Você está na página 1de 2

A sereia e o pirata

Sir Henry Drunke estava sentado mais uma vez no balcão da taverna, sentado não seria a
palavra mais apropriada, ele estava praticamente escorado no balcão. Com a cabeça sobre
os braços cruzados, contava os centavos que lhe restaram da última viagem. Se endireitou
e deu um gole em seu caneco de cerveja, o que faria com tão pouco dinheiro?
Saiu da taverna, dando um sorriso cansado aos seus marujos, e seguiu para o píer.
Observou os grandes navios de outros piratas, analisou cada bandeira, ouviu o ranger que
suas botas provocavam nas tábuas de madeiras frágeis, sentiu o cheiro do mar salgado
envolver seu corpo esguio. Finalmente, ao chegar no final da longa passarela de madeira
envelhecida, sentou-se e se pôs a olhar a lua, admirava esta tanto no céu quanto no reflexo
do mar, o mundo estava em preto e branco naquele momento, só havia ele, a lua e o mar
sombrio e misterioso.
Tinha já viajado para muito longe, conheceu vários mares e pessoas novas, principalmente
mulheres, mas Sir Henry Drunke nunca se apaixonou por nenhuma delas, em compensação
todas essas mulheres se apaixonaram pelo homem alto e mal encarado. Não queria admitir,
porém, que gostaria de sentir um pouco do amor que tanto se falava por aí. Não sabia se
era algo como nos livros ou se era como seus marujos contavam, apenas uma noite de
bebedeira e sexo, e nada mais.
Não percebeu o tempo passar, estava perdido no reflexo da lua no oceano aberto, até que
algo lhe chamou a atenção, não estava assustado, apenas curioso. Não fez menção a se
levantar, colocou as mãos na bainha de sua espada e tombou a cabeça para a direita,
tentando entender o que era aquele movimento estranho sob as águas profundas e frias.
Descobriu do que se tratava quando uma mulher de cabelos encaracolados longos e de
pele negra submergiu das águas ao longe: era uma sereia.
Sua silhueta perfeita exatamente no meio do reflexo da lua lhe dava um ar misterioso, o
pirata a encarava incrédulo e ela a encarava um tanto quanto curiosa. Abruptamente,
desapareceu nas águas. A essa altura, Sir Henry já havia soltado suas mãos da bainha e
estava caído de joelhos observando atentamente a água que estava sob seus pés. O que o
pirata esperava aconteceu: a sereia submergiu das águas aos seus pés, fitando Henry com
seus enormes olhos de jabuticaba.
Seus olhos eram suaves e cruéis, sua pele tilintava à luz do luar, suas longas madeixas
molhadas eram de uma maciez que mulheres normais não eram capaz de reproduzir em
seus cabelos, perto dos fios da sereia qualquer outra cabeleira se igualaria a palha de
milho. Um pequeno sorriso sutil surgiu em seus lábios, e a sereia perguntou:
"Estás sozinho, meu caro? Posso lhe fazer companhia?"
"Sim, minha cara... Com certeza." Disse o pirata desnorteado com a voz encantadora da
sereia.
O pirata se sentou no píer e a sereia apoiou-se neste com seus dois braços cruzados, ainda
encarava-o com uma curiosidade mórbida.
"De onde veio a cicatriz?"
"Uma batalha em meu convés, alguns saqueadores invadiram meu navio e seu líder veio
lutar comigo, sabe como é, lutar para morrer."
"Então você é do tipo durão? Mata saqueadores sem dó nem piedade?"
"Pode-se dizer que sim" respondeu encarando as mãos. "E o que uma moça como você faz
aqui?"
"Eu sempre vivi aqui."
"Mas creio que você não costuma falar com homens antes de matá-los."
"Sim, nisto você está certo. Mas algo em você me deixa intrigada."
"Como?" Perguntou incrédulo, encarando-a nos olhos.
"Eu acredito que seja você."
Sem esperar que ele respondesse, a moça subiu no píer e surpreendentemente sua cauda
eram duas pernas longas e brilhantes. A recém-moça aproximou seu rosto do pirata,
colocou seu dedo no queixo do pirata com barba por fazer e afirmou:
"Só pode ser você."
Inesperadamente a moça uniu seus lábios carnudos com a linha fina do pirata. Seu beijo
tinha gosto de laranjas frescas, seus lábios eram macios como seda, seu cheiro era de
verão e morte, mas naquele momento ela exalava um cheiro mais característico do açúcar.
O pirata puxou a sereia para mais perto de si, com uma das mãos puxou sua nuca e com a
outra puxou seus quadris, seus quadris se moviam na direção do pirata, ela o almejava
tanto, seu desejo estava aparente no suor em sua testa e em seu corpo nu, nos
movimentos violentos que sua boca fazia. Naquele momento ela desejava que eles fossem
um.
O pirata se levantou com a moça em seu colo, instintivamente suas pernas longas se
enrolaram na cintura de Sir Henry, o pirata a carregava para seu navio.
Já com a cama bagunçada, respirações ofegantes e perfumes e cheiros misturados, o
pirata encarou o teto com seu peito desnudo peludo e disse:
"Eu te amo eternamente"
"Eu também te amo eternamente"
Henry adormeceu naquele momento, sabendo que no dia seguinte acordaria com a mulher
de sua vida ao seu lado. Não demorou muito até o sol dar seu primeiro indício de aparição.
Acordou perturbado com a luz do sol, a porta estava aberta, a brisa do mar invadia o
cômodo e o cheiro do sal preenchia o quarto vindo das janelas, não se lembrara de fechar a
porta e as janelas na noite anterior?
Foi neste momento que percebeu.
Ela não estava lá.
Sentado nu começou a chorar, e chorou durante o que pareceram ser horas.
Naquela noite de sábado seus marujos estavam a cantar sob a luz do luar, Sir Henry não
cantou naquela noite, apenas encarou o mar e implorou silenciosa e inútilmente pela volta
de seu único e verdadeiro amor.

Você também pode gostar