operaça$ o e executada, ja que as listas que categorizam todas as possibilidades, incluem a enumeraça$ o das identidades de ge nero, das pra ticas sexuais, das orientaço$ es sexuais, entre outras. Estes discursos, embora sejam poderosos em seus efeitos, que lugar deixam para o sujeito, como a psicana lise o entende? Ou seja, o sujeito dividido entre um saber na$ o sabido e uma meia - verdade, pela pro pria estrutura que o engendra. Como exemplo destas questo$ es relacionadas a s diferenças entre a psicana lise como pra tica discursiva e os discursos de ge nero, vou tomar um breve corte clínico de um jovem que iniciou o caminho de produzir uma mudança de sexo. Algumas questo$ es que o jovem levanta em relaça$ o ao ge nero sa$ o anteriores ao início da ana lise. O jovem propo$ e uma linguagem críptica em suas histo rias, extraída dos discursos predominantes da LGTB sobre questo$ es de ge nero. De maneira semelhante, extraído do discurso da cie ncia, ele começa um relato detalhado dos efeitos que as drogas psicotro picas produzem nele. Neste cruzamento de saberes, ele se define como um "menino transexual na$ o bina rio", com um processo de tratamento hormonal em curso. Ele comenta que anteriormente, quando era menina, ele tinha um parceiro homossexual e que naquela e poca ele estava distante da masculinidade por causa de algo negativo. O negativo o coloca em um jogo sexual na infa ncia com dois primos. O aspecto trauma tico deste jogo esta localizado no lado de uma demanda que foi feita dele naquela e poca, porque este jogo começa com a pergunta de seu primo: "Eu tenho isto, o que voce tem?" Nas entrevistas ele diz que sentiu vontade de te -la, o que talvez nos permita entender a forma de resposta que encontrou para a questa$ o da diferença sexual. Uma forma de resposta tirada por palavras de um discurso que na$ o era seu pro prio. E9 assim que ele chama os homens de "masculinidades", acreditando que desta forma ele consegue evitar a diferença sexual, pois ele pensa que sabe que a palavra "homem" e a que o refere a diferença. Algo semelhante acontece com a palavra "mulher". As palavras homem-mulher sa$ o as palavras que ele evita porque sa$ o os significantes da diferença sexual. Toma -las como palavras, e na$ o como significantes, permite que ele tenha a certeza de poder ser uma mulher como gostaria, e sobre isso ele fundamenta o que chama de sua declaraça$ o de sexo. E9 assim que se define como um "garoto gay", habitando uma feminilidade dissidente. Uma decisa$ o que o faz pertencer a um sexo que na$ o esta de acordo com seu corpo anato mico. Do efeito trauma tico do jogo sexual com os primos e deste encontro com a falta, surgiu o desejo de encontrar uma mudança de sexo, levando o discurso de ge nero a encontra -lo e o discurso me dico a reafirma -lo. Neste ponto, parece evidente a desorientaça$ o que se produz ao tomar os postulados de um discurso como verdade, quando a verdade esta do lado da diferença sexual, que e real. Acreditando encontrar uma argumentaça$ o que apaga a diferença sexual, ele tira algo dos discursos predominantes, na$ o percebendo ainda que esse apagamento e um produto dos discursos que ele usa. Na$ o e pro prio, pois na$ o abre espaço para o discurso do inconsciente como saber na$ o sabido. Cada ser falante, pelo fato de falar enfrentara , em algum momento, a decisa$ o por um ou outro sexo. As vicissitudes subjetivas que se apresentam a este jovem, em sua tentativa de conseguir uma mudança de sexo, sa$ o sustentadas por postulados discursivos, tais como os de ge nero, como se estes pudessem proporcionar um ponto de apoio para resolver as questo$ es relacionadas a sua sexualidade. Embora a "declaraça$ o de sexo" que este jovem afirma na$ o impeça a suposiça$ o de um sujeito que fala, encontramos algue m que, paradoxalmente, declara seu ge nero ao Linguagem custo de se manter fora da língua - e da interdiça$ o do gozo - os significantes da diferença, deslocando a diferença sexual para a diferença de ge nero. A "disco rdia das línguas" testa a disposiça$ o de escutar e a psicana lise como um discurso que se interroga a si mesmo.
Resposta À Intervenção de Paul B. Preciado - Jean-Claude Maleval Resposta À Intervenção de Paul B. Preciado Na 49 Jornada Da Escola Da Causa Freudiana Jean - Claude Maleval