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September 5, 2016
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Michel Lacroix é filósofo e escritor francês. Nasceu em 12 de dezembro de 1946. Foi aluno da
École normale supérieure de Saint-Cloud. Ele é um associado de Filosofia, Doutor de Estado e
professor honorário sênior da Universidade de Cergy-Pontoise. Foi autor de uma tese sobre “A
ideia de polidez em manuais de decoro (séculos XIX e XX)”. Ele recebeu o prêmio Grande filosofia
da Academia Francesa no Prix Psychologies-Fnac 2009, com o um ensaio sobre como tentar viver
melhor.
O filósofo discute sobre o papel da emoção na sociedade moderna e como ela tem sido
exageradamente excitada. Para ele, há muita emoção, mas pouco sentimento. No decorrer de
três partes, Lacroix comenta os aspectos positivos e negativos da sociedade da emoção.
A super valorização da emoção não é novidade. Ela ocorreu durante a época do romantismo. Por
muito tempo, ela foi marginalizada pelos psicólogos e vista como um defeito inevitável do ser
humano. Porém, na segunda metade do século XX, começou a ser valorizada e atualmente
objeto de grande procura.
Existe uma cultura da emoção. Associamos emoção com os sentidos. Parece que se não
sentimos fortes emoções, não nos pertencemos. Não é para menos, portanto, que a publicidade
utilize o termo com tanta frequência e faça nexo com os cinco sentidos do corpo.
A busca por fortes emoções é o que impulsiona os aventureiros. Vivemos na época do homo
sentiens, cujo desejo é viver na e pela emoção. Ele não segue mais os preceitos do positivismo
do século XIX. A sociedade acredita no “sinto, logo existo”. Até mesmo a meditação super
valorizam a emoção. Procura-se um encontro com o ser interior e a êxtase resultante.
Delírio, adrenalina, alucinante, arrepiante. Essas palavras já fazem parte de nosso vocabulário e,
como podemos notar, todas fazem referência à emoção. Tudo é um flash, admite Lacroix. Ele cita
vários exemplos de chamadas em noticiários e propagandas que utilizam a palavra “agito”,
indicando a realidade do culto da emoção. Vivemos num mundo de sensibilidade hiper excitada.
As pessoas estão caçando as fortes emoções constantemente. O autor cita o termo para tais:
sensation-seeker. Estes são indivíduos narcísicos, que vivem em busca do perigo, da vertigem, da
loucura, das drogas e da crueldade, na tentativa de saciar seu desejo por fortes sensações.
Possuem uma vida solitária, dedicada sua procura. É, porém, uma emoção pobre, que não
promove a comunicação. É artificial e egocêntrica. Mas, depois de um tempo, o egoísmo se
revela vazio e muitos desses indivíduos passam a se dedicar a causas nobres, como ajudar os
pobres. A busca de emoções fortes nos afasta dos outros.
Ele cita o caso dos relacionamentos românticos. Começam com fortes emoções e comunicação
intensa. Com o tempo, isso vai diminuindo, resumindo-se a trocas de serviços sexuais. Mas,
apenas isso não sustenta a relação. Ela perde seu valor. A emoção ruim expulsa a boa. O
relacionamento acaba.
Vivemos numa sociedade da super estimulação sensorial. No caso da audição, notamos como é
difícil encontrar um ambiente silencioso. As pessoas estão sempre ouvindo música. Não gostam
do ritmo lento. Querem melodias mais explosivas, excitantes. A exposião visual é ainda maior.
Propagandas, TV, Internet, Realidade Virtual, tudo criado para estimular a visão e gerar fortes
sensações.
O autor refere-se aos usuários de drogas como xamanistas. Os xamãs eram sacerdote feiticeiro
das sociedades arcaicas que fazia uso de psicodélicos em cerimônias sagradas, a fim de entrar
em estados alterados de consciência. O mesmo ocorre hoje, onde muitos encontram nas drogas
um mecanismo de fácil acesso à super excitação emocional.
A perversidade dos criminosos é outra evidência do culto da emoção. Eles sentem prazer ao ver
o medo da vítima. Aquilo sacia o seu desejo por super estimulação sensorial. Nossa sociedade
também é saciada com o sadismo. Filmes de extrema violência ganham espaço e vendem
bastante.
A super estimulação das emoções não levam ao aumento da sensibilidade. Pelo contrário, a
corroem. O culto da emoção levam à falta de atenção. Percebemos claramente a dificuldade que
os jovens de hoje possuem para concentrar-se. Outra consequência é a predominância de
emoções negativas na psique coletiva.
O ser humano tem se tornado mais artificial. Não consegue contemplar o que é sensível, como o
sorriso de uma criança, um luar, uma tarde tranquila. Quer emoções chocantes. Essa vida de
questões-chave não são metabolizadas na consciência profunda e a empobrecem. A imaginação
perde-se nessa corrida frenética por emoções. O romantismo é considerado fraqueza. A paixão é
desqualificada diante de experiências sexuais, refletindo a busca da satisfação de sua insaciável
sede por emoções fortes, não pelo sentimento.
Mesmo a arte vem sofrendo com o culto exacerbado da emoção. Dá-se preferência ao impacto e
não à transcendência. São trabalhos que tentam chocar o espectador. É a tentativa de causar
fortes emoções, não consciência. Se não tem forte surpresa, choque, escândalo, espanto, perde-
se o valor.
Nessa última parte, o autor destaca como desenvolver a emoção de forma construtiva.´´E
necessário tanto a disponibilidade como a arte do sentir. O primeiro passo é um estilo de vida
mais lento. As emoções-choque são impacientes, insaciáveis. A contemplação envolve um clima
de lentidão, onde as emoções calmas penetram no interior e se fazem crescer. Nesse sentido, a
leitura supera a imagem. Esta é mais explosiva. Há um excesso de informação. A leitura é linear,
cresce como uma árvore em nosso ser.
Para ter disponibilidade, é preciso agir de forma desinteressada. Também é importante deixar
que o ser seja. É uma renúncia da potência, uma aceitação e compreensão das coisas tais quais
elas são e estão. Não deve ter o espírito de posse. Não deve ter medo de sentir, de estar
vulnerável, pois ele nos leva à alteridade.
Devemos reconhecer que não somos autossuficientes. Não bastarmos em nós mesmos e sim
entender o mundo ao redor. Não ficar preso à vida interior. Ela só será bela se tiver ligada a uma
vida exterior. Um vaso acumula belezas que vem de fora. O mesmo deve acontecer com nosso
ser.