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3 As partes loucas de pessoas sãs

A NATUREZA DA LOUCURA

O espírito da alquimia respeita tanto os poderes


destrutivos quanto transformadores da loucura. Em
seu livro, On Private Madness [A Loucura Privada],
André Green analisa perspicazmente a loucura em
termos dos aspectos criativos e destrutivos da paixão:

A loucura, que é um componente do ser humano,


está ligada às vicissitudes do Eros primordial, as
quais estão em constante conflito com os instintos
destrutivos. Quando o Eros prevalece, é porque as
paixões que o habitam ficam vinculadas e a psicose é
evitada. Mas quando os instintos destrutivos triunfam
sobre Eros, o processo de desvinculação é mais forte
do que a vinculação, e a psicose vence...

(1993, 242-
43)
Como Eros, representante do poder vinculativo do
amor e da sexualidade, dá lugar aos instintos
destrutivos, isto é, à morte da estrutura e à regressão a
anteriores formas arcaicas e compulsivas de
comportamento, a paixão não vinculada leva a
processos psicóticos. E, posso adicionar, a psicose ou
uma parte psicótica pode, às vezes, ser vinculada por
Eros e criativamente animada pela paixão. Acredito que
loucura e psicose estejam muito interligadas para
separá-las em termos práticos, e vejo ambas como
qualidades do mesmo fenômeno no qual os seres
humanos não são capazes nem de se vincular nem de
se separar de um objeto primordial.
Esse dilema ancestral está sistematizado no mito da
Grande Mãe dos Deuses, Cibele, e seu filho e amante,
Átis. Nesse conto, que provavelmente data do final do
Neolítico, mostra-se que a paixão de Átis por Cibele é
tão grande que ele não consegue ficar com ela, nem
separar-se dela. Suas necessidades de individuação
estão tão inteiramente bloqueadas que sua paixão se
transforma em destruição total e, em um ato psicótico,
ele comete suicídio por meio de uma horrível
automutilação. Tal mito vive intrapsíquicamente e não
deveria ser mais estranho hoje do que era mais de
5.000 anos atrás.

A área psicótica de pessoas que possuem


comumente um funcionamento normal não só cria
distorções sutis ou, às vezes, bastante gritantes da
realidade, mas também pode motivar atos destrutivos
para com si mesmas e para com os outros. Por um lado,
o poder da área louca do analisando, em relação à
fragmentação da consciência do analista, pode criar
dificuldades consideráveis nas tentativas do analista de
se concentrar de maneira geral, mas sobretudo nas
tentativas de descobrir uma terceira área. Por outro
lado, uma vez que o analista supera essa experiência
dissociadora do analisando, a experiência de suas
partes loucas podem, então, levar à descoberta da
natureza e da estrutura do campo interativo. Dessa
forma, quando as ‘águas da loucura’ podem ser
contidas em vez de estarem permitidas a invadir a
existência de uma maneira aleatória, as áreas psicóticas
da psique podem tornar-se construtivas ao invés de
destrutivas.

Assim como a alma em um mito egípcio emerge das


Águas Primordiais do Caos, uma frase que os
alquimistas costumam usar para a prima matéria,
também um senso de significado,

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propósito e identidade - um self- pode emergir das


áreas caóticas da loucura de alguém. Os alquimistas,
então, estavam muito alertas ao potencial destrutivo das
Águas Primordiais do Caos. Como Johannes Fabricius
observa: ‘o encontro inicial do alquimista com a prima
matéria é caracterizado por sentimentos de frustração,
perplexidade, dissociação e desintegração’ (1976, 20).
Uma declaração do alquimista Alphidius no Rosarium
captura a natureza ameaçadora da loucura que os
alquimistas enfrentaram: ‘Esta pedra procede do
sublime e mais glorioso local de grande terror, que
entregou muitos sábios para morte ' (Jung 1967, 13:
parágrafo 429, nota 8). E os perigos mentais da arte
alquímica são deixados claros nas inscrições para
medalhas que ilustram o estágio inicial: ‘Esta ciência
requer um filósofo e não um louco’ (citado em Fabricius
1976, 20). No início, o opus era considerado uma
proposta arriscada. No que se refere aos seus perigos
mentais, os adeptos falam sobre: ‘A fundação desta arte
em razão da qual muitos pereceram’ (Jung 1967, 13:
parágrafo 429, nota 1). E o alquimista Olimpiodoro cita a
expressão de Petasios de que o chumbo1 (prima
matéria) era tão 'desavergonhado e atormentado' que
levou os adeptos à loucura (Jung 1963, 14: parágrafo
493).

Por partes loucas ou psicóticas de uma pessoa sã,


quero dizer aqueles aspectos da psique que não são
contidos pelo eu e nos quais a função de autorregulação
da psique falha. O ‘eu’ 2representa aqueles aspectos do
'Self’, a maior totalidade da personalidade, que foram
integrados, metaforicamente falando, sendo este tanto
um centro para o ego quanto a circunferência que o
engloba. Essa experiência de contenção se expande
com a integração da personalidade. No entanto, as
partes psicóticas de uma personalidade, como as águas
caóticas de todas as culturas tradicionais, sempre estão
no limite dessa estrutura do eu, na melhor das
hipóteses, como um fenômeno fronteira e, na pior das
hipóteses, sempre invadindo e perturbando qualquer
sensação de contenção. Essas águas caóticas, as

1Mysterium Coniunctionis Vol. 14/2 (Obras completa de C. G. Jung): “Expressões mais fortes emprega o filósofo Petasios citado por Olimpiodoro: ‘O chumbo é de
tão demoníaca possessão e sem-vergonhice, diz ele, que faz com que todos aqueles que querem pesquisar entrem em louco furor ou percam o juízo’.”
2 O autor utiliza nesse momento uma distinção entre os termos “self” e “Self”. Optamos por manter, então, a distinção com os termos “eu” e “Self” nesse
parágrafo. Deixamos grifados outros casos em que houve dúvida sobre o termo utilizado.
partes psicóticas de uma personalidade, fazem parte do
Self; e são sempre cruciais para a mudança e
regeneração.

Quando o setor psicótico é estimulado no trabalho


analítico, surge uma transferência que tem um
parentesco com a descrição de Harold Searles da
transferência psicótica com analisandos
esquizofrênicos. A transferência ‘distorce ou impede
uma relação entre analisando e terapeuta como dois
seres separados, vivos, humanos e sãos’ (Searles 1965,
669). A diferença entre a transferência psicótica com o
esquizofrênico e a constelação dessa transferência em
uma pessoa não psicótica é uma diferença de grau e
também estrutural. Enquanto o setor psicótico engolfa o
esquizofrênico, a parte louca de uma pessoa sã é
parcialmente contida pela cisão de defesas.

Geralmente, estados de loucura que têm uma causa


perceptível são frequentemente mais compreensíveis do
que estados psicóticos da mente experimentados ao
interagir com indivíduos esquizofrênicos. Um analista
pode descobrir estados de loucura dentro de condições
limítrofes em que os opostos são mantidos separados
por meio da divisão de defesas. Nesses casos, uma
enxurrada de material emocional, consistindo em
desespero, raiva, estados de pânico, ansiedade e
sentimentos de abandono, pode apoderar-se do sujeito
quando a separação dos opostos falha. Todavia, ao
mesmo tempo que as áreas de loucura podem, então,
dominar o sujeito, o quadro geral pode tornar-se
significativo pelo reconhecimento desses estados
enquanto resultado do terror do abandono. Existe,
portanto, em uma extremidade, um espectro que é
delimitado por estados de natureza limítrofe levemente
caóticos. Por sua vez, existe um meio termo em que o
processo psicótico é menos contido, principalmente em
transtornos esquizoides nos quais um núcleo psicótico
pode se manifestar em opostos que não se dividem de
uma maneira relativamente estável, e no qual o núcleo
de loucura pode estar muito mais escondido. Então, no
extremo oposto do espectro está a esquizofrenia, na
qual

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a separação dos opostos muitas vezes falha,


levando a uma fusão de estados incompatíveis e a uma
sensação de bizarrice. Essa sensação de bizarrice,
estranhamento ou estranheza também acompanha o
processo psicótico em pessoas não psicóticas, e este
aspecto particular do processo psicótico é uma
característica chave da contratransferência que muitas
vezes leva à negação do analista no que diz respeito ao
processo em questão e à condução do analisando em
direção a um discurso e comportamento mais racional e
não psicótico.

Quando defesas como negação, idealização e


divisão mente-corpo começam a falhar, as partes
psicóticas invadem a personalidade consciente. O
sujeito então torna-se dissociado em alto grau e pode
oscilar entre fases de irrealidade no seu relacionamento
com sua própria pessoa e com os outros.
Comportamentos e fantasias decorrentes dessas partes
podem distorcer a realidade de maneiras muito sutis. Ao
mesmo tempo em que a pessoa pode comportar-se de
modos nos quais se sente inspirada, ela pode não ter
absolutamente nenhuma consideração por outra
pessoa, ou neste caso, por sua própria alma. O analista
é comumente afetado de maneiras semelhantes.
Quando a loucura do analisando se coloca em análise,
o analista muitas vezes se sentirá desorientado e
descobrirá ser extremamente difícil se concentrar e
conter o processo em questão. Seu próprio centro
parece falhar e predominam as partes dissociadas.
Falar sobre uma parte psicótica é, em certo sentido,
uma contradição. Uma vez que nunca experimentamos
os estados psicóticos em outra pessoa como se fossem
parte dessa pessoa, como às vezes fazemos quando
falamos de um complexo. Os estados psicóticos são,
como as águas do caos na alquimia ou nos mitos da
criação, espaços psíquicos em que a linguagem
cartesiana falha. Esses estados se estendem
prontamente para o analista, criando um campo no qual
não é possível afirmar quem está contendo ‘a parte
psicótica’. Em vez disso, o analista e o analisando lidam
com um fenômeno de campo, o qual não é redutível a
estruturas separáveis. Geralmente, o termo ‘parte
psicótica’, ou uma palavra ou conceito semelhante, é
entendido aqui como um termo abreviado para ajudar a
designar esse domínio de experiência na qual o
processo psicótico domina. Entretanto, não se pretende
levar a uma abordagem em que o analista tenta falar
das ‘partes psicóticas de um analisando’ como se essas
fossem, de alguma maneira, totalmente separáveis dos
mesmos fenômenos no analista. De certo modo, a
psicose de transferência constela a psicose
contratransferencial, mas em menor grau e de uma
forma mais gerenciável, se a análise dessas áreas for
bem-sucedida.

Há um paralelo interessante entre o comportamento


das áreas psicóticas e o caos como é entendido no
campo da Teoria do Caos. Até o advento da Teoria do
Caos, os cientistas aprenderam a não focar no caos.
Em sua constante preocupação com a busca pela
ordem, eles raramente estudavam aleatoriedade ou
mudanças repentinas e imprevisibilidade.
Consequentemente, a descoberta de que certos
sistemas aparentemente aleatórios, de fato, tinham um
tipo de ordem dentro deles foi inovadora e -
dependendo do entusiasmo do escritor - semelhante a
um novo paradigma científico.

Um paralelo muito próximo a essa situação é a


investigação das áreas loucas ou psicóticas. Esses
estados mentais há muito tempo são considerados
essencialmente não analisáveis, visto que são tão
erráticos na aparência que nunca poderiam encontrar
uma contenção estável em um processo analítico. Além
disso, seus afetos e imagens foram considerados
bizarros demais para serem decifrados e sem qualquer
significado. Uma forma extrema deste estado foi
pensada para residir 3na esquizofrenia.

À medida que os cientistas estão reconhecendo


qualidades caóticas de sistemas que antes eram
considerados supremamente ordenados, por exemplo,
as órbitas planetárias, e que eles começam a
reconhecer o valor do caos, então, eles também podem
- como a ciência antiga fez - começar a se perguntar
sobre a

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função criativa das áreas loucas da mente. A


sensibilidade extrema a pequenas mudanças - marca
característica do que a ciência considera como
processos caóticos – é apenas uma lamentável
fraqueza na criação do indivíduo, um pouco de
desordem que deve ser administrada de alguma forma?
Ou pode tamanha desordem ter alguma função ou
propósito desconhecido? Alguns estados da mente
3 O autor utiliza a expressão “thought to lie in schizophrenia”. Pensamos em outras opções de tradução: “pensada como residindo” ou, em último caso,
pensamos na possibilidade de deixar “pensada na esquizofrenia”.
parecem nunca revelarem uma ordem mais profunda.
Eles parecem permanecer ‘buracos negros’ na psique
que sugam todas as formas de ordem e as substituem
por nenhuma. No entanto, outros estados mentais que
parecem totalmente fragmentários e desprovidos de
sentido acabam por possuir um estranho tipo de ordem
que pode ser trabalhada.

A área psicótica é inerentemente instável, sujeita a


grandes oscilações devido à entrada emocional de
fatores externos ou internos. Ela contém opostos
essencialmente incompatíveis. Entretanto, ao invés de
sistemas dinâmicos conhecidos no mundo físico e
descritos pela teoria do caos, em que os estados de um
sistema oscilam radicalmente, mas continuamente;
teríamos que imaginar algo em que uma oscilação para
um estado aniquilasse o estado que já existia
anteriormente. Essa imagem seria, na linguagem da
teoria do caos, um ‘estranho atrator’. Esse oscilador
seria bastante instável em termos de ‘condições iniciais’,
o que significa dizer que esse poderia mudar
qualitativamente dependendo de pequenas mudanças
na entrada. Acredito que esse modelo oferece uma
metáfora útil para os processos psicóticos. Portanto, se
as áreas psicóticas podem ser conceituadas de tais
maneiras não lineares, não seria melhor aprendermos a
conviver com elas, tanto no trabalho analítico quanto na
vida? E se tal não linearidade existe, não poderiam as
formas de transferência e contratransferência caóticas,
nas quais todo sentido de sentido desaparece, ser mais
bem acolhidas como, de fato, um processo que pode
gerar um novo significado por meio de um tipo incomum
de ordem? Na verdade, se eles pudessem encontrar
esse tipo de contenção, poderíamos então ver as áreas
psicóticas como formas potencialmente criativas?
Alcançar essa nova perspectiva exigiria contenção, não
por uma mente que preenche e mantém o processo do
analisando, mas por uma mente que se concentra em
um processo caótico à medida que revela sua forma
instável de ordem. Essa é uma possibilidade clínica.

Desse ponto de vista, a psique não é vista como um


sistema estável de objetos que interage com outros
objetos. Por vezes, pode-se experienciar apenas ruídos
e estados sem sentido, mas então algo único aparece; e
se este evento pode ser visto, é, então, possível para o
sujeito começar a ver de uma nova forma e reconhecer
processos criativos antes ocultos. É dessa forma, vendo
como a área psicótica é vivenciada, e quando é contida,
que a criação de um self pode ser sentida como se
estivéssemos muito próximos do próprio processo
criativo.

Além da questão geral de seu poder transformador, o


analista tem uma razão específica para envolver essas
áreas como prima matéria.

INICIO DA AULA – PG 36/37

Durante os primeiros anos da infância, algumas


pessoas 'viram' que um ou ambos os pais estavam
'loucos'. Isso não significa que o pai ou a mãe eram
necessariamente manifestamente psicóticos - embora
isso também ocorra e possa ser negado pelo sistema
familiar, mas sim que a criança ‘viu’ imaginalmente, nos
bastidores, que a mãe ou o pai foram dominados por
forças fora de seu controle, ou estavam afastados e
completamente ausentes, mesmo enquanto agindo
como se estivessem presentes e sãos. Essa loucura
não necessariamente colocou-se o tempo todo, mas ou
foi a presença de um contexto aterrorizante que a
criança sentiu, ou então foi manifestada às vezes,
quando o objeto parental passou por uma mudança
temporária de personalidade, por exemplo, devido ao
uso de substâncias como o álcool. A loucura dos pais
pode se colocar na forma de abuso físico e sexual,

mas quando as partes loucas de figuras


parentais não operam de maneiras tão devastadoras
e desveladas, elas frequentemente se manifestam
de maneiras mais sutis e ímpares

[ pg 38 ]

Por exemplo,

um pai permitiu que seu filho dirigisse seu carro,


mas insistiu que ele não usasse o rádio. O filho
naturalmente o usou e a cada vez tentou colocá-lo
novamente em sua configuração inicial; c

ontudo, o pai, alerta para tais coisas, ficou furioso.

O conto pode parecer simplesmente representar um


pouco de um comportamento extremo. Porém, é muito
mais que isso: o jovem sabia que nessas horas seu
pai estava ‘totalmente’ fora de controle, na verdade
louco. Ele sabia que a loucura sempre esteve à
espreita de seu pai, manifestando-se de várias
maneiras que poderiam sempre ser reduzidas como
sendo apenas exemplos da rigidez de seu pai.

Em outro exemplo,
o pai de um homem insistiu que seus filhos polissem
imediatamente seus sapatos sempre que entrassem em
casa, mesmo com 3 anos de idade.

A intensidade e a violência do seu pai, para que


ele ou seus irmãos não fossem nada além de perfeitos
com seus sapatos brilhando, eram algo assustador
para todos eles. No entanto, seu pai era bem
adaptado, amado em sua comunidade, e só se
mostrava abertamente como assustador e fora de
controle para os outros quando bebia muito.

Muitos outros exemplos podem ser dados de


maneiras em que a loucura de um objeto parental era
uma presença de fundo, sempre aterrorizante, e às
vezes manifestada em um comportamento peculiar que
tendia a ser normalizado, geralmente pelo outro
progenitor. Como resultado, a visão da criança dessa
loucura teve que ser cindida.

Quando essas pessoas entram em tratamento,


manifestam vários graus de dissociação, muitas vezes
concebidos em sonhos ou intuitivamente percebidos
como a imagem de uma jovem criança dissociada do
estado normal do ego da pessoa. Normalmente, 'a
criança' está extremamente assustada. É muito fácil
supor que tais pessoas foram vítimas de abuso
incestuoso, ou até mesmo de abuso de culto, pois seu
comportamento traumatizado pode ser o mesmo que o
de tais sobreviventes; mas, essa explicação pode ser
apenas uma abordagem apressada apreendida em um
desejo de entender por que a vida de um analisando
não muda suficientemente. Uma pessoa inteligente,
criativa e perspicaz pode repetir o mesmo
comportamento destrutivo e continuar a se envolver em
relações objetais prejudiciais.

Minha experiência é que áreas de loucura no


analisando, formadas através da incorporação e
separação de sua percepção imaginal da loucura no
objeto parental, tornam-se sujeitas ao mesmo tipo de
compulsão a repetição que um analista encontra nas
vítimas de abuso sexual e físico.

Como consequência dessa divisão, a realidade é


distorcida, e a distorção continua ao longo vida,
minando a vida e vitalidade do ego e do self mais
amplo.
Áreas psicóticas também frequentemente se formam
em pessoas que foram abusadas fisicamente ou
sexualmente, especialmente quando a pessoa não foi
capaz de usar formas neuróticas de dissociação para
fins de sobrevivência.

Como resultado do processo de negação, a pessoa


que foi traumatizada por uma área psicótica de um
objeto parental carrega dentro de si um ‘objeto
estranho’, que é o processo psicótico dos pais, agora
misturado com as próprias defesas de divisão da
pessoa.

Para lidar de forma eficaz com essa mistura, a


pessoa primeiramente deve reconhecer sua própria
área de loucura e, em seguida, reunir coragem para
‘ver’ mais uma vez o que ela viu uma vez, mas agora,
como em um ato de lembrança de si mesmo, não mais
como separação da percepção.

O problema que a pessoa enfrenta, entretanto, é


que possuir essa percepção significa estar sozinho, sem
ter outra escolha a não ser deixar o sistema familiar. A
verdade que ela ‘vê’ é, portanto, em alguns aspectos
cruel, mas, em aspectos mais profundos, essa visão é o
caminho para a liberdade e propriedade de um self.

A chave para lidar com áreas psicóticas é a relação


entre analista e analisando ser capaz de dar continência
a elas /envolvê-las.

Esse envolvimento raramente é uma questão de foco


atenção constante;

ao contrário, é como observar um traço de uma


reação em uma câmara de nuvem nas ciências físicas.

Por um instante, o

analista vê a estrutura peculiar de opostos na área


psicótica;

ou ele vislumbra uma divisão frente-trás 4na qual


vivem conteúdos loucos, perigosos e envolventes,
separados por trás da pessoa;

ou o analista pode perceber imaginalmente opostos


estranhos lado a lado- estranhos por causa da maneira
como eles se engendram para produzir uma qualidade
bizarra.

Karl Jaspers observou: ‘A distinção mais profunda na


vida psíquica [é] aquela entre o que é significativo e
4 No texto, o autor utiliza a expressão “front-back”, que também poderia ser traduzida como: “frente-verso” e “frente-costas”.
permite empatia e o que em sua forma particular é
incompreensível, "louco" no sentido literal, vida psíquica
esquizofrênica’ (citado em Sass, 1992, 16-17).
Fantasias, como Louis Sass constata em Madness and
Modernism [Loucura e Modernismo]:

podem ser bastante delirantes sem ser bizarras. Mas


em esquizofrênicos elas são bizarras. Alguém com
psicose maníaca pode sentir que está criando o mundo
e isso pode ser entendido como resultado de
sentimentos de extrema inferioridade que eles estão
compensando. Todavia, considere a descrição da
dançarina (EXEMPLO)Nijinsky durante uma pausa
esquizofrênica: ‘Uma vez fui dar um passeio e
pareceu-me que vi um pouco de sangue na neve. Eu
segui os rastros do sangue e senti que alguém que
ainda estava vivo foi morto’.

(Sass 1992, 17)

A sensação do bizarro, como exemplos ulteriores


irão mostrar, ocorre através da fusão de imagens
contraditórias na área psicótica.

Estados incompatíveis se fundem, mas o fazem


de uma maneira que não é integrada.
Em vez de produzir um produto simbólico que
transcende ambos,

eles produzem um estado misto que manifesta


mensagens conflitantes e uma sensação de
estranheza.

, o mesmo tipo de material, com sua desconcertante


falta de sentido pode, por vezes, ser encontrado tanto
no seu discurso aparentemente normal quanto nos seus
sonhos.

Por exemplo, uma analisanda sabia que ela tinha


que deixar o relacionamento em que ela estava
envolvida, mas ao mesmo tempo negava esse
conhecimento, muitas vezes dizendo coisas
contraditórias na mesma frase. Enquanto ainda tentava
desesperadamente dar sentido ao comportamento
dúplice e dúbio do namorado, ela sonhou:

EXEMPLO DE IMAGEM/SONHO

Há uma festa dada por um casal furioso que está se


divorciando. A festa é para comemorar por terem estado
juntos por um ano.
a contradição existe como um padrão inconsciente
que cria um sentido bizarro para suas comunicações.

Muitas vezes, imagens de um sonho que não fazem


sentido podem significar uma área psicótica,

Obviamente, se pode-se encontrar significado em


tais imagens, elas deixam de ser bizarras e não são
mais indicativo de um processo psicótico.

Mas assumir que tais possibilidades são a regra, ao


invés da exceção, é ingênuo.

pode ser uma resistência da contratransferência em


ver diretamente que o analisando pode ser bastante
louco e um estranho para nós.

Geralmente, o analista deve ficar atento à falta de


significado que uma imagem parece ter, mas, ao
mesmo tempo, perceber que essa ausência de
significado é uma função de sua própria psique e da
interação do analisando.

Portanto, no trabalho analítico, tudo que o analista


tem a oferecer é sua própria percepção e subjetividade.

está fora dessa limitação a condição de que a


verdade para o analisando possa emergir.
.

Às vezes, as áreas psicóticas são explícitas,

como quando um homem sonhou que estava


carregando sua mãe psicótica em seus ombros.

Ou, quando uma mulher, cuja mãe acabara de ser


internada em um hospital psiquiátrico, sonhou que a
carregava em casa tentando encontrar um lugar para
colocá-la no chão.

geralmente as áreas psicóticas se comunicam


conosco por meio de

uma sensação de bizarrice que pode seguir um


sentimento de confusão ou de estar mentalmente vazio,
ou ainda,

elas comunicam-se através das próprias reações


contratransferenciais dissociativas do analista.

Internamente, a área psicótica de uma pessoa é


extremamente estressante.

Sob seu impacto, o analisando pode sofrer de uma


sensação crônica de não ser capaz de criar uma vida
que tenha qualquer continuidade e estabilidade.
Uma mulher sofria com a sensação de que tudo era
devastador para ela. Uma vez, por exemplo, ela teve a
ideia de fazer um jantar em sua casa para seus amigos.
A ideia parecia tão maravilhosa que um sentimento
muito rico e criativo a cercou. Porém, logo esse estado
de euforia transformou-se num estado de terror
completo, pois ela, de repente, convenceu-se de que o
jantar seria um fracasso.

Ambos os estados eram absolutos, e cada um


não permitiu que nenhum indício de qualquer coisa
do estado oposto entrasse.

Em outra situação de como a parte psicótica


infunde e distorce internamente a experiência de
alguém,

uma mulher meditou e imaginou ver o lindo gato de


sua professora na sala. A presença do gato deixou-a
com uma sensação de graciosidade, beleza e calma.
Então, ela sentiu uma mudança radical, e estava
totalmente dominada por pensamentos e sentimentos
de problemas que envolveriam cuidar do gato. À medida
que esses estados de mudança continuavam, ela se
sentia inundada incontrolavelmente por esses
pensamentos e todo o seu corpo começou a doer. Ela
não conseguia se lembrar de nenhuma das experiências
iniciais de beleza e graciosidade; isso foi totalmente
eclipsado.

os opostos estavam tão cindidos a ponto de impedir


esse processo simbólico que, por definição, combina os
opostos em um terceiro significativo.

Muitas vezes, a área louca de uma pessoa pode


ser um depósito de criatividade - em termos
alquímicos, “uma pérola de grande valor”- mas sua
extração não é fácil.

Por exemplo, uma mulher que veio a conhecer sua


parte psicótica

reconheceu que essa loucura se formou nela como


um resultado de interações com seu pai.

Ele parecia ser maravilhoso e muito amoroso, mas


de repente, ele se transformaria em um bruto que, ela
sentia, que aniquilava qualquer sentido de sua
identidade ou valor.

Ela foi incapaz (NÃO ATUOU A DEFESA CISÃO) de


idealizá-lo, ou seja, de manter o pai positivo em sua
mente e separar o negativo.

Em vez disso, o negativo estava sempre lá com o


positivo, pressionando sua mente como uma
possibilidade sempre presente, mesmo quando ele
estava sendo seu eu maravilhoso.

Era, ela disse, como dois trilhos, cada um com seu


próprio trem, e ambos estavam sempre muito próximos,
como se houvesse um milímetro de distância entre eles

Os opostos em sua área louca foram, portanto,


quase fundidos e ela não conseguia separá-los
totalmente. Cada um era totalmente verdadeiro, e
cada um aniquilava o outro.

Quando ela estava confusa e apavorada


internamente, e cheia de idealizações distorcidas de si
mesma e dos outros, ela também era capaz de ser
notavelmente criativa e produtiva.

O problema, no entanto, era que ela era atraída por


homens criativos que podiam ser bastante psicóticos.
Essas relações acabavam sendo desastrosas, por um
lado replicando sua experiência com seu pai e, por
outro, representando uma tentativa de extrair sua
própria criatividade de uma área de loucura. No
processo, sua própria criatividade não podia emergir.
Áreas psicóticas, que geralmente são um
anátema/maldição para a pessoa e para todos em
contato com elas fora do relacionamento analítico (e
muitas vezes lá também),

são na verdade um esconderijo inteligente/esperto


para o que a pessoa mais estima e mais deseja manter
longe de relacionamentos abusivos.

Na mitologia alquímica, o símbolo central de um


Self unificado, a procurada ‘Pedra do Sábio’ ou
‘Lapis’, é encontrada em montes de esterco e
geralmente em lugares desprezados.

MANIFESTAÇÕES DA PARTE PSICÓTICA

Os analistas têm diferentes maneiras de lidar com a


dinâmica da transferência psicótica. Quando a atenção
do analista começa a fragmentar-se e surgem estados
de morte interior, vazio e confusão, o que pode conter
tais estados? Um ato de vontade, por exemplo um
esforço de concentração intenso, pode, muitas vezes,
acolher uma retirada esquizoide ou a regressão que
acompanha a perturbação do equilíbrio do caráter
narcisista. Contudo, a dissociação da parte psicótica
geralmente domina o ego do analista. Frequentemente,
mas nem sempre, uma qualidade de contenção pode vir
da percepção do analista de que uma transferência
psicótica está trabalhando nos bastidores. Em outras
palavras, o analisando pode ser bastante racional e
também conectado a afetos, ao contrário do que ocorre
na dinâmica de cisão em um estado esquizoide, mas
estar dominado por uma projeção de natureza psicótica.
Do ponto de vista deste setor, o analista é um objeto
perigoso e perseguidor; o 'como se' de uma projeção
não psicótica é perdida. Além disso, o modo como
vemos esse estado é essencial se a parte psicótica
deve ser contida. O analista deve entender o estado
psicótico do analisando não apenas como uma
realidade psíquica, mas também como um estado
mental comum, visto que quando o analista vê a parte
psicótica, a tendência é recuar diante dessa natureza de
distorção da realidade. O analisando parece estranho
ao analista. Essa estranheza é inerente à
fenomenologia da loucura à medida que irrompe no
mundo normal do dia-dia; o fenômeno da loucura é
como o deus grego Dionísio, mas também é uma
representação do medo do analisando de ser visto
como um “leproso psíquico”5. Consequentemente, o
analista deve ser capaz de ver a parte psicótica de uma

O mistério da relação humana 42

maneira prática. O analista está com uma pessoa


ferida e limitada (como todos nós), mas ele ou ela
também está com alguém de beleza e valor, muito do
que, na verdade, é resultado de seu sofrimento no
âmbito psicótico.

Muitas vezes, se o analista perde um estado


corporificado e realista, e fala sobre as distorções da
realidade da transferência psicótica, o analisando pode
reconhecer que o que é dito é correto, mas estados
dissociativos retornam para ambos porque a contenção
da ansiedade falha. Por outro lado, se o analista pode
permanecer incorporado, experimentando ativamente e
imaginando o setor psicótico, ele pode criar

5 A expressão no texto é “psychic leper”. Pensamos em deixar entre aspas, porque a força do conteúdo da expressão causou um certo estranhamento na hora
de traduzir. Chegamos a pesquisar outras formas de tradução, mas o termo “leper” só possuía significados atrelados à hanseníase.
interpretações que sejam contentoras para o
analisando.

A transferência psicótica é um estado no qual algum


grau da aliança entre analista-analisando ainda existe.
Portanto, quando o analista é capaz de ‘ver’ a
desconfiança dupla do analisando, algo no analisando é
aliviado e segue-se uma sensação de contenção. Em
contraste, quando a qualidade da aliança analisando-
analista se esvai e a transferência torna-se delirante,
nenhuma quantidade de visão, conexão empática ou
compreensão tem uma influência de contenção. Em vez
disso, analista e analisando permanecem, pelo menos
por enquanto, em um estado em que o demoníaco 6
ganhou a vantagem.

Para conter o campo psicótico, o analista deve ser


capaz de reconhecer e resistir à loucura traduzindo-a
em algum sistema de pensamento com o qual esteja
familiarizado. Uma vez que as partes loucas, em sua
essência, quebram os pensamentos, levam a estados
de vazio e, especialmente, atormentam o analisando
com um purgatório de angústia mental em que qualquer
coisa que ele ou ela sente ou pensa pode ser
prontamente desfeito, levando a um estado em que o
6 A expressão literal do autor é “devil”, que pode ser traduzida também como demônio. Mas refletindo pensamos que talvez demoníaco pudesse se encaixar
melhor, pela noção mais ampla que traz. Também discutimos sobre o termo “daimoníaco”, mas acabamos optando por apenas comentar sobre ele e não utilizá-lo no
texto, devido à insegurança de talvez mudar o sentido do que o autor trouxe.
que foi dito não tem significado nenhum. O analisando
percebe que ele ou ela tem se agarrado a palhas no
vácuo, com absolutamente nenhum sentido de um
centro de orientação interno, ou de um suporte de fundo
que dá uma sensação de estar no caminho certo. Pelo
contrário, nenhum caminho parece possuir algum tipo
de sentido. Os opostos cindidos da parte psicótica, ao
invés de criarem um estado de suspensão voluntária de
conhecimento, transformam-se em destruidores
violentos de pensamentos e sentimentos e tornam todos
os estados sem sentido.

Se o analista puder conter a parte psicótica


reconhecendo o desespero total que o analisando sofre
na crença de que esta parte e seus efeitos nunca
mudam, então uma nova experiência de self pode vir a
existir. Para facilitar essa mudança, o analista sacrifica
sua onipotência e se alinha com a realidade do
analisando, a qual pode muito bem ser real. Essa não é
uma questão apenas de empatia, mas também de
coragem, a qual deixa aberta a possibilidade de
fracasso. Tudo o que o analista pode realmente oferecer
é uma medida de incerteza em face do pessimismo do
analisando. O mistério dessa medida de incerteza está
em sua qualidade de contenção. A menos que essa
incerteza que não abandona a fé seja comunicada, o
estado de ‘não saber' do analista deixará de ter uma
vantagem criativa.

A parte psicótica de uma pessoa sã se manifesta de


inúmeras maneiras, e a percepção dessas exige que o
analista registre-as e use a contratransferência. O
analista pode experimentar uma tendência à
dissociação, que pode incluir a retirada e perda de
energia comum no encontro com a dinâmica esquizoide,
mas principalmente ele ou ela experimenta
fragmentação, tornando a concentração no analisando
extremamente difícil em meio à sensação de vazio,
ausência, estupidez e desalento. Qualquer tentativa de
orientação fixa falha facilmente e tende a mudar para
um oposto. Como consequência desses estados
mentais desconfortáveis, o analista pode sentir ódio do
analisando e uma tendência para recuar ou atacar.

A tendência do analista é evitar fazer contato afetivo


com o analisando nesses

As partes loucas de pessoas sãs 43


momentos, especialmente separando-se dos
sentimentos negativos. Em vez disso, a inclinação é
permitir que a dissociação passe e vá embora como se
nada tivesse acontecido. Uma tendência concomitante,
a qual frequentemente é diagnóstico da constelação da
parte psicótica, é que o analista comece a salientar os
pontos fortes do analisando e abordar a parte neurótica
mais normal. Mais tarde, o analista pode muitas vezes
aprender que, por meio dessa manobra, ele tem
enfatizado um dos opostos na parte psicótica, e tem
excluído outro, na esperança de reduzir sua ansiedade.

Se o analista consegue encontrar o campo


dissociativo que acompanha a transferência psicótica,
de tal forma que ele ou ela mantenha uma presença
coesa e envolva emocionalmente o analisando, o
analista pode começar a esclarecer o campo, na medida
em que este não é mais uma confusão de fragmentos
de ataque e destruição de imagens, mas que assume a
forma de imagens reais. O analista pode, então,
reconhecer uma forma de transferência psicótica. Por
exemplo, o setor psicótico do analisando distorce a
imagem do analista como um animal de ataque ou como
uma figura parental perigosa. O analista torna-se
identificado com partes da psique parental que eram
especialmente perigosas para o analisando. Um
exemplo é ver o analista como morto, um estado que,
mais tarde, pode ser descoberto como parte de uma
vida interior psicótica dos pais que o analisando separou
de sua consciência. Como parte da elucidação da
natureza da transferência psicótica, o analista sente que
o analisando o vê de uma forma extremamente irreal.
Nessas horas, o analisando também parece estranho
para o analista, pois o estado psicótico se opõe
radicalmente à parte normal-neurótica que um prefere
experimentar. Se o analista tem sucesso em
experimentar essa transferência de maneira
suficientemente estável, a percepção do analisando de
si mesmo e do analista pode muitas vezes transformar-
se e mudar dramaticamente.

Enquanto o analista está elucidando essa sequência


desrealizada7 e despersonalizada, as resistências do
analisando para experienciar a parte psicótica começam
a ser esclarecidas e tornar-se sujeitas à mudanças.
Essas resistências comumente mostram-se de natureza
erótica, compulsiva, maníaca ou sadomasoquista. Por
exemplo, formas extremas de sadomasoquismo
frequentemente foram separadas na parte psicótica.
7 “Derealization”: perda da sensação de realidade do mundo circundante. Sentimento de que algo aconteceu, de que o mundo mudou ou foi alterado, de que
a pessoa está destacada do ambiente. Miller-Keane Encyclopedia and Dictionary of Medicine, Nursing, and Allied Health, Seventh Edition. © 2003 by Saunders, an
imprint of Elsevier, Inc.
Quando essa parte é contida, e se torna corporificada,
pode se tornar claro que muitos comportamentos
sadomasoquistas, como a entrega extrema de si mesmo
aos outros, ao mesmo tempo que este se retrai
sutilmente, é, na verdade, uma defesa inconsciente
contra a loucura. Minha impressão também é que a
experiência de abuso sexual no início da vida muitas
vezes reside em um setor psicótico, e a recuperação de
memórias pode exigir trabalhar com as dinâmicas deste
setor.

Alcançar uma consciência de opostos distintos


dentro do setor psicótico, muitas vezes, leva tempo e
esforço consideráveis. Geralmente, os opostos neste
setor têm a qualidade peculiar de estarem totalmente
divididos e também fundidos: eles parecem se separar,
mas também se fundem de forma que sua distinção
desaparece. Essa divisão lembra a natureza do
Mercúrio alquímico, que é uma boa imagem das
qualidades de campo que esses opostos engendram.
Dentro desse campo, o analista tende a sentir-se
identificado com um ou outro oposto ou, inversamente,
afastar-se de experimentar os opostos. Essa
combinação peculiar de fusão e divisão coloca os
opostos em um estado na fronteira do que os
alquimistas se referiram como ‘antes do segundo dia’,
isto é, antes da separação dos opostos. Eles
emergiram, separaram-se e, em seguida, fundiram-se
rapidamente de volta a um estado fusionado e não
distinto. Nota-se, então, algo mais importante, a fusão e
a separação de opostos podem ocorrer com extrema
rapidez na parte psicótica, produzindo uma oscilação
que pode criar pânico e confusão.

O mistério da relação humana 44

A área louca, como qualquer complexo, é


estruturada por qualidades opostas, como amor e ódio;
mas em áreas loucas, os opostos não complementam,
compensam ou equilibram um ao outro. Em vez disso,
eles se comportam como anti-mundos um para o outro:
experimentar ou estar ciente de qualquer estado mental,
muitas vezes, levará a uma percepção de outro estado
oposto, o que destrói inteiramente a percepção anterior.
Em certo sentido, o analista e o analisando confrontam
um processo à beira da separação dos opostos, como
se um oposto e, então, o outro emergisse; mas ambos
não existem a menos que um ato intencionalmente
consciente literalmente mantenha-os juntos.
Consequentemente, esse processo imaginal difere de
um processo projetivo de identificação no qual um
oposto é separado no analista; ao encontrar áreas da
loucura, a percepção do oposto é aniquilada à medida
que desliza de volta para o inconsciente. Às vezes, um
analista pode pensar que esqueceu o que acabou de
acontecer, mas, em uma reflexão mais profunda, verá
que este não é o caso. Em vez disso, alguma percepção
foi aniquilada, e outra percepção, ou um estado de
inconsciência, tomou o seu lugar.

O processo de descoberta dos opostos na parte


psicótica geralmente decorre de experimentá-los como
extremamente divididos dentro de um campo interativo
e às vezes sentido em identificação projetiva. O analista
sente que os opostos estão divididos, com cada um
competindo por atenção total, e com a lacuna entre os
opostos engendrando um estado de ausência ou vazio
no qual as energias estão embotadas e a consciência é
difícil de ser mantida. Quando os opostos são
apreendidos juntos como um par relacionado, o que
significa que o analista torna-se capaz de não se
identificar com um ou outro do par, um novo
desenvolvimento é possível. Pode surgir um campo de
união, uma experiência sentida de conjunctio. Através
dessa experiência, o centro do coração 8tanto para o
analista quanto para o analisando torna-se mais aberto.
Isso é geralmente uma nova experiência para o
analisando, para quem a experiência e visão do coração
foi fechada por forte blindagem. A apreensão dos
opostos não leva sempre a essa experiência, mas leva,
com efeito, a uma nova consciência do setor psicótico,
especialmente de sua natureza limitante. Analista e
analisando podem aprender sobre o poder do setor
psicótico de distorcer a realidade muito sutilmente, e
através dessa consciência, eles podem desenvolver um
processo no qual aspectos da psique escondidos dentro
do setor psicótico podem emergir. Mais comum é uma
parte esquizoide cuja fraqueza essencial, falta de
conexão e natureza distorciva levam a um profundo
sentimento de humilhação. Apenas a percepção dos
opostos como parte da consciência que se instala,
permite que esta experiência seja contida ao invés de
se transformar em um estado persecutório. Como
resultado, o que parece ser esquizoide e sem vida,
8 No princípio, surgiu uma dúvida sobre o uso da expressão “centro do coração”. Pesquisando, encontramos artigos sobre a importância desse símbolo na
teoria junguiana e alquímica, por isso, mantivemos a tradução como estava, mas decidimos sinalizar para caso haja outra forma de expressar essa questão que talvez
possamos ter deixado passar.
muitas vezes começa a se mostrar como parte de um
campo altamente energizado que foi dividido. De
maneiras tão típicas, a descoberta da parte psicótica e o
trabalho com suas energias é semelhante a um
processo de criação.

Um contraste entre o processo de divisão do setor


psicótico com o de dissociação em transtornos
dissociativos revela que as partes em transtornos
dissociativos são mais completas. Eles geralmente são
diferenciados uns dos outros por uma barreira de
memória, e frequentemente levam a um estado
semelhante ao transe induzido no objeto com o qual a
pessoa está se relacionando. Essa condição também
tem um efeito dissociador sobre a pessoa relacionada,
mas não é fragmentada da mesma forma que quando
induzida por uma área psicótica. Distúrbios dissociativos
podem se formar para sobreviver ao abuso, ou para
dividir os opostos de mensagens de vínculo duplo com
as quais se cresce quando criança. Mensagens de
vínculo dupla são comunicações compostas por duas
mensagens contraditórias com a demanda implícita de
que o alvo da mensagem não processe a contradição.
Na defesa contra a confusão da
As partes loucas de pessoas sãs 45

vinculação dupla, cada parte do vínculo forma uma


parte dissociada. No entanto, em um setor psicótico,
divisão, abuso e mensagens de vinculação dupla não
são processadas por meio de transe – a capacidade de
fazer isso provavelmente tem base genética, assim
como a capacidade de ser hipnotizado. Em vez disso,
uma área psicótica se forma, a qual é definida por
opostos que são vivenciados como anti-mundos
mutuamente aniquiladores.

Os opostos divididos no setor psicótico criam


confusão extrema em inúmeros encontros diários. Por
exemplo, um aluno de uma classe me perguntou sobre
algo que eu disse em um palestra que ele havia
assistido. Algo em sua pergunta me deixou nervoso.
Essa sensação piorou quando ele passou a fazer outra
pergunta com base no que eu disse naquela palestra.
Nesse ponto, senti uma onda de raiva e confusão. Por
um lado, ele havia distorcido o que eu disse de uma
maneira, que aquilo tornou-se difícil de ser reconhecido.
Por outro lado, ele estava fazendo uma pergunta
relevante, que, no entanto, me colocou em um conflito
de duplo vínculo. Se eu confrontasse sua distorção, eu
senti que estaria atacando-o por não abordar sua
questão; e se eu respondesse a sua pergunta, senti que
estaria concordando com sua distorção. Nessa
interação, não fui capaz de separar as duas vertentes
da sua mensagem, pois a situação do grupo tornava
uma comunicação tão íntima praticamente ingovernável.
A natureza do campo se manifestando através do
dinamismo da parte psicótica criou confusão suficiente
para tornar o pensamento diferenciado muito difícil.

Levando em consideração que diferentes partes de


um estado dissociativo podem muitas vezes ser
totalmente opostas uma a outra, elas existem dentro de
uma dimensão da lógica de transe de modo que tais
contradições não são necessariamente confusas. X e Y
podem ser afirmações completamente contraditórias,
como uma crença da pessoa de que ela pode ser
totalmente competente e totalmente incompetente. Na
dinâmica da lógica de transe, essas crenças opostas
podem existir simultaneamente. Porém, ao lidar com um
complexo psicótico, X e Y representam estados mentais
que não existem com equanimidade, e em combinação
eles aniquilam um ao outro ou criam uma sensação de
bizarrice. A oposição deles não pode ser tratada como
se fosse um mundo hipnótico em que a lógica de transe
existia; em vez disso, eles deixam algo suspenso em
um estado de confusão. O melhor que o analista pode
fazer, ao começar a experimentar esse estado, é ficar
confuso. Entretanto, é importante não estar confuso
sobre estar confuso. A confusão dentro do campo criado
pela parte psicótica é o meio em que o analista e o
analisando trabalham. Se o analista deixar de lado a
confusão, ele ou ela estará propenso a sentir uma raiva
impotente e tenderá a afastar o analisando para longe
da área psicótica e levá-lo para um funcionamento mais
competente. Essa cisão pode ocorrer quando o analista
se envolve com as partes de um transtorno dissociativo;
mas isso geralmente é quando ele ou ela fica
exasperado com jovens partes dissociadas. Ou, a cisão
no analista ocorre quando ele ou ela não consegue
reconhecer todo o sistema de partes e tende a tratar a
pessoa como se uma parte fosse o todo, apenas
encontrando grande resistência e regressão como
resultado. Sob o estresse de tais estados dissociativos
induzidos, o analista pode tender a sentir o mesmo tipo
de raiva impotente que ocorre quando ele ou ela está
lidando com áreas psicóticas. Todavia, quando o
analista recupera seu rumo e encontra o tom de voz
apropriado que pode encorajar uma sensação segura
de apego, a angústia que uma vez pareceu catastrófica
pode desaparecer rapidamente. Esse tipo de mudança
não ocorre ao lidar com a área psicótica, onde os
sentimentos catastróficos não mudam tão prontamente.
Quando a natureza da cisão não está contida em um
campo interativo e na imaginação do analista, e quando
sua capacidade de reter um self, em meio à confusão e
ataques à possibilidade de relacionamento, é perdida,
então, uma regressão perigosa pode ocorrer.

O mistério da relação humana 46

Muitas vezes, essa regressão resulta no colapso do


tratamento e em feridas graves para o analisando.
Mesmo que o material de uma pessoa dissociada
possa parecer bizarro, tais comunicações podem
parecer muito mais compreensíveis e dotadas de
sentido do que em processos psicóticos. Por exemplo,
uma mulher sonhou que estava comendo o cérebro
exposto de uma pessoa deitada sobre uma mesa. Era
também seu próprio cérebro, e era como fios de queijo.
A imagem, no entanto, fazia sentido. Referia-se a como
ela havia se dissociado durante um abuso, a como seu
cérebro foi programado, e a como ela foi obrigada a
destruir seus próprios pensamentos. Quer, ou não, essa
interpretação seja verdadeira ou falsa, a questão é que
foi prontamente disponível como uma forma de pensar,
enquanto em níveis psicóticos esse não é o caso.

O papel da idealização defensiva na dinâmica da


parte psicótica é especialmente importante. É
empregada com extrema tenacidade para bloquear a
experiência de ódio e raiva em relação a um objeto e
para manter uma autoimagem ideal. Quando um
analisando estava trabalhando com sua parte psicótica
e suas defesas idealizadoras começaram a diminuir, ela
sonhou com um luz ofuscante que rapidamente mudou
para uma escuridão total. Esses opostos oscilavam
rapidamente criando medo e pânico e fazendo com que
ela tentasse restaurar suas defesas idealizadoras. Outro
analisando começou a alucinar que tinha os dentes de
um animal, e em várias ocasiões, eu vi imagens de
sonhos ou alucinações reais nas quais o analisando
possui garras de animais. Quando esses estados
terríveis são vividos e contidos, isto é, não são
descarregados sobre outra pessoa em, por exemplo,
raiva extrema, então os opostos na parte psicótica
podem se transformar. Objetos inanimados tornam-se
animados; formas animais de sangue frio evoluem para
as de sangue quente; e os animais se transformam para
ter forma ou fala parcialmente humana.

Uma lógica peculiar de ‘nem-nem’ na parte psicótica


pode ser discernida uma vez que os opostos nessa
parte começam a assumir uma forma mais significativa,
em que seus status como anti-mundos começam a
mudar e os opostos se aproximam de uma função
compensatória. Essa lógica pode ser discernida também
nas profundezas da organização limítrofe e é
considerada ali pela existência da parte psicótica nessa
organização da personalidade. Por exemplo, uma
mulher borderline9 que havia trabalhado, com sucesso,
através de uma série de defesas, notadamente a

9 Esse é o segundo caso em que a expressão “borderline” aparece nesse parágrafo, mas optamos por não traduzir como limítrofe por achar que esse termo
não se encaixaria tão bem, no entanto, decidimos sinalizar para confirmar se esse é mesmo o sentido correto.
idealização, escondendo a parte psicótica, falava de não
se sentir morta, mas não se sentir viva. Ela dizia que
não se sentia nem cheia nem vazia. Em vez disso,
qualquer qualidade era sentida dentro de um estado
desconcertante de não ser nem X nem não ser X. Esse
estado de suspensão dominou.

Muitas vezes encontra-se este estado de suspensão


com mais força na tentativa de recordações de incesto
entre vítimas de abuso. A pessoa geralmente será
atormentada pelo pergunta: ‘Aconteceu ou não?’ ou
‘Estou inventando tudo isso?’. Porém, a questão é que
tudo o que aconteceu primeiro emerge de um setor
psicótico, onde o analista não pode conhecer o que
aconteceu, nem o que não aconteceu. Regras de
suspensão, um estado severamente oposto por
mecanismos paranoicos que não podem tolerar
ambiguidade. No entanto, o analista deve ser capaz de
conter a questão de saber se isso aconteceu ou não,
apenas tolerando tal estado de suspensão ambígua.
Como resultado da cisão e dos opostos
incompatíveis dentro das áreas psicóticas,

as pessoas com fortes áreas psicóticas tendem a


criar mensagens de vinculação dupla em suas
comunicações. E

reciprocamente, as áreas psicóticas são


frequentemente formadas como uma defesa

contra ser o objeto de mensagens de dupla


vinculação.

O trauma desempenha um papel crucial na formação


de áreas psicóticas. Com o tempo, essas áreas podem
se tornar ‘lugares’ para os quais o ego regride para
evitar a dor de uma parte jovem que retém a memória
do trauma.

Por exemplo,

uma mulher começou a encontrar seu medo de


expressar quaisquer necessidades. E

sse medo era baseado em uma contínuo trauma com


sua mãe, a qual às vezes era realmente psicótica, e era
um medo de tais proporções que sempre que ela
começava a experimentar sua necessidade de meu
apoio, o campo entre nós rapidamente se fragmentava,
e eu mal podia me concentrar em qualquer coisa que
ela dizia.
ÁREAS PSICÓTICAS, VÍNCULOS E
RELACIONAMENTO HUMANO (PG 47)

Fora do estado de opostos apreendidos,

uma pessoa pode aprender a respeitar a existência


da parte psicótica e

pode, assim, mudar.

Psicologicamente, um sacrifício está envolvido: a


consciência de ser limitada por sua existência.

Na análise, o terapeuta deve se submeter ao estado


de ser limitado, especialmente devido à lógica ‘nem-
nem’ e à divisão extrema na parte psicótica, por estados
mentais que desafiam completamente qualquer um dos
sentimentos de onipotência do analista.

Contudo, por meio dessa aceitação da limitação,


uma sensação de estrutura interna do self/eu e uma
vida interior da alma emergem tanto para o analista
quanto para o analisando.

Além disso, ambos podem aprender como viver perto


das energias da parte psicótica tem um estranha
capacidade de abrir o coração, de criar uma consciência
centrada no coração na qual o reino imaginal é uma
poderosa realidade psíquica e uma forma de "ver" que
antes era excluída.

A parte psicótica e a transferência que ela cria


podem, assim, ser assim reunidas. Para alcançar essa
estabilidade relativa, o analista deve trabalhar
repetidamente a dinâmica que eu tenho enumerado,
pois a natureza Mercurial da parte psicótica pode induzir
atenção e consciência para escapar da turbulência e da
profundidade desta área. Todavia, o esforço contínuo,
muitas vezes, levará a uma relativa estabilidade no
acesso a essa parte do analisando, um estado que não
depende apenas da dinâmica arquetípica do nível
psicótico, mas também da disponibilidade do analista de
acessar continuamente seus próprios estados de mente
psicóticos. Quando a transferência e a
contratransferência são reunidas, o analisando
experimentará um grau de contenção para que uma
natureza mais profunda da parte psicótica possa ser
enfrentada.

No curso desse processo de encontro, analista e


analisando podem experimentar não apenas o
sentimento de serem emocionalmente sobrecarregados,
mas também estados que não podem ser chamados de
mentais nem físicos. Esses estados são ambos mais
pungentemente conhecidos como uma sensação de dor
que parece não ter limites. Muitos experimentam essa
dor na região do peito, como um estado em que o Outro
- pessoa ou deus - está ausente. Em vez disso, não há
nada além de uma agonia de pavor, uma experiência
que beira a não experiência e leva muitos a acreditar
que são, nesse terrível inferno interior, afligidos por
sentimentos e percepções não assimiladas de uma vida
inteira. Esses estados não metabolizados ocorrem sem
imagens, com apenas dor e terror em sua aparente
infinitude.

Esse nível reitera a noção de Jung da psique como


se estendendo ao longo de estados delimitados pelo
‘nível psicoide’, um espectro definido e limitado por uma
extremidade vermelha de um processo instintivo e
somático, e uma extremidade violeta do processo
mental e espiritual.

No nível psicótico, esses opostos se combinam ou


nunca foram separados.

Quando o nível psicótico é suficientemente recolhido,


torna-se evidente como uma ausência de vínculo abre
as portas para o terror deste nível.
É, entretanto, errado dizer que essa ausência ‘faz
com que’ esse nível exista, porque tais domínios são
arquetípicos, anteriores a criação no sentido de
estruturas adquiridas temporalmente ou da ausência do
que deveria ter se desenvolvido.

Mas os problemas de vinculação são especialmente


evidentes em termos da falta de contenção que o nível
psicótico introduz na consciência do ego.

Minha experiência tem sido que uma qualidade de


especial importância que entra em jogo como resultado
de problemas de vínculo é um masoquismo muito
profundo.

A pessoa reage ao buraco negro da psicose


(Grotstein 1990) com uma esponja obscura do
masoquismo.

Para neutralizar o vazio de vinculação, a pessoa se


liga a tudo que ela sente como errado, seja o que for
que errado possa significar.

Tudo, desde as menores mudanças de interesse ou


atenção por parte do objeto, real ou distorcido através
do processo paranoico, até ataques diretos de culpa
pelo objeto, são absorvidos em um nível muito profundo
. Esse é um fenômeno central da parte psicótica, e
um dos horrores dessa dinâmica é que ela ocorre de
maneira bastante autônoma.

Denotar esse nível de masoquismo como dominado


pelo arquétipo de "bode expiatório" é inapropriado ou é
um tipo de palavra mágica que embota o horror do fato
de que, em alguns pontos, todos nós somos esponjas
de tudo que percebemos como obscuro ou errado.

A pessoa com uma parte psicótica forte é


extremamente governada por esse estado.

Ela se integra através deste qualidade masoquista e


não sente contato com outra pessoa.

A dor do não contato toma o seu lugar.

Criar um vínculo genuíno significaria confiar em


outra pessoa nesse nível, um estado que é totalmente
estranho e só se torna uma imagem e uma possibilidade
uma vez o nível psicótico foi exposto e contido.

Através dos afetos da parte psicótica, não apenas as


relações objetais são distorcidas, mas também os
limites do ego podem mudar rapidamente para que uma
pessoa possa sentir que está tomando todo o espaço,
ou nenhum espaço.
Para evitar perder totalmente o sentido de si mesmo,
o analisando pode cortar-se, abusar de si mesmo ou
agir de outras maneiras autodestrutivas.

Sentimentos de catástrofe podem ter uma forma de


fundo crônica, muitas vezes de baixo nível, surgindo de
maneiras chocantes, como ao acreditar que qualquer
coisa que for dita será totalmente destrutiva, ou sentir
qualquer tipo de necessidade pode ser equivalente a
sentir-se ameaçado de ser morto.

Sob o impacto da parte psicótica, a transferência


pode se tornar psicótica.

Por exemplo, o analisando pode acreditar que o


analista é o pai invejoso ou destrutivo.

Para o analista, uma característica central desta


transferência é a sensação de bizarrice do analisando
quando sua parte psicótica é ativada.

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