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Prof. Ms. Doutorando Daniel Barile da Silveira
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Dr. Fabrício Keidy Arakaki
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Dr. Jorge Kuranaka
teoria que preza pela preservação de um patrimônio mínimo existencial, intangível aos
infraconstitucional.
patrimônio mínimo.
ABSTRACT
the preservation of a heritage minimum existential intangible assets to creditors, able to meet
the basic needs of human beings, respecting human dignity, the program standards and
Key words: person, property, principle of human dignity, preservation of heritage minimum.
SUMÁRIO
Introdução ............................................................................................................................... 10
Conclusão ................................................................................................................................ 65
Referências .............................................................................................................................. 69
10
INTRODUÇÃO
preservar um patrimônio de expropriação, venda, doação, etc. para que a pessoa e a entidade
Este estudo foi produzido com base na teoria do professor Luiz Edson
Fachin que desenvolveu a teoria do Estatuto Jurídico do Patrimônio Mínimo, utilizando como
evolução que direito civil teve com o fenômeno da constitucionalização, conceitos para
entender e delimitar parâmetros para discorrer sobre o assunto, passando então para tomada
de fato a respeito da teoria concebida pelo Prof. Luiz Edson Fachin. Já se inclinando para o
final do desenvolver do trabalho foi dado à parcela de responsabilidade pelo qual o Estado
assume. Sendo ele o mantenedor da ordem sócio-jurídica recebe forte encargo de condicionar
a sociedade para um futuro prospero e igualitário. Por fim, conclui-se o estudo no caminho de
que mediante ação positiva do governo, postura firme e severa para coibir dilapidação da base
existente, e quando não versa sobre as oportunidades que o sujeito junto ao Estado consegue
gerir.
possa ser concretizada. Talvez caiba afirmações como sendo esta teoria uma utopia jurídica,
perfeitos, assim sendo toda teoria tem seu valor real se apresentado dentro das diretrizes
jurídicas vigentes.
Por fim, pode-se dizer que o estudo preza por uma ação efetiva do estado
atuando de maneira sóbria para materializar os direitos do cidadão, e nesse aspecto insere-se a
I. DA DESPATRIMONIALIZAÇÃO OU REPERSONALIZAÇÃO DO
DIREITO CIVIL
século XIX até sua evolução para qual conhecemos hoje, será crucial indicar como passamos
de um código protecionista materialmente falando até a efetiva proteção da figura central para
ano de 2002, foi tardiamente posto em prática pelos legisladores, o que explica,
foi chamado por epítetos tão grandes quanto o seu próprio criador: “Código Imortal”, “resumo
da moral universal”, “arca santa digna de um respeito religioso e destinada a guardar o direito
para o futuro”. Para Washington de Barros Monteiro (2003, p. 48), era uma “carta
imprescritível dos direitos civis, servindo de regra à França e de modelo ao mundo”, e cujos
reflexos atingiram o Brasil, que na época pecava por falta de normas que regulassem as
1
O Código Napoleônico, originalmente chamado de Code Civil des Français (Código Civil dos Franceses), foi
outorgado por Napoleão I e entrou em vigor em 21 de março de 1804. Porém, não foi o primeiro de sua espécie.
Antecederam-no o Código da Baviera, Prússia, entre outros. Contudo, foi o que teve maior efetividade na época.
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seu artigo 174, inciso XVIII, um código regulador do direito civil e criminal. Eis o artigo:
Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos Brazileiros,
que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida
pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte.
XVIII. Organizar–se-ha quanto antes um Codigo Civil, e Criminal, fundado nas
solidas bases da Justiça, e Equidade.
para disciplinar as relações jurídicas. Para melhor ilustrar o alegado certifica-se num esboço
cronológico das tentativas: em um primeiro momento houve o estudo sobre a Codificação das
Leis Civis (Carvalho Moreira, 1845), que tratava-se de um estudo sobre a revisão geral e
codificação das leis civis e de processo. Após, vieram as obras de Augusto Teixeira de
Freitas, denominadas Consolidação das Leis Civis (1855) e Esboço das Leis Civis (1865).
dos Santos, 1881), Projeto de Código Civil (Coelho Rodrigues, 1890), e O Projeto de Clóvis
Beviláqua (1899), com consequente embate travado dentro do Congresso Nacional entre
Ernesto Carneiro Ribeiro e o então Senador Ruy Barbosa que só fez acentuar ainda mais a
demora na tramitação do projeto final, que seria posto em vigor apenas em 1917, ficando
conhecido como o Código de Beviláqua. Tanto assim, que o Código Civil somente foi
aprovado em 1o de janeiro de 1916 pela Lei nº 3.071/1916, entrando em vigor somente no ano
seguinte, quase um século depois do seu passo inicial. Assim, não surpreende o fato de já ser
República atravancou o processo. Nesse novo governo ocorreram trabalhos individuais que
também não vingaram. Um dos principais, se não o principal, foi o projeto de Coelho
Rodrigues, anteriormente citado, que apesar de seu notável saber jurídico e reconhecimento
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de todos foi rejeitado pelos legisladores. Daí se propôs a Clóvis Beviláqua aproveitar o
projeto de seu antecessor e redigir um código apto aos quereres das pessoas da lei. Mesmo
apoiado pelo Presidente e Ministro da Justiça, o projeto Clóvis foi recebido por duros
inimigos que conseguiram segurar a proposta por anos até ser finalmente transformado em Lei
em 1916. Essa demora, desde o depósito do projeto até sua conversão em Lei, resultou ainda
em 1.736 emendas, em sua maioria na própria redação. Veja portanto, que desde a proposta de
Carvalho Moreira em 1845 até terminar a “batalha” em 1916 houve uma trajetória de desgaste
e disputa por um código que satisfizesse a vontade dos comandantes do país, e mesmo com
1916, houve uma falsa sensação de satisfação, haja vista que, em primeiro lugar, saciado
estava em parte o inciso XVIII do artigo 179 da Constituição Imperial de 1824 (já substituída
pela república): enfim havia uma norma reguladora para os atos civis. Isto é fato! Porém, em
um segundo instante, deparava-se com a falta de correspondência entre a lei e a ordem social
Mesmo com tamanho atraso, o Código de 1916, para sua época, foi tido
como excelência por consagrados juristas. Washington de Barros Monteiro cita Vittorio
Scialoja, Pierre Arminjon, Boris Baron Nolde, Martin Wolff e Aníbal Delmas (este último
Ministro da Justiça do Paraguai), como alguns que celebraram a obra prima que foi o Código
de 16, tendo a clareza, a precisão e a técnica jurídica como pontos ressaltados por aqueles
nomes. Claro que havia falhas, pois em meio a tantas turbulências, intervenções, e protestos
certos pontos do direito civil deixa a desejar. Valendo ainda da opinião de Monteiro, como a
hipoteca judicial.
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qual era um conjunto de normas que favoreciam os interesses dos poderosos da oligarquia
leite com a influência dos currais eleitorais onde se criou uma manipulação para se chegar ao
Silvio Rodrigues (2000, p. 12) diz que o Código anterior peca em “representar a
economia da sociedade.
super valorizando a essência do ter ao invés do ser, o Código anterior mantinha uma postura
arrecadador e usuário de todo o patrimônio protegido pelas normas que ele mesmo criara. De
básicos como dignidade humana, justiça distributiva e acesso aos meios para que o indivíduo
pudesse ter uma vida honrada e manter sua prole com um mínimo de condições de
Leonardo Barreto Moreira Alves (Revista Brasileira de direito de família, ano 8, número 46)
explica a idéia posta por Gustavo Tepedino, um dos mais respeitados estudiosos da área civil
na atualidade, em seu livro Temas do Direito Civil, onde sustenta que quatro eram os
16
persongens tutelados pelo Código Beviláqua: o marido que detinha todo o poder familiar,
tanto dos bens quanto da ordem dos entes familiares (pátrio poder); o proprietário que tinha
absoluto direito e de forma ilimitada sobre seus bens e da família, ao passo de ser considerado
pelo que possuía sobrepondo portanto os bens às pessoas; o contratante, vigorando o princípio
do pacta sunt servanda, a rigor de forma absoluta; e o testador2. Atente para que os quatro
personas que o o Código Civil de 1916 protegia tinham ligação direta com o patrimônio, ou
com a forma de arrecadá-lo (casamento). A proteção dada pelo código anterior nada
resguardava a condição da pessoa simples, aquele que não era possuidor de bens ou nome,
desprovido de propriedade e patrimônio não era atingido pela tutela legal, se materializava no
cidadão que apenas tinham em si o termo ser faltando-lhes o que a lei tutelava, o ter. A lei
estava lá para “todos” desde que “todos” tivessem algum patrimônio, o que gerava uma certa
insegurança jurídica.
Beviláqua era normatizar aquelas relações jurídicas que mais se sobressaía no século passado:
as relações diretamente ligadas aos bens. E de forma magistral o Professor Gustavo Tepedino
O Código Civil, bem se sabe, é fruto das doutrinas individualista e voluntarista que,
consagradas pelo Código de Napoleão e incorporadas pelas codificações do século
XIX, inspiraram o legislador brasileiro quando, na virada do século, redigiu o nosso
Código Civil de 1916. Àquela altura, o valor fundamental era o indivíduo. O direito
privado tratava de regular, do ponto de vista formal, a atuação dos sujeitos de
direito, notadamente o contratante e o proprietário, os quais, por sua vez, a nada
aspiravam senão ao aniquilamento de todos os privilégios feudais: poder contratar,
fazer circular as riquezas, adquirir bens como expansão da própria inteligência e
personalidade, sem restrições ou entraves legais. Eis aí a filosofia do século XIX,
que marcou a elaboração do tecido normativo consubstanciado no Código Civil.
2
Para Miguel Reale (1999, p. 7), são cinco os principais personagens do direito privado tradicional: o
proprietário, o contratante, o marido (pai de família), o testador e o empresário .
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monopolizador das relações privadas”, sendo conhecido, por isso mesmo, como a
Constituição do Direito Privado.
Codex permanecia o mesmo. Um simples exemplo eram os artigos 230 e 232, que dispunham
Art. 230 - O regime dos bens entre cônjuges começa a vigorar desde a data do
casamento, e é irrevogável.
Art. 232 - Quando o casamento for anulado por culpa de um dos cônjuges, este
incorrerá:
I - na perda de todas as vantagens havidas do cônjuge inocente;
II - na obrigação de cumprir as promessas, que lhe fez, no contrato antenupcial (arts.
256 e 312);
Só por estes dois artigos vislumbramos uma clara satisfação do ter em face
ao ser. Ao invés das leis protegerem o homem, houve uma inversão de valores que integrou o
que o legislador tinha em preservar o patrimônio, isso porque, dos 290 artigos que regulavam
os direitos de família 151 eram destinados ao direito patrimonial. Podemos citar por exemplo
os artigos referentes ao direito assistencial da tutela, curatela e da ausência onde que instituía-
se um ser legal destinado exclusivamente a administrar os bens. Veja que até os filhos se
bastardos fossem não obteriam nenhum respaldo legal, pois na visão do legislador a família
era uma forma de montar a sociedade apenas, outrossim era o interesse , nada mais do que
contratual, que visava guardar os direitos dos bens em eventual situação de desconforto.
Antes dos cônjuges se conhecerem, havia contato entre as famílias que mantinham relações de
interesse (praticamente negocial) para que pudessem continuar com a classe social ou voltar a
ela (casamento como ascensão social). É um simples fato corriqueiro para época. Atente para
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o fato de que em nenhum momento foi falado do interesse das partes em contrair matrimônio,
diferente dos dias atuais. É de extrema e indispensável importância a vontade dos nubentes
propriedade, negócios, dotes, sobrenome, herança e etc, pois o “bom partido” era escolhido
por vontade dos pais visando assegurar o modo de vida que levavam.
mesma esteira vinha a responsabilidade de prover os meios de subsistência para ela, no qual
se responsabilizava o chefe familiar. O Código trazia como chefe do lar a figura do pai.
Então temos uma jurídica arcaica, veja: meio de constituir família era pelo
consanguíneos, ou ser único, pois havia um chefe familiar representado sempre pelo homem,
havia distinção legal entre filhos legítimos, ilegítimos, relações pactuadas por contratos de
dote à formação da família, distinguia-se direitos entre homem e mulher, e tudo isso engloba o
direito patrimonial, pois a distinção dada aos seres se valia para os bens da entidade. Ou seja,
dado o exposto, a construção do Código Civil passado, além de paternalista, fazia direitos ao
homem e não à figura femina, distinguia heranças entre filhos, mantinha relações familiares
A dignidade dos entes familiares pouco importava, vez que o pai estava em
pleno cumprimento do seu dever de manter a prole, e de se sair bem sucedido em relação da
Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e lembremos de que no início até um pouco mais
E ainda temos que ressaltar o papel assumido pela mulher dentro daquele
direito, mais especificamente o papel que o direito de família reservou a ela. Protesta-se pela
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falta de proteção de um Código ultrapassado, se tornando quase que ausente. Paulo Luiz Netto
Lôbo (2003, p. 204) coloca com perfeição que “as liberdades e igualdades formais a ela não
Código anterior passaram a não mais favorecerem os direitos alcaçados pelas relações
impregna nosso atual Código Civil já não poder ser aceita em uma época de importantes
mudanças sociais”. Vemos assim, uma mudança do Código atual para se adaptar a sociedade
que gritava por uma legislação mais próspera, própria e adaptável ao momento vivido.
segundo plano e concedeu ao bem seu verdadeiro porquê de existir, a sua aquisição, a
propriedade, as normas concernentes ao regime de bens, a lei do divócio e assim por diante.
Tudo agora, passando a girar em torno do ser a se utilizar do ter, distanciando daquela visão
Estado brasileiro, percebendo o déficit da Legislação Civil (vale a pena abrir este espaço para
frizar que o Código Civil de 1916 era de uma abrangência total e completo para sua época, e
realizada sua finalização pelo imenso Clóvis Beviláqua fez daquele Código uma obra prima,
como anuncia M. H. Diniz (2007, p. 49): “o Código Civil de 1916 era obra monumental”
estabeleceu como responsáveis para dar os moldes finais à reforma do Código Civil alguns
reconhecidos mestres do direito brasileiro: Miguel Reale, José Carlos Moreira Alves,
20
Agostinho Alvim, Sílvio Marcondes, Ebert V. Chamoun, Clóvis Couto e Silva e Torquato
Castro, onde foi apresentado o anteprojeto ao Diário do Congresso em 1984. Aprovado pelo
Senado em 2001 e publicado em 2002, no qual revogou o Código Civil de 1916 e a primeira
Este por sua vez, passa a ter um aspecto mais paritário e um sentido social
mais aguçado, e ainda, como ensina Maria Helena Diniz (2007, p. 38) em sua obra Teoria
Geral do Direito Civil, procura exprimir as necessidades vitais vivenciadas nessa era
contemporânea, tendo como base a justiça social, o respeito à dignidade da pessoa humana e o
dando ênfase à função social da propriedade e do contrato (...) e ao mesmo tempo contém o
Gonçalves (2009, p. 24-25) ensina que o Código vigente opera sob três princípios básicos
sobrevalência de valores coletivos sobre os individuais. Nada mais justo quando se vive em
uma sociedade democrática de direito, fazendo a ressalva para que não haja prejuízo do valor
inaugurada, a privilegiar áreas que beneficiam toda a coletividade, como: saúde, educação,
pessoa humana e a concretizar os novos princípios que orientam o Direito Civil, além de um
dos máximos princípios constitucional: a dignidade da pessoa humana. O novo diploma entra
que a pessoa humana tem como fonte para os demais valores experimentados por um sistema
21
de direito. Visa a satisfação das causas éticas como a equidade entre as relações, a boa-fé, a
justa causa, entre outros. Por este princípio o juiz condiciona seu julgamento de forma mais
clara e justa.
Gonçalves (2009, p. 25) “leva em consideração que o direito é feito para ser efetivado, para
de não legislar em abastrato e sim para o indivíduo que se submeterá à norma, por exemplo:
prevalecedor dos nobres, posteriormente burgueses detentores de posses, fica claro que o ser
comum, um indivíduo da massa ficaria marginalizado pela Legislação Civilista, que a rigor é
a grande maioria. Maioria esta explorada pelas relações jurídicas dos ditadores e formadores
das leis.
socializada, até por força de institutos tutelados, agora, de forma positiva nos campos do
ambiental, demonstra a evolução nas dimensões materiais do direito civil. Paulo Luiz Netto
Lôbo ensina que essas valorizações passaram a dominar o cenário constitucional do século
XX, pressionando a sociedade por formas de acessar os bens e serviços produzidos pela
básicas que exige um vida com dignidade, com proteção a valores que beneficiam a toda
Estado social, já que tem na sua base seu principal alicerce: o povo.
22
Código de Beviláqua não mais sustentavam as necessidades de uma sociedade mais igualitária
e justa, iniciando-se uma mudança em todo ordenamento civil brasileiro com o código reale.
continuidade”, aqui o autor faz referência, além do atraso das norma infraconstitucional, a
A repersonalização do direito civil veio por meio de uma ótica atual de não
integrar o patrimônio com a mesma personalidade que se dá ao ser humano. Deve-se sim, e
por tanto é essa a função da propriedade, considerá-la como coisa integrante, formadora,
complementadora do indivíduo, este por sua vez digno de ser dotado de personalidade. Atente
que antes se tinha personalidade para o ser e para o ter, mas numa inspiração racionalista
como se pode atribuir personalidade a um ente que por si só não a possui? Uma das
1916 é uma visão burguesa valorando os seres humanos de acordo com sua condição social,
voltado a preservação dos bens ao invés de tê-los numa tendência humanistíca, colocando as
coisas no seu lugar e protegendo as pessoas para que essas sim usufruam das coisas. No
decorrer do século as mudanças sociais e até a evolução das Constituições brasileiras trouxe a
para o código civil de 2002 a elevação do ser e a retirada da personalidade do ter. Os objetos
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tutelados pelo Código constituem, entre outros fatores, a formação da dignidade da pessoa
equiparando, talvez, com certa soberba, a propriedade aos direitos fundamentais como vida e
liberdade.
Com alguma segurança pode-se alegar que nos tempos onde a humanização
do direito é mundial, a patrimonialização das relações civis se faz incompatível com o artigo
1º, inciso III da Constituição; nele temos a dignidade da pessoa humana sempre no cerce do
direito, e colocando seu acessório (o bem) com papel secundário, servindo seu propósito de
auxiliar a vida humana e não com meta ou guia para uma vida reconhecida nas relações de
direito.
demonstrando sua priorização do mundo material até transcender ao patamar de Código Civil
social (entendendo a palavra social como a mudança da visão egoística que possuía para uma
maior acessibilidade à todos, com a tutela direcionada mais às pessoas e ao dever igualitário),
atentaremos agora para o tão repetido termo pessoa humana e patrimônio, o que são e o
HUMANA
capacidade e personalidade. Qual a definição pertinente ao estudo, que referência faz a teoria
do patrimônio mínimo sobre este tema, qual pessoa que se insere nessa teoria. E ainda
suas agregações, o que é considerado, por esse estudo, como tal. Qual é a proporção do
bens. E, por fim, será exposto a idéia do princípio estruturante da dignidade da pessoa
num compêndio do capítulo, a integração em uma única dinâmica de todos os tópicos sob a
2.1. Da Pessoa
Seria plausível a explicação do termo pessoa empregado desde sua origem, atravessando o
sentido amplo até o desejado especificamente. Pois veja que da sua concepção até o sentido
empregado hoje em dia, seja ele genérico ou específico, há uma grande mutação,
principalmente se empregado no mundo jurídico. E ainda mais, a que tipo de pessoa se aplica
25
capazes, incapazes, maiores e menores de idade? Esta teoria vale tanto para pessoas físicas
quanto jurídicas?
utilizavam de maneira especial para que suas vozes produzissem eco (o doutrinador
ressoar). Ao longo do tempo o indivíduo incorporou essa expressão tornando-se este vocábulo
Entendemos pessoa como ser humano, porém não existe somente este meio
sentido vulgar que foi empregada apenas ao ente humano, tido como tal conhecemos: homem
e mulher, mas como dita a história esse termo não podia ser empregado para escravos e
estrangeiros em auroras passadas, já que escravos eram tidos como bens ou coisas, e
estrageiros não possuiam direitos ou se preferir, personalidade fora de seu país, sendo ele
portanto, apenas um ser existente num território arredio. Num conceito filosófico trazido por
W. de Barros Monteiro (2003, p. 62) “pessoa é o ente que realiza seu fim moral e emprega sua
Só que só isso não basta para o mundo jurídico que aceita pessoa como
sendo também as empresas, associações, entidades por exemplo. No espaço das normas trata-
se o termo pessoa como sendo o titular de direitos, um sujeito de direito, seja ele transpassado
por um ser físico ou jurídico, incorporado de personalidade que detém direitos, obrigações,
deveres e exceções. Pontes de Miranda (1999, p. 209) traz pessoa física ou natural como
simples ser humano e por exclusão define pessoa jurídica, sendo esta aquela “que não
corresponde tão-só ser humano diz-se pessoa jurídica”. Na mesma linha de pensar, pessoa
26
jurídica é tida como pessoa pois há nesse sujeito de direito a personalidade; aquele que não é
ser humano é pessoa jurídica, “portanto ser pessoa, ter personalidade” como ensina Pontes de
Miranda (1999, p. 210). Assim, em conclusão, pessoa é um sujeito de direito capaz de atuar,
existir, acessar aquilo que o mundo real lhe oferece e o mundo jurídico lhe permite. Fazendo
um paralelo a etimologia do termo persona, emprega Pontes de Miranda (1999, p. 215) que
pessoa é “quem põe a máscara para entrar no teatro do mundo jurídico está apto a
considerações sobre pessoa. No artigo 1º já faz uma importante anotação de que toda pessoa
(e aqui se trata de pessoa física) é capaz de diretios e deveres na ordem civil reportando-se ao
(1999, p. 155-156):
Art. 2º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei
põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.
tratar com as duas pessoas que se refere o ordenamento jurídico. É de clara e fácil
compreensão do emprego da pessoa física nesta teoria, afinal, a teoria do patrimônio mínimo
se faz de forma mais reluzente em direito de família, por exemplo, na transmissão da herança
ou na vedação da doação total dos bens sem reserva para subsistência. Porém, nada obstante,
podemos indagar o emprego deste teoria às pessoas jurídicas quando se tratar, a título de
27
exemplo, sobre expropriação de bens quando o bem (aqui materializado como empresa
familiar, por exemplo) for o único meio de subsistir. De acordo com César Fiuza (2003, p.
143), são protegidas pelo direito de pesonalidade as pessoas jurídicas que, “na medida que é
meio para atingir fins almejados pelas pessoas naturais. Por detrás delas estarão as pessoas
naturais, estas sim, objeto da clásula geral de tutela da pesonalidade”. Porém alguns autores
naquilo que lhe couber como o nome, símbolos, marca, direito à honra. Um deles é Francisco
Ambas situações serão inseridas num contexto mais claro num momento
mais adequado. Para o instante, importante se faz a valorização da pessoa jurídica como
2.2. Do Patrimônio
afinal a tese defende que devemos ter um patrimônio presente, existencial e que deve ser
protegido para se manter uma condição decente de moralidade, qualidade de vida, projeção de
vida e, acima de tudo, propciar ao ser a tão valorosa e prezada dignidade da pessoa humana.
patrimônio. Tudo se torna um bem na visão tirânica do capitalismo impiedoso que tantos
matéria, aquisição de bens, propriedades, valores, etc., para que possamos desenvolver a vida
planejada e passar aos descendentes as conquistas de nossas vidas, pois é o que idealizamos
para que eles vivam da melhor forma possível. É o ideal. É certo também, que uma
28
quantidade satisfatória dele torna a vida mais confortável e tranquila, nos asseguramos
naquilo que temos. Mas afinal, a que tipo de bem jurídico se destina a terminologia
patrimônio tão empregada no estudo em tela? O professor paranaense Luiz Edson Fachin
(2006, p. 31) inicia o tema explicando que “a configuração do patrimônio, por isso mesmo,
não se funda, necessariamente, sobre um bem imóvel. Pode, sem dúvida, abarcar elementos
Em seara de doação, a renda já teve tal consideração: “Os autores visam a nulidade
de uma doação feita aos filhos, ao fundamento de que lhes não restou renda
suficiente para sua subsistência. É o que ensina Carvalho Santos: a totalidade dos
bens do doador quer dizer todos os bens, rendimentos e proventos, o que excluir,
naturalmente a nulidade da doação sempre que o doador tenha recursos para
subsistir, provenientes de emprego vitalício, se com este emprego estiver assugurada
a sua subsistência. (2006, p. 31).
Desta forma já se tem a noção de que bem se torna tudo aquilo que o ser
quer, as vezes não necessariamente precisa, mas que satisfaz os mais fúteis desejos, ou ainda,
primitivo referência aos bens de família o qual era cercado de cuidado pelo homem, o ser
masculino materializado pela figura do pai a cuidar da sobrevivência de sua prole. No entanto
o termo tinha caráter de res. Hoje em dia englobamos res ao patrimonium sugerindo, como
anteriormente dito, tudo aquilo que satisfaz o homem de valor capaz de ser transformado em
dinheiro.
Para o direito, o bem é uma utilidade, porém com extensão maior do que a utilidade
econômica, porque a economia gira dentro de um circulo determinado por estes três
pontos: o trabalho, a terra e o valor; ao passo que o direito tem por objecto interesses
29
que se realisam dentro desse circulo, e interesses outros, tanto do individuo quanto
da familia e da sociedade.
Silvio Rodrigues (2003, p. 116) inclui ao conceito de bem que além de ser
útil, deve conter a qualidade de rara para oferecer a ameaça de apropriação por parte do
noção de patrimônio através da palavra “bem” como foi passada, sugerindo que patrimônio é
direito de um sujeito. Anteriormente tal termo significava bens de família, nada mais sendo do
patrimônio é formado por todos aqueles bens capazes de serem revertidos em dinheiro,
possuidores de valor econômico, citando seu antecessor Beviláqua “o complexo das relações
negativa. A primeira é de fácil tradução: os bens possuídos superam a dívida (caso haja) do
sujeito; A segunda forma é o patrimônio negativo, quando nos deparamos com a insolvência.
Faz-se necessário, por simples peso que seu nome possui, falar sobre a
concepção de patrimônio trazida por Pontes de Miranda, que entende patrimônio como o
direito sobre os bens e não os bens propriamente dito. Considera Miranda, os direitos reais, os
Aloja-se a condição de patrimônio figuras imateriais, como lucida do Código Civil atual em
respeito de como temos que analisar a correlação de pessoa e patrimônio, vez que aquela é
simples pessoa natural ou jurídica que se alimenta, se apóia e precisa do objeto material pelo
simples fato de que sem patrimônio, por mais cruel que seja a observação, se torna um ser
não possuem bens para se sustentar em tempos tão agressivos olhando de uma perspectiva
material. Mas, mesmo tendo o ser a necessidade do ter, isso não os une de forma simbiótica.
alguns certos direitos inerentes ao ser humano desde o seu nascimento que são invioláveis,
equipara ao direito à vida e à liberdade, fatores que, se adentrar com esses dois últimos títulos
num debate filosófico estaríamos num patamar tão alto de complexidade que sua definição
ficaria a cargo do tempo histórico que pode-se utilizar para cituar a explicação: os dois outros
direitos naturais, quais sejam, vida e liberdade, são de tamanha imponência que é com base
neles que legislamos e, separando-os, os bens jurídicos tutelados perdem o prumo. A vida e a
liberdade é tratada com uma fineza, que para alguns indíviduos a vida sem liberdade não
serve, seria uma escravidão; ou ainda, ter sua liberdade mas sem uma vida digna, sem ter
como aproveitar as condições essenciais pelo qual o Estado se garante em oferecer, seria estar
encontra-se ligando seu pensamento a propriedade como sendo tão importante quanto a vida
3
Art. 91. Constitui universalidade de direito o complexo de relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor
econômico.
31
esse posicionamento vem a afirmação do jurista Norberto Bobbio (1992, p. 1.034) que “o
numa forma de se complementar, visualizando o todo num ideal único antes das ganâncias
individuais, algo que é antes de qualquer ato definido pelo coletivo, com um sentido social.
Pessoa, ser central, ator principal, centro do universo jurídico, das ordens
normativas reguladoras de condutas que utilizam do patrimônio: tudo aquilo que o ser reúne e
que possui valor econômico, podendo ser direito, obrigações, ou a res propriamente dita deve
Deixemos para trás aquela visão guiada por antolhos de patrimônio ser meio
de arrecadação de riqueza, ele se complementa na fase humanística que vivemos, onde que o
homem é o centro do universo e nesse pensar, parafrasiando Galileu Galilei “é o sol que
circunda o homem, e não o homem que circunda o sol”4. O patrimônio na sua abrangência
total é meio de vida da pessoa humana, meio de se chegar a uma vida digna de uma sociedade
que preza pelos seus componentes, atuante numa política e justiça social. Não se deve
peticionar ao Estado uma atuação solidária de auxiliar seus cidadãos, pois isso já se faz dentro
humana em seu artigo 1º como sendo um dos fundamentos da federação brasileira, e não só
em caráter de direito fundamental, pois, posto no primerio artigo terá a missão de tornar
4
Trata-se, pois do fenômeno da constitucionalização do Direito Civil. Ele volta para a pessoa humana e seus
objetos ficam marginalizados na forma de atuarem na complementação da vida das pessoas. São os bens que
devem ser utilizados para propiciar uma melhor qualidade de vida, e não voltar boa parte do direito (como fez o
Código Beviláqua) para proteger os bens e em “outros” resguardar os direitos do homem
32
demais princípios, aparentando que para ser fundamental deve conter um resquício embasador
que a lei deve preservar a dignidade da pessoa humana. Como analisa Celso Bastos (1999, p.
425) tal princípio “parece conglobar em si todos aqueles direitos fundamentais, quer sejam os
princípio é o parâmetro para a criação de normas, devendo atentar a reação que a criação das
leis terão perante a sociedade, visar o bem estar daqueles indivíduos formadores de todo esse
pessoa humana está para a normatização geral assim como o devido processo legal (art. 5º,
LIV da CF/88) se encontra como máxima dos princípios do direito processual, afinal todo
processo judicial deve respeitar os ditames previstos em lei para que o princípio não seja
violado e ele passe a ser válido. O princípio da dignidade da pessoa humana é o carro chefe
Em seu artigo Leonardo Barrate Moreira Alves (2008, p. 42) traz sua
Lammêgo Bulos (2007, p. 83) acerca do inciso III do art. 1º da Carta Maior. Espalha com
consigo todos os demais direitos e garantias fundamentais do ser humano. De passagem, são
os direitos e garantias fundamentais mais visados por ele o direito à vida, os direitos pessoais
de constituir família, entre outros. O autor (2007, p. 83), ao constar nos seus ensinamentos
próprio Estado se serve para legislar, jurisdicionar, implementar seus atos sócio-econômicos,
pacotes de desenvolvimento social, etc. Em outro ensinamento, Celso Ribeiro Bastos (2005,
p. 425) afirma que um dos fins do Estado é tornar palpável, acessível aos meios para que as
pessoas se tornem dignas da sua existência. Porém, surge outro questionamento, qual seja, o
que seriam formas dignas de se viver? Onde se encaixa a dignidade da pessoa humama, seja
no respeito do ser em si, nos bens adquiridos com seu suor, na qualidade e oportunidade que a
racíocinio puro, deixando de lado, por enquanto, as idéias mais elaboradas. Se explica pela
simplicidade dessa definição pois, o critério da generalidade, ou melhor dizendo, aquela idéia
34
que um ser humano médio tem em relação a todos os seres (humanos) sobre o que é preciso
para que haja dignidade na forma de vida. Chegaremos a uma definição de qualidade de
com o fim em si mesmo e não sendo objeto para realização das ações; se torna o foco de todas
as atitudes tomadas, seja pelo Estado no seu exercício singular próprio, seja pela sociedade
que alcança uma interferência em todos os seres que nela convivem ou, simplesmente, ter
condições de comprar pão numa panificadora. A dignidade deve ser vista sempre como um
fim das relações. Há autores, como Jorge Miranda, citado por Tavares (2009, p. 557) que
observam que este princípio pressupõe a autonomia vital do indivíduo, sua imposição como
ser propulsor da máquina estatal que possibilita a garantia de escolhas de seus atos sendo
respeitado e auxiliado como parte de um imenso organismo pulsante, além, é claro, de tornar
certo esta mesma condição perante as outras pessoas. É um individualismo racional que
ao declarar que “a dignidade da pessoa humana considera o homem como “ser em si mesmo”
e não como “instrumento para alguma coisa”, fica este princípio soberano quase na condição
ideal, mas ao analisar de perto ele é representado na vontade social, nos atos de
responsabilidade que o Estado tem perante nós, no conceito de vida humana que cada ser
pensante insere no mundo e toda a longínqua perspectiva que temos de vida ideal, utópica que
buscamos incessantemente. Sócrates ao nos definir como seres racionais responsáveis pelos
nossos atos, trouxe o ser humano como pensador em plena capacidade de decidir seus atos,
direcionar sua vontade, e representar seu ser. Condicionou o indivíduo a ambasar sua idéia de
guarda a dimensão de garantir a não maculação (em todos os sentidos) do ser, como também a
presente em um infinito número de comandos normativos. Temos como exemplo seu texto na
Considerando que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na Carta, sua fé nos
direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor da pessoa humana, e na
igualdade de direitos do homem e da mulher, e que decidiram promover o progresso
social e melhores condições de vida em uma liberdade mais ampla [...]. (grifo meu)
Humanidade, de autoria da ONU enunciado em novembro de 1975, que traz além da melhoria
da vida de todos a utilização das descobertas científicas para realçar o princípio da dignidade:
Reflete na Constituição alemã onde que Jorge Miranda (1998, p. 50) faz
Federal de 1988, que a intervenção gerada por ele deve te um conho social, de valorização ao
Estado paternalista que sempre policiou a ordem sócio-econômica deve gerar meios a todos
homens e mulheres, sem distinção de raça, credo ou cultura. Seus filhos detêm direitos iguais
aqueles cobertos por este manto. Além desses exemplos existem vários outros que poderiam
ser transcritos para este estudo, porém considerando que esse tema complementa um maior,
vale apenas citar este, a título exemplificativo, como a Constituição Portuguesa, a Contituição
familiares propiciando um modo de vida decente e que condiz com os valores trazidos na
Constituição, inclusive aquele disposto no inciso III do artigo 1º, a diginidade da pessoa
humana.
Trabalhamos aqui com os dois tipos de pessoa trazido pelo Código Civil
(física e jurídica), pois vimos que mesmo as pessoas jurídicas possuem personalidade pelo
fato de haver pessoas físicas por detrás delas que são respaldadas por direitos e garantias que
Além disso, foi posto a disposição que patrimônio se traduz em tudo aquilo
adquirido pelo homem capaz de satifazer suas necessidades, sendos elas essenciais ou
37
bens usado como, além de satisfazer vontades, respaldar garantia de crédito, não interessando
reflete em todo o ordenamento jurídico. Se traduz, simplesmente, num mundo melhor, com
mais alcances e oportunidades, com proteção de fato e não tão somente disposto em lei, é a
plenamente em condições de se sustentar e manter sua família com relação a moradia, saúde
educação, alimentação, lazer e tudo aquilo que dá ao ser uma condição melhor de vida.
protecionista dos valores econômicos, caminhando para a função real que o direito tem: a
personificação das normas. Temos aí a razão, de um código civil tão diferenciado do que era
uma sociedade harmônica, sintonizada nos direitos e garantias do homem como um todo, com
as funções sociais das instituições jurídicas – no caso em tela o patrimônio, seja ele qual for.
proposta por Fachin. Temos o ser, o ter e a base legal no qual se vale este princípio. A teoria
pessoa. Para melhor visualizar-mos vamos seguir com a teoria propriamente dita.
39
anexar o quanto de acesso disponível temos, haja vista que para concretizar a teoria proposta
o Estado pater deve ser inserido nessa perpectiva viabilizando meios sócio-jurídicos de
jurídicos materias e, ao se falar material desconsidere a pessoa. Ora, a tutela das relações
privadas anteriores ao Código de 2002 era de forma a assegurar o patrimônio6 sendo este o
Civil atual, com respaldo constitucional, faz o ser humano como a condição essencial do
ordenamento jurídico e traz o bem como fruto de utilização da pessoa para que exista uma
possuí-lo para desenvolver uma vida próspera e digna. A teoria do patrimônio mínimo vem a
preservar uma condição inviolável, inalienável de patrimônio do qual a pessoa não pode ser
5
Entre tantas linhas, entendemos que FACHIN sintetizou a harmonia conectiva pessoa-patrimônio-dignidade,
refazendo a proposição da repersonificação do direito civil/constitucional “(...) resguardada a dignidade em razão
da qual os indivíduos merecem proteção (...)”, afirmando que a proteção dessa individualização humana, tendo a
idéia de individualização necessária para se manter a pessoa dentro de um Estado democrático de direito, com
oportunidades, amparo social, etc., reforça ainda mais a formação de uma coletividade próspera sem lacunas
sociais.
6
Reforçando o conceito de patrimônio, pois agora trataremos de forma convergente à teoria, é o conjunto das
relações jurídicas avaliáveis em dinheiro, pecúnia na sua totalidade, pertencente a um sujeito de direito. É,
portanto, todo o complexo arrecadado pelo ser que lhe traz direitos e obrigações apreciáveis na forma
econômica.
40
desempossada. Fatos antes desprovidos de base legal, foi reavaliada no novo código civil que
além de seguir o princípio da dignidade da pessoa humana visa assegurar também, dois dos
pois vigora na proposta um ter pré-existente. Este mínimo existencial será defendido perante
os demais. Paulo Bonavides, Jorge Miranda e Walber de Moura Agra (2009, p. 382), trazem o
pensamento de Daniel Sarmento para explicar este direito do mínimo existencial dando sua
origem no Estado alemão por uma decisão do Tribunal Federal Administrativo em 1954,
entre vários outros países pelo Brasil na Constituição de 1988.8 Em suma podemos afirmas
que o mínimo existencial são garantias de uma vida digna, onde que, sua proteção é essencial
constitucionais pode-se dizer que são garantias de um mínimo existencial, haja vista seu papel
do salário mínimo (art. 7º, IV da CF/88). Tudo que incorpora um grande valor moral nos
anseios da sociedade, desde que relacionado com a dignidade da pessoa humana pode ser
7
Princípios inseridos na Constituição alemã. No capítulo anterior há transcrito o artigo destacando seus valores.
8
Daniel Sarmento aponta três princípios basilares para o mínimo existencial, que são: liberdade real, proteção
dos pressupostos da democracia e atendimento às necessidades materiais humanas. Dentro desse tripé explica o
autor que a liberdade se traduz, além da limitação de ação do agente, envolve também “possibilidade do seu
exercício”, no caso a falta de condição é que impede a garantia da liberdade real. Já em relação à democracia,
argumenta que não se trata apenas da vontade da maioria, e sim de um conjunto de ações promovidas pelo
Estado a assegurar as “necessidades materiais básicas das pessoas mais carentes”. Por fim o último critério se
traduz que o atendimento das necessidades básicas dos homens “representa uma exigência autônoma da justiça”.
Assume um papel de extrema importância o princípio da dignidade da pessoa humana, pois ele que norteará o
rumo dessas definições, pois para cada Estado há uma compreensão diferente das necessidades da pessoa
humana.
41
serve como forma de garantia (garantia real) a assegurar relações jurídicas, há na teoria o
estudo de um mínimo existencial intangível que o ser humano não pode dispensar face ao
Privar-se-á, sempre, pela dignidade da pessoa. Assim, um credor que visa expropriar os bens
do devedor poderá fazê-lo até certo ponto, pois chegará uma hora que o patrimônio do
devedor não mais poderá estar à disposição dos credores, correndo o risco dos bens se
podemos afirmar que a teoria do patrimônio mínimo advém de uma intervenção estatal dos
ligados a ele, fazendo dessa intervenção um mal necessário (pelo menos aos credores, por
exemplo) de ação legítima. Por tudo, temos então a lógica apontada por Leonardo B. Moreira
Alves (2008, p. 50) de que a teoria em análise não faz distinção em proteger um ou outro, mas
sim:
Não afasta o caráter patrimonial das relações jurídicas privadas, isto é, não visa
atacar a propriedade privada e o direito creditício, muito pelo contrário, ela apenas
provoca uma redefinição, releitura, adaptação destes institutos às novas brisas do
Direito Civil-Constitucional, determinando que os mesmos não se sobreponham à
dignidade do indivíduo.
cumprimento dos contratos. Via de regra, são firmados quando duas ou mais pessoas plena de
seus direitos firmam vontades que lhe são oportunas. Via de regra também, se faz o princípio
do pacta sunt servanda, onde salvo as hipóteses de reestruturação contratual gera sérios
problemas ao inadimplente.
surge a teoria do professor paranaense defendendo um mínimo exitencial para manter uma
pessoa exerce sobre a coisa, que pode ser oposta contra outro. Nesse conceito então, pode
concluir que a relação do direito real se faz de forma direta com suas coisas, “é o poder
4). Há aqui um poder sobre a coisa por parte de um único indivíduo, independe da co-
Essa consideração sobre direito real se faz necessária haja vista o conflito de
sem que haja a reserva para que o doador possa se subsistir. No Código Civil anterior já havia
9
Maior aprofundamento não se fará necessário, pois os pontos de interesses serão dados com a responsabilidade
necessária.
43
Art. 1.175. É nula a doação de todos os bens, sem reserva de parte, ou renda
suficiente para a subsistência do doador.
art. 548 do Código Civil atual. Preserva-se aqui a manutenção da vida digna do doador, pois,
se assim não fosse, o sujeito ficaria a merce da miséria despindo-se de seus bens de origem
por doação por vontade sua, ficaria vulnerável as mazelas do mundo. No entanto, evita-se a
o sujeito ativo em condições plenas de subsistência. Diz Fachin (2008, p. 94) que a nulidade
visa conter ato pródigo do doador, mostranto a pretenção protetiva à pessoa, fato raro no
código anterior; para o Código atual onde houve a consubstanciação da valorização do ser,
ocorreu a continuidade da primazia da dignidade da pessoa humana. Tanto é que tal processo
torna-se inderrogável por vontade das partes, ou seja, a doação universal dos bens, mesmo que
coação.
ensinamento de Carvalho dos Santos, no que tange à possibilidade de doação universal dos
bens, desde que, com reserva de usufruto. Acertadamente, como cogitou Santos, a hipótese de
Ora doado a totalidade dos bens, resta ao doador usufruir dos mesmo já
repassados, que nada mais é do que o direito de usar e gozar de coisa de propriedade diversa.
Trata-se pois, de direito real, “porque se exerce diretamente sobre a coisa, sem a
(BESSONE, 1996, p. 287). Tal fato aplica-se a questão da doação ao passo do ex-possuidor
44
ter o direito (direito real de usufruto) de aproveitar dos bens agora doados para se subsistir. Na
mesma esteira complementa Darcy Bessone (1996, p. 288) a explicação da função alimentar,
que é com a razão de tirar proveito para manter a subsistência do usufrutuário, que então só se
nulidade da doação deve corresponder ao princípio encravado em regra legal, qual seja, o
doador deve dispor dos meios ou bens necessários à própria subsistência, “caso contrário, não
qual insere a revogação da doação em caso de negativa de prestação de alimentos por ato do
contendo como objeto a herança de pessoa viva (art, 557, IV, art, 4, IV e art. 426 do Código
Civil).
mesmo que o ordenamento quer preservar, mas também de seus familiares. Quem está nessa
condição tem capacidade reduzida da perspectiva real das situações mundanas, colocando em
risco sua condição de manter-se como na iminência de desapojamento de sua família, dos
10
A renúncia, no que confere com a doação universal com reserva do usufruto, não produz efeitos. Se assim
fosse a proteção vislumbrada pelo direito de usar e gozar dos bens doados perderia a razão de ser. Evita-se a
renúncia em face à prodigalidade.
45
doador sem reservas com o pródigo, demonstrando assim sua condição de incapacidade
relativa.
humana. Vale lembrar, no entanto, que o Código atual, apesar de no seu âmago haver ocorrido
seus artigos.
Art. 550. A doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice pode ser anulada pelo outro
cônjuge, ou por seus herdeiros necessários, até dois anos depois de dissolvida a
sociedade conjugal.
bens deixados pelo testador, visto que protege-se o patrimônio mantendo-o na sua função
social.
Vigora aqui que a última vontade do de cujo deve ser cumprida como forma
de proteção do bem deixado por ato de liberalidade (tanto em vida quanto na transmissão
donatário, desta forma o bem se torna inalienável apenas ao donatário e não aos sucessores,
posto que, se o beneficiário original venha a falecer extingue-se a cláusula e o bem, agora
repassado aos sucessores, passa a ter disponibilidade. O fato verifica-se da mesma forma tanto
na doação quanto no testamento e, fora esses atos de liberalidade, somente por interesse do
faz impenhorável. Resta ao receptor do bem usar, gozar, reivindicar, proibindo-se dispor da
como também, tratando-se de pessoa, conceber o donatário como incapaz para aquele ato. De
para Silvio Rodrigues (2002, p. 190), esta é somada àquela, quando o tema é clásula
exceção é a não clausura como disposto no art. 1.848, caput12. Debora Gozzo e Silvio Venosa
(2004, p. 229) fazem a ressalva de que, diferentemente do Código anterior, para que ocorra
cláusula restritiva dos bens, deverá o testador ou doador deixar expressamente testado o
porquê que o faz, não se valendo de mera vontade em “prender” o bem ou não.
geradora da miséria. Essa restrição pode ser concedida na forma temporária ou vitalícia (mas
lembremos que nunca ultrapassando a pessoa do donatário); o que irá definir é a vontade do
testador.
primeiro plano dá-se a noção de prejudicar uma relação creditícia, mas ao contrário do que se
11
http://www.dji.com.br/normas_inferiores/regimento_interno_e_sumula_stf/stf_0049.htm: STF Súmula nº 49 -
13/12/1963 - Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal - Anexo ao Regimento
Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 49. Cláusula de Inalienabilidade-Comunicabilidade dos Bens. A
cláusula de inalienabilidade inclui a incomunicabilidade dos bens.
12
Art. 1.848. Salvo se houver justa causa, declarada no testamento, não pode o testador estabelecer cláusula de
inalienabilidade, impenhorabilidade, e de incomunicabilidade, sobre os bens da legítima.
47
imagina não se viola o direito do credor, pois o bem a ser adquirido é a continuidade do
patrimônio mínimo que as vezes será formado apenas por este adicional herdado. Insere aí a
dignidade da pessoa em que pese a necessidade de meios a quitar suas dívidas, ao menos pode
se respaldar no bem doado para se manter em baixo de um teto, ou utilizando como forma de
arrecadação (aluguel por exemplo), ou alienar os frutos vez que a razão da cláusula, além de
Trazendo Caio Mário (1974, p. 185) no trecho a seguir, fica clara a relação
forma absoluta. No §2º do artigo sub examem, cabe ao herdeiro, quando houver justa causa,
autorizado pelo juiz, alienar os bens, “empurrando” a clausura a outros bens, para que aquele
possa ser liberado da condição a quo e seja alienado afim de resolver condição financeira
precária do herdeiro. Quando a coisa protegida perde sua razão confrontando-se com a
necessidade de, até mesmo, manter a vida digna da pessoa a norma protetiva também se vai,
inalienabilidade.
Eis a norma:
Art. 1.848. Salvo se houver justa causa, declarada no testamento, não pode o
testador estabelecer cláusula de inalienabilidade, impenhorabilidade, e de
incomunicabilidade, sobre os bens da legítima.
§ 2º Mediante autorização judicial e havendo justa causa, podem ser alienados os
bens gravados, convertendo-se o produto em outros bens, que ficarão sub-
rogados nos ônus dos primeiros.(grifo meu)
seguinte forma:
48
Art. 1.911. A cláusula de inalienabilidade, imposta aos bens por ato de liberalidade,
implica impenhorabilidade e incomunicabilidade.
Parágrafo único. No caso de desapropriação de bens clausulados, ou de sua
alienação, por conveniência econômica do donatário ou do herdeiro, mediante
autorização judicial, o produto da venda converter-se-á em outros bens, sobre os
quais incidirão as restrições apostas aos primeiros.
expropriados por necessidade, utilidade pública, interesse social, quando haver execução de
caso de alienar o patrimônio como citado) a outro imóvel resultado da alienação do bem
inalienabilidade seja transmitida aos novos bens, o autor se aduz dos ensinamentos de
Maximiliano onde que para que ocorra a tranferência da clausura dos bens não originários do
supramencionada:
A proteção pode atingir tanto o bem, por haver sido adquirido por labuta
para mantença própria e dos entes familiares, valorando o ser que torna a cláusula eficaz e
válida.
Luiz Edson Fachin salienta que embora destinando algumas páginas de sua
obra Estatuto Jurídico do Patrimônio Mínimo ao tema, ele não se confunde com a proposta.
49
primeiramente como “lar de família” ainda em 1893 na Parte Geral. No atual Código
podemos ler à respeito no Livro IV do Direito de Família nos artigos 1.711 a 1.722 guarando
Rolf Madaleno (2009, 755) repassa que o Código de Processo Civil também
brasileiro: uma delas é chamada institucional, prevista no artigo 1711 do Código Civil, e a
outra é denominada “legal” e está prevista na lei federal 8009/90. No entanto ambas levam a
um resultado comum, qual seja, proteger o bem o tornando impenhorável por dívidas, e isso
porque a criação dele não decorre automaticamente da lei, mas sim da manifestação de
vontade do seu instituidor que pode ser o casal ou a entidade familiar que reserva um ou mais
bens seus e os tornam bens de família mediante uma escritura pública ou um testamento.
Neste instituto o único requisito para proteção é que o bem reservado não ultrapasse um terço
(1/3) do patrimônio líquido do instituidor ao tempo da instituição. Por outro lado, o bem de
família da lei 8009/90, não depende da vontade de quem quer que seja para se constituir, ou
50
seja, sua existência é “ex lege”. Conclui então, que bem de família legal é o imóvel residencial
próprio do casal ou da entidade familiar, bem este que se torna impenhorável por dívidas.
familiar. A palavra “casal” designa pessoas que se unem mediante casamento civil ou
casamento religioso com efeitos civis. Por sua vez, a expressão “entidade familiar” deve ser
interpretada no sentido mais amplo possível para abrigar todos os outros tipos de núcleos
familiares não formados pela relação amorosa de cunho matrimonial, tal qual famílias que se
constituem por vínculos afetivos e de união estável, as mono parentais (um genitor e a prole),
aquelas formadas apenas por irmãos, primos entre si, tios e sobrinhos, tios-avôs e sobrinhos-
Proteção esta prevista na Constituição Federal em seu artigo 6º13. Há no STJ14 uma orientação
firme de que todos eles estão amparados pela impenhorabilidade do bem de família e o
principal argumento para tanto é o de que a moradia é um direito social previsto no artigo 6º
13
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a
previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta
Constituição
14
http://www.dji.com.br/normas_inferiores/regimento_interno_e_sumula_stj/stj__0364.htm: STJ Súmula nº 364
- 15/10/2008 - DJe 03/11/2008 - Conceito de Impenhorabilidade de Bem de Família - Abrangência - Pessoas
Solteiras, Separadas e Viúvas. O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel
pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas.
51
destinação de proteger o prédio considerado domicílio familiar, não podendo ser dado em
garantia real, salvo nas hipóteses de execução por impostos relativos ao prédio ou despesas de
condomínio e, por dívidas anteriores a sua instituição. Alerta também que o bem de família é
inalienável sem que todos os interessados e representantes legais concordem com a alienação.
família, além da estrutura predial residencial ou rural, se salva da penhora seus pertences e
acessórios, e como nessa guarda civil o lapso temporal que se instaura no bem de família é
família (imóvel ou móvel) caso haja desfazimento da entidade familiar. Aquele bem que não
for mais necessário da proteção, mediante autorização judicial, se torna alienável. Confirma-
proteção para certas pessoas jurídicas: às firmas indivíduais, às pequenas empresas de cunho
Para ser válida esta última consideração, é necessário que o imóvel seja do devedor, além de
ser usado como moradia para si e para sua família. Porém, desintegra-se tal proteção quando
temos na mesma propriedade o imóvel de destinação mista que abrange residência, comércio
gerar renda, então, por exemplo, aluga-se o imóvel (bem de família impenhorável) e os
constituintes da família passam a morar em outro lugar de menor valor para usufruir da renda
entidade familir, o que ocorre de fato é se utilizar dele para angariar meios de sustento, da
mesma forma se caracteriza o veículo que o devedor usa para como instrumento laborativo. O
situação a lei define como bem de família o de menor valor, que faz dos demais bens meios
insolvência adquire um imóvel maior e mais valioso daquele que possui. Nesses casos a lei
15
Luiz Edson Fachin (2006, p. 145) traz ainda a condição de terreno com prédio inacabado, protegendo o bem se
este for o único destinado a moradia, quando demonstrado sua boa-fé e anterioridade do início da construção.
53
Porém, não é sempre que a Lei 8.009/90 fará proteção ao bem de família.
sendo válida, portanto, a execução e penhora quando o fato gerador for por dívidas de
limites dos valores previstos no contrato de financiamento. Válidos também contra crédito
legislador fez a sua opção e tornou penhorável o bem de família com a preocupação de
melhoria. Outros tributos, inclusive aqueles devidos em outros imóveis, não abalam a
hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar: se
16
Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária,
trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:
I - em razão dos créditos de trabalhadores da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias;
II - pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no
limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato;
III -- pelo credor de pensão alimentícia;
IV - para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel
familiar;
V - para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar;
VI - por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a
ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.
VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.
54
o imóvel foi dado em hipoteca pelo casal ou pela entidade familiar, o artigo 3º da Lei
8.009/90 estabelece que ele fica sujeito à execução e à penhora, da qual resultará,
contrato de fiança concedida em contrato de locação. Perceba que este inciso refere-se a dois
imóvel residencial do casal ou da entidade familiar que constituiu a fiança naquele contrato
principal.
centro, e agora de fato, de que a nova ordem jurídica civil, com amparo constitucional
mínimo. Veja que, relacionamos seus elementos à realidade atual qual está prevista numa
ordem ainda maior visada: um lugar democrático de direito, de liberdade e justiça social.
que tem por finalidade básica o respeito e a sua dignidade, por meio
humana”
jurisdicionalmente, Celso Ribeiro Bastos assevera que “dá-se o nome de liberdades públicas,
(2000, p. 165).
55
ramos do Direito, a protetividade ao ente humano passa a ser prioridade. E este faz por onde,
que vivemos fica a sombra do outrora fora, pois vislumbramos um povo igual com direitos
iguais, que buscam oportunidades iguais. O patrimônio mínimo está, em tese, presente para
guardar a dignidade que o ser tem desde a sua concepção, um desenvolvimento a altura de
em tratar toda sua composição de forma única, deve ter em mãos um direito material servil, a
todos guarda-se um mínimo estruturante de direito, cultura, lazer e economia, não atentando a
valores patrimoniais, muito pelo contrário, incentivar seu povo a buscar sua personalidade,
dignidade almejada pala pessoa. Seus incisos tratam da valorização do emprego, proteção de
nossa terra, de propriedade e da função social que ela deve ter, alcança a todos quanto ao
inciso V relevante ao direito do consumidor; é um arcabouço reflexivo ao artido 1º, III e art.
5º.
e até a proteção demostrada nos artigos 64817 e 64918 do Código de Processo Civil - execução
de bem de família - são uma base para a coletividade socializada por inteiro. Pois protegendo
suas dívidas. Não se exime o ser contraente de obrigação, busca a priori manter suas
condições básicas e dignas de vivência para poder cumprí-las. Não há vantagem em atingir o
ser, jogando na miséria sem meios de suas obrigações. Trata-se pois, nada mais do que
usufruir da garantia que o constituinte inseriu de maneira indisponível nos direitos sócio-
Segue:
E completa:
17
Art. 648 - Não estão sujeitos à execução os bens que a lei considera impenhoráveis ou inalienáveis.
18
Art. 649 - São absolutamente impenhoráveis:
I - os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução;
II - os móveis, pertences e utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo os de elevado
valor ou que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida;
III - os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor;
IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e
montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família,
os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, observado o disposto no § 3º deste
artigo;
V - os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou
úteis ao exercício de qualquer profissão;
VI - o seguro de vida;
VII - os materiais necessários para obras em andamento, salvo se essas forem penhoradas;
VIII - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família;
IX - os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou
assistência social;
X - até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos, a quantia depositada em caderneta de poupança.
XI - os recursos públicos do fundo partidário recebidos, nos termos da lei, por partido político.
57
pessoa jurídica, como alhures afirmado. A teoria sustenta a inclusão da empresa dentro da
proteção.
Entretanto, para não alongar o tema, pois este não é o foco, posto que
desse estudo, dar-se-á por encerrado este tópico. Além do que, em uma sociedade tão desigual
quanto a que vivemos, seria de uma pretensão tamanha descrever as inúmeras possibilidades
cada caso individual, visto que o caso concreto e as necessidades impostas ao sujeito
proposta de que é o alcance universal, cabível a todos indiferente de sua condição financeira,
sexo, razões sociais e políticas, pois aqui, muito embora sabemos que a realidade de todos
terem um patrimônio mínimo esteja longe, consideramos tal falácia para estudo, posto a
instrumentos de trabalho.
atividade do indíviduo, pouco importa os bens impenhoráveis, seus valores, sua condição,
715), insere nota de um julgado com a interpretação de que a lei não exige que os meios de
trabalho sejam indispensáveis, basta que sejam úteis. Interessa saber que o respaldo dado cabe
apenas às pessoas que vivem do próprio esforço, não alcança portanto, firmas por exemplo.
Implica-se às pessoas físicas então, pois certo é que a ampliação da proposta poderia afetar na
mínimo é ampla. Consideramos, por tudo já exposto, que as maneiras de agasalhar a pessoa
apropriar até mesmo de algumas das gerações dos direitos fundamentais. Segundo Uadi
não fazer por parte do Estado, com vistas à preservação do direito à vida, à liberdade de
locomoção”19 (grifo meu), vindo em seguida os direitos de segunda geração gerados pela
preservação do ser pós primeira guerra que “compreende os direitos sociais, econômicos e
prestação positiva, no sentido de fazer algo de natureza social em favor do homem” (grifo
ser humano.
19
Ainda segundo o autor, roga por gerações temporais distintas mas que na teoria sempre colocaram a pessoa
humana no cerne da questão. Precioso o fato de que, mesmo de difícil concretização houve a valorização do ser
humano. A dignidade da pessoa humana em seus primórdios pode ser verificada , já que sempre o Estado tinha a
obrigação de não fazer ou fazer, tratando seus cidadãos de forma prioritária. O que se deu posteriormente foi à
sobreposição da pessoa em face o objeto. Mesmo assim havia um resquício do princípio da dignidade.
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A teoria dada por Luiz Edson Fachin traz um sistema perfeito, fechado,
utópico de que todos têm um patrimônio. Não há o que criticar visto que a necessidade dos
homens se apregoa num bem, pois dele se tira o sustento próprio e da família (considerada
pela sua formação como um todo: visão de família clássica, monoparental, ser único,
agrupamento de parentes consanguineos de diferentes linhas, etc.). Tanto real é a postura que
Vimos também que a realidade fática brasileira não foi desconsiderada pelo
ilustre professor. Nas suas passagens pelo clássico sobre o tema ele transporta a realidade:
teoria é preservar um mínimo de patrimônio já existente, seja ele de pessoa física ou jurídica,
este por sua vez atrelado a sustentar um ser humano, para preservar uma vida digna e honrada.
O tempo conspirando com o avanço da sociedade foi colaborando para interagir a nova ordem
social com os ditames legais, e mesmo aos poucos sendo positivado nos códigos
direitos materiais, hora afetado por um intenso século XX de ditaduras, guerras, censura e
privação de direitos.
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dentro de uma faceta estatal, sendo ela a postulada pela Constituição Federal de 1988 de
a teoria de Fachin com suas características dentro da atuação do Estado, pois o estudo está
ligado diretamente a quatro classes de atuação máxima do regente: a conduta social, política,
econômica e jurídica, que são atreladas à proposta dada por Luiz Edson Fachin.
privado, em principal análise do Direito Civil, que voltou sua tendência a repersonalização de
sua ordem. Agraciado pelo inciso III, do artigo 1º da Cosntituição Federal de 1988,
principalmente, a pessoa vem ocupar seu devido posto, pilar mestre, objeto das graças que o
patrimônio o qual atua como coadjuvante para o ser. A consonância que a constituição exige
vem sendo aplicada neste caso. Relativiza-se a proteção da propriedade para usufruir em
razão da necessidade da pessoa humana, afirmando Fachin que o patrimônio deve vir através
do trabalho, suor da pessoa, indo mais além ao ressaltar que a titularidade das coisas não pode
Não basta entretanto mirar metas e estabelecer propostas. O Estado tem que
ser atuante, pois a teoria aqui apresentada versa da dependência de uma igualdade de direitos,
indivíduo único. Preza-se pela ascensão do ser como um todo, e não favorecimentos de alguns
e aproveitar de outros tantos. O Poder Público deve atuar de forma positiva, cumprindo o
artigo 6º da Carta Máxima referente aos direitos sociais. Na plena sabedoria de José Afonso
que possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, direitos que tendem a realizar a
pessoa humana que o Estado, mediante o Poder Público atuando em favor da sociedade
de renda, tudo o que for válido, e feito com ombridade e dignidade para diminuir a sociedade
meio de se manter. Claro que seu patrimônio visa não só manter o ser, como também, evitar
seu definhamento social preservando um patrimônio mínimo, seja ele a forma que for.
cerne desta teoria, considerando o patrimônio a serviço da pessoa, razão de ser, ou seu fim
último para igualdade social. Ter acesso aos bens e poder controlá-los é o mesmo que
controlar seu meio de subsistência, cabe aí a atuação do direito civil, nortear a função
Entende pois, que o direito não é imutável, muito pelo contrário, traz em si
sociedade, das pessoa sobre certo assunto irá mudar, pois o interesse do indivíduo segue uma
razão existencial - servir ao homem. Orlando Gomes (2000, p. 72-90) passa esse contexto de
da solicialidade representou um peso grande na construção do novo código civil, sendo que o
Estado passa a se comprometer com a justiça social visto por uma tendência humanista desta
vez. GOMES dispara radicais mudanças que a evolução da sociedade proporcionou incubindo
Fica saliente que para se validar a teoria do Poder Público deve agir
por detrás dessa ação estatal não pretende nivelar as relações econômicas, ou desestabilizar as
relações contratuais, em sentido oposto a este senso primário, a teoria do estatuto jurídico do
existencial para promover a subsistência do ser, muitas vezes até dando base para uma
reestruturação para cumprir com suas obrigações. Muito embora tal teoria considerar a
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universalidade de patrimônio, não se faz surpresa a afirmação descaradamente falsa, por força
histórica, a desigualdade é manifesta em qualquer lugar e região do Brasil, mas isso não
automóvel do autônomo, etc. Perceba que a falha existente no pressuposto de que todos
possuem um patrimônio pode ser superada se o Estado agir honestamente com o repasse de
verbas, atução firme e severa nas políticas sócio-econômicas, até mesmo usando de
idealizado por qualquer Estado que dê importância para sua população. Reeducar o Estado
para que assim ele possa reeducar sua nação é essencial para dar concretude e força à teoria.
O que passa pela alçada do Estado então? A resposta é dada pela própria
base da teoria de Fachin, melhor dizendo, expõe a Constituição Federal de 1988 no Título I:
Dos Princípios Fundamentais (já se sabe, portanto, que o ordenamento cravado a seguir é
formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se
humana; não há forma de limitar o que é dignidade da pessoa humana, pois cada caso que se
Estado versará toda e qualquer ação que traga aos seus cidadãos uma qualidade melhor de
vida. Vida digna e com qualidade, pois sobreviver muitos sobrevivem, mas viver com
qualidade... pelo menos o Estado possui condições de enxugar esse mar de desigualdade.
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CONCLUSÃO
fundamental, qual seja, desenvolver a tese do patrimônio no vértice que foi proposto. Para
tanto, concentra-se esforços finais para uma síntese dos emblemas formadores da tese.
uma entidade familiar a ser protegida pela carta constitucional, quanto a pessoa jurídica no
qual é o único meio de sobrevivência do ser, ela existe e permanece com o fim propulsor de
manter a família.
gerar um valor real, pecúnia, capaz de trazer renda e fins econômicos. Não se confunde com
propriedade ou bens, sendo que estes constituem um círculo maior denominado patrimônio. E
ainda, ressalta-se que patrimônio, hoje entendido assim, como uma res que pode ser
contituída de personalidade desde que sua razão de existir seja proteger a pessoa por detrás
dela. Então não mais devemos enchergar o bem como fim em si mesmo, mas como meio de
princípio da dignidade da pessoa humana, que representa nada mais do que o ente persona,
ser responsavél e tutelado pelo direito, como centro de toda a relação sócio-político-jurídico,
pois sendo este princípio o basilar (posto no inciso III do artigo 1º da Constituição),
fundamental, constituinte dos demais direitos. Melhor dizendo, seria o artigo 1º de toda e
qualquer proposta regulamentadora de qualquer relação homem-mundo. Caso não siga este
relações sociais. O direito passou a se voltar para a pessoa humana como foco central,
marginalizando por conseguinte, a visão liberal patrimonialista que o Código Civil anterior
privado. Veja que seu almejar era tornar eficaz os ditos programáticos da Constituição Federal
de 1988, sua visão passa a ser um terreno sólido de alicerces rijos para uma legislação
infraconstitucional mais apta a realizar sua funções humanísticas. Nada mais do que a efetiva
seres menos agraciados dos meios de subsistir. Reza por um mínimo patrimonial já existente
que seria inatingível pelos credores. Tal proteção tem primeira imagem de ser protecionista e
desreguladora de economia, mas não direciona-se para este caminho o pensar do professor
Fachin. A teoria não consiste em proteger os insolventes, os devedores ou dar bases lagais
para fraudes ou golpes fiscais, visa um propósito muito mais nobre. O patrimônio mínimo é
uma forma de manter aqueles que com muito esforço pouco conseguiu adquirir, ou por força
maior veio a esfarelar o que possuía; protege-se esse mínimo restante para que o ser humano,
Ato falho seria expor a perfeição desta teoria ao passo que a premissa de
todos os indivíduos serem possuidores de algum patrimônio seria absurda, e que a lei é
aplicável de igual forma a todos. Pois não se vale Fachin de tamanha falácia. Como
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anteriormente citado o autor sabe desta lacuna, mas solucionar um problema sócio-econômico
de tamanha magnitude numa simple proposta teórica seria uma soberba digna de Narciso.
normas efetivamente eficazes possam possibilitar aos entes compositores desta nação o
compromisso firmado na consituição nos artigos 1º, III, cumprindo com a diginidade da
pessoa humana a cada cidadão, artigo 2º, utilizando os poderes complementarmente visto que,
sua disposição apesar de independentes são harmônicos, artigo 3º, em todos seus incisos
destacando porém o I e o III: formação de uma sociedade livre, justa e solidária, visando
também o artigo 6º anunciando os direitos sociais dos cidadãos, o artigo 170 que preceitua
uma ordem econômica que possibilite a existência digna e justa aos seres humanos, o artigo
226 protegendo a formação familiar. Todos estes dispositivos são da Constituição Federal do
Brasil de 05 deoutubro de 1988, e cada artigo destes se refere a uma fração formadora da tese
economicamente falando, ou proteção aos que agem de má-fé. Trata-se apenas de uma
A teoria de Fachin tem falhas, mas traz uma proposta no centro de sua
razão. Uma forma de solucionar o abismo social que há em nosso país. Por políticas
avançadas, num entendimento mais claro da hermenêutica jurídica, de padrões mais acessíveis
ao direito brasileiro, seria um proposta de grande valor, deveríamos dar a ela uma atenção
Por fim, salvamos a questão que o ser humano é o olho do furacão e sua
força rotativa centrípeta deve mover razões, ideais, prosperidade a todos que são iguais para o
Estado, e seus ventos devem sempre converterem ações benéficas a seus entes, transcendendo
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o tempo e as idéias rumo a uma sociedade que, quem sabe, não é somente utópica, mais sim
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