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(ISCTEM)
ESCOLA DE DIREITO
Dedicatória
Agradecimentos
Neste dia em que apresento a dissertação para a obtenção do grau de Licenciatura em Direito, pelo
ISCTEM, julgo ser oportuno deixar uma palavra de gratidão a todos aqueles que, directa ou
Em primeiro lugar expresso o meu profundo agradecimento ao Dr. Acácio Fóia, primeiro, por
partilhar uma grande paixão pelo mundo da Propriedade Intelectual e, segundo, pelo apoio
incondicional dispensado durante todo o processo que culminou com a apresentação deste trabalho.
Aos Drs. Carlos Macôo, Henriques Henriques, Mia Couto, Carlos Serra, Drª Nacivia Machavana e a
Srª Sofia Magaia, pela disponibilidade e atenção dispensada em todos os momentos da construção da
presente tese.
Expresso também a minha gratidão à Drª Angelina Dias, Eng. Hélio Soares e a Srª Rosemary White,
Por fim, mas não menos importante, o meu khanimambo aos meus irmãos, familiares, colegas de
jornada académica e amigos pela força que o seu companheirismo abnegado e sincero durante estes
quatro anos.
DECLARAÇÃO DE AUTENTICIDADE
Declaro que este Trabalho, na sua essência, constitui minha investigação pessoal, estando indicadas
no texto e na bibliografia as fontes que utilizei.
____________________________________________
Leonardo Jorge Macôo Nhavoto
ÍNDICE
I. Introdução .................................................................................................................. 2
VEGETAIS .............................................................................................................................7
INTERNACIONAL ............................................................................................................... 9
NACIONAL ............................................................................................................................15
Criticas ................................................................................................................................... 18
BIBLIOGRAFIA ..................................................................................................................... 27
CC — Código Civil;
1. Introdução
Moçambique é um país com uma vasta gama de recursos naturais — muitos deles ainda
insuficientemente explorados. Num contexto de acelerada globalização, em que instituições
supranacionais cada vez mais facilmente acessam e exploram os recursos naturais de vários países, a
salvaguarda do interesse nacional de cada Estado passa pelo desenvolvimento de um dispositivo
legislativo nesse sentido.
Na presente pesquisa procuramos lançar um olhar técnico-jurídico para a situação
moçambicana relativamente à protecção dos recursos genéticos, tendo em atenção os dispositivos
internacionais ratificados por Moçambique em matéria de propriedade intelectual e a regulamentação
interna existente no nosso ordenamento jurídico.
O trabalho divide-se em cinco partes, que correspondem aos capítulos da pesquisa: no
primeiro capítulo enquadramos a questão da protecção de recursos vegetais a nível da propriedade
intelectual; no segundo capítulo analisamos os dispositivos legais internacionais a que o nosso país
se encontra vinculado; o terceiro capítulo é dedicado à análise da legislação interna no concernente à
protecção de espécies vegetais com propriedades medicinais. No quarto capítulo desenvolvemos um
exercício de análise de Direito Comparado, olhando para os casos do Brasil e Portugal. Dedicamos o
quinto e último capítulo para as conclusões e pertinentes recomendações.
O presente tema mereceu a nossa atenção por termos constatado que, apesar de trazer muitas
vantagens para o nosso país, no que toca a oportunidades de desenvolvimento em diversas áreas
socioeconómicas, o fenómeno da globalização1 trouxe também um grande perigo do Estado
moçambicano se tornar palco de exploração por parte de instituições que se encontram num estágio
mais avançado de desenvolvimento científico e económico.
1
A globalização pode, segundo Giddens, ser definida como a intensificação das relações sociais à escala mundial, que
ligam localidades distantes de tal maneira que os acontecimentos locais são enformados por acontecimentos que se dão a
muitas milhas de distância e vice-versa. Giddens, A (1990) – The Consequences of Modernity. Polity Press, UK
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A PROTECÇÃO DE ESPÉCIES VEGETAIS COM VALOR MEDICINAL EM MOÇAMBIQUE
3. Identificação do Problema
O estágio actual da ciência no mundo reflecte também um desnível de forças entre as nações
do ―Primeiro Mundo‖ e as do ―Terceiro Mundo‖. A maior parte das nações em desenvolvimento,
grupo em que Moçambique se enquadra, ainda não possui recursos económicos e científicos para
explorar o potencial que a sua biodiversidade apresenta. Recursos económicos e científicos que se
encontram em peso nas nações mais desenvolvidas, e que, no caso vertente, são hábil e eficazmente
utilizados pelas suas indústrias farmacêuticas.
Com os avanços da globalização, que têm diminuído as barreiras espaciais e de tempo no
relacionamento entre os Estados, aumentando o fluxo de comunicação. Com a tecnologia e os meios
de transporte modernos a reduzirem as dimensões do mapa mundial do ponto de vista prático, temos
assistido a um fenómeno que se consubstancia na exploração, por instituições supranacionais, de
recursos genéticos com potencial medicinal, localizados em territórios de países que, por não terem
capacidade para a exploração científica, não tiram proveito dos ganhos desta exploração.
2
Recurso genético: a informação de origem genética, contida em amostras do todo ou de parte de espécime vegetal,
fúngico, microbiano ou animal, na forma de moléculas ou substâncias provenientes do metabolismo destes seres vivos e
de extractos obtidos destes organismos vivos ou mortos, encontrados em condições in-situ, inclusive domesticados, ou
mantidos em colecções ex-situ, desde que colectados em condições in-situ no território nacional, na plataforma
continental ou na zona económica exclusiva;
No mercado mundial de medicamentos (cerca de US$ 320 biliões anuais), 40% dos remédios
são oriundos directa ou indirectamente de fontes naturais (30% de origem vegetal e 10% de animal).
Estima-se que 25 mil espécies de plantas sejam usadas para a produção de medicamentos. 3
A legislação internacional relativa à propriedade intelectual permite que plantas milenares e
com propriedades medicinais conhecidas e exploradas pelas comunidades locais4 sejam patenteadas
como novas descobertas por companhias farmacêuticas, o que resulta na criação de compostos
farmacêuticos que são vendidos no mercado internacional com um reduzido ou nulo benefício dos
países de origem e de suas comunidades locais inicialmente detentoras do conhecimento que deu
origem à exploração.
O patenteamento dos recursos genéticos de Países em Vias de Desenvolvimento (PVD), por
parte de companhias farmacêuticas estrangeiras, é um bloqueio ao potencial económico que o
desenvolvimento das indústrias farmacêuticas destes países representa. No momento em que o
desenvolvimento científico e a conjuntura socioeconómica permitir a exploração deste potencial por
parte dos PVD, tal não poderá acontecer ou pelo menos acontecerá com limitações, em virtude de os
tais recursos terem sido patenteados por companhias farmacêuticas estrangeiras.
Moçambique é um país situado na região intertropical do continente africano e integra no seu
território diversas zonas climáticas, possuindo uma vasta e rica gama de recursos vegetais com certo
potencial farmacêutico. A comprovar este potencial, um estudo recente da organização WWF5, em
parceria com a Universidade Eduardo Mondlane, tendo como área de incidência somente a zona do
Parque Nacional das Quirimbas, na província de Cabo Delgado, norte de Moçambique e envolve
uma área de aproximadamente 7.506 km2, revelou a existência de 132 especies vegetais com
potencial medicinal. De um total de 53 enfermidades alistadas como podendo ser combatidas pelas
espécies medicinais encontradas nas Quirimbas, constam a diarreia, complicações respiratórias,
doenças oportunistas relacionadas com o HIV/SIDA, a malária, hérnia entre outras doenças6.
No geral e de acordo com os resultados do estudo realizado pela Universidade Eduardo Mondlane, o
3
Cfr. COSTA, Wanderley Messias da, BECKER, Bertha k. e ALVES, Diogenes Salas Dimensões humanas da biosfera-
atmosfera na Amazônia, Editora da Universidade de São Paulo, 2007 Pag 96
4
Comunidade local: o agrupamento de famílias e indivíduos vivendo numa circunscrição territorial de nível de
localidade ou inferior, que visa a salvaguarda de interesses comuns através da protecção de áreas habitacionais, áreas
agrícolas, sejam cultivadas ou em pousio, florestas, sítios de importância cultural, pastagens, fontes de água e áreas de
expansão;
5
World Wide Fund for Nature é uma das mais conhecidas ONGs ambientalistas do planeta, tendo iniciado suas
atividades em 1961, por iniciativa de um grupo de cientistas da Suíça preocupados com a devastação da natureza.
6
Cfr.Terrestrial Vegetation Assessment of theQuirimbas National Park (Final report submitted to the Quirimbas National
Park ), Pag. 104
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A PROTECÇÃO DE ESPÉCIES VEGETAIS COM VALOR MEDICINAL EM MOÇAMBIQUE
Parque Nacional das Quirimbas apresenta uma diversidade de plantas raras e para várias aplicações,
daí que o mesmo estudo recomenda ao governo moçambicano no sentido de promover acções de
exploração sustentável dos mesmos. A nosso ver, estudos como este vêm realçar a necessidade de
um aproveitamento mais profundo dos benefícios que podem advir de uma gestão eficaz dos nossos
recursos vegetais.
Num universo de um milhão de patentes no mundo em cada ano, menos de 300 são
concedidas e registadas em Moçambique7, patentes estas que são concedidas através de 3 sistemas: i)
sistema internacional com base no Tratado de Cooperação em matéria de Patentes (PCT); ii) sistema
regional através do Protocolo de Harare; e iii) com base no sistema nacional, através do Código de
Propriedade Intelectual. Destas 300 patentes concedidas em Moçambique, não encontrámos, desde a
criação do Instituto de Propriedade Industrial, uma única que tenha sido concedida a uma entidade
nacional e que tivesse como objecto um produto ou processo da área da biodiversidade8, sendo de
realçar que a primeira patente a nível mundial concedida nesta matéria já tem mais de duas décadas,
tendo sido atribuída em 1985 ao americano Kenneth Hibbert9. Entendemos que a inexistência de
patentes na área da biodiversidade, contrastando com a riqueza de recursos existentes nesta área, é
sintomática do actual sistema de patentes em vigor no nosso pais, que não se mostra eficaz no
aproveitamento dos nossos recursos e na inclusão dos cidadãos no geral e das comunidades locais,
em particular, no processo de aproveitamento deste potencial.
4.Objectivos
Tendo em conta que o conhecimento sobre as potencialidades medicinais da maior parte das
variedades vegetais encontra-se no domínio da população rural, iletrada e com recursos financeiros
limitadíssimos, pretende-se com o trabalho fazer uma reflexão sobre os mecanismos e critérios de
7
Dados colhidos na apresentação do Dr. Fernando Santos, Director do Instituto de Propriedade Industrial de
Moçambique, ―Legislação sobre Patentes em Moçambique e implementação do TRIPs na área de medicamentos‖ a 3 de
Dezembro de 2008 no Ministério da Saúde.
8
Vide Boletim da Propriedade Industrial n°41 de Dezembro de 2008
9
Crf. FARIA, Rachel S. M. Patentes Biologicas in
http://www.senado.gov.br/conleg/artigos/politicasocial/Patentesbiologicas.pdf
CAPÍTULO I
10
Vide alínea a) do artigo n˚1 do Código de Propriedade Industrial.
11
Vide Glossário em anexo na lei nº 4/2001 de 27 de Fevereiro (Lei dos direitos de autor)
12
O título concedido para a protecção de uma invenção, segundo a alínea b) do artigo n˚1 do Código de Propriedade
Intelectual.
13
Definição constante no CPI, alínea c) do artigo nº˚1
ligados ao aspecto cultural das populações. Embora ocorram numa região restrita, uma vez
aproveitados racionalmente o processo pode ser replicado para outras regiões do país.
CAPÍTULO II
A Convenção da Diversidade Biológica foi primeiro instrumento legal criado para assegurar
a conservação e o uso sustentável dos recursos naturais. Este instrumento tem como principais
objectivos a conservação da diversidade do património genético e biológico, em seus habitats
naturais ou fora deles, a utilização sustentável de seus componentes e a repartição justa e equitativa
dos benefícios derivados da utilização dos recursos genéticos, mediante o acesso adequado aos
recursos genéticos e a transferência adequada de tecnologias pertinentes, levando em conta todos os
direitos sobre tais recursos e tecnologias e mediante financiamento adequado.
Mais de 160 países assinaram o acordo, que entrou em vigor em Dezembro de 1993. O
impulso inicial para a criação da Convenção ocorreu em Junho de 1992, quando o Brasil organizou e
sediou uma Conferência das Nações Unidas, a Rio-9214, como ficou conhecida a conferência, que se
propunha a atingir os seguintes objectivos: elaborar 2 convenções, uma sobre a mudança climática e
outra sobre biodiversidade, promover um plano de acção, a agenda XXI, que incidisse sobre vastas
áreas desde a reciclagem de resíduos industriais ao tratamento de resíduos nucleares e, por último,
aprovar uma Declaração sobre os princípios, direitos e obrigações em matéria de ambiente e
desenvolvimento, posteriormente chamada Declaração do Rio.
À luz do artigo 8 alínea j) relativo à conservação in situ15, a CDB16 orienta os países parte a
“em conformidade com a sua legislação nacional, preservar, respeitar e manter o conhecimento,
inovações e práticas das comunidades locais e populações indígenas com estilo de vida tradicionais
relevantes à conservação e a utilização sustentável da diversidade biológica e incentivar sua mais
ampla aplicação com a aprovação e a participação dos detentores desse conhecimento, inovações e
práticas; e encorajar a repartição equitativa dos benefícios oriundos da utilização desse
conhecimento, inovações e práticas”. É uma das disposições que pode ser impulsionadora, a nível
14
Cfr. CONDESSO, Fernando dos Reis Direito do Ambiente, Coimbra, Livraria Almedina, Junho 2001, pág.226;
15
A conservação dos ecossistemas e dos habitates naturais e a manutenção e recuperação de populações viáveis de
espécies no seu meio natural e, no caso das espécies domesticadas ou cultivadas, em meios onde tenham desenvolvido as
suas propriedades específicas
16
Convenção da Diversidade Biológica
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A PROTECÇÃO DE ESPÉCIES VEGETAIS COM VALOR MEDICINAL EM MOÇAMBIQUE
nacional, de uma mais ampla inclusão das comunidades locais na tomada de decisões sobre a gestão
dos recursos vegetais.
No nº1 do artigo 15 da convenção sobre a diversidade biológica, relativo ao acesso a
recursos genéticos, a CBD estatui que: “Em reconhecimento dos direitos soberanos dos estados
sobre seus recursos naturais, a autoridade para determinar o acesso a recursos genéticos pertence
aos governos nacionais e esta sujeita à legislação nacional”, num incentivo claro, a nosso ver, à
criação de legislação interna relativa à matéria de regulamentação do acesso aos recursos genéticos.
Apesar de ter ratificado este dispositivo em 24 de Agosto de 1994, Moçambique continua
até aos dias de hoje a ter resposta negativa aos quesitos relativos ao desenvolvimento de programas
de capacitação que envolvam as comunidades locais e outros intervenientes relevantes a participarem
efectivamente nos processos de regulamentação dos recursos genéticos. Tem igualmente tido um
desempenho negativo e quase nulo no apoio às comunidades locais na realização de estudos de
campo que determinem o estado, tendências e ameaças relacionadas com o conhecimento, inovações
e práticas das comunidades locais, como urge o artigo 8 da CDB.17
No tocante ao cumprimento das directrizes da CDB previstas no número 1 do artigo 19,
que estabelecem a necessidade de cada parte contratante adoptar medidas legislativas, admnistrativas
ou políticas, conforme o apropriado, para assegurar a participação efectiva nas actividades de
investigação em Biotecnologias das Partes contratantes, em especial os PVDs que forneçam os
recursos genéticos para tais investigações, Moçambique continua com um desempenho aquém do
previsto. Por um lado não tomou ainda medidas para promover a participação efectiva em
actividades de pesquisa biotecnológica e, por outro, não tomou medidas práticas para promover e
avançar com o acesso prioritário pelas partes na base justa e quitativa, aos resultados e benefícios
resultantes da biotecnologia baseados nos recursos genéticos fornecidos pelas partes, como prevê o
número 2 artigo supracitado.18Não tendo desde 1994 até aos dias actuais implementado tais medidas
práticas, o Estado moçambicano continua a alhear-se aos benefícios que podem advir de um
cumprimento dos planos traçados no cumprimento da CBD.
17
Terceiro Relatório Nacional sobre a Convenção Sobre Diversidade Biológica - pág 80
18
Ibidem - pág 106
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A PROTECÇÃO DE ESPÉCIES VEGETAIS COM VALOR MEDICINAL EM MOÇAMBIQUE
19
TRIPS Agreement on Trade Related Aspects on Intellectual Property Rights
20
GATT General Agreement on Tariffs and Trade, ou seja Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio
21
Cfr. FRAGOSO, João Henrique da Rocha, Direito Autoral, Da Antiguidade à internet, Quarter Latin, São Paulo, 2009
pag. 108 –“ Este acordo, embora da OMC foi instituído como resultado do esforço de cooperação estabelecido entre a
OMPI e OMC...”
22
A que abreviadamente nos referiremos como TRIPS
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modo que não se coaduna com os direitos soberanos dos países sobre os recursos genéticos existentes
em seus territórios, como prevê a CBD.
O TRIPS abre a possibilidade de patenteamento e outras formas de protecção da propriedade
intelectual, que permitem uma exploração económica que não tem harmonização com as disposições
da CBD, que indicam a necessidade do respeito, manutenção e preservação do conhecimento
tradicional23 e a repartição equitativa dos benefícios resultantes da utilização desses conhecimentos,
como tivemos oportunidade de analisar no capítulo anterior.
É nosso entendimento que com esta disposição em vigor a nível do comércio mundial, os
interesses dos PVD`s encontram-se precariamente protegidos, visto que os estados com maiores
recursos económicos e científicos, através das suas empresas farmacêuticas, têm neste artigo 27
campo de actuação para materializar o seu interesse em recursos vegetais de outros países, e a
coberto da protecção do sistema de patenteamento em vigor podem se apoderar dos componentes
activos destes recursos vegetais. Esta será mais uma razão porque o Estado moçambicano deve
alinhar no grupo de países24 que contestam esta disposição e clamam para que a mesma seja revista,
de modo a proteger também os interesses dos PVD`s, que são actualmente os que detêm grande parte
das plantas medicinais.
23
São considerados conhecimentos tradicionais todos os elementos intangíveis associados à utilização comercial ou
industrial das variedades locais e restante material autóctone desenvolvido pelas populações locais, em colectividade ou
individualmente, de maneira não sistemática e que se insiram nas tradições culturais e espirituais dessas populações,
compreendendo, mas não se limitando a conhecimentos relativos a métodos, processos, produtos e denominações com
aplicação na agricultura, alimentação e actividades industriais em geral, incluindo o artesanato, o comércio e os serviços,
informalmente associados à utilização e preservação das variedades locais
24
Cfr. World Trade Organizationnational workshop on the TRIPS Agreement (Basic Documentation), Prepared by the
WTO Secretariat, Maputo, 5 August 2005 Pag. 11 capitulo IV, que enumera os paises que ja submeteram comunicaçoes a
Organização Mundial do Comercio propondo a revisão da alínea b) do artigo 27 do TRIPS, nesta lista encontramos, o
Brasil, Austrália, India, entre outros.
25
A Agenda 21 foi um dos principais resultados da conferência Eco-92, ocorrida no Rio de Janeiro, Brasil, em 1992. É
um documento que estabeleceu a importância de cada país a se comprometer a refletir, global e localmente, sobre a forma
pela qual governos, empresas, organizações não-governamentais e todos os setores da sociedade poderiam cooperar no
estudo de soluções para os problemas sócio-ambientais. Cada país desenvolve a sua Agenda 21.
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O presente protocolo nasce das prerrogativas criadas pelos artigos 8 na sua alínea g), 17, 19 nos seus
números 3 e 4 da Convenção sobre a Biodiversidade, bem como da Decisão II/5 de 5 e 17 de
Novembro de 1995, da conferência das partes, a qual determina a elaboração de um protocolo sobre
Bio-seguranca, com enfoque especial para o movimento transfronteiriço de quaisquer organismos
vivos modificados resultantes da biotecnologia.
Este protocolo visa assegurar um nível adequado de protecção no campo da transferência, da
manipulação e do uso seguros dos organismos vivos modificados resultantes da biotecnologia
moderna e no uso sustentável da diversidade biológica, levando em conta os riscos para a saúde
humana, decorrentes do movimento transfronteiriço.
Entendemos que o Protocolo de Cartagena, mesmo tendo um objecto diferente do
directamente tratado no nosso trabalho, ou seja incidindo sobre organismos geneticamente
modificados e não sobre material genético na sua forma original ainda sem a interferência da
biotecnologia, é relevante para o nosso estudo por demonstrar uma crescente influência da
biotecnologia como um factor de cooperação entre os países no mundo actualmente. Esta relevância
estende-se ainda pelo facto de muitas das prerrogativas criadas para regulamentar o movimento
transfronteiriço dos organismos vivos geneticamente modificados serem aplicáveis também para o
caso dos organismos vivos na sua forma natural.
Assim sendo, é nosso entendimento que, com as devidas adaptações, a situação da
movimentação dos organismos vivos não modificados, são relevantes também os princípios
estabelecidos por este protocolo no tocante à comunicação prévia entre as partes (importador e
exportador) que deveria anteceder qualquer movimento transfronteiriço de material genético vegetal,
como regulamentam os artigos: 6 relativo ao trânsito e uso em contenção; 7 aplicação do
procedimento de acordo prévio; 8 notificação e 9 acusação do recebimento de notificação. Estes
artigos estabelecem uma plataforma de comunicação entre as partes envolvidas neste processo de
movimento transfronteiriço, que torna possível o controlo sobre os organismos vivos modificados.
Fica, entretanto, a parte exportadora obrigada a notificar ou assegurar que o exportador notifique por
escrito a parte importadora do movimento transfronteiriço antes desta ter início. É também relevante
para o nosso estudo a abertura criada pelo artigo 14 no sentido do incetivo ao estebelecimento de
acordos bilaterais ou regionais entre os estados desde que não resultem num nível de segurança
inferior ao pretendido pelo presente protocolo.
Como afirmamos inicialmente, apesar do objecto do presente protocolo não incidir
directamente no objecto do nosso estudo, acreditamos que estas medidas que regulamentam os
Estados em matéria de movimento transfronteiriço podem ser aproveitadas, para que, com as devidas
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ressalvas, dêem origem a plataformas de entendimento que podem resultar em legislação que poderá
orientar a relação entre Moçambique e outros Estados no tocante à divulgação de informação sobre
as intenções de importação de material genético vegetal nacional.
CAPÍTULO III
26
Lei do ambiente nº˚ 20/97 de 1 de Outubro.
regulamento, regular o acesso ao conhecimento tradicional associado a recursos genéticos, que seja
relevante para a conservação da diversidade biológica, à integridade dos recursos naturais, a
utilização dos seus componentes e a repartição justa e equitativa dos benefícios derivados da
exploração de componentes dos recursos genéticos e do conhecimento tradicional associado.
No seu papel como autoridade nacional em matéria de Acesso e Partilha de Benefícios
Provenientes de Recursos Genéticos, o Ministro para a Coordenação da Acção Ambiental tem, dentre
as suas funções, as tarefas descritas no número 1 do artigo 5, sendo de sublinhar:
d) Propor normas técnicas, critérios para as autorizações de acesso e de remessa, bem como
sobre as directrizes para elaboração do contrato de utilização dos recursos genéticos e de repartição
de benefícios e dos termos de transferência de material.
De salientar que no capítulo IV, que incide sobre a protecção do conhecimento tradicional
associado, encontramos medidas protectoras, sendo de destacar:
1. A proibição da utilização ou exploração ilícita e outras acções lesivas ou não autorizadas pela
autoridade nacional, do conhecimento tradicional das comunidades locais, associado aos recursos
genéticos.
2. O conhecimento tradicional associado aos recursos genéticos de que trata este regulamento
integra o património histórico-cultural moçambicano e poderá ser objecto de cadastro.
3. A protecção, ora instituída, não deve afectar, prejudicar ou limitar direitos relativos à propriedade
intelectual.
1. Críticas
Na interpretação por nós feita ao dispositivo legal criado para regulamentar o acesso e
partilha de benefícios provenientes de Recursos Genéticos e Conhecimento Tradicional Associado,
não encontramos indícios de que o legislador tenha avançado na definição dos mecanismos ao dispor
das comunidades locais para legitimar o seu conhecimento legalmente, o que faz com que o mesmo
se torne ineficaz, como comprova o facto de até hoje não haver nenhum registo da sua utilização por
parte das comunidades moçambicanas.
No capítulo IV encontramos as medidas protectoras ao conhecimento tradicional, e no
número 5 do artigo 14 a declaração de que a protecção, ora instituída, não deve afectar, prejudicar ou
limitar direitos relativos à propriedade intelectual. Esta declaração, a nosso ver, não define
claramente até que ponto as comunidades locais têm direitos e podem protegé-los legalmente sem
limitar os direitos relativos à propriedade intelectual de terceiros interessados.
Nos termos do n°1 do artigo 15 do Regulamento sobre o Acesso e Partilha de Benefícios
provenientes de Recursos Genéticos e Conhecimento Tradicional Associado, que passamos a citar
―qualquer conhecimento tradicional associado aos recursos genéticos poderá ser de titularidade da
comunidade, ainda que apenas um indivíduo, membro dessa comunidade, detenha esse
conhecimento.‖ Em nosso entender esta enunciação não faz a pormenorização dos mecanismos
através aos quais a comunidade pode aceder a titularidade do conhecimento tradicional em termos
práticos, ou seja, é difícil apurar tal titularidade pese embora o regulamento disponha nesse sentido.
Outro problema identificado na análise do artigo 15 é o facto de a possibilidade de o conhecimento
de um indivíduo poder ser apropriado pela comunidade em que esta inserido pode significar uma
lesão do direito de propriedade do indivíduo inicialmente em posse do conhecimento, esta agressão
aos direitos individuais em beneficio comunitário pode, a nosso ver, configurar uma violação à
protecção constitucional nos termos do nº2 do artigo 94 da CRM29.
O capítulo VI do mesmo diploma legal estabelece as disposições relativas aos mecanismos
de partilha dos benefícios resultantes da exploração dos recursos genéticos, e em nenhum momento é
indicado o mecanismo que vai permitir à comunidade local provar que o seu conhecimento sobre o
aproveitamento de um dado recurso genético é anterior à exploração que deu início aos benefícios
em questão.
29
Cfr. Número 2 do Artigo 94 da CRM, que estatui, ―O estado protege os direitos inerentes à propriedade intelectual,
incluindo os direitos de autor, e promove a prática e a difusão de letras e das artes‖.
CAPÍTULO IV
1. O caso do Brasil
Nos estudos do Direito Comparado a experiência brasileira no campo da protecção de
recursos genéticos e dos conhecimentos tradicionais é das mais relevantes, não só devido à riqueza
da diversidade biológica30, como também à similaridade deste ordenamento jurídico com o
moçambicano31 e do seu sucesso na criação de legislação específica para o acesso e exploração dos
recursos vegetais com potencial medicinal.
O Brasil possui a maior área contínua de floresta tropical do mundo, a Amazónia, entre 10% e 20%
das 1,5 milhões de espécies de seres vivos catalogadas, cerca de 55 mil espécies de plantas com
sementes, a maior diversidade de primatas, anfíbios, peixes de água doce e insectos e a terceira maior
de aves.
A implementação no Brasil da Convenção sobre a Diversidade Biológica, especialmente
da alínea j) do artigo 8 e no artigo 15, artigos que tratam respectivamente do conhecimento
tradicional e do acesso aos recursos genéticos e da repartição dos benefícios provenientes da sua
utilização, resultou na criação da Medida Provisória 2.186-16/01 que instituiu as regras para o acesso
e a remessa de componentes do património genético e o acesso a conhecimentos tradicionais
associados. Nesta norma o legislador brasileiro previu a criação de uma autoridade competente, o
Conselho de Gestão do Património Genético32 no âmbito do Ministério do Meio Ambiente que
iniciou as suas actividades em Abril de 2002.
30
O Instituto de Pesquisa Económica Aplicada estima o valor da biodiversidade brasileira em US$ 2 trilhões (quatro
PIBs nacionais brasileiros).
31
Tanto o Brasil como Moçambique pertencem à família Romano Germánica do Direito.
32
Vide competências no Anexo I
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A PROTECÇÃO DE ESPÉCIES VEGETAIS COM VALOR MEDICINAL EM MOÇAMBIQUE
b) A descrição a que se refere a alínea anterior deverá ser feita de forma que terceiros possam
reproduzir ou utilizar os conhecimentos tradicionais e obter resultados idênticos aos obtidos pelo
titular dos conhecimentos.
Esta protecção conferida pelos conhecimentos tradicionais outorga aos respectivos titulares o direito
a, de acordo com o nº 4 do artigo 3:
a) Oporem-se à sua reprodução, imitação e ou utilização, directa ou indirecta, por terceiros não
autorizados, para fins comerciais;
33
Conferência realizada em Leipzig, em 1996, no âmbito da FAO, se refere, na alínea e) do seu parágrafo 203, que os
governos devem considerar medidas legislativas que permitam a distribuição e comercialização de variedades locais.
Este diploma legislativo revela-se um mecanismo eficaz quanto ao acesso e partilha dos
benefícios de uma eventual exploração, pois a utilização destas plantas, partes destas pertencentes ao
seu material vegetal directamente ou através dos princípios activos nelas contidos, para fins
industriais ou biotecnológicos, é também sujeita a autorização prévia do CoTerGAPA34 e, se
necessário, do organismo competente do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território,
sempre com a audição do titular do registo, estando o acesso condicionado a uma partilha justa dos
benefícios resultantes dessa utilização, por acordo prévio com o titular do registo35.
Entendemos que a solução legislativa portuguesa para proteger os conhecimentos
tradicionais é eficaz por indicar especificamente os direitos que assistem às comunidades locais ou
aos detentores legítimos dos conhecimentos tradicionais após o registo dos mesmos, criando
vantagens específicas e claras que servem de incentivo à colaboração das comunidades no processo
de levantamento, discrição e registo dos conhecimentos tradicionais.
34
Conselho Técnico do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas para os Recursos Genéticos
Agrários, das Pescas e Aquicultura
35
Como prevê o nº˚4 do artigo 7 do Decreto-Lei nº 118/2002
CAPÍTULO V
CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
5. Para uma implementação mais eficaz dos dispositivos legais ja criados, deve haver uma maior
coordenação inter-institucional.
1. Moçambique tem que se posicionar no grupo de países em vias de desenvolvimento que têm
feito chegar aos órgãos pertinentes a nível internacional reclamações e propostas de revisões
no tocante à legislação internacional que regula o acesso ao material genético vegetal.
2. Moçambique deve fazer chegar o seu parecer à Organização Mundial de Comércio, para que
seja elaborada uma revisão do artigo 27 n.º 3 b) do TRIPS, de modo a obrigar a todos os
membros a tornarem as espécies vegetais e animais não patenteáveis.
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A PROTECÇÃO DE ESPÉCIES VEGETAIS COM VALOR MEDICINAL EM MOÇAMBIQUE
2.2 Sejam incorporadas no TRIPS directrizes que orientem a não concessão de patentes que não
sejam harmoniosas com o disposto no artigo 15 da CBD.
BIBLIOGRAFIA
Doutrina
— BERTOGNA, Viviane Alves e CIBIM, Juliana Cassano, Acessos aos recursos genéticos e
conhecimentos tradicionais associados: Protecção de direitos e repartição de benefícios, Direito
Internacional do Meio Ambiente, São Paulo, Editora Atlas S.A, 2006;
— BENSUANSAN, Nurit, LIMA, Andre, Quem Cala Consente? - Subsídios para a Protecção
aos Conhecimentos Tradicionais, ISA, Brasilia, junho de 2003.
— CONDESSO, Fernando dos Reis, Direito do Ambiente, Coimbra, Livraria Almedina, Junho
2001;
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Legislação Moçambicana
Diversidade Biológica.
Bio-Segurança.
Legislação Internacional
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conservação, salvaguarda legal e transferência do material vegetal autóctone de Portugal
Publicações
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Leonardo Jorge Macôo Nhavoto – TRABALHO DE LICENCIATURA EM DIREITO
A PROTECÇÃO DE ESPÉCIES VEGETAIS COM VALOR MEDICINAL EM MOÇAMBIQUE
— http://www.wwf.org.mz/( 20/07/09)
ANEXOS
Este órgão, criado especialmente para gerir as questões conexas ao acesso a material genético com
II — estabelecer:
a) Normas técnicas;
Benefícios;
d) Critérios para a criação de base de dados para o registo de informação sobre conhecimento
tradicional associado;
III — acompanhar, em articulação com órgãos federais, ou mediante convénio com outras
IV — deliberar sobre:
titular;
instituição nacional, pública ou privada, que exerça actividade de pesquisa e desenvolvimento nas
áreas biológicas e afins, e à universidade nacional, pública ou privada, com prazo de duração de até
pública ou privada, que exerça actividade de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e
afins, e à universidade nacional, pública ou privada, com prazo de duração de até dois anos,
pública federal de gestão para autorizar outra instituição nacional, pública ou privada, que exerça
f) Credenciamento de instituição pública nacional para ser fiel depositária de amostra de componente
do património genético;
Benefícios quanto ao atendimento dos requisitos previstos nesta Medida Provisória e no seu
regulamento;
VI — Promover debates e consultas públicas sobre os temas de que trata esta Medida Provisória;
VII — funcionar como instância superior de recurso em relação à decisão de instituição credenciada
Anexo II - Terrestrial Vegetation Assessment of the Quirimbas National Park pag. 105