Você está na página 1de 13

Psicanálise em

Lacan II
Profa. Dra. Carolina Molena
Profa. Dra. Carolina Molena

Graduação em Psicologia pela Universidade de São


Paulo (USP-RP)

Mestrado em Psicologia pela Universidade de São


Paulo (USP-RP)

Doutorado em Psicologia pela Universidade de São


Paulo (USP-RP)
A FALTA NO DESEJO
O desejo nasce da falta. Só desejamos o
que nos falta. O analista, em vez de dar o
significado ao analisando, deve despertar
a curiosidade do analisando. Isso é feito
pelo oferecimento de interpretações que
sejam enigmáticas e polivalentes. A “fala
oracular” serviria como convite a novas
projeções. Desse modo, a interpretação
deve surpreender, desviar os cursos de
pensamento costumeiros do analisando.
A INTERPRETAÇÃO PSICANALÍTICA
• O real lacaniano é aquilo que faz o analisando voltar ao mesmo assunto,
acontecimento ou pensamento, girar em torno dele e se sentir incapaz de ir adiante. O
paciente sente que algo de essencial permanece não formulado.
• O analista busca maneiras evocativas de se expressar, preferindo, por exemplo,
formulações que contenham sons que sejam parte de palavras ou nomes que tenham
sido importantes no discurso do analisando.
• O real, segundo Lacan, tem de ser simbolizado através da análise: tem de ser falado,
posto em significantes, significantizado. A análise envolve a drenagem progressiva do
real para o simbólico, segundo Miller. Visando ao real, a interpretação ajuda o
analisando a pôr em palavras aquilo que levou seu desejo a ficar fixado.
• O desejo é uma pergunta. Ao fazer o analisando questionar as coisas, o analista o faz
querer saber algo, descobrir algo, entender o que o inconsciente está dizendo, o que o
analista vê em seus atos falhos, sonhos e fantasias, o que o analista quer dizer quando
pontua, escande, interpreta.
O DESEJO
• O desejo do Outro causa o desejo do sujeito, ou seja, o que consideramos mais
íntimo revela-se vindo de outro lugar, de uma fonte externa, dos nossos pais, por
exemplo.
• A fantasia encena o modo como o sujeito se imagina em relação ao desejo do Outro,
como se defende desse desejo.
• No trabalho de Freud com o “Homem dos Ratos”, descrito em “Notas sobre um caso
de neurose obsessiva”, temos que: o desejo de se vingar do pai é central nos
sintomas descritos (sua crença infantil em que uma menina, cuja afeição ele queria
despertar o notaria, caso seu pai morresse). Temos a ideia de que certa forma de
tortura de que ele ouvia falar (na qual ratos entravam no ânus da vítima) era infligida
a seu pai.
• No decorrer de seu trabalho com Freud, o “Homem dos Ratos” começou a dar vazão
a sua raiva de Freud. O “Homem dos Ratos” praticava uma conduta provocadora, na
expectativa de receber um tratamento rude, tal qual recebera de seu pai. Ele
colocou Freud no lugar de seu pai de um ponto de vista inconsciente.
O sujeito e o Outro
• Toda fala é uma demanda. Toda demanda é uma
petição de amor (LACAN, 1998).
• O sujeito passa a se ver como crê que os pais o
veem, a valorizar o que acredita que os pais
valorizam e a tentar ser o que pensa que os pais
querem que ele seja. Identifica-se com os ideais
dos pais e se julga de acordo com esses ideais.
TRANSFERÊNCIA
• Quando o analista se recusa a permitir que seu desejo seja discernido, faz com
que o querer do Outro seja atualizado. O término inesperado da sessão
analítica, no qual o analisando é colocado cara a cara com o analista, escande as
últimas palavras do analisando.
• Há duas etapas do trabalho da transferência:
1) o analista deve contornar as demandas do analisando, a fim de incentivar
seu desejo a vir à tona.
2) o analista deve acarretar uma reformulação da interpretação que o
analisando faz do desejo do Outro e uma mudança em sua posição subjetiva.
• Na primeira etapa trata-se da dialetização do desejo e na segunda temos a
reconfiguração da fantasia fundamental. Elas constituem momentos lógicos da
“subjetivação”, mediante a qual o analisando transita de ser o sujeito que
demanda para ser o sujeito que deseja.
Toda neurose implica numa postura ressentida para
com a satisfação do Outro. Furtar, trair, ultrapassar o
limite de velocidade, transgredir a lei, são
satisfações ilícitas que representam na economia
psíquica do neurótico, uma indenização do Outro
para com o sujeito pela perda sofrida. As acusações
dos neuróticos ao Outro (por exemplo, “Meus pais
não me deram amor, reconhecimento e aprovação
suficientes”) não têm limites (FINK, 2018).
As mulheres ressentem-se de suas A certeza é característica da
mães por haverem-nas privado de um Os diagnósticos lacanianos psicose. O psicótico importa-
pênis; o amor oferecido por essa orientam o clínico e indicam a se com as implicações da
perda imaginária é considerado posição que o terapeuta deve mensagem recebida para sua
insuficiente. Os homens nunca adotar na transferência. Certas vida: “Estão tentando me
superam sua angústia de castração, a técnicas usadas com os pegar”, “Eles querem meu
aprovação concedida pelo pai é vista neuróticos são inaplicáveis aos cérebro”, ou “Eles roubam
como algo que está condicionado à psicóticos. minhas ideias”. Na psicose, o
realização, e um homem nunca pode estabelecimento do ideal do
Para um homem neurótico, ao eu é malsucedido. O
descansar, independentemente de ter a impressão de ter visto a ex-
quanto realize. imaginário continua a
mulher num corredor, pensou predominar na psicose.
que a mesma estaria ali para
A busca da análise é a de fazer o
confrontá-lo, o que pareceu O conhecido fenômeno da
analisando assumir a responsabilidade
indicativo do seu desejo de se perseguição enquadra-se na
por sua castração, em vez de exigir do
vingar dela, transformado no categoria das relações
Outro uma compensação por ela.
medo de que ela fizesse mal a imaginárias e é o traço
Desse modo, o sujeito superaria o
ele – o mecanismo neurótico do predominante na paranoia
estágio de culpar o Outro por seus
medo que disfarça um desejo. (FINK, 2018).
problemas ou seu destino.
OS QUATRO DISCURSOS
Os quatro discursos propostos por Lacan são:
1) discurso do mestre,
2) discurso da histérica,
3) discurso do universitário e
4) discurso do analista
São correspondentes às atividades impossíveis apontadas por
Freud (1930/1980): “governar, fazer desejar [acrescida por
Lacan (1969-1970/1992, p. 183)], educar e analisar”.
O discurso do capitalista
• Nossa sociedade vem sendo caracterizada como uma sociedade de consumo.
• O discurso do capitalista trata de uma mutação do discurso do mestre.
• O capitalismo altera a nossa relação com os objetos e com o desejo, e serve a uma nova modalidade de sujeito
engendrado pelo discurso ilimitado da ciência.
• Vivemos em um contexto social que não limita, pelo contrário, incita a gozar, empurrando ao gozo sem
barreiras, fomentando “a sociedade sem limites”. O gozo pode ser compreendido como uma modalidade de
satisfação.
• O efeito dessa discursividade é uma espécie de rejeição da castração. Isso porque a exclusão do particular do
desejo do sujeito, ao dar lugar ao imperativo do gozo, rechaça a dimensão da falta simbólica, enquanto sinal do
real impossível.

O discurso capitalista é promotor do fracasso dos recursos


simbólicos, ao passo que o discurso psicanalítico é a via da
explicitação do desejo, o que pode favorecer o
cerceamento do real, na singularidade.
• Sobre a trajetória do conceito de “supereu” no arcabouço psicanalítico, temos dois
apontamentos: 1) o supereu como herdeiro do Complexo de Édipo (FREUD,
1938/1980), cumpridor da função de lei que proíbe e limita o gozo; 2) o supereu ligado
à pulsão (FREUD, 1930/1980).

• O supereu lacaniano testemunha a emergência do real por meio


do gozo.
• Suas manifestações não são temperadas pelo princípio do prazer,
uma vez que a crueldade dos seus imperativos é motivada pela
pulsão de morte, que sempre cobra um algo a mais de gozo.
• O empobrecimento metafórico permite que a instância supereu
(Lacan, 1998) se imponha sobre o ideal do eu, debilitando os ideais
vindos do discurso do Outro.
• Recolhe-se inúmeras consequências na contemporaneidade do
impacto social dos imperativos superegóicos.

Você também pode gostar