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DA PSICOLOGIA DA MODA: UM
ESTUDO SOCIOLÓGICO
Gustavo Cruz

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SIMMEL, George. A MODA.


lior zalis

03 IARA Simmel versao final


Marina Magalhães

Reflexos de uma sociedade: a indument ária como difusor cult ural na sociedade francesa pré-revoluci…
Lucas Sant os Rosa
DA PSICOLOGIA DA MODA: UM ESTUDO SOCIOLÓGICO
Georg Simmel

O fundamento fisiológico do nosso ser, que aponta para a mudança de


repouso e movimento e de receptividade e atividade, contém, com isso,
também o modelo do nosso desenvolvimento espiritual. Quando o nosso
conhecimento é levado tanto pela procura da máxima abstração e generalidade
quanto pela necessidade de descrever o mais específico e particular; quando
em nossa vida sentimental nos satisfazemos na pacífica dedicação a outros
seres humanos e coisas ou em enérgica atividade contra eles; quando o nosso
ser ético encontra fronteiras de suas oscilações tanto no amálgama do nosso
grupo quanto na distinção individual em relação ao mesmo - tudo isso se refere
a conformações provinciais das grandes forças contraditórias, cujas lutas e
compromissos fazem o nosso destino.
Essas fontes e orientações últimas que caracterizam tudo que é humano
não podem sequer ser expressas por palavras.
Apenas a partir daquelas manifestações singulares, quando essas
orientações últimas produzem, por meio da sua direção, os conteúdos
particulares da vida, nos quais elas se realizam, pode-se apontar para elas e
decantá-las como forças iguais de esferas distintas. Elas podem expressar-se
pela oposição entre Eleatas e Heráclito, ou, como no presente, pela oposição
entre socialismo e individualismo.
As formas de vida típicas da história de nossa espécie demonstram
sempre a eficácia desses princípios antagônicos. Todos eles expressam, na
sua esfera, e sob uma forma específica, o interesse de unir a permanência e a
perseverança da mesma maneira que a mudança e a variação; de fundar um
acordo entre o geral e o mesmo com o específico e singular; de proporcionar
um compromisso entre a dedicação à totalidade social e a imposição da própria
individualidade.
Nas configurações sociais dessas contradições temos, freqüentemente,
um dos pólos como portador da tendência psicológica para a "imitação". A

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imitação nos proporciona, de pronto, o estímulo de uma efetiva prova de força,
na medida em que não exige nenhum esforço criativo e pessoal relevante, e
nos é conferida de forma leve e direta a partir do caráter dado do seu conteúdo.
Ao mesmo tempo, ela nos dá a tranqüilidade de não estarmos sozinhos na
ação em questão. Ela se sobrepõe à forma como uma atividade é
costumeiramente executada, como um fundamento sólido que desobriga a
execução atual da dificuldade de carregar a si próprio. Na imitação é o grupo
que conduz o indivíduo, na medida em que, simplesmente, transmite a forma
do seu comportamento e liberta o indivíduo da tortura e da responsabilidade da
escolha.
Mas a imitação é apenas "uma" das direções fundamentais do nosso
ser, aquela, precisamente, que satisfaz a unidade, a igualdade e o amálgama
do indivíduo na generalidade, enfatizando o momento da permanência na
transitoriedade. Não acontece o mesmo com aquela direção que, ao contrário,
procura o transitório no permanente, a diferença individual, a auto-suficiência, o
distanciamento da generalidade. Se se analisa estas duas tendências antagô-
nicas como uma imagem das suas formas biológicas fundamentais, pode-se
descrever a imitação como uma herança psicológica, enquanto o esforço de
superá-la em direção a formas de vida próprias e novas corresponderia à
variabilidade.
Para a moda é essencial nesse contexto o seguinte: ela satisfaz, por um
lado, a necessidade de apoio social, na medida em que é imitação; ela conduz
o indivíduo às trilhas que todos seguem. Ela satisfaz, por outro lado, a
necessidade da diferença, a tendência à diferenciação, à mudança, à distinção,
e, na verdade, tanto no sentido da mudança de seu conteúdo, o qual confere
um caráter peculiar à moda de hoje em contraposição à de ontem e à de
amanhã, quanto no sentido de que modas são sempre modas de classe. As
modas dos estratos superiores diferenciam-se daquelas dos estratos inferiores,
e são prontamente abandonadas quando os últimos passam a se apropriar das
mesmas. "A moda é uma forma peculiar dentre aquelas formas de vida, por
meio das quais se procura produzir um compromisso entre a tendência para a
igualdade social e a tendência para marcar a distinção individual". Nessa
essência fundamental da moda, ordenam-se os traços psicológicos que nela
observamos.

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Do ponto de vista sociológico ela é, como mencionado, um produto de
separação de classe, da mesma forma como a honra era originalmente honra
estamental, ou seja, retirava seu caráter e, acima de tudo, seus direitos éticos
do elemento estamental, de forma que o indivíduo na sua honra representava e
protegia seu círculo social e seu estamento. Do mesmo modo, a moda
significa, por um lado, o pertencimento em relação àqueles que estão na
mesma situação, e, por outro, o distanciamento do grupo como um todo em
relação aos que se situam abaixo socialmente.
As formas sociais, a vestimenta, os julgamentos estéticos, o estilo por
inteiro, por meio do qual o homem se expressa, são percebidos na sua
modificação progressiva por meio da moda, e esta, ou seja, a nova moda, diz
respeito, em todas as suas manifestações, apenas aos estamentos superiores.
Estes se apartam, desse modo, dos estamentos inferiores, ressaltando a
igualdade dos seus componentes e, simultaneamente, a distinção em relação
aos que se situam abaixo. Tão logo estes últimos começam a apropriar-se da
moda - precisamente porque- eles olham e se orientam sempre para cima e
conseguem realizar essa aspiração antes de tudo na moda -, reagem os
estamentos superiores com o abandono da mesma e a pronta inclinação para
uma nova moda, por meio da qual a distinção em relação à massa se realiza
novamente. Esse momento da separação que, ao lado do momento da
imitação, constitui a essência da moda mostra-se, na ausência de uma estra-
tificação estamental vertical, até mesmo na estratificação horizontal dos
estamentos. A respeito de alguns povos primitivos comenta-se que, entre
grupos com estreitas relações de vizinhança e que vivem nas mesmas
condições, desenvolvem-se, às vezes, modas absolutamente distintas, por
meio das quais cada grupo pretende marcar o pertencimento intragrupal e a
diferença extragrupal.
A esse momento do pertencimento intragrupal é conferida uma luz
peculiar, pelo fato de que as modas freqüentemente são produzidas de fora
para dentro. Elas são valorizadas com especial predileção dentro de certo
círculo como "moda", quando não são constituídas dentro do mesmo. Pelo fato
de as modas virem de fora, elas produzem uma forma singular de socialização,
a qual aparece na medida em que dá ensejo a uma relação comum referente a
um ponto localizado externamente. Parece que às vezes os elementos sociais

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procuram convergir, como os eixos do olhar, para um ponto não-localizado de
maneira muito próxima, e, desta forma, apresentam, ao lado do elemento
centrípeto e socializador, também, por meio da moda, o componente de
variabilidade e de satisfação dos impulsos para a variação. Assim sendo, a
origem da moda garante, de forma peculiar, pela procedência externa, a sua
"novidade", ou seja, a distinção em relação ao estado de coisas que vigorava
até então. Essa mudança abrupta realiza-se, freqüentemente, por meio de
oposições, porque, apenas quando se está imerso nelas, toma-se, de fato,
consciência de si próprio.
A partir das tendências contraditórias do nosso ser, para as quais cada
um dos lados da moda representa uma unificação singular, verificamos que
uma encontra sua satisfação na forma social da moda, enquanto a outra no seu
conteúdo. Onde falta um desses dois momentos - seja a necessidade e a
possibilidade da distinção, seja a necessidade e o desejo de vincular-se aos
outros -, aí também termina o reinado da moda. Por conta disso, os estamentos
inferiores possuem raramente modas específicas, que foram escolhidas como
tais; e também, pela mesma razão, são as modas dos povos primitivos bem
mais estáveis que as nossas. Também pela razão contrária, em um círculo
onde os indivíduos buscam uma significação de caráter particular e a imitação
é abominada, não temos a formação de uma moda. Supõe-se que, em
Florença, por volta de 1390, não havia nenhuma moda dominante do vestuário
masculino, pelo fato de que cada qual procurava vestir-se de forma particular.
A essência da moda reside no fato de que sempre apenas uma parte do
grupo a pratica; a totalidade, no entanto, fica a meio caminho dela. Ela nunca é,
mas é sempre um vir a ser. Tão logo ela seja dominante, ou seja, tão logo
aquilo que apenas alguns poucos praticavam passe a ser praticado por todos
sem exceção, como elementos do vestuário ou das formas de contato social,
não se pode mais falar em moda. Desse fato - de que a moda como tal não
pode ter alcance geral - é que surge no indivíduo a satisfação que a moda
representa, na medida em que o particulariza como algo especial, enquanto, ao
mesmo tempo, ele é carregado pela multidão que anseia o mesmo - e não
como em outras formas de satisfação social da totalidade de efetivos fazedores
do mesmo. Por conta disso, é que a mentalidade que permeia o modismo
exprime uma mistura bem temperada entre aprovação e inveja.

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A moda toma-se, dessa forma, a arena por excelência dos indivíduos, os
quais não são autônomos no seu íntimo e no seu conteúdo pessoal, que
necessitam da aprovação social, ao mesmo tempo que sua auto-:estima exige
distinção, atenção e o sentimento de ser algo especial. Ela eleva de certo modo
também o insignificante, na medida em que o faz representante de um coletivo,
sentindo-se portador de um espírito geral. Nos fanáticos pela moda e nos
"janotas" (Gigerl), temos esse fenômeno levado ao paroxismo, no qual aparece
de novo a aparência do individual e da especialidade. O “janota" leva a
tendência da moda para além das suas próprias medidas: se é moda sapatos
com bico, ele deixa que os seus terminem em esporões; se é moda colarinho
alto, ele os traz até as orelhas; se é moda ir à igreja aos domingos, ele
permanece nela de manhã até a noite, etc. A individualidade que ele imagina
baseia-se no aumento quantitativo de elementos que são, na realidade, bem
comuns da multidão. Ele caminha na frente dos outros e, ao mesmo tempo, no
caminho dos outros. Ele marcha aparentemente na vanguarda da multidão,
precisamente porque representa a ponta-de-lança do gosto público. Na
realidade, vale para os heróis da macia o que de resto é observado em todas
as relações do indivíduo com o seu grupo social: o guia é, na verdade, o
guiado. O herói da moda representa, dessa forma, uma relação de equilíbrio
verdadeiramente original entre os impulsos socializadores e individualizantes. E
é a partir do estímulo, que advém desse fato, que podemos compreender as
tolices modísticas aparentemente tão abstrusas em algumas pessoas, as
quais, em outras ocasiões, são muito lúcidas e até de grande valor.
Em relações primitivas, e também em estágios elevados, cria-se,
freqüentemente, uma moda a partir da invenção, por parte de alguma
personalidade extraordinária, do modo de vestir, de se comportar, de se
interessar, etc., modos estes que permitem a essa personalidade distinguir-se
dos outros. Esses outros procuram avidamente essa nova oportunidade de
prestígio, imitando, tão rápido quanto possível, por conta de sua significação, o
comportamento daquela personalidade. A satisfação deste último advém da
mistura entre o sentimento de individualidade, de possuir algo especial e
particular, e o sentimento social, pela imitação da multidão que o leva a ser
carregado pelo seu espírito. Apesar de os dois sentimentos oporem-se
logicamente, psicologicamente esses são compatíveis e até estimulam-se

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reciprocamente. Cada imitador participa, naturalmente em um grau menor,
dessa mesma constelação emocional até que a moda alcance total aceitação e
perca o seu elemento individualizador.
Uma mesma combinação dessas tendências é alcançada, da mesma
forma que pela extrema obediência à moda, pela oposição à mesma. Quem se
comporta e se veste de maneira conscientemente anacrônica conquista o
sentimento de individualidade não propriamente por meio de qualificação
própria e pessoal, mas pela mera negação do modelo social: se modernidade
significa imitação do modelo social, temos então no anacronismo intencional
uma imitação de sinal trocado, o qual, entretanto, é testemunha do poder da
tendência social, que, de uma forma ou de outra, seja positiva ou
negativamente, nos faz dependente dela. Pode até acontecer que se tome
moda, em amplos círculos de uma sociedade abrangente, vestir-se não-
modernamente. Essa é uma das mais estranhas complicações sociológicas na
qual, em primeiro lugar, o impulso da distinção individual se satisfaz com a
mera inversão da imitação social e, em segundo lugar, retira a sua força de um
círculo restrito de iguais: sociologicamente, um fenômeno análogo à
associação dos inimigos das associações.
O significado sociológico do modo de expressar, simultaneamente, tanto
o impulso para a igualidade quanto para a individualidade, tanto o estímulo
para a imitação quanto para a distinção, talvez possa explicar por que
especialmente as mulheres apóiam-se, em geral, na moda. Apesar de a
prudência científica dever resguardar-se contra qualquer julgamento sobre as
mulheres no plural, deve permitir-se, ao menos, veicular o pensamento geral de
que a ciência psicológica feminina é distinta da masculina e se baseia numa
carência de diferenciação, numa ênfase na média social, resultando daí a
relação mais estreita no que concerne aos costumes, às formas aceitas
geralmente e ao que "convém". A partir da sólida base dos costumes, da
média, do nível geral, elas se esforçam por alcançar uma relativa
individualização e uma relativa distinção da personalidade individual que
estejam dentro dos limites sociais. A moda oferece a elas precisamente essa
combinação: por um lado, a região da imitação geral, a moda nas correntes
sociais mais amplas; por outro lado, a distinção, a ênfase, o adorno individual
da personalidade.

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E ainda mesmo lá onde a moda se cruza com os mais recônditos
movimentos psíquicos, ela preserva a sua relação de equilíbrio típico entre as
tendências contraditórias: é na realidade importante que ela pretenda submeter
todas as individualidades a uma mesma medida; no entanto, não é verdade
que ela perpasse o ser humano como um todo; a moda permanece em relação
a ele, por conta de sua mutabilidade, a qual, precisamente, tem seu critério de
medida no caráter mais permanente do sentimento do eu, sempre alguma
coisa relativamente externa, contra a qual o ser humano pode perceber, ao
menos em situações-limite, a própria personalidade como pièce de résistance.
E é, na verdade, apenas uma intensificação dessa nuança, quando
homens refinados e originais utilizam a moda como uma máscara, como uma
reserva consciente e desejada do seu sentimento e gosto mais pessoal que
eles alcançam por meio de cega obediência à norma geral em todas as
exterioridades. Isso representa uma vergonha e uma timidez refinadas de trair
a particularidade da natureza mais íntima por uma particularidade da
apresentação exterior, fazendo com que algumas dessas pessoas procurem
refúgio no elemento ocultador do nivelamento da moda.
Aquele dualismo simultaneamente satisfeito da unidade igualizadora e
da distinção individual transmuta-se também para as configurações internas da
alma individual - de acordo com aquele paralelismo característico segundo o
qual, tão freqüentemente, relações intersubjetivas repetem-se na imaginação
individual. Com maior ou menor grau de intencionalidade, o indivíduo constrói
para si próprio uma forma de comportamento, de estilo, a qual, por meio do
ritmo de sua aparição, da forma como se impõe e como se retira, pode ser
caracterizada como uma moda. Principalmente as pessoas jovens demonstram
uma extravagância surpreendente na sua maneira de apresentar-se, um
interesse sem fundamento real de produzir-se que domina todo seu círculo de
consciência e desaparece da mesma forma irracional como apareceu. Isso
pode ser chamado de moda pessoal, que constitui um caso-limite da moda
social. Ela é definida a partir da necessidade individual de diferenciação e
substitui a necessidade gregária da imitação por meio da concentração da
própria consciência. A coloração unitária que o ser atinge por meio disso talvez
signifique uma coesão, uma forma mais profunda pela qual esse indivíduo é
levado pelo conteúdo total do eu, como se a moda fosse uma outra.

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Pelo fato de a moda representar um momento de coincidência notável
entre as diversas dimensões da vida, resulta que o ritmo geral no qual se
movimentam indivíduos e grupos influencia também, de maneira decisiva, a
relação destes com a moda. Percebemos que conservadorismo e variabilidade
distribuem-se de forma bastante irregular nos diferentes estamentos de um
agrupamento político. Por um lado, são as massas mais baixas de movimento
difícil e de desenvolvimento lento. Elas produzem muitas vezes como por
exemplo na Inglaterra, como é bem visível, por ocasião das conquistas dos
dinamarqueses e dos normandos - a continuidade da vida do povo, dado que
se apegam teimosamente às suas primitivas formas de vida, enquanto os
estamentos situados mais acima, como o cume de uma árvore pelo movimento
da atmosfera, são atingidos e modificam-se de maneira mais radical a partir de
novas influências.
Por outro lado, são, reconhecidamente, os estamentos superiores os
mais conservadores, até mesmo, freqüentemente, arcaístas e apenas
desenvolvem-se em ritmo pesadamente lento. O estamento médio é aquele da
variabilidade, e por conta disso é que a história dos movimentos socioculturais
ganha um ritmo absolutamente diferente desde que o tiers état assumiu o
comando. A partir disso é que podemos compreender por que a moda - a forma
da mudança e da contradição da vida, para cujo conteúdo o momento da altura
a1cançada representa, simultaneamente, o momento da queda -, desde a
dominação da burguesia, passou a abranger mais e mais esferas da vida,
ressoar, cada vez mais, rápidos e coloridos ritmos, ganhar cada vez mais
validade.
As classes e os indivíduos mais nervosos que pressionam por mudanças
reencontram na moda o ritmo dos seus próprios movimentos psicológicos: ela
possui uma curva de consciência muito aguda, precisamente por chamar para
si, de forma muito forte, a atenção, por significar uma radicalização
momentânea de consciência social para um certo ponto, é a razão última da
semente de sua morte e de seu destino, para desaparecer. Qualquer outra
coisa simultaneamente nova e repentinamente generalizada, seja na teoria
como na prática, não seria nunca uma moda para alguém que acredita na
verdade e permanência dela. Apenas alguém convencido de sua rápida
aparição e desaparecimento poderia assim defini-Ia.

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Temos, no entanto, em oposição a isso, o fenômeno estranho de que
toda moda singular aparece como se quisesse viver para sempre. Quem
compra hoje um mobiliário, que deve durar um quarto de século, compra-o de
acordo com a última moda sem sequer considerar aquela que vingava dois
anos antes. No entanto, depois de alguns anos, o estímulo dessa moda já teria
passado, ficando para ambas outros critérios de avaliação. Parece realizar-se
aqui um processo dialético-psicológico: sempre existe uma moda, ou seja, a
moda como um conceito geral é imortal e está refletida em todas as suas
conformações particulares, apesar de a essência dessas manifestações
particulares residir precisamente no fato de elas não serem passageiras; de
que a mudança dura dota cada objeto, nu qual ela se realiza, de uma idéia
psicológica de duração.
O que existe de picante na atração estimulante da moda é o contraste
entre sua ampla proliferação, que a tudo abarca, e seu caráter de rápida e
fundamental transitoriedade - a qual, por sua vez, também se contrapõe àquela
ilusória pretensão de validade duradoura. Essa atração reside tanto na forma
decidida pela qual a moda consegue constituir um círculo - no qual o efeito de
pertencimento se manifesta como causa e efeito seus - quanto na de-
tenninação com a qual ela o isola dos outros círculos. Essa atração manifesta-
se, finalmente, tanto pela possibilidade de ser levado por um círculo social, o
qual exige dos seus participantes imitação recíproca, retirando deles, dessa
forma, o peso de toda responsabilidade - seja ética, seja estética -, quanto pela
possibilidade, ainda que dentro desses limites, de propiciar intensificação da in-
dividualidade e nuances originais dos elementos da moda. Dessa forma, a
moda mostra-se como uma configuração singular, extremamente caracterizada
dentro das configurações múltiplas já mencionadas, na qual a conveniência
social objetificou correntes contrárias da vida segundo direitos iguais.

Extraído de: SOUZA, Jessé e ÖELZE, Berthold. Simmel e a modernidade. Brasília:


UnB. 1998. p. 161-170.

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