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ANÁLISE DE PROJECTOS AGRÁRIOS

CÓDIGO: PDR ANO DE ESTUDOS:4 SEMESTRE:1 CRÉDITOS:4

HORAS DE CONTACO EFECTIVAS: 53


HORAS DE ESTUDO INDEPENDENTE:76

Introdução: A disciplina de Análise de Projectos Agrários avalia diferentes opções


de investimentos no sector agrário avaliando-os sob o ponto de vista
económico-financeiro assim como social e ambiental. Assim, a disciplina visa
capacitar os estudantes a desenvolverem e implementarem projectos que produzam o
bem estar dos cidadãos.

Resultados da aprendizagem:
No final desta disciplina os estudantes devem ser capazes de:
 Definir o que é um projecto agrário
 Identificar e comparar custos e benefícios de projectos agrários
 Mobilizar financiamento para a implementação de projectos
 Implementar projectos agrários
 Monitorar e avaliar os projectos

PLANO TEMÁTICO PLANO ANALÍTICO


1. Introdução a Projectos: definição e i. O que é um projecto
identificação do projecto
ii. Porque projectos
2. A análise de Forças, Fraquezas, i. O que é e quais os benefícios da
Oportunidades e Ameaças a análise FOFA
projectos agrários num dado contexto
ii. Como realizar a análise FOFA
3. Avaliação técnica do projecto i. O ciclo do projecto
4. Avaliação económico-financeira do i. Identificação de custos e benefícios
projecto sem aplicação de taxas de
ii. Análise financeira:
desconto
a) Orçamento da empresa agrária

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b) Finanças do projecto

5. Avaliação económico-financeira do i. Análise económica: Valoração dos


projecto com aplicação de taxas de custos e benefícios
desconto
6. O financiamento do projecto i. Critérios de investimento: custos e
benefícios ao longo do tempo
ii. O risco e a incerteza
7. Avaliação do valor social do projecto i. A distribuição dos benefícios do
projecto
8. Avaliação do impacto ambiental e
medidas de mitigação ii. O ambiente, a sociedade e as
políticas
iii. Mudanças técnicas e género
iv. A ajuda do projecto: Alcançando os
mais pobres?
9. A implementação e monitoria do Guia básico para avaliação e monitoria
projecto

10. As avaliações do projecto i. O projecto e o contexto


macroeconómico:
a) A planificação do projecto no
seu contexto político
b) Revisão e perspectivas para o
futuro.

Metodologia de ensino: O ensino será baseado em aulas teóricas expositivas, aulas


práticas e seminários.
Estratégias de avaliação: A avaliação será baseada num projecto feito pelos
estudantes e na participação nas aulas e debates.
Testes: por marcar

Literatura básica:
1. Marques, A. (2006). Concepção e análise de projectos de investimento.
Edições Silabo

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2. Gittinger, J. (1972). Economic Analysis of Agricultural Projects. World Bank
Publication. Johns Hopkins University Press.
3. Wiggins, S. e Shields, D. (1995). Clarifying the logical Framework as a Tool
for Planning and Managing Development Projects. Mac Millan Publications
4. Shields, D. (1993). What is a Logical Framework? Rural Extension Bulletin
I (4) pp 15-20.
5. ACCD, sd. SWAT Manual. AY13, Austin Community College SWOT Team
manual

DESENVOLVIMENTO DOS CONTEÚDOS

1. INTRODUÇÃO A PROJECTOS: DEFINIÇÃO E IDENTIFICAÇÃO DO


PROJECTO

Projectos são meios largamente utilizados para alocar recursos limitados a específicos
propósitos de desenvolvimento tão efectivamente quanto possível, para beneficiar
tanto os produtores como os consumidores dos produtos agrários.

i. O que é um projecto

Um projecto é um pacote discreto de investimentos, políticas e acções (institucionais


e outras) destinadas a alcançar um objectivo específico de desenvolvimento (ou
conjunto de objectivos) dentro de um determinado período.

Os 4 Ps: Projectos, Programas, Planos e Políticas

Um Projecto é um pacote discreto de investimentos, factores e actividades destinados


a remover ou aliviar vários constrangimentos de desenvolvimento de modo a alcançar
um ou mais resultados/benefícios em termos de incremento de produtividade e
melhoria da qualidade de vida de um grupo de beneficiários alvo durante um
determinado intervalo de tempo. Portanto está associado a um tempo limitado.

Diferentemente, um Programa pode ser:

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a) Um investimento ou seriço em curso, tal como o controle da malária, que não está
associado a um tempo limitado, ou
b) Uma colecção de projectos e/ou programas (como definido atrás em (a)), tais
como construção de estradas rurais a partir de componentes de vários projectos.
Muitas vezes é recomendável dar o formato de projectos a tais programas
tornando-os discretos e associados a um tempo limitado (isto é, quebrá-los em
componentes individuais menores) tal como financiar um programa florestal de
longo prazo por um determinado tempo; ou
c) Usado como sinónimo de Plano de desenvolvimento - Programa de
desenvolvimento

Planos, Projectos e Políticas


Um plano de desenvolvimento saudável requer um conhecimento minucioso dos
projectos existentes e potenciais. Embora haja sempre um número infinito de planos
viáveis, apenas um é o melhor e é a este óptimo que se deseja chegar. É necessário
direccionar de forma contínua os investimentos para os sectores onde eles produzem
os melhores benefícios para a economia, e dentro dos sectores, para os projectos mais
produtivos. Portanto, para uma alocação racional de investimentos aos diferentes
sectores, é essencial que os custos e benefícios dos diferentes projectos dos vários
sectores sejam avaliados numa base comparável.

Não é possível formular planos realísticos sem um conhecimento profundo dos


projectos e sua avaliação económica. Muitas vezes tal avaliação não é possível sem
conhecer os planos as políticas subjacentes. Por exemplo, não é possível avaliar um
projecto sem estimar a demanda do produto. Para estimar a demanda é necessário
saber como a economia se vai desenvolver, o que por sua vez requer amplo
conhecimento dos planos e políticas do governo. Há, portanto, uma interdependência:
os planos requerem projectos e os projectos requerem planos. Não é possível formular
bons planos sem uma avaliação económica adequada dos projectos e não é possível
estimar o valor real dos projectos fora da moldura de um plano. Já que existe tão
profunda interdependência, por onde se deve começar? É o clássico problema do ovo
e da galinha. Quem veio primeiro, o ovo ou a galinha? Começa-se por formular
planos inadequados usando métodos inadequados de avaliação de projectos. Estes
levarão a uma melhoria na análise e avaliação dos projectos, e estes, por sua vez, a
uma melhoria no plano e assim por diante. Esta iteração e reiteração leva a uma
cada vez maior aproximação do plano óptimo.

ii. Porque projectos

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Os países em desenvolvimento e os doadores põem grande ênfase nos projectos de
desenvolvimento agrário como fócus da sua intervenção financeira e física por
várias razões: i) os projectos fornecem evidência física da assistência ao
desenvolvimento agrário (ex: uma barragem, um regadio); ii) os projectos de
desenvolvimento agrário podem absorver elevados fundos de investimento, e por
conseguinte, são especialmente valiosos para as agências de ajuda que têm dificuldade
em fazer a sua alocação; iii) os projectos de desenvolvimento agrário são também um
meio de habilitar os governos e as agências de ajuda a ter um certo controle dos
fundos que dispensam, para alcançar um uso apropriado e custo-efectivo.

A abordagem do projeto tem se mantido como uma maneira disciplinada de


gerenciar o uso de recursos para alcançar objectivos importantes de
desenvolvimento. Esta abordagem ajudou os países em desenvolvimento a
estabelecer instituições viáveis indispensáveis para um crescimento económico
ordeiro, para fazer as mudanças políticas necessárias para o bom desempenho do
projecto, e para fazer investimentos correctamente projectados, financeiramente
viáveis e economicamente saudáveis.

A abordagem do projecto combina bem com a visão cada vez mais pragmática do
desenvolvimento encontrada hoje em dia em muitos países. A complexidade e
interdependência da economia global moderna impõe disciplina e realismo nos
fazedores de políticas. As recentes vicissitudes (recessão, redução da ajuda externa,
crise de débitos) acentuaram este facto. Em vez de construír modelos elaborados para
a planificação central, os governos concentram mais os seus esforços nos dois meios
primários dentro do seu controle para conduzir o processo de crescimento: um
programa saudável de investimento no sector público que aloca recursos escassos para
as necessidades públicas mais prioritárias, e uma moldura política que provoca o
comportamento desejado tanto das entidades públicas como das privadas. A ênfase
está em ser prático, mais do que doutrinário, em aprender fazendo, em usar o que
funciona e abandonar o que não funciona. Isto é cada vez mais verdade tanto para as
economias centralmente planificadas como para as de mercado. Neste contexto, a
abordagem de projecto provou ser um instrumento flexível e útil, independentemente
do sistema económico do país, tipo do governo, ou estágio de desenvolvimento.

2. A ANÁLISE DE FORÇAS, OPORTUNIDADES, FRAQUEZAS E


AMEAÇAS A PROJECTOS AGRÁRIOS NUM DADO CONTEXTO

i. O que é e quais são os benefícios da análise FOFA

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A análise FOFA é um dos vários instrumentos de avaliação e planificação que,
quando correctamente utilizado, fornece uma visão global dos factores mais
importantes que influenciam o futuro de um projecto (programa). É a base para uma
reflexão de auto-avaliação de como a missão está sendo desempenhada. Dela
resulta a base para o desenvolvimento de recomendações e planos de acção, também
conhecidos como Planos para a Melhoria da Qualidade. Tais recomendações e
planos de acção tomam em conta muitos factores internos e externos que maximizam
o potencial das fortalezas e oportunidades dos programas, enquanto minimizam o
impacto das suas fraquezas e ameaças. A análise FOFA ajuda a assegurar o uso
eficiente dos recursos para fornecer resultados benéficos do programa. Ela
habilita mais o pensamento proactivo do que as reacções habituais ou instintivas.

A análise FOFA é uma moldura simples mas poderosa para alavancar as fortalezas
da unidade, melhorar as fraquezas, minimizar as ameaças e tirar a maior vantagem
possível das oportunidades. Além destes, os seus benefícios incluem também os
seguintes:
 Oportunidade para colaboração na formulação de planos estratégicos;
 Incorporação de muitos e diferentes factores internos e externos;
 Processo estruturado que permite uma formulação cuidadosa de uma ideia
 Colocação de uma ideia em contraste com o seu congelamento, o que minimiza a
ocorrência do seu processamento reaccionário e mentalidade de grupo;
 Participantes geralmente calados e pouco participativos são encorajados e têm a
habilidade de participar num processo que é mais amigável para as suas
necessidades.
 Permite que os participantes geralmente “dominadores” sejam igualados aos
outros, mas não dominados;
 As respostas são priorizadas dentro de cada categoria pela sua importância, dando
às unidades uma clara percepção dos seus tópicos mais pertinentes e das áreas a
ser consideradas.

ii. Como realizar a análise FOFA

A análise FOFA é uma avaliação subjectiva de dados organizada em forma de


matriz tetradimencional, semelhante a uma lista básica de duas colunas de prós e
contras.

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PRÓS CONTRAS

Fortalezas Fraquezas
O que a unidade faz muito bem, Onde as funções são
internamente desempenhadas internamente,
abaixo do desejável
Oportunidades Ameaças
Condições externas potencialmente Condições externas potencialmente
favoráveis à unidade desfavoráveis à unidade

Vejamos como combinar estes prós e contras.

Fortalezas Fraquezas
O que a unidade faz muito Onde as funções são
bem, internamente desempenhadas
internamente, abaixo do
desejável
Oportunidades Fo&Op Fr&Op
Condições externas Realize as oportunidades Ultrapasse as fraquezas
potencialmente favoráveis que melhor se enquadram para realizar as
à unidade nas fortalezas do programa oportunidades
Ameaças Fo&Am Fr&Am
Condições externas Identifique formas de o Estabeleça um plano
potencialmente projecto (programa) usar defensivo para evitar que
desfavoráveis à unidade as suas fortalezas para as fraquezas do projecto
reduzir a vulnerabilidade (programa) o tornem
às ameaças externas altamente vulnerável às
ameaças externas

Para desenvolver iniciativas (estrategias) que tomem em conta o perfil FOFA, os


membros da unidade podem converter as quatro listas numa matriz (veja acima) que
associa as fortalezas (manter, construír e alavancar), oportunidades (priorizar e
optimizar), fraquezas (remediar) e ameaças (contornar) em acções que podem ser
acordadas e apropriadas pela unidade.

Identificação das Fortalezas, Oportunidades, Fraquezas e Ameaças (FOFA)

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Os seguintes passos podem ser utilizados para fazer a análise FOFA:
 Introdução do grupo e estabelecimento de regras básicas/guião;
 Discutir os dados da unidade/projecto/programa e a sua relação com o
desempenho da missão da unidade/projecto/programa. Isto ajudará a clarificar as
fortalezas e fraquezas existentes. Fortalezas e fraquezas ajudarão a identificar
possíveis oportunidades e ameaças.
 Discutidos os dados inicia-se a tempestade de ideias “brainstorming” sobre cada
um dos elementos da FOFA, um de cada vez (ex: primeiro fortalezas, depois
fraquezas, a seguir oportunidades e por último ameaças). Pede-se aos
participantes que escrevam o que pensam sobre os dados, ou os seus comentários.

Nota: recomenda-se que se encoraje os participantes a usar frases claramente


inteligíveis ao escrever as suas sugestões ou comentários.

 É importante clarificar as descrições da FOFA durante a sessão, para garantir a


sua contextualização em discussões e análises futuras.
 Fortalezas - De que forma (em que aspectos) é que a
unidade/projecto/programa brilha?
 Fraquezas - Que aspectos da unidade/projecto/programa poderão impedir o
desenvolvimento futuro se não se prestar atenção a elas?
 Oportunidades - De que factores a unidade/projecto/programa precisa tirar
vantagem, que devem melhorar a qualidade da área?
 Ameaças - Que factores externos podem afectar negativamente o
desempenho futuro da unidade/projecto/programa?

O processo FOFA
 Fazer a recolha contínua das contribuições
 Registar as contribuições de forma aleatória diante do grupo, maximizando assim
a garantia de ausência de viés;
 Terminada a escrita dos tópicos dos grupos procede-se a leitura em voz alta de
todas as contribuições arroladas;
 A seguir encoraja-se os participantes a agrupar os tópicos por semelhança ou em
temas;
 Juntos, os participantes acordam no título de cada grupo ou “cluster”;

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o Pode haver uma manipulação dos agrupamentos dos temas que surgirem.

 Atribuídos os títulos aos grupos, lêem-se de novo os clusters para se certificar de


que todos os tópicos se enquadram neles.
 Segue-se depois o ordenamento pelos participantes quer dos grupos de temas ou
dos tópicos individuais dentro dos clusters;
 Por último agrupam-se os clusters de modo a facilitar a escrita do relatório e
faz-se um pequeno intervalo antes de se passar para a secção seguinte (ex:
Fraquezas), e assim se procede até completar as quatro secções.

A análise FOFA produz uma lista de assuntos que são no momento os mais
pertinentes para o programa/projecto/unidade. Estes formam a base para qualquer
Plano de Melhoria de Qualidade (PMQ).

3. AVALIAÇÃO TÉCNICA DO PROJECTO

i. O ciclo do projecto

Pretende-se nesta unidade introduzir as cinco principais etapas do chamado “ciclo do


Projecto”, mantendo especial ênfase nas primeiras duas etapas, a identificação e a
preparação do projecto. Pretende-se igualmente melhorar a consciência do projecto
como um processo iterativo. Assim, irá se aprender como sequenciar e organizar as
diferentes actividades envolvidas no ciclo do projecto, bem como os principais
assuntos e questões na identificação e preparação do projecto.

Há uma tendência de haver uma sequência natural na forma como os projectos são
planificados e realizados. Tal sequência é muitas vezes designada “cilo do projecto”, e
este pode ser dividido em diferentes formas, todas igualmente válidas. Uma delas é a
que vamos adoptar, e divide o ciclo em cinco etapas:
a. Identificação
b. Preparação e análise
c. Apreciação
d. Implementação
e. Avaliação

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O diagrama seguinte mostra a relação entre estas etapas e os diferentes tipos de planos
de desenvolvimento:

Diagrama 1: O Ciclo do Projecto

Plano regional

Plano Identificação
macro
Avaliação
Plano sectorial ex-post

Preparação

Apreciação

Implementação

Monitoria e
Avaliação corrente

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Embora o diagrama mostre de forma simplificada e sequenciada as diferentes etapas
do ciclo do projecto, na prática estas ocorrem de forma iteractiva, com ajustes e
reformulações sempre que necessário. Vejamos em detalhe os principais aspectos das
etapas:

a. Identificação
A identificação é o início do processo através do qual os planos de investimento
nacional e as estrategias do sector são traduzidas em programas específicos de
investimento e de acção, num processo dinâmico e iteractivo.

Os projectos são gerados a partir de uma multiplicidade de fontes, tais como:


i. Identificação de
 Demanda ou necessidades não satisfeitas e possíveis meios de os
satisfazer
 Problemas ou constrangimentos no processo de desenvolvimento
provocados por escassez de facilidades, serviços, e material ou recursos
humanos essenciais e por obstáculos institucionais ou de outro tipo
 Materiais ou recursos humanos não utilizados ou sub-utilizados e
oportunidades para a sua conversão para propósitos mais produtivos; ou,
alternativamente, recursos naturais sobre-utilizados que precisam de ser
conservados e restaurados
 A necessidade de complementar outros investimentos (tais como
fornecer ligações ferro-portuárias a projectos mineiros)

ii. Ideias de projectos podem também emanar de


 Iniciativas de empreendedores públicos ou privados locais que desejam
tirar vantagem de oportunidades percebidas ou responder a incentivos do
governo
 Resposta do governo a pressões políticas ou sociais locais provocados,
por exemplo, por desigualdades económicas, sociais ou regionais
 Prosseguimento de objectivos nacionais, tais como auto-suficiência em
produtos alimentares

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 Ocorrência de eventos naturais (ex: secas, cheias, terramotos)
 Desejo de criar uma capacidade local permanente para realizar
actividades de desenvolvimento através da construção de instituições
locais

iii. Ideias de projectos podem também provir do exterior, como resultado de


 Propostas de investimento de empresas multinacionais
 Actividades de programação de agências de ajuda bilateral ou
multilateral e seus projectos correntes no país
 Influência de estratégias de investimento adoptadas por outros países em
desenvolvimento, bem como oportunidades criadas por acordos
internacionais (por exemplo, sobre o uso de recursos costeiros)
 Opinião profissional ou consenso público prevalecentes na comunidade
internacional em campos tais como população, ambiente, e alívio a
pobreza

Definição dos objectivos do projecto - É importante começar por identificar


explicitamente os objectivos que o projecto pretende alcançar. Este exercício pode
revelar que nem todos os objectivos são mutuamente compatíveis. Pode revelar
também que o projecto proposto não é adequado para alcançar todos os possíveis
objectivos. A selecção de um objectivo simples e claro pode aumentar a possibilidade
de sucesso, mas também pode limitar a contribuição para o desenvolvimento, a menos
que sejam também realizados outros investimentos complementares. Para aumentar a
probabilidade de sucesso, é importante dedicar um esforço explícito para assegurar
que todas as partes que se irão envolver na implementação e operacionalização do
projecto (incluindo as autoridades políticas relevantes, os beneficiários finais e as
agências financeiras externas) partilhem desde cedo uma visão comum dos objectivos
e da estrategia para o seu alcance.

Quanto mais se avança na identificação para a preparação do projecto, tanto mais


necessário se torna aparar (podar) as ideias do projecto e aumentar o nível de detalhe
das ideias sobreviventes.

Identificação - A primeira fase do ciclo consiste na identificação de projectos com


alta prioridade, elegíveis para os eventuais credores e que o governo e os eventuais
peticionários estejam interessados em considerar. Tais projectos devem se enquadrar
em e apoiar uma estratégia coerente de desenvolvimento, consistente com os
objectivos sectoriais. Devem igualmente satisfazer um teste primário de viabilidade,
isto é, prever soluções técnicas e institucionais ajustadas aos benefícios esperados.

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Preparação e análise - Elabora-se um pequeno resumo descrevendo os objectivos,
identificando as principais questões e estabelecendo o calendário para o posterior
processamento. A responsabilidade formal da preparação é do peticionário. A
preparação do projecto pode requerer assistência financeira e técnica. A preparação
deve cobrir toda a gama de condições técnica, institucional, económica, e financeira
para alcançar os objectivos do projecto. Um elemento crítico da preparação é a
identificação e comparação de alternativas técnicas e institucionais para alcançar os
objectivos do projecto. Assim, a preparação requer estudos de viabilidade que
identifiquem e preparem desenhos preliminares de alternativas técnicas e
institucionais, comparação dos respectivos custos e benefícios, e investigação mais
detalhada das alternativas mais promissoras até se encontrar a solução mais
satisfatória.

Apreciação - Esta é talvez a fase mais bem conhecida do trabalho do projecto (em
parte, porque é o culminar do trabalho preparatório). Fornece uma revisão
compreensiva de todos os aspectos do projecto e constitui o alicerce da
implementação do projecto e da sua avaliação quando terminado. É responsabilidade
do credor. Se a preparação tiver sido bem feita, a apreciação pode ser relativamente
simples e rápida. A apreciação cobre quatro aspectos principais do projecto: técnico,
institucional, económico e financeiro.

 Técnico - Diz respeito ao desenho saudável, engenharia apropriada, e


conformidade com padrões aceitáveis nas áreas agronómica, educacional e outras.
Verifica as alternativas técnicas consideradas, as soluções propostas, e os
resultados esperados. Mais concretamente, diz respeito às questões de escala
técnica, layout, e localização de facilidades: que tecnologia será usada, incluindo
tipos de equipamento ou processos e a sua adequação às condições locais; que
abordagem será seguida para a provisão dos serviços; quão realístico é o
calendário de implementação; e qual a probabilidade de alcançar os níveis de
output esperados.

Uma parte crítica da apreciação técnica é uma revisão dos custos estimados e a
engenharia ou outros dados em que se baseiam para determinar se são credíveis
dentro de uma margem aceitável e se as provisões para contingências físicas e
aumento esperados de preços durante a implementação do projecto são
adequadas. A apreciação técnica também revê os arranjos do “procurement”
propostos para se assegurar que estão de acordo com as exigências do financiador.
Examina os procedimentos da engenharia, arquitectura e outros serviços
profissionais. Também estima os custos da operação das facilidades e serviços do
projecto, bem como a disponibilidade das matérias primas e outros inputs
necessários. Por último, examina igualmente o potencial impacto do projecto no

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ambiente humano e físico para ter a certeza de que quaisquer efeitos adversos
serão controlados e minimizados.

 Institucional - Diz respeito à criação de uma instituição sã e viável, incluído a


sua organização, gestão, recursos humanos, políticas e procedimentos. Abrange
também o conjunto de políticas governamentais que condicionam o ambiente em
que a instituição opera. Reza a experiência que uma atenção inadequada aos
aspectos institucionais do projecto leva a problemas durante a sua implementação
e operação. A capacitação institucional talvez seja o aspecto do projecto mais
difícil de se lidar com ele. Isto se deve em parte ao facto de o seu sucesso
depender tanto do entendimento do ambiente cultural da instituição.

 Económico - Através da análise custo-benefícios de desenhos alternativos do


projecto, deve-se seleccionar a alternativa que mais contribui para os objectivos
de desenvolvimento. Esta análise é geralmente feita em estágios sucessivos
durante a preparação do projecto, mas é durante a apreciação que se faz a última
revisão e avaliação.

Durante a apreciação económica o projecto é estudado nos seus arranjos


sectoriais. Examina-se o programa de investimento por sector, as fortalezas e
fraquezas das instituições sectoriais públicas e privadas e as políticas
governamentais chave.

Sempre que possível, faz-se uma análise detalhada dos custos e benefícios do
projecto para o país, e o seu resultado é expresso através da taxa de retorno
económico. Esta análise requer com frequência a solução de problemas tão difíceis
como a determinação das consequências físicas do projecto e a sua valoração em
termos de objectivos de desenvolvimento para o país. Quando distorções do mercado
devidas por exemplo a restrições, impostos ou subsídios não permitem calcular a
preços de mercado o verdadeiro valor económico dos custos utilizam-se “preços
sombra”. Usam-se “preços sociais” para ponderar a distribuição da renda e o
incremento da poupança pública e usa-se a análise da sensibilidade para avaliar
alterações no retorno do projecto devidas à variação de algumas das assumpções
chave.

A análise económica visa sempre avaliar a contribuição do projecto para os


objectivos de desenvolvimento do país, critério básico para a selecção e
apreciação do projecto. Todo o projecto deve ter um retorno económico
satisfatório.

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 Financeiro - A avaliação financeira tem vários propósitos. Um deles é assegurar
que há fundos suficientes para cobrir os custos de implementação do projecto.
Um aspecto importante desta avaliação é assegurar que existe um plano
financeiro para disponibilizar os fundos para implementar o projecto agendado.
Para projectos geradores de renda, a apreciação financeira avalia também a sua
viabilidade financeira. As finanças do projecto são minuciosamente revistas
através das projecções do balancete, declaração de rendimentos (income
statment), e fluxo de caixa. São revistos os rácios financeiros, a capacidade de
endividamento, o nível e estrutura dos preços, a recuperação do investimento e
dos custos operacionais, as taxas de juros pagas e/ou cobradas.

É a partir do relatório da apreciação que se negoceia um eventual acordo de


financiamento do projecto.

Implementação e supervisão - A implementação é da responsabilidade do dono do


projecto e inclui estudos organizacionais, treinamento do pessoal, contratação de
gestores expatriados, contratação de consultores para ajudar a supervisar. Havendo
financiamento, o credor terá também a responsabilidade da supervisão da
implementação do projecto.

A supervisão é a parte menos glamorosa do projecto mas é em muitos aspectos a mais


importante. Todos os projectos enfrentam problemas de implementação, alguns dos
quais não podem ser previstos. Tais problemas podem provir de dificuldades inerentes
ao processo de desenvolvimento ou de causas mais específicas tais como mudanças na
situação política e económica, na gestão do projecto, ou mesmo no tempo. Como
consequência, embora o objectivo de desenvolvimento do projecto permaneça na
generalidade o mesmo, o percurso da sua implementação varia com frequência em
relação ao inicialmente traçado. O principal objectivo da supervisão é assegurar que
o projecto atinja o seu objectivo de desenvolvimento, e em particular, identificar
problemas que surjam durante a implementação e lidar com eles. A supervisão é,
acima de tudo, um exercício de resolução colectiva de problemas e como tal é um dos
meios mais efectivos de providenciar assistência técnica. Em caso de financiamento, a
supervisão deve verificar também a conformidade do “procurement” dos bens ou
serviços financiados com as regras e procedimentos do credor acordados com o
devedor.

A supervisão tem também por objectivo recolher experiência acumulada para


retroalimentar o desenho e preparação de projectos futuros e a melhoria de políticas
e procedimentos. É actualmente frequente a incorporação de uma unidade de
monitoria e avaliação na supervisão para colher tal informação.

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Avaliação - Por a supervisão ser, em parte, um processo de aprender através da
experiência, ela diz respeito, acima de tudo, ao período em que, na vida do projecto,
as componentes físicas estão sendo construídas, o equipamento comprado e instalado,
e novas instituições, programas e políticas estão sendo postos em prática. Uma vez
completados estes estágios, o nível de supervisão declina drasticamente. Durante o
período de supervisão activa, a atenção tende a ser focalizada nos problemas do
momento. A monitoria e avaliação permanente dos projectos tornou evidente a
necessidade de uma abordagem mais compreensiva para avaliar os seus resultados.
Foi assim que em 1970 se estabeleceu um sistema de avaliação como a etapa final do
ciclo do projecto.

Como última etapa da supervisão, elabora-se um relatório no final de cada projecto,


que é uma espécie de auto-avaliação. Este relatório serve de base para uma auditoria
final, e se necessário, para uma avaliação no terreno tão exaustiva como a apreciação
inicial. Cada relatório final e subsequente relatório de auditoria estima de novo a taxa
de retorno económico com base nos actuais custos de implementação e informação
actualizada sobre os custos operacionais e benefícios esperados. Para projectos cuja
vida económica e respectivos custos e benefícios económicos se estendem para além
do fim do período do financiamento se prepara o “relatório da avaliação do
impacto” pelo menos cinco anos depois do último desembolso. O sistema de
avaliação é uma mina de ouro de informação, que suplementa e complementa aquela
fornecida pela vasta gama de relatórios de supervisão do projecto. Assim, as lições da
experiência vão sendo integradas no desenho e preparação de futuros projectos. Por
outras palavras, o ciclo do projecto está funcionando como previsto.

4. AVALIAÇÃO ECONÓMICO-FINANCEIRA DO PROJECTO SEM


APLICAÇÃO DE TAXAS DE DESCONTO

i. Identificação de custos e benefícios

A análise económica dos projectos agrários se faz para comparar custos com
benefícios e determinar qual dos projectos alternativos tem um retorno aceitável.
Portanto, os custos e benefícios do projecto proposto devem ser identificados. Uma
vez conhecidos, devem ser valorados, isto é, deve-se-lhes atribuir um preço, e
determinar o seu valor económico. Embora isto seja bastante óbvio, é muitas vezes
embaraçoso.

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Objectivos, custos e benefícios

Na análise de projectos, os objectivos da análise fornecem o padrão a partir do qual


os custos e benefícios são definidos. Assim, custo é tudo quanto reduz um objectivo, e
benefício é tudo quanto contribui para um objectivo.

Esta caracterização tão simples acarreta, no entanto, um problema: cada participante


no projecto tem um objectivo. Assim, por exemplo, enquanto o objectivo principal de
um agricultor é maximizar a quantidade que a família tem para viver, ele pode querer
também que seus filhos sejam educados (portanto não estejam disponíveis para
trabalhar em tempo inteiro na machamba), e pode valorizar também o seu tempo fora
da machamba (o que lhe vai impedir de adoptar um padrão de cultura que requeira,
por exemplo, dez horas de trabalho durante 365 dias por ano). O gosto ou preferência
pode impedí-lo de adoptar uma nova variedade mais produtiva, a aversão ao risco
pode levá-lo a produzir em simultâneo culturas alimentares com culturas de
rendimento, etc. Todos estes aspectos afectam a escolha do padrão de cultura pelo
agricultor e portanto, a capacidade de o projecto gerar renda. Na nossa análise
tentaremos identificar o padrão de cultura que nos parece mais provável que o
agricultor escolha, e então avaliaremos os efeitos desse padrão no incremento da sua
renda, e portanto, na nova renda gerada pelo projecto.

Tanto para o sector privado como para o governo o objectivo principal é maximizar a
renda líquida. No entanto, ambos têm também muitos outros objectivos, tais como
diversificar a actividade para reduzir o risco, contratar um gestor para poder ter mais
tempo de lazer, garantir transporte público em zonas com baixa densidade
populacional ou em horas de baixo tráfego, situações estas todas que reduzem a renda
líquida. Na nossa análise começaremos por identificar o padrão de operações que as
empresas no projecto irão mais provavelmente seguir e depois avaliar os efeitos de
tal padrão na capacidade de o projecto gerar renda.

A sociedade como um todo terá como principal objectivo aumentar a renda nacional.
No entanto, outros objectivos significantes podem ser: a distribuição da renda, o
aumento das oportunidades de emprego (redução do desemprego), o aumento da
poupança (para poder investir, acelerar o crescimento e aumentar mais a renda no
futuro), o aumento da integração regional, a elevação do nível educacional, o aumento
da saúde rural, o aumento da segurança nacional, etc.

Nenhum sistema analítico formal pode agregar os vários objectivos de todos os


participantes num projecto. É necessário fazer-se uma selecção. Nós tomaremos
como critério formal a maximização da renda, uma vez que nos países em
desenvolvimento o incremento da renda é provavelmente o único objectivo mais

17
importante nos esforços económicos individuais, e o incremento da renda nacional é
provavelmente o mais importante objectivo da política nacional.

Para as empresas familiares tomaremos como objectivo a maximização do benefício


líquido incremental (o aumento da quantidade que a família agricultora tem para
viver como resultado da participação no projecto). Para a empresa privada ou
pública tomaremos como objectivo a maximização da renda líquida incremental.
Para a sociedade como um todo tomaremos como objectivo a contribuição do
projecto para a renda nacional (o valor de todos os bens e serviços finais produzidos
durante um período específico, geralmente um ano). Exceptuando pequenas variações
formais na definição tais como a maximização do PIB, este é virtualmente o mesmo
objectivo. É importante enfatizar que o facto de tomar a renda com que o projecto vai
contribuir para a sociedade como critério analítico formal na análise económica não
rebaixa os outros objectivos nem nos impede de os ter em conta. Eles são
considerados como decisões separadas. Usando o nosso sistema analítico podemos
avaliar qual dos projectos alternativos ou qual das formas alternativas de um
determinado projecto fará uma contribuição aceitável para a renda nacional. Isto nos
habilitará a recomendar aos investidores o projecto com maior potencial de gerar
renda e fará um contributo significativo para outros objectivos sociais.

Portanto, no sistema de análise económica aqui discutido, tudo o que reduz a renda
nacional é um custo e tudo o que a aumenta é um benefício. Uma vez que o nosso
objectivo é aumentar a soma de todos os bens e serviços finais, tudo o que
directamente reduz os bens e serviços finais é um custo e tudo o que directamente os
aumenta é claramente um benefício. Assim, a tarefa do analista na análise económica
é estimar a quantidade do aumento desta renda nacional disponível para a sociedade,
isto é, determinar se, e por quanto, os benefícios superam os custos em termos de
renda nacional.

Note-se que ao definir o objectivo da análise económica em termos de mudança na


renda nacional está-se a defini-lo em termos reais. Ao contrário de termos monetários,
termos reais se refere às características físicas e tangíveis de bens e serviços. É de
realçar que, a análise económica, ao contrário da análise financeira, consiste em
rastrear o fluxo real de recursos induzido por um investimento, mais do que os efeitos
monetários do investimento.

Definidos estes objectivos, pode-se dizer que na análise financeira o numerário (a


medida comum utilizada como unidade de conta) é a unidade de moeda, geralmente
moeda doméstica, enquanto que na análise económica o numerário é a unidade da
renda nacional, geralmente também expressa em moeda doméstica.

Na análise económica assume-se que todo o financiamento para o projecto vem de


fontes domésticas, e que todos os retornos do projecto vão para os residentes
domésticos. É por esta razão que identificamos o nosso objectivo social com o

18
Produto Interno Bruto (PIB) em vez do mais familiar Produto Nacional Bruto (PNB).
Esta convenção (quase universalmente aceite pelos analistas de projectos) separa a
decisão de quão bom é o projecto no seu potencial de geração de renda da decisão de
como financiá-lo.

Comparação “com” e “sem”

A análise do projecto procura identificar e valorar os custos e benefícios que irão


surgir com o proposto projecto e compará-los com a situação que ocorreria sem o
projecto. A diferença é o benefício líquido incremental decorrente do investimento
do projecto. Esta abordagem não é idêntica à comparação da situação “antes” e
“depois” do projecto. A comparação antes-e-depois não contabiliza as mudanças na
produção que ocorreriam sem o projecto, e portanto, induz a uma declaração errada
dos benefícios atribuíveis ao investimento do projecto.

Pode ocorrer uma alteração dos “outputs” do projecto em dois tipos de situação. O
mais comum é quando a produção na área está já a crescer, mesmo que lentamente, e
provavelmente continuará a crescer durante a vida do projecto. O objectivo do
projecto é aumentar o crescimento intensificando a produção. No entanto, uma
alteração no “output” pode também se verificar sem o projecto: pode ocorrer redução
da produção na ausência de um novo investimento, por exemplo, devido à erosão e
consequente perda de solos com aptidão para a agricultura. O investimento do

19
projecto vai prevenir a erosão. Uma simples comparação antes-e-depois não irá
identificar os benefícios decorrentes do investimento.

Por vezes um investimento para prevenir perdas pode também levar a um aumento da
produção, de tal modo que o benefício total provém por um lado da perda evitada e
por outro, do aumento da produção. Mais uma vez, uma simples comparação
antes-e-depois não irá identificar os benefícios alcançados por evitar as perdas.

É evidente que, se não se espera nenhuma alteração do “output” na área do projecto


sem o projecto, a distinção da comparação antes-e-depois com a comparação

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com-e-sem o projecto é menos crucial. Em alguns projectos a previsão de incrementar
a produção sem o projecto é mínima. O valor incremental pode ser atribuído apenas
ao novo investimento. Um exemplo onde não se espera que haja mudança no “output”
sem o projecto é o de alguns projectos de reassentamento. Sem o projecto não há
nenhum uso económico da área. Neste caso, o “output” sem o projecto é o mesmo que
o “uotput” antes do projecto.

Pagamentos de transferências directas

Algumas entradas na contabilidade financeira representam transferências de bens e


serviços de uma entidade da sociedade para outra e não uma alteração da renda
nacional. São os chamados pagamentos de transferências directas, que são mais fáceis
de identificar se tivermos em mente a nossa definição de custos e benefícios. Na
análise de projectos agrários são comuns quatro tipos de pagamentos de
transferências directas: impostos, subsídios, empréstimos e serviço de dívida (o
pagamento do capital e juros).

Na análise financeira o pagamento de impostos é sem dúvidas um custo. Quando o


agricultor paga o imposto o seu benefício líquido se reduz. No entanto, o pagamento
do imposto pelo agricultor não reduz a renda nacional. Apenas transfere a renda do
agricultor para o governo que a vai utilizar para fins sociais presumidos mais
importantes para a sociedade do que o incremento do consumo ou do investimento
individual do agricultor. Por não reduzir a renda nacional, o pagamento do imposto
pelo agricultor não constitui um custo para a sociedade como um todo. Portanto, na
análise económica do projecto não constitui um custo. Faz parte do rol de benefícios
do projecto que contribuem para o aumento da renda nacional. É apenas uma
transferência de pagamentos. Importa, no entanto, não confundir o imposto com a
compensação devida pelo fornecimento de bens ou serviços necessários para a
produção, tal como o pagamento da taxa de água para irrigação. Este é um custo, pois
a água utilizada por um agricultor representa redução daquele bem para a sociedade
como um todo.

Os subsídios são também pagamentos de transferências directas que fluem na


direcção oposta à dos impostos. Quando um agricultor compra fertilizante a preços
subsidiados, reduz os seus custos e incrementa o seu benefício líquido, mas o custo do
fertilizante em uso pela sociedade permanece o mesmo e os recursos necessários para
a sua produção ou importação reduzem a renda nacional disponível para a sociedade.
Portanto, para a análise económica do projecto, considera-se o custo pleno do
fertilizante.

21
As transacções de crédito são outra forma de transferência directa de pagamentos
nos projectos agrários. Para o agricultor a recepção do empréstimo aumenta a sua
disponibilidade de recursos para produzir, e o pagamento dos juros e do capital reduz
tal disponibilidade. No entanto, do ponto de vista económico, nem o empréstimo reduz
a renda nacional disponível, nem o pagamento do capital e dos juros a aumenta. Nos
dois casos há apenas uma transferência do controle de recursos.

Custos de Projectos Agrários

Em quase todas as análises de projectos os custos são mais fáceis de identificar e


valorizar que os benefícios. Sempre que examinarmos custos iremos nos perguntar se
o item reduz o benefício líquido da farma ou a renda líquida da empresa (objectivo
da análise financeira), ou a renda nacional (objectivo da análise económica).

Bens físicos

Raramente os bens físicos usados num projecto agrário serão difíceis de identificar.
Para estes bens a dificuldade reside no problema técnico da planificação e desenho
associados com a identificação da quanto e quando serão necessários.

Força de trabalho

Também para a força de trabalho a dificuldade não reside na sua identificação, mas
de quanto e quando será necessária. Uma dificuldade especial reside na sua
valorização, que pode requerer o uso de preços sombra. A valorização da força de
trabalho familiar pode trazer uma dificuldade adicional.

Terra

Por razões idênticas, não é difícil identificar a terra a usar num projecto agrário, nem
a sua localização e a quantidade a ser usada. Podem surgir problemas na sua
valorização por causa do tipo muito especial de condições de mercado existente no
momento da sua transferência de um proprietário para outro.

22
Provisões para contingências

De uma forma geral, ao calcular-se os custos de um projecto assume-se que não


haverá alterações nos preços nacionais e internacionais, nem inflação durante o
período do investimento. Esta assumpção não é realista. Uma sã planificação requer
que se tomem provisões com antecedência sobre possíveis alterações adversas nas
condições físicas ou nos preços iniciais. É por isso que no cálculo dos custos do
projecto se incluem as contingências.

As dotações para contingências devem ser divididas em dotações para contingências


físicas e dotações para contingências de preços. As contingências de preços dizem
respeito a duas categorias: a) alterações nos preços; e b) inflação geral. As
contingências físicas e de alteração de preços que proporcionam aumento nos preços
relativos correspondem à nossa expectativa de que elas poderão ocorrer, embora não
se possa prever com exactidão como se irá sentir a sua influência. A ocorrência de tais
contingências será um custo real, que irá reduzir os bens e serviços finais disponíveis
para o nosso propósito, isto é, irão reduzir a renda nacional, e por isso, serão um
custo para a sociedade. Quanto à inflação geral, ela levanta um problema diferente.
Lida-se com ela trabalhando a preços constantes. Assume-se que todos os preços
serão afectados de igual forma por um aumento no nível geral de preços. Este
procedimento permite comparações válidas entre projectos alternativos. No entanto,
se se espera que a inflação seja significativa, devem-se fazer as necessárias provisões
no plano financeiro do projecto a fim de se produzir um orçamento adequado. As
dotações para as contingências da inflação geral devem ser incluídas apenas no plano
financeiro.

Impostos

Lembre-se que os impostos não reduzem a renda nacional. Embora na análise


financeira constituam um custo, na análise económica são uma mera transferência de
pagamentos e como tal são parte do benefício líquido incremental, isto é, da nova
renda gerada pelo projecto.

Serviço da dívida

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O pagamento de juros e do capital são um custo na análise financeira e uma
transferência de pagamentos na análise económica. Tal pagamento é omitido nas
contas económicas. Mesmo no caso da capitalização dos juros, isto é, adição dos juros
ao capital durante o período que antecede a geração de receitas pelo projecto, estes
continuam sendo uma transferência de pagamentos na análise económica, embora
aumentem o custo do capital e consequentemente o serviço de dívida na análise
financeira. Para obter o valor económico do custo do capital tais juros devem ser
subtraídos do custo do capital e omitidos nas contas económicas.

Na análise económica o serviço de dívida é tratado como uma transferência de


pagamentos mesmo que o projecto seja financiado por um empréstimo estrangeiro e o
serviço de dívida seja pago no exterior. Isto acontece por causa da convenção que se
assume de que todo o financiamento para um projecto provém de fontes domésticas e
todos os retornos do projecto vão para residentes domésticos. Como se disse antes,
esta convenção separa a decisão de “quão bom é um projecto”, da decisão de “como
financiá-lo”.

Custos irrecuperáveis (Sunk costs)

Custos irrecuperáveis (Sunk costs) são custos incorridos no passado e sobre os quais
uma nova proposta de investimentos se irá basear. Tais custos não podem ser
evitados. Aliás, quando se analisa uma proposta de investimento, apenas se
consideram os retornos futuros de custos futuros. As despesas do passado, ou custos
irrecuperáveis (sunk costs), não aparecem nas contas. De facto, o dinheiro dispendido
no passado já foi gasto, e não implementar um projecto já concluído não constitui
nenhuma alternativa.

Benefícios tangíveis de projectos agrários

Os benefícios tangíveis de projectos agrários podem provir quer do aumento do valor


da produção quer da redução de custos. No entanto, a forma específica como os
benefícios aparecem nem sempre é óbvia e a sua valorização pode ser bastante difícil.

Produção incrementada

24
O benefício mais comum de projectos agrários é o incremento da produção física. Na
maioria dos projectos agrários que produzem para comercializar não será difícil
identificar o benefício e encontrar o preço de mercado, embora possa ser difícil
determinar o valor correcto a usar na análise económica. Em muitos projectos
agrários o benefício pode incluir o incremento da produção consumida pela própria
família agricultora. Tal produção consumida incrementa tanto o benefício líquido da
família agricultora, e portanto, a renda nacional, como se ela tivesse sido vendida no
mercado. Uma vez que tal produção consumida contribui para os objectivos do
projecto tanto como a comercializada, ela é claramente parte dos benefícios do
projecto tanto na análise financeira como na económica. Omitir a produção
consumida pela família agricultora tenderá a fazer parecer os projectos que produzem
culturas comerciais relativamente mais produtivos, e poderá levar a uma escolha não
adequada entre projectos alternativos. Não incluir a produção consumida pela família
agricultora significará também subestimar o retorno dos investimentos agrários em
relação aos retornos dos investimentos dos outros sectores da economia.

Melhoria da qualidade

Por vezes o benefício de um projecto agrário pode tomar a forma de uma melhoria da
qualidade do produto. Tanto o aumento da produção como a melhoria da qualidade
são na maior parte das vezes esperados nos projectos agrários, embora nem sempre se
espere que ocorram ambos. No entanto, a taxa e a extensão do benefício da melhoria
da qualidade podem facilmente ser sobre-estimados.

Alteração no tempo de venda

Em alguns projectos agrários os benefícios podem provir da melhoria de facilidades


de armazenagem que permitem que o produto seja vendido numa altura em que os
preços sejam mais favoráveis. Por exemplo, os benefícios de um investimento na
armazenagem provêm desta alteração no “valor temporal”.

Alterações no local de vendas

Outros projectos podem incluir investimentos em meios de transporte para levar os


produtos da área local onde os preços são baixos para mercados distantes onde os
preços são mais altos. Os benefícios de tais projectos provêm da alteração no “valor
da localização”.

Alterações na forma do produto (normalização e processamento)

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Projectos que envolvam indústrias de processamento agrário esperam que os
benefícios provenham da alteração da forma dos produtos agrários. Até mesmo uma
simples facilidade de processamento tal como um alpendre para a
normalização/tipificação do produto origina um benefício ao mudar a forma do
produto de tal-como-é-colhido, para classificado (agrupado por classes). Os de
melhor qualidade são vendidos a um preço maior e o valor total aumenta.

Redução de custos através da mecanização

O exemplo clássico de um benefício proveniente da redução de custos em projectos


agrários é o da redução do custo da força de trabalho através da mecanização
agrária. A produção total pode não aumentar, mas o benefício resulta dos custos
reduzidos, desde que o ganho não seja ofuscado pela força de trabalho dispensada que
não pode ser empregue de forma produtiva em outro local.

Reduzidos custos de transporte

A redução de custos é uma fonte comum de benefícios no factor transporte. Melhores


vias de acesso ou mesmo autoestradas podem reduzir os custos de deslocar um
produto da machamba para o consumidor. O benefício percebido pode estar
distribuído entre agricultores, transportadores e consumidores.

Perdas evitados

Quando discutimos a comparação “com” e “sem” verificamos que em alguns


projectos os benefícios podem provir não do aumento da produção, mas da perda
evitada. Nem sempre este tipo de benefícios é óbvio, mas ele é um dos que podem ser
claramente evidenciados pelo teste “com” e “sem” o projecto. Por vezes um projecto
aumenta a produção através da redução de perdas.

Outro tipo de benefícios tangíveis

Os projectos de desenvolvimento agrário têm outros tipos de benefícios tangíveis,


directos, a maior parte das vezes em sectores diferentes da agricultura. Por exemplo,
nos projectos de transporte associados ao desenvolvimento agrário, os benefícios
provêm não só da redução de custos como também da poupança do tempo, da

26
redução de acidentes, ou do desenvolvimento de actividades em novas áreas
acessíveis para o mercado.

Custos e benefícios secundários

Os projectos podem levar a benefícios criados ou custos incorridos fora do próprio


projecto. A análise económica deve ter em conta estes custos e benefícios externos, ou
secundários, de modo a atribuí-los devidamente ao investimento do projecto. Isto se
aplica apenas na análise económica, e não na análise financeira. Ao usar preços de
mercado na análise económica é necessário estimar os custos e benefícios
secundários e adicioná-los aos custos e benefícios directos. Este processo é
teoricamente difícil e facilmente sujeito a abuso. A maior parte das análises de
projectos realizadas por agências internacionais, no sistema baseado em preços
sombra proposto pela literatura mais recente sobre análise de projectos, e no sistema
analítico aqui apresentado, em vez de adicionar os custos e benefícios secundários
ajustam-se os valores usados na análise económica ou incorporam-se os custos e
benefícios secundários na análise, convertendo-os assim em custos e benefícios
directos. A incorporação dos custos e benefícios secundários na análise do projecto
pode ser encarada como um recurso analítico para contabilizar o valor acrescido
gerado fora do projecto, mas que resulta do investimento do projecto. No sistema
analítico que vamos utilizar todos os itens são valorados ou no seu custo
oportunidade ou no valor determinado pela vontade do consumidor pagar por ele
(willingness to pay). O efeito é eliminar todas as transferências e desta forma atribuir
ao investimento do projecto todo o valor acrescentado que dele provém, esteja ele
onde estiver, na sociedade. Assim não se torna necessário adicionar os custos e
benefícios secundários separadamente. Fazê-lo seria duplicar a contabilização.

Apesar do uso de preços sombra baseados em custos oportunidade ou em vontade de


pagar (willingness to pay) reduzir grandemente a dificuldade de lidar com custos e
benefícios secundários, ainda subsistem muitos problemas de valoração relacionados
com bens e serviços não frequentemente comercializados em mercados competitivos.
Uma forma de evitar alguns desses problemas é tratar um grupo de investimentos
muito relacionados como um único projecto. Por exemplo, é frequente considerar o
resultado (output) de um projecto de irrigação como o aumento da produção agrária,
uma vez que é difícil valorizar a água da irrigação.

Outro grupo de custos secundários é o chamado “technological spillover” ou


“externalidades tecnológicas”. Um exemplo comum é o efeito ecológico adverso.
Outro exemplo é o efeito secundário do desenvolvimento da irrigação (redução do
caudal de água a jusante, redução da pesca, aumento de doenças de água, etc.). Se
estas externalidades tecnológicas forem significativas e poderem ser valoradas,
deverão ser tratadas como custos directos do projecto.

27
Custos e benefícios intangíveis

Quase todos os projectos agrários têm custos e benefícios intangíveis, tais como
criação de novas oportunidades de emprego, melhor saúde e redução de mortalidade
infantil, melhor nutrição. Tais benefícios intangíveis são reais e reflectem valores
verdadeiros, embora não se prestem à valorização. Porque os benefícios intangíveis
contam para a selecção do projecto, é importante que sejam cuidadosamente
identificados e, sempre que possível, quantificados, mesmo que a sua valoração seja
impossível. Por exemplo, quantas crianças se irão matricular na nova escola? Quantas
casas irão beneficiar de um melhor sistema de fornecimento da água? Quantas
crianças serão salvas por causa de mais clínicas rurais?

Na maior parte dos casos de benefícios intangíveis provenientes de projectos agrários,


os custos são suficientemente tangíveis: custos de construção de uma escola, salários
de enfermeiras num sistema de saúde público, tubagem para o fornecimento de água
rural, etc.. No entanto, existem custos intangíveis nos projectos. Incorre-se em tais
custos quando novos projectos quebram os padrões tradicionais da vida familiar,
quando o desenvolvimento leva a um aumento da poluição, quando o balanço
ecológico é perturbado, quando valores são perdidos. Embora seja impossível a sua
valoração, os custos intangíveis devem ser cuidadosamente identificados e se possível,
quantificados. De facto, todas as decisões do projecto devem ter em conta os factores
intangíveis através de uma avaliação subjectiva porque os custos intangíveis podem
ser significativos e porque os benefícios intangíveis podem fazer uma contribuição
importante para muitos dos objectivos do desenvolvimento rural.

Valoração dos custos e benefícios do projecto

Uma vez identificados os custos e benefícios dos projectos, para compará-los é


necessário atribuir-lhes um valor. Uma vez que a única forma prática de comparar
directamente diferentes bens e serviços é dar a cada um deles um valor monetário,
devemos encontrar o preço apropriado para os custos e benefícios na nossa análise.

28
Preços reflectem valor

Subjacente a toda a análise financeira e económica está a assumpção de que os preços


reflectem valor (ou podem ser ajustados para tal). Como encontrar tais preços?
Comecemos por definir dois conceitos económicos fundamentais para a análise de
projectos: valor do produto marginal e custo oportunidade.

O valor do produto marginal é a receita extra proveniente do aumento em uma


unidade da quantidade de um factor usado, mantendo constante a quantidade de todos
os outros factores. Compensa ao agricultor utilizar o factor apenas até ao ponto em
que o valor do produto marginal é igual ao seu preço de mercado. Assim, o preço de
mercado, é uma estimativa do valor do produto marginal do factor.

É evidente que a quantidade óptima de factor muda se o preço deste mudar, quando
comparado ao preço do produto. Se o preço relativo do factor aumentar, o agricultor
responderá reduzindo a quantidade do factor que utiliza, aumentando assim o valor do
seu produto marginal (reduz a quantidade total do factor e o valor da produção) até
que o valor do produto marginal do factor seja de novo igual ao seu preço.

Custo oportunidade é o benefício perdido por usar um recurso escasso para um


propósito em vez do seu melhor uso alternativo. Por outras palavras, custo
oportunidade é o retorno que um recurso pode trazer no seu próximo melhor uso
alternativo.

No caso do recurso escasso ser aplicado na produção de mais de uma cultura, o nível
óptimo da sua aplicação será o ponto em que o valor do produto marginal do factor
em cada cultura será igual.

Este princípio é válido quer para o agricultor individual quer para a economia como
um todo. Num mercado de competição perfeita, deve-se atribuir o preço de todos os
bens económicos de acordo com o valor do seu produto marginal. De facto, os
agricultores utilizarão os factores até ao ponto em que o valor do seu produto
marginal é igual ao seu preço, e o mesmo acontecerá com todos os outros items na
economia. Por outras palavras, o preço de todos os bens e serviços será exactamente
igual ao valor que a última unidade utilizada contribui para a produção, ou o valor em
uso do item para o consumo é exactamente igual ao valor com que ele contribuiria
para a produção adicional. Se uma unidade de bem ou serviço pudesse produzir mais
ou trazer maior satisfação numa actividade diferente do seu presente uso, alguém
poderia querer elevar o seu preço, e seria atraído pelo novo uso. Quando este sistema
de preços está em “equilíbrio”, o valor do produto marginal, o custo oportunidade, e

29
o preço serão iguais. Então os recursos terão sido alocados através do mecanismo de
preço de tal modo que a última unidade de todo o bem e serviço na economia está no
seu uso mais produtivo ou melhor uso de consumo. Nenhuma transferência de
recursos poderia resultar em maior “output” ou mais satisfação.

Que implicações tem para os projectos agrários a assumpção de que os preços


reflectem valores? Como se sabe, os mercados não são perfeitos e nunca estão em
equilíbrio perfeito. Portanto, os preços reflectem o valor apenas de forma imperfeita.
Mesmo assim, esta teoria dos preços baseada no modelo de mercado perfeito é
bastante fidedigna. Em geral, a melhor aproximação do “verdadeiro valor” de um
bem ou serviço adquirido e vendido de forma ampla e honesta é o seu preço de
mercado. Alguém na economia está querendo pagar este preço. Pode-se presumir que
este comprador irá usar o item para aumentar a produção no mínimo por tanto quanto
o seu preço, ou que ele está querendo trocar algo de valor igual ao preço para ganhar a
satisfação de consumir o item. Portanto, o preço de mercado de um item é
normalmente a melhor estimativa do valor do seu produto marginal e do seu custo
oportunidade, e na maior parte das vezes será o melhor preço para usar ao valorizar
quer um custo quer um benefício. Como já se viu, na análise financeira sempre se usa
o preço de mercado. No entanto, na análise económica um outro preço (como o preço
sombra) pode ser um melhor indicador do valor de um bem ou serviço, isto é, a
melhor estimativa do seu verdadeiro custo oportunidade para a economia. Aliás,
quando na análise económica são usados preços diferentes dos preços de mercado, o
fardo da prova recai sobre o analista.

A estimação do preço de mercado

A análise de projectos é tipicamente construída identificando em primeiro lugar os


inputs e os outputs técnicos para o proposto investimento. Depois se valoriza os
inputs e os outputs ao preço do mercado para construir as contas financeiras. Por
último ajustam-se os preços financeiros para melhor reflectirem os valores
económicos.

Para estimar os preços o analista deve ir ao mercado. Deve perguntar o preço actual
em transacções recentes e consultar muitas fontes: agricultores, pequenos
comerciantes, importadores e exportadores, extensionistas, pessoal dos serviços
técnicos, especialistas e estatísticos governamentais de mercado, estatísticas públicas
e privadas sobre preços de mercados nacionais e internacionais. A partir destas fontes
o analista deve chegar a um número que adequadamente reflicta o preço corrente de
cada input ou output no projecto.

30
Ponto da primeira venda e preço à porta da machamba

Na análise de projectos uma boa regra para determinar o preço de mercado para
bens agrários produzidos no projecto é procurar o preço no “ponto de primeira
venda”. Se este ponto está num mercado relativamente competitivo, o preço a que o
bem é vendido nesse mercado será provavelmente uma estimativa relativamente boa
do seu valor quer em termos económicos quer em termos financeiros. Se o mercado
não é razoavelmente competitivo, na análise económica o preço financeiro poderá ter
de ser melhor ajustado para reflectir o custo oportunidade ou valor no uso do bem.

Para muitos produtos agrários em que o objectivo é aumentar a produção de um bem,


o melhor ponto da primeira venda a considerar é a fronteira da machamba. Assim se
tem o que o agricultor recebe quando vende o seu produto, o preço “à porta da
machamba”. Habitualmente o preço do ponto de primeira venda pode ser aceite como
o preço “à porta da machamba”, mesmo que tal ponto esteja no mercado da aldeia
vizinha e o agricultor ganhe alguma taxa por transportar o produto da machamba
para o mercado.

O preço à porta da machamba é geralmente o melhor preço a que se deve valorar a


produção consumida pela família produtora. No entanto, quando há distorções do
mercado devidas, por exemplo, à aplicação de taxas (impostos) pelo governo, tal
preço pode ser um pobre indicador do verdadeiro custo oportunidade que se pretende
usar na análise económica. Nesse caso, quando o bem é transaccionado, o seu valor
económico deverá ser considerado mais alto que o actual preço à porta da machamba,
e tal distorção do preço deverá ser corrigida na análise económica. Na presença de
subsídios ocorre precisamente o oposto: parte do preço não reflecte exactamente o
valor económico do produto (o seu custo se pudesse ser importado), mas sim uma
transferência indirecta de renda para os pequenos agricultores. Esta distorção de preço
deverá ser também corrigida na análise económica.

Estimação do preço dos bens intermediários

Ao enfatizar o ponto da primeira venda como o ponto de partida para a valoração do


output dos projectos, está-se a dizer implicitamente que se deve evitar nas análises
preços imputados para bens intermediários. Recorde-se que um bem intermediário é
um bem produzido principalmente para ser usado como um factor na produção de
outro bem. Se um bem intermediário não é livremente comercializado num mercado
competitivo, não se pode esperar um preço estabelecido por uma série de transacções
competitivas. O analista deve evitar valorá-lo. Em vez disso, o analista deve tratar
toda a farma como unidade e valorar o bem final no seu primeiro ponto de venda. O

31
tratamento de produtos intermédios varia de projecto para projecto, de acordo com as
estruturas peculiares de marketing. Para evitar a maior parte dos problemas que
podem ser introduzidos por tentar imputar valores para os produtos intermediários, as
contas financeiras nos projectos agrários se baseiam em orçamentos para toda a farma
em vez de orçamentos para actividades individuais na farma.

Um bem intermediário que se encontra com frequência nos projectos agrários é a água
de rega. O “produto” de um sistema de água de rega é, sem dúvida, destinado a
produzir bens agrários. O preço que os agricultores são cobrados pela água é
geralmente determinado administrativamente, e não por algum jogo de forças de
mercado competitivo. Se o analista tentar separar o sistema de irrigação da produção
que ele torna possível, ele irá encarar uma tarefa quase impossível de determinar o
valor da água de rega. Assim, não surpreende que a análise económica da maioria dos
projectos de rega tome como a base para o rol de benefícios o valor dos produtos
agrários que são oferecidos num mercado relativamente livre no ponto de primeira
venda.

Outros problemas na busca de preços de mercado

Ocorre com frequência enorme confusão ao determinar os valores de dois importantes


inputs nos projectos agrários, a terra e a força de trabalho. Isto acontece em primeiro
lugar quando a análise se desloca das contas financeiras do projecto para a análise
económica. Nas contas preparadas para a análise financeira, o tratamento do preço
da terra e da força de trabalho é bastante directo: o preço usado é o preço
actualmente pago. Na análise financeira não se questiona se é um “bom” preço em
termos económicos.

Se as contas da farma são produzidas numa base “com” e “sem” como anteriormente
visto, nos casos em que o projecto envolve apenas uma mudança de padrão de cultura
(por exemplo, uma alteração de pastagem para mapira irrigada), o custo da terra
(neste caso um custo oportunidade) não precisa de ser considerado separadamente por
causa da forma da conta. Quando o benefício líquido sem o projecto é subtraído do
benefício líquido com o projecto, a contribuição da terra para o velho padrão de
cultura é também subtraída e apenas resta o valor incremental.

Ao valorar a força de trabalho para as contas da análise financeira, de novo o


problema surge quando as contas financeiras são ajustadas para reflectir valores
económicos. Para a análise financeira, o analista considera o valor actualmente
pago para a força de trabalho contratada, quer em troca de salário quer de bens, nos
orçamentos da farma ou contas do projecto. A força de trabalho familiar é tratada de
forma diferente. Não entra como um custo; em vez disso, o “salário” para a família

32
torna-se uma parte do benefício líquido. Assim, se o projecto incrementa o benefício
líquido, de facto ele também incrementa a renda da família ou “salário” para a sua
força de trabalho. Mais uma vez, seguindo o formato de que se falou anteriormente, a
conta irá automaticamente valorar a força de trabalho familiar ao seu custo
oportunidade, e o benefício líquido incremental irá reflectir qualquer retorno
acrescido que a família irá receber pela sua força de trabalho.

Os preços para os bens agrários estão geralmente sujeitos a substancial fluctuação


sazonal. Sendo assim, deve-se tomar alguma decisão sobre o ponto no ciclo sazonal
em que escolher o preço a ser usado para a análise. Um bom ponto de partida é o
“preço à porta da machamba” no pico da época de colheita. Este será provavelmente
o preço mais baixo do ciclo. Esta escolha se deve ao facto de a subida do preço
durante o ciclo se dever, pelo menos em parte, não às actividades de produção do
agricultor, mas aos serviços de marketing embutidos na armazenagem da produção até
ao momento da sua disponibilização ao consumidor. No entanto, sendo os mercados
como são, deve haver um elemento de imperfeição no nível de preço da colheita. Os
canais de mercado podem ficar tão congestionados que os comerciantes tentem
activamente desencorajar os agricultores de trazer imediatamente os seus produtos ao
mercado, oferecendo um preço que os próprios comerciantes considerem demasiado
baixo. Além disso, a necessidade de vender de imediato para pagar dívidas contraídas
pode forçar os agricultores a oferecer os seus produtos apesar desta penalização de
preços artificialmente baixos. No entanto, por vezes se escolhe um preço mais alto
que o “preço à porta da machamba” na época da colheita. Neste caso, é necessário
justificar a escolha deste preço como sendo mais válido que o preço mais baixo da
época. Uma forma de resolver este problema é incluir uma componente de crédito no
desenho do projecto. Isto permitirá ao agricultor manter o seu produto fora do
mercado até que o preço suba, e dispor ao mesmo tempo de dinheiro suficiente para
satisfazer as suas obrigações monetárias e as despesas familiares. A componente de
crédito deve também incluir crédito para a construção de armazém na machamba,
para que o agricultor tenha um lugar seguro para armazenar a sua produção até que
decida comercializá-la a um melhor preço.

É certo que os preços variam com o padrão do produto. Assim, escolher o preço
apropriado para a análise do projecto pode envolver tomar algumas decisões sobre a
qualidade do produto. Pode-se assumir que duma maneira geral os agricultores irão
produzir no futuro maioritariamente a mesma qualidade que produziram no passado e
irão comercializar o seu produto não padronizado. Em muitos projectos agrários,
aliás, o objectivo é melhorar a qualidade da produção bem como aumentar a
produção total. Nestes casos, o preço apropriado a escolher será o preço médio
esperado para a qualidade a ser produzida.

Um problema especial ocorre ao atribuir preço às casas. Se o investimento do


projecto inclui a construção de casas, como acontece num projecto de reassentamento,

33
um dos benefícios que provêm do investimento é o valor da renda da casa. Uma vez
que o valor da renda é geralmente um valor imputado mais do que o preço real do
mercado, deve-se ter cuidado ao determiná-lo. Não se deve permitir maior valor de
renda do que seria normalmente pago por uma prospectiva família proprietária. Nem
se deve permitir uma renda maior do que seria de esperar que a família pagasse para
uma casa equiparada na vizinhança ou algures em área semelhante, se o novo
assentamento estiver em local distante. Em particular, deve se evitar a tentação de
tomar como valor da renda alguma proporção arbitrária do custo da casa.

Preço da fronteira do projecto

Os preços usados na análise de projectos não são necessariamente preços “à porta da


machamba”. O conceito de preço “à porta da machamba” deve ser expandido para
preço “à fronteira do projecto” se o projecto tem uma componente de marketing ou
se é um projecto de puro marketing. Muitos projectos têm uma componente de
marketing, talvez porque não existe canal competitivo que alcance o nível da “porta
da machamba” para o produto não processado. Nestes projectos, há que se considerar
tanto o preço “à porta da machamba” (no qual se baseia a estimativa do benefício
líquido do agricultor) como o preço a que é vendido o produto processado no mercado
(depois de ser manuseado nas instalações financiadas pelo projecto). Por exemplo,
num projecto para a construção de uma barragem para regar a cultura de algodão que
é processado em instalações construídas pelo projecto, o analista se interessa pelo
preço do algodão pago ao agricultor para calcular a renda deste. No entanto, este
preço é fixado administrativamente, e não pode ser usado na análise económica do
projecto. Assim, o analista também se interessa pelo preço do algodão processado
porque este é o primeiro produto que o projecto vai vender num mercado
relativamente competitivo. Neste caso, o ponto de primeira venda é FOB (free on
board - isto é, no porão do barco do porto de exportação), e este preço se torna a
base para o fluxo de benefícios.

Estimativa de preços futuros

A análise de projecto consiste em avaliar futuros retornos de investimentos. Por isso,


o analista avalia como serão os futuros preços. Não existem modelos matemáticos
para isso. Ele deve avaliar tomando em conta todos os factos que encontrar, bem
como as opiniões de entidades respeitáveis e tirar conclusões.

Até aqui discutimos como estimar os preços de mercado, e é por estes preços que
vamos começar. A melhor estimativa inicial de preços futuros é que eles irão manter
as relações presentes, ou talvez, as relações médias construídas nos últimos anos. No

34
entanto, há que pensar que estas relações médias poderão mudar no futuro e como se
irá lidar com um aumento geral do nível de preços devido à inflação.

Mudanças nos preços relativos

Na análise financeira, uma mudança nos preços relativos significa mudança na


estrutura de preços de mercado que os produtores irão encarar quer nos factores de
produção quer nos produtos. Esta mudança se reflecte directamente nas contas
financeiras do projecto.

A mudança no preço relativo de um item implica uma mudança na sua produtividade


marginal, isto é, uma mudança no valor marginal do seu produto ou uma mudança
na sua contribuição para a satisfação, quando consumido. Na análise económica
onde o objectivo é a maximização da renda nacional, uma mudança no preço relativo
de um factor implica uma mudança na quantidade que se deve prescindir ao usar o
item no projecto em vez de o usar em algum outro lugar na economia. É, portanto,
uma mudança na contribuição que o produto faz à renda nacional. Portanto, a
mudança nos preços relativos tem um efeito real nos objectivos do projecto e deve ser
reflectida nas contas do projecto nos anos em que tais mudanças são esperadas.

Inflação

Nenhum analista de projectos pode evitar a decisão de como lidar com a inflação na
sua análise. A abordagem tomada na maior parte das vezes é fazer a análise do
projecto a preços constantes. O analista assume que o nível corrente de preços irá
prevalecer no futuro. Assume que a inflação irá afectar de igual forma a maior parte
dos preços de modo que os preços retenham as mesmas relações gerais entre eles.
Trabalhar a preços constantes é mais simples e envolve menos cálculos do que
trabalhar a preços correntes. Para preços correntes, todas as entradas têm de ser
ajustadas para mudanças antecipadas no nível geral de preços.

Mesmo quando se usam preços constantes na abordagem mais convencional da


análise de projectos, deve se incluir quer na análise quer como um memorandum
separado, uma tabela com a estimativa do efeito orçamental em termos correntes que
irá prevalecer pelo menos durante a fase do investimento. Deverá alistar em preços
correntes as necessidades de moeda doméstica, a moeda externa requerida, e os
subsídios.

35
Preços para bens comercializados internacionalmente

Para bens que entram de forma significativa no comércio internacional, quer sejam
factores quer sejam produtos, o analista de projectos obtém habitualmente a
informação sobre preços de vários grupos de especialistas que acompanham a
tendência dos preços e fazem projecções sobre preços relativos no futuro. Em muitos
países em que as exportações agrárias são importantes, há grupos no ministério da
agricultura ou no ministério das finanças cuja ajuda deve ser solicitada. Há também
muitas organizações internacionais tais como o Banco Mundial e a FAO, e grupos de
comércio a quem o analista pode pedir ajuda. Uma lista detalhada de fontes de
informação sobre preços do mundo (Sources of Information on World Prices) está
disponível no Banco Mundial (WOO 1982).

Preço financeiro de paridade para exportação e importação

Em projectos que produzem um bem significante no comércio internacional, a


estimativa de preços é muitas vezes baseada em projecções de preços num ponto
distante no exterior. Então o analista deve calcular o preço apropriado para utilizar
nas contas do projecto, quer “à porta da machamba” quer na “fronteira do
projecto”.

Se os preços “à boca da machamba” ou na fronteira do projecto para os produtos


internacionalmente comercializados no projecto já são conhecidos e os preços no
país em análise tendem a seguir os preços do mercado mundial, os preços ‘à boca da
machamba” devem ser ajustados pelo mesmo valor relativo indicado, ou seja, pela
tendência média projetada nos preços relativos futuros fornecidos por uma ou outra
organização internacional. Além disso, na análise financeira, se o preço “à boca da
machamba” é fixado administrativamente e não é permitido ajustar livremente aos
preços mundiais, o preço relevante a utilizar é o preço fixado administrativamente.

Ajustar simplesmente os preços domésticos pelo mesmo valor relativo que os preços
estrangeiros geralmente resulta em números muito imprecisos para a análise do
projeto. A abordagem ignora o facto de que as margens de comercialização no
comércio de bens tendem a ser menos flexíveis do que os preços dos próprios bens.
Há também muitos casos na estimação do valor económico de uma mercadoria
comercializada que envolvem a derivação de um preço sombra baseado em preços
internacionais. Nesses casos, é necessário calcular os preços de paridade de
exportação ou de importação. Estes são os preços estimados “à porta da machamba”
ou na fronteira do projeto, os quais são derivados ajustando-se os preços c.i.f. ("cost,
insurance and freight" = custo, seguro e frete) ou f.o.b. ("free on board" = livre a bordo)
por todos os encargos relevantes entre “a porta da machamba” e na fronteira do

36
projecto e o ponto em que o preço c.i.f. ou f.o.b. é cotado. Os elementos comumente
incluídos nos preços c.i.f. e f.o.b. são apresentados na tabela seguinte:
Tabela 1: Elementos do C.I.F. (cost, insurance and freight) e do F.O.B. (free on board)
ITEM ELEMENTO
CIF Inclui:
 Custo FOB no ponto de exportação
 Custo do frete para o ponto de importação
 Custo dos seguros
 Descarga do navio para o cais do porto

Exclui:
 Direitos de importação e subsídios
 Encargos portuários no porto de entrada (impostos, manuseio,
armazenamento, taxas de agentes e similares)
FOB Inclui:
 Todos os custos para ter as mercadorias a bordo - mas ainda no porto
do país exportador:
 Custos locais de marketing e transporte
 As taxas portuárias locais, incluindo impostos, armazenagem,
carregamento, fumigação, honorários de agentes e similares
 Impostos e subsídios à exportação
 Preço na fronteira do projeto
 Preço à porta da machamba

Um caso comum para o qual um preço de paridade de exportação deve ser calculado
é o de uma mercadoria produzida para um mercado externo. A Tabela 3-3 dá-nos um
exemplo. Mostra os elementos generalizados para calcular os preços de paridade das
exportações. A mesma metodologia pode ser aplicada em outros casos.

Tomemos como exemplo um projecto hipotético designado FacAgro localizado em


Chókwè que inclui uma unidade de processamento de algodão. Esta unidade produz
fibra e semente de algodão para a exportação, e resíduo, um subproduto de fibra muito
curta não adequado para a exportação e vendido localmente. O analista precisa de três
preços (um para cada produto).

Para as estimativas de fibra e sementes, ele começa com as previsões dos preços
correntes c.i.f. de 1980 em Liverpool, disponíveis nas publicações do Banco Mundial.
Deduz destes preços c.i.f. o seguro, o frete marítimo, os direitos de exportação, os

37
custos de manuseamento portuária e o frete ferroviário da unidade de processamento
no local do projeto para o porto de Maputo, obtendo assim os preços de paridade das
exportações na fronteira do projeto: 178.650 MT para a fibra e l8.097 MT para as
sementes. O preço para o resíduo, que não é exportado, foi baseado no preço
doméstico prevalecente.

Para ilustrar, podemos continuar a calcular o preço de paridade das exportações “na
porta da machamba”, embora no exemplo de Chókwè, onde o preço ao produtor (“a
porta da machamba”) foi fixado administrativamente, esse cálculo não foi feito. Os
cálculos são apresentados na parte da tabela 2 depois da rubrica "Igual ao preço de
paridade de exportação na fronteira do projeto". Aqui surge uma nova questão. Os três
produtos que a unidade de processamento produz, fibra, semente, e resíduo, devem ser
convertidos em seus equivalentes de semente, uma vez que é a semente de algodão
que o agricultor vende.

Para o projecto FacAgro ponderou-se o preço de 83.239 MT para a semente de


algodão usando um rendimento de descaroçamento de 40 por cento de fibra, 59 por
cento de sementes e 1 por cento de resíduo. A partir deste preço ponderado foram
deduzidas as despesas de descaroçamento, de acondicionamento e de armazenagem,
bem como os custos de recolha e transporte da porta da machamba até à unidade
processadora, chegando-se assim ao preço de paridade da exportação “à porta da
machamba” de 66.946 MT.
Valor por tonelada
ETAPA RELEVANTE NO
ETAPA NO CÁLCULO Despe
EXEMPLO DA FacAgro Fibra Semente
rdício
CIF, no ponto da importação CIF Liverpool (tomado
USD USD
como estimativa para todos -
639.330 103.390
os portos europeus)

 Deduzir a descarga no
ponto de importação
 Deduzir frete para o Frete e seguro -39.630 -24.730 -
ponto de importação
 Deduzir o seguro
Igual a FOB no ponto de USD USD
FOB no Porto do Maputo -
exportação 599.700 78.660
 Converter a moeda Converter à taxa oficial de
estrangeira para moeda câmbio de l,00 USD= 63,7 38.200.8 5.010.64
-
nacional à taxa de 90 MT 2 MT
MT
câmbio oficial
 Deduzir tarifas Direitos de exportação - - 63.701 -
1.111.39 MT
 Adicionar subsídios Subsídio (Nenhum)
5 MT

38
 Deduzir as taxas Custos de movimentação do - -
portuárias locais porto
- 354.436
Fibra: 354.436 MT por
- -
tonelada

 Deduzir custos locais de Frete de Chókwè para o


transporte e marketing porto de Maputo a 432.022
do projecto até ao ponto MT por tonelada
- 432.022 -432.022 -
de exportação (se não
for parte do custo do
projecto)

Igual preço de paridade de Preço de paridade de


exportação na fronteira do exportação na unidade de
36.303.0 4.514.91
projecto processamento no local do -
37 MT 9 MT
projecto (fábrica de
processamento em Chókwè)

 Dotação para a Conversão para semente de


conversão (se algodão:
36.303.0 4.514.91 7.019.
necessário)
36.303.037x0,4 37 9 740
+4.514.919x0,59 =14.521.215+2.663.802+70.19
+7.019.740x0,01 a) 7= 17.255.214 MT

 Deduzir custos locais, se Processamento,


não fizerem parte dos enfardamento e -974.546 MT
custos do projecto armazenagem (974.546 MT
(armazenagem, por tonelada)
transporte e
Recolha e transferência
comercialização) -67.776 MT
interna (67.777 MT por
tonelada)
Igual preço de paridade de Preço de paridade de
exportação “à porta da exportação, “à porta da 16.212.892 MT
machamba” machamba”
a) O algodão é convertido em fibra, semente e desperdício a uma taxa de 400 kg, 590 kg e 10 kg por
tonelada, e o desperdício é vendido a 7.019.740 MT a tonelada

Um cálculo semelhante leva ao preço de paridade de importação. A questão aqui é o


preço a que pode ser vendido no mercado doméstico um substituto de importação se
tiver de competir com a importação. A tabela seguinte ilustra este assunto com o
exemplo de um projecto hipotético de produção de milho em Chókwè. O mesmo
exemplo é apresentado em forma de diagrama na figura que segue. A Moçambique é
um importador líquido de milho, e o projecto deve produzir milho para o consumo
doméstico para substituir o milho importado. Começamos com o preço f.o.b. no ponto
de exportação (neste caso, porto dos EUA no Golfo de México) extraído das
estimativas de bens do Banco Mundial. Adiciona-se a este o frete e o seguro para
obter o preço c.i.f. no porto de Maputo, em Moçambique. Então adicionamos

39
quaisquer tarifas e subsídios (neste caso não há nenhum); adicionam-se os encargos
portuários devidos ao porto local, fumigação, manuseio e outros; acrescenta-se de
seguida o transporte local para o mercado relevante dentro do país. O resultado é o
preço a grosso do milho importado. É o preço a grosso do milho no mercado dentro
do país que é ponto focal do nosso cálculo. A alternativa para a produção do projecto
é não importar o milho e transportá-lo para a área do projecto. De outro modo, a
alternativa será importá-lo e comercializá-lo directamente no mercado do interior do
país. Assim o preço que o agricultor pode esperar receber na ausência de tarifas,
subsídios, ou proibição de importação é o preço a grosso menos o custo de
movimentar o milho para o mercado. Se o projecto incluiu facilidades de
processamento, então o preço relevante na fronteira do projecto será este preço a
grosso menos os custos de manuseio da facilidade de processamento para o mercado
grossista. Não foi incluída no projecto nenhuma facilidade de processamento. Assim,
o preço de paridade de importação é o preço “à porta da machamba”. À medida que
retrocedemos do mercado grossista para a “porta da machamba”, teremos que
providenciar alguma dotação para a conversão. Neste caso não é necessária nenhuma,
uma vez que se assume que o agricultor irá vender milho encaroçado. Então, do preço
a grosso se deduzem os custos locais de comercialização, incluindo acumulação,
sacos, e margens intermediárias, transporte da machamba para o mercado, e perdas
por armazenamento, obtendo assim o preço de paridade de importação “à porta da
machamba” de 9.300 MT. Este é o preço máximo que o agricultor pode esperar
receber na ausência de tarifas, subsídios ou proibição de importação.

Figura: preço financeiro de paridade de importação de milho para o Projecto Central


de Desenvolvimento Agrário, Nigéria
Etapas no cálculo Etapas relevantes no exemplo do Valor por
Milho tonelada
F.O.B. no ponto de F.O.B. no porto no Golfo dos EUA USD 116
exportação (milho amarelo no 2 dos EUA, a
granel)
Adicione:
 Frete para o porto de Frete e seguro 31
importação
 Descarga no porto de
importação
(incluídos na estimativa do frete)
 Seguro
Igual C.I.F no ponto de
importação C.I.F Maputo USD 147
Convertido à taxa de câmbio oficial
 Converter a moeda 9.364 MT
de 1USD = 63,7 MT
estrangeira em moeda
doméstica, à taxa de

40
câmbio oficial
 Adicionar tarifas (nenhuma)
 Deduzir subsídios (nenhum)
 Adicionar encargos Encargos terrestres e de porto 1.401
do porto local (incluindo custo de sacos)

 Adicionar custos de Transporte 1.147


transporte local e
comercialização até
ao mercado relevante
Igual ao preço de mercado Preço a grosso 11.912 MT
Dotação para a conversão
(se necessário) Não necessário

Deduzir custos de Comercialização primária (inclui


transporte local e acumulação, custo de sacos, e -892
comercialização para o margens intermediárias)
mercado relevante

Transporte
- 1.147

Deduzir custos de
armazenagem local, Perdas por armazenagem (10 -573
transporte e porcento do peso armazenado)
comercialização (se não
fizerem parte dos custos
do projecto)
Igual preço de paridade de Preço de paridade de importação “à
importação “à porta da porta da machamba” 9.300 MT
machamba”

41
Figura: Diagrama da derivação do preço de paridade de importação do milho,
Projecto Central de Desenvolvimento Agrário, Chókwè, Moçambique:

Preço grossista
no mercado interior

11.912
Transporte para MT

o mercado do interior + 1.147

Encargos do porto local + 1.401 - 892 Comercialização primária

(Preço convertido à taxa de Câmbio - 1.147 Transporte


Oficial) de 1USD = 63.7 MT do projecto para o mercado
9.364 MT
C.I.F. Maputo USD 147

- 573 Perdas no armazém


Frete e seguros + USD 31

USD 116 9.300


MT

F.O.B. Portos do Preço de paridade


Golfo EUA de importação “à
Porta da machamba”

42
ii. Análise financeira:
a) Orçamento da empresa agrária

A análise financeira de um projecto é necessária para avaliar os efeitos financeiros


do projecto em cada um dos seus vários participantes. Nesta unidade se fará a análise
financeira ao nível da machamba, através do cálculo dos orçamentos da machamba.
Estes são importantes porque:
 Mostram se os retornos financeiros são satisfatórios para o agricultor
 Os dados dos orçamentos de um ou mais tipos de modelos ou padrões de
machamba são agregados para dar os custos e benefícios agrários para o
projecto como um todo.

Assim, os dados do orçamento da machamba fornecem a matéria prima para a análise


financeira do projecto em si e dos seus efeitos nas receitas e despesas do governo. Os
dados são também ajustados para valores económicos para efeitos de análise
económica do projecto.

Pretende-se nesta unidade


 Explicar os objectivos da análise financeira do projecto
 Apresentar os métodos de preparação de orçamentos completos da machamba,
usados para determinar os efeitos de um projecto de investimento ou intervenção
na machamba como um todo
 Apresentar os métodos de preparação de orçamentos parciais da machamba que
podem ser usados para medir os efeitos da mudança em um ou mais
empreendimentos ou partes da machamba.

Aprender-se-à
 A necessidade de diferentes tipos de análises financeiras e os seus objectivos
 Como preparar orçamentos completos da machamba para machambas padrão
 O propósito de analisar alterações menores numa machamba e como preparar
orçamentos parciais.

43
1. Introdução

É importante diferenciar a análise financeira da análise económica. Enquanto a


primeira avalia os efeitos financeiros de um projecto para cada um dos vários
participantes, a segunda avalia o projecto do ponto de vista da economia nacional ou
da sociedade como um todo.

Na análise financeira de projectos agrários há geralmente três grupos principais a


considerar:
 Os beneficiários directos
 As agências do projecto
 O governo

Beneficiários directos do projecto


São geralmente as famílias agrárias. São tipicamente pobres e operam em condições
de considerável risco. É particularmente importante uma planificação financeira
cuidadosa a nível da machamba. Para encorajá-los a participar no projecto, é
essencial ter incentivos em quantidade e confiabilidade, sobretudo quando se inclui a
compra de novos factores adicionais, talvez com crédito, e a adopção de novas
tecnologias.

São necessários orçamentos projectados da machamba para um modelo ou padrão de


machambas para avaliar o fluxo de entradas de caixa para o agricultor para garantir
que irá cobrir os custos dos factores e qualquer reembolso de crédito, sobretudo nos
primeiros anos da vida do projecto.

Os incentivos de caixa esperados devem também premiar o suficiente a família


agricultora para os seus inputs adicionais de trabalho, gestão e capital, e compensá-la
por algum risco adicional resultante das mudanças ou inovações introduzidas pelo
projecto.

Se o projecto estimular produção incremental que é directamente consumida pela


família, deve-se avaliar a sua quantidade e valor e converter em equivalente de caixa.

É também importante na preparação do projecto e desenho das fases, a análise das


rendas da machamba projectadas, por exemplo, no desenho de esquemas de crédito
rural, para determinar as condições em que o empréstimo deve ser feito. Ajudará

44
também na planificação e avaliação de políticas sobre para onde devem ser orientados
os benefícios e certos subsídios do projecto.

Agências do projecto

É o segundo grupo para quem os efeitos financeiros do projecto devem ser


determinados. Estabelecer o capital e os custos recorrentes projectados e qualquer
receita esperada é essencial para o desenho, planificação e operação do projecto. A
primeira preocupação para este tipo de análise financeira é assegurar fundos
adequados para realizar o projecto até ao fim.

Pode se decidir que uma parte apropriada dos custos seja recuperada dos
beneficiários ou utilizadores através de um sistema de preços ou pagamentos. Esta
recuperação de custos é importante para aliviar o fardo do orçamento do governo ou
para ajudar a financiar investimentos posteriores pela agência patrocinadora.

Onde se deve cobrar aos utilizadores pelo uso dos serviços do projecto deve se
estabelecer o nível de taxa apropriado. A fixação desta e do melhor método da sua
cobrança realça a importância da análise financeira a nível da machamba para indicar
o que os agricultores devem ser capazes de pagar, ou, mais importante, devem estar
dispostos a pagar.

Se a autoridade do projecto não se financia a partir da receita, devem ser tomadas


providências para assegurar que uma alocação orçamental adequada seja feita a partir
de fundos centrais para a reposição de equipamento capital (se apropriado), e para
pagar os custos anuais recorrentes.

A viabilidade financeira de outras instituições e organizações que fazem parte do


projecto ou são por ele afectados devem também ser estabelecidos, por exemplo,
bancos de crédito agrário, conselhos de comercialização (marketing boards) ou
cooperativas, organizações de agricultores e indústrias de processamento de produtos
agrários.

Orçamentos do governo

As receitas e as despesas do governo com o projecto devem ser explicitamente


descritos, e requer-se que qualquer doação ou subsídio seja plenamente explicado e

45
justificado, juntamente com qualquer aumento de receita de imposto ou necessidade
de qualquer empréstimo público adicional associado com o projecto.

O Factor de Recuperação de Custo, isto é, a percentagem a ser recuperada do capital


e custos recorrentes financiados pelo governo, devem estar claros. Para projectos que
têm grandes benefícios sociais isto deve ser muito baixo, e é essencial que o governo
tenha um conhecimento claro dos compromissos financeiros que devem ser
requeridos para implementar com sucesso o projecto. Inadequados planeamento e
gestão financeiros manifestados pela falha em satisfazer orçamentos de operação
recorrentes e reposição de equipamento, é a causa principal e mais comum de pobre
desempenho de projectos.

Objectivos da Análise Financeira

Na análise financeira de projectos agrários existem seis principais objectivos:


 Avaliação do impacto financeiro
 Avaliação do uso eficiente de recursos
 Avaliação de incentivos
 Provisão de um plano financeiro saudável
 Coordenação das contribuições financeiras
 Avaliação da competência da gestão financeira

Vejamos em que consiste cada um destes objectivos

 Avaliação do impacto financeiro


O objectivo mais importante da análise financeira é avaliar os efeitos financeiros que
o projecto vai ter nos agricultores, nas empresas públicas e privadas, nas agências
operacionais do governo, e em qualquer outra entidade que esteja a participar no
projecto. Esta avaliação se baseia na análise do estatus financeiro de cada participante
e na projecção do seu futuro desempenho financeiro à medida que o projecto é
implementado. São necessárias projecções financeiras detalhadas para esta análise.

 Avaliação do uso eficiente de recursos

46
O retorno geral do projecto e o reembolso de empréstimos concedidos a empresas
individuais são indicadores importantes da eficiência do uso de recursos.
Especialmente para a gestão, o retorno geral é importante porque os gestores devem
trabalhar dentro da moldura de preços de mercado que eles enfrentam. A análise do
investimento agrário e a análise do racio financeiro providenciam as ferramentas para
esta revisão. Os analistas do projecto e outros interessados nas decisões sobre
políticas para o crescimento e desenvolvimento económico nacional deverão olhar
para além da análise financeira a preços de mercado, e avaliar os efeitos do projecto
sobre os recursos reais para a economia como um todo.

 Avaliação de incentivos
A análise financeira é de importância crucial na avaliação de incentivos para os
agricultores, gestores, e proprietários (incluindo governos) que irão participar no
projecto. Terão as famílias agrárias um incremento de renda suficientemente grande
para compensá-los pelo esforço adicional e risco em que irão incorrer? Irão as
empresas do sector privado ganhar retorno suficiente no investimento do seu capital
próprio e recursos emprestados para justificar fazer o investimento que o projecto
requer? Para empresas semi-públicas, o retorno será suficiente para as empresas
manterem a capacidade de auto-financiamento e satisfazerem os objectivos
financeiros estabelecidos pela sociedade?

 Provisão de um plano financeiro saudável


Um objectivo principal da análise financeira é gerar um plano que projecta a situação
financeira e as fontes de fundos dos vários participantes do projecto e do próprio
projecto. O plano financeiro fornece a base para determinar a quantidade e o tempo
do investimento pelos agricultores e para estabelecer os termos de reembolso e
condições para o crédito concedido para apoiar o investimento. Fornece a mesma base
para uma avaliação dos planos de investimento e capacidades de reembolso de dívidas
de empresas públicas e privadas que participam no projecto. Finalmente, para o
projecto como um todo, o plano financeiro é a base para determinar a quantidade e o
tempo de financiamento externo (quer do tesouro nacional ou de fontes internacionais)
e para estabelecer quão rapidamente os recursos emprestados devem ser devolvidos.
O efeito estimado da inflação nas receitas e custos devem ser tomados em conta ao
fazer esta avaliação.

 Coordenação das contribuições financeiras


O plano financeiro permite a coordenação das contribuições financeiras dos vários
participantes no projecto. A coordenação é feita na base de uma projecção financeira
global para o projecto como um todo. Refere-se a questões tais como “se a
disponibilidade de recursos do tesouro ou da agência internacional condiz com as

47
capacidades de investimentos dos agricultores e os fundos disponíveis para o
investimento e despesas operativas assim como com o tempo das despesas para
projectos de investimento tais como vias de acesso e estruturas de rega e para capital
circulante necessário para estoques nas indústrias de processamento e similares.

 Avaliação da competência da gestão financeira


Com base numa projecção do padrão de contas financeiras, especialmente para as
empresas maiores e entidades do projecto, o analista pode formar um juízo acerca da
complexidade da gestão financeira que o projecto irá requerer e a capacidade dos
que irão gerir a implementação do projecto. E desta avaliação, o analista pode então
julgar que mudanças na organização e gestão podem ser necessárias se o projecto
tiver de avançar conforme calendarizado e que treino especializado pode ser
recomendável.

Preparação da análise do investimento da machamba

O ponto de partida tanto para a análise financeira como para a económica de um


projecto agrário é geralmente um grupo de análise de investimentos do padrão ou
modelo de machambas, baseada em orçamentos de padrões de machambas
individuais. Tais orçamentos de padrões de machambas comparam a situação com o
projecto durante a vigência deste, com a situação antecipada sem o projecto.
Habilitam o analista a formar um julgamento são sobre os prováveis benefícios dos
agricultores pela participação no projecto agrário e sobre os incentivos para os
agricultores participarem.

Esta análise é semelhante e por vezes confundida com a análise da gestão da


machamba feita por economistas agrários, que pode ser discriminada em análise da
renda da machamba (farm income analysis) e análise do fluxo de fundos (funds flow
analysis).

A análise da renda da machamba é geralmente usada para avaliar o desempenho da


machamba num determinado ano. O seu objectivo é ajudar a melhorar a gestão da
machamba. Usam-se preços correntes, e se incluem provisões para depreciação para
ter em conta a parte do investimento capital de longo prazo utilizada no ano em
análise. São incluídos os itens que não correspondem a dinheiro físico tais como a
produção caseira consumida e os pagamentos em espécie. São excluídos o dinheiro e
as despesas de fora da machamba porque se espera que o analista avalie apenas o
desempenho da machamba em si. O analista fornece uma estimativa do retorno do
capital investido e da força de trabalho do agricultor, e este deve então ser comparado
com o retorno de um padrão de cultura alternativo ou de oportunidades fora da
machamba.

48
A análise do fluxo de fundos, também designada análise de fontes-e-usos-de-fundos,
é usada para determinar a liquidez do agricultor na análise da situação do seu
crédito. Entram na análise apenas os itens de dinheiro físico, incluindo a compra e
venda de bens de capital. Inclui-se a renda e a despesa fora da machamba, mas não a
produção caseira consumida. A análise mostra o dinheiro vivo disponível para a
família ao longo de um período de tempo.

Por sua vez, faz-se a análise do investimento da machamba para determinar o grau
de atracção de um investimento proposto para os agricultores e para outros
participantes, incluíndo a sociedade como um todo. Projecta-se o efeito de um
determinado investimento sobre a renda da machamba e estima-se o retorno para o
capital envolvido. Segue-se o princípio de análise de fluxo de caixa descontado. A
análise é projectada pelo período da vida útil do investimento. No início da projecção
é mostrado o investimento inicial e no final o valor residual. Em geral a análise é feita
a preços constantes, e é feita uma dotação para a inflação. Inclui-se a renda de fora da
machamba. Embora se use a designação de “fluxo de caixa”, entram na projecção
elementos que não constituem dinheiro vivo, incluindo a produção caseira consumida
e os pagamentos e recebimentos em espécie. Ao fazer a análise do investimento da
machamba, são muitas vezes incorporados alguns elementos da análise do fluxo de
fundos para permitir que o analista avalie a liquidez do agricultor e o uso do seu
crédito.

Devem ser preparados padrões da análise do investimento da machamba que incluem


orçamentos da machamba para quase todos os projectos agrários. Apesar de existirem
análises de projectos agrários que não têm orçamentos das machambas, é cada vez
mais aceite que os orçamentos das machambas são parte extremamente desejável, se
não essencial, da análise de projectos. O rol de benefícios de um projecto agrário pode
ser construído multiplicando simplesmente a área total a plantar pelo rendimento
esperado, tratando essencialmente toda a área como uma machamba não diferenciada.
No entanto, se se fizer apenas isto, esconder-se-à informação crucial sobre os efeitos
do projecto nos agricultores individuais e assentar-se-à em assumpções não
realísticas.

O propósito de preparar uma análise de investimento da machamba para um projecto


não é tomar uma amostra das machambas na área do projecto. Pelo contrário, é
escolher o principal tipo de machambas que se espera que participem e olhar para o
impacto do projecto nelas. Estas análises do investimento da machamba são
geralmente projecções para a vida do projecto, muitas vezes vinte a vinte e cinco anos,
e não para um único ano. O analista quererá analisar o padrão de cultura e talvez
traçar o seu diagrama; determinar a força de trabalho que será necessária se os
agricultores tiverem que participar no projecto e talvez preparar um orçamento mensal
da força de trabalho mostrando as necessidades e a disponibilidade da força de

49
trabalho familiar; olhar para a produção e factores de produção; e, finalmente,
preparar um orçamento da machamba com o detalhe necessário para perceber e
avaliar os efeitos do projecto na renda dos agricultores participantes. A partir daqui o
analista pode avaliar o efeito financeiro do projecto proposto sobre as machambas
típicas, tanto para ajuizar os incentivos pela participação como para determinar se as
políticas nacionais sobre a renda mínima para os participantes estão a ser alcançadas.
As análises do investimento da machamba e os orçamentos da machamba podem de
facto ser preparados para machambas de qualquer tamanho.

Ao considerar pequenas machambas, o analisa considerará de modo particular o efeito


do projecto na renda total da machamba familiar. Os aspectos da pequena machamba
como uma unidade familiar e como uma empresa de negócios devem ser claramente
percebidos e apreciados. Estes aspectos serão diferentes de sociedade para sociedade,
e o analista do projecto tanto deverá conhecer suficientemente bem a sociedade para
antecipar a resposta dos agricultores, como deverá estar informado pelos outros que a
conhecem. Deve avaliar a atitude da família para propor padrões de cultura que
envolvem mais dias de trabalho, para padrões que incrementam a produção de
culturas de rendimento e reduzem a produção de culturas alimentares para níveis
inferiores às necessidades familiares, para padrões que alteram as responsabilidades
de trabalho do homem e da mulher, e para padrões que requerem que a família corra
um considerável risco de mercado. De facto, as famílias são responsivas aos preços,
mas vivem num determinado ambiente cultural e de risco, e o analista de projecto
deve tomar em consideração tal ambiente quando projecta o seu padrão de análises de
investimento da machamba.

Apesar de nos projectos agrários o analista geralmente olhar para o orçamento de


toda a machamba, pode usar a técnica dos orçamentos parciais para realizações que
envolvem apenas uma relativamente pequena mudança na organização da machamba.
Para isso, olha para o custo marginal (incluindo o custo oportunidade) de adicionar
uma actividade de produção e compara-o com o incremento marginal no benefício
que a nova actividade irá trazer. Os orçamentos parciais são uma ferramenta
efectiva para ajudar a procurar a melhor combinação de actividades de produção.

Uma fonte crucial de informação em todos os projectos agrários são os próprios


agricultores. É somente através de entrevistas aos agricultores que o analista de
projectos chega a uma conclusão válida sobre o realismo da sua análise de
investimento da machamba. O analista de projecto quererá entrevistar agricultores
sobre os seus actuais padrões de cultura, necessidades de força de trabalho, uso de
factores de produção, e os preços de mercado que actualmente recebem e pagam.
Quererá ganhar sensibilidade sobre a vontade de o agricultor participar no projecto
caso este prossiga. Muitas vezes acontece que na área do projecto, ou num sítio
semelhante alguns agricultores já estão a usar a nova tecnologia proposta. É
importante que estes agricultores sejam entrevistados para explorar a sua experiência.

50
O analista quererá conhecer os rendimentos que os agricultores alcançam actualmente
com a nova tecnologia, os factores de produção que actualmente utilizam, e os seus
comentários gerais sobre a nova tecnologia e padrão de cultura propostos no projecto.
O analista quererá avaliar as exigências da força de trabalho que os agricultores
acharam necessária para usar a nova tecnologia.

Foi aplicada a programação linear na preparação da análise de projectos agrários,


mas esta não é regularmente utilizada quer pelas agências de planificação nacionais
nem pelas agências internacionais de empréstimos. Há sérias limitações
metodológicas no uso da programação linear para análise de projectos agrários: há
problemas ao lidar com o risco, com as tradições culturais dos agricultores, com a
variabilidade dos solos dentro das machambas, com a disponibilidade da água nas
diferentes áreas da machamba, e outras variações ao nível da machamba. Mesmo
assim, ao preparar um projecto para uma área onde não existe uma experiência
adequada para se confiar nela para formar de forma subjectiva padrões de cultura ou
ao lidar com padrões muito complexos, o analista de projecto pode querer consultar
especialistas em programação linear para assitência.

Em muitos projectos agrários serão suficientes análises de investimentos de uns


poucos padrões de machambas, mas a sua generalização é perigosa. O número de
padrões de análises de machambas depende apenas da complexidade do projecto. O
analista quererá um padrão de análises de investimentos para cada grupo principal
de condições de solo e água na área do projecto e para cada principal diferença no
tamanho de proprietário. Com certeza que cada principal padrão de cultura ou de
criação pecuária irá requerer uma análise de investimento de machamba separada.
Recorde-se que o objectivo é uma indicação do efeito do projecto, não uma espécie de
amostra aleatória rigorosamente desenhada. Na prática, o número de orçamentos de
machamba preparados por qualquer análise de projecto é um compromisso entre a
complexidade do proposto projecto e a disponibilidade de quadros para preparar a
análise do investimento.

b) Finanças do projecto

51
5. AVALIAÇÃO ECONÓMICO-FINANCEIRA DO PROJECTO COM
APLICAÇÃO DE TAXAS DE DESCONTO
i. Análise económica: Valoração dos custos e benefícios

6. O FINANCIAMENTO DO PROJECTO
i. Critérios de investimento: custos e benefícios ao longo do tempo
ii. O risco e a incerteza

7. AVALIAÇÃO DO VALOR SOCIAL DO PROJECTO


8. AVALIAÇÃO DO IMPACTO AMBIENTAL E MEDIDAS DE
MITIGAÇÃO

i. A distribuição dos benefícios do projecto

As técnicas de apreciação económica de projectos estudadas realçam a abordagem


directa da eficiência, visando seleccionar projectos que maximizam a renda nacional.
Esta abordagem implica a estrategia de desenvolvimento de “trickle down”1): a
crença de que o investimento para aumentar o produto, enquanto beneficia
directamente um sector, indústria ou grupo na sociedade, através das ligações de
consumo e de produção na economia também beneficia indirectamente o resto da
sociedade.

1)
a estrategia de desenvolvimento “trickle down” é uma estrategia segundo a qual os mais
pobres beneficiam gradualmente como resultado do aumento do bem-estar dos mais ricos.

De facto, muitas vezes se considera que o efeito “trickle down” na prática não
funciona, uma vez que se passa por cima das secções mais pobres da sociedade, e que
os ricos se tornam mais ricos. Como as políticas macroeconómicas ou fiscais que
redistribuem a renda, por exemplo através dos impostos, são politicamente difíceis de
implementar, fizeram-se tentativas de incorporar medidas para melhorar a distribuição
da renda a nível microeconómico ou de planificação do projecto.

Squire e Van der Tak desenvolveram para o efeito uma metodologia usando os
“preços sociais”, que consideram a incidência, ou distribuição, dos benefícios do
projecto entre investimento e consumo, e entre rico e pobre. Este método é
problemático e raramente é utilizado, devido a dois problemas principais:

52
 É difícil definir exactamente quais são os grupos mais pobres que mais deveriam
beneficiar de qualquer projecto;
 É difícil fazer comparações inter-pessoais da utilidade do consumo marginal, isto
é, decidir quanto um dólar extra é mais valioso para um pobre do que para um
rico.

Tal julgamento é inevitavelmente subjectivo, e portanto os pesos a serem atribuídos


aos benefícios do projecto são também muito subjectivos e objecto de debate. Se se
usam pesos, então se torna necessário que a mesma gama de pesos seja aplicada na
apreciação de todos os projectos na mesma economia para permitir a comparabilidade.
No entanto, se os pesos forem publica e largamente disponibilizados, então estarão
expostos à mesma pressão e interferência política como as outras políticas de renda.

Por último, quase sempre que se experimentou a metodologia constatou-se que tinha
pouco impacto na decisão final do investimento, a menos que o projecto já fosse
marginal no que diz respeito à sua viabilidade económica. Este tipo de projectos seria
provavelmente rejeitado sempre que o risco, a incerteza, e projectos alternativos
fossem considerados.

ii. O ambiente, a sociedade e as políticas

No desenho de projectos há que ter em conta os aspectos ambientais, sociais e


políticos. Nem sempre grandes projectos financiados pelas grandes instituições
financeiras respeitam tais aspectos. O projecto Narmada na Índia, financiado pelo
Bnco Mundial é disso um exemplo. É o maior projecto de desenvolvimento duma
bacia hidrográfica no mundo. É um mega-projecto financiado pelo Banco Mundial,
visando construir no vale Narmada 30 grandes barragens, 135 barragens de tamanho
médio, e 3.000 sistemas de regadio. O seu custo foi avaliado em 16.000 milhões de
libras esterlinas. Prevê desalojar de suas terras mais um milhão de pessoas, na sua
maioria tribais. O projecto é política e economicamente desejável e o Banco Mundial
insiste no seu financiamento, mesmo reconhecendo a devastação ambiental e o
desastre humanitário (miséria e empobrecimento) que irá causar.
A complexidade de um área tão grande e diversa, com uma população tão grande e
tão diversa, está combinada com a complexidade política e administrativa. A área do
projecto abrange três Estados da Índia e envolve um grande número de instituições e
agências locais e estaduais, consultores e pesquisadores independentes, e diferentes
grupos políticos, incluindo os que advogam contra o projecto. O drama humano
reflecte a escala e complexidade acima indicados, e as principais mudanças na vida de
muitas pessoas abrangidas pelo projecto, incluindo reassentamento de grande escala.
As pessoas e organizações preocupadas com os efeitos ambientais e sociais dos danos
e destruições ambientais são contrárias ao projecto. Os ecologistas questionam muitas

53
das noções de “desenvolvimento” aceites e promovidas pelas agências
governamentais e internacionais.

Os críticos do projecto argumentam que o projecto terá efeitos destrutivos na natureza,


nas pessoas, e nas relações entre pessoas e natureza. A seguir se sumarizam as
principais críticas:

 Efeitos destrutivos na natureza


 Submersão de florestas e espécies florestais
 Sobre-exploração comercial de florestas para as indústrias de papel e madeira
 Submersão de terra para agricultura
 Perigo de irrigação de solos aráveis do vale (encharcamento, salinidade)
 Açoreamento de rios
 Implicações geológicas de grandes barragens na área (estimula tremores de
terra)
 Destruição da vida selvagem

 Efeitos destrutivos nas pessoas


 Perda de acesso a terras agrárias e florestas pelos agricultores tribais e mais
pobres
 Reassentamento mais pobre ou não compensado, e consequente
empobrecimento do modo de vida
 Destruição das comunidades
 Problemas das terras irrigadas, como acima se disse
 Riscos de saúde e doença
 Destruição de lugares religiosos históricos e de rotas de peregrinação

iii. Mudanças técnicas e género

Um exemplo diferente do anterior é o do projecto de produção de arroz na Gâmbia,


cujos objectivos são:

54
a. Crescimento
1. Aumentar a produção de arroz, alimento básico
2. Reduzir a importação do arroz
b. Equidade
3. Fazer uma espécie de revolução verde disponibilizando factores de
produção para todas as famílias agricultoras na área do projecto
4. Providenciar aumento da renda às mulheres, tradicionais cultivadoras de
arroz

Os objectivos 1 e 3 foram alcançados e 2 e 4 não. Como se explica o alcance do


objectivo 1 sem alcançar o objectivo 2?

Analisemos alguns pontos chave:


 Força de trabalho - na Gâmbia o cultivo de arroz exige trabalho intensivo e há
momentos em que há escassez de força de trabalho.
 A família (factores sociais) - canalizaram-se a terra e os factores melhorados para
o homem chefe da família, na assumpção de que a família é uma unidade de
produção homogénea na qual os membros obtêm recursos e partilham os ganhos
e benefícios de excedentes comercializáveis. Na verdade, há diferenças
importantes entre as famílias no acesso a recursos (quantidade, localização e tipo
de terra) e no tamanho e composição das famílias. Tais diferenças condicionaram
as respostas à intensificação da força de trabalho na área do projecto.

Deste caso se podem extraír as seguintes lições


 Na agricultura camponesa os recursos, sobretudo a força de trabalho, podem
parecer ociosos (não utilizados ou sub-utilizados) para o observador casual,
embora não seja o caso habitual. A assumpção do recurso ocioso na maior parte
das vezes é falsa quando se refere à força de trabalho feminina, porque seja qual
for a forma de trabalho agrário que a mulher faz, é combinada com uma
multiplicidade de tarefas de “trabalho doméstico” (buscar água, lenha, cuidar das
crianças, lavar roupa, varrer a casa, etc.).
 Os constrangimentos no uso pleno dos recursos podem ser ecológicos
(sazonalidade), técnicos (método de cultivo), ou sociais (divisão de trabalho por
género), ou, mais provavelmente, uma combinação deles. É cada vez mais
reconhecido que a agricultura camponesa é um sistema complexo: factores
ecológicos, técnicos e sociais estão fortemente interligados, e de modos que
determinam os objectivos económicos e as tomadas de decisão. Este

55
reconhecimento gerou novo estilo de pesquisa para o desenvolvimento agrário e
rural designado pesquisa de sistemas de cultivo.
 O ponto principal a reter é que uma intervenção de projecto ou política que vise
mudar um elemento no sistema não terá probabilidade de sucesso se não
considerar o sistema como um todo. O projecto descrito, tal como muitos outros,
visava melhorias técnicas nos métodos de cultivo (irrigação, sementes
melhoradas, etc.) sem ter em conta as relações sociais e organizações da
agricultura, em particular, como as exigências em força de trabalho, terra e renda
são estruturadas por género.

Isto nos leva à segunda e mais largamente relevante lição do caso: o problema de
tratar as machambas familiares como unidades “homogéneas” de produção e/ou de
consumo. Este é o maior perigo da ciência social ocidental e da economia neoclássica.
De facto as famílias camponesas são social e internamente diferenciadas e têm
diferentes exigências de recursos e renda. O género e a idade são a forma mais
difundida de diferenciação dentro da família.

A principal lição a tirar e que deve ser tida em conta na planificação e apreciação de
projectos é que não se deve tratar os recursos familiares (força de trabalho, terra, gado,
implementos) como factores homogéneos que podem simplesmente ser realocados
pelo projecto, ao procurar novas combinações óptimas dos factores. É preciso ter em
conta, por exemplo, como a divisão do trabalho por género irá afectar o tipo de
análise do orçamento da machamba ou o índice de recuperação da renda.

Além das diferenciações intra-familiares, é necessário ser-se também cautelosos das


diferenciações inter-familiares ou sociais do campesinato. Isto significa que os
recursos não são distribuidos de forma igual entre as famílias nas comunidades
camponesas, e que as famílias mais ricas em recursos podem “explorar” as mais
pobres, por exemplo, contratando a sua força de trabalho, dando-lhes emprestado
dinheiro, dando-lhes a terra ou os factores por aluguer, etc.

Daqui resulta que em primeiro lugar, não há camponês médio ou família camponesa
“média”. Em segundo lugar, os benefícios de um projecto de desenvolvimento, que se
pretende que atinja toda a população rural, bem pode atingir de forma
desproporcionada a minoria das famílias mais ricas e poderosas. Isto é muito comum
nos projectos agrários.

iv. A ajuda do projecto: Alcançando os mais pobres?

56
1. Introdução

A razão fundamental da ajuda ultramarina conforme apregoado pelos pagadores


de imposto que a financiam é melhorar os padrões de vida das pessoas mais
pobres do terceiro mundo. Esta tarefa não é fácil, devido à dureza do ambiente em
que estas pessoas existem e a multiplicidade de pressões que conspiram nos países do
terceiro mundo para concentrar qualquer ganho na renda nas mãos dos que já estão
bem e têm poder.

Tanto os doadores de ajuda oficial como as organizações voluntárias têm agora, de


facto, grande dose de experiência prática de tentar ultrapassar tais dificuldades, mas
tal experiência não é largamente disponível. O objectivo deste relatório é tornar
disponível tal experiência quer para os engajados na planificação da nova geração de
projectos de desenvolvimento, na esperança de os ajudar a fazer melhor o seu trabalho,
como para os que financiam tais projectos através do pagamento dos seus impostos e
suas contribuições para agências voluntárias, na esperança de os poder ajudar a
contribuir para o debate em como o seu dinheiro está sendo gasto. Infelizmente, só é
possível progredir fazendo erros, e as ocasiões em que a ajuda monetária que, na
interpretação mais caritativa, pouco fez para ajudar os miseráveis da terra são muitas.
O que importa é que as lições destes erros sejam agora aprendidas.

2. “Ajuda para os mais pobres”: um breve esboço histórico

Até a década de 1980, muitos doadores de ajuda, capitalistas e comunistas,


acreditaram na habilidade de crescimento económico nos países do Terceiro Mundo
para alívio da pobreza, e apostaram a sua ajuda em grandes projectos de engenharia
civil (centrais eléctricas, estradas e portos), destinados a acelerar o crescimento. A
preocupação dos doadores nestes anos era com a quantidade da ajuda que podia ser
transferida para o Terceiro Mundo, e em particular, com o alcance do objectivo das
Nações Unidas de um rácio de 0,6% da ajuda oficial para o PNB (Produto Nacional
Bruto) e um rácio de 1% de todo o fluxo financeiro para o Terceiro Mundo para o
PNB. Pouco se discutia sobre a qualidade e a efectividade de tal ajuda.

Nos princípios de 1970 tornou-se evidente para muitas pessoas que esta abordagem
era simplesmente inadequada. Tornou-se claro que um quarto de um século de
crescimento económico no Terceiro Mundo não melhorou o bem-estar dos indigentes:
então, tal como na dédaca 1950, cerca de um bilião de pessoas ao longo do Terceiro
Mundo ainda vivia em condições de pobreza absoluta, carecendo dos requisitos
mínimos de alimentos, roupa e tecto. Então, como outrora, grande número de pessoas
morria de fome nos anos de seca. Portanto, já não era possível aos doadores alegar

57
que a ajuda que deram gotejou automaticamente para o alívio da pobreza. Os
diferentes doadores responderam a este desafio à sua credibilidade de diferentes
maneiras. Alguns responderam focalizando-se em grupos específicos de beneficiários,
outros, concentrando-se em sectores específicos, e outros ainda confinando a maior
parte da sua ajuda a países que eles encaravam como estando seriamente
comprometidos com a redistribuição de recursos dos ricos para os pobres.

O Banco Mundial

É normal atribuir o início do “novo idealismo na política de ajuda” ao anúncio do


Presidente MacNamara ao Concelho de Governadores em 1973 que o Banco Mundial
pretendia dali em diante:
“alterar a ênfase (de política) de esforços visando promover o simples
crescimento para uma tentativa de melhorar a produção de pequenos agricultores
aumentando principalmente os investimentos que beneficiam os grupos de renda
mais baixa nas áreas rurais”.
Esta alteração na ênfase devia ser alcançada de duas formas: por um lado, um
aumento naquelas categorias de empréstimo que o Banco definiu como “focalizados
na pobreza” (nomeadamente, desenvolvimento rural, moradia local e de serviço,
abastecimento de água e esgoto, educação primária e não formal, e população, saúde e
nutrição), e por outro lado uma modificação nos procedimentos de apreciação e
avaliação destinados a estimar o número de beneficiários de um projecto que estão
debaixo da linha de pobreza para aquele país. Em muitos países pobres em que os
dados de renda e despesa familiar não são fiáveis ou não existem o Banco
implementou a segunda destas alternativas estimando o efeito de projectos sobre
grupos funcionais tais como “pequenos agricultores, moradores das favelas urbanas,
ou os carentes de água adequada ou acesso à escola primária”.

Alguns exemplos

A Grã Bretanha copiou o modelo do Banco Mundial em 1975, através da sua


declaração de política de assistência ao desenvolvimento explanada no “White Paper”
que preconiza “mais ajuda para os mais pobres” que preconiza:
a) Dar ênfase crescente na nossa ajuda bilateral aos países mais pobres,
especialmente aqueles que estão nos grupos mais seriamente afectados pelo
aumento do preço do petróleo.

58
b) Dar ênfase especial a programas orientados para os grupos mais pobres
dentro daqueles países, e especialmente ao desenvolvimento rural.

A Dinamarca não adoptou a política de ajuda focalizada na pobreza à luz do


prevalecente vento político. O relatório anual da DANIDA dos princípios de 1972
anuncia uma intenção de “não só ajudar os países com maiores necessidades, mas
também alcançar a parte mais pobre da população nesses países”.

A Holanda antecipou a viragem do Banco Mundial para ajuda focalizada na pobreza


em 1973. A característica distintiva da política de Jan Pronk, Ministro para a
Cooperação de Desenvolvimento de 1973 a 1977, foi uma tentativa de combater a
pobreza não só ao nível da ajuda do projecto mas também ao nível da políticas
nacionais. O Governo Holandês atribuiu a culpa da pobreza do Terceiro Mundo no
empreendimento multinacional e na distribuição injusta das relações de poder nos
mercados de bens. Anunciou uma intenção de concentrar a sua ajuda bilateral nos
países em desenvolvimento que quisessem praticar políticas fiscais distributivas e
manter as multinacionais na verificação.

3. Progresso até agora: o que foi alcançado

Qualquer tentativa de medir progresso no alcance de um objectivo tem de escolher


entre medir factores (os bens e serviços que o projecto pretendia fornecer, tais como
fertilizantes ou bombas para água) e produtos ou impacto (a contribuição que ele faz
para os objectivos finais de políticas de desenvolvimento, tais como auto-suficiência
ou o alívio à pobreza). O primeiro é fácil mas exige a questão fundamental de saber se
os objectivos finais da actividade estão sendo alcançados (isto é, se os pobres estão
ficando melhor como resultado da ajuda); o segundo é muito difícil.

Os dados das tabelas seguintes parecem indicar que a fracção de ajuda dada por cada
doador bilateral aos “países mais pobres” aumentou ao longo da década 1970; parece
também que os doadores alcançaram uma mudança substancial nos seus projectos de
ajuda a favor dos ramos de actividade económica convencionalmente descrita como
“focalizada na pobreza”, isto é, desenvolvimento rural, fornecimento de água,
planificação familiar e educação não formal.

59
Distribuição da ajuda, 1975 e 1984 Mudança sectorial na política de ajuda
Proporção do total de ajuda bilateral Percentagem média anual do orçamento
dada aos países menos desenvolvidos classificado como focado na pobreza
1975 1984 1971-3 1978-9
Grã Bretanha 20,6 27,3 Grupo Banco Mundial 15,3 29,5
Holanda 19,2 28,8 Grã Bretanha 14,1 32,8
Dinamarca 19,2 35,2 Holanda 5,9 46,2
Dinamarca 17,5 43,6

No entanto, nada nos garante que os pobres terão sido os principais beneficiários de
tais actividades. Há actualmente um elevado número de micro-estudos que
demonstram que em muitos casos os bens e serviços que as agências de ajuda,
incluindo as ONGs destinavam aos mais pobres foram desviados por pessoas na
escala superior da renda. Precisa-se com urgência de dados ao nível dos projectos que
nos digam se as mudanças bastante marcantes nos instrumentos de política revelada
no quadro acima tiveram de facto um impacto no alvo das políticas, isto é, se a “novo
estilo” de políticas de desenvolvimento melhoraram actualmente o padrão de vida das
pessoas mais pobres.
4. Porque é que os pobres permanecem pobres
Antes de se ver o que a experiência revela sobre o que se pode fazer para as pessoas
pobres, e de explicar porque os pobres permanecem pobres, vejamos quem eles são.
Há essencialmente três grupos de pobres no Terceiro Mundo:
i. Pequenos agricultores que não têm terra suficiente para produzir comida
para a subsistência da família. Quanta terra é necessária varia com a
fertilidade do solo, clima, e regime de cultivo. Os agricultores que não têm
terra suficiente muitas vezes têm os seus problemas compostos por acesso
inadequado a factores de produção, tais como água para a rega, fertilizantes
ou crédito.
ii. Os sem terra. Pessoas rurais que não têm nenhuma terra, que têm de viver
com trabalho ocasional nas machambas dos vizinhos. Uma vez que não
podem produzir comida, são extremamente vulneráveis ao aumento do preço
dos alimentos.
iii. Os pobres urbanos. Pessoas com trabalho ocasional e salário baixo, nas
cidades do Terceiro Mundo. São muitas vezes pessoas que vivem em favelas:
enormes conjuntos de moradias improvisadas com peças de madeira, caixas
de cartolina, folhas de plástico, qualquer coisa que pode ser escavado dos
lixões da cidade. São geralmente pessoas em trânsito, muitas vezes os deste
ano são os pequenos agricultores e os sem terra rurais do ano passado que
levados pelo desespero, possivelmente devido à falha na cultura, tentam a sua

60
sorte na cidade, que se não conseguirem suportar a despesa na cidade no ano
seguinte voltarão a ser de novo “sem terra” rurais.

Porque é que estes pobres são pobres? Há causas internas da pobreza (originadas
dentro do país pobre) e causas externas (originadas de fora do país pobre, no
sistema de comércio e finanças internacionais).

Podemos identificar quatro das causas internas da pobreza, as quais estão


inter-relacionadas:
i. Falta de poder de compra
ii. Ausência de mercados para os factores de produção
iii. Atitude relutante em relação ao risco
iv. Factores políticos
i. Falta de poder de compra - o pobre quer comprar algum equipamento
que lhe habilite a escapar da pobreza (fertilizante, bomba de água, cana
de pesca, máquina de costura, etc.), ou treinar-se em alguma habilidade
(tecelagem, carpintaria, mecânica), mas não pode pagar. Esta é a causa
da pobreza que mais facilmente se pode perceber, e motiva a forma mais
comum de ajuda: uma doação de uma determinada peça de equipamento
ou curso de treinamento
ii. Ausência de mercado para os factores de produção que a pessoa pobre
precisa - neste caso, ajuda em forma de donativo de equipamento não
resolve o problema da pobreza. Precisa-se duma instituição. Embora os
doadores de ajuda, pela sua natureza, forneçam principalmente dinheiro
e assistência técnica, podem contribuir para a construção de uma
instituição.
iii. Atitudes que tornam o pobre relutante na adopção de qualquer acção
que tenha o menor risco ligado a ela - (exemplo, adopção de novas
sementes, fertilizantes ou pesticidas). Tal relutância é altamente racional.
No entanto, a relutância em inovar prende o agricultor num ciclo vicioso:
agarra-se à tecnologia tradicional porque é pobre e é pobre porque se
agarra à tecnologia tradicional. Qualquer tentativa de a agência de ajuda
injectar dinheiro no ciclo vicioso está condenada ao fracasso, uma vez
que o agricultor não se interessa por nenhum dinheiro a que esteja ligado
algum risco. O que a ajuda externa precisa de fazer é reduzir o risco não
oferecendo “novas recomendações” aos agricultores senão depois de
testar e saber que são apropriadas para as condições do solo e clima da
região para as quais estão sendo recomendadas. Isto é em parte uma
questão de desenho institucional, uma vez que existem instituições que
habilitam o governo a partilhar o risco com o agricultor, como é o caso
das seguradoras agrárias. Os doadores de ajuda podem ajudar a reduzir o
risco dispondo-se a financiar tais esquemas.

61
iv. Factores políticos que impedem que os benefícios destinados aos pobres
alcancem esta camada - eles operam a dois níveis: a) “viés urbano”,
visível na maior parte dos países do Terceiro Mundo, que é o desenho
deliberado de políticas que favorecem os que ganham salários e
honorários nas cidades, onde vivem os que têm poder político, e
desfavorecem as áreas rurais onde vive a maior parte dos pobres; b)
dentro das áreas rurais, os ricos podem usar o seu controle de processos
administrativos e legais a nível da aldeia para ficar com a parte do leão
nos benefícios que o governo e os doadores de ajuda pretendiam que
fosse apenas para os pobres.

5. O que podem fazer as agências de desenvolvimento para ajudar

Uma vez identificados quem são os pobres e as causas da sua pobreza, passemos a
sumarizar os princípios mais óbvios que as agências de ajuda que pretendem alcançar
os pobres de forma mais efectiva devem observar:
i. Uma vez que a maioria dos pobres vive na área rural e nas favelas, a política
de ajuda focalizada na pobreza deve centralizar-se nos bens que são
produzidos nas áreas rurais e favelas (alimentos e indústria artesanal) e
serviços associados (estradas rurais e fornecimento de água, e moradias
locais e de serviço.
ii. Uma vez que tal pobreza provém da simples falta de capital e habilidades, a
ajuda focalizada na pobreza deve consistir em activos e habilidades que
o pobre seja capaz de usar. Geralmente o que o pobre quer comprar são
activos pequenos, simples, feitos localmente, tais como uma energia
proveniente da combustão da madeira ou do petróleo, em vez de energia
duma usina nuclear ou geotérmica.
iii. Muita pobreza rural ocorre e persiste porque o sistema de mercado não
fornece os bens e serviços que o pobre precisa para melhorar a sua condição.
É função de todo o tipo de ajuda fornecer o que o mercado não fornece
para superar este tipo de problemas, isto é, não fornecer dinheiro isolado,
mas sim desenvolver uma instituição. É exemplo disso o Grameen Bank do
Bangladesh que fornece crédito com lucro aos marginais e sem terra rurais a
quem os bancos comerciais geralmente não financiam.
iv. Porque o pobre não está em condições de aceitar nenhum aumento do nível
de risco a que for exposto, as agências de ajuda devem evitar impor
tecnologias que não são experimentais. Por exemplo, muitas práticas
agrárias vistas pelo ocidente como irracionais (tal como o cultivo de muitas

62
variedades diferentes de culturas no mesmo talhão e a fragmentação de
explorações em pequenas parcelas), são simplesmente estratégias de
sobrevivência para reduzir o risco de perda total de culturas.
v. Muitos projetos focalizados na pobreza colapsaram porque ignoraram os
politicamente poderosos na área alvo. Isto requer que os planificadores de
projectos de ajuda considerem no estágio de desenho quem esperam que
ganhe e quem esperam que perca com a implementação do projecto
escolhido. É importante notar, em primeiro lugar, que se um grupo que está
na posição política de causar danos ao projecto perder com a implementação
do projecto, então a probabilidade da sua oposição deve ser contornada. A
forma mais óbvia de fazer isso é dar-lhes uma fracção dos benefícios do
projecto. O que é mesmo mais importante é que os que se pretende que
beneficiem queiram actualmente o projecto. É notável quantas agências
externas planificam projectos de desenvolvimento sem mesmo perguntar
àqueles que elas acreditam que irão ganhar com o proposto projecto
(construção de estrada, barragem, escola, etc.), se o desenvolvimento
pretendido é o que eles irão acolher com prazer. Se a resposta for não, mas se
acredita que o proposto projecto seja de importância vital para o
desenvolvimento, por exemplo, conservação do solo, ou planeamento
familiar, pode ser necessário sugar a pílula satisfazendo simplesmente uma
necessidade local sentida, tal como a construção de uma escola da aldeia ou
de um posto de saúde nos primeiros dois anos, construindo assim durante o
referido período uma relação de confiança com a população local, confiança
essa que deve existir antes de projectos mais controversos terem alguma
hipótese de sucesso.
vi. Certifique-se que o projecto se possa sustentar a si mesmo quando
terminar o dinheiro da ajuda externa. O propósito de qualquer projecto de
ajuda externa é tentar criar algum benefício permanente por meio da injeção
temporária de dinheiro e força de trabalho. É, no entanto, muito frequente
que o benefício se confine ao período de ajuda formal e o Terceiro Mundo
está repleto de destroços de estradas que se desintegraram em poeira, de
hospitais que têm de fechar, de bombas de água que deixam de funcionar
quando termina a ajuda monetária. O risco disto ocorrer é particularmente
sério em projectos focalizados na pobreza porque as pessoas pobres terão
grande dificuldade em pagar pelos serviços que o projecto fornece. Caso
contrário, e se o governo não quiser assumir a responsabilidade, o projecto
irá colapsar. A implicação é que uma estratégia de recuperação do custo deve
ser elaborada durante o fornecimento da ajuda externa, sendo ideal, antes do
acordo do projecto ser assinado.
vii. O progresso no alcance dos pobres deve ser avaliado durante o
funcionamento do projecto. Como se viu antes, as agências doadoras ainda
não ganharam o hábito de examinar os efeitos dos seus projectos sobre os
grupos de baixa renda, sendo por isso muito pouco o que se conhece a este
respeito. É de facto um princípio fundamental de gestão para qualquer
organização que é necessário um feedback regular sobre quão bem está a

63
alcançar os seu objectivos. Se o objectivo for a redução da pobreza, será
necessária uma pesquisa regular da nutrição, renda e outras dimensões do
bem-estar na área do projecto, e semelhante pesquisa num ‘grupo de
controle’ fora da área do projecto para separar os efeitos do projecto dos
efeitos do tempo, dos preços das culturas, e de outras forças que podem
alterar o bem-estar independentemente do projecto. Um feedback deste tipo
pode ajudar a alertar a gestão do projecto sobre a necessidade de alterar o
desenho do projecto.
viii. As agências oficiais de ajuda (as quais operam dentro dos constrangimentos
dos procedimentos orçamentais dos governos) devem evitar sobrecarregar
a estrutura administrativa local. Isto significa desembolsar o dinheiro aos
poucos, e não sobrecarregar a burocracia local com tarefas que ela não pode
desempenhar. O problema da pobreza do terceiro mundo é tão grave que
existe a tentação de procurar resolvê-lo com tácticas de choque, isto é,
através de grandes injecções de dinheiro e material. No entanto, a frágil
estrutura do governo e do transporte numa área pobre não pode absorver tal
transfusão, mais do que o corpo de um subnutrido pode absorver uma grande
refeição rica.
ix. As agências oficiais de ajuda (as quais operam dentro dos constrangimentos
dos procedimentos orçamentais dos governos) devem condicionar os
programas de ajuda à implementação de políticas de alívio da pobreza e
indução do crescimento. Como já atrás se viu, um dos principais
desenvolvimentos na política oficial de ajuda dos últimos anos foi um
aumento do uso do programa de ajuda, muitas vezes como forma de
persuadir o país recipiente de fazer o que se acredita serem mudanças
essenciais nas suas políticas económicas nacionais. Até hoje tais medidas
foram usadas, em particular pelo Banco Mundial, sobretudo para remover
obstáculos ao crescimento induzidos por políticas: taxas de câmbio
sobrevalorizadas, quotas de importação, baixos preços explorativos para os
agricultores, etc. Mas podem também ser usadas como um instrumento para a
redução da pobreza: e uma mudança de política a nível nacional pode ser
considerada essencial para a redução da pobreza (ex: reforma da terra, ou
alteração no sistema de imposto), então o doador pode pedir que ela seja
implementada como condição para conceder o programa de ajuda.

9. A IMPLEMENTAÇÃO E MONITORIA DO PROJECTO

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i. Guia básico para avaliação e monitoria

A monitoria e avaliação é o último estágio do ciclo do projecto. Pode ser definida


como a colecção contínua de dados sobre a implementação e impacto de um
projecto e a revisão e análise periódica desses dados. Ela pretende responder às
cinco perguntas seguintes:
 Estará o projecto a decorrer conforme planificado?
 Se não, porque?
 Como o poderíamos mudar?
 Terá o projecto sido uma boa ideia?
 Que lições podemos aprender para futuros projectos?

Neste capítulo se irá estudar a moldura conceptual e a terminologia desenvolvida para


responder a estas questões. Embora nenhum sistema de monitoria e avaliação possa
satisfazer a todos os projectos, podem se deduzir alguns princípios comuns a partir de
experiências de projectos e podem ser sugeridas soluções para problemas comuns.
Serão revistas e explicadas variadas formas de avaliação realizadas em tempos
diferentes na vida do projecto, e em particular, a diferença entre avaliações correntes
(on-going evaluation) e à posteriori (ex-post evaluation). Serão também revistas
abordagens alternativas para monitoria e avaliação de projectos.

É objectivo do capítulo:

 Explicar os princípios, objectivos e processos de monitoria e avaliação de


projectos;
 Fornecer um guião sobre os principais requisitos para um sistema bem
sucedido de avaliação e monitoria de projectos;
 Realçar os principais problemas de experiências de projectos e as lições que
foram aprendidas;
 Apresentar as vantagens de determinadas abordagens de monitoria e
avaliação;
 Proporcionar um entendimento suficiente do papel da monitoria e avaliação
no desenvolvimento rural, para capacitá-lo a julgar a efectividade de sistemas
de monitoria e avaliação de projectos existentes, e a adequação do desenho
da monitoria e avaliação do projecto proposto.

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O capítulo ensinará:
 A moldura conceptual, os princípios e guiões necessários para o desenho e
operação efectivos do sistema de monitoria e avaliação de projectos;
 Que elementos são essenciais para o sucesso da monitoria e avaliação, e o que se
deve evitar.

Note que a monitoria e avaliação não utiliza uma metodologia técnica rigorosa do tipo
da aprendida para a apreciação financeira e económica. O capítulo não lhe irá
transformar por si só num perito em monitoria e avaliação. Precisará de se familiarizar
com muitas das questões de colheita e análise de dados cobertas no curso de “métodos
de pesquisa económica e social e análise de dados”. Alguns problemas práticos de
colecta de dados nos países em desenvolvimento serão aqui ligeiramente abordados, e
serão aprofundados no curso de “pesquisa’.

A. Introdução

A monitoria e avaliação é a etapa final do ciclo do projecto. Enquanto a monitoria


e a avaliação corrente (on-going evaluation) fornecem o feedback da implementação
do projecto (retro-alimentam), a avaliação a posteriori (ex-post evaluation) fornece o
feedback (retro-alimenta) às fases da planificação e identificação do projecto,
formando assim o laço que fecha o ciclo do projecto.

Avaliação é o acesso à informação para determinar se o projecto está a operar de


forma eficiente, e se está a ter os efeitos ou impactos desejados. O primeiro objectivo
da monitoria e avaliação é promover a implementação e operação efectiva e eficiente
dos projectos e programas de desenvolvimento. Deve ajudar a optimizar o uso de
recursos limitados minimizando os desperdícios e atrasos na implementação através
da detecção cedo de problemas e identificação das acções correctivas necessárias. A
monitoria e avaliação servem como um sistema de feedback para a resolução de
problemas durante o período da implementação do projecto, promovendo uma
apreciação crítica do progresso do projecto e do cumprimento de objectivos desde o
estágio de planificação e implementação até ao estágio da operação.
O segundo principal objectivo da monitoria e avaliação é fornecer lições construtivas
para a planificação e desenho de futuros projectos, e contribuir para uma avaliação
do progresso global das estratégias de desenvolvimento. Uma má percepção comum é
que a monitoria e avaliação são dois elementos inseparáveis de uma metodologia
claramente definida. Actualmente são duas actividades relacionadas, mas distintas, e é
importante perceber claramente as distintas funções de cada. Monitoria e avaliação
são conceitos relativamente novos para muitos funcionários de projectos. Apesar dos

66
termos serem de uso comum, não representam uma ciência exacta, e a aplicação da
monitoria e avaliação tende a reflectir a disposição e crenças dos seus praticantes.
Fez-se uma série de tentativas para definir os termos, das quais é actualmente aceite a
do Banco Mundial:

Monitoria - é a provisão de informação, e o uso de tal informação para habilitar


a gestão, avaliar o progresso da implementação e tomar decisões atempadas
para assegurar que o progresso seja mantido de acordo com o
calendarizado... ... ... A monitoria é uma actividade interna do projecto, uma
parte essencial da prática de boa gestão, e portanto, uma parte integral da
gestão diária.

Avaliação - Acessa os efeitos globais do projecto, tanto os intencionais como os


não intencionais, e o seu impacto. Envolve comparações que requerem
informações de fora do projecto, em tempo, área ou população.

Embora estes conceitos sejam simples em si mesmo, os problemas práticos residem


no desenho e selecção dos sistemas de monitoria e avaliação do projecto.
Inevitavelmente o sistema actual de monitoria e avaliação deve ser “feito à medida”
para se adequar às exigências e condições de um projecto específico, de tal modo que,
apesar de alguns princípios e guiões de experiências passadas poderem ser seguidos,
não há solução universal para o desenho dos programas de monitoria e avaliação de
projectos.

A monitoria e avaliação é uma disciplina relativamente nova no campo do


desenvolvimento, embora os termos sejam familiares na gestão. A monitoria e
avaliação foram realizado numa base “ad-hoc” em alguns projectos de
desenvolvimento na década de 1950, mas a principal preocupação e interesse nesta
abordagem emergiu apenas na década de 1970. A necessidade de a monitoria e
avaliação complementar a apreciação e implementação do projecto foi parte da
crescente percepção da natureza complexa do processo de desenvolvimento, e da
necessidade de aprender lições de experiências. O desenvolvimento económico
envolve crescimento económico, mas também promoção de crescimento de forma a
aliviar e eventualmente erradicar a pobreza absoluta. Isto levou a uma nova
consideração dos objectivos distribucional e outros do projecto.

A apreciação prévia do projecto, de facto uma avaliação “ex-ante” (antes do evento),


era o instrumento principal usado para planificar o desenvolvimento e tomar
decisões de investimento. Propostas de projecto aceitáveis prosseguiam para
financiamento e implementação e a única avaliação “ex-post” para determinar o
sucesso do projecto era através dos procedimentos da auditoria e contabilidade.

67
A ênfase era primariamente na monitoria do desembolso de fundos, que era
considerada uma medida da implementação com sucesso do projecto. Em anos
recentes o âmbito da monitoria e avaliação foi alargado para o estudo da
implementação física de todas as componentes do projecto ou programa, tanto em
termos de calendário do plano global como da natureza e extensão do impacto sobre
os beneficiários.

No entanto, no passado, quando a apreciação do projecto era realizada de forma não


apropriada, baseada em assumpções incorrectas ou em maus dados, levou
inevitavelmente a uma pobre implementação e desempenho do projecto. A
necessidade de diagnosticar o pobre desempenho do projecto e de documentar a
experiência levou à consciência da necessidade de um sistema de recolha de dados.

A evolução levou a que agora os sistemas de monitoria e avaliação de projectos


desempenhem um papel mais funcional e dinâmico, provendo relevante informação
aos planificadores e gestores de projecto para habilitá-los a responder a questões tais
como:
 O projecto é bem sucedido?
 É razoável esperar que o projecto alcance os seus objectivos especificados?

No entanto, ainda há muitos problemas em responder a tais questões no


desenvolvimento agrário. Alguns são problemas práticos e dificuldades envolvidas
simplesmente na colecta de dados acurados nas comunidades rurais. É difícil até
definir o que é gestão efectiva de projecto, e tentar sozinho avaliar o desempenho da
gestão em relação ao sucesso ou falha do projecto.

A avaliação do impacto do projecto pode também levar a questionar as assumpções


básicas em que se basearam o desenho do projecto, ou mesmo os planos de
desenvolvimento. Isto deve ser politicamente muito difícil, sobretudo quando as
conclusões entram em conflito com a filosofia de desenvolvimento ou os interesses de
um grupo influente na sociedade.

Actualmente quase todas as instituições internacionais e muitos doadores de ajuda


bilateral incorporam monitoria e avaliação nos projectos que financiam. Ao mesmo
tempo, a maioria dos países em desenvolvimento também percebem a importância da
monitoria e avaliação como um instrumento para a gestão efectiva de projectos e
programas de desenvolvimento. A maioria, mas não todos: há momentos em que a
monitoria e avaliação é encarada como não sendo directa e fisicamente produtiva e

68
portanto, um desperdício de recursos. Esta posição pode ser tomada em relação ao
papel essencial da monitoria e avaliação para a implementação com sucesso, e para a
selecção prudente de futuros investimentos para o desenvolvimento. Aliás, é também
suficiente argumentar que quando muitas vezes muito grandes quantidades do capital
nacional estão sendo gastas, é razoável que alguma avaliação dos resultados seja feita,
e que os resultados sejam publicamente disponíveis.

A importância da monitoria e avaliação varia com a natureza do projecto. Tende a


ser mais crucial em projectos multi dimensionais tais como projectos agrários e de
desenvolvimento rural, que geralmente envolvem várias agências implementadoras,
uma variedade de benefícios, e um grande número de beneficiários, de tal maneira
que o impacto possa ser bastante difuso. Ademais, enquanto o governo providencia a
maior parte do investimento, os beneficiários de projectos agrários tendem a estar no
sector privado. Isto torna a tarefa da monitoria e avaliação não só mais complexa, mas
também mais desafiante, interessante e importante.

B. Uma moldura conceptual para monitoria e avaliação de projectos

A identificação dos objectivos do projecto é essencial para o desenho de um sistema


de monitoria e avaliação para o projecto. Há que considerar dois conjuntos de
objectivos. Os propósitos final e principal de um projecto de desenvolvimento agrário
são tipicamente incrementar a produção da cultura, elevar a renda da machamba,
aumentar os níveis de emprego, e geralmente, promover o crescimento económico
rural. Aliás, este objectivo global depende da realização de um número de tarefas
intermediárias ou objectivos do projecto, por exemplo, a terminação de algum
trabalho físico ou infraestrutura necessária, a operação e manutenção de sistemas de
produção, gestão e transporte, e provisão de serviços tais como extensão, formação ou
facilidades de marketing.

O desenho da monitoria e avaliação deve considerar a distinção clara entre objectivos


intermediários do projecto (“outputs” do projecto) e efeitos e impacto em relação aos
objectivos globais. É, portanto, útil representar o projecto agrário como uma
hierarquia de objectivos como a seguir se descrimina:
INPUTS descrever os recursos humanos, físicos e financeiros providenciados
para o projecto operar;
OUTPUTS se os inputs forem disponibilizados na quantidade e qualidade
correcta, e no tempo correcto, podem ser usados pelo projecto para
produzir outputs, em forma de bens e serviços, por exemplo,
áreas cultivadas, quilómetros de canais construídos, número de
agricultores de contacto visitados por agentes da extensão;

69
EFEITOS espera-se que a provisão de outputs do projecto leve a efeitos
directos na área e beneficiários do projecto. Por exemplo,
decorrente dos outputs acima referidos, é de se sperar
um aumento na produção agrária agregada, incremento na
intensidade do cultivo, aumento na proporção de área cultivada
com variedades melhoradas;
IMPACTO se todos os efeitos preditos se materializarem para cada componente
do projecto, tomados no seu conjunto como um todo, terão um
impacto na área do projecto e população. Juntamente com outros
projectos complementares, o impacto combinado deve afectar a
economia nacional e regional. O impacto é frequentemente
descrito em termos de parámetros sócio-económicos tais como
renda familiar, emprego, e indicadores do padrão de vida.

Note-se que o uso da distinção entre output, efeito e impacto acima descrita depende
na prática da natureza, fim, tamanho, e sobretudo, dos objectivos específicos do
projecto ou programa.

Por detrás do processo representado por esta hierarquia estão assumpções sobre o
desenho do projecto, e do modo como ele vai funcionar. Por outras palavras, o
desenho do projecto como um todo está baseado num modelo causal que
relaciona as actividades do projecto ao propósito desejado. Exemplo disso é o
projecto de drenagem do “Left Bank Outfall” do Paquistão, em que uma drenagem
subterrânea através de tubos, e bombagem de água subterrânea para baixar o lençol
freático está sendo instalado numa área muito grande para agricultura irrigada. O
modelo causal subjacente é que uma drenagem pobre levou à subida do lençol freático
e salinização do solo, daí resultando o abandono da terra e por conseguinte, redução
do output agrário, redução do emprego e da renda da machamba. A provisão de uma
drenagem melhorada irá, mantendo o resto constante, restaurar e estimular a produção,
emprego e rendas.

O implícito modelo causal consiste em duas hipóteses implícitas: a) primeiro, que a


“intervenção” proposta pelo projecto está correctamente direccionada para o
propósito do projecto, e é técnica a economicamente sã; b) segundo, que o
beneficiário da intervenção (primariamente o agricultor) irá responder com um curso
de acções que contribuam para o alcance do propósito do projecto.

Um ponto final importante é que o modelo causal irá tipicamente fazer uma
quantidade de outras assumpções. Elas deverão ser relacionadas à economia como
um todo, tal como comércio, ou política financeira, ou considerações operacionais
tais como o papel que outras agências governamentais irão desempenhar na provisão

70
de serviços de apoio essenciais. Se estas assumpções não forem verdadeiras, o
modelo deverá ser invalidado.

Descrever um projecto em termos da moldura conceptual esboçada tem implicações


imediatas para o desenho da monitoria e avaliação. Em primeiro lugar pode se
deduzir uma simples distinção entre inputs e outputs do projecto, que são geridos pelo
projecto e para os quais a monitoria será a principal exigência, e o impacto do
projecto, que claramente ocorre ao longo de um extenso período de tempo, e para o
qual será necessária avaliação.

A dificuldade surge com os efeitos do projecto. Em geral eles dependem não só dos
outputs do projecto, mas também das acções realizadas pelos beneficiários do
projecto em resposta às intervenções do projecto. Por exemplo, um projecto de
extensão pode realizar correctamente as suas funções planificadas e informar aos
agricultores acerca de variedades melhoradas. A adopção destas variedades e qualquer
aumento de produção resultante depende, aliás, inteiramente da percepção dos
agricultores dos benefícios a serem ganhos, e dos seus recursos e tomadas de decisão.

Efeitos determinados por muitas variáveis, tais como níveis de produção agrária, são
tipicamente muito difíceis de medir com precisão. Mesmo onde são obtidos dados de
boa qualidade, variações naturais que afectam o rendimento das culturas significam
que serão necessárias série temporais de mais de cinco anos antes de se poder
identificar correctamente tendências. Mesmo onde parece haver tendências, é ainda
difícil atribuí-las com clareza às actividades do projecto.

A implicação disto é que a produção ou outro efeito similar deve ser uma parte da
avaliação de longo prazo. Aliás, se nenhuma acção for realizada pelos agricultores,
estes benefícios não se irão materializar. A gestão do projecto não pode esperar cinco
anos ou mais para ser dita que nenhum dos efeitos desejados pode ser ainda
atribuído ao projecto. Para ultrapassar este problema é melhor se concentrar o mais
cedo possível nas acções tomadas pelos agricultores em resposta às intervenções do
projecto. Este tipo de estudos é designado de “monitoria de contacto com o
beneficiário” (Beneficiary contact monitoring).

Em termos mais gerais, o problema de medir e atribuir efeitos ao projecto cria a


necessidade de ter alguma forma de avaliação corrente (on-going evaluation) e
frequente dentro do programa global de monitoria e avaliação.

71
C. Monitoria do projecto

A monitoria consiste na vigilância contínua ou periódica da implementação de


um projecto, envolvendo a medida, registo, colecta, processamento e
comunicação de informação. O objecto final é comunicar informação relevante à
gestão do projecto na forma, local, tempo e frequência correctos, de modo a apoiar a
tomada de decisão dos gestores.

Diz Clayton que a monitoria focaliza-se na operação, desempenho e impacto de


projectos agrários.

A monitoria da operação de projectos envolve o registo de dados relativos às funções


e tarefas de rotina do projecto, por exemplo:
 O desempenho do sistema de entrega de factores, tais como a distribuição e
comercialização de fertilizantes;
 A operação das actividades de crédito ou extensão;
 A regularidade da oferta de água de rega.

Portanto, diz respeito ao uso eficiente dos inputs do projecto e à detecção de


desperdício ou simplesmente, má gestão. Basicamente, é uma questão de medição e
registo de quão bem o projecto está a operar, e identificação de algum atraso ou
custo excedido.

A monitoria do desempenho de um projecto diz respeito aos produtos e efeitos do


projecto tais como:
 A área de novas terras cultivadas;
 A produção agrária agregada ou média que o projecto obtém;
 O número de novos empregos criados.

Basicamente, diz respeito à tentativa de monitorar o que o projecto faz e o que


produz, em suma, ao alcance dos seus objectivos intermédios.

A monitoria do impacto do projecto diz respeito ao efeito global do projecto na


comunidade rural, na economia rural, na economia regional ou nacional, e no
ambiente. Por exemplo, pode envolver o registo de alterações no:

72
 Rendimentos e rendas das machambas individuais;
 Bem-estar e nutrição;
 Salinidade e erosão do solo;
 Preços dos inputs e outputs da machamba.

O sistema de monitoria pode assim ser visto como um sistema de fornecimento de


informações e análise para servir o processo de tomada de decisões. Como tal, é uma
parte integrante do projecto e uma boa prática de gestão. Deve também se enfatizar e
recordar que a gestão do projecto será a primeira utilizadora da informação gerada
pela monitoria.

Esta função pode também ser mostrada de forma útil através de uma visão de sistema
de projectos. Os diagramas A e B seguintes representam a ideia de hierarquia de
objectivos acima realçada, e a importância de dados relevantes para a gestão do
projecto.

Diagrama A: visão de sistemas de um projecto de desenvolvimento

Inputs Inputs/outputs Outputs


SISTEMA SISTEMA
Dinheiro Estradas Milho
DE DE
Trabalho PROJECTO Fertilizantes Batata
CLIENTES
Extensão Frangos
Todo o sistema é definido nos seus objectivos (propósitos) e suas fronteiras
(localização). O sistema do projecto é desenhado para mudar um sistema do cliente.

Diagrama B: gestão e sistema do projecto

SISTEMA
DE
GESTÃO
decisões
decisões
SISTEMA dados dados
DO
SISTEMA
PROJECT
DO
O
Fluxo de recursos CLIENTE
O

73
Processo de eficiência
Processo de efectividade

No diagrama B o processo de retro-alimentação de eficiência corresponde à monitoria


da operação do projecto e o processo da efectividade à monitoria do desempenho e
impacto do projecto.

Como comentário final para esta secção: é importante para o sucesso do projecto que
a monitoria do progresso financeiro e físico caminhem a par e passo, o que requer
uma participação estreita de controladores financeiros no desenho do sistema de
monitoria. Combinar as despesas financeiras com o progresso físico (crescimento da
produção) ajuda a detectar e prevenir que se excedam os custos, e melhorar o controle
do desempenho do local do trabalho, os quais são ambos importantes para a gestão do
projecto.

Se trabalha como gestor deve sentir que já realiza muitas das funções de monitoria
aqui descritas. Por exemplo, deve já recordar o progresso das actividades pelas quais é
responsável e preparar os relatórios semanais e mensais. Talvez antes não tenha
pensado em tal trabalho como sendo monitoria, mas a tenha encarado simplesmente
como parte do seu trabalho como gestor. A integração da monitoria com a
actividade regular de gestão é crucial se deve colectar a informação correcta e
comunicar em tempo, lugar e forma correctos.

D. Avaliação

A avaliação é realizada
 Durante a implementação (avaliação corrente “on-going evaluation”).
 No fim do projecto (avaliação final); no caso de projectos grandes com uma
escala de tempo longa deve também ser necessária uma avaliação de meio
termo.
 Alguns anos depois do fim, quando o projecto tenha atingido o seu pleno
desenvolvimento e se espera que seu impacto tenha sido plenamente
realizado (avaliação a posteriori “ex-post evaluation).

Avaliação corrente

74
A avaliação corrente é a análise dos actividades do projecto durante a fase da
implementação para certificar a continuação da sua relevância, eficiência e
efectividade. Examina se as assumpções feitas durante o estágio da
formulação/apreciação do projecto são ainda válidas, ou se são necessários
ajustamentos para garantir que os objectivos globais do projecto sejam alcançados.

Para começar, em alguns casos, as assumpções subjacentes ao desenho devem não ter
sido apropriadas, ou factores imprevistos podem ter invalidado os calendários e
previsões do tempo. Como alternativa, os próprios objectivos podem requerer revisão
ou ajustamento à luz da experiência ganha desde o início do projecto.

Tal como a monitoria, a avaliação corrente é uma actividade interna do projecto


realizada pela gestão do projecto. Relativamente informal, os resultados são antes de
mais para a gestão do projecto e devem ser usados para melhorar a implementação.

10. AS AVALIAÇÕES DO PROJECTO


i. O projecto e o contexto macroeconómico:
a) A planificação do projecto no seu contexto político
b) Revisão e perspectivas para o futuro.

11. TPC
PROPOSTA DE ESTRUTURA DO RELATÓRIO
A. Introdução

75
i) Propósito do projecto (Porque foi desenhado o projecto?)
ii) Resumo (breve sumário dos principais aspectos que o projecto irá abordar)
B. Contextualização
i) Características do sector agrário
 Ambiente natural e económico
 O subsector do projecto
ii) Planos e objectivos de desenvolvimento
 Tendências e políticas, desenvolvimentos e programas passados
iii) Constrangimentos de desenvolvimento e principais problemas
iv) Área do projecto
 Características físicas, económicas e sociais
C. O projecto
i) Objectivos
ii) Descrição geral
iii) Características detalhadas e alternativas
D. Organização e Gestão
i) Autoridade organizadora
 Instituições necessárias
ii) Beneficiários do projecto
iii) Implementação planificada
iv) Força de trabalho
 Recursos, treinamento
v) Produção, mercados e preços
E. Custos e benefícios do projecto
i) Custos do projecto
 Items a ser identificados
 Necessidades em moeda estrangeira
ii) Benefícios do projecto
 Primários
 Secundários

76
F. Orçamento e financiamento
i) Orçamento total do projecto
ii) Financiamento
 Arranjos propostos para empréstimo, recuperação de custos, contribuição
dos agricultores e/ou necessidades de financiamento
G. Avaliação económico-financeira do projecto com taxas de desconto
 Análise custo/benefícios
 Valor actual líquido
 Taxa interna de retorno
H. Conclusões e recomendações
i) Sumário
 Necessidade e justificação do projecto
ii) Requisitos para a preparação e apreciação
 Recomendações

GUIÃO PARA ACEDER AS QUESTÕES CHAVE A SEREM


CONSIDERADAS

1. Que demandas ou necessidades irá o projecto satisfazer? Por que meios?


2. Que problemas ou constrangimentos no processo de desenvolvimento,
provenientes de várias fontes/factores irá o projecto superar? Como?
3. Que recursos não utilizados ou subutilizados irá o projecto converter para
propósitos mais produtivos? Como?
4. Irá conservar ou restaurar algum recurso natural que actualmente é
sobre-explorado? Se sim, como?
5. Irá complementar algum outro investimento, ou actividade económica importante?
Se sim, como?
6. Quais são os objectivos de desenvolvimento do projecto?
7. Que características básicas do projecto e alternativas devem ser alvo de
consideração mais profunda no desenho do projecto?

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8. Que questões institucionais, políticas e outras devem ser endereçadas durante a
apreciação e implementação do projecto?
9. Que passos são necessários para preparar o projecto e os recursos humanos e
outros a serem empregues?
10. Que tipo de items ou inputs o projecto irá usar e quais irão requerer uma análise
custo-benefício?
11. Quais serão os principais items “pesados” (hard), por exemplo, trabalhos civis,
construções, maquinaria?
12. Quais serão os principais items “leves” (soft), por exemplo, instituições
necessárias, programas de treinamento, organizações de beneficiários ou grupos
de utilizadores?
13. Quais são as principais áreas de incerteza e exigências de dados chave?
14. Será apropriado um desenho relativamente mais simples ou mais complexo?

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