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UNIVERSIDADE FEDERAL DE CAMPINA GRANDE

CENTRO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES


UNIDADE ACADÊMICA DE CIÊNCIAS SOCIAIS

ALLISSON BRUNO BANDEIRA DOS SANTOS

TORCIDAS ORGANIZADAS E A MANCHA AZUL: “A MAIOR DO SERTÃO PARAIBANO”

CAJAZEIRAS - PB
2022
ALLISSON BRUNO BANDEIRA DOS SANTOS

TORCIDAS ORGANIZADAS E A MANCHA AZUL: “A MAIOR DO SERTÃO PARAIBANO”

Projeto de Pesquisa apresentado à disciplina Projeto


de Pesquisa IV, do Curso de graduação e Licenciatura
Plena em História, da Universidade Federal de
Campina Grande Orientador: Prof. Dr. Matheus
Maria Beltrame

CAJAZEIRAS-PB
2022
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO...................................................................................................................4
2. JUSTIFICATIVA E REFERENCIAL TEÓRICO...........................................................................7
3. ONJETIVOS GERIAS E ESPECÍFICOS...................................................................................11
4. METODOLOGIA................................................................................................................12
5. CRONOGRAMA DE ATIVIDADES.......................................................................................17
6. REFERÊNCIAS...................................................................................................................18
7. ANEXO I...........................................................................................................................19
INTRODUÇÃO

A presente pesquisa pretende explorar o fenômeno das torcidas organizadas, um


tema instigante para diversos campos da teoria social. Ao longo do século XX, o futebol
profissional se expande e torna-se um fenômeno esportivo de dimensões planetárias, se
distinguindo dos demais esportes por atrair uma massa de espectadores, torcedores
coletivos, que tem no clube a representação de sua vontade torcedora, de sua identidade e
de sua paixão. As torcidas organizadas tem sua emergência, ou melhor, sua fase mais
significativa, nos fins dos anos 60, onde uma nova etapa do futebol profissional se afigura
com o surgimento de torneios de alcance nacional junto com a transmissão televisionada dos
jogos. Estas reclamavam para si direitos de representatividade, questionando as decisões
administrativas dos clubes que mostravam tornar-se de caráter burocrático e autoritário.
Nesse momento, as torcidas organizadas se mantinham distantes do aparato
burocrático dos clubes, como força de contestação, e se aproximavam dos movimentos
sociais de bairros, fábricas, afirmando sua existência como uma instituição de caráter popular,
contemporaneamente inseridas num contexto de repressão política que predominava nos
longos “anos de chumbo”. Nesse contexto, surgia a Gaviões da Fiel, em 1969, como um novo
tipo de associação, questionando as práticas anteriores do torcer coletivo em apoio
incondicional aos clubes e seus dirigentes, transformando assim o torcedor em parte
constitutiva de um grupo, que reclamava participação e contestava as formas administrativas
do clube, constantemente vinculadas a organizações políticas externas ao futebol e mais
próximas dos partidos políticos em um período de forte repressão da ditadura de 64. Esta
iniciativa partia de grupos de jovens torcedores, na maioria estudantes.
Uma cena que representa a formação destes grupos se encontra nas caravanas
realizadas de um estado a outro, inicialmente entre o eixo Rio-São Paulo, ocupando espaços
para além dos estádios, passando a circular em território nacional. O estabelecimento de
vínculos comunitários no interior da prática futebolística passa a possibilitar então ao antigo
torcedor um certo grau de consciência e questionamento diante da sociedade a qual está
inserida, compartilhando entre si histórias, símbolos, linguagens dotadas de características
próprias ao lócus torcedor. Partindo do futebol, novas formas de identidades coletivas
surgiam através de suas respectivas torcidas, sobretudo no ambiente urbano dos anos 70, em
um cenário de repressão, censura, e grande migração para os centros urbanos por motivos
da expansão dos polos industriais no eixo Rio-São Paulo. O futebol também passaria por
momentos de exclusão, quando não de segregação dos torcedores das camadas mais baixas,
com os processos de mercantilização do esporte, a criação das “novas arenas” e suas
transações, influenciando diretamente no modo de comportamento dos torcedores como
resultado de uma forma milionária no modo de gerir o futebol a nível mundial. Tal fato
significou a perda direta da influência das torcidas diante das decisões de seus clubes.
Tivemos também uma tentativa de criminalização das torcidas organizadas, tanto pelo
sistema judiciário, via promotoria pública, como pela mass media via influência da opinião
pública, sempre noticiando manchetes negativas em relação as torcidas. Posturas reativas a
este processo de mercantilização do futebol começam a se expressar de forma persuasiva e
não apenas de forma passiva. Se nos anos 60 o movimento era de contestação, nas suas
origens, com o advento do futebol em terras brasileiras nos anos 20 e 30 ocorria de modo
diverso. Examinemos os momentos históricos desse fenômeno.
Seção I: os primórdios das torcidas organizadas

Com a massificação do futebol nos decorridos anos de 30, 40, e 50, despontam neste
cenário as primeiras entidades torcedoras, mais conhecidas como “Torcidas Uniformizadas”,
quase que de formas espontâneas, muitas vezes nomeadas também de “Charangas”. Eram
compostas por orquestras musicais que faziam a animação das partidas, ocupando as
arquibancadas e guiadas pelo líder de torcida em seus hinos e performances. Observa-se
então que as torcidas organizadas compõem duas fases históricas: a primeira surge nos inícios
dos anos 40, já mencionadas acimas, as “uniformizadas” ou “charangas”. Eram compostas de
pequenas orquestras musicais que animavam as partidas sob a orientação de um líder, este
tendo a função de “chefiar” o grupo, amenizar as reclamações e críticas ao clube e seus
jogadores e sustentar apoio incondicional ao clube. Neste momento se inicia uma cultura de
massas no Rio de Janeiro em torno do futebol.
Essa massificação reflete no ambiente urbano e demanda edificações esportivas e a
criação de locais próprios para os atos comemorativos e carnavalescos ligados ao mundo do
futebol, sobre tudo na então capital do país. Neste momento, estavam umbilicalmente
ligadas aos respectivos times e ao jornalismo esportivo, também surgindo de forma
autônoma diante deste fenômeno, chegando inclusive a se criar a Competição de Torcidas,
em 1936, por Mário Filho no seu Jornal dos Sports. Em suas crônicas, este ressaltava a
ascensão do negro nesse esporte de origem bretã, prática até então elitizada e praticada
apenas por ingleses e filhos de imigrantes de classe média e alta, mas que ganharia
características nacionais típicas do seu povo, apropriando-se desse esporte e considerando
assim uma espécie de emancipação do negro nesta sociedade. Esse é o primeiro momento
do aparecimento da organização de torcedores na defesa pelos seus times fora de campo, o
ato de torcer estando intrinsecamente ligado ao ato de jogar.
Seção II: as primeiras “organizadas”.
Os anos 60 e 70 são o segundo momento deste recorte temporal, quando são
formados os elementos constitutivos para a transformação das “charangas” em “Torcidas
organizadas”, com o advento de jovens torcedores, questionando a unidade acrítica das
charangas, como todo o aparato institucional dos clubes, cada vez mais inseridos na lógica
mercantilista sob forma de transações milionárias, iniciando todo um ciclo de dissidências
dentro do modelo formal posto até então. Reclamavam fundamentalmente maior autonomia
perante aos clubes. Neste momento, o futebol ganha amplitude diante dos campeonatos
nacionais, junto ao advento da televisão, influenciando em mudanças de formas e grandezas
dos clubes e refletindo em seu público, levando ao fracionamento de diversas torcidas antes
homogeneizadas e ao fim do apoio incondicional as instituições clubísticas, ainda que
unificados pela paixão torcedora. Agora sob formas de protestos, contestações e reclamações
de suas insatisfações diante do distanciamento dos clubes, reflexo também de todo um
cenário econômico, cultural e político. Surgem assim a Poder Jovem do Flamengo, desde 1967
e se oficializando em 1969, em 1969 a Poder Jovem do Botafogo se tornaria Torcida Jovem, a
Força Jovem do Vasco da Gama, criada em 1969 e oficializada em 1970, e a torcida Young-Flu
em 1970. Em breves linhas, pode-se considerar a emergência dessas torcidas em um período
de regimes ditatoriais extremamente repressivos, com forte censura e combate direto a
qualquer manifestação de insatisfação com órgãos burocráticos e autoritários, considerando
o futebol um dispositivo usado pelas instituições estatais para construir uma imagem benéfica
para o Brasil, convencional para ocultação das tensões contidas em uma sociedade instável e
dominada pela violência.

Seção III – O panorama Latino-Americano.


Se a exposição contida até aqui limita-se ao caso da ascensão das torcidas organizadas
no Brasil, em um recorte temporal específico, não pode prescindir das experiências contidas
em todo território latino-americano, que também pertence a este movimento e com
características semelhantes, apesar de conter também suas peculiaridades. Quando se trata
deste esporte, este continente apresenta suas singularidades em contraposição às práticas
futebolísticas em seu país de origem, a Inglaterra, como também no outro polo americano,
mais ao norte. A introdução deste esporte, sobretudo como parte do ideário da modernidade
e civilização na América Latina durante a segunda metade do século XIX e inícios do século
XX, são resultados de um modo de penetração econômico-cultural imperialista
predominantemente das ilhas britânicas sobre a região, mas também através de outros
contingentes vindos da Europa nos processos migratórios deste período.
O futebol torna-se também esporte de massas nos países platinos, como Argentina,
Uruguai, limitando assim a influência dos Estados Unidos do ponto de vista da cultura
esportiva. Circuitos de campeonatos continentais e mundiais também são criados para
abarcar a massificação do público, como a Copa América, criada em 1975, havendo o
deslocamento de torcidas em âmbito intercontinental. Em cada um dos respectivos países as
torcidas ganham nomenclaturas próprias e estéticas singulares, como por exemplo as
“Hinchadas” ou “Barras”, de origens platinas.
O futebol, considerado um ato de sublimação da criatividade humana, existe dentro
de relações sociais contraditórias, e diversos fatos históricos demonstram que ela não
prescinde da violência. Diante das conotações civilizatórias contidas neste esporte moderno,
as multidões que acompanham e declaram suas paixões pelos seus respectivos times são
objetos de estudos históricos e sociológicos, sobretudo dos fenômenos que ultrapassam a
pedagogia do esporte e transformam-se em conflitos.
Seção IV – A mancha.

Este trabalho se deterá na investigação histórica da Torcida Organizada “Mancha


Azul”, da cidade de Cajazeiras-PB. Situá-la nesta trama, conhecer suas tipificações e
manifestações, sem pretensão de nenhum enquadramento estático ou qualquer
esquematização de forma prévia é interesse deste trabalho. O caminho a ser percorrido será
inicialmente a análise teórica do fenômeno das torcidas organizadas. Em seguida
analisaremos brevemente também as raízes históricas do futebol e sua função social na
formação da identidade nacional, tendo o fenômeno das torcidas ligação intrínseca a este
esporte, o clube como vontade e representação do torcedor.
Para melhor compreensão do objeto de pesquisa, também há a pretensão de
percorrer a história do futebol em Cajazeiras, para situarmos as origens do time Atlético de
Cajazeiras, fundado no ano de 1948. Por último, mas não menos importante, e sendo o objeto
central desta pesquisa, o trabalho pretende percorrer e registrar a história da torcida
organizada Mancha Azul, que tem suas origens nos anos de 2002 e mantem-se fervorosa até
os dias de hoje, denominando-se a “Maior do Sertão”, como mais uma contribuição no acervo
antológico deste fenômeno.

JUSTIFICATIVA E REFERENCIAL TEÓRICO

I: Permeando a Teoria
O mundo do futebol e das torcidas organizadas, são observados de formas distintas
por diversos campos das teorias sociais. No campo da prática futebolística, boa parte da
opinião hegemônica tenta enquadrar o fenômeno das torcidas organizadas nas normas
jurídicas de punição, como se essas fossem potencialmente violentas e oferecessem riscos à
sociedade, suprimindo cada vez mais do espetáculo do futebol as manifestações do torcer e
suas representações. Observa-se, ligeiramente, que essas agremiações não se deixam vencer
nem pelas malhas da normatividade jurídica, nem pelas tentativas de apropriação do
mercado, em compasso com a elitização do futebol e a conversão desse esporte em
commodities, transformando o torcedor em mero consumidor e suprimindo-o do lócus do
torcer. Pelo menos não completamente e não com total passividade.
O jornalismo esportivo que impera nos principais canais esportivos demonstra sua
parcela de contribuição no enquadramento da vontade torcedora nos dois aspectos
mencionados acima. Por outro lado, essas formas coletivas de torcer estão amparadas, por
vezes mecanicamente, em teorias cientificistas que objetivam exaurir e explicar
definitivamente este fenômeno, como se esta vontade se cristalizasse em conceitos que não
permitissem plasticidade a compreensão da dinâmica, do movimento persistente das práticas
torcedoras. O próprio objeto desta pesquisa procura não se submeter acriticamente a
nenhum enclausuramento unilateral, a normas definidas e estruturas hierarquizantes dentro
e fora dos clubes a que pertencem no mundo futebolístico.
Coexistem com as ideias mencionadas, tradições teóricas que fogem do elitismo ou
das considerações pejorativas simplistas que tentam definir as manifestações culturais das
torcidas como sintomas patológicos e movimentos de violência, incluindo-as na cultura
popular, como tentativa de fuga dos padrões de consumo dominante e dos meios de
comunicação de massa.
O tema é tratado por diversas correntes de pensamento das Ciências Humanas e
Sociais, como o Marxismo, a psicologia e o jornalismo. Desde a Escola de Frankfurt, com as
teses da indústria cultural e cultura de massas, considerando o universo futebolístico como
instrumento de controle do sistema político-econômico vigente, à Gramsci e a teoria da
dominação de classe através dos conceitos de hegemonia e consenso, e cultura popular. De
Freud e a psicanálise, para a compreensão do fenômeno do inconsciente nas multidões e do
escoamento pulsional da agressividade, ao Jornalismo, onde ressalta os excessos de
demonstração de fervor e altruísmo de forma pejorativa, concomitante com os incidentes
internacionais ocasionados por grupos denominados de hooligans, passando a registrar os
fenômenos da torcida organizada como patologia e de forma sensacionalista, amparado em
estereótipos eurocêntricos, tendo estas premissas recepções acríticas da mídia esportiva.
Nem todas as concepções citadas fazem uso de um trato metodológico que prescindem de
critérios morais e juízos de valor, ora superestimando o que é popular, ora subestimando,
divergindo entre as potencialidades e limitações de tais movimentos.

Examinando este agrupamento no âmbito da sociedade capitalista, Benedito Tadeu


César, em sua dissertação de mestrado: os gaviões da fiel e a águia do capitalismo: ou O duelo,
recolhia-se diante da produção cultural que até então estava sob bases fincadas na Escola de
Frankfurt e seus intelectuais, como Marcuse e Adorno, com suas posições acerca da Indústria
Cultural e sua teoria da transformação da cultura em bens de consumo. Tratava de analisar
as funções reprodutoras do lazer diante do tempo livre de uma sociedade proletarizada ao
máximo, restando apenas objetos de massificação cultural apropriadas e transformadas pela
indústria, como forma ideológica das classes dominantes de subjugação e alienação sob as
bases do Estado. Essa posição direcionava os esportes para apenas mais uma instituição
reprodutora da ideologia dominante. Dessa forma, os Frankfurtianos chamavam a atenção
para uma falsa compreensão de que haveria produção cultural emanada do povo. Este seria
o cerne deste pesquisador, mas não resumia este fenômeno ou estabelecia a análise apenas
sob esta perspectiva, sobretudo no mesmo campo do marxismo.
Em um trabalho recente, Hévilla Wanderley Fernandes, da UFPB, sob o título: Não é
apenas um jogo: A questão nordestina no futebol, é feita uma análise a partir das categorias
teóricas do filósofo italiano Antônio Gramsci, com o qual nos interessa nesta pesquisa
dialogar. Em linhas gerais o trabalho de Fernandes procura mostrar como, considerando um
estado de classe, Gramsci reflete sobre a articulação entre os:

aparelhos repressivos do Estado, buscando explicar a articulação entre esses


aparelhos e os ‘aparelhos privados de hegemonia’ (escolas, universidades,
bibliotecas, museus, jornais, sindicatos, partidos, igrejas etc., que órgãos
responsáveis pela formação de um consenso), apresentando assim os termos
da sociedade política e da sociedade civil em relação de unidade-distinção.
(WANDERLEY, 2020, p. 23)
Neste sentido a expansão da classe dominante, não é apenas resultado de força, mas
antes resulta também na universalização de seus interesses, ocorrendo processos de
assimilação, mesmo que de forma subordinada, das classes subalternas. Trata-se da
delimitação do conceito de hegemonia. Para que a dominação de classe se efetive seria
preciso a incorporação dos fenômenos e instituições sociais dos grupos subalternos para sua
expansão em classe dirigente, resultando em uma articulação de coerção e consenso. O
futebol, que abarca uma quantidade imensa de adeptos, torna-se um fenômeno de massas,
e assim um instrumento para o consenso, mas não perdendo sua natureza de cultura de
massas, se estendendo para todo o tecido social.
A autora dá importância, sobretudo, a produção teórica crítica as teses de Frankfurt
baseadas numa anulação total de qualquer positividade dos fenômenos culturais advindo das
camadas populares. Seria preciso então entender as origens históricas para a compreensão
da transformação do fenômeno popular em massificação. Esta assimilação não aconteceria
de forma simples, ou de forma passiva, como supostamente incorre as teses da Escola de
Frankfurt. Para a autora:
Pensar o futebol enquanto fenômeno de massas, a partir do conceito de
hegemonia, significa trazer a análise para uma perspectiva de classe ao
procurar pensar a cultura, e especialmente a cultura popular, como um
espaço que faz parte do processo de dominação cultural no interior do
Estado capitalista, lembrando que este é um organismo de classe que se
sustenta sobre o equilíbrio instável das relações sociais antagônicas. Através
desse olhar, pensa-se como a cultura de massas é capaz de dar legitimidade
social para a construção de consensos, ou seja, ser responsável pela
consolidação da hegemonia (WANDERLEY, 2020, p. 116)

Por outro lado, a autora ressalta, a partir de suas pesquisas fundamentadas na


produção teórica de Martin-Barbero, a precaução de incorrer numa positividade acrítica da
cultura popular advinda dos grupos subalternos pela esquerda, principalmente quando há o
resgate da cultura popular em momentos de crise(WANDERLEY, 2020, P. 116).
Seria preciso assim prescindir de uma abordagem maniqueísta, no exame tanto das
limitações quanto das potencialidades da cultura popular, praticando um afastamento do
objeto diante de uma abordagem de um populismo ufanista, que considera qualquer
movimento ou fragmento da cultura popular como definitivamente positivo.
II) Hooliganismo e torcidas organizadas

Com a manifestação de demonstrações excessivas das paixões clubistas presenciadas


entre os anos 70 e 80, uma série de pesquisas também trataram de analisar esse fenômeno,
agora sobre o viés estritamente negativo. Os ocorridos provocados pelas torcidas britânicas,
como a “tragédia de Heysel”, os Hooligans, repercutiam em escala mundial, dando origem a
diversas correntes de pensamento que tratariam do tema pejorativamente com bases nesses
eventos. Na tese de doutorado: O clube como vontade e representação, Bernardo Borges
Buarque de Hollanda assim define essas novas formas de abordagem do tema: “Diante dos
princípios morais requeridos pelos esportes, a existência deste personagem no futebol
moderno parecia a muitos um contrassenso, um anacronismo, um aparecimento
extemporâneo” (HOLLANDA, 2009, P.30).

Rememorando o caráter fleumático do esporte postos pelos ingleses, as novas


abordagens que tratavam esses fenômenos de forma negativa demonstram um certo
saudosismo pela “idade do ouro”, o início da prática futebolística. O autor ressalta a
desconsideração do momento político e social inglês nos anos 80 por esta abordagem, diante
das retrações de emprego e seu efeito nas classes trabalhadoras diante do governo Thatcher.
A partir do viés irracionalista que agora são atribuídos a esse movimento, se estabelece o
interesse do tema por parte da Psicologia e suas observações sobre as multidões.
As torcidas organizadas seriam examinadas diante de um cenário de urbanização
crescente, como também a profissionalização do futebol, atingindo os interesses afetivos
pelos torcedores diante de um utilitarismo, com interesses monetários por parte dos clubes
com funções mercadológicas, tendo as paixões clubísticas desses torcedores entrados em
forte contradição com o apartamento e a mercantilização dos seus times, resultando na perda
direta da torcida com o vínculo clubístico. Assim evoca-se uma posição refratária e insurgente
diante de tais mudanças “com inclusão da violência e do culto a força física nesse horizonte
de descontentamentos” (HOLLANDA, 2009. P.37.).
No artigo A psicologia da torcida, de Jacques Akerman, aborda-se o fenômeno das
torcidas organizadas sob o aparato teórico de Freud, diante da análise das identidades de
grupo influenciados por um líder para a compreensão do movimento das multidões. Através
da premissa de que o ser humano age segundo processos psíquicos inconscientes:
Há em Freud dois eixos de investigação que podem lançar luz sobre o
comportamento das torcidas de futebol. Um primeiro diz respeito à noção
de “narcisismo das pequenas diferenças” em que, Freud, no texto “O mal-
estar na civilização”, ao discutir a questão da agressividade como ameaça à
civilização, apresenta a hipótese de que a possibilidade de satisfação da
pulsão agressiva pode tornar mais fácil a coesão entre os membros de uma
comunidade. Esta coesão apresentaria uma forte tendência de escoamento
pulsional e daria à multidão, sob a forma de hostilidade ao diferente, grande
potência aglutinadora (AKERMAN, 2004)

Este pensamento estaria presente neste livro, onde ressalta o “narcisismo das
pequenas diferenças”, para demonstrar como essas comunidades se opunham para rivalizar-
se, característica também presente nas rixas entre as torcidas organizadas(Hollanda, 2009.
P.38)
É diante desse aparato teórico que se pretende “iniciar” esta pesquisa. Partindo destes
aportes faremos uma imersão em um mundo repleto de produções conflituosas e
divergentes. Diante da infinidade de pesquisas relacionadas ao tema no âmbito acadêmico,
ainda se mantém viva o senso comum do fenômeno das torcidas organizadas como patologia
ou grupos unicamente destinados à prática da violência, demonstrando ser ainda um
problema não resolvido ou que permite certas vulgarizações, sobretudo quando são
reproduzidas pela mídia esportiva, um dos principais instrumentos de consenso quando se
trata do tema. Esta pesquisa tem a pretensão de entender o movimento analítico que busca
compreender um pouco mais um objeto não estático e que é tanto tratado de forma
maniqueísta. A pretensão é analisar a torcida local “Mancha Azul” à luz de aportes teóricos
que tratam do tema, contribuindo para que esta organização ganhe também espaço no
estudo antológico do assunto.
O futebol, considerado um ato de sublimação da criatividade humana, existe dentro
de relações sociais contraditórias, e diversos fatos históricos demonstram que ela não
prescinde da violência. Diante das conotações civilizatórias contidas neste esporte moderno,
as multidões que acompanham e declaram suas paixões pelos seus respectivos times são
objetos de estudos históricos e sociológicos, sobretudo dos fenômenos que ultrapassam a
pedagogia do esporte e transformam-se em conflitos.

OBJETIVOS GERAIS

Analisar o fenômeno das torcidas organizadas à luz da produção teórica relevante no


âmbito acadêmico a fim de compreender a função social destas instituições e suas práticas e
o impacto de seus movimentos na sociedade brasileira. Esta análise será objetivada para a
compreensão e produção historiográfica sobre a torcida organizada Mancha Azul.

OBJETIVOS ESPÉCIFICOS

● Analisar a produção teórica sobre o fenômeno das torcidas organizadas pela


comunidade acadêmica, situando dentro deste esporte as origens e funções sociais
das torcidas organizadas.

● Explorar as origens do futebol, suas práticas e sua função social na sociedade


Brasileira, direcionando progressivamente o caminho da pesquisa a regionalidade do
futebol cajazeirense.

● Pesquisar, a partir de fontes documentais e orais a história da torcida organizada


“Mancha Azul”, contribuindo para o acervo histórico e analítico desta entidade.
METODOLOGIA

I: O método dialético

Ao contrário de Parmênides, onde o não-ser não existe e o movimento é uma ilusão,


Heráclito traz para o ser a fluição. O real não é o imutável, mas o movimento que jamais cessa
e que tudo está em transformação constante. A realidade seria a tensão e a conciliação do
Ser com o Não-Ser. Essa é a primeira aparição da dialética na História da Filosofia. “Ser e Não-
Ser”, que a primeira vista, se opõem e se excluem, na realidade realmente real constituem
uma unidade sintética, que é o ser em movimento, o Devir” (LIMA, 2015, P. 15). Neste
momento os polos opostos tese e antítese são excludentes, mas em seguida se unificam em
uma síntese, onde é superado como também guardado conteúdo do primeiro movimento e
surge algo de novo. Nem sempre o resultado dessa síntese é positivo, mas também ocorre de
forma destrutiva, onde, ao invés de unificação, há apenas exclusão e destruição. O processo
histórico da dialética vai desses e passa pelos socráticos, platônicos, aristotélicos.

Neste trabalho não teremos espaço para discutir de forma histórica e filosófica todo o
movimento da dialética. Focaremos no método dialético de Marx. Sabemos que para este a
fonte principal do seu método dialético é Hegel, onde a dialética é:
O método que permite o pensador dialético observar o processo pelo qual
as categorias, noções, ou formas de consciência surgem uma das outras para
formar totalidades cada vez mais inclusivas até que se complete o sistema
de categorias, noções ou formas, como um todo. Para Hegel, a verdade é o
todo e o erro está na unilateralidade, na incompletude e na abstração; pode
ser reconhecido pelas contradições que gera e remediado por sua
incorporação em formas conceituais mais plenas, mais ricas, mais concretas.
(BOTTOMORE, 1988, p. 168)

Hegel concebe a dialética como a introdução da negação no entendimento de cada


categoria, entendendo cada produto como uma evolução de uma fase anterior. Nela há
sempre uma tensão, e essa negação é o que dá processualidade ao pensamento na
investigação da matéria. Mas, para Marx, o método dialético se constitui em duas partes. Um
seria o método de pesquisa, onde o objeto é entendido, e o outro é o método de exposição.
Aqui o nosso interesse se mantém no primeiro momento. O próprio Marx, no segundo
posfácio d’O Capital, nos diz o que seria o momento de investigação quando distingue seu
método do método hegeliano:
sem dúvida, deve-se distinguir o modo de exposição segundo sua forma, do
modo de investigação. A investigação tem de se apropriar da matéria em
seus detalhes, analisar suas diferentes formas de desenvolvimento e
rastrear seu nexo interno. Somente depois de consumado tal trabalho é que
se pode expor adequadamente o movimento real (MARX, 2017, P. 90)
Desse modo observamos que tanto “Para Marx, como para Hegel, “a verdade” só se encontra
no todo, na “totalidade negativa”. (MARCUSE, 1978, P. 285). Marx, na sua crítica da economia
política, sempre parte das relações abstratas objetivando o seu conteúdo real. Para Marx, a
totalidade a que examina é a totalidade da sociedade de classes. O motor da história é o
conteúdo apropriado pelo método dialético, sendo os antagonismos do processo social
submetida à análise dialética, apoderando-se da análise de suas contradições inerentes, como
de sua negação dentro do movimento concreto real. Na dialética de Marx, o conceito de
“necessidade” é fundamental, “as leis dialéticas são leis necessárias; as várias formas de
sociedades de classes necessariamente morrem por força de suas contradições internas.”
(MARCUSE, 1978, P. 289).

II: a relação sujeito/objeto

O método a ser utilizado neste trabalho tenta se apropriar de algumas perspectivas


sobre a relação sujeito/objeto que permeia o pensamento filosófico do século XIX. Uma
pesquisa que lida com sujeitos ativos, seres em movimento, deve pretender circunvagar as
características mais gerais do ser, o que conhecemos por ontologia. Quando se trata do
sujeito:
A ideia de “substância como sujeito” concebe a realidade como um processo
dentro do qual todo ser é a unificação de forças contraditórias. “sujeito”
designa não somente o eu ou a consciência epistemológica, mas um modo
de existência, a saber, aquela de uma unidade que se autodesenvolve em
um processo contraditório (MARCUSE, 1978, p.21)

Nesse sentido, o homem por meio da razão reconhece e compreende seus limites e
potencialidades, e interfere objetivamente na realidade histórica, sendo o senhor do seu
próprio desenvolvimento. Como sujeito, está intrinsecamente relacionado ao objeto, que
também é uma espécie de sujeito não estático. O pesquisador, a fim de compreende-lo, se
apropria da sua dinâmica e de seu movimento. Marcuse, tratando do começo da filosofia
ocidental, demonstra que todo ser determinado carrega em si a qualidade universal de “ser”,
comum a cada um dos seres individualmente, um ser-como-tal. Descreve que
O ser-como-tal é o que todos os entes particulares tem em comum, e é, por
assim dizer, seu substrato. [...] A coisa individual é o sujeito ou substância
que persiste por todo um movimento pelo qual unifica e conserva reunidos
os diversos estados e fases de sua existência (MARCUSE, 1978, p.50).

As mais diversas formas de ser carregam em si modos diversos de unificar, de perecer,


como também suas potências e seus limites. Com isso, Ser significa movimento, e “os vários
tipos de movimento denotam as várias maneiras de realização de potencialidades inerentes
à essência ou coisa que se move” (MARCUSE, 1978, p.50). Resumidamente, o autor dialoga
com os pensamentos de Kant e Hegel. Em Kant a “coisa-em-si" difere do seu fenômeno. Essas
coisas seriam inapreensíveis pela razão, abrindo um abismo entre o sujeito e o objeto. Abismo
esse que Hegel procura estabelecer uma ligação. Esta ligação seria a conclusão da existência
de uma estrutura universal do ser. Para Marcuse, se tratando das formas mais gerais do ser,
observa que:
O ser seria um processo: aquele pelo qual uma coisa “compreende” ou “se
apodera” dos vários estados de sua existência, levando-os à unidade mais
ou menos duradoura do seu “em-si”, constituindo-se, pois, ativamente,
como “a mesma” através de toda mudança. Tudo que é, em outras palavras,
existe, em maior ou menor grau, como um “sujeito”. A mesma estrutura de
movimento perpassa todo o reino do ser, e unifica os mundos objetivo e
subjetivo (MARCUSE, 1978, p. 70).

Nota-se a unificação e a não separação na relação sujeito/objeto. Em Hegel, o


movimento do pensamento reproduz o movimento do objeto, do ser. Os conceitos seriam a
reprodução desse movimento (MARCUSE, 1978, p. 70). No mundo dos animais, dos orgânicos
e das plantas, o movimento do sujeito é realizado de forma passiva sob cega necessidade de
suas determinações, o sujeito não podendo refletir sobre o seu processo e sobre as suas
potencialidades. Mas, para o sujeito pensante, é possível realizar a reflexão de todo o
processo constitutivo do ser no plano do pensamento. E como seria possível o conceito
representar a verdade do objeto? Vejamos bem: no ente particular reside aquilo que reside
em todos os outros entes, a qualidade universal de ser. Todo ser seria a unificação de forças
onde “o modo de existência dos homens e das coisas é engendrado por relações
contraditórias; assim, cada conteúdo particular só se expande ao mudar-se no seu oposto”
(MARCUSE, 1978, P. 73).
A diversidade dessas coisas, e consequentemente as suas diferenças, estão
emaranhados numa rede infinita de relações, onde cada coisa particular afirma-se em
oposição a outra coisa particular, por meio de qualidades específicas. Assim, elas existem a
partir do ser do outro. O ser outro é a sua referência, excluindo qualidades opostas às suas.
A diferenciação de qualidades opostas seria a referência para a identidade das qualidades que
a possui. Essa negação, por outro lado, não isola a coisa, mas o relaciona com outras coisas
em um movimento próprio.
Existe outra determinação que constitui todos os entes finitos: a negatividade. Esta é
a “mais interna fonte de toda atividade, do autodesenvolvimento vital e espiritual. A
negatividade que sem encontra em todas as coisas é o prelúdio necessário a realidade delas”
(MARCUSE, 1978, P. 73). Cada coisa particular carrega em si potencialidades e limites, que na
sua existência dada, em sua forma imediata, não está plenamente realizada. É através do
conceito que se expressa esses limites e contingências. O movimento do ser é realizado a
partir da negação de sua condição imediata.
Como seria possível o conceito captar a verdade do objeto, pondo fim então a
separação entre objetividade e subjetividade? Em outras palavras, como reproduzir o
movimento real do objeto no plano do pensamento? Para correntes de pensamento que
estabelecem a separação entre sujeito/objeto, conhecer a verdade de objetos exteriores, das
coisas-em-si se tornaria impossível, pois tais objetos não teriam a capacidade de se
apresentar, ou seja, de nos fornecer as informações de seu ser determinado, como objeto. Só
poderíamos então, conhecer suas representações, a forma que ela aparece para nós, o seu
“fenômeno”.
Na relação sujeito/objeto, o que deve ser apreendido pelo conceito é seu movimento
próprio, o próprio objeto estabelecendo as relações necessárias entre ele e seu oposto. Ou
seja, o objeto deve ser compreendido como um sujeito. Mas quando tratamos de objetos
materiais, orgânicos ou irracionais, estes, como sujeitos, não podem realizar seu próprio
movimento a partir da autorreflexão. Como dito anteriormente, o seu movimento é realizado
de forma passiva e sob cega necessidade. É a penas o sujeito “homem” que pode realizar seu
movimento e conceitua-lo no plano do pensamento. Só o sujeito pensante tem a liberdade
de se autorrealizar e autorrefletir, de teorizar. O sujeito pensante é compartilha das mesmas
determinações gerais do ser: movimento e negação. Como parte constitutiva da natureza, ele
difere dos outros sujeitos que realiza o processo de forma contingente e sob cega
necessidade, pois tem a liberdade e o poder de conhecer seus limites e potencialidades
através da razão, pois “o pensamento é atributo existencial de um ser que “compreende”
todos os objetos, e o faz em duplo sentido, a saber, entendendo-os e apreendendo-os"
(MARCUSE, 1978, P. 78). Sendo assim é dado a possibilidade de também superá-los. o ser, e
no caso o ser humano, é ser e objeto, é a natureza entendendo e refletindo sobre si mesma.
o homem como parte constitutivo da natureza e como mediação da realidade objetiva para
o plano do pensamento.

III: da aparência à essência

o conhecimento do objeto não se dá por meio da experiência direta, de forma


imediata. Para Netto (2011) quando se trata da pesquisa de um objeto, é preciso ultrapassar
as formas dadas empiricamente e apenas descritivas deste, partindo da aparência e se
aprofundando exaustivamente na estrutura e dinâmica do objeto por meio de processos
analíticos. A aparência constitui apenas um momento de manifestação da essência do objeto,
nela prevalecendo o senso comum (ou experiência sensível), onde conceitos são fixados e seu
movimento real passa despercebido, confundindo essa identidade imediata com a essência.
A relação sujeito/objeto permite que a pesquisa seja uma reflexão ativa do objeto pelo sujeito
mediante a mobilização de conhecimentos e conceitos, comparando as formas aparentes
com suas potencialidades, negando o positivo, tomando posse da matéria e examinando o
processo de “ser” do objeto. Os conceitos não são construídos por meio de uma concepção
idealista ou pessoal do pesquisador, mas expressa o movimento imanente ao objeto.
Então, é sob as bases metodológicas da dialética que tentaremos explorar o nosso
objeto de pesquisa. Para o professor Grespan(2002) O método dialético não deve ser aplicado
de forma indiferente ao objeto que se pretende pesquisar, como se “valesse por si mesmo”,
mas sim, quando este objeto se constitui de modo contraditório. É necessário na análise
daqueles objetos que parecem ter manifestações ou aparências que não são exatamente a
expressão real ou a verdade do objeto, diferenciando de sua essência. Em outras palavras, a
essência do objeto não está imediatamente apresentada, mas essa só se mostra a partir de
mediações analíticas que exploram o movimento essencial da coisa. A aparência é
determinada pelo próprio movimento contraditório do objeto, que constitui a sua essência
(GRESPAN, 2002, p. 27).

A análise que se pretende seguir não abre mão da crítica ao objeto analisado, aceitando e
observando as formas que aparece, compreendendo a necessidade do próprio objeto de
aparecer de forma diversa a sua essência. A tentativa é também de compreender também as
interpretações sociológicas, psicológicas e históricas que determinados campos do
pensamento com qual iremos trabalhar projetam sobre este objeto. Numa sociedade
marcada por conflitos, onde interesses ideológicos se condensam em interesses de classes,
movimentos populares (ou movimentos de massa) constitui em sua maioria objetos de
repressão e violência, sendo as torcidas organizadas mais um fenômeno de massa alvo destas
ações.
IV: Do Abstrato ao Concreto

Cotidianamente a palavra abstração carrega em si a ideia de algo que é desprovido de


sentido, ou quando algo está insuficiente, quando não contém conexão com a realidade ou
quando a coisa não é palpável. Assim, o concreto ganha prioridade em relação ao abstrato. O
concreto, neste sentido, parece estar bem mais próximo da verdade (OIVEIRA, 2016). Oliveira
ainda nos diz que em Marx “trata-se de entender o movimento conceitual que nos leva do
abstrato ao concreto, movimento este que se torna impossível se abandonarmos de imediato
o abstrato para nos lançarmos no concreto, como se assim pudéssemos encontrar a verdade”
(OLIVEIRA, 2016, P. 25).
O concreto então nos parece bem mais os resultados do que o ponto de partida de
uma pesquisa. Assim, a abstração é o caminho de seu conhecimento pelo pensamento, onde
deve ser entendido como momento em que as partes do objeto não foram somadas, “O
abstrato carrega o sentido de provisoriedade, ou melhor incompletude”. (OLIVEIRA, 2016,
P.26). o movimento em direção ao concreto se dá na articulação das partes para a construção
de uma totalidade, em um sistema. Assim, o sentido cotidiano que abstrato e concreto tem
mostra-se errôneo, pois a abstração é parte constitutiva do método dialético, sendo o ponto
de partida para chegar no concreto, este “como síntese de múltiplas determinações”, e não
o seu inverso.

V: Fundamentos metodológicos

Esse item irá tratar dos aspectos operacionais técnicos que nortearão a pesquisa, em
função de complementar a pesquisa epistemológica sobre o objeto. Segundo Severino (2013)
a primeira atividade que o cientista deve realizar é a observação dos fatos, para logo em
seguida problematizá-lo. Como o nosso objeto de pesquisa é um fenômeno social que não é
estático, mas que se movimenta de forma contraditória, o nosso trabalho será amparado pelo
método de pesquisa qualitativo, que segundo as concepções de Severino (2013) diferem dos
métodos quantitativos próprios do método científico positivista presente nas ciências
naturais. O método implica uma proposição da relação sujeito/objeto.

No método de pesquisa quantitativo, predomina a concepção vinda das ciências


naturais, “submisso assim as leis de regularidade (determinismo), acessível portanto aos
procedimentos e observação e de experimentação (experimentalismo)”. (SEVERINO, 2013, P.
67). Assim, dentro de pressupostos epistemológicos, realiza-se operações de observação,
experimentação e mensuração, havendo uma prioridade do objetivo sobre o subjetivo. De
certa forma observa-se que seu modo operacional é mecânico, sob bases positivistas. Essa
vertente teórica considera a essência do objeto inacessível, sendo possibilitado assim a
apreensão do fenômeno através da experiência controlada por técnicas cientificistas (ou
experimental-matemático) e eliminadas as interferências qualitativas. Apreendendo seus
objetos como fenômeno, é estabelecido uma análise de causa e efeito, a causalidade,
seguindo leis dentro de uma relação funcional quantitativa. Com o advento do conhecimento
científico a partir do século XIX, os métodos próprios desse paradigma também passaram a
compor as pesquisas sobre o homem e seu mundo dentro dos mesmos parâmetros das
ciências naturais:
O homem seria um ser natural como todos os demais (naturalismo),
submisso às mesmas leis de regularidade (determinismo), acessível portanto
aos procedimentos de observação, experimentação e mensuração
(experimentalismo e racionalismo). Como pretendia Comte, é possível – e
necessário – constituir uma física social, análoga à física natural. (SEVERINO,
2013, P. 70).

Na contramão deste caminho, o método de pesquisa qualitativo, como rompimento


do monolitismo do paradigma positivista, difere do paradigma quantitativo no que se refere
a relação sujeito/objeto, esta diferença implicando outros pressupostos ontológicos. Esses
pressupostos já foram expostos no item II.
Dentro da pesquisa qualitativa estudaremos um caso particular. Uma das formas
desse método seria o estudo de caso. No nosso caso estudaremos a torcida organizada
mancha azul, “considerado representativo de um conjunto de casos análogos, por ele
significativamente representativo” (SEVERINO, 2013, P. 75), partiremos dessa associação
particular no caminho do entendimento do fenômeno das torcidas organizadas em sua
totalidade.
um Estudo de Caso estuda um caso particular e trabalha com fontes bibliográficas,
fontes documentais e fontes orais. As técnicas de pesquisa utilizadas nesse trabalho farão
uso da coleta de dados. Nos apropriaremos da análise documental, bibliográfica e entrevista
com recurso da fonte oral. O uso bibliográfico nos ajudará no entendimento de conceitos e
categorias teóricas indispensáveis para a compreensão. Procuraremos encontrar um acervo
ou documentos particulares de membros dessa associação para a investigação e análise do
objeto. O recurso da fonte oral nos ajudará apreender a concepção que os próprios sujeitos
têm de si mesmos quando se encontram dentro de uma associação.
Esta entrevista será semi-estruturada, possuindo um roteiro prévio, mas flexível à
novos questionamentos, por isso não-diretiva, deixando o sujeito livre. O entrevistado
intervém discretamente e apenas em questões estritamente pontuais. A entrevista será
síncrona, realizada ou de forma presencial ou de forma remota conforme roteiro de
entrevista em anexo. será realizada, a princípio, com um membro da torcida organizada
Macha Azul.
Exposto como primeiro item de nossa metodologia, usaremos o método dialético que
“penetra no mundo dos fenômenos através de sua ação recíproca, da contradição inerente
ao fenômeno e da mudança dialética que ocorre na natureza da sociedade” (LAKATOS, 1992,
P. 106).
CRONOGRAMA DE ATIVIDADES
2022

Atividades Jan Fev Mar Abr Mai. Jun Jul. Ago Set. Out Nov Dez.
. . . . . . . .
Levantamento X X X X X X
bibliográfico
Pesquisa de fontes X X X X
documentais e orais
Análise das fontes X X X X X
bibliográficas e
documentais
Redação/escrita da X X X
monografia
Defesa da monografia X

REFERÊNCIAS
HOLLANDA, Bernado Borges Buarque de. O clube como vontade e representação: o jornalismo
esportivo e a formação das torcidas organizadas no futebol do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: 7Letras,
2009.

HOLLANDA, Bernardo Borges Buarque de; AGUILAR, Onésimo Rodríguez. (org.) Torcidas organizadas
na América Latina: estudos contemporâneos. 1.ed. Rio de Janeiro: 7Letras, 2017.

FILHO, Mario. O negro no futebol Brasileiro. 5. ed. Rio de Janeiro: Mauad, 2003.

CÉSAR, Benedito Tadeu. Os gaviões da fiel e a águia do capitalismo: ou o duelo 1981. Dissertação de
Mestrado em Antropologia social – UNICAMP, Campinas, 1981.

FERNANDES, Hévila Wanderley. Não é apenas um jogo: A questão nordestina no futebol. Dissertação
de Mestrado no programa de Pós-Graduação em Ciência Política e Relações Internacionais – UFCG,
João Pessoa, 2020.

AKERMAN, Jaques. A psicologia da torcida. In: Revista Mediação. Belo Horizonte: FUMEC; FCH. 2004,
n.4.

LIMA, Carlos Cirne. Dialética para Principiantes. (local?): Unisinos 3° ed. 200
BOTTOMORE, Tom. (org.) Dicionário do pensamento Marxista. Rio de janeiro: Jorge Zahar, 1988.

MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política; livro I : o processo de produção do capital. 2 ed. -
São Paulo: Boitempo, 2017.

MARCUSE, Herbert. Razão e Revolução: Hegel e o advento da teoria social. 2°ed. Rio de Janeiro: Paz
e Terra, 1978.

PAULO NETTO, José. Introdução ao estudo do método de Marx. 1 ed. São Paulo: Expressão Popular,
2011.

GRESPAN, Jorge. A Dialética do avesso. Crítica Marxista, São Paulo, Boitempo, v.1,n.14, 2002, p. 26-
47.

OLIVEIRA, Hélio Ázara de. A circulação simples como epiderme da experiência capitalista. 1.ed.
Curitiba: Editora Prismas, 2016.

LAKATOS, Eva Maria. Metodologia do trabalho científico: procedimentos básicos, pesquisa


bibliográfica, projeto e relatório, publicações e trabalhos / Eva maria Lakatos, Marina Andrade
Marconi. 4. ed. São Paulo: Atlas, 1992.

SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 1. ed. São Paulo: Cortez, 2013.

ANEXO I – ROTEIRO DA ENTREVISTA

I - DADOS DO ENTREVISTADO:

NOME COMPLETO:

LOCAL E DATA DE NASCIMENTO:

ENDEREÇO:

II - DADOS PARA CONTATO:

CEL:

EMAIL:

1. Como iniciou sua relação com a torcida organizada Mancha Azul?


2. Desde quando você é sócio?
3. Para você, qual o papel da torcida organizada para o clube?
4. Qual a relação da torcida organizada com a sociedade?
5. Qual a relação da torcida organizada com a direção do clube?
6. Como enxerga a opinião pública sobre a torcida organizada?
7. Qual a função do chefe de torcida?
8. Como você enxerga a relação dos sócios com o chefe de torcida?
9. Qual o grau de importância de instrumentos musicais para a torcida organizada?
10. Como se dá a relação das torcidas com a segurança pública nos estádios?

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