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História em debate
Renato Mocellin, Rosiane de Camargo
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Ensino Médio
História
Editora do Brasil
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História em debate
2
História - Ensino Médio
Renato Mocellin
Bacharel em Direito e licenciado em História pela UFPR
Pós-graduado em História da Arte pela PUC-PR
Mestre em Educação pela UFPR
Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná
Professor do Ensino Médio
Rosiane de Camargo
Licenciada em História pela UFPR
Pós-graduada em História do Brasil pela Faculdade Bagozzi (PR)
Professora do Ensino Fundamental e do Ensino Médio
Editora do Brasil
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Visitante olha para a instalação Thank you Letters (Cartas de agradecimento), de Chiharu Shiota, durante a exposição Chiharu
Shiota – Em busca do destino, em São Paulo, 2015.
Editrora do Brasil
Rua Conselheiro Nébias, 887 – São Paulo/SP – CEP 01203-001
Fone: (11) 3226-0211 – Fax: (11) 3222-5583
www.editoradobrasil.com.br
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Apresentação
CARTA AOS JOVENS ESTUDANTES
Somos bombardeados diariamente com centenas de informações. Elas são como
ruídos que nos chegam pelos sentidos e são processados pelo cérebro. Já pensou se
todas elas ficassem retidas na memória? Seríamos como supercomputadores. Mas
como isso não é possível, nem necessário, elas são filtradas e apenas as mais
relevantes permanecem.
A disciplina de História é repleta de informações. Elas não são dadas somente para
você memorizá-las, mas também para que você possa refletir sobre elas, mudar sua
vida e, consequentemente, a sociedade em que vive. Esta é a grande mágica da
aprendizagem: transforma informações em conhecimento.
Este livro, por meio da abordagem temática, suscita diversas reflexões. Não são
priorizados dados como nomes, datas e fatos, que podem ser descartados pelo
cérebro por não serem significativos ou até mesmo podem ser acessados na internet e
armazenados no computador.
Refletindo acerca dos temas propostos neste material, você será capaz de confrontar a
realidade que conhece com outros contextos ou desenvolver uma nova maneira de
olhar para a mesma questão. Nesse processo, poderá aplicar as novas informações
históricas à sua realidade e modificá-la ou reconstruí-la.
Os autores
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Organização do livro
Este livro está organizado em dez capítulos. No início de cada capítulo, você encontrará uma grande imagem, que
representa o assunto que será trabalhado e uma introdução que inspira uma reflexão inicial.
O texto principal, desenvolvido de forma clara e objetiva, começa sempre em uma nova página, facilitando sua
localização nas aulas e no estudo em casa.
A seção Viajando pela história traz os acontecimentos organizados cronologicamente, facilitando assim a
compreensão do tema estudado, são retomados conceitos e assuntos desenvolvidos no livro.
Na seção Organizando ideias, em questões que envolvem análise e interpretação de textos e imagens, são
retomados conceitos e assuntos desenvolvidos no livro.
Aspectos culturais específicos, relacionados ao assunto abordado no capítulo, são explorados na seção Resgate
cultural.
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A seção Debate interdisciplinar traz uma temática, tratada no capítulo, que dialoga com outras disciplinas,
possibilitando a você relacionar os diferentes conhecimentos escolares entre si.
Questões do Enem e dos principais vestibulares do país você encontra na seção Testando seus conhecimentos.
Nas seções Para você ler, Para você assistir e Para você navegar, há sugestões de livros, filmes e sites sobre temas
tratados no capítulo.
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Sumário
1 Direitos humanos 10
Direitos humanos: somos todos iguais? 12
A origem dos direitos humanos 15
A conquista dos direitos sociais 24
A terceira geração dos direitos humanos 26
Direitos de quarta e quinta gerações: Bioética e paz 30
Debate interdisciplinar: Em busca de direitos humanos ambientais 32
Testando seus conhecimentos 34
Referências 286
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1 Direitos humanos
Neste capítulo
Direitos humanos: somos todos iguais?
A origem dos direitos humanos
A conquista dos direitos sociais
A terceira geração dos direitos humanos
Direitos de quarta e quinta gerações: Bioética e paz
Jewel Samad/AFP
Ativistas e comunidades muçulmanas exibem cartazes com mensagens relacionadas a direitos humanos, durante uma
manifestação em solidariedade aos refugiados sírios e iraquianos. Nova York (EUA), 2015.
Mas que direitos são esses que igualam todos os seres humanos? Como eles foram
historicamente declarados? Quem elaborou os tratados e as convenções internacionais
sobre direitos humanos e em que contexto?
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Por que, apesar de aceitos e discutidos por muitas sociedades, os direitos ainda são
violados e, em alguns casos, sumariamente ignorados? Importante e polêmico, esse tema
tem sido alvo constante de discussões nos âmbitos nacional e internacional. É preciso ter
claro que esse assunto e todas as suas ações concretas afetam a todos os habitantes do
planeta tanto individual como coletivamente. Essas e outras questões serão abordadas
neste capítulo.
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A discussão sobre os direitos humanos, tema debatido nas sociedades contemporâneas e nas relações
entre os países, nem sempre esteve presente na história da humanidade.
Na Europa feudal do século X, por exemplo, não havia a noção de direitos individuais e coletivos, já que
a sociedade feudal mantinha uma ordenação social diferente da que estamos sujeitos atualmente no
Brasil. Naquela época, a Igreja Católica e a aristocracia feudal detinham o poder e, portanto, os direitos
e privilégios. Esses privilégios não se estendiam aos camponeses, que realizavam todos os tipos de
trabalho no regime de servidão feudal.
Historicamente, o tema direitos humanos começou a ser discutido a partir do século XVI, durante a
transição do feudalismo para a sociedade burguesa, no período de formação do Estado Nacional
Moderno.
No decorrer dos séculos, muitos lutaram e morreram pela liberdade de direitos, como votar e ser
votado; contra a onipotência de reis que se julgavam representantes divinos e, portanto, acima de
todos, podendo, inclusive, dispor da vida de seus súditos; também contra a segregação étnica ou a
escravização, além de muitos outros motivos que incitaram diversas lutas para que fossem asseguradas
as condições fundamentais de existência e igualdade a todos os seres humanos.
Essas lutas, porém, ainda não terminaram. Necessidades básicas, como moradia, alimentação e
educação, não têm sido asseguradas à população de forma igualitária, o que abre precedentes para
constantes manifestações com o objetivo de cobrar dos governantes solução para esses problemas.
CARDIA, Nancy; ADORNO, Sergio. Das análises sociais aos direitos humanos. In: BROOKE, Nigel; WITOSHYNSKY, Mary (Org.). Os 40
anos da Fundação Ford no Brasil: uma parceria para a mudança social. São Paulo: Edusp; Rio de Janeiro: Fundação Ford, 2002. p.
206.
Jacqueline Lau/Demotix/Corbis/Glow Images
Milhares de manifestantes seguem em direção ao Parlamento britânico em protesto contra as medidas de austeridade planejadas
pelo governo. Os cartazes pedem melhores condições de moradia e educação, apoio aos imigrantes, fim do envolvimento do país
em guerras, entre outros. Londres, Inglaterra, 2015.
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Organizando ideias
Em dupla, converse com o colega sobre as questões a seguir e depois debatam, em sala de aula,
suas conclusões.
1. O que significa dizer que os direitos humanos foram conquistados por meio de lutas ao longo do
tempo?
2. Juntos, pesquisem os principais fatos ocorridos no Brasil e no mundo noticiados pela imprensa
no último mês. De acordo com as notícias que vocês encontraram, é possível concluir que
atualmente os direitos humanos são efetivos para todas as pessoas? Justifiquem sua resposta
exemplificando.
3. A charge a seguir foi criada por Angeli no ano de 1998. Analise-a e faça o que se pede.
Angeli
Angeli. Declaração dos Direitos Humanos. A charge foi publicada no jornal Folha de S.Paulo em 11 de dezembro de 1998.
b) É possível afirmar que a charge retrata a realidade de parte da população brasileira? Justifique.
c) Elabore um pequeno texto estabelecendo relação entre a charge e o título “Direitos humanos:
somos todos iguais?”.
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O mais antigo documento que envolve direitos humanos encontrado até agora é o Cilindro de Ciro. O
texto escrito pelo rei da Pérsia (atual Irã), Ciro II, foi gravado em um cilindro de barro em 539 a.C.
Album Art/Latinstock
O documento escrito por Ciro apresentava características diferenciadas para a época: declarava a
liberdade de religião, libertava os escravos e lhes dava a oportunidade de participar do corpo de
funcionários do reino. Por suas características humanitárias, é considerado precursor das declarações de
direitos humanos.
Outro documento que merece destaque é o Pacto dos Virtuosos (Hifl-al-fudul), concluído por tribos
árabes por volta de 590 d.C., considerado uma das primeiras alianças em prol dos direitos humanos. Ele
foi elaborado por cinco tribos da cidade de Meca após uma guerra ocorrida na região, entre 586 e 590
d.C., com a finalidade de defender os oprimidos da cidade, além de restaurar seus direitos.
Documentos posteriores, como a Carta Magna da Inglaterra, de 1215, e a Carta de Mandén, de 1222,
também são exemplos de textos relacionados aos direitos humanos.
A Carta de Mandén (ou Carta de Kurukan Fuga) é considerada a declaração constitucional do Império de
Mali, fundado no século XI e unificado por Sundiata Keita, em 1222, imperador que a proclamou. Esse
documento incorpora um conjunto de práticas cujos pontos principais são: o respeito pela vida humana,
a solidariedade com a comunidade, a liberdade individual (em conformidade com a comunidade) e a
oposição ao sistema de escravidão vigente na região. A carta é considerada um dos primeiros modelos
de constituição e o primeiro documento escrito em território africano a abordar direitos humanos.
A Carta Magna, manuscrita, redigida em latim e assinada pelo rei João Sem Terra diante de barões
e do alto clero em 1215, foi considerada o primeiro documento oficial com o propósito explícito de
garantir as liberdades e direitos dos súditos e impedir os abusos de poder real. Em termos gerais,
estabelecia que nenhum homem está acima da lei, nem mesmo o rei, por dádiva divina ou favores
da igreja. Os 63 artigos exigiam direitos estamentais e limitação do poder real, a partir de um
entendimento com a nobreza, prioritariamente com os barões e, em seguida, com os demais
súditos. O princípio básico que inspirou a formatação final do documento foi a sujeição do poder
do rei às liberdades individuais de seus súditos.
GUIMARÃES, Elisabeth da Fonseca. A construção histórico-sociológica dos direitos humanos. Revista ORG & DEMO, Marília:
Unesp/Boitempo, v. 11, n. 2, p. 99, jul./dez. 2010.
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Nesse período, a sociedade era estamental, ou seja, não havia mobilidade entre uma camada social e
outra. A nobreza detinha privilégios e o poder estava concentrado nas mãos dos reis; o sistema político
dominante era o absolutismo. Os trabalhadores (sobretudo os camponeses) e os burgueses – nova
classe relacionada ao comércio e à prestação de serviços e que também não tinha direitos assegurados,
apesar do acúmulo de capital – passaram a questionar a arbitrariedade e as injustiças cometidas pelos
nobres e pelos reis absolutistas, além de agir contra esses desmandos, dando origem às chamadas
Revoluções Burguesas.
Coube aos pensadores liberais disseminar e fazer valer mecanismos capazes de frear o autoritarismo
estatal dos absolutistas. De acordo com as ideias iluministas, a razão passou a ser o instrumento de
conhecimento do mundo. Em uma sociedade não mais baseada no poder da Igreja Católica Romana, o
direito divino dos reis começou a ser questionado.
Portanto, os primeiros direitos conquistados por meio das Revoluções Burguesas foram os direitos
individuais, ou seja, aqueles considerados naturais.
Nesse período histórico, a caminhada rumo à conquista da liberdade e igualdade entre os seres
humanos deu um primeiro, mas fundamental, passo por meio da luta pelo reconhecimento dos
direitos civis e políticos, isto é, as prerrogativas dos indivíduos e grupos de indivíduos que não
podem sofrer a intervenção despótica do Estado, podendo competir de maneira igualitária. [...]
A partir de então, a figura do indivíduo que só tem deveres a prestar em relação ao príncipe
(súdito) começa a ser substituída pela do sujeito que possui direitos que devem ser respeitados
pelos governantes (o cidadão). [...]
Em suma, estamos tratando aqui de uma mudança de eras, da substituição de uma “era dos
deveres” por uma “era dos direitos”. [...]
Porém, assim como essa nova “era dos direitos” nasce por intermédio da conquista dos direitos
civis e políticos, ela também tem uma precisa localização espacial, uma geografia própria –, seu
berço encontra-se em três países precisos: Inglaterra, Estados Unidos e França.
Será exatamente no curso dos acontecimentos históricos que levaram esses três países à
modernidade que subirão à tona as primeiras vitórias da luta incessante travada em nome da
afirmação dos direitos da cidadania no mundo. [...]
MONDAINI, Marco. Os direitos humanos no período pré-Revolução Francesa: a conquista dos direitos civis e políticos I. In:
______________. Direitos humanos. São Paulo: Contexto, 2006. p. 22.
Nesse período, consolidava-se uma rica camada de produtores rurais ligada à produção de lã e à
agricultura comercial. Esse grupo, aliado à burguesia urbana, opunha-se ao absolutismo, defendido pelo
clero anglicano e também pelos nobres aristocratas.
Para assumir a Coroa, o Parlamento obrigou Guilherme de Orange e sua esposa a assinarem um
documento de compromisso com os cidadãos denominado Declaração de Direitos (Bill of Rights, 1689),
que inaugurou um novo tipo de Estado, voltado aos cidadãos: um estado de direito.
[...] os ditos lordes espirituais e temporais, e os comuns, respeitando suas respectivas cartas e
eleições, estando agora reunidos como plenos e livres representantes desta nação, considerando
mui seriamente os melhores meios de atingir os fins acima ditos, declaram, em primeiro lugar
(como seus antepassados fizeram comumente em caso semelhante), para reivindicar e garantir
seus antigos direitos e liberdades:
1. Que é ilegal o pretendido poder de suspender leis, ou a execução de leis, pela autoridade real,
sem o consentimento do Parlamento.
2. Que é ilegal o pretendido poder de revogar leis, ou a execução de leis, por autoridade real, como
foi assumido e praticado em tempos passados.
3. Que a comissão para criar o recente Tribunal de comissários para as causas eclesiásticas, e todas
as outras comissões e tribunais de igual natureza, são ilegais e perniciosos.
4. Que é ilegal a arrecadação de dinheiro para uso da Coroa, sob pretexto de prerrogativa, sem
autorização do Parlamento, por um período de tempo maior, ou de maneira diferente daquela
como é feita ou outorgada.
5. Que constitui um direito dos súditos apresentarem petições ao Rei, sendo ilegais todas as prisões
ou acusações por motivo de tais petições.
6. Que levantar e manter um exército permanente dentro do reino em tempo de paz é contra a lei,
salvo com permissão do Parlamento.
7. Que os súditos que são protestantes possam ter armas para sua defesa adequadas a suas
condições, e permitidas por lei.
10. Que não deve ser exigida fiança excessiva, nem impostas multas excessivas; tampouco infligidas
punições cruéis e incomuns.
11. Que os jurados devem ser devidamente convocados e nomeados, e devem ser donos de
propriedade livre e alodial os jurados que decidem sobre as pessoas em julgamentos de alta
traição.
12. Que são ilegais e nulas todas as concessões e promessas de multas e confiscos de pessoas
particulares antes de condenação.
13. E que os Parlamentos devem reunir-se com frequência para reparar todos os agravos, e para
corrigir, reforçar e preservar as leis.
E reclamam, pedem e insistem que todas essas premissas constituem seus direitos e liberdades
inquestionáveis; e que nenhumas declarações, julgamentos, atos ou procedimentos, para prejuízo
do povo em alguma das ditas premissas, devem ser, de alguma maneira, tomadas no futuro como
precedente ou exemplo.
Declaração Inglesa de Direitos (1689). In: ISHAY, Micheline R. (Org.). Direitos humanos: uma antologia – principais escritos
políticos, ensaios, discursos e documentos desde a Bíblia até o presente. São Paulo: Edusp; Núcleo de Estudos da Violência, 2006.
p. 172-173.
Glossário
Alodial: bem imóvel livre de vínculos ou pendências relacionadas à sua posse.
Organizando ideias
De acordo com seus conhecimentos, responda às questões a seguir.
Após a vitória da Inglaterra e a assinatura do Tratado de Paris (1763) – pelo qual a Inglaterra obteve da
França os territórios do Canadá, Nova Escócia, São Vicente, Dominica, Tobago, Granada e Minorca –, os
colonos americanos ainda desejavam explorar novas terras, mas seus projetos foram restringidos pela
metrópole, que tinha uma visão diferente sobre como a ocupação deveria acontecer. A partir de então,
os desentendimentos entre colônia e metrópole se intensificaram, principalmente por causa das
seguidas taxações impostas pela Inglaterra às colônias americanas, descritas no quadro a seguir.
1764 Lei do Açúcar Aumentava os impostos pagos pelos colonos sobre o melaço com o
objetivo de obrigá-los a consumir o açúcar comercializado pelos ingleses.
1765 Lei do Selo Estabelecia que todas as correspondências em circulação na colônia
deveriam receber selos da metrópole. O selo era pago.
1766 Lei Declaratória Reafirmava o poder do Parlamento inglês sobre as colônias em todos os
aspectos, incluindo seu direito de tributá-las.
1767 Leis Townshend Entre outras medidas, aumentavam as taxas alfandegárias sobre produtos
britânicos básicos, como vidro, papel, tinta e chumbo.
1773 Lei do Chá Aumentou os impostos sobre o chá – produto bastante consumido na
colônia – e instituiu seu monopólio comercial à Companhia das Índias
Orientais, sediada em Londres.
1774 Leis Coercitivas (Leis Diversas leis foram promulgadas pelo Parlamento britânico com o objetivo
Intoleráveis) de implantar várias medidas, entre elas o fechamento do Porto de Boston
e a transferência das despesas das forças britânicas na colônia para os
próprios colonos.
A Guerra dos Sete Anos foi travada pela Inglaterra e pela Prússia contra a França e a Áustria, e
estendeu-se por toda a Europa e América do Norte.
A grande rivalidade econômica e colonial entre ingleses e franceses, tanto na América quanto na Índia,
foi a principal motivadora do conflito, uma vez que ambos os países reivindicavam a posse de diversos
territórios coloniais na América do Norte, Índia e África.
Apesar de ter vencido o conflito, a Inglaterra contraiu uma grande dívida, que foi repassada aos colonos
americanos. Além de arcar com os custos da guerra pagando altos impostos, os colonos sofreram
restrição nas transações comerciais e foram proibidos de ocupar as terras francesas conquistadas. Esse
panorama incitou os colonos a iniciar uma série de conflitos e batalhas contra a dominação britânica.
Os colonos não ficaram passivos diante desses acontecimentos. A princípio, reagiram pacificamente
exigindo o direito de eleger representantes para o Parlamento de Londres e assim discutir e votar leis,
mas depois passaram a boicotar mercadorias inglesas e protestar. Essas reações forçaram o governo
britânico a não adotar algumas das medidas, mas isso não foi suficiente para satisfazer os colonos. O
conflito agravou-se ainda mais quando o governo britânico passou a enviar tropas para conter os
protestos.
Diomedia
Destruição do chá no Porto de Boston, 1773. Ilustração, de autoria desconhecida, que retrata o protesto dos colonos contra a Lei
do Chá.
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Como resposta, em 1774 os representantes das colônias americanas, exceto Geórgia, enviaram seus
delegados a Filadélfia (estado da Pensilvânia) para um congresso que tinha o objetivo de dar voz política
aos colonos. No Primeiro Congresso Continental de Filadélfia, os delegados decidiram não mais
comerciar com a Inglaterra enquanto não fossem restabelecidos todos os direitos coloniais anteriores a
1763, e foi redigida e divulgada uma Declaração de Direitos.
Os objetivos desse primeiro congresso não foram alcançados, e a tensão entre colônias e metrópole
aumentou até que, em 1775, começaram os conflitos militares entre ingleses e americanos. Nesse
mesmo ano, os líderes dos colonos se reuniram novamente em um segundo congresso, agora com a
participação do representante da Geórgia, e decidiram declarar as colônias “em rebeldia”. A Coroa
britânica reagiu, assim como os colonos, até que a tensão contínua deu início a uma guerra que
culminou com a independência.
Quando, no curso dos acontecimentos humanos, torna-se necessário a um povo dissolver os laços
políticos que o ligam a outro e assumir, entre os poderes da Terra, situação independente e igual a
que lhe dão direito as Leis da Natureza e de Deus, o correto respeito às opiniões dos homens exige
que se declarem as aulas que o levam a essa separação.
Consideramos estas verdades evidentes por si mesmas, que todos os homens são criados iguais,
que são dotados pelo Criador de certos Direitos inalienáveis, que entre estes estão a Vida, a
Liberdade e a busca da Felicidade. – Que para garantir esses direitos são instituídos entre os
Homens Governos que derivam de seus justos poderes de consentimento dos governados; Que
toda vez que uma Forma qualquer de Governo ameace destruir esses fins, cabe ao Povo o Direito
de alterá-la ou aboli-la e instituir um novo Governo, assentando sua fundação sobre tais princípios
e organizando-lhes os poderes de forma que pareça mais provável de proporcionar Segurança e
Felicidade. [...]
DRIVER, Stephanie Schwartz. A Declaração da Independência dos Estados Unidos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2006. p. 53.
A Revolução Americana não foi apenas uma luta pela independência, pois implicou mudanças sociais e
políticas. No período em que ocorreu, significou um grande avanço, pois trazia uma concepção política e
uma abordagem inovadoras para os conceitos de liberdade e cidadania. A revolução representou não só
a libertação das colônias inglesas na América como também a afirmação de alguns direitos básicos, por
exemplo, o direito à vida, à liberdade e à segurança, que eram, naquele momento, cerceados e violados
pela metrópole, contudo, nativos e escravizados não eram contemplados com tais direitos.
A Revolução Americana, também conhecida como Guerra da Independência dos Estados Unidos,
começou em 1773 e terminou oficialmente em 1783. Tinha como intuito inicial protestar contra a
cobrança abusiva de impostos pela metrópole inglesa, mas com o apoio de diversos países antagonistas
da Inglaterra, desencadeou, depois de muitos episódios, a assinatura do tratado em que a
independência norte-americana foi reconhecida.
Glossário
Delegado: alguém que recebe autorização para representar outra pessoa, comissário.
Passivo: aquele que não reage a algo, indiferente.
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Organizando ideias
Em dupla, analise a conjuntura da Independência dos Estados Unidos da América e juntos façam o
que se pede.
1. No texto da Declaração de Independência dos Estados Unidos da América consta a frase: “que
todos os homens são criados iguais, que são dotados pelo Criador de certos Direitos inalienáveis,
que entre estes estão a Vida, a Liberdade e a busca da Felicidade”. Expliquem-na no contexto do
período.
2. O trabalho escravo foi mantido nos Estados Unidos ainda após a independência. Esse fato estava
de acordo com os preceitos da Declaração de Independência? Expliquem.
3. A Declaração deixa claro que os governos são instituídos pelo povo, e cabe a este destituí-los em
caso de não agirem em benefício desse mesmo povo. Expliquem essa afirmação e escrevam sua
opinião sobre ela argumentando favoravelmente ou não.
O marco inicial dessa revolução foi a Tomada da Bastilha – uma antiga prisão que havia na cidade de
Paris –, em 14 de julho de 1789. Em seguida, ocorreu uma série de modificações na organização social e
política da França.
A Queda da Bastilha representa até hoje um marco na defesa dos direitos humanos e um dos fatos da
Revolução Francesa que mais contribuiu para substituir a política abusiva da monarquia francesa por
uma sociedade menos segmentada. Apesar disso, 14 de julho não é o dia comemorativo da Queda da
Bastilha.
Dea Picture Library/Getty Images
Jean-Baptiste Lallemand. A prisão da Bastilha em 14 de julho de 1789, 1789. Óleo sobre tela, 80 cm × 104 cm.
A bastilha foi construída para ser um portal de entrada para o bairro parisiense de Saint-Antoine.
Entretanto, entre 1370 e 1383, foi ampliada para dar espaço a uma prisão e passou também a guardar
parte do exército e do aparato bélico francês.
Em 1789, em razão do boato de que a população não nobre seria atacada pelas tropas parisienses como
represália às manifestações contrárias à cobrança abusiva de impostos e às péssimas condições de vida,
o povo invadiu a Bastilha para se armar, já que lá o governo francês armazenava pólvora e cartuchos.
Tomada da Bastilha ou Queda da Bastilha, um dos principais eventos da Revolução Francesa, levou a
discussões que contribuíram para a instituição da Assembleia Nacional Constituinte e, posteriormente,
da Constituição francesa.
Para o povo parisiense, o episódio significou o rompimento com a monarquia, sua política e os abusos
até então cometidos pela Igreja Católica.
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Em 1790, na mesma data, soldados federados entraram em Paris e desfilaram da Bastilha ao Campo de
Marte. Foi então organizada a Festa da Federação, para celebrar uma decisão da Assembleia
Constituinte, que reunia várias militâncias de cidadãos presentes na Revolução Francesa, ratificando-a e
celebrando a união nacional.
A Revolução Francesa é lembrada até hoje por seu slogan: “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”. Esses
preceitos foram decisivos para que as mulheres, que até então não tinham muito espaço na sociedade
francesa, participassem ativamente dos movimentos sociais que desencadearam a revolução, sem,
contudo, obterem direitos políticos.
Na discussão a respeito dos direitos dos cidadãos, não havia distinção hierárquica (nobres ou não
nobres), econômica (ricos ou pobres) ou de gênero (homens ou mulheres), o que imprimiu à Revolução
Francesa um papel relevante no processo de construção da cidadania. Com o propósito de sintetizar os
princípios básicos necessários à cidadania, foi elaborada a Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão, em 26 de agosto de 1789. Nos 17 artigos desse documento, estão expressos os direitos
considerados fundamentais para toda a humanidade.
Jean-Jacques-François Le Barbier. Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, 1791. Óleo sobre madeira, 56 cm × 71 cm.
Quando a Constituição francesa foi elaborada, em 1791, algumas normas estabelecidas alteraram o
conceito de cidadania original da declaração. Uma das questões era a definição de cidadão ativo: para
compor a Assembleia Nacional ou participar da vida política era preciso preencher certos requisitos que
definiam a pessoa como cidadão ativo, incluindo o pagamento de impostos e o acúmulo de terras e
riquezas. Dessa forma, muitos foram alijados da condição de cidadãos, pois foi estabelecida uma nova
classe de privilegiados e outra de excluídos.
Glossário
Alijar: impedir contato, desprezar.
Entre 1789 e 1791, a vitoriosa burguesia moderada, atuando através do que tinha a esta altura se
transformado na Assembleia Constituinte, tomou providências para a gigantesca racionalização e
reforma da França, que era o seu objetivo. A maioria dos empreendimentos institucionais
duradouros da revolução data deste período, assim como os seus mais extraordinários resultados
internacionais, o sistema métrico e a emancipação pioneira dos judeus. Economicamente as
perspectivas da Assembleia Constituinte eram inteiramente liberais: sua política em relação aos
camponeses incluía o cerco das terras comuns e o incentivo aos empresários rurais; para a classe
trabalhadora, a interdição dos sindicatos; para os pequenos artesãos, a abolição dos grêmios e
corporações. Dava pouca satisfação concreta ao povo comum, exceto, a partir de 1790, com a
secularização e venda dos terrenos da Igreja (bem como dos terrenos da nobreza emigrante) que
tinha a tripla vantagem de enfraquecer o clericalismo, fortalecer o empresário rural e provinciano e
dar a muitos camponeses uma retribuição mensurável por suas atividades revolucionárias. A
Constituição de 1791 rechaçou a democracia excessiva através de um sistema de monarquia
constitucional baseada em um direito de voto censitário dos “cidadãos ativos” reconhecidamente
bastante amplo. [...].
HOBSBAWM, Eric J. A era das revoluções: 1789-1848. São Paulo: Paz e Terra, 2011. p. 113-114.
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Organizando ideias
Em dupla, leia os textos a seguir e, juntos, façam o que se pede.
Texto 1
Art. 1º Os homens nascem e continuam livres e iguais em direitos. As distinções sociais não podem
ter outro fundamento senão a utilidade comum.
Art. 3º O princípio de toda Soberania reside essencialmente na Nação. Nenhum corpo social,
nenhum indivíduo pode exercer autoridade que dela não emane expressamente.
Art. 4º A liberdade consiste em poder fazer tudo o que não prejudique a outrem: assim, o exercício
dos direitos naturais de cada homem não tem outros limites senão aqueles que asseguram aos
outros Membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. Somente a Lei pode determinar esses
limites.
Art. 5º A Lei não tem o direito de proibir senão os atos prejudiciais à Sociedade. Tudo o que não é
proibido pela Lei não pode ser impedido, e ninguém pode ser obrigado a fazer o que ela não
ordena.
Art. 6º A Lei é a expressão da vontade geral. Todos os cidadãos têm o direito de concorrer,
pessoalmente ou por seus Representantes, para a sua formação. Ela deve ser a mesma para todos,
seja para proteger, seja para punir. Todos os Cidadãos, sendo iguais a seus olhos, são igualmente
admissíveis a todas as dignidades, lugares e empregos públicos, segundo a sua capacidade e sem
outra distinção senão a de suas virtudes e de seus talentos.
Art. 7º Nenhum homem pode ser acusado, preso ou detido, salvo nos casos determinados pela Lei,
e de acordo com as formas que ela prescreveu. Aqueles que solicitam, expedem, executam ou
mandam executar ordens arbitrárias devem ser punidos; mas todo cidadão convocado ou detido
em virtude da Lei deve obedecer imediatamente: torna-se culpado se resistir.
Art. 8º A Lei deve estabelecer penas estritas e evidentemente necessárias, e ninguém pode ser
punido senão em virtude de uma Lei instituída e promulgada anteriormente ao delito e legalmente
aplicada.
Art. 9º Sendo todo homem presumidamente inocente até que seja declarado culpado, se for
julgado indispensável prendê-lo, todo rigor que não seja necessário para apoderar-se de sua pessoa
deve ser reprimido severamente pela Lei.
Art. 10. Ninguém deve ser incomodado por suas opiniões, mesmo religiosas, desde que sua
manifestação não perturbe a ordem pública estabelecida pela Lei.
Art. 11. A livre comunicação dos pensamentos e das opiniões é um dos direitos mais preciosos do
Homem: todo Cidadão pode, portanto, falar,
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escrever, imprimir livremente, sob condição de responder pelo abuso dessa liberdade nos casos
determinados pela Lei.
Art. 12. Para garantir os direitos do Homem e do Cidadão, é necessária uma força pública: essa
força é instituída, portanto, para a vantagem de todos, e não para a utilidade particular daqueles a
quem é confiada.
Art. 13. Para a manutenção da força pública, e para as despesas de administração, é indispensável
uma contribuição comum: deve ser distribuída igualmente entre todos os cidadãos,
proporcionalmente às suas possibilidades.
Art. 14. Todos os cidadãos têm o direito de comprovar, por si mesmos ou por representantes, a
necessidade da contribuição pública, consenti-la livremente, acompanhar-lhe o emprego e
determinar-lhe a proporção, a distribuição, a cobrança e a duração.
Art. 15. A Sociedade tem o direito de pedir contas a todo Agente público de sua administração.
Art. 16. Toda Sociedade em que a garantia dos Direitos não seja assegurada, nem a separação dos
Poderes estabelecida, não possui Constituição.
Art. 17. Sendo a propriedade um direito inviolável e sagrado, ninguém pode dela ser privado, a não
ser quando a necessidade pública, legalmente comprovada, o exigir claramente e sob a condição
de justa e prévia indenização.
ISHAY, Micheline R. (Org.). Direitos humanos: uma antologia. São Paulo: Edusp, 2006. p. 243-245.
Texto 2
Povo da França!
Por quinze séculos tu viveste escravo, e consequentemente infeliz. Há seis anos tu mal respiras, na
espera da independência, da felicidade e da igualdade.
A Revolução Francesa não passa de mensageira de uma outra revolução muito maior, muito mais
solene, e que será a última [...]. Chegou o momento de fundar a REPÚBLICA DOS IGUAIS, esse
grande asilo aberto a todos os homens. Chegaram os dias da restituição geral. Famílias gementes,
vinde se sentar à mesa comum posta pela natureza para todos os seus filhos [...]. Já no dia seguinte
dessa verdadeira revolução, eles se dirão muito surpresos: Ora essa! A felicidade de todos
dependia de tão pouco? Bastava que a quiséssemos. Ah, por que não a quisemos mais cedo?
MARÉCHAL, Sylvain. Manifesto dos iguais, 1796 apud BEAUD, Michel. História do capitalismo. São Paulo: Brasiliense, 1987. p. 132.
1. Analisem os preceitos da declaração. Mesmo tendo sido escrita em 1789, os direitos que ela
reivindica dizem respeito à nossa realidade social?
5. Elaborem um texto relacionando a Revolução Francesa à construção da cidadania com base nos
direitos humanos.
Glossário
Gemente: que emite gemidos, lamentos, lamúrios.
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Os direitos de primeira geração referem-se aos indivíduos. Eles não traziam as garantias sociais e
econômicas necessárias para que a igualdade entre todos fosse efetivada. Percebeu-se, por exemplo,
que sem trabalho digno ou vivendo com fome e na miséria, o direito à vida, que é um dos mais
relevantes, estava sendo amplamente desrespeitado. Essa percepção de alguns grupos suscitou novas
discussões e lutas em prol dos direitos necessários para que todos os seres humanos pudessem ter uma
vida digna.
As discussões sobre os direitos humanos de segunda geração – que possibilitam o acesso da população
aos direitos sociais – têm como objetivo a garantia de cultura e desenvolvimento econômico e social a
todos os governados por regimes democráticos. Esses direitos fundamentam-se em um preceito de
reciprocidade: se a população tem o direito de eleger seus representantes no sistema governamental,
também deve ter assegurado o direito aos serviços de educação, saúde, assistência social, trabalho,
transporte e outros necessários à assistência vital.
Nos séculos XVIII e XIX, a exploração dos operários nas fábricas suscitou discussões em busca de
soluções e fez muitas pessoas com ideias humanitárias levantarem a voz para denunciar as contradições
do sistema capitalista e do Estado liberal. Nesse contexto de crítica, alguns pensadores elaboraram um
conjunto de teorias políticas e econômicas que se opunham à ordem social vigente e sugeriam uma
sociedade sem classes, verdadeiramente igualitária. Esse conjunto de teorias recebeu o nome de
socialismo. Para esses pensadores, a igualdade só se efetivaria quando acabassem as desigualdades
sociais e econômicas criadas pelo capitalismo e pelo liberalismo.
O século XIX viu, portanto, nascer um confronto que se estende ao século XX, sobre o conteúdo dos
direitos humanos. Os direitos fundamentais do ser humano seriam os direitos individuais
enunciados pelas revoluções burguesas do século XVIII? Ou seriam novos direitos de natureza
social que garantiriam coletivamente as condições de existência humana? A dúvida e a polêmica
perduram até os dias de hoje.
DORNELLES, João Ricardo W. O que são direitos humanos? São Paulo: Brasiliense, 2007. p. 23-24 e 28.
O impulso revolucionário produziria nova e mais formidável vaga em 1848: a “Primavera dos
Povos”, como ficou conhecida, devido a seu internacionalismo e forte presença popular. Uma crise
econômica fizera recrudescer o desemprego desde o início da década e as classes populares
voltaram a se agitar. No primeiro semestre desse ano, a maioria das regiões da Europa central e
ocidental – França, Alemanha, Itália, Áustria, Hungria, Polônia e Bálcãs – foi tomada por
insurreições de conteúdo nacionalista, antimonárquico, democrático ou operário (às vezes tudo
isso junto). Todas foram vitoriosas a princípio e, logo a seguir, todas foram esmagadas com muito
sangue. A grande novidade da Primavera dos Povos, destacadamente na França, foi a emergência
dos operários reivindicando uma “república democrática e social” – muito além do que estavam
dispostos a ir os liberais das revoluções anteriores.
TRINDADE, José Damião de Lima. História social dos direitos humanos. São Paulo: Peirópolis, 2011. p. 128.
Podemos afirmar que, depois do movimento socialista, a discussão e a implantação dos direitos
humanos foram ampliadas para o reconhecimento dos direitos sociais. Estes são essencialmente
coletivos e de natureza social, como o direito ao trabalho e demais direitos trabalhistas (férias,
aposentadoria, greve, segurança no trabalho, organização sindical etc.); direito ao lazer; à saúde; à
moradia; à educação; à segurança; aos serviços públicos, entre outros direitos econômicos, sociais e
culturais que devem beneficiar toda a sociedade.
Crianças caminham em frente a escola. São Paulo (SP), 2016. A educação é um dos direitos sociais consolidados.
Organizando ideias
O manifesto a seguir é de Louis Blanc, um socialista que participou da Revolução de 1848, na
França. Leia-o e faça o que se pede.
Um poder democrático é o que tem a soberania popular por princípio, o sufrágio universal por
origem e por objetivo a realização da fórmula: Liberdade, Igualdade e Fraternidade.
Os governantes, numa democracia bem constituída, são apenas os mandatários do povo: devem
ser responsáveis e sujeitos à demissão.
As funções públicas não são distinções e não devem se constituir em privilégios: são deveres. [...]
A educação dos cidadãos deve ser comum e gratuita. É ao Estado que compete fornecê-la. [...]
Ao cidadão vigoroso e apto, o Estado deve o trabalho; ao velho e ao enfermo, deve ajuda e
proteção.
BLANC, Louis apud FALCON, Francisco; MOURA, Gerson. A formação do mundo contemporâneo. Rio de Janeiro: Campus, 1989. p.
69.
2. Qual deve ser o papel dos governantes em um Estado democrático? Você concorda com a
opinião do autor? Justifique.
Historicamente, o período que antecedeu a Segunda Guerra Mundial foi caracterizado pela ascensão
dos estados totalitários, como o nazismo de Hitler, na Alemanha, e o fascismo de Mussolini, na Itália.
Essas ditaduras foram marcadas por violações constantes dos direitos humanos, por exemplo, nos
campos de concentração nazistas onde foram massacrados cerca de 6 milhões de judeus, além de
outros grupos, como os de ciganos, homossexuais e deficientes mentais.
No fim da Segunda Guerra Mundial, o saldo foi aproximadamente 60 milhões de mortos e uma nova
realidade mundial: a divisão do mundo em dois blocos de poder: de um lado, os Estados Unidos –
capitalista – e de outro, a União Soviética (URSS) – socialista. Iniciou-se um período conhecido como
Guerra Fria, em que a ameaça de uma guerra nuclear era constante; acreditava-se na possibilidade
concreta de destruição de todo o planeta.
A Guerra Fria era velada, disputada por meio da aquisição de armamentos, do desenvolvimento de
tecnologia nuclear e da disputa pela influência em países ainda não aliados a cada bloco de poder. Nesse
ambiente de tensão, surgiram novas discussões a respeito dos direitos a ser garantidos em conjunto
pelo Estado e pelos indivíduos representantes dos diferentes setores das sociedades e também das
diferentes nações. As questões incluíam o direito à paz, à autodeterminação dos povos, ao meio
ambiente saudável e à utilização do patrimônio comum da humanidade (por exemplo, o uso do mar –
seja a superfície ou o fundo dele –, o espaço extra-atmosférico e a Antártica). Em suma, eram discutidos
os direitos dos povos, que complementavam os direitos individuais e sociais, já estabelecidos
anteriormente.
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Seleção de pessoas doentes para a câmara de gás no campo de concentração de Auschwitz, 1963. Desenho de Jerzy Potrzebomsky
(ex-prisioneiro).
Página 27
Nessa frente de luta pelos direitos humanos, surgiu o conceito de crime contra a humanidade, que são
os crimes caracterizados por ações de perseguição e extermínio, praticados contra grupos específicos –
étnicos, religiosos etc. –, e considerados crimes contra a população mundial. O novo ciclo de debates,
lutas e propostas de expansão dos direitos humanos estava focado na exigência de estender a
democracia a toda a humanidade. Após a Segunda Guerra Mundial, formulou-se um conjunto de leis,
conhecido como Direito Internacional, que valeria para vários países.
[...] Os crimes aqui enunciados são puníveis como crimes perante o Direito Internacional.
a) Crimes contra a paz: planejar, preparar, incitar ou contribuir para a guerra de agressão ou para a
guerra, em violação aos tratados e acordos internacionais, ou participar de um plano comum ou
conspiração para a realização das referidas ações;
b) Crimes de guerra: violações ao Direito e ao Direito costumeiro da guerra. Tais violações devem
incluir – mas não devem ser limitadas a esses atos – assassinato, tratamento cruel, deportação de
populações civis que estejam ou não em territórios ocupados, para trabalho escravo ou para
qualquer outro propósito, assassinato ou tratamento cruel de prisioneiros de guerra ou de pessoas
em alto-mar, assassinato de reféns, saques à propriedade pública ou privada, destruição de vilas ou
cidades, devastação injustificada por ordem militar;
Art. 6º do Estatuto do Tribunal de Nuremberg apud VASCONCELOS NETO, José Ramos de. Democracia no terceiro milênio. São
Paulo: Nobel, 2002. p. 142.
Um dos fatos marcantes do período pós-guerra foi a tentativa de universalização dos direitos humanos,
o que estabeleceu compromissos internacionais expressos em declarações, pactos e convenções que
vêm sendo constantemente assinados, reiterados e expostos a todas as nações, visando ao
cumprimento das deliberações referentes aos direitos de todos os povos do mundo.
Bill Ingraham/AP Photo/Glow Images
Uma comissão de manifestantes organizaram um protesto contra a sala de concerto no Instituto Negro Choir, que não permitia
negros em suas dependências. Washington (EUA), 3 de junho de 1946.
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Entre os documentos que visam à proteção dos direitos humanos, um merece destaque por ser o mais
expressivo: a Declaração Universal dos Direitos Humanos, elaborada por uma comissão da Organização
das Nações Unidas (ONU) e aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de
1948. Esse documento serviu, e ainda serve, de base e de referência para a promoção dos direitos
humanos em todo o mundo.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 inicia-se com um preâmbulo contendo sete
considerações, a primeira das quais aponta o espírito geral do documento: “o reconhecimento da
dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é
o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo”.
Assim, [...], a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 inaugurou o direito internacional
dos direitos humanos (até então não havia nenhum documento internacional que se dedicasse ao
assunto com tanta abrangência e importância) [...].
TRINDADE, José Damião de Lima. História social dos direitos humanos. São Paulo: Peirópolis, 2011. p. 192-193.
A Declaração de 1948 já foi complementada com outros pactos aprovados posteriormente, pois não é
estanque, ou seja, continua sendo debatida com o objetivo de buscar uma forma global de evitar
atrocidades similares às cometidas contra a humanidade em diferentes momentos históricos, e que
continuam acontecendo contra alguns grupos.
A universalidade parte da premissa de que todos são iguais perante a lei, portanto, nenhum indivíduo
pode sofrer qualquer tipo de discriminação étnica, cultural, econômica, política, ideológica, de gênero,
de orientação sexual ou religiosa.
Essas garantias estão presentes na Declaração Universal dos Direitos Humanos, porém isso não é
suficiente para que elas sejam realmente efetivas, pois, nos diferentes países, há desigualdades que se
revelam em formas diversas de violação desses direitos.
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Por isso, a luta por direitos deve ser percebida e entendida como um instrumento de transformação
social, que visa a uma sociedade mais justa.
A defesa dos direitos humanos ocorre de forma mais efetiva em países onde vigora o regime
democrático de governo. Nos países com regimes ditatoriais não há liberdade de expressão e a violência
pode partir do Estado, impedindo que os direitos humanos sejam realmente efetivados para a
população. Além disso, as questões referentes aos direitos humanos envolvem numerosos fatores, entre
eles, os culturais, que são específicos em cada país.
Manifestantes fazem um minuto de silêncio pelas crianças sírias em frente ao Portão de Brandemburgo. Berlim, Alemanha, 2013.
Organizando ideias
Forme um grupo com alguns colegas e, juntos, leiam os textos e façam o que se pede.
Texto 1
Será obrigado a reconhecer que, apesar das antecipações iluminadas dos filósofos, das corajosas
formulações dos juristas, dos esforços dos políticos de boa vontade, o caminho a percorrer ainda é
longo. E ele terá a impressão de que a história humana, embora velha de milênios, quando
comparada às enormes tarefas que estão diante de nós, talvez tenha apenas começado.
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. p. 44.
Texto 2
a) Após a leitura, dividam os artigos da declaração em partes para fazer o exercício proposto na
primeira frase do texto 1.
b) Cada grupo deve apresentar sua conclusão sobre se está acontecendo, na prática, o que foi
proposto na parte do texto que lhe coube.
3. Quais são os “objetivos mais altos” a que o autor do texto 2 faz referência? Como você imagina
que é possível alcançá-los?
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Nesse contexto, teve início a quarta geração dos direitos humanos, caracterizada pelo incentivo à
pesquisa biológica e científica e pela defesa do patrimônio genético, necessários em razão do rápido
avanço tecnológico.
Essa geração pauta os padrões de Bioética defendendo o respeito ao patrimônio genético, tanto
individual quanto de grupos étnicos, com o objetivo de colocá-lo acima da corrida pelo avanço
tecnológico e da Medicina.
Toda pessoa tem o direito de saber os detalhes do medicamento que está consumindo. Por essa razão, as empresas farmacêuticas
são obrigadas a informar na bula todas as indicações, contraindicações e possíveis efeitos colaterais do remédio. A transparência é
uma ação que envolve bioética.
Nestas primeiras décadas do século XXI, em que atrocidades, crimes, atentados contra indivíduos e
nações e outras formas de violação contra a vida continuam a acontecer, é responsabilidade de todos os
seres humanos, bem como dos Estados e povos, utilizar meios, valores e comportamentos que busquem
estimular uma cultura da paz para toda a humanidade.
A cultura da paz pode ser definida como um conjunto de valores, atitudes e posturas, enfim, modos de
vida que rejeitem a violência e procurem prevenir e resolver conflitos por meio de negociações e,
principalmente, do diálogo permanente.
Assim como a violência, a paz não é inerente à humanidade. Ela precisa ser aprendida e estimulada,
buscando permanentemente um mundo mais harmonioso.
Glossário
Bioética: campo de estudo referente às implicações éticas de certos procedimentos médicos e
biológicos, como transplantes de órgãos, engenharia genética e cuidados com doentes terminais.
1. Selecionem duas reportagens sobre assuntos diferentes e anotem os dados principais como:
onde a situação ocorreu, consequências, se houve solução imediata ou não e como chegaram à
solução.
2. Para cada reportagem, estabeleçam a relação entre o assunto e o modo como essa questão
afeta a população mundial.
Resgate cultural
Existem diversas organizações internacionais que atuam de forma a evitar que haja risco para a
vida das pessoas nesses casos, como a Anistia Internacional, a Cruz Vermelha e os Médicos sem
Fronteiras. Por meio de acordos internacionais, essas instituições conseguem atuar em regiões de
conflito onde há perigo para a população.
Os Médicos sem Fronteiras, por exemplo, nasceram de uma experiência de voluntariado em uma
guerra civil, na Nigéria, no fim dos anos 1960. Um grupo de médicos e jornalistas decidiu criar uma
organização que pudesse oferecer atendimento médico a toda população envolvida em conflitos e
guerras, sem que essa ação fosse entendida como uma posição política favorável ou contrária aos
lados envolvidos. Assim, seus membros conseguem chegar a regiões remotas e/ou sob forte
bombardeio para atender os que estão feridos e sob risco de vida.
Para que a imparcialidade dos Médicos sem Fronteiras seja possível, é preciso que as partes
envolvidas no conflito respeitem os direitos dos pacientes atendidos. Assim, a organização informa
a localização de suas bases e o tipo de atendimento que deve ocorrer ali; o objetivo é proporcionar
uma atuação transparente, que sublinhe o caráter humanitário da ação dos profissionais da
organização.
1. Você conhece alguma situação de conflito no Brasil em que a defesa dos direitos foi feita
principalmente por uma instituição internacional?
MSFBrasil
Em 3 de outubro de 2015, o hospital administrado pelos Médicos sem Fronteiras na cidade de Kunduz, no Afeganistão, foi
bombardeado pelo exército dos Estados Unidos, o qual atua no país sob a justificativa de combater membros do grupo Talibã, que
tenta retomar o poder. Nas imagens acima, de antes e depois do bombardeio, é possível observar que o ataque foi bastante
preciso: apenas o prédio do hospital foi atingido – ao longo de quase uma hora, diversas partes do edifício receberam bombas,
apesar de a organização ter informado aos dois lados do conflito que se tratava de um hospital. Foram mortas 19 pessoas – 12
membros dos Médicos sem Fronteiras e sete pacientes, entre os quais três eram crianças.
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Debate interdisciplinar
Em busca de direitos humanos ambientais
Na segunda metade do século XX muitas pessoas, em diversos países, começaram a se organizar em
associações e organizações devido a preocupações com o esgotamento de um recurso natural ou um
pequeno conjunto deles. Essas pautas ambientais de lutas e manifestações desde o início
caracterizaram-se pela diversidade de concepções a respeito das relações entre as sociedades e o meio
físico – alguns grupos ambientais entendem o modo de vida das populações tradicionais como a
principal referência para a humanidade e propõem mudanças radicais no modo de vida urbano-
industrial; outros, no entanto, acreditam poder resolver o esgotamento dos recursos naturais com a
sofisticação dos meios tecnológicos de sua apropriação.
A Carta da Terra, um documento feito coletivamente na década de 1990 com propostas de superação da
crise ambiental, ressalta esse direito já nos primeiros princípios:
Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade
deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo torna-se cada vez mais interdependente e
frágil, o futuro enfrenta, ao mesmo tempo, grandes perigos e grandes promessas. Para seguir
adiante, devemos reconhecer que no meio de uma magnífica diversidade de culturas e formas de
vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Devemos
somar forças para gerar uma sociedade sustentável global baseada no respeito pela natureza, nos
direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz.
[...]
a. Reconhecer que a liberdade de ação de cada geração é condicionada pelas necessidades das
gerações futuras.
b. Transmitir às futuras gerações valores, tradições e instituições que apoiem, em longo prazo, a
prosperidade das comunidades humanas e ecológicas da Terra.
Assim como muitos outros direitos humanos, “garantir as dádivas e a beleza da Terra para as atuais e as
futuras gerações” não é uma tarefa simples. Isso envolve interesses bastante diversos: de distintos
grupos sociais, de distintos países e de modos de vida igualmente distintos. É bastante provável que
uma enquete a respeito da contenção do desmatamento receba respostas favoráveis: grande parte da
população mundial se pronuncia a favor de medidas de proteção de florestas. No entanto, pelo fato de
o desflorestamento ser necessário a certas demandas sociais, como o avanço agrícola, a construção de
barragens para a produção de energia elétrica e a exploração de minérios, quando se trata de
transformar as práticas sociais construídas sob os modelos econômicos vigentes, a adesão é menor.
Glossário
Recurso natural: elemento da natureza que serve à vida humana. É uma expressão que se refere a
elementos físicos do planeta que podem ser utilizados pelas sociedades para suprir as necessidades da
espécie humana.
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Atividade
1. Os mapas a seguir foram feitos com base em estimativas e possibilidades. O objetivo da autora é
alertar sobre a substituição das florestas por pastagem e terras agrícolas. Observe-os e faça o que
se pede.
© DAE/Sonia Vaz
Fonte: RAISSON, Virginie. 2033: atlas des futurs du monde. Paris: Robert Laffont, 2010. p. 144.
© DAE/Sonia Vaz
Fonte: RAISSON, Virginie. 2033: atlas des futurs du monde. Paris: Robert Laffont, 2010. p. 144.
• A Carta da Terra menciona, em diversos trechos, a formação de uma “sociedade civil global”.
Observe a distribuição desigual das florestas e pradarias e discuta com os colegas a necessidade do
estabelecimento de regras globais de uso e apropriação dos recursos naturais.
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1. (Enem) Compreende-se assim o alcance de uma reivindicação que surge desde o nascimento da
cidade na Grécia antiga: a redação das leis. Ao escrevê-las, não se faz mais que assegurar-lhe
permanência e fixidez.
As leis tornam-se bem comum, regra geral, suscetível de ser aplicada a todos da mesma maneira.
VERNANT, J. P. As origens do pensamento grego. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1992 (adaptado).
Para o autor, a reivindicação atendida na Grécia antiga, ainda vigente no mundo contemporâneo,
buscava garantir o seguinte princípio:
2) O fim da propriedade privada, como resultado direto dos ideais inscritos na Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão, declara inspiração socialista.
Responda no caderno
a) Direitos humanos são aqueles que estão previstos de forma expressa em uma Constituição e que
se referem somente a direitos das pessoas que respondem a um inquérito ou a um processo penal.
b) Considerando o que prevê a Constituição de 1988, os direitos humanos se dão por meio da
propriedade, que se impõe como um valor incondicional e insubstituível, que não admite
equivalente.
e) Como os direitos humanos são inerentes à natureza humana, somente derivam do espírito
humano e não devem ser positivados nas leis.
• O que são direitos humanos?, de João Ricardo W. Dornelles. São Paulo: Brasiliense, 2007. Apresenta
um estudo sobre as principais lutas políticas que buscaram assegurar (ou eliminar) os direitos das
pessoas nos últimos dois séculos, além de discutir as diferentes concepções do que seriam os direitos
fundamentais do ser humano e como é possível garanti-los a todos.
• Você é livre!, de Dominique Torres. São Paulo: Autêntica, 2012. O livro conta a história de Amsy e sua
família que, em pleno século XXI, ainda são escravos de um grupo de tuaregues. Em uma manhã, um
homem desconhecido se propõe a levá-lo para a cidade, onde ele poderá viver livre, porém, para isso,
Amsy precisará lutar muito e vencer barreiras pessoais.
2A dominação da América e a
visão do outro
Neste capítulo
A visão do outro: europeus e americanos
A chegada dos europeus à América
A América antes dos europeus
A conquista da América
O mercado de Tlatelolco, detalhe do mural A grande cidade de Tenochtitlan, de Diego Rivera, 1945.
Eram universos culturais distintos uns dos outros e também do universo dos europeus que
aqui chegaram.
No final do século XV, em 1492, os espanhóis aportaram em terras americanas e, em 1500, foi a vez dos
portugueses. A partir daí, começou o processo de conquista e colonização do continente por povos da
Europa. Nos anos seguintes, diversos deles, como os franceses, ingleses e holandeses, desembarcaram
em terras americanas, formando colônias e buscando riquezas.
Dessa forma, em vários lugares do continen te americano, no decorrer do século XVI, europeus foram se
organizando e tomando posse de terras que já eram habitadas por comunidades com raízes culturais há
muito definidas. Esses povos estavam distribuídos por diferentes pontos do continente e organizavam-
se em sociedades com características próprias, muitas delas altamente complexas, causando admiração
aos recém-chegados.
© DAE/Studio Caparroz
Fonte: ARRUDA, José Jobson de A. Atlas histórico básico. 17. ed. São Paulo: Ática, 2011. p. 19.
© DAE/Studio Caparroz
Fonte: ARRUDA, José Jobson de A. Atlas histórico básico. 17. ed. São Paulo: Ática, 2011. p. 19.
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de gêneros cuja extração ou produção gerasse acúmulo de riquezas nos cofres europeus. Esse fato,
somado à grande importância da religião na cultura europeia, contribuiu para que os costumes
europeus fossem impostos em detrimento dos costumes nativos.
Assim, inicialmente, o contato entre europeus e povos nativos alterou os costumes vigentes nas terras
encontradas. Com menor impacto, os conquistadores defrontaram-se com realidades e costumes
diferentes dos conhecidos na Europa. Além da relação América-Europa, a colonização do novo
continente alterou a realidade africana, com a implantação do sistema de trabalho escravista, que
realocou milhares de africanos para suprir a necessidade de mão de obra na América.
As relações que se seguiram à chegada dos europeus com a chamada conquista da América (e também
de outros continentes) foram de dominação, trocas culturais, assimilação e destruição de muitas das
organizações sociais nativas. Nessas relações, a inexistência da noção de direitos humanos – somada à
certeza dos europeus de que seu modo de vida e religião eram os corretos –, além da intenção de
explorar as novas terras, contribuíram para a desintegração quase completa de diversas culturas nativas.
É possível afirmar que a colonização das Américas, assim como a que ocorreu em outros lugares no
período, seguindo a lógica das expansões marítimas e comerciais, foi um processo marcado pelo
etnocentrismo – os europeus priorizaram suas crenças e objetivos comerciais, deixando de lado os
costumes preestabelecidos pelos povos nativos.
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Encontro do navegador e conquistador espanhol Francisco Pizarro com a população inca no Peru. Gravura de Theodore de Bry
para o livro Historia Americae, publicado em 1602.
Organizando ideias
Leia a charge, reflita sobre a mensagem e depois faça o que se pede.
http://www.evanscartoons.com
Página 40
Foram elaboradas diversas teorias sobre esse assunto, e a mais popular é a teoria de Betty Meggers
(1921), que defende a ideia de que os primeiros habitantes das Américas teriam vindo da Ásia, por meio
do atual Estreito de Bering, durante a Era Glacial. Essa teoria se vale do seguinte argumento: um grande
volume de águas teria sido retido pelo surgimento de extensas geleiras, o que, estima-se, entre 30 mil e
10 mil anos atrás, abriu um caminho terrestre raso o suficiente para ser percorrido por seres humanos,
possibilitando assim a penetração dos asiáticos no continente americano.
Um pesquisador mais antigo, Paul Rivet (1876-1958), afirmava que os primeiros habitantes americanos
teriam vindo da região da Oceania por meio do Oceano Pacífico. Ele acreditava ter cumprido a função de
interligar a Ásia, a Oceania e o Novo Mundo. Essa conclusão se deve ao fato de os vestígios dos
primeiros americanos encontrados terem traços semelhantes aos da população oriental atual.
© DAE/Studio Caparroz
Fonte: DUBY, Georges (Dir.). Atlas histórico mundial. 3. ed. Barcelona: Larousse Editorial, 2011. p. 14-15.
Entre as inúmeras opiniões, há ainda a da arqueóloga brasileira Niède Guidon (1933), que defende a
tese da origem
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múltipla dos primeiros habitantes da América. Ela chegou a essa conclusão por meio do estudo do sítio
arqueológico de Pedra Furada, no Piauí. Segundo ela, nos últimos 100 mil anos, diferentes povos
chegaram a nosso continente das mais variadas maneiras, porém deixa claro que o estudo está focado
em desvendar a história dos povos que habitaram a região do Piauí, e não o continente todo.
As controvérsias das teorias não dizem respeito apenas às vias de acesso dos primeiros habitantes
americanos, mas também à época em que chegaram.
Algumas teorias afirmam que a presença humana na América teria começado entre 40 mil e 12 mil anos,
mas nem todas as linhas de pesquisa aceitam esse período.
Os vestígios arqueológicos humanos mais antigos encontrados nas Américas são de indivíduos de
comunidades do México, América Central, Equador e Bolívia, que viviam, aparentemente, em pequenos
grupos, da caça e coleta de alimentos. Com o passar do tempo, esses povos foram avançando em
direção ao sul, o que, segundo os pesquisadores, caracterizou uma grande mudança de ambiente, que
favoreceu a transformação dos meios de vida e dos hábitos de nossos ancestrais americanos, incluindo o
desenvolvimento da agricultura.
Apesar de não ser possível confirmar concretamente nenhuma das teorias sobre a chegada dos
primeiros habitantes à América, grandes discussões têm ocorrido ao longo dos muitos anos de pesquisa,
e é a própria imprecisão e impossibilidade de uniformização das afirmações que faz com que todas elas
tenham as mesmas chances de aceitação.
Organizando ideias
Pensando a respeito da origem dos povos americanos, responda às questões seguintes.
1. Quais são as teorias citadas no texto sobre o povoamento da América? O que elas afirmam?
2. Em sua opinião, por que as pesquisas sobre a chegada dos primeiros habitantes ao continente
americano divergem tanto?
Página 42
Foram vários os acontecimentos que impulsionaram essa expansão. Entre eles, destacamos a tomada de
Constantinopla pelos turcos, que prejudicou o lucrativo comércio de especiarias entre o Ocidente e o
Oriente e intensificou a necessidade de os europeus encontrarem novas rotas comerciais. Além disso, o
aperfeiçoamento das técnicas de navegação, o surgimento das caravelas e a invenção de novos
instrumentos náuticos foram fundamentais para a expansão europeia dos séculos XV e XVI.
Colombo realizou ainda mais três viagens à América (1493-1494; 1498; 1502-1504), sempre acreditando
tratar-se da Ásia Oriental. O nome América apareceu pela primeira vez em um mapa de Martin
Waldseemüller (1507), como homenagem ao navegador florentino Américo Vespúcio, que, na obra
Mundus Novus (Novo Mundo), relatara suas viagens ao novo continente.
Em seus contatos com os povos originários da América, Colombo escreveu que nunca tinha encontrado
pessoas de tão bom coração e tanta franqueza, e descreveu os indígenas como curiosos e amistosos
com os desconhecidos. No entanto, desde o primeiro momento, deixou claros seus objetivos
colonizadores construindo um forte e aprisionando alguns indígenas para enviá-los como curiosidade ao
rei Fernando e à rainha Isabel, da Espanha.
Coleção particular
Martin Waldseemüller. Mapa Universalis cosmographia secundum Ptholomaei traditionem et Americi Vespucii alioru[m]que
lustrationes, 1507. Xilogravura, 1,37 m × 1,44 m.
Página 43
A atitude de Colombo para com os índios decorre da percepção que tem deles. Podemos distinguir,
nesta última, duas componentes, que continuarão presentes até o século seguinte e, praticamente,
até os nossos dias, em todo o colonizador diante do colonizado. Estas duas atitudes já tinham sido
observadas na relação de Colombo com a língua do outro. Ou ele pensa que os índios (apesar de
não utilizar estes termos) são seres completamente humanos com os mesmos direitos que ele, e aí
considera-os não somente iguais, mas idênticos e este comportamento desemboca no
assimilacionismo, na projeção de seus próprios valores sobre os outros ou então parte da
diferença, que é imediatamente traduzida em termos de superioridade e inferioridade (no caso,
obviamente, são os índios inferiores): recusa a existência de uma substância humana realmente
outra, que possa não ser meramente um estado imperfeito de si mesmo. Estas duas figuras básicas
da experiência da alteridade baseiam-se no egocentrismo, na identificação de seus próprios valores
com os valores em geral, de seu eu como o universo; na convicção de que o mundo é um.
TODOROV, Tzvetan. A conquista da América. São Paulo: Martins Fontes, 2003. p. 51.
A partir do século XVI, os espanhóis instalaram-se nos territórios americanos, apropriaram-se deles e
submeteram a população local pela força, assumindo desse modo o controle da região.
Coleção particular
Representação do primeiro encontro entre Cristóvão Colombo e nativos americanos. Litografia colorida à mão, de D. K. Bonatti,
1827.
Organizando ideias
O texto a seguir é do cronista Gonzalo Fernandes de Oviedo, que descreve, no século XVI, a
conquista espanhola da América.
O Almirante Colombo encontrou, quando descobriu esta ilha Hispaniola, um milhão de índios e
índias [...] dos quais, e dos que nasceram desde então, não creio que estejam vivos, no presente
ano de 1535, 500, incluindo tanto crianças como adultos, que sejam naturais, legítimos e da raça
dos primeiros índios [...]. Alguns fizeram esses índios trabalhar excessivamente. Outros não lhes
deram nada para comer como bem lhes convinha. Além disso, as pessoas desta região são
naturalmente inúteis, corruptas, de pouco trabalho, melancólicas, covardes, sujas, de má condição,
mentirosas, sem constância e firmeza [...]. Vários índios, por prazer e passatempo, deixaram-se
morrer com veneno para não trabalhar. Outros se enforcaram pelas próprias mãos. E quanto aos
outros, tais doenças os atingiram que em pouco tempo morreram [...]. Quanto a mim, eu
acreditaria antes que Nosso Senhor permitiu, devido aos grandes, enormes e abomináveis pecados
dessas pessoas selvagens, rústicas e animalescas, que fossem eliminadas e banidas da superfície
terrestre [...].
OVIEDO, Gonzalo Fernandes de. In: ROMANO, Ruggiero. Mecanismos da conquista colonial. São Paulo: Perspectiva, 1973. p. 76.
2. Segundo o autor, qual foi a justificativa para o massacre dos nativos americanos?
Após o retorno de Vasco da Gama, a Coroa portuguesa enviou uma nova expedição para formalizar as
relações comerciais com as Índias. Essa expedição, que partiu de Portugal em março de 1500, era
comandada por Pedro Álvares Cabral, que, propositalmente ou não, desembarcou em terras ao sul do
atual estado da Bahia em 22 de abril de 1500.
Assim como as regiões a que os espanhóis chegaram, a porção sul da América era habitada por povos
étnica e culturalmente diferentes, espalhados por um imenso território.
Os contatos iniciais foram pacíficos, conforme relata o escrivão Pero Vaz de Caminha na carta escrita ao
rei de Portugal, Dom Manuel, descrevendo as terras e os povos que habitavam a Ilha de
Vera Cruz, primeiro nome dado às terras que hoje formam o Brasil. Nas expedições dos anos seguintes,
eles perceberam que não se tratava de uma ilha e alteraram o nome para Terra de Santa Cruz.
A primeira riqueza encontrada nessas terras e enviada à Europa foi o pau-brasil, árvore abundante, de
cujo tronco se extraía um corante para tecidos de alto valor comercial. Nas primeiras décadas (1500-
1530), os portugueses vieram ao Brasil basicamente para extrair pau-brasil. Essa árvore acabou
inspirando um apelido para as novas terras portuguesas: Terra do Brasil.
Inseridos no modo de pensar europeu, os portugueses não procuraram compreender o universo cultural
do indígena. Sua concepção de mundo estava fundamentada na religião e nas práticas mercantilistas, e
era difícil entender as crenças e práticas dos nativos que cultuavam elementos da natureza e praticavam
(alguns grupos) a antropofagia. Os nativos também não entendiam o conceito europeu de propriedade
da terra ou de exploração de seus recursos naturais para a obtenção de lucro.
Cartografia Histórica/USP, São Paulo
Giacomo Gastaldi, Giovanni Battista Ramusio. Delle navigazioni e viaggi, 1556. Aquarelado à mão, 29,8 cm × 39,2 cm. Neste
mapa, é possível visualizar a retirada do pau-brasil pelos indígenas, que o entregavam aos portugueses em troca de utensílios
europeus, numa relação de escambo.
A relação dos indígenas com a terra era bem diferente da estabelecida pelos europeus. Além de usufruir
coletivamente dela, os nativos identificavam nos elementos naturais suas representações religiosas.
Página 45
Dessa forma, não tinham a intenção de explorar a terra com exclusividade, uma vez que eles se
consideravam parte dos elementos presentes nela.
Antropofagia é o ato de um ser humano ingerir uma ou várias partes do corpo de outro ser humano
durante um ritual mágico ou cerimonial.
A antropofagia era comum em diversas comunidades espalhadas por quase todos os continentes, já que
muitos povos cultivavam a crença de que, ao se alimentar da carne de seus inimigos, podiam tomar para
si as melhores características deles.
Organizando ideias
O trecho a seguir é parte da carta escrita por Pero Vaz de Caminha ao rei de Portugal, na ocasião da
chegada dos portugueses a terras americanas. Leia-o e depois faça o que se pede.
Até agora não pudemos saber se há ouro ou prata nela, ou outra coisa de metal, ou ferro; nem lha
vimos. Contudo a terra em si é de muito bons ares frescos e temperados como os de Entre-Douro-
e-Minho, porque neste tempo d’agora assim os achávamos como os de lá. Águas são muitas;
infinitas. Em tal maneira é graciosa que, querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo; por causa das
águas que tem!
Contudo, o melhor fruto que dela se pode tirar parece-me que será salvar esta gente. E esta deve
ser a principal semente que Vossa Alteza em ela deve lançar. E que não houvesse mais do
que ter Vossa Alteza aqui esta pousada para essa navegação de Calicute bastava. Quanto mais,
disposição para se nela cumprir e fazer o que Vossa Alteza tanto deseja, a saber, acrescentamento
da nossa fé!
CAMINHA, Pero Vaz. A carta. Disponível em: <www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000292.pdf>. Acesso em: mar.
2016.
1. No trecho da carta ao rei de Portugal, o autor reafirma o objetivo mercantil que norteava a
Expansão Marítima portuguesa nos séculos XV e XVI. Explique essa afirmação.
2. De acordo com a visão religiosa católica dos portugueses, eles deveriam “salvar” os indígenas.
Essa visão é etnocêntrica? Explique.
Contestando o controle do novo continente exercido por Portugal e Espanha, a Inglaterra passou a
praticar pirataria realizando muitos saques às riquezas carregadas pelas embarcações das potências de
então.
Glossário
Entre Douro e Minho: região ao Norte de Portugal situada entre o Rio Ninho (ao norte) e o Rio Douro
(ao sul).
Página 46
A Inglaterra, todavia, não se concentrou apenas em roubar os navios ibéricos. No fim do século XV, a
Coroa inglesa nomeou encarregados para explorar a América e, na década de 1580, a rainha Elizabeth I
concedeu permissão para que a colonização na região fosse iniciada.
A princípio, o projeto de colonização inglês era parecido com os projetos ibéricos, nos quais o soberano
europeu concedia partes das novas terras a nobres, que passavam a ser responsáveis por seu
povoamento e desenvolvimento econômico.
Mesmo assim, os ingleses inicialmente tiveram muitas dificuldades para se instalar nas novas terras, pois
sofreram com doenças e ataques indígenas. No entanto, a partir de 1600, o grande aumento da
população nas cidades inglesas fez com que a ideia de uma colônia que abrigasse parte dessas pessoas e
ainda gerasse acúmulo de riquezas fosse vista com simpatia.
A partir de então, muitos grupos de pessoas, chamados de companhias, com diferentes objetivos,
dirigiram-se para a América com o apoio financeiro da Coroa inglesa. Órfãos, mu - lheres pobres e
grupos religiosos, entre outros, passaram a ocupar o território da América do Norte lentamente, dando
início ao que se tornaria as Treze Colônias inglesas e, mais tarde, os Estados Unidos.
Currier & Ives. A chegada dos peregrinos em Plymouth. Gravura, nov. 1620.
Organizando ideias
O texto a seguir aborda aspectos da colonização inglesa na América do Norte. Leia-o e depois faça
o que se pede.
O processo de êxodo rural estava acentuando-se no decorrer do século XVII. Esse processo
inundava as cidades inglesas de homens sem recursos. A ideia de uma terra fértil e abundante, um
mundo imenso e possível de enriquecer a todos era um poderoso ímã sobre essas massas.
Naturalmente as autoridades inglesas também viam com simpatia a ida desses elementos para
lugares distantes. A colônia serviria, assim, como receptáculo de tudo que a metrópole não
desejasse. [...]
Em 1620, a Companhia de Londres [empresa responsável pela colonização na América] trazia cem
órfãos para a Virgínia. Da mesma maneira, mulheres eram transportadas para serem leiloadas no
Novo Mundo. É natural concluir que estas mulheres, dispostas a atravessar o oceano e serem
vendidas na América como esposas, não eram integrantes da aristocracia intelectual ou financeira
da Inglaterra.
KARNAL, Leandro et al. História dos Estados Unidos: das origens ao século XXI. São Paulo: Contexto, 2007. p. 44-45.
1. De acordo com o autor, o que levava a Coroa inglesa a incentivar a imigração para a América?
2. Analisando as informações, descreva o perfil dos imigrantes ingleses que iam para a América.
3. Compare a imagem de Currier & Ives com o texto de Leandro Karnal. Anote as semelhanças e
diferenças no modo como os ingleses que vieram colonizar a América do Norte são representados.
Página 47
A procura e a interpretação desses vestígios feitas pelos arqueólogos – que buscam, em objetos,
pinturas e outros registros, indícios de costumes, cultos religiosos, hierarquia social, alimentação,
hábitos funerários, entre outras pistas – possibilitam-nos entender melhor as sociedades ameríndias
anteriores à chegada dos europeus.
Um grande desafio surge quando não há documentação escrita produzida pela sociedade
estudada, naquilo que chamamos, por convenção, de Pré-História. O historiador que se volta para
o passado mais recuado confronta-se com vestígios materiais, em geral, muito limitados. Ossos
fossilizados de animais e/ou de humanos, indícios de ocupação no solo, como fogueiras ou buracos
feitos por suportes de barracas, restos de objetos de pedra, ou líticos, e, nos casos mais recentes,
de cerâmica. Como então avançar na pesquisa? [...]
Na pesquisa e na análise histórica, as fontes que surgem integram-se ao que já é conhecido sobre a
sociedade estudada e sobre as sociedades humanas, em geral, e em particular sobre aquelas
semelhantes ou comparáveis àquela que nos interessa. No caso das sociedades sem escrita, há que
se estudar, antes, o que se disse ou se registrou sobre tais sociedades, o que se sabe sobre o papel
da oralidade nesses grupos sociais, as relações pessoais e face a face, sua interação com o meio
ambiente, sua religiosidade. São, portanto, leituras de caráter metodológico, antropológico e
filosófico que devem ser feitas pelo pesquisador.
FUNARI, Pedro Paulo. Os historiadores e a cultura material. In: PINSKY, Carla Bassanezi (Org.). Fontes históricas. São Paulo:
Contexto, 2006. p. 94-95.
Durante longo período, o continente americano foi povoado por caçadores e coletores. Somente por
volta de 5000 a.C. iniciou-se na região um processo que culminou na agricultura. Esse processo não
abrangeu todas as sociedades, e aquelas que desenvolveram a agricultura não o fizeram da mesma
forma.
Enquanto alguns grupos de nativos americanos mantiveram a caça e a coleta como atividades principais
– como os esquimós, que habitavam as regiões geladas –, outros incorporaram também a agricultura a
suas atividades, por exemplo, algumas sociedades indígenas brasileiras. Outras sociedades – como a dos
maias, astecas e incas –, por sua vez, organizaram-se em torno de Estados, com uma hierarquia bem
definida e construção de grandes centros habitacionais e áreas agrícolas capazes, inclusive, de produzir
excedentes utilizados em relações de troca de produtos.
Os maias
A civilização maia desenvolveu-se na Península de Yucatán, onde hoje é o sul do México, Guatemala,
Belize e partes de El Salvador e Honduras.
A mais antiga inscrição maia data de 292 a.C. e foi encontrada em Tikal, atual Guatemala. Contudo,
sabe-se que essa civilização começou a se desenvolver muito antes e foi influenciada culturalmente por
povos que a antecederam na região, destacando-se os olmecas, zapotecas e teotihuacanos.
A base da economia maia era a agricultura. As terras eram cultivadas coletivamente, porém os
camponeses tinham de pagar tributos pelo seu uso, já que, em última instância, elas pertenciam ao
Estado.
Do ponto de vista político, os centros urbanos estavam ligados a vários tipos de “confederações” ou
“reinos”. Uma elite formada por sacerdotes e militares detinha o poder e executava as cerimônias
religiosas. À frente dos “reinos”, estava o halac uinic (o “homem verdadeiro”), uma espécie de rei-
sacerdote. Corporações de artistas, artesãos, camponeses e escravos completavam o quadro social.
Os maias eram politeístas, sua religião deificava a natureza e seus cultos eram singulares. Os ritos
sacrificais tinham um papel fundamental na religião. Eles acreditavam que o sangue humano era o que
tinham de melhor para oferecer às divindades, procurando nutri-las para mostrar agradecimento ou
apaziguá-las em caso de escassez ou seca. Sacrificavam também animais, especialmente o jaguar. Os
sacrifícios acompanhavam todos os tipos de cerimônias: coroações de soberanos, festas do calendário,
casamentos dos monarcas e ritos de consagração dos templos. Havia também o autossacrifício, que
consistia na oferta do próprio sangue obtido pela punção de certas partes do corpo. Reis, rainhas e
sacerdotes perfuravam a própria língua e os órgãos sexuais com instrumentos pontiagudos. Essa prática,
junto com a dança e a ingestão de substâncias alucinógenas, levava-os a um estado de transe e a ter
visões alucinatórias. O autossacrifício era realizado para alimentar a terra visando a boas colheitas.
Em razão da falta de registros precisos, não podemos afirmar com segurança quais foram os motivos
que levaram ao declínio da sociedade maia. Entretanto, acredita-se que, por volta do ano 900, tenha
começado um processo de desestruturação social que levou a população a abandonar os grandes
centros e a se dispersar. Supõe-se que, com a queimada e a devastação das matas, causadas pela
agricultura itinerante, houve desgaste do solo, dificultando a alimentação da população, então já bem
numerosa. Nesse contexto, ocorreram muitas revoltas internas motivadas pela falta de alimentos e de
recursos, o que, somado a um longo período de seca e à invasão da Península de Yucatán, fragmentou
gradativamente a sociedade maia.
World History Archive/Ann Ronan Collection/Easypix Brasil
Afresco do século XI, localizado no sítio arqueológico de Bonampak (Chiapas, México). Na imagem vemos o chefe (chamado de
Batabob) vestindo uma roupa cerimonial feita com pele de jaguar.
Depois que abandonaram os grandes centros urbanos, os maias voltaram a se reorganizar ao norte da
Península de Yucatán. Essa fragmentação tornou possível a conquista do território pelos espanhóis, que
chegaram à península em 1511 e depois no final da década de 1520. O fato de a sociedade maia ter se
dispersado nas regiões ao norte da península fez com que o processo de dominação pelos espanhóis
acontecesse lenta e gradualmente, mas não de modo menos incisivo, já que a estratégia de colocar uma
região contra a outra causou grandes guerras entre os diferentes agrupamentos maias.
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Organizando ideias
1. Com base em seus conhecimentos sobre a sociedade maia, responda às questões.
b) De que forma a organização dos maias, no começo do século XVI, facilitou a conquista espanhola
da Península de Yucatán?
Na antiga língua maia, “Popol” significa reunião, comunidade, casa, junta; e “Vuh”, árvore de cujo
corte se fazia papel, por extensão, livro. Popol Vuh é o mais precioso relato – e legado – da
antiguidade americana; é o livro sagrado dos índios que habitavam uma região onde é hoje a
Guatemala. É em essência um conjunto mítico e teogônico, dividido em três partes: a primeira é
uma descrição da origem do mundo e da criação do homem; a segunda trata das aventuras dos
jovens semideuses Hunahpu e Ixbalanqué no reino sombrio de Xibalbay; e, finalmente, a terceira
parte refere-se à origem dos povos indígenas da Guatemala, suas guerras e emigrações, com o
predomínio dos quíchua-maias até pouco antes da conquista espanhola. O livro teria sido escrito
no começo do século XVI, possivelmente em pele de veado, e foi transcrito para o latim em 1542,
por frei Alonso Del Portillo de Noreña. A versão espanhola apareceu em 1701, feita pelo frei
Francisco Ximenez.
COSTA, Flávio Moreira da. Uma flor misteriosa, solitária, na imensidão da América adormecida. In: _______ (Org.). Os melhores
contos da América Latina. Rio de Janeiro: Agir, 2008. p. 15.
Os astecas
Ao chegar ao México, vindos da região de Aztlán, os astecas (ou mexicas), guerreiros conquistadores,
foram paulatinamente influenciados pelas culturas toltecas e zapotecas, que já estavam em declínio.
Por volta de 1325, os mexicas fundaram Tenochtitlán, que se tornou uma das mais importantes cidades
astecas. Depois de violentas lutas durante o reinado de Itzcoatl (Serpente de Obsidiana), este, em
aliança com o governante de Texcoco, formou a Tríplice Aliança (Tenochtitlán, Texcoco e Tlacopán).
IT–ip Images/Glow Images
Segundo a lenda, o deus Huitzilopochtli ordenou aos mexicas que se estabelecessem onde encontrassem “uma águia num cacto,
em uma ilhota, devorando uma serpente”. Na região pantanosa do Lago Texcoco, fundaram Tenochtitlán. A atual Cidade do
México foi construída sobre as ruínas da capital dos astecas. Acima, página inicial do Codex Mendoza apresentando o mito
fundador, 1548.
Os astecas chamavam a si mesmos de mexicas, e eram chamados assim também pelos espanhóis. O
termo asteca deriva de aztecatl que, na língua nativa dos mexicas, designava os povos vindos da região
de Aztlán, sua terra natal, segundo a lenda. Essa denominação passou a ser utilizada pela historiografia a
partir do século XIX, popularizando-se desde então.
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O fortalecimento militar, combinado com a confiança que os mexicas tinham em seu próprio destino,
possibilitou a contínua expansão política e econômica. Povos de línguas e costumes diferentes – como
os totonacas, huaxtecas, mixtecas, zapotecas e outros – foram submetidos de maneiras diversas pelos
mexicas.
Com relação à estrutura social, sabe-se que a sociedade asteca era estratificada e diretamente
relacionada com a hierarquia política e econômica. O grupo dominante, dividido em vários níveis
hierárquicos, referentes a cargos e títulos diversos, controlava os altos cargos administrativos e não
pagava tributos. Ciosos de seus privilégios, os nobres teriam forjado a imagem de que eles eram os
responsáveis pela urbanização e embelezamento da cidade, pelo estabelecimento de rotas comerciais,
por artes e ofícios, pela propagação da língua náhuatl, pela boa administração e pela manutenção e
renovação do Sol e da humanidade por intermédio das oferendas, cujo objetivo era a restauração da
energia divina. O poder político era centralizado e o tlatoani (“aquele que fala” ou “que comanda”) era
eleito vitaliciamente pela elite mexica.
Os escravos, situados na faixa mais baixa da escala social, tinham um estatuto curioso.
Trabalhavam sem salário, eram bem tratados e moravam na casa de seus donos, que os
alimentavam e vestiam.
As dívidas de jogo eram a causa mais corrente da escravatura, pois, diante da impossibilidade de
pagá-las, os devedores ofereciam-se volun - tariamente para a ocupação servil. Em outros casos,
uma família que passava necessidades vendia um de seus membros. E, entretanto, esse estatuto
não era perpétuo: o escravo ou seus parentes podiam comprar de volta a liberdade, e seus filhos,
ne cessariamente, nasciam livres. Além disso, não se podia vendê-los sem seu consentimento.
ACOSTA, Rosário. Astecas: da grandeza à tragédia. História viva, São Paulo, Duetto Editorial, ano 4, n. 44, p. 46.
Os mexicas estabeleceram uma área de comércio intenso na qual os produtos eram exibidos por
setores. Na ala dos comestíveis havia feijões, pimenta, cebolas, sal, coelhos, rãs, patos, peixes,
cachorros, mel, perus, girinos e milho de diversas variedades. Na ala das vestimentas havia tangas,
casacos de peles de coelho, de raposa e de jaguar. No mercado de Tlatelolco era possível comprar
utensílios de obsidiana, sílex, cerâmica policromada e louças de vários tipos. Os comerciantes, chamados
de pochtecas, constituíam um grupo social diferenciado, que, além dos produtos trazidos pelos
mercadores, recebiam tributos pagos pelos povos dominados.
O milho era a base da alimentação, além de legumes, amendoins, flores, formigas, vermes, insetos,
gafanhotos, perdizes, rãs, pombos, coelhos e até moscas. As mulheres cuidavam da casa, da tecelagem,
dos filhos e do preparo de alguns alimentos.
A principal atividade econômica era a agricultura. Cultivavam-se milho, feijão, baunilha, pimenta,
tomate e diversas espécies de algodão, amendoim, abóbora e cacau.
Os astecas adotavam um calendário solar com 18 meses de 20 dias, mais um décimo nono mês de cinco
dias, perfazendo 365 dias. A cada ciclo de 104 anos, acrescentavam 25 dias. Havia também um
calendário divinatório de 260 dias. Os dois calendários só começavam no mesmo dia de 52 em 52 anos –
era o ce-atl, que acreditavam trazer grandes mudanças, uma espécie de nova era.
A arquitetura asteca era grandiosa e sofisticada. A cidade de Tenochtitlán tinha pontes, canais, calçadas,
praças e avenidas. Os manuscritos hieroglíficos e pictográficos (chamados códices) atestam a habilidade
dos escribas-pintores, que, para escrever, usavam diversos materiais (pele de veado, panos de algodão
ou papéis produzidos com a casca da figueira ou do agave).
Calendário asteca esculpido em basalto. Também chamada de Pedra do Sol, a obra foi encontrada em 1790, tem 3,58 m de
diâmetro e está em exposição no Museu Nacional de Antropologia da Cidade do México (México).
Página 51
Já a religião mexica caracterizou-se pela variedade de manifestações, pelo politeísmo, pela origem
heterogênea e pelos sacrifícios aos deuses. Os astecas empreendiam as chamadas “guerras floridas”
(xochiyaoyaotl) para conseguir prisioneiros que, depois, seriam sacrificados. O texto a seguir aborda as
razões para os sacrifícios.
A missão do homem em geral, e mais particularmente da tribo asteca, povo do Sol, consistia em
conjurar infatigavelmente o assalto do nada. Para isso era preciso garantir ao Sol, à Terra e a todas
as divindades a “água preciosa”, sem a qual a engrenagem do mundo deixaria de funcionar: o
sangue humano. Dessa noção fundamental decorrem as guerras sagradas e a prática de sacrifícios
humanos. Ambas, segundo os mitos, iniciaram-se com a criação do mundo. O Sol exigia sangue: os
próprios deuses lhes haviam dado o seu; e depois homens, sob suas ordens, haviam exterminado
as serpentes de nuvens do Norte. Huitzilopochtli nasceu guerreando. A única exceção foi
Quetzalcóatl, símbolo das teocracias pacíficas da alta época clássica, que nada desejara sacrificar
senão borboletas, pássaros e serpentes. Tezcatiploca, porém, o vencera, e os deuses exigiam o seu
“alimento”.
SOUSTELLE, Jacques. A civilização asteca. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1987. p. 76.
Organizando ideias
O conquistador espanhol Bernal Diaz del Castilho registrou, em 1519, sua surpresa ao deparar-se
com a organização de um mercado da cidade asteca de Tenochtitlán.
[...] Quando lá chegamos, ficamos atônitos com a multidão de pessoas e a ordem que prevalecia,
assim como com a vasta quantidade de mercadorias [...]. Cada espécie tinha seu lugar particular,
que era distinguido por um sinal. Os artigos consistiam em ouro, prata, joias, plumas, mantas,
chocolate, peles curtidas ou não, sandálias e outras manufaturas de raízes e fibras de juta, grande
número de escravos homens e mulheres, muitos dos quais estavam atados pelo pescoço, com
gargalheiras, a longos paus. O mercado de carne vendia aves domésticas, caça e cachorros.
Vegetais, frutas, comida preparada, sal, pão, mel e massas doces, feitas de várias maneiras, eram
também lá vendidas. Outros locais na praça eram reservados à venda de artigos de barro,
mobiliário doméstico de madeira, tais como mesas e bancos, lenha, papel, canas recheadas com
tabaco misturado com âmbar líquido, machados de cobre, instrumentos de trabalho e vasilhame
de madeira profusamente pintado. Muitas mulheres vendiam peixe e pequenos “pães” feitos de
uma determinada argila especial que eles achavam no lago e que se assemelhava ao queijo. Os
fabricantes de lâminas de pedra ocupavam-se em talhar seu duro material e os mercadores que
negociavam em ouro possuíam o metal em grãos, tal como vinha das minas, em tubos
transparentes, de forma que ele podia ser calculado, e o ouro valia tantas mantas, ou tantos
xiquipils de cacau, de acordo com o tamanho dos tubos. Toda a praça estava cercada por “piazzas”
sob as quais grandes quantidades de grãos eram estocadas e onde estavam, também, as lojas para
as diferentes espécies de bens.
DEL CASTILHO, Bernal Diaz apud MEGGERS, Betty J. América pré-histórica. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985. p. 96-97.
2. O local descrito por Bernal pode ser comparado a uma cidade atual? Explique.
Glossário
Assaltar: no sentido utilizado no texto, pode ser entendido como ataque súbito, de surpresa.
Conjurar: tramar, reunir pessoas para fins comuns.
Infatigável: que não sente fadiga, incansável.
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Os incas
Na região da Cordilheira dos Andes, na costa oeste da América, desenvolveu-se um grande império: o
Império de Tawantinsuyu – que significa “quatro caminhos” –, também chamado de Império Inca. A
origem dos incas é incerta, mas sabe-se que eles se estabeleceram na região a partir do século XIV,
tendo Cuzco como o centro de seu império.
Ao longo do século XIV, uma série de monarcas guerreiros conquistou a hegemonia local e Cuzco passou
a ser o centro do mundo incaico.
Cada aldeia era habitada por um conjunto de famílias unidas por laços de parentesco ou aliança,
que representavam um ayllu. Esse grupo localizado e de tendência endogâmica não era, contudo,
nem um clã nem uma linhagem. No interior do ayllu, ao que parece, a filiação se traçava em linha
masculina direta para os homens e em linha feminina direta para as mulheres, de tal modo que os
homens descendiam de seu pai e as mulheres de sua mãe. Esse sistema de descendência paralela
era particularmente difundido nos Andes centrais e meridionais [...].
FAVRE, Henri. A civilização inca. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2004. p. 31-32.
F. A. Alba/Shutterstock.com
Glossário
Celibatário: solteiro, que não se casou.
Endogamia: casamento entre pessoas da mesma família.
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O chefe do ayllu era o kuraka, que, entre outras funções, distribuía terras, organizava os trabalhos
coletivos e era responsável pela resolução dos conflitos. O território do ayllu chamava-se marka. Cada
família tinha, para usufruto, lotes de terra. Extensas áreas de estepes eram utilizadas coletivamente
para a atividade agropastoril, com a criação da alpaca e da lhama, animais típicos da região.
A terra, em última instância, pertencia ao Império Inca, que recebia parte da produção e tinha o direito
de exigir a prestação de serviços dos súditos. Todos tinham de trabalhar, somente os inválidos e doentes
estavam dispensados. Os instrumentos de trabalho eram simples, como a enxada de madeira, chamada
taclla.
Os incas cultivavam cerca de 300 variedades de batata. Nos vales mais quentes, plantavam milho,
alimento muito importante para eles, com o qual também produziam uma bebida chamada de chicha.
Nas áreas úmidas, cultivavam a coca; a mastigação das folhas dessa planta reduzia a fome e o cansaço,
além de ter importância em rituais religiosos. Produziam, ainda, quinoa, arroz andino, amendoim e
legumes diversos. As técnicas agrícolas eram avançadas, com a construção de terraços e canais. O guano
(excremento de aves marinhas) era utilizado como fertilizante.
A sociedade inca era hierarquizada e subdividia-se em diversos grupos. No topo da pirâmide social
estava o sapa inca (o “único inca”), soberano absoluto e adorado como um deus.
Os incas construíram milhares de quilômetros de estradas pavimentadas, por meio das quais os correios
reais (chasquis) levavam e traziam mensagens com grande rapidez. Os templos e palácios, bem como as
fortalezas, destacam-se, ainda hoje, pelas técnicas de construção. As construções eram integradas às
paisagens andinas, como podemos observar em Machu Picchu e Ollantaytambo.
Em relação à produção de cerâmica e de tecido, os incas assimilaram os avanços das outras culturas
andinas. Havia um sistema de contabilidade baseado nos kipus, uma combinação de cordas com nós de
várias espessuras e cores, nos quais os diferentes números eram registrados com nós de tamanhos
diversos.
De Agostini/G. Dagli Ori/Getty Images
Ilustração que indica um contador inca e seu kipu. Gravura do séc. XVI.
Quanto à religião, os incas eram politeístas e idólatras. O culto ao Sol (Inti) ocupava lugar de destaque.
Acreditavam num deus criador, Viracocha, cultuavam os mortos e realizavam sacrifícios, principalmente
de animais, mas também de humanos. Os soberanos eram mumificados e guardados no templo do Sol.
Procissões, sacrifícios, danças, jejum e abstinência sexual caracterizavam o ritual dos diversos festivais
religiosos.
Organizando ideias
Analise as informações do texto e responda às questões.
Chamavam lei de irmandade à que mandava que todos os moradores de cada cidade se ajudassem
uns aos outros a lavrar, a semear, e a colher suas colheitas, e a lavrar suas casas, e outras coisas
desta sorte, e o fizessem sem levar pagamento nenhum. [...]
Tiveram lei sobre o gasto cotidiano, que lhes proibia o fausto com os vestidos ordinários, e as
coisas preciosas, como o ouro e a prata, e as pedras finas; eliminava totalmente o supérfluo dos
banquetes e comidas; e mandava que duas ou três vezes ao mês comessem juntos os moradores
de cada cidade diante de seus curacas, e se exercitassem em jogos militares ou populares para que
se reconciliassem os ânimos e guardassem perpétua paz, e para que os pastores e outros
trabalhadores do campo se alentassem e regozijassem. A lei em favor dos que chamavam pobres, a
qual mandava que os cegos, mudos e coxos, os entrevados, os velhos e velhas decrépitos, os
enfermos de longa enfermidade, e outros impedidos que não podiam lavrar suas terras para vestir
e comer por suas mãos e trabalho, os alimentassem dos depósitos públicos.
Também tinha a lei que mandava que dos mesmos depósitos públicos provessem os hóspedes que
recebessem, os estrangeiros, e peregrinos, e os caminhantes, para todos os quais tinham casas
públicas, que chamam corpahuaci, que é a casa de hospedagem, onde lhes davam de graça e em
abundância todo o necessário. Ademais disto, mandava a mesma lei que duas ou três vezes ao mês
chamassem aos necessitados, que acima os citamos, aos banquetes e refeições públicas, para que
com o regozijo comum aliviassem parte de sua miséria.
Outra lei chamavam caseira; continha duas coisas: a primeira que ninguém ficasse ocioso; pelo que,
como atrás dissemos, mesmo as crianças de cinco anos se ocupavam em coisas mui leves,
conforme sua idade; os cegos, coxos e mudos, se não tinham outras enfermidades, também o
faziam trabalhar em diversas coisas. A demais gente, enquanto tinha saúde, ocupava-se cada um
em seu ofício e benefício, sendo entre eles coisa de muita infâmia e desonra castigar em público a
alguém por ocioso.
Além disto, mandava a mesma lei que os índios comessem e ceassem com as portas abertas, para
que os ministros dos juízes pudessem entrar mais livremente a visitá-los. Porque havia certos juízes
que tinham o encargo de visitar os templos, os lugares e edifícios públicos e as casas particulares:
chamavam-se llactacamayu. Estes por si, ou por seus ministros, visitavam frequentemente as
casas, para ver o cuidado e diligência que tanto o varão como a mulher tinham acerca de sua casa e
família, e a obediência, solicitude e ocupação dos filhos.
LA VEGA, Garcilaso de. O universo incaico. São Paulo: Educ, 1992. p. 94-96.
Glossário
Coxo: manco.
Curaca: tipo de tigela utilizada nas refeições.
Decrépito: muito idoso ou enfraquecido fisicamente.
Entrevado: paralítico, que não pode se mover.
Fausto: luxo, ostentação.
Ordinário: no sentido em que aparece no texto, pode ser entendido como usual, comum, habitual.
Regozijar-se: alegrar-se, ter grande satisfação.
Página 55
Os nativos do Brasil
No território do Brasil atual, os portugueses entraram em contato com povos diversos. Havia grande
heterogeneidade étnica, linguística e cultural. A maioria dos grupos vivia da coleta, da caça e da pesca, e
alguns praticavam a agricultura.
Não há um consenso entre os especialistas sobre a quantidade de nativos que vivia no território hoje
pertencente ao Brasil quando ocorreu a invasão portuguesa. Os números oscilam entre 2,5 e 5 milhões
de pessoas pertencentes a centenas de povos. Cada povo tinha costumes e tradições próprios.
De forma geral, pode-se dizer que os povos indígenas se organizavam em aldeias fixas ou itinerantes (no
caso dos grupos nômades), dependendo do grupo.
A visão religiosa era semelhante, respeitando a diversidade de cada grupo. Cultuavam elementos e
algumas forças da natureza, como o Sol, a Lua, o trovão, as águas. Organizavam rituais, danças e festas,
criavam adornos e faziam pinturas corporais com motivos religiosos.
Não havia entre eles a noção atual de propriedade. A terra e o que nela fosse produzido ou coletado
eram bens comuns a todos da mesma aldeia.
As aldeias eram organizadas hierarquicamente e havia um chefe, responsável pela tomada de decisões e
pela liderança do grupo em caso de guerras. As decisões eram tomadas de acordo com os costumes de
cada grupo: alguns consultavam os membros masculinos ou os homens mais idosos, por exemplo.
Alguns grupos relacionavam-se com outros, mantendo contatos pacíficos e por vezes reunindo-se em
festas e rituais. Outros eram considerados inimigos e era comum guerrearem.
Os nativos produziam instrumentos e utensílios usados para caça, coleta, agricultura e armazenamento.
As técnicas de produção também diferiam entre os grupos, dependendo da cultura e do local onde
habitavam; alguns, por exemplo, usavam cerâmica queimada, outros não.
© DAE/Studio Caparroz
Fonte: ARRUDA, José Jobson de A. Atlas histórico básico. 17. ed. São Paulo: Ática, 2011. p. 35.
Página 56
Album/akg-images/Latinstock
Para os portugueses, o contato com os saberes dos indígenas foi muito importante. Eram os nativos que
conheciam as matas e seus recursos, como as plantas comestíveis ou as que podiam ser usadas como
remédios, bem como a localização de fontes de água.
O contato inicial dos portugueses foi com os tupis, habitantes do litoral. Por isso, os missionários que
fizeram parte da colonização do Brasil elegeram o tupi como língua geral, desconsiderando a imensa
variedade linguística entre os nativos.
Muitas manifestações culturais e línguas indígenas, que existiam quando os portugueses fizeram
contato com eles, permanecem entre seus descendentes nos diversos grupos indígenas atuais.
Os tupis se referiam aos demais grupos indígenas como tapuia, que quer dizer “inimigo”. Por isso, os
portugueses classificaram os indígenas brasileiros em dois grupos: tupis, os do litoral, e tapuia, os do
interior do território.
Organizando ideias
O texto a seguir é do francês Michel Eyquem de Montaigne (1533-1592), que escreveu sobre as
tradições culturais dos tupinambás. Esses povos eram criticados pelos europeus em razão dos
rituais de antropofagia, os quais Montaigne compara com as guerras realizadas pelos franceses em
nome da religião. Leia-o e depois responda às questões.
[…] não vejo nada de bárbaro ou selvagem no que dizem daqueles povos; e, na verdade, cada qual
considera bárbaro o que não se pratica em sua terra. […] Não me parece excessivo julgar bárbaros
tais atos de crueldade [o canibalismo], mas que o fato de condenar tais defeitos não nos leve à
cegueira acerca dos nossos. Estimo que é mais bárbaro comer um homem vivo do que o comer
depois de morto; e é pior esquartejar um homem entre suplícios e tormentos e o queimar aos
poucos, ou entregá-lo a cães e porcos, a pretexto de devoção e fé, como não somente o lemos mas
vimos ocorrer entre vizinhos nossos conterrâneos; e isso em verdade é bem mais grave do que
assar e comer um homem previamente executado. […] Podemos, portanto qualificar esses povos
como bárbaros em dando apenas ouvidos à inteligência, mas nunca se compararmos a nós
mesmos, que os excedemos em toda sorte de barbaridades.
MONTAIGNE, Michel de. Ensaios I. São Paulo: Nova Cultural, 2000. p. 199.
1. Montaigne considera os indígenas bárbaros ou selvagens? Como eles eram geralmente tratados
pelos europeus? Explique.
Havia tribos nômades e sedentárias que ocupavam a extensão entre os oceanos Atlântico e Pacífico.
Sioux (ou dacotas), apaches, comanches iroqueses, cheroquis, algonquinos, cheyennes e crow são
alguns dos grupos indígenas norte-americanos.
Nas regiões do Ártico, viviam os inuítes ou esquimós, com características bastante distintas dos demais
grupos em razão da adaptação a um ambiente extremamente hostil. A economia desse grupo estava
fundamentada na busca pelo que a natureza oferecia, como caça de focas e aves, pesca de baleia e
outros animais de grande porte. Dos animais caçados, aproveitavam a pele para o vestuário, e o marf im
e os ossos para a confecção de instrumentos de caça, como pontas de lanças e f lechas, além da
produção de esculturas. A domesticação do cachorro possibilitou aos esquimós o uso de trenós para
locomoção e caça.
Cada etnia indígena tinha seu idioma e, entre os grupos diferentes, a comunicação ocorria por meio de
sinais.
Entre as tribos nômades, uma das formas de obter alimentos era a caça de grandes animais, como
antílopes, alces, búfalos e bisões.
Dentre os grupos citados destacaram-se os iroqueses, que ocupavam a área dos Grandes Lagos e dos
Apalaches centrais. Sua organização social era matriarcal. Tinham uma forte estrutura guerreira, o que
lhes possibilitou resistir por quase dois séculos à dominação inglesa, dificultando a expansão das
colônias.
Heritage Images/Diomedia
Corrida de cavalos dos índios sioux próximo ao Forte Pierre. Ilustração do livro Travels in the Interior of North America,
publicado em 1843. A vida dos sioux, que habitavam a planície do oeste, foi modificada pelo uso do cavalo trazido pelos
espanhóis, prática que se espalhou pelo continente. As montarias facilitaram a caça de búfalos e bisões.
Página 58
Organizando ideias
Leia o texto a seguir e faça o que se pede.
Centenas de tribos indígenas habitavam a América do Norte até a chegada dos europeus. Há uma
variedade enorme nessas tribos: só em línguas diferentes encontraram-se mais de trezentas.
As opiniões dos colonos sobre os indígenas variaram, mas foram, quase sempre, negativas. [...] O
preconceito [...] não foi o único dano que os ingleses causaram aos índios. Mesmo se não fossem
agressivos, os europeus já seriam perigosos. A imigração europeia havia introduzido na América do
Norte doenças para as quais os nativos não tinham defesa. As epidemias nas colônias inglesas
atingiram os indígenas da mesma forma que nas áreas ibéricas. O sarampo matou milhares de
indígenas em toda a América.
A ocupação das terras indígenas por parte dos colonos baseava-se em argumentos de ordem
teológica. Os peregrinos haviam se identificado com o povo eleito que Deus conduzia a uma terra
prometida. Tal como Deus dera força a Josué (na Bíblia) para expulsar os habitantes da terra
prometida, eles acreditavam no seu direito de expulsar os que habitavam a sua Canaã. John Cotton,
pastor puritano, fez vários sermões nos quais destacou a semelhança.
Embora o fato seja bem pouco conhecido da História norte-americana, os índios também foram
escravizados. Os colonos das Carolinas, em particular, desenvolveram o hábito de vender índios
como escravos. Em 1708, a Carolina do Sul contava com 1.400 escravos índios. Essa prática
permaneceria até a Independência.
É natural imaginar uma reação indígena. A expansão agrícola por sobre áreas indígenas originou
violentos ataques às terras dos colonos. No começo da colonização, mais de uma aldeia inglesa foi
arrasada por ataques de índios, como, por exemplo, a de Wolstenholme, na Virgínia. [...]
De várias formas os índios resistiram à violência da colonização. Uma maneira comum era fugir
para o interior, estratégia que seria utilizada até o século XIX. [...] Ao longo dos séculos XVII e XVIII,
os índios fizeram várias alianças com franceses contra os ingleses.
É importante dizer, por fim, que nem todos os colonos tinham o mesmo grau de agressividade
contra os índios. Grupos quakers e menonitas recusavam a violência contra índios e também a
violência da compra de escravos negros. Porém, quakers, menonitas, católicos e puritanos
ocupavam de igual modo as terras que foram, originalmente, dos índios.
KARNAL, Leandro et al. História dos Estados Unidos: das origens ao século XXI. São Paulo: Contexto, 2007. p. 59-62.
1. A conquista de colônias na América pelos ingleses provocou a morte de milhares de indígenas.
Explique como isso ocorreu.
3. Quais eram as estratégias adotadas pelos indígenas para resistir à dominação inglesa?
4. Com base no que você estudou, compare a dominação espanhola com a dominação inglesa das
terras americanas e sua relação com a população nativa, ou seja, com os diversos povos indígenas
que ali viviam. Que semelhanças e diferenças você identifica?
Página 59
A conquista da América
A conquista da América pelos europeus não foi um acontecimento rápido. Foi um longo, contínuo e
complexo processo que durou vários séculos sob a visão etnocêntrica do colonizador europeu,
acrescida de outros elementos, como a dominação militar (principalmente no caso dos espanhóis), a
religiosidade e a desestruturação (demográfica, econômica, social e espiritual) provocada pelo choque
entre culturas tão distintas nas sociedades indígenas da América. A religião influenciou tanto os
dominadores, que impuseram suas crenças, quanto os dominados; os astecas, por exemplo,
interpretaram miticamente que a chegada dos espanhóis era o cumprimento de presságios e sinal de
novos tempos.
As primeiras décadas após a chegada europeia foram as mais marcantes. Estima-se que grande parte da
população nativa americana tenha sido dizimada nos primeiros 50 anos, principalmente na América
Hispânica. Portanto, o contato entre Europa e América pode ser considerado um dos mais violentos da
história da humanidade.
Ao mesmo tempo, a organização de algumas sociedades causava espanto, surpresa e admiração, como
pode ser observado na descrição da cidade de Tenochtitlán na imagem e no texto a seguir.
De modo simples, o etnocentrismo pode ser definido como uma visão de mundo fundamentada
rigidamente nos valores e modelos de uma dada cultura: por ele, o indivíduo julga e atribui valor à
cultura do outro a partir de sua própria cultura. Tal situação dá margem a vários equívocos,
preconceitos e hierarquias, que levam o indivíduo a considerar a sua cultura a melhor ou superior.
SILVA, Kalina Vanderlei; SILVA, Maciel Henrique. Dicionário de conceitos históricos. São Paulo: Contexto, 2006. p. 127.
The Bridgeman/Keystone Brasil
Glossário
América Hispânica: refere-se às regiões da América colonizada pelos espanhóis.
Página 60
BERNAND, Carmen; GRUZINSKI, Serge. História do Novo Mundo: da descoberta à conquista, uma experiência europeia (1492-
1550). São Paulo: Edusp, 1997. p. 347.
Já os costumes e modos de vida dos grupos indígenas causavam perplexidade aos recém-chegados.
Ainda que admirassem alguns aspectos, outros causavam rejeição e foram severamente combatidos,
como a nudez de alguns grupos ou práticas como politeísmo e poligamia. Para a maioria dos europeus,
os indígenas viviam em um estágio atrasado, sem normas e religião. Esse discurso foi a base da
exploração e do processo de colonização instituído, principalmente, com violência.
Os indígenas foram analisados com base nos parâmetros da sociedade europeia e apontados como
primitivos, brutos, sem alma, obscenos. Eram raros os defensores, como Frei Bartolomé de Las Casas e o
filósofo francês Michel de Montaigne.
A reação dos indígenas foi variada. A chegada de pessoas tão diferentes nos modos de vestir, agir e falar
deve ter causado curiosidade e estranheza. De maneira geral, foram amistosos, como nos relatos de
Colombo e Cabral. Em alguns casos, como entre os astecas, os colonizadores foram vistos como deuses,
e sua chegada, o cumprimento de profecias. Houve também casos de hostilidade, revelando que os
indígenas também resistiram à presença estrangeira.
Mesmo com reações diferentes a princípio, assim que perceberam a real intenção dos estrangeiros que
invadiam seu espaço e sua vida, os indígenas reagiram com lutas, fugas e até mesmo acordos. De
qualquer maneira, a chegada dos europeus significou, para os nativos, perda do território, necessidade
de deslocamento, escravidão e morte.
Organizando ideias
Leia o texto a seguir e responda às questões.
[...] Interessava aos conquistadores compreender, tomar e destruir, usando as palavras de Tzvetan
Todorov, o que fizeram com rapidez e obstinação. De outro lado, as civilizações do Novo Mundo
que cresceram e se desenvolveram de maneira autônoma, sem contatos com culturas muito
diferentes de seus padrões de comportamentos. Para incas, astecas e maias, paralisados por
dúvidas e incertezas, o problema era compreender o fato adverso surgido com a chegada dos
estrangeiros. Se, num primeiro momento, o aparecimento repentino daqueles estranhos homens
confirmava as antigas profecias que anunciavam a volta das divindades criadoras do Universo, mais
tarde eles foram qualificados como piores que diabos. Ao mesmo tempo que os estrangeiros se
diziam naturais de uma civilização superior e portadores da única e verdadeira fé, agiam com
extrema crueldade e nas batalhas não se limitavam a prender o inimigo, como era a tradição, mas
sim matá-lo – atitude que para os astecas era intolerável do ponto de vista ético.
FERREIRA, Jorge Luiz. Conquista e colonização da América espanhola. São Paulo: Ática, 1992. p. 9.
3. Houve motivo para que os nativos americanos considerassem os espanhóis “piores que diabos”?
Explique.
Página 61
Espanhóis na América
Os espanhóis chegaram à América em razão da expansão marítima e comercial, impulsionados pelos
princípios mercantilistas. Assim, ao instalar-se no Novo Mundo, buscaram submeter os povos nativos,
com o intuito de conquistar suas terras e procurar nelas produtos que lhes rendessem algum tipo de
benefício.
A América simbolizava o Eldorado, uma terra que fazia parte do imaginário europeu e que garantiria
rápido enriquecimento pela abundância de ouro e prata que lá haveria.
Para se apossar das terras, foram enviadas expedições, a partir do século XVI, encarregadas de explorar
a terra e também iniciar a colonização. Colonizar era importante, pois as notícias de riquezas
abundantes atraíam a cobiça de outros europeus, pondo em risco a hegemonia espanhola.
A superioridade militar – expressa na vantagem bélica dos espanhóis, que detinham o domínio do
cavalo, das armas de fogo e do aço (usado em espadas, lanças etc.) – ficou explícita nas campanhas do
espanhol Hernan Cortés, a partir de 1519, na região do México: mesmo com menor número de
soldados, ele massacrou os astecas.
Ao chegar a Tenochtitlán, capital do Império Asteca, Cortés foi recebido pacificamente pelo governante
Montezuma II. A princípio, o líder mexica pensou que os espanhóis fossem deuses, que, segundo as
profecias, voltariam para dominar o império. Diante disso, Cortés iniciou a invasão da cidade, numa
operação de guerra que massacrou parte da população e matou seu líder.
As doenças, principalmente a varíola, também auxiliaram os europeus durante a conquista. Além disso,
o apoio das nações inimigas dos astecas (os tlaxcaltecas, por exemplo) tiveram um peso decisivo para o
sucesso da conquista espanhola. Outro elemento importante foi a visão mística que os astecas tinham
dos espanhóis, hipótese que explicaria a recepção pacífica aos invasores. Num primeiro momento os
astecas viram os espanhóis como representantes do deus Quetzalcoatl, porém ao perceberem que eram
humanos e que agiam com crueldade passaram a combatê-los e a resistir até serem conquistados.
Museu Nacional de Arte, Cidade do México
Felix Parra. Episódios da conquista, 1877. Óleo sobre tela, 68 cm × 109 cm.
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Organizando ideias
O conceito asteca da conquista
[...] O primeiro traço fundamental da visão asteca da Conquista é o que se poderia descrever como
o quadro mágico no qual esta haveria de se desenvolver. Os astecas afirmam que, alguns anos
antes da chegada dos homens de Castela, houve uma série de prodígios e presságios anunciando o
que haveria de acontecer. No pensamento do senhor Motecuhzoma [Montezuma], a espiga de
fogo que apareceu no céu, o templo que se incendiou por si mesmo, a água que ferveu no meio do
lago, a voz de uma mulher que gritava noite adentro, as visões de homens que vinham
atropeladamente montados numa espécie de veados, tudo isso parecia avisar que era chegado o
momento, anunciado nos códices, do regresso de Quetzalcoátl e dos deuses.
Mas, quando chegaram as primeiras notícias procedentes das margens do Golfo sobre a presença
de seres estranhos, chegados em barcas grandes como montanhas, que montavam uma espécie de
veados enormes, tinham cães grandes e ferozes e possuíam instrumentos lançadores de fogo,
Motecuhzoma e seus conselheiros ficaram em dúvida. De um lado, talvez Quetzalcóatl houvesse
regressado. Mas, de outro, não tinham certeza disso. No coração de Motecuhzoma nasceu, então,
a angústia. Enviou, por isso, mensageiros que suplicaram aos forasteiros para que regressassem ao
seu lugar de origem.
A dúvida a respeito da identidade dos homens de Castela subsistiu até o momento em que, já
hóspedes dos astecas em Tenochtitlán, perpetraram a matança do templo maior. O povo em geral
acreditava que os estrangeiros eram deuses. Mas quando viram seu modo de comportar-se, sua
cobiça e sua fúria, forçados por esta realidade, mudaram sua maneira de pensar: os estrangeiros
não eram deuses, mas popolocas ou bárbaros, que tinham vindo destruir sua cidade e seu antigo
modo de vida.
As palavras anteriores encontram novo eco na resposta dos sábios aos doze franciscanos chegados
em 1524:
Deixem-nos, pois, morrer, deixem-nos perecer, pois nossos deuses já estão mortos!** Muitas outras
citações poderiam acumular-se para mostrar o que foi o trauma da Conquista para a alma indígena.
[...] Não se deve esquecer que os astecas eram seguidores do deus da guerra, Huitzilopochtli; que
se consideravam escolhidos do Sol e que, até então, sempre creram ter uma missão cósmica e
divina de submeter a todos os povos dos quatro cantos do universo. Quem se considerava
invencível, o povo do Sol, o mais poderoso da Mesoamérica, teve de aceitar sua derrota. Mortos os
deuses, perdidos o governo e o mando, a fama e a glória, a experiência da Conquista significou algo
mais que tragédia: ficou cravada na alma e sua recordação passou a ser um trauma.
LEÓN-PORTILLA, Miguel. A conquista da América Latina vista pelos índios. Petrópolis: Vozes, 2001. p. 16-18.
2. De acordo com o autor do texto, os estrangeiros passaram de deuses a bárbaros na visão dos
astecas. Por que isso ocorreu?
O relato desse primeiro encontro com Atahualpa foi feito por diversas testemunhas oculares [...].
Por meio de seu testemunho, a cena aparece para nós, hoje, como um confronto entre duas visões
incompatíveis do mundo: de um lado, a de um soberano para quem a própria natureza do poder
que encarna proíbe a comunicação direta com seus súditos e o recurso a mediadores; do outro, a
de dois hidalgos espanhóis, Soto e Hermando Pizarro, para os quais os reis são interlocutores
diretos a despeito de sua majestade. Quebrando sistematicamente as barreiras rituais que os
separam do Inca, apagando os códigos de polidez e de hierarquia, os conquistadores vão marcar
uma primeira vitória sobre um homem fechado em sua dignidade solar. Pois, mais do que as armas,
são os gestos e as palavras que vão solapar a solenidade do Filho do Deus Sol, anunciando o fim de
um império do qual o Inca era a chave-mestra. [...]
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BERNAND, Carmen; GRUZINSKI, Serge. História do Novo Mundo: da descoberta à conquista, uma experiência europeia (1492-
1550). São Paulo: Edusp, 1997. p. 499-500. Execução do inca Atahualpa, em gravura colorida no relato de viagem de Theodore de
Bry, 1597.
Glossário
Hidalgo: fidalgo, pessoa nobre.
Página 64
Organizando ideias
Forme dupla com um colega e, juntos, leiam o texto a seguir e façam o que se pede.
Juan de Zumáraga, primeiro arcebispo do México, se orgulhava, em uma carta de 1547, de que
seus sacerdotes haviam destruído até então mais de 500 templos indígenas e queimado cerca de 2
mil ídolos. Ele próprio ajudou a incinerar os arquivos existentes em Texcoco. O mesmo fez o bispo
de Yucatán, Diego de Landa, ao atirar ao fogo purificador os manuscritos maias – único povo da
América pré-colombiana que havia criado uma escrita –, fazendo com que se destruíssem os
principais documentos históricos e literários.
RAMPINELLI, Waldir José. A falácia do V Centenário. In:; OURIQUES, Nildo Domingos (Org.). Os 500 anos: a conquista interminável.
Petrópolis: Vozes, 2000. p. 30-31.
1. Explique a relação entre a cruz (religião) e a espada (guerra) na dominação dos povos que viviam
na América pelos espanhóis.
2. Pode-se dizer que os nativos americanos sofreram influência religiosa dos espanhóis? Explique.
3. Há poucos documentos escritos deixados pelos povos que habitavam a América antes da
conquista europeia. Assim, quase todas as informações foram colhidas de documentos espanhóis e
achados arqueo lógicos. Podemos afirmar, com base nessa ponderação, que temos versões dessa
história, mas a maioria delas do ponto de vista dos habitantes das Américas? Explique como isso
afeta o conhecimento histórico.
Essa trilogia – doenças, desunião dos indígenas e o aço espanhol – responde por boa parte do
resultado da Conquista. Basta remover um de seus elementos para que a probabilidade de fracasso
das expedições lideradas por Cortés, Pizarro e outros fique muito alta [...].
Um quarto fator também desempenhou um papel importante: a cultura bélica. Por exemplo, os
astecas foram prejudicados por certas convenções de batalha ignoradas pelos hispânicos. Os
métodos de guerra astecas salientavam a observação de cerimônias que antecediam as batalhas –
que eliminavam a possibilidade de ataques de surpresa – e a captura de inimigos para posterior
execução ritual, em vez de matá-los no ato [...]. Por fim, a Conquista espanhola só pode ser
plenamente compreendida se situada no contexto histórico mais amplo da expansão ultramarina.
Essa história mais ampla não fala de uma superioridade espanhola, ou mesmo da Europa Ocidental,
mas aborda, ao contrário, um complexo fenômeno da história mundial que transcende as
peculiaridades da Conquista espanhola das Américas [...].
RESTALL, Matthew. Sete mitos da conquista espanhola. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006. p. 240-242.
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A barbárie cometida pelos conquistadores espanhóis foi descrita em relatos como este, do frei
Bartolomé de Las Casas:
Os espanhóis, com seus cavalos, suas espadas e lanças começaram a praticar crueldades estranhas;
entravam nas vilas, burgos e aldeias, não poupando nem as crianças e os homens velhos, nem as
mulheres grávidas e parturientes e lhes abriam o ventre e as faziam em pedaços como se
estivessem golpeando cordeiros fechados em seu redil. Faziam apostas sobre quem, de um só
golpe de espada, fenderia e abriria um homem pela metade, ou quem, mais habilmente e mais
destramente, de um só golpe lhe cortaria a cabeça, ou ainda sobre quem abriria as entranhas de
um homem de um só golpe. Arrancavam os filhos dos seios da mãe e lhes esfregavam a cabeça
contra os rochedos [...]. Faziam certas forcas longas e baixas, de modo que os pés tocavam quase a
terra, um para cada treze, em honra e reverência de Nosso Senhor e de seus doze Apóstolos (como
diziam) e deitando-lhes fogo, queimavam vivos todos os que ali estavam presos. Outros, a quem
quiseram deixar vivos, cortaram-lhes as duas mãos e assim os deixavam.
LAS CASAS, Bartolomé de. O paraíso destruído: brevíssima relação da destruição das Índias. Porto Alegre: L&PM, 1996. p. 30.
Execução de dois índios paraguaios acusados de matar o expedicionário Juan de Ayolas. Gravura publicada em livro de Mattaeus
Merian, Frankfurt, 1631. As imagens contribuíram para reforçar os posicionamentos de Las Casas e ajudaram a provocar e
sustentar uma onda de indignação europeia – principalmente nos países subordinados à Espanha – contra a violência impingida
pelos conquistadores espanhóis. Eles foram responsabilizados pela destruição de grande parte das populações e culturas nativas.
Glossário
Destramente: com destreza, habilidade.
Fender: dividir ao meio, abrir uma fenda.
Parturiene: mulher que está prestes a parir, em trabalho de parto, ou que acaba de dar à luz.
Redil: curral para gado de carneiros e cabras.
Página 66
Toda essa violência era justificada pela visão “religiosa” da desigualdade entre os seres humanos, por
meio da qual uns eram considerados superiores aos outros, e também pela busca desenfreada por
riquezas. Todo empecilho para a obtenção da riqueza deveria ser eliminado, mesmo que fosse um ser
humano. Historicamente, os espanhóis estavam na fase de transição entre a Idade Média, dominada
pela religião, e a Idade Moderna, na qual os bens materiais subiram ao topo da escala de valores. Era
essa mentalidade que justificava suas ações.
Assim, o declínio da população indígena foi muito rápido, conforme os dados da tabela a seguir.
Fonte: BETHELL, Leslie (Org.). História da América Latina: a América Latina colonial. 2. ed. São Paulo: Edusp; Funag, 1998. v. 1. p. 201.
Na Idade Moderna, ainda não havia um sistema de leis que pudesse minimizar essas ações. O fato de
Igreja e Estado ainda dividirem o poder fazia com que a Igreja justificasse os atos do Estado. Um
exemplo é a Bula Intercoetera, documento de 1493 que legalizava a soberania e o domínio da Coroa
espanhola sobre as terras do Novo Mundo e, em contrapartida, os reis deveriam difundir a fé católica
entre os nativos.
Outro documento favorável aos reis espanhóis foi o Requerimento, elaborado em 1514 por Palácio
Rúbios, jurista e conselheiro dos reis espanhóis. Trata-se de um importante documento jurídico, que
autorizava o domínio e a intervenção nas colônias. A justificativa centrava-se na crença de que Jesus
Cristo teria dado a São Pedro a posse do continente americano, e este a transferiu ao chefe da Igreja
Católica, o papa, que, por sua vez, concedeu essas terras aos reis Fernando de Aragão e Isabel de
Castela. Portanto, a Igreja legitimava a posse e as atitudes dela decorrentes.
Esse documento deveria ser lido a toda comunidade indígena antes de subjugá-la, mesmo que os
nativos não falassem a mesma língua e, portanto, não o compreendessem. A partir de então os
indígenas passavam a ser subordinados à Coroa espanhola. Caso houvesse resistência, o documento
autorizava a guerra justa e a escravização.
O ideário da colonização desenvolveu-se com base nesses documentos. De acordo com esses princípios,
as populações indígenas que sobreviveram aos massacres iniciais foram forçadas a pagar tributos à
Coroa espanhola, a se converter à fé cristã e também a se adaptar aos hábitos europeus, em um
processo de etnocídio que se estendeu durante toda a colonização.
A violência cultural empregada pelos espanhóis se traduziu em ações como a queima de livros (códices),
destruição dos templos e ídolos religiosos, além da renomeação dos lugares onde viviam os indígenas
usando nomes escolhidos pelos espanhóis.
Guerra justa era o embate autorizado pela Coroa (metrópole) ou pelos governadores, como as guerras
travadas em legítima defesa contra os ataques indígenas.
Glossário
Etnocídio: destruição sistemática da cultura e dos costumes de uma etnia por grupo étnico de formação
diferente.
Página 67
Organizando ideias
Junte-se a um colega para formar uma dupla e, juntos, leiam os textos a seguir. Ambos fazem parte
de um debate realizado entre 1550 e 1551, na Espanha, entre o frei Bartolomé de Las Casas e o
jurista espanhol Juan Ginés Sepúlveda.
O debate discutia se os indígenas americanos eram ou não bárbaros e se seria justo ou não
guerrear com os nativos para propagar o cristianismo na América. Esse debate foi de extrema
importância, pois envolvia questões que permearam todo o período da modernidade. Nele, foi
exposta, de um lado, a visão etnocêntrica, defendida por Sepúlveda, de imposição de verdades
consideradas universais, em que predomina a intolerância diante dos valores do outro. Do outro
lado, Las Casas defendeu a autodeterminação dos povos e o respeito à diversidade, ainda que com
restrições, pois apoiava o ensinamento da fé católica aos nativos.
Texto 1
Aqueles que pretendem que os índios são bárbaros, responderemos que essas pessoas têm aldeias,
vilas, cidades, reis, senhores e uma ordem política que, em alguns reinos, é melhor que a nossa [...].
Eles superavam também a Inglaterra, a França, e algumas de nossas regiões da Espanha [...]. Pois a
maioria dessas nações, senão todas, foram muito mais pervertidas, irracionais e depravadas, e
deram mostra de muito menos prudência e sagacidade em sua forma de se governarem e
exercerem as virtudes morais. Nós mesmos fomos piores, no tempo de nossos ancestrais e sobre
toda a extensão de nossa Espanha, pela barbárie de nosso modo de vida e pela depravação de
nossos costumes.
LAS CASAS, Bartolomé apud LAPLANTINE, François. Aprender antropologia. São Paulo: Brasiliense, 1987. p. 38-39.
Texto 2
É justo e útil que [os indígenas] sejam servos, e vemos que isso é sancionado pela própria lei divina,
pois está escrito no livro dos provérbios: “o tolo servirá aos sábios”. Assim são as nações bárbaras e
desumanas, estranhas à vida civil e aos costumes pacíficos. E sempre será justo e de acordo com o
direito natural que essas pessoas sejam submetidas ao império de príncipes e de nações mais
cultivadas e humanas, de modo que graças à virtude dos últimos e à prudência de suas leis, eles
abandonam a barbárie e se adaptam a uma vida mais humana e ao culto da virtude. E se recusam
esse império, é permissível impô-lo por meio das armas e tal guerra será justa, assim como declara
o direito natural [...].
Concluindo: é justo, normal e de acordo com a lei natural que todos os homens probos,
inteligentes, virtuosos e humanos dominem todos os que não possuem essas virtudes.
SEPÚLVEDA, Juan Ginés apud WOLKMER, Antônio Carlos (Org.). Direito e justiça na América indígena: da conquista à colonização.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998. p. 70.
4. De acordo com o que foi visto até agora, qual visão prevaleceu?
5. Pode-se considerar que nesse embate aparecem valores relativos a direitos humanos? Explique.
Glossário
Permissível: admissível, que pode ser permitido.
Probo: íntegro, honesto.
Prudência: cautela, moderação, sensatez.
Sagacidade: sutileza, perspicácia, inteligência.
Página 68
Resgate cultural
Ao contrário do Brasil, onde o Carnaval é a maior festa popular, com milhares de pessoas entregues
à folia por três dias consecutivos, no México, a maior mobilização festiva e popular ocorre no Dia
dos Mortos. Na realidade, geralmente as festividades acontecem em vários dias, entre 31 de
outubro e 2 de novembro, e em muitas cidades elas começam já no dia 28 de outubro. Parentes,
amigos e convidados festejam o retorno de seus finados com grande variedade de comidas,
bebidas, doces e frutas em banquetes espetaculares. De tão importante, o acontecimento foi
declarado patrimônio cultural da Humanidade pela Unesco.
Maria Teresa Toribio Brittes Lemos. A doce vida dos mortos. Revista de História da Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro, 2 fev.
2012. Disponível em: <www.revistadehistoria.com.br/secao/artigos-revista/a-doce-vida-dos-mortos>. Acesso em: fev. 2016.
Vestígios de oferendas astecas dos séculos XIV-XVI em exposição no Museu Arqueológico da Cidade do México (México). A antiga
cidade asteca de Tenochtitlán, onde atualmente se localiza a Cidade do México, é uma importante fonte de achados arqueológicos
no México. Na área do chamado Templo Superior de Tenochtitlán, vestígios arqueológicos possibilitaram a estudiosos
compreender alguns rituais do povo asteca. Na fotografia acima, vemos um sepulcro onde foram encontrados cerca de 14 mil
objetos enterrados com o objetivo de proporcionar ao morto um trajeto seguro até Mictlán. Nesse lugar também foi encontrado o
esqueleto de um canídeo (fotografia abaixo) – com diversos objetos em ouro e pedras preciosas, indicando que o dono se tratava
de alguém poderoso na sociedade asteca –, que serviria, de acordo com as crenças daquela sociedade, para guiar o morto.
Esqueleto de um lobo usado como oferenda pelos astecas. Cidade do México, México.
Página 69
Yaacov Dagan/Alamy/Latinstock
Desfile de carnaval do Dia dos Mortos em Oaxaca, México, 2015. Um dos rituais da festa do Dia dos Mortos no México
corresponde a decorar e, muitas vezes, iluminar o caminho entre o cemitério onde o parente está enterrado e sua residência.
Ofertar, no Dia dos Mortos, é compartilhar com os defuntos o pão, o sal, as frutas, as delícias
culinárias, a água e, se são adultos, o vinho. [...]
O altar do Dia dos Mortos é uma mistura cultural para a qual os europeus contribuíram com flores,
velas e lamparinas; os indígenas agregaram o defumador de copal, as comidas e a flor do cravo-de-
defunto. O altar, como o conhecemos hoje, é também um reflexo do sincretismo do velho e do
novo mundo.
Ofrendas de día de muertos. Comisión Nacional para el desarrollo de los pueblos indígenas, 13 out. 2009. Disponível em: <
www.cdi.gob.mx/index.php?option=com_content&task=view&id=563>. Acesso em: mar. 2016.
(Tradução nossa).
O cuidado que muitas famílias no México têm em indicar o caminho entre a residência e o
cemitério, assim como em comunicar seus novos endereços no sepulcro dos parentes, remete à
ideia vigente na sociedade asteca de que os vivos poderiam empreender esforços para que os
mortos pudessem se deslocar com segurança.
1. Como é celebrado o Dia dos Mortos no Brasil? Ele tem um caráter festivo como o mexicano?
Responda no caderno.
Página 70
Nos primeiros contatos com os portugueses, os indígenas trabalharam no corte e carregamento de pau-
brasil, que era trocado por produtos desconhecidos pelos nativos. Com o desenvolvimento da
agricultura, eles passaram a ser escravizados.
No que se refere à catequização, a América Portuguesa recebeu religiosos de várias ordens, destacando-
se os jesuítas da Companhia de Jesus. Esses padres procuraram estabelecer uma relação com os
indígenas aprendendo a língua deles. A forma encontrada para a catequização e educação dos indígenas
nos princípios cristãos foi reuni-los em aldeamentos, chamados de missões ou reduções jesuíticas. Os
jesuítas tentavam, nesses locais, convencer os indígenas a abandonar seus costumes e ensinavam, além
da religião, a ler, escrever, contar e tocar instrumentos musicais.
Foram estabelecidas missões em quase todo o território que hoje é o Brasil, avançando inclusive para
além dos limites portugueses determinados pelo Tratado de Tordesilhas.
Nas missões, a liberdade era garantida aos aldeados, não se permitia a escravização. Os indígenas
podiam trabalhar para colonos, porém mediante remuneração. Assim, nesses locais havia reserva de
mão de obra, o que contribuiu para a colonização de vários pontos do território, sobretudo no interior.
Em 1570, uma lei proibiu a escravização dos indígenas, porém eles deveriam ser educados, adotar a
religião dos portugueses e submeter-se à autoridade deles. Caso contrário, prevaleceria o conceito de
guerra justa.
Os indígenas resistiram de diferentes formas: fugiam dos aldeamentos missionários e de outros tipos de
cativeiro, atacavam as vilas e as fazendas dos colonizadores e negociavam com europeus que estavam
em disputas com grupos indígenas inimigos. O suicídio e o sincretismo religioso também eram práticas
de resistência adotadas pelos nativos.
Um dos exemplos de resistência armada foi a Confederação dos Tamoios, aliança de indígenas da região
onde hoje é São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo. O objetivo era resistir à ocupação portuguesa na
capitania de São Vicente. Nesse contexto, na tentativa de ocupar a região da Baía de Guanabara e
formar a França Antártica, os franceses aliaram-se aos tamoios, liderados por Cunhambebe. Em
contrapartida, os portugueses aliaram-se aos indígenas temiminós (liderados por Arariboia), inimigos
ferrenhos dos tamoios.
O conflito gerou um grande número de mortos, resultando na expulsão dos franceses da região em
1567. Os tamoios foram massacrados, e os temiminós presenteados com terras pelos portugueses.
Esse embate não foi apenas entre portugueses e franceses, mas também entre grupos indígenas
tradicionalmente inimigos que se aproveitaram do conflito entre os europeus para resolver suas
questões e disputas.
Rodolfo Amoedo. O último tamoio, 1883. Óleo sobre tela, 1,83 m × 2,61 m.
Página 71
O contato dos ingleses com os indígenas, seguido de guerras, massacres e epidemias, exterminou
grande parte deles. Se no período dos primeiros contatos havia entre 10 e 12 milhões de nativos
povoando a região, depois da conquista restaram aproximadamente 250 mil.
Relatos mostram que a epidemia de varíola, que assolou a população indígena por volta de 1630, foi
considerada uma dádiva, e “confirmava” o direito divino da exploração das novas terras pelos ingleses.
Apesar de haver poucos relatos do fato, os ingleses, assim como os portugueses no Brasil, escravizaram
e comercializaram a população indígena norte-americana.
Os indígenas tentaram de várias formas resistir à violência da colonização, tanto fugindo para o interior
quanto enfrentando os colonos.
Apesar de nem todos os grupos de colonos se oporem aos nativos e das estratégias de resistência, a
intensificação da conquista dos territórios fez com que a população indígena dos Estados Unidos
diminuísse drasticamente, o que, por sua vez, possibilitou, junto a outros fatores e investimentos, a
expansão dos colonos para o interior do país e a conquista efetiva da região.
Organizando ideias
O texto a seguir descreve a opinião dos colonos ingleses sobre os indígenas.
As opiniões dos colonos sobre os indígenas variaram, mas foram, quase sempre, negativas. Um dos
mais antigos relatos sobre eles, de 1628, de autoria de Jonas Michaëlius, mostra bem isso:
Quanto aos nativos deste país, encontro-os totalmente selvagens e primitivos, alheios a toda
decência; mais ainda, incivilizados e estúpidos, como estacas de jardim, espertos em todas as
perversidades e ímpios, homens endemoniados que não servem a ninguém senão o diabo [...]. É
difícil dizer como se pode guiar a esta gente o verdadeiro conhecimento de Deus e de seu
mediador Jesus Cristo.
Jonas Michaëlius parte de um ponto de vista europeu. Como os índios não têm uma cultura
semelhante à europeia, ele os considera incivilizados. [...]
KARNAL, Leandro. Estados Unidos: a formação da nação. São Paulo: Contexto, 2007. p. 59.
1. A postura dos colonos ingleses em relação aos indígenas da América do Norte foi a mesma dos
outros europeus nas regiões que colonizaram. Em dupla, elabore um texto descrevendo de forma
geral os grupos que habitavam as Américas e a visão etnocêntrica dos europeus sobre os nativos.
Página 72
Debate interdisciplinar
Europa e a
América
A chegada dos europeus à América foi o começo de uma das transformações mais revolucionárias nos
hábitos alimentares dos seres humanos. Nos primeiros anos da conquista, os espanhóis resistiram a
comer produtos nativos americanos, por isso trouxeram consigo plantas e animais de sua terra natal.
Todavia, os espanhóis enviavam à Europa todos os alimentos exóticos que os nativos lhes ofereciam
para, de alguma forma, apaziguar a Coroa pelas dificuldades que tinham de encontrar os tão desejados
metais preciosos. Progressivamente, por meio dessa troca entre América e Europa, a fauna e a flora de
ambos os continentes foram modificadas, pois diversas plantas e animais adaptaram-se aos novos
climas. Com isso, a dieta dos habitantes das duas regiões foi enriquecida.
1 Xoloitzcuintle
É uma raça de cães sem pelos, da Mesoamérica, considerada a mais antiga das raças puras de cachorro,
com registros arqueológicos de mais de 3 mil anos. Esse cachorro poderia ser criado em casa como
animal de estimação, mas sua carne também era usada pelos nativos como alimento e bastante
apreciada em rituais como os jogos de bola.
2 Perus
Os astecas consumiam a carne e os ovos de diferentes espécies de perus.
3 Cavalos 4
Os espanhóis trouxeram cavalos à América para auxiliar no transporte e nos combates militares.
Cabras e ovelhas
Forneciam carne, leite e algodão.
Vacas
Multiplicaram-se de modo selvagem.
Porcos
Eram fáceis de criar e todas suas partes eram utilizadas.
Galinhas
Essas aves domésticas espalharam-se em razão da riqueza de seus ovos
e de sua carne.
Palmeiras
Elas forneciam palmito, coco e outros produtos considerados exóticos na Europa.
©Sol 90 Images
Página 73
Atividades
1. Qual foi o impacto nos hábitos alimentares dos seres humanos após a chegada dos europeus à
América?
b) assumia o controle de todas as cerimônias religiosas, visto que o imperador era considerado da
linhagem dinástica de Manko Kapaq.
c) desposava uma irmã, o que o envolvia cada vez mais com os laços familiares, tornando o incesto
uma instituição necessária à manutenção da dinastia de Kapaq.
d) era apresentado como “órfão e pobre”, embora reconhecesse o grupo de parentesco como
condição necessária para que fosse reconhecido como “filho do Sol” e tivesse o direito de morar no
Templo do Sol.
e) estabelecia alianças com outras dinastias Incas, com o propósito de fortalecer o mito de Manko
Kapaq e garantir a perpetuação de uma linhagem, ao mesmo tempo, divina e terrena.
2. (Enem) Segundo a explicação mais difundida sobre o povoamento da América, grupos asiáticos
teriam chegado a esse continente pelo Estreito de Bering, há 18 mil anos. A partir dessa região,
localizada no extremo noroeste do continente americano, esses grupos e seus descendentes teriam
migrado, pouco a pouco, para outras áreas, chegando até a porção sul do continente. Entretanto,
por meio de estudos arqueológicos realizados no Parque Nacional da Serra da Capivara (Piauí),
foram descobertos vestígios da presença humana que teriam até 50 mil anos de idade. Validadas,
as provas materiais encontradas pelos arqueólogos no Piauí
a) comprovam que grupos de origem africana cruzaram o Oceano Atlântico até o Piauí há 18 mil
anos.
c) contestam a teoria de que o homem americano surgiu primeiro na América do Sul e, depois,
cruzou o Estreito de Bering.
d) confirmam que grupos de origem asiática cruzaram o Estreito de Bering há 18 mil anos.
3. (Enem) O índio era o único elemento então disponível para ajudar o colonizador como
agricultor, pescador, guia, conhecedor da natureza tropical e, para tudo isso, deveria ser tratado
como gente, ter reconhecidas sua inocência e alma na medida do possível. A discussão religiosa e
jurídica em torno dos limites da liberdade dos índios se confundiu com uma disputa entre jesuítas e
colonos. Os padres se apresentavam como defensores da liberdade, enfrentando a cobiça
desenfreada dos colonos.
Entre os séculos XVI e XVIII, os jesuítas buscaram a conversão dos indígenas ao catolicismo. Essa
aproximação dos jesuítas em relação ao mundo indígena foi mediada pela
Responda no caderno
a) atuar como grande defensor da vida, da liberdade e da dignidade dos índios, tendo enfrentado
diversos teólogos que defendiam a legitimidade da conquista e a escravidão dos mesmos.
b) haver sido o principal teórico a fornecer a justificativa teológica para a conquista espanhola da
América e a escravização da população indígena.
d) teorizar sobre o direito ou não de os espanhóis escravizarem os indígenas embora jamais tenha
vivido em terras da América.
e) elaborar a obra Brevíssimo relatório da destruição das Índias, que admitia o direito da coroa
espanhola de conquistar a América e escravizar os indígenas em casos de guerra justa.
a) o processo colonizador europeu não foi violento como se costuma afirmar, já que preservou e
até mesmo valorizou várias culturas indígenas.
c) a cultura indígena, extinta graças ao processo colonizador europeu, foi recriada de modo
mitológico no Brasil dos anos 1940.
d) a cultura xinguana, ao contrário de outras culturas indígenas, não foi afetada pelo processo
colonizador europeu.
• Índios no Brasil, de Manuela Carneiro da Cunha. São Paulo: Companhia das Letras, 2013. A autora
examina aspectos da história dos indígenas no Brasil e procura desconstruir preconceitos sobre a
organização desses povos. Apresenta ainda um histórico dos direitos indígenas no país e os
fundamentos para sua implementação.
3Colonização da América:
exploração e resistência
Neste capítulo
A América do século XXI
A empresa colonial espanhola
A empresa colonial portuguesa
A colonização da América Inglesa
Revolução Americana: a primeira reação americana contra a metrópole
Independências na América Espanhola
Independência da América Portuguesa
Jean-Baptiste Debret (1768-1848). O caçador de escravos. Óleo sobre tela, 27 cm × 25,2 cm.
Enquanto em países como a Bolívia e o Peru a maioria da população é formada por descendentes de
indígenas, em outros, como a Colômbia e a Venezuela, predomina a descendência espanhola. No Brasil,
temos ao mesmo tempo algumas áreas onde predominam os descendentes europeus e outras com
grande número de afrodescendentes.
A atual divisão do continente em países é fruto dos movimentos de independência das metrópoles.
Foram lutas que aconteceram de formas diversas em busca da libertação do jugo das nações
conquistadoras. Assim se fez a América e assim ela se tornou dos americanos.
No texto a seguir, o autor define a América Latina no século XXI. Seu conceito pode ser estendido a todo
o continente.
Mulheres da etnia quíchua vendendo tecidos tradicionais no Vale de Lares. Cuzco, Peru, 2013.
Meridith Kohut/Bloomberg/Getty Images
A América Latina pode ser vista como um vasto, complexo e movimentado laboratório de culturas
e civilizações, formas de sociabilidade e jogos de forças sociais, etnias e racismos; compreendendo
estruturas de dominação e apropriação, nativismo e nacionalismo, colonialismo e imperialismo;
ingressando na época do globalismo. Parece um labirinto ou nebulosa, experimentando ciência e
tecnologia, realizações e frustrações, ideologias e utopias. [...]
IANNI, Octávio. Enigmas do pensamento latino-americano. São Paulo: Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São
Paulo. p. 2-3. Disponível em: <www.iea.usp.br/textos/iannienigmas.pdf>. Acesso em: mar. 2016.
Página 79
A busca das minas foi o motor da conquista: o processo da economia mineira – explorar até o
esgotamento e, depois, partir para mais longe – marcou toda a economia da América Latina.
Situadas pela natureza no coração da cadeia dos Andes, a 3.400 metros de altitude, e por vezes
mais [...] as minas americanas foram devoradoras de índios fornecidos pela mita (rezava-se por
eles o ofício dos mortos antes da partida). [...]
CHAUNU, Pierre. História da América Latina. São Paulo: Difel, 1976. p. 55-56.
Mita foi o nome utilizado no Peru para designar uma organização de trabalho indígena que os espanhóis
herdaram dos incas no Período Colonial. Essa forma de trabalho compulsório consistia em deslocar certo
número de indígenas de suas comunidades para atuar quase ininterruptamente na extração de
minérios. Como a atividade tinha prazo determinado, os indígenas trabalhavam por uma quantidade de
meses, que variava de acordo com a região. Embora eles recebessem pelo serviço, as quantias eram
irrisórias.
Página 80
© DAE/Sonia Vaz
Fonte: BETHELL, Leslie (Org.). História da América Latina: a América Latina Colonial, 2. ed. São Paulo: Edusp; Brasília: Funag, 1998. v. 1. p.
100-101.
Pela leitura do texto, é possível perceber que os metais preciosos da América foram de suma
importância para a economia europeia do período. Entre os anos de 1503 e 1660, chegaram à Espanha
oficialmente (cabe salientar que o contrabando era intenso) cerca de 85 mil quilos de ouro e 16 milhões
de quilos de prata. Apesar de todas essas riquezas, a Coroa espanhola estava com graves problemas
financeiros. Sem indústrias, com uma aristocracia dependente da Coroa, enfrentando guerras em
diversas frentes, os espanhóis viviam na ilusão de que eram ricos e poderosos – já que, na verdade, as
riquezas extraídas da América iam parar nas mãos de holandeses, franceses, italianos, ingleses e
alemães como forma de pagamento das dívidas contraídas pela Espanha. Como se percebe, por
intermédio da Espanha e também de Portugal, a América financiava as transformações no modo de
produção europeu.
Página 81
Fonte: VILAS, Pierre. Oro y moneda en la historia (1450-1920) apud SANTIAGO, Théo (Org.). América Colonial. São Paulo: Ícone, 1988. p.
144.
A grande afluência de metais preciosos provocou a chamada “revolução dos preços” na Europa, ou seja,
um gigantesco processo inflacionário. De acordo com o preceito mercantilista adotado pelos espanhóis,
o acúmulo de metais preciosos representava o enriquecimento da nação. A consequên cia dessa política
podia ser notada na pobreza da produção de manufaturas, no encarecimento dos meios de subsistência,
no comércio especulativo e nos gastos exagerados de uma aristocracia improdutiva, o que contribuiu
para aprofundar a pobreza das camadas sociais exploradas. Em suas colônias americanas, as autoridades
espanholas não aplicaram integralmente a doutrina mercantilista, pois toleraram a continuidade da
produção artesanal nativa mediante o sistema chamado de obraje.
O rendimento da economia colonial era baixo em razão dos métodos de exploração: as relações de
produção – escravidão e relações “servis” – e a exploração metropolitana, que impedia o
desenvolvimento das forças produtivas.
Nas colônias, as atividades mineradoras causaram grande impacto, por exemplo, o aumento dos
rendimentos das coroas e também mudanças no dia a dia dos colonos, que passaram a ser escravizados
para as atividades mineradoras.
Um exemplo desse processo foram as minas de prata do Potosí, localizadas no Cerro de Potosí, no Alto
Peru, atual território boliviano. Inicialmente, as
Glossário
Cardar: destrinchar, desembaraçar.
Página 82
minas foram lavradas e exploradas externamente, ou seja, em veios que corriam na superfície das
montanhas. Entretanto, no decorrer da exploração, foram cavados túneis para explorar o interior das
montanhas e retirar dali o máximo possível de riquezas.
Bildarchiv Steffens/AKG-Images/LatinStock
Com o objetivo de encontrar ouro, os espanhóis colonizaram, primeiramente, as Antilhas, mas, tendo
encontrado pouca quantidade desse metal, instalaram-se gradativamente em Istmo, Nova Espanha
(atual México), e em seguida no Peru, regiões dotadas de muitas jazidas. Na busca por minérios,
descobriram jazidas no atual México e, na América do Sul, nos Andes centrais orientais.
Conforme os distritos começaram a gerar aumento de renda para a Espanha, novas vilas foram surgindo
em regiões antes habitadas apenas pela população nativa. As estradas e o comércio expandiram-se
proporcionalmente ao desenvolvimento dos novos centros econômicos, possibilitando a circulação,
pelas vilas mineiras, de mercadorias como roupas e vinhos, escravos da África, seda e especiarias do
Oriente. Os habitantes das vilas pagavam por tudo isso com enormes quantidades de metais preciosos,
o que gerou um grande acúmulo de minérios pelos espanhóis.
Nessas regiões, a mineração também estimulou o cultivo agrícola e a criação de gado bovino, o que
contribuiu para o crescimento econômico e populacional.
Entretanto, esse grande crescimento se apoiou na exploração da mão de obra indígena, tendo em vista
que as atividades mineradoras utilizaram o trabalho dos nativos em larga escala. As péssimas condições
de trabalho, contudo, somadas à alimentação precária, ao alcoolismo (incentivado pelos europeus) e ao
crescente endividamento – considerando os sistemas de exclusividade e cadernetas de compras nas
vendas das vilas mineradoras –, contribuíram para desestruturar comunidades nativas. Os mitaiosque
atuavam nas minas raramente voltavam para casa. A expectativa de vida era baixíssima em razão das
doenças, dos acidentes e das duras condições de trabalho.
Essas condições contribuíram para a extinção de grande parte das populações nativas da América
Espanhola, que migraram do ambiente rural para o urbano. Nesses locais, além de terem sido, muitas
vezes, escravizados ou forçados ao trabalho em troca de pagamentos irrisórios, os indígenas tiveram sua
cultura esmagada pelo sistema de produção imposto pelos colonizadores.
Glossário
Mitaio: no sentido em que aparece no texto, refere-se aos trabalhadores das minas.
Página 83
Índios escravos trabalhando em uma mina em Cuba. Gravura de livro de André Thevet, séc. XVI.
Organizando ideias
Tanto para os indivíduos quanto para as comunidades nela envolvidas, a mineração exerceu
profundos efeitos sociais. Para o imigrante da Espanha ou para o colono pobre, a mineração
oferecia um caminho rápido, embora perigoso, para alcançar a distinção social. Os pouco
afortunados, por exemplo, que descobriram um veio no norte da Nova Espanha, na segunda
metade do século XVI, tornaram-se figuras de proeminência social. [...] A riqueza proveniente da
mineração era fonte não só de projeção social, como também de poder político. [...] Naturalmente,
porém, a mineração podia elevar um homem a altas posições sociais e políticas e em seguida lançá-
lo no abismo. Se o veio se perdesse, ou as galerias de repente ficassem inundadas, então uma mina
engoliria a prata com a mesma velocidade com que a havia vomitado. Os credores fechavam o
cerco, tomando terras, casas e bens pessoais. [...]
Também para os índios a mineração podia trazer profundas alterações sociais. A mais radical delas
foi a mudança da zona rural para a urbana que a mineração frequentemente impunha, a mudança
das comunidades agrícolas tradicionais para as vilas relativamente grandes, dominadas pelos
espanhóis. Essa transferência foi imposta a muitos índios pelo recrutamento forçado de mão de
obra; no entanto, alguns não retornaram a seu lugar de origem e decidiram permanecer no local
para onde haviam sido transferidos, criando dessa forma nos centros maiores, a partir do final do
século XVI, um corpo de mineiros profissionais que trabalhavam em troca de salários e passavam a
adotar hábitos espanhóis. [...] Foram, assim, perdendo pouco a pouco a sua identidade indígena e
passaram à categoria demestizo, na cultura, quando não no tipo genético. Evidentemente, essa
proletarização e aculturação dos índios não era rara nas cidades coloniais, uma vez que estas
constituíam o centro da presença espanhola, enquanto a zona rural permanecia
predominantemente indígena.
BAKEWELL, Peter. A mineração na América Espanhola Colonial. In: BETHELL, Leslie (Org.). História da América Latina: América
Latina Colonial. São Paulo: Edusp; Brasília: Funag, 2004. v. II. p. 127-128.
1. De acordo com o texto, de que maneira a mineração contribuiu para que colonos e imigrantes
espanhóis conseguissem distinção social? Pode-se afirmar que essa nova situação era definitiva?
Explique.
2. Qual foi o impacto social e cultural que a mineração causou nas populações indígenas?
Justifique.
A encomienda era a instituição por meio da qual a Coroa entregava, aos senhores espanhóis, “em
encomenda”, indígenas que deveriam ser protegidos e catequizados; em troca disso, os nativos tinham
de lhes pagar tributos. A partir de 1542, a encomienda só poderia comportar tributos, não serviços, mas
a modificação não foi obedecida em várias regiões. A princípio, os indígenas foram entregues
provisoriamente aos encomenderos, porém, com o passar do tempo, a entrega tornou-se permanente.
Outro modo de exploração foi o chamado repartimiento, que, no Peru, ficou conhecido como mita e, no
México, como cuatéquitl. Os vocábulos são de origem indígena, pois a instituição já existia antes da
chegada dos europeus. No Peru, por exemplo, a mita era o tributo pago pelas comunidades aos
governantes incas.
O repartimiento de indígenas era uma forma de trabalho compulsório, temporário e remunerado que as
comunidades nativas tinham de prestar aos espanhóis.
O trabalho compulsório imposto aos nativos, além das longas jornadas e péssimas condições de
trabalho, alojamento e alimentação, resultou na morte de muitos indígenas, fator determinante para a
diminuição das populações naturais da América.
CARDOSO, Ciro Flamarion S. O trabalho na América Latina. São Paulo: Ática, 1985. p. 49.
Página 85
Localizadas nas haciendas, as tiendas de raya eram armazéns onde se pagavam os salários e se vendiam
artigos para os trabalhadores. O papel das tiendas, entretanto, trazia outras implicações, uma vez que,
tendo de consumir os produtos de necessidade básica fornecidos pelas haciendas, os trabalhadores
acabavam criando dívidas com seus senhores. Dessa forma, quando recebiam o salário, pagavam o que
deviam e já precisavam de mais produtos, obtendo dívidas que só seriam saldadas no próximo
pagamento, o que impedia que se desvinculassem da atividade nas propriedades.
A dificuldade de empregar a mão de obra na tiva nas operações comerciais levou os europeus a utilizar o
trabalho de africanos escravizados na agricultura, nas minas, no artesanato, na indústria de confecções,
na Marinha Real e em uma série de outros lugares e práticas. Por serem considerados caros, os
africanos eram usados nas atividades mais rentáveis. Enquanto a escravidão dos indígenas provocou
duras condenações por parte de religiosos, a africana raramente foi criticada até o século XVIII. Com a
gradativa diminuição das populações indígenas, os africanos escravizados foram sendo introduzidos em
diversas regiões, sobretudo na costa da Venezuela e da Colômbia.
Coleção particular
Theodore de Bry. Negros trazidos de sua terra natal para trabalhar como escravos na América Espanhola, c.1541-1556. Gravura.
A escravidão negra esteve presente na América espanhola desde a chegada dos europeus. Cortés e
Pizarro receberam licença para a importação de escravos como uma compensação pelos gastos
pessoais ocorridos na conquista. O tráfico negreiro realizava-se muitas vezes como contrabando e,
portanto, seus números são imprecisos. [...] estima que chegaram aos territórios espanhóis 75 mil
escravos no século XVI; 125 mil no período de 1600-1650 e 344 mil entre 1651-1760 (média anual
de 3 mil). Enquanto isso, na América portuguesa, o mesmo autor estima que entraram 560 mil, só
no século XVII, perfazendo 41,8% do total de escravos remetido à América. A escravidão negra foi
empregada nas zonas de baixa densidade populacional, principalmente para o trabalho em minas
(México no século XVI, e Nova Granada), ou nas re giões onde a população autóctone havia sido
dizimada, prioritariamente nos cultivos tropicais de exportação, as plantations.
Foi uma relação minoritária na maior parte dos territórios espanhóis, mas adquiriu importância no
século XVIII nas costas caribenhas da Nova Granada e da Venezuela (com o cultivo do cacau), nas
faixas litorâneas do Equador e Peru e na ilha de Cuba (açúcar). As ordens religiosas utilizaram muito
a mão de obra escrava em suas propriedades. Os jesuítas possuíam, quando de sua expulsão dos
domínios espanhóis, em 1767, 5.224 escravos em suas fazendas peruanas, dos quais 62% na
plantation açucareira e 30% nos vinhedos. Comumente recebiam parcelas para cultivar seus
próprios alimentos [...], como ocorreu em outras áreas escravistas. [...]
WASSERMAN, Claudia (Coord.). História da América Latina: cinco séculos. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2010. p. 50-51.
Página 86
Os escravos africanos não trabalharam apenas nas grandes plantações. Muitos se tornaram artesãos,
criados domésticos, capatazes, pequenos comerciantes, barbeiros, lojistas e rea lizavam tarefas
remuneradas a terceiros. Na América Portuguesa esses escravos eram chamados de “escravos de
ganho”. Alguns deles economizavam e, com seus rendimentos, compravam a alforria. Alguns senhores,
por gratidão ou dificuldade econômica, libertavam seus cativos. As fugas também eram comuns, daí a
formação de quilombos no Brasil e de palenques na América Espanhola.
Quilombo é uma palavra de origem banta, que, no período escravista da América Portuguesa, foi
utilizada para designar o ajuntamento de escravos fugitivos. Nos quilombos, os negros se reuniam para
fugir do trabalho escravo, proteger-se do “resgate” de seus senhores, cultivar lavouras para sua
subsistência e dar continuidade a suas práticas culturais e religiosas. O mais famoso quilombo brasileiro
foi o Quilombo dos Palmares (fim do século XVI e início do século XVII), na região que hoje pertence ao
estado de Alagoas.
Organizando ideias
Leia o texto a seguir, sobre a escravidão africana na América Espanhola, e faça o que se pede.
Em regiões como Nova Granada (Colômbia) utiliza-se quase que exclusivamente negros na extração
de minérios, pois não há índios disponíveis. [...]
O ritmo de reprodução biológica do escravo é muito lento; em todo caso, menor que as
necessidades de reposição de mão de obra. Na América espanhola não há nada parecido com os
criadores de escravos da Virgínia e Carolina do Sul (Estados Unidos) destinados à venda para
plantações de algodão localizadas mais ao sudoeste. Pelo contrário: é notória a alta taxa de abortos
provocados deliberadamente pelas mulheres escravas, ou então como consequência das duras
condições de trabalho. Além disso, para o proprietário, uma mulher grávida é mão de obra forçada
a trabalhar menos. Assim, para não perder os dias de trabalho, os amos preferem que as mulheres
abortem.
No geral, tendeu-se – e não somente nas colônias espanholas – a importar muito mais homens
negros que mulheres. [...] O homem é preferido por razões produtivas. No que se refere às crianças
que nascem, a enorme mortalidade existente nas plantações faz com que somente 10% delas
chegue à idade adulta. [...]
Geralmente os amos possuem negros de diferentes origem tribal e cultural. Quanto menos se
entenderem entre si, menores são as possibilidades de entrar em acordo para ações comuns de
reivindicações. [...]
Quando a escravidão e a servidão são abolidas legalmente, sem que isso signifique ao mesmo
tempo mudanças fundamentais na estrutura da sociedade, os valores antigos persistem, assim
como os hábitos e usos, os preconceitos raciais e o simbolismo inerentes à sociedade legalmente
superada, mas não nas relações reais, atuantes e eficazes. O que usualmente se chama de
“mentalidade” se prolonga, se petrifica em favor da permanência daquilo que, dia a dia, hora a
hora, segrega essa “mentalidade”. [...]
POMER, León. História da América Hispano-Indígena. São Paulo: Global, 1983. p. 116-121.
Resgate cultural
Em 2013, dos estrangeiros com vínculo formal de trabalho, cerca de 40% tinham curso superior e pouco
mais de 30% haviam completado o Ensino Médio. Esses dados contribuem para compor um perfil
aproximado da integração dos estrangeiros ao mercado de trabalho formal do Brasil. Observe alguns
dados no fim da página.
E o trabalho informal? Os dados mais reveladores das más condições de trabalho de estrangeiros no
Brasil dizem respeito às autuações de empresas que oferecem aos trabalhadores condições análogas à
escravidão. Diferentemente do que é representado segundo o imaginário social, trabalhadores são
resgatados de condições degradantes não apenas em fazendas isoladas no interior do país, mas também
em grandes centros urbanos. Conheça uma dessas histórias.
Doze haitianos e dois bolivianos foram resgatados de condições análogas às de escravos em uma
oficina têxtil na região central de São Paulo. [...] As vítimas trabalhavam no local há dois meses
produzindo peças para a confecção As Marias, mas nunca receberam salários e passavam fome.
[...] No local também ficavam os quartos onde os doze haitianos, um casal de bolivianos e seu filho
de quatro anos dormiriam. Com colchões em mal estado no chão, mofo, infiltrações e péssimas
condições de higiene [...].
De segunda a sábado, submetidos a uma jornada que podia chegar a até 15 horas por dia, os
bolivianos teriam a função de ensinar às demais vítimas a costurar. Assim, os haitianos tiveram suas
carteiras de trabalho assinadas na função de “aprendiz de costureiro”. [...] O artifício tinha a função
de permitir o registro em carteira com salário de R$ 724 [...].
Apesar de baixo, o salário nunca veio. [...] Quando, quase dois meses depois do início do trabalho,
as vítimas reclamaram que queriam ser pagas, receberam da dona da oficina um vale de R$ 100.
Em contrapartida, deixaram de receber comida.
WROBLESKI, Stefano. Fiscalização resgata haitianos escravizados em oficina de costura em São Paulo. Repórter Brasil, 22 ago.
2014. Disponível em: <www.reporterbrasil.org.br/2014/08/fiscalizacao-resgata-haitianos-escravizados-emoficina-de-costura-em-
sao-paulo>. Acesso em: fev. 2016.
1. Por que muitos trabalhadores estrangeiros, mesmo com alto nível de escolaridade, acabam
enganados por empregadores envolvidos com o chamado trabalho escravo?
Paula Radi
Fonte: CAVALCANTI, Leonardo et al. A inserção dos imigrantes no mercado de trabalho brasileiro. Brasília: Cadernos do Observatório das
Migrações Internacionais, 2014. Disponível em: <www.freelists.org/archives/colombiamigra/11-2014/pdfMIS5kdHQv1.pdf>. Acesso em:
mar. 2016.
Página 88
Somente após outros países realizarem incursões pela costa brasileira, ameaçando a posse de Portugal e
a diminuição de lucros no comércio, os portugueses iniciaram a colonização do território da América.
A expedição colonizadora pioneira chegou em 1530 e fundou a primeira vila no Brasil, a de São Vicente,
no litoral do atual estado de São Paulo. Ali se iniciou o plantio de cana-de-açúcar, que movimentou a
economia local durante quase todo o Período Colonial (1530-1822).
Por vários motivos, entre eles, a falta de recursos financeiros dos donatários, esse sistema acabou
fracassando. Para tentar centralizar o poder, a segunda forma de administração foi o governo-geral, que
começou em 1548. Cabia aos governadores que se sucederam no poder, entre outras coisas, a
administração da colônia, o incentivo à implantação de engenhos e a criação de vilas e cidades,
garantindo o povoamento local. O governador-geral era o representante da Coroa portuguesa no Brasil.
Cartografia Histórica-USP
Georg Mattheus Seutter. Recens Elaborata Mapa Geographica Regni Brasiliae in América Meridionali Maxime Celebris Accurate
Delineata, 1750. Gravação em metal aquarelada, 53 cm × 60 cm. Neste mapa podemos observar a divisão das capitanias
hereditárias.
Trabalho e trabalhadores
No período dos primeiros contatos entre portugueses e povos nativos, quando o único produto tirado
das novas terras era o pau-brasil, a mão de obra indígena foi largamente utilizada na extração dessa
árvore.
Em geral, esses indígenas eram capturados, escravizados e forçados a extrair recursos naturais e cultivar
produtos destinados à exportação.
Assim como na América Espanhola, a utilização de grandes contingentes indígenas como mão de obra
colocou as populações nativas em contato com doenças europeias, que, somadas às péssimas condições
de vida e às longas e desgastantes jornadas de trabalho, acabaram devastando os povos originários do
atual Brasil.
Espalharam-se os engenhos por várias regiões do litoral brasileiro, mas foram os do atual Nordeste,
principalmente de Bahia e Pernambuco, que tiveram produção mais significativa e duradoura.
Entre 1550 e 1650, o Brasil foi o maior produtor mundial de açúcar. Para atender a essa produção
surgiram outras atividades econômicas, como a pecuária.
Aos portugueses e, em menor grau, aos castelhanos, coube sem dúvida a primazia no emprego do
regime que iria servir de modelo à exploração latifundiária e monocultora adotada depois por
outros povos. E a boa qualidade das terras do Nordeste brasileiro para a lavoura altamente
lucrativa da cana-de-açúcar fez com que essas terras se tornassem o cenário onde, por muito
tempo, se elaboraria em seus traços mais nítidos o tipo de organização agrária mais tarde
característico das colônias europeias situadas na zona tórrida. A abundância de terras férteis e
ainda mal desbravadas fez com que a grande propriedade rural se tornasse, aqui, a verdadeira
unidade de produção. Cumpria apenas resolver o problema do trabalho. E verificou-se, frustradas
as primeiras tenta ti vas de emprego de braço indígena, que o recurso mais fácil estaria na
introdução de escravos africanos.
HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. Rio de Janeiro: José Olympio, 1979. p. 17.
Apesar de os portugueses terem optado inicialmente pela escravização de indígenas, a partir do século
XVI os nativos foram sendo substituídos por escravos trazidos da África. Entre os principais motivos
estavam o interesse da Coroa portuguesa pelo rentável tráfico de escravos africanos devido à dupla
taxação – no momento do embarque na África e do desembarque no Brasil, o que aumentava a renda
da Coroa – e a diminuição da população nativa por extermínio ou fuga para o interior, dificultando a
captura.
Para os colonos, a substituição tinha várias vantagens, entre as quais o desconhecimento do território
pelos africanos, o que dificultava as fugas.
Os escravos africanos trabalharam em quase todas as atividades econômicas do Brasil Colonial: nas
plantações de cana, na mineração, nos centros urbanos como escravos de ganho ou de aluguel, nas
lavouras de subsistência, como transportadores de cargas e de gente, na limpeza das ruas, nos serviços
domésticos. Por quase 400 anos o Brasil foi um país escravista.
De forma geral, os escravos dos engenhos eram submetidos a longas jornadas de trabalho (de 14 a 17
horas), sob a vigilância constante dos feitores. Eram punidos caso não cumprissem as ordens de seus
senhores ou os contrariassem de alguma forma. Muitos castigos eram aplicados em público para servir
de exemplo aos demais.
As ações impositivas também se estendiam aos escravos que trabalhavam no ambiente urbano, tendo
em vista a exploração à qual eram submetidos.
Muitos escravos serviam como fonte de renda para seus senhores, os chamados escravos de ganho,
sendo alugados para outros senhores ou atuando em diferentes funções, como vendedores, artesãos,
costureiros, pedreiros, pintores, entre outras. Os escravos de ganho podiam receber do senhor parte do
lucro obtido com sua atividade. Havia também escravos que eram obrigados pelos donos a mendigar
nas ruas, principalmente nas portas das igrejas, entregando a seu proprietário parte do que arrecadava.
Vários escravos de ganho gozavam de certa autonomia e liberdade de locomoção, e muitos deles só
retornavam para pagar, diária ou semanalmente, a parte que cabia a seus senhores.
Glossário
Primazia: prioridade, primeiro lugar.
Página 90
Organizando ideias
A descrição a seguir é de um cirurgião naval inglês, Thomas Nelson, que presenciou o desembarque
de um navio negreiro no Rio de Janeiro em fevereiro de 1841.
Observei que muitos deles tinham rastejado até o lugar em que a água havia sido servida, na
esperança de conseguir um gole do líquido precioso; mas incapazes de retomar a seus lugares,
jaziam prostrados ao redor da tina. Aqui e ali, em meio ao aglomerado, havia casos isolados da
mesma doença repugnante em sua forma confluente ou pior, e casos de extrema emaciação e
exaustão, alguns em estado de completo estupor, outros olhando penosamente ao redor,
apontando com os dedos para suas bocas crestadas. Em todos os lados, rostos esquálidos e
encovados tornados ainda mais hediondos pelas pálpebras intumescidas e pela ejeção puriforme
de uma violenta oftalmia, da qual parecia sofrer a maioria, além disso, havia figuras reduzidas a
pele e osso, curvadas numa postura que originalmente foram forçados a adotar pela falta de
espaço, e que a debilidade e rigidez das juntas forçaram-nos a manter.
NELSON, Thomas apud CONRAD, Robert Edgar. Tumbeiros: o tráfico de escravos para o Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1985. p. 56.
Coleção particular
Seção de um navio negreiro. Ao regressar à Europa em 1829, a embarcação em que viajava o Rev. Robert Walsh, irlandês, abordou
em alto-mar um navio negreiro. Este transportava em condições desumanas 562 cativos negros trazidos da África.
1. De acordo com a imagem e as descrições do texto, quais eram as condições de saúde dos cativos
encontrados no navio e que fatores provocavam essa situação?
2. Em dupla, reflita e anote suas hipóteses para responder à seguinte questão: Como os escravos
eram mercadorias que só tinham valor comercial vivos, por que eram mantidos em condições que
propiciavam a morte durante o trajeto?
Glossário
Crestado: queimado.
Ejeção puriforme: secreção de pus.
Emaciação: magreza extrema.
Encovado: diz-se de rosto magro, com depressões.
Esquálido: referente à magreza extrema e desnutrição.
Estupor: paralisia da capacidade de exibir reações motoras e perceber o ambiente.
Intumescido: inchado.
Oftalmia: inflamação dos olhos.
Pústula: ferida, pequena erupção na pele.
Tina: vasilha grande feita de tábuas, como um barril.
Página 91
Várias foram as formas de resistência do escravo negro ao regime escravista. Mesmo com todas as
limitações que a estrutura do sistema impunha ao cativo, ele, ao contrário do que afirmam aqueles
que seguem a chamada historiografia acadêmica, resistiu de várias formas e níveis de importância
durante todo o tempo em que a escravidão perdurou. Resistiu usando desde formas ativas, como
as insurreições citadinas que não se esgotaram com a de Salvador, ocorridas durante o século XIX,
até os quilombos, disseminados em todo o território nacional – do Rio Grande do Sul ao Pará – e as
guerrilhas que permeavam as duas formas fundamentais de resistência.
MOURA, Clóvis. Os quilombos e a rebelião negra. São Paulo: Brasiliense, 1986. p. 94-95.
Entre as formas de resistência estavam as fugas, das quais surgiram esconderijos na mata denominados
quilombos.
Os quilombos chegavam a reunir milhares de pessoas que buscavam uma forma de organização baseada
em seus costumes. O mais famoso e duradouro deles foi o Quilombo de Palmares, na Serra da Barriga –
área que hoje pertence ao estado de Alagoas e na época fazia parte da capitania de Pernambuco.
Esses locais eram, quando descobertos, alvo de expedições militares que visavam destruí-los e
reescravizar sua população.
Além das fugas, revoltas e outras ações, os escravos buscavam pequenos espaços de negociação. Nesses
casos, muitas vezes conseguiam, por meio de pressões e negociações com os senhores, mais autonomia,
menos repressão e esporadicamente até a liberdade.
A repressão aos escravos era explícita não só no âmbito do trabalho mas no que dizia respeito a cultura,
religião e outros inúmeros costumes, trazidos das diversas regiões do continente africano das quais se
originavam.
Coleção Sergio Fadel, Rio de Janeiro
François Auguste Biard. Fuga de escravos, 1859. Óleo sobre madeira, 33 cm × 52 cm.
Página 92
A primeira reação dos senhores no Brasil foi a repressão desses costumes, já que acreditavam que
permitir as práticas religiosas e culturais promoveria maior união dos escravos, o que poderia facilitar a
resistência ao trabalho.
Entretanto, assim como resistiram à condição de trabalho imposta, os escravos também se opuseram à
proibição de suas práticas culturais, tanto que, ainda hoje, podemos perceber muitos traços de
diferentes culturas africanas que se fundiram à que já havia no Brasil, dando origem a novos costumes.
São inúmeros os exemplos de resistência cultural, como a música, a dança, a capoeira e as religiões afro-
brasileiras.
O que é possível detectar quando falamos de religiões afro-brasileiras é o sincretismo que uniu cultos a
divindades das diversas regiões africanas às tradições cristãs, para dar origem a religiões como o
candomblé e a umbanda.
O surgimento dessas religiões pode ser caracterizado como parte de uma estratégia de sobrevivência
cultural que promoveu a integração étnica entre os escravos africanos no ambiente brasileiro, criando,
em última análise, espaço para uma forma inicial de organização e inserção deles na sociedade que se
constituía.
Os terreiros – locais de culto às divindades e prática dos rituais religiosos afro-brasileiros – passaram,
nesse contexto, a constituir um local de assistência e apoio comunitário aos escravos. Dessa forma,
promoveram a resistência e a preservação de tradições culturais que perduraram ao longo dos séculos
e, presentes ainda hoje em todas as regiões do país, funcionam como meio de resgate às origens
africanas da cultura brasileira.
Babalorixá dando bênção no Terreiro Ile Axe Ala Obatalandê, Lauro de Freitas (BA), 2015.
GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Trabalho análogo à condição de escravo e degradante: antítese do trabalho decente. Revista do
Direito Trabalhista, Brasília, Consulex, ano 14, n. 3, mar. 2008.
Faça uma pesquisa e elabore um texto sobre a existência de escravidão ou condições análogas à
escravidão no Brasil contemporâneo analisando os casos à luz dos direitos humanos. Procure
informações também sobre as punições previstas em lei e busque saber se são aplicadas. Esse
assunto pode ser pesquisado na internet e em periódicos.
Página 93
Até o século XVII foram fundadas 13 colônias na América do Norte, todas subordinadas à metrópole
inglesa.
De acordo com o tipo de colonização implantado, essas colônias podem ser classificadas em duas
categorias, descritas a seguir.
• Colônias do norte: eram povoadas principalmente por religiosos puritanos, e nelas multiplicaram-se as
pequenas propriedades rurais baseadas na agricultura familiar e produção diversificada. Subsistiam
também da pecuária, da pesca e das serrarias, onde a madeira era beneficiada para a construção de
casas e navios. A produção era destinada ao mercado local, e o • excedente ia para o mercado regional.
• Colônias do sul: tinham sua economia baseada na monocultura de exportação, encaixando-se nas
práticas mercantilistas do período.
Esses fatores, somados à união entre Estado e burguesia na busca por novos mercados consumidores,
incentivaram a atividade colonizadora e, posteriormente, o desenvolvimento das colônias.
Como poucos podiam arcar com os custos da viagem, visto que esses primeiros imigrantes eram, na
maioria, pequenos burgueses, artesãos, comerciantes, camponeses e pequenos proprietários rurais, a
solução foi o financiamento da viagem por pessoas de recursos. Com isso, muitos imigrantes
comprometiam-se a pagar as despesas depois de instalados nas novas terras, gerando o que pode ser
chamada de servidão temporária.
Durante o século XVII, a principal força de trabalho nas colônias inglesas eram esses servos temporários,
sobretudo nas colônias do norte.
Já nas colônias do sul, essa força de trabalho servil não foi suficiente para a demanda exportadora,
motivo pelo qual foi preciso recorrer ao lucrativo comércio de escravos africanos.
Fototeca/Leemage/Glow Images
Os peregrinos: embarque de 102 famílias em 1620 a bordo do navio Mayflower. Gravura do século XVII de autoria desconhecida.
Essa imagem faz alusão às primeiras famílias de ingleses que desembarcaram na América do Norte.
Glossário
Beneficiamento: conjunto de procedimentos efetuados em matérias-primas antes da industrialização.
Página 94
Nas colônias inglesas, trabalhavam nas grandes plantações de tabaco, linho e algodão, produtos que
causavam rápido esgotamento do solo, aumentando cada vez mais a área das propriedades.
Estima-se que no século XVII, na Virginia e Carolina do Sul, a maioria da população constituía-se de
africanos escravizados. Com isso, foram criadas leis específicas para regulamentar a vida deles. Havia
leis, por exemplo, proibindo-os de se reunir nas cidades aos domingos, para evitar aglomerações e
insurreições contra seus senhores. Também era proibido o porte de armas, e os crimes cometidos por
eles eram julgados com mais rigor, principalmente nos casos de rebeliões coletivas.
A resistência escrava se fazia por meio de fugas, destruição de plantações, quebra de ferramentas,
diminuição no ritmo de trabalho, insurreições e fingimento de doenças.
Organizando ideias
1. Observe o mapa e responda às questões propostas.
© DAE/Studio Caparroz
a) De que forma a população afro-americana se distribui pelo território dos Estados Unidos nos
dias atuais?
No processo de colonização da América, a doutrina econômica dominante foi o mercantilismo, que pode
ser entendido como uma política econômica própria dos Estados europeus modernos, nos quais
predominava o regime absolutista. No sistema mercantilista, podemos destacar as seguintes
• características principais: forte presença estatal, por meio de leis e regulamentos intervencionistas;
As práticas mercantilistas variaram de acordo com a época, bem como de um país para outro. O
mercantilismo ibérico foi essencialmente metalista (privilegiava o acúmulo de metais preciosos) e
mantinha monopólio sobre o comércio com suas colônias (o chamado pacto colonial); já os ingleses
priorizaram uma balança comercial favorável.
De forma geral, as colônias americanas deveriam fornecer matérias-primas e metais preciosos, comprar
produtos da metrópole e empregar os excedentes populacionais metropolitanos.
A partir da metade do século XVIII e à medida que as forças produtivas avançavam, o Antigo Regime
entrou em profunda crise.
Cada vez mais fortalecida, a burguesia passou a questionar os privilégios do clero e da nobreza. No
campo, começaram a ser contestadas as relações sociais baseadas no regime de servidão e erradicados
os resquícios feudais que impediam a implantação completa do capitalismo.
A filosofia iluminista também teve papel relevante na derrocada do Antigo Regime e, por extensão, do
antigo sistema colonial.
Dudley Wood/Alamy; Stock Photo/Latinstock
O Antigo Regime da Europa centro-oci dental do século XV ao XVIII caracterizou-se pelo Estado
absolutista, pelas práticas mercantilistas, pela sociedade de ordens (distinções sociais e privilégios com
base no nascimento) e por uma visão de mundo essencialmente aristocrática.
O termo iluminista indica um movimento de ideias que teve suas origens no século XVII, mas que
atingiu o apogeu no século XVIII, chamado de Século das Luzes.
Em síntese, os séculos XVIII e XIX foram palco de inúmeras mudanças, sobretudo para o mundo
europeu, como a queda das monarquias absolutistas e suas práticas mercantilistas, a difusão dos ideais
iluministas, os movimentos que transformaram as estruturas políticas, econômicas e sociais, como a
Revolução Industrial e a Revolução Francesa. Essas mudanças espalharam-se pela Europa e para além de
suas fronteiras geográficas, atingindo as colônias europeias na América.
Os ideais de liberdade e igualdade defendidos pela Revolução Francesa difundiram-se pelas colônias
motivando lutas por sua realização. Essas lutas levaram à independência das colônias e à formação de
novos países.
Bianchetti/Leemage/Other Images
Organizando ideias
Leia, a seguir, o fragmento de um documento assinado por Larcher, capitão francês de um navio
em expedição ao Brasil no século XVIII, e responda às questões.
O Povo, que eu tive a honra de Vos descrever na minha memória de 27 Prairéal 5º, é aquele de São
Salvador na Baía de Todos os Santos, capital da mais considerável Capitania do Brasil cuja
População é avaliada em sessenta mil almas.
Os habitantes investidos dos direitos do homem clamam sua independência; eles a pedem à
República francesa, e não a Desejam senão de Vós.
[...]
Assim que o comandante da divisão tiver lançado o sinal combinado, a colônia se levantará em
massa, as tropas se reunirão aos habitantes que tomarão a casa da moeda, cofres, depósitos, e o
arsenal: destituem-se todas as autoridades do Governo, e criam-se outras Populares [...].
Esta revolução terá um efeito elétrico sobre as outras capitanias do Brasil, a experiência nos prova:
todas elas se reunirão para formar um povo livre. [...]
Um tratado de aliança com a República francesa terá lugar imediatamente: um outro de Comércio
deve necessariamente o seguir: a República francesa poderá exigir a exclusividade durante um
certo número de anos em que sua proteção será indispensável a este novo Povo [...].
Projeto de expedição contra São Salvador (Brasil) pelo cap. de navio Larcher – 24 de abril de 1797 apud JANCSÓ, István; MOREL,
Marco. Novas perspectivas sobre a presença francesa na Bahia em torno de 1798. Topoi, v. 8, n. 14, p. 220, jan./jun. 2007.
3. Faça uma pesquisa sobre a época em que o documento foi redigido e responda:
A partir da segunda metade do século XVIII, porém, o Parlamento britânico foi tomando uma série de
medidas coercitivas que intensificaram o controle sobre o comércio e, com isso, prejudicaram os
colonos americanos. Essas medidas visavam aumentar a arrecadação fiscal da metrópole.
Foram diversas leis que incluíam proibições, taxações e perda do monopólio das colônias. Entre elas
estão a Lei do Açúcar (1764), a Lei do Selo (1765) e a Lei do Chá (1773). O golpe final da metrópole veio
com as Leis Intoleráveis (1774), um conjunto de medidas altamente repressivas que visavam conter as
reações dos colonos às outras leis.
Essas medidas provocaram reação imediata das elites coloniais, que, temendo a perda de sua relativa
autonomia, contestavam a cobrança abusiva de impostos.
As colônias se reuniram, em 1774, no Congresso Continental da Filadélfia para pedir o fim das medidas
restritivas a seu desenvolvimento. A metrópole reagiu aumentando ainda mais a repressão.
O que se seguiu foi uma série de conflitos armados que contribuíram para a adesão de alguns setores
conservadores das colônias do sul às reivindicações e para o retorno da autonomia. Começava, então, a
guerra pela independência das 13 colônias.
Em 1775 houve o Segundo Congresso da Filadélfia, no qual se iniciou a redação da Declaração Unânime
dos Treze Estados Unidos da América, finalizada em 4 de julho de 1776. Esse documento se tornou a
Declaração de Independência das colônias que mais tarde formariam os Estados Unidos da América.
A Revolução Americana de 1776 foi a primeira rebelião bem-sucedida do mundo colonial. O processo
emancipador foi pautado em diversos ideais iluministas, como liberdade, justiça e combate à opressão.
Organizando ideias
Leia o texto a seguir e faça o que se pede.
Em 4 de julho de 1776, as treze colônias que vieram inicialmente a constituir os Estados Unidos da
América (EUA) declaravam sua independência e justificavam a ruptura do Pacto Colonial. Em
palavras candentes e profundamente subversivas para a época, afirmavam a igualdade dos homens
e apregoavam como seus direitos inalienáveis: o direito à vida, à liberdade e à busca da felicidade.
Afirmavam que o poder dos governantes, aos quais cabia a defesa daqueles direitos, derivava dos
governados. Portanto, cabia a eles derrubar o governante quando ele deixasse de cumprir sua
função de defensor dos direitos e resvalasse pelo despotismo.
Esses conceitos revolucionários que ecoavam o Iluminismo foram retomados com maior vigor e
amplitude treze anos mais tarde, em 1789, na França.
COSTA, Emília Viotti da. Apresentação da coleção. In: WINN, Peter. A Revolução Chilena. São Paulo: Unesp, 2003. p. 6.
1. Por que a autora afirma que as ideias iluministas eram subversivas para a época?
2. Explique por que a Declaração de Independência dos Estados Unidos é considerada um marco de
luta pelos direitos humanos.
Glossário
Apregoar: como foi utilizado no texto, o termo tem o sentido de divulgar, denunciar.
Candente: muito intenso; entusiasmado, ardoroso.
Página 98
O reinado de Carlos IV (1788-1808) pautava-se pelo absolutismo e por uma frágil política econômica. As
colônias na América deveriam essencialmente pagar tributo, fornecer metais preciosos e comprar as
onerosas manufaturas metropolitanas.
Nas últimas décadas do século XVIII, os reis da Dinastia Bourbon procuraram modernizar a Espanha,
bem como suas relações com as colônias. Foi implantado um modelo mais eficiente de tributação e de
arrecadação dos impostos. Por outro lado, foram abrandadas as regras relativas ao comércio entre a
América e a metrópole. A medida desagradou os comerciantes espanhóis, que perdiam o monopólio, e
tampouco satisfez os criollos (brancos nascidos na América), que consideravam as mudanças
insuficientes.
Essas reformas tornaram mais difícil a ascensão dos criollos aos altos cargos administrativos e
eclesiásticos, o que aumentava o ressentimento em relação à metrópole. Quanto aos segmentos mais
pobres da sociedade, nada foi feito pela Coroa para que a situação mudasse.
À medida que os interesses econômicos da elite criolla iam sendo cada vez mais contidos pela
administração colonial, as diferenças entre colônia e metrópole se intensificavam, instigando ainda mais
o desejo dos colonos de romper com a estrutura vigente.
[...] na década de 1770, quando um cacique de Tinta, ao sul de Cuzco, começou a desenvolver
ambições políticas reformistas, mudou seu sobrenome de Condorconqui para “Tupac Amaru”,
nome do último inca a resistir aos espanhóis no século XVI, e afirmou ser, talvez legitimamente,
descendente direto do imperador rebelde.
Como Tupac Amaru ele liderou um grupo que, em novembro de 1780, executou o corregedor local
por abusar da população índia, recrutou um grande exército de maioria indígena, travou batalhas
contra a resistência armada espanhola, ameaçou Cuzco e, por algum tempo, dominou grande
extensão da área do altiplano, até que se organizaram forças para derrotá-lo e executá-lo em maio
de 1781. Mas se a revolta tinha base indígena, sua liderança era, em grande parte, crioula e
mestiça – gente dos níveis médios das sociedades da província. O próprio Tupac Amaru tinha certa
ascendência espanhola, fora educado em espanhol e tinha esposa espanhola. E se, por um lado, ele
enfatizou o patriotismo inca entre os índios, entre os não índios falava de impostos mais baixos e
justos, tribunais melhores e economia regional mais aberta. [...]
SCHWARTZ, Stuart B.; LOCKHART, James. A América Latina na época colonial. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. p. 468-
469.
Georgios Kollidas/Alamy/Glow Images
Por sua atuação como líder da resistência indígena, Tupac Amaru II foi considerado um herói nacional no Peru. Com isso, passou a
ser representado em diferentes símbolos nacionais, como nessa cédula de 50 soles de oro, moeda em circulação em 1977.
Peru
O contingente indígena tinha um peso significativo. No Peru, por exemplo, em uma população de 1 115
207 habitantes (em 1795), 58% eram indígenas; 20%, mestiços; 10%, negros livres e escravos; e 12%,
brancos. A elite – europeus e descendentes – temia os nativos e suas revoltas.
Uma dessas temidas revoltas foi a rebelião de Tupac Amaru, em 1780, no Peru, um movimento indígena
que teve a participação de africanos e afrodescendentes interessados no fim da escravidão.
Página 99
A elite criolla perdia paulatinamente a confiança no governo espanhol, desencadeando uma série de
movimentos contestatórios. Eram revoltas contra tributos, o europeu e toda e qualquer forma de
sujeição.
Com a derrota de Napoleão, em 1813, o rei Fernando VII voltou ao trono. Sem considerar as mudanças
que haviam ocorrido, procurou manter a mesma política mercantilista e arbitrária em relação às
colônias. Com isso, os interesses dos criollos foram prejudicados pela metrópole.
México
No México, ocorreu uma tentativa emancipadora com participação ativa dos grupos mais pobres da
população. A Nova Espanha (atual México) era a mais rica das colônias espanholas. Com uma população
de pouco mais de 6 milhões de habitantes, era responsável por um terço da população total do império
ultramarino.
Uma parte da elite criolla não apoiou os movimentos emancipacionistas. Alguns lutaram do lado dos
espanhóis. Outros passaram a conspirar contra a metrópole.
O padre Miguel Hidalgo, inspirado pelos ideais iluministas, aderiu ao movimento, objetivando melhorar
a vida de indígenas e mestiços.
Na manhã de 16 de setembro de 1810, Hidalgo proferiu seu “Grito de Dolores”. Invocando a proteção
de Virgem de Guadalupe – padroeira do México –, convocou indígenas e mestiços a se juntarem a ele
num levante cujos objetivos eram eliminar o domínio espanhol, defender a religião, abolir a escravatura
e promover a devolução das terras às comunidades indígenas.
Os rebeldes chegaram a formar um exército de 80 mil homens, que saquearam aldeias e povoados,
executaram espanhóis e chegaram a amea çar a Cidade do México. Entretanto, os realis tas
desencadearam uma violenta contraofensiva, e Hidalgo foi preso e fuzilado. Ainda assim, a rebelião não
estava vencida e, sob o comando do padre José Maria Morelos, o movimento revolucionário renasceu.
Museu Miguel Hidalgo, Dolores Hidalgo/John Mitchell/Alamy/Other Images
Grito de Independência em 16 de novembro de 1810, pintura de autoria desconhecida a respeito da Independência do México e
do líder Miguel Hidalgo. Em exposição na Museo Casa de Hidalgo, antiga casa de Miguel Hidalgo, na cidade de Dolores Hidalgo,
estado de Guanajuato (México).
Página 100
[...] Morelos adotou também medidas importantes, que tornaram mais claros os objetivos políticos
e sociais da revolta [...]. Seu programa tinha em mira a independência (proclamada em 1813), uma
forma congressional de governo e reformas sociais – entre elas, a abolição do tributo, da
escravidão, do sistema de castas e de barreiras legais ao avanço das classes baixas, bem como a
introdução do imposto de renda. Defendeu também a distribuição das terras aos que nela
trabalhavam [...] atenuou sua revolução social com declarações sobre o primado absoluto da Igreja
Católica [...]. Tentou atrair abertamente o apoio dos “criollos” com declarações mais moderadas,
mas, como Hidalgo, não conseguiu obtê-lo.
ANNA, Timothy. A Independência do México e da América Central. In: BETHELL, Leslie (Org.). História da América Latina: da
independência a 1870. São Paulo: Edusp; Brasília: Funag, 2004. v. III. p. 89.
Morelos foi capturado, levado para a Cidade do México, julgado e condenado à morte.
Apesar disso, a emancipação política do México foi retomada pelas forças conservadoras. Agustín de
Iturbide, militar que se destacara nas lutas contra Hidalgo e Morelos, considerou o processo de
independência irreversível e negociou com o líder rebelde Vicente Guerrero. Em Iguala, proclamou seu
plano: o México deveria ser governado por Fernando VII ou outro príncipe que ele designasse, criollos e
espanhóis teriam direitos iguais e a Igreja Católica seria a única a manter todos os seus privilégios.
Como nenhum monarca europeu foi designado para governar o México, Agustín de Iturbide foi
declarado imperador do México.
Guatemala, El Salvador, Nicarágua, Honduras e Costa Rica aderiram ao Império Mexicano, que durou
pouco mais de um ano (de 1822 a 1823). Agustín de Iturbide foi deposto pelo general Antonio López de
Santa Anna, que proclamou a república. Também em 1823, a antiga capitania da Guatemala separou-se
do México, formando a federação independente das Províncias Unidas da América Central, a qual mais
tarde se fragmentou formando vários novos países.
Arturo Michelena. Entrega da bandeira vencedora de Numancia ao batalhão Sem Nome, 1883. Óleo sobre tela. (detalhe).
América Andina
Na América Andina, o grande articulador e executor do movimento emancipatório foi Simón Bolívar. De
família rica, Bolívar recebeu excelente educação, que incluiu o estudo dos pensadores iluministas, e,
depois de viajar para a Europa e os Estados Unidos, engajou-se nas lutas pela independência.
Apoiou Francisco Miranda quando este proclamou a Primeira República Venezuelana, em 1810, que
acabou fracassando. Em 1812, fundou a Segunda República Venezuelana, que também sucumbiu diante
da reação espanhola. Refugiou-se na Jamaica e, depois, viajou ao Haiti, onde recebeu o apoio do
presidente Alexandre Pétion.
Em 1816, Bolívar retornou à Venezuela, iniciando uma campanha de emancipação das colônias que
resultou na independência da Colômbia, da Venezuela e do Equador.
Página 101
Outra personalidade considerada um “líder da independência” na América Latina foi José de San Martín.
Nascido na Argentina, ele destacou-se na liderança das lutas pela independência da Argentina, do Chile
e do Peru. Suas ações no Peru foram importantes para que José Antonio Sucre, lugar-tenente de Bolívar,
derrotasse o último batalhão espanhol na América. Quanto ao encontro de San Martín e Bolívar em
Guayaquil, pouco se sabe de fato. Basicamente, os dois tinham projetos diferentes sobre o futuro da
América Espanhola. Bolívar esperava a unidade, já San Martín argumentava em prol da criação de vários
Estados independentes, pois entendia que as barreiras geográficas e os interesses locais impediriam a
união.
J. Collignon. Entrevista de Guayaquil em 1822, 1843. Litografia colorida. A imagem retrata o encontro de San Martín e Simón
Bolívar.
[...] a elite “criolla” exercia seu papel de misto de bombeiro e carcereiro durante todo o século XIX.
Independência, sim, mas branca, latifundiária e controle social. A ruptura com a Espanha abriria um
novo ciclo de ditaduras na América Hispânica. Como escreveu o jurista argentino Juan Bautista
Alberdi: “Agora que nos libertamos da Espanha, quem nos libertará de nossos libertadores?”
KARNAL, Leandro. Um mundo às vésperas do colapso. História Viva, São Paulo, Duetto Editorial, n. 48, p. 45, out. 2007.
Organizando ideias
Leia o texto a seguir e faça o que se pede.
A posição dos habitantes no hemisfério americano tem sido, no decorrer dos séculos, puramente
passiva; a sua existência política era nula.
Nós, os do sul, estávamos num grau mais baixo da servidão, e, como tal, com mais dificuldades
para nos elevarmos ao prazer da liberdade.
Permita-me estas considerações para assentar a questão. Os Estados são escravos pela natureza de
sua Constituição, ou por abuso da mesma, de modo que um povo é escravo quando o governo, por
essência ou por vício, calca ou usurpa os direitos do cidadão ou súdito. Aplicando estes princípios,
diremos que a América não só estava privada da sua liberdade, mas também de uma tirania ativa e
dominante [...].
É uma ideia grandiosa pretender formar o Mundo Novo uma só nação, com um único vínculo
ligando suas partes entre si e com o todo.
Visto que tem uma origem, uma língua, costumes e uma religião, deveria ter um só governo que
confederasse os diferentes Estados que venham a se formar, mas não é possível, porque climas
remotos, situações diversas, interesses opostos, características não semelhantes dividem a
América.
1. Existe alguma relação entre o pensamento de Bolívar expresso no documento anterior e a atual
situação americana? Explique.
Página 102
Haiti
No século XVII, os franceses ocuparam parte da ilha, dizimaram a população indígena e deram início à
lavoura açucareira, fundamentada no trabalho escravo dos africanos. A partir do século XVIII, Saint-
Domingue seria a mais rica de todas as colônias ultramarinas francesas. Em 1789, quando teve início a
Revolução Francesa, a população era de 800 mil habitantes, 85% dos quais escravos.
Mais tarde, quando a França esteve sob o domínio de Napoleão Bonaparte, algumas conquistas se
perderam. Após diversos combates, L’Ouverture entregou-se aos franceses. Enviado para a França,
morreu num presídio em 1803.
Em 1802, os líderes negros Alexandre Pétion, Henri Christophe e Jean-Jacques Dessalines uniram-se para
combater os franceses. Em janeiro de 1804, a colônia francesa de Saint-Domingue tornou-se
independente, adotando o nome nativo de Haiti. Os escravos foram libertos.
Dessalines coroou-se imperador, com o título de Jacques I. Como adotou métodos autoritários de
governo – arrendamento de terras e cobrança abusiva de impostos –, ocorreram muitos protestos e
conflitos, que resultaram no declínio de seu império, seguido pela recuperação da parte leste da ilha
pelos espanhóis. As ações adotadas por Dessalines resultaram em uma conspiração de generais,
culminando em seu assassinato em 1806.
Os planejadores da conspiração acabaram se envolvendo em uma guerra civil, que resultou na divisão
do país entre dois líderes: Henri Christophe – que governou o norte sob o título de Henri I – e Alexandre
Pétion – que governou o sul.
Com a morte de Pétion (1818), foi eleito Jean-Pierre Boyer, que, após o suicídio de Henri (1820),
promoveu a unificação do país e conquistou a parte oriental da ilha.
O último “ajuste” do território haitiano ocorreu em 1843, quando a República do Haiti, na parte
ocidental, foi separada da República Dominicana, na oriental.
Coleção particular
Gravura que retrata a Revolta em Leocane (Haiti), em 1791. Autoria desconhecida, 1840.
Página 103
Organizando ideias
Leia os textos a seguir e responda às questões propostas.
Texto 1
Seus sócios, os donos das terras, não estavam, por sua vez, interessados em resolver “a questão
agrária”, senão na medida de suas próprias conveniências. O latifúndio consolidou-se sobre o
saque, ao longo do século XIX. A reforma agrária foi, na região, uma bandeira precoce. Frustração
econômica, frustração social, frustração nacional: uma história de traições sucedeu à
independência.
GALEANO, Eduardo. As veias abertas da América Latina. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2007. p. 128-129.
Texto 2
POMER, Leon. A independência da América Latina. São Paulo: Brasiliense, 1996. p. 12.
1. De acordo com os textos, os objetivos da independência foram atingidos? Justifique.
No início do século XIX, a França era governada por Napoleão Bonaparte. Com o objetivo de tornar esse
país uma potência continental, as ambições expansionistas do imperador esbarravam na Inglaterra, sua
maior rival. Consciente da impossibilidade de vencer os ingleses militarmente, Napoleão resolveu
prejudicá-los economicamente. Em 1806, ele decretou o Bloqueio Continental, que proibia as nações
europeias de comercializarem com a Inglaterra, sob a ameaça de ter seus territórios invadidos pelas
tropas francesas caso não cumprissem as determinações do bloqueio. Essa medida gerou um problema
para Portugal, pois o país dependia economicamente da Inglaterra.
Desejando manter boas relações com ambos os países, o monarca português D. João optou pela
neutralidade, mas não pôde sustentar essa posição por muito tempo. Em 1807, a pressão francesa
aumentou e Napoleão determinou a invasão de Portugal, enviando as primeiras tropas para a região.
Com o risco de perder o trono, D. João resolveu transferir a Corte portuguesa para o Brasil, contando
com o apoio e a escolta de navios ingleses. O projeto de transferência da Corte já havia sido cogitado na
metade do século XVIII, visando aumentar a eficiência da administração da região mineradora.
Quando D. João e a Corte portuguesa mudaram-se para o Brasil, em 1808, a cidade do Rio de Janeiro
tornou-se a nova capital.
Em 1815, com a queda de Napoleão Bonaparte, D. João foi chamado a reassumir seu trono em Portugal,
o que lhe criou um impasse, já que não poderia mais governar a metrópole vivendo na colônia.
Para resolver a situação, D. João elevou o Brasil a Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, igualando-o
assim politicamente a Portugal. Esse passo, apesar de não mudar efetivamente a situação da colônia,
possibilitou o surgimento das condições para a independência brasileira.
Em 1820, a situação político-econômica do Brasil era estável. Já em Portugal, houve piora na crise
política, militar e econômica, o que levou à deflagração da Revolução Liberal do Porto na cidade
homônima. Entre as reivindicações dos líderes desse movimento estavam o retorno de D. João VI para
assumir o trono e, com isso, a convocação de uma Assembleia Constituinte.
Pressionado por esses acontecimentos, D. João VI partiu em abril de 1821 para Portugal, deixando no
comando do Brasil seu filho e herdeiro, o príncipe regente D. Pedro de Alcântara.
As Cortes Portuguesas desejavam reverter as conquistas políticas e econômicas alcançadas pelo Brasil.
Diante disso, a classe dominante da colônia se sentiu impelida a buscar a independência, pois não queria
mais a antiga subordinação.
A Revolução Liberal do Porto, entre outras reivindicações, era a favor da volta do pacto colonial e da
elaboração de uma Constituição para Portugal e seus domínios ultramarinos. Esse processo levou à
criação das Cortes Gerais e Extraordinárias da Nação Portuguesa, também conhecidas como Cortes
Portuguesas e Soberano Congresso – reunidas entre 1821 e 1822 –, que foram, de maneira geral, o
primeiro Parlamento português, interferindo bastante no regime político de Portugal. Para compor as
Cortes, foram eleitos deputados representantes de Portugal e das províncias brasileiras, que, além da
participação na Constituição, tinham a incumbência de analisar e orientar as ações empreendidas pela
Coroa em seu período de vigência.
Em 1821 houve em Portugal uma reunião das Cortes, para a qual o Brasil, como parte do império,
também deveria enviar representantes. Mas as Cortes se reuniram antes da chegada desses
representantes, exigindo que o rei assinasse um documento que anulava o título de regente de D.
Pedro, o que reduziria a autonomia da colônia. Reivindicavam, ainda, o retorno imediato de D. Pedro a
Portugal.
No Brasil, além de sofrer a pressão vinda de Portugal, D. Pedro era pressionado internamente,
sobretudo pelos dois grupos políticos locais: o Partido Português, integrado por militares e comerciantes
de origem lusitana que apoiavam as decisões da metrópole, e o Partido Brasileiro, composto de
comerciantes, proprietários de terras e profissionais liberais que queriam a manutenção da autonomia
do país.
No início de 1822, foi entregue a D. Pedro um manifesto elaborado pelas elites brasileiras com centenas
de assinaturas pedindo-lhe que ficasse no Brasil. Esse abaixo-assinado o levou a decidir sua permanência
em 9 de janeiro do mesmo ano. Esse foi o primeiro de uma série de episódios protagonizados por D.
Pedro que desagradaram as Cortes Portuguesas, culminando com a separação do Brasil de Portugal.
Dentre eles, destacam-se:
• a nomeação de José Bonifácio de Andrada e Silva, membro do Partido Brasileiro, para chefiar o
ministério;
• em maio de 1822, a decretação de que nenhuma ordem vinda das Cortes Portuguesas seria cumprida
sem sua prévia autorização;
• em agosto, a proibição da entrada das tropas portuguesas no Brasil sem sua autorização.
No início de setembro, em resposta a essas ações, as Cortes Portuguesas enviaram despachos ao Brasil
tornando nulas as decisões de D. Pedro e ordenando seu imediato retorno a Portugal.
Naquele momento, o príncipe regente estava em São Paulo, onde recebeu esses despachos das mãos de
um mensageiro junto com um aconselhamento de José Bonifácio de romper os laços com a metrópole.
Página 106
Diante dessa situação, D. Pedro declarou a Independência do Brasil. Isso aconteceu no dia 7 de
setembro de 1822. Em 12 de outubro, ele foi aclamado imperador e, em 1º de dezembro, coroado com
o título de D. Pedro I, Imperador do Brasil.
A independência do Brasil, ao contrário do que ocorreu na América Espanhola, foi instaurada de forma
rápida e sem fragmentação da colônia em diversos países. Houve graves conflitos armados em algumas
províncias (entre elas Bahia, Piauí e Pará) como reação à independência, mas todos foram debelados até
o fim de 1823.
[...] Se o movimento foi liberal, porque rompeu com a dominação colonial, mostrou-se conservador
ao manter a monarquia, o sistema escravocrata e o domínio senhorial. Além do mais, se o processo
de emancipação foi deflagrado pela vinda da corte, o que explica o formato final é o movimento
interno de ajustamento às pressões de dentro e de fora, e principalmente um processo de
substituição de metrópoles: com o atual reinando bem na região Centro-Sul do recém-fundado
país. Por outro lado, se uma nova unidade política foi implantada, prevaleceu uma noção estreita
de cidadania, que alijou do exercício da política uma vasta parte da população e ainda mais o
extenso contingente de escravizados. […].
SCHWARCZ, Lilia Moritz. STARLING, Heloisa Murgel. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. p. 222.
In: Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Coleção particular.
Jean-Baptiste Debret. Cerimônia de coroação de D. Pedro I, Imperador do Brasil, 1822. Aquarela, 27,5 cm × 20,5 cm.
Página 107
Organizando ideias
1. Leia o texto a seguir e faça o que se pede.
BETHELL, Leslie (Org.). A independência do Brasil. In: História da América Latina: da Independência até 1870. São Paulo: Edusp;
Brasília: Funag, 2004. v. III. p. 229-230.
a) Explique a “continuidade política” citada pelo autor com relação ao Brasil independente.
François-René Moureaux. A Proclamação da Independência, 1844. Óleo sobre tela, 2,44 m × 3,83 m.
Museu Paulista/USP, São Paulo
Pedro Américo. Independência ou morte, 1888. Óleo sobre tela, 4,15 m × 7,60 m.
b) Em dupla, responda: Qual é o papel das pinturas históricas na construção da memória nacional?
Página 108
Debate interdisciplinar
A transformação dos metais
Durante a exploração europeia na América, a extração de metais foi a principal atividade econômica. A
extração de prata e ouro, por exemplo, foi responsável pelo aumento das receitas da Coroa espanhola.
Além dos metais preciosos, outros metais eram explorados com o objetivo de compor ligas metálicas
utilizadas na fabricação de diversos artefatos, incluindo armas para a repressão dos povos nativos.
Minerais metálicos
Os minerais metálicos são recursos naturais não renováveis encontrados em estruturas geológicas muito
antigas. Correspondem a substâncias compostas, entre outros elementos, de químicos de metal, como a
hematita, que tem em sua composição o óxido de ferro (Fe 2O3), e a bauxita, que contém óxido de
alumínio (Al2O3). Os minerais metálicos mais abundantes são o cobre (Cu), o alumínio (Al), o zinco (Zn), o
ferro (Fe) e o chumbo (Pb). Em contrapartida, os mais escassos são o ouro (Au) e a prata (Ag). Como os
metais não se encontram de forma pura na natureza, é preciso extraí-los e purificá-los. A obtenção dos
minerais metálicos ocorre por meio de processos químicos.
Obtenção de ferro
O ferro é um dos elementos mais abundantes e um dos mais importantes do ponto de vista econômico,
pois é utilizado como base na siderurgia, setor industrial que produz a liga metálica mais utilizada no
mundo: o aço.
O ferro é obtido da hematita (Fe2O3), da magnetita (Fe3O4), da limonita (2 Fe2O3 3 H2O) ou da siderita
(FeCO3). O princípio básico da formação do ferro é a interação de seus minérios com o monóxido de
carbono (CO), produzindo ferro metálico e gás carbônico.
óxido de ferro "mais" monóxido de carbono "gera" ferro metálico "mais" gás carbônico
Essa é uma reação de oxidorredução na qual o monóxido de carbono (CO) é o agente redutor, pois
causou a redução do ferro.
Outros metais, como o alumínio, são obtidos por eletrólise, que é a redução dos minérios por meio de
corrente elétrica, método econômico e eficiente.
Phil Clarke Hill/In Pictures/Corbis/Latinstock
Ligas metálicas
Muitos dos materiais encontrados no cotidiano são considerados metais, embora na maioria sejam, de
fato, ligas metálicas.
Uma liga metálica corresponde à união de dois ou mais elementos químicos, no qual pelo menos um
deles (o predominante) é um metal e os outros podem ser outros metais ou diferentes elementos. Essa
união dá origem a um material com propriedades metálicas, criado para modificar ou acrescentar
propriedades diferentes das propriedades dos metais formados. Veja alguns exemplos a seguir.
1. Bronze – a liga entre o cobre (Cu) e o estanho (Sn) produz um material flexível e resistente à
corrosão. Principais usos: industrial (fabricação de parafusos, ferramentas, aparelhos elétricos, conexões
hidráulicas etc.); fabricação de sinos, instrumentos musicais e objetos de decoração.
2. Latão – a liga entre o cobre (Cu) e o zinco (Zn) produz um material resistente à corrosão em
atmosfera ambiente e água do mar. As aplicações do latão são vastas, desde armamento e munições,
passando pela ornamentação, até tubos de condensador e terminais elétricos.
3. Aço carbono – liga entre o ferro (Fe) e pequenas quantidades de carbono (C). Dentro do aço, o
carbono se junta ao ferro e forma um composto chamado carboneto de ferro ou cementita (Fe 3C), uma
substância muito dura que é responsável pela dureza do aço, pois aumenta sua resistência mecânica.
Esse tipo de liga constitui a mais importante categoria de materiais metálicos usada na construção de
máquinas, equipamentos, estruturas, veículos etc.
Formação da cementita
3 Fe + C → Fe3C
Zoonar/Artem Merzlenko/Alamy/Latinstock
Fundição de metais
Existem vários processos de transformação dos metais e ligas metálicas em peças para inúmeras
utilidades. Dentre eles, a fundição se destaca, pois, além de ser um dos métodos mais antigos, é muito
versátil, sobretudo quando se consideram os diferentes formatos e tamanhos das peças produzidas por
esse processo.
Na fundição, o metal é derretido e colocado em moldes para que se solidifique, formando os objetos
metálicos. Esse processo não se restringe apenas ao ferro, pode ser empregado com diferentes metais e
ligas metálicas, observando-se sempre as propriedades de cada um, por exemplo, a tem peratura de
fusão.
Atividade
1. Atentando para o conceito de que muitos materiais encontrados em nosso cotidiano sejam, na
verdade, ligas metálicas, cite outros exemplos de ligas, assim como suas características,
importância e principais usos.
Página 110
1. (Enem)
2. (Unesp) Octávio Paz, escritor mexicano, assim se referiu à participação de índios e mestiços no
movimento de Independência do México:
Não foi a rebelião da aristocracia contra a metrópole, mas sim a do povo contra a primeira. Daí que
os revolucionários tenham concedido maior importância a determinadas reformas sociais que à
independência propriamente dita: Hidalgo decreta a abolição da escravatura; Morelos a divisão dos
latifúndios. A guerra de Independência foi uma guerra de classes e não se compreenderá bem o
seu caráter se ignorarmos que, diferente do que ocorreu na América do Sul, foi uma revolução
agrária em gestação.”
b) opôs-se aos ideais políticos do Iluminismo europeu, dividindo o país em regiões politicamente
independentes.
3. (Fuvest-SP) Uma observação comparada dos regimes de trabalho adotados nas Américas de
colonização ibérica permite afirmar corretamente que, entre os séculos XVI e XVIII,
a) a servidão foi dominante em todo o mundo português, enquanto, no espanhol, a mão de obra
principal foi assalariada.
d) não houve escravidão africana nos territórios espanhóis, pois estes dispunham de farta oferta de
mão de obra indígena.
e) o Brasil forneceu escravos africanos aos territórios espanhóis, que, em contrapartida, traficavam
escravos indígenas para o Brasil.
4. (UFPR) A mão de obra utilizada nas plantations que se estabeleceram nas colônias europeias na
América era formada majoritariamente por escravos trazidos da África e seus descendentes.
Página 111
Responda no caderno
a) A libertação dos escravos na América do Norte foi o principal motivador da Independência das
treze Colônias inglesas.
b) Os escravos e os negros e mestiços livres haitianos armaram-se para a luta e tiveram papel
fundamental nos levantes contra as autoridades francesas que culminaram na Independência do
Haiti e na abolição da escravidão nesse território.
d) Somente Colômbia, Venezuela e Equador levaram a cabo a abolição da escravidão durante seus
processos de independência.
5. (UFMG-MG) Assinale a alternativa que caracteriza o sistema de trabalho conhecido como "mita".
c) Trabalho forçado de índios nas minas de ouro e prata do Peru e Alto Peru.
• As veias abertas da América Latina, de Eduardo Galeano. Porto Alegre: L&PM, 2010. Descreve o
processo de dependência social e econômica da América Latina com relação aos europeus desde sua
chegada ao Novo Mundo.
• Os jacobinos negros: Toussaint L’Ouverture e a revolução de São Domingos, de Cyril Lionel Robert
James. São Paulo: Boitempo, 2000. O livro aborda aspectos da História do Haiti e descreve
minuciosamente a insurreição de escravos que expulsaram os colonizadores franceses da região.
Para você assistir
• Manuela Sáenz, direção de Diego Risquez. Venezuela, 2000, 97 min. O filme retrata os últimos anos
de Manuela Sáenz, companheira de Simón Bolívar, um dos maiores heróis da América do Sul.
• A outra conquista, direção de Salvador Carrasco. México, 1998, 105 min. O filme retrata os conflitos
entre o modo de vida asteca e o dos europeus que estavam conquistando a América. Em 1520, os
espanhóis dizimaram os astecas durante uma cerimônia religiosa, evento que ficou conhecido como o
Massacre do Grande Templo. Um habilidoso escriba asteca, filho ilegítimo do imperador Montezuma,
sobrevive escondendo-se sob um cadáver. O longa-metragem acompanha o jovem enquanto ele
testemunha a nova ordem instaurada em sua terra, então sob o domínio espanhol.
• Memorial da América Latina. Disponível em: <www.memorial.org.br>. Acesso em: mar. 2016. Nesse
site é possível acessar publicações em formato digital, fazer uma visita virtual ao Memorial e agendar
visitas físicas.
Página 112
O direito à vida na América Latina tem sido violado desde os primórdios do processo
colonizador. Foram séculos de exploração até que as colônias conseguissem a
independência. Seguiu-se então um longo processo de for mação das nações latino-
americanas. Da independência aos dias atuais, os países latino-americanos têm lutado
para sua afirmação na ordem mundial. Nesse caminho amargaram, de forma geral,
situações de violação aos direitos humanos quando sofreram com o imperialismo, as
ditaduras e os conflitos armados.
Página 113
A luta é contínua e atual. Muito já se conseguiu, mas ainda há muito que se buscar no que
se refere a direitos para os povos latino-americanos.
Neste capítulo serão abordados assuntos referentes às nações americanas após suas
respectivas independências e às situações atuais de dependência econômica, além de
conflitos, imperialismo, revoluções e ditaduras que marcaram a história da América Latina.
Página 114
A América independente
José María Velasco. Hacienda de Chimalpa, 1893. Óleo sobre tela, 1,04 m × 1,59 m. Comum a toda a América Colonial, a grande
propriedade rural, ao lado do sistema escravista, representou a base de sustentação do sistema colonial. Para muitos, sua
manutenção após o processo de independência é a causa da desigualdade social nos países latino-americanos.
A emancipação política não alterou substancialmente as estruturas econômicas e sociais dos países da
América Latina. As propostas das elites eram conflitantes. Algumas pessoas propunham uma
organização centralizada de governo, outras defendiam mais autonomia, optando pelo federalismo.
Com a adoção da forma republicana de governo, cujo poder político deveria emanar da sociedade, era
necessário realizar eleições. Contudo, por meio de mecanismos diversos (voto censitário, eleições
fraudulentas, abuso do poder econômico, entre outros), os setores populares permaneceram afastados
das decisões políticas, sem afetar a ordem social.
A grande propriedade manteve-se ao longo do século XIX. No México, alguns poucos proprietários
possuíam haciendas de até 100 mil hectares. No Chile, 600 potentados rurais controlavam metade das
terras cultiváveis. No Brasil, o binômio escravidão e latifúndio atravessou quase todo o século.
Liberal, e mesmo democrática, em teoria, cada República, de fato, é presa a facções que disputam
violentamente os postos de governo. Raramente são preenchidas as condições necessárias ao
funcionamento de um regime constitucional. Além disso, as guerras de independência puseram em
evidência a figura do chefe, o caudilho. [...]
SCHNERB, Robert. O século XIX: as civilizações não europeias. In: CROUZET, Maurice (Dir.). História geral das civilizações. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 1994. t. VI. v. 14. p. 50.
© DAE/Studio Caparroz
Fonte: VICENTINO, Cláudio. Atlas histórico: geral e do Brasil. São Paulo: Scipione, 2011. p. 162.
Página 116
O regime neocolonial
Pode-se dizer que a independência da América Latina foi apenas política, pois, economicamente, as
jovens nações subordinaram-se à Inglaterra. Os ingleses apoiaram os colonos americanos nas lutas
contra Espanha e Portugal porque seu interesse era controlar o comércio naquela rica região. Para
concretizarem esse objetivo, os ingleses contaram com o apoio da aristocracia local dos países então
recentemente independentes.
No geral, as elites da América Latina foram coniventes com a expansão imperialista. No México, por
exemplo, durante o governo de Porfirio Díaz, empresas britânicas e norte-americanas tiveram benefícios
diversos. Havia uma aliança entre as camadas dirigentes e as potências imperialistas. Eram comuns as
cisões entre grupos das elites, bem como conflitos entre as empresas que faziam investimentos nos
países latino-americanos. É preciso destacar que mesmo os ideólogos liberais acreditavam que não
podia haver democracia, pois a maioria da população estava “despreparada” para tal regime político.
No contexto americano de disputas por poder político e de tensões geradas pela ruptura com a
Espanha, a Revolução Industrial abalou o frágil equilíbrio econômico da América Latina. Esse quadro
encaminhou a maioria dos países latino-americanos a governos ditatoriais, cuja estratégia econômica
era a produção para o mercado externo.
Jean-Baptiste Debret. Real fábrica de ferro de São João de Ipanema, Sorocaba, 1827. Aquarela.
O repentino processo de abertura da América Latina ao mercado exterior gerou mudanças significativas
em diferentes aspectos econômicos e sociais do Novo Mundo. Entre eles, podem ser citados a
modernização das cidades, a expansão da produção agrícola – e em alguns casos do uso de tecnologia
agrícola – e o aumento do número de imigrantes.
A industrializada Inglaterra enviava aos mercados latinos uma grande quantidade de tecidos e diversos
produtos manufaturados, levando em troca, a preços baixos, o café do Brasil, o cobre do Chile, o couro
dos países platinos, o ouro, o nitrato e o guano do Peru – entre outros gêneros –, além de obter
enormes lucros com o tráfico de escravos africanos.
Com isso, a pequena indústria de alguns países latino-americanos no início do século XIX, que com
incentivos poderia crescer e se consolidar, foi sufocada pela concorrência estrangeira. Na Bolívia, por
exemplo, havia uma bem-sucedida produção têxtil. Só na cidade de Cochabamba, milhares de pessoas
dedicavam-se à fabricação de lenços, panos e toalhas. Os bolivianos fabricavam ainda mantas, ponchos,
tecido de linho e de algodão, chapéus etc. Todavia, diante da concorrência inglesa, a produção boliviana
quase desapareceu. Os portos dos países latino-americanos ficavam lotados de mercadorias inglesas,
que iam de caixões a patins de gelo, passando por vestimentas e outros tantos produtos.
A subordinação econômica refletia-se nos planos cultural e político. Nas cidades da América Latina, as
inovações já eram visíveis na segunda metade do século XIX. O estilo de vida em Buenos Aires, por
exemplo, assemelhava-se ao das cidades europeias. Havia certa estabilidade econômica e os avanços
técnicos contribuíam para as diversas mudanças. Ruas pavimentadas, iluminação a gás, construção de
teatros e uma aristocracia europeizada caracterizavam esse período.
Glossário
Guano: adubo resultante de excremento (fezes) e de cadáveres de aves marinhas, como alcatrazes e
gaivotas.
Página 117
DONGHI, Tulio Halperin. História da América Latina. São Paulo: Círculo do Livro, s.d. p. 178.
Quanto à inserção comercial externa no continente, podemos observar diferentes estruturas produtivas
e implicações econômicas, políticas e sociais. Enquanto no Brasil e no Caribe implantou-se uma
economia baseada na agricultura tropical e no trabalho extensivo com baixo nível tecnológico, na
Argentina, no Chile e no Uruguai, implantou-se a agricultura temperada como base econômica. No
segundo caso, podemos destacar como diferença o uso extensivo da terra com grande nível de
tecnicização. Países como México, Peru, Chile e Bolívia passaram a investir na mineração, com uso
intensivo de capital e de força de trabalho.
Escravos plantando cana. Gravura colorida de William Clark para o livro Dez vistas da Ilha de Antígua, 1823. A cana-de-açúcar foi
um dos gêneros agrícolas favorecidos pelo clima tropical.
Dessa forma, como reflexo dos governos autoritários e da atividade econômica voltada à exportação,
surgiu na América Latina uma sociedade caracterizada por uma relação predatória com a terra e pelo
consumo nas cidades. Os estrangeiros instalados em novo território apropriavam-se de grandes
extensões de terra no interior do continente com o intuito de produzir para exportação, o que serviu
como ponto de partida para a formação de uma sociedade rural, pautada pela desigualdade de renda e
pelo modo de vida entre os grandes proprietários e os trabalhadores.
Nesse panorama, o grande desafio dos recém-constituídos países latino-americanos era assumir o
controle político e econômico de seus próprios territórios, para que fosse possível governar e produzir
de acordo com suas necessidades, e não mais com as necessidades do mercado europeu, contornando
as novas regras estabelecidas pelo capitalismo industrial e financeiro do período.
Os governos autoritários são caracterizados por ressaltar o papel dominante do Estado. Geralmente,
têm como característica principal a centralização do poder em torno de uma pessoa ou instituição, que
se excede no exercício da autoridade a ela investida. Uma das formas de autoritarismo bastante
presentes na história da América Latina foi o que chamamos de caudilhismo, na qual grandes líderes ou
políticos de determinadas nações se utilizaram do carisma e do caráter populista para governar de
forma ditatorial, controlando as atividades não apenas econômicas e políticas mas muitas vezes
também sociais, como a liberdade da população.
Organizando ideias
1. De que forma se relacionam o desenvolvimento do capitalismo, a Revolução Industrial e a
estrutura política da América Latina?
2. Compare as relações econômicas entre as metrópoles ibéricas e suas colônias na América na
época do mercantilismo com o que ocorria no século XIX entre a Inglaterra e a América Latina.
Dentre os conflitos mais significativos, destacamos a Guerra do Paraguai, a Guerra do Pacífico e a Guerra
do Chaco. Esses três embates chamam a atenção porque violaram constantemente os direitos humanos.
Na historiografia tradicional brasileira, em meados do século XX, Solano López, o ditador paraguaio, era
visto como um tirano; já o Exército Brasileiro teria lutado em prol da liberdade e teve, no Duque de
Caxias (Luís Alves de Lima e Silva), seu herói maior. Por outro lado, para os paraguaios, a guerra foi um
massacre e Solano López teria sido um paladino das causas nacionais.
Na década de 1970, alguns historiadores afirmaram que a guerra foi causada pela Inglaterra, desejosa
de destruir o Paraguai, que não se subordinava aos interesses do imperialismo inglês. A tese teve o
mérito de desmistificar a visão de que o exército aliado libertou os paraguaios de uma tirania, mas a
afirmação de que o conflito resultou de manobras políticas do imperialismo britânico não se sustentou.
No panorama da busca por afirmação econômica, a maioria dos países latino-americanos voltou-se para
atividades ligadas à antiga economia agroexportadora. O Paraguai, em contrapartida a essa tendência,
preferiu implementar um conjunto de medidas que modernizaria o país.
Entre as décadas de 1810 e 1860, muitos avanços ocorreram em decorrência dessas ações e tornaram
propício o surgimento de uma indústria autônoma e competitiva, consequentemente melhorando a
condição de vida da população. Dentre essas medidas, destacam-se a erradicação do analfabetismo, a
instalação de fábricas com subsídio estatal e a melhora do abastecimento alimentício – conseguida por
meio da reforma agrária, que deu aos produtores terras onde trabalhar, insumos e materiais.
Em 1862, Solano López chegou ao poder. Ele tinha como objetivo dar continuidade aos avanços
conquistados pelas administrações anteriores. Um dos maiores problemas paraguaios à época era a
falta de áreas litorâneas, o que dificultava o escoamento das mercadorias produzidas. Para chegar aos
portos, estas precisavam atravessar a região da Bacia do Prata, que abrangia territórios brasileiros,
uruguaios e argentinos.
Glossário
Insumo: na economia é chamado de insumo qualquer maquinário, energia ou força de trabalho
utilizado na produção de mercadorias ou na prestação de serviços.
Página 120
A principal vertente da historiografia atual defende que a guerra teria sido incitada pelo próprio
Paraguai. Com o intuito de controlar a região do Prata e conseguir uma saída para o mar, o país teria se
voltado à produção de armamentos e ampliação do exército visando lutar pelo controle da bacia
hidrográfica.
Ainda segundo essa versão, a Argentina – partidária da consolidação de um novo governo uruguaio, que,
unido ao paraguaio e ao argentino faria ressurgir o antigo Vice-Reinado do Prata – mostrou-se favorável
às intenções paraguaias.
O Brasil, sob o comando de D. Pedro II, contrário a tal tendência e defendendo a livre navegação na
região do Prata, decidiu invadir o Uruguai. A resposta a tal ato, entretanto, foi o aprisionamento do
navio brasileiro Marquês de Olinda, em novembro de 1864, episódio que motivou a declaração
brasileira de guerra contra o Paraguai. A aproximação de Solano López com os federalistas argentinos e
com membros do Partido Blanco no Uruguai despertou no presidente argentino Bartolomé Mitre
receios quanto à consolidação do Estado Nacional argentino. No Uruguai, as divergências entre
membros do Partido Blanco e do Partido Colorado, que eram aliados dos governos brasileiro e
argentino, levaram o país a se envolver no conflito.
Victor Meirelles de Lima. Combate naval do Riachuelo, final do século XIX. Óleo sobre tela, 4 m × 8 m.
Sendo assim, em 1865, Uruguai, Brasil e Argentina formaram a Tríplice Aliança, com o objetivo de
derrotar o Paraguai.
No início do conflito, os paraguaios obtiveram alguns êxitos. Logo, porém, a contraofensiva aliada
resultou na invasão do país. Os paraguaios passaram por diversas derrotas, mas tinham forte
resistência. O embate foi arrastado por quase cinco anos e, em 1869, o Paraguai foi rendido.
Apesar da vitória, o saldo brasileiro tampouco foi positivo, uma vez que o governo imperial contraiu
muitas dívidas com a Inglaterra. O Exército Brasileiro, que ganhou corpo e força durante a guerra,
passou a interferir nas questões políticas nacionais, o que, unido à insatisfação da população, foi um dos
fatores que impulsionaram o início do governo republicano no Brasil.
Museu Nacional de Artes Plásticas, Montevidéu
Juan Manuel Blanes. A paraguaia, c. 1880. Óleo sobre tela, 100 cm × 80 cm.
Página 121
• o Paraguai perdeu grande parte de sua população e entrou em uma enorme recessão econômica; a
guerra frustrou o desenvolvimento do país e, após o conflito, ocorreu a privatização das terras públicas
– com a consolidação do latifúndio –, a estrada de ferro passou para as mãos dos ingleses e os
monopólios estatais desapareceram;
• o Brasil teve compensações territoriais e manteve seu domínio sobre a região do Prata; além disso,
ocorreu o aumento da dívida externa, o Exército ganhou força política e o movimento abolicionista foi
acelerado;
Não só o Brasil mas também o Paraguai utilizavam a força escrava em suas tropas, que, em determinado
momento do conflito, chegaram a ser constituídas quase que unicamente por negros.
No caso específico do Paraguai, que ainda não havia abolido a escravidão, os negros começaram a ser
recrutados aproximadamente um ano após o início do conflito, para preencher as baixas de mortos,
feridos e doentes do exército em combate.
Já no Brasil, a participação escrava na guerra iniciou-se por outros motivos. Como o efetivo do Exército,
à época da Guerra do Paraguai, era insuficiente para defender os interesses brasileiros, foram utilizados
reforços da Guarda Nacional das províncias do Império e de um grupo de Voluntários da Pátria, criado
em janeiro de 1865.
A eclosão de vários levantes que questionavam a estrutura política centralizada do Período Regencial
levou seus dirigentes a autorizar, em agosto de 1831, a criação da Guarda Nacional, que consistia numa
força paramilitar para defender tanto o Brasil quanto o governo regencial de ataques internacionais.
José Wasth Rodrigues. Corpos de Voluntários da Pátria, c. 1865-1870. Bico de pena, 30 cm × 41 cm.
Página 122
Diante dessa situação, os cidadãos desprovidos de posses ou recursos não tinham como escapar ao
alistamento. Já aqueles que dispunham de melhores condições podiam se esquivar da convocação
doando recursos e equipamentos ao Exército e, sobretudo, enviando escravos para auxiliar no combate.
Como incentivo à participação de escravos na guerra, o próprio imperador D. Pedro II instituiu a alforria
de todos que fossem enviados ao conflito, deixando sem opção os menos abastados quanto à entrada
no embate.
Foi esse descaso que, criticado pelos abolicionistas e somado à campanha contrária ao império, feita
pelos militares – que ganharam força no pós-guerra –, levou ao enfraquecimento do governo imperial.
Sendo assim, tanto no Paraguai quanto no Brasil, a participação dos negros na guerra esteve ligada à
questionável cidadania relacionada à questão étnica. O alistamento maciço atingia igualmente os
escravos e os pobres, mostrando que os direitos individuais não eram respeitados nem na monarquia
escravocrata brasileira nem na pretensa república paraguaia.
Organizando ideias
De acordo com as informações anteriores sobre a Guerra do Paraguai, faça o que se pede.
1. O que diferenciava o Paraguai das outras nações da América do Sul em meados do século XIX?
3. Analise a participação dos negros escravos na Guerra do Paraguai, tanto do lado paraguaio como
do brasileiro.
4. De acordo com a leitura dos dois textos a seguir, como se encontram as condições do Paraguai
antes e depois da guerra?
Texto 1
Até a sua destruição, o Paraguai se destacava como uma exceção na América Latina: a única nação
que o capital estrangeiro não havia deformado. [...] O Estado, onipotente, paternalista, ocupava o
lugar de uma burguesia nacional que não existia, na tarefa de organizar a nação e orientar seus
recursos e seu destino. Francia [o ditador Gaspar Rodríguez de Francia (1815-1840)] apoiava-se nas
massas campesinas para esmagar a oligarquia paraguaia [...]. As expropriações, os desterros, as
prisões, as perseguições e as multas não tinham servido de instrumento de consolidação do
domínio interno dos latifúndios e comerciantes, mas, ao contrário, tinham sido usados para sua
destruição. Não existiam – nem surgiriam mais tarde – as liberdades políticas e o direito de
oposição, mas naquela etapa histórica só os saudosos privilégios perdidos estranhariam a falta de
democracia. Não havia grandes fortunas privadas quando Francia morreu, e o Paraguai era o único
país da América Latina que não tinha mendigos, famintos e ladrões [...]. O agente norte-americano
Hopkins informava em 1845 ao seu governo que no Paraguai “não há criança que não saiba ler e
escrever” [...].
GALEANO, Eduardo. As veias abertas da América Latina. Porto Alegre: L&PM, 2016. E-book.
Texto 2
Terminada a Guerra da Tríplice Aliança e ainda sob a ocupação das tropas brasileiras, teve início o
processo de reorganização do Estado Paraguaio, com a instalação de um governo provisório.
Essa reorganização do Estado se deu num cenário de miséria e dominação estrangeira, resultantes
da guerra que não só destruiu todo o setor produtivo, mas também consumiu mais da metade da
sua população. Além disso, Brasil e Argentina impuseram ao país derrotado uma dívida de guerra
de 19 milhões de peso ouro e anexaram, a seus territórios, cerca de 160 quilômetros quadrados de
território paraguaio.
MORAES, Ceres. Paraguai: a consolidação da ditadura de Stroessner (1954-1963). Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000. p. 13. (Coleção
História, 34).
Página 123
Essa guerra começou devido à pretensão chilena de se apossar da província boliviana de Antofagasta,
rica em salitre e guano.
A fragilidade econômica da Bolívia de fato levava à exploração da região pelos chilenos. Inicialmente
eles não tinham grande interesse em dominá-la, mas depois, com a descoberta do valor comercial
desses produtos, passaram a ter ambições também de se apossar da província peruana de Tarapacá,
abundante em tais riquezas.
A disputa por territórios entre os países envolvidos ocasionou a Guerra do Pacífico, que, apesar de mais
modesta que a Guerra do Paraguai, envolveu mais de 70 mil pessoas, deixando um saldo de milhares de
mortos.
A guerra começou quando o governo boliviano resolveu aumentar os impostos sobre o mineral, ferindo
os interesses chilenos.
Em 1879, aproveitando-se da fragilidade militar da Bolívia, tropas chilenas ocuparam Antofagasta com o
intuito de aumentar o domínio territorial de seu país e garantir a exploração do salitre na região. O Peru
quis mediar a contenda, mas os chilenos não só rejeitaram a mediação como declararam guerra ao país.
Com o intuito de dominar a região, o Chile resolveu iniciar uma ofensiva, porém a dificuldade em
avançar pelo deserto levou o país a investir em combates navais e invasões anfíbias.
Inicialmente os ataques ocorreram no Porto de Iquique, no Peru, onde depois de algum tempo de
conflito os peruanos conseguiram afundar sete navios chilenos e expulsar os invasores.
© DAE/Studio Caparroz
Fonte: BLACK, Jeremy. World history atlas. Londres: Dorling Kindersley, 2008. p. 151.
Glossário
Invasão anfíbia: é um tipo de operação militar que começa no mar e envolve o desembarque dos
navios em uma praia inimiga.
Salitre: é o nome comum do nitrato de potássio, substância utilizada como fertilizante e como
componente de explosivos.
Página 124
Após o episódio, como represália, os chilenos capturaram um dos principais navios da esquadra
peruana. Usando-o contra as próprias forças do Peru, só então conquistaram o almejado porto.
A partir de então, os chilenos iniciaram uma série de investidas contra o Peru e a Bolívia, em batalhas
que ocasionaram a morte de milhares de pessoas.
A guerra só chegou ao fim com a assinatura do Tratado de Ancón. O Peru perdeu a província salitreira
de Tarapacá e algumas ilhas guaneiras, enquanto a Bolívia perdeu Antofagasta, onde hoje os chilenos
exploram uma das maiores minas de cobre do mundo, e o acesso ao mar. Como compensação, os
bolivianos teriam livre acesso ao Porto de Arica e seria construída uma estrada de ferro ligando a região
a La Paz.
A consequência mais importante da Guerra do Pacífico para o Chile foi a incorporação de amplas áreas
onde se concentravam a exploração do salitre. O eixo da economia do país passou da agricultura para a
mineração, cujo controle se encontrava nas mãos de capitalistas ingleses. O Estado se fortaleceu em
razão dos impostos que cobrava das exportações. Os gastos públicos aumentaram e cresceram as
camadas médias ligadas ao aparelho estatal. Nasceu também uma combativa classe operária mineira.
[...] A Guerra do Pacífico foi a primeira na qual os capitalistas europeus (e, em menor proporção, os
norte-americanos) tomaram abertamente partido, fazendo-o em favor do Chile e contra a aliança
do Peru e da Bolívia […]. A conquista do norte, onde estão as jazidas de salitre, significa também
um importante ganho para os grupos dominantes da sociedade chilena.
Na Bolívia, nada disso acontece: uma economia estagnada minou a superioridade das elites
tradicionais e constituiu um novo grupo de governo, formado por oficiais vulgares, cujos modos
grosseiros e cuja facilidade de corrupção podem ser objeto de denúncias enérgicas, mas que não
parecem ter maiores consequências que aquelas determinadas pelo estilo administrativo dos
representantes das velhas elites, impopulares por terem imposto sacrifícios em vista de objetivos –
como o saneamento monetário e a depuração administrativa – cujas vantagens não eram
facilmente perceptíveis.
[...]
No Chile, a situação foi [...] diferente da peruana e mais ainda da boliviana. O regime conservador
começou a limitar a força do exército; com a primeira guerra do Pacífico, as forças armadas
chilenas adquirem um prestígio nacional sem paralelo no resto da América Latina. Os oficiais do
exército chileno compreenderam as vantagens de ser a expressão armada da nação, e, só muito
discretamente e em segundo plano, os garantidores da ordem pública; tanto é assim que aceitaram
sem dificuldade a missão “política” que lhes foi conferida pelo novo regime […]. O fato de que o
exército pudesse ser, ao mesmo tempo, expressão do país e da facção dominante era, para os
observadores mais benevolentes, outro índice de uma experiência excepcional, mais europeia que
latino-americana, e isso explica – pelo menos em parte – as características peculiares da evolução
do país.
DONGHI, Tulio Halperin. História da América Latina. São Paulo: Círculo do Livro, s.d. p. 225.
Forme um grupo com os colegas e, juntos, busquem informações sobre a atual situação dessa
questão. Houve finalização do julgamento? Qual foi a consequência da decisão da Corte?
Página 125
Sua principal motivação foi a conquista da região do Chaco Boreal, que, além de apresentar grande
quantidade de petróleo, era crucial para a Bolívia como via de acesso ao Oceano Atlântico por meio do
Rio Paraguai.
À época do antigo Vice-Reinado do Rio da Prata, a região do Chaco pertencia à Bolívia, que, tendo
perdido a costa para o Chile na Guerra do Pacífico em 1879, não queria perder o domínio da área e,
consequentemente, do petróleo existente nela.
Por muitos anos, Paraguai e Bolívia tentaram chegar a um acordo que ajustasse suas fronteiras para
atender tanto um quanto outro, assinando uma série de tratados que não foram cumpridos. Isso
agravou ainda mais o problema, somado às perdas territoriais dos dois países em conflitos
internacionais ocorridos durante o século XIX.
A partir de 1920, a descoberta de petróleo na região do Chaco tornou a disputa ainda mais intensa.
Tanto o Paraguai quanto a Bolívia fizeram concessões de suas reservas a companhias internacionais –
esta para a Standart Oil Co. e aquele para a Shell. Entretanto, a produção boliviana precisava ser
transportada pelo Rio Paraguai para chegar ao Oceano Atlântico, e a empresa que administrava o
petróleo paraguaio, dominando a região dos Chacos meridionais, impedia a passagem de sua
concorrente.
Diante do conflito, o Chile, interessado no rompimento entre Paraguai e Bolívia com o intuito de
expandir sua atuação no mercado petrolífero, declarou apoio à Bolívia. O Paraguai, por sua vez, recebeu
o apoio da Argentina, sua grande parceira comercial.
A partir de tal impasse, os dois países começaram a organizar seus exércitos. Apesar de ter melhores
condições e mais reservas monetárias disponíveis para o investimento em suas tropas, os bolivianos
foram derrotados, devido à falta de costume com o ar rarefeito e com o clima quente do Chaco Boreal.
© DAE/Studio Caparroz
Fonte: BLACK, Jeremy. World history atlas. Londres: Dorling Kindersley, 2008. p. 152.
Página 126
O fim das investidas militares aconteceu em 1935, quando a Liga das Nações interferiu no conflito com
o intuito de apaziguá-lo.
A Liga das Nações foi uma organização internacional criada em 1919 com o objetivo de reunir todas as
nações do mundo para manter a paz e a ordem e evitar conflitos entre elas. Fundada durante a Primeira
Guerra Mundial, mediava os conflitos entre países de forma satisfatória para todos os envolvidos.
O tratado de paz entre os dois países foi assinado somente em 1938, com o Paraguai saindo vitorioso. A
Bolívia ficou apenas com o domínio da Planície do Chaco. Apesar disso, a empresa que gerenciava o
petróleo boliviano antes do acordo ficou com o controle petrolífero da região somente até 2006,
quando este voltou às mãos paraguaias.
Como consequência da guerra, a Bolívia perdeu parte de seu território para o Paraguai. O conflito
deixou cerca de 90 mil mortos entre paraguaios e bolivianos, num dos maiores massacres da América
Latina.
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Membros das tropas bolivianas em frente à Catedral de La Paz durante a Guerra do Chaco (1932-1935).
Organizando ideias
Leia o texto e faça o que se pede.
Aqui os países mais pobres do continente, os únicos sem saída para o mar, lutaram a guerra dos
desesperados, que deixou, numa estimativa conservadora, 80 mil soldados mortos. A Guerra do
Chaco terminou há setenta anos. O Paraguai tentou ocupar a região, mas quem se deu bem foi o
gado. Há dez cabeças para cada pessoa e quase nenhuma infraestrutura para o ser humano. Pela
geografia, é possível imaginar o desastre que esperava o Exército da Bolívia, que buscava
conquistar, através do rio Paraguai, uma saída para o Oceano Atlântico, para compensar o que
havia perdido para o Chile no Pacífico. Treinados por alemães e armados com o que havia de mais
moderno na Europa, os invasores deslocaram tanques Vickers de 6 toneladas para a mata fechada.
A gasolina para abastecer os motores era escassa. A água para matar a sede dos soldados mais
ainda.
Graças às manobras ligeiras comandadas pelo então coronel José Felix Estigarribia, o Paraguai
ganhou a guerra. Esperava retirar do solo a recompensa, petróleo farto, como já havia em território
boliviano.
Parece até maldição. Todas as descobertas subsequentes foram do lado boliviano da fronteira
definida pelo Tratado de Buenos Aires, de 1938, que pôs fim ao conflito.
AZENHA, Luiz Carlos. Poeira e conspiração no Chaco paraguaio. Carta Capital, São Paulo: Editora Confiança, n. 493, p. 10, 30, abr.
2008.
1. Analisando as informações sobre a Guerra do Chaco expostas pelo autor, responda: O Paraguai
saiu realmente vitorioso desse conflito? Justifique.
Página 127
Na Inglaterra, durante o século XIX, houve um significativo avanço técnico em algumas áreas, como a
produção de aço em grande escala e as invenções – por exemplo, o motor de combustão, o automóvel
movido a gasolina e a fotografia. Todas essas e outras inovações provocaram profundas mudanças nas
relações econômicas internacionais.
Nesse contexto, alguns Estados que já se destacavam como potências econômicas – como França,
Inglaterra, Alemanha, Estados Unidos – começaram a praticar uma política imperialista, que consistia
em conquistar e dominar territórios fora de suas fronteiras, neste caso, na Ásia, na África e na América
Latina.
LÊNIN, Vladimir I. O Imperialismo: fase superior do capitalismo. São Paulo: Centauro, 2008. p. 88.
Os trustes são empresas ou grupos de empresas que se unem com o objetivo de controlar seu mercado
econômico de atuação visando neutralizar a livre concorrência. Frequentemente essas empresas se
organizam para controlar todas as etapas da produção de suas mercadorias, desde a exploração para
retirada de matéria-prima até a distribuição.
Página 128
O imperialismo britânico
No século XIX, o imperialismo inglês preponderou na América Latina, pois, apesar de independentes
politicamente, as jovens nações ainda não haviam conseguido se organizar a ponto de produzir e
comercializar seus produtos com total autonomia.
A penetração do imperialismo no continente se deu por via comercial e financeira. Desde o começo
do século XIX, o capital britânico esteve presente para financiar o comércio exterior, e desde a
metade deste século, para explorar minas, agricultura, vias de comunicação, portos etc.
Ao iniciar-se o século XX, a América Latina já absorvia 20% dos investimentos totais do mundo.
Os investimentos britânicos [...] estavam distribuídos de forma desigual pelo continente, pois
dependiam da importância de cada país em termos de produção de matérias-primas necessárias ao
mercado mundial.
INVESTIMENTOS BRITÂNICOS NA AMÉRICA LATINA E NO BRASIL NO PERÍODO DE 1825 A 1913 (EM MILHÕES
DE LIBRAS)
Ano América Latina Brasil
1825 24,6 4,0
1840 30,8 6,9
1865 80,9 20,3
1875 174,6 30,9
1885 246,6 47,6
1895 552,5 93,0
1905 688,3 122,9
1913 1.177,5 254,8
Fonte: SILVA, S. Expansão cafeeira e origens da indústria no Brasil. São Paulo: Alfa-Ômega, 1986.
Na segunda metade do século XIX, os ingleses controlavam a maior parte do comércio exterior e da rede
bancária em quase todos os países latino-americanos.
Com o aumento da dívida externa, as nações endividadas entregavam os lucros das alfândegas e até a
exploração das ferrovias.
Para melhor compreensão dessa estratégia econômica, tomemos como exemplo o Brasil. Em 1823,
emprestamos dos bancos ingleses a quantia de 3 686 200 libras, dando como garantia parte das rendas
das alfândegas do Rio de Janeiro, da Bahia, de Pernambuco e do Maranhão. Essa dívida deveria ser paga
até 1854, porém, quando o prazo findou, tínhamos amortizado apenas 513 mil libras. Após avanços e
retrocessos, o referido emprésti- mo foi liquidado em 1890, 67 anos depois de contraído.
Para garantir seus investimentos, as grandes potências não hesitavam em intervir na política interna dos
países latino-americanos. Estudiosos das práticas imperialistas relatam que se aplicou com certa
frequência a técnica do bloqueio marítimo ou simplesmente o bombardeio dos portos mais
importantes.
A lista das intervenções indiretas ou diretas é longa. Dentre elas, destacamos: a conquista do Texas, do
Novo México e da Califórnia pelos estadunidenses (1845-1848); a tentativa de instaurar o protetorado
americano nas Ilhas Galápagos, no Equador (1854), e o italiano no Uruguai (1863); a invasão francesa do
México com o apoio de Inglaterra e Espanha (1862-1867); a Guerra de Reconquista Espanhola em São
Domingos (1866); a intervenção espanhola no Peru e no Chile (1864).
Outros conflitos também podem ser relacionados aos interesses econômicos e políticos das potências
imperialistas na América Latina, por exemplo, a Guerra da Independência de Cuba (1866) e a Guerra do
Pacífico (1879-1883).
Glossário
Amortização: pagamento de uma dívida por meio de parcelamento com cálculo de juros.
Página 129
As Ilhas Malvinas, situadas a aproximadamente 500 km da costa argentina, são, desde o final do
século XIX, um território em disputa entre os governos da Argentina e da Inglaterra.
Desde sua ocupação, em 1690, o território foi disputado por Reino Unido, França e Espanha, que
buscavam o domínio da região devido à abundância de baleias existentes no local, cuja caça era
economicamente importante naquele período.
Ao longo dos anos, muitos ataques e conflitos bélicos ocorreram na região, envolvendo
especialmente a Argentina e a Inglaterra. Em 1833, as ilhas passaram para o domínio britânico e,
em 1982, as forças conjuntas argentinas ocuparam-nas. Após um assertivo bombardeio britânico, a
Argentina se rendeu, cedendo o domínio da região à Inglaterra.
Mais de duas décadas depois, a então presidente, Cristina Kirchner, decidiu reclamar novamente a
soberania sobre a ilha, reavivando o clima de tensão entre as duas nações.
No início de 2013, o governo britânico propôs uma solução diplomática para o conflito: a realização
de um plebiscito na região, por meio do qual a própria população mostraria sua predileção – fazer
parte do Reino Unido ou da Argentina.
Na ocasião, a população mostrou-se favorável ao domínio inglês, ostentando até mesmo símbolos
britânicos pelas ruas das Ilhas. Apesar disso, a presidente argentina insistiu em continuar a
campanha pela retomada das Malvinas, não encerrando a questão.
Mulher vota em referendo para decidir se as Ilhas Malvinas permanecem como território ultramarino do Reino Unido ou aceitam a
soberania da Argentina. Puerto Argentino, Ilhas Malvinas, 2013.
Esse episódio é um dos muitos exemplos das distintas possibilidades de identificação nacional, que
muitas vezes transpassam os limites territoriais como elemento de formação de uma unidade para
se apropriar de outros modos de identificação, como a origem e os costumes.
1. Pensando a respeito da disputa pelo domínio das Ilhas Malvinas e dos diversos fatores
envolvidos nos processos de formação das identidades nacionais, pesquise a chegada britânica à
Argentina e a influência cultural europeia no país.
A doutrina Monroe, instituída pelo presidente norte-americano James Monroe (1823), defendia a não
intervenção dos europeus nos assuntos dos americanos. O lema “América para os americanos”
reafirmava as independências recém-conquistadas na América Latina e reprimia qualquer tentativa de
retomada das colônias pelas antigas metrópoles europeias.
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A doutrina Monroe atualizada. Cartum publicado na revista semanal norte-americana Judge, 1903.
O avanço da colonização estadunidense para o oeste e o sul seguia a crença no chamado Destino
Manifesto, que consistia na ambição de dominar as regiões periféricas, apresentando, como justificativa
moral, o argumento de que essa seria uma missão que agradaria à providência divina. Com esse
pretexto, os estadunidenses travaram guerra contra o México, apossando-se do Texas, do Novo México
e da Califórnia.
No final do século XIX, durante a presidência de William McKinley (1897-1901), o general Alfred T.
Mahan proclamava a necessidade dos estadunidenses de ocupar as ilhas do Caribe e controlar o Golfo
do México. Nessa época, os Estados Unidos ocuparam as ilhas de Cuba e Porto Rico e instalaram bases
navais em Guantánamo e Vieques.
Em 1904, o governo do então presidente, Theodore Roosevelt, enviou ao Congresso um documento que
ficou conhecido como “Corolário Roosevelt”, uma espécie de complemento à Doutrina Monroe. Na
prática adotou-se a política do Big Stick (Grande Porrete). O governo aconselhava seus compatriotas a
“falar manso com o porrete na mão”. Em outras palavras, os Estados Unidos reservavam-se o direito de
utilizar a força para intervir nos assuntos internos e externos das repúblicas latino-americanas.
Com o governo de Teodoro Roosevelt iniciou-se a fase do “big stick” e organizou-se a União Pan-
americana, com a finalidade de implantar uma espécie de protetorado americano sobre todo
território da América Latina. Com esta política sucederam-se intervenções dos “marines” em
numerosos países, como o Haiti (1915-33), a República Dominicana (1916-24), a Nicarágua (1912-
25 e 1926-33) etc. A intervenção era feita sempre para defender interesses das empresas
estadunidenses ou impor governos que servissem a esses interesses. Entre os ditadores famosos
por sua subserviên cia, salientaram-se Machado e Batista em Cuba, Trujillo na República
Dominicana, Somoza na Nicarágua e os Duvalier no Haiti.
ANDRADE, Manuel Correia de. O Brasil e a América Latina. São Paulo: Contexto, 1991. p. 68.
No governo Roosevelt (1901-1909), os estadunidenses chegaram a interceder em prol da formação de
um país – o Panamá – com o objetivo de atingir melhor seus desígnios imperialistas.
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Charge norte-americana do início do século XX que satiriza a política do Big Stick. Tio Sam, que representa os Estados Unidos, faz
um arco com as pernas cobrindo a América e segura um porrete com os dizeres “Doutrina Monroe”.
Em 1879, o engenheiro francês Ferdinand Lesseps obteve do governo colombiano a concessão para
construir um canal que ligaria os oceanos Atlântico e Pacífico. Dez anos depois, o empreendimento de
Lesseps faliu e grande parte de sua companhia foi comprada pelos Estados Unidos, que, sem se importar
com os legítimos direitos da Colômbia, tinham pressa em começar as obras.
[...] Foi então que o Big Stick a atingiu. Os funcionários da companhia sediada no Panamá foram
estimulados a proclamar a independência da região. Vindo em socorro de um movimento
autonomista, os fuzileiros desembarcaram em Cólon, impedindo a reação dos colombianos. Em
novembro de 1903, firma-se o Tratado Hay-Bunau-Varilla [John Hay – Secretário de Estado norte-
americano e Philippe Jean Bunau-Varilla], que dava aos Estados Unidos o domínio perpétuo sobre
uma zona de 16 km de largura através do istmo. Em troca, os Estados Unidos pagariam 10 milhões
de dólares e um arrendamento de 250 mil dólares anuais. […] Em 1904, o governo americano
tomou posse formalmente da Zona do Canal, dando início às obras que seriam concluídas dez anos
depois, quando, em 15 de agosto de 1914, o Canal era aberto ao comércio do mundo. Os Estados
Unidos passavam assim a ser uma potência que tinha a possibilidade de exercer o controle sobre os
dois grandes oceanos.
SCHILLING, Voltaire. EUA × América Latina: as etapas da dominação. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1984. p. 23-24.
Na presidência de William Howard Taft (1909-1913), foi aplicada a política chamada de diplomacia do
dólar, a qual visava à obtenção de facilidades financeiras e comerciais para empresários estadunidenses.
O objetivo era dominar economicamente as repúblicas centro-americanas e estender a influência norte-
americana por toda a América Latina.
Os Estados Unidos adotavam uma política preventiva, fazendo o possível para abortar revoluções ou
aniquilar pretensões nacionalistas de alguns governantes latino-americanos. Na Nicarágua, por exemplo,
o presidente José Santos Zelaya foi derrubado por “ferir os interesses dos cidadãos norte-americanos”,
mais especificamente da empresa de transporte United States-Nicarágua Concession.
No governo de Woodrow Wilson (1913-1921), os Estados Unidos passaram a intervir ainda mais
intensamente nos países latino-americanos. As principais ações desse período foram:
Glossário
Istmo: porção de terra estreita, cercada de água dos dois lados, que liga um continente a uma
península ou duas grandes porções de terra.
Página 132
Desse modo, os Estados Unidos assumiram a função de polícia a serviço das relações financeiras
instauradas durante o período de maturidade do neocolonialismo. Os fatos iriam posteriormente
demonstrar com que seriedade os Estados Unidos cumpririam os seus novos deveres nos trinta
anos seguintes. Não era essa a única novidade nas relações da América Latina com o seu vizinho
cada vez mais poderoso, e nem era sequer a única causa das intervenções norte-americanas. Só
raramente os Estados Unidos intervinham inspirados pelo desejo de orientar um Estado hispano-
americano qualquer no sentido de uma política mais sadia. As intervenções norte-americanas eram
muito variadas: por vezes, basea vam-se numa espécie de puritanismo político que, em outros
casos, desmentiam categoricamente e eram frequentemente escolhidas com um misto de
indignação e incredulidade na América Latina, terminando também com frequência por
comprometer a causa que pretendiam sustentar [...].
DONGHI, Tulio Halperin. História da América Latina. São Paulo: Círculo do Livro, s.d. p. 240.
Na segunda metade do século XIX, alguns países europeus – França, Alemanha, Bélgica e Itália – e os
Estados Unidos despontaram no cenário industrial mundial como grandes potências. Buscando expandir
suas margens de lucro por meio do aumento do mercado consumidor e da diminuição do custo de
produção (obtida com a utilização de matéria-prima e mão de obra mais baratas), essas potências
começaram a se dirigir para os territórios da África e da Ásia. Esse movimento é chamado de
neocolonialismo, um termo que faz referência ao período de domínio europeu na América e na África,
com a diferença de que, enquanto no caso colonial a justificativa para as ações chamadas imperialistas
era a disseminação do cristianismo, no neocolonialismo o ideal ressaltado foi a disseminação da ciência
e da tecnologia.
Organizando ideias
Leia os textos a seguir e desenvolva as atividades solicitadas.
Texto 1
A influência da mídia é tão forte que globaliza o indivíduo. Gradativamente, os seres humanos vão
perdendo a sua identidade, individualidade, diferença, cultura. Um exemplo claro para nós da
região Nordeste do Brasil, mais precisamente no sertão paraibano, é o crescimento das festas de
Halloween.
Texto 2
“O Halloween sem reflexão é a mera importação de valores culturais. Mas, a escola deve ser um
espaço para formar cidadãos críticos que possam desvendar a lógica da padronização cultural. Por
isso, não podemos ensinar as crianças a cultuar valores que não são nossos”, afirma [Marilza
Suanno, pedagoga e mestre em Ciências da Educação Superior, da Universidade Estadual de Goiás].
Texto 3
Os cursos de língua inglesa também colaboram para a propagação da festa [de Halloween] em
território nacional, pois valorizam e comemoram esta data com seus alunos: uma forma de
vivenciar com os estudantes a cultura norte-americana e britânica.
As revoluções
A forte intervenção norte-americana na economia dos países das Américas, a reor ganização econômica
de alguns deles e o grande aumento populacional nas cidades primárias, que proporcionou o
surgimento de uma vasta classe trabalhadora urbana, era o panorama da época. Ele fez surgir
movimentos que questionavam tanto a intervenção americana nas demais economias da América Latina
quanto os governos que incentivavam políticas de apoio ao imperialismo.
A Revolução Mexicana
Trinta e quatro anos depois da independência do México, subiu ao poder no país um grupo político de
ideais liberais, que almejava alcançar a produtividade e a estabilidade econômica conseguidas pelos
Estados Unidos após sua independência.
A essa época, os mexicanos já haviam perdido quase metade de seu território para os Estados Unidos na
guerra travada entre 1846 e 1878, na qual o México tentou impedir a expansão da nova potência em
seu território.
Entrada das tropas dos Estados Unidos na Cidade do México. Litografia de Thomas S. Wagner e James Mc Guigan. 10,6 cm × 18
cm.
Os liberais buscavam assegurar a autonomia mexicana não só tentando manter seu território mas
também por meio de medidas como a redução do poder político da Igreja – que havia se alinhado aos
defensores do conservadorismo –, a retomada das terras pertencentes a ela e a retirada do catolicismo
do papel de religião oficial do Estado mexicano. Assim como a Igreja, o exército, também partidário dos
conservadores, perdeu muitas propriedades de terras e regalias.
A guerra entre eles chegou ao fim em 1857, com a vitória dos liberais. O primeiro representante destes
a governar o México foi Benito Juárez, líder de origem indígena que implantou uma Constituição liberal,
nacionalizou os bens da Igreja e procurou criar uma classe de pequenos produtores.
Os grandes proprietários de terra e a Igreja recorreram à ajuda externa para retomar o poder, mas os
Estados Unidos, em plena Guerra de Secessão, não puderam ajudá-los. Os conservadores procuraram
então a França, propondo a Napoleão III a criação de um protetorado francês sobre o México. Sendo
assim, em 1863, as tropas francesas derrotaram os liberais e forçaram a substituição de Juárez por
Maximiliano de Habsburgo, irmão do imperador da Áustria. Entretanto, a população mexicana opunha-
se à presença de Maximiliano no poder.
Em 1867, tropas chefiadas por Benito Juárez depuseram e fuzilaram Maximiliano, abrindo espaço para a
volta dos liberais ao poder, sob o comando do próprio Benito.
A Guerra de Secessão, ou Guerra Civil Americana, ocorreu nos Estados Unidos entre 1861 e 1865,
marcando o embate entre os estados do sul – latifundiários, aristocratas e defensores da escravidão – e
os estados do norte – industrializados e favoráveis à abolição. Os dois lados divergiam quanto às
atividades econômicas regionais – e, por conseguinte, às políticas de importação e exportação adotadas
– e à questão abolicionista.
Página 134
Édouard Manet. A execução do Imperador Maximiliano, 1867. Óleo sobre tela, 2,52 m × 3,05 m.
A partir de então, o governo de Juárez, ao mesmo tempo que combateu os setores reacionários da
sociedade mexicana, abriu as portas do país aos investidores estran geiros, sobretudo aos
estadunidenses, e à produção para o exterior, discriminou índios e mestiços pobres e substituiu a
autonomia dos estados pelo centralismo. Tais medidas se consolidaram com a ditadura de Porfirio Díaz
(1876-1911), durante a qual a elite de produtores e representantes dos capitais estrangeiros tomou
conta da economia e das propriedades mexicanas como se o país fosse uma propriedade rural.
Durante o governo de Porfirio, o México reergueu sua agricultura, empregando técnicas modernas e
consolidando a implantação do capitalismo agrário e exportador. Por outro lado, os setores de oposição
foram duramente reprimidos, os estados perderam completamente sua autonomia, a população
camponesa vivia sob condições de exploração e miséria e o operariado teve os salários congelados,
situação que se opunha aos benefícios concedidos a uma minoria privilegiada.
Em 1910, deveria haver uma nova eleição presidencial, mas, como Díaz mantinha o controle do jogo
eleitoral, sua vitória era tida como certa. Mesmo assim, Francisco Madero lançou-se candidato à
Presidência.
Na época das eleições, Madero foi preso e as urnas deram mais uma vitória a Porfirio, que obteve 99%
dos votos. Diante disso, era perceptível que Díaz provavelmente só seria derrubado pela força, motivo
pelo qual Madero convocou o povo para se posicionar contra o governo, mesmo que fosse necessário
um combate.
Glossário
Reacionário: contrário à democracia, aquele que se opõe a qualquer mudança política ou social.
Página 135
É esta singularidade que confere à Revolução Mexicana uma distinção radical em relação às
numerosas lutas intraoligárquicas, típicas da história da América Latina.
A derrota dos exércitos camponeses nos campos de batalha permitirá ao Estado manipular as suas
demandas e incorporar a mística de Villa e, sobretudo, Zapata ao projeto burguês de dominação. A
especificidade dos vários movimentos revolucionários é diluída e surge uma nova burguesia
pretensamente herdeira dos precursores e agentes da revolução. Este apagamento das diferenças
e a realização de algumas reformas reivindicadas pelos dominados permitiram legitimar
ideologicamente os novos donos do poder e preservar o regime político mais estável da América
Latina neste século.
© DAE/Studio Caparroz
Fonte: BETHELL, Leslie. História da América Latina: de 1870 a 1930. São Paulo: Edusp; Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2008. v. 5.
p. 22.
Emiliano Zapata, líder dos camponeses do estado de Morelos, a princípio apoiou Madero. No dia 8 de
junho de 1911, num encontro entre eles, Zapata mostrou a Madero que os camponeses exigiam a
restituição de suas terras arrebatadas pelos latifundiários durante o governo de Porfírio Díaz. Madero
procurou convencer Zapata de que a questão exigia tempo e os trâmites jurídicos deveriam ser
respeitados.
Madero tomou o poder, aclamado como "o Redentor", mas os problemas econômicos, políticos e sociais
herdados do governo de Porfirio permaneceram.
Emiliano Zapata Salazar (1879-1919) foi um mestiço, descendente de brancos e indígenas, cuja
ocupação era treinar cavalos. Inconformado com o abandono da população pobre do México durante a
gestão de Porfirio Díaz, Zapata organizou-se e lançou um manifesto, sob o lema “Terra e Liberdade”,
unindo-se, a partir de então, a um grupo de indígenas e camponeses que realizavam ações de guerrilha,
ocupavam e repartiam as terras dos grandes proprietários. Também fez alianças políticas com outros
líderes na luta contra o governo autoritário de Díaz.
Página 136
Em novembro de 1911, os zapatistas proclamaram o Plano de Ayala, no qual exigiam a recuperação das
terras usurpadas.
O plano [de Ayala] advertia que a “imensa maioria das gentes e cidadãos mexicanos não são mais
donos senão do terreno que pisam”, e promulgava pela nacionalização total dos bens dos inimigos
da Revolução, a devolução a seus legítimos proprietários das terras usurpadas pela avalanche
latifundiária e a expropriação da terça parte das terras dos fazendeiros restantes. O Plano de Ayala
converteu-se num ímã irresistível que atraía milhares e milhares de camponeses às fileiras do
caudilho reformista. Zapata denunciava “a infame pretensão” de reduzir tudo a uma simples troca
de pessoas no governo: a Revolução não era feita para isso.
GALEANO, Eduardo. As veias abertas da América Latina. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2007. p. 159.
O governo de Madero enviou exércitos bem equipados para combater as forças zapatistas, embora tal
ação não tenha sido suficiente para derrotar o movimento revolucionário. Este tomou força com a
população dos campos, que enfrentou a repressão, e as massas populares nas cidades, que por sua vez
se organizaram em diversas associações com o intuito de derrubar o governo.
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Mulheres mexicanas no exército revolucionário. Página do jornal francês Le Petit Journal, 16 nov. 1913.
A partir de então, ficou claro que o movimento revolucionário não reivindicava apenas mudanças
políticas superficiais mas também transformações econômicas e sociais que tivessem efeito positivo
sobre a vida da população pobre e trabalhadora – rural e urbana – do México.
Tendo em vista tais reivindicações, os Estados Unidos sentiram que seu interesse econômico no México
poderia ser atrapalhado pelos ideais da revolução. Passaram então a apoiar as forças reacionárias,
fomentando o golpe de Estado que levou ao poder, no lugar de Madero – fuzilado com outros membros
do governo –, o general Victoriano Huerta, numa jogada aprovada pelo alto clero, pelos grandes
industriais e comerciantes e pelos banqueiros ingleses, interessados nas riquezas minerais do país.
Entretanto, a subida ao poder nos Estados Unidos de um democrata – Woodrow Wilson – transformou a
visão do país imperialista com relação aos governos autoritários. A nova administração americana
defendia a formação de nações democráticas na América, o que, somado ao apoio inglês ao presidente
Huerta, colocou os EUA contra o México, numa ação totalmente contraditória, visto que o país passou a
se opor ao governo que ele mesmo ajudara a instituir.
Foi nesse momento que os Estados Unidos decidiram intervir no governo mexicano novamente, apoi
ando as forças militares que depuseram Huerta, e colocaram em seu lugar o chefe militar e
revolucionário Venustiano Carranza.
Nessa época, grandes reservas de petróleo haviam sido descobertas no território mexicano, o que
aumentou o interesse dos Estados Unidos na política do vizinho, uma vez que os norte-americanos
buscavam garantir a permanência de um governo favorável à sua interferência na economia local. Os
ingleses, apesar da menor intervenção nos conflitos internos do país, tinham os mesmos interesses nas
riquezas minerais mexicanas.
Página 137
A gestão de Carranza buscava conciliar a abertura do México para a exploração do petróleo pelos EUA
com as reivindicações de melhores condições de vida e trabalho feitas pelos trabalhadores rurais e
urbanos. Apesar disso, as camadas populares encontravam-se bastante insatisfeitas, e a oposição de
Pancho Villa e Zapata atrapalhou a consolidação do regime.
Pancho Villa, como se denominava José Doroteo Arango, nasceu em Urango, no norte do México, em
1887. Trabalhador rural, aos 16 anos foi acusado de matar um fazendeiro que havia violentado sua irmã,
sendo obrigado a fugir. Tornou-se, então, um “bandido” que saqueava fazendas para distribuir os
produtos aos pobres. Após alistar-se no exército mexicano, lutou em 1910 contra a ditadura de Porfirio
Díaz e a favor de Madero, com quem rompeu logo depois da vitória. Villa passou a ser a maior liderança
revolucionária no norte do país, enquanto Zapata priorizou a luta no sul.
Pressionado pelo governo estadunidense, pelas companhias de petróleo, pelo clero, pelos latifundiários
e pelos camponeses, Carranza ficou cada vez mais isolado e acabou sendo assassinado. O mesmo
aconteceu com Zapata, em 1919, e Villa, em 1923. Pouco a pouco, a revolução foi imobilizada e
institucionalizada. Contudo, o Estado oligárquico foi suprimido, uma reforma agrária realizada, o capital
estrangeiro teve suas ações limitadas e a classe operária direitos garantidos, mas também uma nova
elite política formou um Estado clientelístico e um sistema eleitoral corrupto.
Organizando ideias
A Revolução Mexicana, assim como outros episódios da história mundial, foi eternizada pela arte.
Nesse caso, foram principalmente os muralistas (artistas que fazem pinturas em murais)
mexicanos, como José Clemente Orozco, David Alfaro Siqueiros e Diego Rivera, que legaram à
posteridade cenas que retratam o povo mexicano como o grande herói da revolução.
Beatriz Aurora
Beatriz Aurora. Trece demandas zapatistas, 1997. Acrílico sobre papel, 50 cm x 70 cm.
2. Por que as principais palavras que aparecem na imagem estão relacionadas aos direitos
humanos?
6. Com base no estudo do capítulo, por que esse grupo se autodenomina zapatista?
A Revolução Cubana
Cuba foi um dos últimos países latino-americanos a se tornar independente. Dominada pelos espanhóis,
a ilha do Caribe só se emancipou politicamente em 1898.
O país passou por alguns movimentos que visavam à independência, como a Primeira e a Segunda
Guerras de Independência – a última destacada pela maior significância política –, iniciados em 1895,
que surgiram em um contexto de descontentamento com a tributação elevada, as dificuldades
econômicas da burguesia açucareira devido à má safra de 1894, a política alfandegária desfavorável aos
comerciantes de tabaco e o crescente desemprego gerado pela crise econômica.
Os generais Máximo Gómez e Antonio Maceo e o poeta José Martí, que já haviam participado da
primeira tentativa de conseguir a independência, tomaram uma iniciativa que buscava a emancipação
refletida nas reivindicações dos nacionalistas e reformistas da pequena burguesia.
A luta antiespanhola tornou-se, então, radical, com a utilização de táticas de guerrilha e a adesão cada
vez maior dos setores populares urbanos e rurais, que levaram a própria burguesia e os Estados Unidos
a temerem os rumos revolucionários do movimento de libertação.
repressivas das tropas espanholas, com o intuito de mobilizar a opinião pública para a intervenção
norte-americana no conflito.
Em poucos meses a Espanha foi derrotada e obrigada a aceitar o Tratado de Paris. O acordo marcou o
fim do domínio espanhol em Cuba, mas também o início da ocupação norte-americana, legitimada com
a aprovação de uma emenda criada pelos Estados Unidos à Constituição cubana, a Emenda Platt. Essa
emenda autorizava o país a intervir na economia e política cubanas sempre que achasse necessário,
colocando então a ilha sob seu domínio.
Da independência formal até 1959, a história de Cuba caracterizou-se por eleições fraudulentas, golpes
de Estado, corrupção e torturas, sob o olhar vigilante das autoridades estadunidenses, que, quando
necessário, intervinham direta ou indiretamente na vida política e econômica da ilha. Nesse contexto,
Eduardo Chibás fundou, em 1947, o Partido do Povo Cubano, também conhecido como Partido
Ortodoxo, que passou a ter grande força política.
Foi convocada uma assembleia constituinte para definir o novo tipo de regime que deveria vigorar
em Cuba, mas o seu funcionamento foi fortemente condicionado pela presença das tropas norte-
americanas e pela vigorosa ação do nascente imperialismo ianque. Depois de várias ameaças
explícitas do governo norte-americano, foi aprovada em 1901 a chamada Emenda Platt,
apresentada por um senador norte-americano com esse nome. Por essa emenda, Cuba aceitaria a
tutela econômica e militar dos EUA, o que incluía, entre outras coisas, o direito norte-americano de
instalar bases militares e portos na ilha, além de outras concessões territoriais e privilégios
econômicos que violavam abertamente a soberania política da ilha, recém-libertada do jugo
colonial espanhol.
Com seu estilo eloquente, Chibás agitava grandes setores do povo com palestras radiofônicas e
comícios públicos, em que fazia denúncias concretas sobre casos de corrupção do governo.
Quando não conseguiu provas para certificar legalmente uma denúncia que tinha feito, sentindo-se
com a honra ofendida, Chibás se suicidou em pleno programa radiofônico, como protesto contra a
situação do país, em plena campanha eleitoral, em que era candidato favorito para a presidência
da República.
Mesmo com a morte de Chibás, Fulgêncio Batista – que já havia comandado a ilha de Cuba duas vezes –
percebeu que não venceria as eleições presidenciais novamente. Por isso, com aval das autoridades
norte-americanas, deu um golpe de Estado em março de 1952 e passou a governar ditatorialmente.
A ditadura de Batista gerou um descontentamento popular muito grande. A juventude cubana ansiava
por mudanças. Entre esses jovens, encontrava-se Fidel Alejandro Castro Ruiz – filho de um fazendeiro –,
que se formara em Direito pela Universidade de Havana e militava na oposição.
Em 26 de julho de 1953, Fidel e 126 opositores à ditadura de Batista tentaram tomar o quartel de
Moncada e a fortaleza de Bayamo. As operações militares dos rebeldes acabaram fracassando, Fidel foi
condenado a 15 anos de prisão, e seu irmão Raúl, a 13 anos. Os demais participantes receberam penas
menores. Em 1955, a população cubana, descontente com o governo de Batista, fez grande pressão para
que o ditador anistiasse os rebeldes.
A anistia ocorreu, mas as opiniões e ideias de Fidel a respeito do governo vigente passaram a ser
censuradas. Temendo ser assassinado pelos agentes de Batista e ciente do pouco espaço político que
tinha em Cuba, Fidel e seus companheiros exilaram-se no México.
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Fidel Castro e seus companheiros na Cidade do México, após terem sido exilados de Cuba, 1953.
No exílio, buscaram fomentar tanto a luta política contra o governo de Batista quanto a unificação dos
cubanos que se encontravam no exterior em favor da deposição do regime, além de trabalhar na
preparação militar dos exilados que regressariam ao país.
No México, Fidel conheceu o médico argentino Ernesto Guevara de La Serna, que, em 1953, apoiara o
governo progressista de Jacob Arbenz, presidente da Guatemala, o qual acabou sendo deposto por ter
nacionalizado a companhia norte-americana United Fruits. Guevara foi apelidado pelos cubanos de
“Che”.
Juntos, Fidel Castro e Che Guevara planejaram a invasão de Cuba e a tomada do poder, numa investida
que recebeu o nome de “26 de Julho”, em homenagem ao ataque ao quartel de Moncada – a tentativa
de golpe anterior ao exílio de Fidel e seus companheiros.
Num velho iate, o Granma (hoje nome do jornal oficial do governo cubano), os rebeldes partiram do
México em 24 de novembro de 1956. Eram 82 guerrilheiros sob o comando de Fidel Castro. Em Cuba,
um levante organizado pelos partidários de Fidel foi sufocado pelas tropas governamentais, que se
preparavam para enfrentar os rebeldes.
Assim que desembarcaram, os guerrilheiros foram atacados pela força aérea. Eles procuraram se
esconder sob as árvores, no meio de pantanais com água muitas vezes até o pescoço; alguns
conseguiram se instalar nas montanhas e florestas de Sierra Maestra. Dos 82 rebeldes, sobraram pouco
mais de 20.
A insatisfação com o governo autoritário de Batista reforçava o apoio popular aos guerrilheiros.
Camponeses, estudantes e pessoas de variados segmentos sociais passaram a combater pela revolução.
O número de militantes do Movimento 26 de Julho aumentou, tanto no campo quanto nas cidades. Os
rebeldes fizeram o exército sofrer importantes derrotas.
No início de 1958, os cubanos iniciaram uma greve geral, que foi violentamente reprimida pelas tropas
de Batista. Somado a um discurso inflamado de Fidel Castro em uma rádio de Cuba, esse fato fez a
população rebelde se mobilizar com os guerrilheiros exilados, passando então à efetiva ofensiva contra
o governo ditatorial.
Batista tentou diversas manobras para barrar a vitória da revolução; mas, finalmente, indicou um
substituto para comandar a ilha, fugindo para o exílio, na República Dominicana.
Sendo assim, a revolução havia vencido – em janeiro de 1959, os guerrilheiros foram recebidos
triunfalmente em Havana.
Página 141
Camilo Cienfuegos foi o primeiro comandante das forças revolucionárias a entrar em Havana e o responsável por organizar a
tomada do Regimento Columbia, um dos maiores símbolos da força militar de Fulgêncio Batista. Após desaparecer
misteriosamente em uma viagem que fazia de avião entre as províncias da ilha, Camilo nunca mais foi encontrado.
A Revolução Cubana teve um caráter democrático-popular e contou com o apoio de diversos setores da
sociedade. Depois da vitória, Fidel Castro, que se tornara primeiro-ministro, encampou as empresas de
pessoas ligadas ao governo anterior, as indústrias de grande porte e as empresas estrangeiras. Fez que
fosse aprovada a Lei de Reforma Agrária e desencadeou uma dura repressão aos antigos colaboradores
do regime de Batista, que foram sumariamente julgados e, na maioria, fuzilados.
Quando as novas leis começaram a ser aplicadas, os que se sentiram prejudicados passaram a aumentar
o bloco de oposição, que continha de antigos companheiros de Fidel descontentes com os rumos
tomados pela revolução a aliados do regime deposto.
De 1959 a 1965, ocorreram diversos conflitos entre governistas e oposicionistas, com muitos mortos de
ambos os lados. Nos três primeiros anos da revolução, 265 mil cubanos migraram para os Estados
Unidos, sobretudo para a Flórida, dando origem a uma influente comunidade anticastrista, que, nas
décadas seguintes, aumentaria significativamente.
O governo cubano, ao ferir os interesses dos EUA, provocou a reação do presidente norte-americano
Dwight D. Eisenhower (1953-1961), que logo iniciou as represálias. Primeiro, deixou de importar o
açúcar cubano. Fidel reagiu nacionalizando as companhias açucareira, telefônica, petrolífera e de
eletricidade, bem como os bancos es ta dunidenses. Diante desses fatos, os norte-americanos
bloquearam economicamente Cuba, que passou a ser “a ilha proibida” na América Latina.
Em 16 de abril de 1961, uma tentativa de tomada do poder foi tramada pelos contrarrevolucionários
cubanos que viviam nos Estados Unidos. Segundo o jornal The New York Times, os invasores foram
treinados, equipados e financiados pelos Estados Unidos e eram supervisionados diretamente pela
Central Intelligence Agency (CIA). Eles desembarcaram na Baía dos Porcos, mas a invasão foi um
fracasso, tendo como saldo a morte de cerca de 80 revoltosos e a prisão de 1 179 deles. Além disso, um
barco foi afundado e cinco aviões derrubados.
Glossário
Encampar: no sentido utilizado no texto, diz respeito à tomada de posse de algo por parte do
governo mediante o pagamento de indenização.
Aeronave norte-americana sobrevoando navios de guerra soviéticos no litoral da Costa Rica, out. 1962. A tensão causada pela
Crise dos Mísseis fez com que a Guerra Fria atingisse também as ilhas caribenhas.
Página 142
Diante das pressões dos Estados Unidos em uma época marcada pela Guerra Fria, Fidel Castro buscou se
aliar à União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Em maio de 1961, Fidel declarou que adotaria
o marxismo-leninismo, o que aumentou ainda mais as divergências entre o governo cubano e o norte-
americano.
Em outubro de 1962, ao descobrir que mísseis soviéticos estavam sendo instalados em Cuba, os Estados
Unidos, que já buscavam razões para se opor à ilha e prejudicar seu avanço econômico, bloquearam-na
militarmente e se prepararam para uma invasão.
Para evitar um conflito de consequências graves, a URSS retirou os mísseis e o bloqueio foi cancelado.
Isolada no continente americano, Cuba atrelou-se à economia dos países socialistas, especialmente da
União Soviética. O país viveu em função do açúcar, da reexportação do petróleo fornecido pela URSS e,
em escala menor, do fumo, do níquel e de frutas cítricas.
Organizando ideias
De acordo com as informações anteriores sobre a Revolução Cubana, faça o que se pede.
1. É correto afirmar que a Emenda Platt selou a paz com a Espanha e garantiu a total liberdade e
soberania de Cuba? Por quê?
2. Como foi possível que Fidel Castro e Che Guevara obtivessem sucesso em seu movimento
revolucionário se tão poucos combatentes sobreviveram aos ataques no momento em que
desembarcaram em Cuba?
Avanços sociais
Apesar do embargo econômico que os Estados Unidos impuseram a Cuba e da oposição do grupo que se
beneficiava do poder econômico e político da ilha antes da revolução, o governo estabelecido se propôs
a superar a pobreza extrema herdada da ditadura.
[...] Fidel Castro fez da educação uma das mais importantes prioridades revolucionárias. Em 1961,
designado o “Ano da Educação”, foi iniciada uma campanha maciça de alfabetização para crianças
e adultos. Mais de 100 000 alunos das escolas secundárias das grandes e médias cidades foram
enviados ao campo para ensinar as primeiras letras para a população analfabeta. No final do ano,
os princípios básicos de leitura tinham sido ensinados a cerca de 700 000 adultos.
Nos anos que se seguiram à revolução, milhares de novas escolas foram construídas na área rural
cubana e foi instituído um programa maciço de bolsas de estudo para estudantes, cujo objetivo era
levar as crianças pobres do campo para os internatos nas áreas urbanas. O número de crianças
inscritas na escola elementar dobrou e, em 1985, havia três vezes mais professores que em 1958
[...].
Cuba teve amplas vitórias contra a fome, um problema que permanece na maioria dos países do
terceiro mundo [...].
VAIL, John J. Fidel Castro. São Paulo: Nova Cultural, 1987. p. 101-102. (Coleção Os Grandes Líderes).
Página 143
Esses dados positivos, referentes à década de 1980, não permanecem dessa forma e também não
apagam problemas e fatos negativos do período, por exemplo:
• a ausência de crítica, a qual, quando muitas vezes feita, era confundida com oposição ao regime e
levava à prisão dos dissidentes;
• a corrupção nos vários escalões do governo, escondida e não admitida pelo regime;
Após a desintegração da União Soviética, ocorrida em 1991, Cuba passou a enfrentar muitas
dificuldades, já que não podia mais contar com o grande aliado econômico e político. Paulatinamente, a
ilha desenvolveu novas estratégias para lidar com os problemas, sobretudo os relacionados aos
investimentos no turismo.
Depois de mais de 52 anos de embargo econômico dos Estados Unidos a Cuba, medida criticada pelos
organismos internacionais, no final de 2014 o presidente estadunidense, Barack Obama, declarou o
restabelecimento das relações diplomáticas entre os dois países, além de outras medidas.
Pablo Martinez Monsivais/AP Photo/Glow Images
O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama (à direita), e o de Cuba, Raúl Castro (à esquerda), em encontro durante a Cúpula
das Américas, Panamá, 2015.
A aposentadoria de Fidel Castro, a ajuda venezuelana após a ascensão de Hugo Chávez (1998), a
aproximação com a Igreja Católica, a maior inserção do país na América Latina, o aprofundamento das
reformas, o aumento das desigualdades e o reatamento das relações diplomáticas com os Estados
Unidos são alguns dos fatos relevantes da história cubana no começo do século XXI.
• educação;
O populismo
Populismo é o termo usado para se referir às práticas políticas que visam ao estabelecimento da relação
entre um líder carismático e a população sem o intermédio de instituições políticas. Nessa relação, o
povo é colocado como personagem central da ação política, tendo em vista que as ações tomadas pelos
governantes objetivam sempre a satisfação da população para que esta não interfira nas decisões
tomadas por eles e seus representantes.
[...] O populismo não pode ser explicado basicamente pela simples aparição de um líder que,
demagogicamente, carrega e dirige as massas para a direção que lhe aprouver. Há inúmeras
variantes que interferem no processo histórico e o conhecimento delas é que nos pode aproximar
do real. O carisma de uma Eva Perón, por exemplo, é mais um dado que obviamente deve ser
levado em conta por parte do analista, na compreensão do fenômeno populista. Mas não pode ser
entendido como fator determinante, como se as massas caíssem nos braços do primeiro demagogo
que se lhes surgisse à frente.
[...] o fenômeno populista corresponde a uma manipulação das massas por parte do líder, mas
também corresponde a uma satisfação de aspirações longamente acalentadas. Dessa maneira, o
líder populista, em geral com forte dose de carisma, ao mesmo tempo em que procura manipular
as massas para que elas se enquadrem dentro dos limites por ele impostos, também ativa
mecanismos de satisfação de velhas aspirações – um exemplo, apenas, a legislação social – das
massas trabalhadoras.
[...] o populismo latino-americano representou uma ampla mobilização das classes populares e sua
inserção direta nas lutas políticas, transformando-as num dos principais setores sociais de que o
sistema político necessitava para a sua legitimação.
PRADO, Maria Ligia. O populismo na América Latina. São Paulo: Brasiliense, 1981. p. 74-77.
Tivemos vários governos populistas na história da América Latina. Getúlio Vargas, no Brasil, e Juan
Domingo Perón, na Argentina, foram exemplos significativos. Em ambos, os operários obtiveram ganhos
reais em termos de salário e conquistaram direitos sociais consideráveis, mas o autoritarismo, a
burocratização e a intensa corrupção marcaram esses governos, tão bem avaliados pelas classes
populares.
O populismo entrou em crise por não conseguir atender aos anseios das camadas populares e passou a
sofrer forte oposição das elites econômicas. Durante a Guerra Fria, a política externa independente de
alguns líderes latino-americanos ia na contramão dos interesses dos Estados Unidos.
É importante destacar que o conceito de populismo não é unânime entre os estudiosos da história
latino-americana, bem como os regimes chamados de populistas tiveram características diferentes,
dependendo do país e da época.
Organizando ideias
1. O que foi o populismo na América Latina?
2. Quais são as características principais dos líderes populistas? Se necessário, pesquise sobre
Vargas e Perón e busque as semelhanças entre as duas ações políticas.
Página 145
As ditaduras
A América Latina foi palco de diversos golpes militares, os quais, pode-se dizer, foram desfechados para
conter o avanço das forças democráticas a fim de impedir mudanças na estrutura econômica e social
dos países da região. Com raras exceções, eles não contaram com o apoio popular.
Com o objetivo de “garantir a ordem”, esses golpes de Estado tiveram o apoio das camadas
conservadoras e da burguesia, aliadas ao capital estrangeiro, as quais, em alguns regimes democráticos,
sentiam-se ameaçadas pelas constantes pressões populares que pretendiam mudanças não só políticas
como, sobretudo, econômicas e sociais.
• havia algumas forças de respaldo, como: Forças Armadas atreladas à doutrina de Segurança Nacional
do Pentágono (EUA) – de luta contra a expansão do comunismo;
• grandes proprietários rurais que se opunham às mudanças nas estruturas agrárias. No Brasil, por
exemplo, os grandes proprietários temiam que João Goulart concretizasse uma reforma agrária;
• a burguesia ligada ao capital estrangeiro, que defendia a livre circulação de capitais, mercadorias e
serviços, opondo-se ao intervencionismo estatal, bem como à excessiva tributação;
• os setores conservadores da Igreja Católica. Havia, dentro da Igreja, setores e pessoas favoráveis às
mudanças, bem como defensores das mais amplas liberdades democráticas e sociais. Os conservadores
estavam amedrontados com a possibilidade do avanço do comunismo.
Aplicou-se um conjunto de normas mais ou menos parecidas: as eleições foram abolidas ou limitadas, a
imprensa ficou sob censura, os partidos políticos foram dissolvidos, as atividades sindicais reprimidas, os
parlamentos depurados, líderes oposicionistas cassados e, com frequência, assassinados. O movimento
estudantil foi atingido, bem como os movimentos sociais. O direito à vida foi desrespeitado, houve
muita corrupção, os desníveis de renda aumentaram e poucos enriqueceram com os benefícios do
crescimento econômico.
Paula Radi
Fonte: LE MONDE diplomatique. El atlas histórico. Buenos Aires: Capital Intelectual, 2011. p. 62.
Página 146
Argentina
A Argentina, por exemplo, entre 1943 e 1976, passou por vários golpes militares. Todos os regimes
oriundos deles se caracterizaram por flagrantes atentados contra o direito à vida. A ditadura imposta em
1976, além de violar os direitos humanos, adotou uma drástica política econômica.
A junta militar inaugurou uma política de abertura às importações que liquidou um terço da
estrutura produtiva; foram anuladas conquistas trabalhistas obtidas ao longo de meio século e o
salário real ficou reduzido à metade do seu valor. As economias regionais acabaram asfixiadas pelas
altas taxas de juros e até a oligarquia pecuarista dos pampas foi afetada pela generalizada
transferência de recursos que beneficiou o setor financeiro: o rebanho de gado bovino se reduziu a
dez milhões de cabeças.
O desemprego levou muita gente a emigrar. A dívida externa chegou a 40 bilhões de dólares, dos
quais se estima que cerca de 15 bilhões correspondam à compra de armamentos. E ainda, a partir
de 1980, também ocorreu a quebra dos bancos e sociedades financeiras.
Quando o regime militar estava em declínio, o general Leopoldo Galtieri planejou, como estratégia para
obter apoio popular, invadir as Ilhas Malvinas, que, embora sob o poder britânico, eram reivindicadas
pelos argentinos desde o século XIX.
Retomar o poder das ilhas traria de volta a credibilidade nacional e garantiria o controle estratégico do
tráfego marítimo austral e das recém-descobertas áreas de exploração de petróleo na região. Por pouco
tempo, o regime gozou de apoio popular; porém, com a derrota nas Malvinas (1982), os militares saíram
de cena.
Em pleito direto, Raul Alfonsín chegou à Presidência em 1983. Processos contra os militares, crise
econômica e tentativas de golpe marcaram seu governo. De Alfonsín até a reeleição de Cristina
Kirschner, em 2011, a Argentina, apesar das crises, mantém-se dentro da legalidade democrática.
Museu de Ciência, Londres/Diomedia
Ingleses comemoram a vitória na Guerra das Malvinas. Londres (Inglaterra), 13 out. 1982.
Chile
No Chile, a vitória do socialista Salvador Allende, em 1970, marcou uma tentativa de implantar o
socialismo por via pacífica e democrática. Allende concorreu pela Unidade Popular, que congregava uma
aliança de forças de esquerda.
No poder, Allende aprimorou a reforma agrária, iniciada pelo ex-presidente Eduardo Frei, nacionalizou
importantes empresas estrangeiras, procurou estatizar os bancos, intensificou a construção de casas
populares e deu um papel de destaque à educação e aos movimentos populares.
Diante dessa política de esquerda, os setores mais conservadores da sociedade chilena se organizaram
para desestabilizar o presidente. Com o apoio dos Estados Unidos e de empresas multinacionais,
desfecharam o golpe militar que derrubou o governo constitucional de Allende, dando início à Era
Pinochet.
A instauração da ditadura de Pinochet foi o começo de uma gestão autoritária, que não tolerava a
presença de esquerdistas ou quaisquer outros opositores. Além disso, o governo ditatorial estava sujeito
a satisfazer todos os interesses dos Estados Unidos.
Página 147
Assim como na Argentina e no Brasil, a ditadura do Chile torturou, sequestrou e matou milhares de
opositores ao regime, que durou 16 anos.
Em 1980, Augusto Pinochet promulgou uma Constituição que tornava legal seu governo ditatorial. Tal
fato, entretanto, aumentou significativamente as pressões de grupos contrários ao regime, dando
origem a uma mobilização popular de grandes proporções. O movimento reivindicou a realização de um
plebiscito em 1987 que acabou impedindo a permanência de Pinochet no comando do país.
Dois anos depois, Patrício Aylwin foi eleito presidente do Chile, pondo fim ao governo ditatorial e
punindo os envolvidos na ditadura.
Durante a ditadura de Pinochet, milhares de pessoas deixaram o país, outras tantas foram assassinadas
ou simplesmente desapareceram.
Com a redemocratização, a Era Pinochet é atualmente lembrada com certo saudosismo por uns – devido
ao crescimento econômico – e detestada por muitos, em razão das violações aos direitos humanos.
Manifestantes carregam placas em que se lê “Pinochet assassino” em frente ao palácio presidencial La Moneda, em Santiago
(Chile), 10 set. 2006. Pinochet foi julgado pelos crimes cometidos durante sua ditadura, mas morreu em 2006, antes de ser
condenado.
Guatemala
Assim como no Chile, a ditadura na Guatemala foi incentivada pela intervenção dos Estados Unidos,
que, observando as várias reformas favoráveis à economia e à população implantadas pelo governo
democrático de Jacobo Arbenz Guzmán – a redistribuição de terras, por exemplo –, entenderam que a
política do país estava ligada ao comunismo.
A CIA organizou então, entre 1953 e 1954, o que chamou de “exército de libertação”, uma força militar
com aproximadamente 400 homens, treinados e equipados pelo exército americano. Numa invasão à
Guatemala, eles tomaram o poder no país, instaurando uma ditadura que permaneceu por
aproximadamente quatro décadas.
Nesse período, houve uma sucessão de ditadores no poder, o que gerou inúmeros levantes da
população contra o governo, causando a morte e o desaparecimento de mais de 140 mil pessoas.
Diante de tal fato, em 1993 a própria CIA resolveu interferir nos conflitos, ajudando a população
guatemalteca a instaurar um regime democrático.
Ao final das apresentações, juntos, componham, com a ajuda do professor, um painel que
contenha as principais informações de cada pesquisa.
Página 148
As guerrilhas
Guerrilha é um tipo de conflito armado não convencional, no qual os combatentes têm grande
mobilidade entre as áreas onde ocorrem os embates. Além dessa característica, aponta-se nas
guerrilhas o que alguns historiadores chamam de movimentação híbrida, ou seja, a possibilidade de as
tropas em ação se unirem a forças colaboradoras de determinadas regiões ou lutarem sozinhas em
busca de seu ideal político ou social.
Durante o período das ditaduras latino-americanas, surgiram muitas guerrilhas que lutavam pelo fim da
imposição política, por melhores condições de vida para a população e liberdade política e de expressão.
Nesse processo, alguns personagens da história acabaram se destacando. A personalidade mais
significativa no movimento de guerrilhas na América Latina foi o argentino Ernesto Che Guevara.
Poucos personagens do século XX conseguiram sensibilizar tanto a juventude quanto Che Guevara. Seu
retrato – com a boina estrelada, o fuzil na mão, cabelos e barbas longas – tornou-se símbolo das
manifestações estudantis de 1968.
Após o triunfo da Revolução Cubana, Guevara ocupou cargos importantes. Declarando-se “um
guerrilheiro do mundo”, abandonou Cuba e foi lutar secretamente no Congo. Voltou à América e tentou
formar um foco de guerrilhas na Bolívia. O plano de Guevara – criar outros núcleos guerrilheiros nos
países vizinhos à Bolívia – fracassou. Isolado, foi morto em 9 de outubro de 1967.
As ideias de Che Guevara influenciaram a esquerda latino-americana na década de 1960. Sua teoria do
foco guerrilheiro encontrou grande acolhida em todo o continente.
GORENDER, Jacob. Combate nas trevas. São Paulo: Ática, 1998. p. 20.
A guerra de guerrilhas foi largamente empregada na América Latina ao longo do século XX. Inspiradas
total ou parcialmente no foquismo, surgiram guerrilhas em países como Colômbia, Venezuela, Peru,
Guatemala, Argentina e Brasil. Para esses grupos, as mudanças nas arcaicas estruturas econômicas e
sociais só seriam possíveis se houvesse a derrubada violenta da ordem vigente.
Em muitos casos, a luta armada foi a forma encontrada para combater regimes ditatoriais. Apenas dois
movimentos guerrilheiros alcançaram o poder: o de Cuba e o da Nicarágua, este último por meio da
Frente Sandinista de Libertação Nacional.
Phillip A. Harrington/Corbis/Fotoarena
Um dos guerrilheiros de destaque na Colômbia foi Camilo Torres Restrepo. Camilo foi um padre dominicano que, depois de tentar
melhorar os problemas sociais colombianos por via pacífica, entrou para a luta armada. Fotografia de 1962.
Página 149
Essas tentativas de guerrilhas na América Latina fracassaram por várias razões. Eis algumas:
• falta das condições ideais ou, quando existiam, aproveitamento inadequado delas.
À época das reações armadas aos regimes ditatoriais, nas décadas de 1960 e 1970, os direitos humanos
foram violados tanto pelos governos quanto pelos guerrilheiros. Nos porões das ditaduras, pessoas
eram torturadas e mortas. As guerrilhas promoviam sequestros, emboscadas e assassinatos de civis,
policiais e soldados. A população muitas vezes era vítima de ações retaliativas tanto das forças
governistas quanto dos grupos rebeldes.
O presidente colombiano, Juan Manuel Santos (à esquerda), aperta a mão do chefe da guerrilha das Farc, Timoleón Jiménez,
conhecido como Timochenko (à direita), mediado pelo presidente de Cuba, Raúl Castro (centro), durante reunião em Havana
(Cuba) em 23 de setembro de 2015. O governo colombiano e membros da guerrilha das Forças Armadas Revolucionárias da
Colômbia (Farc) iniciaram negociações de paz com o objetivo de acabar com o conflito mais duradouro do país. Entre os temas do
acordo estão reforma agrária, participação política de ex-rebeldes e drogas ilícitas. As negociações de paz dividem as opiniões dos
colombianos, principalmente sobre a situação jurídica dos ex-rebeldes após o fim da guerrilha.
Pausa para investigação
Em grupo, busque informações sobre os temas a seguir. Juntos, apresentem o resultado em sala de
aula.
Debate interdisciplinar
Che Guevara: da guerrilha para o mercado
A imagem mais conhecida de Che Guevara é uma fotografia tirada pelo cubano Alberto Korda Gutierrez
em 5 de março de 1960, durante um evento em homenagem às vítimas da explosão de um barco que
matara 136 pessoas. O fotógrafo oficial de Fidel Castro imortalizou a imagem do guerrilheiro em uma
expressão que seria reproduzida incontáveis vezes após aquela data. Contudo, a fotografia não se
tornou conhecida logo após o evento, nem foi publicada logo após ter sido tirada.
Superstock/Glow Images
Foi o italiano Giangiacomo Feltrinelli que, alguns anos mais tarde, editou, reproduziu e espalhou-a ao
redor do mundo em forma de monotipo, tornando sua arte um material de domínio público, o que
facilitou sua reprodução em muros, cartazes e camisetas.
A monotipia é uma técnica que transforma uma imagem colorida ou preto e branco (que na realidade
apresenta vários tons de cinza) em uma mancha de uma só cor. A mancha reproduz a mensagem da
imagem original, ressaltando alguns pontos mais escuros e deixando o vazado para as partes claras. Essa
mancha pode ser reproduzida mais facilmente, pois necessita de apenas um molde e uma cor de tinta,
uma vez que não há gradação de cor. Assim, diversas técnicas de reprodução podem utilizar a imagem
de modo mais barato.
São usadas diferentes técnicas para esse tipo de reprodução, por exemplo, a serigrafia, que exige
apenas uma tela para aplicação de uma única cor, tornando o processo rápido e fácil, e o estêncil, que
consiste em fazer moldes vazados em papéis, geralmentekraft, que são colocados na superfície na qual a
imagem será aplicada e, em seguida, recebem tinta spray. A parte vazada, isto é, recortada, fica pintada.
Fernando Favoretto/Criar Imagem
A princípio, a imagem de Che Guevara foi utilizada por diversas gerações de militantes, partidos políticos
e jovens em protestos e passeatas que se identificavam com os ideais do guerrilheiro ou com o
comunismo.
Contudo, quanto mais sua imagem foi reproduzida, mais ela se afastou do verdadeiro sentido das lutas
travadas por ele, até tornar-se um objeto de consumo de gerações que querem parecer revolucionárias,
contestadoras, mas que, em suas práticas, estão mais vinculadas com o capitalismo do que com o
comunismo.
Página 151
Banalizada, a imagem passou, então, a figurar não apenas em cartazes e manifestações de cunho
político mas também em objetos dos mais variados tipos. Ela pode ser encontrada em relógios de
parede, canecas, chaveiros, bonés, agendas, descansos de copo etc., todos à venda. É uma imagem com
bastante saída no mercado de consumo; logo, reproduzi-la dá lucro.
Reproduzir o rosto de Che Guevara dá tanto lucro que algumas empresas de grande porte chegaram a
utilizar sua imagem em anúncios publicitários ou em seus produtos. Em um caso, uma indústria
automotiva recorreu ao guerrilheiro para a publicidade de um modelo de luxo. A fotografia original foi
editada, e no lugar da estrela da boina foi colocada a logomarca, que utilizou o mote “Viva la
revolución”. Anos antes, uma empresa de bebidas alcoólicas também usou o rosto de Che em anúncios.
Uma marca de roupas de praia fez uma estampa com dezenas de imagens reproduzidas em um biquíni,
e até relógios suíços também tiveram uma edição limitada com a imagem do guerrilheiro e a bandeira
de Cuba.
Esses produtos, nem de perto, representam os ideais comunistas. Ao contrário, fazem parte do imenso
mercado que tenta conquistar mais consumidores apelando para todos os públicos. Afinal, quem
compraria um relógio de marca com o rosto de Che Guevara estampado? O quão distante esse tipo de
produto está das lutas travadas pelos grupos comunistas em todo o mundo?
Em virtude desse abuso, os herdeiros de Che Guevara têm entrado na Justiça contra as empresas que
buscam lucrar com a imagem do guerrilheiro, distorcendo seus ideais de luta e de revolução ou a
afastando deles. As ações têm sido movidas uma a uma e, em alguns casos, o parecer foi favorável aos
herdeiros de Che, que detêm o direito sobre sua imagem e não a querem vinculada a produtos de lógica
capitalista.
A modelo brasileira Gisele Bündchen desfila no São Paulo Fashion Week de 2002 para uma grife de roupas de praia usando biquíni
com estampa do rosto de Che Guevara.
Atividade
1. Observe as imagens a seguir.
Rosto do guerrilheiro Che Guevara desenhado com giz na calçada da Avenida Paulista, São Paulo (SP), nov.2014.
© Soeren Stache/dpa/Corbis/Latinstock
Barras de chocolate que têm em sua embalagem o rosto do guerrilheiro Che Guevara. Berlim, Alemanha, jan. 2008.
a) Você consegue distinguir quais são as técnicas utilizadas na reprodução da imagem de Che?
Justifique.
1. (Enem)
Acervo Iconographia/Reminiscências
Charge de Ângelo Agostini de 1870, De Volta do Paraguai, publicada no jornal "Vida Fluminense", em 12 de junho de 1870.
Na charge, identifica-se uma contradição no retorno de parte dos “Voluntários da Pátria” que
lutaram na Guerra do Paraguai (1864- 1870), evidenciada na
2. (Unicamp-SP) A ditadura de Porfírio Díaz (1876- 1911) produziu no México uma situação de
superficial bem-estar econômico, mas de profundo mal-estar social. [...] Fizeram-no chefe de uma
ditadura militar burocrática destinada a sufocar e reprimir as reivindicações revolucionárias. [...]
Amparavam-na os capitalistas estrangeiros, tratados então com especial favor.
MARIÁTEGUI, José Carlos. A Revolução Mexicana. São Paulo: Ática, s/d. (Coleção Grandes Cientistas).
3. (Fuvest-SP) Na América Latina, no século XX, aconteceram duas grandes revoluções: a Mexicana
de 1910 e a Cubana de 1959. Em ambas, os
I. Durante o longo governo de Porfírio Díaz (1876-1911), os recursos nacionais do subsolo foram
entregues ao controle estrangeiro e se manteve a forte concentração fundiária.
II. Pressionado pelas massas camponesas e operárias, Francisco Madero estabelece uma reforma
agrária radical, que incluía o fim dos latifúndios.
III. A institucionalização do processo revolucionário tem como marco a promulgação de uma carta
constitucional em 1917, na qual se preconizava a nacionalização do solo e do subsolo.
IV. Após a renúncia de Porfírio Díaz, assumiu Francisco Madero, que, com o apoio dos Estados
Unidos, governa o México até o início dos anos 1930.
Responda no caderno
a) I, III e V, apenas.
b) I, IV e V, apenas.
e) I, II, III, IV e V.
5. (Uessba) O período da história republicana do Brasil que vai da queda do Estado Novo (1945) ao
movimento militar (1964) é caracterizado como populismo. O populismo não foi um fenômeno
exclusivamente brasileiro, mas latino-americano que floresceu no período pós-guerra.
a) Este fenômeno, historicamente, não foi uma forma assumida de controle governamental do
Estado sobre a população.
• Revoluções na América Latina contemporânea, de Everaldo de Oliveira Andrade. São Paulo: Saraiva,
2000. O livro relata as revoluções contemporâneas ocorridas no México, na Bolívia e em Cuba, nas quais
os respectivos povos se levantaram para defender a independência nacional durante o século XX.
Para você assistir
• Diários de motocicleta, direção de Walter Salles. Argentina/Brasil/Chile/Inglaterra/Peru, 2004, 130
min. Aos 23 anos, o estudante de medicina Ernesto Guevara decide acompanhar seu amigo em uma
viagem de motocicleta pela América do Sul, começando por Buenos Aires. Nessa viagem, conhecem o
continente onde vivem e Guevara descobre sua verdadeira vocação.
• No, direção de Daniel Dreifuss. Chile/França/EUA, 2012, 110 min. Quando o ditador Augusto Pinochet
realiza um referendo para que o povo decida se ele continua ou não no poder, seus opositores
convencem um jovem publicitário a liderar sua campanha. Apesar dos recursos limitados e da censura, o
publicitário e seu time elaboram um engenhoso plano para vencer o referendo e libertar seu país da
opressão.
5 O imperialismo na Ásia
Neste capítulo
O imperialismo
A diversidade das ações imperialistas
China Japão
A conquista da Índia
Cavalaria inglesa atacando os sikhs na Batalha de Aliwal, 1846, durante as guerras coloniais na Índia.
As ações imperialistas que estudaremos neste capítulo foram resultado direto da Segunda
Revolução Industrial, ocorrida no final do século XIX. Nesse contexto, os Estados europeus
e os Estados Unidos da América estenderam seus domínios para outros continentes em
busca de novos mercados, de lugares de onde pudessem extrair matéria-prima para as
indústrias e, ainda, que oferecessem mão de obra barata.
A forma pela qual ocorreu esse processo e as consequências dele para os povos asiáticos
serão algumas das questões abordadas neste capítulo.
Página 156
O imperialismo
Em meio às discussões relacionadas aos direitos humanos no decorrer da história, o imperialismo
destaca-se como um dos fatores que mais contribuíram para o desrespeito à cultura, à economia e ao
domínio territorial de diversos povos espalhados por todo o globo.
Durante e após o período das Grandes Navegações, continentes inteiros – como a África e as Américas –
foram ocupados por nações europeias, suas terras foram exploradas e seu povo foi subjugado e
escravizado, impedido de rea lizar cultos religiosos e propagar seus costumes.
O termo imperialismo começou a ser utilizado na segunda metade do século XIX e fazia referência às
pessoas e regiões partidárias de um imperador ou de uma forma imperial de governo.
No final do século XIX, esse termo designava uma forma de organização política na qual um centro
imperial governava muitas áreas coloniais. Entretanto, no começo do século XX, depois dos processos de
independência das colônias, passou a indicar um sistema econômico de investimento externo e controle
de mercados, firmado com a consolidação das grandes potências econômicas, como os Estados Unidos
e, atualmente, a China.
Rene Fluger/CTK Photo/Grupo Keystone
Os processos de ocupação têm em comum não apenas o caráter domina tório como também a
imposição de padrões cul turais, de consumo, de produção, de modo de trabalho, entre outros, aos
povos e nações dominados.
As ações imperialistas são legitimadas pelas potências de cada época, de acordo com as atividades em
voga no período, relacionadas ou não ao comércio e à obtenção de lucro. Tal situação já caracterizaria a
não garantia dos direitos humanos, mas a violência muitas vezes utilizada nesses processos confirma a
oposição entre imperialismo e garantia dos direitos humanos.
Atualmente, a grande corrida comercial dos países impõe um padrão de consumo que determina a
inserção cultural e econômica das pessoas e nações, caracterizando uma nova fase do imperialismo.
Semelhante às fases anteriores, esta também segrega e desfavorece determinadas parcelas da
população e estabelece novas relações de exploração pautadas na produção, no consumo e nas
transações de mercadorias e tecnologia ao redor do mundo. Não podemos esquecer, além disso, que,
em razão da grande integração entre as nações atualmente, o processo afeta quase toda a população
mundial.
Capa do periódico francês Le Petit Journal de 19 de novembro de 1911, em que a França é retratada como provedora da
civilização no Marrocos. O texto abaixo da imagem diz: “A França poderá livremente levar ao Marrocos a civilização, a riqueza e a
paz”.
Organizando ideias
Analise a tirinha e responda às questões.
André Dahmer
Diversos Estados europeus espalharam-se por todos os continentes estabelecendo relações de trocas
comerciais e culturais, muitas vezes firmadas por meio de ações impositivas.
Da mesma maneira que diversas nações europeias apossaram-se de territórios das Américas e da África,
especialmente entre os séculos XV e XVIII, mais tarde elas trataram também de explorara Ásia e
desenvolver relações comerciais com o continente asiático. Essas relações intensificaram-se na segunda
metade do século XIX e no começo do XX.
Com a independência das colônias europeias, as antigas metrópoles passaram a procurar novas fontes
de lucro, ocupando regiões com as quais já haviam consolidado relações comerciais. O obje tivo era
buscar novos mercados para o investi mento do capital excedente europeu, especialmente após a
Segunda Guerra Mundial. Nesse panorama, a Ásia foi um dos principais continentes envolvidos com o
mercado comercial.
Esse contraste nos modos do expansionismo foi realçado por mudanças ocorridas durante a
evolução do próprio capitalismo. A expansão geográfica inicial dos países europeus que confinam
com o Ocea no Atlântico esteve estreitamente vinculada à ascensão do capitalismo mercantilista.
Nesse período, quando as atividades manufatureiras eram relativamente subdesenvolvidas e em
geral subservientes ao capital comercial, a riqueza e o poder das nações europeias em expansão (e
dos colonos originários dessas terras) tiveram origem em quatro principais condições: 1) a absorção
de grande parcela do comércio intra-asiático tradicional, depois de eliminados os antigos
mercadores, e a ascensão dos europeus à situação de senhores das rotas marítimas mundiais; 2) a
exploração do ouro e da prata das Américas, bem como dos tesouros descobertos em outros
territórios conquistados; 3) a aquisição de produtos nativos da Ásia e das Américas para os quais
existia, ou podia ser criada, demanda na metrópole; e 4) o desenvolvimento do comércio escravista
africano. O âmago dessa atividade foi a apropriação direta dos excedentes dos territórios
dominados, cabendo notar que as guerras entre as potências europeias foram na maior parte,
embora não exclusivamente, motivadas pela divisão dos despojos do comércio e das possessões
coloniais. Em última análise, contudo, havia limites a esse tipo de “imperialismo”. Enquanto a
produtividade permanecesse virtualmente estagnada e a maioria dos povos do mundo mal
produzisse o suficiente para uso próprio, não poderia haver grande crescimento do excedente que
pudesse ser surrupiado.
Este último, contudo, não se desenvolveu na mesma ocasião e em igual medida em todas as nações
que lideraram a revolução comercial nos séculos XVI e XVII. O novo modo de produção
amadureceu apenas nos países onde a necessária base vinha evoluindo desde os tempos medievais
e onde o Estado e as relações de classe criavam um ambiente suficientemente favorável.
MAGDOFF, Harry. Imperialismo: da era colonial ao presente. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1979. p. 9.
Pesquise quais produtos são os mais exportados por empresas asiáticas atualmente e como eles
influenciam a relação dos países ocidentais com a tecnologia.
Glossário
Subserviente: que concorda em seguir as ordens de outra pessoa, servil.
Página 160
China
Durante muito tempo, os países europeus não conseguiram estabelecer um grande volume de comércio
com os chineses. Alguns produtos, como sedas e chás, eram comercializados; a China, porém,
permanecia fechada para a influência cultural ou maior penetração dos costumes ocidentais em seus
domínios.
Foi somente durante a Dinastia Ming que se intensificou a penetração ocidental na China. Os
portugueses ocuparam Macau (1557) e missionários católicos converteram muitos chineses ao
cristianismo. A despeito das conquistas dos exércitos da Dinastia Ming, a crise econômica, as
intempéries climáticas e as epidemias enfraqueceram a hege monia Ming. Na Corte as disputas entre
grupos rivais de ministros, generais e eunucos impossibilitava uma reação coordenada contra a
crescente ameaça dos manchus (conhecidos como a Dinastia Qing).
Akg-Images/Latinstock
Recipiente esmaltado com desenhos de lótus produzido durante a Dinastia Ming. Cobre esmaltado, 12,4 cm de diâmetro, c. 1450-
1456.
A Dinastia Ming governou a China de 1368 a 1644 e foi lembrada por estimular o retorno às tradições
chinesas.
Nessa dinastia, muitos projetos foram levados adiante, como a reconstrução do Grande Canal da China e
o término da construção da Muralha da China. Foi formado também um grande exército, de
aproximadamente 1 milhão de pessoas, conforme estimativa.
Nesse período, o incentivo à produção rural gerou muitos excedentes, que passaram a ser
comercializados, aumentando assim as rotas de venda de produtos na China.
A Dinastia Ming terminou quando os manchus, originários da Sibéria, tomaram Pequim em 1644,
dominando toda a China em poucos anos.
Mesmo procurando preservar suas raízes culturais, os manchus tiveram de se aliar ao grupo étnico
chinês conhecido como han. Com a paz interna, foi possível realizar a expansão na Ásia Central,
impondo um protetorado à Mongólia, ao Tibet, a Kashgar e à Coreia.
A princípio, os manchus tinham uma inclinação favorável em relação aos missionários cristãos,
especialmente os jesuítas, que lhes proporcionavam importante assistência técnica nos campos da
astronomia, cartografia e artilharia. Mas a “Controvérsia dos Ritos” (os jesuítas procuraram se
adaptar à realidade cultural chinesa), decidida por Roma contra os jesuítas, prejudicou seriamente
a sua posição; assim, em 1717, o cristianismo foi proibido e, em 1724, os missionários foram
expulsos. O governo chinês impôs um controle estrito dos contatos com estrangeiros e deixou de
acompanhar o progresso tecnológico que o Ocidente estava fazendo nessa época, chegando a
esquecer boa parte do que os jesuítas tinham ensinado.
JAGUARIBE, Hélio. Um estudo crítico da História. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2001. v. 2. p. 138.
O esforço para manter a paz interna, aliado à unificação dos países da região, afastou os chineses do
comércio e dos costumes europeus, fazendo com que se isolassem em relações comerciais internas e
costumes próprios, abstendo-se de qualquer relação com o Ocidente.
Guerra do Ópio
A China procurou se fechar em relação ao Ocidente, tanto que, quando uma missão diplomática inglesa
visitou o país, em 1793, com o objetivo de solicitar aos chineses o direito de estabelecer uma embaixada
em Pequim, o imperador, polidamente, respondeu que ela não era necessária.
Os britânicos buscavam capital para investir na indústria e tinham muito interesse nos produtos
chineses, como a seda e o chá, vendidos a altos preços na Europa. Assim, pesquisaram um
Página 161
produto que despertasse o interesse dos orientais, com o objetivo de estabelecer relações comerciais
com eles. Desco briram então a papoula, principal matéria-prima do ópio.
O ópio era produzido em larga escala na Índia e na Indonésia, que já permitiam certa abertura ao
comércio britânico, e passou a ser vendido para a China, possibilitando a comercialização dos preciosos
produtos chineses.
Em 1825, o imperador Daoguang recebeu um relatório informando que a quantidade de prata usada
para pagar o ópio contrabandeado pelos ingleses crescera enormemente. Na década de 1830, o
aumento foi demasiado, prejudicando a economia nacional. A questão econômica e a saúde da
população, cada vez mais abalada pelo consumo da droga, levaram o imperador a reunir seus
conselheiros.
Após ouvir os altos funcionários, em 1838, o imperador Daoguang decidiu erradicar o tráfico de ópio e
combater seu consumo. Para aplicar o decreto, escolheu um funcionário de nome Lin Zexu.
Em proclamações públicas, Lin procurou alertar as pessoas sobre os perigos do uso da droga para a
saúde. Em relação aos estrangeiros, argumentou que eles deveriam continuar com seus negócios
legítimos – como o chá, a seda e o ruibarbo – abdicando do ópio. Complementando sua medida, usou a
força contra os que desobedeceram ao decreto imperial. Milhares de chineses foram presos e toneladas
de ópio foram confiscadas.
SPENCE, Jonathan D. Em busca da China moderna: quatro séculos de história. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. p. 165.
Nas proximidades de Hong Kong, ocorreram os primeiros combates da chamada Guerra do Ópio (1839-
1842) entre os navios ingleses e os juncos chineses. Os chineses foram derrotados e assinaram os
termos do Tratado de Nanquim, em 29 de agosto de 1842. Entre as várias imposições, destacam-se:
• a abertura de cinco cidades chinesas para a residência de súditos britânicos e suas famílias, bem como
para o comércio;
Edward Duncan. Nemesis destruindo os juncos chineses na Baía de Anson em 1841, 1843. Aquarela.
Glossário
Ruibarbo: gênero de planta de raiz medicinal.
Página 162
Na esteira do Tratado de Nanquim, outras potências conseguiram privilégios semelhantes, caso dos
Estados Unidos e da França, em 1844. Os chineses fizeram mais duas importantes concessões: o
princípio da extraterritorialidade – o direito de ser julgado por suas próprias leis quando alguém cometia
um crime em território chinês – e o princípio que garantia plena tolerância religiosa, beneficiando tanto
católicos quanto protestantes.
Imperialistas na China
Muitos países tinham interesse em dominar os territórios e mercados asiáticos. Além da Grã-Bretanha, a
França, a Alemanha e mesmo a Rússia empreenderam ações com o intuito de controlar alguma parte da
Ásia, especialmente da China.
O país com mais interesses econômicos na Ásia era a Grã-Bretanha, que detinha o controle de quase
70% do comércio marítimo da China, além de controlar a dívida externa do país e possuir 30% dos
investimentos diretos chineses, calculados – no início do século XX – em 150 milhões de dólares. O
controle do mercado chinês pelos britânicos havia se tornado, então, uma questão de manutenção dos
ganhos obtidos, que, por si só, já era bastante lucrativo.
Print Collector/Diomedia
As indústrias inglesas em Cantão. Ilustração de B. Clayton e Piqua para o livro A História da China e da Índia, de Miss Corner,
publicado em 1847.
Página 163
A França, por sua vez, dominava as planícies meridionais asiáticas, região mineradora e com linhas
ferroviárias. O controle desse local era muito lucrativo para os franceses, o que fazia com que
empregassem grandes esforços em manter sua integridade territorial.
A Alemanha, apesar de entrar atrasada na partilha territorial, conseguiu firmar solida mente seu
comércio e seus investimentos na partilha colonial. No início do século XX, os alemães haviam
conquistado 28% das obrigações do governo chinês. Ocupavam o terceiro lugar em porcentagem de
dominação na China, atrás apenas dos ingleses e dos russos. Seu domínio foi tanto que, em 1898,
conseguiram concessão para a cons trução de duas ferrovias em Chaotung, o direito de explorar
reservas minerais num raio de 17 quilômetros de cada lado dessas ferrovias, a prioridade de fornecer
conhecimentos práticos, capital e material para qualquer finalidade na província de Chaotung, além do
arrendamento do Porto de Kiaostschu (Kiachau) por 99 anos. Em 1914, o governo chinês cancelou a
concessão.
Já os estadunidenses, até 1880, não se interessaram muito em dominar a China. Sua participação não
era muito intensa, pois estavam envolvidos na guerra com a Espanha pelo domínio de Cuba. Apesar
disso, também apoiavam a integridade territorial chinesa com o intuito de, no futuro, abrir mais espaço
para suas transações comerciais no território.
A Rússia tratava o controle do território e comércio da região como assunto de política nacional, o que
levou ao comando de toda a região da Sibéria para evitar o avanço do domínio britânico.
Os russos começaram suas investidas no território chinês no século XVII dominando a Sibéria e
conquistando uma base no Pacífico em território chinês. Aos poucos, eles foram avançando e
conquistando diversas regiões, como o Estreito de Bering, as ilhas Curilas e Aleutas e o Alasca.
Quando o imperialismo moderno começou, a Rússia já havia estendido sua influência sobre toda a
região asiática, dos Montes Urais ao Pacífico.
A ampliação do comércio com a China ajudou muito no desenvolvimento industrial da Rússia, que teve
um crescimento estimado em 350%, entre 1824 e 1854, relacionado especialmente à indústria têxtil.
A Rússia foi um dos grandes dominadores do território e comércio chineses, exercendo seu controle até
aproximadamente 1904, quando os japoneses começaram sua empreitada imperialista na China.
Organizando ideias
Analise a imagem e faça o que se pede.
Coleção particular
Henry Meyer. A partilha da China pelos europeus. Charge publicada no Le Petit Journal, jan. 1898.
Japão
A palavra Japão, utilizada no Ocidente, é de origem chinesa e quer dizer “ilha do Sol nascente”. Já
aqueles que os ocidentais denominaram de japoneses chamam seu país de ninhon ou nippon ou, ainda,
nihonjin, palavras que remetem ao mesmo significado.
O arquipélago japonês é povoado há milhares de anos. Os ainos dominaram o território por um grande
período, mas foram pouco a pouco suplantados por outros povos, a maioria de origem chinesa, que se
estabeleceram no local, assim como os de origem coreana. No século VI, foi introduzido o budismo. No
século seguinte, o primeiro Estado japonês alcançou estabilidade. Havia forte influência chinesa nos
protocolos, nas insígnias hierárquicas, no calendário, bem como na escrita, que foi sendo adaptada ao
idioma nipônico.
A organização política do Japão foi modificada algumas vezes, em períodos sucessivos, passando por
fases de governo imperial, oligárquico e militar, todos marcados por fracas relações comerciais e
culturais com o Ocidente.
Ainos é a denominação de um grupo étnico que surgiu por volta do século XII, em Hokkaido, nas ilhas
Curilas e Sacalina, atual Japão. Sua cultura pode ser encontrada, ainda hoje, na região do Tibete e nas
Ilhas Andamão, no Oceano Índico.
A abertura japonesa
Assim como a China, o Japão inicialmente evitou a influência ocidental em seu território e em sua
economia; porém, em 8 de julho de 1853, uma esquadra norte-americana apareceu na Baía de Edo
(hoje Tóquio).
O comodoro Matthew Calbraith Perry exigiu a presença de um emissário de xógum para entregar uma
carta do presidente estadunidense Millard Fillmore, que dava um ultimato aos japoneses: estabelecer
relações comerciais pacíficas ou sofrer as consequências de uma guerra.
Esta crise econômica é acompanhada de crise política e torna as classes populares das cidades e
dos campos mais turbulentas. Cresce a hostilidade aos estrangeiros e por volta de 1858-1860
adquire a forma de numerosos atentados individuais.
Estes atingem também políticos japoneses favoráveis à política pró-ocidental do xógum. Esta
política de concessões é vivamente criticada pelos adversários tradicionais dos Tokugawa, em
particular os grandes daimios do sul cujos feudos, mais evoluídos economicamente, estão
sufocados no quadro vetusto do Antigo Regime japonês. O sobressalto nacional cristaliza-se em
torno do imperador e de seus conselheiros de Kyoto: é o movimento “lealista”, sustentado por
jovens samurais [...]. Em seus espíritos, o tradicionalismo conservador mescla-se confusamente
com uma sincera aspiração reformista. As casas comerciais sustentam o Movimento e fornecem
fundos aos adversários do xógum.
CHESNEAUX, Jean. A Ásia Oriental nos séculos XIX e XX. São Paulo: Pioneira, 1976. p. 43-44.
Dentre as diretrizes gerais desse movimento, destacavam-se: unir todas as classes de alto a baixo;
destruir os “maus hábitos” e adotar, como base, os costumes do Ocidente; buscar o conhecimento em
todas as partes do mundo; e convocar assembleias para resolver assuntos de Estado.
Glossário
Vetusto: velho, antigo, ultrapassado.
Xógum: designação do general que comandava o exército japonês. Era quem efetivamente governava o
país.
Página 165
No plano político, foi promulgada uma Constituição nos moldes ocidentais. A nobreza perdeu o direito
de usar armas, e a linhagem cedia lugar à capacidade. A ascensão social só seria possível por mérito, e
não mais pelo nascimento.
Em pouco tempo, mais de 3 mil especialistas estrangeiros trabalhavam no país; o exército foi
modernizado; o serviço militar e o ensino das crianças tornaram-se obrigatórios; e o sistema educacional
foi reformado, seguindo o modelo francês e depois o alemão. Milhares de jovens japoneses foram
estudar no exterior. O governo financiava a pesquisa e investia na formação de técnicos. O processo de
industrialização acelerou-se.
Print Collector/Diomedia
Retrato da imperatriz Shoken (1850-1914), que foi casada com o imperador Meiji, século XIX. Na pintura, observa-se a
incorporação dos costumes ocidentais. Tanto as vestimentas da imperatriz quanto o cenário e a técnica são característicos do
Ocidente.
Os japoneses compreenderam que, para se ajustar ao novo modelo de governo e comércio a que
haviam se submetido, era necessário agir como as potências ocidentais. Assim, rapidamente tornaram-
se também uma potência imperialista.
Ao contrário da China, o Japão não sofreu durante muito tempo com o colonialismo do Ocidente.
Herbert Norman, no seu estudo pioneiro Japan’s emergence as a modern state, escreveu que “o
cadáver vasto e prostrado da China serviu como escudo do Japão diante da cobiça mercantil e
colonial das potências europeias”. Em pouco tempo, o império japonês se apresentaria como um
rival ao mundo ocidental, utilizando uma agressiva política de expansão regional. A Restauração
Meiji, ao abolir as antigas estruturas feudais sem, todavia, alterar profundamente as bases da
sociedade japonesa, permitiu aos privilegiados da antiga ordem reciclar-se em homens de
negócios, mantendo a crença social nas fortes tradições ancestrais.
COGGIOLA, Osvaldo. Japão: 500 anos de história, 100 de imigração – 1854-2008. São Paulo: Duetto, 2008. v. 2. p. 23.
O sucesso japonês foi rápido. Em pouco tempo, já exportava para os mercados europeus e a agricultura
tornou-se eficiente; a seda desempenhou um papel importante, bem como a indústria de produtos de
algodão. A mão de obra qualificada e instruída, aliada à cultura que valorizava o trabalho, facilitou esse
progresso.
FRIEDEN, Jeffry A. Capitalismo global: história econômica e política do século XX. Rio de Janeiro: Zahar, 2008. p. 77.
Glossário
Meiji: a Era Meiji ou "governo iluminado".
Prostrado: fraco, desfalecido, que se encontra abatido.
Página 166
O Japão na Coreia
A Coreia manteve, durante muito tempo, boas relações com o Japão, especialmente do século III ao V,
quando os japoneses começaram a ocupar uma parte da Península Coreana.
Por meio do contato com a Coreia, os japo neses conheceram aspectos que se enraizaram em sua
cultura, como o confucionismo, o taoismo e o budismo, este último também por influência da China.
Ao longo dessa relação, muitos coreanos se instalaram no Japão, fato que, aliado à distribuição dos
territórios no leste da Ásia, fez a Coreia se tornar uma ponte quase obrigatória entre o Japão e a China.
Esse fato despertou, na década de 1580, a disputa entre chineses e japoneses pelo território coreano.
A Coreia, governada desde o século XIV pela Dinastia Yi, tinha uma identidade cultural própria, porém
sofreu grande influência das sociedades chinesa e japonesa.
Em 1894, o governo coreano, que pagava tributos aos chineses, solicitou apoio militar da China para
reprimir uma rebelião interna. Na ocasião, tanto China como Japão enviaram auxílio, o que intensificou
a presença de ambos na região e aumentou a tensão entre os dois países.
Essa tensão culminou com a Guerra Sino-Japonesa (1894-1895), vencida pelo Japão, que, em 1910,
anexou a Coreia e iniciou um processo de colonização na península.
Horace Bristol/Corbis/Latinstock
Hasteamento da bandeira em frente a uma tropa de soldados em formação após a declaração da independência da Coreia. Seul
(Coreia), 1946.
Embora tenha possibilitado alguma modernização com a construção de escolas, estradas e hospitais, a
ocupação japonesa impôs significativas restrições aos coreanos, como a proibição do uso do idioma local
e o uso obrigatório de nomes japoneses. Além disso, os melhores cargos públicos na Coreia eram
ocupados por japoneses.
A Coreia tornou-se para o Japão uma colônia rural de exploração. Assim, trabalhos penosos e forçados
foram impostos a milhares de coreanos.
Foi apenas após a Segunda Guerra Mundial que a Coreia conseguiu conquistar a independência, mas
divergências ideológicas em seu território fizeram com que o país se dividisse em Coreia do Norte e
Coreia do Sul.
A ocupação da Manchúria
A Manchúria – região localizada a nordeste da China – faz fronteira com a Rússia, a noroeste, e com a
Coreia do Norte, a sul. É considerada muito importante estrategicamente por estar justamente entre o
Japão e a China, além de apresentar abundância em minérios de ferro e recursos agrícolas.
Inicialmente, o território pertencia à China; porém, com o declínio do Império Chinês, foi disputado na
Guerra Russo-Japonesa (1905-1910).
Enquanto os japoneses procuravam expandir seu território, numa investida de conquistas pela Ásia, o
objetivo dos russos era conquistar a região para expandir a ferrovia transiberiana, que os levaria das
principais cidades russas ao Extremo Oriente e possibilitaria o abastecimento da região da Sibéria,
também anexada pela Rússia.
Depois de várias batalhas e tentativas diplomáticas de acabar com o confronto, os japoneses tomaram o
Porto de Arthur – principal da região – e derrotaram os russos. Foi a primeira vez que um país asiático
derrotou um país europeu.
O Japão, então, dominou a Manchúria e consolidou sua posição criando o Estado de Manchukuo. Apesar
disso, com a derrota dos japoneses na Segunda Guerra Mundial, em 1945, a Manchúria voltou a
pertencer à China, que na ocasião também anexou portos e estradas da região.
Página 167
© DAE/Studio Caparroz
Fonte: LE MONDE diplomatique. Atlas der Globalisierung. Taz: Berlin, 2011. p. 30.
Organizando ideias
Leia a seguir o trecho da reportagem e responda às questões.
O ministro chinês das Relações Exteriores, Yang Jiechi, acusou nesta quinta-feira o Japão de roubar
da China um arquipélago no Mar da China Oriental disputado pelos dois países, durante seu
discurso na Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York.
“A China exorta firmemente o Japão a cessar imediatamente todas as atividades que violam a
soberania territorial chinesa, a adotar ações para corrigir seus erros e a voltar ao caminho para
resolver a disputa mediante negociações”, declarou Yang.
“O Japão roubou estas ilhas em 1895, ao final da guerra sino-japonesa, e forçou o governo chinês e
firmar um tratado desigual para ceder estes territórios”.
O chanceler reafirmou que as ilhas “formam parte integrante do território chinês desde a
antiguidade”.
“As ações tomadas pelo Japão são totalmente ilegais e inválidas. Não podem, de nenhuma
maneira, mudar o fato histórico de que o Japão roubou as ilhas Diaoyu e que a China tem soberania
territorial sobre elas”, proclamou Yang.
As tensões entre Pequim e Tóquio cresceram após o Japão decidir nacionalizar as ilhas, chamadas
de Senkaku pelos japoneses.
O primeiro-ministro japonês, Yoshihiko Noda, afirmou na quarta-feira nas Nações Unidas que “não
há compromisso” possível com a China sobre a soberania das ilhas Senkaku.
A conquista da Índia
Os europeus interessavam-se pela Índia desde o século XV, período das Grandes Navegações e da
chegada de Vasco da Gama ao local, mas foi durante o século XVIII que a Inglaterra dominou a região.
Os ingleses, com seu costume de ter os olhos fixos no horizonte, já tinham tomado a iniciativa do
comércio direto com o Extremo Oriente. Em 1600, ainda entusiasmada pela derrota infligida à
Invencível Armada de Felipe II da Espanha, a rainha Elizabeth I concedeu um monopólio de
comércio à Company of Merchants of London Trading to the East Indies. A guerra contra a Espanha
tinha cortado todo o abastecimento de pimenta, antes carregada em Lisboa, e foi essa iguaria,
cujos preços nas partidas comercializadas pela Holanda haviam explodido, que levou os londrinos a
criar sua própria companhia. [...]
A missão de um navio da Companhia das Índias durava muitos meses. Às vezes a embarcação só
voltava ao porto de origem dois anos depois da partida, pois, além de as negociações comerciais no
Oriente serem muito demoradas, era preciso esperar por ventos favoráveis para tomar o caminho
de volta. Desde os portos do noroeste da Europa até Cantão, situado na costa chinesa, na
embocadura do rio das Pérolas, um grande centro comercial, contam-se de 15 a 16 mil milhas. [...]
A companhia possuía cerca de 30 navios, número que passou a 37 em 1757, dos quais os maiores,
como Le Condé, Le Centaure, La Chine e Le Robuste chegavam a 1.500 toneladas. Cerca de três a
quatro navios desapareciam por ano, entre 1723 e 1744. Nesse período, o tráfego de navios foi
irregular, até mesmo em extremos: do total de embarcações, 35 fizeram 61 viagens de Lorient às
Índias e à China; outros 19 percorreram a rota só uma vez, oito trafegaram duas, seis fizeram três e
somente dois, quatro viagens. Essa média tão baixa pode ser atribuída a diferentes fatores.
Além das tempestades, de encalhes devidos à má previsão de rotas, um grande número de barcos
foi capturado ou incendiado, e outros foram retirados de circulação.
Nas 14 mil viagens ao Oriente efetuadas em três séculos, pelas diferentes versões da Companhia
das Índias, 1,5 milhão de homens não voltaram mais. Muitas vozes se ergueram contra esses
empreendimentos, cujas frotas enviadas pela Inglaterra, por Portugal e pela Holanda sugavam todo
o dinheiro da Europa para “comprar mercadorias inúteis”. Na verdade, seus lucros fabulosos e seu
poder inquietavam as nações. A partir de 1874, a Inglaterra não renovou mais a carta da East
Company. [...]
CASTELBAJAC, Bernadette de. Companhia das Índias, grandes negócios em muitas versões. História Viva. Disponível em:
<www2.uol.com.br/historiaviva/reportagens/companhia_das_indias_grande_negocio_em_muitas_versees.html>. Acesso em: fev.
2016.
Entre o final do século XVIII e as primeiras décadas do século XIX, os britânicos, por meio da Companhia
das Índias Orientais, conquistaram militarmente a Índia.
Durante a dominação da Índia, os ingleses pautaram-se pela seguinte premissa: dividir para dominar.
Para alcançar esse objetivo, usaram estratégias como: utilização de mercenários de uma região para
impor domínio sobre outras; concessão de vantagens a certos governantes ou etnias; aprofundamento
das divergências religiosas; superioridade econômica e bélica.
A presença britânica na Índia era altamente lucrativa: proporcionava empregos aos militares,
cobradores de impostos, juízes e burocratas, que dificilmente teriam oportunidades semelhantes na
metrópole. A colônia era uma válvula de escape para muitos.
Na área econômica, os mercados indianos absorviam as manufaturas britânicas, o que provocou a ruína
de muitos produtores locais. De exportadores de produtos têxteis, os indianos tornaram-se
importadores. Em outros setores, a produção artesanal sucumbiu diante de concorrência de artigos
metropolitanos.
Os altos impostos, o desrespeito às tradições culturais indianas, a deposição de príncipes que não se
submetiam aos ditames dos colonizadores e as humilhações a que os nativos foram submetidos
contribuíram para que ocorresse uma grande rebelião contra os britânicos.
Página 169
O motim de 1857, conhecido como Revolta dos Cipaios (também sepoys ou saphis, soldados indianos
que serviam no exército britânico), iniciado como uma revolta de quartel, expandiu-se com o apoio
popular e de príncipes, e os insurretos chegaram a controlar Délhi e outras cidades.
Coleção particular
Apesar de algumas vitórias iniciais, os rebeldes acabaram vencidos. Já os britânicos contaram com a
ajuda de príncipes protegidos, grandes proprietários enriquecidos e tropas originárias de outras regiões.
Durante a revolta, os dois lados praticaram atrocidades. Rebeldes massacraram mulheres e crianças
inglesas. Por outro lado, aldeias foram queimadas, insurretos foram massacrados e diversos líderes
nativos acabaram executados.
O que se verificou após o motim de 1857 foi a intensificação do racismo. A cidade de Délhi foi saqueada,
e os muçulmanos, alvos principais, foram duramente reprimidos.
Em 1858, a Coroa britânica havia assumido diretamente o governo da colônia. Mais tarde, em 1877, a
rainha Vitória foi proclamada imperatriz da Índia.
O imperialismo britânico beneficiou alguns poucos indianos que foram cooptados das mais diversas
formas. Como resultado, houve um grande processo de ocidentalização da sociedade indiana. Na
década de 1880, por exemplo, havia cerca de 8 mil indianos com diploma universitário em meio a um
crescente movimento de modernização das cidades, que contava com a implantação de ferrovias e
telégrafos.
[...] A rainha Vitória fez publicar solenemente em todas as grandes cidades uma proclamação
conciliadora, na qual se comprometia a proteger os príncipes e a respeitar as religiões e os
costumes indígenas, e também concedia seu perdão a todos os rebeldes, exceto aos assassinos de
súditos britânicos. Às veleidades reformistas e ao intervencionismo político da época precedente,
sucederam-se circunspecção e conservadorismo social. Suspenderam-se as anexações de Estados
principescos e seus soberanos foram cobertos de honrarias. Favo re ceu-se a aristocracia das terras
para atrair essa classe que fornecera demasiados chefes à revolta e para enquadrar mais
eficazmente, através dela, as massas camponesas que lhe eram fiéis. De maneira geral, reforçaram-
se as hierarquias sociais. Ao mesmo tempo, o exército das Índias foi reequilibrado (cem mil cipaios
a menos, vinte mil europeus a mais) e reorganizado com base nas castas e nas religiões. Fracionado
em comunidades homogêneas, ele de fato se tornou menos suscetível de unir-se em bloco contra
seus senhores. Assim garantida a ordem, a dominação britânica na Índia entrava em sua fase de
apogeu, que duraria até a Primeira Guerra Mundial.
POUCHEPADASS, Jacques. In: FERRO, Marc (Org.). O livro negro do colonialismo. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004. p. 339.
Coleção particular
Novas coroas para os mesmos velhos. Charge de John Tenniel, publicada em 15 de abril de 1876, que mostra o primeiro-ministro
Benjamin Disraeli oferecendo a coroa da Índia à rainha Vitória.
Glossário
Circunspecção: cautela, moderação.
Veleidade: fantasia, utopia.
Página 170
Organizando ideias
Em dupla, analise os textos que descrevem o imperialismo britânico na Índia. Depois façam o que
se pede.
Texto 1
No caso da Índia, algumas vezes alega-se que o status do país como uma preciosidade militar
essencial para a Coroa britânica retardou o crescimento devido à negligência colonial em relação às
necessidades econômicas. É verdade que o principal gasto da Grã-Bretanha na Índia, a construção
de um sistema ferroviário extenso, fora motivado por razões militares. Mas, longe de retardar o
desenvolvimento, as ferrovias provavelmente foram a maior fonte de qualquer sucesso econômico
registrado na Índia. No entanto, tal fato sozinho era insuficiente. Da mesma forma como os
governantes da China e do Império Otomano, tanto os britânicos quanto seus aliados indianos
preocupavam-se prioritariamente em manter o controle político, e viam com suspeita as medidas
desenvolvimentistas agressivas.
FRIEDEN, Jeffry A. Capitalismo global: história econômica e política do século XX. Rio de Janeiro: Zahar, 2008. p. 112.
Texto 2
A expansão imperialista é acompanhada pela luta do capital contra as ligações sociais e econômicas
dos nativos, os quais são espoliados dos seus meios de produção e força de mão de obra.
Essas instituições são rompidas pelo fato de uma economia de mercado ser impingida a uma
comunidade de organização completamente diferente; o trabalho e a terra são transformados em
mercadorias, o que, mais uma vez, é apenas uma fórmula curta para a liquidação de toda e
qualquer instituição cultural em uma sociedade orgânica [...]. As massas indianas na segunda
metade do século XIX não morreram de fome porque eram exploradas por Lancashire [região de
grande produção têxtil na Inglaterra]; pereceram em grande número porque tinha sido destruída a
comunidade de aldeia indiana.
POLANYI, Kan. In: DAVIS, Mike. Holocaustos coloniais. Rio de Janeiro: Record, 2002. p. 20.
2. Por que era importante manter o controle político na região dominada? Expliquem.
3. Expliquem a frase final do texto 2: “[...] pereceram em grande número porque tinha sido
destruída a comunidade de aldeia indiana”.
4. Associem a imagem abaixo aos textos e respondam: Quais foram as consequências do domínio
britânico sobre a Índia?
Coleção particular
Resgate cultural
Krishna e Rahda comemorando o Holi com companheiros, c. 1775-1780. Pintura feita com guache exposta no Museu Victória &
Albert, Londres, Inglaterra.
Durante o Holi é realizado o chamado Festival das Cores: milhares de pessoas saem às ruas para
colorir umas às outras com bexigas cheias de água, pétalas, pó e tintas de diversas cores. Como
outras práticas culturais relacionadas ao início da primavera, o arremesso de água e pó colorido
celebra o começo do período de fertilidade e prosperidade – nas sociedades tradicionais de base
agrícola, esse período é representado no imaginário como o tempo da renovação, já que as
temperaturas se elevam e se podem plantar diversas espécies.
[...] Anualmente, o evento que reúne um maior número de pessoas e que mais chama a atenção é
o Festival de Cores que se realiza no segundo dia de Holi e que consiste em lançar balões d’água,
pétalas e pó de cores – denominados gulal – entre as pessoas que estão nas ruas, enquanto se
desejam um “Feliz Holi”.
Os pós coloridos eram preparados inicialmente com ervas medicinais, mas com o tempo foram
sendo incluídos materiais sintéticos para que o pó durasse mais tempo no corpo dos participantes e
também para experimentar novas tonalidades. Ainda assim, as cores utilizadas não são escolhidas
aleatoriamente, e sim devem transmitir alegria e desejos positivos. Assim, foram mantendo certas
cores como tradicionais dentro da celebração, como o amarelo, que evoca piedade, o laranja, que
representa otimismo, o azul, que simboliza a calma, o vermelho, que é usado para o amor e a
pureza, e o verde para a vitalidade. Entre as novas cores a que mais se destaca é o rosa.
GAETE, Constanza Martínez. Trad. De Victor Delaqua. “Festival de Cores Holi”: Boas-vindas da primavera na Índia. Archdaily, 23
abr. 2013. Disponível em: <www.archdaily.com.br/br/01-109957/festival-de-cores-holi-boas-vindas-da-primavera-naindia>.
Acesso em: fev. 2016.
TUSHAR SHARMA/CITIZENSIDE.COM/AFP Photos
Adeptos da religião hindu influenciaram a cultura de diversos países ocidentais, os quais abrigam
comemorações inspiradas no Festival das Cores – trata-se, em geral, de uma festa que celebra a
alegria e a harmonia entre as pessoas. Recentemente várias festas de música eletrônica adotaram
o uso do pó colorido em seus eventos; algumas chegam a utilizar o nome do festival indiano – no
Brasil, por exemplo, elas ocorrem o ano todo, sem que guardem relação com o início da primavera.
No entanto, trata-se de eventos esvaziados de sentido religioso em que foram atribuídos novos
significados.
1. Forme um grupo com uns colegas e, juntos, pesquisem os novos significados do Holi para a
juventude indiana: Que práticas culturais são aceitas durante o festival?
Página 172
Debate interdisciplinar
Semelhanças e diferenças entre os sistemas linguísticos de
China, Índia e Coreia
A língua chinesa, que tem mais de 1,2 bilhão de falantes no mundo, é composta de diversos dialetos e
variações, como o mandarim e o cantonês, espalhados por todo o território chinês e também por países
onde há comunidades chinesas. As trocas culturais constantes entre a China e outros países do Leste
Asiático resultaram na influência do idioma chinês em línguas como o coreano, o japonês e o vietnamita.
Por outro lado, recebeu influências de outras línguas devido às transações comerciais estabelecidas pela
Rota da Seda. Muitas palavras do vocabulário chinês foram emprestadas de idiomas falados nos países
ligados por essa rota, como a Índia e a Pérsia.
Algumas influências linguísticas da Índia ocorreram por meio do budismo. Nesse processo, missionários
indianos traduziram documentos budistas, escritos em sânscrito, para o chinês. A importância da
literatura budista na China cresceu à medida que China e Índia tornavam-se países cada vez mais
próximos. Esse foi um período de muitas trocas culturais em diversas áreas, como a matemática, a
música, a astronomia e a medicina. A tradução dos textos indianos para o chinês mantinha os dois
países em contato constante, proporcionando também enriquecimentos linguísticos. Atualmente, há
forte tendência à valorização do sânscrito na China. Existem até mesmo cantores pop escrevendo letras
de música nessa língua.
A língua oficial da Coreia, o coreano, é falada por 78 milhões de pessoas no mundo atualmente. Suas
origens, segundo estudiosos, não são muito claras. Uma hipótese é que o coreano seja uma língua
isolada, que não tem semelhanças com nenhuma outra língua do mundo. Entretanto, o uso do chinês na
Coreia se dá desde o século IV. Por muito tempo, a escrita coreana foi uma adaptação dos caracteres
chineses hanzi, chamados de hanja na Coreia. Por volta dos séculos XIX e XX, o alfabeto fonético
coreano, chamado hangul, passou a ser mais utilizado e o hanja ficou para trás. Hoje em dia, é
necessário saber hanja quando se deseja estudar a História da Coreia ou melhorar seu vocabulário em
coreano, pois conhecer o hanja permite saber mais da etimologia das palavras, apesar de mesmo as
palavras de origem chinesa serem escritas com o hangul a maior parte das vezes.
Estima-se que mais de 50% das palavras coreanas tenham origem chinesa. Esse grupo de palavras é
chamado de vocabulário sino-coreano, e é composto de palavras emprestadas do chinês e palavras
criadas em coreano tendo como base os caracteres chineses. O budismo também foi responsável por
levar a cultura indiana à Coreia por meio de textos budistas traduzidos para o chinês.
Assim como a China abriga muitos idiomas e dialetos diferentes, a Índia conta com cerca de 1 652
línguas nativas, sendo o hindi o idioma oficial do país e o inglês secundário. O sânscrito, língua utilizada
no budismo, além de ter influenciado as línguas faladas na China e na Coreia, também influenciou o
japonês, pois o budismo tornou-se uma das principais religiões do arquipélago.
Atividade
1. Em virtude da chegada dos portugueses ao Japão entre os anos de 1542 e 1543, há muitas
palavras japonesas cuja origem está na língua portuguesa. Os portugueses foram os primeiros a
traduzir o japonês para uma língua ocidental. Missionários jesuítas elaboraram um dicionário e o
publicaram em 1603. A maior parte das palavras de origem portuguesa no japonês refere-se a
costumes e produtos que chegaram ao arquipélago por meio dos comerciantes portugueses. Você
consegue identificar a palavra portuguesa que deu origem a cada uma destas palavras japonesas:
arukôru, birôdo, iesu, agirisu, kappa, shabon, kompeitô, iruman, furasuko?
Página 174
No final do século XIX, os europeus defendiam seus interesses imperialistas nas regiões africanas e
asiáticas, justificando-os como missão civilizatória. Uma das ações empreendidas pelos europeus
como missão civilizatória nessas regiões foi:
a) aplicação do livre-comércio
2. (Uesc-BA) No século XVII, os tecidos leves de algodão representavam 60% a 70% das
exportações indianas. Com a industrialização, a Inglaterra produziu máquinas 350 vezes mais
rápidas do que um operário indiano. Graças à posição dominante, a Inglaterra pôde introduzir
livremente seus tecidos na Índia. O resultado foi que, em menos de um século, a indústria dos
algodões indianos havia praticamente desaparecido.
b) Os tecidos ingleses, de pior qualidade que os indianos, pagavam altos impostos de circulação em
âmbito local.
d) A produção de tecidos foi desarticulada, porque os seus responsáveis desistiram da ajuda inglesa
para a aquisição de máquinas modernas.
4. (UERJ) “Se tivéssemos de definir o imperialismo da forma mais breve possível, diríamos que ele é
a fase monopolista do capitalismo.”
Indique, tomando como ponto de referência o texto acima, dois fatores que estimularam a
expansão imperialista.
5. (UFPB) O texto a seguir, relativo ao imperialismo, apresenta lacunas que devem ser preechidas
corretamente.
Responda no caderno
6. (Unirio-RJ) Foi essa consciência de nossa superioridade inata que nos permitiu conquistar a
Índia. Por mais educado e inteligente que seja um indígena, por mais valente que ele se manifeste
e seja qual for a posição que possamos atribuir-lhe, penso que jamais ele será igual a um oficial
britânico.
(Lord Kitchener, in: PANIKKAR, K. M., A Dominação Ocidental na Ásia. Tradução de Nemésio Salles, Rio de Janeiro: Saga, 1965, p.
160.)
A expansão imperialista europeia sobre o continente asiático, ao longo do século XIX e o início do
século XX, atingiu uma de suas principais expressões na dominação britânica sobre duas das mais
antigas civilizações da Ásia: a China e a Índia.
Marque a opção a seguir que apresenta uma característica correta da dominação imperialista
inglesa sobre a China ou a Índia.
b) Na China, a vitória militar dos ingleses sobre os exércitos imperiais chineses na Guerra do Ópio
(1841) determinou a instalação do monopólio da Inglaterra sobre o comércio chinês de especiarias
com o Ocidente.
e) Na Índia, uma alta burocracia de indianos exercia a administração das áreas conquistadas para
reduzir os custos elevados gerados pelos gastos militares com dominação imperialista.
• Lagaan – era uma vez na Índia, direção de Ashutosh Gowariker. Índia, 2001, 225 min. Quando o
Império Britânico ameaça dobrar o imposto cobrado dos moradores de uma pequena vila na Índia
Vitoriana, o jovem Bhuvan propõe uma maneira inusitada de resolver a questão: jogadores veteranos de
críquete disputariam contra os moradores da vila pelo controle do local.
• A Guerra do Ópio, direção de Xie Jin. China, 1997, 110 min. Em 1839, negociantes britânicos de ópio
são executados porque o comércio da droga está destruindo o Império. Depois que a China queima 20
mil caixas de ópio, a Inglaterra declara guerra, pois o ópio queimado era propriedade de um importante
comerciante britânico.
Página 176
6África: do escravismo ao
imperialismo
Neste capítulo
A escravidão na África
O comércio de pessoas
O colonialismo europeu
O imperialismo e a partilha da África
Movimentos de resistência
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A milenar cultura africana foi uma das mais subjugadas pelos povos colonizadores, tendo
em vista a opressão e a escravização às quais foi submetido o povo africano.
A escravidão na África
Assim como outras regiões, a África esteve intimamente ligada à história da escravidão, por servir como
fonte principal de mão de obra escrava para as sociedades antigas, o mundo islâmico, a Índia e as
Américas e ser uma das regiões onde a escravidão era mais comum.
A escravidão já existia no continente africano séculos antes do início do tráfico de escravos realizado
pelos portugueses, mas sem o caráter mercantil que foi incorporado a essa prática. Havia diversas
formas de escravidão doméstica, o que não caracterizava o escravo como um produto a ser consumido,
ele era uma ferramenta a mais para ajudar na colheita, caça, pecuária, mineração e nas campanhas
bmilitares; enfim, atividades do cotidiano de agrupamentos familiares, aldeias, cidades etc.
[...] A maior fonte de escravos sempre foram as guerras, com os prisioneiros sendo postos a
trabalhar ou sendo vendidos pelos vencedores. Mas um homem podia perder seus direitos de
membro da sociedade por outros motivos, como a condenação por transgressão e crimes
cometidos, impossibilidade de pagar dívidas, ou mesmo de sobreviver independentemente por
falta de recursos. [...]
Se considerarmos a escravidão como: situação na qual a pessoa não pode transitar livremente nem
pode escolher o que vai fazer, tendo, pelo contrário, de fazer o que manda o seu senhor; [...]
situação na qual o escravo não é visto como membro completo da sociedade em que vive, mas
como ser inferior e sem direitos, então a escravidão existiu em muitas sociedades africanas bem
antes de os europeus começarem a traficar escravos pelo oceano Atlântico. [...]
SOUZA, Marina de Mello e. África e Brasil africano. São Paulo: Ática, 2006. p. 47.
Havia diferentes formas de organização social e também vários modos de escravidão na África. Entre
alguns povos africanos, por exemplo, os escravos acabavam se tornando membros da sociedade, já que,
entre eles, a condição de escravo não designava uma classe social, e sim o tipo de atividade
desempenhado pelos trabalhadores. Havia, inclusive, casos de sociedades em que os escravos podiam,
se fossem fiéis a seus senhores, assumir cargos de grande prestígio local.
Prisma/Album Art/Latinstock
SILVA, Alberto da Costa e. A manilha e o libambo: a África e a escravidão de 1500 a 1700. Rio de Janeiro: Nova Fronteira;
Fundação Biblioteca Nacional, 2002. p. 80-81.
Organizando ideias
1. Levante hipóteses sobre o que significa a escravização do ponto de vista do escravo. Depois,
apresente-as em sala de aula e busque documentos para comprovar ou confrontar as questões
apontadas.
Página 179
As religiões e a escravidão
Embora as três grandes religiões monoteístas – cristianismo, islamismo e judaísmo – incentivem, em
seus preceitos, o respeito ao próximo, o tema “escravidão” provocou reações distintas entre os
representantes religiosos ao longo dos anos, que, geralmente de acordo com os interesses de suas
instituições, assumiram diferentes posturas no que diz respeito à utilização do trabalho escravo e ao
tratamento dispensado aos escravizados.
No cristianismo, por exemplo, Paulo de Tarso (século I), um de seus maiores difusores, apesar de ter
afirmado que, perante Cristo, não existe senhor ou escravo, não se opôs ao sistema escravista romano.
Já Agostinho de Hipona (354-430) dizia que a escravidão era consequência do pecado, motivo pelo qual
o indivíduo merecia ser escravizado. Para Tomás de Aquino (1225-1274), embora a escravidão fosse
dolorosa, era útil e necessária. No século XVI, os europeus passaram a utilizar um velho argumento
árabe: como os africanos descendiam dos filhos de Cam, que fora amaldiçoado por Noé (relato bíblico),
eram escravos.
Entre os islâmicos, a escravização de não muçulmanos era aceita, não importando a etnia. Já entre os
judeus, a relação tinha dois vieses: quando se tratava de escravizados de origem judaica, que se
encontravam em tal condição devido a dívidas, roubos ou outros motivos, o tratamento era brando e
durava o tempo limitado de sete anos; já no que se referia a escravos africanos, o tratamento e o tráfico
ocorreram de maneira bem parecida com a que aconteceu na América Portuguesa, por exemplo.
Organizando ideias
A Mauritânia, um país localizado na costa ocidental da África, foi o último país do mundo a abolir a
escravidão, em 1981. Contudo, somente em 2007 essa prática se tornou crime, sendo processado e
condenado um único senhor de escravos. De 4% a 17% da população (dados da ONU em 2015) vive
na condição de escravo, mas o governo do país nega-se a reconhecer que a prática escravista ainda
exista.
Escravidão doméstica
Nos confrontos entre os vilarejos africanos era comum que os vitoriosos escravizassem alguns dos
vencidos, numa relação que hoje chamamos de escravidão doméstica, cujo objetivo era utilizar a força
de trabalho dos cativos em geral na agricultura de pequena escala, familiar.
Nesse tipo de relação, os escravos eram poucos e, apesar de sua posse assegurar poder e prestígio aos
senhores, acabavam associados à unidade familiar, porque representavam a capacidade de
autossustentação da linhagem.
A preferência para o cativeiro, nesse caso, era por mulheres e crianças, que garantiriam a ampliação do
grupo do qual passavam a fazer parte, sendo gradativa a incorporação dos escravos na família: como os
filhos de escravos não podiam ser vendidos ou trocados, iam, de geração em geração, perdendo a
condição de cativos e se assimilando à linhagem.
A guerra não era o único meio de escravização na África da Antiguidade. Em muitas sociedades, o
cativeiro servia de punição a quem fosse condenado por roubo, assassinato e, dependendo da
sociedade, feitiçaria e adultério. Outras maneiras de obter escravos consistiam na penhora, no rapto
individual, na troca e na compra etc. Entretanto, apesar da incorporação dos escravos aos núcleos
familiares, sentenciar alguém à escravidão ainda significava desenraizá-lo.
A presença muçulmana modificou a escravidão africana, com a organização, pelos árabes, do tráfico de
escravos como empreendimento comercial em grande escala no continente.
A partir do final do século VIII, os árabes disseminaram a crença no islamismo por meio da palavra, dos
acordos comerciais e do uso de armas, em episódios que ficaram conhecidos como jihad – ou guerra
santa. As expedições tinham o objetivo de islamizar a população.
Entre os povos que se recusassem a aceitar o islamismo, eram escolhidos membros para ser
escravizados e seguir com as caravanas, servindo como moeda de troca e carregadores de bagagens,
mantimentos e mercadorias nas viagens pelas longas rotas que cortavam o Deserto do Saara.
Os escravos transportados por essas caravanas eram trocados por outras mercadorias e vendidos em
grandes centros comerciais. Todo o mundo árabe foi, aos poucos, revelando-se um ótimo mercado para
a comercialização dos escravos levados da África, da Índia, da China e do sudeste da Ásia à Europa
Ocidental.
Uma nova fase da islamização começou no século XVIII, também auge da época escravista. A
servidão já existia em várias sociedades altamente hierarquizadas da África Ocidental [...]. Porém o
rapto de seres humanos se acelerou e novos Estados, tais como Dahomey e Ashanti (atual Gana)
surgiram no litoral em resposta à crescente demanda europeia por escravos africanos – na sua
maioria trazidos para a América. Os fuzis que os vendedores indígenas de escravos receberam em
troca da mercadoria humana facilitavam novas caças que vitimaram populações inteiras, enquanto
transformavam os grupos caçadores e mercadores em novas elites. Parte dos escravos vendidos
eram muçulmanos. Foram eles que trouxeram os primeiros núcleos do islã para as Américas. No
entanto, na África Oriental, escravos comercializados pelo sultão de Zanzibar foram para o próprio
Oriente Médio.
Esse comércio era pequeno se comparado com o tráfico inaugurado pelos europeus na Era Moderna.
Embarcavam-se algumas dezenas ou centenas de cativos, sem provocar nenhum grande abalo
demográfico.
Organizando ideias
Leia o texto e faça o que se pede.
Na sua forma primitiva, a escravidão funcionava a margem da sociedade. Existiam alguns cativos
que não tinham conseguido pagar dívidas, que tinham sido condenados por crimes, acusados de
bruxaria, capturados por guerra [...]. Entretanto, a estrutura básica da sociedade era a unidade de
parentesco. Os escravos emergem quase como produtos incidentais da interação entre grupos
familiares. [...] Uma vez que os comerciantes organizaram a coleta de escravos, a troca foi
transformada. Da mesma forma que os escravos continuavam a se movimentar de um lado para
outro entre os grupos de parentesco, com pouca, se é que havia alguma, discrepância no equilíbrio
de seu fluxo, agora os cativos também eram dirigidos para o mercado de exportação. O efeito foi a
perda pela África desses escravos e a substituição de seres humanos por mercadorias importadas.
LOVEJOY, Paul. A escravidão na África: uma visão de suas transformações. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. p. 84-85.
O comércio de pessoas
No contexto da expansão comercial europeia, os portugueses exploraram, ao longo do século XV, a
costa africana. O tráfico de escravos pouco a pouco se tornou uma atividade rentável. Com a
colonização da América, a demanda por cativos aumentou. A importância econômica do tráfico elevou-
se, e os lusitanos ganharam concorrentes: ingleses, holandeses, franceses e espanhóis.
O tráfico atlântico gerou mudanças na África, pois o aumento ou a diminuição da escravidão interna
estavam relacionados a uma maior ou menor demanda externa.
Na busca por cativos, os conflitos entre africanos aumentaram, as economias foram desarticuladas. Em
algumas regiões, as perdas demográficas – sobretudo de pessoas do sexo masculino – foram tão
grandes que não há como medi-las.
Fonte: ELTIS, David; RICHARDSON, David. Atlas of the transatlantic slave trade. New Univertiy Press, 2010. p. 18-19.
Organizando ideias
A eficácia e abrangência do tráfico não seria alcançada se não houvesse cumplicidade das
sociedades africanas. [...]
No entanto, vale repetir: foi provavelmente graças à existência da escravidão na África Atlântica
pré-colonial que os navios negreiros puderam ser rapidamente abastecidos. Os europeus não
inventaram a instituição, mas sim destinaram para outro fim – o comercial, cujas dimensões eram
então inéditas.
DEL PRIORE, Mary; VENÂNCIO, Renato Pinto. Ancestrais: uma introdução à história da África Atlântica. Rio de Janeiro: Elsevier,
2004. p. 38 e 40.
1. De acordo com as informações do texto, explique o que significa a dimensão “comercial” da
escravidão inaugurada pelos portugueses.
Página 183
O colonialismo europeu
A necessidade de metais preciosos, cereais e especiarias impulsionou os portugueses a tentar alcançar
as Índias por via marítima. Para isso, era necessário contornar a costa africana. A tomada de Ceuta, em
1415, foi o marco inicial. O Cabo Bojador foi vencido em 1434; o Forte de São Jorge da Mina (entreposto
de ouro e escravos) foi construído em 1482; já o Cabo da Boa Esperança, na extremidade sul do
continente, foi alcançado em 1488 e, finalmente, Vasco da Gama conseguiu, em 1498, chegar às Índias.
No século XVI, a África Ocidental passou para a órbita do capitalismo europeu, que estava em franca
expansão. Por um lado, os africanos exportavam matérias-primas, mão de obra (escravos) e metais
preciosos; por outro, consumiam manufaturas europeias.
Até meados do século XIX, o controle político europeu no continente era mínimo, reduzindo-se a
pequenos enclaves com objetivos comerciais. Contudo, havia algumas exceções: os portugueses
ocuparam a costa de Angola e parte de Moçambique, os holandeses fundaram a colônia do Cabo em
1652 e os britânicos fundaram Freetown (Serra Leoa) para abrigar escravos libertos.
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No século XIX surgiram novos fatores de transformação na história do continente, que tinham como
base o desejo dos países europeus de levar seu comércio para a África e, assim, intervir na vida social e
econômica das populações locais.
Para que o comércio fosse instituído, os europeus precisaram conhecer melhor a população e os
recursos do interior do continente, acabar com o tráfico negreiro e estabelecer a exportação africana de
determinados produtos. Os missionários tinham papel importante nessa tarefa, uma vez que, por meio
da tentativa de imposição da maneira cristã de viver aos nativos, abriam espaço também para a
assimilação dos conceitos de consumo europeus e ajudavam na compreensão das atividades locais.
As novas relações comerciais estimularam as trocas de produtos que já havia no continente, mas não
criaram novas atividades econômicas. Representaram apenas o aumento do comércio instituído na
época do tráfico negreiro, configurando a permanência de sistemas políticos, da rede de rotas
comerciais, das relações sociais e econômicas e do sistema de produção agrícola preexistentes.
Assim, no início do século XIX, as tradições herdadas do século anterior tiveram muito mais importância
que as mudanças vindas da nova instalação europeia, que só passaram a exercer maior influência nos
períodos seguintes da relação Europa -África.
Glossário
Enclave: território cujas fronteiras geográficas estão totalmente localizadas dentro de outro território.
Página 184
Organizando ideias
Com base nas informações do texto e do quadro, responda às questões propostas.
O óleo de palma é uma gordura vegetal obtida a partir da polpa da fruta da palmeira de óleo
africana, conhecida no Brasil como dendezeiro, cujo nome científico é Elaeis guineensis. É nativa do
Oeste Africano, na região do Golfo da Guiné, sendo encontrada também originalmente na África
Central, Leste Africano e em algumas localidades da ilha de Madagascar. [...]
Com a emergência da Revolução Industrial Inglesa, se tem uma demanda de óleo de palma para
velas e para servir de lubrificante para o maquinário. Com isso se inicia a produção de óleo de
palma para a exportação, ainda incipiente, que tem registros na primeira metade do século XIX na
África subsaariana, no Reino de Daomé (hoje Benin) e no Delta do Níger (Nigéria) [...].
Após a Segunda Guerra Mundial, ocorrem melhorias no refino e no transporte de óleo de palma,
que fazem com que seu uso se difunda no Ocidente sem precisar aplicar a tecnologia de
hidrogenação.
A partir desse período, tem-se a intensificação da plantação da palmácea no Sudeste Asiático, que
se adapta perfeitamente aos solos e ao clima da região, ganhando em produtividade em relação às
plantações africanas. O óleo de palma foi utilizado principalmente pela Malásia e Indonésia, como
símbolo de um processo de diversificação econômica, tentando fugir da dependência econômica da
produção e exportação da borracha.
ALBANO, Gleydson Pinheiro. Globalização da agricultura na Oceania: óleo de palma, a última fronteira. Revista GEOTemas, Pau
dos Ferros, Rio Grande do Norte, v. 2, n. 1, p. 49, jan./jun. 2012.
1. O óleo de palma, extraído da planta que no Brasil é conhecida como dendezeiro, é utilizado em
vários produtos, como você pôde observar no quadro.
b) Cite alguns produtos de seu uso diário que tenham, em sua composição, óleo de palma.
Fonte: ALBANO, Gleydson Pinheiro. Globalização da agricultura na Oceania: óleo de palma, a última fronteira. Revista GEOTemas,
Pau dos Ferros, Rio Grande do Norte, v. 2, n. 1, p. 49, jan./jun. 2012.
b) Em que ano, aproximadamente, houve o cruzamento das duas linhas? O que isso significa?
A partilha do continente africano decorreu dos anseios por crescimento econômico dos países que
haviam se industrializado no século XIX. A busca por matérias-primas, mercados consumidores e locais
para a aplicação dos excedentes de capital de forma lucrativa impulsionou as conquistas. Além dos
fatores econômicos, destaca-se a importância do poder político e das questões ideológicas.
[...] a primeira coisa que o historiador tem de restabelecer é o fato óbvio que ninguém teria
negado, nos anos 1890, de que a divisão do globo tinha uma dimensão econômica. [...]
O desenvolvimento econômico não é uma espécie de ventríloquo, com o resto da história como
seu boneco. Neste sentido, mesmo o homem de negócios mais limitado, à procura do lucro em,
digamos, minas sul-africanas de ouro e diamantes, jamais pode ser tratado exclusivamente como
uma máquina de ganhar dinheiro. Ele não ficava imune aos apelos políticos, emocionais,
ideológicos, patrióticos ou mesmo raciais associados de modo tão patente à expansão imperial.
Entretanto, embora seja possível determinar uma conexão econômica entre as tendências do
desenvolvimento econômico no centro capitalista do mundo na época e sua expansão na periferia,
torna-se muito menos plausível imputar todo o peso da explicação do imperialismo a motivos que
não tenham uma conexão intrínseca com a penetração e a conquista do mundo não ocidental.
E mesmo os que parecem ter, como os cálculos estratégicos das potências rivais, devem ser
analisados tendo em mente a dimensão econômica.
HOBSBAWM, Eric J. A era dos impérios: 1875-1914. 11. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2007. p. 95.
Também há outras questões que podem explicar a expansão imperialista, como a crescente influência
europeia na África.
Admitem que foram motivos de ordem essencialmente econômica que animaram os europeus e
que a resistência africana à invasão crescente da Europa precipitou a conquista militar efetiva.
Parece, de fato, que a teoria da dimensão africana oferece um quadro global e histórico que
explana melhor a partilha do que as teorias puramente eurocêntricas.
UZOIGWE, Godfrey N. A África sob dominação colonial, 1880-1935. In: BOAHEN, A. Adu (Coord.). História geral da África: África
sob dominação colonial, 1880-1935. 2. ed. Brasília: Unesco, 2010. v. VII. p. 31.
Diversas teorias foram utilizadas para justificar a ação imperialista na África, entre elas o darwinismo
social e o cristianismo evangélico – todas atreladas a um imaginário coletivo baseado na crença em uma
superioridade racial e cultural europeia. De acordo com o darwinismo social, os “superiores” (europeus)
dominariam naturalmente os “inferiores” (africanos). Além disso, muitos evangélicos acreditavam que a
conversão dos africanos ao cristianismo por meio do imperialismo seria um caminho de “salvação”.
Alguns fatores contribuíram para a dominação europeia na África, como a superioridade do armamento
e dos aparatos de comunicação utilizados pelos europeus, em especial no início do século XX; os
progressos da medicina europeia, como o uso doquinino no controle da malária; o acesso dos europeus
a informações sobre o território africano – graças às atividades de missionários e exploradores; e o
grande número de conflitos que envolvia diferentes povos nativos.
Glossário
Imputar: atribuir a algo ou alguém a responsabilidade por um ato ou acontecimento negativo.
Quinino: substância natural retirada da casca de uma planta medicinal, utilizada como complemento no
tratamento da malária.
Página 186
O rei Lobengula, dos ndebeles, por exemplo, assinou um contrato com o empresário britânico Cecil
Rhodes em troca de “proteção”. O problema é que o monarca não sabia ler nem falava inglês. No
contrato, nada havia sobre “proteção”. Apesar dos protestos de Lobengula, Rhodes, com o apoio do
governo da Grã-Bretanha, abriu caminho para a exploração do território ndebele (hoje Zimbábue), de
onde muito ouro foi retirado.
O crescente avanço francês, no início da década de 1880, exacerbou as rivalidades pelas disputas de
colônias, aumentando o risco de guerra entre as potências imperialistas europeias.
Com o intuito de organizar “a corrida por territórios na África” e abrandar os ânimos, o chanceler
alemão Otto von Bismarck e o primeiro-ministro francês, Jules Ferry, convocaram uma conferência
internacional das grandes potências, realizada em Berlim. A Ata Geral da Conferência (28 de fevereiro
de 1885), em linhas gerais, estabeleceu: o reconhecimento do “Estado Livre do Congo”, atendendo aos
interesses econômicos do rei Leopoldo II, da Bélgica, escolhido para ser presidente da Associação
Internacional Africana, com sede em Bruxelas; o direito de livre navegação e livre-comércio nas bacias
do Níger e do Congo; a proteção e instrução dos nativos para “a compreensão e apreciação das
vantagens da civilização”; e a aceitação da necessidade de acabar com a escravidão e o comércio de
escravos na África.
A decisão que teve maiores consequências foi o estabelecimento da norma de que um país europeu
tinha de ocupar efetivamente um território para reivindicá-lo. Instalou-se uma corrida desenfreada
entre as potências imperialistas para dominarem novos territórios.
A demarcação das fronteiras prosseguiu até após a Primeira Guerra Mundial (1914- 1918). Houve ainda
outros tratados entre os países europeus para efetivar acertos dessa partilha. Com essas ações o
território da África foi quase totalmente dividido.
Organizando ideias
Observe a charge, leia a citação e faça o que se pede.
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O mundo está quase todo parcelado, e o que dele resta está sendo dividido, conquistado,
colonizado. Pense nas estrelas que vemos à noite, esses vastos mundos que jamais poderemos
atingir. Eu anexaria os planetas se pudesse; penso sempre nisso.
RHODES, Cecil apud HUBERMAN, Leo. História da riqueza do homem. Rio de Janeiro: LTC, 2010. p. 204.
1. Relacione a imagem à citação. Qual era a pretensão de Rhodes com relação à África?
Após ter ficado sob o domínio bizantino e árabe, a África setentrional passou para o domínio do Império
Otomano.
A decadência turca levou ingleses e franceses a disputar a região. Napoleão Bonaparte invadiu o Egito
em 1798, mas os britânicos logo voltaram a exercer influência sobre o governo egípcio.
No começo do século XIX, alguns países europeus procuraram exercer influência comercial e política na
costa norte da África. Os espanhóis mantinham enclaves na região; os franceses e, depois, os italianos
tinham ambições pelas áreas mediterrânicas do continente.
Em 1830, os franceses anexaram a Argélia e, paulatinamente, foram ocupando grande parte da África
Ocidental. Foram seguidos pelos ingleses, que passaram de um domínio indireto ao domínio direto
sobre o Egito e, depois, sobre o Sudão.
Na África Ocidental, os ingleses estenderam sua influência na região do Rio Níger. Os franceses se
estabeleceram na Costa do Marfim, no Senegal e adjacências. Em 1884, os alemães se fixaram no Togo e
criaram o Protetorado de Camarões. Os portugueses ocuparam a região da Guiné (atual Guiné -Bissau).
Fonte: DUBY, Georges (Dir.). Atlas histórico mundial. 3. ed. Barcelona: Larousse Editorial, 2011. p. 246.
Glossário
Enclave: no texto, território ou região situada em território alheio.
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No nordeste da África, os italianos ocuparam a Eritreia em 1885 e, após grandes dificuldades, a Etiópia
em 1936. A Somália foi ocupada pelos ingleses e pelos italianos. Os franceses também ocuparam uma
área na entrada meridional do Mar Vermelho, a que chamaram Somalilândia, hoje Djibuti.
Os ingleses dominaram grande parte das regiões leste e sudeste da África, já os alemães dominaram a
África Oriental Alemã, e os portugueses preservaram Moçambique. No Oceano Índico, os franceses
dominaram Madagascar, Ilhas Maurício, Reunião e Ilhas Comores, enquanto os britânicos ocuparam as
Ilhas Seychelles.
Em 1876, o monarca organizou a Conferência Geográfica de Bruxelas. Nesse evento, incitou as nações
participantes a promover a integração do continente africano por meio da abertura de estradas,
incentivando a paz entre os chefes tribais.
Nos anos seguintes, Leopoldo II, por meio de seus prepostos, assinou diversos acordos com chefes locais
e, usando a força, criou em 1885 o “Estado Livre do Congo”, uma colônia do rei belga (não do Estado
belga), cujo administrador foi Henry Morton Stanley.
Primeiro, o marfim e, depois, a borracha possibilitaram um retorno lucrativo dos investimentos do rei no
Congo. Entretanto, para alcançar esse retorno, o monarca utilizou-se de meios violentos para conseguir
a cooperação dos habitantes da floresta.
Para explorar a borracha, os belgas escravizaram a população local. Os africanos eram convocados sob a
mira de armas, trabalhavam em turnos de até 18 horas e tinham a mão direita cortada caso não
atingissem a cota estabelecida. Consequentemente, suas lavouras ficaram abandonadas e, sem
alimentos, logo teve início a fome.
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Retrato de duas crianças mutiladas, vítimas do regime do rei Leopoldo II. Estado Livre do Congo, c. 1905. A prática de mutilação
das mãos dos africanos pelos belgas percorreu o mundo por meio de fotografias publicadas nos jornais denunciando a crueldade
aplicada pela administração belga no Congo.
No começo do século XX, a situação agravou-se com a intensificação da exploração dos nativos em
busca de lucros cada vez maiores. Por outro lado, com a crescente divulgação internacional da
exploração belga, foram fundadas associações humanitárias que pregavam o fim da colonização belga e
surgiram campanhas na imprensa que alcançaram uma dimensão até então inédita.
Com a constante pressão externa, em 1908 chegou ao fim o Estado Livre do Congo, após a entrega dos
direitos da colônia ao Estado belga. A partir de então teve início o chamado Congo Belga, com uma
administração também rígida, mas menos brutal que a exercida pelo rei Leopoldo II.
Glossário
Infenso: adverso, contrário.
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Abrir para a civilização a única parte do globo ainda infensa a ela, penetrar na escuridão que paira
sobre povos inteiros é, eu diria, uma cruzada digna deste século de progresso... Será que preciso
dizer que, ao trazer os senhores a Bruxelas, não fui guiado por nenhum sentimento egoísta? Não,
cavalheiros, a Bélgica pode ser um país pequeno, mas está feliz e satisfeita com seus rumos; e eu
não tenho outra ambição que não seja a de servi-la bem.
[...] Nossas tarefas consistem na localização de rotas a serem abertas com sucesso pelo interior do
continente e a instalação de postos hospitaleiros, científicos e pacificadores, como forma de abolir
o tráfico de escravos, estabelecer a paz entre os chefes tribais e fornecer-lhes arbitragem justa e
imparcial.
Leopoldo II apud HOCHSCHILD, Adam. O fantasma do rei Leopoldo: uma história de cobiça, terror e heroísmo na África Colonial.
São Paulo: Companhia das Letras, 1999. p. 54-55.
Organizando ideias
Em 1894, um missionário sueco registrou uma canção congolesa que retratava a insatisfação em
relação ao colonialismo europeu. Leia um trecho do poema e faça o que se pede.
2. Escreva um texto explicando por que os congoleses queriam morrer ou não se importavam em
morrer na guerra.
Em 1820, colonos britânicos se estabeleceram na região. Anos depois, os bôeres – motivados por fatores
como a abolição da escravidão, efetuada pelas autoridades inglesas, à qual eram contrários; os
ressentimentos com os novos colonizadores e a deterioração econômica – penetraram no interior da
África do Sul e fundaram o Estado Livre de Orange e do Transvaal. Para impedir que os bôeres
reivindicassem a costa, os britânicos anexaram Natal.
Com a expansão dos europeus e dos bôeres, reduziram-se os territórios ocupados pelos africanos, que
passaram a competir entre si. Os zulus, que tinham formado um poderoso Estado expansionista,
provocaram uma redistribuição de povos na África meridional. Para se defender dos zulus, os povos dos
Estados Swazi, Sotho e Tsuana fizeram alianças com os colonizadores europeus e com os bôeres.
Com a descoberta de diamantes em Orange e ouro no Transvaal – província da África do Sul entre 1910
e 1994 –, aguçou-se a cobiça pela região. A Primeira Guerra dos Bôeres, entre britânicos e descendentes
de holandeses, ocorreu entre 1877 e 1880, terminando com a derrota inglesa. No final do século, os
britânicos voltaram a atacar, naquela que ficou conhecida como a Segunda Guerra dos Bôeres (1899-
1902), e venceram.
Nessa guerra, os ingleses fizeram uso de campos de concentração. Homens, mulheres, crianças e idosos
que haviam auxiliado as tropas bôeres foram levados para redutos insalubres; antes disso, suas fazendas
foram destruídas e seus bens confiscados. A falta de saneamento, a água escassa e poluída, a comida de
má qualidade e os poucos cuidados médicos fizeram
Página 190
perecer mais de 20 mil pessoas (os campos abrigavam 120 mil) em consequência da subnutrição e de
moléstias diversas.
Durante a guerra, os britânicos queimaram fazendas, destruíram plantações e mataram animais. Ao final
do conflito, muitos dos fazendeiros bôeres estavam na miséria e tiveram de trabalhar nas minas ou
fábricas. Apesar do declínio econômico, como eram brancos, eles viviam separados dos negros e
obtinham melhores empregos e salários.
Com o fim da Guerra dos Bôeres, o presidente da província do Transvaal foi deposto e, nos termos do
tratado de paz assinado, as repúblicas bôeres retornaram à condição de colônias britânicas. O rei da
Inglaterra, Eduardo VII, foi reconhecido como soberano legítimo desse povo, o que marcou o início da
unificação política da África do Sul.
Soldados ingleses renderam-se aos bôeres em Doornbosch, Transvaal. Ilustração publicada no periódico Le Petit Journal, em 8
dez. 1901.
Organizando ideias
Analise os textos e responda às questões no caderno.
Texto 1
Afirmo que esta política colonial é um sistema concebido, definido e limitado do seguinte modo:
repousa sobre uma tríplice base: econômica, humanitária e política.
No tempo em que vivemos e na crise que atravessam todas as indústrias europeias, a fundação de
uma colônia é a criação de uma válvula de escape.
É preciso dizer abertamente que as raças superiores têm direitos sobre as raças inferiores, porque
têm um dever para com elas – o dever de civilizá-las.
Discurso do francês Jutes Ferry, em 28 de julho de 1885. In: BRUNSCHWIG, Henri. Mythes et réalités de l’impérialisme colonial
français. Paris: Armand Colin, 1960. p. 73. (Tradução nossa).
Texto 2
Nós tentávamos, indo sempre mais longe, dentro da floresta, e quando não conseguíamos nada, ou
a borracha era pouca, os soldados vinham ao povoa do e nos matavam. Muitos eram fuzilados,
outros ficavam sem orelhas; outros eram levados amarrados pelo pescoço. Às vezes, os brancos do
posto não sabiam das coisas que os soldados faziam conosco, mas eram eles que enviavam os
soldados para nos punir por não trazermos bastante borracha.
Os diários negros. In: ROBERTS, J. M. (Org.). História do século XX. São Paulo: Abril, 1968. v. 1. p. 314.
2. Analisando o texto 1 no contexto em que foi escrito, as afirmações nele contidas são
justificáveis? Explique.
Movimentos de resistência
Os africanos não aceitaram resignados a dominação europeia. Eles resistiram de diversas formas, da luta
armada à resistência cotidiana.
No território argelino, por exemplo, os nativos, sob o comando de Abd-al -Eladir, resistiram às invasões
francesas de 1834 a 1847, quando foram vencidos por um exército de cerca de 100 mil homens.
Entre os séculos XIX e XX, muitas ações de resistência tiveram destaque, caracterizadas por um forte
sentimento religioso, por motivações econômicas ou ainda por divergências culturais:
• a Rebelião Ashanti (onde hoje é Gana), contra os britânicos (1890 a 1900), ocorreu após a deposição
de chefes tradicionais considerados sagrados. Os chefes escolhidos pelos britânicos não foram
reconhecidos pelos habitantes locais, que se rebelaram contra os ingleses;
• a Rebelião de Mamadou Lamine (1898-1901), no alto Senegal, ocorreu devido à crença de que os
muçulmanos não deveriam se sujeitar a não muçulmanos. Portanto, deveriam se rebelar contra os
trabalhos forçados a que eram submetidos.
• a Revolução dos Maji Majis (1905-1907), na África Oriental Alemã (hoje Tanzânia), foi o levante mais
grave e extenso (atingiu quase 26 mil quilômetros quadrados) contra o colonialismo até 1914. O conflito
ocorreu porque os nativos, que viam sua economia de subsistência ameaçada, não aceitaram a
crueldade, injustiça e submissão a trabalhos forçados imposta pelos alemães;
• a revolta do imposto da palhota (habitação), em Serra Leoa (1898), teve como estopim o conjunto de
medidas repressivas impostas pelos britânicos na região, como a perda de terras, o trabalho
compulsório e, sobretudo, a cobrança de um imposto anual sobre as palhotas;
• a Revolta dos Akambas, no Quênia (1911), deu-se inicialmente por razões econômicas, mas
transformou-se numa revolta anticolonial na medida em que incorporou questões mais amplas, como a
falta de liberdade e a imposição de padrões culturais europeus;
Museu de Londres, Londres
Derrota do povo ashanti perante as forças britânicas em 11 jul. 1824. Litografia colorida de J. Ronis, publicada em 1825.
Página 192
• a Revolta do Bailundo, em Angola (1902- 1904), reuniu “reinos” umbundos e ovambos na luta contra a
imposição de padrões e valores culturais. Teve êxito inicial ao expulsar comerciantes e colonos
portugueses.
Além das revoltas, havia muitas formas de resistência cotidiana. Simulação de doença, sabotagem de
equipamentos, fugas, pilhagem de armazéns e diminuição do ritmo de trabalho, entre outras, eram
parte da estratégia dos africanos.
Todas essas rebeliões foram reprimidas violentamente. Um exemplo significativo foi o modo com que os
alemães, que dominavam o chamado Sudoeste africano (hoje Namíbia), trataram o povo herero, que,
em 1904, insurgiu-se porque suas terras e seu gado haviam sido confiscadas, atacando fazendas e
matando aproximadamente uma centena de alemães.
Os massacres contra o povo herero não tardaram, sendo cerca de 80 mil africanos
(aproximadamente 80% da população) dizimados, enquanto por volta de 14 mil foram confinados
em campos de concentração. Vale a pena observar que nesse movimento salta aos olhos a estreita
relação entre violência inerente às próprias relações econômicas e o rico espectro sociocultural
garantidor da cooptação e organização combativa dos hereros. Não causa por isso estranheza que
a administração alemã tenha proibido a reconstituição de instituições etnoculturais e a prática de
cerimônias tradicionais. Além disso, os hereros tiveram que se converter em massa ao cristianismo.
HERNANDEZ, Leila Leite. A África na sala de aula: visita à História Contemporânea. São Paulo: Selo Negro, 2005. p. 122.
Nesse contexto, o banditismo social, representado por parte das populações africanas que organizavam-
se em grupos com o objetivo de resistir ao domínio europeu, tornava-se uma alternativa para as massas
rurais. Mapondera – considerado bandido por portugueses e ingleses – atuou, nas regiões onde hoje é
Moçambique e Zimbábue, de 1892 a 1903. Para as populações camponesas tornou-se um mito, pois
protegia os trabalhadores dos recrutadores de mão de obra, dos coletores de impostos, dos agentes das
companhias e das autoridades coloniais.
Organizando ideias
Leia atentamente o texto a seguir e responda às questões propostas.
Se é certo que a resistência à conquista colonial foi importante, a que se seguiu e se opôs ao
sistema implantado não foi menos notável, por seu caráter perpétuo, ininterrupto, a cessar aqui
para ressurgir acolá, sempre a renascer, deixando zonas inteiras quase indomáveis e o colonizador
numa perpétua incerteza [...]. É igualmente notável o engenho de que os africanos deram mostras
para contestar esse sistema, desde a recusa individual até aos motins regionais, desde a reação
imediata a um dos efeitos da colonização até à vontade profunda de mudar as coisas. A resistência
era passiva ou ativa, local ou alargada, eclodia em meio rural ou urbano, assumia formas antigas ou
modernas, e colocava-se no terreno econômico, social, político sem excluir o religioso. Implicava
ora as populações, ora as elites tradicionais, ora ainda as elites modernas, desencadeava alianças
entre essas diferentes camadas sociais, fazia nascer ou renascer consciências de classe ou de
pertença étnica – tudo isso com conteúdos ideológicos mais ou menos claros, objetivos mais ou
menos elevados. A diversidade dessas resistências é tão desconcertante, que o estudo global passa
necessariamente por uma abordagem tipológica; porém, toda e qualquer descrição setorial é
forçosamente exclusiva. [...]
M'BOKOLO, Elikia. África negra: história e civilizações. Salvador: Edufba; São Paulo: Casa das Áfricas, 2011. p. 524.
1. É correto afirmar que os povos africanos não aceitaram passivamente a colonização? Explique.
Resgate cultural
MAHAMA, John Dramani. Qu’aurait pensé Fela de l’Áfrique d’aujourd’hui? SlateAfrique, 2 ago. 2012. Disponível em:
<www.slateafrique.com/2631/nigeria-fela-kuti-musique-democratie-goodluck-jonathan >. Acesso em: mar. 2016. (Tradução
nossa).
Em diversos países que se formaram após longa luta pela independência, foram proibidos alguns
elementos culturais tradicionais, expressões dos vários povos que ocupavam o território. Os
chamados primeiros regimes nacionalistas africanos, que estavam muito associados à luta pela
independência, buscaram, de várias maneiras, levar a cabo a formação de identidades nacionais de
forma autoritária, controlando e censurando a produção artístico-cultural.
Jacob Crawfurd/Demotix/Corbis/Latinstock
Estatueta fang talhada em madeira entre os séculos XIX e XX. A obra está em exposição na Galeria de Entwistle, Londres,
Inglaterra.
Arte e cultura tiveram um papel essencial na resistência à colonização africana, ganhando ainda
mais relevância com a independência. As formas pelas quais governo e grupos sociais lidaram com
os movimentos artísticos e as expressões culturais tradicionais possibilitam depreender o enorme
valor que eles tiveram na consolidação dos Estados Nacionais africanos.
1. Faça uma pesquisa sobre o movimento Afrobeat e a censura às culturas tradicionais e responda:
Por que foram vistos como um desafio à construção de identidades nacionais na África?
Página 194
Debate interdisciplinar
Extração de diamantes na África
Apesar do atual discurso de "liberdade ao povo africano" defendido por muitos países ocidentais,
algumas situações que envolvem os países da África e os aspectos da economia ocidental levam a crer
que o domínio do ocidente sobre o antigo continente perdura até os dias de hoje.
Um grande exemplo desse domínio é o processo de extração de diamantes que ocorre em diversos
países, mas de forma mais exploratória em Serra Leoa, onde milhares de pessoas são submetidas a
precárias e insalubres condições de trabalho a fim de abastecer o mercado de joalherias dos países
desenvolvidos.
Em Serra Leoa, a produção de diamantes representa uma grande fonte de renda, entretanto, durante
muito tempo, ela foi financiada e esteve sob o controle de grupos armados, que coordenavam o
trabalho nas minas com o intuito de contrabandear as pedras encontradas para diversas partes do
globo, sem repasse dos lucros à população ou pagamento de impostos.
Anistia Internacional
Reprodução de panfleto da Anistia Internacional. Na imagem lê-se: "Qual é o preço desses diamantes? Não ao comércio de armas
e matéria-prima com países que violam os direitos humanos".
Esse sistema exploratório já existia, mas se intensificou com o fim da Guerra Fria, como resultado de
campanhas para o financiamento de exércitos e guerrilhas locais na África Ocidental, que buscavam
controlar áreas específicas da região por meio da imposição e de conflitos armados.
O tráfico de diamantes na África pode ser comparado ao narcotráfico nas Américas, chegando –
segundo pesquisas britânicas – a responder por aproximadamente 15% do comércio mundial de
diamantes.
Atualmente, os governos de países africanos, em especial de Serra Leoa, vêm tentando demonstrar
maior transparência nas exportações de pedras preciosas, influenciados por iniciativas dos países
compradores, que passaram a investir mais no material extraído e comercializado pelas vias legais,
apesar do pagamento de altos impostos.
Mesmo com essa iniciativa, boa parte da população ainda se encontra sob o domínio dos controladores
do contrabando, trabalhando em condições degradantes e vivendo em condições piores ainda,
enquanto grupos armados permanecem lucrando com o comércio ilegal de diamantes.
Atividade
1. Assim como alguns países da África, o Brasil também é um exportador de diamantes, e a
extração deles é bastante controversa. Com base nessas informações, pesquise essa prática em
terras brasileiras, suas vantagens e desvantagens, e escreva um texto informativo para apresentar
em sala de aula.
Página 196
a) teve início no final do século XVII, quando as primeiras jazidas de ouro foram descobertas nas
Minas Gerais.
b) foi pouco expressivo no século XVII, ao contrário do que ocorreu nos séculos XVI e XVIII, e foi
extinto, de vez, no início do século XIX.
c) teve início na metade do século XVI, e foi praticado, de forma regular, até a metade do século
XIX.
d) foi extinto, quando da Independência do Brasil, a despeito da pressão contrária das regiões
auríferas.
e) dependeu, desde o seu início, diretamente do bom sucesso das capitanias hereditárias, e, por
isso, esteve concentrado nas capitanias de Pernambuco e de São Vicente, até o século XVIII.
2. (Enem) Torna-se claro que quem descobriu a África no Brasil, muito antes dos europeus, foram
os próprios africanos trazidos como escravos. E esta descoberta não se restringia apenas ao reino
linguístico, estendia-se também a outras áreas culturais, inclusive à da religião.
Há razões para pensar que os africanos, quando misturados e transportados ao Brasil, não
demoraram em perceber a existência entre si de elos culturais mais profundos.
SLENES, R. Malungu, ngoma vem! África coberta e descoberta do Brasil. Revista USP, n. 12, dez./jan./fev. 1991-92 (adaptado).
3. (Furg-RS) “Dividir para reinar” era o lema das potências imperialistas europeias na conquista do
território africano. Essa ação produziu nefastas consequências ao povo africano, sendo correto
afirmar que:
a) até o século XIX, apenas a França envolveu-se com o tráfico de escravos para a América, que só
foi extinto pela ação direta dos ingleses através do famoso conflito do Bôeres.
b) os únicos países africanos que não foram colônias da Europa foram o Egito e a Etiópia.
c) a Conferência de Bandung foi a primeira a falar e a afirmar que o imperialismo e o racismo são
crimes, propondo a criação do Tribunal da Descolonização.
d) a presença de países como a Alemanha, Itália e Holanda no continente africano subsistiu até o
final da I Guerra Mundial, quando se iniciou o processo de independência da maioria dos países
africanos sob domínio europeu.
K. Munanga. “Algumas considerações sobre a diversidade e a identidade negra no Brasil”. In: Diversidade na educação: reflexões
e experiências. Brasília: SEMTEC/MEC, 2003. p. 37.
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Responda no caderno
4. (UPE) A extração de diamantes e de ouro na região do Orange provocou lutas entre os ingleses,
comandados pelo governador Cecil Rhodes, e os africanos de origem holandesa que habitavam a
região. Esses confrontos ficaram conhecidos como:
a) Guerra do Opium.
• A África na sala de aula: visita à história, de Leila Leite Hernandez. São Paulo: Editora
Contemporânea, 2008. O livro mostra que não há uma única África, ou seja, um continente cujos países
têm a mesma identidade, como muitos imaginam. A proposta é olhar para a África e reconhecê-la como
um entrelaçamento de diversas culturas e processos históricos, de identidades complexas e, muitas
vezes, contraditórias.
• Quase deuses, direção de Joseph Sargent. EUA, 2004, 110 min. O filme conta a história real de um
afro-americano que sonhava em ser médico e, após conseguir emprego numa clínica como faxineiro,
começa a estudar para alcançar seu objetivo. Em seu trajeto profissional, o protagonista precisou
enfrentar muitas situações discriminatórias e racistas. Sua competência e dedicação foram reconhecidas
muito tardiamente por meio do prêmio de Doutor Honoris Causa.
Afolabi Sotunde/Reuters/Latinstock
Estudantes participam de um espetáculo de dança cultural durante as celebrações para comemorar o 55º Dia da Independência da
Nigéria. Abuja, Nigéria, 2015.
O processo de colonização da Ásia e da África pelas potências europeias foi pautado por
muita violência e opressão. Contudo, o contexto da Segunda Guerra Mundial enfraqueceu
o poderio econômico e bélico das metrópoles, o que tornou a dominação menos intensa e
proporcionou concessões a algumas colônias.
Nesse cenário houve a proliferação de ideais nacionalistas e libertários nas colônias, além
da consolidação de propostas políticas renovadas. Tudo isso se deu no contexto da Guerra
Fria, na qual as duas superpotências – Estados Unidos e União Soviética – buscavam
aliados para ampliar suas influências.
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O período marcado pelo fim dos impérios teve muitos desdobramentos e questionamentos a respeito
da permanência das relações de poder instituídas séculos antes pelos países europeus. Isso gerou
diversos conflitos não apenas entre as nações envolvidas no processo mas também internos, tanto das
colonizadoras quanto colonizadas, o que ocasionou o surgimento de mudanças constantes nas relações
entre esses grupos.
Desse processo de mudanças faz parte também a alteração dos conceitos de colonização e
descolonização.
[...] Para os povos que foram colonizados há muito tempo, essas palavras chocam.
Em vez de “descolonização”, termo que pressupõe que a saída dos colonizadores se deve às
metrópoles, eles preferem a expressão “luta pela emancipação nacional”, que os transforma em
agentes de sua própria história.
FERRO, Marc. O século XX explicado aos meus filhos. Rio de Janeiro: Agir, 2008. p. 71-72.
Após a Segunda Guerra Mundial, a Alemanha, outra potência imperialista da época, ficou econômica e
fisicamente destruída, portanto com seu potencial imperialista enfraquecido. Nesse período, a maioria
dos impérios coloniais (britânico, japonês, francês, português, belga, holandês e o que restava do
espanhol) acabou destruída, uma vez que o enfraquecimento dos dominadores dificultava, quando não
impedia, o controle exercido sobre as colônias.
Desde a chegada dos europeus, os nativos expressaram seu descontentamento, mas foram reprimidos
pelas potências imperialistas. No entanto, um contexto mundial mais favorável no pós-guerra e o
amadurecimento dos movimentos de resistência foram elementos fundamentais para o sucesso
emancipatório das regiões colonizadas.
O declínio dos antigos sistemas de domínio influenciou a proliferação de movimentos nacionalistas nas
colônias, dando início a inúmeras lutas por independência. Aos poucos, elas culminaram no surgimento
de muitos países e muitas formas de governo, abrindo caminho para a constituição de grande parte do
mundo tal qual conhecemos hoje.
Página 201
Emancipações na Ásia
O primeiro movimento significativo de emancipação nacional foi o asiático, consequência tanto do
declínio das potências europeias ocasionado pelos combates da Segunda Guerra Mundial quanto das
lutas pela emancipação da Ásia.
Diante de um contexto de controle político e exploração – tanto dos mercados como da população – e
submetidos às leis e privações impostas por seus dominadores no que diz respeito à cultura e religião,
os asiáticos buscaram diversas estratégias, incluindo apoio externo, para retomar o controle de seu
respectivo país.
Somado a isso, destaca-se no processo o apoio concedido pelas potências que despontavam no período
da Guerra Fria: Estados Unidos e União Soviética. Ambas buscavam afirmar seus ideais e políticas de
governo e mercado, aumentando a área de influência, respectivamente, capitalista e socialista.
O sucesso das reivindicações por independência na Ásia foi o grande incentivador dos movimentos de
emancipação de outras colônias, por exemplo, as africanas.
© DAE/Studio Caparroz
Fonte: VICENTINO, Cláudio. Atlas histórico geral e do Brasil. São Paulo: Scipione, 2011. p. 155.
Índia
Como vimos no Capítulo 5, a colonização inglesa na Índia foi marcada pela violência e repressão à
cultura indiana, o que causou muitos transtornos e revoltas ao longo do século XIX.
Para os britânicos, os indianos eram cidadãos de segunda classe, a quem cabia somente trabalhos
considerados inferiores. Com essa justificativa, aos poucos o povo foi perdendo seus direitos políticos e
a liberdade, além de ser privado dos benefícios do crescimento econômico. Sob o
Página 202
domínio britânico, os indianos foram obrigados até a usar o inglês como língua comum.
A permanência dos ingleses por um longo tempo no território indiano proporcionou o crescimento de
uma elite local, fruto de acordos políticos e enriquecimento econômico. Em 1817 foi criada a primeira
instituição de ensino para a elite indiana, o Colégio Hindu. Em 1913 a Índia havia se tornado a principal
importadora de produtos britânicos, com destaque para os têxteis, ferro, aço e maquinários. Por sua
vez, fornecia à Grã-Bretanha produtos agrícolas, como algodão, índigo, juta, arroz, chá e oleaginosas.
Durante a Primeira Guerra Mundial (1914- 1918), os indianos foram convocados a integrar as forças
armadas britânicas. Passaram então a exigir maior participação no governo, o que em tese se
concretizou com um acordo assinado pelo governo britânico, pelo Partido do Congresso Nacional
Indiano e pela Liga Muçulmana, que propunha uma reforma constitucional que abrangesse a instituição
de um autogoverno e o direito ao voto para os indianos.
A princípio, o Partido do Congresso funcionava como um fórum para a atividade política de caráter
nacionalista em toda a Índia. Durante a década de 1920, foi liderado por Mohandas Gandhi e
Jawaharlal Nehru, representando os hindus. Em alguns momentos, contou com a participação de
Mohamed Ali Jinnah, que representou os muçulmanos.
O Partido do Congresso Nacional Indiano (conhecido como Partido do Congresso) é a mais antiga
organização política ativa na Índia e, atualmente, um dos maiores partidos do país. Foi fundado em 1885
pela elite nativa – formada pelas bases da educação ocidental – e tinha caráter nacionalista.
Fundada em 1906, por uma elite fundiária e aristocrática, a Liga Muçulmana tomou como objetivo
defender os interesses de todos os muçulmanos. Seu principal líder, Mohamed Ali Jinnah (1875-1948),
membro de uma família tradicional, estudou Direito em Londres e passou a advogar com sucesso em
Bombaim. Em meio às lutas por direitos civis na Índia, a Liga aproximou-se do Partido do Congresso
Nacional, mas ambos não chegaram a nenhum acordo quanto às garantias constitucionais para os
muçulmanos.
Mohandas Karamchand Gandhi é o nome original de Mahatma Gandhi, que assim passou a ser
popularmente chamado como uma alusão a seus ideais libertários. O termo mahatma vem do sânscrito
e significa “grande alma”.
Gandhi nasceu numa família influente do estado de Guzerate, no ano de 1869. Estudou Direito em
Londres (1888-1891) e foi trabalhar na África do Sul de 1893 a 1914, onde procurou defender os direitos
dos trabalhadores indianos. Após retornar à Índia, liderou protestos de trabalhadores em Bihar e em
Guzerate. Em 1920 conseguiu o apoio do Congresso Nacional indiano para sua estratégia de
desobediência civil e não violência. Defensor da resistência pacífica à dominação britânica e da
tolerância religiosa, Gandhi foi preso muitas vezes e praticou diversos jejuns em defesa dessas causas.
Morreu em 1948, aos 78 anos, assassinado por um hindu que não concordava com a tolerância religiosa
defendida por ele.
A participação de Gandhi na luta pela autonomia política indiana ocorreu de maneira pacífica, por meio
de uma campanha que pregava a não violência e cujo objetivo era afastar seus seguidores das posições
governamentais e estatais de destaque,
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promovendo a desorganização da estrutura de governo até então em vigor. Sempre que os britânicos
reagiam à oposição com violência, o líder iniciava longos jejuns, como forma de chamar a atenção dos
governos mundiais para a necessidade de autonomia indiana e para as atrocidades cometidas pelos
colonizadores, exercendo assim um papel importantíssimo no processo de independência indiano.
Para combater a dominação e a violência britânicas, Gandhi propunha a resistência pacífica por meio da
desobediência civil. Com campanhas pelo país, recomendava aos indianos que não pagassem os
impostos nem comprassem produtos ingleses, boicote que ficou conhecido como swadeshi. Estimulou-
os a vestir o khadi, traje caseiro, interrompendo a compra dos têxteis britânicos. E, acima de tudo, pedia
que não aceitassem as leis que os discriminavam em sua própria terra. O objetivo era não cooperar com
os colonizadores, isolando-os e enfraquecendo-os.
Mulher indiana vestindo e confeccionando o khadi, uma vestimenta típica indiana feita em casa. Madurai, Índia, 2013.
Como precaução contra novas manifestações, o governo inglês da Índia promulgou o Decreto Rowlatt,
ato legislativo que impunha duras medidas destinadas a sufocar o movimento independentista, além de
autorizar a detenção preventiva e o julgamento sem júri. O presidente do Conselho Legislativo Imperial,
juiz Sidney Rowlatt, justificou as medidas repressivas como uma forma de combater o terrorismo. A lei
entrou em vigor em março de 1919. Houve reações com greves e protestos em todo o país. A repressão
foi violenta e culminou no massacre do Jallianwala Bagh (o jardim Jallianwala). Na ocasião, tropas
britânicas dispararam contra uma multidão de manifestantes indianos, provocando a morte de 370
pessoas e deixando mais de mil feridos.
Na década de 1920, cresceu a luta nacionalista, quando o comando de Mahatma Gandhi no Partido do
Congresso passou a ser importantíssimo, em razão de seus jejuns e da visibilidade mundial conquistada
por suas campanhas, assim como pela liderança exercida sobre a população indiana. Em 1930, Gandhi
liderou seguidores numa marcha de 300 quilômetros até o mar, onde tomou em mãos o sal, desafiando
as leis britânicas que proibiam a posse do produto que não fosse adquirido do monopólio
governamental. Em 1934 foi substituído como dirigente máximo do Partido do Congresso por Jawaharlal
Nehru.
Mary Evans/Diomedia
Fotografia de Mahatma Ghandi durante a Marcha do Sal publicada no periódico The Illustrated London News em 26 de abril
1930.
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, o poder político e bélico da metrópole enfraqueceu e, ao
mesmo tempo, os movimentos populares pela independência da Índia se fortaleceram. Pressionados
pelos indianos e desgastados pela guerra, os britânicos abriram as negociações para a transferência do
poder. O objetivo era preparar a independência com a criação de uma Assembleia Constituinte,
formando um governo transitório indiano, que deveria obrigatoriamente preservar o território e
assegurar os inúmeros interesses econômicos do Reino Unido na região. Entretanto, os planos ingleses
nunca foram realizados, pois as divergências entre muçulmanos e hindus impediam a unidade.
Diante daquele quadro, o governo britânico já não podia mais resistir às manifestações contrárias a seu
domínio nem controlar os graves conflitos entre hindus e muçulmanos, e a independência
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do povo indiano foi conquistada em 15 de agosto de 1947. Apesar disso, a recém-formada Índia não
tinha como lidar com as inúmeras lutas religiosas que estouravam em seu território, o que ocasionou
sua fragmentação em dois países.
A Liga Muçulmana, liderada por Mohamed Ali Jinnah, fundou o Paquistão, reunindo os muçulmanos em
territórios a oeste e a leste do subcontinente indiano. A República da Índia (multiétnica e plurirreligiosa)
passou a ser dirigida por Jawaharlal Nehru.
Em 1971, com o apoio da Índia, o Paquistão Oriental rom peu com o Paquis tão Ocidental e formou a
República de Bangladesh.
© DAE/Studio Caparroz
Indochina
A Indochina é a região que abrange os países do Sudeste Asiático localizados entre a China e a Índia.
A França dominou a região desde 1858, quando tomou o controle da porção sul do Vietnã. Em 1885, o
país venceu um embate contra a China, que controlava a parte norte do país, consolidando a hegemonia
francesa com a fundação da chamada Indochina Francesa, que anexou também o Camboja. Ainda no fim
do século XIX, a potência agregou a seus domínios o território pertencente ao Laos, controlando
significativamente a região.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o Império Japonês ocupou o norte da Indochina Francesa com o
intuito de impedir que a China importasse armas e combustíveis, enfraquecendo assim o domínio
francês na região. A Tailândia aproveitou-se da fragilidade da França e também reivindicou seus
territórios perdidos anteriormente. Com o declínio da influência francesa na Indochina, a região passou
a ser controlada pelos japoneses.
Com o fim da guerra, o Japão, mesmo afetado pelo conflito, viu-se sem condições de continuar
controlando a região. Ciente disso, a França tentou retomar seu domínio. No entanto, foi barrada pelo
movimento independentista denominado Vietminch (sigla da Liga para a Independência do Vietnã),
comandado por Ho Chi Minh (1890-1969). O objetivo da liga era expulsar do Vietnã tanto os japoneses
quanto os franceses. Inicialmente tiveram apoio dos Estados Unidos contra os japoneses (1943-1945) e,
após a guerra, voltaram-se para a retirada dos franceses. Em 1945, o líder do movimento declarou a
independência do Vietnã. A reação francesa iniciou uma luta armada que terminou com a derrota dos
franceses em 1954.
Em julho de 1954, na Conferência de Genebra, reunida a fim de buscar uma solução para os conflitos na
Indochina, foi acordado que o Vietnã, o Laos e o Camboja se tornariam independentes. O Vietnã foi
dividido em Norte e Sul.
O Vietnã do Norte tornou-se uma república socialista, enquanto o Vietnã do Sul transformou-se em um
forte aliado dos Estados Unidos. Essa situação acabou mantendo a região em estado de tensão e
provocando uma nova guerra (1964- 1975), que contou com intensa participação estadunidense, cujo
governo temia que a região fosse dominada pelo comunismo.
Mapas: © DAE/Studio Caparroz
Fonte: ARRUDA, José Jobson A. Atlas histórico básico. 17. ed. São Paulo: Ática, 2011. p. 34.
Fonte: LE MONDE Diplomatique. El atlas histórico. Buenos Aires: Capital Intelectual, 2011. p. 64.
Página 206
O Sudeste Asiático
© DAE/Studio Caparroz
Fonte: BLACK, Jeremy. World history atlas. Londres: Dorling Kindersley, 2008. p. 251.
O arquipélago indonésio esteve sob o domínio da Holanda desde o século XVII, quando os neerlandeses
estabeleceram na região a Companhia Holandesa das Índias Orientais, fundando a colônia das Índias
Orientais Neerlandesas.
Durante a Segunda Guerra Mundial, os Países Baixos foram ocupados pela Alemanha, cujo poderio
sobre as colônias havia enfraquecido. Os japoneses então, vendo o caminho livre, dominaram a
Indonésia.
Apesar das tentativas neerlandesas de retomar o controle da Indonésia, a população, dando início à
Revolução Nacional Indonésia – que durou mais de quatro anos –, conseguiu forçar o reconhecimento
formal de sua independência em dezembro de 1949.
As Filipinas, por sua vez, foram colonizadas no século XVI pela Espanha, permanecendo sob seu domínio
até o século XIX. Os nativos combateram a presença espanhola em seu território com o apoio dos
americanos, que tinham interesse em controlar a região. O domínio espanhol foi então substituído pelo
norte-americano em 1898, quando a Espanha vendeu o arquipélago aos Estados Unidos.
Os filipinos lutaram para tornar o país independente dos EUA e, assim como os indonésios, passaram
por um período de domínio japonês, só conseguindo recuperar a autonomia em 1946.
Já a Malásia tornou-se colônia britânica em 1824. Bem como os demais países do Sudeste Asiático,
passou a ser controlada pelos japoneses na Segunda Guerra Mundial. Com o apoio dos britânicos, o país
retomou o poder de seu território, sendo proclamado independente em 1957.
Página 207
Emancipações na África
Nas primeiras décadas do século XIX, todo o continente africano foi invadido e segmentado em
possessões e colônias de domínio europeu. Essa divisão provocou sérios problemas por unir grupos
distintos e desrespeitar os diferentes aspectos étnicos e culturais.
A resistência dos povos africanos ao controle europeu foi bastante grande, várias vezes assumindo o
caráter de guerras e conflitos armados pela retomada dos territórios e das práticas tradicionais
redefinidas pelo olhar dos colonizadores, sempre voltado à exploração comercial.
Negros de origem antilhana, bem como africanos de Serra Leoa, Libéria, Nigéria, Costa do Ouro,
Somália, Cabo Verde e Etiópia, fundaram em 1897 a Associação Africana, que em 1900 formulou um
documento manifestando a solidariedade aos “irmãos africanos menos favorecidos”. Foi nessa época,
sobretudo nos Estados Unidos, que as ideias de pan-africanismo surgiram com mais força e radicalismo.
Esse movimento visava unir os africanos e seus descendentes numa comunidade ligada por uma união
de sentimentos e de conscientização, com o objetivo de combater a opressão colonialista.
HERNANDEZ, Leila Leite. A África na sala de aula: visita à história contemporânea. São Paulo: Selo Negro, 2008. p. 138.
© DAE/Studio Caparroz
Fonte: VICENTINO, Cláudio. Atlas histórico geral e do Brasil. São Paulo: Scipione, 2011. p. 154.
Página 208
Colônias britânicas
O nacionalismo africano se espalhou rapidamente após o fim da Segunda Guerra Mundial. Nessa época,
africanos que iam estudar na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos percebiam ainda mais claramente a
discriminação racial a que estavam submetidos. Os britânicos viam nas emancipações uma
oportunidade para expandir seus mercados consumidores e manter seus domínios pela via comercial.
Entretanto, os nacionalistas africanos fizeram intensas e, algumas vezes, violentas campanhas para pôr
fim à dominação colonial.
África do Sul
No período de partilha do continente, no século XIX, os britânicos dominaram a África do Sul depois de
vencerem inúmeras batalhas contra grupos africanos e bôeres, consolidando então sua ação
imperialista no território, cujo governo era exercido pela minoria branca. Nessa organização, efetivada
em 1910 com a constituição da União Sul-Africana, prevaleciam os interesses europeus, e cada vez mais
se impôs o regime de segregação racial. O estabelecimento de um Estado de hegemonia da minoria
branca impunha a exploração da maioria negra da população. Em 1911 o governo estabeleceu um
conjunto de leis que limitava ainda mais os direitos dos negros em relação a trabalho, residência e até
relações sexuais. Por essa lei, os trabalhadores eram proibidos de fazer greves e não podiam ter
trabalhos especializados, por exemplo. A resposta a tais medidas foi a criação, em 1912, do Congresso
Nacional Africano (CNA), destinado a reivindicar os direitos da população negra.
Em 1948, o governo decretou o apartheid, um conjunto de leis ainda mais rígido e explícito de
segregação étnica.
Apartheid era um sistema rígido de segregação racial, de separação entre brancos e negros, que
teriam lugares separados onde morar [...]. Os contatos entre os dois grupos deveriam restringir-se
às relações de trabalho, nas quais os brancos estavam destinados a ser os patrões e os negros, os
empregados. [...] Na lógica do apartheid, cabia aos brancos a riqueza e aos negros, a pobreza. E
estes últimos não eram cidadãos.
SILVA, Alberto da Costa e. A África explicada aos meus filhos. Rio de Janeiro: Agir, 2008. p. 140.
Diante desses acontecimentos, o CNA lançou uma forte campanha de desobediência civil, que culminou,
em 1960, na morte de dezenas de pessoas durante uma manifestação contrária ao apartheid em
Sharpeville, bairro negro próximo a Johanesburgo. Esse massacre mobilizou o mundo todo contra as
políticas segregacionistas, num movimento que praticamente obrigou a Grã-Bretanha a declarar o país
independente em 1961.
Apesar disso, o congresso foi declarado ilegal pelo governo independente – Partido Nacional, sob o
comando dos africânderes –, e a repressão aos não europeus cresceu cada vez mais. Esse fato levou à
prisão do líder do CNA, Nelson Mandela, em 1963.
O regime do apartheid, entretanto, passou a ser criticado pelas demais nações. A pressão aumentou
com as independências dos demais países africanos. Nesse contexto, em 1991 o regime chegou ao fim,
quando o então presidente Frederick de Klerk o declarou encerrado oficialmente e libertou os líderes
políticos presos no período de vigência do apartheid, incluindo Nelson Mandela, que pouco tempo
depois foi eleito presidente do país.
Walter Dhladhla/AFP Photos
O presidente Nelson Mandela durante cerimônia de sua posse. África do Sul, 1994.
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Nigéria
Nigéria deriva de Níger, nome do rio que atravessa parte do território do país, cujos limites foram
traçados pelo colonialismo britânico. Atualmente é o país mais povoado da África e um dos mais ricos
graças a suas jazidas petrolíferas.
Entre os séculos XVII e XIX, o comércio de escravos foi a atividade comercial estabelecida com os
europeus, tendo em vista a crescente necessidade de mão de obra nas lucrativas lavouras americanas.
Em meados do século XIX, entretanto, essa atividade foi substituída pelo comércio das commodities
europeias.
Commodity, em inglês, significa literalmente mercadoria. O termo é utilizado para se referir às matérias-
primas, produtos de base utilizados na fabricação de outros bens. Geralmente, as commodities são
produzidas em grande escala, com destino à exportação.
Com o intuito de difundir sua influência e comercializar suas mercadorias, bem como explorar as
matérias-primas locais disponíveis, o governo britânico criou, em 1886, a Companhia Real do Níger,
empresa mercantil cujo objetivo era explorar a capacidade comercial da região. Em 1900 foram
instituídos os protetorados britânicos da Nigéria, com o objetivo de fundir todo o território em uma
única colônia.
A Nigéria era a maior das colônias britânicas na África, com uma população de mais de 60 milhões. A
região tinha – e ainda tem – grande diversidade cultural e religiosa, mas isso foi ignorado pelos
colonizadores, que pretendiam aglutinar todos em um mesmo território, sem respeitar as diferenças
entre essas populações. Essa tentativa britânica não foi bem-sucedida, e as tensões entre as populações
locais seguiram, fato que dificultou a administração colonial dos ingleses.
VISENTINI, Paulo Fagundes; RIBEIRO, Luiz D. T.; PEREIRA, Analúcia D. História da África e dos africanos. Petrópolis: Vozes, 2013. p.
94-95.
Organizando ideias
Leia o texto e responda às questões.
Junto com os movimentos de libertação cresceu a ideia de uma unidade africana, só possível de ser
criada a partir dos efeitos da colonização, e que foi batizada com o nome de “pan-africanismo”. Por
trás dessa ideia havia um forte sentimento anticolonial e de valorização do que foi chamado de
“negritude”, ou seja, um conjunto de características culturais próprias das sociedades africanas e
afro-americanas, formadas a partir da diáspora atlântica. A ideia de negritude é fruto do contato
com Ocidente, com a escravidão, com a dominação colonial e com o racismo. Ela não existe em
africanos que não passaram por um processo de formação ocidental, que não foram assimilados
pelos valores da sociedade colonizadora. A ideia de negritude incorpora a contribuição ocidental,
além de recuperar as raízes africanas.
Por ter se formado a partir do contato com as culturas ocidentais, o movimento da negritude
contém a ideia de raça à medida que defende uma diferenciação entre o negro e o branco. Nesse
movimento, a ideia de raça negra é um forte elemento de sustentação da possibilidade de
africanos e afrodescendentes pensarem a África como uma unidade [...].
MELLO E SOUZA, Marina de. África e Brasil africano. São Paulo: Ática: 2006. p. 167 -168.
1. De acordo com o texto, pan-africanismo e negritude remetem à ideia de uma África para os
africanos. Explique essa afirmação.
2. Explique a afirmação de que a ideia de negritude não existe para os africanos que não passaram
pelo processo de formação ocidental.
Página 210
Colônias francesas
Argélia
Antes mesmo dos combates da Segunda Guerra Mundial, a população argelina estava muito
descontente com os privilégios dos franceses e da elite argelina que descendia deles. Com o fim do
conflito e o enfraquecimento da Europa, o povo argelino intensificou sua insatisfação com o confisco de
suas melhores terras, que ficavam nas mãos dos franceses.
A resistência ao domínio francês ocorreu por meio da chamada Guerra da Argélia (1954 -1962), na qual
diversos grupos argelinos pró-libertação organizaram-se em ataques de guerrilhas e atos de violência
contra os representantes da metrópole.
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Capa do periódico italiano La Domenica del Corriere, publicado em 16 de junho de 1957. Na chamada da reportagem de capa, lê-
se: "Terror na Argélia: um bando de foras da lei, os membros da Frente de Libertação Nacional (FLN) têm ocupado uma aldeia ao
sul da Argélia e abatido todos os habitantes masculinos, poupando apenas mulheres e crianças".
O político argelino Mohamed Ahmed Ben Bella (1916-2012) ajudou a organizar o Movimento pelo
Triunfo das Liberdades Democráticas, que pleiteava igualdade para os argelinos, porém a iniciativa foi
declarada ilegal em 1949 pela França.
Em abril do mesmo ano, ele e outros ex-militares locais atacaram o correio da cidade de Orã, iniciando a
revolta contra a França. Em 1950, Ben Bella encabeçou a formação da Frente de Libertação Nacional
(FLN), um partido de ideologia socialista que buscava livrar a Argélia do domínio francês e instituir um
novo governo com representantes de origem argelina.
Inicialmente a França obteve vantagem na resistência contra os argelinos. Como estratégia, a FLN
organizou ataques urbanos na Argélia e na França, dando início, em 1954, a uma série de investidas e à
formação de guerrilhas focadas nos representantes do governo francês, tendo como objetivo conquistar
a independência da Argélia.
Em 1961, convocado a interferir nos conflitos, o exército francês promoveu sequestros seguidos de
tortura, morte e diferentes formas de violência contra a população. Foi instituído inclusive, em 5 de
outubro, o toque de recolher para todos os “muçulmanos franceses da Argélia”.
A resposta da FLN foi a eclosão de mais uma série de atentados contra as forças francesas no país com
ataques no próprio território francês. Um exemplo foi o ocorrido em fevereiro de 1962 na estação de
metrô parisiense Charonne, que causou a morte de 9 franceses, cujo enterro reuniu mais de meio
milhão de pessoas em protesto contra a batalha travada.
Em decorrência disso, no dia 13 de fevereiro foram assinados os Acordos de Evian, que previam o
cessar-fogo entre França e Argélia. A FLN decidiu, então, organizar uma ação de massas: proclamou um
alto nas ações armadas
Glossário
Alto: solenidade ou ato público que ocorre por determinação legal. No texto, a expressão se refere
à paralisação dos ataques da FLN aos representantes do governo francês na Argélia.
Página 211
e deu instruções para que a população desrespeitasse o toque de recolher, convocando uma greve geral
e outras manifestações. Dessa vez, a natureza pacífica das iniciativas foi ressaltada com palavras de
ordem e cartazes.
Neste contexto, em 1962 foi ratificada a independência da até então colônia, que se tornou um país
autônomo politicamente. Seu primeiro presidente, o próprio Ben Bella, foi eleito democraticamente
quase por unanimidade no ano seguinte.
Organizando ideias
A seguir, encontra-se um pequeno trecho de um livro que conta a história de Paris, capital da
França. Leia-o e, depois, faça o que se pede.
Os novos surtos de violência na Argélia coincidiram com novas ondas de imigração em Paris, a
maioria vinda da África do Norte. Entre 1947 e 1953, os números oficiais registram que, somente
da Argélia, 740 mil imigrantes chegaram a Paris. O número real provavelmente era muito maior, é
claro.
[...]
Os norte-africanos em Paris perceberam rapidamente que muitas das promessas [...] em relação à
tolerância racial nunca seriam cumpridas ou já haviam sido quebradas. Eles enfrentavam
preconceitos diariamente e, como os judeus antes deles, começaram a se reunir em grupos ao
redor da cidade, muito mais por sua própria segurança do que por qualquer outra coisa.
HUSSEY, Andrew. A história secreta de Paris. São Paulo: Amarilys, 2011. p. 472.
1. Como os argelinos e os outros norte-africanos que viviam em Paris nas décadas de 1940 e 1950
foram tratados?
2. Como esses imigrantes fizeram para tentar se proteger? Essa tática havia sido uma inovação?
Djibuti
O Djibuti é um país de pequenas dimensões localizado no nordeste africano, inicialmente colonizado
pelos portugueses, que, em sua expansão comercial e territorial em direção ao Oriente, acabaram
perdendo o interesse pela região.
Foi só em 1888 que a França, em decorrência da partilha do território africano entre as potências
europeias, tomou posse dele, estabelecendo uma colônia chamada de Costa Francesa da Somália, cuja
capital era o Djibuti.
A emancipação do Djibuti foi bem específica, se comparada aos demais processos das possessões
francesas, pois ocorreu de maneira pacífica.
No panorama de emancipação dessa região, alguns grupos étnicos defenderam a permanência do país
na Comunidade Francesa (união que propunha a liderança política da França sobre suas colônias e ex-
colônias em troca de auxílio financeiro), enquanto outros repudiaram a ideia.
Apesar do impasse, em 1967 um plebiscito aprovou a vinculação à França. O quadro só mudou com um
novo plebiscito realizado em 1977, quando a população finalmente decidiu pela conversão do Djibuti
em Estado independente.
Em 1956, a França abriu mão do controle das colônias do Marrocos e da Tunísia, que haviam se
rebelado contra seu domínio e exigido a independência.
Apesar disso, a metrópole tentou uma última manobra para impedir a concessão definitiva da
independência às colônias. A “libertação” seria concedida sob a condição de que fossem realizadas
eleições a fim de decidir se as colônias fariam parte da Comunidade Francesa. A Guiné foi a única
colônia que votou pela independência imediata. Outras, como Senegal e Sudão, tentaram se organizar e
instituir conselhos ou federações com outros territórios. De todo modo, as ex-colônias francesas foram
pouco a pouco conquistando sua autonomia, independentemente das diferentes formas de
organização.
Página 212
Colônias portuguesas
Guiné-Bissau
A Guiné-Bissau foi colônia de Portugal desde o século XV até 1973, quando, por meio de luta armada,
conseguiu conquistar a independência. Apesar de ter obtido a liberdade apenas na década de 1970, a
Guiné foi a primeira colônia portuguesa na África a ser declarada independente.
A guerra de independência na Guiné começou em 1963, com as ações de guerrilha. Durante muito
tempo, a reação da metrópole foi a defesa aos ataques do PAIGC por meio da organização de grandes
operações militares, mas sem muito sucesso, uma vez que os esforços portugueses estavam
concentrados na luta contra os angolanos, que também reivindicavam independência.
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Amílcar Cabral foi assassinado, em 1973, por líderes de seu próprio partido sob a suspeita de defender
os ideais da elite guineense. Entretanto, mesmo com sua morte, o PAIGC continuou a lutar pela
emancipação, declarando, ainda no mesmo ano, a independência da Guiné-Bissau.
Nos meses que se seguiram, os guineenses tiveram o ato reconhecido em vários países, sobretudo nos
territórios africanos de ideais socialistas. Os portugueses, entretanto, só aceitaram a independência da
Guiné-Bissau em 1974, após o encaminhamento dos conflitos relacionados à concessão da autonomia
angolana.
Moçambique
Em 1964 começaram os conflitos por independência em Moçambique, motivados pela exploratória e
violenta ocupação portuguesa, agravada pela falta de acesso à educação e escassez de empregos para a
população.
A manifestação oficial das reivindicações ocorreu por meio da criação da Frente de Libertação de
Moçambique (Frelimo) – fundada e dirigida por Eduardo Mondlane (1920-1969) e posteriormente por
Samora Machel (1933-1986). A estratégia de articulação era a criação de “zonas libertadas” do controle
português, que funcionavam com um sistema de organização próprio, como se fossem um Estado à
parte dentro do território moçambicano.
A guerra por independência em Moçambique durou cerca de dez anos, num movimento de instituição
de áreas livres do domínio colonial que passaram a servir como bases de abastecimento e comunicação
das forças revoltosas.
Apenas com a assinatura dos Acordos de Lusaka o conflito se encaminhou para o fim. Em setembro de
1974, estabeleceu-se um governo provisório composto de representantes tanto da Frelimo quanto de
Portugal, e, em junho de 1975, foi proclamada oficialmente a independência de Moçambique.
Página 213
Angola
O Movimento Popular pela Libertação da Angola (MPLA), fundado por Agostinho Neto (1922-1979), foi o
principal grupo que lutou pela independência do país.
Assim como ocorreu com as demais colônias portuguesas, o governo da metrópole não queria negociar
a independência, reagindo agressivamente a qualquer tentativa por parte do povo angolano.
A guerrilha entre os grupos independentistas e o exército português começou em 1962. Em 1966, foi
criada a União Nacional para Independência Total de Angola (Unita), que passou a figurar no embate
entre o imperialismo português e os vários projetos para uma Angola livre.
Em 1974, Angola finalmente se tornaria independente, após a queda do sucessor de Salazar, Marcelo
Caetano (1909-1989), na Revolução dos Cravos.
Keystone-France/Gamma-Keystone/Getty Images
A Revolução dos Cravos foi o movimento que derrubou o governo ditatorial de Antonio de Oliveira
Salazar em Portugal, restabelecendo as liberdades democráticas, que haviam sido vetadas à população.
A revolta começou em 25 de abril de 1974. Previamente organizados, à espera de uma música escolhida
para tocar na emissora de rádio Renascença como senha para o motim, os oficiais de média patente do
exército português saíram às ruas exigindo a deposição de Marcelo Cae tano, sucessor de Antonio
Salazar.
A revolução recebeu esse nome porque, ao comemorar nas ruas a vitória do golpe, a população
portuguesa distribuiu cravos aos soldados participantes.
Organizando ideias
Antonio de Oliveira Salazar (1889-1970) governou Portugal de forma ditatorial entre 1932 e 1968.
Durante seu mandato, as colônias começaram o processo de independência. Entre elas, estava o
Estado Português da Índia, cuja capital era Goa. Considerado um enclave territorial, era ocupado
pelos portugueses desde o século XVI. Sobre as lutas de libertação dessa região, veja a seguir o que
Salazar escreveu ao governador da Índia.
Não prevejo possibilidade de tréguas nem de prisioneiros portugueses, pois sinto que apenas pode
haver soldados e marinheiros vitoriosos ou mortos.
1. O que Salazar quis dizer com essa frase? Interprete-a à luz do que acontecia na época não só
com Portugal mas também com as outras potências europeias.
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Resgate cultural
A África pode ser tratada como um caso específico, uma vez que, durante o Período Colonial, foi
muito retratada por cineastas do Ocidente. Por meio de sua arte, eles apresentaram ao mundo um
continente estigmatizado pela ideia da fome e da miséria, levando em conta apenas a noção de
desenvolvimento pautada no poder de consumo, e não seus diversos aspectos culturais.
Morgan Creek/Album/Latinstock
Cena do filme Ace Ventura 2 - Um maluco na África. O filme, estrelado pelo ator Jim Carrey (retratado em primeiro plano na
imagem), apresenta a África como um continente selvagem e exótico. Estados Unidos, 1995.
Até a década de 1960, a visão da África transmitida pelo cinema era a ocidental. O primeiro filme
reconhecido como genuinamente africano foi África sobre o Sena, realizado por alunos do Instituto
de Artes e Estudos Cinematográficos (IDHEC), os quais, proibidos de fazer gravações em seus
respectivos países de origem, resolveram retratar a vida de imigrantes africanos em Paris.
Já o primeiro festival de cinema africano de fato foi o Jornadas Cinematográficas de Cartago (JCC),
em 1966, que buscou, por meio de obras dirigidas e produzidas por africanos, mostrar que a
riqueza do continente estava além daquela associada aos valores da sociedade de consumo. O
movimento teve seguimento três anos depois, com o Festival Pan -Africano de Cinema e Televisão
de Ouagadougou.
Tahar Cheriaa
Cartaz da 26ª edição do Festival de Cinema de Cartago, realizado em novembro de 2015. O cartaz mostra a imagem dos dois
fundadores do festival, Tahar Cheriaa (em primeiro plano) e Ousmane Sembène (em segundo plano). Tunísia, 2015.
Foi a partir do ano 2000 que, de fato, o cinema africano ganhou grande destaque no mundo.
Surgiram os festivais de cinema africano, como o Dockanema, o Festival de Cinema de Ruanda, o
Curtas-Metragens de Madagascar e o Afrykamera, marcando o momento histórico em que o povo
africano passou a divulgar sua multiplicidade, contribuindo para o engrandecimento do patrimônio
cultural da humanidade como um todo.
Em grupo, realize um debate sobre como os filmes e a mídia em geral fortalecem ou criam imagens
estereotipadas de pessoas, situações ou lugares, e de que forma essa situação pode ser
modificada. No caso da produção interna africana, que busca essa mudança, até que ponto ela está
sendo eficaz, ou seja, alcançando outros continentes e fortalecendo a identidade africana?
Página 216
Debate interdisciplinar
Entretanto, não houve desenvolvimento econômico após as emancipações capaz de elevar o padrão de
vida da população. A economia ainda se baseia na exportação de produtos agrícolas e minerais.
Petróleo, diamantes, cobre, alumínio, urânio e coltan são alguns dos materiais naturais mais
encontrados no subsolo africano. Apesar dessa imensa riqueza, os países africanos estão entre os mais
pobres do mundo, de acordo com indicadores internacionais.
As reservas naturais
As reservas naturais do continente africano tornam a região atraente para os países dependentes de
matérias-primas, como os Estados Unidos e a China. Os EUA, por exemplo, desenvolveram uma ofensiva
comercial, diplomática e militar para ampliar sua influência no continente. O objetivo é garantir o acesso
às fontes de energia e assegurar militarmente as vias de transporte, explorando as riquezas naturais. Os
norte-americanos dependem de algumas matérias-primas fornecidas pela África, como manganês (para
produção de aço), cobalto, cromo, ouro, flúor e os diamantes industriais.
Zaire e Zâmbia têm metade do cobalto do planeta; as maiores reservas de cromo do mundo estão na
África do Sul e no Zimbábue, que também concentram as maiores reservas de metais da platina.
Entretanto, o petróleo é a grande questão. A África Subsaariana produz diariamente quase a mesma
quantidade de barris que o Irã, a Venezuela e o México juntos. A Nigéria é o principal produtor africano,
seguida por Angola. O Sudão também passou a exportá-lo, assim como a Guiné Equatorial, que tem
potencial para se tornar um dos grandes produtores africanos de petróleo bruto.
Página 217
Atividades
1. Quais são os principais produtos exportados pelo continente africano?
1. (Enem)
Voz do sangue
Palpitam-me
os sons do batuque
e os ritmos melancólicos do blue.
Ó negro esfarrapado
do Harlem
ó dançarino de Chicago
ó negro servidor do South
Ó negro da África
negros de todo o mundo
Eu junto
Ao vosso magnífico canto
a minha pobre voz
os meus humildes ritmos.
Eu vos acompanho
pelas emaranhadas áfricas
do nosso Rumo.
Eu vos sinto
negros de todo o mundo
eu vivo a nossa história
meus irmãos.
Disponível em: www.agostinhoneto.org. Acesso em: jun. 2015.
Nesse poema, o líder angolano Agostinho Neto, na década de 1940, evoca o pan-africanismo com o
objetivo de
a) aos vinte anos que passou injustamente encarcerado pelo regime racista então vigente na África
do Sul.
b) à sua campanha incansável em favor dos milhões de africanos vitimados pela Aids e deixados
sem assistência.
3. (Unicamp -SP) O ativista negro Steve Biko, um dos críticos do Apartheid, que vigorou
oficialmente na África do Sul entre 1948 e 1990, afirmou: “Nós, os negros, temos que prestar muita
atenção à nossa história se quisermos tornar-nos conscientes. Temos que reescrever nossa história
e mostrar nossa resistência aos invasores brancos. Muita coisa tem que ser revelada e seríamos
ingênuos se esperássemos que nossos conquistadores escrevessem uma história imparcial sobre
nós. Temos que destruir o mito de que a nossa história começa com a chegada dos holandeses.”
Adaptado de Steve Biko, I write what I like: a selection of his writings. Johannesburg: Picador Africa, 2004. p. 105, 106.
a) Segundo o texto, por que os negros necessitariam reescrever a história da colonização sul-
africana?
Responda no caderno.
a) da reação de setores políticos conservadores na França, associados aos franceses que viviam na
Argélia.
c) da iniciativa dos Estados Unidos que pressionaram a França a manter a colônia a qualquer preço.
d) da ação pessoal do general De Gaulle que se opunha aos projetos hegemônicos dos Estados
Unidos.
e) da atitude da França que desejava expandir suas colônias, após a Segunda Guerra Mundial.
5. (UEM -PR) Após a Segunda Guerra Mundial, surgiram no mundo várias nações independentes,
que se formaram principalmente na Ásia e na África em consequência da luta destes povos para se
libertarem dos antigos domínios coloniais. Esse processo é conhecido como descolonização. A esse
respeito, assinale a(s) alternativa(s) correta(s).
I. Com o fim do domínio britânico no subcontinente indiano, as divisões internas entre hindus e
mulçumanos levaram ao surgimento de dois países: Índia e Paquistão.
II. No Vietnã, a luta pela independência terminou na década de 1970, com a vitória das forças
comunistas.
III. A independência da Argélia foi obtida no início da década de 1950, de forma consensual com
sua antiga metrópole.
V. A libertação do Congo belga da dominação colonial só foi conseguida com sangrentas lutas. Tais
conflitos se estenderam, após a independência, com confrontos entre etnias e grupos políticos
rivais.
• Hotel Ruanda, direção de Terry George. Itália/Reino Unido/África do Sul, 2004, 117 min. Em Ruanda,
nos anos 1990, duas etnias entram em conflito, os tútsis e os hútus. Quando estes últimos chegam ao
poder, promovem um genocídio contra os tútsis. Paul Rusesabagina é um gerente de hotel que,
inspirado pelo amor por sua família, salva a vida de mais de mil refugiados da etnia tútsi abrigando-os
no estabelecimento onde trabalha.
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8 A era da globalização
Neste capítulo
O que é globalização?
A globalização neoliberal
Globalização e localismo
Aspectos positivos e negativos da globalização
O Brasil na era da globalização
Globalização e direitos humanos
O século XXI é marcado pela globalização e pela relação dos seres humanos com a tecnologia.
Tal integração, ocorrida ao longo do século XX, abrangeu diversos fatores que nem sempre
colocaram todos os países envolvidos em posições favoráveis. Esse processo se deu num
movimento de interligação e uniformização de vários aspectos, que criaram novos padrões
mundiais para a difusão de informações, mercadorias e culturas.
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De acordo com essa realidade, quase tudo o que acontece não atinge somente uma região
ou um país, mas todo o planeta. Os problemas políticos, sociais e econômicos passaram a
ter escala mundial, impactando direta ou indiretamente as distintas partes do globo. Neste
capítulo, estudaremos como a globalização efetivou-se nas diferentes sociedades e como
elas passaram a se conectar. Também veremos os aspectos positivos e negativos da
globalização e a relação entre esta e os direitos humanos.
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O que é globalização?
O termo globalização surgiu na década de 1980 para designar e sintetizar as modificações econômicas,
políticas e culturais que o mundo, num contexto bastante amplo, começou a viver a partir daquele
período.
Esse termo é ainda usado para definir a interconexão e a interdependência econômica, política e
cultural entre as diferentes sociedades. A partir do momento em que grande parte do mundo se
globalizou, os problemas sociais passaram a ser de ordem mundial, por exemplo, a questão ambiental e
o aumento da temperatura mundial, que afetam a sobrevivência de todos os seres vivos. Outros casos
podem ser a violência a determinados grupos – como as mulheres e as crianças – e os crimes contra os
patrimônios históricos da humanidade.
A globalização pode assim ser definida como a intensificação das relações sociais em escala
mundial, que ligam localidades distantes de tal maneira que acontecimentos locais são modelados
por eventos ocorrendo a muitas milhas de distância e vice-versa. Este é um processo dialético,
porque tais acontecimentos locais podem se deslocar numa direção inversa às relações muito
distanciadas que os modelam. A transformação local é tanto uma parte da globalização quanto a
extensão lateral das conexões sociais através do tempo e espaço. [...]
GIDDENS, Anthony. As consequências da modernidade. Trad. Raul Fiker. São Paulo: Unesp, 1991. p. 69-70.
Glossário
Dialético: relativo à dialética, lógica que considera qualquer processo (por exemplo, o histórico) sob
dois pontos de vista que se opõem.
Organizando ideias
1. Quais ideias você associa à palavra globalização?
Entrada de supermercado em Dubai, Emirados Árabes Unidos, 2013. De origem francesa, essa rede de supermercados pode ser
encontrada em diversos países.
Léo Burgos
Fachada de loja de equipamentos eletrônicos em São Paulo (SP), 2015. Com produtos vendidos em todo o mundo, a tecnologia
dessa empresa é concebida nos Estados Unidos e os componentes de seus equipamentos são fabricados em países da Ásia e
Oceania.
Página 223
© DAE/Studio Caparroz
Fonte: AQUINO, Rubim Santos Leão de et al. História das sociedades americanas. Rio de Janeiro: Record, 2008. p. 134.
Conforme dito, o termo globalização surgiu na década de 1980, mas o fenômeno da mundialização
data de tempos mais antigos.
O contexto de globalização em que estamos inseridos consiste em uma fase da mundialização na qual a
sociedade mundial está interligada por relações econômicas que são, por sua vez, legitimadas pela
ideologia neoliberal.
A intensificação desse processo remonta ao período das Grandes Navegações europeias, durante os
séculos XV e XVI. A possibilidade de circum-navegação e a chegada dos europeus ao continente
americano redesenharam o mapa do mundo conhecido até então. Com essas novas rotas, foram abertas
mais possibilidades de intercâmbio, inicialmente comercial e depois político (relação metrópole-colônia)
e cultural (novos hábitos, novos valores sociais).
A expansão comercial mercantilista estruturou o chamado comércio triangular entre a Europa – que
fornecia produtos manufaturados –, a África – fornecedora da mão de obra (escravos) – e a América –
exportadora dos produtos coloniais e consumidora das manufaturas europeias.
Um segundo momento da mundialização foi a Revolução Industrial, entre os séculos XVIII e XIX, com o
desenvolvimento dos transportes terrestres (ferrovias) e oceânicos (navios a vapor) e das comunicações
(telégrafo). Isso mudou radicalmente as relações de mercado e trabalho, provocando o fim das
monarquias (Revolução Francesa) e alterando as relações sociais (surgimento da burguesia e do
proletariado).
Segundo o economista Adam Smith, um de seus maiores difusores, o comércio internacional isento de
impostos alfandegários favoreceria sobremaneira as nações envolvidas com benefícios maiores do que
os obtidos por meio da proteção à produção nacional. Dessa forma, autorizar a livre troca de
mercadorias entre países ajudaria a economia mundial.
A indústria moderna estabeleceu o mercado mundial, para o qual a descoberta da América havia
aberto caminho. Esse mercado desenvolveu enormemente o comércio, a navegação, a
comunicação por terra.
todos os lugares. A burguesia, por meio de sua exploração do mercado mundial, deu um caráter
cosmopolita para a produção e o consumo em todos os países. [...]
As indústrias nacionais antigas foram destruídas ou seguem sendo destruídas dia após dia. Elas são
desalojadas por novas indústrias, [...] por indústrias que não mais trabalham com matéria-prima
nacional, mas matéria-prima extraída de zonas remotas; cujos produtos são consumidos não só no
próprio país, mas em todos os cantos do globo. Em lugar das antigas necessidades, satisfeitas com
a produção do país, encontramos novas necessidades, exigindo, para satisfazê-las, produtos de
terras e climas distantes. [...]
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. O manifesto comunista. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1998. p. 11-12 e 15.
Esse período também foi marcado por uma nova era de colonialismo, o imperialismo, que significou a
ocupação e o domínio de partes da Ásia, da África e da América Latina por países europeus e pelos
Estados Unidos. As disputas imperialistas em busca de novas colônias, para facilitar a expansão
econômica e o aumento da política belicista, causaram duas guerras mundiais no século XX: a primeira
entre 1914 e 1918, e a segunda entre 1939 e 1945.
Durante a Guerra Fria, os países que compunham o bloco socialista, liderado pela URSS, permaneceram
isolados do processo de integração internacional dos mercados, constituindo-se, assim, em barreira
geográfica para a globalização. Fora desse grupo, a interdependência entre os países, no que se refere
sobretudo à economia, aprofundou-se gradativamente.
A partir de 1986, o presidente russo Mikhail Gorbatchov abriu a economia soviética, por meio da política
da glasnost. Entre outras consequências, o muro construído para separar o mundo entre socialismo e
capitalismo foi derrubado, em novembro de 1989, em Berlim. Esses dois fatos abriram o caminho para o
bloco socialista começar a participar da economia mundial, não restando mais barreiras para a
globalização.
Organizando ideias
Não há uma globalização, mas sim globalizações, nem todas convergentes. Essas globalizações
manifestam a realidade de um mundo que se tornou comum. Elas correspondem a um processo
que não é nem novo nem dotado de um sentido único, e no qual frequentemente se alternam
abertura e fechamento. [...]. Os grandes descobrimentos, a constituição dos impérios coloniais
europeus e depois a exploração da África e das ilhas do Pacífico extinguiram de modo irrevogável a
compartimentação das civilizações. Assim, o mundo tornou-se na prática um mundo unificado. [...]
CANTO-SPERBER, Monique. A globalização com ou sem valores. In: BARRET-DUCROCQ, Françoise. Globalização para quem? São
Paulo: Futura, 2004, p. 50.
Glossário
Cosmopolita: termo que faz referência à ideia de cidade atual que contém grande número de
pessoas, muitas vindas de outros lugares. Diz-se da união de características culturais de diversos
lugares do globo e do respeito a elas.
Página 225
A globalização neoliberal
A globalização pode ser observada na internacionalização da informação, da política, da economia e da
cultura. Essa nova ordem mundial é consequência das políticas de liberalização, do desenvolvimento de
tecnologias da informação e da comunicação.
Economia e política
Analisando-a pela perspectiva econômica, a globalização é a mundialização financeira por meio da
integração dos mercados e das bolsas de valores, bem como da intensificação dos fluxos de
investimento e de capital em escala global.
O caráter global das relações comerciais ficou mais explícito no fim da década de 1970, após Margaret
Thatcher tornar-se primeira-ministra da Inglaterra (1979) e Ronald Reagan ser eleito presidente dos
Estados Unidos (1980). A partir de então, essas duas grandes potências colocaram em prática novos
padrões econômicos pautados na não interferência do Estado na economia, visando aumentar a
competitividade do mercado internacional e estimular a influência das megaempresas americanas e
inglesas em outros países. Esse movimento consolidou a implementação das novas políticas de mercado
neoliberais e deu início à implantação das grandes empresas multinacionais em diversas partes do
globo.
AP Photo/Glow Images
Primeira-ministra britânica Margaret Thatcher (centro) e o presidente dos Estados Unidos Ronald Reagan (esquerda) analisam o
modelo da futura estação espacial. Londres (Inglaterra), 6 jun. 1984.
Na esfera política, o neoliberalismo caracteriza-se como a ideologia da globalização. Essa política tem
como princípios básicos a abertura de mercados, o incentivo à indústria nacional, a mínima intervenção
estatal na economia, as privatizações de empresas públicas (hegemonia do setor privado) e a
desburocratização do Estado.
Muitos cientistas políticos e economistas defendem a globalização econômica como um processo que
gera riquezas e desenvolvimento para as nações envolvidas. Entretanto, também é causadora de
desemprego e subempregos.
Com o advento do “pensamento único” ou das chamadas políticas neoliberais, passou a prevalecer
[...] a ideia de que os Estados abandonassem a cena, abrindo suas fronteiras ao livre jogo das forças
do mercado e das finanças internacionais, desregulamentassem quaisquer mecanismos de
proteção à economia nacional ou às garantias dos trabalhadores e submergissem junto com toda a
sociedade sob uma liberalização geral, em benefício da atuação mais desinibida das grandes
corporações. Os argumentos em favor desse rearranjo enfatizam o que é caracterizado como seus
aspectos positivos: a difusão das ideias e informações, a atualização e transferência das
tecnologias, o rebaixamento dos custos das mercadorias e a ampliação das opções para os
consumidores.
SEVCENKO, Nicolau. A corrida para o século XXI: no loop da montanha-russa. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. p. 42.
Página 226
Organizando ideias
1. Observe o mapa a seguir e faça o que se pede.
© DAE/Studio Caparroz
Fonte: WESSEL, David. U. S. Firms Keen to Add Foreign Jobs. The Wall Street Journal, 22 nov. 2011. Disponível em:
<online.wsj.com/article/SB10001424052970203710704577052220096932832.html>. Acesso em: mar. 2016.
a) Identifique os dois países onde houve o maior número de empregos criados e os dois que
tiveram o maior crescimento percentual.
Cultura
O termo cultura vem do latim colere, que faz referência a “plantio”, “cultivo da terra”. Sendo assim,
cultura é o cultivo de costumes, rituais e técnicas artísticas, que, reunidos, formam o conjunto de
características que unem e identificam determinada população. Na sociedade neoliberal, entretanto, a
cultura passou a ter novos papéis.
A disseminação da cultura – vinda das grandes potências comerciais – como produto de consumo foi
facilitada pela utilização coordenada da imprensa, do cinema, do rádio e da televisão como meios
divulgadores do consumo em geral de todos os bens passíveis de se tornar mercadorias.
A ideia de indústria cultural evidencia a busca pela universalização de valores, como se isso ocorresse
em forma de intercâmbio, com a valorização de variadas culturas. Entretanto, de maneira geral e
simplificada, os valores e as mentalidades propostos como mundiais são advindos do Ocidente, mais
precisamente dos grupos hegemônicos economicamente – alguns países da Europa e os Estados Unidos
da América.
Outras teorias se atentam para como os padrões culturais ditados pelo mercado em diversas partes do
mundo interferiram nas tradições e características particulares de diversas culturas.
Como exemplo, podemos citar a ideia de multiculturalismo, que ressalta a existência de diferentes
culturas em determinado campo, o que proporciona a formação de novos costumes em alguns casos.
Essa “reunião cultural” existe em decorrência do colonialismo, que inseriu os conceitos ocidentais de
cultura em diversas sociedades da África, América e Ásia, somando diferentes conceitos e noções de
mundo, relações sociais e representatividade.
HALL, Stuart. Da diáspora: identidade e mediações culturais. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2009. p. 50.
Na teoria multiculturalista, há diversas maneiras de analisar os distintos aspectos e tradições que
formam a cultura de um povo, que se valem de diferentes pressupostos, como o mercado comercial, a
visão pluralista de mundo e a crítica à imposição de padrões culturais. Entretanto, o que diferencia o
multiculturalismo de outras teorias a respeito da cultura no mundo neoliberal é a exaltação dos
movimentos de resistência e valorização/preservação das culturas locais.
Globalização e localismo
Ainda no âmbito da discussão sobre globalização está a ideia de localismo, presente no conceito de
cultura ou economia globais, já que qualquer aspecto da vida na sociedade neoliberal, por mais que
esteja em condição global, tem uma raiz local. Sendo assim, a propagação de um aspecto cultural ou
uma empresa multinacional como exemplos globais implica a localização de outros aspectos culturais e
empresas multinacionais. Nessa lógica, a afirmação de um padrão global enquadra tudo o que não se
encaixa nele por ser considerado exótico ou étnico, num movimento de reafirmação de raízes culturais
em todas as instâncias.
[...] Quer isto dizer que, uma vez identificado determinado processo de globalização, o seu sentido
e explicação integrais não podem ser obtidos sem se ter em conta os processos adjacentes de
relocalização com ele ocorrendo simultânea ou sequencialmente, a globalização do sistema de
estrelato de Hollywood contribuiu para a etnização do sistema de estrelato do cinema hindu.
Analogicamente, os actores franceses ou italianos dos anos 60 – de Brigitte Bardot a Alain Delon,
de Marcello Mastroiani a Sofia Loren – que simbolizavam então o modo universal de representar,
parecem hoje, quando revemos seus filmes, provincianamente europeus, se não mesmo
curiosamente étnicos. A diferença do olhar reside em que, de então pra cá, o modo de representar
hollywoodesco conseguiu globalizar-se. Para dar um exemplo de uma área totalmente diferente, à
medida que se globaliza o hambúrguer ou a pizza, localiza-se o bolo de bacalhau português ou a
feijoada brasileira, no sentido em que serão cada vez mais vistos como particularismos típicos da
sociedade portuguesa ou brasileira.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Por uma concepção multicultural de direitos humanos. Revista Crítica de Ciências Sociais,
Coimbra, Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, n. 48, p. 15, jun. 1997.
Dessa forma, um fenômeno local pode ser globalizado com sucesso, como ocorre no chamado localismo
globalizado, a exemplo do uso da língua inglesa como língua universal ou da disseminação do fast-food
americano. Por outro lado, pode haver o impacto de práticas e imperativos de fora em culturas locais, o
chamado globalismo localizado, que desestrutura a resposta aos produtos da globalização devido à
grande necessidade de adaptação, como é o caso das zonas francas, da destruição maciça de recursos
naturais para a produção de empresas estrangeiras, do uso turístico de lugares históricos etc.
Comparando as duas tendências, é possível perceber que o globalismo localizado acaba sendo mais
nocivo às culturas locais, tendo em vista que a definição dos padrões de globalização varia de acordo
com a condição econômica dos países envolvidos no processo. Dessa forma, enquanto as nações
desenvolvidas são aquelas que “exportam” aspectos globais, as mais pobres são obrigadas a lidar com
os aspectos globais vindos de fora.
Taba Benedicto/Futura Press
Glossário
Adjacente: diz-se de algo que está próximo, vizinho.
Étnico: relativo à etnia; algo que faz parte das características físicas, culturais e linguísticas de uma
comunidade.
Exótico: algo diferente, extravagante, que difere daquilo com que se está acostumado.
Fast-food: “comida rápida”, em inglês. É o nome dado aos alimentos que podem ser preparados e
ingeridos em pouco tempo.
Imperativo: imposição, autoritarismo.
Página 229
Resgate cultural
Há alguns anos, uma parte significativa do fluxo de dados que circulam pela internet entre pessoas
é mediada por redes sociais virtuais. Nelas, pessoas, assim como empresas, conectadas entre si de
maneiras diversas, trocam informações, comentários e conteúdos audiovisuais.
As redes sociais estão transformando a forma pela qual as pessoas se reúnem e atuam
coletivamente. Se, antes, a proximidade geográfica e os encontros presenciais eram essenciais para
formar e manter um movimento social, atualmente há experiências muito interessantes de uso das
redes sociais virtuais para formar redes de atuação coletiva.
A ocupação de escolas da rede estadual paulista, no fim de 2015, por estudantes da educação
básica é um exemplo de rede de atuação coletiva impulsionada pela internet. A decisão do governo
do estado de fechar escolas e transferir alunos para outras unidades, chamada de “reorganização
escolar”, levou muitos estudantes a ocupar suas escolas como forma de protesto.
• O Facebook, uma das principais redes sociais virtuais, tem uma forma de selecionar o que as
pessoas verão em seus respectivos “feed de notícias”. Veja algumas regras na figura a seguir e
responda: Qual é a tendência nessa rede social: diversidade ou homogeneidade? Justifique sua
resposta.
Arte AE/Estadão conteúdo
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As empresas passaram então a atuar além das fronteiras de seus países de origem. Implantando filiais
em outras nações, elas viram a possibilidade de aumentar suas forças na competição com as
concorrentes por meio da instalação em regiões com abundância de matéria-prima, mão de obra a
menores custos e incentivos fiscais.
Embora estejam presentes em diversas regiões do mundo, as empresas multinacionais têm matrizes
bem definidas, das quais parte o planejamento da produção e da participação no mercado,
característica mais marcante na diferenciação entre elas e as transnacionais.
Essas empresas, apesar de terem filiais, não concentram nelas o controle de sua produção.
DAE
DAE
Apesar de ter promovido mudanças positivas, a globalização, que por si só passa uma ideia de
uniformidade e acessibilidade, tem outro lado, como vimos, que localiza e exclui as iniciativas e os
aspectos que se encontram fora do esquema global.
Como aspectos positivos da globalização, podemos citar a expansão dos mercados comerciais e o
aumento da facilidade de distribuição de produtos, assim como a disponibilidade de capital para
investimento em novas tecnologias de diversas áreas, como a medicina, a física etc.
O aumento da produtividade também é visto como fator positivo, já que a produção em larga escala,
especialmente quando realizada nos países em desenvolvimento – com mão de obra e matéria-prima
mais baratas e incentivos fiscais –, além de baratear os custos, gera mais empregos e crescimento
econômico em diferentes áreas do globo.
O acesso à tecnologia também deu um grande salto com o advento da globalização, sobretudo com a
criação da internet, que revolucionou e barateou os meios de comunicação, intensificando as relações
internacionais e aproximando distâncias e interesses sociais, culturais, políticos, econômicos e
tecnológicos.
Como aspectos negativos, destacam-se a perda de autonomia política e econômica – tendo em vista o
aumento crescente da relação entre países – e a necessidade constante de planejar estruturas
financeiras sólidas com base em investimentos de longo prazo e ideias cada vez mais inéditas, já que a
concorrência entre as companhias por mercados consumidores aumenta a cada dia no mundo global.
Casas construídas com material de pré-moldagem de concreto. São João da Boa Vista (SP), 2014.
No campo econômico, inúmeros processos foram intensificados com a globalização da produção e das
relações econômicas, como as grandes mudanças cambiais, o aumento da inflação, a elevação de juros e
o crescimento da dívida externa, já que, para entrar no esquema global de consumo e fornecimento de
materiais e informações, os países precisam fazer grandes adequações.
A população dos países que se enquadram nas especificações exigidas pelo novo mundo global desfruta
os benefícios da comunicação espontânea e o acesso aos mais variados e modernos produtos.
Entretanto, quem vive nas nações que se encontram à margem do processo não tem acesso algum às
condições mínimas de sobrevivência, quanto mais à internet e aos bens de consumo tão populares nos
países centrais.
A automação é o processo de substituição da mão de obra humana por máquinas, com o intuito de
tornar a produção mais precisa, rápida e econômica.
Página 232
De fato, o que impede a globalização de alcançar o sucesso absoluto é a existência de países totalmente
excluídos e marginalizados do processo, uma vez que o intuito dela é o rompimento de fronteiras como
o excesso de impostos e as barreiras alfandegárias. Mesmo assim, os produtos e serviços fornecidos
pelas nações em desenvolvimento ainda enfrentam muitos obstáculos criados pelas nações mais ricas,
os quais pesam sobre as populações carentes dos países excluídos.
As barreiras alfandegárias são exigências comerciais impostas pelos governos para controlar o
intercâmbio internacional de mercadorias. Entre as formas mais comuns de barreiras estão as tarifas e
licenças de importação, que acarretam certa dificuldade às transações e maior domínio para alguns
países.
Organizando ideias
Analise a charge a seguir e responda às questões.
Moisés
2. Que aspectos da globalização podem provocar a situação descrita? Escolha um deles e explique.
b) Quem ela alcança e quem é deixado de fora? Em outras palavras, quem ganha e quem perde
com a globalização?
Após a Independência, em 1822, o Brasil passou do jugo português para o inglês, atendendo às
demandas de uma nova ordem de mercado. Posteriormente, o Brasil tornou-se um dos maiores
exportadores de café. Hoje há uma economia no país que se destaca pelo desenvolvimento social,
político e cultural.
Para o Brasil se inserir no fenômeno da globalização, foi preciso provocar algumas mudanças radicais em
sua base política e econômica.
Com a criação do Plano Real, em 1994, o país tornou-se atrativo para investimentos diretos de
estrangeiros, conseguindo ao longo dos anos financiar os crescentes déficits existentes.
A economia brasileira é aberta, o que integra o país ao mercado financeiro internacional, aumentando o
investimento externo. Isso representa uma alternativa para financiar o desenvolvimento, criar novas
vantagens competitivas, desenvolver projetos de exportação, expandir a produção e diminuir a
importação.
O acesso aos mercados internacionais gera a entrada de produtos no país, que muitas vezes são mais
baratos ou mais aprimoradas que os fabricados aqui. Isso, por um lado, aumenta a possibilidade de
consumo para a população, mas, por outro, cria grande concorrência para as indústrias nacionais, que
nem sempre conseguem se manter no mercado.
Organizando ideias
Com base nos dados apresentados na tabela a seguir, faça o que se pede.
3. Com base em sua análise da tabela, reflita sobre o papel do Brasil no mercado global.
Página 234
Nesse sentido, a globalização pode servir como um aspecto positivo na implantação dos direitos
humanos, ao facilitar a difusão de informações sobre as diferentes culturas ao redor do mundo e a
comunicação entre os países, com o intuito de traçar objetivos comuns às condições de vida das
populações que, ao mesmo tempo, respeitem as particularidades das sociedades em pauta e igualem o
acesso à alimentação, educação, saúde etc.
Apesar disso, o aspecto econômico da globalização privilegia o barateamento dos custos de produção e
a obtenção de maiores lucros no mercado comercial. E faz isso deixando de lado a possibilidade de
integração igualitária entre os países e dificultando essa tarefa a partir do momento em que incentiva a
exploração de matérias-primas e mão de obra das nações em desenvolvimento e, num
contramovimento, afasta cada vez mais aquelas que já estão fora do fluxo global de produção e capital.
Essa realidade da globalização acaba suprimindo a concretização dos direitos humanos, o que gera
novas questões a serem pensadas e novos desafios a serem enfrentados.
Duas vertentes de pensamento se mostram aparentes na análise desse processo. A primeira ressalta o
caráter de homogeneização cultural proporcionado pela ascensão do sistema global de relações, com a
imposição de padrões ocidentais de pensamento, ação e vivência às outras partes do planeta. A
segunda, entretanto, chama a atenção para a busca à distinção por parte dos indivíduos inseridos no
processo de globalização, que se afirmaria por meio da manutenção de culturas tradicionais ou locais.
Sendo assim, ao mesmo tempo em que a globalização impõe padrões de consumo e comportamento às
populações dos países, surge a ação contrária, de resgate, preservação e defesa de seus referenciais
identitários, com o intuito de preservar as memórias locais, ocasionando o surgimento de diversos
movimentos culturais com raízes em tradições do passado.
Esse movimento não afeta apenas os indivíduos mais velhos, mas também os jovens, que procuram
resgatar suas raízes encontrando pontos de conexão entre as culturas tradicionais e os novos fatores
culturais. Isso pode ser observado em diversos casos brasileiros, como o movimento manguebeat, a
tradição das rendeiras do Ceará e de Santa Catarina – que se mantém por meio do aprendizado da
atividade pelas novas gerações –, a capoeira, entre outros.
O manguebeat (também grafado manguebit ou mangue beat) é um movimento musical pernambucano
de contracultura que surgiu na década de 1990. Por meio de letras e ritmos, o movimento, que une o
maracatu – elemento regional – com ritmos como o rock, o funk e a música eletrônica, faz crítica ao
descaso socioeconômico com a região dos mangues e denuncia as desigualdades sociais do Recife, tão
semelhantes às dos outros grandes centros urbanos brasileiros.
Um dos principais nomes e divulgadores do manguebeat foi o músico Chico Science, que, liderando a
banda Nação Zumbi, disseminou as ideias do movimento tanto no Brasil quanto no mundo.
Página 235
A ideia de resguardar as tradições, não apenas culturais, como também “naturais”, ou seja, conservar a
fauna e a flora de todos os países, está associada ao desenvolvimento de novas tecnologias – sobretudo
a biotecnologia. Elas estão relacionadas à atual ênfase dada à cultura da sustentabilidade, cuja base é o
conceito de biodiversidade e a preservação dos mais diversos recursos naturais. Esse fato inaugurou
uma nova faceta do que se entende por respeito e preservação, incorporando elementos diferentes ao
conjunto de características regionais.
Organizando ideias
Observe as imagens a seguir e suas respectivas legendas.
Apresentação do Maracatu Baque do Vale durante a Festa do Divino Espírito Santo. São Luiz do Paraitinga (SP), 2015.
Gerson Gerloff
Família guarani toma chimarrão enquanto prepara a refeição matinal. Saldo do Jacuí (RS), 2015.
Roberto Couto/Tyba
Apresentação do Boi Garantido durante o Festival de Folclore de Parintins, Amazonas (AM), 2015.
Allan Torres/Framephoto
1. Com base nas imagens e no que você aprendeu, elabore um texto que apresente hipóteses
sobre como essas culturas tradicionais combatem a hegemonia cultural difundida pela
globalização.
Página 236
Debate interdisciplinar
A música e a transposição de barreiras
A história de Cuba é marcada por conflitos ideológicos e pelo embargo econômico rigoroso imposto
pelos Estados Unidos, que ocasionou muitas limitações ao povo da ilha, como a restrição de acesso à
informação e ao consumo dos mais diversos tipos de produtos. As viagens para fora do país também
foram proibidas.
O embargo teve início em 7 de fevereiro de 1962, e foi transformado em lei em 1992. Atu almente, a
grande maioria dos países se declara contra o embargo e até mesmo a ONU condenou-o formalmente,
porém não chegou a enfraquecê-lo.
Apesar das restrições e imposições à economia, política e liberdade pessoal, a população da ilha
caribenha prezou pela preservação de suas riquezas imateriais e culturais, em especial a música, que
conseguiu ultrapassar as barreiras e tornar-se mundialmente conhecida. Com ricos arranjos, improvisos,
timbres e percussão, a música de Cuba é uma mistura de ritmos e influências múltiplas: da música
africana – evidente pelo uso de instrumentos de origem africana, como na rumba, no guaguanco e na
comparsa; dos ritmos europeus, especialmente os espanhóis; de elementos culturais de origem
francesa, com a tumba – tipo de dança com influência da França; e até mesmo da música chinesa, com o
uso de cornetas típicas.
Com esse potencial nasceu o grupo Buena Vista Social Club, cujo nome faz referência a uma famosa e
antiga casa de shows de Havana que funcionou até a década de 1950, onde muitos cantores renomados
se apresentavam. Ao ganhar o mundo com sua música, o grupo assumiu o papel de legítimo
representante da arte cubana e seus integrantes são prova de que o embargo econômico imposto pelo
governo norte-americano, embora tenha debilitado a economia, não diminuiu a capacidade de
transposição de barreiras da música.
Matthias Oesterle/ZUMA Press/Corbis/Latinstock
Apresentação do grupo Buena Vista Social Club no Festival de Música de Pedralbes, Barcelona, Espanha, 2015.
Página 237
A trajetória do grupo teve início em 1996, quando o guitarrista e produtor norte-americano Ry Cooder,
contrariando a lógica dos governantes de seu país (que inibe a visitação turística à Cuba), foi até a ilha
para conhecer os artistas locais, se inspirar e gravar um disco com eles. Chegando lá, ficou fascinado
com o som e os testemunhos dos artistas e teve a ideia ousada e revolucionária de, juntamente com
outros músicos – como o pianista Rubén González –, instrumentistas e o compositor e instrumentista
Compay Segundo, produzir o CD Buena Vista Social Club. Essa obra projetou a música cubana na mídia
mundial e, sem dúvida, colocou-a em seu ponto alto, com o alcance do reconhecimento, da qualidade e
da importância cultural do país. Os cubanos chegaram a fazer um show em Nova York e sua música foi
reconhecida com o maior prêmio da música na atualidade, o Grammy.
O exemplo do Buena Vista Social Club é uma confirmação do papel da música nas sociedades, que é
misturar elementos como forma de expressão, colocando em pauta tanto a realidade de seus autores
quanto dos que são por ela cantados. Assim, a música cubana, que expressa a mescla da identidade
latina com a africana, fala, canta e toca o universo de um povo que, apesar das limitações, busca das
mais variadas formas mostrar ao mundo sua identidade nacional originária, que vai além da imposta
pelo regime socialista, mostrando como os traços culturais podem ultrapassar qualquer fator na
organização e formação da realidade de um país.
Apresentação do grupo Buena Vista Social Club no Carnegie Hall para o álbum dos vencedores do Grammy, Nova York (EUA), 1º
jul. 1998.
Atividade
1. Embora a ilha de Cuba enfrente muitos problemas econômicos, tem também uma importante
característica: sua riqueza cultural que, muitas vezes, ameniza as dificuldades impostas à
população. De certa forma, essa também é uma característica do Brasil: apesar dos desafios
econômicos e problemas sociais, contamos com uma rica diversidade musical, fruto de nossas
diferentes raízes culturais.
Forme um grupo com alguns colegas e, juntos, pesquisem as diversas formas de expressão musical
presentes em nosso país. Realizem, então, uma apresentação aberta à comunidade com os ritmos
e as expressões musicais pesquisados. Pode ser um festival cultural incluindo outras turmas ou um
sarau, por exemplo.
Página 238
1. (UECE) A globalização tem sido vista, de maneira muito simplificada, como simples abertura de
fronteiras e geração de um espaço mundial comum. É natural a construção ideo ló gica segundo a
qual nosso mundo encolheu dramaticamente e qualquer ponto do planeta está a nosso alcance,
através do teclado do computador ou da tela da televisão. Considere os seguintes itens a respeito
da globalização:
III. Num mundo globalizado, as realidades geográficas se renovam, contribuindo para vivermos
num espaço sem fronteiras, uma aldeia global onde todos podem conhecer extensivamente e
profundamente o planeta.
a) I e III.
b) II e III.
c) II.
d) I.
2. (UFPI) No que diz respeito ao processo de globalização hoje dominante no espaço mundial,
analise as seguintes afirmações.
I. A expansão das multinacionais vem provocando a descentralização das atividades produtivas, das
aplicações de capitais e a interligação dos mercados em escala mundial.
III. As cidades globais ou metrópoles mundiais são os centros de decisões do capital, as sedes das
principais empresas financeiras, polos de pesquisa tecnológica e de comando da economia
mundial. De acordo com as afirmações acima, é correto afirmar que:
a) I e II são verdadeiras.
b) I e III são verdadeiras.
d) apenas I é verdadeira.
e) apenas II é verdadeira.
3. (Unicamp-SP) Faz cerca de vinte anos que “globalização” se tornou uma palavra-chave para a
organização de nossos pensamentos no que respeita ao funcionamento do mundo. A palavra
“globalização” entrou recentemente em nossos discursos e, mesmo entre muitos “progressistas” e
“esquerdistas” do mundo capitalista avançado, palavras mais carregadas politicamente passaram a
ter um papel secundário diante de “globalização”. A globalização pode ser vista como um processo,
uma condição ou um tipo específico de projeto político.
(Adaptado de: HARVEY, David. Espaços de Esperança. São Paulo: Edições Loyola, 2006. p. 79.)
Responda no caderno
a) no acesso à informação.
c) na instabilidade do dólar.
5. (Udesc) Na década de 1980, Ronald Reagan (nos Estados Unidos) e Margaret Thatcher (na
Inglaterra) levaram a cabo políticas formuladas com base nas ideias econômicas desenvolvidas em
meados dos anos 1970, que defendiam transformações substanciais no capitalismo, a fim de
superar a crise da década. Esse conjunto de ideias e medidas – adotado pela maioria dos países
desenvolvidos no período – pode ser explicado, de modo geral, (1) ________ e ficou conhecido
como (2) ________.
Assinale a alternativa correta que preenche os espaços (1) e (2) na sequência estabelecida, com as
respectivas definições.
a) (1) pela intervenção direta do Estado na economia nacional, política econômica baseada na
teoria do economista inglês John Keynes – (2) New Deal.
b) (1) pelo aumento da produção industrial e pela participação no comércio internacional, bem
como políticas de valorização da moeda por parte do Estado, com o objetivo de fortalecer a
economia nacional – (2) capitalismo monopolista.
c) (1) pela não intervenção do Estado na economia; ao Estado cabia apenas a gerência sobre a
formação dos trustes e cartéis – (2) mão invisível do mercado.
d) (1) pela não intervenção do Estado na economia, o que incluía deixar de defen der a
manutenção dos empregos, e o corte significativo de gastos públicos na área social – (2)
neoliberalismo.
e) (1) pela intervenção estatal na economia; para proteger o mercado interno, o governo
armazenou a produção do setor agrícola, a fim de aumentar os preços no mercado interno e a
elevação de taxas de importação etc. – (2) neoliberalismo.
• Encontro com Milton Santos ou o mundo global visto do lado de cá, direção de Sílvio Tendler. Brasil,
2007, 89 min. Com base no pensamento do geógrafo brasileiro Milton Santos, o filme discute o processo
de globalização em relação à realidade nacional e os efeitos cotidianos da globalização e dos novos
modos de trabalho do capitalismo moderno.
• Maracatu, Maracatus, direção de Marcelo Gomes. Brasil, 1995, 14 min. Disponível em:
<portacurtas.org.br>. Acesso em: fev. 2016. Esse curta-metragem revela os aspectos religiosos e
culturais do ritual afro-indígena chamado Maracatu, que se originou nos engenhos de açúcar de
Pernambuco.
9 Direitos violados
Neste capítulo
Desrespeito aos direitos humanos
Miséria em toda parte
Violência: o valor da vida
Discriminação, intolerância e corrupção
Nas primeiras décadas do século XXI, mesmo diante de várias ações globais e políticas
públicas implementadas em muitos países, o número de pessoas sem acesso a condições
mínimas de sobrevivência ainda é grande. Essa não é a realidade apenas das nações
consideradas em desenvolvimento. Mesmo países desenvolvidos têm dificuldade em
proporcionar qualidade de vida adequada a toda a população.
A violação dos direitos humanos aparece não apenas nas notícias de roubos e mortes
exibidas na televisão mas também quando a população é privada das condições mínimas
de vida em sociedade.
As situações de desrespeito aos direitos humanos são muitas e estão relacionadas tanto à carência de
condições básicas para a sobrevivência quanto a violações físicas e morais.
O descumprimento desses direitos pode ser identificado em muitas partes do globo, nas mais variadas
formas, dentre as quais podemos destacar a miséria e a violência, presentes no decorrer da história em
diferentes sociedades. Situações de miséria causadas por guerras, aumento populacional e outros
motivos podem ser facilmente encontradas nos estudos históricos em diferentes períodos. São comuns
também exemplos de violência como a Inquisição, a colonização na América, as guerras de conquista
romanas, a escravização e outros tantos casos.
Diante dos avanços nas discussões sobre os direitos humanos e com tantas ações concretas para seu
cumprimento, como é possível que esses dramas sociais perdurem atualmente? Essa questão não tem
uma resposta simples, pois são vários os motivos que desencadeiam a violência ou produzem as
situações de miséria. Eles incluem desigualdade social, discriminação e crises econômicas, apenas para
citar os mais comuns.
Miséria é a situação de pobreza extrema, entendendo-se pobreza como carência material (que envolve
as necessidades da vida cotidiana, por exemplo, alimentação, vestuário, moradia e cuidados de saúde),
falta de recursos econômicos e carência social (exclusão social, falta de acesso à educação e à
informação).
Violência refere-se a qualquer força física ou moral empregada contra uma pessoa.
Mohamed al-Sayaghi/Reuters/Latinstock
Juntos, selecionem três reportagens e analisem as situações descritas. Para cada notícia,
destaquem os fatores que influenciam a violência e a pobreza e elaborem um comentário
abordando as possíveis causas e soluções.
Finalizem a atividade com o levantamento de questões sobre violência e miséria. Elas devem ser
retomadas nos estudos do final do capítulo.
Página 243
A pobreza extrema afeta diretamente os direitos humanos, na medida em que nega o direito ao bem-
estar, à saúde e à qualidade de vida. Também compromete o princípio da liberdade de escolha, já que
não é possível gozar a liberdade sem condições mínimas de vida e sobrevivência. Em suma, ela prejudica
os direitos econômicos, sociais, culturais, civis e políticos, pois uma pessoa que vive em situação de
miséria, desprovida de recursos mínimos para garantir alimentação, saúde e outros recursos necessários
à manutenção de sua vida, passa a ser ignorada como sujeito, uma vez que lhe é negado o exercício
desse direito.
Bruno Fernandes/Fotoarena
O crescimento da riqueza mundial, proporcionado pela modernização e pelo aumento dos volumes de
produção dos mais variados gêneros de consumo, foi, ao longo do século XX, proporcional à expansão
da pobreza nas regiões mais carentes do globo. As implicações desse processo se encontram nas novas
relações de exploração de matérias-primas e mão de obra. Embora essas relações envolvam diversas
regiões do globo na produção dos mais variados gêneros, elas não o fazem quando se trata da
distribuição do lucro adquirido.
Pesquisas apontam que entre as décadas de 1940 e 1990, ao mesmo tempo em que a riqueza mundial
cresceu cerca de sete vezes, o número de pessoas em situação de pobreza ao redor do mundo triplicou.
A pobreza também pode ser consequência da discriminação étnica, sexual e etária, na medida em que
atinge sobremaneira os grupos minoritários, como mulheres, crianças, idosos e populações das áreas
mais pobres do globo.
Os direitos estão consagrados em instrumentos legais, como leis, tratados e declarações, mas em
nenhum desses documentos consta uma cláusula coercitiva ao Estado para que os cidadãos em
situação de miséria tenham seus direitos efetivamente garantidos. Lamenta-se a situação dos países
com maiores índices de miséria, mas não há um mecanismo legal que exija do Estado ações diretas para
a solução do problema.
Organizações não governamentais e outras procuram minimizar a gravidade da situação apelando para
a solidariedade, o que não é garantia de solução, já que essas medidas são apenas paliativas.
Logo, é difícil erradicar a pobreza sem alterar as estruturas econômicas e sociais. Na busca pela solução
efetiva, é preciso fomentar a distribuição de renda e o investimento em educação, considerando, é
claro, os fatores culturais de cada sociedade. No entanto, ainda há muitas questões a discutir e ações a
implementar para que sejam atendidas as necessidades humanas básicas – alimentação, vestimenta,
moradia, educação, saúde, trabalho, segurança e serviços públicos, como água e saneamento – e todos
tenham garantido o pleno exercício de seus direitos.
Em todo o mundo, e já há bastante tempo, são inúmeras as discussões sobre a miséria e as tentativas de
implementar leis e diretrizes para erradicá-la. Entretanto, concretizá-las tem se
Glossário
Coercitivo: que se impõe pela força, que reprime.
Paliativo: meio ou recurso empregado para atenuar um problema ou adiar uma crise, sem resolvê-
los.
Página 244
tornado um grande desafio para os governos ao redor do globo. O documento a seguir – reproduzido
em partes – foi criado com esse fim.
A Conferência Mundial sobre Direitos Humanos afirma que a pobreza extrema e a exclusão social
constituem uma violação da dignidade humana e que devem ser tomadas medidas urgentes para
se ter um conhecimento maior do problema da pobreza extrema e suas causas, particularmente
aquelas relacionadas ao problema do desenvolvimento, visando a promover os direitos humanos
das camadas mais pobres, pôr fim à pobreza extrema e à exclusão social e promover uma melhor
distribuição dos frutos do progresso social. É essencial que os Estados estimulem a participação das
camadas mais pobres nas decisões adotadas em relação às suas comunidades, à promoção dos
direitos humanos e aos esforços para combater a pobreza extrema.
Os documentos resultantes de acordos internacionais buscam a cooperação de todos para que esse
grave problema seja sanado.
Em 2000, durante a Cúpula do Milênio – evento promovido pela ONU que reuniu representantes de 189
países para debater os principais problemas que afetam o mundo – foi firmado um compromisso
conhecido como Declaração do Milênio. Nele foram estabelecidas oito metas chamadas de Objetivos do
Milênio (ODM), que no Brasil foram chamadas de oito maneiras de mudar o mundo. Essas metas
deveriam ser cumpridas até dezembro de 2015. A primeira das metas era erradicar a extrema pobreza e
a fome.
Em 2015, após alguns documentos produzidos pela ONU, foram tomadas novas decisões visando
melhorias globais. Formularam-se os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), aprovados na
Cúpula das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável (25 a 27 de setembro 2015), que estão
explicitados no documento Transformando nosso mundo: a agenda 2030 para o desenvolvimento
sustentável.
São 17 objetivos e 169 metas que visam estimular ações em áreas de importância crucial para a
humanidade e para o planeta, conforme se pode observar na imagem a seguir.
ONU
A Agenda de Desenvolvimento Sustentável Pós-2015, chamada Agenda 2030, corresponde ao conjunto de programas, ações e
diretrizes que orientarão os trabalhos das Nações Unidas e de seus países-membros rumo ao desenvolvimento sustentável.
Nesse documento, os dois primeiros objetivos são: acabar com a pobreza e a fome em todos os lugares,
alcançar a segurança alimentar, melhorar a nutrição e promover a agricultura sustentável.
Portanto, as questões relativas à fome e à pobreza permanecem no topo das discussões e dos
documentos relativos às garantias de direitos humanos a todos.
Para efetivação desses e dos demais objetivos, é necessária uma parceria global com a participação ativa
de todos: governos, sociedade civil, setor privado, Nações Unidas etc.
O combate à pobreza tornou-se prioridade na agenda internacional depois que se constatou seu
aumento em nações onde os índices eram baixos e seu agravamento em países em desenvolvimento
que já sofriam com essa mazela.
Os documentos resultantes dos acordos internacionais buscam a cooperação de todos para que esse
grave problema universal possa ser sanado ou ao menos minimizado.
Página 245
Organizando ideias
1. Analise a charge a seguir. Com base no que você já estudou até o momento, interprete a
situação apresentada e responda às questões.
Angeli
2. Forme uma dupla com um colega e, juntos, analisem e descrevam um dos Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável (ODS) listados na página anterior. Depois, apresentem propostas
concretas relacionadas a ele. Vocês podem pesquisar a efetivação dessas propostas na região ou
estado em que moram. Apresentem o resultado em sala de aula.
Página 246
Para calcular a quantidade de pessoas que vivem em situação de miséria no Brasil, é preciso, primeiro,
definir matematicamente o que é miséria e o que é pobreza. Assim, é possível chegar aos percentuais de
pobreza e miséria do país por meio de censos e pesquisas. Na linha da pobreza, são incluídas as pessoas
com renda insuficiente para cobrir os gastos mínimos com a manutenção da vida: alimentação, moradia,
transporte e vestuário. Para esses dados, são desconsideradas a educação e a saúde oferecidas
gratuitamente pelo governo. No percentual da miséria, são consideradas as pessoas incapazes ou
impossibilitadas de ganhar o bastante para garantir a alimentação.
Essas pessoas se encontram abaixo da linha da pobreza, numa situação clara de flagelo social.
Falar de miséria no Brasil é falar de subnutrição, analfabetismo, exclusão social, perda da cidadania, ou
seja, falta de atendimento às necessidades básicas de alimentação, moradia, educação, transporte,
saneamento, saúde, emprego etc.
Os estudos sobre a fome no país apontam a falta de renda para uma alimentação adequada como um
de seus fatores determinantes. Segundo estudiosos do tema, ela provém da desigualdade social,
agravada pelo desemprego e pela falta de políticas efetivas no campo da segurança alimentar.
Isso não quer dizer que nada está sendo feito. Existem vários programas públicos tanto federais quanto
locais que buscam minimizar o problema, mas a solução definitiva ainda não foi encontrada.
Nelson Antoine/Fotoarena
Miséria e fome são inseparáveis, pois quem vive em situação de pobreza extrema geralmente não tem o
que comer ou tem pouquíssimo acesso a alimentos. Mas o que é fome? Segundo a definição dos
dicionários, fome é a condição em que o indivíduo não recebe a quantidade mínima de alimento para
um dia. Nesses casos, se os intervalos entre as refeições são muito longos ou não há ingestão de
alimento, o organismo tende a avisar por meio da sensação de desconforto, evidenciado por tonturas,
mal-estar, fraqueza e dor no estômago.
Entre as possíveis causas de fome no mundo, há aquelas de origem natural (adversidades relativas ao
clima e ao solo, como secas, inundações, terremotos, além de pragas de insetos e doenças na lavoura
que prejudicam a agricultura e consequentemente a produção de alimentos) e as causadas por
problemas sociais (como a concentração desigual de terra e de renda, o desemprego, as guerras e
conflitos civis etc.).
Embora essas causas possam ser usadas como explicação, elas não são as únicas e tampouco podem ser
consideradas individualmente. Em geral, a fome é o resultado de um conjunto de motivos que difere de
um país para o outro; portanto, cada caso deve ser analisado em seu contexto. A fome é hoje um
problema universal, muitas vezes “justificado” pela produção insuficiente de alimentos – apesar de esse
fato ser bem questionável.
De acordo com dados oficiais da ONU, a quantidade de alimentos produzida no mundo atual seria
suficiente para prover uma pessoa com cerca de 2 kg de comida por dia, desde que sua distribuição
fosse correta. Portanto, a produção de alimentos não é o problema, e sim sua distribuição e, sobretudo,
o acesso a eles, ou seja, a condição dada para adquiri-los.
Num mundo globalizado e tecnologicamente desenvolvido, as causas naturais também não podem mais
ser as únicas responsáveis pela fome, pois já há, por exemplo, como se prever muitas das catástrofes
naturais e/ou minimizar seus efeitos. Além disso, essas situações não são permanentes.
Analisando essas questões, percebe-se que a fome é, de fato, um problema social que só pode ser
solucionado por meio de ações políticas nos âmbitos nacional e internacional.
A fome é uma violação aos direitos humanos não só no que diz respeito ao direito à alimentação como
também ao exercício dos demais direitos. Ela não é insolúvel, podendo ser eliminada por políticas
adequadas e pelo trabalho conjunto de todas as nações. Obviamente, o resultado só virá em longo
prazo e, para chegar a ele na atual globalização, as medidas devem fazer parte de políticas de
desenvolvimento que abranjam as diversas regiões do mundo.
Flavio Florido/Frame Photo
Organizando ideias
Forme uma dupla com um colega e, juntos, analisem o mapa a seguir. Em seguida, respondam às
questões.
© DAE/Sonia Vaz
Fonte: Programa Mundial de Alimentos. Disponível em: <www.wfp.org/content/hunger-map-2015>. Acesso em: fev. 2016.
1. Quais países têm maior porcentagem de população com fome? 2. Quais países têm o menor
percentual de pessoas que passam fome?
3. No ano de 2015, apenas um país da América Latina foi classificado com o nível muito alto. Que
país é esse? Qual contexto resultou nessa classificação? Se necessário, pesquisem.
4. Pela classificação do Brasil no Mapa da Fome, é possível concluir que as ações de combate à
fome em nosso país têm gerado resultados positivos? Justifiquem.
Consequências da fome
As consequências imediatas e mais visíveis da fome são a perda de peso, os problemas relativos ao
desenvolvimento das crianças e a desnutrição. A desnutrição é resultante da falta de alimentos ou da
quantidade insuficiente de alimentos apropriados por um período longo.
Em situações de miséria e de fome, a desnutrição pode atingir um grande número de pessoas. Quando
severa, ela pode causar falência dos órgãos, anemia, infecção generalizada e outras patologias graves,
levando inclusive à morte, sobretudo de crianças. A fome também é responsável pelo aumento da taxa
de mortalidade infantil.
Página 249
Mas nenhum atestado de óbito se refere à fome como causa da morte de um indivíduo. Então, como se
pode afirmar que a fome mata?
Os efeitos da fome
Ninguém morre de fome, pelo menos segundo os atestados de óbito, que registram apenas as
doenças e problemas causados por ela, como infecções ou falência de órgãos vitais. Após um dia
sem comer, a pessoa tende a apresentar apatia, cansaço e fraqueza. O metabolismo e a pressão
tendem a cair, resultando em sonolência e sensação de frio.
O organismo começa a produzir cetonas, o que causa mau hálito. Após uma semana sem se
alimentar, a pessoa começa a ter câimbras, redução da atividade cerebral, perda de peso e massa
muscular e diminuição do volume sanguíneo, o que dá à pele um tom amarelado. Quatro semanas
sem comer levam, entre outros sintomas, a arritmias cardíacas, por falta de potássio, confusão
mental, infecções na pele e nos intestinos, queda do cabelo, insuficiência renal e riscos de entrar
em coma, caso a temperatura corporal caia a menos de 35 ºC. A fome prolongada, portanto, afeta,
de uma maneira ou de outra, todos os órgãos do corpo.
NORONHA, Ana Beatriz. Fome crônica da cidadania. Radis, Rio de Janeiro, Fiocruz, n. 8, p. 11, abr. 2003. Colaboração de Kátia
Machado).
Organizando ideias
“Cooperativas agrícolas alimentam o mundo” é o tema do Dia Mundial da Alimentação 2012, em
reconhecimento do papel que elas desempenham na melhora da segurança alimentar e na
erradicação da fome.
Praticamente uma em cada sete pessoas sofre de desnutrição, mas o mundo tem os meios para
eliminar a fome e promover o desenvolvimento sustentável. Há um amplo acordo de que os
pequenos agricultores fornecerão grande parte dos produtos necessários para alimentar mais de
nove bilhões de habitantes em 2050. Uma das medidas necessárias para obter a segurança
alimentar é apoiar as cooperativas, organizações de produtores e outras instituições rurais
investindo nelas.
Várias histórias de sucesso em todo o mundo mostram que as instituições rurais, como
organizações de produtores e cooperativas, contribuem para a segurança alimentar ajudando os
pequenos agricultores, pescadores, criadores de gado, silvicultores e outros produtores a obter
acesso às informações, ferramentas e serviços de que necessitam. Isso permite que eles aumentem
a produção de alimentos, comercializem os seus produtos e criem empregos, melhorando a sua
subsistência e aumentando a segurança alimentar no mundo. [...]
COOPERATIVAS AGRÍCOLAS ALIMENTAM O MUNDO. Disponível em: <www.fao.org.br/download/WFD2012.pdf>. Acesso em: fev.
2016.
3. Nas discussões sobre a fome no mundo, é recorrente a expressão “segurança alimentar”. O que
isso quer dizer no contexto dos Direitos Humanos?
4. De acordo com o texto, qual é a importância das cooperativas agrícolas para minimizar a fome
no mundo?
Página 250
Para entender como a violência afeta nosso cotidiano, faça o seguinte teste: pergunte a colegas e
pessoas próximas o que mais lhes causa medo. Possivelmente, o medo de assaltos, assassinatos e
sequestros estará entre os citados, sobretudo se as pessoas investigadas residirem em grandes centros
urbanos. Outra forma de perceber a forte presença da violência é a observação da paisagem urbana:
casas com muros e grades altas, cercas eletrificadas, cadeados, correntes e outros aparatos que
denotam a busca constante por proteção.
Violência vem do latim violentia, que remete a vis (força, vigor, emprego de força física ou os
recursos do corpo para exercer sua força vital). Essa força torna-se violência quando ultrapassa um
limite ou perturba acordos tácitos e regras que ordenam relações, adquirindo carga negativa ou
maléfica. É, portanto, a percepção do limite e da perturbação (e do sofrimento que provoca) que
vai caracterizar o ato como violento, percepção essa que varia cultural e historicamente.
ZALUAR, Alba. Violência e crime. In: MICELI, S. (Org.). O que ler na ciência social brasileira (1970-1995). São Paulo: Sumaré;
Anpocs, 1999. p. 28.
Thiago Bernardes/FramePhoto
Moradia em São Paulo (SP), com muros altos e cerca elétrica, 2016.
A violência é um fenômeno social presente no cotidiano de todas as sociedades sob várias formas.
Em geral, ao nos referirmos à violência, estamos falando da agressão física. Mas violência é uma
categoria com amplos significados. Hoje, esse termo denota, além da agressão física, diversos tipos
de imposição sobre a vida civil, como a repressão política, familiar ou de gênero, ou a censura da
fala e do pensamento de determinados indivíduos e, ainda, o desgaste causado pelas condições de
trabalho e condições econômicas. Dessa forma, podemos definir violência como qualquer relação
de força que um indivíduo impõe a outro.
Por outro lado, nas sociedades complexas, a violência deixou de ser uma ferramenta de
sobrevivência e passou a ser um instrumento da organização da vida comunitária. Ou seja, foi
usada para criar uma desigualdade social sem a qual, acreditam alguns teóricos, a sociedade não se
desenvolveria nem se complexificaria. Essa desigualdade social é o fenômeno em que alguns
indivíduos ou grupos desfrutam de bens ou valores exclusivos e negados à maioria da população de
sua sociedade. Tal desigualdade aparece em condições históricas específicas, constituindo-se em
um tipo de violência fundamental para a constituição de civilizações.
SILVA, Kalina Vanderlei; SILVA, Maciel Henrique. Dicionário de conceitos históricos. São Paulo: Contexto, 2006. p. 412.
Página 251
As formas de violência variam de uma sociedade para outra e são determinadas pelo momento
histórico.
Nas décadas de 1950 e 1960, ocorreram várias revoltas populares e guerras civis contra governos
ditatoriais. Esses movimentos são exemplos de violência ideo ló gi ca, ou seja, luta política empreendida
por intelectuais e grupos engajados. Nesses casos, a violência era direcionada não às pessoas, e sim aos
governantes, ao Estado constituído, sob a forma de atos violentos.
A partir da década de 1970, e sobretudo depois de 1980, a violência se espalhou, atingindo mais
diretamente a população comum. Grandes cidades – como Los Angeles e Detroit (EUA), Johanesburgo
(África do Sul), Paris (França), Hamburgo (Alemanha), Birmingham (Inglaterra), São Paulo e Rio de
Janeiro, para citar apenas algumas – passaram a conviver com o que podemos chamar de guerras civis.
Nesses e em outros grandes centros, aumentaram consideravelmente o número de homicídios e crimes
violentos, os atos de vandalismo (depredação de bens como carros, prédios etc.) e as agressões físicas
diretas (algumas resultantes de assaltos e roubos, outras de brigas de rua, de trânsito etc.), deixando a
população em estado de medo e alerta.
Portanto, nas últimas décadas do século XX e início do século XXI, a violência direta contra a pessoa – e
não mais contra as instituições – tornou-se mais contundente.
Policiais controlam motim entre gangues rivais em presídio de Escuintla. Guatemala, 2015.
Página 252
Esse e outros exemplos suscitam os debates atuais sobre o que está acontecendo com a sociedade e o
Estado contemporâneos. Os questionamentos e as pesquisas buscam entender por que nações com
baixo índice de violência passaram, nas últimas décadas, a registrar números cada vez maiores de
crimes, agressões e outros comportamentos destrutivos e antissociais.
A temática da violência urbana é um objeto de preocupação mundial. Como explicar o ódio, o prazer de
espancar, violentar seu semelhante? A crueldade e a frieza no trato com o outro são uma realidade em
todas as sociedades contemporâneas.
Para a análise do crescimento da violência, o mundo deve ser considerado no contexto da globalização.
Todavia, há particularidades que ajudam a compreender as diferentes manifestações de violência nos
âmbitos nacional, regional e local.
Apesar disso, o principal foco deve ser sempre a prevenção: estabelecer uma cultura de paz para
prevenir a violência.
EZRA ACAYAN/Reuters/Latinstock
Centenas de pessoas participam de marcha pela paz na cidade de Quezon (Filipinas), 2015.
Organizando ideias
1. De forma geral, você considera que a violência no Brasil tem aumentado ou diminuído?
Justifique sua resposta.
4. A educação é apontada como um dos caminhos para a prevenção da violência. Você concorda?
Apresente argumentos para justificar sua opinião.
Página 253
O alto índice de assaltos, sequestros, assassinatos, violência doméstica e violência no trânsito contribui
para que o Brasil ocupe essa posição. Quando analisados esses casos, chega-se a algumas causas
prováveis: pobreza, má distribuição de renda, desemprego, desarticulação familiar e alcoolismo, apenas
para citar as mais recorrentes.
No cenário urbano brasileiro, é possível perceber mais acentuadamente o crescimento de alguns tipos
de violência:
• aumento da chamada delinquência urbana, expressa sobretudo pelos crimes contra o patrimônio –
roubos, assaltos, extorsão mediante sequestros – e contra a pessoa – homicídios, agressões;
• aumento da violência institucional, praticada pelos representantes do Estado para manter a ordem e
reprimir a violência (forças policiais);
• aumento de conflitos das mais variadas ordens, que podem terminar em desfechos fatais, como brigas
de trânsito, atritos entre torcedores rivais de futebol, desavenças familiares, desentendimentos entre
vizinhos, confrontos escolares etc.
Esses fatos têm uma característica comum: a violência. No entanto, suas causas e consequências são
específicas.
Fonte: WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da violência 2015: mortes matadas por armas de fogo. Brasília: Secretaria Nacional da Juventude,
2015. p. 87.
Cadu Rolim/Fotoarena/Folhapress
Moradores e Polícia Militar enfrentam-se em reintegração de posse no bairro de Rio Vermelho, Florianópolis (SC), 2014.
Página 254
O tráfico de drogas
Atualmente, um dos maiores problemas e desafios mundiais é o controle do tráfico e do uso de drogas –
mais precisamente, o controle e a destruição da indústria do crime organizado, que se espalhou pelo
mundo e afeta drasticamente países como o Brasil, que se encontra na rota da distribuição de drogas.
Esse mercado ilegal conta com uma logística eficaz, que garante seu funcionamento em várias nações.
Pode-se afirmar que hoje o mercado das drogas é um dos setores econômicos mais desenvolvidos do
mundo e movimenta uma grande rede financeira de lavagem de dinheiro. Esse mercado mistura
legalidade e ilegalidade para garantir sua eficácia. As redes financeiras usadas para a legalização do
capital (lavagem de dinheiro) provêm de atividades como o contrabando e o tráfico de armas.
ZALUAR, Alba. Democratização inacabada: fracasso da segurança pública. Estudos avançados, São Paulo, IEA/USP, v. 21, n. 61,
set./dez. 2007.
Estudos recentes apontam a relação entre o crescimento de crimes violentos e do crime organizado,
pois esse mercado é responsável pela entrada de um grande contingente de armas ilegais no país. Como
as estruturas da ilegalidade e a criminalidade vêm aumentando no mesmo período, pode haver uma
relação direta entre ambas.
As atividades econômicas ilegais – neste caso, o tráfico de drogas e armas – são altamente lucrativas.
Com tanto lucro, a corrupção policial e a institucional (Justiça) é facilitada. Isso não quer dizer que toda a
polícia e os órgãos de justiça estejam implicados nela, mas, da parte envolvida, advêm as facilidades
para o aumento e a proteção dessas atividades. E, como elas são ilegais, todos os conflitos e disputas
são resolvidos com violência.
O crime organizado é uma das faces da violência urbana e, por estar constantemente sendo propalado
pela mídia, é um dos assuntos mais recorrentes quando se discute a violência.
O tema não se esgota neste nem em outros exemplos, mas deve ser constantemente debatido e,
sobretudo, combatido.
Fagner Alves/Código19/Folhapress
Organizando ideias
Observe o infográfico a seguir e faça o que se pede.
Alex Argozino
Fonte: United Nations Office on Drugs and Crime. World Drug Report 2015. New York: United Nations, 2015.
2. Menos de 1% dos consumidores de drogas permanecem consumindo-a por toda a vida. Elabore
hipóteses que expliquem esse fenômeno.
3. O vírus HIV é o causador da aids. De que modo a transmissão desse vírus pode estar relacionada
com o uso de drogas? Se necessário, pesquise.
Resgate cultural
BREAK
Mike Segar/Reuters/Latinstock
Dançarinos realizam apresentação no teatro United Palace. Nova York, Estados Unidos, 2015.
GRAFITE
DJ (disc-jóquei)
MC (mestre de cerimônias)
“Aquele que canta ou declama as letras sobre as bases eletrônicas criadas e executadas ao vivo
pelo DJ”
O movimento hip-hop p nasceu nos Estados Unidos atrelado a diversas expressões da cultura negra
do país e em meio a movimentos sociais de conquista dos direitos civis pela população afro-
americana, desde a década de 1960. Caracterizam as produções de hip-hop p (gráficas, musicais e
de dança) “a valorização da ascendência étnica negra, o conhecimento histórico da luta dos negros
e de sua herança cultural, o combate ao preconceito racial”.
ZENI, Bruno. O negro drama do rap: entre a lei do cão e a lei da selva. Estudos Avançados, n. 18, 2004, p. 230. Disponível em:
<www.scielo.br/pdf/ea/v18n50/a20v1850.pdf>. Acesso em: fev. 2016.
O rap, que reúne DJs e MCs, é a expressão do movimento hip-hop mais conhecida das pessoas;
muitos rappers participam de apre- sentações musicais desvinculadas do grafite e do break.
No Brasil, a cidade de São Paulo ocupou durante longo tempo uma enorme centralidade na cultura
hip-hop: a produção artística de jovens negros de periferia circulava para muito além das cidades,
chegando às periferias de outros centros urbanos e influenciando sua produção. Entre os muitos
temas abordados nas canções, destaca-se a atuação da polícia em bairros e comunidades pobres
das periferias.
1. Como a denúncia social por meio da arte atua na transformação das sociedades? Em sua
opinião, o movimento hip-hop p influencia mudanças na sociedade brasileira?
Página 258
A discriminação e a intolerância caminham juntas e têm sido motivo de preocupação nas discussões da
ONU desde a década de 1990. Um exemplo disso é que, em 1995, a Organização das Nações Unidas para
a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) aprovou a Declaração de Princípios sobre a Tolerância.
Já em seu primeiro artigo, ficam claros o conceito de tolerância e sua necessidade nas sociedades, o que
motivou as Nações Unidas a elaborar esse documento.
Aprovada pela Conferência Geral da Unesco em sua 28ª reunião, Paris, 16 de novembro de 1995.
Preâmbulo
De acordo com esse documento, qualquer manifestação de intolerância é uma ameaça à efetivação dos
direitos humanos e, sobretudo, à paz.
A tolerância nada mais é que o reconhecimento de que o “outro” é diferente e isso deve ser respeitado.
Nenhum valor político ou social pode se sobrepor a esse princípio básico de aceitação, pois a tolerância
é condição imprescindível para que se possa estabelecer e manter a ordem social.
A tolerância pratica-se por meio do diálogo, da aceitação, da compreensão mútua, que são atitudes
difíceis, pois as pessoas têm ideias e comportamentos diferentes, mas necessárias para a construção da
cultura da paz.
Glossário
Antissemitismo: doutrina ou movimento contra os judeus.
Xenofobia: sentimento de antipatia ou desconfiança de quem julga alguém alheio a sua cultura,
ambiente de convivência ou país.
Página 259
Artigo 1
Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e
consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade.
Artigo 2
1. Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta
Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião
política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra
condição.
2. Não será também feita nenhuma distinção fundada na condição política, jurídica ou
internacional do país ou território a que pertença uma pessoa, quer se trate de um território
independente, sob tutela, sem governo próprio, quer sujeito a qualquer outra limitação de
soberania. […]
Artigo 7
Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos
têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e
contra qualquer incitamento a tal discriminação.
As leis punitivas contra a discriminação existem em muitos países, por exemplo, no Brasil, onde essa
questão é tratada tanto na Constituição Federal quanto em outras leis. Nelas, o racismo deixou de ser
contravenção penal, tornando-se crime: “Serão punidos os crimes resultantes de discriminação ou
preconceitos de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional” (Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de
1989).
Para entender o que é discriminação, é preciso também entender o que é preconceito, já que, na
sociedade brasileira, esses dois termos são, às vezes, usados como sinônimos.
Preconceito é a opinião formada com base em pouco conhecimento sobre um fato ou assunto. Traduz-
se em intolerância ou aversão a outras etnias, religiões, condição social etc.
De acordo com essas definições, uma pessoa preconceituosa é aquela que analisa ou julga o outro sem
ter ancorado sua argumentação na realidade, baseando-se apenas em sentimentos ou opiniões. O
preconceito não é algo palpável, e sim abstrato – uma intolerância.
Ocorre, por exemplo, quando alguém julga o outro como menos capaz por ele ser de outra etnia,
nacionalidade, religião, orientação sexual, idade ou condição social.
A discriminação acontece quando o preconceito se traduz em ações, como quando alguém ofende, trata
com indiferença, de forma humilhante ou impede o acesso de uma pessoa de outra etnia ou com
deficiência física, por exemplo, ao que está garantido pela Constituição (emprego, serviço público etc.).
Juridicamente, no Brasil, os termos preconceito e discriminação não se distinguem, pois as leis tratam
do preconceito de raça, cor e etnia como racismo.
Legalmente, há quase uma fusão desses termos, o que, na prática, criminaliza qualquer ação resultante
de discriminação e preconceito.
Os casos de discriminação sexual ainda precisam de legislação específica para que possam ser punidos
com mais rapidez e rigor. Para esses casos, vale o que está determinado na Constituição, na qual consta
que não são permitidos preconceitos de nenhuma natureza.
Contudo, é preciso esclarecer que os meios legais e as sanções penais, apesar de importantes para a
prevenção e a eliminação da discriminação, não bastam.
É necessária uma transformação de mentalidade para que realmente seja possível eliminar a
discriminação. Alguns dos meios mais eficazes para alcançar os objetivos são, em longo prazo, a
educação e, em curto prazo, o uso dos meios de comunicação de massa, que podem efetivamente
empreender uma intensa luta contra todas as formas de discriminação.
O terrorismo, o crime organizado e a corrupção também são fortes ameaças aos direitos humanos
constituídos.
Glossário
Corrupção: a palavra deriva do latim corruptus, que significa “quebrar em pedaços”. Encontramos
no dicionário: “Ato ou efeito de corromper; suborno; peita”.
Página 260
Manifestação feminista conhecida por Marcha das Vadias, Bauru (SP), 2015.
As ações terroristas em todas as suas formas, assim como as práticas do crime organizado (tráfico de
drogas, lavagem de dinheiro, violência, tráfico de pessoas etc.), são ameaças constantes à democracia, à
liberdade e aos direitos humanos. Elas comprometem a segurança dos cidadãos e dos Estados, a
integridade territorial e a estabilidade dos governos constituídos legitimamente.
Presente em vários níveis, a corrupção pode ser definida, grosso modo, como todas as atitudes cujo
único objetivo é obter vantagem pessoal a qualquer custo, inclusive causando prejuízos à sociedade.
No que tange aos direitos humanos, a corrupção mais danosa é a praticada no exercício da função
pública, ou seja, nas atividades realizadas por um indivíduo em nome do Estado ou a serviço dele ou de
suas entidades, em qualquer de seus níveis hierárquicos. Essas ações lesam diretamente os cidadãos e
atentam contra seus direitos.
Existem meios de combate à corrupção? Certamente, e um deles é acabar com a impunidade, ou seja, é
premente punir quem pratica atos de corrupção. Há legislações internacionais, como a Convenção
Interamericana Contra a Corrupção (29 de março de 1996), que abordam os casos de corrupção e os
mecanismos de prevenção e punição.
Mas não podemos esquecer que toda a sociedade civil é responsável por combater e denunciar os atos
de corrupção.
Alexandre Tokitaka/Pulsar Imagens
Organizando ideias
Analise a história em quadrinhos a seguir e, depois, responda às perguntas.
5. Você já ouviu alguma piada ou frase que denote preconceito ou discriminação referente a
mulheres ou outros grupos? Exemplifique.
Discuta com os colegas o que cada um deve fazer para erradicar a corrupção.
Traga o resultado para a classe e, juntos, façam uma mesa-redonda sobre a corrupção e os meios
de resolvê-la.
Página 262
Debate interdisciplinar
Fome × Obesidade: efeito dos dois extremos no organismo
humano
A discrepância de renda entre países de diferentes partes do globo e as dificuldades de organização do
processo de distribuição de alimentos entre as populações, atreladas a aspectos específicos do cotidiano
das pessoas em sociedades distintas – como a cultura da ociosidade no Ocidente e os diferentes hábitos
alimentares relacionados às particularidades culturais de países da África, por exemplo –, fazem com
que surjam situações extremas, tanto relacionadas à fome quanto à obesidade, ao redor do mundo.
De maneira geral, a energia necessária para manter o organismo em perfeito funcionamento é obtida
por meio da ingestão dos nutrientes encontrados nos alimentos, como proteínas, carboidratos e
gorduras.
A respiração celular, na grande maioria dos seres vivos, é feita por meio do consumo de oxigênio pelo
corpo (a respiração aeróbica). Essa reação ocorre na mitocôndria da célula, na qual a glicose, na
presença do oxigênio, forma gás carbônico e água com liberação de energia.
As reações metabólicas precisam estar sempre balanceadas no organismo para que a energia necessária
à manutenção da vida seja suficiente, evitando a falta ou o acúmulo dela, o que pode gerar
consequências para o corpo humano.
Vagner Coelho
STRINGER/INDIA/Reuters/Latinstock
Primeiramente, o organismo recorre ao tecido adiposo e começa a “queimar gordura” para se manter
vivo. A pessoa inicia a perder peso. Após consumir toda a gordura do corpo, e se a condição de fome
persistir, o organismo começa a retirar energia dos músculos, transformando glicose, oxigênio, gás
carbônico, água, sais minerais e proteínas musculares em glicose. Nessa fase, ocorre perda de massa
muscular, e o indivíduo fica “pele e osso”.
Como a energia obtida é distribuída para todo o organismo, o cérebro também sofre consequências,
como a perda da capacidade de comandar o restante do corpo. Os sintomas nessa fase incluem
tonturas, enjoos, náuseas e dificuldade de raciocínio. Se nesse momento a pessoa não conseguir obter
nutrientes por meio da alimentação, restará ao organismo pouquíssima energia e ele passará a
economizá-la; então, os níveis de produção de substâncias fundamentais, como enzimas e hormônios,
começarão a cair. Finalmente, se o organismo usar toda a reserva e a fome persistir, ocorrerá o óbito.
Muitos são os malefícios da obesidade, dos quais podem ser destacados: doenças cardiovasculares,
diabetes, hipertensão arterial, colesterol alterado e problemas ortopédicos em razão do excesso de
peso sobre os ossos. Além das consequências biológicas, há as psicológicas, pois, frequentemente,
ocorre discriminação social, causando isolamento, depressão e perda de autoestima.
Peter Werner/Alamy/Latinstock
Atividade
1. Atualmente, a obesidade é considerada problema de saúde pública e, portanto, alvo de
discussões e projetos cujo objetivo é diminuir essas taxas, principalmente em crianças e
adolescentes, e incentivar a alimentação saudável nas escolas. Considerando o elevado número de
crianças e adolescentes obesos no país, busque informações sobre os principais riscos biológicos e
psicológicos causados pela obesidade nessa faixa etária.
Página 264
1. (UFF-RJ) “Uma valorização do eufemismo parece importante na dinâmica das relações sociais.
Seu emprego permitiria, em parte, contornar o valor negativo que certas expressões espelham. O
eufemismo, no entanto, não afronta o estigma. Seu uso indica uma relação de cortesia, necessária,
no curso das trocas sociais que se passam com aqueles que não podem se desfazer de suas marcas.
Observamos que este uso é generalizado entre diferentes grupos sociais – a mesma preocupação
pode levar a substituir o termocomunidade por outro equivalente, como morro ou bairro.
Sabemos todos que nas trocas sociais o mais importante é o sentido que se elabora no interior das
suas dinâmicas. O esforço continuado para não ferir as pessoas que acompanham as trocas sociais
correntes motiva o uso do termo comunidade em muitos momentos, inclusive por aqueles
diretamente concernidos – as pessoas que moram em favelas –, quando se referem a seus locais de
moradia. Empregado pela mídia, pelo governo, pelas associações locais, pelas ONGs, o termo
comunidade muitas vezes explicita a dificuldade dessa operação de levar em conta o que pensam
os que se veem nomeados de uma forma negativa.
Se este uso eufemístico é recorrente, vale observar que, em muitas circunstâncias, do ponto de
vista dos moradores, o que é mais reivindicado é a não identificação, ou seja, preferencialmente, a
anulação de qualquer referência à identidade territorial em trocas sociais diversas.
O termo ‘comunidade’ em seus usos eufemísticos não é capaz de impedir a associação da pessoa
com os traços negativos provenientes dessa identificação; somente indica a suspensão destes pelo
uso momentâneo de aspas que podem ser retiradas quando for preciso.”
BIRMAN, Patrícia. “Favela é comunidade?”. In: SILVA, L. A. (Org.). Vida sob cerco. Violência e rotina nas favelas do Rio de Janeiro.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008. p. 106-107. (Adaptado).
“Falar de favela é falar da História do Brasil desde a virada do século passado [século XIX]. É falar
particularmente da cidade do Rio de Janeiro na República, entrecortada por interesses e conflitos
regionais profundos. Pode-se dizer que as favelas tornaram-se uma marca da capital federal, em
decorrência (não intencional) das tentativas dos republicanos radicais e dos teóricos do
embranquecimento [...] para torná-la uma cidade europeia.”
ZALUAR, Alba; ALVITO, Marcos (Org.). Um século de favela. Rio de Janeiro: FGV, 1998. p. 7.
Tomando-se o texto de L. A. Silva e o de Alba Zaluar e Marcos Alvito como ponto de partida, é
possível afirmar que as favelas, na História do Brasil, em geral, e do Rio de Janeiro, em particular,
podem ser percebidas como:
b) espaços sociais cujas representações a seu respeito naturalizam uma visão dualista do espaço
urbano, tanto em 1950 como hoje em dia.
c) redutos exclusivos de nordestinos migrados do campo, na década de 1960 e na atualidade,
apenas como espaços do crime e das quadrilhas.
d) espaços exclusivos de afirmação da verdadeira cultura popular brasileira, nos inícios do século
XX e na atualidade.
2. (UFPR) “Tem muita gente boa aplaudindo Barack Obama porque ele proibiu a prática de torturas
contra presos. O suplício mais conhecido era a simulação de afogamento. Um pedaço dessa mesma
plateia emocionou-se com a valentia do Capitão Nascimento no filme Tropa de Elite e com o poder
de persuasão de seus sacos de plástico. É um novo tipo de esquizofrenia política. O sujeito é
Obama nos Estados Unidos e George Bush no Brasil.”
Responda no caderno
1. A esquizofrenia política a que o autor se refere é a atitude paradoxal de algumas pessoas que
apoiam Obama e o Capitão Nascimento ao mesmo tempo.
2. O Capitão Nascimento representa uma simbiose de Obama e George Bush, mas em lugares
diferentes.
4. No que se refere a respeitar os direitos humanos, o autor coloca Barack Obama e George Bush
em polos opostos.
• Morte e vida severina, de João Cabral de Melo Neto. Rio de Janeiro: Alfaguara Objetiva, 2007. Morte
e vida severina conta a história de um retirante nordestino que deixa a Paraíba e sai em busca de uma
vida melhor no litoral.
• O que é fome?, de Ricardo Abramovay. São Paulo: Brasiliense, 1991. Por meio do trabalho, o homem
é responsável por seu próprio sustento, produzindo, armazenando e distribuindo alimentos. Entretanto,
milhares de pessoas no mundo passam fome. Nesse livro, o autor explica o fenômeno e suas causas.
• Um dia de fúria, direção de Joel Schumacher. EUA/França/Reino Unido, 1992, 113 min. Quando
William Foster é demitido, sua frustração o leva a perder o controle e responder com violência a todas
as “injustiças” encontradas em seu caminho pela cidade.
• Núcleo de Estudos da Violência (NEV). Disponível em: <www.nevusp.org/portugues>. Acesso em: out.
2015. Com o propósito de apoiar pesquisas, o núcleo investiga as relações entre violência, democracia e
direitos humanos. Pesquisadores de diversas áreas examinam, no Brasil, a violação de direitos humanos
e a construção da democracia. O site dá acesso a publicações, mapas, vídeos e outros materiais sobre o
assunto.
Página 266
Grafite retrata uma comunidade sendo observada por uma mulher. Embora faltem oportunidades, transborda solidariedade.
São Paulo (SP), 2012.
Na prática, a simples existência dos direitos expressos em tratados ou constituições das nações não é
suficiente – é preciso que as pessoas possam exercê-los em todos os lugares do planeta. Para tanto, faz-
se necessário que os Estados não só os garantam em suas leis, mas ofereçam condições sociais,
econômicas e políticas que possibilitem a todos os cidadãos o exercício pleno da cidadania e,
consequentemente, de seus direitos. Para que esses direitos sejam efetivados, é imprescindível a
participação dos Estados e dos cidadãos. Se todos os conhecerem e, principalmente, interessarem-se
por eles, não ficarão alheios às injustiças ou a outras ações que desrespeitam os direitos em sua
essência – nem à mercê delas.
É preciso que as pessoas percebam que a ofensa ao direito de qualquer pessoa que não for
imediatamente punida ou corrigida enfraquece todo o conjunto de regras de direito. Isso porque se
cria a impressão de que os que forem suficientemente fortes ou malandros para fugir à punição
não precisam respeitar as regras. No final das contas, os próprios arbitrários acabam prejudicados,
pois chegará um momento em que seus direitos também não serão respeitados e eles não poderão
reagir para ajudá-los, porque todos estarão acostumados a ver o direito desrespeitado.
Assim, portanto, não é necessário que uma pessoa sofra um prejuízo imediato, atingindo sua
integridade física ou moral ou seu patrimônio, para que seu direito tenha sido ofendido. A
imposição de leis injustas e as ações arbitrárias ferem os direitos de todos e de cada um. Para que
isso não ocorra, ou pelo menos se reduza ao mínimo, é indispensável que todas as pessoas
procurem conhecer seus direitos e exijam sempre que eles sejam respeitados.
DALLARI, Dalmo de Abreu. O que são direitos da pessoa. São Paulo: Brasiliense, 1985. p. 60.
Dessa perspectiva, o papel de cada um – respeitar, defender e exigir o cumprimento das leis – é
essencial para que as teorias e aspirações relativas aos direitos humanos sejam concretizadas
indiscriminadamente.
A atuação da ONU
Os direitos são, a princípio, protegidos pelos Estados. Além disso, há uma proteção mais ampla, de
âmbito internacional, representada pela Organização das Nações Unidas (ONU). A principal meta da
ONU é buscar a cooperação internacional para o desenvolvimento e fortalecimento do respeito aos
direitos humanos e às liberdades fundamentais de todos, sem nenhum tipo de distinção – étnica,
linguística, sexual ou religiosa. Essa organização é regida e orientada pelo Estatuto das Nações Unidas.
Todos os países-membros da ONU devem cumprir o estatuto – que tem força de lei internacional –,
sobretudo em relação à promoção do respeito e à observância dos direitos humanos. Por isso, é comum
nos depararmos, nos noticiários, com ações impetradas pela ONU de ajuda humanitária a vítimas de
catástrofes naturais ou em áreas de conflito. Portanto, há proteção internacional aos direitos humanos.
MIKE SEGAR/Reuters/Latinstock
Membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas em reunião sobre mulheres, paz e segurança. Nova York, Estados Unidos,
2015.
Mas, com tanto aparato de proteção e controle, por que os direitos ainda são violados e ignorados por
muitos paí ses e pessoas em várias partes do mundo? Para responder a essa questão, é preciso
considerar que nem todos os países fazem parte da ONU e muitos resistem à interferência internacional
em seu território. Outro ponto diz respeito ao próprio estatuto da ONU,
Página 269
que não permite a intervenção em questões internas essenciais de nenhum Estado, o que, de certa
forma, limita as ações da entidade, mas assegura a soberania dos países. É um assunto polêmico e
complexo, que suscita diferentes interpretações.
Entre as deliberações da ONU está a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), escrita para
servir de norma a todos os povos de todas as nações, com o objetivo de ser uma orientação única sobre
os direitos inalienáveis. Ela é o documento de caráter universal mais aceito para orientar a conduta de
todos, tanto que partes dele são citadas nas constituições de vários países, em tratados regionais e em
outros documentos internacionais. A Declaração é um parâmetro a ser seguido, mas não é uma lei;
portanto, não é obrigatório cumpri-la. Outros pactos, declarações e tratados a têm confirmado e
complementado, atendendo a algumas especificidades, como os direitos das crianças e das mulheres,
entre outros.
Em dezembro de 1966, foram aprovadas outras duas seções complementares da Lei Internacional dos
Direitos Humanos – da qual a Declaração faz parte –, compostas de pactos internacionais. Uma é
relativa aos direitos econômicos, sociais e culturais, e outra, aos direitos civis e políticos. Apesar disso,
só entraram em vigor em 1976, após sua validação pelos Estados-membros.
Os tratados internacionais são a base da Lei Internacional dos Direitos Humanos. Mas há outros
instrumentos, como declarações e princípios, adotados em âmbito internacional, que auxiliam na
compreensão e no desenvolvimento desses direitos fundamentais. Para que se efetive o respeito aos
direitos humanos, são necessárias leis, tanto nacionais quanto internacionais.
Além desses instrumentos, há muitos outros com o status legal de declarações, princípios, regras ou
recomendações, que não são necessariamente obrigatórios, mas têm força moral e conduzem os
Estados em suas deliberações locais. Seu cumprimento só é obrigatório aos países que os ratificam.
Glossário
Ratificar: confirmar, validar.
Organizando ideias
Em 2008, houve a comemoração dos 60 anos da publicação da Declaração Universal dos Direitos
Humanos. Esse fato foi amplamente celebrado, pois a Declaração foi e continua sendo uma
referência moral ao desenvolvimento e fortalecimento dos direitos e às liberdades fundamentais
dos seres humanos, sem exceção.
Observe o cartaz criado pelo governo brasileiro para essa comemoração e faça o que se pede.
Divulgação
2. Elabore um pequeno texto que relate a importância desse documento para todos e descreva o
papel de cada cidadão na efetivação dos parâmetros descritos na Declaração.
Página 270
[...] A lei nº 8.069, de 1990, reuniu experiências da sociedade civil e botou no papel desafios que
deveriam ser as ambições de qualquer nação civilizada que pretenda tornar-se socialmente justa e
desenvolvida quando crescer. Um de seus artigos-chave estabelece que “é dever da família, da
comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a
efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer,
à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária” para todas as crianças (até 12 anos de idade) e adolescentes (até 18) – faixa etária em
que se encontra menos de um terço da população brasileira.
Não é preciso andar muito pelas cidades para encontrar trabalhando ou pedindo esmola jovens
que deveriam estar na escola ou brincando; ou que se sentem mais seguros expostos aos riscos da
vida nas ruas do que dentro de casa junto da família. São sintomas evidentes de que o ECA ainda é
uma criança frágil, que tem um longo caminho para atingir a maioridade e se tornar uma lei que
pegou.
A luta por direitos humanos no Brasil tem sido árdua. Para traçar um histórico deles no país, é preciso
retornar ao Período Colonial, no qual a maioria da população estava excluída dos direitos civis e
políticos. Por exemplo, os africanos escravizados não tinham acesso nem aos direitos mais elementares,
como à integridade física e, por vezes, à vida. A exclusão e a discriminação social também se estendiam
aos indígenas, aos homens livres pobres e às mulheres em geral.
Com a independência, em 1822, não houve mudanças significativas no panorama já descrito. Uma das
heranças coloniais foi a escravidão.
A partir desse momento, podemos traçar um panorama da trajetória dos direitos humanos com base no
estudo das constituições.
Em 1824, foi outorgada a Constituição Imperial, que prevaleceu até o fim da monarquia, em 1889. Esse
documento regulou os direitos políticos. Podiam votar os homens com mais de 25 anos que tivessem
renda mínima anual de 100 mil-réis. A lei permitia também o voto aos analfabetos. A exigência da renda
não era, de fato, diretamente excludente, pois a maioria da população trabalhadora ganhava mais do
que a renda exigida. Mas os escravos e as mulheres continuavam excluídos.
Coleção particular
Angelo Agostini. O país que não vê festejar o dia 7 de setembro senão pelo canhão e foguetório oficial. Litografia veiculada na
Revista Illustrada, 1881, 21,5 cm × 29 cm. O artista retrata dois grupos sem direitos no Brasil do século XIX: africanos e indígenas.
Contudo, em 1881, houve um retrocesso: a Câmara dos Deputados aprovou uma lei que, entre outras
questões, mudou a exigência de renda para 200 mil-réis, proibiu o voto aos analfabetos e instituiu o
voto facultativo. As regras para a comprovação de renda se tornaram mais rígidas, o que passou a
impedir de votar muitos
Página 271
que antes estavam aptos. Como o número de analfabetos era grande, a nova determinação excluía
cerca de 80% dos eleitores masculinos. Mulheres, soldados e membros de ordens religiosas também
não tinham direito ao voto. Todas essas proibições estavam em sintonia com a mentalidade do período.
Em 1889, com a Proclamação da República, o novo regime herdou os resquícios da escravidão – abolida
em 1888 –, a manutenção das grandes propriedades rurais e muitos vícios do sistema eleitoral, como as
constantes fraudes.
Os direitos civis não existiam na prática, apesar de estarem previstos na Constituição de 1891, a
primeira do regime republicano. O conceito de igualdade estava presente nas leis, mas não foram
oferecidas condições mínimas aos ex-escravos para uma vida digna. Não lhes foi garantido o acesso a
empregos, terra, moradia nem escola. Sem essas condições, muitos nem chegaram a sair das fazendas e
passaram a se sujeitar à baixa remuneração, vivendo em condições muito parecidas com as de antes da
abolição. Os que foram para os centros urbanos acabaram por engrossar a massa de trabalhadores sem
emprego fixo.
As consequências disso foram duradouras para a população negra. Até hoje essa população ocupa
posição inferior em todos os indicadores de qualidade de vida. É a parcela menos educada da
população, com os empregos menos qualificados, os menores salários, os piores índices de
ascensão social. Nem mesmo o objetivo dos defensores da razão nacional de formar uma
população homogênea, sem grandes diferenças sociais, foi atingido. A população negra teve que
enfrentar sozinha o desafio da ascensão social, e frequentemente precisou fazê-lo por rotas
originais, como o esporte, a música e a dança. [...]
A libertação dos escravos não trouxe consigo a igualdade efetiva. Essa igualdade era afirmada nas
leis, mas negada na prática. Ainda hoje, apesar das leis, aos privilégios e à arrogância de poucos
correspondem o desfavorecimento e a humilhação de muitos.
CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. p. 52 -53.
Essa Constituição instituiu o sufrágio direto para a eleição de deputados, se na do res, presidente e vice-
presidente da República. No entanto, permaneciam excluídos desse processo mendigos, analfabetos,
religiosos e mulheres. Foi abolida a exigência de renda.
Os poucos avanços legais desse pe río do para a garantia dos direitos foram a legitimação dos sindicatos
(1903 – sindicatos rurais; 1907 – sindicatos urbanos), a instituição do Código de Menores (1927), a
criação do fundo de aposentadoria e pensão dos ferroviários (1923) – que pode ser considerada a
primeira lei eficaz de assistência social – e a fundação do Instituto Previdenciário da União (1926).
Sob o comando de Getúlio Vargas (1930 -1945), o governo instituiu o Ministério do Trabalho, Indústria e
Comércio, além de uma vasta legislação trabalhista e previdenciária, que culminou com a criação da
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em 1943. Mas essa legislação social foi instaurada ao mesmo
tempo em que os direitos políticos e civis estavam bastante limitados. É importante salientar que a CLT
é fruto da luta da classe operária brasileira, que, no período da Primeira República, organizou-se em
sindicatos, fez greves, lutou pela jornada de trabalho de oito horas, pelo fim do trabalho infantil, enfim,
deu passos significativos para a construção de uma identidade trabalhista nacional. Não foi um presente
do governo.
A Constituição de 1934 incorporou a legislação já existente com relação aos direitos sociais,
estabelecendo normas de proteção ao trabalhador, como a proibição do trabalho a menores de 14 anos,
a instituição do repouso
Página 272
semanal remunerado, a limitação das horas de trabalho e a criação do salário mínimo (que vigorou a
partir de 1940). Ela também instituiu o voto secreto e a justiça eleitoral, além de validar o voto feminino,
já permitido pelo Código Eleitoral de 1932.
Já em 1937, começou o período chamado de Estado Novo, durante o qual Getúlio Vargas, como ditador,
outorgou a Constituição de 1937, que suspendia drasticamente a liberdade e os direitos de todos os
cidadãos.
Vargas deixou o poder em 1945 e, com o novo governo (Eurico Gaspar Dutra), o Brasil entrou em uma
fase democrática. A Constituição de 1946 restaurou os direitos e garantias individuais, manteve as
conquistas sociais e garantiu direitos políticos, civis e culturais.
Em 1964 foi instaurado o Regime Militar no Brasil. Duas constituições foram elaboradas nesse período –
a de 1964 e a de 1967 –, com o objetivo de legalizar a ditatura.
Por esses documentos, os direitos políticos e civis dos cidadãos foram cerceados. Era o fim da liberdade
de expressão, de reunião, de publicações, incluindo a restrição ao direito de greve.
No período da Ditadura Militar, o desrespeito aos direitos humanos intensificou-se a partir do Ato
Institucional número 5 (AI -5), em 1968, que ampliou o poder público, dando-lhe a prerrogativa de
confiscar bens, suspendeu o habeas corpus nos casos de crimes políticos contra a segurança nacional, a
ordem socioeconômica e a economia popular; enfim, legalizou as arbitrariedades do governo. Com o
endurecimento do regime, as torturas e os assassinatos políticos foram amplamente praticados em
nome da manutenção da lei e da ordem. A força
Arquivo/Estadão Conteúdo
Placa da Universidade de Brasília pichada por estudantes. Em 1966, os universitários, armados de pedaços de pau e ferro, atrás de
barricadas improvisadas, transformaram o campus em um “território livre” da ditadura.
Página 273
A partir de 1974, o Brasil entrou em um lento processo de abertura política e alguns direitos
ressurgiram. A revogação do AI -5, em 1978, o fim da censura prévia e o retorno de exilados políticos
representaram passos significativos em direção a alguns direitos cerceados pelo Regime Militar.
No governo do general Figueiredo, em 1979, foi aprovada a Lei da Anistia, abolido o bipartidarismo –
possibilitando a criação de novos partidos políticos – e permitida a eleição direta para governadores.
Fazendo um balanço geral dos governos militares, podemos concluir que os direitos sociais foram
ampliados, ao mesmo tempo em que foram cerceados duramente os direitos políticos e,
principalmente, os civis.
Esse documento ampliou os direitos de cidadania aos brasileiros, já que garantiu uma participação mais
ativa na sociedade e no governo. Além de assegurar os direitos historicamente conquistados e
ratificados por vários documentos internacionais, a Constituição ampliou o leque deles, dando aos
cidadãos direitos como apresentar projetos de lei, participar de plebiscitos ou referendos, propor ações
judiciais visando sobretudo à garantia dos direitos fundamentais, impetrar ações populares e mandados
de segurança para impedir o abuso de autoridades. Esses direitos de cidadania possibilitam que os
brasileiros participem mais ativamente da vida pública.
Portanto, em termos legais, os direitos no Brasil estão garantidos. Falta apenas todos se conscientizarem
deles para rei vin di cá-los e exigir seu cumprimento, sempre que necessário. Também é essencial a
garantia do Estado de que essa legislação inovadora realmente se efetive.
Apresentem o resultado em sala de aula. Para finalizar, pode ser feito um resumo ou um quadro
em que constem as constituições e suas referidas conquistas na área do Direito. Assim, será
possível uma análise dos direitos na trajetória constitucional.
Organizando ideias
1. Podemos dizer que a consciência sobre os direitos humanos aumentou no Brasil? Justifique.
3. A quem compete a afirmação e a execução dos direitos fundamentais ao ser humano (ao Estado,
aos cidadãos, às organizações etc.)? Explique o papel de cada um desses atores sociais nesse
processo.
4. Qual é o papel da educação na construção da consciência dos direitos humanos? 5. Relacione os
direitos humanos ao exercício da cidadania no Brasil.
Página 274
Para que realmente seja instituída uma ordem internacional, na qual prevaleçam os direitos humanos –
que garantem as liberdades individuais e a igualdade –, é necessária a observância da justiça, da lei, do
respeito, da autodeterminação dos povos, da tolerância e da paz. Vale reforçar que esses preceitos se
tornam realidade com mais facilidade em regimes democráticos.
E, nesses regimes, os cidadãos se organizam e promovem ações sociais individuais, coletivas ou por
meio de movimentos sociais em busca da efetivação dos direitos para todos.
No Brasil e em outros lugares do mundo são vários os movimentos que lutam para garantir a efetivação
de direitos a grupos historicamente excluídos ou discriminados. Essas mobilizações buscam dar
identidade a sujeitos sociais que têm necessidades específicas a serem contempladas. Nesse perfil se
encaixam os movimentos de gênero, etários, étnicos, de deficientes, enfim, todos os movimentos
inclusivos que buscam construir uma sociedade mais justa e igualitária.
Dos movimentos de gênero fazem parte as organizações feministas e anti-homofóbicas. Ambas têm
conseguido avanços significativos, como o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo (homoafetivo),
já regulamentado em vários países, e diversas conquistas femininas, como a Lei Maria da Penha, no
Brasil, relativa à punição da violência contra a mulher.
M. Stan Reaves/Demotix/Corbis/Latintock
Ativistas protestam contra o racismo e a islamofobia em Nova York, Estados Unidos, 2015.
Página 275
Com relação aos deficientes, suas muitas necessidades específicas precisam ser atendidas garantindo
acessibilidade e outras formas de inclusão na sociedade. Nesse quesito os avanços podem ser vistos
com as vagas reservadas a cadeirantes em estacionamentos, a inclusão de painéis em braile em
elevadores e em outros lugares, a presença de tradutores de programas em Libras (Linguagem Brasileira
de Sinais), entre outros.
A prática de inclusão social em todas as áreas (educação, trabalho, cultura, propriedade etc.) baseia-se
nos princípios da aceitação das diferenças individuais, da valorização de cada indivíduo, da convivência
com respeito à diversidade, da aprendizagem por meio da cooperação e da garantia de atendimento às
necessidades específicas.
Organizando ideias
1. Forme dupla com um colega e, juntos, analisem as imagens a seguir, associem-nas às discussões
mais recentes sobre os direitos humanos e escrevam a respeito delas. Apresentem o resultado na
sala de aula e conversem sobre o papel de cada um na garantia do respeito aos direitos de todos.
Nelson Antoine/Framephoto
Indígenas Guaranis e integrantes de movimentos sociais fazem protestos pela demarcação de terras indígenas em São Paulo (SP),
2013.
Notimex/Foto/Especial/Cor/Hum/Afp Photo
Ativistas protestam contra a homofobia no Dia Internacional contra a Homofobia na cidade de Yucatán, México, 2014.
Página 276
Área de convivência em escola pública mobiliada com materiais reciclados. Natal (RN), 2014.
Uma das grandes preocupações atuais diz respeito ao meio ambiente, assunto que interessa a toda a
humanidade, porque a destruição ambiental fere o princípio fundamental de direito à vida.
No que se refere à proteção ambiental, podemos contar hoje com um grande número de documentos
internacionais, a maioria deles específicos (sobre mares, oceanos, vida selvagem etc.), que tratam da
proteção da biosfera e da busca por soluções para as degradações ambientais.
Essas questões se referem diretamente à proteção das condições de saúde e à qualidade de vida.
Portanto, são urgentes e necessárias, suscitando soluções locais, nacionais e internacionais. Temas
como as mudanças climáticas já são considerados globais, por se tratar de um “bem comum da
humanidade”.
A defesa dos direitos humanos e a proteção ambiental compartilham, portanto, interesses. Entre eles
está a proteção aos grupos considerados vulneráveis, como os povos indígenas, as minorias étnicas,
religiosas e linguísticas, pessoas com deficiência etc. Essa proteção está prevista nas legislações
ambientais e de direitos que colocam o ser humano no centro das discussões sobre desenvolvimento
sustentável.
A expansão do corpo normativo internacional de direitos humanos e de meio ambiente tem sido
motivada pela necessidade de proteção diante de novas ameaças e de situações de não
observância ou violação dos direitos humanos e de deterioração do meio ambiente, que exigem
respostas ou reparação e regulamentação.
À abordagem global contemporânea dos direitos humanos e do meio ambiente, corresponde uma
proteção global ou integral. Os direitos à informação e à participação democrática são de extrema
importância nesse contexto, bem como a ideia elementar da solidariedade.
É decerto com base na solidariedade (mais do que na soberania) que os Estados – individualmente
tão vulneráveis – vão conter o armamento nuclear, combater a fome e a pobreza da maioria de sua
população, resistir a epidemias, recuperar-se dos desastres naturais e beneficiar-se com a
transferência de tecnologia e com as comunicações internacionais.
Ao menos, é difícil duvidar que os vínculos entre a proteção dos direitos humanos e a proteção do
meio ambiente não estejam claramente
Página 277
definidos hoje. Trata-se de dois grandes desafios do nosso tempo e de um interesse legítimo
comum a toda a humanidade. [...]
TRINDADE, Antonio Augusto Cançado. Os direitos humanos e o meio ambiente. In: SYMONIDES, Janusz (Org.). Direitos humanos:
novas dimensões e desafios. Brasília: Unesco Brasil; Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2003. p. 198 -200.
Nessa árdua luta de proteção, estão envolvidos diversos atores sociais, como grupos, associações,
ONGs, formadores de opinião, cientistas, governos, instituições internacionais, pois esses dois grandes
desafios contemporâneos – proteção aos direitos e ao meio ambiente – exigem participação coletiva.
É hora de pensar: O que posso fazer hoje para assegurar a existência da humanidade em um ambiente
adequado? E a resposta é: múltiplas e pequenas ações, que vão desde o fechamento de uma torneira
para economizar água potável até soluções para o desmatamento e o aquecimento global, entre outras.
Vista áerea de plantação de mudas de árvores típicas da Mata Atlântica para reflorestamento em área rural. Rio de Janeiro (RJ),
2014.
Página 278
A concretização e a defesa dos direitos ocorrem de maneira mais significativa nos Estados democráticos.
Direitos humanos e democracia são indissociáveis.
Nos Estados onde vigoram regimes ditatoriais, autoritários ou despóticos, são mais comuns as violações
aos direitos inerentes ao ser humano.
Gustau Nacarino/Reuters/Latinstock
Voluntários da Anistia Internacional colocam centenas de barcos de papel com o escrito “SOS Europa” e mostram cartazes com os
dizeres “Não há mais mortes no mar”, “Salvar vidas”, “Mortes no Mediterrâneo até quando?” em Barcelona, Espanha, 2015.
[...] Constitui ideia central da democracia o governo ou o controle popular sobre a tomada de
decisões coletivas. A democracia tem por ponto de partida o cidadão, não as instituições
governamentais. Rezam seus princípios definidores que todos os cidadãos têm o direito de opinar
sobre os assuntos públicos, tanto por meio das associações da sociedade civil quanto pela
participação no governo; e que esse direito deve ser igualmente acessível a todos. O controle dos
assuntos coletivos pelos cidadãos e a igualdade entre estes no exercício desse controle são os
princípios democráticos fundamentais. O controle pode ser exercido diretamente nas sociedades
ou associações pequenas e simples, mediante a participação nas decisões coletivas, ao passo que
só pode ser indireto naquelas que são grandes e complexas: por meio do direito de candidatar-se a
cargos públicos, eleger representantes em sufrágio universal, fiscalizar o governo e aprovar
diretamente os termos de qualquer mudança constitucional. [...]
No coração da democracia, repousa, assim, o direito do cidadão de opinar nos assuntos públicos e
de exercer controle sobre o governo, em pé de igualdade com os demais. Para que esse direito seja
efetivo, importa, por um lado, que existam as instituições políticas familiares à experiência das
democracias já consolidadas (eleições, partidos, legislaturas, e assim por diante). Por outro lado, é
necessária a garantia dos direitos humanos rotulados de civis e políticos e inscritos em acordos
internacionais, como no Pacto dos Direitos Civis e Políticos e na Convenção Europeia para a
Proteção dos Direitos do Homem.
As questões relativas aos direitos humanos envolvem inúmeras variáveis de cunho político – a existência
ou não de democracia –, além de outras, como a soberania e os fatores culturais.
E como serão respondidas essas questões no futuro? Todos os obstáculos relativos à efetivação dos
direitos devem ser considerados e solucionados, como a miséria, as guerras, a intolerância,
Página 279
A educação em direitos humanos é o meio pelo qual se pode desenvolver uma cultura desses direitos,
na qual os grupamentos possam resolver conflitos de maneira pacífica.
Processo de longo prazo, o estabelecimento dessa cultura pressupõe a participação da sociedade civil.
Só por meio de uma cultura fundamentada nos direitos humanos será possível promover relações
amigáveis entre as diferentes comunidades mundiais, bem como o entendimento e a tolerância entre os
povos, como atributos essenciais para a conquista da paz.
A paz – não entendida aqui como ausência de conflito entre os seres humanos, e sim como estado de
bem-estar compartilhado – é assunto recorrente nas discussões sobre os direitos humanos, pois a
ausência deles é uma permanente ameaça a ela.
Portanto, a observância e o respeito aos direitos humanos não são necessariamente um estado de paz,
mas a ausência de paz ameaça os direitos humanos. Assim, ambos os valores (paz e direito) devem ser
observados quando se almeja uma sociedade mais justa e igualitária, na qual todos possam ter um
padrão de vida adequado à dignidade humana.
Organizando ideias
No filme O Grande Ditador, produzido, dirigido e estrelado por Charles Chaplin em 1940, é feita
uma crítica ao autoritarismo, que, entre outras características, é marcado pelo desrespeito aos
direitos humanos. Leia a seguir o discurso de encerramento do filme e responda às questões.
Todos nós desejamos ajudar uns aos outros. Os seres humanos são assim. Desejamos viver para a
felicidade do próximo – não para o seu infortúnio. Por que havemos de odiar e desprezar uns aos
outros? Neste mundo há espaço para todos. A terra, que é boa e rica, pode prover a todas as
nossas necessidades.
O caminho da vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém nos extraviamos. A cobiça
envenenou a alma dos homens, levantou no mundo as muralhas do ódio e tem-nos feito marchar a
passo de ganso para a miséria e os morticínios. Criamos a época da velocidade, mas nos sentimos
enclausurados dentro dela. A máquina, que produz abundância, tem-nos deixado em penúria.
Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos [...]. Pensamos em demasia e sentimos bem pouco.
Mais do que de máquinas, precisamos de humanidade. Mais do que de inteligência, precisamos de
afeição e doçura. Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido.
[...]
Vós, o povo, tendes o poder – o poder de criar máquinas. O poder de criar felicidade! Vós, o povo,
tendes o poder de tornar esta vida livre e bela... de fazê-la uma aventura maravilhosa. Portanto –
em nome da democracia – usemos desse poder, unamo-nos todos nós. Lutemos por um mundo
novo... um mundo bom que a todos assegure o ensejo de trabalho, que dê futuro à mocidade e
segurança à velhice.
[...]
Lutemos agora para libertar o mundo, abater as fronteiras nacionais, dar fim à ganância, ao ódio e
à prepotência.
CHAPLIN, Charles. O grande ditador. apud SIMÕES JR., José Geraldo. O pensamento vivo de Charles Chaplin. São Paulo: Martin
Claret, 1984. p. 13-15.
Resgate cultural
Em grande parte das sociedades, nascer mulher implica viver desafios específicos de sua condição
no exercício pleno de direitos. No Brasil há enormes desafios, como a baixa participação política, as
oportunidades desiguais no mercado de trabalho, o machismo nas relações familiares e a violência
física, vivida, em sua maioria, em ambiente doméstico.
A luta das mulheres por igualdade de direitos conta com marcos importantes, como o direito ao
voto, em 1932, e a equiparação total de direitos com os homens, na Constituição Federal de 1988.
Os enormes avanços alcançados pela sociedade brasileira quanto aos direitos das mulheres
estabelecidos em lei não se refletiram, como esperado, na diminuição da violência contra elas. Em
2006, a Lei Maria da Penha entrou em vigor alterando a possibilidade de seus agressores,
principalmente em ambiente doméstico, obterem penas alternativas para seus crimes. A Lei Maria
da Penha também é considerada um marco na luta das mulheres por igualdade de direitos, já que
transforma a percepção social do papel das mulheres.
Christiane S. Messias
Fontes: WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da violência 2015: homicídio de mulheres no Brasil. Disponível em: <www.mapadaviolencia.org.br/pdf2015/MapaViolencia_2015_mulheres.pdf>.
Acesso em: fev. 2016; Estatísticas de Gênero: uma análise dos resultados do Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2014.
Página 281
Os casais homossexuais, além da discriminação, viviam em uma grande instabilidade jurídica: como
não eram reconhecidos como um núcleo familiar, não tinham os mesmos direitos dos casais
heterossexuais. Foram inúmeras as situações em que, após muitos anos de vida conjugal e da
construção de um patrimônio comum, com a morte de um dos cônjuges, o outro perdia sua
residência e demais bens. Além disso, não tinha direito de requerer pensão nem de receber outros
auxílios reservados aos cônjuges heterossexuais.
Christiane S. Messias
A violência contra homossexuais e transexuais, no entanto, ainda não conta com legislação
específica, sendo sua condução jurídica estabelecida, em muitos casos, como crime de ódio. Desde
2006, tramita pelo Congresso brasileiro um projeto de lei que criminaliza a homofobia e a
transfobia.
1. Qual é o papel das leis na conquista de direitos humanos? Justifique sua resposta com exemplos
relacionados às questões de gênero.
Página 282
Debate interdisciplinar
ONGs e os direitos humanos
As organizações não governamentais (ONGs) são entidades sem fins lucrativos que constituem uma
poderosa ferramenta de mobilização social. Surgiram no Brasil na década de 1970 – sob grande
influência de Paulo Freire –, como alternativa à crise do Estado na promoção do bem-estar social. Elas
representam uma opção às demandas da população relacionadas a questões econômicas, ambientais,
raciais e até mesmo reivindicações de melhorias nas condições de vida e fiscalização do poder público.
Paulo Freire foi um filósofo e educador brasileiro. Influenciou o movimento “pedagogia crítica”,
fundamentado em preceitos marxistas, que propõe uma forma de educação pautada em um processo
contínuo composto de cinco etapas: “desaprender, aprender, reaprender, refletir e avaliar”, com o
objetivo de formar cidadãos mais críticos e cientes dos processos democráticos.
Alunos participam de um concurso de pintura organizado por uma ONG no Dia Internacional de Pessoas com Deficiência, em
Noida, Índia, 2015.
O termo ONG nasceu após a Segunda Guerra Mundial para denominar organizações supranacionais e
nacionais estabelecidas por acordos governamentais. Somente após a redemocratização da sociedade
brasileira, na década de 1990, surgiram as principais organizações não governamentais do país, com a
proposta de romper com o assistencialismo ligado a partidos políticos ou entidades religiosas.
STELZER, Joana. União Europeia e supranacionalidade: desafio ou realidade? 2. ed. Curitiba: Juruá, 2004. p. 67-68.
A ONG é uma forma de organização que cumpre um importante papel na democracia brasileira, pois
está intimamente ligada às necessidades da população. Empenha-se em atividades e localidades não
alcançadas pelo estado de direito e bem-estar social ou nas quais ele não cumpre suas funções com
excelência.
As ONGs são criadas e dirigidas por membros da sociedade civil. Em muitos casos, para que possam
fazer um trabalho de qualidade, elas estabelecem parcerias com o próprio Estado, que pode ter o
dinheiro, mas não a mão de obra, o conhecimento ou mesmo a infraestrutura para desempenhar
determinadas atividades. Elas podem também fazer parcerias com instituições privadas. Ao se engajar
em projetos sociais, uma empresa consegue abatimento de impostos, uma vez que o Estado
compreende que ela pode proporcionar à sociedade brasileira um bem maior do que o pagamento de
tributos à União.
As organizações não governamentais são uma forma de atender com rapidez às demandas sociais.
Sempre que fazem parceria com órgãos públicos, estão sujeitas à prestação de contas ao Tribunal de
Contas da União.
São instituições que trabalham para garantir o pleno exercício da cidadania de forma democrática.
Quando a sociedade civil se organiza e coloca
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em prática projetos que atendem às diversas carências da população, os muitos benefícios superam o
assistencialismo. O melhor deles é o exercício da cidadania, pois o maior ganho social é que o povo saiba
exigir o cumprimento de seus direitos.
Sem dúvida, a luta pelos direitos humanos é uma tarefa difícil, mas é obrigação de todos vigiar e
verificar seu cumprimento e, no caso de não serem respeitados, denunciar aos órgãos competentes. As
ONGs se encaixam nesse papel como alternativa de organização civil, mas há outras, como as fundações
e as entidades beneficentes.
Sempre que nos envolvemos com o cuidado e a preservação do bem-estar social, tornamo-nos
politicamente mais fortes e conhecedores de nossos direitos. Essa conscientização facilita a
reivindicação e cobrança aos governantes de condições dignas para todos, reforçando, com nossas
ações, a jovem democracia brasileira, em um processo que é fortalecido pela atuação das ONGs.
Anderson Nascimento/FramePhoto
Pacientes internados em hospital recebem visita de ONG. Durante a visita, palhaços cantam e tocam paródias de carnaval.
Pernambuco, 2016.
Atividade
A organização da sociedade civil é essencial para fiscalizar o trabalho do governo e cobrar ações
práticas relacionadas à qualidade de vida e aos direitos básicos dos cidadãos, tarefa que pode ser
facilitada pelo trabalho das ONGs.
1. Pesquise se há alguma ONG em sua localidade, de que modo ela trabalha e qual é sua
contribuição para a sociedade; depois apresente suas descobertas aos colegas.
Página 284
1. (Unir-RO) Sobre a Organização das Nações Unidas (ONU) e seu símbolo, analise as afirmativas.
I. Surgiu no fim da Segunda Guerra Mundial e sua sede fica em Nova Iorque.
III. Possui várias agências que atuam em vários setores como o PNUD, a FAO entre outros.
IV. O símbolo da ONU é uma projeção conforme que distorce a forma, mas mantém o tamanho real
dos países.
b) I e IV, apenas.
c) I, II e III, apenas.
b) o direito de voto foi assegurado a todos os brasileiros e brasileiras com idade a partir dos 16
anos desde que alfabetizados.
c) os direitos foram amplamente assegurados, sendo a prática de racismo classificada como crime
inafiançável.
d) o direito de o poder público intervir nos sindicatos foi assegurado, aumentando o controle do
Estado sobre os trabalhadores.
e) o direito à informação ampliou-se, ainda que o governo possa impor censura prévia à imprensa.
c) ( ) na constituição republicana de 1891 o presidente, chefe do poder executivo, era eleito pelo
voto censitário.
e) ( ) a Carta de 1891 criou a Guarda Nacional formada pelos proprietários rurais e seus agregados.
Assinale:
5. (Unirio-RJ) A ideia de desenvolvimento sustentável tem sido cada vez mais discutida junto às
questões que se referem ao crescimento econômico. De acordo com este conceito considera-se
que:
Página 285
Responda no caderno
a) o meio ambiente é fundamental para a vida humana e, portanto, deve ser intocável.
b) os países subdesenvolvidos são os únicos que praticam esta ideia, pois, por sua baixa
industrialização, preservam melhor o seu meio ambiente do que os países ricos.
d) deve-se buscar uma forma de progresso socioeconômico que não comprometa o meio ambiente
sem que, com isso, deixemos de utilizar os recursos nele disponíveis.
e) são as riquezas acumuladas nos países ricos, em prejuízo das antigas colônias durante a
expansão colonial, que devem, hoje, sustentar o crescimento econômico dos povos.
• Dez vezes venceremos, direção de Cristian Jure. Argentina, 2011, 75 min. Depois de sete anos de
prisão e exílio na Argentina, o filho do líder de uma comunidade mapuche, do sul do Chile, retorna à
terra natal para auxiliar os indígenas a divulgar sua luta por meio de rádio pirata.
• Unicef Brasil. Disponível em: <www.unicef.org.br>. Acesso em: 4 dez. 2015. No site do Unicef Brasil é
possível conhecer os projetos da instituição, saber como colaborar com eles e ter acesso às principais
notícias sobre suas atividades.
• Conectas Direitos Humanos. Disponível em: <www.conectas.org>. Acesso em: 13 fev. 2013. Conectas
é uma organização internacional que promove a efetivação dos direitos humanos e do Estado
Democrático de Direito nos países localizados no Hemisfério Sul. No site é possível conhecer a
organização, aprender direitos humanos e acompanhar notícias e publicações on-line.
• Movimento Nacional de Direitos Humanos. Disponível em: <www.mndh.org.br>. Acesso em: 4 dez.
2015. O Movimento Nacional de Direitos Humanos tem por objetivo lutar pela vida e contra a violência,
promovendo os direitos humanos por meio de projetos voltados à mídia e à sociedade em geral, além
de atuar em órgãos públicos nacionais e internacionais.
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