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FATEC

CURSO DE PÓS GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL, SEGURIDADE E


POLITICAS PÚBLICAS

FLAVIANE DE MORAIS SANTOS BORGES

A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA: DA SUA GÊNESE A SUA MATERIALIZAÇÃO NA


PROTEÇÃO SOCIAL BÁSICA. PRECISAMOS DEFENDÊ-LA.

BELÉM-PA
2019
FLAVIANE DE MORAIS SANTOS BORGES

A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA: DA SUA GÊNESE A SUA MATERIALIZAÇÃO NA


PROTEÇÃO SOCIAL BÁSICA. PRECISAMOS DEFENDÊ-LA.

Trabalho de Conclusão de Curso de Pós-


graduação em Serviço Social, seguridade e
políticas públicas da FATEC como requisito
para obtenção do título de especialista.

BELÉM-PA
2019
RESUMO

Este Trabalho de Conclusão de Curso de pós-graduação teve como objetivo


fazer uma pesquisa de abordagem qualitativa a respeito da política de assistência
social, visto que, ela faz parte do tripé que compõe a seguridade social juntamente
com a saúde e a previdência. Para isso, primeiramente foi realizada uma discussão
teórica acerca da gênese da própria política de assistência elucidando desde os
seus moldes altamente marcados pela caridade e filantropia, seguindo dos
acontecimentos que marcaram a sua efetivação como política de seguridade social
através de documentos oficiais como a promulgação da Constituição Federal de
1988, a Lei Orgânica de Assistência Social - LOAS; além disso, uma discussão a
respeito do Centro de Referência de Assistência social – CRAS como unidade de
referência da Proteção Social Básica (PSB) a cargo da Política de Assistência Social
e por fim, uma breve explanação sobre os desmontes por ela sofrido nos últimos
anos frente ao avanço de projetos neoliberais no cenário brasileiro e a importância
de defender essa política tão necessária para a sociedade.

Palavras chave: Política de assistência social. Desmontes. Projetos neoliberais.

ABSTRACT

This graduate course conclusion work aimed to do a qualitative research on social


assistance policy, since it is part of the tripod that composes social security together
with health and social security. For this, first a theoretical discussion was held about
the genesis of the care policy itself, elucidating from its highly marked molds by
charity and philanthropy, following the events that marked its effectiveness as social
security policy through official documents such as the promulgation of the Federal
Constitution of 1988, the Organic Law of Social Assistance - OLSA; in addition, a
discussion about the Reference Center for Social Assistance - RCSA as a reference
unit of Basic Social Protection (BSP) in charge of the Social Assistance Policy and
finally, a brief explanation about the dismantling suffered by it in recent years years in
the face of the advancement of neoliberal projects in the Brazilian scenario and the
importance of defending this much-needed policy for society.

Keywords: Social assistance policy. Dismounts. Neoliberal projects.


SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ......................................................................................................
01
2. ASSISTÊNCIA SOCIAL: DA AJUDA AO DIREITO ...............................................
02
3. CRAS, A PORTA DE ENTRADA DA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL ......
06
4. ASSISTÊNCIA SOCIAL: DEFENDER PARA NÃO PERDER ...............................
09
CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................
13
REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 14

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – gráfico do orçamento para a proteção social básica ................................


09
1 – INTRODUÇÃO

De acordo com os documentos oficiais a Assistência Social, é uma política


pública não contributiva, que tem por dever atender a todos os cidadãos que dela
necessitar. Ela tem por objetivo garantir a proteção social à família, à infância, à
adolescência, à velhice; garantir a proteção social aos cidadãos intervindo
no enfrentamento de suas dificuldades, por meio de serviços, benefícios, programas
e projetos. Cabe dizer que a Assistência Social faz parte do tripé da seguridade
social e suas ações se pautam na prevenção e eliminação dos riscos e
vulnerabilidades sociais.
Ela é uma política pública de extrema importância na diminuição dos riscos
sociais, e se hoje ela é vista como tal, foi pelo esforço e pela luta de muitas mãos
que buscaram a sua efetivação. No entanto, ao longo desse artigo será explanado o
quão árduo foi o caminho que levou a assistência social passar de ações pontuais
de cunho filantrópico e religioso para ser reconhecida como política pública de
seguridade social e ao mesmo tempo o quanto a sua “pouca idade” a faz ser tão
pouco defendida pelos nossos representantes.
Hoje em dia, as conquistas históricas no âmbito da assistência social tem sido
constantemente atacadas por meios de drásticos cortes em seu orçamento, medidas
tomadas por governantes que tem propostas de cunho neoliberais que defendem a
qualquer custo um plano econômico que privilegia o grande capital. Este fato reflete
veementemente tanto nos serviços ofertados pela rede socioassistencial, quanto na
prática profissional do assistente social e dos demais servidores que compõe as
diversas unidades do SUAS. Sendo assim, a busca pela sua defesa é um ato que
deve ser reforçado em toda sociedade, pois juntamente a saúde e a previdência, a
assistência social é uma política capaz de resgatar a dignidade de muitas famílias
mediante seus programas, projetos e ações.

E é no sentido de tentar compreender a realidade que hoje a assistência


vivencia, que esse artigo vem discutir em três breves capítulos os caminhos
percorridos por essa política. O primeiro traz uma discussão a respeito da
historicidade da assistência social. O segundo trata dos CRAS como unidade de
referência da Proteção Social Básica (PSB) a cargo da Política de Assistência Social
e o terceiro e último, uma breve explanação sobre os desmontes por ela sofrido nos
últimos anos frente ao avanço de projetos neoliberais e claro, a importância de
defender essa política tão necessária para a sociedade.

2 – ASSISTÊNCIA SOCIAL: DA AJUDA AO DIREITO

Conforme Yazbek (2015), historicamente a assistência social se mostrou


como uma estratégia adotada pelo Estado para o enfrentamento da questão social
associada as relações na qual caracteriza a sociedade de classes. De acordo com a
análise de Couto et al (2014), essa área de intervenção do Estado, caracterizou-
se por muito tempo como não política, esse fato se deve ao padrão clientelista em
que se desenvolveu a política brasileira, na qual até hoje encontra-se resquícios
dessa prática culturalmente interpelada pela troca de favores.
Vista muitas vezes como uma área polêmica e complexa, a assistência social
é marcada como sinônimo de ajuda, associada a benevolência para com os pobres.
Boschetti (2016), inclusive, aponta que desde os primórdios da ampliação do Estado
social a assistência imprimiu primeiramente um caráter filantrópico, de ajuda,
ausente de uma formulação política que pudesse transitar para o campo dos direitos
sociais.
Para adquirir status de direito social foi percorrido um logo caminho, Couto
(2010) destaca, inclusive, que a assistência foi a última política social regulamentada
no século XX e Boschetti acrescenta que:

A assistência social passou do ‘dever moral de ajuda’ ao ‘dever legal de


assistência’, compondo o rol dos direitos sociais nas sociedades
capitalistas, sobretudo nos países do capitalismo central, mas também em
menor grau, nos países do capitalismo periférico, que passaram a incluí-la
como política de seguridade social. (BOSCHETTI, 2016, p. 76).

No entanto, cabe enfatizar, que o processo de implantação e efetivação da


Política de Assistência Social foi permeado de contradições, tendo em vista uma
conjuntura adversa, na qual, segundo Couto et al (2014, p. 57), evidencia o ideário
neoliberal que “coloca em andamento processos desarticuladores, de desmontagem
e retração de direitos e investimentos no campo social. ”
É importante assinalar que os anos de 1990 foram de perdas significativas
para os trabalhadores e de profundas transformações societárias, configurando
assim “um novo perfil para a questão social brasileira” (idem, 2014, p. 59). Esse fato
se deu devido a profunda recessão econômica em que o país se encontrava, a
vulnerabilização do trabalho, ao desmonte do sistema de garantia de direitos e
proteções sociais e a manifestação de práticas filantrópicas que vão de contra a
efetivação de políticas públicas que atendam os interesses da classe mais
empobrecida da sociedade.
Mesmo diante de conjunturas desfavoráveis, o processo que levou a
implementação de novas matrizes para a Assistência Social foi tomado por
resistência e enfrentamento aos desmontes ocasionados pelo primado neoliberal.
Dessa maneira, Boschetti (2016, p. 76) afirma que, a trajetória que levou a
assistência ser reconhecida como direito social, não foi livre de tensões e conflitos.
O fato da assistência social ter sido associada por muito tempo a práticas
clientelistas e focalizadas, tornou dificultoso o seu reconhecimento no campo do
direito social. Mesmo que mais tarde ela tenha tido seu reconhecimento nesse
campo, a assistência não foi “elevada” ao mesmo patamar em que se incluía outras
políticas, como, previdência, saúde e educação.

A condição subalterna da assistência social no conjunto das políticas sociais


deve ser compreendida na sua particularidade de se constituir como uma
política social em incessante conflito com as formas de organização social
do trabalho no capitalismo. (Idem, p. 76).

Esse conflito citado por Boschetti faz referência a tensão existente entre
assistência social e trabalho no contexto da sociedade capitalista. O primado liberal
do trabalho gerador de mais-valia, materializou historicamente o princípio em que o
homem deve sustentar a si próprio e a sua família a partir da venda de sua força de
trabalho. Logo, a partir do momento que a assistência social é considerada como
política social de cunho público, não contributiva, compreende-se, a partir desse
princípio, a relação tensa entre assistência social e trabalho, ou melhor dizendo,
entre o não trabalho.
Essa relação pode ser melhor explicada quando adotamos como referência a
política de previdência social – configurada como contributiva e identificada por
Boschetti (2016, p. 97) como “seguro” –. Segundo a autora, as políticas de
Assistência social e previdência estão introduzidas em uma relação contraditória de
atração e rejeição quando mediadas pelo trabalho, pois,
O trabalho é a determinação que assegura o acesso aos seguros sociais,
definindo a natureza e o montante dos direitos legalmente reconhecidos em
sistema nacional de proteção social. Só tem acesso aos seguros o
trabalhador que, via trabalho, teve parcela de seu salário (ou rendimento
derivado do trabalho) subtraída no presente para assegurar um benefício
monetário no futuro. (BOSCHETTI, 2016, p. 98).

Quantos aos incapacitados para o trabalho? Aqueles que não encontram mais
espaços para adentrar ao mercado de trabalho? Os atingidos pelo desemprego ou
pelo emprego precário? Esse cenário de contradição torna-se propicio para as
manifestações de luta por direitos sociais, assim como, traz o importante debate
para que a assistência social seja visualizada no campo dos direitos sociais.
Assim, dois acontecimentos marcantes – a promulgação da
Constituição Federal (1988) e cinco anos depois a sanção da Lei Orgânica de
Assistência Social/LOAS (1993) – foram responsáveis por trazer a questão da
Assistência Social para um novo campo: o da seguridade social e o campo da
proteção social pública, que, de acordo com Yasbek (1995, p. 10 apud COUTO et al,
2014, p.56), permitiu que a Assistência social fosse vista e tratada como política
social e não mais como assistencialismo clientelista. Esse avanço foi um processo
que a tornou visível como política pública e direito de todos que dela necessitarem,
especialmente “dos segmentos mais empobrecidos da sociedade”:

A inclusão da assistência social na Seguridade traz a questão para o campo


dos direitos e para a esfera da responsabilidade estatal. Inicia-se um
processo que irá torná-la visível como política pública e direito dos que dela
necessitarem, embora dentro de uma concepção restritiva (apesar de
prioritária) de seu destinatário. (YASBEK, 2015, p. 66).

A LOAS veio trazer para a assistência social uma nova roupagem na medida
em que afirmou seu caráter não contributivo, “ao apontar a necessária integração
entre o econômico e o social, a centralidade do Estado na universalização e garantia
de direitos e acessos a serviços sociais [...]” (COUTO et al, 2014, p. 57). Ela vem
configurar a assistência social como o mecanismo mais importante na garantia de
proteção e prevenção de riscos à família, à maternidade, à infância, à adolescência
e à velhice. Seus princípios e diretrizes estão voltados a construir um sistema no
qual reverta o quadro de ajuda que até então era desenvolvido pela assistência
social.
No entanto, apesar de ser uma legislação que aponte para a universalização
e a garantia de direitos, ainda sim, no intuito de enfraquecer a criação de uma
cultura de direito social, em 1995 é criado o programa comunidade solidária 1 –
medida provisória n° 813/95 – paralelo aos preceitos da LOAS. Com essa medida,
além da criação do programa supracitado, foram extintas a Legião Brasileira de
Assistência Social (LBAS), o Centro Brasileiro para a Infância e Adolescência (CBIA)
e o Ministério do Bem-Estar Social. Esta ação governamental ocasionou processos
desarticuladores no campo da assistência social. Veja-se:

A colocação da ampla tarefa de combate à pobreza em um programa


específico, vinculado a Casa Civil da Presidência da República, pode
recolocar seu equacionamento no âmbito das relações privadas e
desconsidera a área da assistência social como campo privilegiado na
coordenação do problema. (COUTO, 2010, p. 178-179).

Assim, observa-se o pouco interesse ao cumprimento dos preceitos legais da


LOAS, bem como a implementação de uma política de assistência social pautada
nos princípios do direito social. Tanto o governo da época – de Fernando Henrique
Cardosos (FHC) –, como os governos antecessores, priorizavam os programas de
reformas econômicas2 em detrimento aos programas sociais, pautados pela lógica
de que a estabilidade econômica traria o desenvolvimento social como
consequência.
No entanto, apesar do cenário adverso, a LOAS representa uma grande
conquista no campo da assistência social, no processo que levou o seu
reconhecimento como direito social. Esse processo contou não somente com a
existência e o reconhecimento da lei, mas também com o protagonismo social e
participação popular na luta por esse direito.
É importante destacar que, além da LOAS, a Política de Assistência Social é
organizada por mais três instrumentos que a qualifica como um direito e uma
“Política social inserida no sistema de proteção social brasileiro, no campo da
Seguridade social” (COUTO et al, 2014, p. 61). Tabaranã (2015), traz a respeito:

Os três instrumentos de organização dessa política são: a Lei Orgânica da


Assistência Social (LOAS), que indica o que vai reger legalmente a
execução da política; as normas e direcionamentos; a Política Nacional da
Assistência Social (PNAS), que estipula as diretrizes e matrizes de

1
O objetivo do programa era “coordenar ações governamentais visando o atendimento de parcela da
população que não dispõe de meios para prover suas necessidades básicas, em especial o combate
à fome e a pobreza” (Artigo nº 12 da MP nº 813/95, apud COUTO, 2010, p. 178)
2
Programas que na sua grande parte ocasionam a supressão de direitos.
pensamento e ação da política; e o Sistema Único de Assistência Social
(SUAS), que organiza os serviços, programas, projetos e demais recursos
dessa política. A Política de Assistência Social (2004), na atualidade, é uma
Política não contributiva que deve prover os mínimos sociais por meio da
integração intersetorial entre iniciativas públicas e privadas no atendimento
das necessidades básicas. (TABARANÃ, 2015, p. 76).

A materialização do SUAS vem ser de fundamental importância na garantia


do direito à assistência social, pois ele articula em todo território nacional a
ampliação significativa do acesso à essa política. Baseado em uma perspectiva
territorial, a sua implementação apresenta uma nova lógica de organização nas
ações de proteção social, na qual passam a ser tratadas em níveis de complexidade
proteção social básica3 e proteção social especial.

Portanto, a partir dessa colocação, evidencia-se – para dar gancho ao


próximo item que tratará sobre o CRAS, como porta de entrada ao acesso a política
de assistência social – o reconhecimento da Assistência também como via de
acesso a garantia de direitos ao seu usuário, por meio de atendimento digno dado
pela escuta profissional qualificada, pela concessão de benefícios na busca por
complementar ou assegurar a renda para população em situação de extrema
pobreza, como é o caso do PBF, BPC e benefícios eventuais.

3 – CRAS, A PORTA DE ENTRADA DA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL.

Como vimos, a Política de Assistência Social articulada à outras políticas no


campo social, tem em vista à garantia de direitos e de melhores condições de vida
para a população. Mais do que isso, de acordo com Yasbek (2004) a assistência
social se configura em um espaço que possibilita essa população ampliar o seu
protagonismo e a sua presença na sociedade, visto que, a Constituição de 1988
garante nas suas diretrizes que ela seja um sistema de gestão descentralizada e
com participação popular.

3
Evidencia-se neste trabalho o equipamento de Proteção Social Básica, representado pelo CRAS.
A consolidação da assistência social como política pública e direito social,
como já foi explicitado anteriormente, se deu a partir da elaboração da LOAS e, mais
tarde, a elaboração do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), que por sua
vez, veio com a finalidade de regulamentar os serviços, benefícios, programas e
projetos desenvolvidos no âmbito social. Dentre as ações previstas no SUAS, está a
implantação dos Centros de Referência da Assistência Social – CRAS em todo o
território nacional. De acordo com Couto et al:

A instalação de Centros de Referência de Assistência Social (Cras) como


unidade de referência da Proteção Social Básica (PSB) a cargo da política
de assistência social, tem importante significado no contexto de construção
do suas. (COUTO et al, 2014, p. 173).

De acordo com a Política Nacional de Assistência Social (PNAS), o CRAS


vem ser uma unidade pública-estatal de referência do SUAS que tem por finalidade
materializar direitos à proteção social básica e a assistência social as famílias e
indivíduos em seu contexto coletivo, visando à orientação e o convívio sócio-familiar
e comunitário. Suas ações estão voltadas a atuar especialmente com a população
em situação de vulnerabilidade social e trabalhar essencialmente o fortalecimento
dos seus vínculos tanto familiares, quanto comunitários, estabelecidas na PNAS:

São considerados serviços de proteção básica de assistência social aqueles


que potencializam a família como unidade de referência, fortalecendo seus
vínculos internos e externos de solidariedade, através do protagonismo de
seus membros e da oferta de um conjunto de serviços locais que visam a
convivência, a socialização e o acolhimento em famílias cujos vínculos
familiar e comunitário não foram rompidos, bem como a promoção da
integração ao mercado de trabalho. (BRASIL, 2004, p. 36).

É importante destacar que a sua instalação se dá em territórios de maior


vulnerabilidade social, se configurando assim, em uma unidade pública de base
territorial. De tal modo, o CRAS possibilita dentro da abrangência das comunidades
e/ou Bairros em que está instalado, o desenvolvimento de ações voltadas ao
atendimento das necessidades da população usuária. Assim, por meio de uma
equipe especializada o CRAS deve localizar, cadastrar e acompanhar famílias
pobres de sua área de abrangência, para que sejam desenvolvidas também as suas
potencialidades. Ele se configura como a principal porta de entrada do Sistema
Único de Assistência Social – SUAS, ou seja, é uma unidade que propicia o acesso
de um grande número de famílias à rede de proteção social. Couto et al (2014)
aponta que,

O Cras realiza concomitantemente as funções de proteção às famílias,


defesa de direito e vigilância das exclusões e violações sociais podendo,
dessa forma, captar necessidades de proteção social e agir
preventivamente antecipando-se à ocorrência de riscos e aos agravos a
vida. (COUTO et al, 2014, p. 175).

Couto et al (2014, p. 175), afirma ainda que, o CRAS “é uma unidade


efetivadora da referência e contrarreferência do usuário na rede socioassistencial
em seu território de abrangência”. Ele vem ser um dos principais instrumentos da
política de assistência social na organização e oferta dos serviços de proteção social
básica, ao possibilitar o acesso a outros serviços oferecidos pela rede
socioassistencial.

Por sua vez, a proteção social básica no CRAS prevê programas e projetos
locais de acolhimento, convivência e socialização de famílias e de indivíduos, a partir
da identificação da situação de vulnerabilidade apresentada. Castro (2008) reitera
que:

O CRAS é a base física de sustentação do sistema, responsável por uma de


suas duas vertentes, a proteção social básica, cabendo-lhe exprimir
localmente os valores universais da política: política de Estado,
descentralizada e participativa. Em destaque, o CRAS assume a
responsabilidade de pôr em prática, precisamente, os conceitos da
centralidade na família, por abrigar obrigatoriamente o PAIF, o Programa de
Atenção Integral à Família; e o da territorialidade, na medida em que deve
instalar-se em áreas de vulnerabilidade social, exercer sobre elas a função
de vigilância social, articular a sua rede socioassistencial e coordenar ali a
prestação de serviços do sistema. (CASTRO, 2008, p. 76).
Além do Programa de Atenção Integral às Famílias (PAIF), podem ser
operacionalizados nos CRAS outros programas, projetos e serviços, como:
Programa de inclusão produtiva e projetos de enfrentamento da pobreza; Centros de
Convivência para Idosos; Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos
(SCFV), dentre outros.

De acordo com a resolução do Conselho Nacional de Assistência social


(CNAS) nº. 109/2009 o SCFV é realizado em grupos, organizados de modo a
garantir alcances progressivos aos seus usuários no que diz respeito ao
desenvolvimento de suas capacidades e potencialidades, levando em conta seu
ciclo de vida, a fim de complementar o trabalho social com famílias e prevenir a
ocorrência de situações de risco social. “Organiza-se de modo a ampliar trocas
culturais e de vivências, desenvolver o sentimento de pertença e de identidade,
fortalecer vínculos familiares e incentivar a socialização e a convivência comunitária”
(p. 8).

Apesar de oferecer diversos serviços importantes a população, atualmente, a


rede de proteção social básica vem sofrendo com os inúmeros ataques sofridos a
política de assistência. Não somente os CRAS, mas todas as unidades que fazem
parte do Sistema Único de Assistência Social. Ano após ano, os orçamentos se
apresentam cada vez mais reduzidos, causando impactos significativos na maneira
de se desenvolver qualquer tipo de serviço oferecido a população usuária do SUAS.

O gráfico a seguir mostra a evolução do orçamento do SUAS para a rede de


proteção social básica entre os anos de2013 a 2018.

Figura 1 – Evolução do Orçamento SUAS entre 2013 a 2018 – Recursos para a


Rede de Proteção Básica
Fonte: SANTOS; BONETTI; MATIELO (2018)

Pode-se observar uma drástica queda nos recursos destinados a rede de


proteção social básica, pela ordem de 98% no orçamento destinados a manutenção
de serviços de acolhimento, convivência e socialização de famílias e indivíduos em
situação de vulnerabilidade social. Essa queda significativa, para muitos estudiosos,
faz parte de um projeto de desmonte da política de seguridade social – nesse estudo
priorizamos a assistência social – no cenário nacional, que prioriza os projetos
econômicos e políticos em detrimento as políticas públicas destinadas a população
mais vulnerável. E diante disso tudo os CRAS, e outras unidades do SUAS sofrem
com o sucateamento da política de assistência, colocando em risco todos os
serviços por ele oferecidos, em especial, os de proteção a família e prevenção aos
riscos sociais.

4 – ASSISTÊNCIA SOCIAL: DEFENDER PARA NÃO PERDER

Diante de tudo que foi exposto anteriormente, especialmente ao que diz


respeito a gênese da assistência social até a sua consolidação, pode-se perceber o
quanto os acontecimentos históricos que marcam a sua efetivação como política de
seguridade social explicam o seu atual cenário de descaso e desmonte. Mesmo
diante de acontecimentos importantes como a promulgação da Carta Magna em
1988, a sanção da LOAS em 1993, o primado neoliberal sempre esteve presente
nas práticas governamentais em relação as políticas de seguridade social, inclusive
no governo considerado popular como o de Lula.

O governo do presidente Lula seguiu o receituário de seu antecessor e do


pós-Consenso de Washington, pois conjugava medidas de cunho
social-liberal, sem romper com as estruturas neoliberais. Ao contrário,
rendia-se às estratégias de valorização do capital, apoiando um conjunto de
medidas para favorecer e proteger o investimento das transnacionais, em
detrimento dos investimentos em Educação, Saúde, Habitação, entre outros.
(CASTELO, 2010, apud. CASTILHO, 2017, p. 452)

De acordo com Castilho (2017), programas sociais que serviriam para


minimizar as intempéries das expressões da “questão social” continuam sendo
oferecidas de maneira assistencialistas, pulverizados, fragmentados e focalizados,
numa explícita perspectiva de “políticas pobres para pobres”. Pode-se apontar como
exemplo as políticas de transferência de renda, que apesar de terem trazido
impactos positivos na realidade de algumas famílias, reduzindo índices da miséria
absoluta no país, não dá conta por si só de transformações mais significativas na
sociedade. Nesse sentido, Veroneze (2017) contribui:

Os números são favoráveis, contudo é preciso entender que para a


erradicação da fome e da pobreza, tanto absoluta quanto não absoluta, é
necessário sair da esfera quantitativa para a esfera qualitativa e, para isso, é
preciso conjugar vontade política, desejo da comunidade, integração a um
conjunto de ações que visem efetivar os direitos sociais, de forma
descentralizada e intersetorial, aumentar o número de emprego e efetivar
uma política de ajuste fiscal, além, é claro, de ter uma sólida e eficaz política
contra a corrupção. (VERONEZE, 2017, p. 355-356)

É fato que o brasil sempre caminhou a passos lentos em relação a criação de


políticas eficazes a nível de efetivação de direitos sociais, no entanto, o cenário de
golpe que se instalou no país no ano de 2016 agravou ainda mais a realidade social
no Brasil. Mesmo nos governos anteriores ao golpe, o que prevalecia era a
valorização de setores econômicos em relação ao social. Logo, em um governo
ilegítimo, tudo tende a se agravar, os drásticos cortes nos orçamentos destinados a
seguridade social, em especial a assistência, só reforçam que é muito mais fácil
atacar os direitos das classes mais subalternizadas do que ir de encontro aos
interesses do sistema financeiro das elites burguesa.

Nesse processo, a prática profissional do assistente social encontra-se


comprometida diante do agravamento da precarização das condições e relações de
trabalho, causando impacto direto nos serviços ofertados nas diversas unidades do
SUAS. E é diante desse cenário que Castilho (2017) aponta que a assistência social
tem se revelado como um espaço com vínculos empregatícios cada vez mais
instáveis, menores salários e baixas condições de trabalho, realidade que tem
implicado diretamente na atuação do assistente social que necessita buscar de
estratégias para dar conta da realidade que se apresenta cada vez mais difícil nas
unidades do SUAS. Sobre esse processo Boschetti (2017) aponta,

[...] por mais que os os(as) profissionais se dediquem


incansavelmente ao exercício de suas atribuições e competências, o
resultado de seu trabalho estará sempre determinado, por um lado,
pela própria condição da política social, e por outro, pela sua
condição de trabalhador inserido na divisão sociotécnica do trabalho.
(BOSCHETTI, 2017, p. 67)

É nessa contramão de diminuição de direitos, que Boschetti (2017) chama de

“contraofensiva capitalista às conquistas civilizatórias resultantes das lutas sociais”,

que a categoria profissional busca se mobilizar política e profissionalmente na

tentativa de reverter esse quadro de inúmeros retrocessos instalado no âmbito da

assistência social. Não é à toa que o Conselho Federal de Assistência Social –

CEFESS – lançou a campanha “Não aos cortes na política de Assistência Social” a

luz do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA 2019), que cortou mais de 50% do

orçamento da assistência para 2019.

Segundo nota publicada no site oficial do CEFESS, esses cortes, feitos sob a

justificativa de conter o déficit público, representam um desmonte que inviabiliza o


funcionamento de serviços, programas, projetos e benefícios, e deixa absolutamente

sem proteção milhões de pessoas que vivem sem qualquer acesso aos direitos

sociais.

Essa realidade sinaliza um esfacelamento das conquistas e dos avanços já

alcançados na política de assistência social, atingindo a população como um todo,

pois essas medidas implicam na realidade de muitas famílias, seja na de milhares de

usuários ou na dos muitos profissionais que atuam no SUAS que lidarão com

condições de vida cada vez mais difíceis e desumanas vivenciadas pela população

usuária dos serviços e benefícios socioassistenciais.

As determinações do atual momento de crise do capital agravam as


condições e relações de trabalho dos(as) assistentes sociais tanto
nos seus impactos sobre as respectivas políticas nas quais realiza
sua intervenção quanto nas condições objetivas como trabalhador(a).
(CASTILHO, LEMOS, GOMES, 2017, p. 460-461)

Cabe destacar que muitas outras medidas e acontecimentos fragilizam ainda

mais a política de assistência social no que tange a ação profissional do assistente

social. Um exemplo disso é a retomada do primeiro-damismo nas esferas

municipais, estaduais e em destaque na esfera federal ainda no governo ilegítimo de

Temer diante da criação do programa “criança feliz” que aponta uma tendência de

desprofissionalização da política social pelo seu viés assistencialista, voluntário,

solidário, que possui.

Assim, o cenário político que se desenhou no país com as eleições de 2018

só reforçam as incertezas e temores em relação aos rumos que a política de

assistência social irá tomar, pois sabe-se que foi eleito um governo de moldes

ultraconservadores e de tendências ultraliberais que colocam as políticas sociais em

um patamar desfavorável.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao desenvolver essa pesquisa, a intenção não foi somente explanar sobre a


construção da assistência social brasileira ao longo dos anos, mas principalmente,
através de sua história, demonstrar a sua importância, do por que e para quem ela
existe e o quanto a sua defesa se faz necessária para toda a sociedade. Mais do
que isso, ela buscou destacar a importância e a necessidade de defender aquilo que
é público e de direito do cidadão.

Nesse sentido, é necessário lutar pela ampliação dos benefícios, serviços,


programas e projetos com caráter universalizante da política, e não observar de
braços cruzados as ações de tantos desgovernos que não hesitam em retirar cada
vez mais direitos da população. Mais do que nunca é preciso responsabilizar o
Estado na garantia de conduzir a assistência social como política de direito no
âmbito da Seguridade Social, com financiamento público.

Além disso, se faz necessário buscar a articulação tanto de profissionais da


área, quanto da sociedade em geral para defender aquilo que está para o bem de
todos. Não se pode retroceder depois de tanta luta pra que a política de assistência
fosse reconhecida como um direito, pois caridade e filantropia não remexem as
estruturas de uma sociedade. É preciso que haja de fato não só a garantia dos
direitos, mas também a sua ampliação.

Logo, é preciso ter meios para atender com qualidade quem se encontra em
situação de vulnerabilidade social, é preciso ter condições de trabalho para prevenir
as situações de riscos e desenvolver as potencialidades e aquisições dos sujeitos
sociais na proteção social básica. É necessário defender os CRAS, porta de entrada
da política de assistência social. É preciso ir de encontro a tudo o que está imposto
pelo capital e se colocar contra todas as formas de cerceamento de direitos.

REFERÊNCIAS

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Boschetti – São Paulo: cortez, 2016.

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