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Ele era o homem mais honrado que Theo’Zyn havia conhecido, pai
daquela que ele amava, o respeitava mais do que qualquer outro. Theo
havia feito um juramento para protegê-lo... mas ele não estava lá
quando o senhor mais precisou.
E sua filha era a pessoa mais gentil que Theo havia tido a honra de
conhecer, uma diplomata com dotes artísticos incríveis, onde ensinou
para Theo que o dialogo evitaria mais guerras do que a força bruta. E
assim como gentilmente ela conheceu Theo, ela dominou seu coração.
"Obrigado, irmão", replicou Theo, sem deixar que ele terminasse. Não
queria que sentissem pena dele. Os guardas o saudaram e seguiram
seu caminho.
‘’Theo?"
Theo’Zyn se arrependeu de não ter ido embora imediatamente.
Ele se virou lentamente. Ela já não era mais uma garotinha. Estava até
mais alta do que Theo. Seus olhos estavam avermelhados e rodeados
por profundas olheiras. Theo’Zyn percebeu que não era o único que
havia passado a noite em claro.
Theo olhou para cima. Ela o olhava furioso, com a pesada espada de
treinamento ainda na mão. Não existia uma resposta adequada, uma
forma de dizer tudo o que sentia.
"Eu falhei com ele", respondeu Theo, finalmente. "E falhei com você."
Ela permaneceu ali por mais alguns instantes, depois se virou e foi em
direção a uma das várias prateleiras de armas espalhadas pelo salão.
‘’Levante-se", ordenou ela.
Quando Theo’Zyn o fez, ela jogou uma espada em sua direção. Ele
pegou a espada com a mão esquerda por reflexo. Era outra lâmina de
treinamento, pesada e embotada. Ela avançou na direção dele, com
postura intensa e furiosa.
"Minha dama, acho que não é uma boa ide–", começou ele, sendo
interrompido por outra investida dela, atacando com a espada em
direção ao seu peito. Theo empurrou-a para o lado com o cabo de sua
espada e recuou.
"Ama–", disse ele, mas ela atacou novamente, muito mais furiosa do
que já estava.
Dessa vez foram dois golpes, um alto, um baixo. Ela estava usando
uma espada de treinamento, mas se acertasse os golpes, certamente
seria capaz de quebrar alguns ossos. Theo foi obrigado a se defender,
esquivando-se do primeiro golpe e inclinando seu corpo, e desviando
do segundo com a lâmina de sua própria espada. Ele sentiu o impacto
no braço.
Theo’Zyn abaixou suas armas. "É assim que quer fazer isso?",
murmurou ele.
"É", respondeu ela, com uma ira latente e segurando a espada com um
aperto feral.
"Eu deveria ter feito isso há muito tempo", disse o rei sem tirar os
olhos de sua mesa, sobre a qual escrevia uma carta.
Cada mergulho da pena na tinta era uma espetada violenta, e sua
escrita era rápida e furiosa.
Nem mesmo nas disputas brutais da (arena) Theo havia visto uma
arma daquele calibre. Na verdade, o segredo de como lutar com ela
havia se perdido na época dos primeiros nobres do distrito 2, em mãos
inexperientes, ela era tão letal para quem a empunhava quanto para o
inimigo. Por isso, é vista como uma arma cerimonial há séculos,
tornando-se um ícone da família nobre. No entanto, quando a nobre
era apenas uma garota, sonhava em lutar com ela, como os heróis de
antigamente que ela tanto idolatrava. Theo’Zyn prometeu que o
ensinaria quando ela estivesse pronto.
Contudo, antes que Theo pudesse ensinar ela como manejar a arma,
ele mesmo precisava dominá-la. Com a aprovação do senhor, ele
começou a treinar para aprender seus segredos. Surpreendentemente
leve e perfeitamente equilibrada, era uma arma sublime criada por um
mestre no auge de suas habilidades.
Então, assinou a carta e pingou uma cera azul real ao lado de seu
nome, usando seu sinete pessoal sobre ela. Ele assoprou a carta e a
ergueu, sacudindo-a levemente para que a cera esfriasse.
Mas havia certo equilíbrio em ser morto pela filha do homem que ele
devia ter protegido.
Mesmo assim, Theo podia ter bloqueado. Seria por pouco, mas sua
velocidade – mesmo estando exausto – garantiria que o golpe não
fosse concluído.
No entanto, ele nem sequer se moveu. Ele já não queria mais lutar.
"Meu pai ordenou que você fosse embora", disse ela. "E você não quer
culpá-lo pela sua ausência."
"E desobedecer uma ordem dele? Você não faria isso, eu te conheço",
respondeu ela. "O que ele pediu que você fizesse?"
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"Os caçadores de magos devem ser contidos antes que tudo isso se
agrave. Já foi longe demais."
"Meu senhor, não acho que seja sensato eu–", dizia Theo’Zyn,
quando o senhor o interrompeu abruptamente.
"Sempre pensando em assuntos oficiais. Sabia que ele perdeu meu rito
da espada, no meu aniversário de 14 anos, por causa de uma reunião
do Conselho de Defesa? Uma reunião sobre impostos."
Theo olhou alarmado para a princesa. Ele nunca a tinha ouvido falar
com tanta aspereza. Na verdade, a princesa sempre se incomodou com
o tratamento dado aos magos naquele distrito. Mas isso foi antes.
"Acredito que seu pai não compartilharia essa visão", disse Theo, com
uma voz comedida.
Não havia nada de útil que Theo pudesse dizer, então permaneceu em
silêncio. O fogo da ira que havia tomado ela naquele momento foi
quase imediatamente extinto. Seus olhos se encheram d'água, por mais
que ela tentasse conter as lágrimas.
"Eu não sei o que fazer", confessou. Naquele momento, ela era uma
garota outra vez, uma apavorada e sozinha.
Então, ela começou a chorar, com soluços tão intensos que sacudiam
seu corpo todo, e todas aquelas lágrimas contidas também começaram
a escorrer pelo rosto de Theo.
Quando se virou, viu que ela havia tirado sua camisa suada e vestia
uma longa túnica branca de linho com um cristal azul estampado. Ela
parecia mais serena.
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"Agora você fará o que nasceu para fazer", disse Theo. "Você irá
governar."
"Há muito tempo, fiz uma promessa", explicou Theo. "Se o seu pai
sofresse qualquer mal, eu perderia minha vida."
"E quantas vezes você salvou a vida do meu pai?", perguntou ela, num
tom repentinamente severo. Naquele momento, sob o olhar de Theo,
ela parecia muito com o pai. "Testemunhei pessoalmente pelo menos
três vezes. Sei que foram muito mais."
"Minha honra é minha vida", disse ele. "Eu não seria capaz de viver
com a desonra de descumprir minha palavra."
"Para quem prometeu isso?"
‘’Ainda tenho uma dívida para pagar a você’’ – Disse Theo olhando
nos olhos dela
‘’Hum?’’
‘’Não posso prometer que vou voltar, então eu preciso dizer enquanto
tenho a chance....’’ – Ele disse sem olhar para os olhos dela, quase
sussurrando
‘’Eu não consigo aceitar essas suas palavras gentis, ao menos não
agora.’’ – Retrucou Theo, com um pesar no coração.
‘’Você me superou. Não posso ficar do seu lado sem estar ao seu
nível, eu não conseguiria, perdão.’’ – Theo disse isso abrindo a grande
porta de metal da ala de treinos, e depois a mesma se fecha sozinha.
Foi um abalo.
Havia perdido seu fiel escudeiro e seu próprio pai no mesmo dia.