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Piêtra Laiany Souza Alves

DRE: 121145272
A CONSTITUIÇÃO COMO AQUISIÇÃO EVOLUTIVA ATRELADO A “MORTE AO
REI”
A obra cinematográfica, “Morte ao Rei”, dirigido por Mike Barker, retrata um momento
histórico da Inglaterra após a Guerra Civil marcado por diversos acontecimentos que
promoveram mudanças nas suas estruturas políticas e sociais durante a primeira metade do
século XVII que resultaram na morte do Carlos I. Nesse período, inicialmente, o sistema
instaurado na Inglaterra era a Monarquia absolutista, forma de governo na qual o monarca
detém o poder absoluto do Estado, ou seja, um regime opressor onde todos os súditos deviam
obediência e respeito ao rei que se autoproclamava o “escolhido por Deus”.

O filme expõe os posicionamentos políticos dos personagens Oliver Cromwell e o Lorde


Thomas Fairfaix contra o monarca que explorava seus súditos com altos impostos por meio do
seu poder absoluto. Ambos os personagens almejavam reformar e unificar o país, no entanto,
Cromwell desejava tornar a Inglaterra um país livre da soberania monárquica através da
execução do rei e instaurar a democracia, ou seja, usar-se somente do Parlamento, enquanto
Fairfaix queria uma reforma mais moderada e a continuação do sistema monárquico, mas, com
limites impostos ao poder do rei e com consultas ao Parlamento. Por conseguinte, os atritos
gerados entre os reformistas Cromwell e Fairfaix, em virtude das ideologias opostas, geram
uma batalha entre os dois.

A partir disso, o filme se desenvolve retratando o cenário caótico pós-guerra civil da


Inglaterra e a posição que as desavenças entre Oliver e Thomas fizeram o país assumir. Os
planos de Fairfaix teriam se concretizado se Cromwell não tivesse realizado uma intervenção
através de um discurso feito com veemência e ardor, resultando na queda da monarquia. Com
isso, a Inglaterra muda o seu sistema político: de Monarquia Absolutista para República.

Paralelamente, o texto “A Constituição como aquisição evolutiva” (1990), de Niklas


Luhmann, traz um conjunto de contribuições acerca do papel da Constituição no sistema
jurídico e sua interação com o sistema político. No texto citado (LUHMANN, 1990), o autor
expõe uma teoria da evolução, onde o surgimento de uma Constituição é atribuído à um
momento evolutivo e não à uma inovação intencional. À vista disso, nota-se uma correlação
entre o texto e o contexto histórico do longa-metragem, uma vez que, a modificação do regime
político da Inglaterra se deu devido à Guerra Civil Inglesa organizada por Cromwell

Seguindo esse pensamento, Luhmann explora a função da Constituição no regime


político, apresentando-a como solução para o problema da soberania. É possível observar essa
vertente no seguinte trecho da obra:

Prevalece, no entanto, a necessidade de enfatizar a unidade da organização


estatal e de concentrá-la (ricongiungerla) na pessoa do soberano, suportando-se como
anomalias os problemas emergentes em relação ao direito. Com o que a descrição do
sistema é levada aos extremos do paradoxo da soberania, ou seja, à forma de poder
ilimitado de autolimitação. [...] A novidade evolutiva consiste, ao invés, na crescente
importância (sobretudo no reconhecimento da importância) da legislação. O que, na
Inglaterra, leva ao reconhecimento da soberania do Parlamento. (LUHMANN, 1990)

Com base nessa concepção, além de apresentar a Constituição como um meio de


conjuntura entre o direito e a política, Luhmann afirma que “a necessidade da Constituição é
justificada em relação ao problema da soberania” ( LUHMANN, 1990). Atrelando essa citação
ao filme, observa-se que, de fato, o declínio do absolutismo na Inglaterra ocorreu devido ao
“problema da soberania” enfatizado pelo próprio Rei Carlos I e suas ações abusivas com o
corpo social inglês.

Ademais, é possível observar que o autor analisa o papel da Constituição também como
o de garantidor do processo de evolução sistêmica do Direito. Diante disso, percebe-se que
apesar da obra literária e a cinematográfica tratarem de ângulos distintos, elas apresentam algo
em comum que é a Constituição como um mecanismo de um processo evolutivo e a relação
entre o direito e a política nesse meio. A exemplo disso, é evidente que um dos principais pontos
abordados no filme é a narração da Guerra Civil Inglesa e o processo de mudança da forma de
governo, trazendo uma crítica à monarquia e os abusos de poder do Rei. Esses fatos descritos
no filme “Morte ao Rei” e esse recorte do texto estruturam um dos momentos mais polêmicos
da história inglesa durante o século XVII.
Ainda sobre o autor Niklas Luhmann, é válido ressaltar a sua teoria de sistemas, na qual
ele afirma que a evolução de um sistema depende das características do ambiente onde ele se
encontra e, consoante a tolerância do sistema, tais características podem promover mudanças
nas suas estruturas. De outro ponto de vista, o filme citado acima, se passa em um cenário
conturbado, onde as características do regime político da Inglaterra levaram a mudanças
extremas no sistema. Esse retrato do filme pode ser afirmado por Luhmann na seguinte
passagem da sua obra: “No século XVII, um papel cada vez mais relevante é assumido também
pela possibilidade de interpretar as relações institucionais na Inglaterra em direção à uma
divisão de poderes” (LUHMANN, 1990).

A teoria dos sistemas impõe um enfoque diverso à pesquisa histórica - a história como
algo que é sempre um sistema autopoiético no momento em que, na realização de suas
operações, recruta os "princípios" para tanto necessários. Sob essa ótica, ocorre
proceder de modo binário. A razão teórica dessa aquisição evolutiva que é a
Constituição é individuada na necessidade de um acoplamento estrutural entre o
direito e a política e do uso do acoplamento pela destautologização da
autoreferenciabilidade de ambos os sistemas (LUHMANN, 1990)

Ademais, no trecho destacado acima, Luhmann indica que um sistema sempre é


autopoiético quando, no momento das suas operações, recruta os princípios necessários, ou seja,
um sistema autopoiético seria aquele que se desenvolve a partir de suas próprias estruturas. Sob
essa perspectiva, é possível verificar-se, no contexto do filme, esse sistema autopoiético,
seguido da formação do acoplamento estrutural, já que, houve uma relação entre o direito e a
política sendo construída por meio da reforma da monarquia que, posteriormente, levou a
República.

Em suma, na Inglaterra, no século XVII, como já foi dito, as relações institucionais


estavam a caminho de uma divisão de poderes e, tanto o filme, quanto o texto aqui exposto,
apresentaram de forma clara a situação do regime politico da Inglaterra durante esse período
turbulento. Por fim, é notório que parte do texto de Niklas Luhmann, “A Constituição como
aquisição evolutiva”, embasado na análise do filme dirigido por Mike Barker, de alguma forma
sustenta a estória por trás do filme em questão. Assim, o filme e a historiografia se
complementam para fundamentar um dos momentos mais críticos da Inglaterra. Desse modo,
apesar de serem obras diferentes, é possível destacar inúmeros pontos semelhantes entre ambos
os trabalhos em relação ao acoplamento estrutural entre o direito e a política e, como
propriamente dito no título, a Constituição como uma aquisição evolutiva, mais
especificamente, na Inglaterra.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AGRA, Dennis. Morte ao Rei (Legendado). Youtube. 20 maio, 2016. (122m30s).


Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=0p5_cjgQLNg. Acesso em: 17 jan. 2021
GONÇALVES, Guilherme Leite. Teoria dos sistemas sociais: direito e sociedade na obra
Niklas Luhmann. São Paulo: Saraiva, 2013.
LUHMANN, Niklas. A Constituição como Aquisição Evolutiva. Tradução livre feita por
Menelick de Carvalho Netto a partir do original La costituzione come acquisizione evolutiva.
In: ZAGREBELSKY, Gustavo (coord). II Futuro Della Costituzione. Torino: Einaudi, 1996,
p. 10. Disponível em: http://pt.scribd.com/doc/31253250/LUHMANN-Niklas-A-constituicao-
como-aquisicao-evolutiva. Acesso em: 18 jan. 2021.

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