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MEDIAÇÃO, PROCESSO PENAL E DEMOCRACIA

Leonardo Sica. In “Processo Penal e Democracia. Estudos em homenagem aos 20 anos da


Constituição da República de 1988”. Geraldo Prado e Diogo Malan (org.). Rio de Janeiro,
Lumen Juris, 2008, p. 289-320

1. Premissas

Por mais que a justiça penal se mostre ineficiente,


seletiva, custosa e sua intervenção agrave os problemas que se propõe a
resolver (criminalidade, conflituosidade, violência), sua estrutura segue imune
a quaisquer tentativas de reforma mais profunda, absorvendo apenas pequenas
modificações tópicas 1 e não orientadas por objetivos funcionais, por critérios
político-criminais construídos a partir da observação da realidade social.

Mesmo no âmbito das iniciativas reformistas ou


progressistas, impera a tendência de restringir as possibilidades de aprimorá-la
à edição de novas leis ou alteração daquelas vigentes. Contudo, atualmente, o
processo legislativo está fortemente condicionado ao ambiente político-
eleitoral, mais tendente a medidas populistas, simbólicas e de impacto
midiático, que respondem a fobias coletivas de segurança, rapidez e a apelos de
“lei e ordem”, que nem sempre correspondem às necessidades reais de justiça.
Por isso, ao falar em reforma, proponho uma reconstrução teórica que forneça
um discurso (com princípios e metas) capaz de moldar novas práticas dentro do

1
Tais como a Lei 9.099/95, que sob o pretexto de criar um espaço mais informal, flexível e aberto ao diálogo,
apenas aprofundou a feição burocrática e autoritária das agências judiciais; a Lei 9.714/98, que, também sob o
louvável pretexto de estabelecer “novas penas alternativas”, apenas reprisou idéias superadas e absolutamente
inócuas no que se refere à redução da carcerização e mesmo o recente e super divulgado “pacote de reformas”,
cujo ponto mais aplaudido foi a supressão do recurso de protesto por novo Júri, cujos reflexos práticos são,
sabidamente, quase inócuos.
2

sistema judiciário penal e, principalmente, consolidar um entendimento


importante: a função política do processo penal e o papel fundamental que o
exercício do poder punitivo cumpre na efetivação do Estado Democrático de
Direito.

A premissa inicial deste artigo resume-se em uma


afirmação de Zaffaroni (1991): “é preciso reduzir o exercício de poder do
sistema penal e substituí-lo por formas efetivas de solução de conflitos”.
Reconhecer o processo penal como manifestação de poder, resulta em
compreendê-lo como elemento essencial ao sistema de contenção e
racionalização de seu uso, o que converge, necessariamente, para o tema da
democracia (ou, num país ainda incipiente nesse campo, parece adequado mais
relacionar o processo penal à necessidade de assegurar a continuidade da
transição democrática).

Estudos recentes apontam a existência de um a


negligência recíproca entre os temas democracia e punição (legal), como se
ambos estivessem situados em dimensões separadas e desconectadas (GREIFF,
2002; WILLIAMS, 2002) 2. Esse silêncio é surpreendente, por diversas razões.
Para Pablo de Greiff, surpreende porque a democracia tem razões externas e
internas para considerar a questão da punição, tais como as elevadas taxas de
encarceramento e a tendência crescente da utilização de medidas penais como
método para resolver uma variedade ampla de problemas sociais (2002, p. 374).
Melissa S. Williams lembra que o sistema de justiça criminal tem três funções:
a definição do que é crime; a previsão do processo para determinar culpa ou
inocência; a definição e imposição das respostas ao comportamento criminal,
sendo que a definição do comportamento criminal pode, efetivamente,
representar uma discriminação contra uma particular classe de pessoas, assim
como as respostas punitivas podem ser aplicadas de forma diferenciada sobre

2
Pablo de Greiff constata que a teoria legal trabalha como se a punição estivesse colocada dentro de um vácuo
político (2002, p. 374) e para Melissa S. Williams “o lugar da justiça criminal tem sido pouco estudado na teoria
democrática recente” (2002, p. 451).
3

os cidadãos (2002, p. 452). Essas impressões iniciais indicam que há afinidades


não exploradas entre democracia e ciência penal. Afinidades, por exemplo, que
afloram quando tentamos capturar o significado da punição e, mais ainda, a
própria justificação dessa prática por meio do processo penal.

Greiff lembra que a democracia deliberativa vê a


política como meio de “resolução racional dos conflitos”, mais em termos de
argumentação e comunicação, do que imposição, assim “a aceitação racional
das leis pode ser estabelecida apenas sob condições de deliberação livre e
aberta” (Idem, p. 377) 3. Esse conceito de deliberação, inclui uma noção mais
robusta de participação, pois, enquanto o liberalismo pensa na participação em
termos mais limitados (somente durante as eleições ou para negociar interesses
particulares, p. ex.), a democracia deliberativa requer alto nível de
engajamento, “cujo propósito é, em último nível, fazer o exercício de poder ser
racional” (Idem, p. 378) (ao que acrescentamos não ser possível excluir daqui o
exercício do poder punitivo). Democracia, nessa perspectiva, é um mecanismo
que aumenta a probabilidade de obter decisões razoáveis também quanto à
interpretação e aplicação da lei, segundo Greiff,

per mitir àqueles que são afetados pela norma participar das
discussões nas quais a sua validade é determi nada, pode incrementar
a possibilidade de que a decisão sej a alcançada sobre a base de
infor mações relevantes e mais acuradas ( Idem).

Ao ligar os temas democracia, processo penal e


mediação, este breve ensaio assume abordagem político-criminal, por isso, a
mediação penal será exposta como via de acesso para uma reforma penal
substancial e como reação penal legítima com reflexos relevantes sobre os
mecanismos de habilitação do exercício do poder punitivo.

3
Segundo o autor, as deliberações, para serem democráticas, devem ser a) inclusivas e públicas; b) livres de
qualquer coerção interna ou externa; c) deve ser possível deliberar sobre todos os interesses e desejos contidos no
que está sendo deliberado e d) as deliberações visam acordos racionais e motivados (Idem, p 381).
4

A preocupação com a democracia num estudo cujo


foco é a ciência penal pode parecer equivocada, principalmente por causa
daquela despreocupação recíproca entre os estudos sobre punição e democracia,
a qual, em grande parte, deriva da falta de reconhecimento inequívoco sobre
qual a finalidade da primeira (objetivos díspares como reabilitação, retribuição
e dissuasão compartilham esse espaço, tanto na doutrina, quanto no senso
comum) e também da prevalência dos aspectos morais dentro das teorias da
punição. Contudo, se, conforme a definição de Bobbio (1996, p. 19-36), o
regime democrático funda-se na existência e no respeito das regras do jogo,
que devem ser definidas com o máximo grau de deliberação entre os
“jogadores”, pergunta-se: não é nos domínios da lei criminal onde as regras
mais agudas são definidas, expressadas e, ao mesmo tempo, questionadas?
(tanto pelas condutas desviantes, como pela própria atividade das agências
judiciais penais). Logo, há diversas afinidades não exploradas entre democracia
e punição, que costumam aflorar quando se discute o uso de práticas
restaurativas, com destaque para a mediação.

Enfim, não houvesse essa profunda relação, apenas


indicada sumariamente aqui, não se justificaria a inquietante tese formulada
por Teresa Caldeira (2000) após profunda pesquisa sobre crime, violência,
segregação urbana e direitos civis: a esfera da justiça representa o principal
obstáculo à expansão da democracia brasileira para além do sistema político,
pois é nessa arena que a democratização continua sendo desafiada
cotidianamente, por meio da ação de instituições que organizam e reproduzem
práticas violentas e violadoras dos direitos da cidadania.

Se está claro que “é pouco provável que um estado não


democrático seja capaz de garantir as liberdades fundamentais ” (BOBB I O ,
1 9 8 6 , p . 2 0 ) ; instituições estatais não democráticas serão incapazes de garantir
as mesmas liberdades fundamentais, o que reforça a validade da tese de Teresa
Caldeira.
5

Assim, a hipótese em discussão é: há indicativos de


que o uso da mediação em matéria penal pode colaborar na transição para o
Estado Democrático de Direito, que, de 1988 até o momento, tem sido
neutralizada por vários fatores, dentre os quais, a resistência articulada por
meio do discurso do crime e da violência e através da atuação do sistema
judiciário penal.

2. Democracia e justiça: a demanda por ampliação dos espaços de


participação e deliberação

A expressão democracia pode ser usada para justificar


práticas das mais diversas 4 e constantemente é aplicada de maneira
indiscriminada e pouco criteriosa, pois, falar em democracia confere a qualquer
discurso conotação simpática e aceitável. Por isso, mesmo condutas autoritárias
e arbitrárias - tais como a invasão de países, o massacre de populações, o
encarceramento em massa ou a rigidez do processo penal - abrigam-se,
discursivamente, sob o termo. Logo, o passo inicial deste tópico é esclarecer do
que estamos falando, quando falamos em democracia.

Com esse esclarecimento inicial, restará investigar


qual a relação entre democracia e justiça penal: existe alguma relação? Deve-se
atribuir à justiça penal o papel ativo no processo de assegurar a continuidade
democrática? Isso não extrapolaria os limites de sua atuação e escopo,
sobrecarregando de expectativas um sistema já hipertrofiado?

Participação e deliberação convergem para a


“definição mínima de democracia ” de Bobbio, para quem um regime
democrático caracteriza-se por (i) permitir a participação de um número muito

4
“A falta de exatidão com que se fala de democracia, ligada ao entusiasmo colossal que a democracia desperta no
continente, constitui um dos desafios mais importantes para as ciências sociais” (Casanova, 2002, p. 167).
6

elevado de membros do grupo nas decisões coletivas, identificando-se o


processo de democratização com o alargamento progressivo desse número de
indivíduos chamados a participar das decisões importantes para cada
comunidade. Somam-se à essa primeira condição, duas outras: (ii) a existência
de regras claras que regulam essas deliberações e (iii) a necessidade de que
aqueles que sejam chamados a decidir sejam colocados diante de alternativas
reais e tenham condição de deliberar entre uma ou outra (1986, p. 19-20).

Eleger os parlamentares que irão definir os crimes e as


penas é, nessa perspectiva, uma forma ainda muito limitada de democratizar um
assunto de evidente interesse coletivo: o controle público do crime.

Noam Chomsky define que “uma sociedade é


democrática na medida em que seus cidadãos desempenham um papel
significativo na gestão dos assuntos públicos. Se seu pensamento for
controlado ou se suas opções forem drasticamente restringidas, é evidente que
eles não estarão desempenhando um papel significativo: somente os
controladores e os que forem servidos por eles o estarão fazendo ” (2003, p.
19). Sendo a administração da justiça penal assunto público (“público”
entendido como aquilo que é referente ao povo e não ao Estado), deve-se
questionar qual o papel que os cidadãos desenvolvem na sua gestão. Por
exemplo, quais as opções, que tem a vítima de um crime para elaborar a ofens a
que sofreu e buscar a reparação? No que sua opinião pesa na solução do
problema? Em que medida as justificativas oferecidas pelo ofensor interferem
na decisão de um caso criminal, principalmente se não tiverem cunho técnico-
jurídico? Para responder tais perguntas, vale formular a hipótese de um crime
patrimonial em que, durante o processo, o ofensor resolva restituir a coisa ou
reparar o dano, pedir desculpas e justificar-se e a vítima receba positivamente
essas atitudes: tudo isso não terá qualquer significado para a justiça penal.

Logo, se tais indagações apontarem para uma


participação significativa de ambos na gestão daquele assunto público (crime),
pode-se dizer que nossa sociedade é democrática. Do contrário, ainda com
7

Chomsky, a participação representará apenas “meros gestos formais


desprovidos de significado” (Idem), tais como testemunhar sobre os fatos
narrados na denúncia ou negar os termos da exordial acusatória...

Os conceitos de Bobbio e Chomsky combinam-se para


afirmar que a democracia pode definir-se pela manutenção e constante
ampliação dos espaços de deliberação e participação no que se refere à decisão
e/ou gestão dos assuntos públicos relevantes para a convivência comunitária.

Acrescenta-se a contribuição crítica de Pablo González


Casanova, que desenvolveu inúmeros estudos sobre o tema, concluindo que “ ao
falar de democracia, é necessário incluir, pelo menos, cinco categorias: a
repressão 5, a negociação, a representação, a participação e a mediação ”
(2002, p. 167), que formam um conjunto indispensável à sua análise completa.
Ao elencar a repressão dentre as categorias imprescindíveis à compreensão do
que é a democracia, evidencia-se a imbricação entre esta e o processo penal,
que, essencialmente, é a manifestção única da repressão legal. Quanto à
representação (categoria à qual se limita a nossa democracia), Casanova lembra
que sem a possibilidade efetiva de participação do povo, mesmo que seja na
atuação dos representados, não haverá mais do que uma “sensação de
representação”, a qual, então, pode se tornar real através das diversas formas
de mediação que se desenvolvem no cotidiano de uma nação. Essa mediações
são essenciais, pois contêm as formas de diálogo, negociação e conciliação que
permitem ao povo afirmar sua liberdade, participando não só do sistema
político-eleitoral, mas também do poder e das decisões do Estado.

Casanova faz uma profunda revisão crítica das


democracias, em especial na América Latina, constatando que pouco avançaram
no último século por uma razão primordial: as utopias democráticas não
conseguiram alcançar seus objetivos pois foram incapazes de construir uma

5
“Por mais estranho que pareça, ao analisar qualquer democracia, é necessário se perguntar como anda a repressão,
e não só a que se exerce fisicamente contra as pessoas com perseguições, prisões, desaparecimentos, crimes e
massacres. Na análise de qualquer democracia, cabe ver o contexto da repressão física, moral e econômica contra
8

democracia includente (ou não excludente) (Idem, p. 291). Assim, o postulado


de construir uma democracia includente pode ser considerado como
fundamental para alcançar “um mundo menos violento e autodestruidor”
(Idem). E, adiantando, uma das proposta básicas da mediação penal é,
justamente, incluir ou re-incluir ofensor e vítima no processo de resolução do
conflito que os envolve.

Sob esse prisma, o crescente aumento de competências


estatais (em especial no campo do controle do crime), impulsionado pelo
surgimento de novas demandas sociais e pela pluralidade cultural, pode
representar um grave risco à democracia, se não vier acompanhado de um
incremento proporcional das oportunidades de participação e deliberação dos
cidadãos na gestão dessas novas necessidades. Notadamente, aqui se inclui a
expansão do aparato penal, considerada como aumento quantitativo e
qualitativo das possibilidades de exercer o poder punitivo. Consoante a
compreensão de Theodomiro Dias Neto:

a sociedade demanda novas incumbências do sistema estatal, mas não


dispõe, em contrapartida, de mecanismos políticos e j urídicos
capazes de vincular democraticamente o Estado com competências e
poderes consideravelmente expandidos [ ...] e os instrumentos
tradicionais de controle j urídico e político tornam-se anacrônicos em
face do poder estatal ampliado e transfor mado (2005, p. 28) .

Verifica-se, portanto, a necessidade de reforçar, ou


melhor, renovar o conceito de democracia aqui esboçado, consolidando as
categorias de participação e deliberação sob outras formas de expressão, mais
distantes da imposição (punição) e mais próximas da negociação (mediação). A
complexidade dessas teias entre demandas sociais e respostas institucionais
requer “espaços democráticos cada vez mais amplos” e um maior esforço das
ciências sociais (direito incluso) para estudar os “variados caminhos, práticas e
opções das redes estruturantes e suas organizações” (CASANOVA, 2002, p.

as pessoas como indivíduos e como coletividades, como pessoas e como povos ou como classes, como violação de
direitos de indivíduos ou como violação de direitos de coletividades” (Casanova, Idem).
9

302); esforço que compreende o “redirecionamento das estratégias de controle


do crime” (DIAS NETO, 2005, p. 31).

Tal redirecionamento de estratégias, pode apontar


também para práticas mais autoritárias, tais como a alardeada política de
“tolerância zero”. Por isso, é preciso pesquisar por inovações que contemplem
os ideais de democracia e pluralismo, os quais, em apertadíssimo resumo, têm
em comum a limitação do poder estatal pela existência de “outros núcleos de
poder” (DIAS NETO, 2005, p. 33), pois é perceptível que a própria
continuidade da transição democrática (especialmente nas democracias mais
incipientes como o Brasil) depende da identificação coletiva e da “ proliferação
extra-estatal de arenas públicas, onde os cidadãos possam debater os seus
conflitos e viabilizar as transformações necessárias à sua governabilidade ”
(Idem, p. 41). Embora Dias Neto não enfoque o tema mediação, suas
afirmações coincidem com as aspirações que compõem o novo paradigma de
justiça penal; o que é reforçado quando o autor diz que essa abertura de novas
arenas públicas, é necessária também para que “os conflitos sejam assimilados
e adquiram sentido civilizatório, contribuindo ao aperfeiçoamento das regras e
instituições sociais” (Idem, p. 42). Ao reverso do que se vêm experimentando:
o fechamento contínuo dos espaços de participação comunitária em prol de uma
ordem simbólica imposta e estruturada sobre conceitos inflexíveis à
deliberação.

Tudo isso, aponta para uma “nova compreensão da


democracia”, plural e includente, que permita a inserção do cidadão como ator
central de todos os espaços da vida comunitária, garantindo-lhe a oportunidade
de solucionar seus problemas e construir o processo de regulação social a partir
da interpretação dos marcos legais pré-definidos, compensando o “déficit de
participação”, problema central da política contemporânea (DIAS NETO, 2005,
p. 43) e elaborando novos consensos, justamente a partir de cada dissídio, que
surge no cotidiano sob vários contornos, inclusive como conduta criminal.
A ampliação dos espaços democráticos, de participação
e deliberação, deve seguir a utopia desenhada por Casanova, na qual
10

os valores de liberdade e de j ustiça social, de tolerância e de


solidariedade ou fraternidade deverão ser deter minados como parte de
um pr oj eto universal de ‘democracia de todos’ com mediações a
serem incentivadas e criadas a partir da sociedade civil ( Idem, p.
302).

Resta, então, verificar se a justiça penal cumpre ou


deve cumprir algum papel nessa pauta de ampliação dos espaços democráticos,
se é uma esfera institucional que pode ser aberta a algum grau de deliberação e
permitir que a sua administração seja assunto de gestão pública no qual os
cidadãos exerçam uma participação mais ativa.

3. Democracia e justiça penal: o caráter disjuntivo da democracia


brasileira

O lugar tradicional de afirmação da democracia tem


sido o Estado, provedor onipotente do bem-estar social. Foi essa a base sobre a
qual se desenvolveram os regimes democráticos nos últimos dois séculos, em
especial o brasileiro. Porém, Antoine Garapon demonstra que, na atualidade, “ o
lugar simbólico da democracia migra do Estado na direção da justiça ” (1997,
p. 33). Garapon analisa com profundidade as transformações mais recentes no
senso de justiça, principalmente em face do deslocamento progressivo de novas
expectativas sociais para a atuação do judiciário. O fracasso (crise do Welfare
State) e o enfraquecimento (neoliberalismo e globalização) do poder de
intervenção do Estado na distribuição de bens e prestações, desloca para fora
da esfera tradicional a ação política, pois, “o sucesso da justiça é inversamente
proporcional ao descrédito das instituições políticas, causado pela crise de
desinteresse e pela perda do espírito público” (GARAPON, idem). Assim, a
nova cena da democracia é o tribunal, que é o local simbólico para onde são
transportadas todas as reivindicações e todos os problemas. Isso, então, coloca
11

a justiça num local de visibilidade destacado em relação à continuidade


democrática, o que se explica, em parte, pelo declínio da classe política:

o terceiro imparcial compensa o ‘déficit democrático’ da deci são


política, a esta altura eleita para a mera administração e confere à
sociedade aquele ref erente si mbólico tão pouco identificável no
parlamento [...] o j uiz representa, portanto, a recuperação de uma
democracia de ‘um legislati vo, um executivo, sempre mais
enfraquecidos, obcecados pelos períodos eleitorais’ (Idem).

Na nova cena da democracia, esta é vista cada vez


mais sobre a forma do direito e do procedimento – o que reitera a construção
de Ferrajoli indicada no tópico anterior -, o que confere relevo crescente à
justiça, fruto de uma mudança profunda na própria democracia (Idem, p. 31),
consistente, agora, na compreensão de que o direito se define por meio das
possibilidades de submeter um comportamento ou uma situação ao juízo de um
terceiro: quanto maiores essas possibilidades, maior seria a sensação de
democracia.

A justiça é, de fato, uma cena, posto que sua atuação é


sempre associada a um espaço circunscrito, à suspensão do tempo, ao debate na
presença de um terceiro; mas uma cena que oferece “um reservatório de
imagens no qual uma democracia inquieta procura seu fundamento” (Idem), ou
seja, a cena judiciária permite à democracia representar-se e compreender-se,
oferecendo a uma sociedade privada de projetos coletivos a oportunidade de se
olhar no espelho. Conforme ratifica Ceretti, “a justiça, em definitivo, é a única
coisa comum que resta quando o discurso político revela sua incapacidade de
construir um senso para o futuro” (2000). A submissão de um caso à justiça faz
com que as pessoas envolvidas sintam-se parte da comunidade, como talvez não
consigam sentir-se em outra esfera pública. Não é raro que a primeira
oportunidade de afirmação dos direitos de um cidadão marginalizado ocorra
quando um delegado ou um juiz lhe lê os direitos do interrogando.
12

A cena retratada por Garapon é de duplo


deslocamento: da democracia para dentro do cenário da justiça e desta para um
“lugar de exigibilidade da democracia”, pois “a cooperação entre os diferentes
atores da democracia não é mais assegurada pelo Estado, mas pelo direito, que
se põe como a nova linguagem política para a formulação das reinvidicaçoes
políticas” (Idem, p. 34). Nesta nova configuração, o recurso ao judiciário dá ao
cidadão impressão maior de controle sobre sua representação, não acessível por
outros caminhos, o que, necessariamente, impõe uma abertura das agências
judiciais à essas expectativas legítimas de maior participação, o que pode ser
alcançado pela inclusão da mediação penal no cenário da justiça.

Em suma, esse movimento faz com que os cidadãos


reinvidiquem um papel mais ativo na administração da justiça, para influir na
decisão do próprio destino e disto “deriva a propensão atual para a mediação, a
negociação ou a conciliação, que é a outra face de um mesmo processo”
(GARAPON, 1997, p. 34).

De forma muito sintética, o que Garapon demonstra é a


existência de uma dependência crescente entre a afirmação da democracia e a
atuação do sistema de justiça: “a justiça se tornou o lugar eletivo das paixões
democráticas e o tribunal o último teatro do desencontro político” (Idem, p.
80). Esse interesse crescente pela justiça, também não escapa à preferência
penal, o que “mostra ao mesmo tempo o desejo de reforçar um contra-poder e
um interesse novo e menos nobre pela vingança” (Idem). É neste ponto, ao
identificar a preferência penal desse novo cenário, que a visão do magistrado
francês vem ampliar sua repercussão se confrontada com a tese de Teresa
Caldeira.

A partir do estudo de problemas como crime,


violência, segregação urbana e direitos civis no Brasil, em especial em São
Paulo, Teresa Caldeira reafirmou tese que elaborara antes, em conjunto com
James Holston (1998), sobre o caráter disjuntivo da democracia brasileira.
13

Também de maneira resumida, o conceito de democracia disjuntiva 6 foi


desenvolvido para “dar conta dos processos contraditórios que marcam a
sociedade brasileira e indicar a esfera na qual a expansão dos direitos é mais
problemática” (CALDEIRA, 2000, p. 55), qual seja: o sistema de justiça. O que
Caldeira verifica é um fenômeno comum em países que passaram recentemente
por transições democráticas: “muitos grupos sociais reagiram negativamente à
ampliação da arena política e à expansão dos direitos” e “encontraram no
problema do crime uma forma de articular sua oposição” (Idem), o que se
confirma quando percebe-se que, de um lado, houve uma expansão real da
cidadania política, expressa por eleições livres e regulares, pela organização de
partidos e sindicatos, pelo fim da censura e pela liberdade de expressão e de
imprensa, etc.; mas de outro houve uma “deslegitimação da sociedade civil”,
decorrente do aumento da repressão judiciária, o desrespeito aos direitos
individuais, os abusos por parte das instituições de ordem, ao preconceito e à
intolerância veiculados por meio do universo do crime; fatores que
contrapõem-se às tendências democráticas, contribuindo para sustentar uma das
sociedades mais desiguais do mundo (Idem, p. 56).

Em suma: a democracia não penetrou o sistema


judiciário, em especial o penal que, ao reverso, constitui-se, segundo Caldeira
(Idem), na esfera em que a democratização é desafiada cotidianamente e a
resistência às transformações que poderiam levar a uma sociedade mais
igualitária estão articuladas de forma explícita.

Em apertadíssimo resumo, vale tentar colocar em


evidência os principais argumentos que sustentam essa idéia.

Após profunda pesquisa, que incluiu centenas de


entrevistas com moradores de São Paulo entre 1988 e 1998, uma vasta revisão

6
“A cidadania brasileira é disjuntiva porque, embora o Brasil seja uma democracia política e embora os direitos
sociais sejam razoavelmente legitimados, os aspectos civis da cidadania são continuamente violados” (Caldeira,
idem, p. 343) mesmo dentro do sistema de justiça e pela atuação de suas instituições, sendo que a autora adota a
seguinte distinção entre as dimensões civil, política e social da cidadania: civil refere-se aos direitos necessários
para a liberdade individual, para a asserção da igualdade perante a lei e aos direitos civis em geral; política refere-
14

das estatísticas da criminalidade e da violência na cidade e também das


políticas de segurança pública nas últimas décadas, Caldeira concluiu que a
experiência e a dramatização do crime passaram a ocupar um lugar central no
cotidiano, sendo que o crime tornou-se um objeto de organização da narrativa
da vida social dos centros urbanos: passou a fornecer uma linguagem para
expressar outras experiências amargas, como a inflação e a queda social (em
especial para as classes médias) e não o contrário, uma vez que oferece um
código mais simplificado para se lidar com diversas mudanças sociais (Idem, p.
35). Por ser mais fácil, tornou-se comum reduzir à criminalidade e à violência
a explicação de várias angústias e problemas sociais, assim como crime e
violência passaram a integrar uma só categoria, muito embora a pesquisa de
Caldeira demonstre que, de fato, o que aumentou significativamente nas
últimas três décadas foi a violência e não a criminalidade, esse aumento
compreende, é claro, formas delitivas mais violentas, mas também e
principalmente a violência estatal (aquela praticada pelos órgãos de repressão)
e aquela que não é computada como crime pelos órgãos oficiais.

Essa organização narrativa dá origem ao que Caldeira


chama de fala do crime. A fala do crime permite ordenar o mundo, promover a
reorganização simbólica de um universo perturbado por diversas mudanças (não
só a criminalidade) a partir de uma oposição entre bem e mal e “não é feita de
visões equilibradas, mas da repetição de estereótipos” (Idem, p. 38), dentre os
quais está a figura do criminoso, elaborada para diferenciar e distanciar as
pessoas “de bem” daquelas “do mal”. Caldeira procura chamar a atenção para a
maneira como as narrativas do crime estão relacionadas com a reprodução da
violência e também à democratização, considerando que toda fala produz um
“certo tipo de significação” (Idem, p. 39), a qual ganha uma força especial se é
reproduzida em práticas institucionais, como ocorre na justiça penal. A
institucionalização da fala do crime resulta na ritualização da violência, o que

se ao direito de participar de organizações políticas, de votar e ser votado e social refere-se aos direitos associados
ao estado do bem-estar social (Idem).
15

Caldeira demonstra com base no célebre estudo de René Girard 7, ao qual


Garapon (1997, p. 175) também se refere, para demonstrar como a justiça penal
insere-se num ciclo de violência, ao simbolizá-la e ritualizá-la: “o propósito
dos rituais é consolidar a diferença entre o bem e o mal, selecionar uma certa
forma de violência e marcá-la como boa e necessária em oposição a outras
formas, que são consideradas ruins” (CALDEIRA, 2000, p. 40).

No contexto das cidades modernas, a fala do crime


oferece uma narrativa que, além de manter um sistema de distinções, cria
estereótipos e preconceitos, separa e reforça desigualdades, multiplica regras
de evitação, impõe divisão e distância, constrói separações; o que acaba por
legitimar tipos de reação como: segurança privada para garantir o isolamento,
encarceramento e distanciamento daqueles que são considerados perigosos
(CALDEIRA, 2000, p. 9 e 43). Enfim, “a fala do crime faz a violência
proliferar ao combater e simbolicamente reorganizar o mundo”, é uma nova
“tecnologia de exclusão social”.

A fala do crime é produtiva, mas produz autoritarismo,


ajuda a “produzir segregação (social e espacial), abusos por parte das
instituições da ordem, contestação dos direitos da cidadania e, especialmente, a
própria violência” (Idem, p 44). Essa produção é facilmente notada no debate
público do tema dos direitos humanos, usualmente rotulados como “privilégio
dos bandidos”, ou seja, a fala do crime levanta-se como obstáculo à afirmação
dos direitos humanos.

Na esfera de justiça, essa articulação da fala do crime


percebe-se pela tendência quase unânime de justificar a imposição de penas
duras e regime carcerário mais rígido com motivação na “gravidade do delito”,
na “periculosidade” ou na “defesa da sociedade”, todos elementos não previstos

7
Girard elabora uma teoria da transformação da violência em cultura, especialmente do mecanismo capaz de
controlar a violência, descrevendo os processos de violência recíproca e generalizada como uma “crise sacrificial”
pela qual a humanidade passa, que é uma espécie de guerra de todos contra todos, unidos e nivelados pela
violência: “o mecanismo de violência recíproca pode ser descrito como um círculo vicioso. Uma vez a comunidade
entre nesse círculo, está incapaz de livrar-se. Nós podemos definir este círculo em termos de vingança e repetição”
(1977, p . 81).
16

em lei e por vezes considerados pelo Supremo Tribunal Federal como inidôneos
como fundamento de punição mais severa, o que não tem impedido que
continuem sendo largamente utilizados em primeiro grau e mesmo em tribunais
estaduais (Ver a pesquisa Decisões judiciais no crimes de roubo em São Paulo.
A lei, o direito e a ideologia. Ibccrim/ Iddd, 2005).

Essa relação deletéria entre justiça penal e


democratização ressaltada por Caldeira, é confirmada por Garapon, quando o
autor manifesta que a recepção dessa nova expectativa sobre a justiça num
cenário onde atua a preferência pela solução penal, diminui dramaticamente as
possibilidades dessa relação resultar positiva, pois “responder com a repressão
àquela demanda inédita, só pode fazer acelerar o processo de degradação do
tecido social” (1997, p. 122), pois esta preferência detona mecanismos como a
demonização do outro, a vitimizacão coletiva, o denuncismo, o retorno de
práticas sacrificiais, etc. (1997, p. 81-89).

A identificação do sistema de justiça como o elemento


marcante da disjunção da democracia brasileira resulta, justamente, da análise
de qual o papel que as suas instituições vem cumprindo em (i) garantir a
plenitude dos direitos civis e (ii) conter a violência. Pois, “se o sistema
judiciário é de fato crucial para impedir a difusão da violência, então a
consolidação da democracia na sociedade brasileira contemporânea e a
interrupção do atual ciclo de violência dependem da reforma desse sistema de
acordo com princípios do estado de direito, accountability, e respeito aos
direitos civis” (CALDEIRA, 2000, p. 206). O que a democracia requer do
sistema de justiça, é a reciprocidade, entendida como a congruência da ação
das agências judiciais com os princípios do Estado Democrático do Direito.
Sem isso, não haverá como costurar essa disjunção, pois:

por meio da questão da punição violenta e do cri me, os brasileiros


articulam uma for ma de resistência às tentativas de expandi r a
democracia e o respei to pelos direitos além dos li mites do sistema
político. No contexto da transição para a democracia, o medo do
17

crime e os desej os de vingança pri vada e violenta vieram si mboli zar a


resistência à expansão da democracia para novas di mensões da
cultura brasileira, das relações sociais e da vida cotidiana.
(CALDEIRA, idem, p. 375).

E, a mediação penal fornece uma nova linguagem para


enfrentar o problema do crime, cujos signos marcante são, justamente, não
recorrer à punição e privilegiar o caráter relacional dos conflitos rotulados
como crime.

Resumindo, poderíamos afirmar que existe uma


profunda relação entre democracia e justiça penal, a partir de dois aspectos
fundamentais: (i) a justiça como nova cena da democracia e como lugar de sua
exigibilidade; (ii) o sistema de justiça como principal barreira à expansão da
democracia brasileira.

Sob outra perspectiva, cujas conseqüências certamente


são mais sutis, uma observação interna da democracia moderna revela a sua
relação pouco íntima com o sistema penal, que limita a participação popular no
assunto a uma “moral de obediência política”, assim descrita: (i) o sistema
político (parlamento) cria a lei, criminaliza uma conduta e decide a pena
mínima e máxima; (ii) ao sistema jurídico (tribunais), resta, estritamente,
interpretar a lei e aplicar a pena dentro daqueles limites rígidos e pré-
ordenados, com pouca autonomia para reduzi-la e nenhuma para dela
prescindir. E, aos cidadãos, reserva-se o papel inicial de coadjuvante: eleger o
parlamento e, a partir daí, ser excluído da pauta de decisões que interferem na
solução de determinado conflito, mesmo quando aqueles cidadãos são parte
ativa do conflito! (ofensor e vítima).

Numa sociedade onde a exploração do medo crime


tornou-se uma arma política e a justiça a arena na qual a democracia é mais
gravemente desafiada (CALDEIRA, 2000, p. 157), este aspecto interno apenas
reforça que a justiça penal é mesmo uma das áreas mais problemáticas da
cidadania brasileira.
18

4. Processo penal e mediação como instituições de garantia da democracia

A importância do devido processo legal na manutenção


do Estado Democrático de Direito é incontroversa. Ferrajoli (2007, p. 6), em
sua obra mais recente, sublinha que a democracia é um método de formação das
decisões públicas: precisamente, no conjunto de regras que atribuem ao povo
ou a maioria de seus membros, o poder – direto ou representativo – de assumir
tais decisões. A construção da democracia, como demonstra profundamente
Ferrajoli, depende da existência de “instituições de garantia”, dentre as quais
destaca-se o devido processo legal.

As decisões públicas que culminam em processo e pena


(ou sejam, habilitam o exercício do poder punitivo), portanto, também
submetem-se ao regime democrático, que, aqui, se expressa por meio do estrito
cumprimento do conjunto de regras consagradas no âmbito do devido processo
legal. Logo, o processo penal, como saber e como método de controle do crime,
assume manifesta condição de instituição de garantia da democracia. Contudo,
as crescentes transformações no campo penal e também na realidade social
subjacente fizeram com que essa condição – de única instituição garante da
democracia naquele campo – se tornasse insuficiente, por vezes até precária.

Assim, a mediação penal surge como mais uma


instituição de garantia, baseada na hipótese construtiva de bifurcar o sistema
de justiça penal, de maneira a compor mediação e punição como duas vias de
acesso, complementares e conectadas, a espaços públicos, regulados e
democráticos de reação ao fenômeno do crime.

Ainda quanto à possibilidade de conceber a mediação


como instituiçã de garantia, nada melhor do que voltar ao pensamento de Luigi
Ferrajoli, que, ao debater as possibilidades de controle social alternativo,
elenca quatro modelos privados de qualquer garantia contra a opressão e o
arbítrio. Nenhum deles refere-se à perspectiva de justiça e mediação penal,
19

pelo que o garantismo não veda ou, ao menos, deixa uma porta aberta para a
consideração dessa idéia.

Os sistemas de controle antigarantistas seriam: (a)


social-selvagem, expresso nos ordenamentos arcaicos, baseados na lei do mais
forte, na vingança de sangue, duelo, etc; (b) estatal-selvagem, expresso nos
ordenamentos despóticos antigos e nos modernos autoritários, onde a pena é
imposta de acordo com os interesses de quem a comina; (c) social-disciplinar,
próprio das comunidades moralistas ou ideologizadas, que submetem o
indivíduo a forte autocensura, pressões coletivas, policiamento e linchamento
moral, demonização pública, etc.; (d) estatal-disciplinar, produto tipicamente
moderno, caracterizado pelo desenvolvimento de funções preventivas de polícia
e segurança pública, de vigilância, etc. (FERRAJOLI, 1998, p. 514-515) 8.

5. Enfim, o que é a mediação penal?

Na re al i dade, ex i s tem di vers as “m edi a ções ”, o q u e


i m pos s i bi l it a um concei t o fe chado. P aí s es di fer ent es des en vol veram form as
di st i nt as de m edi ação, as s i m com o, em âm bi t os di fere nt es, t am bém s e
defi nem m odal i dade s des i gu ai s , m es m o que s e r es t ri nj a a p es qui s a à m at é ri a
penal . M as , é pos s í vel e ne ces s ári o fi x ar um a noção b ás i ca, s al i en t an d o,
t odavi a, o ri s co em faz ê-l o e a caba r p or pret eri r ou s upr i m i r ab o rd a gens
i nt eres s ant es.

A ex pres s ão m edi ação, do l at i m ant i go med i a r e


(di vi di r, abri r ao m ei o) é ad apt ada p ara i ndi c ar a fi nal i dade de enfr ent ar
di nam i cam ent e um a si t uação probl em á t i ca e abri r can ai s de com u n i cação
bl oqueados ; re fer e- s e a um a at i vi dade em qu e um a part e t erc ei ra, neu t r a,

8
Contudo, partindo de algumas críticas ao modelo consensual de justiça, é possível que a justiça restaurativa
tangencie os sistemas (c) e (d), daí a necessidade de fundar o novo paradigma sobre bases claras e bem definidas,
distanciando-o daqueles sistemas não desejados.
20

aj uda doi s ou m ai s suj ei t os a com pre ender o m ot i vo e a ori gem d e u m


confl i t o, a confront ar os própri os pont os de vi s t a e encon t rar um a s o l u ção,
s ob a form a de rep a ração s i m ból i ca, m a i s do que m at e ri al ( C ER ETT I, 1 9 9 7,
p. 91-92). A m edi aç ão vi s a rest abel e cer o di ál ogo ent re as part es p ar a p o der
al canç ar um obj et i vo concret o: a r eal i z ação de um proj et o de reo r g an i z ação
das rel açõ es , com resul t ado o m ai s s at i s fat óri o pos s í vel para t o d os
(P IS AP IA, 1997, p. 05).

Ini ci al m ent e, a m e di ação s ur gi u com o um p ro ces s o


de resol uç ão de co nfl i t os que prevê a i nt ervenç ão de u m a t erc ei ra p art e
neut ra, com o i nt ent o de favo re cer a co m uni cação e, ev ent ual m ent e, a co rdo s
vol unt ári os ent re as part es . A Reco men dação do C ons el ho da Eu r o p a nº R
(99 ) 19, d efi ne a m edi ação, p art i cul ar m ent e aquel a des en vol vi da n o âm bi t o
penal ( vi ct i m-of f end er medi at i on ), com o t oda at i vi dade na qual a v i t i m a e o
aut or do cri m e podem , des de que o cons i nt am l i vrem ent e, part i ci par
at i vam ent e na res ol ução dos probl em as que sur gem com a c om i s são do i l í ci t o
penal at rav és da a j uda de um a t er ce i r a par t e i mpar ci al , qual s ej a, o
m edi ador. O que s e i nfere da R ecom end ação é de pa rt i cul ar i m port ân ci a, v ez
que i dent i fi ca al gu m as cara ct erí s t i cas e al guns l i m i t es da at i v i d ad e d e
m edi ação pen al que val em para a m edi a ção em geral , em qu al quer âm b i t o no
qual es t a i nt erv enh a. Em part i cul ar, a at i vi dade de m edi ação b as ei a -s e no
cons ent i ment o l i vr e das part es , e fet i vo a t odo m om en t o , e na
conf i denci al i dade d as di s cus s ões : os fa t os t raz i dos na m edi ação n ão p o d em
s er us ados em out r a s ede, es p eci al m e nt e no proces s o pe nal , s en ão co m a
concordân ci a das p a rt es.

J ean-P i erre Bonaf é- S chm i t t (1997, p. 36), defi n e -a


com o um “pro ces so ” at r avés do qual u m a t erc ei ra pes s oa neut ra t en t a, p o r
m ei o da organi z ação das t rocas ent re as part es, perm i t i r a es t es co n fro n t ar em
s eus própri os pont o s de vi s t a e pro cur ar, com a aj uda do m edi ado r, u m a
s ol ução ao confl i t o que as opõe. Adol fo C eret t i (1997, p. 94), refo rç a a
presenç a da part e t ercei r a neut ra co m o el em ent o í nsi t o ao co n cei t o d e
m edi ação e faz um a di s t i nção i m port ante: o concei t o de m edi ação n ão p o d e
21

s er equi pa rado àque l e de conf l i ct r es ol ut i on , (P IS AP IA, 199 7), u m a v ez q u e


a m edi ação não ofe rece às pa rt es s om ent e um a pos s i bi li dade de en co n t ra r
um a m odal i dade de conci l i ação, v ai al é m di s s o: oferece t a m bém u m a chanc e
para a abert ur a d e espaços com uni t ár i os , para const rui r um s egm en t o do
t eci do soci al e re cons t rui r o p roces s o de r e gul aç ão s oci al d e form a
nego ci ada.

Traz endo a i déi a à nos s a real i dade, i m port a des t aca r


que a m edi ação penal não i dent i fi ca-s e com nenhu m a das m ed i d as
des penal i z adoras i n t roduz i das pel a Lei 9.099/ 95 e t em p oucos p on t o s d e
cont at o com a p rá t i ca di ss em i nada d os J uiz ados Es peci ai s C ri m i nai s n a
ex peri ênci a br as i l ei ra. P el o cont r ári o, a m edi aç ão põe em rel ev o as fal h a s
proj et uai s e em pí ri c as dos J uiz ados Es peci ai s C ri m i nai s .

M es m o di ant e dess a observa ção, a m ed i ação , em


pri m ei ra e super fi c i al anál i s e, pode s er l i da apenas com o um a fo rm a d e
“conci l i aç ão”, com p reendi da com o enco nt ro ent re pes s oas em con t en d a, n a
presenç a de um fa ci l i t ador, para a di s cu s s ão de event ual ac ordo. P o r i s s o , a
neces s i dad e de qual i fi cá-l a com o uma form a de rea ção p en al cuj o
des envol vi m ent o po de a fet ar a ne ces s i dade d e p ena e, p or con s eq ü ên ci a,
des aut ori z ar a h abi l i t ação do poder p uni t i vo e a defl a gr ação do p ro ces s o
penal .

M as , m es m o as si m , é di fí ci l d ar um s i gni fi c ado
especí fi co à m edi aç ão que l he i dent i fi que os aspect os es s e nci ai s em rel aç ão
a out ros i ns t rum ent os de resol ução de confl i t os . Um a m anei ra p ro fí cu a d e
defi ni -l a é a p art i r da di s t i nção ent re m edi ação e conci l i a ção. C on ci l i ação,
cuj a noção é m ai s p róx i m a do s ens o com um em nos s o paí s , poi s é apl i cáv el
às m edi das des pe nal i z adoras dos J ui z ados Especi ai s C ri m i n ai s (Lei
9.099/ 95), s endo q ue a opos i ção d as noções de “j us t i ça cons ens u al ” e d e
j ust i ça rest aurat i va, que abri ga a m edi ação pen al , é um pont o cent ral p ar a
afast ar, des d e j á, poss í vei s crí t i cas à m edi ação, bas ead a s na eq u i v o cad a
22

ass i m i l ação ent r e e s s a e a p rát i ca de conci l i aç ão dos J ui z ados Es peci ai s


C ri m i nai s .

Na t abel a ab ai x o 9, são i ndi cados al gun s d o s t raços


ess enci ai s da m edi a ção em com pa raç ão com aquel es da con ci l i ação . A t abel a
part e do t rab al ho de Baru ch Bus h e Fol ger (1996):

M E D IA Ç Ã O C O N C IL I A Ç Ã O

Visão do é u ma r e l a ç ã o e nt r e p e s so as é um p r o b l e ma qu e d e ve s er
conflito q u e d e ve s e r ge r i da d e mo d o r e s ol vi d o
c o n s t r ut i vo

Resposta f a ci l i t a r o di ál o go a t r a vé s do p r o p or u m e s b oç o d e ac o r d o e
i d e al ao r e c o nh e ci me n t o da s e mo ç õ e s o r i en t ar a d i s c u ss ão sobre os
conflito e d o s va l or e s e l e me n t o s co mu n s , de mo d o a
ma x i mi za r a va n t a ge m p a r a t o d o s

O b j e t i vo p o t e nc i al i za r a c ap a c i da de s o l u çã o ne go c i a d a d o c o n f l i t o
das p a r t es de ge r i r e m os
e f ei t os d o co n f l i t o

Papel do s e c u n dá r i o : as partes são d i r et i vo : o c o n ci l i a do r é o e x pe r t


me d i a d o r c o n s i d e r a d as e m c o nd i ç ã o d e que c o n du z o p r o c es s o de
( t er c ei r o ge r i r as c on s e qü ê nc i a s do r e s ol u çã o d o pr o bl e ma
neutro) c o n f l i t o d e mo d o d ur ad o u r o

A t i vi d a d e d o explica o c o nc ei t o de e x p l i c a q ue o o bj e t i vo é a l c a n ç ar
me d i a d o r me d i a ç ã o , e s cl ar e c end o q u e o u m a c o r d o , e s t ab e l ec e a s et a p as
a c o r do é só u ma das p a r a t a l f i m e d e f i n e a s r e gr as
p o s s i b i l i da d es r e s ul t a n t es da b á s i c a s . P o de p r o p or u m e s b o ç o d o
me d i a ç ã o a c o r do

9
Agradecimento especial ao professor Roberto Cornelli, doutorando em
Criminologia na Universidade de Milão-Bicocca, pela elaboração e envio da tabela,
ainda não publicada.
23

d e i x a q ue as p ar t e s d i s c ut a m d i r i ge a d i s c u ss ã o pa r a a s q ue s t õ es
s e é i s s o q u e qu e r e m q u e ma n t ê m ma i s f i ns ú t ei s p a r a o
a c o r do
e n c o r aj a um e x a me do
p a s s ad o c o mo modo de d e s e nc o r aj a a s p ar t e s a f a l a r e m d o
p e r mi t i r o r ec o n he c i me n t o d o p a s s ad o , f oc al i za n d o , a o i n vé s , o
outro p r e se n t e e seu f ut u r o – c o mo
r e s ol ve r o pr o bl e ma p o s t o à me s a
e n c o r aj a a e x pr ess ã o da s
e mo ç õ e s c o mo el e me n t o s as e mo ç õ e s são vi s t a c o mo
ú t ei s a o p r oc e ss o me d i a d or e s t r a n ha s a o pr o ce s s o d e r e s o l uç ão
d o s c on f l i t o s e d es vi a m d e s t e. O
f o c al i za s u a a t e n ç ão s o b r e a s
c o n c i l i a d or p r oc u r a evi t a r e xi bi ç ã o
r e l a ç õ es e nt r e a s p a r t e s
e mo c i o n a l

f o c al i za a a t e n ç ão sobre o
p r o b l e ma e s u a so l uç ão

D e f i ni ç ão d e B e m -e s t a r das pa r t e s e a c o r do a ss u mi d o p e l as p a r t es
sucesso a u me n t o d e s u a c a pa ci d a d e de
ge r i r as c on s e qü ê nc i a s do
conflito

Na con ci l i ação, o t e rcei ro neut ro n ão t e m o po d er d e


deci di r s obre o pro bl em a t raz i do pel as part es ( ao m enos enquan t o aj a n a
qual i dade de con ci l i ador), m as t em um papel at i vo na r esol ução d a d i s p u t a:
na t ent at i va de che ga r a um “com prom i s s o” ent re as part e s, ou s ej a, de u m
bal ance am ent o dos i nt eress es des t as, o conci l i ador t em um a funç ão d i r et i va
na prom oção da co nci l i ação e no cont rol e e ori ent aç ão da di scu s s ão s o bre
el em ent os t i dos com o út ei s para a res ol ução do probl em a . Não ob s t an t e a
deci s ão fi nal s er t om ada form al m ent e pel os cont endores , o co nci l i ad o r
ex erce um papel d et erm i nant e na con s t rução dos t erm os do acord o e n a
propos i ção des t e às part es par a que o a c ei t em . Us ual m ent e, a função d i r et i v a
24

é ex erci t ada a pa rt i r da pos i ção d e aut or i dade que r eves t e o conci l i ad o r ( é o


cas o do j ui z que p r om ove a conci l i aç ã o ent re as p art es) e que t o rn a m ai s
det erm i nant e a s u a i nt ervenç ão.

A m edi aç ão, ao i nv ers o, é um p roc es s o de r es o l u çã o


dos confl i t os no qual é d ei x ado à s part es , por i nt e i ro, o po d e r, e
cons eqüent em ent e a res pons abi l i dade, de deci di r s e e co m o enco nt rar u m a
s ol ução ao confl i t o, na pres ença de u m ou m ai s m edi adores , cu j a t aref a
ex cl us i va é faci l i t a r a com uni c aç ão. A i m parci al i dade dos m edi ado res n ão
di z res pei t o apenas aos i nt er ess es da s part es , m as t am bém ref er e-s e às
rel açõ es de poder e nt re as part es : o a c ordo a que s e ch e ga na m ed i ação n ão
t em as cara ct erí s t i c as de “com prom i s s o ” que fi x a de um a vez po r t o d as um
equi l í bri o ent re os i nt eres s e em j ogo e que s e funda, n ec es s ari am en t e, no
des equi l í bri o das pos i ções i ni ci ai s das part es , m as s i m aq uel e de u m p a ct o
bas eado na pro gres s i va (re) cons t rução de um a rel aç ão ent re as p art es , q u e
cons ent e a c ri aç ão d e novas re gras par a afront ar concr et am e nt e os efei t o s do
confl i t o e o des con fort o que as part es es t ão vi v endo e d e out ro s co m o s
quai s s e confront ar ão. A m edi ação pe r m i t e a revel aç ão e o recon h e ci m ent o
pl eno das neces si da des e dos val ores das pess oas em confl i t o e, p o rt ant o , o
i ncrem ent o das pos s i bi l i dades que che gu em a um acordo est á vel e d u rado u ro.

A preocup ação em não i dent i fi car a m edi ação co m a


t rans aç ão e a con ci l i ação da Lei 9. 099/ 95 ou com i déi a d e co n f l i ct
r es ol ut i on , res i de na const at ação de qu e am bas concent r am t oda a at en ção n a
obt enção do a cordo e no des a fo gam ent o da m áqui na j udi ci ári a, r ed uz i n do e
em pobrec endo as po s s i bi l i dades de reva l ori z ação e r econh e ci m en t o ent re as
part es (B AR UC H BUS H; FO LGER , 1996, p. 22) e desp rez an d o a
oport uni dade de r e cons t rui r o p roces s o de re gul a ção s o c i al po r m ei o do
com ponent e com uni cat i vo-rel aci onal da m edi ação.

A opção ut i l i t ári a, cent rad a na obt ençã o d e aco rdo e


na cel eri d ade, seri a vál i da, é cl aro, m as t raz o ri s co, para n ão d i z er o
res ul t ado c ert o d e, em poucos anos, a m edi ação pad e cer do s m es m os
25

probl em as que j á af et am o s i st em a t radi ci onal de j us t i ça (m ai s um a v ez , val e


o ex em pl o do fraca s so da Lei 9.099/ 95, que, vi s t a apenas s ob a p ri m ei ra
aborda gem , a cabou reduz i ndo-s e a m ai s um i ns t rum ent o buro crát i co e
aut ori t ári o de adm i n i s t ração de um si st e m a penal hi pert ro fi a do).

Al ém di s s o, o que a ex peri ênci a dos J EC R IM rev el ou


foi a i ncom p at i bi l i dade ent re “es p aço d e cons ens o ” e devi d o proces s o l e gal .
É cert o qu e, por u m l ado, há um a d e m anda l e gí t i m a pel a am pl i aç ão d as
pos si bi l i dades de re s ol ução cons ens ual dos probl em as rot ul ados com o cri m e,
m as , por out ro, est á evi denci ado que o t ri bunal , o pro cess o l egal n ão co n fe re
- e n ão dev e conf e ri r - o es paço adeq uado par a t ant o, d a í a defi n i ç ão d a
m edi ação p enal com o “espaço -out ro”.

A pers pect i va da m e di ação cons i der a o con fl i t o com o


part e i nt e grant e da vi da do hom em , por i ss o não part e da p rem i s s a q ue é u m
probl em a a s er r es ol vi do/ deci di do a qual quer cus t o e de form a r áp i d a: a
m edi ação p erm i t e que as p es s oas c om preendam -s e a s i m es m as e s e
rel aci onem com as out ras at ravés do m arco do confl i t o (BAR UC H BUS H;
FO LGER , 1996, p. 2 2).

Ao l ongo da hi s t óri a, os hom ens el ab o rar am


num eros as m odal i da des de ges t ão dos c onfl i t os , al gum as b as eadas n a fo rç a,
ou sej a, na ut i l i z ação de um a pos i çã o de s uprem a ci a re al ou p res u m i d a,
out ras basead as no di ál ogo, no reconh eci m ent o, ao m enos form al , de u m a
pos i ção de pa ri dade. Todas as m odal i dades de ges t ão do co n fl i t o
(basead as na fo rça o u no cons ens o) t êm em com um a vont ad e de res o l v e r u m
probl em a que cri ou um di ss í di o ent re as part es ou ent re es s as e o s i s t em a
norm at i vo.

O re curs o ao t er cei ro n eut ro ao con fl i t o fo i


cons i derado n eces s á ri o vez que com fr e qüênci a a di v ersi da de de v i s õ es ge ra
com port am ent os hos t i s e di fi cul dade na com uni caç ão: s ão a s própri as p art es
que pedem a i nt e rm edi ação de um t erc e i ro que ga rant a a di scus são nu m n í v el
de ci vi l i dade e que s e des envol v a no i n t eress e dos cont end ores de en co n t r ar
26

um a s ol ução ao p ro bl em a. O t er cei ro n eut ro pode s e r t ant o o j ui z , q u an t o o


m edi ador. O que s e pr et ende é po r t ant o, que, d e m a nei ra re gr ad a e
j udi ci al m ent e cont r ol ada, aos ci dadãos s ej a of ert adas es sa pos s i b i l i d ad e d e
encam i nhar s eu prob l em a para um ou out ro canal .

A pos s i bi l i dade de a m edi aç ão re pres en t ar um


el em ent o i m port ant e para a s uper ação d o paradi gm a puni t i vo e, m ai s d o q u e
i ss o, a vi a de const rução de um novo m odel o de j us t i ça penal , reco m en d a u m
enfoque di f eren ci ad o, di st i nt o e di s t ante dos proj et os de re form a d a j u s t i ça
que s e fi x am nas i déi as de des con ges t i onar o j udi ci ári o, com o s e o ú n i co
probl em a fos s e o e x ces s o de t rab al ho, ou de i ns t i t ui r m e cani sm o s p rem i ai s
de evas ão ao p ro cess o, t am bém co m a úni ca fi nal i dade de “es v az i ar
prat el ei r as ”. O di ál ogo l i vre e m edi ado ex erci t a a c apa ci da de rel a ci o n al do s
ci dadãos ( Baru ch B us h e Fol ge r, 1996, p. 145) que foi abol i da pel a j u s t i ça
penal t radi ci onal , p oi s, no proces so penal , a re gr a é o di s t anci amen t o , n a
m edi ação, o encont r o. Lo go, a pot enci al i d ade da m edi aç ão de pen d e d e u m
proj et o com o ful cro de r econst r ução do pr ocess o de r egul aç ão s oci a l .

No cam po pen al , Di et er R ös sner d e m on s t ra qu e a


medi ação é um el em ent o bás i co do cont rol e do cr i me (2000 , p. 21 3 ). As s i m ,
ai nda com o aut or, o fat o é que a t e ori a cri m i nal t ent a s e aut o -i m un i z ar
cont ra a r eal i dade soci al , i gno rando a c om pl ex i dade do con fl i t o en t re v í t i m a
e ofens or, deci di ndo-o s obre s t andar ds l egai s e es cus an d o -s e de
com preend ê-l o. C ont udo, os procedi m ent os de pafi ci cação , recon ci l i aç ão e
recom posi ção, t al c om o a m edi ação, s em pre com puseram a noção d e j u s t i ça
penal , s em pre fora m um hábi t o nas com uni dades hum anas , m as for am
s upri m i dos pel os l i m i t es art i fi ci ai s do s i s t em a l e gal e s ubs t i t uí d o s p el as
prát i cas puni t i vas por um a raz ão: “u m Es t ado fraco re vel a s u a f raqu ez a
at ravés do cont rol e brut al do cri m e ” ( Id em , p. 215 ). O f ort al eci m en t o do
poder puni t i vo l evou a t eori a cri m i nal t radi ci onal a dei x ar de con s i d era r o
que R ös sner cl as s i fi ca com o d ependê nci a mút ua ent re os doi s s i s t em as
(m edi ação e puni ç ão), a qu al j us t i fi ca, am pl am ent e, a i ncorp o ra ção d a
27

m edi ação no si st em a es t at al de cont rol e do cri m e, poi s “a caract erí s t i ca do


s i s t em a penal l e gal é o cont rol e es t at al , não a puni ção ” ( Id e m , p. 2 1 9 ).

Nes s a l i nha, R ös s ner propõe qu e a m edi ação p en al


l ocal i z e-s e ent re a não-i nt erven ção e a puni ção, o que põ e em rel ev o s u a
funci onal i dade pa ra a efet i vação do pri ncí pi o da ul t i ma r at i o . O m ai s
i m port ant e na propos t a de R ös s ner é a percep ção de que o c ont rol e es t at al do
cri m e é i m pres ci ndí vel , m as dev e s e r c om preendi do ap enas com o um a p art e
do si st em a geral de cont rol e soci al . P art e i nt egra da a um t o d o,
com pl em ent ada por out ros si s t em as e, pri nci pal m ent e, subsi di ári a. P art e n a
qual am bos os m ei o s de cont rol e s ão ne cess ári os (pen a e m edi ação ) e d ev em
s er bal anc eados . Es s e bal ance am ent o pr es s upõe que, ao of e ns or, s ej a d ad a a
oport uni dade de ass oci aç ão vol unt á ri a, a fi rm aç ão da norm a ( r ul e-
af f i r mat i on ) e i nt egr ação à com uni dade ( Id em , p. 218), ant es do aci o n am ent o
dos m ecani s m os puni t i vos .

M es m o est rei t ando o con cei t o de m ed i ação p ar a


m edi ação penal , ai n da rest a um c ert o e m baral ham ent o d e n oções (m ed i aç ão,
conci l i ação, res ol u ção de confl i t os , et c.). A si s t em at i zação d e G raz z i a
Mannoz z i (2003, p. 340), el uci da qu ai s as di m ensões concei t u ai s m ai s
i m port ant es da m edi ação e, de ce rt a fo r m a, or gani z a o ent e ndi m en t o s o b re o
que pode s er a m edi ação p enal :

a) a m edi aç ão pod e ser consi der ada, em pri m ei ro l uga r, com o u m a m era
t écni ca d e i nt erven ção s oci al , em que um s uj ei t o t ercei ro e neut ro , t en d e a
prom over a s uper aç ão do con fl i t o ex i s tent e ent r e doi s i ndi ví duos , p o r m ei o
do encont ro e do co nfront o;

b) em segundo l u ga r, a m edi ação em er ge n a s ua função d e m odal i dad e d e


s ol ução de confl i t os que t em i nt ers ecç ão com o proces s o p en al , n a
perspect i va m ai s am pl a da j us t i ça r es t aurat i va ;
28

c) em t er cei ro l u gar, a m edi a ção põ e-s e com o um a no va abo rd a g em d e


di nâm i cas s oci ai s , que cons ent e em pres ci ndi r da r es post a j udi ci ári a 10 em
rel aç ão a al guns con fl i t os i nt erpess oai s ou ent re grupos.

Há out ros el em ent os que defi n em a m edi ação p en al


aqui des enhad a: di á l ogo, com uni c ação, com uni dade, part i c i pação , o s q u ai s
apont am para a de fi ni ção anal í t i ca d a a ut ora i t al i ana ( Id em , 2003, p . 3 5 9 ):

a mediação é um processo dialético de ativação do


conhecimento entre autor e vítima (que pode funcionar também
como fator de estabilização social) em que o mediador é
chamado para reconstruir o espaço comunicativo inter-subjetivo
entre as partes e para encontrar um ‘sinal’ comum que possa
conduzir à superação do conflito.

A des vi ncul a ção d a m edi ação com o r esul t ad o fi n al


de “a cordo” revel a sua “não-i ns t rum e nt al i dade” em r el a ção ao p r o ces s o
penal , por um s i m p l es m ot i vo: a m edi ação pen al não é um m ei o e s i m u m
fi m , um a at i vi dade, cuj o al c ance pode re sul t ar em um a s ol uç ão que i n d i q u e a
des necess i da de de pena, afas t an do, as s i m , as neces s i dades m at eri ai s d e
aci onam ent o da t ut el a penal repr es s i va (o que s e l e gi t i m a a p art i r d a
i nt erpret a ção do art i go 59 do C ódi go P enal ). N es s a l i nha, o conc ei t o qu e s e
encai x a no âm bi t o naci onal poderi a s e r: a medi ação é u ma r ea çã o pena l
(concebi da s ob o po nt o de vi s t a pol í t i co -cri mi nal ) aut ônoma e co mpl eme n t ar
à j us t i ça f or mal puni t i va, cuj o obj et o é o cr i me em s ua di mens ão r el a ci o n al ,
cuj o f undament o é a cons t r ução de um novo s i s t ema de r egul ação s oci a l ,
cuj o obj et i vo é s u per ar o déf i ci t co muni cat i vo que r es ul t ou o u q u e f oi
r evel ado p el o conf l i t o e, cont ext ual ment e, pr oduz i r uma sol ução co n s en s ua l
com base na repar a ção dos danos e da paz j ur í di ca.

Ex i s t em caract e rí st i cas com uns às m edi açõ es


prom ovi das em t odos âm bi t os : (i ) a i nt ervenç ão de t er cei r os i m p arci ai s n a
função de fa ci l i t adores, (i i ) o envol vi m ent o das part es e m confl i t o , (i i i ) o

10
A extrajudiciariedade é uma característica fundamental da mediação.
29

cons ens o das m es m as à at i vi dade d e m edi a ção e (i v ) a n at u rez a ex t ra-


j udi ci al .

A R ecom endaç ão do C ons el ho da Eu ro p a


m enci onada, i dent i f i ca ent re os pri ncí pi os ger ai s da at i vi dade de m edi ação o
pri ncí pi o da aut on om i a com rel aç ão ao si st em a de j ust i ça c ri m i nal : é o
reconhe ci m ent o cl a ro de que a m edi a ção, m es m o r el aci o nando -s e co m o
s i s t em a da j us t i ça, es t á fo ra do pro ces s o j udi ci ári o, con fi gur and o-s e com o
“es paço -out ro”.

De out ra part e, a m edi ação nas ceu e s e des en vo l v eu


no sei o de t eori as e ex peri ênci as di ri gi das à s uper aç ã o do i n s t ru m ent o
proces s ual com o úni co m ei o para res ol ução dos confl i t os . Bast a p en s ar n a
i m port ânci a das con t ri bui ções de t eóri c os do abol i ci oni s m o, m as t am b ém n as
prát i cas de r esol uçã o dos confl i t os ut i l iz adas nas popul açõ es i ndí gen as t ai s
com o os í ndi os da Am éri c a, os aborí gi nes can adens es e os ma or i . O s e u
s urgi m ent o na pós - m o derni dade i ns e re -se num a pl ural i da de de d eb at es : a
perda d e c ent ral i d ade do Est a do e a re cuper aç ão da cent ral i d ad e d a
“com uni dade ” (no s ent i do de col et i vi dade) n a gest ão d as pro b l em át i c as
s oci ai s ; a i nad equaç ão do i ns t rum ent o l e gi s l at i vo (c ri se d a v i s ão l e gi cên t ri c a
do di rei t o) e a pes qui sa de novos i ns t rum ent os de ges t ão dos con fl i t o s ; a
ex pans ão m oderna da l i berdad e e dos di rei t os e as cons eq üênci as n e gat i v as
de t udo i s t o no funci onam ent o da j us t i ça.

A m edi ação não é um a at i vi dade dese nvo l v i d a p el o


j ui z e pel os operad ores da j us t i ça, m as acont e ce fora das s al as d e aud i ênci a
e ut i l i z a i nst rum ent os vol t ados para a es cut a das em oções e par a o
reconhe ci m ent o dos val ores . Não t em a fi nal i dade de de fi ni r a v erdad e do s
fat os e est ab el ec er quem es t á ce rt o e q uem es t á er rado, m a s vi s a es t abel ec er
um a com uni caç ão e nt re as pes s o as e perm i t i r-l hes af ront ar os pro bl em a s
ent re el as . Ness e s e nt i do, o m edi ador não t em poder s ob re as part es e v i s a
cri ar no encont ro u m cl i m a (es paço e t e m po) de confi den ci a l i dade (o b ri ga ção
do s egredo pro fi s s i onal ), que pe rm i t e às pess oas s e ex press a rem l i vrem ent e.
30

Evi dent em ent e, no âm bi t o penal , o recu rs o à


m edi ação deve rá s e r s ubm et i do a cont r ol e j uri sdi ci onal , s e j a na deci s ão d e
envi ar o caso à m ed i ação, s ej a n a a cei t a ção d e s eu res ul t ad o com o fo rm a d e
ex cl us ão da i nt ervenção penal . As s i m , é neces s á ri o defi n i r parâm et ro s d e
re gul aç ão l egal , par a que não s e t orne um procedi m ent o pri vado d e ga ran t i as
ou um a form a de pri vat i z ação do confl i t o, cuj a ger ênci a s e ri a con feri d a ao
Es t ado, com o es péci e de “ adm i ni s t ração públ i ca de i nt eres s e s pri v ad os ”.

P el o cont rári o, o cont rol e j uri s di ci onal p res erv a o


carát er públ i co da dem anda, reconh e cendo, apen as , a pos s i bi l i d ade d e
i nt ervenção di r et as das part es em s ua s ol ução e, ai nda, garan t e o
envol vi m ent o com uni t ári o s ob re gra s defi ni das . C aber á ao j ui z , co m
part i ci paç ão ou não do M i ni s t éri o P úbl ico, deci di r qu al cas o s erá rem et i d o à
m edi ação e, adi ant e , rec epci onar s eu r e s ul t ado dent ro do s i s t em a d e j u s t i ça,
conferi ndo-l h e form a j urí di ca, s e gui ndo cri t éri os defi ni dos pel a d o gm át i c a.
Val e di z er: a l ei fornece os cri t éri os pa ra adm i s s ão da s ol ução al t ern at i v a e
conform i dade do s e u res ul t ado ao ord en am ent o j urí di co.

E, i m port ant e fi x ar, a m edi a ção n ão po de s u b v ert e r o


di rei t o ao pr oces s o , s ob pena d e t orn ar-s e m ai s um m ei o aut o ri t ári o d e
gove rno da j ust i ça penal , com o o é a t rans aç ão penal . Des s a con cl us ão,
defi ne-s e a r el aç ão da m edi ação com o proces s o penal : co m pl em en t ari ed ad e
funci onal .

Colocando-se a voluntariedade como requisito básico –


e não como direito público subjetivo – sempre que assim quiserem, quaisquer
das partes podem recusar o envio do caso à mediação, excercendo seu direito
ao processo. Por outro lado, o direito ao processo, deve ser concebido como
direito, não como obrigação, ou seja: o direito ao processo, para ser pleno e
realizável, deve incluir o direito de evitar o processo, naquelas cirscunstâncias
em que a resposta punitiva possa ser substituída por outras reações penais,
como a reparação-conciliação, a qual entendemos que só pode ter lugar no
espaço extra-judicial e extra-processual.
31

É razoável supor que, ter direito a alguma coisa


compreende, necessariamente, a opção de não usufruir dela, não recorrer ou,
pelo menos, renunciar. Se a opção transforma-se em imposição, não há como
falar em direito ao processo. O direito a ser compelido a participar do processo
penal, reduz o alegado direito ao processo, ao direito de defesa para o acusado
e ao direito de ser testemunha (?) e não encontrar-se com o acusado para a
vítima. A opção, voluntária, livre, informada e regulada para apropriar-se do
conflito, discuti-lo e, eventualmente, negociar uma solução, tem que ser
incluída na pauta de decisões públicas que consolidam o direito ao processo.
Sem essa possibilidade, tal direito não existe.

Em sum a, os requi s i t os para qual i fi ca r a m edi aç ão


penal s ão: (i ) vol unt ar i edade; (i i ) c onf i denci al i dade e or al i d a d e, (i i i )
i nf or mal i dade; (i i i ) neut r al i dade do medi ador; (i v ) at i vo en vo l vi ment o
comuni t ár i o; (v ) aut onomi a em r el ação ao si st ema de j us t i ça .

Quant o á vol unt a ri edade, t r at a-s e do req ui s i t o


fundam ent al , poi s pres erv a o di rei t o ao proc es s o e a p a rt i ci pação l i vr e e
cons ent i da ex pres s a um s ent i do de confi an ça no or denam ent o e de
reconhe ci m ent o da m ens a gem no rm at i va m ui t o m ai or q ue aqu el e efei t o
i l us óri o deri vado da am eaç a de pena (efei t o de prev ençã o ger al ). M as , o
engaj am ent o vol unt ári o de ofens or e ví t i m a deve ser consi derado em b as es
real i s t as , ou s ej a, n ão há com o des cons i derar que a s i m pl es pos s i b i l i d ad e d e
reenvi o do cas o pa ra o s i s t em a form al de j us t i ça s em pre pres s i o n ará as
part es em al gum s ent i do: o ofens or, m ai s nat ural m ent e, t ent ará ev i t ar a
est i gm at i z ação e a possi bi l i dade de pena e a ví t i m a, ocas i onal m en t e, p od erá
ver na m edi aç ão um a vi a r ápi da p ara o r es s arci m ent o dos pr ej uí z o s m at eri ai s
ou, por out ro l ado, poderá evi t ar o encont ro com o ofens or t em en d o a
revi t i m i z ação. P or iss o, os prat i cant es de m edi ação p enal prefe rem fal ar e m
cons ens o i nf or mado par a os ofens or es e es col ha i nf ormad a par a as v í t i m as
(T IC KE LL; AKES T ER , 2004, p. 24). Es s a i nform ação pr évi a d ev e i n cl u i r
ass i s t ênci a j urí di ca (ad vo gado) t ant o pa ra ofens o r, quant o p ara ví t i m a. J á a
confi denci al i dad e é o el em ent o de garant i a pa ra, no c as o de m edi aç ão
32

i nfrut í fera, evi t ar q ue os fat os deb at i dos naquel a s ed e pos s am ser u s ad o s em


j uí z o, a não ser que as part es co ns i nt am para t ant o.

6. A mediação como forma de assegurar a continuidade democrática

A democracia tem a ver com a abertura e i ndefinição de fronteiras,


não com enclausur amentos, fronteiras rígidas e distinções
dicotomi zadas. ( CALDEIRA, 2000, p. 44).

Se o modelo vigente de justiça penal, vertical,


inflexível e fechado, demonstrou-se incapaz de atender à demanda por
democracia e, mais do que isso, abriu um espaço para a articulação de
discursos e práticas que impedem a continuidade democrática, iniciada com a
transição posterior ao regime militar, é preciso pesquisar por um novo modelo.

Ao analisar a fuga da democracia para a justiça e a


fuga desta para o penal, Ceretti identifica “dois fenômenos paralelos,
antitéticos, convergentes e densamente problemáticos: um recurso maciço às
categorias penais, de um lado, e o desejo por reapropriar-se da gestão das
relações sociais, por outro” (2000). Por todo o debatido até aqui, está evidente
que a mediação é uma forma de reapropriação, de ativação da participação dos
cidadãos na gestão dos conflitos que nascem do crime e, enfim, de aceitar as
suas deliberações como um ponto de referência que pode influenciar a
administração da justiça no caso concreto.

Claudius Messner reconhece que, para que seja


concebida como forma de substituição da tutela penal, na medida em que
oferece espaço para o dimensionamento social do conflito, deve apartar-se da
idéia de defesa social (ínsita à justiça guiada pela fala do crime) e caminhar na
direção de um Estado democrático de direito, voltando-se para a garantia da
liberdade e a manutenção de “concretas possibilidades de desenvolvimento dos
33

indivíduos” (2000, p. 100). Nesse sentido, a demanda é, portanto, que a


mediação seja “um procedimento democrático de produção do direito no
sentido da consolidação da liberdade individual” (Idem) e da capacidade de
auto-determinação dos sujeitos. A mediação, para Messner, poderá ser uma via
democrática se não reduzir a vítima à definição legal restritiva e não levar o
réu à estigmatização e à exclusão (Idem, p. 101).

A produção do direito a partir de uma atividade


dialética e infomal pode assustar àqueles que ainda mantêm uma visão
exclusivamente legicêntrica do direito. Reação esta que vai justificar parte das
críticas contra as chamadas formas de “justiça negociada”. Ocorre que, como já
foi dito, a mediação põe em confronto os paradigmas do direito imposto e do
direito negociado, mas mantém ambas as esferas intactas e separadas, em
relação de complementariedade funcional (ou seja, onde a não funciona a
mediação, funciona a punição, e vice-versa), partindo da premissa que a

multiplicação vertiginosa de demandas de direito relaciona-se com a


própria multiplicação das oportunidades de conflito, devidas a
profundas transfor mações no plano sócio-econômico, ao aumento da
comunicação, às trocas sociais, ao crescimento do número de bens de
circulação que favoreceram a passagem de um modelo uni versali sta,
‘geocêntrico’, que i mpõe as mesmas regras a todos os cidadãos de
uma nação, a um modelo j urídico ‘egocêntrico’, particularista, onde
cada suj eito vai regulamentar as relações j urídicas que lhe dizem
respeito sobre a base de um códi go j urídico distinto (CERETTI,
2000).

É visualizando este pluralismo jurídico que se entende


a necessidade de uma maior variedade de recintos jurídicos abertos à
comunicação. Nesse contexto, a ordem imposta baseada em normas
exclusivamente repressivas se dilui, se “desorganiza”, fazendo emergir diversas
ordens negociadas, as quais, se não forem trazidas para a esfera da justiça,
acabarão legitimando-se à margem desta, tal como ocorre com as chamadas
subculturas criminais.
34

A mediação tem como escopo legitimar a negociação


da ordem sob a insígnia da lei, trazendo essa atividade para a luz de um espaço
público, reconhecido e valorizado como tal. A expressão gestão negociada,
para Ceretti (2000), funciona, então, como uma

metáfora da autorepr esentação moderna da democracia, entendida


como um debate públi co e per manente, onde os valores e as nor mas
que estão na base da sociedade e do direito restam sempre latentes e
provisórios, submetidos à força da melhor argumentação.

Provisoriedade, não entendida como precariedade da


ordem normativa: diz respeito à necessidade de reafirmação das normas diante
da possibilidade que cada caso oferece para discuti-las e interpretá-las a partir
de referências subjetivas e situacionais das partes e por meio de uma atividade
de conhecimento (mediação) baseada na linguagem e na recepção da mensagem
normativa conforme as particularidades dos atores da comunicação.

Mesmo no paradigma atual, do direito imposto e


supostamente inegociável, ocorrem formas implícitas de negociação das
normas, que se desdobram desde a elaboração, até a compreensão e aplicação
das leis. No contrato social, as partes mais influentes, que “dispõem de maior
peso contratual” (CERETTI, 2000), conseguem negociar seus interesses e
direitos já no momento de elaboração das leis, as quais, entretanto, têm efeito
vinculante também para aqueles que não foram representados na contratação.
Mesmo pensando em termos de devido processo penal, reserva legal e
obrigatoriedade da ação penal, é sabido que, no desenrolar do processo, as
pessoas com mais capacidade de compreender a lei e encontrar uma
justificativa para seu comportamento, ou amparo para seu interesse no
emaranhado legislativo (e jurisprudencial), conseguem criar condições de
negociar o direito (capacidade esta que deriva diretamente da situação
econômica da pessoa). Ao reverso, as pessoas privadas dos códigos de
comunicação dos tribunais, sequer conseguem compreender a atividade
jurisdicional e, muito menos, negociar uma solução que lhes seja mais justa.
35

Sem falar, ainda, nos mecanismos evasivos ilegais (corrupção), cujas


oportunidades são potencializadas, e muito, num sistema paleorepressivo,
fechado e, logo, tendente à arbitrariedade. Nessa perspectiva, a justiça
consensual ou negociada difunde para um maior número de membros do grupo
a possibilidade de tutelar suas posições em relação à lei (CERETTI, 2000), o
que, lembrando Bobbio, perfaz uma das condições essenciais do regime
democrático.

Avaliando a experiência catalã, Nogueras Martin


(2003, p. 69) concluiu que:

a mediação traduz uma j ustiça horizontal e não vertical, oferece


elementos restaurativos, o que leva a que os cidadãos participem da
j ustiça. A mediação é diálogo, é comunicação e, como J.F. Six dis se,
é uma arte de compromisso. Se usar mos a mediação em qualquer área
de nossa vida, seremos mais responsáveis e melhoraremos a
democracia.

Ao falar da “mediação em qualquer área”, recorda-se


das categorias indispensáveis para a análise da democracia propostas por
Casanova (2002), nas quais essa se insere (considerada em sentido amplo), pelo
que, uma sociedade que reduz as formas de mediação disponíveis para o
desenvolvimento da vida comunitária, reduz suas próprias aspirações
democráticas.

Discorrendo sobre as particularidades dos projetos de


mediação penal em curso na Europa, Christa Pelikan conclui que t êm cumprido
a função de clarificar e confirmar as reivindicações legítimas através de um
método diferente, que se distingue por alguns elementos basilares, dentre os
quais o elemento participativo ou democrático, que está fortemente presente
nas experiências de MVO (mediação vítima-ofensor) e decorre do requisito da
voluntariedade (2003, p. 74/75). Este, impõe o desafio participativo à
mediação, pois esta nunca se realiza sem a concordância das partes, fator, que
por si só, já confere um diferencial de democracia bastante destacado em
36

relação à justiça penal tradicional. A voluntariedade, por sua vez, atende


àquela condição essencial para uma definição mínima de democracia propost a
por Bobbio (1986): a oferta de opções, de alternativas reais para que os
membros do grupo possam efetivar sua participação por meio da deliberação
entre uma ou outra coisa. No sistema complementar de dupla entrada (mediação
e punição), há uma possibilidade concreta para o cidadão deliberar uma ou
outra forma de solucionar o conflito que viveu, no sistema fechado, de mão
única, não há a mais tênue possibilidade. A voluntariedade, confere aos
cidadãos aquele papel significativo na gestão de um assunto público, pleiteada
por Chomsky (2003).

Ao falar sobre os chamados sistemas alternativos de


resolução dos conflitos na América Latina, Juan Enrique Vargas (2002, p. 16)
assevera que mediação e conciliação têm apresentado algumas vantagens em
relação ao sistema tradicional, tais como promover uma maior e melhor
comunicação entre as pessoas, instalando uma cultura de diálogo, e fazendo-as
mais responsáveis por seus próprios atos, “em definitivo, se afirma que estes
sistemas favorecem formas mais democráticas e participativas de resolução dos
conflitos”.

O tema da participação popular na administração da


justiça também é abordado por Ana Paula Zomer Sica (2003, p. 114), que
enfatiza já ser o momento de estender o conceito para além da instituição do
júri, pois a idéia de soberania popular

‘tem como sua base material o conflito entre as classes sociais e as


contradições que se desenvol vem dentro delas; constitui o filtro
através do qual a soci edade concebe e vi ve tais contrastes.’ Ainda, e
tocando no tema ‘participação popular’, diz o referido autor que tal
expressão deve ser compreendida como uma possibilidade concreta de
impedir que a neutralidade da magistratura se traduza na legiti mação
de escolhas que, negando a conflitualidade social e, bem por i sto,
procurem resol vê-la anulando o polo conflitual mais fraco, o
interesse subalterno merecedor de tutela e o direito do cidadão à
tutela dos direitos fundamentais de liberdade.
37

O histórico trabalho da Comissão para Verdade e


Conciliação na África do Sul (S ICA, 2007), desenvolvido sobre os princípios
mais avançados de justiça restaurativa, foi prova viva do seu potencial para
concretizar a transição democrática. Marcelo Flores (1999), Ceretti (2002) e
David A. Crocker (2002) analisaram a experiência e partilham dessa opinião. A
“revolução negociada” (CERETTI, 2000) promovida na África do Sul, baseada
sobre o perdão, a anistia, a reparação às vítimas e a conciliação demonstrou
que é possível utilizar métodos de solução pacífica dos conflitos e abrir mão da
resposta punitiva (post-conflict peace building ), mesmo numa situação de
conflagração nacional e de graves violações dos direitos humanos, com uma
contrapartida considerável para a democracia. Após anos de apartheid, as
comissões conseguiram suplantar sentimentos de vingança historicamente
enraizados e, com a força da linguagem, abrir um espaço de co-habitação, de
co-presença (CERETTI, 2002) que conduziu o país à uma estabilização
democrática naquele momento intangível.

O desafio inicial das comissões era, justamente,


assegurar a continuidade da transição democrática, evitando a ameaça que os
sentimentos de vingança e punição pós- apartheid representava para esse
processo. Havia, então, uma forte consciência de que liberar essa demanda sob
a forma de repressão não poderia resultar na superação plena do período
totalitário e impediria a criação de uma nova compreensão do regime político,
mantendo-o atado ao passado violento e limitando a democracia à possibilidade
de voto universal. Crocker, então, ressalta que os africanos demonstraram que
antigos inimigos, pessoas em conflito, podem acordar uma vida comunitária
não letal, sob o regime da lei e reduzir suas diferenças através da deliberação
pública (2002, p. 545). A reconciliação promovida na África do Sul, resultou
na desnecessidade da punição, mesmo em face de graves crimes cometidos e
reconhecidos. “As metas da justiça penal e da reconciliação, então, podem
reforçar-se uma à outra”, a lição daquele momento histórico foi que não há
como uma ignorar a outra e, segundo o autor: “daqui em diante, as sociedades e
a comunidade internacional deveriam desenhar instituições nas quais ambos os
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ideais de punição e reconciliação sejam compreendidos simultaneamente, em


várias instituições e mecanismos” (Idem). A Comissão para a Verdade e
Reconciliação demonstrou, em síntese, uma nova visão da balança da justiça,
bem resumida pelas palavras do Arcebispo Tutu: “nós temos que balancear as
necessidades de justiça, accountability, estabilidade, paz e reconciliação”, ou
seja, uma justiça que não pesa e contra-balanceia as necessidades de punição
com as possibilidades de mediação-reparação-conciliação, não pode ser justa.

Em outro contexto, Melissa S. Williams (2002)


analisou a relação entre justiça penal e democracia em face do pluralismo
cultural, enfocando a situação dos aborígines canadenses. Williams,
igualmente, concluiu que a justiça restaurativa é um modelo capaz de abater a
seletividade e a iniqüidade de um sistema fechado às diversas concepções de
justiça que afloram no interior de uma nação. Reconcebendo a justiça através
da linguagem, as práticas restaurativas implementadas naquele país, têm
conseguido criar um “espaço normativo compartilhado” mais adaptável ao
conhecimento local e à compreensão de justiça daquele povo marginalizado,
cuja presença na justiça penal tem sido expressiva, sem, no entanto, abalar a
estrutura jurídica canadense. Aliás, muito pelo contrário, a sentença R. v.
Gladue, da Suprema Corte do Canadá, revelou um processo inverso: as práticas
restaurativas introduzidas no sistema por causa da população aborígine, estão
fornecendo uma base mais rica para aperfeiçoamento da justiça também em
casos de não-aborígines, impulsionando até mesmo uma mudança expressiva no
Código Penal.

Após detida análise, Williams concluiu que “os


espaços abertos dentro de nossos conceitos, normas e regras têm uma
importância crítica como recurso para a renegociação dos termos de nossas
relações de maneira a não recriar dominação”, cultural e econômica que sempre
existe nas sociedades e que o sistema de justiça tradicional tendencialmente
reproduz e aumenta, tornando-se, de fato, uma barreira institucionalizada à
expansão da democracia.
39

Philip Oxhorn e Catherine Slakmon (2005), também


partem da construção de Caldeira sobre o caráter disjuntivo da democracia
brasileira para concluir que “a justiça restaurativa pode ajudar de fato a
compensar déficits democráticos importantes ao unir o Estado e a sociedade em
um processo de sinergia” (Idem, p. 189), posto que se insere num conceito que
os autores chamam de micro-justiça, cujas iniciativas podem tornar a justiça
mais democrática em termos de acessibilidade, universalidade e legalidade,
enfrentando, então, o maior desafio da transição democrática em nosso país
(Idem, p. 196).

Enfim, revendo as experiências de justiça restaurativa


– que é moldura conceitual que viabiliza a mediação em matéria penal - no
Canadá e Nova Zelândia, Oxhorn e Slakmon sugerem que esta poder oferecer
um locus concreto para democratizar a justiça e construir cidadania civil de
baixo para cima (Idem, p. 205); considerando-se que a mediação pode ser tida
como a atividade que melhor realiza os princípios da justiça restaurativa, abre-
se chance real para que a mediação assegure a continuidade democrática e
integre a cidadania brasileira, preenchendo o vácuo democrático criado pelo
atual sistema de justiça.

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