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10- MBEMBE, Achille. As formas africanas de auto-inscrição.

- Filósofo camaronês que pensa as relações sociais de poder, entre vida e morte, a partir do
conceito de biopoder de Michel Foucault. Com esse conceito, ele desenvolve a ideia de
necropolítica, que é a gestão política orientada pelo princípio da morte. Segundo ele, existe
um projeto político de assassinato sistemático de uma parcela da população. Sendo o racismo
o marco regulador.

- O texto fala , basicamente, sobre a auto afirmação identitária dos povos africanos e da
pluralidade das identidades no continente, criticando visões simplificadoras da construção
dessas múltiplas identidades.

- Duas formas de historicismo no esforço na explicação da subjetividade do sujeito africano: a


primeira utiliza categorias marxistas e nacionalistas, fundamentadas na autonomia, resistência
e emancipação, para determinar a legitimidade do discurso africano autêntico. A segunda tem
ênfase na condição nativa, que promove a ideia de uma única identidade africana, cuja base é
o pertencimento à raça negra.

- Três eventos históricos centrais: a escravidão, o apartheid e o colonialismo.

- Processo de alienação identitária decorrente desses três eventos.

- A expropriação material resultou na falsificação da história da África pelo outro. A


expropriação e a violência da falsificação são os principais fatores que constituem a
singularidade da história africana e na tragédia na qual ela se baseia.

- Mbembe critica as duas correntes ideológicas de pensamento: a nativista e a


instrumentalista. Ele afirma que essas duas visões promoveram o aniquilamento do self
africano e propõe formas alternativas a essas ideias.

- Segundo Mbembe, a corrente marxista está permeada por vitimismo. Ele aponta quatro
inconsistências nessa abordagem: 1- falta de reflexividade. Abordagem útil se estiver a serviço
de luta partidária. 2- visão mecânica da história. Sempre é um ator externo que determina a
condição identitária do sujeito africano. 3- A crença de que a verdadeira identidade só pode
ser construída a partir de formação da classe operária, negando as múltiplas bases do poder
social.

- As narrativas marxistas e nacionalistas têm sido superficiais. Seu privilegiamento da


vitimização, em detrimento do sujeito, resulta de uma compreensão da história como
feitiçaria.

- Crítica à universalidade iluminista, cujos valores são considerados universais, dos quais
derivam direitos e valores que podem ser partilhados por todos. Logo, setores sombrios do
iluminismo não consideravam os africanos como humanos.

- Os três vetores do processo de domesticação seriam a conversão ao cristianismo; a


introdução à economia de mercado e a adoção de formas de governos racionais e iluministas.

- No paradigma pós-colonial da vitimização, considerava-se o africano como um sujeito


“castrado”, passivo instrumento do gozo do outro. Por trás da neurose da vitimização, uma
forma de pensar circular, negativa, xenófoba e racista se desenvolve. Ver a história como
feitiçaria.

=> Crítica ao nativismo


- Na história do ser africano, a raça é o sujeito moral, e ao mesmo tempo, um fato imanente da
consciência.

- A necessidade de provar a própria humanidade vem da negação da mesma pelo outro. Só


existe porque a humanidade lhe foi negada.

-Há o recorte racial da africanidade. Só é considerado africano que é negro. A identidade


cultural deriva da relação entre raça e geografia. O pan-africanismo, em particular, define o
“nativo” e o “cidadão” a partir de sua identificação com o povo negro.

- Mbembe aponta duas abordagens críticas às apresentadas anteriormente, que são


alternativas à elas:

1- Esforços para desconstruir a tradição, e assim, a própria África, demonstrando-se que essa
foi inventada. Deste ponto de vista, a África existe apenas sendo construída enquanto ficção
do outro.

2- A África enquanto uma identidade em formação. O mundo não é mais uma ameaça, mas
uma rede vasta de afinidades. Todos podem imaginar e escolher o que os torna africanos.

- A extrema desvalorização da vida leva a uma intoxicação, de forma tal, que o sujeito já não
sabe mais se está vivo ou morto. Como se pode resgatar a vida da incessante operação de sua
negação?

- Não há uma memória formal da escravidão. Apenas da ferida, domínio do inconsciente


psíquico (feitiçaria). (p.188)

- O silêncio da culpa da responsabilidade sobre a escravidão moderna, que não é apenas


resultado da vontade tirânica e da crueldade do outro. A morte do irmão pelo irmão.
Esquecimento.

- Critica a comparação aos judeus em campos de concentração. Mas afirma que as diásporas
são comparáveis, embora difiram nas formas de expressão. Inventando uma arte de existir, em
meio à espoliação.

- A crítica marxista e nacionalista subestimou a grande variedade da experiência africana da


conquista colonial. Os africanos deram respostas diferentes. O avanço colonial em direção ao
interior foi quase uma efervescente revolta escrava.

- A colonização foi uma co-invenção. Tanto foi resultado da violência ocidental quanto do
trabalho de seus auxiliares africanos em busca de lucro.

- A temática do anti-colonialismo se exauriu, mas a vitimização não foi transcendida.

- A unidade racial africana sempre foi um mito.

- Há várias identidades africanas, árabes, luso-africanos, etc.

- Muitas identidades raciais, muitos tipos de branquitude e negritude.

- Não há identidade sem territorialidade.

- A tradição, movimentos comunitários enquanto constituintes das identidades.

- A territorialidade é a focalidade em que relações próximas e diretas são reforçadas pelo


pertencimento à mesma matriz ou genealogia comum.
- A reivindicação de direitos enquanto construto da identidade. A alegação de uma identidade
ferida.

- O mercado também é um veículo para invocar a tradição. Particularmente no turismo e nas


políticas relacionadas a questões de herança.

- O estado de guerra na África contemporânea poderia ser concebido como uma experiência
cultural comum que molda identidades.

1- a zona de indistinção: quando o horror da guerra ultrapassa as fronteiras do caos,


onde tudo é possível. Construção de memórias traumáticas e terror. (p. 194)

2- dimensão sacrificial da guerra: pessoas enquanto obras de arte esculpidas pela


crueldade. O agente do genocídio busca a transcender a si próprio e inventar um novo
eu.

3- abolir, por meio da violência extrema da guerra, qualquer tipo de dívida em relação
a um passado.

- A religiosidade enquanto formadora de identidades:

1- O carisma

2- Registros sacrificiais

3- Domínios do milagroso

- Conclusão: A identidade africana não existe como substância. Ela é constituída de formas não
idênticas, móveis, reversíveis e instáveis. Não podendo ser reduzidas a uma ordem puramente
biológica, baseada em sangue, raça ou geografia. Nem ser reduzida à tradição. Apenas as
diversas práticas com as quais os africanos estilizam suas condutas podem dar conta da
densidade da qual o presente africano é feito.

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