Você está na página 1de 6

 

12. Trauma pediátrico 
 
Introdução
No brasil há uma deficiência de dados que mostram o impacto do trauma pediátrico na 
menor  idade.  Mas  utilizando  dados  do  USA,  nota‐se  que  1  a  cada  6  crianças  são 
internadas por ano para tratar trauma pediátrico. Fazendo com que o trauma seja um 
grande problema de saúde pública e de atendimento para essa população. 
 
 
Tipos e padrões de lesão
Traumas associados a veículos automotores são a principal causa de morte em crianças 
em  todas  as  faixas  etárias,  sendo  a  criança  tanto  o  ocupante  como  o  pedestre  ou  o 
ciclista. Mortes causadas por afogamento, incêndios domiciliares, homicídios e quedas 
seguem. 
Mecanismos  de  trauma  fechado  e  as  características  físicas  das  crianças  resultam  em 
traumatismos  multissistêmicos,  por  isso,  sempre  deve‐se  presumir  que  os  órgãos  e 
sistemas  estejam  lesados,  ate  que  se  prove  o  contrário.  Na  tabela  10.1  há  uma 
correlação entre os mecanismos de trauma e as possíveis lesões. 

  
Características singulares dos doentes pediátricos
 Tamanho e forma
Como a criança tem menor massa corporal, o impacto de energia resulta em maior força 
aplicada por  unidade  de área  corporal.  Essa  energia  mais intensa  é transmitida  para  um 
corpo que possui menos gordura e tecido conjuntivo e maior proximidade entre os órgãos. 
Nisso há uma alta incidência de lesões múltiplas observadas nas crianças. 
 Esqueleto
O  esqueleto  da  criança  tem  calcificação  incompleta,  contém  múltiplos  centros  de 
crescimento ósseo ativos e é mais flexível do que o do adulto. Por essas razoes, lesões de 
órgãos  internos  são  frequentemente  observadas  sem  fraturas  ósseas  associadas.  Por 
exemplo,  fraturas  de  arcos  costais  são  incomuns  nas  crianças,  mas  as  contusões 
pulmonares, não. 
 Superfície corporal 
A relação entre superfície e volume corporal é maior ao nascimento e vai diminuindo com 
a  idade.  Como  consequência,  a  perda  de  calor  é  um  fator  de  estresse  importante  em 
crianças, a hipotermia pode se instalar rapidamente e complicar o tratamento. 
 Efeitos a longo prazo
Uma lesão pode causar implicações no crescimento e desenvolvimento. Alterações sociais, 
afetivas e no aprendizado estão presentes em metade das crianças que sofreram traumas 
graves. 
As lesões ósseas e de órgãos parenquimatosos são exemplos de lesões que podem levar a 
anormalidades de crescimento do osso lesado. A fratura no centro de crescimento de uma 
ou mais vertebras torácicas pode resultar em escoliose, cifose ou giba. 
A  radiação  ionizante,  usada  na  avaliação  de  doentes  traumatizados,  aumenta  o  risco  de 
algumas neoplasias. 
 Equipamentos
A  fita  métrica  de  reanimação  pediátrica  de  Broselow  é  um  acessório  ideal  para  a 
determinação rápida do peso com base na altura da criança, facilitando o calculo apropriado 
do volume de fluidos. Um lado da fita indica as drogas e suas doses recomendadas para 
doentes  pediátricos  com  base  no  peso  e  o  outro  lado  identifica  os  equipamentos 
necessários. 
Via Aérea: Avaliação e Tratamento
O ‘’A’’ do ABCDE do atendimento inicial é o mesmo em crianças e em adultos. Sendo ele  Comentado [A96]: A‐ Via Aérea 
garantir uma oxigenação tecidual adequada.  B‐ Breathing(ventilação) 
C‐ Circulação 
 Anatomia D‐ Dano neurológico 
1. Na criança a laringe é mais alta, localizada entre C3‐C4 e esta anteriorizada.  E‐Exposição 
2. A língua ocupa um espaço maior na orofaringe; 
3. A epiglote da criança é mais curta e flexível, possuindo angulação mais aguda com 
o eixo da traqueia o que dificulta a visualização das cordas vocais; 
4. As  cordas  vocais  são  mais  cartilaginosas  e  distensíveis  sendo  facilmente  lesadas 
durante a intubação. 
Para intubar o plano da face deve manter‐se paralelo ao da prancha em posição neutra, 
ao invés da posição de cheirador recomendada para adultos. 
 Tratamento
Se a criança estiver respirando espontaneamente com a via aérea apenas parcialmente 
obstruída,  deve‐se  manter  o  plano  da  face  paralelo  da  prancha  e  utilizar  manobras 
como  de  tração  da  mandíbula  para  abrir  as  vias  aéreas.  Nisso,  realizar  a  limpeza  de 
secreções  ou  de  fragmentos  de  corpos  estranhos  presente  na  boca  e  na  orofaringe, 
deve‐se também administrar oxigênio suplementar. 
Se a criança estiver inconsciente, podem tornar‐se necessários métodos mecânicos de 
manutenção da permeabilidade. 
Antes de tentar um acesso mecânico à via aérea, a criança deve ser pré‐oxigenada. 

Tubo Orofaríngeo
Deve ser utilizado somente quando a criança estiver inconsciente 
‐Intubação orotraqueal 
É o meio mais seguro de se estabelecer a permeabilidade da via aérea e de ventilar a 
criança. 
Deve seguir o protocolo de intubação de urgência conhecido por intubação assistida 
por drogas ou intubação de sequência rápida. 
Lactentes tem reflexo vagal mais acentuado que crianças maiores e podem evoluir para 
bradicardia devido a estimulação direta da laringe. 
Deve ser usado um bloqueador neuromuscular para realizar a intubação, podem ser a 
succinilcolina, de meia vida curta, ou o rocuronio, de meia vida mais prolongada. 
A  intubação  nasotraqueal  não  deve  ser  realizada  em  crianças,  pois  requer  um 
procedimento às cegas. 
A regra de ouro para o correto posicionamento do tubo endotraqueal é a gengiva estar 
no comprimento correspondente a 3 vezes o número do tubo. As técnicas primarias de 
confirmação  tais  como  a  ausculta  de  ambos  os  hemitoraces  nas  axilas,  devem  ser 
realizadas para confirmar que não houve intubação seletiva. 
 
Circulação e Choque: Avaliação e tratamento
Hipovolemia
A  criança  possui  maior  reserva  fisiológica,  por  isso  precisa  perder  mais  de  30%  da 
volemia  para  que  manifeste  diminuição  da  pressão  arterial  sistólica.  Normalmente, 
taquicardia e diminuição da perfusão periférica frequentemente são as únicas chaves 
para  o  reconhecimento  precoce  da  hipovolemia  e  inicio  precoce  da  reanimação 
volêmica. 
O choque hipovolêmico grave normalmente ocorre como resultado de lesões de órgãos 
intratorácicos, intra‐abdominais ou de vasos.  
 

 
Acesso venoso
Os acessos preferenciais devem ser os periféricos, se não for posição após 2 tentativas, 
devem  considerar  a  realização  de  punção  intraóssea  realizada  com  uma  agulha  de 
punção de medula óssea ou a punção femoral. Locais de acesso venoso: 
Percutâneo periférico(2x) ‐ fossa antecubital, veia safena no tornozelo. 
Intraósseo‐ tíbia Antero medial, fêmur distal. 
A maioria das crianças se estabiliza com reposição apenas de cristaloides, não sendo 
necessária  a  transfusão  de  sangue.  Em  algumas  crianças  a  uma  resposta  inicial  a 
cristaloides e sangue, mas depois há a piora clinica e outras crianças não a resposta nem 
no início. 
 
Trauma torácico
Oito por cento de todos os traumatismos em crianças comprometem o tórax. O
trauma de tórax constitui-se como marcador para lesões de outros sistemas,
visto que mais de dois terços das crianças portadoras de trauma de tórax
apresentam também lesões de outros sistemas, devido a complacência e
flexibilidade da parede torácica da criança resultar em transmissão das forças
para o interior da caixa torácica, afetando o pulmão e causando lesão ao
parênquima pulmonar.
A mobilidade das estruturas mediastinais torna a criança mais sensível ao
pneumotórax hipertensivo, lesão mais comum que ameaça a vida de imediato. Comentado [A97]: Pneumotórax hipertensivo é o
A  maioria  das  lesões  torácicas  pediátricas  pode  ser  tratada  adequadamente  com  acúmulo de ar no espaço pleural sob pressão,
suporte ventilatório e drenagem torácica, a toracotomia não costuma ser necessária na  comprimindo os pulmões e diminuindo o retorno venoso
para o coração. 
criança. 
 
Trauma abdominal
A  maioria  dos  traumas  abdominais  na  criança  é  decorrente  de  trauma  fechado, 
geralmente envolvendo veículos e quedas. 
A criança hipotensa, que apresenta trauma abdominal penetrante ou fechado, necessita 
de procedimento cirúrgico de imediato. 

Avaliação
O exame físico deve ser feito enquanto se conversa calmamente e em voz baixa com a 
criança, perguntando quanto a presença de dor e avaliando‐se suavemente a tensão da 
musculatura abdominal. A palpação profunda, capaz de despertar dor, deve ser evitada 
no inicio do exame a resistência voluntaria que ocorre a seguir pode tornar confusos os 
achados do exame abdominal. 
Devido  a  grande  deglutição  de  ar  durante  e  após  o  trauma,  torna‐se  necessário  a 
descompressão  do  estomago,  através  da  passagem  de  sonda  gástrica  (sondagem 
orogástrica),  a  tensão  da  parede  abdominal  frequentemente  diminui  após  a 
descompressão, permitindo uma melhor avaliação. 

Medidas auxiliares no diagnostico


A tomografia computadorizada, a ultrassonografia e a lavagem peritoneal diagnostica 
são medidas que auxiliam na avaliação do trauma. 
Tomografia computadorizada‐ pode ser útil na avaliação do abdome da criança vítima 
de  trauma  abdominal  fechado  e  que  se  encontra  hemodinamicamente  estável, 
podendo permitir tratamento não cirúrgicos. A TC deve ser realizada apenas quando 
necessário  e  quando  os  resultados  determinarem  mudanças  na  conduta,  deve‐se 
examinar somente as áreas de interesse e usar a menor dose de radiação possível para 
evitar futuras neoplasias. 
Lavagem peritoneal diagnostica‐ Para detectar sangramento intra‐abdominal na criança 
com  instabilidade  hemodinâmica. A maioria  dos  casos tem hemorragia autolimitada, 
portanto,  o  achado  de  sangue  não  indica  cirurgia  necessariamente  em  uma  criança 
hemodinamicamente estável. 
 

Tratamento não operatório


Nota‐se que sangramentos de lesões esplênicas, hepáticas ou renais normalmente são 
autolimitados, significando que não necessitam de laparotomia. 
Se  a  criança  não  normalizar  sua  condição  hemodinâmica  e  um  procedimento 
diagnostico  realizado  for  positivo  para  sangue,  deve‐se  indicar  a  laparotomia 
prontamente para controle da hemorragia. 
 
Lesões viscerais específicas
Crianças contidas apenas com cinto de segurança de duas pontas tem risco aumentado 
de  lesões  das  alças  intestinais,  especialmente  quando  houver  marca  do  cinto  de 
segurança na parede do abdome ou fratura lombar de flexão‐distração. 
Lesões  de  alça  de  delgado  próximas  ao  ligamento  de  Treitz  são  mais  frequentes  em 
crianças, assim como as lesões mesentéricas e avulsões de alças de intestino delgado, 
tais  lesões  tem  diagnostico  tardio  frequentemente  devido  a  sintomalogia  inicial  ser 
inespecífica. 
 
Trauma Craniencefálico
Causas: colisões de veículos automotores, abuso, colisões com bicicletas e quedas. 
O cérebro da criança é anatomicamente diferente do adulto. Ele dobra de tamaanho 
nos primeiros 6meses de vida e atinge 80% do tamanho do cérebro adullto por volta 
dos 2 anos de idade. O espaço subaracnoide é relativamente menor, oferecendo menos 
proteção  ao  cérebro  devido  a  menor  flutuabilidade.  Aumentando  a  possibilidade  de 
lesão do parênquima cerebral. 
Crianças possuem maior suscetibilidade do cérebro a hipóxia e hipercarbia devido ao  Comentado [A98]: Hipoxia significa baixo teor de oxigênio 
grande fluxo cerebral ate os 5 anos de idade.  Hipercarbia significa elevação da pressão de CO2 no sangue 
1‐Crianças  são  mais  suscetíveis  as  lesões  cerebrais  secundarias  produzidas  por  circulante. 
hipovolemia,  que  causa  diminuição  na  perfusão  cerebral,  hipóxia,  convulsões  ou 
hipertermia. O efeito combinado da hipovolemia e da hipóxia no cérebro traumatizado 
é muito devastador. 
2‐ Criança com fontanela aberta ou com linhas de saturas cranianas não consolidadas 
tolera  melhor  uma  lesão  intracraniana  com  efeito  de  massa  ou  inchaço  cerebral.  Os 
sinais  de  uma  lesão  expansiva  podem  ser  mascarados  ate  que  ocorra  uma  rápida 
descompensação. Portanto, uma criança que não esta em coma, mas tem a fontanela 
abaulada ou espaçamento da linha de satura, deve ser tratada como portadora de uma 
lesão grave. 
3‐ Vômitos ou mesmo amnesia são comuns após a lesões, mas tornando se frequente 
devem ser investigados com uma TC de crânio, assim, como convulsões. 
 

 
Trauma medular
Causas: colisões com veículos automotores e acidentes em atividades esportivas. 
Diferenças anatômicas
‐Os ligamentos interespinhosos e as capsulas articulares são mais flexíveis. 
‐Os corpos vertebrais tendem a deslizar para frente com a flexão. 
‐As  crianças  possuem  a  cabeça  muito  maior  quando  comparada  ao  pescoço, 
aumentando as lesões entre o occipício e C3. 
 
 
Trauma musculo esquelético  
Importante nesses casos é a história do doente. Visto que em crianças mais novas o 
diagnostico radiográfico de fraturas e luxações é difícil devido a falta de mineralização 
ao redor da epífise e da presença de núcleos de crescimento. 
A história do trauma é importante visto que em conjunto com evidencias radiográficas 
de fraturas em diferentes estados de consolidação ou fraturas dos membros inferiores 
em  crianças  mais  novas  que  ainda  não  deambulam  evidencia  uma  criança  vítima  de 
abuso. 
Considerações  
Lesões nas áreas de crescimento ósseo ou lesões próximas a essas áreas podem retardar 
o crescimento ou alterar o desenvolvimento normal. 
A imaturidade e a flexibilidade dos ossos das crianças podem levar a chamada fratura 
em galho verde, fraturas incompletas e com angulação mantida pela camada cortical da 
superfície  côncava.  Essa  fratura  sugere  abuso  físico  em  doentes  com  histórias 
inconsistentes e vagas. 
 
A criança vítima de abuso
Como reconhecer lesões sugestivas? O homicídio é a causa mais comum de lesão fatal 
no primeiro ano de vida, logo médicos devem estar preparados para identificar lesões 
intencionais. 
‐ Existe discrepância entre a história e o grau de lesões físicas; 
‐ Intervalo de tempo prolongado entre o trauma e a procura por atendimento médico; 
‐ Há historia de traumatismos de repetição e de atendimentos em diferentes hospitais; 
‐ A história do trauma muda ou é diferente entre pais ou cuidadores; 
‐ Os pais não respondem de forma adequada ou são evasivos. 
Os seguintes achados durante o exame podem sugerir abuso: 
‐ Equimoses múltiplas(hematoma); 
‐ Evidencia de lesões traumáticas previas e repetidas, como cicatrizes antigas ou fraturas 
consolidadas; 
‐ Lesões perineais ou perianais; 
‐ Fraturas de ossos longos em crianças menores de 3 anos de idade; 
‐ Lesões bizarras; 
‐ Hematomas subdurais múltiplos; 
‐ Queimaduras; 
‐ Fraturas de crânio ou de arcos costais em crianças menores de 24 meses de idade. 
 
 
 
 

Referências 
Brandt, C. T. Introdução a Cirurgia Geral da Criança. Pernambuco, Editora UFPE. 2003; 
Colégio  Americano  de  Cirurgiões.  ATLS  –  Advanced  Trauma  Life  Support,  9ª  edição. 
Chicago, 2012; 
IMIP Fernando Figueira. Pediatria, 4ª edição. Rio de Janeiro, Medbook, 2011; 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Você também pode gostar