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Rodolfo Miguel de Figueiredo

Reflexões
Astrológicas
2021
Parte II
Rodolfo Miguel de Figueiredo

Astrólogo e Tarólogo. Dá
consultas de astrologia e tarot há
cerca vinte anos e faz
consultadoria astrológica para
empresas há mais de dez anos.
Estudou Filosofia na Universidade
Nova de Lisboa - Faculdade de
Ciências Sociais e Humanas, mas é
como autodidacta que tem
estudado áreas como o Estudo
C ompa ra d o da s R e li g iõe s, a
Cultura Clássica, a Filosofia Antiga
e o Esoterismo. Na astrologia, tem
-se dedicado a especialidades como
a Astrologia Antiga, a Astrologia
Hermética e a Astrologia
Mitológica, tendo orientado a sua
investigação para a tradução e
interpretação de textos
astrológicos gregos e latinos.
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Ref lexões Astrológicas
Astr ol ogia & Tar o t

Rod olf o Mi gue l d e Figueired o

rod olfo migue ld e figue ir e d o@g mail.c om

htt ps :/ / rod olf omfigue ir e d o.wi xsi te .c om/ a stro log i a -e -tarot

Título : Reflexõe s As tr ol ó gic as 2021, Par te II

Autor : Rod o lfo Migue l d e Figue ir e d o

Capa: Gio van ni Be lli n i, Quatr o Ale goria s: Fortuna (ou


Melanco lia), c.14 90, Ve n e za: Galle r ie d e ll’ Accad emia.

Com po sição e pa ginaç ão : RMd F

© Rod o lfo Migue l d e Fig ue ir e d o, J ane ir o d e 2022

Os text os apre se ntad o s n e ste livr o d igital fora m publicad o s n os


blo gues e red e s soc iai s d o aut or d ur ante o segu n d o seme stre d e
2021, são por tan to d e a c e sso l ivr e e gratui to . No e ntan to , os
d ireitos d e autor d e ve m se r r e spe itad os , log o nen huma parte
d este livro p od e se r r e pr od uzid a se m o con senti ment o d o
mesmo .
Rod olfo Mig uel d e Fig ue ired o

Ref lexões
Astrológicas

2021
Par te II

Lisboa
2022
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Índice

ÍNDICE 7

INTRODUÇÃO 9

REFLEXÕES ASTROLÓGICAS 13

2021

Parte II : Julho - Dezembro 17

1 - Lua Nova: Caranguejo 19

2 - Lua Cheia: Eixo Aquário - Leão 27

3 - Lua Nova: Leão 35

4 - Lua Cheia: Eixo Aquário - Leão 43

5 - Lua Nova: Virgem 51

6 - Lua Cheia: Eixo Peixes - Virgem 59

7 - Lua Nova: Balança 67

8 - Lua Cheia: Eixo Carneiro - Balança 75

9 - Lua Nova: Escorpião 83

10 - Eclipse Lunar Parcial 91

11 - Eclipse Solar Total 103

12 - Lua Cheia: Eixo Caranguejo - Capricórnio 115

CONSULTAS DE ASTROLOGIA E TAROT 125


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Reflexões Astrológicas 2021 9

Introdução

Nas Reflexões Astrológicas, procura-se analisar anualmente


alguns eventos astrológicos. O objectivo é examinar e explorar, de
ano para ano, diferentes aspectos do sistema astrológico, de modo
a apresentar uma compilação interpretativa o mais ampla possível.
No ano de 2021, as Reflexões Astrológicas focam-se nos principais
fenómenos lunares: as Luas Novas e as Luas Cheias. Inclui-se
também uma interpretação um pouco mais extensa dos eclipses
que ocorrem em 2021. Uma vez que os textos aqui reunidos foram
publicados nos blogues do autor e nas redes sociais do autor, o
livro digital é de distribuição livre e gratuita. As Reflexões Astrológicas
para 2021 serão disponibilizadas em duas partes, correspondendo
cada uma aos textos de um semestre.

A mensagem que se pretende passar tem essencialmente o


intuito de demonstrar que a análise astrológica é plural como
universo e não deve estar depende de uma uniformidade
interpretativa que, por sinal, tende a ser redutora e conduz a um
esvaziamento dos conceitos. A leitura astrológica se for propensa à
reprodução de uma cartilha, seguindo as modas dos tempos, corre
o risco de se fixar em lugares-comuns e em frases-feitas. Os
conceitos devem ser, desta forma, aprofundados de um modo
diverso e a profundidade não pode sucumbir ao carácter líquido da
10 Rodolfo Miguel de Figueiredo

linguagem actual.

A interpretação astrológica que aqui se apresenta sustenta-se


nas vertentes que o autor elegeu como especialidades: a Astrologia
Antiga, a Astrologia Hermética e a Astrologia Mitológica.
Paralelamente, procura-se criar uma ponte entre a astrologia e a
filosofia, visando o desenvolvimento de uma Filosofia da
Astrologia e de uma Astrosofia, baseada na filosofia prática e nos
exercícios espirituais, cujos pressupostos permitem uma estrutura
conceptual de passagem entre estes e a leitura hermética da
astrologia.

A escolha dos fenómenos lunares para o início destas


Reflexões Astrológicas não é inocente. Os pressupostos astrológicos
são os evidentes: a proximidade da Lua face à Terra, a relação entre
a Lua e o Sol e a influência primordial e radical que a Lua exerce
sobre a vida na Terra. No entanto, o fundamento dessa escolha
não se deve apenas a esses pressupostos. A Lua indica o feminino e
o Eterno Feminino e o retorno do feminino e da Grande Mãe são
os eixos espirituais destas reflexões.

Em suma, ao longo dos doze capítulos, pretende-se conjugar


a interpretação astrológica com uma leitura filosófica e espiritual.
Dessa união, pode nascer assim uma nova astrologia ou uma
astrologia refundada.

Nota: os mapas astrológicos, apresentados em cada capítulo, foram gerados pelo software
Janus 5.5 (Astrology House, 2021) com um modelo que inclui os decanatos e os termos.
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Ref lexões Astrológicas
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2021
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Par te II

Julho - Dezembro
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1

Lua Nova

C
Lisboa, 02h17min, 10/07/2021

Sol - Lua
Decanato: M er cúrio

T ermos : M er cúr io

M onomoir ia: Sol


20 Rodolfo Miguel de Figueiredo
Reflexões Astrológicas 2021 21

Lua Nova: Caranguejo

A Lua Nova de Julho ocorre no signo de Caranguejo, de


noite e sob o horizonte, no Lugar da Deusa (III) e junto ao Ponto
Subterrâneo (IC), nos termos e decanato de Mercúrio e na
monomoiria do Sol. É facilmente observável o modo como o
carácter primordial desta lunação acentua o Feminino como
origem, sentido e transformação. Caranguejo é o signo da origem e
tanto o signo como o lugar em que a sizígia se firma expressam
uma natureza lunar radical. Por outro lado, ao colocar-se junto ao
Ponto Subterrâneo, o encontro dos luminares adquire um valor de
base ou fundação, enraizando-se assim no ventre da Terra, no
silêncio e na escuridão inaugural. O sistema de casa-signo ou signo
inteiro permite que o valor de subterrâneo, de abismo original
esteja partilhado entre a III e a IV, ou seja, ambos adquirem o
sentido de Lugar Sob a Terra. Desta forma, a Lua Nova reúne em
si vários elementos que integram a expressão do Feminino, da
Grande Mãe.

No Lugar sob a Terra (IV), estando o Ponto Subterrâneo na


III, Vénus e Marte unem os seus raios. Convém que se note que,
para além dos luminares, no que à união dos opostos concerne,
estes são os astros mais favorecidos. Vénus e Marte estão no seu
próprio segmento de luz (αἵρεσις), lançando, a partir das
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profundezas da Terra, os seus raios. No signo de Leão, onde a


individualidade se torna génese e criação, complementam a
mensagem, o sentido profundo, que a união dos luminares projecta
para todo o tema. A luz, não desce do céu, nasce no abismo, no
útero de Gaia, do Sagrado Feminino. Vénus e Marte afirmam aqui
a união dos contrários e, sabendo nós que os benéficos
(ἀγαθοποιοί) encerram em si o valor da dádiva, será sobretudo o
planeta de Afrodite a atenuar o olhar diametral (oposição) que se
tece entre os maléficos (κακοποιοί). Os benéficos (Vénus e
Júpiter) têm sempre o poder de abençoar, de trazer em si a luz do
bem, e essa dádiva transforma sempre o lugar ou o aspecto,
anulando ou atenuando qualquer malefício.

Por outro lado, Vénus e Marte unem hexagonalmente (sextil)


os seus raios com Mercúrio. A fase helíaca destes astros é essencial
para compreender a sua expressão neste novilúnio. Vénus e Marte,
estando para além dos raios do Sol, são Estrelas da Tarde,
adquirindo portanto uma natureza feminina e um carácter
emocional e intuitivo. Nesta posição, Vénus é a Afrodite Cipriota,
é Inanna e Deméter, é Ísis e Bast. Já Marte como Estrela da Tarde
é o Herói que se inicia nos mistérios da Deusa. É Ulisses na ilha de
Circe. É Héracles, vencendo os desafios de Hera. É Artur a receber
Excalibur da Senhora do Lago. Na constelação de Leão, Marte é o
deus ou o herói que, do útero do Feminino (Caranguejo/Lua),
emerge para a Luz, não deixando de ser seu filho, irmão e amante.
Porém, por ser uma Estrela da Tarde e estar junto a Vénus, Marte
Reflexões Astrológicas 2021 23

em Leão torna-se o herói que se entrega à Deusa, que se submete à


sua intensidade sexual e participa na sua fertilidade.

Mercúrio, pelo contrário, toma a posição dianteira e mostra-


se como Estrela da Manhã. Nesta posição, Mercúrio é o
mensageiro dos deuses e o arauto do Logos, mas é também
Hermes Crióforo, o ardiloso pastor da Arcádia. Mercúrio em
Gémeos, no seu domicílio diurno, é tanto a palavra proclamada
como a palavra sussurrada, podendo surgir como verdade contada
no deserto ou mentira aplaudida na multidão. Essa expressão de
Mercúrio é consubstanciada pela presença da Caput Draconis no
mesmo signo. Até bem perto do Natal, o Dragão da Lua estenderá
o seu corpo no eixo Sagitário-Gémeos, sugerindo uma viagem
iniciática da Sabedoria (Sagitário) até à Palavra, ao Conhecimento
(Gémeos), dando assim sentido à forma. Depois, seguir-se-á o
caminho ou a senda que vai da Morte (Escorpião) à Vida (Touro),
que integra o morrer no modo de se viver.

A razão pela qual Vénus se assume, neste novilúnio, como a


expressão maior da dádiva dos benéficos prende-se sobretudo ao
facto de Júpiter estar fora do seu segmento, mas também por
formar um aspecto de tensão (quadratura) com Mercúrio e com o
Dragão da Lua, dificultando a sua expressão. No entanto, apesar
do benéfico diurno estar assombrado pelo peso da noite, não deixa
de contribuir com a luz da sua dádiva. O Senhor do Espaço, da
Verdade e da Justiça une-se triangularmente aos luminares,
hexagonalmente com Úrano e Plutão e por presença com
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Neptuno. Júpiter em Peixes, conjunto a Neptuno, e partir do Bom


Espírito (ἀγαθόν δαίμων), da XI, concede e partilha a dádiva da
compaixão e o dom da contemplação. Exorta assim a uma outra
forma de se estar colectivamente. O tempo pós-pandemia ou de
cansaço da pandemia não deve ser um regresso à falsa
normalidade, nem à ilusão de uma sociedade líquida, construída
sobre a vaidade e o egocentrismo. A integração na luz pede sempre
uma imersão desapegada na totalidade.

Do cume do céu (MC), Plutão, o Senhor da Morte, é o astro


que está mais perto da culminação, embora cadente. No Lugar de
Deus (IX), a morte é aquela que ressuscita, que purifica e que traz
o infinito à solidão do eu. Sem a presença da morte, seria
impossível fixar um valor, conferir uma qualidade axiológica, daí
que a lembrança constante - marcada com o ritmo de um tambor –
de que também nós vamos morrer seja uma condição de
possibilidade para a construção de um novo modo de vida. Ora a
dificuldade de integrar na vida esse tambor iniciático da melodia da
ceifeira é observável pela oposição de Plutão (e do MC) aos
luminares, ou seja, tem de se saber acolher essa via de
transformação.

Por outro lado, Plutão une-se em trígono a Úrano, que está


em conjunção ao Ascendente, e em sextil a Neptuno (e a Júpiter)
que, por sua vez, se une também em sextil a Úrano. Esta união que
une a Morte (Plutão), a Compaixão ou o Amor Universal
(Neptuno) e a Revolução (Úrano), concedendo as bênçãos e os
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dons a um processo interno e colectivo de transformação, irá


equilibrar, beneficamente, aquela que une a Força/Amor (Marte/
Vénus), o Tempo (Saturno) e a Revolução (Úrano).

A oposição de Vénus e Marte a Saturno e a quadratura destes


a Úrano são, por excelência, o principal elemento de tensão neste
novilúnio. No entanto, o que de uma forma empírica surge como
tensão – os acidentes, os desastres naturais e os crimes de sangue,
em particular contra as mulheres, são disso exemplo – será
apreendido, mais tarde, já com um olhar distante, como um
elemento estruturante. Estes aspectos surgem no tema da Lua
Nova junto aos seus pólos ou pontos cardeais (κέντρα): Úrano no
Horóscopo (Asc.), unindo a revolução do humano ao leme da vida;
Vénus e Marte no Lugar sob a Terra (perto do Ponto Subterrâneo)
onde a relação dos opostos se torna a fundação da realidade; e
Saturno no Lugar de Culminação (perto do Meio do Céu) onde o
tempo se apresenta como cume da realidade e daquilo que se faz.

A dupla quadratura a Úrano em Touro torna a ideia de


revolução um princípio formal, tanto no concerne à consciência
íntima do tempo (Saturno em Aquário) como no que diz respeito à
religação da polaridade na individualidade (Vénus e Marte em
Leão). O trígono de Saturno a Mercúrio mostra ainda, sobretudo
nestes tempos difíceis, como a apreensão da consciência do tempo,
enquanto conhecimento da vida e da morte, é um dom de
transformação.
26 Rodolfo Miguel de Figueiredo

Neste novilúnio, um aspecto que serve de síntese da lunação


é o sextil de Úrano aos luminares. O significado profundo do
Sagrado Feminino enquanto origem, sentido e transformação,
expresso aqui pela Lua Nova em Caranguejo, une-se ou reúne-se à
revolução do humano como expressão de uma necessidade de
ligação à Terra, a Gaia (Úrano em Touro). Uma das lições que
devemos colher destes tempos sombrios é que quanto menor é a
nossa presença abusiva no planeta maior é a sua vida, a sua
renovação. Nos confinamentos, vimos veados a descer a cidade,
vimos os efeitos de décadas de poluição recuarem, sem a circulação
desenfreada de aviões, barcos e automóveis. A natureza não clama
pelo humano, mas o humano precisa da natureza e quem precisa
cuida.

Da Lua Nova em Caranguejo até bem perto da Lua Cheia,


acentuar-se-á uma passagem de sentido entre a origem e o fim,
entre a matriz que gera e o poder que culmina, ou seja, será
firmado o caminho entre Caranguejo e Capricórnio.
2

Lua Cheia

Q-O

Lisboa, 03h37min, 24/07/2021

Lua
Decanato: Vénus

Termos: Mercúrio

Monomoiria: Júpiter

Sol
Decanato: Saturno

Termos: Júpiter

Monomoiria: Vénus
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Reflexões Astrológicas 2021 29

Lua Cheia: Eixo Aquário - Leão

O eixo da Lua Cheia de Julho coloca a Lua acima do


horizonte, no seu próprio segmento de luz, no Lugar de Deus
(IX), no decanato de Vénus, termos de Mercúrio e monomoiria de
Júpiter. Por seu lado, o Sol surge no Lugar da Deusa (III), abaixo
do horizonte, fora do seu segmento de luz, no decanato de
Saturno, termos de Júpiter e monomoiria de Vénus. Sendo por
natureza a Lua Cheia um fenómeno astrológico axial, esse carácter
estender-se-á e conjugar-se-á com outros eixos.

Por um lado, a Lua Cheia ocorre no eixo Aquário-Leão,


trazendo à representação a dicotomia, também ela axial, do
individual e do colectivo, do pessoal e do social, por outro lado,
essa dinâmica axial surge no eixo dos lugares de Deus e da Deusa,
do Deus-Sol e da Deusa-Lua (IX-III). Ora o potencial axial coloca
dois elementos, não numa verdadeira oposição, mas a olharem-se
de frente, a retesarem entre si uma linha, um fio de Ariadne, que
representa tanto uma tensão, própria da polaridade, como uma
harmonia, um encontro ou união amorosa dos opostos – algo que
só se concretiza ou se torna efectivo na Lua Nova ou numa
qualquer conjugação .

Com este carácter axial a Lua Cheia de Julho coloca a tensão


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na individualidade, no Sol que, na Noite Escura da Alma, perde a


sua luz. A individualidade leonina terá de enfrentar a sombra, terá
de olhar-se ao espelho e fitar a soma das suas vaidades. A presença
de Marte no signo de Leão, mas já fora do alcance dos raios
solares, vai frisar e exacerbar a inquietude radical desta dinâmica.
No Lugar da Deusa, o Sol sente a orfandade do feminino e a perda
da palavra. Pelo contrário, a Lua, no Lugar de Deus, irradiando,
brilhando no seu segmento de luz, traz o feminino à
espiritualidade, ao pensamento e, por estar em Aquário, ao
humano e à construção contínua da humanidade.

A Lua encontra-se, porém, junto a Saturno. Lembremo-nos


de uma tradição antiga, que contraria a correspondência comum de
Ptolomeu (Apotelesmática I, 6, 1), e que nos diz que Saturno é feminino.
Essa é a tradição enunciada, primeiramente, por Doroteu de Sídon
(século I EC), no seu Carmen Astrologicum (I, 10, 18-19), e que se
encontra em harmonia com a doutrina do segmento de luz
(αἵρεσις), sobretudo se considerarmos que existe um benéfico e
um maléfico diurno (Júpiter e Saturno) e um benéfico e um
maléfico nocturno (Vénus e Marte), sendo um masculino e outro
feminino. Esta harmonia dos contrários só existe se Saturno for
feminino.

Como em todas as tradições, tende a existir uma


fundamentação cultural, filosófica ou mitológica. Cronos derrota
Úrano, castrando-o, com a ajuda de sua mãe, Gaia. É uma
Reflexões Astrológicas 2021 31

divindade que reúne, também na sua forma romana, fortes


elementos telúricos e ctónicos, enraizando-se portanto na terra-
mãe. Por outro lado, a sua companheira é Reia, a deusa-mãe que se
associará a Cíbele. Ora esta deusa, Reia-Cíbele, a Mãe dos Deuses,
é a mesma que Manílio coloca a reger o signo de Leão, juntamente
com Júpiter (Astronomica II, 447). Existe portanto em Saturno uma
subalternância de poder, uma certa submissão ao feminino, à
Necessidade e às Meras - as verdadeiras deusas do tempo.

A Lua conjunta a Saturno, no Lugar de Deus, associa o


feminino ao tempo e à forma, pois se Júpiter concede a matéria,
Saturno força a forma na matéria. Essa é a tensão da criação. Por
estarem em Aquário e no Lugar de Deus, a Lua e Saturno,
sobretudo se tivermos em conta que se opõem ao Sol e a Marte,
vão impor sobre o colectivo, sobre a dimensão social que procura a
revolução do humano, transformando-o e agregando-o numa
verdadeira humanidade, uma necessidade de forma, de construção
de uma consciência de si, integrada no tempo e no meio.

A forma do colectivo, quando burilada com grande esforço


pela individualidade, exige sempre um espírito de serviço e uma
vontade desapegada. É preciso queimar no fogo da consciência a
soma de todas as vaidades. Ora esse esforço vai encontrar
necessariamente Úrano em Touro (quadratura), no Mau Espírito
(κακός δαίμων), revelando que a sombra revoltada da Terra paira
sobre o mundo. A natureza está cansada dos seus opressores e,
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como um animal ferido ou uma fêmea protegendo as suas crias,


mostrará as suas garras e o seu ferrão.

Paralelamente, temos Júpiter em conjugação quase exacta à


Culminação (MC), despedindo-se - até voltar - do signo de Peixes.
Ora no Ponto Subterrâneo, em posição diametral, temos Vénus,
recém-chegada à constelação de Virgem. Os benéficos estendem-
se, desta forma, da fundação ao cume. Por estar no seu próprio
segmento de luz, embora abaixo do horizonte, Vénus é o benéfico
cuja luz é mais intensa. No entanto, Júpiter, apesar de estar fora do
seu segmento, acima do horizonte e retrógrado, colhe a luz de
Vénus. A posição dos benéficos, neste plenilúnio, é como um feixe
de luz, um raio fulgente que espalha o desejo (Vénus) de verdade
(Júpiter), o Amor e a Justiça. Neste eixo zodiacal, os benéficos
pedem que não se perca o serviço ao próximo, o acto desapegado
de cuidar do corpo e da alma.

Com os benéficos a olharem-se de frente, a luz que se une


por distinção, e não por conjugação, não se limita a si própria, jorra
como uma dádiva, um dom do céu. Vénus (IV) une-se
diametralmente a Neptuno (X) e triangularmente a Úrano (XII) e a
Plutão (VIII). Já Júpiter une-se por presença a Neptuno (X) e
hexagonalmente a Úrano (XII) e a Plutão (VIII). Estas uniões
apresentam também o modo como, neste momento, os planetas
transpessoais se unem: Úrano em Touro em sextil a Neptuno em
Peixes; Neptuno em sextil a Plutão em Capricórnio; e Plutão em
Reflexões Astrológicas 2021 33

trígono a Úrano. A tessitura ou a urdidura destas relações surgem


como uma síntese dos nossos tempos e como uma proposta de
futuro. Com os benéficos vigiando, concedendo a sua dádiva, a
revolução da terra (Úrano em Touro), a compaixão como
unicidade (Neptuno em Peixes) e o poder da morte (Plutão em
Capricórnio) transformam a nossa realidade. Estas posições trazem
consigo o dom da possibilidade. Não obrigam a mudança, mas
estão lá, umas vezes discretas, sussurrando, outras vezes pujantes,
clamando e gritando pelas transformações necessárias.

Mercúrio em Caranguejo, no Lugar do Modo de Vida, do


Viver, resume o valor da origem enquanto palavra, enquanto
instrumento criador. A comunicação fixará na tradição, no
passado, no valor da vida e da morte, a bênção do conhecimento.
Esse potencial da palavra como origem é particularmente
expressivo pelo facto de Mercúrio (II) se unir de forma benéfica a
Vénus (sextil) e a Júpiter (trígono), mas também a Úrano (sextil) e a
Neptuno (trígono). Com esta união, a palavra torna-se uma dádiva,
um dom de transformação.

Nesta posição, o valor do conhecimento trará consigo a


alegria de um despertar, de um renascer. É como se
encontrássemos um manuscrito perdido e ao lê-lo descobríssemos
um novo mundo, um novo humano. A descoberta dos manuscritos
de Nag Hammadi trouxe essa sensação. Esta é a origem como
potencial de transformação. Porém, a potência da criação carrega
34 Rodolfo Miguel de Figueiredo

consigo, como um desígnio inaugural, a potência da destruição. A


morte é a sombra da vida. Com Mercúrio (II) em oposição a Plutão
(VIII), a palavra como valor da vida encontrará a qualidade da
morte, o seu poder. Plutão no Lugar da Morte é o deus Hades a
subir à terra e a raptar Perséfone. É o lamento de Deméter, o
Inverno e a destruição sobre o manto de Gaia, daí que seja o
senhor de pestes e pandemias, de incêndios e secas, de vulcões e
erupções.

À semelhança daquilo a que assistimos na Lua Nova de


Julho, a oposição de Marte a Saturno e a quadratura destes a Úrano
continua a ser, por excelência, o principal elemento de tensão neste
novilúnio. Porém, no novilúnio, este posicionamento recaía sobre
os pólos, os pontos cardeais (κέντρα), mas agora situa-se em casas
cadentes, o que naturalmente reduz a sua condição malévola. A
acção destes planetas continuará todavia e os seus efeitos trarão
tensão e destruição, externa e interna. No entanto, o corpo do
Dragão estende-se sobre o horizonte, troando a importância da
viagem da palavra à sabedoria e da sabedoria à palavra. Essa
continua a ser uma mensagem para o futuro.
3

Lua Nova

O
Lisboa, 14h50min, 08/08/2021

Sol - Lua
Decanato: J úpiter

T ermos : Saturno

M onomoir ia: M er cúrio


36 Rodolfo Miguel de Figueiredo
Reflexões Astrológicas 2021 37

Lua Nova: Leão

A Lua Nova de Agosto ocorre no signo de Leão, de dia e


acima do horizonte, no Lugar da Práxis (X), no decanato de
Júpiter, termos de Saturno e monomoiria de Mercúrio. Estando a
Lua fora do seu Segmento de Luz e com as posições acima
descritas, a afirmação do masculino e do carácter solar torna-se
evidente. Mercúrio vai acentuar igualmente a expressão masculina
desta sizígia, pois encontra-se sob os raios do Sol e numa posição
anterior, também ela masculina. Junto ao Ponto de Culminação
(MC), na XI, o Bom Espírito (ἀγαθόν δαίμων), Marte em
Virgem assume-se como o astro que brilha mais alto no céu.

O carácter masculino e solar apresenta-se portanto como o


principal elemento de significação. O intelecto agente expande a
sua luz criadora de uma forma que pode, se essa for a vontade,
transformar o mundo e o humano. Esta luz vibrante pede que se
procure o lugar secreto onde o divino habita em nós. Lembremo-
nos, por exemplo, do Evangelho de Maria Madalena quando diz: “onde
está o Intelecto, ali está o tesouro” (10). No entanto, o caminho para se
alcançar esse tesouro surge como um enigma. É a esfinge que
desafia o peregrino e, perante a inquirição da vida e da morte, é
exigida uma revelação.
38 Rodolfo Miguel de Figueiredo

A luz de Agosto arde na individualidade, consome o


narcisismo e o egocentrismo e alumia a consciência de si, a chama
pulsante do intelecto, do numinoso em nós. No entanto, olhando
de frente, opondo-se em retrogradação, o Espaço e o Tempo, a
Verdade e a Necessidade, Júpiter e Saturno enfrentam os luminares
e também Mercúrio. Aquilo que brilha em nós pode, porém, não
chegar ao outro, pode não ser reconhecido. Em Aquário, a
construção do Novo Humano e da Humanidade traz sobre si,
como se a si retornasse, o espírito do bloqueio e a impotência da
realização, ou seja, o espírito agregador de um colectivo aquariano
não nasce, nem floresce, pedindo espera e reflexão.

Existe, nesta posição, uma necessidade imperiosa e social de


pensar o valor da humanidade, da solidariedade como matriz do
colectivo. No Lugar sob a Terra (IV), Júpiter e Saturno ocultam
nas profundezas da terra a sombra do feminino, o elemento que
neste novilúnio sente a sua expressão diminuída, pois Júpiter
encontra-se nos termos de Saturno e no decanato da Lua e Saturno
nos termos e decanato de Vénus. Na fundação, na base da
realidade, o Humano fita a luz e o cume, reconhecendo o caminho
da luz.

Apesar de estar sob o horizonte, Júpiter é o benéfico que


reverbera a luz da dádiva, intensificando a mensagem de Mercúrio
e dos luminares. O elemento criativo, a genialidade, o que
transcende o comum firma-se como potencial e expressa-se como
Reflexões Astrológicas 2021 39

luz do amanhã. O colectivo, o social, não conseguindo fazer nascer


em si essa luz, terá de colher na excepção do individual essa
potência de criação. Sob o véu do outro, Úrano em Touro, na VII,
em quadratura aos luminares e a Mercúrio (X) e a Júpiter e Saturno
(IV) força o conflito entre a liberdade e a tradição e demonstra a
dificuldade da luz da individualidade chegar ao outro. No entanto,
é aí que reside o esforço e a possibilidade de se alcançar um
verdadeiro espírito de humanidade, onde o génio de cada
individualidade se toque e crie, agregando um colectivo que una os
seres humanos em solidariedade e compaixão, mas também em
sintonia com o espírito da terra, com a mãe Gaia.

Entre o conhecimento da vida e conhecimento da morte,


entre a II e a VIII, o corpo do Dragão da Lua estende a sua
mensagem ao transportar a sabedoria (Sagitário) na palavra
(Gémeos), ao infundir a sabedoria nesse conhecimento da vida e da
morte. Ora a importância dessa mensagem é enfatizada pelos
aspectos benéficos (trígonos e sextis) da sizígia dos luminares, de
Mercúrio, de Júpiter e Saturno. Pelo contrário, Vénus e Marte, e
também Neptuno, formam quadraturas com o Dragão da Lua,
mostrando que a harmonia dos contrários pode não ser acolhida
por aqueles que recebem – ou rejeitam - a sabedoria na palavra, no
conhecimento.

Sabendo nós que o masculino tem regido os paradigmas


humanos da maioria dos séculos que a história grafa, mesmo que
40 Rodolfo Miguel de Figueiredo

de forma deturpada, o problema reside em aceitar o feminino


como origem e sede da sabedoria. A tensão de Neptuno aponta
também para esse problema, para a dificuldade de se compreender
que a compaixão e o amor universal são também eles meios para a
sabedoria se expressar e a ilusão é teimar na negação dessa
evidência. O paternalismo e o chauvinismo que persiste nos nossos
tempos – mesmos no seio das espiritualidades – terão sempre
dificuldade em acolher o Divino Feminino. O medo do feminino
torna-se assim um obstáculo no caminho.

O encontro de Vénus e Marte no signo de Virgem, estando


ambos fora do seu Segmento de Luz, vem reforçar a necessidade
de se acolher a harmonia dos contrários. Porém, a forma como os
opostos são integrados tende, face à fragilidade humana, a abarcar
o seu aspecto de conflito, de guerra permanente, o πόλεμος de
Heraclito (frag, 53 Diels). A influência desta conjunção no signo de
Mercúrio e no Bom Espírito (XI) intensifica uma dimensão
racional e traz ao plano das ideias um espírito combativo, mas
também estético. Por outro lado, a força e o desejo podem fazer
ainda com que a intolerância e a intransigência ideológica sejam
potenciadas, o que é expresso também pela oposição a Neptuno
em Peixes (V). Firma-se a ilusão e desvanece a empatia.

A relação benigna (trígono) de Vénus e Marte em Virgem


(XI) com Úrano em Touro (VII) e Plutão em Capricórnio (III)
frisa a importância de se alcançar um equilíbrio ecológico e
Reflexões Astrológicas 2021 41

sustentável. Esse é o desafio dos nossos tempos. No entanto,


Marte trará o conflito a esse processo, mostrando como os seres
humanos são tão relutantes em mudar os seus hábitos. Não se
salva o planeta com algumas mudanças alimentares e apanhando
algum plástico para a fotografia. Existe uma exigência mais
profunda que obriga a mudanças radicais, sobretudo ao nível dos
transportes, do comércio e dos recursos. Não sendo Vénus o
benéfico mais favorecido, pois encontra-se fora do seu segmento
de luz, e estando Marte pela mesma razão exacerbando o seu
carácter de maléfico, este é um tema que firmará intensas
discussões e obrigará a um marcar, por vezes extremado, de
posições.

Por outro lado, concedendo a dádiva e unidos em trígono e


sextis, Úrano em Touro, Neptuno em Peixes e Plutão em
Capricórnio continuam a transformar a nossa realidade. Essa união
da revolução da terra, da compaixão como unicidade e do poder da
morte, nos lugares da Deusa, da Boa Fortuna e do Poente,
transporta o nascer de uma nova era. O Eterno Feminino, o
regresso da Grande Mãe marca aqui um caminho, uma senda de
possibilidade. O dom do aspecto feminino do Divino pede uma
integração, que não obriga, mas leva necessariamente a uma
aceitação, a uma transformação da realidade. É preciso ver a
sabedoria que a maioria não vê e nega.

Com Escorpião a marcar a hora e os luminares em Leão, a


42 Rodolfo Miguel de Figueiredo

intensidade marcará o novilúnio, trazendo a luz e a sombra, a


vaidade e a morte. O caminho que é de tensão entre o abismo e o
cume, entre a terra e o céu exige que o génio em cada um brilhe
como nunca, mas, sob a sombra dos nossos demónios, teremos,
por força e necessidade, de vencer esse medo do feminino. A Idade
do Espírito Santo é a luz do Eterno Feminino.
4

Lua Cheia

Q-O

Lisboa, 12h02min, 22/08/2021

Lua
Decanato: Lua

Termos: Saturno

Monomoiria: Júpiter

Sol
Decanato: Marte

Termos: Marte

Monomoiria: Vénus
44 Rodolfo Miguel de Figueiredo
Reflexões Astrológicas 2021 45

Lua Cheia: Eixo Aquário - Leão

O eixo da Lua Cheia de Agosto coloca a Lua sob o


horizonte, fora do seu segmento de luz, no Lugar sob a Terra (IV),
no decanato da Lua, termos de Saturno e monomoiria de Júpiter. Por
seu lado, o Sol surge no Lugar de Culminação (X), acima do
horizonte, no seu próprio segmento de luz, no decanato de Marte,
termos de Marte e monomoiria de Vénus. Neste plenilúnio, é
impossível não assinalar o facto de este marcar o fim de um ciclo
iniciado na Lua de Cheia de Julho: a primeira no signo de Leão.
Ora a 24 de Julho a Lua estava no segundo grau de Aquário e o Sol
no segundo de Leão e agora, nesta Lua de Cheia de Agosto,
encontram-se no grau trigésimo grau, percorrendo-se assim quase
um signo. O sentido deste ciclo continuará, porém, até Lua Nova
de Setembro, mas desta vez e progressivamente o simbolismo da
colheita e do serviço ganhará a sua gravidade.

Este ciclo foi mediado pela Lua Nova de Agosto no


décimo sétimo grau de Leão. Mais do que em qualquer outro
período do ano este ciclo marca a relação entre a individualidade
(Leão) e a humanidade (Aquário), ou seja, o humano terá de
encontrar o lugar entre a consciência de si, a chama pura do
intelecto, e a consciência social e colectiva. A necessidade de se
46 Rodolfo Miguel de Figueiredo

encontrar um equilíbrio entre a criação individual e a partilha


colectiva é imperiosa. Veja-se, por exemplo, o desequilíbrio
mundial no processo de vacinação, entre países ricos e pobres, ou a
forma como cada país responde aos desastres naturais, à
intolerância, à misoginia, ao racismo e à guerra. A consciência de si
terá de quebrar colectivamente a soma de todas as vaidades, pois
só onde existir solidariedade, a humanidade persistirá.

Um outro elemento de análise deste ciclo, oferecido como


uma pequena pista - a última das dignidades astrológicas -, é a
monomoiria. Segundo a lição de Paulo de Alexandria (Introdução, cap.
5), ficamos a saber que tanto a Lua Cheia de Julho como a de
Agosto ocorrem nas mesmas monomoirias, isto é, a Lua encontra-se
na monomoiria de Júpiter e o Sol na de Vénus. O feminino e o
masculino alternam assim as suas dádivas. E a mediar estas
bênçãos encontra-se, na Lua Nova de Agosto, a monomoiria de
Mercúrio. Hermes Trismegisto indica o caminho do Pai e o da
Mãe, o da Vontade e o da Sabedoria, dizendo que são um e o
mesmo. Por outro lado, calculados os eventos lunares para Lisboa,
no tema da Lua Nova e da Lua Cheia de Agosto, Escorpião marca
a hora, colocando assim o novilúnio e o plenilúnio junto ao eixo
polar vertical. A segunda parte do ciclo estabelece, deste modo,
uma relação entre a Morte (Escorpião), a Criação (Leão) e a
Humanidade (Aquário). Nesta segunda fase do ciclo, a morte e a
extinção será necessariamente uma ameaça à vaidade, pois o eu
quando voltado apenas para si, criando apenas simulacros de si
Reflexões Astrológicas 2021 47

próprio, extingue-se com a morte, com a sua própria destruição.

Com o eixo do plenilúnio sobre o de culminação, a ideia de


cume e de acção efectiva recai sobre o Sol que expande a expressão
leonina de criação e recebe a dádiva dos benéficos: de Vénus em
Balança (sextil), a partir da XII, do Mau Espírito (κακός δαίμων),
e de Júpiter em Aquário (oposição), junto da Lua, a partir da IV, do
Lugar sob a Terra (ὑπόγειον). Ora os benéficos, unidos
triangularmente entre si, trazem consigo os dons do bem, da beleza
e da justiça, porém também a dádiva ocorre segundo a necessidade
e a presença de Saturno, junto à Lua e a Júpiter, é a lembrança
dessa lei divina. Ora esta relação entre a luz, a dádiva e a
necessidade produz, se tivermos também em consideração a
posição de Úrano em Touro na VII, muitas das transformações
que temos assistido nos últimos dias ou semanas. A resposta da
Terra à agressão humana e o modo como em humanidade reage
são expressos por muitas destas posições.

Já em contraste com a ponte que separa as margens do


narcisismo e da genialidade leonina, estão Mercúrio e Marte em
Virgem, na XI, no Bom Espírito (ἀγαθόν δαίμων) e, olhando-os
de frente, está Neptuno em Peixes, na V, na Boa Fortuna (ἀγαθή
τύχη). No eixo dos lugares benéficos de Vénus (a V) e Júpiter (a
XI), a força da palavra, que poderá estender-se da opressão e da
desinformação até à transformação radical pelo espírito do serviço
colectivo ao próximo, recebe a compaixão e o amor universal
48 Rodolfo Miguel de Figueiredo

como a face da verdadeira fortuna ou colhe a ilusão e constrói, sob


uma mente tolhida pela ignorância, o negacionismo e o populismo.
De facto, estando Marte fora do seu segmento de luz, o seu brilho
espalhará uma energia maléfica que, pela proximidade, corromperá
primeiramente a palavra e o pensamento (Mercúrio) e, por estar na
XI, conduzirá, por força da necessidade, à intolerância e ao
extremismo, às propostas colectivas disruptivas.

Nesta Lua Cheia, o Sol em Leão terá de se esforçar por


fazer da criação uma dádiva e ser um arauto da luz, caso contrário,
o perigo do egocentrismo, pessoal e social, poderá tornar a luz
num incêndio. Contudo, a posição, aparentemente maligna, de
Marte conjunto a Mercúrio é equilibrada, forçada a uma harmonia,
pelo trígono destes a Úrano em Touro, na VI, e a Plutão em
Capricórnio, na III. Esta ligação coloca em destaque a Revolução
da Terra, o Poder da Morte e a Força da Palavra, unindo-se num
sentido que expressa, por exemplo, o relatório do Painel
Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas que, face às suas
conclusões, terá de ser discutido na próxima Assembleia Geral das
Nações Unidas que vai começar a 14 de Setembro.

Desta forma, este trígono dos signos de Terra é um sinal no


caminho que se funde com o sextil de Úrano e Plutão a Neptuno
em Peixes. A percepção de que o planeta Terra é um organismo
vivo - o corpo da Deusa Mãe - será no tempo em que vivemos
uma realidade indiscutível, sobretudo por força de uma causalidade
Reflexões Astrológicas 2021 49

natural que traz, como reacção, a resposta da Mãe Terra à agressão


humana. Colhemos assim o fruto das nossas acções.

Com Vénus em Balança, na XII, no Mau Espírito, o


pensamento e as ideias oprimem o feminino e criam uma discórdia
na sua dádiva de beleza e bondade. O mal cinge o feminino e a
igualdade pede a sua presença. O trígono entre a Deusa do Amor
na XII e Saturno na IV, lançando, a partir das profundezas da
terra, o jugo do tempo sobre a Vénus dignificada, que surge aqui
como uma forma de repressão. A consciência dos direitos da
mulher avança, por um lado, mas é reprimida por outro. A ameaça
dos talibãs sobre a mulher e o feminino é disso mesmo exemplo.
Ora esse sentido é reforçado pela quadratura de Vénus a Plutão em
Capricórnio, na III, no Lugar da Deusa da Lua. O poder sobre o
feminino afirma-se como domínio, submissão e abuso. A
possibilidade de destruição, enquanto expressão física da
ignorância, ganha uma força que obrigará a pensar a vida e a morte,
o valor e a tradição. Essa é a mensagem que encontramos na
posição relativa do Dragão da Lua.

Vénus em Balança, na XII, une-se em trígono à Caput


Draconis em Gémeos, na VIII, e em sextil à Cauda Draconis em
Sagitário, na II. A harmonia da dádiva do feminino (Vénus),
reprimida pelo lugar que ocupa (XII), pelo olhar opressivo da
Necessidade (Saturno) e da Morte (Plutão), mas obrigada a
expandir-se (trígono a Júpiter), une-se à sabedoria da palavra e à
50 Rodolfo Miguel de Figueiredo

palavra da sabedoria. A proposta de futuro, a mensagem de eterno


retorno, indicada até ao Natal pelo eixo nodal Sagitário-Gémeos do
Dragão da Lua, sugere uma passagem, um caminho de sentido, que
conduz a sabedoria à palavra, ao discurso e ao conhecimento.

A nossa estrutura de pensamento, centrada na razão, no


Logos, ignorou a Sabedoria. Ora a Sabedoria, a deusa Sophia, é
também o Eterno Feminino, o Espírito Santo. Porém, nesta Lua
Cheia, com a Lua sob o horizonte, no Tártaro abismal, com Vénus
sob o véu demoníaco de um Mau Espírito e o Sol reinando no alto
cume, o feminino não só é temido como pode até ser rejeitado. Se
a luz leonina aluminar o colectivo, então a Mãe Eterna deixará o
seu santuário secreto e abençoará o mundo.
5

Lua Nova

V
Lisboa, 01h52min, 07/09/2021

Sol - Lua
Decanato: Vénus

T ermos : Vénus

M onomoir ia: M er cúrio


52 Rodolfo Miguel de Figueiredo
Reflexões Astrológicas 2021 53

Lua Nova: Virgem

A Lua Nova de Setembro é a lua da deusa Deméter. A


deusa-mãe dos mistérios de Elêusis que rege o acto de semear e
colher e que governa as estações de vida e morte. O hino órfico de
Deméter designa-a de “divina mãe de todos” (παμμήτειρα θεά) e de
“divina dadora de bênçãos, de riquezas” (ὀλβιοδῶτι, πλουτοδότειρα
θεά). A sizígia do novilúnio ocorre no signo de Virgem, de noite e
abaixo do horizonte, no Lugar da Deusa (III), junto ao Ponto
Subterrâneo (IC), no decanato e termos de Vénus e monomoiria de
Mercúrio e com Caranguejo a marcar a hora. Neste evento lunar, a
luz expressa, por natureza e excelência, o feminino, a glória e a
graça do Espírito Santo, a Divina Mãe. No entanto, esta é uma luz
oculta, invisível, escondida sob a terra, no útero da Mãe Gaia e
que, devido à conjunção da sizígia a Marte, faz a terra ranger e a
lava borbulhar. Existe um grito feminino de revolta que eclode
como uma tempestade.

A dádiva dos luminares olha-nos desde o abismo da nossa


vontade e fita o cume, a culminação (MC), onde Poseídon
(Neptuno em Peixes), o senhor do mar, das águas primordiais do
feminino, no Lugar de Deus (IX), colhe a tensão da distância
(oposição de Marte a Neptuno), da separação e do desequilíbrio
54 Rodolfo Miguel de Figueiredo

entre o Divino Pai e a Divina Mãe. Essa é a mensagem que se


desenvolve na cruz das casas cadentes (mutáveis), onde os bons
declínios se firmam em tensão (quadratura) contra os declínios
fracos (φαῦλον). Ora sob o véu deste conceito de declínio
(ἀπόκλιμα) encontramos os luminares e Marte na III, Neptuno na
IX e o corpo do Dragão da Lua na VI e XII (cauda na VI, em
Sagitário, e caput na XII, em Gémeos). O sentido de passagem da
sabedoria à palavra, de um conhecimento tornado sabedoria, perde
-se, esvai-se e é traído pelas mensagens disruptivas de negação, de
deturpação e de ilusão. A ignorância - o maior dos males - vence a
sabedoria e esta oculta-se assim sob o véu de Ísis. Ao deixar o
comum, a sabedoria torna-se necessariamente eleição.

Por outro lado, os raios dos luminares unem-se, a partir da


III e em trígono, a Úrano em Touro (XI) e a Plutão em
Capricórnio (VII). O triângulo da Terra funde-se num pedido de
estrutura, numa exortação que clama pelo criar de um Novo
Mundo. No Bom Espírito (ἀγαθόν δαίμων) e em Touro, Úrano
insurge-se contra a apatia da tradição e contra a cristalização dos
valores. Já Plutão, poente e em Capricórnio, faz cair sobre a vida,
sobre a segurança da vaidade, o Poder da Morte. Estas uniões
triangulares ganham força, adquirem um aumento ou reforço da
sua própria dinâmica pelo facto de Marte também participar nesta
ligação. De forma idêntica, Neptuno, pelos sextis a Plutão e a
Úrano, contribui com os dons da compaixão, da empatia e da
imaginação.
Reflexões Astrológicas 2021 55

Mercúrio e Vénus, no seu segmento de Luz, para além dos


raios do Sol e como Estrelas da Tarde, no Lugar sob a Terra (IV),
assumem o carácter comparativo da imaginação, do acto criativo,
retraindo a razão, imposta pela natureza matutina. Enquanto canto
de vésperas, passando pela constelação de Balança, Mercúrio e
Vénus entoam a harmonia dos opostos. A mensagem deste signo
não é o equilíbrio em si mesmo, mas sim a vontade e a necessidade
de equilíbrio. Esse apelo da finalidade, mas também da
incompletude, consiste na procura de um equilíbrio primordial
entre o feminino e o masculino, entre o signo de Virgem e o signo
de Escorpião. A beleza e o sublime irrompem desde do Hades (IV)
como forma de renovar o mundo (Vénus em Balança no seu
domicílio diurno). Existe uma tendência em colocar o carácter de
transformação no bem e na justiça, mas a beleza também produz
revoluções.

O trígono de Mercúrio e Vénus (IV) a Júpiter e Saturno


(VIII) concede tanto a dádiva como a retribuição. No entanto, a
dádiva dos benéficos mostra uma qualidade diferente, pois Vénus
está no seu segmento de luz e Júpiter não. Esta qualidade da luz é
partilhada com Saturno, o que faz deste o maléfico cujos raios são
mais abrasivos. Saturno corromperá Mercúrio, já Vénus vencerá o
carácter maligno de Saturno fora do seu segmento. Essa vitória é
também ela sugerida pela facto do novilúnio se dar no decanato e
termos de Vénus. A luz do feminino brilhará desde o ventre da
Terra (IV) e estenderá o seu manto até ao Dragão da Lua (trígono
56 Rodolfo Miguel de Figueiredo

à caput e sextil à cauda) e à sua mensagem, debilitada pelos lugares


que ocupa (VI e XII). Contudo Vénus colidirá (quadratura) com
Plutão, sem que todavia se deixe afectar. O Amor vencerá a Morte,
mas não evitará a sua passagem.

Os senhores do Espaço e do Tempo, Júpiter e Saturno,


permanecem retrógrados em Aquário, agora no Lugar da Morte
(VIII). A expansão, agora retrotensa, da verdade jupiteriana
produz, no interior do sentido colectivo de humanidade, um
ensimesmamento com carácter de revelação, o que está em
harmonia com a consciência da necessidade e da retribuição. A
Némesis saturnina adquire nesta posição um valor de redenção que
só alcançará um verdadeiro sentido de perdão e purificação quando
Saturno ficar directo e a caminhar rumo ao signo de Peixes. No
Lugar da Morte, Júpiter e Saturno em Aquário trazem ao humano a
gravidade da ceifeira, as lapidares verdades do Et in Arcadio ego e do
Memento Mori.

Devido ao facto estar fora do seu segmento, Saturno


adquirirá uma expressão maléfica que suplantará a dádiva de
Júpiter, também ele com a sua luz diminuída. Como um arco em
tensão e com uma corda estendida desde o Lugar da Morte (VIII)
até a Lugar do Viver (II), Úrano será a seta cuja necessidade
malfazeja de Saturno forçará a ser lançada. Júpiter conseguirá ser
apenas a dádiva da verdade oculta. Desta quadratura, a revolução
da terra será a retribuição e actuará com a causalidade natural que é
Reflexões Astrológicas 2021 57

própria da providência. O humano agiu e terra reagiu. É


impossível, mesmo para aquele que está em negação, não sentir
algo entre o reconhecimento e o temor face a resposta da Mãe-
Terra a décadas de abuso. O mundo que o humano construiu
sobre a liquidez da vaidade e a efemeridade de vigas, metal e betão,
de alcatrão, tijolo e madeira-morta, é absurdamente frágil. E, face
ao grito de revolta de Gaia, ora negamos a sua mensagem, ora nos
iludimos com teorias rocambolescas de chips em vacinas e de
conspirações delirantes. É mais fácil atirar a sombra para longe que
olhá-la de frente em nós. No humano, repousa tanto o daímon
(δαίμων) como o demónio e nós somos o nosso próprio
demiurgo.

Neste novilúnio, onde a espiga é salvação e a videira


revelação, o Divino Feminino será a luz de eleição. Sem os
luminares sobre o horizonte, a Lua Nova traz a luz sob o véu, a
candeia escondida. A Grande Mãe, a Alma do Mundo, coloca no
céu uma mensagem que se estenderá, de forma muito expressiva e
astrologicamente evidente, da Lua Nova à Lua Cheia. No
Evangelho de Tomé, Jesus diz: “A colheita certamente é grande; mas os
trabalhadores são poucos. Rogai, pois, ao senhor que me mande
trabalhadores” (logion 73). E Deméter espera em Setembro pela sua
colheita.
(Página deixada propositadamente em branco)
6

Lua Cheia

X-V

Lisboa, 00h55min, 21/09/2021

Lua
Decanato: Marte

Termos: Saturno

Monomoiria: Júpiter

Sol
Decanato: Mercúrio

Termos: Saturno

Monomoiria: Mercúrio
60 Rodolfo Miguel de Figueiredo
Reflexões Astrológicas 2021 61

Lua Cheia: Eixo Peixes - Virgem

O eixo da Lua Cheia de Setembro coloca a Lua em Peixes


acima do horizonte, no seu Segmento de Luz, no Lugar de Deus
(IX), no decanato de Marte, termos de Saturno e monomoiria de
Júpiter. Por seu lado, o Sol em Virgem surge no Lugar da Deusa
(III), abaixo do horizonte, fora do seu Segmento de Luz, no
decanato de Mercúrio, termos de Saturno e monomoiria de
Mercúrio. Quem quer que tenha observado o tema da Lua Nova
de Setembro, concluirá que existe uma grande semelhança com o
da Lua Cheia, firmando-se assim o sentido profundo proposto no
novilúnio. À excepção da natural mudança da Lua, mudam de
signo e de lugar somente Vénus (da IV para a V, de Balança para
Escorpião) e Marte (de III para IV, de Virgem para Balança).
Propõe-se, desta forma, uma releitura da reflexão anterior, visto
que a maioria das posições e aspectos é igual.

A regência da deusa Deméter (Virgem) estende-se portanto


da Lua Nova até à Lua Cheia, porém, pela natureza axial de um
plenilúnio essa regência é partilhada. Poseídon (Peixes) assume o
seu lugar no eixo. Porém, pelo facto de tanto o Sol como a Lua se
encontrarem nos termos de Saturno e por este ser o maléfico que
se encontra fora de seu segmento, o mito que melhor descreve esta
relação é o da Deméter Negra.
62 Rodolfo Miguel de Figueiredo

Pausânias, na sua Descrição da Grécia (VIII, 42, 1-13), conta-


nos que no Monte Elaios, perto da Figália, na Arcádia, existia uma
caverna sagrada, dedicada a Deméter Melaina (μέλαινα), a Negra.
Segundo os locais, depois de Poseídon se ter unido a Deméter,
ambos sob a forma de cavalos, pois o deus dos mares perseguira a
deusa da agricultura quando esta procurava a filha, Cora ou
Perséfone, raptada por Hades, e, para se esconder, a deusa
transformara-se em égua e escondera-se no meio de uma manada,
mas o deus, sob a forma de um garanhão, encontrou-a, da união
nasceu um filha e não um cavalo. Essa é pelo menos a tradição
local, pois segundo outros nasceu uma filha e um cavalo divino,
Árion. O nome da filha está todavia reservado aos iniciados, sendo
apenas conhecida por Despoina (δέσποινα), a Senhora.

Ora Deméter, furiosa com Poseídon e pesarosa pela


violação da filha Perséfone, refugia-se na referida caverna. Sem a
sua presença, os frutos da terra pereceram e a espécie humana
morria de fome. O deus Pã, ao visitar a Arcádia, encontrou a deusa
na caverna e espiou-o, vendo-a vestida de negro, de um profundo
luto. Avisou então Zeus que enviou as Moiras. As deusas do tempo
e do destino - expressões femininas de Saturno - convenceram a
deusa a moderar o seu lamento e a acalmar a sua ira. E assim a
terra tornou-se, de novo, fértil e na caverna foi colocada uma
imagem de madeira da deusa negra com cabeça de égua.

Este mito representa na perfeição a mensagem da Lua


Reflexões Astrológicas 2021 63

Cheia de Setembro, a mesma que se estende desde a Lua Nova. A


luz oculta do Divino Feminino terá de brilhar de novo. A
fertilidade da terra, do corpo e do espírito é a bênção da sua
presença. No entanto, o mito também nos avisa dos perigos da sua
ausência. Na caverna escura, o feminino agrilhoado desequilibra o
mundo. Não existe harmonia se a Mãe Divina não ocupar o seu
lugar. Se a Sabedoria continuar a passar por entre nós e não for
reconhecida, se a insultarem e dela abusarem, as trevas cairão sobre
a terra e sobre todos nós. Essa é a mensagem de Júpiter e Saturno
retrógrados no Lugar da Morte (VIII) e de Plutão poente (VII),
bem como das relações que estes tecem (aspectos).

O eixo Peixes-Virgem neste plenilúnio entrega-nos, como


uma dádiva no caminho, o serviço como via de salvação. “A
solidariedade não é facultativa”, deixou-nos escrito o Presidente Jorge
Sampaio pouco antes da sua partida. A empatia e a compaixão são
uma visão de totalidade (Lua em Peixes conjunta a Neptuno em
Peixes no Lugar de Deus, IX) e saber colher as suas dádivas é um
esforço que transforma o mundo. O serviço alicerçado na
solidariedade (Virgem) e na compaixão (Peixes) tem um enorme
poder de mudança. Este último eixo zodiacal colhe a dádiva do fim
e da finalidade e integra a unidade do humano na totalidade da
humanidade e do divino. A necessidade coloca, para a hora de
Lisboa, os dois eventos lunares (Lua Nova e Lua Cheia) no mesmo
signo Ascendente. Caranguejo marca a hora. O signo da origem
traz consigo o cuidado maternal, a Grande Mãe. E, culminando,
64 Rodolfo Miguel de Figueiredo

com a luz da Lua e de Neptuno, Peixes colhe o olhar do cume que


fita tanto o horizonte como o abismo.

Face ao tema do novilúnio e agora ao tema do plenilúnio e à


posição dos luminares, notamos primeiramente que o grande
benéfico, que é uma vez mais Vénus, surge agora com ligações
favoráveis ao Sol (sextil) e à Lua (trígono). A luz do feminino,
embora ainda sob o véu de Ísis, torna-se mais forte. Por outro
lado, Mercúrio, que antes colhia as bênçãos de Vénus, afirma-se
agora com a força de Marte. A palavra não cria harmonia e as
ideias antagónicas tornam-se uma fonte de hostilidade. A união de
Mercúrio e Marte em Balança cria um elemento de passagem entre
a harmonia e o conflito, entre a paz e a discórdia. Esse elemento é
a força da palavra, o impulso radical do conhecimento, que pela
informação eleva e pela desinformação destrói. No entanto,
Mercúrio surge como Estrela da Tarde, para além dos raios solares,
e anunciando a sua retrogradação, ou seja, a palavra torna-se
pensamento e introspecção, sentimento e intuição.

Marte, embora esteja num signo diferente, está sob os raios


do sol. Porém, como é sabido, segundo a tradição antiga, Marte é o
único que não se deixa afectar pelos raios fulgentes, abrasivos, do
Sol. Ora, estando o Sol junto ao Ponto Subterrâneo (IC) e Marte
no Lugar sob a Terra (IV), existe um carácter visceral e abissal
nesta ligação. No útero da terra, a força da luz (Sol e Marte) surge
como passagem, como proposta de sentido, entre o serviço e a
Reflexões Astrológicas 2021 65

harmonia. Contudo, esta é um elemento contido no interior da


terra, no abismo da realidade. Esse carácter de luz oculta, de
potencialidade não efectivada, pois Marte está em Exílio, firma-se
também, por um lado, na relação benéfica com o Dragão da Lua
(trígono à Caput na XII e sextil à Cauda na VI), embora este esteja
em lugares nocivos, e, por outro lado, nos trígonos a Júpiter e
Saturno e na quadratura a Plutão.

No que concerne a Júpiter e Saturno deve seguir-se a regra


de Nechepso e Petosíris (F38 Riess) que diz nem todas as
quadraturas são más, contrariamente, nem todos os trígonos são
bons. No entanto, estes conservam o potencial do bem, dizendo-
nos aqui que a força da luz (Marte e Sol) encontra a morte no
espaço e no tempo, na justiça e na necessidade (Júpiter e Saturno
na VIII), ou seja, o humano morre perante a afirmação do limite,
do limiar e da limitação, e só na luz poderá renascer. Face à
finitude, a vaidade torna-se serviço e a harmonia surge da
integração do humano na humanidade.

Vénus, a dádiva do bem e a bênção do feminino, surge aqui


na sua queda, escalando o abismo. O amor entra assim no templo e
conhece o mistério da morte. E, vencido o medo, agora em
Escorpião e no Lugar da Boa Fortuna, (ἀγαθή τύχη), verte o
néctar da Cornucópia da Abundância, não sobre o comum, mas
sobre o eleito. Nesta posição, e apesar do ser o benéfico mais
favorecido, por estar no seu Segmento de Luz, Vénus está em
66 Rodolfo Miguel de Figueiredo

Exílio, sob o horizonte, ou seja, a partir da noite escura, da origem


da criação, o amor propõe uma via iniciática.

Esta posição de Vénus em Escorpião, embora surja no tema


plenilúnio de modo favorável, indica também o medo do feminino
e a opressão da mulher. E não são os nossos dias um tempo de
agressão para a mulher, quando já tudo deveria ser diferente? As
quadraturas de Júpiter e Saturno a Vénus revelam a dificuldade
social e colectiva, ainda dominante, de expressar os direitos da
mulher e de pensar o feminino, em especial, o Sagrado Feminino.
Já a oposição entre Úrano (XI) e Vénus (V), colocada entre Touro
e Escorpião, entre o viver e a morte, entre o valor e a finitude, é
mais um alerta sobre a vida do planeta que habitamos e de como as
agressões à Mãe Terra condicionam os tempos futuros.

Por outro lado, o trígono de Vénus em Escorpião (V) a


Neptuno em Peixes (IX), bem como o sextil de Vénus a Plutão em
Capricórnio (VII), acentua o carácter de Vénus enquanto grande
benéfico do plenilúnio. A dádiva do bem coloca o amor sobre a
morte. A união das expressões do amor (Vénus e Neptuno)
transmite sempre uma visão de totalidade e a capacidade de estar
na parte como no todo. O vencer a morte consiste nessa acção
libertadora de transformar o momento ou o instante em
eternidade. Essa é uma das lições que podemos colher, sobre o
olhar vigilante de Deméter, nesta Lua Cheia.
7

Lua Nova

L
Lisboa, 12h05min, 06/10/2021

Sol - Lua
Decanato: Satur no

T ermos : M er cúr io

M onomoir ia: Sol


68 Rodolfo Miguel de Figueiredo
Reflexões Astrológicas 2021 69

Lua Nova: Balança

Neste mês de Outubro, o encontro dos luminares ocorre


no signo de Balança, de dia e acima do horizonte, no Lugar do
Bom Espírito, ἀγαθόν δαίμων (III), no decanato do Saturno,
termos de Mercúrio e monomoiria do Sol e com Sagitário a marcar a
hora, estando o eixo do horizonte junto ao do Dragão da Lua. O
Sol está no seu próprio segmento de luz (αἵρεσις), sendo o
portador da luz neste novilúnio. Já a Lua está fora do seu
segmento de luz, num signo masculino e diurno, logo a sua luz de
prata está enfraquecida. A posição da sizígia nos doze lugares
acentua o carácter solar e masculino deste encontro.

No entanto, o Lugar do Bom Espírito confere sempre uma


elevação espiritual, uma transposição da materialidade, da fortuna
terrena e da individualidade. Neste lugar, a regência de Júpiter e a
força significativa do conceito de δαίμων permitem uma expansão
da alma até ao espírito e uma interiorização da gnose. De igual
forma, o sentido relacional do signo de Balança concede também
um crescimento desta gnose individual até ao próximo, até ao
outro. A alteridade primordial da lei da harmonia obriga mesmo a
esse processo. A evolução do humano tem de integrar a realidade
da partilha e da interacção, ou seja, a visão da totalidade tem de si
70 Rodolfo Miguel de Figueiredo

iniciar no limiar do eu.

Com os luminares estão também Mercúrio e Marte, todavia,


encontram-se ambos fora do seu Segmento de Luz. Mercúrio por
estar numa posição posterior ao Sol, estando ainda sob os seus
raios, adquire um carácter feminino, pertencendo assim ao
segmento da Lua. Ora esta natureza de Mercúrio está também de
acordo com o facto de estar retrógrado. Mercúrio, o senhor da
palavra, encontra-se muito debilitado, tornando difícil a partilha e a
harmonia através da discurso e do conhecimento. Esta posição
relativa de Mercúrio torna-o também um promotor de
desinformação e de ideias disruptivas. O acto deliberado de levar a
mentira ao outro como se fosse verdade estará particularmente
destacado neste período. A força da palavra ganha assim um
carácter regressivo e senão mesmo repressivo.

Marte, por seu lado, partilha alguns dos elementos que


definem a posição de Mercúrio, todavia, existe alguma ambiguidade
no seu sentido radical. Por um lado, sabemos, segundo as lições
dos astrólogos antigos, que Marte é o único que não se deixa
queimar pelos raios do Sol, pelo contrário, a sua força sai
reforçada. Ora Marte não está só sob os raios como está no seu
coração, ou seja, a menos de um grau do luminar. O Coração do
Sol está para astrologia antiga como o Cazimi está para a astrologia
árabe. Desta forma, a posição estaria favorecida, contudo Marte
está Exílio, estando portanto a sua acção operativa enfraquecida, e
Reflexões Astrológicas 2021 71

está ainda fora do seu Segmento de Luz, fazendo dele o maléfico


dominante e cuja acção é mais destrutiva. A posição de Marte
resume assim uma certa dualidade que tenderá a existir entre acção
e inacção, entre potência e impotência, entre a força que cria e a
força que destrói. De qualquer forma, ser-lhe-á muito difícil
contribuir para a harmonia que é pedida pela sizígia do novilúnio.
Pelo contrário, tenderá a trazer a malícia e o conflito não de forma
directa, mas habitando na sombra.

Em contrapartida, os luminares, bem como Mercúrio e


Marte, unem-se em trígono com Júpiter e Saturno que se
encontram no Lugar da Deusa (III). Por estarem no seu Segmento
de Luz, os senhores do espaço e do tempo adquirem um carácter
benigno e vantajoso que vê somente a já conhecida ameaça de
Úrano (quadratura). Ora pela posição de Úrano na VI, na Má
Fortuna, e pelo fim da retrogradação de Plutão no mesmo dia do
novilúnio, a pandemia vai mostrar que ainda não chegou o seu fim,
seja pela sua persistência em países já com boas taxas de vacinação,
seja pela sua disseminação em países que, devido à soberba de
outros, ainda receberam vacina, ou também pelo surgimento de
outras variantes. A quadratura de Plutão aos luminares - e a
Mercúrio e Marte - refere também este sentido, bem como pode
descrever o peso, em termos mundiais, dos negacionistas e dos
populistas. Com um outro sentido, a terra continuará a tremer e a
borbulhar fogo e lava. Esse é o poder da morte sobre a terra.
72 Rodolfo Miguel de Figueiredo

A ligação benéfica da sizígia, Mercúrio e Marte com Júpiter e


Saturno (trígono), bem como a união também triangular à Caput
Draconis, representa uma forte união significante no elemento ar.
As qualidades de uma mente activa e agente como forma de
expressar a humanidade e o humano tornam-se não só dominantes
como necessárias. A exigência do pensamento e do espírito crítico
tornam-se portanto fundamentais nos nossos dias. Os perigos da
superficialidade acrítica revelar-se-ão, mostrando o quão necessário
é o espírito reflexivo. No entanto, esse imperativo da razão,
seguindo a mensagem do Dragão de Lua, terá de ter a Sabedoria
como origem, fundação e base. Sem os grilhões da Razão de
outrora, a Sabedoria renascerá.

Depois do elemento dionisíaco de Nietzsche e do


inconsciente da psicanálise de Freud, a humanidade compreendeu a
parcialidade da razão e trouxe até si o potencial do irracional. Ora a
Sabedoria como origem permite que existe em si a Razão e o
Irracional, mas lembremo-nos que o irracional não é sinónimo de
ignorância, daí que o excesso de elemento ar possa fazer do
pensamento uma vaidade efémera e vazia ou um fanatismo restrito
e opressivo. Esta é, porém, uma oportunidade de trazer novas
ideias ou de recuperar, com um novo olhar, velhos conceitos.
Existe um potencial comunicativo e discurso nesta união de astros
(Sol, Lua, Mercúrio e Marte em Balança; Júpiter e Saturno em
Aquário; e Ponto Poente e Caput Draconis em Gémeos) que vem
exacerbar a importância das ideias e também das ideologias, dos
Reflexões Astrológicas 2021 73

conceitos e das correntes de pensamento. A mente vai porém


necessitar de equilíbrio e de harmonia, do propósito de Balança.

A conjunção de Neptuno em Peixes com o Ponto


Subterrâneo (IC) confere ao Amor Universal o potencial de origem
e fundação, tornando a compaixão, a empatia e a solidariedade os
alicerces do futuro, os pilares de um novo mundo e de uma nova
humanidade. No entanto, a quadratura de Neptuno ao corpo do
Dragão Lua relembra a dificuldade de a Sabedoria se tornar Palavra
e de como os vícios da imaginação, ou seja, a ilusão e o engano
poder-se-ão tornar os braços armados da ignorância, a mãe de
todos os males, aquela se opõe à Sabedoria, ao Eterno Feminino. A
partir do seu Exílio em Escorpião, conhecendo a morte e o
renascimento, Vénus, a Dádiva do Amor, une-se em quadratura a
Júpiter e Saturno e a Úrano (oposição), Neptuno (trígono) e Plutão
(sextil). Ora estes três últimos unem-se também entre no triângulo
anteriormente referido (sextis de Úrano e a Plutão e a Neptuno e
trígono de Úrano a Plutão), o mesmo que conjuga a Revolução da
Terra, a Compaixão como Unicidade e o Poder da Morte.

A posição de Vénus, que está fora do seu Segmento de Luz,


mas a ascender no horizonte, é determinada essencialmente pela
relação do seu estado de exílio com a união quadrangular a Júpiter
e Saturno. Essa união adquire uma certa especificidade, pois a
quadratura com Júpiter é favorável, embora estruturante, dado que
une os dois benéficos, um deles bonificado pelo facto de estar no
74 Rodolfo Miguel de Figueiredo

seu Segmento de Luz (Júpiter), e a quadratura com Saturno é


mitigada por este estar também no seu segmento. Assim sendo,
esta relação, que se estabelece entre o Lugar da Deusa (III) e o do
Mau Espírito, κακός δαίμων (XII), serve de véu de ocultação, de
sombra, àquela que se firma entre a sizígia, Mercúrio e Marte e
Júpiter e Saturno. Vénus está ocultada, negada, num lugar de
sombra, a XII. Na verdade, existe uma semelhança na condição de
Vénus e Marte, todavia, este último oculta-se, exilado, sob os raios
do Sol, já Vénus está fechada num lugar assombrado sob o véu do
espaço (Júpiter) e do tempo (Saturno) à espera da luz, da revelação,
ou seja, a lei da atracção (Vénus) pede um outro espaço e um outro
tempo, onde o desejo se torne concórdia.

O novilúnio de Outubro, em Balança, torna a harmonia do


pensamento a anunciação dos dois eclipses que irão marcar a parte
final do ano e as mudanças astrológicas que se vão começar a sentir
com o fim da retrogradação de Plutão, Saturno, Júpiter e Mercúrio
(ordem cronológica). A harmonia nasce do movimento. Lembremo
-nos da carta de Tarot a Temperança e de como o eterno fluir das
coisas, equilibrando os opostos, é o sentido da Sabedoria
(Sagitário). O encontro dos luminares dá-nos neste mês lunar o
potencial de criação que é a partilha da luz e a união das suas
bênçãos.
8

Lua Cheia

A-L

Lisboa, 15h57min, 20/10/2021

Lua
Decanato: Vénus

Termos: Saturno

Monomoiria: Júpiter

Sol
Decanato: Júpiter

Termos: Vénus

Monomoiria: Sol
76 Rodolfo Miguel de Figueiredo
Reflexões Astrológicas 2021 77

Lua Cheia: Eixo Carneiro - Balança

O plenilúnio de Outubro coloca a Lua em Carneiro sob o


horizonte, fora do seu Segmento de Luz, no Lugar de Deusa (III),
no decanato de Vénus, termos de Saturno e monomoiria de Júpiter.
Por seu lado, o Sol encontra-se em Balança, no Lugar de Deus
(IX), acima do horizonte, no seu Segmento de Luz, no decanato de
Júpiter, termos de Vénus e monomoiria do Sol. Aquário marca a
hora entre Júpiter e Saturno, com este último a ascender acima do
horizonte, já o Ponto de Culminação surge em Sagitário, na XI, no
Lugar do Bom Espírito (ἀγαθόν δαίμων), junto a Vénus e à
Cauda Draconis.

À semelhança do plenilúnio de Outubro, os elementos


significativos masculinos são mais fortes que os femininos. No
entanto, o facto de quer a Lua, quer o Sol se encontrarem
respectivamente no Lugar da Deusa e no Lugar de Deus estabelece
uma fixação do sentido original destas posições. Desta forma, e
como é próprio dos plenilúnios, a natureza axial firma a sua
representação da realidade.

O Eu, projectado com a luz lunar e a partir do lugar do


Divino Feminino, encontra o Outro, realizando a luz solar e
reunindo-se ao Divino Masculino, ou seja, pelo Feminino o Eu
78 Rodolfo Miguel de Figueiredo

encontra o Outro, pela Sabedoria encontra a Vontade, e, através


desse encontro, renasce a luz em si mesmo. O Eu, unido e perdido
no Outro, encontrará o Si Mesmo quando completar o ciclo e
conhecer a totalidade. E a chave dessa ligação harmónica é o termo
“encontro”, o olhar de frente, enquanto acontecimento radical e
potência de transformação. A matriz dessa união transporta em si o
sentido e o valor da origem porque reproduz o mistério da câmara
nupcial.

Um outro aspecto que valora, isto é, que atribui um valor


original a este plenilúnio é o facto de este apresentar apenas dois
planetas retrógrados (Úrano e Neptuno), bem diferente dos seis
que assim se encontravam no início do mês (Mercúrio, Júpiter,
Saturno, Úrano, Neptuno e Plutão). Devemos ter sempre em
consideração, o sentido profundo da retrogradação, contrariando a
liquidez de uma astrologia popular que esvazia, quase que
ridicularizando, este fenómeno astrológico. Ora enquanto
fenómeno, a retrogradação nasce de uma percepção, do olhar
humano que colhe sensação de que um determinado astro se move
em sentido contrário. O lugar fixa, desta forma, o olhar.

A ideia de retrogradação constrói-se pois a partir desta


percepção, provando assim a natureza antropocêntrica da
linguagem astrológica. Um planeta retrógrado indica um voltar a si,
um retorno ao sentido original, um ensimesmamento retrotenso,
daí que a acção se torne reacção, potência reafirmada ou ainda
Reflexões Astrológicas 2021 79

impotência ou não potência. É como a negação da acção de


Bartleby de Melville. Contrariamente, o movimento agora directo de
Mercúrio, Júpiter, Saturno e Plutão exterioriza e efectiva, deste
modo, a natureza destes planetas, tornando-os activos.

O Sol em Balança, nesta Lua Cheia, faz-se acompanhar por


Marte e Mercúrio, o primeiro sob os raios solares e o segundo a
afastar-se deles, já para além do limite dos quinze graus e
apresentando-se como Estrela Manhã. A posição anterior ao Sol de
Mercúrio e Marte fixa o seu carácter masculino e racional. Já a Lua
surge sozinha no Lugar da Deusa. No entanto, o eixo do novilúnio
une-se de forma vantajosa aos benéficos. O Sol, Mercúrio e Marte
formam um sextil com Vénus e com o Ponto de Culminação (MC)
e um trígono com Júpiter, Saturno e o Horóscopo (Asc.). Já a Lua,
de forma inversa, une-se em sextil a estes últimos e em trígono aos
primeiros.

De facto, existe neste tema da Lua Cheia uma intensa


harmonia axial, formada pelos eixos de ascensão, de culminação,
dos luminares e nodal e pelos planetas que confluem nestes eixos.
Por outro lado, a presença dos benéficos junto ao Horóscopo
(Júpiter) e ao Ponto de Culminação (Vénus) confirma o valor da
dádiva que surge exacerbado neste momento, revelando o
potencial de transformação que reside no acto de se saber receber
as bênçãos do céu. Se tivermos em conta os lugares onde se fixam,
tantos os benéficos, como os eixos anteriormente citados, concluir-
80 Rodolfo Miguel de Figueiredo

-se-á o potencial espiritual deste tema, não necessariamente num


sentido mais contemporâneo, embora também, mas num sentido
clássico, ou seja, o humano poderá afirmar o seu potencial de
excelência segundo os princípios do bem, da beleza e da justiça,
mas também da temperança e da fé. Existe assim uma proposta de
revolução do humano que, na verdade, serve de fundação do tema
com Úrano em Touro no Lugar sob a Terra.

Por outro lado, Plutão une-se quadrangularmente com o Sol,


com Mercúrio, com Marte e com a Lua. O Senhor da Morte e da
Transformação, avançando agora de forma directa segundo a sua
natureza, no Lugar do Mau Espírito, κακός δαίμων (XII), faz
sentir a sua presença. O Poder da Morte ou Plutão em Capricórnio
adquire o sentido do Et in Arcadia ego, ou seja, a morte caminha
entre nós, até na Arcádia, e sussurra os seus ditames. A actividade
vulcânica será, por exemplo, mais intensa, pois Plutão faz
borbulhar as profundezas da terra, revelando assim o seu poder.
Não é por acaso que, tal como a morte, a erupção não seja possível
de prever. A natureza define também o limite do humano, seja por
esta acção de Plutão, seja pela quadratura de Úrano a Júpiter e
Saturno, ou até mesmo pela conjunção destes últimos. De um
outro modo, a união benéfica de Úrano em Touro, Neptuno em
Peixes e Plutão em Capricórnio (trígono de Úrano a Plutão e sextil
destes a Neptuno) estrutura esse limite e permite a transformação
espiritual do humano.
Reflexões Astrológicas 2021 81

O exacerbamento do masculino neste tema conduz, não por


necessidade, mas como resultado da natureza humana, das suas
fraquezas, ao enfraquecimento do feminino. A oposição da Lua a
Mercúrio e Marte, estando estes no Lugar da Deus (IX), apresenta
o modo como o Feminino tem ainda uma expressão débil nas
religiões tradicionais, sendo, por exemplo, a Mãe de Deus, mas não
é Deus-Mãe. Essa é uma transformação que falta fazer. Por outro
lado, continua a existir uma resistência chauvinista à presença da
mulher na academia e no pensamento. A mulher que estuda
continua a ser perigosa. Todo isto continua a promover a violência
contra as mulheres.

A quadratura de Vénus em Sagitário (XI) a Neptuno em


Peixes (II), do Amor ao do Amor de Deus, do desejo à compaixão,
mostra a dificuldade de encontrar o valor, um modo de vida (II),
em que impere o desapego e a empatia. Esta tensão evidencia o
bloqueio que existe na passagem do limiar de nós. Não
conseguimos ver que a sabedoria é também o amor ao próximo.
Com indiferença, não existe evolução humana. É como aquele que
vai de modo espiritual, compenetrado, meditando, à Índia e que a
caminho do ashram do seu guru passa, sem ver, as crianças com
fome e que vivem para além da dignidade humana. O desejo de
espiritualidade facilmente se torna vaidade.

Vénus em Sagitário, a partir do Lugar do Bom Espírito (XI),


conjunta ao Ponto de Culminação (MC) e à Cauda Draconis, une-se
82 Rodolfo Miguel de Figueiredo

Vénus em Sagitário, a partir do Lugar do Bom Espírito (XI),


conjunta ao Ponto de Culminação (MC) e à Cauda Draconis, une-se
em sextil ao Sol, Mercúrio e Marte, na IX, e a Júpiter, ao
Horóscopo (Asc.) e a Saturno, na I, traduzindo a vontade ou o
desejo de levar a Amor à Sabedoria até ao Leme da Vida e ao
Lugar de Deus. A união dos benéficos, em especial, por Júpiter ser
o mais vantajoso, aquele que está no seu próprio Segmento de Luz,
tende a expandir esse propósito, no entanto, Júpiter está ainda sob
o horizonte. Essa ocultação faz com que o caminho da sabedoria,
anunciado nomeadamente pelo corpo do Dragão Lua, esteja ainda
sob o véu, tornando-o presente, mas não comum. A vida tem de
trazer a sabedoria até si, mas para tem de se libertar da ignorância e
da sua prole: a ilusão e o engano. Esse esforço catártico manifesta-
se, por exemplo, na união de Vénus e Saturno e pelo facto de
Saturno ser a luz que surge no horizonte, proclamando a
mensagem do Tempo e da Necessidade.

Neste plenilúnio, existe um potencial de transformação


espiritual explícito e inegável que poderá, todavia, ser negado e
repudiado, mas que necessariamente produzirá a mudança. Esta
mudança, já sentida no novilúnio, culminará nos eclipses que
marcam o final do ano.
9

Lua Nova

E
Lisboa, 21h15min, 04/11/2021

Sol - Lua
Decanato: Sol

T ermos : M er cúr io

M onomoir ia: Satur no


84 Rodolfo Miguel de Figueiredo
Reflexões Astrológicas 2021 85

Lua Nova: Escorpião

No mês de Novembro, o encontro dos luminares ocorre no


signo de Escorpião, de noite e abaixo do horizonte, no Lugar do
Boa Fortuna (V), no decanato do Sol, termos de Mercúrio e
monomoiria de Saturno, com Caranguejo a marcar a hora e com o
Ponto de Culminação (MC) no Lugar de Deus (IX), em Peixes,
junto a Neptuno. O triângulo da água estabelece assim o seu poder
e firma o sentido profundo que se estabelece entre o Horóscopo
(I), a Boa Fortuna (V) e o Lugar de Deus (IX). Por outro lado,
dado que a sizígia se encontra abaixo do horizonte, Neptuno torna
-se a luz mais alta, a que culmina, Úrano sobe no céu, ascende
como a vida, e Júpiter, Saturno e Plutão descendem para o ocaso,
para a sua morte. O novilúnio é um tempo em que a luz se torna
particularmente importante, concentrando e concedendo a sua
dádiva, o dom inaugural. O movimento da luz é sempre para
humano uma proposta de sentido e uma determinação da
Necessidade.

No Luga r da Boa Fortuna (ἀγαθή τύχη), onde a


Cornucópia da Abundância ou o Corno de Amalteia entregam as
suas bênçãos, os luminares unem a sua luz à de Marte. Esta é a
acção renascida depois de um tempo de retrogradação. Sob os
86 Rodolfo Miguel de Figueiredo

raios solares, o princípio da força intensifica o seu brilho. Marte


surge como Estrela da Manhã e, numa posição anterior ao Sol,
adquire uma qualidade masculina e activa, o que permite uma
harmonia dos opostos, visto que está num signo feminino,
Escorpião, o seu domicílio nocturno. Note-se que Marte encontra-
se nos seus próprios termos e decanato. Esta união do Sol, da Lua
e de Marte em Escorpião apresenta um enorme potencial
regenerador e um valor aumentado do dom de renascimento.

Na Boa Fortuna, esse potencial e esse valor concedem uma


força fulgente e abrasiva a tudo o que criamos. O dom do
transformar e de destruir para criar estará bem vivo nas nossas
mãos. Podemos, se a assim o quisermos, ser “aqueles que por obras
valerosas / se vão lei da morte libertando”, como diria Camões n’Os
Lusíadas. Existe portanto aqui uma potência de criação que permite
a passagem do limiar do comum, a génese da unicidade. Se a
acolhermos, a luz eclodirá da escuridão e do silêncio, tornando-se o
princípio da criação.

Esse nascer do silêncio é expresso também por Mercúrio em


Balança no Lugar sob a Terra (IV). Aqui a palavra, enquanto
princípio de harmonia, torna-se a fundação, a raiz da realidade.
Ora, como Estrela da Manhã e primeira luz do amanhecer,
Mercúrio, unido a Marte, ao Sol e à Lua, fará da palavra uma força
de vanguarda, uma claridade radical entre as trevas. Esse valor
torna-se dádiva ao unir-se salutarmente aos benéficos, ou seja,
Reflexões Astrológicas 2021 87

forma um trígono com Júpiter e um sextil com Vénus. Este último,


por a luz dominante ser a do segmento nocturno, torna-se o
grande benéfico. Vénus, sob o horizonte, em Sagitário e no Lugar
da Má Fortuna (VI), apresenta-se como a sabedoria que anda entre
nós, mas não é vista, o feminino ocultado.

Existe, deste modo, uma dádiva que une a palavra à


sabedoria sob o véu de um princípio de atracção, porém, essa é
uma luz invisível, que os humanos teimam em não ver. A união
auspiciosa de Mercúrio e Vénus, bem como de Júpiter e Saturno,
ao corpo do Dragão da Lua corrobora o sentido desta mensagem
(Mercúrio trígono à Caput Draconis, Vénus conjunta à Cauda e
Júpiter e Saturno trígono à Caput). A sabedoria é uma potência
oculta, um valor que a humanidade teima em renegar e não
transforma em palavra viva, em conhecimento. A Deusa Sophia é a
promessa do amanhã, aquela que ainda não desceu ao espaço e ao
tempo e que não vive ainda no seio da humanidade. Essa é a
quadratura de Vénus a Neptuno. Aquilo que se deseja está cingido
por uma ausência de universalidade, de visão do Todo. A
imaginação criativa eclipsa-se pela atracção da ilusão. A compaixão
não sai do Lugar de Deus (IX) e não chega nem à sabedoria, nem
ao amor. Porém, o potencial permanece, está guardado como um
tesouro.

Os luminares, enquanto luz oculta sob a terra, guardam essa


Compaixão e Amor de Deus, tornando-os um potencial de criação,
88 Rodolfo Miguel de Figueiredo

uma força imaginativa e criativa (trígono do Sol e da Lua, e de


Marte, a Neptuno), pois Neptuno representa agora aquilo que se
faz (conjunção ao Ponto de Culminação). A luz tem, porém, uma
dificuldade de efectivação, uma vez que forma, juntamente com
Marte, uma quadratura com Júpiter e Saturno e, estando estes no
Lugar da Morte (VIII) e no signo da humanidade (Aquário), a
proposta do novilúnio de transformação radical encontra um
dificuldade material e formal.

No entanto, o sextil do Sol, da Lua e Marte a Plutão


permitem, após cumprir-se a morte e o renascimento, o efectivar
desse potencial luminar. Esse esforço sofrerá todavia a adversidade
actual de se tornar palavra (quadratura de Mercúrio e Plutão). O
tempo, tecendo a sua magia e sortilégio, revela que o hoje se
esfuma e o amanhã se adensa. O trígono de Mercúrio e Saturno
mostra que essa palavra perdida, sussurrada ou calada poderá,
porém e em breve, tornar-se discurso e criar novos mundos.

Por outro lado, os aspectos de tensão que se erguem com


Úrano (oposição aos luminares e a Marte e quadratura a Júpiter e
Saturno) expressam, entre outros sentidos, a Revolução da Terra, o
grito de revolta da Mãe-Terra, as alterações climáticas e a
cristalização dos valores humanos. A pobreza torna-se cada vez
mais uma forma de opressão e, onde esta existe, a revolução
nascerá. A cimeira de Glasgow, a COP26, mostrará também a
incapacidade dos líderes mundiais criarem um verdadeiro plano
Reflexões Astrológicas 2021 89

ecológico, um conjunto de medidas que tenha um propósito


genuíno de transformar o mundo e a humanidade e de enfrentar as
alterações climáticas. A febre dos combustíveis fósseis destrói a
construção do futuro. As palavras tornam-se vazias e não existe um
compromisso que rompa com a mobilidade desenfreada e o
consumismo desmedido. O novilúnio ocorre em plena cimeira,
mas infelizmente a luz não brilhará, pois as soluções perdem-se
naquilo que corrompe o humano: dinheiro e privilégios.

Marte une os seus raios em trígono com Neptuno e em sextil


com Úrano. A força do morrer e do renascer colhem as bênçãos da
compaixão e da humanidade, do acto de imaginar e mudar. Só
existe esperança no humano, na excepção que luta contra o
mundo. Os jovens que dizem que não existe Planeta B, que saem à
rua e enfrentam o comum, o modo de vida que a maioria não quer
mudar, são a esperança e a resistência. A crise energética, de
combustíveis, electricidade e gás natural, resulta dessa dicotomia,
dessa luta entre aqueles que querem manter uma sociedade
centrada num determinado modelo de mobilidade e aqueles que
querem um modo diferente de vida. Esse elemento de passagem
resulta igualmente da estruturação que tem vindo a ser pedida
pelos sextis de Úrano a Plutão e a Neptuno e pelo trígono de
Úrano a Plutão, onde se conjuga a Revolução da Terra, a
Compaixão como Unicidade e o Poder da Morte.

Regressemos, porém, ao grande benéfico deste novilúnio,


90 Rodolfo Miguel de Figueiredo

Vénus, aquela que une a sua mensagem à de Marte e dos luminares,


mostrando o sentido da luz, do Segmento de Luz (αἵρεσις). Deve-
se acolher a dádiva da união dos benéficos (sextil de Vénus a
Júpiter) que, pela sua localização, une a sabedoria e a humanidade
(Sagitário e Aquário), mas nos lugares da Má Fortuna e da Morte,
ou seja, essa união terá de nascer da destruição e da ocultação. O
peso da gravidade temporal face ao desejo de viagem, de travessia
do eu para o si, é revelado pelo potencial de acção que une, em
sextil, Vénus e Saturno. O Amor e o Tempo são sempre os limites
radicais de compreensão da realidade, aqueles que forçam o
humano a integrar a humanidade.

Nesta Lua Nova, sob véu vulcânico de Escorpião, os dons


de destruir e criar, de mudar e transformar, bem como aqueles que
fixam a capacidade resistir e actuar, serão particularmente visíveis e,
sob o véu de Ísis, anunciarão os dois eclipses que marcam o termo
do ano.
10

Eclipse Lunar Parcial

T-E

Lisboa, 08h57min, 19/11/2021

Lua
Decanato: Saturno

Termos: Marte

Monomoiria: Júpiter

Sol
Decanato: Vénus

Termos: Saturno

Monomoiria: Sol
92 Rodolfo Miguel de Figueiredo
Reflexões Astrológicas 2021 93

Eclipse Lunar Parcial (Lua Cheia: Eixo Touro-Escorpião)

O eclipse lunar parcial de 4 de Novembro é o último eclipse


lunar de 2021, o último eclipse lunar parcial de eixo nodal Gémeos
-Sagitário, tendo o eclipse de 25 de Maio sido o último eclipse
lunar total. Por outro lado, o eclipse de dia 4 de Novembro é o
primeiro de um conjunto de eclipses no eixo Touro-Escorpião.
Este eclipse pertence à série Saros 126 e nesta é o primeiro eclipse
parcial da segunda fase, ou seja, daquela que se segue aos eclipses
totais. Na série Saros 126, os eclipses principais, aqueles que
marcam o início ou o fim de uma fase, indicam uma posição lunar
que ocorre essencialmente em signos de Ar, Terra e Fogo. Existe
uma ausência significativa da Água nas posições lunares dos
principais eclipses desta série, revelando como o potencial criativo,
imaginativo e artístico é menor. O princípio de vida encontra-se
comprometido, porque a Água é condição de vida, daí que a fome
e a guerra marquem esta série Saros.

O primeiro eclipse da série ocorreu a 18 de Julho de 1228


(CJ), com a Lua em Aquário. Ora o último eclipse da série dá-se a
19 de Agosto de 2472, novamente com a Lua em Aquário. O signo
do humano e da humanidade surge com uma luz eclipsada, ou seja,
não colhe a luz solar, o espírito do intelecto agente. E, com a Lua
94 Rodolfo Miguel de Figueiredo

em Aquário, não consegue colher a excelência (ἀρετή) da


individualidade leonina. Se considerarmos o exemplo do primeiro
eclipse da série Saros 126, compreendemos que, nesse momento, o
mundo e, em especial, a Ásia passava por grandes transformações.
Genghis Khan morrera no ano anterior (18/08/1227) e, no
período que se segue, o império mongol será dividido em quatro
canatos.

Por outro lado, dois dias antes do eclipse de 1228, São


Francisco de Assis é canonizado pelo Papa Gregório IX. Ora no
tema deste eclipse, Neptuno em Touro está em trígono a Vénus e
Plutão em Virgem. O voto de pobreza e a ligação à natureza e aos
animais marcam a vida de São Francisco, bem como este aspecto.
Convém também salientar-se, a respeito deste eclipse, que, em
1228, Saturno encontrava-se em Aquário tal como hoje se
encontra, o que, juntamente com a posição lunar que fixa o início e
o fim da série Saros, concede um sentido profundo ao potencial
humano do aguadeiro.

O fim da primeira fase penumbral da série Saros 126 ocorre


com o eclipse de 13 de Março de 1607. Este eclipse, tal como o
primeiro da primeira fase parcial, a 24 de Março de 1625, serve
para mostrar como existe um denominador geográfico, que se
estende até hoje, na extensão da sombra, ou seja, na visibilidade do
eclipse. Em 1607, é criada, na Virgínia, a colónia britânica de
Jamestown e, em 1625, é fundada a Nova Amesterdão, também na
Reflexões Astrológicas 2021 95

América do Norte, pela Companhia Holandesa das Índias


Ocidentais. De um outro modo, na península malaia, em 1607,
Iskandar Muda torna-se sultão de Achém e lança uma ofensiva
naval pelo território indonésio, hostilizando, por exemplo, Malaca,
controlada pelos portugueses. Já em 1625, o sultão
Anyakrakusuma, conhecido por Agung, conquista Surabaya, a sua
maior rival na Java Oriental. Existe portanto nestes eclipses um
espírito invasor e de domínio da terra.

A significação histórico-geográfica destes eclipses estende-se


até ao primeiro eclipse total da série Saros, a 19 de Junho de 1769.
Neste ano, os missionários espanhóis estabelecem vinte e uma
missões na Califórnia e, em Bengala, inicia-se um período de fome
que se estenderá até 1773 e matará um terço da população. Já os
eclipses que na fase total merecem maior atenção, tanto em
magnitude como extensão espacial, são os 1805, 1823, 1841 e 1859.
Nestes devem ser assinalados os eventos ligados às guerras
napoleónicas (a criação da Terceira Coligação e a Batalha de
Austerlitz), às lutas liberais (rebelião do Conde de Amarante e a
Vilafrancada), à independência do Brasil (tensão entre D. Pedro I
do Brasil e a Assembleia Constituinte e a coroação de D. Pedro II
como imperador do Brasil). Só o eclipse de 1859 é que revela uma
tendência que não é tão político-militar, pois na véspera do eclipse
é criada a Igreja Presbiteriana do Brasil e, nesse ano, é publicada a
Origem das Espécies de Darwin e iniciada a construção do Canal do
Suez. No entanto, a componente de tensão política e bélica é
96 Rodolfo Miguel de Figueiredo

reforçada no último eclipse total da série, a 9 de Novembro de


2003. Nesse ano, o facto de maior relevo é a invasão do Iraque (19
de Março), iniciada na Cimeira das Lajes (16 de Março), e que
culminará com a captura de Saddam Hussein a 13 de Dezembro.

A Lua em Touro, segundo as lições de Vétio Valente (Antologia


I, 2), vai reger as regiões da Média (o actual noroeste do Irão, o
Azerbaijão, o Curdistão Iraniano e o Tabaristão ou Mazandarão),
da Cítia (Irão, mas também uma área que se estendeu da Bulgária
às fronteiras da Rússia, Mongólia e China), do Chipre, da Arábia,
da Pérsia e das montanhas do Cáucaso, da Samártia (junto à
Média), de África, de Elymais ou Elamais (Cuzistão, província do
Irão), de Cartago, da Arménia, da Índia e da Germânia. Já no que
concerne ao Sol em Escorpião, Valente diz-nos que este rege
Metagonitis ou Numídia (Norte de África, Argélia e Tunísia), a
Mauritânia, a Getúlia (Norte de África, Argélia e Tunísia), a Síria,
Comagena (Ásia Menor), a Capadócia, Itália, Cartago, Líbia,
Amom (Jordânia), Sicília, Espanha e Roma.

Finalmente, com um olhar a partir de Lisboa - elegido aqui


como ὁμφαλός, umbigo do mundo -, Sagitário marca a hora e rege
a Etrúria (Itália), Gália (França), Espanha, Arabia Felix (Iémen e
Omã), Cilícia, Creta, Sicília, Itália, Chipre, o Mar Vermelho,
Casperia, as nações junto ao Eufrates, Mesopotâmia, Cartago, Mar
da Líbia, o Adriático, o Atlântico, os Tribálios (povo ilírio ou
trácio), a Báctria (Afeganistão, Tajiquistão, Uzbequistão, Paquistão
Reflexões Astrológicas 2021 97

e China), o Egipto e as regiões circundantes. Estas áreas,


juntamente com o mapa da visibilidade do eclipse, mostram-nos as
regiões onde o eclipse exercerá uma maior influência.

O eixo do eclipse lunar coloca a Lua sob o horizonte, fora


do Segmento de Luz (αἵρεσις) dominante, no Lugar da Má
Fortuna (κάκη τύχη), a VI, no decanato de Saturno, termos de
Marte e monomoiria de Júpiter. Já o Sol, renascido após a hora de
alba, surge no seu próprio Segmento de Luz, no Lugar do Mau
Espírito (κακός δαίμων), a XII, no decanato de Vénus, termos de
Saturno e monomoiria do Sol. Convém ainda, a respeito dos
luminares, destacar o facto de a Lua estar em conjunção com a
estrela Algol. Ora esta é a estrela que os antigos consideravam a
mais maléfica. Ptolomeu, na Syntaxis ou Almagesto (VII, 5), diz-nos
que, na constelação de Perseu, esta é a estrela mais brilhante da
cabeça da Górgona. Curiosamente, a estrela Algol que passou a
representar o lado demoníaco do feminino – infelizmente não com
raiz original do termo δαίμων – surge aqui, não no grau, mas no
signo de exaltação da Lua (Touro).

A Medusa, bem como Lilith, é a persona mitológica que rege


esta estrela, trazendo necessariamente consigo – e sem ser ainda
um fenómeno psíquico, embora acabe por o ser – o medo do
feminino. Aqui não estamos diante da Grande-Mãe, encontramos
sim o feminino selvagem, guerreiro, independente, sexual. Note-se
que a Medusa, a única das três Górgonas que era mortal,
98 Rodolfo Miguel de Figueiredo

reconhecida pela sua beleza e o seu cabelo, é castigada por Atena,


por ter copulado com Poseídon no templo da deusa. Contudo, o
que nem sempre se diz é que a união sexual não foi consensual.
Medusa foi violada pelo deus. E insultada pela cópula, Atena, a
deusa sem mãe, torna Medusa num ser horrifico, com um cabelo
serpentino e um olhar petrificante.

Desta forma, quando Perseu vence o monstro feminino,


decapitando-o, saem dele o cavalo alado Pégaso e Crisaor, o
gigante de espada de ouro, ambos filhos de Posídon e Medusa.
Este mito, aliás como aquele que descreve a primeira mulher de
Adão, aquela que rejeita a submissão sexual, impõe, por força do
paradigma dominante, uma certa hostilidade para com o feminino.
A astrologia não se pode pois fixar no arquétipo dominante,
negando ou ignorando a realidade que se oculta. As significações
têm de evoluir e aceitar que muitos dos conceitos estão
excessivamente masculinizados.

O medo do feminino, resultante aqui da conjunção da Lua


em Touro eclipsada com a estrela Algol, mas também pela
oposição de Mercúrio, Marte e naturalmente do Sol, todos no
signo de Escorpião, firma um fenómeno que se expressa tanto no
inconsciente pessoal como colectivo, e ainda nas relações pessoais,
sociais, políticas e empresariais. A mulher e a Terra-Mãe
continuarão a ser assim um alvo da brutalidade humana. A morte
fixa assim o seu olhar sobre a vida.
Reflexões Astrológicas 2021 99

Num eclipse lunar, com Marte em Escorpião e a Lua em


Touro, conjunta a Algol, o feminino selvagem, a feiticeira e a
sedutora, bem como o lado mais violento da natureza, estarão
potenciados e vão marcar um período de influência que vai
dominar os próximos meses. Acerca do período da influência de
um eclipse devemos relembrar a lição de Ptolomeu na sua
Apotelesmática ou Tetrabiblos (II, 6), ou seja, até ao limite Abril ou
Maio de próximo ano, variante consoante o lugar, este eclipse
tornar-se-á presente e afectará assim lugares e gentes.

Um outro aspecto que sobressai na análise do tema é o facto


de não existir uma luz a culminar. Com a excepção do Sol, de
Mercúrio e de Marte em Escorpião, na XII, todos os astros estão
abaixo do horizonte, submersos na luz oculta. Ora esta situação faz
de Marte a primeira luz a ascender. No entanto, pelo Segmento de
Luz dominante ser o do Sol, Marte torna-se o maléfico fora de
segmento, aquele cujo potencial maligno se encontra potenciado.
Este, juntamente com o Sol e Mercúrio, une-se em quadratura a
Júpiter e Saturno em Aquário, na III, no Lugar da Deusa.

A discórdia ou tensão deste encontro leva a morte ao


humano, corrompe a palavra e a comunicação. Mercúrio e Marte
que são Estrelas da Manhã, tocados pelos raios do Sol, não
conseguem colher o espírito ascendente do seu raiar na aurora,
porque Júpiter e Saturno não lhes dão matéria e forma, espaço e
tempo. O velho e o novo senhor do Olimpo criam uma tensão
100 Rodolfo Miguel de Figueiredo

com o eixo do plenilúnio, com o eclipse lunar. No signo da


humanidade, o humano não vê, nem com os olhos, nem com o
espírito, a luz do Sol e da Lua.

É quando tudo parece escuro, indeterminando e incerto que


temos de encontrar a dádiva, a bênção do céu e da terra. Júpiter, o
benéfico potenciado pelo Segmento de Luz, embora esteja sobre
tensão luminar, colhe a bênção de estar em conjunção com
Sadalsuud, uma estrela fixa que, para a astrologia árabe, é um sinal
de ventura e fortuna. Quando uma sombra se alonga, existe sempre
no humano uma candeia que se ergue. O trígono de Júpiter à Caput
Draconis e o sextil à Cauda une esse potencial de luz ao sentido
profundo do Dragão da Lua, aquele que no eixo Gémeos-Sagitário
leva, como se fosse uma mensagem, a Sabedoria à Palavra.

Por outro lado, Vénus, fora do seu Segmento de Luz,


constrói o seu poder no signo que lhe dá forma. A deusa do amor
fixa-se em Capricórnio durante um longo período, até 6 de Março,
passando por uma retrogradação de 19 de Dezembro até 29 de
Janeiro de 2021. Vénus pedirá uma estruturação do desejo e um
amor pela finalidade, algo que neste eclipse se une, primeiramente,
à morte e à transformação, pela conjunção a Plutão, mas também à
força do renascer (sextil a Marte em Escorpião) e à Revolução da
Terra (trígono a Úrano em Touro). A dádiva de ver o outro leva-
nos, por exemplo, para a fronteira da Bielorrússia com a Polónia e
para uma percepção de mudança na consciência do que é a
Reflexões Astrológicas 2021 101

humanidade.

A posição de Vénus em Capricórnio, no Lugar do Viver,


onde se encontra o valor e o seu sentido, permite que se una em
sextil ao Sol, a Mercúrio e Marte e em trígono à Lua, concedendo-
lhe uma bênção, uma dádiva, que pede paciência na construção de
um novo modo de vida que terá, por força da Necessidade, de
destruir a matriz anterior. Ora, a partir do Lugar do Sob a Terra,
onde se criam as fundações da realidade, Neptuno em Peixes faz
brotar o Amor Universal como uma visão da totalidade, lançando
os seus raios de empatia e compaixão sobre o Sol, Mercúrio e
Marte (trígono) e a Lua (sextil) e levando à luz eclipsada e à luz
ascendente o dom de ver o próximo, de levar a compaixão a quem
sofre. A crise dos migrantes e dos refugiados desafia o valor da
vida e do humano, daí que Vénus e Neptuno se unam em sextil,
oferecendo o amor como finalidade. Esse terá, porém, de acolher o
Poder da Morte e seu potencial de transformação (sextil de Plutão
ao Sol, a Mercúrio e a Marte e trígono à Lua).

Por fim, e depois do fracasso COP26 em Glasgow, é preciso


destacar a posição de Úrano em Touro, que pede uma Revolução
da Terra e uma desestruturação dos valores e dos modos de vida.
Ora Úrano está em conjunção com a Lua eclipsada, em oposição
ao Sol, a Mercúrio e Marte e em quadratura a Júpiter e Saturno. É
portanto impossível não concluir aqui uma tensão profunda, uma
raiz disruptiva. Úrano vai romper com tudo aquilo que se encontra
102 Rodolfo Miguel de Figueiredo

cristalizado, mas pode também trazer consigo, devida à sua


posição, uma resistência à mudança e uma persistência nos
preconceitos e nos falsos valores.

Sob o véu do patriotismo e do nacionalismo exercer-se-á


violência. Sob a égide do conforto capitalista e consumista negar-se
-á a mudança que o planeta precisa. E sob o falso poder dos medos
e da vaidade, sob o medo do feminino, continuar-se-á a agredir,
abusar e menosprezar a mulher. Se pensarmos no sentido imediato
do eclipse lunar, na lua obscurecida, vemos o feminino oculto, a
Sabedoria que anda entre nós, mas não é vista, que é denegrida e
insultada. A ignorância, como expressão radical do mal, estende-se
nesse manto escuro, na sombra que ameaça o humano e
humanidade.
11

Eclipse Solar Total

S
Lisboa, 07h43min, 04/12/2021

Sol - Lua
Decanato: L ua

T ermos : Vénus

M onomoir ia: L ua
104 Rodolfo Miguel de Figueiredo
Reflexões Astrológicas 2021 105

Eclipse Solar Total (Lua Nova: Sagitário)

O eclipse solar total de 4 de Dezembro marca o fim


anunciado da presença do Dragão da Lua, do eixo nodal, sobre o
eixo Sagitário-Gémeos. Os nodos só chegarão ao eixo Escorpião-
Touro no dia 18 de Janeiro de 2022, mas este eclipse marca o
termo da mensagem, da sua proposta de sentido. O caminho da
Sabedoria à Palavra será substituído por aquele que leva a Morte à
Vida, que define o valor que vai da qualidade da morte até ao
modo de viver. Essa via eleita de criação e mistério foi proclamada
como um prenúncio ou sinal no eclipse lunar do passado dia 19 de
Novembro, todavia, a mensagem do Dragão da Lua sobre os
signos de Sagitário e Gémeos ainda se faz notar e marcará de uma
forma mais intensa o período até ao dia 18 de Janeiro.

Este eclipse pertence à série Saros 152, uma série recente,


iniciada no século XIX. O facto de esta série estender-se de 1805
até 3049 mostra e revela uma proposta de futuro e a criação de
uma nova individualidade e de nova autoridade, visto que se inicia
e se finda em eclipses no signo de Leão. A série Saros 152 é
marcada pelo sentido do poder seja ele sobre si próprio, sobre os
outros ou sobre a terra. O primeiro eclipse, a 26 de Julho de 1805,
é definido necessariamente pelas guerras napoleónicas. Nesse ano,
Reflexões Astrológicas 2021 106

Lord Nelson derrota Napoleão em Trafalgar, mas, por sua vez,


Napoleão vence, em Austerlitz, de forma marcante, a Terceira
Coligação. Este foi um ano de luz e sombra para a Europa e para o
leonino Napoleão.

A primeira fase da série terminará com o eclipse de 21 de


Outubro de 1949. Nesse ano, uns dias antes e sob o patrocínio de
Balança, é criada a República Popular da China sob a liderança de
Mao e a República da China é recolocada em Taiwan, mas também,
na Europa, nasce a República Democrática Alemã (RDA). Uns
meses antes, é criada a NATO e termina a Primeira Guerra Indo-
Paquistanesa, bem como a guerra Árabe-Israelita, a Guerra de
Independência para os israelitas e “A Catástrofe” para os
palestinianos.

Por outro lado, a fase central da série Saros, ou seja, a fase


dos eclipses totais, apresenta três eclipses até ao actual: o de 2 de
Novembro de 1967, o de 12 de Novembro de 1985 e o de 23 de
Novembro de 2003. Nos dois primeiros, sob a égide de Escorpião,
encontramos, em 1967, a Guerra dos 6 Dias e a consequente
ocupação israelita da Faixa de Gaza, da Península do Sinai, da
Cisjordânia e dos Montes Golã, já em 1985, encontramos na URSS
a ascensão de Gorbatchov ao poder, o fim da Ditadura Militar no
Brasil e da Guerra do Líbano, bem como o escândalo, no segundo
mandato de Reagan, da venda de armas americanas ao governo
iraniano de Khomeini.
107 Rodolfo Miguel de Figueiredo

De um outro modo, temos nesse mesmo ano o grande


terramoto na Cidade do México com milhares de mortos (19 de
Setembro) e algumas horas após o eclipse, já no dia 13 de
Novembro, a tragédia de Armero com a erupção estratovulcão
Nerado del Ruiz em Tolima, Colômbia, com cerca de vinte mil
mortos. A influência nefasta de Escorpião é notória. Por fim, o
eclipse de 2003 une-se ao um eclipse lunar, do qual já falámos
aquando do eclipse lunar parcial de 19 de Novembro de 2021, e
que determina os acontecimentos em torno da Guerra do Iraque e
do fim do regime de Saddam Hussein.

Se, por um lado, a série Saros 152 confirma uma forte


influência político-militar, por outro lado, com Sagitário a marcar a
hora e a acolher o encontro eclipsado dos luminares e com o mapa
da visibilidade do eclipse de 4 de Dezembro definimos a sua
influência geográfica. Sagitário rege, segundo Ptolomeu
(Apotelesmática, II, 3), Tirrénia ou Etrúria (Toscana, Lácio e Úmbria), a
Celtica, a Espanha e a Arabia Felix (Iémen e Omã), já segundo
Hiparco, Creta, Sicília, Itália, Ibéria (Heféstion de Tebas,
Apotelesmática, I, 1). Segundo Valente (Antologia, I, 2), governa a Etrúria
(Itália), Gália (França), Espanha, Arabia Felix (Iémen e Omã),
Cilícia, Creta, Sicília, Itália, Chipre, o Mar Vermelho, Casperia, as
nações junto ao Eufrates, Mesopotâmia, Cartago, Mar da Líbia, o
Adriático, o Atlântico, os Tribálios (povo ilírio ou trácio), a Báctria
(Afeganistão, Tajiquistão, Uzbequistão, Paquistão e China), o
Egipto e as regiões circundantes.
108 Rodolfo Miguel de Figueiredo

Já o mapa da visibilidade do eclipse coloca-o na Antárctida,


Sul de África e no Atlântico Sul. Não nos coloca este numa área de
particular relevância nas alterações climáticas e na nova variante
ómicron do vírus SARS-CoV 2? E não será a Antárctida o
continente determinante para o futuro do planeta Terra?

O eclipse solar coloca o respectivo encontro dos luminares


no mesmo lugar onde Sagitário marca a hora, no Leme da Vida,
com o Sol e a Lua ainda abaixo do horizonte, no Segmento de Luz
(αἵρεσις) nocturno, aguardando a iminente hora de alba, na
decanato da Lua, termos de Vénus e monomoiria da Lua. Esta é uma
posição que, tendo em conta o Eclipse Solar Total, confere uma
qualidade radical de ocultação da luz, de um manto negro caído
sobre o mundo e a humanidade, mas também de espera e
esperança, de seguir a Sabedoria que revela a luz oculta e que nos
confirma que essa mesma luz chegará.

Nesta hora escura, a única luz acima do horizonte é Marte


em Escorpião, no lugar do Mau Espírito (κακός δαίμων). É,
porém, impossível não reconhecer aqui as semelhanças com o
tema do Eclipse Lunar Parcial de 19 de Novembro, onde Sagitário
também marcava a hora e onde Marte era igualmente a luz mais
alta. No entanto, neste evento astrológico, Marte ascende sozinho.

O mais positivo dos astrólogos contemporâneos, renegando


o olhar nefasto dos astrólogos antigos sobre a sombra dos eclipses,
terá com certeza dificuldade em não sentir aqui o peso, a gravidade,
Reflexões Astrológicas 2021 109

da destruição e da morte, da opressão e do sofrimento.


Naturalmente, onde existem trevas, existe luz, pois mesmo
ocultada brilhará na noite escura, sob o manto do sábio, na chama
da fé e da sabedoria, da Deusa Pistis-Sophia. A via eleita traz-nos
sempre rosas rubras de espinhos aguçados. Ilude-se quem pensar
que dar as mãos em grupinho e pensar positivo evita o horror da
realidade. E Marte em Escorpião sobre a sombra que recai nos
luminares obriga a esse choque com o real. Não existe uma
verdadeira transformação pela luz se vivermos dissociados da
realidade numa qualquer bolha de ilusão espiritual.

A chegada próxima de Júpiter a Peixes, onde se encontra


Neptuno, força a visão de totalidade e a expansão inevitável do
horizonte que é a empatia e a compaixão. A quadratura de
Neptuno em Peixes, agora Directo, ao Sol, à Lua e a Mercúrio em
Sagitário surge hoje como súplica, como um pedido urgente de se
unir a Sabedoria ao Amor Universal. Se virarmos as costas ao
outro, ignorando quem sofre, porque embarcámos numa viagem
até ao templo de todas ilusões, de todas as vaidades, não existe
salvação para a humanidade e a sombra triunfará.

Na sombra, a luz dos luminares une-se em sextil a Júpiter e


Saturno. A luz constrói sob o seu próprio véu uma resistência que
perdura no espaço e no tempo. Se a humanidade se unir à
sabedoria, a luz triunfará. Essa é a proposta de acção deste sextil e,
considerando-se que um sextil traz consigo maior liberdade que um
110 Rodolfo Miguel de Figueiredo

trígono, ou seja, força a acção sobre o possível e não sobre o


destino, a estruturação que, no signo da humanidade (Aquário),
Júpiter e Saturno concedem permite um acto transformador da
vontade, aquele que no signo da sabedoria (Sagitário) leva a sua
dádiva à palavra, à construção da realidade (eixo nodal Sagitário-
Gémeos).

A posição posterior de Mercúrio face ao Sol apela a esse lado


criador da palavra. Mercúrio, enquanto Estrela da Tarde, gera a
poesia da realidade, a representação do sentido profundo dos
mistérios. Em Sagitário, a palavra de Mercúrio torna-se assim
viagem, elemento radical de passagem. Porém, também ela se
ressente da luz eclipsada com quem partilha a presença, adquirindo,
desse modo, uma qualidade de potência não efectivada, mas
consciente do espaço e do tempo.

No Lugar do Viver (II), onde se cria o modo de vida,


atribuindo-lhe um valor, o amor beija a morte no signo do poder
(Vénus e Plutão em Capricórnio). A longa estadia de Vénus em
Capricórnio (de 5 de Novembro a 6 de Março), incluindo o
período retrogradação (de 19 de Dezembro a 29 de Janeiro)
concede uma união do amor ao poder ordenado do tempo. Esta
posição conjuga, por força da necessidade, aquilo se deseja e se
atrai com aquilo que se faz e se almeja. Ora, neste lugar, existe uma
ligação tripla entre o amor, o poder e o viver e o valor da vida é
encontrado nessa ligação.
Reflexões Astrológicas 2021 111

A expressão de Vénus funde-se com a Plutão, trazendo a


morte, o renascimento e a transformação para essa valor da vida.
Face ao facto do Segmento de Luz dominante ser o nocturno,
Vénus torna-se o grande benéfico espalhando as suas bênçãos até
Marte (sextil), Úrano (trígono) e Neptuno (sextil). Com este último,
o Amor Universal surge como valor e fundação, mas é com Marte
e Úrano que a sua acção é determinante, pois, pela intensidade da
dádiva, atenua a sua acção nociva.

Para se avaliar o peso que o eixo Marte-Úrano coloca, de


uma forma, sobre os luminares e Mercúrio e sobre o corpo do
Dragão da Lua, visto que envolve o eixo do horizonte, mas
também sobre o Júpiter e Saturno e, de outra forma, sobre
Neptuno (trígono), sobre Vénus e Plutão (sextil) e sobre o Ponto
de Culminação (sextil), temos que considerar o sentido do termo
δαίμων. Este nasce com o sentido de deus ou deusa, de divindade
ou poder divino, mas também de alma, em especial, das almas da
Era de Ouro, e dessa forma tem também sentido de destino, do
lote ou quinhão que coube ou foi distribuído a cada um. Ora é a
partir daí que nasce o significado de génio, de demiurgo, de ser de
passagem, desenvolvendo-se, com uma acepção muito negativa e
deturpada, enquanto demónio. Na astrologia, o termo surge
essencialmente associado a dois lugares ou casas (XI e XII) e a um
lote ou parte (Lote ou Parte do Espírito), mas também em íntima
relação com o termo τύχη, Fortuna.
112 Rodolfo Miguel de Figueiredo

Úrano em Touro no Lugar da Má Fortuna (κάκη τύχη) e


Marte em Escorpião em Lugar do Mau Espírito (κακός δαίμων)
trazem consigo e levam aos outros o sentido maligno de uma má
mediação seja ela pelo Espírito ou pela Fortuna. A Revolução da
Terra (Úrano em Touro) e a Força do Renascimento (Marte em
Escorpião), em conjugação com a propínqua mudança do eixo
nodal, conduzem a um leque de transformações intensas que, na
maioria dos casos, não surgirão de forma pacífica ou benigna. A
pandemia está longe de estar controlada ou ultrapassada. As
alterações climáticas vão ser cada vez mais evidentes e os seus
efeitos mais destrutivos.

As crises financeiras, em especial, aquelas relacionadas com


cripto-moedas e com novas formas de especulação, nomeadamente
imobiliárias, estão à espreita. As desigualdades sociais e as
migrações, com a crise dos refugiados, forçam o sentido
fundamental da solidariedade. Os movimentos de extrema-direita
ameaçam as democracias. Os conflitos geopolíticos e militares
podem surgir ou agravar-se.

As quadraturas de Marte a Júpiter e Saturno e destes a Úrano


potenciam estas situações. Estes não são tempos de paz, mas
também não deixar de ser tempos de fé e esperança. Neptuno
junto ao Ponto Subterrâneo faz do Amor Universal e da fé uma
fundação da realidade. Por outro lado, o Ponto de Culminação em
Virgem recentra o serviço ao próximo e ao planeta como cume e
Reflexões Astrológicas 2021 113

salvação.

Júpiter e Saturno, lado a lado, no Lugar da Deusa (III),


continuam a estabelecer os pilares da realidade. No entanto, pelo
facto do Eclipse se fixar no segmento de luz nocturno, Saturno
torna-se o grande maléfico. O senhor do tempo impede a expansão
de Júpiter, restringe e constringe as suas dádivas, ou seja, Saturno
coloca a Roda da Necessidade sobre o Bem, a Beleza e a Justiça.
Némesis determina assim a acção. No Lugar da Deusa, Júpiter e
Saturno reafirmam o imperativo de se criar novas formas de
comunicação e conhecimento, pedem portanto uma mediação
assente na Sabedoria.

Vivemos num tempo que ameaça o valor da verdade e onde


o imediatismo desfaz a exigência do rigor. Ora a ligação de Júpiter
e Saturno ao Dragão da Lua (trígono à Caput Draconis e sextil à
Cauda) confere um poder de disposição e ordem à sua proposta de
sentido e, por estarem no Lugar da Deusa, traçam um caminho de
salvação, de catarse, que é o Eterno Feminino, o regresso da Deusa
Sophia. A Palavra, o verbo que cria, nasce da Sabedoria e a via do
futuro é esse caminho de origem.

O encontro eclipsado dos luminares no decanato e


monomoiria da Lua e termos de Vénus, num signo masculino, mas
intimamente relacionado com a Sabedoria e com a Deusa Pistis-
Sophia, traz a este eclipse um simbolismo profundo que faz da
Grande-Mãe, da Sabedoria, esse elemento de passagem que traz a
114 Rodolfo Miguel de Figueiredo

luz das trevas, tornando-a a Iluminada e Iluminadora. Nesse


sentido, é a Virgem Negra que carrega em si, qual gestante, a Luz
da Sabedoria. Os eclipses, sob a égide do eixo nodal Sagitário-
Gémeos, concedem o dom da viagem e da passagem, do caminho
entre dois elementos.

Da Sabedoria à Palavra, o Novo Humano nascerá, formando


-se na nova senda, aquela vai da Morte ao Viver. Esta proposta de
sentido e, sobretudo a transformação exigida pela mudança axial,
vai vigorar, intensificando-se, desde este eclipse até ao eclipse solar
parcial do dia 30 de Abril de 2022. A Luz, de uma forma de outra,
fará o seu caminho, mas somos que escolhemos onde ela brilhará.
12

Lua Cheia

G-S

Lisboa, 04h35min, 19/12/2021

Lua
Decanato: Sol

Termos: Saturno

Monomoiria: Vénus

Sol
Decanato: Saturno

Termos: Marte

Monomoiria: Saturno
116 Rodolfo Miguel de Figueiredo
Reflexões Astrológicas 2021 117

Lua Cheia: Eixo Gémeos - Sagitário

A última Lua do Cheia de 2021 coloca a Lua no seu próprio


Segmento de Luz (αἵρεσις), acima do horizonte, sendo ela a luz
mais alta, embora fixada no Lugar da Morte (VIII), no signo de
Gémeos e com a Caput Draconis, no decanato do Sol, nos termos
de Saturno e na monomoiria de Vénus. Já o Sol encontra-se em
Sagitário, fora do Segmento de Luz, abaixo do horizonte, no Lugar
do Viver (II), no decanato de Saturno, termos de Marte e
monomoiria de Saturno. Com o Sol, mas para além dos seus raios
encontra-se Marte e a Cauda Draconis.

Ora este encontro, sem a qualidade abrasiva de que Marte


poderia beneficiar, intensifica a força do elemento de passagem e
do espírito de viagem, de travessia do rio da realidade, que é
própria do eixo Sagitário-Gémeos. Porém e dado o eixo de lugares
em que os luminares se firmam, a intensidade não possui um valor
próprio e, neste caso, ou se eleva ou se afunda. A transformação
nesta qualidade axial tem portanto um potencial de transformação
que não é em si mesmo valorativo.

Os luminares, entre o modo de vida (II) e a qualidade da


morte (VIII), concedem a luz que permite encontrar o sentido do
real. A união do Sol e da Lua com o corpo do Dragão da Lua,
118 Rodolfo Miguel de Figueiredo

aquele que a 18 de Janeiro de 2022 deixará o eixo Sagitário-


Gémeos, faculta a possibilidade de se enraizar o limite e o limiar da
mensagem proposta. Essa passagem da Sabedoria à Palavra deixará
de ser a luz que guia para voltar a ser mistério. O Dragão da Lua
coloca sobre a vida o peso da Necessidade, é um agente do
Destino e da Providência, daí que Vétio Valente diga, por exemplo,
que o ponto quadrangular à Caput tem uma força anairética (Antologia,
III, 9), ou seja, a criação e a destruição ou a acção e a retribuição são
expressões do Dragão da Lua.

Neste plenilúnio, sobretudo pela proximidade dos luminares


ao corpo do Dragão, existe uma dificuldade de efectivação na sua
proposta de sentido. O caminho da Sabedoria à Palavra é
renegado, é visto por uns e percorrido por poucos, e agora quando
a sua proclamação está a terminar, a via da Morte ao Viver já surge
no horizonte. Desta forma, será preciso fixar o valor nessa senda e
encontrar o sentido da morte para transformar o modo de vida, o
que já surge com clareza pelo facto do eixo do horizonte se
estender de Escorpião a Touro.

O ponto proposto anteriormente por Valente encontra-se no


mesmo signo onde está Neptuno e, embora já distante, contamina
esse lugar com o elemento destruidor, e também devido à
observância quadrangular dos luminares e de Marte, ou seja, a visão
de totalidade que é o Amor de Deus (Neptuno em Peixes) não
alimenta nem a Sabedoria, nem a Palavra, não é acolhida como a
Reflexões Astrológicas 2021 119

uz que guia, a grande iluminadora. Porém, Neptuno está na V, no


Lugar da Boa Fortuna (ἀγαθή τύχη), mostrando como tanto a
compaixão como a imaginação continuam a dar novos mundos ao
mundo. E, no final do ano, quando Júpiter se juntar Neptuno, essa
mensagem ganhará um novo fôlego, revelando-se, novamente, o
poder da solidariedade.

Por outro lado, se Marte coloca a força e a tensão sobre os


luminares e o Dragão da Lua, então Júpiter e Saturno estruturam a
sua acção, concedendo-lhes tanto a matéria e a forma como a
consciência íntima do espaço e do tempo, da justiça e da
necessidade. O sextil de Júpiter e Saturno ao Sol, a Marte e à Cauda
e o trígono à Lua e à Caput conduzem o humano e a humanidade à
sua proposta de sentido, ou seja, a partir do Lugar sob Terra (IV) e
junto ao Ponto Subterrâneo (IC), Júpiter e Saturno permitem a
refundação das bases da realidade quer ao nível individual, quer na
dimensão colectiva ou social. As lições do passado tornar-se-ão
mais vivas, assinalando que se a história não se repete, repete-se o
humano.

Contudo, por estarem fora do segmento dominante, a luz


dos senhores do espaço e do tempo está diminuída, o que
enfraquece a qualidade a benéfica de Júpiter e exacerba a qualidade
maléfica de Saturno. Nestes tempos que vivemos, o bem e a justiça
que a humanidade poderia criar e seguir desagregam-se e dispersam
-se, esvaziando-se na espuma dos dias, e, de um outro modo, a
120 Rodolfo Miguel de Figueiredo

retribuição, a consequência de uma ὕβρις, torna-se mais evidente e


activa. Neste plenilúnio, a acção humana estará sobre um olhar
atento e vigilante das Meras e a Roda da Necessidade há-de impor
a sua gravidade, pois só assim poderá existir transformação.

Um outro encontro que marca de forma indelével este


plenilúnio é o de Mercúrio, Vénus e Plutão em Capricórnio, no
Lugar da Deusa (III). No signo do poder e da culminação, a
Palavra, o Amor e a Morte unem-se num único sentido,
concentrando o potencial do futuro. Entre outras significações,
esta é uma co-presença que pode dar origem a um novo
movimento artístico, literário ou filosófico. Encontramos aqui as
bases de um movimento assente num novo realismo que contraria
as interpretações líquidas, dispersas e disformes que dominam o
olhar actual sobre o mundo e sobre o humano. Capricórnio irá
conceder o rigor que falta e a exigência que se rejeita, dar-lhe-á a
precisão de uma finalidade.

Face ao segmento de luz dominante, Vénus apresenta-se


como o grande benéfico e, se pensarmos que Vénus está no Lugar
da Deusa e a Lua é a luz mais alta, então concluímos, uma vez
mais, que o Eterno Feminino marca o fim deste ano de 2021. Ora
Vénus, com Mercúrio e Plutão, agrega-se numa simbiose de
bênção e dádiva a Úrano em Touro (trígono) e a Neptuno em
Peixes (sextil). A Revolução da Terra (Úrano em Touro) e o Amor
de Deus (Neptuno em Peixes) fundem-se com o Poder da Palavra,
Reflexões Astrológicas 2021 121

do Amor e da Morte (Mercúrio, Vénus e Plutão em Capricórnio),


concedendo ao mundo e ao humano um intenso potencial de
transformação.

Note-se que também aqui o feminino traz consigo a sua


dádiva, pois estes aspectos têm a sua raiz em signos de Terra e de
Água. Algo que é igualmente visível no trígono de Úrano a Plutão e
nos sextis de Úrano a Neptuno e de Neptuno a Plutão. A Grande
Mãe estende as suas mãos a quem luta pelo planeta e pela
humanidade, desvelando o quanto ela se insurge e se revolta. Gaia
é o ventre e o túmulo, a mãe, mas também o vulcão e o sismo.

Quando se fala de mudança, de transformação, ou até


mesmo de revolução, existe sempre um movimento contrário, uma
resistência que só é natural, porque a sombra continua a pesar
sobre o humano. A sombra da personalidade e a penumbra que se
estende sobre as relações sociais assenta numa teia de vaidade, de
ilusão e de superficialidade. O lago de Narciso continua a colher o
olhar e, numa Lua Cheia, onde os luminares se contemplam de
frente, unindo-se e opondo-se, é fácil confundir a luz com o fogo-
fátuo.

Desta forma, a quadratura de Júpiter e Saturno a Úrano,


unindo-se a partir do Lugar Sob a Terra (IV) com o Poente (VII),
assinala que também as fundações da realidade encontram o seu
fim, renovando-se e recriando-se, fazendo do velho o novo e do
novo o velho. Os pilares do templo podem ruir para depois se
122 Rodolfo Miguel de Figueiredo

erguerem num dolce stil novo, como diria Dante no Purgatório (XXIV,
57). Com esta quadratura, podemos ser os barqueiros das
profundezas da realidade, sombrias e cristalizadas, ou os
timoneiros da luz prometida e anunciada. Sob o brilho da Lua, de
uma Lua Cheia, alta no céu, a Senhora da Luz, illuminata et
iluminatrix, consagra a Nova Era, o Novo Humano.
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Reflexões Astrológicas 2021: Parte I

Fragmentos Astrológicos

O Resto Permanece Humano: Livro I


(Poesia)

Esta Noite Sonhei com Dante e outras


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