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CONHECENDO A VIDA DO SOLO

Meso
VO LUME 3

fauna
© 2017 by Maíra Akemi Toma, Rogério Custódio Vilas Boas e Fatima Maria de Souza Moreira
Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida, por qualquer meio ou forma,
sem a autorização escrita e prévia dos detentores do copyright.
Direitos de publicação reservados à Editora UFLA.
Impresso no Brasil – ISBN: 978-85-8127-067-8

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Ficha Catalográfica Elaborada pela Coordenadoria de


Produtos e Serviços da Biblioteca Universitária da UFLA

Mesofauna / editores: Maíra Akemi Toma, Rogério Custódio Vilas Boas


e Fatima Maria de Souza Moreira – Lavras :
Ed. UFLA, 2017.
32 p. : il. (Conhecendo a vida do solo ; v. 3)

ISBN: 978-85-8127-067-8

1. Biodiversidade. 2. Organismos do solo. 3. Serviços


ambientais. I. Toma, Maíra Akemi. II. Boas, Rogério Custódio Vilas.
III. Moreira, Fatima Maria de Souza. IV. Universidade Federal de Lavras.
V. Título.

CDD – 631.4
CONHECENDO A VIDA DO SOLO

VO LU M E 3

Meso
fauna

Lavras, Minas Gerais


2017
EDITORES
Maíra Akemi Toma
Universidade Federal de Lavras | mairakemi@gmail.com

Rogério Custódio Vilas Boas


Universidade Federal de Lavras | rogeriovilas@gmail.com

Fatima Maria de Souza Moreira


Universidade Federal de Lavras | fmoreira@dcs.ufla.br

AUTORES
Leopoldo Ferreira de Oliveira Bernardi
Universidade Federal de Lavras | leopoldobernardi@gmail.com

Lívia Dorneles Audino


Universidade Federal de Lavras | livia.audino@gmail.com

Patrícia de Pádua Marafeli


Universidade Federal de Lavras | paduamara@yahoo.com.br

Thiago Alves Ferreira de Carvalho


Universidade Federal de Lavras | thiagoafcarvalho@gmail.com

REVISÃO TÉCNICA
Paulo Rebelles Reis
Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais – EPAMIG Sul de Minas/EcoCentro
paulo.rebelles@epamig.ufla.br

REVISÃO DE TEXTO
Paulo Roberto Ribeiro

PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO


Miriam Lerner | Equatorium Design

CRÉDITOS DAS IMAGENS


Andy Murray: p. 18
Cintia Carla Niva: p. 30
David Fenwick: p. 16
Dragisa Savic: p. 27
David Walter: p. 6
Felipe França: pp. 8, 11, 13, 15, 17, 19, 21, 32
Leopoldo Ferreira de Oliveira Bernardi: pp. 4, 7, 8, 9, 24
Maíra Akemi Toma: pp. 9, 28
Pexels: p. 28
Shutterstock/ © keko-ka: p. 25
Shutterstock/ © Rainer Fuhrmann: p. 25
Shutterstock/ © Jiri Prochazka: p. 25
Shutterstock/ © Mirko Graul: p. 25
Shutterstock/ © Honza Krej: p. 28

Agradecemos às agências de fomento:


O que é a
mesofauna
do solo?
A mesofauna de solo é um con-
junto de pequenos seres vivos
que apresentam tamanho corporal
ção, e seus nomes e formas podem
ser inteiramente novos para a maio-
ria das pessoas. Entre os grupos de
entre 0,2 e 2,0 milímetros. Ou seja, organismos que compõem a meso-
são organismos de tamanho bastan- fauna de solo, estão os ácaros (Acari),
te reduzido, e que, muitas vezes, não colêmbolos (Collembola), palpigra-
podem ser vistos a olho nu, sendo dos (Palpigradi), proturas (Proturos),
necessário o uso de instrumentos de paurópodos (Pauropoda), dipluras
aumento para sua observação, tais (Dilpura), enquitreídeos (Enchytraei-
como lupas e microscópios. da) e sínfilos (Symphyla). Os ácaros,
Devido ao pequeno tamanho, enquitreídeos e os colêmbo­los são
muitos desses seres vivos são desco- grupos comumente en­contrados e
nhecidos da maior parte da popula- em maior abundância no solo.

V O L U ME 3E 3
A B

C D

E F

Exemplos de colêmbolos (A e B) e ácaros (C, D, E e F).

4 VOLUMVMLEO 3 4 A E3 EO C OBO
Importância
da mesofauna
P or apresentarem tamanho cor-
poral semelhante e viverem no
solo, esses organismos encontram-se
Entre os benefícios promovidos
por esses organismos, podem-se ci-
tar: o controle de pragas e parasitas,
em um mesmo grupo, o da mesofau- revolvimento do solo, auxílio na ci-
na edáfica; porém, eles apresentam clagem de nutrientes e incorporação
formatos e estilos de vida completa- de matéria orgânica no solo.
mente distintos. Alguns deles podem Nas camadas iniciais do solo, prin-
ser predadores, outros se alimentam cipalmente nos primeiros 15 cm, on­
de matéria orgânica em decomposi- de é encontrada a grande maioria
ção, alguns podem saltar e outros ter dos organismos pertencentes à me­
a capacidade de revolver o solo. Todos sofauna, existe uma gran­de quantida-
esses organismos juntos e essa grande de de raízes e matéria or­gânica mor­ta
diversidade de estilos de vida auxiliam (folhas, troncos, animais mortos, en-
na manutenção da qualidade do solo, tre outros), que constituem o princi-
trazendo benefícios para o ecossiste- pal recurso, a base da cadeia alimentar
ma no qual são encontrados. da qual fazem parte os organismos
da mesofauna edáfica. Poucos são os
Fauna edáfica: é o conjunto de organismos encontrados em camadas
organismos que vivem no solo. A mais profundas, pois além de apre-
palavra “edáfico” é originária do sentar pouco alimento, são bastante
grego, derivada do termo “edá-
fos”, que significa solo ou terra.
compactadas, o que dificulta a loco-
moção da maior parte dessas espécies.

V O L U ME 3E 5
Ácaros
O s ácaros são organismos per­
tencentes ao grupo dos que-
licerados (o mesmo onde se en-
Apresentam tamanho bastante re­
duzido, geralmente entre 0,08 e 1
milímetro, mas em alguns casos, po-
contram as aranhas e escorpiões). dem atingir mais de 0,5 centímetro.

6 VOLUMVMLEO 3 4 A E3 EO C OBO
Hábitos alimentares
O hábito alimentar desse grupo é micro-organismos, e até mesmo,
o mais diversificado entre os que- em alguns casos, podem ser oní-
licerados. Algumas espécies são voros, alimentando-se tanto de
predadoras, outras parasitas de outros organismos como de maté-
plantas ou animais, alguns podem ria orgânica em decomposição ou
se alimentar de matéria orgânica e partes de vegetais vivos.

CU RI OS ID AD ES :
stas
Flo re st a Am az ôn ica e, principalmente, em flore
Na
as da Eu ro pa , os or ib at ídeos (um grupo específico
temperad nsidades
ác ar os ) po de m se r en contrados em grandes de
de tro
de nd o ch eg ar at é a 10 0.000 espécimes por me
no solo, po dos os
ad ra do . Ele s po de m re presentar até 95% de to
qu
em determinados locais.
invertebrados presentes

V O L U ME 3E 7
Características morfológicas
Uma característica interessante dos Observe na figura abaixo a estru-
ácaros é que todos apresentam os tura corporal de um ácaro:
segmentos do corpo fundidos (não A. Quelíceras
sendo possível distinguir o cefalo- B. Palpos
tórax do abdômen, tal como nas C. Pernas
aranhas), sendo essa a principal ca-
racterística que difere os ácaros dos
outros aracnídeos.
A maioria dos ácaros adultos tem
um par de quelíceras, localizadas na
porção frontal. Abaixo delas, locali-
zados lateralmente, existem um par
de palpos. No corpo, podem ser vis-
tos quatro pares de pernas.

Cefalotórax: cabeça fundida com o


tórax, não é possível distinguir os dois.

Ciclo de vida
O ciclo de vida dos ácaros é bastan-
te variado, mas é constituído basi-
camente de: a) ovo; b) uma fase de
larva com 3 pares de pernas; c) uma
a três fases de jovens com 4 pares de
pernas (que se chamam protonin-

8 CON HECEND O A V I DA D O SOLO


fa, deutoninfa e tritoninfa, sendo apresenta 4 pares de pernas, mas é
a última ausente em alguns grupos a única fase do ciclo de vida capaz de
de ácaros) d) adulto, que também se reproduzir.

Muitos cupins constroem suas casas utilizando o solo, matéria orgânica e


uma excreção que podemos chamar de saliva. Devido ao seu formato, ofere-
cem proteção das intempéries (como chuvas fortes, frio, calor), por isso os
cupinzeiros acabam por se tornar um local atrativo, e podem vir a abrigar
outras espécies que acabam vivendo em simbiose com os cupins. Um dos
organismos que são encontrados dentro dos cupinzeiros e interagem dire-
tamente com os cupins, são os ácaros!
São muitas as espécies de ácaros que podem ser encontradas dentro dos
cupinzeiros, algumas são parasitas, se alimentando nos cupins, outras são
oportunistas, e se alimentam dos restos gerados pelas colônias, e algumas
podem ajudar na limpeza dos cupinzeiros, se alimentando de fungos que
crescem dentro destes locais. Mas são poucos os estudos que tentam des-
vendar as causas e as consequências dessas associações, e ainda sabemos
muito pouco sobre a relação entre estas espécies.

Simbiose: é um termo geral utilizado para de-


signar que duas espécies convivem intimamen-
te associadas, tendo seus corpos em contato,
muitas vezes durante toda a vida.

M E S O FAU N A 9
Reprodução
A reprodução dos ácaros pode se da fêmea. Na forma assexuada, o
dar de duas formas: a sexuada e a ovo gera um novo espécime sem ter
assexuada (partenogenética; desen- sido fecundado. Essa última forma
volvimento do óvulo sem fecunda- é bastante vantajosa, pois apenas
ção). A forma sexuada ocorre quan- uma única fêmea, ao chegar em um
do existe troca de gametas, ou seja, determinado local, pode estabelecer
o espermatozoide fecunda o óvulo uma nova população.

Importância dos ácaros no


ecossistema solo
Apesar de pequenos, os ácaros têm capazes de controlar pragas agríco-
grande importância para os solos. las, e outros organismos prejudiciais
Eles são responsáveis pela fragmen- ao ser humano e as suas culturas
tação de boa parte da matéria or- agrícolas.
gânica morta, acelerando a decom- Algumas espécies de ácaros são
posição e a ciclagem de nutrientes predadores vorazes, capazes de se ali-
realizada pelos fungos e bactérias. mentar de centenas ou até milhares
Com o aumento no interesse so- de outros organismos vivos e seus
bre os organismos presentes no solo, ovos. Assim, os ácaros estão sendo
têm-se descoberto mais detalhes estudados para que possam ser uti-
sobre as funções dos ácaros nesses lizados como predadores, capazes
ecossistemas. Uma das descobertas de controlar pragas de plantas, como
que tem gerado bastante interesse algumas espécies de nematoides (pe-
por parte dos pesquisadores é a res- quenos vermes capazes de atacar as
peito dos ácaros como organismos raízes das plantas prejudicando seu

10 CON HECEND O A V I DA D O SOLO


crescimento e causando até a morte mas sabe-se que grande parte des-
delas), ou então auxiliar no controle sas desconhecidas espécies estão
de moscas, como a mosca-do-chifre presentes no solo, desempenhando
(as larvas destas moscas se desenvol- inúmeras funções.
vem no solo e esterco de bovinos, e
podem servir de alimento para algu-
C U R IO S ID A D E :
mas espécies de ácaros).
Infelizmente sabe-se muito pou- Alguns ácaros e
ncontrados na
Floresta Amazô
co a respeito dos ácaros. Atualmen- nica são resiste
inundações, e p ntes a
te se conhecem cerca de 50 mil es- odem passar até
dias submersos 250
pécies; entretanto, as estimativas em água doce,
sendo necessári não
mostram que o número pode passar o voltar em nenh
momento à supe um
de 1 milhão. Muito ainda está para rfície.
ser descoberto sobre esse grupo,

M E S O FAU N A 11
Palpígrados
O s palpígrados são pequenos
aracnídeos esbranquiçados
e cegos que vivem principalmen-
público leigo, quanto pelos cien-
tistas. Eles são raramente encon-
trados, e, no Brasil são conhecidas
te no solo e em meio a detritos. cerca de dez espécies.
São pouco conhecidos tanto pelo

Características morfológicas
Por pertencerem à Classe Chelice- comprimento do corpo do animal.
rata, seu corpo é composto de uma Esse flagelo provavelmente apresen-
porção anterior (cefalotórax) e pos- ta função sensorial.
terior (abdômen). Na porção an- Nos palpígrados, o primeiro par
terior, estão localizados um par de de pernas não é utilizado para lo-
palpos, um par de quelíceras e 4 pa- comoção. Esse membro tem função
res de pernas. Na porção posterior, semelhante à das antenas, pois nele
se encontram os órgãos sexuais, e estão localizados órgãos sensoriais
um longo flagelo, que pode atingir que auxiliam o organismo a reco-
um tamanho igual ou maior que o nhecer e “sentir” o meio ao redor.

12 VOLUMVMLEO 3 4 A E3 EO C OBO
Hábitos alimentares e reprodução
Pouco se sabe a respeito dos hábi- eles possam se alimentar de micro-
tos de vida desse grupo. Acredita- -organismos. Sua reprodução pode
se que sejam predadores de ácaros, ser feita de forma sexuada, ou as-
colêmbolos e invertebrados do sexuada. Muito ainda precisa ser
solo. Porém, já foram encontra- descoberto sobre o grupo, mas são
dos dentro do sistema digestório poucas as pessoas que dedicam
desses animais restos de cianobac- parte de seus estudos para enten-
térias, e por isso, suspeita-se que der mais sobre eles.

M E S O FAU N A 13
Sínfilos

O s sínfilos pertencem ao mesmo


grande grupo das centopeias e
piolhos de cobra (Myriapoda). São
tudo, apesar da sua relativa abun-
dância, os sínfilos só foram descritos
na segunda metade do século XVIII.
os miriápodos mais frequentemente Mundialmente, existem cerca de
encontrados em alguns solos. Con- 160 espécies descritas.

Características morfológicas
São pequenos organismos, com percepção de sensações químicas,
tamanho que varia de 0,5 a 8 mm. físicas, detecção da umidade do
Sua coloração é esbranquiçada e o ambiente e até mesmo detectando
corpo é dividido em duas partes vibrações aéreas. Para compensar
(cabeça e tronco). A cabeça não a falta de visão, o corpo é coberto
possui olhos, mas apresenta um por cerdas sensoriais, que auxiliam
par de órgãos localizados na base na percepção do ambiente. O tron-
das antenas, conhecidos como co é dividido em placas, que podem
Tömösvary, com função sensorial. variar entre 15 e 22 segmentos, e
Ainda não se conhece a função estão presentes 12 pares de per-
exata desse órgão, mas especula- nas nos indivíduos adultos. O últi-
se que pode estar relacionada à mo segmento apresenta um par de

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cercos (estruturas alongadas que expelindo seda (teia) para afugen-
se parecem com caudas), que têm tar quaisquer predadores que se
função semelhante às fiandeiras, aproximam da parte traseira.

Reprodução
Os sínfilos são animais dioicos, e a que são depositados e armazenados
reprodução ocorre de forma indire- em uma cavidade pré-oral. O ovo é
ta. Os machos deixam espermatófo- depositado sob e em fendas no solo,
ros (cápsulas com espermatozoides) musgos, matéria orgânica e outros.
espalhados no substrato, e as fêmeas A fecundação dos ovos se dá poste-
coletam essas cápsulas com a boca, riormente, quando a fêmea espalha
rompendo a membrana, permitindo os espermatozoides armazenados
assim a saída dos espermatozoides em sua cavidade oral sobre os ovos.

Fiandeiras: órgãos capazes de produ- Dioicos: organismos que têm machos


zir teias. São geralmente encontradas e fêmeas.
nas aranhas.

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Hábitos alimentares
Os sínfilos podem se alimentar de guns plantios agrícolas, como cana-
detritos e de partes de vegetais vi- de-açúcar e abacaxi. Algumas poucas
vos (herbívoros), tal como raízes. Por espécies apresentam um hábito ali-
serem herbívoros, algumas espécies mentar diferente, e são predadores
podem causar sérios prejuízos a al- de outros invertebrados.

16 CON HECEND O A V I DA D O SOLO


Paurópodes
O s paurópodes, assim como
os sínfilos, são parentes das
centopeias e piolhos-de-cobra e,
te abundantes nos solos, e mesmo
assim, só foram descobertos pela
primeira vez no fim do século XIX.
dessa forma, pertencente ao grupo Existem cerca de 500 espécies des-
dos miriápodes. São relativamen- critas mundialmente.

Características morfológicas
São pequenos invertebrados com tenas e um par de órgãos sensoriais
não mais de 2 mm de comprimen- que provavelmente são utilizados
to, geralmente esbranquiçados. Na para sentir a umidade do ambiente.
cabeça, apresentam um par de an- Os paurópodes não possuem olhos.

M E S O FAU N A 17
Curiosamente também não apre- significa pés pequenos. Quando
sentam nenhum tipo de sistema adultos eles possuem nove pares
respiratório e nem coração. Devi- de pequenas pernas, mas os jovens
do ao seu diminuto tamanho, suas nascem com um reduzido par de
trocas gasosas são feitas através do pernas, e vão adicionando outros
seu fino tegumento (respiração por pares ao longo de seu crescimento.
difusão). O nome desse grupo foi Esses animais são dioicos.
derivado de um termo grego que

Hábitos alimentares
Vivem em lugares úmidos, como tais como raízes, mas algumas espé-
o solo de florestas e se alimentam cies são predadoras de pequeninos
principalmente de tecidos vegetais, invertebrados.

18 CON HECEND O A V I DA D O SOLO


Proturos
Características morfológicas e
classificação

O s proturos são pequenos ani-


mais (cerca de 0,2 cm de com-
primento) esbranquiçados, que têm
é alongado e mantido sempre apon-
tando para a frente, não servindo
para locomoção. Sua função é senso-
um formato de larva, com cabeça rial, atuando de forma semelhante à
cônica e sem olhos. Conhecem-se antena dos insetos. Apesar de algu-
apenas cerca de 205 espécies mun- mas semelhanças, esses organismos
dialmente. Apresentam três pares não são classificados como insetos.
de pernas. Contudo, os proturos se Eles são chamados de Enthognatos
locomovem com apenas dois pares (peças bucais internas). As caracte-
de pernas. O primeiro par de pernas rísticas que diferem esses animais

M E S O FAU N A 19
dos insetos são: ausência de antenas das no interior da cavidade cefálica.
e, principalmente, a localização das Justamente essa última característi-
peças bucais, que estão posiciona- ca é que dá nome ao grupo.

Ciclo de vida
O ciclo de vidas dos proturos é sim- completar 12 segmentos, o desen-
ples, do ovo eclode uma larva pouco volvimento está completo e o orga-
desenvolvida, com seis pernas e 9 nismo chega à fase adulta. Curiosa-
segmentos abdominais. O cresci- mente, as mudas nos proturos não
mento se dá em forma de muda, e param depois da fase adulta; contu-
durante cada evento um novo seg- do, nenhum outro segmento é adi-
mento é adicionado ao corpo. Ao cionado ao corpo.

Hábitos alimentares e importância


ecológica
Os hábitos de vida são muito pou- podem fazer parte da dieta de ou-
co conhecidos, mas sabe-se que eles tros invertebrados predadores, tais
se alimentam de fungos, bactérias como alguns ácaros e outros peque-
e pequenos invertebrados mortos. nos predadores.
Devido ao hábito de se alimentar
de matéria orgânica morta, os pro- Muda: também conhecida como ecdi-
turos são importantes para o solo, se, é um processo de crescimento que
ocorre no momento em que os artró-
atuando na ciclagem de nutrientes. podes trocam seu exoesqueleto.
Eventualmente, esses organismos

20 CON HECEND O A V I DA D O SOLO


Dipluros
Características morfológicas
e classificação

O s dipluros apresentam cerca de


650 espécies descritas mun-
dialmente. Tal como os proturos,
vezes maior. Por apresentar antenas,
os dipluros não utilizam o primeiro
par de pernas como órgão sensorial,
os dipluros também fazem parte do e por isso, todos os pares de pernas
grupo dos Enthognatos. Eles tam- são tidos como “cursoriais”, ou seja,
bém são esbranquiçados, não têm responsáveis pela locomoção.
olhos e apresentam três pares de per-
nas; contudo, diferem dos proturos
por apresentar antenas, além de um
par de cercos localizados no último
segmento do abdômen, com função
sensorial e de captura de presas. Os
cercos podem ser longos e filiformes
(em formas de fio) ou curtos e seme-
lhantes a pinças. É exatamente essa
característica (cercos) que dá nome ao
grupo, “diplo” = dois e “uros” = cauda.
Dipluros são geralmente maiores que
os proturos, sendo cerca de 4 a 40

M E S O FAU N A 21
Estratégias de defesa
Os dipluros são dotados de habili- um dos pouco artrópodes que con-
dades de defesa interessantes. Caso seguem regenerar, produzindo no-
algum predador tente capturá-los vas estruturas, tais como pernas ou
segurando seus cercos abdominais, cercos abdominais, caso esses te-
eles podem soltar seus cercos por nham sido perdidos. O processo de
vontade própria, escapando do or- muda pode ser realizado mais de 30
ganismo que estava tentando captu- vezes ao longo da vida dos dipluros;
rá-los. Essa ação de soltar uma parte a regeneração do órgão ou apêndice
do corpo é conhecida como autoto- perdido pode ocorrer durante esse
mizar. Além disso, os dipluros são processo.

Hábitos alimentares
Os dipluros são comuns em solos ção. Os dipluros que apresentam
úmidos, serrapilheira ou húmus, os cercos em forma de pinças são
mas são raramente vistos devido geralmente predadores e aqueles
ao seu tamanho e hábitos subter- com cercos filiformes são geral-
râneos. Esses organismos podem mente detritívoros (que se alimen-
ser predadores ou se alimentar de tam de matéria orgânica em de-
matéria orgânica em decomposi- composição).

22 CON HECEND O A V I DA D O SOLO


Colêmbolos
S e existisse uma competição
on­de o ganhador fosse aque-
le gru­po da mesofauna que mais
to mais alto do pódio. Atualmente
existem cerca de 6000 espécies de
colêmbolas descritas no mundo.
contribuísse para a boa “saúde” Estes pequenos invertebrados, de
do solo, os ácaros, os colêmbolos formato pouco usual, também es-
e os enquitreídeos seriam grandes tão no mesmo grupo dos proturos
competidores, e ambos teriam as e dipluros, os Enthognatos.
mesmas chances de ocupar o pos-

Características morfológicas
São organismos que apresentam an- o tórax, onde estão localizadas as
tenas de tamanho variado. Em algu- pernas, e o abdômen, a parte fi-
mas espécies, podem ser tão longas nal). O nome Collembola, foi dado
quanto o próprio tamanho do corpo devido a uma estrutura localizada
ou curtas a ponto de serem difíceis posteriormente às pernas, que tem
de visualizar. formato de tubo, ou êmbolo (coló-
A cabeça geralmente apresenta foro), capaz de produzir uma secre-
um par olhos e um corpo que pode ção que funciona como uma cola,
ser alongado ou globoso (essa re- fixando o organismo ao solo ou
gião apesar de parecer uma só, é qualquer outro substrato (“Colla” =
resultado da fusão de duas partes, cola, adesivo; embolon = êmbolo).

M E S O FAU N A 23
Outra estrutura peculiar aos colêm- zendo com que o organismo consi-
bolos é uma “cauda”, chamada de ga saltar, o que funciona como uma
fúrcula, que está localizada ao final maneira rápida e eficiente para fu-
do corpo. A fúrcula, quando alon- gir de predadores.
gada, funciona como alavanca, fa-

A. Antenas
B. Cabeça
C. Tórax
D. Abdômen
E. Colóforo
F. Pernas
G. Fúrcula

24 CON HECEND O A V I DA D O SOLO


CURIOSIDADE:
Alguns colêmbolos têm força o suficiente para saltar predio
alturas que equivalem cerca de 20 vezes o tamanho de
seu corpo, o que corresponde a um homem ter impulso
para ultrapassar a altura de um prédio de 10 andares.

M E S O FAU N A 25
Reprodução e ciclo de vida
Os colêmbolos são organismos ame- nunca param de crescer, realizando
tábolos, isso significa que o jovem, mudas durante toda a vida.
mesmo aquele que acabou de sair A reprodução dos colêmbolos
do ovo, tem o corpo com forma se- pode se dar de duas formas, sexuada
melhante ao adulto, diferindo basi- e assexuada, semelhante àquela que
camente na ausência de órgãos se- ocorre nos ácaros.
xuais. Curiosamente, os colêmbolos

Hábitos alimentares e importância ecológica


Apesar de se tratar de um inver- atuam na decomposição, devolvendo
tebrado pequeno e bastante des- os nutrientes para o solo. Juntamen-
conhecido do público leigo, os co- te com fungos, bactérias e os ácaros,
lêmbolos exercem uma importante os colêmbolos são responsáveis pela
função nos ecossistemas. Além de formação e enriquecimento do solo
servirem como presas para um gran- que sustenta florestas e é base para
de número de outros invertebrados a agricultura. Mas engana-se ao pen-
(aranhas, ácaros, insetos), eles tam- sar que os colêmbolos só podem ser
bém podem servir de alimento para fontes de boas ações; algumas pou-
vertebrados (sapos e lagartos) quíssimas espécies têm o aparelho
Entretanto, mais importante que bucal modificado, formando um
servir de alimento para outros orga- pequeno tubo de ponta afiada, que
nismos, é a função que eles exercem serve para sugar a seiva das plantas,
na ciclagem de nutrientes. Com seu hábito esse que torna essas espécies
hábito de se alimentar de matéria como pragas potenciais, podendo
orgânica morta animal e vegetal, eles causar pequenos danos agrícolas.

26 CON HECEND O A V I DA D O SOLO


Enquitreídeos
O s enquitreídeos são parentes
das minhocas, e até mesmo co-
nhecidos como minho­cas-brancas.
700 espécies mundialmente, das
quais aproximadamente 30 ocorrem
no Brasil. Apresentam ampla distri-
Devido ao seu tamanho pequeno buição mundial, podendo ser encon-
e dificuldade na identificação, o co- trados em todos os continentes, em
nhecimento sobre a diversidade e solos de florestas e pastagens natu-
biologia desse grupo ainda é bastan- rais e até mesmo em solos cultiva-
te escasso; contudo, já se conhecem dos e modificados pelo ser humano.

V O L U ME 3E 27
Características morfológicas e diversidade
Ao contrário das minhocas, são or- permite visualizar seus órgãos in-
ganismos extremamente pequenos, ternos. Seu corpo é constituído de
apresentando apenas 0,2 a 2 milí- segmentos que lembram anéis, e
metros de diâmetro de corpo (lar- não possuem apêndices locomo-
gura) e dificilmente ultrapassam 4 tores. Eles se movem por rasteja-
centímetros de comprimento. mento e escavam o solo por meio
Esses organismos são alongados de contrações musculares. Ao
e cilíndricos, com uma coloração lon­go dos segmentos corporais, é
esbranquiçada translúcida, o que também possível encontrar algu-

VOCÊ SABIA?
Em uma floresta tropical, é possível
encontrar até 23.000 espécimes de
enquitreídeos em um metro quadrado
de solo. Em florestas temperadas, esse
número pode chegar a 146.000.

28 CON HECEND O A V I DA D O SOLO


mas cerdas, que servem para auxi- solo (até 20 centímetros de pro-
liar na aderência do enquitreídeo fundidade), sendo encontrados
ao solo. Os enquitreídeos vivem em maior abundância nos 5 centí-
nas camadas mais superficiais do metros superiores.

Hábitos alimentares e
importância ecológica
A dieta dos enquitreídos é, de ma- de muitos ecossistemas terrestres.
neira geral, 80% baseada em micro- Apesar de sua importância, já
-organismos e 20% em matéria orgâ- existem evidências de que os en-
nica. Devido à sua atividade no solo, quitreídeos estão sendo negativa-
ao se movimentar ou alimentar, os mente afetados pelas modificações
enquitreídeos são responsáveis por ambientais humanas. Isso ocorre
uma série de funções, tais como: porque são influenciados pela umi-
decomposição da matéria orgânica, dade do solo (pouco tolerantes a
ciclagem de nutrientes, dispersão de ambientes secos devido à cutícula
esporos de fungos, promoção do au- delicada e respiração cutânea), pH
mento da micro-porosidade do solo, (preferem solos com pH neutro ou
assim como estimulam a recoloni- levemente ácido), temperatura e
zação e crescimento de micro-orga- compactação (não conseguem so-
nismos e facilitam a ação decompo- breviver em solos compactados).
sitora por triturar e semidigerir a Por esse motivo, são considerados
matéria orgânica. Por essas razões, indicadores da qualidade do solo,
são considerados atualmente um sendo sensíveis a contaminantes e
importante grupo da fauna de solo a mudanças no seu uso.

M E S O FAU N A 29
Reprodução
Os enquitreídeos são hermafroditas mininos do outro e vice-versa), mas
(órgãos sexuais femininos e mascu- pode ocorrer autofertilização. Algu-
linos estão presentes em um mesmo mas espécies são capazes de se repro-
espécime), e se reproduzem princi- duzir por partenogênese e outras por
palmente através de fecundação cru- fragmentação, em que o espécime se
zada (os gametas masculinos de um divide em algumas partes e cada uma
espécime fecundam os gametas fe- delas dá origem a um novo ser.

A maior espécie de enquitreídeo – Mesenchytraeus antaeus – pode


ter até 6 cm de comprimento e mais de 100 segmentos. Já a menor
espécie de enquitreídeo – Marianina eleonorae – tem somente 1 mm
de comprimento e não mais que 15 segmentos.

30 CON HECEND O A V I DA D O SOLO


Estudo da
mesofauna
D evido ao pequeno tamanho
corporal e o fato de os orga-
nismos da mesofauna de solo pas-
versidades e centros de pesquisa é
chamado de Funil de Berlese-Tüll-
gren. Esse nome foi dado em home-
sarem em boa parte de seu ciclo de nagem aos pesquisadores que de-
vida em espaços porosos, pequenas senvolveram tal aparato, Antonio
galerias, e em meio à matéria orgâ- Berlese e Albert Tüllgren. Primeira-
nica presente no solo, a coleta e a mente, o aparato foi desenvolvido
visualização desses organismos são por Berlese em 1905, e posterior-
bastante dificultadas. Dessa for- mente, em 1918, Tüllgren incorpo-
ma, para que se possa visualizar e rou lâmpadas elétricas, facilitando
conduzir estudos com a mesofau- o uso do método.
na de solo, são utilizados métodos No desenho a seguir, pode-se ver
de coleta com aparatos específicos um funil montado em laboratório e
e padronizados. Aparentemente a cada uma de suas partes.
construção desses aparatos pode A lâmpada localizada acima do
ser complicada, mas isso não pas- Fu­nil de Berlese-Tüllgren aumenta
sa de um equívoco. É possível que progressivamente a temperatura
qualquer pessoa, munida de mate- da amostra coletada de solo e ser-
riais básicos, construa seu próprio rapilheira, e diminui a umidade e,
extrator de fauna de solo. como consequência, a mesofauna
O extrator de mesofauna mais se movimenta para a parte infe-
utilizado em laboratórios de uni- rior, em direção contrária da fonte

V O L U ME 3E 31
luminosa. Dessa forma, o organis- no pote contendo álcool ou outra
mo passa pela peneira localizada substância que preserva os seres
dentro do funil e acaba por cair da decomposição.

O álcool é largamente utilizado para se conservar espécies de invertebrados


em laboratórios e centros científicos. A porcentagem de álcool utilizada no
armazenamento depende do propósito do estudo. Solução de álcool 70% (sete partes
de álcool e 3 de água) são muito utilizadas para manter íntegras a morfologia do
organismo, podendo conservar os espécimes por tempo indeterminado, caso o álcool
seja trocado periodicamente e a armazenagem seja feita em local adequado. Solução
de álcool puro, ou 100%, pode ser utilizada para conservar não só o espécime, mas
também seu DNA, que atualmente tem sido muito utilizado em estudos taxonômicos.

32 CON HECEND O A V I DA D O SOLO


O solo e suas múltiplas funções são a base da vida no planeta. Além
de produzir nossos alimentos, fibras para nossas roupas e energia
para diversos fins, é responsável pela qualidade do ar e da água, entre
outras funções. Apesar disso, os diferentes segmentos da sociedade, em
geral, negligenciam a sua importância. Para muitos, o solo é considerado
“sujeira”. Do mesmo modo, os inúmeros organismos que nele ha­bi­tam
são considerados pragas e causadores de doenças. No entanto, organis-
mos maléficos são uma minoria das espécies existentes e são controla-
dos por outras espécies quando o ambiente está em equilíbrio. Equilíbrio
que é rompido por atividades humanas inadequadas. Isso acontece dev-
ido ao enorme desconhecimento sobre tudo que se refere ao solo. O ob-
jetivo da coleção “Conhecendo a vida do solo” é aumentar a consciência
sobre a importância do solo, de modo que esse recurso da natureza seja
preservado, não só para garantir a existência das futuras gerações, mas
também para melhorar a qualidade de nossa vida hoje.

Os editores

ISBN 978-85-8127-067-8

9 788581 270678

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