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Beijos, de sua,
Baby.
CAPÍTULO UM
Ela era uma loira simplesmente escultural. E gostava de
tomar sol.
Aparecera por volta das onze horas da manhã na praia
privada do Beach Beach Hotel, em Miami Beach: envolta em
um roupão de banho tonalidade azulada delicada; um azul
diferente dos olhos, cujo tom era muito mais intenso, da cor
do céu... Sim, eles eram olhos celestiais.
E resistente ao sol, porque em momento algum a loira
recorrera a óculos de óculos escuros ou qualquer coisa assim.
Possivelmente alguém chegou a pensar que era uma sereia
encantada que possuía algumas horas ou alguns dias para se
misturar com os seres humanos, com a aparência de tal, e
estar ciente das coisas que os humanos fizeram e disseram...
Embora não. Claro que não. De forma alguma seria
justificável que uma sereia deixar o belo mundo marinho
para perambular por terra firme e total, para descobrir o que
os humanos fazem e o que dizem, que, aliás, não é nada que
mereça ser escrito em letras douradas, por exemplo. Se
acaso, o que os humanos fazem e dizem deve ser escrito com
letras de sangue, porque vamos, o que veio a inventar o
animal humano é explodir em lágrimas, e até se eliminar
desse mundo podre que...
Mas não. Nenhum pensamento negativo. De modo que a
loira ainda estava tomando sol, pensando ou tentando pensar
em coisas agradáveis.
Por exemplo: um jardim silencioso. Por exemplo, um ato
de generosidade, esse alguém deve permanecer na Terra. Por
exemplo, ao fazer amor. Por exemplo, ajudando quem
precisa. Por exemplo...
— Miss Connors?
A loira abriu os olhos, ficou momentaneamente cega pelo
sol e imediatamente protegeu os olhos, colocando uma mão
sobre eles. Uma mão especial: bela, fina, aristocrática,
lindamente laqueada em rosa pálido e que parecia inútil, à
primeira vista, mas o oposto a um segundo olhar, a menos
que o observador fosse um cretino; foi uma mão linda e, ao
mesmo tempo, uma ferramenta sólida de alta utilidade,
características, por sinal, que não abundam. Geralmente,
quem tem mãos bonitas não costuma usá-las muito em coisas
úteis.
— Señor Carrizo? — perguntou a loira, por sua vez.
O homem sorriu. A loira sorriu. A loira era bonita, e
ofereceu o esplendor de seu corpo quase nu, já que, para
desfrutar melhor do sol, removera a parte superior do
biquíni, oferecendo toda a magnificência de um par de seios
túrgido, encantador, bronzeado, cheio de vida. Porque há
seios de mulheres que não são cheios de vida, mas apenas de
carne, que é muito diferente. Pelo menos, foi o que o señor
Leopoldo Carrizo pensou, que ele não conseguia se livrar de
sua fascinação contemplando a bela e loira señorita Connors.
— Sim, eu sou Carrizo — ele disse, — e eu trago de volta
memórias de Capri.
Miss Connors deu uma risada deliciosa, sentou-se na
extensão e apontou para outra à sua esquerda. O olhar de
Carrizo ainda estava preso na contemplação dos seios agora
vibrantes e saltitantes da señorita Connors, que rira
novamente.
— Por favor, sente-se — ela disse. Estava esperando por
ele, naturalmente. — Gracias, muy amable.
Carrizo sentou-se. Carrizo não era bonito nem loiro nem
dono de um porte atlético. E ele nem era jovem, pois já havia
completado cinquenta anos. Não era uma múmia, é claro,
mas não era mais jovem. Coisas da vida: quem vai vivendo
há de se fazer velho. O señor Carrizo, por seu lado, era
moreno, ainda mais do que a señorita Connors, pois sua pele
era escura e natural, enquanto a da señorita Connors (que,
aliás, era um nome tão falso quanto a cor de seus cabelos)
era natural, sendo branco com tons de alabastro, mas por
força de sol era um encanto da vida, de modo bronzeada, tão
suave, tão sedosa... O señor Carrizo, que media apenas um
metro e setenta, não parecia, certamente, o par mais
adequado para a loira señorita Connors, cuja altura não era
inferior a um metro e setenta e cinco. E com esse corpo...! O
señor Carrizo teria feito bem em não aparecer em um traje
de banho na praia, mas, é claro, se houvesse aparecido
completamente vestido teria chamado mais atenção do que
oferecer a imagem de seu pequeno corpo franzino e um
pouco flácida.
— Então você está vindo de Capri — disse señorita
Connors.
— Não, não. Eu venho de outro lugar, mas trago
lembranças de Capri... Você já entendeu.
— Sim, entendo1. E como está meu querido Natan?
Quero dizer, de aspecto. Eu não o vejo há muito tempo e,
embora sua voz soe igual a sempre ao telefone, ele pode ter
envelhecido ou descuidado de sua forma física.
— Não, não, nada disso — disse Carrizo energicamente.
— Nataniel é feito um tigre.
— Um tigre — a loira concordou. — Sim, isso o descreve
bem. Embora eu diria melhor um puma ou um jaguar. Sim,
um jaguar. Você gostaria de tomar uma bebida, señor
Carrizo?
1
Conforme aventura “Leilão em Capri”. Publicada nessa coleção na edição
número 35 — Episodio em Capri.
— Acho que sim, está quente.
— Sim É que estamos praticamente no verão, e para estas
datas em Miami é geralmente um pouco quente. É por isso
que tantas pessoas vêm..., deixando de lado muitas outras
excelências de Miami. Você gosta de Miami?
— Não — rechassou Carizo. — há muito vício e muitas
lutas sociais, racistas e de contrabando.
— Caramba! — quedou-se, por um instante, a perplexa
señorita Connors. — A isso eu chamo descrever uma cidade
com três palavras, señor Carrizo.
— Você pode me chamar de Leo. É como me chama
Natan, e isso me faz sentir apreciado e útil.
— E é um nome muito zodiacal — disse a loira. De
acordo, Leo, vou convidar você para um refresco, e enquanto
nós bebemos e todos pensam que você é um sujeito
formidável por ter conquistado uma loira sensual, nós
dizemos um ao outro nossas coisas. Te parece bem?
— Naturalmente.
Connors sinalizou para um dos garçons que, à sombra do
bar da praia, observava exatamente esse tipo de sinal. Ele
quase correu para a señorita Connors, mais do que feliz por
poder olhá-la atentamente, o que ele fez com satisfação total
enquanto ela fazia o pedido refrescante: duas taças de
champanhe com um pouco de suco natural de abacaxi.
— Mas isso não é propriamente um refresco — disse
Carrizo, enquanto o garçom se afastava.
— Não, mas também não somos propriamente amantes,
mas dois espiões em ação, por isso merecemos coisas
exóticas e caprichosas. Não está de acordo?
— Sim — sorriu Carrizo. — Natan me avisou que eu
passaria alguns momentos encantadores com você. Ele
também me avisou para não ser enganado por isso, já que
você é uma mulher muito perigosa.
— A verdade é sim — concordou ela, com uma
expressão gentil, quase afetuosa, — mas não com os amigos
dos meus amigos. Vamos ver, Leo, o que está acontecendo, o
que é tão importante que levou Natan a me citar aqui e
enviar-lhe em seu nome?
— Desde logo, são coisas que não devem ser ditas por
telefone.
— Muito bem. Eu já entendi isso. Que ocorre?
— Uma frase que é um slogan: Liberdade, Tesouro
Divino, está começando a circular por toda a América
Latina.
A señorita Connors olhou para o homenzinho que, por
sua vez, a contemplava sempre fascinado.
— Que tipo de slogan? — murmurou.
— Natan acredita que a coisa pode acabar muito mal.
Para ele, é um slogan de guerra.
— Nesse caso, parece-me que Rubén Darío não gostaria
que imitassem seus versos.
— Você conhece a poesia de Rubén Darío?
— O suficiente para saber que esta “Liberdade, Tesouro
Divino”, é uma imitação de sua obra “Canção de Outono na
Primavera”:
Juventud, divino tesoro,
¡ya te vas para no volver!
Cuando quiero llorar no lloro...
y a veces lloro sin querer...2
2
Juventude, tesouro divino. Você não vai voltar! Quando eu quero chorar, eu
não choro... e às vezes eu choro sem querer...
Ficou em silêncio. Leopoldo Carrizo estava ficando cada
vez mais fascinado. O garçom chegou com as bebidas, e
señorita Connors provou o conteúdo do copo, aprovou com
um gesto e sorriu para o garçom, que retornou ao seu posto
de observação sentindo-se feliz.
— Talvez alguém procure algum tipo de liberdade por
meio das armas? — perguntou Lili Connors de repente.
— Como você sabe? — exclamou Carrizo.
— Não sei; mas se você fala comigo sobre um slogan que
menciona a liberdade, e ao mesmo tempo me diz que Natan
pensa que é um slogan militar, a coisa não pode ser mais
clara: as palavras armas e liberdade, usadas juntas, só eles
significam revolta, rebelião; Em suma, uma classe como
qualquer outra de guerra.
— Pode ser uma guerra terrível — murmurou Carrizo.
— Ou seja, você concorda com Natan.
— Desde já. Olha, isso de libertar novamente a América
tem que ser algo ... muito complicado.
— Libertar novamente a América? Libertá-la de quê?
— Isso terá de perguntar ao Novo Libertador, ainda que
na realidade ele já deixou bem claro que se trata não apenas
de libertar, mas de limpar. Realmente uma limpeza não iria
mal.
— A limpeza sempre vai bem. E nas pessoas é altamente
higiênico. Mas antes de continuar com a limpeza, me diga: o
que isso significa sobre o Novo Libertador?
— Bem, é isso: um Novo Libertador das Américas.
Digamos ... outro Simón Bolívar?
— Mais ou menos. O fato verdadeiro é que existe alguém
chamado Novo Libertador, que propôs libertar e limpar a
América Latina de todos os seus vícios, misérias e
humilhações.
— Oh vamos...! — protestou Lili. — O que você está
falando? Esse tipo de coisa não acontece mais, Leo. Para tal
coisa, seria necessário ter tanto poder que é simplesmente
inimaginável. Não importa o quão poderoso, um homem não
pode...
— Um homem sozinho? Se você se referir ao Novo
Libertador, ele não estaria sozinho: Nataniel acredita que
praticamente toda a América Latina estaria... ou já está com
ele.
— Você se refere aos governos de toda a América
Latina?
— Governos, não: as pessoas. Precisamente, trata-se de
aniquilar todos aqueles governos corruptos e o serviço do
Mestre do Norte.
— Sim E o Mestre do Norte, é claro, são os Estados
Unidos.
— Sim. O Novo Libertador tem a ideia fixa e imóvel de
que todos os governos da América Latina estão ocupados por
fantoches do imperialismo ianque, isto é, que quem comanda
em toda a América é, portanto, os Estados Unidos, mas
criando tanta corrupção e miséria no povo americano, não o
povo norte americano, que simplesmente recorreu à
liberdade, por mais que seja.
— Leo: se os Estados Unidos governassem na toda
América, não haveria miséria. Os Estados Unidos, isto é, o
governo da Casa Branca, é... ambiciosos e cruel, para dizer o
mínimo, mas se tivesse realmente controlado toda a
América, o padrão de vida de todos os americanos seria
muito melhor.
— Sim? Por quê?
― Entre outras coisas, porque a América iria explorar a
grande riqueza americana, os padrões de vida, assim, a saúde
e a cultura do todo povo americano seria muito superior do
que agora.
— Sempre e quando os Estados Unidos não lhes
interessam para manter a América Latina destituídos de
propósito e com absoluta deliberação.
— Com que objeto? — Lili ergueu as sobrancelhas.
— Vamos apenas dizer que a América Latina é... a
grande reserva de necessidades futuras do colosso do Norte.
Há tanta riqueza na América Latina que, se alguém fosse
capaz de imagina-la, morreria de impressão. E por que não
colocar em marcha as riquezas? Bem, simplesmente porque
o Mestre da Norte não se interessa por isso. Ele prefere que a
riqueza seja mantida em reserva. Se isso requer manter
carentes quinhentas milhões de pessoas à espera que a
exploração desses recursos seja necessário para os Estados
Unidos, uma vez que permanece na miséria os quinhentos
milhões de seres humanos. Ou um ou dois bilhões, se
necessário. Enquanto isso, nos postos de comando de todos
os países latino-americanos há apenas alguns bonecos sem
escrúpulos e traidores de seu povo em troca de amedrontá-
los pessoalmente, sujeita o seu povo ao sacrifício concebido
e imposto pelos Estados Unidos. O que importa para esses
governantes corruptos, traidores vendidos e o que acontece
em seu país se eles estão vivendo como reis sob poder norte
americano?
— E o Novo Libertador quer... eliminar os governantes
corruptos, mesmo pela força das armas.
— Há alguns líderes que não são vendidos ao sinistro
desígnios do Mestre do Norte. A esses governantes que se
dirige o Novo Libertador pedindo apoio direto e formal para
ajudá-lo a obter a verdadeira liberdade de suporte América
Latina.
— E entre esses governantes está Natan, claro.
— Exatamente. Nataniel nunca se deixou ser pressionado,
muito menos liderado pelos Estados Unidos. Há dois outros
com o mesmo caráter forte e honesto... Bem, os três
governantes não sujeitos à corrupção criada pelo Mestre do
Norte foram convidados pelo Novo Libertador para apoiá-lo
com seus exércitos e todos os seus recursos quando chegar o
grande momento.
— E em que consiste o grande momento?
— Depor todos os governantes corruptos, para remover
das casas presidenciais os fantoches do Mestre do Norte e
colocar patriotas honestos e corajosos que estão dispostos a
dar suas vidas por seu país e seu povo.
— Isso soa muito bonito — murmurou Lili, — mas
envolve enorme derramamento de sangue. E também
significa enfrentar todos os países latino-americanos uns
com os outros. Tomemos por exemplo o país de vocês e de
Natan, San Nataniel. Se as forças armadas de San Nataniel
invadissem um país vizinho supostamente submetido ao
Mestre do Norte, é concebível que o país vizinho não
aceitasse tal invasão como tal, mas enfrentaria com armas.
— A coisa não seria tão cruel quanto parece. O Novo
Libertador conta com a ajuda interna de cada país, isto é,
com os patriotas que seguiriam suas instruções de acordo
com um plano geral. Por exemplo, se San Nataniel enviou
suas forças armadas para invadir o país vizinho, este já seria
praticamente dominado por patriotas que teriam pegado em
armas contra o governo. Então, as forças armadas de San
Nataniel chegaram, apoiaram os patriotas e a revolta foi
definitivamente consolidada.
— Mas para organizar uma revolta você deve ter armas e
pessoal militar ou paramilitar bem treinado para liderá-la.
O Novo Libertador está disposto a fornecer armas e
pessoal a todos os patriotas dispostos a se rebelar contra os
governos governados por fantoches a serviço do Mestre do
Norte. O Novo Libertador está oferecendo uma América
Latina única e autenticamente irmanada, onde todos os
americanos podem realmente viver como filhos de Deus e
não como cães subjugados, enganados, escarnecidos. O
Novo Libertador está oferecendo o maior tesouro ao qual o
ser humano pode aspirar.
— A Liberdade — sussurrou Lili Connors.
— A liberdade total e absoluta. A liberdade de um
continente inteiro. Do México para baixo, uma única nação
irmã e liberdade e prosperidade para todos.
— Sim O México não entraria no jogo?
— As negociações secretas estão ocorrendo. Claro. E o
Brasil?
— Brasil é latim, certo? Nada tem que ver que eles falem
uma língua diferente da nossa, da mesma forma que nada
importa que nos Andes eles falem línguas ou dialetos
indígenas diferentes. Não se trata de falar o mesmo, mas de
pensar o mesmo, de pensar no bem-estar de todos os latino-
americanos.
— Sonha bonito. Eu gosto. Mas, Leo, essa ideia é... Eu
nem vou dizer maluca ou irrealizável, mas vou dizer que é...
fantástica demais. E naturalmente, não acredito na
sinceridade desse Novo Libertador.
— É o que Nataniel disse o que você diria. Ele também
desconfia dos verdadeiros planos ou propósitos do Novo
Libertador. Por isso te chamou por telefone para fazer você
me encontrar comigo onde você quisesse, para que eu te
explicasse tudo, começando com o pedido de que o Novo
Libertador fez a Nataniel. Ele foi descobrir através de seus
agentes especiais
— Ou seja, ele ainda está praticando espionagem — disse
Lili.
— Nataniel protege seu país por todos os meios. E a
espionagem é uma delas.
— Sim, é verdade — suspirou a loira — ... Caramba,
terminamos esse delicioso refresco. Foi bom né?
— Muito bom — sorriu Leo.
— Bem, vamos pedir outro — Lili fez novo sinal para o
garçom, que compreendeu e se dispôs a servir diretamente
como antes —... Como esse personagem, o Novo
Libertador... Quem é ele e onde ele está?
— Não sabemos quem ele é ou onde ele está.
— Mas, claro, se Nataniel aceitasse sua proposta, ele teria
que se dar a conhecer, você não concordaria? Apenas
Nataniel está evitando comprometer, mesmo que apenas em
palavras.
— Ele sempre foi muito cauteloso. Então, para nos fazer
dançar... um fabuloso Novo Libertador que ninguém sabe
quem ele é ou onde está, e que está oferecendo ao povo
latino-americano, nada menos do que um continente inteiro,
o maravilhoso tesouro da liberdade, a saúde, prosperidade e
dignidade humana.
— Sim. Não é lindo?
— Muito lindo — Lili olhou maliciosamente para
Carrizo. — Lindo demais, meu amigo Leo, não é isso que os
desconfiados pensam?
— Sim
— Aqui vem o garçom com nossos novos refrescos —
sorriu a loira Lili. — Estamos nos divertindo, certo?
— Admiravelmente — Carrizo sorriu. — Seria ótimo
poder ficar aqui para sempre, absorvendo o sol e os refrescos
com champanhe gelado. Pena que isso não é possível.
— Sempre me perguntei por que isso não deveria ser
possível — Lili Connors franziu o cenho. — Vamos ver, se
uma pessoa faz seu dia de trabalho, porque então ele não
deveria ser capaz de relaxar com alguns óculos e se
bronzear, ou fazer amor, ou pintar, ou dançar, ou, em suma,
livremente e calmamente fazendo o que ele gosta...? Por que
sempre tem que interferir na vida de outras pessoas que
querem usá-lo, manipulá-lo, sacrificá-lo...? O que determina
que o ser humano se dedique a incomodar uns aos outros, em
vez de viver em paz e com alegria?
— A maldade?
— Estupidez, querido Leo, estupidez — suspirou Lili,
sorrindo para o garçom —... Obrigado. E não fique tanto
tempo no sol. Seus cachos podem aquecer.
O homem riu e foi embora. Lili Connors bebeu outro gole
de coquetel, que estava realmente delicioso. Então, ela olhou
placidamente para Leo, que também bebeu, sem perdê-la de
vista. Era uma alegria olhar para a señorita Connors. Tudo
uma alegria.
— Eu entendo perfeitamente, Leo, que você é algo
como... um espião eficaz que trabalha diretamente sob as
ordens de Natan, digamos que sempre atendendo a serviços...
especiais.
— Assim é.
— Que significa que você goza de toda a confiança de
Natan.
— Claro.
— Quantos guarda-costas acompanham você em suas
viagens?
— Nenhum. Eu sempre viajo sozinho.
— Verdade? Então você e eu somos muito parecidos.
— Se você diz...! — riu Carrizo.
— Como chegou a Miami? Por avião?
— Sim, claro... Por que você pergunta?
— Porque me ocorreu que mesmo se você estivesse
tratando apenas desse assunto, você poderia ter chegado em
Miami com um parceiro, em uma lancha, ou em um iate...
— Não Eu viajo sozinho, trabalho sozinho e venho de
avião.
— Entendido. Você me perdoará alguns minutos, por
favor?
— Eu não sentiria mais falta...
Leo levantou-se ao mesmo tempo em que a senhorita
Connors, que sorriu e se afastou para a entrada do hotel,
vestindo o roupão de banho, o que causou mais desencanto...
CAPÍTULO DOIS
Por outro lado, as pessoas que passeavam pela Ocean
Drive se divertiram e se deleitaram quando viram, aparecer
na porta da frente do Ocean Beach Hotel, uma linda loira
vestida com um roupão azul e usando sapatos de praia azuis.
Na verdade, apenas uma pessoa não notou que a señorita
Connors havia saído do hotel: o homem que ela estava
seguindo, um homem vestido com um terno elegante de cor
creme e camisa esportiva de gola aberta e colocada sobre o a
jaqueta. Esse sujeito, que segurava um livro na mão
esquerda, chegou em questão de segundos ao lado de um
Ford estacionado perto do hotel, sentou-se ao volante e
colocou o livro no assento ao lado, sorrindo secamente.
Mas seu sorriso se transformou em um gesto de estupor
quando a porta direita se abriu, e a loira também entrou no
carro, sentada ao seu lado e em cima do livro. O sujeito
piscou, abriu a boca para dizer alguma coisa... e o punho
esquerdo da señorita Connors, com um movimento
alucinatório para a frente e para trás, acertou-o na têmpora,
com a parte externa das juntas dos dedos indicador e médio.
O sujeito emitiu uma espécie de ronco, revirou os olhos e
relaxou, perdendo a consciência instantaneamente.
Com vigor que surpreenderia a qualquer um que visse, a
señorita Connors conseguiu mover rapidamente o homem do
assento do motorista para o que ela ocupava, puxando-o
enquanto saía do carro. Deixando o infeliz desacordado no
assento, a señorita Connors deu a volta no carro e sentou-se
ao volante. As chaves não estavam no slot de ignição, mas
ele as encontrou logo no bolso do sujeito.
Ela ligou o motor, arrancou e dirigiu o carro para o
estacionamento do hotel, descendo para o segundo piso. Ela
parou o carro no canto mais isolado e solitário, saiu e abriu o
porta-malas, onde encontrou, entre outras coisas, um rolo de
corda de plástico, o que pareceu lhe agradar bastante.
Deixando de lado o rolo de corda para abrir a porta do
carro, puxou o sujeito, e arrastou-o sem dificuldade à parte
traseira do carro. Sempre exibindo uma força muscular em
tudo excepcional, a señorita Connors conseguiu colocar o
sujeito no porta-malas, movendo-o como se fosse um
simples boneco. Ele tirou a carteira, a arma que carregava na
axila esquerda e tudo o que encontrou nos bolsos. Enquanto
isso, o homem começou a mostrar sinais de recuperação,
mas a questão foi rapidamente resolvida por Lili Connors
aplicando-lhe outro golpe, agora em um lado do pescoço, o
que novamente mergulhou o desconhecido na inconsciência.
Cinco minutos depois, deixando o homem amarrado e
amordaçado no porta-malas do Ford, a señorita Connors saiu
do estacionamento, levando o livro e os outros pertences que
havia tirado do sujeito.
Outros dois minutos depois, a loira deslumbrante entrou
em sua suíte.
A primeira coisa que ela fez foi abrir o livro, que resultou
ser uma espécie de caixa oculta que continha uma câmera
fotográfica que poderia ser ativada apenas pressionando uma
parte da lombada do livro. Simples, mas engenhoso e
prático. Então a señorita Connors examinou os pertences do
sujeito que dormia no carro, entre as quais poderia destacar a
documentação que o identificava: o nome do homem era
Tadeo Ruiz, de trinta e dois anos, e era natural de Medellín,
na Colômbia.
— Que chocante — Lili disse em voz alta. — Eu nunca
conheci alguém que fosse de Medellín.
Sorrindo de sua própria piada, entrou no quarto, abriu o
armário e tirou a maletinha vermelha com flores azuis
estampadas, de onde tirou o pequeno rádio de bolso. Abriu,
moveu as pequenas placas com a delicada função de ajustar a
sintonia do rádio, e imediatamente seguiu a ligação: se
houvesse ajustado bem as placas, ou seja, se tivesse
sintonizado bem a onda de Miami, deveria receber uma
resposta. A resposta não tardou muito. Foi imediata.
— Sim? — perguntou a voz de um homem.
— Bom dia, Simon.
O momento de silêncio foi muito breve, substituído
imediatamente por uma exclamação de alegria.
— Baby?! Não me diga que você está aqui, em Miami,
que eu vou ser um com olhos de sorte!
— Estou aqui, e você vai ser um daqueles sortudos — riu
Lili. — Podemos contar com outro parceiro?
— Naturalmente... Naturalmente! Mas eu te aviso uma
coisa: quando eu disser que você ligou, que está aqui e que
precisa de nós, ele não vai querer acreditar.
— Porque não?
— Porque esse sempre foi o nosso sonho.
— Bem, acorde, porque eu realmente preciso de vocês.
Nada complicado, mas têm que me prestar um pequeno
serviço. Quanto tempo para chegarem ao Ocean Beach
Hotel?
— Nem vinte minutos.
— Perfeito Eu vou dizer o que você tem que fazer...
Em alguns minutos, as instruções foram mais do que
claras, e a señorita Connors cortou a comunicação. Vestiu-se
na rua, colocou em sua maleta as coisas do homem chamado
Tadeo Ruiz, e depois de olhar seu relógio de pulso, acendeu
um cigarro e foi olhar o mar pela janela.
Quatro minutos depois, ela esmagou o cigarro no
cinzeiro, pegou o telefone e pediu uma ligação para o bar da
praia.
***
Leopoldo Carrizo viu o garçom se aproximar carregando
um telefone, que apoiou sobre a mesa.
— A senhora liga para o senhor — disse o garçom.
Não um pouco surpreso, Carrizo respondeu a chamada...
a poucos metros de distância, sentado em uma das mesas
colocadas sob a lista de toldo do bar, um homem de estatura
média, moreno e vestido com um terno claro e camisa
esportiva, cujo colarinho estava posicionado sobre o paletó,
o observava entre intrigado e inquieto. Ele não se sentia
confortável em ficar sozinho, mas havia entendido a atitude
do parceiro de querer salvaguardar as fotografias tiradas e,
ao mesmo tempo, pedir ajuda. Porque, evidentemente, se
Carrizo tivera contato com uma garota, isso significava que,
na verdade, ela havia viajado para Miami em busca de
alguma coisa, e isso poderia dar origem a muitas atividades
por parte de Carrizo; talvez tantas atividades que apenas dois
homens não pudessem controlá-los...
Carrizo desligou o fone naquele momento, depois se
levantou e se dirigiu para a entrada do hotel, do lado da
praia.
Ele passou a menos de três metros do sujeito semelhante
ao de Medellín, entrando no hotel. O parceiro de Medellín
levantou-se e caminhou atrás de Carrizo. Atravessou o
saguão do hotel e saiu para a avenida, aproximando-se da
beira da calçada, onde parou.
Sua atitude era a de estar esperando por um táxi, e o
parceiro de Medellín começou a amaldiçoar Tadeo por sair
com o Ford que haviam alugado no Aeroporto Internacional
de Miami. Mas, para sua surpresa e alegria, o Ford apareceu
de repente, vindo do estacionamento do hotel.
A surpresa persistiu, mas a alegria desapareceu logo
depois de descobrir que o motorista do Ford não era seu
parceiro Tadeo, mas a bela loira com quem Carrizo havia
feito contato apenas uma hora antes. A surpresa trouxe como
continuação um espanto considerável por parte do sujeito,
que permaneceu como se estivesse pregado ao chão
enquanto Carrizo subia no carro que a loira estava dirigindo.
O carro se afastou, avenida acima.
Muito bem. Ainda que fosse usando um táxi, ele iria
seguir a loira. Ele não tinha ideia do que poderia ter
acontecido ou de onde seu companheiro poderia estar, mas
certamente não queria perder de vista a loira e Carrizo...
— Você gostaria que eu colocasse uma bala nos seus
ovos? —ouviu ao seu lado.
O companheiro de Medellín virou a cabeça, e viu ao lado
dele o rapaz alto, atlético, loiro, de olhos claros e grandes,
com uma expressão que não prenunciava nada de bom. Por
um momento, pensou em recorrer a sua própria pistola para
resolver a situação, mas tinha um palpite de que se eu fizesse
o menor gesto nessa direção era um homem morto, tão
simplesmente olhou com expressão alucinada o belo e
atlético loiro com expressão de poucos amigos.
— Você é um cara inteligente — disse o loiro. — Entre
na parte de trás do carro.
Ele apontou com um simples aceno de cabeça. O parceiro
de Medellín olhou em sua direção e viu, espiando pela
janela, o rosto de outro rapaz com uma expressão ainda mais
perversa que o primeiro.
A revelação foi súbita na mente do sujeito: ali tinha os
malditos agentes da CIA.
Ele recebeu um leve empurrão e percebeu que, no
momento, o menor dos males era obedecer ao loiro. Então
ele foi até o carro, entrou na parte de trás... e então ele viu a
arma com o silenciador com o qual o motorista estava
apontando. O loiro entrou, sentando ao lado dele, e revistou-
o rapidamente, primeiro removendo a arma. O agente
sentado ao volante do carro meteu sua pistola no coldre
subaxilar e fez o carro partir.
O loiro estava examinando a carteira do parceiro de
Medellín, que se verificou chamar-se Fidel Lozano, e não era
de Medellín, na Colômbia, mas de Estelí, Nicarágua. Pois
muito bem. O loiro olhou para Fidel Lozano e sorriu
sarcasticamente.
— Se você se comportar bem, talvez envelheça — ele
disse, — mas se ele for um tolo, mesmo que seja só um
pouquinho, ele está morto. Você me entendeu?
Lozano assentiu e engoliu em seco. O loiro sorriu e
beliscou-o na bochecha de forma ofensiva, dizendo:
— Bom menino, bom menino. Bem, amigo — disse ele,
olhando para o motorista, — acho que você pode seguir
adiante, agora.
— Eu estou indo para lá — assentiu o motorista.
***
— Eu juraria que um carro nos acompanha desde que
saímos do hotel — disse Leopoldo Carrizo, olhando para o
retrovisor externo à direita.
— Está seguro? — exclamou Lili.
— Eu diria que sim.
— Céus! Estamos perdidos... O que se faz em uma
situação semelhante?
— Bem, depende de... Droga! Você está zombando de
mim?
— Um pouco — disse a loira. — Mas fique calmo: nesse
carro estão alguns amigos meus, e agora eles passarão por
nós e nos levarão a um lugar calmo onde poderemos
conversar com alguns colegas.
— Que colegas?
— Aqueles que te seguiram até Miami.
Carrizo ficou espantado por um momento. Então ele
exclamou:
— Ninguém me seguiu!
— Olhe, meu amigo Leo, até os mais espertos são
controlados por inimigos de vez em quando. São coisas que
passam.
— Mas... o que está acontecendo?
— Você percebeu que um cara vestido na rua passou não
muito longe de nós, enquanto nós estávamos bebendo o
refresco e nos fotografou?
— Não... eu não percebi — disse Carrizo. — Tem
certeza?
Lili parou o carro em um semáforo.
O carro que a ruiva estava dirigindo foi colocado ao lado
do Ford. Pela janela da direita, o homem loiro apareceu,
olhando extasiado para Lili, que perguntou; sorrindo:
— Algum problema, Simon?
— Não. Agora vamos para o norte, para um...
— Não me diga. Basta ir em frente, como nós
concordamos. Como se comporta o nosso convidado?
— Bem. Seu nome é Fidel Lozano.
— E é de Medellín, na Colômbia?
— De...? Não. É de Esteli, na Nicarágua.
— Caramba! — impressionou-se a señorita Connors: —
Tampouco havia conhecido alguém que fosse de Esteli, na
Nicarágua! Mas bem, a oportunidade não é para ser
desperdiçada, certo? No mundo existem muitos lugares,
além de Nova York.
O agente da CIA riu. Obviamente, eles não deram maior
importância aos súditos de Medellín e Esteli. Atrás dos dois
carros tocou a buzina de outro. O semáforo mudara para
verde. Os dois carros partiram, tomando imediatamente a um
dos dois Simons a direção da marcha.
Apenas trinta minutos depois, os dois carros pararam em
frente a uma pequena casa charmosa perto da praia, ao norte
de Miami. O mar mostrava um tom brilhante entre verde e
cinza. O dia estava esplêndido. Lili e Carrizo saíram do Ford
e ela abriu o porta-malas... Dentro, contorcido e
congestionado, o sujeito de Medellín olhou para ela com
olhos saltitantes. Lili removeu a mordaça improvisada com
seu próprio lenço e cordão e sorriu para ele gentilmente.
— Eu convido você para uma cerveja, Sr. Ruiz — disse
ela.
Os dois Simons chegaram, com Fidel Lozano, no outro
carro. O loiro empurrou Lozano e disse:
— Vamos, carregue seu amigo e leve-o para casa.
— Não precisa — disse Lili. — Desatem-no e ele vai
sozinho. Ambos vão se comportar de maneira sensata,
espero. Venha, Leo. Bem, acho que não conhece nenhum
desses dois personagens.
— Não — rosnou Carrizo. — E eles vão me explicar
como, de onde e por que eles me seguiram!
— Eles vão explicar isso para nós e muitas outras coisas
— disse a señorita Connors, suavemente. — Porque, se não
o fizerem, parece-me que terão um tempo muito ruim pela
frente.
Cinco minutos mais tarde, a situação era a seguinte: Lili
Connors e Carrizo estavam sentados no sofá da sala de estar
da casa de praia, olhando para Ruiz e Lozano, que, sentados
em poltronas à frente deles, bebiam de bom grado cerveja
fresca. De pé, de frente para os dois latinos, estavam Simon I
e Simon II, calmos, mas sem o menor descuido, embora a
situação deixasse claro quem a estava dominando.
— Tudo vai bem? — perguntou amavelmente a señorita
Connors.
Lozano e Ruiz a olharam. Eles não eram muito espertos,
mas tampouco eram tolos, então entenderam perfeitamente a
situação: se eles colaborassem, seriam tratados com
bondade; mas se eles se negassem a colaborar, aquela loira
com o sorriso de um anjo seria capaz de cortar seus pescoços
ela mesma. A coisa era muito simples.
— E quem é você? — perguntou Lozano.
— A agente Baby, da CIA — disse surpresa Lili. — Não
lhes ocorreu?
Os dois homens estavam agora lívidos. Simão I e Simão
II olhavam para eles com espanto. Eles eram tão estúpidos
que não pensaram que nos Estados Unidos e enfrentando
uma mulher, esta só poderia ser a agente Baby?
— Nós... estávamos apenas vigiando Carrizo —
desengasgou, por fim, Ruiz.
— Todos nós entendemos isso — disse Baby. — De onde
e como o seguiram para Miami?
— Nós não o seguimos: esperamos por isso. Estávamos
em Havana quando nos disseram que deveríamos viajar para
o Aeroporto Internacional de Miami e aguardar a chegada de
Leopoldo Carrizo de San Nataniel.
— Vocês já conheciam Carrizo?
— Não, mas o descreveram para nós. É fácil de
identificar.
— Quem lhes contou sobre a viagem de Carrizo?
— Nosso chefe.
— E quem é seu chefe?
— Seu nome é Onésimo Varela.
— Ele é o Novo Libertador?
— O que? — Lozano e Ruiz ficaram aturdidos.
A loira estreitou as pálpebras. Por alguns segundos ela
esteve contemplando os dois desafortunados aventureiros da
quinta categoria. Então, perguntou:
— E como seu chefe sabia que Carrizo estava viajando?
— Bem, Onésimo conhece alguns dos chefes mais
importantes dos serviços secretos sul-americanos e
ultimamente sabemos que ele está... observando-os de uma
maneira especial. Ele deve ter sabido que Carrizo estava
viajando para Miami, e nos avisou. Ele nos disse que
deveríamos observá-lo bem de perto e tomar nota de todas as
pessoas com quem ele interagia.
― Por quê? Para que?
— Isso não sabemos. Nós obedecemos Onésimo, isso é
tudo.
— Mas vocês não sabem de que se trata o assunto?
— Não
— E não ouviram falar do Novo Libertador?
— Não.
— Vamos lá, não diga coisas estúpidas — enfadou-se a
loira.
— Eu juro que não sabemos nada sobre isso — Ruiz
quase gemeu.
— Ou eles fingem zombar de nós — disse Simon II, —
ou são ainda mais tolos do que pensávamos.
— Nem uma coisa ou outra — Baby murmurou. — Eles
são apenas peões. Parece-me que eles não serão muito úteis
para nós. Para acessar mais informações, teríamos que...
entrevistar Onésimo Varela. Onde está ele? Em havana?
— Não, não — disse Lozano. — Ele nos ligou de
Maracaibo, é claro.
— Por que claro?
— Bem, ele... ele mora em Maracaibo.
— Ela mora em Maracaibo — a senhorita Connors agora
parecia simplesmente fascinada. — Eu tenho a sensação de
que estou entrando em um jogo absurdo com retardados
mentais. Vamos ver: Onésimo Varela é seu chefe, claro,
mas... quem mais é o chefe, ou melhor, o que é o chefe?
— Não sabemos. Ele nos contratou há muito tempo, em
Veracruz, onde passávamos uma temporada. Ele nos disse
que nos pagaria um bom salário todo mês e que, em troca
disso, tínhamos que estar sempre dispostos a ir aonde ele
indicasse e fazer o que ele pedisse. E desde então estamos
fazendo isso.
— Está bem. Vamos supor que tenham ido adiante com
este trabalho, que revelaram as fotos, que sabiam quem eu
era e o que Leopoldo Carrizo e eu estávamos fazendo
juntos... O que teriam feito? Teriam informado Varela,
teriam matado Carrizo sozinho, ou ambos, ou...?
— Nós não tínhamos ordem para matar ninguém. Apenas
para informar sobre o que Carrizo estava fazendo.
— Quem e como teriam informado?
— A Onésimo, claro.
— Claro. Como teriam feito isso?
— No telefone, claro.
— Claro — Baby estava atordoada. — Claro.
— Deixe-os por nossa conta — grunhiu Simon. — E
você verá como eles mudam a história em breve. Nós vamos
ensiná-los a provocar suas mães!
— Não, não, não - Baby balançou a cabeça. — Tenho
certeza que eles estão nos dizendo a verdade. Tão certo
quanto eles vão nos dizer qual é o número de telefone de
Varela em Maracaibo, onde ele mora, o que ele está fazendo,
digamos... oficialmente, e algumas outras coisas. Você não
vai nos dizer tudo isso, colegas?
Lozano e Ruiz passaram alguns segundos olhando os
olhos da loira fixos neles. Eles passaram a língua pelos
lábios, engoliram quase em seco, aparentemente com alguma
dificuldade e, finalmente, ambos ao mesmo tempo,
assentiram.
— Veja isso? — sorriu a señorita Connors. — Com
bondade, você pode obter quase tudo na vida. Caramba,
Maracaibo... Acreditariam em mim se eu lhe dissesse que só
uma vez eu fui a Maracaibo, e foi só de passagem, e...? Mas
não vamos relembrar acontecimentos. Diga-me: como é
Onésimo Varela?
CAPÍTULO TRÊS
CAPÍTULO SEIS
O jato privado, relativamente pequeno, do britânico
Jonathan Lengton estava esperando no Aeroporto
Internacional de Varadero, na hora marcada no dia seguinte.
Para surpresa de Arévalo e Lugones, o próprio Lengton
esperava no avião, afável e sorridente. Recebeu os dois
homens com um cordial cumprimento e uma especial
atenção à belíssima loira, a qual ajudou a subir a escada do
avião.
— Amigo Lugones, como vai você? — disse ele em
espanhol aceitável. — Eu não sabia que você traria
companhia. Isto é, — ampliou seu sorriso, — já havíamos
calculado que traria seu secretário, mas...
— Ela é a representante de uma indústria americana com
a qual espero em pouco tempo realizar negócios importantes
— disse Lugones secamente. — Senhorita Lili Connors...
Senhor Jonathan Lengton.
— É um prazer, senhorita Connors — o morador da
Jamaica se dirigiu a ela em inglês. — Devo entender que esta
viagem do señor Lugones pode ser de algum interesse para
você?
— Mais do que o señor Lugones pode interessar-lhe —
disse com sorriso irônico a simpática señorita Connors. —
Eu represento um... pequeno consórcio privado americano
que pode vender armas em abundância e a um bom preço.
— Ah!
A atitude de Lengton pareceu mudar radicalmente, seus
olhos claros escrutaram em maior profundidade o azul da
señorita Connors. Esta, por sua vez, analisou o novo
personagem: alto, magro, com cerca de cinquenta e cinco
anos, cabelos grisalhos e barba igualmente agrestes. Vestia-
se de maneira esportiva, mas com certa desenvoltura. A
señorita Connors não gostou em absoluto do señor Lengton,
não só pela sua aparência física e roupas bastante educado,
mas o que viu nas profundezas daqueles olhos como água
estagnada.
— É claro — acrescentou a señorita Connors, — só
fazemos operações de contato, señor Lengton.
— Isso não seria um problema — respondeu o britânico.
— Estupendo! Faz tempo que estou querendo ganhar uma
boa comissão e, francamente, na África, eles geralmente são
uns mortos de fome.
— Esse não é o nosso caso — disse Lengton. — Temos
todo o dinheiro de que precisamos. E em espécie.
— Nesse caso — Lili Connors sorriu novamente, —
minha impaciência para começar esta viagem aumentou.
Lengton sorriu e apontou para o interior do aparelho.
Caminharam pelo centro, deixando o departamento de
suprimentos a ré. Eles apareceram na sala em cujo fundo se
notava a porta que comunicava com a cabine do piloto e o
departamento do pessoal de serviço. A sala, retangular,
seguindo a forma da barriga do aparelho, continha uma dúzia
de assentos, um bar, algumas mesas pequenas e era atapetada
com produtos persas. Nas janelas circulares, o sol parecia
folhas de ouro.
— Acomodem-se ao seu gosto — disse Lengton. — Eu
vou dizer ao piloto que podemos decolar. Você quer tomar
alguma coisa?
— Champanhe — disse Lili.
Lengton olhou para ela genuinamente surpreso, depois
olhou para o relógio de pulso e finalmente soltou uma risada.
— Bem — ele disse alegremente. — Todavia ainda falta
um pouco para o almoço, mas vamos considerar que
tomamos um aperitivo. Meu criado nos servirá champanhe
assim que estivermos no ar.
Ele desapareceu para frente. Lili e os dois cubanos
sentaram-se. Lengton reapareceu e quase imediatamente a
manobra de decolagem começou. Três minutos depois, eles
decolaram. Outros dois minutos depois, a aeronave foi
estabilizada para o sudeste. Abaixo, o mar e a terra cubana
verde brilhavam. Jonathan Lengton apertou uma campainha
e depois ofereceu a Lili um cigarro de uma cigarreira de ouro
ricamente trabalhada.
Lili estava expelindo o primeiro sopro de fumaça quando
a porta dos compartimentos da proa se abriu e o empregado
de Lengton apareceu, vestido com calça preta e jaqueta
branca. Ele carregava uma bandeja na qual havia um balde
de prata contendo uma garrafa de champanhe dentro de um
leito de gelo picado e quatro copos.
O criado era chinês.
A señorita Connors pressionou os lábios quando o viu e
fitou-o firmemente enquanto o chinês servia nos copos.
Finalmente, ele olhou para Lengton, que estava olhando para
ela com uma curiosidade sorridente.
— Certamente, você me considera exótico porque tenho
um empregado chinês, quando vivo em um lugar onde o
trabalho negro é tão barato — disse o britânico.
— Há quanto tempo ele está ao seu serviço?
— Não demasiado, mas é muito eficiente e discreto. Seu
nome é Poi. Naturalmente fala inglês perfeitamente. Não é
assim, Poi?
— Certamente, senhor — concordou o chinês. De
repente, ele olhou para Lili e sorriu simpaticamente... —
Sing Tai recebe você a bordo e deseja uma feliz viagem,
señorita Celeste.
Se o chinês esperava surpreender a loira, ela teve uma
boa decepção, porque ela apenas levantou o copo, sorrindo e
disse:
— Agradeça em meu nome sua atenção a Sing Tai.
Levará muito tempo para chegarmos ao destino?
— Um par de horas — disse Poi.
Os dois cubanos e os ingleses ficaram pura e
simplesmente surpresos. Finalmente, Lengton poderia
exclamar:
— Podemos saber do que estão falando?
— Temo, señor Lengton — disse Lili festivamente, —
que fomos sequestrados. Espero que tenhamos champanhe
suficiente para a viagem... embora não seja precisamente a
qualidade digna do meu paladar.
— O que significa isto? — Lengton insistiu, olhando para
Poi. — O que pensa estar fazendo, chinês do inferno?
— Você realmente não entende? — Lili ficou surpresa.
— Eu vou explicar isso com prazer. Esse homem chamado
Poi trabalha para um homem chamado Sing Tai, que está
viajando por toda a América dirigindo a operação
“Liberdade, Divino Tesouro”. E não me diga que você não
sabia disso, señor Lengton.
— Claro que não! — disse o britânico, ficando de pé.
— Não? Então... com quem você tem lidado com a
operação, de quem você tem recebido ordens?
— Bem...
Plop! Disparou a arma provida de silenciador na mão de
Poi.
Jonathan Lengton recebeu a bala no coração, com forte
impacto que o matou e empurrou-o, sentando-o novamente.
O britânico residente na Jamaica sequer teve tempo de saber
que ia morrer, ou melhor, que estava morto. Ele ficou com a
cabeça torcida para um lado, olhos extraviados, com a boca
torcida em uma careta de raiva...
Poi apressou-se a desviar a sua arma em direção a
señorita Connors, que olhou para ele, bebeu outro gole de
champanhe, e isso foi tudo.
— Deus bendito! — finalmente resmungou Carlos Maria
Lugones.
Tanto ele quanto seu secretário estavam lívidos, meio
mortos de susto e medo, olhando com estranha fascinação
para o cadáver ainda latejante de Lengton.
— Seria gentil a ponto de me entregar sua arma, señorita
Celeste? — perguntou Poi.
A loira assentiu, levantou a saia revelando suas belas
pernas, e de sua coxa esquerda descolou a pistola com cabo
de madrepérola, que entregou ao chinês. Ele colocou na
bandeja, fez um gesto de despedida, com a cabeça e se
retirou, depois de murmurar:
— Tenho certeza que você entende que será melhor para
todos que não procurarem complicações durante a viagem.
— Vou manter isso em mente — disse Lili.
Pouco menos de dez segundos depois que o chinês
assassino desapareceu de cena foi que os cubanos finalmente
conseguiram reagir.
Ambos olharam para Lili exorbitantemente, e Lugones
gaguejou:
— Ma-mas... o que significa isso?
— Vou explicar isso com muito prazer, porque dessa
forma, esclareço minhas próprias ideias... Vejamos, em tudo
isso, intervém um chinês muito atraente e inteligente que
está usando o nome de Sing Tai, com o qual eu já tive um...
pequeno tropeço em Maracaibo. Sing Tai escolheu desde o
início alguns homens da América Central e do Sul, de nível
muito alto, a quem ele confiou, digamos, a direção da
operação de maneira local. Ou seja, para cada país ele
escolheu um homem importante. Esse homem importante,
por sua vez, escolheu outros personagens para apoiá-lo e, por
sua vez, esses personagens estavam escolhendo outros
colaboradores cuja importância social, política e econômica
estava declinando. Desta forma, o inteligente Sing Tai
formou uma espécie de... pirâmide de personagens, em cujo
pico está o Novo Libertador. Todos os outros são
colaboradores. De maior ou menor importância, mas apenas
colaboradores, a quem uma determinada parte da operação é
atribuída. Por exemplo, no caso de você, señor Lugones,
teve que contribuir com sua frota de pesca para transportar
armas. No caso do señor Lengton, ele teve que coordenar a
colaboração de vários colaboradores como você. Vamos
dizer que o señor Lengton estava um pouco mais alto do que
você em direção ao topo da pirâmide. Mas, por sua vez, ele
estava sob o comando de outro personagem de maior
importância que está próximo do Novo Libertador ou talvez
o próprio Novo Libertador. Quer fosse o primeiro ou o
segundo, Sing Tai não podia permitir que Lengton
mencionasse isso, e Poi tinha ordens muito específicas sobre
isso. Assim, morto Lengton, não importa o que seja de
vocês, nada mais preocupa Sing Tai para que eu siga em
frente, porque a pista realmente foi por fim cortada... Sim, é
muito, muito inteligente meu colega Sing Tai. Ele refletiu
sobre quais personagens o pobre Onésimo Varela conhecia e
previu o risco de que, de alguma forma e de uma vez ou
outra, ele os tivesse mencionado em minha presença. Quais
personagens da pirâmide conheciam Onésimo Varela? Bem,
eu conheci o Carlos María Lugones. Portanto, era
conveniente... remover Carlos María Lugones do jogo.
Mas... quem é que o Carlos María Lugones sabia? Bem,
señor Jonathan Lengton. Portanto, seria conveniente...
remover o señor Carlos María Lugones da festa em primeiro
lugar e, no caso de o señor Lugones já ter mencionado o
señor Lengton, removê-lo também. Então, Sing Tai ordena
que o señor Lengton cite o señor Lugones na Jamaica, para
juntá-los e eliminar os dois. Mas logo ele melhora sua ideia:
ele pede que o señor Lengton viaje em seu avião para pegar
pessoalmente o señor Lugones. Desta forma, ele não tem que
correr nenhum risco de se mudar para a Jamaica... Por que
movê-lo em busca de suas vítimas, se ele pode fazer suas
vítimas irem onde ele está esperando por eles? E lá vamos
nós. Eu presumo que este avião, naturalmente pilotado por
pessoas que realmente obedecem ao fantástico Sing Tai,
pousará em um pequeno aeródromo na Venezuela ou na
Colômbia. Sim, nosso amigo Sing Tai se move muito
confortavelmente no continente sul-americano. Sem dúvida,
é por isso que ele foi escolhido para liderar a operação.
— Se eu entendi bem sua explicação — murmurou
Lugones, depois de refletir por alguns segundos, — o que ele
realmente quer é evitar que você continue subindo em
direção ao topo daquela pirâmide e alcance o Novo
Libertador.
— Exatamente
— E não seria mais simples e mais lógico eliminá-lo em
vez de nos eliminar?
— Bem, señor Lugones — disse Lili, — me eliminar não
é tão simples.
— Não? Bem, Poi poderia ter te matado com muita
facilidade, em vez de matar Lengton.
— Sim... Mas olhe, señor Lugones, sem a intenção de
ofender você e seus amigos, acontece que personagens como
você estão em abundância, e ao invés disso, personagens
como eu são muito escassos neste mundo infeliz.
— Não importa quão especial você seja, será para seus
amigos, não para seus inimigos. Quero dizer que se eu fosse
seu inimigo, e precisamente porque você era tão especial, eu
faria todo o possível para tirá-la do caminho. Por que Sing
Tai não deu a ordem para que você fosse eliminada?
— Talvez ele tenha se apaixonado por mim — sugeriu
Lili, com um sorriso malicioso.
— O que não entendo, é que em tudo isso intervém um
chinês — disse Arévalo, como se saísse de um sonho. — O
que um chinês faz nos projetos do Novo Libertador?
— Obviamente — Lili olhou para ele, — quaisquer que
sejam os projetos definitivos do Novo Libertador, a China
não será alheia a eles.
— Você quer dizer que, através do Novo Libertador, da
China ele lideraria todo o continente sul-americano?
— Eles tentaram uma vez — sussurrou Lili. — Eles
queriam transformar a América do Sul em um país chamado
Chinamerica.
— Mas o que você diz — recomeçou Lugones.
— Deus Todo Poderoso — respirou Arévalo. — Então,
estamos trabalhando para fazer a China dominar toda a
América Latina...! Eles estão nos enganando a todos!
— Mais do que você pensa — disse Lili, secamente.
— O que quer dizer?
A espiã mais perigosa do mundo não respondeu.
Aquietou-se, olhando para a janela cheia de sol, taça de
champanhe na mão. Terminou o conteúdo da taça, olhou
para Jonathan Lengton e moveu a cabeça. A insensibilidade
do ser humano está aumentando: ali estava um pobre
homem, recentemente assassinado, e ela bebendo champanhe
e conversando com outros dois pobres homens... Porque
tanto Lengton quanto Lugones e Arévalo eram pobres
homens, simples peões manipulados habilmente.
Em certas esferas e atividades, Lugones e até mesmo
Arévalo, e claro, Lengton, eram de primeira linha, mas lá,
naquele jogo em que a aposta foi sempre a própria vida,
eram como crianças perdidas no bosque...
— Mas eu não sou uma garota perdida na floresta —
disse Lili.
— O que? — se interessou Arévalo.
Lili olhou para ele, depois olhou para Lengton e
finalmente para a taça vazia de champanhe. Ela se levantou e
foi até o compartimento de serviço. Abriu a porta e
imediatamente viu Poi, sentado em uma cadeira de lona e
fumando pensativamente. O chinês olhou para ela
bruscamente, com um brilho de alarme em seus olhos, e se
levantou imediatamente, puxando sua pistola para Baby.
— Ficamos sem champanhe — disse ela. — Você seria
amável em servir-nos um pouco mais?
— Ah, sim, com prazer.
— E, por favor, remova o corpo do señor Lengton.
Poderia colocá-lo na popa, no compartimento de carga.
— Será atendida.
— Obrigada. Existe um piloto ou dois?
— Dois
— Chinos ou latino-americanos?
— Latino-americanos — Poi sorriu. — Esses são
funcionários do señor Lengton, é claro.
— Naturalmente. Mas devidamente subornado pelo
serviço da China, certo?
Poi sorriu e isso foi tudo. Lili Connors olhava para ele
com certa estranha gentileza. De repente, ele perguntou: —
Podemos entrar em contato com Sing Tai por rádio?
— Claro.
— Eu gostaria de te enviar uma mensagem.
— Que mensagem?
— Diga-lhe o seguinte: se ele concordar em falar comigo
e me ajudar a desmascarar a operação “Liberdade, Divino
Tesouro”, tudo terminará bem para ele. Se, pelo contrário,
ele decidir ir em frente, eu o mato.
— Eu vou te dizer — sorriu Poi.
— Mas primeiro me sirva mais champanhe — disse
Baby.
CAPÍTULO SETE
De fato, o pequeno avião aterrissou em certo lugar
discreto e ninguém sabia que país. Tão discreto era o lugar
que nem sequer era um aeródromo, muito menos um
aeroporto. Tratava-se, simplesmente, de uma longa seção
reta de uma larga estrada, cujo piso não estava em boas
condições, mas que resistia ao pouso. A señorita Connors
não pôde deixar de pensar que o local já havia sido usado
como pista de aterrissagem em diversas ocasiões. Tudo ao
redor eram montanhas, e nos picos de alguns deles o brilho
da neve era visível.
— Nos despedimos aqui — disse Poi, quando o avião
parou completamente. — Desejo-lhe um final feliz.
— Obrigado Você enviou minha mensagem para Sing
Tai?
— Sim
— E qual foi sua resposta?
— Não.
— Entendido. Eu me pergunto se você seria tão gentil a
ponto de devolver minha pistola, Poi.
— Não, eu não vou ser tão gentil — sorriu o chinês.
— Claro — sorriu Lili. — Não vou exagerar, certo? Você
tem sido gentil o suficiente em todos os momentos, servindo-
nos champanhe e aquele saboroso e delicioso almoço
baseado em comida chinesa. Eu me encanto com a culinária
chinesa.
Poi sorriu de novo, apertou o botão na porta e moveu-se,
projetando a escada no chão. O primeiro a descer do avião
foi a señorita Connors, seguida por Lugones e Arévalo. A
escada foi recolhida, a porta de acesso ao avião se fechou, e
em poucos segundos rodava de volta pela pista, enquanto o
recém-desembarcado se afastavam... escapando da força de
decolagem. Trezentos metros adiante, o avião decolou do
asfalto, levantou-se e logo começou a manobra para voar
para o norte.
Lugones e Arévalo pararam de olhar para ele, olharam
em volta e depois para a señorita Connors.
— Não há ninguém aqui — disse Arévalo. — Mas
suponho que não pode demorar muito para passar um
veículo.
— Não — disse a loira. — Esta é uma seção de estrada
abandonada. Nenhum carro passará, se é isso que eles
esperam. Na verdade, estamos na selva. É um lugar lindo.
Sabem de uma coisa? Eu nunca vi um condor em toda a
minha vida. E eu gostaria muito...
Mas nenhum condor voou por ali. Nenhum veículo
passou. Nenhum ser humano estava passando. O sol parecia
novo e limpo. O silêncio era absoluto.
Até que começou a ser ouvido o rumor do voo de um
helicóptero. A primeira a ouvir foi, de fato, a señorita
Connors, que logo o localizou à distância. O aparelho
apareceu piscando ao sol e logo estava sobre eles.
Finalmente, ele desceu, aterrissando na estrada.
Dois chineses, vestindo macacões de camuflagem e
empunhando metralhadoras, pularam ao chão, e um deles
sinalizou para os três personagens abandonados em algum
lugar dos Andes.
— Venha cá — disseram os chineses, em espanhol.
Os três se aproximaram. As pás do helicóptero
continuavam girando, com um tom abafado.
— O que é isso aí? — perguntou um dos chineses,
apontando para a maletinha de Lili.
— Minhas coisas pessoais. Nada que os perturbe. Você
quer ver?
— Sim. Abra, deixe-a no chão e entre no aparelho.
Lili obedeceu. O segundo chinês subiu atrás deles,
sempre os controlando com sua submetralhadora. Nos
comandos havia outro chinês. O chinês, ainda no chão,
agachou-se ao lado da pasta, examinando seu conteúdo, mas
sem tocá-lo, com alguma cautela. Finalmente, ele fechou a
maleta, pegou e jogou no helicóptero, subindo novamente. O
piloto ativou os controles e o aparelho subiu. Sentados ao
fundo do helicóptero. Lili, Carlos María e Marcos
permaneceram imóveis. Sentados na frente deles, apontando
para eles suas armas, os dois chineses. Lá embaixo, a
vegetação era infinita.
A viagem de helicóptero durou apenas vinte minutos.
Quando pousou em uma pequena clareira, parecia que tudo
ao redor simplesmente permanecia na selva. Mas, abaixo,
entre as árvores, os três raptados divisaram as pequenas
construções, tão habilmente localizadas que do céu não
podiam ser vistas de forma alguma.
— Vamos lá — disse o chinês mais falante.
Entre a vegetação havia sido feito um caminho estreito
para os edifícios. Eram três cabanas construídas a base de
troncos e barro, e sem dúvida haviam sido construídas há
muito tempo.
Através dos galhos ouviram o granido de alguns pássaros.
— Você sabe onde estamos? — perguntou Lugones.
— Não. Quer dizer, eu sei aproximadamente, mas isso
não resolve nada.
— Onde estamos aproximadamente, de acordo com
você?
— Eu diria que estamos em algum lugar da Serra de
Perijá, entre as fronteiras da Venezuela e da Colômbia e
mais ou menos ao nível de Maracaibo... Sempre voltamos a
Maracaibo.
— Oque quer dizer?
— Nada especial. Se acaso, que nosso anfitrião conhece
muito bem essa área.
— Parece não haver ninguém aqui — disse Arevalo.
Logo se convenceram do contrário, ao alcançar a primeira
cabana. Pela janela viram um chinês sentado diante de uma
emissora. O chinês deu-lhe um olhar indiferente, e voltou
seu olhar indiferente à emissora. Através da janela da
segunda cabana eles viram o que parecia um escritório, com
mapas nas paredes, uma máquina de escrever, um ventilador
no teto (que evidenciou a existência de um gerador), uma
biblioteca caindo aos pedaços... Dois homens, sem dúvida,
sul-americanos, estavam conversando diante de um mapa,
mas emudeceram quando Lili e outros passaram diante da
janela. O chinês apontou a terceira cabana, ordenando que
entrassem ali.
Os três obedeceram. O chinês fechou a porta, e foi isso. A
cabana tinha duas janelas, como as outras, mas elas foram
seladas com fortes taboas e grandes pregos. Entre as taboas,
por pequenas frestas, penetrava luz mais do que suficiente.
Dentro da cabana, havia duas fileiras de camas, colocadas
uma sobre a outra, como beliches. No total, seis camas. Do
lado de fora seguia se ouvindo o grasnar de alguns pássaros
grandes.
— Isto é como um pesadelo — murmurou Arévalo.
— É mais sério — disse Lili, — não acho que aqui tenha
champanhe. Vou reclamar com Poi.
Os dois sul-americanos a olharam, incrédulos, e um
pouco desconcertados. Lili verificou a hora em seu relógio
de pulso. Eram três menos cinco minutos do período da
tarde. Lili acomodou-se em uma das camas-beliches, e, em
segundos, para o espanto de seus companheiros, ela
adormeceu.
Carlos Maria Lugones sentou-se em outro dos beliches,
ficando alguns segundos absorto, e de repente olhou para
Arévalo.
— Eu lamento ter metido você nisso.
— A culpa não é sua. Esse maldito Lengton tramou tudo
— murmurou Marcos. — Deve ter dito a eles que você
estava interessado em fazer parte da operação, ele nos
vigiava, sabia sobre nós, e conseguiu condicionar o
apartamento durante a semana, enquanto nós estávamos em
Havana. Seguramente os chineses ajudaram em tudo.
— De qualquer modo, se você não tivesse aceitado a
minha...
— Maldita seja. Como você poderia saber que enquanto
estávamos no nosso quarto, havia alguém nos filmando? Que
seja. Nada pode mudar as coisas que aconteceram. O que me
preocupa é o que vai acontecer. O que você acha que os
chineses vão fazer com a gente?
Lugones levou um tempo para responder: — Eu não creio
que nos trate melhor do que a Jonathan Lengton.
— Ou seja, eles nos matarão.
— Se matou Lengton também nos matar.
— Lengton foi morto por Poi, não o outro, o chamado
Sing Tai.
— Poi não teria feito nada que não fosse autorizado por
Tai. Marcos, eles vão nos matar, isso é tudo.
Ambos ficaram em silêncio. Arévalo foi se sentar na
frente de Carlos María Lugones e ficaram olhando nos olhos
um do outro. Perto deles, a señorita Connors respirava lenta
e profundamente.
Por volta das cinco da tarde, a señorita Connors estava
acordada, ouviram o som do helicóptero se afastando. Por
volta das seis horas, eles o ouviram voltar. Então, por cerca
de dez minutos, silêncio. Finalmente, a porta da cabana se
abriu e entrou Sing Tai, deixando de fora dois homens
armados Metralhadoras, com a porta aberta, de modo que a
cabana recebeu muito mais luz.
Sentada na beira de um dos beliches, Lili olhou para o
belo e jovem chinês, que agia como se ela não estivesse ali.
Ele se dirigiu aos dois sul-americanos, que, também
sentados, olharam para ele com óbvia surpresa.
— Sinto muito sobre o que aconteceu com Jonathan
Lengton — disse Sing Tai em espanhol perfeito, — mas Poi
tinha instruções muito claras de que nenhum nome deveria
ser pronunciado. Estão bem?
— Sim — Lugones murmurou. — Estamos bem, sim.
— Estou feliz em ouvir isso. Eles vão tirá-los daqui e
espero que em alguns dias estejam de volta a Cuba. Nós
devemos...
— Você não vai nos matar? — quis saber Arévalo.
— Por que supõem isso? — surpreendeu-se Sing Tai.
— Bom não sei. Ela nos conhece — balançou a cabeça
para Lili.
— Sim — Sing Tai sorriu. — Ela conhece você, mas ela
nunca poderá incomodá-lo no futuro. Portanto, não se
preocupe com nada: volte para Cuba e espere novas
instruções. Naturalmente, eu não os culpo em tudo, porque
se ela os localizado não foi culpa de vocês, mas para alguma
indiscrição de outro parceiro... Não é mesmo, señorita
Martinez?
— Sim, está certo — Lili sorriu. — O nome de Carlos
María Lugones me foi dado por Onésimo Varela antes de
morrer.
— Assim eu calculei. Bem, você pode ir agora. E deixe-
se levar pelos meus homens em todos os momentos.
Lugones e Arévalo pareciam não acreditar em sua boa
estrela. Eles olharam para Lili, e então, rapidamente, os dois
saíram da cabana. Sing Tai sentou-se na frente de Lili, a
quem ela contemplou para sua satisfação, muito a sério.
Finalmente, ele balançou a cabeça com admiração e disse:
— Você é uma pessoa muito ativa, señorita Martinez. E
ainda mais surpreendente.
— E você é muito inteligente, señor Tai. Nem todo
mundo seria capaz de obter tantas conclusões e sucesso
quanto você está fazendo. Como poderia ter ocorrido a você
que eu sou a mesma pessoa que usou o nome de Celeste
Martínez? Entre outras pequenas diferenças, ela era negra e
eu sou branca. E não só isso, mas você parece... adivinhar
que meus pensamentos. E, portanto, meus passos e minhas
ações.
— Não foi muito difícil. Eu entendo que você agora usa o
nome de Lili Connors. É bonito. Você é linda também.
Melhor dizendo, é extraordinariamente bella. Quer que
façamos um acordo, señorita Connors?
— Eu já propus um acordo no avião, por meio do rádio, e
você não deu resposta alguma. Pelo menos, foi o que Poi me
contou.
— Esse negócio era inaceitável para mim. Mas tenho
outro que gostaria que merecesse sua aprovação.
— Eu ouço você.
— Eu posso fazer duas coisas com você. Uma delas,
matá-la. É o mais fácil. O outro é usá-la. É mais difícil e
mais comprometido, mas muito mais útil. Este é o meu
acordo: diga-me os nomes de outras pessoas que você
conhece relacionadas a esta operação, e eu vou deixar você ir
livre.
— Você está brincando.
— Não. Se você não me disser esses nomes, terei que dar
a ordem para que mais de sessenta pessoas sejam eliminadas,
porque sem saber quais você descobriu, terei que eliminá-las
todas. Isso implicaria a paralisia do projeto “Liberdade,
Divino Tesouro”...
— O que me satisfaria muito.
— Mesmo em troca de sua vida?
— Isso já não me satisfaria tanto — Lili franziu a testa.
— Olhe, señorita Connors, eu sei que você é a agente
Baby. Depois de Maracaibo, você foi para Cuba. Mas, entre
Maracaibo e Cuba, há três dias no meio. O que você fez
nesses três dias? Ouso supor que, confiando no que Onésimo
Varela lhe disse, tomou certas precauções antes de se
apresentar em Cuba. O que você fez? Quem passou
informações, que tipo de informação, que nomes vieram
conhecer além dos nomes de Arévalo e Lugones? Diga-me
isso e eu a deixo partir.
— Quer dizer, eu trocaria minha vida pelas das pessoas
cujos nomes eu diria.
— Claro.
— Não conheço outro nome.
— Seja sensata. Você está se condenando à morte. E
condenando sessenta pessoas.
— O que eu estou condenando à morte, señor Tai, é a
operação “Liberdade, Divino Tesouro”.
— Mas você vai morrer com ela.
— De acordo.
― Esta louca?
Lili Connors pressionou os lábios e isso foi tudo. Sing
Tai esperou em vão por um minuto para que ela mudasse de
atitude; Finalmente, ele murmurou:
— O que ele está fazendo é impróprio para sua
inteligência.
— Señor Tai, eu vou lhe dar uma amostra da minha
inteligência, já que você está falando sobre isso. Eu posso te
dizer, por exemplo, como eu vejo a operação “Liberdade,
Divino Tesouro”. Você gostaria de ouvir minha versão?
— Claro.
— Muito bem. Bem, eu lhe direi que em nenhum
momento você poderia acreditar que poderia reconquistar a
América do Sul pela força das armas. Ou seja, a ideia de
revoltar as forças armadas de todos os países latino-
americanos de maneira simultânea é simplesmente absurda,
pelo menos no sentido de que essa revolução conjunta
poderia ter sucesso. No entanto, isso pode ser conseguido
mais ou menos ao mesmo tempo, e sob a instigação de
traidores em cada país e mercenários da guerra, todos os sul-
americanos se levantam em armas... Por que não? Afinal de
contas, é certo que alguns bastardos estão massacrando fome
e nojo o povo latino-americano, de modo que ninguém
poderia culpá-los também, se, eventualmente, todos os
irmãos americanos erguessem armas para eliminar esses
bastardos que os estão escravizando e vendendo. Mas isso
não é o que você quer... Eles não querem que a revolução
dos meus irmãos americanos seja um sucesso, mas, pelo
contrário, eles querem que ela fracasse.
— Verdadeiramente você está louca! — disse Sing Tai
ofegante.
— Sim? Você prefere que eu não termine de explicar
minha versão?
— Siga... Siga.
— O que vocês querem não é que essa revolução total
triunfasse, mas apenas que isso continue. Para que? É o que
eu digo: quando a revolução começar, vocês enviaram tropas
para todo o continente sul-americano, a fim de sufocar a
rebelião, ajudando governos estabelecidos e, ao mesmo
tempo, fazendo uma espécie de limpeza... de personagens
que hoje ou no futuro poderiam se opor a seus projetos. Uma
vez que a rebelião tenha diminuído, vocês administrariam
muito bem o comando em todos os governos da América
Latina. E fariam isso desta vez de maneira direta e efetiva,
porque para isso suas forças estariam ocupando todos esses
países. Assim, Señor Tai, o futuro da América do Sul estaria
em suas mãos... o futuro e, claro, a sua grande riqueza de
todo o tipo, a sua terra, as suas culturas... Toda a grande
despensa, toda a grande reserva de mão de obra, todas as
riquezas da América Latina estarão disponíveis para você. E
é isso que você chama de “Liberdade, Divino Tesouro”?
— Realmente, você está louca se acredita que a China
pode conseguir isso...
— Não me insulte — disse Lili friamente. — Eu não
estou falando sobre a China quando falo sobre você. Eu não
disse a qualquer momento que é a China que tramou este
plano, assim como eu não disse a qualquer momento que
você, só porque é de raça chinesa, está trabalhando para o
Lien Lo Pou. Eu não disse isso, Señor Tai?
— Não — Sing Tai engasgou. — Você não disse isso.
— Então, tenha a bondade de não insultar minha
inteligência. E agora, a menos que você tenha algo realmente
interessante para me dizer, você será tão gentil a ponto de me
deixar em paz?
— Você é minha prisioneira.
— Não seja estúpido. Se as coisas fossem como você
queria que parecessem, eu não teria me deixado ser pega,
nem, supondo que você teria conseguido, eu ainda estaria
viva e encararia você. Saia daqui
— Eu vou sair — disse Sing Tai, levantando-se, — mas
você não sairá por pelo menos meio ano.
— Você é quem está louco se pensa que vai permitir que
fique encerrada nesse buraco da floresta a agente Baby por
seis meses. Nem mesmo por seis dias. Eles já sabem que me
inteirei da verdade, mas não me sacrificam, claro que não.
Antes eles sacrificariam a você. E você sabe por que eles
sabem que eu sei a verdade?
— Por que?
— Porque o súbito desaparecimento dos meus Simons em
Maracaibo não era de todo credível. Porque de modo algum
é possível acreditar que a agente Baby chegue a um lugar,
em qualquer lugar do mundo, e nenhum Simon atenda a sua
ligação por rádio. Porque sabem que sei que meus Simons
foram removidos do meu caminho, separados... e até mesmo
possivelmente receberam ordens para tornar as coisas
difíceis para mim, e até mesmo para me confrontar mesmo
que fosse uma simulação na qual eu não corria riscos. E
quando eles fazem algo assim, e eu respondo
adequadamente, eles sabem que descobri a verdade. E se eu
já descobri a verdade, eles sabem que eu não vou ser feliz
com isso, então, na verdade, eles têm que escolher me
eliminar ou continuar contando comigo. Eliminar-me é
absurdo, porque os meus recursos são muito numerosos,
tenho amigos em todo o mundo, amigos a quem talvez já
tenha relatado a operação “Liberdade, Divino Tesouro”, e
eles a denunciariam assim que soubessem de minha morte.
Você entende por que a maldita CIA sempre me prefere
antes de você?
— Então você realmente sabe que tudo isso foi
arquitetado pela CIA, que seriam os Estados Unidos que
invadiriam a América do Sul com suas tropas.
Lili Connors deu ao chinês um olhar de desprezo. Então
ela acendeu um cigarro e pareceu esquecer-se dele... de seu
colega. Porque, por muito chinês que fosse, Sing Tai estava
trabalhando para a CIA, para os Estados Unidos da América
do Norte... para o Mestre do Norte.
— Você — sussurrou Sing Tai de repente, — não vai
destruir meus sonhos pessoais. Por anos, eu tenho a
admirado, e você pode ver que eu nunca a delatei, não só
porque sou uma agente da CIA e americano de nascimento,
mas porque sempre a admirei.
Agora vejo que minha admiração era mais do que
justificada. Você é única, você é a melhor, você é a rainha
indiscutível... mas eu vou continuar com isso. Fui escolhido
justamente no caso de haver dificuldades que todos
pensavam ser uma manobra chinesa, depois da qual tive que
desaparecer. Mas ninguém além de você criou problemas
para a operação “Liberdade, Divino Tesouro”, com a qual eu
alcançaria níveis muito altos dentro do CIA e, mais tarde,
dentro da vida política dos Estados Unidos... Droga, eu não
vou deixar você arruinar todos os meus planos, todos os
meus sonhos!
— Quer dizer, ele vai me matar e tudo vai continuar.
— Sim Quero dizer, não... eu não vou matá-la. Eu vou
simplesmente segurá-la neste lugar até que tudo acabe.
Então... vamos ver o que eu faço com você.
— Isso significa que, para todos os efeitos, a agente Baby
terá desaparecido sem deixar vestígios.
— Sim. Eles vão me perguntar, mas eu direi que a deixei
ir com Lugones e Arévalo, e que se algo aconteceu com
você, será culpa deles.
— O que não seria verdade, já que você ordenou a
execução daqueles dois desafortunados, não é?
— Eu repito — sorriu o belo Sing Tai, — você é única.
Mas até que eu considere minha vida futura no CIA, como
na política, permanecerá aqui.
— E eles não vão dizer nada? — Lili apontou para os
homens de Tai.
— Eles não são da CIA, mas pessoal contratado por mim
em particular, é claro, porque era precisamente disso que se
tratava, que você não sentisse o cheiro da CIA em nenhum
momento, os homens neste lugar trabalham para mim e eles
não têm ideia do que está sendo planejado. Eles são simples
aventureiros dispostos a tudo por dinheiro. Portanto, não
espere considerações especiais. Seja feliz e daqui a pouco
você encontrará um destino... agradável.
— Ou seja, agora a operação é baseada em você.
— Eu nunca terei outra chance de me destacar, e quem
cair na operação continuará. Até a vista.
Sing Tai saiu da cabana, fechando a porta. Lili Connors
ouviu-o falar em chinês com os dois homens com as
metralhadoras. Então, ele ouviu o clique de um cadeado
sendo colocado do lado de fora.
A señorita Connors continuou a fumar em paz. Ele
conhecia a CIA muito bem. E a CIA a conhecia ela. Não foi
a primeira vez que se enfrentaram, que a CIA efetuava
algumas brincadeiras sujas sem ela saber. Mas agora ele
descobrira... E a CIA sabia que, se a agente do Baby se
inteirava de uma operação como “Liberdade, Divino
Tesouro”, faria o possível para desbaratá-la, e que, de fato,
tinha muitos amigos, de toda a classe, em todo o mundo,
alguns dos quais já deviam estar cientes do que o cérebro
privilegiado da senhorita Brigitte Montfort havia descoberto.
A questão era: a CIA a preferiria a Sing Tai... que ainda
poderia oferecer-lhes o triunfo da operação... mesmo que
essa operação pudesse ser denunciada por amigos do agente
Baby?
Trancada na cabana, a senhorita Connors ouviu o som do
helicóptero se afastando.
Algumas horas depois, com a última luz do dia, os dois
atiradores chineses entraram na cabana, um deles com
comida para a prisioneira... que estava muito calma,
penteando o cabelo com a escova que tirara da maleta
vermelha com flores azuis estampadas.
Quando o estilete afiado apareceu de dentro do cabo, o
sol lançou seus últimos raios avermelhados nas montanhas
dos Andes.
ESTE É O FINAL
Ele colocou o carro na garagem e fechou a porta atrás de
si, usando o controle remoto, como sempre. Depois saiu e
olhou pensativo para o veículo. Talvez ele tivesse que se
livrar dele, porque era com ele que costumava visitar
Onésimo Varela em Maracaibo, quando este tinha Baby em
sua casa com o nome de Celeste Martínez e com a pele
enegrecida...
Negra! Que mulher fantástica! Negra, loira, morena,
olhos de qualquer cor, capacidade de se adaptar a tudo, um
valor absolutamente incrível e inabalável...
“Mas eu vou ter que matá-la” — pensou Sing Tai. —
“Não será possível mantê-la viva após a operação
„Liberdade, Divino Tesouro‟. Eu vou ter que matá-la. E
porque não? Todo reinado tem seu fim: o de Baby estará
terminado e o meu começará. Tudo o que nasce morre, tudo
muda, a vida nunca mais é a mesma”.
Por alguns segundos ele pensou novamente na
conveniência de se livrar daquele carro. Era em seu nome, e
ele não gostou depois do que aconteceu. Ele se livraria dele o
mais rápido possível.
Ele entrou na casa pela porta que ligava diretamente à
garagem. Ele morava em uma casinha modesta, mas
agradável no distrito de La Pastora, em Caracas, entre o rio
Catuche e o cemitério Filhos de Deus. Que nome legal para
um cemitério! Mas ele teria que sair de lá. Ele estava no
mesmo lugar há muito tempo, embora fizesse viagens
frequentes por toda a América Latina. Maldita seja! Nunca
teria uma oportunidade como esta para deixar de ser um Don
Nadie e se tornar um herói secreto do CIA e a Casa Branca!
Ele acendeu a luz na sala quando entrou e foi direto para
o bar-armário. Ele não viveu mal em Caracas, mesmo que os
tenha dado aos pobres. Afinal, ele tinha dólares dos ianques
e o dólar dos ianques resolve tudo. Ou quase tudo. Claro,
resolveu a aquisição de um bom uísque. Serviu-se de uma
boa dose, despejou dois cubos de gelo no copo e sentou-se
numa poltrona.
“Liberdade, Divino Tesouro”. Ah, que frase sábia. Falso,
mas bem sucedido. Porque a liberdade é um tesouro, não é?
Tomou um gole de uísque, sorriu... e então viu aparecer na
porta da sala a linda mulher de cabelos negros e ondulados,
grandes olhos azuis celestes, feições pronunciadas, exóticas,
lindas.
Ele identificou isso no ato. Era a senhorita Brigitte
Montfort, a jornalista de Nova York e a mais perigosa espiã
do mundo.
— Não — sussurrou Sing Tai. — Droga, não!
Ela estendeu o braço direito, apontou para o coração do
homem chinês com a pistola silenciosa e puxou o gatilho.