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Vânia Nery
1 Introdução
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2 Assistência Social: da prática social à Política Pública
14 Em 2012, a Lei nº 12.435, conhecida como Lei do SUAS, altera a LOAS de 1993, modificando seus
principais artigos à luz das novas diretrizes e conceitos adotados pelas normativas do SUAS.
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relacionais e de pertencimento social (discriminações etárias, étnicas, de gênero ou por
deficiências, dentre outras).” (p. 33)
Nesse sentido, ser referência responde a duas diretrizes estruturantes da gestão do SUAS
(Resolução n. 33, 2012). Por um lado, o CRAS com base no princípio da matricialidade
sociofamiliar, ao ofertar serviços de caráter preventivo, protetivo e proativo exige reconhecer
que para a família - na maior parte das vezes a mulher/mãe - responder as exigências sociais de
proteção social é fundamental ser provida de condições para tal.
Partindo desse entendimento para a efetivação do trabalho social com família “não basta
constatar as transformações por que passam as famílias, se persistem abordagens conservadoras
e disciplinadoras no trabalho profissional que se realiza” (MDS & Instituto de Estudos
Especiais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo [IEE-PUC-SP], 2008, p. 59). É
necessário à Assistência Social a superação de práticas ancoradas no julgamento e
culpabilização através das quais são atribuídas responsabilidades à família que deveriam ser
exercidas pelo Estado15, afirmando-se enquanto referência no desenvolvimento de um trabalho
social gerador dos sentimentos de pertença, identidade e apropriação cidadã por parte das
famílias. Nesse sentido, não somente o CRAS torna-se referência para a família, mas também
o trabalho profissionalizado ali desempenhado, alicerçado em parâmetros éticos, técnicos e
modo permanente, requisito fundante às Políticas Públicas.
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atenção à família e indivíduos que se encontram em situação de risco pessoal e social,
por ocorrência de abandono, maus tratos físicos e/ou psíquicos, abuso sexual, uso de
substâncias psicoativas, cumprimento de medidas socioeducativas, situação de rua,
situação de trabalho infantil, entre outras. (p. 92).
Todavia observa-se, a constituição de uma identidade híbrida entre aquilo que está
apontado nos normativos enquanto sua responsabilidade dentro do SUAS e uma requisição
superdimensionada por parte dos órgãos do Sistema de Justiça. Necessário, portanto ainda para
o CREAS, uma melhor definição das funções de sua equipe de forma a esclarecer os agentes
públicos desses órgãos, o alcance do trabalho social realizado pela equipe de média
complexidade do SUAS, delimitando inclusive, o caráter não investigativo e sim protetivo face
às denúncias de violência que aportam esta unidade estatal.
A presença da Psicologia nas Políticas Públicas enquanto foco dessa reflexão, não pode
prescindir de um resgate de sua trajetória enquanto prática profissional. Esse balizamento antes
de pretender ser uma sinalização cronológica na linha do tempo da profissão serve para
subsidiar o diálogo a ser desencadeado sobre as mudanças processadas na direção da promoção
Assistência Social com abrangência nos três níveis federativos são organismos públicos com
representação da sociedade civil, governo e usuários para fiscalização e proposição dos serviços
socioassistenciais, vocalizando para o órgão gestor as demandas da população. Complementarmente,
as Conferências Nacional, Estaduais e Municipais, espaços de debate e deliberação bianuais através dos
quais os rumos da Política de Assistência Social tornam-se pauta de debate de um coletivo amplo de
agentes comprometidos com sua direção e compromisso com o enfrentamento da desigualdade social.
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de direitos e no enfrentamento das desigualdades sociais enquanto arena de exercício
profissional.
Sendo assim, considera-se conforme apontado por Gonçalves, importante destacar que
a Psicologia nunca esteve totalmente ausente das Políticas Públicas, embora sua participação
tenha se caracterizado por ações auxiliares de outros campos profissionais de atuação “na
emissão de laudos e diagnóstico” a partir de um conhecimento predeterminado sobre o
comportamento dos indivíduos. (Gonçalves, 2010, p. 82).
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curativo das anormalidades, alicerçado por sua vez, em uma “pseudoneutralidade” com relação
à finalidade da profissão. Todavia, Gonçalves (2010) pondera que em sua origem a
É evidente que vários são os fatores que contribuem para o tipo de inserção das
profissões nos espaços sociocupacionais - históricos, políticos, econômicos e sociais -
entretanto, vale refletir sobre a maior presença de Psicólogas (os) em consultórios, enquanto
profissionais liberais, e relacioná-la a baixa especificidade enquanto campo do saber,
característico do início da profissão. Importante nesta ponderação, fazer referência à análise
crítica de Gonçalves (2010) sinalizando o processo de mobilização em direção a uma nova
configuração da Psicologia na sociedade já que,
Cabe destacar que as mudanças projetadas para o Sistema Nacional de Saúde neste
período, constituem lócus de destaque da participação da categoria em virtude das proposições
por uma Reforma Psiquiátrica. Inserida no movimento da saúde pública e constituição do
Sistema Único de Saúde - SUS no país em 1990, a Psicologia buscava romper com práticas
voltadas ao ajustamento e adaptação dos indivíduos, já que o “modelo clínico de atendimento
passa a ser alvo de intensa crítica e debate por estar associado ao médico, tão criticado e
combatido pelo movimento sanitário”. (Yamamoto & Oliveira, 2010, p. 16)
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moralizantes sobre o comportamento de indivíduos e famílias, ancoradas na perspectiva
harmônica sobre a dinâmica da sociedade.
Em contrapartida busca-se que o trabalho social desenvolvido pela (o) Psicóloga (o) na
Política de Assistência Social reconheça primeiramente o cidadão que aporta os serviços
socioassistenciais enquanto participante ativo no processo de conquista do direito
socioassistencial. Ampliar a compreensão sobre os fatores coletivos e de classe social,
determinantes da condição de vida da população, consiste um segundo aspecto fundamental,
sem o qual a intervenção profissional torna-se individualista e pontual.
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excessivamente especializada do presente e do futuro trabalhador”, perspectiva esta,
inspiradora e campo fértil para o desenvolvimento do toyotismo considerando que sua principal
diretriz volta-se aos saberes articulados e complementares necessários ao mundo do trabalho.
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central da prática profissional, associado ao Decálogo dos direitos socioassistenciais do SUAS,
considerar o contexto socioeconômico e os impactos sobre as condições de vida e subjetividade
do cidadão.
5 Considerações Finais
À ação interdisciplinar hoje no SUAS estão postas algumas indagações tais como:
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Este argumento, dialoga com o segundo ponto indagado, na medida em que chama
atenção para a necessidade de construir uma distinção entre as práticas profissionais da
Psicologia nas diversas Políticas Públicas, considerando a crescente inserção da profissão
nessas institucionalidades. Trata-se, de potencializar os saberes que refletem o que é específico
e requerido pela Assistência Social e por intermédio da ampliação do campo teórico e
metodológico, incidir de modo mais efetivo na vida da população.
Por último, cabe destacar que muitos dos avanços conquistados nos últimos anos no
SUAS são fruto da construção de conhecimento oriunda dos cotidianos de trabalho
interdisciplinar. Sem dúvida, a manutenção e ampliação dessas conquistas, estabelecendo
rupturas definitivas com as marcas pretéritas da área, requer novas formas de organização e
gestão do trabalho que não podem ser de responsabilidade individual de uma profissão, mas de
todas que hoje adensam o coletivo de trabalhadores da Política de Assistência Social.
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CAPÍTULO 7
CAMINHOS ENIGMÁTICOS DA VIGILÂNCIA SOCIOASSISTENCIAL NAS
QUEBRADAS DO SUAS
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