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SOBRE A FORÇA DO PENSAMENTO

Jorge de Souza

Diz-se, com freqüência, que somos capazes de ler o pensamento alheio.


Não é comum, entretanto, que se diga que o vemos ou que o sintamos por um modo distinto
de ver. Esta idéia de leitura do pensamento corresponde, efetivamente, à possibilidade de o
percebermos pela via de um mecanismo intelectivo com o qual estamos devidamente
familiarizados – a leitura. Na realidade, nesses casos, o que captamos não é o pensamento em
si, mas a sua verbalização, a sua expressão no plano mental da realidade humana. Fôssemos
nós outros mais percucientes, tivéssemos a sensibilidade mais aperfeiçoada e seríamos
capazes de ver as manifestações imagísticas do pensamento a emanarem incessantemente dos
que o emitem. Isto se dá, com efeito, com os espíritos desprovidos da roupagem carnal e que
se encontram em estágios evolutivos mais adiantados, afirmam os nossos mentores. Na
realidade, qualquer espírito recebe as mensagens informativas que promanam do pensamento
alheio, mas o que ocorre é uma profunda diferenciação na capacidade de colher, no plano
consciente, o que produzem as outras mentes. Há que se convir, também, em que a captação
do pensamento não exige a simultaneidade temporal entre a sua emissão, pela fonte, e a
conseqüente captação, pelo receptor. Esse descompasso temporal entre a transmissão e a
recepção do pensamento leva-nos à natural conclusão da existência do que se pode
perfeitamente chamar de formas-pensamento, tal como as concebem algumas doutrinas
esotéricas. Há, assim, na natureza, um mundo de formas-pensamento que devem sujeitar-se a
algumas leis cuja essência gostaríamos de descobrir. Seria razoável aceitar, desde logo, que
tais formas-pensamento se alimentassem pela intensidade de sua emissão e, também, pela
insistência ou continuidade da ação da fonte emissora em sua sustentaçào. Deste modo, sendo
fraca a ação criadora ou abandonada por desinteresse, poderia a forma-pensamento
correspondente ir-se definhando na sua plasticidade, mas extinguindo-se paulatinamente,
desde que não agissem sobre ela por agregação, por conta de uma outra lei, a lei de afinidade,
outras matrizes de pensamentos assemelhados. Assim, atraírem-se ou repelirem-se
mutuamente, conforme o seus teores específicos de cargas positivas, como a do amor, ou,
negativas, como a do ódio, deve ser outra lei a que devem obedecer as formas-pensamento.

Nesse mundo de formas-pensamentos estamos todos mergulhados e ao


mesmo tempo em que o alimentamos com novas construções ou com a potencialização de

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outras pré-existentes, somos também por ele influenciados, tanto no plano mental, através de
suas induções sugestivas como, de igual maneira, no corpo sutil com que nosso espírito se
manifesta. Cumpre destacarmos, ainda, a existência de duas classes distintas de influenciações
das formas-pensamentos sobre a humanidade. Na primeira delas age uma espécie de ação
obsessiva sobre a mente, induzindo-a a ações modeladas pelas formas-pensamentos atraídas à
sua psicosfera. A segunda atua no plano da fisiologia extra-corpórea, acarretando
desequilíbrios orgânicos e contaminando a estrutura sutil com seus teores deletérios e onde
vicejam o que se designa por vibriões mentais.

Existem também, por conta da mesma atração por afinidade, estratos


homogêneos onde vibram e agem formas-pensamentos afins criadas por sentimentos e
vibrações comuns de todos os espíritos, encarnados ou não. Podemos falar, desse modo, nos
amplos estratos das formas-pensamentos racistas, no estrato das formas-pensamentos
desencadeadas por um assassinato ou pelo nobre sentimento de amor fraternal. Decorre disso
que o que se conhece nas doutrinas iniciáticas sob a denominação de egrégora nada mais
significa que o correspondente estrato de formas-pensamentos alinhadas a uma idéia, a uma
instituição, a uma determinada oração e assim por adiante. Por isso mesmo é que se pode falar
nas egrégoras das palavras sagradas e, contrariamente, nas egrégoras das imprecações! A
oração gera uma egrégora constituída pelas mais nobres formas-pensamentos que, instadas
por seus simples enunciados, constituem evocações de forças psíquicas muito poderosas! Daí,
por exemplo, a crença equivocada em amuletos, em relíquias sagradas, no uso de mãntras,
verdadeiros campos de força mas que, contrariamente à crença, não agem por si mesmos
porque o fenômeno evocatório suscirado tem natureza essencialmente mental. Até aqui, como
sempre, é imprescindível o esforço do espírito, o seu trabalho incessante para que essas forças
possam ser desencadeadas... É nesse mesmo sentido, também, que os espíritos reveladores
responderam à questão proposta por Kardec quanto à influência dos amuletos.

É ainda importante considerarmos, no contexto científico em que se


inserem as formas-pensamentos, o capítulo significativo das egrégoras das criações literárias.
São vastos mundos alimentados pelas forças extraordinárias originadas nas mentes dos
autores, sustentadas e, mais que isso, muitas vezes ampliadas pelas emoções com que leitores
e assistentes as brindam. Deixam, assim, tais obras de serem criações literárias neutras como
meras concepções no plano abstrato da estética, para tornarem-se mundos vivos que também
interagem com os homens.

Tanto mais forte essas criações, mais poderosas as correspondentes


estruturas de formas-pensamentos. Daí porque, tantas vezes, sentimos como vivas as

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concepções dos grandes artistas e como reais as personagens mais marcantes. Não se trata,
desse modo, de meros fenômenos psicológicos que nos incitam a mente por mecanismos de
condicionamento mas, em verdade, são realidades criadas e atuantes no plano mental. Talvez,
por essas razões, tenham-se confundido as formas-pensamento animadas ou cascões com os
próprios espíritos desencarnados... Quem sabe, pelo mesmo motivo, o candomblé não acredite
na comunicação dos espíritos, mas nas manifestações de seus eguns.

A ação do pensamento irradia uma forma de energia chamada de


energia mental. Essa energia, dentro de um princípio geral, propaga-se em forma ondulatória
e é constituída por partículas elementares denominadas mentalões. Essa energia mental age
sobra a matéria em todas as suas formas, sobretudo sobre a matéria sutil que constitui a base
das manifestações do espírito no plano extra-terreno. Ela é dotada, também, de um poder de
coesão ou estabilidade proporcional à força de vontade da fonte emissora. É desse modo que,
por exemplo, concebem as suas obras os artistas, os arquitetos do plano espiritual e os
engenheiros siderais. Estas concepções os transformam em criadores (porque só é de Deus o
ato de crear) ao mesmo tempo em que são eles, também, os executores de suas próprias
criações. Para espíritos menos evoluídos a força da vontade é bem mais reduzida, se gerada
pelo ato consciente e, deste modo, as criações conscientes dessas entidades são menos
estáveis ou bem mais passageiras. Entretanto, para essas mesmas entidades as emissões da
energia mental decorrentes dos atos involuntários provenientes do ódio ou dos remorsos
profundos são muito poderosas. Neste caso o arrependimento dota a energia mental do
emissor de uma grande capacidade de coesão dos mentalões e o poder plástico dessa energia
vai agir, no plano da matéria sutil, criando os fantasmas e os ambientes físicos animados que
projetam, como realidade subjetiva, as cenas dos crimes que atormentam o infeliz. São
verdadeiros infernos privados que o remorso sustenta até a consumição ou esgotamento da
força emissora pela transformação moral e pelas disposições sinceras de reparação do
criminoso. Essas criações tormentosas ainda se agravam pelo reforço com que a lei das
afinidades das formas-pensamentos as contemplam, sobretudo se por intermédio dessa mesma
lei agem vítimas impenitentes sob o augúrio da vingança.

O leitor espírita encontra farto material ilustrativo deste assunto nas


obras revelativas de André Luiz, nas narrações da médium Ivone Pereira e na tragédia de
Camilo Castelo Branco.

Tudo isso dá o que pensar quando, surpresos, olhamos os


acontecimentos cotidianos. Neste sentido pareceu-nos estranho o assassinato da jovem atriz
de televisão num clima que, de alguma maneira, dava continuidade ao ciúme doentio da

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personagem que com ela contracenava na novela escrita pela mãe da própria vítima. Nada,
entretanto, que aja de fora para dentro do ser eterno é determinante absoluto de sua ação. Sem
embargo, se este é um princípio espírita inquestionável, não podemos deixar de considerar a
conjuntura social e, sobretudo, o clima mental como fatores de indução das ações humanas.
No ambiente sócio-psíquico em que estamos mergulhados agimos por nosso livre-arbítrio e,
ao mesmo tempo, somos influenciados pelos múltiplos vetores de forças que representam o
nosso mundo psíquico-espiritual e as auto-heranças do passado encarnatório...

As sintonias que nos assaltam ou nos auxiliam são matematicamente


correspondentes aos nossos anseios mais íntimos, ao teor de nossa vida mental e à
espiritualização de que somos detentores. Se viciosa nossa existência ou, o que é tão comum,
se desprovida de qualquer preocupação com o lado superior da vida, com o aprimoramento
espiritual e com o bem do próximo, não há como nos desvencilharmos das correspondentes
influenciações do vício, do desamor e do egoísmo. Com as companhias por nós atraídas
cumprem-se as expiações mais dolorosas pelas mãos desafortunadas de outros infelizes que só
fizeram, neste plano, caírem mais fundo em suas desditas...

Deus, o eterno dispenseiro da Justiça, há de lançar um olhar


misericordioso a tantos sofredores. A nós, espíritas cristãos, cabe também o dever caridoso da
oração e a vigilância constante que o Mestre nos recomendou em profundo e real
ensinamento. E tal vigilância, com toda a certeza, estende-se ao plano mental, aos produtos de
nossa mente e àqueles outros, de patrocínio alheio, atraídos à nossa psicosfera e indutores de
comportamentos e atratores de cargas que auxiliam ou pesam em nossa economia mental.

Os fenômenos psíquicos revelam a existência de uma força mental que


exibe as seguintes características:

i). essa força mental é detectável através da chamada “fotografia do


pensamento”.

ii) essa força mental tem, em certas pessoas, o poder de agir à distância pelo
deslocamento de objetos. Tal fenômeno é chamado de psicocinésico.

iii) essa força mental tem o poder de romper barreiras físicas que impedem,
por exemplo, a passagem dos raios “ X ” e outras formas de emissões
subatômicas.

iv) essa força mental propaga-se em qualquer meio físico (ar, água, vácuo,
etc.).

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v) constata-se que a força mental possui massa e propaga-se com velocidade
própria.

A força mental tem por fonte o pensamento. Este pensamento é, assim,


uma energia emanada do espírito e, ao ser transformada em ação como força mental,
manifesta-se com uma intensidade ou poder segundo a potência espiritual chamada de
vontade. Como o espírito, na condição humana, é dotado de pensamento contínuo, isto é,
como o pensamento espiritual jamais se encontra inativo, conclui-se que a força mental,
como o resultado da ação do pensamento também age continuamente sobre o meio em que o
espírito se encontra mergulhado.

Ensinam-nos os espíritos reveladores que toda a criação divina


encontra-se imersa no que eles denominam fluido cósmico universal. Assim, todos nós
espíritos, por pensarmos continuamente, criamos uma psicosfera própria que representa a
natureza dos nossos pensamentos – mesmos os ocultos ou não explicitados – sobremodo em
torno do seu fulcro irradiante e que são projetados e concretizados como imagens vivas nesse
fluido. Esta irradiação, imagística sobremaneira, é o nosso campo mental. Todos os seres
possuem, de alguma maneira, um campo mental. Não seria, então, o fluido cósmico universal,
o campo mental da Mente Divina?

Estas digressões permitem-nos concluir que o pensamento não é, como


se crê falsamente, uma atividade solitária do espírito. O pensamento instrumentaliza a razão,
fazendo a consciência ou a alma sair de si para compreender (pesar, avaliar, ler, etc.) os
objetos ou as coisas de que ele cogita. As coisas são, deste modo, cogitáveis ou cognoscíveis
pelo pensamento. Esta observação conduz-nos aos dois tipos de realidades:

i) a realidade subjetiva, que vem a ser o produto do conhecimento das coisas


obtido pelo espírito através do pensamento;

ii) a realidade objetiva, que é o que as coisas são em si mesmas, os númenos,


independentemente do espírito.

A palavra razão deriva do grego e nessa língua o seu equivalente é


logos. Do mesmo modo, recorrendo ao latim, seu equivalente é a palavra ratio. Tanto logos
quanto ratio são substantivos formados, respectivamente, dos verbos legein, em grego, e
reor, em latim, ambos traduzindo as ações de contar, de reunir e de separar. Ora, quem conta,
reúne ou separa está medindo e classificando e, desse modo, está tentando ter uma visão ou
entendimento ordenado do mundo no qual as coisas estão inseridas. A inteligência é um dos

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componentes da razão. Mas não é a única! Também são partes da razão a memória, a
imaginação ou ideação, a sensibilidade, a faculdade de associação e a vontade.

O espírito é, assim, um ser racional, porque dotado de razão, enquanto


o mundo é racional por ser formado por coisas compreensíveis ou cognoscíveis.

A filosofia clássica, com Aristóteles, concebeu a razão sujeita a quatro


leis ou princípios da razão, de natureza essencialmente lógica. Sem a obediência a esses
quatros princípios não seríamos capazes de conhecer a realidade. Esses princípios da razão
são os seguintes:

i) o princípio da identidade, cujo enunciado literal traduz-se na expressão “o


que é, é”. Desde o ponto de vista da lógica formal ou matemática, esse
princípio da identidade pode ser traduzido por esta outra expressão equivalente
à anterior.

Todo X é idêntico a si mesmo, qualquer que seja X .

Este princípio da identidade é condição absolutamente necessária ao


conhecimento das coisas porque, caso ele não existisse, seríamos incapazes de
reconhecer as coisas quando o espírito voltasse a elas numa outra vez. Este
reconhecimento das coisas permite-nos, em qualquer situação, a qualquer
momento ou lugar, identificá-las, possibilitando-nos dizer isto é isto e não
qualquer outra coisa.

ii) o princípio da não contradição.

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O princípio da não contradição assegura que, estando diante de duas
proposições contraditórias, ambas não podem ser simultaneamente verdadeiras.
Torna-se, claro, deste enunciado, que ele garante apenas que a veracidade
conjunta é inadmissível mas, daí, não se pode afirmar, por exemplo, que uma
das proposições seja verdadeira enquanto a outra seria necessariamente falsa.
Não! Pode ocorrer o caso de ambas as proposições serem falsas. Assim, por
exemplo, diante das duas proposições contraditórias: “o selenita tem olhos
verdes” e “o selenita não tem olhos verdes”, compreende-se que se pode estar
diante de duas proposições simultaneamente falsas caso, por exemplo, os
selenitas existissem e não tivessem olhos.

Desde um ponto de vista formal o princípio da não contradição, também


conhecido como princípio da contradição, pode ser enunciado da seguinte
maneira: “Para todo X, X e X (não X) não podem ser simultaneamente
verdadeiros”.

iii) o princípio do terceiro excluído.

Em sua Metafísica (Título 1, Livro Gama, #7) Aristóteles faz a seguinte


afirmação (em tradução livre) : “Para a mesma coisa pode-se assignar ou não
um dado predicado ou qualidade ou enunciado; não existe predicado ou
qualidade ou enunciado; intermediários entre a afirmação e a negação e é
preciso afirmá-lo ou negá-lo”.

O princípio do terceiro excluído pode ser enunciado simbolicamente do


seguinte modo: “Para cada coisa A e para todo atributo X ou A tem o
atributo X ou A não tem esse atributo”.

iv) o princípio da causalidade.

Esse princípio também é conhecido como o princípio da razão


suficiente, pode ser traduzido de modo sucinto na afirmação de que todo efeito
tem uma causa. A causa é também denominada razão suficiente porque ela é a
razão porque ocorre o efeito e é razão suficiente porque a sua ocorrência basta
para que o efeito se dê.

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