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O PERÍODO DA DITADURA CIVIL-MILITAR

EM JOINVILLE
Patrik Roger Pinheiro¹
Raquel Elisa da Silva Meneghelli ²

RESUMO
O presente trabalho tem por objetivo analisar como foi a ditadura para o joinvilense, o que
aconteceu e o que o joinvilense lembra que aconteceu. Empregando o método da pesquisa com
survey, buscamos sondar as memória dos que viveram a ditadura em Joinville. Usando a pesquisa
bibliográfica, estudamos os acontecimentos do período na localidade. A pesquisa indicou que
houve repressão em vários campos e perseguição a várias pessoas, seja no campo cultural, a
direitos trabalhistas ou perseguições por motivação política. A pesquisa indicou que o número de
pessoas que sofreu com a ditadura não é expressivo, o que não diminui a dor dos que a sofreram.
Ficou claro que o joinvilense sabe pouco sobre conterrâneos que sofreram perseguição, e muitos
ainda gostariam que o regime militar retornasse.

Palavras-chave: Ditadura Civil-Militar. Regime Militar. Perseguição. Tortura. Repressão.


Joinville.

1. INTRODUÇÃO

A ditadura civil-militar tem sido alvo de constantes críticas da intelectualidade, e não


poderia ser diferente, haja vista que muitos direitos humanos foram desrespeitados no período.
Nascida de uma suplicada intervenção militar, a ditadura hoje já não parece assustar os cidadãos
desse vasto país. Após cada decepção política, seja com o poder executivo, legislativo ou mesmo
com judiciário (em especial, com as decisões do Supremo Tribunal de Justiça), os brasileiros
clamam nas redes sociais e nas ruas por uma nova intervenção militar.
O desapontamento leva todos a quererem que uma força maior acabe com os desencontros
das autoridades com os governados, mas que força poderia ser essa? De tempo em tempos, os
militares tem interferido nos rumos políticos do país, nem sempre com resultados negativos ou
abusivos. Primeiro com Deodoro da Fonseca e a proclamação de república, em 1889. Depois os
tenentes da "Aliança Liberal" que resultou, via força das armas, na subida de Vargas ao poder.
Quando um golpe civil-militar tentava impedir que o presidente eleito Kubitschek e seu vice
Goulart tomassem o poder que o povo lhes deu, o general Lott deu um contragolpe que garantiu o
respeito pela democracia. Aqui as forças das armas foram usadas para respeitar a constituição.
O tempo passou, e o povo foi às ruas pedindo que mais uma vez os militares interviessem.
As Marchas da Família com Deus pela Liberdade foram uma série de manifestações que incitaram
cada vez os políticos a reagirem. Mas quem desejava apenas uma breve intervenção para que a casa

1 Nome dos acadêmicos


2 Nome do Professor tutor externo
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI - Curso (Código da Turma) – Prática do Módulo VII -
14/11/19
2

política do Brasil fosse reparada, acabou despertando uma força muito maior, que dominou o país
por duas décadas com mãos de ferro. Começava a ditadura Civil-Militar.
A bibliografia é clara em mencionar a brutalidade do regime:

Florestan Fernandes destacava que no regime militar foi posta em prática uma ampla
repressão “de maneira brutal e ostensiva (...) e fora de qualquer consenso ou legitimidade
civil e política”.20 Acredita-se, no entanto, que a singularidade da ditadura estava na
combinação de uma enorme repressão com uma pretensão de legitimidade, a qual não era,
sob qualquer aspecto, democrática, mas orientava os meios de dominação postos em prática
pelos componentes do grupo de poder no seu empenho para sedimentar aquele regime.
(REZENDE, 2013, p. 6)

Os mais jovens, no entanto, não experimentaram pessoalmente um governo sob regime


militar. Talvez por isso mesmo, nos críticos dias atuais, alguns joinvilenses de menos idade clamem
a plenos pulmões ou escrevam em redes sociais textos em caixa alta, dizendo que querem
novamente uma intervenção militar. Mas que dizer dos joinvilenses já idosos, aqueles que viveram
dentro do período, e os de meia idade que nasceram nele, e também pedem que os militares
intervenham? Como conciliar esse pedido com o fato de terem vivido sob um regime, que segundo
vimos, é descrito como pondo em prática uma repressão brutal e ostensiva?
Ora, se muitos não tiveram plena noção do que realmente foi a ditadura, será que foi por que
ela pouco se fez sentir nas suas vidas e rotinas? Como Joinville sentiu a ditadura? Foi ruim para os
moradores da maior cidade do estado? A memória coletiva do município tem que lembranças
daquele período?
Empregando a pesquisa bibliográfica somada à pesquisa com survey, pretendemos analisar
como foi a ditadura militar para Joinville e o que os joinvilenses lembram dela.

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Ditadura, uma palavra que costuma evocar sentimentos negativos. Ela trouxe consigo
"consequências políticas bastante sérias [...], principalmente depois do AI-5" (CUNHA, 2019). O
poder deixou de estar nas mãos do povo e passou para as mãos do governo autoproclamado
“Revolucionário”.
Já dizia o primeiro Ato Institucional, em 1964, que “o Povo é o único titular” do poder. No
entanto, o mesmo Ato lembra aos brasileiros que “a revolução vitoriosa, como Poder Constituinte,
se legitima por si mesma” e que “só a esta cabe ditar as normas e os processos de constituição”. A
contradição reside na ideia de que um poder que se torna legítimo por si mesmo não precisa
governar de acordo com a vontade popular.
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FIGURA 1: REPRESSÃO MILITAR NA PRAÇA DA SÉ.

FONTE: Ditadura Militar no Brasil. Disponível em: < https://www.politize.com.br/ditadura-


militar-no-brasil/>. Acesso em: 20/11/2019

Rezende (2013, p. 89) afirmou que o arbítrio passou a prevalecer, já que a tortura e a
repressão estavam sendo institucionalizada. Isso tudo com o aval não só de militares, mas dos
tecnoburocratas e dos daqueles que detinham grande capital.
Os donos dos meios de produção não viam o regime militar exatamente como um inimigo.
Como poderia ser, se movimentos grevistas, tão temidos por empresários, eram tidos como
clandestinos? Rezende(2013, p. 89) continua a explanar o assunto:

Os movimentos grevistas e estudantis eram encarados como clandestinos e ilegais pelo


governo militar. As greves dos bancários e metalúrgicos em Minas Gerais, em outubro de
1968, eram vistas como atentados à ordem institucional. O ministro do Trabalho afirmava:
“Não se trata de 90 salários. É a ordem que está em jogo”.98 O Conselho de Segurança
Nacional99 passava a discutir sigilosamente quais seriam as estratégias diante dos
movimentos que contestavam o regime. Com o aparecimento das primeiras atividades da
esquerda armada, os diversos setores que compunham o grupo de poder (civis e militares)
se colocavam de acordo com o fechamento do regime e, portanto, com o endurecimento do
“sistema” de poder.

A barbárie cometida em nome do regime militar foi intensa, mas os números não chegam a
assustar, como os milhões que sofreram nas mãos de pessoas como Hitler ou Stalin. De fato, um
evento muito esquecido pelos brasileiros foi a criação de uma prisão militar, chamada às vezes de
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campo de Concentração, na cidade do atual Oiapoque, no extremo norte do Brasil. Para lá, Romani
(2002, p.315) alega que o presidente Artur Bernardes degredou "algo em torno de 1200 prisioneiros
entre soldados rebeldes, operários sindicalistas, anarquistas, ladrões, loucos e vadios, conforme a
classificação elaborada pela polícia nas listas de envio". Quantos desses voltaram? Romani
continua:
Deste total, mais da metade sucumbiu às doenças tropicais e faleceu, vítima do
impaludismo, malária, beribéri, disenteria e desidratação. Os que voltaram trouxeram
consigo sequelas permanentes: o olhar distante, sem vida, a face amarelada e o corpo
esquálido, na descrição feita por Everardo Dias (Romani, 2002, p.315).

Se a metade desses exilados morreu em Clevelândia do Norte, então 600 pessoas morreram.
Isso já é mais do que os mortos e desaparecidos indicados pelo relatório da Comissão Nacional da
Verdade, que no seu volume III indicou 434 pessoas mortas ou desaparecidas.
Mas números para mais ou para menos não diminuem a dor do indivíduo que sofreu o abuso
de autoridade, ou a tortura. Não abranda o pesar de quem tem um ente querido entre os 434
mencionados no relatório da CNV.
O volume III do relatório da Comissão Nacional da Verdade traz relatos vívidos de presos
que sofreram inclusive crimes sexuais. Há relatos tensos de como mulheres foram abusadas. Uma
delas foi deixada de modo que seu corpo nu ficasse exposto às sondagens e toques de pervertidos
sexuais, enquanto uma corda enrolada no pescoço passou pelas costas até as mãos. Se ela tentasse
se defender do sadismo do qual era vítima, acabaria se enforcando, então o instinto a fazia voltar
atrás na ação.
Sob muitos aspectos, de muitas maneiras, houve inacreditável abuso de autoridade. Mesmo
os que acham que nada sofreram com a ditadura também foram vítimas delas no que se refere a
liberdade cerceada. Cada intelectual que foi proibido de se expressar, cada jornal ou jornalista que
teceu uma matéria depois censurada, cada leitor ou tele-espectador que só pôde ler ou assistir o que
a ditadura permitiu... Cada uma dessas pessoas foi de certa forma diminuída de seus direitos.
O braço forte da ditadura se fez sentir em Joinville, claro. Cunha (2019), falando da situação
na maior cidade catarinense, recorda que as consequências mais sérias vieram "principalmente a
partir do AI-5, em 1968". Cunha menciona perseguições no legislativo joinvilense e a movimentos
populares da sociedade civil. Ainda assim, a memória coletiva do joinvilense parece estar se
esquecendo de tudo isso.
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3. MATERIAIS E MÉTODOS

Este trabalho emprega a pesquisa bibliográfica somada à pesquisa com survey para obter um
quadro claro de como foi a ditadura militar para Joinville e como ela ficou gravada na memória
coletiva joinvilense
O método conhecido como “Pesquisa com Survey” será de composto por uma pesquisa que
não será supervisionada, ou seja, o questionário será enviado e as respostas retornarão depois, sem
nenhuma interferência do pesquisador nesse meio tempo.
Representando a população-alvo, no caso aqueles que estavam em Joinville durante a
ditadura civil-militar, foram escolhidas pessoas de diferentes rodas da vida. As perguntas feitas aos
pesquisados encontram na Tabela 1. Não identificaremos os pesquisados com seus nomes para
garantir o sigilo, mas revelaremos algumas características deles, conforme Tabela 1 abaixo:

TABELA 1: CARACTERÍSTICAS DOS ENTREVISTADOS

Entrevistado 1: Trabalhou na produção, em empresas de Joinvile e dirigiu uma pequena olaria em certo momento.

Entrevistado 2: Trabalhou na produção, em empresas de Joinvile e foi militar durante algum tempo.

Entrevistado 3: Trabalhou no departamento de recursos humanos de uma empresa joinvilense.

Entrevistado 4: Trabalhou em empresas de pavimentação e terraplanagem.

Entrevistado 5: Radialista em Joinville.

TABELA 2: PERGUNTAS ENVIADAS AOS ENTREVISTADOS

Perguntas a serem respondidas pelos entrevistados

Sobre a tortura física, censura ou repressão de qualquer forma, por parte da ditadura militar, responda as três perguntas
a seguir:

Pergunta 1) Você ou algum dos seus parentes sofreu tal repressão?

Pergunta 2) Você conheceu pessoalmente alguém que a sofreu?


(excluindo você e seus parentes)

Pergunta 3) Você lembra de ter tomado conhecimento, por jornal, rádio, TV ou mesmo através de conversa informal, de
alguém que morando ou estando em Joinville, sofreu tal repressão? Você não precisa ter conhecido a vítima
pessoalmente. O caso não precisa ter sido confirmado.
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As respostas poderão ser enviadas por escrito ou respondidas em áudio e aqui transcritas.
Uma vez obtidas as respostas, serão analisadas para verificar o quão entranhada está na memória
coletiva os atos arbitrários do regime militar, ocorrido localmente.
Para aprofundar a pesquisa, uma análise bibliográfica, por vídeos ou artigos escritos,
complementará o entendimento do que ocorreu de fato e de como o joinvilense faz a leitura do que
ocorreu.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Entrevistados os que viviam em Joinville no período do regime militar, conforme Tabela 1,


essas foram as respostas:

TABELA 3: RESPOSTAS DOS ENTREVISTADOS


Entrevistado 1 Entrevistado 2 Entrevistado 3 Entrevistado 4 Entrevistado 5

Respostas à pergunta 1: "Você ou algum dos seus parentes sofreu tal repressão?”

Não Não Não Não Sim. O irmão do


entrevistado, menor
de idade, foi pego
sem documentos.

Respostas à pergunta 2: "Você conheceu pessoalmente alguém que a sofreu? (excluindo você e seus parentes)

Não Não Sim. Era um Não Sim. o entrevistado


advogado e militante citou um professor e
de partido político. um jornalista que
foram presos e
torturados.

Respostas à pergunta 3: " Você lembra de ter tomado conhecimento, por jornal, rádio, TV ou mesmo através de conversa
informal, de alguém que morando ou estando em Joinville, sofreu tal repressão? Você não precisa ter conhecido a vítima
pessoalmente. O caso não precisa ter sido confirmado.”

Não. Acha que isso Disse que ouvia falar Sim. Disse que Viu uma reportagem Sim. Disse que soube
deve ter acontecido que aconteciam, mas conheceu vários sobre um escritor que de vários sequestros
nos grandes centros servia o exército na casos, inclusive de morou em Joinville e feitos pelos "milicos"
do país. época e disse que em desaparecimento. sofreu com o regime. para obter informa-
revistas e bloqueios ções e delações de
que participou não era incendiadores na
usado de maneira cidade.
nenhuma a violência
ou qualquer ameaça.
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A fim de apurar graves violações de Direitos Humanos, o governo federal criou a Comissão
Nacional da Verdade (CNV), que irradiou pelo país a criação de comissões estaduais e municipais,
co o mesmo fim.
O relatório final da CNV praticamente não cita Joinville, exceto quando aborda violações
dos direitos trabalhistas. O segundo de três volumes do relatório final descreve:

Em Santa Catarina, muitos dirigentes dos sindicatos que sofreram intervenção e


sindicalistas cassados foram presos. No estado catarinense ocorreu um caso extraordinário
de intervenção direta do Exército no interior da empresa, quando esse acampou em uma
sala especial dentro da Fundição Tupy, em Joinville, mediante acordo com a empresa, e
ficou usando suas instalações por 20 anos. Segundo depoimentos de presos políticos de
Joinville, a direção da empresa possuía uma clara postura de apoio à repressão política na
região. Quem era demitido por participação política ou reivindicação salarial tinha a
carteira de trabalho assinada com caneta vermelha e nunca mais conseguia emprego na
cidade, pois esse era o código utilizado entre as empresas.

No que se refere à Comissão Estadual da Verdade, de Santa Catarina, pode-se ver que muito
se debruçou sobre violações de direitos e perseguições ocorridas em Joinville. O Relatório Final da
Comissão (2014, p.9) cita elaborações de listas negras de empregados, feitas por empresários locais
e (pp. 178-194) menciona 35 pessoas de Joinville que sofreram detenção na época da ditadura.
Viabilizada por intermediação da Comissão de Participação Popular e Cidadania (CMV), da
Câmara de Vereadores de Joinville, ocorreu nesse município a "Comissão Municipal da Verdade",
nascida a partir de debates realizados com entidades de defesa dos direitos humanos, instituições de
ensino superior e órgãos como a Ordem dos Advogados do Brasil.
A CMV entrevistou 7 pessoas que passaram por algum tipo de perseguição pelo regime
militar e alguns de seus parentes, que contaram com muitos detalhes suas agonias e sofrimentos.
Foram 5 audiências que geraram um relatório final questionado por alguns membros da CMV. No
site da Câmara de Vereadores de Joinville, Azevedo (2014) menciona que alguns desses membros
se negaram a assinar o relatório final, seja por entenderem que houve erro na condução as
audiências, seja por discordarem de algo no relatório final.
O trabalho da Comissão Municipal da Verdade foi bem menos abrangente para a cidade do
que o da Comissão Estadual, que tinha um estado todo para cobrir, e não só Joinville. A falta de
zelo da CMV não contribuiu tanto quanto poderia, para fazer o joinvilense reviver as lembranças ou
saber mais detalhes do que é viver sob um regime autoritário.
No campo artístico, há o relato de uma peça teatral chamada de "Os Palhaços" que foi
escrita pelo professor e dramaturgo Miraci Dereti. Herbst (2018) informa que "o texto não foi
encaminhado para análise em Brasília e acabou barrado pelos militares de plantão, se tornando o
primeiro e único espetáculo censurado em Joinville."
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FIGURA 2: EDEGAR SCHATZMANN,VÍTIMA DO REGIME MILITAR, DEPÕE NA COMISSÃO


MUNICIPAL DA VERDADE, DE JOINVILLE

FONTE: Câmara de Vereadores de Joinville, 2014. Disponível em:


<http://www.cvj.sc.gov.br/home/46-toppanel/2463-qameaca-da-ditadura-e-permanenteq-diz-ex-
preso-politico-veja-galeria-de-fotos-da-reuniao> Acesso em: 15/11/2019

Em 2011 foi lançado o documentário "Ditadura Reservada", que aborda o regime militar em
Joinville e região resgatando depoimentos de presos políticos, historiadores, radialistas e sociólogos
convidados que contam como foi esse período em Joinville. Logo no início, transeuntes são
entrevistas, e aqui há uma revelação interessante do que a memória joinvilense guarda do período
em questão. Reproduziremos a seguir trechos de algumas respostas:
"É pior do que hoje. [...] Se hoje não tá bom, aquele era pior." Disse um deles. Outro,
mencionando depois que o povo de hoje não tem educação, declara: "Eu gostaria que voltasse."
Questionada sobre a ditadura, uma senhora responde perguntando: "Que ano foi? Depois ela disse
que pior tá agora". Outro entrevistado menciona a liberdade que temos hoje como uma vantagem
em relação àquele período. Como pode-se ver, as opiniões são divididas.

5. CONCLUSÕES

A pesquisa com Survey nos permitiu verificar que, apesar da ditadura civil-militar perdurar
por duas décadas, a maioria dos joinvilenses não enfrentou sua pior face pessoalmente ou na sua
9

família, nem conheceu alguém que sofreu às mãos do regime. Ao falar de casos de pessoas que
sofreram perseguição, de que ouviram falar, costumam ser casos muito distante da sua realidade.
A pesquisa bibliográfica nos permitiu verificar que há casos documentados de perseguição,
mas as comissões da verdade a nível federal, estadual e municipal não trazem um número
impressionante de pessoas que sofreram torturas ou foram perseguidas pela ditadura. O fato de que
a própria Comissão Municipal da Verdade decidiu investigar poucos casos, e sabidamente havia
mais, mostra que poderia haver mais vontade na hora trazer à tona a dor que um regime autoritário
pode trazer. O relatório final da Comissão Nacional da Verdade quase ignora Joinville por
completo, e nenhum caso de desaparecimento de pessoas daqui ela traz.
Claro que as dezenas de pessoas perseguidas mencionadas no relatório final da Comissão
Estadual da Verdade, ouvidas detalhadamente na Comissão Municipal da Verdade, entrevistadas no
documentário "Ditadura Reservada" ou aquelas lembradas pelos entrevistados nessa pesquisa
mostram que a o braço pesada do regime se fez sentir por aqui.
Além disso, a peça teatral "Os Palhaços" impedida de ser exibida, é prova de que a censura
se fazia presente em nossa cidade no campo cultural. Mesmo indiretamente, todos só viam ou
assistiam o que a censura prévia permitia, um ataque à liberdade humana que atingia todo dia não só
os joinvilenses, mas um país inteiro.
Sem dúvida os pais e avôs contam para seus descendentes como era a vida que viveram. As
respostas dos entrevistados mostra que eles de modo geral não pintariam um quadro ruim do regime
militar. Uma ideia reforçada por alguns daqueles transeuntes do documentário "Ditadura
Reservada", que entendem que agora está pior e que desejam a volta do regime militar.
Joinville, uma cidade industrial que aproveitou o crescimento industrial do período, pode ter
um conceito distorcido do que foi a ditadura militar. Por isso, ignorando os que ocorreu nos recintos
ocultos das forças armadas, os joinvilenses mais velhos, e os mais jovens que os ouvem, clamam
pela volta desse regime.

REFERÊNCIAS

AZEVEDO, Sidney. Avaliação de membros da Comissão da Verdade: críticas ao relatório


final e continuação da investigação. Site da Câmara de Vereadores.
Disponível em: < http://www.cvj.sc.gov.br/home/47-comissoes/2812-avaliacao-de-membros-da-
comissao-da-verdade-criticas-ao-relatorio-final-e-pedido-para-maior-investigacao>. Acesso em: 15
nov. 2019.

Brasil. Ato Institucional nº 1, de 9 de abril de 1964. Disponível em:


<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/AIT/ait-01-64.htm>. Acesso em: 05 nov. 2019.
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Comissão Estadual da Verdade. Relatório Final. Disponível em:


<https://www.plural.jor.br/documentosrevelados/wp-content/uploads/2016/04/relatorio_final_-
_novembro_-_20-11-14_1_2.pdf>. Acesso em: 16 nov. 2019.

Comissão Nacional da Verdade. Relatório da Comissão Nacional da Verdade, Volume II.


Disponível em: < http://cnv.memoriasreveladas.gov.br/images/pdf/relatorio/volume_2_digital.pdf>.
Acesso em: 16 nov. 2019.

Comissão Nacional da Verdade. Relatório da Comissão Nacional da Verdade, Volume III.


Disponível em: <http://cnv.memoriasreveladas.gov.br/images/pdf/relatorio/volume_3_digital.pdf>.
Acesso em: 06 nov. 2019.

CUNHA, Dilney. Joinville.DOC - Ulisses Tavares Lopes. Documentário produzido pela Câmara
de Vereadores de Joinville, 2019. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=ogRCX8l715E>. Acesso em 18 nov. 2019

HERBST, R. Os 50 anos da primeira (e única) peça censurada de Joinville. Jornal Digital OCP
News. Disponível em: <https://ocp.news/entretenimento/os-50-anos-da-primeira-e-unica-peca-
censurada-de-joinville>. Acesso em: 15 nov. 2019.

PORTO, Fábio. Ditadura Reservada. 2011. (1h19m32s). Disponível em:


<https://www.youtube.com/watch?v=IGr8saF5DCA>. Acesso em: 02 nov. 2019.

REZENDE, Maria José de. A Ditadura Militar no Brasil - Repressão e Pretensão de


Legitimidade - 1964-1984 [livro eletrônico]. 1 ed. Londrina: Eduel, 2013.

ROMANI, Carlo (SAMIS, Alexandre - Organizador). Clevelândia. Anarquismo, sindicalismo e


repressão política no Brasil. São Paulo: Imaginário, 2002.

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