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Jean-Jacques Roubine

Introdução às
grandes teorias do teatro

Tradução:
André Telles

Jorge Zahar Editor


Rio de Janeiro
Título original:
Introduction aux grandes théories du théâtre
publicado por Editions Dunod, Paris

Tradução autorizada da edição francesa


publicada em 2000 por Nathan/HER,
de Paris, França

Copyright © 2000 Nathan/HER


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gravura de Jacques Callot, séc.xvn (Bibliothèque Nationale, Paris)

CIP-Brasil. Catalogação-na-fonte
Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ.

Roubine, Jean-Jacques, 1939-1990


R764i Introdução às grandes teorias do teatro / Jean-Jac-
ques Roubine; tradução André Telles. — Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Ed., 2003

Tradução de: Introduction aux grandes théories du


théâtre
Inclui bibliografia
ISBN 85-7110-708-4

1. Teatro francês — História e crítica — Teoria etc. 2.


Teatro — Estética. I. Título.

CDD 842.009
03-0436 CDU 821.133.1 -2 (09)
Introdução

Toda prática artística se desenvolve a partir de motivações teóricas


implícitas ou explícitas. Ao mesmo tempo toda teoria se alimenta da
prática por ela fundada. Elas contribuem mutuamente para sua evo-
lução e sua transformação. Mas, no teatro, existe teoria e teoria!
Em primeiro lugar, é preciso considerar uma heterogeneidade
fundadora: o teatro é ao mesmo tempo uma prática do ato da escrita
e uma prática de representação (interpretação, direção). As teorias
relativas ao teatro tendem ou visam a cobrir essa heterogeneidade,
elaborando corpos de doutrina que tomam por objeto ora o texto
dramático, ora a representação, às vezes ambas simultaneamente.
Essa simultaneidade, no entanto, está longe de ser sistemática.
Por razões ideológicas que abordaremos, as teorias do teatro na Fran-
ça, do século XVII até os anos 1880, são essencialmente poéticas. Seu
objeto principal é o texto da peça. Os textos relativos à representação
restringem-se à tecnologia do teatro. Limitam-se a explicar como, por
exemplo, realizar acontecimentos espetaculares,1 como declamar cor-
retamente o alexandrino trágico (tratados de dicção) etc. A mais
notável exceção a essa regra é evidentemente o Paradoxo sobre o ator,
de Diderot, que constitui provavelmente a primeira abordagem teó-
rica moderna da arte do ator (mas esse texto não será publicado antes
de 1830).
Nos anos 1880 produz-se uma transformação bem conhecida
dos historiadores do teatro: o advento do diretor? A partir de então,
vê-se multiplicarem as reflexões teóricas sobre sua arte, seus direitos e
seus deveres, ao passo que, ao mesmo tempo, observa-se uma rarefa-
ção dos discursos teóricos de vocação totalizante. A história do teatro
recente incitou os "doutos" da época moderna a serem mais modestos
que os Chapelain, d'Aubignac etc. que dominavam o teatro clássico.
10 Introdução às grandes teorias do teatro

Quanto aos dramaturgos, preocupam-se apenas em teorizar para seu


uso pessoal (Claudel). Aí também, surge uma notável exceção à regra:
a teoria de Brecht. Sua personalidade, sua competência múltipla de
crítico, esteta, dramaturgo e diretor lhe permitem cobrir com perti-
nência o conjunto dos campos em que a coisa teatral é elaborada.
Uma outra distinção deve ser feita. Há dois tipos de teorias, o
explícito e o implícito: o tipo explícito é formulado através de um
conjunto de textos diversos: dissertações, ensaios, prefácios, adver-
tências etc. Tem freqüentemente pretensões totalizantes, enunciando
uma teoria que deve valer para toda uma época e toda uma classe
social (por exemplo, o gênero dito sério, para a burguesia da segunda
metade do século XVIII, ou o drama romântico, para a geração "artis-
ta" da Restauração), e até mesmo para a eternidade (o aristotelismo
revisitado pelos "doutos" do século XVII).
Como seu nome indica, o tipo implícito dispensa a formulação
discursiva. Esta existe, mas dificilmente é perceptível e vale apenas
para seu autor. Vejam Marivaux: seu teatro pressupõe uma reflexão
teórica sobre as principais categorias dramatúrgicas que o consti-
tuem: o personagem, a ação, o cômico, o diálogo etc. Mas o autor de
Falsas confidencias, salvo engano, não formulou nenhuma reflexão a
esse respeito. Somos portanto obrigados a extrapolar e induzir a partir
de suas peças uma hipotética teoria com margem de interpretação e
de erro que tal procedimento supõe.
Uma Introdução às grandes teorias do teatro não podia então
deixar de ser, por evidentes razões materiais, fortemente seletiva. Era
preciso escolher o mais significativo. Era preciso também evitar o
caráter arbitrário de uma subjetividade, portanto fixar e formular os
critérios de seleção.
O primeiro consiste em falar de ura teatro que permanece vivo.
O campo é ainda bastante vasto, uma vez que se pode caracterizá-lo
como uma produção ininterrupta desde o início do século XVII. Não
cessamos de retornar à tragédia clássica e ao drama romântico; de
representar Molière, Marivaux e Labiche. Em contrapartida, é forço-
so reconhecer que o teatro da Idade Média não corresponde a esse
critério, constituindo apenas objeto de pesquisas eruditas. Eis por
que esta Introdução não o leva em conta — e não sem hesitação ou
tristeza! Porém, mais uma vez, escolher é eliminar...
Introdução 11

Mantivemos as doutrinas que fizeram escola, que mobilizaram,


mesmo através da polêmica, uma ou várias gerações de autores e de
práticos. Foram excluídas, além disso, é claro, aquelas fugazes teorias
implícitas, todas as que diziam respeito exclusivamente a seus auto-
res. O que não deve de maneira alguma ser assimilado a um juízo de
valor: Musset ou Claudel não são absolutamente autores de segundo
plano. Mas a doutrina deles é essencialmente elaborada para uso
pessoal. A partir dos anos 1880, optou-se por privilegiar as teorias da
representação. São as mais numerosas, as mais diversas, freqüente-
mente as mais interessantes. Soma-se a isso o fato de que a maioria
das obras que tratam do teatro moderno e contemporâneo fez antes a
opção inversa: é mais fácil, hoje em dia, informar-se sobre o teatro
segundo Ionesco ou Beckett do que sobre o teatro segundo Mnouch-
kine ou Bob Wilson.
O campo explorado é prioritariamente o do teatro francês. Mas
essa delimitação de tipo ideológico-geográfico perde quase toda a
pertinência no século XX: o teatro viaja, circula. Torna-se menos
europeu, isso quando não se abre às influências do Extremo Oriente.
As grandes teorias do teatro de nosso século são francesas (Copeau,
Artaud...), mas também russas (Stanislavski, Meyerhold...), inglesas
(Craig...), alemãs (Brecht...), polonesas (Grotowski, Kantor...) etc. O
critério da escolha deixa então de ser mecanicamente nacionalista,
passando a levar era conta a importância da ressonância que uma ou
outra dessas teorias puderam ter tido sobre a vida e a prática teatrais
francesas.
Trata-se enfim de uma introdução, e apenas de uma introdução.
Em outras palavras, são apresentadas as teorias em questão tentando
apreender a lógica de sua elaboração, de sua operacionalização. Po-
rém, não foi o caso de resumi-las em detalhe. Limitamo-nos a dar as
indicações indispensáveis para que o leitor pudesse compreender esta
introdução, para que pudesse se encontrar em um conjunto de textos
esparsos e nem sempre muito acessíveis. Uma introdução é apenas a
cartografia de um território mal explorado.

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