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DADOS

DE ODINRIGHT
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mais lutando por dinheiro e poder, então nossa sociedade poderá
enfim evoluir a um novo nível."

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Evidências convincentes de que o Criador existe

Ariel A. Roth

Tradução: Neumar de Lima e Eunice Scheffel do Prado

Casa Publicadora Brasileira


Tatuí, SP
Deus existe? Será que um Designer criou nosso Universo, ou ele evoluiu de
maneira espontânea? Pode a ciência ser objetiva e, ao mesmo tempo, admitir a
possibilidade de que Deus existe? Isso faz diferença?
Ariel Roth, cientista e pesquisador cristão, analisa os pontos-chaves
relacionados com a questão de Deus e a existência do Universo:
▪ a intrincada organização da matéria no Universo
▪ a precisão das forças da física
▪ a complexidade do olho e do cérebro
▪ o sofisticado código genético
▪ a disparidade entre o registro fóssil e o tempo necessário para a evolução
Em face de tanta evidência que parece exigir um Deus para explicar o que
vemos na natureza, por que a comunidade científica permanece em silêncio
sobre o Criador? Hipóteses e especulações que tentam encaixar os dados em uma
conclusão predeterminada existem aos montes. O que impede os cientistas de
seguir os dados da natureza na direção em que apontam?
Deus existe? Essa pergunta não vai simplesmente desaparecer, e a própria
ciência está oferecendo a resposta.

Ariel A. Roth passou os últimos 50 anos pesquisando a natureza, dando


aulas e fazendo palestras ao redor do mundo sobre a disputa entre ciência e
religião. Com um doutorado em zoologia pela Universidade do Michigan, ele
lecionou nas universidades Andrews e Loma Linda. De 1980 a 1994, liderou o
Geoscience Research Institute, na Califórnia. Foi editor da revista Origins
durante 23 anos e publicou mais de 180 artigos científicos e populares. Seu livro
Origins, publicado em 16 línguas, foi lançado no Brasil pela Casa Publicadora
Brasileira.

Título original em inglês:


SCIENCE DISCOVERS GOD

COPYRIGHT © DA EDIÇÃO EM INGLÊS:


REVIEW AND HERALD, HAGERSTOWN, EUA.
Direitos internacionais reservados.

Direitos de tradução e publicação em


língua portuguesa reservados à
CASA PUBLICADORA BRASILEIRA
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Atendimento ao cliente: (15) 3205-8888
www.cpb.com.br

1ª edição neste formato


Versão: 1.2
2013

Editoração: Marcos De Benedicto e Neila D. Oliveira


Design Developer: Levi Gruber
Capa e Projeto Gráfico do Livro Original: Eduardo Olszewski
Foto da Capa: Jupiterimages

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio,
sem prévia autorização escrita do autor e da Editora.

12401 / 25723
À minha paciente esposa, Lenore.
Mais do que ninguém, ela sabe que,
quando alguém escreve um livro,
quase todos no círculo de influência
do autor sofrem igualmente.
Quero expressar minha dívida para com um grande número de pessoas com
quem tenho mantido um relacionamento construtivo e duradouro. Meus alunos
como um todo, em especial os da pós-graduação, têm sido para mim uma fonte
constante de novas ideias e desafios.
Sou muito grato pelas habilidades editoriais de Gerald Wheeler, editor da
versão em inglês, que fez maravilhas para melhorar meu estilo. Seu
conhecimento, interesse e insights foram muito úteis. De igual modo, agradeço
aos editores da versão em português, Marcos De Benedicto e Neila Oliveira.
Muitos colegas meus, com suas qualificações e especialidades, forneceram
sugestões úteis para a elaboração do manuscrito. Quero expressar de modo
especial minha dívida para com Mart de Groot, James Gibson, Paul Giem, Lee
Greer, Marcus Ross, Larry Roth, William Shea e Tim Standish pela sábia e
inteligente assessoria. Contudo, eles não têm nenhuma responsabilidade por
meus pontos de vista e viés, pelos quais assumo total responsabilidade.
A vida humana tem algum significado ou propósito? Deus existe? Se Ele
existe, por que permite tanto sofrimento? A ciência não vem oferecendo
respostas adequadas sem levar em conta Deus? Perguntas dessa natureza
mantêm inquietos nossos mais profundos pensamentos à medida que buscamos
respostas sobre nossa origem, propósito e destino. Poucos conseguem ignorar
esses enigmas desconcertantes que insistem em retornar à medida que
contemplamos, maravilhados, os mistérios de nossa existência. A discussão
sobre a existência de Deus não pode simplesmente ser passada por alto.
Felizmente, no que diz respeito aos questionamentos fundamentais sobre
origens, nem tudo é conjectura. Em anos recentes, cientistas realizaram inúmeras
descobertas extraordinárias que revelam um nível tão elevado de precisão e
complexidade que está ficando muito difícil sugerir que tudo que existe surgiu
por acaso. Parece que um Deus muito sábio tinha que estar envolvido no
planejamento das maravilhosas complexidades que estamos descobrindo em
todo o Universo.
Alguns cientistas afirmarão de imediato que a ciência não pode considerar
Deus pelo fato de a ciência e Deus representarem diferentes campos de
pensamento. Infelizmente, essa concepção obriga a ciência a atuar de um ponto
de vista muito estreito que limita sua capacidade de encontrar toda a verdade. A
ciência não poderá encontrar Deus enquanto Ele estiver fora de seu repertório de
explicações. Se a ciência espera prover respostas significativas e verdadeiras aos
nossos questionamentos mais profundos, ela precisa se libertar da prisão do
secularismo em que se deixou prender. A ciência deveria estar aberta à
possibilidade de que Deus existe em vez de excluí-Lo ou relegá-Lo apenas a
outro campo de investigação.
Este livro aborda a discussão sobre a existência de Deus segundo a
perspectiva de que a ciência constitui, ou pelo menos deveria constituir, uma
busca aberta pela verdade e que devemos permitir que os dados da natureza nos
conduzam aonde quer que possam nos guiar. A ciência frequentemente se dá ao
luxo de discutir diversas especulações e hipóteses, como a existência de outros
universos além do nosso ou a vida se originando completamente por si. Se quiser
ser coerente, a ciência deve também estar disposta a considerar a possibilidade
de que existe um Deus. Com essa mentalidade imparcial, a ciência, considerando
Deus uma hipótese provável, poderia enfim encontrá-Lo.
Nessa discussão sobre a existência de Deus, é importante ressaltar que todos
os pioneiros da ciência moderna, como Kepler, Galileu, Boyle, Pascal, Lineu e
Newton, incluíram Deus em sua perspectiva científica. Esses cientistas sempre
mencionavam Deus, e, para eles, seus estudos científicos representavam a
descoberta das leis que Deus criou. Esses gigantes intelectuais demonstraram
como a ciência e a religião podem trabalhar em cooperação ao se estudar a
natureza. Desde essa época, porém, a ciência e a religião têm se distanciado, e
atualmente a ciência basicamente ignora o conceito de uma divindade. Além
disso, alguns cientistas estão profundamente preocupados com o fato de que uma
retomada do sentimento religioso na sociedade seria um sério empecilho à
ciência. Por outro lado, há indícios de um renovado interesse em Deus por parte
de alguns cientistas e acadêmicos. Isso se deve parcialmente a recentes e
importantes descobertas, como os exatos valores necessários para as forças
básicas da física e os complexos caminhos bioquímicos dos organismos vivos.
Essas descobertas levantam sérias dúvidas a respeito de qualquer sugestão de
que esses fatos científicos teriam simplesmente surgido por acaso. Está se
tornando mais razoável acreditar em Deus do que nas explicações extremamente
improváveis a que os cientistas céticos precisam recorrer.
Este livro adota uma abordagem bastante eclética que acreditamos ser
essencial para proporcionar uma visão abrangente que a discussão sobre a
existência de Deus merece. Visto que os desafios mais contundentes sobre a
existência de Deus procedem do meio científico, nossa discussão terá como foco
principal temas científicos inter-relacionados. Com o objetivo de auxiliar o leitor
a avaliar as descobertas e conclusões da ciência, incluímos inúmeros relatos
sobre os procedimentos empregados por cientistas em suas descobertas, fazendo
a discussão convergir de modo especial para detalhes relacionados com o
assunto da existência de Deus.
Nosso ponto de partida será uma breve revisão histórica que nos conduzirá à
surpreendente constatação de que quatro entre dez cientistas norte-americanos
acreditam em um Deus pessoal que responde às orações. O paradoxo é que
poucos, se é que existe algum, dentre esses cientistas publicarão algo a respeito
de Deus em revistas científicas ou livros escolares. Há uma grande disparidade
entre o que muitos cientistas acreditam e o que publicam em nome da ciência.
Em seguida, discutiremos questões vitais relacionadas com a existência de Deus,
como a complexa organização da matéria do Universo e a precisão das forças da
física. Após essa discussão, mencionaremos vários temas da biologia, incluindo
a origem da vida, o código genético e certas estruturas complexas como o olho e
o cérebro. Passaremos então a considerar o problema que o fator tempo impõe à
evolução quando se analisa o registro fóssil. A conclusão a que se chega é de que
as eras geológicas são totalmente inadequadas para as improbabilidades
pressupostas.
A terceira e última parte do livro aborda uma intrigante pergunta: mesmo
diante de tantos dados que parecem exigir a existência de um Criador como
única explicação para os fatos observados, por que os cientistas persistem em
ficar calados a respeito de Deus? Lidaremos com esse assunto do ponto de vista
da pressão sociológica de paradigmas dominantes, como a evolução, e do
exclusivismo e elitismo de um empreendimento científico comprovadamente
bem-sucedido. A conclusão deste livro é de que a ciência está fornecendo
inúmeras evidências que apontam para a existência de um Deus. Nossa
esperança é que os cientistas permitam que Deus volte a fazer parte da
perspectiva científica, como acontecia na época dos pioneiros da ciência
moderna.
Este livro lida principalmente com duas visões opostas de mundo. Por um
lado, existem aqueles que limitam a realidade ao que pode ser observado na
natureza. Para esses, tudo que existe se resume aos fatos observados. Essa visão
se encaixa perfeitamente no ambiente científico do qual Deus é excluído. Outros
acreditam que existe uma realidade transcendente além dos simples fatos
observados. Para esses, é particularmente importante pensar que nossa existência
tem um significado supremo, que existe um Deus que nos projetou e nos dotou
de características singulares, como consciência, compreensão, interesse pelo
próximo e senso de justiça. Em outras palavras, a realidade vai além da matéria
observável e há propósito para nossa existência. Nossa visão de mundo e
filosofia pessoal serão profundamente afetadas por qualquer uma dessas duas
abordagens que viermos a adotar. Este estudo parte do pressuposto de que a
separação entre essas duas visões opostas não seja sustentável. Dados da própria
ciência nos estão compelindo a concluir que algo fora do comum está em
operação, e tudo indica que se trata de um Deus sábio e transcendente que Se
preocupou em projetar as complexidades que estão sendo descobertas.
Seria este livro totalmente objetivo? Infelizmente, a resposta é negativa.
Quem pode alegar para si completa objetividade? Por outro lado, esforcei-me ao
máximo em ser justo com os dados, além de ter procurado, com cuidado,
selecionar os melhores. Convido o leitor a tirar suas conclusões com base nesses
dados e não simplesmente em inferências geralmente aceitas. Este livro não se
propõe a apresentar um mero levantamento de interpretações correntes. Ao
contrário, algumas conclusões não refletem o pensamento dominante. Se
queremos, de fato, tirar proveito de nossos pontos de vista aceitos, precisamos
estar igualmente dispostos a nos libertar deles.
Diversas palavras utilizadas no livro, como “verdade”, “ciência”, “religião”,
“Deus”, “evolução” e “criação”, são muito importantes para o diálogo, mas
apresentam diferentes usos e significados. Sugiro que o leitor consulte o
glossário na parte final do livro para ter uma ideia clara do significado dessas
palavras no contexto de nossa discussão. Em alguns casos, identifiquei no texto
algum uso específico.
Após mais de 50 anos de envolvimento com o debate entre ciência e
religião, estou consciente da intensa carga emocional refletida em toda discussão
relacionada com visões de mundo que norteiam filosofias pessoais. Estou
também consciente de que alguns julgarão minha abordagem questionável.
Lamento. Temos muito que aprender uns com os outros, e gostaria de incentivar
aqueles que têm pontos de vista diferentes a manter o diálogo aberto e a
continuar contribuindo para o aumento do cabedal de conhecimento da
humanidade.

Ariel A. Roth
Loma Linda, Califórnia
Reconheço que alguns leitores têm verdadeira aversão a números. Eles me
fascinam, mas procurei limitá-los ao mínimo possível. Ocasionalmente, fui
obrigado a usar números extremamente grandes. Em casos em que precisei fazer
rápidas comparações, em vez de escrever os números em sua totalidade, adotei
simplesmente a convenção comum de usar um pequeno número sobrescrito
depois do número ordinário 10 para indicar a quantidade de zeros (potências de
10). A título de ilustração, observe os exemplos abaixo:
101 = 10
102 = 100
103 = 1.000 = mil
104 = 10.000
105 = 100.000
106 = 1.000.000 = um milhão
107 = 10.000.000
108 = 100.000.000
109 = 1.000.000.000 = um bilhão
1010 = 10.000.000.000
Etc.
Esse pequeno número sobrescrito simplesmente indica a quantidade de vezes
que o número 10 é multiplicado por si mesmo e representa a mesma quantidade
de zeros caso o número fosse escrito da maneira convencional. Este
procedimento poupará o leitor de ter que contar todos os zeros em números
grandes, além de facilitar as comparações. Por exemplo, é fácil perceber que
1019 tem dois zeros a mais que 1017 sem precisar contar todos os zeros, caso
fossem escritos.
Nesse sistema, não se pode absolutamente esquecer que cada potência
multiplica o número por 10; portanto, 103 (1.000) é 10 vezes maior que 102
(100), e, da mesma forma, 107 (10.000.000) é 1.000 vezes menor que 1010
(10.000.000.000).
A ciência sem a religião é manca,
a religião sem a ciência é cega. 1
Albert Einstein

O incansável
Ele era profundamente com prometido com a religião e escreveu
amplamente a respeito das profecias bíblicas de Daniel e Apocalipse. Foi
membro de uma comissão encarregada de construir cinquenta novas igrejas nos
arredores de Londres e ajudou também a distribuir Bíblias aos pobres. 2 Quem
foi ele? Pastor, teólogo ou evangelista? Nenhum dos três. Trata-se de alguém
considerado por muitos o maior cientista de todos os tempos: Sir Isaac Newton.
Um homem com um intelecto muito superior ao de seus contemporâneos, ele
ajudou a lançar os fundamentos da ciência moderna. Sua vida foi marcada por
profunda reverência a Deus e incansável dedicação à pesquisa científica.
Isaac Newton nasceu na Inglaterra ( Figura 1.1 ) como um presente de Natal
em 1642. Seu pai, infelizmente, havia falecido três meses antes. Seu nascimento
foi aparentemente prematuro. Ele era tão pequeno que podia caber em uma
caneca de um litro. Paradoxalmente, esse grande líder dos filósofos de sua época
teve um início humilde, sendo criado em uma família sem instrução ou qualquer
distinção social. Seu pai, embora não vivesse na miséria, era incapaz de assinar o
próprio nome. A infância de Isaac foi um mosaico de experiências marcadas por
um desejo insaciável de elaborar projetos mais eficientes para diferentes tipos de
inventos, como pipas e relógios de sol. Gostava muito de ler, tinha poucos
amigos e preferia o estudo ao convívio social. Por isso, nem sempre era
compreendido ou apreciado. Ao deixar o lar para estudar na Universidade de
Cambridge, os empregados se alegraram com sua partida e comentaram
ironicamente que ele só servia para a universidade. 3 Descrito como
“incansável”, 4 Isaac era propenso a trabalhar isoladamente em seus vários
projetos e com intensidade tal que se esquecia às vezes de comer ou dormir.
Em Cambridge, Newton alcançou distinção imediata, e logo se tornou um
renomado membro do corpo docente. Ele submeteu à apreciação da Sociedade
Real de Londres um novo tipo de telescópio refletor ( Figura 1.2 ) que havia
idealizado. O instrumento causou grande sensação, gerando considerável
entusiasmo, e logo chamou a atenção dos principais astrônomos da Europa. Em
seguida, Newton apresentou à Sociedade Real documentos meticulosamente
preparados a respeito das propriedades da luz e da cor, sendo igualmente
bastante apreciados. Newton relutava em apresentar suas novas ideias e, por isso,
frequentemente havia um intervalo de anos entre o início de um projeto e sua
apresentação pública. Seu trabalho era apresentado aos poucos, “mas cada
porção representava um monumento imortal a seu gênio”. 5
Era talvez inevitável que a chegada repentina de um jovem cientista tão
bem-sucedido suscitasse críticas por parte da velha-guarda, o que não demorou
muito a acontecer no caso de Newton. Diversas controvérsias se desenvolveram,
sendo amplamente discutidas pelos historiadores. Newton conseguia ser um
temível inimigo. Tendo passado anos absorto em suas descobertas, às vezes lhe
era difícil ser paciente com pessoas que não haviam dado a mínima consideração
às suas ideias, ou não as entendiam, e decidiam opor-se a elas.
Um célebre e prolongado conflito se desenvolveu entre Newton e Robert
Hooke, o diretor de experiências da Sociedade Real. Hooke não era um cientista
qualquer, chegando quase ao nível de um gênio. Além disso, havia escrito o
tratado Micrographia, relacionado com tópicos sobre a luz e a ótica. Hooke
considerava-se a autoridade final sobre muitos assuntos e tinha o repugnante
hábito de afirmar que era o responsável pela maior parte das descobertas.
Quando as ideias de Newton foram debatidas na Sociedade Real de Londres,
Hooke imediatamente ressaltou que a maior parte dos conceitos de Newton já
estava presente em sua obra Micrographia. Newton, que se encontrava em
Cambridge, apontou posteriormente que em sua maior parte os conceitos de
Hooke sobre luz pertenciam ao famoso cientista e filósofo francês René
Descartes! Hooke, com todo o tato de uma morsa desajeitada, sugeriu, com ar de
superioridade, que Newton, sendo apenas um novato, deveria continuar a
trabalhar com telescópios e deixar o campo da luz experimental com os que já
haviam elaborado conceitos satisfatórios. 6
Uma acirrada polêmica começou a se formar. Em Londres, intelectuais
influentes faziam reuniões secretas num café popular, onde discutiam as ideias
de Newton. Hooke, um dos participantes, mantinha, como era de se esperar, que
o jovem cientista havia adotado algumas de suas próprias ideias. 7 Havia
também discussões a respeito da natureza da luz, assunto que de certa forma
permanece sem solução até hoje. Discutia-se também sobre o que causa as
diferentes cores da luz. Newton, que já tinha realizado inúmeras experiências
sobre o assunto, rejeitava categoricamente os argumentos de Hooke. As disputas
continuaram por anos até a morte de Hooke. “Para Hooke”, resume um
historiador, “Newton era um temido rival; para Newton, Hooke não passava de
um chato intolerável, um chacal dissimulado e indigno de se alimentar entre os
leões.” 8
Outros, além de Hooke, desafiavam os conceitos de Newton sobre a luz. Na
Europa continental, um idoso professor jesuíta em Liège, Bélgica, que se
autodenominava Linus, discordava das ideias de Newton sobre a luz colorida.
Ele havia feito experiências com prismas, como Newton, e chegara à conclusão
de que as várias cores da luz eram causadas pelas nuvens no céu. Quando Linus
apresentou seus pontos de vista para a Sociedade Real, Newton contestou, dando
instruções sobre a maneira de conduzir uma experiência decisiva que colocaria
fim à polêmica, e solicitou que a Sociedade Real a fizesse. Correspondências
posteriores provenientes de Liège indicaram que Linus havia morrido, mas que
seu fiel discípulo John Gascoines estava pronto para prosseguir a batalha contra
Newton. Insinuações de que Newton houvesse realizado seu experimento uma
vez apenas indicavam não somente uma patética ignorância da meticulosidade
de Newton, mas também a superficialidade dos comentários provindos de Liège.
O experimento crucial, que Newton sugerira, foi finalmente realizado na
Sociedade Real, com a presença de Robert Hooke, o qual, podemos supor, não
ficou nada contente com os resultados. 9 Estes foram exatamente como Newton
havia predito. Alguém poderia pensar que isso silenciou as objeções de Liège,
mas não foi o caso. Outro professor, Anthony Lucas, retomou a batalha contra
Newton, mas logo ficou óbvio que Lucas e Newton se encontravam em níveis
muito diferentes de objetividade. Por fim, Newton solicitou que as cartas de
Lucas não mais lhe fossem encaminhadas.
Mais famosa ainda foi a batalha entre Isaac Newton e Gottfried Wilhelm
Leibniz. Ambos disputavam quem havia primeiramente descoberto os
complexos procedimentos matemáticos do cálculo. Logo a contenda ganhou
dimensões internacionais. Na Alemanha, Leibniz tinha um grupo de adeptos,
especialmente nos principais países do continente europeu, que lhe dava todo o
apoio. Por outro lado, na Inglaterra, a Sociedade Real servia como base fiel,
apoiando Newton como inventor. Os dois adversários têm sido acusados de
terem roubado teorias do cálculo um do outro. O enigma, alvo de extensas
investigações, é complexo e muito intrigante, mas não fornece detalhes factuais
que permitiriam uma solução definitiva. Em geral, os estudiosos concordam que
é provável que ambos tenham inventado o cálculo independentemente, 10 sendo
que Newton o teria feito antes de Leibniz, que, por sua vez, publicou suas
descobertas antes de Newton. (Os símbolos do cálculo que Leibniz desenvolveu
ainda são ensinados hoje.) À medida que a batalha se intensificou, os adeptos de
Newton acusaram Leibniz de ignorar uma antiga carta que ele havia recebido de
Newton sugerindo o cálculo. Por outro lado, há acusações de que Newton tenha
influenciado a Sociedade Real a emitir relatórios a seu favor, indicando que ele
havia inventado o cálculo muito tempo antes de Leibniz. Newton foi o
presidente dessa prestigiosa organização durante os últimos 24 anos de sua vida,
quando a disputa ainda estava em andamento. No que diz respeito ao cálculo de
Leibniz, a opinião de Newton era que inventores secundários não merecem
consideração.
Isaac Newton pode ser acusado com justiça de ter sido um enclausurado,
especialmente durante seus primeiros anos, e, embora se esquivasse de
confrontos, não hesitava em usar a força de seu intelecto e sua posição para
diminuir o trabalho dos que se opunham a ele. Contudo, ele tinha também seu
lado bom. Quando seu meio-irmão ficou doente com uma febre maligna, sua
mãe passou a cuidar dele, mas acabou sendo acometida da mesma doença. Ao
tomar conhecimento do fato, Isaac partiu de Cambridge e logo estava ao lado da
mãe para cuidar dela pessoalmente. Um de seus parentes relata que Isaac ficava
acordado noites inteiras ao lado da mãe, aplicando-lhe tratamentos físicos e
cuidando de suas bolhas com as próprias mãos, usando assim sua famosa
destreza manual para aliviar-lhe a dor. 11 Todos os seus esforços não foram
suficientes para deter a devastadora doença, que finalmente ceifou a vida de sua
mãe. Embora o relacionamento familiar na infância de Isaac Newton tivesse sido
conturbado, devido ao segundo casamento de sua mãe, que, por sinal, não o
criou, ele mostrou ser um filho leal e dedicado. Como executor do testamento
dela, Newton providenciou que a mãe fosse sepultada junto de seu próprio pai, a
quem nunca tinha visto.
Newton, sempre relutante em publicar o que quer que fosse, finalmente
publicou os resultados de muitos anos de estudo na obra Principia, 12 aclamada
como “talvez o maior acontecimento na história da ciência – certamente o maior
até anos recentes”. 13 Além disso, “nenhuma alma viva podia desafiar a
originalidade e o poder” dessa obra. “Newton havia se tornado
reconhecidamente o ditador do pensamento científico, e não havia nenhum rival
que pudesse desafiá-lo ao duelo.” 14 A importância da obra Principia, em três
volumes, é que ela introduziu na ciência um alto nível de rigor matemático e
observacional, o que contribuiu para aumentar drasticamente o respeito pelos
estudos científicos. Newton colocou a ciência em bases muito mais sólidas do
que as que vigoravam até então. Principia é uma obra repleta de deduções
matemáticas, cobrindo temas como gravidade, mecânica celeste, cometas, a Lua,
marés, movimento dos fluidos e as leis que os governam. Seus estudos deram
um golpe mortal no sistema cosmológico popular desenvolvido pelo grande
filósofo e matemático francês René Descartes, famoso por sua célebre frase:
“Penso, logo existo”. Descartes propôs que os planetas se movem pela ação de
vórtices giratórios no éter (ou meio), estendendo-se por todo o Universo. Os
cálculos sofisticados de Newton, que mostravam como a gravidade explica
muitos detalhes dos precisos padrões giratórios dos planetas, eliminavam
qualquer necessidade das teorias de Descartes. No fim da segunda edição de
Principia, Newton acrescentou algumas observações conclusivas sob o título
“General Scholium”. Aí ele permitiu que um pouco do seu fervor religioso
viesse à tona ao dar crédito a Deus como o Criador, comentando que “este
maravilhoso sistema composto pelo Sol, planetas e cometas só poderia ter
surgido a partir do conselho e domínio de um Ser poderoso e inteligente”. 15
Newton acabou publicando também o resultado de suas muitas pesquisas
sobre a luz e a ótica. Parece que boa parte dessas pesquisas já estava pronta
quando, ao retornar certo dia da capela em Cambridge, percebeu que uma vela
havia iniciado um fogo que queimara seu manuscrito e outros documentos muito
valiosos. Essa perda o perturbou de tal forma que, conforme se relata, ele ficou
fora de si por um mês. Alguns descrevem esse episódio como resultado de um
esgotamento mental, ao passo que outros mantêm um ponto de vista totalmente
diferente. 16 Todos os detalhes da vida desse gênio têm sido assunto de extrema
investigação e especulação. 17 Mais de uma década depois do incêndio, Newton
finalmente publicou seus estudos sobre a luz com o título de Opticks. O
historiador de ciência Sir William Dampier comenta que “a obra de Newton
sobre ótica, mesmo que tivesse sido a única de sua autoria, seria suficiente para
colocá-lo na vanguarda dos homens da ciência”. 18 Opticks mereceu três edições
em inglês, duas em francês e duas em latim.
Muitas honras foram conferidas a Newton. Em Cambridge, suas façanhas
matemáticas lhe conquistaram a posição de professor de matemática. Após
mudar-se para Londres, foi nomeado mestre da casa da moeda, envolvendo-se
em muitos assuntos cívicos. A Academia de Ciências da França o elegeu como
associado estrangeiro, e a rainha Ana concedeu-lhe o cobiçado título de
cavaleiro, tornando-se Sir Isaac Newton. Voltaire, um dos grandes líderes do
movimento da razão e do livre pensamento, que estava florescendo na época,
mantinha contatos pessoais com Newton. Ele o elogiava, afirmando que, “se
todos os gênios do Universo se reunissem, Newton seria o líder do grupo”. 19
Mais de um século depois, o aclamado matemático e cosmólogo Laplace era da
opinião de que a obra seminal Principia tinha garantido para sempre “uma
preeminência acima de todas as outras produções do intelecto humano”. 20
Recentemente, ao analisar as pessoas mais importantes do último milênio, a
revista Time elegeu Newton como a mais importante do século 17. 21 Não há
dúvida de que Isaac Newton foi uma das pessoas mais brilhantes de todos os
tempos, intelectualmente falando.
Newton, em paralelo com sua perspicácia científica de grande magnitude,
possuía profunda devoção a Deus, o que tem implicações significativas ao
considerarmos a relação entre Deus e ciência. Newton não aprovava a descrença
em Deus, afirmando que “o ateísmo é tão sem sentido e odioso para a
humanidade que nunca veio a ter muitos defensores”. 22 Ele não tolerava
qualquer leviandade em assuntos religiosos. Quando presenciava tal
comportamento, criticava-o severamente. 23 Embora a maioria dos cientistas de
sua época acreditasse em Deus, sendo, inclusive, prática usual referir-se a Deus
em obras acadêmicas, Newton se distinguia por seus intensos estudos sobre
tópicos religiosos. Ele deixou para a posteridade uma quantidade extraordinária
de escritos, e pelo menos um terço deles lida com temas religiosos.
Newton tinha um interesse especial pelas profecias bíblicas e estudava tudo
que podia sobre o assunto, independentemente de ter sido o material escrito em
grego, aramaico, latim ou hebraico. Costumava compilar longas listas com as
várias interpretações. A relação entre profecias bíblicas e história lhe despertava
interesse especial, e antes de sua morte estava pronto um manuscrito discorrendo
sobre a interpretação de datas históricas. Era importante definir bem essas datas
a fim de estabelecer pontos de referências corretos para as profecias bíblicas.
Esse manuscrito de seus últimos anos teve uma publicação póstuma com o título
de Chronologies of Ancient Kingdoms Amended [Cronologias Corrigidas dos
Reinos Antigos]. Os dois livros essencialmente proféticos da Bíblia, Daniel e
Apocalipse, lhe foram de especial interesse. Ao estudar esses livros, Newton
empregou a mesma abordagem analítica que adotava ao estudar a natureza. Ele
desenvolveu uma série de quinze “regras para a interpretação das palavras e
linguagem nas Escrituras”. 24 Interpretava as profecias desses dois livros
distintos como revelação da história mundial. Muitas interpretações
contemporâneas desses dois livros bíblicos ainda ecoam as ideias de Newton.
Vários anos depois de sua morte, suas investigações nessa área foram publicadas
num livro com o título de Observations upon the Prophecies of Daniel and the
Apocalypse of St. John 25 [Observações Sobre as Profecias de Daniel e o
Apocalipse de São João]. O cientista escreveu também a respeito da vida de
Cristo e de outros assuntos religiosos, mostrando, às vezes, grande
independência em seu pensamento teológico, como sua rejeição da doutrina da
Trindade. Acreditava, como a Bíblia indica, que todas as nações procederam de
Noé, e que Deus foi o Criador de todas as coisas, como Ele mesmo afirma nos
Dez Mandamentos. 26 O estudo que Newton realizava sobre a natureza criada
por Deus e as Sagradas Escrituras, inspiradas pelo mesmo Deus, revelava seu
intenso desejo de conhecê-Lo mais plenamente.
Newton também estudou e escreveu extensivamente sobre alquimia. Ele
tinha profunda familiaridade com a literatura alquímica de sua época e abordava
o assunto com a mesma atitude analítica com que abordava outros temas. Alguns
charlatões haviam trazido grande descrédito à alquimia devido às suas tentativas
de criar ouro a partir de metais inferiores. No entanto, na época de Newton, a
alquimia começava a se emancipar de seu manto místico para se tornar a
respeitável química. Alguns têm procurado deduzir uma personalidade mística
em Newton devido aos seus escritos alquímicos, mas essa conclusão parece não
corresponder à sua meticulosa abordagem racional em relação à física, à
matemática e à Bíblia. Algumas implicações da alquimia podem ter interessado a
Newton em seus questionamentos metafísicos, mas ele sempre realizava
verificações experimentais assim como fazia em relação à física. 27
A aura de fervor religioso que circundava a personalidade de Newton
conquistou-lhe muitos admiradores. Um francês renomado até tentou criar uma
nova igreja com o nome Religião de Newton. Outro francês chegou a criticar a
Inglaterra por não dar o devido respeito à teologia de Newton. Além disso,
houve propostas de que o calendário deveria ser revisado para começar a partir
da data do nascimento de Newton e que uma igreja fosse construída no local em
que ele nascera. 28 O matemático suíço Fatio de Duillier foi um bom amigo de
Newton, e uma carta que escreveu a Newton reflete a influência e a
profundidade espiritual do cientista inglês. Fatio adoeceu e perdeu a esperança
de viver. Ao escrever a Newton a que lhe parecia ser sua última carta, ele assim
se expressa: “Agradeço a Deus porque minha alma se encontra em perfeita paz, e
devo isso principalmente a você.” 29
Newton encontrou seu derradeiro lugar de descanso entre os mais honrados
da Inglaterra, sendo sepultado na reverenciada Abadia de Westminster.
Paradoxalmente, cerca de 150 anos depois, Charles Darwin, cujas ideias sobre
Deus eram bem diferentes das de Newton, foi sepultado no mesmo local, a
poucos metros de distância onde jaz Newton. Quando visitei os túmulos desses
dois ícones do mundo científico, não pude deixar de meditar sobre o legado
contrastante sobre Deus que ambos deixaram à humanidade. Esse contraste
constitui a base de boa parte da discussão dos capítulos que se seguirão.
Para Newton, Deus não era um conceito qualquer. Ele tinha profunda
reverência por Deus e comentou que “este Ser governa todas as coisas, não como
a alma do mundo, mas como Senhor sobre tudo”. Em seguida, acrescentou: “O
Deus supremo é um Ser eterno, infinito e absolutamente perfeito.” 30 Para ele,
Deus era também um ser muito pessoal que nos ama e a quem deveríamos amar
e respeitar. Um tom de sinceridade irradia de suas palavras ao dizer que
“devemos crer que existe um único Deus ou Monarca supremo a quem possamos
temer e obedecer, guardando Suas leis e dando-Lhe honra e glória. Devemos crer
que Ele é o Pai por meio de quem todas as coisas existem, e que ama Seu povo
como Seus filhos de maneira que eles O amem em reciprocidade e Lhe
obedeçam como Pai”. 31
Isaac Newton, provavelmente mais do que qualquer outra pessoa, ajudou a
estabelecer a ciência sobre um sólido fundamento. Isso foi possível pelo fato de
que ele aplicou padrões muito rigorosos em suas pesquisas e publicações. Para
alguns, pode parecer contraditório que um dos cientistas mais ilustres que o
mundo já conheceu tenha sido profundamente religioso. Mas a vida de Newton
ilustra claramente como a excelência científica e uma firme fé em Deus podem
andar de mãos dadas.

Newton não foi o único


Newton viveu em um momento crítico na história da ciência. Foi nessa
época que a ciência moderna procurou se libertar das fortes amarras de séculos
de antigas tradições. Observação, experimentação e análise matemática
começavam a substituir os dogmas filosóficos da Idade Média. A Renascença,
conhecida também como o “reavivamento do conhecimento”, produziu uma
atmosfera de agitação intelectual. Os grandes cientistas que atuaram nesse
período tornaram-se os pioneiros da ciência moderna; e, como Newton,
acreditavam com toda convicção que Deus é o Criador de todas as coisas. Os
princípios da nossa ciência moderna emergiram de um paradigma intelectual em
que Deus representa uma figura dominante.
Johannes Kepler (1571-1630), que trabalhou em Praga, figura entre os
principais cientistas de todos os tempos. Ele demonstrou que os planetas se
movem ao redor do Sol segundo um padrão oval e não circular. Como grande
adepto da matemática, desenvolveu três princípios, conhecidos como as leis de
Kepler, que se relacionam com o movimento dos planetas. Essas leis
permanecem quase intactas até hoje. Como o famoso italiano Galileu (1564-
1642), Kepler via uma relação rigorosa entre Deus e a matemática da natureza. A
motivação de Kepler para suas investigações era poder encontrar as “harmonias
matemáticas na mente do Criador”. 32 À semelhança de Newton, Kepler
escreveu também sobre a vida de Cristo. 33
O versátil francês Blaise Pascal (1623-1662) foi outra mente brilhante dessa
época. Versado em teologia e o equilíbrio dos fluidos, lançou as bases da teoria
da probabilidade matemática. Os princípios que ele estabeleceu servem de base
para o método atual do estudo de muitos problemas na física, biologia e
sociologia. Pascal foi um homem profundamente religioso. Seu compromisso
implícito com Deus pode ser observado quando ele comenta que “o curso de
todas as coisas deve ter como objetivo o estabelecimento e a grandeza da
religião”. 34
O cientista inglês Robert Boyle (1627-1691) é considerado por muitos o pai
da química. Uma das suas principais contribuições foi subverter a concepção
clássica de apenas quatro elementos básicos: fogo, ar, terra e água. Estudantes de
química o conhecem especialmente pela Lei de Boyle, que explica a relação
inversa da pressão e volume nos gases. Boyle acreditava que podemos glorificar
a Deus ao explicar a criação, e que Deus criou o mundo e é continuamente
necessário para mantê-lo em funcionamento. 35 O historiador Frank Manuel
comenta que “o uso tradicional da ciência como forma de louvor ao Pai [Deus]
assumiu novas dimensões a partir das ideias de Robert Boyle”. 36 Boyle doou
boa parte de sua fortuna para causas religiosas na Irlanda e Nova Inglaterra.
Um dos principais biólogos dessa época foi o sueco Carl von Linné (1707-
1778), também conhecido como Lineu. Ele era o mais notável professor na
Universidade de Uppsala. Sua fama por classificar quase tudo de que tinha
conhecimento atraiu estudiosos do mundo inteiro. Lineu classificou inúmeras
espécies de organismos e ajudou a estabelecer o sistema atualmente usado para
dar nome aos organismos, composto de dois nomes, um para o gênero e outro
para a espécie. Novamente, como muitos outros cientistas de sua época,
acreditava que “a natureza é criada por Deus para a Sua honra e para bênção da
humanidade, e tudo acontece ao Seu comando e sob Sua direção”. 37
Nem todos os cientistas dessa época aceitavam a Bíblia de forma tão
implícita. Na França, o naturalista Buffon começou a propor pontos de vista não
bíblicos que diminuíam a importância de Deus na natureza; no entanto, ele fazia
parte de uma pequena minoria.

Situação atual: um confronto de visões


Milhares de pessoas assistiam a um encontro da Sociedade Americana de
Geologia em Nova Orleans. O presidente de uma sessão ressaltou que “a criação
é prostituição científica”, além de afirmar que “os criacionistas são tão
ultrapassados como uma nota de três dólares” (os Estados Unidos não possuem
essa nota). Outro orador comentou que “o catastrofismo bíblico” (ou seja, as
interpretações baseadas em um dilúvio universal, como descrito na Bíblia) é
“desonesto” e “vergonhoso”. Uma outra pessoa declarou que “ninguém deveria
se deixar enganar pela fraude dos criacionistas”. Esses foram apenas alguns dos
comentários que ouvi. 38 Embora algumas evidências válidas foram
apresentadas para apoiar essas afirmações, não se tratava de uma discussão
científica convencional. Ali não se podia ver aquela imagem do cientista calmo
em seu jaleco branco e absorto em seus cálculos.
A reação violenta percebida nesse encontro foi, em parte, estimulada por
uma pesquisa do instituto Gallup, feita com adultos nos Estados Unidos,
indicando que muitos não estavam seguindo a ciência. A pesquisa revelou que
44% acreditavam que Deus criou a humanidade nos últimos dez mil anos; outros
38% acreditavam que Deus conduziu o desenvolvimento do ser humano no
decorrer de milhões de anos; e apenas 9% criam no modelo científico segundo o
qual a humanidade teria evoluído num período de milhões de anos, sem a
intervenção de Deus. Alguns não expressaram nenhuma opinião. O Gallup já
repetiu a mesma pesquisa pelo menos mais cinco vezes e obteve basicamente os
mesmos resultados. 39 Parece que a maioria acha difícil imaginar que a
existência da humanidade não tenha nenhum significado ou propósito, e que
estamos aqui por mero acidente.
Os comentários críticos sobre a criação mencionados acima ilustram como o
clima atual de opiniões por parte de muitos cientistas em relação à Bíblia é bem
diferente daquele que se observava na época dos pioneiros da ciência moderna.
Esses pioneiros acreditavam com todo fervor que a Bíblia é a Palavra de Deus e
a verdade. Atualmente, os cientistas frequentemente se referem à Bíblia como
mitologia inválida em sua essência. No entanto, isso não significa que os
cientistas não mais creem em Deus. Eu me encontrava em um congresso
internacional de geologia em Paris. Um concerto de órgão de tubos na grande
catedral de Notre Dame estava programado como atração cultural do congresso.
Para minha alegria e surpresa, percebi que muitos geólogos se ajoelharam
reverentemente em atitude de oração ao entrarem na catedral. Pude então
constatar que a maioria desses cientistas realmente acredita em Deus. O quadro
se complica, no entanto, devido às diferentes concepções de Deus e da religião.
Alguns cientistas às vezes expressam livremente sua crença em algum tipo de
religião, mas não em Deus. Outros traçam uma nítida linha entre religião e
ciência. 40 A religião pode ser definida de muitas maneiras, incluindo retidão
moral, mas a concepção comum da palavra religião está frequentemente
relacionada com a adoração de um ou mais deuses. Manteremos essa concepção
em mente ao prosseguirmos.
Quantos cientistas creem em Deus? Embora exista todo tipo de dados a esse
respeito em várias publicações, sem falar nas opiniões informais da internet,
duas pesquisas publicadas na prestigiosa revista Nature parecem válidas. Mil
pessoas foram escolhidas aleatoriamente da lista de cientistas do dicionário
biográfico American Men and Women of Science e questionadas sobre sua crença
em Deus. Mas qual é o significado da palavra Deus? É uma palavra que pode ter
diferentes significados. Deus é um ser pessoal, um princípio ou, como dizia um
dos meus professores de zoologia, a natureza? Para a maioria, Deus é o Ser
Supremo, o Criador e Mantenedor da natureza. Nessa pesquisa, optou-se em usar
uma interpretação bastante estreita a respeito de Deus, uma que não encorajaria
uma resposta afirmativa. Os cientistas que acreditavam em Deus tinham que
afirmar: “Eu creio em um Deus que Se comunica com a humanidade de maneira
intelectual e afetiva, ou seja, um Deus a quem podemos orar com a expectativa
de obter uma resposta. Por ‘resposta’ quero dizer mais do que o efeito
psicológico e subjetivo da oração.” Os cientistas podiam também indicar que não
acreditavam nesse tipo de Deus ou ainda que não tinham condições de opinar.
Cerca de 40% responderam que criam no tipo de Deus que responde às orações,
45% responderam negativamente e 15% não possuíam crença definida. 41
Provavelmente mais de 40% acreditem em Deus, mas não no Deus conforme a
definição limitada do questionário. Um cientista chegou a escrever na margem
do questionário: “Acredito em Deus, mas não acredito que alguém possa esperar
respostas às suas orações.” É interessante observar que essa pesquisa, realizada
em 1996, foi semelhante a outra realizada 80 anos antes, com basicamente os
mesmos resultados. Logo após a pesquisa de 1996, membros da prestigiosa
Academia Nacional de Ciências dos Estado Unidos foram também pesquisados
sobre sua crença em Deus com as mesmas perguntas. Somente 7% afirmaram
acreditar em um Deus que responde às orações, conforme a definição do
questionário da pesquisa. 42
Por que uma proporção tão pequena dos membros dessa academia creem em
Deus? Vários fatores parecem entrar em jogo. 43 É de se esperar que o nível
maior de especialização dos membros da academia venha a limitar sua
perspectiva. A especialização facilmente restringe a visão do pesquisador,
especialmente se ele negligencia olhar além de sua área de especialização.
Ademais, o elitismo associado ao fato de ser membro da academia pode refletir
uma atitude de superioridade e orgulho gerada pelo sucesso da ciência. Esse
orgulho está em nítido contraste com a humildade e atitude de adoração
estimuladas pela crença em Deus. Insinuações têm sido ventiladas 44 de que
mais membros da Academia Nacional de Ciências dos Estado Unidos creem em
Deus do que se admite, e fatores sociológicos desempenham aí um papel
complicador. Persiste no meio científico a ideia de que, para ser um verdadeiro
cientista, deve-se permanecer distante da religião. Na época da pesquisa, a
academia estava preparando um livreto e revisando outro, ambos incentivando o
ensino da evolução nas escolas públicas e ao mesmo tempo opondo-se ao ensino
da criação. Tais atividades e pontos de vista não encorajariam, de fato, alguém a
defender a crença em Deus. Em contraste, um membro da academia
recentemente ousou criticar a evolução na imprensa, ressaltando que ela é muito
flexível e frequentemente utilizada para explicar concepções opostas como o
comportamento altruísta e o agressivo, além de contribuir pouco para a biologia
experimental. 45
Precisamos levar em conta que a academia representa menos de 2% dos
cientistas na lista de American Men and Women of Science. Dessa forma, ela
obviamente não representa a opinião da comunidade científica como um todo.
Afinal, 40% dos cientistas dessa comunidade creem num Deus que responde às
suas orações. Mas por que os livros didáticos de ciência, artigos científicos e as
apresentações na mídia praticamente nunca fazem referência a Deus? Essa
incongruência reflete, sem dúvida, a aversão que o etos científico atual parece ter
pela religião, o que não está de acordo com as crenças de muitos cientistas.
Fatores sociológicos e atitudinais que consideraremos mais adiante podem
explicar melhor essa disparidade. 46
Por outro lado, cientistas e outras autoridades do Discovery Institute vêm
exercendo um impacto muito significativo por meio de livros, 47 palestras e da
internet. Eles têm promovido o conceito de que deve haver algum tipo de
desígnio inteligente para a natureza. Essa ideia tem merecido cada vez mais
atenção, à medida que o movimento do “desígnio inteligente” ganha
popularidade. No entanto, cientistas influentes opõem-se veementemente a
qualquer sugestão, por mínima que seja, de que existe algum tipo de Deus. Em
uma edição recente da revista American Scientist, um evolucionista comentou
que “o sucesso do movimento do desígnio inteligente atualmente é aterrador”. E
completou: “Em pelo menos 40 estados [americanos], esse movimento está
sendo considerado um item adicional ao currículo de ciência exigido nas escolas
públicas”. 48 É possível sentir um pouco do “sabor” da controvérsia se
atentarmos para as instruções dadas a membros do Congresso dos Estados
Unidos apoiando o desígnio inteligente. Oradores do Discovery Institute
enfatizaram que estavam lá “simplesmente para abrir mentes que têm sido
mantidas fechadas por um sacerdócio científico elitizado”. 49
Um incidente ocorrido em Kansas, nos Estados Unidos, esclarece ainda mais
a crescente importância do conceito do desígnio inteligente e a ameaça que traz à
evolução. Com o objetivo de avaliar o que deveria ser incluído no currículo da
escola pública, o departamento de educação do estado convocou defensores do
desígnio inteligente e do evolucionismo para discutir o assunto num encontro de
vários dias. Infelizmente, os evolucionistas não compareceram ao encontro para
debater com os defensores do desígnio inteligente. Porém, sentiram-se na
liberdade de expressar seus pontos de vista em entrevistas coletivas após as
reuniões. O boicote foi dirigido pela Associação Americana Para o Progresso da
Ciência, a maior organização de ciência geral do mundo e a editora da respeitada
revista Science. As razões apresentadas pelos evolucionistas para não
comparecerem incluíram a desconfiança de que o evento pudesse ser uma
armação, a prudência no sentido de não confundir o público e a necessidade de
mais tempo para discutir o assunto em um momento posterior. Contudo, essas
desculpas banais deixam os evolucionistas vulneráveis à crítica. Um membro do
departamento de educação comentou que estava “profundamente desapontada
pelo fato que eles tenham escolhido defender seus pontos de vista às escondidas”
e que “teria apreciado ouvir seus argumentos de maneira profissional e ética”. 50
Quando algo realmente desafia o secularismo dominante na ciência, é
compreensível que os evolucionistas se sintam incomodados. 51
O conceito de Deus criando o mundo em seis dias, conforme descrito na
Bíblia, ainda faz parte das crenças de inúmeros cientistas modernos. Um livro
recente intitulado In Six Days: Why 50 Scientists Choose to Believe in
Creation 52 [Em Seis Dias: Por que 50 Cientistas Escolheram Acreditar na
Criação] apresenta artigos escritos por 50 cientistas com título de doutorado, em
que eles explicam por que acreditam no relato da criação. Ainda está vivo o
compromisso dos pioneiros da ciência moderna em relação à Bíblia e ao relato
da criação nela contido, apesar da intensa polêmica e crítica mordaz por parte de
cientistas de renome. Referindo-se ao livro mencionado acima, o evolucionista
Richard Dawkins, da Universidade de Oxford, Inglaterra, comenta que “nunca
teria imaginado que tal fantasia ilusória e autoengano pudessem ser
possíveis”. 53 Do outro lado do Atlântico, o falecido Stephen Gould, de Harvard,
também fez pouco caso da discussão a respeito da criação. Em sua opinião, a
ciência conseguiu fornecer respostas muito adequadas sem apelar para Deus. Ele
caracterizou a evolução como “um fenômeno tão bem documentado como
qualquer outro na ciência” e “um dos maiores triunfos da descoberta
humana”. 54 Percebe-se que as trincheiras da batalha estão ficando cada vez
mais profundas.
Alguns podem se perguntar por que, numa era de avanço científico, tantas
pessoas nos Estados Unidos acreditam que a humanidade foi criada por Deus.
Sem dúvida, há muitas razões para isso. Um fator importante é a “alta
porcentagem de professores de biologia que defendem o criacionismo”. 55 Essa
afirmação do editor da revista The American Biology Teacher [O Professor de
Biologia Americano], sob a rubrica “Imperícia Educacional”, tem que ver com
uma série de pesquisas efetuadas com professores de biologia do nível
secundário de vários estados norte-americanos. Os resultados mostram que entre
29 e 69% acreditam que o “criacionismo deveria ser ensinado nas aulas de
ciência de escolas públicas”, e entre 16 e 30% de fato o ensinam. Deus não está
morto nessas aulas de ciência. Por outro lado, a Associação Nacional de
Professores de Biologia fez uma declaração em 1995 afirmando que a evolução
“é um processo natural, imprevisível, impessoal e não supervisionado”. 56 Ao
usar as palavras “não supervisionado” e “impessoal”, a Associação insinuou, na
visão de muitos, uma postura ateísta; na verdade, ela está fazendo uma
declaração teológica de que não há Deus. Após prolongadas discussões, as
palavras ofensivas foram removidas da declaração e alguns repórteres da
imprensa pública acusaram os cientistas de terem cedido às pressões dos
criacionistas. Para complicar a equação, existe o fato sutil de que o debate sobre
a existência de Deus sempre vem carregado de forte carga emocional, o que leva
muitos cientistas e outros estudiosos a simplesmente preferir o silêncio. Há
grande divergência entre os cientistas quanto à discussão sobre Deus. Usarei a
expressão “a discussão sobre Deus” vez ou outra para me referir ao
questionamento específico se Deus existe ou não.

Interesse crescente na discussão sobre Deus


Durante a última década, foram realizadas diversas conferências importantes
sobre a existência de um planejador ou de Deus. Especialmente notáveis foram
as conferências “Cosmos e Criação” na Universidade de Cambridge (1994),
“Mera Criação” na Universidade de Biola (1996), “A Ciência e a Busca
Espiritual” na Universidade da Califórnia em Berkeley (1998), “A Natureza da
Natureza” na Universidade de Baylor (2000) e “Deus, Natureza e Desígnio” na
Universidade de Oxford (2008). Nessas reuniões, cientistas de primeira linha são
os oradores, e alguns ganhadores de Prêmio Nobel ocasionalmente participam.
Inúmeras outras conferências sobre o assunto já foram realizadas em vários
lugares do mundo. Nesses encontros, muitas ideias são discutidas. A principal é
a discussão sobre a origem da vida. Sobre esse tema, os tópicos mais relevantes
que têm sido avaliados são os seguintes: (a) a evolução autônoma da vida, sem
qualquer intervenção de Deus (evolução naturalística); (b) a existência de algum
tipo de planejador (desígnio inteligente); (c) o uso da evolução no processo
criativo de Deus (evolução teísta); (d) a criação de várias formas de vida num
período de bilhões de anos (criação progressiva); (e) a criação de diferentes
formas de vida há alguns milhares de anos conforme implícito na Bíblia (criação
recente).
Há amplas evidências de um crescente interesse a respeito da discussão
sobre Deus. Tem havido um aumento acentuado no número de cursos
acadêmicos que abordam a relação entre ciência e religião. Há algumas décadas,
praticamente não existiam essas disciplinas nas instituições americanas de
ensino superior; atualmente, centenas delas enriquecem os currículos. 57
Incentivos da Fundação John Templeton contribuíram, sem dúvida, para esse
aumento. A antologia Cosmos, Bios, Theos 58 apresenta contribuições de muitos
cientistas renomados, incluindo mais de vinte ganhadores do Prêmio Nobel, que
discutem sobre ciência, religião e a existência de Deus. A revista Science,
considerada por muitos o periódico científico de maior prestígio no mundo,
apresentou em 1997 uma discussão sob o título “Science and God: A Warming
Trend?” 59 As seções de notícias e cartas de algumas revistas científicas
ocasionalmente se unem à discussão. A revista Explorer, da Associação
Americana de Geólogos do Petróleo, na edição de 2000, apresentou uma
discussão em seu editorial sugerindo que os geólogos deixam de se envolver no
debate sobre a criação para serem “politicamente corretos”. O artigo acrescenta
ainda que “um cientista que entra em debate com essa gente acaba se
aborrecendo. [...] Eles têm em estoque uma infinidade de frases de efeito e
palavras-chave para engabelar aqueles que não estão familiarizados com suas
táticas”. 60 Os leitores do editorial foram categoricamente contra o artigo,
ressaltando que a ciência deveria ser mais aberta a diferentes ideias sobre a
criação ou Deus. 61
No que diz respeito à exploração espacial, a discussão sobre a existência de
Deus é também assunto em pauta. Quando o famoso cosmonauta russo Gherman
Titov retornou de sua viagem, declarou que não conseguira encontrar deuses de
espécie alguma; disse também que havia procurado anjos, mas não os
encontrara. Ele tinha viajado apenas 221 quilômetros acima da superfície da
Terra! Mais tarde, contudo, os terráqueos observavam os astronautas da Apollo
circulando a Lua a 386.000 quilômetros de altitude enquanto liam a um público
extasiado as primeiras palavras da Bíblia: “No princípio criou Deus os céus e a
Terra.”
A imprensa também frequentemente se une a essa discussão. Uma edição da
revista Newsweek de 1998 estampou na capa as palavras “A ciência descobre
Deus”; e em 2006 a revista Time trouxe como manchete de capa o tema “Deus x
Ciência”. Revistas como Christianity Today, New Scientist, Skeptic e Skeptical
Inquirer frequentemente abordam a relação entre ciência e religião, às vezes
dedicando a maior parte de uma edição ao tema.
Alguns cientistas ousam crer em Deus. Ocasionalmente, alguns cientistas de
destaque escrevem a respeito da relação entre ciência e Deus. Paul Davies,
professor de Física Teórica na Universidade de Newcastle upon Tyne, na
Inglaterra, escreveu um livro para o público em geral intitulado God and the
New Physics [Deus e a Nova Física]. Ele se arrisca a dizer que “a ciência oferece
um caminho mais seguro para Deus do que a religião”. 62 Davies tende a ser
prudente no sentido de identificar com muita exatidão o tipo de Deus a que se
refere. Em um livro mais recente, ele comenta sobre “fortes evidências de que
‘algo está agindo’ por trás de tudo ao nosso redor”. 63 Além disso, Davies
defende a tese de que os cientistas podem ser religiosos. Ele revela: “Após a
publicação do livro God and the New Physics, fiquei admirado ao descobrir que
muitos cientistas do meu círculo próximo são membros praticantes de alguma
religião.” 64 John Polkinghorne, após ter trabalhado durante mais de 25 anos
como físico teórico de partículas na Universidade de Cambridge, redirecionou
seu campo de atuação e tornou-se clérigo da Igreja Anglicana e, mais tarde,
administrador na área educacional em Cambridge. Ele tem se dedicado ao estudo
da relação entre ciência e teologia, e já publicou muitos livros sobre o assunto.
Polkinghorne crê que Deus desempenha um papel ativo na manutenção do
Universo, além de garantir nosso livre-arbítrio. 65 Muitos outros cientistas têm
expressado sua crença em Deus e várias de suas declarações foram publicadas. 66

A ciência e o Deus racional da Bíblia


Um conceito fascinante que vem sendo divulgado há mais de meio século
desafia os contrastes sugeridos entre a ciência e Deus. Segundo esse conceito, a
ciência se desenvolveu no mundo ocidental especialmente graças à tradição
judaico-cristã. Em outras palavras, em vez de concebermos a ciência e Deus
como mundos à parte, a ciência deve sua origem ao Deus descrito na Bíblia.
Essa tese é defendida por um número impressionante de estudiosos. 67
O renomado filósofo Alfred North Whitehead, que foi professor em
Cambridge e Harvard, propõe que os conceitos da ciência moderna
desenvolveram-se como “derivativos inconscientes da teologia medieval”. 68 O
conceito de mundo ordenado, conforme inferido a partir do Deus único, racional
e coerente da Bíblia (monoteísmo), proveu o fundamento para a crença no
conceito de causa e efeito da ciência. Os inúmeros deuses pagãos imprevisíveis
de outras culturas eram caprichosos e, consequentemente, não se encaixavam na
previsibilidade que torna possível a ciência. R. G. Collingwood, que foi
professor de filosofia metafísica na Universidade de Oxford, ressalta que a
crença de que Deus é todo-poderoso contribuiu para mudar a visão sobre a
natureza de imprecisão para precisão, 69 e precisão se encaixa bem com a
exatidão alcançada pela ciência. Na Holanda, o falecido Reijer Hooykaas,
professor de história da ciência na Universidade de Ultrecht, enfatizou também
que a visão bíblica de mundo contribuiu para o desenvolvimento da ciência
moderna. Vale ressaltar que o relativo antiautoritarismo nutrido pela Bíblia, em
contraste com as práticas restritivas da Idade Média, foi de grande importância
no sentido de libertar a ciência da autoridade dos teólogos. 70 Um dos principais
eruditos nessa área é Stanley L. Jaki, com doutorado em física e teologia,
professor emérito na Seton Hall University, em New Jersey. Jaki ressalta com
muita perspicácia que as culturas grega, babilônica, egípcia, maia, chinesa e
hindu tiveram, em diferentes níveis, uma ciência embrionária que terminou em
aborto. Ele atribui esse fato à falta de crença dessas culturas na racionalidade do
Universo. A tradição judaico-cristã, por outro lado, forneceu o Deus racional
necessário para o estabelecimento da ciência. 71 É um paradoxo que o Deus que
pode ser a própria causa do surgimento da ciência moderna seja agora
categoricamente rejeitado pelo modelo de ciência secular da atualidade.
Não podemos dizer que a ideia amplamente aceita sobre a relação causal
entre o Deus da tradição judaico-cristã e a ciência moderna seja um fato
inquestionável. No entanto, esse conceito nos ajuda a perceber que não existe
uma forte dicotomia entre a ciência e o tipo de Deus descrito na Bíblia. Em
outras palavras, Deus é uma divindade de causa e efeito, que age com lógica, e
isso se enquadra bem na ciência.

Síntese
Os pioneiros da ciência moderna, como Kepler, Boyle e Newton, eram
crentes devotos em Deus e na Bíblia. Nenhum deles via conflito entre Deus e a
ciência, pois criam que Ele havia criado os princípios da ciência. Obviamente, é
possível a um grande cientista crer em um Deus ativo na natureza. Desde o
tempo desses pioneiros houve um processo de distanciamento. A ciência tomou
seu próprio rumo, isolando-se da religião e procurando respostas para muitos
questionamentos, incluindo as profundas questões sobre a origem e o propósito
da vida humana, sem qualquer referência a Deus. Embora muitos cientistas
acreditem em Deus atualmente, Ele é excluído praticamente de toda
interpretação científica. Cientistas renomados da atualidade fazem questão de
praticar uma ciência separada de Deus.
De tempos em tempos, a ciência passa por um processo de redefinição, e
este é um fato que merece consideração. Em geral, a maioria considera a ciência
o estudo de fatos e explicações sobre a natureza, mas os detalhes da definição
podem variar muito. Quando os fundamentos da ciência moderna foram
lançados, os estudiosos da natureza (os cientistas) eram chamados de
historiadores da natureza ou filósofos da natureza. Esses cientistas glorificavam
em seus escritos o Deus que eles consideravam ativo na natureza. Deus era
frequentemente mencionado como o criador de todas as coisas. Ele havia
estabelecido as leis da natureza, sendo assim parte da interpretação científica. A
importância de Deus na ciência foi diminuindo aos poucos, especialmente em
meados do século 19. Atualmente, presenciamos uma forte tendência no sentido
de excluir Deus da prática científica. Se alguém tentar incluí-Lo, não será
considerado um verdadeiro cientista. Deus é excluído por uma questão de mera
definição. Essa visão fecha as portas que poderiam permitir que a ciência
descobrisse Deus. Dentro desse paradigma, a ciência não pode ser vista como
uma busca aberta da verdade, o que pode conduzir ao erro, especialmente no
caso de Deus realmente existir!
Neste livro, proponho que o cientista deve estar aberto para a possibilidade
da existência de Deus e que a ciência deve seguir os dados da natureza,
aceitando qualquer direção para onde eles possam conduzir. Nossa preocupação
é encontrar a verdade, não adequar nossas conclusões a uma definição limitada
de ciência. Nas páginas a seguir, consideraremos a ciência como o estudo dos
fatos e interpretações da natureza. Uma questão básica que discutiremos no
último capítulo será a razão por que a ciência exclui Deus de seu repertório de
explicações.
Nas últimas décadas, temos visto um crescente interesse pela religião no
meio científico. A discussão sobre Deus vem ocorrendo de maneira séria,
refletindo padrões de como a ciência e a religião se relacionavam no passado.
Além disso, o Deus descrito na Bíblia é um Deus lógico, racional, que combina
bem com os princípios de causa e efeito da ciência. Na verdade, no que diz
respeito às abordagens racionais fundamentais, Deus e a ciência não são
diferentes, e a brecha estabelecida entre a ciência e Deus merece ser reparada.

Referências
1
Einstein A. 1950. Out of my later years. Nova York: Philosophical Library, p. 26.
2
Manuel FE. 1974. The religion of Isaac Newton. Oxford: Clarendon, p. 6.
3
Westfall RS. 1993. The life of Isaac Newton. Cambridge: Cambridge University Press, p. 18.
4
Westfall RS. 1980. Never at rest: a biography of Isaac Newton. Cambridge: Cambridge University Press.
5
More LT. 1934. Isaac Newton: a biography. Nova York: Dover, p. 97.
6
Ibid., p. 106.
7
Christianson GE. 1984. In the presence of the Creator: Isaac Newton and his times. Nova York: Free
Press, p. 193.
8
Ibid., p. 194.
9
Ibid., p. 197.
10
(a) Dampier WC. 1949. A history of science: and its relations with philosophy & religion. 4a edição.
Nova York: Macmillan, p. 159. (b) Westfall, The life of Isaac Newton, p. 276-286.
11
Westfall, The life of Isaac Newton, p. 134.
12
O título completo desse tratado é: Philosophiae naturalis principia mathematica.
13
Dampier, p. 154.
14
More, p. 287.
15
Newton I. 1686, 1934. Mathematical principles of natural philosophy and his system of the world.
Traduzido para o inglês em 1729 por Andrew Motte; tradução revisada por Florian Cajori. Berkeley:
University of California Press, p. 544.
16
More, p. 390-391.
17
Por exemplo, veja algumas sugestões em: Manuel FE. 1968. A portrait of Isaac Newton. Cambridge:
Harvard University Press.
18
Dampier, p. 160.
19
Citado por Miller DC. 1928. Newton and optics. In: The History of Science Society: Sir Isaac Newton,
1727-1927, a bicentenary evaluation of his work. Baltimore: Williams and Wilkins, p. 15.
20
Ibid., p. 15.
21
Gray P. 1999. The most important people of the millennium. Time 154 (27), p. 139-195.
22
Brewster D. 1885. Memoirs of the life, writings, and discoveries of Sir Isaac Newton, v. 2, reimpresso
em 1965 da edição de Edinburgh. Nova York: Johnson Reprint Corporation, p. 347.
23
Christianson, p. 355; Manuel, The religion of Isaac Newton p. 6, 61.
24
Manuel, The religion of Isaac Newton, p. 116-125.
25
Newton I. 1773. Observations upon the prophecies of Daniel and the Apocalypse of St. John. Londres:
impresso por J Darby e T Browne. [Esse livro foi publicado em português em 2008 pela editora
Pensamento-Cultrix.]
26
Westfall, The life of Isaac Newton, p. 301,303.
27
Christianson, p. 225.
28
Manuel, The religion of Isaac Newton, p. 53.
29
Turnbull WH, editor. 1961. The correspondence of Isaac Newton, v. 3, 1688-1694. Cambridge:
Cambridge University Press, p. 229-230.
30
Newton, Mathematical principles of natural philosophy and his system of the world, p. 544.
31
Citado por Manuel, The religion of Isaac Newton, p. 104; de Yahuda MS. 15. 3, fol. 46r.
32
Dampier, p. 127.
33
Manuel, The religion of Isaac Newton, p. 61.
34
Pascal B. 1952. Pensées. In: Pascal B. The provincial letters; Pensées; scientific treatises. Trotter WF,
tradutor. Great Books of the Western World Series. Londres: Encyclopedia Britannica, p. 270.
35
Dampier, p. 140.
36
Manuel, The religion of Isaac Newton, p. 33.
37
Nordenskiöld E. 1928, 1942. The history of biology: a survey. Traduzido por Eyre. Nova York: Tudor,
p. 206, 207.
38
Para saber mais, ver: Roth AA. 1983. Where has the science gone. Origins 10, p. 48-49.
39
Ver http://www.gallup.com/poll/content/default.aspx?ci=1942. Acesso: junho de 2005.
40
Gould SJ. 1999. Rocks of ages. Nova York: The Library of Contemporary Thought.
41
Larson EJ, Witham L. 1997. Scientists are still keeping the faith. Nature 386, p. 435-436.
42
Larson EJ, Witham L. 1998. Leading scientists still reject God. Nature 394, p. 313.
43
Para uma revisão geral de alguns fatores relacionados com essa questão, veja: Pearcey NR. 2004. Total
truth: liberating Christianity from its cultural captivity. Wheaton: Crossway, p. 97-121.
44
Para discussão adicional, ver Larson EJ, Witham L. 1999. Scientists and religion in America. Scientific
American 281 (3), p. 88-93.
45
Skell PS. 2005. Why do we invoke Darwin? The Scientist 19 (16), p. 10.
46
Ver os capítulos 7 e 8.
47
Algumas publicações significativas, entre muitas, são: (a) Behe MJ. 1996. Darwin’s black box: the
biochemical challenge to evolution. Nova York: Touchstone. (b) Dembski WA. 2004. The design
revolution: answering the toughest questions about intelligent design. Downers Grove: InterVarsity. (c)
Dembski WA. 1999. Intelligent design: the bridge between science & theology. Downers Grove:
InterVarsity. (d) Johnson PE. 2000. The wedge of truth: splitting the foundations of naturalism.
Downers Grove: InterVarsity. (e) Johnson PE. 1991. Darwin on trial. Downers Grove: InterVarsity. (f)
Wells J. 2000. Icons of evolution: science or myth? Why much of what we teach about evolution is
wrong. Washington, DC: Regnery Publishing.
48
Shipman P. 2005. Being stalked by intelligent design. American Scientist 93, p. 500-502.
49
Ver http://www.atheists.org/flash.line/evol10.htm. Acesso: junho de 2005.
50
Release da Associated Press, Topeka, 9 de maio de 2005. Ver
http://www.cbsnews.com/stories/2005/05/09/national/main693896.shtml. Acesso: junho de 2005.
51
Para uma revisão ampla de alguns argumentos, ver Dembski, The design revolution.
52
Ashton JF, editor. 1999. In six days: why 50 scientists choose to believe in creation. Sydney: New
Holland Publishers.
53
Dawkins R. 2000. Sadly, an honest creationist. Free Inquiry 21 (4), p. 7-8.
54
Gould SJ. 1999. Dorothy, it’s really Oz. Time 154 (8), p. 59.
55
Moore R. 2001. Educational malpractice: why do so many biology teachers endorse creationism.
Skeptical Inquirer 25 (6), p. 38-43.
56
Larson EJ, Witham L. 1999. Scientists and religion in America. Scientific American 281 (3), p. 88-93.
57
Ibid.
58
Margenau H, Varghese RA, editores. 1992. Cosmos, bios, theos: scientists reflect on science, God, and
the origins of the universe, life, and Homo sapiens. La Salle: Open Court Publishing Company.
59
Easterbrook G. 1997. Science and God: a warming trend? Science 277, p. 890-893.
60
Brown D. 2000. Quiet agenda puts science on defense: creation debate evolves into politics. American
Association of Petroleum Geologists Explorer 21 (1), p. 20-22.
61
Ver 10 cartas em Readers’ Forum. 2000. American Association of Petroleum Geologists Explorer 21
(3), p. 32-37.
62
Davies P. 1983. God and the new physics. Nova York: Simon and Schuster, p. ix.
63
Davies P. 1989. The cosmic blueprint: new discoveries in nature’s creative ability to order the universe.
Nova York: Touchstone, p. 203.
64
Davies P. 1992. The mind of God: the scientific basis for a rational world. Nova York: Simon &
Schuster, p. 15.
65
(a) Giberson KW. 2002. Bottom-up apologist: John Polkinghorne—particle physicist, Gifford lecturer,
Templeton Prize-winner, and parish priest. Christianity Today 46 (6), p. 64-65. (b) Polkinghorne J.
1990. God’s action in the world. CTNS Bulletin 10 (2), p. 1-7. (c) Polkinghorne J. 1986. One world: the
interaction of science and theology. Londres: SPCK. (d) Polkinghorne J. 1989. Science and creation:
the search for understanding. Boston: New Science Library. (e) Polkinghorne J. 1989. Science and
providence: God’s interaction with the world. Boston: New Science Library.
66
Alguns exemplos são: (a) Ashton JF, editor. 2001. The God factor: 50 scientists and academics explain
why they believe in God. Sydney: Thorsons, Harper Collins. (b) Ashton, In six days. (c) Barrett EC,
Fisher D, editores. 1984. Scientists who believe: 21 tell their own stories. Chicago: Moody Press. (d)
Mott N, editor. 1991. Can scientists believe? Some examples of the attitude of scientists to religion.
Londres: James & James. (e) Richardson WM, et al., editors. 2002. Science and the spiritual quest: new
essays by leading scientists. Nova York: Routledge.
67
Para uma análise recente, ver Stark R. 2003. For the glory of God: how monotheism led to
reformations, science, witch-hunts, and the end of slavery. Princeton: Princeton University Press, p.
147-157.
68
Whitehead AN. 1925. Science and the modern world. Londres: Macmillan, p. 19.
69
Collingwood RG. 1940. An essay on metaphysics. Oxford: Clarendon, p. 253-255.
70
Hooykaas R. 1972. Religion and the rise of modern science. Grand Rapids: Eerdmans, p. 98-162.
71
(a) Jaki SL. 1974. Science and creation: from eternal cycles to an oscillating universe. Nova York:
Science History Publications. (b) Jaki SL. 1978. The road of science and the ways to God: the Gifford
Lectures 1974-1975 e 1975-1976. Chicago: University of Chicago Press. (c) Jaki SL. 2000. The savior
of science. Grand Rapids: Eerdmans, p. 9-48.
A gravidade pode colocar os planetas em
movimento, mas, sem o poder divino, ela
jamais poderia colocá-los em seu movimento
circulatório ao redor do Sol; assim,
por essa e outras razões, sou forçado
a atribuir a estrutura desse sistema
a um agente inteligente. 1
Sir Isaac Newton

O que existe no Universo?


Há poucas paisagens mais deslumbrantes do que a visão cristalina de
miríades de estrelas cintilantes numa noite clara. Infelizmente, hoje em dia
apenas aqueles que vivem longe dos grandes centros urbanos podem se
maravilhar frequentemente com essa infusão de realidade. As luzes das cidades e
a poluição ofuscam o magnífico desfile de estrelas com seus vários tons de azul,
amarelo ou vermelho. A maioria das pessoas tem o privilégio de ver apenas
algumas estrelas brilhantes ou o brilho pálido da Lua espreitando por entre a
parafernália da civilização. Contudo, o Universo que estamos descobrindo além
da Terra é muito maior do que aquilo que é possível ver em uma noite sem
nuvens.
Munidos de telescópios altamente sofisticados e instrumentos
especializados, os cientistas têm feito descobertas incríveis. Especialistas que se
denominam cosmólogos, físicos, filósofos, teólogos, astrofísicos e astrônomos
reivindicam para si a habilidade de interpretar o que está sendo descoberto. Essa
é umas das áreas de pesquisa mais empolgantes, e tem profundas implicações
filosóficas. Estamos descobrindo que o Universo aparenta ser ajustado com
muita precisão, de modo a permitir tanto sua existência como a nossa. Antes de
considerarmos esse ponto, vamos analisar o que existe no céu para entendermos
com mais facilidade as razões por que se acredita que o Universo está em
sintonia fina.
Um dos aspectos que mais chamam a atenção no céu noturno é uma
“nuvem” de estrelas muito comprida e irregular, popularmente conhecida como
Via Láctea. Na verdade, fazemos parte dessa nuvem, que é uma massa
gigantesca de estrelas com o formato de um disco ( Figura 2.1 ). Quando
observamos em direção às bordas desse disco, ou seja, da Via Láctea, podemos
ver ali um número muito maior de estrelas do que o encontrado na sua superfície
plana, que compreende quase todo o restante do céu. É como estar em meio a
uma multidão: você verá um maior número de pessoas se olhar ao seu redor do
que se fitar o chão ou o céu. O disco de estrelas que vemos é chamado de
universo-ilha ou galáxia, sendo a nossa a Via Láctea. Ela abriga cerca de cem
bilhões de estrelas relativamente semelhantes ao nosso Sol. Este tem uma cor
amarelada; algumas estrelas são mais frias e aparentam mais avermelhadas,
enquanto outras são mais quentes e azuladas. As quatro estrelas azuis do
Trapézio na constelação de Órion possuem massa (quantidade de matéria) dez
vezes maior que a do Sol e um brilho milhares de vezes mais intenso. 2 As
estrelas, às vezes, parecem sofrer a influência da gravidade de uma maneira que
sugere a existência de muita matéria extra no Universo. Os físicos a chamam de
matéria escura, pois ela não emite luz como as estrelas. Aparentemente, existe
mais matéria escura do que estrelas, mas há muitas perguntas sem respostas; na
verdade, nem mesmo sabemos ao certo o que é matéria escura ou se ela de fato
existe. Esse enigma representa apenas uma pequena parcela dos muitos mistérios
que os cientistas estão descobrindo sobre o Universo.
As estrelas de nossa galáxia não estão distribuídas de modo equilibrado. Elas
tendem a se concentrar nos braços alongados que saem do centro em formato de
espiral ( Figura 2.1 B ). Nós vivemos na extremidade de um desses braços, a
cerca de dois terços de distância do centro da galáxia. O centro da nossa galáxia
possui uma saliência onde o disco é mais espesso. Um ou mais dos infames
buracos negros podem estar localizados ali. Nos buracos negros, a força da
gravidade é tão intensa que nem mesmo a luz escapa; por isso, eles parecem
negros. Se você se aventurasse a chegar muito perto, também não conseguiria
escapar. Essas são áreas a ser evitadas!
Nossa galáxia parece estar girando majestosamente no espaço, mas não
muito rapidamente. O Sol leva cerca de 250 milhões de anos para concluir uma
rotação completa ao redor da nossa galáxia. 3 Pode não parecer muito rápido,
mas as distâncias são tão vastas que o Sol precisa viajar a 225 quilômetros por
segundo (806.400 quilômetros por hora) para completar esse circuito nesse
tempo.
A maior parte das estrelas observadas no céu noturno são outros sóis da Via
Láctea. Contudo, se você observar com cuidado, mesmo sem usar um telescópio,
poderá ver fracamente a Galáxia Andrômeda, que fica muito distante da nossa.
Essa galáxia possui uma quantidade de estrelas semelhante à nossa, e perto dela
encontram-se galáxias satélites menores, formadas por bilhões de estrelas. Esses
satélites são mantidos lá pela atração gravitacional de Andrômeda. A Via Láctea
e Andrômeda correspondem ao que chamamos de galáxias espiraladas devido ao
arranjo aberto de suas estrelas. Porém, a maioria das galáxias tem um formato
diferente, como o elíptico, que é bem comum. Algumas galáxias são esféricas e
outras são irregulares.
Nossa galáxia faz parte de um “Grupo Local” composto de cerca de 34
galáxias localizadas na extremidade do enorme aglomerado de galáxias de
Virgem. Um agrupamento de galáxias em forma de lençol, conhecido como “a
Grande Muralha”, foi também encontrado. 4 É quase inacreditável o número de
galáxias que estão sendo descobertas mediante o uso de telescópios na Terra e no
espaço. Estamos falando de cem bilhões de galáxias em nosso Universo
conhecido, cada uma com uma média de cem bilhões de estrelas. 5 Será que
existem outras galáxias ou universos além dos que conseguimos ver? Não
sabemos. Qualquer sugestão nesse sentido não passa de mera especulação.
Todos temos eventos em nossa vida que nunca esquecemos. Para mim, um
desses momentos ocorreu em 1987, quando eu viajava pela Austrália. Certa
noite, olhei para o céu e vi uma estrela muito brilhante onde antes só havia uma
estrela bem apagada. Como isso era possível? Tratava-se de um evento raro: a
explosão de uma supernova, e umas das maiores já vistas. Algumas dessas
explosões foram registradas na história antiga, mas essa foi a mais notável nos
tempos modernos. Acredita-se que uma estrela de brilho fraco, com massa
aproximadamente dez vezes maior do que a do nosso Sol, entrou em colapso.
Isso ocorreu devido ao efeito da gravidade em uma massa de tamanha
magnitude. A desintegração da estrela causou uma explosão que produziu uma
estrela de grande brilho em apenas algumas horas. Ela ficou bem visível durante
várias semanas. A supernova provavelmente tenha produzido uma estrela de
nêutron, cuja matéria é tão pesada que poderá finalmente entrar em colapso de
novo e se transformar em um buraco negro.
Estima-se que uma colher de chá dessa estrela desintegrada pesaria cerca de
quinhentos milhões de toneladas na Terra. Uma afirmação como essa pode
parecer mais plausível se reconhecermos que a matéria “sólida” comum é
composta em sua maior parte de espaços vazios. O motivo pelo qual o raio-x
consegue penetrar tão facilmente em nosso corpo é justamente porque somos
compostos de muito espaço vazio, incluindo nosso cérebro! Se eliminássemos o
espaço vazio que existe entre os átomos e dentro deles, obteríamos uma matéria
muito pesada. Os átomos são muito vazios, milhares de vezes mais vazios do
que suas representações nas ilustrações tradicionais ( Figura 2.2 ). O diâmetro
externo de um átomo é calculado em cerca de dez mil vezes o tamanho de seu
núcleo central, enquanto quase toda a matéria está concentrada no núcleo.
Assim, existe muito espaço vazio em um átomo, fazendo com que este entre em
colapso. Se toda a humanidade fosse comprimida até a densidade de uma estrela
de nêutrons, todos nós juntos teríamos o tamanho de uma ervilha! 6
Uma supernova que se explode é apenas um exemplo da dinâmica do nosso
Universo. Podemos observar também os quasares, que, embora muito menores
que as galáxias, podem ser mil vezes mais brilhantes do que elas. Podem
também abrigar alguns dos intrigantes buracos negros. Existe, então, a sugestão
de que algumas galáxias poderiam estar engolindo outras galáxias, como se
fossem canibais. Nosso universo parece bastante ativo.
Felizmente, a situação é mais tranquila em nosso sistema solar com seus oito
planetas (entre eles, a Terra) girando ordenadamente ao redor do pródigo Sol,
que nos fornece uma fonte segura de energia. Plutão, considerado um planeta
durante décadas, perdeu esse título oficial, mas ainda está presente em nosso
sistema com sua “lua”. Os planetas, que, ao surgirem no céu noturno, se parecem
com vagarosas estrelas caminhando, não emitem luz própria, mas apenas
refletem a luz do Sol. Ao todo, os planetas têm pelo menos 60 luas, 7 incluindo a
que gira sozinha ao redor da Terra, que tem sido motivo de inspiração para
cantores e poetas.
Os quatro planetas internos, incluindo a Terra, possuem superfície sólida.
Marte é o planeta que mais se parece com a Terra. Vênus, cuja órbita é mais
próxima do Sol do que a da Terra, gira curiosamente em direção contrária à dos
planetas vizinhos. Esse fato torna problemático o conceito de um modelo
simples segundo o qual os planetas teriam se formado a partir de um único
evento. Os planetas externos têm maior quantidade de massa, mas são
principalmente gasosos, com pequenos centros rochosos. Plutão, bem mais
afastado do que os planetas, é diferente, sendo composto de certa quantidade de
gelo de metano, e, como Vênus, gira em direção oposta à dos outros seis
planetas. Saturno, famoso por seus impressionantes anéis, é tão leve que poderia
de fato flutuar sobre a água, se fosse possível encontrar um reservatório com
quantidade suficiente de água. O maior planeta, Júpiter, também gasoso, tem
uma lua, Io, intensamente vulcânica. Entre Marte e Júpiter encontra-se um anel
contendo milhares de pequenos corpos rochosos irregulares chamados
asteróides. Alguns deles ocasionalmente invadem impetuosamente nossa
atmosfera, produzindo raios de luz conhecidos como meteoros. Júpiter é tão
maciço que chega a atrair escombros que de outra forma atingiriam a Terra. Os
astrônomos estimam que, se Júpiter não estivesse ali, a Terra seria atingida por
cometas e escombros de cometas “com frequência aproximadamente mil vezes
maior”. 8 Cometas de gelo com longas caudas que percorrem nosso sistema
solar por caminhos previsíveis somam-se à complicada trama que compõe nosso
sistema solar. Recentemente, os cientistas descobriram novos planetas que
orbitam ao redor de outros sóis.

A imensidão incalculável do Universo


A partir do nosso planeta, não é fácil compreender quão distantes se
encontram outras partes do Universo. Nosso Sol aparentemente encontra-se a
pouca distância da Terra, mas está a quase 150 milhões de quilômetros. Não é
fácil ter uma ideia correta do que isso significa. A seguinte ilustração poderá
ajudar: se alguém tivesse que fazer uma viagem da Terra ao Sol na velocidade de
um avião comercial, levaria 19 anos ininterruptos para chegar lá. Para chegar a
Plutão com essa mesma velocidade, seriam necessários 741 anos.
Proporcionalmente, se o Sol fosse aproximadamente do tamanho de um quarto
com três metros de cumprimento, a Terra teria o tamanho aproximado de um
damasco, girando a uma distância de 330 metros, e Plutão, por sua vez, teria o
tamanho de uma ervilha, a 13 quilômetros de distância.
Comparado com o Universo, nosso sistema solar é extremamente pequeno.
Para falarmos sobre o restante do Universo, é mais fácil usar uma unidade de
medida muito maior do que quilômetros, se não quisermos encher muitas
páginas com zeros ao escrever os números. Os astrônomos usam outra unidade
conhecida com ano-luz, que é a distância que a luz viaja no período de um ano,
ou seja, aproximadamente 9.461.000.000.000 de quilômetros.
A luz do Sol leva oito minutos para chegar à Terra. Isso significa que,
quando você vê um grande raio solar brilhando a 95 mil quilômetros da
superfície do Sol, ele ocorreu de fato oito minutos antes. A estrela mais próxima
fora do nosso sistema solar é a Alfa Centauro. A luz proveniente dessa estrela
leva quatro anos para chegar à Terra; por isso, dizemos que ela se encontra a
quatro anos-luz de distância. A extensão da Via Láctea é de aproximadamente
100 mil anos-luz; e Andrômeda, segundo estimativa dos astrônomos, situa-se a
dois milhões de anos-luz da Terra, uma viagem nada curta. O que observamos
agora no espaço já está desatualizado, especialmente se pensarmos nas galáxias
mais distantes, que se encontram a bilhões de anos-luz da Terra. Visto que a luz
proveniente das estrelas mais distantes leva tanto tempo para chegar até nós, os
astrônomos interpretam as imagens dessas estrelas como eventos ocorridos há
muito tempo.
Embora exista um número estimado de 70 sextilhões (7 seguido de 22 zeros)
de estrelas no Universo visível, o espaço é incrivelmente vazio, se levarmos em
conta as tremendas distâncias entre as estrelas, galáxias e conglomerados de
galáxias. Se todos os átomos de toda a matéria do Universo fossem isolados uns
do outros e distribuídos uniformemente por todo o volume do Universo, teríamos
apenas um átomo para cada cinco metros cúbicos de espaço. 9 Isso significa que
num volume equivalente a um cômodo de uma casa teríamos apenas seis
átomos. Em escala maior, constatamos que as galáxias se encontram a milhões
de anos-luz distantes umas das outras. Talvez seja positivo que a matéria se
encontre de forma tão dispersa no Universo. O físico Freeman Dyson 10 calcula
que, se a distância entre as estrelas fosse dez vezes menor do que a distância
real, haveria a forte probabilidade de alguma estrela se aproximar do nosso
sistema solar o suficiente para perturbar as órbitas dos planetas. Esse quadro
provocaria efeitos desastrosos para a vida em nosso planeta.

Com o que o Universo foi formado?


O imenso Universo é feito de minúsculos átomos comuns. O átomo foi
considerado a princípio a menor partícula de matéria existente no Universo, sem
a possibilidade de ser divido em partículas menores. No entanto, há cerca de um
século, os cientistas descobriram partes do átomo conhecidas como elétrons.
Trata-se de partículas minúsculas com uma carga elétrica negativa. Não demorou
muito até que descobrissem no átomo outras partículas muito maiores, ou seja,
os prótons, com carga positiva, e os nêutrons, sem carga alguma. Um próton tem
massa (quantidade de matéria) 1.836 vezes maior que a do elétron. Seriam essas
partículas do átomo as menores partes da matéria? Décadas atrás, descobriu-se
que é possível pressionar os prótons em rápido movimento uns contra os outros,
e aparentemente eles se dividem em unidades menores chamadas de quarks. Essa
constatação foi apenas o início das descobertas recentes nesse intrigante campo
da ciência. Os físicos já descobriram pelo menos 58 tipos de partículas
subatômicas. 11 A maior parte dessas partículas possui uma antipartícula
contendo uma carga oposta. Quando as duas se colidem, destroem-se
mutuamente. Surge então o questionamento se realmente algumas dessas
partículas são de fato partículas. Ainda não compreendemos totalmente muitas
coisas nesse ramo de estudo.
Nosso conceito simplificado de átomos é o de que consistem de um núcleo
central composto de prótons e nêutrons com elétrons orbitando na parte externa
( Figura 2.2 ). O núcleo do elemento mais leve que conhecemos, o hidrogênio,
consiste de apenas um próton e um elétron na parte externa. O hélio possui dois
prótons, dois nêutrons e dois elétrons. O carbono e o oxigênio, tão essenciais à
vida, geralmente possuem, respectivamente, seis e oito dessas partículas básicas.
Elementos mais pesados têm relações mais complexas e em maior número.
Ao observar uma luz branca comum, você talvez não se dê conta de que o
que realmente está vendo é uma mistura de todos os tipos de cores. A luz branca
na televisão ou na tela do computador é, na realidade, o resultado da combinação
de luz vermelha, verde e azul, o que pode ser facilmente percebido com o uso de
uma lente de aumento. Passamos a ter maior consciência desse fato quando a luz
solar branca se divide nas diferentes cores do arco-íris pelas gotas de chuva. Esse
fenômeno é utilizado para nos informar a respeito da composição química do
Universo. Ao se passar um feixe estreito de luz de uma estrela através de um
prisma de vidro, os astrônomos conseguem observar as diferentes cores
produzidas pelas estrelas, e muito se tem aprendido com base nessas
observações. Os átomos muito ativos nas estrelas produzem essa luz à medida
que os elétrons ao redor dos núcleos dos átomos liberam parte de sua energia
quando saltam de uma órbita para a outra. Cada tipo de átomo produz um padrão
de cor diferente. Por exemplo, se observarmos tipos específicos de vermelho,
azul, violeta e violeta escuro, podemos saber que estamos vendo átomos de
hidrogênio. Graças ao estudo da luz proveniente de muitas estrelas no Universo,
tem-se constatado que as estrelas são compostas do mesmo tipo de elementos
que encontramos na Terra, mas com proporções muito diferentes. Enquanto 82
% da crosta terrestre é composta de elementos mais pesados como o oxigênio, o
silício e o alumínio, 97% do Universo parece ser formado pelos dois elementos
mais leves de que temos conhecimento, ou seja, hidrogênio e hélio.

Concepções sobre o Universo


Alguns acreditam que o Universo sempre existiu. Para esse grupo, a
pergunta sobre a origem do Universo não tem nenhum significado. Os cristãos,
judeus e islâmicos acreditam que Deus criou o Universo. Religiões orientais, por
sua vez, apresentam uma variedade de concepções e sugestões envolvendo ciclos
repetitivos de mudança no decorrer do tempo. Alguns séculos atrás, havia todo
tipo de especulação sobre a natureza do Universo. Surgiram, então, muitos
gigantes intelectuais, incluindo Sir Isaac Newton, que descreveu as leis da
gravidade e o movimento dos corpos, que explicaram a trajetória das estrelas. As
descobertas de Newton causaram grande impacto no pensamento científico de
sua época. Os cientistas passaram a mostrar que o Universo até então misterioso
era explicável e previsível, assim como muitas outras coisas. Havia,
aparentemente, menor necessidade de Deus. Visto que tudo estava sendo
explicado, havia até insinuações de que o trabalho dos físicos estava chegando
ao fim. Mas nem tudo permaneceu tão explicável assim por muito tempo. A
teoria quântica e a teoria da relatividade mudaram completamente essa
concepção. Analisaremos brevemente o desenvolvimento dessas teorias pelo fato
de nos ajudarem a compreender com mais clareza como a ciência funciona.
Sérias dificuldades surgiram um século atrás, não no campo das estrelas,
mas no mundo submicroscópico de seus átomos e da energia que emitem. A área
de estudo conhecida como teoria quântica lida com conceitos que, às vezes,
parecem pura fantasmagoria quando contrastados com o universo normal de
causa e efeito que intuitivamente aceitamos sem questionamento. Introduzida
por Max Planck (1858-1947), a teoria quântica propunha que certas quantidades
físicas podiam assumir apenas certos valores definidos, mas não valores
intermediários. Além disso, os elétrons poderiam se comportar em alguns
aspectos como as ondas, mas em outros como partículas. Alguns resultados eram
previsíveis, mas apenas em nível estatístico e quando os pesquisadores
consideravam muitos eventos juntos. Em nível individual, no entanto, predições
válidas não eram possíveis. Um dos grandes conceitos derivados desses estudos
foi o princípio da incerteza, de Werner Heisenberg, que afirma que não é
possível saber precisamente a posição e o momentum (velocidade multiplicada
pela massa) de uma partícula. Toda essa teoria abriu as portas para muita
especulação filosófica, incluindo conceitos de que não existe nenhuma realidade
quântica concreta, ou de que a imprevisibilidade na teoria quântica constitui a
base de nossa liberdade de escolha. Uma conclusão cautelosa seria a de que
ainda temos muito que aprender a respeito do misterioso mundo da teoria
quântica. Qualquer afirmação alegando compreensão plena da teoria quântica
não passa de mera pretensão. O conceito, no entanto, tem sido muito proveitoso
no desenvolvimento de instrumentos exóticos como lasers e ímãs
supercondutores, e vem sendo usado amplamente em modelos de universo em
expansão. Um dos melhores efeitos da teoria é a ampliação da perspectiva
filosófica do homem. O conceito nos ajuda a perceber que a realidade não se
limita às simples ideias que podemos compreender; é necessário levar em conta
o incerto e o imprevisível.
Igualmente desconcertante para nossa maneira convencional de ver as coisas
é a teoria da relatividade. Introduzida por Albert Einstein (1879-1955), um dois
maiores gênios do nosso tempo, a teoria tem-se demonstrado notavelmente útil.
Einstein, nascido na Alemanha e educado na Suíça, cria firmemente em Deus,
mas não no tipo de Deus que os cristãos geralmente aceitam, ou seja, um Deus
criador envolvido com a criação e com nossa vida pessoal. Para Einstein, a
consistência, ordem e harmonia do Universo representavam Deus. Sua famosa
afirmação de que “Deus não joga dados” reflete seu pensamento. Essa afirmação
foi proferida como objeção a algumas incertezas da teoria quântica.
Na teoria da relatividade, não é possível ir mais rápido do que a velocidade
da luz, e essa velocidade é sempre a mesma no vácuo, não importa o movimento
ou a direção da fonte ou do observador. Contudo, o quadro pode ser mais
complicado. Por exemplo, algumas descobertas recentes sugerem que possa ter
existido alguma variação na velocidade da luz ou em fatores que mantêm
estreitas ligações com ela. 12 Na teoria da relatividade, muitos outros fatores
físicos podem variar drasticamente, mas em geral não percebemos essas
variações, pois no campo normal de nossas observações elas são minúsculas.
Contudo, se viajássemos próximos da velocidade da luz, perceberíamos que os
relógios funcionariam mais lentamente, as distâncias se reduziriam e a massa
aumentaria. À velocidade da luz, teoricamente a massa se tornaria infinita, o que
restringiria a velocidade de qualquer objeto. Na teoria da relatividade, o espaço
pode se tornar curvo e a massa pode se transformar em energia e a energia em
massa, conforme descrito pela famosa expressão E = mc2.
Muitas observações confirmam a validade da relatividade. O tempo deveria
transcorrer mais lentamente perto de corpos maciços, o que de fato acontece.
Relógios de alta precisão funcionam mais rapidamente no alto de um
reservatório de água do que em sua base, onde estão mais perto da massa da
Terra. Nossos incríveis sistemas globais de posicionamento (GPS) podem levar
em consideração essas diferenças para aumentar sua precisão. 13 Grandes
massas como a do Sol podem curvar a luz, conforme predito pela relatividade.
Por meio do uso de relógios atômicos colocados em aviões, é possível detectar
efeitos ínfimos de relatividade, embora um avião viaje a um milionésimo da
velocidade da luz. 14 Quanto mais rapidamente uma pessoa viajar no espaço,
mais lento deverá ser seu processo de envelhecimento. Você poderia viajar com
extrema velocidade no espaço por algumas semanas e, ao retornar à Terra, se
daria conta de que muitos anos teriam se passado e que seus amigos a familiares
estariam velhos ou mortos. 15
Seria o caso de a teoria da relatividade derrubar por terra Newton e suas
fórmulas cuidadosamente elaboradas a respeito da mecânica celeste? Não, mas a
teoria acrescenta nova dimensão ao trabalho de Newton e tem aplicação especial
a condições mais extremas. Os conceitos de Newton ainda funcionam em nosso
nível comum de experiência e no que diz respeito ao movimento do sistema
solar, com exceção de um problema pouco importante relacionado ao planeta
Mercúrio, o qual a relatividade explica melhor.
É possível que a teoria da relatividade seja superada no futuro por outros
conceitos mais avançados. No entanto, o conceito é útil para explicar muitos
fenômenos e tem sido confirmado de modo notável no decorrer dos anos. O fato
de que o tempo pode ser modificado é impressionante. Alguns pesquisadores
chegam a sugerir que o tempo na realidade não existe, e que não passa de fruto
de nossa imaginação. Porém, o conceito ainda é útil, pelo menos em nosso
planeta, e é bom tomar cuidado para não chegar atrasado ao trabalho!

O Universo em expansão e o Big Bang


No início do século 20, o astrônomo americano Vesto Slipher estudava a luz
proveniente das galáxias quando observou evidências que indicavam que
algumas galáxias se distanciavam de nós a uma velocidade inacreditável de mil
quilômetros por segundo. Uma das maneiras de calcular a velocidade com que
uma galáxia está retrocedendo é observar o quanto seu espectro de cores de luz
modifica em relação ao seu padrão normal. Quanto maior é a mudança, mais
rapidamente a galáxia está se movendo. Essa conclusão é baseada no conhecido
Efeito Doppler, frequentemente percebido quando uma ambulância com a sirene
em volume máximo vem em nossa direção e em seguida se distancia. O tom da
sirene cai sensivelmente depois que a ambulância nos ultrapassa, e, quanto maior
for a velocidade da ambulância, maior será a variação no tom ou frequência das
ondas sonoras. Quando uma ambulância vem a toda velocidade em nossa
direção, as ondas sonoras encontram-se relativamente “comprimidas”, deixando
o tom do som mais alto; à medida que o veículo se afasta, as ondas “se
alongam”, deixando o som mais baixo.
As ondas de luz provenientes das estrelas comportam-se, em certos aspectos,
como as ondas sonoras da sirene da ambulância. Quanto maior for a velocidade
das estrelas movendo-se em direção a nosso planeta ou se afastando dele, maior
será o aumento ou a diminuição da frequência observada, conforme as ondas de
luz são comprimidas ou alongadas da sua fonte. É importante ressaltar que é a
frequência das ondas de luz que determina a cor da luz. Por exemplo, a luz azul
tem uma frequência de onda mais alta, ou seja, mais rápida do que a luz
vermelha. Portanto, se o padrão normal de linhas no espectro da luz proveniente
de uma estrela muda-se para o lado vermelho do espectro, com frequência mais
baixa, isso significa que a estrela está se distanciando da Terra; se a mudança for
para o lado azul, com frequência maior, a estrela está se movendo em nossa
direção.
A realidade é que as galáxias distantes parecem mostrar uma variação em
direção ao vermelho, fenômeno conhecido como redshift. Esse movimento é
interpretado como significando que as galáxias estão se distanciando de nós,
algumas a uma velocidade de 50 mil quilômetros por segundo. Essas
interpretações são muito mais complicadas do que um simples redshift. Algumas
evidências bem fundamentadas não apoiam o redshift. Por isso, certos estudiosos
argumentam sobre a luz ir ficando cansada ao percorrer uma longa distância,
enquanto outros sugerem diferentes alternativas, 16 mas a opinião prevalecente
no momento favorece a exclusão de tais interpretações.
Na década de 1920, enquanto estudava as galáxias, o famoso astrônomo
Edwin Hubble, utilizando o então recente telescópio de 100 polegadas instalado
no Monte Wilson, na Califórnia, descobriu que, quanto mais distante uma
galáxia se encontrava, mais rapidamente ela se afastava. Esse fenômeno ficou
conhecido como a Lei de Hubble. O fato acrescentou ainda mais lenha à fogueira
da discussão que se avolumava a respeito do que acontecia no espaço. Hubble
calculava as distâncias com base no brilho que certos traços astronômicos
padrões assumiam, algo como definir a distância de uma vela com base no seu
brilho. O método não se mostrou muito preciso pelo fato de que nem todas as
estrelas têm brilho igual. Atualmente, os astrônomos medem distâncias estelares
por meio da luminosidade das estrelas variáveis Cefeidas. Eles descobriram que
algumas estrelas com um brilho específico se ofuscam ou avivam em períodos
regulares. Ao medirem o período de variação dessas estrelas, os cientistas podem
verificar o brilho normal da estrela e avaliar a distância da galáxia que contém
tal estrela.
Os cientistas têm procurado determinar a idade exata do Universo a partir da
premissa de que ele começou pequeno. Assim, eles calculam quanto tempo
levaria para que se expandisse ao seu tamanho atual. Estimativas recentes
colocam a idade do Universo na casa dos 10 a 15 bilhões de anos.
O conceito de que o Universo esteja se expandindo a uma velocidade
acelerada representou grave ameaça às visões tradicionais do início do século 20.
Se está em expansão, isso significa que no passado foi menor e antes disso
menor ainda. No fim das contas, chega-se a um ponto em que surgem
questionamentos sobre quando, como e por que o Universo teria inicialmente
surgido. Tais reflexões têm profundas implicações. A principal é que o Universo
não existiu sempre. Essa constatação abre a porta para se questionar como as
coisas tiveram um início e se alguma inteligência dominante como Deus poderia
ter dado início a tudo, e, se não, como tudo teria se iniciado. Todavia, a ideia de
Deus atuando na natureza é atualmente uma concepção impopular na ciência. O
renomado astrônomo Robert Jastrow comenta que, “quando um cientista escreve
a respeito de Deus, das duas uma: ou ele está pendurando a chuteira ou está
ficando senil”. 17 No entanto, a sugestão de que o Universo repentinamente veio
à existência parece estar muito próxima do relato bíblico que apresenta Deus
como a causa primeira de todas as coisas.
Einstein achava sem sentido e irritante a ideia de que o Universo teve um
início. 18 O surpreendente, no entanto, é que suas equações sobre a relatividade
indicavam, de fato, um Universo em expansão que teria tido um início. Esse
corolário lhe foi apresentado pelo astrônomo holandês Willem de Sitter e pelo
matemático russo Alexander Friedman, que também encontrou um erro em seus
cálculos. Einstein tentou resolver o problema da expansão propondo uma força
nova e desconhecida na natureza. Ele acrescentou uma constante cosmológica
hipotética, que anularia perfeitamente o conceito de expansão, proporcionando,
assim, um universo estático. Contudo, os dados do redshift de Hubble eram
bastante convincentes, e Einstein finalmente admitiu que sua proposta de uma
força desconhecida era o maior erro de sua vida. Paradoxalmente, os físicos
estão novamente retornando às ideias de Einstein sobre a constante cosmológica
com o objetivo de explicar dados recentes que sugerem que o Universo está não
somente se expandindo, mas aumentando cada vez mais sua velocidade de
expansão. Outras teorias, como a de que o Universo esteja se expandindo
repetidamente e então se contraindo, num suposto universo oscilante, ou a teoria
de um universo em estado invariável, segundo a qual nova matéria está sendo
continuamente criada, evitam o assunto de como iniciar um Universo. Porém,
essas ideias, de modo geral, ainda não são aceitas.
Se o Universo teve um começo, o que aconteceu no momento decisivo? Não
sabemos, mas existem algumas teorias de grande impacto. O modelo aceito
atualmente é denominado de Big Bang. O nome foi dado pelo famoso
cosmólogo britânico Sir Fred Hoyle, um dos mais ferrenhos críticos da teoria. A
expressão foi usada por ele de forma pejorativa, mas o termo acabou pegando
por ser dramático e descritivo. De forma geral, a teoria afirma que há cerca de
doze bilhões de anos toda a matéria do Universo estava concentrada em uma
partícula menor do que o núcleo de um átomo. A partícula era tão pequena que
seriam necessárias 1032 dessas partículas, uma ao lado da outra, para formar um
milímetro. 19 Contudo, a partícula teria sido extremamente pesada e quente,
tendo densidade e temperatura quase infinitas. Durante o primeiro período de
tempo do Universo, estimado em uma 1043 parte de um segundo, ocorreu o que é
chamado de singularidade. Nesse período, as condições eram tão diferentes que
as leis da física, como as conhecemos, falhavam e não se aplicavam. Detalhes
sobre o assunto são altamente especulativos. O Universo continuou a se expandir
à medida que se esfriava. Um período especialmente rápido desse processo de
expansão, chamado de inflação, teria ocorrido em algum ponto entre uma parte
de 1035 até uma parte de 1033 do primeiro segundo. Os quarks se formaram e,
em seguida, os prótons e nêutrons, à medida que a expansão prosseguia. Quando
o Universo tinha alguns segundos de idade, os núcleos de alguns átomos simples
começaram a se formar. A expansão continuou por muito tempo até que estrelas
e galáxias se formaram. Nessa época, o Universo teria cerca de um bilhão de
anos. As galáxias continuaram a se formar, e nossos elementos mais pesados se
formaram quando estrelas se desfizeram. Novas estrelas e sistemas solares se
apropriaram desses elementos mais pesados à medida que um tipo de Universo
mais maduro tomava forma. O que acontece no fim de todo esse processo? Há
varias teorias a respeito. No futuro, o Universo poderá diminuir seu ritmo de
expansão e se esfacelar completamente numa imensa catástrofe universal, ou
poderá continuar a se expandir até se transformar num vácuo indefinido.
Seria essa história realmente verdadeira ou alguma fantasia, fruto de uma
overdose de ficção científica? Estamos simplesmente diante de um jogo com
números enormes promovido por algumas personalidades dominantes, ou
estamos nos aproximando da verdade há tanto tempo esperada? A teoria do Big
Bang precisa se deparar com tantas circunstâncias favoráveis que alguns a
chamam de o “derradeiro almoço grátis”, e trata-se realmente de uma teoria que
desafia nossos conceitos normais de realidade. Contudo, o mesmo pode ser dito
sobre o Universo. Alguns renomados astrônomos, como Robert Jastrow, 20 que
afirma ser agnóstico, e Hugh Ross, 21 que é cristão, consideram o Big Bang uma
evidência de que Deus deu início a todas as coisas no princípio. Além disso, não
é difícil encontrar indícios de um processo semelhante na própria Bíblia ao
lermos em cinco passagens pelo menos a respeito de Deus “estendendo os
céus”. 22 Poderia Deus ter usado processo semelhante ao do Big Bang para criar
o Universo? Não sabemos. Ninguém precisa depender do Big Bang como
evidência para crer em Deus. Como veremos, a matéria do Universo está
organizada em uma configuração tão precisa e versátil que, independentemente
do Big Bang, a presença de um Deus planejador parece ser necessária.
O astrônomo real inglês Sir Martin Rees ressalta com muito discernimento
que “a teoria do Big Bang tem sobrevivido perigosamente por mais de trinta
anos”. 23 Uma das razões por que ela sobrevive é o simples fato de que nenhum
cientista tenha proposto algo melhor; outra razão é que a teoria é fundamentada
com dados impressivos, que, no entanto, vêm sendo contestados. Alguns
argumentos que favorecem o Big Bang são os seguintes: (a) evidência de que o
Universo está se expandindo; (b) a proporção de hidrogênio e hélio, que é
próxima à que se esperaria no Big Bang; (c) uma potente radiação de fundo em
forma de microondas encontrada em todo o Universo, com um padrão próximo
ao que se esperaria no Big Bang. Algumas variações minúsculas foram
detectadas nessa radiação e interpretadas como responsáveis pela formação de
galáxias.
O conceito por trás do Big Bang tem também graves problemas,
especialmente quando se considera que o processo teria ocorrido sem a presença
de algum tipo de planejador. Primeiro, como teria acorrido por acaso a precisão
necessária para o que obervamos? Consideraremos alguns detalhes a seguir.
Segundo, há que se considerar o intrigante problema da natureza misteriosa da
matéria negra com seu potencial de mudar muitas teorias. Terceiro, também
significativo é o problema da singularidade durante os primeiros poucos
momentos do Big Bang, o que reconhecidamente exclui as leis da ciência como
as conhecemos.
O famoso cosmólogo Stephen Hawking, conhecido por ser muito produtivo
apesar de estar confinado a uma cadeira de rodas com a doença de Lou Gehrig
(ou esclerose amiotrófica lateral), tem procurado contornar os problemas de uma
singularidade e de um início para o Universo. Ele uniu dois grandes pilares da
cosmologia, a saber, a relatividade e a teoria quântica, e acrescentou conceitos da
teoria das cordas e membranas (ou branes) 24 , que lida com dimensões além das
quatro que conhecemos (as três dimensões espaciais e uma temporal). Ele inclui
também conceitos matemáticos de tempo imaginário e de números
imaginários, 25 e sugere um universo sem limites no tempo e no espaço e sem
necessidade de um início ou fim. 26 Ele parece favorecer a ideia de um universo
que “simplesmente existiria”. Hawking comenta: “Que espaço resta então para
um criador?” 27 Suas ideias não são aceitas tão amplamente. Ele se refere a
Deus ocasionalmente, mas em geral num contexto avaliativo e não de aceitação.
Segundo alguns, é possível que seja deísta. 28 Um deísta crê em alguma forma
de Deus que deu início a todas as coisas há muito tempo, e que não mais atua na
natureza. Em seu livro recente, The Universe in a Nutshell [O Universo Numa
Casca de Noz], Hawking propõe uma abordagem puramente mecanicista. 29
Muitos cosmólogos admitem não saber como o Big Bang iniciou; outros
consideram esse mistério uma possível evidência para a existência de Deus.

Alguns exemplos de ajuste fino no Universo


Durante os últimos 25 anos, uma tendência importante e sólida vem
ganhando espaço na comunidade cosmológica. 30 Trata-se do reconhecimento
de que muitos fatores apontam para um tipo de universo “feito sob medida”, com
todas as condições adequadas para manter a vida, pelo menos em algumas partes
como a Terra. Poucos negam a natureza extremamente incomum desses
parâmetros físicos, difíceis de explicar no contexto de um mero acaso. A Tabela
2.1 resume algumas dessas descobertas. Somente imaginando as mais
desvairadas coincidências para acreditar que esses fatores, e às vezes as
interrelações extremamente precisas entre eles, simplesmente aconteceram por
golpe de sorte. Muitos veem nas evidências de ajuste fino no Universo a marca
de um desígnio altamente inteligente. Outros, naturalmente, nada têm a dizer,
mas poucos não admitem que algo muito incomum esteja acontecendo.
Alguns desses fatores incomuns são mais bem compreendidos em termos de
probabilidades. Números probabilísticos são às vezes usados de forma abusiva,
especialmente quando distorcem a realidade. Porém, quando usados de forma
conveniente, eles podem nos fornecer representações bastante precisas das
probabilidades envolvidas. Ninguém precisa ser jogador profissional para
perceber que, ao jogar “cara ou coroa” com uma moeda, você tem uma chance
em duas para que ela caia com a “cara” para cima. No caso do dado, a chance de
ele ter o número cinco no topo é uma em 6. Se você tiver uma bola de gude
amarela e 99 azuis, a chance de você conseguir pegar a amarela na primeira vez
e sem olhar é de uma em 100.
A probabilidade, ou seja, a chance de que um resultado ocorra, diminui
drasticamente quando são considerados juntos diversos eventos improváveis.
Para conseguir exatidão matemática ao se combinarem eventos improváveis, é
necessário multiplicar as improbabilidades de um pela improbabilidade de outro,
etc. 31 Por exemplo, a chance de alguém conseguir o número 5 depois de jogar
um dado uma vez é de uma em seis; a chance de conseguir um cinco em dois
dados é de apenas uma em 36 (1/6 x 1/6); e de um cinco em três dados é de um
em 216 (1/6 x 1/6 x 1/6); e de um cinco em quatro dados numa jogada é de
apenas uma em 1296 (1/6 x 1/6 x 1/6 x 1/6). Em outras palavras, se você ficar
jogando quatro dados muitas e muitas vezes, todos acabarão com cinco no topo
uma vez, em média, num total de 1296 jogadas. As improbabilidades
combinadas que encontramos no Universo são infinitamente menores e mais
improváveis. Abaixo seguem alguns exemplos das improbabilidades no
Universo.
O Sol. A vida não seria possível sem o Sol, pois a Terra seria extremamente
fria. O Sol surge todos os dias e vemos isso com a maior naturalidade.
Raramente apreciamos sua “fidelidade” em nos dar luz e calor. A luz do Sol,
mediante o processo da fotossíntese, nos fornece o alimento de que
necessitamos. A órbita da Terra parece estar no local exato em que deveria estar
para nos fornecer a temperatura que a vida humana, baseada no carbono, requer.
Se estivesse mais próxima ou mais distante do Sol, estaríamos sujeitos a
temperaturas insuportáveis. A temperatura do planeta Vênus, que se encontra
mais perto do Sol, chega a 460º C aproximadamente, ao passo que a de Marte,
mais distante do Sol do que a Terra, chega a -23º C. Estima-se que, se a Terra
estivesse apenas 5% mais perto do Sol ou 1% mais distante, toda a vida em
nosso planeta se extinguiria. 32
O Sol produz energia por meio da combinação de hidrogênio a fim de
formar o hélio ( Figura 2.2 ). Nesse processo de fusão, cerca de 0,7% da massa
do hidrogênio se converte em energia. 33 Trata-se do mesmo tipo de processo
que ocorre quando uma bomba de hidrogênio explode, e podemos imaginar o
Sol como uma explosão controlada de uma bomba de hidrogênio. A fusão solar
nos fornece há muito tempo a quantidade exata de calor e luz, e calcula-se que o
Sol possa continuar nesse processo por mais cinco bilhões de anos. O Sol é
muito quente na sua superfície e modelos matemáticos de suas atividades
internas indicam que seja muito mais quente no seu interior. Manchas e chamas
do tamanho de um planeta continuamente aparecem em sua superfície, indicando
sua atividade violenta. Parece haver no Sol um equilíbrio entre a força da
gravidade, que atrai para o interior a sua superfície mais fria, e a pressão externa
resultante da atividade nuclear interna. Essas forças, especificamente seus
valores constantes básicos, conforme discutiremos a seguir, parecem estar em
níveis bastante críticos.
A origem do carbono. O carbono é um elemento extremamente versátil que
forma a espinha dorsal química da vida na Terra, especialmente as moléculas
orgânicas encontradas nos organismos vivos, incluindo o DNA, as proteínas, os
carboidratos e gorduras. O que nos chama a atenção é a presença de um conjunto
admirável de circunstâncias fortuitas que favorecem a existência desse elemento
essencial. Quando os cosmólogos estudaram pela primeira vez a formação de
elementos mediante a fusão nas estrelas, notou-se que as reações favoreceriam
apenas um indício ínfimo de carbono, apesar de este constituir-se o quarto
elemento mais comum no Universo. O famoso cientista britânico Sir Fred Hoyle
propôs que o carbono deve ter um nível de ressonância de energia específico que
facilitaria sua formação a partir da combinação de núcleos de átomos de hélio e
berílio. Ressonância refere-se à harmonia entre diferentes fatores (níveis de
energia e alvos) que permitem as coisas acontecerem. É mais ou menos como
colocar uma raquete de tênis na posição exata para rebater uma bola lançada. Da
mesma forma, o nível exato de ressonância ajuda na formação de novos átomos.
A ressonância aumenta grandemente as chances de que um átomo de berílio,
formado por dois núcleos de hélio, combine com outro núcleo de hélio para
formar um átomo de carbono ( Figura 2.2 ). Sem essa ressonância, o hélio e o
berílio simplesmente seguiriam seu curso normal, comportando-se como se nada
mais fosse importante. Quando os colegas de Hoyle no Instituto de Tecnologia
da Califórnia verificaram o nível de ressonância do carbono, encontraram
praticamente o mesmo valor que Hoyle havia predito. Um deles, Willy Fowler,
recebeu posteriormente o Prêmio Nobel por seus estudos nessa área. O elemento
seguinte nessa série de síntese sugerida seria o oxigênio, cuja formação ocorreria
ao se acrescentar um núcleo de hélio a um núcleo de carbono ( Figura 2.2 ). O
que ocorre é que o oxigênio possui um nível de ressonância um pouco abaixo do
que é produzido, de maneira que uma pequena quantidade do carbono é
transformada em oxigênio, preservando, assim, o carbono necessário. John
Barrow, do Centro de Astronomia da Universidade de Sussex, considera esse
fenômeno algo “quase miraculoso”. 34 Calcula-se que, se o nível de ressonância
do carbono tivesse sido 4% mais baixo, ou o do oxigênio 1% mais alto,
praticamente não haveria carbono. 35 Para alguns, fica a impressão de que Deus
tem uma predileção especial pelo átomo de carbono!
A predição notável de Hoyle, junto com a demonstração experimental que a
confirmou, representa um dos marcos da cosmologia, cuja relevância, segundo
alguns, “nunca poderá ser exagerada”. 36 Acontecimentos dessa ordem ilustram
o poder de predição da ciência. Eles revelam o que de melhor a ciência pode
oferecer. É por isso que os cientistas procuram se certificar de que esses eventos
não sejam passados por alto. O próprio Hoyle, que rejeita a ideia de um Deus e
não aceita o cristianismo, 37 ficou de certa forma pasmo com os resultados. Ele
afirmou: “Uma interpretação dos fatos baseada no bom senso sugere que alguma
inteligência superior se intrometeu com a física, a química e a biologia, de
maneira que não vale a pena falar de forças cegas agindo na natureza. Os
números que se calculam a partir dos fatos me parecem tão convincentes que
essa conclusão se impõe praticamente sem a possibilidade de qualquer
questionamento.” 38 Cosmólogos como John Gribbin e Martin Rees, que, em
consonância com Hoyle, mantêm outros pontos de vista sobre a origem do
Universo opostos ao conceito de um Deus criador, estão também
impressionados, e chegam a afirmar que “não há evidência melhor para apoiar o
argumento de que o Universo foi projetado para nosso benefício, ou seja, feito
sob medida para o homem”. 39 Independentemente do fato de o carbono ter sido
formado nas estrelas, como alguns cosmólogos creem, ou por qualquer outro
processo, fica difícil escapar da proposta de que fatores especiais estejam
relacionados com seu papel crucial nos organismos vivos.
Força nuclear forte. Há quatro forças conhecidas na física. As forças de
suas constantes básicas são excepcionalmente adaptadas a suas funções. A mais
potente é a força nuclear forte, que mantém os quarks unidos em prótons e
nêutrons, e estes restritos aos núcleos dos átomos. Felizmente, essa força
funciona apenas em distâncias curtas dentro do núcleo do átomo; caso contrário,
o Universo poderia se resumir a uma simples bolha sustentada pela força nuclear
forte, sem a presença de átomos, estrelas ou galáxias individuais. Parece que a
força nuclear forte precisa estar dentro de limites próximos para funcionar
apropriadamente. Se fosse 2% mais potente, não haveria hidrogênio, 40 e sem
hidrogênio não haveria nenhum Sol para fornecer calor, nenhuma água, elemento
essencial para a vida, e nenhum organismo vivo, cujos componentes orgânicos
possuem hidrogênio em abundância. Se a força nuclear forte fosse apenas 5%
mais fraca, haveria apenas oxigênio no Universo, 41 e tudo seria simples e muito
enfadonho.
Força nuclear fraca. Esta força é milhares de vezes mais fraca do que a
força nuclear forte. Ela atua em certas partículas dentro do núcleo dos átomos, e
controla algumas formas da decadência radioativa dos átomos. A força nuclear
fraca ajuda a controlar a combustão do hidrogênio no Sol de maneira que este
continue em ação por bilhões de anos em vez de explodir como uma bomba. Se
ela fosse só um pouco mais forte, o hélio, produto da fusão no Sol, não seria
formado; e, se fosse só um pouco mais fraca, nenhum átomo de hidrogênio
restaria no Sol. 42
Força eletromagnética. Esta força atua fora dos limites do núcleo dos
átomos e interage com partículas de carga elétrica. Ela tem que ver com os
princípios que controlam as mudanças químicas e sua função é guiar os elétrons
ao fazerem sua órbita ao redor do núcleo dos átomos. Quando esses elétrons
mudam de órbita, podem liberar parte de sua energia em forma de luz visível.
Essa força está muito relacionada com a luz que obtemos do Sol. Se ela fosse um
pouco mais forte, estrelas como o Sol seriam vermelhas e muito frias para nos
fornecer o calor de que precisamos. Se fosse um pouco mais fraca, as estrelas
seriam azuis, de curta existência, e extremamente quentes, 43 de forma que
teríamos calor de sobra, mas só por um curto período de tempo.
A gravidade. Em contraste com as outras três forças mencionadas, a
gravidade é extremamente fraca. A forca nuclear forte é surpreendentemente
1039 vezes mais forte do que a gravidade. Contudo, em contraste com a força
nuclear forte, cujo domínio de atuação se limita ao núcleo dos átomos, a
gravidade tem um alcance muito mais amplo, exercendo sua força de atração
inclusive entre galáxias. É a gravidade que mantém as galáxias juntas, guia as
estrelas em suas órbitas e mantém unida a matéria das estrelas. Trata-se de uma
força muito importante que precisa ter um ajuste preciso para manter o Universo
em equilíbrio.
Os físicos têm procurado estabelecer uma relação entre as quatro forças
básicas mencionadas através de uma grande teoria unificada, mas até o momento
uma ligação causal entre a gravidade e as outras forças não pode ser
estabelecida. Nessas quatro forças, constatamos que cada uma parece estar no
nível adequado para desempenhar sua função específica e manter uma relação
com as funções das outras forças.
Um dos equilíbrios delicados observados é o relacionamento preciso
existente entre a gravidade e o eletromagnetismo. O físico Paul Davies comenta
que “cálculos revelam que mudanças na resistência de qualquer uma das forças
em apenas uma parte em 1040 representariam catástrofe para estrelas como o
Sol”. 44 Sob condições dessa natureza, não teríamos nosso benevolente Sol para
nos aquecer. Uma parte de 1040 representa um valor tão ínfimo que mal
conseguimos imaginar. Um exemplo hipotético poderá nos ajudar. Suponha que
você esteja diante de uma pilha gigantesca e esférica de palitos de fósforo, muito
maior do que todo o volume da Terra. Na realidade, uma pilha não apenas um
milhão de vezes maior que o volume da Terra, mas um milhão vezes um milhão
de vezes o volume de nossa Terra. Essa pilha mal se encaixaria entre a Terra e o
Sol. Nessa pilha, somente um fósforo tem cabeça, e os outros são completamente
lisos, sem cabeça. Você está sentindo muito frio e precisa daquele palito de
fósforo com cabeça para acender um fogo. A chance de você conseguir pegar
esse palito na primeira tentativa, sem olhar, é maior do que uma em 1040.
Portanto, a chance de você conseguir pegar o palito correto é maior que a chance
de a gravidade ter o valor exato!
Qual é o nível de confiabilidade desses números? Os físicos às vezes se
referem a probabilidades ainda menores para outras relações no Universo, como
uma chance em 1050, 1060 ou 10100. Alguns anos atrás, esses números ajudaram
a estabelecer o conceito de que o Universo tem, de fato, uma sintonia fina. Em
geral, a ciência os aceita hoje. Mas precisamos também ter em mente que essas
deduções se baseiam em dados e interpretações muito complicados e, às vezes,
as conclusões são contestadas. Mesmo as mais leves mudanças nessas forças e
em fatores afins poderiam alterar profundamente as inferências. Por outro lado,
estamos lidando com tantas relações com níveis de precisão tão extremos que
fica difícil não concluir que existe uma sintonia fina em nosso Universo. Como
as quatro forças discutidas poderiam selecionar seus valores exatos numa
extensão incrível de 1039 vezes que possuem em um contínuo da mais fraca para
mais forte, para então ter suas esferas definidas de atuação, e tudo isso por acaso,
a fim de nos fornecer o Universo “sob medida”, tão bem adaptado para manter a
vida? O famoso físico Freeman Dyson comenta que, “à medida que olhamos
para o Universo e identificamos os muitos acidentes da física e da astronomia
que atuam juntos para nosso benefício, é quase como se o Universo de algum
modo soubesse que estávamos vindo”. 45
Massa de partículas subatômicas. Mencionamos anteriormente que, no
átomo, a massa de um próton é 1.836 vezes maior que a de um elétron; um
nêutron, por sua vez, pesa muito pouco mais que um próton. A precisão dessa
leve diferença é crucial. Stephen Hawking ressalta que, se essa diferença “não
representasse duas vezes a massa do elétron, não seria possível obter as centenas
de nuclídeos estáveis [elementos e seus isótopos] que formam os elementos que
estão na base da química e biologia”. 46 Em outras palavras, bastaria uma
pequena mudança na massa do próton ou nêutron para se eliminar do Universo
qualquer elemento químico ou mudança química; não haveria também químicos
ou qualquer outra coisa maior como os planetas, os sóis e as galáxias. A massa
de um próton não pode variar nem mesmo uma parte em 1.000. 47
O espaço tridimensional. Há muita coisa na natureza que vemos com a
maior naturalidade. Uma delas é o número de dimensões que o espaço apresenta.
Mas por que três? Se pensarmos em dimensão zero, podemos mencionar um
ponto. No caso de uma dimensão, temos uma linha. Duas dimensões nos dão
uma superfície. E com três dimensões temos um objeto sólido. Podemos falar
então do tempo como uma quarta dimensão, mas não se trata de uma dimensão
do espaço. A teoria das cordas preconiza até 11 dimensões, mas reduz muitas
delas à invisibilidade ou insignificância. Essa teoria não é totalmente consistente
e seus fundamentos carecem de autenticação experimental direta. 48
Novamente perguntamos: por que o espaço possui apenas três dimensões?
Na configuração original do Universo, por que não podemos ficar com duas,
quatro ou mais dimensões? Um universo bidimensional seria muito estranho.
Um gato com essas dimensões simplesmente se desmontaria ( Figura 2.3 ), e
uma galinha bidimensional tampouco se manteria unida, muito menos forneceria
ovos bidimensionais para prepararmos omeletes bidimensionais, que, por sinal,
seriam extremamente planos. Vida inteligente, seja qual for seu grau de
complexidade, não poderia existir em duas dimensões. Ela precisa de um
universo em três dimensões. É interessante observar que o espaço com quatro
dimensões (sem incluir o tempo) seria também desastroso. A força da gravidade
mantém a Terra em sua órbita ao redor do Sol em vez de continuar uma trajetória
retilínea no espaço, como seria de se esperar. Num espaço com quatro
dimensões, um “planeta em órbita que reduzisse sua velocidade – o mínimo que
fosse – mergulharia numa velocidade crescente em direção ao Sol em vez de
simplesmente mudar para uma órbita levemente menor; [...] por outro lado, um
planeta em órbita que aumentasse levemente sua velocidade se moveria
rapidamente em espiral rumo à escuridão”. 49 Essa relação tem sido observada
há muito tempo. O famoso teólogo William Paley chamou a atenção para essa
evidência especial de desígnio da parte de Deus dois séculos atrás. Ocorre
também que, no nível atômico, num universo com quatro dimensões, teríamos o
mesmo problema, pois não teríamos órbitas estáveis para os elétrons ao redor do
núcleo, e não “teríamos átomos como os conhecemos”. 50
De onde vieram as leis da natureza? A maioria dos cientistas tem profundo
respeito pelas leis da natureza. São elas que tornam a ciência possível,
inteligível, lógica e muito fascinante. Por exemplo, as forças gravitacional e
eletromagnética seguem o que chamamos de lei quadrada inversa. Elas
diminuem em força proporcionalmente ao quadrado da distância da fonte. Se a
distância for dobrada, ambas as forças correspondem a um quarto do que eram
na distância original, o que explica por que a luz de uma vela fica fraca tão logo
uma pessoa se distancia dela. Muitas outras leis seguem relações matemáticas
precisas e complicadas. Como essas precisões teriam surgido? De onde vieram
as leis da natureza, que frequentemente representam valores específicos e
relações complicadas? Num contexto naturalístico, que não leva em conta a
existência de Deus, é necessário postular um amontoado impressionante de
acontecimentos acidentais e precisos.
Alguém poderia propor que as leis simplesmente surgiram como condição
necessária para a existência, mas trata-se de especulação em grande escala. Por
que o Universo não poderia ter apenas bolhas desorganizadas de substâncias
pegajosas e amorfas? Isso é o que se esperaria de uma atividade aleatória, mas
não é o que vemos. Ao contrário, estamos descobrindo quarks e muitos outros
tipos de partículas subatômicas que interagem umas com as outras para formar
mais de uma centena de elementos altamente organizados que, por sua vez,
também se interagem de modo notável. Essas interações às vezes liberam
energia, como é o caso do Sol, ou produzem muitas variações químicas
essenciais para a vida, como a produção dos hormônios. Esses átomos
complexos formam elementos menores do que moléculas de água e tão grandes
quanto o Sol, galáxias e o próprio Universo. A organização da matéria é
extremamente complexa, coordenada e versátil.
Como um universo organizado poderia surgir do nada e casualmente ter as
leis necessárias para sua existência? Esse padrão parece totalmente contrário à
tendência à desorganização que normalmente vemos na natureza. Elementos
ativos tendem a se desorganizar e não a se organizar ainda mais. Quando a chuva
cai sobre o pó, ou um tornado atinge casas por todos os lados, tudo tende a se
tornar cada vez mais desorganizado. As chances de elas se auto-organizarem são
as mesmas de uma explosão numa gráfica produzir um dicionário. Esses
exemplos ilustram algumas consequências da segunda lei da termodinâmica, que
assinala que as mudanças na natureza tendem para a desorganização e a
confusão; e quanto mais o tempo passa, mais as coisas se tornam caóticas. Esse
processo de desorganização é chamado entropia. Quanto maior for a confusão
nos elementos da natureza, maior será a entropia; e, ao contrário, quanto maior a
organização, menor a entropia. Eu frequentemente percebo a entropia quando
livros, artigos, correspondência, e-mails, CDs ou faxes começam a chegar aos
montes e se misturam na mesa do meu escritório.
De acordo com a segunda lei da termodinâmica, o Universo está
caminhando para um nível máximo de desorganização ou entropia, o que indica
que ele deve ter sido mais organizado no princípio do que o é agora.
Independentemente de sua crença quanto à origem do Universo, seja o modelo
do Big Bang ou qualquer outro, a segunda lei da termodinâmica carrega em si a
implicação inevitável de que o Universo teve um início e um organizador. Se ele
tivesse “sempre” existido, seria de esperar que apresentasse em seu estado atual
um alto nível de desorganização. Mas o fato é que o Universo tem ainda um alto
nível de organização, sugerindo uma origem um tanto recente.
A probabilidade de que a organização do Universo possa ter ocorrido
simplesmente por acaso já foi avaliada, e constatou-se que é bem menor do que
qualquer compreensão de possibilidades plausíveis. O físico-matemático Roger
Penrose, da Universidade de Oxford, falando sobre probabilidades, observa:
“Qual é o tamanho do volume original do espaço de fase que o Criador teve que
planejar a fim de prover um universo compatível com a segunda lei da
termodinâmica e com o que observamos atualmente? [...] O plano do Criador
deve ter sido de uma precisão correspondente a uma parte em 1010(123).” 51
Trata-se de uma probabilidade incrivelmente pequena. A implicação dessas
cifras é que a probabilidade de um universo organizado como o que conhecemos
vir a existir sem um criador é de um em 1 seguido de 10123 zeros. 52 Se você
tentasse escrever esse número colocando um zero em cada átomo do Universo
conhecido, os átomos acabariam muito antes dos zeros. O Universo tem apenas
1078 átomos. Essas improbabilidades deveriam encorajar qualquer um a procurar
outras alternativas para a origem do Universo além do mero acaso. Muitos
cientistas reconhecem essas improbabilidades, mas não fornecem nenhuma
alternativa realista que se encaixe nos limites das interpretações materialistas que
excluem a existência de Deus.

Reações às evidências de ajustes finos no Universo


Poucos negam a natureza incomum dos dados que mostram o Universo com
finos ajustes, apesar de alguns quererem diminuir sua importância. A lista de
traços incomuns é muito maior do que os poucos exemplos fornecidos acima. O
cosmólogo Hugh Ross apresenta uma lista de 74 aspectos e muitos outros
parâmetros necessários para a existência da vida. 53 Caso o leitor tenha interesse
em se aprofundar no assunto, poderá consultar a literatura específica dessa área,
que nas últimas duas décadas tem se tornado abundante. 54 Será que o ajuste
fino no Universo implica a existência de um Deus que é o criador inteligente do
Universo? Não necessariamente, segundo algumas autoridades no assunto,
apesar de a argumentação usada não ser nada convincente. O fato é que as
reações diante dos dados têm sido variadas, fascinantes e instrutivas.
Discutiremos as principais sob três subtítulos.
O princípio cosmológico antrópico. O leitor pode passar muitas horas lendo
a literatura científica na tentativa de compreender o princípio cosmológico
antrópico, mas não deve esperar nenhuma resposta definitiva. O filósofo John
Leslie generaliza o princípio afirmando que “qualquer ser inteligente existente
somente pode se encontrar onde a vida inteligente é possível”. 55 Trata-se de
uma afirmação óbvia e autoevidente, e dificilmente uma resposta à pergunta de
como o Universo apresenta os ajustes finos. Dois especialistas no assunto, John
Barrow e Frank Tipler, ao se referirem ao princípio antrópico, sugerem que “os
astrônomos parecem gostar de deixar uma pequena flexibilidade em sua
formulação, talvez na esperança de que sua importância possa dessa forma vir à
tona mais prontamente no futuro”. 56 O conceito é mal definido, sendo
interpretado de várias formas por diferentes autores. E até o principal arquiteto
do conceito, Brandon Carter, 57 gostaria de não ter usado o termo “antrópico”,
que se refere a seres humanos, em sua designação. 58 O princípio antrópico é às
vezes confundido com “equilíbrios antrópicos” e “coincidências antrópicas”, que
se referem especialmente aos dados do Universo com finos ajustes.
O princípio antrópico, segundo sua compreensão geral, tem pelo menos
quatro formas: fraca, forte, participatória e final. Embora as quatro formas sejam
difíceis de ser definidas, em geral a forma fraca enfatiza o fato de que
observadores devem estar situados em condições que permitem a vida. A forma
forte ressalta que o Universo deve ter as condições exatas para que a vida se
desenvolva em determinado estágio. A forma participatória se apropria de
algumas ideias da teoria quântica e faz a afirmação singular de que a
participação do observador é uma força motriz no cosmos. O último princípio
antróprico volta-se para o futuro, e propõe que o processamento de informação
avançará no Universo de tal modo que até nossa consciência será preservada,
alcançando, assim, alguma forma de imortalidade.
Esse princípio é às vezes usado para enfatizar nossa posição privilegiada no
Universo. Um universo sem vida não será observado; portanto, nossa situação é
incomum e, como observadores, estamos analisando os fatos de uma perspectiva
selecionada, embora limitada. Levando em conta o princípio como tendo alguma
validade, teríamos que considerar esse privilégio incomum de observação um
projeto especial de Deus, o que não representa a interpretação comumente dada
ao princípio. Alguns, na tentativa de responder às questões de um universo com
finos ajustes, ressaltam que, se assim não fosse, simplesmente não estaríamos
aqui. 59 Esse tipo de resposta se presta ao que chamamos de non sequitur, ou
seja, a resposta não se aplica à pergunta. É como se estivéssemos em um deserto
e, ao perguntarmos de onde vem a água de um oásis, recebêssemos a resposta de
que, se a água não estivesse lá, as árvores não cresceriam ali.
Embora a literatura sobre o princípio cosmológico antrópico seja extensa, 60
trata-se de um conceito controverso. Alguns cientistas e filósofos têm feito
comentários pejorativos em relação ao conceito ou a seus diferentes aspectos,
como: “destituído de qualquer significado físico”, 61 “colocou o argumento
original de pernas para o ar”, 62 “não fornece absolutamente nenhuma
explicação” 63 e “só serve para confundir”. 64 Fica claro que o princípio
antrópico não é ciência objetiva.
A explicação dos muitos universos. Seria possível haver outros universos
que não conhecemos? Seria possível haver diferentes tipos de universo e em
grande quantidade? Tudo isso é possível. Com base na pura força dos números,
poderíamos sugerir que existe um número infinito de universos, sendo o nosso o
único que por mero acaso veio a ter as características exatas para a existência da
vida. Essa ideia tem sido alvo de muitas considerações como resposta para o
Universo com finos ajustes no qual vivemos. Simplesmente aconteceu de
estarmos no universo correto dentre muitos outros. Tal raciocínio não possui
nenhuma força argumentativa e carece de validação. É possível explicar
praticamente qualquer coisa com esse tipo de argumento, sendo, portanto,
desprezível. Seja lá o que você encontrar, basta dizer que simplesmente surgiu
por acaso em um dos infinitos universos. O cerne da questão é onde estariam
esses outros universos. Onde estariam as evidências científicas para a existência
deles? Parece não haver uma sequer.
Cosmólogos de destaque como Martin Rees e Stephen Hawking às vezes
endossam com cautela o conceito de muitos universos. Alguns associam o
conceito com interpretações do princípio antrópico forte, ao passo que outros
discordam completamente. Trata-se de uma área em que não é possível chegar a
um consenso. O conceito de muitos universos se tornou um campo fértil para
muitas cogitações sobre nossa existência, a vida e o cosmos. Não é difícil se
perder nessas lucubrações, especialmente quando se pode misturar nelas uma
pitada de realidade para fazê-las parecer mais plausíveis. 65 O humorista Mark
Twain comentou que “há algo fascinante quando se trata de ciência. Obtêm-se
retornos incríveis de conjecturas a partir de um investimento insignificante de
fatos”. 66 Talvez ele não esteja muito longe da verdade. Há um elemento de
cautela a que deveríamos atentar no provérbio que diz que “os cosmólogos estão
frequentemente errados, mas raramente em dúvida”.
Alguns têm especulado a respeito de outros universos ou locais em nosso
Universo onde a vida não estaria baseada em carbono, como ocorre na Terra,
mas em hidrogênio sólido ou enxofre líquido. Os elementos silicone e baro são
os candidatos favoritos para outras formas de vida não baseadas em carbono. Há
quem sugira que a vida talvez não esteja baseada em átomos, mas na força
nuclear forte ou na gravidade. Tal vida poderia ter criado civilizações nas
estrelas de nêutron. Pode haver universos na imensidão do espaço cuja natureza
nos escape totalmente, ou pode ser que nosso sistema solar seja o equivalente a
um átomo no esquema mais amplo das coisas. O filósofo John Leslie afirma que
“essas especulações são de natureza tal que fazem a hipótese da existência de
Deus parecer muito tratável”. 67
Pode-se argumentar que há sempre a possibilidade de existir muitos outros
tipos de universos, fornecendo todos os tipos de ideias mirabolantes, mas isso
não é ciência; é pura imaginação. Quanto a um número infinito de universos, o
cosmólogo Hugh Ross comenta com propriedade: “Esta proposta é um abuso
gritante da teoria da probabilidade. Ela pressupõe os benefícios de uma amostra
com dimensões infinitas sem possuir, contudo, qualquer evidência de que exista
mais de uma amostra.” 68 A única amostra que possuímos é o nosso próprio
Universo, e não parece existir outro. É necessário postular um número
gigantesco de universos na tentativa de reduzir as inúmeras improbabilidades
observadas no Universo com finos ajustes no qual vivemos. Essa sugestão
representa uma grave ofensa ao princípio científico conhecido como a navalha
de Ockham (também conhecido como princípio da parcimônia). Esse princípio
requer que as explicações não se multipliquem além do necessário. A proposta
da existência de muitos universos não passa de especulação desenfreada, não é
raciocínio cuidadoso baseado em fatos conhecidos.
O Universo com finos ajustes indica desígnio. Nem todas as evidências de
um universo com finos ajustes podem estar corretas, e é de se esperar que
algumas de nossas interpretações científicas a esse respeito mudem no decorrer
do tempo. Contudo, diante do grande número de exemplos e da incrível precisão
que apresentam, fica difícil pensar que todos esses fatos são meros casos de boa
sorte resultantes de mais boa sorte ainda. Além disso, os valores constatados
geralmente mantêm estreitas inter-relações. Leslie comenta acertadamente que
“uma minúscula alteração é suficiente para desmoronar o cosmos em um
milésimo de segundo ou esmiuçá-lo tão rapidamente que em pouco tempo nada
resta exceto gás tão diluído que escaparia à força gravitacional”. 69 É necessário
manter em mente também, conforme ilustramos com o exemplo dos dados
anteriormente, que a correta expressão matemática ao se combinarem diversas
improbabilidades é obtida com base na multiplicação desses valores. Esse
procedimento torna a improbabilidade total de um universo com sintonia fina
muito maior do que qualquer das improbabilidades consideradas isoladamente.
Poderia tudo isso acontecer por acaso? Quantos desses valores com finos
ajustes podem ser descartados por um cientista honesto sem que este perca seu
senso de objetividade? Há limites quanto àquilo que podemos aceitar. Por
exemplo, poderíamos fantasiar que todas as partículas do Universo vieram
acidentalmente à existência dez segundos atrás e, sem qualquer razão,
produziram a configuração que observamos na natureza. Contudo, a
racionalidade e um desejo sincero de realmente descobrir a verdade nos ditariam
a necessidade de procurar alternativas mais razoáveis. A realidade que vemos à
nossa volta não é tão caprichosa assim. Temos evidências poderosas em favor de
algum tipo de desígnio para nosso Universo com finos ajustes.
Diversos astrônomos de renome como Robert Jastrow, do Instituto Goddard
para Estudos Espaciais da NASA, e Owen Gingerich, do Observatório
Astrofísico Smithsoniano da Universidade Harvard, favorecem a interpretação
de um desígnio. O astrônomo George Greenstein, do Amherst College, assinala:
“Ao investigarmos todas as evidências, surge insistentemente o pensamento de
que alguma agência sobrenatural – ou, melhor dizendo, uma Agência – precisa
estar envolvida. Será possível que repentinamente, sem nenhuma intenção
deliberada, acabamos tropeçando na prova científica da existência de um ser
supremo? Será que foi Deus que interveio e de maneira tão providencial criou
com Suas próprias mãos o cosmos para nosso beneficio?” 70 Parte do estímulo
para essas conclusões provém da crença de que um Deus beneficente revelou-Se
na Bíblia. Esse fato traz à tona o espectro da religião, e alguns cientistas não se
sentem à vontade em misturar ciência e religião, a despeito da esmagadora
evidência em favor de um Criador. Contudo, se esperamos encontrar a verdade,
talvez precisemos eliminar nossos preconceitos, abordar os dados com mente
aberta e seguir as evidências aonde quer que elas nos conduzam.

Síntese
Embora o Universo seja imenso, constatamos também que ele é composto de
partículas subatômicas minúsculas. Todas essas partículas estão relacionadas
entre si por meio de leis e uma variedade de outros fatores que tornam possível a
existência de um universo capaz de sustentar a vida. A precisão que constatamos
indica fortemente que existe um planejador do Universo ( Tabela 2.1 ). Alguns
cientistas aceitam essa conclusão, ao passo que outros não.
Alguns têm procurado atribuir a existência desses fatores precisos a um vago
non sequitur baseado num tipo de princípio antrópico, enquanto outros recorrem
a uma multiplicidade de universos imaginários. Mas quantas coincidências de
ajustes finos alguém necessita constatar antes de reconhecer que eles precisam
ser explicados? Se alguém quiser esquivar-se da conclusão de que há um
planejador, basta apelar às alternativas mencionadas. Contudo, elas não passam
de distrações para desviar a atenção dos inegáveis dados científicos que indicam
que alguma inteligência deve ter criado a matéria e as forças do Universo de
maneira que nosso ambiente fosse adequado à vida. Um Planejador desse calibre
certamente superaria o Universo que Ele criou.

Referências
1
Newton I. 1692. Second letter to Bentley. In: Turnbull HW, editor. 1961. The correspondence of Isaac
Newton, v. 3, 1688-1694. Cambridge: Cambridge University Press, p. 240.
2
Rees M. 2000. Just six numbers: the deep forces that shape the universe. Nova York: Basic Books, p. 42.
3
Jastrow R. 1992. God and the astronomers. 2a edição. Nova York: W. W. Norton, p. 11.
4
Wilkinson D. 2001. God, time and Stephen Hawking. Londres: Monarch, p. 35.
5
Hawking SW. 1996. A brief history of time: the updated and expanded tenth anniversary edition. Nova
York: Bantam, p. 38.
6
De Pree C, Axelrod A. 2001. The complete idiot’s guide to astronomy. Indianapolis: Alpha, p. 277.
7
Nos últimos anos, tem-se descoberto muitas pequenas “luas”, especialmente ao redor dos planetas mais
distantes. Veja: Cowen R. 2003. Moonopolies: the solar system’s outer planets host a multitude of
irregular satellites. Science News 164, p. 328-329.
8
(a) Ross H. 1995. The Creator and the cosmos: how the greatest scientific discoveries of the century
reveal God. 2a edição. Colorado Springs: NavPress, p. 137. (b) The editors. 1993. Our friend Jove.
Discover 14 (7), p. 15.
9
Rees, p. 73.
10
Dyson F. 1979. Disturbing the universe. Nova York: Harper & Row, p. 251.
11
Ross H. 1996. Beyond the cosmos. Colorado Springs: NavPress, p. 30.
12
Webb JK, et al. 2001. Further evidence for cosmological evolution of the fine structure constant.
Physical Review Letters 87 (9), p. 091301-1-4.
13
Hawking, A brief history of time, p. 33, 34.
14
Rees, p. 33.
15
Wilkinson, p. 111.
16
Para discussões e avaliações, ver: (a) Arp H. 1998. Seeing red: redshifts, cosmology and academic
science. Montreal: Apeiron. (b) de Groot M. 1992. Cosmology and Genesis: the road to harmony and
the need for cosmological alternatives. Origins 19, p. 8-32. (c) Hoyle F, Burbidge G, Narlikar JV. 2000.
A different approach to cosmology: from a static universe through the big bang towards reality.
Cambridge: Cambridge University Press. (d) Narlikar JV. 1989. Noncosmological redshifts. Space
Science Reviews 50, p. 523-614.
17
Jastrow, p. 9.
18
Como relatado em Jastrow, p. 21.
19
Baseado em 10-33 cm como sugerido em Wilkinson, p. 47.
20
Jastrow (veja a nota 3).
21
Ross, The Creator and the cosmos.
22
Jó 9:8; Salmo 104:2; Isaías 40:22; Jeremias 10:12; Zacarias 12:1.
23
Rees, p. 117.
24
Hawking SW. 2001. The universe in a nutshell. Nova York: Bantam.
25
(a) Ibid., p. 82-83. (b) Overman DL. 1997. A case against accident and self-organization. Lanham:
Rowman & Littlefield, p. 161.
26
(a) Hawking, The universe in a nutshell, p. 82-83. (b) Overman DL. 1997. A case against accident and
self-organization. Lanham: Rowman & Littlefield, p. 161.
27
Hawking, A brief history of time, p. 146.
28
Ross, The creator and the cosmos, p. 91.
29
Ver também Wilkinson, p. 70, 71.
30
Para uma discussão adicional, ver Strobel L. 2004. The case for a creator: a journalist investigates
scientific evidence that points towards God. Grand Rapids: Zondervan, p. 93-192.
31
Assume-se que várias probabilidades são independentes de cada evento.
32
Hart MH. 1979. Habitable zones about main sequence stars. Icarus 37, p. 351-357.
33
Rees, p. 47.
34
Barrow JD. 1991. Theories of everything: the quest for ultimate explanations. Oxford: Clarendon, p. 95.
35
Gribbin J, Rees M. 1989. Cosmic coincidences: dark matter, mankind, and anthropic cosmology. Nova
York: Bantam, p. 246.
36
Ibid.
37
Ross, The Creator and the cosmos, p. 113.
38
Hoyle F. 1981. The Universe: past and present reflections. Engineering and Science 45 (2), p. 8-12.
39
Gribbin, Rees, p. 247.
40
Leslie J. 1989. Universes. Nova York: Routledge, p. 35.
41
Ibid., p. 36.
42
Overman, p. 140, 141.
43
Leslie, p. 4.
44
Davies P. 1984. Superforce: the search for a grand unified theory of nature. Nova York: Simon and
Schuster, p. 242.
45
Citado por Barrow JD, Tipler FJ. 1986. The anthropic cosmological principle. Oxford: Oxford
University Press, p. 318.
46
Hawking SW. 1981. Is the end in sight for theoretical physics? Physics Bulletin 32, p. 15-17.
47
Barrow, Tipler, p. 400; Leslie, p. 5; Ross, The Creator and the cosmos, p. 114.
48
Woit P. 2002. Is string theory even wrong? American Scientist 90 (2), p. 110-112.
49
Rees, p. 135.
50
Hawking, A brief history of time, p. 181.
51
(a) Penrose R. 1989. The emperor’s new mind. Oxford: Oxford University Press, p. 344. Ver também:
(b) Dembski WA. 1999. Intelligent design. Downers Grove: InterVarsity, p. 265, 266. (c) Leslie, p. 28.
(d) Overman, p. 138-140.
52
Esses números são baseados em pressuposições que podem ser debatidas. Por exemplo, Penrose assume
a existência do Big Bang e que o Universo é termodinamicamente um sistema fechado. Os números
servem para ilustrar quão altamente organizado é o Universo.
53
Ross H. 1998 Big Bang model refined by fire. In: Dembski WA, editor. Mere creation: science, faith &
intelligent design. Downers Grove: InterVarsity, p. 363-384.
54
Algumas referências significativas são: (a) Barrow, Tipler [veja a nota 45]. (b) Carr BJ, Rees MJ. 1979.
The anthropic principle and the structure of the physical world. Nature 278, p. 605-612. (c) Carter B.
1974. Large number coincidences and the anthropic principle in cosmology. Reimpresso em Leslie J,
editor. 1998. Modern cosmology & philosophy, 2a edição. Amherst: Prometheus, p. 131-139. (d) Davies
P. 1992. The mind of God: the scientific basis for a rational world. Nova York: Simon & Schuster. (e)
Davies PCW. 1982. The accidental universe. Cambridge: Cambridge University Press. (f) Greenstein G.
1988. The symbiotic universe: life and mind in the cosmos. Nova York: William Morrow. (g) Gribbin,
Rees. (h) Leslie, Universes. (i) Overman. (j) Rees. (k) Ross, The Creator and the cosmos. (l) Ward PD,
Brownlee D. 2000. Rare earth: why complex life is uncommon in the universe. Nova York: Copernicus.
(m) Wilkinson D. 2001. God, time and Stephen Hawking. Londres: Monarch.
55
Leslie, Universes, p. 128.
56
Barrow, Tipler, p. 15.
57
Carter, p. 131-139.
58
Leslie, Modern cosmology & philosophy, p. 1-34.
59
Por exemplo, Heeren F. 2000. Show me God: what the message from space is telling us about God,
edição revisada. Wheeling: Day Star Publications, p. 234.
60
Ver as referências na nota 54 e também a extensa lista nas páginas 23-26 em Barrow, Tipler [veja a nota
45].
61
Silk J. 1994, 1997. A short history of the universe. Nova York: Scientific American Library, p. 9.
62
Gingerich O. 1994. Dare a scientist believe in design? In: Templeton J, editor. Evidence of purpose.
Nova York: Continuum, p. 21-32.
63
Boslough J. 1985. Stephen Hawking’s Universe. Nova York: William Morrow, p. 124.
64
Swinburne R. 1989. Argument from the fine-tuning of the universe. In: Leslie J, editor. 1998. Modern
cosmology & philosophy. 2a edição. Amherst: Prometheus, p. 160-179.
65
Para entender as complicações quando se exclui um designer, ver Strobel, p. 138-152.
66
Conforme citado por Fripp J, Fripp M, Fripp D. 2000. Speaking of science: notable quotes on science,
engineering, and the environment. Eagle Rock: LLH Technology Publishing, p. 56.
67
Leslie, Universes, p. 53.
68
Ross, The Creator and the cosmos, p. 99.
69
Leslie, Universes, p. 53.
70
Greenstein, The symbiotic universe, p. 27.
A origem da vida me parece
incompreensível como sempre,
assunto que causa admiração,
mas não se explica. 1
Franklin M. Harold, bioquímico

Micróbios
A senhora estava para dar à luz o seu bebê e chorava. Havia sido
encaminhada à Primeira Clínica, e esse era o lugar para onde ela não queria ir.
Ela desejava ir para a Segunda Clínica. Explicou ao Dr. Ignaz Semmelweis que
as mães, aparentemente, morriam mais na Primeira Clínica do que na Segunda.
Isso perturbou muito Semmelweis, que era um jovem médico assistente na
Primeira Clínica. Teria razão aquela senhora? Ele decidiu investigar. Os números
eram estarrecedores. Examinando os registros hospitalares, ele descobriu que,
em seis anos, quase duas mil mulheres haviam morrido na Primeira Clínica, e
menos de setecentas na Segunda. 2
Isso aconteceu no Hospital Geral de Viena, Áustria, há um século e meio,
quando epidemias da temível febre puerperal não eram tão incomuns. Com
demasiada frequência, uns quatro dias após o parto, a nova mamãe ficava febril e
quase sempre morria dentro de uma semana. Considerava-se que a doença era
causada por algum tipo de vapor nocivo no ar, ou problemas com o leite da mãe.
Às vezes, o ar fresco era empregado como medida de controle. Nada disso
explicava por que a taxa de mortalidade na Primeira Clínica era quase três vezes
maior que na Segunda.
Os médicos, que, como parte de seu preparo e pesquisas, estudavam os
corpos dos falecidos, dirigiam a Primeira Clínica. As parteiras, que não
participavam das pesquisas, dirigiam a Segunda Clínica. Teria isso a ver com a
dramática diferença nos índices de mortalidade? Surgiu um indício quando um
dos colegas de Semmelweis se cortou enquanto realizava uma autópsia. Ele teve
febre no quarto dia e morreu pouco depois. Um estudo de sua autópsia mostrou o
mesmo tipo de achado visto no caso das mulheres que sucumbiam à febre
puerperal. Ali estava um homem com febre puerperal, mas essa devia ser uma
doença de mulheres! Teria acontecido que, ao cortar-se, o colega havia se
aproximado demais do corpo de alguém que morrera da temida doença?
Semmelweis estabeleceu estritos procedimentos, usando cloro para limpar as
mãos, a fim de impedir o contágio daquilo que ele chamou de “veneno
cadavérico” dos corpos de mortos aos pacientes da Primeira Clínica. O resultado
foi dramático. Os índices de mortalidade caíram de 12% para cerca de 1%. O
que causava tantas mortes era o fato de que os médicos realizavam as autópsias
das mulheres que haviam morrido com febre puerperal e depois atendiam as
parturientes sem lavar as mãos, passando adiante a doença letal.
Alguém poderia pensar que o sucesso de Semmelweis seria saudado como
grande divisor de águas, mas, com frequência, a humanidade não segue os dados
aonde eles conduzem. Enquanto alguns aceitaram as conclusões de Semmelweis,
o sistema médico não. O despeito se revelou no hospital. Admitir que os
médicos tivessem causado tantas mortes era algo difícil de encarar. Além disso,
havia hospitais que não realizavam autópsias, e tinham taxas de mortalidade tão
altas quanto 26%. A ideia de limpar as mãos com cloro foi ridicularizada. O
chefe de Semmelweis, em Viena, não renovou o contrato dele. Muitas petições
resultaram apenas no oferecimento de um cargo inferior. Um desanimado e
desalentado Semmelweis partiu discretamente de Viena, retornando à sua terra
natal, Hungria, sem mesmo entrar em contato com os amigos.
Em 1861, Semmelweis publicou os resultados do seu estudo sobre como
evitar a febre puerperal. Enviou-os a muitos médicos na Europa, mas não foram
bem recebidos. A comunidade profissional cria que essa ideia havia sido
desacreditada. Cada vez mais preocupado com a morte de tantas jovens mães,
ele espalhou panfletos denunciando aqueles que disseminavam a doença. Ficou
intensamente preocupado e sua depressão se aprofundou. Sua esposa, por fim,
concordou em mandar interná-lo num asilo para doentes mentais, onde ele
morreu duas semanas mais tarde, unindo-se a milhares de mães que também
foram mártires do preconceito e de mentes fechadas. A resistência à verdade
pode ser incrível! Felizmente, poucos anos mais tarde, a ciência médica
reconheceu que Semmelweis tinha razão, e agora ele recebe o devido respeito
por ter aberto o caminho para a vitória sobre essa febre mortal.
O que Semmelweis e outros de sua época não sabiam é que um minúsculo
micróbio vivo causa a febre puerperal. Alguns cientistas estavam descobrindo
um mundo de pequeníssimos organismos, mas ainda não havia sido estabelecida
uma relação sólida entre micróbios e doenças contagiosas. Agora, devido aos
dramáticos avanços da ciência, sabemos qual micróbio (germe) causa qual
doença, e muitos livros podem ser escritos acerca de um único micróbio.
Os micróbios são muito complexos. Um dos mais bem estudados é o
Escherichia coli, que se encontra em muitos lugares, como no trato digestório de
humanos e animais e no solo. Embora geralmente seja um micróbio inofensivo,
alguns são germes temíveis. Trata-se de um minúsculo organismo em forma de
bastão. É tão pequeno que seriam necessários quinhentos, alinhados um atrás do
outro, para preencher a extensão de um milímetro. Embora tão pequeninos,
descobrimos que são muito complicados. Exteriormente, cada micróbio tem de
quatro a dez filamentos espirais alongados (flagelos) salientes para fora do
corpo, e usados para locomoção. O motor na base desses flagelos tem sido
cabalmente estudado 3 e é um bom exemplo do conceito de complexidade
irredutível, que consideraremos mais adiante. Por dentro, dois terços do
micróbio consistem de uns quarenta bilhões de moléculas de água. Além disso, a
composição do organismo é de uma complexidade espantosa. Como
complexidade, referimo-nos a partes dependentes umas das outras a fim de
funcionar de modo adequado, 4 e não a uma porção de partes que simplesmente
não se relacionam.
O DNA (ácido desoxirribonucleico) é o centro de informações que dirige as
atividades da célula, providenciando a fórmula genética que, no caso do
Escherichia coli, codifica mais de quatro mil tipos diferentes de moléculas de
proteína. O DNA é uma alça fina em forma de fio de ácido nucleico tão longa
que precisa ser dobrada muitas vezes para caber dentro do micróbio. Na verdade,
é oitocentas vezes mais longa que o próprio micróbio! Como o organismo
consegue acessar todas as suas informações genéticas é algo que desafia nossa
imaginação. A Tabela 3.1 dá alguns pormenores da composição de um
organism Escherichia coli. As proteínas, os carboidratos (polissacarídios),
lipídios (substâncias do tipo gorduroso) e outras moléculas especiais
compreendem uns cinco mil tipos diferentes de moléculas, a maioria das quais
são multiplicadas muitas vezes, num total de várias centenas de milhões de
moléculas especiais em apenas um micróbio microscópico! Só porque algo é
pequeno não quer dizer que seja simples. O que antes se considerava ser uma
vida simples revela-se como incrivelmente complexo. A questão que nos deixa
perplexos é: como uma complexidade assim chegou a organizar-se, para
começar?
Aviso: os quatro parágrafos seguintes não são de fácil leitura, mas você deve
captar seu significado, mesmo que não se lembre de todos os detalhes. O próprio
DNA é uma molécula complexa, com uma forma que lembra um pouco uma
escada torcida. Detalhes de uma pequena porção são mostrados na Figura 3.1 .
A molécula consiste de unidades básicas chamadas nucleotídeos, compostos de
um açúcar, um fosfato e as todo-importantes bases, que providenciam a
informação através do código genético, necessário para formar e manter uma
célula como a Escherichia coli. Há quatro tipos de bases no DNA: adenina,
timina, guanina e citosina, abreviadas como A, T, G e C. No RNA (ácido
ribonucleico), semelhante ao DNA e importante na comunicação das
informações na célula, a timina (T) é substituída pela uracila (U). O DNA do
Escherichia coli consiste de 4.639.221 bases. 5
As proteínas são moléculas versáteis que agem como operárias e como
partes estruturais das células. São constituídas por dezenas a centenas de
moléculas mais simples, ou blocos de construção chamados aminoácidos. Há
vinte tipos diferentes de aminoácidos nos organismos vivos. Numa proteína, os
aminoácidos se ligam uns às extremidades dos outros como elos de uma corrente
ou contas de um colar ( Figura 3.2 , esquerda). A corrente, então, é dobrada
muitas vezes, em geral auxiliada por moléculas de proteína grandes e especiais,
apropriadamente chamadas de acompanhantes. O formato final da molécula de
proteína é determinado pela posição dos vários tipos de aminoácidos ao longo da
cadeia. A forma de uma proteína é muito importante para sua função, e se
permitem apenas variações mínimas na ordem dos aminoácidos, se for para a
proteína atuar devidamente no tipo certo de molécula.
Quando a célula precisa de determinada proteína, uma parte do DNA
apropriado é copiada para moléculas mensageiras do RNA. Estas, por sua vez,
são lidas como transferência de RNA que, em combinação com moléculas
especiais chamadas aminoacil-tRNA sintetases, as quais são específicas para
cada tipo de aminoácido, colocam o aminoácido correto onde for necessário na
proteína que está sendo formada. Isso ocorre em estruturas altamente
especializadas, chamadas ribossomos ( Figura 3.2 ), nas quais os aminoácidos
são acrescentados à taxa de três a cinco por segundo. Os próprios ribossomos são
complexos, formados por umas 50 moléculas diferentes de proteína e muito
RNA. Um organismo de Escherichia coli abriga 20 mil ribossomos.
Como é selecionado o devido aminoácido para formar uma molécula de
proteína? Isso é feito através do todo-importante código genético formado pelas
bases A, T, C e G do DNA, e as bases A, U, C e G do RNA. Os computadores
trabalham usando apenas dois tipos de símbolos básicos; em contraste, os
organismos vivos usam quatro tipos de bases. São necessárias três bases para
codificar um aminoácido. Por exemplo, no RNA, GAU codifica o aminoácido
glicina, e CGC codifica o aminoácido arginina. O triplete, ou unidade, de bases
que codificam um aminoácido é chamado códon. Os códons de vinte tipos
diferentes de aminoácidos são dados na Tabela 3.2 . Também há códons para
iniciar e interromper o processo da linha de montagem que fabrica as proteínas.
Sendo que existem 64 códons possíveis e apenas 20 tipos de aminoácidos em
organismos vivos, vários códons diferentes dão a fórmula para o mesmo
aminoácido. Todos os códons possíveis são usados.
É suficiente essa quantidade de detalhes. Poderíamos prosseguir, página
após página, descrevendo muitos outros sistemas celulares, semelhantes ao
sistema de produção de proteínas. A esta altura, você já deve ter formado a ideia
de que um micróbio é uma coisa exata e extremamente complicada. Enquanto o
Escherichia coli está vivo, passa por milhares de alterações químicas às quais
nos referimos coletivamente como metabolismo, e também reproduz mais
micróbios como ele mesmo.
Organismos como o Escherichia coli estão entre as formas vivas mais
simples que existem. Os vírus, que são muito menores, não se qualificam como
organismos vivos. Sendo apenas uma combinação inerte de DNA ou RNA e
proteínas, eles não se reproduzem por si e, assim, não poderiam representar as
primeiras formas de vida sobre a Terra. Uma vez tendo sido produzido um, esse
seria o fim. Os vírus são duplicados pelos complexos sistemas das células vivas
que por acaso eles estejam visitando. Existem uns poucos micróbios
(micoplasma), cujas dimensões são de aproximadamente um décimo daquelas do
Escherichia coli, que provavelmente representem as menores formas de vida
independente já descobertas. 6 Esses organismos ainda não foram cabalmente
estudados, mas sabemos que alguns têm mais de meio milhão de bases em seu
DNA, codificando quase quinhentos tipos diferentes de proteínas que realizam
uma multidão de funções específicas. Se a vida na Terra surgiu por si, como foi
que todas as partes certas se reuniram ao acaso, de modo a produzir a primeira
coisa viva?

A batalha sobre a geração espontânea


O químico pioneiro Jan Baptist van Helmont (1579-1644) inventou a
fórmula para produzir ratos. Se alguém escondesse trapos sujos no meio de
cereais e queijo no sótão, em pouco tempo encontraria ratos por lá! Essa
experiência funciona ainda hoje, mas não acreditamos mais que os ratos possam
surgir de maneira espontânea. Desde a antiguidade até pouco tempo atrás,
costumava-se afirmar que organismos simples surgiam espontaneamente de
matéria inorgânica. Esse processo, chamado geração espontânea, podia ser
demonstrado por simples observação científica. Negá-lo seria negar a realidade.
Os bichinhos simplesmente apareciam nas frutas, e na primavera as rãs
apareciam em poças de água. Além do mais, havia alguns organismos
asquerosos como a tênia, que, segundo se argumentava, Deus não poderia ter
criado, de modo que deviam ter surgido espontaneamente dentro do corpo das
pessoas. Poucos adotavam a visão atual de que esses parasitas representam
formas degeneradas de organismos originalmente vivos e livres. Pensava-se que
organismos mais simples haviam se desenvolvido sozinhos, onde quer que
aparecessem. Agora sabemos que todas as coisas vivas precisam vir de outras
coisas vivas. A batalha para resolver essa disputa foi uma das mais litigiosas na
ciência e durou dois séculos.
Um dos pioneiros nesse combate foi o físico italiano Francesco Redi (1626-
1697). Observara-se por longo tempo que os gusanos, o estágio de larvas das
moscas, se desenvolvem em carne estragada. Isso foi no tempo em que não havia
geladeiras e a decomposição dos alimentos era comum. Mas de onde vinham os
gusanos? Redi decidiu tentar produzir gusanos em restos de vários tipos
diferentes de animais, incluindo cobras, pombos, peixes, ovelhas, sapos, veados,
cães, coelhos, cabras, patos, gansos, galinhas, leões, tigres e búfalos. Ele ficou
espantado ao ver que, independentemente do tipo de restos de animais que ele
usava, sempre encontrava o mesmo tipo de gusanos e de moscas. Também viu
que, no verão, os caçadores enrolavam a carne com panos a fim de preservá-la.
Seria o caso de que os gusanos viessem das moscas e não se produzissem
espontaneamente na carne? Para testar essa ideia, ele permitiu que a carne se
decompusesse em recipientes abertos e também em recipientes cobertos com
gaze, para impedir o acesso das moscas. Como não se formavam gusanos na
carne protegida das moscas, ele concluiu que não surgiam espontaneamente, mas
vinham das moscas.
Isso não acabou com a batalha. Algumas ideias podem levar longo tempo
para morrer. Após a época de Redi, outros cientistas se envolveram nessa
batalha. Enquanto se travava o conflito, experimentos envolvendo o
aquecimento de vários tipos de caldo orgânico, em várias temperaturas, em
recipientes abertos e fechados, davam resultados conflitantes. Às vezes surgiam
organismos e às vezes não. Tornou-se importante a questão relativa à
necessidade de que a vida tivesse acesso ou não ao ar. De maneira estranha, a
ideia de que a vida podia surgir espontaneamente foi ainda mais aceita no século
19 do que no tempo de Redi. 7 A verdade estava retrocedendo.
Então, das mãos de Louis Pasteur (1822-1895), um dos cientistas mais
conhecidos de todos os tempos, veio aquilo que muitos consideram o golpe
mortal contra a ideia da geração espontânea. Pasteur, muito competente e
produtivo, trabalhou com uma grande variedade de projetos científicos. Ele
salvou a indústria vinícola da França ao demonstrar que micróbios estavam
estragando os vinhos. Inventou um método de preservar o vinho usando um
calor apenas moderado, que matava os micróbios agressivos, mas conservava o
sabor da bebida. Esse é o mesmo processo que hoje usamos para o leite, e que
chamamos pasteurização. Ele desenvolveu vacinas contra antraz e raiva, e se
envolveu na batalha da geração espontânea. Através de experimentos habilmente
conduzidos, ele pôde responder a vários argumentos daqueles que defendiam a
geração espontânea. Usando frascos com tubos de acesso em espiral, demonstrou
que o caldo aquecido adequadamente não gerava vida, mesmo que tivesse acesso
aberto ao ar. Com seu costumeiro estilo exuberante, Pasteur proclamou: “A
doutrina da geração espontânea jamais se recuperará do golpe mortal deste
simples experimento.” 8
Mas Pasteur estava errado! Embora seus experimentos demonstrassem
claramente que a vida só pode vir de outra vida, e tanto os microbiologistas
quanto os médicos confirmassem esse ponto de vista, outras ideias surgiam no
horizonte. Na Inglaterra, em 1859, Charles Darwin havia acabado de escrever
seu famoso livro A Origem das Espécies, que defendia que organismos
avançados evoluíam gradualmente dos mais simples, por um processo natural de
seleção, em que os organismos mais aptos sobreviviam aos menos capazes. Isso,
por fim, embaralhou completamente a questão da geração espontânea. No livro A
Origem das Espécies, Darwin não defendeu a geração espontânea. Aliás, em
edições posteriores, ele falou da vida como “tendo sido originalmente soprada
pelo Criador”. 9 Mas sua abordagem reabriu a porta da geração espontânea,
pois, se organismos avançados podiam se desenvolver por si mesmos a partir dos
mais simples, por que a vida também não podia se originar sozinha? Mais tarde,
Darwin expressou interesse pela geração espontânea, sugerindo que “em alguma
poça morna” as proteínas poderiam formar-se, “prontas para passar por
mudanças ainda mais complexas”. 10 Essa visão posterior encaixou-se bem com
o interesse crescente pelas explicações naturalistas (mecanicistas). Essas
explicações buscavam eliminar qualquer necessidade de Deus na natureza.
Nenhum cientista dessa época, incluindo Semmelweis, Pasteur ou Darwin,
tinha ideia de quão complexos eram os menores tipos de organismos. Se
tivessem sabido disso, seria o caso de perguntarmos se a evolução teria recebido
a aceitação que recebeu. Na França, houve pouco apoio às ideias seculares de
Darwin. Os interesses nacionalistas ajudaram a Academia Francesa de Ciências
a alinhar-se firmemente ao lado de Pasteur. A comunidade científica acabaria
por seguir o estranho caminho de rejeitar a geração espontânea de organismos
que vivem hoje, mas aceitá-la para o primeiro organismo que apareceu na Terra
há bilhões de anos. Esse processo é chamado de evolução química.

Evolução química
No início do século 20, à medida que se aceitava a evolução, o interesse
também se concentrava em como a vida se originou por si mesma. Sem dúvida,
esse é o mais perturbador problema que a evolução biológica enfrenta, e
procurar dar-lhe uma resposta se tornou um empreendimento científico menor.
Por volta de 1924, o famoso bioquímico russo A. I. Oparin sugeriu um cenário
dentro do qual compostos inorgânicos e orgânicos pudessem formar compostos
orgânicos mais complexos, e estes, por sua vez, formariam organismos simples.
Na Inglaterra, o brilhante geneticista e bioquímico J. B. S. Haldane trabalhou
com algumas das mesmas ideias. Outros acrescentaram detalhes, e o conceito de
que a vida se originou por si mesma há muito tempo, naquilo que se costuma
chamar de “sopa orgânica morna”, tornou-se tópico para sérias considerações.
Em 1953, Stanley Miller, trabalhando na Universidade de Chicago, no
laboratório de Harold Urey, premiado com o Nobel, relatou um experimento que
se tornou ícone para os defensores da geração espontânea. A experiência foi
idealizada para simular as condições que supostamente existiam na Terra antes
que se originasse a vida, e que podem ter provocado o surgimento de organismos
vivos. Usando um aparato químico fechado que excluía o oxigênio, Miller expôs
uma mistura de gases – metano, hidrogênio, amônia e vapor de água – a
centelhas elétricas. O aparato continha um alçapão protetor para coletar as
delicadas moléculas orgânicas que poderiam ser produzidas. Depois de muitos
dias, ele descobriu que muitos tipos diferentes de moléculas orgânicas se haviam
formado, incluindo alguns dos aminoácidos encontrados em organismos vivos. A
experiência tem sido repetida muitas vezes, e incrementada, e parece que se
produzem os tipos diferentes de aminoácidos encontrados em proteínas, quatro
das cinco bases encontradas em ácidos nucleicos 11 e alguns açúcares. Milhões
de alunos de biologia foram ensinados a respeito dessa experiência, e cientistas e
professores a apregoaram por todo o mundo como evidência de como a vida
pode ter se originado por si. Durante meio século, foi efervescente a discussão
sobre a importância desse experimento. A verdade é que uma multidão de
problemas permanece sem solução.
Uma questão básica que precisa de consideração diz respeito a quão bem as
experiências de laboratório representam aquilo que realmente aconteceu na Terra
primitiva. Os químicos dos laboratórios, usando equipamento sofisticado e
produtos químicos purificados, podem não proporcionar bons exemplos das
condições que existiam numa Terra primitiva e rústica, muito tempo atrás. Às
vezes, pode-se relacionar devidamente as observações de laboratório com o que
se supõe ter acontecido no passado, mas às vezes não se pode. Por exemplo, no
experimento de Miller, os produtos desejados foram protegidos, num alçapão,
dos efeitos destrutivos das faíscas da fonte de energia usada. O uso de um
alçapão protetor especial não representa aquilo que se esperaria numa Terra
primitiva. 12
Precisamos conservar em mente que estamos falando aqui de uma Terra
primitiva sem vida, sem laboratórios e sem cientistas. Quando um cientista entra
no seu laboratório e executa experimentos com base em sua inteligência, e usa
informações e equipamentos reunidos após séculos de experiência, está fazendo
mais aquilo que esperaríamos de um Deus inteligente, e não aquilo que
esperaríamos de uma Terra vazia. Em muitos sentidos, o cientista está
representando mais as atividades criativas de Deus do que as condições
primitivas do acaso. A evolução química exige que todo tipo de coisas boas
aconteça por si, e não por meio de cientistas em sofisticados laboratórios.

Problemas com a evolução química


Você pode achar esta seção um pouco técnica para seu gosto, mas é muito
importante e merece esforço especial. Se você não acompanhar cada detalhe,
ainda assim captará o significado básico.
Onde estava a sopa? Os evolucionistas precisam de toda a “sopa orgânica
morna” que possam encontrar. Os organismos são tão complexos, e a chance de
se organizarem por si mesmos é tão remota, que existe a real necessidade de um
bocado de sopa. Quanto mais sopa houver, maior será a chance de que em algum
lugar a vida tenha surgido espontaneamente. A suposta sopa teria sido algo
parecido com um caldo, e, para aumentar o potencial para a formação da
proteína, poderia ter o volume de todos os oceanos do mundo! O problema é
que, se você tivesse essa sopa orgânica na Terra primitiva por muitos milhões de
anos, de modo a acumular as moléculas necessárias, você esperaria encontrar
muitas evidências disso nas rochas mais antigas da Terra. Ali deviam estar todos
os tipos de restos de matéria orgânica, mas virtualmente nada foi encontrado. 13
A ideia da sopa primitiva tem sido muito popular, e é frequentemente
apresentada como fato. 14 Assim, como indica o biólogo molecular Michael
Denton, “chega a ser chocante perceber que não existe absolutamente nenhuma
evidência positiva de sua existência”. 15
A necessidade do tipo certo de moléculas. Experimentos para a produção
das primeiras moléculas da vida produzem uma quantidade de outros tipos de
moléculas inúteis para a vida. Por exemplo, no experimento de Miller, muitos
tipos de aminoácidos inúteis na produção de proteínas foram produzidos, além
dos 20 necessários para as formas de vida. 16 O processo de geração de vida
teria, de alguma forma, de selecionar e jogar fora os refugos, antes de poder
organizar as primeiras proteínas úteis para a vida. É difícil imaginar como isso
aconteceria por si. Nesse tipo de experiência, moléculas como cianeto de
hidrogênio e formaldeído, muito tóxicas à vida, também são produzidas. 17
Moléculas orgânicas não sobreviveriam. A fim de formar a primeira vida,
teria sido necessária uma pesada concentração de moléculas orgânicas,
particularmente as certas. Mas as moléculas orgânicas tendem a ser facilmente
destruídas, especialmente pela luz ultravioleta que se supõe ter fornecido a
energia para sua formação. Num centro de pesquisas na Califórnia, o químico
Donald Hull 18 calculou a chance de sobrevivência do aminoácido mais simples,
a glicina (NG2CH2COOH), na Terra primitiva. Ele concluiu que 97% se
decomporiam na atmosfera primitiva antes de chegar ao oceano, onde os 3%
restantes seriam destruídos. Os aminoácidos mais complicados, que são mais
delicados, teriam menos chance ainda de sobreviver. Assim, podem-se esperar
apenas concentrações extremamente diluídas do tipo certo de moléculas
orgânicas. 19
Isômeros óticos. Sua mão direita é muito semelhante à esquerda, mas as
partes são arranjadas de tal maneira que não sejam idênticas, e sim imagens
espelhadas uma da outra. As moléculas orgânicas também são complicadas
estruturas tridimensionais que podem existir em diferentes formas, embora
tenham os mesmos tipos de átomos e estrutura química básica. Essas diferentes
formas de moléculas semelhantes são chamadas isômeros e, assim como as suas
mãos, podem ser imagens espelhadas uma da outra ( Figura 3.3 ). 20 Um modo
de identificar as duas imagens espelhadas das moléculas é notando a maneira
como elas giram as ondas de luz que vêm de luz polarizada que tem suas ondas
alinhadas. Se a rotação é para a esquerda, elas são do tipo L (levo); se para a
direita, são do tipo D (dextro). Quando essas moléculas são sintetizadas no
laboratório, acabam sendo metade L e metade D. Uma exceção é o aminoácido
glicina, o qual é tão simples que não possui uma imagem espelhada de si mesmo.
No experimento de Miller, a metade dos aminoácidos era L e a metade D, o que
se encontraria na sopa primitiva. 21 Mas, quando você examina organismos
vivos, exceto algumas moléculas extremamente singulares, todas as suas
moléculas de aminoácido são do tipo L. Não há muito espaço para substituições.
Apenas um aminoácido D numa molécula de proteína impedirá que ela se forme
da maneira certa a fim de poder funcionar adequadamente. 22 A questão que
deixa o evolucionista perplexo é: como foi que as primeiras formas vivas que se
desenvolviam na sopa resolveram escolher apenas os aminoácidos L para as
primeiras proteínas, no meio de uma mistura igual de L e D na sopa? Depois,
quando se trata das moléculas de açúcar no DNA e RNA, temos o mesmo tipo de
problema, com a exceção de que esses açúcares são apenas do tipo D.
Ao longo dos anos, os evolucionistas têm sugerido uma multidão de
mecanismos, como a luz polarizada, o magnetismo e o efeito do vento, para
tentar solucionar o mistério de somente o aminoácido L ocorrer nas coisas
vivas. 23 Mas nada resolve o problema, e assim novas ideias continuam
aparecendo. Os mínimos lampejos de esperança, em experimentos artificiais
bem controlados de laboratório, os quais poderiam apenas vagamente se
assemelhar a algo que teria realmente acontecido na natureza, são recebidos
como possíveis soluções. Por enquanto, não se produziu nenhuma solução
realista para o mistério.
Formação de moléculas grandes. Aminoácidos, bases de nucleotídeos e
açúcares são moléculas relativamente simples, comparadas com as enormes
moléculas que eles formam quando se combinam para compor proteínas, DNA e
RNA. Podemos fazer muitas moléculas simples, mas como foi que as moléculas
grandes chegaram a se organizar sozinhas? Uma proteína típica é feita de uns
cem aminoácidos, e o DNA do Escherichia coli é uma enorme molécula que
consiste de mais de 4 milhões de bases. Lembre-se de que até os tipos mais
simples de organismos independentes que conhecemos têm meio milhão de
bases em seu DNA, codificando quase 500 proteínas diferentes. 24
Como foi que se organizou a primeira vida? Os organismos precisam de
proteínas para produzir DNA e devem ter DNA para reunir as proteínas. Poderia
esse sistema todo resultar simplesmente de uma casualidade, enquanto interações
entre átomos seguem as leis da física? Foram calculadas as chances de se formar
apenas um tipo específico de molécula de proteína, e elas são incrivelmente
pequenas. Um estudo 25 dá o resultado de menos de uma possibilidade entre
10190 (4.9 x 10-191). Esse é um número inacreditavelmente pequeno. Cada um
dos 190 zeros aumenta a improbabilidade dez vezes em relação ao zero anterior.
Mas não existe ainda a possibilidade de que isso possa ter acontecido sem uma
orientação inteligente? Embora os matemáticos às vezes definam probabilidades
de menos de uma chance em 1050 como impossíveis, pode-se ainda, um tanto
racionalmente, argumentar que só uma vez se conseguiu a molécula certa de
início. Contudo, uma vez tendo uma molécula de proteína, isso não ajuda muito,
pois são necessárias pelo menos centenas de tipos diferentes para as formas de
vida mais simples. 26 Então são necessárias as moléculas do DNA e RNA, e
essas podem ser mais complexas que as proteínas. Também são necessários os
carboidratos e as gorduras (lipídios).
Se formos invocar o acaso e leis naturais não guiadas para isso, teremos de
pensar em mais matéria do que teríamos no Universo conhecido para acomodar a
improbabilidade! Bernd-Olaf Küppers, que favorece a ideia de que as moléculas
de alguma forma se organizaram sozinhas para formar a vida, estudou essas
probabilidades. E comenta: “Mesmo que toda a matéria no espaço consistisse de
moléculas de DNA com a complexidade estrutural do genoma bacteriano [DNA
do micróbio], com sequências casuais, então as chances de encontrar entre elas
um genoma bacteriano, ou algo parecido, ainda seriam completamente
desprezíveis.” 27 Embora um bom número de evolucionistas reconheça o
problema, ainda não apresentaram nenhuma solução plausível. Então, por fim,
na história da vida, é necessário fazer evoluir o DNA de seres humanos, que é
mil vezes maior que o dos micróbios. 28 Também devemos considerar que,
geralmente, a informação biológica no DNA deve ser muito exata. Mudar apenas
um aminoácido numa proteína pode significar desastre, como é o caso dos que
sofrem de anemia falciforme. No que tange à origem espontânea da vida, a
racionalidade sugeriria que procurássemos outras alternativas que não o acaso.
Seria melhor crer em milagres do que nessas improbabilidades.
O código genético. Uma das diversões na infância é criar códigos secretos
nos quais, ao substituir letras ou números, temos uma nova linguagem, entendida
apenas por alguns poucos escolhidos que têm o privilégio de saber como o
código funciona. As atividades bélicas usam códigos sofisticados e os trocam
frequentemente para proteger as informações dos inimigos, que envidam
consideráveis esforços para decifrá-las. Algumas décadas atrás, a interpretação
do código genético também exigiu considerável esforço. 29 Essa conquista
representa um dos grandes triunfos da ciência.
Mencionamos antes como as bases A, T, G e C, numa molécula de DNA,
dirigem a produção de proteínas, passando a informação ao RNA e aos
aminoácidos ( Figura 3.2 ). Como a informação do DNA é comunicada aos
aminoácidos? Essa informação do DNA é transmitida através de moléculas
especiais que usam a linguagem do código genético. Sem o código genético, é
virtualmente impossível pensar em algum tipo de vida como a conhecemos.
Portanto, ele precisava existir antes que esse tipo de vida existisse. Lembre-se de
que no código genético é necessária a combinação de três bases (um códon) para
codificar um aminoácido ( Tabela 3.2 ). Como essa linguagem codificada veio a
existir é uma questão constrangedora para a evolução. A sopa primordial não foi
uma espécie de sopa de letrinhas! Não se esperaria que uma multidão de bases
de DNA se arranjassem numa ordem codificada significativa por meio de
mudanças ao acaso. Além disso, não haveria utilidade no sistema, e nenhum
valor de sobrevivência evolutiva, enquanto não houvesse evoluído um sistema
que combinasse os aminoácidos com o código.
Por outro lado, muitos evolucionistas pensam que a própria existência de um
código genético quase universal é uma forte evidência de que todos os
organismos se relacionam uns com os outros e evoluíram de um antepassado
comum. Como está escrito num importante livro didático: “A universalidade do
código genético está entre as mais fortes evidências de que todas as coisas vivas
participam de uma herança evolutiva comum.” 30 Os evolucionistas usam
amplamente o argumento da semelhança entre células, genes e ossos dos
membros para apoiar a evolução, mas uma reflexão mostra que ele não
convence, sendo facilmente refutado pela sugestão de que todas essas
semelhanças são evidência de que há um Deus criador que usou o mesmo esboço
viável ao criar vários organismos. Pareceria incomum que Deus apelasse para
uma multidão de diferentes códigos genéticos para vários organismos, sendo que
um código bom e prático já existia. Esse argumento das semelhanças não tem
muito significado no debate sobre a evolução dos organismos e a existência de
Deus.
Como invariavelmente ocorre entre os seres vivos, os vários sistemas não
são simples, e esse é o caso do código genético. Comentamos antes que, na
formação das proteínas, moléculas especiais (aminoacil-tRNA sintetases)
combinam o tipo certo de aminoácido com o tipo específico de RNA de
transferência que tem o código genético certo para aquele aminoácido. Então, a
combinação do aminoácido e o RNA codificado de transferência se unem à
informação codificada do RNA mensageiro. Essa informação veio originalmente
do DNA e resulta na ordem certa dos aminoácidos, ao se ligarem para formar
uma molécula de proteína num ribossomo ( Figura 3.2 ). A menos que os
códigos no DNA e os códigos usados pelo RNA de transferência se combinem,
não teremos as proteínas necessárias. Uma analogia simples é que, para uma
linguagem como o código genético ser útil, tanto a pessoa que fala como a que
ouve usem e entendam o mesmo idioma. Além disso, qualquer tentativa de
mudar gradualmente o código decretaria morte instantânea para o organismo.
Linguagens como o código genético simplesmente parecem não surgir de
modo espontâneo entre seres vivos ou inanimados, a menos que sejam criadas
com um propósito. Num cenário de desenvolvimento evolutivo gradual, surge a
questão quanto a qual evoluiu primeiro: o complicado código no DNA ou a
capacidade de lê-lo e combinar os aminoácidos segundo o código. Nenhum
parece ter valor de sobrevivência evolutiva até que ambos estejam funcionando.
Necessita-se de pelo menos um código separado de DNA de três letras para cada
um dos 20 aminoácidos. Esse código precisa ser combinado com os aminoácidos
pelas 20 moléculas especiais (aminoacil-tRNA sintetases) que ligam os
aminoácidos certos aos 20 tipos de RNA de transferência, que então leem a
informação no RNA mensageiro que veio do DNA. Isso não é simples, e o
sistema todo precisa trabalhar corretamente a fim de produzir os tipos certos de
proteínas. Na verdade, o sistema é muito mais complicado do que esse mínimo
sugerido acima. São muitas as partes associadas ao código genético que
dependem de outras partes antes que possam funcionar. Isso tudo dá a impressão
de que um intelecto deve ter se envolvido na criação tanto do código quanto do
complicado processo de produzir proteínas.
Trilhas bioquímicas e seu controle. Os organismos geralmente efetuam uma
série de passos químicos para produzir um só tipo que seja de molécula. As
mudanças são realizadas um passo de cada vez, numa ordem definida, até que se
obtenha o produto final. A sequência é chamada de trilha bioquímica, e uma
molécula de proteína diferente, denominada enzima, promove cada passo
( Figura 3.4 ). Essas trilhas bioquímicas, semelhantes a uma linha de montagem,
são abundantes nos organismos vivos. Elas provocam o mesmo problema para a
evolução que já mencionamos em relação com o desenvolvimento do código
genético. É implausível pensar que uma trilha inteira, complexa, tenha aparecido
de repente e por acaso, tendo assim sobrevivido evolutivamente. Se não
aconteceu de repente, como poderiam esses complexos sistemas evoluir aos
poucos, quando não há possibilidade de sobreviverem sem o passo final na sua
sequência, para manufaturar a molécula necessária?
Os evolucionistas têm lutado com esse problema, e a solução padrão
apresentada em livros didáticos é assumir que as várias moléculas necessárias e
seus intermediários já estavam disponíveis no ambiente. O processo evolutivo
foi para trás, seguindo a trilha bioquímica. Quando uma molécula (por exemplo,
a molécula G, Figura 3.4 ) se exauriu, uma enzima (enzima F) evoluiu para
alterar um intermediário anterior (molécula F) até ficar mais avançado (molécula
G). Esse processo continua retrocedendo até que todas as enzimas diferentes
tenham evoluído. 31 É uma sugestão inteligente, mas, devido ao fato de que as
moléculas intermediárias necessárias, com raras exceções, não se encontram no
ambiente da Terra, é um aposta que já começa perdendo. 32 Além disso, é
altamente improvável que o tipo certo de enzima seja codificado tanto no tempo
quanto no lugar certo no DNA para proporcionar um sistema que funcione.
E se as trilhas bioquímicas continuassem o tempo todo? Seria caótico.
Felizmente, essas trilhas em geral têm um elaborado mecanismo de controle
associado com o primeiro passo, que regula a produção das moléculas
necessárias. Esses sistemas reguladores podem reagir de várias maneiras,
enquanto delicados sensores determinam se é necessária ou não a molécula final.
Sem esses mecanismos reguladores, a vida não seria possível. As enzimas
continuariam produzindo indefinidamente mais e mais moléculas e, como uma
casa em chamas, tudo ficaria fora de controle. Esse fato suscita mais um
problema para a evolução química. Qual evoluiu primeiro: a trilha bioquímica ou
o sistema de controle? Se foi a trilha bioquímica, o que providenciaria o
necessário sistema de controle? Se foi o sistema de controle, por que ele
evoluiria na ausência de uma trilha para ele controlar? Os seres vivos exigem que
muitas coisas apareçam todas ao mesmo tempo.
Como se formaram as células? Existe um abismo incrivelmente imenso
entre as moléculas simples e desorganizadas do tipo de experimento tão
aclamado de Miller e uma célula viva, incluindo sua multidão de sistemas
controlados de funcionamento. Infelizmente, esse abismo raras vezes é notado
nos livros didáticos de biologia. Como observa o filósofo Michael Ruse: “Se há
uma lacuna desagradável no seu conhecimento, então sua melhor política é não
dizer nada.” 33
Os micróbios minúsculos dos quais estivemos falando representam células
mais simples do que as células da maioria das coisas vivas com que estamos
familiarizados. As células dos organismos, de uma ameba ao ser humano e de
um musgo às gigantescas sequoias, tendem a ser maiores, e seriam necessárias
apenas cerca de 100 dessas células para preencher um milímetro. Essas células
maiores têm um núcleo central que abriga a maior parte do DNA, e são
configuradas em todas as variedades, desde células de glândulas a células
nervosas. Esses tipos de células também precisam ser levados em conta na
grande questão da origem da vida.
Mencionamos proteínas, DNA, RNA, enzimas, etc., mas não se tem nem
mesmo um ínfimo micróbio enquanto não houver uma membrana da célula que
envolva essas moléculas especiais, facilitando assim a sua interação e controle.
A membrana da célula executa essa função vital. Estamos descobrindo que as
membranas das células são muito complexas. Incluem partes especiais que
controlam e “bombeiam” o que entra na célula e o que sai. Como foi que a
primeira célula viva fez evoluir sua membrana?
Químicos evolucionistas têm sugerido que agregações de grandes moléculas
orgânicas ou mesmo aminoácidos poderiam ter formado massas esféricas que
resultaram nas primeiras células. 34 Essas esferas não possuiriam uma
membrana de célula funcional, não teriam organização interna nem alguma outra
característica especial necessária à vida. Referindo-se a isso, William Day, que
ainda argumenta em favor de algum tipo de evolução biológica, comenta: “Não
importa como você o considere, isso é uma tolice científica.” 35 Além disso, a
vida não é apenas uma porção de elementos químicos dentro de um saco. Estes
em pouco tempo chegariam ao que chamamos de equilíbrio químico, e em
estado de equilíbrio você está morto. Uma célula desse tipo não realizaria as
muitas alterações metabólicas características de algo que está vivo. Como indica
o bioquímico George Javor, para haver vida você precisa de uma multidão de
trilhas bioquímicas interdependentes, acionadas e funcionando. 36 Podemos ter
todos os elementos químicos necessários, como os que seriam encontrados numa
canja de galinha, mas a vida não aparece ali espontaneamente.
Encontramos nas células todo tipo de estruturas especializadas ( Figura
3.5 ). Elas incluem: centríolos, que ajudam na divisão celular; mitocôndria, que
provê energia; retículo endoplasmático, onde os ribossomos fazem moléculas de
proteína; corpos de Golgi, que coletam produtos sintetizados; lisossomos, que
digerem produtos celulares; filamentos, que protegem a estrutura celular; e
microtúbulos, que, junto com moléculas especiais, movem partes das células
para onde for necessário. E esse é apenas o início daquilo que estamos
descobrindo como um território incrivelmente pequeno e intrincado.
Qual é a probabilidade de que uma célula tenha simplesmente surgido por
acaso? Alguns pesquisadores têm tratado dessa questão, e a probabilidade é
extremamente pequena. Sir Fred Hoyle 37 calculou que a probabilidade de obter,
de uma vez só, duas mil enzimas (moléculas de proteína) necessárias para dar
início à vida é uma em 1040.000. É difícil conceber quão pequena é essa
possibilidade. Só para escrever os 40.000 zeros dessa improbabilidade, usando
números comuns, seriam necessárias mais de 13 páginas de zeros! Seria muito
monótono ler isso. Lembre-se de que cada zero acrescentado multiplica a
improbabilidade dez vezes. Acontece que Hoyle era muito otimista. Usando a
termodinâmica (relacionamento de energia de átomos e moléculas), o físico-
químico Harold J. Morowitz, 38 que defende a origem evolutiva da vida, calcula
que a probabilidade de um micróbio muitíssimo pequeno (micoplasma) aparecer
espontaneamente é de uma em 105.000.000.000 (10-5x109). O cosmólogo Chandra
Wickramasinghe, que defende uma fonte extraterrestre da vida, é mais prático ao
descrever o dilema: “A chance de a vida ter simplesmente aparecido na Terra é
tão improvável quanto um tufão ter soprado num ferro-velho e construído um
747 [avião da Boeing].” 39
Reprodução. Ter apenas uma célula viva por aí não vai estabelecer a vida
sobre a Terra. Antes de morrer, essa célula precisa dividir-se repetidamente. A
reprodução é uma das principais características identificadoras da vida. A fim de
se reproduzir, todas as intrincadas partes necessárias da célula têm de ser
replicadas, ou então a vida cessa. Enquanto nossa imaginação é desafiada a saber
como células minúsculas fazem isso, a ciência agora nos apresenta uma porção
de detalhes fascinantes.
A parte mais importante que precisa ser duplicada é o DNA. Um mecanismo
muito especial, que consiste de umas 30 moléculas de proteína, chamado
polimerase do DNA, passa ao longo do DNA e o duplica. Quando a célula
começa a se dividir, o DNA, que nos seres humanos mede um metro de
comprimento em cada célula, comprime-se em 46 microscópicos cromossomos.
Isso se realiza primeiro ao espiralar-se o DNA, depois enrolando o que foi
espiralado, depois dobrando o enrolado e finalmente dobrando o duplo enrolado
espiralado, produzindo assim cromossomos pares que serão destinados a cada
nova célula, para que cada uma tenha um complemento inteiro do DNA. Os
cromossomos são alinhados no meio, entre as duas células novas que estão se
formando, e os microtúbulos se engancham e as puxam na direção dos
centríolos, que ficam em extremidades opostas ( Figura 3.6 ). Ali os
cromossomos se desenrolam na nova célula-filha, onde dirigem a atividade
celular. O que parece ainda mais espantoso é como o laço circular de 1,6
milímetro de comprimento do DNA no Escherichia coli, que é espremido numa
célula de apenas um oitocentos avos de seu comprimento, consegue duplicar-se.
E faz isso sem formar cromossomos compactados, como é o caso em organismos
avançados, e sem enredar-se. O processo dura uns 42 minutos, e significa que os
dois mecanismos de polimerase da proteína do DNA, que se movem ao longo do
DNA, copiam as bases do código genético à taxa de aproximadamente mil pares
por segundo. As maravilhas dos micróbios nunca deixam de nos impressionar!
Demos apenas um relato geral de um processo muito complicado sobre o
qual sabemos alguns pormenores, mas ainda temos muito que aprender. E depois
existe o restante das partes de todo tipo de células, como a membrana celular e
muitas fibras que precisam ser duplicadas. Poderiam esses processos
complicados e necessariamente integrados aparecer simplesmente por si
mesmos? Muitas partes dependem de outras partes, e não sobreviveriam
evolutivamente a menos que todas estivessem presentes. Por exemplo, que
utilidade teria o DNA sem o mecanismo de polimerase da proteína para duplicá-
lo? E que utilidade teria a polimerase sem um DNA para duplicar? Cada um
seria inútil sem o outro, e sem ambos não teríamos organismos novos. E isso
acontece com quase todas as partes dos organismos vivos. É necessário um
extenso arranjo de partes interdependentes até para começar a pensar em vida. O
bioquímico Michael Behe estudou vários sistemas de organismos que têm muitas
partes que precisam atuar com outras, a fim de funcionar. Para ele, esses
sistemas representam uma “complexidade irredutível”, 40 e isso descreve muito
bem o que estamos descobrindo.
A origem dos sistemas de leitura e correção do DNA. Quando uma célula se
divide, centenas de milhares ou milhares de milhões de bases que formam o
código genético no DNA precisam ser duplicadas. Alguns erros na cópia são
inofensivos e, em casos raros, até benéficos, enquanto quase todos os outros são
prejudiciais e até fatais. Felizmente, no caso dos seres vivos, existem vários
sistemas especiais para fazer a revisão do código copiado, remover os erros e
substituí-los pelas bases corretas. 41 Como esses sistemas inibem mutações,
interferem na evolução. Sem os processos de revisão e correção feitos pelas
proteínas, o índice de erros de cópia poderia chegar a 1%, e isso é totalmente
incompatível com a vida. Quando esse sistema de correção está inativo nas
células, causa algumas formas de câncer. Os elaborados sistemas de correção
podem melhorar a exatidão da cópia milhões de vezes, e isso permite que a vida
continue, enquanto as células se dividem repetidas vezes e mantêm a exatidão do
seu DNA. Isso provoca outra pergunta para o modelo de geração espontânea da
vida. Como foi que os complexos sistemas de leitura evoluíram num sistema que
teria sido tão inconsistente ao copiar antes que eles existissem? Um cientista
identifica essa dificuldade como “um problema não solucionado na biologia
teórica”. 42
Algumas outras ideias
Muitos cientistas compreendem quão improvável é que a vida tenha surgido
espontaneamente. Por isso, não é surpreendente que proponham várias
explicações alternativas. Mas, como nos exemplos dados acima, elas beiram o
impossível. Elas incluem: (1) A vida se originou de informações especiais
encontradas nos átomos. Não existe evidência disso. (2) A princípio, houve um
tipo muito mais simples de vida, que deu origem à vida presente. Para isso
também não há muito mais evidências. (3) Um sistema cíclico de autogeração
de proteínas e RNA pode ter dado início à vida. Mas as moléculas envolvidas
são difíceis de produzir e tendem a avariar-se rapidamente. Problemático de
modo especial é o fato de que esse RNA não tem a volumosa biblioteca de
informações genéticas (DNA) necessárias até para o mais simples organismo. (4)
Possivelmente, a vida começou em fontes aquecidas na profundeza dos oceanos.
Esse é um ambiente muito limitado, em que o calor poderia facilmente destruir
moléculas delicadas, e tampouco oferece a vasta informação genética necessária
para um sistema vivo. (5) A vida pode ter se originado usando padrões de
minerais como a pirita (ouro-de-tolo) ou minerais de argila como modelo para
as complexas moléculas dos organismos vivos. Esses minerais têm um arranjo
organizado de átomos, mas o arranjo se repete em sequência e não poderia
fornecer as variadas e complexas informações necessárias para a vida.
Infelizmente, os cientistas muitas vezes confundem uma abundância de
regularidade, como a encontrada em minerais argilosos, com a complexidade
encontrada no DNA. É mais ou menos como se tivéssemos um livro contendo
apenas as letras A, B e C, repetidas indefinidamente, do início ao fim, enquanto
aquilo de que precisamos para a vida é um Dicionário Aurélio, repleto de
informações significativas. (6) Uma ideia popular tem sido que a vida se
originou como RNA, porque o RNA tem algumas propriedades de enzimas e uma
breve sugestão de cópia. Embora um químico bem preparado possa fazer RNA
no laboratório, não parece que isso tenha sido possível na Terra primitiva, antes
que algum tipo de vida estivesse presente. O bioquímico Gerald F. Joyce, que se
especializou nessa área e ainda é simpático ao modelo do RNA, avisa que “você
precisa fazer um homem-de-palha após outro até chegar ao ponto em que o RNA
seja uma biomolécula viável”. 43 Além disso, assim como no caso das outras
sugestões dadas acima, de onde virá a informação necessária para a vida? (7) Se
é tão difícil que a vida tenha começado na Terra, por que não aceitar que tenha
vindo do espaço, viajando num cometa ou numa partícula de pó? Isso não ajuda
muito, porque simplesmente transfere os mesmos problemas para outra área. Os
mesmos problemas e improbabilidades que enfrentamos na Terra também
precisam ser enfrentados em qualquer outro lugar. Todas essas sete sugestões
alternativas têm sérios problemas e fracassam totalmente ao explicar a origem da
vasta informação integrada que encontramos no DNA, tão essencial ao
funcionamento e à reprodução até dos organismos mais simples e independentes
de que temos conhecimento.
Alguns dos dados apresentados acima geraram um dos maiores embates que
a comunidade erudita enfrentou em longo tempo. Antony Flew, famoso filósofo
britânico, escreveu mais de duas dezenas de livros sobre filosofia, tem sido um
dos maiores ícones dos ateus por décadas e foi chamado o filósofo ateu mais
influente do mundo. Recentemente, entretanto, ele considerou algumas
evidências científicas muito convincentes e mudou sua posição, passando do
ateísmo para a crença de que algum tipo de Deus deve estar envolvido, para
explicar o que está sendo descoberto. Em suas palavras, ele precisou “ir para
onde as evidências levam”. Ele chama atenção para o fato de que “os mais
impressionantes argumentos em favor da existência de Deus são aqueles
amparados pelas recentes descobertas científicas”. Ele se refere à sintonia fina
do Universo e, em particular, à capacidade reprodutiva dos organismos vivos,
indicando que os evolucionistas “devem dar alguma consideração a isso”. Além
do mais, “agora me parece que as descobertas em mais de cinquenta anos de
pesquisa do DNA oferecem material para um novo e grandemente poderoso
argumento em favor do planejamento”. 44 Embora Flew não esteja adotando
uma religião tradicional, ele desistiu do ateísmo por causa de dados científicos.

Síntese
Uma das mais profundas questões que enfrentamos é acerca de como a vida
se originou. Pasteur demonstrou que a vida só provém de vida anterior. Desde
então, um verdadeiro exército de cientistas tem investigado como a vida pode ter
surgido por si mesma. Só que essa busca não tem se mostrado nada frutífera.
Estamos descobrindo que uma “simples” célula é imensamente mais complicada
do que se imaginava, e ainda temos muito a aprender.
Os cientistas têm obtido algum sucesso em criar moléculas orgânicas
simples, como aminoácidos, sob supostas condições da Terra primitiva. Contudo,
é suspeita a relação de seus experimentos de laboratório com aquilo que
realmente aconteceu numa Terra vazia e caótica. Além desse questionável
sucesso, tem havido enorme quantidade de problemas intransponíveis para a
evolução química. Não se encontraram evidências de uma sopa orgânica no
registro geológico. As moléculas necessárias para a vida são delicadas demais
para sobreviver aos rigores de uma Terra primitiva. Experimentos que produzem
moléculas simples da vida não apresentam a configuração ótica necessária e vêm
misturados com todo tipo de moléculas desnecessárias e prejudiciais. Como foi
que só as moléculas certas foram selecionadas? Nada parece fornecer a
informação específica necessária para as moléculas grandes, como as proteínas e
o DNA.
Muitos fatores interdependentes, como os encontrados no código genético,
na síntese do DNA e nas trilhas bioquímicas controladas, desafiam a ideia de que
podem ter se desenvolvido de forma gradual, sobrevivendo evolutivamente em
cada estágio, até que todos os fatores necessários estivessem presentes. Os
modelos alternativos são irreais e insatisfatórios, e ignoram totalmente o fato de
que a vida requer uma abundância de informações coordenadas. Depois, vem a
questão da formação de todas as partes da célula e de fazer com que essas partes
se reproduzam. Todos os cálculos matemáticos indicam, em essência,
probabilidades impossíveis. O pesquisador Dean Overman esboça o dilema da
evolução: “Alguém pode escolher, com base religiosa, acreditar em teorias sobre
a auto-organização, mas essa crença deve estar baseada nas pressuposições
metafísicas, e não na ciência e em probabilidades matemáticas.” 45
O fracasso da evolução química para apresentar um modelo plausível, junto
com a persistência dos cientistas em tentar criá-lo, provoca uma séria questão
sobre a prática atual da ciência. Por que tantos cientistas têm fé em modelos da
origem da vida que seguem uma multidão de proposições essencialmente
impossíveis, mas não consideram a fé em um idealizador? Existe uma atitude
preconceituosa contra Deus no atual ambiente científico? Estaria essa atitude
impedindo que a ciência encontre toda a verdade? Algo parece estranho.

Referências
1
Harold FM. 2001. The way of the cell: molecules, organisms and the order of life. Oxford: Oxford
University Press, p. 251.
2
Este relato de Semmelweis baseia-se principalmente em: (a) Clendening L. 1933. The romance of
medicine: behind the doctor. Garden City: Garden City Publishing Co., p. 324-333. (b) Harding AS.
2000. Milestones in health and medicine. Phoenix: Oryx Press, p. 24, 25. (c) Manger LN. 1992. A
history of medicine. Nova York: Marcel Dekker, p. 257-267. (d) Porter R. 1996. Hospitals and surgery.
In: Porter R, editor. The Cambridge illustrated history of medicine. Cambridge: Cambridge University
Press, p. 202-245.
3
Behe MJ. 1996. Darwin’s black box: the biochemical challenge to evolution. Nova York: Touchstone, p.
69-72.
4
Ver no capítulo 4 discussão adicional sobre o conceito da complexidade.
5
Blattner FR, et al. 1997. The complete genome sequence of Escherichia coli K-12. Science 277, p. 1453-
1474.
6
Fraser CM, et al. 1995. The minimal gene complement of Mycoplasma genitalium. Science 270, p. 397-
403.
7
Farley J. 1977. The spontaneous generation controversy from Descartes to Oparin. Baltimore: The Johns
Hopkins University Press, p. 6.
8
Vallery-Radot R. 1924. The life of Pasteur. Devonshire RL, tradutor. Garden City: Doubleday, p. 109.
9
Darwin C. 1859. 1958. The origin of species: by means of natural selection, or the preservation of
favoured races in the struggle for life. Nova York: Mentor, p. 450.
10
Darwin F, editor. 1888. The life and letters of Charles Darwin, v. 3. Londres: John Murray, p. 18.
11
Shapiro R. 1999. Prebiotic cytosine synthesis: a critical analysis and implications for the origin of life.
Proceedings of the National Academy of Sciences 96, p. 4396-4401.
12
Thaxton CB, Bradley WI, Olsen, RL. 1984. The mystery of life’s origin: reassessing current theories.
Nova York: Philosophical Library, p. 102-104.
13
Entre várias referências, ver: Yockey HP. 1992. Information theory and molecular biology. Cambridge:
Cambridge University Press, p. 235-241.
14
Yockey HP. 1992. Information theory and molecular biology. Cambridge: Cambridge University Press,
p. 240.
15
Denton M. 1985. Evolution: a theory in crisis. Londres: Burnett Books, p. 261.
16
Thaxton CB, Bradley WB, Olsen RL. 1984. The mystery of life’s origin: reassessing current theories.
Nova York: Philosophical Library, p. 52, 53.
17
Giem PAL. 1997. Scientific theology. Riverside: La Sierra University Press, p. 58, 59.
18
Hull DE. 1960. Thermodynamics and kinetics of spontaneous generation. Nature 186, p. 693, 694.
19
(a) Overman DL. 1997. A case against accident and self-organization. Lanham: Rowman & Littlefield,
p. 44-48. (b) Thaxton, Bradley, Olsen, p. 45-47. (c) Yockey, p. 234-236.
20
A identificação dessas formas para algumas moléculas complicadas é mais difícil.
21
Para recentes exemplos dando os mesmos resultados, veja: (a) Bernstein MP, et al. 2002. Racemic
amino acids from the ultraviolet photolysis of interstellar ice analogues. Nature 416, p. 401-403. (b)
Muñoz Caro GM, et al. 2002. Amino acids from ultraviolet irradiation of interstellar ice analogues.
Nature 416, p. 403-409.
22
Yockey (p. 237) indica que uma mistura dos dois tipos de aminoácidos interferiria no processo de
dobradura.
23
Sobre uma tentativa recente, ver Saghatelian A, et al. 2001. A chiroselective peptide replicator. Nature
409, p. 797-801.
24
Fraser [veja a nota 6].
25
Bradley WL, Thaxton CB. 1994. Information and the origin of life. In: Moreland JP, editor. The
creation hypothesis: scientific evidence for an intelligent designer. Downers Grove: InterVarsity, p. 173-
210.
26
Discussão adicional no capítulo 5.
27
Küppers B-O. 1990. Information and the origin of life. Manu Scripta A, tradutor. Cambridge: The MIT
Press, p. 60.
28
Alguns cientistas questionam se os íntrons nos genomas são úteis, mas outros sugerem mais e mais
funções para eles. Ver: (a) Brownlee C. 2004. Trash to treasure: junk DNA influences eggs, early
embryos. Science News 166, p. 243. (b) Dennis C. 2002. A forage in the junkyard. Nature 420, p. 458,
459. (c) Standish TG. 2002. Rushing to judgment: functionality in noncoding or “junk” DNA. Origins,
53, p. 7-30.
29
Nirenberg M, Leder P. 1964. RNA codewords and protein synthesis: the effect of trinucleotides upon
the binding of sRNA to ribosomes. Science 145, p. 1399-1407.
30
Raven PH, Johnson GB. 1992. Biology. 3a edição. St. Louis: Mosby-Year Book, p. 307.
31
O documento clássico é: Horowitz NH. 1945. On the evolution of biochemical syntheses. Proceedings
of the National Academy of Sciences 31, p. 153-157.
32
Behe, p. 154-156.
33
Ruse M. 2000. The evolution wars: a guide to the debates. New Brunswick: Rutgers University Press,
p. 154.
34
(a) Oparin AI. 1938, 1965. Origin of life. 2a edição. Morgulis S, tradutor. Nova York: Dover, p. 150-
162. (b) Fox SW, et al. 1970. Chemical origins of cells. Chemical and Engineering News 48, p. 80-94.
35
Day W. 1984. Genesis on planet earth: the search for life’s beginning. 2a edição. New Haven: Yale
University Press, p. 204, 205.
36
Javor GT. 1998. What makes a cell tick? Origins 25, p. 24-33.
37
(a) Hoyle F. 1980. Steady-state cosmology re-visited. Cardiff: University College Cardiff Press, p. 52.
(b) Hoyle F, Wickramasinghe NC. 1981. Evolution from space: a theory of cosmic creationism. Nova
York: Simon and Schuster, p. 24, 26.
38
Morowitz HJ. 1968. Energy flow in biology: biological organization as a problem in thermal physics.
Nova York: Academic Press, p. 67.
39
Anônimo. 1982. Threats on life of controversial astronomer. New Scientist 93, p. 140.
40
Behe, p. 39.
41
Radman M, Wagner R. 1988. The high fidelity of DNA duplication. Scientific American 259, p. 40-46.
42
Lambert GR. 1984. Enzymic editing mechanism and the origin of biological information transfer.
Journal of Theoretical Biology 107, p. 387-403.
43
A citação é de Irion R. 1998. RNA can’t take the heat. Science 279, p. 1303. Ver também Joyce GF.
1989. RNA evolution and the origin of life. Nature 338, p. 217-224.
44
Flew A, Habermas GR. 2004. My pilgrimage from atheism to theism: a discussion between Antony
Flew and Gary Habermas. Philosophia Christi 6, p. 197-211. Ver também Flew A, Varguese RA. 2007.
There is a God: how the world’s most notorious atheist changed his mind. Nova York: Harper One.
45
Overman, p. 101, 102.
O desafio de elucidar plenamente como
os átomos se reúnem – aqui na Terra e
quem sabe em outros mundos – para formar
seres vivos complexos o suficiente para
ponderar sobre suas origens é mais
amedrontador que qualquer outra coisa
na cosmologia. 1
Sir Martin Rees, astrônomo real

Tragédia
A notícia era ruim; alguns dias depois, ficou pior. Meu amigo Lloyd estivera
trabalhando até tarde da noite, e retornava para a universidade, onde o repouso,
as aulas e os compromissos aguardavam sua atenção. Mas demoraria um longo
tempo até que ele chegasse lá. Sentia-se exausto e, ao dirigir por uma solitária
estrada do interior, o cansaço o venceu, e o carro sem comando caiu num curso
de água. Ele sobreviveu, mas logo ficamos sabendo que seus ferimentos eram
muito graves. O acidente havia rompido os nervos na parte inferior da medula
espinhal e ele não mais podia controlar as pernas. Para o resto da vida, ficou
confinado a uma cadeira de rodas.
A recuperação, se a chamarmos assim, foi muito lenta. Felizmente, ele não
era uma pessoa comum, e decidiu não permitir que seu problema o
transformasse num fardo para a sociedade. Suas vigorosas capacidades mentais e
a perseverança o sustiveram ao longo do curso universitário e por décadas
depois. Ele trabalhou admiravelmente como professor, capelão e editor. Mas o
acidente não foi o fim dos seus problemas físicos. Com os nervos afetados, as
pernas se tornaram uma fonte constante de problemas, e a tendência para a
deterioração ficou tão grave que, cinco anos após o acidente, ele teve as pernas
amputadas.

Partes interdependentes
O transtorno que Lloyd sofreu com as pernas, depois que a medula foi
rompida, ilustra como muitas partes dos organismos vivos dependem de outras.
Os músculos nas pernas não funcionam sem que os nervos lhes enviem os
impulsos para fazer com que se contraiam. Os nervos, isoladamente, também
seriam inúteis sem músculos que respondessem ao impulso que estiver sendo
enviado, e ambos seriam inúteis sem um complicado sistema de controle no
cérebro, para determinar quando um movimento seria desejável, e assim
providenciasse o estímulo apropriado para mover o músculo. Esses três
elementos – músculos, nervos e o mecanismo de controle – representam um
exemplo simples de partes interdependentes. Nenhum deles funciona a menos
que todas as partes necessárias estejam presentes. No caso do meu amigo, o
nervo era a parte que faltava e, por causa disso, as pernas ficaram inúteis; eram
um transtorno do qual ele escolheu livrar-se.
Como de costume, estamos flagrantemente simplificando demais as coisas.
Em nosso exemplo, precisamos de mais partes vitais, como as estruturas que
transferem o impulso dos nervos para os músculos. Essas estruturas segregam
uma substância química especial que é recebida por um determinado receptor no
músculo, e esse receptor, quando estimulado, muda a descarga elétrica nas fibras
musculares e as leva a contrair-se. Há muitos outros fatores ainda.
Os nervos se desenvolvem a partir do sistema nervoso central, mas é
necessário um sistema que os associe ao músculo certo. Além disso, as fibras
alongadas e muito finas, que são parte das células nervosas e que transportam os
impulsos nervosos, podem medir mais de um metro; ainda assim, têm um
diâmetro de apenas um milésimo de milímetro. A fim de conservar em
funcionamento essas fibras celulares alongadas, sistemas especiais de transporte
levam partes e substâncias químicas para lá e para cá ao longo de sua grande
extensão. 2 Os músculos tampouco são estruturas simples. Nossa força muscular
é providenciada por muitos milhares de unidades contendo minúsculas
moléculas de proteína que rastejam ao longo das fibras, de modo a puxar e
contrair os músculos que ativam a maioria dos 206 ossos do nosso corpo.
O controle da atividade muscular também é algo muito complexo, com as
principais partes do cérebro ou da medula espinhal coordenando a ação de mais
de seiscentos músculos no corpo. Muitos movimentos corporais envolvem a
ação coordenada de vários músculos, tudo ao mesmo tempo. Sem um controle
adequado, podemos sofrer espasmos musculares e outras condições graves
ilustradas pela paralisia cerebral ou epilepsia. Para facilitar um movimento
suave, existem nos músculos estruturas especiais em forma de hastes, as quais
monitoram constantemente a atividade muscular. Elas são especialmente
abundantes nos músculos que controlam um movimento preciso, como aqueles
que movem nossos dedos. Nas hastes, há dois tipos de fibras musculares
modificadas que mantêm a tensão, a fim de que nervos sensoriais especiais nas
fibras possam monitorar o comprimento, a tensão e o movimento muscular.
Essas hastes se parecem um pouco com sistemas musculares em miniatura
dentro dos próprios músculos, e têm o seu próprio conjunto de partes
interdependentes. Nem todas as partes dessas hastes dependem de outras partes,
mas a maioria, se não todas, não funciona sem a presença de algumas outras
partes.
Um sistema de alarme contra roubo também ilustra as partes
interdependentes. Quer seja num carro, quer seja numa casa, é necessário certo
número de peças básicas. É preciso ter: (1) um sensor que detecte o intruso; (2)
fios (ou um transmissor) para a comunicação com um sistema de controle; (3)
um sistema de controle; (4) uma fonte de energia; (5) fios que se comuniquem
com um alarme; e (6) um alarme que, geralmente, é uma sirene. Assim como o
exemplo do músculo, nervo e mecanismo de controle, e vários outros exemplos
dados no capítulo anterior, esses são sistemas de partes interdependentes, em que
o sistema não funciona a menos que todas as partes necessárias estejam
presentes. Representam a complexidade irredutível, 3 às vezes também chamada
de estrutura irredutível. 4
Ao falar de complexidade, referimo-nos especificamente a sistemas como
um alarme contra roubo, que têm partes interdependentes. Não é, de forma
alguma, o mesmo que complicação. Muitas coisas podem ser complicadas, mas
não são complexas porque suas partes não se relacionam umas com as outras e
não dependem umas das outras. Por exemplo, um relógio com engrenagens
girando e ligando-se a outras é complexo; consiste de partes interdependentes,
necessárias para o devido funcionamento do relógio. Por outro lado, um monte
de lixo pode ser muito complicado e ter mais partes que um relógio, mas não é
complexo porque as peças não são interdependentes. Páginas de vários
documentos numa lixeira podem ser uma complicação, mas as páginas de um
romance são complexas; relacionam-se com outras e são interdependentes à
medida que o enredo se desenvolve.
Coisas complexas são complicadas, mas coisas complicadas não precisam
ser complexas, se as partes não se relacionam entre si. Na grande questão da
ciência descobrindo Deus, é importante distinguir entre complexo e complicado.
Infelizmente muitos, inclusive cientistas, confundem os dois termos. A maioria
dos sistemas biológicos é complexa; tem muitas partes interdependentes que,
como os músculos, serão inúteis a menos que outras partes necessárias, como os
nervos e o mecanismo de controle, também estejam presentes.
Dois séculos atrás, o filósoso e eticista inglês William Paley (1743-1805)
publicou um famoso livro intitulado Natural Theology 5 [Teologia Natural], que
se tornou um popular manual filosófico, tendo várias edições. O livro foi uma
resposta a sugestões de que a vida poderia ter se originado por si e de que não
havia Deus. Paley argumentava que as coisas vivas devem ter tido algum tipo de
fabricante. Ele chegou a essa conclusão muito antes de termos qualquer ideia
sobre quão complexas elas são. Seu mais famoso exemplo diz respeito a um
relógio. Se numa caminhada, afirmava ele, encontrássemos uma pedra,
provavelmente não saberíamos explicar como ela se originou. Por outro lado, se
encontrássemos um relógio no chão, concluiríamos imediatamente que o relógio
teve um fabricante. Alguém que compreendia a sua construção e o seu uso o
havia montado. Sendo que a natureza é mais complexa que um relógio, também
deve ter um fabricante. Argumentou ainda que, se um instrumento como um
telescópio teve um idealizador, também deve ser esse o caso dos olhos, que são
complexos. Paley desafiou a ideia de que o avanço evolutivo tenha sido o
resultado de uma multidão de pequenas alterações e o ilustrou referindo-se à
estrutura indispensável que chamamos de epiglote, em nossa garganta. Quando
engolimos, o alimento e a bebida são conservados fora do pulmão pela epiglote,
que fecha a traqueia. Se a epiglote se houvesse desenvolvido gradualmente por
um longo tempo, teria sido inútil na maior parte desse tempo, já que não fecharia
a traqueia antes de ter chegado ao seu tamanho completo.
Os argumentos de Paley foram difamados por longo tempo. Afirma-se
frequentemente que Darwin e seu conceito de seleção natural se encarregaram de
refutar os exemplos de Paley. No livro The Blind Watchmaker [O Relojoeiro
Cego], Richard Dawkins, famoso professor da Universidade de Oxford, trata
especialmente do exemplo do relógio citado por Paley, mostrando que “ele está
errado, gloriosa e completamente errado”. Disse também que o “único relojoeiro
da natureza são as forças cegas da física”, e que “Darwin tornou possível ser um
ateu intelectualmente realizado”. 6 Parece que isso tudo não vem ao caso. Os
recentes avanços na moderna biologia, revelando uma vasta coleção de sistemas
interdependentes, têm levado muitos a se perguntar se Paley e seu ridicularizado
relógio não teriam acertado o alvo.

Pode a evolução explicar a complexidade?


A evolução tem sido incapaz de apresentar uma explicação satisfatória para
o desenvolvimento gradual de sistemas complexos com partes interdependentes.
Bem ao contrário, o próprio processo que supostamente conduz o avanço
evolutivo pode, na verdade, interferir no desenvolvimento da complexidade. Em
1859, Charles Darwin publicou seu instigante volume A Origem das Espécies.
Sugeria que a vida evoluíra de formas simples para as avançadas, um diminuto
passo após o outro, por um processo que ele chamou de seleção natural.
Arrazoava que os organismos variam constantemente e que existe uma super-
reprodução que resulta em competição. Sob tais condições, os organismos
superiores sobrevivem aos inferiores. Assim, temos o avanço evolutivo pela
sobrevivência do mais apto.
O sistema pode, a princípio, parecer muito razoável e é amplamente aceito,
embora alguns evolucionistas optem apenas pelas mutações, sem qualquer
seleção natural para ajudar. A sobrevivência do mais apto funcionaria
especialmente para eliminar organismos fracos e anomalias, mas não favorece a
evolução de sistemas complexos com partes interdependentes. Esses sistemas
não funcionam e não sobrevivem enquanto todas as partes necessárias não estão
presentes. Em outras palavras, a seleção natural funciona para eliminar
organismos inferiores, mas não tem como idealizar sistemas complexos. Além
do mais, a seleção natural não é um processo que apoia especificamente o
conceito de evolução. Seria de se esperar que os organimos mais capazes
sobrevivessem de qualquer maneira, quer tivessem evoluído, quer tivessem sido
criados por Deus.
Os cientistas agora atribuem a variação que vemos nos organismos a
mutações que representam mudanças mais ou menos permanentes no DNA.
Estamos descobrindo que uma variedade de fatores causa mutações. O interesse
científico passou de pequeninas mudanças em uma ou em algumas bases de
DNA para a atividade de elementos transportáveis que às vezes consistem de
milhares de bases. Esses segmentos se movimentam, às vezes em grande
velocidade, de uma parte do DNA para outra e até entre organismos. Essas
mudanças podem ser úteis para proporcionar variedade, mas também podem ser
prejudiciais. Outros cientistas consideram diferentes tipos de mecanismos como
responsáveis pela variedade, como as mudanças em genes de controle que
dirigem o desenvolvimento (genes homeobox). 7 Essa é uma área da biologia na
qual ainda temos muito que aprender. Tanto os criacionistas quanto os
evolucionistas acreditam que as mutações ocorrem e causam mudanças mínimas,
chamadas microevolução. Além disso, os evolucionistas creem em mudanças
muito maiores, denominadas macroevolução, enquanto aqueles que creem na
criação tendem a se esquivar desse conceito. As evidências da microevolução
são boas, mas não é esse o caso da macroevolução.
Embora não haja dúvida de que ocorre algum tipo de microevolução, alguns
exemplos comuns usados podem não ser o que se pretende que sejam. O caso
elementar, ilustrado na maioria dos livros didáticos de biologia básica, é a
mudança na proporção de mariposas claras e escuras na Inglaterra. Isso é às
vezes chamado de “mutação” 8 e é tratado como “uma mudança evolutiva
notável”. 9 Acontece que provavelmente não seja nada disso.
O ambiente poluído deixou as árvores mais escuras durante a revolução
industrial, ao matar os liquens coloridos na casca dos troncos. Quando isso
aconteceu, parecia que a proporção de mariposas escuras aumentava. As
mariposas mais escuras ficavam protegidas porque eram menos visíveis aos
predadores. À medida que as árvores se tornavam mais claras novamente, na
última metade do século, a proporção de mariposas mais claras pareceu haver
aumentado. Tem havido, entretanto, sérios desafios científicos quanto a esse
exemplo. 10 Estudos feitos em outras regiões mostram resultados conflitantes, e
o experimento original sugerindo seleção natural é considerado como não
representando condições normais. Parece que as populações de mariposas estão
simplesmente mudando as proporções de genes que já existem.
Quando são testados novos inseticidas, a maioria dos insetos morre, mas
sempre parece haver alguns singulares indivíduos resistentes, que se reproduzem
e reivindicam o território. São resistentes a produtos químicos e, como
enfrentam menos competição, reproduzem-se rapidamente e se tornam
dominantes.
O mesmo tipo de situação parece aplicar-se ao frequentemente relatado
“desenvolvimento” de resistência dos germes a antibióticos. Os “novos”
supergermes, resistentes a muitos antibióticos, aparentemente têm andado por aí
resistindo a antibióticos por muito tempo; na realidade, são organismos muito
comuns. 11 Os antibióticos também são abundantes, vindo de organismos que
vivem no solo. Os supergermes que resistem a eles tendem a invadir-nos com
mais frequência agora, principalmente porque temos aumentado sua relativa
abundância ao usar antibióticos demais para matar suas contrapartes mais
suscetíveis, que carecem dos sistemas de resistência.
Importantes cientistas têm questionado o conceito de que os três exemplos
dados acima representem realmente uma mutação ou avanço evolutivo
recente. 12 Parece que não são nada novos os genes que provocam as
“mudanças”, e isso não é uma evolução rápida em ação, como às vezes se alega.
Os genes já estavam presentes em pequeno número nas populações e somente as
proporções mudaram devido à seleção natural, reagindo às mudanças no
ambiente.
Para novos avanços evolutivos são necessárias novas informações genéticas,
e não só mudanças na proporção de genes já presentes, como em geral parece
acontecer com mariposas, inseticidas e antibióticos. Ocorrem, sim, mutações que
envolvem verdadeiras mudanças de informação no DNA. 13 A seleção natural
pode favorecer algumas delas e em alguns casos garantir a resistência a
antibióticos. O vírus causador da gripe é notório pelas rápidas mudanças, mas
estas são apenas variações menores, 14 e não configurações novas e complexas.
Também parece que organismos, incluindo os mais simples, são dotados com
muitos e variados sistemas protetores, como ilustram nossos três exemplos.
Esses sistemas tornam a vida sobre a Terra algo muito persistente, mas podem
não representar nenhum novo avanço evolutivo. Muitos dos exemplos propostos
de adaptação evolutiva rápida não são isso.
As mutações são notavelmente prejudiciais. Uma proporção quase sempre
mencionada é de apenas uma mutação benéfica para mil nocivas, mas não temos
dados sólidos sobre isso. Contudo, pouco se duvida de que, quanto às mutações
casuais, a seleção natural precise contender com uma tremenda proporção de
efeitos daninhos, em comparação com os bons. A evolução precisa ir na direção
dos melhoramentos, e não da degeneração. Em vista disso, alguns cálculos
suscitam a pergunta sobre como a raça humana sobreviveu diante de
possibilidades nocivas tão abundantes, em comparação com outras mutações
benéficas, tão raras. 15 Esperaríamos que praticamente qualquer tipo de
mudança casual, acidental, como as mutações, fosse danosa, visto que estamos
lidando com sistemas vivos complexos que já se encontram em atividade. As
mudanças nesses sistemas, em geral, os levariam a não funcionar tão bem, ou a
simplesmente não funcionar. Mudar uma única peça de um sistema complexo
pode ser prejudicial a várias outras partes dependentes da ação daquela
determinada parte. Como ilustração, quanto de melhoramento você esperaria na
complexa página que está lendo agora, se fossem inseridas mudanças
tipográficas acidentais? Quanto mais se muda, pior fica. Quanto mais complexo
um sistema for, mais difícil será mudá-lo e ainda conseguir que funcione. 16
Um dos mais severos desafios que o modelo evolutivo enfrenta é sua
incapacidade para explicar como evoluíram órgãos e organismos complexos,
com partes interdependentes. O problema básico é que mutações aleatórias não
planejam com antecedência no sentido de gradualmente formá-los, e não é
plausível o aparecimento de uma multidão do tipo certo de mutações, todas ao
mesmo tempo, para produzir um novo órgão. Se formos produzir gradualmente
essas coisas complexas, o processo em si da seleção natural pela sobrevivência
do mais apto, proposto por Darwin, tenderia a impedir sua evolução. Até que
todas as partes necessárias de um sistema complexo possam operar, não há
sobrevivência. Antes disso, as partes extras, sem função, de um sistema
incompleto em desenvolvimento, são inúteis, um impedimento embaraçoso.
Seria de esperar que a seleção natural se livrasse delas. Como exemplo, como
sobreviveria um músculo novo em evolução, sem um nervo que o estimulasse a
se contrair, e como sobreviveria um nervo sem um mecanismo de controle para
oferecer o estímulo necessário?
Nos sistemas com partes interdependentes, nos quais nada funciona sem que
todas as peças necessárias estejam presentes, seria de se esperar que a seleção
natural eliminasse organismos desajustados com partes extras e inúteis, que só
atrapalhariam. Esse parece ser o caso com a degeneração ou perda dos olhos de
peixes e aranhas que vivem em cavernas em total escuridão, onde seus olhos são
inúteis. Assim como as pernas do meu amigo, mencionadas antes, as quais
ficaram inúteis quando os nervos foram afetados, essas são partes sem utilidade.
Numa tosca analogia, é mais provável que você vença uma corrida de bicicleta
com uma bicicleta sem marchas do que com uma que tenha um motor potente,
mas sem peças suficientes para fazê-lo funcionar. Para que uma estrutura seja
preservada pela seleção natural, deve ter alguma superioridade que a faça
sobreviver. Mas sistemas parciais, sem função, inativos, não sobrevivem;
constituem um inútil excesso de bagagem. Acontece que o proposto processo
evolutivo da sobrevivência do mais apto pode eliminar organismos fracos, mas
não pode planejar com antecedência para fazer evoluir sistemas complexos, e
tenderia a eliminar gradualmente sistemas complexos em desenvolvimento
porque eles não sobreviveriam se todas as partes necessárias não estivessem
presentes.
Nem sempre é possível determinar se é essencial certa parte ou processo
num sistema complicado. Várias vantagens evolutivas têm sido sugeridas para
situações desconcertantes. Por exemplo, alguns evolucionistas sugerem que a
razão pela qual alguns animais tiveram uma evolução gradual de asas é que os
membros dianteiros de alguns animais eram primeiramente usados para descer
das árvores planando, antes de desenvolver a capacidade de voar. Outros
evolucionistas discordam totalmente, propondo que o voo evoluiu em animais
terrestres que tentavam com rapidez cada vez maior perseguir suas presas. 17
Estranhamente, na discussão dos evolucionistas, não se considera com seriedade
a pronunciada desvantagem da perda do uso de bons membros dianteiros, à
medida que estes gradualmente se transformam, nos estágios em que não são
nem bons membros nem boas asas. A especulação é um exercício fácil, e alguém
pode defender a utilidade de quase qualquer situação esquisita. Se alguém
encontra uma máquina de terraplenagem no meio de uma quadra de tênis, pode
alegar que está ali para deixar o jogo mais variado! O problema está na
autenticação. Muito mais do que temos feito, precisamos identificar o que é fato
e o que é interpretação.
Os cientistas têm se preocupado com o problema que a complexidade
representa para a evolução. Um recente artigo na revista Nature tenta esclarecer
como a evolução pode explicar a origem de “características complexas”. 18 Mas
a sugestão encontra sérios problemas, 19 e um deles é que há um enorme vazio
entre os “organismos digitais” simples programados num computador e que
foram usados para este estudo, e organismos vivos e reais num ambiente normal.
Os autores conseguiram obter algumas vantagens evolutivas simples, usando
sequências que haviam sido arbitrariamente definidas como benéficas. Esse tipo
de exercício representa um planejamento mais inteligente do que as mudanças
aleatórias ocorridas por si mesmas na tosca natureza, como se espera da
evolução. Outros programas de computador têm sido usados para tentar explicar
a evolução da complexidade, mas eminentes biólogos criticam essas tentativas
como simplistas demais, e definitivamente não relacionadas ao mundo realmente
complicado da biologia. 20
Proeminentes evolucionistas como Douglas Futuyma, da Universidade de
Michigan, 21 e outros também têm tratado do problema da evolução da
complexidade. Suas sugestões não são muito animadoras para a evolução. A
seleção natural é por vezes sugerida como a solução, mas, como foi dito, ela
tenderia a eliminar os estágios de desenvolvimento ainda não funcionais de
sistemas com partes interdependentes. Também se propõe que sistemas simples
possam evoluir gradualmente até chegarem a ser complexos. Um exemplo
comumente usado é que existem tipos de olhos simples, mais complexos e muito
complexos numa variedade de animais. Supostamente, isso significaria que os
olhos podem evoluir de modo gradual. Esse argumento passa por alto o fato de
que olhos simples funcionam sobre princípios diferentes, em comparação com
olhos avançados, que têm sistemas complexos, como o foco automático e
sistemas reguladores da abertura. Suas muitas partes interdependentes não
funcionariam se não estivessem todas presentes. A solução proposta é simples
demais, comparada com os fatos. Outra explicação proposta pela evolução para a
complexidade é que certas estruturas complexas foram modificadas pela
evolução para produzir outras estruturas, com uma função diferente. 22 Isso é
esquivar-se da questão da complexidade, porque neste modelo é necessário um
sistema complexo para início de conversa. A evolução não tem uma explicação
válida para o problema da complexidade.
Além disso, alguém pode perguntar: se a evolução da complexidade é real,
por que, ao olharmos para muito além de um milhão de espécies vivas sobre a
Terra, não vemos todo tipo de sistemas complexos no processo de
desenvolvimento? Por que não vemos alguns olhos, fígados e pernas, por
exemplo, evoluindo gradualmente naqueles organismos que ainda não os
possuem? Essa é uma séria acusação contra o processo evolutivo que se alega
ser real. 23 Sistemas complexos constituem graves desafios no cenário da
evolução.

São abundantes os sistemas complexos


Descrevemos antes o complexo processo de células que se reproduzem. 24
Muitos organismos simples, como os micróbios, costumam reproduzir-se por
divisão celular comum, formando dois organismos com a mesma fórmula do
DNA. Os organismos mais avançados normalmente criam a geração seguinte
pelo processo mais complexo de reprodução sexual, que envolve um conjunto
mais extenso de processos interdependentes ou irredutíveis. Por exemplo, na
produção de esperma e óvulos, há duas divisões sucessivas especiais. Na
primeira, ocorre a troca de DNA e, na segunda, uma redução do número de
cromossomos, de modo que, quando o esperma e o óvulo finalmente se unem
para começar um novo organismo, a quantidade normal de DNA está presente.
Fazer evoluir o esperma e o óvulo e uni-los no processo de fertilização também
não é simples. Muitos passos altamente especializados são necessários antes que
o sistema de reprodução sexual possa funcionar. Temos, uma vez mais, outro
exemplo de uma série de passos interdependentes que não se esperaria que
surgissem de repente, e que não sobreviveriam se todos os passos necessários
não ocorressem. Não parece que a complexa reprodução sexual pudesse evoluir.
Poderíamos prosseguir sempre, descrevendo centenas de sistemas
complexos com partes interdependentes. Se apenas um componente essencial
estiver faltando, o sistema todo torna-se inútil. Nossa capacidade de sentir gosto,
cheiro, de detectar calor, etc., envolve sistemas com unidades interdependentes.
Por exemplo, uma papila gustativa na nossa língua é inútil, a menos que haja
algumas células especiais, sensíveis a certo sabor, como a doçura do açúcar. Mas
essas células são inúteis, a menos que a sensação seja passada ao cérebro. No
caso dos seres humanos, a sensação de doçura é passada de uma célula da papila
gustativa na língua por uma célula nervosa alongada até o núcleo gustativo na
base do cérebro. De lá, vai através de outra célula nervosa para o tálamo no
cérebro, e por uma terceira célula nervosa para o córtex cerebral, que analisa o
estímulo e gera uma resposta, num processo igualmente complexo.
O sentido do paladar é simples, comparado com a capacidade de ouvir e
analisar sons. No ouvido, temos uma intrincada cóclea em forma de espiral, que
consiste de uma multidão de partes especializadas, incluindo sistemas de
feedback. É uma maravilha de engenharia microscópica. O caracol passa os sons
captados para uma variedade de células nervosas, que detectam tipos diferentes
de mudanças nos sons. Outras células nervosas, então, reúnem essa informação
para uma análise adicional. Muitas partes interdependentes integram esses
sistemas de análise.
E não somos apenas nós que apresentamos essa complexidade; todas as
coisas vivas são assim. A humilde lagarta realiza um grande esforço para se
tornar uma borboleta – literalmente, uma transformação completa. Num contexto
evolutivo, teria esse processo algum valor até que todas as mutações necessárias
para produzir uma borboleta perfeita ocorressem? São necessárias muitas
modificações específicas para desenvolver um sistema de voo. Quantas
mutações aleatórias envolvendo a maioria das tentativas frustradas poderíamos
esperar que ocorressem? O número seria imenso. E por que não vemos nenhum
outro tipo de organismo no processo de fazer evoluir essa miraculosa proeza?
Alguns evolucionistas tentam resolver o mistério propondo um cruzamento
reprodutivo de uma minhoca com borboleta, mas isso parece impossível. 25
Também nos perguntamos quantos processos interdependentes estão envolvidos
quando uma diminuta aranha realiza uma obra de engenharia com sua teia.
Quando encaramos o número esmagador de complexos sistemas com muitas
partes essenciais interdependentes, fica difícil pensar que todas elas surgiram
gradualmente, por acaso. Lembre-se de que elas não sobrevivem se não
estiverem completas. Estamos lidando com o que parece ser uma impressionante
abundância de inquestionável complexidade irredutível. Os dados sugerem
eloquentemente que algum tipo de raciocínio lúcido seja necessário para
produzir tudo o que continuamos descobrindo.

A persistente conflagração quanto ao olho


A controvérsia em andamento sobre a origem do olho vem fervilhando há
dois séculos. Aqueles que acreditam num Deus criador alegam que é
inadmissível pensar que um instrumento complicado como o olho possa ter
surgido sozinho, enquanto os que mostram uma tendência mais naturalista
alegam que, com tempo suficiente, isso poderia acontecer. Charles Darwin tinha
plena consciência do problema e dedicou várias páginas de A Origem das
Espécies a essa questão, sob o título “Órgãos de Extrema Perfeição e
Complicação”. Ele introduz o problema admitindo que “supor que o olho, com
seu inimitável expediente engenhoso para ajustar o foco a distâncias diferentes,
para admitir diferentes quantidades de luz e para a correção da aberração esférica
e cromática, poderia ter sido formado por seleção natural, parece, confesso
livremente, absurdo no mais alto grau”. Ele então mostra que, no reino animal,
há todo tipo de variedades de olhos, desde um ponto sensível à luz, muito
simples, até o olho de uma águia. Pequenas mudanças podem produzir
melhoramentos graduais. Ele argumenta, ainda, que não é irrazoável pensar que
“a seleção natural ou a sobrevivência do mais apto”, operando por milhões de
anos em milhões de indivíduos, pudesse produzir instrumentos óticos vivos
“superiores a um de vidro”. 26 Para ele, o processo de seleção natural que estava
propondo era o que levava os olhos a se tornarem mais e mais avançados, um
pequeno passo de cada vez.
Um século mais tarde, George Gaylord Simpson, da Universidade Harvard,
usaria praticamente o mesmo tipo de argumento sugerindo que, como os olhos,
desde os simples aos complexos, são todos funcionais, devem ter um valor de
sobrevivência. 27 Mais recentemente, Futuyma e Dawkins, fervorosos
defensores da evolução, também usaram o mesmo tipo de argumento. 28 Mas o
argumento todo deixa de lado a questão crucial da sobrevivência de sistemas
incompletos, que não funcionam enquanto não estiverem presentes todas as
partes interdependentes necessárias. Por exemplo, a maioria dos avanços
evolutivos do olho, como a capacidade de distinguir cores, seria inútil até que
houvesse também um avanço comparável no cérebro capaz de interpretar as
diferentes cores. 29 Ambos os processos dependem um do outro a fim de ter uma
função útil. Além disso, apenas porque os olhos podem ser classificados em
alguma sequência desde os simples aos complexos, não há evidência de que um
tipo evoluiu de outro. Pode-se catalogar muita coisa no Universo, como os
chapéus das madames ( Figura 5.5 ), dos simples aos complexos. Nem é
necessário mencionar que os chapéus das senhoras são idealizados e criados por
seres humanos, e não evoluíram um do outro a partir de um chapéu ancestral
comum!
Muitos animais têm algum tipo de “olho” que detecta a luz. São estruturas
fascinantes que variam muito. Existe uma minhoca marinha simples que tem um
olho muito avançado, e o famoso molusco argonauta tem um olho muito
simples. O grau de complexidade dos olhos não segue um padrão evolutivo.
Alguns animais unicelulares (protistas) têm um ponto simples, sensível à luz. As
minhocas têm células sensíveis à luz, especialmente nas extremidades do corpo.
Algumas minhocas marinhas têm mais de dez mil “olhos” em seus tentáculos, e
a despretensiosa lapa tem um olho intrigante, no formato de uma taça.
Organismos como os caranguejos, algumas minhocas, lulas, polvos, insetos e
vertebrados (peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos) têm olhos que detectam
a luz e formam imagens. Embora as lulas sejam um tipo de animal muito
diferente do homem, seus olhos são notavelmente semelhantes aos nossos. Lulas
gigantes, que chegam a atingir o comprimento de 21 metros, e mergulham em
águas profundas onde há bem pouca luz, precisam de olhos maiores, a fim de
reunir toda luz possível. Esses animais gigantescos são dotados dos maiores
olhos de que se tem conhecimento. O olho de uma lula que encalhou numa praia
da Nova Zelândia tinha um diâmetro de 40 centímetros. Isso é significativamente
maior que nossos globos comuns (usados nas aulas de geografia) de 30
centímetros! Calcula-se que um olho assim abrigue um bilhão de células
fotossensíveis. Como comparação, nossos olhos ( Figura 4.1 ) têm apenas uns
2,5 centímetros de diâmetro.
Os olhos empregam muitos sistemas diferentes para formar imagens. Nos
vertebrados, incluindo os humanos, há uma lente na frente do olho para focalizar
a luz que chega sobre a retina sensível à luz no fundo, resultando numa imagem
nítida. Em animais como o argonauta não há lente; em vez disso, um furinho
ajuda a localizar a luz em várias partes da retina. Os insetos formam imagens de
modo completamente diferente, usando pequenos “tubos” chamados omatídios
( Figura 4.2 ), que apontam em direções levemente diferentes. A luz de cada
tubo é então combinada para formar um quadro. As libélulas chegam a ter
28.000 omatídios em seus olhos salientes. Existe uma variedade de outros
sistemas oculares intrincados, com vários arranjos de partes interdependentes,
incluindo o impressionante sistema de um pequeno copépode semelhante a
caranguejo, que forma uma imagem mais ou menos como um sistema de
televisão o faz, por escaneamento rápido. 30 Todos esses diferentes arranjos
complexos, com partes interdependentes, desafiam a ideia de que os vários olhos
são produzidos por pequenas alterações graduais.
Mudar de um sistema para outro exige uma abordagem completamente
diferente, a fim de formar uma imagem, como se pode ver ao comparar os olhos
nas Figuras 4.1A e 4.2 . A maioria dos evolucionistas reconhece essas
diferenças básicas e propõe que o olho evoluiu independentemente para cada
sistema. Isso nega a sugestão de outros evolucionistas, mencionados antes, de
que olhos complexos evoluíram a partir de olhos simples. 31 Os sistemas são tão
variados, ou então sistemas semelhantes são encontrados em tipos tão diferentes
de grupos de animais, que alguns propõem que o olho pode ter evoluído
independentemente muitas vezes, talvez até 66 vezes, e não um do outro. 32
Por outro lado, pesquisadores descobriram um gene mestre no DNA de uma
variedade de organismos, o qual estimula o desenvolvimento do olho. Os
evolucionistas consideram que a presença generalizada desse gene signifique um
ancestral evolutivo comum. Aqueles que creem num Criador, ao contrário, veem
esse gene mestre como a impressão digital de um intelecto usando eficazmente
um sistema que funciona em diferentes organismos. Por exemplo, os cientistas
podem tirar esse gene mestre de controle do desenvolvimento do olho de um
camundongo, inseri-lo numa simples mosquinha-das-frutas e causar o
desenvolvimento de olhos extras nas asas, antenas e patas. 33 Bem, a mosca-da-
fruta tem um tipo muito diferente de olho em relação ao do camundongo,
conforme ilustração nas Figuras 4.2 e 4.1A , respectivamente, mas o mesmo
tipo de gene mestre pode estimular o desenvolvimento de ambos. Os biólogos
calculam que vários milhares de genes estão associados ao desenvolvimento
embriônico do olho da mosca-das-frutas; assim, parece que estamos lidando com
um gene controlador que aciona muitos outros genes que produzem o
desenvolvimento de tipos diferentes de olhos em organismos variados. As
diferenças vêm dos muitos outros genes, e o gene mestre do controle pouco faz
para tratar da questão de como os diferentes tipos de sistema visual podem ter
evoluído. O conceito de uns poucos genes mestres (“Evo-Devo”) simplificando
o processo evolutivo é complicado pela descoberta de que múltiplas fileiras de
ativadores e repressores são necessárias para fazer com que esses genes mestres
funcionem devidamente. O tempo em que ocorre a atividade é muito importante,
e o próprio controle da devida cronometragem também teria que evoluir. 34
O estudo dos trilobitos tem revelado alguns fatos surpreendentes acerca dos
seus olhos. Um pequeno trilobito é ilustrado na parte inferior da Figura 5.1 . Os
trilobitos, remotamente aparentados com os caranguejos-ferradura, são
considerados pelos evolucionistas como estando entre os mais antigos animais.
Entretanto, eles têm olhos notáveis do mesmo tipo básico ilustrado na Figura
4.2 . Suas lentes são feitas de cristais do mineral calcita (carbonato de cálcio). A
calcita é um mineral complicado que curva raios de luz que entram, ou deixa-os
em diferentes ângulos, dependendo da orientação do cristal. Nos olhos do
trilobito, a calcita das lentes é orientada exatamente na direção própria, provendo
o foco certo. Além disso, a lente é moldada de um modo especial que corrige o
embaralhado do foco (aberração esférica) que ocorre com lentes comuns
simples. O tipo de planejamento reflete um conhecimento ótico altamente
sofisticado. 35 Isso é muito notável, pois, ao subir pelo registro fóssil, os olhos
do trilobito estão entre os primeiros a ser encontrados, e eles não parecem ter
nenhum tipo de ancestral evolutivo. Um pesquisador se refere às lentes desses
olhos como “um feito insuperável da otimização da função”. 36

Olhos complexos
Olhos avançados, como os nossos, sobre os quais temos aprendido bastante,
são maravilhas de complexidade. A seguinte descrição é um tanto técnica, mas
simplesmente por acompanhá-la você terá uma ideia geral desse fascinante órgão
que lhe permite ler esta página. Ao visualizar o arranjo das camadas de um olho
esférico, tente conservar em mente o que fica voltado para dentro, na direção do
centro da esfera do olho, e o que fica na direção da superfície externa do olho.
Isso é importante na discussão posterior sobre a retina reversa ou “invertida”.
O olho é essencialmente uma esfera um pouco oca, com elementos muito
complexos formando a parede externa ( Figura 4.1A ). Forrando o interior da
maior parte do olho está a importantíssima retina, o órgão que percebe a luz
entrando pelo olho através do orifício preto chamado pupila. A retina é muito
complicada e consiste de muitas camadas de células, conforme a ilustração
na Figura 4.1C e D . A camada mais próxima da superfície externa do olho é o
importante pigmento epitelial. A camada contém pigmento que recolhe a luz e
também nutre as células da camada seguinte no interior, a qual consiste de
bastonetes e cones. Esses bastonetes e cones são as importantíssimas células
fotorreceptoras que detectam a luz que entra pelo olho. Os bastonetes funcionam
especialmente na detecção de luz fraca, enquanto os três tipos de cones servem
para detectar luz mais brilhante e colorida.
Conforme a ilustração da Figura 4.1D , a porção final dos bastonetes e
cones alongados que fica mais perto do pigmento epitelial ou, em outras
palavras, a extremidade externa do olho, contém muitos discos. Esses discos têm
um tipo muito especial de molécula de proteína chamada rodopsina, e um
bastonete pode conter quarenta milhões dessas moléculas. Quando a luz atinge
uma molécula de rodopsina, faz com que a molécula mude sua forma. Essa
resposta é passada adiante a muitos outros tipos diferentes de moléculas,
resultando numa reação do tipo “avalanche” que rapidamente modifica a carga
elétrica na superfície do bastonete ou cone, indicando assim que a luz foi
detectada pela célula. Então, o processo todo é revertido, como preparação para
receber mais luz. Pelo menos uma dúzia de tipos diferentes de moléculas de
proteína se envolve nesse processo. 37 Muitos deles são específicos e
necessários para o processo visual. Esse é outro exemplo da complexidade
irredutível mencionada no capítulo anterior, e que representa um sério desafio à
evolução.
A mudança na carga elétrica na superfície do bastonete ou cone é passada
adiante, como um impulso, a uma complexa rede de células nervosas. Essas
células formam uma camada que fica por dentro (ou seja, na direção do centro
do olho) da camada de bastonetes e cones (“camada de células nervosas”
da Figura 4.1C ). Da camada de células nervosas, a informação é enviada para o
cérebro através do nervo ótico ( Figura 4.1A ).
Há mais de cem milhões de células sensíveis à luz (bastonetes e cones) na
retina humana, e a informação dessas células é parcialmente processada na
camada de células nervosas. Mais de cinquenta tipos diferentes de células
nervosas foram identificados nessa camada. 38 Através de cuidadosas pesquisas,
estamos começando a descobrir o que algumas dessas células fazem. Por
exemplo, se uma área específica é estimulada, a informação das células ao seu
redor é suprimida, de modo a reforçar o contraste. Esse tipo de processamento é
realizado em vários níveis de análise da luz que entra. Isso é muito complexo e
inclui sistemas de feedback. Sabemos que alguns outros circuitos dessas células
nervosas tratam da detecção de movimento, mas ainda temos muito mais a
aprender acerca do que estão fazendo todos os tipos diferentes de células dessa
camada.
Na realidade, não vemos com os olhos, embora intuitivamente pensemos
assim. O olho apenas recolhe e processa informações que são enviadas para a
parte de trás do cérebro, onde a imagem é produzida. Sem o cérebro, não
veríamos nada. Milhões de dados passam rapidamente do olho para o cérebro
através do nervo ótico. No cérebro, parece que os dados são subdivididos para a
análise dos vários componentes, como brilho, cor, movimento, forma e
profundidade. Depois, tudo é reunido numa imagem integrada. O processo é
incrivelmente complexo, incrivelmente rápido, e acontece sem esforço
consciente. Os pesquisadores que trabalham nessa área comentam que “as
tarefas visuais mais simples, como perceber cores e reconhecer rostos familiares,
exigem uma computação elaborada e mais circuitos nervosos do que possamos
imaginar”. 39
Olhos avançados incluem vários outros sistemas com partes
interdependentes que não funcionariam a menos que todos os componentes
básicos necessários estivessem presentes. O mecanismo que analisa o brilho da
luz e controla o tamanho da pupila é um. O sistema que determina se o ponto
focal da luz que entra está na frente ou atrás da retina, de modo a alterar a forma
da lente para manter a imagem focalizada na própria retina, é outro. E existem
vários outros sistemas complexos que nos ajudam a ver melhor, como o
mecanismo que mantém os dois olhos olhando a mesma coisa.
Todos esses fatores provocam perguntas sobre uma multidão de partes
interdependentes. Por exemplo, qual seria a utilidade de um sistema que pode
detectar que uma imagem no olho está fora de foco, sem um mecanismo que
possa ajustar a forma da lente e focalizar a imagem? Num cenário de evolução
gradual, esses mecanismos em desenvolvimento não sobreviveriam, sendo que a
maioria das partes, se não todas, seria inútil sem as outras. Aqui, como em
muitos outros aspectos, temos o típico enigma da galinha e do ovo: o que veio
primeiro, a galinha ou o ovo? Cada um é necessário para a sobrevivência.
Às vezes, Darwin não hesitava em lançar desafios aos críticos de sua teoria.
Logo após discutir a evolução do olho em A Origem das Espécies, ele dispara o
seguinte: “Se ficasse demonstrado que algum órgão complexo existiu, o qual
possivelmente não teria sido formado por numerosas, pequenas e sucessivas
modificações, minha teoria desmoronaria, simplesmente. Mas não encontro
nenhum caso como esse.” 40 Embora Darwin tentasse proteger seu desafio ao
exigir que alguém mostrasse que não teria “possivelmente” acontecido, ele cai
justamente no problema da sobrevivência de partes interdependentes, ao falar de
“numerosas” e “pequenas modificações”. Elas constituem, especialmente, um
problema para o seu mecanismo. Condições em que partes interdependentes em
lento desenvolvimento, que não funcionam enquanto as outras partes necessárias
não estiverem presentes, não sobrevivem por um tempo longo. Infelizmente,
como Darwin sugere, sua teoria desmoronou completamente.

O olho incompleto da evolução


Dois pesquisadores, Dan-E Nilsson e Susanne Pelger, da Universidade Lund,
na Suécia, publicaram um interessante artigo sobre a evolução do olho. Esse
artigo é intitulado “A Pessimistic Estimate of the Time Required for an Eye to
Evolve” 41 [Um Cálculo Pessimista do Tempo Necessário Para que um Olho
Evolua]. Foi publicado no prestigiado periódico Proceedings of the Royal
Society of London e chegou à surpreendente conclusão de que o olho poderia ter
evoluído em apenas 1.829 passos mediante um arbitrário 1% de melhoramento.
Levando em conta alguns fatores da seleção natural, eles concluíram que teria
levado menos de 364 mil anos para que um olho-câmara (olho com um pequeno
orifício) evoluísse a partir de um ponto sensível à luz. Ademais, desde a
primitiva era cambriana, 550 milhões de anos atrás, segundo os cálculos, há
tempo suficiente “para que os olhos evoluam mais de 1.500 vezes”! Seu modelo
da evolução do olho começa com uma camada de células fotossensíveis
encaixada entre uma camada transparente em cima e uma camada de pigmento
embaixo. Essas camadas são gradualmente curvadas para formar primeiro uma
taça e depois um olho com lente ( Figura 4.3 ). Cada passo apresenta uma
vantagem ótica sobre o estágio anterior, propiciando assim a sobrevivência ao
longo do processo. Aí está: o olho evoluiu num período muito curto de tempo!
Embora alguém aprecie a abordagem analítica empregada, é difícil levar a
sério esse modelo, e é muito difícil aceitar a alegação de que há tempo suficiente
para um olho com lente ter evoluído mais de 1.500 vezes. Eles falam de um olho
tão simples que nem funciona. Há muitos problemas significativos:
1. O modelo omite a evolução da parte mais importante e complexa do olho:
a retina sensível à luz. Como foi mencionado, a retina tem uma quantidade de
tipos diferentes de células para detectar e processar a informação luminosa.
Precisam surgir todos os tipos de moléculas novas e especiais de proteína. Mais
cedo ou mais tarde, no cenário evolutivo, todas as partes do olho avançado têm
de evoluir; e excluir a parte mais complicada e importante do olho, no cálculo do
tempo, é uma omissão grave que invalida completamente a conclusão principal.
2. Um olho complexo, como se propõe, é inútil sem um cérebro para
interpretar o que é visto, mas o modelo não considera o problema da evolução
das partes necessárias do cérebro. Pelo menos em seres humanos, as partes do
cérebro que lidam com a visão são muito mais complexas que a própria retina, e
a parte visual do cérebro precisa estar intimamente relacionada com a retina, se é
que deva haver alguma importância naquilo que o olho vê.
3. Para que um olho seja útil, é necessário ter ocorrido a evolução de uma
ligação entre o cérebro e o olho, o que, no caso do ser humano, envolve um
nervo ótico que tem mais de um milhão de fibras nervosas por olho, e essas
fibras precisam estar devidamente conectadas. O nervo ótico de um olho se
cruza com o nervo ótico do outro olho, e aí ocorre uma complexa seleção. Pouco
adiante, uma seleção muito mais complexa tem lugar, enquanto as células
nervosas levam impulsos para o cérebro. Seria de se esperar uma série de
tentativas aleatórias, antes que a evolução estabelecesse os padrões corretos da
conexão.
4. Não é levado em consideração o tempo para a evolução do mecanismo de
foco da lente. Até mesmo algumas minhocas têm essa capacidade. 42 Como já
notamos, esse é um sistema complexo que detecta que a imagem na retina está
fora de foco e ajusta a lente para o grau necessário a fim de criar um foco nítido.
O sistema envolve várias partes especiais. Em alguns animais, a focalização é
feita pelo movimento da lente, enquanto em outros é realizada pela mudança do
formato da lente.
5. O modelo não considera o tempo necessário para a evolução do
mecanismo que regula o tamanho da pupila. Esse é outro sistema complexo de
olhos avançados que envolve músculos, nervos e um sistema de controle. Seria
necessário um tempo muito longo para a evolução de um sistema assim, mesmo
que fosse uma vez só, se acontecesse. Essas partes importantes precisam ser
incluídas em qualquer estimativa realista do tempo necessário para a evolução
do olho.
6. Lá pela metade do caminho proposto pelo processo evolutivo, começa a
aparecer uma lente. Seria imprescindível um conjunto muito fortuito de
circunstâncias para que essa parte nova funcionasse devidamente e
sobrevivesse. 43 Necessita-se de uma lente com a proteína correta, no devido
formato e posição, tudo aparecendo no tempo certo. Seria necessário um período
imenso de tempo para que mutações essencialmente aleatórias produzissem tudo
isso de uma vez, a fim de que o sistema sobrevivesse.
7. Nos embriões de vertebrados, como os peixes, sapos ou galinhas, o olho
não se forma pela dobra de camadas superficiais na superfície da cabeça, como
propõe o modelo de Nilsson e Pelger. Ele surge como uma excrescência do
cérebro em desenvolvimento, que então induz o desenvolvimento da lente a
partir de uma camada superficial. Assim, devemos considerar também o tempo
que seria necessário para que um sistema evoluísse e se transformasse em outro
diferente.
8. Além disso, os olhos dos vertebrados e de alguns invertebrados empregam
um complexo sistema muscular para coordenar o movimento dos dois olhos.
Algumas aves são capazes de ajustar a direção dos olhos para que tenham uma
visão binocular com o foco próximo, ou uma visão panorâmica ampla, já que os
olhos se voltam para direções diferentes. 44 Esses sistemas não são simples. O
polvo tem seis músculos para controlar o movimento de cada olho, como
acontece com os nossos olhos. No polvo, encontramos umas 300 mil fibras
nervosas que conduzem impulsos do cérebro para os seis músculos, a fim de
controlar cuidadosamente o movimento dos olhos. Todos esses sistemas
exigiriam muito tempo para evoluir e isso deve ser levado em conta no cálculo
sobre quantas vezes o olho poderia evoluir.
Nilsson e Pelger reconhecem bem poucas dessas omissões em seu relatório,
mas lamentavelmente não as consideram nem no título nem nas conclusões. Seu
“cálculo pessimista” não pode ser levado a sério. São ignoradas todas as
complexas partes do olho, toda a quantidade de células nervosas e quase todos os
tipos especiais de proteínas que precisam ser formuladas. Recentemente, foi
descoberto na córnea um tipo especial de molécula de proteína, que impede o
desenvolvimento de vasos sanguíneos. Isso mantém a córnea livre do sangue que
se encontra na maior parte do tecido, de modo que a luz possa entrar pelo olho.
Não se pode simplesmente dobrar algumas camadas por aí, acrescentar uma
lente de maneira arbitrária e depois alegar que o olho pode ter evoluído “mais de
1.500 vezes” no tempo evolutivo. Esse tipo de exercício beira o que se chama de
ciência sem fatos.
De modo surpreendente, o modelo recebeu forte endosso. Na renomada
revista Nature, Dawkins publicou uma resenha favorável intitulada “The Eye in
a Twinkling” 45 [O Olho Num Piscar], mostrando que os resultados de Nilsson e
Pelger eram “rápidos e decisivos” e que o tempo exigido para a evolução do olho
“é uma piscadela geológica”. Além disso, Daniel Osorio, da Universidade de
Sussex, na Inglaterra, o qual estudou todos os tipos de olhos, afirma que o artigo
acalma o problema da evolução do olho, com o qual Darwin estava muito
preocupado. Às vezes se faz referência a esse problema como “o calafrio de
Darwin”. 46 O artigo de Nilsson e Pelger deu um pouco de ânimo aos
evolucionistas que se manifestam na internet. Um deles comentou que “o olho se
tornou a MELHOR PROVA da evolução”. 47 Considerando os fatos reais do
caso, tudo isso é uma sóbria revelação de quanto pode ser subjetiva a retórica
humana.
A veemência de alguns evolucionistas quanto ao modelo de Nilsson e Pelger
reflete, provavelmente, quão sério tem sido o problema do olho para a evolução
ao longo dos anos. Um modelo que ignora todos os sistemas complexos do olho
pode servir para animar o zeloso evolucionista, mas pouco faz pelo pesquisador
sério da verdade que deseja considerar todos os dados disponíveis. Infelizmente,
estudos como esse de Nilsson e Pelger não apenas abalam a confiança na
evolução, mas também na ciência como um todo. Sir Isaac Newton, que foi
presidente da Sociedade Real por 24 anos, e que foi tão meticuloso em seu
trabalho, provavelmente não se agradaria de ver um artigo como esse sendo
publicado na revista de sua amada Sociedade Real.

O olho é ligado ao contrário?


“Não haveria ponto cego se o olho dos vertebrados fosse realmente
planejado de modo inteligente. Na verdade, ele foi idealizado sem
discernimento.” 48 “Entretanto, os vasos e nervos não estão localizados atrás dos
fotorreceptores, onde qualquer engenheiro sensível os teria colocado, mas na
frente deles, onde filtram um pouco da luz que entra. Um construtor de máquina
fotográfica que cometesse um disparate como esse seria despedido
imediatamente. Em contraste, os olhos da despretensiosa lula, com os nervos
engenhosamente ocultos por trás dos fotorreceptores, são um exemplo de
perfeição de planejamento. Se o Criador tivesse realmente prodigalizado seu
melhor plano para a criatura formada à sua imagem, os criacionistas certamente
teriam que concluir que Deus, na realidade, é uma lula.” 49 “O olho humano tem
um ‘ponto cego’. [...] É causado pelo arranjo funcionalmente sem sentido dos
axônios das células da retina que correm para a frente no olho.” 50 “Os
vertebrados são amaldiçoados com uma retina de dentro para fora no olho. [...]
Teria Deus, por ocasião da ‘queda’, colocado a retina dos vertebrados pelo
avesso...?” 51 “Qualquer engenheiro [...] teria rido da sugestão de que as
fotocélulas poderiam apontar na direção oposta da luz, com os seus fios partindo
do lado mais próximo da luz. [...] Cada fotocélula, com efeito, está ligada às
avessas.” 52 A enxurrada precedente de diatribes de respeitados cientistas,
incluindo alguns célebres evolucionistas, refere-se a outra controvérsia em torno
do olho. Para alguns, a retina está tão mal colocada que não representaria
nenhum planejamento inteligente. Fica de dentro para fora, e nenhum Deus
competente faria isso. A implicação é que não há um Deus inteligente.
O problema está bem ilustrado na Figura 4.1 , onde a orientação de todos os
diagramas é tal que a luz entra no olho pela direita, dirigindo-se para a esquerda.
Os evolucionistas sugerem três problemas. Primeiro, como já foi mencionado, os
bastonetes e cones estão enterrados no fundo da retina, com suas extremidades
sensíveis à luz viradas na direção contrária da luz e para dentro do escuro
pigmento epitelial. Note especialmente a Figura 4.1D , onde o corpo principal
(núcleo, etc.) da célula do bastonete ou cone fica na direção da luz, enquanto os
discos fotossensíveis ficam para a esquerda, alguns enterrados no pigmento
epitelial. Esse arranjo reverso é considerado mais ou menos como virar uma
câmera de vigilância para a parede, em vez de colocá-la focalizando uma área
aberta. Segundo, a complicada camada de células nervosas da retina fica entre a
luz que entra e os bastonetes e cones sensíveis à luz. Por que não colocar as
partes sensíveis à luz dos bastonetes e cones de frente para a luz (na parte direita
da retina, Figura 4.1C ), de modo que a luz que entra pela lente os atinja
primeiro, sem ter de passar por todas aquelas células nervosas? A presença de
todas as células nervosas no interior da camada de bastonetes e cones também é
a causa do terceiro problema. A informação que essas células nervosas
processam precisa sair do olho, e isso é feito através do nervo ótico. No ponto
em que o nervo passa pela retina, não há bastonetes nem cones, e isso causa um
ponto cego, no qual não conseguimos enxergar. É rotulado como “disco ótico”
na Figura 4.1A ). Argumenta-se que, se o olho tivesse sido planejado com
entendimento, o arranjo das camadas da retina teria sido ao contrário do que se
observa. Assim, a camada de células nervosas e o nervo estariam atrás dos
bastonetes e cones, e não haveria necessidade de um ponto cego.
Em alguns animais como a lula, o polvo e muitos animais simples, a retina
não está ao contrário. Eles empregam tipos diferentes de células fotossensíveis, e
essas células apontam com sua parte sensível à luz na direção da luz. Nos
vertebrados (peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos), incluindo você, as
retinas estão todas na posição que muitos evolucionistas consideram como
invertida ou ao contrário.
Contudo, quando se sabe um pouco mais acerca da fisiologia e dos
pormenores de como funciona o avançado olho dos vertebrados, fica evidente
que a retina invertida é um plano muito bom, e vários evolucionistas apoiam essa
conclusão. 53 A objeção de que as células nervosas ficam na frente dos
bastonetes e cones é muito suavizada na mais importante região do olho, onde se
processa nossa visão mais aguda. Essa região, chamada fóvea ( Figura 4.1
A , B ), abriga uns trinta mil cones que proporcionam o tipo nítido de visão que
você está usando ao ler estas palavras. Ali, as células nervosas e suas fibras são
especialmente pequenas, e as fibras se irradiam dessa região, deixando os cones
da fóvea mais abertos à luz direta que entra pela lente ( Figura 4.1B ). Outras
fibras nervosas e raros vasos sanguíneos na região da fóvea passam ao redor,
evitando assim qualquer bloqueio à luz que entra. O olho é construído de modo a
proporcionar uma imagem nítida onde ela é necessária. Além disso, as fibras e
células nervosas não chegam a ser uma obstrução à luz que entra. Se for
removido o escuro pigmento epitelial na parte de trás da retina, o que resta,
incluindo os bastonetes e cones e a camada de células nervosas, é “quase
perfeitamente transparente”. 54 Além disso, algumas células longas parecem
transferir luz da superfície interna da retina diretamente para os bastonetes e
cones. O ponto cego do olho não parece ser o grande impedimento alegado. É
difícil de localizar, e a maioria das pessoas nem tem consciência de que ele
existe. Está situado na lateral, e um olho compensa o ponto cego do outro.
Parece haver uma razão muito boa pela qual a retina está ao contrário, e essa
se deve às exigências nutricionais especiais dos bastonetes e cones. Essas células
especiais estão entre as mais ativas em nosso corpo, e estão constantemente
substituindo seus discos, provavelmente para manter um abastecimento
renovado de moléculas de proteína que detectam a luz. Uma única célula de
bastonete pode ter perto de mil discos, muito mais do que a ilustração na Figura
4.1D . Estudos com o macaco reso indicam que cada bastonete produz oitenta a
noventa discos novos por dia, e provavelmente o mesmo acontece com os seres
humanos. (Entre parênteses, podemos notar que essa taxa é lenta, quando
comparada com os dois milhões dos glóbulos vermelhos do sangue que
produzimos no corpo a cada segundo!) Os discos se desenvolvem na região do
bastonete ou cone mais próxima do núcleo, e são descartados na extremidade
associada mais de perto com o pigmento epitelial. Esse epitélio absorve os
discos velhos e recicla algumas de suas partes para os bastonetes. Por razões
diversas, a separação da retina de seu pigmento epitelial resulta em cegueira, daí
ser essencial essa conexão. Justamente no exterior do pigmento epitelial está a
camada de suprimento de sangue, a coroide ( Figura 4.1C ), que fornece ao
pigmento epitelial alguns dos nutrientes necessários para os ativos bastonetes e
cones, ao manufaturarem mais discos.
Se revertêssemos a retina, como alguns evolucionistas sugerem que Deus
deveria ter feito, parece que teríamos um desastre visual. Os discos dos
bastonetes e cones ficariam de frente para a luz, mas quem realizaria a função
essencial do pigmento epitelial ao absorver os discos antigos? Os bastonetes e
cones não tiram férias; produzem uns dez bilhões de discos por dia em cada um
dos olhos. Esses se acumulariam no humor vítreo transparente do olho ( Figura
4.1A ) e sua grande quantidade em pouco tempo prejudicaria nossa capacidade
de ver. Também, os bastonetes e cones ficariam sem o necessário pigmento
epitelial e o suprimento de sangue da membrana coroide, necessário para
substituir os discos, de modo que o sistema de substituição de discos
simplesmente não funcionaria. Se, sob esse tipo de arranjo, devêssemos então
tentar fornecer às extremidades dos discos dos bastonetes e cones apontados para
a luz o necessário pigmento epitelial e a membrana coroide de suprimento de
sangue, essas camadas teriam que ficar no interior da camada de bastonetes e
cones. Em outras palavras, elas ficariam mais próximas do centro do olho do que
o restante da retina. Como resultado, a luz que entra no olho teria primeiro que
passar pela membrana coroide de suprimento sanguíneo antes de chegar aos
discos sensíveis à luz. Uma hemorragia na retina é extremamente debilitadora e
ilustra quão destruidor pode ser o sangue ao processo visual. O pigmento, no
pigmento epitelial, que absorve a luz também interferiria e contribuiria para uma
cegueira completa. Assim como jogar tênis com tomates maduros, isso não seria
uma grande ideia!
A maneira como a retina está colocada parece ser um plano muito bom, que
providencia para os ativos bastonetes e cones de organismos avançados o
suprimento de sangue e nutrientes de que eles necessitam. Além disso, o olho
funciona muito bem! Se, conforme sugerem alguns evolucionistas, o olho foi tão
mal planejado, e se, como outros sugerem, o olho pode evoluir “num piscar de
olhos”, por que a seleção natural não produziu um olho melhor, muito tempo
atrás?

O cérebro humano
Cada uma das células do corpo humano, das quais temos muitos trilhões,
tem mais de três bilhões de bases de DNA. O DNA em cada célula, se fosse
estendido, teria um metro de comprimento. Aliás, se todo o DNA de um corpo
humano comum fosse esticado, ele se estenderia da Terra a Júpiter, ida e volta,
mais de 60 vezes. Mas uma complexidade como essa, vista em nossas células,
empalidece e se torna insignificante quando comparada com o nosso cérebro.
Muitos consideram o cérebro a estrutura mais complexa de que temos
conhecimento no Universo.
No que tange a organismos vivos, o homem está no topo. Não por causa do
corpo, que não é nem o mais forte nem o maior, mas porque temos um cérebro
que excede o de todos os outros seres vivos. Podemos, dentro de limites,
manipular todas as outras criaturas, sem falar de nossa capacidade de destruir o
ambiente delas e também o nosso!
O cérebro consiste de aproximadamente cem bilhões de células nervosas
(neurônios) ligadas umas às outras por quase inacreditáveis 400 mil quilômetros
de fibras nervosas. Essas fibras muitas vezes se ramificam repetidamente, ao se
conectarem com outras células nervosas. Uma grande célula nervosa pode ligar-
se com até 600 outras células, totalizando umas 60 mil conexões. O número total
de conexões no cérebro é calculado de maneira conservadora em cem milhões de
vezes um milhão, que é o mesmo que cem mil bilhões (1014). É difícil visualizar
números tão grandes. Poderia ajudar se soubéssemos que num único milímetro
cúbico da parte principal do cérebro (o córtex cerebral), onde as células são
especialmente grandes, existem aproximadamente 40 mil células nervosas e um
bilhão de conexões. Estamos descobrindo que o cérebro é muito mais do que um
monte de conexões como as que temos num computador. O cérebro é capaz de
cobrir várias áreas de atuação e de se desenvolver onde for necessária uma
capacidade cerebral maior.
Um lufa-lufa de atividade mental e de coordenação ocorre no cérebro
quando mudanças na carga elétrica viajam ao longo das fibras nervosas,
conduzindo impulsos entre as células. Pelo menos trinta tipos diferentes de
substâncias químicas, provavelmente muito mais, são usados para transferir os
impulsos no contato de uma célula nervosa com outra. Isso é espantoso, porque
esses tipos diferentes de substâncias químicas precisam ser destinados para
conexões específicas. Estamos apenas começando a aprender acerca da
complexidade do cérebro, e percebendo o desafio de pensar sobre o órgão com o
qual pensamos! A grande questão que o cérebro coloca diante da evolução é:
seria possível que todos aqueles cem mil bilhões de conexões alcançassem o
padrão certo de conexão, com mudanças simplesmente aleatórias de tentativa e
erro acontecendo no lento e laborioso processo de seleção natural? Também, não
está nada claro que as capacidades mentais exclusivas do homem consigam
sobreviver evolutivamente, já que os babuínos parecem sobreviver muito bem
sem elas. Vários eminentes líderes do pensamento têm-se preocupado com
isso. 55 Stephen Hawking declara com franqueza: “Não está claro que a
inteligência tenha de sobreviver. As bactérias vivem muito bem sem
inteligência.” 56 Talvez nenhum processo evolutivo tenha criado nosso cérebro.
Darwin, que morou na Inglaterra, tinha um bom amigo e patrocinador nos
Estados Unidos, um famoso botânico de Harvard, Asa Gray. Darwin, às vezes,
partilhava alguns de seus mais profundos sentimentos com Gray, que era
simpático à evolução, mas cria muito num Deus ativo na natureza. 57 Numa
carta a Gray, Darwin confidenciou: “Lembro-me bem do tempo em que eu me
arrepiava só de pensar no olho, mas superei esse estágio da doença, e agora
pequenos particulares insignificantes de estrutura costumam me deixar
constrangido. Toda vez que olho para uma pena da cauda de um pavão, fico
doente!” 58
Por que a pena de um pavão faria com que Darwin se sentisse mal? Não sei
responder com certeza a essa pergunta, mas suspeito que poucas pessoas
consigam refletir sobre o elaborado desenho e, especialmente, sobre a beleza de
uma pena iridescente da cauda do pavão, sem se perguntar se aquilo não é o
resultado de algum tipo de intenção proposital. Além disso, por que apreciamos
a beleza, a música ou compreendemos que existimos? Isso leva a questão das
origens para um nível diferente – aquele de nossa mente misteriosa. Nesse
cérebro extremamente complexo de 1,5 quilo encontra-se o espantoso fato de
que ele é a sede do “quem sou eu”. Como foi que a multidão de conexões no
cérebro se programou para que possamos pensar com lógica (esperamos que a
maioria esteja pensando direito!), ter curiosidade de fazer perguntas sobre nossa
origem, aprender novos idiomas, criar teoremas da matemática e compor óperas?
Ainda mais desafiadoras à visão naturalista do mundo são as perguntas sobre o
nosso poder de escolha e características como responsabilidade moral, lealdade,
amor e uma dimensão espiritual. John Polkinghorne, físico de partículas,
administrador da Universidade de Cambridge e sacerdote anglicano, expressa a
preocupação de muitos. Referindo-se ao mundo físico, declara: “Não posso crer
que nossa capacidade de compreender sua estranha natureza seja uma curiosa
herança de nossos antepassados tendo que escapar de tigres-dentes-de-sabre.” 59
O debate em torno da mente concentra-se com frequência sobre a natureza
do enigmático fenômeno da consciência, que é a percepção consciente que todos
temos; em outras palavras, o senso de que existimos. Essa consciência parece
intimamente relacionada com nossa capacidade de pensar, nossa curiosidade,
nossas emoções, nosso julgamento e outros fenômenos da mente consciente.
Essa consciência que temos seria evidência de uma realidade além de uma
simples explicação mecanicista (naturalista), ou seria apenas um sistema
puramente mecanicista e muito complicado? A batalha entre essas duas ideias
vem sendo travada há séculos. A questão é se as explicações mecanicistas, que
excluem a Deus, são suficientes ou não para explicar toda a realidade.
Aqueles que defendem a posição de que a consciência é um fenômeno
puramente mecanicista sugerem que não há nada de especial nela. Na verdade,
ela nem mesmo existe. É só uma grande quantidade de atividade simples. Em
anos recentes, alguns têm enfatizado a analogia que pode ser feita entre um
computador e o cérebro. Algumas comparações frívolas ridicularizam qualquer
diferença entre os dois. Na verdade, o cérebro é um computador feito de
carne, 60 e dispositivos rudimentares como os termostatos têm crenças! 61 Um
reducionismo simplista como esse é contrariado por líderes do pensamento,
como Sir John Eccles, ganhador do Prêmio Nobel, que comenta: “Pode-se [...]
relembrar a penetrante pergunta feita por amantes do computador: em que
estágio de complexidade e desempenho concordaríamos em dotá-lo de
consciência? Felizmente, essa pergunta carregada de emoção não precisa de
resposta. Você pode fazer o que desejar com os computadores sem o receio de
ser cruel!” 62 O famoso matemático e cosmólogo Roger Penrose, da
Universidade de Oxford, comenta que “a consciência me parece ser um
fenômeno tão importante que simplesmente não posso crer que seja algo que
surgiu ‘por acidente’, por meio de um cálculo complicado. É o fenômeno pelo
qual se torna conhecida a própria existência do Universo”. 63
Parece não haver nada nas leis da ciência que diga que devemos ter uma
percepção consciente. 64 A consciência é algo que escapa da presente análise;
não a encontramos como característica da matéria. A existência da
conscientização aponta para uma realidade além da nossa compreensão
mecanicista comum.
Todavia, não é necessário apoiar-se no fenômeno da percepção consciente
para concluir que um desígnio proposital é necessário para a nossa mente. A
comparação do cérebro com o computador apenas fortalece a evidência de um
Deus projetista, porque sabemos que os computadores não se organizaram
simplesmente por si mesmos. Eles são produzidos por desígnio intencional,
envolvendo um conhecimento prévio que leva a uma complexidade correlata. O
mesmo se pode dizer de nosso extremamente complexo cérebro. Há mil vezes
mais conexões em cada cérebro do que estrelas em nossa galáxia. A mera
sugestão de que um conjunto organizado se originou como resultado de eventos
casuais desafia a credulidade. Como pode algum processo aleatório produzir
algo próximo dessa magnitude de complexidade? A seleção natural é prejudicial
à evolução de sistemas com partes interdependentes? Além de tudo, o cérebro
abriga mentes que processam e integram informações extremamente bem, e com
rapidez.

A longa busca de um mecanismo evolutivo


Como os cientistas explicam a origem da complexidade? Por dois séculos,
estiveram procurando um mecanismo evolutivo. Uma ideia após outra vem
sendo proposta ( Tabela 4.1 ), mas atualmente não há um modelo de consenso.
Em especial, não há um modelo para explicar a origem da complexidade. A
maioria dos cientistas concorda com a ideia de que a evolução aconteceu, mas
uma explicação satisfatória de como os vários sistemas de organismos avançados
evoluiu ainda está por ser apresentada. Alguns tradicionalistas apegam-se à ideia
de Darwin de que é adequada a seleção natural pela sobrevivência do mais apto.
Outros preferem modelos mais puros de casualidade. Alguns pensam que a
evolução avança através de pequenas mudanças, enquanto outros acreditam em
grandes saltos, mas esses saltos exigiriam uma quantidade de mutações fortuitas,
todas de uma vez. Outros, ainda, discutem quanto ao critério usado para
determinar os relacionamentos evolutivos. A metodologia mais rigorosa da
cladística, que considera especialmente características singulares, está ganhando
considerável aprovação. Entretanto, como discutiremos no próximo capítulo, a
cladística não é um mecanismo evolutivo; é apenas uma forma de testar
hipóteses sobre relacionamentos. Como já foi mencionado, tentativas de explicar
a complexidade, simuladas em computador, não apresentaram nenhuma
representação realista daquilo que se encontra na natureza.
A evolução é o melhor modelo que a ciência pode apresentar, no caso de se
excluir Deus, mas ela fica muito aquém da plausibilidade. A perseverança que os
evolucionistas têm demonstrado é altamente elogiável. Mas, após dois séculos de
uma busca essencialmente infrutífera, chegou a hora de os cientistas
considerarem com seriedade alternativas não naturalistas. O planejamento da
vida por uma inteligência racional como Deus parece necessário para explicar
aquilo que a ciência está continuamente descobrindo.

Síntese
Os órgãos avançados dão muitos exemplos de sistemas complexos com
partes interdependentes. A seleção natural constitui um problema para a
evolução desses sistemas. Embora a seleção natural possa eliminar tipos fracos e
anômalos, não pode planejar com antecedência, de molde a desenvolver
gradualmente as várias partes exigidas por sistemas complexos. A seleção
natural se limita a um sucesso imediato na sobrevivência. Nesse caso, também se
espera que elimine as várias partes novas de sistemas complexos com partes
interdependentes que evoluem de modo gradual. Essas novas partes extras
seriam inúteis e representariam um embaraçoso impedimento, até que todas as
partes necessárias estivessem presentes para constituir um sistema funcional que
sobrevivesse. Seria de se esperar que organismos com partes extras e inúteis
sobrevivessem menos que aqueles desprovidos delas. Consequentemente, parece
que o sistema de Darwin, que defende a sobrevivência do mais apto, na verdade
interfere no avanço evolutivo de sistemas complexos.
A maioria dos sistemas é complexa, mas o olho e o cérebro são exemplos de
órgãos extremamente complexos. Não parece que exista uma forma pela qual um
desses órgãos se haja desenvolvido sem planejamento inteligente. Esse é um
dado científico que favorece a ideia da existência de um Deus.

Referências
1
Rees M. 2000. Just six numbers. Nova York: Basic Books, p. 19.
2
Schnapp BJ, et al. 1985. Single microtubules from squid axoplasm support bidirectional movement of
organelles. Cell 40, p. 455-462.
3
Behe MJ. 1996. Darwin’s black box: the biochemical challenge to evolution. Nova York: Touchstone.
4
Polanyi M. 1968. Life’s irreducible structure. Science 160, p. 1308-1312.
5
Paley W. 1807. Natural theology; or, evidences of the existence and attributes of the deity. 11a edição.
Londres: R. Faulder and Son.
6
Dawkins R. 1986. 1987. The blind watchmaker: why the evidence of evolution reveals a universe
without design. Nova York: Norton, p. 5, 6.
7
Schwartz JH. 1999. Sudden origins: fossils, genes, and the emergence of species. Nova York: John
Wiley and Sons, p. 12, 13.
8
Por exemplo, ver Sagan C. 1977. The dragons of Eden: speculation on the evolution of human
intelligence. Nova York: Ballantine, p. 28.
9
Keeton WT. 1967. Biological science. Nova York: Norton, p. 672.
10
Para conferir os muitos problemas nesse cenário, ver Wells J. 2000. Icons of evolution, science or myth:
why much of what we teach about evolution is wrong. Washington, DC: Regnery Publishing, p. 137-
157.
11
D’Costa VM, et al. 2006. Sampling antibiotic resistance. Science 311, p. 374-377.
12
(a) Amábile-cuevas CF. 2003. New antibiotics and new resistance. American Scientist 91, p. 138-149.
(b) Ayala FJ. 1978. The mechanism of evolution. Scientific American 239 (3), p. 56-69. (c) Jukes TH.
1990. Responses of critics. In: Johnson PE. Evolution as dogma: the establishment of naturalism.
Dallas: Haughton, p. 26-28. Para discussão adicional, ver: (d) Anderson KL. 2005. Is bacterial
resistance to antibiotics an appropriate example of evolutionary change? Creation Research Society
Quarterly 41, p. 318-326.
13
Hall BG. 1982. Evolution on a Petri dish. Evolutionary Biology 15, p. 85-150. Para uma avaliação do
significado deste relatório, ver Pitman SD. 2005. Why I believe in creation. College and University
Dialogue 17 (3), p. 9-11.
14
Por exemplo, ver Chen H, et al. 2005. H5N1 virus outbreak in migratory waterfowl. Nature 436, p. 191-
192.
15
(a) Beardsley T. 1999. Mutations galore: humans have high mutation rates. But why worry? Scientific
American 280 (4), p. 32, 36. (b) Nachman MW, Crowell SL. 2000. Estimate of the mutation rate per
nucleotide in humans. Genetics 156, p. 297-304.
16
Futuyma DJ. 1998. Evolutionary biology. 3a edição. Sunderland: Sinauer Associates, p. 684.
17
Ver discussão adicional no capítulo 6.
18
Lenski RE, et al. 2003. The evolutionary origin of complex features. Nature 423, p. 139-144.
19
Por exemplo: Pitman SD. 2003. Computers and the theory or evolution.
http://www.detectingdesign.com. Acesso: 20 de março de 2005.
20
(a) Horgan J. 1995. From complexity to perplexity. Scientific American 272 (6), p. 104-109. (b) Lewin
R. 1992. Complexity: life at the edge of chaos. Nova York: Collier Books, Macmillan. (c) Oreskes N,
Shrader-Frechette K, Belitz K. 1994. Verification, validation, and confirmation of numerical models in
the earth sciences. Science 263, p. 641-646.
21
Futuyma, p. 681-684, 761.
22
Gould SJ. 1980. The panda’s thumb: more reflections in natural history. Nova York: Norton, p. 19-26.
23
Alguns evolucionistas generalizam e sugerem que tudo no mundo orgânico está no processo de evoluir.
Isso é pouco para servir de resposta ao problema da ausência de novos órgãos em evolução.
24
Ver o capítulo 3.
25
Para algumas ideias especulativas, ver: (a) Margulis L, Sagan D. 2002. Acquiring genomes: a theory of
the origins of species. Nova York: Basic Books, p. 165-172. (b) Williamson DI. 2003. The origins of
larvae, edição revisada. Dordrecht: Kluwer Academic Publishers. (c) Williamson DI. 2001. Larval
transfer and the origins of larvae. Zoological Journal of the Linnean Society 131, p. 111-122. Essas
fontes sugerem que o ciclo complexo da vida das borboletas evoluiu através de alguns tipos de
minhocas e de borboletas que evoluíram independentemente, combinando depois seus genes por
hibridização, resultando num ciclo de vida lagarta-borboleta. Essa especulação não tem autenticidade
experimental e se encaixa na ciência livre. Além disso, não trata do problema sério da origem de toda a
nova atividade coordenada dos genes, especialmente a formação de muitos hormônios que
consideramos necessários para um bem-sucedido processo de conversão, passando de lagarta a
borboleta. Para mais interpretações tradicionais e perguntas, ver (d) Hall BK, Wake MH, editores. 1999.
The origin and evolution of larval forms. San Diego: Academic Press.
26
Darwin C. 1859 [1958]. The origin of species by means of natural selection or the preservation of
favoured races in the struggle for life. Nova York: Mentor Books, New American Library of World
Literature, p. 168-171.
27
Simpson GG. 1967. The meaning of evolution: a study of the history of life and of its significance for
man. Edição revisada. New Haven: Yale University Press, p. 168-175.
28
Dawkins, The blind watchmaker, p. 15-18, 77-87; Futuyma, p. 682-684.
29
Os evolucionistas às vezes propõem que detectores de várias cores teriam evoluído para realçar a
capacidade total de ver objetos, embora com cores diferentes, ressaltando assim uma “constância da
cor”. Não é isso que estamos considerando aqui. Nosso enfoque é a capacidade de distinguir entre
diferentes cores e reunir essa informação numa imagem significativa no cérebro. Para discussão
adicional, ver: (a) Goldsmith TH. 1991. The evolution of visual pigments and colour vision. In: Gouras
P, editor. The perception of colour. Boca Raton: CRC Press, p. 62-89. (b) Neumeyer C. 1991. Evolution
of colour vision. In: Cronley-Dillon JR, Gregory RL, editores. Evolution of the eye and visual system.
Boca Raton: CRC Press, p. 284-305.
30
Gregory RL, Ross HE, Moray N. 1964. The curious eye of Copilia. Nature 201, p. 1166-1168.
31
Alguns evolucionistas reconhecem que o olho evoluiu muitas vezes, e ao mesmo tempo sugerem que o
olho evoluiu dentro de grupos limitados. Ver: (a) Futuyma, p. 683; e (b) Salvini-Plawen LV, Mayr E.
1977. On the evolution of photoreceptors and eyes. Evolutionary Biology 10, p. 207-263. Seu exemplo
do olho de moluscos apresenta mudanças relativamente pequenas no desenvolvimento do olho, e pouco
explica a evolução do ocelo de um protista para o olho de uma águia.
32
Salvini-Plawen, Mayr [veja a nota 31].
33
Halder G, Callaerts P, Gehring WJ. 1995. Induction of ectopic eyes by targeted expression of the
eyeless gene in Drosophila. Science 267, p. 1788-1792.
34
Para uma versão simples de “Evo Devo” sob uma perspectiva evolutiva, ver: Carroll SB. 2005. Endless
forms most beautiful: the new science of Evo-Devo and the making of the animal kingdom. Nova York:
Norton.
35
(a) Clarkson ENK, Levi-Setti R. 1975. Trilobite eyes and the optics of Des Cartes and Huygens. Nature
254, p. 663-667. (b) Towe KM. 1973. Trilobite eyes: Calcified lenses in vivo. Science 179, p. 1007-
1009.
36
Levi-Setti R. 1993. Trilobites. 2a edição. Chicago: University of Chicago Press, p. 29.
37
Behe, p. 18-22.
38
Kolb H. 2003. How the retina works. American Scientist 91, p. 28-35.
39
Shapley R, et al. 1990. Computational theories of visual perception. In: Spillmann L, Werner JS,
editores. Visual perception: the neurophysiological foundations. San Diego: Academic Press, p. 417-
448.
40
Darwin C. 1859, 1985. The origin of species. Londres: Penguin Books, 219.
41
Nilsson D-E, Pelger S. 1994. A pessimistic estimate of the time required for an eye to evolve.
Proceedings of the Royal Society of London, B, 256, p. 53-58.
42
Duke-Elder S. 1958. The eye in evolution. Volume 1 de: Duke-Elder S, editor. System of
ophthalmology. St. Louis: C. V. Mosby Company, p. 143, 192, 591.
43
Baldwin JT. 1995. The argument from sufficient initial system organization as a continuing challenge to
the Darwinian rate and method of transitional evolution. Christian Scholar’s Review 24, p. 423-443.
44
Pettigrew JD. 1991. Evolution of binocular vision. In: Cronly-Dillon JR, Gregory RL, editores.
Evolution of the eye and visual system. Boca Raton: CRC Press, p. 271-283.
45
Dawkins R. 1994. The eye in a twinkling. Nature 368, p. 690-691.
46
Osorio D. 1994. Eye evolution: Darwin’s shudder stilled. Trends in Ecology & Evolution 9, p. 241-242.
47
http://www.geocities.com/evolvedthinking/evolution_of_the_eye.htm. Download da declaração em
2003, a qual aparecia no segundo parágrafo. Provavelmente, por uma boa razão, não aparecia mais na
página da web que ainda estava aberta em 2005.
48
Williams, GC. 1992. Natural selection: domains, levels, and challenges. Oxford: Oxford University
Press, p. 73.
49
Diamond, J. 1985. Voyage of the overloaded ark. Discover 6 (6), p. 82-92.
50
Futuyma, p. 123.
51
Thwaites WM. 1983. An answer to Dr. Geisler–from the perspective of biology. Creation/Evolution 13,
p. 13-20.
52
Dawkins, The blind watchmaker, p. 93.
53
Por exemplo, ver Duke-Elder, p. 147; Kolb [veja a nota 38].
54
Maximow AA, Bloom W. 1957. A textbook of histology. 7a edição. Filadélfia: W. B. Saunders, p. 566.
55
Por exemplo, Maynard Smith J. 1988. Did Darwin get it right? Essays on games, sex, and evolution.
Nova York: Chapman & Hall, p. 94.
56
Hawking S. 2001. The universe in a nutshell. Nova York: Bantam, p. 171.
57
Elucidação adicional em Ruse M. 2001. The evolution wars: a guide to the debates. New Brunswick:
Rutgers University Press, p. 93-96.
58
Darwin C. 1860. C. Darwin para Asa Gray. In: Darwin F, editor. 1888. The life and letters of Charles
Darwin, v. 2. Reimpresso em 2001. Honolulu: University Press of the Pacific, p. 90.
59
Polkinghorne J. 1996. Beyond science: the wider human context. Cambridge: Cambridge University
Press, p. 79.
60
Ruse, p. 197.
61
Brown A. 1999. The Darwin wars: the scientific battle for the soul of man. Londres: Touchstone, p.
153.
62
Eccles J. Citado em Horvitz LA. 2000. The quotable scientist. Nova York: McGraw-Hill, p. 68.
63
Penrose R. 1989. The emperor’s new mind: concerning computers, minds, and the laws of physics.
Oxford: Oxford University Press, p. 447, 448.
64
Com referência a uma tentativa recente e com reduzido impacto, ver: Ramachandran VS. 2004. A brief
tour of human consciousness: from impostor poodles to purple numbers. Nova York: Pi Press.
Líderes da ciência, ao falarem ex cathedra,
deveriam deixar de polarizar as mentes
dos alunos e novos cientistas criativos
com afirmações para as quais a fé
é a única evidência. 1
Hubert P. Yockey, biólogo molecular

Qual é a velocidade do passado?


O estranho odor de fumaça de enxofre alarmou a tripulação do navio
pesqueiro Isleifur II enquanto singrava tranquilamente as águas do Atlântico
Norte ao sul da Islândia. Em meio aos primeiros raios de sol que despontavam
timidamente na manhã de 14 de novembro de 1963, podia-se vislumbrar uma
fumaça ao sul do horizonte. Seria outro barco em chamas? Após se verificarem
as mensagens de rádio, constatou-se que não havia ocorrido nenhum S.O.S. O
barco começou a girar de forma estranha. O capitão esquadrinhou o horizonte
com seu binóculo e percebeu colunas negras em erupção que se levantavam do
mar a apenas um quilômetro de distância. Os tripulantes do navio que eram da
Islândia, onde a atividade vulcânica praticamente faz parte do dia a dia, logo
suspeitaram de que se tratava de um vulcão subaquático que se erguia do fundo
do oceano. Por acaso, o barco estava navegando sobre a Cadeia do Meio-
Atlântico, que naquela localidade situa-se a parcos 100 metros abaixo da
superfície do oceano.
A erupção continuou durante todo o dia. Cinzas, vapor e fumaça eram
lançados para o ar, e, embaixo, podiam-se ver jatos de luz e pedras. Cinco dias
depois, uma ilha de 600 metros de comprimento havia se formado logo acima do
local onde outrora peixes nadavam livremente em pleno oceano. A nova ilha,
que finalmente alcançou um diâmetro de dois quilômetros, foi batizada com o
nome Surtsey, inspirado no gigante mitológico Surtur. Posteriormente, quando
alguns pesquisadores examinavam a ilha, ficaram admirados com a idade antiga
que a ilha aparentava ter. Em apenas cinco meses, uma enorme praia aprazível
em idade madura e com rochedos ao redor havia se formado pela ação das
ondas. Um pesquisador comentou: “Aquilo que em outro lugar pode levar
milhares de anos”, “aqui pode levar algumas semanas ou mesmo alguns dias.”
“Em Surtsey, poucos meses foram necessários para que fosse formada uma
topografia tão variada e desenvolvida que mal se podia acreditar.” 2
Em nosso planeta geralmente calmo, acontecimentos como a formação da
ilha de Surtsey nos fazem lembrar que, às vezes, as coisas podem acontecer com
muita rapidez. A pergunta “Qual é a velocidade do passado?” tem alimentado
por mais de dois séculos uma acirrada controvérsia. Alguns cientistas
consideram as grandes catástrofes eventos muito importantes, ao passo que
outros simplesmente as ignoram.

Catastrofismo e uniformismo: duas perspectivas conflitantes


A controvérsia entre uniformismo e catastrofismo, 3 do ponto de vista
histórico, está intimamente relacionada com o debate sobre a posição de Deus na
ciência. Catastrofismo refere-se a eventos rápidos de grande escala e sugere que
a crosta da Terra foi moldada principalmente por esses terríveis eventos. O
uniformismo, por outro lado, sugere que a crosta da Terra foi moldada
principalmente por eventos prolongados de pequenas proporções, mais de acordo
com os processos geológicos habituais. O catastrofismo se adapta melhor ao
conceito bíblico de um grande dilúvio catastrófico e à concepção de um Deus
não limitado pelo tempo. O uniformismo se adapta melhor aos supostos longos
períodos das eras geológicas e ao tempo necessário para o processo evolutivo
lento e gradativo.
O catastrofismo tem sido bem aceito no decorrer de quase toda a história
humana. Dominou a mitologia antiga, e, no período medieval, perdeu um pouco
o interesse, embora os árabes seguissem rigorosamente Aristóteles, que
acreditava piamente em catástrofes. O interesse no catastrofismo renovou-se no
mundo ocidental durante os períodos revolucionários da Renascença e da
Reforma, e, nessa época, o dilúvio bíblico era o evento catastrófico que
explicava marcas geológicas como fósseis de animais cujo habitat normal é o
oceano, mas que eram encontrados no alto dos Alpes. No entanto, não demorou
muito para que alguns críticos mordazes se afigurassem no horizonte.
Dois séculos atrás, o geólogo escocês James Hutton, notório por seu espírito
polêmico, publicou um famoso livro intitulado Theory of the Earth [Teoria da
Terra], que defendia o uniformismo. Hutton enfatizava a importância das lentas
mudanças geológicas no decorrer de longos períodos de tempo. A abordagem
naturalística por ele adotada, isto é, nenhum Deus envolvido no processo, é
célebre, visto que o autor afirma que nenhuma força deve “ser empregada exceto
aquelas que são naturais no globo terrestre, nenhuma ação deve ser reconhecida
a não ser aquelas cujos princípios conhecemos, e nenhum evento extraordinário
deve ser apresentado para explicar fenômenos comuns”. 4 Hutton conclui seu
livro com a famosa frase: “Não encontramos nenhum vestígio de um princípio e
nenhuma perspectiva de um fim.” 5 Essa afirmação representou uma ousada
afronta à ideia bíblica predominante na época de que Deus é o Criador e que
criou o mundo em seis dias alguns milhares de anos atrás. Além disso, ela
rejeitava o grande dilúvio catastrófico descrito na Bíblia e que era endossado por
diversos geólogos de renome na Inglaterra. Nesse contexto de controvérsia,
surgiu outro livro que rapidamente se tornaria o mais influente sobre geologia já
escrito. Essa obra não apenas revolucionaria a geologia, mas alteraria
profundamente o pensamento científico como um todo.
Princípios de Geologia, de autoria de Charles Lyell, foi publicado pela
primeira vez em 1830, e, tendo alcançado grande sucesso, chegou a ter onze
edições. Confirmando fortemente o uniformismo, a obra defendia os efeitos
permanentes das mudanças lentas e graduais. Em meados do século 19, o
uniformismo já representava a visão predominante nos círculos intelectuais, ao
passo que o catastrofismo perdia pouco a pouco sua influência. A obra de Lyell
era uma das “mais estimadas posses” 6 de Charles Darwin durante sua viagem
épica de descoberta ao redor do mundo a bordo do Beagle, navio da realeza
britânica. As longas eras geológicas defendidas no livro forneceram algumas das
estruturas de tempo necessárias para as lentas mudanças evolutivas de Darwin.
Lyell era advogado por formação, e parte do êxito alcançado por seu livro se
deve à sua habilidade em apresentar suas ideias. Como ilustração desse fato, vale
mencionar uma carta que ele escreveu a um amigo e partidário, George Poulett
Scrope. Nessa carta, Lyell escreve: “Se não provocarmos irritação, o que receio
ser provável [...], teremos todos do nosso lado. Se não adotarmos uma atitude de
vitória sobre eles, mas elogiarmos o espírito de tolerância e abertura da época
atual, os bispos e os iluminados santos se unirão a nós em desdenhar os antigos e
modernos teólogos físicos [catastrofistas]. Chegou o momento de atacar; por
isso, alegre-se que, pecador como você possa ser, a Q.R. [Quarterly Review]
esteja à sua disposição.” “Se Murray [o editor do livro de Lyell] continuar a
promover meus volumes, e você dominar a geologia da Q.R., poderemos, em
curto espaço de tempo, operar uma completa mudança na opinião pública.” 7
Como Lyell esperava, ele conseguiu a completa mudança que havia previsto,
pelo menos na comunidade geológica. Por bem mais de um século, as
interpretações catastrofistas simplesmente não eram toleradas.
Embora Hutton e Lyell se opusessem ao modelo bíblico das origens e
tivessem enfrentado muita oposição de diferentes círculos religiosos, nenhum
deles parece ter negado a existência de Deus. Hutton é reconhecido como tendo
sido, de fato, “um homem piedoso, com pontos de vista conservadores”. 8 Ele
definia Deus como “a mente que formou a matéria do nosso globo”. 9 É
provável que Lyell tivesse inclinações para o deísmo, 10 mas tudo indica que ele
acreditava em um Deus um pouco mais envolvido. Ele aceitava alguns aspectos
da evolução, apesar de crer que o homem possuía um status especial na criação e
de “ter sempre negado que a espécie humana pudesse ter evoluído a partir de
criaturas simiescas”. 11 Conta-se, inclusive, que Lyell sentia-se “amedrontado
com a ideia de perder todo contato com Jeová [Deus] se seguisse Darwin ao que
lhe parecia ser um fim amargo”. 12
Por volta da virada do século, as longas eras propostas pelo uniformismo e a
evolução já se encontravam firmemente estabelecidas, e o catastrofismo se
tornou, por assim dizer, palavra proibida nos meios científicos. Mas nem tudo
era um mar de rosas para o uniformismo. Alguns fenômenos observados nas
rochas não condiziam com os conceitos predominantes de lentas mudanças, sem
espaço para grandes catástrofes. Na parte sudeste do estado de Washington
existe uma região desgastada pela erosão hídrica, com cerca de 40.000
quilômetros quadrados compostos de enormes e íngremes testemunhos
geológicos e grandes canyons formados em meio a sólidas rochas vulcânicas.
Montes de cascalho de riachos, dispostos em diferentes níveis, e vestígios de
centenas de antigas cascatas, algumas chegando a 100 metros de altura, tendo em
sua base profundos lagos formados pela erosão, dão testemunho de um passado
bastante incomum. Como essa topografia, conhecida como Channeled Scabland,
teria se desenvolvido? O geólogo livre-pensador J. Harlen Bretz passou a estudar
essa área e apresentou uma opinião que foi um verdadeiro escândalo na época,
provocando uma polêmica que durou quase 40 anos. Por incrível que pareça,
Bretz estava condescendendo com a heresia antiquada do catastrofismo!
Em 1923, Bretz publicou seu primeiro relato científico sobre a região, 13
mas não divulgou sua suspeita de um grande dilúvio catastrófico. Sugeriu apenas
que imensas quantidades de água estavam envolvidas. Posteriormente, naquele
mesmo ano, em uma segunda publicação, 14 ele propôs que um dilúvio
catastrófico de pouca duração havia provocado a erosão dos canais e depositado
as enormes faixas de cascalho. Isso não passava de um catastrofismo gritante,
totalmente inaceitável na época, como é o relato da criação nos meios científicos
atuais. Cabia então à comunidade científica dar conta desse pretensioso jovem
cientista, que estava sugerindo ideias perigosas muito próximas do conceito
bíblico de dilúvio. 15 A adoção das teorias de Bretz implicaria um retrocesso ao
catastrofismo “da idade escura”, o que “não poderia, nem deveria, ser
tolerado”. 16
Bretz, que era professor de geologia na Universidade de Chicago, tornou-se
alvo de concentrados esforços por parte da comunidade geológica no sentido de
dissuadi-lo de suas teorias. O colega rebelde, que insistia em publicar segundo o
modelo catastrófico, precisava de uma conversão. Bretz foi convidado a
apresentar seus pontos de vista à Sociedade Geológica de Washington. Para lhe
fazer oposição, “uma verdadeira legião de céticos foi convocada para debater a
hipótese do dilúvio”. 17 Após a exposição de Bretz, cinco cientistas da
prestigiosa United States Geological Survey apresentaram explicações
alternativas, como a ação do gelo e outros processos lentos. Por incrível que
pareça, dois dos oponentes nem mesmo haviam visitado o Channeled Scabland!
Aparentemente, ninguém mudou de posição nessa reunião. No que diz respeito
ao próprio Bretz, ele continuou suas pesquisas com teor catastrófico, apesar da
incessante oposição. Conforme relata Bretz, seus opositores afirmavam que sua
“heresia deve ser eliminada de modo cortês, mas firme”. 18 Logo alguns
geólogos encontraram evidências de um enorme e antigo lago que
provavelmente possa ter servido de fonte das grandes correntes de água que
varreram o Channeled Scabland, 19 o que fez com que as tensões diminuíssem,
uma vez que um número crescente de geólogos passou a admitir que a
explicação de Bretz era a correta.
Por fim, os dados provenientes das rochas convenceram. Em 1965, a
International Association for Quarternary Research organizou uma excursão
geológica até a área para examinar as evidências. Ao fim da excursão, Bretz, que
não pôde estar presente, recebeu um telegrama dos participantes enviando-lhe
saudações e contendo a seguinte confissão: “Agora somos todos
catastrofistas.” 20 Alguns anos depois, Bretz foi condecorado com a Penrose
Medal, que é a mais ilustre premiação geológica nos Estados Unidos. O
catastrofismo havia vencido e, juntamente com ele, Bretz. Esse “Noé” moderno
bem como seu dilúvio igualmente rejeitado haviam sido vindicados.
Em meados do século 20, alguns cientistas destemidos começaram a sugerir
outros eventos catastróficos para explicar as rochas e seus fósseis. Devemos ser
gratos aos dinossauros por terem dado o golpe de morte no uniformismo estrito.
Como esses monstruosos animais teriam desaparecido? Muitas teorias já foram
sugeridas. Um artigo científico relacionou 40 possíveis razões, que vão desde
mera estupidez até mudança na constante gravitacional. 21 Surgiu então, em
1980, a proposta de Louis Alvarez, professor na Universidade da Califórnia,
campus de Berkeley, e ganhador do Prêmio Nobel. Esse cientista, juntamente
com outros, 22 sugeriu que a abundância inusitada do elemento irídio espalhado
em depósitos no topo do Período Cretáceo (isto é, no topo do Mesozoico, Figura
5.1 ) teria vindo de um asteroide que dizimou os dinossauros. Essa surpreendente
teoria tornou-se bastante popular nos meios de comunicação e entre os
geofísicos, mas outros grupos de cientistas, especialmente os paleontólogos (que
estudam fósseis), tinham fortes reservas. Alguns questionaram a interpretação
dos asteroides, visto que certos dinossauros parecem desaparecer mais cedo nas
camadas de fósseis e devido às evidências de atividades vulcânicas
generalizadas, incêndios globais, ou elevação da temperatura, fatores que
poderiam explicar o fim dos dinossauros. 23
Detalhes continuam a ser debatidos, mas a porta para as interpretações
catastrofistas encontram-se escancaradas. Essa mudança foi definida como “um
grande avanço filosófico”, 24 e possibilitou o reconhecimento das catástrofes em
todo o registro rochoso. Na verdade, os meios científicos vêm reconhecendo
progressivamente “o intenso papel das grandes tempestades no decorrer da
história geológica”. 25 Um geólogo refere-se a “eventos violentos [...] de
tamanha magnitude e de efeitos tão devastadores que não foi possível observá-
los do ponto científico, e provavelmente nunca será”. 26 O catastrofismo
retornou com toda a força, mas não se trata do catastrofismo clássico de dois
séculos atrás, em que o dilúvio bíblico era um fator geológico dominante.
Atualmente, muitos tipos de eventos catastróficos são cogitados de imediato; no
entanto, pressupõem-se entre eles longos intervalos de tempo. O termo
neocatastrofismo está sendo usado cada vez mais no meio geológico para
identificar esse novo tipo de catastrofismo.
O mais importante em toda essa discussão é a lição que aprendemos a partir
dessas mudanças de interpretações. Por milênios, pensadores aceitaram as
catástrofes como elementos comuns na história da Terra. Houve, então, uma
mudança de paradigma, e, por mais de um século, as catástrofes foram
praticamente erradicadas das interpretações geológicas. As mudanças passaram a
ser interpretadas como graduais e dentro dos limites dos processos ativos atuais.
Agora, grandes catástrofes são acolhidas novamente sem restrições. Por vezes,
velhas ideias rejeitadas provam-se, no fim das contas, verdadeiras!

O que é a coluna geológica


Não há nenhum lugar nas camadas rochosas da Terra onde alguém pudesse
encontrar uma grande coluna denominada coluna geológica. A expressão é mais
uma representação ou um mapa, frequentemente com um formato semelhante a
uma coluna vertical. Uma pequena porção de determinada camada geológica
empilha-se sobre outra, a título de ilustração, mostrando a ordem e as principais
divisões das camadas de rochas espalhadas na superfície da Terra. As camadas
mais inferiores da coluna, que teriam sido depositadas primeiramente,
encontram-se na base, e as mais recentes, no topo. A coluna geológica tem
desempenhado importante papel nos debates a respeito de Deus e do fator
tempo.
Como costuma acontecer ao se estudar a natureza, o quadro é mais
complicado do que parece à primeira vista e do que nossa mente possa imaginar.
Frequentemente, muitas partes da coluna geológica estão ausentes em
determinada localidade. Essa ausência pode ser detectada pelo fato de
encontrarmos essas partes em outras localidades. A totalidade da coluna
geológica foi elaborada por meio de cuidadosas e minuciosas comparações entre
as rochas de diferentes localidades, e especialmente entre os fósseis encontrados
nelas. A Figura 5.1 apresenta, em linhas gerais, a coluna geológica e alguns
fósseis representativos dos diferentes níveis. Os números à esquerda na Figura
5.3 representam as eras geológicas comumente aceitas, que, vale ressaltar, são
alvo de sérias objeções. Vamos considerar uma delas no fim deste capítulo. É
provável que não exista em nenhum lugar da Terra uma coluna geológica
completa. No entanto, as principais divisões estão bem representadas em muitos
lugares.
Uma das duras realidades da coluna geológica é o contraste um tanto
acentuado entre os fósseis encontrados nas camadas inferiores do Pré-cambriano
e os do Fanerozoico (ver Figura 5.1 ). Apenas organismos raros e pequenos,
geralmente microscópicos, são encontrados na parte inferior, ao passo que os
mais desenvolvidos se limitam essencialmente à parte superior. Esse contraste
não é o que se esperaria no modelo de evolução gradual, o que discutiremos
mais adiante. Pode-se observar também uma tendência moderada a um aumento
progressivo da complexidade dos organismos à medida que se sobe nas camadas
do Fanerozoico, o que é interpretado pelos evolucionistas como forte evidência
de progresso evolutivo em períodos de milhões de anos.
Alguns criacionistas interpretam a coluna geológica como uma
representação de eventos de criação repetitivos no decorrer de longas eras, ao
passo que outros veem o dilúvio bíblico como um evento rápido e extraordinário
responsável por uma importante parte da coluna geológica. Esses últimos
interpretam a leve tendência ao aumento progressivo de complexidade dos
fósseis, à medida que se sobe na coluna geológica, como um reflexo da ordem de
sepultamento da distribuição primitiva dos organismos antes do dilúvio. 27
Outros criacionistas negam a validade da ordem na coluna geológica, 28 e
algumas de suas tentativas no sentido de invalidá-la provaram-se errôneas. 29

A origem da vida e o escasso tempo na coluna geológica


Os evolucionistas dependem excessivamente de longos períodos de tempo
para explicar os eventos extremamente improváveis propostos em seu modelo.
Essa confiança é muito bem ilustrada pela famosa citação de George Wald,
ganhador do Prêmio Nobel, ao referir-se a dois bilhões de anos para a origem da
vida. Ele afirma: “Com uma grande quantidade de tempo, o impossível torna-se
possível, o possível, provável, e o provável, praticamente certo. Tudo o que se
tem a fazer é esperar: o tempo se encarrega de realizar os milagres.” 30
Infelizmente, para o modelo evolucionista, eras de tempo que chegam a 15
bilhões de anos, a suposta idade do Universo, simplesmente não são de nenhuma
ajuda quando avaliadas a partir do conhecimento que temos a respeito da
química da vida e das probabilidades matemáticas. No capítulo 3, discorremos
sobre a probabilidade extremamente baixa de se formar uma proteína ou uma
pequena célula a partir de um evento acidental único. No entanto, se
acrescentássemos muito tempo, o que permitiria muitas tentativas, a
possibilidade de um processo evolutivo aparentemente aumentaria de modo
drástico. Contudo, quando se trata da origem da vida, as probabilidades são tão
ínfimas, e o tempo exigido tão extenso, que mal se pode perceber os efeitos dos
bilhões de anos do tempo geológico. O tempo, deixado a si mesmo, não realiza
os milagres que os evolucionistas esperam. Se avaliarmos com cuidado,
constataremos que a evolução dispõe de muito pouco tempo em comparação
com o que é realmente necessário. Como ilustração, basta considerar o longo
tempo que seria necessário para formar pelo menos duas moléculas de proteína.
Quando eu estava na faculdade, uma das minhas preciosidades era o livro
Human Destiny [Destino Humano], escrito pelo biofísico francês Lecomte du
Noüy. Essa obra apresenta muitos questionamentos relevantes que contestam as
concepções tradicionais sobre a origem do homem. Na primeira parte do livro,
Noüy discorre sobre a origem da vida e apresenta alguns cálculos sobre a
quantidade média de tempo que seria necessário para produzir determinada
molécula de proteína. Adotando uma abordagem conservadora, ele até foi muito
benevolente com os evolucionistas na maneira como trabalhou com os números.
Levando em conta uma quantidade de átomos equivalente à que existe em nosso
planeta, sua estimativa é de que teriam sido necessários 10242 bilhões de anos
para produzir uma única molécula de proteína. 31 Atualmente, supõe-se que a
Terra tenha menos de cinco bilhões de anos (5x109). Vale lembrar que cada
dígito do expoente “242” em “10242” multiplica o tempo dez vezes. Mesmo que
tivéssemos à nossa disposição um tempo infinito, conseguiríamos, em média,
apenas um único tipo de molécula de proteína para cada 10242 bilhões de anos.
Contudo, considerando a natureza frágil das moléculas de proteínas e a
dificuldade que teriam para se conservar por longos períodos de tempo em
condições primitivas, seria praticamente impossível acumular a enorme
quantidade necessária de moléculas. Precisa-se de muita proteína para produzir
a vida. Se o leitor observar novamente a Tabela 3.1 , vai relembrar que o
minúsculo micróbio Escherichia coli tem 4.288 diferentes tipos de moléculas de
proteínas que se replicam muitas vezes, chegando a um total de 2.400.000
moléculas de proteínas em um único micróbio. Além disso, sua existência
depende também de uma quantidade muitas vezes maior de outros tipos de
moléculas orgânicas. Embora esse micróbio não seja o menor organismo
conhecido, é o que mais conhecemos. Se para produzir a menor forma de vida de
que se tem conhecimento precisamos de pelo menos centenas de diferentes tipos
de moléculas de proteínas, podemos então concluir que um período infinito de
tempo com tentativas para acumular frágeis moléculas de proteínas não nos
parece uma solução plausível. Além do mais, vale lembrar que essas moléculas
precisam estar todas juntas no mesmo lugar. Para ilustrar, se todas as partes de
um carro estiverem espalhadas por toda a Terra, após bilhões de anos elevados à
infinita potência, elas não se terão ajuntado no mesmo lugar para fabricar um
carro.
Alguns evolucionistas ressaltam que, visto os organismos terem tantos tipos
diferentes de proteínas, qualquer uma delas, entre as muitas, poderia servir como
a primeira molécula de proteína, tornando, assim, desnecessário que essa
primeira molécula tenha sido tão específica. Contudo, há dois problemas com
essa proposta. Em primeiro lugar, ela funcionaria apenas por um curto espaço de
tempo no início da vida, pois, mal iniciado o processo de organização da vida,
uma molécula de proteína específica seria necessária para agir juntamente com a
primeira a fim de fornecer um sistema que funcione. Em segundo lugar, as
proteínas são elementos muito complexos. A quantidade 32 total de tipos
possíveis de moléculas de proteínas é 10130, um número tão imenso que a
probabilidade de se produzir uma única sequer, dentre as centenas de diferentes
tipos de proteínas específicas encontradas nos mais simples micro-organismos, é
uma verdadeira impossibilidade. Lembre-se de que existem apenas 1078 de
átomos em todo o Universo conhecido.
Outro estudo mais recente realizado pelo biólogo molecular Hubert
Yockey, 33 da Universidade da Califórnia, campus de Berkeley, não nos fornece
resultados mais animadores do que os apresentados acima, com base em Noüy.
Yockey, de certa forma, retoma a mesma discussão relacionada com a
quantidade de tempo exigida para se formar uma molécula de proteína
específica. Ele inclui informações e concepções matemáticas mais avançadas,
mas, em vez de iniciar com os átomos, como o fez Noüy, aborda apenas o
problema relacionado com o tempo exigido para se compor uma proteína a partir
de aminoácidos que supostamente já estivessem presentes. Sendo assim, como é
de se esperar, ele propõe um tempo mais curto, apesar de ainda ser
extremamente longo. O quadro apresentado por Noüy reflete mais o que se
esperaria numa Terra primitiva. Yockey propõe que a sopa 34 original,
pressuposta no modelo evolucionista, tinha as dimensões dos oceanos atuais e
continham 1044 moléculas de aminoácidos. 35 Seus cálculos indicam que nessa
sopa seriam necessários, em média, 1023 anos para se formar uma molécula de
proteína específica. Considerando que a suposta idade da Terra é menor que
cinco bilhões de anos (1010 anos), essa idade se mostra 10.000 bilhões de vezes
menor que o tempo necessário para se formar uma molécula de proteína
específica. Supondo-se que essa proteína necessária tenha se formado por mero
acaso no início desse extenso período de tempo, mesmo assim teríamos apenas
uma molécula, e, como vimos, um tipo específico de molécula se formaria
apenas uma vez a cada 1023 anos. O tempo geológico é, sem sombra de dúvidas,
muito curto!
Naturalmente, fica bem evidente que os cinco bilhões de anos mencionados
acima não são suficientes nem mesmo para formar a primeira proteína, muito
menos para dar origem à vida na Terra. O panorama científico atual propõe que a
Terra tem 4,6 bilhões de anos, e, em seus primórdios, tinha uma temperatura tão
elevada que precisaria se esfriar por mais de 600 milhões de anos antes que a
vida pudesse se iniciar. 36 De acordo com alguns cientistas, admite-se que a vida
tenha se iniciado há 3,85 bilhões de anos, 37 embora essa evidência seja
controversa. Contudo, muitos cientistas estão de acordo que, com base na
evidência que o isótopo de carbono fornece para a origem da vida e nos
questionáveis registros fósseis encontrados, a vida originou-se na Terra há pelo
menos 3,5 bilhões de anos. A evidência do isótopo de carbono baseia-se no fato
de que os seres vivos tendem, até certo ponto, a selecionar as formas mais leves
de carbono (carbono 12) em maior quantidade que as formas mais pesadas
(carbono 13 ou 14), o que é evidente nas rochas. Contudo, esses resultados
poderiam ter sido causados pela contaminação de carbono proveniente de vida
de outros locais. Sendo generosos com o modelo evolucionista, podemos afirmar
que, segundo suas teorias, a primeira vida deveria ter se iniciado no decorrer de
um período inferior a meio bilhão de anos, entre 4 e 3,5 bilhões de anos atrás.
Esse tempo corresponde a apenas um décimo dos 5 bilhões de anos mencionados
em nossos cálculos acima. No entanto, se levarmos em conta as excessivas
improbabilidades consideradas, esses ajustes de somenos importância
dificilmente fariam qualquer diferença. O fato é que não há tempo suficiente.
Nesses estudos relacionados com probabilidades, é sempre possível fazer
outras conjecturas e sugerir novas condições na tentativa de melhorar as
possibilidades; no entanto, quando temos diante de nós probabilidades
efetivamente impossíveis, fica difícil não concluir que temos aí um problema
concreto e que outras alternativas precisam ser consideradas. Muitos cientistas já
se deram a esse trabalho e sugeriram outros modelos que já discutimos. 38 Todas
essas propostas se mostraram insatisfatórias pelo fato de não proverem nenhuma
solução para o mesmo problema relacionado com as moléculas de proteínas, a
saber, os complexos requisitos integrados e específicos. Além disso, não são
simplesmente as proteínas que precisam ser consideradas; há que se levar em
conta as gorduras (lipídios) e os carboidratos, os quais, diga-se de passagem, são
elementos relativamente simples, se comparados com o DNA em sua complexa
função de fornecer as informações essenciais para a vida.
Em relação ao problema da origem da vida, há algumas discussões recentes
sobre a identificação da vida primitiva. Grandes ícones das formas mais
primitivas de vida na Terra perderam seu impacto devido a discussões polêmicas
sobre o assunto em muitas revistas científicas 39 e em outras fontes. O que a
ciência, em dado momento, considerava como fato mostrou ser algo bem
diferente. Um influente pesquisador nessa área comenta com propriedade que
“para cada interpretação corresponde uma interpretação contrária”. 40 O que
ficou demonstrado é que algumas das rochas mais relevantes em que a vida teria
ocorrido não representam os tipos de rochas originalmente classificadas. Os
fósseis, por sua vez, muitas vezes parecem fósseis, sendo, no entanto, coisas
totalmente diferentes. Esse último problema tem infestado boa parte dos estudos
sobre fósseis pré-cambrianos. Alguns achados apenas são definidamente
irrefutáveis; quanto aos demais, um pesquisador chega a mencionar quase 300
variedades de fósseis catalogados de natureza dúbia ou simplesmente falsos. 41
Na verdade, trata-se de um campo de estudo que não oferece muita
credibilidade, não podendo ser investigado superficialmente ou aceito só pelo
fato de se encontrar na literatura científica.

A explosão cambriana: o Big Bang da evolução?


Será que o registro fóssil das rochas sugere que a vida evoluiu gradualmente
há mais de 3,5 bilhões de anos? Absolutamente não! Como mencionamos, a
maioria dos paleontólogos, os cientistas que estudam os fósseis, acredita que a
vida se originou há 3,5 bilhões de anos. O inacreditável é que, durante a maior
parte desse período, contando desde o seu início, não há praticamente nenhum
avanço evolutivo. Após se passarem 3 bilhões de anos, o que corresponde a
cinco sextos do suposto período evolutivo, a maior parte dos organismos vivos
ainda é composta de uma única célula ( Figura 5.1 ). O extenso período Pré-
cambriano não apresenta nenhum aumento significativo em complexidade.
Subindo na coluna geológica, ao chegarmos à parte fanerozoica,
inesperadamente nos deparamos com o que os evolucionistas denominam
explosão cambriana ( Figura 5.1 e 5.2 , Grand Canyon, seta esquerda), época em
que um grande número dos tipos básicos de animais aparece repentinamente.
Esses tipos são conhecidos como filos, e representam os principais grupos
distintos do reino animal. Esses grupos se definem com base em diferenças
significativas em seus planos corporais. Exemplos conhecidos de diferentes filos
são os das lesmas (moluscos), esponjas, estrelas-do-mar (equinodermos) e
animais vertebrados como peixes e os seres humanos (cordatos).
Alguns evolucionistas referem-se a um período de 5 a 20 milhões de anos
para essa explosão cambriana, 42 apesar de se tratar de um período não muito
bem delimitado. A título de comparação, se o período evolutivo correspondesse
a uma hora, a maior parte dos fósseis dos filos animais teria aparecido em menos
de um minuto. A distribuição proporcional da explosão cambriana na escala do
tempo está representada na Figura 5.3 (seta preta) e na Figura 5.1 (seta preta
inferior). Samuel Bowring, do Massachusetts Institute of Technology,
especialista em datação de rochas, comenta ironicamente: “Gosto de fazer a
seguinte pergunta a meus amigos biólogos: qual é a velocidade da evolução
antes de vocês começarem a ficar incomodados?” 43 Um estudo abrangente 44
sobre a distribuição dos fósseis relata que apenas três planos corporais definidos
de filos animais (Cnidária, Porífera e alguns vestígios de vermes) aparecem no
Pré-cambriano, não nas camadas mais inferiores, porém próximos das camadas
cambrianas. 45 Dezenove planos corporais no registro fóssil de filos animais
aparecem no Cambriano (num período de aproximadamente 50 milhões de
anos), e apenas seis em todos os períodos geológicos posteriores que
representam meio bilhão de anos!
Mais acima nas camadas de fósseis, encontramos pequenas explosões como
a “explosão placentária do paleoceno”, 46 responsável pelo surgimento da maior
parte dos grupos modernos de mamíferos, ocorrendo explosão semelhante em
relação ao surgimento da maioria dos grupos de pássaros vivos. De acordo com
os padrões da escala do tempo geológico, essas explosões levaram menos de 12
milhões de anos cada uma. É pouquíssimo tempo, para não dizer nenhum, para
que ocorram todas as mudanças previstas. Uma espécie, via de regra, subsiste no
registro fóssil de um a vários milhões de anos. Isso significa, com base nessa
evidência, que há tempo para apenas 12 espécies sucessivas produzirem a maior
parte dos variados tipos de mamíferos e pássaros existentes. Refletindo sobre
essa escassez de tempo para os processos evolutivos dessa imensa variedade de
mamíferos, um evolucionista comenta que “isso é um verdadeiro absurdo”, 47 e
sugere como solução um tipo de evolução rápida. Outros evolucionistas
procuram solucionar o problema com a teoria de que novas espécies teriam
“brotado” a partir de espécies em seu estágio inicial e preservadas em fósseis,
reduzindo, assim, o tempo para o surgimento de uma nova espécie. No entanto,
essa redução significativa do paradoxo na questão do tempo pressupõe uma
enorme quantidade de germinações fortuitas de novas espécies e um registro
fóssil abundante de toda essa atividade; mas nada disso efetivamente parece
existir. 48 Tentar explicar essas explosões dessa forma é uma verdadeira
apelação de última instância.
Um problema sério que a evolução enfrenta é como conseguir que várias
mutações ao acaso ocorram de uma vez, de modo a proporcionar valor de
sobrevivência para as partes em desenvolvimento dos novos sistemas. Ao passo
que micro-organismos de rápida reprodução podem sofrer pequenas mudanças
em um tempo curto, esse não é o caso para organismos avançados, que às vezes
podem exigir anos entre as gerações. Cálculos feitos por Michael Behe 49
indicam que as eras geológicas extremamente longas são muito curtas para
acomodar as improbabilidades envolvidas. Esse é um problema particularmente
agudo para organismos avançados como répteis, aves e mamíferos, que se
reproduzem devagar, e tais organismos aparecem abundantemente no registro
fóssil.
O repentino aparecimento das principais espécies de animais e plantas mais
parece um ato criativo de Deus do que um progresso evolutivo gradual. A
evolução precisa de muito tempo para acomodar eventos praticamente
impossíveis, necessários para o surgimento de formas de vida variadas e
complexas. No entanto, os numerosos tipos de fósseis que surgem
repentinamente não abrem quase nenhum espaço para qualquer período de
tempo. Por outro lado, os que preferem aceitar a hipótese da existência de Deus
veem a explosão cambriana como evidência do poder criativo de Deus, e alguns,
de modo particular, interpretam-na como evidência dos organismos vivos que
foram soterrados durante a catástrofe do dilúvio bíblico.

Uma nova tendência evolucionista: o método cladístico


A biologia tem assistido a uma nova revolução de que o público em geral
mal tem consciência. O método convencional de analisar os organismos vivos
segundo suas classificações tradicionais vem sendo substituído por um “método
completamente evolucionista de investigar a natureza”. 50 Um suposto ancestral
evolutivo de um organismo vivo, e não sua aparência exterior, está se tornando o
fator determinante na classificação dos organismos vivos. Esse método permite
que os evolucionistas aleguem que pássaros são dinossauros, pelo fato de ambos
os grupos compartilharem em maior grau algumas características singulares,
conhecidas como fatores derivados ou sinapomorfias, quando comparados com
outros grupos. 51 Nesses estudos mais recentes, avanços sofisticados nos
métodos de análise foram implementados tendo como foco específico
características singulares, como ossos longos do pescoço, etc., não encontradas
em outros grupos. Esse procedimento se opõe ao método de analisar como um
todo as características gerais dos organismos vivos, como frequentemente é
feito, por exemplo, ao se classificarem cobras e pássaros.
Uma grande variedade de fatores distintos é levada em conta nessas
comparações, e, no caso dos organismos vivos, as similaridades genéticas
surgem como os principais critérios. Supõe-se que, quanto maiores forem as
similaridades no DNA de dois tipos de organismos, maior será a relação
evolutiva entre eles e menor o tempo decorrido a partir do momento em que
ambos evoluíram um do outro. Essa pressuposição parece fazer muito sentido do
ponto de vista evolucionista. No entanto, as mesmas similaridades genéticas
teriam que ser contempladas se olharmos a natureza como ato criativo de Deus.
O DNA determina o aspecto exterior de um organismo, e é quase desnecessário
dizer que organismos semelhantes terão características genéticas semelhantes, e,
quanto maiores forem as semelhanças físicas, mais próximo será o padrão de
DNA entre ambos, quer tenham sido evoluídos ou criados.
Por vezes, as relações evolutivas entre os organismos são ilustradas
mediante o uso de linhas conectadas em diagramas conhecidos como
cladogramas e apresentados em formatos e com interpretações relativamente
diferentes. Nesses diagramas, organismos que mantêm relações evolutivas entre
si formam um grupo denominado de clado, com tamanhos variados, dependendo
das características sob consideração. Levando ao extremo, se o correto tipo de
características “singulares” for usado, é possível formar um enorme clado de
todos os organismos vivos, o que vem a calhar com a crença evolucionista de
que todos os seres vivos estão relacionados. A Figura 5.4 representa um
cladograma simplificado de todos os vertebrados existentes. Esses vertebrados
fornecem um exemplo conhecido, razão por que foi usado para apresentar o
conceito em um livro didático de introdução à paleontologia. Características
singulares são pressupostas ao longo das linhas ascendentes do cladograma.
Nesse diagrama, a designação “tetrápodes” refere-se aos quatro membros de
todos os grupos que enfileiram as linhas ascendentes a partir daquele ponto. O
quadro completo, no entanto, é mais complicado. Em se tratando de fatores
singulares mais particularizados dentro do grupo dos vertebrados, pode-se
perceber uma relação diferente e mais complexa do que na Figura 5.4 . 52 Por
exemplo, a classe convencional dos répteis (lagartos, crocodilos, tartarugas,
cobras) não mais é considerada um grupo legítimo (clado), pois eles têm com
outros grupos inúmeras características comuns, especialmente os pássaros. 53
Não podemos perder de vista o fato de que o uso indiscriminado de
características singulares, às quais se dá muita importância, pode sugerir relações
evolutivas muito excêntricas, como é o caso dos peixes com pulmões,
considerados mais relacionados com vacas do que com outras espécies de
peixes. 54
Os cladogramas geralmente indicam, no diagrama, quais fatores singulares
são importantes para determinar o padrão evolutivo proposto. A seleção desses
fatores pode ser tarefa difícil, e, com muita frequência, características similares,
como o olho de uma lula e o de um peixe contendo a mesma estrutura básica,
são consideradas como tendo evoluído por caminhos independentes (evolução
paralela, convergência), não podendo, portanto, estar relacionadas. Essa linha de
pensamento dá margem a muitas conjecturas ao se tentar determinar as relações
evolutivas. Por outro lado, os cladogramas podem se apresentar de forma muito
sofisticada ao procurarem representar processos complicados que analisam
minuciosamente as similaridades singulares encontradas entre certos grupos de
organismos, lançando mão do caminho mais curto possível para estabelecer as
relações evolutivas. Na verdade, o problema com os cladogramas é que os
padrões estabelecidos não significam que os organismos tenham
necessariamente evoluído da maneira proposta ou de qualquer outra, fato este
ressaltado por alguns evolucionistas, apesar de a evolução estar geralmente
implícita. Os cladogramas demonstram similaridades singulares e não processos
evolutivos. É possível “brincar” de cladograma com qualquer tipo de objeto
como brinquedos ou casas. A Figura 5.5 ilustra uma proposta de “cladograma”
para a evolução de chapéus para mulheres. Ora, todos sabemos muito bem que
chapéus não evoluem sozinhos uns dos outros ou a partir de um chapéu ancestral
comum. Eles foram projetados. A realidade sobre as relações entre os
organismos pode ser bastante distinta daquela ilustrada pelos cladogramas.

Ignorando os fósseis
Existe outra tendência recente particularmente relacionada com o tempo.
Embora os fósseis nos forneçam as melhores pistas disponíveis a respeito da
vida passada sobre a Terra, é comum pesquisadores ignorarem evidências de
peso do registro fóssil quando elas não lhes parecem convenientes. Nem todos
estão de acordo com essa nova tendência, que, por sinal, tem sido alvo de muita
polêmica no meio científico. Enquanto um especialista afirma que “não cremos
que o tempo seja tão importante assim”, outro, mais cauteloso, argumenta que
falar em grandes períodos de tempo é um absurdo. 55 Essa nova tendência
poderá vir a ser mais uma dentre as muitas teorias fracassadas! Não sabemos que
caminho a ciência tomará, mas a tendência, por si só, é alarmante.
Essa nova abordagem permite que os evolucionistas expliquem problemas
como a explosão cambriana, pois, de acordo com o paradigma 56 que adotam, o
DNA lhes indica que os filos animais evoluíram uns dos outros em períodos
muito mais remotos. 57 O raciocínio é que, visto serem lentas as mudanças no
DNA e enormes as diferenças entre o DNA dos diversos filos animais, estes
devem ter evoluído muito tempo antes que seus fósseis aparecessem nas rochas.
Novamente, temos aí um campo de pesquisa que chega às raias de ciência
despojada de fatos.
Para determinar a velocidade das mudanças genéticas, faz-se uso do relógio
molecular, que frequentemente se pauta em supostos tempos geológicos para
avaliar os padrões de mudança. Infelizmente, verificou-se que esse relógio é
bastante imprevisível. 58 Há pesquisadores que mencionam o “extremo índice de
variação no relógio molecular” 59 e ressaltam que “os problemas relacionados
com o estabelecimento de pontos de calibragem precisos, a definição exata das
matrizes das filogenias e as estimativas precisas quanto à extensão das suas
ramificações continuam dificílimos”. 60 O respeitado paleontólogo James
Valentine, da Universidade da Califórnia, campus de Berkeley, ressalta que,
“infelizmente, os índices de evolução molecular não podem ser medidos como se
fossem regulados por um relógio, por várias razões: diferentes moléculas, bem
como partes distintas delas, evoluem com base em diferentes padrões de
mudança; moléculas pertencentes a uma mesma linhagem variam também em
relação a esses padrões de mudança, com o passar do tempo, e o mesmo ocorre
com moléculas homólogas de diferentes táxons”. 61
Apesar dessas limitações, há conjecturas de que a evolução de algumas das
formas básicas de animais possa ter ocorrido de meio a um bilhão de anos antes
da explosão cambriana, 62 embora não se tenha encontrado praticamente
nenhum registro fóssil relativo a esse imenso período de tempo. Trata-se de um
período com a mesma extensão, ou até o dobro, do tempo sugerido para a
evolução de quase todos os organismos desde a explosão cambriana até o
presente. Os paleontólogos, cuidadosos ao estudar os fósseis e analisar seu real
significado, são mais cautelosos em suas estimativas sobre quanto tempo, antes
do período cambriano, os animais teriam evoluído uns dos outros. Lembre-se de
que na base do Fanerozoico se encontram as camadas cambrianas, onde ocorre a
explosão cambriana e há uma abundância de diferentes espécies animais bem
preservadas, enquanto abaixo dele há quase completa ausência. Com o intuito de
explicar essa aparição repentina de espécies animais, os evolucionistas
mencionam fósseis raros e minúsculos bem como vestígios duvidosos de animais
encontrados no Pré-cambriano. No entanto, se a evolução dos filos animais
realmente tivesse ocorrido antes da explosão cambriana, teríamos que ter pelo
menos milhares de bons fósseis animais do Pré-cambriano que fossem
representativos de animais em processo evolutivo; mas, basicamente, nada foi
encontrado.
É deprimente observar que os dados fidedignos que temos à disposição sobre
a distribuição dos fósseis estejam sendo simplesmente ignorados por inúmeros
pesquisadores à medida que ganham espaço as novas tendências na classificação
evolutiva. O fato de muitos cientistas se mostrarem dispostos a seguir nessa
direção revela a facilidade com que a ciência pode ser conduzida por teorias e
não por fatos da natureza. Há mais de meio século, Richard Lull, afamado
paleontólogo e então diretor do mundialmente conhecido Peabody Museum, da
Universidade de Yale, aclamava os fósseis como “o tribunal de última instância
sempre que a doutrina da evolução for levada a juízo”. 63 É possível que tenha
sido mesmo, naquela época; mas agora que o registro fóssil está se mostrando
um problema sério para a evolução percebe-se uma tendência no sentido de
ignorá-lo. O tribunal de última instância para a evolução pode vir a ser
simplesmente uma aplicação duvidosa do suposto relógio molecular e a
incontestada pressuposição de que a evolução realmente ocorreu.

Os elos perdidos
Se vasculharmos as camadas das rochas, encontraremos muitas centenas de
fósseis de tartarugas; algumas enormes, com mais de três metros. Se
investigarmos abaixo da última tartaruga na camada de rocha mais inferior, não
encontraremos os elos evolutivos entre as tartarugas e o seu suposto ancestral
evolutivo, com aparência de lagarto. As tartarugas, na verdade, são uma espécie
diferente de animais, e surgem repentinamente. O mesmo pode ser dito sobre os
fósseis dos hostis répteis voadores, conhecidos como pterossauros, os fósseis de
morcegos e muitos outros grupos pertencentes à grande quantidade de filos de
animais que, subitamente, aparecem na explosão cambriana ( Figura 5.1 ). O
problema de ordem evolutiva relacionado com a explosão cambriana não se
resume no fato de que subitamente uma imensidade de filos de animais surgem
quase que ao mesmo tempo; o problema é mais amplo, pois abaixo da explosão
cambriana não encontramos fósseis das formas intermediárias a partir das quais
os filos de animais teriam que ter evoluído. Os outros importantes grupos de
organismos também tendem a surgir repentinamente no registro fóssil.
Novamente ressaltamos: se esses organismos tivessem evoluído de fato, teríamos
que encontrar os fósseis de todas as formas intermediárias abaixo deles, levando
em conta o lento processo evolutivo que teria dado origem à grande variedade de
filos.
Charles Darwin tinha consciência desse problema e honestamente o admitiu
em sua famosa obra A Origem das Espécies. Ele afirma: “Da mesma forma que
esse processo de extermínio ocorreu em escala gigantesca, o número de
variedades intermediárias, outrora existentes sobre a Terra, deve ter sido também
realmente imenso. Por que então as várias formações e camadas geológicas não
estão repletas desses elos intermediários? Certamente, a geologia não revela
nenhuma cadeia orgânica com uma sequência precisa de mudanças gradativas.
Esse fato representa, talvez, a mais óbvia e séria objeção que possa ser feita
contra a minha teoria.” 64 Em seguida, Darwin dedica muitas páginas tentando
explicar que os elos intermediários são inexistentes devido à grande imperfeição
do registro geológico. Ele ressalta como partes da coluna geológica estão
ausentes em muitos locais da Terra, e faz referência casual ao surpreendente fato
de que a camada logo abaixo dessas lacunas não apresenta os efeitos do tempo.
Com essa menção, Darwin inadvertidamente levanta um problema bastante
relevante relacionado com as longas eras necessárias para que ocorra o lento
processo evolutivo por ele mesmo proposto. É possível falar em lacunas na
coluna geológica ao se constatar que as partes ausentes, especialmente os fósseis
característicos, se encontram em outros locais da Terra. Além disso, Darwin
relata a respeito dos “muitos casos registrados em que uma formação é coberta
compativelmente, após um imenso intervalo de tempo, por uma outra formação
posterior, sem que a camada anterior sofra, nesse intervalo, qualquer
desgaste”. 65 Com o termo “compativelmente” Darwin quis dizer que a camada
logo abaixo da lacuna, supostamente muito mais velha, e a camada muito mais
recente logo acima dela encontram-se horizontalmente unidas uma com a outra.
Visto que a camada inferior é horizontal, temos aí uma evidência de que o
“imenso intervalo de tempo” sugerido por Darwin nunca ocorreu, já que não se
podem ver ali os efeitos destrutivos do tempo, como as erosões irregulares
previstas. Os geólogos chamam de desconformidades essas lacunas
significativas, para cuja existência as rochas não fornecem nenhuma ou pouca
evidência; e, caso exista uma leve erosão, chamam-nas de desconformidades. A
falta de “desgaste” nessas lacunas horizontais faz com que elas sejam de difícil
identificação, tornando-se necessário o estudo cuidadoso dos fósseis para
localizá-las. Trata-se de um verdadeiro desafio, pois não há nada nessas lacunas
que possa permitir sua representação. No entanto, a imensa quantidade delas e a
surpreendente horizontalidade de seus contatos levantam sérios questionamentos
a respeito da validade das longas eras geológicas, inclusive do complicado
processo de datação radiométrica empregado para determiná-las. 66
Adam Sedgwick, o velho professor de geologia de Darwin na Universidade
de Cambridge, não tinha problemas com as longas eras geológicas, apesar de ter
sérias dúvidas a respeito da evolução. Ele não permitiu que Darwin propagasse a
teoria de que a ausência de camadas, mesmo sem desgaste na camada inferior,
indicava enormes intervalos de tempo. Darwin tentou explicar essas camadas
identificando-as com regiões no fundo do mar, mas essa explicação não é
compatível com os fósseis e os tipos de rochas encontrados nessas lacunas. Em
um artigo crítico, publicado em The Spectator, Sedgwick, sem fazer uso de
muitas sutilezas, comenta que “não se pode fazer uma corda a partir de bolhas de
ar”, e, referindo-se especificamente às lacunas, indaga: “Onde será que podemos
encontrar uma prova da existência de enormes lapsos de tempo geológico que
possam explicar as mudanças? [...] Evidências no mundo físico revelam o
contrário. Para sustentar sua teoria sem fundamento, Darwin costumava apelar
para incontáveis intervalos de eras, os quais não apresentavam nenhum
monumento físico comensurável.” 67
Esse problema pode ser facilmente constatado no Grand Canyon ( Figura
5.2 , seta direita), visto que os períodos ordovicianos e silurianos, que cobrem
mais de 100 milhões de anos, não são encontrados ali; todavia, verificam-se
poucas evidências de erosão na camada inferior desse intervalo. Existem
inúmeras outras lacunas nas camadas do Grand Canyon, mas, como mostra a
ilustração, as camadas nessa região do registro geológico são extremamente
planas. O contraste da camada inferior horizontal nessas lacunas com o recorte
irregular do Grand Canyon por si só ilustra o enigma. O tempo produz muita
erosão irregular como a do Grand Canyon, mas não é possível ver erosão nessas
lacunas. 68 Com o decorrer do tempo, o desgaste da erosão é devastador. Com
base no índice médio de erosão nos continentes do nosso planeta, a previsão é de
que a superfície da Terra ficaria rebaixada em três quilômetros em 100 milhões
de anos, o que representa duas vezes a profundidade do Grand Canyon
inteiro! 69 O problema que Sedgwick apresentava em relação à falta de
evidência física para os longos períodos de tempo sugeridos para essas lacunas
permanece ainda sem solução. 70 Qualquer diminuição da escala padrão de
tempo geológico deixa menos tempo ainda para as improbabilidades da
evolução. Os dados encontrados nas lacunas geológicas apoiam fortemente o
modelo bíblico das origens.
Quase um século e meio depois, as preocupações de Darwin concernentes à
falta de fósseis intermediários estão ainda em pleno vigor. Já foi possível, desde
sua época, coletar inúmeros fósseis, e, à medida que subimos na escala
geológica, tipos importantes de fósseis surgem subitamente nas camadas, sem
dar indícios de que tivessem evoluído no decorrer do tempo a partir de diferentes
ancestrais. Alguns pesquisadores admitem o problema, como o conhecido
paleontólogo Robert Carroll, defensor da evolução. Esse pesquisador ressalta
que “a previsão seria de que os fósseis apresentassem uma progressão contínua
de formas com pequenas diferenças, ligando todas as espécies bem como todos
os principais grupos uns com os outros num espectro quase ininterrupto. Na
verdade, a maior parte dos fósseis bem preservados permite uma classificação
imediata num pequeno número de grupos básicos, semelhante ao que ocorre com
os seres vivos da atualidade. Referindo-se às características das várias espécies
de plantas que produzem flores, Carroll comenta que “em nenhum caso é
possível documentar a evolução gradual dessas características”. 71 Ao discutir a
relação entre paleontologia e teoria biológica, David Kitts, da Universidade de
Oklahoma, salienta que, “a despeito das animadoras promessas de que a
paleontologia forneceria os meios para “enxergar” a evolução, ela, ao contrário,
tem apresentado algumas dificuldades muito desagradáveis para os
evolucionistas, sendo a mais notória a presença de ‘lacunas’ no registro fóssil. A
evolução requer formas intermediárias entre as espécies, e a paleontologia não as
fornece”. 72 O paleontólogo T. S. Kemp, da Universidade de Oxford, confirma o
problema ao comentar que “o padrão de fóssil observado é invariavelmente
incompatível com o processo evolutivo gradualista. Somente em casos
extremamente raros é que se pode observar linhagens de formas intermediárias
com mudanças gradativas precisas capazes de associar ancestrais com seus
descendentes”. 73 O autor opta por uma série de outras possíveis explicações
para a evolução e o registro fóssil.
Alguns evolucionistas, como Stephen Gould, da Universidade Harvard,
chegam a sugerir que o processo da evolução ocorre por meio de pequenos
saltos, não deixando em seu rastro nada significativo no que diz respeito ao
registro fóssil. Trata-se do modelo do equilíbrio pontuado. Porém, essa teoria
não traz quase nenhuma contribuição para solucionar o problema com que a
evolução se depara ao investigar o registro fóssil, pois a total ausência de
intermediários é mais acentuada entre os grandes grupos de organismos, como os
filos animais, onde se esperaria encontrar o maior número de intermediários
evolutivos para servirem de ponte entre os grandes intervalos existentes entre
esses grandes grupos. E é justamente nesses espaços que as formas
intermediárias estão notoriamente ausentes; e o problema parece ser ainda mais
grave no reino vegetal. 74 Justamente onde se deveria encontrar grande
quantidade de pequenos saltos evolutivos, o registro se mostra praticamente,
para não dizer totalmente, desprovido de qualquer amostra. Apesar dessa
constatação, alguns evolucionistas, entre eles o porta-voz da Academia Nacional
de Ciências, nos Estados Unidos, alegam que muitos desses intervalos já foram
preenchidos, 75 o que não corresponde à verdade. Sendo fiéis aos fatos, não
podemos nos esquecer de que ter simplesmente encontrado um intermediário não
comprova a evolução, pois o achado poderia representar nada mais do que outra
variedade criada com traços que os evolucionistas interpretariam como forma
intermediária.
Muitos evolucionistas não parecem compreender o cerne do problema no
registro fóssil. Eles chamam a atenção para indícios isolados de possíveis partes
ou formas intermediárias. Mas esse não é o caminho para demonstrar que a
evolução ocorreu de fato. Até o momento, milhões de fósseis já foram
identificados, correspondendo a bem mais de 250 mil espécies diferentes.
Quanto mais fósseis são encontrados, mais óbvio nos parece que a falta de
intermediários seja um fato consumado. As poucas exceções existentes quase
não contribuem para solucionar o problema da evolução. Na verdade, muitos dos
supostos intermediários não passam daquilo que chamamos de mosaicos, ou
seja, formas que apresentam muitas características dos dois grupos para os quais
estariam servindo de ponte. No entanto, cada traço da espécie supostamente
intermediária, como uma pena ou tipo de tornozelo, se apresenta completamente
desenvolvido e não em estado intermediário.
Se a evolução tivesse realmente acontecido, num processo em que os
organismos tentassem evoluir por bilhões de anos, com os poucos sucessos e os
muitos fracassos previstos, teríamos que encontrar uma sólida continuidade de
intermediários, e não as poucas e questionáveis exceções. Essa sólida
continuidade teria que ser mais expressiva na coluna geológica logo abaixo de
onde surgem repentinamente os grandes grupos, como os da explosão cambriana
ou os mamíferos e pássaros modernos. Deveria haver muitos milhares de
intermediários, mas praticamente nenhum foi sugerido até o momento. 76
Charles Darwin estava, de fato, fazendo a pergunta correta, conforme discutimos
anteriormente, ao indagar “por que as diferentes formações geológicas e estratos
não estão repletos desses elos intermediários”. 77

Síntese
A discussão relacionada com a velocidade com que o passado transcorreu
tem dado margens a inúmeros questionamentos com profundas implicações não
somente para o debate sobre a existência de Deus, mas também para a maneira
como a ciência opera. Refletimos neste capítulo sobre uma imensa quantidade de
conclusões conflitantes a respeito do tempo. Observamos também como no meio
científico o catastrofismo, a princípio aceito, foi sepultado e recentemente
ressuscitado.
Faz pouca diferença apelar ou não para bilhões de anos a fim de explicar a
evolução. O fato é que o tempo geológico como um todo é totalmente
inadequado. Quando se acredita na criação, 78 temos então um Deus onipotente,
não limitado pelo tempo, que não necessita de muito tempo para criar. Vimos, no
entanto, que a evolução precisa de muito mais tempo do que realmente tem. Não
há tempo suficiente nem mesmo para a produção de uma única molécula de
proteína específica numa imensa sopa primordial primitiva, quanto mais para a
evolução de todas as várias formas de vida desde um micróbio até uma baleia.
Aparentemente, a ciência não está preocupada em descobrir Deus. A
tendência do pensamento científico atual é defender firmemente a evolução
naturalista. O descaso que a ciência mostra para com as implicações do registro
fóssil, seja em termos do breve período de tempo da coluna geológica, do
mistério da explosão cambriana ou da falta de intermediários entre os principais
tipos de fósseis, ilustra a facilidade com que a ciência ignora os dados. Será que
a ciência adota esse mesmo procedimento quando ignora as evidências para a
existência de Deus? Nos próximos capítulos investigaremos com cuidado alguns
traços peculiares da ciência.

Referências
1
H. P. Yockey. 1981. Self-organization origin of life scenarios and information theory. Journal of
Theoretical Biology 91, p. 13-31.
2
Thorarinsson S. 1964. Surtsey: the new island in the North Atlantic. Eysteinsson S, tradutor. Nova York:
Viking Press, p. 39.
3
Para uma discussão adicional, ver: (a) Gould SJ. 1970. Is uniformitarianism useful? In: Cloud P, editor.
Adventures in earth history. San Francisco: W. H. Freeman and Company, p. 51-53. (b) Hallam A.
1989. Great geological controversies. 2a edição. Oxford: Oxford University Press, p. 30-64. (c) Palmer
T. 1999. Controversy: catastrophism and evolution, the ongoing debate. Nova York: Kluwer Academic /
Plenum Publishers.
4
Hutton J. 1795. Theory of the earth: with proofs and illustrations, v. 2. Edinburgh: [sem editora].
Reimpresso em1959 por R. Engelmann (J. Cramer) e Wheldon & Wesley, p. 547.
5
Esta famosa afirmação é mencionada em muitas referências, entre elas: Cohn N. 1996. Noah’s flood: the
Genesis story in western thought. New Haven: Yale University Press, p. 102.
6
Hallam A. 1989. Great geological controversies. 2a edição. Oxford: Oxford University Press, p. 55.
7
Lyell KM, editor. 1881. Life, letters and journals of Sir Charles Lyell, v. 1. Londres: John Murray, p. 271
(14 de junho de 1830), p. 273 (20 de junho de 1830).
8
Cohn, p. 102.
9
Hutton, p. 551.
10
Ruse M. 2000. The evolution wars: a guide to the debates. New Brunswick: Rutgers University Press,
p. 34.
11
Palmer, p. ix.
12
Bailey E. 1963. Charles Lyell. Garden City: Doubleday, p. 191.
13
Bretz JH. 1923a. Glacial drainage on the Columbia Plateau. Geological Society of America Bulletin 34,
p. 573-608.
14
Bretz JH. 1923b. The Channeled Scablands of the Columbia Plateau. The Journal of Geology 31, p.
617-649.
15
Allen JE, Burns M, Sargent SC. 1986. Cataclysm on the Columbia: a layman’s guide to the features
produced by the catastrophic Bretz floods in the Pacific Northwest. Scenic trips to the Northwest’s
geologic past, nº 2. Portland: Timber, p. 44.
16
Bretz JH. 1978. Introduction. In: Baker VR, editor. 1981. Catastrophic flooding: the origin of the
Channeled Scabland. Benchmark Papers in Geology 55. Stroudsburg: Dowden, Hutchinson & Ross, p.
18-19.
17
Baker VR. 1981. Comentários do editor sobre os trabalhos 4, 5 e 6. In: Baker, p. 60.
18
Bretz JH, Smith HTU, Neff GE. 1956. Channeled scabland of Washington: new data and
interpretations. Bulletin of the Geological Society of America 67, p. 957-1049.
19
Para discussões recentes sobre o número de dilúvios envolvidos, ver: (a) Clague JJ, et al. 2003.
Paleomagnetic and tephra evidence for tens of Missoula floods in southern Washington. Geology 31, p.
247-250. (b) Shaw J, et al. 1999. The Channeled Scabland: back to Bretz? Geology 27, p. 605-608.
20
Bretz JH. 1969. The Lake Missoula floods and the Channeled Scabland. Journal of Geology 77, p. 505-
543.
21
Jepsen GL. 1964. Riddles of the terrible lizards. American Scientist 52, p. 227-246.
22
Alvarez L, et al. 1980. Extraterrestrial causes for the Cretaceous-Tertiary extinction: experimental
results and theoretical interpretations. Science 208, p. 1095-1108.
23
(a) Dobb E. 2002. What wiped out the dinosaurs? Discover 23 (6), p. 36-43. (b) Hallam A. 1989. Great
geological controversies. 2a edição. Oxford: Oxford University Press, p. 184-215.
24
Kauffman E. 1983. Citado por Lewin R: Extinctions and the history of life. Science 221, p. 935-937.
25
Nummendal D. 1982. Clastics. Geotimes 27 (2), p. 22-23.
26
Brett CE. 2000. A slice of the “layer cake”: the paradox of “frosting continuity”. Palaios 15, p. 495-498.
27
(a) Clark HW. 1946. The new diluvialism. Angwin: Science Publications. (b) Roth AA. 2003. Genesis
and the geologic column. Dialogue 15 (1), p. 9-12, 18.
28
Para discussão adicional e referências, ver: Numbers RL. 1992. The creationists. Nova York: Alfred A.
Knopf, p. 79-81, 123-219.
29
Ver: (a) Chadwick AV. 1987. Of dinosaurs and men. Origins 14, p. 33-40. (b) Kuban GJ. 1989.
Retracking those incredible man tracks. National Center for Science Education Reports 9 (4), 4 páginas,
suplemento especial não paginado. (c) Neufeld B. 1975. Dinosaur tracks and giant men. Origins 2, p.
64-76. (d) Numbers, p. 265-267.
30
Wald G. 1954. The origin of life. Scientific American 191 (2), p. 45-53.
31
du Noüy L. 1947. Human destiny. Nova York: Longmans, Green, p. 33-35.
32
Meyer SC. 1998. The explanatory power of design: DNA and the origin of information. In: Dembski
WA, editor. Mere creation: science, faith & intelligent design. Downers Grove: InterVarsity, p. 113-147.
33
Yockey HP. 1992. Information theory and molecular biology. Cambridge: Cambridge University Press,
p. 248-255.
34
Este assunto foi discutido no capítulo 3.
35
Trata-se de um número bem aceito. Por exemplo: Eigen M. 1971. Self-organization of matter and the
evolution of biological macromolecules. Die Naturwissenschaften 58, p. 465-523.
36
Morowitz HJ. 1992. Beginnings of cellular life: metabolism recapitulates biogenesis. New Haven: Yale
University Press, p. 31.
37
(a) Hayes JM. 1996. The earliest memories of life on earth. Nature 384, p. 21-22. (b) Mojzsis SJ,
Harrison TM. 2000. Vestiges of a beginning: clues to the emergent biosphere recorded in the oldest
sedimentary rocks. GSA Today 10 (4), p. 1-6.
38
Ver o capítulo 3.
39
Para alguns comentários críticos gerais e referências, ver: (a) Copley J. 2003. Proof of life. New
Scientist 177, p. 28-31. (b) Kerr RA. 2002. Reversals reveal pitfalls in spotting ancient and E.T. life.
Science 296, p. 1384-1385. (c) Simpson S. 2003. Questioning the oldest signs of life. Scientific
American 288 (4), p. 70-77.
40
Copley, p. 28-31.
41
Hofmann HJ. 1992. Proterozoic and selected Cambrian megascopic dubiofossils and pseudofossils. In:
Schopf WJ, Klein C, editores. The Proterozoic biosphere: a multidisciplinary study. Cambridge:
Cambridge University Press, p. 1035-1053
42
Por exemplo: (a) Bowring SA, Erwin DH. 1998. A new look at evolutionary rates in deep time: uniting
paleontology and high-precision geochronology. GSA Today 8 (9), p. 1-8. (b) Bowring SA, et al. 1993.
Calibrating rates of early Cambrian evolution. Science 261, p. 1293-1298. (c) Zimmer C. 1999. Fossils
give glimpse of old mother lamprey. Science 286, p. 1064-1065.
43
Conforme citado em Nash M. 1995. When life exploded. Time 146 (23), p. 66-74.
44
Meyer SC, Ross M, Nelson P, Chien P. 2003. The Cambrian explosion: biology’s Big Bang. In:
Campbell JA, Meyer SC, editores. Darwinism, design, and public education. East Lansing: Michigan
State University Press, p. 323-402. Ver também Apêndice C, Stratigraphic first appearance of phyla
body plans, p. 593-598; Apêndice D, Stratigraphic first appearance of phyla-subphyla body plans, p.
599-604.
45
(a) Valentine JW. 2004. On the origin of phyla. Chicago: The University of Chicago Press. (b) Valentine
JW. 2002. Prelude to the Cambrian Explosion. Annual Review of Earth and Planetary Sciences 30, p.
285-306.
46
Benton MJ. 2000. Vertebrate paleontology. 2a edição. Oxford: Blackwell, p. 327.
47
Stanley SM. 1981. The new evolutionary timetable: fossils, genes, and the origin of species. Nova
York: Basic Books, p. 93.
48
Para um estudo adicional, seria conveniente consultar as nítidas implicações matemáticas de Foote M.
1996. On the probability of ancestors in the fossil record. Paleobiology 22 (2), p. 141-151.
49
Behe MJ. 2007. The edge of evolution: the search for the limits of Darwinism. Nova York: Free Press,
p. 44-63.
50
Padian K. 2000. What the media don’t tell you about evolution. Scientific American 282 (2), p. 102-
103.
51
A discussão sobre a evolução dos pássaros será feita no capítulo 6.
52
Cowen R. 2000. History of life. 3a edição. Malden: Blackwell Science, Figura 3.9.
53
Benton, p. 32; Cowen, p. 50.
54
Gee H. 1999. In search of deep time: beyond the fossil record to a new history of life. Nova York: Free
Press, p. 145.
55
Conforme citado em DiSilvestro RL. 1997. In quest of the origin of birds. BioScience 47, p. 481-485.
56
O conceito de paradigmas será discutido amplamente no capítulo 6.
57
(a) Fortey RA, Briggs DEG, Wills MA. 1996. The Cambrian evolutionary “explosion”: decoupling
cladogenesis from morphological disparity. Biological Journal of the Linnean Society 57, p. 13-33. (b)
Smith AB, Peterson KJ. 2002. Dating the time of origin of major clades: molecular clocks and the fossil
record. Annual Review of Earth and Planetary Sciences 30, p. 65-88. (c) Valentine JW. 2002. Prelude to
the Cambrian Explosion. Annual Review of Earth and Planetary Science 30, p. 285-306.
58
(a) Ayala FJ. 1997. Vagaries of the molecular clock. Proceedings of the National Academy of Sciences,
USA 94, p. 7776-7783. (b) Ayala FJ. 1986. On the virtues and pitfalls of the molecular evolutionary
clock. Journal of Heredity 77, p. 226-235. (c) Smith AB, Peterson KJ. 2002. Dating the time of origin
of major clades: molecular clocks and the fossil record. Annual Review of Earth and Planetary Sciences
30, p. 65-88.
59
Vawter L, Brown WM. 1986. Nuclear and mitochondrial DNA comparisons reveal extreme rate
variation in the molecular clock. Science 234, p. 194-196.
60
Smith AB, Peterson KJ. 2002. Dating the time of origin of major clades: molecular clocks and the fossil
record. Annual Review of Earth and Planetary Sciences 30, p. 65-88.
61
Valentine JW. 2002. Prelude to the Cambrian Explosion. Annual Review of Earth and Planetary
Sciences 30, p. 285-306.
62
(a) Valentine [veja a nota 45]. (b) Wang DY-C, Kumar S, Hedges SB. 1999. Divergence time estimates
for early history of animal phyla and the origin of plants, animals and fungi. Proceedings of the Royal
Society of London, B, 226 (1415), p. 163-171. (c) Wray GA, Levinton JS, Shapiro LH. 1996.
Molecular evidence for deep Precambrian divergences among metazoan phyla. Science 274, p. 568-
573.
63
Lull RS. 1931, 1935. Fossils: what they tell us of plants and animals of the past. Nova York: The
University Society, p. 3.
64
Darwin C. 1859. On the origin of species by means of natural selection, or the preservation of favoured
races in the struggle for life. Londres: John Murray. In: Burrow JW, editor. Reimpressão de 1968. Nova
York: Penguin, p. 291-292.
65
Ibid., p. 298.
66
Para uma avaliação bem embasada, ver: Giem PAL. 1997. Scientific theology. Riverside: La Sierra
University Press, p. 111-190. Também: www.scientifictheology.com.
67
Artigo anônimo indiscutivelmente atribuído a Adam Sedgwick; Darwin referia-se a Sedgwick como o
autor em suas correspondências. 1860. Objections to Mr. Darwin’s theory of the origin of species. The
Spectator, 7 de abril de 1860, p. 334-335.
68
(a) Roth AA. 2003. Implications of paraconformities. Geoscience Reports nº 36, p. 1-5. (b) Roth AA.
1998. Origins: linking science and Scripture. Hagerstown: Review and Herald, p. 222-229, 262-266.
[Este livro foi publicado em português em 2003 pela Casa Publicadora Brasileira.] (c) Roth AA. 1988.
Those gaps in the sedimentary layers. Origins 15, p. 75-92.
69
A América do Norte vem sofrendo um processo de erosão a um índice de 61 milímetros a cada 1.000
anos. Este índice parece corresponder aproximadamente à média de erosão nos demais continentes. Ver
Judson S, Ritter DF. 1964. Rates of regional denudation in the United States. Journal of Geophysical
Research 69, p. 3395-3401. Para algumas outras estimativas, ver McLennan SM. 1993. Weathering and
global denudation. Journal of Geology 101, p. 295-303. Para mais referências, ver Roth, Origins, p.
263-266, 271-273. Com esse índice, prevê-se uma erosão de 6,1 quilômetros em 100 milhões de anos.
Estima-se que as práticas modernas de agricultura tenham duplicado o índice de erosão, de maneira que
a erosão prevista nos últimos 100 milhões de anos, sem a agricultura, seria de aproximadamente 3
quilômetros.
70
Para uma tentativa de solução, que se enquadra apenas em um caso particular, ver Newell ND. 1967.
Paraconformities. In: Teichert C, Yochelson EL, editores. Essays in paleontology & stratigraphy.
Department of Geology, University of Kansas Special Publication 2, p. 349-367.
71
Carroll RL. 1997. Patterns and processes of vertebrate evolution. Cambridge: Cambridge University
Press, p. 8, 9.
72
Kitts DB. 1974. Paleontology and evolutionary theory. Evolution 28, p. 458-472.
73
Kemp TS. 1999. Fossils and evolution. Oxford: Oxford University Press, p. 16.
74
Simpson GG. 1967. The meaning of evolution: a study of the history of life and its significance for
man. Edição revisada. New Haven: Yale University Press, p. 232-233.
75
(a) Futuyma DJ. 1998. Evolutionary biology. 3a edição. Sunderland: Sinauer Associates, p. 761. (b)
National Academy of Sciences. 1998. Teaching about evolution and the nature of science. Washington,
DC: National Academy Press, versão da internet, capítulo 5.
76
Exemplo disso é um recente artigo (Prothero DR. 2005. The fossils say yes. Natural History 114 [9], p.
52-56) que, apesar de afirmar que o registro fóssil não representa mais um empecilho à evolução,
apresenta uma lista de apenas uns poucos exemplos de supostos intermediários, alguns dos quais de
validade duvidosa, e nem sequer chega a mencionar o problema da explosão cambriana.
77
Darwin C, On the origin of species, p. 292.
78
Apoio a concepção de um universo antigo, de uma Terra antiga e de uma variedade de vida recente.
Para uma discussão mais elaborada, ver meu livro Origins [veja a nota 68].
Quase todos podem fazer ciência;
quase ninguém consegue fazer boa ciência. 1
L. L. Larison Cudmore, biólogo

Paradigmas
Meu professor de geologia física discutia o impressionante encaixe do tipo
“jogo de quebra-cabeça” entre as costas leste e oeste do Oceano Atlântico.
Comentava que, décadas antes, um homem chamado Wegener havia sugerido
que muito tempo atrás a Europa e a África se localizavam junto às Américas do
Norte e do Sul e que não havia o Oceano Atlântico entre elas. De lá para cá, um
enorme supercontinente se dividiu em continentes menores, criando entre eles o
Oceano Atlântico. Meu professor também mencionou que, embora a ideia fosse
interessante, ninguém mais lhe prestara muita atenção. O que ele não percebeu
foi que, seis anos mais tarde, a comunidade geológica faria uma reviravolta
completa, indo da rejeição quase unânime à aceitação quase total da ideia de
Wegener.
A ideia de que os continentes se moviam foi revolucionária e afetou muitas
interpretações geológicas, especialmente conceitos acerca de como os
continentes, montanhas e oceanos do mundo se haviam formado. Todos os livros
didáticos tiveram de ser reescritos. Conviver com essa grande mudança de
pensamento foi, ao mesmo tempo, emocionante e solene. Foi emocionante
porque se apresentaram muitas interpretações novas e porque Wegener, que
havia sido tão criticado, especialmente por geólogos americanos, 2 no fim das
contas tinha razão. Infelizmente, ele morreu muito antes de suas ideias serem
defendidas. A mudança foi solene porque deixou muitos de nós perguntando
quantas ideias ridicularizadas num determinado momento se tornariam um
dogma aceito. A mudança para a crença de que os continentes se moviam foi
dramática e grave. O ridículo e a sátira entravam frequentemente no debate.
Antes da aceitação, não faria parte da comunidade geológica quem acreditasse
que os continentes se movem. Depois, crer que eles não deslizaram pela
superfície da Terra faria da pessoa um leigo da geologia. Os fatores sociológicos
parecem ter preponderado. O intrigante era que grupos tão grandes de cientistas
tinham tanta certeza de que os continentes não se moviam, e então logo depois
estavam certos de que se moveram. Esse fato sugere que os cientistas tendem a
agir como grupos unificados que são leais uns aos outros ou a uma ideia, em vez
de agir como investigadores independentes. Não são apenas os cientistas que
fazem isso; também vemos essa tendência em muitas áreas, como o
nacionalismo, a política e a religião. Isso pode ter profundas implicações ao
tentarmos interpretar a ciência. Seria a ciência uma progressão decisiva rumo à
verdade, como alguns cientistas tendem a crer que seja, ou fica à mercê do
comportamento gregário de cientistas, que passam de uma ideia para outra?
Eu assistia a uma conferência da Associação Internacional de
Sedimentologistas, na qual se fazia todo tipo de apresentações técnicas acerca de
como identificar e interpretar estruturas e várias mudanças que se produziram ao
longo do tempo nos sedimentos geológicos. A apresentação inquestionavelmente
mais importante da conferência não foi sobre pormenores do modo como os
sedimentos se comportam, mas sobre como se comportam os próprios
sedimentologistas (aqueles que estudam os sedimentos). Sob o título de
“Fashions and Models in Sedimentology: A Personal Perspective” 3 [Modismos
e Modelos na Sedimentologia: Uma Perspectiva Pessoal], o presidente da
associação se dirigiu aos cientistas, mostrando como eles tendem a passar de
uma interpretação na moda para outra. Ao considerar interpretações do passado
acerca de sedimentos, ele mostrou como, por alguns anos, uma ideia predomina,
para depois de algum tempo outra atrair os holofotes, até ser substituída por
outra. Ele também identificou aquilo que ajuda uma ideia a se tornar popular.
Especialmente importantes para conseguir reconhecimento são os aspectos que
têm que ver com o momento certo, a simplicidade e a publicidade. É gratificante
ver que alguns cientistas de vanguarda reconhecem o fato de que outros fatores
podem conduzir o processo científico, além daquela alegada busca
despreconceituosa pela verdade. A aceitação popular de uma ideia pode refletir
um comportamento, em vez de ser baseada numa evidência inquestionável.
Em 1962, Thomas Kuhn publicou um livro considerado por muitos eruditos
como a análise mais influente do comportamento dos cientistas: The Structure of
Scientific Revolutions 4 [A Estrutura das Revoluções Científicas]. Nessa obra,
ele desafia a “percepção imaculada” da ciência como um avanço resoluto rumo à
verdade. Em vez disso, Kuhn propõe que a ciência é governada mais pelo
comportamento social dos cientistas do que pelos fatos da ciência. Como era de
se esperar, ele foi criticado sob muitas perspectivas, e alguns cientistas não se
mostraram nada impressionados. Vários filósofos, incluindo o filósofo húngaro
da ciência Imre Lakatos, saíram em missão de resgate da ciência, propondo um
cenário menos radical em que as ideias científicas mudam, porém mais com base
numa correção racional do que pelo comportamento social. 5
Kuhn indicou que, normalmente, os cientistas procedem às suas
investigações enquanto elas se encaixam nas conclusões sob a influência de
conceitos amplos, que ele chama de paradigmas. Os paradigmas são definidos
como conceitos “que por algum tempo apresentam problemas e soluções
modelos”. 6 Embora os paradigmas possam ser verdadeiros ou falsos, os
cientistas os aceitam, pelo menos por algum tempo, como verdadeiros. Alguns
exemplos seriam a evolução ou a ideia de que os continentes se movem. Antes, a
ideia amplamente aceita de que os continentes não se movem também seria um
paradigma. Como os paradigmas são aceitos como verdadeiros, as explicações
que não se encaixam no paradigma são consideradas falsas, ou dados contrários
são interpretados como anômalos. Pessoas que propõem ideias fora do
paradigma também são inaceitáveis. Uma atitude tão fechada tende a restringir a
inovação e ajuda a perpetuar a vida do paradigma.
Encaixar dados sob um paradigma aceito é o que Kuhn chama de ciência
normal. Ocasionalmente, ocorre uma mudança no paradigma, e isso é o que se
chama de revolução científica. A mudança da crença em que os continentes não
se movem para a crença contrária foi uma revolução científica. Kuhn
caracterizou a revolução científica como uma “experiência de conversão”, 7 uma
expressão que não lhe conquistou a simpatia de uma comunidade científica que
vê a objetividade e a razão como suas marcas registradas. A transformação de
um paradigma em outro é geralmente difícil e pode representar uma mudança
tanto para a verdade quanto para o erro. As ideias de Kuhn são, provavelmente,
extremas e tendem a minimizar as realizações da ciência. Por outro lado, com
base naquilo que aprendemos da história da ciência, seu conceito de paradigma é
uma análise sensível do comportamento dos cientistas.
Às vezes, uma mudança de paradigma pode retroceder a um paradigma já
rejeitado. Um exemplo mencionado antes é a ideia de que a vida pode surgir
espontaneamente, por si. Essa ideia foi geralmente aceita por longo tempo e
depois rejeitada como resultado do trabalho de Louis Pasteur, e agora foi
novamente aceita como parte do cenário evolutivo naturalista. 8 O mesmo se
pode dizer quanto ao papel das grandes catástrofes na história terrestre
(catastrofismo). Essa ideia foi aceita, rejeitada e novamente aceita. 9 Qualquer
avaliação da ciência precisa levar em consideração a influência dos paradigmas
dominantes sobre as conclusões a que chega.

Os cientistas são humanos!


Na Edinburgh Review de abril de 1860, apareceu uma resenha longa,
contundente e anônima do livro A Origem das Espécies, de Charles Darwin.
Foram questionadas muitas das ideias de Darwin, especialmente quanto ao
desenvolvimento progressivo de formas de vida por seleção natural, na qual os
mais aptos eram os que sobreviviam. O autor apresentou uma enxurrada de
argumentos, alguns de valor dúbio, contra as propostas de Darwin. Um dos mais
incisivos foi o comentário simples de que, se o avanço evolutivo ocorreu pela
sobrevivência do mais apto, como os organismos mais simples são hoje muito
mais abundantes que os mais sofisticados? O mais apto devia substituir o menos
capaz, ou pelo menos excedê-lo em número. Além disso, o artigo tecia elogios às
ideias do mais renomado naturalista inglês da época, Sir Richard Owen. Owen,
fundador do monumental Museu de História Natural de Londres, acreditava
numa forma modificada de criação, na qual Deus havia originado os principais
tipos de organismos, e esses mais tarde se transformaram numa variedade de
outros, enquanto conservavam as mesmas características básicas. Os vertebrados
são exemplo de um dos principais tipos criados, segundo Owen. Foi ele o
originador do termo dinossauro, reconhecendo esses organismos peculiares
como um grupo distinto. Aliás, ele supervisou a criação de modelos de
dinossauros em tamanho natural no Palácio de Cristal. Vinte e duas pessoas,
incluindo Owen, participaram de um banquete de ano-novo dentro de um dos
modelos de dinossauro, e uma multidão de 40.000 pessoas, incluindo a Rainha
Vitória, participou da exposição na cerimônia inaugural. 10
Não demorou muito para se solucionar o mistério da crítica anônima. O
próprio Richard Owen, um dos mais ferozes oponentes de Charles Darwin, a
escrevera. Como se pode imaginar, Darwin, que também vivia na Inglaterra, não
ficou satisfeito com a crítica. Numa carta para o botânico Asa Gray, da
Universidade Harvard, nos Estados Unidos, ele comentou que “nada fala tão
pesadamente contra Owen, considerando sua posição anterior no Colégio dos
Cirurgiões, como o fato de ele nunca ter feito um discípulo ou seguidor”. 11 O
historiador Nicolaas Rupki comenta essa alegação: “Isso, naturalmente, era uma
tolice; Owen foi amplamente seguido, no movimento do museu, como
cuvieriano [Cuvier foi um naturalista francês] e como transcendentalista.” 12
O anônimo subterfúgio de Owen em apoio às próprias ideias e a distorção
que Darwin fez dos fatos ilustram que os cientistas são indubitavelmente
humanos e podem envolver-se pessoalmente na sua ciência. Isso provoca uma
questão importante acerca da prática da ciência: é a ciência uma busca aberta
pela verdade quanto à natureza, ou é uma busca de evidências que apoiam as
hipóteses e teorias do cientista? Acaba sendo uma mistura de ambas.
O prolongado conflito envolvendo o famoso fóssil Archaeopteryx ilustra
como os cientistas se envolvem pessoalmente com sua ciência.
Anteriormente, 13 foi feita referência ao comentário de Charles Darwin de que,
provavelmente, a objeção mais grave que se poderia fazer contra sua teoria era o
fato de que o registro geológico não estava cheio de elos intermediários entre
vários tipos de organismos. Não só o registro não estava cheio desses
intermediários, mas não havia exemplos aceitáveis; e isso a despeito do fato de
que na época os fósseis eram uma grande fascinação, adornando as prateleiras de
muitos museus e acomodando-se em muitos lares e porões. Então, numa
cronometragem quase impecável, apenas dois anos após a publicação de A
Origem das Espécies, descobriu-se um suposto intermediário chamado
Archaeopteryx. 14 Apesar da tumultuada estreia do fóssil, ele parecia, em vários
sentidos, ser uma boa transição entre répteis e aves, e estava no lugar certo das
camadas geológicas. Está entre os mais famosos fósseis conhecidos.
O Archaeopteryx foi descoberto nos calcários de Solnhofen, Alemanha. Esse
calcário se parte prontamente em finas placas e às vezes é de tão fina qualidade
que já foi usado para impressão litográfica nítida; daí o nome científico do fóssil,
Archaeopteryx lithographica. Os fósseis não são abundantes em Solnhofen, mas
o calcário tem produzido alguns dos fósseis mais preservados que em qualquer
outro lugar, e podem alcançar um preço muito respeitável no mercado de
colecionadores. Especialmente interessantes foram as descobertas dos répteis
chamados pterossauros. Eles tinham enormes asas com aparência de couro, e não
se pareciam com nenhum outro animal vivo conhecido. O Archaeopteryx
também se mostrava muito singular ( Figura 6.1 ). Parecia uma ave, tinha patas
semelhantes às de ave, e penas muito bem preservadas, incluindo as típicas
penas assimétricas de voo das aves modernas. Nas penas de voo, a bárbula de
um lado do eixo da pena é mais larga que do outro. Em contraste, aves que não
voam, como avestruzes, nhandus e quivis, têm penas simétricas. O
Archaeopteryx também tem algumas características típicas de répteis, como
garras nos membros dianteiros, que neste caso são as asas. Tem ainda uma longa
cauda óssea e dentes afiados, e isso não se encontra nas aves modernas. Por
outro lado, muitas aves fósseis têm dentes e um par de aves modernas têm garras
nas asas. Até agora, dez espécimes descritas de Archaeopteryx foram
encontradas nos calcários de Solnhofen. Um exemplar está representado por
apenas uma pena e um espécime se perdeu.
O primeiro bom espécime de Archaeopteryx caiu nas mãos de um médico
que parece ter tido mais interesse em ganho monetário do que em outras coisas.
Ele estava suficientemente familiarizado com fósseis para saber que possuía algo
muito incomum. Permitiu que especialistas vissem o fóssil, mas não podiam
fazer anotação nenhuma sobre ele. A importância do fóssil começava a ser
reconhecida. Podia ser o elo perdido, do qual os seguidores de Darwin sentiam
tanta necessidade. John Andreas Wagner, professor de zoologia encarregado da
Coleção Estadual da Baviera, em Munique, mostrava interesse especial. Como
estava muito mal de saúde, enviou seu talentoso assistente para olhar o
Archaeopteryx. O assistente guardou na memória o que viu e, depois de várias
visitas, fez uma reprodução notavelmente exata da aparência do fóssil. Wagner,
que, à semelhança da maioria dos cientistas do seu tempo, cria no relato bíblico
da criação, tinha a preocupação de que o fóssil fosse interpretado como o elo
perdido. A despeito de sua saúde frágil, entregou um relatório oficial à Coleção
Estadual Bávara de Munique sobre a nova criatura. Ele a classificou como um
réptil, com uma característica que se assemelhava a penas. Na conclusão de sua
apresentação, declarou que o fóssil não era um elo perdido e desafiou os
darwinistas a apresentar os passos intermediários esperados, entre as classes de
animais. Declarou: “Se eles não podem fazer isso (como certamente não
poderão), seus pontos de vista devem ser rejeitados de imediato como sonhos
fantásticos, com os quais a investigação exata da natureza nada tem que ver.” 15
Pouco tempo depois, Wagner morreu, mas a crescente aspereza entre criação
e evolução continuou. O triunfalismo às vezes prevalecia. O paleontologista
Hugh Falconer escreveu a Charles Darwin comentando que o darwinismo havia
“matado o pobre Wagner, mas, em seu leito de morte, consolou-se denunciando-
o como uma phantasia”. 16 Deve-se conservar em perspectiva o fato de que
Charles Darwin não era ateu, como às vezes é considerado. Durante seu último
ano, discutiu severamente com dois ateus por serem tão beligerantes acerca de
suas crenças. Com referência à questão da existência de Deus, Darwin defendia
um agnosticismo passivo, e não um ateísmo agressivo. Os secularistas, porém,
não desistiram. Após o sepultamento de Darwin na Abadia de Westminster, um
deles gracejou dizendo que, embora a igreja tivesse o cadáver de Darwin, não
possuía suas ideias! Essas ideias estavam solapando os próprios fundamentos da
igreja.
Muito antes, em Londres, Richard Owen, oponente de Darwin, tinha plena
consciência das ideias fulminantes em torno do Archaeopteryx. Havia poucas
coisas no mundo que ele queria mais do que ter o espécime real do fóssil.
Usando sua poderosa posição no Museu Britânico, e após consideráveis
negociações tanto com a direção como com o médico que possuía o exemplar,
chegaram ao consenso de adquiri-lo, bem como alguns outros fósseis menos
importantes, por umas setecentas libras esterlinas. Depois de minucioso estudo
do Archaeopteryx, Owen relatou suas descobertas à Sociedade Real. Ele
previsivelmente concluiu, assim como Wagner havia feito, que o fóssil não era
intermediário entre aves e répteis. Em contraste com a ideia de Wagner, porém,
não era um réptil; era uma forma primitiva de ave, não diferente de algumas aves
modernas, e voava muito bem. Essa conclusão não impediu que a então minoria
dos darwinistas o promovesse como um exemplo do elo perdido, de que tanto
precisavam. Posteriormente, Darwin providenciou para que ele fosse incluído
nas edições futuras do seu livro A Origem das Espécies. Os evolucionistas,
contudo, necessitavam de uma hoste de intermediários para autenticar a
transição gradual de répteis para o Archaeopteryx, e depois do Archaeopteryx
para tipos modernos de aves. Para aqueles que acreditavam na criação por parte
de Deus, o Archaeopteryx podia simplesmente representar outra variedade
criada.
Penas voando sobre a origem das aves
Alguns anos após a publicação de A Origem das Espécies, a evolução se
tornou mais aceita, no geral; porém, a questão da origem evolutiva das aves não
se resolveu com o Archaeopteryx. Muitas outras ideias estavam sendo cogitadas.
Alguns se perguntavam se as aves não poderiam ter evoluído dos répteis alados,
chamados pterossauros, mas as diferenças básicas entre pterossauros e aves eram
tão grandes que a ideia teve poucos defensores. Talvez as aves tivessem evoluído
dos dinossauros, e algumas dessas ideias incluíam o Archaeopteryx na linha dos
antepassados. Uma ideia que recebeu grande aceitação, especialmente no início
do último século, foi que tanto aves quanto dinossauros surgiram de um ancestral
ainda não descoberto. O naturalista dinamarquês Gerhard Heilmann
desempenhou um papel decisivo na adoção dessa ideia. Cedo na vida, Heilmann
rejeitou as ideias religiosas de seus pais, adotando uma forte posição
antirreligiosa. Interessado em ciências, e mais especificamente na evolução das
aves, publicou vários artigos e livros sobre o tema. Procurava um ancestral das
aves muito anterior, nas camadas geológicas, às que continham o Archaeopteryx.
Heilmann também era um excelente ilustrador, tendo desenhado algumas cédulas
bancárias da Dinamarca. Em suas publicações, incluía sofisticadas ilustrações
daquilo que julgava ser a aparência do elo evolutivo perdido das aves. A
representação daquilo que ele chamou de Proavis tinha muitas escamas e penas
em desenvolvimento, especialmente nos membros anteriores e na cauda. A alta
qualidade das ilustrações contribuiu, sem dúvida, para a aceitação geral de suas
ideias sobre a evolução das aves, e elas foram amplamente aceitas pela
comunidade científica durante décadas.
Em 1964, John Ostrom, paleontologista da Universidade Yale,
esquadrinhava as rochas da Formação Cloverly (Cretáceo inferior, parte superior
do Mesozoico na Figura 5.1 ) em Montana quando notou uma garra de fóssil
que acabou sendo um importante fator na discussão sobre a evolução das aves.
Foi removido o restante do esqueleto que a acompanhava, e se viu um animal
pequeno, leve, de aproximadamente um metro de altura, com uma garra saliente.
Ostrom o chamou de Deinonychus, que significa “garra terrível”. A garra letal
significava que esse dinossauro terópode de duas patas seria um ágil caçador, e
essa não era a imagem predominante dos dinossauros naquela época. Além
disso, Ostrom notou que os pulsos de sua nova descoberta eram notavelmente
parecidos com os do Archaeopteryx. Isso ajudou a colocar o Archaeopteryx, que
a essa altura havia quase sido relegado ao esquecimento, de volta na sequência
da evolução das aves. 17 Considerava-se agora que o Archaeopteryx havia
evoluído de um dinossauro terópode. Ostrom também acreditava que as aves
eram simplesmente dinossauros com penas. Supostamente um ancestral comum
tanto do Deinonychus quanto do Archaeopteryx existiu algum tempo antes da
deposição das camadas de Solnhofen. Essa ideia não era tão diferente, em
princípio, do suposto ancestral de Heilmann, mas o decisivo ancestral de
Heilmann não fora encontrado, e novas ideias seriam bem recebidas. Houve
inclusive sugestões de que as aves teriam evoluído de crocodilos ou
mamíferos. 18 Ainda assim, a ideia de Ostrom de que as aves evoluíram dos
dinossauros ganhou significativa aceitação, especialmente entre os
paleontologistas. 19 Essa ideia desencadeou uma intensa guerra tribal intelectual
dentro da comunidade científica entre os paleontologistas, que eram especialistas
em fósseis, que alegavam que as aves evoluíram dos dinossauros, e os
ornitólogos, especialistas em aves, e que preferiam algum outro tipo de réptil
como antepassado das aves.
Essa famosa batalha incluiu gritaria contra os oponentes em conferências e
providências para que as ideias contrárias não fossem publicadas. 20 Os
ornitólogos se consolidaram sob a bandeira BAND, que é a sigla em inglês da
declaração “Birds Are Not Dinosaurs” [As Aves Não São Dinossauros], e, por
ocasião de importantes conferências, os defensores ostentavam orgulhosamente
bótons com essa inscrição. Ambos os lados não entendem por que os oponentes
são tão ingênuos, e ambos os lados se inclinam a alegar vitória. Os
paleontologistas, que constituem maioria moderada, contam com a vantagem de
alguns tipos de fósseis intermediários representativos e têm a mídia ao seu lado.
As histórias de dinossauros são maravilhosas para prender a atenção, e pode
haver uma relação íntima entre aqueles que encontram dinossauros e a mídia
financeiramente pujante.
Alan Feduccia, da Universidade da Carolina do Norte, tem sido um dos
líderes na questão da origem antidinossauro das aves, promovida pelo grupo
BAND. Ele acha que os pormenores estão sendo passados por alto. “Se você
montar um esqueleto de dinossauro e um esqueleto de galinha um ao lado do
outro, e depois olhar os dois com binóculo a cinquenta passos, eles parecerão
muito semelhantes. Entretanto, se você os olhar em detalhes, descobrirá que há
diferenças enormes em suas mandíbulas, dentes, dedos, pélvis e muitas outras
partes.” 21 Já houve e continua havendo debates intermináveis sobre a evolução
dos pulsos dos fósseis intermediários e os dedos relacionados com eles. Os
ornitólogos alegam que não se pode transformar o pulso de um dinossauro no de
uma ave. 22 Os criacionistas, que acreditam que Deus criou os principais tipos
de aves, tendem a simpatizar com alguns dos argumentos dos ornitólogos, que
por sua vez se afligem quando os paleontologistas os acusam de ser como os
criacionistas. 23
Como evoluiu a capacidade de voar? Esse tem sido outro ponto de contenda
na saga da evolução das aves. O veterano paleontologista Michael Benton,
especialista em dinossauros, menciona com franqueza que “as origens do voo
das aves devem ser inteiramente especulativas”. 24 Outro notável
paleontologista, Robert Carroll, discutindo problemas da evolução, comenta com
discernimento: “Como podemos explicar a evolução gradual de estruturas
completamente novas, como as asas de morcegos, aves e borboletas, quando é
quase impossível conceber a função de uma asa parcialmente evoluída?” 25 A
falta de dados sólidos não impede que os ornitólogos do BAND e os
paleontólogos prossigam com acalorados debates, cada lado argumentando sob
uma perspectiva que encaixa sua interpretação da evolução. Os ornitólogos do
BAND favorecem a ideia de que o voo se desenvolveu em animais que subiam
em árvores, saltavam para baixo e planavam usando os braços para finalmente
desenvolver um tipo de voo tornado possível por asas que batiam. Essa ideia de
“descer das árvores” contrasta com a ideia de “subir” dos paleontologistas, que
sugeriam que os animais saltando pelo chão, perseguindo insetos, acabariam
desenvolvendo os braços como asas, que por sua vez possibilitaram o voo.
Embora alguns animais, como os raros esquilos e lagartos voadores, saltem
como se estivessem planando, com dobras estendidas de pele entre seus
apêndices, e outros, como sapos e lagartos, persigam insetos, não vemos hoje
animais no processo de adquirir evolutivamente a capacidade de voar a partir de
seus membros anteriores. A capacidade de voar requer o tipo de estruturas
extremamente especializadas que são vistas nas aves, insetos e morcegos.
A persistente discordância entre os ornitólogos do BAND e os
paleontologistas teve um interlúdio bem recebido, mas chocante, quando em
1985 dois astrônomos altamente respeitados alegaram que o Archaeopteryx era
uma fraude. Sir Fred Hoyle e Chandra Wickramasinghe, da Universidade de
Gales, estudaram o espécime de Londres que Richard Owen havia adquirido a
um preço assombroso na época. Relataram que a semelhança de penas havia sido
acrescentada a um esqueleto fóssil existente e que isso provavelmente fora feito
como tentativa de produzir o necessário elo perdido para consubstanciar a teoria
da evolução de Darwin. A história se espalhou rapidamente pelo mundo. Os
evolucionistas não acharam nenhuma graça. Alguns criacionistas se deleitaram
porque, finalmente, esse enigmático elo perdido havia sido destronado. Os
curadores do Museu de História Natural de Londres prepararam uma defesa
abrangente. Após um estudo cabal, puderam refutar com credibilidade os
argumentos de falsificação. 26 Alguns criacionistas também se colocaram ao
lado desse último estudo, 27 emprestando seu apoio à autenticidade do famoso
fóssil.
Na última década, alguns maravilhosos achados de fósseis deram esperança
aos paleontologistas que pensam que as aves evoluíram a partir dos dinossauros.
Esses vieram principalmente de uma rica fonte de fósseis na província de
Liaoning, nordeste da China. Os grãos finos dos sedimentos que cobrem os
fósseis se originam de vulcões e são geralmente classificados como dos
primórdios do Cretáceo. Embora não tenha sido possível uma datação precisa,
isso significa que, segundo a escala-padrão de tempo geológico, pertencem
possivelmente à mesma época ou são mais recentes do que o jurássico
Archaeopteryx.
Uma interessante descoberta de Liaoning é um pequeno dinossauro terópode
chamado Sinosauropteryx. 28 Embora com apenas 68 centímetros de
comprimento, causou grande sensação por causa de uma densa crista preta
encontrada especialmente ao longo de seu dorso e cauda. A crista, que parecia
ser feita de filamentos, foi interpretada como penas ou alguma forma de pena em
evolução, chamada protopena, mas a preservação não era boa o suficiente para
permitir uma identificação definitiva. A interpretação sobre a protopena favorece
a interpretação evolutiva dos animais que procuravam elevar-se do chão. Por
outro lado, pesquisas feitas pelo grupo BAND sugeriram que a crista não era de
penas e poderia ser constituída apenas de músculos degenerados ou algum tipo
de tecido fibroso conjuntivo.
Ainda mais enigmático é o Protarchaeopteryx, 29 interpretado como
dinossauro pelos paleontologistas e como ave pelos ornitólogos do BAND. O
conflito ilustra a tentativa de reunir argumentos ao mudar definições. Um
defensor do BAND adverte que uma galinha seria um dinossauro para os
paleontologistas, 30 e os paleontologistas que pensam que os dinossauros tinham
penas indicam que “as penas são irrelevantes no diagnóstico das aves”. 31 O
nome Protarchaeopteryx na realidade significa “anterior” ao Archaeopteryx, mas
isso dificilmente se aplica, já que o Protarchaeopteryx seria considerado mais
recente ou no máximo tão antigo quanto o Archaeopteryx. Além disso, o
Archaeopteryx tem, inquestionavelmente, penas plenamente desenvolvidas,
enquanto o Protarchaeopteryx tem estruturas alongadas que se parecem um
pouco com penas, mas carece de evidência de um verdadeiro eixo de penas.
Também, no espécime fóssil, as melhores penas podem não ter estado ligadas ao
corpo e podem ter vindo de algum outro organismo. Embora o Archaopteryx seja
mais avançado, o Protarchaeopteryx é considerado pelos que o descrevem como
o elo perdido na evolução das aves.
Aquilo que provavelmente pode ser mais bem entendido como conflito
cultural foi relatado enquanto se estudava o Protarchaeopteryx. Quatro cientistas
ocidentais, um do BAND e três do grupo dos paleontologistas, viajavam pela
China e tiveram o privilégio de ver o fóssil antes que ele fosse oficialmente
descrito. Seguiu-se uma significativa discussão, e todos os cientistas ocidentais
foram avisados de que a viagem não continuaria, a menos que identificassem as
intrigantes estruturas achatadas do fóssil como penas. Anunciava-se uma
calamidade, já que nenhum dos cientistas ocidentais endossaria a interpretação
das penas. Isso se resolveu ao decidirem que as estruturas se chamariam
protopenas. Como não havia uma definição estabelecida para protopenas, a
excursão prosseguiu como um grande sucesso. 32
Os chineses encontraram muitos fósseis mais em Liaoning, e mais
dinossauros foram descritos como tendo estruturas semelhantes a penas, como
filamentos longos e ramificados. 33 Storrs Olson, um ornitólogo do BAND no
Museu Nacional de História Natural em Washington, DC, não se impressiona:
“Eles querem ver penas, então veem penas.” “Isso é simplesmente um exercício
de pensamento positivo.” 34 Ele sugere que os filamentos podiam ser
simplesmente cabelo. Afinal, o Archaeopteryx, reconhecido como a mais
primitiva ave conhecida, provavelmente se localize mais abaixo nas camadas
fósseis e tem penas de voo plenamente desenvolvidas.
Tanto o BAND quanto o grupo dos paleontologistas têm certeza de que as
aves evoluíram de alguma forma, e nem se considera a possibilidade de que não
tenham evoluído. As diferentes interpretações que eles aplicam à evolução das
aves ilustra como suas suposições são acrescentadas à suposição da evolução,
enquanto a ciência que é conduzida por hipóteses se torna mais especulativa.
Precisamos cavar mais fundo e aprender a distinguir entre boas explicações
apoiadas por dados e aquelas baseadas na especulação.
Fósseis de aves que parecem ser bem modernas (Confuciusornis) também
apareceram em Liaoning. Têm boas penas e nenhum dente, como acontece com
as aves de hoje. 35 Todavia, a descoberta mais surpreendente até hoje é o
Microraptor, descrito como um dinossauro de quatro asas. Vários espécimes
parecem ter grandes penas sobre quatro apêndices, e não têm pernas para andar.
O animal é considerado como tendo sido um tipo de organismo planador, que
vivia nas árvores, no caminho evolutivo de adquirir a capacidade de voar. 36 Até
agora, essa descoberta tem deixado a maioria completamente desconcertada.
Encontrar penas plenamente desenvolvidas nessa parte da coluna geológica,
como no caso do Archaeopteryx e do Confuciusornis, indica simplesmente que
esse é o lugar errado para procurar a evolução das penas. A evolução exigiria
que essas penas tivessem evoluído antes, e uns poucos evolucionistas apontam
esse fato. 37 Contudo, é tão forte o desejo de fazer com que as aves evoluam a
partir dos dinossauros que as interpretações descrevendo a evolução de penas em
dinossauros continua a aparecer na literatura científica. 38 Essa é outra ilustração
de como a teoria, em lugar dos fatos, pode conduzir a ciência. 39
Você não pode simplesmente grudar penas num dinossauro ou em outro tipo
de animal e esperar que ele voe. As aves têm numerosas características especiais
que lhes permitem voar, inclusive um sistema respiratório especial, músculos
especiais, ossos leves 40 e, acima de tudo, penas para o voo. A “penugem de
dinossauro” descrita não se qualifica como penas para o voo, embora alguns
evolucionistas sugiram que as penas evoluíram de algum tipo de estrutura
filamentosa que a princípio servia como isolante. Mas isso é especulação, e
novas descobertas de fósseis poderiam mudar tudo isso. Entretanto, até agora
nenhum dinossauro verdadeiro foi encontrado com penas para o voo. 41 Os
evolucionistas sugerem frequentemente que as penas evoluíram da modificação
das escamas dos répteis do ancestral evolutivo das aves, mas não parece ser esse
o caso. Com base em novos achados, 42 o paleontologista Richard Cowen
adverte que “as proteínas que produzem penas em aves vivas são completamente
diferentes das proteínas que produzem escamas de répteis hoje”. 43 Além disso,
as penas para o voo são estruturas altamente especializadas, muito leves, fortes,
flexíveis e complicadas. Possuem um eixo central, barbas laterais, minúsculas
farpas nas barbas e muitos ganchinhos em cada farpa, que agem como velcro
( Figura 6.2 ). Quando as barbas se separam, a ave pode enganchá-las
novamente, ajeitando-as com o bico. Mas essa é apenas uma pequena parte do
sistema muito mais complexo de sensores e músculos que ajustam o movimento
preciso das asas, e tudo isso precisa ser administrado por um complexo sistema
de coordenação no cérebro. 44 A teoria da evolução tem um caminho muito
longo a percorrer para tentar explicar a evolução das aves que voam, a partir de
dinossauros ou de algum réptil ancestral desconhecido.

Lições do Archaeoraptor
No dia 15 de outubro de 1999, a National Geographic Society convocou uma
importante entrevista coletiva no seu Salão do Explorador, em Washington, DC.
O centro da proclamação era a exibição de uma nova descoberta de fóssil, com o
nome de Archaeoraptor. A descoberta seria um “elo perdido” entre dinossauros e
aves. O fóssil tinha o corpo de ave, mas a cauda tinha, definidamente, a
aparência daquela de um dinossauro. Alguns dos cientistas presentes, que
haviam estudado o fóssil, comentaram: “Estamos contemplando o primeiro
dinossauro capaz de voar. [...] É nada menos que impressionante.” “Até que
enfim podemos dizer que alguns dinossauros sobrevivem; nós os chamamos de
aves.” 45 A mídia ficou devidamente impressionada e reagiu com outra onda de
“dinomania”. O anúncio precedeu a publicação da edição de novembro da
revista National Geographic, que trouxe a reportagem sobre esse achado fóssil
com o título “Penas para o T. rex? Novos fósseis semelhantes a aves são os elos
perdidos na evolução do dinossauro.” Esse artigo, 46 que ilustra um modelo
voador do Archaeoraptor e um jovem dinossauro T. rex com penugem, trazia a
declaração de que “podemos agora dizer que as aves são terópodes
[dinossauros], com a mesma confiança com que dizemos que os humanos são
mamíferos. [...] Tudo, desde lancheiras até exposições em museus, mudará para
refletir essa revelação.” O Archaeoraptor é caracterizado como “um elo perdido
entre dinossauros terrestres e aves que podiam mesmo voar”. Além disso, “essa
mistura de características avançadas e primitivas é exatamente o que os
cientistas esperariam encontrar em dinossauros na sua tentativa de voar”. Era
justamente desse tipo de descoberta que o grupo dos paleontologistas precisava
para defender sua ideia de que as aves evoluíram a partir dos dinossauros.
A euforia que acompanhou esse solene anúncio não durou muito tempo.
Levou apenas dias para que alguns cientistas questionassem a autenticidade do
fóssil. Os ornitólogos do BAND ficaram especialmente desconfiados. Storrs
Olson, numa carta aberta a Peter Raven, secretário da Comissão de Pesquisa e
Exploração na National Geographic Society, comentou que “a National
Geographic alcançou o ponto mais baixo, por ter-se engajado num jornalismo ao
estilo tabloide, sensacionalista, sem comprovação”. Também apontou que o bebê
T. rex “coberto de penas [...] é simplesmente imaginário e não tem espaço fora da
ficção científica”. Além disso, “a verdade e uma cuidadosa ponderação científica
das evidências estão entre as primeiras vítimas” do apoio prestado à origem
terópode das aves, “o que agora rapidamente se transforma numa das maiores
fraudes científicas de nosso tempo”. 47
O que acontece é que o Archaeoraptor é uma composição fóssil que consiste
de muitas partes cuidadosamente coladas juntas. A cauda de um dinossauro foi
acrescentada ao corpo de uma ave (ver a Figura 6.3 ). Ademais, as pernas são
apenas uma única perna direita, tendo sido usada como a outra perna a sua parte
correspondente encontrada na contraplaca de rocha. Hoje, o Archaeoraptor é
conhecido como “A Ave de Piltdown”, assim chamado como referência à famosa
farsa de Piltdown, em que no início do último século uma mandíbula semelhante
à de macaco foi rusticamente encaixada num crânio humano. Durante uns
quarenta anos, antes de a fraude ser descoberta, a montagem ocupou respeitada
posição como elo perdido na evolução da humanidade. A história do
Archaeoraptor é igualmente lamentável. Originou-se nos famosos estratos de
fósseis de Liaoning, na China, com partes extras coladas para realçar seu valor.
Por ser ilegal tirar esses fósseis do país, ele foi para os Estados Unidos
camuflado, e acabou na exposição anual, mundialmente renomada, de gemas,
minerais e fósseis de Tucson, no Arizona.
Stephen Czerkas, diretor de um pequeno museu em Blanding, Utah, ficou
estupefato quando viu o fóssil e percebeu imediatamente sua importância como
intermediário entre dinossauros e aves. Pagou o preço solicitado de oitenta mil
dólares e, após retornar a Blanding, procurou engajar o renomado Philip J.
Currie, do Museu Real Tyrell de Paleontologia em Alberta, Canadá, em seu
estudo. Currie entrou em contato com os líderes da National Geographic, que
frequentemente publicam sobre evolução, 48 e eles indicaram que apoiariam o
projeto. Também impuseram segredo absoluto quanto ao estudo, a fim de realçar
a eficácia de um anúncio público explosivo sobre esse notável elo perdido. Xing
Xu, do Instituto de Paleontologia dos Vertebrados, de Pequim, e Timothy Rowe,
da Universidade do Texas, além de outros, foram acrescentados à equipe do
estudo. Czerkas, Currie e Xu têm sido fervorosos defensores da visão
paleontológica de que as aves evoluíram dos dinossauros.
Concordaram em que o espécime contrabandeado retornaria para a China.
Estudos com raios X revelaram que a amostra da placa do fóssil consistia de 88
partes separadas. 49 Alguns dos investigadores também notaram que os ossos da
cauda do dinossauro não estavam adequadamente ligados ao corpo com
aparência de ave, e que as duas pernas eram a justaposição das duas metades da
placa de rocha que cobriam uma perna só. É possível que os pormenores daquilo
que aconteceu durante o estudo jamais se tornem conhecidos. Várias bandeiras
vermelhas foram acionadas, mas o projeto não foi detonado. Embora o fracasso
tenha sido atribuído em parte à falta de comunicação, Louis M. Simons, um
repórter investigativo veterano solicitado a examinar o assunto, encontrou muitas
discrepâncias enquanto entrevistava os participantes. Ele notou que “poucos
aceitam a culpa; todos acusam algum outro”. 50 A National Geographic gostaria
de ver publicações quase simultâneas dos detalhes do Archaeoraptor num órgão
técnico, mas nenhum se apresentava. Tanto a revista Nature quanto a Science se
recusaram a publicar um relatório técnico que admitia a natureza composta do
espécime, mas, ao mesmo tempo, o considerava um tipo de organismo.
Nesse meio tempo, a National Geographic, diante do prazo final para sua
enorme tarefa de publicação, foi em frente e publicou a infame edição de
novembro sem um relatório de apoio técnico, e também realizou seu
extraordinário anúncio público. Persistiram os comentários de que o fóssil era
uma fraude. Xing Xu, ao retornar à China, pôde encontrar a contraplaca
correspondente da cauda do Archaeoraptor. Combinava perfeitamente, e foi
ligada ao corpo de um dinossauro! Informou, pesaroso, aos seus colegas nos
Estados Unidos: “Temos de admitir que o Archaeoraptor é um espécime
falsificado.” 51 Embora alguns dos que estudaram o espécime não tenham
aceitado a princípio seu relatório, agora todos parecem concordar que se trata de
uma fraude. O constrangimento foi de grande interesse para a imprensa
internacional. A parte de ave do Archaeoraptor tem sido reestudada junto com
um espécime similar, e recebeu um nome científico diferente daquele que lhe foi
dado pela National Geographic. Agora se chama Yanornis martini, e aqueles que
a descrevem propõem que as pernas, mas não a cauda do Archaeoraptor,
pertencem a essa nova espécie. 52 Os ornitólogos do BAND venceram esse
“assalto”, mas os paleontologistas, que têm a mídia ao seu lado, demonstram
grande dose de persistência. Também foi expressa a preocupação quanto ao fato
de “os cientistas terem medo demais de revelar seus temores aos seus
patrocinadores da mídia”. 53 A mídia continua providenciando penas para o T.
rex, embora não se haja encontrado pena nenhuma em fósseis do T. rex. Keith
Thompson, professor e diretor do Museu da Universidade de Oxford, resume a
argumentação usada para fornecer penas ao T. rex, dando o placar final de
“Penas 3 X Lógica 0”. 54
Acontece que a teoria da evolução ainda não tem um modelo autenticado
para a origem de penas, voo ou aves, e a batalha entre paleontologistas e
ornitólogos do BAND continua, enquanto as teorias, e não os fatos, conduzem a
ciência. Parece que não foram aprendidas lições de cautela. Desde o desastre do
Archaeoraptor, a National Geographic Society e o museu de Stephen Czerkas,
em Utah, têm publicado livros ilustrando especialmente dinossauros com
penas! 55 Infelizmente, a evolução das aves não é um caso isolado. No livro
Icons of Evolution: Science or Myth? [Ícones da Evolução: Ciência ou Mito?], o
biólogo Jonathan Wells documenta uma variedade de outros exemplos. 56

O insidioso potencial dos paradigmas


Há muitos fatores que favorecem a durabilidade de um paradigma, e um
deles é a persistência dos cientistas que o promovem. É difícil uma pessoa
desistir daquilo em que deseja acreditar, e a honra pessoal pode ser um fator de
peso. O renomado físico alemão Max Planck, certa vez, comentou francamente
que “uma nova verdade científica não triunfa ao convencer seus oponentes e ao
fazer com que vejam a luz, mas sim porque seus oponentes por fim morrem, e
cresce uma nova geração que está familiarizada com ela”. 57 O princípio é por
vezes francamente expresso como “a ciência progride a um funeral de cada vez”.
Os cínicos alegam que “a história pertence aos vitoriosos”, e esse é muito
frequentemente o caso. Uma vez que o paradigma tenha conquistado a posição
dominante, aqueles que o apoiam não deixarão que seja esquecido. Ridicularizar
outros paradigmas pode estabelecer um “clima de opinião” que favorece
grandemente a visão dominante, quer seja verdadeira, quer não. Um dos infelizes
resultados disso é que, em vez de investigar acuradamente as questões mais
profundas de sua pesquisa, os cientistas param de pesquisar 58 e começam a
publicar, quando seus dados parecem combinar com o paradigma aceito. Isso
pode fazer com que o paradigma vá sempre em frente, de maneira especial nas
áreas mais especulativas da ciência, onde pode haver poucos dados. Não é fácil
revisar um paradigma dominante, e quando a mídia e a indústria do
entretenimento se envolvem, como acontece muitas vezes com grandes ideias
científicas, a mudança é ainda mais difícil. Os paradigmas, às vezes, têm seu
jeito de levar uma vida própria, como é o caso da evolução, indo muito além da
comunidade científica.
Ideias e paradigmas predominantes não precisam se basear em fatos a fim de
serem aceitos. A humanidade, com frequência demasiada, sai por tangentes sem
consistência, e a ciência não está isenta disso. Alguns exemplos servem de
ilustração:
1. O famoso “Julgamento do Macaco” ocorreu em 1925, na cidade de
Dayton, Tennessee. Embora tenha começado por causa de aspectos técnicos do
ensino da evolução em escolas públicas, o julgamento na verdade acabou por se
tornar uma competição pública mundialmente famosa entre evolução e criação.
A opinião pública afirma que o famoso advogado Clarence Darrow, de Chicago,
que defendia a evolução, venceu William Jennings Bryan, três vezes candidato à
presidência dos Estados Unidos, que defendia a criação. Essa foi a história que
ouvi quando cursava pós-graduação. Uma recente reavaliação do julgamento
feita por dois eminentes historiadores – Ronald Numbers e Edward Larson, das
universidades de Wisconsin e da Geórgia, respectivamente – revela que não foi
assim. 59 Na melhor das hipóteses, para a evolução, o julgamento foi um
empate. Por um lado, Darrow fizera a Bryan algumas perguntas desafiadoras às
quais ele não havia respondido bem; por outro lado, muitos acharam que o
sarcasmo e a atitude arrogante de Darrow fizeram com que perdesse a causa. Ele
objetou contra qualquer oração no tribunal e foi finalmente citado por desacato.
Muitas reportagens de jornais após o julgamento, bem como outros documentos,
refletiam sérias preocupações no sentido de que a evolução havia perdido. A
versão popular corrente de que Darrow derrotou Bryan se deve principalmente
ao livro Only Yesterday, que vendeu mais de um milhão de exemplares, e ao
filme muito popular Inherit the Wind. Ambos apresentam uma visão distorcida
do julgamento, a qual favorece muito a Darrow. 60 A ampla aceitação da ideia de
que Darrow venceu é uma novidade que se introduziu muito depois de encerrado
o julgamento.
2. Você provavelmente tenha ouvido falar do conceito da Terra plana e de
como Cristóvão Colombo foi o herói que ousou desafiar esse falso dogma
promovido pela igreja. Colombo saiu navegando para a América do Norte e o
fez sem despencar pela borda da Terra! Essa “sabedoria” convencional é
encontrada em muitos livros didáticos e enciclopédias. 61 Acontece que esse é
outro falso conceito. Uma pesquisa acurada feita por Jeffrey Burton Russell,
professor de história da Universidade da Califórnia em Santa Bárbara, mostra
um quadro bem diferente. No livro Inventing the Flat Earth [Inventando a Terra
Plana], 62 Russell explica como a falsidade se tornou dogma. Dificilmente
algum erudito da igreja acreditava numa Terra plana durante os dois primeiros
milênios da cristandade; virtualmente todos criam que a Terra era uma esfera.
Mas durante o século 19 dois livros amplamente distribuídos tiveram sucesso em
convencer o mundo do contrário. Os títulos eram: History of the Conflict
Between Religion and Science [História do Conflito Entre Religião e Ciência] e
A History of the Warfare of Science with Theology in Christendom [Uma
História da Guerra da Ciência com a Teologia na Cristandade]. 63 Ambos os
livros promoviam a superioridade da ciência e acusavam a igreja de propagar o
erro. Mas eram os autores desses livros que estavam propagando o erro, ao
criarem seu achatado e ardiloso argumento sobre o ensino da igreja a respeito da
Terra plana. Por sorte, nos últimos anos, vários textos e obras de referência
começaram a corrigir a falsidade.
3. Em 1860, na Universidade de Oxford, Inglaterra, houve um famoso
embate entre o bispo de Oxford, Samuel Wilberforce, chamado “Sam
Ensaboado”, e Thomas Huxley, apelidado de o fiel “buldogue” de Darwin. Uma
das anedotas dominantes, contada e recontada por gerações de evolucionistas, 64
relata como Thomas Huxley derrotou Wilberforce. Há várias versões do
incidente. Relata-se que, no encontro, Wilberforce falava sobre a ausência de
intermediários fósseis e, de modo importuno e descortês, dirigiu-se a Huxley
perguntando-lhe se era por parte de sua avó ou de seu avô que ele descendia do
macaco. Isso provocou uma enxurrada de aplausos e risos de um auditório então
dominado pelos oponentes de Darwin em Oxford. Huxley imediatamente
comentou com um amigo que o Senhor lhe havia entregado o bispo nas mãos.
Mais tarde, ao responder formalmente à pergunta do bispo, ele indicou que
preferiria descender de um macaco a ser descendente de um homem que usa sua
influência para obscurecer a verdade! Essa ridicularização do respeitado bispo
provocou uma onda de protesto. Relata-se que uma senhora desmaiou enquanto
os poucos defensores de Huxley aplaudiam ruidosamente. 65 Na verdade, na
melhor das hipóteses para Huxley, o encontro resultou em empate. Mas a história
ganhou vida própria como uma tremenda vitória para Huxley. 66 A realidade
parece estar longe da atual versão. Uma revisão crítica do incidente, feita pelo
historiador J. R. Lucas, 67 da Universidade de Oxford, indica que Huxley
provavelmente tenha desvirtuado o resultado do encontro. Além do mais, a
pergunta de Wilberforce acerca da linhagem de um macaco não foi dirigida
especificamente a Huxley, mas foi uma pergunta retórica endereçada a “qualquer
um”. Ao longo dos anos, contudo, a história da vitória de Huxley ganhou
aceitação, à medida que a evolução de Darwin se tornava a ideia dominante, pelo
menos entre os cientistas.
4. Muitos consideram Margaret Mead a mais famosa antropóloga cultural do
século 20. Em 1928, ela publicou o célebre livro Coming of Age in Samoa
[Crescendo em Samoa]. Foi uma bomba que se tornou sucesso imediato; milhões
de exemplares foram publicados, com tradução para dezesseis idiomas. O livro
louvava as vantagens da liberdade em relação a costumes culturais,
exemplificados pelo estilo de vida sexual livre em Samoa, especialmente entre
os jovens que cresciam num ambiente não estorvado por um tipo de organização
familiar que asfixia a vida emocional. Também relatou que, em Samoa, os
valores familiares não constituem prioridade.
Nos Estados Unidos, Margaret Mead se tornou guru para muitos jovens e
seus pais durante a turbulenta década de 1960. Seu famoso livro exerceu ampla
influência, enfatizando a importância da cultura, em contraste com a
hereditariedade, ao determinar o comportamento. Isso fez parte da controvérsia
“natureza versus cultura”, que foi um tema quente naquele período e continua
em fogo lento desde então. O conceito da sociobiologia que discutiremos mais
tarde 68 é sobre o lado da natureza (genes), enquanto Mead e muitos sociólogos
tendem a se colocar ao lado da cultura. Ela e alguns dos seus colegas têm sido
chamados de deterministas absolutos da cultura. Seu livro recebeu o crédito de
ter “praticamente sozinho” 69 desencorajado o florescente movimento eugênico
daquela época, o qual procurava melhorar a humanidade ao restringir a
reprodução de indivíduos e grupos considerados geneticamente inferiores.
Agora, a impressão é de que o livro foi em grande parte uma projeção das
fantasias de Mead, além do fato de ela provavelmente ter sido induzida a
conclusões falsas. Alguns samoanos cultos reagiram com ira diante da
deturpação de sua cultura. Outros nativos indicaram que, se ela algum dia
ousasse retornar a Samoa, seria amarrada e jogada aos tubarões!
A ansiedade por vingança foi parcialmente aplacada. No livro Margaret
Mead and Samoa 70 [Margareth Mead e Samoa], o antropólogo Derek Freeman,
da Austrália, o qual estudou durante anos a cultura de Samoa, relata que muitas
das afirmações de Mead estão “fundamentalmente erradas, e algumas delas são
grotescamente falsas”. 71 Seu livro, publicado pela editora da Universidade
Harvard, mereceu um anúncio na primeira página do New York Times, quando
foi publicado em 1983. Felizmente para Mead, ele foi publicado após a morte
dela. O estudo de Freeman indica que a avaliação de Mead quanto ao
comportamento sexual dos habitantes de Samoa é essencialmente falsa. Os
samoanos têm padrões sociais altamente restritivos, bem mais elevados que os
padrões tradicionais do Ocidente. O matrimônio e a virgindade são altamente
respeitados, e assim acontecia antes mesmo da chegada do cristianismo às Ilhas
de Samoa. 72
As reações ao livro de Freeman foram violentas, algumas delas fazendo
lembrar mais uma campanha política do que uma atividade acadêmica.
Apareceram todos os tipos de posição, pró e contra, expressos em artigos, livros,
resenhas de livros e críticas de resenhas de livros. Alguns difamaram Mead,
outros difamaram Freeman, e ainda outros se perguntaram como informações tão
errôneas trouxeram tanta fama a Margaret Mead. Nossa preocupação, a esta
altura, não é se a natureza, a cultura ou a liberdade de escolha determina o
comportamento, mas o fato de que aparentemente se tenha processado uma
significativa mudança na visão de mundo ou ela pelo menos foi fortemente
influenciada pela inválida informação de Mead.
Pode-se perguntar quantos outros conceitos errados devem andar de
emboscada em nossas bibliotecas, livros didáticos e salas de aula. Os quatro
exemplos dados acima ilustram como aceitamos ideias dominantes, mesmo que
tenham pouca autenticidade factual. Devemos ser tolerantes com vários pontos
de vista, mas não devemos ser simplórios. Não devemos aceitar sem crítica os
modismos intelectuais na ciência ou em outra área. A melhor maneira que
conheço de não ser levado por ideias e paradigmas populares errôneos é ser
independente no pensar e fazer um estudo mais acurado, não confundindo dados
com interpretações, e prestando atenção especial aos melhores dados.

A sociologia da ciência
Durante a Segunda Guerra Mundial, quando o governo dos Estados Unidos
criou o Projeto Manhattan, alguns dos melhores cientistas do mundo se
envolveram na produção da primeira bomba atômica. Esse é um exemplo de um
governo influenciando fortemente a direção da pesquisa científica. Sabe-se há
muito tempo que fatores externos, como a opinião pública e o apoio
financeiro, 73 afetam a investigação científica. Apesar disso, a prática da ciência
tem alegado ser objetiva e racional, e assim tem geralmente sido considerada. 74
Infelizmente, com demasiada frequência, esse não tem sido o caso.
A ciência teve seu apogeu após a Segunda Guerra Mundial, quando o
sucesso da bomba atômica e o lançamento do satélite russo Sputnik, de 1957,
reforçaram grandemente o respeito para com a ciência. Recursos para pesquisas
e projetos científicos jorravam para dentro das universidades num ritmo sem
precedentes, e não era difícil encontrar dinheiro para projetos de pesquisa
científica. Pessoalmente, recebi várias subvenções do governo para pesquisas e
trabalhei com vários projetos científicos financiados pelo governo.
A ciência ingressou em tempos mais difíceis de lá para cá. Seu valor para a
sociedade não mais é entendido como tão necessário, e a confiança em sua
objetividade e integridade está sendo desafiada. Vários sociólogos têm liderado
uma avaliação da ciência. Isso tem feito com que alguns cientistas se perguntem
se os sociólogos não deveriam cuidar da sua própria área. Mas os sociólogos
alegam que a sociologia da ciência é a sua área. Essa é uma questão sensível que
gera sua quota de controvérsia e disputa. Infelizmente, não é difícil melindrar a
autoestima de uma comunidade científica muito bem-sucedida, que parece ter
alguma dificuldade para se lembrar de todos os erros que já promulgou no
passado. Por outro lado, os sociólogos parecem se esquecer de que a ciência por
vezes lida com fatos objetivos simples, e estes não são facilmente sujeitos a
influências sociológicas.
Quando começaram a florescer os estudos sobre a sociologia da ciência, o
sociólogo Bernard Barber publicou um artigo sobre o assunto na revista
Science. 75 Com o título de “Resistance by Scientists to Scientific Discovery”
[Resistência dos Cientistas à Descoberta Científica], ele relacionava fatores
externos que podem afetar as conclusões da ciência. Alguns incluídos são: (1)
interpretações previamente aceitas; (2) conceitos metodológicos, como ser
excessivamente parcial ou excessivamente hostil à matemática; (3) a religião do
cientista tem influenciado a ciência de várias maneiras; (4) situação profissional;
(5) especialização profissional; (6) sociedades, grupos e “escolas de
pensamento”. São abundantes os exemplos dessas várias situações na literatura
sociológica e histórica. 76 Essas ideias nem sempre são bem-recebidas pelos
cientistas, já que desafiam a acalentada imagem da ciência como estando livre de
influências externas.
O caso lamentável do monge agostiniano Gregor Mendel (1822-1884), que
descobriu os princípios básicos da hereditariedade ao cultivar ervilhas, ilustra
bem a influência dos fatores sociológicos na ciência. Mendel publicou suas
épicas descobertas numa revista da sociedade de ciência natural de Brunn. Ao
contrário do que às vezes é relatado, essa revista circulava amplamente pela
Europa; mas, apesar dos dados impressionantes de Mendel, ele foi
completamente ignorado pelas autoridades na sua área. 77 Não foi senão anos
após sua morte que vários biólogos redescobriram e confirmaram suas
descobertas sobre reprodução. Por que foi ele ignorado? Essa é uma pergunta
intrigante para a qual não temos boas respostas, mas há várias sugestões que
refletem influências sociológicas na ciência. O fato de ele ser um monge
desconhecido, isolado, e não membro de uma comunidade científica regular, foi
sem dúvida um fator significativo. Sua abordagem nova, de misturar botânica
com matemática, como o estudo exigia, não foi compreendida nem apreciada
pela maioria dos cientistas. Havia outras ideias concorrentes sobre fatores
hereditários, e era o momento errado para que suas ideias revolucionárias fossem
aceitas. Felizmente, a ciência avançou por cima dessas barreiras e agora Mendel
é uma das pessoas mais importantes na história da ciência.

Como distinguir a boa ciência da má


Uma das lições mais importantes que podemos aprender é que existe boa
ciência e existe má ciência. A descoberta do Archaeoraptor é má ciência, mas a
descoberta do planeta Netuno, com base em dados do movimento irregular de
Urano, ilustra uma ciência muito boa. Na época atual, em que a ciência
desempenha uma função tão relevante em nosso pensamento, é importante
distinguir entre boa e má ciência. Infelizmente, isso não é fácil, especialmente
para um não cientista. Dados incompletos ou falsas premissas podem iludir até
os melhores cientistas. Existem algumas pistas ( Tabela 6.1 ) que podem ajudar
qualquer um de nós a avaliar quão fidedignas podem ser as interpretações
científicas.
1. A ideia se encaixa nos fatos? Gera uma conclusão lógica, especialmente
quando se considera um amplo espectro de dados?
2. A alegação se sujeita a testes, ou, de modo especial, é possível repeti-la
em experiências? A ciência experimental, como os resultados de uma
experiência química, é considerada mais confiável. Por outro lado, temos o que
se chama de ciência histórica, 78 que é mais especulativa, e é considerada menos
confiável. Um exemplo seria o estudo de um fóssil, quando pode haver apenas
parte de um espécime, e procuramos então inferir o que aconteceu durante um
passado que não se pode observar agora. Algumas ideias são mais facilmente
testadas que outras. Nem a evolução nem a criação, consideradas eventos
passados, podem ser facilmente testadas como as observações atuais. Contudo,
isso não significa que não possamos usar observações atuais para inferir o que
pode ter acontecido no passado. A questão importante é quão bem a conclusão se
encaixa nos dados. Alguns associam a possibilidade de submetê-la a um teste
com a capacidade de se refutar a alegação, concluindo que, se não se pode
refutá-la, realmente não é ciência.
3. Pode a ideia ser usada para predizer resultados desconhecidos? Um
exemplo, mencionado antes, 79 é quando o nível de energia da ressonância do
carbono acabou sendo justamente aquele que Sir Fred Hoyle predisse que seria.
A previsibilidade é ciência no melhor sentido.
4. A alegação está envolta em controvérsia? Se os cientistas se desentendem
a respeito dela, isso sugere que ideias alternativas são defensáveis.
5. A base para a conclusão são os dados da natureza, ou o resultado é
conduzido pela teoria? Fique atento ao potencial dos paradigmas dominantes e
elaborações filosóficas. Tenha especial cautela se houver vantagens comerciais
ou financeiras para uma conclusão em particular. A pesquisa financiada pela
indústria do tabaco sugerindo que o hábito de fumar é inofensivo é um exemplo
de erro induzido pelo interesse financeiro dos patrocinadores da pesquisa.
6. São feitas alegações não comprovadas? Nesse caso, também fique atento.
Alegações sem fundamento lançam suspeitas sobre a integridade do pacote todo.
Especialmente comum é a prática de confundir a correlação na abundância de
dois fatores com causa e efeito. Por exemplo, um estudo mostrou que os
fumantes tinham notas mais baixas na universidade que os não fumantes. A
correlação foi levada a sério, e a maneira óbvia para que os fumantes
aumentassem suas notas era parar de fumar. Mas essa conclusão podia estar
muito errada. Podia acontecer que, em vez disso, as notas baixas levassem os
estudantes a fumar, ou que os tipos sociáveis que não estudam muito também
tendam a fumar, produzindo assim a correlação com notas baixas. 80 O simples
fato de que dois fatores pareçam estar quantitativamente correlacionados não
significa que um cause o outro. Existe uma elevada correlação, no mundo todo,
entre casas que têm telefone e aquelas que têm máquinas de lavar, mas todos
sabemos que possuir um equipamento não leva ao outro. Não se deve confiar em
conclusões baseadas em dados correlacionados sem um estudo de causa e efeito,
mas tanto os cientistas quanto a mídia frequentemente passam por alto esse fator
crucial. Muitos componentes de nosso complicado mundo podem dar a
aparência de um relacionamento de causa e efeito que realmente não existe.
Com o fim de aproveitar a ciência ao máximo, é necessário avaliar
laboriosamente o que está sendo dito e separar a boa da má ciência. Afinal,
existe muito das duas.

Síntese
A questão do paradigma na ciência e em outros estudos é indício da forte
influência de ideias aceitas. Isso nos deve deixar em guarda e estimular-nos a
cavar mais fundo, em vez de simplesmente seguir “o clima da opinião”
predominante.
A longa pesquisa sobre como as aves podem ter evoluído não é o tipo de
história que convence alguém de que as interpretações científicas são conduzidas
por dados. As muitas ideias contraditórias que têm sido fervorosamente
perseguidas por mais de um século e meio por vários grupos de cientistas
ilustram bem como as teorias, em lugar dos dados, podem ser a força motivadora
na ciência. Se a ciência é a busca pela verdade acerca da natureza, como alega
ser, por que condescender com tanta especulação, acompanhada por um
tribalismo intelectual, em vez de simplesmente deixar que os fatos falem por si
mesmos? Repetidas vezes, e mais do que muitos gostariam de admitir, os
cientistas – assim como o restante da humanidade – creem naquilo em que
desejam crer, preenchendo com suas pressuposições os dados que faltam. Tenho
certeza de que alguns dos meus colegas cientistas consideram ofensiva essa
afirmação, e eu gostaria que não fosse assim, mas, quanto antes percebermos
isso, melhor será para a ciência.
Com demasiada frequência, a ciência é dirigida mais por teoria do que por
dados. Por causa disso, é particularmente importante que se envide um esforço
especial para tentar separar a boa ciência, que leva à verdade acerca da natureza,
da má ciência, que não o faz. Os cientistas são bastante humanos, e pode ser
difícil encontrar um cientista que, como o restante da humanidade, não tenha
uma agenda a cumprir. Contudo, esses cientistas que dão prioridade aos dados,
em lugar de teorias, terão maior probabilidade de descobrir o que realmente
acontece na natureza.
Tudo isso pode ser muito significativo para a questão de Deus. Nos capítulos
2 a 5, apresentamos muitos exemplos de dados que indicam que é necessário
haver um planejador. A despeito das evidências, os cientistas se esquivam de
uma conclusão assim. Prevalece o paradigma dominante atual, de que a ciência
precisa explicar tudo sem Deus, embora isso envolva conjecturas desenfreadas
para testar e explicar os fatos encontrados. Atitudes pessoais e a sociologia da
comunidade científica determinam, com muita frequência, o que é aceito como
verdade. Outros fatores, além dos dados da natureza, muitas vezes moldam as
conclusões da ciência.

Referências
1
Cudmore LLL. 1977. The center of life. Citado em Fripp J, Fripp M, Fripp D. 2000. Speaking of
science: notable quotes on science, engineering, and the environment. Eagle Rock: LLH Technology
Publishing, p. 37.
2
Oreskes N. 1999. The rejection of continental drift: theory and method in American earth sciences.
Oxford: Oxford University Press.
3
Reading HG. 1987. Fashions and models in sedimentology: a personal perspective. Sedimentology 34, p.
3-9.
4
Kuhn TS. 1996. The structure of scientific revolutions. 3a edição. Chicago: The University of Chicago
Press.
5
Ideias adicionais sobre o argumento encontram-se em: (a) Lakatos I, Feyerabend P. 1999. For and
against method. Motterlini M. editor. Chicago: The University of Chicago Press. (b) Popper K. (1935)
2002. The logic of scientific discovery. Nova York: Routledge. (c) Ruse M. 1999. Mysteries of
mysteries: is evolution a social construction? Cambridge: Harvard University Press. Lakatos considera
a ciência algo objetivo, Feyerabend a vê como anarquia, Popper a vê como racional e Ruse dá muitos
exemplos de influências externas sobre as conclusões da ciência.
6
Kuhn, p. x.
7
Kuhn, p. 151. Ver também Cohen IB. 1985. Revolution in science. Cambridge: Harvard University
Press. Este livro também se refere às experiências de conversão na ciência, sem a implicação de
significado religioso do termo “religião”, como é normalmente entendido.
8
Ver o capítulo 3.
9
Ver o capítulo 5.
10
(a) Chambers P. 2002. Bones of contention: the Archaeopteryx scandals. Londres: John Murray, p. 103;
(b) Desmond AJ. 1979. Designing the dinosaur: Richard Owen’s response to Robert Edmond Grant.
ISIS 70, p. 224-234.
11
Darwin C. 1860. Letter to Asa Gray, June 8. In: Darwin, F, editor. 1903. More letters of Charles
Darwin: a record of his work in a series of hitherto unpublished letters, v. 1. Nova York: Appleton, p.
153.
12
Rupke NA. 1994. Richard Owen: Victorian naturalist. New Haven: Yale University Press, p. 211.
13
Ver o capítulo 5.
14
Boas referências gerais sobre a parte desta seção que fala do Archaeopteryx incluem: (a) Chambers
[veja a nota 10]. (b) Wells J. 2000. Icons of evolution; science or myth? Washington, DC: Regnery
Publishing, p. 111-135. Informações mais técnicas incluem: (c) Benton MJ. 2000. Vertebrate
paleontology. 2a edição. Oxford: Blackwell Science, p. 260-276. (d) Cowen R. 2000. History of Life. 3a
edição. Oxford: Blackwell Science, p. 228-237. (e) Ostrom JH. 1976. Archaeopteryx and the origin of
birds. Biological Journal of the Linnean Society 8, p. 91-182. Presto meu reconhecimento especial à
abrangente referência de Chamber em relação a vários pormenores desta seção.
15
Wagner JA. 1862. Relatado em Burkhardt F, et al., editores. 1999. The correspondence of Charles
Darwin, v. 11. 1863. Cambridge: Cambridge University Press, p. 7.
16
Falconer H. 1863. Letter to Charles Darwin, 3 January. In: Burkhardt, p. 4, 5.
17
Ostrom [veja a nota 14].
18
(a) Benton, p. 263-265. (b) Walker AD. 1972. New light on the origin of birds and crocodiles. Nature
237, p. 257-263.
19
Diz-se que a análise cladística dos caracteres favorece uma origem terópode (dinossauro) das aves (ver
Benton, p. 265), mas isso não se encaixa na sequência encontrada nos estratos fósseis (Wells, p. 119-
122).
20
Chambers, p. 192, 193.
21
De uma entrevista com Paul Chambers relatada em Chambers, p. 187.
22
Por exemplo: (a) Feduccia A. 1999. 1, 2, 3 = 2, 3, 4: accommodating the cladogram. Proceedings of the
National Academy of Sciences (USA) 96, p. 4740-4742. (b) Wagner GP, Gauthier JA. 1999. 1, 2, 3 = 2,
3, 4: a solution to the problem of the homology of the digits in the avian hand. Proceedings of the
National Academy of Sciences (USA) 96, p. 5111-5116.
23
Dalton R. 2000. Feathers fly in Beijing. Nature 405, p. 992.
24
Benton, p. 267.
25
Carroll RL. 1997. Patterns and processes of vertebrate evolution. Cambridge: Cambridge University
Press, p. 9.
26
Charig AJ, et al. 1986. Archaeopteryx is not a forgery. Science 232, p. 622-626.
27
Clausen VE. 1986. Debate recente sobre Archaeopteryx. Origins 13, p. 48-55.
28
Chen P, Dong Z, Zhen S. 1998. An exceptionally well-preserved theropod dinosaur from the Yixian
Formation of China. Nature 391, p. 147-152.
29
Qiang J, et al. 1998. Two feathered dinosaurs from northeastern China. Nature 393, p. 753-761.
30
Chambers, p. 230.
31
Qiang [veja a nota 29].
32
Chambers, p. 227-229.
33
Xu X, Zhou Z, Prum RO 2001. Branched integumental structures in Sinornithosaurus and the origin of
feathers. Nature 410, p. 200-204.
34
Conforme relato de Wang L. 2001. Dinosaur fossil yields feathery structures. Science News 159, p.
149.
35
Martin LD, Zhou Z. 1998. Confuciusornis sanctus compared to Archaeopteryx lithographica.
Naturwissenschaften 85, p. 286-289.
36
Xu X, et al. 2003. Four-winged dinosaurs from China. Nature 421, p. 335-340.
37
Por exemplo: (a) Martin LD [veja a nota 35]. (b) Prum RO, Brush AH. 2003. Which came first, the
feather or the bird? Scientific American 288 (3), p. 84-93.
38
O conceito de evolução paralela ou convergente, que sugere que processos evolutivos separados
independentes produziram a mesma estrutura, permitiria a evolução independente de penas tanto nos
dinossauros quanto nos ancestrais evolutivos do Archaeopteryx. Alguns fazem objeção, indicando que
as penas são estruturas tão altamente especializadas que seria improvável que sua evolução ocorresse
mais de uma vez. Tanto os ornitólogos do BAND quanto os paleontologistas usam livremente a
evolução convergente em suas interpretações.
39
Para uma revisão da perspectiva dos paleontologistas, ver Norell MA, Xu X. 2005. Feathered dinosaurs.
Annual Reviews of Earth and Planetary Sciences 33, p. 277-299.
40
Como exemplo ver Ruben JA, et al. 1999. Pulmonary function and metabolic physiology of theropod
dinosaurs. Science 283, p. 514-516.
41
Um relatório recente de Mark Norell, do Museu Americano de História Natural, não traz nenhuma
evidência convincente de que tenham sido encontradas penas genuínas em dinossauros. Ver Norell M.
2005. The dragons of Liaoning: a trove of feathered dinosaurs and other astounding fossils finds in
northern China shakes the roots of paleontology. Discover 26, p. 58-63. Estruturas estranhas têm sido
noticiadas como sendo penas em dinossauros, e é possível que penas reais sejam descobertas; contudo,
é preciso avaliar muito bem tais descobertas.
42
Brush AH. 1996. On the origin of feathers. Journal of Evolutionary Biology 9, p. 131-142.
43
Cowen, p. 205.
44
Thoresen AC. 1971. Designed for flight. In: Utt RH, editor. Creation: nature’s design and Designer.
Mountain View: Pacific Press Publishing Association, p. 8-23.
45
Conforme citação em Chambers, p. 245.
46
Sloan CP. 1999. Feathers for T. rex? New birdlike fossils are missing links in dinosaur evolution.
National Geographic 196 (5), p. 98-107.
47
Esta carta, junto com a correspondência relacionada, está disponível em muitas páginas da internet,
como Answers in Genesis, http://www.answersingenesis.org/ (acesso em abril de 2005).
48
Ver um exemplo recente em Quammen D. 2004. Was Darwin wrong? No. The evidence for evolution is
overwhelming. National Geographic 206 (5), p. 2-35.
49
Rowe T, et al. 2001. The Archaeoraptor forgery. Nature 410, p. 539-540.
50
Simons LM. 2000. Archaeoraptor fossil trail. National Geographic 198(4):128-132.
51
Relato em: Simons LM. 2000. Archaeoraptor fossil trail. National Geographic 198 (4), p. 128-132.
52
Zhou Z, Clarke J, Zhang F. 2002. Archaeoraptor’s better half. Nature 420, p. 285.
53
Chambers, p. 248.
54
Thomson KS. 2002. Dinosaurs, the media and Andy Warhol. American Scientist 90, p. 222-224.
55
(a) Czerkas SJ, editor. 2002. Feathered dinosaurs and the origin of flight. Blanding: The Dinosaur
Museum. (b) Sloan, C. 2000. Feathered dinosaurs. Washington, DC: National Geographic Society.
56
Wells [veja a nota 14].
57
Planck M. 1949. Scientific autobiography and other papers. Gaynor F, tradutor. Westport: Greenwood,
p. 33-34.
58
Branscomb LM. 1985. Integrity in science. American Scientist 73, p. 421-423.
59
(a) Larson EJ. 1997. Summer for the gods: the Scopes trial and America’s continuing debate over
science and religion. Cambridge: Harvard University Press, p. 206-208. (b) Larson EJ. 2004. Evolution:
the remarkable history of a scientific theory. Nova York: The Modern Library, p. 217.
60
Comentários adicionais, ver Ruse M. 2005. The evolution creation struggle. Cambridge: Harvard
University Press, p. 164-167.
61
(a) Gould SJ. 1994. The persistently flat earth. Natural History 103 (3), p. 12, 14-19. (b) Russell JB.
1991. Inventing the flat earth: Columbus and the modern historians. Nova York: Praeger.
62
Russell [veja a nota 6].
63
(a) Draper JW. 1875. History of the conflict between religion and science. 5a edição. Nova York:
Appleton and Company. (b) White AD. 1896, 1960. A history of the warfare of science with theology in
Christendom. 2 volumes. Nova York: Dover. Provavelmente tanto Draper quanto White tenham
aplicado a sugestão de William Whewell, que em 1837 publicou o livro History of the Inductive
Sciences.
64
Ruse M. 2001. The evolution wars: a guide to the debates. New Brunswick: Rutgers University Press,
p. 60.
65
Ver relatos desse incidente em: (a) Chambers, p. 14-22. (b) Hellman H. 1998. Great feuds in science:
ten of the liveliest disputes ever. Nova York: Wiley, p. 81-103.
66
Por exemplo: (a) Dampier WC. 1949. A history of science: and its relations with philosophy & religion.
4a edição. Cambridge: Cambrige University Press, p. 279. (b) Ruse, The evolution wars, p. 59, 60. (c)
Witham LA. 2002. Where Darwin meets the Bible: creationists and evolutionists in America. Oxford:
Oxford University Press, p. 212-214.
67
Lucas JR. 1979. Wilberforce and Huxley: a legendary encounter. The Historical Journal 22 (2), p. 313-
330.
68
Ver o capítulo 7.
69
Hellman, p. 178.
70
Freeman D. 1983. Margaret Mead and Samoa: the making and unmaking of an anthropological myth.
Cambridge: Harvard University Press.
71
Ibid., p. 288.
72
Hellman, p. 177-192.
73
Merton RK. 1970. Science, technology & society in seventeenth-century England. Nova York:
Howard Fertig.
74
Segerstråle U. 2000. Science and science studies: enemies or allies? In: Segerstråle U, editor: Beyond
the science wars: the missing discourse about science and society. Albany: State University of New
York Press, p. 1-40.
75
Barber B. 1961. Resistance by scientists to scientific discovery. Science 134, p. 596-602.
76
Como introdução, ver o artigo seminal de Shapin S. 1982. History of science and its sociological
reconstructions. History of Science 20 (3), p. 157-211. Mais exemplos se encontram em Collins H,
Pinch T. 1998. The golem: what you should know about science. 2a edição. Cambridge: Cambridge
University Press. E em Collins H, Pinch T. 1998. The golem at large: what you should know about
technology. Cambridge: Cambridge University Press.
77
Barber [veja a nota 75].
78
Documentação adicional no capítulo 8.
79
Ver o capítulo 2.
80
Huff D. 1954. How to lie with statistics. Nova York: Norton, p. 87-89.
Num pólo, os intelectuais da literatura;
no outro, os cientistas. [...] Entre os dois,
um golfo de mútua incompreensão. 1
Sir Charles Snow, escritor e cientista

Áreas que a ciência evita hoje


Dois séculos atrás, o célebre matemático e cosmólogo francês Pierre-Simon
de Laplace escreveu um famoso livro acerca da mecânica celeste. Nesse livro,
descreveu o seu modelo da origem do sistema solar, em que os planetas se
formaram pela condensação de vapor. Laplace, que se tornou um destacado
erudito, decidiu fazer uma apresentação do seu livro ao imperador Napoleão. O
imperador havia sido informado com antecedência de que não havia menção do
nome de Deus no livro. Enquanto Laplace apresentava o livro, o imperador lhe
perguntou por que ele havia escrito um livro acerca do Universo em que sequer
mencionava seu Criador. Laplace respondeu secamente que ele “não tinha
necessidade dessa hipótese em particular”. 2 Não tinha necessidade de Deus!
Embora haja variações nos detalhes do encontro, o incidente ilustra bem as
atitudes independentes e exclusivistas que desabrochavam naquela época.
Recentemente, a mesma tendência foi refletida pelo físico teórico Stephen
Hawking, quando propôs um Universo inteiramente autocontido, que “não
necessitaria de nada exterior para dar corda no relógio e pô-lo a funcionar.
Antes, tudo no Universo seria determinado pelas leis da ciência e pelo lançar de
dados. Isso pode parecer presunçoso, mas é aquilo em que eu e muitos outros
cientistas cremos”. 3 Na França, o famoso zoólogo marinho Félix Lacaze-
Duthiers escreveu sobre a porta do seu laboratório: “A ciência não tem religião
nem política.” 4 Phillip Frank, físico de Harvard, comenta que na ciência “toda
influência de natureza moral, religiosa ou política sobre a aceitação da teoria é
considerada ‘ilegítima’ pela [...] ‘comunidade de cientistas’.” 5 E Christian de
Duve, laureado com o Nobel, discutindo o problema da origem espontânea da
vida, indica que “deve ser evitado qualquer indício de teleologia [propósito]”. 6
Recentemente, a Academia Nacional de Ciências e a Associação Americana
para o Progresso da Ciência fizeram forte objeção às tendências que estimulam a
discussão de alternativas à evolução nas aulas de ciência dos cursos secundários.
Até mesmo a ideia de que possa haver algum tipo de desígnio inteligente na
natureza é considerada objetável. 7 Nem todos os cientistas concordariam, mas a
presente disposição mental e o espírito geral, especialmente da parte de líderes
da comunidade científica, é que a ciência deve seguir sozinha e excluir tudo o
mais. Deve-se evitar especialmente o espectro da influência religiosa.
O exclusivismo na ciência é estimulado por um grau de elitismo, e essas
duas características podem trabalhar muito bem juntas, incentivando uma à
outra. Entre um grande número de cientistas, existe o pensamento de que a
ciência é superior a todos os outros métodos de investigação. O notável sucesso
da ciência em várias arenas tem, sem dúvida, contribuído para esse pensamento,
e certo grau de orgulho é justificável. A ciência é boa especialmente ao procurar
responder às perguntas do tipo como (entre elas, como a gravidade afeta o
movimento dos planetas), mas não se sai bem com o tipo que pergunta por que
(por exemplo, por que existe um Universo). Existem perguntas legítimas além da
ciência. “Se você pedir à ciência que faça uma bomba atômica, ela lhe dirá
como. Se você perguntar à ciência se deve realmente fazer uma, ela permanecerá
em silêncio.” 8 Qualquer pessoa que esteja em busca da verdade e da
compreensão tem o direito de perguntar por quê.
O biólogo Richard Lewontin, da Universidade Harvard, também reflete um
pouco do exclusivismo da ciência num perceptivo comentário, cuja franqueza é
digna de respeito. “Nossa disposição para aceitar alegações científicas contrárias
ao senso comum é a chave para uma compreensão da verdadeira batalha entre a
ciência e o sobrenatural. Ficamos ao lado da ciência a despeito do evidente
absurdo de algumas de suas interpretações, a despeito de seu fracasso em
cumprir muitas de suas extravagantes promessas de saúde e vida, a despeito da
tolerância da comunidade científica para com meras histórias sem comprovação,
porque temos um compromisso prévio, um compromisso com o materialismo.
Não é o caso de que os métodos e instituições da ciência nos obriguem de
alguma forma a aceitar a explicação material do mundo dos fenômenos, mas, ao
contrário, de que somos forçados, por nossa adesão a priori às causas materiais,
a criar um aparato de investigação e um conjunto de conceitos que produzem
explicações materiais, não importando o quanto sejam contrárias à intuição,
quanto mistificadoras sejam para o não iniciado. Ademais, esse materialismo é
absoluto, pois não podemos permitir um Pé Divino à porta.” 9 No que diz
respeito a Deus, a ciência pendurou a placa de “ENTRADA PROIBIDA”.
A evolução é um dos grandes jogadores no campo exclusivo da ciência; ela
providencia a exclusão de Deus e de todas as explicações não mecanicistas das
origens. A comunidade científica geralmente defende a evolução com fervor; e,
embora a ciência agora se sinta muito livre para excluir Deus, os cientistas
parecem chocados quando alguém tenta excluir sua teoria evolucionária. Quando
a Comissão Estadual de Educação do Kansas decidiu remover a evolução e a
cosmologia do currículo de ciências, um editorial da revista Science, que é a
principal publicação científica nos Estados Unidos, caracterizou essa exclusão
como “atrocidade” e “insanidade”. 10
Theodosius Dobzhansky, o conhecido geneticista da Universidade de
Colúmbia, um dos principais arquitetos da moderna síntese evolutiva ( Tabela
4.1 ), declarou: “Nada na biologia faz sentido, exceto à luz da evolução.” 11
Pronunciamentos tão radicais podem dar a entender que todos os atuais estudos
de biologia que não incluam a evolução – tais como determinar a rapidez com
que um impulso nervoso transita ao longo de um nervo – evidentemente não
fazem sentido! Além disso, a meticulosa obra de Antony van Leeuwenhoek, ao
descrever micróbios, e de William Harvey, ao descobrir a circulação do sangue,
no século 17, antes da aceitação da evolução, ao que parece tampouco fazem
sentido. O geneticista Francisco Ayala, que recentemente presidiu a Associação
Americana Para o Progresso da Ciência, expressou a mesma tendência
excludente ao comentar que “a teoria da evolução precisa ser ensinada nas
escolas porque nada, na biologia, faz sentido sem ela”. 12
O exclusivismo se reflete no título do livro The Triumph of Evolution and
the Failure of Creationism 13 [O Triunfo da Evolução e o Fracasso do
Criacionismo], especialmente porque a segunda metade do título foi escrita de
trás para a frente, com o fim de enfatizar a desesperada situação do criacionismo.
Embora uma atitude tão triunfante não seja incomum no comportamento
humano, não é proveitosa para uma cultura séria. O autor do livro é Niles
Eldredge, do Museu Americano de História Natural, que é famoso por ser um
dos arquitetos do conceito de equilíbrio, salpicado de evolucionismo. O famoso
cosmólogo Carl Sagan, já falecido, também defendeu a eminência da ciência
sobre tudo mais em seu livro intitulado The Demon-Haunted World: Science as a
Candle in the Dark 14 [O Mundo Assombrado pelos Demônios: A Ciência Vista
Como uma Vela no Escuro]. A humildade às vezes é escassa na comunidade
científica.
Os exemplos dados acima ilustram uma atitude científica elitista e
exclusivista que tende a isolar a ciência de todas as outras áreas de inquirição.
Alguns cientistas se sentem tão confiantes que virtualmente não veem limite ao
que a ciência por fim seja capaz de fazer. 15 Ao postular uma visão mecanicista
da realidade e um conhecimento quase infinito, podemos atingir o assim
chamado “ponto ômega”, no qual a vida é eterna e a ressurreição da vida passada
uma realidade. A ciência nos proverá a imortalidade. 16 A confiança na
superioridade da ciência é tão grande que, às vezes, a ciência invade áreas que
ela é incapaz de estudar, e depois tenta oferecer respostas científicas para
perguntas às quais não pode responder. A sociobiologia é um exemplo.

A batalha da sociobiologia
A sociobiologia busca investigar a evolução do comportamento social. Tenta
responder a perguntas acerca de como os organismos se comportam da maneira
como o fazem, sob a perspectiva evolucionista, e penetra nas espinhosas
questões das causas do comportamento humano. A sociobiologia não deve ser
confundida com a sociologia da ciência, embora haja alguma sobreposição. A
primeira lida mais com as causas biológicas do comportamento de todos os tipos
de organismo, enquanto a última lida com o comportamento da comunidade
científica.
Um dos problemas que a sociobiologia aborda é: se, como Darwin propõe, o
avanço evolutivo ocorre porque o mais forte sobrevive ao menos apto, como
explicar a evolução do comportamento altruísta, quando organismos se dispõem
a sacrificar a vida pelo bem de outros? Isso é suicídio, e não contribui para a
sobrevivência do organismo. Por que esses traços evoluiriam, quando o
organismo não tem chance de passá-los para a geração seguinte? Um exemplo
comum é o da abelha que ferroa alguém para proteger outras na colônia. Sendo
que a abelha deixa partes vitais de seu corpo cravadas na pessoa, ela morre logo
depois. Isso é suicídio, e não sobrevivência. Os evolucionistas têm várias
explicações, incluindo a suposição de que a colônia inteira evolui como um tipo
de organismo único. Há particularidades genéticas nesses tipos de organismo que
favorecem essa ideia. Assim, é a colônia de abelhas que sobrevive, e não a
abelha individual.
Mais problemáticos são muitos exemplos de um comportamento de
autossacrifício entre aves e mamíferos. Os suricatos são um tipo altamente
sociável de mangustos ( Figura 7.1 ) que lutam pela vida no deserto de Kalahari,
sul da África. Vivem em grupos de três a trinta indivíduos, em túneis
subterrâneos. Estão entre os mais colaboradores animais conhecidos. Um
membro do grupo cuida de um filhotinho e o protege, enquanto a mãe biológica
sai por longos períodos para procurar alimento. Outros se colocam como
sentinelas em pontos de observação expostos, onde ficam muito visíveis aos
predadores. Seu plantão como guardas permite que outros membros do grupo
cuidem da tarefa de trazer alimento com segurança. Se uma sentinela percebe
um predador, como uma águia, ou avista uma cobra, o suricato dá o alarme,
colocando-se ainda mais em perigo ao chamar a atenção para o local em que se
encontra, mas ao mesmo tempo avisando os outros para que fujam com
segurança. Nesse tipo de comportamento, as sentinelas arriscam a vida pelo bem
dos outros. Por que deveria um comportamento tão altruísta evoluir,
considerando o fato de que os altruístas teriam menor probabilidade de
sobreviver? E, quando se trata de seres humanos, por que uma mãe correria para
dentro de uma casa em chamas, arriscando a vida, para tentar salvar o filho? 17
Esse tipo de comportamento envolvendo sacrifício próprio não é o que se espera
de um processo evolutivo, no qual a meta é a sobrevivência e não um altruísmo
que se sacrifica. Muitos veem o comportamento abnegado como um sério
desafio à teoria da evolução.
Alguns evolucionistas têm proposto o que consideram ser a resposta para
esse quebra-cabeça. É a chamada seleção de parentesco. Na seleção de
parentesco, o importante não é a preservação do organismo individual, mas a de
um tipo particular de genes. Ao preservar um parente próximo, a pessoa está
preservando seu próprio tipo particular de genes, já que os que são próximos em
parentesco têm o mesmo tipo de genes. Os irmãos têm os mesmos pais, e os
primos têm os mesmos avós; então, ao salvar parentes próximos, aumenta a
chance de se salvar para a posteridade o tipo especial de genes que se possui. Em
outras palavras, caso um animal dê a vida para preservar a vida de seu parente
próximo, isso pode ajudar a preservar seu próprio tipo de genes, embora o
próprio animal morra. A matemática do mecanismo da hereditariedade é tal que
se pode sugerir que, se você dá a vida para salvar três dos seus irmãos ou nove
dos seus primos, as chances são de que você esteja favorecendo a sobrevivência
de seu próprio tipo de genes. Quanto mais próximo for seu parentesco com
aqueles a quem salva, menos indivíduos terá de salvar a fim de preservar seu
tipo de genes. A seleção da consanguinidade é considerada uma explicação da
evolução para o comportamento altruísta. A profunda implicação de tudo isso é
que um ato altruísta não é isso de jeito nenhum; é um ato egoísta para ter a
certeza de que o seu tipo de genes se propague pelos parentes que sobrevivem. O
conceito de Darwin da sobreviência egoísta do mais apto se torna a explicação
para o comportamento altruísta.
A dramática descoberta da teoria da seleção da consanguinidade chamou a
atenção de um famoso entomologista da Universidade Harvard, Edward O.
Wilson. Ele ampliou o conceito e, em 1975, apresentou-o junto com ideias
relacionadas num livro que evocou uma das mais tempestuosas reações a um
livro já testemunhadas. Com o título de Sociobiology [Sociobiologia], 18 o
volume de tamanho exagerado discute o comportamento social de uma variedade
de animais. Porém, há pouca dúvida de que ali havia um manifesto com o
objetivo de dar razões evolucionárias ao comportamento social do homem. O
primeiro capítulo, intitulado “A Moralidade do Gene”, implica que nossas
emoções como amor, ódio, temor e culpa existem por seleção natural; e o último
capítulo, intitulado “Homem: Da Sociobiologia à Sociologia”, passou claramente
para o cenário do comportamento humano. A ênfase era: os genes controlam
tudo.
No ano seguinte, Richard Dawkins promoveu algumas das mesmas ideias no
seu famoso livro The Selfish Gene 19 [O Gene Egoísta]. Se um organismo parece
comportar-se altruisticamente, podemos ter certeza de que seu motivo é
fundamentalmente egoísta. Os organismos estão amplamente sob o controle de
seus genes e o princípio da sobrevivência do mais apto promove sua própria
sobrevivência egoísta em detrimento de outros genes diferentes. 20 Em 1978,
Wilson retornou com o livro On Human Nature [Sobre a Natureza Humana],
uma expansão do especialmente controverso último capítulo de Sociobiologia.
Aqui, os atos altruístas atribuídos até a nações não são resultantes de nenhum ato
de bondade, mas se devem à sobrevivência darwiniana do mais apto. Além
disso, ele se aventura dentro da área sensível da religião: “As mais sublimes
formas da prática religiosa, quando examinadas de perto, podem ser vistas como
conferindo vantagem biológica.” 21 Religião não é algo que escolhemos por seu
valor ou verdade; somos religiosos por causa da vantagem que ela proporciona
quanto à sobrevivência evolutiva.
Tudo isso era mais do que se podia suportar! 22 Desde o momento da
publicação da Sociobiologia de Wilson, reações contundentes explodiram.
Irrompeu uma guerra aberta de palavras, personalidades, livros e raro humor.
Surpreendentes fontes declararam guerra, incluindo formidáveis âmbitos
intelectuais. A batalha não era apenas sobre a natureza da humanidade; muitas
outras controvérsias surpreendentes apareceram no horizonte. Os críticos
declararam a sociobiologia como falsa, maligna, fascista e não científica. Uma
das grandes questões foi o temor de que a sociobiologia restabelecesse o
darwinismo social, em que os seres humanos superiores deveriam ser tratados de
modo a sobreviver aos inferiores (eugenia). Em contraste com a atitude que
prevalece agora, de que todos os homens devem ser tratados igualmente, a
sociobiologia estimularia um retorno à crença na superioridade de classe, com
base em genes superiores. Isso entra na controvérsia da natureza versus cultura, a
respeito daquilo que determina quem somos, se a natureza (genes) ou a cultura
(ambiente). 23 A distinção de classes era aceitável na Inglaterra vitoriana de
Darwin e atingiu horripilantes níveis desumanos durante a Segunda Guerra
Mundial, quando os nazistas usaram câmaras de gás para eliminar milhões de
seres humanos rotulados como inferiores. Meio século mais tarde, esse
Holocausto ainda está recente demais na mente das pessoas para favorecer
qualquer aceitação de superioridade genética.
Nas redondezas da Universidade Harvard, ativistas, muitos dos quais faziam
parte do seu corpo docente, distribuíam folhetos, realizavam reuniões e
publicavam artigos contra a sociobiologia. Wilson, que até certo ponto foi
malcompreendido, foi identificado como um mestre da ideologia racista. A
controvérsia se espalhou pela imprensa em geral, aparecendo até na capa de
Time. A Associação Americana Para o Progresso da Ciência realizou um
simpósio em Washington, DC, para discutir a sociobiologia. Quando Wilson se
levantou para apresentar sua palestra, uns dez ativistas se ergueram e tomaram o
microfone, acusando-o de racismo e genocídio. Um deles despejou um jarro de
água gelada sobre a cabeça dele, exclamando: “Wilson, você está todo
molhado!” 24 A apresentação continuou em conformidade com o programa, mas
não foi tão emocionante quanto sua incômoda introdução.
Os principais luminares no debate da sociobiologia incluíam Stephen J.
Gould, escritor muito apreciado e, até sua morte recente, o mais bem conhecido
fomentador da evolução nos Estados Unidos. Ele se opunha fortemente à
sociobiologia. Esse é também o caso de Richard Lewontin, popular geneticista, a
quem nos referimos antes. Esses dois oponentes trabalharam no mesmo prédio
de Harvard em que Wilson trabalhou, e ambos têm afinidades com o judaísmo e
o marxismo, que tenderiam para um tratamento igualitário dos seres humanos.
Alguns eruditos sugerem que essas afinidades podem ter afetado sua rejeição da
sociobiologia. Juntamente com muitos outros, eles fazem sérias objeções àquilo
que consideram as respostas simplistas que a sociobiologia tenta apresentar para
um comportamento humano complicado. Por outro lado, John Maynard Smith,
da Universidade de Sussex, na Inglaterra, especialista em biologia teórica,
juntamente com Richard Dawkins, de Oxford, tem prestado significativo apoio à
sociobiologia.
As atitudes para com a religião entre esses luminares variam grandemente.
Dawkins opõe-se a ela ativamente; Gould 25 e Maynard Smith tendem a separar
a religião da ciência; enquanto Wilson, por vezes, alega ser deísta. Deísta é
alguém que acredita em algum tipo de Deus que permite que o Universo ande
por conta própria. Esses especialistas não hesitam em criticar muitas coisas,
inclusive um ao outro. Maynard Smith, que apoia fortemente o darwinismo e não
concorda com o desvio de Gould da ideia tradicional da evolução, comenta: “Os
biólogos evolucionistas com quem tenho discutido a obra dele [de Gould]
tendem a vê-lo como um homem cujas ideias são tão confusas que mal vale a
pena incomodar-se com elas, e como alguém que não se deve criticar
publicamente porque, pelo menos, está do nosso lado contra os criacionistas.” 26
Gould reflete alguns dos mesmos sentimentos ruins ao referir-se a Maynard
Smith e Dawkins como “fundamentalistas darwinianos”. 27 A despeito da
argumentação científica interna, os evolucionistas tendem a se unir quando
enfrentam o espectro da criação, que eles sentem a necessidade de evitar.
Na cáustica batalha da sociobiologia, Wilson se sentiu traído pelos colegas e
perguntou por que Lewontin, que tinha escritório no mesmo prédio, não fora
discutir suas preocupações em particular, em vez de criticá-lo pela imprensa. 28
Deve-se admirar Wilson por ter sugerido um comportamento semelhante ao do
princípio bíblico de procurar primeiro o irmão ofensor, antes de fazer qualquer
outra coisa. 29 Sua sugestão bíblica, porém, dá margem a que se pergunte sobre
sua lealdade ao princípio evolutivo da competição e da sobrevivência do mais
apto, e de sua disposição de enfrentar as consequências do severo sistema
darwiniano que ele abraça.
Uma das críticas à sociobiologia introduzidas por Lewontin foi que as
mudanças na frequência dos genes em grupos humanos demonstram-se
extremamente lentas, enquanto as mudanças sociológicas através da história
podem ser muito rápidas; então, as mudanças genéticas não poderiam ser
responsáveis pela sociologia humana. Charles Lumsden e Wilson trataram desse
problema e de outros no livro intitulado Genes, Mind, and Culture [Genes,
Mente e Cultura]. 30 A solução matemática proposta no livro não recebeu
aprovação. Nem mesmo Maynard Smith (que apoia a sociobiologia), após
exaustivo estudo, conseguiu apoiar os modelos apresentados. 31
Um grande problema com a sociobiologia é sua alegação de responder a
uma ampla variedade de questões com base em dados muito limitados. Lewontin
expressou sua preocupação numa entrevista. “Se vou me sentar e escrever uma
teoria sobre como toda a cultura humana é explicada pela biologia, tenho um
bocado de fundamento epistemológico para aprender, ou melhor, uma
quantidade fantástica. [...] Esse pessoal simplesmente se precipitou num tipo
ingênuo e vulgar de explicação biológica do mundo, e a consequência é um
fracasso. É um fracasso como sistema de explanação porque eles não fizeram a
lição de casa.” “É algo barato!” 32 O filósofo Michael Ruse, da Universidade
Estadual da Flórida, expressa uma preocupação semelhante acerca do trabalho
dos arquitetos da sociobiologia: “Eles se precipitaram à frente das evidências e
depois se congratularam por um trabalho empírico benfeito. E estavam decididos
a não permitir que uma pequena contraevidência servisse de obstáculo. Para ser
franco, eles estavam decididos a não permitir nem que uma quantidade maciça
de contraevidências fosse obstáculo.” 33 Ruse mostra que os críticos têm sido
incomumente ríspidos.
O filósofo da ciência Philip Kitcher, da Universidade de Colúmbia, revela
preocupações adicionais acerca da sociobiologia quando comenta que “as
ambiciosas alegações que têm atraído tanta atenção do público repousam sobre
uma análise falsa e um argumento inconsistente” e “os sociobiólogos parecem
adotar uma especulação desvairada justamente onde deveriam ser mais
cautelosos”. Além disso, ele compara especificamente a sociobiologia de Wilson
com uma escada que “se desconjunta em cada degrau”. 34 Três décadas mais
tarde, em um movimento que deixou perplexos os sociobiólogos ao redor do
mundo, Wilson, embora fosse considerado o “pai da sociobiologia”, repudiou a
seleção da consanguinidade como uma explicação para o altruísmo, pelo menos
no caso de insetos sociais como as abelhas. 35 Agora ele favorece um modelo de
flexibilidade genética preliminar e um único salto para o altruísmo.
O debate da sociobiologia ilustra o que acontece quando uma atitude
científica exclusivista, e às vezes elitista, reforça as tentativas de aplicar a
ciência a tudo, entrando livremente em áreas onde a ciência não tem apresentado
evidências significativas nem respostas válidas. Ali a ciência pode ser um
tremendo fracasso.
Apesar de seu apoio científico muito frágil, a sociobiologia não está
completamente morta. Livros como The Triumph of Sociobiology 36 [O Triunfo
da Sociobiologia] procuram resgatar o conceito, mas o livro tem sido
caracterizado como “uma análise decepcionantemente superficial”, “usando a
desgastada tática de caracterizar os críticos com os termos mais exagerados”. 37
A sociobiologia tem passado por alguns melhoramentos ao longo dos anos, ao
serem consideradas algumas críticas, e ainda é popular entre alguns biólogos,
mas carece muito de autenticação na maioria de suas alegações, e algumas
parecem estar definitivamente erradas. Como exemplo, considere um dos
fascinantes ícones da sociobiologia, os suricatos, que mencionamos antes. Pois
bem, mesmo como modelos de comportamento cooperativo, eles suscitam uma
questão acerca da seleção por parentesco. Vivem em grupos que geralmente
incluem “imigrantes” geneticamente não consanguíneos, que são visitantes
dentro da família normal dominante do grupo. Esses suricatos não parentes
participam ativamente como sentinelas do grupo e como babás para os filhotes.
Por não serem consanguíneos, seu comportamento altruísta não pode resultar do
princípio sociobiológico da seleção por parentesco. 38 Esses dados desafiam a
explicação evolucionista do altruísmo nesses tipos de organismos como forma de
proteger os próprios genes.
As batalhas amainaram, e um novo conceito semelhante, chamado
psicologia evolutiva, substituiu a sociobiologia tradicional no que se refere ao
estudo da humanidade. Trata-se, essencialmente, de vinho velho em odres novos.
A psicologia evolutiva ainda enfatiza muito os genes como responsáveis por
quase tudo, incluindo religião, 39 mas o interesse volta-se mais para o que leva a
mente a funcionar da maneira como funciona. Um número significativo de novos
livros promove a ideia. 40 Entre eles está o de Robert Wright, The Moral Animal
[O Animal Moral], cuja menção na lista dos best-sellers do jornal The New York
Times por dois anos diz algo acerca da popularidade da psicologia evolutiva.
Wright fala de nós, humanos, como “uma espécie com consciência, simpatia e
até amor, tudo fundamentado basicamente no interesse genético próprio”. 41
Ideias contrárias, enfatizando as limitações, aparecem em livros como Alas,
Poor Darwin: Arguments Against Evolutionary Psychology 42 [Ah, Pobre
Darwin: Argumentos Contra a Psicologia Evolutiva], editado pela socióloga da
ciência Hilary Rose e pelo neurobiólogo Steven Rose. Esse livro inclui um
capítulo escrito por Stephen J. Gould, que faz perguntas acerca do darwinismo
tradicional e sua inadequação para explicar mudanças culturais. Embora Gould
tenha endossado agressivamente a evolução, não apoiou o cenário tradicional
simples.

Temos o poder de escolha?


Todos nós temos consciência de que podemos escolher dar dinheiro ao
Exército da Salvação, pintar a casa de roxo, furtar um carro e chutar um cachorro
moribundo. Podemos escolher fazer essas coisas porque temos o livre-arbítrio. A
maioria dos seres humanos acredita que temos liberdade para escolher; mas
alguns, chamados deterministas, não acreditam. 43 Não creem que haja algo
como o livre-arbítrio. Nossos atos seriam causados por fatores puramente
mecânicos, como nossos genes ou o ambiente. Isso nos coloca no meio do
ardente conflito que sustenta o debate da sociobiologia e da psicologia evolutiva.
Seríamos meras máquinas que reagem aos genes e ao ambiente e, portanto, não
responsáveis por nossos atos, ou temos o poder de escolher, como escolher o
certo e não o errado, e assim sermos responsáveis pelas nossas ações? Sem
liberdade de escolha não há culpa. Em relação com isso, aparecem questões
sobre a existência de valores morais absolutos, bem e mal, etc.
Os tribunais de justiça pelo mundo pressupõem basicamente o livre-arbítrio,
e os indivíduos são considerados responsáveis por seus atos. Se você escolhe
“cometer um crime”, espera-se que você “cumpra seu tempo” na prisão. Mas não
é possível que os genes controlem nossas atividades? A psicologia evolutiva, que
começa a se tornar um componente significativo nas recentes discussões sobre
comportamento, sugeriria isso. Comporto-me desta maneira porque está nos
meus genes. O clímax desse raciocínio apareceu recentemente no livro A Natural
History of Rape: Biological Bases of Sexual Coercion 44 [Uma História Natural
do Estupro: Bases Biológicas da Coerção Sexual]. De acordo com os autores, o
estupro é uma adaptação evolutiva que permite que homens fracassados
propaguem seus genes. Apoiam seu argumento usando exemplos daquilo que
consideram sexo forçado entre os animais. Esse argumento fica longe de suas
implicações para a humanidade, mas ilustra como, na tentativa de explicar tudo
dentro de um módulo exclusivamente naturalista, é necessário recorrer a
algumas analogias avulsas. Ilustra também um crescendo de desculpas para
aberrações comportamentais que parecem estar permeando a sociedade nas
décadas mais recentes.
Os pesquisadores às vezes se referem aos genes de Deus ou genes
espirituais. Alguns argumentam que a tendência religiosa da humanidade, que é
vista em todos os lugares, seria controlada pelos genes. Contudo, o fato de que
alguns cientistas e outras pessoas mudam sua maneira de pensar, indo da crença
em Deus para o ateísmo e vice-versa, enquanto os genes não sofrem mudança,
sugere que a causa da espiritualidade não seja primariamente controlada por um
fator genético. Temos livre-arbítrio.
Pode-se argumentar que os genes são responsáveis por certos padrões de
comportamento, e isso ocasionalmente é verdade. Por exemplo, parece que o
alcoolismo tem um componente genético, mas isso não significa que, se alguém
tem tendência ao alcoolismo, não tem escolha a não ser se tornar alcoólatra.
Milhões de membros bem-sucedidos dos Alcoólicos Anônimos testificam de que
não é esse o caso; eles usaram seu livre-arbítrio para não ser alcoólatras. Existem
outras anormalidades hereditárias mais lamentáveis que limitam o poder de
escolha, mas são exceções. Nosso interesse aqui é acerca de seres humanos
normais e como escolhem usar sua força de vontade.
Não é somente a nossa liberdade de escolha que está sendo desafiada pelo
suposto poder dos genes. Como a sociobiologia sugere, nossos sentimentos de
amor e preocupação pelos outros não são exatamente isso. São só motivos
egoístas que apenas parecem sentimentalmente abnegados. Todos os nossos atos
são meramente a influência desses genes egoístas. A conclusão é de que
realmente não somos bons e generosos ou preocupados com os outros – apenas
egoístas. O filósofo Michael Ghiselin, da Academia de Ciências da Califórnia,
dá um exemplo de como pode ser tão difundido esse tipo de raciocínio quando
comenta: “Nenhum indício de genuína caridade melhora nossa visão da
sociedade, uma vez que se deixe de lado o sentimentalismo. Aquilo que passa
como cooperação é, na realidade, uma mistura de oportunismo e exploração. Os
impulsos que levam um animal a sacrificar-se por outro acabam tendo como
razão máxima obter vantagem sobre um terceiro; e atos ‘para o bem’ de uma
sociedade vêm a ser realizados em detrimento do restante. Quando for em favor
de seu próprio interesse, pode-se esperar que todo organismo ajude seus
semelhantes. Quando ele não tem alternativa, submete-se ao jugo da servidão
comunitária. Tendo, porém, oportunidade plena de agir em seu próprio interesse,
nada a não ser a conveniência o impedirá de brutalizar, de mutilar, de matar –
seu irmão, seu companheiro, seu pai ou seu filho. Arranhe um ‘altruísta’, e
observe um ‘hipócrita’ sangrar.” 45 A retórica dessa passagem é
excepcionalmente boa, mas não se confirma em sua autenticação factual. Somos
nós simplesmente vítimas impotentes das circunstâncias? Não podemos nós,
com nobreza de caráter e firmes decisões, erguer-nos acima do mal e sermos
bons?
Os evolucionistas usam várias explicações para a presença do livre-arbítrio.
Wilson e Dawkins reconhecem sua existência, mas a explicam como algo
programado pelos genes que pode, às vezes, vencer os ditames dos genes. Como
era de se esperar, esse tipo de argumentação confusa tem sofrido muitas críticas.
Podemos obter resultados determinados e indeterminados de genes
determinantes? Por que tentar combinar áreas tão separadas como a genética e a
liberdade de escolha? Pode o livre-arbítrio ser verdadeiramente livre se é
determinado pela genética? Alguns evolucionistas simplesmente negam a
existência da liberdade de escolha. William Provine, historiador da biologia na
Universidade Cornell, simplesmente declara: “O livre-arbítrio é a ideia mais
destrutiva que já inventamos.” 46 Entretanto, a maioria dos seres humanos
acredita que indivíduos normais têm liberdade de escolher e, portanto, são
responsáveis por seus atos.
A questão da existência do livre-arbítrio é fator fundamental que influencia
dramaticamente nossa visão do mundo. Somos simplesmente entidades
mecânicas sem sentido, com a psicologia evolutiva legitimando todo tipo de
comportamento anômalo? Ou, por outro lado, temos na verdade o livre-arbítrio
e, portanto, somos responsáveis pelos nossos atos? A isso se pode acrescentar
nosso senso inato, normal, de certo e errado, de retidão moral e de imoralidade,
de justiça e injustiça, de bondade e egoísmo. Esses atributos, que a maioria
admite experimentar, apontam todos para uma realidade além da psicologia
evolutiva limitada pelos genes, e igualmente além das interpretações científicas
comuns. A realidade parece ser muito mais do que aquilo que uma interpretação
científica materialista (mecanicista, naturalista) permite. Isso nos leva a
perguntar seriamente se existe um Deus que criou todas essas percepções que
dão sentido e propósito à existência, como também sobre alguma
responsabilidade para com esse ser. O grau de responsabilidade pode depender
do tipo de Deus que se imagina. No contexto bíblico, a resposta do cristão
diante de um Deus benévolo e perdoador não se mostra carregada de fardos.
É verdade que alguns cientistas, como Gould e Aldous Huxley, que optaram
por um Universo sem sentido, falam da “liberdade máxima” e da “liberação” que
essa decisão proporciona. 47 Mas é interessante que a maioria dos cientistas que
não acreditam em Deus, no livre-arbítrio e em outras características especiais da
mente não se comportam como simples animais que fazem questão de passar
seus genes egoístas ao maior número possível de descendentes. Esses cientistas
são quase sempre justos, honestos e têm um senso de valores morais. São seres
humanos decentes e, como tais, testemunham do fato de que a realidade tem
aspectos que estão além de suas simples explicações científicas materialistas.
Nossa liberdade de escolha e nosso senso de valores morais são uma forte
evidência de uma realidade acima de simples interpretações científicas
mecânicas. Existe sentido em nossa existência, e esse sentido está muito além do
nível dos genes.

Um recente show paralelo: as guerras da ciência


“Tornou-se, portanto, cada vez mais evidente que a ‘realidade’ física, não
menos que a ‘realidade’ social, é no fundo uma elaboração social e linguística;
que o ‘conhecimento’ científico, longe de ser objetivo, reflete e codifica as
ideologias dominantes e as relações de poder da cultura que o produziu; que as
alegações da ciência quanto à verdade são inerentemente carregadas de teoria, e
autorreferentes.” 48 Essa citação realmente impressiona, e se presta a uma
interpretação cultural da ciência, mas não foi por isso que foi escrita, e sim para
induzir sociólogos a publicar algo sobre o qual não sabiam muito. E funcionou!
A citação é da autoria de Alan Sokal, um físico teórico da Universidade de Nova
York, que escreveu um artigo impressionante sob o erudito título “Ultrapassando
as Fronteiras: Rumo a uma Hermenêutica Transformadora da Gravidade
Quântica”. O artigo tem um tom conciliador, é fartamente documentado e
embelezado com muitas citações de eminentes especialistas do pensamento.
Inclui também vários erros que seriam óbvios a especialistas no campo da física.
Sokal apresentou-se como um esquerdista político-cultural aos editores de Social
Text, uma importante publicação de estudos culturais. Pediu-lhes que
publicassem o artigo, e eles o fizeram. Ao mesmo tempo, numa publicação
diferente, Língua Franca, ele anunciou que o artigo era um embuste designado a
mostrar como a posição política de alguém determina o que é publicado,
independentemente de sua exatidão. Os editores do Social Text, que deveriam ter
examinado o artigo em busca de erros científicos, sentiram que haviam sido
enganados. A história do embuste ganhou a primeira página do The New York
Times, e a mídia em geral teve um dia fora do comum, censurando acadêmicos.
Mas simplesmente não foi essa a intenção da manobra. 49
O que estava por trás de tudo isso era o que se tornou conhecido como
“guerras da ciência”. É uma continuação da centenária batalha entre as “duas
culturas”, com as humanidades que lidam com os estudos culturais de um lado e
a ciência ocupada com o estudo da natureza do outro. Na última década, as
guerras da ciência têm sido uma conflagração entre o pós-modernismo extremo
com o construtivismo social de um lado e a ciência do outro. A ciência enfatiza
os fatos e a razão. O movimento pós-modernista nega o conhecimento objetivo e
não adota padrões universais de valores. O construtivismo sugere que as
conclusões da ciência, e de todos os outros estudos, são socialmente
determinadas. A ciência, portanto, não é melhor que os estudos na área de
humanidades. Até a matemática e a lógica são consideradas constructos sociais.
A ciência é apenas um entre muitos sistemas de crença. Os próprios “fatos”
científicos são simplesmente os constructos sociais dos cientistas. Essa nova
abordagem da ciência abriu uma área inteiramente nova de investigação para os
construtivistas, e a oportunidade tem sido perseguida com fervor. Os erros da
ciência têm sido devidamente notados, e a ideia de Kuhn 50 sobre a ciência
como paradigma que muda de tempos em tempos ajudou a censurar a visão
segundo a qual a ciência era uma trilha bem pavimentada rumo à verdade. Os
construtivistas rotularam a ciência como um mero jogo de poder político.
Infelizmente, a ciência tem sido com frequência seu pior inimigo. Seu
exclusivismo e arrogância ajudam a prover o combustível para os fogos da
guerra.
Alguns cientistas não se agradaram ao ver outros, fora de seu clube,
avaliando seu trabalho e deslustrando a imaculada percepção da ciência que
consideram tão cara. Outros se preocuparam com a perda de objetividade na
sociedade como um todo, como se a ciência fosse relegada a um mero pacote de
opiniões comuns. Livros e conferências apresentados por cientistas começaram a
abordar a questão. A principal estrela da guerra foi um livro publicado em 1994,
intitulado Higher Superstition: The Academic Left and its Quarrels With
Science 51 [Alta Superstição: A Esquerda Acadêmica e seus Embates com a
Ciência]. A “Esquerda Acadêmica” do título refere-se aos construtivistas e pós-
modernistas que vinham atacando a ciência. De autoria de um biólogo, Paul R.
Gross, e um matemático, Norman Levitt, é uma polêmica que arrasa uma porção
significativa da argumentação sendo usada contra a ciência, e fala da “peculiar
amálgama de ignorância e hostilidade” 52 dos críticos da ciência. Mediante
estudo e avaliação meticulosos, os autores dão um grande número de exemplos
de erros cometidos por aqueles que criticam a ciência, mas nem mesmo a
entendem. Alguns argumentos empregam o mesmo tipo de lógica que os
construtivistas e pós-modernistas têm usado contra a ciência, mas agora voltada
contra eles. O embuste de Sokal, que ocorreu dois anos mais tarde, é apenas
mais um argumento que os cientistas usam para exaltar a superioridade da
ciência. Por outro lado, os construtivistas indicam que esse embuste é um
incidente isolado; é apenas uma particularidade de elementos. E assim a batalha
continua sendo travada. 53
As guerras da ciência sublinham a profunda e persistente insatisfação que
muitos sentem para com uma ciência elitista; ilustram também a mesquinhez e
arrogância de algumas das contendas intelectuais da humanidade. Embora a
ciência tenha significativos pontos fortes e pareça ter vencido essa rixa recente,
não há razão para pensar que esteja resolvido o conflito entre a ciência e o
restante da cultura. As razões para os conflitos são complexas, mas parece óbvio
que a autossuficiência e o exclusivismo da ciência continuarão a ser assaltados
de várias perspectivas. Além disso, enquanto a ciência secular não produzir
respostas satisfatórias para nossas questões mais profundas, como nossas
percepções e a razão de nossa existência, a ciência exclusivista continuará a ser
atacada.

Síntese
Para onde nos leva tudo isso? Existe alguma luz no fim do túnel?
Atualmente, a ciência tende a excluir aquelas áreas que não fazem parte do seu
cardápio materialista. O elitismo é evidente quando a ciência entra em áreas
como a sociobiologia e tenta responder a perguntas além de sua área de
conhecimento. A ciência atribui aspectos do comportamento humano, como
altruísmo e religião, a fatores mecanicistas como os genes. Então, a esquerda
acadêmica entra na rixa e acusa a ciência de ser apenas um constructo social. O
quadro é complicado, mas começam a emergir algumas conclusões importantes.
Através disso tudo, temos também alguns dados científicos confiáveis para
ajudar em nosso raciocínio.
A meta é descobrir o que é verdade ou, em outras palavras, a realidade. O
padrão pós-moderno de pensamento de alguns sociólogos, sugerindo que tudo é
relativo e que não há nada absoluto, não é uma solução. Esse tipo de raciocínio
conduz mais ao ceticismo do que à verdade que procuramos. Além disso, é
difícil levar a sério uma premissa como o pós-modernismo, que sugere que nada
é objetivamente verdadeiro. Isso significaria que a premissa do pós-modernismo
também não é verdade objetiva. 54 A melhor solução é chegar às melhores
conclusões que pudermos, com base nos melhores dados disponíveis, e nos
dispormos a aceitar todas as possibilidades e revisões, à medida que novas
informações se tornem disponíveis. As várias facções nessas batalhas poderiam
lucrar ao não ser tão exclusivistas e reconhecer que existe valor além da área de
sua especialidade.
A ciência tem sido exclusivista demais, evitando algumas importantes áreas
de investigação, enquanto permite que paradigmas dominantes determinem o
que é considerado verdade. Isso tem, às vezes, causado problemas à ciência,
como foi o caso ao ignorar as mortes causadas por germes da febre puerperal ou
grandes catástrofes.55 Por outro lado, é necessário adotar a perspectiva de que a
ciência tem muito de bom em si. Quando leio opiniões filosóficas, sociológicas,
psicológicas e teológicas variadas, a falta de dados e a abundância de conjecturas
me desapontam muitas vezes. Meu preparo como cientista pode influenciar
minha visão, mas sempre fico feliz ao recorrer à ciência quando existem alguns
fatos simples e sólidos da natureza com os quais posso começar. Isso acontece,
especialmente, nas ciências físicas como a física e a química, e nelas
encontramos algumas das mais fortes evidências de Deus. A biologia é mais
complexa, e é mais difícil chegar a conclusões firmes. Na psicologia ou
sociologia, é ainda mais difícil chegar a conclusões consistentes porque esses
sistemas são extremamente complicados e difíceis de analisar. Nessas áreas,
estamos lidando com a mente humana, que não é tão bem compreendida. Todas
essas áreas, contudo, são dignas de cuidadosa investigação e respeito. Há o bom
e o mau em todos esses campos, e precisamos com muito cuidado procurar
separar um do outro.
A ciência tem vários problemas. Um dos principais é que os cientistas estão
concentrados demais no sucesso da ciência. Existem alguns cientistas que não
hesitarão em mostrar-lhe quão bem-sucedida é a ciência. Esse, especialmente, é
o caso quando os cientistas dão a entender que a ciência tem resposta para quase
tudo. Embora isso seja, em parte, um comportamento humano normal, não
podemos jamais esquecer que não devemos interpretar o sucesso da ciência em
algumas áreas como superioridade universal e licença para o exclusivismo. A
batalha da sociobiologia nos ensina que, em algumas áreas, a ciência não pode
fazer contribuições aceitáveis. A ciência precisa aprender a prestar o devido
respeito àqueles âmbitos da realidade além do campo que ela domina. Um
exemplo é o nosso livre-arbítrio. A ciência baseia-se na causa e no efeito. O
livre-arbítrio, que a maioria de nós temos, não é causa e efeito. Se fosse, não
seria livre. A livre vontade é exemplo de uma realidade além da ciência.
Em resumo, a ciência não é tão má quanto alguns sociólogos acham e não é
tão boa quanto muitos cientistas pensam. Infelizmente, a ciência tende a ser
exclusivista e elitista demais. Com frequência, os cientistas visualizam a ciência
como aquele castelo inexpugnável que se ergue acima do plano da ignorância.
Na realidade, a ciência é mais como uma casa importante entre outras casas,
como a história, a arte e a religião, todas com seus pontos fortes e fracos. Todas
as casas são importantes na busca pela verdade. O problema é que muitíssimos
cientistas na casa da ciência fecharam as cortinas e não conseguem ver a igreja,
que fica ali bem ao lado.

Referências
1
Snow CP. 1959, 1963. The two cultures: and a second look. Nova York: Mentor, p. 11, 12.
2
Conforme relato em Dampier WC. 1949. A history of science, and its relation with philosophy &
religion. 4a edição. Cambridge: At the University Press, p. 181. Traduzido por mim de uma citação
francesa.
3
Hawking S. 2001. The universe in a nutshell. Nova York: Bantam, p. 85.
4
Citado em Nordenskiöld E. 1928. The history of biology: a survey. Eyre LB, translator. Nova York:
Tudor, p. 426.
5
Citado em Barber B. 1961. Resistance by scientists to scientific discovery. Science 134, p. 596-602.
6
de Duve C. 1995. The beginnings of life on earth. American Scientist 83, p. 428-437.
7
Ver o voto recente do Comitê da Associação Americana para o Progresso da Ciência: Frazier K. 2003.
AAAS Board urges opposing ‘Intelligent Design’ theory in science classes. Skeptical Inquirer 27 (2), p.
5.
8
Chauvin R. 1989. Dieu des fourmis Dieu des étoiles. Paris: França Loisirs, p. 214.
9
Lewontin R. 1997. Billions and billions of demons. New York Review of Books 44 (1), p. 28-32. Itálicos
no original.
10
Hanson RB, Bloom FE. 1999. Fending off furtive strategists. Science 285, p. 1847.
11
Dobzhansky T. 1973. Nothing in biology makes sense except in the light of evolution. The American
Biology Teacher 35, p. 125-129.
12
Ayala FJ. 2004. Teaching science in the schools. American Scientist 92, p. 298.
13
Eldredge N. 2000. The triumph of evolution and the failure of creationism. Nova York: W. H. Freeman
and Company.
14
Sagan, C. 1996. The demon-haunted world: science as a candle in the dark. Nova York: Random House.
15
Barrow JD, Tipler FJ. 1986. The anthropic cosmological principle. Oxford, Nova York: Oxford
University Press, p. 613-682.
16
Tipler FJ. 1994. The physics of immortality: modern cosmology, God and the resurrection of the dead.
Nova York: Doubleday.
17
O conceito de altruísmo recíproco, em que você ajuda um indivíduo em crise para que ele possa ajudá-
lo quando você estiver em crise, foi proposto para explicar esse comportamento. Há um problema em
gradualmente estabelecer esse comportamento dependente do grupo numa população, já que não pode
funcionar enquanto não estiver estabelecido. Ver Wilson EO. 1975. Sociobiology: the new synthesis.
Cambridge: Harvard University Press, p. 120, 121. Num sentido, esse é outro exemplo de partes
interdependentes que não funcionam enquanto todas as partes essenciais não estiverem presentes.
18
Wilson, Sociobiology [veja a nota 17].
19
Dawkins R. 1976, 1989. The selfish gene. Nova edição. Oxford: Oxford University Press.
20
Para avaliar a ideia de Dawkins, ver McGrath A. 2005. Dawkins’ god: genes, memes, and the meaning
of life. Oxford: Blackwell.
21
Wilson EO. 1978. On human nature. Cambridge: Harvard University Press, p. 188.
22
Três boas referências dessas batalhas são: (a) Brown A. 1999. The Darwin wars: the scientific battle for
the soul of man. Londres: Touchstone. (b) Ruse M. 2000. The evolution wars: a guide to the debates.
New Brunswick: Rutgers University Press, p. 203-230. (c) Segerstråle U. 2000. Defenders of the truth:
the battle for science in the sociobiology debate and beyond. Oxford: Oxford University Press. Esta
última referência é abrangente.
23
Foi discutido no capítulo 6.
24
(a) Segerstråle, Defenders of the truth, p. 23; (b) Wilson EO. 1994. Naturalist. Washington, DC: Island
Press/Shearwater Books, p. 307.
25
Gould SJ. 2002. Rocks of ages: Science and religion in the fullness of life. Nova York: Ballantine. Há
indícios de que Gould pode não ter apoiado sempre a religião como se reflete aqui.
26
Maynard Smith J. 1995. Genes, memes, & minds. The New York Review of Books 42 (19), p. 46-48.
27
Citado em Ruse, The evolution wars, p. 231, 232.
28
(a) Segerstråle, Defenders of the truth, p. 29, 30. (b) Shermer M. 2001. The evolution wars. Skeptic 8
(4), p. 67-74. (c) Wilson, Naturalist, p. 338.
29
Mateus 18:15-17.
30
Lumsden CJ, Wilson E. O. 1981. Genes, mind and culture: the coevolutionary process. Cambridge:
Harvard University Press.
31
(a) Maynard Smith J, Warren N. 1982. Models of cultural and genetic change. Evolution 36, p. 620-
627. (b) Segerstråle, Defenders of the truth, p. 162-164.
32
Entrevista relatada em Segerstråle. Defenders of the truth, p. 165, 166 [veja a nota 22].
33
Ruse, The evolution wars, p. 224.
34
Kitcher P. 1985. Vaulting ambition: sociobiology and the quest for human nature. Cambridge: MIT
Press, p. ix, 9, 333.
35
Wilson EO. 2008. One giant leap: how insects achieved altruism and colonial life. BioScience 58 (1), p.
17-25.
36
Alcock J. 2001. The triumph of sociobiology. Oxford: Oxford University Press.
37
Beckwith J. 2001. Triumphalism in science. American Scientist 89, p. 471-472.
38
(a) Bednekoff PA. 1997. Mutualism among safe, selfish sentinels: a dynamic game. The American
Naturalist 150, p. 373-392. (b) Clutton-Brock TH, et al. 2001. Effects of helpers on juvenile
development and survival in meerkats. Science 293, p. 2446-2449. (c) Clutton-Brock TH, et al. 1999.
Selfish sentinels in cooperative mammals. Science 284, p. 1640-1644.
39
Ver duas tentativas recentes em: (a) Hamer DH. 2004. The God gene: how faith is hardwired into our
genes. Nova York: Doubleday. (b) Newberg A, d’Aquili EG, Rause V. 2002. Why God won’t go away:
brain science and the biology of belief. Nova York: Ballantine.
40
Por exemplo, Gander EM. 2003. On our minds: how evolutionary psychology is reshaping the nature-
versus-nurture debate. Baltimore: The Johns Hopkins University Press.
41
Wright R. 1994. The moral animal: evolutionary psychology and everyday life. Nova York: Vintage, p.
378.
42
Rose H, Rose S, editores. 2000. Alas, poor Darwin: arguments against evolutionary psychology. Nova
York: Harmony.
43
Wegner DM. 2002. The illusion of conscious will. Cambridge: Bradford.
44
Thornhill R, Palmer CT. 2000. A natural history of rape: biological bases of sexual coercion.
Cambridge: MIT Press.
45
Ghiselin MT. 1974. The economy of nature and the evolution of sex. Berkeley: University of California
Press, p. 247.
46
Provine, WB. 2001. De uma palestra a que assisti na Universidade da Califórnia, campus de Riverside,
5 de abril.
47
(a) Gould SJ. 1989. Wonderful life: the Burgess shale and the nature of history. Nova York: Norton, p.
323. (b) Huxley A. 1937. Ends and means. Nova York: Harper & Brothers, p. 316.
48
Sokal AD. 1996. Transgressing the boundaries: towards a transformative hermeneutics of quantum
gravity. Social Text 46/47; 14 (1, 2), p. 217-252.
49
Ver relatos deste curioso incidente em: (a) Editors of Lingua Franca. 2000. The Sokal hoax: the sham
that shook the academy. Lincoln: University of Nebraska Press. (b) Segerstråle U. 2000. Science and
science studies: enemies or allies? In: Segerstråle U, editor. Beyond the science wars: the missing
discourse about science and society. Albany: State University of New York Press, p. 1-40.
50
Discutido no capítulo 6.
51
Gross PR, Levitt N. 1994, 1998. Higher superstition: the academic left and its quarrels with science.
Baltimore: The Johns Hopkins University Press.
52
Ibid., p. 34.
53
Informações adicionais sobre essa fascinante guerra são encontradas nas quatro referências
imediatamente acima e em: (a) Brown JR. 2001 Who rules in science: an opinionated guide to the wars.
Cambridge: Harvard University Press. (b) Collins H, Pinch T. 1998. The golem at large: what you
should know about technology. Cambridge: Cambridge University Press. (c) Collins H, Pinch T. 1998.
The golem: what you should know about science. 2a edição. Cambridge: Cambridge University Press.
(d) Gross PR, Levitt N, Lewis MW, editores. 1996. The flight from science and reason. Nova York: The
New York Academy of Sciences. (e) Koertge N, editor. 1998. A house built on sand: exposing
postmodernist myths about science. Oxford: Oxford University Press. (f) Sokal A, Bricmont J. 1998.
Fashionable nonsense: postmodern intellectuals’ abuse of science. Nova York: Picador USA.
54
Ver uma discussão deste enigma em Forman P. 1995. Truth and objectivity, part 1: Irony; part 2: Trust.
Science 269, p. 565-567, 707-710.
O sentido da vida consiste no fato
de que não faz sentido dizer que
a vida não tem sentido. 1
Neils Bohr, físico

A parte boa da ciência


Duas meninas enfrentaram a tragédia de não serem capazes de combater os
germes que costumam emboscar-se ao nosso redor. Eram como o famoso
“garoto da bolha”, que sobreviveu a essa calamidade por doze anos, vivendo
dentro de uma “bolha” de plástico que o isolava dos germes. Muitas crianças
com essa terrível doença não chegam a comemorar seu primeiro aniversário.
Elas têm um gene defeituoso que prejudica a função dos glóbulos brancos do
sangue, que rechaçam os germes. As maravilhas da engenharia genética,
felizmente, vieram em resgate das duas meninas. Algumas de suas células foram
removidas, alteradas geneticamente para providenciar o gene certo, e devolvidas
às meninas, em cujo organismo se desenvolveram, dando-lhes a resistência
necessária. Outro triunfo científico! Esses procedimentos não são simples, e esse
tipo de terapia genética tem apresentado seus problemas. Às vezes, o vírus usado
para transferir o gene pode causar complicações, mas os cientistas não desistem.
Novas abordagens incluem a tentativa de alterar os vírus, direcionar as
transferências de genes e consertar os genes usando os sistemas de leitura e
correção das células [glóbulos] que mencionamos antes. 2
Usando a engenharia genética, os cientistas têm conseguido alterar o DNA
de vários organismos, para que façam o que desejamos que eles façam.
Micróbios geneticamente alterados podem produzir vacinas, hormônios como a
insulina, que controla o metabolismo do açúcar, e o interferon, que melhora a
resistência às infecções causadas por vírus. Somos capazes de produzir porcos e
ratos maiores, e vacas que produzem mais leite. Muitas plantas têm sido
alteradas, incluindo o novo arroz dourado, que produz o precursor da vitamina
A. Fizemos frutas que conservam por mais tempo seu frescor, e plantas de
algodão que possuem uma toxina emprestada de um micróbio que as torna
resistentes ao temível gorgulho do algodão. Naturalmente, existe o temor de que
alguns desses novos tipos de organismos causem um desastre biológico
universal, por violentas infecções ou reprodução incontrolável. Essa é uma
preocupação profunda que não pode ser facilmente descartada e ilustra o poder
potencial da ciência.
Quando a história registrar as grandes conquistas do século 21, sem dúvida
incluirá o mapeamento dos mais de três bilhões de bases de DNA encontrados na
fórmula genética do homem. Uns trinta mil genes, provavelmente muitos mais,
foram encontrados em seres humanos, e eles realizam todo tipo de diferentes
funções. Por exemplo, pelo menos oito deles estão associados ao nosso relógio
biológico, que regula os hormônios, a temperatura do corpo e os padrões de
sono. A clonagem de mamíferos é outra realização impressionante; todavia,
estamos clonando apenas o corpo físico desses organismos. Até aqui, a ciência
tem feito pouco na clonagem de nossa mente misteriosa.
As impressionantes consecuções da ciência não se limitam de modo algum à
engenharia genética. Em quase qualquer lugar para onde nos volvamos, vemos
evidências do sucesso da ciência, que, em associação com os impressionantes
avanços tecnológicos, ameaça sepultar-nos na insignificância. Precisamos apenas
mencionar termos como computador, telescópio Hubble ou o jipezinho de Marte
para entender que a ciência tem sido um dos mais bem-sucedidos
empreendimentos humanos, se não o mais. Não precisamos gastar mais tempo
com isso. Em muitas áreas, a ciência é eminentemente bem-sucedida.
Nos dois últimos capítulos, demos exemplos de como a ciência segue
paradigmas fechados e pode ser muito exclusivista. Ao olharmos o quadro geral,
também precisamos conservar em perspectiva os bons aspectos da ciência, como
suas muitas descobertas fascinantes e úteis. Os sucessos da ciência são célebres,
e está ficando difícil encontrar alguém que não ache que, em termos gerais, a
ciência seja uma boa coisa.

Onde está Deus? E por que há tanto sofrimento?


Eu assistia a uma grande convenção secularista, quando o orador pediu que
aqueles que estivessem dispostos orassem para que Deus o fizesse crescer quinze
centímetros durante a palestra de vinte minutos que apresentaria. 3
Naturalmente, isso não aconteceu. Onde estava Deus? Era algo como o assim
chamado serviço de discagem de oração para ateus: você disca o número e
ninguém atende! Os cientistas seculares frequentemente fazem duas perguntas
acerca de Deus: “Onde está Ele?” e “Como pode Deus, especialmente o
benevolente Deus da Bíblia, permitir tanto sofrimento na natureza?” Essas são
preocupações reais e sérias, pertinentes de modo especial à questão em torno de
Deus.
Embora haja muitas evidências que apontam para um Deus inteligente e
planejador, por vezes, ao discutir essas questões, surgem perguntas como quem
planejou o planejador, e o que estava fazendo antes de começar a criar. Relata-se
que Santo Agostinho tinha uma resposta para essa última pergunta. Antes da
criação, Deus estava preparando o inferno para as pessoas que fazem esse tipo de
pergunta! A questão sobre quem planejou o planejador é um tanto inválida,
simplesmente porque, se alguém planejasse o planejador, então o planejador não
seria o verdadeiro planejador de tudo, e alguém teria de planejar o planejador do
planejador, ad infinitum. A pergunta pode implicar que, se não sabemos quem
planejou o planejador ou de onde veio Deus, nossa informação é vaga, e pode
não haver planejador nenhum. Mas isso pode ser facilmente equilibrado com a
pergunta: “De onde vem o Universo?” No contexto de conceitos complicadores,
como a relação entre tempo e espaço, ilustrados pelas ideias de Einstein sobre a
relatividade, 4 nossas perguntas comuns acerca da natureza e do momento do
começo de tudo podem parecer sem sentido.
É muito legítimo perguntar por que existe alguma coisa, em vez de não
existir nada. Nem a ciência nem a teologia apresentam boas respostas para as
perguntas quanto às origens. Mas temos certeza de que algo existe. Nossa
ignorância deve gerar uma dose saudável de humildade, ao considerarmos o
quanto é insuficiente nosso conhecimento.
É legítimo indagar de onde veio Deus ou o Universo, mas definitivamente
não é o mesmo que perguntar se Deus ou o Universo existem. Só porque não sei
de onde vieram Deus e o Universo não significa que eles não existam! Tenho
muita disposição para aceitar a existência de muitas coisas, embora eu não saiba
como chegaram a existir. Se um enorme crocodilo me persegue, estou disposto a
concordar com sua existência muito antes de saber como, por que ou de onde ele
veio. De modo semelhante, na natureza, podemos ver evidências de um
planejador, embora não saibamos como, por que ou de onde o planejador veio.
Não sabemos onde Deus está. Apesar dessa grave deficiência, aqueles que
acreditam que Ele existe constituem a vasta maioria. Embora haja variadas
definições de Deus, uma pesquisa do Gallup em 1996 indica que 96% dos
adultos nos Estados Unidos acreditam em Deus, 5 e a religião é praticamente um
fenômeno universal ao redor do globo. Na pergunta acerca da existência de
Deus, devemos ter em mente que a ausência de evidências não é a mesma coisa
que a evidência da ausência. Embora não possamos ver Deus, existe uma
abundância de evidências convincentes de que Ele existe. Não precisamos
visualizar Deus para crer na Sua realidade. Se numa clareira, no meio da floresta,
encontro um jardim bem organizado e cuidado, sem ervas daninhas e com
canteiros caprichados de flores e folhagens, posso não ver o(a) jardineiro(a), mas
a evidência é tão irresistível que me dá a certeza de que ele ou ela existe. De
modo semelhante, se inspeciono as ruínas de uma casa que foi destruída pelo
fogo, e vejo as vigas carbonizadas, o teto queimado e objetos derretidos, tenho
certeza de que houve um incêndio, embora não o veja naquele momento. A
evidência pode ser tão óbvia a ponto de deixar poucas dúvidas.
Pode-se legitimamente perguntar: Se existe um Deus, por que Ele não Se
torna mais visível? Não temos muita informação quanto a isso, mas uma
sugestão atraente é que Deus, no contexto do conflito entre o bem e o mal, isola-
Se a fim de proteger nossa liberdade de escolha. Nessa controvérsia, nossa
liberdade de escolha e a justiça de Deus poderiam ser comprometidas se Ele
dominasse demais, e assim manipulasse as decisões. Uma analogia rústica: se
um pai se senta na cozinha todos os dias para ter certeza de que os filhos não
assaltarão o recipiente dos biscoitos, as crianças terão pouca liberdade para
escolher se comem algum biscoito ou não. Além disso, as crianças podem não
ter a oportunidade de aprender integridade e praticar a força de vontade,
mantendo distância da lata de biscoitos porque essa é a coisa certa a fazer.
Seremos capazes de aprender as grandes lições da vida mais prontamente se
ficarmos sozinhos do que se formos constantemente fiscalizados. Esse
argumento pode não ter peso se você tem uma visão de mundo puramente
mecanicista e não crê em nenhum tipo de divindade, mas, para outros, a
argumentação é muito importante. Se Deus precisa dar-nos a liberdade de aceitá-
Lo ou rejeitá-Lo, Ele poderá Se manter fora do quadro. Ou poderia haver muitas
outras razões. Durante uma batalha, os soldados nem sempre entendem o
planejamento de guerra.
Depois existe a questão do sofrimento. Como pode um tipo de Deus todo-
poderoso e bondoso, especialmente como o descrito na Bíblia, criar um desfile
mundial de tanta dor e sofrimento? Vários cientistas e outros pensam que a
presença do mal moral, do medo, da dor e de calamidades naturais, como os
terremotos, que matam milhares de uma só vez, desafiam o conceito de um Deus
criador bom e inteligente. A esses problemas, poderíamos acrescentar tubarões
que devoram seres humanos, bebês com câncer e parasitas horripilantes, como a
tênia. Embora existam evidências irrefutáveis de um desígnio inteligente, nem
tudo está bem.
Já se escreveu muito acerca do problema do sofrimento na presença de um
Deus criador bom. 6 Relacionarei algumas soluções, mas estas são apenas
sugestivas:
1. Embora fosse ótimo não sentir dor nem medo, sem eles nossa vida poderia
ser desastrosa. A dor e o medo das consequências parecem necessários para nos
impedir de ferir a nós mesmos, como queimar as mãos ao trabalhar perto de uma
fogueira ou de uma grande fonte de calor.
2. O mal moral, como a injustiça, não deve ser atribuído a Deus quando
temos a liberdade de escolha e podemos causar o mal. Não devemos culpar Deus
por nossas escolhas erradas, assim como não devemos culpar o arquiteto de uma
casa se os ocupantes a incendeiam. A questão da liberdade é vital aqui, como o é
a questão da existência de Deus mencionada acima. A verdadeira liberdade de
escolha requer que se permita o mal moral. Em vez de seres humanos, Deus
poderia ter criado apenas criaturas sub-humanas, algo parecido com macacos,
sem a liberdade de fazer escolhas morais, excluindo assim a possibilidade do
bem ou do mal. Mas uma existência desse tipo parece destituída de desafios, e
realmente tediosa. Felizmente, temos a liberdade de fazer escolhas morais, só
que também temos de enfrentar suas consequências.
3. Alguns sugerem que o sofrimento é útil para o desenvolvimento do caráter
virtuoso. Isso é, às vezes, defendido pela premissa de que nos lembramos melhor
de virtudes adquiridas do que das inatas. O sofrimento que experimentamos nos
ajuda a lembrar melhor dos efeitos do mal.
4. Também se sugere que o mal das calamidades naturais pode ser explicado
pela existência de um Deus que Se distancia da Sua criação, permitindo assim
que a natureza siga seu curso. Conquanto possa haver um pouco de verdade
nessa conclusão, ela não parece se encaixar no tipo de Deus próximo que se
espera numa criação tão complexa.
5. Um Deus criador poderia realizar todo tipo de milagres, o tempo todo,
para impedir o sofrimento. Todavia, poderia muito bem acontecer que, se Deus
manipulasse demais a natureza e realizasse milagres muito numerosos,
perdêssemos o conceito de causa e efeito. As calamidades podem servir para nos
lembrar que existe racionalidade, isto é, causa e efeito no Universo. Se o
Universo não fosse basicamente organizado, é duvidoso que fosse possível haver
um significativo raciocínio lógico.
6. O sofrimento que vemos nos organismos, como doenças infecciosas,
câncer e até predadores carnívoros, pode ser o resultado de pequenas variações
biológicas, especialmente mutações nocivas, e não do específico desígnio ou
intenção de Deus. Essas também podem servir para nos lembrar de que vivemos
num Universo racional, em que causa e efeito são normais.
Não temos as respostas a todas as perguntas sobre o sofrimento que vemos
na natureza, no contexto de um Deus benigno. Há muita coisa que não sabemos,
mas os itens acima oferecem algumas explicações plausíveis.

Alguns alertas quanto à ciência


Existe uma história apócrifa sobre um biólogo que se tornou famoso por ser
capaz de treinar pulgas. Ele ordenava que elas saltassem, e elas, obedientemente,
saltavam. Um dia, a fim de demonstrar a alguns amigos a perfeição com que
havia adestrado as pulgas, ele começou a arrancar fora as pernas de suas pulgas
treinadas, uma de cada vez, e depois pedia que saltassem. Toda vez, as pulgas
bem adestradas saltavam. Ele arrancou todas as pernas, com exceção de uma e,
quando deu a ordem, as pulgas a cumpriram devidamente. Por fim, arrancou a
última perna e pediu que as pulgas pulassem, mas nada aconteceu. Voltando-se
para os seus amigos, o biólogo observou que, ao longo dos anos, havia aprendido
que, se você tira todas as pernas de uma pulga, ela fica surda! Essa é uma
interpretação. É lógico que a outra interpretação é que a pulga não saltava mais
porque não tinha pernas. Isso ilustra a diferença entre dados e interpretação. Que
a pulga não saltava quando ficava sem pernas é um fato, ou seja, os dados. Que
ela não conseguia ouvir é uma interpretação. Uma das grandes confusões na
ciência é que com frequência não se faz diferença entre dados e interpretação.
Uma interpertação, contudo, pode ser apenas uma opinião. A fim de descobrir o
que realmente acontece, é necessário persistentemente tentar distinguir entre os
dois.
Há muito tempo, os cientistas têm estado a par desse problema e, como foi
mencionado antes, a expressão “ciência histórica” 7 é usada por eles para
designar as áreas da ciência que tendem a ficar mais do lado subjetivo ou
interpretativo. Essas são as áreas em que a autenticação é mais difícil, como, por
exemplo, onde não se pode realizar repetidamente um experimento para verificar
os resultados. Acontece que muitas dessas áreas mais especulativas da ciência
lidam com eventos passados, e são geralmente mais difíceis de testar, daí a
designação “histórica”. Áreas como a cosmologia, paleontologia, evolução,
criação e antropologia física ficam mais do lado histórico. Por outro lado, temos
a ciência experimental, como a física, química e alguns aspectos da biologia, a
exemplo da engenharia genética, em que as experiências podem ser facilmente
repetidas no laboratório. É necessário ter especial cuidado em fazer a separação
entre dados e interpertação, ao lidar com a ciência histórica.
O fato de que a ciência é dominada por paradigmas é muito pertinente dentro
de nossa avaliação geral da questão relacionada com Deus. Paradigmas
implicam que há um componente sociológico na ciência e isso desafia a pureza,
objetividade e transparência que alguns cientistas gostam de reivindicar para sua
disciplina. Mas quando, em vez de exibir independência individual de
pensamento, a comunidade científica passa como um todo de uma firme lealdade
a um paradigma para uma firme lealdade a outro, como foi o caso no movimento
dos continentes, é difícil não acreditar que haja um significativo componente
sociológico nas conclusões da ciência. Mudanças nos paradigmas são
interpretadas como progresso, mas isso é desafiado pelo fato de que às vezes a
mudança volta ao velho paradigma rejeitado. Foi esse o caso dos exemplos
anteriores que demos, da geração espontânea da vida e das catástrofes
geológicas. 8 Nesses casos, embora o novo paradigma readotado seja diferente
em alguns detalhes do rejeitado antigo, o princípio permanece o mesmo, tanto na
versão antiga quanto na nova. Daí que a ciência por vezes retorna a
interpretações rejeitadas. À medida que se acumulam informações científicas
adicionais, a ciência tende a progredir de maneira geral em direção à verdade,
mas pode haver muitos desvios, alguns deles bem longos, por trilhas de
paradigmas errôneos.
Após estudar intensivamente a questão das origens por décadas, e com o
devido respeito para com todo o esforço científico investido para demonstrar a
evolução, parece-me que a ideia de que os organismos se originaram por si e
evoluíram do simples para o complexo enfrenta problemas científicos
intransponíveis. Embora muitos aceitem a evolução, os dados para apoiá-la são
difíceis de encontrar, enquanto os dados que a desafiam são muito
significativos. 9 Ademais, vários cientistas têm feito perguntas sérias sobre a
evolução e escrito livros sobre isso. 10 Huston Smith, notável professor de
filosofia da Universidade de Siracusa, expressa algumas dessas mesmas
preocupações. Falando sobre a evolução, ele declara: “Nossa avaliação pessoal é
que em nenhuma outra teoria científica a mente moderna coloca tanta confiança
em evidências proporcionalmente tão pequenas.” 11 Quando se trata de falta de
evidências, a evolução ocupa uma posição de liderança.
Percebemos algo dos cativantes poderes de um paradigma quando vemos
quão confiantes são alguns evolucionistas, apesar da escassez de evidências.
Douglas Futuyma, da Universidade de Michigan, escreveu o mais amplamente
usado livro didático sobre a evolução nos Estados Unidos. Nesse livro, ele
declara que “os biólogos evolucionistas de hoje não se preocupam em tentar
demonstrar a realidade da evolução. Isso, simplesmente, não é mais um
problema, e não tem sido por mais de um século”. 12 Quando a ciência exibe
uma atitude tão confiante, de maneira especial em face de evidências contrárias
tão significativas, passou de uma busca pela verdade a um dogma. A evolução é
sintoma de uma ciência secular excessivamente confiante.
Como já notamos, a ciência tende a isolar-se. Thomas Huxley declarou, certa
vez, que nenhum homem podia ser “ao mesmo tempo um genuíno filho da igreja
e um leal soldado da ciência”. 13 Uma atitude como essa reflete a tendência da
ciência de ser exclusivista. 14 Os cientistas frequentemente declaram que a
ciência e a religião são domínios separados. Podemos separar todo tipo de
diferentes áreas da informação, como literatura, economia e psicologia, mas
ignorar algumas delas a propósito, como a ciência costuma fazer com a religião,
só pode acabar como uma distração menor ao longo da ampla rodovia em busca
daquilo que é verdadeiro. Nossa busca pela realidade ou verdade máxima, como
alguns dizem, precisa incluir o máximo possível de informações, especialmente
quando se fazem perguntas amplas como a origem de tudo. Quanto mais
possibilidades considerarmos, tanto maiores serão as probabilidades de encontrar
explicações corretas.
Por infelicidade, a tendência ao exclusivismo e ao isolamento na ciência é
incomumente forte. Por causa disso, a ciência por vezes se acha tentando dar
explicações – como a vida se originar de informação nos átomos ou a
sociobiologia explicar o comportamento humano – que estão além de sua
capacidade. 15 A maioria dos cientistas tem pleno conhecimento de que a ciência
é poderosa, e o poder da ciência não é algo de que os cientistas queiram abrir
mão. Tudo isso contribui para um senso de superioridade, que tende a isolar a
ciência de outros domínios de investigação que também fazem parte da
realidade. Tanto sucesso na ciência se torna um impedimento para descobrir a
verdade. Os cientistas têm o direito de especializar-se em ciências, mas podem
se meter em problemas quando não reconhecem que uma das desvantagens da
especialização é que ela restringe a visão. Você consegue pensar em bem poucas
coisas além do seu estreito campo.
Alguns se perguntam se a ciência está sendo menos do que honesta quando
exclui Deus de maneira arbitrária, mas ao mesmo tempo alega ter a verdade
acerca da questão das origens. Embora ocorra na ciência um engano intencional
ocasional, e embora isso seja algo em relação ao qual seríamos insensatos ao
ignorar totalmente, é muito raro acontecer e provavelmente não constitua fator
significativo no conflito quanto à questão de Deus. E não precisamos procurar
muito longe para encontrar um bocado de maldade e desonestidade executadas
sob a bandeira da religião ou de Deus. O principal problema nesse conflito não é
um engano intencional; é o que se chama de autoengano, em que os cientistas
têm certeza e julgam honestamente que eles estão certos e os outros, errados.
Deus pode ser excluído porque, afinal de contas, a maioria dos cientistas tenta
explicar e explica quase tudo sem Deus. Por exemplo, o autoengano parece
evidente quando os cientistas acreditam que certos organismos viveram centenas
de milhões de anos antes de os encontrarem nos registros fósseis, 16 porque têm
certeza de que eles evoluíram de outras espécies, e sabem que isso levaria muito
tempo.
Embora os cientistas geralmente achem que estão certos, a história nos
ensina que a ciência errou frequentemente no passado. O autoengano não é um
problema só da ciência, mas a ciência é mais vulnerável por causa de seu
sucesso incomum. Ela pode mais facilmente desviar-se por tangentes errôneas,
achando que está certa. Os cientistas precisam prestar mais atenção aos dados da
ciência e menos a estar de acordo com outros cientistas.

O secularismo na ciência
Hoje a ciência geralmente reivindica uma posição naturalista estrita, e Deus
não faz parte do quadro. Gurus da ciência como Stephen Gould caracterizam a
ideia de um desígnio inteligente como uma “falácia” que foi “historicamente
roída por traças”. 17 Vários cientistas notáveis fazem questão de enfatizar que a
aparência de um desígnio na natureza é ilusória, ou que precisa ser evitada.
Julian Huxley, neto de Thomas Huxley, comenta: “Os organismos são formados
como se tivessem um desígnio proposital [...]; o propósito é apenas aparente.” 18
Na Universidade de Oxford, Richard Dawkins, em seu livro The Blind
Watchmaker [O Relojoeiro Cego], opina que “a biologia é o estudo de coisas
complicadas que dão a impressão de terem sido idealizadas para um
propósito”. 19 Ele então passa o restante do livro tentando mostrar que não é
assim. Francis Crick, Prêmio Nobel, adverte que “os biólogos devem ter sempre
em mente que aquilo que veem não foi planejado, mas evoluiu”. 20 Não é difícil
concluir que uma agenda secular está em ação aqui, e muitos exemplos mais
foram dados no início do último capítulo. Tudo isso indica que, considerando o
modo como a ciência é praticada agora, estamos lidando com uma filosofia
secular materialista fechada, e não com uma investigação científica aberta,
voltada para a busca de explicações reais sobre a natureza, seguindo os dados
aonde quer que eles conduzam. O fato de que meio milhão de cientistas
interpreta a natureza sem Deus, enquanto apenas um punhado inclui o Criador,
representa um tremendo preconceito contra Deus na literatura científica.
Qualquer evidência de Deus é sistematicamente desprezada. Deus deverá ter o
Seu “dia no tribunal”, na arena científica. Isso deve mesmo acontecer, se a
ciência está à procura da verdade.
Conquanto a ideia de algum tipo de criação esteja recebendo muito mais
atenção agora por parte dos cientistas do que no passado, ela muitas vezes não é
bem recebida, e alguns líderes da ciência desprezam o conceito. Esta é, afinal de
contas, a nova era científica na qual Deus não existe ou é irrelevante. Embora os
cientistas, na sua maioria, sejam inteligentes, benévolos e responsáveis, a
agressividade secular não está morta. Parece que alguns cientistas nunca se
cansam de reclamar de como a igreja maltratou Galileu por sua crença não-
ortodoxa, mas correta, de que a Terra gira em torno do Sol. Galileu se tornou
uma espécie de ícone de como a ciência estava certa e a igreja errada, e isso
pode se refletir na crença em Deus. Só um cientista muito corajoso ousaria agora
invocar algum tipo de divindade que estivesse em ação na natureza, embora os
dados da ciência apontem para essa necessidade a fim de explicar as minuciosas
engenhosidades e complexidades que encontramos. 21 Em instituições de ensino
avançadas, esses cientistas que creem em Deus se conservam em silêncio. A
pressão do grupo, o receio do ridículo e o medo de perder o emprego impedem
que os 40% dos cientistas que acreditam num Deus que responde às orações 22
publiquem algo acerca dEle. O sociólogo Rodney Stark, da Universidade de
Washington, indica que, “segundo o marketing dos últimos 200 anos, se você
quer ser uma pessoa da ciência, precisa manter sua mente livre dos grilhões da
religião”. 23 Se um químico prepara uma complexa molécula orgânica, isso é
ciência; se Deus faz a mesma coisa, não é ciência!
Dois séculos excluindo Deus deixaram uma insidiosa matriz intelectual
secular na ciência, e isso permeia as teorias, as interpretações e até o
vocabulário. Hubert Yockey, biólogo molecular no campus de Berkeley da
Universidade da Califórnia, critica a visão confiante mas limitada da ciência e
ridiculariza o uso de “oxímoros” como “evolução química, sopa prebiótica” e
“auto-organização” que criam na mente o preconceito sobre como a vida se
originou. 24
Atualmente, a ciência pergunta: “Como a vida evoluiu?”, e não: “A vida
evoluiu?” Mas fazer isso deixa de lado a questão crucial sobre Deus. Um forte
componente secular na ciência induz o preconceito nas conclusões a que se
chega. Acontece que, assim como é praticada atualmente, a ciência é a estranha
combinação do estudo da natureza e de uma filosofia secular que expulsa Deus.
Você pode excluir Deus por definição, mas isso não funciona muito bem se Deus
existe!
Infelizmente, a autocensura contra Deus é muito forte na ciência
contemporânea. Quando eminentes biólogos evolucionistas, como Richard
Dawkins, escrevem livros intitulados The God Delusion 25 [Deus, um Delírio], a
mensagem é clara. O cientificismo, que é a confiança excessiva na ciência, está
muito vivo. Cientistas que fervorosamente creem em Deus às vezes enfrentam
um dilema de partir o coração, ao terem de manter uma posição secular e
essencialmente fingir que são ateus, a fim de ser aceitos pela comunidade
científica e poder publicar em periódicos científicos. 26 Ao investigar as áreas da
ciência que envolvem a questão de Deus, sua integridade intelectual pode ser
desafiada ao terem de viver a vida de um agente secreto. É de esperar que, ao se
tornarem mais aceitas as evidências de Deus, esses cientistas possam expressar
livremente suas crenças e ajudar a libertar a ciência da prisão secular que ela
criou para si mesma.
Pode-se indagar legitimamente se a ciência não tem o direito de se definir
como um empreendimento secular. Certamente tem; mas, se fizer isso, deve
tratar apenas de questões seculares. Isso pode ser extremamente difícil de fazer
porque o conhecimento muitas vezes não se encaixa em compartimentos
distintos. Por exemplo, quando a ciência tenta responder tudo num contexto
secular, ela está inadvertidamente fazendo a grave declaração teológica de que
Deus não existe, e isso é invadir questões religiosas. O isolamento intelectual em
disciplinas distintas como arte, religião e ciência não funciona quando se
pergunta de onde vieram todas as coisas.
Se a ciência vai se definir como estritamente secular, precisa evitar todas as
áreas em que a questão de Deus possa estar envolvida, e guardar-se de fazer
pronunciamentos acerca do início de quase tudo sem evidências suficientes. A
ciência deve declarar francamente que é ateia e fechada à conclusão de que Deus
existe. Mas já mencionamos anteriormente que a Associação Nacional dos
Professores de Biologia não se dispôs a tomar uma posição tão radical. 27 Os
evolucionistas muitas vezes afirmam que a criação não é ciência porque não há
um meio científico de avaliar um milagre como a criação, mas esse argumento
tende a perder sua validade quando eles escrevem livros como Scientists
Confront Creationism 28 [Cientistas Confrontam o Criacionismo] e tentam
avaliar a criação usando a ciência. Podem andar dos dois lados? A definição de
ciência, como tem sido praticada atualmente, é nebulosa.
Sob uma perspectiva diferente, alguns se inclinam a presumir que os
cientistas são um bando de ateus. A realidade quanto a isso é mais complicada.
Existem todos os tipos de cientistas e apenas alguns poucos são charlatães ou
deliberadamente hostis à religião. Deve-se conservar em mente que parte da
razão pela qual muitos cientistas não mencionam Deus é que frequentemente
seus experimentos, hipóteses e teorias não têm relação alguma com a questão de
Deus. Os cientistas gostam de lidar com aquilo que podem observar na natureza.
É a sua especialidade, e se sentem muito confortáveis nesse campo. Muitos
aspectos da ciência, como as alterações químicas que ocorrem quando o cimento
endurece, podem ser estudados sem envolver nenhuma pergunta quanto à
existência de Deus. As consistentes leis da natureza permitem que se estude
muita coisa da ciência sem invocar alguma referência direta a Ele. Isso, contudo,
não significa que Deus não exista; pode simplesmente significar que Deus não é
tão simples como alguns aspectos da nossa ciência. A questão da existência de
Deus é mais focalizada quando fazemos perguntas mais difíceis, incluindo, por
exemplo, como as leis da natureza entram em ação em padrões correlatos a
ponto de tornar possível o Universo, ou como se originou a vida.
Um número significativo de cientistas associa Deus com a evolução. Com
esse tipo de abordagem pode-se ter uma posição científica semissecular e um
Deus para resolver os mais difíceis problemas da evolução, como a origem da
vida e a explosão cambriana. Já foi apresentada uma variedade de ideias, 29 mas
você não encontrará essas ideias promovidas em publicações científicas ou em
livros didáticos. Essas ideias não são compatíveis com o idealismo secular atual
da ciência. Ademais, no contexto dos grandes problemas que a evolução
enfrenta, se você tem um Deus ativo na natureza, resolvendo esses problemas, há
pouca necessidade da teoria geral da evolução, de qualquer maneira! Uma vez
permitindo realmente a entrada de Deus no quadro, todo o horizonte muda, e
muitos cientistas resistem a isso. Incluir Deus tende a desaprovar a autonomia da
ciência.
Outros cientistas escolhem viver em dois mundos diferentes ao mesmo
tempo; especificamente, duas diferentes esferas filosóficas da realidade: uma que
inclui Deus e outra que O exclui. Isso pode ser conveniente, mas não é maneira
de encontrar a verdade. A verdade não pode se contradizer. Ou existe um Deus
ou não existe.
Em resumo, a posição secular atual da ciência introduz um grave
preconceito e não reflete as crenças de muitos cientistas; mas sugerir a atividade
de Deus é considerado não científico. Essa posição é uma visão restrita que
compromete a alegação da ciência de encontrar a verdade. Por exemplo, se Deus
existe, a ciência jamais poderá encontrá-Lo enquanto Ele for excluído do
cardápio explanatório. Nessa área de investigação, a ciência não mais respeita a
liberdade acadêmica e perde suas credenciais. Na ciência, deixe que os dados da
natureza falem por si mesmos, incluindo a possibilidade de que exista um Deus.
Na minha opinião, essa seria uma abordagem científica mais aberta e melhor.

A evidência científica de Deus


Existem muitos dados científicos que apontam para a necessidade de algum
tipo de intelecto com discernimento para ter planejado aquilo que estamos
descobrindo. Alguns podem achar que aqui lidamos com a ciência histórica, que
não é tão objetiva quanto a ciência experimental, mas não é esse o caso. A maior
parte desses dados, como as forças da física e a complexidade da bioquímica,
integra o tipo de ciência que se pode observar, e com a qual se fazem
experimentos repetíveis. Aqui temos a grande vantagem de lidar com fatos, e
não com ficção. Muitas dessas evidências já foram discutidas anteriormente 30 e
não as repetiremos aqui, exceto para recapitular alguns pontos altos. Estes estão
resumidos na Tabela 8.1 .
1. Por que a matéria se organizaria sozinha, com leis que permitem a
interação de partículas subatômicas, como os quarks, nêutrons e prótons, com
parâmetros muito exatos que facilitam a formação de pelo menos 100 tipos de
elementos? Esses elementos versáteis têm a capacidade de interagir uns com os
outros, propiciando a matéria do Universo, as moléculas e as mudanças químicas
necessárias à vida. A matéria não precisa existir, e certamente não precisa ser
controlada por leis tão elaboradas a fim de existir. Podia simplesmente ser uma
bolha de um grude desorganizado e caótico. As leis e a natureza organizada da
matéria, como são vistas nos átomos e suas partes, sugerem que foram
idealizadas para um universo com propósito. Por exemplo, a massa de um próton
deve ser exata dentro de uma parte em mil, a fim de ter os elementos que
formam o Universo.
2. O âmbito de ação e os valores muito exatos das constantes das quatro
forças básicas da física certamente não poderiam ter surgido por acaso, embora
alguns cientistas tentem sugerir exatamente isso. Sem essas características
precisas, não teríamos um universo habitável. Se o valor da força
eletromagnética ou da gravidade fosse diferente numa quantidade mínima, isso
seria catastrófico para o Sol. Nosso Sol nos tem providenciado a quantidade
exata de luz e calor por um tempo muito longo. Não nos encontramos apenas à
distância certa dele, mas, se as forças básicas da física fossem apenas levemente
alteradas, o Sol e o restante do Universo entrariam em colapso num instante.
Além do mais, a posição preferida do todo-importante elemento carbono, dentro
do esquema da formação dos elementos, também parece ter sido designada a
propósito para tornar a vida possível.
3. A origem da vida é o problema mais desconcertante que a evolução
orgânica enfrenta. A ciência ainda não foi capaz de apresentar cenários
plausíveis relativos a como a vida pode ter se originado por si. Há especulações,
mas elas são insignificantes quando encaram a multidão de moléculas especiais
de proteína necessárias, a origem das complexas informações do DNA, as
maravilhas dos ribossomos, elaboradas trilhas bioquímicas, os sistemas de
leitura e revisão, e o código genético. E o problema complica quando
observamos todas as outras partes da célula. No caso de organismos vivos, tudo
isso deve ser capaz de reproduzir-se para fazer mais organismos semelhantes.
Como poderia tudo isso acontecer por conta própria? Certamente parece que
algum tipo de planejamento muito inteligente esteve envolvido.
4. Quando tratamos de organismos vivos avançados, acumulam-se mais
problemas para uma interpretação mecanicista. Um cérebro humano médio tem
100 bilhões de células nervosas, conectadas por 400 mil quilômetros de fibras
nervosas, envolvendo 100 trilhões de conexões. No caso dos chips de
computador, é necessário ter as conexões certas para as devidas funções. Quando
estudamos a complexidade do olho, não temos a impressão de que possa ter
evoluído. O olho tem muitos sistemas complexos como a bioquímica integrada
sensível à luz da retina, as características de autoexposição e autofoco, que
consistem de muitos componentes que não funcionariam e não teriam
sobrevivência evolutiva até que todas as partes necessárias estivessem presentes.
A visão colorida é outro exemplo de complexidade irredutível, porque a
capacidade de separar várias cores na retina não ajudaria a proporcionar visão
multicolorida sem um mecanismo cerebral para analisar as diferentes cores.
Receptores e analisadores específicos devem estar presentes e funcionar
devidamente a fim de proporcionar um sistema que sobreviva.
5. Embora o tempo seja um fator importante para aumentar a possibilidade
de eventos evolutivos improváveis, o que acontece é que, quando
quantitativamente avaliadas, as eras de tempo propostas para a idade da Terra e
do Universo são totalmente inadequadas. Cálculos indicam que, em todos os
oceanos da Terra, seriam necessários em média 1023 anos para produzir uma
molécula específica de proteína de aminoácidos já existentes. Portanto, a idade
de cinco bilhões de anos para a Terra é um tempo dez bilhões de vezes menor do
que o necessário. Além disso, pelo menos centenas de tipos diferentes de
moléculas de proteína, e muitas duplicatas delas, são necessárias para a forma
mais simples de vida que conhecemos. O DNA nessas formas é muito mais
complexo do que as proteínas. E depois são necessários os lipídios (gorduras),
carboidratos, etc.
6. Parece ter havido pouca evolução durante os primeiros 5/6 do tempo
evolutivo. Então, quando se olha o registro fóssil, vê-se que a maioria dos filos
de animais aparece subitamente numa explosão cambriana que dura menos de
2% desse tempo evolutivo. O aparecimento repentino comum da maioria dos
grupos de plantas e animais não sugere que a evolução tenha ocorrido. Se a
evolução realmente aconteceu, esperaríamos ver uma continuidade sólida de
todos os tipos de intermediários fósseis de várias formas tentando evoluir, mas
os evolucionistas sugerem apenas alguns poucos intermediários que
frequentemente mostram diferenças em apenas partes do organismo, e assim têm
um significado um tanto dúbio. Dificuldades como essas exigem a existência de
um Criador.
7. Alguns aspectos da nossa mente apontam para uma realidade acima dos
limites mecanicistas normais da ciência. Esta não tem alcançado êxito com eles,
indicando que estão muito além do simples sistema de causa e efeito. Esses
fatores envolvem um Deus transcendente que Se responsabilize por eles. Um
desses mistérios é o nosso estado consciente, a percepção de que existimos. A
matéria não parece ter essa característica. Outro é nosso poder de escolha, ou
livre-arbítrio. Se é realmente livre, como a maioria concorda, está além da lei
normal de causa e efeito da ciência. Outro mistério é o nosso senso de bem e
mal, às vezes expresso no senso de justiça e injustiça. Reagimos diante da
injustiça e dos maus-tratos para com os fracos e pobres, e isso está em agudo
contraste com o conceito evolucionário de competição e da sobrevivência do
mais apto. Como seres humanos, temos ideais acima de um comportamento tão
impiedoso. Por outro lado, se simplesmente evoluímos, esse comportamento e
esses desejos seriam exatamente os que sobreviveriam. De onde vieram todas
essas elevadas características de nossa mente? Parece haver na humanidade uma
noção de sentido e bondade acima daquilo que a ciência encontra na matéria, e a
evolução não explica isso.
Ou existe um Deus que planejou a natureza ou não existe. Quando
consideramos todos os dados apresentados acima, desde a precisão das forças da
matéria e a complexidade da vida, até nosso cérebro e mente, temos de admitir
que há uma abundância de significativa evidência que é muito difícil de explicar
se não cremos num Deus. Os dados científicos forçam o conceito de um
planejador.

Podem os cientistas ignorar a evidência científica de Deus?


Muitas vezes, a ciência fornece dados que os cientistas não aceitam.
Anteriormente já foram dados exemplos como o de Semmelweis e os germes
causadores da febre puerperal, Mendel e os princípios da hereditariedade,
Wegener e sua ideia de que os continentes se movem e Bretz e as interpretações
catastróficas. Esses exemplos todos ilustram como a comunidade científica pode
se apegar a conclusões errôneas, a despeito das evidências. Abundantes e
convincentes evidências indicam que é necessário um Deus planejador. O
paradoxo é: por que os cientistas não proclamam isso?
Atualmente, os cientistas têm fechado a porta a toda consideração
relacionada com Deus na ciência. Como foi mencionado, não era assim quando
gigantes intelectuais como Kepler, Boyle, Pascal, Galileu, Lineu e Newton
lançaram os fundamentos da ciência moderna. Eles estavam descobrindo os
princípios e as leis que Deus criara. O clima científico secular atual não reflete as
crenças dos pioneiros da ciência; tampouco reflete as crenças de muitos
cientistas de hoje. Existe um toque de realismo na declaração um tanto jocosa
segundo a qual muitos cientistas acreditam em Deus, mas só nos fins de semana,
quando vão à igreja! Lembre-se de que 40% dos cientistas acreditam num Deus
que responde às orações, 45% não acreditam e 15% não têm certeza. 31
Podemos provavelmente explicar melhor a postura secular dos cientistas como
um fenômeno sociológico ou de atitude. Além disso, vários eruditos têm
sugerido que às vezes a evolução pode tomar a forma de uma religião. 32 O fato
de que Deus tenha sido excluído da ciência por um século e meio, sem que a
ciência tenha sido capaz de apresentar quaisquer respostas satisfatórias às
principais questões das origens, deve ser um tema de profunda preocupação.
Gostamos de pensar que nossas ideias são as melhores, e que o erro estava
no passado. Sentimo-nos muito superiores se podemos mostrar que o passado
estava muito errado. Mas, às vezes, o passado estava certo e os antigos
paradigmas descartados podem novamente ser aceitos como verdadeiros. Imre
Lakatos, filósofo da ciência no século 20, não parece ter tanta certeza acerca da
superioridade do presente sobre o passado, quando ironicamente comenta: “As
lixeiras eram recipientes usados no século 17 para descartar algumas das
primeiras versões de manuscritos que a autocrítica – ou a crítica pessoal de
amigos cultos – eliminava à primeira leitura. Na nossa era de explosão de
publicações, a maioria das pessoas não tem tempo para ler os próprios
manuscritos, e a função da lixeira passou a ser assumida pelas publicações
científicas.” 33 Não devíamos simplesmente seguir o atual “clima de opinião”, e
não há razão para crer que aquilo que se considera verdade hoje seja considerado
verdade no futuro, à medida que surjam novas ideias e informações. Se a história
servir de indício, muitas de nossas ideias serão ridicularizadas no futuro.
Os grandes modos de pensar da humanidade têm, por vezes, mudado
dramaticamente. A alquimia e a caça às bruxas tiveram seus séculos de domínio.
Damos graças porque já se foram. Na antiguidade, líderes intelectuais como
Sócrates, Platão e Aristóteles deram muita ênfase ao processo do pensamento, a
como chegamos à verdade, à importância da razão e ao significado subordinado
dos sentidos. Então, no mundo ocidental, durante a Idade Média, verificou-se um
conjunto diferente de prioridades nas atividades intelectuais. O padrão de
pensamento naquele período, conhecido como escolasticismo, prestava atenção
especial à lógica, gramática, retórica, relação entre fé e razão e respeito para com
a autoridade, especialmente de Aristóteles. Agora temos um conjunto diferente
de prioridades, com as ideias científicas gerando alto grau de aceitação. Alguns
sociólogos seriam exceção; eles acham que a ciência é basicamente um
empreendimento subjetivo moldado pelos caprichos dos cientistas. De qualquer
maneira, encontramo-nos numa era científica, e a ciência é a tendência de nossa
atual matriz intelectual. Eu gostaria de sugerir que, em meio a todo esse labirinto
de ideias humanas que vêm e vão, ainda existem dados firmes que nos ajudam a
permanecer no caminho em direção à verdade, e creio que os dados científicos
que apontam para Deus são abundantes e convincentes. Por sorte, temos alguns
pontos sólidos de ancoragem.
A questão não é apenas uma batalha entre algum tipo de evolução e algum
tipo de criação; essa discussão é somente um sintoma da questão mais profunda
que deseja saber se a ciência naturalista (mecanicista, materialista) pode,
sozinha, fornecer uma visão satisfatória do mundo. Isso provoca a solene
pergunta: tem a ciência nos levado a um caminho errôneo ao excluir Deus? Na
minha mente, há pouca dúvida de que seja esse o caso. O clima científico
contemporâneo se colocou numa camisa de força intelectual que não admite
Deus no contexto, e muitos cientistas insistem em permanecer com ela a
despeito das convincentes evidências em contrário. Isso provoca outra grave
pergunta: por que aconteceu? A questão do comportamento dos cientistas (ou, já
que falamos nisso, de qualquer outro grupo de seres humanos) é complexa
demais para permitir uma resposta final, mas algumas sugestões parecem
definidamente significativas.
1. Uma razão, a que já nos referimos antes, é que a ciência é o estudo dos
fatos e das explicações acerca da natureza, e o cientista se sente mais à vontade
com a natureza do que pensando em Deus. Essa é uma explicação válida, mas
pode ser apenas uma razão menor para que a ciência rejeite Deus, porque os
cientistas acolhem todo tipo de ideias especulativas.
Existe uma multidão de ideias realmente malucas na ciência, as quais
precisam ser eliminadas muito antes de se pensar em eliminar Deus. A existência
delas aponta para uma grave atitude tendenciosa no atual clima científico.
Exemplos de ideias especulativas que a ciência considera incluem: a
singularidade no início do Big Bang, quando as leis da ciência não se aplicavam;
universos múltiplos para os quais não há evidência válida; um incompreensível
princípio cosmológico antrópico; informação nos átomos que poderia criar vida;
aceitar a evolução de organismos muito tempo antes de serem encontrados no
registro fóssil. Todo tipo de ideias imaginárias é levado a sério, e a tolerância da
ciência para com histórias fantásticas do tipo “é assim mesmo” 34 fica às vezes
além do crível. Contudo, quando se trata de Deus, hoje em dia, não se permite
que Ele faça parte do quadro da ciência. Os cientistas se sentem mais à vontade
com os dados da natureza, mas, sendo que fazem muitas especulações e teorias
além dos dados, deveriam estar dispostos a considerar também a possiblidade
de que Deus existe.
2. Uma segunda sugestão vem de um respeitadíssimo filósofo da ciência do
século 20, Michael Polanyi, que atribui o secularismo da ciência a uma reação
exagerada diante das repressões do pensamento medieval. Esse pensamento
conseguia ser muito restritivo. Durante a época medieval, Deus era considerado
a causa de quase tudo. De acordo com algumas ideias, Ele criou os ratos para
nos ensinar a guardar a comida, e criou os percevejos para impedir que
dormíssemos demais. Polanyi declara: “É aí onde vejo o problema, onde parece
haver um arraigado distúrbio entre a ciência e o restante da cultura. Creio que
esse distúrbio estava inerente no impacto liberador da ciência moderna sobre o
pensamento medieval, e só posteriormente se tornou patológico.
“A ciência se rebelou contra a autoridade. Rejeitou a dedução [arrazoado
com base em premissas] a partir das causas primárias em favor de generalizações
empíricas [percepção dos sentidos]. Seu objetivo máximo era uma teoria
mecanicista do Universo.” 35 O pêndulo da ciência foi muito longe e agora se
encontra num forte secularismo. Como já foi indicado, 36 há indícios de uma
recente tendência a se afastar de uma ciência puramente secular, mas só o tempo
dirá se essa é uma tendência ou apenas uma variação no ruído de fundo.
3. Bom número de cientistas acha que admitir a existência de Deus equivale
a desistir da racionalidade. Um Deus imprevisível não Se encaixa no princípio
científico de causa e efeito. Esse argumento, porém, tende a perder muito do seu
significado no contexto da tese bem aceita, mencionada antes, 37 de que a
ciência se desenvolveu no mundo ocidental por causa do tipo racional de Deus
da tradição judaico-cristã. O temor da irracionalidade é válido somente quando
se pressupõe uma divindade irracional.
4. Existem preocupações sociológicas. Alguns cientistas temem que admitir
Deus no cenário encorajaria um tipo de controle político-religioso
fundamentalista da sociedade, e acham que isso seria muito ruim para a ciência.
O persistente debate sobre ensinar a criação junto com a evolução nas escolas
públicas dos Estados Unidos se ergue no horizonte ao se considerarem essas
preocupações sociológicas.
5. O orgulho intelectual que os cientistas sentem pela ciência pode ser outro
fator. Às vezes, os cientistas têm razão em se orgulhar das conquistas da ciência,
mas o autoritarismo pode ser altamente contagioso num clima de sucesso.
Amamos o poder, mas os ditadores, os líderes intelectuais, os altos executivos e
todos os favorecidos com a eminência podem ter dificuldade ao administrar seu
poder com discrição. A famosa declaração do historiador britânico Lord Acton
de que “o poder tende a corromper e o poder absoluto corrompe
absolutamente” 38 é muitas vezes verdade. Esse não é um problema especial dos
cientistas; é um problema de todos os que alcançam algum grau significativo de
sucesso. Na ciência, quando se traz para dentro do quadro um Deus que criou a
natureza, os cientistas podem sentir que estão perdendo o controle do seu
edifício intelectual e seu poder. Porém, as consecuções da ciência não são tão
grandes a ponto de Deus poder ser ignorado, especialmente quando a ciência
deixa tantas perguntas sem respostas.
O orgulho e a aversão a Deus que frequentemente vemos agora na ciência
permanecem em agudo contraste com a humildade, devoção e respeito a Deus
revelados pelos gênios que estabeleceram os fundamentos da ciência moderna.
Notamos isso em Newton, 39 e o mesmo pode ser visto em Kepler, que escreveu
num contexto de devoção: “Se eu fui sedutoramente levado à arrogância pela
maravilhosa beleza das Tuas obras, ou se tiver amado minha própria glória entre
os homens enquanto avançava no trabalho destinado à Tua glória, terna e
misericordiosamente perdoa-me; e, por fim, digna-Te de fazer com que essas
demonstrações me conduzam à Tua glória e à salvação de pessoas, e que de
forma alguma eu seja um obstáculo para isso. Amém!” 40 Não há muitos
cientistas que aleguem ser maiores que Kepler ou Newton. Esses gigantes
intelectuais exemplificam como a ciência e Deus podem operar juntos.
6. Fatores como o ego e a liberdade pessoal podem servir de obstáculo para
o reconhecimento de Deus, especialmente de um Deus diante de quem a pessoa
se sinta responsável. Como foi mencionado no último capítulo, alguns eminentes
escritores da ciência, como Gould e Huxley, referem-se à “liberdade máxima” e
à “liberação” proporcionadas por uma visão sem sentido do mundo, onde não
existe Deus.
7. Outra razão pela qual a ciência agora exclui Deus é simplesmente porque
esse é o “espírito científico” contemporâneo, o paradigma ou o modismo
científico atual de nossa era. Se você é cientista, é assim que se espera que você
se comporte; e existem autoproclamados guardiães da ciência que não hesitarão
em avisá-lo se você se desviar desse estilo. Independentemente daquilo que os
dados da natureza estejam dizendo, se você vier a se chamar cientista, é melhor
não deixar que a ideia de Deus faça parte do contexto. O biólogo Scott Todd, da
Universidade Estadual de Kansas, comenta na revista Nature: “Mesmo que todos
os dados apontem para um designer inteligente, essa hipótese é excluída da
ciência porque não é naturalista.” 41 Esse tipo de ciência é uma atitude, uma
filosofia secular subjetiva; é não permitir que se sigam os dados da natureza para
onde eles conduzem.
Uma visão tão estreita da ciência excluiria Newton e Kepler do quadro dos
cientistas, porque eles incluíam Deus em algumas de suas conclusões relativas à
natureza, mas inferir que Kepler e Newton não foram cientistas é blasfêmia.
Além disso, como se notou na última parte do capítulo 1, vários cientistas
modernos também cogitam seriamente de um Deus que está ativo na natureza.
Nossas tendências gregárias, bem como nosso desejo de aprovação,
sobrevivência social e sucesso, podem levar muitos cientistas a se conformarem
com o padrão secular da ciência. Podemos ter uma ideia da caixa fechada onde
os cientistas se encontram agora por este comentário do físico teórico Tony
Rothman: “Quando confrontados com a ordem e a beleza do Universo e as
estranhas coincidências da natureza, é muito tentador dar um salto da fé da
ciência para a religião. Tenho certeza de que muitos físicos desejam fazê-lo. Eu
só gostaria que eles o admitissem.” 42 Embora muitos cientistas creiam em
Deus, trazê-Lo para o mundo científico simplesmente não é, neste momento, a
coisa “legal” a ser feita. O espectro da religião deve ser evitado. Prevalece a
conformidade.
Todas as sugestões dadas acima são significativas, mas tenho a impressão de
que as três últimas são muito importantes. A ciência exclui Deus principalmente
por causa de fatores pessoais e sociológicos relacionados com o comportamento
dos cientistas, não por causa de dados científicos.
Durante três séculos, Deus foi incluído no cardápio explanatório da ciência.
Agora, a despeito do fato de que muitos dados apontam para Deus, Ele é
excluído. Em minha opinião, a ciência cometeu seu maior erro filosófico um
século e meio atrás, quando rejeitou Deus como fator explanatório na natureza e
tentou explicar tudo de maneira naturalista (materialista, mecanicista). Não
tivesse a ciência feito isso, ela não estaria agora enfrentando os problemas
insuperáveis e as improbabilidades que desafiam as atuais interpretações
( Tabela 8.1 ). Existe espaço para Deus na ciência.

Síntese
A vida tem algum sentido? A existência da humanidade não vale nada?
Somos apenas acidentes da natureza? Bertrand Russell, o filósofo britânico
secular, expressou uma das mais significativas descrições da ausência de sentido:
“Ainda mais despropositado, mais vazio de sentido, é o mundo que a ciência
apresenta para que nele creiamos. Em meio a um mundo assim, nossos ideais
devem encontrar seu espaço daqui para a frente. Que o homem seja o produto de
causas que não previam o fim a ser atingido; que sua origem, seu crescimento,
suas esperanças e temores, seus amores e crenças sejam tão-só o resultado de
combinações acidentais de átomos; que nenhuma paixão, nenhum heroísmo e
nenhuma intensidade de pensamento e sentimento possam preservar uma vida
individual após a tumba; que todos os labores dos séculos, toda a devoção, toda a
inspiração e todo o brilho meridiano do gênio da humanidade sejam destinados à
extinção na vasta morte do sistema solar, e que o templo inteiro das conquistas
do homem deva ser inevitavelmente sepultado sob os escombros de um universo
em ruínas – todas essas coisas, se não são indiscutíveis, são, todavia, quase tão
certas que nenhuma filosofia que pretenda rejeitá-las pode ter a esperança de
permanecer. Somente junto aos andaimes dessas verdades, somente sobre o
firme fundamento de um desespero obstinado, pode a habitação da alma ser
edificada com segurança daqui para a frente.” 43
Que tom sinistro! Felizmente, os dados científicos que apontam para Deus
( Tabela 8.1 ) desafiam o “firme fundamento do desespero” de Russell. Além
disso, é difícil defender que a vida seja sem sentido e que não há propósito
naquilo que fazemos. Alfred North Whitehead, o eminente filósofo do século 20,
famoso em Cambridge e Harvard, desafia essa noção de falta de propósito
quando graceja: “Os cientistas que passam a vida com o propósito de provar que
ela é sem propósito constituem um interessante objeto de estudo.” 44 Existe uma
realidade além da ciência. Houston Smith aponta para isso claramente quando
comenta: “Ao visualizar a maneira como são as coisas, não há lugar melhor onde
começar do que a ciência moderna. Igualmente, não há lugar pior onde
terminar.” 45
A posição secular da ciência moderna é especialmente irrelevante para
algumas das questões mais profundas da vida, como a razão de nossa existência,
nossas percepções, nossos valores morais, nossa vontade de fazer o bem ou o
mal, e nosso amor e interesse pelos outros. A isso podemos acrescentar outros
mistérios, como a curiosidade, a criatividade e a capacidade de entender. São
aptidões que a ciência não encontrou na simples matéria e geralmente ignora,
mas entendemos que fazem parte da realidade e daquilo que dá sentido à vida.
Como Hubert Yockey ilustra, o homem não é apenas matéria: “Se a vida é
apenas material, então os crimes de Hitler, Stalin e Mao Tse-Tung não trazem
consequências. Se os seres humanos são apenas matéria, não é pior queimar uma
tonelada de seres humanos do que uma tonelada de carvão.” 46 Francis Collins,
ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas do Genoma Humano, o qual teve
muito que ver com o recente mapeamento do padrão genético humano (nossa
fórmula dos três bilhões de bases de DNA), acredita que “um poder superior
deve também desempenhar um papel naquilo que somos e no que nos
tornamos”. Ele também se pergunta: podem a genética e a biologia molecular
“realmente responder pelo conhecimento universal intrínseco de certo e errado,
comum a todas as culturas humanas, em todas as eras”, e “pela forma abnegada
de amor que os gregos chamavam de agape”? 47
Se a ciência naturalista tivesse apresentado modelos plausíveis para a origem
da matéria, da vida e de nossa mente, então se poderia seriamente considerar a
possibilidade de que não existe Deus. Mas o silêncio absoluto da ciência secular
nessas áreas implica a necessidade de um planejador mestre. Como parece que
somos o resultado de um desígnio, temos muito boas razões para crer que nossa
vida não seja sem sentido e sem propósito, e que nem tudo está acabado quando
morremos. Os dados científicos que apontam para Deus também sugerem que há
luz no fim do túnel da vida.
Não posso crer que simplesmente aparecemos aqui por acidente, e não posso
crer que Deus nos criaria para nada. Todavia, temos a liberdade de decidir se
queremos acreditar que nossa vida tem sentido ou não, se há um propósito para a
existência da humanidade ou não, ou se existe um Deus ou não. É lamentável
que, apesar de todos os dados que apontam para Deus, tantos cientistas concluam
que a vida não tem sentido. Eles tendem a perder a riqueza, o significado, a
satisfação e a esperança que se obtêm de uma vida dirigida aos mais elevados
ideais de bondade e interesse pelos outros. 48 Esses são ideais que não se
encontrarão em parte alguma na aridez da competição e da sobrevivência do
mais apto da evolução, nem nas simples interpretações mecanicistas da natureza.
Quando examino a natureza, parece-me que deve haver um Deus que criou
as coisas muito exatas e muito complexas que encontramos. Isso inclui nosso
cérebro complexo e a capacidade intelectual que ele tem de raciocinar e
compreender, nossas percepções e nossa consciência. Seria muito estranho que
um Deus criasse esses seres pensantes e não lhes deixasse algum tipo de
comunicação de Sua parte, de modo que saio em busca dessa comunicação. Para
mim, a Bíblia parece ser a melhor candidata para tanto, não só por causa de seu
significado e franqueza, mas porque o tipo de Deus racional, que vai da causa
para o efeito, encontrado nela combina com o efeito racional de causa e efeito
que a ciência encontrou no Universo. Essa conclusão se encaixa bem na tese
amplamente aceita que discutimos antes, 49 segundo a qual a razão por que a
ciência moderna se desenvolveu no mundo ocidental se deve à lógica racional da
tradição judaico-cristã, oriunda do tipo de Deus descrito na Bíblia. Podemos
considerar outras grandes religiões, como hinduísmo, budismo, confucionismo
ou xintoísmo, e descobrir o misticismo, mas não Deus; muitos deuses, às vezes
deuses em conflito uns com os outros, mas não o Deus coerente da Bíblia. Esse
tipo de Deus é congruente com a racionalidade que encontramos no Universo e
com a ciência; em particular, com as leis da ciência que funcionam ao nosso
redor.
Pode-se objetar que ainda é necessário invocar “milagres irracionais” de um
Deus que está ativo na natureza, a fim de explicar mistérios como a origem da
vida. Pode não ser esse o caso. Não sabemos como Deus atua. O que a princípio
parece irracional para nós, pode não sê-lo quando o entendemos melhor. Além
disso, esses “milagres” parecem ser escassos o suficiente para que a costumeira
racionalidade da realidade não seja destruída se uns poucos milagres ocorrem.
Requer-se fé para crer em Deus? Sim. Mas, em vista de todos os dados que
apontam para um planejador, requer-se muito menos fé para crer em Deus do
que para acreditar que toda a precisão, todas as complexidades e o sentido que
encontramos tenham simplesmente surgido por acaso. Ademais, deve haver
algum significado no fato de que a Bíblia, da qual bilhões de exemplares foram
impressos, e que tem uma distribuição muitas vezes maior que a de qualquer
outro livro, seja o mais aceito guia da humanidade para a vida. Embora escrita
por dezenas de autores em três continentes, cobrindo um período de 1.500 anos,
sua coerência interna é notável. Para mim, a combinação da ciência com a Bíblia
provê as melhores respostas para minhas perguntas mais profundas.
Podemos sempre alegar um conjunto extremamente fortuito de
circunstâncias, e que estamos aqui só por acidente. Contudo, em vista das muitas
improbabilidades extremas que esse tipo de raciocínio envolve, não parece ser
uma solução razoável. Parece necessária a existência de uma mente superior. Um
número elevado demais de graves problemas permanece sem solução quando
Deus é excluído. A natureza sugere um Deus com desígnio e propósitos, e
também que há sentido em nossa existência. Atualmente, a ciência, com sua
perspectiva restrita, não considera essa ideia. Mas, para formar uma sólida visão
do mundo, deve-se estar disposto a avaliar alternativas, e não a excluí-las. A
ciência devia retornar àquela abertura que tinha quando os pioneiros da
moderna ciência permitiram a entrada de Deus no quadro das explanações.
Durante os dois primeiros séculos da ciência moderna, Deus foi incluído no
cardápio explanatório da natureza. Agora, as interpretações dos cientistas
mudaram, e eles O excluíram. Muitas descobertas científicas recentes, porém,
mostram um grau de precisão e complexidade que é virtualmente impossível de
explicar com base em mudanças naturais aleatórias. Especialmente notáveis são
a sintonia fina das forças da física, que têm as constantes exatas para permitir um
universo habitável, e as numerosas e extremamente integradas complexidades
dos sistemas biológicos. Vários outros fatores também parecem exigir uma
elaborada formulação muito além daquilo que pode ser explicado por
ocorrências naturais ( Tabela 8.1 ). Todas essas descobertas apontam para um
tipo de complexo planejamento feito por um idealizador inteligente, um ser que
consideraríamos Deus.
A ciência descobriu Deus. Os dados científicos indicam que Deus é
necessário. Espera-se que mais e mais cientistas permitam que Deus volte às
interpretações científicas.

Referências
1
Citado em Horvitz LA. 2000. The quotable scientist: words of wisdom from Charles Darwin, Albert
Einstein, Richard Feynman, Galileo, Marie Curie, and more. Nova York: McGraw-Hill, p. 151.
2
Ver o capítulo 3.
3
Palestra feita por Gary Posner, em 9 de novembro de 2001, em Atlanta, Convenção do Centro de
Pesquisa.
4
Ver o capítulo 2.
5
Por exemplo, Shermer M. 2000. How we believe: the search for God in an age of science. Nova York:
W. H. Freeman and Company, p. 21.
6
Por exemplo, (a) Emberger G. 1994. Theological and scientific explanations for the origin and purpose
of natural evil. Perspectives on Science and Christian Faith 46 (3), p. 150-158. (b) Hick J. 1977. Evil
and the God of love. 2a edição. Londres: Macmillan. (c) Lewis CS. 1957. The problem of pain. Nova
York: Macmillan. (d) Wilder-Smith AE. 1991. Is this a God of love? Wilder-Smith P, tradutor. Costa
Mesa: TWFT.
7
Ver o capítulo 6. Para uma visão discordante, ver Cleland CE. 2001. Historical science, experimental
science, and the scientific method. Geology 29, p. 987-990. Para uma introdução abalizada, ver
Simpson GG. 1963. Historical science. In: Albritton CC, Jr., editor. The fabric of geology. Reading:
Addison-Wesley, p. 24-48.
8
Ver os capítulos 3 e 5.
9
Ver os capítulos 3-5.
10
Para alguns exemplos ilustrativos, ver: (a) Behe MJ. 1996. Darwin’s black box: the biochemical
challenge to evolution. Nova York: Touchstone. (b) Crick F. 1981. Life itself: its origin and nature.
Nova York: Simon & Schuster. (c) Denton M. 1985. Evolution: a theory in crisis. Bethesda, MD: Adler
& Adler. (d) Ho M-W, Saunders P, editores. 1984. Beyond neo-Darwinism: an introduction to the new
evolutionary paradigm. Orlando: Academic Press. (e) Løvtrup S. 1987. Darwinism: the refutation of a
myth. Nova York: Croom Helm. (f) Ridley M. 1985. The problems of evolution. Oxford: Oxford
University Press. (g) Shapiro R. 1986. Origins: a skeptic’s guide to the creation of life on earth. Nova
York: Summit. (h) Taylor GR, 1983. The great evolution mystery. Nova York: Harper & Row. (i) Wells
J. 2000. Icons of evolution: science or myth? Why much of what we teach about evolution is wrong.
Washington, DC: Regnery Publishing.
11
Smith H. 1976. Forgotten truth: the primordial tradition. Nova York: Harper Colophon, p. 132.
12
Futuyma DJ. 1998. Evolutionary biology. 3a edição. Sunderland: Sinauer Associates, p. 28.
13
Huxley, TH. 1871 (1893). Darwiniana: essays. Nova York: Appleton, p. 149.
14
Ver também a primeira parte do capítulo 7 para discussão anterior.
15
Ver os capítulos 3 e 7.
16
Ver a discussão no capítulo 5.
17
Gould SJ. 1985 (1998). Mind and supermind. In: Leslie J., editor. Modern cosmology & philosophy. 2a
edição. Amherst: Prometheus, p. 187-194.
18
Huxley J. 1953. Evolution in action. Nova York: Mentor, p. 13.
19
Dawkins R. 1986. The blind watchmaker: why the evidence of evolution reveals a universe without
design. Nova York: Norton, p. 1.
20
Crick F. 1988. What mad pursuit: a personal view of scientific discovery. Nova York: Basic Books, p.
138.
21
Ver os capítulos 2-5.
22
Ver o capítulo 1.
23
Citado em Larson EJ, Witham L. 1999. Scientists and religion in America. Scientific American 281 (3),
p. 88-93.
24
Yockey HP. 1992. Information theory and molecular biology. Cambridge: Cambridge University Press,
p. 288. Itálicos suprimidos.
25
Dawkins R. 2006. The God delusion. Boston: Houghton Mifflin.
26
Existem raras exceções. De interesse recente: Meyer SC. 2004. The origin of biological information and
the higher taxonomic categories. Proceedings of the Biological Society of Washington 117 (2), p. 213-
239. Esse artigo, que advoga o desígnio inteligente, causou furor desde sua publicação numa revista
científica. Essas reações comprovam a atual resistência da comunidade científica para com o conceito
de Deus.
27
Ver o capítulo 1.
28
Godfrey LR, editor. 1983. Scientists confront creationism. Nova York: Norton.
29
Para discussão e avaliação, ver: Roth AA. 1998. Origins: linking science and scripture. Hagerstown:
Review and Herald, p. 339-354.
30
Ver especialmente os capítulos 2-5.
31
Ver o capítulo 1.
32
Por exemplo: (a) Midgley M. 1985. Evolution as a religion: strange hopes and stranger fears. Londres:
Methuen. (b) Ruse M. 2003. Is evolution a secular religion? Science 299, p. 1523-1524.
33
Citado em 1987 em Palaios 2, p. 445. Lakatos crê que, em geral, a ciência progride com o tempo.
34
A expressão “histórias assim mesmo” é ocasionalmente usada na literatura científica em referência a
conceitos fantasiosos considerados como não tendo boa autenticidade. A expressão vem de um livro de
Rudyard Kipling, Just So Stories, escrito para crianças. Um relato nesse livro é que o elefante
desenvolveu sua longa tromba porque um crocodilo puxou por longo tempo o focinho do elefante. Ver:
Kipling R. 1907. Just so stories. Garden City: Doubleday.
35
Michael Polanyi. 1969. Knowing and being: essays by Michael Polanyi. Green M, editor. Chicago: The
University of Chicago Press, p. 41.
36
Ver o capítulo 1.
37
Ver o capítulo 1.
38
Lord Acton (John Emerich Edward Dahlberg). 1887. Citado em Partington A, editor. 1992. The Oxford
dictionary of quotations. 4a edição. Oxford: Oxford University Press, p. 1.
39
Ver o capítulo 1.
40
Citado em Gingerich O. 2004. Dare a scientist believe in design? Bulletin of the Boston Theological
Institute 3.2, p. 4-5.
41
Todd SC. 1999. A view from Kansas on that evolution debate. Nature 401, p. 423.
42
Rothman T. 1987. A ‘What you see is what you beget’ theory. Discover 8 (5), p. 90-99.
43
Russell B. 1929. Mysticism and logic. Nova York: Norton, p. 47, 48.
44
Citado em du Noüy L. 1947. Human destiny. Nova York: Longmans, Green, p. 43.
45
Smith, Forgotten truth, p. 1.
46
Yockey HP. 1986. Materialist origin of life scenarios and creationism. Creation/Evolution XVII, p. 43-
45.
47
Collins FS, Weiss L, Hudson K. 2001. Heredity and humanity. The New Republic 224 (26), p. 27-29.
Itálicos na versão original do autor.
48
Falo aqui das preocupações muito além da limitada preocupação pelos familiares mais próximos,
sugerida pelo conceito da seleção de parentesco da sociobiologia.
49
Ver o capítulo 1.
A questão de Deus: Como é usada neste livro, a expressão refere-se
especificamente à questão da existência ou não de Deus.
Agnóstico: Alguém que crê que são desconhecidas as respostas para as grandes
questões, como a existência de Deus ou a origem do Universo.
Aminoácido: Molécula orgânica simples, com um grupamento de nitrogênio. Os
aminoácidos se combinam para formar proteínas. Os organismos vivos têm 20
tipos diferentes de aminoácidos.
Ateu: Alguém que não crê na existência de Deus.
Base (DNA, RNA): Também chamada base nucleotídea. É uma molécula
semelhante a um anel, que contém nitrogênio e serve como a parte principal
dos nucleotídeos. Essas bases são as unidades do código genético. Os cinco
tipos diferentes encontrados no DNA e RNA são: adenina, guanina, citosina,
uracila (somente no RNA) e timina. Ver nucleotídeo.
Bastonete: Célula alongada fotorreceptora na retina dos vertebrados, sensível à
luz fraca, mas não a várias cores de luz. Ver cones.
Big Bang: Evento explosivo especial que se supõe ter ocorrido no início do
Universo, mudando-o de uma minúscula partícula a um cosmo em expansão.
Cambriano: Divisão (período) inferior da porção fanerozoica da coluna
geológica. É a unidade mais baixa, com abundância de fósseis.
Catastrofismo: Teoria de que fenômenos fora de nossa experiência atual da
natureza (grandes catástrofes) modificaram radicalmente a crosta terrestre por
meio de eventos repentinos, violentos, mas de curta duração, mais ou menos
em âmbito planetário.
Ciência histórica: Tipo de ciência menos objetiva e mais difícil de comprovar.
Isso frequentemente inclui eventos passados que não podem ser repetidos, daí
o qualificativo “histórica”. A ciência histórica contrasta com a ciência
experimental, em que se pode facilmente repetir um teste.
Ciência moderna: Ciência dos últimos cinco séculos, caracterizada por
objetividade, experimentação e matemática. Mais recentemente, também tem
sido caracterizada por uma filosofia naturalista (materialista).
Ciência sem fatos: Conclusões científicas baseadas em conjecturas, e não em
fatos.
Ciência: Estudo dos fatos e interpretações sobre a natureza. Alguns excluem a
possibilidade de um Deus ativo na natureza a partir das conclusões da ciência,
mas uma tese deste livro é que essa exclusão é restritiva e pode interferir na
descoberta da verdade sobre a natureza.
Cladística: Classificação de um seleto grupo de organismos de acordo com
semelhanças, especialmente as exclusivas.
Cladograma: Diagrama em forma de ramificações, ilustrando as semelhanças e
diferenças entre um grupo de organismos. Muitos cientistas consideram que
um cladograma representa as mudanças evolutivas que supostamente
ocorreram.
Classe (classificação): Ver classificação de organismos.
Classificação de organismos: Os biólogos usam frequentemente o seguinte
sistema hierárquico para classificar organismos. Cada categoria abaixo da
primeira é uma subdivisão da que vem acima.
Reino
Filo (animais) e Divisão (plantas)
Classe
Ordem
Família
Gênero
Espécie
Clima de opinião: Opinião ou ponto de vista que prevalece num grupo social.
Código genético: As 64 combinações das três bases nucleotídeas encontradas no
DNA (ver códon), que determinam quais dos 20 aminoácidos encontrados em
organismos vivos serão colocados numa posição específica numa molécula
de proteína.
Códon: Unidade básica do código genético. Cada códon consiste de três bases
de nucleotídeos, codificando um tipo de aminoácido.
Coluna geológica: Sequência vertical ou cronológica das camadas de rocha,
comumente representada no formato de coluna, com as camadas mais baixas e
antigas na base, subindo até as mais jovens no topo. A coluna pode representar
uma área local ou a sequência vertical geral de todas as camadas de rocha da
Terra.
Complexidade irredutível: Complexidade na qual os vários componentes são
todos necessários para o devido funcionamento. Ver partes interdependentes.
Complexidade: Relação de partes ligadas de algum modo umas às outras. Neste
livro, usamos o termo especialmente para designar partes dependentes umas
das outras a fim de poderem funcionar devidamente.
Cone (olho): Célula sensível à luz (fotorreceptora) da retina dos vertebrados,
que é sensível a diferentes cores de luz. Os cones proporcionam cor e visão
aguda na claridade.
Consciência: Percepção pessoal de que existimos.
“Counterslab” (paleontologia): Uma placa ou lâmina de rocha que esteve em
contato com uma outra que continha um fóssil, e reflete a imagem do fóssil.
Criação progressiva: Ideia de que Deus criou tipos cada vez mais avançados de
organismos ao longo de éons de tempo.
Criação recente: Ideia de que Deus criou a vida alguns milhares de anos atrás,
rapidamente, num período de seis dias, conforme o relato da Bíblia.
Criação: O termo tem muitos significados. Neste livro, refere-se ao ato
específico de Deus trazendo algo à existência, como o Universo, a vida ou a
nossa percepção da existência. Para usos mais específicos, ver criação recente,
criação progressiva.
Cromossomo: Forma compacta semelhante a filamentos do DNA que se produz
durante a divisão celular.
Deísmo: Crença em algum tipo de Deus que pode ser impessoal e atualmente
não está ativo na natureza.
Deísta: Alguém que acredita no deísmo. Ver deísmo.
Desconformidade: Lacuna significativa nos estratos geológicos sedimentares,
onde as camadas acima e abaixo da lacuna são paralelas uma em relação à
outra e onde há bem pouca ou nenhuma erosão da camada inferior.
Desígnio inteligente: Conceito de que o Universo exibe objetivamente um
planejamento discernível.
Desígnio: Conceito de que algo foi criado ou idealizado com um propósito, em
contraste com um surgimento acidental ou casual.
Deslocamento para o vermelho: Deslocamento das linhas de luz do espectro,
de galáxias distantes, na direção da extremidade vermelha do espectro de luz.
É interpretado como o afastamento da galáxia em relação ao ponto de
observação.
Deus: Ser supremo, criador e mantenedor do Universo. Há muitas outras
compreensões acerca de Deus. Alguns pensam nEle como sendo as leis da
natureza, ou como a própria natureza. Outros pensam em vários tipos
diferentes de deuses.
DNA: Abreviatura comum de “ácido desoxirribonucleico”, que forma a longa
cadeia de moléculas que codificam a informação genética de um organismo.As
moléculas do DNA podem ter milhões de nucleotídeos ligados um ao outro.
Ver nucleotídeo.
Elétron: Pequena partícula subatômica encontrada fora do núcleo dos átomos,
com carga elétrica negativa.
Elitismo: Consciência ou sensação de ser o melhor ou superior em relação a um
grupo maior.
Enzima: Moléculas de proteína em organismos vivos que promovem mudanças
em outras moléculas sem serem alteradas ou destruídas.
Equilíbrio pontuado: Modelo evolucionário que considera que as espécies
geralmente existem por longos períodos de tempo sem alteração, mas
ocasionalmente são “pontuadas” com breves períodos de rápidas mudanças.
Espécie: Organismos semelhantes que se cruzam, na prática ou potencialmente.
Ver também classificação de organismos.
Eugenia: Ciência do melhoramento da raça humana, ou de animais, pelo
controle ou eliminação da reprodução de indivíduos que possuem
características indesejáveis.
Evolução química: Mudanças químicas que supostamente possam ter ocorrido
na Terra primitiva, as quais produziram a primeira forma de vida.
Evolução teísta: Evolução que inclui as atividades de Deus, especialmente para
ajudar nos desafios mais difíceis da evolução, como a origem da vida e a
explosão cambriana.
Evolução: Desenvolvimento gradual do simples para o complexo. O termo é
geralmente usado para designar o desenvolvimento evolutivo da vida, de
organismos simples aos mais avançados (ver macroevolução e
microevolução). O termo também é usado para a origem da vida (ver evolução
química) e para o gradual desenvolvimento do Universo, etc. Comumente, o
termo implica que Deus não está envolvido. Ver evolução teísta.
Explosão cambriana: Expressão usada para descrever o fato segundo o qual, ao
se ascender pelos estratos geológicos, repentinamente a maioria dos fósseis de
filos animais parece plenamente formados no Cambriano. O termo se refere ao
que os evolucionistas consideram ser um fenômeno “explosivo” de rápida
evolução.
Fanerozoico: Porção da coluna geológica acima do Pré-cambriano. Sua grande
unidade inferior é o Cambriano. Em contraste com o Pré-cambriano, o
Fanerozoico tem abundância de fósseis de grandes organismos.
Filo (classificação): Ver classificação de organismos.
Força de vontade: O controle do comportamento baseado em propósito
deliberado ou pensamento racional. Contrasta com o comportamento
impulsivo ou acionado pela genética ou outros meios fora do controle da
pessoa.
Fotorreceptor: Uma parte de célula, uma célula ou órgão que detecta a luz. No
caso do olho dos vertebrados, os bastonetes e os cones são as células que
detectam a luz.
Gene: Unidade básica da hereditariedade que controla determinada
característica. Também, a sequência de bases nucleotídeas do DNA que
codifica uma proteína, ou a transcrição dessa informação.
Gênero (classificação): Ver classificação dos organismos.
Geração espontânea: Conceito de que formas vivas surgem de matéria
inorgânica.
Idade Média: Expressão usada para descrever a fragilidade da comunicação e
coordenação da atividade intelectual na Europa nos séculos anteriores ao
chamado período de “reavivamento do saber”. O reavivamento do saber,
conhecido como Renascença, ocorreu nos séculos 14 a 16. A ciência moderna
veio a seguir.
Invertebrados: Animais que não têm espinha dorsal (coluna vertebral).
Exemplos: esponjas, minhocas, estrelas-do-mar, medusas, lesmas e lulas.
Isômero: Uma de duas ou mais moléculas que têm o mesmo tipo e número de
átomos, mas o arranjo espacial dos átomos é diferente.
Isômeros óticos: Isômeros (ver isômero) que são imagens espelhadas um do
outro e giram a luz em direções opostas.
Livre-arbítrio: Faculdade de agir de acordo com as próprias escolhas.
Macroevolução: Grandes mudanças evolutivas em organismos, supostamente
ocorridas entre os níveis mais elevados da classificação, como entre famílias,
ordens, classes, filos, etc. Ver microevolução.
Microevolução: Pequenas mudanças herdadas em organismos, em torno do
nível de espécie na classificação. Ver macroevolução.
Mutação: Mudança mais ou menos permanente na fórmula do DNA de uma
célula. Inclui mudanças nas bases nucleotídeas, mudanças na posição dos
genes, remoção ou duplicação de genes e transferência de sequências externas
para dentro da célula.
Natureza versus cultura: Expressão usada para designar o conflito que discute
o que é mais importante na modelagem da sociedade: se a natureza (os genes)
ou o ambiente cultural.
Neocatastrofismo: Termo usado para designar o novo tipo de catastrofismo, que
sugere várias grandes catástrofes no decorrer de longas eras geológicas, em
contraste com o catastrofismo clássico, que considera o dilúvio bíblico dos
dias de Noé como o grande evento.
Nucleotídeo: Unidade básica das longas moléculas de DNA e RNA, que
consiste em uma base, ácido fosfórico e uma molécula de açúcar.
Paleontologista: Alguém que se especializa no estudo dos fósseis.
Paraconformidade: Significativa lacuna em camadas geológicas sedimentares,
na qual as camadas acima e abaixo da lacuna são paralelas em relação umas às
outras e a lacuna é representada por um contato dominantemente plano ou não
é visível.
Paradigma: Uma ideia geralmente aceita, que por algum tempo oferece uma
área para investigação e sugere soluções a uma comunidade de profissionais.
Partes interdependentes: Partes de sistemas complexos, como os encontrados
nos átomos ou olhos, nos quais as partes dependem umas das outras a fim de
funcionar adequadamente. Ver complexidade irredutível.
Partícula subatômica: Partes dos átomos, como elétrons, prótons, nêutrons,
quarks, etc.
Pré-cambriano: Porção da coluna geológica que fica abaixo do Fanerozoico.
Coloca-se justamente abaixo do Cambriano, que é a maior unidade inferior do
Fanerozoico. O Pré-cambriano, em contraste com o Fanerozoico, é
caracterizado por uma pronunciada escassez de fósseis, e esses fósseis são
todos essencialmente de organismos microscópicos.
Princípio cosmológico antrópico: Conceito de que só se encontra vida
inteligente onde as condições possam acomodá-la. Há várias versões desse
conceito.
Proteína: Grandes moléculas orgânicas, algumas vezes compostas de centenas
de aminoácidos. Os organismos vivos contêm de centenas a muitos milhares
de tipos diferentes de proteínas.
Próton: Uma das principais partículas subatômicas no núcleo dos átomos. É
pouco menor que o nêutron e tem carga elétrica positiva.
Quarks: Supostas partículas subatômicas minúsculas que formam partículas
subatômicas maiores, como nêutrons e prótons.
Racional: Característica de ter como base a razão, ser sensível e sadio, não ser
algo tolo ou absurdo.
Relatividade: Na física, teoria que reconhece o caráter universal da luz e a
relação relativa de espaço e tempo, etc., sobre o movimento do observador.
Religião: Crença num ser superior ou em seres pessoais com direito a
obediência e adoração. Há muitas outras definições, mas a que é dada aqui é
de entendimento usual e é a usada neste livro. A religião é também entendida
às vezes como algo a que uma pessoa se dedica, como princípios de
moralidade ou mesmo uma ideia secular, como a ciência.
Renascença: Período histórico na Europa durante os séculos 14 a 16, quando,
após a Idade Média, houve um reavivamento na arte e literatura. A Reforma e
a ciência moderna vieram após esse período.
Ressonância (mecânica quântica): Combinação de fatores favoráveis, como
energia e alvos, que favorecem determinada reação nuclear.
Ribossomo: Partícula complexa em células, composta de várias proteínas e
RNA. É nessas partículas que os aminoácidos se combinam para formar
proteínas de acordo com a fórmula que vem do DNA.
RNA mensageiro: O RNA que transfere a informação do DNA no núcleo de
uma célula para os ribossomos.
RNA: Abreviatura comum do ácido ribonucleico. Longa cadeia de ácidos
nucleicos semelhante ao DNA, mas contendo ribose de açúcar e bases
levemente diferentes. Ver DNA, nucleotídeo e base.
Secular: Algo que não diz respeito à religião ou a crenças religiosas.
Seleção natural: Processo pelo qual os organismos mais aptos sobrevivem aos
menos aptos por causa da competição entre organismos ou adaptação ao
ambiente. Ver sobrevivência do mais apto.
Seleção por parentesco: Proposição segundo a qual, com o sacrifício da própria
vida para salvar a vida de vários familiares próximos, é possível salvar o
próprio tipo de genes porque os parentes tendem a possuir genes semelhantes.
Sobrevivência do mais apto: O conceito de que, devido à competição, os
organismos que são superiores ou mais capazes em seu ambiente sobreviverão
aos inferiores. Ver seleção natural.
Sociobiologia: Estudo da evolução do comportamento social em animais,
incluindo humanos.
Sopa orgânica: Suposto fluido semelhante a um caldo que, na Terra primitiva,
continha vários compostos orgânicos que acabaram produzindo a primeira
vida.
Supernova: Estrela que repentinamente explode, exibindo um fulgor intenso
e temporário.
Teoria quântica: Também chamada mecânica quântica. A teoria é
especialmente significativa em nível atômico e inclui conceitos de que a
energia se apresenta em discretas unidades e que algumas interações atômicas
e subatômicas são previsíveis apenas estatisticamente.
Transferência de RNA: Breve sequência de RNA que liga um tipo específico
de aminoácido ao lugar certo ao se combinarem as proteínas em ribossomos.
Trilha bioquímica: Série de passos em sequência num processo bioquímico, no
qual as enzimas transformam gradualmente uma molécula para produzir o
necessário produto final.
Uniformismo: Conceito de que os processos geológicos no passado não
mudaram em ritmo e tipo em relação àquilo que se observa agora na Terra.
Pode ser expresso como “o presente é a chave para o passado”. Ver
catastrofismo.
Verdade: Aquilo que realmente é; realidade, isenção de erro. Às vezes, a
expressão “realidade última” é usada para descrever a verdade absoluta em
contraste com aquilo que se crê ou aceita pessoalmente como verdade, mas
que pode estar errado. Neste livro, a menos que venha indicado de outra
forma, usamos o termo verdade no sentido de realidade definitiva.
Vertebrados: Animais com coluna vertebral ou espinha dorsal. Incluem os
peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos.
Visão materialista: Visão filosófica de que a matéria é tudo o que existe no
mundo real. É muito semelhante à visão mecanicista e visão naturalista.
Visão mecanicista: Visão filosófica de que, no mundo real, tudo consiste de
matéria e movimento. Não existe Deus. É muito semelhante à visão
materialista e visão naturalista.
Visão naturalista: Visão filosófica que admite apenas fenômenos naturais,
excluindo assim o sobrenatural como parte da realidade. Deus não existe. É
muito semelhante à visão materialista e visão mecanicista.

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