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Bíblica
Indaial – 2021
2a Edição
Elaboração:
Prof. Alexandre de Paula Amorim
A524c
ISBN 978-65-5663-582-8
ISBN Digital 978-65-5663-581-1
CDD 220
Impresso por:
APRESENTAÇÃO
O presente livro didático tem como objetivo apresentar os aspectos culturais,
étnicos, ecológicos, econômicos, religiosos e sociais dos antigos hebreus e dos demais
povos antigos do Oriente Próximo e da Palestina. Permitir que o acadêmico possa ser
apresentado e introduzido aos diversos mundos e às diversas culturas que figuram,
que fizeram parte e que influenciaram na construção do texto bíblico.
No Tópico 3 apresentaremos uma história sumária dos hebreus, sua origem, seu
modo de vida, a formação de sua religião, os etnônimos, sua trajetória tribal à formação da
monarquia e sua relação com os diversos povos, semitas e não semitas que fizeram parte
da formação de desenvolvimento dos antigos hebreus e, posteriormente, dos judeus.
Bons estudos!
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para complementar a sua compreensão acerca do ENADE. Confira,
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LEMBRETE
Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma
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REFERÊNCIAS...................................................................................................................... 63
REFERÊNCIAS..................................................................................................................... 141
REFERÊNCIAS.....................................................................................................................213
UNIDADE 1 —
A TERRA, A CULTURA E O
POVO DA BÍBLIA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará
autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.
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1
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 1!
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2
UNIDADE 1 TÓPICO 1 —
INTRODUÇÃO À CULTURA E A BÍBLICA
1 INTRODUÇÃO
“A cultura é como uma lente através da qual o homem vê o mundo.
Homens de culturas diferentes usam lentes diversas e, portanto, têm
visões desencontradas de cada coisa.”
(Ruth Benedict)
3
Cabe ainda esclarecer, que os escritos bíblicos são frutos de interpretação
teológica tanto por parte do hagiógrafo (escritor bíblico) quanto por parte da comunidade
que recebeu os textos. Mesmo que contenham elementos culturais, geográficos
e históricos, os escritos são condicionados pela crença religiosa do escritor e dos
receptores do texto bíblico.
A Bíblia é uma coletânea de livros que narra a história do povo hebreu. Cobre um
período de mais ou menos mil e setecentos anos, que vai desde os patriarcas (Abraão,
Isaac, Jacó) no século XIX a.C. até os últimos escritos do Novo Testamento (2ª epístola
de Pedro) no século II d.C.
Por se tratar de um contexto histórico que está distante cerca de três mil e
setecentos anos, relativos ao Antigo Testamento, e dois mil anos no que se refere ao
Novo Testamento, somado a um contexto social e cultural muito diferente dos dias
atuais, um dos principais entraves à análise e estudo do texto bíblico é a sua correta
compreensão e interpretação.
4
A maioria dos leitores da Bíblia a interpreta de forma literal. Entretanto, é
consenso entre os especialistas que a leitura da Bíblia não pode ser literalista, ou seja,
“ao pé da letra” – isso é impraticável. Tampouco se deve abri-la aleatoriamente para
corroborar uma opinião que se deseja defender. Independentemente do interesse,
seja ele científico ou religioso, é necessário que se compreenda que cada livro tem sua
própria história e deve ser lido à luz do seu contexto histórico, gênero literário, intenção
do autor, sem que se perca de vista a sua unidade com o todo.
NOTA
Sitz im leben é uma expressão alemã utilizada na exegese de
textos bíblicos, cunhada pelo teólogo Herman Gunkel. Na crítica
das formas ou história das formas, o ponto de vista sociológico
tornou-se um exercício obrigatório para os exegetas. Por meio
do sitz im leben, se reconhece que as tradições bíblicas levam a
marca dos ambientes socioculturais que as transmitiram. Traduz-
se comumente por “contexto vital”. De uma forma simples, o sitz
im leben descreve em que ocasião uma determinada passagem da
Bíblia foi escrita, ou seja, qual foi o fato que motivou o surgimento
de um determinado gênero literário bíblico. Há dois tipos de sitz im
seben: o primário e o secundário. O primário se refere ao fato que
promoveu a elaboração do gênero literário. O secundário se refere
ao local onde era utilizado este gênero.
2 A ORIGEM DA CULTURA
As ciências sociais ainda não chegaram a um consenso sobre a origem da
cultura. Contudo, na antropologia, há uma interpretação amplamente aceita, que afirma
ser a regra da proibição do incesto que estabelece o limite entre o reino da natureza e
o reino da cultura entre os seres humanos, de acordo com o antropólogo francês Lévi-
Strauss (1982). Segundo Lévi-Strauss (1982), ao impor limites à natureza humana, a
regra ou o tabu do incesto acaba produzindo uma estrutura de organização social, que
obriga os homens de uma família a buscarem mulheres em outra família, estabelecendo
assim uma rede de reciprocidade.
5
Pelo fato de existirem pessoas, em especial, mulheres com as quais não se
pode ter relações sexuais, os grupos humanos se veem obrigados a trocarem mulheres
entre si, criando a regra da exogamia e estabelecendo alianças com outros grupos que
eram potenciais rivais. A regra da exogamia, a que obriga a se casar com uma pessoa
de outro grupo ou família, também pode ter ajudado a manter a integridade do grupo
familiar, já que impede que os homens da mesma família disputem a mesma mulher.
6
obrigatória de todo conhecimento e de toda criação, do justo, do
saudável e perfeito, precisamente o que se entende por “natural”. Daí
os critérios de toda existência válida: do homem natural, da sociedade
natural e da forma do estado, da educação, da maneira de viver.
Tal como se realizam desde o século XVI ao século XX (GUARDINI,
2000, p. 38).
IMPORTANTE
É importante ressaltar que tal interpretação antropológica da
possível origem da cultura, nada diz sobre a origem humana, se
criacionista, evolucionista ou design inteligente. Mostra apenas a
lógica por trás de uma instituição humana, que, possivelmente,
teria sido a regra que estabeleceu uma distinção entre os seres
humanos e os outros animais, permitindo, assim, a proliferação
da espécie.
3 O QUE É CULTURA?
Dentro das humanidades, mais especificamente, dentro das ciências sociais,
o termo/conceito cultura é um dos mais debatidos, um dos mais polêmicos e um dos
mais estudados.
7
O conceito antropológico de cultura foi uma das ideias mais
importantes e de maior influência no pensamento do século XX.
O uso do termo cultura adotado pelos antropólogos do século XIX
espalhou-se para outras áreas de pensamento com um profundo
impacto; hoje é um lugar-comum para que os humanistas e outros
cientistas sociais falem, por exemplo, de “cultura japonesa”.
No entanto, paradoxalmente, a noção de cultura implícita nesses
usos mostrou ser muito ampla e muito rudimentar para ser capaz
de capturar os elementos essenciais no comportamento humano.
A reação de alguns estudiosos foi abandonar o termo como
instrumento conceitual básico; resposta de outros foi aprimorar e
limitar o instrumento para torná-lo mais preciso.
No uso da antropologia, é claro, cultura não significa cultivo nas artes
e dotes sociais. Refere-se, ao contrário, à experiencia apreendida
e acumulada. Uma cultura – digamos a cultura japonesa – refere-
se àqueles de comportamento característicos de um grupo social
específico que foram socialmente transmitidos (KEESING, 2014, p.
34-35).
É provável que nenhuma apropriação do termo cultura tenha tido mais êxito do
que a efetuada pelas chamadas minorias. Há uma miríade de grupos que se consideram
vítimas do processo civilizacional do Ocidente. Estas transformam a cultura num
termo corrente e instrumental usado como forma de protesto contra o atual processo
civilizatório do capitalismo. De acordo com Kuper (2002), o uso corrente do termo, na
verdade, é fruto de um fenômeno de despertamento de consciências culturais, que está
na ordem do dia. Desde subgrupos urbanos, aborígines australianos à fundamentalistas
islâmicos, todos se sentem ameaçados pela diferença e sobreposição cultural.
8
Na França, o debate se dá em torno do termo civilização (civilisation). O termo
civilização é cunhado no espírito positivista do iluminismo e tem sentido análogo ao
sentido dado posteriormente ao termo cultura.
Entretanto, é preciso esclarecer, que por mais que suas contribuições tenham
sido de grande importância, Tylor ainda permanece como um evolucionista. A grande
preocupação de Tylor não estava na diversidade cultural, mas sim na questão da
igualdade humana. Segundo ele, a diversidade cultural seria o resultado dos diferentes
estágios da evolução humana. Uma concepção tipicamente evolucionista unilinear fruto
da grande influência de Charles Darwin nas ciências modernas (LARAIA, 2017).
9
Em seu artigo The limitation of the comparative method of anthropology, de
1896, Boas (2003) expõe quais são as duas tarefas primordiais da Antropologia: 1) a
reconstrução da história de povos ou regiões particulares; 2) a comparação da vida
social de diferentes povos, cujo desenvolvimento segue as mesmas leis.
Como o tema deste livro diz respeito aos povos da antiguidade, povos nômades,
seminômades, caçadores e coletores que mantinham outro tipo de relação com a
natureza, é importante abordar a discussão antropológica acerca da natureza e da
cultura, pois toda a evolução das sociedades antigas, assim como da humanidade como
um todo, está relacionada à relação inversamente proporcional que os grupos humanos
mantêm com “reino da natureza” ou com o “reino da cultura”.
Por natureza entende-se tudo que faz parte do reino animal, vegetal e mineral.
De outra forma, pode-se dizer que a natureza é a totalidade das coisas. É tudo que existe
antes que o ser humano faça alguma coisa, incluindo o próprio ser humano. Do pondo
de vista orgânico, fisiológico, o ser humano é um espécime do reino animal, porém, há
uma especificidade tão peculiar no ser humano, que o antropólogo norte americano
Alfred Kroeber (1876-1960), chegou a se referir ao ser humano como o “superorgânico”
(LARAIA, 2017).
Veja a síntese das teses do artigo de Kroeber (1949 apud SANTOS, 2020, p. 4-5):
10
4. Em decorrência da afirmação anterior, o homem foi capaz de
romper as barreiras das diferenças ambientais e transformar toda
a terra em seu habitat.
5. Adquirindo cultura, o homem passou a depender muito mais do
aprendizado do que a agir através de atitudes geneticamente
determinadas.
6. Como já era do conhecimento da humanidade, desde o Iluminismo,
é este processo de aprendizagem (socialização ou endoculturação,
não importa o termo), que determina o seu comportamento e a
sua capacidade artística ou profissional.
7. A cultura é um processo acumulativo, resultante de toda a
experiência histórica das gerações anteriores. Esse processo
limita e estimula a ação criativa do indivíduo.
8. Os gênios são indivíduos altamente inteligentes que têm a
oportunidade de utilizar o conhecimento existente ao seu dispor,
construído pelos participantes vivos e mortos do seu sistema
cultural, e criar um novo objeto ou uma nova técnica. Nessa
classificação podem ser incluídos os indivíduos que fizeram as
primeiras invenções, tais como o primeiro homem que produziu o
fogo através do atrito da madeira seca; ou o primeiro homem que
fabricou a primeira máquina capaz de ampliar a força muscular, o
arco e a flecha etc. são eles gênios da mesma grandeza de Santos
Dumont e Eistein. Sem as suas primeiras invenções descobertas,
hoje consideradas modestas, não teriam ocorrido as demais. E pior
do que isto, talvez nem mesmo a espécie humana teria chegado
ao que é hoje.
CULTURA:
Sentido habitual, senso comum: formação espiritual que eleva o gosto, a inteligência e a
personalidade à dimensão universal.
Sentido antropológico: conjunto complexo que inclui conhecimentos, técnicas, tradições,
e caracteriza uma sociedade ou um dado grupo.
Termos e expressões conexos.
Relação de vizinhança: civilização.
Relação de dependência: educação – humanidade – saber – sociedade.
Relação de oposição: ignorância – natureza.
FONTE: O autor
11
4 A BÍBLIA
A Bíblia é o livro mais popular e mais lido em todo o mundo. Por ser a regra de fé
das religiões monoteístas da atualidade – o cristianismo e judaísmo, estima-se que um em
cada três habitantes do planeta possua uma Bíblia ou que pelo menos já a tenha lido ou
conheça algumas de suas histórias.
Paradoxalmente, por mais que seja um dos livros mais lidos e mais conhecidos,
a Bíblia também é um dos livros menos compreendidos. Por esse motivo é que existem
milhares de religiões, seitas, cultos e confissões que se baseiam na Bíblia, mesmo
mantendo profundas divergências entre si.
O que a maioria das pessoas não sabe é que a Bíblia não é um livro. É na verdade,
um conjunto de livros, uma biblioteca. Etimologicamente falando, o termo bíblia é plural
do termo grego bíblion (livro). Seu significado original é “rolo” ou “livro”.
12
NOTA
Um biblon era um rolo de papiro ou biblo, uma planta semelhante
a uma taquara, cuja casca interna era secada para se tornar uma
matéria de escrita de uso generalizado no mundo antigo.
FIGURA 4 – A TORAH
13
O Antigo Testamento possui quarenta e seis livros, a depender da versão da
Bíblia. Os primeiros cinco livros (Gênesis, Êxodo, Levítico, Números, Deuteronômio), são
chamados de pentateuco. Uma referência aos “cinco estojos” onde eram guardados os
rolos de papiro ou pergaminho contendo os cinco primeiros livros da Bíblia hebraica.
O Novo Testamento foi escrito em grego, pois esta era a língua do cotidiano
da maioria dos judeus e cristãos do primeiro século. Era um grego popular, conhecido
como koiné. Como os primeiros cristãos também eram judeus, o grego koiné sofreu forte
influência do hebraico e aramaico. Por isso se diz que o Novo Testamento está repleto
de semitismos (KONINGS, 1998).
14
datas, estilística, coerência interna, entre outros. Entretanto, acadêmico, tudo isso em
nada diminui o mérito e a validade dos escritos acolhidos pela comunidade das origens,
que serviram e ainda servem de testemunho de fé para os cristãos.
Por volta do século III a.C. a comunidade judaica que vivia no exílio em Alexandria
no Egito, faz uma tradução da Bíblia hebraica para o grego. Essa versão é chamada de
Septuaginta, referência aos setenta anciãos que teriam feito tradução, de acordo com
a tradição. A Septuaginta possui sete livros a mais, que não são aceitos pelos judeus e
nem pela maioria dos protestantes. São os chamados deuterocanônicos (não aceitos
no cânon ou “canonizados posteriormente”) (KESSLER, 2009). Alguns protestantes
chamam estes livros de apócrifos. O que consiste em um erro terminológico, pois os
livros apócrifos são aqueles recusados tanto por protestantes quanto por católicos.
FIGURA 5 – A SEPTUAGINTA
FONTE: <https://mytheoblogy.files.wordpress.com/2012/11/septuagint-manuscript.jpg?w=497>.
Acesso em: 17 maio 2021.
15
origens", o protestantismo adotou o cânon judaico, o cânon restrito. Por isso há uma
diferença entre a Bíblia católica e a Bíblia protestante. Porém, para os que acreditam
nela, a mensagem é uma só.
INTERESSANTE
Nos livros originais da Bíblia não havia separação entre as palavras,
nem vogais, sem sinais de pontuação e nem títulos. No século XIII, foi
feita a divisão em capítulos e, no século XVI, em versículos. E os dois
Testamentos encadernados juntos só acontece no século XV, com a
invenção da imprensa.
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QUADRO 2 – BÍBLIAS HEBRAICA, GREGA, CATÓLICA E PROTESTANTE
17
10 COISAS QUE VOCÊ PRECISA SABER SOBRE A BÍBLIA COMO LITERATURA
Leland Ryken
Como fiz carreira como defensor da Bíblia como literatura por meio século,
adotei a estratégia de primeiro limpar do terreno as concepções equivocadas e só
depois fazer a defesa positiva da importância de ler e interpretar a Bíblia preservando
sua natureza literária. Uma vez que a expressão “bíblia como literatura” entrou em
cena em meados do século XX, é compreensível que evangélicos tenham receio da
ideia. Contudo, grandiosos baluartes teológicos do passado, como Agostinho, Lutero
e Calvino, jamais duvidaram de que a Bíblia tivesse qualidades literárias.
3 Dizer que a Bíblia é literatura não precisa implicar que seja ficcional e
não factual.
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5 A ideia da Bíblia como literatura começou com os escritores da Bíblia.
Foram os escritores da Bíblia que nos deram uma Bíblia literária, de modo
que a origem do conceito pode remontar a eles. Temos uma pista disso no modo
como alguns autores bíblicos falam com precisão técnica dos gêneros literários em
que escreveram – salmo, crônica, cântico, parábola, epístola, apocalipse e outros.
Entretanto, a principal evidência é a natureza literária do que escreveram. Cada
página da Bíblia contém ao menos algum exemplo de técnica literária, e muitas
páginas estão inteiramente repletas delas.
19
9 Respeitar os aspectos literários da Bíblia é uma forma de observar as
intenções dos autores bíblicos.
FONTE: <http://monergismo.com/novo/cosmovisoes/10-coisas-que-voce-precisa-saber-sobre-a-biblia-
como-literatura-leland-ryken/>. Acesso em: 17 maio 2021.
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RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• A origem e a evolução do conceito de cultura desde John Locke até os dias atuais.
• A Bíblia, sua origem, sua história, sua relevância para os povos semitas e para a
civilização ocidental.
• A Bíblia e sua importância para os judeus e para os cristãos. Sua importância como
orientação traditiva para os judeus, na sua formação e desenvolvimento enquanto
povo e como regra de fé para os cristãos.
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AUTOATIVIDADE
1 A cultura, assim com outros conceitos fundamentais, desde a sua origem passa
por um processo de debates, disputas teóricas, polissemias e apropriações por
outros campos do conhecimento. Por se tratar de um conceito que diz respeito a
todas as dimensões da vida humana, o conceito de cultura acabou se tornando
o objeto próprio da Antropologia. Elabore um texto dissertativo, apresentando o
conceito antropológico de cultura e o conceito de cultura apropriado por campo de
conhecimento ou segmento social.
( ) O ser humano é um ser biocultural porque nasce de forma natural, mas torna-se um
ser cultural.
( ) A natureza é o reino do mundo selvagem, incluindo os povos primitivos que não
foram ocidentalizados, civilizados.
( ) O ser humano não possui especializações corporais assim como os animais, porém,
cria especializações superficiais que supera a dos animais.
( ) O ser humano é um ser biocultural porque possui um corpo com necessidades
naturais e fisiológicas. Não obstante, vivencia essas necessidades de acordo com a
sua cultura.
3 A Bíblia é o livro mais lido na atualidade. Ela foi composta por um longuíssimo período
de mais ou menos três mil anos de tradição oral, redações primitivas, redações
posteriores, várias cópias e uma centena de versões e traduções. Seus livros são
compostos por múltiplos gêneros literários, dos quais constam salmos, crônicas,
cânticos, parábolas, epístolas, apocalipses e outros. Com relação à Bíblia, assinale a
alternativa CORRETA:
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a) ( ) A Bíblia é a religião das três maiores religiões do mundo; cristianismo, judaísmo e
islamismo.
b) ( ) A Bíblia é um livro literário como qualquer outro.
c) ( ) A Bíblia judaica, católica e protestante é a mesma Bíblia.
d) ( ) O fato de a Bíblia ser um livro literário que possui vários gêneros, em nada altera
o fato dela ser um livro sagrado.
4 A Bíblia é um livro sagrado que serve de regra de fé e orientação moral para milhões
de indivíduos. Por outro lado, é um importante patrimônio universal por fazer parte dos
documentos históricos escritos mais antigos da humanidade. Analise os enunciados
a seguir:
23
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UNIDADE 1 TÓPICO 2 —
A TERRA: CANAÃ, ISRAEL, PALESTINA
1 INTRODUÇÃO
A terra do povo da Bíblia é uma pequena faixa de terra com extensão territorial
de apenas 22.000 km². A Palestina, como é conhecida na historiografia universal é
do tamanho do menor estado brasileiro, o estado de Sergipe. Para se ter uma ideia,
caberiam sete Palestinas dentro do estado do Amazonas, o maior estado brasileiro,
porém, a inexpressividade topográfica da Palestina contrasta com a sua importância
geográfica, estratégica, política e econômica.
FONTE: <https://super.abril.com.br/wp-content/uploads/2016/09/super_imgmapa_exodo.
jpg?quality=70&strip=info>. Acesso em: 17 maio 2021.
25
Palestina sempre foi uma região muito cobiçada por causa de sua posição
estratégica. Foi palco de muitos conflitos e disputas. Entre tantos conflitos, invasões e
destruições, dois eventos em especial estão entre os mais traumáticos para a memória
judaica. No ano 200 a.C. Antíoco Epifânio, um rei da dinastia dos selêucidas, proíbe a
prática do judaísmo, desfigura o templo e o dedica à Zeus. E no ano 135 d.C. o imperador
romano Adriano, constrói sobre as ruínas de Jerusalém uma cidade romana, Aelia
Capitolia. Ergue um templo dedicado a Júpiter e muda o nome da Judéia para Síria-
Palestina para apagar qualquer ligação com os judeus.
IMPORTANTE
Quando se trata da Geografia Bíblica, o interesse não é estudar
apenas os povos e as terras do Oriente, mas conhecer o cenário
onde os acontecimentos bíblicos vieram a acontecer, para que
se possa compreender melhor a história do relacionamento de
Yahweh com seu povo, através do estudo da influência que as
características físicas e ambientais da região exerceram sobre os
personagens da epopeia bíblica.
26
2 TOPONÍMIA
A identificação dos nomes de localidades da antiguidade não é tarefa fácil. No
caso da Palestina, por ser uma região palco de disputas imperiais, e que possui um rico
acervo arqueológico, os topônimos da religião foram registrados e conservados. Quanto
à delimitação das fronteiras e cronologia não se pode exigir muito.
O termo Palestina não é um termo usado na Bíblia. É o termo com o qual a região
tornou-se conhecida na historiografia mundial. O termo vem dos gregos antigos que
apelidaram assim a região, por causa dos povos que habitavam a região costeira, os
filisteus, filistim (em hebraico plishtim).
3 LOCALIZAÇÃO E CLIMA
A Palestina ou Israel está localizada na costa oriental do Mar Mediterrâneo.
Encontra-se latitudinalmente no hemisfério Norte. Por isso, possui diferenças marcantes
entre as estações climáticas. Pode ocorrer neve durante o inverno e ter verões bem
ensolarados. Faz fronteira ao Norte com a Fenícia, atual Líbano; ao Sul com o Egito; ao
Leste faz fronteira com Amon e Moabe, atual Jordânia; e Nordeste com Aram, Atual Síria.
27
FIGURA 10 – MAPA MUNDI LOCALIZAÇÃO DE ISRAEL
FONTE: <https://vamospraonde.com/wp-content/uploads/2016/12/israel-mapa-1024x507.jpg>.
Acesso em: 17 maio 2021.
INTERESSANTE
A Palestina é atravessada de norte a sul por montanhas
beirando uma depressão ou fosso geográfico, pelo qual
desce o rio Jordao, que desemboca no Mar Morto –
chamado assim porque a evaporação elevou seu teor
salino a ponto de impossibilitar a vida em suas águas.
4 O CRESCENTE FÉRTIL
Em relação à localização mais ampla, a Palestina está situada no que hoje se
chama de Oriente Médio. Na antiguidade essa região era conhecida como Crescente
Fértil, o cenário pano de fundo da história bíblica. É uma faixa territorial em formato
semicircular, uma meia lua, de terras férteis que se estendem do Egito até o Golfo
Pérsico, passando pelas planícies da Palestina e da Mesopotâmia (KONINGS, 1998).
28
FIGURA 11 – MAPA DO CRESCENTE FÉRTIL
FONTE: <https://www.todoestudo.com.br/wp-content/uploads/2018/10/crescente-fertil.jpg>.
Acesso em: 17 maio 2021.
Existe uma crença medieval que diz que Jerusalém é o centro do mundo.
Segundo Douglas (2006), num certo sentido, tal crença não é tão absurda, “pois o
minúsculo corredor sírio, que une o mundo da Europa, da Ásia e da África, os cinco
mares Mediterrâneos, Negro, Cáspio, Vermelho e Golfo Pérsico, é o lugar onde a maior
massa de terra do nosso planeta, se transforma num istmo” (DOUGLAS, 2006, p. 977).
29
FIGURA 12 – MAPA DE JERUSALÉM NO CENTRO DO MUNDO
5 A CAPITAL
A afirmação de que Jerusalém está no centro do mundo não é um exagero
quando se compreende que esta é a cidade sagrada para os cristãos, judeus e
muçulmanos. Estamos falando de mais da metade da população do planeta, 55,48%, o
que equivale a 4 bilhões e 327 milhões de pessoas.
A crença de que uma terra foi dada por Deus, impede que esta terra seja
entregue ou até mesmo dividida. O fato de ser um solo sagrado é usado politicamente,
colocando Jerusalém no centro da questão geopolítica mundial.
Não há registro de uma cidade que tenha sido tão disputada nos últimos quatro
mil anos. De fato, Jerusalém é a cidade mais disputada da história. Seus números são
impressionantes. A cidade foi palco de cento e dezoito conflitos nos últimos quatro mil
anos. Duas vezes destruída, vinte três vezes sitiada, cinquenta e duas vezes atacada e
quarenta e quatro vezes capturada (SZKLARZ, 2008).
Jerusalém foi fundada por volta de dois mil a.C. Há inscrições egípcias antigas
que mostram o interesse dos faraós pela cidade em mil e novecentos a.C. No século
seguinte, a cidade torna-se um núcleo urbano pelas mãos dos cananeus. Estes serão
conquistados por semitas descendentes de Canaã filho de Noé, os jebuseus. É contra
este povo que Davi luta e conquista Jerusalém, fazendo dela a capital de seu reino
(DOUGLAS, 2006; SZKLARZ, 2008).
30
Jerusalém, que em hebraico (Yerushalem), significa “cidade da paz”, segundo
atribuição encontrada no Antigo Testamento em hebraico (Jeremias 26, 18) e no
aramaico em (Esdras 5, 14). Jerusalém é uma cidade de muitos topônimos, de muitas
denominações. Também chamada de Sião (Tzion), provavelmente por causa da fortaleza
jebusita próxima à cidade na época em que a cidade foi conquistada pelo monarca Davi.
Davi quanto se torna rei, sua capital era Hebrom. Percebeu que Jerusalém tinha
uma localização diplomaticamente estratégica entre as tribos de Benjamim e Judá. Ao
conquistá-la, Jerusalém passa a ser conhecida também com a “cidade de Davi” (ir David)
(2 Samuel 5, 6-8). Posteriormente, seu filho Salomão constrói o templo e Jerusalém se
torna a “cidade santa” (ir qodesh) (2 Samuel 5, 9).
31
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• A Palestina, sua origem e história. De terra primitiva dos filisteus até se tornar terra
prometida dos hebreus. Sua localização e principais características históricas,
culturais e ambientais. Sua importância estratégia, sua ocupação e os diversos
capítulos de domínio e disputas.
• A capital Jerusalém, sua história e sua importância para os judeus. A antiga cidade
dos jebuseus. Uma cidade que foi berço do esplendor da monarquia hebraica, uma
das cidades mais amadas e mais disputada da história.
32
AUTOATIVIDADE
1 A Palestina é uma região semiárida de estepes. Batizada há muito com o nome de
Terra Santa, igualmente conhecida por Cananeia, ou terra de Canaã, consiste numa
estreita faixa territorial a sudoeste do Líbano, banhada a leste pelo mar Mediterrâneo
e dividida pelo rio Jordão, em duas partes: a leste, a Transjordânia; e a oeste, a
Cisjordânia, onde se encontra, presentemente, o Estado Judeu ou de Israel. No ponto
de vista da macro localização, a Palestina encontra-se no Oriente Médio, no meio
do Crescente Fértil, entre a Mesopotâmia e o Egito. Elabore um texto dissertativo,
destacando o fator de contraste da localização da Palestina em relação à Mesopotâmia
e ao Egito e suas consequências na história de Israel.
2 A palestina sempre foi uma região de muitas disputas, várias ocupações sobrepostas
e uma terra de muitos nomes. Sobre os topônimos da Palestina, associe os itens,
utilizando o código a seguir:
I- Palestina.
II- Canaã.
III- Israel.
( ) Terra prometida ao patriarca Abraão por meio de um pacto de vassalagem com Yahweh.
( ) Nação surgida das tribos e remanescentes que sobrevivem a invasões e deportações.
( ) Região denominada pelo Império Romano em referência aos antigos habitantes
filisteus.
33
a) ( ) O Crescente Fértil tem esse nome porque está cercado por regiões desérticas.
b) ( ) O Crescente Fértil deve sua fertilidade aos rios Tigres e Eufrates.
c) ( ) O Egito faz parte dessa região, mas não por causa de fatores naturais e sim por
questões religiosas.
d) ( ) A região mais fértil do Crescente Fértil é a Palestina.
4 Para os judeus, Jerusalém é considerada divina porque foi a capital do Reino de Davi.
Esse também foi o local onde o Rei Salomão construiu o templo para guardar a Arca
da Aliança. Sobre Jerusalém, analise os enunciados a seguir:
I- Jerusalém, cujo significado em hebraico é “cidade da paz”, faz jus à alcunha pelo
fato de ter experimentado milênios de paz.
II- Sião e Jerusalém são a mesma cidade.
III- Jerusalém é a antiga fortaleza dos jebuseus.
34
UNIDADE 1 TÓPICO 3 —
O POVO: OS HEBREUS E OS SEMITAS
1 INTRODUÇÃO
“Ouve, Israel! O Senhor nosso Deus é o único Senhor. Amarás o
Senhor teu Deus com todo e teu coração, com toda a tua alma e
com todas as tuas forças”.
(Lei Mosaica)
35
O patriarca hebreu Abraão é um semita que vivia na Mesopotâmia, mais
especificamente em Ur, uma importante cidade-estado suméria, atual sul do Iraque.
Variáveis do seu nome aparecem em escritos cuneiformes dos séculos XIX e XVIII a.C.
na região (DOUGLAS, 2006). Não há informações suficientes do estilo de vida de Abraão
na Mesopotâmia, se era nômade ou sedentário. Por ser uma cidade de pujança urbana
e econômica, acredita-se que a vida de Abraão pregressa à Canaã era sedentária. E que
Abraão era um homem de posses, conforme (Gênesis 14,14).
3. PERÍODO HELÊNICO
Helênico I 330 – 165 a.C.
Helênico II – Período Macabeu 165 – 63 a.C.
36
2 OS HEBREUS
O Período dos patriarcas é o primeiro das três fases de presença dos hebreus na
Palestina. Esta fase se inicia com Abraão, Isaque e Jacó em 1900 a.C. e vai até o Êxodo
com Moisés e a entrada na terra prometida com Josué por volta de 1250 a.C. A segunda
fase vai do Êxodo até a formação do judaísmo antigo no século V a.C. E a terceira fase
vai do judaísmo antigo até o século II d.C. com a perseguição e expulsão dos judeus
pelos romanos.
FONTE: <https://de-academic.com/pictures/dewiki/50/220px-Rembrandt_Harmensz._van_Rijn_035.jpg>.
Acesso em: 17 maio 2021.
37
Os assentamentos de Israel eram em áreas que ficavam nos arredores das
cidades-estado, vilas e povoados urbanos. Pela grande ocorrência da palavra behemah,
indicando pequenos animais, provavelmente ovinos, jumentos, bois, cabras e camelos,
a criação de gado foi a principal atividade de subsistência dos israelitas (DOUGLAS,
2006). As evidências de sítios arqueológicos mostram que, excetuando os elementos
característicos e distintivos de Israel, não há grandes diferenças culturais entre os
israelitas e os cananeus (MERRILL, 2001).
10
Com efeito, a terra em que vais entrar para possuí-la, não é como o
Egito de onde saíste, onde, depois de lançada a semente, devias regar
a terra com a força de teus pés, como se rega uma horta. 11A terra que
ides ocupar é uma terra de montes e vales, que bebe as chuvas do
céu. 12É uma terra de que o Senhor, teu Deus, toma cuidado, e para a
qual os seus olhos estão continuamente voltados do começo ao fim
do ano (Deuteronômio 11,10-12).
NOTA
Não há um consenso entre os estudiosos sobre a real diferença
entre nomadismo e seminomadismo. Além disso, a definição e
as diferenças dependem de uma série de variáveis, tais como o
tempo, a região e o tipo de sociedade. Uma tipologia amplamente
aceita, afirma ser, a presença da agricultura sazonal, a diferença
entre o nomadismo e seminomadismo, o que faz com que os
grupos seminômades tenham moradias permanentes, as quais
são abandonadas em algum período do ano.
38
QUADRO 4 – OS PATRIARCAS
39
3 ETNONÍMIA
O estudo da etimologia, etnonímia, antroponímia e toponímia dos povos da
antiguidade é sempre um empreendimento árduo e complexo. São povos multiétnicos,
em intenso contato com outros povos, se deslocando constantemente, incorporando
elementos de várias línguas, somado à escassez de fontes históricas e arqueológicas.
No caso hebreu, o fato de terem vivido por longo tempo como escravos e nômades,
acabou por retardar o desenvolvimento da escrita. Deste modo, seus primeiros escritos
foram em outros idiomas semíticos, como no caso do livro de Jó, que Moisés teria
escrito em proto-sinaítico.
FONTE: <https://i2.wp.com/www.biblestudywithrandy.com/wp-content/uploads/2014/06/House-of-David.
jpg?w=948&ssl=1>. Acesso em: 17 maio 2021.
40
O termo hebreu é substituído pelo termo Israel na transição do modo de vida
monádico para os assentamentos fixos e posterior constituição da monarquia. Os
hebreus ficam para trás com a vida de migrante, de “povo sem organização política” e
nasce Israel, como uma grandeza étnica, radicada em Canaã. Israel (Yisra’el) é o patriarca
neto de Abraão. Este teve seu nome trocado de Jacó (Yacob) para Israel por ocasião da
renovação do pacto de Yahweh com os descendentes do Abraão.
9
Quando Jacó voltou de Padã-Arã, Deus apareceu-lhe novamente e
o abençoou. 10 "Teu nome, disse-lhe ele, é Jacó. Tu não te chamarás
mais assim, mas Israel." 12 E chamou-o Israel. 11 Deus disse-lhe: "Eu sou
o Deus todo-poderoso. Sê fecundo e multiplica-te. De ti nascerão um
povo e uma assembleia de povos; e de teus rins sairão reis. 12 A terra
que dei a Abraão e a Isaac, eu te darei e à tua posteridade. 13 Depois,
Deus retirou-se de junto dele. 14 No mesmo lugar onde Deus lhe falou,
Jacó erigiu uma estela sobre a qual fez uma libação, e derramou óleo.
15
E deu o nome de Betel ao lugar onde Deus lhe tinha falado (Gênesis
35, 9-15).
O termo judeu, em hebraico yehudi, como designação não apenas dos membros
da tribo de Judá, mas de todos os descendentes de Abraão surge no pós-exílio babilônico
no século VI a.C. No período posterior, do domínio persa, o termo judeu deixa de ser aplicado
de forma exclusiva aos israelitas e adquire a conotação religiosa, identificando todo
seguidor da religião judaica, pois outros povos se convertem à religião dos filhos de Abraão.
FONTE: <http://www.templodeapolo.net/imagens/figuras/templodeapolo.net_
tmp729098023069548546.jpg>. Acesso em: 17 maio 2021.
41
As bases do judaísmo começam a ser formadas no exílio babilônico (586 – 539
a.C.). No pós-exílio é período de grandes e profundas transformações em Israel. É nesse
período que ocorre a redação da maioria dos escritos da Tanak, a Bíblia hebraica. A
Lei de Moisés passa a ter uma importância muito grande diante do desmantelamento
da vida litúrgica ligada ao templo. Como nem todos retornam do exílio, surge uma
relativa diferença entre os repatriados em Jerusalém e os exilados da diáspora. As
transformações que atingem estes dois grupos tornam-se elementos constitutivos da
formação e desenvolvimento do judaísmo (KONINGS, 1998).
Por mais que o judaísmo tenha relações profundas e constitutivas com a religião
de Israel do Antigo Testamento, trata-se da religião dos judeus, que nasce no exílio
babilônico e se consolida em 70 d.C., com a destruição do templo. Nesse sentido, essa
“nova religião” contrasta com a religião antiga (DOUGLAS, 2006).
NOTA
Sobre a confusão dos etnônimos: 1) hebreu – Abraão o patriarca
era chamado de hebreu; 2) Israel – os filhos e netos de Abraão eram
chamados de Israel; 3) judeu – após o exílio babilônico, os descendentes
de Davi, da tribo Judá, eram chamados de judeus; 4) israelense – todo
cidadão do Estado moderno de Israel, independente da origem étnica.
4 OS SEMITAS
A ideologia do purismo étnico, cultural e nacional sempre foi e ainda é uma
estratégia utilizada por grupos humanos como forma de afirmação de sua identidade.
A partir das sumárias informações históricas já mencionadas, percebe-se que Israel é
um grupo multiétnico. Uma realidade vivenciada por praticamente todos os povos da
antiguidade na Eurásia e África em maior ou menor grau.
42
Do ponto de vista da fenomenologia, a construção da identidade étnica de povo
é desenvolvida num processo marcado por duas dinâmicas: a primeira é a identificação e
assimilação de traços e elementos de outros grupos. A segunda dinâmica é o contraste,
ou seja, a rejeição de traços, elementos e características de outros grupos (BARTH,
1998). Esse processo esteve presente em Israel durante todo o seu desenvolvimento
enquanto povo e religião, no caso do judaísmo.
4.1 OS CANANEUS
Os cananeus são provavelmente o conjunto étnico que manteve o mais longo e
intenso contato com Israel, e por consequência, o que exerceu maior influência em sua
cultura. São identificados como sendo os moradores da costa e da colina Palestina. Os
cananeus são semitas descendentes de Canaã, filho de Noé, entre os quais se encontram
os edonitas, moabitas, amalecitas, amonitas, girgaseus, amoritas, perisitas, hivitas e os
jebusitas (Deuteronômio, 7, 1). Alguns estudiosos acreditam que em sentido genérico, o
termo cananeu também se refere aos amorreus e fenícios. Outros já acreditam que se
trata de etnônimos equivocadamente sobrepostos e que, portanto, são povos diferentes.
43
Os cananeus eram povos politeístas que veneravam deuses locais chamados
de Baal, que significa senhor, marido, chefe, possuidor. Estes títulos eram comuns entre
os semitas de Canaã. Os próprios parentes de Saul tinham nomes com esse sufixo
(Jerobaal, Esbaal, Isbaal, Meribaal). Os Israelitas percebem que a cada parte de Canaã
tem sua própria deidade, por isso eles os identificam no plural, baalim e não apenas
como uma só divindade (1 Reis 18, 18). Outra importante divindade cultuada entre os
cananeus era Moloc. No entanto, a grande rivalidade era entre Yahweh, Deus de Israel e
os baalim dos cananeus (KONINGS, 1998).
4.2 OS BABILÔNICOS
Os sumérios, apesar de não serem mencionados na Bíblia, merecem uma
menção dado sua importância para o desenvolvimento do que chamamos de civilização
do Oriente Próximo. Os sumérios teriam chegado à Mesopotâmia antes de 5.000 a.C.
Não se sabe ao certo de que ponto específico da Ásia eles vieram. O que se sabe é que
a língua suméria não encontra correlação cognata nem com as línguas antigas e nem
com as línguas modernas. É creditado a eles a invenção da escrita, a escrita cuneiforme.
Uma técnica de talhar (cunhar) em blocos de argila.
44
A sua origem é controversa. Segundo André Parrot, a zigurate procedia dos
templos de terraço. Desde o IV milênio, numerosos templos foram erguidos sobre altos
terraços artificiais, os quais teriam sido concebidos para que as habitações dos deuses
ficassem ao abrigo das inundações. A raridade deste tipo de arquitetura obriga a dar
primazia a uma explicação de carácter místico ou religioso (SANTOS, 2003, p. 189).
[...]
Torre de Babel
Relatos de épocas posteriores dizem que a muralha que rodeava a cidade fora
construída por Gilgamesh, rei de Uruk e herói de um dos primeiros épicos da história.
Segundo a Epopéia de Gilgamesh, um terço da cidade de Uruk era constituída de
templos, e outro terço, de jardins (FARAH, 2003, p. 1).
45
FIGURA 17 – ZIGURATE DE UR
Além desse grande legado que foi a escrita, os sumérios também inventaram a
roda, foram os primeiros a desenvolverem técnicas de construção de barragens, diques
e canais de irrigação, que posteriormente, serão desenvolvidos pelos egípcios. Pesa
sobre os sumérios o crédito de também terem desenvolvido conhecimentos e técnicas
de exploração e manipulação de forças ocultas sobrenaturais.
46
FIGURA 19 – O CÓDIGO DE HAMURABI
FONTE: <https://www.todoestudo.com.br/wp-content/uploads/2018/06/c%C3%B3digo-de-hamurabi.png>.
Acesso em: 17 maio 2021.
FONTE: <https://learnodo-newtonic.com/wp-content/uploads/2018/07/Babylon-Facts-Featured-
1024x384.webp>. Acesso em: 17 maio 2021.
47
5 POVOS NÃO SEMITAS
Dado o fato de a Palestina ser um grande espaço aberto, uma terra aberta
para os lados, seus povos tinham que conviver com as invasões que de um lado viam
da Mesopotâmia e do outro viam do Egito. ou seja, Israel era um corredor entre duas
grandes civilizações. Além disso, ainda tinha que lidar com as migrações de povos que
viam da Ásia Menor e do Mediterrâneo, como no caso dos filisteus. Como a Palestina
sempre foi uma região muito disputada, Kessler (2009) afirma que o surgimento de dois
reinos, Israel e Judá, se deve ao fato de um vácuo de poder das grandes potências da
antiguidade, assírios, babilônicos, persas, egípcios, gregos e romanos.
5.1 OS EGÍPCIOS
Ao lado dos assírios, babilônicos, persas, gregos e romanos, os egípcios foram
uma das grandes potências que se rivalizavam pelo controle do mundo antigo. Um reino
de três mil anos e trinta e quatro dinastias, o Egito sempre esteve presente na história
de Israel, ora como aliado, ora como inimigo. O Egito está no centro do evento mais
marcante da histórica de Israel, o Êxodo. O Êxodo é o evento que marca a separação
entre os hebreus nômades tribais e a nação de Israel.
Um dos fatores fundamentais que possibilitou que o Egito fosse uma grande
potência é a infalível cheia do Rio Nilo. Que deposita sedimentos ao longo de suas
margens, fertilizando o solo para a agricultura. Por isso o Egito foi considerado o “celeiro
do mundo mediterrâneo oriental” (MERRILL, 2002). Heródoto, historiador grego do século V
a.C. dizia que o “Egito era uma dádiva do Nilo”. Heródoto teria viajado pela região, porém
não se encantou com as maravilhas arquitetônicas do Egito. Ficou impressionado com
Nilo e entedia que o Egito dependia do Nilo para existir. Veja o relato do historiador:
48
os bens dos pobres se multiplicam; torna feliz cada um conforme seu
desejo... Não se esculpem pedras nem estátuas em tua honra, nem
se conhece o lugar onde ele está. Entretanto, governas como um
rei cujos decretos estão estabelecidos pela terra inteira, por quem
são bebidas as lágrimas de todos os olhos e que é pródigo de tuas
bondades (HERÓDOTO, 1998, p. 365).
49
A cosmovisão egípcia tem uma perspectiva otimista acerca do ser humano.
Tal perspectiva entende o ser humano como um ser bom, destinado a coisas boas. A
criação dos seres humanos é fruto da bondade divina. Este fora criado para se deleitar
nos prazeres terrenos. Sua única obrigação é a de empreender certo esforço cúltico
com a finalidade de manter o equilíbrio dos cosmos, para que as forças caóticas não o
destruam. Todo o aparato litúrgico e cerimonial tem como objetivo a manutenção desse
equilíbrio (MARQUES, 2015).
FONTE: <https://favpng.com/png_view/hand-drawn-illustration-of-ancient-egypt-ancient-egyptian-
religion-horus-osiris-myth-deity-png/DE8jNBNk>. Acesso em: 17 maio 2021.
Os reis e sacerdotes eram obrigados a passar pelo rito, como forma de marcar
o início da puberdade, que possuía múltiplos significados, entre os quais: marcar a
passagem para a puberdade; aumentar a fertilidade; como marca de filiação ao deus Rá
e também para finalidades médico-higiênicas.
50
Sobre a questão de o monoteísmo egípcio ter influenciado o monoteísmo
de Israel, Douglas (2006) e Silva (2019) descartam até mesmo a possibilidade de um
ateísmo egípcio e sua possível influência em Israel. Acredita-se que na verdade, o que
ocorreu no Egito do faraó Arkhenaton foi um culto monolatátrico e não monoteísta, ou
seja, admitia-se outros deuses, mas se cultuava preferencialmente o deus Aton. Eliade
(2008) admite que Israel transitou da monolatria para o monoteísmo no seu processo de
construção identitária e religiosa, porém, o mais provável é que o monoteísmo já estava
presente entre os antepassados distantes de Abraão.
Outro fator de contraste com Israel era a liturgia egípcia. O templo era restrito
aos sacerdotes, enquanto a população cultuava em casa os seus deuses familiares.
O culto aos grandes deuses seguia o mesmo formato dos serviços dispensados aos
faraós. Suas imagens eram despertadas matinalmente, eram lavados, vestidos,
recebiam desjejum, refeição ao meio dia e à tarde, ou seja, deuses que dependiam dos
seus súditos para tudo. Em contraposição, Yahweh é um Deus que não dorme, sempre
vigilante e autossuficiente (DOUGLAS, 2006).
5.2 OS PERSAS
Os persas são povos de origem indo-europeia que tiveram grande importância no
Oriente Médio. Sua cosmologia, teologia, sistema bancário, sistema postal influenciaram
profundamente os povos do Crescente Fértil, incluindo Israel. Os persas tiveram um
papel marcante na história de Israel, quando Ciro, o persa, derrotou os babilônicos e
permitiu que os judeus retornassem para sua terra.
51
FIGURA 22 – ARQUEIROS PERSAS
5.3 OS GREGOS
Os gregos são povos de origem indo-europeia. Fazem parte das civilizações
egeias, que além dos helenos (gregos) tem os cretenses e os miceanos. Os gregos
são responsáveis por um grande legado ao mundo ocidental, que inclui o idioma, a
democracia, a filosofia, a aritmética, a medicina e vultosa mitologia. Os gregos encerraram
o longo período da relativa autonomia judaica sob o domínio persa em 333 a.C.
52
De modo geral, o helenismo foi a concretização de um ideal de Alexandre
Magno: o de levar e difundir a cultura grega aos territórios que conquistava. Ao invés
disso, incorporou elementos tão heterogêneos, que o caráter heleno se diluiu. Foi nesse
período que as ciências tiveram seu primeiro e grande desenvolvimento, por causa da
fusão de civilizações milenares. Os judeus foram profundamente influenciados pelo
helenismo. Tanto os que viviam na Palestina como os que estavam na diáspora, dentro
do grande império helênico. A influência cultural helênica foi tão profunda entre os
judeus, que por volta de 250 a.C. o rei Ptolomeu II encomendou aos judeus de Alexandria
a tradução da Bíblia para o grego (KONINGS, 1998).
FONTE: <http://2.bp.blogspot.com/-9Bf02n4qz1k/UoL2VrqinLI/AAAAAAAADcE/5ODGzw69xPo/s1600/
Diapositiva85.jpg>. Acesso em: 17 maio 2021.
Essa tradução grega é chamada de Septuaginta (sigla LXX), dado que a tradição
atribui tal empreendimento a 70 sábios anciãos judeus (KONINGS, 1998). A Septuaginta
tornou-se tão importante entre os judeus, por ser o texto bíblico utilizado por muitos
judeus e cristãos do primeiro século, incluindo o próprio Jesus Cristo. Contudo, um
século antes, a influência helênica também produziu a paganização de vários costumes
judaicos. O ápice dessa relação cultural espúria foi a profanação do Templo em 168 a.C.
por Antíoco Epífanes, com instalação de estátuas de deuses gregos e sacrifícios de
animais impuros. Fato que foi o estopim para a revolta dos Macabeus.
O fato de os romanos não terem imposto sua cultura permitiu que, no contexto
do Novo Testamento, o helenismo continuasse sendo a cosmovisão dominante. A língua
grega era o veículo da cultura e do comercio. “[...] A maioria dos judeus eram “helenistas”:
comerciantes, profissionais liberais, ou até escravos que viviam nas diversas cidades do
Império Romano” (KONINGS, 2002, p. 1496). A língua grega praticamente se tornou a
língua franca do mundo antigo. Esse é um fato positivo que possibilitou que os discípulos
de Jesus disseminassem a mensagem cristã ao mundo conhecido de sua época.
53
O fato é que o helenismo deixou marcas profundas no judaísmo e no cristianismo.
O próprio templo de Salomão que Herodes “O grande” reconstruiu tinha certos detalhes
arquitetônicos helênicos. A helenização da Palestina Judaica pode ser percebida nas
inúmeras construções que exibem o estilo arquitetônico grego em mármore.
54
A infiltração das seitas filosóficas helênicas foi um dos primeiros grandes desafios
que o cristianismo nascente teve que lidar. O período patrístico, primeiro período da
historiografia cristã, tratou basicamente da conciliação entre a fé cristã e a filosofia grega
e da defesa apologética dos principais artigos do cristianismo diante do grego-helênico.
Muitos teólogos cristãos estavam convencidos de que a ideia de logos, a grega e a do
evangelho é o elo ente a filosofia e o cristianismo; e que o cristianismo é uma busca
filosófica pela verdade. Enquanto o Novo Testamento afirma, categoricamente, que a
verdade é uma pessoa – o logos, o verbo encarnado. O aforismo de Tertuliano atesta a
incompatibilidade: “O que tem Atenas a ver com Jerusalém?”.
5.4 OS ROMANOS
Por último, os romanos, povos também de origem indo-europeia. É provável
que nenhum povo tenha conseguido realizar tamanha façanha como os romanos. A de
construir o império mais famoso da história e um dos mais proeminentes em manter seu
legado, que durou cerca de dez séculos.
55
Os romanos tiveram uma importância política significativa para o destino do
judaísmo na Palestina, e principalmente para o surgimento do cristianismo, haja vista que
foi sob o domínio romano que Cristo foi crucificado. O fato de o cristianismo ter surgido
como uma seita do judaísmo, a influência romana deve ser analisada separadamente,
pois se trata de influências distintas, dadas as especificidades que a cisão provocou nos
judeus e nos cristãos do primeiro século e nos séculos posteriores. Por critério bíblico
neotestamentário, o foco será mais nos cristãos do que nos judeus.
56
LEITURA
COMPLEMENTAR
DA FILOSOFIA HELENÍSTICA À TEOLOGIA CRISTÃ. FORMAÇÃO DO DOGMA
COMO PROCESSO CRIATIVO
Alfio Cristaudo
57
Na passagem do termo noùs do âmbito da filosofia grega para aquele judaico,
bem como na recepção cristã, o acolhimento da fé bíblica comportou a redução dos
noùs ao nível das realidades criaturais e contingentes. O substantivo pnèuma abandona
gradualmente uma acepção material para passar a indicar a dimensão transcendente
e incorpórea: de fato, no epistolário paulino, pnèuma designa a irrupção da potência
divina em oposição à carnalidade pecaminosa do homem terrenal, aspecto ulteriormente
exasperado pela mentalidade gnóstica através da identificação da natureza pneumática
com a realidade divina e excedente, estruturalmente estranha, até mesmo hostil à
sensibilidade e à matéria. Finalmente, se na filosofia grega o lògos é o instrumento para
a comunicação do pensamento, o prólogo do quarto evangelho associa-se a retomada
deste termo à concepção veterotestamentária da palavra criadora, refundida junto à
representação da Sabedoria personificada: assim, o substantivo lògos foi usado como
título pessoal do filho de Deus pré-existente.
As diferentes fases destacadas pelo exame histórico das fontes podem levar a
concluir que o desenvolvimento do dogma coincide com a superposição de elementos
estranhos à fé evangélica original; de fato, os mesmos resultados, se considerados de
acordo com um critério de compreensão teológica, referem-se à existência do único
sujeito Igreja, que prossegue na tentativa de compreender e definir melhor a identidade
de Cristo, especialmente em relação ao dado da fé na unicidade de Deus: nesta
operação, os mestres cristãos adotaram, de tempos em tempos, os modelos linguísticos
e categoriais considerados mais apropriados. E isso com o único propósito de expressar
a mesma fé na proclamação do Cristo do Evangelho, o enviado de Deus para a salvação
do mundo.
58
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• Os hebreus e sua origem. Os semitas que tiveram sua origem com Abrão, o caldeu. A
peregrinação e a trajetória das tribos nômades e a história dos patriarcas.
59
AUTOATIVIDADE
1 Os hebreus podem ser colocados em paralelo com outras grandezas multiétnicas
do mundo antigo, com semelhanças culturais, sociais, econômicas e religiosas
que, ao longo do seu processo de formação e desenvolvimento, influenciaram-se
mutuamente. Elabore um texto dissertativo, destacando os fatores distintivos dos
hebreus em relação aos povos com quem mantiveram contato.
I- Hebreu.
II- Israelita.
III- Judeu.
3 Durante toda a história de ocupação dos hebreus na palestina, eles tiveram que
conviver com uma diversidade de povos semitas e não semitas, mantendo modos de
vida muito semelhantes, influenciando e sendo influenciado por estes povos. Analise
as proposições a seguir:
I- Os cananeus foram os povos com quem os hebreus tiveram contato mais extenso e
prologando.
ENQUANTO
60
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) As duas proposições são verdadeiras, e a segunda proposição está em oposição
à primeira.
b) ( ) As duas proposições são falsas, e a segunda proposição está em oposição à
primeira.
c) ( ) A primeira proposição é verdadeira, e a segunda proposição é falsa.
d) ( ) A primeira proposição é falsa, e a segunda é uma proposição verdadeira.
4 Além da influência dos povos semitas, seus congêneres, os hebreus, também tiveram
que lidar com a intromissão das grandes potências da antiguidade, os chamados
“donos do mundo antigo”. Entre estes, encontram-se os romanos, os gregos, os
assírios, os egípcios, os babilônicos e os persas. Sobre a influência das superpotências
entre os hebreus, assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) Os hebreus foram escravos por tanto tempo no Egito, que esse fato acabou
influenciado o surgimento do monoteísmo hebreu e a prática da circuncisão.
b) ( ) Fora a questão do politeísmo, entre a religião egípcia e religião hebraica não há
grandes diferenças.
c) ( ) Os gregos tiveram grande influência cultural sobre Israel, mas esta logo foi
substituída pela cultura romana.
d) ( ) Entre a religião persa, o zoroastrismo e o judaísmo existem certos aspectos
semelhantes.
61
62
REFERÊNCIAS
BARBOSA, M. T. Do antigo oriente próximo a Roma: uma abordagem da antiguidade.
Guarapuava: Unicentro, 2009.
DOUGLAS, J. D. O novo dicionário da Bíblia. Tradução: João Bentes. 3 ed. Rev. São
Paulo: Vida Nova, 2009.
ELIADE, M. Tratado das religiões. Tradução: Fernando Tomaz; Natália Nunes. São
Paulo: Martins Fontes, 2008.
GUARDINI, R. O fim da Idade Moderna. Trad. M. S. Lourenço. Lisboa: Edições 70, 2000.
HERÓDOTO. História. 2. ed. Tradução de Mário da Gama Kury. Brasília: UNB, 1998.
KESSLER, R. História social do Antigo Israel. Tradução: Aroldo Reimer. São Paulo:
Paulinas, 2009.
63
KONINGS, J. A Bíblia e suas origens. Petrópolis: Vozes, 1998.
RYKEN, L. 10 Coisas que você precisa saber sobre a Bíblia como literatura. Tradução
de Willian Campos da Cruz. Monergismo, [S. l.], 31 jul. 2019. Disponível em: http://
monergismo.com/novo/cosmovisoes/10-coisas-que-voce-precisa-saber-sobre-a-
biblia-como-literatura-leland-ryken/. Acesso em: 17 maio 2021.
SILVA, R. Especial Egito: o faraó do êxodo. [S. l.: s. n.], 2019, 1 vídeo (28 min).
Publicado pelo canal Evidência NT. Disponível em: https://www.youtube.com/
watch?v=ccWsLlzjCD8. Acesso em: 17 maio 2021.
64
UNIDADE 2 —
O MUNDO E A CULTURA DO
ANTIGO TESTAMENTO
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará
autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.
CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
65
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 2!
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66
UNIDADE 2 TÓPICO 1 —
A VIDA CULTURAL DOS HEBREUS
1 INTRODUÇÃO
“Às margens dos rios de Babilônia, nos assentávamos chorando,
lembrando-nos de Sião.
Nos salgueiros daquela terra, pendurávamos, então, as nossas
harpas, porque aqueles que nos tinham deportado pediam-nos
um cântico. Nossos opressores exigiam de nós um hino de alegria:
Cantai-nos um dos cânticos de Sião.
Como poderíamos nós cantar um cântico do Senhor em terra estranha?
Se eu me esquecer de ti, ó Jerusalém, que minha mão direita se paralise!
Que minha língua se me apegue ao paladar, se eu não me lembrar
de ti, se não puser Jerusalém acima de todas as minhas alegrias.”
(Salmos 137, 1-6)
Por questões mais lógicas do que empíricas, as teses mecanicistas que afirmam
ser o tamanho do grupo e o tipo de economia uma determinação dos recursos naturais
disponíveis, sempre obtiveram maior aceitação do que as teses dialéticas, que afirmam
a influência, mas não uma determinação dos recursos naturais sobre o tamanho e o tipo
de economia praticada pelos grupos humanos.
Nesta relação, que não é mecânica e sim dialética, ocorre que os seres humanos,
ao mesmo tempo em que, culturalmente se adaptam e transformam o meio ambiente,
sofrem certa influência das características e recursos disponíveis no ambiente físico.
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O fato é que a cultura e o modo de vida de qualquer grupo humano estão
diretamente relacionados com o seu habitat. É por isso que existem variados modos de
vida espalhados pelo planeta. A cultura imprime sua marca no ambiente assim como
carrega em si marcas constitutivas desse ambiente. No caso dos hebreus, essa relação
povo e ambiente tem contornos ainda mais dramáticos, pois a imagem do “paraíso”, do
“novo Éden”, da “terra que mana leite e mel” foi nutrida na memória coletiva por vários
séculos. Para um antigo hebreu, a noção de identidade se efetiva dentro da esfera
comunal que depende da terra para se concretizar.
Os primeiros cinco séculos da vida dos hebreus, desde a saída do Egito até a
formação da nação de Israel são caracterizados pelo modo vida agrário. As informações
bíblicas e extrabíblicas dão conta de que os primeiros séculos dos hebreus na Palestina
se desenvolveram dentro desse modo de vida.
É a partir dessa perspectiva que se deve analisar a vida dos hebreus do período
pré-estatal. Baseada em uma estrutura de linhagem segmentária, a questão da
sobrevivência ocupa as concepções e as práticas do camponês. E tais práticas cotidianas
refletem a reprodução do grupo, não só fundamentado no aspecto econômico, como
também na reprodução de outras relações: festas, cerimônias, trocas recíprocas, visitas,
trocas matrimoniais entre tantas outras.
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Uma característica em comum encontrada na maioria dos povos agrários,
dos povos sem escrita, são coincidências normativas produzidas pelas pressões do
ambiente e sua relação umbilical com a religião. Abrindo apenas um parêntese; é desta
característica que reside toda a dificuldade de descrever o modo de vida desses povos.
Entre os hebreus, nos quais o fator religião tem ainda mais peso e relevância
na discrição e análise do seu modo de vida, tem-se a sensação de estar escrevendo
ou lendo sempre a mesma coisa. Sobre qualquer aspecto, seja a vida econômica, seja
política, seja a vida familiar, seja a arte ou seja a sexualidade, tudo orbita em torno da
religião javista.
Não é por outro motivo que não esse, que baal se tornou a principal divindade
de Canaã. “Baal era o deus das tempestades, controlador da chuva e da fertilidade,
chamado de senhor do céu e da terra e o que está montado nas nuvens” (DOUGLAS,
2006, p. 96).
NOTA
Estrutura de linhagem segmentária é a organização típica de sociedades
sem Estado, sem instituições administrativas e judiciárias especializadas,
baseada em segmentos de linhagens, sublinhagens, clãs, subclãs, estrei-
tamente ligados por ancestralidade comum. Além do fator genealógico, as
linhagens segmentárias permanecem unidas graças à existência de uma
cultura religiosa e uma moral religiosa comum.
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Elias replicou: Não temas; volta e faze como disseste; mas prepara-
me antes com isso um pãozinho, e traze-mo; depois prepararás o
resto para ti e teu filho.
Porque eis o que diz o Senhor, Deus de Israel: a farinha que está na
panela não se acabará, e a ânfora de azeite não se esvaziará, até o dia
em que o Senhor fizer chover sobre a face da terra (1 Reis 17, 13 –14).
Eis o que diz o Senhor a Jeremias a propósito da seca:
Judá está coberta de luto, e às suas portas enlanguesce o povo, a
cabeça pendida para a terra. De Jerusalém se levanta um clamor de
angústia.
Os grandes da cidade enviaram os servos à procura de água.
Encaminham-se estes às cisternas; água, porém, não encontram,
e voltam com os recipientes vazios, envergonhados, confundidos,
cobertas as cabeças (Jeremias 14,1-3).
As sementes secaram sob os torrões, os celeiros estão vazios, os
armazéns, arruinados, porque falta o trigo.
Como geme o rebanho, e como anda errante o gado por falta de
pastagens! Até mesmo os rebanhos de ovelhas padecem.
Clamo a vós, Senhor, porque o fogo devorou a erva do deserto, a
chama queimou todas as árvores do campo;
os próprios animais selvagens suspiram por vós, porque as correntes
das águas secaram, e o fogo devorou a erva do deserto (Joel 1,17-20).
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2.1 O MODO DE PRODUÇÃO
De acordo com Kessler (2009), com relação ao modo de produção dos hebreus,
não há nenhuma novidade ou elemento que os diferenciasse dos demais povos do
período ou do contexto cananeu. Vale lembrar, acadêmico, que do ponto de vista
macroeconômico, as sociedades com Estado desse período viviam sob o regime de
servidão coletiva.
Os servos tinham que produzir para sua própria subsistência, entregar parte de
sua produção para o Estado e trabalhar compulsoriamente nas obras públicas, o que
era chamado de corveia. Os hebreus provavelmente foram submetidos a esse regime
no Egito, antes da saída dos hicsos e na Babilônia de Nabucodonosor (BARBOSA, 2009).
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O ano sabático era um modo de construir e fazer a manutenção de uma
memória de longa duração entre os hebreus. Memória esta que estava conectada
com a criação de Yahweh, que “descansou” no sétimo dia, prática do shabat, e com a
memória perpétua que se deve manter sobre o perdão das dívidas, da restituição de
terras perdidas, de ações de graça, de gratidão e de generosidade em resposta aos
feitos de Yahweh (DOUGLAS, 2006).
FONTE: <http://2.bp.blogspot.com/-FgEyw379zdU/UpeAbzfJdLI/AAAAAAAAmmw/cTrb_Ei2uqs/s1600/arado.gif>.
Acesso em: 18 maio 2021.
O modo de vida simples dos hebreus tem sido comprovado por evidências
arqueológicas. Tais evidências encontram-se tanto nos relatos de estelas egípcias sobre
os hebreus, quanto nos vestígios materiais encontrados na região que testemunham tal
modo de vida.
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Durante o período pré-estatal os povoados hebreus eram compostos por
casas simples, que apresentavam a mesma grandeza, não havendo assim, grandes
desigualdades, indicando uma configuração social mais igualitária. Esse aspecto
igualitário inclui até mesmo as relações de gênero. As mulheres trabalhavam em
atividades que, posteriormente serão atividades exclusivas para os homens.
Falava ainda com eles, quando chegou Raquel com o rebanho do seu
pai, porque era pastora (Gênesis 29, 4-9)
Ora, as sete filhas do sacerdote de Madiã vieram tirar água do poço e
encher as gamelas para dar de beber às ovelhas de seu pai.
Sobrevindo então alguns pastores, as expulsavam. Moisés, porém,
tomou sua defesa e deu de beber ao seu rebanho (Êxodo 2, 6,17).
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Contra a argumentação de que se trata de episódios isolados, caso não fossem
ocupações ordinárias, o texto faria tal menção de destaque para evidenciar que seria algo
extraordinário. Há ainda casos de ocupações mais proeminentes, como por exemplo, a
profetisa e juíza Débora:
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Davi partiu dali e refugiou-se na caverna de Odolão. Seus irmãos
e toda a sua família, ouvindo isso, foram juntar-se a ele. Todos os
que se viam em miséria, os endividados, os descontentes, foram ter
com Davi, e ele tornou-se o seu chefe. E estiveram com ele cerca de
quatrocentos homens (1 Samuel 22,1,2).
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As transformações sociais e no modo de vida vão acontecendo gradativamente. Aos
poucos, a figura do rei vai adquirindo importância, assumindo parte da responsabilidade
e o lugar da estrutura patriarcal, sendo responsável pelo bem-estar do povo, sua defesa
e pelo acesso às dádivas divinas e da natureza.
3 A COSMOVISÃO HEBRAICA
Mesmo cientes dos problemas de imprecisão relativos à tradução de certos
termos, optamos por utilizar supra textualmente o termo cosmovisão. O termo alemão
weltanschauung tem sido traduzido por cosmovisão ou visão de mundo. A princípio
se pode pensar que não há dificuldade alguma em se traduzir welt, para mundo e
anschauung, para visão. A questão é que o termo tem sua origem na filosofia alemã,
com Immanuel Kant (1724 – 1804). E em cada nova utilização, Dilthey (1838 – 1911),
Mannheim (1893 -1947), Heidegger (1889 – 1976), o termo adquire novas acepções e até
mesmo acepções antagônicas. Na acepção kantiana, weltanschauung é empregado de
forma análoga à filosofia da cultura (BLACKBURN, 1997).
Com relação aos povos da antiguidade, não está claro para os antropólogos,
sociólogos e filósofos da religião, quais os limites, as diferenças e a natureza da relação
entre a cosmovisão de um grupo e sua religião. No entanto, a ideia de que a religião
é parte constitutiva da vida cultural desses povos é amplamente aceita. O que nos
leva a entender que a cosmovisão desses povos tem como realidade subjacente a sua
religião. Nesse sentido, dizer “cosmovisão religiosa”, consiste em redundância, pois
toda cosmovisão é necessariamente religiosa. Além disso, alguns teóricos da religião
acreditam que a característica definidora do ser humano é o homo religiosus, como
afirma Poupard (1984, p. 860): “O homem religioso é aquele que crê na presença de uma
força, o sagrado, e que ajusta o seu comportamento a essa crença”. E, ainda, Eliade
(1996, p. 14) afirma que:
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[...] O homo religiosus é um homem que transmite uma mensagem:
esta mensagem vem da história, mas transcende a história [...] O
homo religiosus vive uma experiência religiosa. Ele encontra-se
numa série de situações existenciais que o colocam em contato
com o mundo transcendente. Através das diversas situações por ele
assumidas, penetramos no seu universo espiritual. Essas situações
deixaram traços. Em definitivo, a história das religiões é a história
do homo religiosus mergulhado na realidade existencial das suas
crenças, das suas experiências e do seu comportamento. Esse
homem crê na origem sagrada da vida e no sentido da existência.
Assim, o homo religiosus é o homem que “toma conhecimento do
sagrado, poque este se manifesta, se mostra como qualquer outra
coisa completamente diferente do profano”.
Devido à influência grega que legou ao ocidente uma noção pejorativa de mito
em termos intelectuais, como aquilo que foge à lógica hipotética dedutiva, há certa
resistência por parte de alguns segmentos religiosos em aceitar que tais narrativas
seriam de natureza mitológica, como nos informa Marques (2015, p. 18):
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A Bíblia hebraica tem, no seu início, um livro que começa com um
capítulo no qual se descreve a criação do universo material, dos seres
vivos e do homem. Trata-se do Livro do Gênesis, que foi colocado
no início do conjunto bíblico não porque seja o de redação mais
antiga, mas exatamente porque relata o início de tudo. Este relato
foi tomado à letra por muitos e em diferentes épocas (ainda hoje por
algumas comunidades), mas é óbvio para os estudiosos que se trata
de um relato mítico, que apenas pretende explicar o mundo como
ele se apresentava aos autores dos relatos, bem como os redatores
(compiladores) finais do texto.
O seu tema fundamental, do ponto de vista teológico, é o tema da
criação. Tudo o que existe é obra do Deus único, Yahweh, que o criou
pela palavra, num tempo primordial, longínquo, dispondo tudo tal
qual como se encontra hoje, através de processos de criação e de
separação dos diversos elementos, até resultar algo ordenado e com
sentido, após o estado caótico original: «a terra era informe e vazia,
as trevas cobriam o abismo e o sopro de Deus (ruah ̓elohîm) movia-
se sobre a superfície das águas» (Gênesis 1, 2-3).
Em primeiro lugar, vamos entender o que é de fato o mito, depois entender qual a
sua função e por último, os tipos de mito. O conceito de mito aqui apresentado se orienta
pelas formulações desenvolvidas por Croatto (2001), Eliade (1989) e Detienne (1998).
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O mito fornece uma explicação satisfatória para o contexto em que foi elaborado.
Entre outras coisas, sua função é a de tornar coerente explicações que de outro modo
não seriam compreendidas.
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dos primeiros onze capítulos se situam num tempo primordial, mítico,
sem personagens históricos, sendo esses relatos muitas vezes de cariz
etiológico, procurando proporcionar explicações para o tempo do autor,
de difícil compreensão ou aceitação, através de histórias colocadas nas
origens ou tempos muito antigos, elaboradas para esse fim.
Vivendo o povo israelita num determinado contexto cultural,
nomeadamente entre os egípcios e os povos do Próximo Oriente Antigo,
é natural que tenha absorvido muito do material mítico próprio desses
povos e que o tenha incorporado, adaptando-o à sua especificidade,
nos seus próprios escritos. Assim, com as descobertas arqueológicas
recentes, séculos XIX e XX, de textos diversos desses povos, foi possível
aos estudiosos dos textos bíblicos detectar semelhanças, em muitos
relatos, entre as histórias bíblicas e as outras, relativas a contextos e a
problemáticas idênticas (MARQUES, 2015, p. 18).
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Então Deus disse: "Façamos o homem à nossa imagem e semelhança.
Que ele reine sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus, sobre os
animais domésticos e sobre toda a terra, e sobre todos os répteis que
se arrastem sobre a terra." Deus criou o homem à sua imagem; criou-o
à imagem de Deus, criou o homem e a mulher. Deus os abençoou:
"Frutificai, disse ele, e multiplicai-vos, enchei a terra e submetei-a.
Dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todos
os animais que se arrastam sobre a terra" (Gênesis 1, 26-28).
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3.3 CONCEPÇÕES JUDAICAS ACERCA DO SOFRIMENTO
A história do povo hebreu é um dos capítulos da história universal em que é possível
verificar a presença constante e aguda do sofrimento humano. Uma interpretação literal da
narrativa do Gênesis causa a impressão de que há uma relação direta de causa e efeito
entre errar e ser automaticamente punido como consequência do episódio da queda
humana. Em diálogo com a narrativa teodiceica do Gênesis, a tradição sapiencial judaica
dá importante destaque ao tema do sofrimento humano, que a partir da realidade física
espraia-se para as dimensões da qualidade de vida do indivíduo, do aspecto psicológico,
religioso e espiritual (DOUGLAS, 2006; MARQUES, 2015).
Como não existe na língua hebraica o termo para sofrimento no sentido amplo
e abstrato, como por exemplo, o conceito moderno de “sofrimento existencial”, é típico
do pensamento e da literatura judaica usar o sofrimento e enfermidades físicas e dores
específicas nos órgãos internos como metáforas do sofrimento generalizado, que atinge
toda a interioridade e exterioridade do ser humano:
Fiquei mudo, mas sem resultado, porque minha dor recrudesceu. Meu
coração se abrasava dentro de mim, meu pensamento se acendia
como um fogo, então eu me pus a falar: Fazei-me conhecer, Senhor,
o meu fim, e o número de meus dias, para que eu veja como sou
efêmero. A largura da mão: eis a medida de meus dias, diante de vós
minha vida é como um nada; todo homem não é mais que um sopro.
De fato, o homem passa como uma sombra, é em vão que ele se
agita; amontoa, sem saber quem recolherá (Salmos 39, 2-6).
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A questão do sofrimento também se relaciona com o sistema de sacrifícios
judaicos. O conjunto de prescrições ritualísticas da lei mosaica acabou por estabelecer
uma relação com o sagrado mediada pelo ciclo de dádivas e bençãos. Quanto mais
se oferece sacrifícios e ofertas mais se atrai o favor divido. Quanto menos ou nada se
oferece, menos chance de se atrair a atenção divina. Daí se estabelece um ciclo vicioso
que desemboca na “teologia da retribuição”. Esta teologia estabelece uma relação
estreita entre o pecado e castigo pela via do sofrimento. Assim como a obediência
é recompensada pela via da prosperidade dos bens e da prole extensa (DOUGLAS,
2006; KESSLER, 2009; MARQUES, 2015).
– De onde vens?
Yahweh então lhe provoca perguntando se ele observou seu servo Jó, e
elogia este homem em relação à sua fidelidade e seu caráter irrepreensível, mas
Satanás reage e argumenta que Jó só é assim fiel, porque Yahweh o cobre com toda
sorte de benção, e desafia propondo que Jó sofra a fim de se verificar se continuará
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fiel como o é na bonança. Yahweh aceita o desafio, confiando na boa índole de seu
servo, e então, num primeiro momento, retira-lhe os bens, os servos e os filhos.
Entretanto, Jó permanece fiel mesmo diante dessas tragédias.
– Viu como meu servo é leal? Mesmo diante do sofrimento inútil que eu lhe
causei, ele continua fiel!
Mas Satanás argumenta que ele continua fiel só porque não sentiu na própria
pele a dor. Então Yahweh outorgou a Satanás o poder de flagelar a Jó, colocando
como limite, apenas, não lhe tirar a vida. Desse momento em diante, Satanás cuidou
para que a vida de Jó se tornasse um inferno, fazendo-o doente da cabeça aos pés.
Jó se sentiu injustiçado, pois sabia que não tinha cometido pecado algum,
e que seu sofrimento, portanto, não era um castigo merecido. Diante de tamanha
desgraça, Jó se tornou rejeitado pela sociedade, pelos amigos e até por sua própria
mulher, que queria que ele amaldiçoasse a Yahweh e morresse. Porém, mesmo em
meio a dor física e ao desprezo, Jó permaneceu fiel (Jó, 1-42).
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Diante do que parecia ser um paradoxo – o sofrimento de um justo, num
contexto em que todo sofrimento estava relacionado à infração moral e ao pecado,
a narrativa surpreende com um desfecho que aponta para a inerência do sofrimento
humano. Diante da inexorabilidade do sofrimento, Jó se recolhe ao sentimento de
criatura (CROATTO, 2013).
4 O PARENTESCO
O parentesco é a primeira forma de organização da vida em coletividade. É um
sistema que consiste em definir os limites da família, em atribuir estatutos e papéis aos
indivíduos e subgrupos, em regular a atividade sexual do grupo, em exprimir relações
econômicas segundo a idade, o sexo e o lugar dos indivíduos no grupo. Parentesco
se define pelo conjunto das relações que unem geneticamente, ou seja, por filiação e
descendência, ou voluntariamente, por meio da aliança, do pacto de fidelidade de um
certo número de indivíduos (LÉVI-STRAUSS, 1982).
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Uma concepção tipicamente hebreia ou judaica diz respeito à sacralidade da
família, principalmente dos pais. A ordenação presente na Torá: “honra teu pai e tua mãe”,
não tem paralelo nos códigos congêneres do Oriente Próximo. E é importante frisar que
é pai e mãe, não somente pai. Isto significa que ambos estão no mesmo patamar de
respeito, de acordo Chwarts (2016). De modo que o desrespeito aos país constitui-se em
erro gravíssimo: “Aquele que ferir seu pai ou sua mãe, será morto” (Êxodo 21,15); “Maldito o
que despreza o pai e a mãe! E todo o povo dirá: Amém!” (Deuteronômio 27,16). Os primeiros
conselhos da literatura sapiencial são conselhos sobre a importância dos pais:
Geralmente, contava com pai e mãe, filhos solteiros, filhos casados com esposas
e filhos, viúvas, aparentados, servos e escravos e estrangeiros recebidos como hospedes.
Na casa paterna se concentrava o poder político e econômico, que eram exercidos pelo pai.
Essa é uma configuração típica do período patriarcal (CHWARTS, 2016).
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O patriarca conduzia seu clã como uma expressão de sua devoção a Yahweh. Isso
pode ser evidenciado nos nomes dados aos filhos e nos nomes de lugares significativos
denominados pelo patriarca. Prática que resultava em uma forma de transmitir valores,
crenças de geração em geração e a importância de se manter fiel a Yahweh.
Neste tempo não havia sobrenomes, a patronímia era um hábito comum dos
grupos de linhagem segmentários patriarcal, de utilizarem o nome do pai para identificar
dentro do próprio grupo os indivíduos com o mesmo nome, visto que o repertorio de
nomes não era tão vasto, resultando em muitos indivíduos com nomes iguais no mesmo
clã ou tribo (DOUGLAS, 2006).
Durante este período, o pai liderava os ritos religiosos na família. Tinha poderes
amplos sobre a vida daqueles que pertenciam a sua casa. O pai era sucedido pelo
primogênito, que herdava sua posição, nome, função e propriedades.
Fato é que nem a Torá legisla sobre tal assunto. Não há nenhuma lei específica
sobre isso. E sobre as práticas pré-existentes à Torá, existem basicamente três posturas:
a Torá pode regulamentar, pode combater e pode ser indiferente, como neste caso.
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Judá escolheu para Her, seu primogênito, uma mulher chamada
Tamar. Her, porém, o primogênito de Judá, era mau aos olhos do
Senhor, e o Senhor o feriu de morte. Então Judá disse a Onã: "Vai,
toma a mulher de teu irmão, cumpre teu dever de levirato e suscita
uma posteridade a teu irmão." Entretanto Onã, que sabia que essa
posteridade não seria dele, maculava-se por terra cada vez que se
unia à mulher do seu irmão, para não dar a ele posteridade (Gênesis
38, 6-9).
Como a residência nesse sistema é patrilocal, em que os noivos vão morar com
os parentes do pai do novo, os demais membros da família, principalmente as filhas,
fundam linhagens aparentadas paralelas. A reunião dessas linhagens paralelas forma
o clã (mishpahah). A associação de vários clãs forma a tribo (shevet ou matteh). Como
esse sistema está fundamentado no parentesco de um ancestral primitivo comum, um
dos seus principais pilares, senão o principal, é o casamento endogâmico, de acordo
com (CHWARTS, 2016). O casamento endogâmico, preferencialmente com parentes
consanguíneos e monogâmicos é a união matrimonial ideal expressa na Torá:
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O casamento endogâmico era a união preferencial, pois, era favorável para
manter a consanguinidade, os acertos econômicos e, no caso específico dos hebreus,
era indispensável para manter a identidade cultural e religiosa. Ademais, o casamento
exogâmico produz a assimilação cultural e religiosa, que acaba conduzindo às práticas
idolátricas (MERRILL, 2001).
Assim como a fertilidade era interpretada como favor de Yahweh, ser estéril
também era interpretado como uma maldição. O matrimônio é uma teia de relações
complexas entre os hebreus e os demais povos da antiguidade. Parte desta complexidade
deve-se aos resquícios do modo de vida nômade tribal e parte se deve à influência de
outras culturas.
Na maioria dos casos, um dote era pago pelo noivo à família da noiva. Era muito
comum o dote ser pago por meio de trabalho do noivo para o sogro. Douglas (2006),
esclarece que não se deve interpretar o dote como pagamento pela noiva e sim uma
espécie de compensação pela perda de um membro valioso da família. Quando se casa
um filho homem, automaticamente a família recebe mais um membro, mais uma mão de
obra. No caso de se casar uma filha mulher, família perde um membro e por causa disso
deve ser compensada.
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A idade ideal para o casamento era por volta dos 18 anos, porém, era aconselhável
fazer um jovem casar-se aos 13 anos, para que, entrando na puberdade, não passasse
pela experiência da ejaculação e fosse tentado a pecar (GONDIM, 2012). Um casamento
não poderia ocorrer sem o consentimento e a benção do patriarca da família. E era ele
quem escolhia com quem os filhos se casariam. Em alguns casos, o jovem escolhia uma
moça e os pais tratavam das negociações, mas raramente um filho se casava sem o
consentimento dos pais. E uma vez dada a benção dos pais ao casal, esta não poderia
ser revogada (DOUGLAS, 2006). De acordo com Chwarts (2016), Rebeca era o arquétipo
de esposa ideal entre os hebreus:
Se um homem tiver vendido sua filha para ser escrava, ela não sairá
em liberdade nas mesmas condições que o escravo. Se desagradar
ao seu senhor, que a havia destinado para si, ele a fará resgatar; mas
não poderá vendê-la a estrangeiros depois de lhe ter sido infiel. Se a
destinar ao seu filho, tratá-la-á segundo o direito das filhas. Se tomar
outra mulher, não diminuirá nada à primeira, quanto à alimentação,
aos vestidos e ao direito conjugal. Se lhe recusar uma destas três
coisas, ela poderá partir livre, gratuitamente, sem pagar nada" (Êxodo
2, 7-11).
Quando um teu irmão hebreu, homem ou mulher, se tiver vendido a ti,
ele te servirá seis anos, mas no sétimo ano deixá-lo-ás ir livre de tua
casa (Deuteronômio 15, 12).
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Nos casos em que uma criada era dada de presente de casamento pelo pai da
noiva, os filhos dessa criada eram reputados como da família. O mesmo ocorria com
os filhos de escravas e concubinas. Todos estes arranjos e costumes que envolviam o
casamento e a sexualidade tinham como finalidade resolver o problema da descendência.
Em muitos casos era a própria esposa que escolhia uma escrava ou uma concubina
para o seu marido, como no caso de Sarai:
Sarai, mulher de Abrão, não lhe tinha dado filho; mas, possuindo uma
escrava egípcia, chamada Agar, disse a Abrão: "Eis que o Senhor me
fez estéril; rogo-te que tomes a minha escrava, para ver se, ao menos
por ela, eu posso ter filhos." Abrão aceitou a proposta de Sarai. Sarai
tomou, pois, sua escrava, Agar, a egípcia, passados dez anos que
Abrão habitava a terra de Canaã, e deu-a por mulher a Abrão, seu
marido (Gênesis 16, 1-3).
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Outro tema importante relacionado ao matrimonio e à sexualidade é a questão
do incesto. A prática do incesto consiste na relação sexual entre parentes próximos
consanguíneos ou afins. Não há informações específicas e cabais sobre incesto nos
escritos bíblicos. A lei mosaica proibia relações sexuais entre certos parentes próximos
e afins, porém, não há uma explicação do porquê de tal proibição. O fato é que a prática
existia entre os hebreus e com a compilação dos escritos da Torá, tais práticas foram
proibidas:
Pelo fato de existirem pessoas, em especial mulheres com as quais não se pode
ter relações sexuais, os grupos humanos se viram obrigados a trocarem mulheres entre
si, criando a regra da exogamia e estabelecendo alianças com outros grupos que eram
potenciais rivais (LÉVI-STRAUSS, 1982).
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O interdito à relação sexual irrestrita significa para alguns teóricos o chamado
“ponto crítico”. Aquele que estabelece a transição do ser humano da condição de
natureza para a humanidade. De acordo com Lévi-Strauss, a regulação do sexo teria
a função de divisor de águas entre o reino da natureza e o reino da cultura. A cultura
se funda na relação sexual e/ou concomitantemente na classificação de mulheres
permitidas e mulheres não permitidas para o intercurso sexual, o que caracteriza a
proibição do incesto (LÉVI-STRAUSS, 1972).
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4.2 O PAPEL DA MULHER
O papel da mulher nos primórdios de Israel deve ser analisado à luz do modo
de vida nômade, seminômade e campesino. Em todos esses contextos dificilmente há
assimetrias de gênero e estrutura hierárquica social rigorosa. Todos os membros do
grupo são de fundamental importância para a manutenção e sobrevivência do grupo.
Por isso as relações são simétricas.
O segundo fator, é que, o que a lei mosaica prescreve e ordena deve ser
compreendido como o modo de ser e o comportamento ideal para manutenção das
relações saudáveis entre os indivíduos. Na prática, sabe-se que nem tudo o que está
escrito na lei era obedecido. Desse modo, não só a mulher, mas todos os membros de
Israel, homens, servos, escravos, concubinas e até mesmo o próprio Yahweh, em algum
grau, não recebiam o tratamento devido prescrito pela lei.
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vossos filhos e vossas filhas, vossos servos e vossas servas,
assim como o levita que se encontrar dentro de vossos muros,
porque ele não tem parte nem herança em Israel (Deuteronômio
12,11,12, grifo nosso).
Vós estais hoje todos em presença do Senhor, vosso Deus, vossos
chefes, vossas tribos, vossos anciãos, vossos oficiais, todos os
homens de Israel, vossos filhos e vossas mulheres, o estrangeiro
que mora no acampamento, desde o cortador de lenha até o
carregador de água (Deuteronômio 29,10-11, grifo nosso).
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As manifestações divinas, as hierofanias, não eram acontecimentos ordinários.
Em todo o Antigo Testamento há pouquíssimas pessoas que passaram por essas
experiências, de serem visitadas por Yahweh ou por seus emissários diretos. De modo
que, os que vivenciaram tal encontro eram tidos como pessoas especiais. A narrativa
bíblica mostra o próprio Yahweh se dirigindo diretamente às mulheres:
NOTA
Nas sinagogas, a partir do século I a.C., havia um espaço para
mulheres separado dos homens. Já, de acordo com achados
arqueológicos, alguns templos não possuíam um andar superior
para mulheres, como, por exemplo, a Sinagoga de Korazim. São
evidências arqueológicas que sugerem que não havia separação
entre homens e mulheres nessa e em outras sinagogas antigas.
4.3 O LEVIRATO
O levirato é um terno de natureza jurídica que deriva do latim levir – “irmão
do marido”. O levirato é uma instituição que tem como função resolver o problema da
falta de descendência nos grupos clânicos de linhagem segmentária. Quando o homem
morria sem deixar descendentes, esperava-se que seu irmão solteiro esposasse a viúva
para prover descendentes ao seu irmão falecido. O levirato não é costume exclusivo dos
hebreus. Também era praticado entre os babilônicos e cananeus. E entre os hebreus, já
era praticado antes da Torá, como sugere a icônica narrativa de Judá e sua nora Tamar
(Gênesis, 38) (DOUGLAS, 2006).
96
Como se trata de um costume, de uma prática fluida e não de um código
normativo, na prática, no cotidiano dos hebreus havia muitas situações que extrapolavam o
ideal preconizado pelo costume, fazendo surgir uma série de variações desse preceito.
4.4 OS ANCIÃOS
Há uma crença coletiva que circula nas sociedades do Ocidente sobre o respeito
e a devoção que as sociedades orientais teriam pelos anciãos. Que estes seriam os
guardiães da tradição, da história, da sabedoria e do legado deixado pelos antepassados
e por causa disso seriam reverenciados. Não que tal crença esteja completamente
equivocada. A questão é que a ideia de “povos orientais” é uma categoria inventada
por nações europeias. As categorias Oriente e Ocidente servem mais para designar a
posição geográfica do que de fato diferenças culturais. É bem provável que povos ditos
orientais encontrem um grau maior de estranhamento entre outros povos orientais do
que entre alguns povos ocidentais. Além disso, o apreço e deferência aos mais velhos
está presente em praticamente todos os povos da antiguidade.
Em todas as civilizações a autoridade tem sido investida sobre aqueles que, por
terem mais idade e experiência, são julgados como sendo mais qualificados para exercer
funções de orientação e liderança. Tal investidura está fundamentada no princípio
natural que os que chegaram primeiro à vida e que mais viveram foram provados pela
experiência e que por isso, possuem melhor qualificação para cuidar, orientar e ensinar
os que estão chegando.
97
É por isso que em todas as civilizações se estabelece idade mínima para exercer
certas funções. Os títulos de líderes encontrados entre diversos povos da antiguidade
eram termos equivalentes à “idade avançada”. Entre os hebreus se utiliza o termo zaqen.
Termo correspondente ao termo gerontes utilizado pelo poeta Homero. Os espartanos
usavam prebys para identificar seus anciãos. Os romanos usavam o termo senatus e os
árabes usavam o termo sheik para os anciãos (TAYLOR, 2006).
98
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
99
AUTOATIVIDADE
1 A relação entre os seres humanos e o espaço natural onde habitam é uma relação
de simbiose. Com o tempo, os seres humanos incorporam e desenvolvem modos de
vida próprios e condicionados pelo ambiente, ao mesmo tempo em que transformam
o ambiente, adaptando-o às suas necessidades. Elabore um texto dissertativo,
apresentando a relação e os desafios que a terra de Canaã, ou Palestina, impôs à
sobrevivência dos hebreus.
2 O modo de produção asiático, ou servidão coletiva, era empregado nas nações que
possuíam Estado. Nele, os súditos eram obrigados a produzir para sobrevivência e
produzir um excedente para abastecer a corte. Além disso, era obrigado a prestar
trabalho compulsório nas obras públicas e fazer parte do exército do soberano.
Associe os itens, utilizando o código a seguir:
I- Corveia.
II- Ano sabático.
III- Agricultura de subsistência.
3 Parentesco é a relação que une duas ou mais pessoas por vínculos genéticos ou
sociais. O parentesco estabelecido mediante um ancestral em comum é chamado
parentesco consanguíneo, enquanto, que, o criado pelo casamento e outras relações
sociais recebe o nome de parentesco por afinidade. Analise as proposições a seguir:
ENQUANTO
100
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) As duas proposições são verdadeiras, e a segunda proposição está em oposição
à primeira.
b) ( ) As duas proposições são falsas, e a segunda proposição está em oposição à primeira.
c) ( ) A primeira proposição é verdadeira, e a segunda é proposição é falsa.
d) ( ) A primeira proposição é falsa, e a segunda é uma proposição verdadeira.
101
102
UNIDADE 2 TÓPICO 2 —
A VIDA RELIGIOSA DOS HEBREUS
1 INTRODUÇÃO
“Podemos partir de um traço caracterológico dos judeus que domina
sua relação com os outros. Não há dúvida de que eles têm uma
opinião particularmente elevada de si próprios, de que se consideram
mais eminentes, de posição mais alta, superiores a outros povos –
dos quais também se distinguem por muitos de seus costumes. Ao
mesmo tempo, são inspirados por uma confiança peculiar na vida,
tal como a que se deriva da posse secreta de algum bem precioso,
uma espécie de otimismo: pessoas idosas o chamariam de confiança
em Deus.”
(Sigmund Freud)
103
cananeus, pelo menos no início. Ela contava com templos, ritos estruturados, sacrifícios
e classe de sacerdotes. Inscrições encontradas nos vestígios arqueológicos atestam o
uso do título de sumo sacerdote nas religiões canaanitas (DOUGLAS, 2006).
2 O SISTEMA DE SACRIFÍCIOS
O sistema de sacrifícios judaicos é um sistema complexo e sincrético que tem
sua origem em práticas ancestrais de Abraão e nas nações circunvizinhas. Nessas
nações são encontrados muitos aspectos paralelos que remetem ao sistema de
sacrifícios judaico. Contudo, como se trata de nações consideradas pagãs para Israel,
há práticas que não coincidem e principalmente, a diferença do significado por trás de
toda a liturgia sacrificial. Em todo o sistema de sacrifícios há uma gradação de vítimas
sacrificadas segundo seu valor econômico ou simbólico. Geralmente o ápice dessa
gradação de vítimas é o primogênito humano ou uma virgem. Mesmo que em algum
momento tenha havido este tipo de sacrifício em Israel, pois há fortes indícios que sim,
este é terminantemente proibido pela Torá:
104
os dois principais tipos de sacrifício. O termo ólah, para a oferta que é inteiramente
consumida pelo fogo e o termo zevah, para a oferta que é comida conjuntamente com
o ofertante. Para além de uma questão de troca mercantil ou indenizatória, típica dos
sacrifícios das nações circunvizinhas, o sistema de sacrifícios de Israel é um sistema
didático, que simboliza a necessidade e os meios de expiação da condição de corrupção
psíquica e moral humana, por meio dos sacrifícios (‘olah), e a necessidade de comunhão,
por meio das ofertas pacíficas (zevah) (DOUGLAS, 2006; MERRILL, 2002).
Contudo, é preciso chamar à atenção para a diferença que existe entre o ideal
preconizado pelo sistema religioso e o comportamento religioso do fiel no cotidiano. A
forma mais básica e primitiva do comportamento religioso está orientada para o ciclo
vicioso dádiva-benção. Independentemente de como se inicia neste ciclo, se é ofertando
pelo medo da punição ou ofertando em agradecimento pela dádiva recebida, de qualquer
modo o fiel é perenemente incentivado a ofertar. Essa é a dinâmica operacional por trás
da chamada “teologia da retribuição”. Na prática, este sistema, e esta teologia foram
responsáveis pelo tesouro acumulado pelo templo em Israel.
105
De acordo com Kessler (2009), com a institucionalização religiosa na monarquia,
em alguns momentos esse tesouro religioso se funde com o tesouro real para servir às
demandas do Estado:
A partir das ofertas dos fiéis que visitam o templo e das “ofertas reais”
(1Rs 14, 25s; 15, 18; 2Rs 12, 19; 14, 14; 16, 8; 18, 15; 24, 13). Primeiramente,
o tesouro do templo sempre é diferenciado em relação ao tesouro
real. Em segundo lugar, o tesouro do templo é sempre mencionado
em segundo lugar, o que pode ser atribuído ao interesse especial dos
redatores deuteronomistas no templo. Em terceiro lugar, sempre se
pressupõe que o rei pode dispor de ambos os tesouros. Este último
detalhe evidencia o quanto os santuários, sobretudo os centrais,
estavam inseridos na ordem estatal (KESSLER, 2009, p. 119).
Isso mostra que o templo, para além de sua importância espiritual, religiosa
e simbólica, também desempenhou uma função econômica importante. Como a Torá
ordenava a não aparecer diante de Yahweh com mãos vazias (Êxodo 23, 15; 34, 20), havia
uma intensa movimentação econômica em função das ofertas e oferendas no templo.
Nesse sentido, fica exposto que no contexto da monarquia, a relevância e a supremacia
da esfera religiosa são relativizadas. O Estado representa a união político-administrativa,
que anteriormente era representada única e exclusivamente pela religião.
3 AS FESTIVIDADES RELIGIOSAS
De forma análoga ao que ocorre com o fenômeno religioso, as festas e as
celebrações são fenômenos universais, estando presentes nas manifestações humanas
mais remotas. Registros históricos e arqueológicos dos mais variados possíveis,
testemunham a importância das celebrações para as civilizações passadas. Dentre
os múltiplos sentidos atribuídos às celebrações estão: o agradecimento, o colhimento
ao chegante, a celebração de momentos da vida familiar, a celebração da colheita, os
rituais tradicionais, a memória, os ritos de passagem, a solidariedade, a generosidade, a
gratuidade, a devoção, a diversão e a penitência.
106
As refeições sangrentas são uma das principais formas de aproximação à
comunhão entre os deuses e os seres humanos desde os primórdios. Celebrações
divino-humanas como estas eram praticadas pelos povos do Oriente Próximo, a exemplo
dos gregos e dos romanos.
Além dos animais domésticos comestíveis, pão e vinho são os alimentos mais
presentes na mesa de um hebreu. O pão é o alimento mais básico da dieta hebraica. O
plantio da uva está presente desde os tempos imemoriais, como apresentado na saga
de Noé. Por isso, tornou-se uma bebida muito popular. O terceiro alimento mais comum
na dieta de um hebreu é o azeite da oliveira, segundo o Kitchen (2006). Além de serem
ingredientes presentes em todas as celebrações, ter na mesa pão e vinho era um sinal
de provisão, de ter o necessário, o suficiente para a sobrevivência. Veja o caso deste
hebreu e sua serva:
107
3.1 O HABURAH
O haburah é uma refeição comunitária de múltiplos formatos. Nesta, o formato
não é importante, apenas o sentido. Pode ser qualquer ocasião para celebração dos laços
fraternos, para promover a união, para apagar as diferenças, fortalecer a mutualidade.
Principalmente em tempos adversos, tempos que em Israel somam-se muitos. O
haburah pode ser a celebração de um casamento, uma aliança, um acordo de negócio,
uma circuncisão e outros momentos especiais. Carmo Filho (2003) nos informa que
haburah, provavelmente tenha-se originado do termo heber, mesmo nome do patriarca,
que significa “amigo” (CARMO FILHO, 2003).
Veja a descrição de uma cerimônia de haburah apresentada por Carmo Filho
(2003, p. 17):
a) Lavavam as mãos, hábito típico dos judeus (Marcos 7,3) “... seguem
os ensinamentos que receberam dos antigos. Só comem depois de
lavarem as mãos, com bastante cuidado”;
b) Consumiam algum tipo de alimento acompanhado do primeiro
cálice; um detalhe neste item, é que todos os participantes
pronunciavam uma benção. Era uma forma de o grupo unido
entrar em sintonia com o sagrado, e caracterizava sua abrangência
comunitária;
c) Novamente lavavam as mãos “cuidadosamente”;
d) É o momento da refeição comunitária. O dono da casa, o
anfitrião, proferia a benção do pão e o distribuía pedaços para os
participantes assentados em redor da mesa;
e) Havia a benção do segundo cálice e todos prosseguiam na refeição;
f) No final todos tomavam o terceiro cálice chamado de Ação de
Graças, cuja benção era feita pelo anfitrião, representando o grupo
reunido.
3.2 O QUIDDUS
O termo quiddus ou kidush em hebraico significa “benção”. É a benção ou prece
proferida a princípio para anunciar o início do shabat, “dia de descanso”, ou em dias
de festas. Está relacionado à prescrição: “lembra do dia de sábado para santificá-lo”. O
anfitrião ou o chefe da família segura o cálice e ora santificando-o (CARMO FILHO, 2003).
A prece do quiddus é composta por duas partes. Inicia-se com a declamação do
trecho da Torá (Gênese 2,1-3) no qual pela primeira vez menciona-se o Shabat e depois
segue-se a oração feita pelos sábios especialmente para o quiddus. Entre as duas partes
está a bênção do vinho – Borê pri haguefen. Antes da bênção do vinho há duas palavras
em aramaico, avisando aos presentes que se preparem para a oração. A declaração
"Bendito sejas... por cujos mandamentos somos santificados" significa que a mitzvah é
uma maneira de se alcançar um nível de santidade (MITZVAH, 2018).
108
O quiddus é uma prática familiar dos tempos tribais que posteriormente aparece
como celebração na sinagoga durante o exílio babilônico para manter viva a memória da
comunidade familiar e étnica, com relação aos feitos de Yahweh (CARMO FILHO, 2003).
109
FIGURA 3 – REPRESENTAÇÃO DA PÁSCOA JUDAICA NO ÊXODO
FONTE: <https://seedsoffaith.cph.org/wp-content/uploads/2017/07/cph_30256304907-768x1008.jpg>.
Acesso: em 10 jan. 2021.
110
E acontecerá que, quando vossos filhos vos disserem: Que culto
é este? Então direis: Este é o sacrifício da Páscoa ao Senhor, que
passou às casas dos filhos de Israel no Egito, quando feriu aos
egípcios, e livrou as nossas casas. Então o povo inclinou-se, e adorou
(Êxodo 12, 26,27).
Guarda o mês de Abibe, e celebra a Páscoa ao SENHOR teu Deus;
porque no mês de Abibe o SENHOR teu Deus te tirou do Egito, de
noite. Então sacrificarás a Páscoa ao Senhor teu Deus, das ovelhas
e das vacas, no lugar que o Senhor escolher para ali fazer habitar o
seu nome. Nela não comerás levedado; sete dias nela comerás pães
ázimos, pão de aflição (porquanto apressadamente saíste da terra do
Egito), para que te lembres do dia da tua saída da terra do Egito, todos
os dias da tua vida. Levedado não aparecerá contigo por sete dias
em todos os teus termos; também da carne que matares à tarde, no
primeiro dia, nada ficará até à manhã. Não poderás sacrificar a páscoa
em nenhuma das tuas portas que te dá o Senhor teu Deus; Senão no
lugar que escolher o Senhor teu Deus, para fazer habitar o seu nome,
ali sacrificarás a páscoa à tarde, ao pôr do sol, ao tempo determinado
da tua saída do Egito. Então a cozerás, e comerás no lugar que
escolher o Senhor teu Deus; depois voltarás pela manhã, e irás às tuas
tendas. Seis dias comerás pães ázimos e no sétimo dia é solenidade
ao Senhor teu Deus; nenhum trabalho farás (Deuteronômio 16, 1-8).
O pão sem fermento que comiam, era feito com os grãos moídos
das espigas recém-colhidas. A razão de comer unicamente este tipo
de pão está relacionada com as antigas tradições que falavam de
influências maléficas que havia nas casas, quando o alimento estava
ficando escasso.
Utilizar o fermento que restou da colheita anterior para fazer
fermentar o fruto da nova colheita não era tido como prática correta.
(Compare esta ideia de não usar o fermento velho no fruto da colheita
nova, com I Co 5.8: “Então vamos comemorar a nossa Páscoa, não
com o fermento, o fermento velho do pecado e da imoralidade, mas
com o pão sem fermento, o pão da pureza e da verdade”) (CARMO
FILHO, 2003, p. 32).
Alguns autores acreditam que a celebração da Páscoa e dos pães ázimos são a
mesma celebração, e que no episódio do Êxodo a festa dos pães ázimos fora incorporada
à páscoa, com atribuição de novo sentido. Tanto Carmo Filho (2003), quanto Douglas
(2006), acreditam que as duas celebrações coexistiram separadamente durante muitos
111
séculos. E que por ocasião da reforma religiosa de Josias ocorre a junção e as duas festas
tornam-se uma. De qualquer modo, acadêmico, vale destacar que as duas celebrações
estão relacionadas, seja pela ocasião do mês de abib ou pela proibição do fermento,
com uma oferenda e agradecimento a Yahweh, memorialmente renovadas a cada ano.
4 A ARTE JUDAICA
Ao contrário do que muitos pensam a Torá não condena nenhuma expressão
artística e sim a idolatria. É provável que o veto à idolatria tenha desencorajado o
desenvolvimento das artes visuais entre os judeus. Olhando para o campo das artes
como um todo, existem poucas evidências nas narrativas bíblicas e nos achados
arqueológicos sobre a arte hebraica. De modo geral, não é possível estabelecer uma
distinção clara entre a arte hebreia ou judaica e a dos demais povos em períodos
anteriores à dominação grega, quando de fato se tem uma arte com matizes e
características próprias do judaísmo. Sabe-se que a maioria dos ofícios e das artes
práticas pelos povos do Oriente Próximo também eram praticadas pelos hebreus. Entre
elas conta-se a xilogravura em metais e joias, bordados e olaria (WISEMAN, 2006).
Se nas artes visuais não houve desenvolvimento entre os hebreus, nas artes
performáticas e literárias se desenvolveu um alto padrão de expressão artística. Os
hebreus deixaram grande legado na música sacra e na literatura em prosa e poesia.
O legado nestas artes fora importante elemento para o desenvolvimento da cultura
ocidental. A música e a dança são expressões artísticas que sempre estiveram presentes
entre os hebreus. Estão presentes nas celebrações, nos momentos de alegria familiar,
nas cerimonias religiosas, nas conquistas militares e até nos momentos de tristeza e
lamento (WISEMAN, 2006).
112
Entre os instrumentos citados nas narrativas bíblicas estão o címbalo, a harpa, a
cítara, a flauta, a corneta, a lira, a trombeta, o tamboril e o saltério. Não sendo expressões
exclusivas da cultura hebraica, parte da influência na música e na dança vem das
culturas egípcia e fenícia (STRADING, 2006).
FONTE: <https://www.justviolin.org/uploads/2/6/8/0/26802979/editor/hebrew-instruments.
png?1584627971>. Acesso em: 18 maio 2021.
113
A sexualidade é outro tema muito presente, principalmente entre os assírios e
os egípcios. Pela ausência desse tipo de imagens entre os hebreus, é provável que eram
consideradas excessos ou até cruezas obscenas.
114
encontra paralelo entre os povos do Oriente Próximo. Alguns estudiosos afirmam que
a religião do Antigo Testamento se resume à antítese entre a verdadeira adoração a
Yahweh e a ameaça da idolatria (MOTYER, 2006).
Em momentos excepcionais em que havia a necessidade da arte da
representação iconográfica, contratavam-se artistas estrangeiros para a produção de
imagens, com exceção da imagem de Yahweh, como no caso da construção do templo
de Salomão:
115
TABELA 2 – PRINCIPAIS CÓDIGOS DO PERÍODO PATRIARCAL
116
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
117
AUTOATIVIDADE
1 Para alguns estudiosos do fenômeno religioso, a vida social e cultural dos povos da
antiguidade é um mero reflexo, uma espécie de decalque do universo religioso, dado a
tamanha dependência que possuem deste. Elabore um texto dissertativo, destacando
os efeitos práticos na vida dos hebreus em função do monoteísmo javista.
I- Zevah.
II- Ólah.
III- Mitzvah.
3 Assim como a vida social e cultural é um mero reflexo da esfera religiosa para os
povos antigos, suas festividades e celebrações guardam um sentido análogo, em
que a festa se torna uma experiência gradiente com o transcendente ou com a
transcendência, indicando que culto e celebração são realidades imiscuídas. Sobre a
religiosidade e as celebrações judaicas, classifique V para as sentenças verdadeiras
e F para as falsas.
( ) A Páscoa é uma refeição comunitária que possui diversos sentidos, podendo ser
celebrada em muitas ocasiões pela comunidade judaica.
( ) Os principais ingredientes da dieta hebraica são: pão, peixe, mel e vinho.
( ) O kiddus consiste em uma prece proferida para abertura do shabat desde os tempos
tribais.
( ) O aniconismo é o veto à representação de formas humanas ou divinas não somente
entre os hebreus, mas em todas as religiões abraâmicas.
118
Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:
a) ( ) F – F – V – V.
b) ( ) F – V – V – V.
c) ( ) F – V – V – F.
d) ( ) V – F – F – V.
4 Os sacrifícios humanos faziam parte da ritualística nos cultos de diversos povos. Nos
sistemas de sacrifícios dos povos da antiguidade havia uma gradação de vítimas
sacrificadas segundo seu valor econômico ou simbólico. Geralmente, o ápice desta
gradação de vítimas sacrificadas era um primogênito humano. Elabore um texto
dissertativo, estabelecendo uma diferença entre o sistema de sacrifícios dos povos
do Oriente Próximo e o sistema de sacrifícios dos hebreus.
I- Os hebreus possuíam refinada habilidade nas artes e grande acervo artístico antes
do período mosaico.
II- O grande legado deixado pelos hebreus foi nas artes performáticas e literárias.
III- Ao contrário da maioria dos códigos legais da antiguidade, que eram quase que
exclusivamente códigos civis, o código hebreu, ou lei mosaica, era quase que
exclusivamente um código moral.
119
120
UNIDADE 2 TÓPICO 3 —
A VIDA POLÍTICA DOS HEBREUS
1 INTRODUÇÃO
“Todos os anciãos de Israel vieram em grupo ter com Samuel em
Ramá,e disseram-lhe: Estás velho e teus filhos não seguem as tuas
pisadas. Dá-nos um rei que nos governe, como o têm todas as nações.”
(1 Samuel 8, 4-5)
O mais famoso dos chefes juízes foi Sanção, conhecido por sua força hercúlea.
Após vieram Saul (status de rei pelo profeta Samuel), Davi e Salomão.
121
2 A ORGANIZAÇÃO POLÍTICA NO PERÍODO TRIBAL
Os israelitas possuíam uma organização política simples como os demais povos
nômades ou seminômades da Palestina. Após o período do cativeiro egípcio e tomada
da terra de Canaã, a organização simples baseada no parentesco e na atuação de juízes
eventuais, será aos poucos transformada em uma estrutura burocrática que culminará
na instituição da monarquia. Primeiro, iremos descrever a organização política tribal,
seguido dos fatores de transição condicionantes até a formação do Estado monárquico
em Israel. Esta era estrutura da organização política após o processo de sedentarização
(Figura 7).
Tribo
(shevet)
Clã
(mishpahah)
Chefia masculina
"Casda do pai"
FONTE: O autor
122
Nesse processo de sedentarização as tribos se unem para enfrentar as cidades-
estados de Canaã. Surge então a anfictiônia israelita. Esse modelo de confederação de
tribos, que se reúnem episodicamente para combater inimigos comuns, tem sua origem
na Grécia.
Os gregos reuniam seus clãs e tribos tendo por critério e motivo a necessidade
de fortalecimento para combater inimigos, mas principalmente pelo vínculo sagrado. De
modo semelhante, no caso israelita, o principal motivo e critério era o culto a Yahweh.
Havia o fato das doze tribos que se reuniam em Canaã serem todas de descendentes
de Abraão, mas o motivo fundamental era o de combater os inimigos de Yahweh. Os
demais motivos eram secundários. Posteriormente, durante a monarquia surgem outras
motivações para a guerra (DOUGLAS, 2006).
123
recenciamento e centralização do poder, quando se trata dos grupos tribais de linhagem
clânica, como o caso hebreu, a dinâmica interna tem um papel muito importante na
mudança social. Veja a Figura 8:
FONTE: O autor
À luz de tudo o que fora apresentado está claro o caráter religioso tanto do povo
hebreu quanto do Estado monárquico Israelita. A grande importância que os israelitas
dão a esfera religiosa é o elemento norteador da vida política, social e econômica. Em
termos de relevância e influência, a esfera religiosa e a relação com Yahweh passou por
vários momentos de recrudescimento e arrefecimento, que vão deste o nomadismo
idólatra, o estabelecimento em Canaã e formação de ethos religioso mosaico, o
descumprimento dos preceitos divinos, o sofrimento e arrependimento exílico até o
ciclo interminável de dominações e diásporas. Desse modo, pode-se estabelecer um
contraste entre o modo de vida simples tribal campesino e o modo de vida complexo
urbano estatal. Na transição de um estilo de vida para o outro tem-se paulatinamente o
abandono da observância dos preceitos da Torá.
124
Alguns teóricos, como Carmo (2001), acreditam que a constituição de um
governo ou um poder centralizado, necessariamente enfraquece e fragiliza a força,
a coesão e autoridade da estrutura familiar, baseada na autoridade do pater família,
do pai (‘av), mas na verdade, a fragilização dos laços familiares e o esgarçamento do
tecido social ocorrem antes da formação do Estado. O estado apenas acentua e acelera
esse processo de degradação familiar e social. Alguns elementos presentes desde a
conquista da terra de Canaã são elucidativos para entender todo o processo que se
desenvolveu posteriormente. Um desses elementos foi a presença de remanescentes
cananeus que permaneceram na terra após a conquista das tribos israelitas.
125
santuário central que ficava a cargo da classe sacerdotal. No final do século VII, no
período babilônico, todos os santuários locais foram fechados e ocorre a introdução da
figura do sumo sacerdote, como no contexto religioso canaanita. Mesmo assim, Merrill
(2001), afirma que havia uma simplicidade cúltica entre os hebreus comparada com os
povos do Oriente Próximo. O número de estelas ou monolitos religiosos dos hebreus e
dos demais povos comprovam tal simplicidade.
126
Por mais que se possa pensar que os princípios estavam expressos na lei
serviriam para qualquer situação, na prática se tem outro contexto bem distinto ao
contexto em que a lei fora dada (SORJ, 2014). Não havia informações claras de como
deveriam ser tratadas as questões de ordem política num Estado. E com o Estado surge
outro problema, a questão geopolítica, que diz respeito às estratégias de administração,
manutenção e expansão territorial, mas que também não são contempladas pela
legislação mosaica.
127
TABELA 3 – LINHA DO TEMPO DAS GRANDES POTÊNCIAS
JUDAÍSMO
GREGOS
Neemias/Esdras 5
HELENISMO Malaquias/Zacarias
330 Alexandre na Judéia 4
CRISTIANISMO
37 Calígula
41 Cláudio
Apóstolos e
evangelistas, profetas
e mártires
79 Tito Destruição do 2º Templo
81 Domiciano Cristãos x judeus 2
96 Nerva, Trajano Perseguições romanas
Diante dos problemas políticos apresentados, tudo nos leva a acreditar que o
ideal por trás da expansão, estatização e centralização do poder não só não estava
em consonância com a lei mosaica, como também não estava em consonância com
a vontade de Yahweh. A recusa de Samuel, a resposta de Yahweh e as constantes
exortações dos profetas para que se voltasse ao modo de vida tribal simples corroboram
essa interpretação (Vide 2.1 Modo de Produção).
128
4 AS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS E CULTURAIS NO
PERÍODO MONÁRQUICO
Apesar de todas as transformações ocorridas, não se deve pensar que o antigo
modo de vida foi completamente extinguido. No contexto monárquico, os dois modos
de vida conviviam paralelamente.
129
A riqueza de alguns não é exatamente fruto da pobreza de outros, porém, no
interior desta diferenciação está o sistema de crédito que opõe credores e devedores,
que antes eram regidos por princípios de solidariedade, perdão e generosidade estatuídos
pela lei mosaica. O esgarçamento do tecido social e diferenciação econômica e social
são facilmente percebidos nas duras críticas tecidas pelos profetas Isaías e Miquéias ao
reino do sul e do profeta Amós ao reino do norte:
130
A consanguinidade cede lugar ao local de moradia comum e às listas de
deportados. As províncias formadas por exilados de Israel estão cercadas por províncias
de outros povos. O resultado são os casamentos mistos e acentuação da degradação
moral e religiosa (KESSLER, 2009).
Merrill (2001) chama a atenção para o que considerou ser uma característica
positiva para sobrevivência dos israelitas no contexto exílico. No exílio os israelitas se
mostraram o povo de fácil adaptação. Uma relativa coesão e uma habilidade de serem
“bons cidadãos” na terra de seus algozes. Nesse sentido, eles absorvem profundamente
o estilo de vida da sociedade em que vivem. E, ao mesmo tempo, mantêm sua
religiosidade e tradições ancestrais. Exemplos desse comportamento adaptativo são a
adoção de nomes babilônicos de Ester, Mardoqueu, Daniel e seus companheiros.
Como vassalo do império persa, o fato de retornarem a sua terra de origem não
faz Israel uma nação soberana politicamente. Eram um povo, mas não eram uma nação
soberana. Embora sua identidade estivesse fundamentada nas experiências religiosas
e na vida dos patriarcas e no episódio do Êxodo, a reestruturação do legado cultural
e religioso no pós-exílio ocorre com a escrituração da Torá. A redação dos escritos da
Torá foi uma estratégia e uma forma de manter viva a identidade religiosa. E a partir da
lei, das memórias dos profetas e dos escritos sapienciais se projeta e se constrói uma
imagem idealizada da vida comunitária de Israel (KONINGS, 1998).
A partir desse momento se estabelece uma distinção clara entre “o Israel fiel”
e “o Israel infiel. No processo de reconstrução da vida nacional, as transformações
atingem mais a elite do que o povo como um todo. Uma parte da elite foi assimilada no
contexto do exílio.
131
A assimilação significa uma intensa participação política e econômica com
a cultura dominadora tanto no contexto do exílio como após o exílio, vivendo sob o
domínio da nação dominadora. Como o lugar da elite é a cidade, as cidades sobrevivem
do intenso fluxo de comércio de trocas. Uma intensa rotina comercial exige que se
comercialize a todo tempo, incluindo o sábado. Também exige que se sente à mesa para
fechar negócios. Sendo este o modo quase que exclusivo de se concretizar parcerias
comerciais.
É por esse fator que existem inúmeras referências a tendas e metáforas como
cortar a corda de uma tenda, tenda forte, tenda alargada, que demonstram o quanto o
nomadismo permaneceu no imaginário, nas crenças coletivas de Israel. É a partir deste
imaginário monádico que os escritos da Torá são produzidos (DOUGLAS, 2006).
132
O profetismo é um movimento de renovação moral e religiosa e de denúncia das
mazelas sociais. O profeta é compreendido como sendo o porta voz da vontade divina
e exprime o que Deus lhe permite compreender a respeito da realidade presente ou, às
vezes, mas não necessariamente, futura.
Apesar de toda experiência sofrida por Israel, com potencial de eliminar todo e
qualquer vínculo com a religião javista, a ligação desse povo com Yahweh se manteve
viva. Nas crônicas de Esdras e Neemias encontra-se um capítulo que coroa do modo
lapidar a relação entre Yahweh e esse povo. Uma confissão pública de pecados e um
compromisso público coletivo de guardar a lei, por parte daqueles que acabavam de
passar pela experiência do exílio:
Nestes episódios fica claro a força que o monoteísmo javista possui como
elemento estruturante do ethos judaico. A questão do nacionalismo étnico e a religião
não se separam. Este um é dos fatores, talvez o principal fator que explica a violência
da revolta dos Macabeus, os piedosos hassidim, quando este fator de unidade sofre
a ameaça de ser extinto, quando da profanação do templo e perseguição aos judeus
piedosos por Antíoco Epífanes (KONINGS, 1998).
133
À luz de tudo o que fora apresentado pode-se perceber que, do ponto de vista
sociológico, após os cativeiros, exílios e deportações há um esfacelamento do tecido
social do povo hebreu. As transformações sociais ocorridas e os milhares de judeus
que permaneceram na diáspora, espalhados por todos os cantos do Oriente Próximo
comprovam tal afirmação. Do ponto de vista antropológico, pode-se dizer que um
conjunto de crenças fundamentais do monoteísmo javista sobreviveu e se tornou o
liame entre o judaísmo posterior e o cristianismo.
134
LEITURA
COMPLEMENTAR
OS HEBREUS
Michele Tupich
O território palestino nesse período era composto por quatro regiões: a faixa
junto ao Mar Mediterrâneo; uma zona de montanhas e colinas áridas; uma faixa estreita
entre o Jordão; e os semiáridos que pertencem ao deserto da Síria e Arábia. Em geral,
uma região que não favorecia a prática da agricultura. Os Hebreus começaram seu
povoamento em Canaã, de onde migraram para o Egito, provavelmente incentivados
pelos Hicsos e impulsionados pelo clima seco que dificultava a sobrevivência que
dependia da agricultura.
Entretanto, foi sob a liderança de Salomão, filho do rei Davi, que os Israelitas
tiveram maior desenvolvimento. O exército foi expandido, obtiveram o controle das rotas
comerciais, das caravanas que comerciavam incenso e perfumes com as rainhas da
Arábia meridional, desenvolveram a comercialização pelo Mar Mediterrâneo e pelo Mar
Vermelho. Salomão desenvolveu um reinado pacífico e diplomático e, com sua morte,
135
explodiram duas tensões: a primeira foi o conflito entre os pontos de vista político e
religioso, a outra foi a competição latente entre as tribos setentrionais e Judá ao sul.
Como resultado dessas discordâncias, o reinado dividiu-se em dois, o reino de Israel ao
norte e o de Judá ao sul.
Segundo Barucq, o reino de Israel não teve longa duração e foi dominado
pelos assírios, os quais eram controlados por Sargão II, que converteu a região em uma
província assíria. Já o reino de Judá seguiu a política diplomática de Salomão com o
Egito, a Assíria e a Babilônia, submetendo-se às formas de vassalagem, pagando tributos
e alianças, o que garantiu uma existência mais longa, de quase dois séculos. Por volta
de 587 a.C., Nabucodonosor e seu exército ocuparam Jerusalém em caráter definitivo. A
maioria da população e certamente os que se encontravam nas camadas superiores da
sociedade foram levados para a Babilônia como cativos. Nessa circunstância, portanto,
desapareceram os agrupamentos populacionais que caracterizavam os povos hebreus.
136
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
137
AUTOATIVIDADE
1 Anfictiônia é uma organização de caráter religioso que surgiu na Grécia, no Período
Arcaico, que congregava vários povos, antes do surgimento da Pólis grega. Com
o tempo, essas anfictiônias tinham também uma função política e militar. O fator
religioso acabou favorecendo o agrupamento de povos contra seus inimigos comuns.
Elabore um texto dissertativo sobre a anfictiônia hebraica e suas características.
I- Shebet.
II- Shofetim.
III- Mishpahah.
138
( ) A organização política dos hebreus, desde os primórdios, deve ser considerada uma
teocracia, pois sempre foram governados por Deus, pelo intermédio de homens que
eram seus representantes.
( ) Do ponto de vista tipológico, tanto o Estado hebreu quanto o Estado egípcio são
Estados característicos fundamentados na religião.
( ) As relações simétricas e igualitárias entre homens e mulheres típicas do período
patriarcal deram lugar às relações assimétricas no período monárquico.
( ) Após muitos séculos de subjugação, Israel tornou-se uma grande potência sob
reinado de Salomão e passou a ter domínio absoluto em toda a região da Palestina.
139
140
REFERÊNCIAS
BARBOSA, M. T. Do antigo Oriente próximo a Roma: uma abordagem da antiguidade.
Guarapuava: Unicentro, 2009.
141
CUCHE, D. A noção de cultura nas ciências sociais. Tradução: Viviane Ribeiro.
Bauru: EDUSC, 2002. p. 9-12.
DOUGLAS, J. D. et al. O novo dicionário da Bíblia. Tradução: João Bentes. 3. ed. rev.
São Paulo: Vida Nova, 2006.
HERÓDOTO. História. 2. ed. Tradução de Mário da Gama Kury. Brasília: UNB, 1998.
142
JONES, A. [Imagem]. In: DOUGLAS, J. D. et al. O novo dicionário da Bíblia.
Tradução: João Bentes. 3. ed. Rev. São Paulo: Vida Nova, 2006. p. 611. Disponível em:
https://seer- https://prandrelda.files.wordpress.com/2013/01/j-d-douglas-novo-
dicionc3a1rio-da-bc3adblia.pdf. Acesso em: 18 maio 2021.
KESSLER, Rainer. História social do Antigo Israel. Tradução: Aroldo Reimer. São
Paulo: Paulinas, 2009.
143
MOUNCE, R. H. Bíblia. In: ERWLL, W. (Editor). Enciclopédia histórico-teológica da
igreja cristã. Tradução: Gordon Chown. São Paulo: Vida Nova, 2009.
SILVA, R. Especial Egito: o faraó do êxodo. [S. l.: s. n.], 2019, 1 vídeo (28 min).
Publicado pelo canal Evidência NT. Disponível em: https://www.youtube.com/
watch?v=ccWsLlzjCD8. Acesso em: 18 maio 2021.
144
TAYLOR, J. B. [Ancião]. In: DOUGLAS, J. D. et al. O novo dicionário da Bíblia.
Tradução: João Bentes. 3. ed. Rev. São Paulo: Vida Nova, 2006. p. 52. Disponível em:
https://seer- https://prandrelda.files.wordpress.com/2013/01/j-d-douglas-novo-
dicionc3a1rio-da-bc3adblia.pdf. Acesso em: 18 maio 2021.
145
146
UNIDADE 3 —
O MUNDO E A CULTURA DO
NOVO TESTAMENTO
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará
autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.
CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
147
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 3!
Acesse o
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148
UNIDADE 3 TÓPICO 1 —
A VIDA CULTURAL NO NOVO TESTAMENTO
1 INTRODUÇÃO
Bendito aquele que diz a verdade com um coração puro,
e não calunia com sua língua.
Benditos os que se apegam às suas leis,
e não se apegam a caminhos perversos.
Benditos os que se regozijam nela,
e não investigam em caminhos loucos.
Benditos os que a buscam com mãos puras.
e não solicitam com coração traidor.
Bendito o homem que alcança a Sabedoria,
e caminha na lei do Altíssimo,
e aplica seu coração a seus caminhos,
e se obriga à sua disciplina,
e em suas correções se compraz sempre;
e não a abandona na aflição de seus males,
e no tempo da angústia não a despreza,
e não a esquece nos dias de espanto,
e na aflição de sua alma não a aborrece.
Pois sempre pensa nela,
e em seu mal ele medita a lei,
e durante toda a sua existência pensa nela,
e a põe ante seus olhos
para não caminhar por caminhos de maldade.
149
O judaísmo que aparece nos escritos do Novo Testamento não possui
uma conexão direta com o pós-exílio imediato, assim como também não pode ser
compreendido sem as informações do Intertestamento.
A influência da cultura grega e a dominação romana, que são os substratos
dos acontecimentos do Novo Testamento ocorrem no período intertestamentário.
A adesão ou a rejeição dos segmentos judaicos aos dominadores são pontos importantes
para o estabelecimento das posições desses grupos nas disputas pelo poder. Fariseus,
saduceus, essênios, zelotas e herodianos são os personagens importantes de um
capítulo determinante para a formação do cristianismo e para o destino de Israel na
Palestina e fora dela.
2 O PERÍODO DO INTERTESTAMENTO
Antes dos achados dos manuscritos de Qumran na década de 1940 havia certa
dificuldade em relação às fontes históricas do período Intertestamentário. As fontes
internas – os escritos bíblicos – não são aceitas por todos os segmentos religiosos, há
os escritos deuterocanônicos, aceitos pelos católicos e não são aceitos pela maioria dos
protestantes, e há os escritos considerados apócrifos ou pseudepigrafos por católicos
e protestantes, porém, são aceitos pelas Igrejas Ortodoxas.
150
QUADRO 1 – ESCRITOS APÓCRIFOS, PSEUDEPIGRAFOS E DE QUMRAN
Escritos
Escritos Apócrifos Escritos de Qumran
Pseudepigrafos
Antigo Testamento Apocalipse de Moisés A Nova Jerusalém (5Q15)
Primeiro Livro de Adão
Apocalipse de Sidrac A Sedutora (4Q184)
e Eva
Caverna dos Tesouros Assunção de Moisés Antologia Messiânica (4Q175)
Epístola de Aristéas Ascensão de Isaías Bênção de Jacó (4QPBl)
Oráculos Sibilinos Livro dos Jubileus Bênçãos (1QSb)
Primeiro Livro
Prece de Manassés Cânticos do Sábio (4Q510-4Q511)
de Enoque
Quarto Livro Cânticos para o Holocausto do Sábado
Salmo 151
dos Macabeus (4Q400-4Q407/11Q5-11Q6)
Comentários sobre a Lei
Samuel Apócrifo Apocalipse de Esdras
(4Q159/4Q513-4Q514)
Segundo Livro de
Salmos de Salomão Comentários sobre Habacuc (1QpHab)
Adão e Eva
Segundo Tratado do Comentários sobre Isaías
Terceiro Livro de Enoque
Grande Sete (4Q161-4Q164)
Terceiro Livro
Novo Testamento Comentários sobre Miqueias (1Q14)
dos Macabeus
Do Novo Testamento
existe mais de
150 escritos entre
evangelhos, atos de
apóstolos, diálogos, Testamento de Abraão Comentários sobre Naum (4Q169)
ditos de Jesus, rituais,
epistolas, apocalipses,
fragmentos e obras
perdidas.
151
Testamento dos
Comentários sobre Oseias (4Q166-4Q167)
Doze Patriarcas
Testamento de Jó Comentários sobre Salmos (4Q171/4Q173)
Segundo Livro
Consolações (4Q176)
de Enoque
Martírio de Isaías Eras da Criação (4Q180)
Escritos do Pseudo-Daniel
(4QpsDan/4Q246)
Exortação para Busca da Sabedoria (4Q185)
Gênesis Apócrifo (1QapGen)
Hinos de Ação de Graças (1QH)
Horóscopos (4Q186/4QMessAr)
Maldições de Satanás e seus Partidários
(4Q286-4Q287/4Q280-4Q282)
Melquisedec, o Príncipe Celeste (11QMelq)
O Triunfo da Retidão (1Q27)
Oração Litúrgica (1Q34/1Q34bis)
Orações Diárias (4Q503)
Orações para as Festividades
(4Q507-4Q509)
Os Iníqüos e os Santos (4Q181)
Os Últimos Dias (4Q174)
Palavras das Luzes Celestes (4Q504)
Palavras de Moisés (1Q22)
Pergaminho de Cobre (3Q15)
Pergaminho do Templo (11QT)
Prece de Nabonidus (4QprNab)
Preceito da Guerra (1QM/4QM)
Preceito de Damasco (CD)
Preceito do Messianismo (1QSa)
Regra da Comunidade (1QS)
Rito de Purificação (4Q512)
Salmos Apócrifos (11QPsa)
Samuel Apócrifo (4Q160)
Testamento de Amran (4QAm)
152
O Intertestamento é o período que marca o fim do judaísmo antigo e início do
Novo Testamento, de acordo com a terminologia cristã. Em termos cronológicos, abarca
o período do ano 424 a.C. ao ano 5 da era cristã. E em termos escriturísticos, é o período
entre o livro de Malaquias e o livro de Mateus, também conforme o cânon cristão. O
Intertestamento é considerado um dos períodos mais conturbados vividos por Israel.
Após o cativeiro babilônico, o povo de Israel está sem profetas, sem orientação precisa,
ou seja, vivendo como ovelhas sem pastor (KONINGS, 1998; DA SILVA, 2012). Veja o
Quadro 2 seguir com a cronologia no período Intertestamentário:
153
O ofício de escriba, do hebraico sofer e do grego gramateu, durante o período da
monarquia se restringia às funções de escrivão real, do povo, do exército, de conselheiro
e de secretário, pois, no antigo Israel, ler e escrever era um privilégio de pouquíssimas
pessoas (WISEMAN, 2006).
No contexto do pós-exílio os escribas assumem prioritariamente a função de
copistas, guardiões e intérpretes da Lei. Veja o exemplo de Esdras: “Este Esdras vinha
da Babilônia. Era um escriba versado na Lei de Moisés dada pelo Senhor, Deus de Israel.
Como a mão do Senhor seu Deus repousasse sobre ele, o rei concedeu-lhe tudo o
que pediu” (Esdras 7, 6). Esdras é tido como o principal representante deste ofício que
assume grande importância no Intertestamento e no Novo Testamento (ELLISON, 2006).
FONTE: <https://www.esbocandoideias.com/wp-content/uploads/2010/12/significado-de-escriba.jpg>.
Acesso em: 19 mar. 2021.
A função que passa a ser ocupada pelo escriba, de doutor da lei, de mestre da
lei era a princípio uma ocupação do sacerdote, mas com a descentralização da vida
religiosa ligada ao templo no exílio e no pós-exílio, a função sacerdotal perde certa
relevância. O próprio Esdras cumulou as funções de sacerdote-escriba:
É importante frisar que alguns escribas eram fariseus, mas não todos. Por isso,
eles também são acusados de formalismo. Davam mais importância à lei oral (tradição)
do que à lei escrita (torá). Há uma forte indicação de que os escribas tiveram sua função
alterada no Novo Testamento, o que não ocorre com o sábio, o hakham (FEINBERG, 2006).
A figura do sábio, o hakham, já estava presente em Israel desde os tempos
patriarcais. Contudo, a tradição costuma utilizar Salomão como sendo o arquétipo de
sábio. Desse modo, a figura do hakham está ligada à tradição sapiencial.
Segundo Soares (2009), o mais correto seria pensar numa influência persa-
babilônica nos escritos do apocalipsismo desse período. O apocalipsismo, apesar das
diferenças, possui uma ligação estrutural com o profetismo. Enquanto no profetismo
155
a tônica era uma interpretação histórica, voltada para o presente, convocando o povo
a uma transformação, no apocalipsismo como substituição dos oráculos dos profetas,
sua tônica está no despertar da esperança messiânica, com o olhar fito na trans-
história. A concepção sobre a ressureição corporal aparece na fonte extra canônica
de Enoque e na fonte canônica de Daniel, considerados do gênero apocalíptico tardio
(RIBEIRO, 2009).
A influência persa entre os judeus foi tão relevante que o episódio da libertação
e a política de pacificação de Ciro, assim como o próprio Ciro foram interpretados
como sendo cumprimento de oráculos proféticos. Ciro recebe o título de “ungido
de Yahweh”, ou “messias de Yahweh”. Um título de atribuição exclusiva dos reis em
Israel. Posteriormente, este título se tornaria o título do messias apocalíptico do Novo
Testamento (SOARES, 2009).
FONTE: <https://viajento.files.wordpress.com/2018/04/olimpia-grecia-jogos-olimpicos-luta.jpg?w=840>.
Acesso em: 19 mar. 2021.
156
É necessário que se faça uma distinção entre o que se conhece como cultura
clássica grega e o helenismo, que é, de fato, o responsável pelas grandes transformações
no Oriente Próximo desse período. De modo geral, o helenismo foi a concretização de um
ideal de Alexandre Magno, o de difundir a cultura grega aos territórios que conquistava.
Foi nesse período que as ciências tiveram seu primeiro e grande desenvolvimento. O
helenismo preparou, sedimentou e marcou um período de transição para o domínio e
apogeu do império romano.
NOTA
O gnosticismo é uma filosofia partilhada por várias seitas que
ganhou destaque por volta do século II, na qual se combinam
elementos cristãos e pagãos. Atribui-se uma importância central
à gnose, um conhecimento revelado, mas secreto, sobre Deus e
sua natureza, que permite que aqueles que o possuem atinjam a
salvação. No início do cristianismo houve muita influência gnóstica
combatida pelos “pais apostólicos”. Posteriormente, ficou claro
que o cristianismo é uma religião da fé, enquanto o gnosticismo
provou ser uma religião do conhecimento.
157
Intertestamento e no Novo Testamento fala-se do “povo do livro”, representado pelo
judaísmo rabínico-farisaico. Contudo, longe de ser o ethos definidor do judaísmo
do Intertestamento, o farisaísmo é apenas mais um dos retalhos da imensa “cocha”
fragmentada que se torna o judaísmo do Intertestamento.
2.3.1 Os Fariseus
Do ponto de vista farisaico, esses 400 anos foram marcados pelo esforço da
obediência rigorosa à lei, visto que os cativeiros foram interpretados como sendo o
resultado da desobediência de Israel. Por causa disso, se desenvolve um grande zelo
à lei mosaica, mais especificamente à tradição dos rabinos, ao ponto de se chegar ao
fanatismo. Uma característica típica do comportamento farisaico. Uma intransigência e
uma certa impecabilidade no que se refere ao cumprimento da lei.
158
Por outro lado, de acordo com Ellison (2006), os fariseus não contavam com a
simpatia do povo comum, dado a rigorosa interpretação e observância da lei. Outrossim,
os fariseus achavam que os pobres não tinham condições de seguir a lei e que também
não eram úteis na luta pela libertação dos opressores de Israel (DA SILVA, 2012).
As principais crenças dos fariseus são: a importância da observância da lei, mais
especificamente, a lei oral, chamada de tradição dos antigos; a crença na imortalidade;
a crença na ressurreição do corpo; no julgamento final; no castigo e na recompensa
eterna; acreditam em anjos, espíritos bons e espíritos maus; acreditam no livre arbítrio
humano e que o ser humano é moralmente responsável por seus atos.
2.3.2 Os Saduceus
De acordo com Gelston (2006), as fontes são hostis e, portanto, inadequadas
para um quadro exato quanto à origem dos saduceus. Não está claro se era um partido
político ou religioso. Quanto ao perfil sociológico dos saduceus, trata-se de membros
da elite financeira, burocrática e religiosa. A maioria dos especialistas e comentadores
acreditam que a origem do termo saduceus descende do nome de Zadoque, um sumo
sacerdote da época de Salomão. O que liga os saduceus a uma linhagem de sacerdotes.
Gelston (2006), apresenta mais duas possibilidades etimológicas. O termo syndikoi,
“controladores fiscais” e o termo tsadiq, de “retos”.
159
2.3.3 Os Zelotas
O termo zelota significa quem tem o “zelo”, ou seja, “aquele tem paixão pela
causa religiosa e/ou política”. De acordo com os especialistas do tema, não está claro se
os zelotas eram um grupo de natureza política ou religiosa. À luz de toda a caracterização
feita de Israel até esse momento, fica evidente que, no caso de Israel, essas esferas não
se separam, mas se perpassam e se misturam. Talvez, no caso dos zelotas se possa
dizer que se trata de um grupo que teve uma atuação mais relevante do ponto de vista
da oposição política aos dominadores.
De acordo com Josefo (1961), os zelotas foram fundamentais na revolta dos
judeus contra a tributação do império romano na Judeia, que teve como seu líder
e fundador, Judas, o galileu. Tal tributação foi vista como sendo uma traição contra
Yahweh, pois, era destinada a um imperador pagão. Josefo (1961), considera os zelotas
um segmento importante dentro do contexto judaico palestino do primeiro século.
Classifica os zelotas como sendo a quarta “filosofia” judaica, juntamente com os fariseus,
saduceus e essênios.
Os zelotas são sempre descritos como um grupo de revolucionários, radicais
nacionalistas e agitadores do povo. Contudo, assim como os demais grupos judaicos,
tinham uma composição heterogênea, de modo que muitos de seus membros eram de
judeus legalistas e formalistas quanto à observância da lei e também messiânicos. Da
Silva (2012), descreve os zelotas como fervoroso movimento religioso com compromisso
de transformação social, que defendiam a libertação de Israel por meio da luta armada.
160
2.3.4 Os Herodianos
Ao que tudo indica, os herodianos seria mais um dos partidos judaicos, sendo
formado pela elite palaciana ligada à dinastia dos Herodes. Não era um grupo de
natureza religiosa. Faziam parte daqueles que aguardavam a redenção de caráter político
nacional, que nesse caso, seria conquistada pela dinastia herodiana. Os herodianos são
citados em trechos do Novo Testamento em que aparecem como adversários de Jesus:
2.3.5 Os Essênios
Os essênios são determinados como sendo uma seita ou uma comunidade
religiosa judaica que floresceu no segundo século antes da era cristã. De acordo com o
historiador Flávio Josefo, os essênios são a terceira seita ou filosofia judaica em grau de
importância nos séculos II a.C. e I d.C. (JOSEFO, 1961). Há uma série de teorias sobre a
possível origem e significado do termo essênio. Meiklejohn (2006), acredita que o termo
grego essenoi deriva do aramaico ‘asen, que significa “curador”, por isso que o historiador
Fílon de Alexandria utiliza o termo therapeutai para se referir os essênios.
As fontes históricas mais antigas sobre os essênios são dos historiadores Flávio
Josefo e Fílon de Alexandria. Na década de 1940 foram achados escritos essênios no
deserto da Judéia, no vale de Khirbet Qumran, dando início a uma série de pesquisas
nas últimas décadas. Em relação ao estilo de vida, os essênios são descritos tanto
pelos historiadores antigos, quanto pelos pesquisadores modernos, como uma seita
ou comunidade de ascetas sectários que viviam à margem do estilo de vida religioso e
cultural dos demais judeus do seu contexto (JOSEFO, 1961; MEIKLEJOHN, 2006).
A parte do tempo que não era gasta com trabalhos braçais era gasta com
uma rotina de muito estudo, em meio a rigorosas prescrições morais e religiosas.
Praticavam a meditação, a abstinência e o celibato. Dedicavam-se à interpretação dos
161
escritos sagrados, não sacrificavam animais e possuíam rigorosos ritos de purificação
(MEIKLEJOHN, 2006). Assim como os zelotas, os essênios também não são mencionados
no Novo Testamento.
162
Podemos dizer que os essênios são a junção do movimento apocalíptico com
o ideal de vida monástica. Nesse sentido, a vida desértica, monástica e campesina dos
essênios remonta o ideal de vida preconizado pelo movimento profético, no que tange à
exortação ao abandono da promiscuidade e luxúria da vida citadina e o retorno ao modo
de vida tribal simples.
Há teóricos que afirmam que João Batista, Tiago irmão de Jesus, e que o próprio
Jesus Cristo teriam sido essênios. Há uma série de práticas e terminologias que sempre
foram consideradas exclusivas dos cristãos e que já estavam presentes entre esses
grupos de ascetas. “Os essênios tinham a prática do batismo, e compartilhavam um
repasto litúrgico de pão e vinho presidido por um sacerdote” (ESSÊNIOS, 2010).
O que se pode afirmar com certa convicção, é que os relatos históricos dos
essênios, assim como as novas pesquisas sobre os escritos essênios e de outras
comunidades de Qumran foram de fundamental importância para suprimir uma falta
documental tanto do Novo Testamento quanto do Intertestamento. E que de fato, há
sim, muitos aspectos semelhantes entre os textos de Qumram; teologia, hinologia,
eclesiologia e o Novo Testamento. Há uma similaridade dos escritos essênios com todo
o Novo Testamento, sendo maior a similaridade com os escritos joaninos.
De acordo com Vieira (2008), não é possível dizer se tal similaridade é fruto de
um contato direto dos personagens ou escritores do Novo Testamento, ou se trata de
uma religiosidade comum relativa a um contexto mais amplo do primeiro século. Talvez
num futuro próximo se consigam respostas para tais questionamentos, à medida que
novos resultados das pesquisas dos escritos de Qumran vierem a público.
FONTE: <https://ciberia.com.br/wp-content/uploads/2017/11/94797b09e21d863a50ee573c10a25266-
783x450.jpg>. Acesso em: 19 mar. 2021.
163
3 MODO DE VIDA NO NOVO TESTAMENTO
O modo de vida no Novo Testamento, em muitos aspectos é o resultado do
esfacelamento do tecido social e religioso desde o tempo da monarquia e agravado com
as sucessivas dominações e consequente fragmentação da sociedade judaica numa
série de partidos, seitas, grupos e classes sociais. Tal fragmentação acabou por gerar
certa animosidade entre os próprios judeus, o que agravou ainda mais a situação de
subjugação que o povo vivia. Os pilares que mantinham a identidade judaica (lei, aliança,
identidade religiosa e identidade cultural) foram tão atacados e abalados ao longo de
séculos que o resultado é o cenário exibido no Novo Testamento, que em certo aspecto,
os judeus se tornaram algozes dos próprios judeus.
Com relação às classes sociais, a classe alta era formada pela nobreza sacerdotal
e por altos funcionários, latifundiários e grandes comerciantes. Na classe média estavam
incluídos os pequenos proprietários rurais, artesãos e comerciantes. E na classe baixa
estavam os pobres da cidade, os pobres do campo, pequenos camponeses, camponeses
sem-terra e os indigentes sem classe que eram os escravos que trabalhavam nas terras
de seus donos. É difícil dizer se a situação da classe baixa rural era pior do que a classe
baixa urbana. De acordo com Rocha (2004), a classe baixa rural sofria tanto com a
opressão romana, que além de exigir altos impostos, suas dívidas eram cobradas com o
uso da violência física, o que em alguns casos causavam mortes.
INTERESSANTE
Os ricos viviam em mansões ou estruturas palacianas. Podemos presumir que o lar das
classes médias era menor e menos luxuoso do que o dos ricos. A habitação típica na
terra de Israel era, sem dúvida, a das classes baixas. Era feita de pedras, barro ou tijolos
de barro com chão duro de terra batida. Um pátio aberto servia, em
muitos casos, a várias famílias diferentes. O pátio era cercado por uma
série de casas e aposentos individuais. Ainda na mesma área, haviam
galpões de armazenamento para mercadorias diversas, abrigos para
animais, cisternas, depósitos de lixo e instalações sanitárias (quando
disponíveis). Uma casa de família podia consistir em apenas um
cômodo, mas a maioria consistia em mais. Os cômodos, divididos
por cortinas ou tapetes, eram bem pequenos, por isso as pessoas
normalmente passavam o máximo de tempo possível na rua.
165
O modelo de família extensa, típico do período tribal do Antigo Testamento
vigorou durante toda a Antiguidade. Aos poucos esse modelo foi sendo substituído
pelo modelo de família nuclear. Segundo as formulações de Pereira (2015), não se
sabe exatamente quando ocorreu a mudança de um modelo para o outro, porém,
segundo informações contidas nos escritos do Novo Testamento, o mais provável é que
a diminuição de membros e agregados pode ser percebida, como por exemplo, nos
textos paulinos:
166
dos impostos obrigava os pais a venderem seus filhos e filhas como escravos. O não
pagamento das dívidas gerou o desagregamento de muitas famílias, que começaram a
perambular de um lado para o outro a procura de emprego e comida, deixando parte dos
membros pelo caminho (LAZIER, 2010).
FONTE: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/1/1f/Meryemana_Marienhaus.
jpg/300px-Meryemana_Marienhaus.jpg>. Acesso em: 19 mar. 2021.
167
judaica, essa mudança entre os gêneros está mais relacionada ao patriarcalismo
romano e não ao judaico, em conjunto com os processos internos de transformação
social, cultural, econômica e religiosa.
168
inocência moral. Ao estabelecer que a relação marido e mulher obedeça a mesma lógica
da relação de ambos com Cristo, Paulo afasta e ideia de uma relação de subserviência
como a de um patrão e um empregado que lhe deve submissão irrestrita.
Jesus falava ainda à multidão, quando veio sua mãe e seus irmãos e
esperavam do lado de fora a ocasião de lhe falar. Disse-lhe alguém:
Tua mãe e teus irmãos estão aí fora, e querem falar-te. Jesus
respondeu-lhe: Quem é minha mãe e quem são meus irmãos? E,
apontando com a mão para os seus discípulos, acrescentou: Eis aqui
minha mãe e meus irmãos. Todo aquele que faz a vontade de meu
Pai que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe
(Mateus 12, 46-50).
Podemos dizer, que esse novo sentido de família introduzido por Jesus Cristo
tem uma correspondência análoga ao novo sentido de israelita introduzido pelo
judaísmo no pós-exílio, apresentado por Kessler (2009). Este se deu pela abertura e
inserção de outros povos entre os judeus, a partir do critério dos não judeus aceitarem
fazer parte da comunidade religiosa de livre pertencimento, baseada no credo religioso,
na circuncisão, na observância do sábado, nas leis alimentares e não mais de forma
exclusiva pela descendência abraâmica.
169
3.2 O MODO DE PRODUÇÃO DO NOVO TESTAMENTO
Sob o domínio romano, a Palestina permanece no sistema de servidão coletiva.
Os servos tinham que produzir para sua própria subsistência, entregar parte de sua
produção para o Estado e trabalhar compulsoriamente nas obras públicas, o que era
chamado de corveia. A diferença significativa no caso dos judeus em que a economia era
baseada anteriormente na pequena propriedade rural, com a crescente demanda por
alimentos para alimentar as hordas de soldados romanas, houve o emprego crescente
de latifúndios na época – a agricultura era, de certo modo, extensa.
FONTE: <https://jafetnumismatica.com.br/wp-content/uploads/2018/08/moeda-hermes-300x159.jpg>.
Acesso 19 mar. 2021.
Desse modo, o grande latifúndio expulsava cada vez mais famílias do campo e as
obrigava a perambular e a depender da vida na cidade. Por sua vez, a criação de animais
de pequeno porte era a opção que o povo palestino tinha. “A pecuária é certamente o
setor mais deficitário da Palestina. Josefo nos fala do leite muito abundante da Judéia-
Samaria, o que supõe animais, mas de fato a estepe não produz senão pouca forragem”
(SAULNIER, 1983, p. 24). Um fator importante é a necessidade que pesava sobre os
criadores para sustentar a demanda do templo que é o principal consumidor de carne,
bem como as camadas abastadas da população. E assim, como nos primórdios da
vida tribal, a parcela mais pobre não contava com carne em sua dieta. Prática que só
acontecia durante a Páscoa ou por ocasião dos sacrifícios de comunhão.
170
Gb rosso modo, a economia da Palestina permaneceu baseada na agricultura,
cujos principais produtos são os cereais e os legumes, aos quais se devem somar a
vinha e a oliveira nas regiões mediterrâneas; a pecuária é orientada para o corte (ou
a conserva, de carnes salgadas), mas os animais servem também para os transportes
(animais de tração ou de carga) e para a agricultura. Além dos produtos de primeira
necessidade, as bases do artesanato são a tecelagem, a metalurgia, a cerâmica, bem
como os trabalhos de arquitetura. As permutas locais não são muito conhecidas, pelo
fato de dependerem das iniciativas individuais; ao contrário, o comércio em grande
escala transparece mais claramente (SAULNIER, 1983).
IMPORTANTE
Na época do Novo Testamento havia, pelo menos, três tipos
diferentes de dinheiro em circulação na terra de Israel: judaico,
grego e romano. As moedas gentílicas não eram aceitas para o
pagamento dos encargos religiosos; por isso a necessidade dos
cambistas nos pátios do templo. As moedas judaicas incluíam o
siclo, o meio siclo, o quarto de siclo e o lépton. O último é a moeda
de cobre. A dracma grega era o salário de um dia do trabalhador. A
libra ou mina equivalia a cem dracmas. A didracma correspondia ao
valor de duas dracmas, enquanto o estáter valia quatro dracmas. O
talento não era, de fato, uma moeda, mas uma unidade de medida
de trabalho. Na moeda romana, o denário representava um dia
de salário e era, assim, equivalente em valor à dracma grega. Cem
denários eram o equivalente a uma mina grega.
171
matavam um animal para comê-lo. A proteína mais comum consumida pela população
era o peixe. Somado ao consumo do pão, o peixe estava em todas as mesas e alimentava
muita gente. A atividade de pesca era a principal atividade econômica das cidades
litorâneas. As bebidas mais comuns eram a água pura das fontes, o vinho caseiro, sucos
de romã ou de tâmaras meio fermentado, a shecha, um tipo de cerveja leve, de cevada
e painço (DANIEL-ROPS, 1983). Quanto ao local das refeições, não se pode dizer que
havia um refeitório ou lugar específico. As refeições eram realizadas no pátio da casa.
O horário das refeições era variado de acordo com a fome e a oportunidade, não sendo
rigorosamente pré-estabelecido. Em geral, era feita uma refeição cedo, antes de sair
para o trabalho e outra à noite, depois de chegar. Ao meio-dia comia-se pouco, com
exceção dos sábados, quando o almoço era mais farto. Comia-se sentado no chão, ou
assentado numa cadeira. O costume era respeitar a preeminência do lugar do chefe da
casa ou do hóspede à mesa. Geralmente os hóspedes eram servidos primeiro pelo dono
da casa ou pelo anfitrião (DANIEL-ROPS, 1983).
172
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
173
AUTOATIVIDADE
1 A historiografia bíblica tradicional costuma se ater aos registros bíblicos canônicos,
tendo como referência o livro de Malaquias como o último livro do Antigo Testamento
e o livro de Mateus como o primeiro livro do Novo Testamento. Pouca ou quase
nenhuma importância é dada ao Intertestamento. Disserte sobre a importância do
Intertestamento para a compreensão da história, cultura e religião judaica.
I- Sofer.
II- Hakham.
III- Hazam.
174
I- No movimento do profetismo, a tônica era uma interpretação histórica voltada para
o presente, convocando o povo a uma transformação.
ENQUANTO
II- No movimento do apocalipsismo como substituição dos oráculos dos profetas, tem
sua tônica no despertar da esperança messiânica, com o olhar fito na trans história.
I- Ciro, o persa, por causa da libertação de Israel recebe o título de “ungido de Yahweh”,
ou “messias de Yahweh”. Título que posteriormente foi a atribuído a Jesus Cristo no
Novo Testamento.
II- Os romanos se impunham aos povos dominados com certo vigor. Diferentemente
do que ocorreu no período persa, os romanos almejavam a assimilação dos povos
conquistados.
III- A filosofia romana, que teve como seu principal representante Marco Aurélio, foi
marcada pelo ecletismo. No ecletismo romano não há o predomínio de uma única
forma de pensar, ou de uma única escola de pensamento. Há várias interpretações
e junções de diferentes escolas, pensadores e teorias.
175
176
UNIDADE 3 TÓPICO 2 —
A VIDA POLÍTICA NO NOVO TESTAMENTO
1 INTRODUÇÃO
Os idumeus, por seu lado, foram-lhes talvez inferiores em toda
sorte de crimes? Esses malvados, depois de terem massacrado os
sacerdotes, não se contentaram de abolir todos os sinais de piedade,
que podiam ainda restar; destruíram também tudo o que tinha alguma
aparência de justiça humana e de política e puseram a injustiça sobre
o trono. Mostraram que eram verdadeiramente zelotes, não pelo amor
das coisas justas e santas, as quais os haviam feito tomar esse nome,
que eles se atribuíam tão falsamente e com que entusiasmavam
os ignorantes, mas por um zelo verdadeiro e pela ardente paixão
que tinham de sobrepujar, em toda espécie de crimes, os maiores
criminosos, que jamais existiram sobre a face da terra.
(Flavio Josefo)
Para que isso foi possível, Otávio profissionalizou o exército fazendo com que a
atividade não fosse mais exercida compulsoriamente ou por patriotismo e a transformou
numa ocupação bem remunerada. O exército romano contava com centenas e talvez
milhares de legiões de soldados, cada legião possuía de cinco a seis mil soldados.
177
centro da riqueza e do comércio. Daí o adágio: “todos os caminhos levam à Roma”. A
Judeia tornou-se grande exportadora de óleo de oliva. E os produtos gregos, tais como,
vinhos, maçãs, linho e algodão tornaram-se artigos comuns no dia a dia dos moradores
da Palestina.
Em termos culturais, a Pax romana foi o período de florescimento greco-romano
nas artes, na literatura, na arquitetura e na filosofia. O império atraia talentos de todas
as áreas dos três continentes. Esse período praticamente significou a romanização do
mundo civilizado da época. Diante de tamanha pujança, prosperidade, luxo e ostentação,
a mensagem do reino pregada por Jesus não poderia ter outra recepção, se não o
descrédito tanto por parte dos romanos quanto dos judeus.
2 O IMPÉRIO ROMANO
Após séculos existindo como uma república, governada por um conjunto de
senadores, Roma torna-se um império. Através de sucessivas guerras e conquistas, a
república romana se expande e em meio a disputas internas, Caio Otávio é proclamado
César Augusto, o primeiro imperador romano. O império romano foi uma das mais fortes
potências bélicas, econômicas e políticas do seu tempo e o maior império da antiguidade
clássica, possuindo possessões territoriais em torno da região do mar Mediterrâneo na
Europa, na Ásia e na África.
FONTE: <https://www.deviantart.com/zalezsky/art/HAoE-Greatest-Extent-of-the-Roman-
Empire-745150716>. Acesso em: 11 mar. 2021.
178
César Augusto dividiu o império em 32 províncias. As mais antigas e estáveis
foram designadas províncias senatoriais. Eram governadas pelo procônsul, que
prestava contas ao senado e não contava com autoridade militar. As províncias imperiais
normalmente eram mais difíceis de governar e muitas vezes continham elementos
revolucionários. Seus governantes detinham autoridade civil e militar e prestavam
contas de forma direta ao imperador. Os legados eram responsáveis pelas províncias
imperiais maiores e os prefeitos, pelas menores. Os procuradores (governadores) eram
funcionários públicos que administravam áreas específicas sob a supervisão de um
procônsul ou legado. Havia também um número de reinos em parte independentes e
presididos por governantes nativos chamados reis; eles desempenhavam o cargo como
aprazia a Roma. Outros príncipes subalternos eram chamados tetrarcas ou etnarcas
(título um pouco mais elevado). Outros tipos de funcionários do governo e títulos eram
encontrados em locais específicos (SCOTT JR., 2017).
Os interesses de cada província eram regulados de modo estrito pela lei romana.
No entanto, as cláusulas da lei romana muitas vezes eram interpretadas de forma muito
diferente pelos governantes locais. Qualquer indivíduo que tivesse a posição de cidadão
romano, fosse de nascença, por uma permissão particular ou por compra, desfrutava de
direitos e privilégios especiais que os outros indivíduos não tinham. À cidadania romana
eram conferidos inúmeros privilégios. Os cidadãos romanos tinham direito de ocupar
posições privilegiadas do exército; direito de serem tributados com baixas taxas e em
alguns casos, isenções; não podiam ser presos, espancados, torturados e tinham o
direito de recorrer à corte imperial (SCOTT JR., 2017).
Um cidadão romano também não podia ser executado com crucificação, exceto
no caso de deserção militar. O estigma e a desonra de uma crucificação estendiam-
se à família e aos amigos do crucificado, como uma marca de extrema vergonha. Por
causa da grande extensão do império e a multiplicidade de povos, culturas, costumes
e religiões sob seu domínio, o sistema jurídico romano era composto por dois códigos:
o Jus civille, o direito cível e o Jus gentium, o direito das gentes ou o direito dos povos,
este tendo como fundamentado a razão natural (naturalis ratio) e aplicava-se a todos
os não romanos.
Quando Paulo fora preso, houve uma tentativa de açoitá-lo e os oficiais temeram
ao saberem que se tratava de um cidadão romano, porque era contrário à lei dispensar
tal tratamento a um cidadão romano. O tribuno que estava no comando da unidade em
Jerusalém, havia aparentemente comprado seu direito de cidadania numa ocasião em
179
que tal concessão estava à venda. Se Paulo nascera livre e teria vindo da Cilícia, seu pai
provavelmente prestou algum serviço para a república, anterior ao império, pelo qual a
cidadania fora conferida a ele e à sua família (GOWER, 2017). De acordo com Jerônimo,
há uma tradição que afirma serem os antepassados de Paulo da Galileia. E que por
motivos comerciais teriam migrado para Tarso (DOUGLAS, 2006).
180
Toda estrutura política e jurídica operava para privilegiar cidadãos romanos e
estava sujeita a abusos e injustiças, como por exemplo, a cobrança de taxas mais baixas
dos cidadãos romanos e a permissão tácita de sobretaxação praticada pelos publicanos
(GOWER, 2017). Por isso havia uma desconfiança popular com relação aos publicanos. E
eram vistos como exemplos de comportamentos que deveriam ser evitados:
Eu, porém, vos digo: Amai a vossos inimigos, bendizei os que vos
maldizem, fazei bem aos que vos odeiam, e orai pelos que vos
maltratam e vos perseguem; para que sejais filhos do vosso Pai que
está nos céus; porque faz que o seu sol se levante sobre maus e
bons, e a chuva desça sobre justos e injustos. Pois, se amardes os
que vos amam, que galardão tereis? Não fazem os publicanos também
o mesmo? E, se saudardes unicamente os vossos irmãos, que fazeis de
mais? Não fazem os publicanos também assim? (Mateus 5, 44-47).
Em termos práticos, significava dizer com efeito que ele governava mediante os
comandantes do exército, ou legados, que mantinham seus cargos durante períodos
de cinco anos. Quirino era um legado. “Naqueles tempos apareceu um decreto de César
Augusto, ordenando o recenseamento de toda a terra. Este recenseamento foi feito
antes do governo de Quirino, na Síria” (Lucas 2, 1-2).
181
NOTA
O legado (em latim: legatus) era um general do exército romano, equivalente ao moderno
oficial general. De categoria senatorial, o legado sobrepunha-se a todos os tribunos
militares e estava sujeito ao duque (dux). Para habilitar-se a comandar um exército
independentemente do duque ou do governador da província, o legado precisava ser
de categoria pretoriana ou mais alta. Os homens que ocupavam
o posto de legado eram de origem da classe senatorial
romana. Havia dois cargos principais: o legado legionário
(legatus legionis), que era um ex-pretor, a quem se atribuía
o comando de uma das legiões de elite, e o legado propretor
(legatus propraetor), um ex-cônsul, o qual recebia o governo de
uma província romana com os poderes magistráticos de pretor,
o que, em certos casos, incluía o comando de quatro ou mais
legiões. Numa província com apenas uma legião, o legado
também era o governador provincial, mas em províncias com
várias legiões, cada uma era comandada por um legado e todas
estavam sujeitas ao governador.
182
QUADRO 3 – GOVERNO DA PALESTINA
Procuradores
Copônio (6-9)
Anfíbuio (9-12)
Anio Rufo (12-15)
Valério Grato (15-26) Procurador
Pôncio Pilatos (26-36)
Marcelo (36-38)
Marilo (38-44)
Herodes Agripa I
Rei da Judéia (37-44)
Procuradores
Cúspio Fado (44-46)
Tibério Alexandre (46-48) Herodes Agripa II
Ventídio Cumano (48-52 Tetrarca de Cálcis
Antônio Félix (52-59) e território do norte (48-70)
Pórcio Festo (59-61)
183
O reino da Judeia de Herodes, o Grande, incluía toda a Palestina e alguns distritos
a leste do rio Jordão. O deserto da Judeia que aparece associada à João Batista nos
escritos do Novo Testamento, e provavelmente o mesmo deserto de Judá, a oeste do
mar Morto, mencionado no livro de Juízes. A grande importância da Judeia para os
judeus era por ser a região em que estava a capital Jerusalém (DOUGLAS, 2006).
A Galileia, do hebraico galil, “anel” ou “círculo” era uma região ou distrito da parte
norte da Palestina. Foi o cenário da infância e início do ministério de Jesus. Por ser a
região das tribos do norte na divisão dos reinos de Israel e Judá, a Galileia ficou cercada
por povos não israelitas. No período dos Macabeus esses povos pressionaram os judeus
e os empurraram para o sul, onde permaneceram por pelo menos meio século. Desse
modo, a Galileia teve praticamente que ser colonizada novamente pelos judeus. Fato
que, juntamente com a diversidade populacional contribuía para que a região fosse
vista com desprezo pelos judeus do sul (DOUGLAS, 2006).
184
de 40 km de leste a oeste, tendo ao leste a fronteira natural do rio Jordao e do mar da
Galileia, e cortado a região próxima do Mediterrâneo pela faixa de terra da Síria-Fenícia
que se estendia para o sul ao longo da costa (DOUGLAS, 2006).
185
FIGURA 9 – MAPA DA PALESTINA
FONTE: <https://i.pinimg.com/originals/33/50/27/33502724356d546a0594eea53598b224.jpg>.
Acesso em: 17 mar. 2021.
A estrutura política de domínio dos Césares era facilitada por meio das diferentes
estâncias do poder, que contava com os reis vassalos herodianos, estes contavam com
o auxílio de um deputado, no caso, o procurador. Como o povo não podia contar com a
elite religiosa responsável pelo templo e pelo sinédrio, restava-lhe o nacionalismo judaico
expresso e institucionalizado nas seitas, grupos e partidos judaicos (Vide Subtópico 2.2,
AS SEITAS, OS GRUPOS E OS PARTIDOS JUDAICOS).
186
Contudo os judeus, devido às características peculiares de sua cultura religiosa
e o ordenamento sacral da sua sociedade, gozavam ainda de mais privilégios do que
outros povos sob o domínio romano. Tais privilégios eram:
187
O fato de existirem poucas cidades na Palestina do primeiro século é um fator
relevante do ponto de vista social. Os acontecimentos que precederam o primeiro
século e as características judaicas desempenharam um papel no sentido de dar o clima
essencialmente rural e agrícola em Israel do Novo Testamento (SCOTT JR., 2017).
188
De modo geral, o cenário político da Palestina do primeiro século é o resultado
do legado de Herodes, “O grande”. Herodes (40-4 a.C.), da dinastia idumeia é considerado
um dos maiores construtores, um líder de visão e um grande administrador. Foi o último
grande governante de Israel. Seu sucesso se deve ao fato de ter servido como poucos
aos interesses dos conquistadores, em detrimento dos interesses de seu povo. deixou
um legado monumental de obras públicas, palácios, teatros, ginásios, estádios, todos às
custas de pesadas taxações sobre o povo. tudo com a anuência e participação da elite
religiosa. A imprudência e a ousadia dos sumos sacerdotes eram tão extremas, que eles
mandavam seus homens às granjas, retirar os dízimos que pertenciam aos sacerdotes.
Em alguns casos, os aldeões eram tão pobres que morriam de fome.
189
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
190
AUTOATIVIDADE
1 O contexto político da Palestina do primeiro século era extremamente complexo,
dado às múltiplas estâncias da administração romana que se sobrepunham e se
justapunham à administração judaica. Disserte sobre a atuação política de Jesus na
Palestina.
I- Galileia.
II- Decapólis.
III- Judeia.
I- O sinédrio era composto por sacerdotes, escribas, doutores da lei, anciãos e possuía
sua polícia própria,
PORQUE
191
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) As duas proposições são verdadeiras, e a segunda proposição é uma explicação
da primeira.
b) ( ) As duas proposições são falsas, e a segunda proposição está em oposição à
primeira.
c) ( ) A primeira proposição é verdadeira, e a segunda proposição é falsa.
d) ( ) A primeira proposição é falsa, e a segunda é uma proposição verdadeira.
192
UNIDADE 3 TÓPICO 3 —
A VIDA RELIGIOSA NO NOVO TESTAMENTO
1 INTRODUÇÃO
Além de centro de oração e de vida religiosa e civil, a sinagoga se torna
também lugar de instrução. A instrução que ali se professava era
religiosa, voltada tanto para a "palavra" quanto para os "costumes".
Os conteúdos da instrução eram "trechos escolhidos da Torá", a partir
daqueles usados nos ofícios religiosos cotidianos [...] Nos séculos
sucessivos, os hebreus da diáspora fixaram-se, em geral, sobre este
modelo de formação (instrução religiosa), atribuindo também a esta
o papel de salvar sua identidade cultural e sua tradição histórica.
(Franco Cambi)
A princípio, cabia aos pais a tarefa de ensinar tudo o que diz respeito à tradição
e conhecimento acerca das leis divinas. Era na família que se aprendia um trabalho, os
modos de relacionar-se, como meio de manter vivas as tradições do povo. Quanto aos
métodos pode-se dizer que a leitura, a repetição e a memorização da lei formavam o
conjunto básico para o ensino. “A fim de treinar a memória os alunos eram obrigados
a decorar passagens enormes, que precisavam repetir sem qualquer omissão, sem
acréscimo ou modificação de uma só palavra” (DANIEL-ROPS, 1983, p. 176).
193
2 A IMPORTÂNCIA DO TEMPLO E DA SINAGOGA NO
NOVO TESTAMENTO
Depois da família, a sinagoga era uma das principais referências na vida e na
formação dos jovens judeus. Era aos pés de um rabino que se aprendia tudo o que
fosse necessário para se tornar um verdadeiro israelita. Grande parte desse ensino
era de memorização das escrituras e interpretações rabínicas. Essa memorização de
textos, além de servir de instrução, acabava por favorecer um bom arcabouço teórico
acerca dos escritos, criando imagens e saberes de situações e personagens na mente
do jovem aprendiz. Utilizando-se do hebraico e do aramaico, escritos em rolos de papiro
ou pergaminhos, o fiel lia as Escrituras e na sinagoga apreendia acerca dos valores da
fé judaica. Lembrando que a musicalização e o ritmo na leitura era elemento comum e,
por vezes, necessário à recitação dos textos sagrados. Não havia entre os judeus uma
única cerimônia ou rito em que a música não tomasse parte.
A tarefa dos sacerdotes, recebida pela lei, era formar o povo para o conhecimento
das escrituras. Entre os sacerdotes havia também os levitas que os ajudavam nos serviços
do templo. O mais alto grau do sacerdócio era o sumo sacerdote, que desempenhava
a função de coordenar os sacerdotes e levitas, e também desempenhava o serviço de
chefiar a nação, concentrando em si o poder religioso e o poder civil. Era ele o curador
do culto e da lei. Era o sacerdote que, no tempo de Jesus, coordenava a assembleia
judaica, o sinédrio (JOSEFO, 1961).
Na Palestina do primeiro século era muito difícil ter uma cidade sem uma
sinagoga; praticamente todas as cidades possuíam esse espaço. A sinagoga tem sua
origem ainda no período do exílio, quando o povo se reunia em pequenos grupos nas
casas para as orações e ouvir a Lei. Era obrigatório ir à sinagoga nos dias festivos e aos
sábados, e também em outros dias, conforme a devoção. Toda a família participava da
oração, inclusive as mulheres e crianças. Conforme Seeanner (2015, p. 425), o culto
sinagogal compreendia essa ordem:
194
oração que consistia na recitação do “ouve ó Israel” e do “dezoito
bênçãos” ; leitura de um trecho da Lei e dos Profetas” , seguida da
tradução em aramaico, acessível ao povo que já não compreendia
o hebraico; sermão, feito habitualmente por um escriba ou então
por algum dos presentes convidado pelo arquissinagogo (cf. Lc 4,15;
6,6; Jo 6,59); seguia uma breve oração, depois da qual era dada (se
estava presente um sacerdote) ou invocada (mudando o “vós” em
nós) a bênção de Nm 6, 24-26.
Num certo aspecto, a sinagoga estava muito identificada com o partido dos
escribas e dos fariseus. Era um lugar de estudo da torá, que consistia em outra forma de
mediar o acesso à Yahweh, que se rivalizava com o templo e a classe sacerdotal. Além
de ser um lugar de estudo, a sinagoga também era lugar de adoração, culto e pregação.
Há relatos que havia cerca de 300 sinagogas em Jerusalém (JOSEFO, 1961).
Toda a vida religiosa das famílias desse tempo se dava ao redor do templo
renovado por Herodes, centro do judaísmo. Antes de ingressar no templo, havia os ritos
de purificação. Alguns sacrifícios comuns eram feitos duas vezes por dia, em nome de
todo o povo, como o holocausto do cordeiro, em expiação dos pecados, acompanhado
de outras ofertas. Outros sacrifícios eram feitos em dia de sábado, na lua nova, ou em
outros momentos especiais (SEEANNER, 2015).
195
Conforme vimos anteriormente, as crianças tinham seus mestres que lhes
iniciavam no conhecimento da lei e dos profetas. A partir dos 13 anos elas eram obrigadas
a cumprir toda a lei. Por isso, Maria e José levam Jesus para comparecer no templo,
para que se acostumasse com a tradição. O sábado e a circuncisão eram preceitos
muito bem observados. A circuncisão era praticada entre o oitavo e décimo dia depois
de nascido. Esse ato era tido como um sinal da aliança com Yahweh.
A oração era algo muito presente na vida das famílias que, duas vezes ao dia
faziam suas orações. Orava-se ao amanhecer e ao entardecer, quando se fechavam
as portas do templo, antes e depois das refeições. O jejum também fazia parte da vida
religiosa. A esmola e a caridade revelavam o comprometimento moral da religião com
toda a sociedade.
IMPORTANTE
Após o parto, mãe e bebê passavam pelos rituais prescritos de
pureza e dedicação. A circuncisão do menino aos oito dias era
realizada por um profissional com conhecimentos medicinais.
Era um momento de celebração, mas por causa do aumento
das despesas com os sacrifícios exigidos, mesmo das pombas
que o livro de Levítico prescrevia apenas para os pobres, foram
tomadas medidas durante o período rabínico para manter baixos
os custos. A passagem da infância para a adolescência era física,
social, legal e religiosa. Pela tradição, estava associada ao décimo
segundo aniversário da menina e ao décimo terceiro do menino,
mas isso era apenas um número aproximado. Mesmo pessoas
fisicamente imaturas eram consideradas maduras aos 18 anos,
de acordo com a lei, para alguns rabinos, para outros rabinos a
maturidade era aos 20 anos.
196
De acordo com a literatura especializada, as concepções sobre o juízo final,
fim da história, novo mundo, esperança messiânica, esperança escatológica e luta do
bem contra o mal podem ter tido como nascedouro o próprio profetismo, as influências
babilônicas ou persas. No que diz respeito à questão do fim da história, o eschaton, os
grupos e as seitas judaicas estavam confusos e divididos se a figura do messias iria
inaugurar uma nova fase em que Israel triunfaria sobre todos os seus inimigos neste
mundo, ou se a intervenção de Yahweh seria apenas para encerrar a história e conduzir
Israel ao novo mundo.
197
O grande embate entre concepções de mundo diferentes no Novo Testamento
se dá entre os judeus e os gregos. Os judeus possuíam um modo de vida baseado numa
economia e ambiente que eram, em essência, rurais e agrícolas, enquanto os gregos
eram urbanos. A cosmovisão religiosa dos hebreus era monoteísta, com profundo apelo
ético e ritualístico; a dos helenos era politeísta ou panteísta, metafísica e especulativa.
A religião judaica enfatizava o culto a Yahweh e a relação humana com ele; a religião
helênica era pagã e centrada na ideia do ser e no corpo humano. A visão semítica era
propensa à noção de particularismo e de exclusivismo; a visão helênica era universal
e sincretista. A visão semítica dava ênfase à comunidade; a helenística, ao indivíduo
(SCOTT JR., 2017).
O fato é que era muito fácil uma pessoa se tornar impura. Isso poderia ocorrer
por meio do contato com cadáver humano ou animal, com sangue da menstruação,
com sêmen, com pessoas doentes ou com deformidades e mais uma infinidade de
prescrições e tabus que foram sendo incluídos pela tradição. Para os judeus o problema
não era ficar impuro, o que poderia ocorrer facilmente, mas o fato de não buscar um
meio, ou seja, um ritual de purificação para se purificar. Alguns religiosos levavam muito
a sério essas questões ritualísticas. Fato percebido numa contenda entre os discípulos
de Jesus e os fariseus: “Alguns fariseus e escribas de Jerusalém vieram um dia ter com
Jesus e lhe disseram: ‘Por que transgridem teus discípulos a tradição dos antigos? Nem
mesmo lavam as mãos antes de comer’. Jesus respondeu-lhes: E vós, por que violais os
preceitos de Deus, por causa de vossa tradição?” (Mateus 15,1-3).
198
todos os elementos constitutivos. No judaísmo do primeiro século esses três elementos
estão presentes, porém, sofreram reinterpretações à luz das reações e adaptações que
Israel teve que passar. Tais reinterpretações e mudanças ocorreram principalmente no
período Intertestamentário. Nesse sentido, a característica distintiva mais marcante do
judaísmo neotestamentário é o ethos legalista, ou seja, uma relação de conformidade
literal com a lei e as tradições, como única forma de alcançar o favor divino, a salvação,
uma posição favorável diante de Deus (SCOTT JR., 2017).
Com exceção dos saduceus, que eram materialistas, os demais judeus também
acreditavam na existência e atividade de um mundo dos espíritos, composto por anjos
e demônios. A demonologia judaica é extremamente complexa, tendo suas derivações
de diversos povos da antiguidade, em especial, a demonologia babilônica. Os anjos,
do grego angelos e do hebraico mal’akh, são considerados pelos judeus como sendo
mensageiros divinos, seres superiores aos seres humanos e espíritos não corrompidos.
A crença que esses seres seriam guardiões pessoais surge posteriormente na literatura
rabínica (DOUGLAS, 2006; SEEANNER, 2015).
De modo geral, deve-se notar que tal crença nesses seres não se traduziu em
práticas de adoração ou veneração, como era o caso para os espíritos e divindades
inferiores na Síria, na Babilônia ou na Pérsia. Se no Antigo Testamento o termo daimonion
podia ter a conotação de deus ou poder divino, já no Novo Testamento o termo refere-se a
seres espirituais hostis à Deus e aos seres humanos (SEEANNER, 2015).
199
Temos na Figura 12 Balaam, Identificado como um demônio de três cabeças,
cavalgando um urso e carregando um falcão em suas mãos. No Antigo Testamento,
aparece o nome de Balaão, profeta, vidente e adivinho originário da cidade mesopotâmica
de Petor.
FIGURA 12 – BALAAM
200
Há relatos dessas curas encantamento na literatura intertestamentária de 1
Enoque, Sabedoria de Salomão e num escrito posterior em língua grega, o Testamento
de Salomão. Entre os essênios também há relatos de que esses conhecimentos e
práticas estavam presentes de forma especial por suas artes de cura (SCOTT JR., 2017).
4 OS SAMARITANOS
Não temos informações suficientes no Novo Testamento para uma descrição
do modo de vida samaritano. Por outro lado, não há motivos e evidências para supor
que os samaritanos viviam de modo diverso do que viviam os demais povos que
habitavam a Palestina do primeiro século. Tudo indica que a diferença entre os judeus e
os samaritanos era mais de natureza religiosa do que qualquer outra diferença.
201
Veja, segundo Scott Jr. (2017, p. 212), quais as peculiaridades religiosas dos
samaritanos:
Apesar de ter nascido na Judeia, Jesus passou a maior parte de sua vida e de
sua atividade itinerante na Galileia, que era uma região economicamente próspera por ser
uma importante rota comercial em que residiam muitos soldados e comerciantes, mas
que apesar disso possuía uma multidão de famintos e abandonados pela elite judaica
e pelo império romano. Por ser da Galileia, Jesus falava o aramaico ocidental, que tinha
significativa diferença com o aramaico da região sul da Palestina, a Judeia. Por esse e
outros fatores a Galileia era considerada um lugar de pessoas ignorantes, rudes, caipiras
(KONINGS, 1998). Foi por essa diferença idiomática que Pedro foi reconhecido pelo seu
sotaque como sendo do grupo de galileus seguidores de Jesus:
202
Ora, Pedro estava assentado fora, no pátio; e, aproximando-se dele
uma criada, disse: Tu também estavas com Jesus, o galileu, mas
ele negou diante de todos, dizendo: Não sei o que dizes. E, saindo
para o vestíbulo, outra criada o viu, e disse aos que ali estavam: Este
também estava com Jesus, o Nazareno. E ele negou outra vez com
juramento: Não conheço tal homem. E, daí a pouco, aproximando-se
os que ali estavam, disseram a Pedro: Verdadeiramente também tu
és deles, pois a tua fala te denuncia (Mateus 26, 69-73).
Jesus não apenas era da Galileia, como também era de Nazaré, uma pequena
aldeia em que moravam cerca de 20 famílias. Por isso havia grande menosprezo por
Jesus, dado a sua origem: “Filipe encontra Natanael e diz-lhe: Achamos aquele de quem
Moisés escreveu na lei e que os profetas anunciaram: é Jesus de Nazaré, filho de José.
Respondeu-lhe Natanael: Pode, porventura, vir coisa boa de Nazaré? Filipe retrucou:
Vem e vê” (João 1, 45,46). Outro fator que levou as autoridades a serem hostis à atividade
itinerante religiosa de Jesus foi o fato da Galileia ser um dos pontos de revolucionários
nacionalistas. Foi lá que teve início a guerra judaica contra o império romano em 73 d.C.
(KONINGS, 1998).
A partir das análises de Konings (1998) e Scott Jr. (2017), fica evidente que do
ponto de vista cultural não há nada de significativo em Jesus Cristo que o diferencie
dos demais judeus comuns do primeiro século. Jesus foi um legítimo representante do
seu tempo, de sua cultura e religião; a não ser pelo modo como reinterpretou a religião
judaica e como cuidou dos mais necessitados e discriminados, como se aproximou dos
não judeus, e como defendeu um modo de vida simples, frugal, sem apego às posses e
vivido na perspectiva do serviço abnegado que se presta ao outro.
203
NOTA
Imaginário é um conjunto de representações simbólicas que existe
em função de um traço característico que define o ser humano: a
imaginação simbólica. A imaginação simbólica é a faculdade que
extrapola a esfera da percepção sensível. No entanto, ela é induzida
pelo meio social que tem como instituintes os mitos, os símbolos e os
arquétipos. Nesse sentido, o imaginário, esse conjunto de imagens
possíveis produzidas pelo ser humano como animal simbólico, é
o museu de todas as imagens passadas possíveis, produzidas e a
produzir, não é uma abstração, mas uma construção cultural.
204
LEITURA
COMPLEMENTAR
EPÍLOGO
205
Jesus questionou ou rejeitou alguns adendos feitos às tradições, interpretações
e costumes dos quais os próprios judeus mantinham controvérsias. Ainda assim, ele não
necessariamente se opôs mais a esses adendos que à negligência em relação ao que ele
considerava o verdadeiro cerne da religião hebraica: “Os preceitos mais importantes da lei: a
justiça, a misericórdia e a fidelidade. Vocês devem praticar estas coisas, sem omitir aquelas
[ou seja, algumas das minúcias sobre as quais a controvérsia era travada]” (Mt 23, 23).
206
Daí em diante, o cristianismo precisou se definir em relação aos costumes e às
controvérsias do judaísmo intertestamentário. De fato, a tarefa de se adaptar a cenários
socioculturais singulares e de se definir nesse contexto, sem comprometer sua natureza
essencial, acompanhou a igreja em cada geração subsequente. Seus sucessos e
fracassos eram amplamente determinados pelo nível com que cada geração entendia
a natureza das lutas da igreja primitiva e os princípios morais e espirituais básicos
aplicados pelos cristãos judeus do mundo do século I nos contextos e nas situações
divergentes. As implicações teológicas e éticas deveriam ser óbvias, mas deixe-me
mencionar uma área menos evidente: os missiólogos modernos enfatizam o desafio do
ministério em contextos pouco conhecidos. O problema não é novo.
Uma, duas, talvez quatro vezes ao ano, eu ia de carro para o leste de Decatur,
na Geórgia, e atravessava a Ponce de Leon Avenue em direção a Stone Mountain. A
cerca de um quilômetro e meio dos limites da cidade, eu virava à esquerda em uma
estrada estreita e passava por um bosque. Então eu podia ver a casa branca de dois
andares com a grande varanda. Ela ficava no alto de uma colina e mostrava sua idade.
No começo, eu a visitava com duas pessoas idosas que viveram lá. Eu dava a volta
pelo quintal e pelo pasto, e subia até o celeiro. Passava pelos bosques que cercavam a
fazenda dos três lados. Depois de visitar a formação rochosa que, para um garotinho,
parecia corcovas de camelo, eu ia para um velho pinheiro retorcido e para uma pequena
clareira familiar cercada de espinheiros, vinhas e árvores que cresciam bem juntas.
Hoje, até mesmo a possibilidade de fazer essa jornada sentimental se foi. Uma
barreira bloqueia o percurso, o tempo e o clima venceram a guerra contra o celeiro, a
casa foi vítima de uma escavadeira. Mesmo assim, eu ainda volto, volto por meio da
207
memória e de imagens mentais. Às vezes eu vou, fisicamente, a dois túmulos sob uma
mesma pedra. Essas viagens são importantes. Embora não possa voltar à casa, preciso
me lembrar das raives das quais brotei. Elas me fazem lembrar de quem eu sou. Elas me
dão maior entendimento do quanto o menino da fazenda que antes existiu e o professor
universitário que agora existe são parecidos e diferentes. Sou grato pelo que passou,
mas não posso mais voltar a casa.
FONTE: Adaptada de SCOTT JR., J. J. Origens judaicas do novo testamento: um estudo do judaísmo
intertestamentário. Tradução: Valéria Lamim Delgado Fernandes. São Paulo: Shedd Publicações, 2017, p.
384-387.
208
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• Crença de crendices.
209
AUTOATIVIDADE
1 Se há uma característica que define bem a natureza da cultura judaica é a religiosidade.
Não está claro para os estudiosos da religião, quais os limites, as diferenças e a
natureza da relação entre a cosmovisão dos judeus e sua religião. No entanto, a ideia
de que a religião é parte constitutiva da vida cultural deste povo é amplamente aceita.
Disserte sobre a importância do templo e da sinagoga na vida dos judeus.
3 Entre os locais públicos que Jesus e seus discípulos frequentaram está o templo, a
sinagoga e a porta da cidade. Associe os itens, utilizando o código a seguir:
I- Templo.
II- Sinagoga.
III- Igreja.
ENQUANTO
210
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) As duas proposições são verdadeiras, e a segunda proposição está em oposição
à primeira.
b) ( ) As duas proposições são falsas, e a segunda proposição está em oposição à
primeira.
c) ( ) A primeira proposição é verdadeira, e a segunda proposição é falsa.
d) ( ) A primeira proposição é falsa, e a segunda é uma proposição verdadeira.
5 A instrução na lei e na tradição era o principal legado dado aos filhos pelas famílias
judaicas. Analise os enunciados a seguir.
211
212
REFERÊNCIAS
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fenomenologia da religião. Tradução: Carlos Maria Vasquez Gutiérrez. São Paulo:
Paulinas, 2001.
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Paulo: Vida Nova, 2006.
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218