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Qualidade de vida no trabalho

Cibele Arrieiro de Oliveira Ribeiro


Leonor Natividade de Medeiros Campos

Resumo
Este artigo trata-se de um estudo exploratório que teve como procedimento de
pesquisa a revisão de literatura. Analisa a contribuição dada por alguns pesquisadores
no estudo do conceito de Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) e identifica as suas
dimensões. Os resultados ressaltam a necessidade de transformação do ambiente de
trabalho em um local aprazível onde possamos sentir satisfação e alegria na execução
das nossas atividades profissionais. A busca de literatura para a elaboração deste
artigo baseou-se em dados eletrônicos (BIRENE, LILACS, SCIELO), dissertações, teses e
livros. Quinze publicações foram elegíveis para inclusão nesta revisão. Não houve
critérios de exclusão de material, todos foram avaliados independentes de período.
Nas buscas, os seguintes descritores, em língua portuguesa, foram considerados:
“qualidade de vida no trabalho”, “saúde do trabalhador”, “pressão no trabalho” e
“satisfação no trabalho”.

Palavras-chave: qualidade de vida no trabalho; saúde do trabalhador; pressão no


trabalho; satisfação no trabalho.

Introdução
O trabalho tem grande importância social e psicológica para o ser humano. É no
trabalho que grande parte da vida é passada e, para a maioria dos indivíduos,
trabalhar não é uma opção, mas sim uma necessidade. No contexto em que vivemos,
o trabalho passa a ser fundamental, à medida que se configura como forma de
garantia de subsistência no contexto de mercado (Antunes, 1995). Mesmo que alguns
autores questionem a importância do trabalho na sociedade atual segundo Offe
(1989), ainda vivemos uma sociedade que depende do trabalho para construção de
bens.


Enfermeira graduada pela PUC Minas. Pós graduada em Enfermagem do Trabalho pelo CENEC/UNIUB
Minas Gerais. E-mail: cibelearrieiro@yahoo.com.br

Mestre em Psicologia pela UFSC e professora Assistente do curso de Enfermagem do Centro Universitário
Metodista Izabela Hendrix. Professora de Sociologia Pós-Graduação em Enfermagem do Trabalho
CENEC/UNIUBE. E-mail: leonornatividade@terra.com.br
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Handy (1976) acredita que a vida profissional está associada à vida humana como um
todo. O trabalho surge como uma forma de identidade, de construção do ser social.
Sayles & Strauss (1977) consideram o trabalho como sendo uma das coisas mais
importantes na vida do indivíduo. Salienta-se que a visão desses autores aborda tanto
o lado de consecução dos recursos materiais, através da remuneração do trabalho,
quanto o lado de realização individual e social.
Os estudos de Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) são, levando-se em conta essas
considerações, uma forma de se compreender o processo do trabalho e seus
impactos na vida do empregado, tanto no lado profissional – quer seja pela
produtividade, absenteísmo, turnover – quanto no lado pessoal – doenças, insatisfação,
conflitos internos dentre outros.
Diante dos reflexos da falta de qualidade de vida no trabalho, tanto sobre o indivíduo
quanto sobre a produtividade, os estudos sobre esse tema mostram-se tanto de
interesse dos funcionários quanto das empresas, bem como dos pesquisadores.
Por esse motivo, o estudo da QVT no setor produtivo de uma empresa tem lugar de
destaque, independentemente se o cenário econômico mostra recessão ou
crescimento, perda de poder aquisitivo ou aumento do desemprego. Desta forma, o
presente estudo tem objetivo de realizar uma revisão sistemática de artigos científicos
publicados em periódicos, com o intuito de mostrar "que a sociedade vive novos
paradigmas de modos de vida dentro e fora da empresa, gerando, em conseqüência,
novos valores e demandas de Qualidade de Vida no Trabalho" (FRANÇA, 1997).

Metodologia
Trata-se de um estudo de revisão sistemática, ou seja, um estudo retrospectivo
secundário que identifica, seleciona e avalia criticamente estudos primários,
transformando a informação em conhecimento, onde se pondera erros e acertos
destes estudos já realizados, fazendo-se um novo material a ser pesquisado. A busca
foi realizada em base de dados eletrônica (BIREME, LILACS, SCIELO, BDENF) e listas de
artigos de revistas de enfermagem, dissertações, teses e livros. Não houve critérios de
exclusão de material, todos foram avaliados, independentes de período, pois o estudo
revelou-se um tema recente, que traz, como conseqüência, resultados em aberto. Nas
buscas, os seguintes descritores, em língua portuguesa foram considerados: "qualidade
de vida no trabalho", "saúde do trabalhador", "pressão no trabalho" e "satisfação no
trabalho". Através deste processo de busca foram identificadas quinze publicações
potencialmente elegíveis para inclusão nesta revisão.

Origem e evolução
Determinar a origem da preocupação com a saúde no trabalho pode significar estudar
a origem da transformação da natureza pelo homem. Ou seja, a partir do momento
em que o ser humano se utiliza de ferramentas e cria métodos para aperfeiçoar sua
forma de subsistência, procurando de alguma forma reduzir seu esforço e diminuir seu
sofrimento, pode-se dizer que há embutido o conceito de saúde atrelado ao trabalho.
Ao longo da história é possível perceber diversas referências cujo foco é entender a
relação do indivíduo com o seu trabalho. Embora todos estes trabalhos possam ser
entendidos como essencialmente importantes para que o trabalho ganhe qualidade de

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vida, faz-se necessário destacar que o movimento de qualidade de vida no trabalho
possui origens formalmente delimitadas na história do pensamento administrativo. O
movimento conhecido com QVT tem suas origens formais vinculadas ao
desenvolvimento da abordagem sócio técnica. O movimento conhecido como Relações
Humanas, desenvolvida principalmente pelos estudos de Elton Mayo na Western Electric
e de Eric Trist no Tavistock Institute of Human Relations de Londres, foi um ponto de
partida para os estudos de QVT.
Eric Trist, Ken Bamforth dentre outros que trabalhavam no Tavistock Institute em 1950
estudaram variáveis que futuramente serviriam para desenvolver o conceito de QVT
(Vieira, 1996 e Ladeira & Garcia, 1997). MORAES e colaboradores (1996) apontam o
trabalho de Trist como um modelo que engloba indivíduo, trabalho e organização
visando a estruturação do trabalho assim como a satisfação dos funcionários.
Durante as décadas de 50 e 60 o movimento de pesquisa em QVT teve uma rápida
ascensão no meio acadêmico, principalmente nos Estados Unidos. Historicamente, esse
período coincide com o auge do fordismo e, concomitantemente, nessa época surgem
os grandes movimentos de reivindicação coletiva, com a expansão e consolidação do
movimento sindical (HELOANI, 1994). É possível que o crescimento do movimento
reivindicatório tenha influenciado parte das pesquisas e propiciado a expansão dos
estudos nesta área.
Ressalta-se que o conceito Qualidade de Vida no Trabalho surge somente na década
de 70 e é trabalhada por Louis Davis. Algum tempo depois da definição do conceito,
esse pesquisador criou o Center for Quality of Working Life na Califórnia, Estados
Unidos. Davis mantinha contato com os pesquisadores do Tavistock Institute e foi
influenciado pelas pesquisas que eles realizaram.
Antes da construção do conceito de QVT, diversos autores realizaram pesquisas que
envolviam o problema da motivação, satisfação e insatisfação no trabalho. Herzberg,
McGregor e Maslow são considerados como um segmento dos movimentos de
qualidade de vida no trabalho à medida que procuravam estudar fatores
organizacionais que funcionassem como incentivadores ou coibidores de motivação do
funcionário. Esses autores associam diretamente algumas condições de trabalho e
características individuais à produtividade (Vieira, 1996). O trabalho desses
pesquisadores serviu de base para diversos estudos posteriores sobre QVT
(CLUTTERBUCK & CRAINER, 1993, MORAES et. al., 1996 e VIEIRA 1996).
No início da década de 70, difundem-se os estudos e os centros de pesquisa sobre
qualidade de vida no trabalho nos Estados Unidos. Tantos os estudos quantos os
centros de pesquisa obtiveram apoio das empresas, do governo e dos sindicatos.
Durante essa época são constituídos o National Comission on Productivity e diversos
centros de pesquisa em QVT.
Concomitantemente ao desenvolvimento dos estudos sobre QVT e sobre produtividade,
via-se, no contexto Americano, fortes sinais de crise no sistema de produção em
massa (Mattoso, 1995). Aos poucos se instaura uma crise caracterizada pela
estagflação, pela instabilidade financeira e pela queda de produtividade, sendo
agravada na década de 70 pela crise do petróleo.
Durante a crise do petróleo os investimentos em estudos de qualidade de vida no
trabalho são reduzidos, tanto pelo governo quanto pelas empresas que passaram a

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focar na sobrevivência, deixando os interesses dos funcionários para um segundo
plano (VIEIRA, 1996).
Os estudos que QVT são retomados no final da década de 70, perdurando até os
dias atuais. Até o início da década de 80 muitas pesquisas e grupos de pesquisadores
se destacaram no panorama internacional dentro do que se pode considerar como
pertencentes formalmente ao movimento de QVT, tais como Hackman & Lawler (1971),
Walton (1973), Hackman & Oldhan (1975), Lippt (1978) e Westley (1979) que se
preocuparam em desenvolver e pesquisar, dentro de uma perspectiva funcionalista,
variáveis que pudessem significar a melhoria das condições de trabalho.
Limongi (1995) e Albuquerque e França (1997) consideram que a sociedade vive novos
paradigmas de modos de vida dentro e fora da empresa, gerando, em conseqüência,
novos valores e demandas de Qualidade de Vida no Trabalho. Para os referidos
autores, outras ciências têm dado sua contribuição ao estudo do QVT, tais como:
. Saúde – nessa área, a ciência tem preservar a integridade física, mental do ser
humano e não apenas atuar controle de doenças, gerando avanços biomédicos e
maior expectativa de vida.
. Ecologia – vê o homem como parte integrante e responsável pela preservação do
sistema dos seres vivos e dos insumos da natureza.
. Ergonomia – estuda as condições de trabalho ligadas à pessoa. Fundamenta-se na
medicina, na psicologia, na motricidade e na tecnologia industrial, visando ao
conforto na operação.
. Psicologia – juntamente com a filosofia, demonstra a influência das atitudes
internas e perspectivas de vida de cada pessoa em seu trabalho e a importância
do significado intrínseco das necessidades individuais para seu envolvimento com o
trabalho.
. Sociologia – resgata a dimensão simbólica do que é o compartilhado e construído
socialmente, demonstrando suas implicações nos diversos contextos culturais e
antropológicos da empresa.
. Economia – enfatiza a consciência de que os bens são finitos e que a distribuição
de bens, recursos e serviços deve envolver de forma equilibrada a responsabilidade
e os direitos da sociedade.
. Administração – procura aumentar a capacidade de mobilizar recursos para atingir
resultados, em ambiente cada vez mais complexo, mutável e competitivo.
. Engenharia – elabora formas de produção voltadas para a flexibilização da
manufatura, armazenamento de materiais, uso da tecnologia, organização do
trabalho e controle de processos.
No Brasil o assunto qualidade de vida no trabalho é um tema relativamente novo,
embora algumas pesquisas estejam sendo desenvolvidas, principalmente na
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Universidade Federal de Minas Gerais e na
Embrapa de Brasília, que já tem grupos de estudos sobre o tema constituídos há
vários anos.
Apesar de que os estudos sobre a QVT ainda serem escassos no Brasil, Vieira (1996)
cita várias pesquisas já realizadas, como a de Siqueira e Coleta (1989) com
trabalhadores de empresas industriais e comerciais de Uberlândia, MG; Rodrigues

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(1989) que investigou a qualidade de vida no trabalho a nível gerencial em indústrias
de confecções no Ceará; Fernandes e Becker (1988) investigaram a QVT nos CPDs;
Macedo (1992) diagnosticou a qualidade de vida e estresse em chefias de 12
empresas mineiras do setor público e privado; Tannhauser (1993) investigou as
contribuições reais e ideais do psicólogo organizacional para a melhoria da QVT dos
empregados; Moraes (1988) pesquisou a QVT dos administradores que atuam com
computador; Vieira (1993) investigou a QVT dos enfermeiros de um Hospital de Ensino
em Porto Alegre; Lima (1994) analisou a percepção dos operários de uma empresa de
construção de edificações em Porto Alegre sobre a QVT; Fernandes e Gutierrez (1988)
realizaram um estudo na empresa JH Santos de Porto Alegre, objetivando levantar os
fatores que contribuíram para a melhoria da QVT dos funcionários.
O objetivo principal dos programas de Qualidade de Vida no Trabalho são as
reformulações em nível do trabalho, visando garantir maior eficácia e produtividade e,
ao mesmo tempo, o atendimento das necessidades básicas dos trabalhadores. Walton
citado por Fernandes (1996:36), afirma que, quando adequadamente proposto, um
programa de QVT tem como meta gerar uma organização mais humanizada, na qual o
trabalho envolve, simultaneamente, relativo grau de responsabilidade e de autonomia a
nível do cargo, recebimento de recursos de "feedback" sobre o desempenho, com
tarefas adequadas, variedade, enriquecimento do trabalho e com ênfase no
desenvolvimento pessoal do indivíduo.

Tabela 1 – Evolução do conceito de QVT

CONCEPÇÕES
EVOLUTIVAS CARACTERÍSTICAS OU VISÃO
DO QVT
1. QVT como uma Reação do indivíduo ao trabalho. Investigava-se como
variável (1959 a 1972) melhorar a qualidade de vida no trabalho para o indivíduo.
2. QVT como uma O foco era o indivíduo antes do resultado organizacional;
abordagem (1969 a mas, ao mesmo tempo, buscava-se trazer melhorias tanto
1974) ao empregado como à direção.
3. QVT como um Um conjunto de abordagens, métodos ou técnicas para
método (1972 a 1975) melhorar o ambiente de trabalho e tornar o trabalho mais
produtivo e mais satisfatório. QVT era vista como sinônimo
de grupos autônomos de trabalho, enriquecimento de cargo
ou desenho de novas plantas com integração social e
técnica.
4. QVT como um Declaração ideológica sobre a natureza do trabalho e as
movimento (1975 a relações dos trabalhadores com a organização. Os termos
1980) "administração participativa" e "democracia industrial" eram
freqüentemente ditos como ideais do movimento de QVT.
5. QVT como tudo Como panaceia contra a competição estrangeira, problemas
(1979 a 1982) de qualidade, baixas taxas de produtividade, problemas de
queixas e outros problemas organizacionais.
6. QVT como nada No caso de alguns projetos de QVT fracassarem no futuro,
(futuro) não passará de um "modismo" passageiro.

Fonte: Nadler e Lawler apud Fernandes (1996, 42).

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Algumas das ferramentas para se avaliar o nível de satisfação dos trabalhadores em
relação à QVT são citadas por Rodrigues (1994), entre elas o modelo de HUSE &
CUMMINGS(1985), SHAMIR & SALOMON(1985), HACKMAN et alii(1975), WALTON (1973).
Entre essas ferramentas, destaca-se o modelo de Walton (1973) apresentado no
Quadro 1, pela amplitude dos seus oito critérios que afetam de maneira mais
significativa o trabalhador no seu trabalho, e que servem como base para uma
pesquisa, que pode ser feita através de um questionário ou entrevista com os
trabalhadores.
Para cada dimensão dos oito critérios pode ser adotada uma escala de valores que,
por exemplo, pode variar de 0 (Muito Insatisfeito) a 5 (Muito Satisfeito), onde o valor
médio de 2,50 significa uma posição de neutralidade por parte do trabalhador com o
critério ou dimensão considerada. Assim, pode-se obter a média das respostas quanto
às dimensões e a partir disso também a média em relação ao critério considerado.

Quadro 1 – Modelo de Walton para aferição da QVT

CRITÉRIOS DIMENSÕES
Renda adequada
1. Compensação justa e adequada Eqüidade interna
Eqüidade externa
2. Condições de trabalho Jornada de trabalho
Ambiente físico seguro e saudável
Autonomia
Significado da tarefa
3. Uso e desenvolvimento de capacidades Identidade da tarefa
Variedade da habilidade
Retroinformação
Possibilidade de carreira
4. Chances de crescimento e segurança Crescimento profissional
Segurança de emprego
Igualdade de oportunidades
5. Integração social na empresa Relacionamento
Senso comunitário
Respeito às leis e direitos trabalhistas
6. Constitucionalismo Privacidade pessoal
Liberdade de expressão
Normas e rotinas
7. Trabalho e espaço total de vida Papel balanceado do trabalho
Imagem da empresa
Responsabilidade social pelos
8. Relevância social da vida no trabalho serviços
Responsabilidade social pelos
produtos
Responsabilidade social pelos
empregados

Fonte: Walton, 1973

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As aborgens de qualidade de vida no trabalho no contexto atual
A qualidade de vida no trabalho está ganhando espaço dentro das organizações a
partir da atual reestruturação do trabalho, uma vez que solicita, cada vez mais, que o
trabalhador se identifique com a organização e trabalhe em equipe (Fleury & Fleury,
1997 e Nadler & Lawler, 1983). Lima (1995) salienta que as organizações estão,
atualmente, procurando formas de seduzir o funcionário e reduzir o conflito interno.
Talvez essa seja uma possibilidade de abertura para o desenvolvimento da qualidade
de vida dentro das organizações.
Ao mesmo tempo, percebe-se que têm sido incorporados novos conceitos e
perspectivas aos estudos de QVT, ampliando a forma como o indivíduo, a organização
e o trabalho são vistos sob esta corrente teórica. Questões como estresse
ocupacional, a inclusão de minorias e a gestão inclusiva, a questão do assédio moral,
responsabilidade social, sofrimento psíquico, doenças psicossomáticas, as lesões por
esforço repetitivo (LER) e os distúrbios osteomusculares relacionados com o trabalho
(DORT), o uso excessivo de tranqüilizantes e calmantes associados ao trabalho, (Selye,
1978; Ilmarinen, 1991; Dejours, 1992; Karazek, 1999; Dejours, 2000; Carayon, 2000;
Aldana, 2001; Pot, 2002, Gilioli et al., 2003; Limongi-França, 2004) dentre tantos outros
estudos da relação que se estabelece entre saúde e o espaço laboral.
O que se pode perceber de toda essa ampliação dos estudos de Qualidade de Vida
no Trabalho é que, cada vez mais, procura-se compreender não só o trabalho e o
espaço produtivo como um todo, mas o indivíduo que participa deste processo
também. Neste sentido, os estudos apontam que os programas de QVT caminham em
duas direções. Na primeira, no que tange o indivíduo que trabalha, as concepções
buscam compreender o ser biopsicossocial. Ou seja, entender o trabalho e as
questões biológicas (saúde física) psicológicas (saúde mental), sociais (saúde social)
(LIMONGI-FRANÇA, 1996, 2004 e 2005; ALBUQUERQUE & LIMONGI-FRANÇA, 1998).
Na segunda direção, estes autores observam que as preocupações sobre qualidade de
vida no trabalho têm extrapolado uma preocupação puramente legalista, no sentido de
cumprir o que a legislação determina de uma forma eminentemente burocrática e
adentrado na esfera estratégica, delineando a QVT como parte de uma estratégia
geral da organização com ênfase em resultados.

O que vem a ser, afinal, a Qualidade de Vida no Trabalho?


De acordo com Rodrigues (1994, p. 76),

a Qualidade de Vida no Trabalho-QVT tem sido uma preocupação do homem


desde o início de sua existência. Com outros títulos, em outros contextos,
mas sempre voltado para facilitar ou trazer satisfação e bem-estar ao
trabalhador na execução de sua tarefa.

Por ser considerado um tema ainda recente no Brasil, não há uma definição
consensual na literatura sobre o significado exato de QVT, mas o ponto comum a
todos é que

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a meta principal de tal abordagem volta-se para a conciliação dos interesses
dos indivíduos e das organizações, ou seja, ao mesmo tempo que melhora a
satisfação do trabalhador, melhora a produtividade da empresa (FERNANDES,
1996, p. 43).

Para Werther & Davis (1989:71)

os esforços para melhorar a qualidade de vida no trabalho procuram nos dar


cargos mais produtivos e satisfatórios. Embora sejam usadas muitas técnicas
diferentes sobre o título, a maioria dos métodos acarreta reformulação de
cargos, com a participação dos trabalhadores afetados.

De acordo com Vieira & Hanashiro (1990) o conceito de QVT é amplo e contingencial,
podendo ser definido como melhoria das condições de trabalho com extensão a todas as
funções de qualquer natureza e nível hierárquico, nas variáveis comportamentais, ambientais e
organizacionais que venham, juntamente com políticas de Recursos Humanos condizentes,
humanizar o emprego, de forma a obter-se um resultado satisfatório, tanto para os empregados
como para a organização. Isto significa atenuar o conflito existente entre o capital e o trabalho
(p.45).

Fernandes (1996) conceitua QVT como:

a gestão dinâmica e contingencial de fatores físicos, tecnológicos e sócio-


psicológicos que afetam a cultura e renovam o clima organizacional, refletindo-
se no bem-estar do trabalhador e na produtividade da empresa.

É preciso atentar para uma gama de fatores que, quando presentes numa situação de
trabalho, se refletem na satisfação e na participação do indivíduo, mobilizando suas
energias e atualizando seu potencial.
Desta forma, pode-se dizer que há fatores intervenientes na qualidade de vida das
pessoas quando em situação de trabalho. Dependendo de seu competente
gerenciamento, eles proporcionarão condições favoráveis, imprescindíveis ao melhor
desempenho e produtividade.
Ao se estudar a produtividade de uma empresa, não se pode, apenas, concentrar
atenção nos estudos sobre os processos de trabalho e na tecnologia a ser aplicada.
O fator humano é uma ferramenta relevante dentro deste processo; portanto, deve ser
dada a ele uma atenção toda especial.
Nos dias atuais, a preocupação das empresas está voltada para os aspectos que
possam ajudar o trabalhador a ter melhor qualidade de vida, também, no trabalho.
Nota-se que o mercado hoje está voltado para quem conseguir obter maior eficiência
em produzir mais, melhor e em menos tempo. Tudo isso sem prejudicar a saúde, no
sentido amplo do termo, dos funcionários que é fundamental ao processo produtivo.
Empresas que têm esse tipo de preocupação podem desfrutar de vantagens oferecidas
pela QVT, com o retorno do capital investido, ao tentarem proporcionar o melhor
ambiente de trabalho.

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Um dos fatores almejados pelas empresas atuais é a formação de uma imagem
positiva, em relação não só ao cliente interno como também ao externo. Uma boa
imagem a ser alcançada por uma empresa que procura proporcionar melhor Qualidade
de Vida no Trabalho poderá ser altamente benéfica para sua lucratividade, como
prêmio desse investimento.
A melhoria dos fatores físicos ou tangíveis nas condições de trabalho, tais como
flexibilidade de horário, modificação do local dos equipamentos, entre outros, pode
acarretar uma melhora de desempenho no trabalho.

Discussão
Com a necessidade do aumento da produtividade, as condições de trabalho
começaram a ser analisadas, no século XVIII por economistas liberais e posteriormente
pelos teóricos da Administração Científica no século XIX.
Apesar de tais estudos levantarem a questão, a expressão Qualidade de Vida no
Trabalho – QVT só apareceu na literatura no início do século XX através de
importantes pesquisadores, dentre eles: Walton(1973), França(1996) e Rodrigues(1994),
sendo este termo utilizado inicialmente para representar a satisfação do trabalhador
no ambiente de trabalho e na tentativa da melhoria das condições de trabalho.
Porém, com os trabalhadores convivendo com uma rotina diária cada vez mais
desgastante e massacrante, onde o único objetivo do empregador é a produtividade
gerando lucro, neste contexto, a definição exata de Qualidade de Vida no Trabalho,
nos tempos atuais, se torna mais desafiador.
Contudo, a conceituação do que é Qualidade de Vida no Trabalho – QVT se torna
uma tarefa muita difícil pela sua abrangência, seu caráter subjetivo além de sua
complexidade, pois a Qualidade de Vida de um trabalhador depende de fatores
intrínsecos e extrínsecos os quais variam de pessoa para pessoa, sendo esta sujeita à
influências do cotidiano deste trabalhador, do local onde ele vive,de seu estilo de vida
além de seus hábitos, onde estes fatores independem das políticas adotadas pelas
empresas.
De acordo com Rodrigues (1994:76), "a Qualidade de Vida no Trabalho – QVT tem
sido uma preocupação do homem desde o início de sua existência. Com outros
títulos, em outros contextos, mas sempre voltados para facilitar ou trazer satisfação e
bem-estar ao trabalhador na execução de sua tarefa".

Considerações finais
A construção do conceito Qualidade de Vida no Trabalho pode ser visto como um
indicador da qualidade da experiência humana no ambiente de trabalho. Trata-se de
um conceito estreitamente relacionado à satisfação dos funcionários quanto à sua
capacidade produtiva em um ambiente de trabalho seguro, de respeito mútuo, com
oportunidades de treinamento e aprendizagem e com o equipamento e facilidades
adequadas para o desempenho de suas funções. Um bom lugar para se trabalhar
possibilita, entre outras coisas, que as pessoas tenham, além do trabalho, outros
compromissos em suas vidas, como a família, os amigos e os hobbies pessoais.

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A incorporação da QVT nas organizações que passamos a maior parte de nossas
vidas, naturalmente seria transformada em lugares mais prazerosos e saudáveis para a
execução do nosso trabalho. Locais onde pudéssemos, de fato, passar algumas horas
vivendo, criando e realizando plenamente – com qualidade de vida, satisfação e
alegria.

Abstract
This abstract is about an exploratory study which had as procedure of research a
literature revision. It is analyzing the contribution which was given for some researchers
in the study of the concept of Life Quality at Work (LQW) and it is also identifying its
dimensions. The results underline the necessity of transformation into the work
environment in the way to be this local a pleased place where people can feel
satisfaction and happiness while executing their professional activities. The search for
literature to elaborate this article was based in electronic datas (BIRENE, LILACS, and
SCIELO), dissertations, thesis and books. It was fifteen publications the electable to be
included into this revision. It was not a criterion of material exclusion and all of them
were evaluated independently of the period. In the searches the following
descriptioners, in Portuguese language, were considered: life quality at work, worker
health, pressure into work and satisfaction into work.

Keywords: life quality in work; worker health; pressure into work; satisfaction into work.

Résumen
Este artículo habla de un estudio exploratorio que tuvo como procedimiento de
pesquisa la revisión de literatura. Analisa la contribuición dada por algunos
pesquisadores en el estudio del concepto de Calidad de Vida en el Trabajo (CVT) y
identifica sus dimensiones. Los resultados resaltan la necesidad de transformación del
ambiente de trabajo en un local agradable donde nosotros puedamos sentir
satisfación y alegría en la execución de nuestras actividades profesionales. La
búsqueda de literatura para la elaboración de este artículo fue baseada en datos
electrónicos (BIRENE, LILACS, SCIELO), disertaciones, teses y libros. Quince
publicaciones fueron elegidas para la inclusión en esta revisión. No hubo criterios de
exclusión de material, todos fueron avaluados independientes del período. En las
búsquedas, los siguientes escritores, en lengua portuguesa, fueron considerados:
“calidad de vida en el trabajo”, “salud del trabajador”, “presión en el trabajo” y”
satisfación en el trabajo”.

Palabras clave: calidad de vida en el trabajo; salud del trabajador; presión en el


trabajo; satisfación en el trabajo.

Referências

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