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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ

CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE


CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM ARTES MARCIAIS, ESPORTES
DE COMBATE E LUTAS

FRANCISCO RONNIE VON VIEIRA

KARATE- DŌ E PSICOMOTRICIDADE: UM ELO PARA O


DESENVOLVIMENTO DOS FATORES PSICOMOTORES

FORTALEZA - CEARÁ
2014
1

FRANCISCO RONNIE VON VIEIRA

KARATE- DŌ E PSICOMOTRICIDADE: UM ELO PARA O


DESENVOLVIMENTO DOS FATORES PSICOMOTORES

Monografia apresentada ao Curso de


Especialização em Psicomotricidade do
Centro de Educação da Universidade
Estadual do Ceará, como requisito parcial
para obtenção do Título de Especialista.

Orientadora: Profa. Ms. Joan Cristina Rios


de Oliveira.

Fortaleza – Ceará
2014
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação
Universidade Estadual do Ceará
Biblioteca Central Prof. Antônio Martins Filho
Bibliotecário responsável – Francisco Welton Silva Rios – CRB-3/919

V657k von Vieira, Francisco Ronnie


Karate e psicomotricidade: um elo para o desenvolvimento dos
fatores psicomotores / Francisco Ronnie von Vieira . -- 2014.
CD-ROM. 84 f. : il. (algumas color.) ; 4 ¾ pol.

“CD-ROM contendo o arquivo no formato PDF do trabalho


acadêmico, acondicionado em caixa de DVD Slim (19 x 14 cm x 7
mm)”.
Monografia (especialização) – Universidade Estadual do Ceará,
Centro de Ciências da Saúde, Curso de Especialização em Artes
Marciais, Esportes de Combate e Lutas, Fortaleza, 2014.
Orientação: Prof. Me. Joan Cristina Rios de Oliveira.

1. Karate-do. 2. Psicomotricidade. 3. Fatores psicomotores. 4.


Desenvolvimento psicomotor. I. Título.

CDD: 796.8153
2
3

Ao invés de reprimir as tentativas lúdicas das crianças nós


vamos aceitá-las e até encorajá-las. Isso nos vai permitir
observar os comportamentos espontâneos de cada um,
analisar os sentimentos que ali são experienciados, e
favorecer sua expressão simbólica, para que possam
descarregar-se as tensões e elaborarem-se os conflitos
adjacentes.
(LAPIERRE, 1997, p. 24)
4

Dedico esta monografia a Deus todo


poderoso, que sempre foi misericordioso e
autor da minha vida e que renova minha fé
todos os dias.
5

AGRADECIMENTOS

Realizar este trabalho não foi fácil, requereu muita dedicação, paciência, força de vontade e
muita colaboração.

Agradeço, primeiramente, a Deus que me permitiu concluir este estudo dando-me saúde,
paciência, coragem e força de vontade para continuar minha formação acadêmica. O meu:
“muito obrigado!”.

A minha família pelo apoio e carinho que sempre tiveram comigo.

A todos os professores deste curso de Especialização, pelas experiências partilhadas e


conhecimentos repassados.

À Professora Joan Cristina Rios de Oliveira pela dedicação e serenidade no


acompanhamento dos trabalhos acadêmicos e sua contribuição valiosa para esta conclusão.

Aos demais que contribuíram para essa realização, o meu sincero obrigado.
6

RESUMO

A busca pelo conhecimento e a abordagem educacional do esporte marcial levou a desenvolver o


trabalho: KARATE-DŌ E PSICOMOTRICIDADE: Um Elo para o Desenvolvimento dos Fatores
Psicomotores, que é de cunho articular (movimentos) e de integração psicomotora da criança,
envolvendo o Karate-Dō como arte marcial e a Psicomotricidade englobando funções
neurofisiológicas e psíquicas atuantes na ação e emoção dentro da prática esportiva. O Karate-Dō é
um instrumento socializador e educacional. É uma Arte Marcial secular de origem japonesa, presente
em quase todos os currículos das escolas e universidades daquele país. Partindo dessa premissa, o
objetivo da pesquisa foi apresentar os beneficios que o Karate-Dō proporciona para o
desenvolvimento dos fatores psicomotores. A presente pesquisa se caracteriza como pesquisa de
campo, na qual foram propostas atividades práticas do Karate-Dō avaliadas a partir da bateria
psicomotora de Vitor da Fonseca no período de 02 de maio a 02 de julho de 2012. Analisamos
semelhanças e diferenças quanto ao desempenho psicomotor em dois fatores psicomotores:
equilíbrio e estruturação espaço-temporal. Levou-se em consideração o gênero (masculino e
feminino). Participaram do estudo 20 crianças com idades entre 8 e 10 anos. Como resultado
observou-se que o Karate-Dō e a Psicomotricidade se intercomunicam no momento em que o
desenvolvimento psicomotor pode ser estimulado e exercitado a partir da execução das técnicas do
Karate-Dō. A criança vivencia e experimenta a combinação prática, construindo de maneira sólida os
fatores psicomotores.

Palavras-chave: Karate-Dō; Psicomotricidade;Fatores Psicomotores; Desenvolvimento Psicomotor.


7

SUMÁRIO

LISTA DE ABREVIATURAS........................................................................................... 8
LISTA DE GRÁFICOS E TABELAS............................................................................ 9
1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 10
1.1 Objetivos............................................................................................................... 11
1.2 Aspectos Metodológicos....................................................................................... 12
2. A PSICOMOTRICIDADE ............................................................................................ 14
2.1 Definição de Psicomotricidade.............................................................................. 15
2.2 Histórico da Psicomotricidade no Brasil................................................................ 19
2.3 Áreas de atuação em Psicomotricidade............................................................... 22
3. DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR INFANTIL...................................................... 25
3.1 Fatores Psicomotores........................................................................................... 25
3.2 Bateria de Avaliação Psicomotora........................................................................ 41
4. KARATE-DŌ: HISTÓRIA E CONTRIBUIÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO
INFANTIL........................................................................................................................ 44
4.1 O Karate-Dō no Japão.......................................................................................... 45
4.2 Organizações do Karate Mundial.......................................................................... 52
4.3 Karate-Dō no Brasil.......................................................................................... 53
4.4 Karate-Dō na escola........................................................................................... 54
4.5 Karate-Dō e Psicomotricidade............................................................................ 57
5. A IMPORTÂNCIA DO KARATE-DŌ NO DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR
59
DA CRIANÇA..................................................................................................................
5.1 Ambiente de Pesquisa...................................................................................... 59
5.2 Participantes..................................................................................................... 59
5.3 Percurso Metodológico.................................................................................... 60
5.4 Instrumentos.................................................................................................... 64
5.5 Resultados obtidos e Discussão....................................................................... 64
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................... 75
REFERÊNCIAS......................................................................................................... 77
ANEXOS.................................................................................................................... 81
8

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ASKACE Associação de Karate do Ceará


CBK Confederação Brasileira de Karate
CMH Ciência da Motricidade Humana
COB Comitê Olímpico Brasileiro
COI Comitê Olímpico Internacional
FAJKO Federation of Japan Karate-do Organizations
FCK Federação Cearense de Karate
FMK Federation Mondiale de Karate
OIPR Organisation Internationale de Psychomotricité et de Relaxation
SBP Sociedade Brasileira de Psicomotricidade
WUKO União Mundial das Organizações de Karate
WKF World Karate Federation
9

LISTA DE GRÁFICOS E TABELAS

GRÁFICO1 - Equilíbrio Estático.................................................................................... 68

GRÁFICO 2 - Equilíbrio Dinâmico................................................................................. 69

GRÁFICO 3 - Estruturação Espaço-Temporal.......................................,...................... 69

GRÁFICO 4 - Resultados da Cotação dos Aspectos Psicomotores Avaliados............. 72

TABELA 1 - Congressos Nacionais da Sociedade Brasileira de Psicomotricidade


(SBP, 2012)................................................................................................................... 21

TABELA 2 - Equilíbrio Estático (Apoio Retilíneo) (FONSECA, 2012)........................... 65

TABELA 3 - Equilíbrio Dinâmico (Marcha Controlada) (FONSECA, 2012)................... 65

TABELA 4 - Estruturação Espaço-Temporal (Observação da Organização Espacial)


(FONSECA, 2012)......................................................................................................... 66

TABELA 5 - Equilíbrio Estático...................................................................................... 68

TABELA 6 - Equilíbrio Dinâmico.................................................................................... 69

TABELA 7 - Estruturação Espaço-Temporal................................................................. 69

TABELA 8 - Resultados da Cotação dos Aspectos Psicomotores Avaliados............... 72


10

1 INTRODUÇÃO

Nos dias atuais convive-se constantemente com revoluções de costumes na


pirâmide das classes sociais. O avanço e a tecnologia adquiridos pelo homem nas últimas
décadas fazem com que pensemos em nos modernizar e ajustar-nos a essa nova era de
grandes mudanças para a humanidade.

Tais mudanças nos acompanham em diversos seguimentos do cotidiano, nos


reportando a questionamentos no que diz respeito a essas revoluções e como estas estão
sendo transmitidas e absorvidas por parte de determinados grupos sociais.

Porém esse avanço tem como consequência, por exemplo, a redução do espaço
para a prática de lazer. A rua é para a criança um fator primordial para o seu
desenvolvimento social, a convivência com os colegas e as brincadeiras desenvolvidas e os
jogos populares fazem da rua um lugar ideal e favorável às possibilidades de relação e
comunicação motora.

No entanto, principalmente em decorrência da violência, o espaço urbano


inviabiliza à criança sentir-se em um local o qual possa existir uma relação de identificação
entre o corpo que se move e os lugares que habita. O esquema corporal se constitui no
elemento básico indispensável à formação da criança, é a representação relativamente
global, científica e diferenciada que a criança tem em seu corpo (FONSECA, 1995).

O estudo da Psicomotricidade nos últimos anos vem sendo enfatizado nas mais
diversas áreas que assistem à criança ou o adolescente. Há várias vertentes em que a
Psicomotricidade se debruça, mas este trabalho foi estruturado e fundamentado na
educação pelo movimento ou Educação Psicomotora, sabendo-se que a criança inicia suas
comunicações com o mundo exterior através de uma linguagem essencialmente corporal.

Com este intuito, buscamos unir o Karate-Dō e a Psicomotricidade como formas


de facilitação, nas quais a criança tem sua identidade respeitada, podendo ser ela mesma
num caminho constante de liberdade e responsabilidade, e desta forma desenvolver:

- Potencial criativo;

- Capacidade reflexiva e crítica de suas experiências;

- Autonomia para exploração corporal;

- Autonomia de expressão e comunicação.


11

Procurou-se o melhor, o mais sábio, uma maior proximidade do instinto animal


com o racional humano, exclusivamente voltado à luta. Dessas observações resultaram a
sabedoria, a doutrina do Karate, consolidado em normas modernas as quais “[...] contribuem
com seu desenvolvimento tornando-o um esporte e arte marcial altamente eficiente e
atualizado” (LOPES DE SÁ, 1988, p. 09).

A história do Karate-Dō e da Psicomotricidade vem desde os primórdios da


humanidade, que quer dizer, do momento em que o homem falou, neste instante falou do
seu corpo, pois na Psicomotricidade não é o homem que constitui o simbólico, é o simbólico
que constitui o homem.

Karate-Dō foi proibido no início do governo Meijí (1868) quando sua prática
tornou-se ilegal. Na época não havia dojos (academias), alguns praticantes aceitavam
poucos alunos em sigilo, sendo eles os pioneiros no desenvolvimento do Karate-Dō. Esse
desenvolvimento se deu de forma lenta e complexa por se tratar, a princípio, de uma arte
militar. Após a ocupação militar americana no Japão, professores qualificados pela Nihon
Karate Kyokai viajaram aos Estados Unidos a fim de difundir o Karate-Dō naquele país,
fundaram clubes esportivos e popularizaram o Karate-Dō em todo território americano, e em
outros países.

Karate-Dō co-relacionado com a Psicomotricidade é uma ação psicopedagógica


que utiliza a atividade corporal facilitando à criança suas relações com ela mesma, com os
objetos e com os outros, e as relações afetivas as quais constituem-se como a base interna
para todas as possibilidades de ação e reação da criança.

Na Educação Física Escolar, professor e aluno sempre estão frente a


oportunidades de articulação de múltiplas dimensões que a abordagem educacional do
esporte proporciona. A luta esportiva como o Karate-Dō abrange também essas
oportunidades por ter uma estrutura vinculada a princípios filosóficos que permeiam as
relações dentro e fora do ambiente escolar. Ações que visem incluir as Artes Marciais como
meio de potencializar o desenvolvimento do aluno, devem ser avaliadas com profunda
atenção pelos professores de Educação Física e equipe técnica das escolas (GALINDO,
2001).

1.1 Objetivos

Dessa forma, a presente pesquisa tem como objetivo geral:


12

- Utilizar o Karate-Dō e a Psicomotricidade como meio de potencializar o desenvolvimento


do equilíbrio e espaço temporal da criança.

São objetivos específicos:

- Difundir a ciência da Psicomotricidade e sua importância;

- Apresentar dados sobre o desenvolvimento infantil psicomotor de forma a dar subsídios a


uma análise das intervenções via Karate-Dō;

- Elucidar o aspecto educativo e lúdico do Karate-Dō co-relacionado com a


Psicomotricidade, dando continuidade ao esporte enquanto educação e formação social;

- Oportunizar a prática assistida do Karate-Dō junto a crianças da periferia a fim de reduzir


as perdas da limitação de espaço para as brincadeiras de rua através das seções práticas
de Karate-Dō e Psicomotricidade;

- Sociabilizar os estudos com associações de Karate-Dōdo estado do Ceará e entidades


envolvidas com Psicomotricidade, oportunizando-os a discutir as condições proporcionadas
pelo esporte no desenvolvimento psicomotor;

- Transmitir a todos o grande efeito no desenvolvimento da criança quando submetida a


práticas do Karate-Dō e de Psicomotricidade;

- Implementar pesquisas nas áreas da educação e do desporto.

1.2 Aspectos Metodológicos

Para tanto, o procedimento metodológico adotado partiu de uma pesquisa


teórico-reflexivo, com referências baseadas nos pressupostos de autores como: Drouet
(1993), Ferreira (2008), Fonseca (1995), Galindo (2001), Lopes de Sá (1988), Nakaiama
(1999) e outros especialistas, cujo procedimento caracterizou-se por uma revisão
bibliográfica.

Neste sentido, este trabalho monográfico foi estruturado em três capítulos


teóricos assim distribuídos. No capítulo dois faz-se algumas considerações sobre a
Psicomotricidade, sua definição e histórico mundial, além das repercussões no Brasil. Ainda
neste capítulo são apresentadas as áreas de atuação em Psicomotricidade, notadamente a
de Educação Psicomotora, a qual visa colaborar para um desenvolvimento saudável.
13

O capítulo três apresenta o Desenvolvimento Psicomotor Infantil com ênfase nos


fatores psicomotores apresentados por Victor da Fonseca (1995). A fim de dar
embasamento ao desenvolvimento em geral, são apresentadas algumas relações entre os
fatores psicomotores e a aprendizagem.

O capítulo quatro tem como foco o Karate-Dō, sua história e, principalmente,


contribuições na esfera educacional, filosófica e física. Estes dados são relevantes, pois
ajudam a compreender melhor de que forma o Karate-Dō pode contribuir para o
desenvolvimento psicomotor infantil, alvo da pesquisa de campo.

O capítulo cinco constitui-se de um capítulo prático o qual busca entrelaçar estas


duas áreas, Psicomotricidade e Karate-Dō, oferecendo uma visão sobre como a prática do
Karate-Dō contribui para o desenvolvimento psicomotor através de uma pesquisa de campo
realizada com crianças de 08 a 10 anos de idade as quais foram acompanhadas em seus
treinos nesta arte marcial e avaliadas segundo a Bateria Psicomotora. Os resultados desta
pesquisa de Campo sugerem que a evolução e refinamento dos aspectos relativos ao
Equilíbrio Estático e Dinâmico e a Orientação Espaço-temporal teve contribuição da prática
do Karate-Dō.

Encerrando este trabalho monográfico, as Considerações Finais enfatizam a


necessidade de se conhecer melhor os benefícios que o Karate-Dō pode dar junto ao
desenvolvimento infantil, principalmente psicomotor, além da necessidade de mais
pesquisas as quais possam relacionar estes benefícios propiciando um desenvolvimento
infantil otimizado, principalmente junto às comunidades carentes as quais não têm acesso
ao lazer e ao esporte conforme previsto em Constituição.
14

2 A PSICOMOTRICIDADE

A Psicomotricidade é hoje concebida como a integração superior da motricidade,


produto de uma relação inteligível entre a criança e o meio; é instrumento privilegiado
através do qual a consciência se forma e materializa-se. Historicamente o termo
Psicomotricidade aparece a partir do discurso médico, mais precisamente neurológico,
quando foi necessário, no final do século XIX, nomear as zonas do córtex cerebral situadas
mais além das regiões motoras (LEVIN, 1995).

O esquema anátomo-clínico que determinava para cada sintoma sua


correspondente lesão focal já não podia explicar alguns fenômenos patológicos. É,
justamente, a partir da necessidade médica de encontrar uma área que explique certos
fenômenos clínicos que se nomeia, pela primeira vez, o termo Psicomotricidade, no ano de
1870 (LUSSAC, 2008).

As primeiras pesquisas que dão origem ao campo psicomotor correspondem a


um enfoque eminentemente neurológico. Com o desenvolvimento e as descobertas da
neurofisiologia, começa a se constatar que há diferentes disfunções graves sem que o
cérebro esteja lesionado ou sem que a lesão esteja claramente localizada. São descobertos
distúrbios da atividade gestual, da atividade práxica. Com estas novas contribuições, a
Psicomotricidade diferencia-se de outras disciplinas, adquirindo sua própria especificidade e
autonomia (SBP, 2003).

A figura de Dupré, neuropsiquiatra, aparece com fundamental importância em


1909 para o âmbito psicomotor, pois o mesmo afirma a independência da debilidade motora,
antecedente do sintoma psicomotor, de um possível correlato neurológico. André Thomas e
Dargassie, neste mesmo período, dão início ao estudo sobre o tônus axial.

No ano de 1925, Wallon, médico e psicólogo, ocupa-se do movimento humano


fundamentando-o como instrumento na construção do psiquismo. Isso permite a ele
relacionar o movimento ao afeto, à emoção, ao meio ambiente e aos hábitos do indivíduo,
discursar sobre o tônus e o relaxamento.

Em 1935, o neurologista Guilmain desenvolve um exame psicomotor para fins de


diagnóstico, de indicação terapêutica e prognóstico. Ajuriaguerra, psiquiatra, redefine o
conceito de debilidade motora em 1947 e a considera como uma síndrome com suas
próprias particularidades. Ele delimita com clareza os transtornos psicomotores que oscilam
entre o neurológico e o psiquiátrico. Ajuriaguerra utilizou-se dos subsídios de Wallon em
15

relação ao tônus ao estudar o diálogo tônico. Já a relaxação psicotônica foi abordada por
Soubiran (SBP, 2003;ISPE-GAE, 2007).

2.1 Definição de Psicomotricidade

Segundo Fonseca (1995) a origem do conceito de Psicomotricidade está em


estudar a significação do corpo ao longo da civilização humana até os nossos dias a qual
sofreu inúmeras transformações.

Sob o ponto de vista do ser em ação e também abordando sob um enfoque


histórico-antropológico, podemos recorrer aos estudos de Harrow (apud OLIVEIRA, 2001),
que faz uma análise sobre o homem primitivo ressaltando como o desafio de sua
sobrevivência estava ligado ao uso do corpo e seu caráter utilitário e o desenvolvimento
psicomotor. As atividades básicas consistiam em caça, pesca e colheita de alimentos e,
para isto, as estruturas psicomotoras eram essenciais para a continuação da existência em
grupo: necessitavam de agilidade, força, velocidade, coordenação.

A recreação, os ritos cerimoniais e as danças em exaltação aos deuses, a


criação de objetos de arte também eram outras atividades desenvolvidas pelo homem
primitivo. Ele teve que estruturar suas experiências de movimentos em formas utilitárias
mais precisas.

Hoje, o homem também necessita destas habilidades embora tenha se


aperfeiçoado mais para uma melhor adaptação ao meio em que vive. Necessita ter um bom
domínio corporal, boa percepção auditiva e visual, uma lateralização bem definida,
faculdade de simbolização, orientação espaço-temporal, poder de concentração, percepção
de forma, tamanho, número, domínio dos diferentes comandos psicomotores como
coordenação fina, global, equilíbrio. Harrow (apud OLIVEIRA, 2001) cita ainda os sete
movimentos ou modelos de movimentos básicos inerentes ao homem que são: correr,
saltar, escalar, levantar peso, carregar (no sentido de transportar), pendurar e arremessar;
todos eles básicos em trabalhos de práticas e vivências psicomotoras atuais.

A Psicomotricidade é uma ciência terapêutica, é uma neurociência que


transforma o pensamento em um ato motor harmônico coordenado e organiza as ações
gerenciadas pelo cérebro e as manifesta em conhecimento e aprendizado. Portanto, a
Psicomotricidade é a manifestação corporal do invisível de maneira visível. Foi adotada na
16

Europa há mais de 60 anos, principalmente na França, que instituiu o primeiro curso


universitário de Psicomotricidade em 1963 (ISPE-GAE, 2007). Mas como defini-la?

Fonseca nos diz que, a psicomotricidade tende atualmente a ser


reconceitualizada, não só pela “intrusão” de fatores antropológicos, filogenéticos,
ontogenéticos, paralingüísticos, como essencialmente cibernéticos e psiconeurológicos. É
na integração transdisciplinar destas áreas do saber que provavelmente se colocará no
futuro a evolução e atualização do conceito de psicomotricidade (FONSECA, 1995). Deste
modo, Fonseca expõe um fato comum que ocorre em todas as áreas da Ciência, devido à
quantidade de informações que devem ser compartilhadas, pelas atuações e trabalhos
transdisciplinares, e pelos diferentes novos olhares e abordagens que vêm surgindo a todo
instante nas mais diferentes áreas.

O desenvolvimento motor está relacionado às áreas cognitiva e afetiva do


comportamento humano, sendo influenciado por muitos fatores. Dentre eles
destacam os aspectos ambientais, biológicos, familiar, entre outros. Esse
desenvolvimento é a contínua alteração da motricidade, ao longo do ciclo da
vida, proporcionada pela interação entre as necessidades da tarefa, a
biologia do indivíduo e as condições do ambiente (GALLAHUE, 2005, p. 03).

Psicomotricidade, portanto, é um termo empregado para uma concepção de


movimento organizado e integrado, o qual baseia-se nas experiências vividas pelo indivíduo
através de suas ações, resultado de sua própria individualidade, linguagem e processo de
socialização (SBP, 2003).

Nas palavras de Defontaine (apud OLIVEIRA, 2001, p.28): “La Psychomotricité


est le désir de faire, du vouloir faire; lê savoir faire et le pouvoir faire”.1Defontaine declara
que só poderemos entender a Psicomotricidade através de uma triangulação:corpo, espaço
e tempo usados para definir os dois componentes da palavra Psicomotricidade:“[...] psico
significando os elementos do espírito sensitivo, e motricidade traduzindo-se pelo movimento,
pela mudança no espaço em função do tempo e em relação a um sistema de referência”
(DEFONTAINE apud OLIVEIRA, 2001, p. 35).

Nicola (2004)fornece outro conceito pautado na soma do termo motricidade com


o prefixo psico:

Motricidade: por definição conceitual é a propriedade que têm certas células


nervosas de determinar a contração muscular. Psico (Gr Psyquê): vem
representar a alma, o espírito, o intelecto. Psicomotricidade [seria então]:
condição de um estado de coisas corpo/mente. Visão global de um

1
“A Psicomotricidade é um caminho, é o desejo de fazer, de querer fazer; o saber fazer e o
poder fazer.”
17

indivíduo, onde a base de atuação está no conhecimento desta fusão


(NICOLA, 2004, p. 05).

Uma observação a ser feita refere-se ao olhar de Fonseca (apud OLIVEIRA,


2001) o qual afirma que se deve tentar evitar uma análise desse tipo para não cair no erro
de enxergar dois componentes distintos: o psíquico e o motor, pois ambos se entrelaçam
para determinar a Psicomotricidade.

De modo geral, os psicomotricistas não costumam utilizar o termo motricidade,


pois enxergam a motricidade indissociável da psique humana. O termo motricidade é mais
utilizado pela área da Educação Física no âmbito da perspectiva do treinamento esportivo,
ligado à coordenação motora como qualidade física, sendo interpretado de forma diferente
da perspectiva da Psicomotricidade.

Para Nicola (2004), uma conceituação atual de Psicomotricidade é que esta


ciência nova, cujo objeto de estudo é o homem nas suas relações com o corpo em
movimento, encontra sua aplicação prática em formas de atuação que configuram uma nova
especialidade: “A Psicomotricidade estuda o homem na sua unidade como pessoa”
(NICOLA, 2004, p. 05).

Visto desta forma, a Psicomotricidade para Fonseca (apud OLIVEIRA, 2001) não
é exclusiva de um novo método, escola ou corrente de pensamento, nem constitui uma
técnica, um processo, mas sim visa fins educativos pelo emprego do movimento humano.

Loureiro (apud ISPE-GAE, 2007) coloca que a Psicomotricidade é a otimização


corporal dos potenciais neuropsico cognitivos funcionais, sujeitos às leis de desenvolvimento
e maturação, manifestados pela dimensão simbólica corporal própria, original e especial do
ser humano. Vendo sob esse ângulo, Psicomotricidade é uma ciência de síntese, a qual
através da pluralidade de seus enfoques, procura elucidar os problemas que afetam as
interrelações harmônicas, constituindo-se estas como a unidade do ser humano e sua
convivência com os demais (COSTALLAT apud ISPE-GAE, 2007).

Coste (1989, p.09) aponta ainda que Psicomotricidade “[...] é uma ciência-
encruzilhada em que se cruzam e se encontram múltiplos pontos de vista, e que utiliza
aquisições de numerosas ciências constituídas (biologia, psicologia, psicanálise, sociologia
e linguística). Para Barreto (apud MOLINARI e SENS, 2003, p. 87) ela refere-se a “[...]
integração do indivíduo utilizando, para isso, o movimento e levando em consideração os
aspectos relacionais ou afetivos, cognitivos e motrizes. É a educação pelo movimento
consciente, visando melhorar a eficiência e diminuir o gasto energético. ”Rosa Neto (2002,
18

p. 12) concorda com este olhar e diz: “A motricidade é a interação de diversas funções
motoras (perceptivomotora, neuromotora, psicomotora, neuropsicomotora, etc.).”

Já na visão de De Meur e Staes (1991, p. 5)“[...] a psicomotricidade quer


justamente destacar a relação existente entre a motricidade, a mente e a afetividade e
facilitar a abordagem global da criança por meio de uma técnica.” Este pensamento
complementa o que expõe Chazaud (apud ALVES, 2003, p. 15)ao sugerir que “[...] a
psicomotricidade consiste na unidade dinâmica das atividades, dos gestos, das atitudes e
posturas, enquanto sistema expressivo, realizador e representativo do `ser em ação e da
`coexistência´ com outrem.” Estes autores ligam a Psicomotricidade à afetividade e às
relações interpessoais, ampliando o olhar sobre o indivíduo.

A Psicomotricidade pode ser vista então como uma forma de relacionar-se


através da ação, ou seja, um meio de tomada de consciência que une o ser corpo, o ser
mental, o ser espiritual, o ser natureza e o ser sociedade. Na Psicomotricidade o indivíduo
utiliza seu corpo para demonstrar o que sente, isso comprova que ela está associada à
afetividade e à personalidade do indivíduo.

Há uma área do conhecimento que trata a motricidade como um dos seus


objetos teóricos e práticos de estudo: é a da Ciência da Motricidade Humana - CMH, ou
Cineantropologia, articulada com um corpo epistemológico próprio e que enfoca a
motricidade sob um paradigma diferente do da Psicomotricidade.

O conceito de Ciência da Motricidade Humana do Programa de Ciência da


Motricidade Humana da Universidade Castelo Branco (RJ) encontra-se abaixo:

Ciência da Motricidade Humana é a área do saber que estuda as múltiplas


possibilidades intencionais de interpretação do ser do Homem e de suas
condutas e comportamentos motores no âmbito da fenomelalogia
existencial transubjetiva e da filosofia dos valores, ou seja, a partir da
complexidade cultural de uma vida existencial inserida em um contexto de
circunstância e facticidade e de corporeidade de um ‘ser humano’, do ‘ente’
(do Ser do Homem), em um permanente estado de necessidades, oriundas
de suas carências, privações ou vacuidades de natureza: bio-físicas; bio-
psíquicas ou emocionais; bio-morais (bioética) ou humanas; bio-sociais ou
históricas; e bio-transcendentes ou cósmicas. Tais possibilidades de
interpretação são operacionalizadas de forma multidisciplinar,
interdisciplinar, transdisciplinar e através dos mecanismos cognoscitivos da
pré-compreensão fenomenológica, da explicação fenomênica e da
ordenação axiológica (BERESFORD, 2004, on line).

Nesta citação, e também em outros trabalhos de autores que compõem o corpo


epistemológico da CMH, nos deparamos com diversos conceitos que são encontrados nesta
área como: conduta motora, comportamento motor, corporeidade, comunicação motora,
19

ergomotricidade, ludomotricidade, ludoergomotricidade, entre outros. Para dar maior


objetividade, encontra-se a seguir uma definição de motricidade dentro da perspectiva da
CMH:

Motricidade: Processo adaptativo, evolutivo e criativo de um ser práxico,


carente dos outros, do mundo e da transcendência. Intencionalidade
operante, segundo Maurice Merleau-Ponty. O físico, o biológico e o
antropossociológico estão nela, como a dialética numa totalidade. Como ser
carente, o homem é um ser práxico e onde, por isso, a motricidade se
afirma na intencionalidade electiva. Mas a motricidade humana e,
consequentemente, cultura, acima do mais – cultura não ancilosada em
erudição inerte, mas cultivada porque praticada. A motricidade não se
confunde com a motilidade. Esta não excresce a faculdade de execução de
movimentos que resultam da contração de músculos lisos ou estriados. A
motricidade está antes da motilidade, porque tem a ver com os aspectos
psicológico, organizativo, subjetivo do movimento. A motricidade é o virtual
e a motilidade, o atual, de todo o movimento. Afinal, a motilidade é
expressão da motricidade (CUNHA, 1994, p. 156).

Quando se aborda a motricidade humana, a psique humana não é deixada de


fora, portanto, certos embates semânticos não merecem tantas linhas de discussão. É
necessário observar os objetos de estudo sob a perspectiva de cada área do conhecimento
para uma compreensão isenta de poluição epistemológica ou preconceito científico.

2.2 Histórico da Psicomotricidade no Brasil

A Psicomotricidade no Brasil foi norteada pela escola francesa. Durante as primeiras


décadas do século XX, época da primeira guerra mundial, quando as mulheres adentraram
firmemente no trabalho formal enquanto suas crianças ficavam nas creches, a escola
francesa também influenciou mundialmente a psiquiatria infantil, a psicologia e a pedagogia.
Em 1909, a figura de Dupré, neuropsiquiatra, é de fundamental importância para o âmbito
psicomotor, já que é ele quem afirma a independência da debilidade motora, antecedente do
sintoma psicomotor, de um possível correlato neurológico. Neste período o tônus axial
começava a ser estudado por André Thomas e Saint-Anné Dargassie. Em 1925, Henry
Wallon, médico psicólogo, ocupa-se do movimento humano dando-lhe uma categoria
fundante como instrumento na construção do psiquismo. Esta diferença permite a Wallon
relacionar o movimento ao afeto, à emoção, ao meio ambiente e aos hábitos do indivíduo, e
discursar sobre o tônus e o relaxamento. Em 1935, Edouard Guilmain, neurologista,
desenvolve um exame psicomotor para fins de diagnóstico, de indicação da terapêutica e de
prognóstico. Em 1947, Julian de Ajuriaguerra, psiquiatra, redefine o conceito de debilidade
20

motora, considerando-a como uma síndrome com suas próprias particularidades. É ele
quem delimita com clareza os transtornos psicomotores que oscilam entre o neurológico e o
psiquiátrico. Ajuriaguerra aproveitou os subsídios de Wallon em relação ao tônus ao estudar
o diálogo tônico. A relaxação psicotônica foi abordada por Giselle Soubiran (SBP, 2003) e
(ISPE-GAE, 2007).

Na década de 70, diferentes autores definiram a Psicomotricidade como uma


motricidade de relação, enquanto na mesma época, profissionais estrangeiros convidados
vinham ao Brasil para a formação de profissionais brasileiros. Em 1972, Costallat, estagiária
de Ajuriaguerra e Soubiran em Paris, foi convidada a falar em Brasília às autoridades do
Ministério da Educação, sobre seus trabalhos em deficiência mental e iniciou contatos e
trocas permanentes com profissionais no Brasil (ISPE-GAE, 2007).

Em 1977 foi fundado o Grupo de Atividades Especializadas (GAE), que veio a


promover a partir de 1980 vários encontros nacionais e latino-americanos. O 1° Encontro
Nacional de Psicomotricidade foi realizado em 1979. O GAE é responsável pela parte clínica
e o Instituto Superior de Psicomotricidade e Educação (ISPE), destinado à formação de
profissionais em Psicomotricidade. Este se dedica ao ensino de aplicações da
Psicomotricidade em áreas da saúde e da educação.

A Sociedade Brasileira de Psicomotricidade (SBP), entidade de caráter científico-


cultural sem fins lucrativos, foi fundada em 19 de abril de 1980 com o intuito de lutar pela
regulamentação da profissão, unir os profissionais da Psicomotricidade e contribuir para o
progresso da ciência, promovendo congressos, encontros científicos, cursos, entre outros.

Começa, então, a ser delimitada uma diferença entre a postura reeducativa e


uma terapêutica, já demonstrando diferenças em intervenções da Psicomotricidade, e que,
ao despreocupar-se da técnica instrumentalista e ao ocupar-se do corpo em sua
globalidade, vai dando, progressivamente, maior importância à relação, à afetividade e ao
emocional, acompanhando as tendências do momento pelo qual passava(SBP, 2003).

Em 1982, o ISPE-GAE realizou o vínculo científico-cultural com a Escola


Francesa através da delegação brasileira da Organisation Internationale de Psychomotricité
et de Relaxation (OIPR).

A Sociedade Brasileira de Psicomotricidade, desde os anos de 80, pela


necessidade de ampliar seus objetivos, está presente, em vários estados, promovendo
cursos, seminários e pesquisas, com bons trabalhos científicos, acontecendo vários
congressos nacionais, com repercussão internacional:
21

CONGRESSO PRESIDENTE LUGAR ANO


I O Corpo em Movimento Beatriz Saboya Rio de Janeiro/RJ 1982
II O Corpo Integrado Maria Terezinha Araújo Belo Horizonte/MG 1984
III Psicomotricidade: seu
objeto, seu espaço, seu Maria Aparecida Babst Porto Alegre/RS 1986
tempo.
IV A Imagem do Corpo Regina Morizot Rio de Janeiro/RJ 1989
V O Sujeito na Prática
Katia Godinho Salvador/BA 1992
Psicomotora
VI Especificidade da
Vera Lúcia Matos Rio de Janeiro/RJ 1995
Psicomotricidade
VII Psicomotricidade de Fato
e de Direito, Formação e Dayse Campos de Sousa Fortaleza/Ceará 1998
Ética.
VIII Psicomotricidade: da
Leila Manso Leon Rio de Janeiro/RJ 2001
prevenção ao tratamento
IX Psicomotricidade uma
Ibrahim Danyalgil Junior Recife/PE 2004
realidade transdisciplinar
XInterfaces da
Maria do Carmo Façanha Fortaleza/CE 2007
Psicomotricidade.
TABELA1 - Congressos Nacionais da Sociedade Brasileira de Psicomotricidade (SBP,
2012).

Um grande marco do VII Congresso foi a fundação da Rede Fortaleza Latino-


Americana de Universidades com Formação em Psicomotricidade, aberta e a ser integrada
por todas as instituições de caráter universitário da Latino-américa com formação em
Psicomotricidade. Seus principais objetivos são conseguir o pleno reconhecimento da
profissão de psicomotricista na região, procurando atuar em forma conjunta e colaborando
com as diferentes instituições científicas e gremiais que atuam no âmbito da
Psicomotricidade. A Rede foi formada com a presença de profissionais do Uruguai,
Argentina, Chile e Brasil e conta com uma lista de discussão na internet
(www.chasque.apc.org/psicomot.).

Em janeiro de 2000, teve início a Especialização em Psicomotricidade na


Universidade Estadual do Ceará – UECE, Brasil. Este projeto foi elaborado por Dayse
Campos de Sousa e até o presente momento acontece sob sua coordenação na capital,
terminando neste ano a turma e está sendo estendido para o interior do estado. Em 2001
iniciou a primeira turma no município de Tauá. Atualmente, estamos concluindo formação da
22

09ª turma, e através de muito esforço e divulgação, produz frutos com a defesa de mais de
250 monografias e o outorgamento de títulos de Especialista em Psicomotricidade (SOUSA,
2012).

De acordo com Rosa Neto (2002), na atualidade, existe um grande número de


profissionais de áreas diversas que utilizam a Psicomotricidade em diferentes contextos e
em diferentes faixas etárias, como em escolas, clínicas de reabilitação, academias, hospitais
e outros. Segundo este autor:

Profissionais de medicina (pediatria, psiquiatria, neurologia e reabilitação


infantil); psicologia (psicologia evolutiva, do esporte e especial); educação
física e pedagogia (ensino regular e fundamental); fisioterapia e
fonoaudiologia. A análise dessa realidade leva à busca de critérios claros
que justifiquem tal situação de heterogeneidade, tanto no âmbito da
interpretação de aspectos teóricos fundamentais como nas decisões
relativas à sua aplicação (ROSA NETO, 2002, p. 12).

2.3 Áreas de atuação em Psicomotricidade

Em estudos recentes de pesquisadores são apontados três principais


campos de atuação ou formas de abordagem da Psicomotricidade: 1.
Reeducação Psicomotora; 2. Terapia Psicomotora; e 3. Educação
Psicomotora. Embora em certos trabalhos esses três níveis de atuação
cheguem a confundir-se, existem características próprias em cada um deles
(MELLO, 2002, p. 33).

De Muer e Staes (1991, p.23) afirmam: “A reeducação psicomotora – como qualquer


outra reeducação – deve começar o mais cedo possível: quando mais nova for a criança sob
nossa responsabilidade, menos longa será a reeducação. ”É relativamente fácil fazer com
que uma criança bem nova adquira as estruturas motoras ou intelectuais corretas; mas se a
criança já assimilou esquemas errados, o reeducador deverá primeiro fazer com que os
esqueça, antes de poder inculcar-lhe os esquemas corretos. A reeducação é urgente sobre
tudo para os problemas afetivos. Quanto mais o tempo passa, mais a criança se bloqueia
em um tipo de reação, sente-se mais angustiada, e as punições ou observações de seus
conhecidos só agravam essa angústia. A reeducação ajudará a adotar um novo
comportamento e, pouco a pouco, os que a cercam a verão de forma mais positiva.

Desta forma, trabalhando a função motora, o desenvolvimento intelectual e afetivo,


também o professor estará ajudando-a a construir uma vida melhor. Caso haja um
retardamento dessa ajuda esta criança possivelmente crescerá com dificuldades, afetando-a
23

de forma negativa. Ao necessitar de uma reeducação psicomotora, necessita também de


tratamentos para que possa superar as negligências educacionais que teve em seu passado
escolar. Como afirmam De Muer e Staes (1991, p. 23):

[...] os pais ou os educadores deixaram que as dificuldades se


acumulassem (e até as reprovações escolares), por não terem
compreendido que o problema estava na própria base das aprendizagens,
ou por não terem se convencido bem cedo da pertinência de uma
reeducação.

Por outro lado, o campo de atuação do terapeuta psicomotor abrange a mesma


área que as atividades do psicólogo. O terapeuta psicomotor trata pessoas que têm
problemas. A diferença é que um psicólogo somente fala com as pessoas, enquanto que,
parte do tempo, o terapeuta psicomotor se utiliza de atividades que abrangem o campo de
experiência física e de movimento. A experiência física inclui concentração na experiência e
na percepção do próprio corpo do indivíduo, e pode-se pensar em relaxamento e exercícios
respiratórios, entre outras coisas. Movimentos incluem treinamentos como são feitos em
esportes e em Educação Física. E, para isto, não é importante como se faz alguma coisa,
mas como se experimenta e se trata com isso.

Durante a terapia psicomotora, a pessoa e o terapeuta psicomotor vão observar


como, em várias situações, a pessoa trata a ela mesma, aos outros e o material. Será
priorizada uma relação de qualidade, em que o paciente terá um atendimento
individualizado, com um enfoque especial em seu caso particular, dentro de um histórico
próprio, utilizando-se também de outros meios, para auxiliar no diagnóstico e nos sintomas
específicos de cada caso, ajudando a resgatar etapas que possam ter sido queimadas.
Portanto, sendo possível organizar-se em nível simbólico, através do jogo psicomotor que
põe em ação o jogo fantasmático e relacional, é possível também obter ajuda na
estruturação do corpo próprio do mundo através de novas possibilidades de conhecimento e
de ação mais organizada, permitindo ao sujeito tomar posse de si mesmo como uma pessoa
integrada.

É possível para a criança sem treinos específicos de determinadas habilidades,


superar defasagens evolutivas importantes, pois ela busca espontaneamente atividades que
serão facilitadoras de seu desenvolvimento. Assim, a terapia psicomotora, torna-se válida
como técnica, agindo sobre as origens dos distúrbios psicomotores, buscando ultrapassá-los
a partir da própria vontade da criança em crescer e prosseguir na direção da sua cura
(BEZERRA, 2012).
24

As práticas da Psicomotricidade geralmente se desenvolvem com atividades que


objetivam movimento, possuindo uma extensa ligação com o desenvolvimento,
aprendizagem e a personalidade da criança. No caso da Educação Psicomotora, esta é uma
técnica a qual, através de exercícios e jogos adequados a cada faixa etária, leva a criança
ao desenvolvimento global de ser. Devendo estimular, de tal forma, toda uma atitude
relacionada ao corpo, respeitando as diferenças individuais (o ser é único, diferenciado e
especial) e levando a autonomia do indivíduo como lugar de percepção, expressão e criação
em todo seu potencial. Trata-se de uma técnica que objetiva ampliar as possibilidades de
maturação e interações da criança, sendo que deve ser considerada antes de tudo uma
experiência ativa de confrontação com o meio interno e externo. Porque a partir deste
contato, irá permitir uma integração de estímulos deste ambiente, favorecendo o seu
ajustamento com outras crianças. Isto pode ser possível também através de jogos,
atividades lúdicas, motoras, fontes de prazer, e remetendo neste contexto toda uma
organização e sua imagem no corpo, em relação às suas vivências (BEZERRA, 2012).

O Laboratório de Currículos da Secretaria de Educação do Estado do Rio de


Janeiro em 1981 definiu a Educação Psicomotora como a educação da criança através de
seu próprio corpo e de seu movimento. A criança é vista em sua totalidade e nas
possibilidades que apresenta em relação ao meio ambiente, isto é, a educação deve ser
feita em função da idade e dos interesses das crianças.

Desta forma, a passagem de uma fase para outra será gradativa e dentro do
tempo próprio de cada criança. O professor deve acompanhar este tempo sem tentar forçar
uma antecipação. Por isso, a Psicomotricidade tem como ponto de partida o
desenvolvimento psicológico da criança, na medida em que acompanha as leis do
amadurecimento do Sistema Nervoso Central através da mielinização. Uma das suas
finalidades é preparar a base para a educação daquelas capacidades indispensáveis à
aprendizagem escolar, evitando dificuldades tão comuns à alfabetização (ARAÚJO, 1998).
25

3 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR INFANTIL

Vygotsky (1998) já dizia que o desenvolvimento da criança é objeto de


interferência de instituições sociais e sistemas educacionais, como família, escola, igreja,
que ajudam a construir o próprio pensamento e descobrir o significado da ação do outro e
de sua ação. Ele define o desenvolvimento como mudanças progressivas, a partir de um
estado de indiferenciação. De forma única, o curso do desenvolvimento para ele se dá a
partir de interações simbólicas básicas com outros sujeitos sociais mais maduros e
competentes (SOUSA, 2007).

Por outro lado, a organização do sistema nervoso também tem um peso no


desenvolvimento infantil e é ricamente estimulada pela interação entre o indivíduo e o
ambiente. Desta forma estes dois aspectos terão impacto sobre o desenvolvimento,
notadamente o psicomotor, alvo de atenção doravante.

3.1 Fatores Psicomotores

A motricidade e a inteligência na criança se desenvolvem como resultado da


interação de fatores genéticos, culturais, ambientais e psicossociais.

O desenvolvimento funcional de todo o corpo e suas partes possui como base a


estruturação do desenvolvimento psicomotor, a qual, segundo Fonseca (1995), apresenta
sete fatores: tonicidade, equilíbrio, lateralidade, noção corporal, estruturação espaço-
temporal e praxias fina e global.

Tonicidade

A tonicidade relaciona-se ao tono muscular e tem um papel fundamental no


desenvolvimento psicomotor, pois garante as atitudes, a postura, as mímicas e as emoções,
de onde emergem todas as atividades motoras humanas.

O tônus é o início de tudo, é o fator fundamental da Psicomotricidade, tanto que


está localizado na 1ª unidade neurofuncional de Lúria, fazendo parte assim do alicerce da
vida afetiva, motora e cognitiva, trazendo a base para a constituição da aprendizagem, cuja
função é de alerta e de vigilância, tendo papel fundamental no desenvolvimento motor e
psicológico (FONSECA, 1995)
26

As funções do tônus são descritas por diversos autores de maneiras diferentes,


de acordo com as áreas de estudo de cada um, e encontramos em todas as definições a
importância desta para a realização do movimento corporal.

Segundo Wallon (apud FONSECA, 1992) são duas as funções do músculo: a de


encurtamento e alongamento das miofibrilas, e a de suporte, mantendo o apoio à
musculatura esquelética em estado de repouso. As duas funções dependem do nível inferior
medular e superior reticular e cortical. Este tônus a que Wallon se refere, é o tônus postural,
responsável por toda equilibração no ser humano. Já para André Tomas, Ajuriaguerra e
Dargassies (apud FONSECA,1992), existem duas formas de tonicidade: a de repouso e a
de atividade, sendo que ambas preparam a musculatura para as atividades postural e
práxicas.

Sherrington (apud FONSECA,1992) referiu-se à tonicidade na integração entre


várias partes do sistema nervoso, para que se possa realizar um movimento.A hipotonia ou
a hipertonia estão relacionadas ao tônus de suporte com base na extensibilidade e
passividade, muito importante na qualidade do movimento.

Subfatores da Tonicidade:

 Extensibilidade

A extensibilidade é definida por Ajuriaguerra como o maior comprimento possível


que podemos imprimir a um músculo afastando as suas inserções.

Por meio da sua observação, podemos constatar o grau de mobilização e de


amplitude que uma dada articulação atinge, ou seja, avaliar o ângulo que estabelecem dois
segmentos ósseos unidos pela mesma articulação, isto é, amplitude entre uma aproximação
e um afastamento máximo. A distância que separa as duas extremidade representa o grau
de extensibilidade do músculo considerado (FONSECA, 2012).

As crianças hipoextensas são consideradas hipertônicas e as hiperextensas são


hipotônicas. Essas condições até determinados limites são consideradas adequadas;
somente em casos extremos tais perfis tônicos apontam para sinais desviantes em termos
de organização tônicomuscular e de limitação ou não de movimento à volta das articulações.

A extensibilidade na Bateria Psicomotora (BPM) é averiguada nos membros


inferiores e superiores, desde as articulações proximais até as distais, passando pelas
intermédias, abrangendo a exploração da musculatura proximal e distal.
27

 Passividade

Passividade é a capacidade de relaxamento passivo dos membros e suas


extremidades distais (pé, mão) durante mobilizações, oscilações e balanços bruscos e
ativos colocados exteriormente pelo observador que visa provocar a sensibilidade do peso
dos membros e dos movimentos passivos nas extremidades distais da criança observada.

Trabalhado esse subfator envolvemos a mobilização dos quatro membros e das


suas respectivas extremidades.

 Paratonia

Dupré (1952) a vê dentro do seu conceito de debilidade motora, como um estado


patológico, exposto pelo exagero dos reflexos tendinosos, por perturbações nos reflexos
plantares, sincinesiais e descoordenação dos movimentos intencionais, impossibilitando a
realização voluntária da resolução motora.

Na paratonia ao invés de uma modulação tônica, instala-se uma contratura, um


bloqueio e aumento do tônus impedindo a autodescontração necessária ao movimento
harmonioso, em conseqüência desta falta de modulação tônica, os movimentos tendem a
ser produzidos como uma reação ou uma descarga em massa, afetando a sua adequação,
plasticidade e melodia.

Podemos observar as paratonias tanto nos membros superiores quanto nos


inferiores, por meio de mobilizações passivas e de quedas.Essa observação das paratonias
está associada de forma natural à observação da tonicidade de repouso e também com a
lateralização, pois os membros dominantes acusam menos extensibilidade; desta forma
tendem a apresentar resistência maior nas manobras de manipulação.

 Diadococinesias

Quirós e Schrager (1978) definem as diadococinesias como a função motora que


permite a realização de movimentos vivos, simultâneos e alternados. É a realização
coordenada, sucessiva e antagônica de movimentos com ambas as mãos, ativando a
coordenação cerebelosa.

Deve-se verificar o jogo agonista-antagonista; as resistências tônicas, proximais


e distais; a amplitude, o ritmo, a velocidade e a duração dos movimentos de pronação e
supinação, as diadococinesias, as crispações dos dedos, as reações arrítmicas decorrentes
da simultaneidade e alternância dos movimentos rápidos e vivos das extremidades; a
presença dos movimentos associados involuntários; a discrepância dos movimentos da mão
28

direita e da mão esquerda e, entre elas, a que possui mais velocidade e regularidade na
amplitude etc. Ao mesmo tempo, deve-se registrar as reações tônico-emocionais emergidas
e as sincinesias contralaterais e linguais concomitantes (FONSECA, 2012).

Sincinesias

São os movimentos efetivamente não intencionais, desnecessários, cuja


eliminação exige a inibição tônico-sinética. Para Ajuriguerra e Soubiran (1962) trata-se de
reações parasitas de imitação dos movimentos contralaterais e de movimentos peribucais
ou linguais.

As sincinesias traduzem de alguma forma movimentos associados que


acompanham a realização no movimento intencional o que vem a prejudicar a sua precisão
e eficácia, o que pode ocasionar falta de informação dos fusos neuromusculares que não
registram devidamente as variações da atividade motora e tônica-sinética, afetando a
segmentação progressiva do próprio movimento.

A intensidade das sincinesias e a sua duração podem afetar a coordenação dos


movimentos, além de fornecerem dados valiosos para determinar a lateralidade tônico-
motora da criança (FONSECA, 2012).

Equilíbrio

O equilíbrio postural humano é definido como a manutenção da posição de


equilíbrio, tanto estático quanto mecânico, do corpo humano (FERREIRA, 2008). Este, por
sua vez, fica na dependência de um minucioso controle realizado pelo Sistema Nervoso
Central (SNC) sobre os músculos e articulações, de tal maneira que o corpo seja capaz de
sustentar certas posições estáticas sem ser vencido pela força gravitacional ou ainda
deslocando-se através de movimentos harmoniosos resistindo às forças contrárias.

Este controle é inconsciente, porém constante e dinâmico, com exceção de


quando o corpo encontra-se em repouso (deitado), pois para mantê-lo em determinada
posição é necessário que haja tensão muscular, sendo que à medida que os movimentos
são realizados, ocorre uma adequação dessa tensão.

Este equilíbrio é fundamental, uma vez que, diferentemente dos outros animais
terrestres, os humanos utilizam somente dois membros para locomover-se. Para que o SNC
possa realizar os devidos ajustes constantemente, é imprescindível que o mesmo receba
informações precisas ininterruptamente a respeito de cada uma das partes do corpo.
29

Esta informação deriva-se de diferentes fontes. Em contrapartida, os receptores


sensitivos presentes na pele e articulações encaminham informações ao encéfalo sobre a
situação do corpo no espaço e sobre a posição relativa de cada parte do corpo.

Já a visão é responsável por propiciar uma imagem global da situação do corpo


em relação ao espaço que o envolve. Por fim, há também o aparelho vestibular localizado
no ouvido interno que fornece informações sobre a posição e os movimentos da cabeça. A
informação recebida por todas as partes do corpo chega ao encéfalo de forma constante,
especialmente aos centros nervosos situados no tronco cerebral e no cerebelo, locais onde
ocorre a análise automática das mesmas para que, por conseguinte, sejam enviadas aos
músculos ordens adequadas com a necessidade em questão.

O equilíbrio reúne um conjunto de aptidões estáticas (sem movimento) e


dinâmicas (com movimento), equilíbrio recuperado relacionado à gravidade, abrangendo o
controle postural e o desenvolvimento das aquisições de locomoção.

O equilíbrio estático caracteriza-se pelo tipo de equilíbrio conseguido em


determinada posição, ou de apresentar a capacidade de manter certa postura sobre uma
base.O equilíbrio dinâmico é aquele conseguido com o corpo em movimento, determinando
sucessivas alterações da base de sustentação.

O equilíbrio recuperado explica a recuperação do equilíbrio após o corpo ter


executado um movimento complexo em relação à gravidade.

Subfatores do Equilíbrio:

 Imobilidade

A imobilidade é definida pór Guilmain e Guilman (1971) como a capacidade de


inibir voluntariamente todo e qualquer movimento durante um curto lapso de tempo.

Por meio da sua observação, podemos avaliar a capacidade da criança em


conservar o equilíbrio com os olhos fechados, os ajustamentos posturais, as reações tônico-
emocionais (ansiedade, turbulência, instabilidade etc.), os movimentos faciais, os
movimentos involuntários, como gesticulações, sorrisos, oscilações multidirecionais e
unidirecionais, distonias, os movimentos coreiformes e atetotiformes etc., isto é, apreciar o
grau de controle vestibular e cerebeloso da postura.

A rigidez corporal, os desvios da simetria, a observação dos pés, dos joelhos, do


tronco, dos braços e das mãos, embora indiretos, podem classificar outros sinais relevantes
nessa tarefa. Por exemplo, a criança inibida apresenta normalmente uma blocagem tônico-
30

respiratória, crispações peribucais e periorbitais, mímicas de hipercontrole, insegurança


geral etc. Já a criança instável, em contrapartida, apresenta outros tipos de sinais, como a
instabilidade, oscilações variadas, reequilibrações abruptas, descontrole, sorrisos,
gesticulações múltiplas etc (FONSECA, 2012).

Ver se a imobilidade é assegurada pelos músculos da superfície, como o reto


abdominal e a quadricípete femural, e apreciar o grau de disponibilidade tônica são fatores
importantes a ter em conta. Turbulência, agitação, compensações exageradas,
hiperextensões, tremulações e flutuações são outros sinais difusos significativos que
caracterizam a relação deste subfator da equilibração.

Dentro dos sinais difusos que traduzem disfunções vestibulares e cerebelosas,


temos a referir essencialmente os seguintes:

- Movimentos faciais: movimentos involuntários da cabeça – rotações e inclinações


esporádicas; distonias periorais e perioculares; movimentos irregulares da boca, dos lábios
e da língua; foações e deglutinações; movimentos bruscos descontrolados, crispações
faciais localizadas etc.;

- Gesticulações: movimentos involuntários do tronco; desvios simétricos e assimétricos;


movimentos abruptos e explosivos dos braços – endorrotações e exorrotações; flexões e
extensões; abduções e aduções; desalinhamento incessante da cabeça, do tronco e da
bacia; disquinesias, contorções bizarras; movimentos pseudocoreiformes proximais (ombro)
e distanciais (dedos); movimentos intempestivos pouco econômicos; movimentos coreico-
atetósicos; movimentos coreáticos grosseiros e amplos; movimentos atetóides lentos e
irregulares dos dedos etc.;

- Sorrisos: expressões mímicas inadequadas, atividade caricatural desordenada e sem


relação com a tarefa; desbloqueios tônico-emocionais; manifestações emocionais
transitórias; sorrisos mioclônicos breves e em descarga etc.;

- Oscilações: flutuações ligeiras da postura, oscilações rítmicas, mioclonais involuntárias e


bruscas, reequlibrações do deslocamento do centro de gravidade direita – esquerda, frente
– trás; oscilações unidirecionais seguidas de reequilibrações explosivas abruptas e mal
controladas; oscilações multidirecionais irregulares, desarmônicas e hesistantes;
desequilíbrio unidirecional e multidirecional mal compensado e inibido;

- Rigidez Corporal: distonias, disquinesias cervicais, defeitos estáticos, contrações


involuntárias dos tendões do tibial anterior e dos extensores; anteflexões e retroflexões do
tronco; inibição postural com hipertonia; mioclonias não sinergéticas; hiperextensão do
31

punho e dos dedos; flexão dos ombros; pronação excessiva da mão; abdução do punho;
pressão e alteração da estabilidade do arco da superfície plantar; bloqueio respiratório;
espasmos diversos;

- Tiques: movimentos rítmicos localizados, movimentos parasitas, sacudidelas,


fasciculações, movimentos palpebrais constantes acompanhados de nistagos, assinergia
dos globos oculares; tremulações etc.;

- Hiperemotividade: agitação, instabilidade, assíncronos dos braços e dos dedos, ansiedade;


movimentos atetósicos, imobilidade anárquica incessante etc.

Trata-se, evidentemente, de uma miríade de sinais, difíceis de registrar pela


variedade e certamente pela significação.

 Equilíbrio Estático

Avalia a capacidade do controle vestibular e cerebeloso da postura. O equilíbrio


estático requer as mesmas capacidades da imobilidade e no fundo reveste-se
exatamente das mesmas características e significações nela descritas (FONSECA,
2012).

 Equilíbrio Dinâmico

Avalia a capacidade de execução de movimentos preciosos, econômicos e


melódicos. O equilíbrio dinâmico exige, ao contrario do estático, uma orientação
controlada do corpo em situações de deslocamento no espaço com olhos abertos. Não
se trata só da pesquisa de funções vestibulares ou cerebelosas, mas também da própria
atividade piramidal.

Lateralidade

A lateralização, que constitui o terceiro fator psicomotor da BPM, esta integrada


na segunda unidade funcional de Luria, cuja a função fundamental compreende a recepção,
a análise e o armazenamento da informação (FONSECA, 2012). É seguimento de estudo
para diversos autores que investigam a psicomotricidade, a linguagem e as dificuldades de
aprendizagem.

A lateralidade traduz-se pelo estabelecimento da dominância lateral da mão, olho


e pé, do mesmo lado do corpo e constitui o terceiro fator psicomotor da BPM. A lateralidade
corporal se refere ao espaço interno do indivíduo, capacitando-o a utilizar um lado do corpo
com maior desembaraço e força.
32

Para Fonseca (2012) a lateralização humana respeita a progressiva


especialização dos dois hemisférios que resultaram das funções sócio-históricas da
motricidade laboral e da linguagem (motricidade colaboral).

O desenvolvimento da lateralidade é importante na evolução, adaptação,


formação do esquema corporal, percepção da simetria do próprio corpo e do eixo corporal
da criança, Ocorre naturalmente no individuo que, aos poucos, terá melhor coordenação
motora (SOUSA, 2004).

A lateralidade dominante poderá ser à direita, destrismo, ou à esquerda,


sinistrimo, ou ainda a criança poderá apresentar lateralidade cruzada, aquela que não há
dominância de um só dos lados do corpo. Segundo Grünspun (1987), nesse tipo de
dominância, há evidência de distúrbios psicomotores, como também de perturbações do
esquema corporal (SOUSA, 2004).

Os distúrbios da lateralidade geralmente ocorrem com crianças que apresentam


lateralidade cruzada ou não apresentam uma boa estruturação da lateralidade. De acordo
com Oliveira (1997), essas crianças podem apresentar dificuldade em aprender os conceitos
de direita e esquerda, em relação ao seu corpo como ponto de referência no espaço, ou
ainda, a dificuldade de direção gráfica, de estruturação espacial (já que a lateralidade é à
base deste fator psicomotor), além do comprometimento na leitura e escrita. A escrita torna-
se muitas vezes ilegível (SOUSA, 2004).

Apresentam também perturbações motoras, como na praxia fina, a imprecisão


dos movimentos, o aparecimento de sincinesias e comprometimento visual, isto é, confusão
na visualização das letras de direções diferentes como d/b; p/q. No que se refere a parte
psicológica, podem apresentar perturbações afetivas, baixa auto estima, falta de estimulo
para freqüentar a escola (SOUSA, 2004).

É por volta dos 6 aos 8 anos de idade que a lateralidade se manifesta. Não se
sabe ainda ao certo o que provoca esse fenômeno, mas alguns pesquisadores crêem ser de
natureza genética. Assim, estudos apontam que pais destros só terão filhos canhotos em
9,5% dos casos. Já os genitores canhotos têm uma alta probabilidade de ter filhos canhotos
– se ambos utilizarem o lado esquerdo, o filho terá 26% de possibilidade de também ter o
predomínio desta parte do corpo (PORTAL EFBR, 2011).

Subfatores da Lateralidade:

As tarefas da BPM visam fundamentalmente determinar a consistência da


preferência dos telerreceptores (visão e audição) e dos proprioefetores (mão e pé). Seis
33

situações são sugeridas à criança, mas apenas quatro envolvem duas experiências cada
uma (FONSECA, 2012).

 Lateralização Ocular

Para avaliar o olho preferencial, pede-se à criança que olhe primeiro através de
um tubo ou canudo de papel e, depois de um buraco feito no centro de uma folha de
papel normal (FONSECA, 2012).

 Lateralização Auditiva

Para avaliar o ouvido preferencial, pede-se à criança primeiro que escute um


relógio de corda e, em seguida, simule o atendimento do telefone (FONSECA, 2012).

 Lateralização Manual

Para avaliar a mão preferencial (a observação indireta já permite detectá-la com


certa segurança, não esquecendo que ela se confirmará nas tarefas de coordenação
oculomanual da praxia global e fina), sugere-se à criança que primeiro simule escrever e,
depois, simule corta um papel com a tesoura. O registro da preferência deve ser o mesmo
das situações anteriores (FONSECA, 2012).

 Lateralização Pedal

Para avaliar o pé preferencial (a observação do equilíbrio estático e dinâmico já


fornece dados, não esquecendo que ela se confirmará nas tarefas de coordenação
oculomanual), sugere-se à criança que primeiro dê um passo gigante, partindo da posição
de pés paralelos, e, depois, simule enfiar as calças, registrando-se o primeiro pé. O registro
preferência deve ser o mesmo das situações anteriores (FONSECA, 2012).

Noção de Corpo

A formação do eu, isto é, da personalidade, compreende o desenvolvimento da


noção ou esquema corporal, através do qual a criança toma consciência de seu corpo e das
possibilidades de expressar-se por seu intermédio.

Ajuriaguerra (apud FONSECA, 1995) relata que a evolução da criança é


sinônimo de conscientização e conhecimento cada vez mais profundo do seu corpo, e é
através dele que esta elabora todas as experiências vitais e organiza toda a sua
personalidade.
34

A noção do corpo em Psicomotricidade não avalia a sua forma ou as suas


realizações motoras, procura outra linha da análise que se centra mais no estudo da sua
representação psicológica e lingüística e nas suas relações inseparáveis com o potencial de
alfabetização. Este fator resume dialeticamente a totalidade do potencial de aprendizagem,
não só por envolver um processo perceptivo polissensorial complexo, como também por
integrar e reter a síntese das atitudes afetivas vividas e experimentadas.

A formação e estruturação do esquema corporal encontram na Psicomotricidade


formas que contribuem de maneira expressiva como objetivo principal de incentivar a prática
do movimento em todas as etapas da vida de uma criança. Através das atividades, as
crianças, além de se divertirem, criam, interpretam e se relacionam com o mundo em que
vivem. Desta forma, profissionais da área educacional recomendam que os jogos e as
brincadeiras ocupem um lugar de destaque no programa escolar a partir da Educação
Infantil.

Subfatores da Noção de Corpo:

 Sentido Cinestésico

O sentido cinestésico, de acordo co Jenkins (1966), pertence à somestesia. A


somestesia a sensibilidade cutânea e subcutânea, envolvendo, no caso da BPM, a pesquisa
da identificação tátil do corpo, enquanto o sentido cinestésico compreende o sentido
posicional e o sentido do movimento fornecidos pelos proprioceptores (fuso neuromuscular,
Órgãos tendinosos de Golgi, corpúculos de Pacini, respectivamente localizados nos
músculos, nos tendões e nas articulações) (FONSECA, 2012).

 Reconhecimento Direita-Esquerda

O reconhecimento direita-esquerda é uma prova integrada no fator noção de


corpo, mas que fornece igualmente dados em nível da lateralização simbólica. Não
compreende, portanto, o nível de integração bilateral do corpo já focado, envolve já uma
função de decodificação verbal em face da noção simbólica do hemicorpo e da
consciencialização da linha media do corpo. Em certa medida, o reconhecimento direita-
esquerda refere-se ao poder descriminativo e verbalizado que a criança tem do seu corpo
como um universo espacial interiorizado e socialmente mediado. As tarefas que constitui a
prova são de localização intracorporal para as crianças em idade pré-primária (4 a 5 anos) e
incluem tarefas de localização extracorporal no outro ((observador) para as crianças em
idade escolar (dos seis anos em diante) (FONSECA, 2012).
35

 Autoimagem

A autoimagem, que constitui uma adaptação da prova clássica de dismetria de


Ozeretzky (1936), visa estudar a noção do corpo no seu componente facial dentro do
parâmetro do espaço próprio, isto é, todo o espaço extracorporal imediato que é possível
atingir com os movimentos dos braços sem mover os pés. A autoimagem não é mais do que
o fingernose test (teste dedo ao nariz) utilizado em exames neurológicos pediátricos
(TOUWEN E PRECHTL, 1970) com a finalidade de avaliar a função proprioceptiva da
criança (FONSECA, 2012).

 Imitação de Gesto

A imitação de gestos visa ao estudo do sentido posicional e do sentido dos


movimentos nas óticas de Bergés e Lézine (1963), de Roach e Kephart (1966) e de Borel-
Maisonny (1972).As tarefas desse subfator resumem a capacidade de analise visual de
posturas e gestos, desenhados no espaço, sua retenção visual de curto-termo e respectiva
transposição motora por meio de cópia gestual bilateral (simultaneamente com as duas
mãos) (FONSECA, 2012).

 Desenho do corpo

O desenho do corpo (Bonhomne) tem sido largamente utilizado no campo do


diagnostico psicológico. Inúmeros trabalhos, como os de Goodenough (1957), Wintsch
(1935), Luquet (1935), Fontes (1959), Lurçat e Wallon (1958), Fay (1934) e muitos outros
têm-se referido ao desenho como o processo por meio do qual a criança objetiva a
representação do seu corpo (FONSECA, 1976 e 1977). Na BPM, o desenho do corpo
incluído no fator da noção do corpo é um meio de avaliação da representação do corpo
vivido da criança, refletindo o seu nível de integração somatognósica e a sua experiência
psicoafetiva (FONSECA, 2012).

Estruturação espaço-temporal

A estruturação espaço-temporal decorre como organização funcional da


lateralidade e da noção corporal, uma vez que é necessário desenvolver a conscientização
espacial interna do corpo antes de projetar o referencial somatognósico no espaço exterior
(FONSECA, 1995).

Este fator emerge da motricidade, da relação com os objetos localizados no


espaço, da posição relativa que ocupa o corpo, enfim das múltiplas relações integradas da
tonicidade, do equilíbrio, da lateralidade e do esquema corporal.
36

A estruturação espacial leva a tomada de consciência pela criança, da situação


de seu próprio corpo em um determinado meio ambiente, permitindo-lhe conscientizar-se do
lugar e da orientação no espaço que pode ter em relação às pessoas e coisas.

A orientac ão espacial é a capacidade que tem o indivíduo de situar-se e


orientar- se, localizar outra pessoa ou objeto dentro de um determinado espac o. Quando a
crianc a aprender noc ões de situac ão, tamanho, movimentos, formas, volume e
outras,ela atingirá a etapa de orientac ão espacial,ou seja, ela passa a ter acesso a um
espac o orientado a partir de seu próprio corpo, multiplicando suas possibilidades de
ac ões.

A estruturação temporal, "requer uma construção intelectual por parte da criança,


baseada em operações que são paralelas às envolvidas no pensamento lógico-matemático"
(Condemarin apud GOMES, p. 64, 1998).

No que diz respeito à estruturação espaço temporal, a criança pode apresentar


diversos tipos de dificuldades na escrita, como aglutinações, separações indevidas, omissão
ou adição de letras, sílabas ou palavras... A estruturação temporal proporciona à criança, a
consciência do desenvolvimento das ações no tempo, solicitando mais a percepção auditiva
da criança, em contraposição à estrutura espacial, que exige basicamente a percepção
visual (GOMES, 1998, p. 66).

Percebe-se nesse sentido, que a estruturac ão espac o-temporal é uma


habilidade importante para uma adaptac ão favorável da crianc a, pois lhe permite não só
movimentar-se e reconhecer-se no espac o, mas também desencadear e dar sequ e ncia
aos seus gestos

Subfatores da Estruturação Espaço Temporal:


 Organização

Compreende a habilidade de calcular as distancias e prover os ajustes necessários dos


planos motores para percorrer um determinado espaço, baseando-se nas capacidades de
análises espacial, processamento e julgamento das distancias e das direções, planificação
motora e verbalização simbólica da experiência.
A tarefa requer a fusão de dados direcionais e espaciais ao mesmo tempo que intervém
uma programação do comprimento dos passos. A estrutura espacial é guiada pele área de
integração visual que contribui no fornecimento de informações para os centros motores a
fim de ajustamento das passadas (COSTALLAT, 1998).

 Estruturação Dinâmica
37

A estruturação dinâmica compreende a capacidade de memorização seqüencial


visual (de curto termo) de estruturas espaciais simples. Trata-se de uma tarefa que aprecia
a capacidade da criança reproduzir de memória seqüências de fósforos em posições e
orientações espaciais determinadas (FONSECA, 2012)

 Representação Topográfica

Retrata a noção espacial e a capacidade de interiorização de uma trajetória espacial


apresentada num levantamento topográfico (planta do campo) e das coordenações
espaciais que são os vários pontos e linhas distribuídos (as) pelo campo de futebol, seus
setores e áreas (COSTALLAT, 1998).

 Estruturação Rítmica

Estruturação rítmica compreende a capacidade de memorização e reprodução


motoras de estruturas rítmicas. Trata-se de uma tarefa que avalia problemas de percepção
auditiva e de memorização de curto termo e a translação dos estímulos auditivos para
respostas motoras. A criança deve captar reter, rechamar e expressar em termos motores
(batimento do lápis na mesa) (FONSECA, 2012).

Praxia Global

Praxia global tem por definição a capacidade de realizar a movimentação


voluntária pré-estabelecida como forma de alcançar um objetivo. A praxia global está
relacionada com a realização e a automação dos movimentos globais complexos, que se
desenrolam num determinado tempo e que exigem a atividade conjunta de vários grupos
musculares (FONSECA, 2012)

Segundo Ajuriaguerra (apud FONSECA, 1992, p. 224):

[...] a organização práxica decorre da coordenação de três subsistemas


fundamentais: o somatograma (conhecimento integrado do corpo), os
engramas (integração cognitiva e emocional das experiências anteriores) e
o apticograma (integração dos estímulos externos que abrangem a função
gnóstica).

A praxia global é a expressão da informação do córtex motor, como resultado da


recepção de muitas informações sensoriais, táteis, quinestésica, vestibulares, visuais etc.,
ou seja, como resultado integrado dos fatores psicomotores já apresentados (FONSECA,
2012).
38

Há sinais de descoordenação da praxia global mais característicos como:

[...] dismetrias, que retratam a inadaptação às distâncias e aos movimentos


exagerados e mal-inibidos; as distonias, que identificam os movimentos
tônicos, involuntários, intermitentes e certas paratonias sem qualquer
significação funcional; as disquinesias, que identificam os movimentos
anormais que surgem efetivamente nas posturas ou nos gestos finalizados,
normalmente anárquicos e bruscos, característicos das sacudidelas breves
e parasitas, e, por último, as dissincronias, que sugerem inadequada
velocidade dos movimentos com dissincronismo e ausência de sinergias a
demonstrar desintegração rítmica óbvia, ou seja, a perda de melodia
cinética, que segundo Lúria, traduz a realização da praxia (FONSECA,1992,
p. 228).

Dismetria ocorre por conta de um transtorno do cerebelo que causa uma


interpretação errônea da distância, desorientação espacial e incapacidade para alcançar
com precisão um ponto determinado, mas não há interpretação errônea se esse ponto
determinado esta à frente, atrás ou de ambos os lados. Trabalhando os três fundamentos
principais do Karate-Dō em conjunto com a BPM, podemos realizar um ganho positivo para
a criança que tenha esse tipo de distúrbio.

A praxia é o ato motor harmonioso, provocado pela interação de vários fatores


psicomotores importantes como a tonicidade, a equilibração, a lateralização, a noção do
corpo, e a estruturação espaço-temporal, ocorrendo de forma precisa e eficiente (GURGEL,
2007).

Subfatores da Praxia Global:

 Coordenação Oculomanual

A coordenação oculomanual compreende a capacidade coordenar movimentos


manuais com referências percptivo-visuais. A situação requer a coordenação apendicular
dos membros superiores (normalmente da mão dominante) com as capacidades perceptivo-
visuais de avaliação da distância e de precisão de lançamento. Envolve conseqüentemente
uma praxia global e um planejamento motor, isto é, a avaliação da distância, da altura e das
características do alvo, a consciência quinestésica do lançamento, o peso da bola, a seleção
de engramas, a capacidade de reprogramação de sequências motoras em face da análise
dos efeitos etc (FONSECA, 2012).

 Coordenação Oculopedal
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A coordenação oculopedal copreende a capacidade coordenar movimentos


pedais com referências percptivo-visuais. Ao contrario da tarefa anterior, a situação requer a
coordenação apendicular dos membros inferiores (normalmente do pé dominante) com as
capacidades já referidas no subfator da coordenação oculomanual.

 Dismetria

A dismetria que caracteriza a realização dispráxica traduz a inadaptação visório-


espacial e visório-quinestésica dos movimentos orientados em face a uma distância ou de
um objetivo (alvo). No caso da BPM, esse subfator não constitui uma tarefa em si, pois
resulta da observação das duas tarefas anteriores.

 Dissociação

A dissociação compreende a capacidade de individualizar vários segmentos


corporais que tomam parte na planificação e na execução motora de um gesto ou de vários
gestos intencionais sequencializados. A dissociação requer a formulação melódico-
quinestésica que entra em jogo no autocomando motor de gestos sequencializados, dos
quais resulta a capacidade de diferenciar os vários gestos que integram um padrão motor
global. A dissociação põe em destaque a independência dos vários segmentos corporais
estruturados em função de um fim, o que exige a continuidade rítmica da execução motora.

Praxia Fina

A praxia fina compreende todas as tarefas motoras finas, quando se associa a


função de coordenação dos movimentos dos olhos durante a fixação da atenção, e durante
a fixação da atenção e manipulação de objetos que exigem controle visual, além de
abranger as funções de programação, regulação e verificação das atividades preensivas e
manipulativas mais finas e complexas.

Crianças que têm transtornos na coordenação dinâmica manual geralmente têm


problemas visomotores, apresentando inúmeras dificuldades de desenhar, recortar,
escrever, ou seja, em todos os movimentos que exijam precisão na coordenação olho/mão.

A parte central da função da praxia fina é a mão. Os primatas começaram a


utilizá-la e seus movimentos foram sendo aperfeiçoados com os humanos. Por isso
podemos dizer que hoje a mão é a parte do corpo que mais utilizamos, pois através dela
temos acesso ao mundo que nos rodeia, permitindo que desde bebês tenhamos
acessibilidade ao meio ambiente que nos rodeia e também ao corpo.
40

O diálogo tônico do bebê com sua mãe no início do crescimento infantil se dá


através da mão, é ela que torna possível esse diálogo. Durante a amamentação a criança
pode segurar no seio da mãe, e toda sua temperatura é reconhecida pelo bebê através
deste toque.

Nas fases iniciais do seu desenvolvimento, o bebê utiliza mais a palma da mão
(reflexo palmar), que irá posteriormente deixar de ser um reflexo para ser um movimento
intencional. Os movimentos mais precisos, como o de pinça, realizado pelos dedos polegar
e o indicador da mão, vão sendo aprendidos e cada vez mais utilizados nas fases pré
escolar e escolar da criança. Mais tarde, a mão se torna um membro fundamental na
execução da escrita (forma de representação gráfica da comunicação humana), sendo
efetuada pela preensão destes dois dedos com o lápis.

Segundo Bower (apud FONSECA, 1992), a capacidade de preensão de onde


evolui ontogeneticamente a praxia fina, pode revelar-se antes do nascimento. A mão é muito
utilizada também pelos fetos, com 14 a 16 semanas de gestação, onde já é possível se
visualizar toques em si mesmo em algumas partes do seu corpo.

Subfatores da Praxia Fina:

 Coordenação Dinâmica Manual

A coordenação dinâmica manual compreende a destralidade bimanual e a


agilidade digital, visando ao estudo da coordenação fina das mãos e dos dedos. A tarefa
requer coordenação fina dos movimentos das mãos e dos dedos com as capacidades
visório-perceptivas em termos de velocidade e de precisão. Envolve a praxia fina e,
consequentemente, o planejamento motor das extremidades distais em permanente e
continuas retroação tátil-quinestésica com a atenção, a fixação e a captação visual dos
objetos (FONSECA, 2012).

 Tamborilar

O tamborilar compreende uma tarefa de motricidade fina que estuda a


dissociação digital seqüencial que envolve a localização tátil-quinestésica dos dedos e a sua
motricidade independente e harmoniosa (FONSECA, 2012).

 Velocidade-Precisão

A tarefa exige a integração significativa de movimentos finos de um instrumento


(lápis) com aquisições perceptivo-visuais da coordenação visório-motora, figura e fundo e
41

posição-relação espacial. A cotação do subfator da velocidade-precisão deve ser a média


aritimética aproximada das suas tarefas (FONSECA, 2012).

3.2 Bateria de Avaliação Psicomotora

Um dos modos de avaliar o resultado da ação conjunta do ambiente com o


desenvolvimento neurológico é determinar o perfil psicomotor da criança, que indica a
qualidade do desenvolvimento psicomotor, especificando as habilidades motoras mais e
menos elaboradas adquiridas até o momento.

Esta avaliação é importante pois, caso a integração com o meio não forneça os
estímulos sensório-motores suficientes, é possível que a psicomotricidade apresente um
desenvolvimento insatisfatório.

Para esta avaliação pode-se usar a Bateria Psicomotora (BPM) a qual é um


instrumento de observação cuja construção só foi possível ao longo de 20 anos de
convivência dinâmica com inúmeros casos clínicos por parte de Victor da Fonseca. A BPM
permite descrever o perfil psicomotor da criança. Segundo Fonseca (1992), a partir dela
procura-se captar a personalidade psicomotora da criança, tentando atingir uma
compreensão aproximada do modo como trabalha o cérebro e os mecanismos que
constituem a base dos processos mentais da psicomotricidade.

Apesar da BPM avaliar o desempenho da criança numa situação formal, ou seja,


fora do contexto do dia-a-dia, é possível verificar o reflexo das experiências vivenciadas no
contexto de seu desenvolvimento pelo perfil psicomotor. Além disso, é possível retratar o
desenvolvimento dinâmico por meio da aplicação de várias avaliações durante um período
de tempo, acompanhando cada fase do desenvolvimento psicomotor da criança.

Sua aplicação é recomendada em crianças na faixa etária de 4 a 12 anos de


idade e a aplicação da BPM é simples, os materiais utilizados são econômicos e sem
qualquer sofisticação. Algumas de suas características são:

- A BPM apresenta uma perspectiva mais qualitativa do que quantitativa;

- Período de avaliação: 30-40 minutos.

- Não é utilizada para diagnosticar déficits neurológicos, nem lesões cerebrais;

- Identifica crianças com dificuldades de aprendizagem motora.


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Em todos os fatores e subfatores, o nível de realização das tarefas na BPM é


medido da seguinte forma:

a) Cotação 1 ponto (apraxia): ausência de resposta, realização imperfeita, incompleta,


inadequada e descoordenada (muito fraco e fraco; disfunções evidentes e óbvias,
objetivando dificuldades de aprendizagem significativas);

b) Cotação 2 pontos (dispraxia): realização fraca com dificuldade de controle e sinais


desviantes (fraco, insatisfatório; disfunções ligeiras, objetivando dificuldades de
aprendizagem);

c) Cotação 3 pontos (eupraxia): realização completa adequada e controlada


(bom);(disfunções indiscerníveis, não objetivando dificuldade de aprendizagem);

d) Cotação 4 pontos (hiperpraxia): realização perfeita, precisa, econômica e com


facilidade de controle (excelente, ótimo; objetivando facilidades de aprendizagem).

Cada subfator é consequentemente cotado, sendo assim cotada a média


arredondada e posteriormente transferida para o perfil psicomotor. A qualidade do perfil
psicomotor da criança está associada ao seu potencial de aprendizagem, quer em termos
de integridade ou dificuldade.

A BPM não é um teste no sentido tradicional, é uma bateria de observação que


permite observar componentes do comportamento psicomotor da criança de uma forma
estruturada e não estereotipada.

As tarefas dão oportunidade suficiente para identificar o grau de maturidade


psicomotora da criança e detectar sinais desviantes. Podem-se observar as estruturas
tônico-musculares das articulações proximais e distais, o controle vestibular e
proprioceptivo postural, a segurança gravitacional, o domínio do equilíbrio estático e
dinâmico, a dominância manual e telerreceptiva, a somatognosia e o grau de organização
tátil-quinestésica do corpo, a orientação e a organização espacial, a recepção e a
memorização do ritmo, a dissociação, a planificação e a sequencialização dos movimentos e
a proficiência da motricidade fina.

A BPM dá oportunidade para observar as desordens da atenção, as aquisições


de processamento da informação visual e auditiva, a competência lingüística, a orientação
43

espacial e temporal, a estrutura cognitiva da criança e o comportamento emocional; é útil


para identificação e ratificação de dificuldades de aprendizagem e psicomotricidade; mas
não identifica ou classifica um déficit neurológico ou mesmo diagnostica uma disfunção ou
lesão cerebral. Portanto, o principal objetivo é verificar o comportamento motor de crianças
na faixa etária de 4 a 12 anos de idade e comparar os resultados, entre os sexos masculino
e feminino.
44

4 KARATE-DŌ: HISTÓRIA E CONTRIBUIÇÃO PARA O


DESENVOLVIMENTO INFANTIL

A palavra Karate-Dō significa Caminho das Mãos Vazias e é uma arte marcial
secular, refinada e codificada no início do século XX no Japão pelo Mestre Gichin
Funakoshi, atualmente presente em quase todos os currículos das escolas e universidades
daquele país. Seu objetivo principal é desenvolver de forma salutar o carátere a
personalidade, através da prática consciente, a qual destina-se à manutenção da saúde,
defesa pessoal e competição esportiva (NAKAYAMA, 1999).

O desenvolvimento histórico do Karate-Dō é muito longo e se perde no tempo.


Contam que no terceiro milênio a.C. um príncipe hindu desenvolveu uma arte de luta
baseando-se nos movimentos dos animais. Para tanto, muitos escravos foram sacrificados
nesta experiência na busca dos pontos vitais do corpo humano pois usava-se agulhas para
se descobrir quais pontos eram mais vulneráveis para aplicar golpes de mão e pé e
neutralizar o oponente.

A esse tipo de luta foi dado o nome de Vajramushti, que significa Aquele cuja
mão fechada é um diamante (LUBES, 1994).

No século V d.C. surgiu na Índia uma pessoa mística, era Bodhidharma,


conhecido no Japão como Daruma Daichi, que posteriormente viria ser o 28º patriarca
budista depois de Gautama Buda (LUBES, 1994).

Nos anos de 420 a 479 d.C. Daruma esteve na China divulgando seus
ensinamentos religiosos, mas houve um choque de opiniões entre Daruma e o Imperador
chinês Wu, da dinastia Liang. Este era budista, mas seguidor de uma filosofia em que o
paraíso seria alcançado somente no além. Quanto a Daruma, pregava que o Nirvana era
alcançável nesta terra, em vida. Daruma foi expulso do reino de Wu (LUBES, 1994).

O conceito fundamental dos ensinamentos de Daruma é que deve existir uma


ligação intensa entre o corpo e o espírito, e que a iluminação só será alcançada se houver
uma perfeita união entre ambos. Devia-se então purificar o espírito através da disciplina do
corpo. Assim, junto com seus discípulos, Daruma constrói o templo de Shaolin (Shorinji em
japonês), introduzindo o sistema de luta indiana como forma de ginástica e defesa pessoal
que mais tarde será conhecido como Shorinji – Kempo no Japão (LUBES, 1994).
45

Bodhidharma orientava seus discípulos para que, mediante observação das


características das lutas dos animais, desenvolvessem técnicas que mais se harmonizasem
com seu interior, criando assim estilos próprios. Tempos após sua morte, ocorreu a invasão
mongol, que resultou na fragmentação da China em vários reinos. Após o mosteiro ser
incendiado, os monges viajaram em diversas direções, transmitindo seus conhecimentos e
difundindo estilos de combates. “A invasão mongol e a retomada do poder pela dinastia
Ming, estimulou o aparecimento de várias técnicas de luta. Nesse momento, a arte de
combate militar, sobrepôs-se à arte espiritual” (VIANNA, 1996, p. 3)

4.1 O Karate-Dō no Japão

Na guerra Japão versos China e Coréia, o povo de Okinawa ficou como aliado
dos chineses e coreanos. Como castigo o senhor do clã dos Shimatsu, oprimiu o povo e
proibiu o uso de armas, ficando sujeito a pena de morte quem as usasse (LUBES, 1994).

Os habitantes de Okinawa desenvolveram, num clima de conspiração, as


técnicas de luta corpo a corpo. Os braços e pernas tornaram-se armas mortais para
combater os invasores. Conta-se que um homem de nome Sakugawa da cidade de Shuri,
foi quem sistematizou toda a bagagem técnica do Karate-Dō. Depois de uma longa
permanência na China, voltou a Okinawa e abriu a escola Sakugawa no ano de 1750
(LUBES, 1994).

Em 1798 nasceu na cidade de Shuri na ilha de Okinawa, Sokon Matsumura que


muito cedo iniciou seu treinamento na escola do mestre Sakugawa sendo instruído por
vários Mestres da época. Esteve também sob os ensinamentos de um mestre da escola da
espada de Jigen do clã Satsuma, mais precisamente um mestre chamado Yashuhiro Ijuin
(FUNAKOSHI, 1999)

Matsumura foi conselheiro e instrutor de Karate-Dō para três suseranos


diferentes. Ele residiu na China em torno do ano 1830, quando retornou a Okinawa e
começou a ensinar um kata que traduzido do chinês deu nome Bassai. Entre seus
estudantes mais importantes podemos citar Yasutsune Itosu e Yasutsune Azato. Chegou a
transmitir alguns ensinamentos a Gichin Funakoshi diretamente, mas sua influência maior
era certamente com Azato e Itosu (FUNAKOSHI, 1999).

Yasutsune Azato um grande mestre de Karate-Dō de Okinawa, filho de um


Tonichi, uma das duas classes mais elevadas da sociedade de Okinawa, nasceu na vila de
Azato localizada entre as cidades de Shuri e Naha. Era o oficial militar de maior confiança
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do suserano de Okinawa em assuntos militares e era conselheiro direto do rei. Mestre Azato
era insuperável na arte do Karate-Dō em toda Okinawa, e, além disso, primava na arte da
equitação, kendo e do manejo do arco.

Mestre Azato teve somente um estudante de Karate-Dō, Gichin Funakoshi, ele


lhe deu uma metodologia que o ajudou a desenvolver o Karate-Dō mais exato que se
conhece até os dias atuais. Era muito restrito em seu método de ensinar. Mestre Funakoshi
repetia várias vezes o mesmo kata (luta imaginária) semanas após semanas, ás vezes mês
após mês, até tê-lo dominado completamente. Nunca era autorizado a passar a outro kata
sem que Azato estivesse convencido que ele tinha compreendido bem o que estivera
exercitando (FUNAKOSHI, 1999).

Mestre Azato mantinha um registro completo de todos os especialistas em artes


marciais do seu tempo, neste detalhava suas habilidades e defeitos, dizia sempre: “Conheça
a si mesmo e o seu inimigo: esta é a chave secreta da estratégia” (FUNAKOSHI, 1999).

Certa vez, Mestre Azato foi desafiado por Yorin Kanna, um famoso espadachim
de Okinawa, e mesmo que Mestre Azato fosse um perito em Jigen-kenjutsu, confrontou seu
adversário desarmado. Kanna era conhecido não somente pela sua instrução, mas também
devido a sua força enorme. Kanna atacou Mestre Azato várias vezes, mas Mestre Azato
afastou-lhe os golpes com uma ágil pancada de mão e o imobilizou quase sem esforço.Uma
de suas máximas era: “Veja seus braços e pernas como espadas.” (FUNAKOSHI, 1999).

Mestre Itosu era especialista nos katas Tekki (Cavaleiro de Ferro), o próprio
Mestre Itosu costumava a dizer: "Os tekki são os katas mais fáceis de aprender, mas os
katas mais difíceis de aprender também são os tekki.” Nascido na cidade de Shuri, Okinawa
em 1830, era um amigo muito próximo de Yasutsune Azato e, além disso, estudou com
Shimpan Gusukuma e Yasuri, discípulo de Iwah.Na idade de 16 anos começou treinar o
Karate-Dō com Bushi Sokon Matsumura (FUNAKOSHI, 1999).

Ficou famoso por ser responsável na introdução do Karate-Dō no curriculum do


sistema de escola pública. Para ajudar no processo de ensino, desenvolveu os Katas Heian,
baseando-se nos Katas avançados como: Kanku-Dai, Bassai-Dai e Jion e tomando como
referência o Teki-Shodan criou os Teki: Nidan e Sandan (FUNAKOSHI, 1999).

Mestre Gichin Funakoshi comenta em seu livro Karate-Dō, Meu Modo de Vida
(1999) sobre a força física, a habilidade incrível de suportar socos e o aperto de mão
inacreditável de Itosu. Mestre Itosu não só se destacou como karateca, mas, também, como
pessoa de grande cultura. Totalmente familiarizado com os clássicos japoneses e chineses,
exerceu a função de secretário e conselheiro do suserano de Okinawa.
47

Yasutsune Itosu foi mestre de inúmeros estudantes importantes para o Karate-


Dō, muitos deles criaram uma série de estilos diferentes de Karate-Dō, mesmo que nunca
fosse sua intenção de que isto viesse acontecer (FUNAKOSHI, 1999).

Um de seus estudantes mais famosos foi Gichin Funakoshi, alguém que o


recordou sempre durante toda sua vida e procurou transmitir os ensinamentos recebidos.

Alguém cujo espírito e força mental se fortaleceram através das lutas com
uma atitude de nunca desanimar não deve encontrar dificuldades em
enfrentar nenhum desafio, por maior que ele seja. Alguém que suportou
longos anos de sofrimento físico e agonia mental para aprender um soco ou
um chute deve ter condições de encarar qualquer tarefa, por mais difícil que
ela seja e de executá-la até o fim. Sem dúvida nenhuma, uma pessoa com
essas características aprendeu verdadeiramente o Karate-Dō
(FUNAKOSHI, 1999)

Mestre Gichin

Mestre Gichin Funakoshi nasceu em Shuri, Okinawa, em 1868, o mesmo ano da


Restauração Meiji. Funakoshi era filho único, e logo após o seu nascimento fora levado para
a casa dos seus avós maternos, com quem foi educado e aprendeu poesias clássicas
chinesas com o seu avô. Aos 11 anos de idade iniciou seus estudos, com o mestre Azato,
no duro sistema Naha-Te (força e contração), e com o mestre Itosu no sistema Shuri-te
(velocidade e elasticidade) (FUNAKOSHI, 1999).

O Karate-Dō começa a ser ensinado nas escolas de Okinawa em 1902, durante a


visita de Shintaro Ogawa, que era então inspetor escolar da prefeitura de Kagoshima, à
escola que o Mestre Funakoshi lecionava em Okinawa, foi feita uma demonstração de
Karate-Dō. Mestre Funakoshi impressionou os visitantes devido ao seu status de educador e
sua perícia como Karateca (FUNAKOSHI, 1999).

O Sr. Ogawa ficou tão entusiasmado que escreveu um relatório ao Ministério da


Educação elogiando as virtudes da arte. Foi então que o treinamento de Karate-Dō passou a
ser oficialmente autorizado nas escolas. Até então, o Karate-Dō só era praticado atrás de
portas fechadas. Mestre Funakoshi trouxe o Karate-Dō até o sistema público de ensino, com
a ajuda do Mestre Yasutsune Itosu. Logo, as crianças de Okinawa estavam aprendendo
kata como parte das aulas de Educação Física. A redescoberta da herança étnica em
Okinawa virou moda, e as aulas de Karate-Dō em Okinawa eram vistas como uma prática
salutar (FUNAKOSHI, 1999).

O Karate-Dō (Tode ou Okinawa-te) foi demonstrado pela primeira vez


publicamente, fora de Okinawa em maio de 1922, na primeira Exibição Atlética Nacional,
48

realizada em Tokio sob o patrocínio do Ministério da Educação. Mestre Funakoshi, que na


ocasião era presidente da Okinawa Shobu Kai (sociedade para a promoção das artes
marciais), foi escolhido como representante da ilha, para fazer oficialmente a primeira
demonstração pública na capital japonesa. Mestre Funakoshi reestruturou e codificou as
técnicas de luta passando a chamá-las de Karate-Dō. Mestre Funakoshi sempre enfatizava
o desenvolvimento do caráter e autodisciplina nas suas narrações (FUNAKOSHI, 1999).

O Mestre Gichin Funakoshi, além de Mestre de Karate-Dō, era também exímio


poeta e quando escrevia os seus poemas usava o pseudônimo de Shoto que significa ondas
de pinheiro. Ele usava este nome porque a cidade nativa de Shuri, local do seu nascimento,
era rodeada por colinas com florestas de pinheiros Ryukyu e vegetação subtropical; entre
elas estava o Monte Torao. A palavra Torao significa cauda de tigre e era particularmente
adequada porque a montanha era estreita e tão densamente arborizada que realmente tinha
a aparência de uma cauda de tigre quando vista de longe (FUNAKOSHI, 1999).

Em 1935, foi publicado seu livro Karate-Dô Kyohan. Este livro trata basicamente
dos Kata. Mestre Funakoshi era Taoísta e ensinava Clássicos Chineses, como o Tao Te
Ching de Lao Tzu, enquanto ele estava vivendo em Okinawa. Funakoshi era profundamente
religioso. Tinha muito medo de que o Karate-Dō se tornasse um instrumento de destruição,
e provavelmente queria eliminar do treinamento algumas aplicações mortais dos Kata.
Então, parou de fazer essas aplicações (FUNAKOSHI, 1999).

Ele também começou a desenvolver estilos de luta que fossem menos perigosos.
Mestre Funakoshi teve sucesso ao remover do Karate-Dō técnicas de quebras de juntas, de
ossos, dedos nos olhos, chaves de cotovelo, esmagamento de testículos, criando um novo
mundo de desafios e luta em equipe onde somente umas poucas técnicas seriam legais. Ele
fez isso baseado nos seus propósitos e com total conhecimento dos resultados
(FUNAKOSHI, 1999).

Em 1936, Mestre Funakoshi mudou os caracteres Kanji utilizados para escrever a


palavra Karate. O caractere Kara significava China e o caractere Te significava Mão. Para
popularizar mais a arte no Japão, ele mudou o caractere Kara por outro, que significa Vazio.
De Mãos Chinesas o Karate passou a significar Mãos Vazias, e como os dois caracteres são
lidos exatamente do mesmo jeito, então a pronúncia da palavra continuou a mesma
(FUNAKOSHI, 1999).

Além disso, Mestre Funakoshi defendia que o termo Mãos Vazias seria o mais
apropriado, pois representa não só o fato do Karate-Dō ser um método de defesa sem
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armas, mas também representa o espírito do Karate-Dō, que é esvaziar o corpo de todos os
desejos e vaidades terrenos (FUNAKOSHI, 1999).

No mesmo ano (1936), foi fundado o primeiro Dojo Oficial de, pelo Comitê
Nacional e devido aos feitos do Mestre Funakoshi, foi batizado com o nome de Shoto-Kan.
Daí surgiu o nome de uma escola (estilo) que até hoje é cultivada em várias partes do
mundo. Shoto (pseudônimo do Mestre Funakoshi) e Kan (escola) resultando em Escola de
Funakoshi. Mestre Funakoshi tinha 68 anos em 1936, e foi quando ele deu o primeiro passo
dentro do seu Dojo de Karate-Dō em 29 de Janeiro (FUNAKOSHI, 1999).

O prédio foi feito de doações particulares e uma placa foi pendurada sobre a
entrada e dizia: Shoto-kan. Esse nome dado ao Shoto-kan Karate Dojo foi uma homenagem
de seus alunos. Com o término do novo dojo, uma das primeiras tarefas foi elaborar um
conjunto de normas a serem seguidas, entre elas o Dojo-Kun e também o sistema de faixa
colorida baseando-se no Judo. (FUNAKOSHI, 1999).

No final da 2ª Guerra Mundial uma das vítimas dos ataques aéreos americanos
foi o Shoto-kan Karate Dojo que havia sido construído em 1936. Com a América exercendo
pressão em Okinawa, a esposa de Funakoshi finalmente iria deixar a ilha e juntar-se a ele
em Kyushu no Sul do Japão. Eles ficaram lá até 1947. Os americanos destruíram tudo que
estava em seu caminho (FUNAKOSHI, 1999).

As ilhas foram bombardeadas do ar, todas as cidades queimadas até o fim, as


colinas crivadas de balas pelos cruzadores de guerra de longe da costa, e então as tropas
varreram através da ilha, cercando todo mundo que estivesse vivo. A era dourada do
Karate-Dō em Okinawa tinha acabado. Todas as artes militares haviam sido banidas
rapidamente pelas forças ocupantes americanas. Primeiro uma, depois outra bomba
atômica explodiram sobre as cidades de Hiroshima e Nagasaki. Três dias depois,
bombardeiros americanos sobrevoaram Tokyo em tal quantidade que chegaram a cobrir o
Sol (FUNAKOSHI, 1999).

Tokyo foi bombardeada com dispositivos incendiários. Descobrindo que o


governo do Japão estava a ponto de cometer um suicídio virtual sobre a imagem do
Imperador, cartas secretas foram passadas para os japoneses garantindo sua segurança se
eles assinassem sua rendição incondicional. O Japão estava acabado, a Guerra do Pacífico
também, mas o pesadelo de Mestre Funakoshi ainda havia de acabar.

Então, Gigo (também conhecido como Yoshitaka, dependendo como se escreve


os caracteres do seu nome), filho de Mestre Funakoshi, um promissor mestre de Karate-Dō
no seu próprio direito, aquele que Mestre Funakoshi estava contando para substituí-lo como
50

instrutor do Shoto-kan, é vítima da tuberculose e morre em 1945 enquanto teimosamente


recusava-se a comer a ração americana dada ao povo faminto (FUNAKOSHI, 1999).

Depois do final da guerra, as artes militares haviam sido completamente banidas.


Entretanto, alguns dos alunos de Mestre Funakoshi tiveram sucesso em convencer as
autoridades que o Karate-Dō era um esporte inofensivo. As autoridades americanas
cederam, porque naquela época eles não tinham idéia do que fosse Karate-Dō. Também,
alguns homens estavam interessados em aprender as artes militares secretas do Japão,
então as proibições foram eliminadas completamente em 1948 (FUNAKOSHI, 1999).

Em maio de 1949, os alunos de Mestre Funakoshi moveram-se para organizar


todos os clubes de Karate-Dō universitários e privados numa simples organização, e eles a
chamaram de Nihon Karate Kyokai - NKK (Associação Japonesa de Karate). Eles
nomearam Mestre Funakoshi seu instrutor chefe. Em 1955, um dos alunos de Mestre
Funakoshi consegue um Dojo para a NKK (NAKAYAMA, 1999).

Mestre Gichin Funakoshi, o Pai do Karate Moderno, morreu em 26 de abril de


1957. Em seu túmulo negro, em forma de cruz, estão as palavras Karate Ni Sente Nashi (No
Karate não existe atitude ofensiva). Pouco tempo antes de morrer ele pode dizer: "Acho que
começo a entender o que é um verdadeiro tsuki (soco)" (COMBAT SPORT, 1987)

Masatoshi Nakayama

Em 06 de abril 1913, na cidade de Kanazawa Japão, nasce Masatoshi


Nakayama, filho de uma família de samurais que por muitas gerações foi unida ao clã
Sanada como instrutores de Kendo (COMBAT SPORT, 1987).

O pai e o avô de Nakayama eram médicos e naturalmente esperavam que ele


seguisse seus passos como profissional de medicina. Entretanto, Nakayama havia
desenvolvido um forte interesse em visitar e estudar na China e para que isso viesse
ocorrer teria que se preparar melhor (COMBAT SPORT, 1987).

Ingressou na Universidade de Takushoku para iniciar seus estudos, e também


dar prosseguimento à prática do Kendo, foi quando viu pela primeira vez a arte marcial que
estava emergindo no Japão, o Karate-Dō. Esse encontro com o mestre Funakoshi ocorreu
no ano de 193 quando a equipe de Karate-Dō da universidade estava praticando. Nakayama
ficou fascinado com o que viu e foi convidado a voltar para iniciar seu aprendizado. Após
esse contato, afirmou com suas próprias palavras: "Eu esqueci completamente sobre o
Kendo." (COMBAT SPORT, 1987).
51

Nakayama e outros alunos de mestre Funakoshi fizeram a primeira


demonstração pública das novas técnicas de kumite no ano de 1936 no Centro Cívico de
Tokyo. Em 1937 viajou para China para estudar na Universidade de Pequim e trabalhar para
o governo Chinês. Só retornou ao Japão em 1946, esse período de ausência o poupou dos
horrores da Segunda Guerra Mundial (COMBAT SPORT, 1987).

Em maio de 1949, ajudou a fundar a Associação de Karate do Japão – NKK a


qual tinha a sua frente o mestre Funakoshi,escolhendo Nakayama para seu sucessor no
comando da organização (LUBES, 1994).

No ano de 1957, morre o Mestre Funakoshi, o último grande mestre. Mas sua
obra não morre. O Karate-Dō consegue se firmar como esporte e no mesmo ano de 1957,
mestre Masatoshi Nakayama realiza o primeiro campeonato de Karate-Dō do Japão, cujo
vencedor foi Hirokazu Kanazawa (LUBES, 1994).

Em 1964, foi fundada a Federation of Japan Karate-do Organizations (FAJKO)


que reúne e disciplina os maiores estilos de Karate-Dō. Isso permitiu a criação de
federações nacionais e continentais como a World Union Karate-do Organizations (WUKO)
em 1970 (LUBES, 1994).

Mestre Nakayama dá continuidade ao trabalho de mestre Funakoshi divulgando o


Karate-Dō, não só no Japão, mas em todo mundo, assim nomeia alguns de seus alunos
para representar o Shoto-Kan em vários países, hoje praticado em quase todo planeta.

Em uma entrevista em Tóquio para Rolland Gaillac, quando indagado se fora por
receio, que havia esperado a morte do mestre Funakoshi, para então criar os primeiros
campeonatos de Karate-Dō, respondeu Sensei Nakayama:

Sim, é verdade, eu tinha receio do Mestre Funakoshi por saber que ele era
contra os campeonatos e a competição. Mas hoje ainda tenho receio dele!
Digo a mim mesmo, que pensaria o mestre disto? Terei eu feito mal? Eu
tento fazer o que ele teria feito se fosse vivo. Em 1957, quando criei a
competição, fui me conscientizando de que o Judo e o Kendo se tornaram
esportes, mas sempre preservando o espírito do Budo. Então por que não o
Karate-Dō? É a competição, eu penso, que tornou o Karate-Dō popular no
mundo inteiro. E isso é o que, no fundo, queria Mestre Funakoshi! E é por
isso que eu creio que hoje ele aprovaria o que fiz. Há momentos, entretanto,
em que não consigo deixar de me sentir inquieto. Caso eu tenha me
enganado, no dia em que eu morrer e for me juntar ao Mestre Funakoshi no
paraíso, neste dia haverá lá no alto um kumite sagrado. E será pior para
mim (COMBAT SPORT, 1987, p. 12).
52

4.2 Organizações do Karate-Dō Mundial

Devido à popularidade mundial do Karate-Dō como esporte, tornou-se necessária


a formação de uma Federação Internacional de Karate. Em 1970, a União Mundial das
Organizações de Karate (WUKO) foi criada. Desde então, todos os esforços têm sido feitos
para incluir o karate-Dō nos Jogos Olímpicos, o maior símbolo das realizações do homem
no campo desportivo (NAKAIAMA, 1999).

No dia 06 de junho de 1985, a WUKO foi oficialmente reconhecida pelo Comitê


Olímpico Internacional (COI). Em 1993, na Argélia, para adaptar-se às regras do Comitê
Olímpico Internacional, a Federation Mondiale de Karate (FMK), também conhecida como
World Karate Federation (WKF), absorveu a antiga WUKO, fato este que trouxe um
desenvolvimento direcionado à promoção do Karate mundial (FERREIRA, NASCIMENTO e
NASCIMENTO, 2013).

No dia 18 de março de 1999, o COI em sua 109º sessão realizada em


Seul,confirmou o reconhecimento em caráter definitivo da FMK/WKF, de acordo com o
artigo 29 da Carta Olímpica, como a federação mundial dirigente da modalidade Karate
(FERREIRA, NASCIMENTO e NASCIMENTO, 2013).

Além da intenção de incluir o Karate-Dō nos Jogos Olímpicos, o objetivo da WKF


é de unificar todas as organizações que pratiquem Karate-Dō, como esporte ou como uma
arte tradicional, além de lutar também para promover ligações dentro de um espírito de
amizade entre os karatecas do mundo.

A WKF representa o Karate-Dō mundial e coordena todas as atividades de


Karate-Dō ao redor do mundo, estabelece regras técnicas e operacionais, organiza e
controla reuniões internacionais e toma as decisões sobre vários assuntos que possam
surgir entre os membros.

No Brasil a entidade nacional de administração da modalidade Karate-Dō é a


Confederação Brasileira de Karate (CBK) fundada em 11 de setembro de 1987, a qual
representa 26 federações estaduais. A CBK é filiada a WKF e vinculada ao Comitê Olímpico
Brasileiro (COB), além de obter o reconhecimento através da Portaria nº 551 do Ministério
da Educação (10/11/1987), como entidade de direção nacional da modalidade, com
competência na área do desporto de sua própria denominação (FERREIRA, NASCIMENTO
e NASCIMENTO, 2013).
53

4.3 Karate-Dō no Brasil

Com a chegada dos imigrantes japoneses, o Brasil não ficou de fora da


propagação do Karate-Dō. Para cá vieram alguns mestres e em 1956 o professor Mitsuke
Harada organizou a primeira academia do país, no centro de São Paulo (FERREIRA,
NASCIMENTO e NASCIMENTO, 2013)

Seguindo o exemplo de Harada, outros mestres de Karate-Dō fundaram suas


academias: Juichi Sagara, em São Paulo; Yasutaka Tanaka e Sadamu Uriu no Rio de
Janeiro; Higashino em Brasília e Eisuko Ioshi na Bahia (FERREIRA, NASCIMENTO e
NASCIMENTO, 2013)

Em 1960, o professor Shikan Akamini fundou a Associação Brasileira de Karate


em São Paulo (FERREIRA, NASCIMENTO e NASCIMENTO, 2013), a partir daí essa arte
começou a crescer em qualidade e número de adeptos e o Karate-Dō desenvolveu sua
prática por todo o País, culminando com equipes competitivas e a participação dos atletas
brasileiros em competições nacionais e internacionais, quando conquistaram inúmeras
medalhas.

O I Campeonato Brasileiro de Karate foi realizado na cidade do Rio de Janeiro no


Ginásio de Esportes do Botafogo Futebol e Regatas. Esta foi a primeira competição oficial
de Karate-Dō no Brasil. Foi realizado nos dias 2 e 3 de dezembro de 1969 e teve a
participação dos seguintes estados: São Paulo, Distrito Federal, Bahia e Rio de Janeiro
(CBK, 2014).

A entidade dirigente da modalidade na época era a Confederação Brasileira de


Pugilismo, através do seu Departamento de Karate. Em setembro de 1987 foi fundada a
Confederação Brasileira de Karate (CBK) (FERREIRA, NASCIMENTO e NASCIMENTO,
2013)

Segundo (FERREIRA, NASCIMENTO e NASCIMENTO, 2013), o Karate-Dō


chegou ao Ceará através do Capitão do Exército Brasileiro Maia Martins, que no ano de
1967 fundou a primeira associação do estado no antigo estábulo onde hoje se localiza o
ginásio coberto do Círculo Militar, dando-lhe o nome de Associação de Karate do Ceará
(ASKACE).O Professor Maia Martins formou as primeiras turmas de karatecas, e alguns
deles vieram a se tornar os primeiros faixas pretas do Ceará. Gilson Weine e Heraldo
Guedes Lobo são os Faixas Pretas mais antigos da modalidade.
54

A Federação Cearense de Karate foi fundada em 12 de novembro de 1983,


inicialmente vinculada a Federação de Pugilismo do Ceará tendo como primeiro presidente
o senhor Pedro Gomes, o qual desligou-se em 24 de março de 1987 (FCK, 2014).

O Prof. Luiz Carlos Cardoso, que assumiu a entidade em 1987, diante de um


quadro de 10 academias e 1.500 praticantes, concluiu seu primeiro mandato em 1990,
quando foi eleito vice-presidente e, em 1992, reassumiu a presidência para completar um
mandato de três anos. Hoje a FCK conta com academias em todas as regiões de nosso
estado e cerca de 45.000 praticantes registrados (FCK, 2014).

Esse crescimento se deu graças ao trabalho de interiorização realizado pelo


Prof. Luiz Carlos e dando continuidade a esse projeto, o atual presidente Luiz Carlos Junior
vem oportunizando a toda família do Karate-Dō a desenvolver de forma salutar a prática em
todo Ceará.

Assim, concluímos que a história da modalidade no Ceará, para conquistar títulos


nacionais e internacionais, e para outorgar 566 faixas pretas, das quais 415 - 1º Dan, 77- 2º
Dan, 15 - 4º Dan, oito - 5º Dan, dois - 6º Dan e um - 7º Dan, foi escrita inicialmente pelos
seus pioneiros introdutores e aqueles apresentados na primeira relação de faixas pretas da
FCP, em 1983, citada na pagina 50 (FERREIRA, NASCIMENTO e NASCIMENTO, 2013).

A Federação Cearense de Karate (FCK) é o órgão oficial de administração do


Karate-Dō no Ceará, perante a Confederação Brasileira de Karate. Ficando ao cargo da
FCK a realização de exames de faixa, realização de competições e a regulação da
arbitragem, dentre outras atividades (FCK, 2014).

4.4 Karate-Dō na escola

O Karate-Dō como Esporte Educacional é garantido no Sistema Brasileiro do


Desporto através da Lei Federal 9.615 de março de 1998 (artigos 3º e 7º) e sua
regulamentação (artigos 2º, 8º e pg.: 62, 63, 64, 65 e 66 do Decreto Federal 2.574 de abril
de 1998).

O Karate-Dō como Modalidade Desportiva é reconhecido pelo Comitê Olímpico


Internacional (COI) e Brasileiro (COB) e regulamentado pela Confederação Brasileira de
Karate (CBK) e Federações Filiadas.
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As ações pedagógicas do programa da Federação Cearense de Karate (FCK)


seguem as normas referentes ao ensino da Educação Física Escolar em consenso com a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB nº. 9394/96, abordando o Karate-Dō
como Esporte Educacional, tendo como base de fundamento os três pilares do Karate-Dō
que são Kihon, Kata e Kumite.

Kihon

O Kihon é a parte básica do Karate-Dō, ou seja, é a prática das técnicas


fundamentais sem oponente. Forma de treino onde o praticante desenvolve a coordenação
motora. Coordena e aprende a trajetória correta das técnicas, postura, deslocamento e
bases para os ataques e as defesas os quais são predeterminados e devem ser praticados
regularmente e aplicados com a máxima concentração e esforço possíveis, de uma maneira
rápida e precisa. O praticante melhora a velocidade e a potência de suas técnicas, ao
mesmo tempo em que tenta corrigir a respiração, os movimentos de pés e as posturas. As
ações se exercitam de forma simétrica, pela direita e pela esquerda, o que leva a um
desenvolvimento físico e técnico equilibrado. É neste momento que surge realmente o
entendimento do Caminho.

Kata

É a combinação lógica de técnicas de bloqueio, soco, golpe e chute em uma


sequência predeterminada, é o conjunto que forma os kata do Karate-Dō. Ocorre uma luta
imaginária com adversários atacando de ângulos diferentes, sendo os movimentos de
ataque e defesa são predeterminados. Nesta forma de treino, o praticante desenvolve a
coordenação motora e serve também para diferenciar os estilos pessoais de luta.

As técnicas fundamentadas no Karate-Dō são combinadas de maneira lógica


nos Kata. Desde os tempos antigos os Kata constituem o núcleo do Karate-Dō tendo sido
desenvolvidos e aperfeiçoados pelos antigos mestres através do treinamento e da
experiência. Através da prática do kata, o karateca pode desenvolver seu físico, já que os
movimentos têm que ser executados com vigor e decisão.

É o córtex cerebral a base anatômica que comanda a execução do Kata.A


imagem do movimento é transmitida aos centros nervosos adequados na região têmporo-
frontal. Em seguida, dá-se a impulsão motora voluntária com a transmissão da imagem
pelos neurônios piramidais corticais até aos músculos, que realizarão as contrações
musculares necessárias. Após a execução é feita a regulação motora, quando ocorre uma
tentativa permanente de adaptar o kata à representação mental inicial.
56

Além dos cinco Heian Kata (básicos), existem outros Kata na escola Shoto-kan,
somando um total de 26 kata. São eles: os Tekki, Kata avançados e Kata superiores.

Kumite

É a parte do Karate-Dō que o praticante põe em ação os movimentos de ataque


e defesa treinados no kata e kihon, transformando em luta real. Vale ressaltar que todo o
aprendizado do Kihon e Kata tem como objetivo o aperfeiçoamento do Kumite, portanto não
devem ser negligenciados em hipótese alguma.

Porém, o karateca que visualiza somente o esporte acaba por perder a


conotação do Karate-Dō (caminho das mãos vazias), que leva a busca da perfeição,
maturidade, harmonia e através do treinamento físico unir mente, corpo e espírito tornando-
se uma pessoa melhor.

O Karate-Dō praticado dentro dos princípios éticos e filosóficos contempla o


esporte e o budō, permitindo que ambos caminhem juntos contribuindo para o bem estar
físico e mental do ser humano. As atividades de Karate-Dō contribuem para o
desenvolvimento sensório-motor, cognitivo, afetivo, lúdico e disciplinar dos alunos
estimulando a participação e respeitando a capacidade e etapas de cada um buscando
através da prática do Karate-Dō criar um ambiente onde a criança desenvolva suas
capacidades motora e social.

O Karate-Dō não é apenas uma luta, mas uma arte marcial que proporciona ao
praticante o domínio sobre si mesmo, tanto no aspecto físico como no psicológico,
permitindo uma maturação do praticante no campo psicomotor. O espírito que direciona
essa arte é sem dúvida a auto-superação, tornando-a muito mais que um esporte de
combate. Busca a intuição e o discernimento perante uma situação de real de perigo,
possibilitando ao praticante captar a intenção do adversário, avaliando a situação, para só
então tomar uma atitude correta e consciente. Este fato comprova que sua prática está além
do confronto físico e sim em busca de uma filosofia de vida.

O Budō é a fundamentação filosófica do Karate-Dō, Bu significa virtude e Dō


significa caminho. Norteada nesse pensamento dá-se a formação do caráter de quem
pratica, numa fusão do corpo, mente e espírito, levando à criação de uma personalidade sã
e ética.

Visto sob esta ótica, no contexto contemporâneo, enquanto uma produção


humana, as lutas de Karate-Dō possuem um corpo de conhecimento e uma prática corporal
que fazem parte do saber escolar e não escolar. Assim, as lutas constituem-se em conteúdo
57

a ser ensinado pela área de Educação Física em nível de escola e em outros ambientes da
educação não formal. Tradicionalmente presente no meio escolar da Educação Física, o
conteúdo esportivo apresenta uma diversidade de manifestações, quer seja quanto a sua
forma de organização pedagógica para a aprendizagem (iniciação ou estimulação esportiva,
aprendizagem, aperfeiçoamento e treinamento), quer seja na distribuição do seu ensino nos
diferentes níveis escolares, quer na definição de qual saber esportivo deve adentrar a escola
(SBP, 2006).

4.5 Karate-Dō e Psicomotricidade

Na infância, a criança busca experiências em seu próprio corpo, possibilitando a


formação de conceitos e organizando o esquema corporal. A prática do Karate-Dō e a
Psicomotricidade irá permitir à criança compreensão da forma como ela toma consciência
do seu corpo e das possibilidades de se expressar por meio desse corpo, localizando-se no
tempo e no espaço. A abordagem psicomotora, segundo Lima e Barbosa (apud SILVA e
BORGES, 2008, p.5) “[...] permite a compreensão da forma como a criança toma
consciência do seu corpo e das possibilidades de se expressar por meio dele”.

Junto às formas de movimento encontrados no Karate-Dō em função de um


objetivo, há uma intenção, como expressividade íntima; o movimento transforma-se em
comportamento significante. Para tanto, torna-se necessário que criança passe por todas as
etapas em seu desenvolvimento como Karateca.

O trabalho da Psicomotricidade e o Karate-Dō com as crianças deve prever a


formação de base indispensável em seu desenvolvimento motor, afetivo e psicológico,
dando oportunidade para que, por meio de jogos de luta e atividades lúdicas, conscientize-
se sobre seu corpo.

Através do Karate-Dō a criança desenvolve suas aptidões perceptivas como meio


de ajustamento do comportamento psicomotor. Para que a criança desenvolva o controle
mental de sua expressão motora, o Karate-Dō deve realizar atividades considerando seus
níveis de maturação biológica. O Karate-Dō dirigido proporciona a aprendizagem das
crianças em várias atividades esportivas que ajudam na conservação da saúde física,
mental e no equilíbrio sócio-afetivo.
58

Constata-se que corpo-mente é algo indissociável e, no entanto, no âmbito


educacional, ainda permanece o pensamento do dualismo cartesiano principalmente no que
se refere à disciplina de Educação Física quando professores ainda perpetuam a técnica e a
mera repetição dos movimentos, esquecendo da formação integral do indivíduo e tirando da
criança o seu direito de ser corpo.

A respeito disso, Santin (apud CAUDURO, 2001, p.53) alerta:

[...] mais do que ter um corpo que se usa como objeto ou como instrumento,
o homem precisa ser corpo, realizando a autoconstrução corporal da
consciência de si e da expressividade relacional, vivendo o corpo como um
trabalho e lazer, com o gesto, harmonia, arte e espetáculo.

Nas vivências práticas de Karate-Dō a criança deve evidenciar a relação através


do movimento de seu próprio corpo, levando-se em consideração sua idade, a cultura
corporal e os seus interesses.

A educação psicomotora para ser trabalhada necessita que sejam utilizadas as


funções motoras, perceptivas, afetivas e sócio-motoras e o Karate-Dō proporciona que a
criança explore seu ambiente, passe por experiências concretas, indispensáveis ao seu
desenvolvimento intelectual, ajudando-a a ser capaz de tomar consciência de si mesma e do
mundo que a cerca.

Como exemplo de várias atividades físicas, o Karate-Dō também pode ser


utilizado em caráter recreativo, favorecendo a consolidação de hábitos, aptidão física,
desenvolvimento corporal e mental, criatividade e socialização; buscando a formação do
caráter e da personalidade do praticante.

Podemos concluir, então, que o Karate-Dō, através de atividades afetivas e


psicomotoras, constitui-se num fator de equilíbrio na vida das pessoas, expresso na
interação entre o corpo, a mente e o espírito, a afetividade e a energia, o indivíduo e o
grupo, promovendo a harmonia do ser humano.
59

5 A IMPORTÂNCIA DO KARATE-DŌ NO DESENVOLVIMENTO


PSICOMOTOR DA CRIANÇA

O presente estudo tem como objetivo analisar o perfil psicomotor dos indivíduos
de 8 a 10 anos de idade, de ambos os sexos, praticantes de Karate-Dō, alunos do Programa
Esporte na Comunidade da Secretaria de Esporte e Lazer – Fortaleza/CE.

5.1 Ambiente de Pesquisa

A pesquisa foi realizada no Instituto Marcial Sol Nascente, academia localizada


na Rua Antonio Mendes, nº 91 bairro Jardim América, Fortaleza, CE, Com 120m² de
construção, é um ambiente onde se respira a cultura japonesa através de esculturas,
pinturas, quadros e armas tradicionais oriundas das artes marciais nipônicas. Oferecendo
aos alunos, um local seguro e adequado a vivencia do Karate-Dō, equipada com um tatame
8X8, padrão oficial (WKF), saco de pancada, makiwara e outros acessórios, onde os
praticantes podem se preparar para competições e apresentações, conta ainda com uma
loja especializada na venda de produtos esportivos para prática de artes marciais.

Geralmente nas atividades esportivas os professores conduzem seus alunos


levando em conta apenas o rendimento mecânico, como ganho de força e agilidade.
Sabendo disso, procuramos desenvolver um trabalho diferenciado (Karate-Dō e a
Psicomotricidade) em nossas atividades, pois é importante analisar a capacidade de vencer
as dificuldades físicas e de raciocínio, com a qual o aluno tem contato durante a prática dos
exercícios.

5.2 Participantes

Crianças de ambos os sexos, entre 08 e 10 anos de idade, praticantes de Karate-Dō,


alunos do Programa Esporte na Comunidade da Secretaria de Esporte e Lazer – Fortaleza,
esse programa visa o resgate de crianças em situação de risco, porém é aberta a toda
comunidade do entorno do Ginásio Paulo Sarasati, situado na Rua Idelfonso Albano nº
60

2050, agrega os bairros da Aldeota, Dionísio Torres, Joaquim Távora, Pio XII, Jardim
América e Centro, daí a variação de níveis sócio-econômico dos participantes.

As crianças são incluídas no projeto de forma voluntária, bastando um


responsável fazer o acompanhamento regular durante o período em que ela permanecer no
projeto. Existe um grupo de agentes sociais em cada núcleo do Programa Esporte na
Comunidade, que atua em conjunto com os professores, eles realizam visitas na
comunidade e promovem ações conjuntas entre a comunidade e o núcleo esportivo.

O grupo de participantes da amostra foi escolhido de forma voluntária e com o


comprometimento dos pais para a conclusão do estudo. Foi exposto aos pais que se tratava
de um estudo para conclusão de um trabalho científico e na ocasião foi assinado o Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido (ver Anexo 01), desta forma os pais selaram um
compromisso participativo para a conclusão deste trabalho científico. O grupo foi composto
por 20 crianças, sendo 10 do sexo masculino e 10 do sexo feminino,com idade entre oito e
dez anos, pois é nessa fase que a coordenação motora atinge o ápice, permitindo mensurar
suas qualidades motoras de forma coerente.

Para assim proceder, fazia-se também importante mostrar que os sujeitos dos
dois grupos em estudo, masculino e feminino, eram do mesmo nível de graduação em
relação aos critérios estabelecidos no início do trabalho (tempo de prática e ausência de
problemas neurológicos e sensoriais), como também de outros fatores (idade mínima de 96
meses e máxima de 120 meses, sem histórico de complicações gestacionais e parto,
conforme conversa com os pais).

5.3 Percurso Metodológico

No presente trabalho foram realizadas observações relacionados aos aspectos


característicos do período mediano da infância, tais como:

* Aquisições e Dominantes Fundamentais:

- Crescimento rápido até encontrar uma estabilidade para esse período;

- Enriquecimento sensório-motor e gestual com dominante do desenvolvimento das


qualidades de coordenação no domínio dos principais movimentos naturais (correr, saltar,
lançar, etc.);
61

- Maior capacidade de integração espaço-temporal e desenvolvimento do esquema corporal;

- Egocentrismo e reações emocionais diferenciadas;

- Largo domínio de materiais e espaço;

- Desenvolvimento dos fatores de execução (força, velocidade, destreza);

- Capacidade de execução em grupo e compreensão de regras e funções descriminadas –


artividade coletiva;

- Boa capacidade de execução psicomotora.

* Formas de Atividades Frequentes:

- Exploração do espaço de forma livre;

- Jogos espotâneos e imitação de adultos;

- Atividades expressivas tendo prazer nos ritmos, dramatizações, teatralizações e imitação


dos movimentos que observa;

- Tendência para formas de atividades globais de movimento, (lutas, guerras, velocidades,


descobertas, aventuras, etc.);

- Atividades que implicam as grandes coordenações dinâmicas e óculo-segmentares e


fatores de execução;

- Desejo de práticas pré-desportivas.

* Utilização de Espaços:

- Escolar;

- Familiar;

- Desportivo (clube);

- Rua;

- Parques infantis.

Esta pesquisa caracteriza-se como do tipo descritivo, com teor exploratório-


descritivo, e buscou analisar o perfil psicomotor de crianças de ambos os sexos com idade
62

entre 08 e 10 anos de idade praticantes de Karate-Dō, alunos do Programa Esporte na


Comunidade da Secretaria de Esporte e Lazer – Fortaleza/CE.

As atividades práticas (ao todo 39 seções) tiveram início no dia 02 de maio e


término em 02 de julho de 2012 e as crianças foram sendo acompanhadas através de uma
Ficha de Observação Individual (ver Anexo 2) e dados de observação do professor de
Karate-Dō.

A pesquisa foi realizada com 20 (vinte) alunos do Programa Esporte na


Comunidade, a coleta de dados se deu no período da tarde, três vezes por semana
(segundas, quartas e sextas-feiras) no período 02 de maio e término em 02 de julho de
2012.

Na fase introdutória dos grupos de Karate-Dō as aulas começaram sempre com o


cumprimento inicial, seguido de alongamento dos membros superiores (MMSS) e membros
inferiores (MMII) e aquecimento.

Nas aulas foram enfatizados vários estímulos visuais como: gestos


característicos, interpretação da nomenclatura japonesa, fotos, cartazes, vídeos e também
utilizou-se estímulos táteis, tais como, correção técnica, interrupções, comunicações
diversas.

O desenvolvimento das aulas foi feito de acordo com as etapas de ensino


descritas abaixo:

1ª Etapa: Conhecimento Mútuo

Esta etapa tem como meta principal a adaptação entre professor e alunos,
visando desenvolver a confiança mútua e introduzir os conhecimentos iniciais do Karate-Dō
associados à Psicomotricidade.

2ª Etapa: Adaptação ao Karate-Dō

Esta etapa tem como objetivo apresentar os alunos aos fundamentos do Karate-
Dō (disciplinares, filosóficos, técnicos e educacionais).

3ª Etapa: Inserção

Esta etapa procura inserir os alunos nos âmbitos da coordenação global


explorando os fatores psicomotores co-relacionados ao Karate-Dō.
63

Pode-se optar nas aulas por Kihon (estudos dos fundamentos), Kata (luta
imaginária), Kumite (estudo das técnicas de luta) e finalizar restabelecendo a calma e
apresentando considerações finais da aula, citações dos ensinamentos (Dojo-kun - lema do
praticante) e cumprimento final.

Com o estabelecimento das aulas, as crianças passaram a ser introduzidas no


Karate-Dō e sua influência pode ser observada nas crianças tanto no aspecto sensório-
motor e físico, como também em sua convivência sócia afetiva com o restante do grupo que
não estavam incluídos no estudo. Essa mudança pode ser visualizada durante as praticas
coletivas onde as crianças da amostra realizavam movimentos do Karate-Dō de forma
harmoniosa e segura, assim como a sua cortesia com os colegas.

Em nosso estudo investigamos apenas dois fatores: Equilíbrio e Estruturação


espaço-temporal em vista a que são fatores de extrema importância para o desenvolvimento
da criança durante o processo de maturação da mesma. No entanto, por conta de vários
fatores dos dias atuais, tais como insegurança, falta de espaços destinados ao lazer, etc.,
acaba a criança confinada em um ambiente inadequado onde o Equilíbrio e Estruturação
espaço-temporal com certeza serão suprimidos, vindo desta forma a comprometer um
desenvolvimento sadio e prazeroso para a criança. Portanto, para verificar o nível
psicomotor dos participantes foram utilizados os testes de equilíbrio estático (apoio
retilíneo), equilíbrio dinâmico (marcha controlada), estruturação espaço-temporal
(observação da organização espacial) da Bateria Psicomotora, descrita adiante.

No final das 39º seções, cada criança foi avaliada direta e individualmente ao
longo de um circuito psicomotor preparado para este trabalho e o tempo de cada seção foi
de aproximadamente 50 minutos.

Quanto às observações, estas se deram em dias variados durante os meses de


Maio e Junho de 2012. Utilizou-se Ficha de Observação Individual (ver Anexo 2)e as
técnicas de Karate-Dō, observamos componentes do comportamento psicomotor da criança
de uma forma estruturada e não estereotipada.

A análise dos dados se deu através do método quantitativo sendo pontuadas as


ações dos alunos selecionados para a pesquisa prática do Karate-Dō. Estas informações
foramco-relacionadas com os aspectos psicomotores pesquisados e registrados na Ficha de
Observação Individual.Foi utilizado o Programa de Karate-Dō e a BPM, através da
comparação de médias, pois as variáveis são quantitativas e os grupos são independentes,
e apresentados através de gráficos.
64

Os dados obtidos, em relação às tarefas, foram tratados estatisticamente,


buscando-se verificar se, efetivamente, as diferenças encontradas poderiam, ou não, ser
atribuídas à condição experimental.

Os resultados obtidos estão representados através de gráficos baseados nas


tabelas 2 a 4. Para que se pudesse optar pelo uso da análise paramétrica, foi verificado se
as variáveis TMLR (Tempo de Marcha na Linha Reta), TSPJ (Tempo de Saltos com Pés
Juntos), TSPD (Tempo de Saltos com Pé Direito), TSPE (Tempo de Saltos com Pé
Esquerdo), TMRL (Tempo de Marcha de Ré na Linha) e TCT (Tempo Cambalhota) e bases;
através do Programa de Karate-Dō e a BPM.

5.4 Instrumentos

Para o desenvolvimento do estudo foi utilizado como instrumento de avaliação a


Bateria Psicomotora (BPM) elaborada pelo Prof. Vitor da Fonseca em 1995. A BPM
compõe-se de sete fatores psicomotores: tonicidade, equilíbrio, lateralidade, noção de
corpo, estruturação espaço temporal, praxia global e praxia fina, subdivididos em 26
subfatores.

As tarefas dão oportunidade suficiente para identificar o grau de maturidade


psicomotora da criança e detectar sinais desviantes. Pode-se observar as estruturas tônico-
musculares das articulações proximais e distais, o controle vestibular e proprioceptivo
postural, a segurança gravitacional, o domínio do equilíbrio estático e dinâmico, a
dominância manual e telerreceptiva, a somatognosia e o grau de organização tátil-
quinestésica do corpo, a orientação e a organização espacial, a recepção e a memorização
do ritmo, a dissociação, a planificação e a sequencialização dos movimentos e a proficiência
da motricidade fina.

5.5 Resultados obtidos e Discussão

O resultado total da BPM foi obtido observando-se o desenvolvimento, conforme


descrito nas tabelas de 2 a 4.
65

A cotação assim obtida traduz o desempenho de cada avaliado.

A criança deve colocar um pé no prolongamento exato do outro,


Descrição estabelecendo o contato do calcanhar de um pé com a ponta do pé, com os
olhos fechados.

Posicionamento na base Hanmi-dachi, 70% do peso do corpo concentra-se na


Atividade perna da frente e 30% na perna de trás e os calcanhares se mantém na
mesma linha, braços na lateral do corpo.

Pontuação Desempenho da Criança

Se a criança se mantém em equilíbrio menos que 10 segundos sem abrir os


olhos, ou se a criança não realiza tentativas; sinais disfuncionais vestibulares
1
e cerebelosos bem marcados, permanentes reequilibrações, quedas;
movimentos de compensação das mãos contínuos, etc.

Se a criança se mantém em equilíbrio durante 10-20 segundos sem abrir os


2 olhos, revelando dificuldades de controle e disfunções vestibulares e
cerebelosas; freqüentes movimentos associados.

Se a criança se mantém em equilíbrio durante 15-20 segundos sem abrir os


olhos, revelando um controle postural adequado, com pequenos e poucos
3
discerníveis ajustamentos posturais e ligeiros movimentos faciais
gesticulações, osculações, etc.

Se a criança se mantém em equilíbrio estático durante 20 segundos sem abrir


os olhos, revelando um controle postural perfeito e preciso; admitem-se
4
ajustamentos posturais quase imperceptíveis; as mãos não devem sair da
posição do quadril.

Tabela2 - Equilíbrio Estático (Apoio Retilíneo) (FONSECA, 2012).

A criança deverá evoluir no solo em cima de uma linha reta com 3m de


Descrição comprimento, de modo que o calcanhar de um pé toque na ponta do pé
contrário, permanecendo sempre com as mãos nos quadris.

Atividade Deslocamento para frente, com ajuste de base Zenkutsu-dachi que possibilite
66

analisar os aspectos descritos acima:

Pontuação Desempenho da Criança

Se a criança não realiza a tarefa ou se realiza de forma incompleta ou


1 imperfeita, com sinais disfuncionais óbvios e movimentos coreáticos ou
atetóides.

Se a criança realiza a marcha controlada com pausas frequentes, com


reequilibrações exageradas, quedas e frequentes sinais vestibulares e
cerebelosos; movimentos involuntários, frequentes desvios, sincinesias,
2
gesticulações crônicas e frequentes reajustamentos das mãos nos quadris,
movimentos coreiformes e atetotiformes, sinais de insegurança gravitacional
dinâmica.

Se a criança realiza a marcha controlada com ocasionais e ligeiras


3
reequilibrações, com ligeiros sinais difusos, sem apresentar qualquer desvio.

Se a criança realiza a marcha controlada em perfeito controle dinâmico, sem


4 qualquer reequilibração compensatória; realização perfeita, madura,
econômica e melódica.

Tabela3 - Equilíbrio Dinâmico (Marcha Controlada) (FONSECA, 2012).

Sugere-se à criança que ande normalmente de um ponto da sala a outro na


distância de 5m, contando o número de passos em voz alta. Uma vez realizado
o primeiro percurso, pede-se à criança que realize o segundo percurso com
mais um passo (criança com idade pré-primária), ou mais três passos (criança
Descrição
com idade primária), utilizando para o cálculo o número de passos dados
inicialmente. Por último, solicita-se à criança que realize o terceiro percurso
com menos um passo ou menos três passos, respectivamente, para a criança
pré-primária e primária.

Deslocamento em base zenkutsu-dachi, depois Kokutsu-dachi, realizando a


Atividade
contagem conforme descrito acima

Pontuação Desempenho da Criança

1 Se a criança realiza um dos três percursos ou se não completa a tarefa,


67

evidenciando nítidos problemas de verbalização da ação, de planificação viso-


espacial, de retenção do número de passadas realizadas no primeiro percurso
e de ajustamento espacial e direcional na tarefa.

Se a criança realiza dois dos três percursos com hesitação e confusão na


2
contagem e no cálculo; sinais de desorientação espacial e dismetria.

Se a criança realiza os três percursos com ligeiro descontrole final das


3 passadas (alargamento ou encurtamento), mantendo correta a contagem e o
cálculo.

Se a criança realiza a tarefa com um controle correto nos três percursos, com
4 contagem perfeita do número de passos e com preciso cálculo viso-espacial e,
concomitante, ajustamento inicial e final para as passadas.

Tabela4 - Estruturação Espaço-Temporal (Observação da Organização Espacial)


(FONSECA, 2012).

Bases do Karate-Dō utilizadas nas atividades da BPM

A base Hanmi-dachi, 70% do peso do corpo concentra-se na perna da frente e


30% na perna de trás e os calcanhares se mantém na mesma linha, braços na lateral do
corpo..

A base Zenkutsu-Dachi é uma postura avançada e eficiente para trabalhar a


força para frente nos ataques. É também utilizada nas defesas. Os pés afastam-se no plano
sagital em aproximadamente 80cm e lateralmente na largura do quadril, com toda a planta
do pé no chão. A ponta do pé da frente dirige-se para frente ou ligeiramente para o interior,
enquanto o pé de trás dirige-se para frente o máximo possível. O joelho da perna de trás fica
estendido, enquanto o da perna da frente deve estar flexionado. Ambos encontram-se
contraídos para fora.

A base de Karate-Dō Kokutsu-Dachi é uma postura para trás ou recuada. É uma


postura muito forte, sendo bastante eficaz para defender ou esquivar para trás ou
obliquamente e trocar rapidamente para zenkutsu-dachi no contra-ataque. Os pés
encontraram-se alinhados e afastados no plano sagital em aproximadamente 80cm. O pé
de trás, apontado para o lado, suporta sobre toda planta 70% do peso do corpo, enquanto o
pé da frente, apontado para frente, suporta os 30% restantes. Ambos formam
aproximadamente um ângulo de 90 graus entre si. Na posição recuada, o joelho da perna de
68

trás é fletido para o lado e contrai-se fortemente para fora. O quadril encaixado assenta o
tronco perpendicular ao solo.

Avaliação do Equilíbrio Estático

A avaliação foi feita marcando-se os tempos na realização da atividade


desenvolvida, conforme BPM.

Em relação ao Equilíbrio Estático (EE), fica demonstrado que há diferença entre


os grupos ao comparar os sexos, o sexo masculino se destaca por apresentar maior tempo
de equilíbrio.

NÍVEL M F

4 5 3

3 5 1

2 0 1

1 0 5

GRÁFICO 1 E TABELA 5 – EQUILÍBRIO ESTÁTICO

Avaliação do Equilíbrio Dinâmico

A avaliação foi feita através de observações na realização da atividade


desenvolvida, conforme BPM.

No Equilíbrio Dinâmico (ED), com apenas uma variável, DSL (Deslocamento


sobre a Linha), foi verificada diferença entre os grupos ao comparar os sexos, o sexo
feminino se destaca por apresentar maior número de participantes que desenvolveram a
atividade de maneira adequada.
69

NÍVEL M F

4 3 5

3 6 3

2 1 2

1 0 0

GRÁFICO 2 E TABELA 6 – EQUILÍBRIO DINÂMICO

Avaliação da Estruturação Espaço-temporal

A avaliação foi feita através de observações da contagem numérica verbalizada


na realização da atividade desenvolvida, conforme BPM.

Na Estruturação Espaço-temporal utilizamos uma variável. DCV (Deslocamento


com verbalização) foi verificada diferença entre os grupos ao comparar os sexos, o sexo
feminino se destaca por apresentar maior número de participantes que desenvolveram a
atividade de maneira insatisfatória.

NIVEL M F

4 1 0

3 2 0

2 2 1

1 5 9

GRÁFICO 3 E TABELA 7 – ESTRUTURAÇÃO ESPAÇO-TEMPORAL


70

A combinação prática do Karate-Dō e a Psicomotricidade gera uma fonte


inesgotável de opções onde a criança experimenta e constrói a sua noção de espaço,
projetando nos exercícios formais que são executados durante as aulas práticas, as
aquisições e as conquistas espaciais que realizam.

Segundo Aucouturier (1996), “[...] existem três níveis de expressão motora


através dos quais a criança expressa e projeta sua história profunda.” São elas:

1º nível - sensações internas do corpo;

2º nível - prazer-desprazer;

3º nível - faz de conta.

Sobre o aspecto educativo, o Karate-Dō proporciona fortes efeitos no primeiro


nível visando trabalhar as sensações internas do corpo, na medida em que supri as
possibilidades de relação e comunicação motora. Entretanto não só este nível é focado.
Estes três níveis são de grande valia para as seções Karate-Dō co-relacionado com a
Psicomotricidade, pois essas sensações acompanham a criança desde o pré-natal ao longo
da vida. De acordo com Aucouturier (1993) estes niveis podem ser associados às
experiências motoras como:

O prazer de pressionar: essa vivência lhe reenvia sensações de limite e de unidade, Karate-
Dō: podem ser viveciadas nos agarres e imobilizações;

 O prazer de empurrar: está vinculado à pulsão de domínio, ao desejo de explorar o espaço,


à experimentação com o movimento e à tomada de distância da mãe. A ação de empurar
provoca numerosas vivências internas e externas, simbolicamente, empurar significa
afastar-se do outro e desgrudar-se dele.Karate-Dō: saídas de imobilizações e bunkai -
aplicações de kata.

 O prazer de rodar, de girar e de balançar: vinculado às primeiras sensasões labirínticas.


Karate-Dō: na execução do kata onde é exigido a mudança de direção e giros.

 O prazer de cair: que lembra as vivências de ruptura tônica da criança em sua primeira
infância, quando era carregada nos braços. Se a criança foi bem apoiada, experimentará
grande prazer nos jogos de queda.Karate-Dō: na execução de rolamentos.

 O prazer postural: a vivência postural propociona informação relativa à situação do corpo e a


modulação tônica necessária à realização de mudanças posturais a partir do solo e do corpo
71

do outro.Karate-Dō: a correção postural é uma constante nos treinamentos de kihon, kata e


kumite.

 O prazer de equilibrar-se: do nascimento até o primeiro ano de vida, a criança prepara sua
musculatura e sua estabilidade para iniciar a marcha. A vivência de situações prazerosas de
equilíbrio ajudará a unificar seus hemicorpos, a ter uma maior disponibilidade e uma maior
harmonia. Karate-Dō: utiliza três tipos de equilíbrio, isto é, Equilíbrio Dinâmico através dos
movimentos contínuos; Equilíbrio Estático através das bases e o Equilíbrio Recuperado
proveniente dos saltos.

 O prazer de conquistar a altura: aparece quando a criança se sente segura sobre o solo e
em seus deslocamentos. Isso lhe facilita a utilização de objetos duros, tais como escadas,
bancos, planos inclinados, etc. Karate-Dō: monta-se circuitos de progressão onde a criança
utiliza os objetos mencionados acima e outros..

 O prazer de unificar os dois lados do corpo: nos primeiros momentos de vida da criança, o
sistema nervoso está em pleno processo de mielinização. É necessário que tenha
aproximadamente 3 anos para que vivencie a simetria do seu corpo. A maturação e a
relação que estabelece com seu meio favorecem essa unificação.Karate-Dō: é de extrema
importância para o karateca, pois os movimentos de ataque e defesa tem que ser utilizados
de forma igual de ambos os lados.

 O prazer de saltar em profundidade: implica em perder as referências cinestésica e de


apoio. Poderá fazê-lo caso tenha vivenciado previamente as sensasões de equilíbrio em
contato com o solo. Karate-Dō: essa etapa ocorre nas práticas de rolamentos avançados,
como, por exemplo, o 7º rolamento.

 O prazer de saltar sobre superfície dura: a criança experimenta um bem estar em nível
cinestésico, devido a grande pressão que realiza com os apoios. Essa ação repercute em
todo corpo.Karate-Dō: chutes denominados top-geri e na execução de alguns kata.

 Buscar situações de regressão: geralmente representam a busca de sensações primárias


que podem ser consideradas como um chamado ao outro: “Tenho a necessidade de me
relacionar contigo, de teu espelho de prazer para sair do isolamento em que me encontro”
(AUCOUTURIER, 1993). Karate-Dō: iakusoku kumite. Aplicação de técnicas pré-
determinadas de luta com adversário real, há a necessidade de um companheiro para esse
treinamento, assim como na prática de kumite.
72

 O prazer de andar e de correr: a marcha implica a conquista do mundo pela criança; correr o
mais rápido possível, alcançar aqueles objetivos que até o momento eram
inacessíveis.Karate-Dō: realiza-se com aquecimento e ludicidade.

A partir dos resultados obtidos percebe-se que estes dados se coadunam com os
aspectos ora citados por Aucouturier (1993) visto que as técnicas desenvolvidas e aplicadas
do Karate-Dō podem propiciar um melhor desenvolvimento de aspectos psicomotores.

Abaixo apresentamos uma tabela com os dados finais reunidos para efeito de
comparação entre as atividades.

EQUILÍBRIO EQUILÍBRIO ESTRUTURAÇÃO


NÍVEL ESTÁTICO DINÂMICO ESPAÇO TEMPORAL

4 8 8 1

3 6 9 2

2 1 3 3

1 5 0 14

Tabela 8 - Resultados da Cotação dos Aspectos Psicomotores Avaliados

Gráfico 4 – Resultados da Cotação dos Aspectos Psicomotores Avaliados

Conclui-se que ao ministrar aulas utilizando o conjunto Karate-Dō e


Psicomotricidade os alunos serão compensados no seu desenvolvimento em relação ao
equilíbrio de um modo geral e a estruturação espaço-temporal contribuindo na sua formação
73

pessoal. O instrumento utilizado para coleta de dados foi a Bateria Psicomotora de Fonseca
(2012) e técnicas de Karate-Dō.

Observou-se durante o processo de avaliação das crianças um fator de grande


importância: o grau de motivação dos avaliados, os quais demonstraram claramente que as
atividades realizadas no conjunto BPM e Karate-Dō traziam alegria para as crianças, estas
mostravam-se mais alegres e faziam as atividades com prazer, do início ao término da aula,
a frequência foi de 100% nas aulas nos dois meses de aplicação da metodologia.

Os resultados coletados constataram que há um perfil dominante entre as


crianças pesquisadas.

Em relação ao equilíbrio estático, ficou demonstrado que as crianças do sexo


masculino se destacam por apresentar um perfil hiperpráxico. Já as crianças do sexo
feminino em relação ao masculino apresentam um predomínio maior de perfil eupráxico no
fator psicomotor equilíbrio dinâmico.

Na estruturação espaço-temporal, os grupos masculino e feminino apresentaram


um perfil apráxico.

Esses resultados explicitam a área onde as crianças têm maior defasagem


psicomotora, e reconhecendo as desvantagens que isso significa para a aprendizagem
escolar, deve-se estimular uma educação pelo movimento, que como afirma Le Boulch
(1987), significa contribuir com o desenvolvimento psicomotor da criança, de quem depende
ao mesmo tempo a evolução de sua personalidade e o sucesso escolar.

Fica o registro da importância de ser trabalhado de forma mais acentuada, nas


crianças que praticam esporte, o fator psicomotor Estruturação Espaço-Temporal. No gráfico
3 e tabela 7 verifica-se um déficit motor nas diferentes tarefas que avaliaram a organização
temporal, em relação a outros fatores psicomotores pesquisados no estudo. Segundo
Ferreira Neto (2001, p.103): “O espaço urbano não oferece à criança a possibilidade de se
sentir numa área sua, de modo a existirem relações sistemáticas de identificação entre o
corpo que se move e os lugares em que habita.” Deve se procurar formas de facilitação de
relação em que cada criança possa ser ela própria num trajeto permanente de liberdade e
responsabilidade, de modo a permitir:
• A sua criatividade;
• A sua liberdade de exploração corporal;
• A sua liberdade de expressão e comunicação;
74

• A sua capacidade de crítica e reflexão sobre o que vive.

Os meios para que isto seja possível são, além do espaço familiar e escolar, o
espaço de recreio e jogo, local onde o convívio e a animação sócio-cultural têm lugar.
Decorre disto a nossa recomendação, em especial a este fator psicomotor.
75

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O tema abordado é considerado de grande importância para os que vivenciam o


Karate-Dō ou a Psicomotricidade. Buscamos reunir informações sobre os aspectos co-
relacionados entre Karate-Dō e Psicomotricidade, criando uma infraestrutura de
conhecimento e prática.

Este trabalho chama a atenção para diferentes acontecimentos que vão


modificando e fazendo mais complexa uma prática que tem como eixo central o movimento
e o corpo de um sujeito desejante. A complexidade do aprendizado se dá por conta de
alguns fatores psicomotores que não foram totalmente desenvolvidos. A Psicomotricidade
aliada ao Karate-Dō torna a aprendizagem simples, prática e lúdica, dos exercícios formais
desta arte marcial.

A evolução humana nasce por conta dos obstáculos que nos deparamos os quais
nos obrigam a buscar soluções. Desta forma, utilizamos em nossa didática situações que
remetem a obstáculos, tanto cognitivos quanto afetivos, permitindo uma educação
psicomotora relacionada às necessidades de movimento infantil através de experiências
com o Karate-Dō e a Psicomotricidade, no intuito de recuperar o espaço perdido da criança
em relação a rua, a qual em outrora era a principal aliada para o desenvolvimento espaço-
temporal da criança.

O Karate-Dō, como arte educativa, evidencia a possibilidade de expressão da


criança no sentido de uma maior consciência corporal conjugada ao ambiente que a cerca.
Esta possibilidade é trabalhada no sentido da criança administrar as suas limitações, e com
o desenvolvimento decorrente da prática orientada irá transcendê-las, transpondo-se da
técnica para o estilo e dominando as ações possíveis no espaço.

Embora professores e terapeutas estejam mais envolvidos no fazer na prática,


não restam dúvidas de que um conhecimento e a significação psiconeurológica das causas
das dificuldades podem permitir superar o tradicional empirismo que caracteriza tal tipo de
intervenção. Embora admissível para o prático, o campo da intervenção exige uma
abordagem experimental, a fim de poder ajudar na criação de alternativas interventivas
(FONSECA, 2012).

O meio circundante é diferente do corpo. Seu mundo espacial constrói-se


paralelamente ao seu desenvolvimento psicomotor. Neste contexto, é importante lembrar
76

que Karate-Dō pode ter um papel primordial, no qual o profissional em consona ncia com a
Psicomotricidade pode atuar selecionando conteúdos curriculares adequados, a fim de
propiciar o desenvolvimento e a aprendizagem da criança.

Existe hoje no meio das artes marciais uma carência em relação à pesquisa
cientifica, há falta de trabalhos de confiabilidade acadêmica para dar maior embasamento ao
desenvolvimento deste trabalho, fato que demonstra a necessidade de novas pesquisas e
registros

Permanece a certeza de ainda haver muito a dizer e a fazer. Reconhecemos que


vários domínios da contextualização teórica necessitariam, certamente, de um maior
aprofundamento, outras correlações seriam plausíveis de se verificarem, enriquecendo o
discurso aqui produzido e quem sabe, lançar esta investigação em contextos mais amplos;
este foi apenas um início.
77

REFERÊNCIAS

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Psychomotrice. In Rev. Psychiatrie de I’Enfant, vol. II, fasc.2, PUF, 1962.

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Masson, 1983.

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ARAUJO, Adriana Simões. Contribuições da Música no desenvolvimento Psicomotor


da criança em idade pré-escolar. Universidade Estácio de Sá, Faculdade de Educação
Física. dez./ 1998.

ARNAIZ Sánchez; RABADÁN Martinez; VIVES Penalver. A psicomotricidade na


Educação Infantil. São Paulo: Artmed.

AUCOUTURIER, B. Formação em Pratica Aucouturier. Apostila do curso de formação


realizado no periodo de 1996 a 2001. Rio de Janeiro/Espaço Néctar, 1996.

BARRETO, Sidirley de Jesus. Psicomotricidade, educação e reeducação. 2. ed.


Blumenau: Livraria Acadêmica, 2000.

BERESFORD, Heron. Conceito de Ciência da Motricidade Humana. Anotações em sala


de aula na disciplina Estatuto Epistemológico da Motricidade Humana. Universidade Castelo
Branco, Rio de Janeiro, 1º quadrimestre, 2004, (mimeo).

BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil: Promulgada em 5 de outubrode


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81

ANEXOS
82

Anexo 01
COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA – UECE
TERMOS DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

O (A) Sr.(a) foi selecionado(a) e está sendo convocado(a) para participar da


pesquisa intitulada: Karate-Dō e Psicomotricidade: Um Elo para o Desenvolvimento dos
Fatores Psicomotores, que tem como objetivo: Aprofundar o conhecimento sobre a atividade
psicomotora e sua repercussão para o desenvolvimento da criança. Este é um estudo baseado
em uma abordagem qualitativa, utilizando como método a entrevista.
A pesquisa terá duração de 1 mês, com o término previsto para 29 de junho de
2012.
Suas respostas serão tratadas de forma anônima e confidencial, isto é, em nenhum
momento será divulgado o seu nome em qualquer fase do estudo. Quando for necessário
exemplificar determinada situação, sua privacidade será assegurada uma vez que seu nome
será substituído de forma aleatória.
Os dados coletados serão utilizados apenas nesta pesquisa e os resultados
divulgados em eventos e/ou revistas científicas.
Sua participação é voluntária, isto é, a qualquer momento você pode recusar-se a
responder qualquer perguntar ou desistir de participar e retirar seu consentimento.
Sua recusa não trará nenhum prejuízo em sua relação com o pesquisador ou com a
instituição que forneceu os seus dados, como também na que trabalha.
Sua participação nesta pesquisa consistirá em responder as perguntas a serem
realizadas sob a forma de entrevista. A entrevista será realizada em março para posterior
transcrição e será guardada por três meses e incinerada após esse período.
Sr (a) não terá nenhum custo ou quaisquer compensações financeiras. Não haverá
riscos de qualquer natureza relacionada à sua participação. O benefício relacionado à sua
participação será aumentar o conhecimento científico para a área de educação.
Sr (a) receberá uma cópia deste termo onde consta o celular/e-mail do orientador
responsável, e demais membros da equipe, podendo tirar as suas dúvidas sobre o projeto e sua
participação, agora ou qualquer momento. Desde já agradecemos.

Joan Cristina Rios de Oliveira Francisco Ronnie Von Vieira


Orientadora Orientando
Cel: (85) Cel: (85)
E-mail: E-mail:

Entrevistado:_________________________________________ Data: ____/____/____


83

Anexo 2

INSTITUTO MARCIAL SOL NASCENTE


Filiado a Federação Cearense de Karate
Confederação Brasileira de Karate
Comité Olímpico Brasileiro e World Karate Federation
Rua Antonio Mendes n.º 91-Jardim América-Fortaleza-Ceará

FICHA DE OBSERVAÇÃO INDIVIDUAL

Nome: _____________________________________________________ Aluno desde ___ / ___ / _____


Data de nascimento ____ / ____ / _____ Faixa atual:_______________
Professor responsável: ___________________________________________________________________

PROGRAMA DE ACOMPANHAMENTO
DESENVOLVIMENTO CONCEITO

EQUILÍBRIO ESTÁTICO - EE

EQUILÍBRIO DINÂMICO - ED
ESTRUTURAÇÃO
ESPAÇO-TEMPORAL - EET

EE ED EET
Posicionamento na base
Hanmi-dachi, 70% do peso do Deslocamento em base
Deslocamento para frente, com
corpo concentra-se na perna da zenkutsu-dachi, depois
ajuste de base Zenkutsu-dachi
frente e 30% na perna de trás e Kokutsu-dachi, realizando a
que possibilite analisar os
os calcanhares se mantém na contagem conforme descrito
aspectos descritos acima:
mesma linha, braços na lateral acima
do corpo.

PERFIL CONCEITO
Perfil apraxio (fraco) 1
Perfil dispraxio (satisfatório) 2
Perfil eupraxio (bom) 3
Perfil hiperpraxio (exelente) 4

OBSERVAÇÕES:
84

Anexo 3

Aluno executando movimentos do Kata Heian-Shodan

Equilíbrio Estático Equilíbrio Dinâmico Dominância lateral


Mãos, pés, olhos

Apoio Retilíneo Orientação e Estruturação Dinâmica


estruturação dentro do
espaço

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