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O Golpe civil-militar no Brasil

O Golpe de 1964 foi realizado por uma coligação de forças e interesses, composta
pelo grande empresariado brasileiro, por latifundiários – proprietários de grandes parcelas
de terras, e por empresas estrangeiras instaladas no país, sobretudo aquelas ligadas ao
setor automobilístico. A conspiração contou com a participação de setores das Forças
Armadas, aos quais a maioria da oficialidade acabou aderindo, diante da passividade da
liderança militar legalista, ou seja, aquela que era contra um golpe de força contra o
presidente eleito.
Acenando com o espantalho do comunismo, visto como sinônimo de regimes
violentos e totalitários, a Igreja Católica contribuiu para disseminar o medo do governo
de Jango entre a população e arrastou multidões às ruas, clamando por liberdade.
Manifestações que também serviram de justificativa para o golpe militar contra as
liberdades democráticas.
A situação da politica interna no Brasil criava todas as condições para um golpe,
mas o encorajamento do governo dos Estados Unidos talvez tenha sido fator decisivo para
que ocorresse de fato o golpe. Na preparação da tomada de poder, a diplomacia norte-
americana, comandada pelo embaixador dos EUA no Brasil, Lincoln Gordon,
praticamente coordenou a conspiração entre empresários e militares, dando garantia de
apoio material e militar.
Em 31 de março, as tropas golpistas começam a se deslocar de Minas Gerais para
o Rio de Janeiro. Na mesma data, teve início a Operação Brother Sam, da Marinha dos
EUA, para apoiar o golpe que iria derrubar o governo constitucional. Mas nem foi preciso,
pois a situação militar se resolveu internamente, pois não houve resistência organizada
aos golpistas.
Esboçou-se alguma resistência no meio sindical e no movimento estudantil,
entretanto, essa resistência foi desorganizada e desestimulada pela própria atitude de João
Goulart, que por saber da ameaça de intervenção estadunidense no país teria desistido de
resistir quando foi do Rio de Janeiro, local estratégico para a resistência, para Brasília e,
dali, para o Rio Grande do Sul. Ainda houve alguma discussão entre Jango e Leonel
Brizola se era possível resistir a partir do RS, mas o presidente não assumiu esta opção.
Como muitos outros, Jango achava que seria um “golpe passageiro”, e dali a alguns anos,
novas eleições seriam convocadas. Afinal, fora assim em 1945 e em 1954, por ocasião
das intervenções militares para depois Getúlio Vargas.
Desde o início a ditadura militar buscou ter um aparato legal, como forma de se
institucionalizar e de se legitimar perante a opinião pública, sobretudo a liberal, que tinha
apoiado a destituição de Jango. Nesse sentido, o golpe contou com apoio de setores
ancorados no Congresso Nacional e de juristas conservadores. Foi formalizado na
madrugada do dia 2 de abril, no Congresso Nacional, mas sem amparo na Constituição,
pois o cargo foi declarado vago enquanto o presidente continuava no território nacional e
sem ter renunciado nem sofrido impeachment. Somente numa dessas três circunstâncias,
além da morte, isso poderia acontecer.
O presidente da Câmara, deputado Ranieri Mazilli, foi empossado como
presidente interino. Os políticos golpistas tentaram assumir o controle do movimento,
mas foram surpreendidos: os militares não devolveram o poder aos civis, sinalizaram que
tinham chegado para ficar. Imediatamente criaram um Comando Revolucionário formado
pelo general Costa e Silva (autonomeado ministro da Guerra), o almirante Rademaker, e
o brigadeiro Correia de Melo.
Chamar a deposição de João Goulart de “golpe” ou de “revolução” revelava, e
ainda revela, a linha ideológica da pessoa. Para a direita, sobretudo militar, o que estava
em curso era uma revolução que iria modernizar economicamente o país, dentro da
ordem. Para a esquerda e para os setores democráticos em geral, não havia dúvidas:
tratava-se de um golpe de Estado, um movimento de uma elite, apoiada pelo Exército,
contra um presidente eleito. A historiografia convencionou chamar o acontecimento de
golpe, pelo caráter antirrevolucionário e antirreformista do movimento civil-militar que
derrubou Jango.
No dia 9 de abril de 1964, declarando que “a revolução vitoriosa se investe no
exercício do Poder Constituinte”, esse comando baixou o primeiro Ato Institucional, que
convocou o Congresso a eleger um novo presidente com poderes muito ampliados. No
mesmo dia, o Congresso, já amputado em 41 mandatos cassados, submeteu-se ao poder
das armas, elegendo o general Humberto Castelo Branco à presidência. Entre os
deputados federais cassados nessa ocasião, estavam Leonel Brizola, Rubens Paiva, Plínio
Arruda Sampaio e Francisco Julião.
O movimento militar dava, assim, seu primeiro passo. Um movimento que se
impôs com a justificativa de deixar o Brasil livre da “ameaça comunista” e da corrupção,
e que desde o início procurou se institucionalizar. Dessa forma, pretendia criar uma nova
“legalidade”, que evitasse as pressões da sociedade e do sistema político-partidário sobre
o Estado, considerado como um espaço de decisão política acima dos interesses sociais,
pretensamente técnico e administrativo, comandado pelos militares e pelos civis
“tecnocratas”.
Entretanto, o primeiro Ato Institucional já configurava o novo regime como uma
ditadura. Explicitamente afastava o princípio da soberania popular, ao declarar que “a
revolução vitoriosa como Poder Constituinte se legitima por si mesma”. Dessa forma,
concedeu amplos poderes ao Executivo para decretar Estado de sítio e suspender os
direitos políticos dos cidadãos por até dez anos; cassar mandatos políticos sem a
necessária apreciação judicial; também suspendeu as garantias constitucionais ou legais
de estabilidade no cargo, ficando assim o governo livre para demitir, dispensar, reformar
ou transferir servidores públicos.
Como consequência imediata, houve uma onda de cassações de mandatos de
opositores, de demissão de servidores militares e civis, e numerosas prisões. Nos
primeiros 90 dias, milhares de pessoas foram presas, ocorreram as primeiras torturas e
assassinatos. Até junho, tinham sido cassados os direitos políticos de 441 pessoas, entre
elas os dos ex-presidentes Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros, e João Goulart, de seis
governadores, 55 congressistas, diplomatas, militares, sindicalistas, intelectuais. Além
disso, 2.985 funcionários públicos civis e 2.757 militares foram demitidos ou forçados à
aposentadoria nesses dois primeiros meses. Também foi elaborada uma lista de 5 mil
“inimigos” do regime. A ditadura já começou implacável!
Retido de https://memoriasdaditadura.org.br/origens-do-golpe/

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