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INQUÉRITO 4.

878 DISTRITO FEDERAL

RELATOR : MIN. ALEXANDRE DE MORAES


AUTOR(A/S)(ES) : TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL
ADV.(A/S) : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
INVEST.(A/S) : JAIR MESSIAS BOLSONARO
ADV.(A/S) : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
INVEST.(A/S) : FELIPE BARROS
ADV.(A/S) : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
INVEST.(A/S) : VICTOR NEVES FEITOSA CAMPO
ADV.(A/S) : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS

DECISÃO

Trata-se de Agravo Regimental interposto pelo Presidente da


República, JAIR BOLSONARO, representado nesta oportunidade pela
Advocacia-Geral da União – AGU, a qual formalizada em petição nº
3671/2022, protocolizada nesta data, às 13h:49 e recebida no Gabinete às
14h:08.
A AGU requer, caso não haja reconsideração da decisão, seja o
recurso submetido ao Plenário, a fim de que seja reformada a decisão
agravada, “explicitando-se que ao agente político é garantida a escolha
constitucional e convencional de não comparecimento em depoimento em
seara investigativa”.
É o relatório. DECIDO.

A Advocacia-Geral da União – AGU protocolou a petição nº


3671/2022, nesta data, às 13h:49 – 11 minutos antes do horário agendado
para o interrogatório – e recebida no Gabinete às 14h:08, sabendo tratar-
se de RECURSO MANIFESTAMENTE INTEMPESTIVO POR
PRECLUSÃO TEMPORAL E LÓGICA.
Como consignei na decisão agravada, em 29/11/2021, após deferir
requerimento da autoridade policial, a fim de que a Polícia Federal
procedesse à oitiva pessoal do Presidente da República JAIR
BOLSONARO, no prazo de 15 (quinze) dias, concedi a oportunidade de

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prévio ajuste de local, dia e hora.


Dessa maneira, tendo tomado ciência da decisão de realização de
interrogatório pessoal em 29/11/2021, por intermédio do Ofício nº
536307/2021 – SR/PF/DF, a Defesa teria o prazo de 5 dias para interpor o
competente agravo, ou seja, até o dia 06/12/2021, caso pretendesse que a
discussão fosse levada ao Plenário do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
Ocorre, entretanto, que o investigado, ao tomar ciência da decisão,
não interpôs qualquer recurso no prazo processual adequado. Pelo
contrário, a defesa expressamente concordou com a sua oitiva e solicitou,
por intermédio de petição, protocolada em 10/12/2021, a concessão de
prazo adicional de 60 (sessenta) dias para a sua realização, em razão de
compromissos firmados em sua agenda presidencial previstos para o
período de final de ano, o “que dificultam sobremaneira a sinalização de dia e
hora no exíguo lapso ofertado pela Senhora Delegada de Polícia Federal",
oportunidade em que determinei a prorrogação do prazo para a
realização da sua oitiva, concedendo mais 45 (quarenta e cinco) dias, com
termo final em 28/01/2022, resultando no total de 60 (sessenta) dias para o
cumprimento da diligência.
No ponto, convém rememorar – diferentemente do que,
estranhamente alegado pela AGU no presente agravo – que, ao
formular o pedido de dilação do prazo para a sua oitiva, o Presidente
concordou expressamente com seu depoimento pessoal e restou
acentuado que:

“o Senhor Presidente da República, em homenagem aos


princípios da cooperação e boa-fé processuais, atenderá ao
contido no Ofício nº 536307/2021-SR/PF/DF.”

Observe-se que esse posicionamento foi idêntico àquele ocorrido no


INQ 4831/DF, onde a defesa do Presidente da República, expressamente,
aceitou sua participação pessoal no interrogatório, tendo salientado:

“(…) o Requerente manifesta perante essa Suprema


Corte o seu interesse em prestar depoimento em relação aos

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fatos objeto deste Inquérito mediante comparecimento


pessoal.
Nesta oportunidade, requer lhe seja facultada a
possibilidade de ser inquirido em local, dia e hora
previamente ajustados, em aplicação ao que prevê o artigo
221, caput do Código de Processo Penal, prerrogativa que
compatibilizará o pleno exercício das funções de Chefe de
Estado e do seu direito de defesa na ocasião da prestação de
depoimento em modo presencial.”

No dia 26/1/2022, às 22h:46, horas antes do vencimento do prazo de


60 (sessenta dias) para que o Presidente da República indicasse local, dia
e horário para a realização da sua oitiva, a AGU protocolou nova petição,
na qual, alterando anterior posicionamento do investigado, informou que
não indicaria local, dia e horário para sua oitiva, como também declinava
de comparecer ao ato processual destinado à sua oitiva.
Na decisão agravada, destaquei que nossa CONSTITUIÇÃO
FEDERAL, apesar de garantir o direito ao silêncio e o privilégio contra a
autoincriminação, não consagra o "direito de recusa prévia e genérica à
observância de determinações legais" ao investigado ou réu, ou seja, não lhes
é permitido recusar prévia e genericamente a participar de atos
procedimentais ou processuais futuros, que poderão ser estabelecidos
legalmente dentro do devido processo legal, máxime quando já definidos
ou aceitos pela defesa, como na presente hipótese em que, inclusive,
houve concordância do investigado em participar do ato procedimental e
solicitação de dilação de prazo para o seu agendamento.
A alteração de posicionamento do investigado – que, expressamente,
assentiu em depor pessoalmente “em homenagem aos princípios da
cooperação e boa-fé processuais” – não afasta a PRECLUSÃO
TEMPORAL já ocorrida, pois não tem o condão de restituir o prazo
processual para interposição de recurso de uma decisão proferida em
29/11/2021, cuja ciência foi dada à defesa na mesma data e o término do
prazo para interposição de eventual agravo regimental encerrou-se em
06/12/2021.

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Não bastasse a ocorrência da PRECLUSÃO TEMPORAL,


comportamentos processuais contraditórios são inadmissíveis e se
sujeitam à PRECLUSÃO LÓGICA, dada a evidente incompatibilidade
entre os atos em exame, consubstanciados na anterior aceitação pelo
investigado em comparecer à sua oitiva em momento oportuno – tendo
inclusive solicitado dilação de prazo – e na sua posterior recusa.
Como salientado por essa SUPREMA CORTE:

“Vigoram, no processo penal brasileiro, como expressão


imediata da cláusula do due process of law, os princípios da
boa-fé objetiva e da lealdade processuais, o que torna
imperativa a observância, tanto pelo órgão de acusação quanto
pela Defesa, da cláusula nemo potest venire contra factum
proprium (RHC 189.088/DF, Rel. Min. ROSA WEBER, Primeira
Turma, DJe de 6/8/2021).
Conferir, no mesmo sentido: HC-AgR-ED 195.109/SP, Rel.
Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, DJe de 7/6/2021.

Nesse contexto, é de rigor o RECONHECIMENTO DA


PRECLUSÃO.

DIANTE DE TODO O EXPOSTO, NÃO CONHEÇO DO


AGRAVO REGIMENTAL, POR INTEMPESTIVIDADE.
Publique-se.
Brasília, 28 de janeiro de 2022.

Ministro ALEXANDRE DE MORAES


Relator
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