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MKT-MDL-02

Versão 00

Sonhos e Narcisismo

Disciplina: Fundamentos da Psicanálise


Prof. Ana Catarina Correia Mesquita
MKT-MDL-02
Versão 00

Sonhos

A busca de entendimento dos sonhos, desde sempre


acompanha os seres humanos.

Charlatães em geral procuravam extrair anúncios


proféticos, premonitórios, mensagens de espíritos ou
interpretações falsas.

Médicos e filósofos também tentaram desvendar os


mistérios e enigmas contidos no ato de dormir e
sonhar.
A partir de Freud, mais
exatamente em 1900, com
elaboração e publicação do seu
mais famoso livro – A
interpretação dos sonhos-, os
sonhos não só ganharam uma nova
dimensão científica, como
também o aprofundamento de seu
estudo abriu portas para a
consolidação da teoria da
Psicanálise.
Essa obra representa um marco essencial na história
da Psicanálise pelas seguintes razões:
1) Representa a 1ª autoanálise levada a efeito, sendo
que a maior motivação para esse ato corajoso de
Freud foi a sua necessidade de elaborar os seus
sentimentos despertados pela morte de seu pai.
2) Possibilitou a Freud construir um modelo do
aparelho psíquico.

3) O fenômeno do sonho concebido como paradigma


de um funcionamento normal da mente e, ao
mesmo tempo, como expressão psicopatológica,
facilitou a concepção de que no aparelho psíquico
não existia uma plena delimitação entre o normal
e o patológico.
4) O modelo permitiu que Freud estabelecesse uma
teoria puramente psicológica, abandonando a
neurofisiologia.

5) O estudo dos sonhos permitiu que Freud


estabelecesse uma integração entre experiências
recentes (restos diurnos) e as antigas (conteúdo
latente).
6) Freud estabeleceu uma equivalência entre a estrutura
dos sonhos e a das neuroses, o que lhe possibilitou
conceber e formular a sua clássica postulação de que o
sonho é a via régia para chegar ao ICS.

•Vale lembrar que os sonhos somente adquirem sentido,


psicanaliticamente falando, se estiverem conectados
com o que se passa no ICS do sonhador.
Formação do sonho

Para Freud, são 3 os fatores indispensáveis para que se


processe um sonho:
1) Estímulos sensoriais (internos ou externos) são
considerados como não tendo uma significativa
influência na gênese dos sonhos.

2) Restos diurnos significativos estímulos ambientais;


interesses e preocupações do sujeito.

3) A existência de sentimentos, pensamentos e desejos


que estão reprimidos no ICS.
Fenômenos psíquicos que contribuem para a formação
dos sonhos:
1) Conteúdo manifesto do sonho designa o que
apareceu no CS daquele que sonhou, quase sempre
sob a forma de imagens visuais, que ele pode ou não
recordar depois de despertar.
2) Elaboração onírica secundária consiste numa
atividade do ego, durante o sonho, que se encarrega
de disfarçar e dissimular aquilo que está reprimido no
ICS e que está “proibido” de aparecer no CS em
estado “bruto”.
3) Conteúdo latente do sonho conjunto de desejos,
pensamentos, sentimentos, representações,
angústias que estão represadas no ICS e que serão
disfarçados pela elaboração secundária.

4) Censor onírico parte onírica do ego ICS que suprimi


tudo que julgar inconveniente.
5) Mecanismos defensivos do ego:
▪Condensação o sonho tende a formar uma imagem
única que represente simultaneamente todos os
componentes do conteúdo latente.

▪Deslocamento há um deslocamento de significados ao


longo de uma cadeia associativa.

▪Simbolização corresponde aos significados oníricos


específicos de cada indivíduo e de suas respectivas
repressões.
6) Linguagem do processo primário o conteúdo
latente passa a conteúdo manifesto, deformado
pelos recursos defensivos do ego, expressando-se
com uma linguagem típica, confusa, distorcida,
fazendo com que a satisfação de desejos fique
irreconhecível.

7) Formação de compromisso entre as pulsões do id e


as defesas do ego, permitindo somente uma
gratificação parcial e tolerável das pulsões.
Funções do sonho

Função clássica: forma disfarçada de uma gratificação


de desejos reprimidos.

Outra função primordial exercida pelo sonho é aquela


que foi sintetizada por Freud como a sua clássica
formulação de que o sonho é o guardião do sono.
Quando o sonho não consegue cumprir seu papel de
guardião pode ocorrer o fenômeno do terror
noturno/pesadelo.
O desejo inaceitável está sempre presente no sonho,
embora irreconhecível devido a uma série de
transformações que ele sofre, como comumente é a
possibilidade dele se manifestar pelo oposto.
Os sonhos adquirem configurações e funções
diferentes, de acordo com as características singulares
do psiquismo de quem sonha, da sua capacidade ou
incapacidade para a formação de símbolos, do grau e
tipo de ansiedade vigente, se é criança, adolescente ou
adulto, se está acometido de doença, etc.
Por que seguidamente não recordamos os sonhos?

Segundo Freud, o sonho que foi esquecido é porque já


cumpriu sua missão ou porque foi secundariamente
reprimido.

Atualmente leva-se em conta também o grau de


profundidade do sono, a atenção que o sujeito presta
aos sonhos quando desperta, a motivação para
recordá-los e o desejo de sonhar para acessar o ICS. É
sabido que as pessoas em análise são as que mais
recordam os sonhos.
Na prática analítica

Cabe destacar os seguintes aspectos ao manejo dos


sonhos no dia-a-dia da prática clínica:
▪Evitar buscar um simbolismo universal em cada imagem
visual do sonho;
▪Não considerar o sonho como produção unipessoal, pois
o que importa é o que ele está expressando em termos
de vincularidade (transferência);
▪Estar atento para a possibilidade de que o sonho esteja
exercendo a função de comunicação de sentimentos que
o paciente não tem condições de nomear/verbalizar;
▪Analisar se o conteúdo do sonho tem o propósito
inconsciente de agradar e confundir o analista, para que
não haja uma comunicação útil à análise;

▪Analisar os sonhos seguintes 3 planos: a busca do


significado nas imagens oníricas, uma possível ligação
com os restos diurnos e qual o conteúdo latente.
▪Muitas vezes os sonhos trazidos pelos pcts variam na
proporção direta do maior ou menor interesse do
analista pelo aporte dos sonhos, o que é comum em pcts
regressivos, que tentam agradar seu analista;
“[...] Ainda insisto em afirmar que este livro contém a
mais valiosa das descobertas que eu tive a fortuna de
realizar. Uma intuição como esta o destino pode
depará-la somente uma vez na vida de um homem.”

(Freud, A interpretação dos sonhos, 1900)


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Considerações sobre o
Narcisismo
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Conceitos

• O emprego do termo narcisismo vem da cultura grega


e significa o amor do indivíduo por si mesmo.
•No final do século XIX, de acordo com Roudinesco e
Plom (1998), o seu uso foi incorporado ao discurso
científico, mais precisamente à sexologia nascente,
para designar “uma perversão sexual caracterizada
pelo amor do sujeito por si mesmo” (p.530).
•Em 1914, o termo entra definitivamente para o
discurso psicanalítico, quando Freud (1914/1974) abre
caminho para o entendimento do narcisismo como
elemento constitutivo do amor-próprio e da
autoestima portanto, destinado à autopreservação do
sujeito e formação dos laços sociais.

•“o narcisismo já não surge como uma fase evolutiva,


mas como uma êxtase da libido que nenhum
investimento de objeto permite ultrapassar
completamente” (Laplanche & Pontalis, 2016, p. 287).
Narcisismo: por Freud

•Em 1910, Freud introduziu o termo narcisismo no


discurso psicanalítico para se referir à escolha sexual
dos invertidos, como eram chamados os homossexuais
na época.

•Tratava-se, na verdade, de uma nota de rodapé


acrescida naquele ano aos seus Três Ensaios sobre a
Teoria da Sexualidade, na qual se encontra dito que
eles “partem de uma base narcísica e procuram um
rapaz que se pareça com eles próprios e a quem eles
possam amar como eram amados por sua mãe”
(FREUD, 1905/1972, p.145-146).
•Quase que no mesmo período, por ocasião dos ensaios
sobre Leonardo da Vinci (1910) e sobre Schreber (1911),
Freud dá-se conta de que o narcisismo é um estágio
comum no desenvolvimento sexual humano.

•A descoberta do narcisismo leva Freud a propor – no Caso


Schreber (1911) - a existência de uma fase da evolução
sexual intermediária entre o autoerotismo e o amor de
objeto. “O sujeito começa a tomar a si mesmo, ao seu
próprio corpo, como objeto de amor”, o que permite
uma primeira unificação das pulsões sexuais (Laplanche e
Pontalis, 2016, p. 287).
•É em 1914 que ele articula o conceito psicanalítico do
narcisismo na esteira do desenvolvimento infantil e dos
investimentos libidinais.

•Segundo Freud (1914/1974), os investimentos libidinais


podem ser direcionados ao próprio ego ou aos objetos.
✔Quando a libido é investida no ego, diz-se libido do ego
ou libido narcísica.
✔Quando é investida nos objetos, diz-se libido do objeto.
Narcisismo primário

•A fase que antecede a formação do ego é caracterizada


pela ausência de relações objetais, nessa fase, entendida
como anobjetal, todo o investimento libidinal do bebê é
feito no seu próprio corpo, quando satisfaz suas pulsões
parciais por meio das zonas erógenas a elas
correspondentes.

•A esse estado de satisfação em si mesmo, Freud chamou


de narcisismo primário.
•O narcisismo primário, no
entanto, só se mantém com o
amor dos pais e é por ele
potencializado através da
“onipotência que se cria no
encontro entre narcisismo
nascente do bebê e o
narcisismo renascente dos
pais” (POULICHET, 1992, p.42).
•Esse estado paradisíaco de perfeição e completude,
entretanto, está fadado a ser interrompido sob pena de
a criança não ascender ao estatuto de sujeito.

•Com efeito, desde cedo, a criança está exposta às


exigências do ambiente assim como os seus pais.

•Aos poucos, a criança irá se dar conta de que não é


tudo para a sua mãe, de que esta tem outros interesses.
•Essa percepção da criança é, nas palavras de Poulichet
(1992): “[...] a ferida infligida ao narcisismo primário
da criança. A partir daí, o seu objetivo consistirá em
fazer-se amar pelo outro, em agradá-lo para
reconquistar seu amor; mas isso só pode ser feito
através de certas exigências do ideal do eu” (p.51).
Ego ideal e Ideal do Ego

•Ego Ideal Herdeiro do narcisismo primário

•Espera o máximo de si mesmo, nutre ideais


virtualmente nunca alcançáveis.

•Formação intrapsíquica definida como um ideal


narcísico de onipotência forjado a partir do narcisismo
primário.

•A frustração de suas expectativas, gera além de


culpas, e sim humilhação.
•Ideal do Ego herdeiro do ego ideal, projeta nos pais,
somado às aspirações e expectativas próprias destes.

•Constitui um modelo a que o indivíduo procura


enquadrar-se.

•“Eu deverei ser assim, senão...”

•O sentimento predominante é o de vergonha, diante


eventuais fracassos.
Narcisismo secundário

•Assim a criança entra no segundo estágio de


narcisismo, ao qual Freud denominou de narcisismo do
ego ou narcisismo secundário, porque foi retirado dos
objetos a partir dos processos de identificação com as
figuras parentais ou seus representantes.
Consequências do narcisismo

•Um aspecto da personalidade derivado do narcisismo


é a autoestima.

•Para Freud, “tudo o que uma pessoa possui ou


realiza, todo remanescente de sentimento
prematuro de onipotência que sua experiência tenha
confirmado, ajuda-a a aumentar a sua autoestima”
(1914/1974, p.115).

•Essa também é aumentada, segundo ele, quando se


é amado.
•Assim, a autoestima depende de três aspectos:
✔O primeiro deles é o resíduo mesmo do narcisismo
infantil;
✔O segundo decorre das realizações do ideal do ego
que corroboram a onipotência infantil;
✔O terceiro provém da satisfação da libido objetal, ou
seja, de relações amorosas satisfatórias.
•Quando o indivíduo não consegue realizar-se, tende
a fazer grandes investimentos naquilo “que possui a
excelência que falta ao ego para torná-lo ideal”
(FREUD, 1914/1974, p.18).
ZIMERMAM, David E. Fundamentos psicanalíticos:
teoria, técnica e clínica – uma abordagem didática.
Porto Alegre: Artmed, 1999.

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