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TRABALHOS MAÇÔNICOS

O NÚMERO CINCO
Por Leonardi Santos de Abreu

Nenhum símbolo é tão importante e significante para tantas culturas, povos,


religiões e filosofias diferentes quanto o número cinco. A raça humana, desde os
primórdios, mantém uma relação de estrita familiaridade com esse número,
principalmente por ser parte constante de nossa anatomia. Não por coincidência, a
Maçonaria guarda íntima relação com o número cinco, estando associado ao grau de
Comp⸫ M⸫ tanto simbólica quanto elementarmente.

As primeiras impressões sobre o número cinco e sua simbologia remontam


culturas antigas e milenares como é o caso da Grécia, onde há mais de 2.300 anos, os
membros da escola peripatética relacionavam a existência da matéria a 5 elementos
fundamentais, em sendo o ar, o fogo, a água, a terra e o éter – que para Aristóteles, este
quinto elemento (ou quinta essência natural) consistia em uma substância etérea, que
compunha os corpos celestes e os impedia de cair do firmamento. Semelhante
entendimento extrai-se do budismo, que trata a natureza como sendo composta por 5
elementos primordiais: água, fogo, ar, terra e vazio. Assim como os gregos, os indianos
acreditavam em uma quinta essência, responsável pela formação dos corpos celestes. E
iam além, pois ao contrário da acepção de ausência absoluta de substância, o vazio
compreendia a inércia necessária à formação de todas as coisas, constituindo-se na
energia espiritual inextinguível, inexpugnável, pura, passiva e originária, que compõe
tudo o que existe.

A filosofia japonesa trata de 5 elementos primordiais na natureza, e a exemplo do


budismo, identifica “o vazio” (sora) como sendo a energia pura, classificando-a também
como éter1 (de natureza etérea). O vazio representa “o espirito das coisas”, bem como “o
pensamento”, “a energia criativa” e “a capacidade de comunicação”, mas também
caracteriza a energia invisível (vazia) responsável pela existência de todos os seres, cuja
função é a de criar e sustentar a vida. Nas artes marciais japonesas, os guerreiros mais
experientes e evoluídos usam o ki (energia quintessencial, espiritual) como forma de

1 Fluído cósmico condutor da luz e do calor através do espaço.


potencializar os resultados de sua arte, dominando assim não só o corpo e as coisas
materiais, mas a mente e o espírito. Tal definição guarda íntima relação com a Ayurveda2,
terapia milenar hindu que atua principalmente sobre as energias, canalizadas e
transmitidas pelo corpo humano através dos chakras, que são pontos de absorção e
administração das energias do duplo etérico3. No hinduísmo, o quinto chakra
(Vishuddha) situado no pescoço, especificamente na base da região laríngea, é
responsável pela comunicação, pela expressividade e pela concretização de resultados.
Também representa o éter, enquanto quinto elemento da matéria (akasha).
Os egípcios, por sua vez, acreditavam que a alma era formado por 5 partes: ren
(nome), ba (alma), ka (duplo etérico), sheut (sombra) e ib (coração).

Para outra cultura igualmente milenar, o judaísmo também tem o número cinco
(hamisha – ‫ )ח ֲִמשָׁ ה‬cercado de significados e mistérios. No alfabeto hebraico, a quinta
letra ‫( ה‬he), é, em relação à sua posição no alfabeto, a primeira consoante do
impronunciável nome sagrado de Yehovah (‫)יהוה‬. No judaísmo, há 5 livros sagrados
escritos por Moshe (Moisés), que são: Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e
Deuteronômios4. Yehovah legou aos homens 10 mandamentos, inscrevendo-os em duas
tábuas de pedra, cada qual com cinco instruções distintas, lançando as bases para a Lei
Mosaica. Todas as medidas do Templo de Salomão eram múltiplas de 5, e realizadas em
“côvados reais” – sistema de medição do antigo Egito em que 1 côvado real equivalia a
50 centímetros atuais – e desta forma o 5 é associado à arquitetura sagrada. Uma das mais
importantes simbologias para o número 5 na cultura judaica extrai-se também da Torá, e
marca alguns aspectos da criação. No Livro da Criação (Gênesis), por exemplo, em seu
capítulo primeiro, versículo 9, podemos ler que Yehovah e as demais entidades imbuídas
da criação, “construíram” o Éden com um rio principal, de onde saiam quatro braços, em
sendo o primeiro o rio Pisom, o Giom era o segundo, e os rios Tigre e Eufrates, os outros.

Contudo é no processo de criação do homem, no Livro da Criação entre os


versículos 6 e 8, que se distinguem os elementos compartilhados por grande parte das
culturas antigas. Insere o versículo 6 em diante, com meus destaques, que uma neblina5

2 Ayurveda, em sânscrito, significa “Ciência da Vida”.


3 Também chamado de Corpo Sutil; cópia energética do corpo físico, conectando-o ao espírito; perispírito.
4 Conhecidos como o Pentateuco, que significa “cinco rolos”, em hebraico.
5 Resultado da condensação da água, após o processo de evaporação provocado pelo calor (interação dos
elementos água + fogo)
subia da terra, e regava toda a superfície do solo. Então formou o Senhor Deus ao
homem do pó da terra, e lhe soprou nas narinas o fôlego da vida, e o homem passou a
ser alma vivente. Assim, observa-se que já no início do primeiro livro do Pentateuco,
Moshe descreve os cinco elementos primordiais no processo mítico de criação do
homem, estando presentes a água, o ar, o fogo (na composição da neblina) e a terra
expressos no texto, enquanto a anima, o espírito ou a energia quintessencial, jaz
simbolizada pelo fôlego da vida. Em sendo o homem, imagem e semelhança de Deus e
dos seus iguais, seria Deus não só formado pela quintessência que anima todos os seres,
como também, fonte inesgotável dessa energia primordial, com a qual elaborou a Terra
e os planos celestes.

Na Kabbalah6, a quinta sephirot7 é Guevurah (ou Gueburah) e está disposta na


metade do Pilar da Severidade da Árvore da Vida. Simboliza a Força e é representada no
alfabeto hebraico pela 5ª letra ‫( ה‬he), que expressa a “força divina”.

Para os alquimistas, a “quinta essência” era o elemento primordial e originário de


onde derivariam os demais elementos. Sua obtenção e manipulação eram necessárias
para o conseguimento da Pedra Filosofal8. Esotericamente, além do 5 estar associado ao
éter, à quintessência – como sendo o hálito divino que anima todos os seres viventes
(espírito), é considerado como a representação do homem simbolizado pelo pentagrama
(estrela de cinco pontas), que dentre muitos significados, aduz à prevalência do espírito
(quintessência) sobre a matéria (demais elementos), pois se formaria de “Quatro
(elementos) pela adição de Um” (dominante – o espírito). O pentagrama, um dos mais
antigos talismãs de proteção espiritual, também significa força, evolução, liberdade,
movimento.

Todos os grandes marcos temporais são classificados por múltiplos de 5:


quinquênio, década, século, milênio. Existem 5 reinos naturais: monera, protista, fungi,
plantae e animal. Possuímos 5 sentidos corpóreos: visão, olfato, audição, paladar e tato.

6 Vertente mística do judaísmo.


7 Significa “números” em hebraico. As Sephirot são as potências pelas quais Ein Sof manifestou sua
Vontade na criação do universo visível. Por sua vez, Ein Sof é o nome cabalístico de Deus enquanto deidade
criadora dos mundos e de si mesma, antes da autodeterminação em “Eu Sou”, pautando a singularidade
existencial na manifestação durante o processo de formação de tudo o que existe.
8 Elemento responsável pela transmutação de qualquer metal inferior em ouro puro. Seu significado
esotérico denota “elevação do espirito e da consciência”.
Conforme visto acima, há, pela filosofia clássica e por diversas culturas, 5 elementos da
matéria: água, terra, fogo, ar e éter. A ciência moderna identifica 5 forças da natureza:
Força Nuclear Fraca, Força Nuclear Forte, Gravidade, Eletromagnetismo e Interação de
Múons (teoria incipiente).

Uma das representações clássicas do número 5 importa ao Grau de Comp⸫ M⸫ e


à Maçonaria, lato sensu. A comunicação e a arte da retórica, representados por este
número e simbolizados também pelo pentagrama simples, são instruções que devem ser
apreendidas e praticadas pelo aspirante ao Grau de M⸫ pois é através da palavra falada
e das demais Artes Liberais, que o Companheiro irá aperfeiçoar-se nas Artes Reales,
refinando o desbaste de sua Pedra Cúbica. O pentagrama simples simboliza o homem
não iniciado, que não pode retirar do depositório etéreo a energia necessária para alcançar
a iluminação e a perfeição através do áureo ofício.

São 5 as viagens pelas quais o então Apr⸫ M⸫ será examinado, no que cerne ao
manuseio dos instrumentos a serem utilizados em seu labor no 2º Grau, aperfeiçoando a
prática no lapidar de sua Pedra Cúbica e na nova fase de sua carreira maçônica,
demonstrando, desta forma, o bom uso das faculdades da alma no exercício das suas
funções. Cinco são as faculdades da alma que ensejarão constante avaliação do Comp⸫
M⸫ pelos MM⸫ da oficina, a fim de observarem no aspirante, o exercício das Virtudes
por meio de sua busca e conhecimento da Verdade: o Pensamento, a Consciência, a
Inteligência, a Vontade e o Livre Arbítrio. Os degraus simbólicos que devem ser galgados
pelo Comp⸫ M⸫ para chegar-se ao Trono do Prim⸫ Vig⸫ são no total de 5, e
correspondem aos elementos da natureza bem como as experiências das provas
iniciáticas, sendo representadas por cores. A (1) primeira é o preto, representando o
elemento terra; a (2) segunda é azul, representando o elemento ar; a (3) terceira é a
branca, e representa a água; a (4) quarta é vermelha e corresponde ao fogo; por fim, a (5)
quinta é a incolor, policrômica ou prismática, representando o quinto elemento da matéria
– a quintessência.

Assim como no hinduísmo, o número 5 representa a comunicação, a


expressividade e a arte de falar, que devem ser estudadas e praticadas pelo Comp⸫ M⸫
àquilo que vaticinam as artes do Trivium. No entanto, em análise à simbologia histórico-
esotérica que encerra os mistérios do “cinco” na filosofia maçônica, e considerando a
relação das referências bíblicas, históricas, científicas, filosóficas e dos signos impressos
em sua iconografia, poderíamos associá-lo à arquitetura sagrada do Templo de Salomão;
ao éter, enquanto quinta parte a complementar os elementos presentes na formação do(s)
universo(s) e do(s) plano(s) físico(s); a representação mística do pentagrama enquanto
símbolo do homem e do Comp⸫ M⸫ – seja como profano, seja como iniciado porquanto
um mero aspirante aos segredos da vida e da existência, ou como ser iluminado pela
autoconsciência adquirida pela busca da Verdade Real. Mais do que isto, o 5 representa
algo ainda mais profundo, complexo, completo: a unidade cercada pela dualidade
existencial. É a essência do Princípio Criador no espírito humano; a quintessência, a
energia primitiva, pura, inexpugnável, inextinguível e universal, que compõe o homem
não só como um reflexo da Criação divina, mas, quintessencialmente, como imagem e
semelhança do próprio Criador, e portanto, a representação energética e infinitesimal de
Ein Sof. O número 5 representa maçonicamente o homem, mas enquanto partícula do
espírito de Deus antes de ser deus, o espelho de Demiurgo antes de reduzir-se a Verbo –
a essência do Ser antes do Eu Sou.

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