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Cultura Popular

Brasileira
Prof.ª Emanuele Cristina Siebert
Prof.ª Ligia Karina Meneghetti Chiarelli

2012
Copyright © UNIASSELVI 2012

Elaboração:

Prof.a Emanuele Cristina Siebert


Prof.a Ligia Karina Meneghetti Chiarelli

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

306.4
S5712c Siebert, Emanuele Cristina.
Cultura Popular Brasileira / Emanuele Cristina Siebert
[e] Lígia Karina Meneghetti Chiarelli. Centro Universitário Leonardo da Vinci –
Indaial, Grupo UNIASSELVI, 2012.x ;

194. p.: il
Inclui bibliografia.
ISBN 978-85-7830-329-7

1. Cultura Popular Brasileira 2. Instituição Cultural I. Centro Universitário


Leonardo da Vinci II. Núcleo de Ensino a Distância

Impresso por:
Apresentação
Caro acadêmico, é um prazer estar com você!

Já de antemão, explicitamos que a Cultura Popular é ampla e está em


constante movimento. Por isso, não conseguiremos e nem conseguiríamos
resumir e exemplificar a Cultura Popular Brasileira que é tão rica em suas
formas em algumas páginas, mas trataremos do tema para que você possa, a
partir dos conceitos aqui discutidos e exemplos dados, construir suas próprias
concepções, incluí-las nos conteúdos escolares e ver todas as manifestações
populares a partir de um novo olhar.

Na elaboração deste livro didático, realizamos uma parceria


interessante, pois ambas somos professoras de artes, no entanto, temos
formações em áreas diferentes, uma em Artes Plásticas e outra em Música.

Ao longo de todo o livro, esperamos dialogar com as possibilidades


de utilização deste conteúdo no ensino da Arte.

Um abraço e bons estudos!

Prof.a Emanuele Cristina Siebert


Prof.a Ligia Karina Meneghetti Chiarelli

III
NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto


para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há
novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.

Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.

Bons estudos!

UNI

Olá acadêmico! Para melhorar a qualidade dos


materiais ofertados a você e dinamizar ainda
mais os seus estudos, a Uniasselvi disponibiliza
materiais que possuem o código QR Code, que
é um código que permite que você acesse um
conteúdo interativo relacionado ao tema que
você está estudando. Para utilizar essa ferramenta,
acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor
de QR Code. Depois, é só aproveitar mais essa
facilidade para aprimorar seus estudos!

IV
V
VI
Sumário
UNIDADE 1 – CULTURA.................................................................................................................... 1

TÓPICO 1 – CULTURA POPULAR.................................................................................................... 3


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 3
2 CULTURA............................................................................................................................................. 3
2.1 CULTURA ERUDITA............................................................................................................... 8
2.2 CULTURA DE MASSA............................................................................................................ 9
2.3 CULTURA POPULAR.............................................................................................................. 10
3 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES...................................................................................................... 11
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 12
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 13

TÓPICO 2 – FORMAÇÃO CULTURAL DO POVO BRASILEIRO............................................. 15


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 15
2 PRIMEIROS HABITANTES............................................................................................................. 15
3 UMA NOVA CULTURA SE INSTALA........................................................................................... 17
3.1 A COLONIZAÇÃO....................................................................................................................... 17
3.2 CHEGADA DA FAMÍLIA REAL................................................................................................ 20
4 OS AFRICANOS................................................................................................................................. 20
5 A IMIGRAÇÃO................................................................................................................................... 26
6 INDUSTRIALIZAÇÃO E URBANIZAÇÃO................................................................................. 29
7 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES.................................................................................................... 30
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 33
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 34

TÓPICO 3 – EDUCAÇÃO E PLURALIDADE CULTURAL.......................................................... 37


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 37
2 EDUCAÇÃO........................................................................................................................................ 37
2.1 TEMAS TRANSVERSAIS: PLURALIDADE CULTURAL................................................... 39
2.2 HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA E INDÍGENA NA ESCOLA..................... 42
3 LEIS DE INCENTIVO À CULTURA............................................................................................... 44
4 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES.................................................................................................... 45
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 45
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 48
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 49

UNIDADE 2 – ARTE POPULAR......................................................................................................... 51

TÓPICO 1 – FOLCLÓRICO E POPULAR......................................................................................... 53


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 53
2 CULTURA POPULAR E FOLCLORE............................................................................................. 53
3 MOSAICO............................................................................................................................................ 56
3.1 ESPORTE......................................................................................................................................... 57

VII
3.2 CULINÁRIA................................................................................................................................... 58
3.3 BEBIDAS....................................................................................................................................... 61
3.3.1 Bebidas regionais.................................................................................................................. 64
4 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES.................................................................................................... 64
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 66
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 70
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 71

TÓPICO 2 – MÚSICA POPULAR...................................................................................................... 73


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 73
2 DEFINIÇÕES....................................................................................................................................... 73
3 HISTÓRICO DA MÚSICA POPULAR NO BRASIL................................................................... 74
3.1 ORIGENS.............................................................................................................................. 75
3.2 DA ÉPOCA DE OURO À ERA DOS FESTIVAIS.............................................................. 77
3.3 DA TROPICÁLIA AOS DIAS ATUAIS.............................................................................. 81
4 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES.................................................................................................... 83
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 85
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 86

TÓPICO 3 – ARTE E ARTESANATO................................................................................................ 89


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 89
2 ARTE X ARTESANATO.................................................................................................................... 90
2.1 O ARTESANATO NO BRASIL................................................................................................ 93
3 CERÂMICA.......................................................................................................................................... 95
3.1 CERÂMICA UTILITÁRIA....................................................................................................... 95
3.2 CERÂMICA FIGURATIVA...................................................................................................... 98
4 TRANÇADOS..................................................................................................................................... 100
5 RENDAS E BORDADOS.................................................................................................................. 101
6 PINTURA PRIMITIVA...................................................................................................................... 103
7 ENTALHE............................................................................................................................................. 104
8 GRAVURAS......................................................................................................................................... 106
9 A ARTE POPULAR E ERUDITA...................................................................................................... 107
10 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES.................................................................................................. 107
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 108
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 113
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 114

UNIDADE 3 – FOLCLORE.................................................................................................................. 117

TÓPICO 1 – ARQUITETURA, RELIGIOSIDADE E LITERATURA POPULAR...................... 119


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 119
2 ARQUITETURA.................................................................................................................................. 119
3 RELIGIOSIDADE............................................................................................................................... 122
3.1 RITOS DE PASSAGEM....................................................................................................... 126
4 CRENDICES E SUPERSTIÇÕES..................................................................................................... 127
4.1 AMULETOS......................................................................................................................... 128
4.2 SIMPATIA............................................................................................................................ 128
5 MEDICINA POPULAR...................................................................................................................... 129
5.1 ERVAS, RAÍZES E FRUTAS................................................................................................ 130
6 LITERATURA POPULAR................................................................................................................. 131

VIII
6.1 MITOS E LENDAS.............................................................................................................. 132
6.2 DITADOS OU PROVÉRBIOS............................................................................................. 133
6.3 DÍSTICOS DE CAMINHÃO............................................................................................... 134
6.4 PARLENDAS....................................................................................................................... 135
6.5 TRAVA-LÍNGUAS............................................................................................................... 136
6.6 ADIVINHAS........................................................................................................................ 136
6.7 CORDEL............................................................................................................................... 137
6.8 PÃO POR DEUS.................................................................................................................. 139
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 140
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 142

TÓPICO 2 – FESTAS POPULARES E MÚSICA FOLCLÓRICA.................................................. 145


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 145
2 FESTAS POPULARES........................................................................................................................ 145
2.1 CARNAVAL......................................................................................................................... 146
2.2 FESTAS JUNINAS............................................................................................................... 148
3 MÚSICA FOLCLÓRICA................................................................................................................... 149
4 INSTRUMENTOS MUSICAIS........................................................................................................ 153
5 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES.................................................................................................... 154
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 155
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 159
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 160

TÓPICO 3 – PRESERVAÇÂO, TURISMO E PESQUISA............................................................... 161


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 161
2 PATRIMÔNIOS CULTURAIS DO BRASIL.................................................................................. 161
2.1 PATRIMÔNIOS MATERIAIS.............................................................................................. 162
2.2 PATRIMÔNIOS IMATERIAIS............................................................................................ 162
3 PATRIMÔNIOS DA HUMANIDADE NO BRASIL.................................................................... 164
4 CULTURA POPULAR E TURISMO............................................................................................... 165
5 PESQUISA............................................................................................................................................ 166
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 168
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 170
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 171

TÓPICO 4 – SALA DE AULA.............................................................................................................. 173


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 173
2 PESQUISANDO NA COMUNIDADE........................................................................................... 173
3 PORTFÓLIO OU AUTOBIOGRAFIA FOLCLÓRICA................................................................ 174
4 LIVRETO DE CORDEL..................................................................................................................... 177
5 FOTOGRAFANDO A ARQUITETURA DA CIDADE................................................................ 179
6 A MISCIGENAÇÃO ÉTNICA E O RESPEITO ÀS DIFERENÇAS........................................... 180
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 184
RESUMO DO TÓPICO 4..................................................................................................................... 188
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 189

REFERÊNCIAS....................................................................................................................................... 191

IX
X
UNIDADE 1

CULTURA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir dos estudos desta unidade, você deverá ser capaz de:

• definir cultura popular;

• diferenciar cultura popular, cultura de massa e cultura erudita;

• contextualizar como se deu a formação da cultura brasileira, traçando um


paralelo com a cultura contemporânea;

• inserir o tema transversal Pluralidade Cultural em seu planejamento de


ensino enquanto professor;

• conhecer as leis de incentivo à cultura

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – CULTURA POPULAR

TÓPICO 2 – FORMAÇÃO CULTURAL DO POVO BRASILEIRO

TÓPICO 3 – EDUCAÇÃO E PLURALIDADE CULTURAL

Assista ao vídeo
desta unidade.

1
2
UNIDADE 1
TÓPICO 1

CULTURA POPULAR

1 INTRODUÇÃO
A cultura é um fenômeno em construção, não está acabada em si. Ela se
projeta em transformação constante. Vários autores tratam como sinônimas as
palavras cultura popular, cultura de massa e folclore. No entanto, compreendemos
que são palavras distintas e trazemos aqui alguns autores que nos auxiliarão a
conceituar “cultura popular”.

Neste tópico, primeiramente, discutiremos o conceito de cultura e, em


seguida, a especificidade da cultura popular.

2 CULTURA
A expressão “cultura” é utilizada quando nos referimos ao que é
produzido pelo homem em contraposição ao que é dado pela natureza, pois
somos seres sociais e aprendemos uns com os outros. Se não convivêssemos com
outros indivíduos desde o nosso nascimento, certamente não sobreviveríamos ou
nos comportaríamos como animais. Isso porque não nascemos humanos, mas nos
tornamos humanos. A presença de outro adulto, geralmente os pais, ensinando-
nos a falar, a comer, a brincar, entre outras atividades, permitiu-nos aprender
e, independente da idade, continuamos a aprender um pouco a cada dia. Esses
ensinamentos e os hábitos que adquirimos são CULTURA. Assim, o que não é
dado pela natureza, o que não é biológico, mas que é dado pelo homem, produto
da vida coletiva, é cultural (VYGOTSKY, 2003) (SANTOS, 1983). Ou seja, andar,
comer e chorar são necessidades biológicas e em qualquer parte do mundo elas
estão presentes onde há a presença dos homens.

3
UNIDADE 1 | CULTURA

FIGURA 1 – O CHORO É UMA NECESSIDADE BIOLÓGICA

FONTE: <noticias.r7.com/.../files/2009/11/choro.jpg>. Acesso em: 2 maio 2010.

Já os demais instrumentos e signos são culturais, pois são criados pelo


homem e têm perpassado gerações, por isso sobreviveram. Um exemplo são os
instrumentos que usamos para comer, pois, biologicamente, levaríamos a boca
até a comida, como o fazem os animais ou comeríamos com as mãos. Todavia,
o homem criou instrumentos para comer e que são diferentes em alguns povos.
Há povos que, como os japoneses, comem com hashi (palitos de madeira), já há
outros, como os europeus, usam o garfo.

FIGURA 2 – HASHI E GARFO, EXEMPLOS DE INSTRUMENTOS CULTURAIS USADOS PARA COMER

FONTE: <www.objetosdedesejo.com/.../09/gold_hashi1.jpg> e <quintosabor.files.wor-


dpress.com/2008/05/garfo.jpg>. Acesso em: 2 maio 2010.

Na história da psicologia, já foram registrados alguns casos de crianças


que cresceram fora do convívio com outros seres humanos pelos mais diversos
motivos e, no qual, seus corpos resistiram. Porém, consequentemente não
aprenderam a falar, a escrever, a serem sociáveis como os demais de sua espécie,

4
TÓPICO 1 | CULTURA POPULAR

ou seja, não adquiriram hábitos culturais comuns a grupos da espécie humana;


aprenderam e passaram a ter comportamentos característicos dos animais com
os quais conviveram. Segundo EDUC (2010), são expostas histórias de crianças
selvagens, criadas por animais em vários lugares do mundo, entre os quais
citamos:

• A menina portuguesa Isabel, encontrada em 1980, que passou a infância em um


galinheiro. Tinha características físicas e comportamentais como as dos galináceos
(posição dos braços idênticos às asas da galinha, dentição formada como se fosse
um bico e balançava os braços como se fossem asas).

• Um menino de 12 anos foi encontrado em 1973 vivendo com um grupo de macacos


no Sri Lanka. Ele gruía, uivava, andava de quatro e se sentava como um  macaco.

Isso que lhe parece improvável em pleno século XXI? Não se engane, leia
a seguir a manchete datada de 27 de junho de 2009.

FIGURA 3 – MANCHETE DE JORNAL

FONTE: <http://g1.globo.com/Noticias/Mundo/0,,MUL1175549-5602,00-MENINA+RUSSA+-
QUE+VIVIA+TRANCADA+COM+CAES+E+GATOS+RECUPERASE+DIZEM+MEDICOS.html>.
Acesso em: 9 maio 2010.

DICAS

Titulo original: (Nell)


Lançamento: 1994 (EUA)
Direção: Michael Apted
Gênero: Drama
Sinopse: Uma jovem (Jodie Foster) é encontrada em uma casa
na floresta, onde vivia com sua mãe eremita, mas o médico (Liam
Neeson) que a encontra após a morte da mãe constata que
ela se expressava em um dialeto próprio, evidenciando que até
aquele momento ela não havia tido contado com outras pessoas.
Intrigado com a descoberta e ao mesmo tempo encantado com
a inocência e a pureza da moça, ele tenta ajudá-la a se integrar na
sociedade.

5
UNIDADE 1 | CULTURA

Segundo Santos (1983, p. 27), a palavra cultura é “de origem latina e em


seu significado original está ligada às atividades agrícolas. Vem do verbo latino
colere, que quer dizer cultivar”. Ou seja, o que é criado pelo homem e por este
cultivado através do repasse pelas gerações, diz respeito ao seu modo de ser e de
viver. Portanto, a cultura está relacionada com nosso modo de viver, manusear
os bens materiais, morar, comer, pensar etc. Assim, podemos afirmar que onde há
agrupamentos humanos, há cultura, pois cada grupo procura uma organização
e a cultura surge da necessidade do homem em encontrar soluções para o dia a
dia. Para Santos (1983, p. 8), “cada realidade cultural tem sua lógica interna a qual
devemos procurar conhecer para que façam sentido as suas práticas, costumes,
concepções e as transformações pelas quais passam”.

Tomamos, por exemplo, a linguagem que também integra a cultura do


homem, de um país ou de uma determinada região. Te dua, Je t’aime, Hum Tumhe
Pyar Karte hae, Aishiteru e Te quiero. Você compreendeu algo ao ler? Talvez uma
porcentagem irrisória de acadêmicos compreenda as palavras citadas por já
terem estudado algum desses idiomas, mas, para a maioria, inclusive para nós
autoras, as palavras nos são estranhas por não termos aprendido essas línguas
e não fazerem parte do nosso cotidiano. As palavras acima traduzidas para o
português, nosso idioma oficial, significam “te amo”, nas respectivamente
línguas: albanês, francês, indiano, japonês e espanhol.

Se você conseguiu ler até aqui é por que aprendeu a codificar os signos,
ou seja, as letras, pois o que está escrito poderiam ser apenas manchas no papel,
mas, culturalmente, elas têm um significado. As línguas falada e escrita também
são integrantes da cultura, pois são uma convenção de signos entre os integrantes
de uma mesma sociedade.

Segundo Santos (1983, p. 8):


cada realidade cultural tem sua lógica interna, que devemos conhecer
para que façam sentido suas práticas, costumes, concepções e as
transformações pelas quais passam. É preciso relacionar a variedade
de procedimentos culturais com os contextos em que são produzidos.
As variações nas formas de família, por exemplo, ou nas maneiras
de habitar, de se vestir ou de distribuir os produtos do trabalho não
são gratuitas. Fazem sentido para os agrupamentos humanos que as
vivem, são resultado de sua história, relacionam-se com as condições
materiais de sua existência. Entendido assim, o estudo da cultura
contribui no combate a preconceitos, oferecendo uma plataforma
firme para o respeito e a dignidade nas relações humanas.

Você já estudou cultura no Livro Didático de Psicologia e Sociologia. Vale


a pena dar novamente uma olhada!

6
TÓPICO 1 | CULTURA POPULAR

DICAS

Sugestão de leitura: O que é Cultura de José Luiz dos Santos.

Livro de fácil compreensão que explica como a cultura surgiu e se modificou


ao longo da história.

Cultura diz respeito à humanidade como um todo e, ao mesmo tempo, a


cada um dos povos, pois cada região possui particularidades e uma caminhada
histórica. A cultura pode ser subdividida em três áreas: erudita, popular e de massa.
São áreas que explicaremos separadamente por serem propagadas por diferentes
meios e atingirem diferentes camadas da sociedade, mas que se relacionam entre
si, confundindo-se muitas vezes. Conforme a Figura 4, ainda podemos subdividir
a cultura popular em folclore. Quanto ao folclore, dedicaremos uma unidade
deste caderno à cultura popular.

FIGURA 4 – A CULTURA E SUAS DIVISÕES POR ÁREAS DE ABRANGÊNCIA

FONTE: As autoras

Vejamos o significado de cada uma dessas áreas e seus exemplos.

7
UNIDADE 1 | CULTURA

2.1 CULTURA ERUDITA


A cultura erudita é geralmente associada com as classes dominantes. Há
um processo de legitimação, geralmente dado por instituições acadêmicas, tais
como universidades e especialistas (engenheiros, advogados, médicos, críticos
de arte, historiadores, cientistas etc.). Abrange uma minoria da população e exige
estudo e pesquisa.

Parte da cultura erudita outrora já foi popular, pois pensamos em muitas


obras de arte que foram produzidas por artesãos, mas que na contemporaneidade
integram Museus aos quais apenas uma minoria da população tem acesso e
compreensão. Outro exemplo que podemos dar é que parte do conhecimento
que integra a cultura erudita teve seu início nas crenças populares, pois acerca da
criação do universo, a cultura popular tem várias versões, no entanto, os cientistas,
antropólogos e arqueólogos já encontraram evidências e desenvolveram pesquisas
que dão outras versões, entre os quais está a Teoria do Big Bang.

A arte e as questões que a envolvem como a estética, a história da arte,


bem como o acesso e a compreensão das obras também são questões culturais que
compõem a cultura erudita, pois estas passam por um processo de legitimação e
apenas uma pequena parcela da população compreende e tem acesso a essa área
de conhecimento.

Comumente é na escola que temos acesso à cultura erudita, mas seu acesso
também pode ser dado por meio de leituras, documentários, visitas a locais como
museus, galerias, bibliotecas etc.

FIGURA 5 – ESTUDOS CIENTÍFICOS, PESQUISAS E REGISTROS HISTÓRICOS


INTEGRAM A CULTURA ERUDITA

FONTE: <http://correiociencia.files.wordpress.com/2009/10/ciencia.jpg>.
Acesso em: 30 maio 2010.

8
TÓPICO 1 | CULTURA POPULAR

2.2 CULTURA DE MASSA


Até o surgimento das tecnologias, falava-se apenas em cultura erudita
e cultura popular, mas com as novas tecnologias e o poder de difusão das
informações, surge a cultura de massa. Esta não está vinculada a algum grupo
específico, pois atinge todas as camadas sociais e é fornecida pela indústria
cultural, ou seja, os meios de comunicação entre os quais está o rádio, a televisão,
o cinema, as revistas, as músicas, a internet e os jornais. Na cultura de massa,
“tais meios de comunicação não só transmitem informações, não só apregoam
mensagens. Eles também difundem maneiras de se comportar, propõem estilos
de vida, modos de organizar a vida cotidiana, de arrumar a casa, de se vestir,
maneiras de falar e de escrever, de sonhar, de sofrer, de pensar, de lutar, de amar”.
(SANTOS, 1983, p. 69) A cultura de massa pregoa o consumismo, é só pensarmos
quando os meios de comunicação divulgam um novo modelo de carro ou estreia
uma telenovela, logo, o carro passa a ser o sonho de consumo de muitas famílias
e as vitrines das lojas passam a exibir roupas no estilo dos personagens das
novelas, influenciando deste o modo de falar até a cor do esmalte. Com certeza
você também já foi influenciado pela mídia, pois já deve ter visto uma roupa
que lhe pareceu feia, mas que depois de ver seu artista preferido usando, acabou
comprando uma peça também; ou ouviu as expressões “cada mergulho é um
flash”, “é nóis na fita”, “mármore do inferno”, todas as expressões usadas na
televisão, mas que se popularizaram.

O poder da indústria cultural é tanto que muitas pessoas acabam perdendo


a cultura em que foram criados ou modificam-na drasticamente. A cultura de
massa procura homogeneizar a sociedade, fazendo com que todos pensem, se
vistam e falem da mesma maneira.

Veja a charge a seguir e reflita sobre a influência da mídia e


consequentemente sobre a cultura de massas.

9
UNIDADE 1 | CULTURA

FIGURA 6 – CONSUMISMO PROPAGADO PELA MÍDIA E QUE RESULTA NA CUL-


TURA DE MASSA – CHARGE DE QUINO COM A PERSONAGEM MAFALDA

FONTE: <www.apoioescola.com.br/lumis/portal/file/fileDownload.jsp?fileId>.
Acesso em: 20 jun. 2010.

2.3 CULTURA POPULAR


A cultura popular diz respeito ao que pertence à maioria do povo, que
atinge a maior parte da população e que não é ensinado em espaços formais de
ensino. Comumente, dizemos que a cultura popular se opõe à cultura erudita e
frequentemente é confundida com cultura de massa. A cultura popular é aquela
que surge como resolução de problemas cotidianos e é criada pelo povo e para o
povo. Sua construção é histórica e pode abranger crenças, modos de viver, pensar
etc. Cada povo produz sua própria cultura e por isso, cada país, estado, cidade ou
bairro possui uma cultura própria, diferente, peculiar.

Segundo Ayala e Ayala (1987, p. 66):

a cultura popular não constitui um sistema, no mesmo sentido em


que se pode falar de sua existência na cultura erudita – um conjunto
de produções artísticas, filosóficas, científicas etc., elaboradas em
diferentes momentos históricos e que têm como referência o que foi
realizado anteriormente [...]. As próprias condições de existência
dos grupos subalternos das sociedades de classes implicam não
só a desigualdade de acesso aos produtos da cultura dominante,

10
TÓPICO 1 | CULTURA POPULAR

mas também a falta de meios materiais de registro duradouro de


sua produção cultural (desde a escrita aos modernos instrumentos
de registro sonoro e visual). A documentação da cultura popular,
por conseguinte, depende da memória, que tem seus limites, ou do
registro realizado por estudiosos, fragmentário e dirigido por critérios
diferentes dos que são próprios aos grupos subalternos.

3 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
A cultura popular, aqui discutida, limitar-se-á ao limite geográfico do
Brasil. Por isso, o Livro Didático foi denominado de Cultura Popular Brasileira.
Apesar de geograficamente dividirmos o Brasil em regiões, o conteúdo desta
disciplina focará a Cultura Popular Brasileira em geral, pois existem fatores que
não permitem uma delimitação cultural, tal como a geográfica. Dentre os fatores
estão a migração de pessoas entre as regiões do Brasil e a grande circulação de
informações por meio da televisão, internet, revistas, jornais e rádio. Hoje, não
podemos dizer que aquele estado tem a cultura X, pois a cultura não é estática e
com o grande fluxo migratório, um costume que antes se delimitava apenas ao
Nordeste, pode ser praticado e se difundir pelas demais partes do país.

Ainda de acordo com Santos (1983), a principal vantagem de estudar


a cultura é pelo fato de contribuir para o entendimento dos processos de
transformação por que passam as sociedades contemporâneas.

É importante ressaltar que, apesar de dividirmos a cultura em áreas,


não podemos hierarquizá-las, pois todas surgem em determinados momentos
históricos e têm sua devida importância para a história e sua construção social e
cultural. O que pode ser perdido na oralidade (cultura popular) fica registrado
em livros (através da cultura erudita) e o que poderia ficar restrito a apenas uma
camada da sociedade ou região, pode ser difundida e abranger a maior parte da
população (cultura de massa).

Ao longo da nossa vida temos experiências culturais únicas, visto que o


contexto em que estamos inseridos é diferente e nossas experiências também se
encaixam no mesmo pensamento. Diariamente nos relacionamos com diferentes
grupos culturais, pois há o grupo familiar, há o grupo de amigos, o grupo religioso
etc. Cada grupo mantém uma orientação, um modo culturalmente diferente. Essas
diferenças podem ser facilmente percebidas quando vamos à casa do vizinho e
percebemos que seus hábitos alimentares, sua maneira de tratar os membros da
família ou até mesmo o sotaque e algumas expressões da fala são diferentes da
nossa família. Convivemos diariamente com outros hábitos culturais e precisamos
respeitá-los.

Segundo Santos (1983, p. 8):

saber em que medida as culturas variam e quais as razões da variedade


das culturas humanas são questões que provocam muita discussão
[...] e é sempre fundamental entender os sentidos que uma realidade
cultural faz para aqueles que a vivem. De fato, a preocupação em
entender isso é uma importante conquista contemporânea.

11
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• Cultura é o que é produzido pelo homem e por este repassado por gerações,
podendo ser a fala, a escrita, o modo de viver, de comer, suas crenças etc.
Dizemos também que cultural é o que contrapõe as reações biológicas.

• A cultura erudita restringe-se a apenas uma pequena parcela da população e


geralmente é o conhecimento legitimado em academias e o que é cientificamente
comprovado. Geralmente é registrada por meio de livros ou gravações e seu
acesso é restrito.

• Cultura de massa surge com as tecnologias e é controlada pela indústria


cultural que promove seus produtos e incita ao consumismo. Essa cultura não
foca as particularidades culturais e procura uma homogeneização da cultura.

• Cultura popular é o conhecimento que integra a maior parte da população,


que pertence à maior parte do povo. Sua divulgação dá-se principalmente por
meio oral e por vezes perpassa gerações. Surge como solução para problemas
diários.

12
AUTOATIVIDADE

1 Com base nas discussões realizadas neste tópico, observe as charges a seguir
e pontue algumas considerações acerca da cultura expressa pelas ilustrações:

a)
FIGURA 7 – CHARGES

FONTE: Quino. Toda Malfada: São Paulo: Martins Fontes, 1993.

b)
FIGURA 8 – CHARGES

FONTE: Autor desconhecido

c)
FIGURA 9 – CHARGE - NONO

FONTE: <http://www.radicci.com.br/tirinhas.asp#nono>. Acesso em: 3 jul. 2010.

13
2 Agora, a partir das discussões iniciadas neste tópico, reflita sobre as
diferentes culturas no espaço escolar e o importante papel da escola perante
essas diferenças. Depois, registre suas reflexões para serem discutidas com
seus colegas.

Assista ao vídeo de
resolução da questão 1

14
UNIDADE 1
TÓPICO 2

FORMAÇÃO CULTURAL DO POVO BRASILEIRO

1 INTRODUÇÃO
No último tópico, conceituamos cultura e diferenciamos a cultura popular
da erudita e de massa. Neste tópico, abordaremos como se formou o povo
brasileiro e consequentemente a cultura brasileira.

Você perceberá o quanto recebemos influência dos indígenas que aqui


viviam antes do “descobrimento” de 1500, dos europeus que aqui se estabeleceram
como colonizadores, dos africanos do período colonial escravista que para
cá foram trazidos e tratados desumanamente e pela imigração de europeus e
asiáticos que vieram como trabalhadores assalariados.

Neste tópico, você perceberá que a Cultura Popular Brasileira é o resultado


de uma miscigenação de raças e culturas. Sugerimos que você reveja os estudos
já realizados na disciplina de arte brasileira, pois não entraremos em pormenores
históricos ou artísticos. Focaremos apenas as questões culturais, seja, em relação
à culinária, ao modo de vida, língua ou crenças.

2 PRIMEIROS HABITANTES
Os indígenas encontrados no litoral pelos portugueses eram
principalmente da tribo tupi. Aqui, eles davam os primeiros passos na
agricultura, derrubando árvores com seus machados de pedra, limpando o
terreno com queimadas e cultivando milho, batata-doce, cará, feijão, amendoim,
tabaco, abóbora, urucum, algodão, cabaças, pimentas, abacaxi, mamão, erva-
mate, guaraná, entre muitas outras plantas. Eles também cultivavam dezenas de
plantas frutíferas, como o caju e o pequi. A agricultura lhes permitia ter alimentos
disponíveis durante todo o ano e dependerem dos alimentos ao acaso, apenas
através da caça e pesca. Todos auxiliavam no cultivo, exceto alguns religiosos
(pajés e caraíbas) e chefes guerreiros (tuxuás) (RIBEIRO, 1995).

15
UNIDADE 1 | CULTURA

UNI

Muitas das frutas consideradas típicas brasileiras, como a banana, não são
nativas daqui. Entre as nativas estão: caju, cajá, umbu, buriti, babaçu, jatobá, goiaba, pitanga,
jabuticaba, jenipapo e maracujá.

Entre as plantas consideradas selvagens e cultivadas pelos indígenas


estava a mandioca, que atualmente é conhecida no Brasil também por macaxeira
e aipim. Seu cultivo e consumo foram considerados uma façanha por ser uma
planta venenosa. Pois, além de cultivar, é preciso retirar o ácido cianídrico para
torná-la comestível. A mandioca é considerada uma planta preciosa porque se
mantém na terra por meses e não precisa ser colhida e estocada. Da mandioca, os
índios produziam o cauim, bebida indígena fermentada com alto teor alcoólico.
Atualmente, essa bebida é pouco conhecida no Brasil, sendo consumida apenas
no estado do Maranhão (RIBEIRO, 1995).

UNI

Existem diversas variedades da mandioca, popularmente elas são divididas em


doce e brava, de acordo com a presença do ácido cianídrico que é considerado venenoso
e que somente é destruído pelo calor.

Os indígenas conheciam o poder das plantas e ervas, sendo estas usadas


como remédios, estimulantes, tônicos, cicatrizantes, venenos e uso em cerimônias
(drogas).

Os índios viviam em uma sociedade solidária, tranquila. As mulheres


teciam redes ou trançavam cestos. Os homens caçavam e ambos adornavam seus
corpos com urucum e plumas. A divisão social era diferente, pois todos recebiam
o mesmo tratamento, tinham o mesmo direito e a terra era de todos. Cada aldeia
era composta de 4 a 10 ocas, onde viviam cerca de 300 a 400 pessoas de várias
famílias, dormindo em redes ou esteiras (RIBEIRO, 1995).

16
TÓPICO 2 | FORMAÇÃO CULTURAL DO POVO BRASILEIRO

FIGURA 10 – REDE FEITA COM FIBRA VEGETAL: A “CAMA” DE BOA PARTE DAS TRIBOS

FONTE: <http://www.historiadaarte.com.br/imagens/rede.jpg>. Acesso em:


9 jul. 2010.

3 UMA NOVA CULTURA SE INSTALA

3.1 A COLONIZAÇÃO
Os índios perceberam a chegada do europeu como um acontecimento
espantoso, imaginando ser gente do seu deus sol, o criador – Maíra. Porém, para
os índios, eram estranhos aqueles homens barbudos, feios e fétidos saídos do mar.
Os índios tomavam banho várias vezes ao dia em riachos, lagos e rios, enquanto
que os europeus tinham o hábito de ficar dias sem banhar-se. Eles também não
conheciam doenças, além da coceira. Os brancos trouxeram desde a cárie dental,
as doenças da bexiga, a tuberculose, a coqueluche e o sarampo (RIBEIRO, 1995).

Os brancos viviam com as mãos e naus cheias de presentes (machados,


facas, facões, canivetes, tesouras, espelhos e também, miçangas cristalizadas).
Os índios se encantavam com esses objetos e como não sabiam produzi-los, eles
pagavam o preço que os brancos pediam (RIBEIRO, 1995).

Para os brancos, a vida era sofrida e todos estavam condenados ao trabalho


e subordinados ao lucro. Armados, sentiam-se poderosos e donos do mundo e o
que mais desejavam era fornicar com as índias e fazê-las trabalhar em suas roças,
enquanto, os índios cortavam e juntavam árvores de pau-brasil (RIBEIRO, 1995).

Juntamente aos primeiros europeus, vieram os jesuítas da Companhia


de Jesus, que tinham por objetivo principal levar o catolicismo às novas terras,
catequizando os índios e ensinando-lhes os costumes europeus.

Além dos jesuítas missionários, outras ordens religiosas como os


carmelitas, beneditinos e franciscanos também vieram para a América, mas foram
os padres jesuítas que tiveram papel fundamental na catequização dos indígenas
(PILETTI; PILETTI, 2002).

17
UNIDADE 1 | CULTURA

Segundo Ribeiro (1995, p. 81), “a instituição social que possibilitou a


formação do povo brasileiro foi o cunhadismo, velho uso indígena de incorporar
estranhos à sua comunidade”. Como cada índio poderia ter quantas esposas
pudesse sustentar e aqui praticamente quem desembarcou foram apenas homens
europeus, estes se casavam com as índias e cada um podia fazer vários desses
casamentos. O cunhadismo foi uma das maneiras mais fáceis e vantajosas
do branco, ao mesmo tempo recrutar mão de obra para os trabalhos pesados,
cortar madeira, transportá-las, carregá-las aos navios e também caçar e amestrar
papagaios. Outro fato que incitava o cunhadismo era que, para cá, não vieram
mulheres europeias solteiras. Porém, essa prática tinha o defeito de ser acessível
a qualquer europeu desembarcado junto às aldeias indígenas (RIBEIRO, 1995).

Com o aumento da necessidade da mão de obra, os brancos passaram


do cunhadismo às guerras de captura dos índios, tornando os índios escravos.
Ainda, segundo Ribeiro (1995), a função do cunhadismo na formação do povo
brasileiro foi fazer surgir a numerosa camada de gente mestiça que efetivamente
ocupou o Brasil.

A língua falada até meados do século XVII era o “nheengatu”, que era
uma língua aprendida com os índios e falada com jeito de boca de português
(POVO BRASILEIRO, 2010).

“No ventre das mulheres indígenas começavam a surgir seres que


não eram indígenas, meninas prenhadas pelos homens brancos [...] que
sabiam que não eram índios... que não eram europeus. O europeu não
aceitava como igual. O que era? [...]. O que significavam eles do ponto
de vista étnico? Eles seriam a matéria com a qual se faria no futuro os
brasileiros...”

FONTE: Ribeiro (1995 apud POVO BRASILEIRO, 2010)

18
TÓPICO 2 | FORMAÇÃO CULTURAL DO POVO BRASILEIRO

DICAS

Conheça de forma bem humorada o encontro


dos costumes indígenas e europeus e também a prática do
cunhadismo com o filme “Caramuru: a invenção do Brasil”.

Gênero:  Comédia
Tempo:  85 minutos
Lançamento:  2000
Classificação:  12 anos
Distribuidora:  Columbia Pictures
Sinopse: Em 1º de janeiro de 1500 um novo mundo é
descoberto pelos europeus, graças a grandes avanços
técnicos na arte náutica e na elaboração de mapas.
É neste contexto que vive em Portugal o jovem Diogo, pintor que é contratado para
ilustrar um mapa e, por ser enganado pela sedutora Isabelle, acaba sendo punido com a
deportação na caravela comandada por Vasco de Athayde. Mas a caravela onde Diogo está
acaba naufragando e ele, por milagre, consegue chegar ao litoral brasileiro. Lá conhece a
bela índia Paraguaçu com quem logo inicia um romance temperado posteriormente pela
inclusão de uma terceira pessoa: a índia Moema, irmã de Paraguaçu.

Como de um lado estavam os jesuítas tentando catequizar os índios,


tentando vesti-los, e tirando-os de modos tão rudimentares e cheios de pecados
(segundo os parâmetros europeus), do outro, os senhores do engenho que aqui se
instalavam e começaram o cultivo da cana-de-açúcar, capturavam e escravizavam-
nos. Como resultado: extermínio e fuga dos indígenas para o interior (CASA-
GRANDE; SENZALA, 2010).

Na busca por mais riqueza, em especial dos minérios e na caçada ao


indígena, o interior do Brasil foi explorado e povoado, tendo, assim, seu território
ampliado. As bandeiras de exploração, em sua maioria levavam mais de duas mil
pessoas. Eram homens e mulheres, famílias inteiras de mestiços que iam fazendo
roça de milho e feijão pelo caminho, fundando vilarejos, caçando e pescando pra
comer (POVO BRASILEIRO, 2010).

Fora de seu habitat natural, o índio não se adaptava como escravo: morria
de infecções, fome e tristeza. Para suprir a deficiência da mão de obra escrava, os
senhores de engenho começavam a importar negros caçados na África. Agora, as
escravas negras substituíam as índias tanto na cozinha como na cama do senhor.
Na agricultura, a presença do negro elevava a produção de açúcar e o preço do
produto no mercado internacional (CASA GRANDE; SENZALA, 2010).

19
UNIDADE 1 | CULTURA

3.2 CHEGADA DA FAMÍLIA REAL


Ao transferir a sede do governo de Portugal para o Rio de Janeiro, D. João
VI trouxe consigo a família real, parentes e funcionários do reino. Eram cerca de
15 mil pessoas que consigo trouxeram coleções de arte, bibliotecas e documentos,
além de objetos e bens pessoais (PILETTI; PILETTI, 2002).

A vinda da família real trouxe mudanças significativas na economia do


país com a construção de pontes, estradas, liberação dos portos e introdução
de novas espécies de plantas para cultivo. Outras mudanças ocorreram na vida
cultural da colônia, sendo que foram criados vários cursos como os de química,
agricultura, cirurgia, desenho técnico etc. Foi fundada a Escola Real de Ciências,
Artes e Ofícios e foi fundada a Biblioteca Real (PILETTI; PILETTI, 2002).

Surge, então, a cultura erudita, destinada apenas a uma pequena camada


da população que poderia frequentar e estudar nestes espaços.

4 OS AFRICANOS
Os europeus iam à África e faziam grandes expedições de caça aos
negros que lá viviam com uma vida muito parecida com a dos índios que aqui
se encontram. Eles tinham sua cultura, sua língua, enfim, seu modo de viver.
Trazidos do Sudão, da Costa do Marfim, da Nigéria, de Angola e de Moçambique,
essa gente marcaria com sua cor e com sua força a fisionomia e a cultura brasileiras.
No transporte para cá, em navios, metade morria na travessia, outros tantos na
brutalidade da chegada, de tristeza, mas milhões deles incorporaram-se ao Brasil.
(RIBEIRO, 1995 apud POVO BRASILEIRO, 2010).

FIGURA 11 – ENGENHO MANUAL QUE FAZ CALDO DE CANA, 1822 (aquarela sobre
papel, 17,6 x 24,5 cm. Autor: Debret)

FONTE: <http://www.itaucultural.org.br>. Acesso em: 12 jul. 2010.

20
TÓPICO 2 | FORMAÇÃO CULTURAL DO POVO BRASILEIRO

O Brasil importava da África não somente os escravos que trabalhavam


nos canaviais, mas também técnicos para as minas, donas de casa para os colonos,
criadores de gado e comerciantes de panos e sabão. Os negros vindos das áreas
de cultura africana mais adiantada eram elementos ativos e criadores e se pode
dizer que eram questões nobres na colonização do Brasil, degradados apenas pela
condição de escravos (CASA GRANDE; SENZALA, 2010).

Assim que desembarcavam no Brasil, os negros sobreviventes da travessia


eram batizados e recebiam nomes católicos (CULTURA BRASILEIRA, 2010).

A escravidão desenraizou o negro de seu meio social e desfez seus laços


familiares. Além dos trabalhos forçados, ele era usado como reprodutor de
escravos: era preciso aumentar o rebanho humano do senhor de engenho. As
crianças nascidas eram logo batizadas e ainda assim consideradas gente sem
alma. A Igreja, esteio dos poderosos, agia da mesma forma no tratamento dado
ao negro (CASA GRANDE; SENZALA, 2010).

As negras mais bonitas eram escolhidas pelos senhores para serem


concubinas e domésticas. Muitas vezes, a beleza das negras incomodava a
mulher branca, esposa do senhor do engenho e esta aplicava os mais variados
castigos, como arrancar os dentes da escrava, caso estes fossem brancos e lhe
incomodassem. As escravas na casa do senhor cumpriam as tarefas domésticas
que seriam destinadas a uma mãe de família, como cozinhar, limpar a casa e
cuidar dos filhos (CASA GRANDE; SENZALA, 2010).

“As damas da sociedade se casavam entre os doze e os quinze anos


com homens muito mais velhos. O conhecimento que tinham da vida de
casada, os acontecimentos de fora do engenho e outras histórias - nem
sempre românticas - elas ouviam da boca das mucamas (escravas). O ócio
e a vida reclusa faziam das sinhás mulheres amarguradas e ignorantes. Era
raro encontrar uma que soubesse ler e escrever. A presença da negra na vida
do menino vinha desde o berço, quando ela o amamentava e acalentava o
seu sono. A ama de leite ensinava as primeiras palavras num português
errado, o primeiro “pai nosso”, o primeiro “oxente”, e amaciava com a
própria boca a comida do menino de engenho”.

FONTE: Casa Grande e Senzala (2010)

21
UNIDADE 1 | CULTURA

FIGURA 12 – UMA SENHORA BRASILEIRA EM SEU LAR, 1823 (litografia aquarelada à


mão 16 x 22 cm. Autor: Debret)

FONTE: <http://www.itaucultural.org.br>. Acesso em: 12 de jul. 2010.

“E esses negros não podiam falar um com o outro, veja esse


desafio como é tremendo. Eles vinham de povos diferentes. Então, o único
modo de um negro falar com o outro era aprender a língua do capataz,
que nunca quis ensinar português. Milagrosa e genialmente esses negros
aprenderam a falar português. Quem difundiu o português foi o negro, que
se concentrou na área da costa de produção do açúcar e na área do ouro...
Mas preste atenção: com os negros escravos vinham as molecas de 12 anos,
bonitinhas. Uma moleca daquelas custava o preço de dois ou três escravos
de trabalho. E os donos de escravos queriam muito comprar, e os capatazes
também. Comprar uma moleca pra sacanagem. Mas essas molecas pariam
filhos, e quem era o filho? Era como o filho da índia. Ele não era africano,
visivelmente. Ele não era índio. Quem era ele? Ele também era um “zé
ninguém” procurando saber o que era. Ele só encontraria uma identidade
no dia em que se definisse o que é o brasileiro”.

FONTE: Ribeiro (1995 apud POVO BRASILEIRO, 2010)

Os senhores de engenho casavam-se sucessivas vezes, sempre preferindo


as jovens sobrinhas; exagerava-se, então, o sentimento da propriedade privada.
As heranças eram disputadas por filhos legítimos e parentes próximos. Aos filhos
bastardos, gerados nas casas-grandes e paridos na senzala, restava a tolerância
do senhor, que ao morrer os libertava. Nomes e sobrenomes se confundiam: os
escravos mais próximos, que ganhavam a simpatia do senhor, conseguiam adotar
o sobrenome dos brancos. Na tentativa de ascensão social, os negros imitavam dos
senhores as formas exteriores de superioridade. Todavia, muitos nomes ilustres

22
TÓPICO 2 | FORMAÇÃO CULTURAL DO POVO BRASILEIRO

de senhores brancos vinham dos apelidos indígenas e africanos das propriedades


rurais – a terra recriava os nomes dos proprietários à sua imagem e semelhança
(CASA GRANDE; SENZALA, 2010).

As mães negras e as mucamas, aliadas aos meninos, às moças das casas-


grandes e aos moleques corrompiam o português arcaico ensinado pelos jesuítas
aos filhos do senhor. A nova fala brasileira não se conservava fechada nas salas
de aula das casas-grandes, nem se entregava de todo à maior espontaneidade
de expressão da senzala. Porém, o modo carinhoso do brasileiro colocar os
pronomes: me diga, me espere vêm do africano. Também do seu modo de falar
ficaram as formas diminutivas: benzinho, nezinho, inhozinho (CASA GRANDE;
SENZALA, 2010).

Era um novo jeito de falar, um novo jeito de andar, um novo jeito de comer...
A culinária da senzala aproveitava as sobras de carnes da casa-grande, usava o
aipim indígena e às verduras, misturava os temperos africanos, principalmente o
dendê e a pimenta malagueta. Surgiam a feijoada, a farofa, o quibebe e o vatapá.
Alimentos que combinavam com a dureza do trabalho no cativeiro (CASA
GRANDE; SENZALA, 2010).

O artista Albert Eckhout, quando esteve no Brasil, retratou os tipos


humanos que aqui encontrou. Observe os tipos brasileiros aqui encontrados, bem
como os acessórios que eles carregavam e suas vestimentas.

FIGURA 13 – ÍNDIO TARAIURI E ÍNDIO TUPI

FONTE: <http://www.cliohistoria.hpg.ig.com.br/bco_imagens/eckhout/eckhout.
htm#>. Acesso em: 9 jul. 2010.

23
UNIDADE 1 | CULTURA

FIGURA 14 – ÍNDIAS TUPI

FONTE: <http://www.cliohistoria.hpg.ig.com.br/bco_imagens/eckhout/
eckhout.htm#>. Acesso em: 9 jul. 2010.

FIGURA 15 – HOMEM MESTIÇO (MAMELUCO) E MULHER MESTIÇA (MAMELUCA)

FONTE: <http://www.cliohistoria.hpg.ig.com.br/bco_imagens/eckhout/
eckhout.htm#>. Acesso em: 9 jul. 2010.

FIGURA 16 – MULHER AFRICANA E HOMEM AFRICANO

FONTE: <http://www.cliohistoria.hpg.ig.com.br/bco_imagens/eckhout/
eckhout.htm#>. Acesso em: 9 jul. 2010.

24
TÓPICO 2 | FORMAÇÃO CULTURAL DO POVO BRASILEIRO

UNI

Albert van der Eckhout (1610-1666), a convite do governador-geral do Brasil, o


holandês Maurício de Nassau, viaja para o Brasil, onde permanece entre 1637 e 1644. Nesse
período, Eckhout realiza sua principal obra, composta de oito representações em tamanho
natural de habitantes locais e doze naturezas-mortas de frutas tropicais. Essa coleção, com
que, em 1654, Maurício de Nassau presenteou seu primo Frederico III, rei da Dinamarca,
pertence hoje ao Museu Nacional da Dinamarca (ALBERT ECKHOUT, 2010).

“Desde o princípio houve um partido de jesuítas que tinha uma


utopia para os índios. Era fazer dos índios pios seráficos, religiosos, gente
tão boa que era a melhor gente do mundo. Eles achavam que era a maneira
de fazer o Paraíso na Terra. A religião pegou mesmo foi com as filhas das
índias e das negras, as mestiças, que, não podendo satisfazer-se com a
religião dos índios e dos negros, aceitavam e gostavam das novenas, das
ladainhas, das missas, das procissões... E assim surgiu esse catolicismo
santeiro e festeiro, que foi um belo catolicismo do Brasil [...].”

FONTE: Ribeiro (1995 apud POVO BRASILEIRO, 2010).

Na religião conviviam a cultura do senhor e a do negro. O catolicismo


praticado aqui era uma religião doce, doméstica, de intimidade com os santos. Os
padres se vangloriavam de conceder aos negros certas vantagens, como o direito
de manifestar suas tradições nas festas do terreiro. Nasciam então as religiões
e crenças afro-brasileiras: São Jorge é o orixá Ogum e Nossa Senhora é Iemanjá
(CASA GRANDE; SENZALA, 2010).

FIGURA 17 – JOVENS NEGRAS INDO À IGREJA PARA SEREM BATIZADAS, 1821 (aqua-
rela sobre papel, 18,3 x 23,5 cm. Autor: Debret)

FONTE: <http://www.itaucultural.org.br>. Acesso em: 12 jul. 2010.

25
UNIDADE 1 | CULTURA

A descoberta do ouro mudou totalmente a vida da colônia. A mineração


desbancou a indústria açucareira, que era então a principal atividade econômica.
A sociedade estava estruturada nos moldes da fazenda – da casa-grande e da
senzala – vivendo ao redor do senhor de engenho. O país prosperava graças ao
trabalho escravo de três milhões de negros. O açúcar, no entanto, entrava em
decadência pela concorrência internacional (POVO BRASILEIRO, 2010).

Nestas terras, ricas em ouro e diamante, muitos escravos conseguiram


comprar a liberdade e enriquecer. Assim, surgiu uma classe intermediária formada
de mulatos e negros libertos, que conseguiram melhorar de vida e se dedicar às
atividades de ourives, carpinteiros, ferreiros e artistas (POVO BRASILEIRO, 2010).

A riqueza com que as igrejas foram construídas no período do ouro deixa


transparecer a importância da religião católica na vida da colônia. Todos iam à
missa: brancos, negros libertos, mulatos e escravos. Todavia, cada um frequentava
sua própria igreja, decorada a seu modo (POVO BRASILEIRO, 2010).

O Brasil só se tornou uma nação com a abolição da escravatura, que


concedeu aos negros, ao menos no papel, a igualdade civil. Emancipados, mas
sem a terra que cultivaram por quase quatro séculos, os ex-escravos abandonaram
as fazendas e logo descobriram que não podiam ficar em nenhum lugar, pois, em
1850 as regras de acesso à propriedade rural mudaram, sendo que a ocupação e
cultivo da terra não garantiam sua posse. A terra tinha dono. A maior parte dos
escravos concentrou-se na periferia das cidades (POVO BRASILEIRO, 2010).

“O negro guardou, sobretudo, sua espiritualidade, sua religiosidade,


seu sentido musical. É nessas áreas que ele dá grandes contribuições e ajuda
o brasileiro a ser um povo singular. Quando chegam à cidade são capazes de
fazer coisas, por exemplo, a cultura do Rio de Janeiro, a beleza do Carnaval
carioca, que é uma criação negra, a maior festa da Terra! A beleza de Iemanjá,
uma mãe de Deus que faz amor. [...] Isso é uma coisa fantástica! Um povo que
é capaz de inventar uma coisa destas! [...] Isso são os nossos negros, os nossos
mulatos desse país.”

FONTE: Ribeiro (1995 apud POVO BRASILEIRO, 2010).

5 A IMIGRAÇÃO
No final do século XIX, a crise econômica que assolava alguns países da
Europa trouxe para o Brasil milhões de imigrantes. Eles vinham com o sonho
de conseguir um bom emprego, cultivar o próprio pedaço de terra ou assegurar
um melhor futuro para os seus filhos. Em sua maioria eles vinham da Itália, da
Alemanha, de Portugal e da Espanha e em menor proporção dos países ibéricos
(que fazem fronteira com a Europa). Vinham para trabalhar nas plantações de
café, o principal produto de exportação da época. Acabaram ocupando o lugar
26
TÓPICO 2 | FORMAÇÃO CULTURAL DO POVO BRASILEIRO

dos mestiços e escravos libertos, como mão de obra assalariada. Os europeus se


fixaram principalmente em São Paulo e no sul do país, onde renovaram a vida
local e promoveram o primeiro movimento de industrialização do país (PROJETO
ARARIBÁ, 2006) (POVO BRASILEIRO, 2010).

ATENCAO

Fique atento ao utilizar os temos migração, imigração e emigração, pois há


diferença entre eles:
Migração: é o ato de se mover de uma região para outra ou estar de passagem em outro
país.
Imigração: Entrar (num país estranho) para nele viver.
Emigração: Mudança voluntária de país. Trata-se do mesmo fenômeno da imigração, mas
visto da perspectiva do lugar de origem.

FIGURA 18 – OS IMIGRANTES, DE ANTÔNIO ROCCO, c.1910. (Óleo


sobre tela. 231 X 202 cm. Pinacoteca de São Paulo)

FONTE: <http://www.pinacoteca.org.br/pinacoteca/default.aspx?mn=
153&c=acervo&letra =A&cd=7>. Acesso em: 22 jul. 2010.

Grande parte dos imigrantes instalaram-se nas regiões do Sudeste, em


fazendas de café ou nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo
– e no Sul – como pequenos proprietários rurais (PILETTI; PILETTI, 2002).
“No sul do Brasil, os núcleos de povoamentos se deram em áreas cedidas pelo
governo, muitas vezes em terras indígenas. O objetivo era constituir pequenas
propriedades familiares, que garantissem a ocupação efetiva do território”
(PROJETO ARARIBÁ, 2006, p. 202).

O incentivo à colonização estrangeira refletia a visão de alguns setores das


elites brasileiras, que influenciados por teorias racistas divulgadas na Europa,

27
UNIDADE 1 | CULTURA

acreditavam que os brancos eram superiores e, por isso, o Brasil somente se


desenvolveria se houvesse um “branqueamento” (MELANI, 2006).

No Sudeste, muitos imigraram sob o sistema de parceria em que o


fazendeiro pagava as despesas da viagem e da manutenção das famílias até a
primeira colheita de café. Cada família cuidava de determinados pés de café e
após a venda da colheita, entregavam ao fazendeiro metade da produção de seus
pés de café mais o valor das dívidas contraídas com a viagem, acrescidos a esse
valor da dívida os juros de 6%. Muitos problemas dessa parceria surgiram, pois
os fazendeiros destinavam aos imigrantes os cafeeiros improdutivos e estes não
conseguiam saldar as dívidas, estavam sempre endividados (MELANI, 2006).

Já outros imigrantes eram contratados como trabalhadores nas fazendas de


café e recebiam salários, mas eles faziam suas compras na venda do patrão, o que
quase sempre gerava uma relação de dependência (ENTRE DOIS MUNDOS, 2010).

Alguns imigrantes que na Itália eram operários e artesãos conseguiram


se estabelecer na cidade. Porém, alguns patrões continuavam com a mentalidade
de que seus empregados eram escravos e chamavam seus colonos de “escravos
brancos” (ENTRE DOIS MUNDOS, 2010).

Muitos, desencantados, retornavam para a Itália. Outros seguiam de


fazenda em fazenda na esperança de melhor sorte, que alguns alcançavam
comprando pequenas propriedades (ENTRE DOIS MUNDOS, 2010).

Os imigrantes que se estabeleceram no Sul – Rio Grande do Sul e Santa


Catarina – em sua maioria receberam terras do governo brasileiro, tornando-se
pequenos proprietários. Estes, inicialmente enfrentaram muitas dificuldades, pois
não havia estradas, os meios de transporte eram os animais e a alimentação era
insuficiente. Todavia, aos poucos começaram a produzir o que precisavam para
sobreviver. Desenvolveram assim a agricultura (milho, feijão, batata etc.) e a pecuária
(suínos, bovinos etc.), além de pequenas fábricas artesanais (queijos, salame, vinho,
cestos etc.); tornando-se praticamente autossuficientes (PILETTI; PILETTI, 2002).

“Esses colonos do Sul, que eram pequenos proprietários, desenvolveram


um padrão de vida bastante diferente em relação aos colonos assalariados
paulistas” (PILETTI; PILETTI, 2002).

Permanecer em sua propriedade significava criar condições de


sobrevivência e adaptação, através da construção de casas, escolas, templos e
cemitérios. Os alemães protestantes, que não podiam enterrar seus mortos junto
aos católicos brasileiros, fundaram igrejas e cemitérios protestantes (ENTRE
DOIS MUNDOS, 2010).

E mais uma vez o Brasil recebeu imigrantes, agora vindos da longínqua


Ásia. Eram os japoneses, que desembarcavam já contratados para a lavoura
de café. Desde o início, fazendeiros e capatazes duvidavam da capacidade de

28
TÓPICO 2 | FORMAÇÃO CULTURAL DO POVO BRASILEIRO

adaptação dos japoneses a terra tão estranha. No entanto, eles se adaptaram


rapidamente à vida nos cafezais e permaneceram por mais tempo no campo.
Os japoneses, atualmente, são responsáveis pela maior parte da produção de
legumes e verduras do estado de São Paulo (ENTRE DOIS MUNDOS, 2010).

Todavia, não bastava apenas ficar e sobreviver, era necessário conviver e


se relacionar. Era preciso aprender o português. Se para os italianos a conversa era
mais fácil, alemães e japoneses tinham dificuldades por causa da própria origem
da língua. As crianças, que aprendiam com facilidade, tornavam-se intérpretes
dos adultos (ENTRE DOIS MUNDOS, 2010).

Esses pioneiros, como aqueles que os seguiram, enfrentaram preconceitos


e dificuldades materiais na nova terra; mas com a esperança, a vontade de vencer
e a bagagem cultural que trouxeram aos poucos se tornaram parte da paisagem
brasileira. Já integrados, sua presença se fez sentir nas artes, na arquitetura, na
culinária e no modo de vida. Concretizaram seus sonhos e mudaram a cara do
Brasil (ENTRE DOIS MUNDOS, 2010).

FIGURA 19 – “OPERÁRIOS” - 1933 (óleo/tela 150 X 205 cm, Assin.: “Tarsila 1933”. Col.
do Gov. do Estado de São Paulo)

FONTE: <http://www.tarsiladoamaral.com.br>. Acesso em: 1º jul. 2010.

6 INDUSTRIALIZAÇÃO E URBANIZAÇÃO
Com a imigração, a base da economia do país passa a ser o produto
industrializado e as cidades passam de rurais a urbanas. Assim, as cidades
crescem rapidamente e aumenta a migração dentro do país em busca de melhores
empregos, principalmente dos habitantes da região Nordeste para o Sudeste e
dos que moravam em áreas rurais para as áreas urbanas.

29
UNIDADE 1 | CULTURA

O crescimento desordenado acaba criando as favelas nas periferias


das cidades, pois a estrutura da maioria destas cidades não consegue atender
às necessidades básicas de todos os migrantes, causando impactos sociais e
ambientais.

Com a grande industrialização do país a partir da década de 1930,


surgem os sindicatos e as leis trabalhistas que lutam por melhores condições dos
trabalhadores assalariados.

Já a partir da segunda metade do século XX, com a abertura do comércio


internacional, aumentam as importações e exportações do Brasil.

Com a globalização, aumentam as redes de lojas internacionais no país,


as redes de fast-food, a construção de shoppings, a compra de carros e produtos
importados, enfim, a expansão da comunicação de massa, principalmente da
internet após a década de 1990. As informações e produtos chegam facilmente
às mais longínquas cidades brasileiras e a influência de culturas internacionais,
principalmente a americana, é percebida na música, nas bebidas (coca-cola), nas
roupas (Jeans, Legging), nos filmes, seriados e livros. Os produtos importados da
China também têm invadido as lojas devido ao seu baixo custo de produção.

Sendo assim, você deve ter percebido que a cultura de massa trouxe
grandes mudanças na cultura do nosso país e que esta possibilita que todos
tenham acesso às informações em menos tempo hábil e de forma homogênea
entre as camadas sociais. No entanto, temos que saber separar as informações
fornecidas, pois há muito “lixo cultural” e um excesso de informações inúteis. É
importante saber separar!

7 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Neste tópico, não focamos particulares ou regionalismos. Procuramos
tratar de maneira geral a formação da Cultura Popular Brasileira. É importante
ressaltarmos que o assunto não se esgota aqui, há muitas particularidades que
merecem ser discutidas, por isso, se quiser se aprofundar nesses assuntos,
sugerimos que você leia as obras nas quais nos fundamentamos.

Ainda neste tópico, você deve ter percebido que o Brasil foi sendo explorado
por “partes”, primeiramente sendo explorado seu litoral, posteriormente o
interior do Sudeste e do Nordeste e por último a região Norte e Sul. Devido a
essa formação, você deve ter percebido que as características físicas e culturais
das regiões brasileiras são distintas. Hoje, é claro que com a constante migração
e as facilidades de locomoção de uma região para outra, bem como as novas
tecnologias, essas diferenças tanto físicas como culturais têm-se minimizado.

Muitas dos preconceitos ainda existentes na contemporaneidade, apesar


de serem inadmissíveis, são resquícios de questões históricas.

30
TÓPICO 2 | FORMAÇÃO CULTURAL DO POVO BRASILEIRO

A maioria do povo brasileiro tem em sua raiz familiar uma grande mistura
étnica e cultural, mesmo assim, ainda presenciamos manifestações de preconceito
de uns para com os outros. Há também os que negam seu passado e o preconceito
muitas vezes não vem do outro, mas de si mesmo, ou seja, há um autopreconceito.

Agora, queremos incitá-lo fazendo alguns questionamentos, pois é comum


vermos movimentos sociais que lutam pela preservação da Cultura Indígena e
dos Quilombolas, no entanto:

• Será que essas comunidades querem manter suas tradições?

• Será que frente às novas tecnologias os indígenas realmente querem acender


fogueiras para cozinhar sabendo que há fogões, micro-ondas etc.?

• Será que esses grupos culturais querem ser diferentes do homem contemporâneo
que vai ao supermercado, ao shopping e assiste à televisão?

• É possível na contemporaneidade preservar a cultura de um determinado


povo?

• Como preservar a origem cultural sem negar as mudanças tecnológicas?

São muitos os questionamentos!

Como finalização deste tópico, escolhemos uma música cuja letra traz um
pouquinho desse grande mosaico de culturas em que se formou um maravilhoso
país chamado BRASIL.

Lourinha Bombril

Olha como ela samba


Olha como ela brilha
Olha que maravilha

Essa criola tem o olho azul


Essa lourinha tem cabelo bombril
Aquela índia tem sotaque do Sul
Essa mulata é da cor do Brasil

A cozinheira tá falando alemão


A princesinha tá falando no pé
A italiana cozinhando o feijão
A americana se encantou com Pelé

Häagen-dazs de mangaba
Chateau canela-preta

31
UNIDADE 1 | CULTURA

Cachaça made in Carmo dando a volta no planeta


Caboclo presidente
Trazendo a solução
Livro pra comida, prato pra educação

FONTE: Vianna, Herbert. Nove Luas. Carlos Savalla e Paralamas. Rio de Janeiro: EMI Music Ltda., 1996.

E
IMPORTANT

No próximo encontro presencial, discutam as questões aqui abordadas em sala


de aula e depois postem a opinião de vocês no fórum que será aberto no Ambiente Virtual
de Aprendizagem. A tutoria interna abrirá um fórum e fará essa interação com vocês!

32
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• A cultura do povo brasileiro é o resultado de uma miscigenação étnica e


cultural, principalmente dos povos indígenas, africanos e europeus.

• Os indígenas antes da chegada dos europeus viviam em comunidade. Todos


eram donos das terras e os alimentos produzidos e caçados, bem como as
tarefas eram divididas.

• O cunhadismo foi um forte “instrumento de integração” com os indígenas


sendo usados pelos europeus na colonização e exploração das novas terras.

• Nas primeiras expedições ao Brasil, a Igreja Católica se fez presente com a


Companhia de Jesus, inicialmente com o propósito de civilizar os indígenas.
Posteriormente, com a vinda dos escravos africanos nascem as crenças afro-
brasileiras, que é a integração de crenças africanas à religião católica.

• Os africanos foram afastados do seio cultural em que viviam e trazidos para


o Brasil como escravos, sendo aqui torturados e postos a trabalharem nas
plantações de cana-de-açúcar e café.

• Com a libertação dos escravos e a necessidade de mão de obra para as fazendas


de café, o governo brasileiro em parceria com o governo da Itália e Alemanha
incentivaram a vinda de imigrantes assalariados ao país.

• No Brasil, os imigrantes alemães e italianos se estabelecem na região Sudeste


e Sul do país. No Sul, eles cultivavam suas próprias terras, enquanto que no
Sudeste trabalhavam como assalariados nas fazendas de café.

• Posteriormente, também vieram imigrantes japoneses para trabalharem nas


lavouras de café.

• Na contemporaneidade, devido à comunicação de massa, é forte a influência


da americana na cultura brasileira.

33
AUTOATIVIDADE

1 Cite as principais contribuições culturais dos negros, dos índios e dos


europeus na formação do povo brasileiro e que pode ser percebida na
contemporaneidade.

2 Faça uma árvore genealógica expondo a origem de seus ascendentes, depois,


na correção desta autoatividade no encontro presencial, exponha-a aos
colegas.

3 Observe as duas imagens a seguir e teça um comentário partindo das


discussões realizadas neste tópico.

FIGURA 20 – FAMÍLIA DE UM CHEFE CAMACA PREPARARANDO-SE PARA UMA FESTA


(Litografia Viagem pitoresca e histórica ao Brasil (1834-1839). Volume 1, prancha 3. ©
Museu Castro Maia/Div. Iconografia, Rio de Janeiro)

FONTE: <http://www.moderna.com.br/moderna/didaticos/ei/aventuradeaprender/da-
tas/ indio.htm>. Acesso em: 9 ago. 2010.

34
FIGURA 21 – FAMÍLIA INDÍGENA NA CONTEMPORANEIDADE

FONTE: <http://www.abconlus.it/umanita/21.jpg>. Acesso em: 9 ago.


2010.

4 Como última atividade, observe novamente a litografia Uma Senhora


Brasileira em seu Lar, de Debret que se encontra neste tópico e escreva sobre
as culturas incorporadas à família brasileira naquele momento histórico.

35
36
UNIDADE 1
TÓPICO 3

EDUCAÇÃO E PLURALIDADE
CULTURAL

1 INTRODUÇÃO
Agora que já conhecemos os conceitos de cultura e estudamos sobre
a formação do povo brasileiro, verificaremos como a legislação educacional
brasileira tem tratado estes assuntos. Neste tópico, abordaremos as recentes
mudanças na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional no que se refere ao
ensino de Artes e as diferentes culturas e o tema transversal Pluralidade Cultural,
presente nos Parâmetros Curriculares Nacionais.

2 EDUCAÇÃO
Uma das funções da escola é sistematizar e disseminar conhecimentos
historicamente elaborados, permitindo ao educando apropriar-se dos bens
culturais produzidos pela sociedade. Nessa concepção, o processo educativo
pode ser compreendido como uma dinâmica de socialização da cultura (DIAS,
2010).

A escola é um local privilegiado que responde por uma parte significativa


da formação do sujeito. As interações sociais que ali se desenvolvem influenciam
a compreensão que crianças e adolescentes terão de si mesmos e dos outros
membros da sociedade (DIAS, 2010). Além disso, ao se determinar quais assuntos
devem ser trabalhados na escola, de certa forma se estabelece uma hierarquia
entre os conteúdos, isso se aplica também à cultura e às formas de expressão
artística escolhidas como temas para as aulas de artes.

Cada vez mais se apregoa que os conteúdos apresentados na escola


precisam estar adaptados às necessidades da sociedade e à realidade de seus
alunos. “A intervenção educativa da escola só faz sentido se, de fato, contribuir para
a formação das pessoas, dos estudantes. Caso não se preste atenção às diferenças
e não se integre no processo pedagógico o saber que as crianças, os adolescentes e
os jovens têm sua vida e sua cultura, a escola não poderá contribuir para ampliar
o conhecimento e intervir significativamente na educação das pessoas. Pode, até,
tornar-se um lugar de negação da educação” (MARTINS, 2007).

37
UNIDADE 1 | CULTURA

Reformas na legislação educacional têm buscado democratizar o espaço


escolar, apontando a necessidade de se incorporarem elementos que durante
muito tempo não foram valorizados nos espaços formais de ensino. Recentemente
a Lei nº 12.287/10 alterou o parágrafo referente ao ensino da arte na LDB (Lei nº
9.394/96), pondo em destaque a necessidade da presença de expressões artísticas
regionais nas aulas de artes. O texto da lei ficou assim:

Artigo 26

§ 2. O ensino da arte, especialmente em suas expressões regionais,


constituirá componente curricular obrigatório nos diversos níveis da
educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos
alunos.

FIGURA 22 – BRINQUEDOS DE MIRITI E BUMBA-MEU BOI: EXEMPLOS DE EXPRESSÕES ARTÍSTICAS


REGIONAIS

FONTE: < www.cnfcp.gov.br/pdf/ Patrimonio_Imaterial/Salvaguarda/SalvaguardaPatrimonioImaterial.


pdf>. Acesso: 27 jul. 2010.

O ensino da arte, assim como a educação em geral, deve acompanhar


as transformações históricas e sociais. Analisando o percurso histórico da arte
na educação podemos verificar mudanças nas tendências e concepções sobre
esse ensino, tivemos períodos em que a arte na escola foi enfatizada enquanto
técnica, como livre expressão, como atividade estética e como promotora do
desenvolvimento cognitivo. Já há algum tempo tem se destacada a necessidade
de um ensino que esteja integrado às realidades socioculturais na qual a escola se
insere, reconhecendo o valor das diferentes culturas, das vivências informais dos
alunos e dos interesses da comunidade.

Importantes alterações na legislação educacional têm sido feitas nos


últimos anos com o intuito de promover uma educação que reconheça e respeite

38
TÓPICO 3 | EDUCAÇÃO E PLURALIDADE CULTURAL

as diversidades. (Veremos mais sobre essas alterações no decorrer deste tópico).


Essas alterações, contudo, não devem se restringir aos conteúdos a serem
abordados nas aulas. Devem incluir também o desenvolvimento de atitudes
éticas e de respeito às diferentes culturas e suas formas de expressão artística. A
escola não pode sozinha acabar com o preconceito e a discriminação, mas pode
promover reflexões e incentivar atitudes de respeito à diversidade.

2.1 TEMAS TRANSVERSAIS: PLURALIDADE CULTURAL

Os temas transversais são assuntos do dia a dia que devem ser abordados
de forma transversal nas disciplinas escolares. Yus, (1998, p. 17) explica que os
“temas transversais são um conjunto de conteúdos educativos e eixos condutores
da atividade escolar que, não estando ligados a nenhuma matéria particular,
pode se considerar que são comuns a todas, de forma que, mais do que criar
novas disciplinas, acha-se conveniente que seu tratamento seja transversal num
currículo global da escola”.

A transversalidade é diferente da interdisciplinaridade. No trabalho


interdisciplinar, são mantidos os interesses próprios de cada uma das disciplinas
envolvidas, e os temas transversais, no caso, não compõem uma disciplina
específica. Na transversalidade um tema é trabalhado em diversas disciplinas,
permeando todo o processo educativo. Os conceitos de transversalidade e
interdisciplinaridade são diferentes, mas não excludentes.

A inclusão dos temas transversais no currículo é uma forma de inserir


as questões sociais nas discussões da sala de aula. Os temas sugeridos pelo
Ministério da Educação são: Ética, Saúde, Meio Ambiente, Orientação Sexual,
Trabalho e Consumo e Pluralidade Cultural. Outros temas podem ser incluídos
de acordo com a realidade e necessidades locais.

O documento norteador da inserção destes temas no currículo escolar são


os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Em relação ao tema Pluralidade
Cultural, o documento explica que o estudo das diferentes culturas deve contribuir
para a formação de uma nova mentalidade, onde toda forma de discriminação e
exclusão seja superada, proporcionando a todo brasileiro “uma vivência plena
de sua cidadania” (BRASIL, 1997, p. 13). Espera-se que o conhecimento e a
valorização das características culturais de diferentes grupos incentivem atitudes
éticas, de respeito, e que iniba atitudes discriminatórias e excludentes.

As culturas são “produzidas pelos grupos sociais ao longo das suas


histórias, na construção de suas formas de subsistência, na organização da vida
social e política, nas suas relações com o meio e com outros grupos [...] A diferença
entre culturas é fruto da singularidade desses processos em cada grupo social”
(BRASIL, 1997, p. 16).

39
UNIDADE 1 | CULTURA

FIGURA 23 – CÍRIO DE NAZARÉ E PANELEIRA: ATIVIDADES CARACTERÍSTICAS DE DETERMI-


NADOS GRUPOS SOCIAIS

FONTE: <www.cnfcp.gov.br/pdf/ Patrimonio_Imaterial/Salvaguarda/SalvaguardaPatrimonioImaterial.


pdf>. Acesso em: 27 jul. 2010.

O objetivo de se abordar o tema transversal Pluralidade Cultural não deve


se dividir ou apenas identificar diferentes grupos culturais dentro da sociedade
brasileira, mas sim reconhecer e valorizar as diversas formas de expressão,
reconhecendo especificidades de determinados grupos, que, embora apresentem
características particulares, juntos compõem uma identidade nacional. Sendo assim,
mais do que simples levantamento de dados é necessário que o professor incentive a
reflexão e a construção de conceitos por parte dos alunos, e que estas reflexões levem
a uma vivência de reconhecimento e respeito mútuo entre os membros dos diferentes
grupos sociais.

Com relação à prática do professor, espera-se que este adote uma postura
não discriminatória ou preconceituosa e que valorize as diferentes formas de
expressão cultural, que incentive o convívio saudável e o respeito, e proporcione
o enriquecimento cultural dos alunos através do contato com outras culturas. É
importante que o professor busque se manter informado, atualizado e que sua prática
seja orientada por uma intencionalidade objetiva. Deve ainda adotar uma atitude de
mediação entre os saberes dos alunos e as produções artísticas de outros grupos.

No que se refere aos conteúdos relacionados à disciplina de Artes, podem


ser abordados a história, valores, costumes e expressões artísticas características de
diferentes etnias, sempre considerando a importância de se incluir os grupos e as
formas de expressão artística presentes no contexto sociocultural da comunidade
em que a escola está inserida. É interessante notar diferentes formas de vestuário,
utensílios, culinária, arquitetura, brincadeiras etc., além da presença de festas
regionais, música, danças típicas e símbolos da sua cultura. As experiências cotidianas
são ricas em elementos próprios da cultura local, ao analisá-las o aluno se identifica

40
TÓPICO 3 | EDUCAÇÃO E PLURALIDADE CULTURAL

com um ou mais grupos culturais e conhece mais sobre suas origens, ampliando
sua noção de identidade. A aula de Artes pode ser um espaço para se partilhar
experiências, valorizar as vivências dos alunos e reconhecer a legitimidade dos
conhecimentos vindos de práticas informais, valorizando estas práticas e permitindo
que estes conhecimentos sejam inseridos no rol de conteúdos do currículo escolar.

FIGURA 24 – HIP HOP: MOVIMENTO CULTURAL URBANO

FONTE: <www.sarepassado.wordpress.com/2009/07/page/2/>. Acesso em:


27 jul. 2010.

Também é importante proporcionar a reflexão sobre como os meios de


comunicação apresentam as diferentes formas de expressões artístico-culturais
brasileiras, quais papéis sociais costumam ser relacionados aos diferentes grupos
étnicos e verificar a existência de estereótipos. Visitas a exposições, apreciação de
apresentações musicais também enriquecerão a compreensão dos alunos sobre a
multiplicidade de culturas.

E
IMPORTANT

Existem diferentes conceitos para “estereótipo”. Neste texto, o termo foi usado
no sentido de atribuir, generalizadamente e de maneira infundada, certas características a
uma pessoa pelo fato dela pertencer a um determinado grupo social ou étnico.

Através de atividades orientadas, os alunos podem ampliar sua noção


de cultura, aprendendo a conviver com diferentes opiniões, gostos e expressões
culturais. A construção de um ambiente de respeito na escola pode fortalecer o
convívio democrático entre diferentes grupos, despertar o interesse e a valorização
das diferentes formas de expressão artístico-culturais.

41
UNIDADE 1 | CULTURA

DICAS

A Coleção Arte e Raízes (São Paulo: Moderna, 2001) é


composta por livros paradidáticos que trazem sugestões de atividades
a partir da obra de artistas populares e eruditos, de diferentes lugares
e épocas. A coleção é composta de seis volumes e apresenta os
seguintes temas: Brinquedos e Brincadeiras, Usos e Costumes, Lendas
e Personagens, Religiões e Crenças, Festas e Tradições e Etnias e
Culturas.

2.2 HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA E


INDÍGENA NA ESCOLA
Com o intuito de promover uma educação que valorize e reconheça a
diversidade cultural brasileira foram feitas alterações no texto original da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96). A primeira alteração
ocorreu em 2003, com a promulgação da Lei Federal nº 10.639/03 que estabeleceu
a inclusão de conteúdos relacionados à História da África e da Cultura Afro-
brasileira nos currículos escolares. Estes conteúdos deveriam ser trabalhados
dentro do contexto curricular e não em uma disciplina específica.

FIGURA 25 – JONGO: DANÇA DE ORIGEM AFRICANA

FONTE: <www.cnfcp.gov.br/pdf/ Patrimonio_Imaterial/Salvaguarda/


SalvaguardaPatrimonioImaterial.pdf>. Acesso em: 27 jul. 2010.

42
TÓPICO 3 | EDUCAÇÃO E PLURALIDADE CULTURAL

Em nova alteração, no ano de 2008, foram acrescentados à lei, aspectos


relativos à História e Cultura Indígena. Na nova alteração do artigo 26-A da LDB,
o texto passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 26-A.  Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de


ensino médio, públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da história
e cultura afro-brasileira e indígena.

§ 1o  O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá


diversos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação
da população brasileira, a partir desses dois grupos étnicos, tais como o
estudo da História da África e dos africanos, a luta dos negros e dos povos
indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e o negro e o índio
na formação da sociedade nacional, resgatando as suas contribuições nas
áreas social, econômica e política, pertinentes à história do Brasil.

§ 2o  Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira


e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o
currículo escolar, em especial nas áreas de educação artística e de literatura
e história brasileiras.

FONTE: Adaptado de Brasil (2008)

FIGURA 26 – ARTE GRÁFICA WAJÃPI: PINTURA CORPORAL CARACTE-


RÍSTICA DESSA POPULAÇÃO INDÍGENA

FONTE: <www.cnfcp.gov.br/pdf/ Patrimonio_Imaterial/Salvaguarda/Sal-


vaguardaPatrimonioImaterial.pdf>. Acesso em: 27 jul. 2010.

43
UNIDADE 1 | CULTURA

O objetivo dessas alterações na legislação é promover uma educação


que valorize e reconheça a diversidade cultural brasileira, manifestada em suas
diferentes etnias. De certa forma, os temas cultura indígena e africana sempre
estiveram presentes como conteúdo escolar, principalmente na disciplina de
História. O que se propõe agora é que estes conteúdos sejam revistos com um olhar
mais crítico, fugindo dos estereótipos e de ideias pré-concebidas do senso comum.

ATENCAO

No artigo Educação não tem cor você pode conferir sugestões de como
trabalhar a cultura africana em sala de aula. Disponível em: <www.revistaescolaabril.com.br/
politicas-publicas/legislação/educacaonaotemcor-425486.shtml>.

3 LEIS DE INCENTIVO À CULTURA


As leis de incentivo à cultura são leis que oferecem benefício fiscal como
atrativo para investimentos em cultura. Existem leis de incentivo em âmbito
federal, estadual e municipal, cada uma delas apresenta regras específicas.

Para que um projeto cultural seja beneficiado por alguma dessas leis é
necessário que ele atenda aos parâmetros exigidos pelo órgão responsável pela
aplicação da lei. Os passos para se conseguir o benefício são os seguintes:

Primeiro o órgão do governo responsável pela aplicação da lei


precisa aprovar o projeto apresentado para que ele se beneficie da lei de
incentivo. Depois da aprovação, o produtor cultural (que pode ser o próprio
artista) procura uma empresa que queira patrocinar o seu projeto. Fechado
o patrocínio, a empresa fornece o dinheiro para a realização do projeto
cultural. Esse dinheiro (ou parte dele) voltará para a empresa em forma
de abatimento de imposto na hora do pagamento do tributo (Imposto de
Renda, ICMS ou IPTU/ISS, dependendo da lei utilizada.

FONTE: Adaptado de MKT Cultural (2010)

A Lei Federal nº 8.313/91, mais conhecida como Lei Rouanet, foi durante
muito tempo o principal mecanismo de captação de recursos para incentivo à
cultura no país. Essa lei instituiu o Programa Nacional de Apoio à Cultura
(PRONAC), através da qual pessoas físicas ou jurídicas podem doar recursos
para a promoção, proteção e difusão da produção artística brasileira. Reformas
nessa lei vêm sendo discutidas, e em fevereiro de 2010 foi instituído o Programa
Nacional de Fomento e Incentivo à Cultura – Procultura com o objetivo de

44
TÓPICO 3 | EDUCAÇÃO E PLURALIDADE CULTURAL

incentivar e mobilizar recursos para apoio de projetos culturais regionais. A


intenção do Ministério da Cultura é que o Procultura venha a substituir a Lei
Rouanet.

DICAS

Você pode acompanhar o andamento das discussões sobres as mudanças na


lei Rouanet através do site: www.blogs.cultura.gov.br.

4 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Neste tópico, vimos que a escola, além de desempenhar um importante
papel na difusão do conhecimento e da cultura, também tem como uma de suas
funções promover o desenvolvimento de atitudes éticas e de respeito mútuo
entre diferentes grupos sociais e suas respectivas formas de expressão artística. A
legislação a respeito já existe e parece buscar atender a algumas das necessidades
individuais e sociais presentes no mundo contemporâneo.

Os avanços nas tecnologias e a velocidade na troca de informações não


permitem que a escola mantenha um modelo de ensino pautado em antigas
concepções de educação e sociedade. Hoje nosso aluno se comporta de maneira
diferente daquele de outras épocas e espera ser tratado de forma diferente também.
Os conteúdos escolares não podem estar distantes dos conhecimentos exigidos pelo
cotidiano e também não devem estar fora da zona de interesse dos alunos.

Os conceitos, as leis, os conteúdos e os alunos mudaram. E os professores?


Espera-se que os professores acompanhem esse ritmo de mudanças, mantendo-se
atualizados em relação à legislação, aos conteúdos e às necessidades dos alunos.
Sobre as novas relações que se busca entre educação e pluralidade cultural, espera-
se que as mudanças aconteçam no discurso e, principalmente, na prática. Não
basta falar sobre respeito, é preciso agir com ética. Não podemos esquecer que
a escola e o professor são formadores de opinião e, principalmente, de atitudes.

LEITURA COMPLEMENTAR

O ENSINO DA ARTE
Rosa Iavelberg

A educação em arte ganha crescente importância quando se pensa na


formação necessária para uma adequada inserção social, cultural e profissional
do jovem contemporâneo. Ela imprime sua marca ao demandar um sujeito da

45
UNIDADE 1 | CULTURA

aprendizagem criador, propositor, reflexivo e inovador. Se hoje o aluno deve


ser formado para enfrentar situações incertas e para resistir às imposições de
velocidade e de fragmentação que caracterizam a contemporaneidade, a arte
pode colaborar e muito.

Na construção da identidade artística das crianças e dos jovens que


frequentam as escolas, os professores têm um papel significativo. Sua colaboração
é ainda maior quando sabem respeitar os modos de aprendizagem e dedicar o
tempo necessário a fornecer orientações e conteúdos adequados para a formação
em arte, que inclui tanto saberes universais como aqueles que se relacionam ao
cotidiano do aluno.

É o professor quem promove o fazer artístico, a leitura dos objetos


estéticos e a reflexão sobre a arte, de modo que o aluno possa se desenvolver
como um sujeito governado por si próprio ao mesmo tempo em que interage
com os símbolos da cultura. Além de debater os conteúdos específicos da área, o
professor deve estar atento para o temperamento de cada aluno, observando suas
ações e individualidade. Ou seja, na formação em arte o plano da subjetividade
dialoga permanentemente com as informações e orientações oferecidas pelo
professor.

Acolher e exigir são os polos da oscilação pendular, que representa os


movimentos do professor nas orientações didáticas em arte. Dessa forma, são
criadas as condições para que o aluno sinta-se bem ao manifestar seus pontos
de vista e mostrar suas criações artísticas na sala de aula, além de favorecer a
construção de uma imagem positiva de si mesmo como conhecedor e produtor
em arte.

Assim, fazem parte do conjunto de ações desenvolvidas pelo professor


nessa área: orientar os processos de criação artística oferecendo suporte técnico,
acompanhando o aluno no enfrentamento dos obstáculos inerentes à criação,
ajudando-o na resolução de problemas com dicas e perguntas e fazendo-o
acreditar em si mesmo; propor exercícios que aprimoram a criação, informando-o
sobre a História da Arte; promover a leitura, a reflexão e a construção de ideias
sobre arte e ainda documentar os trabalhos e textos produzidos para análise e
reflexão conjunta na sala de aula.

Cada imagem, cada gesto, cada som que emerge nas formas artísticas
criadas em sala de aula têm grande importância, uma vez que se referem ao
universo simbólico do aluno. Portanto, exigem a atuação precisa do professor,
o planejamento do tempo, a organização do espaço e a atenção aos processos de
comunicação, tanto entre professor e aluno como entre os colegas de classe.

Uma aprendizagem artística assim percorrida deixará marcas positivas


na memória do aprendiz, um sentimento de competência para criar, interpretar
objetos artísticos e refletir sobre arte sabendo situar as produções. Além disso, o
aluno aprende a lidar com situações novas, inusitadas e incorpora competências
e habilidades para expor publicamente suas produções e ideias com autonomia.

46
TÓPICO 3 | EDUCAÇÃO E PLURALIDADE CULTURAL

Isso não significa que arte promova a autoestima num passe de mágica,
pela simples afirmativa de que tudo o que o aluno faz e pensa em arte é ótimo.
Cada um se sentirá confiante em relação a sua arte à medida que aprender
efetivamente, atendendo aos três eixos de aprendizagem significativa: fazer,
interpretar e refletir sobre arte, sabendo contextualizá-la como produção social
e histórica.

Dominar os processos de criação em arte, construindo um percurso


cultivado, ou seja, informado pela cultura requer um professor orientador,
que incentiva a produção, ensina os caminhos da criação e solicita do aluno
envolvimento e constância. O apoio do professor, por sua vez, é alimentado pela
sua atualização permanente, necessária para se ter familiaridade com o universo
procedimental da arte.

Também as leituras de objetos artísticos, outra competência que


promove a imagem positiva do aprendiz, devem ter papel destacado na sala
de aula, porque além de cumprirem o papel de formação cultural, conectam a
aprendizagem escolar ao patrimônio cultural. A instância de formação escolar
integrada à produção social da arte é um aprendizado para a participação do
jovem na sociedade. Ao atribuir e extrair significados das produções de críticos,
historiadores da arte, jornalistas, artistas, filósofos, com a mediação do professor,
os jovens compreendem e se situam no mundo como agentes transformadores.

Nesse percurso de construção de saberes, cada aluno fará escolhas com


liberdade e discernimento, o que caracteriza os processos de criação em arte e
de aprendizagem autoral. Será, sim, influenciado pelas culturas, mas contará
com traços propositivos e transformadores, próprios dos modos de continuar
aprendendo sempre e por si, dentro e fora da escola, renovando-se em contato
a diversidade de manifestações artísticas que revelam o movimento contínuo da
arte e do conhecimento.

A vida cultural pode (e deve) transitar pela escola. A visita a feiras e


ateliês, mostras da cidade, apresentações de dança, teatro e música têm o objetivo
de estabelecer a comunicação permanente entre o que se estuda e a cultura em
produção, além dos estudos referentes à História da Arte.

Um aluno preparado para o futuro é aquele que acompanha seu tempo,


ancorado em uma sólida formação. Nesse aspecto, a arte é, sem dúvida, uma
base imprescindível por incluir as formas simbólicas que dizem respeito à
humanização de todos os tempos e lugares.

FONTE: <www.projetopresente.com.br/revista/rev6_ensino_arte.pdf>. Acesso em: 28 jul. 2010.

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RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• Uma das funções da escola é disseminar o conhecimento e a cultura,


contribuindo para a formação do sujeito. Além da aprendizagem de conteúdos,
a escola também deve incentivar o desenvolvimento de atitudes éticas e de
respeito mútuo entre as pessoas.

• Alterações na legislação educacional têm buscado aproximar os conteúdos


escolares da realidade social do aluno, assim como promover o reconhecimento
e a valorização da cultura de diferentes etnias. Podemos citar: Lei nº 12.287/10
destaca a necessidade de valorização das expressões artísticas regionais nas
aulas de artes; Lei nº 11.645/08 torna obrigatório o estudo da história e cultura
afro-brasileira e indígena.

• Os temas transversais são assuntos importantes da vida cotidiana que devem


ser trabalhados nas disciplinas escolares. Os temas sugeridos são: Ética,
Saúde, Meio Ambiente, Orientação Sexual, Trabalho e Consumo e Pluralidade
Cultural.

• Com o tema Pluralidade Cultural pretende-se desenvolver atitudes éticas em


relação às diferentes culturas, inibindo posturas discriminatórias e excludentes.

• As leis de incentivo à cultura existem para estimular investimentos em


projetos culturais por meio de benefícios fiscais aos investidores. Existem leis
de incentivo à cultura em âmbito federal, estadual e municipal.

48
AUTOATIVIDADE

1 Leia a citação a seguir e escreva sobre qual deve ser a postura do professor
diante das diferentes culturas presentes na escola. “A educação é um dos
ambientes da cultura, um ambiente em que a sociedade reprocessa a si
mesma numa operação sem fim, recriando conhecimentos, tecnologias,
saberes e práticas. Independentemente da área em que nos formamos, nós
professores trabalhamos em territórios culturais” (MOLL, 2008, p. 31).

2 Após a leitura desta unidade, esperamos que você tenha ampliado sua
compreensão sobre os diferentes conceitos de cultura. Analise a figura
a seguir e escreva sobre como os meios de comunicação influenciam na
construção do gosto e do reconhecimento do que é o objeto artístico.

FIGURA 27 – CULTURA QUE VALE

FONTE: <www.jornalacidade.com.br/charges/2009/10/22/cultura-que-vale.
html>. Acesso em: 26 jul. 2010.

3 Você conhece as leis de incentivo à cultura do seu estado e cidade? Pesquise


sobre os programas existentes e converse sobre esse assunto com seus
colegas na próxima aula.

Assista ao vídeo de
resolução da questão 1

49
50
UNIDADE 2

ARTE POPULAR

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• conceituar folclore;

• diferenciar um fato folclórico de uma manifestação apenas popular;

• perceber a riqueza e a diversidade cultural que compõem a Cultura Popu-


lar Brasileira;

• conhecer a música popular e sua história;

• compreender diferenças existentes entre arte e artesanato;

• integrar produtores da arte popular e da arte erudita.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – FOLCLÓRICO E POPULAR

TÓPICO 2 – MÚSICA POPULAR

TÓPICO 3 – ARTE E ARTESANATO

Assista ao vídeo
desta unidade.

51
52
UNIDADE 2
TÓPICO 1

FOLCLÓRICO E POPULAR

1 INTRODUÇÃO
Na Unidade 2, retomaremos algumas discussões já iniciadas
anteriormente e nos aprofundar em outras.

Lembre-se que, na Unidade 1, subdividimos a cultura em três áreas:


erudita, popular e de massa. Quando elaboramos o organograma, mencionamos
que o folclore está incluído na Cultura Popular.

No Tópico 1, você conhecerá a integração entre o folclórico e o popular e a


características de um fato folclórico. Posteriormente, serão apresentados alguns
itens que compõem a Cultura Popular.

No Tópico 2, será apresenta a Música Popular Brasileira, sua trajetória no


Brasil e o nome de alguns autores.

No último tópico, será pautada a diferença conceitual entre arte e


artesanato e também serão apresentadas algumas técnicas do artesanato.

2 CULTURA POPULAR E FOLCLORE


A Cultura Popular é a que pertence à maioria do povo e atinge a maior
parte da população. É aquela que se aprende nas conversas, nas ruas e as
manifestações que são perpassadas por gerações.

Quando nos referimos ao termo “povo”, não estamos falando de forma


pejorativa, mas como um conjunto de pessoas que possui um modo de vida
comum e habita o mesmo território, o mesmo país. O povo é muitas vezes
confundido com as camadas menos favorecidas, tanto na área econômica como na
social e cultural. Porém, por mais simples que o povo pense, sente e faz, há nestas
atitudes muita sabedoria que se traduzem em estórias, cantigas, brincadeiras,
técnicas (ORTENCIO, 2004).

53
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

A Cultura Popular ainda pode ser chamada de Folclore, quando


assim se enquadrar em algumas características. A Carta do Folclore Brasileiro
define que “constituem o fato folclórico as maneiras de pensar, sentir, agir
de um povo, preservadas pela tradição popular, ou pela imitação, e que não
sejam diretamente influenciadas pelos círculos eruditos e instituições que
se dedicam ou à renovação do patrimônio científico e artístico humano ou
à fixação de uma orientação religiosa e filosófica”.

FONTE: Adaptado de Carta do Folclore Brasileiro (2004)

De acordo com a Carta do Folclore Brasileiro (2010) de 1995, que está em


sintonia com as definições da UNESCO - United Nation Educational, Scientific and
Cultural Organization (Organização para a Educação, a Ciência e a Cultura das
Nações Unidas) para que uma atividade popular possa ser classificada como
folclore, fazem-se necessárias quatro condições:

• Dinamicidade - são admitidas inserções nas manifestações desde que não


descaracterizem o fato, ou seja, a dinamicidade tem limite. Por exemplo, não
podemos ignorar a fabricação de tecidos de última geração e sua utilização em
uma manifestação folclórica, pois há mudanças que não podem ser ignoradas,
principalmente em relação a produtos resultado da evolução natural do
homem e do aperfeiçoamento de técnicas. Porém, o uso destas não deve
descaracterizar a intenção original.
• Tradicionalidade - o fato folclórico deve ser expandido por tradição, o pai
ensinando para o filho etc.
• Aceitação Coletiva - deve haver uma aceitação coletiva, isto é, precisa
ser aceito pelo povo. “O povo pega o fato folclórico, como uma estória ou
modinha, aprende, aumenta inventando, elimina o que não gosta e a estória
ou modinha segue para frente, tendo o povo como autor, pois só o que é do
povo é realmente folclore” (ORTENCIO, 2004, p. 17). Aí é que comumente
surgem as variações regionais de uma mesma manifestação, como aconteceu
com o bumba meu boi ou boi bumbá.
• Funcionalidade - pois tudo tem sua função, a sua utilidade, seja para a
sobrevivência, para o lazer ou por motivos religiosos.

ATENCAO

Quando usamos estória, estamos nos referindo a algo inventado, como as


lendas. Já quando usarmos história é porque a história é oficial, verdadeira, como a história
do Brasil ou a história da formação cultural do povo brasileiro.

54
TÓPICO 1 | FOLCLÓRICO E POPULAR

Se uma manifestação realizada pelo povo não apresentar as quatro


características, então, ela apenas é uma manifestação popular. Para ser folclórica
deve obrigatoriamente apresentar as quatro características.

FIGURA 28 – A CULTURA E SUAS DIVISÕES POR ÁREAS DE ABRANGÊNCIA

FONTE: O autor

UNI

Tudo o que é folclórico é popular, mas nem tudo o que é popular é folclórico.

É comum encontrarmos ainda em livros as características do fato folclórico


como sendo cinco: anonimato, oralidade, aceitação coletiva, transmissão oral,
tradicionalidade e funcionalidade. Essas características foram aprovadas na Carta
do Folclore Brasileiro em 1951, no entanto, como citamos anteriormente, foram
modificadas em 1995 por orientação da UNESCO.

O termo folclore vem de folk que significa povo, família. Lore é instrução,
conhecimento, sabedoria, ou seja, folclore é “a sabedoria do povo”. Esse nome foi
criado por William John Thoms (1803-1885), inglês e arqueólogo, em um artigo
publicado na revista inglesa The Athenaeum, em 22 de agosto de 1846. Após a
publicação, o termo tornou-se universal e comum.

55
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

A ciência que estuda o folclore é chamada de Folclorística, pois, após a


pesquisa, é ela que dá tratamento científico aos dados coletados. Já a pessoa que
estuda folclore é chamada de folclorista ou folclórogo.

O estudo do folclore no Brasil foi oficializado em 1951, no 1ª Congresso


Brasileiro de Folclore, no Rio de Janeiro, que aconteceu entre os dias 22 e 31 de agosto
e foi documentado pela Carta do Folclore Brasileiro. Na ocasião, criou-se a Comissão
Nacional de Folclore, hoje ainda existente (CARTA DO FOLCLORE BRASILEIRO,
2004).

A data de início do 1ª Congresso e a data da publicação da carta pelo


inglês William John Thoms serviu de base para instituir no dia 17 de agosto de
1965, pelo então presidente da República Marechal Humberto de Alencar Castelo
Branco, através do Decreto nº 56.747, o Dia do Folclore. Eis os artigos:

Art. 1ª – Será celebrado, anualmente, a 22 de agosto, em todo o


território nacional, o Dia do Folclore.

Art. 2ª – A Campanha de Defesa do Folclore Brasileiro do Ministério


de Educação e Cultura e a Comissão Nacional do Folclore Brasileiro de
Educação, Ciência e Cultura e respectivas entidades estaduais deverão
comemorar o Dia do Folclore e associarem-se a promoções de iniciativa
oficial ou privada, estimulando ainda, nos estabelecimentos de curso
primário, médio e superior, as celebrações que realcem a importância do
Folclore na formação cultural do país.

FONTE: Ortencio (2004, p. 21)

“O folclore não fica só com o povo simples, sem instrução: chega à sociedade,
às camadas eruditas, influi e incentiva as letras e as artes” (ORTENCIO, 2004).

Segundo Ortencio (2004, p.19), o “material folclórico tende a desaparecer


com o progresso gerador da tecnologia, a maior inimiga do folclore. O progresso
desordenado tende a acabar com as tradições, portanto, com o folclore”. Assim,
a tendência é muitas manifestações deixarem de serem folclóricas para apenas
serem populares.

3 MOSAICO
Agora, no restante deste tópico, apresentaremos alguns itens que compõem
a Cultura Popular. Você perceberá que alguns itens são apenas populares e não
folclóricos. Todavia, que comumente se confundem. Por exemplo, o futebol é o
esporte mais popular no Brasil, porém, não é folclórico, pois não se encaixa nas
características do fato folclórico como tradicionalidade, funcionalidade, aceitação
coletiva e dinamicidade.
56
TÓPICO 1 | FOLCLÓRICO E POPULAR

É claro que cada situação deve ser analisada separadamente nos


mais diversos aspectos. Por exemplo: o carnaval, ao longo da história, sofreu
modificações, principalmente com a introdução da Cultura de Massa em algumas
regiões, que acabaram descaracterizando o carnaval. Assim, em algumas
regiões, a festa tornou-se apenas uma festa popular já em outras continua a ter
características folclóricas.

O mesmo acontece com as músicas populares que são diferentes da


folclórica, mas isso veremos nos próximos tópicos.

Fique atento a cada item aqui apresentado, pois o folclórico e o popular se


confundem. Mais adiante retomaremos essa discussão.

DICAS

Conheça itens da Cultura Popular nas mais diversas áreas.


Editora: Ediouro
Autor: JOÃO ROCHA & ELIFAS ANDREATO
ISBN: 9788500023002
Origem: Nacional
Ano: 2009

3.1 ESPORTE
Apesar de o futebol não ter sido criado no Brasil e ter origem inglesa,
foi trazido para cá por um jovem chamado Charles Miller que viajou para a
Inglaterra aos nove anos de idade para estudar. Lá, tomou contato com o futebol
e, ao retornar ao Brasil em 1894, trouxe na bagagem a primeira bola de futebol e
um conjunto de regras. Podemos considerar Charles Miller como o precursor do
futebol no Brasil.

O futebol popularizou-se e  transformou-se na maior paixão de nosso


povo. É o esporte mais popular do Brasil, pois cada pedaço de chão, seja de terra,
cimento ou grama transforma-se em um campo de futebol. Dois chinelos podem
tornar-se uma trave, virando um grande jogo. Quando jogado sem medidas
oficiais ou sem compromisso com regras, chamamos de “pelada”.

O Brasil é considerado o “país do futebol”, visto a popularidade deste


jogo, a quantidade de títulos conquistados em Copas do Mundo e a exportação de
jogadores para outros países. Durante a Copa do Mundo, o país para para assistir
à seleção jogar e a cor amarela e verde toma a conta das ruas.

57
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

O futebol tornou-se tão popular graças a seu jeito simples de jogar. Basta
uma bola, equipes de jogadores e as traves, para que, em qualquer espaço, crianças
e adultos possam se divertir.

FIGURA 29 – FUTEBOL, 1935, ÓLEO SOBRE TELA, 97CM X 130CM. AUTOR: PORTINARI

FONTE: <http://www.portinari.org.br/candinho/candinho/abertura.htm>. Acesso em:


12 jul. 2010.

3.2 CULINÁRIA

No Brasil, a alimentação não tem apenas o significado do ato de comer


que é biológico (lembre-se do que discutimos na Unidade 1, Tópico 1) mas, para
muitas famílias representa o momento de reunir a família à mesa e no qual se deve
ter uma postura de respeito como: não usar acessórios na cabeça, como bonés e
chapéus ou sentar-se sem camisa. Muitas famílias mantêm o hábito também de
rezar antes das refeições.

A cozinha no Brasil continua a ser um importante ambiente da casa.


É considerado o coração da casa, pois é onde recebemos os amigos para um
cafezinho e onde reunimos a família.

A culinária no Brasil é a mais diversificada possível, sendo que cada


região tem um consumo maior de determinados alimentos, devido à colonização,
à posição geográfica e ao clima que facilita o cultivo de determinados alimentos,
em detrimento de outros.

58
TÓPICO 1 | FOLCLÓRICO E POPULAR

Algumas comidas, cujas receitas são perpassadas por gerações e mantêm


o modo de preparo, também fazem parte do folclore. A culinária relaciona-se com
outros itens que apresentaremos mais adiante, como as festas. De acordo com a
festa, há comidas específicas. Na medicina popular, algumas comidas têm poder
curativo.

Há também algumas expressões simbólicas que utilizam termos da


culinária como: quando alguém é delicado é chamado de “Doce de Coco”;
quando a moça é muito bonita “é uma uva” ou “um chuchu”; quando se conta
algo indecente “é apimentado”; quando algo é muito fácil “é uma canja” e quem
costuma sair muito é “arroz de festa”.

Geralmente, o brasileiro realiza três refeições diárias, sendo: o café da


manhã, o almoço e o jantar. No café da manhã, popularmente se toma café e
come-se pão ou bolo. Já no almoço, o prato popular é o feijão acompanhado de
farinha e/ou arroz e carne ou ovos fritos. No jantar, a preferência fica entre o pão
ou sopas.

A feijoada, prato mais popular do país, surgiu nas senzalas e era preparado
com partes do porco que eram desprezados pelos donos dos escravos, no entanto,
o prato hoje é consumido por todas as classes sociais e faz o maior sucesso com
os turistas estrangeiros.

FIGURA 30 – TRADICIONAL FEIJOADA BRASILEIRA

FONTE: <http://www.imprensajacarei.com.br/arquivo/200 93006.html>.


Acesso em: 15 ago. 2010.

A seguir, citaremos alguns pratos que são considerados típicos brasileiros,


porém regionais e que dificilmente você encontrará fora de nosso país.

59
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

• Região Sul

Rio Grande do Sul: Churrasco e arroz de carreteiro.


Santa Catarina: Caldeiradas de peixe, marrecos e patos recheados e os doces
como a cuca e o Strudell.
Paraná: Barreado.

• Região Sudeste

Espírito Santo: Moqueca capixaba.


Minas Gerais: Angu, pão-de-queijo, tutu com couve, feijão tropeiro, vaca-atolada,
galinha com quiabo, goiabada com queijo, arroz-doce, doces em calda e doce de
leite.
Rio de Janeiro: Picadinho de carne, caldeirada de frutos do mar.
São Paulo: Massas e pizzas, cuscuz.

• Região Centro-Oeste

Goiás: Feijão pagão, empadão goiano, bolo de arroz, chouriço.


Mato Grosso: Farofa de banana, arroz com pequi, sopa paraguaia, carnes de caça
(tatu, jacaré).

• Região Nordeste

Ceará: Carne de sol, baião de dois, manteiga de garrafa.


Alagoas: Sururu, beiju, caranguejo.
Bahia: Vatapá, acarajé, caruru, xinxim de galinha, moqueca (à base de azeite de
dendê).
Pernambuco: Sarapatel, buchada, mata-fome.
Sergipe: Castanha de caju com galinha, frito de maturi, escafado.
Rio Grande do Norte: Alambica (sopa de jerimum com leite).
Piauí: Maria Isabel, capote, sarapatel, mugunzá, paçoca,
Maranhão: Arroz de cuchá, mingaus, sarrabulho, mocotó.
Paraíba: Arrumadinho.

• Região Norte

Amazonas: Pirarucu, sopa de tartaruga.


Pará: Tacacá e Pato no Tucupi.
Roraima: Carne de sol com pirão de leite, sarapatel de tartaruga.
Tocantins: Caldeirada de peixe, peixe na folha de bananeira, peixe no leite, carne
de sol.
Acre: Tacacá, pirarucu à casaca, saltenha, quibe de macaxeira.
Rondônia: Tucupi, caldeirada de peixe.
Amapá: Maniçoba, tacacá.

60
TÓPICO 1 | FOLCLÓRICO E POPULAR

Há, também, datas específicas no qual o cardápio é próprio para a data:

• Cardápio do Natal - panetone, rabanada, peru, cheester, tender, bolo de reis,


doces natalinos com cobertura de glacê.

• Cardápio junino - bolo de milho, pé-de-moleque, pipoca, canjica, doce de


polvilho, arroz doce, paçoca, maçã do amor.

FIGURA 31 – ALGUMAS DAS COMIDAS TÍPICAS DE FESTA JUNINA

FONTE: <http://www.vilaprado.com.br/materias.asp?mat=247>. Acesso em: 28 jul. 2010.

3.3 BEBIDAS
Há muitas bebidas populares no Brasil. Primeiramente, elencamos aqui
as que são populares e consumidas em todo território nacional, posteriormente,
incluímos um subitem em que focaremos as bebidas populares regionais.

Entre as bebidas artesanais, podemos destacar o caldo de cana, que nada


mais é do que o “suco” extraído da cana.

Já a cachaça é um destilado da cana-de-açúcar que nasceu no século XVIII


no interior paulista, mas apenas em 1950, é que a clássica mistura da cachaça ao
limão, açúcar e gelo se popularizou, surgindo, assim, a famosa caipirinha.

Devido ao sucesso da cachaça e da caipirinha no mercado internacional


e a utilização indevida desses nomes, ambas foram registradas em 2003 no
mercado internacional pelo decreto nº 4.851. Esse registro evita que outros países
ao produzirem um destilado de cana-de-açúcar nos moldes brasileiros, vendam

61
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

o produto com o nome de cachaça. Outros países também são detentores deste
registro como o México que detém os direitos do nome “Tequila” apenas para os
destilados de cactus, produzidos em seu país ou o Champagne que é o espumante
produzido na região de Champagne na França.

Atualmente, a mistura da cachaça, gelo e a substituição do limão por


outra fruta (pode ser maracujá, morango, manga, caju, jabuticaba etc.) é chamada
caipiroska.

FIGURA 32 – CAIPIRINHA

FONTE: <http://claudia.abril.com.br/receitas/253879/index.shtml?
pagina4>. Acesso em: 28 jul. 2010.

Outra bebida popular no Brasil é o café. É servido nas mais variadas


formas, seja puro, com leite ou açúcar, quente ou frio. Além das formas de preparo,
o horário para seu consumo também varia, há quem prefira tomá-lo apenas no
desjejum, outros como aperitivo após as refeições etc. O café é bem aceito em todo
o país e não há restrição de idade para seu consumo.

FIGURA 33 – CAFÉ

FONTE: <http://comida.ig.com.br/bebidas>. Acesso em: 28 jul. 2010.

62
TÓPICO 1 | FOLCLÓRICO E POPULAR

Quanto às bebidas engarrafadas e que somente encontramos no Brasil,


está o guaraná. É uma bebida consumida em grande escala. Apesar de seu
consumo ser predominantemente em forma de refrigerante, o guaraná também é
encontrado em pó, em xaropes. Seu extrato puro também é vendido em pó.

FIGURA 34 – GUARANÁ, FRUTA JÁ CONSUMIDA PELOS INDÍGENAS ANTES


DO DESCOBRIMENTO

FONTE: <http://www.naturezadivina.com.br/guaraná>. Acesso em: 28 jul. 2010.

Há também o quentão que é preparado na época das festas juninas.


Sua preparação apresenta características regionais, sendo em alguns estados
preparados com cachaça quente e em outros (principalmente nos estados do Sul)
com vinho. Os demais ingredientes acrescentados como cravo, canela, açúcar,
limão e gengibre comumente se mantêm.

FIGURA 35 – QUENTÃO DE CACHAÇA E DE VINHO

FONTE: <http://vilamulher.terra.com.br/quentao-e-vinho-quente-4-1-75-97.html>. Acesso


em: 28 jul. 2010.

63
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

3.3.1 Bebidas regionais


Apesar de termos bebidas consumidas nacionalmente, há algumas que
somente são consumidas em determinadas regiões. Acerca destas bebidas,
expomos aqui na íntegra a reportagem de Januário (2010) que apesar de ser
intitulada de as sete bebidas tipicamente brasileiras, incluiremos nesta listagem
as bebidas mencionadas no item anterior e o vinho, que é uma bebida fermentada
à base de uva, popular no Rio Grande do Sul que é resultado da colonização
italiana e do cultivo da uva nesta região.

FIGURA 36 – VINHO BRANCO E TINTO

FONTE: <http://www.diariodasaude.com.br/news.php?article=uma-taca-de-
-vinho-por-dia-pode-melhorar-a-saude-do-figado&id=3292>. Acesso em: 28
jul. 2010.

4 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Queremos que você perceba que todos os itens mencionados são populares,
sendo que alguns ganharam mais popularidade por meio da divulgação da mídia,
da industrialização de produtos (como aconteceu com o guaraná que se tornou
um refrigerante popular), outros devido à migração (na culinária dos estados de
SP e RJ isso é muito forte), já outros apesar de terem origem específica como o
futebol se popularizam.

É claro que também apresentamos alguns itens folclóricos como a feijoada,


o vinho (quando produzido artesanalmente) e a cachaça (artesanal), pois suas
técnicas perpassam gerações e apresentam as quatro características de um fato
folclórico (dinamicidade, tradicionalidade, aceitação coletiva, funcionalidade).

Optamos em colocar nesta unidade alguns itens da Cultura Popular, pois


nem tudo o que é popular é folclórico, mas tudo que é folclórico é popular.

64
TÓPICO 1 | FOLCLÓRICO E POPULAR

Agora que estamos chegando ao final desta Unidade, faça uma


pausa, tome um café e depois relembre os tópicos principais e tente realizar
as autoatividades. Como acompanhamento do seu café, deixamos a seguinte
sugestão da culinária catarinense:

Cuca de Farofa

• Ingredientes para a massa:


500 g de farinha de trigo, 150 g de açúcar, 250 ml de leite, 150 g de manteiga ou
margarina, 1 colher (sopa) de fermento para pão, 2 ovos.

• Ingredientes para a farofa:


250 g de farinha de trigo, 250 g de açúcar, 200 g de manteiga ou margarina,
raspas de casa de limão ou essência de baunilha.

Modo de preparar: Misture o leite morno, o açúcar e a margarina.


Acrescente os ovos, o fermento e o sal. Adicione a farinha de trigo. Deixe
descansar até dobrar de tamanho. Coloque a massa em uma forma retangular
untada. Para a farofa, misture a farinha, o açúcar, a manteiga e as raspas do limão.
Depois, espalhe a farofa sobre a massa ainda crua. Leve ao forno para assar por
aproximadamente 20 minutos em forno médio.

DICAS

Antes de espalhar a farofa sobre a massa, pode-se espalhar uma geleia ou


pedaços de frutas. Fica uma delícia!

FIGURA 37 – CUCA CATARINENSE DE FAROFA COM BANANA

FONTE: <http://comida.ig.com.br/comidas/cuca+fresca/n1237732719539.html>.
Acesso em: 15 ago. 2010.

65
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

LEITURA COMPLEMENTAR

AS SETE BEBIDAS TIPICAMENTE BRASILEIRAS

Uma seleção de refrigerantes e outras composições regionais. No


Maranhão, o Guaraná Jesus é mais popular do que a Coca-Cola

Pelas ruas de São Luis, no Maranhão, o refrigerante cor-de-rosa com notas de


canela é mais popular do que a Coca-Cola. É o Guaraná Jesus. No Paraná, um refresco
gasoso à base de gengibre foi batizado de Gengibirra. E tem a Cajuína, cristalina, em
Teresina.

O antropólogo Raul Lody anota que, como ocorre com as comidas típicas, as
bebidas regionais do Brasil são influenciadas pelo clima, a vegetação e os costumes
locais. E são várias. Lody classifica esses produtos por situações. “Existem as bebidas
de cotidiano (refrigerantes, refrescos e licores), as de festa (quentões, batidas), que
envolvem rituais culturais, e as de partilha”, explica. “O chimarrão é assim. As pessoas
se reúnem e todos partilham a mesma cuia”. Entre as artesanais, feitas em casa, o aluá
é um refresco à base de casca de abacaxi ou farelo de milho muito consumido no
norte e no nordeste do país.

Veja a seguir uma relação dos produtos regionais mais populares, seus
ingredientes, influências e histórias.

Aluá

É  um refresco de origem indígena e baixa dosagem alcoólica obtido da


fermentação de casca de abacaxi, milho triturado ou arroz. Muito popular em diversas
regiões do Brasil a receita artesanal tem variações no preparo e tipos de ingredientes
de acordo com a localidade, mas é mesmo mais comum no Norte e Nordeste.

No Acre e na Amazônia é comum usar o milho triturado ou a farinha de


milho, já em Belém do Pará usam cascas de frutas como o abacaxi, a raiz de gengibre
(esmagada ou ralada), o açúcar (ou o caldo de cana) e o sumo do limão. O antropólogo
Raul Lody tem uma receita de aluá: coloque num pote de barro milho seco maduro,
rapadura, gengibre e água. Deixe descansar por três dias. Coe e sirva bem gelado.
Outra versão descrita pelo escritor é a feita com casacas de abacaxi, açúcar e água.
“Coloque tudo em uma garrafa e enterre-a por três dias. Também se toma gelado”.

Cajuína

A abundância do caju no estado do Piauí originou a bebida mais popular


da região. Cantada por Caetano Veloso,  nos  versos de Cajuína,  é símbolo cultural
da capital Teresina. O refresco não é alcoólico e é obtido de forma artesanal a partir
do suco do caju, filtrado, clarificado e esterilizado. A cor amarelo-âmbar se deve à
caramelização dos açúcares naturais da fruta. A cajuína é consumida gelada.

66
TÓPICO 1 | FOLCLÓRICO E POPULAR

Chibé

É muito popular entre os caboclos paraenses. É considerada comida por


muitos devido ao seu valor energético, semelhante ao da gemada. É feita com água
e farinha de mandioca processada. Na cuia, coloca-se a farinha e em seguida a água
e, depois, tradicionalmente, se movimenta tudo da esquerda para a direita. Os
nativos tomam o chibé duas a três vezes ao dia e acreditam que ele ajuda a vencer as
dificuldades da vida e a repor as energias. As crianças costumam adicionar açúcar,
mel ou rapadura.

Foto: David Santos Jr./Foto Arena


Tereré do restaurante Sobaria, em São Paulo: a bebida é feita da
erva verde seca. É bebida gelada em uma guampa (recipiente feito
de chifre de boi)

Chimarrão e Tereré

Provenientes da erva mate, tanto o chimarrão quanto o tereré são típicas


bebidas de partilha com algumas peculiaridades. O chimarrão do Rio Grande do
Sul é como um chá feito da erva torrada e servido quente na cuia. Já o tereré, do
Mato Grosso do Sul, é feito da erva verde seca. É bebido gelado em uma guampa
(recipiente feito de chifre de boi). Ambos usam a bomba (canudo de metal com uma
base redonda fechada e pequenos furos que filtram a erva).

O hábito de tomar o chimarrão e o tereré tem estreita ligação com os países


vizinhos Paraguai e Uruguai. E o ritual que envolve a bebida também é parecido
nos dois estados. As pessoas se reúnem em torno da cuia ou da guampa para
saborear a bebida. No Mato Grosso do Sul, o pantaneiro costuma tomar o tereré
no início da manhã e no início da tarde.

67
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

Extrato de Açaí

O açaí vem de uma palmeira muito comum no estado do Pará. Ela dá,
sobretudo durante a seca, coquinhos do tamanho de uma cereja. O fruto de cor
violeta-escura, quase negra, é escolhido e amassado para se tornar a bebida
mais tradicional da região: o extrato de açaí, uma verdadeira paixão belenense.
“É tomado com ou sem açúcar, com farinha d’água, farinha seca ou farinha
de tapioca. Na forma de sorvete ou em mingaus, como se fosse leite, um leite
vermelho misturado na papa de arroz, farinha de mandioca ou mandioca-puba”,
explica Guta Chaves.

Foto: David Santos Jr./Foto Arena


Gengibirra, refrigerante à base de gengibre muito popular no Paraná.
No Amapá, existe uma receita artesanal e alcoólica

Gengibirra

O nome batiza alguns tipos de bebidas a base de gengibre. No Paraná,


popular mesmo é a Cini Gengibirra. No processo industrial de fabricação do
refrigerante, a raiz descansa por um ano em decantação antes de entrar na receita.

Os locais costumam creditar à bebida efeitos de expectorante e até mesmo


afrodisíaco. Existe uma versão caseira que, além de gengibre, leva água e açúcar,
fermento biológico e claras em neve para dar o efeito gasoso à bebida.

No Amapá, a Gengibirra já não é assim tão inocente. Servida nas rodas de


batuque, leva gengibre ralado, fervido em um litro e meio de água com cravos
da índia e açúcar caramelado. Depois de fervida a mistura, adiciona-se cachaça a
gosto. Todas as versões são consumidas geladas.

68
TÓPICO 1 | FOLCLÓRICO E POPULAR

Foto: David Santos Jr./Foto Arena


Guaraná Jesus, o sonho cor-de-rosa do Maranhão

Guaraná Jesus

No Maranhão, o Guaraná Jesus é carinhosamente conhecido como o


“sonho cor de rosa”. É um raro fenômeno de resistência regional às grandes
marcas globais de refrigerantes. A jornalista e pesquisadora Guta Chaves conta
que a fórmula da bebida é a mesma criada em 1920 num laboratório de fundo
de quintal, em São Luís, pelo farmacêutico Jesus Norberto Gomes. Na época, ele
tinha acabado de importar uma máquina de gaseificação.

Gomes queria produzir uma espécie de magnésia fluída, mas não deu
certo e ele resolveu fazer uma bebida para os netos a partir de 17 ingredientes
básicos, entre eles ervas e produtos que descobria em suas viagens pela Amazônia.
O gosto de canela adocicada e a cor diferente agradaram a molecada de toda a
vizinhança e, com o tempo, a bebida caiu no gosto popular.

A história do Guaraná Jesus confunde-se com a de seu criador. Tanto que
quando lhe foi exigido o registro formal do produto já conhecido informalmente
por “Guaraná de Jesus”, assim permaneceu. “O refrigerante, que tem a mesma
fórmula há 80 anos, foi comprado recentemente pela Coca Cola Brasil e talvez por
isso o nome tenha mudado para Cola-Guaraná Jesus”, explica a pesquisadora.

FONTE: Disponível em: <http://clubecetico.org/forum/index.php?action=printpage;topic=22583.0>.


Acesso em: 17 ago. 2010.

69
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• O folclore integra a cultura popular, consequentemente tudo que é folclórico é


popular, mas nem tudo o que é popular é folclórico.

• O termo folclore surgiu em Londres após a publicação de um artigo por


William John Thoms, na revista inglesa “The Athenaeum”, em 22 de agosto de
1846.

• O termo folclore vem de Folk que significa povo, família. Lore é instrução,
conhecimento, sabedoria, ou seja, folclore é “a sabedoria do povo”.

• Um fato folclórico deve obrigatoriamente apresentar quatro características:


dinamicidade, tradicionalidade, aceitação coletiva e funcionalidade.

• No Brasil, dia 22 de agosto é a data de comemoração do folclore.

• O progresso desordenado tende a acabar com as tradições, portanto, com


o folclore”. Assim, a tendência é muitas manifestações deixarem de serem
folclóricas para apenas serem populares.

• O futebol é o esporte mais popular no Brasil.

• A culinária relaciona-se com outras áreas como as festas, expressões populares


e artesanato. Há pratos comuns a todos os brasileiros como a feijoada (que é
folclórica), mas há também os pratos regionais que são feitos de acordo com os
alimentos disponíveis em cada região e sofrem influência da colonização, da
posição geográfica e do clima que facilita o cultivo de determinados alimentos,
em detrimento de outros. Há também comidas que são preparados somente
em datas festivas.

• As bebidas consumidas nacionalmente são a cachaça, o café, o caldo de


cana, o guaraná e a caipiroska (preparada com a fruta da região). Há
também as bebidas festivas como o quentão e as regionais, sendo algumas
industrializadas como o vinho, Guaraná de Jesus e a Gengibirra. Fique atento!
Se o vinho for preparado artesanalmente, poderemos considerá-lo folclórico,
mas se produzido industrialmente, o consideramos apenas como uma bebida
popular.

70
AUTOATIVIDADE

Cruzadinha. Leia as dicas correspondentes a cada número e preencha


os quadros com as palavras correspondentes:

Horizontal

1. Doce catarinense com cobertura de farofa.


4. Bebida destilada produzida a partir da cana-de-açúcar.
7. Pessoa que estuda o folclore.
12. Extraído de uma palmeira muito comum no estado do Pará.
13. Prato consumido nacionalmente que surgiu na senzala.
14. Ave que é assada na ceia de natal.
15. Ciência que estuda o folclore.
16. Também chamado de “Sonho cor de rosa”.

Vertical

2. Bebida quente proveniente da erva mate.


3. Bebida típica de festa junina.
5. Refresco de origem indígena, obtido da fermentação da casca de abacaxi.
6. Bebida fermentada a partir da uva, muito consumida no Rio Grande do Sul.
8. Bebida fria proveniente da erva mate.
9. O mesmo que sabedoria do povo.
10. Fruta que é a base de um refrigerante consumido nacionalmente.
11. Bebida popular na qual o limão é substituído por frutas regionais.
13. Esporte mais popular no Brasil.

71
72
UNIDADE 2 TÓPICO 2

MÚSICA POPULAR

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico, conheceremos as origens da música popular brasileira e
alguns dos principais movimentos de sua trajetória histórica. Seria impossível
apresentar todos os gêneros musicais que fazem parte da cultura musical do país,
então foram selecionados alguns elementos que permitem uma visualização geral
de sua diversidade e que retratam momentos importantes da história do país.

2 DEFINIÇÕES
A música é uma manifestação cultural tão antiga quanto o homem. Ela
desempenhou diferentes funções no decorrer da história e chega aos nossos dias
com uma enorme gama de estilos e possibilidades sonoras.

FIGURA 38 – NA ANTIGUIDADE A CIVILIZAÇÃO EGÍPCIA UTILIZAVA A


MÚSICA NO CULTO AOS DEUSES

FONTE: <www.cid.pauloneves.org>. Acesso em: 1º ago. 2010.

73
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

Há diversas formas de se classificar a música, podendo ser considerado o


período histórico de sua produção, sua forma, função ou instrumentação, entre
outros aspectos. A classificação da música em gêneros é bastante controversa, não
havendo consenso a esse respeito no meio musical. Uma classificação bastante
tradicional é a que divide a música em erudita, popular e folclórica, sendo a
música erudita também chamada de clássica ou de concerto.

UNI

É comum ouvirmos a expressão “música clássica” sendo usada como sinônimo


de “música erudita”, se referindo à música que não é popular. É importante saber que existe
um período da história da música que é denominado Clássico e vai, aproximadamente, de
1750 a 1810.

Alguns autores usam a sigla MPB (Música Popular Brasileira) como uma
espécie de rótulo para designar um conjunto de modalidades musicais que não
é rigidamente definido e que não abarca a totalidade das músicas regionais.
Segundo Krausche (1983, p. 9), fica a impressão “que a MPB é fundamentalmente
o que se cantou em grandes estádios de futebol, sob o título ‘Canta Brasil’, no
ano de 1982: Chico Buarque, Gonzaguinha, Milton Nascimento, Simone, João
Bosco, Pepeu Gomes, Clara Nunes, Baby Consuelo, Moraes Moreira e outros”.
Em nossos estudos, consideraremos como música popular aquela feita pelo
povo e também aceita pelo povo, considerando as produções musicais que são
originadas essencialmente na vivência dos grupos culturais e a música produzida
e veiculada comercialmente, e que acaba tendo grande aceitação pública.

3 HISTÓRICO DA MÚSICA POPULAR NO BRASIL


A seguir, veremos, de forma breve, a origem dos primeiros gêneros
musicais nacionais e alguns dos principais movimentos da história da música
popular brasileira.

74
TÓPICO 2 | MÚSICA POPULAR

3.1 ORIGENS
Quando os portugueses chegaram ao Brasil se depararam com a cultura
musical indígena aqui presente. Os índios expressavam-se musicalmente através
de cantos e danças, utilizando flautas, apitos, chocalhos, bater das mãos e dos pés.

FIGURA 39 – ALGUNS DOS INSTRUMENTOS MUSICAIS UTILIZADOS POR


TRIBOS INDÍGENAS BRASILEIRAS

FONTE: <www.riobranco.org.br/arquivos/sites_2009/1c/Site_Marco/Isa/artein-
digena.html>. Acesso em: 1º ago. 2010.

As primeiras missões jesuíticas portuguesas que chegaram ao Brasil


utilizaram-se da música no processo de catequização, trazendo noções elementares
sobre a música europeia e apresentando alguns instrumentos musicais vindos
de Portugal. Já os africanos, que aqui chegaram como escravos, trouxeram sua
cultura musical rica em danças, instrumentos de percussão e ritmos sincopados.

O intercâmbio cultural entre a música destes e de outros povos fez com


que no século XVIII a música popular brasileira começasse a surgir nos primeiros
centros urbanos do Brasil colonial: Rio de Janeiro e Salvador. Os principais
elementos que influenciaram a formação inicial de gêneros musicais nacionais
foram o lundu, dança de origem africana e a modinha portuguesa que era uma
forma de canção lírica e sentimental (SEVERIANO, 2008). Alguns autores citam
ainda o cateretê, dança de origem indígena, que também teria influenciado a
elaboração dos primeiros ritmos brasileiros (CALDAS, 1985).

75
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

FIGURA 40 – LUNDU (1835): GRAVURA DE RUGENDAS

FONTE: <www.museuvirtualpintoresdorio.arteblog.com.br/6/>. Acesso em: 2


ago. 2010.

A vinda da corte portuguesa, em 1808, impulsionou o desenvolvimento


das artes no Brasil. A família real trouxe consigo instrumentos musicais e danças
típicas europeias, incluindo a valsa e a quadrilha, vindo posteriormente a polca
e o tango, entre outros. No Brasil, essas danças passaram por um processo de
“nacionalização” ao serem fundidas com formas de origem africana. Na década
de 1870, surgem o tango brasileiro, o maxixe e o choro, alguns dos primeiros gêneros
da música popular brasileira. Assim como os ritmos, as técnicas de execução dos
instrumentos também se adequavam aos moldes brasileiros (SEVERIANO, 2008).
O maxixe é considerado a primeira dança urbana do Brasil e o choro “o mais
importante gênero instrumental brasileiro” (SEVERIANO, 2008, p. 34).

FIGURA 41 – “CHORINHO” (1942): TELA DE CÂNDIDO PORTINARI

FONTE: <www.divirta.se.gov.br/noticias/chorinho?nome=&remetente=&men-
sagem=>. Acesso em: 10 ago. 2010.

76
TÓPICO 2 | MÚSICA POPULAR

No início do século XX, o samba, que teria se originado do lundu, maxixe


e outros gêneros afro-brasileiros, ganharia destaque nas festas carnavalescas, ao
lado da marchinha. Até a década de 1920, o carnaval não tinha um ritmo próprio.
As festas nos salões e nas ruas eram embaladas por diversos ritmos, incluindo
modalidades folclóricas. Isso muda com o surgimento da marchinha, que se
firmou como gênero carnavalesco. Até hoje nas festas de salão são cantadas
marchinhas da década de 1930: O teu cabelo não nega, Linda morena, Rasguei a
minha fantasia, entre outras. Em alguns locais, a música regional se impôs, como
é caso do frevo em Recife. Apesar de algumas peculiaridades, esse ritmo é muito
próximo da marchinha, sendo bem aceito em outras regiões. O samba-enredo, que
é o gênero característico dos desfiles das escolas de samba até hoje, cristalizou-se
em 1937, com um decreto “que obrigava as escolas de samba a imprimir ao seu
enredo um caráter didático, patriótico e histórico” (KRAUSCHE, 1983, p. 50).

FIGURA 42 – CHIQUINHA GONZAGA (1847-1935): FOI MAESTRINA, COM-


POSITORA E PIANISTA. ENTRE SUAS COMPOSIÇÕES ESTÁ “Ô ABRE ALAS”,
MARCHINHA DE CARNAVAL CANTADA ATÉ NOSSOS DIAS

FONTE: <www.senado.gov.br/sf/senado/portaldoservidor/jornal/jornal106/
Espaco_cultural/cultura_ chiquinhagonzaga.aspx>. Acesso em: 17 ago. 2010.

3.2 DA ÉPOCA DE OURO À ERA DOS FESTIVAIS


Nas décadas de 1920 e 1930, tivemos a popularização do rádio, o que
contribuiu para que a música popular ganhasse cada vez mais espaço nos lares
brasileiros. Nessa época, destacaram-se importantes compositores como Noel
Rosa e Ary Barroso. Temos ainda Carmen Miranda e Francisco Alves como alguns
dos intérpretes que marcaram esse período. O título “época de ouro” é dado a
essa fase em virtude do grande número de artistas talentosos que aí surgiram.

77
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

FIGURA 43 – CARMEN MIRANDA: CANTORA E ATRIZ QUE DIVUL-


GOU A CULTURA BRASILEIRA NO EXTERIOR

FONTE: <www.fashionbubbles.com/historia-da-moda/identidade-
-brasileira-na-moda-anos-4>. Acesso em: 8 ago. 2010.

Também foi na década de 1930 que foram gravadas as primeiras modas de


viola, que são um tipo de canção rural. Nesse período, começaram a proliferar as
duplas caipiras (SEVERIANO, 2008).

Na década de 1940, a música nordestina ganhou destaque, em especial


o baião, que tem em Luis Gonzaga um de seus principais representantes. Nesse
mesmo tempo, se inicia o período de “exportação” de produtos musicais nacionais.
O estreitamento das relações com os Estados Unidos promoveu a introdução de
elementos da cultura brasileira e latino-americana naquele país. É importante
notar que o mercado norte-americano não absorvia, simplesmente, os elementos
culturais de outros países, mas acabava por estilizá-los, apresentando o que seria
pitoresco como algo exótico (KRAUSCHE, 1983, p. 58).

FIGURA 44 – LUIZ GONZAGA (1912-1989): É CONSIDERADO O “REI DO BAIÃO”

FONTE: <www.osortido.blogspot.com/2009_12_01_archive.html>.
Acesso em: 5 ago. 2010.

78
TÓPICO 2 | MÚSICA POPULAR

A cultura norte-americana também influenciava a música popular


brasileira, a introdução de elementos e instrumentos do jazz já se fazia notar
desde o final da década de 1920. Essa influência é bastante perceptível no samba-
canção, que é uma música mais lenta, lírica e com harmonia mais sofisticada que
a dos sambas até então conhecidos. Grandes compositores desse período foram
Lupicínio Rodrigues e João de Barro, entre outros (KRAUSCHE, 1983).

Em 1959, o disco “Chega de Saudade”, de João Gilberto, lança a bossa nova,


um estilo musical onde se integram a harmonia, melodia e ritmo, sem destaque
especial para apenas um destes elementos. A voz passa a ser utilizada sem
grandes contrastes de altura, soando próximo da voz falada. Tom Jobim e Vinícius
de Moraes, entre outros, são importantes representantes desse movimento
(KRAUSCHE, 1983). A bossa-nova é um dos ritmos brasileiros mais conhecidos
no mundo.

FIGURA 45 – CAPA DO DISCO QUE MARCA O INÍCIO DA BOSSA-NOVA

FONTE: <www.anos60files.wordpress.com/?archives-list=1>. Acesso em: 17


ago. 2010.

Na década de 1960, a televisão se popularizou em solo brasileiro, e


através de programas como “O Fino da Bossa” e “Jovem Guarda” apresentou ao
país artistas que viriam a se consagrar na música popular brasileira, como Elis
Regina e Roberto Carlos. Nessa nova fase, a bossa-nova passa por um processo
de descaracterização, voltam a fazer parte das músicas os contrastes vocais e
surge uma postura mais “teatral” por parte de alguns artistas. Nesse período, a
produção musical precisa se submeter à censura e passa cada vez mais a atender
as exigências da indústria cultural (KRAUSCHE, 1983).

Outro elemento importante para a cultura musical do país na década


de 1960 foi a realização dos festivais de música popular brasileira, também
apresentados na TV. O festivais revelaram grandes nomes da música como Milton
Nascimento, Caetano Veloso e Chico Buarque de Holanda, entre muitos outros.
79
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

FIGURA 46 – CHICO BUARQUE DE HOLANDA NO III FESTIVAL DE MÚSICA POPULAR BRASILEI-


RA, EM 1967

FONTE: <www.cinema.uol.br/ultnot/reuters/2010/07/29/uma-noite-em-67-revive-final-de-festi-
val-de-musica.jhtm>. Acesso: 8 ago. 2010.

DICAS

Conheça mais sobre a era dos festivais através do filme Uma Noite em 67
(VídeoFilmes, 2010). Além de imagens dos festivais o documentário apresenta entrevistas
atuais com artistas que participaram daquele momento.

Ainda na década de 1960, um movimento que teve destaque foi a Jovem


Guarda, que tinha como ritmo característico o iê-iê-iê, “um subgênero inspirado
no rock dos Beatles, temperado por uma mistura com certas formas da canção
brasileira – inclusive a bossa nova [...] e que cultivava letras de romantismo ingênuo,
com salpicos de rebeldia” (SEVERIANO, 2008, p. 399). São nomes representativos
desse movimento: Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Wanderléa, Ronnie Von, Jerry
Adriani e grupos musicais como Os Vips e Renato e Seus Blue Caps.

80
TÓPICO 2 | MÚSICA POPULAR

FIGURA 47 – ROBERTO CARLOS, WANDERLÉA E ERASMO CARLOS APRE-


SENTARAM O PROGRAMA “JOVEM GUARDA” ENTRE 1965 E 1969

FONTE: <http://capitalsucessos.blogspot.com/2009/09/jovem-guarda.html>.
Acesso em: 8 ago. 2010.

3.3 DA TROPICÁLIA AOS DIAS ATUAIS


No fim da década de 1960, estilos musicais variados passam a conviver
no mercado brasileiro. Um marco desse período foi a Tropicália, movimento
vanguardista que rompeu com elementos tradicionais da música popular
brasileira. “Inspirado no Manifesto Pau Brasil, do poeta modernista Oswald
de Andrade, o Tropicalismo cria uma estética cuja combinação e contrastes
de elementos incluem a miséria, o passado, o desenvolvimento, a tecnologia
industrial, os movimentos musicais brasileiros, o subdesenvolvimento e a
paródia” (CALDAS, 1985, p. 64). A música Alegria, alegria de Caetano Veloso, ao
receber vaias e aplausos por apresentar elementos inovadores num dos festivais de
música brasileira é considerada um dos marcos iniciais do movimento.

Além das inovações musicais, os tropicalistas também chocavam o público


com suas performances provocativas. “O tropicalismo foi um movimento mais
discutido do que praticado, talvez pelo fato de ter ficado em evidência apenas
por curto período (setembro de 1967 a dezembro de 1968). É inegável, porém,
que exerceu alguma influência no trabalho de compositores e cantores [...] além
de contribuir para a amenização de preconceitos, como o existente contra os
instrumentos elétricos” (SEVERIANO, 2008, p. 385).

81
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

FIGURA 48 – CAPA DO DISCO TROPICÁLIA, UM DOS MAIS IMPORTANTES


PARA A HISTÓRIA DA MÚSICA POPULAR BRASILEIRA

FONTE: <www.blogs.estadao.com.br/luiz-zanin-/morreu-rogerio-duprat/>.
Acesso em: 9 ago. 2010.

A década de 1970 foi marcada pelo trabalho de artistas revelados nos


festivais de música popular brasileira e pela chegada de novos artistas. Houve
uma significativa expansão do regionalismo musical com o aparecimento de
Alceu Valença, Elba Ramalho, Djavan, Fagner, Kleiton e Kledir, entre outros.
Nesse período, com o declínio da Jovem Guarda e o fim dos Mutantes, o rock
brasileiro encontrou em Raul Seixas, Rita Lee, Erasmo Carlos e o grupo Secos e
Molhados seus maiores representantes (SEVERIANO, 2008).

FIGURA 49 – RITA LEE FOI UMA DAS INTEGRANTES DE “OS MUTANTES”, GRU-
PO MARCADO PELA IRREVERÊNCIA E CRIATIVIDADE NA FASE TROPICALISTA

FONTE: <www.pierdeipanema.com.br/galeria/tunel-do-tempo?page=1>.
Acesso em: 9 ago. 2010.

82
TÓPICO 2 | MÚSICA POPULAR

A década de 1980 trouxe nomes como Blitz, Barão Vermelho, Paralamas


do Sucesso, Lobão, Lulu Santos, entre outros representantes do BRock, “o roque
brasileiro dos anos 80” (SEVERIANO, 2008, p. 436). Nessa mesma década, o neo-
sertanejo (ou pop-sertanejo) é reconhecido através do sucesso de Chitãozinho e
Xororó, seguidos por diversas outras duplas. Ainda em 1980, o pagode se projeta
com o grupo Fundo de Quintal, Zeca Pagodinho e outros (SEVERIANO, 2008).

Em 1990, vemos o sucesso da axé-music, que é a junção da música dos trios


elétricos e a música dos blocos afro. Vários artistas que se destacaram naquela
época continuam fazendo sucesso nos dias atuais, como Daniela Mercury, Ivete
Sangalo, Asa de Águia e Chiclete com Banana (SEVERIANO, 2008).

É importante ressaltar que em nosso estudo procuramos identificar
alguns dos movimentos mais significativos de cada período, mas existe um
grande número de gêneros musicais e de artistas que não foram citados. Também
é importante lembrar que as datas apresentadas são aproximadas e que nem
sempre existiu ruptura de um período para outro, o panorama musical é sempre
composto por formas diversas de expressão musical.

É possível notar que nas últimas décadas a profusão de gêneros musicais


tem aumentado e nos dias atuais há incontáveis gêneros que surgem da fusão de
outros já existentes. Além dos gêneros apresentados, poderíamos ainda citar o rap,
funk, rock-pop, pop romântico e tantos outros. A facilidade de acesso à informação
nos dias atuais nos permite ouvir músicas de todos os gêneros, de diversos
lugares, das músicas mais antigas às mais recentes, com grande facilidade. A
tecnologia do século XXI nos proporciona o contato com “clássicos” da música
popular e com os lançamentos mais recentes. Convivem em nosso dia a dia a
moda de viola e o sertanejo universitário, o choro e o pagode, o samba-canção e o
rock. Há espaço e público, para todos os estilos.

4 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Muita coisa mudou na música do Brasil desde 1500. Mudaram as músicas,
os instrumentos e alguns dos objetivos pelos quais se faz e se ouve música.
Algumas músicas podem ter funções específicas, como em cerimônias religiosas
e momentos cívicos, outras têm função de entretenimento e há aquelas que
encontramos como pano de fundo para as atividades diárias e que muitas vezes
passam despercebidas.

Como nós professores devemos lidar com a variedade de preferências


musicais apresentada por nossos alunos? Em primeiro lugar é importante
respeitar a diversidade, valorizar a música que faz parte do cotidiano deles e
buscar não criar uma hierarquia entre os gêneros, afirmando que determinado
estilo é melhor que outros. Em segundo lugar, devemos buscar ampliar seu
universo musical, mostrando-lhes músicas de outras épocas, lugares e gêneros,
preferencialmente de maneira integrada com outros conteúdos.

83
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

Também é interessante refletir sobre o que orienta nossas preferências,


ou seja, novelas, programas de TV etc., e sobre os significados das músicas
que gostamos, muitas vezes cantamos sem prestar atenção no que a música
diz. O desenvolvimento do gosto, da sensibilidade estética, depende de nossas
vivências e experimentações, por isso a escola deve proporcionar experiências
enriquecedoras mesmo em relação aos objetos do cotidiano, no caso a música.
Deve também ampliar essas vivências oportunizando o contato com outras
formas musicais. Afinal, só podemos gostar daquilo que conhecemos.

84
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• A música popular é aquela feita pelo povo e também aceita pelo povo,
considerando as produções musicais que são essencialmente originadas na
vivência dos grupos culturais e a música produzida e veiculada comercialmente,
que acaba tendo grande aceitação pública.

• A música popular brasileira se originou da miscigenação das culturas indígena,


africana e europeia.

• O lundu, a modinha e o cateretê foram a base para o surgimento dos primeiros


gêneros musicais brasileiros.

• O tango brasileiro, maxixe e choro foram alguns dos primeiros gêneros


musicais brasileiros.

• Na década de 1930, temos a expansão do rádio e o surgimento de muitos


artistas talentosos, por isso esse período ficou conhecido como Época de Ouro.

• O lançamento do disco Chega de Saudade, em 1959, lança a bossa-nova, um dos


gêneros musicais brasileiros mais conhecidos no mundo.

• Na década de 1960, a Jovem Guarda e os Festivais de Música Popular Brasileira


movimentam o cenário musical do país e apresentam importantes nomes da
música brasileira.

• O Tropicalismo foi um movimento vanguardista que quebrou preconceitos e


influenciou o trabalho de muitos artistas.

• A partir da década de 1970, ganham destaque artistas de diversas regiões,


surgem muitos gêneros e subgêneros, não ficando mais um período histórico
marcado por um estilo musical preponderante.

85
AUTOATIVIDADE

1 Você já ouviu a música Garota de Ipanema? e Asa Branca? Por que será que
algumas músicas se tornam “clássicos” e outras são facilmente esquecidas?
Leia a seguir alguns trechos da música “A melhor banda de todos os tempos
da última semana” (TITÃS, 2001), relacione com o conteúdo estudado
e escreva sobre os possíveis motivos que levaram, nos últimos anos, a
um aumento significativo de músicas que fazem sucesso momentâneo e
passageiro.

Quinze minutos de fama


Mais um pros comerciais,
Quinze minutos de fama
Depois descanse em paz.

O gênio da última hora,


É o idiota do ano seguinte
O último novo-rico,
É o mais novo pedinte

A melhor banda de todos os tempos da última semana


O melhor disco brasileiro de música americana
O melhor disco dos últimos anos de sucessos do passado
O maior sucesso de todos os tempos entre os dez maiores
fracassos

Não importa contradição


O que importa é televisão
Dizem que não há nada que você não se acostume
Cala a boca e aumenta o volume então

Um idiota em inglês,
Se é um idiota, é bem menos que nós
Um idiota em inglês
É bem melhor do que eu e vocês

Os bons meninos de hoje


Eram os rebeldes da outra estação
O ilustre desconhecido
É o novo ídolo do próximo verão

86
2 A figura a seguir é uma charge sobre músicos populares, de 1946. Como
seriam representados os músicos populares da atualidade? Você pode criar
um desenho ou fazer uma descrição escrita.

FIGURA 50 – CHARGE DE BELMONTE PUBLICADA EM 25 DE MAIO DE 1946

FONTE: <www.almanaque.folha.uol.com.br/musicapopulardobrasil.htm>. Acesso


em: 17 ago. 2010.

3 Tente se lembrar de músicas representativas da sua vida aos 5, 10, 15, 20


anos, e assim sucessivamente. Faça uma lista, uma “trilha sonora” da sua
vida e compartilhe com seus colegas na próxima aula.

Assista ao vídeo de
resolução da questão 1

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UNIDADE 2 TÓPICO 3

ARTE E ARTESANATO

1 INTRODUÇÃO
Este tópico abordará as artes na Cultura Popular, tendo por foco as
artes plásticas. Vamos diferenciar arte de artesanato, já que artesanato é um dos
itens que compõem a Cultura Popular. Em seguida, traremos alguns exemplos
de artesanato, entre os quais focaremos: a cerâmica utilitária e a figurativa, os
trançados, as rendas e bordados, a pintura primitiva, entalhes, gravuras e por
fim, abordaremos a relação entre a Arte Popular e a Erudita.

Primeiramente, vamos esclarecer que optamos pelo termo Artes Plásticas,


pois, neste tópico consideraremos as formas visuais mais tradicionais, tanto
bidimensionais quanto tridimensionais de expressão, podendo ser uma peça
utilitária, de decoração ou de apreciação.

NOTA

O termo Artes Visuais é utilizado quando nos referimos às artes plásticas mais
as novas tecnologias (inserção da fotografia, da performance, videoarte etc.).

Quando discutimos acerca da diferença entre os termos arte e artesanato,


voltamos a entrar na divisão da Cultura Popular e da Cultura Erudita (termos já
discutidos na Unidade 1, Tópico 1). A definição de ambos os termos também é
cultural e pode ser diferente de acordo com a Cultura que realiza essa classificação,
portanto, não se espante se você encontrar bibliografias onde os autores realizam
outra classificação.

Os termos Arte Popular, Arte do Povo ou Artesanato consideraremos


como sinônimos.

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UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

2 ARTE X ARTESANATO

O autor de qualquer obra de arte ou artesanato não combina em vão ou


sem sentido os elementos da obra. “Todo o inventor, por genial que seja, é sempre
produto da sua época e do seu ambiente” (VYGOSTKY, 2009, p. 35), ou seja, para
produzir uma peça são necessárias as técnicas já criadas anteriormente pelos
homens, pois nenhum deles parte do zero, mas partem do que seus antecessores
descobriram e criaram.

Entendemos que, das relações apontadas entre Técnica, Material e


experiências culturais é que resulta a forma plástica, que poderá ser uma peça
de artesanato ou uma obra de arte, pois, materialmente falando, uma pintura
nada mais é do que uma tela e um pouco de tinta.

A forma plástica depois de pronta, caso seja legítima por instrumentos


aceitos culturalmente, como um museu, um crítico, ou tenha sua importância
histórica reconhecida, será considerado culturalmente como obra de arte. No
entanto, se a peça for produzida para um fim utilitário ou de decoração, essa
forma plástica será Artesanato, salvo exceção, no caso de, futuramente, o artesão
ser reconhecido pelo “mundo da Arte”, então, possivelmente, o trabalho após ser
legitimado passa a ser Obra de Arte e passa a ter um valor monetário maior.

A distinção entre Arte e Artesanato também denota a distinção de classes


sociais ou a separação da Cultura Popular e Erudita.

Observe o que acabamos de explanar no organograma a seguir:

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TÓPICO 3 | ARTE E ARTESANATO

FIGURA 51 – ORGANOGRAMA DO PROCESSO DE PRODUÇÃO DA ARTE E DO


ARTESANATO

FONTE: As autoras

“Essa oposição resulta da dicotomia elite e povo e remete à mesma


matriz que atribui às classes dirigentes, o saber, opondo-se-lhe o fazer,
necessariamente associado às camadas subalternas. Assim, supõe-se que
tudo que aquilo advém da ação das elites é resultante de um conhecimento
superior, é fruto do pensar, é o fazer artístico, negando-se às camadas
populares da sociedade a capacidade de pensar, a possibilidade de
conceber e se expressar racionalmente. A estas só resta o mero fazer. O
fazer artesanal”.

FONTE: Adaptado de Lima (2010)

Arantes (1988, p. 13-14) auxilia-nos a explicar essa diferença existente


entre o Artista e o Artesão:

[...] há um enorme desnível de prestígio e de poder entre essas


profissões, decorrente da concepção generalizada em nossa sociedade
de que o trabalho intelectual é superior ao material.

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UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

Embora essa separação entre modalidades de trabalho tenha ocorrido


num momento preciso da história e se aprofundado no capitalismo,
como decorrência de sua organização interna, tudo se passa como se
“fazer” fosse um ato naturalmente dissociado de “saber”.
Essa dissociação entre “fazer” e “saber”, embora a rigor falsa, é básica
para a manutenção das classes sociais, pois ela justifica que uns tenham
poder sobre o labor dos outros.

Todavia, não é apenas a legitimação que diferencia Arte de Artesanato.


Chiti (2003), aqui adaptado pelas autoras, definiu algumas características do
artesanato, que são:

a) Confecção Manual: a peça artesanal é confeccionada manualmente, podendo


ser realizada de forma individual ou em grupo. Podem-se usar ferramentas
ou equipamentos como: torno, polidores, soldadores etc., desde que estes
instrumentos sejam utilizados pelo artesão como auxiliares na fabricação das
peças. Caso passe por máquinas já não é mais artesanato, e sim, industrialização.
Até as ferramentas são fabricadas pelo artesão.
b) Funcionalidade: Toda peça artesanal serve para um fim prático, ou seja, tem
uma utilidade. Seus fins podem ser domésticos, de trabalho ou religiosos.
c) Produção em Série Artesanal: A confecção em série constitui outra característica
do artesanato. Isso significa que a peça artesanal nunca é concebida como
peça única. Por mais que uma peça tenha sido confeccionada em um número
limitado ou se tenha realizado apenas uma peça, a concepção operacional é
seriada, pois, ela pode ser facilmente repetida, o que não se pode repetir com
um poema, quadro ou com uma escultura artística.
d) Intenção decorativa: Nas peças artesanais, há sempre a intenção de agradar,
adornar, por mais função utilitária que estas tenham.
e) Caráter de objeto: são peças facilmente transportadas e de porte pequeno ou
médio.
f) Durabilidade: são peças que por serem utilitárias, são produzidas para serem
mais fortes, duráveis.

“Artesanato é tudo o que é feito à mão, sem passar pela máquina.


Passou pela máquina já não é mais artesanato, e sim, industrialização.
Artesanato é a arte popular, a arte feita pelo povo. Até as ferramentas são
fabricadas pelo próprio artesão [...] A matéria-prima do artesanato também
deve ser da própria região onde reside e trabalha o artesão”.

FONTE: Ortencio (2004, p.131)

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TÓPICO 3 | ARTE E ARTESANATO

Para que você tenha uma melhor clareza dessa diferença e não confunda
peças de Arte (Cultura Erudita), de Artesanato (Cultura Popular) e peças
industriais (Cultura de Massa), elaboramos o seguinte quadro comparativo entre:

QUADRO 1 – COMPARATIVO ENTRE ARTE, ARTESANATO E INDÚSTRIA

ARTE ARTESANATO INDÚSTRIA


Peça única Pequenas séries Grande produção
Produção manual Produção manual ou Produzida a máquina
semimanual
Trabalho pessoal Trabalho pessoal ou em grupos Grandes fábricas
comunitários
Destino: elites Restringe-se à comunidade Consumo de massa
Fim: expressão, Fim: função decorativa ou Fins múltiplos
ascensão social. funcional
Não é destinada Venda direta ao consumidor ou Venda induzida pela
à venda, pode ser venda em associações ou feiras publicidade
leiloado ou ter um
preço fixo
Preço: alto Preço: baixo Preço relativamente
baixo
Mudanças neste Mudanças são lentas, pois, Mudanças aceleradas,
campo são rápidas mantêm-se a tradição seguindo a demanda do
mercado
Tendência: Tendência: tradicional Tendência: consumista
vanguardista
FONTE: Adaptado de Chiti (2003)

2.1 O ARTESANATO NO BRASIL


Os primeiros artesãos no Brasil foram os indígenas que produziam as
peças para fins místicos, utilitários ou estéticos. Os indígenas já trançavam com
fibras naturais (cestarias, redes, esteiras), fabricavam peças de cerâmica e usavam
os corantes naturais na pintura das peças. Além das peças utilitárias, produziam
cocares, colares e pulseiras na ornamentação dos corpos.

Com a chegada dos jesuítas ao Brasil, no Período Colonial (1549-1808), foram


introduzidas técnicas trazidas da Europa e o artesanato passou a ser confeccionado
por artesãos europeus, indígenas, escravos e jesuítas. Muitos materiais que apenas
no Brasil eram encontrados também passaram a serem usados.

No período colonial, o Brasil adotou o sistema e nomenclatura de trabalho


usado na Europa em que se constatava a diferenciação entre oficiais mecânicos
e artistas, sendo neste último incluídos os pintores, escultores, arquitetos e

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UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

engenheiros. Com as gradativas mudanças, outras nomenclaturas passaram a


serem adotadas, mas as diferenças permanecem (LIMA, 2010).

As peças artesanais revelam os usos e costumes de uma determinada


comunidade ou região. As técnicas usadas em sua produção geralmente são
perpassadas por gerações, por isso, o artesão é um grande guardião de técnicas
artísticas. Alguns artesãos costumam assinar suas peças, outros preferem marcar
com carimbos, mas o mais comum é não assinarem.

Atualmente, o artesanato garante o sustento de muitas famílias e


comunidades, que, por incentivo de organizações governamentais ou não,
têm se fortalecido com a criação de associações. Por isso, é comum nas feiras
municipais encontrarmos artesãos vendendo as peças que produzem diretamente
à comunidade ou por intermédio de associações.

Por trabalhar por conta própria e não ter um patrão, o artesão, se assim
optar, pode contribuir como autônomo para o INSS – Instituto Nacional do
Seguro Social, e terá direito aos benefícios oferecidos pela instituição.

FIGURA 52 – FEIRA DE PEÇAS CERÂMICAS EM MARAGOGINHO/BA

FONTE: <http://www.cnfcp.gov.br/pdf/CatalogoSAP/CNFCP_sap155.pdf>. Acesso


em: 6 ago. 2010.

Segundo o Decreto n° 7.212, de 15 de junho de 2010, que regulamenta a


cobrança, fiscalização, arrecadação e administração de Imposto sobre Produtos
Industrializados – IPI, a produção e a venda de peças artesanais estão livres da
arrecadação de impostos conforme o artigo 5º, inciso IIII:

Art. 5o  Não se considera industrialização:


[...] III - a confecção ou preparo de produto de artesanato, definido
no art. 7º;

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TÓPICO 3 | ARTE E ARTESANATO

Já, o artigo 7º explica o que o decreto considera como produto de artesanato:

Art. 7º Para os efeitos do art. 5o:


I - no caso do seu inciso III, produto de artesanato é o proveniente
de trabalho manual realizado por pessoa natural, nas seguintes condições:
a) quando o trabalho não contar com o auxílio ou a participação de terceiros
assalariados; e
b) quando o produto for vendido a consumidor, diretamente ou por
intermédio de entidade de que o artesão faça parte ou seja, assistido.

O artesanato brasileiro tem tido grande aceitação no mercado internacional,


principalmente com os produtos de decoração e de vestuário. Alguns estilistas,
entre os quais podemos citar Ronaldo Fraga, se inspira nas peças de artesanato
na criação de suas coleções.

As técnicas artesanais que citaremos a seguir são as mais tradicionais e que


conforme análises são caracterizadas como folclóricas. No entanto, a produção
de casacos de tricô, a produção de bijuterias como pulseiras, colares e brincos
também são produções artesanais, porém populares. Lembre-se das nossas
discussões sobre folclórico e popular no início desta Unidade!

3 CERÂMICA

3.1 CERÂMICA UTILITÁRIA


A produção da cerâmica é mais intensa na região Norte e Nordeste, sendo
fabricada em menor escala também na região Sudeste. As argilas utilizadas
como matéria-prima para a produção da cerâmica é a argila preta, caulim e o
tauá amarelo. A variedade de objetos utilitários é imensa, sendo mais comum a
produção de xícaras, panelas, pratos, vasos, luminárias etc. (TIRAPELLI, 2006).

Os artesãos que produzem peças de cerâmica utilitárias são chamados de


oleiros. A argila, geralmente é amassada manualmente, no entanto, há exceções
como veremos a seguir. As peças costumam ser queimadas em forno artesanal e
a pintura realizada com tintas naturais.

Cada localidade produz peças peculiares, tanto no resultado final da


peça, como em seu processo de produção. Em São Paulo, no litoral, as paneleiras
continuam a fabricação das panelas com tradição indígena. Já em Cunha, no Vale
do Paraíba, o forte é a cerâmica artística e utilitária com novas técnicas de queima.
(TIRAPELLI, 2006).

As “Paneleiras de Goiabeiras” são conhecidas em todo país pela produção


de panelas utilizadas no preparo da famosa moqueca capixaba. A técnica por elas

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UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

usadas (a maioria mulheres), perpassa gerações, pois, é a mesma utilizada pelos


índios antes da chegada dos europeus. O galpão onde funciona a associação e
onde as paneleiras produzem as peças é um dos principais pontos turísticos da
capital do Espírito Santo.

FIGURA 53 – PANELAS CAPIXABAS, PRODUZIDAS PELAS PANELEIRAS DE GOIABEIRAS

FONTE: <http://www.ceramicanorio.com/artepopular/paneleirasgoiabeiras/pane-
leiras.htm>. Acesso em: 30 jul. 2010.

DICAS

O processo mostrado a seguir, bem como mais detalhes acerca da


cerâmica na Arte Popular no Brasil, podem ser encontradas acessando o site: http://www.
ceramicanorio.com. Lá você também será direcionado a vídeos sobre o tema.

A seguir, mostraremos os passos para a produção de louças usadas pelos


oleiros de Coqueiros na Bahia.

FIGURA 54 – ARTIFÍCIO INUSITADO, USADO PELAS CERAMISTAS


NO PREPARO DO BARRO

FONTE: <http://www.ceramicanorio.com>. Acesso em: 31 jul. 2010.

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TÓPICO 3 | ARTE E ARTESANATO

UNI

Veja, na figura anterior, o artifício usado pelas ceramistas no preparo do barro.


Espalhado na rua, em frente as suas casas, o material é amassado e moído pelas rodas dos
veículos — caminhões e carros que trafegam no local. Após é peneirado e hidratado ficando
pronto para ser modelado.

FIGURA 55 – ARTESÃ MODELANDO

FONTE: <http://www.ceramicanorio.com>. Acesso em: 31 jul. 2010.

FIGURA 56 – VÁRIAS DEMAIS DE ENGOBE (TAUÁ), DÃO A COR AVERME-


LHADAÀS PEÇAS. FOTO: ROSANGELA CORDARO

FONTE: <http://www.ceramicanorio.com>. Acesso em: 31 jul. 2010.

97
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

FIGURA 57 – QUEIMA DA CERÂMICA PARA SECAGEM

FONTE: <http://www.ceramicanorio.com>. Acesso em: 31 jul. 2010.

E
IMPORTANT

Na figura anterior, você viu que a queima da cerâmica é realizada a céu aberto,
prática indígena bastante primitiva, em fogueiras com as peças empilhadas umas sobre as
outras. A combustão é feita com gravetos, lenha e bambu.

FIGURA 58 – PEÇAS PRONTAS

FONTE: <http://www.ceramicanorio.com>. Acesso em: 31 jul.


2010.

3.2 CERÂMICA FIGURATIVA


A cerâmica figurativa geralmente recria cenas do cotidiano e de
personagens típicos da região em que são produzidos. Essas peças de cerâmica
são confeccionadas principalmente na região Nordeste e facilmente encontradas
à venda em feiras.
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TÓPICO 3 | ARTE E ARTESANATO

O artesão mais representativo da cerâmica figurativa foi Mestre Vitalino,


da Cidade de Caruaru – PE. Em suas peças, costumeiramente retratava os usos e
costumes do homem nordestino. Seu trabalho teve uma grande aceitação, o que
acabou repercutindo no trabalho de outros artesãos que passaram a copiá-lo. As
cópias eram uma lisonja e nunca incomodaram o mestre, tanto que hoje na região
onde Vitalino morava, em Alto do Moura – PE (perto de Caruaru), há muitos
artesãos que com ele aprenderam as técnicas e hoje, produzem peças seguindo
a mesma linha, sendo intitulados de discípulos de Vitalino. A cidade ficou tão
famosa pelos artesãos figureiros que Alto do Moura é considerada pela UNESCO
como o maior Centro de Arte Figurativa das Américas (WANDECK, 2010).

FIGURA 59 – A CENA RETRATADA EM CERÂMICA

FONTE: <http://www.ceramicanorio.com>. Acesso em: 31 jul. 2010.

NOTA

A cena da figura anterior retrata “Gatos maracajás trepados numa árvore,


acuados por um cachorro, e embaixo o caçador fazendo pontaria com a espingarda”.
Produzido por Mestre Vitalino.

No Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, são produzidas as famosas


bonecas que retratam a vida feminina que chama atenção pelas expressões dos
rostos e pelas dimensões.

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UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

FIGURA 60 – ARTESÃO DO VALE DO JEQUITINHONHA/MG PRODUZINDO


BONECA E AS MAIS VARIADAS BONECAS JÁ PRONTAS

FONTE: <http://www.cnfcp.gov.br/pdf/CatalogoSAP/CNFCP_sap159.pdf>.
Acesso em: 6 ago. 2010.

E
IMPORTANT

Mais detalhes sobre cerâmica popular ou folclórica você pode encontrar nos
Livros de Gêneros e Técnicas de Escultura, Modelagem e Cerâmica.

4 TRANÇADOS
Os indígenas já trançavam as fibras antes mesmo da chegada dos europeus.
Os materiais podem ser os mais variados, sendo mais popular realizá-los a partir
de fibras. As fibras mais usadas são juta, taboa, cipó, bambu e folhas de palmeira.
Entre os objetos que podem ser obtidos a partir deste trançado estão as cestas, as
redes, balaios, chapéus, peneiras, assentos de cadeira, esteiras e outros.

Atualmente, muitos artesãos reaproveitam materiais na fabricação de


peças como jornais, sacolas plásticas e garrafas pet.
100
TÓPICO 3 | ARTE E ARTESANATO

FIGURA 61 – ARTESÃO TRANÇANDO

FONTE: <http://www.cnfcp.gov.br/pdf/CatalogoSAP/CNFCP_sap157.pdf>.
Acesso em: 5 ago. 2010.

FIGURA 62 – PALHA DE TABOA

FONTE: <http://www.turismo.al.gov.br/sala-de-imprensa/galeria-de-imagens>.
Acesso em: 31 jul. 2010.

5 RENDAS E BORDADOS
As rendas e bordados estão presentes em roupas, lenços, toalhas e outros
artigos, tendo um importante papel econômico nas regiões Norte, Nordeste e Sul.
As técnicas mais usadas são as rendas de bilros, o filé e os bordados de crivo. A
matéria-prima é a linha de algodão que é sempre branca; outra cor somente por
encomenda. Diz-se popularmente que onde se faz renda, faz-se rede e há pesca;
na maioria dos casos esta frase é condizente, pois, as rendas têm uma maior
presença no litoral e na beira de rios e lagos.

A chamada renda de bilros, também chamada de renda de almofada


ou renda da terra, é desenvolvida pelas mãos das rendeiras que utilizam uma
almofada, com enchimento de folhas de bananeira, de capim, de algodão ou de
barba de velho (em Santa Catarina). O trabalho é feito sobre uma almofada, onde
se fixa o papelão já desenhado com o modelo da renda. Alguns destes motivos
são exclusivos de uma família e perpassam gerações. Já, os bilros são os pedaços
de madeira onde se enrolam os fios que permitem o trançado, a quantidade de
bilros pode variar de 12 a 124 bilros, dependendo do tamanho do trabalho.
101
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

FIGURA 63 – RENDA DE BILROS. FOTOGRAFADO NO CENTRO DAS RENDEIRAS


DE AQUIRAZ - CEARÁ - BRASIL

FONTE: <http://br.olhares.com/renda_de_bilro_foto1974018.html>. Acesso em:


30 jul. 2010.

Já o filé é uma espécie de tecido rendado feito à agulha. Possivelmente,


essa técnica já era utilizada por egípcios e persas e foi trazida para o Brasil pelos
portugueses, assim como a renda de bilros. Primeiramente, no bastidor é montada
uma grade com fios de algodão, em seguida essas grades são preenchidas com
motivos criados pelas bordadeiras.

Olê, muié rendeira,


Olê, muié rendá.
Tu me ensina a fazê renda,
Que eu te ensino a namorá.

FIGURA 64 – ARTESÃ ALAGOANA PRODUZINDO UMA PEÇA COM A RENDA FILÉ

FONTE: <http://www.turismo.al.gov.br>. Acesso em: 31 jul. 2010.

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TÓPICO 3 | ARTE E ARTESANATO

O bordado de crivo, também chamado de labirinto, é feito sobre um tecido


e este é cortado, sendo que no corte é realizado o bordado.

FIGURA 65 – BORDADO DE CRIVO OU LABIRINTO

FONTE: <http://www.cnfcp.gov.br/pdf/CatalogoSAP/CNFCP_sap156.pdf>. Acesso


em: 2 ago. 2010.

Há também outros trabalhos manuais populares como crochê, tricô, ponto


cruz e vagonite.

6 PINTURA PRIMITIVA
São realizadas por pessoas da comunidade que pintam pelo simples gosto
de pintar, são autoditadas ou seja, não têm formação acadêmica e aprendem
sozinhas.

As pinturas têm as características de não apresentarem perspectiva, nem


grandes nuances de cor, as cores são alegres e alguns desenhos (padrões) se
repetem. Os temas geralmente são do local em que vivem ou dos costumes da
comunidade.

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UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

FIGURA 66 – ARRAIÁ, ACRÍLICO S/TELA. 40X 50. PINTURA DA CEARENSE


ERMELINDA

FONTE: <http://www.cnfcp.gov.br/pdf/CatalogoSAP/CNFCP_sap160.pdf>.
Acesso em: 17 ago. 2010.

7 ENTALHE
O entalhe demanda tempo e paciência, pois trabalha com a retirada ou
corte de materiais até obter a forma desejada. Os pedaços retirados em excesso
ou a quebra do material faz com que o artesão tenha que adaptar ou até mesmo
mudar sua ideia inicial. Os materiais mais usados no entalhe são: a madeira e a
pedra.

As madeiras mais usadas são as leves e fáceis de trabalhar, na escolha


do material leva-se em consideração a cor e os veios para o entalhe. O cedro e o
mogno são as madeiras mais usadas para esculturas.

Entre os artesãos no cenário nacional que ficaram conhecidos pelos


trabalhos em madeira estão Arthur Pereira e Geraldo Teles de Oliveira, ambos
autodidatas e mineiros.

Já, entre as pedras, a mais utilizada no Brasil para a fabricação de peças


artesanais é a pedra-sabão, encontrada no centro-oeste do Brasil.

104
TÓPICO 3 | ARTE E ARTESANATO

FIGURA 67 – ENTALHE NA MADEIRA

FONTE: <http://www.cnfcp.gov.br/pdf/CatalogoSAP/CNFCP_sap157.
pdf>. Acesso em: 5 ago. 2010.

FIGURA 68 – ESCULTURAS EM MONOBLOCOS DE MADEIRA

FONTE: <http://www.divirta-se.uai.com.br>. Acesso em: 4 ago. 2010.

UNI

Na figura anterior, Arthur Pereira realiza esculturas em monoblocos de madeira.


Os temas que caracterizam seus trabalhos são os relacionados à vida no campo.

105
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

E
IMPORTANT

A pedra-sabão nos remete ao Barroco Mineiro, pois é o material utilizado em


objetos, esculturas, altares, acabamento de portas e janelas. Tendo nas mãos de Aleijadinho
se eternizado.

8 GRAVURAS
Junto à literatura, floresceu a xilogravura (gravura realizada na madeira)
para a ilustração dos livretos de cordel.

Os textos e os livretos são elaborados e expostos em cordas nas feiras,


tendo aí, a origem de seu nome – Literatura de Cordel. A maioria das gravuras
são impressas em preto e branco.

J. Borges era cordelista, mas o que fez sucesso em seus livretos não foram
os versos, mas as ilustrações das capas, o que o deixou conhecido como uma das
maiores expressões da gravura popular.

FIGURA 69 – CAPA DE UM LIVRETO DE CORDEL, CUJO AUTOR É J. BORGES

FONTE: <http://www.pr.gov.br/mon/exposicoes/j_borges_fotos.html>.
Acesso em: 4 ago. 2010.

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TÓPICO 3 | ARTE E ARTESANATO

9 A ARTE POPULAR E ERUDITA


A Arte Popular e a Erudita ora se entrelaçam nos temas e soluções
plásticas, uma alimento a outra. Não é difícil encontrar estilistas que formam
parcerias com artesãs na elaboração de coleções, nem artesãos que produzem
suas peças inspirados por obras ou acontecimentos eruditos.

Arte e artesanato se relacionam e um constantemente dialoga com o outro.


Ambos também podem ser analisados sob os aspectos da arte (cultural, histórico,
estético, semiótico etc.).

Durante todo o tópico, você deve ter percebido que citamos artesãos
que se destacaram com as peças de artesanato que produziam e que hoje são
chamados de artistas e suas peças integram museus. Há até mesmo espaços que
se dedicam somente a isso. Havendo oportunidade, não deixe de visitar o Centro
Nacional de Folclore, localizado no Rio de Janeiro que dispõe de vários espaços
como o Museu de Folclore Edison Carneiro, a Sala do Artista Popular e a Galeria
do Mestre Vitalino.

O Modernismo brasileiro pode ser tomado como exemplo de movimento


artístico que motivado por temas nacionalistas, calcados nas crenças, festas e
costumes se firmou na história da arte brasileira. A modernista Tarsila do Amaral se
inspirou em temas populares na criação de suas telas, entre os quais está “Carnaval
em Madureira”, “Urutu”, “Feira”, “A cuca”, entre outros.

DICAS

Acesse o site: http://www.tarsiladoamaral.com.br e conheça as obras de Tarsila


do Amaral.

10 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Nossa intenção não é elevar a arte ou artesanato e colocar assim um deles em
detrimento do outro, mas mostrar que ambos merecem respeito e que mutuamente
se comunicam/dialogam.

Na escola, o professor de Artes, ao atuar como um mediador pode criar


situações para que os estudantes atribuam sentido à arte, bem como ampliar o seu
repertório cultural, já que nem todos têm acesso a museus, galerias, exposições,
mostras, contato com artistas ou viagens culturais. Sob essa perspectiva, é
fundamental que o professor esteja ciente de que “é o organizador do meio social
educativo, o regulador e o controlador de suas interações com o educando”
(VYGOTSKY, 2003, p. 76).

107
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

LEITURA COMPLEMENTAR

ARTESANATO: CINCO PONTOS PARA DISCUSSÃO

Ricardo Lima
[...]

Como pesquisador do Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular,


onde coordeno a Sala do Artista Popular, lido com um tipo de artesanato que é
muito conhecido como artesanato tradicional ou de raiz. Um tipo de objeto que
traz em si a expressão de sua própria origem, que traz condensada em si a marca
forte da cultura, um objeto capaz de traduzir uma identidade, sua e daquele que
o produziu, seja um indivíduo ou uma coletividade.

A condição de expressar flagrantemente uma identidade cultural dá a essa


classe de objetos uma tremenda vantagem quando colocado frente a frente com
outras categorias na disputa pelo mercado. Trata-se de um objeto que, a priori,
contém o preconizado valor agregado. Outras formas artesanais necessitam de
artifícios que lhes agreguem valor, pois são desprovidos de lastro cultural, de
referências da cultura, são muito à flor da superfície, não têm profundidade. O
artesanato tradicional traz isso de vantagem, a agregação do valor cultural. É um
bem que extrapola o domínio superficial. E se isso, por um lado é vantagem, por
outro, é uma tremenda desvantagem. Vai exigir uma sensibilidade extrema para
poder lidar com esse artesanato sem ferir os valores, os códigos de comportamento,
os saberes etc., que o portador desse saber, o artesão, detém.

E aí é que eu acho que reside o grande desafio desse programa: lidar com
o artesanato tradicional, valorizando o produto e seu produtor, promovendo a
transformação que viabilize melhores produtos e melhores condições de vida
para o artesão, sem contribuir para seu fracasso e consequente desagregação.

E é acerca desse tipo de objeto que orientei minha fala. Quero destacar
aqui alguns pontos. O primeiro é que:

O artesanato não é mera mercadoria e traz embutido em si, valores,


crenças, culturas.

Muitos de vocês devem conhecer a produção belíssima de presépios


feitos no Vale do Paraíba, em São Paulo. São presépios de pequenas dimensões,
modelados em barro, pintados com tinta xadrez e que não vão ao forno para
serem queimados. Por tradição, eles vêm de meados do século 17, quando os
franciscanos fundaram em Taubaté o Convento de Santa Clara. [...]

O interessante é que, junto aos personagens comumente encontrados nos


presépios, como São José, Maria, o Menino Jesus, os Reis Magos, os pastores, o
boi, o jumento, o galo e alguns outros definidos pela inventividade popular, no
presépio do Vale do Paraíba aparece uma figurinha que é descrita como sendo
108
TÓPICO 3 | ARTE E ARTESANATO

um gambá. Às vezes, a figura assemelha-se muito mais a uma raposa ou a um


cachorro do que a um gambá. Mas, enfim, isso não importa porque, por toda a
região, é dito tratar-se de um gambá. E aí vem o ponto que nos interessa.

Contam os figureiros – assim é a denominação local para os artesãos que


modelam figuras de barro no Vale – que o gambá está ali no presépio porque
quando Jesus nasceu Nossa Senhora não tinha leite. A notícia logo se espalhou e
a gambá, que tinha acabado de parir, correu à gruta de Belém, para oferecer seu
leite. A notícia logo se espalhou e a gambá, que tinha acabado de parir, correu à
gruta de Belém, para oferecer seu leite. No entanto, porque era humana, Nossa
Senhora teve muito nojo do cheiro da gambá. Como ela iria dar aquele leite para
seu filho? Então, por causa do nojo extremo, ela recusou a oferta. Nossa Senhora
era também divina e, ao mesmo tempo em que rejeitou o leite, abençoou a gambá,
determinando que a partir daquela data a gambá não mais sentiria as dores do
parto. E, segundo a lenda, de fato isso aconteceu. A gambá é uma marsupial e os
filhos saem do útero ainda muito pequenos, transferindo-se para a bola externa,
na barriga da mãe, onde completam a gestação.

E isso é muito interessante porque integra o sistema de crenças tradicional


das populações daquela região. Quando uma mulher vai dar à luz, a parteira coloca
sobre a barriga dela uma pele de gambá, para que ela não sinta as dores do parto.
[...]

O segundo ponto é que:

Artesanato não é produto de máquina. Sendo manual, ele é irregular,


perfeitamente irregular.

Este é um pote de Passagem, pequena localidade à margem do curso médio


do Rio São Francisco, no município de Barra, na Bahia. Este pote apresenta estas
manchas, todas irregulares. Se houvesse sido feito pela indústria seria refugado
como objeto mal feito. No entanto, estas marcas podem ser lidas de outra forma.
Neste pote, as marcas na verdade não são defeitos, não são falhas. São marcas de
uma identidade cultural da maior importância não só para Passagem, para Barra,
para Bahia, para o Brasil, mas também para toda a humanidade. É prova do
processo de cozimento da peça, que foi queimada a céu aberto, em fogueira, um
modo de queima de uma tradição, de um saber milenar que já foi muito presente
no Brasil, nas Américas, na África, na Ásia.

[...]

O artesanato não é algo imutável.

O artesanato está sempre em processo de mudança. Para desenvolver esse


ponto, trouxe em minha maleta do convencimento peças de um outro projeto
coordenado pela equipe de pesquisadores do Centro Nacional de Folclore e
Cultura Popular, que são as cuias do município de Santarém, no Pará.

109
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

O Pará tem uma grande tradição na feitura desse tipo de cuia, muito
utilizada para se tomar tacacá e mingaus em geral, beber água, banhar no rio e
em mil outras utilidades na casa, especialmente em Belém, onde o produto era
retrabalhado e revendido, então, por preços majorados.

Toda essa questão foi analisada com as artesãs, discutindo-se com elas a
necessidade de retomarem o controle de todo o processo, do plantio da cuieira
à coleta da cuia, do tingimento com cumatê ao rascunho dos desenhos, enfim, o
domínio pleno do processo de produção até a comercialização das cuias. E parte
do plano traçado referia-se à recuperação dos padrões ornamentais abandonados
ao longo do tempo. Era importante que elas voltassem a criar seus próprios
rascunhos, pois eles tanto eram o elemento definidor da identidade social daquelas
comunidades e impulsionador da autoestima das mulheres quanto agregavam
valor ao produto que eles faziam. E elas aceitaram o desafio.

[...]

Junto a esse processo de resgate, de recuperação de padrões antigos que


a comunidade havia olvidado, agregamos coisa nova. Especialmente no Pará,
encontra-se muito em voga o emprego do grafismo indígena na decoração das
cuias. Propusemos então às artesãs que, em vez de usarem os padrões dos povos
xinguanos ou os desenhos carajá, distanciados da tradição cultural de Santarém,
e já que os grupos indígenas dali haviam sido dizimados, recuperassem os
padrões da cerâmica tapajônica, referência do passado da região. Foi feito então
um levantamento iconográfico em publicações sobre arqueologia que abordavam
o tema e no setor de arqueologia do MAE, em São Paulo, registrando padrões, para
que as artesãs, tendo acesso a eles, pudessem desenvolvê-los nos objetos que criam.

O material coletado foi incorporado aos desenhos tradicionais de cuias


também registrados.

Artesanato é ritmo, artesanato é tempo de produção.

Esta é uma grande questão para todos nós que resolvemos enfrentar
o desafio de equacionar o binômio artesanato e mercado. Lidando com a
comercialização, o mercado acaba por exigir uma continuidade de produção que
o artesanato muitas vezes não atende. [...]

Alguns de vocês já ouviram falar na comunidade de Berilo, um dos mais


conhecidos polos de produção de tecelagem no Vale do Jequitinhonha. Num
determinado ano, Berilo estava de peças para vender. Eram colchas, cobertas,
toalhas, caminhos de mesa, almofadas, enfim, a tecelagem tradicional que o
mercado dos grandes centros urbanos como Rio e São Paulo, ávido, aprendeu
a admirar e a consumir. E, lá no Vale, a população com fome, resultado do ano
de seca que matou a lavoura e as criações. Como em todo tempo de seca, uma
vez que a agricultura tornara-se inviável, restou tempo para o trabalho artesanal
e os estoques haviam crescido. Então, ao saber dessa situação, organizamos a

110
TÓPICO 3 | ARTE E ARTESANATO

toque de caixa uma exposição no Rio de Janeiro de modo que, com a venda da
produção, as consequências do flagelo pudessem ser minimizadas; conseguimos
levar todo o material e também quatro artesãs para a inauguração da mostra.

No dia da inauguração, tudo organizado, chegaram cansadas, mas, com


certeza, esperançosas de realizar boas vendas. Uma das primeiras providências
que tomei foi perguntar se não queriam telefonar para Berilo para dar notícia da
viagem. Quando ligaram, souberam que, mal haviam partido, começara a chover
sem parar. As mulheres simplesmente enlouqueceram: não queriam ficar ali,
paradas no Rio; queriam voltar de imediato para casa, porque eram as primeiras
chuvas do ano e, se elas deixassem passar essas chuvas, perderiam o tempo
de plantar. O tempo do milho e do feijão. Elas tinham que voltar porque eram
artesãs, mas eram também agricultoras.

Então, verifica-se que o artesanato, especialmente de zona rural, obedece


a um ciclo de chuva e seca, de tempo de plantio e tempo de fazer artesanato. Essa
tem sido para nós uma variável difícil de lidar. O mercado quer a encomenda que
não chegou, porque a artesã interrompeu a produção, parou para plantar o milho
e o feijão. E uma coisa que nenhum de nós quer é desagregar alguém da terra, e
temos, portanto, que descobrir formas de fazer o mercado entender isso.

[...]

Artesanato pressupõe autoria e, portanto, tem a ver com os direitos de


autor.

Esta é uma questão ainda muito pouco discutida no Brasil, especialmente


se estivermos falando de artesanato. Eu não sei até quando. Mas é bom que desde
já busquemos discutir os direitos de coletividade; como isso acontece, como se
dão, quem é o detentor dos direitos sobre padrões, modelos, criações etc. Muitas
vezes definidos como anônimos porque integram coletivamente o repertório
cultural de um grupo, esses saberes e expressões são patrimônio coletivo de uma
comunidade.

Em Santarém, discutimos com as artesãs que não usassem os padrões


xinguanos, Carajás etc. porque quem detém esses direitos são os povos do Xingu,
os Carajás. Mas elas teriam o direito de usar os padrões da cerâmica arqueológica
de Santarém, que é patrimônio daquele local.

E de novo o Pará nos oferece a matéria para pensar essa questão. Aqui
em minha maleta estão os brinquedos de Abaetetuba, mais conhecidos como
brinquedos do Círio de Nazaré, de Belém. Dentre eles, um dos mais conhecidos é
a cobrinha de miriti. A cobrinha apareceu uma vez numa novela de televisão. Um
dos atores era paraense e, numa ida a Belém, por ocasião do Círio, comprou uma
dessas cobrinhas. Retornando ao Rio, sugeriu ao diretor que, para compor melhor
seu personagem, um tipo infantilizado que morava num ferro-velho, ele brincasse
com a cobra. E durante vários capítulos ele apareceu brincando com a cobrinha.

111
UNIDADE 2 | ARTE POPULAR

Foi o suficiente para causar frisson no Brasil e todos queriam saber que cobrinha
era aquela, de que era feita, de onde vinha. Logo descobriram Abaetetuba e o
comércio queria encomendar milhares de cobras dos artesãos, que não tinham
condição alguma de produzir objetos naquelas proporções. Então foi acionada
uma indústria de São Paulo que, usando a cobrinha artesanal como protótipo,
criou uma cobrinha de plástico que hoje é vendida aos milhares pelas ruas de
Belém, por ocasião dos festejos do Círio, ao preço de R$ 1,00, concorrendo com a
cobrinha artesanal de miriti que custa R$ 4,00. E nunca se pagou um centavo de
direitos de autor. É bem verdade que esse tipo de direito não está regulamentado.
No Brasil, até hoje, há discussões para se criar uma legislação que proteja os
direitos coletivos, difusos, defendendo as comunidades e seus patrimônios
imateriais.

Penso que nós devemos urgentemente começar a discutir os direitos


patrimoniais. Acho que os objetos do Artesanato Solidário estão ganhando uma
expressão nacional grande, pela qualidade e por tudo que são. E em função disso
seus produtores - os artesãos – devem ter seus direitos resguardados.

Morei um tempo na Noruega e aquela cultura tem uma coisa muito


interessante: determinadas músicas nunca são aplaudidas. Na primeira vez em
que eu assisti a uma apresentação, eu aplaudi, e depois alguém me segredou:
“Essa música não se aplaude, porque é uma música de protesto, de denúncia das
condições sociais. Então todo mundo leva para casa para pensar”. E eu proponho
que façamos isso, levemos para casa e pensemos em todas essas questões.

FONTE: Adaptado de: <http://www.cnfcp.gov.br/pdf/Artesanato/Artesanato_5_ Pontos/CNFCP_


Artesanato_Gomes_Lima.pdf>. Acesso em: 17 ago. 2010.

112
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• A distinção entre arte e artesanato também denota a distinção de classes sociais


e a separação da Cultura Popular e Erudita.

• Artesanato é tudo o que é feito à mão, sem passar pela máquina. Passou pela
máquina já não é mais artesanato, mas industrialização.

• As características do artesanato são: confecção manual, funcionalidade,


durabilidade, caráter de objeto, intenção decorativa e produção em série
artesanal.

• O artesanato também pode ser classificado em folclórico e/ou popular.

• Os primeiros artesãos no Brasil foram os indígenas e posteriormente com a


chegada dos jesuítas foram introduzidas técnicas trazidas da Europa e o
artesanato passou a ser confeccionado por artesãos europeus, indígenas,
escravos e jesuítas.

• Segundo o Decreto n° 7.212, de 15 de junho de 2010, a produção e a venda de


peças artesanais estão livres da arrecadação de impostos.

• Mestre Vitalino foi um grande ceramista figurativo.

• Arte popular e erudita constantemente se relacionam, seja em museus, em


parcerias na produção de peças ou como inspiração.

• J. Borges é um gravurista que ficou conhecido por ilustrar capas de cordéis.

113
AUTOATIVIDADE

1 As pinturas Mulher Rendeira e Rendeira, respectivamente datadas em 1977


e 1967 foram elaboradas por Aldemir Martins. Pesquise sobre o autor das
pinturas e responda: Aldemir Martins é um artesão ou um artista?

FIGURA 70 – PINTURAS “MULHER RENDEIRA” E “RENDEIRA”

FONTE: <http://www.masp.art.br/exposicoes/2005/aldemirmartinsretrospectiva/>.
Acesso em: 16 ago. 2010.

2 Leia sobre alguns personagens fictícios e outros nem tanto, retirados do


artigo Artesanato e arte popular: duas faces de uma mesma moeda?, de Ricardo
Gomes Lima e, depois baseado nas discussões sobre arte e artesanato
realizadas neste tópico, discorra sobre o trabalho dos personagens.

a) Benita tem 40 anos e mora na comunidade de Candeal, no município


mineiro de Cônego Marinho. Lá, além de cuidar da casa, do marido e
dos filhos, dos animais domésticos e do pequeno roçado em que a família
planta principalmente milho, feijão e abóbora, ela faz louças de barro.
Modela peças que usa no trabalho doméstico e também vende para atender
à demanda da vizinhança e do mercado regional. São potes, panelas,
moringas e pratos feitos com o bom barro que ela, assim como outras
mulheres de sua comunidade, sabe reconhecer muito bem. Um saber
resultante do conhecimento que vem sendo transmitido geração após
geração pelas mulheres de seu grupo.

114
b) Gustavo Nogueira está feliz. Foram anos de tentativas após se formar
na Escola Superior de Desenho Industrial no Rio de Janeiro e passar por
um estágio em Milão, onde exercitou o olhar, estudou formas e estéticas
diversas. Agora, acaba de receber uma encomenda que pode mudar sua
vida. Finalmente, as joias que desenha e executa, uma a uma, chamaram
atenção de uma grande rede de joalherias que as quer nas vitrines de suas
lojas, espalhadas por importantes shoppings da cidade do Rio de Janeiro,
onde reside.

c) Paulo Aguiar dá mais uma pincelada. O vermelho da tinta parece saltar


sobre o fundo grafite da tela. Falta pouco para finalizar a pintura com que
pretende se inscrever no Salão de Artes Plásticas. No ateliê contíguo na
casa onde mora em Curitiba, sonha com o prêmio. Acredita que desta vez
irá consegui-lo, afinal a crítica vem sendo elogiosa com tudo que faz. Para
isso tem se esforçado. Desde que se formou na Escola de Belas Artes no Rio
de Janeiro vem aperfeiçoando o que aprendeu. Além da pesquisa de cores,
formas e volume, seu trabalho tem sido marcado pela busca do único.

d) Todo fim de tarde, Antonio Marques chega à praia de Iracema, em Fortaleza


e arma sua barraca. Ali, juntos a outros expositores, ele vende sandálias,
cintos, bolsas, prendedores de cabelo, pulseiras, porta-retratos, molduras
para espelho, caixinhas. Tudo feito em couro que ele amacia, corta, cola,
costura, decora com pirogravura, pinta e enverniza – etapas do processo
que vem aperfeiçoando há 40 anos. Desde que, ainda jovem, tornou-se
“hippie” e, contestando a sociedade de consumo, abandonou a vida de
classe média, escola e família em são Paulo e, mudando-se para praia de
Canoa Quebrada, adotou o que parecia a ele, e a muitos, uma maneira
alternativa de viver.

Assista ao vídeo de Assista ao vídeo de


resolução da questão 1 resolução da questão 2

UNI

Artigo disponível em:

http://www.cnfcp.gov.br/pdf/Artesanato/Artesanato_e_Arte_Pop/CNFCP_Artesanato_
Arte_Popular_Gomes_Lima.pdf.

115
116
UNIDADE 3

FOLCLORE

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir dos estudos desta unidade, você deverá ser capaz de:

• mencionar manifestações populares e folclóricas;

• conhecer como se dão os registros dos patrimônios matérias e imateriais;

• relacionar cultura e turismo;

• inserir temas da cultura popular em sua futura atuação docente.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – ARQUITETURA, RELIGIOSIDADE E LITERATURA POPULAR

TÓPICO 2 – FESTAS POPULARES E MÚSICA FOLCLÓRICA

TÓPICO 3 – PRESERVAÇÃO, TURISMO E PESQUISA

TÓPICO 4 – SALA DE AULA

Assista ao vídeo
desta unidade.

117
118
UNIDADE 3
TÓPICO 1

ARQUITETURA, RELIGIOSIDADE E
LITERATURA POPULAR

1 INTRODUÇÃO
Chegamos à última unidade do livro didático!

Esta última unidade complementa as anteriores. Nos dois primeiros


tópicos, continuamos expondo elementos da cultura popular e também do folclore.
Procuramos agrupar itens que em sua maioria se engradam como folclore, por
isso, você verá que são manifestações que sobrevivem a gerações e que apesar
das mudanças tecnológicas permanecem firmes e fortes. Você relembrará,
nestes primeiros tópicos, muitas brincadeiras, jogos, adivinhas, trava-línguas e
músicas que fizeram parte da sua infância. Será um momento de recordações e
aprendizado!

O tópico posterior abordará as manifestações culturais que são protegidas


pelo Patrimônio Cultural Brasileiro, a relação existente entre a cultura popular, o
turismo e a pesquisa folclórica.

Reservamos, também, um tópico em que trazemos possibilidades de


utilização da cultura popular em sua prática pedagógica. Esperamos que você
goste!

Então, vamos iniciar os estudos?

2 ARQUITETURA
A arquitetura popular, também chamada por algumas pessoas de
casa folclórica, é aquela em que as casas são construídas sem o projeto de um
engenheiro ou arquiteto. As construções variam desde casas para moradia,
até pequenas construções ao lado delas para guardar ferramentas ou animais.
Normalmente, há um “prático”, homem que conhece as técnicas e auxilia na
construção. Todavia, fique atento, pois qualquer construção sem autorização de
órgãos competentes pode lhe acarretar grandes prejuízos, tanto financeiros como
na segurança de seus familiares.

119
UNIDADE 3 | FOLCLORE

As técnicas e materiais mais usados na arquitetura popular podem variar,


mas os mais comuns são as casas de pau-a-pique ou taipa (entrelaçamento de
bambus ou madeiras e preenchimento com barro), de madeira e tijolos.

Nas grandes cidades ou em periferias, geralmente há as favelas onde


são construídos os barracos, pois se aproveitam os pedaços de terra disponíveis
em encostas de morro, em terrenos baldios ou alagados e margens de rios. Os
barracos, geralmente, são construídos com sobras de materiais velhos (papelão,
caixotes, tábuas, latas) ou de tijolos (sem reboco de cimento).

As palafitas são construções realizadas em rios, lagos ou riachos onde


as casas são sustentadas por troncos de madeira. Assim, evita-se que elas sejam
levadas quando o nível das águas sobe.

FIGURA 71 – CASA DE PALAFITAS NO NORTE DA AMAZÔNIA

FONTE: <http://www.trekearth.com/gallery/South_America/Brazil>. Acesso


em: 31 jul. 2010.

FIGURA 72 – CASA DE PAU A PIQUE OU TAIPA

FONTE: <http://www.arq.ufsc.br/arq5661/trabalhos_2004-1/arq_terra/pauapi-
que.htm>. Acesso em: 31 jul. 2010.

120
TÓPICO 1 | ARQUITETURA, RELIGIOSIDADE E LITERATURA POPULAR

FIGURA 73 – CASA DE MADEIRA EM CACHOEIRA DO PIRIÁ

FONTE: <http://oglobo.globo.com/economia/morarbem/fotogaleria/2010>.
Acesso em: 28 jul. 2010.

FIGURA 74 – CASA DE ALVENARIA EM ALCÂNTARA

FONTE: <http://oglobo.globo.com/economia/morarbem/fotogaleria/2010>.
Acesso em: 28 jul. 2010.

No sul do país, nas localidades de imigração alemã é comum ainda


encontrarmos caixas enxaimel, em que há madeiras que estruturam as casas e
são preenchidas com tijolos. O que mais chama atenção nessas casas típicas é a
inclinação do telhado que originalmente na Europa evitava o acúmulo de neve
durante os rigorosos invernos, mas que no Brasil apenas tem a função estética.

FIGURA 75 – CASA ENXAIMEL NA CIDADE DE TIMBÓ/SC

FONTE: As autoras

121
UNIDADE 3 | FOLCLORE

3 RELIGIOSIDADE
O Brasil é um país que apresenta as mais diversas religiões, no entanto,
o catolicismo continua a ter predominância. Percebe-se que a cada ano tem
aumentado o número de fiéis que migram para religiões derivadas do cristianismo.
Essa predominância religiosa deve-se principalmente à herança da colonização
europeia, conforme já explanamos na Unidade 1.

O Brasil, segundo sua Constituição, é um país laico, no entanto, alguns


feriados nacionais fixos e facultativos são de origem religiosa. Acompanhe a seguir:

• Sexta-feira da paixão (data móvel) – Paixão de Cristo (cristã).


• Quinta-feira Santa (data móvel) – (cristã)
• Corpus Christi (data móvel) - (católica).
• 12 de outubro – Nossa Senhora Aparecida (católica).
• 02 de novembro - Finados (cristã).
• 25 de dezembro – Natal (cristã).

Além de religiões que seguem o Cristianismo, como o Protestantismo,


Testemunhas de Jeová; há o espiritismo, o budismo, o islamismo, o judaísmo e
as religiões afro-brasileiras como o Candomblé. A quantidade de religiões que
poderíamos mencionar é enorme, mas nos deteremos apenas em algumas com que
podemos traçar um paralelo com conteúdos já explorados nas unidades anteriores.
Fique atento, pois alguns rituais religiosos são realizados em diferentes religiões.

No Brasil, a devoção aos santos é muito forte no catolicismo. Eles servem


como mediadores quando se quer falar com Deus e também nomeiam ruas, escolas,
bairros, cidades e estados, servindo também como agrupadores culturais.

Os santos mais cultuados pelo povo, geralmente, foram descobertos por


pessoas simples, leigas e de forma mágica.

“Uma estátua, ou um pequeno objeto, é miraculosamente encontrado


num canto do solo, numa fonte de água cristalina, numa poça também cristalina,
enfim. De imediato nem o padre, nem a Igreja intervêm na descoberta, que
passa a ser uma constatação predominantemente leiga frente à instituição
eclesiástica, mas que pertence, nas palavras do historiador Alphonse Dupront,
a “um povo fiel que se dá a si mesmo, antes da disciplina eclesiástica, o objeto
sacro de que tem necessidade” (NASCIMENTO, 2009, p.127).

Nossa Senhora Aparecida é um destes exemplos, pois, aproximadamente


em 1717, alguns pescadores pescavam no rio sem sucesso. Porém, em uma das

122
TÓPICO 1 | ARQUITETURA, RELIGIOSIDADE E LITERATURA POPULAR

vezes que jogaram a rede, pescaram a imagem da santa que representa Maria,
mãe de Jesus, e nas tentativas posteriores os peixes eram obtidos com abundância.
A imagem passou a ser venerada e sua fama se espalhou, tendo o Papa Pio XI
declarado a Santa como a Padroeira do Brasil. Hoje, o Santuário de Nossa Senhora
Aparecida é um dos principais destinos do turismo religioso no Brasil, recebendo
milhares de fiéis todos os dias. O feriado nacional do dia 12 de outubro, como
mencionamos anteriormente, também é dedicado a esta santa.

Cada santo é como um especialista em causas ou um protetor, por exemplo,


Santa Luzia é a protetora dos olhos, Santo Expedito é o das causas urgentes, São
Longuinho acha objetos perdidos e São Cristovão é o protetor dos caminhoneiros.

FIGURA 76 – PROCISSÃO, TARSILA DO AMARAL, 1941, ÓLEO SOBRE TELA, 50 X 61 CM, AS-
SOCIAÇÃO PAULISTA DE MEDICINA

FONTE: SANTA ROSA, Nereide Schilaro. Religiões e crenças. São Paulo: Moderna, 2001. 31p., il.

É comum artesãos fabricarem peças ligadas à religiosidade do povo, como


santos, cruzes, altares, amuletos e peças produzidas sob encomenda dos devotos.

123
UNIDADE 3 | FOLCLORE

FIGURA 77 – PIETÁ NEGRA. PEÇA EM TERRACOTA CONFECCIONADA


POR  NIELSON, CERAMISTA DE TRACUNHAÉM/PE. (SANTEIRO). 36
CM DE ALTURA, 2006. FOTO: RENATO WANDECK

FONTE: <http://www.ceramicanorio.com/artepopular.html>. Acesso


em: 30 abr. 2010.

Os devotos no Brasil criaram maneiras próprias de se relacionarem com


os santos. A sala dos ex-votos é um exemplo, pois lá ficam expostos os objetos,
cartas e fotos de pedidos ou milagres que foram realizados por intermédio dos
santos. Há quem mande esculpir em madeira ou faça a forma de um de seus
membros em parafina. Geralmente, os pedidos estão relacionados às doenças na
família, aprovação em vestibular e abandono de vícios.

“A pessoa faz a promessa, recebe a graça, que é o milagre, e


oferece em paga o ex-voto, que é um quadro, um desenho, uma fotografia
representando a graça recebida, ou, então, uma imagem ou peça, órgão do
doente esculpido em madeira, gesso, sempre encomendada a um santeiro
[...]” (ORTENCIO, 2004, p. 125).

Há também o pagamento de promessas que envolvem penitência e


sacrifício como: andar de joelhos até o altar, carregar pedras na cabeça, realizar
caminhadas de longas distâncias, voto de castidade, realizar doações aos carentes,
cortar o cabelo, deixar o cabelo ou a barba crescer, entre muitas outras promessas.

124
TÓPICO 1 | ARQUITETURA, RELIGIOSIDADE E LITERATURA POPULAR

FIGURA 78 – MUSEU DOS EX-VOTOS DE SERGIPE NO CONVENTO DE NOSSA


SENHORA DO CARMO

FONTE: <http://www.spagnollo.arq.br/fotos/v/urbanas/saocristovao/100_1119.jpg.
html>. Acesso em: 30 jul. 2010.

Candomblé é um culto africano trazido pelos escravos negros na época


do Brasil colonial. No candomblé existe um deus principal – olorum ou zambi (o
dono do céu). O filho desse deus, chamado de Oxalá, criou a humanidade. Em
seguida, estão os orixás (divindades, santos) que são Xangô, Oxum, Iasã, Iemanjá,
Oxumaré, Omolu, Nanã Barucu, entre outros. Cada divindade tem um santo
católico correspondente, por exemplo, Iansã é Santa Bárbara e Oxossi é São Jorge.

O objetivo principal do Candomblé é através do êxtase receber os santos


entre os homens. Segundo a crença, cada pessoa tem um orixá protetor. As
pessoas mais devotas podem ser possuídas por estes santos e são chamadas de os
“cavalos de santo”.

O local onde o culto do candomblé é realizado é denominado de terreiro,


e quem o dirige e coordena os cultos é o pai de santo ou a mãe de santo.

125
UNIDADE 3 | FOLCLORE

FIGURA 79 – TRÊS ORIXÁS. DJANIRA, 1966, ÓLEO SOBRE TELA, 129 X 193,5 CM, PINACOTE-
CA DO ESTADO DE SÃO PAULO

FONTE: SANTA ROSA, Nereide Schilaro. Religiões e Crenças. São Paulo: Moderna, 2001. 31p, il.

A pajelança é mais comum na Região Norte e sua origem é indígena.


Na base da pajelança está o Pajé que recebe o espírito de guias, de animais e de
seres fantásticos (como a cobra-grande). Para que o pajé receba o espírito faz-se
necessário um ritual, em que há danças, cantos e bebidas.

3.1 RITOS DE PASSAGEM


Há momentos na vida do homem que parecem apenas ter sentido se
forem celebrados. Esses momentos de celebrações marcam mudanças na vida
do indíviduo perante a comunidade a que ele pertence, dependendo da religião,
descendência e região.

Geralmente, após o nascimento, ainda na infância, há o batizado, mais


tarde, dependendo da religião, há a primeira comunhão e a crisma. Aniversários,
casamento e velório são ritos em que se realizam orações e em alguns destes ritos
há roupas específicas para serem usadas na ocasião.

126
TÓPICO 1 | ARQUITETURA, RELIGIOSIDADE E LITERATURA POPULAR

FIGURA 80 – ENTERRO. AUTOR: PORTINARI. TÉCNICA: ÓLEO SOBRE MADEIRA. MEDI-


DAS 24,5 CM X 33,5 CM

FONTE: <http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/782012-obra-de-portinari-e-devolvida-a-
-museu-em-pernambuco.shtml>. Acesso em: 22 ago. 2010.

4 CRENDICES E SUPERSTIÇÕES
Há diferenças entre crendice e superstição, fique atento!

“Crendice é crença em coisas infundadas e não aceitas pela ciência ou pelas


pessoas cultas. Afirmar, por exemplo, que existem entes sobrenaturais como
lobisomem, mula-sem-cabeça, Saci-Pererê, boiúna é crendice (ORTENCIO, 2004,
p. 141).

Já “Superstição é crença, ou melhor, sentimento religioso, baseado no


medo de acontecimentos desagradáveis. Seu intuito é predizer ou explicar
certos acontecimentos por meio de causas que estão ligadas a pretensas forças
sobrenaturais, em geral arbitrárias ou malignas, e não à razão” (ORTENCIO,
2004, p. 141). Megale (2000, p. 67) complementa essa definição afirmando que
“é tudo aquilo que o homem acredita, sem qualquer fundamento, apenas por
medo. Acredita em fatos ou seres que lhe dão sorte ou azar, que lhe fazem bem ou
mal, que lhe propiciam vantagens ou polarizam malefícios”. Em geral, associa-se
um acontecimento com futuras consequências, por exemplo, quebrar um espelho
trará sete anos de azar, passar debaixo de uma escada dá azar, quando se vê
apenas uma estrela no céu em pensamento fazer um pedido.

127
UNIDADE 3 | FOLCLORE

4.1 AMULETOS
São objetos no qual se acredita que trazem sorte e afastam o mal. Cada
amuleto tem um poder específico como atrair dinheiro, amor etc. No Brasil, os
amuletos mais conhecidos são o trevo de quatro folhas, escapulário, cruz, pata de
coelho, santinhos, ferradura, figa, fitinhas de santos, entre muitos outros.

Em geral, os amuletos são carregados junto ao corpo ou colocados em


lugares estratégicos nas casas, tudo depende do objeto e do poder atribuído a este.

FIGURA 81 – AMULETOS VARIADOS

FONTE: <http://ivanihbianco.blogspot.com/2010/07/amuletos-da-sorte-02.html>. Acesso


em: 31 ago. 2010.

4.2 SIMPATIA
“Simpatia é a palavra grega que significa sofrimento, paixão”
(ORTENCIO, 2004, p. 146). Segundo o autor, a simpatia tem duas conotações:
influência afetiva que algumas pessoas exercem sobre outras; e ritual místico que
é posto em prática, muitas vezes absurdo, como conseguir a atração de alguém, a
cura de algum mal ou doença.

Ainda, segundo Ortencio (2004, p. 146), o povo costuma confundir simpatia


com remédio:

128
TÓPICO 1 | ARQUITETURA, RELIGIOSIDADE E LITERATURA POPULAR

Se o produto for ingerido com finalidade de remédio, e não como


apenas crendice, é remédio e não simpatia. Exemplo: se a pessoa
estiver com gripe e dependurar ao pescoço, por um cordão, sete dentes
de alho, está fazendo simpatia; agora, se a pessoa fizar um chá com os
dentes de alho e tomar aí está usando remédio.

As simpatias mais comuns são as do ano novo que têm o intuito de trazer
paz, prosperidade ou amor. Entre as mais comuns estão: comer lentilha no jantar
antes da virada do ano, comer três uvas e guardar as sementes durante um ano
na carteira, jogar uma moeda ao mar, vestir-se com alguma peça de roupa na cor
amarela para prosperidade, se desejar paz na cor branca e se desejar amor na cor
rosa etc.

Há simpatias com as mais diversas finalidades como: soprar na testa três


vezes para crianças pararem de soluçar; achar objetos perdidos falando a seguinte
frase: “São Longuinho, São Longuinho seu eu achar a (dizer o objeto perdido)
dou três pulinhos”.

5 MEDICINA POPULAR
As benzedeiras, também conhecidas como rezadeiras ou curandeiras são
na maioria mulheres que conhecem vários tipos de oração e ritos para a cura
dos males físicos e espirituais das pessoas e dos animais. Elas geralmente são
associadas à religião católica, no entanto, há umbandistas e evangélicas. Apesar
da igreja não as reconhecer como parte integrante de seus ritos, elas integram o
catolicismo popular.

Geralmente, são utilizados elementos como ervas, óleos, água, fios ou


ovos, associando-os a uma oração. Todo o conhecimento por elas carregado
são acumulados com o tempo e perpassados por gerações. Acredita-se que esse
conhecimento tenha se iniciado a partir do conhecimento e da utilização de ervas
pelos indígenas, mais o conhecimento trazido pelos africanos, associado às rezas
e rituais católicos trazidos pelos europeus.

Dizem que os rituais de benzer só podem ser ensinados a pessoas da


mesma família, caso contrário, não têm valor e o benzedeiro que ensina pode até
perder sua força para benzer.

As benzeduras servem principalmente para tirar mal-olhado, curar


cobreiro, dor de barriga, arca-caída, dor de cabeça, dor de dente e facilitar parto.

129
UNIDADE 3 | FOLCLORE

FIGURA 82 – SENHORA BENZEDEIRA POR REGINALDO FRANCOLINO

FONTE: <http://novacasadorubens.blogspot.com/>. Acesso em: 31


ago. 2010.

5.1 ERVAS, RAÍZES E FRUTAS


Há algumas receitas para enfermidades que são passadas de pais para
filhos e são “tiro e queda” quando usadas, no entanto, fique atento, pois as receitas
de remédios caseiros jamais devem substituir os remédio receitados pelo médico.

Essas receitinhas antigas têm inspirado grandes laboratórios médicos e


pesquisas na descoberta e fabricação de novos remédios. O Brasil é um dos países
com a maior variedade de flora do mundo, portanto, é grande a quantidade de
remédio natural disponível no país, sendo que muito ainda há para se descobrir.

Alguns cuidados fazem-se necessários no consumo das plantas, pois


algumas quando consumidas em excesso causam intoxicações.

Os métodos mais comuns para preparar as ervas são:

• Infusão: as ervas são socadas e em seguida postas num recipiente com água
fervente. Ex.: Hortelã usado como digestivo e calmante.
• Decocção: é indicado para sementes, cascos de árvores e frutas mais duras,
como maçãs. Em uma panela contendo água, coloca-se as partes da planta e
leva-se ao fogo para ferver. Exemplo: camomila usada para cólica de bebês,
digestiva, calmante para cólicas menstruais e para enxaguar os cabelos claros.
• Cataplasma: ralar a planta ou raiz e acrescentar farinha de mandioca, fazendo
uma papa. Colocar sobre um pano limpo e cobrir a área machucada. Exemplo:
babosa para aliviar o inchaço de contusões.

130
TÓPICO 1 | ARQUITETURA, RELIGIOSIDADE E LITERATURA POPULAR

• Maceração: colocar as ervas, frutas ou raízes em molho, podendo ser água fria,
cachaça, álcool, óleo ou vinagre. Exemplo: alecrim aromatiza vinagres e óleos
usados na culinária.
• Xarope: ferver água com açúcar e juntar uma medida do suco da planta ou da
fruta (sendo uma de suco para cada cinco de água com açúcar) e continuar
fervendo. Exemplo: xarope de guaco combate a tosse.
• Suco: esmagar ou bater no liquidificador com água. Exemplo: suco de capim-
limão é usado como calmante e digestivo.

FIGURA 83 – A MAIOR INFLUÊNCIA NO CULTIVO E CONSUMO DAS PLANTAS MEDICINAIS


DEVE-SE AOS INDÍGENAS

FONTE: <http://www.plantasonya.com.br/hortas-e-medicinais/dicas-para-o-cultivo-de-ervas-medici-
nais-4.html> e <http://www.umbandaquerida.com.br/links/ervas.htm>. Acesso em: 31 ago. 2010.

6 LITERATURA POPULAR
A literatura popular pode ser oral como os mitos, lendas, provérbios,
parlendas, trava-línguas e adivinhas ou também pode ser escrita como a literatura
de cordel, os dísticos de caminhão e o pão por deus.

131
UNIDADE 3 | FOLCLORE

6.1 MITOS E LENDAS


As histórias contadas pelo povo, mesmo as mais “fantásticas” surgiram
com o homem do campo que desconhecendo outros lugares e as teorias da
ciência, imaginava como os seres haviam sido criados, como era o mundo além
de onde vivia e que alguns fenômenos naturais como a tempestade e trovão eram
acontecimentos atribuídos a seres fantásticos.

ATENCAO

Fique atento(a)! Mitos e lendas são diferentes!

Mitos são personagens sobrenaturais, fantásticos que não existem.


Geralmente, eles são associados a fenômenos naturais, ou seja, o homem diante
desses fenômenos cria os personagens, como maneira de justificá-los. Entre os
mitos brasileiros mais comuns estão: curupira, mula sem cabeça, lobisomem,
boitatá, saci, entre muitos outros.

Algumas histórias surgiram no Brasil, principalmente com os indígenas,


mas há algumas como a do lobisomem que já eram conhecidas na Europa e
foram trazidas para o Brasil.

Seguem alguns mitos:

• Boitatá: é uma cobra de fogo.


• Bruxa: a mais nova de sete filhas vira bruxa nas sextas-feiras, se transformando
numa velha enrugada que monta uma vassoura dando gargalhadas estrondosas
e sai voando, apavorando quem vê.
• Curupira: é um menino que tem os pés voltados para trás e que habita as
florestas. Quando pressente uma tempestade ou fortes ventos, ele procura
avisar toda a floresta para que resistam a eles.
• Lobisomem: é um homem que se transforma em um cão feroz durante a noite.
• Mula sem cabeça: mulher que se envolve com padre, vira mula sem cabeça. No
lugar da cabeça da mula há fogo e esta costuma aparecer apenas nas sextas-
feiras.
• Saci: menino negro com uma perna só, que usa capuz vermelho e fuma
cachimbo. Gosta de esconder objetos e dar nó em rabo de cavalo.

132
TÓPICO 1 | ARQUITETURA, RELIGIOSIDADE E LITERATURA POPULAR

Lendas são histórias associadas a homens e mulheres que se tornam heróis


e heroínas ou que seu surgimento é justificado por fenômenos naturais. A maioria
das lendas no Brasil tem origem indígena como a lenda da mandioca, da noite, da
vitória-régia, do açaí, do guaraná etc. Há, também, a lenda que surgiu no período
da escravidão como o Negrinho do Pastoreio.

A diferença principal entre o mito e a lenda está na narrativa, pois as


lendas contam uma história com início, meio e fim, enquanto que o mito apresenta
apenas as características dos personagens.

• Lenda da mandioca: conta a lenda que a filha de um cacique ficou grávida,


mas não era casada. O pai exigia que a filha contasse quem era o pai da criança,
mas a moça afirmava que jamais havia namorado. O cacique rogou em sua
própria filha uma praga, no entanto, durante o sono recebeu a visita de um
deus que disse para acreditar na filha. A índia deu à luz uma menina branca
que para espanto de todos já sabia andar e falar. Seu nome era Mani. Com um
ano de vida Mani morreu e foi enterrada dentro de sua oca. Todos os dias,
a mãe de Mani regava a terra onde a menina havia sido enterrada. Depois
de um tempo, no local onde Mani havia sido enterrada brotou uma planta
desconhecida. A tribo resolveu desenterrar Mani e enterrá-la em outro lugar,
mas após cavar apenas encontraram as raízes da planta. A raiz era marrom por
fora e branca, muito branca por dentro. Após cozinharem e comerem a raiz, os
índios viram que era um presente do Deus Tupã. Os indígenas deram o nome
de Manioca, por causa de Mani que nasceu dentro de uma oca, mas, hoje essa
raiz é conhecida como mandioca, macaxeira ou aipim.

6.2 DITADOS OU PROVÉRBIOS


São frases ou expressões que trazem algum conselho. Geralmente, falam-
se os provérbios quando se quer dar um conselho ou comentar sobre algo que
aconteceu, mas sem diretamente falar sobre o fato. Por isso, eles não devem ser
interpretados ao “pé da letra”.

Há quem diga que é a filosofia do povo, que em poucas palavras resume


um conselho, uma experiência de vida.

• Cavalo dado, não se olham os dentes.


• A esperança é a última que morre.
• A pressa é inimiga da perfeição.
• Aqui se faz, aqui se paga.
• Beleza não põe a mesa.
• Cada macaco no seu galho.
• Cão que ladra não morde.
• De boa intenção o inferno está cheio.
• De grão em grão, a galinha enche o papo.
• Pimenta nos olhos dos outros é refresco.

133
UNIDADE 3 | FOLCLORE

FIGURA 84 – MALUQUINHO E O CASAMENTO

FONTE: <http://ziraldo.blogtv.uol.com.br/tiras?p=3&ID_TAG=0&idBlog=127>. Acesso em: 31 ago. 2010.

6.3 DÍSTICOS DE CAMINHÃO


Os dísticos de caminhão também são chamados de ditados ou provérbios
e são mais populares entre os caminhoneiros e são escritos nos para-choques
dos caminhões. Há quem chame de filosofia de para-choque. Geralmente são
frases com teor humorístico, provérbios satirizados e que envolvem temas como:
estradas, caminhão, casamento, filhos, sogra, sexo e as mulheres em geral.

Segundo Ortencio (2004, p. 36), os caminhoneiros “são gente acostumada


com as dificuldades, vivendo mais tempo em viagem do que em suas casas,
morando praticamente nas cabines dos caminhões. Adquirem muita experiência
de vida e levam pelo Brasil inteiro, nas estradas e nas cidades, as suas filosofias”.

• Seja paciente na estrada para não ser paciente no hospital.


• Não mando minha sogra pro inferno porque tenho dó do diabo!
• Se ferradura desse sorte, burro não puxava carroça.
• Na vida tudo é passageiro, menos o motorista e o cobrador.
• Na subida paciência, na decida dá licença.
• Água mole em pedra dura, tanto bate... até que cansa!
• Mais vale um pássaro na mão do que bois voando.
• Quem tem boca vai a Roma. Meu fogão tem quatro e não saiu da cozinha.

134
TÓPICO 1 | ARQUITETURA, RELIGIOSIDADE E LITERATURA POPULAR

DICAS

Além das frases escritas nos para-choques de caminhão,


o livro Brasil das Placas de José Eduardo Camargo traz também
maneiras inusitadas que o povo cria para alertar, anunciar ou vender
um produto. O livro traz 89 fotografias divertidas dessas placas.

6.4 PARLENDAS
As parlendas eram ditas pelos pais e repetidas pelos filhos como forma
de testar ou continuar as frases. Como são fáceis de decorar, elas são populares
entre as crianças.

• Hoje é domingo
Pé de cachimbo
Cachimbo é de barro
Bate no jarro
O jarro é de ouro
Bate no touro
O touro é valente
Chifra a gente
A gente é fraco
Cai no buraco
Buraco é fundo
Acabou o mundo

• Dedo minguinho
Seu vizinho
Pai de todos
Fura bolo
Mata Piolho

• Chuva e sol, casamento


de espanhol.
Sol e chuva, casamento
de viúva.

• Eu sou pequena,
Da perna grossa,
Vestido curto,
Papai não gosta.

135
UNIDADE 3 | FOLCLORE

• Um, dois, feijão com arroz,


Três, quatro, feijão no prato,
Cinco, seis, falar inglês,
Sete, oito, comer biscoito,
Nove, dez, que bobo tu és.

6.5 TRAVA-LÍNGUAS
O trava-línguas, como o próprio nome diz, tem o objetivo de fazer com
que a pessoa fale corretamente a frase. As frases geralmente têm muitas sílabas
parecidas e que devem ser ditas rapidamente.

Agora, chegou a vez de desafiar de você! Tente falar as frases a seguir sem
enrolar a língua.

• Atrás da pia tem um prato, um pinto e um gato. Pinga a pia, para o prato, pia
o pinto e mia o gato.
• O tempo perguntou pro tempo quanto tempo o tempo tem, o tempo respondeu
pro tempo que o tempo tem o tempo que o tempo tem.
• O rato roeu a roupa do rei de Roma.
• O peito do pé do pai do padre Pedro é preto.
• Sabia que a mãe do sabiá não sabia que o sabiá sabia assobiar?
• Um tigre, dois tigres, três tigres.

Um ninho de mafagafa, com sete mafagafinhos, quem desmafagaguifá,


bom desmafagaguifador será.

6.6 ADIVINHAS
São perguntas em que quem pergunta já sabe a resposta e espera que o
outro adivinhe. Geralmente, as perguntas são pegadinhas, pois a resposta, por
vezes, está na pergunta. É considerada também uma brincadeira entre as crianças.

“As adivinhas constituem um método muito interessante para o


desenvolvimento da criança. Dão vivacidade e aguçam o raciocínio. Então,
adivinhas ou adivinhações são perguntas curiosas, sempre começando com o
tradicional “O que é, o que é” (ORTENCIO, 2004, p. 37).

Será que você adivinha? As respostas daremos logo a seguir!

a) O que é que o boi faz, quando o sol bate nele?


b) O que é o que é que sempre se quebra quando se fala?
c) O que é o que é feito para andar e não anda?

136
TÓPICO 1 | ARQUITETURA, RELIGIOSIDADE E LITERATURA POPULAR

d) O que é o que é que está sempre no meio da rua e de pernas para o ar?
e) O que é o que é que dá muitas voltas e não sai do lugar?
f) Qual é a carta que não leva recado? 

Respostas:

a) Sombra.
b) Segredo.
c) A rua.
d) A letra u.
e) O relógio.
f) A carta de baralho.

6.7 CORDEL
Nas feiras do nordeste, é comum encontrarmos bancas no qual há livretos
à venda. Esses folhetos tratam dos mais variados assuntos: política, lendas,
poesias, histórias envolvendo famosos, santos, heróis e até alertando sobre
direitos e deveres.

Sobre o cordel, já havíamos comentado anteriormente na Unidade 2,


quando falávamos sobre xilogravura. Por isso, volte lá e leia novamente para
recortar.

O mais interessante deste tipo de literatura é que ela sobrevive aos


avanços tecnológicos. É claro que até mesmo o cordel se modernizou, pois agora,
são impressos em gráficos, mas continuam sendo feito por pessoas simples e
sobrevivendo a gerações.

137
UNIDADE 3 | FOLCLORE

FIGURA 85 – FRENTE E VERSO DO FOLHETO DE CORDEL, SEGUIDO PELO INÍCIO DA HISTÓRIA.


ESTE CORDEL FOI ADQUIRIDO POR UMA DAS AUTORAS EM VIAGEM A SALVADOR. ORIGINAL-
MENTE A HISTÓRIA TEM 24 PÁGINAS

FONTE: As autoras

138
TÓPICO 1 | ARQUITETURA, RELIGIOSIDADE E LITERATURA POPULAR

6.8 PÃO POR DEUS


São bilhetes escritos sobre papel recortado como renda em que se envia
um recado para alguém a fim de pedir algo ou para agradecer.

O pão por deus foi trazido pelos portugueses e sua utilização era
mais comum no litoral brasileiro. Atualmente, é raro quem ainda o utilize e
consequentemente é uma parte do folclore que tende a desaparecer. Os recados
ou versinhos escritos seguem a ordem de quadra e a rima se apresenta na segunda
e na quarta linha do verso.

Lá vai meu coração


Nas asas de uma andorinha
Vai pedir pão - por - Deus
A minha querida madrinha.

FIGURA 86 – PÃO POR DEUS

FONTE: <http://dicionariodailha.blogspot.com/2009_08_01_archive.
html>. Acesso em: 5 set. 2010.

DICAS

Conheça um pouco mais do pão por deus com o livro Pão -


por - Deus – Vivo na cultura brasileira de Maria Eli Braga Mannrich, Editora
da UFSC – EdUFSC.

139
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, você aprendeu que:

• A arquitetura popular, também chamada de casa folclórica, é aquela em que


as casas são construídas sem o projeto de um engenheiro ou arquiteto. Entre
as técnicas folclóricas estão: a casa de palafitas, as favelas, casas de madeira e
tijolos e as casas enxaimel.

• As religiões no Brasil são inúmeras, no entanto, ainda há predominância da


Igreja Católica. Esta, nos últimos tempos tem perdido muitos fiéis para igrejas
derivadas do cristianismo.

• As devoções aos santos e o pagamento de promessas estão entre as


manifestações de religiosidade do Brasil.

• Entre as religiões afro-brasileiras está o candomblé, que na Bahia convive


tranquilamente com a Igreja Católica.

• Quando se trata de doenças o povo costuma recorrer aos benefícios das ervas,
das benzedeiras e das simpatias.

• Crendice e superstição têm significados diferentes.

• O homem durante a vida participa de rituais de passagem, entre os quais os


mais comuns são o casamento e o velório, mas cada ritual depende dos grupos
culturais que o indivíduo integra.

• Amuletos são objetos em que se acredita que protegem e trazem sorte.

• As simpatias são realizadas sempre com um objetivo como: trazer um afeto,


trazer saúde, dinheiro etc.

• Mitos são seres fantásticos em que se dão apenas as características (lobisomem,


bruxa etc.), enquanto que a lenda traz uma história que envolve homens e
mulheres (lenda do guaraná, da noite etc.).

• Ditados e provérbios são expressões que trazem algum ensinamento, também


são conhecidos como a filosofia do povo.

• Os dísticos também são ditados, porém são expostos nas traseiras dos
caminhões e possuem um caráter humorístico ou satirizam os provérbios que
trazem algum ensinamento.

140
• Parlendas são frases fáceis de decorar e que são ditas pelas crianças durante as
brincadeiras.

• O trava-língua são frases com palavras sonoras parecidas e que devem ser
repetidas rapidamente sem errar.

• Adivinhas são questionamentos que trazem respostas inesperadas e que


geralmente se iniciam com “o que é, o que é”.

• Literatura de cordel são os folhetos escritos por pessoas simples, geralmente


ilustrados por xilogravura e que são expostos em varais com grampos de
roupa para venda.

• Pão por deus são bilhetes escritos em papel recortado ou decorado e no quais
se escrevem uma quadra fazendo elogios ou pedidos.

141
AUTOATIVIDADE

1 Leia a tira a seguir e teça um comentário sobre o quadrinho:


FIGURA 87 – HISTÓRIA EM QUADRINHO

FONTE: <http://ziraldo.blogtv.uol.com.br/2010/01/05/tiras-do-ziraldo-150--menino-maluquinho-
-e-as-ervas-medicinais-da-carolina>. Acesso em: 31 ago. 2010.

2 Relembre um mito ou uma lenda e partilhe com seus colegas no próximo


encontro. Para esta atividade, lembre-se que também há as lendas urbanas
que não são consideradas folclore, mas que fazem parte da Cultura Popular.

3 Vamos, agora, verificar se você consegue diferenciar algumas expressões


da literatura popular! Leia as expressões a seguir e escreva ao lado se são
provérbios, trava-línguas, dísticos ou parlendas:

a) “Uni, duni, tê, Salamê, minguê. O sorvete é colorê, O escolhido foi você!”
b) “A fiadeira fia a farda do filho do feitor Felício.”
c) “Cuide bem do seu filho, antes que um traficante o adote.”
d) “As melhores essências estão nos menores frascos.”
e) “Cabeça vazia é oficina do diabo.”

4 Encontre no caça-palavras os seguintes itens que compõem a cultura popular:

Adivinhas
Artesanato
Brincadeiras
Brinquedos
Cantigas de Roda
Crendices
Culinária

Assista ao vídeo de
resolução da questão 3

142
Festas
Músicas
Parlendas
Provérbios
Simpatias
Superstições

143
144
UNIDADE 3
TÓPICO 2

FESTAS POPULARES E MÚSICA


FOLCLÓRICA

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico, abordaremos festas populares, música folclórica,
instrumentos musicais e brinquedos folclóricos. Na Unidade 2, vimos que cultura
popular é aquela que pertence ao povo, sendo produzida e/ou aceita por uma
grande parte da população. Assim, as festas e manifestações folclóricas são
elementos que representam os costumes e tradições de determinadas populações.
Esperamos que a leitura deste tópico desperte seu interesse em conhecer mais
sobre as origens das manifestações populares da sua região.

2 FESTAS POPULARES
A festa popular é um momento onde se compartilham tradições, podendo
ser considerada uma espécie de ritual onde são revelados valores, onde o homem
tem oportunidade de expressar aquilo que o toca mais intensamente (PESSOA,
2007).

A aprendizagem dos elementos que compõem as festas populares ocorre,


geralmente, de maneira espontânea, vendo, ouvindo e fazendo. É por meio da
observação que se aprendem as letras das músicas, a maneira como se tocam
os instrumentos e como se realizam os passos da dança. “As pessoas e grupos
populares não têm como primeira forma de expressão o domínio da escrita.
Seus textos são escritos em forma de dança, de cânticos rimados para facilitar a
memorização, são troças, lendas, ditados [...]. Os ingredientes que compõem a
festa popular são também textos por meio dos quais a gente simples manifesta
tudo que lhe toca mais profunda e intensamente” (PESSOA, 2007, p. 4).

As festas populares, assim como outros elementos da cultura popular e


do folclore, são estruturas dinâmicas que se transformam com o passar do tempo.
Além disso, podem passar por adaptações regionais, sendo possível encontrar
festividades semelhantes com nomes diferentes espalhados por todo país. Não
seria possível tratar aqui de todas as festas populares do Brasil. Então foram
selecionados dois dos ciclos festivos mais tradicionais do país: o carnaval e as
festas juninas.

145
UNIDADE 3 | FOLCLORE

2.1 CARNAVAL
O carnaval não tem uma data fixa, pois se trata de uma festa móvel cuja
data todo ano é fixada no sétimo domingo que antecede a Páscoa. O cálculo foi
determinado pela Igreja Católica. A ideia do carnaval é brincar e festejar antes da
chegada da quaresma, pois ela que antecede a Páscoa, é considerado um período
de resguardo e respeito, sendo que os cristãos mais fervorosos chegam a cumprir
um ritual que inclui o jejum.

A festa hoje intitulada Carnaval teve início no começo do século 19 e


consistia em bailes, chamados de Rancho, no qual, participavam a elite brasileira
e os integrantes da corte portuguesa. Aos pobres restava o Entrudo, que em 1823
foi retratado por Debret e, no qual, o povo saia às ruas e brincava de jogar balões
com água e farinha. Aos poucos, o povo passou a copiar os bailes de carnaval
realizados pela elite e então surgiram os cordões e as sociedades carnavalescas.

Com o aumento das tecnologias e a popularização das informações, o


carnaval foi influenciado pelos cantores promovidos pela indústria cultural e
pelo turismo, levando-o a adquirir características distintas em alguns estados.

FIGURA 88 – DIA DE ENTRUDO (CENA DE CARNAVAL NO BRASIL) - QUADRO DE JEAN


BAPTISTE DEBRET – 1823

FONTE: <http://correio24horas.globo.com/noticias/noticia.asp?codigo=19217&mdl=155>.
Acesso em: 24 abr. 2010.

146
TÓPICO 2 | FESTAS POPULARES E MÚSICA FOLCLÓRICA

Na Bahia, os foliões saem às ruas para dançar e cantar atrás de um trio


elétrico (bandas tocam sobre caminhões). A influência da comunicação de massa
faz com que multidões dancem e cantem nas ruas atrás de trios elétricos, ao som
de cantores famosos como Tony Garrido, Daniela Mercury, Ivete Sangalo etc.
Nos blocos carnavalescos são vendidos os abadas, camisetas que caracterizam
cada grupo.

FIGURA 89 – O BLOCO AFRO OS “FILHOS DE GANDHI” CANTANDO E DANÇAN-


DO EM VOLTA DO TRIO ELÉTRICO EM SALVADOR, BA. FOTO: JOTA FREITAS

FONTE: <http://carnaval.bahia.com.br/atracoes-do-verao/carnaval> . Acesso


em: 28 jul. 2010.

Em Natal, Maceió, Olinda e no Recife ocorre o carnaval de rua. Os


participantes vestem pesadas fantasias, cada uma representando um personagem:
rei, rainha, príncipes, damas, embaixadores, cavaleiros, índios, baianas etc.
Todos dançam ao som de um batuque, seguindo as “calungas”, bonecas gigantes
que abrem o desfile e são levadas cada uma por uma mulher. Outra tradição
pernambucana é o frevo, que tem mais força nas principais cidades do estado:
Recife e Olinda. Durante o carnaval, as pessoas dançam nas ruas ao som desse
ritmo rápido, executando passos acrobáticos (CULTURA BRASILEIRA, 2010).

FIGURA 90 – BONECOS GIGANTES DESFILANDO NO CARNAVAL DE OLIN-


DA. FOTO: PASSARINHO/PREF. OLINDA

FONTE: <http://carnaval.olinda.pe.gov.br/>. Acesso em: 28 jul. 2010.

147
UNIDADE 3 | FOLCLORE

No Rio de Janeiro e São Paulo as escolas de samba se preparam durante


todo o ano e os desfiles giram em torno de um tema do qual se faz o samba
enredo, as fantasias e os carros alegóricos. Há uma comissão que atribui notas a
cada quesito e há premiação para as escolas vencedoras. O desfile acontece em
uma passarela, onde os carros e os integrantes da escola desfilam para o público
posicionado em arquibancadas laterais.

FIGURA 91 – DESFILE DA ESCOLA DE SAMBA MANGUEIRA DO RJ

FONTE: <http://g1.globo.com/Carnaval2010/>. Acesso em: 28 jul. 2010.

2.2 FESTAS JUNINAS


Como o próprio nome revela, essa festa acontece no mês de junho, sendo
muitas vezes prolongada até julho. O ciclo das festas juninas começa em meados
do mês de junho, quando se festejam quatro santos muito conhecidos no Brasil:
Santo Antônio, no dia 13; São João, 24; e São Pedro e São Paulo, no dia 29 de junho
(CULTURA BRASILEIRA, 2010).

Nos países europeus católicos, a festa era inicialmente chamada de


“joanina” (em homenagem a São João). Trazida pelos portugueses para o Brasil,
virou festa “junina” e foi incorporada aos costumes locais, com a introdução de
alimentos, como o aipim e o milho (CULTURA BRASILEIRA, 2010).

Mas não foi somente a influência portuguesa que caracterizou as


comemorações. A quadrilha, por exemplo, foi uma adaptação de uma dança da
nobreza europeia (quadrille), muito presente nos salões franceses do século XVIII
(CULTURA BRASILEIRA, 2010).

148
TÓPICO 2 | FESTAS POPULARES E MÚSICA FOLCLÓRICA

Os jesuítas portugueses, a princípio, comemoravam o dia de São João. As


primeiras referências às festas de São João no Brasil datam de 1603. As festas de
Santo Antônio e de São Pedro vieram mais tarde, mas como aconteciam no mesmo
mês, foram incluídas nas chamadas festas juninas (CULTURA BRASILEIRA, 2010).

FIGURA 92 – FESTA DE SÃO JOÃO (1958): OBRA DE PORTINARI

FONTE: <http://www.portinari.org.br/IMGS/jpgobras/OAa_2997.JPG>. Acesso


em: 1º set. 2010.

Atualmente, nas festas juninas, os participantes costumam vestir-se com


roupas remendadas, exagerando o que consideram a vestimenta e o modo de
ser dos caipiras. O foco já não é mais religioso e sim apenas entretenimento.
Geralmente, são feitos o casamento caipira e a quadrilha. No sul do Brasil, é
comum o quentão à base de vinho e o pinhão, já no sudeste, o quentão é preparado
com cachaça.

3 MÚSICA FOLCLÓRICA
A música é um elemento que está presente na maior parte das festas
populares. Agora vamos conhecer um pouco mais sobre algumas das formas
pelas quais a música folclórica aparece na cultura popular brasileira.

Segundo Lima (2003, p. 105), a música folclórica brasileira se concretiza


de três maneiras: “improvisada de maneira espontânea e aceita espontânea
e coletivamente no momento da criação (música de várias danças, como a do
batuque do Médio Tietê, São Paulo); improvisada espontaneamente, ensaiada
e aceita coletivamente (música de manifestações teatrais, exemplificadas pelas
congadas, moçambiques, bumba-meu-boi etc.); transmitida de uma geração para
a outra, em variantes ou versões (música de modinhas, dorme-nenês, romances,
etc.)”.

149
UNIDADE 3 | FOLCLORE

As músicas folclóricas podem estar relacionadas a brincadeiras, rituais


religiosos e danças. Geralmente, possuem letras simples, são repetitivas, podendo
tratar de assuntos do cotidiano, mitos, lendas, envolvendo ou não personagens
do folclore. A música folclórica é transmitida de geração em geração e sempre
apresenta funcionalidade, ou seja, se destina a uma função específica.

As cantigas de roda, também chamadas de ciranda, são em sua maioria


de origem europeia. São brincadeiras musicais onde as crianças geralmente
ficam em roda, de mãos dadas e cantam seguindo a coreografia característica da
música. As letras das músicas podem sofrer variações regionais. São exemplos de
cantigas: ciranda cirandinha, a canoa virou, e muitas outras.

FIGURA 93 – RONDA INFANTIL (1932), OBRA DE PORTINARI QUE RETRATA UMA


BRINCADEIRA DE RODA

FONTE: <http://www.portinari.org.br/IMGS/jpgobras/OAa_3518.JPG>. Acesso em:


7 set. 2010.

Há ainda brincadeiras folclóricas que não se utilizam da música, como:


amarelinha, bola de gude, pipa, cabra-cega, chicotinho queimado etc.

ATENCAO

Candido Portinari tem uma série de pinturas sobre brinquedos, brincadeiras,


usos e costumes brasileiros. Tendo oportunidade acesse o site: http://www.portinari.org.br/ e
acesse “Portinari para crianças”. O site disponibiliza jogos, histórias, sugestões de aula e galeria.

150
TÓPICO 2 | FESTAS POPULARES E MÚSICA FOLCLÓRICA

FIGURA 94 – MENINOS SOLTANDO PAPAGAIO DE PORTINARI

FONTE: <http://www.portinari.org.br/candinho/candinho/OA_2807.JPG>. Acesso em:


7 set. 2010.

ATENCAO

O livro Lenga la lenga – Jogos de mãos e


copos traz uma série de brincadeiras musicais baseadas
em canções da cultura popular brasileira que podem ser
acompanhadas por jogos de mãos, copos e flauta doce
(EDITORA CIRANDA CULTURAL, 2006)

Outro elemento musical muito frequente nas festas populares são as


danças folclóricas, que estão relacionadas à cultura e tradições de cada região.
Podem estar relacionadas a aspectos religiosos, festas, brincadeiras, entre outros
elementos. Podemos citar como danças folclóricas o maracatu, frevo, catira,
quadrilha, coco, fandango e muitas outras.

151
UNIDADE 3 | FOLCLORE

FIGURA 95 – TAMBOR DE CRIOULA: DANÇA TÍPICA DO MARANHÃO

FONTE: <www.contatocultural.blogspot.com>. Acesso em: 2 set. 2010.

FIGURA 96 – FREVO, DE HEITOR DOS PRAZERES. SEM DATA, ÓLEO SOBRE TELA

FONTE: <http://www.margs.rs.gov.br/pag_papel_de_parede.php>. Acesso em:


7 set. 2010.

As danças folclóricas podem ser dramáticas ou não. Nas danças dramáticas,


também chamadas de autos ou folguedos, são representados personagens, com
vestimentas específicas e que geralmente narram uma história. São exemplos de
danças dramáticas o bumba-meu-boi, cavalhada, chegança, terno de reis e outros.

152
TÓPICO 2 | FESTAS POPULARES E MÚSICA FOLCLÓRICA

FIGURA 97 – BUMBA MEU BOI, DE CANDIDO PORTINARI, 1959. ÓLEO SOBRE MADEIRA

FONTE: <http://www.portinari.org.br/ppsite/homepage/100_anos/material/
obras_09.htm>. Acesso em: 7 set. 2010.

4 INSTRUMENTOS MUSICAIS
Os instrumentos musicais folclóricos são assim denominados porque
se originam de um artesanato folclórico (LIMA, 2003). Considerando-se suas
origens, poderíamos citar como de origem africana: tambores, agogô, cuíca,
afoxé, berimbau, entre outros.

FIGURA 98 – AGOGÔ E AFOXÉ

FONTE: </pt.wikipedia.org/wiki/Instrumento_musical>. Acesso em: 7 set. 2010.

153
UNIDADE 3 | FOLCLORE

Instrumentos como o triângulo e a sanfona (também chamada acordeom


ou gaita), que são característicos do baião no Brasil, têm provável origem na
música portuguesa, assim como os diferentes tipos de viola.

FIGURA 99 – VIOLA DE COCHO: INSTRUMENTO FOLCLÓRICO QUE É TALHADO NA MADEIRA

FONTE: <www.cnfcp.gov.br/interna.php?ID_Secao=111>. Acesso em: 5 set. 2010.

Considerados de origem indígena, temos os chocalhos, guizos, flautas e


também tambores. Além destes, existem muitos outros instrumentos folclóricos
brasileiros, e a divisão por origens também é bastante relativa, pois existem
instrumentos que são comuns em várias etnias.

FIGURA 100 – INSTRUMENTOS DE ORIGEM INDÍGENA

FONTE: <http://www.expomar-rio.com.br/2ApresentacaodeFestival13.
htm>. Acesso em: 7 set. 2010.

5 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Neste tópico, vimos que as manifestações folclóricas são estruturas
dinâmicas que se transformam com o passar do tempo. Na escola, muitas vezes,
essas manifestações são tratadas como algo do passado, distantes da realidade e
até ultrapassadas. O folclore está presente em nosso dia a dia, em nossos hábitos,

154
TÓPICO 2 | FESTAS POPULARES E MÚSICA FOLCLÓRICA

crenças e em nossa formação. É importante que o professor tenha clareza da


presença do folclore nas práticas cotidianas e que incentive os alunos a refletir a
respeito, deixando de lado a ideia de folclore como um tema para o mês de agosto.
Falando nisso, se prestarmos atenção muitas vezes as atividades relacionadas ao
folclore abordam sempre os mesmos elementos, deixando de lado uma infinidade
de possibilidades de estudo.

Outro aspecto que não pode ser esquecido é a questão do estereótipo. Será
que o caipira de roupas remendadas retrata mesmo as festas do interior? E os
índios, que são sempre mostrados da mesma forma, como se as nações indígenas
fossem todas iguais, usassem os mesmos tipos de pintura corporal, adereços e
tivessem os mesmos costumes, será que todas as tribos são iguais?

A escola tem muito a descobrir sobre as riquezas do folclore e cultura


popular brasileiras. É preciso fugir das “aulas-receita”, dos temas batidos e das
práticas repetitivas. Vamos pesquisar, vamos conhecer mais, vamos divulgar e
valorizar as manifestações folclóricas. O tema folclore é muito vasto, mas temos o
ano todo para trabalhar com ele.

LEITURA COMPLEMENTAR

APRENDER E ENSINAR NAS FESTAS POPULARES

O homem, “em sua verdadeira essência, é um homo festivus” diz Havey


Cox (1974, p. 20), colocando, nessa nossa caracterização identitária essencial, o
cultivo dos folguedos, das aspirações visionárias e da capacidade de fantasiar.
Sem isso seríamos reduzidos a uma “tribo de robôs”. Como atestam os mais
diferentes tipos de registro, provavelmente todas as civilizações conhecidas
fizeram ou ainda fazem festa. “Tendo sido formado por uma fabulosa mistura de
povos milenares e festeiros, como o indígena, o europeu e o negro vindo à força
da mãe África, o Brasil não poderia fugir a essa universalidade da festa. Fazemos
festa por todos os motivos e, quando não os temos, inventamos” (PESSOA, 2005,
p. 32).

[...] Estamos falando da importância da festa e, mais especificamente,


da festa pensada como experiência educativa. [...] Quando uma criança está em
uma roda de Congo olhando como se toca uma “casaca”, com a convicção de
que, assim que lhe for dada ocasião, saberá fazer o mesmo som, ou quando outra
criança, não mais do litoral capixaba, mas do interior de Goiás, abstrai-se do
conjunto da cantoria de uma Folia de Reis e se fixa nos movimentos do folião que
bate a “caixa”, igualmente com a certeza de que um dia também repetirá a mesma
cena, o que ocorre, nos dois casos e em uma infinidade de outros semelhantes, é
uma “situação de aprendizagem”.

[...] Toda vez que vemos uma Congada, uma Folia de Reis ou do
Divino, um grupo de dançadores de Jongo se apresentando, vemos sempre à

155
UNIDADE 3 | FOLCLORE

volta meninos e meninas absortos em cada gesto e palavra, procurando uma


oportunidade de se fazerem aprendizes daquele ritual ou daquele auto popular.
Para a nossa felicidade enquanto praticantes – como sou folião de reis –, quase
sempre algumas crianças estão olhando e querendo aprender, enquanto que
outras já estão inseridas no grupo, tornando muito concretas as possibilidades
de continuidade de cada grupo e da crença e da tradição que ele expressa e que
o fundamenta.

Há também, nesses casos, outra aprendizagem que nem sempre é tão


aparente assim, mas que se reveste de muito mais profundidade e importância
na compreensão das festas populares. [...] As pessoas e grupos populares não têm
como primeira forma de expressão o domínio da escrita. Seus textos são escritos
em forma de dança, de cânticos rimados para facilitar a memorização, são troças,
lendas, ditados, com muita, mas muita comidinha gostosa. É dessa forma que o
povo escreve suas memórias, seus valores, seus códigos de regras, suas crenças,
suas angústias pelo árduo trabalho, suas esperanças e fantasias. Os ingredientes
que compõem a festa popular são também textos por meio dos quais a gente
simples manifesta tudo aquilo que lhe toca mais profunda e intensamente.

Por isso, uma criança ou adolescente aprendendo a tocar um instrumento


ou ensaiando um passo numa dança, para também fazer parte da festa da
sua família, vizinhança ou comunidade, é uma pessoa que está aprendendo,
assimilando uma compreensão de mundo e buscando uma forma de nele se
inserir. [...] Participar de um ritual ou de uma festa supõe fazer a sua parte, sempre
intercalada com a parte do outro, ou dos outros. E isso tem muita importância,
em se tratando de educação. A vida também é assim: supõe diálogo, cooperação,
esperar a vez do outro, acreditar no outro. Ninguém é tão pobre e impotente
diante da vida que não lhe possa acrescentar um pouco de encanto. Ninguém é
tão seguro e autossuficiente para poder encantá-la unicamente com suas forças e
seus conhecimentos.

Consequentemente, nós podemos pensar a festa como uma grande escola,


na qual se aprende, antes de outras tantas coisas, como a vida em sociedade
acontece – seus valores, seus conflitos e suas possibilidades de interação e
sociabilidade. “Enquanto ritual, a festa reproduz de forma simplificada a
sociedade que a produziu; ela desenvolve uma espécie de pedagogia social”,
diz Ribeiro Júnior (1982, p. 42) citando Ecléa Bosi. Uma criança que começa a
frequentar uma festa começa a descobrir o que terá que fazer para melhor se
inserir na vida em sociedade.

Ocorre que a festa não é feita só de pétalas de rosas. Já que ela é uma
representação da vida em sociedade, entre seus componentes imprescindíveis
está a conflitividade, diz ainda Ribeiro Júnior (p. 45-48). A luta pelo exercício
do poder perpassa todas as instituições da sociedade e não seria diferente com
a festa. Também não podemos pensar uma festa de 30 anos atrás sendo repetida
hoje da mesma maneira. A história muda, as pessoas incorporam novas visões de

156
TÓPICO 2 | FESTAS POPULARES E MÚSICA FOLCLÓRICA

mundo e, por isso, “a cultura é dinâmica”, lembra o antropólogo Roque Laraia


(1986, p. 98-99): “os homens, ao contrário das formigas, têm a capacidade de
questionar os seus próprios hábitos e modificá-los”.

[...] As práticas educativas da escola têm muito a aprender com as festas


populares. Para se conseguir “prender” a criança na escola e “prender” sua atenção
no se quer ensinar, desenvolvem-se teorias e mais teorias pedagógicas, escrevem-
se livros, o Ministério Público apresenta ultimatos aos pais e, ainda assim, essa
presença ainda tem que ser barganhada por compensações financeiras às famílias
(bolsa disso e daquilo outro). As festas populares não precisam de nada disso. As
crianças e adolescentes as procuram, quase sempre, espontaneamente e, não raro,
até as escondidas. Vão por um gosto pela música, pela dança, pela convivialidade
ou, quem sabe, numa hipótese ainda mais otimista, por um sentimento de pertença.
Como poderá a escola chegar a esse mesmo gosto e a esse mesmo sentimento?
Longe deste pequeno texto as receitas! Os professores, que estão “com a mão
na massa” e, ainda, que estão muito mais próximos de cada uma das diferentes
realidades sociais e festivas, é que têm condições de responder a esta e a outras
mais perguntas. Mas, pensando na inevitável indagação sobre o “como fazer”,
seguem pelo menos três indicações substanciais.

A primeira é que a comunidade escolar tenha ocasiões concretas de


conhecimento das festas, como elas realmente acontecem. Quem aprende, para
depois passar a gostar, precisa aprender o certo, de preferência indo aonde um
terno de Congada costuma dançar e celebrar, indo aonde uma Folia de Reis
faz seu giro, ou indo aonde um grupo de vaqueiros (ou seus descendentes)
faz uma Festa de Aboio. Assim acontecendo, os alunos e professores vão ter a
oportunidade de compreender toda a fundamentação mítica, religiosa, artística,
estética daquela festa. Esta primeira indicação pode acontecer, também, com
um movimento inverso: a festa indo à escola. Nesse caso, esses componentes da
fundamentação da festa vão estar irremediavelmente diminuídos, por se tratar
não do acontecimento da festa, em data e local próprios, mas de uma apresentação
excepcional da festa. Mas, pelo menos, alguns elementos da festa (história, dança,
música, vestimenta) poderão ser vistos pelos alunos e explicados pelos próprios
sujeitos que a constituem.

A segunda indicação é quanto à possibilidade de serem desenvolvidas,


nas escolas, releituras ou recriações das festas populares, seja por grupos de
teatro ou pelos próprios alunos. Aqui vale o alerta dos folcloristas, no sentido
de que essas recriações são consideradas “parafolclore”. Ou seja, elas não são o
fato folclórico em si, como no caso de um grupo de Reisado fazendo seu ritual
próprio, sempre ensaiado, corrigido e avalizado por seus mestres, os guardiões
daquela tradição. Mas, como o objetivo é sempre pensar sobre o que a escola e
seus sujeitos podem aprender com a festa, a reprodução desta, mesmo se feita por
outros sujeitos, pode ser de grande oportunidade. Recomenda-se, obviamente,
que esses esclarecimentos sejam sempre feitos e que seja estimulado que, em
outras ocasiões, as festas populares sejam conhecidas em seu ambiente e período
próprios de realização.

157
UNIDADE 3 | FOLCLORE

A terceira e última indicação é que, por um ou por outro caminho, depois


de conhecida, a festa seja tomada também como situação de potencialização
(ampliação) do conhecimento sobre a diversidade cultural brasileira (por meio
de discussões, debates, reflexões, entrevistas, encenações, atividades de leitura
e escrita, etc.). Se as festas populares forem abordadas como momento de ócio,
de lazer, de folga, de brinquedo, etc., já será um ganho, pois elas expressam a
grande riqueza cultural de nosso país. Mas elas podem “dar” muito mais: elas
podem contar de diversas formas, em diversas linguagens, em múltiplas cores,
como nos tornamos uma nação e como o capital está querendo nos fazer crer que
não somos mais uma nação. Se a escola tomar parte nesta dramática tensão e, em
especial, na forma como a cultura popular a vivencia, aí o reconhecimento quanto
ao seu papel de instituição produtora e reprodutora de conhecimentos, social e
culturalmente referenciada, chegará à sua formatação mais completa.

FONTE: PESSOA, Jadir de Morais. Aprender e ensinar nas festas populares. In: Aprender e ensinar
nas festas populares. Salto para o futuro. Boletim 02, MEC, 2007. Disponível em: <www.tvbrasil.
org.br/fotos/salto/series/165621Aprender.pdf>. Acesso: 1 set. 2010.

158
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• As festas populares são momentos onde se compartilham tradições, costumes


e valores.

• As manifestações populares folclóricas se transformam com o passar do


tempo, se adaptando às novas realidades.

• O carnaval no Brasil teve início no século XIX. Primeiro como uma festa da
corte, mas que depois se estendeu a toda população.

• As festas juninas têm origem relacionada à religião, apresentam características


próprias nas diferentes regiões do país, assim como o Carnaval.

• A música folclórica está presente em muitas das festas populares, em rituais,


brincadeiras e danças.

• Os instrumentos musicais relacionados ao folclore são, em sua maioria, de


origem africana, europeia e indígena, podendo ser citados: tambores, agogô,
cuíca, afoxé, berimbau, viola, triângulo, flautas e chocalhos.

159
AUTOATIVIDADE

1 Você já pulou amarelinha? Escolha dez brincadeiras folclóricas que podem


ser feitas na escola e escreva nos espaços abaixo.

2 “É preciso brincar e recuperar o exercício de ser criança. A escola e a TV


matam a brincadeira porque calam a linguagem do corpo do menino”
(HORTÉLIO, 2010). Escreva sobre a importância das brincadeiras folclóricas
na formação da criança. Pense nas diferenças existentes entre as brincadeiras
(e brinquedos) mais comuns da atualidade e as brincadeiras tradicionais
(folclóricas). Será que ambas proporcionam a mesma forma de interação
com os colegas? Será que o desenvolvimento psicomotor e a afetividade são
trabalhados da mesma forma?

Assista ao vídeo de
resolução da questão 1

160
UNIDADE 3
TÓPICO 3

PRESERVAÇÃO, TURISMO E
PESQUISA

1 INTRODUÇÃO
Após apresentarmos o que é a Cultura Popular, como se deu sua formação
no Brasil e suas manifestações em várias áreas (literatura, religiosidade, festas,
arquitetura, música etc.)? Chegou a hora de verificar o que se tem feito para
preservar estas manifestações culturais e que relação há entre Cultura e Turismo
e a importância da pesquisa folclórica como forma de registro para as futuras
gerações e para a história do país.

2 PATRIMÔNIOS CULTURAIS DO BRASIL


O Instituto Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN),
atualmente, é um órgão federal vinculado ao Ministério da Cultura, foi criado
por artistas e intelectuais ligados ao modernismo brasileiro, em 13 de janeiro de
1937, pela Lei nº 378, no governo de Getúlio Vargas. Os objetivos do Instituto são:
fiscalizar, proteger, identificar, restaurar, preservar e revitalizar os monumentos,
sítios e bens móveis do país (IPHAN, 2010).

A missão deste órgão é:

“Promover e coordenar o processo de preservação do Patrimônio Cultural


Brasileiro para fortalecer identidades, garantir o direito à memória e contribuir
para o desenvolvimento socioeconômico do país” (IPHAN, 2010, s.p.).

Segundo o IPHAN (2010), patrimônio cultural é:

“O conjunto de manifestações, realizações e representações de


um povo, de uma comunidade. Ele está presente em todos os lugares e
atividades: nas ruas, em nossas casas, em nossas danças e músicas, nas
artes, nos museus e escolas, igrejas e praças. Nos nossos modos de fazer,
criar e trabalhar. Nos livros que escrevemos, na poesia que declamamos,
nas brincadeiras que organizamos, nos cultos que professamos. Ele faz
parte de nosso cotidiano e estabelece as identidades que determinam os
valores que defendemos. É ele que nos faz ser o que somos. Quanto mais

161
UNIDADE 3 | FOLCLORE

o país cresce e se educa, mais cresce e se diversifica o patrimônio cultural.


O patrimônio cultural de cada comunidade é importante na formação da
identidade de todos nós, brasileiros”.

O Instituto separa os bens em patrimônios materiais e imateriais que


apresentaremos em seus pormenores a seguir.

2.1 PATRIMÔNIOS MATERIAIS


Os patrimônios materiais protegidos pelo IPHAN são classificados de
acordo com sua natureza em quatro Livros do Tombo que são:

• Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico.


• Livro do Tombo Histórico.
• Livro do Tombo das Belas Artes.
• Livro do Tombo das Artes Aplicadas.

“O tombamento é um ato administrativo realizado pelo Poder Público,


nos níveis federal, estadual ou municipal. Os tombamentos federais são da
responsabilidade do Iphan e começam pelo pedido de abertura do processo,
por iniciativa de qualquer cidadão ou instituição pública. Tem como objetivo
preservar bens de valor histórico, cultural, arquitetônico, ambiental e também de
valor afetivo para a população, impedindo a destruição e/ou descaracterização de
tais bens” (IPHAN, 2010, s.p.).

Após a abertura do processo de tombamento, o órgão enviará técnicos


que farão uma avaliação do bem material que pode ser: fotografia, obras de arte,
construções, florestas, cascatas, mobiliário etc. Caso o bem receba uma avaliação
positiva dos técnicos, o Instituto envia uma notificação ao proprietário avisando
que o bem se encontra em proteção até a decisão e término do processo, que
são a divulgação no diário oficial, o registro em um dos Livros do Tombo e a
notificação aos seus proprietários. Apenas os bens materiais podem ser tombados
(IPHAN, 2010).

2.2 PATRIMÔNIOS IMATERIAIS


O IPHAN segue como definição dos bens imateriais a definição dada pela
UNESCO que considera “as práticas, representações, expressões, conhecimentos
e técnicas - junto com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares culturais
que lhes são associados - que as comunidades, os grupos e, em alguns casos,
os indivíduos reconhecem como parte integrante de seu patrimônio cultural”
(IPHAN, 2010).

162
TÓPICO 3 | PRESERVAÇÃO, TURISMO E PESQUISA

Os bens imaterias, quando considerados de importância para a Cultura


do país e sua preservação faz-se necessária, são inscritos nos seguintes Livros de
Registro:

• Livro de Registro dos Saberes: inclui as técnicas e o conhecimento das


matérias-primas, entre os quais podemos considerar técnicas de artesanato, de
fabricação de instrumentos, de culinária etc.
• Livro de Registro das Celebrações: ritos e festas.
• Livro de Registro das Formas de Expressão: inclui a comunicação e as
manifestações por meio da música, do teatro, da literatura e das artes plásticas.
• Livro de Registro dos Lugares: ficam inscritos os espaços onde ocorrem
algumas práticas e atividades como igrejas, praças, mercados e feiras.

Entre os bens imateriais registrados estão: o Ofício das Paneleiras de


Goiabeiras, Arte Kusiwa – Pintura Corporal e Arte Gráfica Wajãpi, Círio de Nossa
Senhora de Nazaré, Samba de Roda do Recôncavo Baiano, Modo de Fazer Viola
de Cocho, Ofício das Baianas de Acarajé, Feira de Caruaru, Frevo, entre outros.

FIGURA 101 – O OFÍCIO DAS BAIANAS DO ACARAJÉ FOI INSCRITO EM 14


DE JANEIRO DE 2005 NO LIVRO DOS SABERES COMO BEM DE NATUREZA
IMATERIAL

FONTE: As autoras

163
UNIDADE 3 | FOLCLORE

DICAS

Para descobrir se na região que você mora há algum patrimônio material


tombado ou imaterial acesse o site www.iphan.gov.br.

3 PATRIMÔNIOS DA HUMANIDADE NO BRASIL


Assim como há um órgão federal que analisa, registra os bens imateriais
e tomba os patrimônios materiais, há a Organização das Nações Unidas para
a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), na qual representantes de 21 países
analisam pedidos para que alguns bens considerados de importância para a
humanidade entrem na lista dos Patrimônios Mundiais. O Brasil participa desta
convenção desde 1977 (IPHAN, 2010).

Há dois tipos de patrimônios Históricos concedidos pela UNESCO que


são o Cultural, que engloba as construções, e o Natural que envolve áreas de
preservação e parques.

Quando algum bem passa a integrar a lista dos Patrimônios Culturais


da Humanidade, cabe ao país onde este se localiza protegê-lo e conservá-lo.
Para isso, a UNESCO participa com recursos técnicos e financeiros do Fundo do
Patrimônio Mundial.

O título dado pela UNESCO confere aos locais mais status e dá mais
visibilidade para a arrecadação de recursos e para o turismo. Todavia, o título
não é permanente, pois, caso a área sofra modificações, corre o risco de sair da
lista.

Entram na lista os bens materiais, imateriais e também os naturais. Nesta


lista, há os seguintes bens materiais e naturais localizados no Brasil:

• Parque Nacional do Jaú.


• A cidade histórica de Ouro Preto em Minas Gerais.
• O Centro Histórico de Olinda em Pernambuco.
• Missões Jesuítas Guarani em São Miguel das Missões/RS.
• Centro Histórico de Salvador na Bahia.
• Santuário do Nosso senhor de Matosinho em Congonhas do Campo/MG.
• Parque Nacional do Iguaçu no Paraná.
• O Plano Piloto de Brasília.
• Parque Nacional Serra da Capivara, no Piauí.
• Centro Histórico de São Luís do Maranhão.
• Centro Histórico da Cidade de Diamantina em Minas Gerais.
• Pantanal Mato-grossense.

164
TÓPICO 3 | PRESERVAÇÃO, TURISMO E PESQUISA

• Costa do Descobrimento.
• Reserva Mata Atlântica.
• Reservas do Cerrado.
• Centro Histórico da cidade de Goiás.
• Ilhas Atlânticas: Reservas de Fernando de Noronha e Atol das Rocas/RN.
• Praça São Francisco em São Cristóvão.

FIGURA 102 – PELOURINHO NO CENTRO HISTÓRICO DE SALVADOR QUE É UM


DOS PATRIMÔNIOS HISTÓRICOS DA HUMANIDADE

FONTE: As autoras

Em 2008, a UNESCO também reconheceu as Expressões Orais e Gráficas


dos Wajãpis do Amapá e o Samba de Roda do Recôncavo Baiano, bens imateriais
que foram proclamados como Obras Primas do Patrimônio Oral e Imaterial da
Humanidade (UNESCO, 2010).

4 CULTURA POPULAR E TURISMO


Culturas diferentes da que estamos habituadas sempre despertam
interesse! Quem não gosta de conhecer locais diferentes? Experimentar novos
sabores? Admirar outras construções? Intrigar-se com outros hábitos, diferentes
dos nossos?

A maioria das pessoas adora passear por isso e é isso que move o turismo.
É a cultura que move o turismo e o turismo move a economia, gerando emprego.

O Brasil devido a sua grande extensão territorial e às diferenças regionais,


tanto de sotaque como de usos e costumes, apresenta um extenso calendário de
festas e eventos. Há locais que a principal fonte de renda é a gerada pelo turismo

165
UNIDADE 3 | FOLCLORE

e estes estão se preparando para receber os turistas bem, investindo em meios de


transporte, na rede hoteleira e nas opções de lazer. Infelizmente, ainda há locais
com grande potencial turístico que não oferecem uma estrutura adequada.

O turismo auxilia na venda de peças artesanais, aumenta a autoestima


de pessoas simples que fazem aquilo porque gostam e precisam. Porém, alguns
cuidados devem ser tomados, pois em alguns locais, as manifestações populares,
ou melhor, folclóricas, motivas pelo turismo deixam de ser uma manifestação
espontânea, para em prol do turismo se tornar apenas uma atração, perdendo sua
identidade. Foi o que aconteceu com o carnaval no Rio de Janeiro e São Paulo, no
qual, as escolas de sambas se preparam para o show televisivo e vendem fantasias
para turistas que nem sabem sambar. Também já presenciei índios, vestidos com
saias de palhas e com os corpos pintados dançando conforme a tradição indígena
ao som de um cd e ao fim cobrando por quem assistiu a sua dança e vendendo
colares de sementes.

Perguntamos: Isso é preservar a cultura?

Entretanto, também não poderia deixar de mencionar manifestações


folclóricas, que mesmo recebendo uma grande quantidade de turistas mantém
seu caráter popular, como as festas juninas do Sergipe.

5 PESQUISA
Você deve ter percebido o quanto o folclore é amplo, por isso, ainda há
muito a se pesquisar e registrar sobre o folclore brasileiro.

Ortencio (2004, p. 167) fala da importância da pesquisa sobre folclore,


pois “se não for preservado se extinguirá pela evolução rápida dos meios
de comunicação, em particular o rádio e a televisão. Mas são esses meios de
comunicação que poderão fixar o folclore, levando-o ao conhecimento e ao
reconhecimento de toda a pátria brasileira”.

Ainda, de acordo com Ortencio (2004), as pesquisas sobre folclore podem


ser realizadas pelos processos diretos e indiretos. A pesquisa direta é quando
uma ou mais pessoas vão até o local onde acontece o fato folclórico e registram-no
com todos os seus pormenores. O pesquisador observa o fato. A pesquisa indireta
é quando o pesquisador não presencia o fato folclórico, mas toma conhecimento
por meio de entrevistas ou de questionários com alguém que participou do fato.

Algo interessante que Ortencio (2004) ressalta é que muitas vezes os


entrevistados acham graça do que o pesquisador quer saber, pois para eles se
trata de bobagens, coisas sem serventia, que para uma pessoa “estudada” não
interessa, mas aí mesmo, nas coisas consideradas mais bobas é que se encontra a
riqueza do nosso folclore.

166
TÓPICO 3 | PRESERVAÇÃO, TURISMO E PESQUISA

Hoje os artefatos tecnológicos como a câmara digital que fotografa,


filma e grava a voz permitem que os fatos folclóricos sejam registrados em seus
pormenores e que tenhamos material visual para mostrar às gerações futuras
ou comparar as evoluções que até mesmo um fato folclórico sofre (lembre-se da
dinamicidade que é uma das características do fato folclórico).

Outro autor de grande contribuição para a pesquisa folclórica é Carneiro


(2008, p. 149-150), que sugere a seguinte disposição dos resultados da pesquisa:

1) Uma descrição sumária do aspecto físico, econômico e populacional


da zona em que se registra o fenômeno. Quando necessário, situar
geograficamente essa zona.
2) Características do fenômeno.
3) Análise dos grupos humanos (posição social, idade, naturalidade, cor
etc.) que o promovem e executam e em geral nele estão interessados.
4) Descrição pormenorizada do fenômeno.
5) Instrumentos musicais ou de trabalho.
6) Vestimentas.
7) Organização associativa.
8) Importância social do fato folclórico.
9) Anotação da área (próxima e remota) em que ocorre.

O item 4, “descrição pormenorizada do “fenômeno”, pode ser,


naturalmente, desdobrada em:

a) disposição e importância relativa dos figurantes;


b) peripécias da marcha, da dança ou da representação (enredo), com
exemplos de versos ou canções típicas que as acompanham, ou fases do
trabalho;
c) comportamento do grupo em marcha, durante a execução do folguedo
e em visita a casas antigas, ou durante a produção e distribuição de
mercadorias de uso popular.

Incluem-se neste item, a descrição ou o esquema da dança ou da


representação e notações musicais.

A parte oral da pesquisa, obtida por meio de gravação, por notas


pessoais ou por cópia dos cadernos dos figurantes, ficará melhor no fim
do relato, como adendo à pesquisa, no caso de ser muito longa, sem que
isso signifique que alguns trechos não possam ser transcritos no corpo do
trabalho, no lugar pertinente.

E, finalmente, o pesquisador pode dar a sua opinião, à base das


observações feitas, acerca deste ou daquele aspecto do fato folclórico,
ou acerca do conjunto dele – de preferência com modéstia e senso das
proporções.

167
UNIDADE 3 | FOLCLORE

Um dos grandes pesquisadores do folclore brasileiro foi Câmara Cascudo


que é autor de uma extensa lista de livros sobre o tema. Vale a pena fazer uma
pesquisa sobre ele!

Por fim, transcrevemos as sábias palavras de Manuel Bandeira em


Evocação do Recife:

“A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros.


Vinha da boca do povo na língua errada do povo
Língua certa do povo
Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil.”

LEITURA COMPLEMENTAR

PESQUISA FOLCLÓRICA: TERMINOLOGIA

Nos seus relatórios científicos, o folclorista deve ter muito cuidado no


que se relaciona à correta ou não utilização de determinados termos. Jamais, por
exemplo, usar “culto” ou “inculto”, porque na base de seu conceito de cultura não
há quem seja culto ou inculto; todos os homens possuem cultura. Embora possa
empregar o vocábulo “povo”, porque também define sociedade culturalmente
homogênea, é preferível que o substitua por “sociedade”.

“Raça” deve ser apenas empregado nas referências às características


físicas, biológicas. “Etnia” ou “Grupo Étnico”, ao complexo biológico e cultural
do homem, grupo, sociedade. Como não há folclore mais rico ou mais pobre, mais
bonito ou feio, nunca utilizar os termos “riqueza” e “beleza”, para caracterizar
esta ou aquela expressão de folclore.

“Autenticidade”, “autêntico”, “pureza”, “puro” são outras tantas palavras


que não possuem qualquer significação para o cientista do folclore; não existe,
como infelizmente dizem até alguns folcloristas, folclore mais ou menos autêntico
e puro. Se é folclore, tem autenticidade e pureza. “Origem” também é coisa
que não deve preocupar-nos, porque a atividade do folclorista, dentro de uma
orientação científica, jamais deve se caracterizar pela busca de origens deste ou
daquele traço ou complexo cultural espontâneo, mas pela observação, análise e
estudo, na aplicação da metodologia folclórica.

Ouve-se, por vezes, menção a expressões como “folclorólogo” e


“folclorogia”, que constituem sintomas de uma doença, que já foi chamada
“terminologite”, a qual é caracterizada pela mania de se criar palavras novas. O
folclorista deve se livrar dessa doença; o que existe cientificamente são folclore
e folclorista, e só. As palavras “tradicionalismo” e “tradicionalista” [...] definem
atitude de quem deseja reviver o passado e, portanto, nada têm que ver com
o folclore, que objetiva estudo e pesquisa de uma manifestação de cultura, na
dinâmica do presente e também na sua história.

168
TÓPICO 3 | PRESERVAÇÃO, TURISMO E PESQUISA

Referindo-se a classes de uma sociedade, dar preferência aos conceitos


sociológicos de classe alta, classe média e classe baixa ou nomeando-as de acordo
com as letras do alfabeto: classe A, classe B, classe C. “Civilização” e “civilizado”
também são designações que não devem ser incluídas na linguagem científica
porque envolvem conceitos de progresso e refinamento e até o preconceito de
se considerar a cidade como o único núcleo gerador de cultura. Considerando
que na nossa sociedade, cidade e campo constituem um todo de manifestações e
intercâmbio cultural. É aconselhável que a expliquemos na fórmula da linguagem
escrita, caracterizando-a como “sociedade letrada”, expressão que ainda é melhor
do que “civilizada”, “histórica” e outras.

“Sobrevivência” e “reminiscência” são termos pouco recomendáveis


para serem utilizados no relatório do folclorista. Sobrevivência quer dizer o que
foi conservado, o que sobreviveu no desaparecimento de uma cultura, e jamais
constitui objeto do estudo do folclore, que para o folclorista está vivo ou já é
história. Aliás, a sobrevivência na realidade não existe como manifestação cultural,
porque se os complexos e traços podem ser observados é por possuírem função
e vida, independentemente de haverem pertencido historicamente a outras
sociedades. Se sugerimos que não se use “sobrevivência”, pelas razões expostas,
jamais devemos incluir em nossos textos a palavra “reminiscência”, porque não
há folclore que seja recordação ou lembrança; ele, repetimos, pode ser folclore de
hoje ou história.

Julieta de Andrade, com respeito ao uso e abuso de determinadas


expressões, refere-se ao “ainda” – “ainda existe”, “ainda há”, “ainda sobrevive”
– o que denota, em sua opinião, o que é certo, um amadorismo saudosista, pois
que se a manifestação de folclore está sendo observada e estudada é porque
existe, a não ser que se esteja fazendo histórica do folclore e, então, comprove-
se que ela já existiu. Da mesma maneira, é errada a afirmação de que se deve
“coletar antes que acabe”; ao folclorista não cabe fazer previsões sobre a morte de
expressões de cultura espontânea. A moderna ciência do folclore também já não
admite como característica do folclore o anônimo, o tradicional e a transmissão
oral: hoje, sabemos, com base em nossas pesquisas e documentação, que certas
manifestações têm autor conhecido, outras são transmitidas pela linguagem
escrita e até impressa, e outras mais independem da tradição, na característica
da passagem de uma geração para outra. O que as define é a aceitação coletiva
espontânea; constatada essa aceitação, está comprovado o folclore.

FONTE: LIMA, Rossini T. de. A ciência do folclore. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 19-21.

169
RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico,você aprendeu que:

• IPHAN é o orgão federal responsável pela avaliação e tombamento dos bens


culturais brasileiros.

• Os patrimônios materiais quando tombados são registrados em quatro Livros


do Tombo que são: Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico;
Livro do Tombo Histórico; Livro do Tombo das Belas Artes; Livro do Tombo
das Artes Aplicadas.

• Apenas os bens materiais podem ser tombados, os bens imateriais apenas são
registrados.

• Os bens imateriais são registrados nos Livros dos Saberes, das Celebrações,
das Formas de Expressão e dos Lugares.

170
AUTOATIVIDADE

1 Você entrará no site do IPHAN que mencionamos neste tópico e fará uma
pesquisa, a fim de descobrir se em seu estado há algum patrimônio material
ou imaterial.

2 Escreva a sua opinião sobre Cultura e Turismo.

171
172
UNIDADE 3
TÓPICO 4

SALA DE AULA

1 INTRODUÇÃO
Neste último tópico, optamos por trazer algumas sugestões que podem
servir de ponto de partida para explorar a Cultura Popular Brasileira em sua
prática pedagógica. Não se trata de receitas ou planos que devam ser seguidos
à risca. Você deve adequar cada atividade ao contexto cultural da turma, à
faixa etária, à quantidade de alunos e aos materiais disponíveis para sua efetiva
execução.

2 PESQUISANDO NA COMUNIDADE
Realize uma pesquisa na comunidade com os estudantes para descobrir
quais as atividades artesanais desenvolvidas na comunidade. Para auxiliar os
estudantes na pesquisa, elabore um quadro para o levantamento dos dados.

Sugerimos o seguinte quadro:

QUADRO 2 – ATIVIDADES ARTESANAIS DESENVOLVIDAS NA COMUNIDADE

Artesão O que faz Para que Do que Instrumentos ou Local de


serve é feito ferramentas que venda
utiliza para a
produção das peças
1 Benita Louças Fazer e Argila Torno e lixa Sua casa
guardar
comida.
2 Camilo Carrinhos Brincar Madeira Formão, serrote, Mercado
pregos e lixa Municipal
3

FONTE: As autoras

173
UNIDADE 3 | FOLCLORE

Depois do levantamento dos dados, vocês podem separar as atividades que


além de serem populares, também são folclóricas. Para classificar em folclórica,
utilize-se das características dos fatos folclóricos apresentados no Tópico 1, da
Unidade 2.

Você também pode escolher outros temas como: medicina popular,


crenças e superstições, brinquedos e brincadeiras etc. Adapte o quadro elaborado
de acordo com sua necessidade.

O importante é que a turma perceba que o folclore faz parte do seu dia a
dia e o quanto esse conhecimento perpassado por gerações é importante!

3 PORTFÓLIO OU AUTOBIOGRAFIA FOLCLÓRICA


O folclore é passado de pais para filhos, geração após geração. As cantigas
de roda, as canções de ninar, as brincadeiras, jogos, adivinhações, os mitos e lendas
que nos contam desde crianças são parte do folclore. Tomamos conhecimento
deles em casa, na escola e nas brincadeiras com os amigos.

A produção de um portfólio tem por intuito proporcionar uma reflexão


sobre as vivências folclóricas de cada indivíduo a partir de uma autobiografia.

Para que esse portfólio seja produzido, sugerimos um roteiro para


estimular a reflexão dos estudantes sobre as atividades folclóricas presentes em
seu cotidiano.

• Cultural Popular Material

Habitação: mencionar do que é feita a casa (alvenaria, madeira, barro,


taquara); do que é coberta (telha, palha etc.); em que lugar foi construída (tipo
do terreno, se é na beira do rio, no barranco etc.); como é a pintura e como são
divididos os compartimentos da casa (muitas vezes a cozinha ou o banheiro são
separados da casa.

Acessórios da habitação: descrevem os móveis da casa, como os tipo de


fogão (se é a lenha), se a cama era de mola ou palha, se são usadas redes, locais
onde são feitas as refeições etc.

Utilidades domésticas: utensílios usados na cozinha como panelas (podem


ser de ferro, barro etc.); colheres (cabaça, de barro, de pau, taquara), cestaria,
pratos usados para as refeições (vidro, barro, cabaça, porcelana) etc.

Indumentárias: roupas usadas no cotidiano ou no trabalho e em ocasiões


especiais (festas religiosas).

174
TÓPICO 4 | SALA DE AULA

Armas de proteção individual e de caça: muitas atualmente são proibidas


por lei, mas já foram usadas na caça como espingardas, estilingues, redes de
pesca, arco e flecha etc.

Comidas e Bebidas: comidas doces ou salgadas, alcoólicas ou não.


Geralmente, há algumas preparadas cotidianamente e outras apenas em ocasiões
especiais.

Criação de Animais, aves e pássaros: o modo de criação destes animais e


os produtos obtidos a partir destes. Aqui se incluem os animais criados no pátio
de casa ou em chiqueiros, poleiros, bem como a marcação do gado.

Agricultura: pomares, jardins e roças.

Artesanato: quais as peças, sua serventia, técnicas, ferramentas.

Religião e Crendices: imagens de santos, oratórios, pequenas capelas,


altares, cruzes, amuletos.

Transporte: carros de boi, carroças, canoas etc.

• Cultura Popular Espiritual

Usos e Costumes: ritos de passagem são todas as práticas relacionadas


de um estado para o outro como nascimento, casamento e morte, formas de
organização social etc.

Festas: sejam elas religiosas, de festas ou de datas comemorativas.

Música: cantigas de ninar, de roda, de festas.

Danças: realizadas em festas, cotidianas.

Jogos: infantis ou de adultos.

Termos e Expressões: linguagem (adivinhas, frases de caminhão, trava-


língua, parlendas).

Superstições e Crendices: ações que são realizadas, pois, acredita-se que


trazem benefícios ou malefícios.

Medicina popular: chás, garrafadas, uso de ervas, trouxinhas.

175
UNIDADE 3 | FOLCLORE

Sugerimos que esse portfólio seja realizado com alunos maiores, pois
estes terão mais maturidade e também vivências sobre os fatos folclóricos, o que
acarretará um trabalho mais rico e reflexivo. Estimule para que o portfólio tenha
continuidade mesmo depois de encerrado o estudo do tema.

Ah! Uma olhada no seu álbum fotográfico poderá trazer muitas surpresas
e enriquecer sua autobiografia.

Recorte da autobiografia folclórica da autora Emanuele:

FIGURA 103 – FOTO AUTORA EMANUELE

FONTE: As autoras

176
TÓPICO 4 | SALA DE AULA

“Para a minha primeira comunhão tive que frequentar aulas de


doutrina em três etapas. Minha iniciação nas aulas de doutrina foi quando
estava na 2ª série, com 8 anos de idade, pois, deveria saber ler e os encontros
eram sempre quinzenais. No ano da eucaristia, os encontros passaram a ser
semanais. O traje das meninas era um vestido branco, flores ou arranjos
sobre a cabeça. O traje dos meninos era calça branca, camisa branca e gravata
borboleta preta na gola. Após a missa da primeira comunhão ocorria a festa,
onde se convidava os padrinhos, avós, tias, tios e primos.”

FONTE: As autoras

DICAS

Registre!
Adquira o hábito de registrar as atividades que você desenvolve em sala de aula, assim,
quando tiver um concurso ou prêmio você terá como comprovar as atividades desenvolvidas
e os resultados obtidos.

4 LIVRETO DE CORDEL
• Faça um levantamento com os estudantes dos mitos e lendas do folclore
brasileiro que eles conhecem.

• Programe uma visita à biblioteca para pesquisar sobre os livros que lá se


encontram sobre os mitos ou lendas elencados pelo estudantes. Por exemplo,
separe todos os livros que contam histórias sobre o saci, leia-os e compare as
diferentes ilustrações e versões das histórias. Não se esqueça de ressaltar que a
autoria original é anônima, no entanto, há o autor que registrou aquela versão
da história no livro.

• Peça para que os estudantes devolvam todos os livros e escrevam a sua versão
sobre aquele mito ou lenda.

• Depois, façam a ilustração e a talhem em uma madeira ou façam o desenho em


baixo-relevo em um isopor, caixa de sapato, caixa de leite vazia (parte prateada)
ou em papelão. Imprimam o desenho como se fosse gravura e montem um
livro de cordel.

• Exponha-o na escola em varais.

• A seguir, exemplificamos essa atividade elaborada por três estudantes de nove


anos que produziram um livreto sobre o Boto.

177
UNIDADE 3 | FOLCLORE

FIGURA 104 – O BOTO

BOTO

O Boto cor-de-rosa se transforma em um belo rapaz.

Na boca da noite; perto do amanhecer ele desaparece.

Quando está na forma humana, usa sempre um chapéu para ninguém ver
a abertura que tem em sua cabeça, comum aos botos.

FIM

FONTE: As autoras

178
TÓPICO 4 | SALA DE AULA

5 FOTOGRAFANDO A ARQUITETURA DA CIDADE


O objetivo principal desta sugestão é despertar o interesse dos estudantes
pela arquitetura popular da cidade utilizando a fotografia como principal meio
de registro. Sugerimos as seguintes etapas para a exploração do referido tema:

QUADRO 3 – ETAPAS PARA EXPLORAÇÃO DE TEMA

ETAPAS ATIVIDADES
01 Pesquisar sobre a arquitetura popular.
Coletar na Secretaria de Turismo de sua cidade materiais sobre a arquitetura
02
da cidade, incluindo folhetos e folders.
Convidar alguém da Secretaria de Turismo da cidade ou alguém com mais
03 idade para que possa falar sobre as mudanças que ocorreram na cidade em
relação às construções.
Pedir que os estudantes tragam fotos antigas de suas famílias onde aparecem
04
construções.
Visitar o museu da cidade para conhecer os objetos antigos que faziam parte
do dia a dia. Ver fotos antigas. Ressaltar e procurar traçar com os estudantes
05
um paralelo entre o passado e o presente, percebendo que as mudanças são
naturais e necessárias.
Com o mapa da cidade ou do bairro, dividir o território e cada grupo fica
06
responsável por fotografar identificar as construções populares.
07 Visita monitorada a um ou mais locais citados, fotografando esses locais.
Mostrar as imagens fotografadas e conversar sobre os locais visitados,
08
ressaltando seu estado de conservação, importância, curiosidades, descobertas.
Conversar com os moradores mais antigos e registrar por escrito as histórias
09
sobre o passado da cidade.
10 Socializar essas histórias.
Explanar sobre a ideia dos modernistas e da Semana da Arte Moderna de
1922, da valorização dos elementos nacionais, mostrando imagens deste
11
período e inspirados pelos mesmos, propor a confecção de cartões postais
de sua cidade através do desenho ou programa de desenho no computador.
Promover um intercâmbio dos cartões postais produzidos pelos estudantes
entre os estudantes de outras escolas. Para isso, previamente você deverá
12
combinar com o professor de outra escola. Se você lecionar em outra escola,
será mais fácil realizar a troca.
Mostrar imagens de Sebastião Salgado ou outro fotógrafo ou utilizar revistas
de atualidades, analisando as mesmas e induzindo os estudantes a refletirem
sobre os problemas encontrados na cidade em que moram ou estudam.
10 Comparando os locais visitados e os cartões postais com os ambientes
degradados e sofridos pela ação do homem ou com as construções (casas,
prédios, escolas etc.) conservadas e as depredadas por atos de vandalismo, a
fim de desenvolver o conceito de conservação/preservação.
11 Avaliar com os estudantes os processos desenvolvidos até o momento.
Organizar um evento cultural na escola ou uma exposição do material
13
levantado e analisado pelos estudantes.
FONTE: As autoras

179
UNIDADE 3 | FOLCLORE

FIGURA 105 – FOTO DE UMA CASA TÍPICA NA CIDADE DE TIMBÓ

FONTE: As autoras

FIGURA 106 – PRODUÇÃO DOS POSTAIS E UM DOS POSTAIS JÁ PRONTOS

FONTE: As autoras

6 A MISCIGENAÇÃO ÉTNICA E O RESPEITO ÀS DIFERENÇAS


A formação cultural do povo brasileiro, abordada na Unidade 1, pode
ser explorada em sala de aula com as sugestões disponíveis no site: http://
www.artenaescola.org.br, onde você poderá conhecer na íntegra essa e outras
possibilidades pedagógicas.

VIAJANDO COM ECKHOUT

PELA PLURALIDADE DAS ETNIAS

No estádio de futebol em dia de jogo ou na hora do recreio da


escola, podemos observar a diversidade de cores, texturas e formas que
precisaríamos utilizar para pintar os tipos humanos presentes nesses locais.

180
TÓPICO 4 | SALA DE AULA

Os holandeses também aqui encontraram uma comunidade mestiça


formada por negros, brancos, mulatos, cafuzos, índios, mamelucos. Essa
diversidade étnica foi ampliada com a presença de ruivos (leste europeu),
italianos, franceses, ingleses, judeus ibéricos (sefarditas) e judeus do leste
europeu (asquenazitas), que deu um belo colorido à grande massa de
brasileiros que habitam o Brasil até hoje. Descendentes das comunidades
holandesas estão espalhados pelo Nordeste brasileiro, constituindo as
famílias denominadas de Wanderley, Lins, entre outras.

A pele cor de terra avermelhada, dos primitivos habitantes, foi


gradativamente tomando outros tons, cores, com a chegada de outras etnias
que provocaram a mestiçagem do nosso País. Com as peles retingidas pelos
cruzamentos com outros povos, fios de cabelos, formas faciais e corporais
foram também submetidos à metamorfose. Mas não só a pele se miscigenou,
como também as heranças trazidas pela cultura, pelos mitos, pelos ritos,
pelas crenças e por todas as suas manifestações, assim, mesclando modos
de ser singulares. Ora opostos, ora complementares, ora semelhantes,
constituindo a pluralidade étnica da nossa formação.

Tematizar nossa construção plural através do legado pictórico de


Albert Eckhout, que representou, nas suas monumentais telas de tamanhos
naturais, a etnografia dos nossos ancestrais, poderá ser um ótimo ponto de
partida para refletir sobre os vínculos e as relações humanas no passado e
seus desdobramentos na contemporaneidade.

Mas como torná-la instigante para nossos alunos?

Aquecimento: momento inicial de mapear desejos


São muitas as possibilidades de despertar para o foco aqui
pretendido. Sugerimos duas possibilidades, como pontos de partida. Uma
não impede a realização da outra, como também você poderá inventar
outros modos de trazer à tona a questão da pluralidade das etnias.

Possibilidade 1

Observando características físicas

Objetivando levar os alunos à observação de características físicas,


sugerimos as seguintes ações:

• Desenhos de observação, através de espelho, de fragmentos do rosto: os


olhos, o nariz, a boca, a cor da pele etc.;
• Depois, montagem de um painel coletivo, agrupando fragmentos e
percebendo semelhanças e diferenças, tanto nos modos de representação
como nas características apresentadas.

181
UNIDADE 3 | FOLCLORE

[...]

Questões problematizadoras

• De que modo representamos a diversidade de nossas características


físicas?
• Por que há essas diferenças e semelhanças?

A discussão com o grupo de alunos pode gerar a percepção das


diferenças étnicas, suas características e a miscigenação, abrindo espaço
também para a percepção do modo como essas características foram
representadas através da linguagem das artes visuais e do corpo como
suporte expressivo e cultural. A moda certamente trará outros ângulos para
abordar a questão. Por exemplo: os ditames da moda de cabelos lisos em
relação aos cabelos cacheados.

Possibilidade 2

Ouvindo Etnia de Chico Science

Escuta atenta da música Etnia, presente no CD Afrociberdelia, de


Chico Science & Nação Zumbi (1996). A percepção da sua letra e melodia,
registrada primeiramente por cada aluno, abre para a troca e a discussão
coletiva tanto dos aspectos sonoros (altura, duração, timbre, intensidade,
ritmo, melodia etc.), as referências culturais que conhecem, como das
interpretações possíveis.

Questões provocadoras:

• Como e por que a música valoriza as origens e as diferentes culturas?


• Há orgulho em ser diferente? Ou a identificação é por “modelos”
mitificados?
• O que sabem sobre o rap?

Refletindo sobre a avaliação diagnóstica

Frente às ações expressivas realizadas, o professor poderá colher


respostas a algumas questões que ao mesmo tempo levam a novas
problematizações, tais como aspectos a serem pesquisados, repensados,
ampliados.

• O que descobrimos sobre nossos alunos frente ao tema?


• Que valores revelam quanto às suas origens? Foi possível conhecê-las
melhor?
• Quais os sentidos que o conceito de etnia tem para eles? Percebem
diferenças nos termos etnia e raça?

182
TÓPICO 4 | SALA DE AULA

• Quais etnias conhecem? O que caracteriza cada uma?


• Há etnias puras?
• Há preconceitos étnicos no mundo contemporâneo? Como são revelados
através das mídias? E através de nosso comportamento?
• Conhecemos expoentes de várias etnias que deixaram suas marcas na
história brasileira? E hoje?
• Conhecemos os nossos ancestrais?
• O que revelam os desenhos e o jogo corporal coletivo (possibilidade
1) e a escuta e interpretação da música (possibilidade 2) em relação à
expressividade e a utilização dessas linguagens?
• Como se dá a discussão no grupo de alunos: sabem ouvir os outros? Têm
facilidade para expressar-se?

Possíveis objetivos e conteúdos/conceitos

Promover situações de aprendizagem que movam os alunos para:

• Investigar por que e como Eckhout valorizou os tipos étnicos no Brasil


holandês e qual a importância de seus trabalhos no passado e no presente
quanto a essa questão.
• Identificar a diversidade étnica do povo brasileiro, como consequência
do amplo processo de miscigenação.
• Conscientizar-se do seu pertencimento na grande malha humana pluri e
interétnica, de modo a ser capaz de aceitar, respeitar, apreciar e valorizar
as diferentes etnias.
• Perceber como as características étnicas extrapolam as aparências físicas.

São muitos os possíveis conteúdos e conceitos que poderão ser


abordados e ampliados dentro dessa temática. Sugerimos que as respostas
do grupo às situações apresentadas direcionem o aprofundamento da
compreensão da pluralidade das etnias, através das obras de Eckhout, por
ângulos múltiplos e diversos. O olhar de cada disciplina sobre esse tema
poderá trazer perspectivas singulares. Pode-se dar foco para:

• Etnias: histórias humanas na luta pela valorização e o respeito às


diferenças.
• A genética desvendando as questões étnicas.
• A diversidade cultural e suas manifestações (leia também Viajando com
Eckhout e encontrando culturas).
• A miscigenação e a antropofagia modernista: repercussões na arte e na
vida.
• Hegemonia branca: presença, poder e superação.
• Brasilidade - identidade, alteridade e pertencimento.
• Família: vínculos afetivos para além das relações de parentesco.
• A representação da figura humana nas artes: etnia, costumes e objetos.

183
UNIDADE 3 | FOLCLORE

Como finalizar? Que aspectos avaliar?

[...]

Conversando com os alunos, discutam as formas de socializar o que


descobriram a partir da viagem com Eckhout e como promover a avaliação
final, somatória de todas as que foram feitas ao longo do projeto.

FONTE: <http://www.artenaescola.org.br/imagens/eckhout/6ViajandocomEckhout Pluralidades.


pdf>. Acesso em: 6 jun. 2010.

LEITURA COMPLEMENTAR

NOVE CLICHÊS SOBRE FOLCLORE

Por sua natureza de difícil delimitação, o folclore é um campo fértil para


a formação de clichês. De tanto serem repetidas, algumas ideias sobre o assunto
acabam entendidas como verdades. Com a assessoria de Alberto Ikeda, professor
de cultura popular e etnomusicologia da UNESP, problematizamos abaixo nove
dessas falsas verdades.

1 - Folclore são apenas mitos e histórias

O folclore - ou cultura popular tradicional - vai muito além disso. São


saberes que alcançam todas as expressões, conhecimentos e costumes dos grupos
humanos, desde que tenham algumas características. Eles devem:

a) ser de domínio e prática coletiva;


b) transmitir-se no convívio social geralmente por meios não formais de ensino e
aprendizagem (eventualmente transformando-se nesse processo);
c) ter presença ao longo de um período histórico e chegar aos dias atuais.

Algumas práticas podem ser restritas a um âmbito local ou regional, mas


outras podem ser quase universais, difundindo-se por um amplo território ou
aparecendo concomitantemente em mais de uma localidade. A cerâmica, por
exemplo - que é o uso do barro para o artesanato utilitário - aparece em um número
enorme de grupos sociais. Nas diferentes comunidades, há particularidades
na técnica de manuseio do barro e na sua transformação em cerâmica, mas, de
maneira geral, o processo é semelhante.

2 - O folclore só existe em comunidades rurais

As comunidades rurais geralmente têm expressões do folclore muito


presentes em sua vida cotidiana. Mas isso não significa que as urbanas vivam

184
TÓPICO 4 | SALA DE AULA

apartadas das culturas populares tradicionais. Além do repertório das regiões


interioranas ter chegado à cidade com o êxodo rural - e ali, muitas vezes, ter se
modificado -, diversas manifestações surgem no próprio contexto urbano, como
brincadeiras (de elástico, por exemplo), lendas (quem não conhece a da loira
do banheiro?) e procedimentos de comunicação (como escrever em banheiros
públicos, um costume encontrado até na Roma Antiga).

3 - Folclore nunca tem autoria pessoal

Nem todas as expressões folclóricas têm autoria desconhecida. Como a


maioria delas tem origem remota, é comum que a identidade do autor se perca
ao longo do tempo. Mas nada impede que a obra de um artista conhecido, por
exemplo, que alcance domínio público em uma comunidade e tenha usos sociais
nesse contexto - virando uma tradição para muita gente - seja considerado
folclore. Com o passar dos anos, a comunidade pode continuar sabendo que
determinada obra foi criação desse artista ou a informação pode se perder. O que
importa é que as pessoas a entendam como algo que faz parte da sua vida e de
seu grupo social. A prática dos figureiros de Caruaru, por exemplo, que fazem
seus bonecos à maneira de Mestre Vitalino, criador de um estilo característico,
podem se enquadrar como expressões do folclore.

4 - O folclore só pode ser transmitido pela cultura oral

Há poucas décadas no Brasil, a leitura e a escrita ainda eram restritas


às elites. Assim, as tradições da zona rural, que concentrava a maior parte da
população, eram transmitidas oralmente. Isso não quer dizer que o registro e
a difusão por meio da escrita - assim como as expressões próprias da cultura
letrada - não possam ser considerados folclore. A literatura de cordel, que tem
histórias e versos conhecidos pela gente, é um exemplo disso, assim como as
frases de para-choque de caminhão, as formulações para não se vender fiado e os
epitáfios nos túmulos.

5 - Só há folclore em contextos de pouca escolaridade

Qualquer pessoa, por mais escolarizada que seja, traz um legado de


saberes e costumes oriundos de tradições de seu contexto familiar e social. O que
geralmente ocorre é que esses saberes tradicionais pautam mais a vida de pessoas
de baixa escolaridade do que aquelas que têm acesso a informações científicas e
a uma pluralidade de “modos de fazer”. O principal aspecto relativo a este ponto
é não opor os saberes tradicionais à ciência em um sentido de comparação, pois
eles são de ordens e usos distintos, e dependem sempre das crenças pessoais
e culturais de cada indivíduo. Remédios caseiros, como chás para tosse ou de
camomila para acalmar, por exemplo, têm suas receitas levadas adiante na
tradição e são utilizadas até hoje por pessoas das mais variadas escolaridades.

6 - As manifestações folclóricas nunca se modificam

185
UNIDADE 3 | FOLCLORE

Embora os saberes ditos folclóricos tendam a se preservar por um longo


tempo, as transformações são inerentes a qualquer manifestação humana.
Como o folclore é apropriado pela gente e transmitido em seus contextos de uso
social, é natural que se adapte e se modifique com o passar do tempo. Com as
migrações, o aumento da velocidade e intensidade de troca de informações, as
novas tecnologias, os modos de vida mudaram. Nesse processo, as expressões
tradicionais só sobrevivem se continuarem a fazer sentido para as pessoas.
A dança da quadrilha caipira, por exemplo, já sofreu muitas modificações em
sua coreografia desde o século 19. Da mesma forma, seus comandos mudaram:
antigamente o “para frente”, se dizia “anavam”, o “para trás”, “anarriê” e o “gire”
era “tur”. Isso porque eles se referiam aos termos em francês que os originaram
(“en avant”, “en arrière” e “tour”). A maioria das pessoas sequer sabia de onde
eles vinham e, ao longo dos anos, os temos em português tomaram o lugar dos
“neologismos” na dança.

7 - Só é possível trabalhar com folclore no mês de agosto

A cultura popular deve ser reconhecida pela escola, trazida para as


discussões em sala de aula e considerada em práticas como a merenda e as
reuniões de pais. As mais diversas expressões folclóricas se manifestam no
ambiente escolar, mas passam despercebidas ou são até mesmo desaprovadas
nesse contexto. Brincadeiras (amarelinha, brincadeira de taco, pega-pega
etc.), hábitos de alimentação (comer manga com feijão, farinha em todas as
refeições, misturas de diferentes tipos de ingredientes em um só prato) e datas
comemorativas (como o dia de São Cosme e São Damião): tudo isso está presente
na vida das crianças e é, direta ou indiretamente, incorporado ao ambiente
escolar. Considerar os saberes que as crianças trazem de seus contextos culturais
pode levantar diversos elementos do folclore. Um aspecto importante é valorizar
esse conjunto de expressões e saberes, e não tratá-los como “crendices” a serem
abandonadas. Além disso, a escola pode propor projetos voltados para o estudo
de diferentes aspectos das culturas populares. Quando se pensa nisso como algo
presente na vida de todos nós, não se corre o risco de tratar outros costumes e
expressões culturais como algo exótico e distanciado da realidade.

8 - O folclore deve ser trabalhado só nas aulas de arte

Outra ideia equivocada sobre folclore é que ele se limita a expressões


artísticas e que, com isso, a disciplina de Arte seria a única em que faria sentido
abordá-lo. As culturas populares dizem respeito aos mais diversos aspectos da
vida de um grupo social – entre eles, suas expressões artísticas. Mas muito se
relaciona a cuidados com o corpo (com remédios caseiros e precauções para não
adoecer), uso da língua (ditados e parlendas), técnicas de preparação de alimentos
(receitas e ocasiões em que se come um determinado prato, como milho assado
e canjica nas festas juninas), brincadeiras de movimento (como rodas e jogos de
adivinhar), e muitos outros elementos da vida - temas que interessam outras
áreas do conhecimento que não apenas as artes. Além disso, o enquadramento

186
TÓPICO 4 | SALA DE AULA

do folclore apenas às aulas de Arte pode se relacionar com a desvalorização tanto


das culturas populares tradicionais quanto da disciplina. Vista por muitos como
uma “aula de recreação”, em que não são trabalhados conhecimentos, ela seria
o espaço perfeito para tratar o folclore, que também não se relaciona com um
trabalho intelectual. Preconceito em dobro a ser quebrado.

9 - O folclore não faz parte da cultura dos alunos

Da forma como o folclore é muitas vezes tratado hoje nas escolas - limitado
à menção de personagens como Saci Pererê ou Curupira - talvez não se relacione
ao universo cultural dos alunos. Mas, como já citado, o folclore faz parte da vida
de qualquer pessoa, nem é preciso dizer que se interessar por ele é uma forma de
conhecer melhor as crianças, seus familiares e a comunidade.

FONTE: GURGEL, Thais. Revista Nova Escola, São Paulo, ago. 2010. Disponível em: http://revis-
taescola.abril.com.br/formacao/formacao-continuada/nove-cliches-folclore-588238.shtml?page
=0. Acesso em: 1º set. 2010.

187
RESUMO DO TÓPICO 4

Neste tópico, você aprendeu que:

• Não há conteúdos em que os pontos relevantes sejam ressaltados, mas você


deve ter percebido que é possível e o quanto é relevante trabalhar temas
relacionados à Cultura Popular na escola.

188
AUTOATIVIDADE

1 Se você já atua na área docente e já aplicou um plano de aula ou um projeto


com o tema Cultura Popular Brasileira, leve material referente às aulas e
socialize-o com a turma.

189
190
REFERÊNCIAS
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ANOTAÇÕES

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