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Final Relatorio Diagnostico Betim Jun 2013-1
Final Relatorio Diagnostico Betim Jun 2013-1
Pesquisadores de campo
Andréia dos Santos
Maria José Gontijo Salum
Marco Antônio Couto Marinho
Rogério Vasconcelos Diniz
Sânia Maria Campos
Vanderlei Lopes Barbosa
3
Assistentes Técnicos
Bruna Aarão
Marco Antônio Couto Marinho
Camila Moreira Costa
Estagiários
Ana Carolina Oliveira (Ciências Sociais)
Andreia Antônia de Jesus (Ciências Sociais)
Bárbara Campos (Psicologia)
Caio Cristiano de Brito Rodrigues (Relações Internacionais)
Jade Cristine Barbosa da Silva (Direito)
Josiane Souza Medeiros (Ciências Sociais)
Lorena Paes Miranda e Martins (Psicologia)
Rudney Avelino de Castro (Relações Internacionais)
Thais Abrantes de Oliveira (Pedagogia)
Revisão
Ev‟Ângela Batista Rodrigues de Barros
Maria do Rosário Alves Pereira
Financiamento:
Fundo da Infância e Adolescência / FIAT
LISTA DE SIGLAS
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 14 – População de 0 a 17 anos nas regionais de Betim, subdivididas nas faixas etárias
correspondentes aos níveis de educação infantil, fundamental e médio – IBGE, Censo
2010...........................................................................................................................................77
Gráfico 27 – Relação entre a lista de espera e a população de 0 a 5 anos em cada uma das
regiões....................................................................................................................................100
Gráfico 28 – Percentual das listas de espera das faixas etárias 0 a 3 e 4 e 5 anos em relação à
lista de espera total da faixa etária 0 a 5 anos – Betim e regionais -
2011.........................................................................................................................................101
Gráfico 30 – Relação entre a lista de espera e a população de 0 a 5 anos em cada uma das
regiões.....................................................................................................................................103
10
Gráfico 36 – TMI de crianças com até 5 anos a cada 1.000 nascidos vivos – Betim - 1995 a
2010.........................................................................................................................................215
Gráfico 38 – Taxa de Homicídio por grupo de 100 mil hab. faixa etária de 0 a 14 anos
Betim, Belo Horizonte, RMBH e Minas Gerais de 1996 a 2009............................................320
Gráfico 39 – Taxa de Homicídio por grupo de 100 mil hab. faixa etária de 15 a 19 anos
Betim, Belo Horizonte, RMBH e Minas Gerais de 1996 a 2009............................................321
Gráfico 40 – Taxa de Homicídio por grupo de 100 mil hab. faixa etária de 15 a 24 anos
Betim, Belo Horizonte, RMBH e Minas Gerais de 1996 a 2009............................................322
LISTA DE TABELAS
Tabela 7 – Distribuição do número absoluto de crianças, adolescentes e jovens até 24 anos por
faixas etárias e por Regionais– Censo 2010.......................................................................56
Tabela 8 – Percentual de crianças, adolescentes e jovens até 24 anos por faixas etárias e por
Regionais em relação à população total do município de Betim – Censo
2010...........................................................................................................................56
Tabela 17 – Evolução das taxas de homicídio na população total segundo área geográfica.
Brasil, 1998-2008.......................................................................................................319
LISTA DE QUADROS
Quadro 5 – Relação entre o número total de matrículas nos diversos níveis de ensino e a
população de 0 a 17 anos – Betim e Regionais – 2010/2011....................................................79
Quadro 7 – Relação entre o número total de matrículas do ensino médio nas escolas estaduais
e a população de 15 a 17 anos – Betim e Regionais –
2010/2011.....................................................................................................................81
Quadro 8 – Número de instituições educacionais ligadas à rede pública existente – totais, por
nível de ensino e por regionais..................................................................................................82
Quadro 24 – Percentual de internações por ano na faixa etária 0 a 18 anos – Betim e em outros
municípios – 2007 a
2010..........................................................................................................................205
Quadro 25 – Internações segundo causas diagnósticas do CID (capítulos), por idade detalhada
de 0 a 18 anos – Betim –
2010.............................................................................................................................206
Quadro 28 – Internações segundo causas diagnósticas do CID 10, de residentes em Betim nas
faixas etárias de 0 a 19 anos – Betim e em outros municípios – 2007 e
2010.........................................................................................................................................207
Quadro 31– Percentual de internações por faixa etária, instituição de saúde e cidade onde
ocorreu a internação – 2010....................................................................................................209
Quadro 39 – Gestantes por faixas etárias por regionais – Betim – 2007 a 2010....................222
LISTA DE CARTOGRAMAS
Cartograma 4 – Distribuição espacial das pessoas com idade de 1 a 4 anos – Betim por
Regionais 2010..........................................................................................................................58
Cartograma 5 – Distribuição espacial das pessoas com idade de 5 a 9 anos – Betim por
Regionais 2010..........................................................................................................................59
Cartograma 6 – Distribuição espacial das pessoas com idade de 10 a 14 anos – Betim por
Regionais 2010..........................................................................................................................58
Cartograma 7 – Distribuição espacial das pessoas com idade de 15 a 19 anos – Betim por
Regionais 2010..........................................................................................................................59
Cartograma 8 – Distribuição espacial das pessoas com idade de 20 a 24 anos – Betim por
Regionais 2010..........................................................................................................................59
19
LISTA DE FIGURAS
APRESENTAÇAO
A partir da década de 1980, o tema da infância e da adolescência ganhou espaço nas agendas
de organizações governamentais e não-governamentais nacionais e internacionais. A PUC
Minas, comprometida com a promoção da justiça social para a construção de uma sociedade
democrática, plural e igualitária sentiu-se no dever de contribuir para melhor compreensão da
complexa problemática da infância e da adolescência em nosso país, com os diferentes
olhares dos domínios do conhecimento produzidos no cotidiano da vida acadêmica. Algumas
iniciativas de pesquisa e reflexão sobre a temática da infância e da adolescência afirmava-se
com grande relevância, resultando na proposta de estruturação do ICA por um grupo
interdisciplinar de professores, em 1999. No ano seguinte, o ICA foi oficialmente reconhecido
e vinculado à Pró-Reitoria de Extensão.
Sabemos, entretanto, que ainda são grandes os desafios perante as graves violações de direitos
que precisam ser enfrentadas, como: o combate ao trabalho infantil; o enfrentamento da
exploração sexual; a melhor estruturação das medidas socioeducativas para o atendimento a
adolescentes em conflito com a lei. Betim precisa garantir oportunidades para a plena
proteção das 122.095 crianças e adolescentes, que correspondiam em 2010, a 32,3% da
população total do município. Para isso, é preciso que as políticas públicas sejam articuladas e
garantam o acesso aos direitos a todas as crianças e os adolescentes. Desafios presentes na
sociedade brasileira estão também presentes na cidade de Betim, como o de enfrentar as
vulnerabilidades representadas pela drogadição, o abuso sexual, os castigos corporais, as
situações de pobreza, e novas questões como o encurtamento da infância, o consumismo
desenfreado e o individualismo. E é urgente combater o assassinato de crianças e adolescentes
pobres, assim como a banalização destes crimes. Enfim, este relatório demonstra avanços na
garantia de direitos para crianças e adolescentes, mas também aponta que ainda persistem
situações de negação de direitos básicos a essa faixa etária.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................27
1.1 Objetivos do diagnóstico....................................................................................................28
1.2 Aspectos metodológicos.....................................................................................................29
1.2.1 Metodologia.....................................................................................................................29
1.2.2 Justificativas metodológicas............................................................................................30
1.2.3 Passos para o diagnóstico – estratégias metodológicas...................................................31
1.2.3.1 Primeira etapa: o levantamento de dados secundários e mapeamento da REDE de
Atendimento.............................................................................................................................31
1.2.3.2 Segunda etapa: a pesquisa de campo............................................................................33
1.3 A estrutura do Relatório.....................................................................................................39
4 A SAÚDE.......................................................................................................................... 200
4.1 A saúde em Betim........................................................................................................... 201
4.2 O ECA e a saúde da criança e do adolescente................................................................ 203
4.3 Morbidade....................................................................................................................... 203
4.4 Mortalidade: Taxa de Mortalidade Infantil – TMI......................................................... 209
4.5 Taxa de Mortalidade Infantil em Betim......................................................................... 211
4.6 Vacinação........................................................................................................................ 215
.7 Unidades de Saúde........................................................................................................... 216
4.8 Ações voltadas para a saúde de crianças e adolescentes em Betim............................... 217
4.9 Propostas de programas da 11ª Conferência Municipal de Saúde de Betim................ 219
4.10 Saúde bucal................................................................................................................... 220
4.11 Mães adolescentes......................................................................................................... 221
4.12 Saúde e desnutrição....................................................................................................... 223
4.13 Breves considerações..................................................................................................... 224
5 ESPORTES....................................................................................................................... 225
5.1 Espaços públicos da municipalidade e promoção dos esportes...................................... 228
5.2 Estrutura de pessoal e descontinuidade de serviços........................................................ 239
5.3 Esporte, lazer, crianças e adolescentes............................................................................ 241
5.4Conclusões........................................................................................................................ 249
REFERÊNCIAS.................................................................................................................. 474
1 INTRODUÇÃO
1.2.1 Metodologia
[...] dá acesso a uma ampla gama de dados, inclusive os tipos de dados cuja
existência o investigador pode não ter previsto no momento em que começou a
estudar e, portanto é um método bem adequado aos propósitos do estudo de caso
(BECKER, 1997, p. 118).
31
meio de uso do Software SPSS -15.0, Programa de Análise Estatística (Statistical Package for
the Social Sciences). Uma cópia do questionário está disponível como anexo do Relatório e a
apresentação e análise dos dados levantados sobre as creches estão dispostas no capítulo
referente à Política de Educação.
Dessa forma, a primeira etapa de pesquisa consistiu no levantamento de informações
que pudessem dizer sobre:
(a) Dados socioeconômicos e demográficos;
(b) Infraestrutura do município (números de estabelecimentos de ensino, de saúde, de
assistência social etc.);
(c) Aspectos administrativos e institucionais (Secretarias Municipais, Conselhos
Municipais atuantes, Conselho Tutelar etc.);
(d) Organizações não governamentais (existências e tipos de organizações voltadas
para a criança e para o adolescente, projetos sociais empresariais etc.).
Ressalta-se que tal etapa foi importante para a realização da pesquisa de campo e
possibilitou dimensionarmos e mapearmos os atores sociais (instituições e pessoas) para as
entrevistas.
a) Observação simples
b) Entrevistas em profundidade
c) Grupos Focais
Base de recrutamento:
Estratégia de abordagem:
Roteiro de discussão:
Morgan (1997) destaca que o roteiro do grupo focal pode ser construído por dois
extremos: (a) assertivas gerais e (b) questões diretas. Cada uma dessas opções oferece suas
vantagens particulares. Nossa opção pelo primeiro caso, considerando o aspecto sensível de
36
certos temas, permitiu que a discussão fosse conduzida com um maior grau de fluidez. Com
relação às questões diretas, conforme Morgan (1997), há a vantagem de se ganhar em
comparabilidade, mas isso depende muito do tema proposto como foco de discussão. Os
temas como lazer, cultura, participações em projetos sociais, foram abordados de forma
direta.
Cruz Neto, Moreira e Suscena (2002) advertem que o Grupo Focal não é um
“instrumento monolítico e estático” e apontam que “sua elaboração envolve a pontuação dos
tópicos que serão discutidos no grupo, a fim de que as sessões sejam bem direcionadas e
nenhum tema deixe de ser mencionado, servindo, pois, como meio de orientação e auxiliar de
memória” (2002, p. 10).
Dessa forma, o roteiro foi construído de maneira a permitir aos participantes um
envolvimento no grupo sem causar-lhes constrangimentos, quaisquer que fossem os temas.
Buscamos a elaboração de um roteiro calcado em questões que possibilitassem aos
participantes o relato espontâneo de suas experiências pessoais. Dividimos o roteiro dos
grupos focais nos seguintes módulos temáticos: I) Estudo e Escola; II) Tempo Livre e Lazer;
III) Família; IV) Trabalho; V) Violência; VI) Expectativas e Sonhos. Em cada um desses
módulos foram feitas cerca de três ou quatro questões diretas.
1
Programa de análise estatística (Statistical Package for the Social Sciences - pacote estatístico para as ciências
sociais).
37
Como bem ressaltam os autores citados, “o pesquisador não deve esquecer-se de que,
por ser uma técnica que visa a coleta de dados qualitativos, o número de Grupos Focais a ser
realizado não é rigidamente determinado por fórmulas matemáticas, mas pelo esgotamento
dos temas, não se prendendo, portanto, a relações de amostragem” (CRUZ NETO;
MOREIRA; SUSCENA; 2002, p. 6).
Forma de recrutamento:
Citando Krueger (1996), Cruz Neto, Moreira e Sucena (2002) sugerem que o número
de participantes de um grupo focal seja “condicionado por dois fatores: deverá ser pequeno o
suficiente para que todos tenham a oportunidade de expor suas ideias e grande o bastante para
que os participantes possam vir a fornecer consistente diversidade de opiniões” (2002, p. 12).
Dessa maneira, procuramos realizar grupos focais contando com o envolvimento entre 7 e 10
componentes – número que consideramos suficiente para garantir um debate adequado e com
a participação dos envolvidos. Ao todo, foram realizados 10 grupos focais, sendo 5 com
adolescentes e jovens, e 4 com pais ou responsáveis.
Para realização dos grupos com adolescentes, contamos com apoio de escolas da rede
municipal e estadual do município – tanto para a realização do recrutamento como para a
utilização do espaço. O quadro seguinte apresenta a composição, os bairros de residência, o
sexo e a quantidade de participantes dos grupos focais feitos com adolescentes e jovens.
38
2 9 3 6 Colônia, Santa
Isabel, Alto Boa
Vista, Cachoeira.
3 7 3 4 Espírito Santo,
Morada do Trevo,
Decamão.
4 10 4 6 Paulo Camilo,
Betim Industrial,
Paulo Camilo II,
Dom Bosco,
Conjunto
Habitacional Jalita
Pedrosa, jardim
Alterosas, Jardim
Alterosa 1ª Seção.
5 11 6 5 Bom Retiro, Alto
das Flores, Vila das
Flores, Liberatos.
Fonte: Diagnóstico da Situação da Infância e Adolescência de Betim – 2012.
O quadro seguinte apresenta a composição, os bairros de residência, o sexo e a
quantidade de participantes dos grupos focais feitos junto aos pais e responsáveis.
Quadro 2 – Grupos Focais com Pais ou Responsáveis
GRUPOS N. de Participantes Sexo Sexo Bairro de
Masculino Feminino Residência
1 8 2 6 Jardim Petrópolis.
A literatura sobre grupos focais recomenda que sua análise deva ser compatível com o
tipo de pesquisa à qual aquele grupo está relacionado (MORGAN, 1997). A unidade de
análise se refere ao grupo, e não às pessoas. Um dos pontos-chave para nossa análise é o
destaque dos tópicos mais citados nos grupos, porém nos colocamos cientes de que
determinados tópicos puderam ser pouco citados, o que não significa que foram ignorados.
Em seção posterior, presente neste Relatório, apresentamos a análise dos grupos focais
realizados, considerando inclusive expectativas e desejos expressos pelas falas dos
participantes.
Neste capítulo buscamos enfocar Betim no tempo e no espaço, e, com isso, identificar
aspectos marcantes de sua história e formação demográfica e econômica, que foram
significativos para a conformação dos contextos e cenários sociais nos quais a infância e
adolescência do município se inserem atualmente. Para tanto, utilizamos informações
censitárias e econômicas produzidas pelo IBGE e por outros órgãos oficiais, além do aporte
aos estudos e pesquisas já realizadas que abordam Betim tanto em seu contexto municipal
como metropolitano.
2
Segundo Camargos (2006, p. 47), “a Cidade Industrial foi criada em terras que pertenciam à Betim, passando a
fazer parte de Belo Horizonte e depois passando a integrar o território de Contagem, através do Decreto Lei n.
336, em 1948”.
43
3
Baldim, Belo Horizonte, Betim, Brumadinho, Caeté, Capim Branco, Confins, Contagem, Esmeraldas, Florestal,
Ibirité, Igarapé, Itaguara, Itatiaiuçu, Jaboticatubas, Juatuba, Lagoa Santa, Mário Campos, Mateus Leme,
Matozinhos, Nova Lima, Nova União, Pedro Leopoldo, Raposos, Ribeirão das Neves, Rio Acima, Rio Manso,
Sabará, Santa Luzia, São Joaquim de Bicas, São José da Lapa, Sarzedo, Taquaraçu de Minas, Vespasiano.
44
Apesar de não ser fronteiriço a Belo Horizonte, o município de Betim teve sua
dinâmica econômica e demográfica fortemente influenciada pela sua participação no contexto
metropolitano no tocante às atividades industriais. Como já mencionado, a presença de
importantes rodovias nacionais, BR-262 e BR- 381, que o perpassam e interligam a RMBH a
outras RM‟s brasileiras como, por exemplo, a de São Paulo, certamente motivou a alocação
das atividades industriais no município. O Cartograma seguinte apresenta os principais eixos
rodoviários e ferroviários que cortam o município de Betim.
4
Segundo o IBGE (2011) a Taxa de crescimento relativo é calculada de acordo com a fórmula=
((Nf – Ni) / Ni) / t. Onde:
Ni = número de indivíduos no início do período considerado
Nf = número de indivíduos no final do período considerado
t = duração do período considerado.
45
Tabela 2 – População total residente Betim, Belo Horizonte e RRMBH – 1960 a 2010
Fonte: IBGE – Censos Demográficos de 1960, 1970, 1980, 1991, 2000 e 2010.
* Exclui Betim e Belo Horizonte.
Fonte: IBGE – Censos Demográficos de 1960, 1970, 1980, 1991, 2000 e 2010.
Além da oferta de bens e serviços urbanos, outro desafio que se impôs para Betim é a
expressiva proporção de população com rendimento baixo. Um dado que explicita bem isso é
o da quantidade de pessoas residentes em domicílios, segundo a faixa do valor do rendimento
per capita nominal.
Até ¼ de salário
30.335 8,0 8,0 8,0
mínimo
De ½ até 1
195.790 51,8 51,9 59,9
salário mínimo
De 1 até 2
101.344 26,8 26,9 86,8
salários mínimos
De 2 a 3 salários
26.502 7,0 7,0 93,8
mínimos
De 3 a 5 salários
15.048 4,0 4,0 97,8
mínimos
De 5 a 10
6.233 1,6 1,7 99,5
salários mínimos
Acima de 10
1.739 0,5 0,5 100,0
salários mínimos
Subtotal 376.991 99,7 100,0
Não se aplica e
Não 1.098 0,3
Respondentes
Total 378.089 100,0
Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010. Elaboração própria.
50
Ao somar os itens a) e b), identificamos que, em 2010, 59,9% das pessoas em Betim
residiam em domicílios cuja renda nominal per capita domiciliar era de até um salário
mínimo. Comparando tal dado com o de outros municípios metropolitanos, identificamos que,
durante o mesmo período, em Belo Horizonte, 37,8% das pessoas tinham renda nominal per
capita domiciliar de até um salário mínimo, e em Contagem correspondia a 47,1% (IBGE,
2012).
A Tabela 4 apresenta a quantidade de pessoas segundo o número de moradores dos
domicílios.
5
Inclusive as pessoas cuja condição no domicílio era pensionista, empregado(a) doméstico(a) ou parente do(a)
empregado(a) doméstico(a).
51
Número Percentual
Frequência Percentual
de Acumulado
Moradores
1 12.836 3,4 3,4
2 46.061 12,2 15,6
3 87.942 23,3 38,8
4 107.176 28,3 67,2
5 65.720 17,4 84,6
6 30.406 8,0 92,6
7 15.349 4,1 96,7
8 6.084 1,6 98,3
9 2.725 0,7 99,0
10 1.649 0,4 99,4
11 939 0,2 99,7
12 745 0,2 99,9
13 156 0,005 99,9
14 26 0,007 99,9
17 274 0,1 100,0
Total 378.089 100,0
Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010. Elaboração própria.
Uma comparação inicial entre os dois últimos censos demográficos realizados pelo
IBGE aponta para uma diminuição da população absoluta de pessoas com idade entre 0 e 9
anos, conforme a Tabela e Gráfico seguintes.
52
60.000
55.000
50.000
45.000
População Total de Betim
40.000
35.000
30.000
25.000
20.000
15.000
10.000
5.000
-
0 a 4 anos 5 a 9 anos 10 a 14 15 a 19 20 a 24 25 a 29 30 a 39 40 a 49 50 a 59 60 a 69 70 a 79 80 anos
anos anos anos anos anos anos anos anos anos ou mais
Faixa Etária
2000 2010
Fonte: IBGE - Censos Demográficos – 1980, 1991, 2000 e 2010. Elaboração própria.
Ressalta-se que a pirâmide acima não tem a pretensão de determinar a futura estrutura
etária do município de Betim no ano de 2020, e sim contribuir para a visualização da
tendência demográfica elaborada a partir da dinâmica populacional observada nos últimos
6
Em termos relativos, em 2010, a população de 0 a 19 anos de Belo Horizonte representava 26,6% da sua
população total, e em Contagem, 29,8%.
7
Grifo nosso. Enfatiza-se que, apesar do quadro de mudanças da composição demográfica, o município de
Betim ainda tem população de criança, adolescente e jovem bastante significativa.
55
dois censos demográficos, 2000 e 2010. Nesse sentido, a projeção feita para 2020 corrobora a
dinâmica de envelhecimento da população observada em Belo Horizonte, em Minas Gerais e
também no Brasil (IBGE, 2012).
Para realizarmos a análise seguinte, contamos com dados consolidados dos censos
demográficos de 2000 e de 2010, conforme disponibilizado pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística - IBGE. A ideia é identificar as tendências da dinâmica
sociodemográfica de áreas do município, a partir da comparação da população total em cada
Regional administrativa entre 2000 e 2010. Desse modo, identificamos que, internamente, o
crescimento demográfico não ocorreu de forma homogênea entre as oito regionais de Betim,
que são: Alterosas, Centro, Citrolândia, Imbiruçu, Norte, PTB, Teresópolis e Vianópolis.
Tabela 8 – Percentual de crianças, adolescentes e jovens até 24 anos por faixas etárias e
por regionais em relação à população total do município de Betim – Censo 2010
Cartograma 4 – Distribuição espacial das pessoas com idade de 1 a 4 anos – Betim por
regionais 2010
Cartograma 7 – Distribuição espacial das pessoas com idade de 15 a 19 anos – Betim por
regionais 2010
Cartograma 8 – Distribuição espacial das pessoas com idade de 20 a 24 anos – Betim por
regionais 2010
REGIONAL ALTEROSAS
Percentual intrarregional
Faixas Valor absoluto %
etárias Masculina Feminina Total Masculina Feminina Total
Menos de 1
ano 746 734 1.480 1,6 1,5 1,6
1 a 4 anos 3.643 3.576 7.219 7,8 7,4 7,6
5 a 9 anos 3.861 3.715 7.576 8,2 7,7 8
10 a 14 anos 4.706 4.501 9.207 10 9,4 9,7
15 a 17 anos 2.754 2.745 5.499 5,9 5,7 5,8
18 a 19 anos 1.739 1.683 3.422 3,7 3,5 3,6
20 a 24 anos 4.455 4.666 9.121 9,5 9,7 9,6
Total Jovem 21.904 21.620 43.524 46,6 45,0 45,8
Total Geral
do Município 46.993 48.038 95.031
Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010. Elaboração própria.
10
9,7
9,5
9,4
10
8,2
7,8
7,7
7,4
8
5,9
5,7
6 Masculina
3,7
3,5
4 Feminina
1,6
1,5
0
Menos de 1 a 4 anos 5 a 9 anos 10 a 14 15 a 17 18 a 19 20 a 24
1 ano anos anos anos anos
Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010. Elaboração própria.
REGIONAL CENTRO
Percentual intrarregional
Faixas Valor absoluto %
etárias Masculina Feminina Total Masculina Feminina Total
Menos de 1
356 360 1,3 1,2 1,2
ano 716
1 a 4 anos 1.473 1.420 2.893 5,2 4,8 5,0
5 a 9 anos 2.014 2.011 4.025 7,1 6,8 6,9
10 a 14 anos2.525 2.450 4.975 8,9 8,3 8,6
15 a 17 anos1.469 1.455 2.924 5,2 4,9 5,0
18 a 19 anos1.039 905 1.944 3,7 3,1 3,4
20 a 24 anos2.758 2.611 5.369 9,7 8,8 9,3
Total Jovem 11.634 11.212 22.846 40,9 37,9 39,4
Total Geral 28.412 29.600 58.012
Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010. Elaboração própria.
63
8,8
10
8,3
7,1
8
6,8
5,2
5,2
4,9
6
4,8
Masculina
3,7
3,1
4 Feminina
1,3
1,2
0
Menos de 1 a 4 anos 5 a 9 anos 10 a 14 15 a 17 18 a 19 20 a 24
1 ano anos anos anos anos
REGIONAL CITROLÂNDIA
Percentual intrarregional
Faixas Valor absoluto %
etárias Masculina Feminina Total Masculina Feminina Total
Menos de 1
194 203 397 1,8 1,8 1,8
ano
1 a 4 anos 959 950 1.909 8,7 8,4 8,6
5 a 9 anos 1.059 991 2.050 9,6 8,8 9,2
10 a 14 anos1.177 1.215 2.392 10,7 10,8 10,7
15 a 17 anos194 203 397 1,8 1,8 1,8
18 a 19 anos418 390 808 3,8 3,5 3,6
20 a 24 anos966 1.039 2.005 8,8 9,2 9,0
Total Jovem 4.967 4.991 9.958 45,2 44,3 44,8
Total Geral 10.979 11.273 22.252
Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010. Elaboração própria.
Esta Regional, apesar de ser uma das menos populosas do município, com população
em torno de 5,9% do total demográfico, como visto em tabela anterior, constitui-se
internamente também como espaço de significativa concentração relativa juvenil. Do total de
22.252 habitantes, em 2010, 9.958 pessoas eram crianças, adolescentes e jovens com idade até
24 anos, ou seja, 44,8% - ou seja, há um contingente superior a 1/3 de população juvenil.
Outro dado que chamou nossa atenção foi a variação da diferença entre a população
relativa juvenil masculina e feminina, vista a partir das faixas etárias de 1 a 4 anos e na de 5 a
9 anos. Na faixa de 10 a 14 anos, há uma aumento da população relativa masculina em relação
à feminina, mas quando atinge a idade jovem, na faixa de 20 a 24 anos, tende a ser menor
novamente. Observando tal dado a partir da tendência já bastante conhecida em nosso país de
que é maior a mortalidade masculina em relação às mulheres, preocupa notar no Citrolândia
essa diminuição da população masculina precocemente, fenômeno que ocorre também em
outras regionais, como Alterosas e Norte. Apesar de esse dado demográfico não ser suficiente
para a realização de uma inferência dessa natureza, nas seções seguintes do Relatório, os
65
dados sobre os homicídios nessa região tornam relevante essa hipótese da mortalidade
precoce de adolescentes e jovens do sexo masculino nessa regional.
Apesar das variações entre a população relativa masculina e a feminina, o total jovem
somado a partir da população de todas as faixas etárias por sexo mostra uma diferença
pequena entre homens e mulheres, com 45,2% e 44,3%, respectivamente, em relação ao total
de crianças, adolescentes e jovens residentes no Citrolândia.
Quanto às faixas etárias, somando homens e mulheres, nota-se que do total de pessoas
residentes na Regional Citrolândia, 1,8% tinha menos de 1 ano, 8,6% tinha de 1 a 4 anos,
9,2%, de 5 a 9 anos, 10,7%, de 10 a 14 anos, 1,8%, de 15 a 17 anos, 3,6%, de 18 a 19 anos e
9,0%, de 20 a 24 anos.
Por meio do gráfico seguinte, é possível visualizar melhor essas diferenças entre a
população relativa infantojuvenil, masculina e feminina, residente no Citrolândia, de acordo
com censo demográfico de 2010.
12
9,6
9,2
10
8,8
8,8
8,7
8,4
6 Masculina
3,8
3,5
4 Feminina
1,8
1,8
1,8
1,8
0
Menos de 1 1 a 4 anos 5 a 9 anos 10 a 14 15 a 17 18 a 19 20 a 24
ano anos anos anos anos
REGIONAL IMBIRUÇU
Percentual intrarregional
Faixas Valor absoluto %
etárias Masculina Feminina Total Masculina Feminina Total
Menos de 1
515 584 1099 1,5 1,6 1,5
ano
1 a 4 anos 2.630 2.594 5.224 7,5 7,1 7,3
5 a 9 anos 2.792 2.743 5.535 8,0 7,6 7,8
10 a 14 anos3.393 3.203 6.596 9,7 8,8 9,3
15 a 17 anos2.026 2.022 4.048 5,8 5,6 5,7
18 a 19 anos1.349 1.308 2.657 3,9 3,6 3,7
20 a 24 anos3.557 3.613 7.170 10,2 10,0 10,1
Total Jovem 16.262 16.067 32.329 46,5 44,3 45,3
Total Geral 35.003 36.288 71.291
Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010. Elaboração própria.
12
10,2
10
9,7
10
8,8
7,6
7,5
8
8 7,1
5,8
5,6
6 Masculina
3,9
3,6
4 Feminina
1,6
1,5
0
Menos de 1 a 4 anos 5 a 9 anos 10 a 14 15 a 17 18 a 19 20 a 24
1 ano anos anos anos anos
Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010. Elaboração própria.
REGIONAL NORTE
Percentual intrarregional
Faixas Valor absoluto %
etárias Masculina Feminina Total Masculina Feminina Total
Menos de 1
ano 356 295 651 1,7 1,4 1,5
1 a 4 anos 1.623 1.514 3.137 7,9 7,0 7,4
5 a 9 anos 1.637 1.612 3.249 8,0 7,5 7,7
10 a 14 anos1.950 1.951 3.901 9,5 9,0 9,3
15 a 17 anos1.213 1.157 2.370 5,9 5,4 5,6
18 a 19 anos698 771 1.469 3,4 3,6 3,5
20 a 24 anos1.849 2.002 3.851 9,0 9,3 9,1
Total Jovem 9.326 9.302 18.628 45,4 43,0 44,2
Total Geral 20.558 21.608 42.166
Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010. Elaboração própria.
68
9,3
10
9
9
9
7,9
8
7,5
8
7
7
5,9
5,4
6
5 Masculina
3,6
3,4
4
Feminina
3
1,7
1,4
2
1
0
Menos de 1 a 4 anos 5 a 9 anos 10 a 14 15 a 17 18 a 19 20 a 24
1 ano anos anos anos anos
REGIONAL PTB
Percentual intrarregional
Faixas Valor absoluto %
etárias
Masculina Feminina Total Masculina Feminina Total
Menos de 1
309 294 603 1,7 1,6 1,6
ano
1 a 4 anos 1.524 1.446 2.970 8,4 7,7 8,1
5 a 9 anos 1.581 1.592 3.173 8,7 8,5 8,6
10 a 14 anos1.787 1.873 3.660 9,8 10,0 9,9
15 a 17 anos1.175 1.066 2.241 6,5 5,7 6,1
18 a 19 anos682 752 1.434 3,8 4,0 3,9
20 a 24 anos1.814 1.683 3.497 10,0 9,0 9,5
Total Jovem 8.872 8.706 17.578 48,9 46,5 47,7
Total Geral 18.145 18.728 36.873
Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010. Elaboração própria.
Gráfico 9 – População infantojuvenil por sexo e grupos etários – Regional PTB – 2010
12
10
10
9,8
10
8,7
8,5
9
8,4
7,7
8
6,5
5,7
6 Masculina
3,8
4
Feminina
4
1,7
1,6
0
Menos de 1 1 a 4 anos 5 a 9 anos 10 a 14 15 a 17 18 a 19 20 a 24
ano anos anos anos anos
Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010. Elaboração própria.
REGIONAL TERESÓPOLIS
Percentual intrarregional
Faixas Valor absoluto %
etárias Masculina Feminina Total Masculina Feminina Total
Menos de 1
332 326 658 1,7 1,6 1,6
ano
1 a 4 anos 1.705 1.540 3.245 8,6 7,5 8,0
5 a 9 anos 1.760 1.653 3.413 8,9 8,1 8,5
10 a 14 anos1.940 2.008 3.948 9,8 9,8 9,8
15 a 17 anos1.127 1.118 2.245 5,7 5,5 5,6
18 a 19 anos744 713 1.457 3,8 3,5 3,6
20 a 24 anos1.921 2.012 3.933 9,7 9,8 9,8
Total Jovem 9.529 9.370 18.899 48,0 45,7 46,9
Total Geral 19.837 20.483 40.320
Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010. Elaboração própria.
A Regional Teresópolis, apesar de ser uma das menos populosas do município, com
população em torno de 10,7% do total demográfico, também constitui-se internamente como
71
espaço de significativa concentração relativa juvenil do mesmo modo que as demais regionais
de Betim. Em Teresópolis, de 40.320 habitantes em 2010, 18.899 pessoas eram crianças,
adolescentes e jovens com idade até 24 anos, ou seja, 46,9% do total da população, o que
corresponde a quase metade dos habitantes da regional.
Outro dado que chamou nossa atenção foi a predominância de população relativa
juvenil masculina em relação à feminina, visto a partir das faixas etárias apresentadas, exceto
na faixa etária de 20 a 24 anos, em que vemos 9,7% e 9,8%, respectivamente.
Quanto às faixas etárias, somando homens e mulheres, nota-se que, do total de pessoas
residentes na Regional Teresópolis, 1,6% tinha menos de 1 ano, 8,0% tinha de 1 a 4 anos,
8,5%, de 5 a 9 anos, 9,8%, de 10 a 14 anos, 5,6%, de 15 a 17 anos, 3,6%, de 18 a 19 anos, e
9,8%, de 20 a 24 anos.
Através do gráfico seguinte é possível visualizar melhor essas diferenças entre a
população relativa, infantojuvenil, masculina e feminina residente em Teresópolis de acordo
com censo demográfico de 2010.
9,8
9,7
10
8,9
8,6
8,1
7,5
8
5,7
5,5
6 Masculina
3,8
3,5
Feminina
4
1,7
1,6
0
Menos de 1 a 4 anos 5 a 9 anos 10 a 14 15 a 17 18 a 19 20 a 24
1 ano anos anos anos anos
Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010. Elaboração própria.
72
REGIONAL VIANÓPOLIS
Valor absoluto Percentual intrarregional %
Faixas etárias Masculina Feminina Total Masculina Feminina Total
Menos de 1
ano
84 87 171 1,3 1,5 1,4
1 a 4 anos 449 433 882 7,0 7,6 7,3
5 a 9 anos 484 483 967 7,5 8,4 8,0
10 a 14 anos 602 593 1.195 9,4 10,4 9,8
15 a 17 anos 359 303 662 5,6 5,3 5,5
18 a 19 anos 238 202 440 3,7 3,5 3,6
20 a 24 anos 714 484 1.198 11,1 8,5 9,9
Total Jovem 2.930 2.585 5.515 45,6 45,2 45,4
Total Geral 6.425 5.719 12.144
Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010. Elaboração própria.
11,1
12
10,4
9,4
10
8,5
8,4
7,6
7,5
8
7
5,6
5,3
6 Masculina
3,7
3,5
Feminina
4
1,5
1,3
0
Menos de 1 a 4 anos 5 a 9 anos 10 a 14 15 a 17 18 a 19 20 a 24
1 ano anos anos anos anos
2.13 Considerações
A população total de Betim, segundo dados do Censo 2010 do IBGE, era de 378.089
habitantes. A distribuição desse contingente pelas oito regionais na quais se divide o
município aparece no gráfico a seguir. No entanto, no que concerne aos objetivos desse
diagnóstico para a área da educação, importa destacar a população na faixa etária de 0 a 17
anos. O seu total no município em 2010 era de 115.407 habitantes, e sua distribuição regional
é visualizada em destaque no gráfico. Ela corresponde, na maioria dos casos, a algo próximo
de 30% das populações totais tanto do município quanto das regionais.
8
Devido à complexidade e extensão deste capítulo, ele será dividido da seguinte maneira: o tópico 3.1 (e suas
subdivisões) trata da descrição quantitativa da educação em Betim; o tópico 3.2 (e suas subdivisões) trata da
análise qualitativa da educação, para ensino fundamental e o médio; o tópico 3.3 (e suas subdivisões) trata da
análise da educação infantil no município; e o tópico 3.4 (e suas subdivisões) trata a temática da inclusão
educacional de crianças e adolescentes com deficiência.
75
95031
100000
90000
80000 71291
70000 58012
60000
50000 40320 42166
36873
40000 29501
30000 22252 21403
15533 12851 12657 12044 12144
20000
7712
10000 3706
0
Educação Ensino
Infantil Fundamental Ensino Médio TOTAL
0 a 5 anos 6 a 14 anos 15 a 17 anos 0 A 17 ANOS
Betim 34036 60021 21350 115407
Citrolândia 2312 4039 1361 7712
Alterosas 8675 15327 5499 29501
Centro 4403 8206 2924 15533
Imbiruçu 6332 11023 4048 21403
Teresópolis 3901 6705 2245 12851
Norte 3743 6544 2370 12657
PTB 3602 6201 2241 12044
Vianópolis 1068 1976 662 3706
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência do Município de Betim 2011 / IBGE, Censo 2010.
76
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência do Município de Betim 2011 / IBGE, Censo 2010.
30000
5499
25000
20000 4048
15327
15000 2924
11023 2245 2370 2241
10000
8206
1361 6705 6544 6201
5000 4039 8675 662
4403 6332
2312 3901 3743 3602 1976
0 1068
outros. Enfim, vários aspectos terão reflexos e desdobramentos específicos para cada uma das
regiões.
Por seu turno, a população de 0 a 17 anos de Betim, se forem consideradas as
populações totais de cada uma das regionais e mesmo a do município, possui distribuição
regular em torno de 30%, como mostra o Gráfico 15. Ou seja, em todas as regiões e no
município como um todo, a população de 0 a 17 anos é cerca de 30% das populações totais. A
região de Citrolândia (34,7%) tem o maior percentual populacional nessa idade, em relação à
sua população total, e a região do Centro (26,8%) tem o menor percentual proporcional,
conforme mostra o gráfico.
Sem pormenorizar para todas as regionais, cumpre destacar dos totais de matrículas
para Betim, em todos os níveis, se comparados à população na faixa etária de 0 a 17 anos, o
percentual de 70,7%, como mostra o quadro seguinte. Na área do Centro, o índice de 98,4%
registrado de matrículas em relação à sua população na faixa etária em estudo certamente está
afetado por alunos moradores nas demais regionais que estudam nas escolas de sua área de
abrangência. Assim, seu percentual nessa relação é seguramente menor que o ora apresentado.
O diagnóstico, no entanto, não acessou dados que permitam aprofundar sobre as matrículas
entre diferentes regiões de moradia.
A regional Teresópolis aparece com o menor percentual (55,9%) nessa relação,
praticamente 15% abaixo da porcentagem de Betim. Seguem-na como as que menos
matrículas registram-se em relação à população existente, as regiões de Alterosas (59%) e
Vianópolis (63,6%).
Quadro 5 – Relação entre o número total de matrículas nos diversos níveis de ensino e a
população de 0 a 17 anos – Betim e regionais - 2010/2011
Área Total de População de Relação entre
Matrículas 0 a 17 anos - IBGE 2010 Matrículas e População
Betim 81.561 115.407 70,7
Alterosas 17.406 29.501 59,0
Centro 15.284 15.533 98,4
Citrolândia 5.479 7.712 71,0
Imbiruçu 16.745 21.403 78,2
Norte 8.511 12.657 67,2
PTB 8.590 12.044 71,3
Teresópolis 7.189 12.851 55,9
Vianópolis 2.357 3.706 63,6
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência do Município de Betim 2011.
80
Este relatório se deterá mais especificamente nos números e análises relativas aos
níveis de ensino vinculados ao executivo municipal – infantil e fundamental. O ensino médio
é responsabilidade da esfera estadual de governo. Contudo, se faz necessário minimamente
situar algum número educacional do ensino médio por envolver parcialmente a faixa etária
abordada por esse diagnóstico.
Como visto no Quadro 6, a área central aparece com o maior número de matrículas no
ensino médio, embora ela seja apenas a 3ª região em população na faixa etária de 15 a 17 anos
(2.924), atrás de Alterosas (1ª – 5.499) e Imbiruçu (2ª – 4048). Esta última região ocupa, no
entanto, em número de matrículas no ensino médio, posição à frente da regional Alterosas que
é mais populosa. Quanto às duas regionais que têm os menores números de matrículas
(Citrolândia e Vianópolis), elas também reúnem as menores populações entre 15 e 17 anos.
O Gráfico 16 abaixo mostra, de forma ilustrada, a relação percentual entre o número
de matrículas e a população total municipal de 15 a 17. Para Betim essa relação é de 75,7%.
Logo após, no Quadro 7 aparece a relação percentual entre matrículas/população dentro de
cada uma das regionais, com destaque para Vianópolis (28,9%), Alterosas (50,5%) e
Teresópolis (54,5%) obtendo os piores desempenhos.
81
1,2
7,6 17,2
8,2
8,3
28,4
23,5
5,7
Quadro 7 – Relação entre o número total de matrículas do ensino médio nas escolas
estaduais e a população de 15 a 17 anos – Betim e regionais - 2010/2011
número é bem menos que as 462 crianças de Citrolândia. Se, hipoteticamente, toda a
população de 0 a 5 anos existente nas duas regionais fosse real demandadora de atendimento,
para se chegar à mesma relação observada em Vianópolis, seria necessário construir mais
quatro instituições de educação infantil em Citrolândia.
Por outro lado, para cada estabelecimento existente na Regional Imbiruçu, há 633
crianças de 0 a 5 anos, o que se constitui na pior relação entre todas as regiões. A seguir, com
510 e 488 crianças respectivamente, as regionais de Alterosas e Teresópolis completam as três
piores relações. Observe-se que não há um padrão preestabelecido do que seria uma boa ou
má relação, mas uma avaliação em termos de (des)equilíbrio da distribuição dos potenciais
demandantes de educação pública.
O próximo quadro traz dados em números absolutos dos totais de matrículas realizadas
em Betim e em cada uma das regionais no ano de 2010, por ciclo do ensino fundamental. Os
ciclos compreendem respectivamente as idades de 6, 7 e 8 anos (1º ciclo); 9 e 10 (2º ciclo); 11
e 12 (3º ciclo); 13 e 14 anos (4º ciclo). Tendo como base essa tabela geral, algumas análises
descritivas serão feitas a seguir, iniciando-se com o Gráfico 17.
85
0 20 40 60 80
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência do Município de Betim - 2011
O Gráfico 19 traz, ainda, números relativos às matrículas nos ciclos, mas agora
mostrando o percentual de crianças e adolescentes matriculados por segmento, em relação ao
total de matrículas no ensino fundamental em cada uma das regionais, e não mais em relação
ao total de matrículas de Betim por ciclo.
A Regional Vianópolis possuía, em 2011, quase metade de suas matrículas do ensino
fundamental no 1º ciclo (42,4%). Esse é o maior percentual entre todas as regionais de Betim.
87
Em seguida, na mesma regional, 35,26% dos matriculados nas escolas municipais cursavam o
2º ciclo. Essa é a regional com os percentuais mais diferenciados. Nas demais, a divisão das
matrículas de suas crianças e adolescentes no ensino fundamental obedece a um perfil mais ou
menos padrão, de cerca de 31% no primeiro ciclo, 23 a 24% no 2º e 3º ciclos e cerca de 21%
no 4º. Em relação ao 1º ciclo, ainda a região de Citrolândia (37%) destoa das demais. Mas, de
uma maneira geral, em todas as regiões o atendimento vai decrescendo percentualmente do 1º
para o 4º ciclo.
Gráfico 19 – Percentual de matrículas nos ciclos do ensino fundamental nas regionais e
em Betim, em relação ao total de matrículas de Betim e das regionais no ensino
fundamental – Escolas municipais
Uma interessante questão despontou na análise dos dados secundários coletados junto
à Secretaria Municipal de Educação sobre o ensino fundamental. Também nas leituras
qualitativas feitas por professores nas entrevistas de profundidade esse fator aparece. Aqui ele
será apresentado em números. Diz respeito a uma quantidade significativa de transferências
de alunos ao longo do ano entre as diferentes regiões, motivadas, entre outros, por mudança
das famílias ou dos alunos, de um local a outro no município. Os próprios educadores nas
entrevistas qualitativas se referem a isso como sendo uma significativa rotatividade dos
alunos que entram nos estabelecimentos e deles saem ao longo do ano, o que interferiria no
seu desempenho escolar. Essa rotatividade é maior que os abandonos e reprovações, como
veremos, e o quadro abaixo traz os seus números.
89
Berçário 1º 2º
Maternal Maternal Maternal
Regional 0 a 11 Período: Período: Total
I: 1 ano II: 2 anos III: 3 anos
meses 4 anos 5 anos
Betim
404 515 1.281 2.228 3.018 2.856 10.302
Alterosas 512
119 152 276 624 634 2.317
Centro 302
35 29 205 360 325 1.256
Citrolândia 148
32 31 58 183 160 612
Imbiruçu 347
81 77 187 515 496 1.703
Norte 338
21 75 224 502 456 1.616
PTB 291
72 54 180 403 391 1.391
Teresópolis 209
9 46 77 302 295 938
Vianópolis 81
35 51 74 129 99 469
Fonte: Prefeitura Municipal de Betim/SEMED - Setor de Escrituração Escolar.
91
Nas linhas relativas à faixa entre 0 e 3 anos de idade, para Betim e todas as suas
regiões, a tendência é de crescimento do número de atendimentos na medida em que a idade
vai aumentando. E esse crescimento, raras as exceções, foi proporcionalmente bastante
significativo entre uma idade e outra. Onde ele é menor (retiradas as exceções), cresce no
mínimo 25% (por exemplo: o acréscimo de atendimento em Betim do berçário para o
maternal I foi de 27%) comparando-se com o número imediatamente anterior. Nos casos em
que foi maior (do maternal II em relação ao maternal I), chegou a atingir 2,3 vezes o
atendimento do maternal I na região do PTB, para não citar o número extremo da Regional
Centro nas mesmas colunas. Essa observação é importante, pois se for comparada essa
tendência com os números do crescimento populacional entre as faixas etárias correlatas, esse
último praticamente é mínimo. Quase não há variação para mais (crescimento) entre os
números absolutos das populações de 0 a 3 anos. Elas são quase idênticas. Isso posto, pode-se
deduzir que a manutenção do aumento de atendimento nessas proporções, quando as
populações são quase as mesmas em cada faixa etária, tende a universalizá-lo.
Mas como se depreenderá da análise global desse relato quantitativo e mesmo dos
gráficos e tabelas à frente, bem como das entrevistas qualitativas, ainda há muito por se fazer;
um longo caminho a se trilhar para alcançar patamares satisfatórios tanto quantitativos como
qualitativos.
Quanto ao atendimento na faixa etária de 4 e 5 anos da pré-escola, ele se mostra
praticamente idêntico no 1º período e no 2º no município e em todas as regionais, não
sofrendo quaisquer variações significativas. Apenas registre-se na região de Alterosas haver
um número cuja tendência é inversa da de todas as outras regiões, pois conta 10 atendimentos
a mais no 2º período que no primeiro (624/634). Em todas as demais regiões e em Betim,
globalmente, o atendimento do 1º período supera o do 2º.
No Quadro 16 (a seguir), pode-se observar a relação entre o atendimento efetivado
pela rede municipal/conveniada da educação infantil em Betim, e a população residente na
faixa etária de 0 a 5 anos, para cada uma de suas regionais e para o total do município. Deve-
se destacar que as regionais Imbiruçu (74%), Teresópolis (74%) e Alterosas (73%) possuem
os três maiores percentuais de não matriculados relativamente às suas populações na faixa
etária em questão. Já em Vianópolis encontra-se a melhor relação entre atendimento e
população existente, da ordem de 53% das crianças da região matriculadas nos
estabelecimentos. Em seguida, PTB (46,4%) e Norte (42,82%) completam as três regionais
em melhor situação neste quadro.
92
O gráfico acima demonstra que o atendimento na faixa etária entre 0 a 3 anos é menor
que o da faixa de 4 e 5 anos, indo de 13,2% (Teresópolis) a um máximo de 33,9%
(Vianópolis). A faixa da pré-escola, 4 e 5 anos, já se inicia com um percentual de atendimento
na casa de 43,6% (Citrolândia), atingindo 78% para a região Norte. A população de 0 a 3 anos
em todas as regionais é maior do que a de 0 a 5 anos; a lista de espera por atendimento em
todas as regiões, como se verá mais à frente no levantamento realizado entre as instituições de
ensino infantil, é maior na faixa etária de 0 a 3 anos. Portanto, esse é um gráfico para ser foco
93
3.1.7.2.1 Localização
Nos próximos blocos de análise, trataremos de uma descrição mais geral das
instituições, o que nos permitirá conhecê-las melhor e conhecer um pouco sobre alguns
reflexos da forma como o poder público vem atuando para a educação infantil,
conscientemente ou não, no que toca especificamente às variáveis descritas. Nesse sentido,
visualizar a existência física das instituições através de sua localização traz interessantes
elementos analíticos, e a apreciação da Figura 3 e do Gráfico 22 mostra uma concentração
delas em determinada área da cidade, que constitui seu centro geográfico.
Há três regiões geograficamente limítrofes, Centro (sede), Norte e Alterosas. Mais da
metade das instituições (32) está nesse âmbito (52,5%), ao passo que as outras cinco regiões
situadas no perímetro geográfico externo do município respondem por 47,5% de instituições
instaladas. Isso demonstra uma lógica quantitativa distribucional indo das extremidades para o
centro.
Essa distribuição coincide com a configuração dos contingentes populacionais. Dito de
outra forma, os quantitativos populacionais também estão mais concentrados nas áreas
centrais e mais diluídos pelas regionais periféricas. Do total da população de Betim (378.089
– IBGE 2010), exatos 52% ou 195.209 habitantes residem nas três regiões da área central.
Se olhado por outro prisma, qual seja, o das carências populacionais, talvez a
distribuição encontrada não se mostre tão adequada. Na cidade de Betim, as maiores carências
de infraestrutura e poder aquisitivo, assim como em outras tantas cidades, encontram-se nas
populações das regiões geograficamente periféricas. Isso aponta para uma maior oferta de
equipamentos em uma lógica inversa da do quantitativo populacional, ou seja, maior
distribuição de instituições nas áreas não centrais.
95
9,8%
PTB 6
11,5%
Terezópolis 7
16,4%
Imbiruçu 10
21,3%
Alterosas 13
Percentual
16,4%
Norte 10
Absoluto
14,8%
Centro 9
4,9%
Vianópolis 3
4,9%
Citrolândia 3
0 5 10 15 20 25
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência do Município de Betim – 2011.
96
27,9
72,1
Sim Não
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência do Município de Betim – 2011.
Um interessante dado a ser observado diz respeito à idade das instituições existentes
no município. Ele revela aspectos ligados à história da educação infantil no município e pode
auxiliar significativamente no processo de municipalização em curso, bem como em diversos
outros aspectos do estabelecimento da política pública para esse nível educacional em Betim,
principalmente se for lido conjuntamente com o material produzido pelas entrevistas
qualitativas realizadas nesse estudo.
98
21 a 30 anos 23
11 a 20 anos 26,2
7 a 10 anos 8,2
5 e 6 anos 24,6
Em número de estabelecimentos, foram 27, dos quais 15 (ou 56%) iniciaram suas
atividades num intervalo de apenas dois anos, entre 2005 e 2006. A tendência de surgimento
de novas instituições, em todos os intervalos apresentados na vertical do gráfico, se for feita
uma média simples e descontado o intervalo de cinco e seis anos, era em torno de duas por
ano. Nesses anos, especificamente, essa média salta para sete em cada um deles. Impõe
verificarem-se as condições do atendimento dos estabelecimentos criados nos últimos 10
anos, em referência ao saneamento dos problemas existentes nos demais centros de ensino
infantil. Essa opção se justificaria na medida em que aqueles com mais tempo de existência
provavelmente já se estabilizaram quanto ao funcionamento e atendimento. O quadro a seguir
traz os números absolutos do surgimento das instituições no tempo.
99
Total 61 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência do Município de Betim – 2011.
20,0
0,0
Lista 0 a 5 Pop. 0 a 5
Espera 0 a 3 Espera 4 e 5
No Gráfico 28, nota-se que a lista de espera na faixa etária de 0 a 3 anos se mostra
indubitavelmente maior em todas as regionais, se comparada com a espera por atendimento
nas idades de 4 e 5 anos. Esse dado tanto pode revelar a tendência da educação municipal de
caminhar na direção de zerar o déficit do atendimento 0 a 3, como, por outro lado, a
existência de muito menor demanda para 4 e 5 anos de idade. Por um motivo ou outro, se o
marco legal para a educação entre 4 e 17 a torna obrigatória, gratuita e universal, Betim pode
almejar agir para dentro em pouco tempo atingir essa meta.
Analisando o gráfico anterior, Alterosas (82,1%), Norte (82%) e PTB (80,2%) são as
regionais que registram maior demanda pelo atendimento de 0 a 3 anos, enquanto Vianópolis,
com 67%, traz a menor.
Outra interessante informação coletada reuniu os dados de atendimento fornecidos
pelo setor de escrituração da SEMED com as declarações de listas de espera feitas pelas
instituições nesse levantamento quantitativo. Essa reunião de dados é apresentada no gráfico a
seguir.
102
200,0
168,1 160,7
150,0
125,6
110,1 116,0
93,2
96,7
100,0 81,3
69,9 66,8
69,7 64,7
61,2 55,0
48,0 49,7
50,0 31,8 37,3
41,9 36,0 33,8
24,4 23,1 12,6 28,3 14,6 12,8
0,0
Uma importante reflexão a ser extraída do gráfico acima é que as listas de espera para
a faixa etária 0 a 3 anos são sempre altas e em muitas vezes supera os 100% da quantidade de
crianças atendidas. Se for lembrado que, na comparação entre atendimento e população
existente nas faixas etárias, os percentuais são bem menores entre 0 e 3 do que entre 4 e 5
anos, conclui-se que os gráficos são complementares no sentido de alertar para a necessidade
de aumento da oferta para a faixa etária dos mais novos.
Outra interessante observação reforça essa tese. Se for feita uma média aritmética dos
percentuais constantes para as colunas de “espera total”, será encontrado um resultado em
torno de 60%. Ou seja, se formos para os números absolutos se concluirá que as crianças em
lista de espera (pelo registro de 61 instituições pesquisadas) são 60% a mais do que as que
estão dentro das instituições. Isso posto, podemos inferir que, mesmo levando em conta outros
fatores como tendências de inversão na pirâmide etária nos anos à frente (diminuição de
crianças e aumento de idosos), a política de atendimento de ensino infantil deve buscar pelo
menos dobrar a atual capacidade de atendimento num relativamente curto espaço de anos se
desejar atingir a universalização da oferta. O desafio maior, no entanto, reside em verificar e
colocar o atual nível de qualidade de atendimento em patamares satisfatórios e, por
conseguinte, ao ampliar-se o atendimento, manter esse grau de qualidade.
103
8,2
32,8
Sim
Não
59 NR
Como mostra o gráfico acima, a maioria dos estabelecimentos (59%) não possui
adaptações para as crianças com deficiências e boa parte deles, visitados quando das
entrevistas de profundidade, apresentaram algumas situações realmente inadequadas para
quaisquer crianças, como espaços somente acessados por escadas ou em determinada altura
(varandas) e com pouca segurança (grades) para a permanência das crianças ali. A
acessibilidade, sem dúvida, é um grande desafio a ser enfrentado pelo gestor público na
condução da política pública para a educação infantil.
Nas piores situações em relação às adaptações para deficientes, estão a Regional
Norte, onde 8 (80%) das 10 entrevistadas não as possui; em Teresópolis, 5 (71%) de 7; no
Imbiruçu, 7 (70%) das 10, e na Regional Vianópolis, 2 das 3 instituições participantes do
levantamento declararam esse déficit. No sentido inverso, as melhores situações foram
105
1,6
16,4
Própria
Vídeos Educativos
33 59 8
0
Brinquedos
98 2 Sim
Não
1
Livros Infantis
98 1 NR
1
Livros Didáticos
92 7
Uma grande parte das instituições de Betim (46%), participantes desse levantamento,
realiza o atendimento das crianças de 0 a 5 anos combinando a modalidade integral com a
parcial dentro do mesmo estabelecimento. Do total, 33% delas atendem em turnos apenas
integrais; se somarmos o atendimento apenas integral ao atendimento que combina as duas
modalidades obteremos que 77% das instituições prestam serviço ofertando o turno integral.
As que se utilizam exclusivamente da modalidade parcial totalizam uma minoria de 21% do
total de instituições entrevistadas.
32,8
Integral Apenas
45,9
Parcial Apenas
Integral e Parcial
21,3
100,0
100,0
90,0 80,0
80,0 71,4
70,0 62,5
60,0
60,0 50,0
42,9 45,9
50,0
37,5 32,8
40,0
26,7
30,0 20,0 21,3
14,3 13,3
20,0 14,3
7,1
10,0 0,0 0,0 0,0 0,0
0,0
Até 4 5e6 7 a 10 11 a 20 21 a 30 Mais 30 Total
anos anos anos anos anos anos
para o mundo do trabalho (que já se inicia mesmo nos anos finais do ensino fundamental), do
ensino profissionalizante ou da preparação para o vestibular.
Analisando especificamente os primeiros anos do ensino fundamental, há uma
importante interconexão de realidades destes com a pré-escola, de 4 e 5 anos de idade, que
será tratada junto às análises da educação infantil. Então, vez por outra, os relatos vão se
deparar com semelhanças entre as realidades encontradas na pré-escola e as tratadas nos
tópicos do trabalho dedicados aos primeiros anos do ensino fundamental.
Quando você falou em desafio eu já pensei na família. Relação família. Não sei se
isso atende. Hoje a gente vê um perfil de família muito diferente do perfil que a
gente tinha antigamente. Uma família que não tem tempo para a criança para dar um
suporte que a criança precisa e o grande desafio é a gente trabalhar determinados
valores na escola que não tem continuidade em casa (Educadora Infantil – Rede
Particular)
Num primeiro apontamento, é interessante notar que, embora o roteiro das entrevistas
qualitativas da educação contivesse uma pergunta específica sobre a participação das famílias
junto aos filhos nos processos educacionais, essa questão foi inúmeras vezes levantada em
outro ponto, que dizia respeito aos desafios pedagógicos e educacionais enfrentados pelas
instituições – o que indica que o tópico extrapolou os limites de ser um dos aspectos que já
estaria presente em determinado eixo de reflexão nas indagações do diagnóstico, ganhando
contornos mais acentuados, tal a força com que apareceu nos demais eixos da realidade
pesquisada.
Se tomarmos como referência o tempo de cinco ou seis décadas atrás, pode-se afirmar
que até então havia uma “confortável” estabilidade no perfil de composição das famílias. O
surgimento desse tipo de família tem sua datação de surgimento no século XIX, com a
ascensão da burguesia industrial europeia. Essa estrutura de família, no entanto, ao longo dos
últimos 50 anos, vem sofrendo crescentes e intensas modificações.
110
Seu perfil básico de composição era o de pai, mãe e filhos, formando núcleos
familiares autônomos que se relacionavam com outros, em esferas de grande proximidade, os
núcleos dos avós, o dos tios e primos, entre outros parentes consanguíneos. Estes, apesar de
serem núcleos distintos, compunham um espectro familiar mais amplo, mas ainda assim eram
considerados como formando a mesma família. Noutras esferas, já não da mesma família,
existiam as famílias dos vizinhos e amigos.
Havia, porém, um elemento que merece destaque, presente para a maioria desses
núcleos que gerava essa noção de “estabilidade” atribuída à instituição família em geral, qual
seja, sua composição. Os membros que formavam a família nuclear eram o pai, a mãe e os
filhos. Essa estabilidade na composição gerava segurança nas relações das famílias entre si e
com todas as outras instituições sociais.
Para se ter uma ideia do fenômeno, um compilado de dados de censos do IBGE
intitulado “Tendências demográficas dos domicílios e das famílias no Brasil”, realizado por
José Eustáquio Diniz Alves e Suzana Cavenaghi, traz algumas informações sobre
diversificação dos arranjos familiares no Brasil entre 1980 e 2010; nele se pode confirmar a
relativa estabilidade existente há algumas décadas, e que atualmente não se mantém. O estudo
aponta um decréscimo do tipo familiar nuclear no Brasil, com pai, mãe e filhos,
respectivamente de 65% em 1980, 61% – 1991, 59% – 2000 e 53% em 2010. Ou seja, mesmo
sem dados estatísticos, os entrevistados têm a percepção de uma homogeneidade bem maior
que a desses percentuais, desse tipo familiar mais frequente há 50 ou 60 anos.
Ocorre atualmente a formação – em números já bastante significativos, mas crescendo
geometricamente – de famílias com variadas composições. Pais apenas, um homem, com seus
filhos e filhas. Mães e filhos apenas, avós e netos, tios e sobrinhos; irmãos apenas ou irmãos e
primos, entre outras:
Do ponto de vista das faixas etárias, ainda se presenciam casos de gravidez precoce.
A necessidade de trabalho das famílias toma cada vez mais o tempo dos seus membros. Betim
vivencia todas essas realidades, conforme os entrevistados o revelaram:
Tem vários fatores. Eu acredito que a correria do dia a dia porque os pais e as mães
precisam trabalhar. A minha geração a mãe não trabalhava. Ela era mais presente,
ela cuidava dos filhos. Tem essa questão de serem pais muito precocemente. Eu já
tive alunos de 6 anos que a mãe tinha 19. Então ela foi mãe muito precocemente.
Não tem uma estrutura para acompanhar. A desvalorização da educação, no geral, eu
acho que é por isso aí. (Educador Ensino Fundamental)
Eu tenho medo que fique uma lacuna pelo processo no qual estamos inseridos hoje.
O professor não conhece a realidade da vida do aluno. Hoje ele não conhece e vou te
falar mais sério ele não tem tempo para conhecer porque ele entra na sala de aula e
vai cumprir um cronograma e fora esse espaço o tempo que o professor tem de
planejar as atividades, corrigir, é muito pequeno. Eu acho que no sistema que nós
estamos hoje enfrentando tem uma lacuna e essa lacuna continua pelo método que
nós temos na escola. A rotina da escola, a dinâmica da escola não permite você se
envolver de uma forma mais humana com o aluno pra você sanar o problema dele.
(Gestor – Educação Fundamental)
Talvez nem seja por desleixo dos pais, mas porque alguns têm essa mentalidade: a
escola é responsável por tudo. Em todos os sentidos. Mas quando não há essa
continuidade em casa é complicado.
Pergunta: Você diria que é o quê? Uns 40% dos pais pensam assim?
Resposta: Sim. Não vou colocar mais não porque seria injusto. (Educadora Infantil -
Rede Particular)
Então eu estou sempre mostrando para ele o outro lado. Ele tem as obrigações dele
de casa. O uniforme dele é ele quem lava e eu saio cedo e falo com ele ai dele se eu
chegar e encontrá-lo na rua. (Grupo Pais e Responsáveis)
Meu marido também é assim: fala com os meninos que pode lavar as vasilhas
porque eu chego cansada e tem quatro pessoas dois que trabalham e dois que
estudam e ele não lavou. Quando foi dez e meia quando ele chegou da aula o pai o
fez lavar tudo. Regra é regra. (Grupo Pais e Responsáveis)
Pergunta: E quando eles não estão na escola, nem estão ajudando nas tarefas
domésticas, nem estão se divertindo, tem algum adolescente que trabalha?
Resposta: O meu trabalha e estuda.
Resposta: O meu trabalha. Ele tem 15 anos, mas não pode assinar a carteira nem
nada, é aprendiz, mas trabalha. (Grupo Pais e Responsáveis)
Um discurso assim, apesar de socialmente soar nobre e ideal, pode estar pouco
conectado com o dia a dia real das pessoas. Há que se propor ações cujo foco seja a educação
para a cidadania, e que por isso mesmo consigam dialogar com as necessidades e o cotidiano
de luta pela sobrevivência das populações de menor poder aquisitivo. Há que se propor cada
vez mais a integração das diversas políticas públicas para que as famílias, respaldadas pelo
Estado no seu dever de garantir-lhes acesso a lazer, cultura, saneamento, saúde, habitação,
trabalho e geração de emprego e renda, possam educar cada vez melhor os seus filhos.
Acho que falta de estrutura econômica. Tem mães que são domésticas e dormem no
emprego e vêm só no final de semana, porque a gente pergunta muito. Tem meninos
que tomam conta dos meninos menores e por ter função que demanda tempo eles
não se dedicam e também falta de incentivo. (Educadora Ensino Fundamental)
Eu acho que o seguinte os pais hoje, tanto o pai quanto a mãe, vamos dizer assim,
estão preocupados em trabalhar e dar as coisas físicas para os filhos e isso, como a
mãe hoje está mais fora de casa. (Educadora Ensino Médio)
Assim, esses são dilemas colocados pelos entrevistados, para os quais as respostas são
complexas e intrincadas. Mas é necessário repensar a educação afastando-se dessa dicotomia,
trabalho versus cidadania, pois insistir na segunda formulação desconsiderando a realidade
imposta pela primeira simplesmente vai impedir de se encontrarem saídas mais
contextualizadas e que estejam ao alcance da sociedade.
Cada vez menos tempo de estar junto; cada vez mais espaços onde ocorre a
convivência e interação dos adolescentes e crianças com a sociedade, tais como a rua, os
bares, a igreja, a escola, o shopping; todos eles diversos do ambiente familiar. Os espaços
virtuais de relacionamento aumentando sempre; cada vez menores possibilidades de interação
afetiva direta “olho no olho”, e cada vez mais interferências externas nas relações entre os
parentes. Tanto e cada vez mais, trabalho para o consumo que garanta a sobrevivência. Todos
esses fatores não somente impregnam internamente os núcleos familiares com novos e
inúmeros elementos sociocomportamentais, como criam canais de relacionamento
individualizados entre cada membro da família com o ambiente externo:
[. . .] Então acaba assim, essas informações são obtidas através dessas trocas afetivas
e então, o que eu percebo, muitas das vezes, é esse desconforto que a criança tem em
relação à falta dos pais. Quando vivem juntos, ele tem que trabalhar, então, essa
criança por passar muito tempo aqui, só vai vê-lo a noite ou quando só vai vê-lo no
outro dia pela manha, porque às vezes sai daqui com muito sono, chega em casa por
volta de cinco, seis horas e já vai dormir e aí, só no outro dia pela manhã que eles
estão acordados para verem, então, o tempo é mínimo com o pai. A grande maioria
dos alunos sente muita a falta.” (Gestora Educação Infantil)
114
Falar de cada um desses aspectos abordados nos parágrafos anteriores – novos arranjos
familiares, relação educação e trabalho, diversos espaços de interação entre família e
sociedade, trabalho infantil invisível etc. – já impressiona, pela constatação do que cada um
per si significa em termos de mudança na estruturação familiar recente. Mas o que realmente
deve chamar a atenção é que, além dessa significação isolada, todos eles estão presentes na
vida cotidiana atual, simultaneamente. Entrelaçam-se, interagem; e seus efeitos não são o que
poderíamos esperar de cada um em separado, mas a resultante dessa interação livre de
qualquer condução ou parâmetros por parte da sociedade, e muito menos das famílias. Assim,
essa constatação indica a necessidade de repensar cada vez mais, de forma ampliada, as
políticas de educação e as demais políticas públicas que influenciam o cotidiano das crianças
e adolescentes betinenses.
Esse tema está em correlação direta com os perfis familiares atuais diferenciados, bem
como o tempo da família dedicado ao trabalho. O acompanhamento escolar extraclasse
esperado pelos educadores não ocorre. Mesmo se considerarmos os diferentes perfis
familiares, aquele “clássico” modelo liberal de família nuclear ou os novos arranjos, constata-
se que há uma dificuldade no processo de “estar junto” do caminhar escolar das crianças e
adolescentes.
A educação como um todo, tarefa complexa que é, tem como partícipes os pais ou
responsáveis, em primeira instância; a escola, através de seus educadores e de uma política
educacional pedagógica bem formulada e adequada; outras instituições, como a igreja, grupos
de interesse diversos, grupos recreativos e esportivos etc. Por fim, participam a própria
sociedade civil de maneira ampla, com seus valores, princípios, códigos de ética e
comportamentos, e o Estado, como ente responsável pelas políticas públicas, dentre elas a de
educação.
A família, no entanto, tem papel preponderante nesse círculo de participantes. É a
partir dela, constituinte que é dos referenciais básicos de formação da personalidade da
criança, que se insere nos demais espaços sociais. Não bastasse isso, será a família a
instituição que ficará como referencial socioafetivo e que, mesmo com ausências, será a de
maior presença na vida da criança e do jovem. Ainda que em inúmeros casos possa haver um
distanciamento de pessoas quaisquer do seu núcleo familiar, esse definitivamente não é o
padrão social vigente:
115
[...] Educacional: _ o apoio dos pais! Hoje em dia para trabalhar com crianças a
gente precisa muito do apoio dos pais e pelo fato dos pais estarem sempre
trabalhando é mais difícil esse apoio. Tem pais que chegam na escola falando que
não estão aguentando mais, mas isso é porque distanciou. A criança precisa de uma
estrutura familiar, religiosa para ter uma estrutura social. E a maioria dessas crianças
estão sendo criadas só pelos pais ou só pela mãe ou só pelos avós e aquela estrutura
vai se perdendo e com ela a religiosa e consequentemente a social.” (Educadora
ensino fundamental)
Pergunta: Tem alguma coisa que a gente não perguntou e que você queria
acrescentar?
Resposta: Negligência de pais tem porque eles não estão participando da vida dos
meninos. Até 10 anos acho que tem, mas quando eles chegam aqui no 6º anos eles
sentem que podem relaxar porque os meninos entraram no 3º ciclo. Eu sinto falta
mesmo dos pais. São poucos os que estão ali vendo o que o filho está fazendo, que
vem aqui cobrar da gente, que vem querer saber. Falta isso. Falta muito família.
(Educadora Infantil)
As entrevistas indicam uma maior dedicação dos pais ou responsáveis nos anos
iniciais da escolarização, e menor nos anos finais. Alguns profissionais arriscam inclusive
uma mensuração do acompanhamento na casa dos 80% nas idades mais tenras, caindo até por
volta de uns 60% nas idades finais dos ensinos fundamental e médio. Não são objeto da
metodologia qualitativa deste trabalho essas mensurações. Os dados acima citados,
correspondentes a entrevistas feitas com educadores infantis, valem mais por demonstrar um
decréscimo do acompanhamento conforme aumenta a idade.
Por quais motivos esse fato se dá? Na visão dos entrevistados, na medida em que a
idade de crianças e adolescentes aumenta, os pais tendem a crer no aumento da capacidade
dos filhos de dar conta com maior autonomia das tarefas e mesmo do seu
autodesenvolvimento educacional. E na visão dos mesmos profissionais, embora haja, sim,
aumento da autonomia dos educandos, isso não ocorre a ponto de eles dispensarem ou
poderem ser negligenciados pelos pais.
Pergunta: Essa participação das famílias, você avalia em que percentual? A maioria
participa ou uma minoria participa?
Resposta: Até certa idade uns 60% vêm.
Pergunta: Qual faixa etária?
Resposta: Até os 12 anos.
Pergunta: Depois cai ou aumenta?
Resposta: Depois eles não aparecem. Eles acham que os filhos a partir disso, não
precisam de ter os pais participando das reuniões e hoje os meninos estão
amadurecendo mais tarde. Rapazes e moças estão muito infantis. Tem que cobrar de
alunos quase adultos. Até no Ensino Médio você tem que cobrar, hoje em dia. Acho
que isso influencia muito. (Educadora Ensino Fundamental)
Ainda de acordo com a percepção dos profissionais entrevistados, essa questão está
diretamente relacionada com outra, a do desempenho escolar. Além de não dispensar o
acompanhamento dos familiares ou responsáveis, os alunos de pais cuja atitude é a de estarem
por perto, incentivando, supervisionando e mesmo reforçando o seu desenvolvimento,
respondem na exata medida dessa ação paterna:
é perceptível, a qualidade cai muito. São os alunos que não fazem, não se
interessam, não se motivam, são apáticos digamos assim. (Educador Ensino
Fundamental)
Avaliando a situação por este último ângulo, o do desempenho escolar, não apenas o
incentivo dos responsáveis aumenta a quantidade e qualidade do resultado de aprendizado dos
seus filhos, como nos casos em que isso não ocorre a falta de incentivo faz decair a resposta
de crianças e adolescentes aos estímulos de professores, da escola, dos processos educacionais
como um todo.
Ainda que a participação da família, o estar junto, o acompanhar sejam fundamentais,
para muitos pais e educadores, diante das condições objetivas, não é essa a prática de uma
parcela importante de pais e responsáveis. Ao que parece, a escola tem se debatido com a
questão, mas suas ações, quando existentes, têm sido impotentes para minimizar o problema.
Urge colocar esse aspecto no foco de elaboração das políticas públicas. Dessa forma, talvez se
encontrem estratégias e procedimentos eficazes e eficientes para superar, quando não,
minimizar, o efeito negativo dessa participação insuficiente de pais e responsáveis na
educação dos filhos.
Outro fator detectado diz respeito à rotatividade das crianças e adolescentes na escola,
por questões de moradia da família. Os entrevistados relataram uma constante alternância de
locais de moradia dos núcleos familiares, em princípio relacionadas à busca por emprego e
trabalho. Ou seja, devido à necessidade do trabalho as famílias se deslocam de uma cidade a
outra na região metropolitana ou de um bairro ao outro dentro de Betim. Esses deslocamentos
produzem evasão escolar de um determinado estabelecimento e reingresso em outro, gerando
rotatividade, e o que é mais grave, descontinuidade da aprendizagem:
Que tem, tem. Lógico que tem. Pelo fato da rotatividade dos pais com relação a
moradia. Eles ficam um mês aqui, não dão conta de pagar aluguel e vão ali pra cima
e o aluno está matriculado aqui e nesse meio tempo fica sem estudar porque até
conseguir vaga no Teresópolis fica sem estudar uns 2, 3 meses então assim, fica
nessa rotatividade de moradia. Porque não tem moradia fixa. E a criança fica nessa
rotatividade, fica dois meses na escola e sai, fica mais três meses na outra escola e
sai. Eu mesmo recebi em Junho um menino que estava sem estudar porque ele
morava no Marajás com o pai e ficou aqui Junho, Agosto e Setembro. Foi pro
Teresópolis e eu não sei se ele está estudando. Quer dizer, então é essa
inconsistência mesmo da falta de moradia, do meio... (Educadora Ensino
Fundamental)
Resposta: A gente tem muita transferência de aluno e a gente recebe muito aluno.
118
Resposta: É um percentual. Não é todo mundo. Tem pessoas aqui que a gente
atende. Já demos aulas para os tios, primos e já estamos na terceira geração já. Eu já
estou dando aula para filhos de alunos. Então são famílias que permaneceram, mas
são famílias que encontraram a sobrevivência aqui. Agora tem aqueles que vêm e
vão. Um percentual que não encontra perspectiva aqui. (Educadora Ensino
Fundamental)
Essa questão foi encontrada quando se buscava na realidade detectar se havia número
significativo de crianças e adolescentes em idade escolar, fora da escola. O diagnóstico queria
localizar se por falta de iniciativa e vontade dos pais ou mesmo das crianças, bem como por
ausência do poder público na oferta adequada de vagas, entre outros, poderia estar havendo o
fenômeno da não matrícula. Ao que tudo indica, a existência de crianças e adolescentes em
idade escolar fora da escola, desde a educação fundamental ao ensino médio, ocorre de
maneira pouco significativa. Os entrevistados reforçam que o contrário disso pode até ter sido
a realidade há alguns anos; mas que hoje, em Betim, esse não é um fator tão preocupante.
Pergunta: Eu queria que você falasse um pouco,. . . crianças em idade escolar, mas
que não estejam na escola. Estejam fora da escola. Tem isso aqui na região? Você
que é moradora
Resposta: Eu acredito que, nesses 10 anos eu não vi, existe o abandono, a evasão.
De uma parcela muito pequena, existem sim um número muito grande de faltas de
alunos regularmente matriculados. E existe uma evasão desses alunos
principalmente nas séries do Ensino Fundamental II que varia das antigas turmas de
5ª a 8ª e todos os casos que eu tive contato de alunos que evadiram foram por
vulnerabilidade social. Casos sempre ligados à violência. Ou porque sofreram
violência ou porque enveredaram pelo caminho dela. Então todos os alunos que eu
lidei foram esses. Tem um número de crianças em idade escolar fora da escola não.
Isso não. (Educadora ensino fundamental)
Eu não sei de nenhum caso, aqui na região, de criança que está fora da escola. A
gente faz um trabalho grande de divulgação com as famílias, falamos com os alunos.
Já tivemos em outra época, quando entramos aqui e nós íamos até as casas conversar
com essas mães procurar e falar que tinha que vir pra escola. Tivemos o caso de uma
mãe que achava que o filho era doente e por isso não o mandava pra escola. Ele
chegou aqui tarde, mas é um excelente aluno, entrou com atraso e corrigimos porque
ele é muito bom. Atualmente, eu não sei de nenhum caso de criança que deveria
estar na escola e não está. Acho que depois que a escola assumiu esse papel, essa
preocupação, diminuiu. A gente não vê isso acontecer. . . . Mas a gente pergunta
se eles conhecem crianças que deveriam estar na escola e não estão. O trabalho da
creche aqui ajuda muito porque muitas crianças já vem da creche e agora o ensino
fundamental aos 6 anos, a creche divulga também e todo esse trabalho já está
surtindo efeito. A gente já não tem tantos problemas não. (Educadora ensino
fundamental)
Por outro lado, a rotatividade encontrada tem um outro e desafiante elemento social;
talvez com maior significância que o dos deslocamentos familiares. Fala-se da violência no
entorno das instituições e o envolvimento de crianças e adolescentes com drogas como um
dos fatores responsáveis por grande parte da evasão escolar e rotatividade de alunos nas
escolas públicas betinenses. Esse aspecto se avoluma conforme se avance nos níveis de
119
ensino, pois o envolvimento das crianças e adolescentes nas faixas de 13 a 17 anos com os
ambientes externos à casa da família naturalmente aumenta conforme a idade vai também
aumentando. Nos níveis iniciais, a dependência e o vínculo das crianças com os familiares é
maior:
[...] não que seja aquela coisa assim: qualquer curso serve. Elas têm feito muitos
cursos, mas eu também fiz nas férias um curso particular riquíssimo da parte
pedagógica e teve participação de vários pedagogos e que não serviu para o PCCV
porque eu não tive o cuidado de pedir autorização então são entraves que a gente
percebe que a gente chateia os professores, os funcionários no geral.” (Gestão ensino
fundamental)
120
Tem que haver só com professor muito motivado e que ele vai produzir, se ele
estiver desmotivado ele vai ficar esperando o sinal bater. O salário, a gratificação
por aquilo que ele faz eu imagino que a gente trabalha por reconhecimento e por
precisar, por dinheiro também. Tem que avançar, eu acredito que nós perdemos
muito nos últimos anos porque o país prosperou muito e a carreira do professor não
acompanhou e isso é uma coisa que desmotiva. O plano de carreira que nós temos
hoje no município está paralisado é um dificultador, é burocrático e está sendo
reestruturado e o que eu acho é: eu, por exemplo, pra eu investir em minha carreira
eu tenho que ser motivado a buscar informações extras e trazer pra escola e não no
meu horário eu sair e ter que pesar alguém e isso é que está sendo o problema,
porque se você tira três e deixa o trabalho pra outros três fazerem, esses ficam
sobrecarregados apesar de ser uma troca depois são eles, mas eu acho que tem que
ser uma busca extra e sempre motivando na verdadeira motivação tem que se
investir na formação e na valorização da carreira porque ainda está pouco.
Tem dez professores e você tira três para a formação, o trabalho é dividido pra sete,
por isso que eu acho que deve ser feito fora do horário de trabalho e recompensado
por aquilo e o trabalho na escola fica comprometido. Menos um na escola faz muita
falta. (Gestor educação fundamental)
Tem umas políticas educacionais até boas. Eu tinha uma turminha com
dificuldade de alfabetização, mas infelizmente a coisa não vai pra frente pela
falta de outra pessoa estar auxiliando a gente, então no caso de falta. Outro
professor pra ajudar a gente. No meu caso com a turminha de alfabetização
eu precisava de mais um alfabetizador para estar auxiliando um a um.
Principalmente em classes de alfabetização que é o mais difícil. Eu acho que
falta a prefeitura estar investindo no 1.4, 1.5 principalmente em classes de
alfabetização. Seria importante para a criança. A prefeitura quer pagar outra
pessoa fora do horário, igual veio uma para ajudar os meninos que estão com
dificuldade, erro. Era melhor pagar antes de dar o problema com a gente na
sala de alfabetização do que ela chegar sem saber onde é o problema e focar
no problema, isso é perda de tempo. Era melhor ter ela com a gente. Tem um
a mais, só um. Precisava de mais um. Para ajudar na questão da alfabetização
122
São cursos esporádicos e não tem nada a acrescentar, pelo contrário, muitas
vezes, a gente sabe mais do que a pessoa que está lá na frente falando. Não
falo que a pessoa não tem boa vontade. Mas não é aquilo que a gente quer. A
gente queria, realmente, que pegasse um educador que viesse acrescentar pra
gente, ainda mais a gente que tem muitos anos de prática. Muitas vezes eles
estão fora da realidade, são pessoas que estão muitos anos fora da sala de aula
e querem inventar coisas que não tem nada a ver com a realidade da gente.
(Educadora Ensino Fundamental)
Ainda não (chegou a violência dentro das escolas do bairro)... Acho que nas três
escolas. Falar que o bairro é violento e que a escola é violenta não. Mas o fato do
bairro ser violento o entrosamento da escola com a comunidade dificulta um
pouquinho e, de novo, a gente acaba perdendo alguns alunos por causa desse
caminhar do bairro.” (Educadora ensino médio)
Os locais onde diversos profissionais da educação atuam, descritos por eles como
violentos ou com grande ocorrência de tráfico ou utilização de drogas, foram também
considerados como bastante prejudicados no que diz respeito aos processos de ensino e
aprendizagem; também no pertinente às formas de interação social dos alunos ali residentes.
São diversas situações bastante graves, com repercussão devastadora sobre a formação de
crianças e adolescentes. Catalogam-se entre os fatos prisões de pais, abandonos da escola e
mesmo da região de moradia em razão de ações ligadas ao crime organizado, a brigas, a
ataques às escolas, a roubos, a morte de alunos. Professores ameaçados ou agredidos, doentes,
mudando de região de atuação ou de cidade, abandonando a docência:
Olha, os alunos que não têm uma família muito estruturada porque aqui a gente tem
uma comunidade de risco para as crianças e adolescentes por causa do tráfico, por
causa das... Basicamente o tráfico. Em média, a gente perde anualmente uns 4 ou 5
alunos e ex-alunos para o tráfico. Então é um dado muito triste. (Educadora –
fundamental)
Nesse sentido cabe sugerir que quanto maior for o envolvimento dos vários setores e a
parceria efetiva entre eles, maiores serão as possibilidades de se encontrarem alternativas
visando à superação dos graves problemas encontrados:
Fumam na frente deles e aí deles se abrirem a boca. A violência que eles vivem lá
eles trazem pra cá.... (Educadora fundamental)
O negativo é que ainda tem um grande número de famílias aqui que estão muito
distantes às novas tecnologias. Eles não tem acesso à informática, à internet e nem
mesmo ao telefone. Isso é um ponto negativo porque às vezes a gente comenta e
aqui tem aula de informática e eles estão mais por fora dessa realidade.”
(Funcionária – fundamental)
Por outro lado, do ponto de vista da interação social e dos relacionamentos, as crianças
e adolescentes das áreas menos urbanizadas ou rurais obtêm melhor qualidade de
desenvolvimento. Isso se daria pelo fato de, segundo os entrevistados, o perfil das famílias ali
existentes se aproximar muito mais do perfil de famílias nucleares (pai, mãe, filhos). Essas
crianças são mais solidárias, mais afetivas, menos dispersas entre a diversidade de
informações e atrativos que povoam a vida nas cidades:
Tem sim. As crianças do meio rural são mais afetivas. Elas se dão bem com os
colegas. Geralmente não se envolvem em tumultos. E são crianças que têm muito
boa vontade. Que apesar da gente perceber que são crianças que demoram um pouco
mais para aprender, elas são muito mais dedicadas. E as famílias mais estruturadas
porque aqui no mundo urbano, a maioria têm pais separados, moram com a avó, a
mãe foi embora então moram com a avó e por isso não tem muita referência de
família não. As da zona rural já tem (Educadora fundamental)
Tem interferência sim. As crianças que moram na zona rural que são filhos de quem
toma conta dos sítios, mostram pra gente uma defasagem porque eles não têm
contato com o mundo. A gente costuma falar que eles não têm contato com o mundo
aqui fora porque eles moram no sítio e não tem contato com livros, revistas e alguns
nem com a televisão e muito menos internet. Então eles estão bem afastados do
mundo que está aí tão avançado. . . É importante que a criança esteja envolvida no
mundo das letras no início da alfabetização, que eles tenham acesso aos livros,
revistas, brincadeiras. . . (Educador fundamental)
125
Resposta: O professor não conhece a realidade da vida do aluno. Hoje ele não
conhece e vou te falar mais sério ele não tem tempo para conhecer porque ele entra
na sala de aula e vai cumprir um cronograma . . . O professor, historicamente, ele
não conhece pessoalmente o aluno. Quem conhece pessoalmente o aluno, a história
de vida e tudo? Aqueles que não estão dentro da sala de aula, no caso eu posso te
citar,. . . diretor, vice direção e os apoios pedagógicos. Quando a gente começa a
visitar a comunidade da seguinte forma: o menino passou mal eu vou lá onde ele
mora levar o menino e você começa a ter contato com a realidade daquela família. A
mãe chega na escola e conta uma história que ela está passando e você conhece a
família e entende o por quê da reação do menino. Quando a gente vai falar isso com
o professor, ele ainda olha com ares de espanto. Eu acho que no sistema que nós
estamos hoje enfrentando tem uma lacuna e essa lacuna continua pelo método que
nós temos na escola. A rotina da escola, a dinâmica da escola não permite você se
envolver de uma forma mais humana com o aluno pra você sanar o problema dele.
(Profissional de gestão)
entrevistado leva a considerar aspectos da estrutura social de difícil manejo pela escola,
dentro de uma tríade: Escola versus Sociedade Complexa e de Consumo versus Projeto
Pedagógico adequado à realidade dos educandos. Porém, é forçoso reconhecer que a escola
não está definitivamente de mãos atadas. Isso é o que subjaz da fala dos profissionais. A
instituição é um dos elos da questão e tem parcela de contribuição importante no
aprofundamento dos problemas, bem como na busca de soluções. Ela pode atuar no sentido de
“humanizar” os processos educacionais:
A questão da leitura pega muito e a defasagem idade/série, por exemplo, tem alunos
de 14 anos que estão na 4ª série, tem alunos que estão com quase 20 na 8ª série então
existe uma defasagem idade/série e eu acredito que isso não é muito incomum não.
É muito comum o que está se fazendo agora são vários projetos de intervenção
buscando atender pequenos grupos pra tentar sanar isso. Outra coisa que atrapalha é
a tal da aprovação direta a gente não tem o direito de reter o aluno quando a gente
acha que necessita não que isso seja uma punição como era no meu tempo de escola,
mas aquele menino precisa de um tempo a mais na escola. (Educador fundamental)
Conversando aqui antes de você chegar eu falei com uma colega minha que parece
que a escola é uma das áreas mais retrógradas da educação, mais retrógradas que
existe. Eu estou falando assim das pessoas se recusarem a mudar, sair do... Hoje a
127
gente tem tudo numa velocidade incrível. Os alunos usam um celular que há pouco
tempo a gente não estava acostumado com tanta tecnologia, mas hoje os alunos
dominam isso com facilidade. Inclusive as crianças menores, sei lá, 6,7 anos já
sabem usar o computador, mexer na internet e tem um certo domínio e na educação,
pelo menos da educação pública parece que ainda existe muita dificuldade nisso.
(Educador fundamental)
Eles são muito carinhosos. Mesmo os que estão envolvidos no pior delito. Alunos
que, depois a gente descobre que estão fazendo assalto a mão armada no Carrefour,
no Apoio . . . (Educadora fundamental)
Aqui se você observar, a escola não é pichada, se você entrar nas salas de aulas, tem
cartazes do início do ano pregados. Eles não depredam. Acho que isso também está
muito ligado à estabilidade do grupo porque quando o grupo muda muito parece que
as crianças ficam sem norte. Já na casa é um rodízio, às vezes, e na escola também,
eles ficam sem referencial.” (Educadora fundamental e médio)
Não seria prudente estabelecer uma relação direta de causa e efeito entre as variáveis
em questão: 1-corpo docente permanente por muitos anos; 2-comportamento não violento dos
128
Agora agressão verbal entre eles existe muito porque é uma coisa que eles têm
dentro de casa então o professor que já trabalha aqui pelo menos 2 anos já aprendeu
que para trabalhar com os alunos, você tem que desarmá-los verbalmente. Porque
quanto mais agressivo ele vier, mais calmo você tem que responder para que eles
percebam que eles estão em um ambiente diferente da casa deles. (Educadora
fundamental)
Por mais estranho que pareça uma escola situada em um aglomerado, uma vila como
essa aqui, a gente não tem casos de agressão física a professor. Eu estou aqui há 18
anos e nunca tive o desejo de sair daqui porque eu sou muito respeitada pelos meus
alunos . . . Às vezes, você não acredita da forma como eles me tratam. Como que
eles têm um respeito aqui dentro da escola. Parece um oásis. A gente estranha. Acho
que isso é por que tem um grupo de professores muito estável aqui na escola. A
maioria tem mais de 10 anos a não ser nos últimos concursos porque o fluxograma
aumenta então chamam professores. Muita coisa que a gente escuta na televisão de
agressão a gente estranha. . . Mas acontece, às vezes, violência quando entram para
a escola. Por exemplo, já aconteceu um assassinato aqui que foi do marido com a
esposa. Ele entrou na escola e matou a esposa aqui por questões de ciúme, outras
questões. Já aconteceu de traficante entrar aqui a atirar no pé de aluno na quadra.
Isso há muitos anos, porque eu estou aqui há muito tempo, mas não ameaça ou
agressão física contra o professor. (Educadora fundamental)
Não que a escola em questão seja um “mar de rosas” no que se refere à relação
professor-aluno. Porém, pelo que se pode constatar, ela se mostra mesmo “diferenciada”, se a
compararmos com a quase totalidade das demais, cujas afirmações de seus educadores vão
sempre na direção diversa desta. Ou seja, há um resultado negativo no aproveitamento escolar
e nos relacionamentos professor versus aluno dentro das escolas, diretamente relacionado à
instabilidade do contexto externo. E esses resultados ruins não são contidos pela ambiência
interna na maioria dos casos:
129
Mas tem o lado bom. Os meninos estão saindo bem preparados a gente tem
resultados na PUC, como eu já falei, no Pitágoras a gente tem uma satisfação.
(Educadora fundamental)
Enfim, no contexto deste relatório, essa pode ser uma “pista” a ser mais bem
investigada no rumo de se encontrar elementos para uma política pública de educação
articulada a outras políticas públicas em acordo com as demandas locais, que não só busque,
mas efetivamente conquiste melhores resultados.
A escola de tempo integral é vista pela maioria dos profissionais entrevistados como
uma boa iniciativa, com ótimos objetivos e é, assim, elogiada. Porém, mesmo quem percebe
acerto na iniciativa não possui clareza e maior conhecimento a respeito do seu “fazer
concreto”. Há mais visões aparentes apenas, relativas aos objetivos midiaticamente colocados,
sem muita percepção da concepção, da lógica e do funcionamento por trás do programa.
Mesmo as avaliações críticas, na sua maioria, não trazem dados ou alegações claras que
justifiquem o posicionamento negativo frente ao projeto.
Era de se esperar melhor e mais aprofundada compreensão deste projeto pelos
educadores, considerando-se que sua implantação iniciou-se em 2009. Talvez por sua
complexidade operacional, além de outros fatores (entre os quais o de que ele ainda se
encontre em fase de adequação e amadurecimento na rede educacional municipal em geral),
se possa explicar a relativa superficialidade com que é descrito pelos profissionais:
Em que pese esse conhecimento raso de parcela significativa dos educadores, há tanto
sugestões de melhoria quanto críticas mais agressivas ao fazer atual do projeto.
130
Escola da Gente começou e ainda tem muitos problemas exige muito investimento,
exige muito cuidado dos seus gestores. Eu acho a gestão muito falha. É um
programa que exige milhões de impostos, porque é um programa oneroso para os
cofres públicos, tem que haver sim, eu não sou contra, tira e pronto. Mas acho que
precisa de uma gestão mais competente. Eu acho que poderia ter resultados
melhores, porque você tem investimentos e eu acho que ele não tem que ser para
todo mundo. Não é toda criança que tem que ser privada do convívio familiar e eu
acho que o grande defeito é achar que toda criança tem que ser privada. Vai quem
quer. Não há uma seleção. . . Não existe critério de seleção de crianças para o Escola
da Gente. A mãe quis, ele vai. E eu não acho que é por aí não. É muito dinheiro
investido. E, às vezes, a criança que mais precisa não entra porque ela tem tanta
vulnerabilidade que o Estado não vai buscá-la é a mãe que tem que vir. Então você
tem crianças que não tem a mínima necessidade de estar em escola integral. A escola
conhece de perto. Eu costumo dizer que o Estado se ausenta de várias maneiras das
grandes periferias do país, mas uma forma de ele estar presente é por meio da escola
e isso é um ganho para o Brasil nos últimos anos. Qualquer lugar que você vai tem
uma escola, pode não ter posto de saúde, pode não ter um posto policial, pode não
ter nada, mas a escola sempre tem. Porque a lei evoluiu nesse sentido e eu acho que
a escola é o braço de fazer da prefeitura é o primeiro. Eu costumo dizer que a gente
vê isso de perto. Porque o trabalho do agente de saúde eles veem mais de perto que a
gente, mas a gente aqui também vê. E a gente não foi ouvido. A escola não foi
ouvida no sentido de saber quem precisa e quem não precisa, mas o precisar não é o
precisar da minha cabeça porque esse menino vem de chinelinho, não eu penso em
registros.
Pergunta: Critérios objetivos. . .
Resposta: Eu não acho que tem que se gastar tanto dinheiro público com todo
mundo, mesmo porque o Estado não vai dar conta de pegar a família de todo mundo
e colocar em um programa, não vai dar conta. Então eu acho que o grande erro da
escola integrada seja universalizar isso. Eu não acho que ela seja para todos. Ela tem
que ter critérios claros, tem que ser para os que estão em vulnerabilidade social esse
é o grande problema. Mas já é uma ótima ação. Alguém tem que começar.”
(Educadora infantil)
Visto de um ângulo mais geral, grande parcela dos entrevistados percebe o projeto
como sendo aquele espaço social onde os filhos interagem, socializam, aprendem outros
131
saberes, mas acima de tudo estão a salvo da “rua” enquanto os pais trabalham. A última
expressão “enquanto os pais trabalham” tem grande significado como síntese do projeto:
Não sei te informar. Eu sei assim que o desejo da escola era de atender 100%, tem
casos de famílias também que não querem porque não precisam porque a mãe não
trabalha e cuida do filho e muitas optam por não participar do Escola da Gente.
(Educadora fundamental)
Tem muita criança que fica na rua. O fato de a criança não ter um lugar para ficar
depois da escola pra mim é muito complicado uma vez que na rua ela não tem os
ensinamentos que ela deveria ter. Os limites, os valores, ficam perdidos, isso, em
alguns lugares da periferia é muito visível sim. A gente consegue perceber isso.
(Educadora fundamental)
132
A educação em tempo integral, para alguns, surgiu como uma resposta a alguns dos
desafios da educação em Betim. Mas os depoimentos nesse sentido também alegam
modificações necessárias ao projeto para que ele se constitua em fator que realmente faça
diferença no âmbito dos desafios.
Eu esqueci de falar de um ponto positivo que é a escola integral que tira os meninos
da rua, mas ao mesmo tempo são falhas porque quem está lá não está apto para
trabalhar com criança e adolescentes porque são estagiários do Ensino Médio e não
têm formação. Não é que eles não tenham boa vontade é que ter boa vontade não é
estar capacitado. Estar capacitado é uma coisa, então aí falha. A criança sair da rua e
ficar o dia inteiro em uma escola estruturada é ótimo, mas precisa equipar direitinho
e com profissionais capacitados, não é colocar os estagiários do Ensino Médio para
trabalhar com adolescentes porque eles vão trabalhar de igual para igual. Seria só
isso. (Educadora fundamental)
ser relido à luz da Emenda Constitucional n. 20/98, que a condição de menor aprendiz
é atingida a partir dos 14 anos. Por seu turno o “Escola da Gente” atende adolescentes
até os 14 anos. Assim, se inserisse conteúdo educacional profissionalizante, não
estaria ferindo a legislação, visto que não estaria “empregando” menores de 14 anos
como aprendizes, mas apenas ofertando conteúdo educacional profissionalizante.
Essa posição pode ser questionada sob a ótica pedagógica e também legal, conforme
as legislações inclusive internacionais, que versam sobre trabalho infantil. No entanto, figurou
como sugestão tanto de profissionais quanto de jovens e seus familiares, sendo nesse sentido
um dado que merece a atenção do poder público:
O Escola da Gente não está – nós até discutimos isso numa reunião de colegiado –
ele não está muito integrado à escola. Como a coordenadora falou, existe a escola
regular . . . aqui e o Escola da Gente lá . . . como se fossem duas coisas separadas,
mas não são separadas. Deveriam estar integradas, mas essa integração não existe de
maneira satisfatória. Não sei de que parte que é que não integra. Talvez seja um
pouco da imposição da prefeitura nas escolas, da maneira como foi feita essa
imposição. A Escola da Gente é um programa interessante, mas assim eu acreditava
que a coisa deveria estar mais integrada. Uma escola integrada deveria começar às
7h e terminar às 17h sendo uma coisa só. Do jeito que está parece que são duas
coisas diferentes. (Educador fundamental)
134
As violações dos direitos das crianças e adolescentes betinenses foram abordadas nas
inúmeras falas dos entrevistados por este diagnóstico, desde a negligência familiar, violência
sexual, passando pelas violências física e psicológica:
Exemplo de casos que aconteceram eu prefiro não falar, mas há sim. Casos de
violência, inclusive de abuso. A função da escola é chamar o Conselho Tutelar e
acompanhar junto. Só não vou citar. Casos têm vários, muitos mesmo desde quando
eu vim pra cá até hoje e a tendência é só aumentar. Eu percebi que aumentou
justamente pela falta de estrutura familiar. (Educadora ensino médio)
Essa constatação nos coloca diante de uma reflexão a respeito das leis e sua eficácia
ou ineficácia, da moralidade vigente, da real visão de cidadania existente e do próprio papel
da criança e do adolescente na sociedade betinense. Assim, o diagnóstico delineará os fatos
conforme a visão dos entrevistados, na perspectiva de serem revistas as atuações dos órgãos,
das famílias, das instituições de ensino, enfim, da sociedade no município.
Se analisarmos a grande quantidade de ocorrências deveremos voltar os olhos às
denúncias feitas. Sob esse ângulo, ainda que grande parte dos fatos não seja denunciada,
aqueles que o são servem à instauração da garantia de direitos. Há aí, porém, uma percepção
de que o acompanhamento até a efetiva resolução do problema esteja falha. Em grande parte,
os entrevistados atribuem essas falhas à menor capacidade de atuação dos órgãos frente ao
quantum de denúncias recebidas. Mas ocorre também a complexidade e dificuldade próprias
do que seja acompanhar e resolver esse tipo de situação, tanto pelos órgãos, quanto por
indivíduos interessados na solução do problema. Enfim, há na atuação dos órgãos públicos,
bem como de envolvidos, um dos “pontos de estrangulamento” a serem trabalhados:
Uma aluna chega, um caso aqui, com suspeita de abuso sexual com sete anos, uma
aluna que não é minha, um aluno que está surtando porque tomava uma medicação e
parou não sei por quê. Bate a cabeça na parede, é violento com os colegas e comigo
e a mãe já foi encaminhada e a psicóloga. “Olha mãe a que estava aqui foi embora”;
“E não tem previsão?”; “Não, não temos”. É uma coisa que tem tentáculos para
todos os lados, eu preciso de um esforço coletivo para dar certo. O entrave é esse,
você manda um encaminhamento para a psicóloga e ela fala que não pode dar
remédio para o menino, você pergunta um menino aqui do Escola da Gente ele cai o
rendimento porque ele não faz um dever porque ele não precisa dos estudos para o
escola integral e os meus alunos que participavam não tinham o hábito do estudo
então eu acho que tem muitos programas sociais, da saúde e cada um atirando para
um lado. Acho que essa falta de harmonia é um entrave. (Educadora Fundamental)
Exemplo de casos que aconteceram eu prefiro não falar, mas há sim. Casos de
violência, inclusive de abuso. A função da escola é chamar o Conselho Tutelar e
acompanhar junto. Só não vou citar. Casos têm vários, muitos mesmo desde quando
135
violações e leva os educadores a procurarem auxílio para o educando. Assim, essa é mais uma
das consequências catastróficas das violações de direito: a sua interferência extremamente
danosa e maléfica, no aproveitamento escolar das crianças e adolescentes.
Pergunta: Quando acontece esse tipo de problema vocês conseguem detectar com
facilidade? A criança muda?
Resposta: É mais pelo comportamento da criança. Ela muda completamente. Seja o
que for que estiver acontecendo. Se for só uma violência, se for droga, se for abuso,
ela muda completamente o comportamento em sala. (Educadora ensino médio)
Para os educadores, o Estatuto seria visto por pais pertencentes à parcela da sociedade
cuja estrutura socioeconômica é a de maior poder aquisitivo como sendo a legislação que
institui direitos e deveres de todos relativamente aos adolescentes. Mas essa é uma percepção
que derivaria de um discurso oficial. Na realidade, ele seria um “ilustre” desconhecido dessas
e de todas as outras camadas da população. Esse desconhecimento de seu conteúdo, e muito
mais, da aplicabilidade dele, foi um dos fatores que mais chamou a atenção neste estudo.
Principalmente porque também o é junto à grande maioria dos educadores. Essa foi uma
constatação, de certa forma, surpreendente, embora haja um discurso de que se conhece ou se
sabe o suficiente dele. Seus ditames não são divulgados ou estudados com maior zelo nas
escolas betinenses, coletiva ou individualmente, sendo raras as exceções. Então, sequer no
seio familiar, presumivelmente, ele é conhecido:
Eu já fui na casa de duas alunas aplicar prova e convencer a avó a trazer as meninas,
mas tem minhas limitações também porque o pessoal fala pra gente não entrar
porque é barra pesada tem droga envolvida e a gente fica constrangida, mas não
podemos omitir. Eu vejo que o ECA... ECA – eu acho que a Lei é bacana demais,
mas vejo que nós ainda precisamos implementá-la. Não só através do conselho.
Acho que todos os cidadãos, profissionais precisam fazer com que a lei seja
cumprida. (Educadora fundamental)
137
É uma coisa que deveria ser inserida no ensino sim. No aspecto geral, se fosse fazer
um balanço do Estatuto da Criança e do Adolescente eu acho que está sendo mais
benéfico, mas não está sendo trabalhado de maneira adequada. (Educador ensino
médio)
Relatos dos entrevistados evidenciam que muitos têm a percepção relativa ao Estatuto
como “usurpador” dos direitos dos pais e das instituições tradicionais que se responsabilizam
pela formação das crianças. Segundo uma entrevistada, “esse ECA veio só para dar asa para o
menor, ele pode fazer o que quiser”. Na visão de muitos, o Estatuto, ao defender os menores,
tira das instituições os “direitos” que estas teriam sobre as crianças, de corrigi-las; ele lhes
usurpa a tutela do adolescente, dando-lhes “asas”, que acabam por gerar um “exagero” de
autonomia, de autorregulação da conduta, que fere e desrespeita a “ordem natural das coisas”.
Mas para todos esses setores, de maneira geral, ele é desconhecido e mal interpretado.
Há uma percepção de que o ECA deve ser mais bem trabalhado na sua relação direitos
X deveres, pois as próprias crianças e adolescentes se apropriam convenientemente dos seus
direitos mas não têm se esforçado por tomar consciência dos deveres. E, nesse paradoxo, sua
aplicabilidade e reconhecimento social vão ficando comprometidos.
Essas visões a respeito do Estatuto refletem dilemas e dificuldades que educadores,
pais e professores enfrentam hoje no ato de educar. Quais são os referenciais, como
138
estabelecer limites e exercer sua autoridade? Pais e professores relatam dificuldades nesse
ponto:
Ele era necessário uma vez que tantas coisas foram colocadas em leis porque
infelizmente alguns pais não tinham limite, eu estou falando do ponto de vista
da família. Eu acho que ele foi uma coisa necessária. Em relação à sociedade,
aí eu abro um pouco mais o leque eu acho que também era necessário uma
vez que muitas coisas que as crianças e os adolescentes estavam
completamente desprotegidos, mas um aspecto que eu acho que está sendo
negativo ou não está sendo bem trabalhado é a questão que os adolescentes
estão olhando só os direitos então os deveres para os adolescentes hoje, não
são vistos. (Educadora ensino médio)
[ ...] Espancamento, espancamento, não. É um pai que faz a correção normal como
eu e você faríamos a um filho...” (Educadora fundamental)
Como que um cara casado pega uma menina de 11 anos? [ ...] A mãe mesmo, acho,
corrigiu a filha... falou, vou corrigir ela, vou jogar pimenta nos órgãos genitais
dela..., e eu perguntei: Você tá ficando doida?! (Educador, sobre mãe)
leis não davam conta de amparar as crianças o Estatuto deu. No cotidiano da escola,
muita coisa já mudou porque, às vezes, existe até o preconceito inverso. Não posso
fazer isso porque o Estatuto não permite. Em função de falta de conhecimento, de
falta de informação de ignorância, então existe um amparo. (Gestora ensino
fundamental)
dividindo a convivência familiar com os avós das crianças ou estando só com elas. Enfim,
uma gama de perfis sobre os quais já nos referimos em outros tópicos do relatório. Em
síntese, está-se migrando de um perfil familiar convencional para variados ou “novos” perfis
familiares:
No caso, por exemplo, que eu acho que tem que ser melhorado é a conscientização
do adolescente porque eu acho que eles têm muitas informações e por essas questões
ditas antes que os pais não estão envolvidos no processo de ensino aprendizagem e
isso é uma novidade para os pais, para os filhos, eu acho que isso tem o
acompanhamento dos pais em casa, muitos dos filhos não têm essa educação que
vem de berço e os pais estão um pouco perdidos com relação a essa nova família
porque eu acho que a gente está passando por um processo e a educação está
agregada a ele que é a estrutura da família ela está sofrendo uma mudança muito
grande em sua estrutura. Eu acho que essa estrutura familiar se desfez e tem muita
coisa para arrumar. É isso que foi desarrumado, é isso que está dentro do caminhão.
É isso que precisa chegar em um ponto e ser arrumado. Um novo modelo de família
que nós vamos ter. Ou os vários modelos porque antes a gente só tinha um modelo e
agora nós temos vários modelos e acho que isso está contribuindo negativamente
porque a maior parte da sociedade não está sabendo lidar com isso e vêm os
preconceitos. Diante disso vêm os preconceitos, a família mudou, muitos dos alunos
não entendem isso e surge o preconceito. Até abrangendo mais um pouco o
capitalismo mesmo, eles veem um produto na televisão e eles não conseguem lidar
com isso. Porque lá os adolescentes aparecem com tênis novos, bonitos. O aluno é
perdido pela marginalidade, pela droga, muitas vezes, porque ele não sabe lidar com
isso. Ele vê uma coisa que não pode ter e a família não tem uma estrutura que não
pode dar isso a ele então ele acha um caminho mais rápido e mais fácil para adquirir
tudo aquilo que é passado. Então eu acho que essa situação que nós temos aí essa
situação paralela acontecendo. Nós temos que chegar a um ponto final e organizar
toda a casa, apesar de que eu acho que o mundo está em constante transformação,
mas eu acho que a gente precisa situar algumas coisas para que fique mais claro para
os adolescentes e para as crianças. Esse referencial aí que eles estão perdendo. E tem
influenciado muito negativamente. Agora os aspectos positivos eu acho que eles
estão na seguinte questão: nós temos vários alunos nossos que tiram disso tudo
coisas boas. Que tiram disso ensinamentos para ter uma educação de qualidade eu
não posso dizer que são todas as famílias que estão vivendo isso eu seria muito
pessimista. No caso, por exemplo, tem famílias que já não têm uma determinada
estrutura, coisas que eu acho que são importantes para um jovem e que fazem a
diferença e alguns dos nossos alunos têm: religião, não significa que a criança é
obrigada a ter uma religião, mas ela tem um referencial daquilo. Alguns têm isso.
Mas isso parte de alguns grupos familiares e a família que dá esse suporte o aluno
consegue fazer essa mudança com uma organização melhor e consegue lá na frente
uma estrutura melhor. Então, na realidade, pra eu não ficar muito perdido na minha
resposta, eu acho que nesse mesmo aspecto tem coisas positivas e negativas. Nas
famílias que não estão sabendo lidar com isso e com as famílias que estão sabendo
lidar melhor com isso. Eu acho que a mudança toda que está acontecendo na
estrutura da família é que está sendo o foco disso tudo. No meu modo de ver.
(Educador ensino médio)
real”. E o que dizer da quantidade de informação transmitida? Pouca informação e que era,
portanto, processada e assimilada mais lentamente. Ou seja, praticamente no mesmo momento
em que ocorre um fato qualquer, ele é divulgado, transmitido, visto e ouvido, compartilhado
por muitas pessoas ou grupos. E se o limite de tempo praticamente não mais existe, também
não há o limite de espaço físico ou geográfico, pois não importa mais se as pessoas em
interação estão próximas; algumas podem estar na China, outras no Brasil, e a interação
ocorre da mesma forma. Por fim, a quantidade de informações circulante atualmente entre
grupos e pessoas é de uma grandeza ou medida incalculável. Ocorre nesse sentido uma
migração de proporções inimagináveis, de uma forma de interação social lenta, gradual e
quantitativamente pouco expressiva, para outra que é semelhante a um “bombardeio” de
possibilidades interativas:
forma de “fazer social”, ambos precisam buscar ter outra consciência de vida ou visão de
mundo, apta a lidar com todas as situações relatadas nas linhas anteriores, numa atitude que
podemos chamar de “Adaptabilidade Crítica”, pois não se pode conceber que o mesmo tipo de
mentalidade vigente nos moldes da vida mais estável vá conduzi-los exitosamente dentro da
nova dinâmica que se instala:
Olha, o principal desafio é nós estamos falando de um corpo docente que foi
formado nas últimas décadas e os desafios que chegam com as novas gerações elas
também são novas. A forma da criança e do adolescente vivenciar determinados
problemas, a forma dele buscar soluções para os problemas, faz com que o perfil das
crianças e adolescentes seja diferente de algumas gerações atrás, mas os nossos
profissionais foram formados ao longo dos anos atrás. A grande maioria dos nossos
profissionais estão na faixa dos 40, 50 anos e o grande desafio que nós percebemos é
que há um comportamento saudosista, vamos assim dizer, e o professor, o Pedagogo
se colocando, muitas vezes, no lugar de vítimas diante dos desafios colocados não só
pelo aluno, mas pelo modelo diferenciado de família e por essa questão da violência
fora da escola e ao redor dos muros da escola e até dentro da escola também. Essa
geração não foi preparada para esse perfil de aluno, esse ainda não é total, mas nós
temos um percentual significativo. Ao invés de buscarmos entender essa nova
geração e essa sociedade como ela está posta, muitas vezes, a gente se coloca como
refém, como a vítima do processo e não como ator que deve atuar sobre o processo.
Então eu vejo isso como um grande desafio. Buscar não só mecanismos para esse
professor atuar sobre isso, mas também trabalhar esse convencimento do perfil desse
profissional que atua hoje nas escolas. Esse é o maior desafio. Gestora Educação
Fundamental
Eu acho que a escola está sofrendo um pouco com isso também. A escola tem
sofrido com essa mudança nos seguintes aspectos: para nós professores, muitas
coisas estão sendo processadas muito rápidas, assim como para todos. Esse
conhecimento que os alunos estão trazendo para nós hoje, todos esses aparelhos que
eles têm acesso a eles, muitas informações que eles têm, muitas vezes, o professor
ainda não adquiriu esse conhecimento. Não porque ele não quis, mas por uma falta
de tempo e de oportunidade, por exemplo, cursos de capacitação, eu acho que isso
está em falta, curso de capacitação dos professores está em falta, para os professores
saberem como lidar com essas situações eu acho que isso está muito a desejar. Não é
isso que está na escola para que a gente possa...o professor em si é uma pessoa que
tem que (confuso 36‟20) a gente sempre está tentando andar a frente do aluno e o
professor em si tem que buscar cursos, mas a instituição também na qual a gente está
trabalhando ela tem que oferecer mecanismos para que nos mantenhamos mais
atualizados possível e isso eu acho que, infelizmente, está faltando, isso infelizmente
nós não temos. Eu acho que esse aspecto está contribuindo negativamente.
(Educador ensino médio)
143
Eu acho que o que pode ser melhorado nesse aspecto é a parte do diálogo mesmo.
Acho que o diálogo é o principal. Acho que todas as partes têm que dialogar seja
governo com professores, seja professores com alunos, seja escola com a
comunidade, seja em qual aspecto for. Eu acho que falta esse diálogo e os cursos são
uma ponte para isso. Os cursos são uma ponte para a gente ter uma relação melhor
com as instituições que a gente está trabalhando da seguinte maneira: que a gente
possa levar até eles os nossos desejos e que eles também tragam para nós os desejos
deles. Quando eu falo na família é a mesma coisa porque esse diálogo constante é
que a gente vai conseguir chegar a uma melhoria da qualidade do ensino. Eu acho
que todos os envolvidos precisam dialogar e fazer projetos que envolvam as partes.
No caso da escola, que envolva a comunidade então nós temos que ter cursos e
quanto mais a gente puder fazer o fechamento desse ciclo, nós vamos falar da
mesma coisa e falando da mesma coisa eu acho que vamos ter uma melhoria maior
na qualidade do ensino. A minha sugestão seria essa: esse encurtamento entre as
partes. A gente fala aquele, aquele. E o discurso deveria ser este é o meu parceiro e a
gente está conversando com um distanciamento muito grande é isso que eu acho que
precisa melhorar. É o que eu penso. (Educador ensino médio)
uma terceira percepção: a ausência de uma articulação e integração que facilite a transição das
crianças e adolescentes de um para outro nível da educação. Faz-se necessário elaborar
processos que preparem os educandos quando deixam um determinado nível, assim como a
constituição de processos que acolham as crianças e adolescentes recém-chegados.
Na educação infantil, são muitos os ângulos a serem abordados, desde os espaços
físicos diferenciados à ampliação dos estudos e pesquisas sobre a educação da infância, assim
como o aprimoramento da legislação para esse segmento do sistema nacional de ensino,
passando pela análise dos processos de interação social das crianças com seus pares de idade
ou com os adultos, entre outros.
A educação infantil é um direito das crianças e cabe ao poder público atender a esta
demanda. Entretanto, assim como em vários municípios do Brasil, também em Betim a oferta
de vagas é insuficiente:
[...] O nosso atendimento é de acordo com a estrutura, porque não temos muito
espaço para olhar nossa lista de espera. Porque as crianças são enturmadas de
maternal dois, maternal três, são enturmadas por turma e tem uma quantidade certa
para você colocar em cada turma. (Educadora infantil)
Resposta: Temos, é uma região que tem uma demanda muito grande para o
atendimento à criança pequena. Já com quatro, cinco anos, a nossa lista de espera
não é tão extensa, porque as escolinhas infantis da redondeza e as particulares
trabalham com quatro, cinco anos, a pré-escola, mas, de um aninho, de zero aninho
– vou colocar até o bebezinho, que é a turma do berçário – nós não temos, nessa
região, muitas instituições. Então, nossa demanda, nossa solicitação de vaga para um
ano, dois anos e três anos é bem extensa, tanto que com três aninhos, nós tivemos
até que colocar turma intermediária, porque tem, também, solicitação para turma
integral, mas temos muitos pedidos também, só para meio horário. (Educadora
infantil)
A educadora cita uma expressão atribuída aos pais no final de sua fala, mas não no
sentido de que os mesmos não se importem literalmente com o que acontece com a criança na
instituição; mas no sentido de não darem a devida importância ou não terem o entendimento
para se preocuparem com os aspectos de diferenciar se a criança está passando por diversos
processos de socialização, formação, aprendizado ou se está apenas sendo cuidada naquele
espaço de tempo.
Mas o grande problema é que se a totalidade dos pais e responsáveis buscar a
educação infantil, o poder público municipal não terá condições de atendê-los. Se for pensado
146
por outro ângulo, a municipalidade nem mesmo pode incentivar, conscientizar, divulgar as
leis e documentos relativos aos direitos das crianças, pois não tem como oferecer sua
contrapartida para efetivação deles. E isso do ponto de vista quantitativo, pois
qualitativamente as diversas avaliações feitas por este diagnóstico apontam situações ainda
mais complexas. Dessa forma, embora haja avanços, ainda há um longo e difícil caminho a
percorrer na construção da política de educação infantil em Betim.
Escada de Acesso
Banheiros
148
O diagnóstico, nesse ponto, não visa traçar análises críticas negativas ou positivas.
Antes pretende citar, descrever. Os locais bem estruturados e adequados devem ser mantidos e
ampliados. É necessário conhecer os que não se encontram em consonância com o desejável
em termos de atendimento:
Hoje eu ainda falei com a minha coordenadora: “me fala outra creche que tem um
berçário como o nosso”, porque na verdade, se a gente tivesse mais estruturas como
essa, a gente conseguiria mais respeito com os educadores e formar mais pessoas
como a gente está sonhando, porque não dá para formar esses sujeitos em uma casa
precária, sem um atendimento de qualidade. (Educadora infantil)
Berçário
Várias instituições estão bem adequadas, mas boa parte possui inconformidades e/ou
adaptações que foram feitas tentando minimizar as inadequações. No que tange ao
atendimento de crianças com deficiência, a situação de inadequação é bastante crítica em
praticamente todos os espaços existentes.
Mas aí hoje já tem o Caixa Escolar, que eles ajudam, dá uma verba para poder estar
comprando as coisas pedagógicas, as coisas que necessitam no decorrer do mês. E às
vezes eu acho que eles acham que é muito, mas...só a coordenação é quem sabe.
Existem dificuldades sim. Às vezes, por exemplo, um... é lógico que tudo ao seu
momento. Lógico. Mas assim, por exemplo, às vezes precisa de um Bombeiro, às
vezes precisa assim... Eu acho, na minha opinião, eles deveriam com mais
frequência estar vindo . . . que às vezes precisa ligar para eles estar vindo, ou às
vezes vem e eles falam „ah, mas hoje eu não posso‟, „sábado eu não trabalho‟, „não
tem hora extra‟, então tem que ser a hora que eles querem. Então, quando é um
caso... em se tratando de uma instituição, estoura um esgoto, ou um vaso entope, ou
149
uma pia da cozinha entope, então isso é coisa para ser vista para ontem. (Educador
infantil)
Espaço de dormir
emergente, dentro da nossa instituição, é a manutenção, porque hoje o valor que nós
conseguimos arrecadar e as contribuições que eles pagam, com doações que eles
pagam mensalmente, e quando não podem e quando não querem não pagam, mas
quando entra qualquer valor, mesmo simbólico, a gente coloca naquilo que é
emergente, de primeira necessidade, fralda, faltou frada, faltou qualquer material
dentro de sala pra consecução do trabalho, a gente usa para essas emergências, uma
conta de água, de luz. Mas a manutenção é muito difícil, porque você tem pintura,
você tem a parte elétrica, a parte hidráulica, e às vezes a Secretaria da educação não
consegue mandar pra gente, e se faz necessário, se temos uma certa urgência naquele
momento, nós temos que recorrer aos pais. Então essa tem sido uma das maiores
dificuldades aqui dentro. E os outros pontos, eu não chamaria de dificuldades,
porque estamos em um processo de municipalização, e com certeza serão
solucionados, é o caso de manutenção na cozinha, troca de uma torneira e os
bebedouros, nós temos dois bebedouros que foram instalados e eles estão hoje
inutilizados, um deles tem até problema com vazamento e aí nós estamos
dificuldade de retirá-los, por que: a Secretaria de Educação, ela tem que intervir
nesse processo para retirá-los, por que eles fazem parte do patrimônio, e como tem
que fazer essa retirada, demora. Se retirarmos, vamos colocar onde? E se não tirar, a
outra opção é reativá-los, mas também para reativá-los, teria um custo. Então, essa é
uma das nossas emergências hoje. No mais está tudo tranquilo. (Educadora infantil)
Dormir e Aprender
Um dos itens avaliados que foi considerado como satisfatório pela maioria dos
entrevistados diz respeito à alimentação. Embora ainda haja observações que destacam
deficiências nesse aspecto, no cômputo final a avaliação foi bastante positiva. De uma
maneira geral, a quantidade de refeições ofertadas, bem como sua qualidade e variedade, têm
sido satisfatórias na maioria das instituições:
Eu acho que ainda tem muito desafio, porque ainda tem muita criança que precisa...
igual a gente já falou da lista de espera, tem muita criança sem estudar aqui no
bairro. Se você for em outra creche que tem aqui perto, você vai encontrar a mesma
demanda. Então, o que está dependendo é disso. Agora, sobre alimentação, fruta,
merenda, tudo que vem é de qualidade, coisa boa, a gente não tem nada a questionar.
O único questionamento que eu tenho a fazer é só isso mesmo: sobre vaga. Criar
151
mais espaço para estar dando o direito de toda criança estar na escola.
(Administrativo educação infantil)
Cercadinho de Brinquedos
Então, aqui dentro da instituição, a gente não está todos os dias, é claro, explanando
sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente para os educadores, em nossas
reuniões, mas a gente sempre dá uma lembrada, sempre passa um artigo ou outro e
procurando mostrar sempre o objetivo principal que é o respeito e a dignidade á
criança e ao adolescente. Bom, o Estatuto da Criança e do Adolescente, ele fala que
além de ser dever da família e tal, ele reza os direitos que a criança tem, os direitos
básicos da criança, que são incondicionais, todos os direitos da criança são
respeitados aqui dentro, a criança aqui na instituição, ela tem todos os seus direitos
assegurados. Eu me preocupo muito, aqui dentro, é com a questão da alimentação,
assim como eu tenho que recebê-las, é um direito de permanecer, de ter essa
educação básica, ela também tem que ter direito à alimentação e eu me preocupo
muito com isso, porque uma vez que os pais ficam um período muito grande longe
dessas crianças, então, nós temos uma diversidade, uma variedade muito grande na
alimentação durante o dia, durante todo o período do dia, são oferecidos para eles
cinco tipos de alimentação, cada uma dentro do seu horário, uma vez que eles
chegam, eles tomam café, depois eles têm o que chamamos de hidratação, que é um
suco ou uma fruta qualquer, depois eles têm o almoço, se é parcial, já vai embora e
não tem mais lanche, mas se for integral, eles dormem, quando acordar, têm
novamente a hidratação com o café da tarde e depois a janta. Então eles têm essas
refeições diárias e eu acho que é muito importante, isso assegura aquele direito à
alimentação. (Educadora Infantil)
Este tópico, embora tenha feito parte dos roteiros de todos os níveis de ensino, será
especialmente abordado aqui, em parte devido ao recente processo de municipalização das
instituições da educação infantil por que passa o município de Betim.
152
Porque eu acho que estamos evoluindo, mas fiquei pensando se isso era conservador
ou se nós estamos perdendo a questão da transição, da socialização, da discussão da
creche porque enquanto Assistência ela é mais que a questão da Educação porque
tem a questão do cuidado, da proteção. Porque eu falei com a pessoa assim: mas a
educação também tem que proteger e cuidar. Ele falou que isso não está claro para a
educação. Eu disse que a gente tinha que aprofundar essa concepção. (Assistente
social)
Na visão do educador hoje, a gente espera mais, nós merecemos mais do que
ganhamos hoje, pelo que fazemos, porque a educação infantil é uma
responsabilidade muito grande, toda construção de uma criança está na educação
infantil, a base de tudo, pra gerar um adulto, para nós termos um bom cidadão, está
na educação infantil, então o profissional tinha que ser mais valorizado, mais
valorizado, principalmente salarialmente... (Educador infantil)
Outros dois aspectos levantados apontam que a formação disponibilizada pelo poder
público é tida, em grande parte, como demasiado fragmentada; os cursos ou palestras ocorrem
espaçados no tempo, sem um cronograma que integre as atividades entre si perfazendo um
caminho com início, meio e fim. E o segundo ponto diz respeito ao fato de os momentos de
formação não estarem devidamente inseridos no contexto e na dinâmica de atuação dos
profissionais no cotidiano das instituições. Dessa forma, não há um encaixe entre o trabalho
do dia a dia e os eventos formativos, dificultando a participação dos educadores. As
instituições frequentemente não podem dispensar a quantidade de funcionários demandantes
de formação, nem mesmo em regimes de rodízio ou alternadamente, sem comprometer o
154
atendimento às crianças, ainda mais se se levar em conta que as instituições estão atendendo
com sua capacidade no limite:
Olha, o principal desafio é nós estamos falando de um corpo docente que foi
formado nas últimas décadas e os desafios que chegam com as novas gerações elas
também são novas. A forma da criança e do adolescente vivenciar determinados
problemas, a forma dele buscar soluções para os problemas, faz com que o perfil das
crianças e adolescentes seja diferente de algumas gerações atrás, mas os nossos
profissionais foram formados ao longo dos anos atrás. A grande maioria dos nossos
profissionais estão na faixa dos 40, 50 anos e o grande desafio que nós. . .
percebemos é que há um comportamento saudosista, vamos assim dizer, e o
professor, o Pedagogo se colocando, muitas vezes, no lugar de vítimas diante dos
desafios colocados não só pelo aluno, mas pelo modelo diferenciado de família e por
essa questão da violência fora da escola e ao redor dos muros da escola e até dentro
da escola também. Essa geração não foi preparada para esse perfil de aluno, esse
ainda não é total, mas nós temos um percentual significativo. Ao invés de buscarmos
entender essa nova geração e essa sociedade como ela está posta, muitas vezes, a
gente se coloca como refém, como a vítima do processo e não como ator que deve
atuar sobre o processo. Então eu vejo isso como um grande desafio. Buscar não só
mecanismos para esse professor atuar sobre isso, mas também trabalhar esse
convencimento do perfil desse profissional que atua hoje nas escolas. Esse é o maior
desafio. O outro desafio que eu posso perceber é a questão também do olhar
corporativo. Nós transitamos de uma geração que pensava na educação como dom,
para uma educação no outro extremo, do profissionalismo. Só trabalho se todas as
condições forem favoráveis. Esse também é um grande dificultador e um desafio
que a Educação tem: fazer um convencimento desses profissionais que nós temos
que atuar mesmo que as condições profissionais não sejam as ideais, claro que isso
não é a maioria, mas existe um segmento significativo que coloca a garantia dos
seus direitos acima da sua atuação em sala de aula como educador. Existe esse
segmento também. (Gestora educação fundamental)
que, se por um lado parece utópica, por outro consegue constatar – e ao mesmo tempo propor –
um conjunto geral de elementos que, se levados a cabo e efetivados pelas instituições, pelo
poder público municipal, podem se constituir num círculo virtuoso englobando os processos de
formação continuada: seria preciso formar profissionais de qualidade para atuarem em
ambientes física e pedagogicamente de qualidade, gerando assim um atendimento de qualidade
que propiciaria a formação de gente de qualidade. Ou seja, ao se formar o profissional devem
estar presentes a qualidade e os conteúdos necessários à lida com as crianças; ao lado disso as
estruturas físicas, o ambiente onde as crianças e os profissionais trabalhariam deveria ser
adequado aos processos ali desenvolvidos, bem como ao público atendido; os projetos
pedagógicos também deveriam estar ajustados ao ambiente físico, à necessidade pedagógica
das crianças, à sua realidade cognitiva e social. Nesse contexto, a cobertura da demanda seria
feita com qualidade, as crianças teriam o estímulo necessário para se desenvolverem de
maneira integral:
Eu não estou colocando aqui, falando da inclusão não. Eu falo dos desafios de
atender essa criança, porque eu acredito muito na inclusão e acho que é por aí
mesmo. Só que ainda falta essa visão: rampas, banheiros adequados. Eu dou banho
aqui em 3 turmas e eu tenho 2 banheiros. Se você for olhar, não tem como estar
atendendo mais, porque os que já estão aqui já não está assim... eu poderia dar
banho nas outras turmas, mas não tem banheiro em sala, eu só tenho 2. Outra coisa:
eu tenho uma criança com inclusão numa turma de 20 crianças – quer dizer,
atualmente tem 19 na sala. A Professora tem que estar segurando ele o tempo
inteiro, porque é preciso. Aí fica um pouco assim... às vezes a gente acha que está
incluindo a pessoa, mas está só inserindo, que está só aqui. A intenção é incluir, mas
falta muito para isso, falta muito para chegar até a palavra „inclusão‟. Ele está só
inserido, ele está só aqui dentro. (Educadora infantil)
A inclusão é um grande desafio. Igual nós estamos agora em parceria com o Ester
Assumpção, se chega um cadeirante, se chega uma pessoa com deficiente visual, eu
tenho que atender. Mas se você chegar aqui e olhar, eu tenho 2 escadarias para
chegar na sala. Entendeu? (Educadora infantil)
Eu tenho uma criança aqui inclusiva. E eu preciso de um Estagiário, que a gente está
buscando, tentando conseguir um Estagiário. Não é muito fácil. É uma contribuição
que eu sei que o Município de Betim ajuda, mas que também não é... o Estagiário
ainda é um adolescente. Ele é um adolescente, que não tem estrutura, conhecimento
nenhum. Então assim, um adolescente atendendo uma criança. Então assim, eu acho
que precisa investir muito nessa área da inclusão. (Educadora infantil)
3.3.7 Família
por parte do poder público de refletirem sobre essa questão quando planejam e executam as
políticas de educação.
Eu frequento...eu vou assim... não me queixar não, mas como eu trabalho na creche
polo aqui, eu venho direto. E há casos e casos. Há professores e professores. É igual
meu departamento de trabalho: há pessoas e há pessoas. Há o professor que é
interessado, ele tem interesse naquilo que ele está fazendo, ele está preocupado com
a escola, ele está preocupado com o desempenho do aluno, ele está preocupado com
o que vai acontecer com o aluno perante tudo isso que está acontecendo, o quê que
vai ser daquele aluno para frente, como que está a cabeça dele. Agora, tem muito
professor que fala assim „problema dele, eu tô é defendendo o meu‟. (Máe – Grupo
Focal)
Um outro lado da participação diz respeito à atuação das famílias junto às crianças, em
casa, como continuidade dos processos educacionais iniciados na instituição. Nesse aspecto
em particular, grande parte dos entrevistados detectou deficiências no acompanhamento
familiar, indo de regular a insuficiente atuação. São em menor proporção as situações de um
158
Então assim, tem que estar presente, tem que estar buscando, sabendo também do
desenvolvimento da criança. Não cabe só nós Educadores ensinarmos aqui na
escola... igual por exemplo: aqui, toda sexta-feira tem uma sacolinha da leitura, a
criança leva 4 livros para casa, onde chega lá os pais leem a historinha e na segunda-
feira a gente faz toda aquela rodinha e vai perguntar da história, vai interpretar o que
eles leram. Então assim, a gente pode ver que tem uns pais – é lógico que sem
querer condenar pai algum – mas tem muitos pais que lê a história e conta, outros já
não lê, outros já nem mandam a sacolinha... Porque eu acho também que isso é
questão de responsabilidade, a responsabilidade tanto para com ele próprio, quanto
para com a criança. Então é igual eu falo: é muito relativo, tem pais e pais, mães e
mães. Então assim, eu acho que a gente tem que procurar fazer da melhor forma
possível, mas tem que ser assim... Todo mundo. (Educadora infantil)
valores na escola que não tem continuidade em casa. (Educadora infantil – rede
particular)
E a instituição, uma vez que percebe a falta dos pais, existem casos de pais que são
separados, então, a criança, às vezes, demonstra em determinados momentos,
agressividade dentro de sala. (Educadora infantil)
Tem vários fatores. Eu acredito que a correria do dia a dia porque os pais e as mães
precisam trabalhar. A minha geração a mãe não trabalhava. Ela era mais presente,
ela cuidava dos filhos. Tem essa questão de serem pais muito precocemente. Eu já
tive alunos de 6 anos que a mãe tinha 19. Então ela foi mãe muito precocemente.
Não tem uma estrutura para acompanhar. A desvalorização da educação, no geral, eu
acho que é por isso aí. (Educador fundamental)
E em relação, assim, a algumas coisas negativas, é que, às vezes – a gente não julga
– mas às vezes, devido ao próprio tempo, da mãe que trabalha, alguma coisa assim,
eles não participam. Igual, assim, nós temos reuniões de pais, reuniões de pais
assim, a gente se prepara, igual o educador se prepara, aquela coisa toda, até mesmo,
você fica, o educador fica na expectativa das famílias estarem participando da
reunião, para ele falar do desenvolvimento da criança, e o pai não aparece. Alguns,
não estou generalizando todos, não, mas eu acho negativo, porque se seu filho está
aqui, você vai querer saber, você vai sempre querer saber como é o desenvolvimento
deles. (Educadora infantil)
Talvez nem seja por desleixo dos pais, mas porque alguns têm essa mentalidade: a
escola é responsável por tudo. Em todos os sentidos. Mas quando não há essa
continuidade em casa é complicado.
Pergunta: Você diria que é o quê? Uns 40% dos pais pensam assim?
Resposta: Sim. Não vou colocar mais não porque seria injusto.
(Educadora infantil – rede particular)
Foi possível localizar neste estudo dois fatores que parecem estar relacionados. De um
lado, o direito da criança, de todas as crianças à educação infantil. Do outro, a necessidade das
famílias trabalhadoras de menor poder aquisitivo de que suas crianças sejam atendidas pelas
instituições. De um lado, um direito universal de cada criança que nasce nesta ou naquela
160
família sem tê-la escolhido. Por outro, a insuficiência da oferta de vagas públicas na educação
infantil:
Então, é uma lista de espera que você tem que obedecer à ordem de numeração,
porque a educação hoje não é só preferência para quem trabalha, é direito da criança,
então toda criança tem que estar na educação, então é um direito aberto para todos; é
por essa ordem que nós olhamos, pelo número da lista de espera. (Educador infantil)
A intenção destas linhas é clara! Provocar uma reflexão sobre uma equação de difícil
resolução, mas que muito nos inquietou durante a realização deste trabalho. É grave e sério o
convite a pensar sobre se deve ou não haver por parte do poder público, especificamente,
atuação no sentido de preferencialmente, mas não exclusivamente, atender aquelas crianças
cujas famílias estão em desvantagem social na busca pela construção de sua dignidade e
cidadania. Não se pode voltar ao extremo da concepção pela qual já foram as creches um dia,
equipamentos discriminados socialmente como “depósitos” de crianças das populações de
baixa renda, como destaca um dos entrevistados. Por outro lado, fechar os olhos a uma
reflexão que proponha tratamento preferencial significa, na realidade, já fazer uma opção, que
penalizaria, no caso, as crianças das famílias de baixa renda, pois que o desenrolar natural e
conjuntural dos fatos nas sociedades atuais já propicia melhores encaminhamentos às demais
crianças. E não caberia a nenhum outro setor, senão ao setor público, implementar uma
política de atendimento da educação infantil, que claramente signifique um outro
direcionamento e a consequente efetivação do direito de todas as crianças, ao tratar
desigualmente os desiguais, e assim fazer realmente política pública. Enquanto não se
consegue cumprir a legislação que universaliza, que determina “atender a todas as crianças”,
como não considerar as situações específicas e graves, inclusive de riscos sociais
gravíssimos?
Outra questão levantada pelos educadores e que também gera muitas polêmicas e
sobre a qual há diferentes concepções e perspectivas é a definição do papel educativo das
famílias e das escolas infantis. Os educadores se queixam de que muitas mães transferem a
responsabilidade pela educação e cuidados das crianças da família para a instituição num
nível acima da capacidade mesma de atendimento das instituições. E apontam que há pouca
participação dos pais na escola:
[...] costuma ter aquela coisa assim, ter uma divergência, porque a família acha que
nós que temos que ter a obrigação de educar. Tem família que chega e quer jogar a
responsabilidade, eles querem transferir a responsabilidade de educar para nós.
(Educador infantil)
161
As crianças participam bastante. Agora, o complicado é fazer com que o pai venha
participar. Porque muitos trabalham num horário... Às vezes tem uma reunião, o pai
tá trabalhando, a mãe também tá trabalhando no mesmo horário e não tem como. Às
vezes vem uma tia, vem um tio, um parente, um irmão mais velho, mas nem sempre
tá participando. (Educador infantil)
Eu ponho meu filho para dentro, você tem obrigação de olhar, não me liga para
nada, não me chama para nada, porque eu não quero nem saber. Porque muitos pais
são assim mesmo: se liga, fala “não, não posso não, estou ocupada”. Uai gente, se é
meu filho... (Educador infantil)
Participação aqui que eu vejo é o pai chega, põe o menino do portão para dentro,
vem na hora de ir embora, se possível no horário que tiver fechando, pega a criança
e simplesmente... quanto ao Educador, muitos deles chegam e fingem que você nem
existisse dentro daquele lugar. Ele veio buscar só seu filho, ele está guardado ali
“vamo embora fulano” (como se gritasse). (Educador infantil)
dos pequenos, a educação infantil em si mesma por sua importância na construção do ser
humano; impossibilidade ou incapacidade para educar a criança por parte da família, famílias
desagregadas ou desajustadas internamente. Todos eles foram encontrados nas falas e relatos
dos entrevistados no curso do diagnóstico.
O fator trabalho, quer das famílias mais bem posicionadas economicamente, passando
pelas medianamente colocadas, quer das famílias trabalhadoras de baixa renda, cria uma
necessidade para o núcleo familiar de que a criança tenha com quem e onde ficar, sendo
cuidada e educada. Esse fator atua preponderantemente junto às famílias de baixa renda.
Sobre o direito da criança a esse atendimento, não há maiores comentários, visto que é a
essência e a razão de ser de toda e qualquer política pública voltada para a infância:
E a gente vê assim... O pouco que eu fico na secretaria... quando eles vêm procurar
vaga, é muito triste, porque eles vêm com toda aquela... Porque aqui a gente está na
periferia e a gente sabe do histórico aqui. A questão social pesa muito. Eu acho que
o que mais a Educação Infantil grita é realmente essas vagas... Para berçário. Igual a
gente relatou que é um número maior na lista de espera, na minha opinião, é
realmente essas vagas. (Educadora infantil)
Por outro lado, há não poucas famílias cujo desejo e interesse de comodidade e/ou
necessidade, dos responsáveis, de maior tempo para outras atividades aparece como
componente da busca pela cobertura de sua demanda na rede de educação infantil. Em alguns
casos, essa comodidade vem associada a um tipo de “desinteresse” ou “falta de consciência”
do responsável pelo processo de possibilitar uma adequada educação para as crianças,
segundo alguns entrevistados.
Explicando melhor, esse aspecto comodidade viria inúmeras vezes do cotidiano
atarefado das pessoas, mas não necessariamente do “atarefamento indispensável”. Há espaços
de tempo no dia a dia que poderiam ser preenchidos com a dedicação às tarefas educacionais
das crianças, mas o foco de atenção dos responsáveis estaria deslocado para outras atividades
de seu maior interesse, sejam elas consideradas por eles como necessárias, ou não.
Em outras entrevistas aparecem questões ligadas à questão da vulnerabilidade social
de muitas famílias. A manutenção de benefícios sociais como o Bolsa Família, por exemplo,
pode também estar presente entre as razões pelas quais os pais e responsáveis buscam o
atendimento da educação infantil pelo poder público:
[...] mas ela ainda existe e ainda é um problema essa questão de negligência da
família com relação à vida escolar das crianças. Quando a gente chama e comunica a
mãe e fala: “Você vai ter problemas com a sua Bolsa Família” ela vem a escola não
pela aprendizagem da criança, pelas faltas, mas por causa do Bolsa Família, mas já
repercute positivamente na aprendizagem porque ela vai ter aquele cuidado de não
164
deixar que a criança falta ainda que seja para não perder o Bolsa Família. Acho que
os entraves maiores que a gente enfrenta na aprendizagem são esses. (Educadora
fundamental)
Como dito anteriormente, sem entrar nos méritos, interessa descrever comportamentos
de pais e responsáveis. E a percepção que vem à tona é a de que esses comportamentos
derivam de uma visão de parcela das famílias, que quer superestimar a capacidade e a
responsabilidade da instituição infantil na educação da criança, nos cuidados, na proteção de
sua integridade, conforme os educadores apontam. E em consequência dessa visão
superestimadora do papel da escola, pais e responsáveis imaginariam que pode ser
minimizada ou diminuída a sua atuação no cotidiano extraclasse e extrainstituição. O trecho
transcrito a seguir pode conter uma percepção exacerbada, unilateral das educadoras
entrevistadas, mas mostra fatos corriqueiros que podem estar apontando para uma atitude
menos comprometida dos pais e responsáveis, com a melhor forma de se atingir a formação
integral e a educação de seus filhos. Não se quer aqui chamar a atenção para uma situação em
que a atenção básica de pais e responsáveis para com suas crianças estaria sendo
negligenciada; mas o direito das crianças é o de obter a educação e o cuidado adequados, ao
máximo possível. E é isso que em tese deveria ser buscado por todos: a melhor e a mais
adequada educação.
Pergunta: Quando vocês falam que as famílias da região na maioria dos casos não
têm problemas de poder aquisitivo, então a quê que vocês...
Resposta: Não são miseráveis. Não são pobres, não moram em periferia.
Pergunta: Isso. A quê que vocês atribuiriam então esse certo descuidado? Mesmo
aquele de falta de complementar as atividades das Educadoras em casa, a quê que
vocês atribuiriam isso? Na visão de vocês, a que se deve isso?
Resposta: Eu acho que é a inversão dos valores.
Resposta: É isso mesmo.
Resposta: Passou para a gente a responsabilidade que é da família. A família não
quer mais a preocupação com dar o remédio na hora certa, porque ele vai ficar 8
horas na creche „a Professora se vira‟.
Resposta: Tem também que antigamente a mãe ficava em casa, cuidava mais, e hoje
em dia o pai e a mãe estão trabalhando. Não tem com quem deixar, joga na escola, a
escola é responsável. Então, vem do trabalho, pega a criança, chega, come e dorme,
e amanhã vem para a escola de novo.
Resposta: Na questão da medicação. Você dá na hora certinha. Aí quando você vai
dar no outro dia... é um antibiótico, então você vai dar no mesmo horário que eu
dei... Aí quando você vai ver, já está num outro horário. Por que?
Resposta: A mãe alterou o horário. A mãe não deu no horário que era para ter dado.
Resposta: Não deu à noite, não levantou na madrugada...
Resposta: Daí há um mês a criança. . .está com antibiótico de novo na bolsinha.
Então assim, essas negligências que eu acho que as mães estão tirando a
responsabilidade delas.
Resposta: É. Porque por mais que trabalhe fora, põe o reloginho para despertar ali e
levanta 4 horas e dá o remédio, e garante esse tratamento, que é de sete dias. Na hora
que vem para a gente como prescrição médica, a gente vai se virar para dar conta
daquilo ali: prega bilhete na parede, põe bilhete na porta, põe aqui no computador
165
para lembrar, para a gente tentar garantir que a orientação médica vai ser cumprida,
mas a família não cumpre. E tem essa questão da mãe estar trabalhando, mas tem a
questão também de não estar nem aí.
Resposta: Tem mãe que não trabalha!
Resposta: Tem. Mas a maioria trabalha ou de repente deixa de cuidar da criança para
bater perna... Vai passear...
Resposta: Não é privilégio da periferia, não é privilégio do pobre, é a sociedade que
está assim. A gente pode pegar é a mãe que chega aqui no outro dia e fala „olha,
ontem Pedrinho levou isso aqui, não é dele e ele veio hoje devolver‟. Some muita
coisa e a gente às vezes não dá nem falta, porque a família não está preocupada com
os valores não. Eu acho mesmo que é tudo uma questão de valor, que se perdeu na
sociedade. (Educadoras infantis)
Porque têm pais muito envolvidos no desenvolvimento, têm outros que já são, mais
assim, soltos, sabe, deixa a coisa muito solta, aí depois, vêm cobrando só do
professor, a família tem que atuar na educação do filho, eu acho isso muito negativo,
cobra só da instituição, a educação, e esquecem que eles também, nós somos é
parceiros, nós não somos a família criança, né, nosso trabalho é de parceria, da
família e instituição, e alguns deixam a desejar nesse aspecto. (Educadora infantil)
Porque tipo assim se seu pai é liberal, não está nem aí para você, você vai achar “ah,
eu posso fazer qualquer coisa”. Aí tipo engravida, mexe com coisa errada, com
droga...seu pai não está nem aí mesmo. Agora, quando seus pais liga, quer saber,
tudo... aí tipo eu acho que se tem uma base familiar boa, bem forte, você vai ser
uma pessoa tipo de caráter na vida, você vai ter uma profissão e tal. Agora, quando
seus pais não estão nem aí para você, o quê que você vai querer? Nada. (Adolescente
– Grupo Focal)
Fica claro que esse não é um “discurso oficial” de pais e responsáveis, e nem
conscientemente assumido. Ele seria subliminar. Mas os profissionais se referem aos
comportamentos do dia a dia que o comprovariam. E essa não é também a realidade com a
maioria dos pais, mas um contingente com significância. E certamente que um trabalho de
conscientização da necessidade e do quanto é fundamental a atuação dos pais e responsáveis
junto a suas crianças tende a ter significativo impacto nessa problemática:
Ao aproximar-me das famílias através do diálogo pude constatar duas situações que
levavam o núcleo familiar a transferir suas responsabilidades de educação e cuidado
para a escola. Uma situação era quando a família não se sentia segura o bastante
quanto à maneira ideal de educar e orientar seus filhos. Nisso segue-se um
sentimento de inferioridade em relação aos saberes dos sujeitos que
profissionalmente se encarregam do cuidado e da educação da criança, como o
professor da escola infantil, por exemplo. Outra situação é que muitas vezes os pais
evidenciaram não saber o quanto sua atitude e seu exemplo interferem no processo
educativo e de desenvolvimento das crianças.
[...] mas falta muita perspectiva para os nossos alunos de periferia, eles estão muito
sem perspectiva no amanhã do que eles vão ser, do que eles vão fazer e a família
acha que não tem estrutura para conversar com eles sobre isso. Eu acho preocupante
a situação deles. (Educador fundamental)
Olha, a gente sabe que tem muitas mães, que tem muitas crianças aqui que não
vivem com os pais, alguns casos são filhos de pais separados, geralmente, em alguns
casos, a mãe trabalha, sai cedo para trabalhar e volta tarde, então, não coincide, mas
tem casos também, que a família não tem interesse nenhum. (Educador infantil)
Como se viu, há aspectos que podem motivar uma busca espontânea pela educação
infantil de 0 a 6 anos, bem como os que podem forçar as famílias, direta ou indiretamente.
Nesse emaranhado de fatores, podemos constatar quão complexo será o estabelecimento
daquilo que efetivamente seja o direito da criança, na relação que ele tem com tantos outros
aspectos da vida das famílias. Onde esse direito se situa? Qual o seu peso efetivo na visão de
mundo dos pais e responsáveis?
Por outro lado, a mesma questão se coloca para o poder público. Não se pode perder
de vista que o interesse das crianças deve ser, em última instância, a diretriz primeira e o foco
das políticas públicas a ela dedicadas.
Teremos, então, o poder público municipal de Betim com o dever da propositura de
políticas públicas que levem em consideração todas essas questões aqui diagnosticadas. Nesse
sentido, é importante salientar que a maior divulgação possível dos conteúdos desse
diagnóstico, o retorno de seus resultados a todos os setores e profissionais da educação – cuja
capilaridade teria como atingir quase todos os lares – deveria ser levado a cabo.
Os próprios profissionais entrevistados o reconheceram e sugeriram. Não apenas a
iniciativa de conhecer melhor essa realidade pelos órgãos gestores é importante. Mas a
devolutiva ao maior número possível de pessoas e mesmo à sociedade em geral, em especial
aos pais, para que possa servir de instrumento indutor de iniciativas vindas de todos os lados,
em auxílio ao poder público. Parece também ser necessário provocar um debate duradouro,
permanente com todas as instituições, todos os profissionais, toda a sociedade betinense
organizada que atua com a criança e o adolescente. Ao CMDCA, à Prefeitura Municipal e ao
Conselho Municipal de Educação pode caber o desencadeamento dessa iniciativa.
Como mais uma sugestão, será bastante pertinente uma discussão séria envolvendo
exclusivamente os profissionais de ensino infantil, que os provoque no intuito de fazerem
sugestões efetivamente mitigadoras ou que superem alguns dos problemas analisados.
A perspectiva dos educadores, por colaboradora que seja no diagnóstico realizado, tem
uma característica de defensividade da escola e superestimação da responsabilidade das
famílias. Por seu turno as famílias não têm, a não ser que provocadas pela escola, como
atuarem melhor e se limitam a pequenas reclamações e intimidação para agir mais
proativamente no ambiente escolar, atitudes estas não geradoras de mudanças onde realmente
se deva mudar. A mudança essencial deve acontecer na interação necessária entre educadores
e familiares, cada qual consciente do seu papel e do papel do outro. Eles são complementares
e não se substituem.
O trecho transcrito a seguir, de outro trabalho realizado sobre a relação família e
educação infantil, numa perspectiva de se trabalhar a formação do educador para lidar com os
pais e responsáveis, dá uma dimensão da complexidade também aqui encontrada, de se tentar
amalgamar, em prol das crianças, as visões de pais e educadores:
Essa meta está articulada com a Emenda Constitucional número 59 de 2009 em seus
artigos 1º. e 6º., que também se transcrevem a seguir:
Emenda Constitucional 59
Art. 1º Os incisos I e VII do art. 208 da Constituição Federal,
passam a vigorar com as seguintes alterações:
Art. 208.
I – educação básica obrigatória e gratuita dos quatro aos dezessete anos de idade,
assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso
na idade própria;
170
Visto está que o intervalo de idade entre 0 e 3 anos da educação infantil não alçou a
mesma trajetória da pré-escola (4 e 5 anos). Na própria meta 1, está colocado o objetivo
visando atingir não menos que 50% de universalização da educação infantil de 0 a 3 até ao
final do período de vigência do PNE.
Esta introdução ao tema da municipalização através da apresentação dos termos legais
atualmente vigentes quer deixar claro que há diretrizes e ordenamentos legais, mas com
formas e caminhos a se construir. É preciso entender o quanto o atual processo de
municipalização em Betim pode e deve ser discutido e rediscutido, repactuado e o quão
necessário foi tê-lo iniciado e levado à frente. Muito se pode ainda, com bom senso e
racionalidade, sobretudo com cooperação entre partes, torná-lo exitoso e profícuo, não para
governos ou gestões das entidades e órgãos que lidam com as crianças e adolescentes; mas
para as próprias crianças e adolescentes.
Parte das questões que envolvem essa discussão será tratada a seguir, não se esgotando
o vasto e abrangente leque de tópicos pertinentes ao tema. Visa-se, sobretudo, trazer para esse
diagnóstico uma mostra de diferentes visões e ponderações a respeito de um mesmo ângulo da
questão, que servem para fazer refletir na direção do que pode e deve ser melhorado.
A mudança, no futuro, vai ser bom, mas no momento, enquanto está passando, está
sendo dolorido, não está sendo fácil não. Porque é um processo e todo processo,
toda mudança exige esforço, [...] falta funcionários... nós estamos com uma média
de Educadores bem menor do que deveríamos ter. (Educadora infantil – instituição
municipalizada)
Este é um processo pelo qual passa o município de Betim, ainda um tanto controverso.
E certamente ocorre tendo como âncoras as instabilidades naturais inerentes a toda e qualquer
vivência social, enquanto elas se encontram na fase de transição, de passagem de um patamar
a outro. Os apontamentos detectados, no entanto, podem ser úteis para minimizar problemas
nesse momento, bem como abrir caminho para aperfeiçoar as municipalizações vindouras e a
criação de novas instituições, evitando-se dar os passos que já tenham se mostrado incorretos
ou mesmo problemáticos. Podem até mesmo servir de base para o estabelecimento de uma
nova etapa de convivência para os próximos anos, entre instituições municipais e privadas
171
Um pouco mais à frente se dará uma discussão conceitual referente a qual seria a
correta classificação das atuais entidades conveniadas. Por ora é importante apenas informar
que grande parte das instituições que lidam com educação infantil em Betim possui convênio
com o município, através da APROMIV – Associação de Proteção à Maternidade, Infância e
Velhice, entidade privada sem fins lucrativos, com vínculos junto ao executivo municipal. E
quase todas são membros do MLPC – Movimento de Luta Pró-Creche, que há algumas
décadas se constituiu no município, e desde então vem sendo um sustentáculo da política
pública de educação infantil, numa duradoura parceria com a municipalidade.
Algumas entrevistas revelaram que, nesse período de transição, poderia ter havido
maior nível de interlocução com o MLPC – Movimento de Luta Pró-Creche –, pois não está
constatado pela direção dele que o processo de municipalização é claro para todas as
instituições, em todas as suas nuanças.
O movimento se ressente de que toda a história e construção anteriores, de uma
política de educação infantil efetivada por décadas, através da parceria entre poder público e
entidades privadas conveniadas, estão sendo praticamente desconsideradas; em que pese
existir a consciência da irreversibilidade da situação, haja vista as determinações legais para a
assunção pelos municípios da responsabilidade pela oferta de educação infantil pública e
gratuita. O que se pode averiguar é que a continuidade desse diálogo ainda se faz necessária
– e há ainda tempo suficiente para se estabelecer uma mudança mais processual, que respeite
mais as dinâmicas já estabelecidas, embora vá caminhando na direção inexorável da nova
realidade:
Eu me lembro muito, que saiu em 1998, já se falava muito, que ia chegar o momento
– logo quando surgiu a LDB – que ia chegar o momento que as creches seriam todas
municipalizadas, já se sabia [...] Qual é o desejo do Movimento? É que a creche –
vamos supor que essa creche fosse municipalizada – que a creche fosse
municipalizada, mas que os critérios criados pelo Município – esse é o nosso desejo
– fosse respeitando assim, os funcionários que estivessem na creche,
municipalizasse, mas deixando os funcionários que estão nela, continuar nela. E não
é assim, não vai ser assim. (Profissional de Gestão)
172
Mas pensa bem... muita gente caiu de paraquedas na Educação Infantil, estava numa
outra área ...e hoje está mexendo com criança. Todas com muita boa vontade, mas
tem gente que nunca viu Educação Infantil.
E estão correndo atrás. Mas isso é um dificultador para o pedagógico. Se fosse um
grupo já com experiência, iria deslanchar muito mais rápido. A . . . também é muito
novata na coordenação pedagógica, então é um outro dificultador.
Eu caí de paraquedas.
Ela vai aprender a ser Coordenadora Pedagógica fazendo, porque ela não vai ter
tempo para capacitar, nem para formar, ela já é a Coordenadora e vai ter que fazer.
Eu acho um dificultador, no caso que ela está falando que veio sem experiência, eu
já vim com um pouco de experiência, porque eu já trabalhei na área. . . Estava
muito complicado: saída de funcionários e entrando as novatas cruas, . . .então as
crianças ficaram muito...Desnorteadas. Cada dia eu e fulana tentando...
Porque não podia fechar... como é que fecha? E fiquei louca... e eram 6! Eu falei
assim „vamos atender‟. E aí eu fui para a cozinha, fui para o banheiro, faxinei e um
monte de gente voluntária auxiliando. Mas o processo de municipalização só causou
tumulto na transição dele, não foi nem um pouco tranquilo.
Não foi.
adaptação com os meninos. Porque simplesmente mandou todo mundo embora e não
tinha ninguém contratado. Aí foi uma loucura. Essa aqui foi a primeira que chegou
aqui, ela ia começar só dia . . . Eu liguei para ela e falei . . .pelo amor de Deus,
vem, depois eu te dou folga, a gente negocia esses dias, eu estou aqui e não tem
ninguém para ficar com os meninos‟. Então foi um erro muito grande da APROMIV
com a Secretaria de Educação de não pensar nos meninos na hora de mandar todo
mundo embora.
A troca a gente sabe que é inevitável, quem não passou, infelizmente, no concurso
vai ter que ceder o lugar para quem passou. Só que podia ser mais brando, mais
tranquilo para os meninos. Podia chegar as novatas e permanecer as antigas, e ir
fazendo essa troca „olha, eu vou ficar com a sua turma, essa turma é assim, esse
menino precisa dessa atenção‟, para eles não sentirem tanto. E mais as famílias,
porque as famílias quase apedrejaram a gente aqui nesse portão, quando chegava e
via aquele caos – porque estava um caos.
Um aprendizado rápido relativo a essa questão pode ser capaz de reposicionar tanto a
administração quanto o MLPC, além de todas as demais instituições conveniadas, e seria
fundamental nesse momento de transição de formatos. Por exemplo, caso se deseje construir
conceitualmente uma caracterização para as instituições de ensino infantil tendo como
parâmetros, de um lado, as estritamente públicas, e de outro, as exclusivamente privadas, não
encontraremos paralelo para aquelas integrantes do movimento. Não têm o mesmo
funcionamento das estritamente privadas, mas também não são públicas na acepção do que é a
prestação de um serviço público. O mais conveniente seria reenquadrá-las conceitualmente.
Encará-las como instituições semipúblicas talvez permitisse um outro momento, menos tenso,
de sua municipalização, ou de estabelecimento de outros caminhos para o processo em curso.
Não se está falando de uma mudança apenas no discurso, mas uma alteração no olhar
do poder público para a construção histórica da qual ele mesmo é partícipe. Essa construção,
ainda que entre altos e baixos, elevou a educação infantil de Betim, ao longo de
aproximadamente três décadas, de um patamar de desorganização para o da existência de uma
rede de instituições ligadas ao poder público, partícipes do surgimento e implementação de
um projeto municipal para a educação infantil, e, portanto, hoje aptas a, num espaço curto de
tempo, serem definitivamente municipalizadas e manter continuidade sem sobressaltos do
atendimento:
O que eu vejo de positivo é...o Poder Público, a Prefeitura é assumir a Educação
Infantil.. . . Agora, o que eu acho que é negativo para a municipalização... que foi
negativo, é esse processo que não foi muito de diálogo. . . Por que? Desconsiderou-
se um pouco a história. Por exemplo, tinha várias creches que tinham uma história,
que começou lá nos anos 80, que iniciou como voluntários todos os funcionários,
que criou uma Diretoria, que tinha toda uma história, que de repente foi
desconsiderada. . . .
Resposta: Porque „olha, a partir de hoje estou municipalizando... essa instituição vai
ser municipalizada‟. Deixa de ter uma Diretoria, passa a ter uma Diretora, que até
então a coordenação dessa instituição era da Dona Maria, daquela que foi voluntária,
que trabalhou, que deu anos e anos de vida nessa instituição, por não ter uma
formação mínima, ela sai do processo . . .
Resposta: E a Dona Maria teve que sair, porque ela não tinha formação mínima para
assumir a coordenação „olha, o lugar que te cabe aqui é na faxina, pela formação que
você tem hoje‟. Quando eu falo que desconsidera a história é nesse sentido, que foi
meio doloroso o processo. (Profissional de gestão)
Educação levará ainda um maior tempo para ser atingida. Por outro lado, o fato de o
município ser mais receptivo às manifestações das instituições e aumentar o diálogo com elas
durante esse processo de transição pode acabar por favorecer a adesão de muitas delas à
municipalização. Ou seja, quanto mais o processo for conduzido harmonicamente, sopesando
as visões do município, do MLPC, da APROMIV e das comunidades, tanto mais célere –
como quer o município – e benéfica às crianças – como querem todos – poderá ser a efetiva
municipalização da educação infantil:
Que nem mesmo, no mês passado a gente teve (reunião com a APROMIV) sobre a
inclusão, que as escolas têm que estar preparadas, que temos que adaptar as escolas,
mas isso aí, a gente depende deles também, que aí no caso, a Prefeitura tem que vir
fazer a parceria com a gente para poder ampliar tudo. E aí agora, as escolas que foram
municipalizadas estão conseguindo, e as que não foram municipalizadas? (Educadora
infantil – instituição conveniada)
177
Elas todas, entraram no dia . . . desse ano. São todas muito novatas. A instituição
foi municipalizada, então todos os Educadores foram demitidos, quem quis
permanecer, permaneceu, mas foi um grupo pequeno. Então a grande parte das
Educadoras são novatas, são fresquinhas aqui na Educação Infantil. (Educadora
infantil – instituição municipalizada)
Existem dificuldades sim. Às vezes, por exemplo, um... é lógico que tudo ao seu
momento. Lógico. Mas assim, por exemplo, às vezes precisa de um Bombeiro, às
vezes precisa assim... Eu acho, na minha opinião, eles deveriam com mais
frequência estar vindo... que às vezes precisa ligar para eles estar vindo, ou às vezes
vem e eles falam “ah, mas hoje eu não posso”, “sábado eu não trabalho”, “não tem
hora extra”, . . . Então, quando é um caso... em se tratando de uma instituição,
estoura um esgoto, ou um vaso entope, ou uma pia da cozinha entope, então isso é
coisa para ser vista para ontem. Porque uma instituição jamais pode... (Educadora
infantil – instituição municipalizada)
Uma das maiores dificuldades hoje que a instituição enfrenta também é a verba que
vem para a manutenção da água, luz e telefone. Você vê, com 2.766 reais para você
tirar quase 2.000 para pagar conta de água, desse dinheiro você ainda tem que
comprar material pedagógico, tem que comprar alimento generalizado, material e
material de limpeza, material de higiene e tudo... com 2.766 reais. (Educadora
infantil – instituição conveniada)
[...] Porque toda melhoria que você vê na estrutura da creche aí foi um projeto que a
gente tem. Nós ganhamos, nós colocamos o telhado todo no chão. Ele ficou mais de
9 anos molhando, o telhado quase desabando. (Educadora infantil – instituição
conveniada)
Estes dois temas apareceram com menos destaque nas entrevistas realizadas com
educadores infantis em relação às realizadas com profissionais do ensino fundamental e
médio:
Foi o que aconteceu com o aluno dela. Um aluno completamente negligenciado,
com problema de saúde, correndo um monte de risco, a gente tanto, tanto correu
atrás de garantir os direitos, que a família desapareceu. (Educadora infantil)
Isso aqui é quase que cotidiano. São diversas violações. A gente tem suspeita de...já
tem menino encaminhado com suspeita de abuso... mas tem diversas violações, que
vai desde a negligência de não dar banho, de não servir alimentação, de negligenciar
horário de remédio, de mandar menino doente para a escola... são diversas. Eu
178
posso pegar uma pasta ali para você... eu te garanto que eu tenho mais ou menos –
de agosto para cá – uns 20 encaminhamentos feitos para o Conselho Tutelar,
pedindo providências... com algumas famílias que persistem em não respeitar os
direitos dos meninos. E aí quando a gente vai lá na mãe para falar com ela „olha, ele
está doente, aqui a gente não vai cuidar, a responsabilidade é sua‟, a mãe se nega,
fica contra a gente, fala „não, que você não quer atender meu menino, que vocês não
querem trabalhar‟. Não são muitos não... de 200 a gente deve ter uns 20 problemas.
(Gestora educação infantil)
Outro aspecto diagnosticado através das entrevistas é que a maioria das violações
ocorridas entre as crianças até 6 anos seriam consideradas “de menor gravidade” no âmbito da
educação infantil, comparadas com as relatadas nos outros níveis de ensino. Algumas formas
de negligência familiar, desatenção com as criança, falta de cuidados, alguns “corretivos
leves” (palmadas, beliscões, entre outros). Mas essas ocorrências, se não trabalhadas, dão
margem à possibilidade de agravamento da situação de violação.
Ao invés de se encarar como “menos graves” essas violações ocorridas até 6 anos, o
mais correto seria defini-las como situações absurdas, pois praticamente todas as discussões
179
sensatas de que se ouve falar atualmente em relação a essa temática propõem que não se
deveria tolerar qualquer tipo de violação de direitos das crianças. Outra questão a ser
observada é a dificuldade maior das crianças na faixa etária de 0 a 5 anos de expressarem e
falarem do assunto:
Uma criança que às vezes relata para a gente “ah, meu pai foi preso”. Então assim,
ela já foi agredida, já é uma agressão, já é uma violência contra aquela criança. Ela
presenciar aquilo ali para mim é algo que vai ficar marcado, algo negativo na vida
daquela criança, então ela vai levar aquilo, se você não tiver uma ação, ela vai levar
aquilo ali para sempre. Então isso é muito real aqui no nosso meio.
[...] Quando eu falo com você da questão da violência é isso: a criança que
realmente tem esse... o âmbito familiar é cheio de violência. Eu tenho casos aqui de
alunos que – como eu vou de sala em sala – quando ele bate no coleguinha e que
você fala assim “não pode bater no coleguinha”, “pode sim, o meu pai bate na minha
mãe”. Isso aqui na instituição é bem... (Educadora infantil)
Quanto ao ECA – Estatuto das Crianças e Adolescentes, o tom das entrevistas traz
conteúdo bastante idêntico àquele encontrado junto aos educadores dos ensinos médio e
fundamental. O documento é conhecido apenas do ponto de vista midiático, ou seja, não há
um conhecimento efetivo, de fato; é pouco estudado e com pouca utilização prática no
cotidiano das instituições. Muitas vezes é encarado como estabelecendo mais direitos que
deveres. Enfim, pesa sobre ele, mesmo entre os educadores, uma visão mais de senso comum
e superficial, do que uma embasada na tentativa de implementação cotidiana:
A Lei está lá, a Lei está aí, mas, às vezes, as pessoas não respeitam os direitos. Eu
acho essa questão de direitos complicada, a pessoa pensa nos direitos, mas não
pensa nos deveres, então, a Lei, às vezes, não é aplicada corretamente por causa
dessa questão, de pensar somente nos direitos e não pensar nos deveres. Eu acho que
quando tem uma lei, tem os direitos e os deveres. Não tem que pensar só nos
direitos, tem que pensar nos deveres também. (Educadora infantil)
Eu avalio assim, o pouco que eu conheço, porque eu não vou ter o conhecimento do
Estatuto todo, mas do pouco que eu conheço em relação à criança eu acredito que a
gente faz por onde, tanto eu como a equipe da instituição, prevaleça o direito da
criança, porque a criança é sujeito de direito, então a gente faz de tudo para
prevalecer, porque ela tem o direito de brincar, ela tem o direito de se manifestar,
direito à saúde, direito a uma boa alimentação. A gente faz de tudo para não
esquecer isso e também a gente faz de tudo de passar isso para as famílias também, a
gente passa para as famílias também. (Educadora infantil)
180
3.4.1 Uma história de rejeição, negação e luta na educação da pessoa com deficiência
Pensar a educação das pessoas com deficiência nos remete não só à questão
educacional propriamente dita, mas aos preconceitos e rotulações que a sociedade lhes impõe.
Os obstáculos enfrentados por elas para participar da educação escolar são enormes, já
que as propostas educacionais não levam em consideração a especificidade de cada indivíduo.
Muitos acreditam que a proposta inclusiva foi criada recentemente e que virou moda
no meio educacional e social, mas ela teve início em 1627 com o educador Jan Amós
Komesnky, mais conhecido como Comenius, que, estando muito à frente de sua época,
propôs uma educação que não excetuasse ninguém, de modo que todos pudessem ser
9
O termo deficiência aqui se refere a toda e qualquer limitação que impossibilite a pessoa de realizar as
atividades cotidianas e/ou educacionais sem ajuda de recurso de acessibilidade – aqui entendido como qualquer
recurso, seja humano, material ou arquitetônico.
181
instruídos da mesma forma. Sua proposta era ensinar tudo a todos, visto que nesse período
somente os homens saudáveis e pertencentes à elite tinham o direito à educação.
Posteriormente, no século XVIII, com a Revolução Francesa surge, entre seus ideais, a
igualdade de direitos. Ainda assim, é somente no século XX que se consolida o direito à
educação.
Durante muito tempo, evidenciam os registros históricos, não se falava nas pessoas
com deficiência, já que eram consideradas inválidas e, por isso, eram mortas. Platão e
Aristóteles, na Grécia Antiga, indicaram que as pessoas nascidas disformes deveriam ser
eliminadas por exposição, abandono ou atiradas do aprisco de uma cadeia de montanhas. Os
romanos também permitiam que os pais matassem as crianças por meio do afogamento, no
entanto, muitos abandonavam seus filhos em cestos no rio Tibre ou em outros lugares
sagrados (GUGEL, 2012).
Na Idade Média, o nascimento de uma criança com deficiência era considerado um
castigo de Deus; os supersticiosos acreditavam que essas crianças tivessem poderes especiais.
Com a chegada do Cristianismo, essas crianças deixaram de ser mortas, mas a segregação
continuava. Décadas depois, começaram a viver escondidas dentro das casas de modo que não
fossem percebidas pela sociedade (GUGEL, 2012).
No Brasil, elas começaram a sair de suas casas no período imperial, quando D. Pedro
II funda, em 1854, o Instituto Benjamin Constant e, em 1857, o Imperial Instituto de Surdos-
Mudos, atualmente conhecido como Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES. Esses
dois institutos eram apenas para dois tipos de deficiência: deficiência visual e auditiva,
respectivamente. Nesse período a pessoa com deficiência era vista como um problema médico
e social que precisava ser tratada para que voltasse a ser “normal”, pois só sendo “normal” ele
teria capacidade de aprender e produzir.
Na década de 1920, as instituições não governamentais e religiosas passaram a se
responsabilizar pela educação no Brasil. As ofertas de educação especial ficaram entre o
poder público e a sociedade civil.
Após uma década, foi criado o Ministério da Educação, inicialmente conhecido como
Ministério da Educação e Saúde Pública, que tratava de assuntos educacionais e de toda a área
da saúde.
No mesmo ano, surge a Sociedade de Pestalozzi, uma instituição beneficente, com
objetivo de oferecer educação às pessoas com deficiência.
Em 1948, é assinada a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Seis anos depois
surge a primeira APAE.
182
Na década de 1970 é criada a Lei 5.692/71, que determina “tratamento especial” para
crianças com deficiência, e também o Centro Nacional de Educação Especial com o objetivo
de integrar os alunos que conseguissem acompanhar o ritmo de estudos. Os demais
ingressariam na Educação Especial.
Apesar dos avanços na educação das pessoas com deficiência, o preconceito e a
exclusão era o que predominava. Assim, visando acabar com essa realidade, em 1989, o
preconceito torna-se crime.
Percebemos que, ao longo dos anos, o direito à educação formal das pessoas com
deficiência foi negado, uma vez que eram poucas as escolas que as atendiam e também pelo
fato de as famílias se negarem a dar a essas pessoas a educação que lhes era de direito, visto
que a pressão social exercida pelo preconceito fazia com que as famílias deixassem as pessoas
com deficiências presas dentro das casas.
A educação delas só passou a ser foco de atenção quando a classe dominante sentiu
essa necessidade.
Na Constituição Federal de 1988 encontramos no Art. 205 que a educação é direito de
todos e dever do Estado e da família, e no artigo seguinte que
Em 1989, surge a Lei 7.853 que dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras10 de
deficiência, sua integração social e sobre a Coordenadoria Nacional para a Integração da
Pessoa com Deficiência, institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou difusos dessas
pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público, define crimes, e dá outras providências.
Nessa Lei surge, pela primeira vez, o termo integração, que segundo o dicionário
Houaiss (2001) significa “incluir formando um todo coerente, incorporar, sentir-se parte de
um grupo, unir-se formando um todo harmonioso, completar-se”. Encontramos, também, o
termo inclusão quando trata da educação das pessoas com deficiência. O termo, de acordo
com o mesmo dicionário, significa “estado daquilo que está incluso, inserido, compreendido
dentro de algo, envolvido, introdução de alguém em um grupo”. A Lei trata da
10
Esse termo não é mais utilizado, visto que tem como definição “carregar”. O termo atualmente usado é pessoa
com deficiência.
183
Embora essa Lei represente um avanço na vida das pessoas com deficiência, a
mentalidade predominante era de segregação. Alunos com deficiência deveriam ficar em
escolas especiais.
No ano seguinte, o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA – amplia os direitos
das crianças e adolescentes, que devem ser respeitados pelos educadores, ter acesso a escola
pública gratuita próxima a sua residência, ter atendimento educacional especializado,
preferencialmente na rede regular de ensino.
Foi a partir do ECA que a inclusão das pessoas com deficiência nas escolas comuns
começou a ser discutida.
Outro ponto importante para a Educação Inclusiva foi a Conferência Mundial sobre
Educação para Todos que aconteceu, em 1990, na Tailândia e visou garantir a democratização
da educação, independentemente das diferenças individuais.
Com a Declaração de Salamanca (1994), a educação das pessoas com deficiência dá
um salto. Ela fala dos princípios e práticas na área das necessidades educacionais especiais.
Esse é um documento das Nações Unidas, que buscou envolvimento da sociedade como um
todo para a melhoria do acesso a educação para pessoas com deficiência e por isso se tornou
um marco na história dessa população.
Aos poucos a educação da pessoa com deficiência vai ganhando visibilidade. Assim,
no mesmo ano, é sancionada a Lei nº 10.098, que estabelece critérios e normas gerais para a
promoção da acessibilidade para pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida. Ela define
como acessibilidade:
Embora essa não seja uma Lei específica da educação, ela também contribuiu muito,
pois trouxe a ideia de acessibilidade arquitetônica possibilitando que as crianças e
adolescentes com deficiência física e mobilidade reduzida tivessem acessibilidade no espaço
educacional.
Dois anos se passam e, enfim, é sancionada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional – LDBEN – por meio da Lei nº 9.394/96. Essa Lei ratifica o que já havia em termos
de educação e amplia a educação inclusiva, quando diz da adaptação do currículo e das
metodologias utilizadas para que atenda aos alunos com necessidades educacionais especiais,
bem como aceleração para conclusão da educação para os alunos com altas habilidades, do
atendimento feito por professores preparados para integrar esses alunos nas escolas comuns e
educação especial para o trabalho visando a inclusão desses alunos também no meio social.
Em 1999 surge, por meio do Decreto 3.298, a Política Nacional para a Integração da
Pessoa Portadora de Deficiência que considera como deficiência
Sobre a educação, ela diz que “serão dispensados tratamento prioritário e adequado às
pessoas portadoras de deficiência, através dos Órgãos e Entidades da Administração Pública
Federal direta e indireta, responsáveis pela Educação” (BRASIL, 1999).
No início do século XXI, surge o Plano Nacional da Educação, um documento com
duração de 10 anos e a partir do qual os municípios deveriam elaborar planos decenais. Seu
artigo 4º trata do sistema nacional de avaliação instituído pela União. Esse documento traz um
diagnóstico da educação especial, as diretrizes, bem como os objetivos e metas a serem
alcançados na educação especial nacional no período de 2000 a 2010.
No ano seguinte, o Conselho Nacional de Educação, por meio da Resolução
CNE/CEB nº 2 de 11 de fevereiro, institui as diretrizes nacionais para a Educação Especial na
Educação Básica.
Em 2007, o Ministério da Educação e Cultura por meio da Secretaria de Educação
Especial cria a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva
que
sociedade mais inclusiva, onde a pessoa com deficiência seja aceita e respeitada (INSTITUTO
ESTER ASSUMPÇÃO, 2011).
Quatro anos depois, a APAE é criada com objetivo possibilitar que os beneficiários de
seu trabalho construam sua autonomia e sejam percebidos como pessoas com desejos,
emoções, capacidades e habilidades, apesar das limitações causadas pela deficiência (APAE
BETIM, 2011).
Em 1994, é criado o Centro de Referência e Apoio a Educação Inclusiva – CRAEI –,
que em uma parceria com os profissionais da saúde da luta antimanicomial começou a se
perguntar onde estavam os deficientes da cidade, bem como os “loucos”. Após uma pesquisa,
verificou-se que os betinenses nessa situação estavam internados em hospitais psiquiátricos de
Belo Horizonte e até outras cidades, como Barbacena. Na educação, era possível encontrar
alguns alunos surdos, outros cegos, mas não eram muitos.
O grupo decidiu então fazer visitas aos domicílios para verificar se havia mais
deficientes, onde eles estavam e como estavam vivendo.
Foi um fato chocante, mas a gente cresceu muito como ser humano. Nós começamos
a perceber que essas pessoas estavam em casa amarradas em correntes, em cordas,
amarradas dentro de cômodos. Pessoas com sofrimento mental. Às vezes pessoas de
40 anos, outras vezes de 10 e outras bebês. As pessoas não tinham compreensão de
que aquelas pessoas podiam estar na sociedade convivendo normalmente. Seja na
escola com medicamento, seja no hospital dia. Essas pessoas estavam totalmente
afastadas e começamos a conversar com as famílias dessas pessoas (ECC).
As instituições de educação que foram construídas nos últimos três anos e meio
seguem os padrões de acessibilidade arquitetônicos, mas infelizmente as creches não têm
estrutura para atender satisfatoriamente um aluno de inclusão.
Tem a inclusão também. Nossos alunos inclusos não têm espaço adequado, nós não
temos formação para atender o aluno cego ou com paralisia cerebral. Tem uma
palestra, esse ano eu fui em uma palestra porque a gente tem um aluno com um nível
de paralisia cerebral. E lá no Sara Kubitschek tinha um monte de material para
trabalhar com o aluno, mas onde está o dinheiro para comprar esse material? Tem
espaço? Não tem. Então como que fica isso? O aluno está frequentando a escola,
agora se ele está incluído, é outra questão (EEI).
Percebemos então que as escolas municipais estão sendo bem equipadas e tem sido
feito um bom trabalho no atendimento aos alunos de inclusão, mas o segmento educação
infantil ainda necessita de muitas intervenções nesse processo.
188
Esse é um ponto de tensão no município. Isso porque a maioria dos cursos realizados
pelos professores, para darem entrada no Plano de Cargos, Carreiras e Vencimentos (PCCV),
são voltados para a inclusão. No entanto, o discurso que ouvimos em muitas entrevistas é que
os professores não estão devidamente preparados.
[...] não adianta a gente pensar que vai qualificar o povo muito antes sem ter a
demanda espremendo ali na garganta não. Porque uma coisa você pode ter certeza
[...] ela falou uma coisa que é muito interessante: se você pegar a maioria dos
professores, chegar e pegar o PCCV dele, o controle não sei como que chama lá, o
Prontuário dele [...] o processo funcional dele, o PCCV dele, ele vai estar lá com
todos os níveis esgotados, curso disso, curso daquilo. Aí você fala assim “é curso de
quê? De Inclusão, curso voltado para a pessoa com deficiência” (EPS).
Percebemos duas possíveis explicações para isso: a primeira é que os cursos não
atendem as expectativas dos profissionais ou então podemos entender que os profissionais não
aceitam o desafio que requer deles repensar práticas e inovar metodologias, sendo mais fácil
dizer: “Eu não estou preparado”, conforme a fala de uma professora.
Essa rejeição dos profissionais, ainda existente em muitas escolas, faz com que esse
processo de inclusão não aconteça mais rapidamente e de forma natural como deveria ser:
É preciso fazer com que esses profissionais entendam que a inclusão está posta e não
há como não fazer parte desse processo e, ainda, que cada aluno é único e não há “receita
pronta” no caso das crianças e adolescentes de inclusão.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera uma pessoa surda quando ela não
consegue perceber os sons nem mesmo com a ajuda de amplificadores. O Decreto 5.626 de 22
de dezembro de 2005 considera
189
pessoa surda aquela que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo
por meio de experiências visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso
da Língua Brasileira de Sinais (BRASIL, 2005).
Isso significa ter domínio dos processos, dos modelos, das estratégias e técnicas de
tradução e interpretação. O profissional intérprete também deve ter formação
específica na área de sua atuação (por exemplo, a área da educação) (QUADROS,
2004).
[...] temos que garantir esse espaço. Porque na Raul Saraiva eu tenho professoras
desviadas da função e trabalhando como intérprete. É uma solução que foi pensada
para os alunos de lá. Eu penso que tem que ter uma solução também para os alunos
daqui. (EPSR3)
11
Algumas das informações contidas neste tópico foram retiradas dos sites das instituições.
191
recursos da saúde,
educação,
promoção social,
cultura, esporte e
lazer.
Clínica de Rua Santos (31) 3594-2525 Atendimento com
Estimulação Dumont,162 - terapeuta
Precoce da APAE Horto ocupacional,
musico terapeuta,
fonoaudiólogo e
fisioterapeuta.
Escola Especial Rua Sagres, 408 – (31) 3539-1159 Atividades
Anastácio Franco Granja São João pedagógicas que
do Amaral (APAE) visam o
desenvolvimento
cognitivo, afetivo e
social.
Escola Especial Fazenda Fortaleza, (31) 8419-1899 Oficinas de
César Augustus s/n - Açude agricultura
Silveira Paschoalin orgânica,
(APAE) marcenaria, papel
reciclado,
informática,
literatura, trabalhos
manuais, pequenos
reparos, música e
expressão corporal.
Associação dos Rua Pedro da Silva (31) 3532-5576 Em defesa dos
Deficientes Físicos Fortes, 179 - Horto (31) 3052-1040 direitos das pessoas
de Betim com deficiência na:
(ADEFIB) - Educação;
- Qualificação
profissional;
- Inserção no
mundo do trabalho
além de outras
atividades.
Centro de Rua Antônio Atendimentos
Referência e Apoio Bernardino Costa, (31) 3532-2389 psicológico,
à Educação 400 – Arquipélago fonoaudiológico,
Inclusiva (CRAEI) Verde terapia ocupacional,
fisioterapia e
sessões de
equoterapia.
Centro Rodovia Fernão Teatro, escolaridade
Especializado Dias, KM 494 – (31) 3529-3500 especial, iniciação
Nossa Senhora S/N Betim/MG esportiva,
D‟Assumpção jardinagem e
oficinas de
artesanato.
192
Fundado pela educadora Ester Assumpção, que acreditava que “a igualdade não é um
objetivo a atingir, mas um ponto de partida, uma suposição a ser mantida em qualquer
circunstância”, o instituto tem como missão mobilizar pessoas e organizações para o exercício
da cidadania das pessoas com deficiência (INSTITUTO ESTER ASSUMPÇÃO).
A APAE Betim possui três unidades: a Escola Especial Anastácio Franco do Amaral, a
Escola Especial César Augustus Silveira Paschoalin (Rural) e a Clínica de Estimulação
Precoce.
A Escola Rural atende aproximadamente 90 alunos, com idades entre 14 a 42 anos
para inserção no mercado de trabalho. Já a escola atende aproximadamente 60 crianças e
adolescentes de 6 a 14 anos com diagnóstico de síndromes, transtornos mais severos ou casos
de deficiências múltiplas, sempre visando às atividades de vida diária para que o aluno
consiga se tornar autônomo dentro de suas limitações.
Segundo entrevista, existe uma lista de espera grande, não pela falta de vagas, mas
pela dificuldade de transporte que facilite o acesso à escola.
As três unidades dispõem de um único ônibus escolar que faz o transporte de alunos.
Como atualmente não há vagas nesse transporte, muitas famílias colocam o nome do aluno na
lista de espera da vaga na escola, mas condicionam a vaga ao transporte. Isso faz com que
muitas desistam desse atendimento na instituição e a criança ou adolescente fique sem
estudar.
A Clínica de Estimulação Precoce atende Betim e região, na maioria dos casos
crianças de 0 a 6 anos e em alguns casos o atendimento é até os 14 anos. As crianças chegam
até a clínica por meio de encaminhamento médico e lá são atendidas conforme a necessidade
por fisioterapeuta, fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional e musico terapeuta visando a
inclusão social e educacional da criança. “A criança que, hoje, frequenta a estimulação
precoce, é muito difícil que ela passe pela escola da APAE. Aqui as crianças com três anos já
recebem encaminhamento para procurar a creche da sua comunidade (...)” (ECCA).
As entrevistas na APAE revelaram que o poder judiciário precisa ser acionado com
frequência, visto que alguns direitos das crianças e adolescentes com deficiência, muitas
193
vezes, não são garantidos. As maiores reclamações são para conseguir órteses e próteses pelo
SUS e com relação a aceitação da matrícula da criança na creche ou escola inclusiva.
É uma instituição privada com 46 anos de existência e tem como missão atender as
necessidades da pessoa com deficiência e da sua família, assegurando-lhes qualidade de vida
e uma educação socializadora (CENTRO ESPECIALIZADO NOSSA SENHORA DA
ASSUMPÇÃO, 2011).
É uma Entidade Beneficente de Assistência Social sem fins lucrativos, que visa
conscientizar as pessoas com deficiência e seus familiares do poder que um grupo organizado
possui na busca da conquista de seus direitos e na sua efetivação.
As professoras para o cargo foram escolhidas dentro das próprias instituições onde
trabalhavam. O diretor oferecia o cargo e aquela que se interessava ou que os profissionais
acreditavam ter mais “jeito”, assumiram o cargo. “É outro mundo! Eu não sabia mexer no
computador. Nós tivemos uma formação inicial no CRAEI, de 40 horas, e agora nós temos
encontros semanais para formação.”
Durante as entrevistas, algumas disseram ter concluído ou estar em formação na pós-
graduação em Atendimento Educacional Especializado pela Universidade Federal do Ceará,
que fez uma parceria com a Secretaria de Educação do Município, para dar formação às
professoras que já estão nas salas de recurso multifuncional, e, posteriormente, abrir para os
demais profissionais da rede que se interessem.
194
Esse trabalho exige que o profissional esteja em constante formação não só para
conhecer e entender sobre as diversas síndromes, transtornos e deficiências, mas também
porque cada aluno é único e traz consigo diferentes limitações e habilidades. Portanto, não
existe uma “receita” que sirva para todos os alunos e não há formação que consiga solucionar
tudo que é necessário:
O grupo maior que eu trabalho são os deficientes intelectuais e eu comecei a fazer a
formação com a Luciane Januzzi em deficiência intelectual. Gostamos demais da
conta, mas é pouco.Você sabe que quer mais, quer mais e o que acontece é pouco.
Além dos deficientes intelectuais você tem os deficientes físicos e os autistas que
são casos mais sérios e a formação da gente é tão pouca! Eu tenho um autista pela
manhã e um à tarde e uma colega me perguntou como fazer para trabalhar com
autista e eu falei que eu não sabia responder e que se ela sentasse na frente do
computador e procurasse na internet sobre autismo ela iria saber o mesmo que eu.
Então é uma busca porque você tem que achar um caminho e fazer cm que o aluno
caminhe. (Entrevista – Estagiários)
Percebemos que este trabalho é realizado por elas com grande esforço e dedicação,
apesar dos desafios a serem vencidos.
A inclusão dos alunos com deficiência nas salas comuns fez com que se percebesse
que alguns necessitariam de um acompanhamento individualizado, visto que não conseguem
realizar atividades de vida diária autonomamente. A partir disso, buscaram-se alternativas
195
para atender esse aluno. Foram realizadas visitas nas cidades que já realizavam esse trabalho
de inclusão para que se fizesse uma avaliação do que seria mais adequado para o município. A
prefeitura adotou o modelo de contratar, como estagiários, alunos do ensino médio para apoiar
esse aluno de inclusão:
Não existe uma lei que regulamenta a questão do estagiário como apoio da pessoa
com deficiência nem no Brasil nem no mundo. Eu não conheço. O que se tem é uma
orientação do MEC que é uma questão de ajuda, de apoio às escolas. (Entrevista –
Estagiários)
Atualmente são 370 estagiários contratados pela prefeitura (ECC). Eles recebem
formação de uma semana em janeiro, julho e outubro e os que são contratados fora desse
período entram sem formação e fazem na próxima oportunidade. Isso porque, muitas vezes, é
necessário que o estagiário seja contratado imediatamente, não sendo possível realizar a
formação antes do início do serviço. No ato da contratação é realizada uma entrevista para
informar sobre o aluno que será acompanhado.
O que percebemos durante a pesquisa foi que, em muitas escolas, essa questão do
estagiário é polêmica. Algumas acreditam que esse estudante não seja o mais indicado para o
trabalho junto aos alunos de inclusão. Outras elogiaram o trabalho e disseram tentar, na
medida do possível, contribuir para a formação deles:
Outra coisa que eu vejo que envolve essa questão da formação é pensar nos
estagiários. Os daqui da escola eu tento ao máximo conversar com eles. Às vezes, o
aluno falta ou avisa que vai faltar porque tem consulta médica, eu trago os alunos
aqui para minha sala. “Vem cá, vamos conversar, vamos ver os materiais, vamos
pensar em uma solução”, mas eu vejo também que é difícil eu assumir essa
formação do estagiário, mesmo porque eu também estou me formando, como eu
disse no início, minha especialização é na área da surdez.
Que o estagiário não está lá para digitar prova, não está lá para lavar louça, não está
lá para nada a não ser trabalhar a questão do aluno com deficiência. Não é da função
nem da atribuição do estagiário dar aula, quem educa é o professor. O estagiário é o
suporte, o apoio do aluno. Caso o aluno falte, a pedagoga pode chamar o estagiário
para que ele ajude a fazer dentro da tecnologia assistiva um engrossador de lápis,
engrossador de colher, ele pode ir para o computador e fazer um joguinho para o
aluno fazer no outro dia. Essa é a função do estagiário. (Entrevista – Estagiários)
196
Uma situação comum nas escolas é o professor entrar na sala de aula e pedir que o
estagiário leve o aluno de inclusão para a quadra, esquecendo-se de que estar em sala de aula
junto com os demais alunos é um direito dele. “Muitos estagiários chegam aqui e contam que
ficam 3 horas com o aluno na quadra porque o professor entra na sala e manda o estagiário ir
para a quadra” (Entrevista – Estagiários).
É necessário que a escola também busque uma relação mais próxima com os
estagiários uma vez que, em algumas instituições, eles não são nem percebidos pelos
profissionais que ali trabalham. “Uma das coisas que mais me entristece é chegar a uma
escola procurar um estagiário e ninguém sabe quem é ele. Ele está ali e a escola não o
conhece” (Entrevista – Estagiários).
A chegada de um novo ser em uma família, na maioria das vezes, traz junto com a
nova vida muitas expectativas, muita alegria e mudanças na vida de todos. O enxoval do bebê,
a curiosidade pelo sexo, a escolha do nome...
197
No nascimento, a primeira pergunta que toda mãe faz ao médico: “Meu filho é
normal? Ele é saudável?”, e quando a resposta do médico é negativa vem a sensação de que o
chão se abriu e todos os sonhos se desfazem naquele momento.
Há também os casos em que uma família, tendo todos os membros saudáveis,
descobre que, por causa de uma doença, aquela criança que corria, brincava, ouvia, ficou
deficiente.
Medo, angústia, dor, luto são alguns dos sentimentos que cercam as famílias das
pessoas com deficiência. O que fazer? Quem procurar? Meu filho poderá ser como as outras
crianças?
Em meio a todos esses sentimentos, a não aceitação da deficiência ou a superproteção
são comuns. Por isso é necessário que a família também receba assistência de psicólogos e
participe de grupos de convivência de outras que passam pela mesma situação. Isso faz com
que não se sintam sozinhos, conheçam os direitos da pessoa com deficiência e busquem um
acompanhamento para que ela se torne mais independente e consiga se desenvolver dentro das
suas limitações.
[...] a família também que às vezes é presente até demais e acaba superprotegendo a
criança não deixando com que ela se desenvolva sozinha. Outras vezes a família não
acompanha.
[...] Tinha famílias que nem deixavam as crianças saírem de casa e hoje já saem.
Famílias que achavam que a criança – temos relatos até esse ano – não precisava de
socialização e por isso não levava ao parque, ao zoológico, ao shopping e nós fomos
conversando, falando e colocando isso. [...]. Tem famílias que aceitam e fazem a
parte delas e tem famílias que não aceitam de jeito nenhum e falam que a criança
não tem deficiência nenhuma e tem aquelas que sabem que a criança tem a
deficiência, mas ainda sim não fazem nada. São vários casos. Não dá para falar de
um caso só. São famílias e famílias.
falando para a outra mãe. Então essas vivências em grupo e essas trocas são tão importantes
[...]”.
No CRAEI as famílias recebem atendimento na Oficina das Mães, feito por uma
psicóloga. Nesse atendimento elas fazem tricô, crochê e paralelamente é trabalhado o direito
da pessoa com deficiência e a afetividade.
3.4.12 Recomendações
O município tem avançado muito no que diz respeito à inclusão da pessoa com
deficiência, mas alguns desafios precisam ser vencidos. Dentre eles estão:
4 A SAÚDE
Segundo a CF/88, o direito à saúde bem como o direito à vida são determinados como
direitos fundamentais e permanentes. Por definição, eles têm como objetivo garantir a
dignidade da pessoa humana, possibilitando que o indivíduo possa viver de forma digna e em
condições com o fato de ser um sujeito de direito. O artigo 227, em epígrafe, especifica os
direitos fundamentais da criança e do adolescente, deixando explícito que o direito à vida é o
mais preponderante, e, consequentemente, o direito à saúde é imprescindível para garantir a
consecução daquele.
Os questionamentos sobre a determinação do modelo mais eficiente para a atenção
básica à saúde no Brasil são inúmeros e nada consensuais. O cenário da saúde pública no
município de Betim não foge a essa regra, quando o assunto é a rede básica de saúde, que faz
a atenção primária, que teria como principal responsabilidade tornar acessível e exequível as
diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS).
O Departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Ciências Médicas
da Universidade Estadual de Campinas desenvolveu, nos meados de 1990, o programa MDV
– Modelo de Atenção em Defesa da Vida, que logo a seguir foi adotado por diversas cidades
do território brasileiro, inclusive Betim. Esse programa objetiva a construção de uma rede de
atendimentos com parcerias e convênios institucionais para garantir o acesso democrático às
instituições de saúde, o acolhimento mais humano e a aproximação entre os profissionais e os
pacientes (CARVALHO; CAMPOS, 2000).
Devemos levar em conta um dificultador na tarefa de construir um diagnóstico sobre a
Saúde de crianças e adolescentes em Betim, ou em outra cidade brasileira: a qualidade e o
acesso aos dados. Nesse sentido, trata-se da inexatidão ou inexistência de informações sobre
todos os registros de atendimentos como a quantidade de doentes, os tipos de tratamento, as
faixas de idade, o detalhamento das causas de óbitos, entre outros dados. Essa deficiência
informacional não impediu a realização deste diagnóstico, contudo impede a produção de
índices mais precisos e eficientes para orientação das políticas de Saúde. As notificações
201
O Governo do Estado não repassa verbas diretamente à Saúde, portanto, temos acesso
apenas aos repasses relativos aos impostos IPVA, ICMS e IPI.
203
4.3 Morbidade
Outras Cidades 28 16 13 15 21 93
Quadro 31– Percentual de Internações por Faixa Etária, Instituição de saúde e cidade
onde ocorreu a internação - 2010
Menos de 1 1a4 5a9 10 a 14 15 a 18
Total
Cidade Hospital ano anos anos anos anos
CASA DE
SAUDE SANTA
IZABEL CSSI 0,25 0,54 0,00 0,17 0,65 0,34
HOSPITAL P R
PROFESSOR
Betim OSVALDO R
FRANCO 54,57 57,71 77,78 73,46 52,14 60,25
MATERNIDADE
P MUNICIPAL
HAYDE ESPEJO
CONROY 25,87 0,00 0,00 3,84 33,64 16,32
Total Betim
80,69 80,69 58,25 77,78 77,46 86,43
Belo Horizonte
17,60 17,60 40,02 20,39 20,03 11,62
7a 1 a 11 0a6 7a
0a6 1 a 11 0a6 7 a 27 1 a 11
27 meses dias 27 Total
dias meses dias dias meses
dias
Total dias
Doenças do sistema 100,0
nervoso. - - 2 2 - - 0 - - 15,38 3,64
Doenças do sistema 100,0
respiratório. - - 4 4 - - 0 - - 30,77 7,27
Algumas afecções
originárias no 69,2 87,1 45,4
período perinatal. 27 5 7 39 3 12,82 17,95 0 5 53,85
Malformação
congênita
deformidade e
anomalias 40,0 12,9 54,5
cromossômicas. 4 6 - 10 0 60,00 - 0 5 -
Sintomas sinais e - - - - - - - - - -
213
achados anormais de
exames clínicos e
laboratoriais.
Doença da pele e do
tecido e do tecido
subcutâneo. - - - - - - - - - -
Doenças do ouvido e
da apófise mastoide. - - - - - - - - - -
Total 56,3 100, 100, 100,0
31 11 13 55 6 20,00 23,64 00 00 0
Fonte: SMS Betim/Bioestatística/MS/DATASUS/SIH - SUS/2010.
15 a 15 a 15 a
1a4 5 a 14 1a4 5 a 14 1a4 5 a 14
19 19 19 Total
anos anos anos anos anos anos
anos Total anos anos
Doenças infecciosas/
parasitárias. - 2 - 2 - 100,00 - - 15,38 - -
100,0
Total 20 13 46 79 25,32 16,46 58,23 100,00 100,00 0 100,00
Fonte: SMS Betim/Bioestatística/MS/DATASUS/SIH - SUS/2009.
Gráfico 36 – TMI de crianças com até 5 anos a cada 1.000 nascidos vivos – Betim - 1995
a 2010
4.6 Vacinação
Quadro 38 – Total de estabelecimentos de saúde prestando ou não serviços ao SUS Betim - 2010
Número de estabelecimentos por tipo de prestador segundo tipo de estabelecimento Dez/2009
Tipo de estabelecimento Público Filantrópico Privado Sindicato Total
Central de Regulação de
1
Serviços de Saúde 1
Centro de Atenção
Hemoterápica e/ou 1 - - -
1
Hematológica
Centro de Atenção
4 - - -
Psicossocial 4
Centro de Apoio à Saúde da
- - - -
Família -
- - - -
Centro de Parto Normal -
Centro de Saúde/Unidade
33 - 2 - 35
Básica de Saúde
Clinica
Especializada/Ambulatório 8 - 38 - 46
Especializado
Consultório Isolado 1 - 97 - 98
Cooperativa - - -
Farmácia Medic Excepcional
- - 1 - 1
e Prog Farmácia Popular
Hospital Dia - - 1 - 1
Hospital Especializado 1 - - - 1
Hospital Geral 2 - 1 - 3
Laboratório Central de
- - - - -
Saúde Pública – LACEN
Policlínica - - 4 - 4
Posto de Saúde - - - - -
Pronto-Socorro
- - - - -
Especializado
Pronto-Socorro Geral 4 - - - 4
Secretaria de Saúde - - - - -
Unid Mista - atend 24h:
- - - - -
atenção básica, intern/urg
Unidade de Atenção à Saúde
- - - - -
Indígena
Unidade de Serviço de
1 - 19 - 20
Apoio de Diagnose e Terapia
Unidade de Vigilância em 2 - - - 2
217
Saúde
Unidade Móvel Fluvial - - - - -
Unidade Móvel Pré-
hospitalar - 1 - - - 1
Urgência/Emergência
Unidade Móvel Terrestre - - - - -
Tipo de estabelecimento não
- - - - -
informado
Total 59 - 163 - 222
Fonte: CNES. Situação da base de dados nacional em 10/04/2010.
O Estatuto diz que é até os dezoito, mas para a OMS é de dez aos dezenove. Mas
ainda há uma resistência nesse atendimento. Algumas unidades já atendem, outras
nós estamos batalhando para conseguir essa ampliação do adolescente de fato, que é
atendido, mas no global da unidade, e a gente quer uma diferenciação desse
atendimento. (Entrevistado da Saúde)
A gente entende que a droga é uma questão de saúde, mas a gente ainda não tem um
programa assim, no Saúde da Criança. O que tem chegado, poucos casos, são as
mães usuárias de drogas, que não podem amamentar, para pedir ajuda aqui no banco
de leite, achando assim, que teria critério para receber aquele leite.
Outro programa citado foi o PSE – “Programa Saúde na Escola”, que é nacional e já
está implantado em várias unidades de saúde do município, e em outras está em fase de
implantação. O objetivo do PSE é trabalhar a questão da saúde na escola, ações de saúde com
parceria com as escolas. Atualmente o PSE atende entre 52 a 54% das crianças matriculadas,
mas a previsão é chegar em 100% em dois anos.
Um fato importante citado pelos entrevistados é a insuficiência de profissionais,
principalmente médicos pediatras:
A gente está tendo problemas nas UAIs, por falta de profissionais da saúde,
principalmente pediatras, e normalmente nos finais de semana e nos plantões nas
maternidades, que são três plantonistas, três pediatras no plantão diurno, mas às
vezes falta um e o plantão fica desfalcado e é um problema que a gente está tendo
em todo lugar, né, está no Brasil todo, não foge à regra não, está complicado.
que estão sendo beneficiados com esse projeto de promoção e de prevenção. Ações de
promoção e oficinas de escovação são realizadas duas vezes ao ano, em todas essas escolas.
Na faixa etária entre 6 e 14 anos, às vezes até 16 anos. O foco é a criança e o adolescente,
com o objetivo de prevenir o adulto com alta complexidade na saúde bucal. Os dentistas, os
auxiliares e técnicos se deslocam para a escola, fazem o trabalho de escovação e de exame
clínico, em que é realizada a triagem, com classificação de risco, que pode ser alto, médio e
baixo risco. A partir de então são feitos os agendamentos para o início do tratamento.
Em relação às crianças de 0 a 2 anos, há atendimentos direcionados aos bebês, que é o
“Cuidando do Sorriso”. São três projetos envolvidos com o “Saúde Bucal”: o “Saúde na
Escola”, o “Cuidando do Sorriso” e o “Salvando os Molares”, que se refere ao atendimento do
escolar. O “Cuidando do Sorriso” é direcionado às crianças de 0 a 2 anos; o “Salvando os
Molares”, para as crianças e adolescentes de 6 a 16, e há também um projeto que é o
“Atendimento da Gestante”, que prioriza o atendimento às futuras mães.
registro das informações: muitos acompanhamentos não têm sua finalização pela falta do
registro de todas as ações obrigatórias no programa em tempo hábil, como rege a Portaria
GM/MS 569 de 1º de Junho de 2000.
Quadro 39 – Gestantes por faixas etárias por regionais - Betim - 2007 a 2010
2007 2008 2009 2010 Total
Regional 10 a 14 15 a 19 10 a 14 15 a 19 10 a 14 15 a 19 10 a 14 15 a 19
anos anos anos anos anos anos anos anos
Citrolândia 3 69 3 57 7 72 3 62 276
Norte 2 61 5 89 8 87 2 33 287
PTB 1 40 5 77 1 39 6 65 234
Vianópolis 1 38 - 31 8 25 - 28 131
Alterosas 28,13 20,97 26,67 22,02 18,33 27,45 32,65 28,63 28,13
Centro
223
Citrolândia 9,38 11,13 6,67 7,80 11,67 8,94 6,12 8,49 9,38
Imbiruçu 25,00 24,35 17,78 20,25 20,00 20,37 22,45 17,67 25,00
Norte 6,25 9,84 11,11 12,18 13,33 10,81 4,08 4,52 6,25
PTB 3,13 6,45 11,11 10,53 1,67 4,84 12,24 8,90 3,13
Teresópolis 12,50 9,03 4,44 6,84 11,67 14,66 18,37 13,01 12,50
Total 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00
Fonte: SMS Betim/Bioestatística/SISPRENATAL/2010
A saúde infantil em Betim evidencia melhoras nas últimas duas décadas. Segundo os
dados coletados, observamos que o município alcançou satisfatoriamente uma das Metas do
Milênio, promovidas pela ONU através do programa Objetivos de Desenvolvimento do
224
Milênio (ODM), que é reduzir em 50% o percentual de crianças subnutridas entre 1990 e
2015. Em Betim, o número de crianças pesadas pelo “Programa Saúde Familiar” em 2010 era
de 44.693; destas, 0,7% estavam desnutridas. .(PORTAL ODM – BETIM, 2011).
Segundo Victora et al., 2011, outra meta do ODM, que é a redução de dois terços dos
coeficientes de mortalidade de crianças menores de 5 anos, tem a previsão de sucesso para
2013, no território brasileiro. Em Betim, a situação se mostra muita mais positiva: de acordo
com o Portal ODM de Betim, que faz o acompanhamento municipal dos objetivos do milênio,
através dos relatórios dinâmicos municipais, essa redução já foi alcançada.
5 ESPORTES
mesmo modo na categoria “lazer”. Foge ao escopo deste capítulo a discussão de práticas
pedagógicas que envolvem brincadeira como processo de aprendizagem, embora tal situação
indicaria certa plasticidade do lazer por este se referir, além disso, a outras atividades que não
estariam sendo realizadas em termos de um tempo nitidamente delimitado para o lazer e pelo
fato de o esporte envolver uma dimensão lúdica. Atividades esportivas no âmbito das escolas
de tempo integral, como algumas existentes em Betim, também embaralham uma delimitação
estanque entre tempo de lazer e tempo de ensino.
O lazer e também os esportes são ainda equacionados a atividades não rotineiras que
geram tensão prazerosa, em contraste com o caráter controlado ou obrigatório das rotinas na
esfera do trabalho (ELIAS; DUNNING, 1992) e mesmo, acrescentaríamos, com a rotina no
âmbito do ensino escolar, apesar de essa última delimitação em certos aspectos não ser tão
precisa se comparada com a ocupação no trabalho. Em nosso caso específico, o lazer será
analisado predominantemente em termos de atividades esportivas efetuadas além do tempo de
um turno escolar. Portanto, não será abordado neste capítulo o esporte realizado no âmbito
das escolas, por meio da disciplina educação física.
Pretende-se ao longo deste capítulo identificar e analisar determinadas linhas de força
que constituem a política pública da municipalidade de Betim voltada para o esporte e que
emergiram de entrevistas realizadas junto a agentes envolvidos na execução dessa política.
Serão abordados a estrutura física e outros recursos destinados às práticas esportivas, a
estrutura de pessoal, as modalidades esportivas praticadas, a promoção do esporte, as
concepções de esporte e lazer e o público atingido por essas ações. Trata-se ainda de entender
como se constitui o desenho dessa política enquanto ela apresentava-se em execução. Para
tanto, foram utilizadas informações produzidas por esta Secretaria, que compreendem dados
contidos no site oficial da Prefeitura de Betim e os fornecidos por essa mesma secretaria com
vistas ao levantamento realizado; dados que provêm da observação direta do pesquisador; de
entrevistas gravadas e realizadas entre junho e agosto de 2011 com quatorze servidores
públicos ligados à Divisão de Esportes Especializados da Secretaria de Esportes de Betim,
dentre os quais se contam oito professores de educação física – seis em cargos de gestão ou
coordenação na área esportiva –, três gestores, uma psicóloga, uma assistente social e uma
pedagoga. Além dessas entrevistas, que consistiram na aplicação de um roteiro
semiestruturado, outras três entrevistas foram realizadas com gestores da Secretaria de
Esportes sem que fossem gravadas. A análise desses dados possibilitará aquilatar as
potencialidades e limitações da atuação da municipalidade na promoção do esporte para
crianças e adolescentes.
227
12
Conforme observação de Sânia Campos, integrante da equipe que realizou o levantamento em pauta, e também do autor
deste capítulo, dentre os interesses marcantes de adolescentes e jovens, expressos em entrevistas pelo método de grupo focal,
estão justamente atividades esportivas e de lazer.
228
13
No Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu capítulo 2, “brincar, praticar esportes e divertir-se” são direitos
subsidiários aos direitos à “dignidade” e à “liberdade” (nessa ordem) de crianças e adolescentes. Não, há, no entanto,
nenhuma recomendação quanto ao modo como tais direitos subsidiários devem ser assegurados (PRESIDÊNCIA DA
REPÚBLICA, 1990).
229
14
Adotamos a seguinte convenção para as entrevistas realizadas: quando for apresentada a letra “Z” na
referência à entrevista, trata-se de entrevistado em cargo de gestão ou coordenação de atividades pertinentes à
Secretaria de Esportes, professor ou não de educação física; quando for a letra “W”, trata-se de professor de
educação física em exercício em uma das unidades esportivas do município, com atuação ou não na rede de
ensino; quando a letra for ”Y”, trata-se de outros profissionais com atuação em unidades esportivas do
município. Quando as entrevistas se referem a “informações adicionais”, trata-se de ocupantes de cargo de
gestão na Secretaria de Esportes que foram entrevistados em um segundo momento da pesquisa e que também
são profissionais da área de educação física. Com exceção da entrevista “4Z”, que foi realizada por Marco
Antônio Marinho, as demais foram feitas por Rogério Vasconcelos Diniz. Em sua versão original, o quadro
descritivo em anexo foi levantado por Vanderlei Lopes Barbosa e com a colaboração de servidores da Secretaria
de Esportes. Aproveitamos o ensejo para agradecer à professora Rita Fazzi pelas críticas certeiras à versão
original desse capítulo.
230
2; ver nota 14). Também vinculado à Secretaria de Esportes, por meio de sua Divisão de
Lazer, há o “Programa Lazer e Recreação Para Todos”, que é um programa itinerante e com
atuação dispersa em diversos bairros do município de Betim. No âmbito desse Programa são
promovidas atividades como as denominadas “ruas de lazer”, “oficinas de teatro” e um
“festival de pipas” de periodicidade anual. A atividade “ruas de lazer” ocorre em parceria com
associações de bairro, igrejas e com a organização de eventos promovidos em bairros e
escolas de Betim. Quando nesses bairros não há um espaço fechado para as atividades, estas
são realizadas nas ruas. O Programa dispõe de equipamentos destinados à recreação para
crianças e adolescentes tais como cama elástica, tobogã, piscina de bolinha, xadrez, dama,
touro mecânico e futebol de sabão (fonte: informações adicionais 2; ver nota 14). Vale
destacar ainda que o “Programa Escola da Gente”, programa municipal de escola integral
implantado pela atual gestão municipal, inclui práticas esportivas e lúdicas entre as suas
atividades rotineiras, normalmente no contraturno do ensino regular.
Segundo dados fornecidos pela Secretaria de Esporte, há cerca de 3.000 crianças e
adolescentes na faixa etária de 4 a 18 anos atendidos por essa secretaria em diversas
modalidades esportivas englobadas pelo “Programa Viva o Esporte para Todos”. Já o
“Programa Futebol para Todos” agrega cerca de 2.800 crianças e adolescentes atendidos, o
que perfaz aproximadamente 5.800 indivíduos que participam de ambos os Programas.
Segundo dados de mesma fonte, no âmbito do “Programa Lazer e Recreação Para Todos”,
aproximadamente 50 mil crianças e adolescentes participaram de oficinas diversas e de
atividades da denominada “ruas de lazer” de janeiro de 2009 a junho de 2011, em um
intervalo, portanto, de aproximadamente dois anos e meio. Há ainda os cerca de 10 mil alunos
do “Programa Escola da Gente”, presente em 30 escolas municipais de Betim. (Ver quadro
descritivo em anexo.)
Conforme dados consolidados do IBGE (CENSO, 2010) e exposto no capítulo “1” do
relatório, em Betim, no ano de 2010, havia 129.038 habitantes na faixa etária de 0 - 19 anos e
de aproximadamente 110.000 habitantes na faixa etária de 4 a 19 anos. Caso se considerem os
dados fornecidos pela Secretaria de Esportes relativos à participação de indivíduos na faixa
etária de 4 a 18 anos, que perfaz um total aproximado de 5.800 indivíduos que integravam
atividades daquela secretaria em 2011, poderíamos estimar que essa participação corresponde
aproximadamente a 5% de crianças e adolescentes entre 4 e 18 anos do município atendidas
por programas regulares, conduzidos pela Secretaria de Esportes, no período em que foi
efetuado o levantamento da pesquisa e excetuando as atividades promovidas pela Divisão de
Lazer da mesma Secretaria.
231
categorias etárias como a mirim (10-11 anos), a infantil (12-15 anos), a juvenil (17-18 anos) e
a juniores (18-20 anos), que chega a envolver cerca de 1.100 participantes. Há um
campeonato que é feito por Regionais do município e também um campeonato municipal em
parceria com a Liga Esportiva de Betim em que participam as chamadas categorias de base do
futebol (até 18 anos). Também importante para a promoção do futebol na cidade é a
participação na Taça BH Júnior, que reúne grandes equipes desse esporte na categoria de 18-
20 anos. Vale ressaltar que a promoção do futebol no município envolve também as chamadas
escolinhas de futebol que funcionam em 16 campos de futebol do município. (Fonte:
Informações complementares; ver nota 14).
Tanto a participação de equipes esportivas em campeonatos e torneios fora do
município como em seu interior tem recebido subsídios da municipalidade. Realizado
anualmente desde 1987 e sem interrupções, os Jogos Escolares de Betim reúnem em torno de
4.000 crianças e adolescentes de escolas de Betim (Entrevista Esporte – 2Z), que dispõem
ainda do auxílio da municipalidade em vale transporte e lanche para os participantes
(Entrevista Esporte – 1W). Para os Jogos Escolares de Minas Gerais, também há o
fornecimento de transporte e alimentação aos atletas participantes (Entrevista Esporte – 2Z), o
que se estende também aos atletas deficientes que participam das atividades físicas adaptadas
(AFA) (Entrevista Esporte – 3Y). Do mesmo modo, a participação de atletas em campeonatos
e torneios específicos em ginástica e dos circuitos de atletas deficientes, inclusive fora do
Estado, recebe subsídios semelhantes (Entrevista Esporte – 2Y, 3W, 6W).
Entre servidores municipais, há também a percepção de que a estrutura física
destinada aos esportes é insuficiente e pouco descentralizada:
Então, falando em valorizar o esporte, eu acredito que tem que ser investido mais em
praça esportiva, fazer mais quadra. Aonde tiver um terreno, faz uma quadrinha, põe
um Professor dando aula [...] Por exemplo, você pega uma cidade igual Betim, nós
temos o Complexo Horto [e do Teresópolis]. Eu acredito que cada Regional deveria
ter um centro esportivo para atender aquela Regional. Trabalhar o Esporte por
região, descentralizar o Esporte, e não só o Esporte, mas a Cultura [também]. Por
exemplo, você pega na região do Alterosa. [...] você trabalhar o Esporte da mesma
maneira [em comparação ao acesso aos complexos esportivos existentes] na região
do Alterosa [...], na região do PTB [...] do Citrolândia [...] Agora, não, nós temos só
duas referências: Horto e o Complexo Esportivo [do Teresópolis]. É muito pouco!
Muito pouco. A pessoa que quer praticar um esporte, ou quer disputar, ou quer ter
um lugar mesmo, eles vão ter que sair [das proximidades de onde residem]
(Entrevista Esporte – 4Z).
Desse modo, a proximidade das estruturas esportivas junto aos locais de moradia de
seus potenciais usuários, dentre os quais o público infantojuvenil, é vista como uma forma de
expandir o acesso da população a práticas esportivas, em especial aquelas pertinentes aos
“esportes de quadra”, pois do contrário os potenciais usuários dos espaços esportivos “vão ter
que sair” das proximidades de onde residem. No caso, “ter que sair” implica também
considerar questões que envolvem a mobilidade de pessoas de baixo poder aquisitivo. Como
relata outro entrevistado,
234
uma vez um aluno meu ficou [...] umas duas semanas sem vir [...]. Assim que ele
veio a primeira vez eu falei „pô, você faltou, o quê que aconteceu, você sumiu‟, aí
ele falou „eu estava sem dinheiro para a passagem‟. Quer dizer, é uma dificuldade
que ele mesmo não tinha como resolver. Ele até tinha vontade de vir aqui, de jogar,
de participar, mas tinha essa dificuldade financeira [...] Eu acho que no caso dessas
pessoas que estão em lugares mais afastados [do Horto] e que não têm acesso, não
têm condições de vir até aqui para fazer o programa aqui, eu acho que o programa
deveria ir até eles, ou seja, promover Núcleos [esportivos] em lugares mais afastados
[para] que possa ter mais gente [atendida]. (Entrevista Esporte – 1W).
Eu tenho aluno, por exemplo, onde eu dava aulas [...], a mãe e o pai pagavam a
passagem pra criança vir treinar [no Horto], o pai apoia, o apoio da família é muito
importante, mas tem criança que não tem condição, tem pais que não têm condições
nenhuma, de uma ajuda, às vezes onde poderia entrar uma ajuda da Prefeitura com
cartão [de passagem de ônibus], um cartão para o aluno que treina, um aluno que
vem, que ele quer buscar o treinamento, poderia ser uma ajuda de custo... Então, a
gente tem crianças que não têm condições de deslocar (Entrevista Esporte – 3Z).
E a outra questão – eu acho que isso aí é do esporte em geral, não é Betim, não é
Minas, é o Brasil – nós já perdemos várias alunas que poderiam estar competindo –
porque a gente compete [em campeonatos] também – mas não vêm, porque moram
longe, por falta de dinheiro de passagem e a gente também não consegue bancar
isso. Então, é mínimo: o quê que o aluno precisa? Dinheiro para vir fazer a aula,
passagem. (Entrevista Esporte – 2W).
235
Algumas vezes as Assistentes Sociais [...] tentaram, mas eu não sei te falar também
porque que não conseguiram, eu não sou a pessoa indicada para falar sobre isso.
Elas tentaram na época, ainda era época do vale transporte, então o nosso intuito era
o quê? Era que os professores da modalidade ficassem com o vale transporte. Então
o menino chegou, você já passa o vale-transporte – 2 vales –, para ele ir embora e
vir no dia seguinte. E também não foi para frente. Então assim, eu não sei falar
porque que não deu certo. (Entrevista Esporte – 2W).
Mas, em todos os casos, se a opção política for por uma expansão descentralizada da
estrutura destinada ao esporte e ainda por promover um ajuste da demanda para as estruturas
físicas existentes – inclusive com subsídio de transporte – há que se considerarem ainda os
espaços físicos das quadras esportivas das escolas municipais e estaduais que poderão ser
utilizados inclusive fora dos horários de aula, no contraturno dos alunos, nos finais de tarde
ou mesmo em dias não letivos, espaços estes que poderiam ainda ser disponibilizados para a
promoção de atividades culturais e de lazer nos bairros em que estas escolas se situam.
Resta saber se é possível ajustar a ocupação dos espaços nas escolas em turnos e
contraturnos dos alunos, em quais escolas isso seria possível de ser feito e quais poderão ser
utilizadas em finais de semana. No entanto, a permanência da ocupação das estruturas físicas
municipais especializadas em esportes seria de suma importância para o desenvolvimento de
atividades esportivas e para o envolvimento do público infantojuvenil nessas atividades. O
deslocamento desse público, que normalmente já permanece um turno nas escolas, para os
espaços especializados em esporte criaria a possibilidade de ampliação de redes de
sociabilidade e convivência e ainda possibilitaria dissociarem as práticas esportivas realizadas
daquelas estruturas da educação física escolar, limitadas ao tempo de uma disciplina escolar,
ministradas no mesmo turno de outras aulas, com as exigências de disciplina escolar
obrigatória, enfim, como elemento integrante da rotina escolar. Participar de atividades
esportivas fora das escolas poderia significar reforçar opções de pertencimento a grupos,
sobretudo entre adolescentes e jovens, e ainda reiterar a noção de que, conforme pode sugerir
a perspectiva de Elias & Dunning (1992), as práticas esportivas em sua conexão com o lazer
possuem algo de especial: estão na contrarrotina de atividades obrigatórias como, por
exemplo, as decorrentes do ensino escolar.
Nesse sentido, amplia-se a possibilidade de adolescentes, jovens e mesmo crianças de
se identificarem com uma das diversas modalidades esportivas ofertadas nas estruturas
especializadas existentes, diferentemente da educação física escolar que tende a homogeneizar
as práticas esportivas e não leva em conta as afinidades dos alunos por uma ou outra
modalidade esportiva.15 Há ainda a se considerar o público que, de algum modo, pretende se
15
A julgar por entrevistas realizadas com professores de educação física que trabalham na Secretaria de Esportes
e, portanto, em ambientes externos à rede de ensino, há uma margem para a experimentação de crianças e
adolescentes em descobrirem essa afinidade à medida que a possibilidade de mudar de uma modalidade a outra
de esporte a eles é facultada dada a simultaneidade de atividades que envolvem modalidades esportivas distintas
como costuma ocorrer na programação esportiva dos complexos esportivos do município. Dificilmente tal
situação pode se repetir no âmbito da disciplina escolar de educação física que, desta feita, se restringe ao que
pode ser executado no tempo da sua carga horária e no espaço da quadra existente na escola – quando há.
237
dedicar ao esporte de modo mais intensivo, uma vez que as estruturas esportivas
especializadas da municipalidade poderão ser mais adequadas para isso que as escolas.
Mas, para alguns entrevistados, a promoção dos esportes no município implica algo
além da ocupação de espaços físicos com finalidade esportiva, pois também importante para
isso seria divulgar o que essas estruturas promovem em termos de esporte. A divulgação da
existência de algumas estruturas especializadas ocorre em escolas das imediações onde tais
estruturas funcionam, mas nem tanto em outras escolas (Entrevista Esporte – 2W). Há
também uma percepção geral dessa falta de divulgação de quem trabalha há pouco tempo no
segmento desportivo da municipalidade:
Então, seria muito bom se o programa [Viva o Esporte para Todos] pudesse atender
de forma eficiente Betim inteiro. E que fosse... Tivesse uma divulgação também,
para que todo mundo conhecesse, porque eu moro em Betim [...] há mais de 15 anos
e não conhecia o programa. Então, tem muita gente que ainda não conhece o
programa do esporte e que poderia fazer a diferença muito grande na vida dos
nossos adolescentes [...]. (Entrevista Esporte – 2Y).
Segundo outro ponto de vista, a divulgação dos esportes deveria ocorrer a partir
mesmo do reconhecimento do público e das mídias em relação ao que o município já acumula
em termos de uma espécie de capital esportivo dado por títulos conquistados por suas equipes
e atletas:
O principal, que a gente vem pedindo há algum tempo é a divulgação, mas a gente
não tem. É lógico que a gente procura fazer o melhor trabalho possível, nós temos
campeões, praticamente em todos os esportes aqui em Betim, nós temos campões, só
que a divulgação é pouca, a gente não tem essa mídia, quer dizer, a gente tem o
espaço, mas não é bem utilizado. Então a gente precisaria mais disso, até para a
gente conseguir mais patrocínio, para a própria equipe, as equipes campeãs que
temos aqui, equipe de vôlei, basquete, judô, handebol, ginástica olímpica, tudo que
você falar a gente tem campeão aqui em Betim, bicicross. Então assim, fica difícil,
mas se você sair da rua aqui, você não sabe que nós temos campeões brasileiros, nós
temos campeões sul-americanos, nós temos vice-campeões sul-americanos,
entendeu? (Entrevista Esporte – 5W) 16
16
O entrevistado se refere a campeonatos de esporte amador no âmbito dos JIMIs e também de conquistas de
atletas que se iniciaram na pista de “bicicross” de Betim.
238
Se tivesse uma equipe profissional de vôlei, de futsal, de basquete, sei lá, qualquer
modalidade, isso desperta mais o interesse do menino, para tentar começar a treinar.
Porque vira um espelho para ele, para ele querer treinar e se tornar um dia um
jogador profissional ou tentar se tornar um jogador profissional. A gente sabe que a
grande maioria não vai se tornar, mas só dele estar nesse processo desde pequeno até
chegar na fase adulta, mesmo que ele não se torne um atleta profissional, ele vai ter
recebido uma formação pessoal muito importante, não só esportiva como pessoal.
Então, eu acho que esse espelho falta um pouco. Agora, também não acho que a
Prefeitura seria responsável por ter uma equipe profissional, como já foi e hoje não é
mais17. Eu acho que isso tem que partir da iniciativa privada também. Então, as
empresas, sei lá, as indústrias que tem em Betim e tudo, que deveriam investir nisso,
para que possa ter uma equipe – que não é barato ter uma equipe profissional, é caro.
(Entrevista Esporte – 1W)
17
O entrevistado se refere a uma equipe de vôlei que foi formada, salvo engano, nas quadras do Horto. O atual
campeão da “Superliga de Vôlei”, a equipe do Cruzeiro, foi originário dessa equipe inicial. (Informações
adicionais 1; ver nota 14.)
239
destrutivo há nisso, mas não só, pois dor, tristeza, alegria, entusiasmo, surpresa, e outras
manifestações estão sujeitas a transmutações semelhantes à medida que no esporte a
expressão das emoções não ultrapassam determinado limiar socialmente assimilável. Torcer
por um time ou “defender” a camisa em um jogo de futebol, por exemplo, neutralizaria
emoções que, de outro modo, poderiam ser conflitivas, a despeito de não ser tão raro nos
esportes de massa os conflitos advindos da rivalidade e da extrapolação das emoções entre
adversários.
contratos via ONGs, com a possível renovação por mais um ano / 11 meses, respectivamente.
Vencido o prazo de vigência de renovação de um contrato, os titulares são dispensados e
outros funcionários poderão ocupar os mesmos cargos, caso estes não venham a ser mantidos.
Foge ao escopo desse relatório aprofundar a discussão dessas formas de contrato vigentes na
municipalidade, antes, nos interessa destacar a precariedade dos vínculos de trabalho de
muitos servidores e a descontinuidade que é criada por essa situação em relação à manutenção
do curso das atividades desempenhadas ao longo de um mandato de governo, mas não só,
pois mudanças de mandato de governo poderão acarretar outras tantas descontinuidades do
ponto de vista da manutenção de políticas públicas.
Essa situação de descontinuidade de atividades é percebida como uma situação em que
o servidor fica de “pés e mãos atados”:
A gente ficou seis meses parado, né. Nós paramos em dezembro e voltamos agora,
vai fazer um mês de aula, foi muito tempo parado. O trabalho que a gente custou,
suou tanto para colocar no jeito, de repente para, e para ele parar, o pessoal já não
leva fé de que vai continuar. O pessoal pergunta “vai continuar mesmo? Vai
continuar?”. [....] Agora, pra buscar esses alunos é mais difícil, então, o período que
a gente demora pra buscar esses alunos, já passa dois, três meses, pra gente
conseguir voltar ao que estava ano passado. Então, toda vez que volta, os pais
chegam aqui e não levam muita fé, porque fala assim “quando chegar no final do
ano vai parar de novo”, então eu escuto isso direto, “ah, mas o que adianta agente
vir aqui, fazer inscrição, se a criança começa, e a hora que está tudo bem, para de
novo?”. [...] Eles acham logo que é política, “ah, vai começar agora por conta de
política”... Não, a gente não está envolvido com política, nós não estamos
trabalhando por conta da política, a gente está trabalhando sim, para trazer a
promoção de saúde para o pessoal. Só que quando para, infelizmente, a gente fica
com os pés e mãos atados, não tem o que fazer. (Entrevista Esporte – 6W)
Agora, por exemplo, teve uma contratação que dura 11 meses, com possibilidade de
renovação. Nós temos um grupo de profissionais efetivos também, mas a grande
parte dos profissionais da Secretaria de Esportes são contratados. E é uma luta
nossa, principalmente dos efetivos, que seja criado concurso para a Secretaria de
Esportes, porque isso iria sanar bem esse problema. Porque existe muitas vezes uma
descontinuidade do trabalho, porque quando esses profissionais... chega no final do
contrato e eles são dispensados, o aluno fica sem vir, quebra o trabalho do aluno.
Então, às vezes o aluno fica 2, 3 meses sem vir à aula, porque não tem profissional
para atendê-lo, até uma nova contratação. (Entrevista Esporte – 6Z)
241
A gente estava com um trabalho, que já vinha de quase dois anos, 1.500 crianças
fazendo escolinha, e de repente nós ficamos seis meses sem Professor, sem uma
atividade. Eu acho que se realmente valorizasse o esporte mesmo, eles não
deixariam isso acontecer (Entrevista Esporte – 4Z)
O modo como lazer e esporte são concebidos pelos entrevistados possibilita que se
vislumbrem a importância e o significado atribuídos a tais campos de atividades e torna
possível identificar o modo como têm sido delineadas as políticas públicas direcionadas ao
público infantojuvenil no segmento esportivo da municipalidade, tendo em vista o período em
que foi realizada a pesquisa de campo, isto é, entre maio e agosto de 2011.
Alguns temas se destacaram nessa atribuição de significados ao esporte e ao lazer, tais
como a noção de que o próprio esporte pode ser concebido a partir de um engajamento
progressivo à lógica competitiva do esporte – o que também implica considerar o “esporte”
242
O nosso primordial é isso, que seja um prazer para a criança, que começa a partir de
um lazer, porque aqui, o nosso intuito é justamente esse, levar o lazer para a criança,
para que, se desse lazer vier o interesse para competição e desenvolver, isso já vai
partir do interesse dele, da vontade, porque, querendo ou não, o [esporte em questão]
é muito cativante, você faz, você começa a praticar, não, só vou treinar, mas quando
você vê, você já está dentro das competições, já está querendo passagens para
competições internacionais e tudo. (Entrevista Esporte – 5W).
Pode-se dizer que nesses entendimentos de esporte como lazer está suposto prazer e
envolvimento, que podem se tornar “cativantes” ao ponto de o desportista “querer” participar
de “competições” e não apenas “treinar”. Mas o esporte pode adquirir uma qualidade
diferente do lazer à medida que a modalidade esportiva de competição é “seletiva” por ser
“para aqueles que se destacam” e que atendem a determinados requisitos como “condições
físicas, técnicas e táticas”. Assim, à medida que a “participação” e o envolvimento no esporte
intensificam-se, há um engajamento progressivo de seus praticantes, do esporte como “lazer”
ao esporte como “competição”, Mas se “a base do esporte é lúdica” (Entrevista Esporte – 3Z),
essa dimensão, no entanto, persiste quando se considera o esporte como competição e mesmo
como profissão.
Se o esporte envolve competição nos diversos níveis de engajamento de seus
praticantes, quanto mais o atleta é envolvido pelo esporte, mais a lógica competitiva adquire
relevo para ele e, desse modo, torna-se primordial ganhar uma disputa esportiva e,
consequentemente, mais se amplia o nível de competitividade e qualificação dos atletas e a
rivalidade entre equipes e desportistas. Ao mesmo tempo, não resta dúvida de que o incentivo
ao esporte por meio de políticas públicas voltadas a crianças e adolescentes poderá criar a
possibilidade de ampliar o interesse pelo esporte, ao ponto de a opção por uma carreira
esportiva ser também uma possibilidade e, se não isso, a possibilidade de o público
infantojuvenil manter uma “atividade física na vida adulta” e com isso manter-se saudável
nessa fase (Entrevista Esporte – 1W).
244
Porque se a gente observar hoje, por exemplo, a quantidade de criança que a gente
atende (criança, adolescente e jovem)... A gente disputa o tempo todo essa criança
com o que elas têm aí – a questão da criminalidade, a questão de droga – a gente
disputa a criança, tenta segurar a criança, mas é ofertado a ela também outros tipos
de coisas na vida. [...] E, por isso que eu te falo que é preventivo. [...] Por exemplo,
lá no Complexo do Teresópolis, eles moram numa região que é região de tráfico de
drogas, e às vezes eles veem, presenciam, como que um traficante tem uma vida
fácil... é um carro, principalmente, que tantos sonham com isso. Então assim, ao
invés dessa criança estar indo para a criminalidade, indo para os presídios quando
jovem e adulto é nesse sentido que eu vejo que a gente trabalha com uma prevenção.
É até mais barato para o Município do que ficar enchendo de gente nas cadeias.
(Entrevista Esporte – 2Z).
práticas esportivas. A criança, segundo ainda outro entrevistado, que, por exemplo, está no
período da manhã na escola, “à tarde está com a gente” e, com isso “não tem muita
oportunidade de ficar na rua”. O tempo dessa criança estaria todo ocupado: “o tempo que ele
[o aluno] está em casa [daí] vai para escola, sai da escola, vai almoçar, vem para a sua
atividade aqui, volta diretamente para casa, e não tem a oportunidade de conhecer essas coisas
aí de fora, tão mundanas, como a droga entre outras coisas” (Entrevista Esporte – 1Z).
Equipara-se assim o espaço doméstico ao das escolas e das quadras como espaços
resguardados de oportunidades “mundanas” da “rua” como “a droga”, “entre outras coisas”. A
“rua” seria espaço hostil a ser evitado e apenas espaço de passagem e não um lugar para
permanecer ao ponto de ter “oportunidade de conhecer essas coisas aí de fora”. Nesse sentido,
estar “dentro” é estar sob o abrigo da escola, da casa e da quadra (esportiva). Mais que espaço
a ser evitado, a “rua” é lugar de onde crianças e adolescentes devem ser “tirados” dada a
ameaça das “drogas”:
Aqui [...], a gente tem vários e vários casos [de crianças e adolescentes envolvidos
com drogas], então assim, eu acho que é preocupante, pra falar a verdade, eu acho
que é preocupante, acho que por isso que a gente tenta buscar atividades ligadas à
criança e ao adolescente o tempo todo, pra tentar tirar da rua, porque a maior parte,
pelo menos ao meu ver, aqui [...], são crianças que ficam na rua mesmo, o horário
que não está na escola está na rua. Então assim, é preocupante, eu acho que é
preocupante. Está geral. Os próprios meninos falam pra gente, pra eles já é uma
coisa tão normal, que eles contam pra gente sobre os pais estarem usando drogas, os
irmãos estarem usando drogas, até eles próprios já terem experimentado. Aqui
começou com a maconha e foi alastrando assim. (Entrevista Esporte – 6W)
Nota-se que nem mesmo a casa – o espaço familiar – estaria resguardada do consumo
de drogas, restando apenas a escola e a quadra como lugar possível de se evitar o consumo de
drogas:
[...] A gente fala é que tem que tirar esses meninos, a gente tem que colocar esses
meninos para fazer alguma coisa, porque pelo menos nesse momento a gente sabe
que eles estão longe de estar fazendo alguma coisa disso. À noite, os pais já estão
em casa, eles estão com os pais, quando não é o caso do pai também usar, né, mas
chegou cinco, seis horas os pais já estão em casa, os meninos já vão direto pra casa,
já evita de ficar na rua nesse período que não estão na escola. (Entrevista Esporte –
6W)
Um contraste a essa percepção da rua como espaço hostil pode ser notado com a
realização do “Programa Lazer e Recreação para Todos” que, com as atividades das “Ruas de
Lazer”, de certo modo devolve às ruas a possibilidade de ser um espaço de sociabilidade,
mesmo que programada. Ocupar sistematicamente os espaços públicos das ruas – e também
246
das praças – com a promoção de atividades diversas para o público infantojuvenil poderia
desencadear uma ressignificação desses espaços, de espaços hostis a espaços de sociabilidade
espontânea, para além de ser programada. No entanto, tudo isso perpassa a problemática da
segurança pública e do modelo de mobilidade urbana no país, que privilegia as ruas como
lugar do trânsito de veículos automotivos.
Mas, como visto, se nem mesmo crianças estariam imunes a “fazer coisas erradas”
(Entrevista Esporte – 1Z), como o consumo de drogas, no entanto há a noção de que
adolescentes são mais difíceis que crianças de serem envolvidos em atividades esportivas e
que demandariam por isso maior persistência quanto a essa participação:
Normalmente as faixas etárias mais críticas lá do colégio, que às vezes não estão
muito a fim de fazer aula, são mais os adolescentes, o pessoal do Ensino Médio.
Normalmente os meninos do Ensino Fundamental participam mais das aulas, fazem
mais, têm mais vontade de participar, de fazer a aula. Os meninos do Ensino Médio
você tem que ficar toda hora chamando para participar, porque às vezes eles não
querem fazer e tal. Mas no geral a diferença básica é essa. (Entrevista Esporte - 1W)
roubo, como expõe, por exemplo, Zaluar (1994). Participar dessas atividades responde
também a anseios de adolescentes e jovens por visibilidade social e reconhecimento, mesmo
que por caminhos tortos, sobretudo entre os que residem em áreas urbanas onde imperam
condições precárias de vida, estrutura reduzida de oportunidades e investimento de recursos
públicos de modo não suficiente para estas áreas.
Mas esses jovens adolescentes a que se referiu o entrevistado também podem ser
“atraídos pelo esporte”. Restaria saber como atraí-los, que estratégias adotar para isso, embora
esse mesmo entrevistado demonstre ao longo de sua fala que a disposição e a motivação em
trabalhar com o público infantojuvenil e especificamente em práticas esportivas poderiam ser
considerados importantes para realizar essa “atração” (o que, aliás, não foram características
apenas desse entrevistado). Em todos os casos e segundo ainda esse entrevistado, uma vez
praticando esporte, o adolescente não consumiria “droga, porque ele depende do seu corpo
para praticar o esporte. E quem pratica esporte geralmente não se envolve com o tráfico”
(Entrevista Esporte – 4Z).
Aliado a isso, há a noção de que o esporte é a “única ferramenta que consegue fazer a
paz”. Convicções à parte, para demonstrar o que disse, o entrevistado se refere à promoção de
um campeonato esportivo, coordenado por ele, que envolveu times de futebol de dois bairros
vizinhos de Betim que à época estavam em permanente conflito e mesmo em “guerra”. “Você
é doido,” disseram a ele. “A própria polícia falou: „não, você tem responsabilidade disso?
Porque isso vai estourar para cima de você‟. Na época, a guerra tava muito grande mesmo, ela
estava matando só porque o cara era da região de cá”. Foi então organizado um campeonato
de futebol com a participação de quarenta times, organizados em oito grupos e cinco times
por grupo. Segundo afirma textualmente, “eu comecei a ir para dentro do vestuário e pregar a
paz, [pois] nós tínhamos que mudar a história da nossa região”. Depois de atuar para
apaziguar possíveis confrontos e comprometer os jogadores para a realização do campeonato,
esse contou com a participação de pessoas da própria “comunidade” e “não precisou da
polícia e nós não tivemos um tapa. E foi nesse primeiro momento que a gente quebrou o gelo
entre o [bairro x] e o [bairro y]”.
Além desse entendimento de que as práticas esportivas atuariam como forma de
prevenir ou evitar o envolvimento de adolescentes e jovens com criminalidade, violência e
consumo de drogas em seu sentido lato, há também a noção de que o investimento em
esportes seria importante para a prevenção de doenças e promoção à saúde:
248
a gente reza para que todos os gestores – eu não digo só o gestor de nível Municipal
não, é nível Estadual e Federal – perceba que investir no esporte... Quem investe
mais no esporte, investe menos na doença, que é construção de hospital, que é
construção de Postos de Saúde... Porque as pessoas estão adoecendo, estão
adoecendo muito. Hoje você vê crianças e adolescentes com depressão –
antigamente era só adulto que tinha depressão. Hoje você vê... São crianças obesas,
crianças hipertensas, hoje nós temos vários casos. Doenças que antigamente eram só
de adulto hoje elas estão afetando as crianças. Então, o investimento no esporte, no
lazer, na qualidade de vida, com certeza diminuiria a incidência dessas doenças,
diminuiria bastante. (Entrevista Esporte – 6Z)
o esporte ensina muita coisa. Desde a parte disciplinar, de respeito, de ter respeito às
regras, de ter respeito ao adversário, ao juiz, ao técnico, torcida e tudo mais. E a
parte de regras, a convivência, a sociabilidade com os outros, os limites e tudo mais.
Não só os limites do que ele pode e o que ele não pode fazer, como os limites do
próprio corpo também, o que ele consegue e o que ele não consegue fazer, o que ele
pode treinar para conseguir fazer melhor, essas coisas assim. (Entrevista Esporte –
1W)
[...] E aqui no programa, o que eu acho interessante, por ser aberto a todos... Então
“então nós temos aqui pessoas que vêm a pé, tem pessoas que vêm de bicicleta, tem
pessoas que vêm de ônibus, tem pessoas que vêm de carro, já tivemos pessoas que
vinha de chofer. [...] Quando a gente vai competir, você tem meninas que têm
dinheiro, que não têm dinheiro e são todas iguais, porque existe o uniforme. A partir
do momento que existe o uniforme, não tem ninguém diferente, o uniforme é o
mesmo para todas. E na hora de fazer a aula é a mesma coisa” [...]. (Entrevista
Esporte – 2W)
249
Assim, não importa se alguém chega de ônibus ou de chofer e se irá “fazer aula” ou se
irá “competir”, todos são nivelados pelo uniforme em comum, embora nem tudo seja
nivelado, pois há que se fazer escolhas quando se trata de encaminhar um participante de uma
modalidade esportiva para o “nível de treinamento” nessa modalidade. Também nesses casos,
o que importaria não seria a condição socioeconômica, e sim o fato de que “você escolhe
aquele [aluno] que está atendendo [as exigências] melhor” (Entrevista Esporte – 2W)
Ao lado disso há também a noção de que “o esporte é paixão” e “é capaz de
transformar pessoas e construir sonhos” (Entrevista Esporte – 5W). O esporte representaria
uma “oportunidade” para crianças e adolescentes e ainda possibilita a vazão de seus “desejos”
(Entrevista Esporte – 5W).
5.4 Conclusões
Do exposto ao longo deste Relatório, pode ser notado que a promoção de atividades
esportivas no município de Betim tem mantido certa continuidade que ultrapassa os intervalos
de tempo dos mandatos de cargo de eleição majoritária. São exemplos disso “programas”
como “Futebol para Todos” e “Viva o Esporte para Todos”, sendo o primeiro vinculado à
Divisão de Futebol da Secretaria de Esportes e o segundo, à Divisão de Esportes
Especializados da mesma Secretaria. Também conflui para essa continuidade a promoção da
participação infantojuvenil em eventos esportivos fora ou no próprio município e ainda a
prática de esportes não apenas como atividade de lazer momentânea, mas também atividade
que envolveria maior dedicação ao esporte, o que não implica concluir que, no caso, se trata
de uma política que vise à profissionalização no esporte e nem que tal direcionamento
signifique deixar de lado o caráter lúdico do esporte como motivação para praticá-lo. No
entanto, se é possível identificar uma continuidade das ações em relação a determinados
programas, tal continuidade é posta à prova em decorrência de contratos de trabalho de
prestadores de serviço temporários terceirizados.
Foram identificados eixos que delineiam potencialidades e limitações quanto ao
direcionamento da política voltada aos esportes, tais como centralização-descentralização dos
espaços esportivos, esporte como “lazer” – esporte como “rendimento”, continuidade –
descontinuidade tanto de atividades como de quadro de pessoal, escola/espaços esportivos
exclusivos. Além disso, é importante ter em mente questões como o financiamento de quem
pratica esporte e as concepções de esporte como atividade física, como educação, como
250
18
Segundo pesquisa realizada pelo IBGE em 2003, a média do orçamento destinado à “função” esporte e lazer
dos municípios brasileiro entre 100.000 e 500.000 habitantes foi de 0,92 %. (IBGE, 2006, p. 33).
251
9, Incrementar as conexões entre esporte e saúde no plano de ações articuladas entre ambos
segmentos da administração municipal .
10. Estabelecer meta de ampliação da participação de crianças e adolescentes em atividades
esportivas promovidas pela Secretaria de Esportes.
11. Valorizar a tradição esportiva no município a partir da criação de um espaço ou de um
museu itinerante que valorize a memória do esporte local.
12. Incrementar base de dados de informações esportivas municipais, de modo a levantar os
espaços esportivos do município em termos de sua capacidade instalada e de sua demanda
potencial e outras informações importantes para o planejamento das atividades esportivas.
13. Viabilizar a ocupação em períodos ociosos de espaços das escolas que possuem
equipamentos esportivos.
14. Criar um Conselho Municipal de Esportes para fixar diretrizes para o fomento do esporte
no município19 de modo articulado ao Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do
Adolescente e outros conselhos municipais.
No sentido oposto, caso se considere um estado mínimo do esporte, não seria difícil
imaginar o que isso poderia acarretar. Mas se realmente a opção política for por um estado
ótimo do esporte, há muito que fazer. Poderia se imaginar graus intermediários entre um
estado e outro, mas aí também não nos compete estabelecer os termos da opção política
assumida.
E se, na perspectiva do antropólogo Marcel Mauss (2003), os esportes envolvem
técnicas do corpo, aprendê-las significaria acionar uma cadeia de transmissão destas, de modo
a amplificar as potencialidades e limites do corpo. Em uma passagem de seu texto, Mauss
(2003, p. 402) se refere à mudança de técnicas corporais de natação em seu tempo que
implicaram modificações em relação a pormenores como o modo de respirar e ao
condicionamento dos reflexos oculares de abrir os olhos sob o contato com a água. Há uma
especificidade de técnicas corporais conforme as modalidades esportivas e que habita
circuitos de onde elas são transmitidas e transformadas, modificando corpos e disposições.
Pertencer a um desses circuitos e neles intensificar a participação ou não também seriam
opções políticas.
19
Segundo dados do IBGE (2006, p. 29), em 2003, “apenas 11,8% dos municípios brasileiros possuíam
Conselho Municipal de Esporte. Dentre os demais conselhos que também atuavam na área do esporte no País,
destacavam-se os da Educação, presentes em 36,1% dos municípios brasileiros; os do Direito da Criança e do
Adolescente (27,2%); e os de Assistência Social (23,3%). Os conselhos do Direito da Criança e do Adolescente e
de Assistência Social retratam a importância das crianças e dos adolescentes como populações-alvos das
atividades esportivas”.
252
Com tudo isso, vale acrescentar ainda que os esportes geram “excitação prazerosa,
amizade e sociabilidade. Eles são uma grande invenção coletiva, que consegue com sucesso
resolver a aparente contradição entre rivalidade e amizade. Pode-se dizer que os esportes são
formas de „rivalidade amistosa‟, e como tais, são extremamente valiosos” (DUNNING, 2008,
p. 227).
253
Tudo isso significa que a situação atual para a construção da Política de Assistência
Social precisa levar em conta três vertentes de proteção social: as pessoas, as suas
circunstâncias e dentre elas seu núcleo de apoio primeiro, isto é, a família.
(PNAS/2004 – NOB/SUAS)
sociais como direitos” (SPOSATI, 2009, p. 15), coloca novos desafios, como o confronto
teórico e cultural com as ideias e práticas arraigadas na sociedade brasileira e a tarefa de
concretizar, construir e garantir a aplicação real deste sistema.
No Brasil, vivemos mudanças tanto no cenário institucional quanto na revisão de
paradigmas conceituais que afetam a formulação e execução de políticas públicas. As
diretrizes do SUAS e da PNAS se contrapõem às concepções de assistência social tão
presentes ainda no nosso contexto, que sustentam políticas assistencialistas e clientelistas,
com práticas de tutela, do favor, da subalternidade. Boa vontade, amor aos pobres,
voluntarismo têm uma larga escala de aceitação como elementos de mediação nesta política.
O enfoque assistencialista e compensatório das políticas de assistência e o caráter
fragmentado e clientelista na orientação das ações estão ainda arraigados na cultura política
do país, o que dificulta o enfrentamento das questões sociais sob a ótica da cidadania e dos
direitos sociais.
Dados do PNUD (Plano das Nações Unidas para o Desenvolvimento), de 2010, pelo
índice de Gini,20 apontam o Brasil com o resultado de 0,56, sendo assim o terceiro país mais
desigual do mundo.21
Além das políticas econômicas, as políticas sociais de educação, saúde, habitação,
assistência, dentre outras, precisam ser construídas na perspectiva redistributiva e com a meta
de combater e diminuir as desigualdades:
[...] pretende-se chamar a atenção para o fato da pobreza ser mais do que um
problema individual ou de manutenção de um patamar mínimo de renda. A
perspectiva aqui sugerida é a de que a pobreza se define sobretudo como problema
social e econômico, encontrando nestas duas esferas suas mais arraigadas raízes e
determinações. Seu enfrentamento, complexo e multidimensional, necessita
mobilizar não apenas os benefícios sociais de manutenção de renda, sejam eles de
natureza contributiva ou não contributiva. A eles devem se articular políticas sociais
que ofertam serviços, equalizam oportunidades, garantem o acesso a padrões
mínimos de bem estar e mobilizem e ampliem as capacidades. Mas é sobretudo face
à ocupação e ao emprego que se sobrelevam os grandes desafios ao enfrentamento
da pobreza. ... Uma política de combate à pobreza e à desigualdade implica o
amadurecimento de um projeto de desenvolvimento com equidade. (JACCOUD,
2009, p. 71)
20
O coeficiente de Gini é um parâmetro internacional usado para medir a desigualdade de distribuição de renda
entre os países. No resultado final, quanto mais um país se aproxima do número 1, mais desigual é a distribuição
de renda e riqueza, e quanto mais próximo do número 0, mais igualitário será aquele país. No ano de 2012, o
Índice de Gini do Brasil é de 51,9, o que demonstra uma alta concentração de renda. Porém, devemos destacar
um avanço do Brasil neste índice, já que em 1990 era de 0,6091.
21
O PNUD constatou, ainda no mesmo ano, que dos 15 países mais desiguais do mundo, segundo o Índice de
Gini, 10 se encontravam na América Latina e no Caribe.
257
Vulnerabilidade articula-se com a ideia de situações de risco, que por sua vez
englobam uma variedade: riscos de saúde, riscos naturais, riscos ligados aos ciclos de vida,
riscos sociais e econômicos, riscos políticos. As políticas públicas de proteção têm o desafio
de fortalecer a capacidade dos indivíduos, das famílias e regiões de enfrentarem a condição de
vulnerabilidade: Sposati reforça a ideia de que, se de um lado, é fato que a pobreza agrava as
vulnerabilidades, os riscos e fragilidades, isso não significa que todas as vulnerabilidades e
riscos que demandam políticas de proteção existam só por causa da pobreza. Há várias
258
ser articuladas, num planejamento e avaliação conjuntos. Isso requer o envolvimento dos
técnicos, das equipes de profissionais da rede socioassistencial e, sobretudo, uma articulação e
decisão dos gestores e dirigentes.
A política de assistência social prevê também a constituição de conselhos, planos e
fundos nas três instâncias do poder com o objetivo de combinar processos de gestão com
sistema de participação e controle social:
Todas essas concepções e diretrizes da PNAS são eixos norteadores para a construção
do Sistema Único da Assistência Social (SUAS). Ao se refletir sobre o objeto dessa política e
sobre os sujeitos atendidos, é preciso atentar para que não basta mudar os nomes, as palavras.
É necessário indagar que nova relação, de fato, estamos construindo. O conteúdo, o olhar e as
relações que se estabelecem entre os sujeitos atendidos e os profissionais da Assistência
precisam ser reconstruídos e repensados, neste esforço de superarmos visões e práticas
estigmatizadoras e reprodutoras das desigualdades e subalternidades. As ações da assistência
social no Brasil historicamente foram confundidas com paternalismo, pelo seu caráter de
tutela que subtraía das pessoas o controle de suas vidas. As pessoas eram convertidas em
espectadores de suas próprias necessidades, em carentes, em meros consumidores da atenção
dada a eles. Não eram considerados como seres humanos íntegros e capazes.
Que olhar os profissionais, os agentes das entidades têm sobre o público, pessoas e
famílias atendidas nos diversos programas da assistência? Ainda é muito comum ouvir os
termos “carentes”, “desestruturados”. No caso das crianças, dos adolescentes e dos jovens, a
construção histórica de que precisam ser educados porque “não têm razão”, “não são
responsáveis”, “precisam da autoridade para se tornarem adultos”, impede-nos muitas vezes
261
de vê-los pelo que eles são, pensam e vivem. Enxerga-se o outro pelo que ele não é, pelo que
falta. No caso do público da assistência, isso se agrava. Muitas ações e programas para
adolescência e juventude ainda têm sido pensados como espaços de contenção e controle dos
jovens, com foco mais nos problemas do que nas potencialidades e na criação de
oportunidades e condições para seu desenvolvimento integral.
A formação e capacitação de profissionais para a atuarem nas políticas sociais precisa
fomentar a capacidade teórica e crítica, desenvolver a capacidade de articular as novas
concepções e diretrizes com as situações e especificidades de cada local e território, num
processo dialógico e participativo que pressupõe a criação de canais efetivos de participação
dos “usuários” (sujeitos) e da sociedade.
Um modelo por si não altera o real... Neste sentido, se o modelo não dá conta (em
seus elementos de base) das configurações do real, ele se transforma em uma
ideologia ou em um discurso como mero arranjo de palavras impactantes, e isso
não significa o efetivo alcance de mudanças e dos resultados esperados. Ter um
modelo brasileiro de proteção social não significa que ele já exista ou esteja pronto,
mas que é uma construção que exige muito esforço de mudança.
É preciso atentar que vivemos em uma federação, e por mais que se tente captar as
diversidades, a tendência é manter um nível de generalização que certamente terá
que ser adequado às particularidades das regiões do país, dos estados e das
microrregiões, especialmente as áreas metropolitanas. A concretização do modelo de
proteção social sofre influência da territorialidade, pois ele só se instala, e opera, a
partir de forças vivas e ações com sujeitos reais. Ele não flui de uma fórmula
matemática, ou laboratorial, mas de um conjunto de relações e de forças em
movimento. (SPOSATI, 2009, p. 17. Grifo nosso)
Dizer que somos “técnicos” e os atendidos “usuários” não transforma a prática. Até
porque a ideia de “ser um técnico” também é passível de problematização. Se pensarmos os
“técnicos” como operadores de projetos, programas e ações, executores de diretrizes que são
desenhadas e pensadas em outras instâncias, as de gestão, por exemplo, percebemos que pode
haver um certo “embotamento” e a perda da criatividade e da capacidade de escuta e diálogo
com os sujeitos com os quais se trabalha com o contexto no qual atuam. Corre-se o risco de
reproduzir um modelo de gestão, ainda muito presente nas nossas instituições e organizações,
em que os que pensam não fazem, não executam, e os que fazem não pensam e de reeditarmos
uma visão tecnicista do trabalho.
Como aponta Sposati na citação anterior, o modelo pode se transformar num discurso
vazio de conteúdo empírico sem implicações práticas e valorativas para o trabalho a ser
realizado diretamente com o público atendido. A padronização, as normatizações e
tipificações produzidas pelo modelo podem gerar uma linguagem homogênea sobre a
assistência que passa a ser repetida quase dogmaticamente, sem nenhum exercício crítico e de
262
questionamento. A assimilação desse discurso, no entanto, não significa que ele esteja sendo
operacionalizado nas ações cotidianas dos responsáveis pela execução da política de
assistência social, restringindo-se apenas a um discurso obrigatório que deve ser formulado.
Portanto, ao pensarmos no objeto e nos sujeitos atendidos nas políticas da Assistência
Social, a partir das diretrizes do PNAS, cabe-nos compreender a complexidade das relações
nas quais se inserem as ações e serviços e criar capacidade estratégica de dar forma e
concretude aos conceitos e propostas. Como traduzir as diretrizes e os princípios em novas
práticas? As desigualdades regionais, as diversidades de cada cidade, estado e região exigem
uma capacidade técnica, analítica e criativa, que identifique as especificidades e problemas de
cada lugar e construa estratégias de efetivação dos serviços na perspectiva de atendimento aos
direitos previstos no SUAS.
[...] dentro da estrutura do SUAS, que foi esse novo ordenamento, mudou muito a
lógica da assistência ... mudou para melhor, inclusive, né. Porque dentro da
Assistência Social, o SUAS coloca essa organização dos serviços, Proteção Social
Básica e Proteção Social Especial. Então, hoje quando você vai discutir um caso, na
Assistência Social, normalmente, o que te referencia: onde esse caso está sendo
discutido? Ele é da proteção básica ou da proteção especial, ele está na média ou ele
está na alta complexidade? Então a gente fica muito mais situada nessa discussão e
na própria metodologia de trabalho, porque muda também, a metodologia, a gente
está sempre nessa discussão, da melhor maneira de atender, e seguindo as diretrizes
da política de assistência social. (Entrevista 2 - Assistência)
Então, o SUAS, que é o Sistema Único da Assistência Social, vem ser um sistema
também para organizar a Assistência Social, que hoje, por mais que em alguns
Municípios já esteja bem avançada – do ponto de vista do direito do cidadão,
rompendo com aquela lógica do clientelismo... vamos dizer assim, que era muito
comum – agora tenta-se normatizar e dar uma forma estruturada mesmo. Alguns
Serviços vão ser resolvidos lá no CRAS – pegando num nível hierárquico – o que
não é possível resolver ali, vai para uma outra instância e isso também vai contribuir
para a questão dos recursos. Então, quando o Governo Federal, ou o Governo
Estadual, ou o próprio Governo Municipal investe recurso nos Serviços, já vai
investir nessa lógica. (Entrevista 3 - Assistência)
263
Em Betim, a Proteção Social Básica conta com oito unidades de Assistência Social de
abrangência regional (Semas Regionais), oito Centros de Referência de Assistência de Social
(CRAS), de abrangência territorial e três projetos sociais com abrangência local nos bairros
São João, Icaivera e Petrovale.
A Proteção Social Especial se divide em média e alta complexidade. O foco é a família
e o objetivo das ações é potencializar a capacidade de proteção e socialização de seus
membros. O Centro de Referência Especializado de Assistência Social – CREAS oferece, de
forma continuada, os Serviços da Proteção Social Especial de média complexidade a pessoas
e famílias com um ou mais de seus membros em situação de ameaça ou violação de direitos,
através do PAEFI que é o serviço de proteção e atendimento especializado a famílias e
indivíduos. Esses serviços funcionam em conjunto com Poder Judiciário, Ministério Público,
Defensoria Pública, Conselhos Tutelares e outras organizações de defesa de direitos, com os
demais serviços socioassistenciais e de outras políticas públicas com o objetivo de estruturar
uma rede eficaz de proteção social.
Além do CREAS, compõem a Proteção Social Especial de média complexidade o
serviço especializado em abordagem social e o serviço de Proteção social à adolescentes em
cumprimento de Medida Socioeducativa de Liberdade Assistida e Prestação de Serviço à
Comunidade.
O atendimento de alta complexidade na Proteção Especial oferece proteção integral
para famílias e pessoas que estão sem referência e/ou em situação de risco e violação de
direitos, cujos vínculos familiares e comunitários foram rompidos. No caso de crianças e
adolescentes, que precisam ser retirados de seu núcleo familiar e/ou comunitário devido a
abandono, maus-tratos, negligência grave, violência física, psicológica e sexual, existe o
serviço de acolhimento familiar e institucional.
Em Betim, existem atualmente seis unidades de acolhimento institucional para
crianças e adolescentes. São três casas-lares, dois abrigos institucionais e uma casa de
passagem. Outra modalidade de acolhimento que está sendo construída em Betim, é o da
Família Acolhedora:
ainda, um risco para eles. Quando é identificado é que vem para a Proteção especial,
então a gente faz esse corte exatamente para ver, quais as famílias que serão
atendidas na Proteção Básica e quais as famílias que serão atendidas na Proteção
Social Especial... e dentro da Proteção Social Especial, nós ainda fazemos essa
distinção, se ela vai ser acompanhada na média complexidade ou se ela será
acompanhada na alta complexidade, porque se houve uma ruptura de vínculo ali, nós
vamos encaminhar para a alta complexidade. Então, aquela criança que estava lá
sendo acompanhada, ou não, pela Proteção Social Básica, o Conselho Tutelar
identificou ali uma negligência, maus-tratos, alguma situação que ele identificou,
conversou com o técnico da alta complexidade, da Proteção Especial, e foi avaliado
que ela precisa ser encaminhada para um abrigo, ela saiu da básica, passou direto
para a alta sem ter passado pela média, porque o caso era grave e precisava de uma
proteção imediata e aí, então, é feito isso. (Entrevista 2 - Assistência)
Nas várias entrevistas realizadas, percebe-se que as diretrizes do PNAS /SUAS estão
bastante assimiladas pelos diversos profissionais e há uma homogeneidade nas falas. As
concepções sobre o trabalho, inclusive sobre os fluxos e serviços, repetem o que está
sistematizado nos Guias de normatizações e de tipificações dos serviços, publicados pela
Secretaria Nacional da Assistência/MDS. No documento do Ministério de Desenvolvimento
Social, - Proteção Básica do Sistema Único de Assistência Social: orientações técnicas para o
CRAS – (Versão preliminar. Brasília Junho de 2006) – por exemplo, há um trecho em que se
afirma: “O Programa de Atenção Integral à Família (PAIF) passa a se referenciar por
nomenclatura padrão em todo o país e deve ter significado semelhante para a população em
qualquer território da federação.” Entretanto, a execução e operacionalização desses serviços
demandam um processo de construção, que considere as especificidades das regiões e
territórios e que implique a escuta e a participação dos sujeitos/público atendido.
A Constituição Federal de 1988 (CF/88) foi um marco na conquista por direitos
sociais, civis e políticos no país. Além disso, consagrou a descentralização na gestão e na
elaboração de políticas públicas, conferindo aos municípios poder para implantar as políticas,
considerando-se as necessidades e demandas concretas dos locais. Estabeleceu-se um novo
pacto entre as diferentes esferas do governo, com fortalecimento do papel dos municípios.
Torna-se importante indagar qual é o papel e a relação entre o poder local e central, no
desenho e operacionalização de ações e políticas públicas.
O Brasil é um país muito grande e diverso. O Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA), por exemplo, quando se refere à organização das políticas públicas, destaca a
necessidade de levar em conta as especificidades das regiões, das cidades. Como articular os
papéis e as responsabilidades de cada esfera de governo?
O MDS se ocupa de estruturar o SUAS e criar as diretrizes da política de assistência
para o Brasil. Isso é importante, apontando um avanço. Contudo, para se atingir as metas e as
265
diretrizes traçadas, cada cidade precisa construir o seu caminho. Como lidar com as leis,
tipificações, e normatizações sem desconsiderar a capacidade de construção e as
especificidades do poder local, os interesses e necessidades da população atendida? É
importante fazermos essa indagação ao elaborarmos as políticas e ações públicas no
município, pois se corre o risco de ações e iniciativas locais serem engessadas, se houver uma
interpretação burocrática destas diretrizes.
Segundo um entrevistado, essa padronização facilita a localização dos serviços nos
diversos municípios. Ele reconhece que existe esse risco de engessamento, mas acredita que
um canal importante para evitar esse processo é a realização das Conferências Municipais e o
controle social, através do Conselho de Assistência:
Eu acho que é uma questão importante da gente observar. Agora, eu vou pegar
primeiro da minha experiência, até mesmo de PPCAAM (programa de proteção),
que eu viajava em vários Estados do país. E era muito interessante, quando nós
precisávamos acessar a Assistência Social. Então era sempre muito complicado, até
mesmo do ponto de vista da nomenclatura, “onde é que eu encontro?”. Então, em
cada lugar você tinha um nome diferente, e com uma qualidade, com Serviços
ofertados de forma diferente. Eu me lembro que, dentro do Estado, quando nós
tínhamos que ir para alguns lugares do interior, quando a gente já começava a poder
procurar o CRAS, era interessante porque o acesso era muito mais rápido, a
identificação onde se localizava determinado Serviço era muito rápido. E isso já
acontece a partir do momento que o Governo Federal, através do MDS, começa a
implantar o CRAS no país.
[...] o SUAS não é uma coisa que está vindo de cima para baixo, ele tem sido
construído ao longo dos anos com o envolvimento dos profissionais que militam e
que trabalham na Assistência Social, já de longa data. E do ponto de vista das
especificidades, tanto de algum público ou a possibilidade de participação ou de
construção local, ele já traz no bojo da sua normatização essas possibilidades... é
uma diretriz nacional , mas a gente percebe que tem ele muito mais a contribuir do
que engessar os processos. É o que me parece... Eu acredito que as conferências
Municipais, Estaduais, elas terão constante possibilidade de aprimorar esse sistema,
tanto do ponto de vista local, como do ponto de vista Nacional, Estadual e
Municipal. (Entrevista 3 - Assistência)
Assim como no ECA, no SUS, na LDB, também para a área da Assistência Social, a
legislação prevê a criação de mecanismos para a participação da sociedade civil nas esferas do
governo com a criação de Conselhos Municipais. Os Conselhos Municipais são esferas de
interlocução entre governo e sociedade e de disputas por políticas públicas. No caso da
Assistência Social, observa-se uma ampliação das atribuições dos conselhos paritários, desde
a promulgação da LOAS, até aprovação da NOBSuas.
Em Betim, na década de 1990, foram institucionalizados diversos conselhos
abrangendo as políticas setoriais, dentre eles o Conselho e o Fundo Municipal de Assistência
266
A questão do controle social... Como essa luta veio lá da Constituição de 88, a gente
começou a perceber que realmente é difícil a sociedade, principalmente os usuários,
participarem dessas decisões, se não for através de algum órgão de controle... E, na
Assistência principalmente, não foi diferente – como na Saúde, mas principalmente
na Assistência – a gente percebeu que, enquanto a gente não lutasse por uma
Assistência como política pública, ela não ia deixar de ser assistencialista.
(Entrevista 1 – Assistência)
Nas entrevistas com gestores e profissionais que atuam na área da Assistência, nas
entidades e conselhos, foram citadas várias dificuldades e desafios para a atuação e avanço da
participação e do controle social:
Em Betim nós temos o Conselho de Assistência desde, acho que 96... Se o gestor
acha que ele deve fortalecer o Conselho enquanto controle social, enquanto órgão
que deve deliberar, que deve fiscalizar e acompanhar, ele fortalece. Mas, por outro
lado, se ele acha que ele é um empecilho para ele, ele procura não fortalecê-lo e,
principalmente, ele procura usá-lo só nas deliberações que ele precisa. (Entrevista 1
– Assistência)
[...] ele se preocupa muito mais em fortalecê-lo às vezes por causa das transferências
de fundo a fundo, que são necessárias e têm que passar pelo crivo e o controle do
Conselho. Mas fora isso, eles não estão muito preocupado nas discussões, nos
debates no Conselho. Claro que isso depende muito da filosofia do gestor. Então
aqui em Betim não é diferente, como na maioria dos locais é assim. Quando o gestor
que está no momento gerindo tem uma filosofia de debater, de discutir, de abrir para
a comunidade participar, os usuários participar, a sociedade civil participar, é mais
tranquilo. Mas quando não tem essa filosofia, o Conselho fica muito esvaziado e
sendo manipulado o tempo todo... O gestor continua com muita força. (Entrevista 1
– Assistência)
Os Conselhos são canais que podem contribuir para o aprofundamento das reflexões
sobre a realidade e problemas da cidade, constituindo-se como espaços estratégicos de
negociação e mediação entre governo e sociedade civil na formulação e gestão das políticas
públicas, num ambiente democrático de mediação e pactuação de diferentes visões e
interesses. Esse processo de participação é demarcado por conflitos e grandes desafios. Se no
final dos anos 1980, a sociedade brasileira conquistou esses espaços, como os conselhos
deliberativos das políticas públicas, na perspectiva do controle social e na luta pela
democracia participativa, garantir hoje estes espaços e fortalecê-los é fundamental. Trata-se
de enfrentar questões como a da representação da sociedade civil e do governo, a relação dos
conselheiros com suas bases e regiões, a transparência nas informações, a autonomia destes
Conselhos.
Esses limites e dificuldades foram apontadas em diversas entrevistas, como desafios a
serem enfrentados na organização e funcionamento do CMAS de Betim:
Orlando Alves dos Santos Júnior (sociólogo, diretor da ONG FASE), que coordenou
uma pesquisa sobre os Conselhos Municipais nas metrópoles brasileiras, na qual foram
entrevistados 1.540 conselheiros municipais, integrantes de diferentes Conselhos setoriais,
concluiu que há um grande risco de transformação dos Conselhos Municipais em estruturas
burocráticas formais, subordinadas às rotinas administrativas das Secretarias Municipais, que
nada mais farão que aprovar contratos e prestação de contas exigidos nos convênios
estabelecidos entre as esferas do governos e entre o município e as entidades sociais parceiras:
De fato, constata-se que a maior parte dos Conselhos não possui uma agenda política
de médio e longo prazos capaz de instituir uma pauta de discussão mais estratégica
para a gestão das políticas públicas em cada cidade (SANTOS JÚNIOR, 2003, p.
108)
Essa questão aparece como um problema nas plenárias e reuniões do CMAS de Betim,
que, segundo alguns, são dominadas pelos técnicos e gestores. A linguagem técnica utilizada
nessas reuniões também é apontada como uma barreira à participação dos representantes da
sociedade civil.
Os eixos – centralidade da família e territorialização – também são considerados como
diretrizes na implantação do SUAS em Betim:
É importante dizer que a Assistência Social está tentando agora de fato trabalhar a
questão da matricialidade sociofamiliar. A tendência – e a gente em alguns
aspectos já consegue isso – é não desenvolver ações segmentadas: só para a criança,
só para o idoso ou só para a mulher... trabalhar a família como um todo. Então você
vai ter momentos nos Serviços que vão tratar as especificidades, mas em todos eles
será considerada essa questão da família, tanto do ponto de vista das ações
desenvolvidas, vamos dizer assim, como também da composição do Serviço,
enquanto espaço, enquanto recursos humanos. (Entrevista 3 – Assistência. Grifo
nosso)
[...] Os territórios, por exemplo, quando vai se implantar um CRAS, são avaliados
vários quesitos, que eu não saberia nesse momento te dizer exatamente quais são
269
esses indicadores. Mas vai entrar o IDH, a questão do alto índice de violência,
enfim, questões relacionadas aí tanto à renda, como situações sociofamiliar de um
determinado território. (Entrevista 3 – Assistência)
Nós temos aqui um benefício chamado Cartão Cesta Básica, que são famílias que
participam do Criança Pequena, do PROJOVEM , da 3ª Idade...No programa Cesta
Escola o foco principal é famílias em vulnerabilidade e assistência socioassistencial
aos filhos dessas famílias, que são em geral crianças e jovens Esse programa é
coordenado pela Secretaria de Assistência Social, em parceria com várias outras
secretarias, entre elas a Secretaria da Saúde, Secretaria da Educação, que são
parceiras diretas, e há outras que são coparceiras, são parceiras indiretas – NARP,
Comunicação, SELT, SEMAS, SEMED... São parceiras indiretas. (Entrevista 8 –
Assistência)
A família que recebe a Cesta Escola pode estar também no Bolsa Família. Neste caso,
o programa municipal vai entrar como uma renda complementar à do Governo Federal. A
família recebe o cartão, hoje no valor de 72 reais, e, com esse cartão, pode fazer aquisição de
bens para a família como alimentos, material escolar:
órgãos das políticas públicas e um grande número delas vai diretamente aos núcleos (demanda
espontânea). Há também a busca ativa, que é feita através de um trabalho das equipes nas
Regionais, onde se divulga o Programa e os critérios de inclusão.
São critérios para participar do programa a família ter a renda de até dois salários
mínimos, ter filho em idade escolar, de 6 a 14 anos de idade:
E tem que ter toda a documentação. Crianças têm que estar com a vacinação em
dia... E frequência escolar que é um critério também exigido, 85% da frequência da
criança ou do adolescente na escola... (Entrevista 8 – Assistência)
Estão previstas reuniões mensais com as famílias, quando elas buscam o cartão. As
reuniões são descentralizadas por bairros e têm o objetivo de fortalecer o vínculo entre
família/escola, família/Assistência Social, família/Saúde.
Esta fala revela uma forte tendência de repassar para os programas da assistência
social a tarefa de controlar a frequência e em alguns casos, até o rendimento das crianças na
escola. Pressupõe que o baixo rendimento e desinteresse dessas crianças se explicam pela
falta de compromisso das famílias que não estão cumprindo seu papel. No capítulo deste
relatório que discute a Educação esta questão será aprofundada. Percebe-se que é uma visão
bastante polêmica, tanto na concepção de família e seu papel, como no entendimento do papel
da escola.
Quanto ao desligamento e o tempo que as famílias podem participar do programa, o
prazo é até que o filho caçula complete 15 anos de idade. Para o acompanhamento às famílias,
o programa tem a parceria com o CRAS, que vai fazer a avaliação socioassistencial da família
e vai fazer o acompanhamento das famílias:
O CRAS acompanha a rotina dessas famílias quando há, por exemplo, ausência do
filho na escola, quando o motivo de saúde da família tem intervenção, quando
precisa de uma intervenção social, quando tem uma intervenção na questão de
272
julho de 2001, que “é um instrumento de coleta de informações que tem como objetivo
identificar todas as famílias em situação de pobreza – definidas como sendo aquelas com
renda igual ou inferior a 1/2 salário mínimo por pessoa – no país”. Após a coleta de dados, as
pessoas constantes do cadastro recebem o Número de Identificação Social (NIS). Cabe ao
CRAS, através do PAIF, fazer o atendimento e acompanhamento dessas famílias:
Também em Betim a Proteção Social Básica tem o PAIF como eixo estruturante de
suas ações.
O PAIF é responsável pelo acompanhamento das famílias... Você tem técnicos que
vão acompanhar as famílias daquele território. “Ah, mas acompanha todas as
famílias?”. Não, nós não temos a infraestrutura necessária de profissionais para
acompanhar a todas as famílias que ali estão cadastradas, que recebem ou Bolsa
Família, ou BPC, ou outro tipo de benefício, mas que trabalha com a lógica da
condicionalidade. (Entrevista 9 – Assistência)
Esbarra-se nesse aspecto com obstáculos, como a desarticulação dos serviços e dos
programas existentes, a falta de clareza dos papéis de cada um. Além disso, os técnicos são
desafiados a pensar e construir metodologias para atendimento às famílias, e para isso
precisam considerar a realidade na qual estas se inserem, suas vulnerabilidades e seu
potencial. Vários documentos dessa política hoje estabelecem normatizações, tipificações e
orientações para o trabalho com famílias no CRAS e PAIF.
Observamos que as diretrizes desses documentos são repetidas nas falas dos técnicos e
gestores desta política. Mas tivemos dificuldade de compreender mais concretamente como
esse acompanhamento é realizado e como são avaliados os resultados. Qual concepção de
274
[...] E nós estamos vendo aí hoje que, infelizmente, as famílias escreverem nesse
norte: as crianças estão sempre em segundo ou terceiro plano, são poucas as famílias
que as crianças e adolescentes estão em primeiro plano. As vezes, os pais têm que
fazer tudo, menos o olhar diferenciado para as crianças e adolescentes, as vezes ele
dá tudo, de material, físico, mas o principal que é a formação do ser, da família você
não tem. E passam essa responsabilidade para outros, que são a escola, a saúde, as
unidades de educação infantil, o governo, os setores que trabalham com políticas
públicas, né? Então, infelizmente nós estamos vivenciando essa inversão de valores
e a gente precisa resgatar isso, né?...é um processo que as famílias estão perdendo
isso, estão deixando isso de lado, em busca de outros interesses. E os
relacionamentos familiares, estão muito promíscuos também, a promiscuidade está
muito grande...
Então a família está passando por um processo de desestruturação. Então acho
que cabe a nós, enquanto atores, que estamos militando nessa causa da criança e do
adolescente, trabalhar essa causa do convívio familiar e comunitário, apesar de cada
um estar num eixo, mas estamos convergindo para um caminho que é o trabalho
com as famílias e as crianças e adolescentes, nós estamos tentando esse trabalho
de reestruturação das famílias...acolher essas famílias, acolher esses adolescentes
e trabalhar essa questão dos valores, ainda que na sua especificidade, nós vamos
conseguir retomar aquelas questões que hoje as pessoas falam que eram caretas, que
eram retrógradas, mas que davam orientação para as pessoas, né. Muitas coisas
foram tiradas das grades curriculares, nós perdemos a questão de estudar a Ética e a
Moral, que estava lá desde o Ensino Fundamental... (Entrevista CMDCA. Grifo
nosso)
Os documentos do SUAS enfatizam que o trabalho social com as famílias visa apoiá-
las e fortalecê-las como protagonistas e não culpabilizá-las ou responsabilizá-las pela sua
situação ou condição. “Importante também citar que os problemas experimentados e vividos
pelas famílias são, quase em sua totalidade, resultados da realidade em que vivem. Ou seja, a
questão social interfere e modifica as relações e dinâmicas familiares.” (ANDRADE;
MATIAS, 2009, p. 220)
Essas orientações, sem dúvida, são diretrizes importantes para organização dos
serviços. Todavia é um desafio concretizar e implementar efetivamente essas ações. Como foi
discutido na primeira parte deste capítulo, “Um modelo por si não altera o real...”. Para lidar
com as diversidades e especificidades dos territórios e municípios e as complexas relações nas
quais estão inseridas as famílias e seus membros, um elemento importante da metodologia é a
construção processual e dialógica permanente.
Ainda existe uma cultura institucional e técnica que dificulta o diálogo com as pessoas
que compõem a “população alvo”, os “usuários”. Quais são as demandas, interesses e
necessidades das famílias e de seus membros? Qual espaço/tempo para a escuta destes
sujeitos que denominamos o usuário? Ao se trabalhar a centralidade da família, é importante
não perder de vista as necessidades específicas de seus membros, nos diferentes ciclos de
vida. No caso das crianças e adolescentes, observamos que as necessidades destas, de seus
pais e dos profissionais nem sempre são as mesmas. As crianças e adolescentes têm
necessidade de acolhimento, cuidado e educação independentes das necessidades parentais.
Considera-se que as crianças e adolescentes são cidadãos. O que conhecemos de suas
demandas?
Propõe-se repensar estas ações: será que se chega à raiz dos problemas? Qual a
efetividade deste trabalho na transformação e melhoria da qualidade de vida e dos vínculos
relacionais e sociais destas famílias? O fato de, nas entrevistas, ter-se falado reiteradamente
que “a gente está chamando a família para assumir as suas responsabilidades” é
emblemático...
276
Mas qual é a condição objetiva e subjetiva de vida dessa família – econômica, cultural,
social – para que ela dê conta de assumir o que pressupõe ser seu papel e responsabilidade? A
Assistência Social vai dar conta de fazer a família assumir esse papel?
Ela está muito audaciosa, se ela pensar que vai dar conta, né? Tem que articular. E aí
vem o tão falado trabalho de rede, que é a questão da rede toda apoiar essa família, a
partir de cada particularidade que ela tem. (Entrevista 5 – Assistência)
Eu não vejo como a família como objeto não. Eu vejo a família como um campo de
atuação da Assistência. E o Técnico, com suas ferramentas... Eu falo invasão, ele vai
invadir aquela família, nós não somos chamados a entrar naquela família, nós somos
invasores daquela família. Nós vamos entrar, compreender a realidade daquela
família.... Porque tem até uma proposta “que metodologia usar para atender as
famílias”. Mas está em construção ainda. ... Pediram cada CRAS para apresentar... o
Técnico escrever qual metodologia ele usa nos seus atendimentos. Eu creio que é
para criar uma metodologia. Porque a forma que eu atendo aqui é diferente da forma
que o Bandeirinhas vai atender... Eu creio que uma linha... até por a gente lidar com
ser humano... Então assim, eu fico muito... é muito complicado para mim
compreender “vamos fazer uma metodologia para lidar com família”. Até porque o
trabalho é... O trabalho que eu vou desenvolver com uma família às vezes não vai
dar resultado com a outra... Eu estou lidando com ser humano, eu não estou lidando
com máquina. (Entrevista 5 – Assistência)
E a criança pequena ficava dentro só das creches. Então agora estão com o foco
voltado... porque agora, o 0 a 6 não é mais Assistência, agora é Educação Infantil.
Então, com as mudanças... quando eu estava até no Conselho Nacional começaram
as discussões e as transições, porque ainda estava aquela história “mas e essas
creches que são comunitárias e conveniadas, os recursos que vão da Assistência para
281
essas creches, como que vai fazer? Vai simplesmente chegar e cortar?” Na época,
nós enquanto Conselheiros, tivemos que brigar muito, porque a visão do pessoal era
“não, já que é Educação a Educação já tem uma previsão de recurso, de
investimento para a área... então, vocês da Educação têm dinheiro suficiente para
isso, e nós vamos simplesmente cortar da Assistência”. E aí foi na época que nós,
Conselheiros da sociedade civil, começamos a falar “olha gente, não é por aí, porque
se for por aí, vocês vão fechar as creches, e aí vai fazer como? E a Educação já tem
de imediato esse dinheiro no orçamento previsto para investir nisso?”, “não, então
vamos discutir um meio termo”... Uma transição “vamos criar uma fase de
transição”. Porque não tem como a Assistência “a partir de hoje acabou”, “a
Educação a partir de hoje assumir”. Não é por aí. Nós temos que construir: a
Assistência aos poucos vai passando para a Educação e a Educação aos poucos vai
assumindo, até chegar um ponto que a Educação Infantil fica toda realmente
Educação...
...E a Assistência vai utilizar esses recursos que ela utilizava especificamente com
creches dentro de programas que atende a criança pequena dentro da área da
Assistência Social, dentro dos CRAS, dentro dos CREAS – que é a nova estrutura da
Política Nacional de Assistência Social, que é o SUAS. Então eu acho que tem que
crescer. E está começando agora a crescer em Betim, com a implantação de 8
SEMAS hoje, dos CRAS, dos 2 CREAS... mas ainda tem muito o que fazer. Agora,
é claro que foi dado um bom pontapé, mas ainda estamos bem na fase inicial. Tanto
que o SUAS virou lei agora em julho, a Presidenta sancionou a lei do SUAS agora
em julho. (Entrevista 1 – Assistência)
Agora, quanto ao Criança Pequena, é diferente a forma da inclusão. Por quê? Ele
pressupõe de uma avaliação do Técnico, onde ele vai estar próximo da família, e ali
no dia a dia ele vai avaliar se aquela família precisa estreitar o laço com a criança.
Ela passa a vir participar daquela oficina que está acontecendo ali no momento, onde
a finalidade é a mãe sempre brincar com a criança, o Educador fica mais como um
facilitador do encontro... (Entrevista 9 – Assistência)
As crianças atendidas no serviço, elas podem estar na creche. Inclusive nós tivemos
aqui recentemente uma consultora do MDS que está desenvolvendo uma pesquisa
em relação à criança pequena para saber como está a situação da criança pequena,
disparidade entre os municípios, enfim e inclusive contribuir metodologicamente e
ela frisava muito isso: é bom que nós tenhamos claro que o serviço criança pequena
não é creche. Não tem essa função de acolher a criança principalmente durante toda
semana, principalmente no período em que a mãe não está ou ela não tem com quem
ficar. Se isso acontecer o município tem que encontrar uma creche, uma escola
infantil, enfim, um local onde ela possa estar, mas o objetivo do criança pequena é
fortalecer vínculos entre a criança e o seu responsável. Pode ser a mãe, uma
cuidadora ou até mesmo um cuidador... A proposta é que sempre que uma criança
esteja no serviço, o seu responsável também esteja. (Entrevista 9 – Assistência.
Grifo nosso)
Eu creio que uma das dificuldades nossa são as limitações também do nosso espaço
físico. O espaço físico não é um lugar de acolher. Igual, por exemplo, o Criança
Pequena: se a gente pegar um período de chuva, nós vamos ter que suspender a
atividade do Criança Pequena. (Entrevista 5 – Assistência)
Assim, nas observações feitas durante a pesquisa, várias indagações surgiram relativas
a este atendimento. Uma delas se refere aos espaços físicos e condições materiais, que em
alguns casos são bastante inadequadas. Outra é sobre a formação do profissional, que vai
mediar e acompanhar as famílias e crianças. Pelos objetivos propostos, entende-se que este
profissional tenha que ter uma formação capaz de lhe prover de ferramentas e conhecimentos
para lidar com vínculos e relações entre as mães, ou o cuidador responsável, com as crianças,
além de trabalhar atividades lúdicas e brincadeiras. Parece não ser este o perfil dos
profissionais que atuam diretamente nas ações do programa. Corre-se o risco de repetir um
dos erros muito comuns nas ações socioeducativas realizadas no âmbito da Assistência Social,
no Brasil. Nos programas para crianças pobres, é comum, para diminuir os custos, a
contratação de trabalhadores, na maioria mulheres, pouco qualificados para atuarem
diretamente com as crianças. É preciso atentar que, para trabalhar com crianças pequenas, os
profissionais precisam de formação prévia e continuada (em serviço), de boas condições de
trabalho.
Outra indagação se refere aos objetivos do serviço. A política deve visar antes de tudo
a própria criança, suas necessidades e demandas. Mesmo tendo que se adequar à situação das
famílias e de seu meio social, as ações para atendimento às crianças pequenas devem ter a
criança como objetivo central. A centralidade na criança vai desde o projeto arquitetônico, o
horário do atendimento até a definição do perfil dos profissionais.
Nesta tentativa de construir “nova ações” para atendimento às crianças pequenas na
Assistência Social, que objetivos são perseguidos? Fala-se na necessidade de educar os pais,
mais especificamente às mães para que fortaleçam seus vínculos com a criança, pautadas em
novos valores. Orientá-las para que melhor cuidem e eduquem seus filhos. Os técnicos
diagnosticam problemas na relação destas mães com seus filhos pequenos e as encaminham
para o serviço:
284
Será que nesta relação há um pressuposto de que o “técnico” sabe o que é bom para as
famílias pobres e para as crianças? Qual espaço e estratégias o programa dispõe para provocar
e estimular as enunciações de crianças e mães, e conhecer as suas necessidades, interesses e
demandas?
Em abril de 2012, eram atendidos 903 crianças e adolescentes, mas este número já foi
bem maior. Este atendimento, que antes era chamado de Socialização, se estruturou no
município, há mais tempo, para atendimento de crianças e adolescentes do Programa
285
Para que esta transição ocorra de forma a garantir o atendimento integral às crianças e
adolescentes, foi formada uma comissão com a participação de representantes de diversas
secretarias e setores que podem contribuir para a construção das metodologias do trabalho
socioeducativo.
É necessário pensar como as crianças e adolescentes atendidos na Assistência,
principalmente os que são encaminhadas pelo CREAS e que tiveram seus direitos violados,
estão sendo acompanhados e contemplados no Programa Escola da Gente. Uma questão que
surge é referente ao fato do programa acontecer apenas em algumas escolas municipais. Neste
caso, como fica o atendimento às crianças e adolescentes que estudam na rede estadual e que
demandam esta jornada ampliada, este espaço de socialização complementar à escola? Como
integrar e compatibilizar os objetivos do “Socialização Infantojuvenil” com o da escola em
tempo integral? Alguns entrevistados revelaram também dificuldades de adesão ao programa
“Escola da Gente”:
... E o que me preocupa é a questão do PETI, que deixou de ter. Agora, igual eu
falei, em relação à Escola da Gente, tem mães que não deixam os meninos irem para
o Escola da Gente por não ser na escola. Aí a gente fica com medo desses meninos
voltarem... Voltarem ao trabalho ou irem para o trabalho, aqueles que nunca foram
também. (Entrevista 6 – Assistência)
Também tem sido apontado que a faixa etária é extensa e os interesses das crianças e
adolescentes se diferem. Até os 12 anos, percebe-se que a metodologia e as atividades
propostas se coadunam com as necessidades e desejos dos meninos atendidos. A partir dessa
287
Social, localizando-se na Proteção Social Básica, que nos informou sobre o número de vagas
e de adolescentes atendidos:
O Projovem Adolescente, você deve já ter ouvido dizer, é uma espécie de evolução
do Agente Jovem, do Juventude Cidadã, que eram outros programas voltados para a
juventude e que tinham bolsa. O Agente Jovem tinha a bolsa parece que de 62 reais
ou 65 reais e o Juventude Cidadã, 100 reais. O Ministério do Desenvolvimento
Social resolveu então reformular todos os Serviços, tratando por faixa etária. Então o
Projovem Adolescente, que é de 15 a 17 anos e 11 meses, esse não tem bolsa e tem
uma metodologia mais focada no fortalecimento dos vínculos familiares e
comunitários e um foco no retorno para a escola ou na melhoria da qualidade da
frequência escolar. De 18 a 29 ele entra com profissionalização, que é o Projovem
Urbano... profissionalização e também essa questão da participação social cidadã.
No caso do Urbano tem uma bolsa de 100 reais, mas no Projovem Adolescente não.
(Entrevista 3 – Assistência)
Eu acho que são meninos com muitos (com ênfase) problemas mesmo, problemas
familiares, de família mesmo, a questão do envolvimento às vezes com drogas, com
álcool... Às vezes eles não com álcool, mas a família, o pai... Só que aqui tem uma
289
especificidade que esses meninos aqui já estão acostumados com projetos sociais,
então eles já procuram isso para fazer... Eu acho que é as drogas e a questão do
vínculo familiar mesmo. Muitos – não a maioria – mas muitas crianças e muitos
adolescentes perdem a questão da referência familiar... Eu acho que acontece por
causa da vulnerabilidade mesmo da família em relação mais à questão do trabalho.
Aqui a gente vê muita gente que não trabalha... Muitas famílias que não trabalham,
muitos pais e mães que não trabalham. Eu acho que falta oportunidade ou até
mesmo... Motivação. (Entrevista 6 – Assistência)
Tem alguns que estão em 7ª série, 8ª série, mas a maioria é 1º ano e 2º ano... Ah,
num grupo de 43, nós temos uma média de 10... Que não estão na escola. Que
deveriam estar [saem da escola]. Olha, pela questão da violência aqui é muito
marcante. Aí eu não posso frequentar... o território, onde determinada pessoa não
pode passar para a outra, porque fica como uma falta de respeito. Então, se a escola
está localizada do outro lado da linha, eles não vão. Aí tem toda a questão de
conseguir a escola no centro de Betim... Para garantir a frequência desse adolescente
lá no centro. Esse é um outro desafio também, o transporte e essa reinclusão do
adolescente, quando aqui ele já não pode frequentar mais. Ele tem o desejo de voltar
e às vezes essa questão „ah, lá pertence a fulano, eu não posso ir‟. Às vezes até
usuários mesmo... (Entrevista 5 – Assistência)
São recursos do Federal e do Municipal... Não é per capita. .. o Governo Federal tem
um sistema – e isso para nós está sendo interessante, isso tem sido penoso, mas eu
acho que é importante, pelo rigor da utilização da verba pública – você tem os
mínimos. Então, o Governo Federal repassa um valor para um Coletivo de no
mínimo 15 jovens. Percebe que a meta é de 25 a 30, preferencialmente 25... essa é a
meta que o Governo Federal trabalha. Mas para ele repassar o recurso tem que ter no
mínimo 15 jovens naquele Coletivo. Então, não chega a ser per capita, porque se cai
se 15, até 7 jovens, ele manda três quartos do valor; se tiver menos de 7, ele não
manda. E essa frequência é acompanhada mensalmente. Então nós temos o desafio
muito grande de estabelecer os Coletivos, isso não é tarefa fácil. Agora, o recurso
que o Governo Federal repassa, em relação ao que o Município de Betim investe, eu
diria que talvez o Município ainda invista mais 2 vezes o valor do recurso Federal.
(Entrevista 3 – Assistência)
Foi destacado que os adolescentes gostam muito dos passeios, das visitas monitoradas,
principalmente quando tem piscina:
[...] Já foi para Ouro Preto. Às vezes a gente vai também para algum clube, o Clube do
Servidor nós já fomos. Agora em julho fomos para Lagos do Jordão, Igarapé... O que
os meninos mais gostam é o passeio de piscina... Piscina para eles é tudo. (Entrevista
6– Assistência)
uma parceria é algo que nós precisamos avançar – uma parceria com a FUNARBE,
que a gente sabe que está nessa linha artístico-cultural – para que a gente possa então
ofertar mais profissionais... Não temos ainda feito parceria com a FUNARBE,
precisamos avançar nisso... (Entrevista 9 – Assistência)
A gente está trabalhando agora meio ambiente. Está vindo um pessoal da Secretaria
do Meio Ambiente, eles vieram, deram palestra, aí vai vim fazer uma oficina de papel
reciclado. (Entrevista 7 – Assistência)
Embora a ideia de trabalho em rede esteja muito presente nas falas e entrevistas
realizadas neste Diagnóstico, percebe-se que é um grande desafio a integração das ações, a
leitura mais totalizante da realidade das regiões e das famílias a serem atendidas e a
construção de uma relação de complementaridade entre as políticas. Ainda se enfrentam
resistências institucionais, culturais e até corporativistas, que dificultam a integração das
ações e reproduzem estruturas fragmentadas, muitas vezes concorrentes: recursos estanques,
ações pontuais e desconexas, ausência de sinergia na ação estatal...
O trabalho em rede é uma modalidade nova de trabalho. E nós não sabemos como
fazer essa rede funcionar. A gente mesmo fala assim „ah, o menino do CRAS
Teresópolis‟, „o menino do Árvore da Vida‟, „o menino do Frei Estanislau‟... E às
vezes é o mesmo menino, esse menino é um menino do território e está sendo
acompanhado por várias ações... não estão integradas. (Entrevista 5 – Assistência)
A gente precisa ter espaços, não só para conversar, mas espaço para articular e todo
mundo conhecer essa rede, e as dificuldades e o quê que cada um tem a oferecer
também, para poder articular isso aí. Tanto para quem está no Governo, vamos dizer
assim, do ponto de vista do Estado mesmo, essa coisa oficial, como as outras
entidades que estão aí também desenvolvendo ações. (Entrevista 9 – Assistência)
reais.”(para trabalhar com dois núcleos) ...Na Cultura é Ensino Médio, mas com a
especificidade naquele tipo de arte que a gente está buscando. Então, por exemplo,
alguém que tem experiência em artes cênicas, não necessariamente ela precisa ter
formação, enfim... ou artesanato. E que é mais difícil inclusive até para encontrar.
(Entrevista 3 – Assistência)
Um grande problema relativo à equipe de profissionais, que também está presente nas
ações para os outros ciclos de vida e nos serviços da Proteção Básica e da Proteção Especial, é
a descontinuidade dos contratos:
Tem uma outra questão também que eu não sei se interessa que é a rotatividade de
profissionais. Não sei se nós podemos tratar. A descontinuidade dos contratos. Isso é
muito frequente e aparece como um problema... Nesse momento nós passamos por
essa dificuldade. Nós estamos em um momento de renovação de convênio e ele não
é apenas garantir os insumos do serviço como material, lanche, mas tudo para o
serviço... Por exemplo, a técnica que você encontrou lá no CRAS é uma técnica
referência que você entrevistou e que tem toda uma bagagem de prestação de
serviço, mas se você for lá hoje, você não vai encontrá-la em função exatamente
dessas renovações e dessa rotatividade... Você identifica um profissional com um
perfil, faz um investimento e começa a trabalhar com ele com formação, etc., mas de
tempos em tempos isso acaba... Porque ele precisa. Olha em determinada data vai
ter renovação de convênio e eu não sei exatamente se esse convênio vai ser
renovado antecipadamente, se vai ter algum buraco e eu vou ficar descoberto e eles
acabam, às vezes, optando por outra oportunidade e tem que começar tudo de novo
com outro profissional. Isso é impactante. Quais as alternativas? O concurso
público? Tem já profissionais efetivos? Seria uma garantia de renovação de
convênios por antecipação? (Entrevista 9 – Assistência)
Eu acho que esses programas estão ótimos. Criança Pequena, Socialização, Escola
da Gente, PROJOVEM, tem Grupo de Idosos, tem o Fica Vivo, tem muita coisa... Só
que falta é organização desses programas. Começando da questão contratual:
contrata funcionário por 6 meses e depois não faz o plano de trabalho, não tem
continuidade no plano de trabalho, pára tudo... Aí tem que começar tudo de novo...
Falta continuidade e organização do Serviço. (Entrevista 6 – Assistência)
Espaço físico não é o ideal. Inclusive o MDS tem uma diretriz do tamanho da sala,
tem que ter uma placa do Projovem em cada unidade, tem que ter filmadora, tem que
ter uma série de recursos assim muito bacanas. Nós temos avançado, mas ainda não
estamos dentro do ideal. Do ponto de vista do espaço do CRAS, nós temos poucos
CRAS, talvez uns 3 CRAS, que de fato atenda aos critérios do espaço para o
desenvolvimento das atividades. E também há essa orientação, que eu acho
interessante, do ponto de vista mesmo da metodologia, é localizar outro espaço
naquele território onde as atividades possam acontecer. (Entrevista 3 – Assistência)
293
Há entrada e saída dos jovens no decorrer do processo... O ideal é que isso não
aconteça. espera-se que nós consigamos concluir o ano com o maior número de
jovens participantes e que esses jovens iniciem o ano que vem e passem pelo ano
que vem o ano todo. A proposta é essa: que ele entre no início do 1º e conclua no 2º.
O que nós temos visto que essa realidade é uma realidade muito difícil e que a
entrada e a saída, o turno aí dos meninos é muito grande. E aí várias questões são
colocadas para nós „ah, é o serviço que não é atrativo?‟, „o quê que nós precisamos
fazer para de fato motivar, segurar e fazer com que esses adolescentes participem?...
E aí... Mexe com a metodologia, porque você tem que estar recriando o tempo todo.
Do ponto de vista também do financiamento não tem sido fácil. Então nós temos,
por exemplo, agora no final do 1º semestre, alguns Coletivos que perderam recurso.
(Entrevista 3 – Assistência)
A questão do benefício, eu acho que isso foi uma perda grande em relação ao Agente
Jovem que existia. O Agente Jovem tinha a bolsa e o Projovem já não tem. Aí eles
visam a questão de querer participar e tal, só que às vezes a gente perde eles para o
trabalho mesmo, e às vezes para o trabalho informa... O ilegal, que não é bacana. E
como que a gente segura o menino de 17 anos, que arrumou um bico, sendo que aqui
financeiramente eles não ganham nada. É impossível. Nessa idade é impossível
segurá-los. (Entrevista 7 – Assistência)
Olha, eu acho que é claro que nós temos problema na oferta com mais qualidade e
de dar uma atividade socioeducativa eu acho que nós temos um problema, nós em
Betim, mas no Brasil também. Qualidade da oferta e o que o adolescente está
querendo. Claro que não dá pra gente ofertar uma coisa mais individualizada, tem
que ser mais coletivo, mas minimamente uma leitura do desejo desses meninos, do
que eles querem, nós temos que fazer. E isso é meio engessado a forma que vem
o recurso, os valores. Ou a gente ainda está também engessado e tem isso
também. (Entrevista– Assistência. Grifo nosso)
Agora, acaba que está confirmando os prognósticos, que foram feitos em 2005
quando mudou o serviço quando foi lançado o Plano Nacional da Juventude em
2005... Os estudiosos dessa área fizeram várias ponderações sobre esta política,como
a retirada da bolsa eu acho que está confirmando que a retirada da bolsa foi uma
perda grande. Eu fico vendo, por exemplo, os jovens. Os desejos, as coisas, os
294
jovens da classe média com os jovens de outras classes não tem muita diferença no
que eles querem. Deixá-los escolher o que querem fazer: eu quero fazer música, eu
quero fazer computador, essa juventude é louca com computador. São crianças e
adolescentes. Então a nossa oferta é muito aquém de escutar e ouvir esses desejos...
Para que nós possamos entender o que a juventude está demandando... Mas nós
não damos conta da nossa juventude dentro de casa? Eles não podem escolher? Por
que esses não podem? Eu quero fazer um curso disso, eu quero daquilo, eu quero
fazer um curso profissionalizante aqui os de 16, mas a ideia é poder juntar. Tem no
Plano Nacional da Juventude, o Projovem Adolescente, o Projovem Trabalhador...
Porque o Urbano é para quem não completou o ensino fundamental...e prepara para
o mundo do trabalho e depois entra para o Projovem Trabalhador que é aí a
qualificação,isto não funcionou. A lógica não foi essa. Porque o jovem não é igual a
gente que pensa hoje eu faço isso, amanhã eu faço aquilo aí daria, mas ele quer tudo
junto e misturado... Ele quer participar do socialização, porque ele quer ficar ali, ele
quer qualificar, ele quer receber, quer trabalhar, entendeu?(grifos nosso) (Entrevista
9 – Assistência. Grifo nosso)
Esta fala sobre a demanda dos adolescentes pela qualificação e primeiro emprego foi
repetida em várias entrevistas:
uma demanda que os jovens cobram muito, pedem muito a gente, é questão de um
estágio e um primeiro emprego. É o que a gente mais ouve da juventude, é pedir um
estágio. Então a gente às vezes tenta indicar. A gente tem essa deficiência. Então eu
acho que está precisando que a gente tenha também essa questão de... o Menor
Aprendiz sempre está atendendo, mas a demanda é muito grande, muito grande, e não
tem como encaixar esses jovens. (Entrevista 12 - Assistência)
temos com o tráfico. O tráfico, numa semana o menino, o adolescente tira... quanto?
Muito e muito dinheiro. Só que não vê as consequências, não quer saber as
consequências que vai ter. Às vezes até percebe, mas pensa „opa, mas eu quero
ajudar‟, quer ajudar a família, „ah, eu quero ajudar de qualquer jeito e não tenho
oportunidade, eu não sei fazer isso, eu não sei fazer aquilo, pede experiência‟. E aí „o
quê que eu vou fazer?‟. E aí essa luta é desigual. (Entrevista 7 – Assistência. Grifo
nosso)
É. Porque... eu acho que nem precisa eles colocarem. Eles colocam, mas a gente tem
que ter essa percepção também, porque até nós quando fomos adolescentes tinha a
questão de estudar, mas se você não tiver uma base legal, estruturada, uma base até
com condição financeira para bancar isso, você... e o público que nós atendemos é um
público completamente contrário a isso, um público que é de família desestruturada,
não tem às vezes saneamento em casa, então é um público que necessita mesmo disso.
Às vezes o pai não trabalha ou faz um bico, ou tem um alcoólatra em casa, ou a
menina sofreu um abuso sexual... Então são muitas questões. Porque senão a gente vai
perder... (Entrevista 7 - Assistência)
Alguns entrevistados interpretam que esta demanda é mais colocada pelas famílias e,
às vezes, pelos adultos que trabalham com estes adolescentes do que pelos próprios jovens;
Porque se nós formos observar as famílias têm que ouvir isso. A demanda por
qualificação e inclusão no mercado de trabalho é muito mais para a família conseguir
se manter. Meu filho tem 15 anos e antes mesmo dos 15 anos ele tem condições de
trabalhar, ganhar um dinheiro e ajudar a família a se manter. Nós vamos atender. Nós
vamos de fato para começar, de fato preparar para o mercado de trabalho com
qualificação profissional a partir dos 15, mas será que isso vai ser suficiente ou será
que daqui um tempo nós teremos que fazer isso na medida em que eles tiverem 12, 13
anos? Porque a demanda é muito mais por: esse menino precisa ganhar um dinheiro
para ajudar essa família a se sustentar... É. A realidade dele é essa. (Entrevista 9 -
Assistência)
Essa que é a atividade socioeducativa que eu acho importante: não é para ajudar em
casa, mas porque eu sou um cidadão e o trabalho é importante para minha auto
realização, mas o mundo está aberto. Quantas possibilidades! Fazê-lo perceber esse
mundo maior a não ser receber aquele dinheiro. Aí que eu acho que é conciliar essa
formação cidadã com esse projeto de qualificação numa conscientização da
sociedade... A coisa não é só: vamos arrumar um emprego pra você, pra você começar
296
a ter uma remuneração, mas nós vamos contribuir para que, de alguma forma, você
tenha uma preparação e tenha algumas ferramentas para competir no mercado, mas
nós temos que dar conta disso. A proposta é essa: fazer a inclusão digital e a formação
para o mercado de trabalho, mas uma formação mais ampla. Como que faz um
currículo? O que é importante para você conhecer do mercado de trabalho? O que ele
tem demandado? Então esse ano a preparação é para isso. E as possibilidades. Abrir as
possibilidades, tem o Sistema S que tem cursos e existem N outras possibilidades
(Entrevista 3 - Assistência)
O quê que seria o mundo do trabalho? ... situar esses jovens, propiciar a esses jovens
um espaço de discussão, onde eles possam conhecer o funcionamento do mercado
do trabalho, as necessidades de se preparar – por exemplo, fazer um Ensino
Fundamental, fazer um Ensino Médio, saber que profissão que quer ter no futuro.
Então, esse é um lugar – esse período de idade onde o PROJOVEM se propõe a
trabalhar – é o lugar de fato para se trabalhar essas questões. E o que a gente percebe
é que mesmo que em alguns momentos tenha a demanda – os próprios adolescentes
acabam trazendo isso também, porque eles são pressionados – mas nós temos
conseguido caminhar no sentido de sensibilizar a comunidade betinense da
importância deles terem essa preparação. Agora, claro que o PROJOVEM não fica
alheio à questão da profissionalização. À medida que determinados adolescentes,
jovens, vão avançando, tanto na idade como no amadurecimento, então, através do
CRAS e da Rede Social, procura-se identificar possibilidades de curso, às vezes até
de ingresso a emprego e ofertar para esses que de uma certa forma já estão atingindo
esse ponto. Então, nós tivemos recentemente, por exemplo, alguns adolescentes que
ingressaram na Fiat já para trabalho, que foi através do CRAS. Alguns projetos,
como o projeto Travessia, alunos que participaram de seleção. Tem outros projetos
mais ligados à qualificação no Município – Oficina Escola, por exemplo – que em
algum momento, ali no convívio com os profissionais do CRAS, diante da
possibilidade, eles então encaminham. (Entrevista 3 - Assistência)
vale, lanche. E não é só para adolescentes de 15 a 18 não, mas abriu para essa faixa
etária. Sempre se discutiu a profissionalização dessa faixa etária e agora chegou.
Vamos ver a resposta que eles vão dar. Agora não é pelo PRONATEC, mas eu achei
uma iniciativa muito interessante, foi o CREAS com os meninos que cumprem
medidas, com uma turma de 11 meninos de mecatrônica também. Um curso difícil,
300 horas e os que estão em acompanhamento conseguiram formar. Eram 20.
Nove(9) não deram conta e saíram e eles vão entrar novamente em uma turma agora
e os outros formaram. A formatura foi maravilhosa e aqueles meninos que ninguém
dava mais nada pra eles e até terno eles alugaram, as famílias foram e durante a
formatura. O coordenador daqui disse que não havia entendido o significado daquela
turma, somente naquele momento que ele entendia a importância daquele momento.
E lá eles anunciaram que 2 alunos da turma já estavam empregados ... É uma área
que é nova pra nós e os adolescentes estarem entrando nessa área da
profissionalização. A gente sempre trabalhou muito na socialização. (Entrevista
– Assistência. Grifo nosso)
Mas tudo isso foi uma demanda deles mesmos. Necessidade de trabalhar de ajudar
em casa. Então eles ficavam um pouco fora do projeto e não era isso que a gente
queria. Eles queriam dar um jeito na vida deles. Só que a gente acha importante
casar medidas socioeducativas com a profissionalização, porque não é entrar numa
indústria que vai resolver o problema. O Projovem Adolescente por orientação
conceitual e metodológica ele tem essa preocupação de abrir o campo, mas não
qualificar, e a demanda é uma demanda das famílias e dos adolescentes para a
qualificação que é algo que a gente discute. Quer dizer, tem momentos que a gente
encontra posições mais favoráveis a não correr com essa coisa da qualificação e a
gente conversa, por exemplo, com o SINE que é o pessoal que está mais ligado à
essas vagas, do primeiro emprego, ao mercado de trabalho para dar um retorno pra
gente que de uma certa forma, ratifica com essa posição de não preocupar em
afoitamente qualificar, mas por exemplo, trabalhar com esses jovens para que eles
possam construir um projeto de vida. Inclusive projeto de vida com vistas à
profissionalização. De profissionais que trabalham trazem isso; não adianta querer
qualificar esses jovens sendo que eles não têm uma certa base e não sabem por onde
eles querem caminhar. Não têm o Ensino Fundamental ou o próprio Ensino Médio,
então não é só qualificar só para oferecer mão de obra barata para o mercado de
trabalho, mas poder ajudar e fazê-lo saber que ele precisa de uma formação mínima,
para trilhar determinadas carreiras ele terá que ter determinadas aptidões. O SINE
que trabalha mais com essa questão das vagas e do encaminhamento, nos dá muito
esse retorno... Então tem essa demanda, ela é gritante, mas nós temos que ouvi-
la e promover uma certa discussão. (Entrevista 9 – Assistência. Grifo nosso)
Foi muito mencionado nas entrevistas no decorrer da pesquisa que, para a faixa etária
a partir dos 15 anos, há um grande “buraco” na rede de atendimento, ou seja, existem poucos
projetos e programas para atender a este público, considerado bastante vulnerável e em
situação de risco pessoal e social. Destaca-se que, mesmo com a redução relativa da
participação dos jovens no total da população de Betim na última década, segundo resultados
de Censo de 2010 (IBGE), 108.011 pessoas estão na faixa etária de 15 a 29 anos, o que
corresponde a 28,57% do total da população.22
O Árvore da Vida não chega a pegar nenhum adolescente de 15 a 17, o público deles
são criança e adolescente de 12 a 15 anos. E a questão do 15 anos aos 17 já tem toda
essa questão do mundo profissional, da qualificação, de conquistar independência
financeira... Tem o Escola da Gente, vem para atender o público da Socialização, de
7 a 14 anos. Então, esse público de 15 a 18 está mais descoberto... (Entrevista 5 -
Assistência)
...mas tem uma preocupação com essa faixa etária acima dos 15, acima dos 16 anos,
porque ainda não tem um foco específico de atuação para essa faixa etária... A
população carcerária em Betim hoje... 80% dela está na faixa etária de 18 a 25 anos
de idade... Ainda falta na cidade investimento em qualificação profissional. Nós
temos um investimento baixíssimo na qualificação profissional. Hoje tem apenas 1
unidade do SENAI... E tem também o problema da evasão escolar. Às vezes, ele vai
evadir da escola sem ter concluído o Ensino Médio e esse é o público que o Poder
Público tem que ter política pública mais... Atenciosa e mais focada para esse
público. (Entrevista 8 - Assistência).
Aqui é importante ponderar que, apesar dessa percepção, os dois programas (Projovem
adolescente e urbano) ofertados no município para este público têm vagas sobrando e
dificuldades de preenchê-las. Recomenda-se aqui uma reflexão mais aprofundada não só para
formulação da política da assistência, mas de outras áreas sociais, sobre o perfil, os interesses
e as necessidades e demandas desses jovens.
Nós atendemos todas as crianças e adolescentes que vivenciam ou têm algum tipo de
violação de direitos. Então, hoje, todas que chegam, independente da violação, em
se tratando de criança e adolescente, pode ser violência sexual, exploração sexual,
abuso, negligência, maus-tratos, elas são acompanhadas, atendidas e acompanhadas
no PAEFI, que é o Serviço de Proteção e Atendimento Especializado às Famílias e
ao Indivíduo...
299
Então, dentro da Proteção Social Especial nós temos esses serviços de média
complexidade, que eu citei, que é o PAEFI, Medidas Socioeducativas e temos
também, a Abordagem Social que é um trabalho de busca ativa que é feito nas ruas e
que podem ser também identificados crianças e adolescentes em algum tipo de
vivência de trabalho infantil ou outra violação de direitos. (Entrevista 2 -
Assistência)
Nós trabalhamos de uma forma unificada. Então, a demanda que chega para a gente
através do Conselho Tutelar, na Rede de modo geral, ou no próprio plantão..., e se
for, por exemplo, criança e adolescente com alguma violência, que não sejam
encaminhadas de medidas socioeducativas, ela vai ser direcionada para o PAEFI,
que é um serviço que nós temos, mas o que direciona a equipe técnica de
atendimento é a regional... Nós não temos equipes separadas: um atende idoso, outro
atende medida socioeducativa, outro atende PAEFI... (Entrevista 2 - Assistência)
Cada técnico atende em média 20 famílias. E a média de tempo das famílias no serviço
tem sido de seis meses. Mas acontecem casos de atendimento que duram mais de um ano.
O trabalho da Proteção Social Especial precisa ser bem articulado com a Rede de
atendimento que, em geral, encaminha as demandas:
A gente tem que estar sempre articulado com o Conselho Tutelar. Os casos que
chegam de média complexidade, na maioria são encaminhados pelo Conselho
Tutelar, pelos serviços de garantia de direitos, de modo geral, e também pela rede da
saúde, educação ou os atendimentos no plantão, a própria família procura, ou outro
que venha anonimamente dizer que tem um vizinho, que está violando os direitos da
criança... (Entrevista 10 - Assistência).
A gente entende que para o acompanhamento do CREAS tem que ter sido aplicada a
medida protetiva, que é aquela aplicada pelo Conselho Tutelar, ou seja, tem que ter
sido identificada a violação de direito que o CREAS atende. (Entrevista 10 -
Assistência).
E isso tem uma representação muito forte para o acompanhamento, porque é nisso
que a gente também pega para dizer para a família „olha, existe uma situação, nós
temos que trabalhar essa situação‟... É claro que as medidas têm um nível de
graduação lá no Estatuto, mas ela é de responsabilização. Então, se a família não a
cumpre, não é só o fato de não vir, mas continua violando o direito do seu filho, tem
uma consequência.. (Entrevista 10 - Assistência).
Quando o Conselho nos encaminha, já fica a medida protetiva, aí, a gente vai
direcionar aquele caso para o atendimento conforme a regional que aquela criança
ou adolescente mora, as nossas equipes que atendem, são divididas por regionais,
tem regional que tem três técnicas, outras tem quatro ou mais, depende mesmo da
população e da demanda daquela regional. Então, o Conselho Tutelar nos
encaminhou, nós vamos acolher aquela criança ou adolescente com o responsável, e
ali é traçado um plano de atendimento para aquela família, conforme aquele caso,
conforme aquela demanda. O Conselho Tutelar vai ser informado que aquele caso
foi acolhido aqui e que iniciou o atendimento... Havendo, no caso da violação de
301
direitos, o caso foi acompanhado, superou aquela violação de direitos que deu
origem ao acompanhamento, ele será contrarreferenciado lá na Proteção Social
Básica, no CRAS ou em um projeto social que está mais próximo da residência.
(Entrevista 2 - Assistência)
Tem aumentado muito, por exemplo, o número de denúncias. Eu acho que esse
também foi um grande avanço. Hoje existe o Disque 100, o 0800 31 11 19 da
Secretaria de Direitos Humanos, eu acho que foi um avanço... Porque haviam
situações que ficavam ali no seio da família, aquilo ficava ali, ninguém dava notícia.
23
A prefeita Maria do Carmo Lara foi premiada no dia 27/06/2012, com o Selo “Prefeito Amigo da Criança”, na
categoria Reconhecimento Pleno, pela Fundação Abrinq – Save the Children, por direcionar políticas públicas
eficientes com o objetivo de melhorar a vida de crianças e adolescentes de Betim nestes quatro anos de governo.
Os critérios estabelecidos para conquista do prêmio deste ano estão baseados nos seguintes eixos: promovendo
vidas saudáveis, acesso à educação de qualidade; proteção contra maus-tratos, exploração e violência; criação e
fortalecimento dos conselhos de direito, setoriais e tutelares.A administração municipal concorreu com outros
1.583 municípios ao prêmio. Betim foi escolhida como uma das 182 cidades brasileiras que mais investiram na
melhoria das condições de vida da população infantil e adolescente, no decorrer da gestão 2009-2012.
304
E hoje, com o Disque 100 e a Secretaria de Direitos Humanos, em que a pessoa pode
fazer a denúncia e não precisa se identificar, chega-se muita demanda. (Entrevista
com Conselheiro Tutelar)
Tem divergências de registro também, às vezes você tem um registro num lugar – se
você pegar uma adolescente, no caso de medida socioeducativa – o Judiciário vai te
dar um dado a Polícia vai te dar outro, o Ministério Público vai te dar outro e o
próprio CREAS vai te dar ou dado, então há essas divergências mesmo (Entrevista 2
- Assistência).
Foi destacado que o trabalho com crianças, adolescentes e suas famílias na Proteção
Social Especial/CREAS depende muito da articulação da Rede de atendimento e da
integração com outros órgãos e setores da política pública:
A gente tem que trabalhar com articulação o tempo todo. A articulação é importante
em qualquer lugar que você esteja trabalhando, na Assistência Social e na Saúde,
mas na Proteção Social Especial ela é muito mais estreita, nosso trabalho, tanto dos
acolhimentos, dos encaminhamentos, a gente tem sempre que estar discutindo com a
Rede... É um encaminhamento só, mas é um encaminhamento que depende de toda
uma rede articulada integrada e comprometida com o caso para que ele flua bem e
que a gente tenha um resultado satisfatório. (Entrevista 2 - Assistência)
Ainda é um grande desafio fazer com todos os profissionais que trabalham na Rede
conheçam o fluxo dos serviços, saibam como agir e para onde encaminhar os casos de
violação de direitos como maus-tratos, violência doméstica, abuso sexual por exemplo. Uma
das razões para que isto ocorra é a alta rotatividade de profissionais:
O desafio maior é fazer com que ela tenha sustentação, de que todas essas pessoas
que estão trabalhando, conheçam de fato esses serviços. Por que isso é um desafio?
Porque a gente conta com a alta rotatividade dos profissionais, principalmente,
dentro da própria Assistência Social, que a gente tem aí, mais de 70% contratados,
então é pouco o número de efetivos, e quando há o rompimento do trabalho, de
vínculo, que pode ser de um ou de outro, e o que é mais grave, às vezes acontece de
vários de uma vez só, então ali já fica complicado, já fica esfacelado . (Entrevista 2 -
Assistência)
Os furos na rede, eu vejo muito pela falta dos profissionais serem efetivos. São
muitos contratados, A alienação de cada um não saber realmente o papel de cada
um... O menino vai esperar ter um profissional para ser contratado... Muito contrato.
A gente precisa que isso seja prolongado, seja por concurso ou faça uns contratos
maiores. Eu não sei o quê que a Prefeitura ou o Município vai fazer, mas tem que
sanar isso. Não dá para que a criança e o adolescente fiquem esperando atendimento
psicológico, social, acompanhamento social, por falta de profissional. (Entrevista
com Conselheira Tutelar).
E nós contamos com isso também, nas outras secretarias, no próprio Município, a
Saúde ainda tem um quadro de efetivos grande, mas a Saúde ainda tem um
problema, porque têm profissionais que não conhecem o fluxo, de, por exemplo,
de uma criança ou adolescente que sofreu maus-tratos, com a relação à
violência sexual,... Não sabem como encaminhar. Educação também ainda tem
muita dificuldade, às vezes consegue identificar um caso de violência, e se for
violência sexual eles temem, às vezes, encaminhar o caso para a gente, ou para o
Conselho Tutelar, ou para a Promotoria, porque eles consideram que estão dentro de
um território, então eles têm dificuldade, ficam com medo de sofrer alguma
represália, de quem violou o direito ou da própria família que tenta esconder o fato.
Então, tudo isso se constitui em nós, nós dessa Rede, é alguém que encaminha e
não recebe retorno, é alguém que, às vezes, encaminha de uma forma errada e aquilo
não chega até aqui, pode encaminhar para o Conselho Tutelar, e o Conselho Tutelar
demora a chegar com o caso aqui e a gente tem que fazer essa discussão o tempo
todo nessa Rede, e quando você acha que está mais compreensível, mudou o
coordenador de algum lugar, que acha que pode mudar o fluxo das coisas, então o
fluxo, a gente tenta centralizá-lo, mas ele depende que essas pessoas que passam
por essa capacitação continuem no serviço, para dar garantias de que ele
aconteça a capacitação tem que ser contínua. (Entrevista 2 – Assistência. Grifo
nosso).
Não podemos tratar da Assistência Social somente nos casos, o caso diz disso, da
entrada no serviço, mas nós vamos juntando esses casos para a gente entender,
307
Identificada a violação de direitos, ela vem pra gente, e dentro da Proteção Social
Especial, nós ainda fazemos essa distinção, se ela vai ser acompanhada na média
complexidade ou se ela será acompanhada na alta complexidade, porque se houve
uma ruptura de vínculo ali, nós vamos encaminhar para a alta complexidade. Então,
aquela criança que estava lá sendo acompanhada, ou não, pela Proteção Social
Básica, o Conselho Tutelar identificou ali uma negligência, maus-tratos, alguma
situação que ele identificou, conversou com o técnico da alta complexidade, da
Proteção Especial, e foi avaliado que ela precisa ser encaminhada para um abrigo,
ela saiu da básica, passou direto para a alta sem ter passado pela média, porque o
caso era grave e precisava de uma proteção imediata e aí, então, é feito isso.
(Entrevista 10 - Assistência)
O ECA, em seu artigo 19, estabelece que crianças e adolescentes têm direito de ser
criados e educados no seio de suas famílias, e excepcionalmente em famílias substitutas,
assegurando-se o direito à convivência familiar e comunitária. Esta convivência é
fundamental para o desenvolvimento das crianças e adolescentes.
Um dos focos das políticas sociais é o apoio sociofamiliar, com a oferta de programas
e serviços para atendimento e promoção das famílias. Uma orientação importante do ECA é a
de superar a tradição existente no Brasil de enfrentamento a situações de vulnerabilidades
com a institucionalização, e buscar sempre resgatar e fortalecer os vínculos das crianças e
adolescentes com a família. O núcleo familiar é o lugar do cuidado e da proteção, entretanto é
também espaço de conflitos e muitas vezes de violência.
A violência contra crianças e adolescentes na família é um fenômeno complexo e que
se manifesta de diversas formas. Há casos em que as crianças e adolescentes estão expostos a
situações de alto risco e violação de direitos no ambiente familiar, que ameaçam sua vida e
integridade. Para atender a esses casos, em que a integridade e saúde da criança e adolescente
estejam ameaçadas e no qual é necessário o afastamento da família, é que se constituem os
espaços de acolhimento institucional. É importante destacar que o ECA prevê que quando a
separação da criança e do adolescente de sua família se torna necessária à sua proteção, é
preciso assegurar opções para o acolhimento, respeitando-se os princípios da
excepcionalidade e da provisoriedade.
Em 2008, o Conselho Nacional dos Direitos das Crianças e Adolescentes
(CONANDA) e o Conselho Nacional da Assistência Social (CNAS) regulamentaram e
publicaram as orientações técnicas para os serviços de acolhimento para crianças e
adolescentes, com vistas a estabelecer parâmetros de funcionamento e orientações
metodológicas, de acordo com os seguintes princípios:
309
Nós temos um convênio com a instituição, Ponto de Contato, e que ela executa todo
o serviço de acolhimento institucional para crianças e adolescentes do Município.
Os abrigos são divididos conforme a faixa etária e conforme o sexo, então nós temos
dois abrigos para adolescentes, um para adolescentes do sexo masculino e outro para
adolescentes do sexo feminino, nós temos três casas-lares, que diferencia do abrigo
no número de crianças e adolescentes, o abrigo atende até vinte e as casas-lares até
dez, nós temos uma casa de passagem que é de zero a dezoito anos, masculino e
feminino, para até vinte, crianças e adolescentes, e temos o programa Família
Acolhedora. (Entrevista 12 - Assistência. Grifo nosso)
trabalho com as famílias que são estimuladas a visitarem seus filhos, exceto nos casos de
impedimento determinado pelo juiz. A meta é resgatar os vínculos familiares e só depois de
esgotadas estas possibilidades é que se buscam alternativas, inicialmente a família extensa
(avós, tios e parentes próximos), e quando necessário as famílias substitutas e
encaminhamentos para adoção. A adoção depois dos 7, 8 anos se torna mais difícil.
Apesar de se trabalhar na perspectiva de que este acolhimento seja excepcional e
provisório, ainda há casos de crianças e adolescentes sem previsão de saída. “Outros já têm
uma medida, às vezes, de destituição do poder familiar, que eles vão ficar mais tempo lá”
(Entrevista 9 - Assistência). Quando eles permanecem até os 18 anos, que é o prazo limite, os
profissionais procuram construir com eles projetos de autonomia e independência.
A criação da Casa de Passagem se deu para atender casos que são identificados pelo
Conselho Tutelar de crianças e adolescentes que precisam de um acolhimento imediato, mas
nos quais foi avaliado que não vão ficar muito tempo sob acolhimento institucionalizado:
isso, de que o CREAS já conhece, já tem referência com essa família, assim que a
criança é abrigada, há uma discussão de caso – com o Abrigo, com o CREAS, com o
Judiciário – e nessa reunião nós vamos decidir quem que vai dar continuidade ao
acompanhamento. Se o CREAS acha que ainda é possível construir e aí fica-se no
CREAS, ou se o CREAS vai dizer assim „não, esgotou, aqui não dá mais‟, então
passa para a Referência Técnica da alta complexidade. Então os Técnicos do
Abrigos que vão trabalhar essa família naquele momento.
Porque a alta complexidade também é proteção especial e trabalha com famílias com
violação de direito, então lá tem as equipes técnicas. Então, acontece, muito comum,
de abrigar imediatamente, sem a família ainda ter sido atendida aqui no serviço.
Então, o CREAS não tem que entrar para a tentativa de rever essa violação de direito
para essa família dar conta de cuidar do seu filho. Então, quando a criança é retirada,
os Técnicos dos Abrigos acompanham essa criança, acompanham essa família, na
perspectiva de retornar. Aí o CREAS pode ser acionado ou não. Por que tem muitos
abrigamentos que às vezes foi tão imediata a situação, que pode inclusive voltar para
a família ou pode ir para a família extensa. (Entrevista 10 - Assistência)
Há uma bolsa auxílio que a família acolhedora recebe para custear as despesas da
criança ou do adolescente acolhido, e o valor desta bolsa em julho de 2011 era de R$ 540,00
por mês. As famílias interessadas fazem a inscrição e depois inicia-se um processo de seleção:
[...] a gente vai avaliar as expectativas, a motivação, o preparo dessa família para se
ofertar para o outro, a questão de valores, o que eles estão dispostos a oferecer para
essa criança ou adolescente que está chegando e que foi vítima de uma violência... e
a gente avalia também, essa expectativa em relação à bolsa auxílio, oferecer esse
recurso não pode ser condição para a pessoa estar interessada em ser incluída no
Família Acolhedora. Então a gente não costuma divulgar a bolsa auxílio não.
(Entrevista 11 - Assistência).
A Lei que veio alterar alguns artigos do ECA diz que o acolhimento familiar é
preferencial em relação ao acolhimento institucional:
Toda política de medida de proteção para a criança e adolescente vem dizendo que
em um ambiente familiar a gente garante muito mais os direitos da criança e
adolescente, oferece um ambiente próprio para um bom desenvolvimento em relação
ao colhimento institucional. Em Betim esse processo se iniciou em 2010,
implantando essa nova alternativa e aí a gente tem esse trabalho, que é uma quebra
de paradigma, uma mudança cultural em relação à política pública familiar versus
institucional. Então assim, a gente sabe que o processo é longo. (Entrevista 11 -
Assistência)
Avaliaram que grande parte destas crianças tinham referência familiar, eles tinham
família e não sabiam por que é que eles estavam nessas unidades, que essas unidades
eram instituições totais, como a FEBEM, aqui no estado de Minas Gerais, como foi
a FEBEM, que essas crianças eram institucionalizadas por um longo período e que
saíam de lá sem condições de viver socialmente, quer dizer, eles perdiam as
referências de convivência comunitária porque estavam dentro de instituições totais.
E aí, a partir dessas avaliações foi construída uma pesquisa do IPEA, que eles
fizeram a avaliação desse dado quantitativo e buscaram o qualitativo depois, eles
avaliaram, que a institucionalização de crianças e adolescentes como medida de
proteção não foi benéfica, não foi uma política benéfica. E aí, buscaram alternativas
para essa política de institucionalização. Uma das alternativas foi construir uma
política onde houvesse modalidade de unidade de atendimento institucional com a
capacidade menor de acolhimento, aonde tivesse poucas crianças, e ali cuidadores
capazes de cuidar melhor dessas crianças, e oferecendo a elas, todos os direitos,
314
Desafios:
1° - Trabalho em REDE articulação e integração das ações: clarear o papel de cada esfera do
governo e a relação com a rede socioassistencial.
315
Recomendações:
1° - A política de assistência, ao propor e executar suas estratégias de atendimento às
crianças, adolescentes e suas famílias tem o desafio de consolidar interfaces com outras
secretarias e órgãos públicos no planejamento, execução e avaliação das ações. E também de
construir de forma participativa as parcerias com a Rede socioassistencial não governamental.
Incrementar contatos e discussões com órgãos, instituições e sociedade de forma geral,
no sentido de consolidar e ampliar a política de atendimento às crianças e aos jovens.
Muitos programas e ações da assistência social são desenvolvidos de forma indireta
pelo poder público, que estabelece parcerias com instituições sociais. Várias entidades
compõem a Rede socioassistencial de Betim. É preciso regulamentar e fortalecer as
parcerias com as instituições sociais, além de desenvolver uma reflexão sobre este tema.
Para o planejamento e o desenvolvimento das ações e programas, ressalta-se a
necessidade de se considerar as diversidades e desigualdades nas várias regiões do
município, o que configura especificidades nas situações e condições das crianças,
adolescentes e suas famílias.
3° - Dotar o serviço de uma estrutura técnica e material condizente com a proposta educativa
dos serviços.
Isso significa espaços físicos arejados, amplos, bem iluminados, mobiliados e
equipados com qualidade. Os recursos materiais e didáticos devem ser variados e
adequados para realização das oficinas e dos projetos propostos.
Reafirma-se que o compromisso com a qualidade dos serviços prestados requer uma
política de financiamento consistentem, que garanta a superação do vício secular da
política social no Brasil, o de oferecer serviços e programas pobres para a parcela mais
pobre da população.
Estabelecer critérios de qualidade e indicadores para avaliação dos impactos das ações
socioassistenciais na trajetória de vida das crianças, dos jovens e de suas famílias.
ausência de políticas públicas é que estão por trás desse tipo de problema social. Os jovens,
nos dias atuais, participam da sociedade de muitas maneiras, e a lacuna de política pública os
afeta sobremaneira. Dentro desse contexto, percebe-se também que as estatísticas oficiais
apontam um perfil criminal cruel em nossa sociedade, pois são os jovens, negros e moradores
de periferia os mais afetados pela criminalidade.
Adorno (2002) diz que a violência urbana e a criminalidade são o resultado de um
processo de desigualdade social. A despeito de melhoras significativas em relação à
concentração de riqueza, a desigualdade permaneceu a mesma de quatro décadas. Dessa
forma, o autor aponta que os conflitos sociais tornaram-se mais graves e ainda que a
desigualdade de direitos e de acesso à justiça afetou de forma significativa a população:
“Neste contexto, a sociedade brasileira vem conhecendo crescimento das taxas de violência
nas suas mais distintas modalidades: crime comum, violência fatal conectada com o crime
organizado”. (ADORNO, 2002, p. 88 e 89)
De acordo com as discussões sobre a violência e a criminalidade, produzida por
Waiselfisz (2011) no Mapa da Violência no Brasil – 2011 – Os jovens do Brasil, percebe-se
que a violência tem aumentado e atingido as cidades de médio porte. O autor afirma que,
mesmo com as políticas públicas desenvolvidas desde 2003 pelo Governo Federal, os índices
permaneceram elevados. Além disso, os temores da população em relação à violência e a
insegurança pública também aumentaram em função de continuado noticiário nacional sobre
o problema. E ainda reforça que
“nossa preocupação cresce quando verificamos que essa violência continua a ter
como principal ator e vítima a nossa juventude. É nessa faixa etária, a dos jovens,
que duas em cada três mortes se originam numa violência, seja ela homicídio,
suicídio ou acidente de transporte” (WAISELFISZ, 2011, p. 5).
Betim/MG, Contagem/MG, Serra/ ES, Marabá/PA, Maceió/AL, entre outras. Além disso, e
apesar do arrefecimento do crescimento dos homicídios em algumas áreas metropolitanas, as
suas taxas são predominantemente mais elevadas do que as do interior, o que significa que o
risco presente nas áreas metropolitanas permanece alto e superior ao risco a que estão
expostos os moradores das cidades do interior. Nesse sentido, o problema pertinente à
violência letal em Betim relaciona-se, em alguma medida, à sua própria condição de
município metropolitano, integrante da RMBH.
Parte desse problema pode ser explicada pela chegada de novas modalidades de drogas
– como o crack, que junto com o tráfico de drogas, de forma geral, elevou os índices de
criminalidade nesses lugares (Sapori; Medeiros; Sena, 2010). Outros autores (Feffermann,
2006; Sales, 2007) apontam para o problema de ausência de perspectiva que envolve a
juventude. Se, de um lado, os jovens são associados à rebeldia, por outro, são associados ao
futuro do país, numa projeção da sociedade em relação à juventude. Por isso alguns jovens,
não toda a juventude, acabam por se ver envolvidos em atividades de cunho ilegal – comércio
de drogas, por exemplo –, o que torna seu cotidiano perigoso, quando atende a rebeldia
juvenil. Por outro lado isso os leva a não construírem laços sociais vigorosos que os tornem o
futuro do país, uma vez que o tráfico de drogas, associado à disputa de novos mercados e
territórios de drogas, leva os jovens à morte.
Dessa maneira, o mercado de drogas sugere que há espaços organizados nas cidades
que segregam e repetem uma lógica de exclusão social que perpetua as diferenças entre as
classes sociais. Parte daqueles que estão excluídos socialmente são moradores de periferias de
grandes centros urbanos brasileiros, como Rio de Janeiro, São Paulo e também na capital
mineira.
Dentro dessa perspectiva da exclusão, Sales (2007) indica que os laços familiares no
país tornaram-se fracos nos últimos 30 anos. Isso levou não apenas ao abandono da
solidariedade familiar, mas à redefinição de padrões de hierarquias e sociabilidade. A autora
expõe:
Há que se considerar que se tais transformações recaem sobre as famílias de modo
geral, a exigir uma adequação em termos de estratégias de organização domiciliar e,
sobretudo no que tange ao cuidado com os dependentes – crianças, idosos, doentes e
portadores de deficiência – pense-se nos recursos e energias que precisam mobilizar
os indivíduos pertencentes aos segmentos mais pauperizados. (SALES, 2007, p. 71)
no interior do país, que cresceu de forma consistente nos últimos anos, já que o aumento foi
de 38,6%, enquanto nas capitais a diminuição foi de 17,7%.
Apesar de a informação não conter dados sobre a faixa etária dos envolvidos em
homicídios, percebe-se que a evolução das taxas de homicídio revela uma consolidação da
mudança de padrão de homicídios no país. Reforça-se que os estudos sobre a violência
(PAIXÃO, 1983; ADORNO, 2002; ZALUAR; LEAL 2001, BEATO, 1998) apontam para um
perfil de vitimização de crimes e homicídios em que jovens não brancos e moradores de
regiões periféricas são os mais afetados pela violência.
Brasil 25,9 26,2 26,7 27,8 28,5 28,9 27,0 25,8 26,3 25,2 26,4 1,9
Capitais 45,3 44,6 45,8 46,5 45,5 46,1 42,4 38,5 38,7 36,6 37,3 -17,7
RM 49,1 49,5 48,9 49,3 48,9 49,1 44,9 40,7 39,9 36,6 37,0 -24,6
Interior 14,0 14,3 15,1 16,3 17,6 17,9 17,2 17,4 18,2 18,5 19,4 38,6
De modo geral, a literatura sobre esse fenômeno social aponta que as faixas etárias que
mais estão sujeitas à criminalidade tanto no aspecto de autor quanto de vítimas são aquelas
entre 15 e 24 anos de idade. Feffermann (2006) concorda que o problema dos homicídios de
jovens no Brasil é preocupante, uma vez que, em 2002, 39,9% das mortes de jovens era por
esse tipo de causa. Isso, segundo a autora, coloca o Brasil em quinto lugar no mundo em
relação a homicídios de jovens. Parte do problema se deve, segundo a autora, à falta de
escolaridade por parte da juventude e à não entrada no mercado formal de trabalho, que acaba
por criar uma marginalidade econômica e colocar em risco parte da juventude no país.
Também parte dessas mortes é causada pelo tráfico de drogas que atrai muitos jovens para
esse tipo de atividade. Uma vez inseridos no tráfico poucos terão reais chances de construírem
família ou relação de trabalho (SAPORI; SENA; SILVA, 2012).
320
Ao compararmos as taxas de homicídio por grupo de 100 mil hab. por faixa etária
percebe-se que o município de Betim, em relação à RMBH e Minas Gerais, entre os anos de
1996 a 2009, teve acréscimo em sua taxa.
Para que pudéssemos comparar as faixas etárias referentes a crianças e adolescentes,
estimou-se para as faixas etárias entre 0 e 14 anos de idade, de 15 a 19 anos, e por fim de 15 a
24 anos. As informações comparativas estão nos Gráficos 40, 41 e 42 abaixo.
Gráfico 38 - Taxa de Homicídio por grupo de 100 mil hab. faixa etária de 0 a 14 anos
Betim, Belo Horizonte, RMBH e Minas Gerais de 1996 a 2009
0
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009
Betim 1,2 1,1 0 0 1 2 2,8 4,5 4,4 3,2 3,1 0,8 4,2 3,3
Belo Horizonte 1,6 1,4 1,4 1,4 2 2,7 2,3 3,8 4,2 3,1 3,9 4,1 2,6 4
RMBH 1,6 1,5 1,2 0,9 2 2,4 2,7 3,3 3,8 3 3 3,4 2,8 3,3
MG 0,7 0,6 0,6 0,6 1 1 1,1 1,3 1,4 1,5 1,4 1,6 1,4 1,5
No tocante aos homicídios em faixas etárias24 mais baixas, como no caso entre 0 a 14
anos, percebe-se que as taxas mantiveram-se estáveis ao longo dos anos com queda no ano de
2008. Em relação ao estado de Minas Gerais, quando se observam as taxas a partir do ano de
1999 para o município de Betim, percebe-se aumento constante com um ligeiro declínio para
o ano de 2007. Mesmo que essa não seja uma faixa etária expressiva em relação aos
homicídios, destaca-se que as taxas de homicídio são altas, quando comparadas com as outras
regiões.
Seguindo as discussões de Waiselfisz (2011) em relação à violência no país, nota-se
que as taxas calculadas aumentaram nos últimos anos acima do aumento da população
revelando um problema social que merece destaque. Nesse sentido, mesmo que a faixa etária
seja pouco expressiva para revelar a violência infantil, a tendência de aumento permanece
24
Procurou-se agregar as idades das crianças e dos jovens tendo como o Instituto Brasileiro de Geografia e
estatística –IBGE.
321
presente. O autor aponta que é na faixa da minoridade legal que os homicídios cresceram
assustadoramente, vejamos: “É na faixa da minoridade legal, dos 14 aos 17 anos, que os
homicídios vêm crescendo em ritmo assustador, com pico nos 14 anos, onde os homicídios,
na década 1994/2004, cresceram 63,1%” (WAISELFISZ, 2011, p. 23).
Gráfico 39 – Taxa de Homicídio por grupo de 100 mil hab. faixa etária de 15 a 19 anos
Betim, Belo Horizonte, RMBH e Minas Gerais de 1996 a 2009
200
150
100
50
0
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009
Betim 14,2 29,6 40,2 40,9 90,2 54,2 46,8 122 122 132 120 139 151 126
Belo Horizonte 17,6 22,3 25,3 33 59 50 71,1 101 99,7 95,5 95 131 109 78,9
RMBH 18,4 21,4 24,4 27,5 52,9 52 67,8 98,5 106 96,8 97,3 113 105 85,9
MG 7,9 8,6 9,4 10,7 17 18,6 23,8 32,4 35,3 36,5 37 41,9 39,3 36
Waiselfisz (2011) aponta que o problema das mortes violentas pode ser melhor
percebido na faixa etária jovem. Essa faixa etária vai dos 15 aos 24 anos de idade. Nela,
incluem-se as mortes violentas em todos os aspectos da classificação de causas externas
(acidentes de trânsito, homicídios, suicídios e demais acidentes). Apesar de não ter havido
preocupação em relação às mortes causadas por acidentes de trânsito, neste estudo, e terem se
concentrado esforços em relação aos homicídios, é esse tipo de morte que tem mais chamado
a atenção no município.
Mesmo com as discussões sobre a interiorização das mortes violentas percebe-se que
em Betim esse fenômeno não é novo e acompanha homicídios da RMBH, bem como as altas
taxas em todo o estado. Percebe-se que as taxas de homicídio por 100 mil em Betim
comparadas com a RMBH, Belo Horizonte e Minas Gerais seguem a tendência de aumento.
Mesmo no estado de Minas Gerais, as taxas que em meados da década de 1990 se mantinham
baixas foram gradativamente aumentando. No entanto, no município estudado, percebe-se que
desde os anos de 1996 as taxas de homicídio sempre foram altas e mantiveram a tendência.
322
Gráfico 40 - Taxa de Homicídio por grupo de 100 mil hab. faixa etária de 15 a 24 anos
Betim, Belo Horizonte, RMBH e Minas Gerais de 1996 a 2009
400
300
200
100
0
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009
Betim 70,3 92,1 83,1 126 209 135 127 303 362 364 290 238 287 233
Belo Horizonte 56,3 56,8 79,5 94,8 131 120 151 222 239 206 185 232 197 164
RMBH 55,5 62,5 71,2 85,6 125 125 160 229 254 222 201 209 193 172
MG 23,9 25 29,5 33,9 46,9 51,1 64,9 89,4 98,9 94,3 89,1 86,8 81,5 78,6
No tocante aos outros tipos de crime em Betim, foram selecionados para este estudo os
que envolvem crianças e adolescentes tais como: estupro25 e extorsão mediante sequestro.
Outros tipos criminais não foram possíveis de se obter dados de forma estatística, como uso
de drogas, por exemplo, pois não estão disponíveis. Mas destacaram-se os casos que mais
chamam a atenção da imprensa por se tratar de crimes contra a criança e o adolescente.
Nesse sentido, observa-se que, percentualmente, os casos de estupro e extorsão
mediante sequestro são menores do que os casos mais graves de violência, que são os
homicídios. Dessa forma, apresentam-se os dados obtidos para esses tipos criminais para que
se possa ter compreensão desse processo. Em relação aos dados sobre estupro, observa-se que
as meninas são mais vítimas desse tipo de crime do que os meninos na faixa etária entre 0 e
11 anos de idade, em todos os anos estudados. Também se revela que não apenas nas faixas
etárias iniciais o estupro é um problema para as meninas e adolescentes do sexo feminino,
como tal informação revela que a violência para as mulheres reside em crimes sexuais. No
entanto, o dado não permite inferências mais conclusivas sobre se esse crime acontece em
casa ou no espaço público (supõe-se o segundo), pois os estudos de Vargas (2000) apontam
que, quando os crimes sexuais, tais como o estupro, acontecem em casa, têm menos chance de
serem denunciados e investigados, pois são crimes de valor moral e social pouco investigados
no âmbito policial.
No entanto, tem-se notícias sobre esse tipo de crime quando se observam as entrevistas
que foram realizadas para o diagnóstico da situação da criança e do adolescente. Uma delas,
realizada com o promotor de justiça, aponta a importância do trabalho realizado no Conselho
Tutelar em diagnosticar os casos de violência sexual contra a criança e o adolescente:
Ressalta-se que o trabalho de denúncia dos casos pode também ter aumentado nos
últimos anos, pois ao observarmos a Tabela 19 percebe-se que entre os anos estudados (2008
25
No tocante à questão do estupro fez a denominação tal qual apresentada pelos dados obtidos junto a SENASP.
No entanto, destaca-se que houve modificação da lei que inclui na ideia de estupro todo ato sexual, desde um
beijo até a conjunção carnal. Dessa forma, optou-se por utilizar ora uma expressão, ora outra como forma de
demonstrar as possibilidades de compreensão do fenômeno.
325
18 a
24 93,75 6,25 100,00 95,00 5,00 0,00 100,00 100,00 0,00 0,00 100,00
anos
25 a
29 66,67 33,33 100,00 100,00 0,00 0,00 100,00 90,00 10,00 0,00 100,00
anos
30 a
34 100,00 0,00 100,00 100,00 0,00 0,00 100,00 85,71 14,29 0,00 100,00
anos
35 a
64 100,00 0,00 100,00 100,00 0,00 0,00 100,00 100,00 0,00 0,00 100,00
anos
65
anos
0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 50,00 50,00 0,00 100,00
ou
mais
Não
Inform 50,00 0,00 100,00 100,00 0,00 0,00 100,00 80,00 20,00 0,00 100,00
ado
Total 93,85 4,62 100,00 93,94 4,04 2,02 100,00 83,81 14,29 1,90 100,00
(28'38''). Aí você vai puxar, a mãe nega, em 90% dos casos a mãe nega, aí eu levo
para conversar com a filha sozinha. A filha confirma, com muita dificuldade, mas
ela confirma. Eu chamo a mãe de novo, converso com a mãe sozinha, mas com a
autorização da filha – eu faço isso, porque a gente não sabe o quê que vai acontecer
em casa depois. Aí eu chamo a mãe de novo, aí a mãe desaba a chorar e conta que é,
que ela precisa de ajuda e ela não sabe por onde começar. (Entrevista com
Conselheira Tutelar)
Pois é. Eu não tenho um caso de menino, só menina. As meninas têm, mas eu não
tenho nenhum caso de menino. Geralmente... Adolescente, de 12 a 14 anos. Aí tem
aquela questão também: 12 a 14 anos, que a gente fica sabendo, que a denúncia é
concluída. Quando elas vêm contar, elas estão sendo abusadas desde os 7, dos 6.
É complicado. E quando você chega assim... Nós temos um caso aqui que eu
acho até... Nós conseguimos... Geralmente a mãe opta pelo companheiro.
Então, de imediato ele tem que sair da residência, se ele não sair a gente tira a
criança. Nós tiramos uma criança, entregamos para a tia em outra cidade. E a mãe
ficou louca, porque ela queria criar a filha. Eu falei 'beleza, mas ele tem que sair da
casa então‟. Aí toda vez que a Polícia batia lá ele não estava. Aí conseguiram tirar
ele, ele saiu. Depois de algum estudo social, a criança volta para casa. Ontem eu tive
a notícia que ele estava dentro de casa de novo e cometendo a mesma coisa. Quem
que aceita? A mãe. Infelizmente. (Entrevista com Conselheira tutelar. Grifo nosso).
Por outro lado, os casos de abuso sexual vêm acontecendo ao longo dos anos sem que
se possa efetivamente fazer alguma coisa, seja por medo das vítimas, seja pela
conivência/impotência das mães diante dos fatos. Amazarray e Koller (1998) esclarecem que
o abuso sexual intrafamiliar é mantido por uma dinâmica complexa, pois, segundo os autores,
citando Furniss (1993):
Morales e Schramm (2002) apontam que os grupos que procuram lidar com essa
questão do abuso sexual contra crianças vêm encontrando dificuldades em evitar que a
impunidade exista para esses casos, uma vez que muitas vezes,
Quer pela prática do silêncio por parte das vítimas e da sociedade em geral, quer
pelas tímidas ações concretas no apoio ao menor e à família, quer, ainda, pelas
próprias reticências por parte da família em denunciar um seu membro e expor-se,
assim, à possibilidade de eventuais consequências negativas adicionais (MORALES;
SCHRAMM, 2002, p. 266).
Parece que, com a evidência de existência desse tipo de crime, as equipes de trabalho
em rede e atendimento às crianças e aos adolescentes precisam de melhor treinamento para
lidar com a situação de agressão e violência sexual. De acordo com Morales e Schramm
(2002), a ideia de que é preciso capacitar os profissionais para atender os casos de violência
sexual contra adolescentes e crianças é urgente, uma vez que é fonte de políticas públicas de
relevo para a sociedade. Dessa forma os autores apontam:
329
As ações dos grupos que vêm trabalhando com o intento de prevenir e desvendar o
abuso sexual em menores no âmbito familiar, e que procuram criar estratégias e
mecanismos capazes de evitar a impunidade. [...] Além disso, existe também uma
falta de consciência profissional sobre a real magnitude do problema, assim como
uma compreensível (mas não necessariamente justificável) reticência dos
profissionais em se envolverem num assunto psicossocial complexo
(AMAZARRAY; KOLLES, 1998, p. 4).
Percebe-se que não apenas as discussões teóricas já apontam para um problema social
de magnitude em relação ao abuso e à violência sexual contra menores, como também a rede
de atendimento à criança e ao adolescente lida com o fenômeno. Isso porque as muitas facetas
da violência social atingem a sociedade de forma variada em sua manifestação, fazendo com
que as políticas públicas sejam projetadas de forma a atender as muitas demandas sociais.
Portanto, urge a formulação de políticas de enfrentamento a esse tipo de problema social.
Outro tipo de crime apresentado aqui, por compor a compreensão que se tem em
relação à violência, são os roubos. Destaca-se aqui que crianças e adolescentes muitas vezes
são vítimas de roubos e também essa questão foi investigada. Mas também são autores de
roubos e, também, apresentam-se dados para o município.
Em relação aos roubos tentados e consumados, percebe-se que esse é um crime que
possui menor incidência no município de Betim, o que se depreende por ser menos relatada
por suas vítimas. Quando essas vítimas são crianças e adolescentes, o problema quanto ao
informe desse tipo de crime pode ser maior. Também não foi dada ênfase à discussão em
relação aos crimes contra o patrimônio, por dois motivos: o primeiro, já apontado aqui, a
baixa incidência de ocorrência e, em segundo, os poucos estudos elaborados sobre a temática.
Destaca-se, no entanto, o estudo de Feltran (2008), que realizou trabalho com jovens
da periferia da cidade de São Paulo sobre a concepção de “mundo do crime” ou do “crime”
dos jovens e adolescentes. O autor aponta:
Dessa maneira, roubos e furtos são parte de uma construção social dos jovens
envolvidos com o mundo do crime, conforme as discussões do autor. É interessante notar que
330
o autor aponta, por meio de uma narrativa de um adolescente morador da periferia, que as
seduções do mundo do crime são severas no que diz respeito a facilidades e na rede de
associações em relação aos furtos e roubos, “desde logo se nota, então, que as relações entre
parentes e amigos também alimentam as pequenas redes de sustento e circulação de produtos
roubados. Nessa perspectiva, e é só a primeira, a casa já não é mais completamente
desconectada do circuito do crime, já não é seu oposto” (FELTRAN, 2008, p. 101).
No tocante às vítimas de roubo em Betim, de modo geral, são os meninos as maiores
vítimas. As faixas etárias que apresentam os percentuais mais altos em relação a esse tipo de
crime são as faixas etárias compreendidas entre 18 e 24 anos e entre 35 e 64 anos (que não
interessa aqui, por não tratar da infância e juventude). Essa informação se mantém estável nos
três anos de estudo, ou seja, 2008, 2009 e 2010.
No entanto, quando a informação é desagregada por regional, percebe-se que há, em
algumas regionais, maior vitimização entre outras faixas etárias, além das que foram
mencionadas. Nesse sentido, apresentam-se informações nas faixas etárias entre 12 e 17 anos
– no ano de 2010, na Regional Alterosas, para os meninos em 7,51%, e 5,88% para as
meninas. Quanto à faixa etária superior, ou seja, 18 a 24 anos na Regional Centro, no mesmo
ano, observam-se percentuais maiores de vitimização, pois para os jovens do sexo masculino
o percentual foi de 24,63% de vítimas e para as jovens, de 34,84%.
Nota-se que não há regional na cidade com maior incidência de vítimas de roubo.
Inicialmente pensou-se que a Regional Centro seria a que apresentaria maior incidência por
concentrar maior número de transeuntes, mas essa hipótese não se verificou, pois a
distribuição percentual de roubos é relativamente igual em todas as regionais. Os percentuais
somados nas faixas etárias entre 18 e 29 anos somam maior percentual em todas as regionais,
em todos os anos. Dessa maneira, pode-se reconhecer que essa faixa etária é bastante
vulnerável em relação aos roubos tentados e consumados.
Ressalta-se que é importante estudar de forma mais detida quem pratica esse tipo de
roubo, pois muitas vezes se tem um grupo bastante pequeno autor desse tipo de crime, que
consegue aumentar significativamente as ocorrências com o seu modus operandi, ou seja, um
pequeno grupo é responsável direto pelas muitas ocorrências de crime de roubo; quando esse
grupo é controlado, pode-se obter redução das ocorrências. Quando se tem muitos jovens
sendo vítimas de crime, pode-se depreender que o valor roubado é baixo, satisfazendo ao
autor apenas momentaneamente. Há suspeitas de que os valores roubados sejam para financiar
o vício em determinados tipos de drogas. Mas não se conhecem artigos acadêmicos que
tratem da questão.
331
Percebe-se que mesmo buscando o trabalho em rede esse pode falhar em sua execução
ou mesmo podem faltar peças que possam compor de maneira adequada os pontos de
conjunção da rede de atendimento. Na concepção de um dos nossos entrevistados uma rede
deve ser pensada da seguinte maneira:
Eu considero a Rede, todos os equipamentos, todos os atores envolvidos – no caso
das crianças e adolescentes, que acolhem, que atendem a criança e o adolescente [...]
332
Ressalta-se que o ECA estabeleceu as diretrizes para uma política de atenção aos
direitos da criança e do adolescente. Essas diretrizes orientam as seguintes linhas de ação para
o atendimento:
Os direitos preconizados pelo ECA não se efetivam “naturalmente”. Por isso, é preciso
uma mobilização dos grupos, órgãos e instituições responsáveis pela promoção e defesa
desses direitos e engajados na proteção integral das crianças e adolescentes. Ou seja, é
necessário a participação da família, do Estado e da sociedade para a construção das políticas
públicas orientadas pelo ECA. Nesse sentido, essas políticas devem ser articuladas por meio
de ações governamentais e não governamentais, da União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios. E é isso que deverá constituir a rede de atendimento à criança e ao
adolescente.
O tópico que estamos analisando, a Segurança Pública, é objeto das ações bastante
complexas que compõem as Políticas de Proteção Especial, como descrito no item III acima.
Mesmo quando consideramos os casos dos adolescentes envolvidos com a prática de atos
infracionais, ou seja, os adolescentes em conflito com a lei, encontramos neles uma história de
334
vida que encerra uma série de direitos violados. Por isso, o atendimento aos adolescentes
autores de atos infracionais é realizado nas instituições que compõem as políticas de proteção
especial.
É muito comum o adolescente começar a trazer a história da família e ter uma mãe
que sofre violência, ou sofreu, ou ele assistia muita agressão dentro de casa. Então, a
questão da violação de direito muitas vezes perpassa por todos os membros da casa.
Então a gente procura escutar isso: o impacto da violência de gênero na vida de um
adolescente que está lá nessa família e acaba partindo para a prática de ato
infracional. (Entrevista CREAS)
Em Betim, como se pode verificar pelos dados apresentados, os jovens são vítimas de
vários crimes violentos. Mas, eles também são apontados como autores de várias infrações.
Principalmente, quando relacionadas ao uso e comércio de drogas. Ressaltamos que o
envolvimento dos jovens com as drogas foi apontado, em quase a totalidade das entrevistas,
como a principal causa dos atos infracionais cometidos pelos adolescentes. Como podemos
ver neste relato:
A maioria dos nossos jovens estão morrendo, a maioria dos nossos jovens não estão
sobrevivendo ao tráfico. Ou eles morrem porque realmente eles foram assassinados
ou eles matam a vida social e familiar deles, porque eles passam a se dedicar
somente a atos infracionais – tráfico de drogas, agressão, a briga. [...]. A rede precisa
funcionar, a família precisa funcionar, todo o Município precisa funcionar.
(Entrevista Conselheiro Tutelar)
Esta fala reflete a dimensão do problema dos jovens em conflito com a lei no
município. Diversas falas manifestam um sentimento de impotência diante do problema. Ou
seja, a rede de proteção para a criança e o adolescente, nesse aspecto, mostra-se insuficiente
para intervir.
Ao se envolverem com o tráfico, os adolescentes rompem com as instituições
socializantes que compõem a rede – família, escola e comunidade em geral. Como foi
relatado por uma entrevistada, quando o adolescente cumpre a medida socioeducativa
demonstrando um percurso inicial nos atos infracionais, e pouco envolvimento com o tráfico,
é possível intervenções que possibilitem uma mudança em sua trajetória de vida. Ou seja, a
medida socioeducativa pode ter um efeito no laço do adolescente com o social e cumprir seu
objetivo educativo. Por outro lado, quando a trajetória de vida do adolescente no tráfico se
encontra mais consolidada , há uma dificuldade em intervir, e o adolescente fica mais difícil
de ser abordado. Nesses casos, o índice de descumprimento da medida é alto, veremos
posteriormente.
335
Para vários dos participantes da rede, é preocupante o uso de álcool e outras drogas em
idade bastante precoce. O Conselho Tutelar do município apresenta casos de crianças fazendo
uso de álcool. Segundo o entendimento de um conselheiro, isso as torna mais vulneráveis a
serem, no futuro, usuárias de drogas ilícitas, além de uma maior exposição à violência e à
criminalidade.
Essa preocupação não é, meramente, especulativa. De acordo com as informações
obtidas nas entrevistas, pode-se considerar que o percurso da vida dos adolescentes em
conflito com a lei, em Betim, tem a seguinte característica: ao chegarem para o cumprimento
da medida socioeducativa, a partir dos 12 anos, a maioria deles já fazia uso de álcool, tabaco e
outras drogas desde os 10, 11 anos. No início da adolescência, se ainda não evadiram da
escola, os vínculos escolares se apresentam bastante frouxos. Logo, acontece a ruptura
definitiva, ao mesmo tempo que estreitam a ligação com a criminalidade. Ao final, instaura-se
um círculo vicioso, pois os adolescentes não conseguem ver possibilidades de vida fora da
criminalidade, especialmente quando conseguem obter ganhos financeiros com o tráfico de
drogas. Sem escolaridade e preparação para o trabalho, o tráfico e os roubos passam a ser
considerados como as únicas alternativas para eles.
recebem a medida em meio aberto. [...] A gente avalia que aquilo lá piorou ainda
mais a situação do adolescente, ele saiu de lá muito mais violento e muito mais
rebelde do que ele entrou, sabe, então a gente tem esse complicador. [...] A nossa
falta de estrutura da Rede para o atendimento a esse adolescente também contribui
para o aumento da própria criminalidade. (Entrevistada CREAS)
Onde colocá-los? Eles recebem um atendimento melhor, quando eles nos relatam
estarem jurados de morte, que eles vão para o programa de proteção. O programa vai
retirá-los de Betim, vai retirá-los do Município se preciso for e eles dão todos os
acompanhamentos necessários. Mas fora isso, vão esperar ficar ameaçado para
340
O entrevistado destaca que, muitas vezes, a situação dos adolescentes e, até mesmo, de
crianças, chega a situações extremas em decorrência do uso de drogas. Quando eles correm
risco de morte em consequência do tráfico, a rede recorre ao Programa de Proteção às
Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM). Este programa tem sido acionado
porque, como já foi relatado, o grande desafio para o trabalho com os adolescentes em
conflito com a lei é risco de homicídio que eles correm devido ao envolvimento com o tráfico
de drogas. Muitos deles, efetivamente, se colocam em risco e acabam morrendo.
Na sequência, apresentamos os números que mostram quantos adolescentes estão em
cumprimento de medidas socioeducativas no município e quais são as medidas.
51 35 33 31 25 24 19 01 -------- 02
Ressalta-se que os números divulgados pelo CREAS nos dão algumas indicações para
o trabalho em busca de uma melhor eficácia no cumprimento das medidas socioeducativas de
PSC e LA em Betim. Chama a atenção o alto índice de adolescentes do Bairro Alterosas. Em
outros indicadores, esta região também aparece como um local onde crianças e adolescentes
enfrentam problemas cuja solução demanda políticas específicas. Além disso, não há
diferença significativa entre o número de adolescentes que cumpriram a medida (60) e o
número de adolescentes que não cumpriram (55). Estes últimos podem indicar os adolescentes
com alto envolvimento na criminalidade para os quais as medidas de meio aberto não
conseguem atingir, segundo relato dos técnicos. Talvez seja importante realizar um estudo
mais detalhado, seguindo a trajetória desses adolescentes nos atos infracionais até o
descumprimento da medida socioeducativa, para que uma intervenção mais adequada possa
ser realizada.
Destacamos que um estudo aprofundado sobre as medidas socioeducativas no
município seria importante porque os dados apresentados indicam que muitos adolescentes
em Betim estão envolvidos com infrações graves. Os técnicos do CREAS observam que as
medidas de meio aberto podem ser consideradas eficazes para os adolescentes cuja prática de
infrações seja inicial, sem grandes comprometimentos com a criminalidade violenta, como se
pode ver no seguinte relato:
ser um intensificador das ações existentes, além de tornar possível que as intervenções com os
adolescentes possam ocorrer logo no início da trajetória nos atos infracionais. Acrescente-se a
isso a possibilidade de dar inicio às medidas de Advertência e Obrigação de Reparar o Dano.
Elas são importantes principalmente para acionar a rede de proteção, acompanhando os casos
em seu início, antes de uma trajetória no crime. Em suma, o Juizado tem um papel central na
articulação da rede de justiça infantojuvenil.
Sabemos que o adolescente, antes de praticar atos infracionais, passa por uma história
de violência e desrespeito aos seus direitos. Assim, sugerimos que esse tópico – sistema de
justiça para os adolescentes em conflito com a lei – seja tomado como um ponto de pauta para
o Conselho de Direitos, a fim de que todas as instâncias envolvidas possam estabelecer uma
política para o município que conte com a Internação, se for o caso, mas que se articule
visando o convívio e a socioeducação.
Para iniciar essa discussão, não há como desconsiderar o que vários entrevistados
observam como causa da violência: uma história de ocupação da cidade de forma desordenada
e o poder público sem condições de acompanhar a demanda por serviços. O município conta
com vários dispositivos, mas ainda é preciso articular as várias ações na esfera municipal,
estadual e federal, assim como as iniciativas governamentais e não governamentais.
Principalmente, no que diz respeito à prevenção da criminalidade.
Uma constatação importante para as medidas de proteção, bem como as
socioeducativas, é a respeito do uso de drogas. Embora Betim conte com a Superintendência
de Políticas para as Drogas, vários serviços de saúde, embora projetados, ainda não foram
implantados. Na sequência, apresentaremos política do município nesse campo, a partir da
Superintendência de Políticas para Drogas.
A Superintendência de Políticas para Drogas foi criada em Betim no ano 2001, com o
nome de Superintendência Antidrogas. Desde o início, teve como objetivo abordar o
problema das drogas na cidade, desde a prevenção até o tratamento. A alteração do nome
ocorreu devido a uma mudança na política federal sobre álcool e outras drogas. No governo
do presidente Fernando Henrique Cardoso, foi criada a Secretaria Nacional Antidrogas
(SENAD), com o objetivo de implantar uma política sobre as drogas semelhante à lógica do
345
Sistema Único de Saúde. Ou seja, uma coordenação nacional orientando as políticas públicas
dos estados, executadas em cada município brasileiro. Assim, os órgãos responsáveis pelas
intervenções deveriam estar vinculados em torno do tema das drogas, seguindo uma
orientação específica, mas adequada à realidade municipal. Na época, a tônica da repressão às
drogas ainda era um ponto forte nas políticas.
Atualmente, está acontecendo uma mudança de foco na política federal. O tratamento,
através da metodologia da redução de danos, é a orientação a ser seguida pelos estados e
municípios, e isso teve consequências no formato da Superintendência em Betim, ela passou a
chamar Superintendência de Políticas sobre Drogas, privilegiando o tratamento do usuário,
no lugar da repressão.
Uma política sobre drogas deve considerar os diversos aspectos que confluem para a
complexidade do problema: aspectos sociais, policiais, financeiros, econômicos e de saúde.
Embora considerando esses aspectos, a Superintendência de Políticas sobre Drogas no
município entende que a saúde pública deve orientar o trabalho com as drogas. Todavia,
embora o uso e abuso de drogas seja um problema com alta incidência em Betim, afetando
principalmente os adolescentes e jovens, a cidade ainda não dispõe de equipamentos para
tratamento.
A Superintendência, juntamente com a Secretaria de Saúde do município, apresentou
três projetos em 2011 para o Governo Federal para o Combate e Enfretamento ao Crack.
Esses projetos foram aprovados e espera-se que sejam implantados um CAPs Ad 24 horas,
um CAPs 3, e um Centro de Referência de Capacitação para os trabalhadores do SUAS e no
SUS que lidam com usuários de álcool e outras drogas. O projeto inclui, também, uma Casa
de Acolhimento Transitório para os usuários que estejam sendo acompanhados no CAPs Ad e
que estejam em situação de trajetória de rua, devido aos vínculos familiares rompidos.
Espera-se que esses dispositivos possam acolher os casos de adolescentes e crianças usuários
de álcool e outras drogas.
Um ponto problemático sobre o uso e abuso de drogas, apontado nas entrevistas, diz
respeito à situação da criança e do adolescente. De acordo com os entrevistados, os pais e
responsáveis, quando procuram o serviço demandam um local para internação. Segundo um
dos entrevistados, é preciso separar os casos de uso e abuso de drogas daqueles que envolvem
o comércio das drogas. Para os primeiros, a tônica deve ser o tratamento, não somente através
dos dispositivos de saúde, mas também a inserção em programas sociais e na escola. Enfim,
inserção na rede de proteção, juntamente com o fortalecimento dos laços familiares. Os casos
de envolvimento no tráfico, que tem levado ao assassinato de muitos adolescentes e jovens no
346
município, extrapolam o trabalho da Superintendência, que tem seu foco na Saúde, segundo
relato do entrevistado.
A precariedade da justiça infantojuvenil no município, que não possui um juiz
específico, juntamente com uma equipe, além da inexistência de uma delegacia especializada,
torna o problema das drogas mais grave no município. Assim, é necessário que os vários
aspectos que envolvem o problema das drogas sejam considerados – saúde, assistência,
criminalidade – para que uma política sobre drogas no município possa abranger a
complexidade do tema. A implantação dos dispositivos de saúde em Betim, previstos para o
ano de 2012, é uma promessa de que algo possa ser feito para melhorar o grave quadro que
encontramos na cidade.
Indicamos, também, que um Conselho Municipal de Políticas para Álcool e outras
drogas pode ser um dispositivo importante para o município, a fim de que as diversas
instâncias possam, em rede, enfrentar esse grande desafio para a cidade.
26
SILVEIRA (2010) aponta que “Com base em experiências bem sucedidas na literatura,e o Centro de Estudos
em Criminalidade e Segurança Pública da Universidade Federal de Minas Gerais (Crisp/UFMG) liderou em
agosto de 2002 o processo de criação do “Programa Controle de Homicídios”, posteriormente denominado “Fica
Vivo”.
27
https://www.seds.mg.gov.br/
348
danos, ou seja, a redução de homicídios seja pensada a partir da atuação do Fica Vivo nas
regionais. Como podemos perceber por parte da entrevista abaixo, isso fica claro quando o
técnico aponta que são os elementos institucionais que vão atender as demandas das parcerias:
As oficinas são implantadas em locais estratégicos assim, porque aqui a gente tem
muita questão de limitação de circulação, tem rivalidades entre regiões, os jovens
não circulam. E aí a gente agente implanta oficinas para atender o maior número
possível de jovens, principalmente os jovens envolvidos. Os oficineiros são pessoas
que, a maioria é da comunidade, que o objetivo é criar uma referência para os
jovens, uma referência além da criminalidade, para criar outras possibilidades
também, junto com eles. (Entrevista – Técnico Fica Vivo)
Por outro lado, quando pensamos na rede institucional que atende as crianças, que são
os órgãos estaduais e municipais que dão apoio ao Programa de Proteção de Jovens e
Adolescentes, percebe-se que os técnicos reconhecem a rede, sabem onde estão os nós de
interseção e interação. Sapori, Sena e Silva (2012, p. 51) apontam que “na dinâmica de
funcionamento da rede destacam-se os preceitos significativos. Um deles é a integração
voluntária das conexões, isto é, o que explica a ligação dos nós de uma rede é a identificação
de valores e objetivos comuns entre eles”. Percebe-se a presença da rede, dos valores que são
propostos para a proteção dos jovens, quando os técnicos apresentam essa inter-relação:
Por outro lado, apontam problemas no acionamento dessa rede de proteção aos direitos
das crianças e dos adolescentes, seja pela ausência da participação ou mesmo pelas falhas de
encaminhamento nos procedimentos junto aos jovens. Nos trechos abaixo evidencia-se parte
dos problemas enfrentados pelos técnicos:
Sentimos falta da Educação, no Fórum, a gente percebe que a Educação é uma coisa
muito isolada, diversos problemas explodem nas escolas, mas eles ainda trabalham
sozinhos, eles não acessam a rede pra discussão desses casos, pensar projetos juntos.
Só em alguns casos específicos que tem participação. (Entrevista – Técnico Fica
Vivo)
A gente percebe, que essa rede, muitas vezes, não quer se assumir diante desses
jovens, então, quando esse jovem chega, ele é tido como um jovem problema e
como um problema eles querem passar a bola, e aí, quando esse jovem começa a se
apropriar de alguns espaços, a gente nota que a rede não está preparada, porque, se a
rede já tem todo um pré-conceito em torno desse jovem, como se ele fosse
envolvido com a criminalidade vinte quatro horas, como se não fosse um jovem que
tem desejos, que tem sonhos, que quer algo diferente, que almeja algo diferente.
Então eu acho que esse é um pouco um gargalo, pois a rede está preparada
para atender a criança e o adolescente, mas aquele que circula, que consegue
acessar vários outros equipamentos, e não esses que têm seus direitos violados
assim, nos mais básicos, os direitos mais básicos violados, que é o direito de ir e vir,
que ele não circula. A gente percebe esse gargalo, ainda, de entender que muitas
vezes, pra preservar a vida, esse jovem fica num beco, restrito, não sai dali, não tem
acesso á educação, à saúde... (Entrevista – Técnico Fica Vivo. Grifo nosso)
Percebe-se, com as falas, que ainda falta um trabalho para melhorar o atendimento às
crianças e aos adolescentes e ainda garantir direitos. Fato é que o Programa Fica Vivo atende
às expectativas e aos jovens de maneira adequada na cidade. Além disso, tem-se a avaliação
do programa em outras cidades que indica a eficácia da proposta para o controle de
homicídios (SILVEIRA et al., 2010).
Isso é bem interessante, porque a gente tem tentado dar uma segurança jurídica às
nossas ações. A dinâmica da questão de segurança pública, da violência, foi
crescendo e a estrutura da Superintendência não acompanhou e as questões
jurídicas, as atribuições, o quê que é a responsabilidade mesmo, da
Superintendência não acompanhou essa dinâmica. Então, nós estamos tentando
agora, dar uma segurança maior, dar uma estrutura para enfrentar essa dinâmica,
esses problemas da violência. A Superintendência tem a Guarda Municipal.
(Entrevista Superintendência de Segurança Pública. Grifo nosso)
Então, além das ações de prevenção à criminalidade que são implementadas pelo
órgão municipal, tem-se ainda as ações da Guarda Municipal e Guarda Patrimonial,
conjuntamente com as ações integradas com a Polícia Militar de Minas Gerais, que possui o
programa de prevenção ao uso de drogas – PROERD. Percebe-se o esforço de controle da
criminalidade na cidade, pois a ação conjunta desses órgãos promove a segurança e pode
transformar a vida dos jovens em contato com a criminalidade.
Os serviços dessas Guardas servem para complementar as atividades de proteção e
segurança, já realizados, também, pela PMMG, bem como visam diminuir a sensação de
medo da violência apresentado pela população.28
Em relação aos programas apresentados pela Superintendência de Segurança Pública,
percebe-se que esse órgão foi criado para lidar com a criminalidade e violência no município
de Betim. Tal órgão compõe a rede, via institucionalização, para a diminuição dos números da
violência, em especial a redução de dano causado pelos homicídios. De acordo com as
informações obtidas junto à Superintendência, os projetos desenvolvidos fazem parte de um
convênio com o Ministério da Justiça por meio do Programa Nacional de Segurança Pública
com Cidadania – PRONASCI. O órgão foi criado em 2010, mas ainda não possui a estrutura
de que necessita para lidar com a violência.29 Os técnicos veem a necessidade de se
implementar as políticas de segurança e de assumir as discussões sobre a segurança ou
prevenção que antes estavam pulverizadas em diversas ações das secretarias municipais:
28
Muitas das falas dos jovens e adolescentes nos grupos focais realizados pelo Diagnóstico dão conta desse
medo do crime e da sensação de insegurança instalado nas cidades brasileiras.
29
Informações obtidas com a entrevista realizada com a equipe da Superintendência.
353
preciso acompanhar de perto o desenvolvimento dessas ações para saber se há eficiência não
apenas no atendimento aos jovens como também na redução dos homicídios.
Além disso, é importante compreender os aspectos de acesso aos jovens aos
programas, para que não se tenha sobreposição de jovens participando das atividades. E poder
atender os jovens que efetivamente precisam de proteção. Percebe-se pela entrevista realizada
com a equipe de trabalho da Superintendência de Segurança Pública que há uma afinação
entre os projetos implementados na cidade e os programas do governo tanto estadual quanto
federal. Destacam-se, então, os projetos que foram implantados a partir das iniciativas com os
representados do governo municipal, no caso os projetos consorciados com a Guarda
Municipal e Patrimonial. Sobre esses projetos o técnico aponta que,
Nós temos a Patrulha Escolar, é uma, e inclusive dessa Patrulha Escolar surgiu uma
demanda apresentada principalmente pelos diretores das escolas, surgiu com o
bullying, aí, nós pensamos algumas palestras, então, um guarda municipal, um dos
envolvidos na questão da patrulha escolar sugeriu que fosse um dia lá para falar
sobre isso, o diretor pediu para ele ir lá e tal, ele foi, falou, deu certo. Aí, acho que
um diretor fala para outro e começou a chamar, e a gente resolveu encorpar isso e
cresceu demais. Então, estamos ampliando os programas contra a violência, cerol e
bullying, só que o cerol é sazonal, então assim, é mais ou menos nessa época. Foram
ao todo, setenta e sete palestras, isso com coisa de cinco mil oitocentos e cinquenta e
três participantes, coisa de seis meses, que durou esse programa. (Entrevista
Superintendência de Segurança Pública)
Um projeto que a gente está chamando de Diálogos pela Paz, que é uma conversa, a
gente sai desse modelo de palestra, eu falo você escuta, e propõe uma roda de
conversa com esses alunos, mas também com os professores, para ver a visão de
cada um sobre aquele determinado assunto e uma interlocução, também, com a
Patrulha Escolar. Então, a gente faz a primeira abordagem, detectou essa
necessidade, entra com o Projeto, com o Diálogos pela Paz, depois faz um
monitoramento. Então, depois dessa intervenção, continua a Guarda, por exemplo,
com passagens mais efetivas nessa escola para saber se mudou a realidade, não
mudou, piorou, melhorou, como é que foi isso. Então, isso é uma ação da Guarda
Municipal já direcionada para o seu público. (Entrevista Superintendência de
Segurança Pública)
Os técnicos também se valem de projetos que são implantados em outros estados para
viabilizar propostas para o município. Nesse sentido, durante as entrevistas percebe-se que os
técnicos que lidam com a questão da violência e criminalidade possuem várias frentes de
356
atendimento mais bem especificado para os jovens, tais como o programa Fica Vivo. Tal
programa, de acordo com as informações de avaliação obtidas, como Silveira indica, é eficaz
na redução da violência e criminalidade, principalmente a redução do crime de homicídios.
Outro ponto a ser destacado diz respeito à elaboração de campanhas educativas tanto
nas escolas quanto nos bairros sobre a questão da violência intrafamiliar. Tais campanhas
devem ser elaboradas em parcerias com as escolas municipais, para abordar as violências
tanto no sentido de castigos físicos e agressões quanto no de abuso sexual contra crianças e
adolescentes. Sugere-se que as atividades de educação possam envolver as famílias e a
comunidade de modo geral, pois assim amplia-se a rede de conhecimento sobre o tema,
permitindo a todos que possam discutir e refletir sobre as implicações desse tipo de violência
na vida das crianças e dos adolescentes.
No tocante ao trabalho realizado nas regionais que são reconhecidas em relação à
violência e criminalidade – incluído o tráfico de drogas –, a manutenção das políticas públicas
já apresentadas e a avaliação sistemática da eficácia de tais políticas é crucial.
A respeito da política sobre drogas no município, indica-se a implantação de um
Conselho Municipal de Políticas sobre Drogas, o qual pode somar esforços junto à
Superintendência de Políticas sobre Drogas, ao ser o responsável pela articulação das diversas
instâncias que lidam com o problema das drogas: saúde, educação, assistência, polícia, entre
outras. Ressalta-se que estas diversas instâncias poderiam ser as responsáveis por propor uma
política para o município.
Sugerimos uma pesquisa qualitativa específica com os adolescentes encaminhados
para o cumprimento das medidas socioeducativas. Assim, seria possível avaliar melhor a
percepção de que grande parte dos adolescentes que apresentam maior envolvimento com a
criminalidade não são afetados pela justiça infantojuvenil, perpetuando o sentimento de
ineficiência, impotência e impunidade, que existe.
No início de 2012, foi implantado o Juizado da Infância e Juventude em Betim. Isso
implica uma estrutura judiciária de atendimento aos jovens em conflito com a lei, pois sabe-se
que o Juizado vai cuidar dos casos envolvendo crianças e jovens do município. No entanto,
ainda não foi criado no município o centro de internação. Portanto, outra sugestão é a criação
de um Centro de Internação para os jovens infratores e em conflito com a lei, uma vez que, ao
cometer um ato infracional grave, como o homicídio por exemplo, os jovens não têm como
ser encaminhados adequadamente em Betim, pois não existe um local apropriado no
município. Os jovens, dependendo do ato infracional, ou são encaminhados para os Centros
de Internação em outros municípios ou são liberados. Por isso é importante saber qual a
358
e articulações representativas. Por isso, entende-se, também, que da esfera do controle fazem
parte os fóruns/frentes de defesa dos direitos da criança e do adolescente.
Não obstante todos os integrantes do SGDCA nos três eixos serem igualmente
importantes para a garantia dos direitos humanos de crianças e adolescentes, na sequência
serão ressaltados o papel e as atribuições do Conselho dos Direitos e o Conselho Tutelar.
De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), artigo 88, os
Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente são órgãos deliberativos e controladores
das ações, têm assegurada a participação popular paritária por meio de organizações
representativas de acordo com as leis de criação. São compostos por metade de representantes
do poder executivo (municipal, estadual, nacional) e outra parte com igual número de
representantes da sociedade civil, no caso, de organizações representativas.
Trata-se órgãos colegiados, cujos atos são provenientes de discussões e decisões
coletivas deliberadas em reuniões plenárias. O Conselho dos Direitos delibera (decide,
normatiza, estabelece diretrizes e parâmetros) sobre a formulação das políticas públicas para
crianças e adolescentes e controla (acompanha, monitora, recomenda correções, representa
pela responsabilização de agentes públicos) as ações públicas governamentais e não
governamentais.
Tais ações públicas referem-se ao conjunto da política de atendimento integral aos
direitos que compreende as políticas sociais básicas e as demais políticas necessárias à
execução das medidas protetivas e socioeducativas dispostas nos artigos 87, 101 e 112 do
Estatuto da Criança e do Adolescente. Não há previsão legal para realizar atos de
planejamento, coordenação ou execução de políticas públicas (programas, projetos, serviços,
outros) que são de responsabilidade dos órgãos públicos e/ou das entidades.
A função de membro do Conselho Nacional e dos Conselhos Estaduais e Municipais
dos Direitos da Criança e do Adolescente é considerada de interesse público relevante e não
será remunerada (Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 89).
A Resolução 106 do CONANDA (2005b) destaca alguns princípios básicos para o
funcionamento do Conselho: (1) legalidade (o Conselho dos Direitos só poderá ser criado
mediante lei específica); (2) publicidade (todos os atos e normas estabelecidos pelos
Conselhos, para produzirem efeitos e validade, devem ser de conhecimento público); (3)
participação (escolha dos organismos da sociedade civil e é exercida por meio do voto dos
pares e do usufruto da representatividade); (4) autonomia (inexistência de subordinação
hierárquica dos Conselhos aos poderes Executivo, Judiciário e Legislativo para definir
questões que lhe são afetas); (5) paridade (a representação governamental, indicada pelo
361
responsável pelas orientações, pela sugestão de cronograma e pela definição dos temas
(Fórum Nacional DCA, 2010, p. 14).
Conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente e o CONANDA (2007), os
Conselhos Tutelares são encarregados de zelar pelo cumprimento dos direitos, atuam no
atendimento de casos concretos de ameaça ou violação dos direitos, aplicam medidas
protetivas, existindo exclusivamente de âmbito municipal ou distrital, devendo haver, no
mínimo, um em cada município (ECA, art. 95, 131, 132, 136).
A Resolução 139 (CONANDA, 2011) recomenda que se observe a proporção mínima
de um Conselho para cada cem mil habitantes e que cabe à legislação local definir a área de
atuação de cada Conselho Tutelar, devendo ser, preferencialmente, criado um para cada
região, circunscrição administrativa ou microrregião.
De acordo com o artigo 136 do ECA, são as seguintes as atribuições do Conselho
Tutelar:
I - atender as crianças e adolescentes nas hipóteses previstas nos artigos. 98 e 105, aplicando
as medidas previstas no art. 101, I a VII;
II - atender e aconselhar os pais ou responsável, aplicando as medidas previstas no art. 129, I
a VII;
III - promover a execução de suas decisões, podendo para tanto:
a) requisitar serviços públicos nas áreas de saúde, educação, serviço social, previdência,
trabalho e segurança;
b) representar junto à autoridade judiciária nos casos de descumprimento injustificado de suas
deliberações;
IV - encaminhar ao Ministério Público notícia de fato que constitua infração administrativa ou
penal contra os direitos da criança ou adolescente;
V - encaminhar à autoridade judiciária os casos de sua competência;
VI - providenciar a medida estabelecida pela autoridade judiciária, dentre as previstas no art.
101, de I a VI, para o adolescente autor de ato infracional;
VII - expedir notificações;
VIII - requisitar certidões de nascimento e de óbito de criança ou adolescente quando
necessário;
IX - assessorar o Poder Executivo local na elaboração da proposta orçamentária para planos e
programas de atendimento dos direitos da criança e do adolescente;
X - representar, em nome da pessoa e da família, contra a violação dos direitos previstos
no art. 220, § 3º, inciso II, da Constituição Federal;
363
XI - representar ao Ministério Público para efeito das ações de perda ou suspensão do poder
familiar, após esgotadas as possibilidades de manutenção da criança ou do adolescente junto à
família natural.
Feitas as considerações gerais sobre o SGDCA e os destaques sobre os papéis dos
Conselhos dos Direitos e os Tutelares, apresenta-se abaixo uma imagem para auxiliar na
compreensão e visualização de um sistema integrado, no qual o Conselho Municipal dos
Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA) tem um papel essencial, visto ser ele o órgão
controlador do funcionamento do SGDCA (CONANDA, 2005b), a instância central para
articular e coordenar (organizar, interligar) o Sistema.
FONTE: Centro de Apoio Operacional das Promotorias da Criança e do Adolescente do Ministério Público do
Paraná (http://www.crianca.caop.mp.pr.gov.br).
O Conselho cresceu muito. Hoje ele tem uma demanda de uma Secretaria. A gente
trabalha com várias divisões: tem o FIA, tem Entidades, tem o Fórum, tem a
Secretaria Executiva, além das comissões temáticas, que funciona aqui o tempo
todo. Então, demanda muito trabalho, muito serviço. [...]. As atividades nossas aqui
são constantes, constantes, constantes. Aí tem as plenárias que acontecem
quinzenalmente. Das plenárias são diversas demandas que saem, porque a gente tem
uma linha de atuação muito grande, de acompanhamento, de monitoramento, em
relação à Saúde, Assistência Social, Educação. São esses setores que mais
demandam serviço. E é uma equipe boa, que está pensando em crescer aqui, porque
é muito serviço para poucas pessoas. A nossa ideia é ampliar esse quadro de
funcionários aqui. O Conselho hoje demanda isso. (Entrevista - Conselheira do
CMDCA governamental).
O conselheiro representante da sociedade civil avalia que, mesmo sendo uma equipe
pequena, é produtiva e “atende as comissões e as necessidades do Conselho”.
Nesse conjunto de atividades do CMDCA, a conselheira dos direitos governamental
destaca algumas que exigem atenção mais constante como (1) o Fundo dos Direitos da
Criança e do Adolescente, chamado de Fundo da Infância e da Adolescência (FIA), cuja
comissão temática é considerada “a menina dos olhos do Conselho”, especialmente por causa
dos recursos financeiros captados junto a empresas e repassados a entidades por meio de
seleção em edital de projetos, após deliberação do Conselho; (2) as entidades sociais
orientadas e visitadas por uma comissão em relação à documentação, por exemplo; (3) o
367
acompanhamento e assessoria aos Conselhos Tutelares; (4) o Fórum de Defesa dos Direitos
da Criança e do Adolescente instituído em 2009. Acerca do Fórum, este também será tratado à
frente, no eixo do controle social.
De maneira geral, conselheiros dos direitos e tutelares avaliam que, atualmente, em
Betim, há mais políticas para crianças e adolescentes, especialmente os programas e serviços
da assistência social. Por outro lado, percebem lacunas e dificuldades em diversos
encaminhamentos, pouca agilidade na resolução dos problemas, imprecisões nos fluxos, além
de diálogo insuficiente entre os profissionais.
Os conselheiros tutelares, pelo fato de demandarem constantemente os serviços
públicos devido à natureza de sua atuação, indicam o que chamam de “furos” na rede de
atendimento:
Realmente, Betim tem muito equipamento, tem uma rede muito grande, cheia de
furos, lotada de furos. Infelizmente é um tentando tapar o furo para que não apareça.
(Conselheiro tutelar).
Os furos na rede, [...] muito pela falta dos profissionais serem efetivos. São muitos
contratados, então isso dá muita brecha para que esses furos venham acontecendo
cada vez mais. (Conselheiro tutelar).
Agora nós estamos caminhando para uma outra situação, não perdendo de vista a
questão da DOPCAD, do CIA e da Vara da Infância, mas para a questão da inclusão
de crianças e adolescentes portadoras de deficiência, no município. Porque muitas
dessas crianças e adolescentes não estão inseridas na questão da educação, não estão
368
sendo acolhidas como deveriam na Saúde e nem na Assistência. Então nós estamos
puxando essa questão e já para agosto [de 2011], nós vamos ter uma assembleia
extraordinária com a pauta da discussão sendo a inclusão da criança e do adolescente
portadores de deficiência nas portas de entrada, como Saúde, Educação e
Assistência, para saber como eles estão sendo acolhidos. (Integrante da secretaria
executiva do CMDCA).
Eu acho que faltou um pouco, por parte da empresa que gerenciou o processo, faltou
um pouco de organização, principalmente no dia da eleição mesmo. Foi um pouco
desorganizado nesse sentido. (Conselheiro Tutelar)
[...] eu achei conturbado foi o processo mesmo do dia, que foi meio desorganizado,
talvez pela empresa. Talvez não, pela empresa. (Conselheira Tutelar)
[...] tem o processo de primeiro de fazer um registro das pessoas que vão votar, para
depois novamente as pessoas irem lá votar. Trabalhoso é, mas quando você começa
a juntar, começa a pesquisar, você vê que a gente tem um ganho muito grande nisso.
Porque todo aquele movimento de você conversar com o eleitor, explicar o que é o
369
Conselho, eu acho que a gente tem muito a ganhar com isso, que não fica uma
eleição sem a pessoa realmente saber para que... (Conselheira Tutelar).
Tem que cadastrar antes, teve esse dificultador, que é levar a pessoa ao local
primeiro para fazer o cadastro, depois ela voltar no dia marcado para fazer o voto
efetivamente ali. E as filas muito grandes, essa desorganização desmotivou muito
muitas pessoas. (Conselheiro Tutelar).
Eu acho que esse processo de ter que fazer um cadastro, para depois voltar em outra
data e votar, só dificulta. (Conselheiro Tutelar).
[...] o vereador acaba querendo ter pessoas ligadas a ele. Aparece uma pessoa que
tem a intenção de ser eleito: precisa de patrocínio, precisa de investimento. É uma
troca que eu vou fazer. (Conselheiro Tutelar).
[Os vereadores] escolhem, indicam às vezes o candidato. Às vezes aquela pessoa ali
que está à frente de algum projeto, que defende uma política para a sociedade, para a
comunidade. Então tem o apoio sim. Porque, na verdade, o Conselheiro por si
próprio, se ele não tiver uma condição financeira, ele não consegue alcançar. Porque
a gente precisa de carros, nós precisamos de materiais disponíveis, porque na
verdade é uma política. Então, se nós não tivermos um apoio, realmente fica muito
complicado. É o Conselheiro bater na porta de cada um, é um trabalho assim...
(Conselheira Tutelar).
A maioria dos que ganharam tiveram. Porque, infelizmente – não sei se daqui para
frente ou daqui alguns anos vai mudar um pouco isso – mas quem não tem o recurso
fica muito complicado alcançar realmente. (Conselheira Tutelar).
E outra conselheira que afirmou não ter recebido apoio de nenhum vereador assim
explicou sua posição:
Eu não quis ficar engessada, porque eu sei que esse trabalho tem que ser você
mesmo, porque você tem que se transpor, então você não pode ficar engessada a
ninguém. (Conselheira Tutelar).
370
Para a realização do trabalho, os quatro Conselhos possuem sedes com estrutura básica
de equipamentos e mobiliário. O funcionamento é orientado por um regimento interno. Seu
horário de funcionamento é de segunda a sexta-feira, das 08h às 18h, com garantia de
atendimento por meio de plantão durante a noite, aos sábados, domingos e feriados. Em cada
Conselho, há um coordenador escolhido pelo grupo a cada seis meses, de modo a favorecer
um rodízio entre os conselheiros e permitir que todos tenham a experiência de ser referência
do grupo a cada período.
Quanto ao Sistema de Informação para a Infância (Sipia), ainda não está instalado nos
dois Conselhos Tutelares mais recentes. Segundo informação de uma conselheira dos direitos,
o município já tomou todas as providências (equipamentos, internet), porém a Secretaria de
Estado de Desenvolvimento Social de Minas Gerais (SEDESE/MG), responsável por esse
serviço no estado, não encaminhou a implantação.
Um fator de insatisfação é a remuneração em relação às responsabilidades e à
quantidade de trabalho, porém os conselheiros tinham informação anterior sobre o valor e
conhecem os trâmites dentro dos poderes executivo e legislativo para alterações:
A maioria – todos até, eu diria – acha que é pouco, que o salário é baixo. [...] Está
defasado. Com relação ao mercado de trabalho mesmo, o valor que a gente recebe
por ser Conselheiro não é equiparado ao que receberia por outras funções que as
pessoas têm, outras atribuições que as pessoas têm no mercado de trabalho lá fora.
Encaro a questão do Conselheiro numa visão de missão mesmo, de contribuir
mesmo. [...]. Eu falo por mim que o salário em si não é me atende, o que eu gostaria.
Mas é um compromisso que eu tenho de ser Conselheiro, de estar Conselheiro nesse
momento, mesmo o salário sendo baixo. Eu tinha noção, eu tinha ciência do salário
antes de aceitar esse desafio. (Conselheiro tutelar).
Mas não temos o salário que gostaríamos de ter não. (Conselheira tutelar).
Tem uma capacitação. Antes de começar e após também. O tempo todo nós estamos
sempre participando de palestras. O tempo todo nós estamos sendo capacitados. Na
371
verdade, o que capacita mesmo a gente é o dia a dia aqui, porque são casos
diferentes, problemas diferentes. (Conselheira tutelar).
[...] Tem os encontros dos fóruns que acabam nos capacitando, que a gente tem com
o Promotor, que é um grande parceiro que a gente tem aqui no Município, o atual
Promotor tem nos ajudado muito. Tem os encontros com o CMDCA, o Advogado
do CMDCA, Dr. Simão, tem visitado os Conselhos para estar tirando dúvidas
jurídicas com o Conselheiro, o que é e o que não é correto. Então isso tem ajudado a
nos capacitar. (Conselheira tutelar).
Até porque o próprio Psicólogo faz tratamento, ele faz terapia. E ele já tem toda a
técnica, já sabe como lidar com todo mundo. Imagina nós. Eu acho que todo
Conselheiro tinha que ter um apoio psicológico mesmo. (Conselheira tutelar).
Talvez algum Psicólogo também para a gente, para nos acompanhar, na forma de
estar abordando mesmo a criança e o adolescente, a família. (Conselheira tutelar).
Mas ainda tem essa visão aí de Polícia. A sociedade mesmo, a comunidade ao redor
ainda tem essa visão de que o Conselheiro vem tomar o filho, vem... [...] Ainda tem
esse tipo de situação. Infelizmente ainda tem. [...] É um Policial, que tem Poder de
Polícia, de tomar, é aquela pessoa que vai retirar o filho de casa, que vai tirar o filho
da família... (Conselheiro Tutelar).
Aconteceu uma situação interessante até: quando o carro do Conselho parou na rua,
alguém disse que era do Conselho Tutelar, um menininho de uns 4, 5 anos saiu
372
correndo e falando „não rapa minha cabeça não, não rapa minha cabeça não‟. Aquela
visão igual a FEBEM 30 do passado: pegava o menino, rapa a cabeça e vai para a
FEBEM. Ele saiu correndo e falando „não rapa minha cabeça não‟. (Conselheiro
Tutelar).
Uma conselheira tutelar acrescenta, com sua opinião, a informação de que além da
população, no geral, atores da rede também não compreendem adequadamente o papel do
Conselho:
A população ainda tem receio de chamar o Conselho, até porque ela tem a visão de
ser um órgão repressor. [...] É a polícia de crianças. Muitos têm essa visão. Muitos
atores da rede têm essa visão de que o Conselho Tutelar é a polícia para
criança. E isso não é verdade. O Conselho é um órgão para garantir que os direitos
dela sejam cumpridos e também mostrar para ela os deveres que ela tem a cumprir.
Isso é um dificultador. (Conselheira Tutelar - Grifo nosso).
E ainda fornece outros detalhes sobre a confusão acerca das atribuições do Conselho:
O órgão que tem que ser chamado nesse tipo de caso é a Polícia. Da mesma forma
com o tráfico de drogas. Se ele é adolescente tem que ser chamada a Polícia. Muitas
vezes o rapaz ou o adolescente está traficando dentro da escola, na porta da escola e
30
Fundação Estadual de Bem-Estar do Menor prevista pela Política Nacional do Bem-Estar do Menor (de 1964)
extinta pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (de 1990).
373
[...] Eu acho que falta uma maior harmonia, uma maior atuação conjunta dos dois
Conselhos. Sempre achei que o Conselho da Criança e Adolescente, até em função
dele ter fundo e etc., ficou parecendo muito que ele era uma instituição independente
ou à parte – não sei é à parte ou se é independente – mas desvinculada dentro das
ações. Eu não vejo hoje, por exemplo, uma harmonia maior que devia ter com o
Conselho da Criança e do Adolescente com o Conselho da Assistência, e
principalmente com o gestor. Para mim – posso estar percebendo de forma
equivocada, mas é a percepção que eu tenho – eu acho os dois [Conselhos] muito
individualistas: o de Assistência preocupa com a Assistência como um todo, mas e
aí? A política da criança e do adolescente também é uma política de interesse da
Assistência Social. E aí isso às vezes provoca atuações superpostas e atuações
concorrentes. E pior de tudo é concorrente. E aí quando faz coisa superposta, o quê
que acontece? Você despende muito esforço para um lugar e falta esforço em outro.
E aí, se houver mais essa harmonia entre os Conselhos, pode melhorar. (Conselheiro
do CMAS).
[...] se houver uma atuação cada vez mais conjunta dos Conselhos. E aí eu entendo
que o CMDCA, através de toda a orientação que é passada pelo ECA, deva ser o
carro chefe condutor disso. Claro que em harmonia com os outros, para tentar
descaracterizar as vaidades, as disputas e etc. (Conselheiro do CMAS).
Uma questão também que para nós foi um desafio... que quando nós assumimos o
Conselho, essa participação era ruim. A entidade só vinha aqui para poder registrar.
Muitas vezes, algumas delas procuravam o Conselho só mesmo para captar recurso
do FIA e não tinha o envolvimento. E hoje a gente já trabalha essa questão do
envolvimento. Isso mudou muito na cidade. A participação da sociedade civil
organizada hoje é bem maior, ela está bem mais envolvente. (Conselheira do
CMDCA governamental).
375
Por outro lado, a mesma conselheira reconhece que os membros das entidades
participam de atividades que o Conselho realiza “senão não justifica o recurso”, porém não
acompanham as reuniões plenárias. A pouca participação das entidades nesses momentos
coletivos do CMDCA pode ser outro fator que contribui para a insuficiente efetividade do
controle social em relação às políticas públicas.
O Fórum Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Betim, de
abrangência municipal, foi criado em 2009, como um espaço de mobilização e articulação de
diversos atores, não somente de entidades da sociedade civil, como informa a integrante da
secretaria executiva do CMDCA:
A partir do Fórum a gente foi criando outras políticas que a gente considerava
importantes, aí nós construímos o Plano Municipal de Convivência Familiar e
376
Comunitária [...]. Construímos também protocolos para tratar da questão dos eixos,
dos fluxos de atendimento. Depois disso, nós implantamos também o [Programa]
Família Acolhedora [...]. (Conselheira do CMDCA governamental).
O Fórum Municipal pega todas as demandas e questões gerais, ele acaba ajudando o
Executivo, ajudando as entidades, os demais equipamentos, o Sistema de Garantia
de Direitos, todos que militam nesta questão da criança e do adolescente a resolver
um problema que está emergindo no município e que precisa de uma solução
imediata. (Integrante da secretaria executiva do CMDCA).
Para uma conselheira governamental, parece que essa organização cumpre um papel
intermediador:
Claro que isso depende muito da filosofia do gestor. Então aqui em Betim não é
diferente, como na maioria dos locais é assim. Quando o gestor que está no
momento gerindo tem uma filosofia de debater, de discutir, de abrir para a
comunidade participar, os usuários participar, a sociedade civil participar, é mais
tranquilo. Mas quando não tem essa filosofia, o Conselho fica muito esvaziado e
sendo manipulado o tempo todo. (Conselheiro do CMAS).
8.2 Recomendações
Entidades Regional
A amostra das ONGs se compôs por duas do Alterosas, duas do Teresópolis, uma da
Vianópolis, uma do Imbiruçu, três da Regional Centro, uma da PTB, três da Regional Norte e
duas da Regional Citrolândia. Ressalta-se que toda escolha implica tanto perda quanto ganhos
de possibilidade de aprofundamento e compreensão da realidade, contudo, a pesquisa só se
viabiliza através das seleções feitas em função tanto das exigências práticas (operacionais)
como pelos objetivos propostos a priori (BECKER, 1997). Outro procedimento
metodológico, relacionado às entrevistas feitas juntas às ONGs, foi a opção de entrevistar pelo
menos duas pessoas de cada entidade selecionada, sendo que uma pessoa deveria atuar nas
atividades de gestão e a outra nas atividades realizadas diretamente com as crianças e
adolescentes.
Faz-se também necessário esclarecimento sobre as principais fontes consultadas, em
especial os registros disponibilizados pelo CMDCA. O Cadastro de Entidade refere-se ao
registro no CMDCA, no qual foi possível identificarmos a relação completa com o nome da
entidade, e-mail, endereço completo, programas desenvolvidos e outras informações (Anexo
I). Destas, 120 estavam com o certificado de funcionamento atualizado (o que indica se a
entidade está regular perante o CMDCA). Consideramos para a produção do Diagnóstico as
ONGs existentes em junho de 2011 no cadastro do CMDCA, em um total de 162 entidades.31
As entidades cadastradas no Conselho recebem este certificado de funcionamento, que
permite a captação de recursos e/ou a realização de convênio com o município para
31
Ressalta-se que as entidades específicas da educação infantil são abordadas no capítulo relacionado à
Educação.
381
23
12
10 10 9 10
8 8
5 5 6 5
2 3 2 3
Sobre este dado é necessário cautela: como não tivemos acesso direto aos bancos de
registros de todas as ONGs, pois utilizamos o cadastro do CMDCA, não podemos informar
sobre os limites de qualidade e fidedignidade de tais registros. Dessa forma, levantamos como
hipótese, por exemplo, que em parte constam atendimentos com registro vinculado às
entidades que gerenciam as atividades ocorridas em outras entidades localizadas em outras
regionais. Por exemplo, a Regional Imbiruçu, que possui 24.060 crianças e adolescentes
residentes (0 a 18 anos), teve uma quantidade pífia de 852 atendimentos registrados, mas isso
não significa que não haja ONGs localizadas em outras regionais e que atendem crianças e
adolescentes moradores do Imbiruçu. Tal dado aponta para a necessidade de aprofundamento
sobre os aspectos relacionados aos registros e ao processamento da informação, o que
demandaria novos esforços de pesquisa.
Os dados da Tabela 20 demonstram que tanto a quantidade de entidades como a de
atendimentos não estavam homogeneamente distribuídas no espaço, ou seja, não estão
divididas de maneira uniforme entre as regionais. Desse modo, considerando todas as
entidades presentes no registro do CMDCA, identificamos que a Regional Centro concentrou
significativamente os atendimentos 40.635 (71,8% em relação ao total municipal), dado que
suscita uma provável polarização em relação aos serviços prestados pelas ONGs.
Outro dado também relevante refere-se à proporção do total dos atendimentos em
relação à quantidade de pessoas residentes no município, 56.610 atendimentos corresponderia
a 15% da população total do município. Contudo, ressalta-se que o número de atendimentos
realizados não corresponde exatamente à quantidade de pessoas atendidas. Desse modo, em
geral o dado sobre o atendimento não informa com exatidão quantas crianças ou adolescentes
foram atendidos, e sim o número de atendimentos. Só para termos uma ideia do que isso pode
significar, hipoteticamente, se considerássemos que cada pessoa tenha recebido em média
cinco atendimentos durante o ano, poderíamos dizer que aproximadamente 13.422 (3,5%)
pessoas teriam sido atendidas pelas ONGs em 2011 no município de Betim, por isso
ressaltamos a necessidade de cautela na análise desse dado.
Segundo consta no Diagnóstico da Oferta e da Demanda dos Serviços Alternativos
para Crianças e Adolescentes do Município de Betim, realizado por Veriano et al. (2005),
por exemplo, o total de atendidos pelas ONGs naquele período foi de 5.626 crianças e
adolescentes. Contudo, consideramos que as limitações encontradas não inviabilizaram o uso
dos dados para a construção do Diagnóstico, inclusive essa constatação já representa um
produto da pesquisa e expõe também a relevância das ONGs no contexto social das crianças e
adolescentes do município. A seguir apresentaremos as informações sobre a Regional Centro.
384
CDDH
19 CENTRO EDUCACIONAL QUERUBINS – ABACIR Santa Inês
20 ASSOCIAÇÃO ATLÉTICA BANCO DO BRASIL MG – AABB Santa Lúcia
Fonte: CMDCA, junho de 2011 - Cadastro de Entidades, entrevistas realizadas.
Quadro 58 - Entidades da Regional Centro por atividades e faixa etária atendida – 2011
NOME DA ENTIDADE ATIVIDADE PÚBLICO QUANT
386
32
Sem considerar atendimento em creches.
387
A ARCA tem como missão contribuir, pela via da educação não formal, para a
formação da criança e do adolescente contemplando em especial a construção de
valores como ética, respeito, cidadania e solidariedade. Cidadania e direitos
humanos sintetizam a orientação e a prática dos trabalhos.
A Regional Citrolândia possui sete entidades registradas, sendo duas creches e cinco
que executam outras atividades relacionadas a crianças e adolescentes apresentadas no
Quadro 60.
Quadro 60 – Entidades da Regional Citrolândia por bairro - 2011
Entidade33 Bairro
PROJETO ASSISTENCIAL CONSTRUINDO O AMANHÃ –
Citrolândia
PACOA
ASSOCIAÇÃO ESPÍRITA CÉLIA XAVIER São Salvador
ASSOCIAÇÃO GUARDA MIRIM ALFERES TIRADENTES
Colônia Santa Isabel
DE BETIM
INCAS – INSTITUTO CASA SANTA Citrolândia
NUBEM – NÚCLEO BENEFICENTE MIRANDINHA Colônia Santa Isabel
Fontes: CMDCA, junho de 2011 - Cadastro de Entidades.
33
Exceto creches.
389
Entidade Bairro
390
Entidade Bairro
GRIASC – GRUPO DE CRIANÇAS CARENTES VILA SÃO São Caetano
CAETANO
ABACIR - PROJETO EDUCAR I Laranjeiras
A Regional Norte possui 11 entidades registradas no CMDCA, das quais 5 são creches
e 6 executam outras atividades relacionadas ao atendimento às crianças e aos adolescentes. O
Quadro 69 apresenta a relação das entidades.
Entidade Bairro
SASFRA – SERVIÇO ASSISTENCIAL SALÃO DO ENCONTRO Santa Lúcia
NÚCLEO ASSISTENCIAL ESPÍRITA GLACUS Ingá
ABACIR - ASSOCIAÇÃO BETINENSE AMPARO AO CIDADÃO Nossa Senhora das Graças
EM SITUAÇÃO DE RISCO
Orientação e
apoio
sociofamiliar/
apoio
MISSÃO AMOR 12 a 18 anos 120
socioeducativo
em meio aberto/
colocação
familiar
395
TOTAL 1.119
Fonte: CMDCA, junho de 2011 - Cadastro de Entidades.
Entidade Bairro
PROJETO VIDA E VERDE – PRO-VIVER Guanabara
ASSOCIAÇÃO DE MORADORES DO BAIRRO PAULO CAMILO Paulo Camilo III
III
SAP- SOCIEDADE AMIGOS DO PETROVALE Petrovale
Atividades
PROJETO VIDA E VERDE – PRO-
culturais e 09 a 16 anos 413
VIVER
esportivas
ASSOCIAÇÃO DE MORADORES DO
Creche 03 a 05 anos 62
BAIRRO PAULO CAMILO III
Orientação e
SAP- SOCIEDADE AMIGOS DO
apoio 0 a 18 anos 80
PETROVALE
sociofamiliar
Não
ASSOCIAÇÃO CIDADÃO Qualificação houve
12 a 18 anos
PROFISSIONAL profissional atividades
em 2011
FEDERAÇÃO DAS ASSOCIAÇÕES
COMUNITÁRIAS DE BETIM – Desativada X X
FACBEM
TOTAL 555
Fontes: CMDCA, junho de 2011 - Cadastro de Entidades, entrevistas realizadas.
O Projeto Vida e Verde – Pró-Viver atende crianças de toda a regional PTB, possui
oficinas de circo, dança e canto, sendo a entidade mais importante na regional. O Pró-Viver
atende crianças e adolescentes em situação de risco, a partir de atividades voltadas para
desenvolvimento social. A ideia central é possibilitar a ampliação de escolhas e perspectivas,
para gerar possibilidades de transformação social através de atividades culturais, como
oficinas de dança, música e artesanato, sensibilização em educação ambiental e direitos
humanos, cursos de informática, recursos audiovisuais e jornalismo e promoção de esportes.
Sua participação efetiva nos atendimentos às crianças e aos adolescentes em 2011 gira em
torno de 74%, ou seja, 413 do total 555 atendimentos registrados para a regional PTB.
397
Reforço escolar e
1.661
MISSÃO RAMACRISNA curso 14 a 18
profissionalização
ASSOCIAÇÃO CIVIL NOSSA SENHORA Assistência a Todas as
60
DO CARMO - OBRA SOCIAL SÃO JOSÉ gestantes carentes idades
Cultural, educação
ABAS - ASSOCIAÇÃO BATISTA DE 04 meses a 16
infantil e 300
ASSISTÊNCIA SOCIAL anos
profissionalizante
TOTAL 2.021
Fontes: CMDCA, junho de 2011 - Cadastro de Entidades, entrevistas realizadas.
400
Fundada pelo professor Arlindo Corrêa da Silva em 1959, a Missão Ramacrisna desde
o início caracterizava-se como uma entidade preocupada com o futuro de crianças em situação
de risco e vulnerabilidade. Inicialmente a instituição era em Belo Horizonte, mas em 1963
inaugurou a sede em Betim, no Bairro Santo Afonso, na Regional de Vianópolis, que na
época funcionava como internato. A entidade tem como marca o investimento em atividades
educativas, e percebe a Educação enquanto recurso tanto para a promoção social como para
prevenção de mazelas sociais como a criminalidade, abuso infantil e juvenil, violência
doméstica, entre outras. Após o ano de 1992 a Ramacrisna iniciou suas atividades junto às
populações dos bairros próximos.
A Ramacrisna tem uma significativa participação no que se refere à atenção à criança
e ao adolescente, não só da região de Vianópolis como nas demais regionais da cidade. De
acordo com um representante da entidade, durante entrevista realizada em 2011:
São seis bairros da região, na regional de Vianópolis, que são o foco da nossa
atuação, mas agora, com os cursos profissionalizantes, nós estamos em toda Betim.
Ano passado nós formamos 906 jovens, e proporcionalmente, desses 906, seriam o
que: 10% da região, o resto de outros bairros da cidade.
ponto importante sobre essa organização é a sua sustentabilidade, segundo um dos dirigentes,
a entidade é capaz de suprir suas necessidades básicas e pagamento de pessoal mesmo sem as
parcerias. Segundo um dos dirigentes entrevistados: “a Ramacrisna, desde a década de
setenta, tem duas unidades produtivas e está nesse foco da sustentabilidade e das ações
sociais, tendo todo o lucro voltado para a garantia dos serviços ofertados ao público que a
Missão RamaCrisna atende.”
9.2 O Contexto das Organizações Não Governamentais e do poder público na gestão dos
programas de atendimento à criança e ao adolescente em Betim
As entidades pequenas não têm, então, eles não conseguem tirar um registro, e assim
não conseguem captar recursos, eles têm os documentos barrados e não conseguem
fazer parceria, entendeu? Não conseguem participar de um edital. E aí, ficam 70%,
80% das organizações dependendo do Poder Público, a hora que atrasa, fecha e
manda os meninos para casa. É isso aí.
Nós hoje contamos com a sede, que está em reforma nesse exato momento. A
reforma dela vai terminar agora no mês de julho, meados de julho. E essas
atividades acontecem com parcerias com outros órgãos.
Por exemplo, o futebol acontece no Complexo Poliesportivo no Teresópolis. As
aulas de fotografia nas escolas do bairro Teresópolis. E nos temos também encontros
com a comunidade. Esses encontros são da seguinte forma: a gente pede a esses
adolescentes e crianças que são atendidos pela instituição para estar convidando seus
pais, convidando seus amigos, para participar de algum momento de formação. Nós
já fizemos várias formações e essas formações sempre em parceria, às vezes num
auditório de uma igreja, às vezes no auditório de uma empresa da região.
Uma das lacunas notadas nas ações das ONGs, e que também pode ser percebida nas
demais esferas da Rede de atendimento à criança e ao adolescente, foi a dificuldade ou
inexistência de atendimento a adolescentes envolvidos em situações de violência como o uso
abusivo de drogas. Apesar de os temas da violência e drogadição estarem contemplados com
404
maior profundidade noutro capítulo do presente Relatório, eles serão brevemente comentados,
à medida que observamos que se constituem como desafio ou mesmo como uma lacuna nos
serviços prestados pelas entidades não governamentais.
Assim, a drogadição, que é entendida como intrínseca à violência urbana atual, é
apontada como um obstáculo instransponível cuja superação dependeria de esforços conjuntos
entre instituições municipais, estaduais, federais. É como se as entidades não governamentais,
e isso não é exclusividade delas, só conseguissem prestar atendimento aos meninos
“bonzinhos”, aqueles que se encontram mais distantes dos riscos sociais reconhecidos na
drogadição e na violência. “E até mesmo a violência na comunidade, que às vezes as crianças
não saem ou os pais ficam com receio, preferem deixar elas em casa do que a vir.”
Outro trecho, a partir da entrevistada da ONG Circo de Todo Mundo, expressa bem
esse contexto da violência enquanto dificultadora do acesso das crianças e adolescentes aos
serviços ofertados pela entidade:
É uma parceria que nós fizemos – não tem nada documentado – mas fizemos uma
parceria do CRAS estar trazendo os jovens deles também, do Projovem, em algumas
atividades aqui [...], essas oficinas mesmo, então, muitos adolescentes não quiseram
mais, os de lá do Projovem. Era como se dividisse em dois grupos, eu tentei unir os
dois grupos.
[...] “Ah não, tem um pessoal muito chato lá”, mas eu senti que o pessoal chato era
o pessoal mais careta, no caso, que eles chamam como caretas, que o pessoal daqui
era mais tranquilo, tanto é que falam “vocês pegaram os bonzinhos, os piores
ficaram com agente”, muitos falam isso.
No trecho acima, fica claro que essa dificuldade atravessa inclusive as relações
institucionais entre as ONGs e demais instituições da rede de proteção e de garantia de
direitos existente no município. Contudo, a violência interfere até mesmo no público (os
bonzinhos) que os serviços das ONGs conseguem atingir mais diretamente. A seguir, a
mesma entrevistada fala sobre os impactos gerados por um território marcado por situações de
violência envolvendo crianças e adolescentes e como isso parece comprometer o acesso, a
oferta e a qualidade dos serviços prestados:
Muitos já presenciaram um assassinato assim, na frente. [...] Então teve alguns
rapazes, que já faleceram, acho que uns dois, devido ao que aconteceu lá e eles estão
revidando aqui. Domingo teve um assassinato aqui também. Então eles estão
falando, que o pessoal do Granja está vindo revidar aqui, então é briga de bairro com
bairro, eu creio que seja por pontos mesmo, de drogas essas coisas.
[...] Eu atendi crianças carentes, de oito anos, que o sonho era ser traficante, porque
nas comunidades carentes, traficante é um título, de poder, de posse, é ter dinheiro.
Falei com ele, você sabe tudo que pode acontecer com o traficante, você acha que
vale a pena? Jogo pra ele: a responsabilidade é sua, você que é responsável por suas
405
escolhas. Então, os daqui, alguns já falaram assim: “Ah não, eu mexo com isso não,
neguim entra nessa e morre rapidinho”, tem uns que já tem essa consciência.
O menino hoje no bairro que a gente mora, na sociedade que a gente mora, o
tempo livre que ele tiver ele vai ter muitas oportunidades de ir para o caminho
errado. (Grifo nosso)
Então, a partir do momento que a gente tem a criança envolvida com atividades
legais, voltadas para a escola, voltada para a igreja, a gente consegue tirar parte do
tempo dele com o convívio com essas pessoas que vão levar ele.
Eu tenho primos nessa situação, amigos... a maioria dos amigos que cresceram
comigo e que não tiveram apoio talvez direto ou intenso, foram para o caminho
errado.
Então, eu acho que a partir do momento que nós tiver Educadores com espírito de
voluntário, por exemplo... porque a gente sabe que se o Educador chegar ali só para
dar aula, o menino vai entrar ali com problema e vai sair com problema.
Agora, se ele tiver uma ideia de voluntário, perceber que aquele aluno não está
rendendo não é porque ele é ruim, mas porque talvez ele está com um problema em
casa e chegar e conversar. Isso, é lógico, tem que ter uma estrutura atrás dele para
ele desenvolver esse trabalho ou então alguém que desenvolva esse trabalho para ele
dentro das escolas. Então, a partir do momento que a escola estiver bem estruturada
para receber esse aluno desde criança lá, desde a 1ª série, desde o Pré, e já ir
trabalhando isso com ele e a gente ter esses programas para envolver o tempo do
aluno, a gente consegue principalmente tirar esses adolescentes e jovens do
mundo das drogas, principalmente. (Grifo nosso)
Nesse sentido, notamos que há uma preocupação muito grande em ocupar o tempo das
crianças e adolescentes, como se isso por si, num contexto de um município com crescente
problema de violência, fosse um fator a mais de risco. Por outro lado, não percebemos em
nenhuma das ONGs ações que ofereçam à criança e ao adolescente a opção de decidir, por
eles próprios, a forma pela qual o “tempo livre” será preenchido. Ou seja, notamos que, de
406
uma maneira geral, nas ofertas de serviços destinados a ocupação do tempo havia pouco ou
quase nenhum protagonismo por parte dos adolescentes e crianças no sentido de poder
escolher sobre as atividades e as ações que irão ocupar seu tempo. Assim há uma tensão
dualista sobre o “tempo”, no sentido de que se não for preenchido pelos serviços
institucionais será preenchido pelo “mundo do crime”, como se a vida das crianças e dos
adolescentes estivesse numa situação dual entre o “bem” e o “mal”. O problema é que
também notamos que, para aqueles que já estão no “mal”, praticamente não há serviços
disponíveis.
Como parte da metodologia qualitativa deste estudo, que visa diagnosticar diversos
aspectos a respeito da situação da infância e da adolescência no município de Betim – MG,
foram realizados grupos focais com adolescentes e com as famílias (pais e responsáveis),
sendo que estes foram divididos de acordo com as regionais administrativas do município.
Foram cinco grupos focais com adolescentes, totalizando 52 participantes, sendo 25
adolescentes do sexo masculino e 27 do sexo feminino. Já com as famílias foram feitos quatro
grupos focais, com um total de 34 participantes, sendo 4 do sexo masculino e 30 do sexo
feminino.
A análise dos dados obtidos nos grupos focais com os adolescentes visa destacar a
percepção destes sobre questões distintas que permeiam seu cotidiano, bem como identificar a
maneira como várias relações se estabelecem, sejam estas no ambiente escolar e/ou familiar.
Propõe-se também identificar os anseios desses sujeitos em relação às perspectivas futuras,
além de atentar-se ainda para análise que fazem sobre seu município e os recursos/serviços
por este destinados às crianças e aos adolescentes da cidade. Para tanto, as entrevistas
realizadas com esses grupos focais enfatizaram os seguintes aspectos: relação das crianças e
adolescentes com a escola; relação destes com a família; utilização do tempo livre e práticas
de lazer; trabalho e projetos sociais; percepção das crianças e adolescentes sobre sua cidade;
e, por fim, a percepção destes justamente sobre a infância e a juventude.
Já os grupos focais realizados com as famílias dessas crianças e adolescentes (pais e
demais responsáveis) objetivaram focar nos seguintes aspectos: de que maneira as famílias
educam as crianças e adolescentes (quais os valores repassados, as dificuldades encontradas
por essas famílias e de que modo se dá a organização familiar); quais as principais
preocupações dos pais/responsáveis em relação ao futuro desses jovens; qual a percepção das
famílias sobre a escola e os projetos sociais destinados a crianças e adolescentes; principais
problemas enfrentados pela cidade no que diz respeito à infância e adolescência e quais as
suas sugestões.
408
Para melhor compreender a relação que essas crianças e adolescentes estabelecem com
a escola, nas entrevistas realizadas com os grupos focais de adolescentes buscou-se destacar
como estes avaliam a escola; qual a expectativa desses jovens com relação à escola e ao que
esta instituição pode proporcionar-lhes; como se dá o relacionamento entre os sujeitos neste
ambiente (alunos, professores, direção, demais funcionários) e como convivem diante das
normativas escolares, além de quais são, na visão dos entrevistados, os principais problemas e
desafios da escola, bem como sugestões para melhorias neste ambiente.
No que concerne à maneira como os adolescentes avaliam a escola e quais as suas
expectativas em torno dessa instituição, destaca-se a notável valorização da instituição. Em
geral, a valorização da escola aparenta estar intimamente relacionada às perspectivas sobre a
inserção dos jovens ao mercado de trabalho e o futuro profissional destes. Nesse sentido, as
falas dos entrevistados contribuem para elucidar a relação escola x futuro profissional:
Entrevistada: Olha, eu gosto da escola. Até que eu me dou bem com todo mundo, eu
me dou bem com os professores. Eu vejo a escola como oportunidade para mim no
futuro, porque eu pretendo ser Advogada. Então, eu acho que é isso: a gente tem que
construir uma base para, quando chegar lá, a gente conseguir.
409
Entrevistada: A gente precisa estudar. Igual ela falou, se a gente quer ser alguém na
vida, se a gente quer ter uma preparação para o mercado de trabalho, a gente precisa
estudar.
Entrevistada: A gente até que gosta, mas não é aquele gostar „ah, eu vou porque eu
gosto‟. Não é assim. Eu, por exemplo, sou assim: se for por gostar, eu não vou. Eu
vou porque eu preciso, eu vou porque eu quero ter um futuro.
Pode-se refletir, inclusive, em que medida essa concepção que os adolescentes têm da
escola como sendo o principal meio de acesso ao mercado profissional estaria contribuindo
para a permanência destes e a conclusão dos estudos (ensino fundamental e médio).
Aparentemente, os adolescentes percebem a escola como uma espécie de investimento de
longo prazo, e a valorização dessa instituição está intrinsecamente relacionada à valorização
social do trabalho e às possibilidades de inserção no mercado de trabalho que a escola lhes
propiciará, sendo que esse argumento pode ser confirmado na fala de alguns entrevistados:
Entrevistado – Eu acho assim, que o estudo ele é muito importante. Depois vai vir
através do estudo porque aqui vai refletir lá na frente. Tem muita gente que pensa: a
não vou estudar não e leva tudo na brincadeira e lá na frente reclama.
Entrevistada – Lá na frente é que vai ver qual foi o prejuízo que levou.
Entrevistada – Porque praticamente a gente com estudo já não é quase nada, sem...
Entrevistado: Ah, eu acho que seria a coisa pior que ia ser, porque a gente não ia ter
oportunidade nenhuma. Ia ficar muita criança na rua... sem aprender nada...
Entrevistada: Ah, o estudo para a gente é tudo. Porque se você para de estudar aqui
hoje, aí mais tarde você quer aprender a lê, uma coisa melhor para a sua família...
Eu acho que se a gente quiser ser alguma coisa na vida, a gente tem que estudar.
410
Observa-se que, além das atribuições curriculares, delega-se à escola também a função
de ocupar o tempo das crianças e adolescentes, especialmente para evitar que estes fiquem na
rua no período em que comumente os pais/responsáveis têm que sair de casa para trabalhar.
No que diz respeito à relação que os alunos estabelecem com os funcionários da
escola, especialmente professores, diretores e supervisores, nota-se que, geralmente, essa
relação está baseada num princípio hierárquico, no qual, comumente, as regras e normas que a
balizam também são estabelecidas nesse mesmo sentido hierárquico. Ou seja, observa-se que
frequentemente as normas e regras escolares são determinadas pelos professores/diretores da
escola, sem que necessariamente os alunos tenham voz ativa no processo de construção dessas
injunções.
Acredita-se que isso possa acabar se tornando um ponto de tensão entre discentes e
docentes, na medida em que essas normas, sendo elaboradas apenas por parte dos sujeitos que
compõem o ambiente escolar, podem mais facilmente tender a enaltecer o universo adulto,
bem como os interesses desse grupo específico. Ou seja, compreende-se que a não
participação das crianças e adolescentes na composição das normativas escolares contribua
para que esse código estabelecido seja mais frágil, na medida em que tal elaboração
facilmente irá corresponder apenas à demanda de um grupo.
É possível confirmar que grande parte das reclamações dos adolescentes em relação à
escola diz respeito justamente ao modo como certas normas são burladas pela própria
instituição, em determinadas situações. Um exemplo disso se refere ao relato de alguns
estudantes que afirmam que, em alguns eventos festivos, a escola venderia bebidas alcoólicas
e cigarros.
Entrevistado: Quando tem festa a escola vende cigarro. Só em eventos tipo
quadrilha.
Entrevistador: Aqui também vende tabaco nas festas?
Entrevistada: Vende.
Acredita-se que esse fato seja interpretado negativamente pelos adolescentes, uma vez
que esses sujeitos demonstram, por meio de outras falas, conhecimento sobre a ilegalidade do
ato, e, portanto, julgam incorreta tal atitude da direção escolar.34
Muitos adolescentes também demonstram descontentamento em relação à aplicação
das normas escolares, pois afirmam que algumas regras e normas não se aplicam de maneira
igualitária para todos os sujeitos que compõem o ambiente escolar. Ou seja, há casos em que
34
Destaca-se que frequentemente os adolescentes entrevistados discorreram sobre a facilidade que menores têm
para comprar álcool e tabaco (além de drogas ilícitas), de maneira que este fato pode ser considerado um dos
problemas que devem ser enfrentados, em relação à situação da infância e da adolescência em Betim.
411
os mesmos procedimentos não são igualmente aplicados em situações similares, seja entre os
alunos ou entre alunos e professores. Pode-se citar como exemplo o uso de roupas curtas na
escola, o uso de celulares e a má conservação dos materiais, que, de acordo com a fala de
alguns entrevistados, é algo que deveria ser proibido a todos, mas nota-se a abertura de
exceções para algumas pessoas:
Entrevistado: Começar na escola e os professores também. É igual a professora
Maria35 que ela estava falando do debate da direção da escola o que queria mudar.
Muitas vezes eles fazem assim: os alunos não vão vir de short curto, não vão vir
com essa ou aquela roupa e os primeiros que vem são os professores. Tem uma
professora lá – já tiveram duas – que a professora vai com um short super curto de
parar a escola quando ela passa.
Entrevistado: O dia que nós descemos para reclamar da professora, uma das
reclamações foi que o pessoal fala muito pra gente não estragar os materiais e ela
fica nervosa pega a cadeira e bate no chão.
Contudo, nota-se que nos casos em que a aplicação dessas normativas é devidamente
executada, os próprios adolescentes se posicionam de maneira favorável a tais medidas; como
no caso de um aluno que diz o seguinte:
E interessante que teve um menino também que ele escreveu, num dos primeiros
dias que chegou ele escreveu na carteira branca. Aí a direção falou com ele para
limpar. Agora nem vê se escreveu na carteira ou não escreveu. Ou seja... (Entrevista
– Grupo focal com adolescentes)
35
Qualquer nome utilizado nas transcrições das entrevistas será fictício, visando preservar a identificação dos
envolvidos neste estudo.
412
sentido, uma das entrevistadas afirma: “Nossas aulas são muito boas, porque os professores
impõem respeito também, muita gente respeita os professores” (Entrevista – Grupo focal com
adolescentes).
Nota-se ainda que, desde que superados esses pontos de conflito na relação entre
discentes e docentes, grande parte dos adolescentes também valorizam a figura do professor
como sendo alguém importante para seu futuro, conforme citado por um dos adolescentes
entrevistados, que afirma o seguinte: “Eles [os professores] pega no pé porque quer o melhor
para a gente, com certeza. Nunca quer ver o mal na gente” (Entrevista – Grupo focal com
adolescentes).
Nos relatos dos entrevistados, essa valorização aparece em aspectos tais como o
comprometimento do professor com os alunos, o tipo de tratamento que recebem dos
docentes, as preocupações que percebem que os professores demonstram em relação ao futuro
destes alunos etc. Um dos entrevistados, inclusive, menciona uma ocasião na qual a postura
da diretora da escola parece ter sido fundamental para a melhoria de seu desenvolvimento
escolar. Esse adolescente afirma que “também tive muita ajuda da escola, por causa que eu
estava até numa fase muito difícil em casa, aí aqui a diretora Maria conversou comigo e tava
me mostrando que não era bem assim do jeito que eu estava pensando... me ajudou bastante”.
Ou seja, nesse caso, a participação da escola foi fundamental para que esse adolescente
superasse certos problemas familiares e mantivesse um bom desempenho escolar. Percebe-se,
portanto, a importância no estabelecimento de um diálogo constante entre família e escola, de
modo que este esteja direcionado a verificar e atender, da melhor maneira possível, as
necessidades das crianças e adolescentes, de maneira que família e escola possam trabalhar
em conjunto a fim de garantir os direitos desses indivíduos.
No que concerne à relação entre alunos e professores, ressalta-se que os adolescentes
afirmam que as brigas entre estes não constituem episódios comuns, mas sim acontecem de
maneira pontual: quando um determinado aluno ou grupo de alunos tem algum
desentendimento com um determinado professor/diretor/funcionário da escola. Quando há
reclamações sobre os professores, por parte dos adolescentes, muitas vezes estão relacionadas
à postura desses profissionais. Alguns dos entrevistados afirmam descontentamento quando
notam que, segundo eles, alguns professores não demonstram interesse pela atividade de
lecionar, ou ainda que os docentes estivessem aparentemente estressados ou frustrados com a
profissão e/ou condições de trabalho e por isso tratariam mal os alunos;
413
Percebe-se neste relato que os adolescentes podem ser motivados por atividades que,
em certa medida, apresentem uma dinâmica pedagógica diferenciada, de modo a trabalhar a
construção do conhecimento curricular com outras técnicas de aprendizagem, que não sejam
apenas aulas expositivas com a utilização do “quadro e giz”. Além disso, outro ponto crucial
na relação alunos x professores explícita nesse relato diz respeito à visão negativa que os
adolescentes têm em relação à postura de alguns docentes, e que se acredita ser uma
importante questão a ser trabalhada, visando à melhoria das relações entre os sujeitos que
compõem o ambiente escolar.
Obviamente, esta visão negativa sobre a postura de alguns professores não é regra,
mas de toda maneira deve ser observada, principalmente considerando-se o valor e as
expectativas que crianças e adolescentes depositam na escola e na figura do professor, como
sendo grandes responsáveis pelo seu futuro, especialmente no que concerne à vida adulta e à
inserção no mercado de trabalho. Dessa maneira, cabe expor o relato abaixo, que melhor
esclarece tais levantamentos:
[...] Tem professor que entra dentro de sala e senta lá, passa a atividade, não explica,
passa a matéria no quadro e deixa o aluno se ferrar lá e aprender sozinho. Eu acho
que o professor deveria ter empenho, ele ser capacitado, porque o governo não
capacita os professores, qualquer instituição capacita bem. Tem professores que são
excelentes. Amo o professor Marcelo, ele explica a matéria. Tem professores lá que
eu já discordo, que entra, passa a atividade e não está nem aí para o aluno. O aluno
sai do 3º ano aqui sabendo nada: entrou, sentou lá, cumpriu sua carga horária,
porque tem que vim, e sai sem aprender nada. Mas tem professores que sabem
explicar bem.
E, reforçando ainda mais o que foi dito sobre a importância do papel da escola e dos
professores na formação das crianças e dos adolescentes, pode-se fazer referência ao trecho
abaixo, no qual os adolescentes entrevistados explanam justamente sobre o que consideram
atitude positivas por parte do corpo docente:
414
Entrevistador: Sem ser por causa de bagunça, sem ser por motivo às vezes por uma
coisa assim que o professor não gostou. Sem ser por esses motivos, tem algum tipo
de coisa que a escola faz que os pais também vêm?
Entrevistado: Reuniões que eles faz para falar como que está o aluno, o
comportamento.
Entrevistado: Às vezes, quando o menino é bagunceiro mesmo, ela chama.
Entrevistado: Quando tem alguma festa na escola da família, vem a família.
Pelo que foi possível verificar no estudo de campo, as reuniões de “pais e professores”
aparentemente não se fazem com frequência. E, além disso, a presença espontânea destes na
escola, com o intuito de acompanhar o desenvolvimento escolar dos filhos, não é algo
comum.
Entrevistado: Tem reunião, [trecho confuso] essas coisas, às vezes minha mãe vai,
às vezes ela não vai.
Entrevistado: A minha não vem muito não, porque ela trabalha.
Entrevistado: A minha mãe trabalha de 2ª a 6ª. Reunião, só se for... Ela sempre vem
na reunião na parte da noite, ela vem e conversa diretamente com a diretoria. E
bagunça comigo até que agora ela não está tendo problema não, porque eu assinei só
um bilhete no ano todo. Agora o problema está sendo a minha irmã.
Entrevistador: E vocês?
Entrevistado: Eu também mais ou menos. Porque ano passado minha mãe até que
vinha, só que agora ela está trabalhando. Eu nem vejo a minha mãe, só vejo ela à
noite, porque ela sai cedo e chega tarde.
Além disso, deve-se considerar também o fato de que parte desses pais/responsáveis
não teve acesso à escola (ou então esse acesso se deu de maneira muito limitada), e isso pode
contribuir para a incompreensão destes em relação aos procedimentos escolares: quando e por
que ir à escola dos filhos? Como auxiliar as crianças e adolescentes, inclusive, nas tarefas
escolares?
Entrevistador: E os pais de vocês... Como que é em casa? Tem hora que eles
chegam a ajudar um pouco no dever de casa? Quando tem alguma dúvida, eles às
vezes ajudam?
Entrevistado: A minha mãe não me ajuda, porque ela não estudou, ela estudou só até
a 1ª série.
Entrevistado: Minha mãe sempre acompanha eu nos negócio. Mas quando eu
preciso, ela está lá do meu lado. Ela sempre olha meus caderno.
Entrevistado: A minha mãe ficou [trecho confuso]. Saiu. Infelizmente, quando ela
passou para o 2º, ela parou de estudar.
Entrevistador: E vocês, José, sua mãe, seu pai?
Entrevistado: A minha mãe estudou só até o Pré. [riso]. Ela saiu da escola, o pai dela
tirou ela da escola.
Entrevistado: Ela vem sim. Ela quer saber o meu desempenho na escola, quer saber
se eu fiz confusão na escola, ela quer saber, ela quer ser informada de todos os
detalhes.
Entrevistado: Minha mãe também é muito presente. Ela me pergunta, quando não dá
para ela comparecer na escola, ela liga. Sempre ela está querendo saber de tudo que
está acontecendo, a direção sempre está em contato com ela, porque eu também não
sou muito santo.
416
Entrevistado: Tem um supervisor lá e ele fica olhando. É o João. Ele fica ajudando
na hora do recreio. Acho que briga não tem mais porque eles fazem assim. Ele
36
A questão da violência e segurança pública é um problema comum, citado não apenas no ambiente escolar,
mas no âmbito da cidade em geral.
417
ajuda. Eu acho precisa ter mais pessoas assim. Ele ajuda. Eu acho que melhora
alguns pontos. Fazer fiscalização mesmo. Tem alunos que entram com drogas na
escola. Os professores não sabem, mas os alunos sabem.
Entrevistado: Tem um menino lá que fica fumando dentro do banheiro.
Entrevistado: Já vim a noite e vi o menino fumando droga.
Por vezes, é possível notar nos relatos dos adolescentes que a urgência na
implementação de tais medidas de segurança sobrepõe o discurso quanto à necessidade das
medidas voltadas para a conscientização em relação ao problema da violência (como palestras
e demais medidas preventivas, por exemplo). Porém, é importante ressaltar que,
aparentemente, isso está relacionado à urgência de soluções mais imediatas na mediação
desses conflitos. Tanto que, por várias vezes, os adolescentes deixam transparecer a noção de
que há necessidade de se criar medidas direcionadas para a conscientização e prevenção dos
episódios de violência, porém, isso é algo que demanda tempo e, portanto, deve ser pensado
como medida ao longo prazo:
Entrevistador: O que mais tem aqui é briga?
Entrevistado: Nossa escola também.
Entrevistador: Na sua escola também tem muita briga?
Entrevistado: Tem muito vandalismo também.
Entrevistado: Depois do projeto...
Entrevistado: Ontem teve uma briga lá.
Entrevistado: Vandalismo no banheiro, essas coisas assim.
Entrevistado: Mas depois do projeto diminuiu muito.
Entrevistado: É. Diminuiu bastante.
Entrevistado: Porque a diretora falou que não ia mais chamar os pais. Era coisa para
fazer boletim de ocorrência. Quem brigasse mais na escola ia ter boletim de
ocorrência.
Entrevistado: Trouxe mais policiamento na escola também.
Entrevistador: Tem policiamento?
Entrevistado: É. Um guarda municipal na porta no final.
Percebe-se também que esse quadro de violência não se limita ao interior da escola,
sendo que por diversas vezes os relatos dos adolescentes entrevistados mencionam episódios
violentos no entorno das escolas. É importante destacar que tais acontecimentos, sejam dentro
ou fora das escolas, afetam de maneira considerável a percepção que esses sujeitos têm em
relação à sensação de segurança, pois com frequência estes citam não se sentirem seguros,
seja na escola ou na “rua”. E, em especial no caso das escolas, houve muitos relatos sobre
episódios de violência nesse ambiente e em seu entorno:
Entrevistado: Essa escola aqui também já parou de funcionar por causa disso.
Entrevistado: Já. Já parou de funcionar por causa disso. Eles invadiram a escola eu
acho que foi duas vezes.
Entrevistado: Duas vezes, para tentar matar, mas só que eles não conseguiram.
Acertou [trecho confuso].
Entrevistado: Eles entraram dentro da escola para matar o menino.
Entrevistador: O menino fugiu?
418
Entrevistado: Fugiu.
Entrevistado: Aqui na escola mesmo, final de semana eles já acertaram um menino,
deu um tiro na perna dele.
Outro agravante percebido em relação aos problemas das escolas é o fato de que
alguns entrevistados afirmam já ter presenciado o consumo de álcool e/ou drogas dentro
dessas instituições de ensino. Alguns relataram, durante a realização dos grupos focais, que
outros alunos consomem álcool e/ou drogas no banheiro da escola, por exemplo, e, além dos
problemas jurídicos / legais que envolvem essa questão (no que diz respeito ao uso dessas
substâncias por menores de idade), há ainda o problema relacionado ao local no qual isso
ocorre. Isso porque se acredita que o consumo de álcool e drogas nas escolas contribua ainda
mais para reforçar a sensação de medo e insegurança nas crianças e adolescentes que
convivem nesse ambiente, uma vez que os próprios entrevistados acreditam que as pessoas
que fazem uso dessas substâncias tendem a ficar mais vulneráveis a brigas/discussões com
outros alunos e professores.
No tocante aos relatos sobre o uso de álcool, cigarro e outras drogas por adolescentes,
cabe ressaltar também a afirmativa dos entrevistados sobre a facilidade para que menores de
idade comprem tais produtos (inclusive variados tipos de drogas ilícitas, como, maconha,
cocaína, crack).
Entrevistado: Os menino agora fecha o banheiro na hora do recreio [...] porque os
menino fumava maconha dentro do banheiro também.
Entrevistado: Pinchava o banheiro todinho...
Entrevistado: Eu lembro da vez que pincharam o banheiro. Eu nem estudava de
manhã ainda.
Entrevistador: Tem muita pichação?
Entrevistado: Tem.
Entrevistado: Tem. Coloca palavras absurdas.
37
Em todos os grupos focais realizados com os adolescentes, um dos problemas das escolas citado com mais
ênfase foi a má infraestrutura das quadras esportivas.
420
Em geral, os adolescentes alegam que as quadras não são cobertas – o que prejudica o
exercício de esportes tanto em períodos ensolarados quanto chuvosos – e também falta
material adequado para a prática esportiva diversificada (já que muitas vezes as aulas de
educação física se limitam ao futebol). Como foi citado por uma das adolescentes, “a gente
pode ver que a nossa quadra não é coberta, a nossa educação física é debaixo de sol, a gente
pode ver isso também” (Entrevista – Grupo focal com adolescentes).
Contudo, chama a atenção no relato desses adolescentes o fato de que, além da noção
de que há necessidade que o governo faça investimentos nas áreas de infraestrutura das
escolas, estes também demonstram clareza quanto à necessidade que a sociedade em geral
contribua para a conservação dos locais públicos, como as escolas, por exemplo:
O recreio é tão pequeno que, se a gente vai comprar lanche, não dá tempo. Aí a
gente fica aqui embaixo enrolando quando bate o sinal ainda. É difícil de comprar lá.
E vai ali, pede alguém para comprar na padaria, ou senão os menino pula, para ir lá
comprar. Aí depois xinga a gente, dá bilhete, que a gente ficou aqui embaixo, depois
que bateu o sinal. (Entrevista – Grupo focal com adolescentes)
antes poderiam ser utilizados para recreação, brincadeiras, ou seja, para o desenvolvimento
lúdico. E, sendo assim, cabe analisar mais profundamente se este pode ser um dos fatores que
influencia para esta “bagunça” no horário destinado ao recreio, visto que esse período escolar
acaba por se transformar num momento no qual as crianças e adolescentes podem vivenciar
um convívio mais próximo com seus pares, e se valer da liberdade percebida no recreio para
extravasar tanta energia...
Também é importante comentar que a quantidade de alunos nas salas de aula é
criticada pelos entrevistados, pois estes avaliam que as classes lotadas interferem
negativamente no desenvolvimento escolar, considerando-se que, provavelmente, o professor
que leciona ali terá menos tempo disponível para atender às necessidades individuais desses
alunos. Outro agravante apontado para o mau desempenho escolar é o caso de alguns
estudantes que são apontados pelos entrevistados como sendo “bagunceiros”, “desordeiros”,
ou seja, “alunos que fazem bagunça e atrapalham a aula”:
coisa e muitos alunos não tem como ser aquela divisão correta. (Entrevista – Grupo
focal com adolescentes)
Como são muitos alunos, nem todos são selecionados para poder assistir. Aí às
vezes alguns pode, alguns deixa, fica sem assistir. Não são todos, tem alguns
professores que traz para assistir, aí uns fica atrapalhando, aí sai prejudicado, aí não
termina de assistir o vídeo. Alguns alunos vai para assistir o vídeo, fica conversando,
fazendo zoação do vídeo. (Entrevista – Grupo focal com adolescentes)
Todas essas declarações dos próprios adolescentes contribuem para evidenciar que
estes, ao contrário do que muitas vezes é disseminado pelo senso comum, estão seriamente
interessados na escola e nos conteúdos que podem ser aprendidos nesse ambiente. Porém, nos
cabe refletir a respeito de questões, tais como: qual o tipo de escola idealizada por essas
crianças e adolescentes? Em que medida se fazem necessárias modificações didáticas,
pedagógicas e estruturais que possam garantir a qualidade de ensino almejada por esses
estudantes? Pois, a partir da análise dos grupos focais com os adolescentes, é possível reforçar
argumentos em relação à necessidade de mudanças e investimentos (tanto em caráter
quantitativo quanto qualitativo) que possam garantir a melhoria e manutenção de escola
pública de qualidade a ser ofertada a esses jovens.
Pensando nesta e demais questões, os próprios adolescentes sugerem algumas medidas
que acreditam ser capazes de propiciar melhorias na qualidade do ambiente escolar. Muitos
sugerem que haja atividades diferenciadas (extraclasse) que propiciem maior interação entre
os alunos e demais funcionários da escola. De acordo com os adolescentes, é necessário que
se façam investimentos que possibilitem melhoria da relação aluno x professor, tais como:
palestras educativas, projetos nas escolas etc.
Os adolescentes também se mostram favoráveis à criação de projetos na escola que
promovam participação e interação entre os sujeitos que compõem este ambiente – podendo
ser também um método para diversificar a rotina de estudo das matérias curriculares. Há
sugestões, inclusive, de projetos que pudessem ocupar o tempo livre de alguns alunos com
atividades variadas e “interessantes”, evitando que crianças e adolescentes fiquem na “rua”
fora do horário das aulas.
Os adolescentes também dão várias sugestões para melhorar a escola, no que diz
respeito à infraestrutura (salas; banheiros; pintura; quadros, mesas e cadeiras). Mas também
demonstram a noção de que, além das reformas, é fundamental que haja conservação do
ambiente, e que para isso é necessário a contribuição de todos os sujeitos envolvidos nesse
ambiente. Ou seja, afirmam ser preciso que todos, especialmente os alunos – que muitas vezes
são responsáveis pela “destruição” desses locais –, assumam a responsabilidade em contribuir
423
Entrevistador: Marco Antônio – Para a escola ficar mais legal, o quê que precisaria?
Para a escola ficar mais legal e para a aula ficar mais legal, para ficar melhor...
Entrevistado: Ter professor mais gente boa.
Entrevistado: Colaboração dos alunos também... a bagunça...
Entrevistado: É todo mundo se unir, conversar...
Entrevistado: Mais projetos educativos, eu acho que seria bem melhor.
Entrevistador: Projetos? Como assim?
Entrevistado: Tipo assim... levar os alunos para conhecer alguns lugares, igual por
exemplo a casa da cultura, o Inhotim... eu acho que seria bem melhor. Eles até
chegam a levar, mas é muito raro, não é sempre. Eu acho que seria bom.
Entrevistado: E às vezes nem é todo mundo, é algumas pessoas.
Entrevistado: É. As pessoa mais boa da sala.
Entrevistado: Eles põe as pessoa mais inteligente de cada sala para levar.
Na citação acima, é possível ilustrar alguns dos pontos propostos pelos alunos, além
de reforçar a necessidade de que as ações, projetos e atividades nas escolas não sejam feitas
de maneira seletiva, de modo a excluir alguns alunos; mas sim que sejam elaborados e
executados de maneira a atender a todos os alunos, visando melhorias no processo de
socialização neste ambiente.
Ao se analisar a percepção que os adolescentes têm sobre a relação com seus pais e/ou
responsáveis, evidencia-se que as famílias demonstram estar apreensivas quanto ao futuro das
crianças e adolescentes, devido ao medo de que a violência e a criminalidade possam atingi-
los. Esta parece ser uma das questões que mais norteia o tipo de conduta adotada pelos
pais/responsáveis e as orientações que estes repassam às crianças e adolescentes, no sentido
de educá-los. Além disso, os entrevistados também discorrem a respeito dos anseios que seus
424
Outro motivo de apreensão das famílias diz respeito à permissão para que esses
adolescentes comecem a namorar. Nesse sentido, nota-se um conflito de gerações sobre o que
se pode ou não permitir aos adolescentes, além das dúvidas sobre quando consentir esse tipo
de relação aos filhos. Especialmente no caso das meninas, evidencia-se que há uma grande
preocupação por parte das famílias de que elas engravidem na adolescência, e isso faz com
que, em muitos casos, a criação das meninas seja mais rígida.
38
Tanto nos grupos focais com os adolescentes quanto nos grupo focais com as famílias, é possível notar que os
adolescentes, bem como seus pais e/ou responsáveis, denotam à escola grande valorização e responsabilização,
por acreditar que esta seja uma das principais responsáveis pela garantia do acesso ao mercado de trabalho.
425
Cabe destacar que muitas adolescentes afirmam que suas mães têm medo de que elas
engravidem na adolescência por terem passado por essa experiência e por considerá-la
negativa, devido a fatores tais como: aumento da possibilidade de abandono escolar,
diminuição das possibilidades de inserção ao mercado de trabalho, não aceitação social etc.
Uma das entrevistadas ilustra essa situação, na seguinte fala:
A minha me proibia de muitas coisas, foi no ponto que eu revoltei, por causa que
tipo assim ela tinha medo de acontecer comigo o que aconteceu com ela. Porque
meu pai nunca quis assumir, mas tipo assim ele que deu o dinheiro para ela poder
fazer aborto e ela não aceitou. Ela sempre trabalhou e cuidou de mim (Entrevista –
Grupo focal com adolescentes).
Geralmente, os entrevistados concordam com essas atitudes, pois isso demonstra que
seus familiares se importam com seu futuro e estão atentos às questões que os envolvem,
objetivando possibilitar a essas crianças e adolescentes um bom futuro.
No que concerne às formas de punição aplicadas pelos pais e responsáveis, os relatos
dos adolescentes indicam ser comum estes baterem nos filhos, como maneira de corrigi-los ou
puni-los por algo errado que tenham feito.
Entrevistado: Meu pai mesmo não bate não. Quem mais bate mesmo é minha mãe.
Na vida foi umas 4 ou 5 vez que meu pai me bateu.
Entrevistador: E vocês?
Ela pega uma vara, passa azeite e bate.
Entrevistador: E dói?
Entrevistado: Dói. [risos]
Entrevistador: E você, Maria, quando desobedece seu pai?
Entrevistada: Ele bate de chinelo.
Entrevistado: Eu não sou muito de desobedecer meu pai não, mas quando eu
desobedeço, ele tira a coisa que eu mais gosto de assistir. Eu adoro, fico o dia inteiro
naquele negócio e não saio. Aí ele fala assim „você não vai assistir hoje‟. Eu tenho
que não assistir. Se eu não obedecer ele, ele corta no coro.
426
Além disso, outra forma de castigo muito citada são as “proibições”. De acordo com
uma entrevistada, “aquilo que eu sempre quero a minha mãe vai e não me dá. Meu pai mesmo
não bate não. Quem mais bate mesmo é minha mãe. Na vida foi umas quatro ou cinco vez que
meu pai me bateu” (Entrevista – Grupo focal com adolescentes). Os adolescentes afirmam
que, comumente, seus responsáveis os proíbem de usar o computador/internet, ou não os
deixam sair de casa, por exemplo.
Entrevistada: A minha mãe não é de me bater não, porque tem mais ou menos uns
sete anos que eu não apanho, mas castigo ela coloca: computador, sair com o
namorado, sair com amiga, telefone, aí ela corta um pouquinho.
Entrevistado: Lá em casa é assim: castigo, sem as coisas que eu gosto... Aí minha
mãe tira. E resolve, porque antes eu ia na direção direto. Agora, desde a 7ª série, é
muito difícil, eu não estou indo mais.
Observa-se que os adolescentes aparentam estar de acordo com grande parte das
punições/castigos impostos pelos pais, pois argumentam que tais castigos são necessários e
contribuem para boa formação do caráter de crianças e adolescentes. Isso porque acreditam na
necessidade de haver normas, regras, limites e uma relação hierárquica para orientação da
vida adulta. E argumentam, inclusive, que o envolvimento de muitos jovens com
violência/crimes/drogas pode ser devido à falta de limites que deveria ser imposta pelos pais.
No que concerne ao relacionamento entre irmãos, apurou-se que, em geral, os filhos
mais velhos têm que ajudar a cuidar e “vigiar” os irmãos mais novos, pois essa é uma
imposição frequente dos pais. Percebe-se que na relação entre irmãos é comum o relato sobre
brigas, discussões, mas também há uma noção da necessidade de “cuidado” entre esses
sujeitos – como se fosse um sentimento de proteção entre os irmãos.
Outro dado relacionado à organização familiar diz respeito à realização de tarefas
domésticas pelas crianças e adolescentes. Grande parte dos adolescentes afirma ajudar nas
tarefas domésticas de sua casa, sendo que as atividades mais frequentes são arrumar a casa,
lavar vasilhas, cuidar dos irmãos mais novos. É comum ouvir relatos como o seguinte:
“E eu ajudo bastante a minha mãe. Igual a questão mesmo de casa. Eu tento às vezes
ajudar ela a arrumar a casa, igual a cozinha mesmo eu que arrumo para ela ou é meu
pai, por causa que ela trabalha à tarde, aí a gente tem que ficar sempre ajudando”
(Entrevista – Grupo focal com adolescentes).
algumas atividades cotidianas, em função dos seus horários de trabalho. Além disso, há casos
em que esses jovens contribuem realizando algumas atividades que envolvem o trabalho dos
pais/responsáveis, caso estes trabalhem em casa ou como autônomos (com comércios dos
tipos bares ou mercearias, por exemplo). Um dos entrevistados ilustra essa situação, quando
diz: “[...] Meu pai é comerciante, ele tem um bar aqui em frente à escola. Aí eu já ajudo ele,
todo final de semana eu ajudo ele também” (Entrevista – Grupo focal com adolescentes).
Quanto à realização dessas tarefas domésticas, nota-se que os adolescentes não
demonstram prazer na realização delas, mas ainda assim argumentam que tal auxílio prestado
é imprescindível, tanto para ajudar em casa (especialmente no caso de “mães” que trabalham
fora), quanto para que amadureçam em relação às obrigações da vida adulta e se tornem
sujeitos responsáveis. No entanto, há alguns relatos nos quais os adolescentes deixam
transparecer que, em algumas situações, a rigidez dos pais/responsáveis quanto ao
cumprimento dessas atividades pode ser prejudicial. Para melhor elucidar tais situações,
podem-se citar casos nos quais essas tarefas domésticas acabam por prejudicar o
desenvolvimento escolar de crianças e adolescentes, como nos relatos abaixo:
Entrevistador: E o quê que vocês acham... para vocês estudarem, essas atividades
que vocês fazem, atrapalha? Ou não atrapalha? O quê que vocês acham?
Entrevistado: Eu acho que não.
Entrevistado: De vez em quando dá uma atrapalhada, mas... É normal.
Entrevistado: Ah, eu acho que atrapalha muito.
Entrevistador: É? Como assim?
Entrevistado: Porque eu, por exemplo, poderia fazer muitas outras coisas, como
participar do basquete, participar de vários cursos da comunidade. Só que eu tenho
que ficar em casa olhando meu irmão.
Entrevistador: [...] Mas pensando assim quando tem uma prova ou tem um
trabalho... por exemplo, às vezes tem semana que tem muita coisa na escola. E aí
essas atividades... Vocês conseguem... Como é que fica isso?
Entrevistado: Quando tem trabalho na escola de dupla, aí não dá tempo de terminar
ele na sala, a professora manda terminar na casa de alguém. Aí minha mãe fala,
quando eu terminar as coisa tudo, eu posso ir, eu tô liberada para ir.
Entrevistador: Você consegue ficar liberada também, Maria?
Entrevistado: Para fazer assim trabalho de escola, minha mãe até faz um esforço de
olhar meu irmão para mim. Eu acho que sim.
Entrevistador: E você, João?
Entrevistado: Eu não. Alguém tem que ir lá em casa, porque os três, né... Só Deus!
Entrevistador: Você é o mais velho?
Entrevistado: Sou.
Ressalta-se que o destaque dado aos relatos não significa considerar negativa a atitude
dos pais/responsáveis ao educarem seus filhos com o compromisso de auxiliarem em tarefas
domésticas. Porém, cabe refletir em que medida a realização dessas atividades ou mesmo de
alguns pode prejudicar os alunos no seu desempenho escolar. Ou seja, devem ponderar quais
428
Outras maneiras comuns das crianças e adolescentes aproveitarem o tempo livre são:
assistir à televisão, praticar algum esporte (sendo futebol, vôlei e basquete os mais
frequentes), ou participar de atividades ligadas à igreja (corais, grupos de jovens etc.).
Quanto às práticas esportivas, muitos adolescentes têm como referência para essa
finalidade um espaço denominado “Horto”, no qual crianças e adolescentes se reúnem para
jogar futebol, vôlei, basquete. Esse espaço é frequentemente citado pelos adolescentes, seja
por aqueles que o utilizam ou mesmo por quem apenas tem conhecimento desse local e sua
finalidade:
Entrevistado: Tem o Horto.
Entrevistado: A gente faz vôlei lá no Horto.
Entrevistado: Eu pratico esporte lá no Horto.
Grande parte dos adolescentes afirma que gostaria de ter mais opções de lazer na
cidade para melhor aproveitar o tempo livre. Entre essas opções, citam com frequência a
necessidade em se ter mais parques, praças e espaços para a prática de esportes na cidade.
Além disso, a questão da segurança e conservação das áreas públicas parece ser fundamental
para que, caso exista investimento público para a criação desses espaços, haja a garantia que
os mesmos possam ser aproveitados com qualidade e segurança pela população.39
39
No tópico 11.1.5 essa questão será aprofundada a partir de discussões sobre a “desapropriação” de alguns
espaços públicos devido à sensação de medo/insegurança acentuada nos locais com frequência de assaltos,
tráfico e consumo de drogas etc.
431
todos, funcionariam de maneira seletiva, ou seja, apenas parte da população alvo pode
participar. Além disso, mencionam também que alguns programas/projetos se iniciam, mas
são interrompidos precocemente devido a motivos variados
Outro fator a ser considerado em relação aos projetos sociais diz respeito à divulgação
e às informações sobre eles. Porém, não basta apenas se discutir sobre o nível de divulgação
e/ou informação coerente sobre determinado projeto social, pois se acredita ser necessário
refletir especialmente sobre a maneira que esta é realizada. Ou seja, em que medida esses
eventos se fazem atrativos ao público para o qual são direcionados? Quais são, de fato,
atividades que despertam interesse nas crianças e adolescentes e que contribuem para seu
desenvolvimento?
Entrevistador: E o quê que vocês fazem com o dinheiro, quando vocês recebem?
Entrevistado: Eu junto.
Entrevistado: Eu dou metade para a minha mãe e fico com a metade.
Entrevistado: Eu não aguento ficar com ele parado. Eu compro bala [risos].
432
Entrevistador: E você, Ana, parece que você comentou também... Você faz alguma
atividade?
Entrevistada: Não. Eu só olho meu sobrinho.
Entrevistador: Ah. Mas aí você ganha?
Entrevistada: Sim.
Entrevistador: E você olha ele é diariamente?
Entrevistada: É.
Entrevistador: O quê que você faz com o dinheiro que você recebe?
Entrevistada: Eu gasto... risos]
Entrevistador: Vocês têm muitos colegas assim que vocês conhecem que também
trabalham? Que fazem alguma atividade assim para poder ganhar algum
dinheirinho?
Entrevistado: Temos.
Entrevistado: Eu tenho bastante.
Entrevistado: Na escola tem uns colegas (18‟43‟‟).
Entrevistador: Qual que é a idade deles?
Entrevistado: Um de 15 e outro de 14.
Entrevistador: E você, Joana, conhece também muita gente?
Entrevistado: Conheço. A menina da minha rua, a vizinha, ela olha um menininho e
uma menininha. A irmã dela trabalha na casa dos outro. O irmão dela trabalha lá na
Colônia, não sei de quê. E algumas outras pessoa que eu não estou lembrando, eu só
estou lembrando...
Entrevistador: Vocês também conhecem assim? Os colegas também têm ocupações
assim?
Entrevistado: Eu conheço. Ela é da nossa sala, ela vende bombom. Ela ajuda a mãe
dela.
Entrevistador: E vocês também têm colegas, irmãos também...
Entrevistado: Eu tenho
Entrevistado: Temos.
Entrevistado: A maioria.
Entrevistado: A maioria nossa.
Entrevistador: E que tipo de trabalho que é mais comum assim dos colegas fazerem?
Entrevistado: Servente.
Entrevistado: Olhar menino pequeno.
Entrevistado: Olhar menino pequeno para os outros.
Entrevistado: Trabalhar em casa de família também.
Entrevistador: Você tem colega que trabalha em casa de família?
Além disso, é sabido que algumas famílias de classe econômica baixa dependem de os
filhos começarem a trabalhar precocemente para contribuir no sustento da casa, como
mencionado por um dos entrevistados: “Então muitos meninos eu já vi daquele lado lá
pararem de estudar para trabalhar, mas eu acho que é pelas condições de vida. (Entrevista –
Grupo focal com adolescentes). Outro entrevistado relata a própria situação e diz: “Aí eu
ajudo em casa também, eu tenho a cesta básica. Agora eu vou começar a pagar uma conta,
acho que é a conta de telefone” (Entrevista – Grupo focal com adolescentes).
Porém, mesmo que nos relatos obtidos nos grupos focais alguns adolescentes afirmem
ajudar financeiramente suas famílias, não é possível concluir que isso aconteça
obrigatoriamente devido à situação econômica dessas famílias, ou se seria apenas um modo
de educá-los, pelo qual os pais/responsáveis podem estar visando, dessa maneira, impor
responsabilidades aos adolescentes. De toda maneira, muitos adolescentes demonstram
satisfação em ter seu próprio dinheiro.
Há também adolescentes que trabalham em algumas empresas como “menor
aprendiz”. Nesse caso, o trabalho pode estar vinculado a algum curso de capacitação
profissionalizante, como mencionado por um entrevistado, quando ele diz: “Eu trabalho em
Contagem e faço o curso de Aprendizagem de Supermercado no Eldorado” (Entrevista –
Grupo focal com adolescentes).
Observa-se também que grande parte dos adolescentes que trabalham e estudam,
apesar de afirmar algum tipo de satisfação com isso, evidenciam ficar mais cansados em sua
rotina, podendo, de alguma maneira, ter prejuízos em relação ao desenvolvimento na escola
ou à utilização do tempo livre que é limitado pela rotina que engloba estudos e trabalho. Em
alguns casos, percebe-se que falta tempo para as atividades escolares ou para se divertir:
Entrevistador: Quais são os problemas que vocês acham que tem na cidade mais?
Entrevistado: Ah... Muitos.
Entrevistador: Então vamos falar.
Entrevistado: Tráfico de drogas que tem muito.
Entrevistado: Prostituição.
Entrevistado: Um matando o outro.
Entrevistador: Um matando o outro.
Entrevistado: É.
Entrevistador: Violência.
Entrevistado: A justiça muitas vezes vê pontos de prostituição e não faz nada. É
normal pra eles.
40
O apontamento desses problemas é frequente em todos os grupos focais realizados com adolescentes.
435
Aí eu tava assim sentado, aí de uma hora para outra a gente está olhando assim para
frente, aí chegou dois cara. Aí um com a mão na cintura assim. Aí tinha um carro
parado na esquina, na nossa frente. Aí ele já tirou a arma assim, na nossa frente, na
frente de todo mundo lá, já tirou a arma prateada, uma 38 prateada, aí já arrombou o
carro na nossa frente. (Entrevista – Grupo focal com adolescentes).
41
Nesse sentido caberiam ainda discussões mais aprofundadas, nas quais se pode indagar em que medida a
facilidade e/ou frequência na ocorrência de atos de vandalismo pode estar relacionada à ausência do Estado e ao
descuido deste com determinadas regiões e locais públicos.
436
Entrevistado: Eles só passa para falar que eles estão cobrindo horário. Pegar
bandido, que é o bom, eles não faz nada.
Entrevistado: O meu bairro eles vai na padaria comer de graça!
Entrevistado: É.
Entrevistador: Quem vai na padaria comer de graça?
Entrevistado: Os policial.
Entrevistado: Os policial.
Entrevistado: Igual eu trabalho com meu pai aqui do lado, a gente vê: direto é
assaltado. Todo dia os policial está lá tomando café. Todo dia, todo dia, mas só que
no dia que assaltaram, cadê os policial?
Entrevistador: Vocês falaram da Polícia aqui, que fica passando carro de Polícia.
Como que vocês percebem a Polícia? Vocês se sentem seguros quando a Polícia
passa ou não?
Entrevistados: [alguns respondem que não].
Entrevistado: Às vezes os Policiais fazem principalmente assim... Tipo assim o meu
padrasto é Policial, ele gosta de mostrar uma gracinhas sim. Porque tipo assim pode
ter uma turminha de garoto e aqueles garoto não tem nada a ver com droga...
Entrevistado: Mas eles para...
Entrevistado: Quer chegar, fazer gracinha...
Entrevistado: Mas eles tem que parar, fazer gracinha, tipo assim mostrar que eles
são os tais. Aí para, revista, faz aquele escândalo no meio da rua, sendo que a pessoa
não tem nada a ver. E os que têm mesmo eles nunca acham ou não querem achar.
Como foi ilustrado no relato acima, os adolescentes, em várias situações, não denotam
credibilidade ao trabalho policial, o que reforça a sensação de não estarem devidamente
protegidos por esses profissionais. Além disso, acreditam que a realização dos procedimentos
de abordagem referentes ao trabalho policial, em muitos casos, é executada erroneamente,
dando destaque ao abuso de autoridade:
Entrevistado: Eu acho que tipo assim os Policiais Militares ultimamente não está
sendo para proteger tipo assim a cidade, está sendo para matar os que mexem com
drogas. Porque em vez de chegar, prender, essas coisas assim, não, eles já chegam
atirando, já chegam fazendo escândalo, não sei o quê. Em vez de chegar, levar para a
delegacia, prender, fazer alguma coisa, não, eles já chegam com tudo.
Entrevistado: Batendo...
Entrevistado: Batendo.
Entrevistado: Eu conheço um menino que o Policial [trecho confuso], eu acho que
ele respondeu o Policial, ele levou ele para a barragem, bateu nele. Diz ele que ele só
sobreviveu porque ele sabia nadar.
Entrevistado: Resgataram ele dentro da barragem.
437
Imagina só. Vamos supor que seja 21 pessoas, eu não tenho certeza, mas vamos
supor que seja 21 pessoas, ao todo, que morreu em Betim. Poderia ser 21 pessoas
que futuramente ia ajudar o Brasil em alguma coisa, ia servir exército, entrar na
Polícia... Podia estar mexendo com coisa errada sim, agora. Mas quem garante que
no futuro eles não iam mudar e fazer alguma coisa? Se a Polícia de hoje não
proteger... Ninguém é santo... Mas se não houver uma operação da Polícia também
e da Prefeitura nesse caso, como que vai ser o futuro? Será que não vai existir
futuro? (Entrevista – Grupo focal com adolescentes)
Entrevistado: O lazer também. Tem uma quadra lá de vôlei, que os poste de colocar
a rede é tudo enferrujado. Não tem cerca em volta, tem que sair na rua correndo para
pegar a bola.
Entrevistado: E tem um parquinho...
Entrevistado: Todo arregaçado [risos].
Entrevistador: Quem que arregaça? Quem quebrou?
Entrevistado: Os menino grande chega...
Entrevistado: Porque o parquinho é para os menininho pequeno... Que lá é mais
para os menino pequeno. Aí chega aqueles grande...
Entrevistado: A pracinha que tem ali embaixo, mas que de noite fica perigoso.
Entrevistado: Só fica noiadinho.
Entrevistador: Só fica o quê? Vocês vão ter que traduzir. O quê que é „os
noiadinho‟?
Entrevistado: É o drogado.
Entrevistado: Os doido.
Entrevistado: Igual aqui... Aqui tem uma esquina, é a esquina da paranoia.
Entrevistado: E o shopping agora também virou um ponto.
Entrevistado: É. Eles querem marcar o território deles.
Entrevistador: Tem tráfico de droga, alguma coisa assim?
Entrevistado: Tem.
Entrevistado: O meu vizinho é traficante.
Entrevistado: Mais ou menos uma vez por semana está indo Polícia lá no nosso
bairro pegando esses menino que fica drogado aí.
Entrevistador: Vocês têm medo deles?
Entrevistado: Temos.
Em geral, os adolescentes gostariam que a cidade contasse com mais opções de lazer,
como parques, praças, quadras esportivas, de modo que, além no investimento na criação,
reforma e manutenção desses locais, haja também investimentos que garantam a segurança
pública no tocante à utilização desses espaços.
Além disso, é preciso também que esses locais sejam próprios e adequados para
utilização por crianças e adolescentes, de modo a garantir questões de segurança (em relação
ao uso de brinquedos, por exemplo) e saúde, como menciona uma das entrevistadas: “Lá no
nosso bairro tem uma quadra toda de areia. Devia colocar alguma coisa tipo grama, alguma
coisa assim, para a gente tipo ir fazer os nossos esportes, porque não tem nada... a grade toda
quebrada. Tipo assim pegar doença na areia” (Entrevista – Grupo focal com adolescentes).
Retomando a questão da violência, pode-se destacar especificamente a preocupação
que os entrevistados demonstraram em relação à violência no trânsito, apontando para a
necessidade de mais vigilância em áreas de grande circulação de crianças e adolescentes,
como, por exemplo, nas proximidades das escolas.
Entrevistador: Se vocês se lembrarem de alguma coisa que vocês sentem falta ainda
para melhorar a vida aqui em Betim. O que falta?
Entrevistado: Colocar quebra-molas nas ruas.
Entrevistador: Colocar quebra-molas nas ruas.
Entrevistada: É. Quebra-molas perto da escola.
Entrevistado: Eles [os motoristas] passam voando.
Eu já perdi uma amiga por causa de trânsito. Ela estava voltando da escola. Ela saiu,
acabou de descer do ônibus... eu morava em Santo Afonso, eu estudava em
Vianópolis, no Barão... aí ela tava descendo do ônibus... e o trecho que ela mora
assim os carro passava em alta velocidade. Eu fiquei boba de ver: lá não tem um
quebra-molas, não tem um sinal avisando que pode descer alunos ali, porque ali é
praticamente perto da escola, é o primeiro ponto do Marimbá. E até hoje eu choro
pela morte dela, porque ela era amiga de todo mundo, o nome dela era Bárbara... aí
eu estou vendo o seu nome assim, aí eu estou lembrando dela. Morreu uma amiga
nossa também na BR. (Entrevista – Grupo focal com adolescentes).
Destaca-se que este é apenas um dos relatos de adolescentes que perderam pessoas
conhecidas devido a acidentes de trânsito. Acredita-se que esse tipo de ocorrência seja
destacada pelos adolescentes devido ao impacto provocado, especialmente por se tratar de um
tipo de fatalidade que poderia ser evitada em muitos casos, desde que houvesse mais
prudência no trânsito. Dessa maneira, muitos dos entrevistados assumem uma postura
favorável à instalação de câmeras e quebra-molas, acreditando que estes instrumentos podem
inibir a atitude imprudente de alguns motoristas e contribuir para a diminuição dos acidentes
de trânsito.
No que diz respeito às preocupações dos adolescentes com o meio ambiente,
destacam-se as falas abaixo:
Entrevistado: E podia ampliar a creche ali embaixo. Tem um lote vago lá do lado da
creche. Às vezes fica cheio de bicho...
Entrevistado: Dá dengue.
Entrevistado: Eu acho que também no bairro tinha que ter, pelo menos uma vez por
semana, ir lá e fazer uma limpeza lá. Porque lá no nosso bairro tem muito lixo.
Entrevistado: Lá perto de casa, debaixo da garagem do meu pai, tem um lote vago
que parece que virou aterro sanitário. Virou lixão aquele trem. É rato, barata. Eu
fico... Eu fico... Eu fico... Não tem palavra.
Entrevistado: E tem a lixeira na frente do lote, o lote atrás, e o povo parece que não
enxerga a lixeira não.
Entrevistado: Eu fico indignada.
Por meio desses relatos, é possível perceber que os problemas apontados pelos
adolescentes, muitas vezes, fazem parte de uma rede complexa, e não devem ser tratados
separadamente. No exemplo mencionado acima, destaca-se como esses adolescentes
demonstram capacidade não apenas de identificar problemas de seu município, mas também
em propor medidas que contribuam para se elaborar soluções, partindo de pensamentos bem
elaborados. Ou seja, ao mesmo tempo que esses adolescentes identificaram um problema
relacionado a um lote vago na cidade (que acumula lixo e pode gerar doenças), propõem que
440
esse tipo de espaço seja utilizado também para solucionar outro problema, que é a questão das
creches na cidade.42 Isso sem falar na consciência de cidadania, que mais uma vez fica
elucidada na fala dos entrevistados.
Quanto à questão da saúde, os adolescentes consideram que no município de Betim
esta é precária e que deveria haver mais investimentos públicos para construção de mais
centros de atendimento, como postos de saúde, por exemplo:
Entrevistado: Nossa! A saúde aqui é precária. Aqui tem um posto de saúde para
atender o povo aqui tudo. O posto de saúde é minúsculo, ele é pequenininho.
Entrevistado: Precária mesmo [riso].
Entrevistado: Lá no meu bairro nem isso. A gente tem que sair de lá do bairro para ir
na cidade...
42
Destaca-se que a citação acima não pretende afirmar que no caso mencionado seria possível utilizar o lote
vago citado pelos adolescentes para a finalidade especificada por eles, visto que tal empreendimento está
condicionado a várias outras implicações (liberação de verba para tal investimento, verificação se o terreno é
público ou privado etc.). No entanto, é relevante ressaltar a capacidade desses sujeitos em identificar problemas e
sugerir soluções para eles.
441
Entrevistador: E vocês, o quê que vocês acham que vocês sonham para a vida das
crianças e adolescentes de Betim? Outras coisas mais, além disso. O quê que vocês
pensam? O quê que vocês acham que toda criança deveria ter?
Entrevistado: Ter um futuro melhor com a família. Compartilhar em casa com os
irmãos.
Entrevistado: Ser uma pessoa bom caráter.
Entrevistador: O quê mais?
Entrevistado: Moradia.
Entrevistado: Saúde.
Entrevistado: Diversão.
Entrevistado: Posto de Saúde também devia ter.
Condizente com o que foi mencionado em vários tópicos deste capítulo, um dos
principais problemas apontados em relação à infância e adolescência é justamente a questão
da educação e inserção ao mercado de trabalho. Muitos adolescentes consideram que a
educação pública deveria melhorar nos aspectos relacionados à qualidade do ensino, de modo
a garantir um futuro profissional melhor. Ou seja, se a escola é compreendida por esses
indivíduos como meio de acesso ao mundo do trabalho, é preciso que se tenha uma escola de
qualidade para garantir que, durante a vida adulta, o ingresso no mercado de trabalho esteja
assegurado (considerando-se o acesso a funções bem qualificadas e devidamente
remuneradas). Além disso, faz-se necessária a qualidade do ensino também para os casos de
adolescentes que desejam continuar estudando após a conclusão do ensino médio, mas que se
sentem em situação de desvantagem em relação aos alunos de escolas particulares, para que
possam disputar, em iguais condições, uma vaga em universidades públicas, por exemplo.
No tocante à questão da violência e criminalidade, nota-se entre os jovens uma
preocupação específica em relação ao gênero, pois há a percepção de que os homens se
envolvem mais em episódios de violência, especialmente em casos com morte. Os
adolescentes acreditam que isso está relacionado à questão cultural da educação masculina,
segundo a qual os meninos seriam “mais soltos”, “menos vigiados” pelos pais; e também
podem ficar mais tempo na “rua”. Além do fato de que, aparentemente, os meninos teriam
maior necessidade sociocultural de se afirmarem como “homens” diante dos outros. E, nos
442
casos em que estes convivem num ambiente com maiores índices de violência e
marginalidade, estariam mais vulneráveis a tal envolvimento:
Entrevistador: Você conheceu muitos [adolescentes] que morreram? Qual era a
idade dele?
Entrevistado: Uns 29 anos.
Entrevistada: Mas o filho dele de 11 anos também morreu disso.
Entrevistador: Disso o quê?
Entrevistada: Ele comprou na mão do traficante de drogas e o menino mesmo foi lá
e o matou.
Entrevistado: O menino, muitas vezes, usa droga para se mostrar e para aparecer.
Para dizer que é o tal. Acha que dentro da escola precisa ter palestra de pessoas que
participaram no mundo das drogas. Eu não vi gente que já usou droga ou esteve no
mundo da prostituição dentro da escola [...].
Entrevistado: [...] ela parou de estudar. Ela não vai mais à escola.
Entrevistador: Parou de estudar porque ficou...
Entrevistado: Ela era [trecho confuso]. Ela teve menino com 14 ou 15. Ela parou de
estudar, mas por quê? Muitas pessoas criticaram.
Entrevistador: Teve preconceito?
Menino – Teve muito preconceito. Não teve ajuda.
Entrevistador: Vocês também conhecem pais e mães adolescentes?
Entrevistado: Sim.
Entrevistador: Também parou de estudar?
Entrevistada: Ela nunca estudou não.
Entrevistador: Ela tinha quantos anos?
Entrevistada: 11 anos.
11-Capítulo final
O Conselho Tutelar (CT) atua nos casos em que os direitos das crianças e dos
adolescentes são violados ou ameaçados por omissão ou abuso dos pais, do Estado, ou em
razão de seu próprio comportamento. Tem a atribuição de aplicar medidas de proteção.
... A população ainda tem receio de chamar o Conselho, até porque ela tem a
visão de ser um órgão repressor.... É a polícia de crianças. Muitos têm essa
visão. Muitos atores da rede têm essa visão de que o Conselho Tutelar é a
polícia para criança. E isso não é verdade. O Conselho é um órgão para
garantir que os direitos dela sejam cumpridos e também mostrar para ela os
deveres que ela tem a cumprir. Isso é um dificultador...As escolas também.
As escolas muitas vezes até demais, encaminham casos errôneos. Um caso
que seria do Pedagogo, ela encaminha para o Conselho ( entrev 6 CT).
que se baseia no atendimento diário dos conselhos tutelares, ainda não estava sendo utilizado
pela maioria dos conselheiros.
... Estamos sem o sistema. É uma falha que vem acontecendo. A gente tinha
improvisado uma impressora dos próprios Conselheiros, a impressora
estragou, a Prefeitura nem consertou e nem mandou outra. Já tem uns 2
meses que a gente está sem impressora nenhuma. Tudo vai manuscrito.
Temos que fazer manuscrito mesmo, na mão.
... Montar o diagnóstico, uma escala, para verificar qual que é o maior
número, tem que ter o sistema, sem ele é impossível. Por mais que você tenha
relatórios à mão, até você contabilizar. E fora as orientações que às vezes
você não registra ou alguma coisa mais simples, porque é tudo, tudo à mão.
Se você vai fazer um registro de um caso detalhado, você vai deixar de
registrar um outro mais simples, digamos assim. Então se perde muito pela
falta de informação, de registro. (entrev6 CT).
Como não havia uma padronização nos registros dos diferentes conselhos, é
complicado comparar os casos, sendo que os atendimentos mais citados pelos conselheiros
em entrevistas e nos registros, foram relativos à conflitos familiares, abuso sexual, abandono
e negligência, ameaça de morte, violência física, falta de vagas em creches, envolvimento
com o tráfico de drogas, gravidez na adolescência, infrequência, evasão e conflitos na escola.
A seguir, serão feitas algumas considerações sobre a violência doméstica, a violência
sexual, a exploração sexual, a exploração do trabalho infantil, conflitos nos famílias e na
escola e sobre o atendimento de adolescentes autores do ato infracional, a partir de casos
atendidos pelos conselhos tutelares.
Violência doméstica:
A violência doméstica, também denominada violência intra-familiar, refere-se a
comportamentos violentos, que acontecem no âmbito familiar . Quando as vítimas são
crianças e adolescentes, a violência é praticada por pais biológicos ou outras pessoas
próximas ao convívio familiar. A violência doméstica se expressa em diferentes
configurações, sendo elas: violência psicológica, negligência, abandono e violência física.
A negligência se configura em situações em que os pais e/ou responsáveis se omitem em
prover alimentação, vestuário, higiene, e outras necessidades básicas para o desenvolvimento
saudável da criança e do adolescente. As entrevistas realizadas com os conselheiros tutelares
apontaram muitos casos de negligência dos responsáveis para com os filhos:
Negligência ao extremo, de você negligenciar uma criança até ela vir a óbito. A gente
já teve caso aqui de negligência a esse ponto. Porque a região estava carente de
conhecer o que é realmente direito, dever, dever de população, de sociedade, qual o
sentido de denunciar... Então, infelizmente, foi preciso uma criança vir a óbito para
que realmente tivesse esse choque, para que todo mundo tivesse um choque, a rede
tivesse um choque, a Polícia tivesse um choque... Porque teve criança que veio a óbito
por negligência. Era uma criança que não recebia alimentação, que ficou doente e não
recebeu cuidados, ficou na chuva e quando a gente teve acesso, essa criança já estava
totalmente debilitada. Infelizmente ela veio a óbito.(entrev6 CT)
448
R –. Também tinha uma outra adolescente que levou uma menina de 10 anos, o
médico falou que ela estava toda inchada, sentindo dores horríveis. Aí a outra
adolescente levou ela no Posto e o Posto achou um absurdo e acionou o Conselho.
P – E por que a mãe não levou?
R – Droga. Ela era usuária. Não é só a criança, os pais estão usando. Então, o
problema sério de Betim é a droga. (entrev 2 CT).
A violência física, caracterizada pela agressão através do uso da força física, foi
durante um longo período histórico considerada como ação educativa/corretiva, poder de pais
e mães para exercício da autoridade. Os depoimentos abaixo revelam a percepção de dois
entrevistados sobre esse fenômeno:
Então assim, eu agrido uma criança e não vejo conseqüência disso, eu estou fazendo
isso para corrigir, eu estou fazendo isso é para educar. Em relação à violência sexual
tem uma questão assim de que a criança é objeto, tanto que ela sempre é ameaçada se
ela expressar. Então eu fico pensando assim, nesse meio de tantas violências contra a
criança, muitos adultos ainda fazem uma interpretação de que aquilo não vai ter
conseqüência para ela, para aquela criança...E na violência física existe muito essa
questão de achar que está cuidando, que eu posso bater, eu sou pai, eu sou
responsável, eu é que falo o quê que pode e o quê que não pode, eu proíbo.( entrev
com técnicos da Assistência Social)
A gente já teve, aqui nesse Conselho mesmo, um caso de uma criança de 9 anos que
chegou a ter a perna cortada com correia, cinto, de tanto apanhar.... Essa criança sofria
um distúrbio. Até o psicológico foi abalado ( Entrev 6 CT)
Apesar de que a maioria dos casos que chegam para atendimento no CT e na Rede,
ser oriundo de famílias de baixa renda, os técnicos e conselheiros afirmam que a violência
doméstica está presente em todas as classes sociais. Nesse sentido, Mioto (2008, p.50)
esclarece que:
“As famílias pobres, “desestruturadas”, são mais facilmente visitadas, por um
assistente social, para verificar suspeitas de violência, educação inadequada. As
famílias consideradas “normais” conseguem se defender com mais facilidade a sua
privacidade, esconder com mais sucesso as suas violências e buscar alternativas de
soluções sem publicização”.
... Então foi elaborado o Plano Municipal de Enfrentamento à Violência Sexual contra
Crianças e Adolescentes e o Protocolo que foi implantado, que foi o Protocolo que o
Sentinela começou no CREAS, de atendimento à criança e o adolescente vítima de
violência sexual, na interface com o serviço de Saúde, do sistema de garantia de
direito e o serviço de atendimento, que é no CREAS. Então, o Sentinela foi extinto,
mas substituído pelo PAEF. (entrev com técnicos da Assistência)
Tem aumentado muito, por exemplo, o número de denúncias. Eu acho que esse
também foi um grande avanço. Hoje existe o Disque 100, o 0800 31 11 19 da
Secretaria de Direitos Humanos, eu acho que foi um avanço também esplêndido.
Porque haviam situações que ficavam ali no seio da família, aquilo ficava ali, ninguém
dava notícia. E hoje, com o Disque 100 e a Secretaria de Direitos Humanos, em que a
pessoa pode fazer a denúncia e não precisa se identificar, chega-se muita demanda...
É. Porque agora começaram a ser mais descobertos, digamos assim. Quando se fala
às vezes de uma situação que acontece dentro da família, geralmente esse abusador é
uma pessoa muito próxima da família e a família é dependente. Então, para aquela
denúncia vir à tona ficava difícil. E hoje com o Disque 100 e a Secretaria de Direitos
Humanos, a pessoa faz uma denúncia, recebe um protocolo dessa denúncia, a pessoa
não precisa se identificar. Mas desde que tenha aqueles dados que possam oferecer
subsídio para o Conselho estar apurando a denúncia, é uma avanço, porque chegamos,
encaminhamos. Hoje também pela Secretaria de Direitos Humanos quando chega uma
denúncia, dependendo da situação, já chega também com cópia para a Procuradoria,
com cópia para a Delegacia de Proteção à Família...
...O PAIR está buscando levar informações... Uma maior divulgação do atendimento,
olhar mesmo a questão da criança e do adolescente. Houve recentemente uma
capacitação para a Guarda Municipal, para a Polícia Militar. Então, de uma certa
450
forma tem contribuído, principalmente a Guarda Municipal, que está na escola, está
nas imediações dos patrimônios públicos e que verifica algum caso ou alguma
demanda, e é interessante ele ter algum preparado para poder atender e a demandar
aquele caso, encaminhar aquele caso „essa é uma situação do Conselho‟, „ah não, o
caso é da saúde‟. (Entrev1CT)
Uma coisa que me chamou atenção é a questão sexual aqui. Tanto violência sexual
quanto gravidez precoce. É muito comum adolescente grávida e relatos de abuso
sexual no núcleo familiar. Isso me chamou muito a atenção. Não sei se eu não tinha
contato próximo com isso antes, talvez, mas me chamou muito a atenção...
...Um caso específico que houve, onde a filha era abusada pelo padrastro, na cama da
mãe, com a ciência da mãe. Tinha 14 anos na época. Esse me deixou esbabacado. Aí a
comunidade descobriu. Vazou. Ela teve atendimento, teve hemorragias e tudo. Essa
informação vazou, a comunidade descobriu e iam linchar, matar, fazer a justiça com
as próprias mãos com o padrasto. Ele fugiu da região, de madrugada, o amigo dele
parou o carro na porta, ele foi e a mãe entrou no carro com o outro filho, foi embora e
largou a menina para trás. .(entrev 3 CT)
A maioria das vezes está dentro da família. ... É o pai, a mãe, o padrasto, o irmão. Nós
temos muita incidência nesses casos, muita também do abuso. É muito grande... O
caso de abuso é mais do que agressão. Mas nós já tivemos aqui casos de pessoas que
até estão presas por causa disso. Nós tivemos um caso, há 1 mês mais ou menos, de
uma criança de 5 anos, que o padrasto torturava essa menina. Essa menina estava tão
revoltada, que depois do agressor estar na Delegacia, ela chegou e falou „eu quero
conversar com o Delegado‟... Entrou na sala dele e falou „prende esse homem, eu não
agüento mais sofrer‟. Ela tem 5 anos de idade. E quando eu tirei essa criança para a
gente tentar a família extensa dela, nós chegamos no abrigo e ela falou comigo „tia, eu
sei que aqui não é uma creche, eu sei que aqui é uma casa que eu vou ter que ficar,
mas promete que você me busca, porque eu quero morar com a minha mãe, porque a
minha mãe nunca me bateu, a minha mãe é boa, ela apanha, ela chora, ela tenta me
proteger‟. Esse caso foi um caso que nós ficamos muito sensibilizados. E graças a
Deus o agressor está preso e a criança a gente conseguiu construir laços com a família.
(entrev 4CT)
– Essas de 12 e 13 anos foram abusadas pelo padrasto. Chegou até nós, porque já tinha
passado pelo serviço de assistência social da Unidade Básica. Então o serviço de
assistência social já tinha acionado o Conselho – a gente verificou isso, porque se não
tivesse acionado, seríamos nós a fazer isso – e aí já tinha sido acionado, já estava
tendo a investigação, ele fugiu antes da Polícia chegar lá. E essa adolescente foi
acompanhada durante todo o grupo, participou de todos os encontros, foi encaminhada
451
R –A gente já recebeu relatos de adolescentes que saem para essas festas que
acontecem corriqueiramente, as famosas raves, cada dia a festa é num lugar, a gente só
vê os anúncios. E essas meninas vão em 3, 4 dias e aí elas chegam... A gente teve
caso que a menina chegou aqui e relatou que nessa festa eles fazem uso de drogas, se
prostituem por droga, ou por dinheiro, ou por cerveja, ou por qualquer coisa. Então a
gente tem tido casos de exploração sexual, porque tem alguém por trás, tem alguém
que busca essas meninas em casa, tem alguém que deixa próximo de casa. Elas vão
para um lugar que elas não conhecem e as pessoas aparecem. E isso tem acontecido
em toda a Betim, toda a Betim. Essas festas cada dia estão num lugar diferente. (
Entrev 6 CT).
"Avançamos muito desde que o ECA foi criado, principalmente quando foram
implementados os Conselhos Tutelares e os Conselhos dos Direitos da Criança e do
Adolescente, descentralizando-se as políticas e os recursos. Mas temos muito ainda
por fazer. As pessoas atualmente estão mais encorajadas a denunciar atos de violência
sexual contra crianças e adolescentes por meio das campanhas, estão se
responsabilizando mais através das denúncias, mas infelizmente ainda não
conseguimos garantir o comprometimento da sociedade como um todo. A violência
sexual sempre existiu e na atualidade vem tomando vários percursos, inclusive através
da pedofilia na internet. O ECA vem se atualizando no sentido de coibir essas práticas.
( psicóloga e consultora em projetos sociais)
452
R – Aqui na rede não tem muito não. Aqui nessa região não tem trabalho infantil .
P –Você não tem esse tipo de denúncia?
R –. A denúncia que chegou para mim era de Nova Serrana, porque lá existe trabalho
infantil, dentro das empresas mesmo. Mas infelizmente a criança não era daqui, então
a gente não tinha nem como trabalhar. Foi encaminhada essa denúncia. Mas aqui no
Município a gente não tem visto. Tem trabalho infantil por parte da própria criança,
que é a que vai vender bala.... O caso que a gente teve aqui, ele foi por conta própria.
Ele implorava para sair de casa, muitas vezes ele mentia que ia para a casa de algum
amigo, e na verdade ele estava indo vender bala no sinal.
P – Aí vocês chamavam o menino aqui?
R – Chamava a mãe, chamava o menino. A gente encaminha para os programas,
PETI, para o Escola da Gente, para ver se ele consegue entreter. Mas quando ele
chega nos 13, 14 ele quer trabalhar.(grifo nosso)
P – Mas então já teve algum caso.
R – Que é vendedor de bala em Betim. A Conselheira aqui chegou a ir na casa de bala
perguntar por que ele estava vendendo aquela quantidade tão grande de bala para uma
criança.... Ele deu as desculpas dele, que ele nunca imaginou e tudo, mas ele sabe,
porque são raras as crianças que compram lá ...Esses casos que a gente teve aqui
mesmo, eles falaram que eles queriam ter uma roupa bonita, que eles queriam comer
um biscoito recheado... eles chegam a relatarem o que eles querem „eu queria mesmo,
tia, eu queria uma blusa nova‟, „eu passei em frente à loja, perguntei o preço, a mulher
falou que era tanto, minha mãe me deu 5 reais, eu comprei tudo de bala e revendi‟.
Eles falam normalmente, tranquilamente. Os casos que a gente teve nesse Conselho
453
realmente foram eles mesmos que queriam realmente uma oportunidade e acharam ali
a brecha. Foram bem mais tranqüilos. A violação era da parte deles, mas mais fácil de
contornar do que quando tem um aliciador por trás... Conseguimos encaminhar para o
PETI, voltou a estudar. A mãe foi até orientada a procurar a ASSPROM em Belo
Horizonte, que apesar dela ser lá, eles também encaminham os meninos daqui. Tem
meninos que fazem estágio pela ASSPROM, trabalham no Fórum, nesses setores,
então a mãe ficou até de procurar lá para tentar inseri-lo, já que ele está acabando de
completar 1(Entrev6 CT).
Que geralmente são adolescentes que infelizmente são recrutados para o tráfico.
Quando há esse recrutamento para o tráfico, o adolescente se insere nesse meio e a
família também. A família só vai nos procurar quando a situação está crítica: que o
adolescente está ameaçado ou que o adolescente está com uma determinada
quantidade e às vezes houve uma apreensão por parte da polícia e esse adolescente
fica ameaçado. Esse adolescente pode chegar ao ponto de querer delatar alguém ali do
tráfico e fica numa situação de ameaça.(Entrev 1CT)
Eu vejo uma região ainda muito pobre, que precisa de muitos recursos, que precisa de
muitos projetos, justamente para tampar esses buracos que ainda tem. A gente precisa
trabalhar os nossos jovens aqui. A consciência para realmente Citrolândia não virar
um lugar de traficantes, de aviõezinhos, de exploração nesse sentido da criança e do
adolescente. As nossas crianças se perdem muito aqui por causa do tráfico. Então a
gente tem que fazer um projeto realmente para trabalhar essa questão. Hoje, apesar de
tudo que eu passei para você em termos de conflitos, o nosso grande problema é o
tráfico aqui dentro.(Entrev 4 CT)
Ele quer trabalhar, ele quer mudar aquela vida dele ali. Ele está cansado muitas vezes
de não ter uma roupa para poder ir para a escola, de não ter uma condição. Ele se sente
muitas vezes excluído, envergonhado da situação. Então falta isso. Se nós dermos essa
oportunidade para os nossos adolescentes, eu acredito que a incidência de tráfico, de
crime aqui vai ser menor. Nós temos crianças aqui de 10 anos, 9 anos, 8 anos que está
envolvida com o tráfico.(Entrev 4 CT).
crianças e adolescentes e suas famílias. Além disto, está previsto para o combate ao trabalho
infantil, a mobilização e conscientização da sociedade sobre o fenômeno e a necessidade de
erradicá-lo. Em Betim, parte das crianças e adolescentes atendidas nos vários serviços
sócioeducativos da Assistência Social foram transferidos para o Programa Escola da Gente.
Cabe indagar se estas mudanças estão sendo avaliadas e monitoradas e, se as políticas sociais,
com foco no enfrentamento à exploração do trabalho infantil, não estão diluídas.
...é questão mesmo do conflito entre mãe-filho, entre mãe-pai, aquela briga conjugal
ali, a falta de autoridade, e esse adolescente envolvido nesse mundo todo aí, nessa
situação, a mãe quer chamar atenção, o menino não obedece, aí vem aqui no
Conselho.(entrev 1 CT)
Outro caso que tem demais é, na separação, os casais um brigando com o outro
pedindo a guarda das crianças. Esse é o que mais tem...Briga pela guarda. É o que
mais tem no Conselho. De 100 usuários, pode ter certeza, que 80% é pedindo guarda.
(Entrev2 CT).
...„eu não dou conta do meu filho‟. Teve outra situação interessante. Outro dia uma
mãe ligou aqui de manhã, era 8 e meia da manhã „aí é do Conselho?, „é‟, „você é
Conselheiro?‟, „sou‟, „você podia vir aqui em casa, porque o menino não quer ir para
escola, você podia vim cá e dá uma dura nele prá mim, porque ele não quer obedecer
não‟. (entrev3 CT)
Olha, na maioria é essa questão de conflito, marido/mulher e o filho está no meio;
também de escola, questão de disciplina, quando a gente vai aprofundar na
averiguação encontra conflito familiar. Conflito familiar tem demais, demais mesmo.
Adolescente sem sentido, sem tudo na vida...(entrev3 CT)
Claro que falta muita coisa ainda ..., porque ainda há uma resistência por parte dos
professores, às vezes de entender qual é o papel do Conselho, em que o Conselho
pode ajudar como parceiro daquela escola, claro, dentro da sua esfera. A escola tem
que esgotar todos aqueles recursos ali inerentes a ela, para depois passar para o
Conselho. Ou até mesmo verificar um caso ali de uma violação de direitos,
encaminhar para o Conselho e o Conselho aplicar as medidas protetivas ao caso.
(entrev 1 CT)
R –As escolas também. As escolas muitas vezes até demais, encaminham até casos
errôneos. Um caso que seria do Pedagogo ela encaminha para o Conselho.
P – Um exemplo.
R – Uma criança na faixa etária menor que 12 anos que não está comportando, levanta
muitas vezes, conversa muito, então atrapalha a aula... Então, esse não é um caso para
456
Conselho Tutelar. Talvez o Pedagogo sentar com essa criança e conversar. Já o caso
da criança que está apática ou que de repente ficou muito elétrica, não é encaminhado.
O caso daquela criança que há uma suspeita de que ela foi violada em algum direito
dela, não é encaminhado.(Entrev6 CT).
Um caso de violação dos direitos dos adolescentes, que é grave em Betim, se refere ao
atendimento aos adolescentes infratores, cumprindo medida de internação. Segundo
dados da PM, publicados no Jornal “o Tempo Betim” (maio de 2013), em 2012 foram
apreendidos 522 adolescentes, autores de ato infracional, de 12 a 17 anos. A ausência de um
local apropriado para acautelar estes adolescentes, conforme prevê o ECA e as diretrizes do
SINASE, é um problema sério. Alguns adolescentes são apreendidos e liberados e, hoje,
alguns vão para cela improvisada na Delegacia Regional. Em 2012, foi desativada a cela da
4ª DP, depois de muitas denúncias e campanhas sobre a situação de violação de direitos
vivida ali:
“ Uma vez eu estava de plantão... no início a gente está totalmente sonhando, não
conhece nada, acha que tudo é realmente do jeito que está no papel. Nossa! Um
adolescente que assaltou e atirou, aí ele foi e ficou preso na 4ª DP, lá no PTB - você
conhece? Eu nunca tinha entrado, até hoje eu nunca fui numa cadeia. Eu fiquei
impressionada com o que eu vi. Eu falei 'gente, tem que chamar os direitos humanos
para vim aqui'. Isso é sub-humano... Eu vi isso de perto... Eu fiquei mais
impressionada, porque dentro de uma... imagina dentro de uma sala dessa ter 100
meninos aproximadamente. Um pisoteando em cima do outro... Um mau cheiro. E o
moço chegou para dar comida, numa daquelas caixas de supermercado, de compra,
com os marmitex tudo assim (parece mostrar) e eles vão para pegar, e aí um vai por
cima do outro, com medo... eu fiquei... esse dia foi um dia que eu cheguei em casa e
chorei muito... Nesse dia eu chorei muito. Eu vi uma coisa que eu achava que era só
na televisão, só em filme de terror.
Todos menores. Todos com menos de 18 anos...E ele gritava 'não me deixa aqui, não
me deixa aqui'. Eu fiquei vários dias com aquilo ecoando”(Entrev 2CT).
Recomendações
Os Conselhos Tutelares (CTs) tem um papel crucial na defesa e promoção dos direitos
das crianças e adolescentes. Para aperfeiçoar e melhorar o trabalho e os atendimentos dos CT ,
recomenda-se:
457
-Rever a área de abrangência dos Conselhos tutelares. É evidente que o número de crianças e
adolescentes residentes nas áreas e regiões de atendimento dos CT, não é o único critério para
se definir a distribuição das regiões e bairros nos quatro Conselhos. Entretanto, se
considerarmos a dispersão geográfica nas áreas atendidas pelo CTI e CTII, e observamos os
dados sobre a população infanto-juvenil residente nas regiões, concluímos que é necessário
debater e refletir sobre este tópico. Para dimensionar o problema, o quadro a seguir apresenta
a população de 0 a 17 anos distribuída por regionais e por faixas de idade escolar:
O ECA define proteção integral como a garantia, com absoluta prioridade, dos
direitos referentes à vida, à saúde, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Garantir e efetivar estes direitos na prática é um desafio complexo. Nenhum setor de
política pública, nenhuma organização social, nem o governo em suas três esferas poderão dar
conta desta tarefa sozinho. As ações precisam ser articuladas e planejadas de forma coletiva e
participativa – o trabalho em REDE – para avançarmos na perspectiva da proteção integral e
da garantia dos direitos previstos na lei.
Conforme define o artigo 86 do ECA: “A política de atendimento dos direitos da
Criança e do Adolescente far-se-á através de um conjunto articulado de ações governamentais
e não governamentais, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios.”
O Sistema de Garantia dos Direitos(SGD) pressupõe, portanto, que diferentes órgãos
públicos das políticas setoriais das três esferas do governo, em parceria com a sociedade, com
o legislativo e judiciário, atuem em sintonia.
Em Betim, segundo vários entrevistados, a falta de articulação faz com que a mesma
criança/adolescente passe por diversos atendimentos governamentais e não governamentais,
na saúde, educação, nos programas de esporte e assistência, sem que haja comunicação entre
eles. Ações desconexas, pontuais e sobrepostas dificultam o avanço das políticas públicas
nesta área. Além disto, ainda há muitos “buracos” nesta rede de atendimento que dificultam
os encaminhamentos e atendimentos:
“O maior desafio é o fortalecimento da rede, porque hoje – o que eu entendo por rede,
são as organizações não governamentais, é o poder Público, é a empresa, é a Justiça –
459
a rede existe, mas têm elos que estão enfraquecidos, quebrados, tem elos que não se
encontram, e, em determinado momento, o adolescente se vê desprotegido em algum
desses elos. O que acontece, se a gente estiver trabalhando com essa visão conjunta,
em parceria com o Poder Público, entra ano, sai ano, entra governo, sai governo, que
essa parceria continue. Às vezes nos continuamos por quatro anos estruturados,
criamos fóruns, criamos redes de defesa, criamos uma série de coisas, capacitamos a
equipe, capacitamos conselheiros, e aí, muda-se a gestão, e muda-se toda a equipe que
está a frente ali, daquele trabalho, então, começa tudo de novo. Por isso que não
consegue construir nada efetivo. E eu acho que com o fortalecimento da rede, quem
vai estar ganhando com isso são as crianças, são os adolescentes, porque a porta em
que ele bater, se não for o serviço específico, ele vai saber onde ele vai recorrer. Se a
criança chegar aqui na instituição e a demanda que ela tiver não for uma demanda
propriamente do Salão do Encontro, o Salão do Encontro vai saber em qual dos
parceiros, em qual elo da rede, ele pode direcionar a criança e o adolescente, ele pode
direcionar aquela família, e ela vai conseguir ter um atendimento e um retorno. Eu
acho que o maior desafio, aí, é esse engajamento, esse entrosamento de toda a rede,
começando pelos conselhos, pelas ONGs, as creches, as empresas e o Poder Público
em geral. E também, a questão da Promotoria da Infância, que é uma que Betim tem
buscado, e a gente não tem uma Vara da Infância, pra nossa cidade, isso ainda não é
real. Às vezes a pessoa que está lá não tem a visão definida, cada hora chega um caso
diferente, ela não sabe ainda como proceder, e eu acho que também, por culpa dessa
falta interação da rede.” (entrevista com representante de uma ONG)”
“Eu particularmente vejo a rede de Betim, uma rede muito desarticulada e que está
tentando. Tem alguns dispositivos no Município, importantes, e que tem dado passos
no sentido de articular melhor essa rede. Um deles é o Conselho da Criança e do
Adolescente e o outro é o Fórum Municipal de Defesa do Direitos da Criança e do
Adolescente. Acho que esses dois, principalmente, têm dado vários passos no sentido
de tentar articular, mas mesmo assim nós... é uma tentativa, é um processo, é uma
construção, mas eu vejo que nós estamos muito aquém ainda dessa articulação entre as
entidades que trabalham com criança e adolescente, o próprio Governo nas suas várias
esferas. Vou te dar um exemplo: participando lá da Pré-Conferência da Criança e
Adolescente , tentando organizar a Conferência da Criança e do Adolescente, então é
pedido que cada representante de uma Secretaria e das entidades também levem para
a comissão organizadora quais ações são desenvolvidas no Município para criança e
adolescente, do ponto de vista da quantidade, da qualidade, dos locais onde isso
acontece e tal. E na hora de identificar isso é muito complicado – identificar e
compilar. E olha que a gente está falando um pouco do que vocês têm feito em relação
à criança e ao adolescente. Na Saúde existem várias ações que são feitas para criança e
adolescente. Quais são essas ações? Na Assistência, quais são? Não há um... não sei
se seria um fórum, mas um espaço rotineiro de discussão de casos... não só de caso
específico, mas de situações que articulem essa rede, o quê que é de um, o quê que é
de outro, onde que cada um entra no atendimento integral. A gente percebe que isso
tem sido muito distante.” (Entrevista da Assistência social)”
R – Sim. Todos falaram muito que Betim tem muito equipamento. Realmente, Betim
tem muito (com ênfase) equipamento, tem uma rede muito grande, cheia de furos,
lotada de furos. Infelizmente é um tentando tapar o furo para que não apareça
(entrevista 6 CT)
Conselheiros tutelares, por exemplo, comentam muito sobre esta confusão e falta de clareza
dos papéis como um dificultador do trabalho.
R –... A população ainda tem receio de chamar o Conselho, até porque ela tem a visão
de ser um órgão repressor.... É a polícia de crianças. Muitos têm essa visão. Muitos
atores da rede têm essa visão de que o Conselho Tutelar é a polícia para criança. E
isso não é verdade. O Conselho é um órgão para garantir que os direitos sejam
cumpridos e também mostrar para os deveres que ela tem a cumprir. Isso é um
dificultador.(entrevista 6 CT)
A realização dos grupos focais com os adolescentes e com as famílias trouxe uma
oportunidade de escuta e de refletirmos sobre algumas questões. Dentre elas, destacamos:
Qual o espaço efetivo para a participação das crianças e adolescentes no planejamento,
na execução e avaliação dos programas, ações e projetos sociais e educacionais
desenvolvidos no município?
Há mecanismos e estratégias para incentivá-los e estimulá-los a participarem nas
escolas, nos colegiados, nos grêmios?
O CMDCA cria esforços para participação continuada e sistemática das crianças
adolescentes e suas famílias nos fóruns de debates, nas plenários e comissões ?
Destaca-se hoje que, para promover e garantir os direitos das crianças e adolescentes e
enfrentar a situação de abandono, pobreza e violência a que ainda estão expostos, é
fundamental o trabalho social com as famílias.
As entrevistas revelaram uma tensão e até mesmo conflito nas relações destas
instituições governamentais e não-governamentais com as famílias. Reconhece-se a família
como lugar do cuidado, da proteção, da construção de valores e referências. Observa-se,
entretanto que há muitos casos de violação de direitos, violência intrafamiliar:
“Acho que é uma má preparação dos pais lá trás. Quando os pais eram adolescentes,
eram crianças, eles não tiveram essa base, essa formação. Chegaram na idade adulta,
463
viraram pais, e são incapazes de ser pais. Não foram preparados para isso, não tem
condição de ser pai, de ser mãe. Eu acho que é isso. E como que vai ser, também
quando essas crianças, esses adolescentes foram pais e mães, vai repetir, não vão ter
condições de ser pai e mãe. Não sabe o que é uma família coesa, uma família...(
entrevista CT)
“Assim, por um lado, pode-se observar que muito raramente encontramos técnicos
que não trabalham com a ideia da diversidade de famílias. Porém, por outro lado,
observa-se que o termo „famílias desestruturadas‟ – surgido originalmente para rotular
as famílias que fugiam a um modelo-padrão descrito pela escola estrutural –
funcionalista – ainda é largamente utilizado, tanto na literatura como nos relatórios
técnicos de serviços‟‟ (MIOTO, p. 53, 2008)
“Pode-se afirmar que não é apenas por uma questão semântica que o termo “famílias
desestruturadas” continua sendo de uso corrente. Cada vez mais ele é utilizado para
nomear as famílias que falharam no desempenho das funções de cuidado e proteção
dos seus membros e trazem dentro de si as expressões de seus fracassos, como
alcoolismo, violências e abandonos. Assim, se ratifica a tendência de soluções
residuais aos problemas familiares”. (MIOTO, p. 54, 2008)
Recomenda-se uma reflexão e a capacitação dos profissionais que atuam nas políticas
públicas de atendimento e promoção dos direitos das crianças e adolescentes, sobre esta
temática, através de um processo de formação sistemático e a construção de novas
metodologias para se trabalhar com as famílias, que repense inclusive a relação destas com o
Estado.
464
“E na violência física existe muito essa questão de achar que está cuidando, que eu
posso bater, eu sou pai, eu sou responsável, eu é que falo o quê que pode e o quê que
não pode, eu proíbo. Tem essa questão religiosa, tem alguns casos aqui, de várias
proibições. E tem muitos também de permissividade „ah, ela foi, eu vou ter que dar
limite‟, a mulher que trabalha fora, o pai que trabalha, ninguém cuida e fica à revelia,
ou fica muito em casa, as adolescentes maiorzinhas cuidam das crianças pequenas,
porque a família sai para conseguir gerir essa casa... (Entrev técnicos da Assistencia
Social)
compreender que existe uma conexão direta entre proteção das famílias, nos seus mais
diversos arranjos, e proteção aos direitos individuais e sociais de crianças e
adolescentes. Dessa forma, ela tem o direito de ser assistida para que possa
desenvolver, com tranquilidade, suas tarefas de proteção e socialização das novas
gerações, e não penalizada por suas impossibilidades.
O segundo aspecto refere-se à mudança de postura da sociedade como um todo, em
especial de profissionais ligados à área, em relação às famílias. Ou seja, significa
desvencilhar-se das distinções entre famílias capazes e incapazes, normais ou
patológicas e dos estereótipos e preconceitos delas decorrentes. Isto implica construir
um novo olhar sobre as famílias e novas relações entre elas e os serviços. Esta
construção necessita ser realizada no âmbito de todos os serviços, que têm como
responsabilidade a implementação de programas relacionados à orientação e ao apoio
sociofamiliar. Assim, o trabalho está apenas começando” (MIOTO, pag 57, 2008).
Três temas permearam as falas nas diversas entrevistas e foram, repetidas vezes,
focados como centrais no delineamento das políticas sociais de atendimento às crianças e
jovens: as drogas, o tráfico e suas consequências na segurança pública, a situação das famílias
e a escola/ o direito à educação. Nesse item vamos nos deter no último tema.
.... O que eu acho que o Município podia fazer...orientar mais, já começar na escola
uma educação, tudo começar da escola. Por isso que eu acho que só muda a realidade,
quando mudar a educação mesmo. (Entrev CT2)
A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na
convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino, nos movimentos sociais e
organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais. Segundo a LDB, a educação
escolar, que ocorre, predominantemente, por meio do ensino, em instituições próprias, deve
oferecer possibilidade de participação na prática social e no mundo do trabalho:
“A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de
liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o
pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho” Art. 2º
características das relações que são construídas no interior das escolas? Qual o papel da
Escola? Quem são as crianças, adolescentes e jovens que nas escolas se transformam em
alunos? Qual é o papel do professor? As respostas a essas e outras perguntas podem ser
elaboradas no dia a dia da escola, num diálogo permanente com os outros setores das políticas
sociais, e com a participação das crianças e jovens e de suas famílias. O CMDCA pode
estimular o diálogo e promover eventos em torno desta temática dos “desafios da escola
contemporânea”, considerando que o grande desafio do Brasil em geral e de Betim em
particular é garantir a equidade social - oportunidades iguais para todos. Políticas
assistenciais, compensatórias, centradas no que os técnicos nomeiam "população em risco"
ou "em situação de vulnerabilidade social", apesar de importantes, não tocam nas raízes dos
problemas e não conseguem reverter sozinhas o quadro grave de desigualdade social da
sociedade brasileira. A ação governamental deve priorizar as políticas sociais básicas e
universalizar o acesso a elas, mas com qualidade: educação (integral desde a primeira
infância), saúde, esporte, lazer e cultura, segurança e trabalho.
Sugere-se também que o CMDCA promova debates sobre as novas e diversas formas
como as infâncias e juventudes se constituem no mundo atual: sua situação e condição. No
decorrer da pesquisa surgiram algumas temáticas que precisam ser compreendidas no
contexto mais amplo das sociedades contemporâneas e globalizadas. Essas questões
relacionam-se com o consumismo, a competição, o sedentarismo e as novas tecnologias.
-O consumismo e seus impactos na vida das famílias, das crianças e dos adolescentes.
Crianças e jovens influenciam as escolhas de consumo de seus pais e esse é um dos
motivos que se tornaram o alvo principal da mídia. Estudos revelam que entre os meios de
comunicação de massa, a TV é o mais utilizado pela publicidade e também é o que as crianças
têm acesso mais fácil. Além de problemas de déficit de atenção e outros que podem ser
467
43
Segundo o artigo “Tirem as crianças da frente da TV”, de Lindsey Tanner [AP, 5/4/04], publicado no Observatório de
Imprensa em 22 de março de 2013, “pesquisadores descobriram que cada hora passada diante da televisão faz com que
crianças em idade pré-escolar aumentem suas chances de desenvolver problemas de déficit de atenção mais tarde. Os
resultados atestam que a TV pode diminuir os níveis de atenção das crianças e apóiam a recomendação da Academia
Americana de Pediatria, segundo a qual crianças com menos de dois anos não devem assistir a programas de televisão.
„Existem milhares de motivos para que as crianças não vejam TV. Estudos anteriores mostraram que o hábito está associado
à obesidade e agressividade infantil‟, afirma Dimitri Christakis, pesquisador do Centro Médico Regional de Seattle. (...) O
resultado da pesquisa sugere que o hábito de ver TV superestimula e modifica o desenvolvimento normal do cérebro de uma
criança. Entre os riscos encontrados estão dificuldade de concentração, impulsividade, impaciência e confusão mental. Os
pesquisadores não se preocuparam em saber que programas as crianças assistiam, pois, segundo Christakis, o conteúdo não é
o culpado pelos danos causados ao cérebro. O problema é a rápida superposição de elementos visuais, típica dos programas
de TV. „O cérebro de uma criança se desenvolve muito rapidamente durante os primeiros três anos de vida. Ele está
realmente sendo „conectado‟ neste tempo‟, diz o pesquisador. O estímulo excessivo durante este período em particular pode
criar mecanismos danosos à mente da criança.”.
468
humano integral das crianças e adolescentes, que envolve as várias dimensões do ser (social,
cognitiva, corporal, afetiva, emocional e espiritual).
Neste artigo sobre os riscos das novas tecnologias para crianças e adolescentes, as
autoras Evelyn Eisenstein, médica Psiquiatra pela UERJ; mestranda do Programa de Pós-
Graduação em Neurologia e Neurociências da UFF e Susana B.Estefenon, presidente do
Instituto Integral do Jovem INJO, sistematizam o seguinte quadro sobre os riscos no
desenvolvimento das crianças e adolescentes, incluindo os riscos digitais:
471
Alguns sociólogos apontam o risco como uma das características mais fundamentais
do mundo atual. O avanço científico e tecnológico produz, ao mesmo tempo, perigos e
benefícios e, segundo Giddens (1999, p.44), “é impossível adotar simplesmente uma atitude
negativa em relação ao risco”. Isso não significa, ainda de acordo com o autor, que não seja
preciso disciplinar o risco e isso poderia ser feito com a criação de “instituições que nos
permitam monitorar a mudança tecnológica, nacional ou globalmente” e com o
estabelecimento de “um diálogo público sobre a mudança tecnológica e suas problemáticas
consequências”. (GIDDENS, 1999, p.44).
Diante da importância e da presença cada vez maior das novas tecnologias e, em
especial, da internet, no cotidiano de crianças e adolescentes, sugerimos uma aproximação
qualificada dessa experiência envolvendo crianças, adolescentes, famílias e educadores num
debate franco por meio da explicitação dos significados, das possibilidades, dos receios e dos
perigos associados a esse “mundo virtual”.
472
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483
70.000
65.000
60.000
55.000
50.000
45.000
40.000
35.000
30.000
25.000
20.000
0 a 4 anos 5 a 14 anos 15 a 19 anos
Faixa Etária
2000
75.000
70.000
65.000
60.000
55.000
50.000
45.000
40.000
0 a 9 anos 10 a 19 anos 20 a 29 anos
Faixa Etária
2000
484
No ano de 2000 pouco mais da metade dos domicílios eram assistidos com serviço de
esgotamento sanitário, 56,1%, neste mesmo período em Belo Horizonte 94,2% dos domicílios
tinham acesso a este serviço (IBGE, 2012).
Já em 2010, há uma significativa ampliação da cobertura do serviço de esgotamento
sanitário, presente em 86,9% dos domicílios de Betim, além de outros serviços como a coleta
de lixo cuja cobertura foi de 98, 5% (IBGE, 2012).
Apesar da boa arrecadação, expressa pelo PIB, em 2010, 55,8% dos domicílios
particulares permanentes do município tinham renda per capita até R$ 510 por mês.
485
Em relação à distribuição etária, a idade varia de 11 a 21 anos, sendo que 92,3% são
adolescentes de 11 a 17 anos e 7,7 são jovens de 18 a 21 anos. Os dados seguintes agregam
informações desses adolescentes e jovens.
Quanto à área na qual residem estes adolescentes e jovens, considerando todos os
participantes dos grupos focais com idades entre 11 e 21 anos, 98,1% residem em área urbana
e apenas 1,9% em área rural. Em relação aos bairros nos quais residem os adolescentes e
jovens entrevistados:
9,6% dos entrevistados residem no Vila das Flores;
7,7% dos entrevistados residem no Recreio dos Caiçaras;
7,7% dos entrevistados residem no Cachoeira;
7,7% dos entrevistados residem no Jardim das Alterosas;
5,8% dos entrevistados residem no Amarantes;
5,8% dos entrevistados residem no Alto da Boa Vista;
5,8% dos entrevistados residem no Citrolândia;
5,8% dos entrevistados residem no Morada do Trevo;
5,8% dos entrevistados residem no Bom Retiro;
3,8% dos entrevistados residem no Laranjeiras;
3,8% dos entrevistados residem no Jardim Teresópolis;
1,9% dos entrevistados residem no Parque Acácias;
1,9% dos entrevistados residem no São Luis;
486
Houve adolescentes e jovens participantes dos grupos focais que afirmaram participar
de mais de dois programas ou de mais de dois projetos sociais no município de Betim. Esse
dado corresponde a 42,8% dos entrevistados.
Quando perguntados se recebiam ou não algum tipo de bolsa ou de pagamento para
participar do programa ou projeto social ao qual disseram estar vinculados, 57,1%
responderam que “SIM” e 42,9% disseram que “NÃO”.
Tabelas geradas a partir dos questionários aplicados aos adolescentes e jovens participantes
dos grupos focais
TABELA a1: Zona na qual reside o/a Adolescente participante de Grupo Focal - Betim -
2012
Zona Frequência Percentual Percentual
acumulado
Zona Rural 1 1,9 1,9
Zona Urbana 51 98,1 100,0
Total 52 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
TABELA a2: Sexo declarado pelo/a Adolescente participante de Grupo Focal - Betim -
2012
Sexo Frequência Percentual Percentual
acumulado
Feminino 29 55,8 55,8
Masculino 23 44,2 100,0
Total 52 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
TABELA a3: Idade declarada pelo/a Adolescente participante de Grupo Focal - Betim -
2012
Idade Frequência Percentual Percentual
acumulado
21 1 1,9 1,9
18 3 5,8 7,7
17 2 3,8 11,5
16 11 21,2 32,7
15 11 21,2 53,8
14 8 15,4 69,2
13 10 19,2 88,5
12 5 9,6 98,1
11 1 1,9 100,0
Total 52 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
TABELA a4: Cidade em que nasceu o/a Adolescente participante de Grupo Focal -
Betim - 2012
494
TABELA a5: Estado no qual nasceu o/a Adolescente participante de Grupo Focal -
Betim - 2012
Estado Frequência Percentual Percentual
acumulado
Não Sabe 2 3,8 3,8
Espírito Santo 1 1,9 5,0
Pernambuco 1 1,9 7,7
Bahia 1 1,9 9,6
Minas Gerais 47 90,4 100,0
Total 52 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
TABELA a6: Se conhece o pai/ Adolescente participante de Grupo Focal - Betim - 2012
Conhece o pai Frequência Percentual Percentual
acumulado
Sim 49 94,2 94,2
Não 3 5,8 100,0
Total 52 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
TABELA a7: Ocupação do pai/ Adolescente participante de Grupo Focal - Betim - 2012
Ocupação do pai Frequênci Percentual Percentual Percentual
a Válido acumulado
Não Sabe 2 3,8 3,9 3,9
Não Respondeu 4 7,7 7,8 11,8
Açougueiro 1 1,9 2,0 13,7
Vidraceiro 2 3,8 3,9 17,5
Operário de Construção Civil 1 1,9 2,0 19,6
Corretor de Imóveis 1 1,9 2,0 21,6
Loteria Federal 1 1,9 2,0 23,5
Motorista 1 1,9 2,0 25,5
Engenheiro Elétrico 1 1,9 2,0 27,5
495
TABELA a8: Nesta ocupação seu pai tem carteira assinada? - Betim - 2012
Carteira Frequência Percentual Percentual
Assinada acumulado
Sim 25 48,1 48,1
Não 10 19,2 67,3
Não Sabe 3 5,8 73,1
Não se Aplica 14 26,9 100,0
Total 52 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim – 2012.
TABELA a9: Ocupação da mãe do/a Adolescente participante de Grupo Focal - Betim -
2012
Ocupação Frequênci Percentual Percentual Percentual
a Válido acumulado
Cuidadora 1 1,9 2,6 2,6
Recepcionista 1 1,9 2,6 5,1
Vendedora 2 3,8 5,1 10,3
Auxiliar da Área de Saúde 1 1,9 2,6 12,8
Administradora 1 1,9 2,6 15,4
Artesã 1 1,9 2,6 17,9
496
TABELA a10: Nesta ocupação sua mãe tem carteira assinada? - Betim - 2012
Carteira Frequência Percentual Percentual
Assinada acumulado
Sim 19 36,5 69,2
Não 16 30,8 100,0
Não Sabe 1 1,9 1,9
Não se Aplica 16 30,8 32,7
Total 52 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
TABELA a12: Série/grau que o/a Adolescente está cursando- Betim - 2012
Série/Grau Frequênci Percentual Percentual
a acumulado
1º ano do Ensino Médio 10 19,2 19,2
3º ano do Ensino Médio 1 1,9 21,1
2º ano do Ensino Médio 4 7,7 28,8
9º ano do Ensino 6 11,5
Fundamental 40,3
8º ano do Ensino 10 19,2
Fundamental 59,5
7º ano do Ensino 8 15,4
Fundamental 74,9
6º ano do Ensino 9 17,3
Fundamental 92,2
5º ano do Ensino 4 7,7
Fundamental 100,0
Total 52 100,0
497
TABELA a15: Programas e Projetos Sociais dos quais os/as Adolescentes participam-
Betim - 2012
Programas e projetos Frequênci Percentual Percentual Percentual
Sociais a Válido acumulado
Meio Ambiente 1 1,9 7,7 7,7
Fica Vivo 1 1,9 7,7 15,4
Oficina do Esporte 2 3,8 15,4 30,8
Basquete na Escola 2 3,8 15,4 46,2
Bolsa Família 1 1,9 7,7 53,9
Viva o Esporte 2 3,8 15,4 69,3
Escola da Gente 2 3,8 15,4 84,7
Árvore da Vida 2 3,8 15,4 100,0
Subtotal 13 26,9
100,0
39 73,1
Não se Aplica
52 100,0
Total
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
TABELA a16: Tempo de participação nos programas ou nos projetos sociais - Betim -
2012
Tempo de participação Frequênci Percentual Percentual Percentual
a Válido acumulado
Mais de 1 ano 5 9,6 35,7 35,7
De 1 a 2 meses 3 5,8 21,4 57,1
De 3 a 6 meses 2 3,8 14,3 71,4
De 6 a 12 meses 2 3,8 14,3 85,7
Não Sabe 2 3,8 14,3 100,0
Subtotal 14 26,9 100,0
498
TABELA a20: Condição do domicílio no qual o/a Adolescente reside - Betim - 2012
Domicílio Frequênci Percentual Percentual
a acumulado
Própria 3 5,8 5,8
Alugada 49 94,2 100,0
Total 52 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
TABELA a28: Algum tio ou tia reside no domicílio do entrevistado? - Betim - 2012
Tio (a) residentes no Frequênci Percentual Percentual
domicílio a acumulado
Sim 1 1,9 1,9
Não 51 98,1 100,0
Total 52 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
TABELA a31: Algum outro parente reside no domicílio do entrevistado? - Betim - 2012
501
TABELA a33: Na residência do/a adolescente possui energia elétrica? - Betim - 2012
Energia Elétrica Frequência Percentual Percentual
acumulado
Sim 52 100,0 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
TABELA a34: Na residência do/a adolescente possui água encanada? - Betim - 2012
Água Encanada Frequência Percentual Percentual
acumulado
Sim 52 100,0 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim – 2012.
TABELA a35: Na residência do/a adolescente possui rede de esgoto? - Betim - 2012
Rede de Esgoto Frequência Percentual Percentual
acumulado
Sim 49 94,2 94,2
Não 3 5,8 100,0
Total 52 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
TABELA a40: Na residência do/a adolescente possui máquina de lavar roupa? - Betim -
2012
Máquina de Frequência Percentual Percentual
lavar roupa acumulado
2 3 5,8 5,8
1 43 82,7 88,5
Não possui 6 11,5 100,0
Total 52 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
TABELA a41: Na residência do/a adolescente possui máquina geladeira? - Betim - 2012
Geladeira Frequência Percentual Percentual
503
acumulado
2 6 11,5 11,5
1 46 88,5 100,0
Total 52 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012
TABELA a44: Na residência do/a adolescente possui vídeo cassete? - Betim - 2012
Vídeo Cassete Frequência Percentual Percentual
acumulado
2 1 1,9 1,9
1 16 30,8 32,7
Não possui 35 67,3 100,0
Total 52 100,00
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012
TABELA a45: Na residência do/a adolescente possui aparelho de DVD? - Betim - 2012
Aparelho de dvd Frequência Percentual Percentual
acumulado
4 1 1,9 1,9
2 7 13,5 15,4
1 38 73,1 88,5
Não possui 6 11,5 100,0
Total 52 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
504
TABELA a46: Na residência do/a adolescente possui telefone fixo? - Betim - 2012
Telefone fixo Frequência Percentual Percentual
acumulado
2 3 5,8 5,8
1 27 51,9 57,7
Não possui 22 42,3 100,0
Total 62 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim – 2012.
TABELA a47: Na residência do/a adolescente possui telefone celular? - Betim - 2012
Telefone Frequência Percentual Percentual
Celular acumulado
7 1 1,9 1,9
6 2 3,8 5,8
5 6 11,5 17,3
4 12 23,1 40,4
3 16 30,8 71,2
2 8 15,4 86,5
1 7 13,5 100,0
Total 52 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim – 2012.
TABELA p2: Sexo dos pais/responsáveis participantes de Grupo Focal - Betim - 2012
Sexo Frequência Percentual Percentual
acumulado
Masculino 4 11,8 11,8
Feminino 30 88,2 100,0
Total 34 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
Total 34 100,0
Total 34 100,0
Total 34 100,0
Total 34 100,0
TABELA p16: O (s) filho (s) do entrevistado moram com os pais e/ou responsáveis?- Betim - 2012
Residência dos Frequência Percentual Percentual
filhos acumulado
Não 9 26,5 26,5
Sim 25 73,5 100,0
Total 34 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
TABELA p17: O (s) filho (s) do entrevistado participam de algum programa ou projeto
sociais em Betim? - Betim - 2012
Programas/Projetos Frequência Percentual Percentual
Sociais acumulado
Não 11 32,4 32,4
Sim 17 50,0 82,4
Não Sabe 1 2,9 88,2
Não Respondeu 5 14,7 100,0
Total 34 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
Total 34 100,0
TABELA p19: De qual (is) programa (s) e/ou projeto (s) sociais o (os) filho (s) do
entrevistado participa (m)?- Betim - 2012
Programas/Projetos Frequência Percentual Percentual Percentual
Sociais válido acumulado
Projeto São João 2 5,9 10,0 10,0
CEMAS 1 2,9 5,0 15,0
Serviço de Convivência e 5 14,7 25,0 40,0
Fortalecimento de Vínculo
Bolsa Família 1 2,9 5,0 45,0
PROERD 4 11,8 20,0 65,0
Escola da Gente 2 5,9 10,0 75,0
Projovem 1 2,9 5,0 80,0
Oficina de Música 1 2,9 5,0 85,0
Não Sabe 3 8,8 15,0 100,0
Subtotal 20 58,8 100,0
Total 34 100,0
TABELA p20: O (s) filho (s) do entrevistado que participa (m) de programas e/ou
projetos sociais recebe(m) algum pagamento ou bolsa pela participação? - Betim - 2012
Recebimento de Frequência Percentual Percentual Percentual
bolsa em válido acumulado
programas/projetos
sociais
Não 16 47,1 69,6 69,6
Sim 6 17,6 26,1 97,5
Não sabe 1 2,9 4,3 100,0
Subtotal 23 67,6 100,0
Total 34 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
TABELA p21: Qual é o valor que o (s) filho (s) do entrevistado recebe (m) por
participar deste (s) programa (s) e/ou projeto (s) sociais?- Betim - 2012
Valor em Reais por Frequência Percentual Percentual Percentual
projetos/programas válido acumulado
sociais
R$ 70,00 1 2,9 12,5 12,5
R$ 96,00 1 2,9 12,5 25,0
R$128,00 1 2,9 12,5 37,5
R$132,00 1 2,9 12,5 50,0
R$134,00 1 2,9 12,5 62,5
R$ 241,00 1 2,9 12,5 75,0
R$ 280,00 1 2,9 12,5 87,5
Não sabe 1 2,9 12,5 100,0
Subtotal 8 13,5 100,0
Não se aplica 26 76,5
Total 34 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
512
TABELA p22: Renda mensal familiar por quantidade de salários mínimos - Betim -
2012
Renda Frequência Percentual Percentual
acumulado
Até 1 salário 8 23,5 23,5
De 1 a 2 salários 15 44,1 67,6
De 2 a 3 salários 4 11,8 79,4
De 3 a 5 salários 2 5,9 85,3
Não Sabe 3 8,8 94,1
Não Respondeu 2 5,9 100,0
Total 34 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
TABELA p24: Número total de pessoas que residem no domicílio - Betim - 2012
Domicílio Frequência Percentual Percentual
acumulado
1 2 5,9 5,9
2 8 23,5 29,4
3 6 17,6 47,1
4 11 32,4 79,4
5 5 14,7 94,1
6 1 2,9 97,1
7 1 2,9 100,0
Total 34 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
TABELA p28: O entrevistado mora com os filhos que possui?- Betim - 2012
Situação de Frequência Percentual Percentual
moradia entre acumulado
pais e filhos
Não 1 2,9 2,9
Sim 33 97,1 100,0
Total 34 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
TABELA p29: O entrevistado mora apenas com uma parte dos filhos?- Betim - 2012
Situação de Frequência Percentual Percentual
moradia entre acumulado
pais e parte dos
filhos
Não 34 100,0 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
TABELA p30: Algum outro parente mora no domicílio do entrevistado?- Betim - 2012
Situação de Frequência Percentual Percentual Percentual
moradia entre o Válido acumulado
entrevistado e
outros parentes
Não 26 76,5 78,8 78,8
Cunhado (a) 7 20,6 21,2 100,0
Total 33 97,1 100,0
Não se aplica 1 2,9
Total 34 100,0
Fonte: Diagnóstico da Infância e Adolescência de Betim - 2012.
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