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alvesSUMÁRIO

Língua Portuguesa
Interpretação de Texto....................................................................................................................................................................................... 01
Significação das palavras: sinônimos, antônimos, sentido próprio e figurado das palavras..............................................07
Ortografia Oficial.......................................................................................................................................................................... 70
Pontuação............................................................................................................................................................................................................... 14
Acentuação............................................................................................................................................................................................................. 74
Emprego das classes de palavras: substantivo, adjetivo, numeral, pronome, verbo, advérbio, preposição, conjunção
(classificação e sentido que imprime às relações entre as orações)......................................................................................17
Concordância verbal e nominal....................................................................................................................................................................... 55
Regência verbal e nominal................................................................................................................................................................................ 60
Crase......................................................................................................................................................................................................................... 68

Legislação e Conhecimentos Pedagógicos

A educação escolar – atuais tendências e exigências.............................................................................................................................. 01


Currículo e o pleno desenvolvimento do educando............................................................................................................................... 05
A construção de uma escola democrática e inclusiva............................................................................................................................. 16
A qualidade social da educação escolar e a educação para a diversidade numa perspectiva multicultural....................31
Relação professor-aluno, escola-comunidade........................................................................................................................................... 36
A educação escolar como direito e dever do estado.............................................................................................................................. 54
Financiamento da educação............................................................................................................................................................................. 54
Concepções Filosóficas da Educação.........................................................................................................................................55
Relação Educação – Sociedade – Cultura. Tendências pedagógicas na prática escolar. Planejamento, metodologia e
avaliação do processo ensino/aprendizagem............................................................................................................................................ 58

Bibliografia Sugerida:
BRASIL. Secretaria de Educação Especial. Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da educação inclusiva.
Brasília, MEC/SEESP, 2008................................................................................................................................................................................. 71
BRASIL. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL –1988. (Artigos 5º, 6º; 205 a 214)..................................71
BRASIL. LEI Nº 8.069, DE 13 DE JULHO DE 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança do Adolescente-ECA..................92
BRASIL. LEI Nº 9.394, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional –
LDB.......................................................................................................................................................................................................................... 147
BRASIL. RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 1, DE 17 DE JUNHO DE 2004....................................................................................................... 164
Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e
Cul- tura Afro-Brasileira e Africana (anexo o Parecer CNE/CP nº 3/2004)....................................................................................164
BRASIL. RESOLUÇÃO CNE/CEB Nº 4, DE 13 DE JULHO DE 2010. Define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a
Educação Básica (anexo o Parecer CNE/CEB nº 7/2010)...................................................................................................................... 166
BRASIL. RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 1, DE 30 DE MAIO DE 2012. Estabelece Diretrizes Nacionais para a Educação em
Direi- tos Humanos (anexo o Parecer CNE/CP nº 8/2012).................................................................................................................. 176
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS..................................................................................................................................177
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e Protocolo Facultativo. Disponível em: \<http://cape.edu-
net.sp.gov.br/cape_arquivos/flash/5Convencao.ONU_2006.pdf\>. Acesso em: 18 jul. 2013.6.949, DE 25 DE AGOSTO DE
2009 Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo,
assinados em Nova York, em 30 de março de 2007............................................................................................................................. 178
PERRENOUD, Philippe. “10 novas competências para ensinar”. Porto Alegre. Artmed............................................................193
SUMÁRIO

PERRENOUD, Philippe. Formando Professores Profissionais, Porto Alegre. Artmed-Artes Médicas Sul, 2001 - Edição
revisada.................................................................................................................................................................................................................. 193
MOREIRA, Antonio Flávio B. (Org.) – Currículo – Questões atuais – Papirus Editora........................................................193
HOFFMANN, Jussara – Avaliação Mediadora – Editora Mediação – 2000....................................................................................198
CARVALHO, Rosita Edler. Educação Inclusiva com os Pingos nos Is. 2. ed. Porto Alegre: Mediação, 2005......................201
CORTELLA, Mário Sérgio. A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológicos e políticos. Ed. São Paulo, Cortez,
2011........................................................................................................................................................................................................................ 206
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 43. ed., São Paulo: Paz e Terra,
2011........................................................................................................................................................................................................................ 216
LA TAILLE, Yves. DANTAS, Heloisa e OLIVEIRA, Marta Kohl de, Piaget, Vygotsky, Wallon: teorias psicogenéticas em dis-
cussão. 24. ed., São Paulo: Summus, 1992................................................................................................................................................ 221
MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. UNESCO/Cortez Editora, cap. III e IV, p. 47-78, e cp.
VI, 93 -104, 2000................................................................................................................................................................................................. 226
RIOS, Terezinha Azerêdo. Ética e competência. 20. ed., São Paulo: Cortez, 2011..............................................................226
SACRISTÀN, J. Gimeno; PÉREZ GOMES, A. I. Compreender e transformar o ensino. 4. ed. Porto Alegre: ARTMED,
2000........................................................................................................................................................................................................................ 229
SAVIANI, Dermeval. Histórias das ideias pedagógicas no Brasil. Campinas; Autores Associados, 2010............................229
TEIXEIRA, Anísio. A escola pública universal e gratuita. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Rio de Janeiro, v.26,
n.64, out./dez. 1956. p. 3-27........................................................................................................................................................................... 231
GROPPA, Julio – Indisciplina na escola (alternativas, teóricas e práticas) Summus Editorial............................................236

Conhecimentos Específicos
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da educação e da pedagogia: geral e Brasil- 3a ed. São Paulo: Moderna 2006......01
BOURDIEU, Pierre. A Escola Conservadora: as desigualdades frente à escola e à cultura. In NOGUEIRA, M. A.; CATANI, A.
Escritos
de Educação. 2 ed. Petrópolis: Vozes, 1999.................................................................................................................................................... 01
FERREIRA, Naura Syria Carapeto (org). Gestão democrática da educação: atuais tendências, novos desafios. 8ª ed. São Paulo:
Cortez, 2013............................................................................................................................................................................................................. 02
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 57a ed. São Paulo: Paz e Terra, 2014....................................................................................03
LIBÂNEO, José Carlos; OLIVEIRA, José Ferreira de Toschi; SEABRA, Mirza. Educação escolar: política, estrutura e
organização. 10a ed. São Paulo: Cortez, 2012.............................................................................................................................................. 10
LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1983........................................................................................................................... 12
LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem escolar. 17a ed. São Paulo: Cortez, 2005..................................................21
PARO, Vitor. A educação, a política e a administração: reflexões sobre a prática do diretor de escola In: Educação e Pesquisa,
São Paulo, v. 36, n.3, p. 763-778, set./dez, 2010........................................................................................................................................... 25
PARO, Vitor. Diretor Escolar: educador ou gerente?. São Paulo: Cortez, 2015..................................................................................... 25
PARO, Vitor. Gestão Democrática da Escola Pública. 4a ed. São Paulo: Cortez, 2016..............................................................26
VYGOTSKY, L. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2001..............................................................................26
VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Inovações e Projeto Político-Pedagógico: uma relação regulatória ou emancipatória? In:
Cader- no Cedes, Campinas, v. 23, n. 61, p. 267-281.................................................................................................................................. 27
VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Projeto Político Pedagógico da escola: uma construção possível. São Paulo: Papirus, 1998.....28
MARSIGLIA, Ana Carolina Galvão. A prática pedagógica histórico-crítica na educação infantil e no ensino fundamental.
Cam- pinas, SP: Autores Associados, 2011..................................................................................................................................................... 32
MARTINS, Lígia Márcia. O desenvolvimento do psiquismo e a educação escolar: contribuições a luz da Psicologia Histórico-
-Cultural e da Pedagogia Histórico-Crítica. Campinas, SP: Autores Associados, 2013......................................................................32
SAVIANI, Dermeval. Escola e Democracia. São Paulo: Cortez; Campinas, SP: Autores Associados, 1983....................................32
SAVIANI, Dermeval. O papel do diretor de escola numa sociedade em crise. IN: Educação: do Senso Comum à
Consciência Filosófica. Coleção Educação Contemporânea. 11a edição. São Paulo: Editora Autores Associados,1996, p.206
a 209............................................................................................................................................................................................... 34
SAVIANI, Dermeval. Pedagogia Histórico-Crítica: primeiras aproximações. Campinas, SP: Autores Associados, 2011...........35
LÍNGUA PORTUGUESA

Leitura e interpretação de diversos tipos de textos (literários e não literários).............................................................................01


Sinônimos e antônimos...................................................................................................................................................................................... 07
Sentido próprio e figurado das palavras................................................................................................................................... 07
Pontuação............................................................................................................................................................................................................... 14
Classes de palavras: substantivo, adjetivo, numeral, pronome, verbo, advérbio, preposição e conjunção: emprego e
sentido que imprimem às relações que estabelecem............................................................................................................................. 17
Concordância verbal e nominal....................................................................................................................................................................... 55
Regência verbal e nominal.......................................................................................................................................................... 60
Colocação pronominal........................................................................................................................................................................................ 66
Crase......................................................................................................................................................................................................................... 68
Ortografia Oficial.......................................................................................................................................................................... 70
Acentuação............................................................................................................................................................................................................. 74
LÍNGUA PORTUGUESA

LEITURA E INTERPRETAÇÃO DE DIVERSOS TIPOS DE - A linguagem não literária é objetiva, denotativa,


TEXTOS (LITERÁRIOS E NÃO preocupa-se em transmitir o conteúdo, utiliza a palavra
LITERÁRIOS). em seu sentido próprio, utilitário, sem preocupação
artística. Geralmente, recorre à ordem direta (sujeito,
verbo, com- plementos).

Leia com atenção os textos a seguir e compare as lin-


Sabemos que a “matéria-prima” da literatura são as guagens utilizadas neles.
pa- lavras. No entanto, é necessário fazer uma distinção
entre a linguagem literária e a linguagem não literária, isto Texto A
é, aquela que não caracteriza a literatura. Amor (ô). [Do lat. amore.] S. m. 1. Sentimento que pre-
Embora um médico faça suas prescrições em deter- dispõe alguém a desejar o bem de outrem, ou de alguma
minado idioma, as palavras utilizadas por ele não podem coisa: amor ao próximo; amor ao patrimônio artístico de
ser consideradas literárias porque se tratam de um voca- sua terra. 2. Sentimento de dedicação absoluta de um ser
a outro ser ou a uma coisa; devoção, culto; adoração:
bulário especializado e de um contexto de uso específi-
amor à Pátria; amor a uma causa. 3. Inclinação ditada por
co. Agora, quando analisamos a literatura, vemos que o
laços de família: amor filial; amor conjugal. 4. Inclinação
escritor dispensa um cuidado diferente com a linguagem
forte por pessoa de outro sexo, geralmente de caráter
escrita, e que os leitores dispensam uma atenção diferen- sexual, mas que apresenta grande variedade e
ciada ao que foi produzido. comportamentos e rea- ções.
Outra diferença importante é com relação ao trata- Aurélio Buarque de Holanda Ferreira. Novo Dicionário
mento do conteúdo: ao passo que, nos textos não literá- da Língua Portuguesa, Nova
rios ( jornalísticos, científicos, históricos, etc.) as palavras Fronteira.
servem para veicular uma série de informações, o texto
literário funciona de maneira a chamar a atenção para a Texto B
própria língua (FARACO & MOURA, 1999) no sentido de Amor é fogo que arde sem se ver;
explorar vários aspectos como a sonoridade, a estrutura É ferida que dói e não se sente;
sintática e o sentido das palavras. É um contentamento descontente;
Veja abaixo alguns exemplos de expressões na lin- é dor que desatina sem doer.
guagem não literária ou “corriqueira” e um exemplo de Luís de Camões. Lírica, Cultrix.
uso da mesma expressão, porém, de acordo com alguns
escritores, na linguagem literária: Você deve ter notado que os textos tratam do mesmo
assunto, porém os autores utilizam linguagens diferentes.
Linguagem não literária: No texto A, o autor preocupou-se em definir “amor”,
1- Anoitece. usando uma linguagem objetiva, científica, sem preocupa-
2- Teus cabelos loiros brilham. ção artística.
3- Uma nuvem cobriu parte do céu. ... No texto B, o autor trata do mesmo assunto, mas com
preocupação literária, artística. De fato, o poeta entra no
campo subjetivo, com sua maneira própria de se expres-
Linguagem literária:
sar, utiliza comparações (compara amor com fogo, ferida,
1- A mão da noite embrulha os horizontes. (Alvaren-
contentamento e dor) e serve-se ainda de contrastes que
ga Peixoto) acabam dando graça e força expressiva ao poema (con-
2- Os clarins de ouro dos teus cabelos cantam na luz! tentamento descontente, dor sem doer, ferida que não se
(Mário Quintana) sente, fogo que não se vê).
3- um sujo de nuvem emporcalhou o luar em sua
nascença. (José Cândido de Carvalho) Questões

Como distinguir, na prática, a linguagem literária da 1-) Leia o trecho do poema abaixo.
não literária?
- A linguagem literária é conotativa, utiliza figuras O Poeta da Roça
(palavras de sentido figurado), em que as palavras adqui- Sou fio das mata, cantô da mão grosa
rem sentidos mais amplos do que geralmente possuem. Trabaio na roça, de inverno e de estio
- Na linguagem literária há uma preocupação com a A minha chupana é tapada de barro
escolha e a disposição das palavras, que acabam dando Só fumo cigarro de paia de mio.
vida e beleza a um texto. Patativa do Assaré
- Na linguagem literária é muito importante a manei-
ra original de apresentar o tema escolhido.

1
LÍNGUA PORTUGUESA

A respeito dele, é possível afirmar que


TEXTO II
(A) não pode ser considerado literário, visto que a lin-
guagem aí utilizada não está adequada à norma culta for- A cana-de-açúcar
mal. Originária da Ásia, a cana-de-açúcar foi introduzida no
(B) não pode ser considerado literário, pois nele não Brasil pelos colonizadores portugueses no século XVI. A
se percebe a preservação do patrimônio cultural brasileiro. re- gião que durante séculos foi a grande produtora de
(C) não é um texto consagrado pela crítica literária. cana-de-
(D) trata-se de um texto literário, porque, no processo -açúcar no Brasil é a Zona da Mata nordestina, onde os
criativo da Literatura, o trabalho com a linguagem pode férteis solos de massapé, além da menor distância em
aparecer de várias formas: cômica, lúdica, erótica, popular relação ao mercado europeu, propiciaram condições
etc favoráveis a esse cultivo. Atualmente, o maior produtor
(E) a pobreza vocabular – palavras erradas – não nacional de cana-de-
permi- te que o consideremos um texto literário. -açúcar é São Paulo, seguido de Pernambuco, Alagoas, Rio
de Janeiro e Minas Gerais. Além de produzir o açúcar, que
Leia os fragmentos abaixo para responder às questões em parte é exportado e em parte abastece o mercado
que seguem: interno, a cana serve também para a produção de álcool,
importante nos dias atuais como fonte de energia e de
TEXTO I bebidas. A imen- sa expansão dos canaviais no Brasil,
O açúcar especialmente em São Paulo, está ligada ao uso do álcool
O branco açúcar que adoçará meu café como combustível.
nesta manhã de Ipanema
não foi produzido por mim 2-) Para que um texto seja literário:
nem surgiu dentro do açucareiro por milagre. a) basta somente a correção gramatical; isto é, a
Vejo-o puro expres- são verbal segundo as leis lógicas ou naturais.
e afável ao paladar b) deve prescindir daquilo que não tenha
como beijo de moça, água correspondên- cia na realidade palpável e externa.
na pele, flor c) deve fugir do inexato, daquilo que confunda a
que se dissolve na boca. Mas este açúcar capaci- dade de compreensão do leitor.
não foi feito por mim. d) deve assemelhar-se a uma ação de desnudamento.
Este açúcar veio O escritor revela, ao escrever, o mundo, e, em especial,
da mercearia da esquina e tampouco o fez o Oliveira, revela o Homem aos outros homens.
dono da mercearia. e) deve revelar diretamente as coisas do mundo:
Este açúcar veio senti- mentos, ideias, ações.
de uma usina de açúcar em
Pernambuco ou no Estado do Rio 3-) Ainda com relação ao textos I e II, assinale a opção
e tampouco o fez o dono da usina. incorreta
Este açúcar era cana a) No texto I, em lugar de apenas informar sobre o
e veio dos canaviais real, ou de produzi-lo, a expressão literária é utilizada
extensos que não nascem principal- mente como um meio de refletir e recriar a
por acaso no regaço do vale. realidade.
Em lugares distantes, onde não há hospital b) No texto II, de expressão não literária, o autor
nem escola, informa o leitor sobre a origem da cana-de-açúcar, os
homens que não sabem ler e morrem de fome lugares onde é produzida, como teve início seu cultivo no
aos 27 anos Brasil, etc.
plantaram e colheram a cana c) O texto I parte de uma palavra do domínio comum
que viraria açúcar. – açúcar – e vai ampliando seu potencial significativo,
Em usinas escuras, explo- rando recursos formais para estabelecer um
homens de vida amarga paralelo entre o açúcar – branco, doce, puro – e a vida do
e dura trabalhador que o produz – dura, amarga, triste.
produziram este d) No texto I, a expressão literária desconstrói hábitos
açúcar branco e puro de linguagem, baseando sua recriação no aproveitamento
com que adoço meu café esta manhã em Ipanema. de novas formas de dizer.
e) O texto II não é literário porque, diferentemente do lite-
Fonte: “O açúcar” (Ferreira Gullar. Toda poesia. Rio de rário, parte de um aspecto da realidade, e não da imaginação.
Janeiro, Civilização Brasileira, 1980, pp.227-228)
Gabarito

1-) D

2-) D – Esta alternativa está correta, pois ela remete ao


caráter reflexivo do autor de um texto literário, ao passo
em que ele revela às pessoas o “seu mundo” de maneira
peculiar.
2
LÍNGUA PORTUGUESA

3-) E – o texto I também fala da realidade, mas com


um cunho diferente do texto II. No primeiro há uma Condições básicas para interpretar
colocação diferenciada por parte do autor em que o
Fazem-se necessários:
objetivo não é unicamente passar informação, existem
outros “motiva- dores” por trás desta escrita. a) Conhecimento histórico–literário (escolas e gêneros
literários, estrutura do texto), leitura e prática;
É muito comum, entre os candidatos a um cargo pú- b) Conhecimento gramatical, estilístico (qualidades do
blico, a preocupação com a interpretação de textos. Isso texto) e semântico;
acontece porque lhes faltam informações específicas a Observação – na semântica (significado das palavras)
respeito desta tarefa constante em provas relacionadas incluem-se: homônimos e parônimos, denotação e cono-
a concursos públicos. tação, sinonímia e antonímia, polissemia, figuras de
Por isso, vão aqui alguns detalhes que poderão aju- lingua- gem, entre outros.
dar no momento de responder às questões relacionadas c) Capacidade de observação e de síntese e
a textos. d) Capacidade de raciocínio.

Texto – é um conjunto de ideias organizadas e rela- Interpretar X compreender


cionadas entre si, formando um todo significativo capaz
de produzir interação comunicativa (capacidade de co- Interpretar significa
dificar e decodificar ). - explicar, comentar, julgar, tirar conclusões, deduzir.
- Através do texto, infere-se que...
Contexto – um texto é constituído por diversas fra- - É possível deduzir que...
ses. Em cada uma delas, há uma certa informação que a - O autor permite concluir que...
faz ligar-se com a anterior e/ou com a posterior, criando - Qual é a intenção do autor ao afirmar que...
condições para a estruturação do conteúdo a ser trans-
mitido. A essa interligação dá-se o nome de contexto. Compreender significa
Nota-se que o relacionamento entre as frases é tão - intelecção, entendimento, atenção ao que realmente
grande que, se uma frase for retirada de seu contexto está escrito.
original e analisada separadamente, poderá ter um sig- - o texto diz que...
nificado diferente daquele inicial. - é sugerido pelo autor que...
- de acordo com o texto, é correta ou errada a afirma-
Intertexto - comumente, os textos apresentam re- ção...
ferências diretas ou indiretas a outros autores através - o narrador afirma...
de citações. Esse tipo de recurso denomina-se intertexto.
Erros de interpretação
Interpretação de texto - o primeiro objetivo de uma
interpretação de um texto é a identificação de sua ideia É muito comum, mais do que se imagina, a ocorrência
principal. A partir daí, localizam-se as ideias secundárias, de erros de interpretação. Os mais frequentes são:
ou fundamentações, as argumentações, ou explicações,
que levem ao esclarecimento das questões apresentadas a) Extrapolação (viagem)
na prova. Ocorre quando se sai do contexto, acrescentado
ideias que não estão no texto, quer por conhecimento
Normalmente, numa prova, o candidato é convi- prévio do tema quer pela imaginação.
dado a:
b) Redução
1. Identificar – é reconhecer os elementos funda- É o oposto da extrapolação. Dá-se atenção apenas a
mentais de uma argumentação, de um processo, de uma um aspecto, esquecendo que um texto é um conjunto de
época (neste caso, procuram-se os verbos e os advér- ideias, o que pode ser insuficiente para o total do entendi-
bios, os quais definem o tempo). mento do tema desenvolvido.
2. Comparar – é descobrir as relações de semelhança
ou de diferenças entre as situações do texto. c) Contradição
3. Comentar - é relacionar o conteúdo apresentado Não raro, o texto apresenta ideias contrárias às do
com uma realidade, opinando a respeito. can- didato, fazendo-o tirar conclusões equivocadas e,
4. Resumir – é concentrar as ideias centrais e/ou se- conse- quentemente, errando a questão.
cundárias em um só parágrafo.
5. Parafrasear – é reescrever o texto com outras pa- Observação - Muitos pensam que há a ótica do
lavras. escritor e a ótica do leitor. Pode ser que existam, mas
numa prova de concurso, o que deve ser levado em
consideração é o que o autor diz e nada mais.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Coesão - é o emprego de mecanismo de sintaxe que


relacionam palavras, orações, frases e/ou parágrafos entre - Falante não pode negar que tenha querido
si. Em outras palavras, a coesão dá-se quando, através de transmitir a informação expressa pelo pressuposto, mas
um pronome relativo, uma conjunção (NEXOS), ou um pode negar que tenha desejado transmitir a informação
pro- nome oblíquo átono, há uma relação correta entre o expressa pelo subentendido.
que se vai dizer e o que já foi dito. - Negação da informação não nega o pressuposto.
- Pressuposto não verdadeiro – informação explícita
OBSERVAÇÃO – São muitos os erros de coesão no dia- absurda.
-a-dia e, entre eles, está o mau uso do pronome relativo e - Principais marcadores de pressupostos: a) adjetivos;
do pronome oblíquo átono. Este depende da regência do b) verbos; c) advérbios; d) orações adjetivas; e) conjunções.
verbo; aquele do seu antecedente. Não se pode esquecer
também de que os pronomes relativos têm, cada um, QUESTÕES
valor semântico, por isso a necessidade de adequação ao
ante- cedente. (Agente Estadual de Trânsito – DETRAN - SP – Vu-
Os pronomes relativos são muito importantes na in- nesp/2013)
terpretação de texto, pois seu uso incorreto traz erros de
coesão. Assim sendo, deve-se levar em consideração que O uso da bicicleta no Brasil
existe um pronome relativo adequado a cada
circunstância, a saber: A utilização da bicicleta como meio de locomoção no
Brasil ainda conta com poucos adeptos, em comparação
que (neutro) - relaciona-se com qualquer com países como Holanda e Inglaterra, por exemplo, nos
antecedente, mas depende das condições da frase. quais a bicicleta é um dos principais veículos nas ruas.
qual (neutro) idem ao Ape- sar disso, cada vez mais pessoas começam a
anterior. quem (pessoa) acreditar que a bicicleta é, numa comparação entre todos
cujo (posse) - antes dele aparece o possuidor e depois os meios de transporte, um dos que oferecem mais
o objeto possuído. vantagens.
como (modo) A bicicleta já pode ser comparada a carros, motocicle-
onde (lugar) tas e a outros veículos que, por lei, devem andar na via e
quando (tempo) jamais na calçada. Bicicletas, triciclos e outras variações
quanto (montante) são todos considerados veículos, com direito de circulação
pe- las ruas e prioridade sobre os automotores.
Exemplo: Alguns dos motivos pelos quais as pessoas aderem à
Falou tudo QUANTO queria (correto)
bicicleta no dia a dia são: a valorização da
Falou tudo QUE queria (errado - antes do QUE, deveria
sustentabilidade, pois as bikes não emitem gases nocivos
aparecer o demonstrativo O ).
Dicas para melhorar a interpretação de textos ao ambiente, não consomem petróleo e produzem muito
- Ler todo o texto, procurando ter uma visão geral do menos sucata de metais, plásticos e borracha; a
assunto; diminuição dos congestio- namentos por excesso de
- Se encontrar palavras desconhecidas, não interrompa veículos motorizados, que atin- gem principalmente as
a leitura; grandes cidades; o favorecimento da saúde, pois pedalar
- Ler, ler bem, ler profundamente, ou seja, ler o texto é um exercício físico muito bom; e a economia no
pelo menos duas vezes; combustível, na manutenção, no seguro e, claro, nos
- Inferir; impostos.
- Voltar ao texto tantas quantas vezes precisar; No Brasil, está sendo implantado o sistema de com-
- Não permitir que prevaleçam suas ideias sobre as do partilhamento de bicicletas. Em Porto Alegre, por
autor; exemplo, o BikePOA é um projeto de sustentabilidade da
- Fragmentar o texto (parágrafos, partes) para melhor Prefeitu- ra, em parceria com o sistema de Bicicletas
compreensão; SAMBA, com quase um ano de operação. Depois de Rio
- Verificar, com atenção e cuidado, o enunciado de de Janeiro, São Paulo, Santos, Sorocaba e outras cidades
cada questão; espalhadas pelo país aderirem a esse sistema, mais duas
- O autor defende ideias e você deve percebê-las; capitais já estão com o projeto pronto em 2013: Recife e
Goiânia. A ideia do compartilhamento é semelhante em
Segundo Fiorin:
todas as cidades. Em Porto Alegre, os usuários devem
-Pressupostos – informações implícitas decorrentes
fazer um cadastro pelo site. O valor do passe mensal é
necessariamente de palavras ou expressões contidas na
frase. R$10 e o do passe diário, R$5, podendo-se utilizar o
- Subentendidos – insinuações não marcadas clara- sistema durante todo o dia, das 6h às 22h, nas duas
mente na linguagem. modalidades. Em todas as cidades que já aderiram ao
- Pressupostos – verdadeiros ou admitidos como tal. projeto, as bicicletas estão espalhadas em pontos
- Subentendidos – de responsabilidade do ouvinte. estratégicos.
A cultura do uso da bicicleta como meio de locomoção
não está consolidada em nossa sociedade. Muitos ainda
não sabem que a bicicleta já é considerada um meio de
transporte, ou desconhecem as leis que abrangem a bike.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Na confusão de um trânsito caótico numa cidade grande,


carros, motocicletas, ônibus e, agora, bicicletas, misturam- não são apenas maus motoristas, sem condições de
se, causando, muitas vezes, discussões e acidentes que dirigir, mas também se engajam num comportamento de
po- deriam ser evitados. risco – algumas até agem especificamente para irritar o
Ainda são comuns os acidentes que atingem ciclistas. outro mo- torista ou impedir que este chegue onde
A verdade é que, quando expostos nas vias públicas, eles precisa.
estão totalmente vulneráveis em cima de suas bicicletas. Essa é a evolução de pensamento que alguém poderá
Por isso é tão importante usar capacete e outros itens de ter antes de passar para a ira de trânsito de fato, levando
segurança. A maior parte dos motoristas de carros, um motorista a tomar decisões irracionais.
ônibus, motocicletas e caminhões desconhece as leis que Dirigir pode ser uma experiência arriscada e emocio-
abran- gem os direitos dos ciclistas. Mas muitos ciclistas nante. Para muitos de nós, os carros são a extensão de
também ignoram seus direitos e deveres. Alguém que nossa personalidade e podem ser o bem mais valioso que
resolve in- tegrar a bike ao seu estilo de vida e usá-la possuímos. Dirigir pode ser a expressão de liberdade para
como meio de locomoção precisa compreender que alguns, mas também é uma atividade que tende a aumen-
deverá gastar com alguns apetrechos necessários para tar os níveis de estresse, mesmo que não tenhamos cons-
poder trafegar. De acordo com o Código de Trânsito ciência disso no momento.
Brasileiro, as bicicletas devem, obrigatoriamente, ser Dirigir é também uma atividade comunitária. Uma vez
equipadas com campainha, sinalização noturna dianteira, que entra no trânsito, você se junta a uma comunidade
traseira, lateral e nos pedais, além de espelho retrovisor de outros motoristas, todos com seus objetivos, medos e
do lado esquerdo. habilidades ao volante. Os psicólogos Leon James e Diane
(Bárbara Moreira, http://www.eusoufamecos.net. Nahl dizem que um dos fatores da ira de trânsito é a ten-
Adaptado) dência de nos concentrarmos em nós mesmos, descartan-
do o aspecto comunitário do ato de dirigir.
01. De acordo com o texto, o uso da bicicleta como Como perito do Congresso em Psicologia do Trânsito,
meio de locomoção nas metrópoles brasileiras o Dr. James acredita que a causa principal da ira de trânsi-
(A) decresce em comparação com Holanda e to não são os congestionamentos ou mais motoristas nas
Inglaterra devido à falta de regulamentação. ruas, e sim como nossa cultura visualiza a direção agressi-
(B) vem se intensificando paulatinamente e tem sido va. As crianças aprendem que as regras normais em
incentivado em várias cidades. relação ao comportamento e à civilidade não se aplicam
(C) tornou-se, rapidamente, um hábito cultivado pela quando dirigimos um carro. Elas podem ver seus pais
maioria dos moradores. envolvidos em comportamentos de disputa ao volante,
(D) é uma alternativa dispendiosa em comparação mudando de faixa continuamente ou dirigindo em alta
com os demais meios de transporte. velocidade, sem- pre com pressa para chegar ao destino.
(E) tem sido rejeitado por consistir em uma atividade Para complicar as coisas, por vários anos psicólogos
arriscada e pouco salutar. sugeriam que o melhor meio para aliviar a raiva era des-
carregar a frustração. Estudos mostram, no entanto, que a
02. A partir da leitura, é correto concluir que um dos descarga de frustrações não ajuda a aliviar a raiva. Em
objetivos centrais do texto é uma situação de ira de trânsito, a descarga de frustrações
(A) informar o leitor sobre alguns direitos e deveres do pode transformar um incidente em uma violenta briga.
ciclista. Com isso em mente, não é surpresa que brigas vio-
(B) convencer o leitor de que circular em uma bicicleta lentas aconteçam algumas vezes. A maioria das pessoas
é mais seguro do que dirigir um carro. está predisposta a apresentar um comportamento irracio-
(C) mostrar que não há legislação acerca do uso da bi- nal quando dirige. Dr. James vai ainda além e afirma que a
cicleta no Brasil. maior parte das pessoas fica emocionalmente
(D) explicar de que maneira o uso da bicicleta como incapacitada quando dirige. O que deve ser feito, dizem
meio de locomoção se consolidou no Brasil. os psicólogos, é estar ciente de seu estado emocional e
(E) defender que, quando circular na calçada, o ciclista fazer as escolhas corretas, mesmo quando estiver tentado
deve dar prioridade ao pedestre. a agir só com a emoção.
(Jonathan Strickland. Disponível em: http://carros.hsw.
(Oficial Estadual de Trânsito - DETRAN-SP - Vunesp uol.com.br/furia-no-transito1 .htm. Acesso em: 01.08.2013.
2013) Leia o texto para responder às questões de 3 a 5 Adaptado)

Propensão à ira de trânsito 3-) Tomando por base as informações contidas no tex-
to, é correto afirmar que
Dirigir um carro é estressante, além de inerentemente (A) os comportamentos de disputa ao volante aconte-
perigoso. Mesmo que o indivíduo seja o motorista mais cem à medida que os motoristas se envolvem em decisões
se- guro do mundo, existem muitas variáveis de risco no conscientes.
trân- sito, como clima, acidentes de trânsito e obras nas (B) segundo psicólogos, as brigas no trânsito são cau-
ruas. E com relação a todas as outras pessoas nas ruas? sadas pela constante preocupação dos motoristas com o
Algumas aspecto comunitário do ato de dirigir.

5
LÍNGUA PORTUGUESA

(C) para Dr. James, o grande número de carros nas


6-) Considere:
ruas é o principal motivo que provoca, nos motoristas,
uma di- reção agressiva. I. Segundo o texto, na ficção científica abordam-se,
(D) o ato de dirigir um carro envolve uma série de ex- com distanciamento de tempo e espaço, questões con-
periências e atividades não só individuais como também troversas e moralmente incômodas da sociedade atual, de
sociais. modo que a solução oferecida pela fantasia possa ser apli-
(E) dirigir mal pode estar associado à falta de controle cada para resolver os problemas da realidade.
II. Parte do poder de convencimento da ficção cientí-
das emoções positivas por parte dos motoristas.
fica deriva do fato de serem apresentados ao espectador
4. A ira de trânsito objetos imaginários que, embora não existam na vida real,
A) aprimora uma atitude de reconhecimento de regras. estão, de algum modo, conectados à realidade.
(B) implica tomada de decisões sem racionalidade. III. A ficção científica extrapola os limites da realidade,
(C) conduz a um comportamento coerente. mas baseia-se naquilo que, pelo menos em teoria, acredi-
(D) resulta do comportamento essencialmente comu- ta-se que seja possível.
nitário dos motoristas. Está correto o que se afirma APENAS em
(E) decorre de imperícia na condução de um veículo. (A) III.
(B) I e II.
5. De acordo com o perito Dr. James, (C) I e III.
(A) os congestionamentos representam o principal fa- (D) II e III.
tor para a ira no trânsito. (E) II.
(B) a cultura dos motoristas é fator determinante para
o aumento de suas frustrações. 7-) Sem prejuízo para o sentido original e a correção
(C) o motorista, ao dirigir, deve ser individualista em gramatical, o termo sonhar, em ... a sociedade se permite
suas ações, a fim de expressar sua liberdade e garantir sonhar seus piores problemas... (2o parágrafo), pode ser
que outros motoristas não o irritem. substituído por:
(D) a principal causa da direção agressiva é o desco- (A) descansar.
nhecimento das regras de trânsito. (B) desprezar.
(E) o comportamento dos pais ao dirigirem com ira (C) esquecer.
contradiz o aprendizado das crianças em relação às regras (D) fugir.
de civilidade. (E) imaginar.

(TRF 3ª região/2014) Para responder às questões de (TRF 3ª região/2014) Atenção: Para responder às
números 6 e 7 considere o texto abaixo. ques- tões de números 8 a 10 considere o texto abaixo.
Toda ficção científica, de Metrópolis ao Senhor dos Texto I
anéis, baseia-se, essencialmente, no que está acontecen- O canto das sereias é uma imagem que remonta às
do no mundo no momento em que o filme foi feito. Não mais luminosas fontes da mitologia e da literatura gregas.
no futuro ou numa galáxia distante, muitos e muitos anos As versões da fábula variam, mas o sentido geral da trama
atrás, mas agora mesmo, no presente, simbolizado em é comum.
pro- jeções que nos confortam e tranquilizam ao nos As sereias eram criaturas sobre-humanas. Ninfas de
oferecer uma adequada distância de tempo e espaço. extraordinária beleza, viviam sozinhas numa ilha do Medi-
Na ficção científica, a sociedade se permite sonhar terrâneo, mas tinham o dom de chamar a si os
seus piores problemas: desumanização, superpopulação, navegantes, graças ao irresistível poder de sedução do seu
totali- tarismo, loucura, fome, epidemias. Não se imita a canto. Atraí- dos por aquela melodia divina, os navios
realida- de, mas imagina-se, sonha-se, cria-se outra batiam nos recifes submersos da beira-mar e
realidade onde possamos colocar e resolver no plano da naufragavam. As sereias então devoravam
imaginação tudo o que nos incomoda no cotidiano. O impiedosamente os tripulantes.
elemento essencial para guiar a lógica interna do gênero,
Doce o caminho, amargo o fim. Como escapar com
cuja quebra implica o fim da magia, é a ciência. Por isso,
vida do canto das sereias? A literatura grega registra duas
tecnologia é essen- cial ao gênero. Parte do poder desse
soluções vitoriosas. Uma delas foi a saída encontrada por
tipo de magia cine- matográfica está em concretizar,
Orfeu, o incomparável gênio da música e da poesia.
diante dos nossos olhos, objetos possíveis, mas
Quando a embarcação na qual ele navegava entrou
inexistentes: carros voadores, robôs inteligentes. Como
inadvertidamente no raio de ação das sereias, ele conse-
parte dessas coisas imaginadas acaba se tornando
guiu impedir a tripulação de perder a cabeça tocando
realidade, o gênero reforça a sensação de que estamos
vendo na tela projeções das nossas possibilidades uma música ainda mais sublime do que aquela que vinha
coletivas futuras. da ilha. O navio atravessou incólume a zona de perigo.
(Adaptado de: BAHIANA, Ana Maria. Como ver um fil- A outra solução foi a de Ulisses. Sua principal arma
me. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2012. formato ebook.) para vencer as sereias foi o reconhecimento franco e cora-
joso da sua fraqueza e da sua falibilidade − a aceitação
dos seus inescapáveis limites humanos.

6
LÍNGUA PORTUGUESA

Ulisses sabia que ele e seus homens não teriam


firmeza para resistir ao apelo das sereias. Por isso, no SINÔNIMOS E ANTÔNIMOS.
momento em que a embarcação se aproximou da ilha, SENTIDO PRÓPRIO E FIGURADO DAS PALAVRAS.
mandou que todos os tripulantes tapassem os ouvidos
com cera e orde- nou que o amarrassem ao mastro
central do navio. O sur- preendente é que Ulisses não
tapou com cera os próprios ouvidos − ele quis ouvir.
Quando chegou a hora, Ulisses foi seduzido pelas sereias
e fez de tudo para convencer os tripulantes a deixarem-no Semântica é o estudo da significação das palavras e
livre para ir juntar-se a elas. Seus subordinados, contudo, das suas mudanças de significação através do tempo ou
cumpriram fielmente a ordem de não soltá-lo até que em determinada época. A maior importância está em dis-
estivessem longe da zona de perigo. tinguir sinônimos e antônimos (sinonímia / antonímia) e
Orfeu escapou das sereias como divindade; Ulisses, homônimos e parônimos (homonímia / paronímia).
como mortal. Ao se aproximar das sereias, a escolha
diante do herói era clara: a falsa promessa de gratificação Sinônimos
ime- diata, de um lado, e o bem permanente do seu
projeto de vida − prosseguir viagem, retornar a Ítaca, São palavras de sentido igual ou aproximado: alfa-
reconquistar Penélope −, do outro. A verdadeira vitória de beto - abecedário; brado, grito - clamor; extinguir, apagar
Ulisses foi contra ele mesmo. Foi contra a fraqueza, o - abolir.
oportunismo suicida e a surdez delirante que ele soube Duas palavras são totalmente sinônimas quando são
reconhecer em sua própria alma. substituíveis, uma pela outra, em qualquer contexto (cara
(Adaptado de: GIANETTI, Eduardo. Auto-engano. São e rosto, por exemplo); são parcialmente sinônimas quan-
Paulo, Cia. das Letras, 1997. Formato eBOOK) do, ocasionalmente, podem ser substituídas, uma pela
outra, em determinado enunciado (aguardar e esperar).
8-) Há no texto
(A) comparação entre os meios que Orfeu e Ulisses Observação: A contribuição greco-latina é respon-
usam para enfrentar o desafio que se apresenta a eles. sável pela existência de numerosos pares de sinônimos:
(B) rivalidade entre o mortal Ulisses e o divino Orfeu,
adversário e antagonista; translúcido e diáfano; semicírculo
cujo talento musical causava inveja ao primeiro.
e hemiciclo; contraveneno e antídoto; moral e ética; coló-
(C) juízo de valor a respeito das atitudes das sereias
quio e diálogo; transformação e metamorfose; oposição e
em
relação aos navegantes e elogio à astúcia de Orfeu. antítese.
(D) crítica à forma pouco original com que Orfeu deci-
de enganar as sereias e elogio à astúcia de Ulisses. Antônimos
(E) censura à atitude arriscada de Ulisses, cuja ousadia
quase lhe custou seu projeto de vida. São palavras que se opõem através de seu significado:
ordem - anarquia; soberba - humildade; louvar - censurar;
9-) Depreende-se do texto que as sereias atingiam mal - bem.
seus objetivos por meio de
(A) intolerância. Observação: A antonímia pode se originar de um
(B) dissimulação. prefixo de sentido oposto ou negativo: bendizer e maldi-
(C) lisura. zer; simpático e antipático; progredir e regredir; concórdia
(D) observação. e discórdia; ativo e inativo; esperar e desesperar; comunista
(E) condescendência. e anticomunista; simétrico e assimétrico.

10-) O navio atravessou incólume a zona de perigo. Homônimos e Parônimos


(4o parágrafo). Mantém-se o sentido original do texto
substi- tuindo-se o elemento grifado por - Homônimos = palavras que possuem a mesma gra-
(A) insolente. fia ou a mesma pronúncia, mas significados diferentes.
(B) inatingível. Podem ser
(C) intacto.
(D) inativo. a) Homógrafas: são palavras iguais na escrita e dife-
(E) impalpável. rentes na pronúncia:
rego (subst.) e rego (verbo);
GABARITO
colher (verbo) e colher (subst.);
1- B 2-A 3-D 4-B 5-E jogo (subst.) e jogo (verbo);
denúncia (subst.) e denuncia (verbo);
6- D 7-E 8-A 9-B 10-C
providência (subst.) e providencia (verbo).

7
LÍNGUA PORTUGUESA

b) Homófonas: são palavras iguais na pronúncia e di-


Denotação e Conotação
ferentes na escrita:
acender (atear) e ascender (subir);
Exemplos de variação no significado das palavras:
concertar (harmonizar) e consertar (reparar);
Os domadores conseguiram enjaular a fera. (sentido literal)
cela (compartimento) e sela (arreio);
Ele ficou uma fera quando soube da notícia. (sentido fi-
censo (recenseamento) e senso ( juízo); gurado)
paço (palácio) e passo (andar). Aquela aluna é fera na matemática. (sentido figurado)
As variações nos significados das palavras ocasionam
c) Homógrafas e homófonas simultaneamente (ou
o sentido denotativo (denotação) e o sentido conotativo
perfeitas): São palavras iguais na escrita e na pronúncia: (co- notação) das palavras.
caminho (subst.) e caminho (verbo);
cedo (verbo) e cedo (adv.); Denotação
livre (adj.) e livre (verbo). Uma palavra é usada no sentido denotativo quando
apresenta seu significado original, independentemente do
- Parônimos = palavras com sentidos diferentes, po- contexto em que aparece. Refere-se ao seu significado
rém de formas relativamente próximas. São palavras pa- mais objetivo e comum, aquele imediatamente
recidas na escrita e na pronúncia: cesta (receptáculo de reconhecido e muitas vezes associado ao primeiro
vime; cesta de basquete/esporte) e sesta (descanso após o significado que aparece nos dicionários, sendo o
almoço), eminente (ilustre) e iminente (que está para ocor- significado mais literal da palavra.
rer), osso (substantivo) e ouço (verbo), sede (substantivo e/ A denotação tem como finalidade informar o receptor
ou verbo “ser” no imperativo) e cede (verbo), comprimento da mensagem de forma clara e objetiva, assumindo um
(medida) e cumprimento (saudação), autuar (processar) e ca- ráter prático. É utilizada em textos informativos, como
atuar (agir), infligir (aplicar pena) e infringir (violar), deferir jor- nais, regulamentos, manuais de instrução, bulas de
(atender a) e diferir (divergir), suar (transpirar) e soar (emi- medica- mentos, textos científicos, entre outros. A palavra
tir som), aprender (conhecer) e apreender (assimilar; apro- “pau”, por exemplo, em seu sentido denotativo é apenas
priar-se de), tráfico (comércio ilegal) e tráfego (relativo a um pedaço de madeira. Outros exemplos:
movimento, trânsito), mandato (procuração) e mandado O elefante é um mamífero.
(ordem), emergir (subir à superfície) e imergir (mergulhar, As estrelas deixam o céu mais bonito!
afundar).
Conotação
Hiperonímia e Hiponímia Uma palavra é usada no sentido conotativo quando
apre- senta diferentes significados, sujeitos a diferentes
Hipônimos e hiperônimos são palavras que perten- interpreta- ções, dependendo do contexto em que esteja
cem a um mesmo campo semântico (de sentido), sendo o inserida, referin- do-se a sentidos, associações e ideias que
hipônimo uma palavra de sentido mais específico; o hipe- vão além do sentido original da palavra, ampliando sua
rônimo, mais abrangente. significação mediante a cir- cunstância em que a mesma é
O hiperônimo impõe as suas propriedades ao hipô- utilizada, assumindo um senti- do figurado e simbólico.
nimo, criando, assim, uma relação de dependência se- Como no exemplo da palavra “pau”: em seu sentido
mântica. Por exemplo: Veículos está numa relação de hi- conotativo ela pode significar castigo (dar-lhe um pau),
peronímia com carros, já que veículos é uma palavra de reprovação (tomei pau no concurso).
significado genérico, incluindo motos, ônibus, caminhões. A conotação tem como finalidade provocar sentimen-
Veículos é um hiperônimo de carros. tos no receptor da mensagem, através da expressividade e
Um hiperônimo pode substituir seus hipônimos em afetividade que transmite. É utilizada principalmente numa
quaisquer contextos, mas o oposto não é possível. A utili- linguagem poética e na literatura, mas também ocorre em
zação correta dos hiperônimos, ao redigir um texto, evita conversas cotidianas, em letras de música, em anúncios
a repetição desnecessária de termos. pu- blicitários, entre outros. Exemplos:
Você é o meu sol!
Fontes de pesquisa: Minha vida é um mar de
http://www.coladaweb.com/portugues/sinonimos,- tristezas. Você tem um coração
-antonimos,-homonimos-e-paronimos de pedra!
SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa
Sacconi. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010. * Dica: Procure associar Denotação com Dicionário:
Português linguagens: volume 1 / Wiliam Roberto Ce- tra- ta-se de definição literal, quando o termo é utilizado
reja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São com o sentido que consta no dicionário.
Paulo: Saraiva, 2010.
Português: novas palavras: literatura, gramática, reda- Fontes de pesquisa:
ção / Emília Amaral... [et al.]. – São Paulo: FTD, 2000. http://www.normaculta.com.br/conotacao-e-denota-
XIMENES, Sérgio. Minidicionário Ediouro da Lìngua cao/
Portuguesa – 2ªed. reform. – São Paulo: Ediouro, 2000. SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa
Sacconi. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010.
Português linguagens: volume 1 / Wiliam Roberto Ce-
reja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São
Paulo: Saraiva, 2010.

8
LÍNGUA PORTUGUESA

Polissemia
De igual forma, quando uma palavra é polissêmica,
ela pode induzir uma pessoa a fazer mais do que uma in-
Polissemia é a propriedade de uma palavra adquirir
terpretação. Para fazer a interpretação correta é muito im-
multiplicidade de sentidos, que só se explicam dentro de
portante saber qual o contexto em que a frase é proferida.
um contexto. Trata-se, realmente, de uma única palavra,
Muitas vezes, a disposição das palavras na construção
mas que abarca um grande número de significados
do enunciado pode gerar ambiguidade ou, até mesmo,
dentro de seu próprio campo semântico.
comicidade. Repare na figura abaixo:
Reportando-nos ao conceito de Polissemia, logo per-
cebemos que o prefixo “poli” significa multiplicidade de
algo. Possibilidades de várias interpretações levando-se
em consideração as situações de aplicabilidade. Há uma
infinidade de exemplos em que podemos verificar a ocor-
rência da polissemia:
O rapaz é um tremendo
gato. O gato do vizinho é
peralta.
Precisei fazer um gato para que a energia voltasse.
Pedro costuma fazer alguns “bicos” para garantir sua
sobrevivência
O passarinho foi atingido no bico.

Nas expressões polissêmicas rede de deitar, rede de (http://www.humorbabaca.com/fotos/diversas/corto-


computadores e rede elétrica, por exemplo, temos em co- cabelo-e-pinto. Acesso em 15/9/2014).
mum a palavra “rede”, que dá às expressões o sentido de Poderíamos corrigir o cartaz de inúmeras maneiras,
“entrelaçamento”. Outro exemplo é a palavra “xadrez”, mas duas seriam:
que pode ser utilizada representando “tecido”, “prisão” ou Corte e coloração capilar
“jogo” – o sentido comum entre todas as expressões é o ou
formato quadriculado que têm. Faço corte e pintura capilar

Polissemia e homonímia Fontes de pesquisa:


http://www.brasilescola.com/gramatica/polissemia.
A confusão entre polissemia e homonímia é bastante htm
co- mum. Quando a mesma palavra apresenta vários Português linguagens: volume 1 / Wiliam Roberto Ce-
significados, estamos na presença da polissemia. Por outro reja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São
lado, quando duas ou mais palavras com origens e Paulo: Saraiva, 2010.
significados distintos têm a mesma grafia e fonologia, SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa
temos uma homonímia. Sacconi. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010.
A palavra “manga” é um caso de homonímia. Ela pode
significar uma fruta ou uma parte de uma camisa. Não é Figura de Linguagem, Pensamento e Construção
polissemia porque os diferentes significados para a pala-
vra “manga” têm origens diferentes. “Letra” é uma palavra Figura de Palavra
polissêmica: pode significar o elemento básico do alfabe-
to, o texto de uma canção ou a caligrafia de um determi- A figura de palavra consiste na substituição de uma
nado indivíduo. Neste caso, os diferentes significados es- palavra por outra, isto é, no emprego figurado, simbólico,
tão interligados porque remetem para o mesmo conceito, seja por uma relação muito próxima (contiguidade), seja
o da escrita. por uma associação, uma comparação, uma similaridade.
Estes dois conceitos básicos - contiguidade e similaridade
Polissemia e ambiguidade - permitem-nos reconhecer dois tipos de figuras de pala-
vras: a metáfora e a metonímia.
Polissemia e ambiguidade têm um grande impacto na
interpretação. Na língua portuguesa, um enunciado pode Metáfora
ser ambíguo, ou seja, apresentar mais de uma interpreta-
ção. Esta ambiguidade pode ocorrer devido à colocação Consiste em utilizar uma palavra ou uma expressão
específica de uma palavra (por exemplo, um advérbio) em em lugar de outra, sem que haja uma relação real, mas em
uma frase. Vejamos a seguinte frase: virtude da circunstância de que o nosso espírito as associa
Pessoas que têm uma alimentação equilibrada e percebe entre elas certas semelhanças. É o emprego da
frequen- temente são felizes. palavra fora de seu sentido normal.
Neste caso podem existir duas interpretações diferen- Observação: toda metáfora é uma espécie de com-
tes: paração implícita, em que o elemento comparativo não
As pessoas têm alimentação equilibrada porque são aparece.
felizes ou são felizes porque têm uma alimentação equi-
librada.

9
LÍNGUA PORTUGUESA

Seus olhos são como luzes brilhantes.


10 - Gênero pela espécie: Os mortais pensam e so-
O exemplo acima mostra uma comparação evidente,
frem nesse mundo. (= Os homens pensam e sofrem nesse
através do emprego da palavra como.
mundo).
Observe agora: Seus olhos são luzes brilhantes.
11 - Singular pelo plural: A mulher foi chamada para
Neste exemplo não há mais uma comparação (note a ir às ruas na luta por seus direitos. (= As mulheres foram
ausência da partícula comparativa), e sim símile, ou seja, chamadas, não apenas uma mulher).
qualidade do que é semelhante. 12 - Marca pelo produto: Minha filha adora danone.
Por fim, no exemplo: As luzes brilhantes olhavam-me. (= Minha filha adora o iogurte que é da marca Danone).
Há substituição da palavra olhos por luzes brilhantes. Esta 13 - Espécie pelo indivíduo: O homem foi à Lua. (=
é a verdadeira metáfora. Alguns astronautas foram à Lua).
14 - Símbolo pela coisa simbolizada: A balança pen-
Observe outros exemplos: derá para teu lado. (= A justiça ficará do teu lado).
1) “Meu pensamento é um rio subterrâneo.” (Fernando Saiba que: Sinédoque se relaciona com o conceito de
Pessoa) extensão (como nos exemplos 9, 10 e 11, acima), enquan-
Neste caso, a metáfora é possível na medida em que to que a metonímia abrange apenas os casos de analogia
o poeta estabelece relações de semelhança entre um rio ou de relação. Não há necessidade, atualmente, de se fa-
subterrâneo e seu pensamento (pode estar relacionando zer distinção entre ambas as figuras.
a fluidez, a profundidade, a inatingibilidade, etc.).
Catacrese
2) Minha alma é uma estrada de terra que leva a lugar
algum. Trata-se de uma metáfora que, dado seu uso contí-
Uma estrada de terra que leva a lugar algum é, na fra- nuo, cristalizou-se. A catacrese costuma ocorrer quando,
se acima, uma metáfora. Por trás do uso dessa expressão por falta de um termo específico para designar um con-
que indica uma alma rústica e abandonada (e angustiada- ceito, toma-se outro “emprestado”. Assim, passamos a
mente inútil), há uma comparação subentendida: Minha empregar algumas palavras fora de seu sentido original.
alma é tão rústica, abandonada (e inútil) quanto uma es- Exemplos: “asa da xícara”, “batata da perna”, “maçã do
trada de terra que leva a lugar algum. ros- to”, “pé da mesa”, “braço da cadeira”, “coroa do
abacaxi”.
A Amazônia é o pulmão do mundo.
Em sua mente povoa só inveja. Perífrase ou Antonomásia

Metonímia Trata-se de uma expressão que designa um ser atra-


vés de alguma de suas características ou atributos, ou de
É a substituição de um nome por outro, em virtude de um fato que o celebrizou. É a substituição de um nome
existir entre eles algum relacionamento. Tal substituição por outro ou por uma expressão que facilmente o iden-
pode acontecer dos seguintes modos: tifique:
A Cidade Maravilhosa (= Rio de Janeiro) continua
1 - Autor pela obra: Gosto de ler Machado de Assis. (= atraindo visitantes do mundo todo.
Gosto de ler a obra literária de Machado de Assis). A Cidade-Luz (=Paris)
2 - Inventor pelo invento: Édson ilumina o mundo. (= O rei das selvas (=o leão)
As lâmpadas iluminam o mundo).
3 - Símbolo pelo objeto simbolizado: Não te afastes Observação: quando a perífrase indica uma pes-
da cruz. (= Não te afastes da religião). soa, recebe o nome de antonomásia. Exemplos:
4 - Lugar pelo produto do lugar: Fumei um saboroso O Divino Mestre (= Jesus Cristo) passou a vida prati-
Havana. (= Fumei um saboroso charuto). cando o bem.
5 - Efeito pela causa: Sócrates bebeu a morte. (= Só- O Poeta dos Escravos (= Castro Alves) morreu muito
crates tomou veneno). jovem.
6 - Causa pelo efeito: Moro no campo e como do meu O Poeta da Vila (= Noel Rosa) compôs lindas canções.
trabalho. (= Moro no campo e como o alimento que pro-
duzo). Sinestesia
7 - Continente pelo conteúdo: Bebeu o cálice todo.
(= Bebeu todo o líquido que estava no cálice). Consiste em mesclar, numa mesma expressão, as sen-
8 - Instrumento pela pessoa que utiliza: Os micro- sações percebidas por diferentes órgãos do sentido. É o
fones foram atrás dos jogadores. (= Os repórteres foram cruzamento de sensações distintas.
atrás dos jogadores). Um grito áspero revelava tudo o que sentia. (grito =
auditivo; áspero = tátil)
9 - Parte pelo todo: Várias pernas passavam apressa-
No silêncio escuro do seu quarto, aguardava os aconte-
damente. (= Várias pessoas passavam apressadamente).
cimentos. (silêncio = auditivo; escuro = visual)
Tosse gorda. (sensação auditiva X sensação tátil)

10
LÍNGUA PORTUGUESA

Fontes de pesquisa: Prosopopeia ou Personificação


http://www.soportugues.com.br/secoes/estil/estil2.
php É a atribuição de ações ou qualidades de seres ani-
SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa mados a seres inanimados, ou características humanas a
Sacconi. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010. seres não humanos. Observe os exemplos:
Português linguagens: volume 1 / Wiliam Roberto Ce- As pedras andam vagarosamente.
reja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São O livro é um mudo que fala, um surdo que ouve, um
Paulo: Saraiva, 2010. cego que guia.
A floresta gesticulava nervosamente diante da serra.
Antítese Chora, violão.
Consiste no emprego de palavras que se opõem Apóstrofe
quanto ao sentido. O contraste que se estabelece serve,
essencialmente, para dar uma ênfase aos conceitos envol-
Consiste na “invocação” de alguém ou de alguma coi-
vidos que não se conseguiria com a exposição isolada dos
sa personificada, de acordo com o objetivo do discurso,
mesmos. Observe os exemplos:
que pode ser poético, sagrado ou profano. Caracteriza-
“O mito é o nada que é tudo.” (Fernando Pessoa)
se pelo chamamento do receptor da mensagem, seja ele
O corpo é grande e a alma é pequena.
imaginário ou não. A introdução da apóstrofe interrompe
“Quando um muro separa, uma ponte une.”
a linha de pensamento do discurso, destacando-se assim
Não há gosto sem desgosto.
a entidade a que se dirige e a ideia que se pretende pôr
Paradoxo ou oximoro em evidência com tal invocação. Realiza-se por meio do
vocativo. Exemplos:
É a associação de ideias, além de contrastantes, con- Moça, que fazes aí parada?
traditórias. Seria a antítese ao extremo. “Pai Nosso, que estais no céu”
Era dor, sim, mas uma dor deliciosa. Deus, ó Deus! Onde estás?
Ouvimos as vozes do silêncio.
Gradação
Eufemismo
Apresentação de ideias por meio de palavras, sinôni-
É o emprego de uma expressão mais suave, mais no- mas ou não, em ordem ascendente (clímax) ou descen-
bre ou menos agressiva, para comunicar alguma coisa ás- dente (anticlímax). Observe este exemplo:
pera, desagradável ou chocante. Havia o céu, havia a terra, muita gente e mais Joana
Depois de muito sofrimento, entregou a alma ao Se- com seus olhos claros e brincalhões...
nhor. (= morreu)
O prefeito ficou rico por meios ilícitos. (= roubou) O objetivo do narrador é mostrar a expressividade
Fernando faltou com a verdade. (= mentiu) dos olhos de Joana. Para chegar a este detalhe, ele se re-
Faltar à verdade. (= mentir) fere ao céu, à terra, às pessoas e, finalmente, a Joana e
seus olhos. Nota-se que o pensamento foi expresso em
Ironia ordem decrescente de intensidade. Outros exemplos:
“Vive só para mim, só para a minha vida, só para meu
É sugerir, pela entoação e contexto, o contrário do amor”. (Olavo Bilac)
que as palavras ou frases expressam, geralmente apresen- “O trigo... nasceu, cresceu, espigou, amadureceu, co-
tando intenção sarcástica. A ironia deve ser muito bem lheu-se.” (Padre Antônio Vieira)
construída para que cumpra a sua finalidade; mal cons-
truída, pode passar uma ideia exatamente oposta à dese- Fontes de pesquisa:
jada pelo emissor. http://www.soportugues.com.br/secoes/estil/estil5.
Como você foi bem na prova! Não tirou nem a nota php
mínima. SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa
Parece um anjinho aquele menino, briga com todos Sacconi. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010.
que estão por perto. Português linguagens: volume 1 / Wiliam Roberto Ce-
O governador foi sutil como um elefante. reja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São
Paulo: Saraiva, 2010.
Hipérbole
As figuras de construção (ou sintática, de sintaxe)
É a expressão intencionalmente exagerada com o in-
ocorrem quando desejamos atribuir maior expressividade
tuito de realçar uma ideia.
ao significado. Assim, a lógica da frase é substituída pela
Faria isso milhões de vezes se fosse preciso.
maior expressividade que se dá ao sentido.
“Rios te correrão dos olhos, se chorares.” (Olavo Bilac)
O concurseiro quase morre de tanto estudar!

11
LÍNGUA PORTUGUESA

Elipse Silepse de Pessoa - Três são as pessoas gramaticais:


eu, tu e ele (as três pessoas do singular); nós, vós, eles (as
Consiste na omissão de um ou mais termos numa três do plural). A silepse de pessoa ocorre quando há um
oração e que podem ser facilmente identificados, tanto desvio de concordância. O verbo, mais uma vez, não con-
por elementos gramaticais presentes na própria oração, corda com o sujeito da oração, mas sim com a pessoa que
quanto pelo contexto. está inscrita no sujeito. Exemplos:
A catedral da Sé. (a igreja catedral)
O que não compreendo é como os brasileiros persista-
Domingo irei ao estádio. (no domingo eu irei ao es- mos em aceitar essa situação.
tádio)
Os agricultores temos orgulho de nosso trabalho.
“Dizem que os cariocas somos poucos dados aos jar-
Zeugma dins públicos.” (Machado de Assis)
Zeugma é uma forma de elipse. Ocorre quando é feita
Observe que os verbos persistamos, temos e somos
a omissão de um termo já mencionado anteriormente. não concordam gramaticalmente com os seus sujeitos
Ele gosta de geografia; eu, de português. (eu gosto de (brasileiros, agricultores e cariocas, que estão na terceira
português) pessoa), mas com a ideia que neles está contida (nós, os
Na casa dela só havia móveis antigos; na minha, só brasileiros, os agricultores e os cariocas).
modernos. (só havia móveis)
Ela gosta de natação; eu, de vôlei. (gosto de) Polissíndeto / Assíndeto
Silepse Para estudarmos as duas figuras de construção é ne-
cessário recordar um conceito estudado em sintaxe sobre
A silepse é a concordância que se faz com o termo período composto. No período composto por coordena-
que não está expresso no texto, mas, sim, subentendido. ção, podemos ter orações sindéticas ou assindéticas. A
É uma concordância anormal, psicológica, porque se faz oração coordenada ligada por uma conjunção (conectivo)
com um termo oculto, facilmente identificado. Há três ti- é sindética; a oração que não apresenta conectivo é assin-
pos de silepse: de gênero, número e pessoa. dética. Recordado esse conceito, podemos definir as duas
figuras de construção:
Silepse de Gênero - Os gêneros são masculino e fe-
minino. Ocorre a silepse de gênero quando a concordân- 1) Polissíndeto - É uma figura caracterizada pela re-
cia se faz com a ideia que o termo comporta. Exemplos: petição enfática dos conectivos. Observe o exemplo: O
menino resmunga, e chora, e grita, e ninguém faz nada.
1) A bonita Porto Velho sofreu mais uma vez com o
calor intenso. 2) Assíndeto - É uma figura caracterizada pela au-
Neste caso, o adjetivo bonita não está concordando sência, pela omissão das conjunções coordenativas, re-
com o termo Porto Velho, que gramaticalmente pertence sultando no uso de orações coordenadas assindéticas.
ao gênero masculino, mas com a ideia contida no termo Exemplos:
(a cidade de Porto Velho). Tens casa, tens roupa, tens amor, tens família.
“Vim, vi, venci.” (Júlio César)
2) Vossa Excelência está preocupado.
O adjetivo preocupado concorda com o sexo da pes- Pleonasmo
soa, que nesse caso é masculino, e não com o termo
Vossa Excelência. Consiste na repetição de um termo ou ideia, com as
mesmas palavras ou não. A finalidade do pleonasmo é
Silepse de Número - Os números são singular e plu- realçar a ideia, torná-la mais expressiva.
ral. A silepse de número ocorre quando o verbo da oração
O problema da violência, é necessário resolvê-lo logo.
não concorda gramaticalmente com o sujeito da oração,
mas com a ideia que nele está contida. Exemplos:
Nesta oração, os termos “o problema da violência”
A procissão saiu. Andaram por todas as ruas da cidade e “lo” exercem a mesma função sintática: objeto direto.
de Salvador. Assim, temos um pleonasmo do objeto direto, sendo o
O povo corria por todos os lados e gritavam muito alto. pronome “lo” classificado como objeto direto pleonástico.
Outro exemplo:
Note que nos exemplos acima, os verbos andaram e Aos funcionários, não lhes interessam tais medidas.
gritavam não concordam gramaticalmente com os sujei- Aos funcionários, lhes = Objeto Indireto
tos das orações (que se encontram no singular, procissão
e povo, respectivamente), mas com a ideia que neles está
contida. Procissão e povo dão a ideia de muita gente, por
Neste caso, há um pleonasmo do objeto indireto, e o
isso que os verbos estão no plural. pronome “lhes” exerce a função de objeto indireto pleo-
nástico.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Observação: o pleonasmo só tem razão de ser quan-


do confere mais vigor à frase; caso contrário, torna-se um Figuras de Som
pleonasmo vicioso:
Vi aquela cena com meus próprios olhos. Aliteração - Consiste na repetição de consoantes
Vamos subir para cima. como recurso para intensificação do ritmo ou como efei-
Ele desceu pra baixo. to sonoro significativo.
Três pratos de trigo para três tigres tristes.
Anáfora Vozes veladas, veludosas vozes... (Cruz e Sousa)
Quem com ferro fere com ferro será ferido.
É a repetição de uma ou mais palavras no início de
várias frases, criando, assim, um efeito de reforço e de Assonância - Consiste na repetição ordenada de
coerência. Pela repetição, a palavra ou expressão em cau- sons vocálicos idênticos:
sa é posta em destaque, permitindo ao escritor valorizar “Sou um mulato nato no sentido lato mulato demo-
determinado elemento textual. Os termos anafóricos po- crático do litoral.”
dem muitas vezes ser substituídos por pronomes.
Encontrei um amigo ontem. Ele me disse que te conhe- Onomatopéia - Ocorre quando se tentam reproduzir
cia. na forma de palavras os sons da realidade:
“Tudo cura o tempo, tudo gasta, tudo digere, tudo aca- Os sinos faziam blem, blem, blem, blem.
ba.” (Padre Vieira)
Fontes de pesquisa:
Anacoluto http://www.soportugues.com.br/secoes/estil/estil8.
php
Consiste na mudança da construção sintática no meio SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa
da frase, ficando alguns termos desligados do resto do Sacconi. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010.
período. É a quebra da estrutura normal da frase para a Português linguagens: volume 1 / Wiliam Roberto Ce-
introdução de uma palavra ou expressão sem nenhuma reja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São
ligação sintática com as demais. Paulo: Saraiva, 2010.
Esses alunos da escola, não se pode duvidar deles.
Morrer, todo haveremos de morrer. Questões
Aquele garoto, você não disse que ele chegaria logo? 1-) (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE
JANEIRO – TÉCNICO SUPERIOR ESPECIALIZADO EM BI-
A expressão “esses alunos da escola”, por exemplo, de- BLIOTECONOMIA – FGV/2014 - adaptada) Ao dizer que
veria exercer a função de sujeito. No entanto, há uma in- os shoppings são “cidades”, o autor do texto faz uso de
terrupção da frase e esta expressão fica à parte, não exer- um tipo de linguagem figurada denominada
cendo nenhuma função sintática. O anacoluto também é (A) metonímia.
chamado de “frase quebrada”, pois corresponde a uma (B) eufemismo.
interrupção na sequência lógica do pensamento. (C) hipérbole.
(D) metáfora.
Observação: o anacoluto deve ser usado com finali- (E) catacrese.
dade expressiva em casos muito especiais. Em geral, evi-
te-o. 1-) A metáfora consiste em retirar uma palavra de seu
contexto convencional (denotativo) e transportá-la para
Hipérbato / Inversão um novo campo de significação (conotativa), por meio de
uma comparação implícita, de uma similaridade existente
É a inversão da estrutura frásica, isto é, a inversão da entre as duas.
ordem direta dos termos da oração, fazendo com que o (Fonte:http://educacao.uol.com.br/disciplinas/portu-
sujeito venha depois do predicado: gues/metafora-figura-de-palavra-variacoes-e-exemplos.
Ao ódio venceu o amor. (Na ordem direta seria: O
htm)
amor venceu ao ódio)
RESPOSTA: “D”.
Dos meus problemas cuido eu! (Na ordem direta seria:
Eu cuido dos meus problemas)

* Observação da Zê!
O nosso Hino Nacional é um exemplo de hipérbato, já
que, na ordem direta, teríamos:
“As margens plácidas do Ipiranga ouviram o brado re-
tumbante de um povo heroico”.

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LÍNGUA PORTUGUESA

2-) (PREFEITURA DE ARCOVERDE/PE - ADMINISTRADOR DE RECURSOS HUMANOS – CONPASS/2014) Identifique a


figura de linguagem presente na tira seguinte:

A) metonímia
B) prosopopeia
C) hipérbole
D) eufemismo
E) onomatopeia

2-) “Eufemismo = é o emprego de uma expressão mais suave, mais nobre ou menos agressiva, para comunicar algu-
ma coisa áspera, desagradável ou chocante”. No caso da tirinha, é utilizada a expressão “deram suas vidas por nós” no
lugar de “que morreram por nós”.
RESPOSTA: “D”.

3-) (CASAL/AL - ADMINISTRADOR DE REDE - COPEVE/UFAL/2014)


Está tão quente que dá para fritar um ovo no asfalto.
O dito popular é, na maioria das vezes, uma figura de linguagem. Entre as 14h30min e às 15h desta terça-feira, ho-
rário do dia em que o calor é mais intenso, a temperatura do asfalto, medida com um termômetro de contato, chegou a
65ºC. Para fritar um ovo, seria preciso que o local alcançasse aproximadamente 90ºC.
Disponível em: http://zerohora.clicrbs.com.br. Acesso em: 22 jan. 2014.

O texto cita que o dito popular “está tão quente que dá para fritar um ovo no asfalto” expressa uma figura de lingua-
gem. O autor do texto refere-se a qual figura de linguagem?
A) Eufemismo.
B) Hipérbole.
C) Paradoxo.
D) Metonímia.
E) Hipérbato.

3-) A expressão é um exagero! Ela serve apenas para representar o calor excessivo que está fazendo. A figura que é
utilizada “mil vezes” (!) para atingir tal objetivo é a hipérbole.
RESPOSTA: “B”.

PONTUAÇÃO.

Os sinais de pontuação são marcações gráficas que servem para compor a coesão e a coerência textual, além de
ressaltar especificidades semânticas e pragmáticas. Um texto escrito adquire diferentes significados quando pontuado
de formas diversificadas. O uso da pontuação depende, em certos momentos, da intenção do autor do discurso. Assim,
os sinais de pontuação estão diretamente relacionados ao contexto e ao interlocutor.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Principais funções dos sinais de pontuação


Ponto de Exclamação (!)
Ponto (.) 1- Usa-se para indicar entonação de surpresa, cólera,
susto, súplica, etc.
1- Indica o término do discurso ou de parte dele, en-
Sim! Claro que eu quero me casar com você!
cerrando o período.
2- Depois de interjeições ou vocativos
2- Usa-se nas abreviaturas: pág. (página), Cia. (Com- Ai! Que susto!
panhia). Se a palavra abreviada aparecer em final de pe-
João! Há quanto tempo!
ríodo, este não receberá outro ponto; neste caso, o ponto
de abreviatura marca, também, o fim de período. Exem-
Ponto de Interrogação (?)
plo: Estudei português, matemática, constitucional, etc. (e
não “etc..”) Usa-se nas interrogações diretas e indiretas livres.
“- Então? Que é isso? Desertaram ambos?” (Artur Aze-
3- Nos títulos e cabeçalhos é opcional o emprego do vedo)
ponto, assim como após o nome do autor de uma citação:
Haverá eleições em outubro Reticências (...)
O culto do vernáculo faz parte do brio cívico. (Napo-
leão Mendes de Almeida) (ou: Almeida.) 1- Indica que palavras foram suprimidas: Comprei lá-
pis, canetas, cadernos...
4- Os números que identificam o ano não utilizam
ponto nem devem ter espaço a separá-los, bem como os 2- Indica interrupção violenta da frase.
números de CEP: 1975, 2014, 2006, 17600-250. “- Não... quero dizer... é verdad... Ah!”

Ponto e Vírgula ( ; ) 3- Indica interrupções de hesitação ou dúvida: Este


mal... pega doutor?
1- Separa várias partes do discurso, que têm a mesma
importância: “Os pobres dão pelo pão o trabalho; os ricos 4- Indica que o sentido vai além do que foi dito: Dei-
dão pelo pão a fazenda; os de espíritos generosos dão pelo xa, depois, o coração falar...
pão a vida; os de nenhum espírito dão pelo pão a alma...”
(VIEIRA) Vírgula (,)

2- Separa partes de frases que já estão separadas Não se usa vírgula


por vírgulas: Alguns quiseram verão, praia e calor; outros,
montanhas, frio e cobertor. * separando termos que, do ponto de vista sintático,
ligam-se diretamente entre si:
3- Separa itens de uma enumeração, exposição de - entre sujeito e predicado:
motivos, decreto de lei, etc. Todos os alunos da sala foram advertidos.
Ir ao supermercado; Sujeito predicado
Pegar as crianças na escola;
Caminhada na praia; - entre o verbo e seus objetos:
Reunião com amigos. O trabalho custou sacrifício
aos realizadores.
Dois pontos (:) V.T.D.I. O.D. O.I.

1- Antes de uma citação Usa-se a vírgula:


Vejamos como Afrânio Coutinho trata este assunto:
- Para marcar intercalação:
2- Antes de um aposto a) do adjunto adverbial: O café, em razão da sua
Três coisas não me agradam: chuva pela manhã, frio à abun- dância, vem caindo de preço.
tarde e calor à noite. b) da conjunção: Os cerrados são secos e áridos. Estão
produzindo, todavia, altas quantidades de alimentos.
3- Antes de uma explicação ou esclarecimento c) das expressões explicativas ou corretivas: As indús-
Lá estava a deplorável família: triste, cabisbaixa, viven- trias não querem abrir mão de suas vantagens, isto é, não
do a rotina de sempre. querem abrir mão dos lucros altos.

4- Em frases de estilo direto - Para marcar inversão:


Maria perguntou: a) do adjunto adverbial (colocado no início da ora-
- Por que você não toma uma decisão? ção): Depois das sete horas, todo o comércio está de portas
fechadas.

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LÍNGUA PORTUGUESA

b) dos objetos pleonásticos antepostos ao verbo: Aos


pesquisadores, não lhes destinaram verba alguma. Questões
c) do nome de lugar anteposto às datas: Recife, 15 de
maio de 1982. 1-) (SAAE/SP - FISCAL LEITURISTA - VUNESP - 2014)

- Para separar entre si elementos coordenados (dis-


postos em enumeração):
Era um garoto de 15 anos, alto, magro.
A ventania levou árvores, e telhados, e pontes, e ani-
mais.

- Para marcar elipse (omissão) do verbo:


Nós queremos comer pizza; e vocês, churrasco.

- Para isolar:
- o aposto: São Paulo, considerada a metrópole brasi-
leira, possui um trânsito caótico.
- o vocativo: Ora, Thiago, não diga bobagem.

Observações:
- Considerando-se que “etc.” é abreviatura da expres-
são latina et cetera, que significa “e outras coisas”, seria
dispensável o emprego da vírgula antes dele. Porém, o
acordo ortográfico em vigor no Brasil exige que empre-
guemos etc. precedido de vírgula: Falamos de política, fu- (SAAE/SP - FISCAL LEITURISTA - VUNESP - 2014) Se-
tebol, lazer, etc. gundo a norma-padrão da língua portuguesa, a pontua-
ção está correta em:
- As perguntas que denotam surpresa podem ter A) Hagar disse, que não iria.
combinados o ponto de interrogação e o de exclamação: B) Naquela noite os Stevensens prometeram servir,
Você falou isso para ela?! bifes e lagostas, aos vizinhos.
C) Chegou, o convite dos Stevensens, bife e lagostas:
- Temos, ainda, sinais distintivos: para Hagar e Helga
1-) a barra ( / ) = usada em datas (25/12/2014), sepa- D) “Eles são chatos e, nunca param de falar”, disse,
ração de siglas (IOF/UPC); Hagar à Helga.
2-) os colchetes ([ ]) = usados em transcrições feitas E) Helga chegou com o recado: fomos convidados,
pelo narrador ([vide pág. 5]), usado como primeira opção pelos Stevensens, para jantar bifes e lagostas.
aos parênteses, principalmente na matemática;
3-) o asterisco ( * ) = usado para remeter o leitor a 1-) Correções realizadas:
uma nota de rodapé ou no fim do livro, para substituir um A) Hagar disse que não iria. = não há vírgula entre
nome que não se quer mencionar.
verbo e seu complemento (objeto)
B) Naquela noite os Stevensens prometeram servir bi-
Fontes de pesquisa:
fes e lagostas aos vizinhos. = não há vírgula entre verbo e
http://www.infoescola.com/portugues/pontuacao/
seu complemento (objeto)
http://www.brasilescola.com/gramatica/uso-da-vir-
C) Chegou o convite dos Stevensens: bife e lagostas
gula.htm
para Hagar e Helga.
Português linguagens: volume 3 / Wiliam Roberto Ce-
reja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São D) “Eles são chatos e nunca param de falar”, disse Ha-
Paulo: Saraiva, 2010. gar à Helga.
SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa E) Helga chegou com o recado: fomos convidados,
Sacconi. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010. pelos Stevensens, para jantar bifes e lagostas.
RESPOSTA: “E”.

2-) (CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – MÉDICO DO TRA-


BALHO – CESPE/2014 - adaptada)
A correção gramatical do trecho “Entre as bebidas al-
coólicas, cervejas e vinhos são as mais comuns em todo
o mundo” seria prejudicada, caso se inserisse uma vírgula
logo após a palavra “vinhos”.
( ) CERTO ( ) ERRADO

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LÍNGUA PORTUGUESA

2-) Não se deve colocar vírgula entre sujeito e predi-


cado, a não ser que se trate de um aposto (1), predicativo Observe outros exemplos:
do sujeito (2), ou algum termo que requeira estar separa-
do entre pontuações. Exemplos: de águia aquilino
O Rio de Janeiro, cidade maravilhosa (1), está em de aluno discente
festa! Os meninos, ansiosos (2), chegaram! de anjo angelical
RESPOSTA: “CERTO”.
de ano anual
4-) (PRODAM/AM – ASSISTENTE – FUNCAB/2014) Em de aranha aracnídeo
apenas uma das opções a vírgula foi corretamente em- de boi bovino
pregada. Assinale-a.
A) No dia seguinte, estavam todos cansados. de cabelo capilar
B) Romperam a fita da vitória, os dois atletas. de cabra caprino
C) Os seus hábitos estranhos, deixavam as pessoas de campo campestre ou rural
perplexas.
D) A luta em defesa dos mais fracos, é necessária e de chuva pluvial
fundamental. de criança pueril
E) As florestas nativas do Brasil, sobrevivem em pe- de dedo digital
quena parte do território.
de estômago estomacal ou gástrico
5-) de falcão falconídeo
A) No dia seguinte, estavam todos cansados. = correta de farinha farináceo
B) Romperam a fita da vitória, os dois atletas = não se
separa sujeito do predicado (o sujeito está no final). de fera ferino
C) Os seus hábitos estranhos, deixavam as pessoas de ferro férreo
perplexas = não se separa sujeito do predicado. de fogo ígneo
D) A luta em defesa dos mais fracos, é necessária e
fundamental = não se separa sujeito do predicado. de garganta gutural
E) As florestas nativas do Brasil, sobrevivem em de gelo glacial
peque- na parte do território. = não se separa sujeito do de guerra bélico
predicado
RESPOSTA: “A”. de homem viril ou humano
de ilha insular
CLASSES DE PALAVRAS: SUBSTANTIVO, ADJETIVO, de inverno hibernal ou invernal
NUMERAL, PRONOME, VERBO, ADVÉRBIO, de lago lacustre
PREPOSIÇÃO E CONJUNÇÃO: EMPREGO E SENTIDO de leão leonino
QUE IMPRIMEM ÀS
de lebre leporino
RELAÇÕES QUE ESTABELECEM.
de lua lunar ou selênico
de madeira lígneo
de mestre magistral
Adjetivo é a palavra que expressa uma qualidade ou de ouro áureo
característica do ser e se relaciona com o substantivo, de paixão passional
concordando com este em gênero e número. de pâncreas pancreático
As praias brasileiras estão poluídas. de porco suíno ou porcino
dos quadris ciático
Praias = substantivo; brasileiras/poluídas = adjetivos de rio fluvial
(plural e feminino, pois concordam com “praias”).
de sonho onírico
Locução adjetiva de velho senil
de vento eólico
Locução = reunião de palavras. Sempre que são ne-
cessárias duas ou mais palavras para falar sobre a mesma de vidro vítreo ou hialino
coisa, tem-se uma locução. Às vezes, uma preposição + de virilha inguinal
substantivo tem o mesmo valor de um adjetivo: é a Locu- de visão óptico ou ótico
ção Adjetiva (expressão que equivale a um adjetivo). Por
exemplo: aves da noite (aves noturnas), paixão sem freio
(paixão desenfreada).

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LÍNGUA PORTUGUESA

* Observação: nem toda locução adjetiva possui um adjetivo correspondente, com o mesmo significado. Por exem-
plo: Vi as alunas da 5ª série. / O muro de tijolos caiu.

Morfossintaxe do Adjetivo (Função Sintática):

O adjetivo exerce sempre funções sintáticas (função dentro de uma oração) relativas aos substantivos, atuando como
adjunto adnominal ou como predicativo (do sujeito ou do objeto).

Adjetivo Pátrio (ou gentílico)

Indica a nacionalidade ou o lugar de origem do ser. Observe alguns deles:

Estados e cidades brasileiras:

Alagoas alagoano
Amapá amapaense
Aracaju aracajuano ou aracajuense
Amazonas amazonense ou baré
Belo Horizonte belo-horizontino
Brasília brasiliense
Cabo Frio cabo-friense
Campinas campineiro ou campinense

Adjetivo Pátrio Composto

Na formação do adjetivo pátrio composto, o primeiro elemento aparece na forma reduzida e, normalmente, erudita.
Observe alguns exemplos:

África afro- / Cultura afro-americana


Alemanha germano- ou teuto-/Competições teuto-inglesas
América américo- / Companhia américo-africana
Bélgica belgo- / Acampamentos belgo-franceses
China sino- / Acordos sino-japoneses
Espanha hispano- / Mercado hispano-português
Europa euro- / Negociações euro-americanas
França franco- ou galo- / Reuniões franco-italianas
Grécia greco- / Filmes greco-romanos
Inglaterra anglo- / Letras anglo-portuguesas
Itália ítalo- / Sociedade ítalo-portuguesa
Japão nipo- / Associações nipo-brasileiras
Portugal luso- / Acordos luso-brasileiros

Flexão dos adjetivos

O adjetivo varia em gênero, número e grau.

Gênero dos Adjetivos

Os adjetivos concordam com o substantivo a que se referem (masculino e feminino). De forma semelhante aos subs-
tantivos, classificam-se em:

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LÍNGUA PORTUGUESA

Biformes - têm duas formas, sendo uma para o mas- mentos flexionados: crianças surdas-mudas.
culino e outra para o feminino: ativo e ativa, mau e má.
Se o adjetivo é composto e biforme, ele flexiona no
fe- minino somente o último elemento: o moço norte-
america- no, a moça norte-americana.

* Exceção: surdo-mudo e surda-muda.

Uniformes - têm uma só forma tanto para o


masculino
como para o feminino: homem feliz e mulher feliz.
Se o adjetivo é composto e uniforme, fica invariável no
feminino: conflito político-social e desavença político-social.

Número dos Adjetivos

Plural dos adjetivos

simples

Os adjetivos simples se flexionam no plural de acordo


com as regras estabelecidas para a flexão numérica dos
substantivos simples: mau e maus, feliz e felizes, ruim e
ruins, boa e boas.
Caso o adjetivo seja uma palavra que também exerça
função de substantivo, ficará invariável, ou seja, se a pala-
vra que estiver qualificando um elemento for,
originalmente, um substantivo, ela manterá sua forma
primitiva. Exemplo: a palavra cinza é, originalmente, um
substantivo; porém, se estiver qualificando um elemento,
funcionará como adjetivo. Ficará, então, invariável. Logo:
camisas cinza, ternos cinza.

Veja outros exemplos:


Motos vinho (mas: motos verdes)
Paredes musgo (mas: paredes
brancas).
Comícios monstro (mas: comícios grandiosos).

Adjetivo Composto

É aquele formado por dois ou mais elementos.


Normal- mente, esses elementos são ligados por hífen.
Apenas o últi- mo elemento concorda com o substantivo a
que se refere; os demais ficam na forma masculina,
singular. Caso um dos ele- mentos que formam o adjetivo
composto seja um substan- tivo adjetivado, todo o
adjetivo composto ficará invariável. Por exemplo: a palavra
“rosa” é, originalmente, um substan- tivo, porém, se estiver
qualificando um elemento, funcionará como adjetivo. Caso
se ligue a outra palavra por hífen, forma- rá um adjetivo
composto; como é um substantivo adjetivado, o adjetivo
composto inteiro ficará invariável. Veja:
Camisas rosa-
claro. Ternos rosa-
claro. Olhos verde-
claros.
Calças azul-escuras e camisas verde-mar.
Telhados marrom-café e paredes verde-
claras.

* Observação:
- Azul-marinho, azul-celeste, ultravioleta e qualquer
adjetivo composto iniciado por “cor-de-...” são sempre
invariáveis: roupas azul-marinho, tecidos azul-celeste, ves-
tidos cor-de-rosa.
- O adjetivo composto surdo-mudo tem os dois ele-
Grau do Adjetivo Alguns adjetivos possuem, para o comparativo de
superioridade, formas sintéticas, herdadas do latim. São
Os adjetivos se flexionam em grau para indicar a eles: bom /melhor, pequeno/menor, mau/pior, alto/supe-
in- tensidade da qualidade do ser. São dois os graus do rior, grande/maior, baixo/inferior.
adje- tivo: o comparativo e o superlativo. Observe que:
a) As formas menor e pior são comparativos de su-
Comparativo perioridade, pois equivalem a mais pequeno e mais mau,
respectivamente.
Nesse grau, comparam-se a mesma característica b) Bom, mau, grande e pequeno têm formas sintéticas
atri- buída a dois ou mais seres ou duas ou mais (melhor, pior, maior e menor), porém, em comparações
característi- cas atribuídas ao mesmo ser. O feitas entre duas qualidades de um mesmo elemento, de-
comparativo pode ser de igualdade, de superioridade ve-se usar as formas analíticas mais bom, mais mau,mais
ou de inferioridade. grande e mais pequeno. Por exemplo:
Pedro é maior do que Paulo - Comparação de dois
Sou tão alto como você. = Comparativo de elementos.
Igualdade No comparativo de igualdade, o segundo Pedro é mais grande que pequeno - comparação de
termo da comparação é introduzido pelas palavras duas qualidades de um mesmo elemento.
como, quanto ou
quão. Sou menos alto (do) que você. = Comparativo de In-
ferioridade
Sou mais alto (do) que você. = Comparativo de Sou menos passivo (do) que tolerante.
Supe- rioridade Analítico
No comparativo de superioridade analítico, entre Superlativo
os dois substantivos comparados, um tem qualidade
supe- rior. A forma é analítica porque pedimos auxílio a O superlativo expressa qualidades num grau muito
“mais... do que” ou “mais...que”. elevado ou em grau máximo. Pode ser absoluto ou relati-
vo e apresenta as seguintes modalidades:
O Sol é maior (do) que a Terra. = Comparativo de Superlativo Absoluto: ocorre quando a qualidade
Su- perioridade Sintético de um ser é intensificada, sem relação com outros seres.
Apresenta-se nas formas:

19
LÍNGUA PORTUGUESA

1-) Analítica: a intensificação é feita com o auxílio


de palavras que dão ideia de intensidade (advérbios). Por Advérbio
exemplo: O concurseiro é muito esforçado.
2-) Sintética: nesta, há o acréscimo de sufixos. Por Compare estes exemplos:
exemplo: O concurseiro é esforçadíssimo.
O ônibus chegou.
Observe alguns superlativos sintéticos: O ônibus chegou ontem.

Advérbio é uma palavra invariável que modifica o


benéfico - beneficentíssimo sentido do verbo (acrescentando-lhe circunstâncias de tempo,
bom - boníssimo ou ótimo de modo, de lugar, de intensidade), do adjetivo e do próprio
advérbio.
comum - comuníssimo
Estudei bastante. = modificando o verbo estudei
cruel - crudelíssimo Ele canta muito bem! = intensificando outro advérbio
difícil - dificílimo (bem)
doce - dulcíssimo Ela tem os olhos muito claros. = relação com um ad-
jetivo (claros)
fácil - facílimo
fiel - fidelíssimo Quando modifica um verbo, o advérbio pode acres-
centar ideia de:
Superlativo Relativo: ocorre quando a qualidade de Tempo: Ela chegou tarde.
um ser é intensificada em relação a um conjunto de seres. Lugar: Ele mora aqui.
Essa relação pode ser: Modo: Eles agiram mal.
1-) De Superioridade: Essa matéria é a mais fácil de Negação: Ela não saiu de casa.
todas. Dúvida: Talvez ele volte.
2-) De Inferioridade: Essa matéria é a menos fácil de
todas. Flexão do Advérbio

* Note bem: Os advérbios são palavras invariáveis, isto é, não apre-


1) O superlativo absoluto analítico é expresso por sentam variação em gênero e número. Alguns advérbios,
meio dos advérbios muito, extremamente, excepcional- porém, admitem a variação em grau. Observe:
mente, antepostos ao adjetivo.
2) O superlativo absoluto sintético se apresenta sob Grau Comparativo
duas formas: uma erudita - de origem latina - outra po-
pular - de origem vernácula. A forma erudita é constituída Forma-se o comparativo do advérbio do mesmo
pelo radical do adjetivo latino + um dos sufixos -íssimo, modo que o comparativo do adjetivo:
-imo ou érrimo: fidelíssimo, facílimo, paupérrimo. A forma - de igualdade: tão + advérbio + quanto (como): Re-
popular é constituída do radical do adjetivo português + nato fala tão alto quanto João.
o sufixo -íssimo: pobríssimo, agilíssimo. - de inferioridade: menos + advérbio + que (do que):
3-) Os adjetivos terminados em –io fazem o super- Renato fala menos alto do que João.
lativo com dois “ii”: frio – friíssimo, sério – seriíssimo; os - de superioridade:
terminados em –eio, com apenas um “i”: feio - feíssimo, 1-) Analítico: mais + advérbio + que (do que): Renato
cheio – cheíssimo. fala mais alto do que João.
2-) Sintético: melhor ou pior que (do que): Renato fala
Fontes de pesquisa: melhor que João.
http://www.soportugues.com.br/secoes/morf/
morf32.php Grau Superlativo
Português linguagens: volume 2 / Wiliam Roberto Ce-
reja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São O superlativo pode ser analítico ou sintético:
Paulo: Saraiva, 2010. - Analítico: acompanhado de outro advérbio: Renato
SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa fala muito alto.
Sacconi. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010. muito = advérbio de intensidade / alto = advérbio
Português: novas palavras: literatura, gramática, reda- de modo
ção / Emília Amaral... [et al.]. – São Paulo: FTD, 2000.
- Sintético: formado com sufixos: Renato fala altís-
simo.

* Observação: as formas diminutivas (cedinho, perti-


nho, etc.) são comuns na língua popular.
Maria mora pertinho daqui. (muito perto)
A criança levantou cedinho. (muito cedo)

20
LÍNGUA PORTUGUESA

Classificação dos Advérbios


Distinção entre Advérbio e Pronome Indefinido
De acordo com a circunstância que exprime, o advér- Há palavras como muito, bastante, que podem apare-
bio pode ser de: cer como advérbio e como pronome indefinido.
Lugar: aqui, antes, dentro, ali, adiante, fora, acolá, Advérbio: refere-se a um verbo, adjetivo, ou a outro
atrás, além, lá, detrás, aquém, cá, acima, onde, perto, aí, advérbio e não sofre flexões. Por exemplo: Eu corri muito.
abaixo, aonde, longe, debaixo, algures, defronte, nenhures, Pronome Indefinido: relaciona-se a um substantivo
adentro, afora, alhures, aquém, embaixo, externamente, a e sofre flexões. Por exemplo: Eu corri muitos quilômetros.
distância, à distância de, de longe, de perto, em cima, à
direita, à esquerda, ao lado, em volta. * Dica: Como saber se a palavra bastante é advérbio
Tempo: hoje, logo, primeiro, ontem, tarde, outrora, (não varia, não se flexiona) ou pronome indefinido (varia,
amanhã, cedo, dantes, depois, ainda, antigamente, antes, sofre flexão)? Se der, na frase, para substituir o “bastante”
doravante, nunca, então, ora, jamais, agora, sempre, já, por “muito”, estamos diante de um advérbio; se der para
enfim, afinal, amiúde, breve, constantemente, entrementes, substituir por “muitos” (ou muitas), é um pronome. Veja:
imediatamente, primeiramente, provisoriamente, sucessi-
vamente, às vezes, à tarde, à noite, de manhã, de repente, 1-) Estudei bastante para o concurso. (estudei muito,
de vez em quando, de quando em quando, a qualquer mo- pois “muitos” não dá!). = advérbio
mento, de tempos em tempos, em breve, hoje em dia.
Modo: bem, mal, assim, adrede, melhor, pior, depressa, 2-) Estudei bastantes capítulos para o concurso. (estu-
acinte, debalde, devagar, às pressas, às claras, às cegas, à dei muitos capítulos) = pronome indefinido
toa, à vontade, às escondidas, aos poucos, desse jeito, desse
Advérbios Interrogativos
modo, dessa maneira, em geral, frente a frente, lado a lado,
a pé, de cor, em vão e a maior parte dos que terminam em
São as palavras: onde? aonde? donde? quando? como?
“-mente”: calmamente, tristemente, propositadamente, pa- por quê? nas interrogações diretas ou indiretas, referentes
cientemente, amorosamente, docemente, escandalosamen- às circunstâncias de lugar, tempo, modo e causa. Veja:
te, bondosamente, generosamente.
Afirmação: sim, certamente, realmente, decerto, efeti-
vamente, certo, decididamente, deveras, indubitavelmente. Interrogação Direta Interrogação Indireta
Negação: não, nem, nunca, jamais, de modo algum, Como aprendeu? Perguntei como aprendeu.
de forma nenhuma, tampouco, de jeito nenhum. Onde mora? Indaguei onde morava.
Dúvida: acaso, porventura, possivelmente, provavel- Por que choras? Não sei por que choras.
mente, quiçá, talvez, casualmente, por certo, quem sabe.
Aonde vai? Perguntei aonde ia.
Intensidade: muito, demais, pouco, tão, em excesso,
bastante, mais, menos, demasiado, quanto, quão, tanto, Donde vens? Pergunto donde vens.
assaz, que (equivale a quão), tudo, nada, todo, quase, de Quando voltas? Pergunto quando voltas.
todo, de muito, por completo, extremamente, intensamen-
te, grandemente, bem (quando aplicado a propriedades Locução Adverbial
graduáveis).
Exclusão: apenas, exclusivamente, salvo, senão, so- Quando há duas ou mais palavras que exercem fun-
mente, simplesmente, só, unicamente. Por exemplo: Bran- ção de advérbio, temos a locução adverbial, que pode
do, o vento apenas move a copa das árvores. expressar as mesmas noções dos advérbios. Iniciam ordi-
Inclusão: ainda, até, mesmo, inclusivamente, também. nariamente por uma preposição. Veja:
Por exemplo: O indivíduo também amadurece durante a lugar: à esquerda, à direita, de longe, de perto, para
adolescência. dentro, por aqui, etc.
afirmação: por certo, sem dúvida, etc.
Ordem: depois, primeiramente, ultimamente. Por
modo: às pressas, passo a passo, de cor, em vão, em
exemplo: Primeiramente, eu gostaria de agradecer aos
geral, frente a frente, etc.
meus amigos por comparecerem à festa.
tempo: de noite, de dia, de vez em quando, à tarde,
hoje em dia, nunca mais, etc.
* Saiba que:
- Para se exprimir o limite de possibilidade, antepõe- * Observações:
se ao advérbio “o mais” ou “o menos”. Por exemplo: Fi- - tanto a locução adverbial como o advérbio modifi-
carei o mais longe que puder daquele garoto. Voltarei o cam o verbo, o adjetivo e outro advérbio:
menos tarde possível. Chegou muito cedo. (advérbio)
- Quando ocorrem dois ou mais advérbios em -mente, Joana é muito bela. (adjetivo)
em geral sufixamos apenas o último: Por exemplo: O alu- De repente correram para a rua. (verbo)
no respondeu calma e respeitosamente.

21
LÍNGUA PORTUGUESA

- Usam-se, de preferência, as formas mais bem e mais


* Quando indicado no singular, o artigo definido pode
mal antes de adjetivos ou de verbos no particípio:
indicar toda uma espécie:
Essa matéria é mais bem interessante que aquela.
Nosso aluno foi o mais bem colocado no concurso! O trabalho dignifica o homem.
- O numeral “primeiro”, ao modificar o verbo, é advér-
bio: Cheguei primeiro. * No caso de nomes próprios personativos, denotando
a ideia de familiaridade ou afetividade, é facultativo o uso
do artigo:
- Quanto a sua função sintática: o advérbio e a lo-
Marcela é a mais extrovertida das
cução adverbial desempenham na oração a função de
irmãs. O Pedro é o xodó da família.
adjunto adverbial, classificando-se de acordo com as cir-
cunstâncias que acrescentam ao verbo, ao adjetivo ou ao * No caso de os nomes próprios personativos estarem
advérbio. Exemplo: no plural, são determinados pelo uso do artigo:
Meio cansada, a candidata saiu da sala. = adjunto ad-
Os Maias, os Incas, Os Astecas...
verbial de intensidade (ligado ao adjetivo “cansada”)
Trovejou muito ontem. = adjunto adverbial de intensi- * Usa-se o artigo depois do pronome indefinido
dade e de tempo, respectivamente. todo(a) para conferir uma ideia de totalidade. Sem o uso
dele (o arti- go), o pronome assume a noção de qualquer.
Fontes de pesquisa: Toda a classe parabenizou o professor. (a sala toda)
http://www.soportugues.com.br/secoes/morf/ Toda classe possui alunos interessados e
morf75.php desinteressados. (qualquer classe)
Português linguagens: volume 2 / Wiliam Roberto Ce-
reja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São * Antes de pronomes possessivos, o uso do artigo é
Paulo: Saraiva, 2010. fa- cultativo:
Português: novas palavras: literatura, gramática, reda- Preparei o meu curso. Preparei meu curso.
ção / Emília Amaral... [et al.]. – São Paulo: FTD, 2000.
SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa * A utilização do artigo indefinido pode indicar uma ideia
Sacconi. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010. de aproximação numérica:
O máximo que ele deve ter é uns vinte anos.
Artigo
* O artigo também é usado para substantivar palavras
O artigo integra as dez classes gramaticais, definindo- pertencentes a outras classes gramaticais:
se como o termo variável que serve para individualizar ou Não sei o porquê de tudo isso.
generalizar o substantivo, indicando, também, o gênero
(masculino/feminino) e o número (singular/plural). * Há casos em que o artigo definido não pode ser usado:
Os artigos se subdividem em definidos (“o” e as va- - antes de nomes de cidade e de pessoas conhecidas:
riações “a”[as] e [os]) e indefinidos (“um” e as variações O professor visitará Roma.
“uma”[s] e “uns”).
Mas, se o nome apresentar um caracterizador, a presen-
Artigos definidos – São aqueles usados para indicar ça do artigo será obrigatória: O professor visitará a bela Roma.
seres determinados, expressos de forma individual:
- antes de pronomes de tratamento:
O concurseiro estuda muito. Os concurseiros estudam
Vossa Senhoria sairá agora?
muito.
Exceção: O senhor vai à festa?
Artigos indefinidos – São aqueles usados para indi-
- após o pronome relativo “cujo” e suas
car seres de modo vago, impreciso:
variações: Esse é o concurso cujas provas foram
Uma candidata foi aprovada! Umas candidatas foram anuladas? Este é o candidato cuja nota foi a
aprovadas! mais alta.
Circunstâncias em que os artigos se manifestam: Fontes de pesquisa:
http://www.brasilescola.com/gramatica/artigo.htm
* Considera-se obrigatório o uso do artigo depois do Português linguagens: volume 2 / Wiliam Roberto Cere-
numeral “ambos”: ja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São Paulo:
Ambos os concursos cobrarão tal conteúdo. Saraiva, 2010.
Português: novas palavras: literatura, gramática, redação
* Nomes próprios indicativos de lugar admitem o uso / Emília Amaral... [et al.]. – São Paulo: FTD, 2000.SACCONI,
do artigo, outros não: Luiz Antônio. Nossa gramática completa Sacconi. 30ª ed.
São Paulo, O Rio de Janeiro, Veneza, A Bahia... Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010.
Português linguagens: volume 1 / Wiliam Roberto
Cere- ja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. –
São Paulo: Saraiva, 2010.

22
LÍNGUA PORTUGUESA

Conjunção 3) Alternativas: ligam orações ou palavras, expres-


sando ideia de alternância ou escolha, indicando fatos
Além da preposição, há outra palavra também inva- que se realizam separadamente. São elas: ou, ou... ou,
riável que, na frase, é usada como elemento de ligação: ora... ora, já... já, quer... quer, seja... seja, talvez... talvez.
a conjunção. Ela serve para ligar duas orações ou duas
Ou escolho agora, ou fico sem presente de aniversário.
palavras de mesma função em uma oração:
O concurso será realizado nas cidades de Campinas e
4) Conclusivas: ligam a oração anterior a uma oração
São Paulo.
que expressa ideia de conclusão ou consequência. São
A prova não será fácil, por isso estou estudando muito. elas: logo, pois (depois do verbo), portanto, por conseguin-
te, por isso, assim.
Morfossintaxe da Conjunção Marta estava bem preparada para o teste, portanto
não ficou nervosa.
As conjunções, a exemplo das preposições, não exer-
Você nos ajudou muito; terá, pois, nossa gratidão.
cem propriamente uma função sintática: são conectivos.
5) Explicativas: ligam a oração anterior a uma oração
Classificação da Conjunção que a explica, que justifica a ideia nela contida. São elas:
que, porque, pois (antes do verbo), porquanto.
De acordo com o tipo de relação que estabelecem, as Não demore, que o filme já vai começar.
conjunções podem ser classificadas em coordenativas e
Falei muito, pois não gosto do silêncio!
subordinativas. No primeiro caso, os elementos ligados
pela conjunção podem ser isolados um do outro. Esse iso-
Conjunções Subordinativas
lamento, no entanto, não acarreta perda da unidade de
sentido que cada um dos elementos possui. Já no segun-
São aquelas que ligam duas orações, sendo uma delas
do caso, cada um dos elementos ligados pela conjunção
dependente da outra. A oração dependente, introduzida
depende da existência do outro. Veja:
pelas conjunções subordinativas, recebe o nome de ora-
ção subordinada. Veja o exemplo: O baile já tinha começa-
Estudei muito, mas ainda não compreendi o conteúdo.
do quando ela chegou.
Podemos separá-las por ponto:
O baile já tinha começado: oração principal
Estudei muito. Ainda não compreendi o conteúdo. quando: conjunção subordinativa (adverbial tempo-
ral)
Temos acima um exemplo de conjunção (e, con-
ela chegou: oração subordinada
sequentemente, orações coordenadas) coordenativa –
“mas”. Já em:
As conjunções subordinativas subdividem-se em in-
Espero que eu seja aprovada no concurso!
tegrantes e adverbiais:
Não conseguimos separar uma oração da outra, pois
a segunda “completa” o sentido da primeira (da oração
1. Integrantes - Indicam que a oração subordinada
principal):
por elas introduzida completa ou integra o sentido da
Espero o quê? Ser aprovada. Nesse período temos
principal. Introduzem orações que equivalem a substan-
uma oração subordinada substantiva objetiva direta (ela
tivos, ou seja, as orações subordinadas substantivas. São
exerce a função de objeto direto do verbo da oração prin-
elas: que, se.
cipal).
Quero que você volte. (Quero sua volta)
Conjunções Coordenativas
2. Adverbiais - Indicam que a oração subordinada
exerce a função de adjunto adverbial da principal. De
São aquelas que ligam orações de sentido completo acordo com a circunstância que expressam, classificam-
e independente ou termos da oração que têm a mesma
se em:
função gramatical. Subdividem-se em:
a) Causais: introduzem uma oração que é causa da
1) Aditivas: ligam orações ou palavras, expressando ocorrência da oração principal. São elas: porque, que,
ideia de acréscimo ou adição. São elas: e, nem (= e não),
como (= porque, no início da frase), pois que, visto que,
não só... mas também, não só... como também, bem como,
uma vez que, porquanto, já que, desde que, etc.
não só... mas ainda.
Ele não fez a pesquisa porque não dispunha de meios.
A sua pesquisa é clara e objetiva.
Não só dança, mas também canta.
b) Concessivas: introduzem uma oração que expressa
ideia contrária à da principal, sem, no entanto, impedir
2) Adversativas: ligam duas orações ou palavras, ex-
sua realização. São elas: embora, ainda que, apesar de que,
pressando ideia de contraste ou compensação. São elas:
se bem que, mesmo que, por mais que, posto que,
mas, porém, contudo, todavia, entretanto, no entanto, não
conquan- to, etc.
obstante.
Embora fosse tarde, fomos visitá-lo.
Tentei chegar mais cedo, porém não consegui.

23
LÍNGUA PORTUGUESA

c) Condicionais: introduzem uma oração que indica a


hipótese ou a condição para ocorrência da principal. São i) Consecutivas: introduzem uma oração que ex-
pressa a consequência da principal. São elas: de sorte que,
elas: se, caso, contanto que, salvo se, a não ser que, desde
de modo que, sem que (= que não), de forma que, de jeito
que, a menos que, sem que, etc.
que, que (tendo como antecedente na oração principal uma
Se precisar de minha ajuda, telefone-me.
palavra como tal, tão, cada, tanto, tamanho), etc.
Estudou tanto durante a noite que dormiu na hora do
** Dica: você deve ter percebido que a conjunção exame.
condicional “se” também é conjunção integrante. A di-
ferença é clara ao ler as orações que são introduzidas Atenção: Muitas conjunções não têm classificação
por ela. Acima, ela nos dá a ideia da condição para que única, imutável, devendo, portanto, ser classificadas de
recebamos um telefonema (se for preciso ajuda). Já na acordo com o sentido que apresentam no contexto
oração: (grifo da Zê!).
Não sei se farei o concurso...
Não há ideia de condição alguma, há? Outra coisa: O bom relacionamento entre as conjunções de um
o verbo da oração principal (sei) pede complemento texto garante a perfeita estruturação de suas frases e pa-
(objeto direto, já que “quem não sabe, não sabe algo”). rágrafos, bem como a compreensão eficaz de seu conteú-
Portanto, a oração em destaque exerce a função de ob- do. Interagindo com palavras de outras classes
jeto direto da oração principal, sendo classificada como gramaticais essenciais ao inter-relacionamento das partes
oração subordinada substantiva objetiva direta. de frases e textos - como os pronomes, preposições,
d) Conformativas: introduzem uma oração que ex- alguns advérbios e numerais -, as conjunções fazem parte
prime a conformidade de um fato com outro. São elas: daquilo a que se pode chamar de “a arquitetura
conforme, como (= conforme), segundo, consoante, etc. textual”, isto é, o conjun- to das relações que garantem a
O passeio ocorreu como havíamos planejado. coesão do enunciado. O sucesso desse conjunto de
relações depende do conhe- cimento do valor relacional
e) Finais: introduzem uma oração que expressa a fi- das conjunções, uma vez que estas interferem
nalidade ou o objetivo com que se realiza a oração prin- semanticamente no enunciado.
cipal. São elas: para que, a fim de que, que, porque (= Dessa forma, deve-se dedicar atenção especial às con-
para que), que, etc. junções tanto na leitura como na produção de textos. Nos
Toque o sinal para que todos entrem no salão. textos narrativos, elas estão muitas vezes ligadas à expres-
são de circunstâncias fundamentais à condução da histó-
f) Proporcionais: introduzem uma oração que ex- ria, como as noções de tempo, finalidade, causa e conse-
pressa um fato relacionado proporcionalmente à ocor- quência. Nos textos dissertativos, evidenciam muitas vezes
rência do expresso na principal. São elas: à medida que, a linha expositiva ou argumentativa adotada - é o caso
à proporção que, ao passo que e as combinações quanto das exposições e argumentações construídas por meio de
mais... (mais), quanto menos... (menos), quanto menos... contrastes e oposições, que implicam o uso das adversati-
(mais), quanto menos... (menos), etc. vas e concessivas.
O preço fica mais caro à medida que os produtos es-
casseiam. Fontes de pesquisa:
http://www.soportugues.com.br/secoes/morf/morf84.
* Observação: são incorretas as locuções proporcio- php
nais à medida em que, na medida que e na medida em SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa
que. Sacconi. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010.
Português linguagens: volume 2 / Wiliam Roberto Ce-
reja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São
g) Temporais: introduzem uma oração que acres-
Paulo: Saraiva, 2010.
centa uma circunstância de tempo ao fato expresso na
Português: novas palavras: literatura, gramática, reda-
oração principal. São elas: quando, enquanto, antes que,
ção / Emília Amaral... [et al.]. – São Paulo: FTD, 2000.
depois que, logo que, todas as vezes que, desde que, sem-
pre que, assim que, agora que, mal (= assim que), etc.
Interjeição
A briga começou assim que saímos da festa.
Interjeição é a palavra invariável que exprime emo-
h) Comparativas: introduzem uma oração que ex- ções, sensações, estados de espírito. É um recurso da lin-
pressa ideia de comparação com referência à oração guagem afetiva, em que não há uma ideia organizada de
principal. São elas: como, assim como, tal como, como se, maneira lógica, como são as sentenças da língua, mas sim
(tão)... como, tanto como, tanto quanto, do que, quanto, a manifestação de um suspiro, um estado da alma decor-
tal, qual, tal qual, que nem, que (combinado com menos rente de uma situação particular, um momento ou um
ou mais), etc. contexto específico. Exemplos:
O jogo de hoje será mais difícil que o de ontem. Ah, como eu queria voltar a ser criança!
ah: expressão de um estado emotivo = interjeição
Hum! Esse pudim estava maravilhoso!
hum: expressão de um pensamento súbito = interjeição

24
LÍNGUA PORTUGUESA

O significado das interjeições está vinculado à manei-


Pedido de Auxílio: Socorro! Aqui! Piedade!
ra como elas são proferidas. O tom da fala é que dita o
sentido que a expressão vai adquirir em cada contexto em Saudação, Chamamento ou Invocação: Salve! Viva!
que for utilizada. Exemplos: Adeus! Olá! Alô! Ei! Tchau! Psiu! Socorro! Valha-me, Deus!
Psiu! Silêncio: Psiu! Silêncio!
Terror ou Medo: Credo! Cruzes! Minha nossa!
contexto: alguém pronunciando esta expressão na
rua ; significado da interjeição (sugestão): “Estou te cha-
* Saiba que: As interjeições são palavras invariáveis,
mando! Ei, espere!”
isto é, não sofrem variação em gênero, número e grau
como os nomes, nem de número, pessoa, tempo, modo,
Psiu!
aspecto e voz como os verbos. No entanto, em uso espe-
contexto: alguém pronunciando em um hospital; sig- cífico, algumas interjeições sofrem variação em grau. Não
nificado da interjeição (sugestão): “Por favor, faça silên- se trata de um processo natural desta classe de palavra,
cio!” mas tão só uma variação que a linguagem afetiva permite.
Exemplos: oizinho, bravíssimo, até loguinho.
Puxa! Ganhei o maior prêmio do sorteio!
puxa: interjeição; tom da fala: euforia Locução Interjetiva
Puxa! Hoje não foi meu dia de sorte! Ocorre quando duas ou mais palavras formam uma
puxa: interjeição; tom da fala: decepção expressão com sentido de interjeição: Ora bolas!, Virgem
Maria!, Meu Deus!, Ó de casa!, Ai de mim!, Graças a Deus!
As interjeições cumprem, normalmente, duas fun- Toda frase mais ou menos breve dita em tom
ções: exclama- tivo torna-se uma locução interjetiva,
a) Sintetizar uma frase exclamativa, exprimindo ale- dispensando análise dos termos que a compõem:
gria, tristeza, dor, etc. Macacos me mordam!, Valha- me Deus!, Quem me dera!
Ah, deve ser muito interessante!
* Observações:
b) Sintetizar uma frase apelativa. 1) As interjeições são como frases resumidas,
Cuidado! Saia da minha frente. sintéticas. Por exemplo:
Ué! (= Eu não esperava por essa!)
As interjeições podem ser formadas por: Perdão! (= Peço-lhe que me desculpe.)
a) simples sons vocálicos: Oh!, Ah!, Ó, Ô
b) palavras: Oba! Olá! Claro! 2) Além do contexto, o que caracteriza a interjeição é
c) grupos de palavras (locuções interjetivas): Meu o seu tom exclamativo; por isso, palavras de outras classes
Deus! Ora bolas! gra- maticais podem aparecer como interjeições. Por
exemplo:
Classificação das Interjeições Viva! Basta! (Verbos)
Fora! Francamente! (Advérbios)
Comumente, as interjeições expressam sentido de: 3) A interjeição pode ser considerada uma “palavra-
frase” porque sozinha pode constituir uma mensagem.
Advertência: Cuidado! Devagar! Calma! Sentido!
Por exemplo:
Atenção! Olha! Alerta!
Socorro! Ajudem-me! Silêncio! Fique quieto!
Afugentamento: Fora! Passa! Rua!
Alegria ou Satisfação: Oh! Ah! Eh! Oba! Viva!
4) Há, também, as interjeições onomatopaicas ou imi-
Alívio: Arre! Uf! Ufa! Ah! tativas, que exprimem ruídos e vozes. Por exemplo: Miau!
Animação ou Estímulo: Vamos! Força! Coragem! Bumba! Zás! Plaft! Pof! Catapimba! Tique-taque! Quá-
Ânimo! Adiante! quá- quá!, etc.
Aplauso ou Aprovação: Bravo! Bis! Apoiado! Viva!
Concordância: Claro! Sim! Pois não! Tá! 5) Não se deve confundir a interjeição de apelo “ó”
Repulsa ou Desaprovação: Credo! Ih! Francamente! com a sua homônima “oh!”, que exprime admiração,
Essa não! Chega! Basta! alegria, tristeza, etc. Faz-se uma pausa depois do “oh!”
Desejo ou Intenção: Pudera! Tomara! Oxalá! Queira exclamativo e não a fazemos depois do “ó” vocativo. Por
Deus! exemplo:
Desculpa: Perdão! “Ó natureza! ó mãe piedosa e pura!” (Olavo Bilac)
Dor ou Tristeza: Ai! Ui! Ai de mim! Que pena! Oh! a jornada negra!” (Olavo Bilac)
Dúvida ou Incredulidade: Que nada! Qual o quê!
Espanto ou Admiração: Oh! Ah! Uai! Puxa! Céus! Fontes de pesquisa:
Quê! Caramba! Opa! Nossa! Hein? Cruz! Putz! http://www.soportugues.com.br/secoes/morf/morf89.php
Impaciência ou Contrariedade: Hum! Raios! Puxa! SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa Sac-
Pô! Ora! coni. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010.
Português – Literatura, Produção de Textos & Gramá-
tica – volume único / Samira Yousseff Campedelli, Jésus
Barbosa Souza. – 3. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2002.

25
LÍNGUA PORTUGUESA

Numeral
Quando atuam em funções adjetivas, esses numerais
Numeral é a palavra variável que indica quantidade
flexionam-se em gênero e número: Teve de tomar doses
numérica ou ordem; expressa a quantidade exata de pes-
triplas do medicamento.
soas ou coisas ou o lugar que elas ocupam numa deter-
Os numerais fracionários flexionam-se em gênero e
minada sequência.
número. Observe: um terço/dois terços, uma terça parte/
duas terças partes.
* Note bem: os numerais traduzem, em palavras, o Os numerais coletivos flexionam-se em número: uma
que os números indicam em relação aos seres. Assim, dúzia, um milheiro, duas dúzias, dois milheiros.
quando a expressão é colocada em números (1, 1.º, 1/3, É comum na linguagem coloquial a indicação de grau
etc.) não se trata de numerais, mas sim de algarismos. nos numerais, traduzindo afetividade ou especialização
Além dos numerais mais conhecidos, já que refletem a de sentido. É o que ocorre em frases como:
ideia expressa pelos números, existem mais algumas pala- “Me empresta duzentinho...”
vras consideradas numerais porque denotam quantidade, É artigo de primeiríssima qualidade!
proporção ou ordenação. São alguns exemplos: década, O time está arriscado por ter caído na segundona. (=
dúzia, par, ambos(as), novena. segunda divisão de futebol)
Classificação dos Numerais Emprego e Leitura dos Numerais
- Cardinais: indicam quantidade exata ou determina- - Os numerais são escritos em conjunto de três alga-
da de seres: um, dois, cem mil, etc. Alguns cardinais têm rismos, contados da direita para a esquerda, em forma de
sentido coletivo, como por exemplo: século, par, dúzia, dé- centenas, dezenas e unidades, tendo cada conjunto uma
cada, bimestre. separação através de ponto ou espaço correspondente a
um ponto: 8.234.456 ou 8 234 456.
- Ordinais: indicam a ordem, a posição que alguém - Em sentido figurado, usa-se o numeral para indicar
ou alguma coisa ocupa numa determinada sequência: pri- exagero intencional, constituindo a figura de linguagem
meiro, segundo, centésimo, etc. conhecida como hipérbole: Já li esse texto mil vezes.
- No português contemporâneo, não se usa a conjun-
* Observação importante: ção “e” após “mil”, seguido de centena:
As palavras anterior, posterior, último, antepenúltimo, Nasci em mil novecentos e noventa e dois.
final e penúltimo também indicam posição dos seres, mas Seu salário será de mil quinhentos e cinquenta reais.
são classificadas como adjetivos, não ordinais.
* Mas, se a centena começa por “zero” ou termina
- Fracionários: indicam parte de uma quantidade, ou por dois zeros, usa-se o “e”:
seja, uma divisão dos seres: meio, terço, dois quintos, etc. Seu salário será de mil e quinhentos reais. (R$1.500,00)
- Multiplicativos: expressam ideia de multiplicação Gastamos mil e quarenta reais. (R$1.040,00)
dos seres, indicando quantas vezes a quantidade foi au- - Para designar papas, reis, imperadores, séculos e
mentada: dobro, triplo, quíntuplo, etc. partes em que se divide uma obra, utilizam-se os ordinais
até décimo e, a partir daí, os cardinais, desde que o nume-
Flexão dos numerais ral venha depois do substantivo;

Os numerais cardinais que variam em gênero são um/


Ordinais Cardinais
uma, dois/duas e os que indicam centenas de duzentos/
duzentas em diante: trezentos/trezentas; quatrocentos/ João Paulo II (segundo) Tomo XV (quinze)
quatrocentas, etc. Cardinais como milhão, bilhão, trilhão, D. Pedro II (segundo) Luís XVI (dezesseis)
variam em número: milhões, bilhões, trilhões. Os demais
Ato II (segundo) Capítulo XX (vinte)
cardinais são invariáveis.
Século VIII (oitavo) Século XX (vinte)
Os numerais ordinais variam em gênero e número: Canto IX (nono) João XXIII ( vinte e três)

primeiro segundo milésimo - Se o numeral aparece antes do substantivo, será lido


como ordinal: XXX Feira do Bordado. (trigésima)
primeira segunda milésima
primeiros segundos milésimos ** Dica: Ordinal lembra ordem. Memorize assim, por
primeiras segundas milésimas associação. Ficará mais fácil!
- Para designar leis, decretos e portarias, utiliza-se o
Os numerais multiplicativos são invariáveis quando ordinal até nono e o cardinal de dez em diante:
atuam em funções substantivas: Fizeram o dobro do esfor-
ço e conseguiram o triplo de produção. Artigo 1.° (primeiro) Artigo 10 (dez)
Artigo 9.° (nono) Artigo 21 (vinte e um)

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LÍNGUA PORTUGUESA

- Ambos/ambas = numeral dual, porque sempre se refere a dois seres. Significam “um e outro”, “os dois” (ou “uma e
outra”, “as duas”) e são largamente empregados para retomar pares de seres aos quais já se fez referência. Sua utilização
exige a presença do artigo posposto: Ambos os concursos realizarão suas provas no mesmo dia. O artigo só é dispensado
caso haja um pronome demonstrativo: Ambos esses ministros falarão à imprensa.

Função sintática do Numeral

O numeral tem mais de uma função sintática:


- se na oração analisada seu papel é de adjetivo, o numeral assumirá a função de adjunto adnominal; se fizer papel
de substantivo, pode ter a função de sujeito, objeto direto ou indireto.

Visitamos cinco casas, mas só gostamos de duas.


Objeto direto = cinco casas
Núcleo do objeto direto = casas
Adjunto adnominal = cinco
Objeto indireto = de duas
Núcleo do objeto indireto = duas

Quadro de alguns numerais

Cardinais Ordinais Multiplicativos Fracionários


um primeiro - -
dois segundo dobro, duplo meio
três terceiro triplo, tríplice terço
quatro quarto quádruplo quarto
cinco quinto quíntuplo quinto
seis sexto sêxtuplo sexto
sete sétimo sétuplo sétimo
oito oitavo óctuplo oitavo
nove nono nônuplo nono
dez décimo décuplo décimo
onze décimo primeiro - onze avos
doze décimo segundo - doze avos
treze décimo terceiro - treze avos
catorze décimo quarto - catorze avos
quinze décimo quinto - quinze avos
dezesseis décimo sexto - dezesseis avos
dezessete décimo sétimo - dezessete avos
dezoito décimo oitavo - dezoito avos
dezenove décimo nono - dezenove avos
vinte vigésimo - vinte avos
trinta trigésimo - trinta avos
quarenta quadragésimo - quarenta avos
cinqüenta quinquagésimo - cinquenta avos
sessenta sexagésimo - sessenta avos
setenta septuagésimo - setenta avos
oitenta octogésimo - oitenta avos
noventa nonagésimo - noventa avos

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LÍNGUA PORTUGUESA

cem centésimo cêntuplo centésimo


duzentos ducentésimo - ducentésimo
trezentos trecentésimo - trecentésimo
quatrocentos quadringentésimo - quadringentésimo
quinhentos quingentésimo - quingentésimo
seiscentos sexcentésimo - sexcentésimo
setecentos septingentésimo - septingentésimo
oitocentos octingentésimo - octingentésimo
novecentos nongentésimo
ou noningentésimo - nongentésimo
mil milésimo - milésimo
milhão milionésimo - milionésimo
bilhão bilionésimo - bilionésimo

fontes de pesquisa:
http://www.soportugues.com.br/secoes/morf/morf40.php
SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa Sacconi. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010.
Português linguagens: volume 2 / Wiliam Roberto Cereja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São Paulo:
Saraiva, 2010.
Português: novas palavras: literatura, gramática, redação / Emília Amaral... [et al.]. – São Paulo: FTD, 2000.

Preposição

Preposição é uma palavra invariável que serve para ligar termos ou orações. Quando esta ligação acontece, nor-
malmente há uma subordinação do segundo termo em relação ao primeiro. As preposições são muito importantes na
estrutura da língua, pois estabelecem a coesão textual e possuem valores semânticos indispensáveis para a compreensão
do texto.

Tipos de Preposição

1. Preposições essenciais: palavras que atuam exclusivamente como preposições: a, ante, perante, após, até, com,
contra, de, desde, em, entre, para, por, sem, sob, sobre, trás, atrás de, dentro de, para com.

2. Preposições acidentais: palavras de outras classes gramaticais que podem atuar como preposições, ou seja, for-
madas por uma derivação imprópria: como, durante, exceto, fora, mediante, salvo, segundo, senão, visto.

3. Locuções prepositivas: duas ou mais palavras valendo como uma preposição, sendo que a última palavra é uma
(preposição): abaixo de, acerca de, acima de, ao lado de, a respeito de, de acordo com, em cima de, embaixo de, em frente
a, ao redor de, graças a, junto a, com, perto de, por causa de, por cima de, por trás de.

A preposição é invariável, no entanto pode unir-se a outras palavras e, assim, estabelecer concordância em gênero
ou em número. Ex: por + o = pelo por + a = pela.

* Essa concordância não é característica da preposição, mas das palavras às quais ela se une.
Esse processo de junção de uma preposição com outra palavra pode se dar a partir dos processos de:

1. Combinação: união da preposição “a” com o artigo “o”(s), ou com o advérbio “onde”: ao, aonde, aos. Os vocábulos
não sofrem alteração.
2. Contração: união de uma preposição com outra palavra, ocorrendo perda ou transformação de fonema: de + o =
do, em + a = na, per + os = pelos, de + aquele = daquele, em + isso = nisso.
3. Crase: é a fusão de vogais idênticas: à (“a” preposição + “a” artigo), àquilo (“a” preposição + 1.ª vogal do pronome
“aquilo”).

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LÍNGUA PORTUGUESA

Dicas sobre preposição Utilizando pronomes, teremos:


O homem julga que é superior à natureza, por isso ele
- O “a” pode funcionar como preposição, pronome
a destrói...
pes- soal oblíquo e artigo. Como distingui-los? Caso o “a”
Ficou melhor, sem a repetição desnecessária de ter-
seja um artigo, virá precedendo um substantivo, servindo
mos (homem e natureza).
para determiná-lo como um substantivo singular e
feminino.
Grande parte dos pronomes não possuem significa-
A matéria que estudei é fácil!
dos fixos, isto é, essas palavras só adquirem significação
- Quando é preposição, além de ser invariável, liga dentro de um contexto, o qual nos permite recuperar a re-
ferência exata daquilo que está sendo colocado por meio
dois
dos pronomes no ato da comunicação. Com exceção dos
termos e estabelece relação de subordinação entre eles.
pronomes interrogativos e indefinidos, os demais prono-
Irei à festa sozinha.
Entregamos a flor à professora! mes têm por função principal apontar para as pessoas do
discurso ou a elas se relacionar, indicando-lhes sua situa-
*o primeiro “a” é artigo; o segundo, preposição.
ção no tempo ou no espaço. Em virtude dessa caracterís-
- Se for pronome pessoal oblíquo estará ocupando o tica, os pronomes apresentam uma forma específica para
lugar e/ou a função de um substantivo. cada pessoa do discurso.
Nós trouxemos a apostila. = Nós a trouxemos.
Minha carteira estava vazia quando eu fui assaltada.
Relações semânticas (= de sentido) estabelecidas [minha/eu: pronomes de 1.ª pessoa = aquele que fala]
por meio das preposições: Tua carteira estava vazia quando tu foste assaltada?
[tua/tu: pronomes de 2.ª pessoa = aquele a quem se
Destino = Irei a Salvador. fala]
Modo = Saiu aos prantos. A carteira dela estava vazia quando ela foi assaltada.
Lugar = Sempre a seu [dela/ela: pronomes de 3.ª pessoa = aquele de quem
lado. se fala]
Assunto = Falemos sobre
futebol. Tempo = Chegarei em Em termos morfológicos, os pronomes são palavras
instantes. Causa = Chorei de variáveis em gênero (masculino ou feminino) e em núme-
saudade. ro (singular ou plural). Assim, espera-se que a referência
Fim ou finalidade = Vim para ficar. através do pronome seja coerente em termos de gênero
Instrumento = Escreveu a lápis. e número (fenômeno da concordância) com o seu objeto,
Posse = Vi as roupas da mamãe. mesmo quando este se apresenta ausente no enunciado.
Autoria = livro de Machado de
Assis Fala-se de Roberta. Ele quer participar do desfile da
Companhia = Estarei com ele amanhã. nossa escola neste ano.
Matéria = copo de cristal. [nossa: pronome que qualifica “escola” = concordân-
Meio = passeio de barco. cia adequada]
Origem = Nós somos do Nordeste. [neste: pronome que determina “ano” = concordância
Conteúdo = frascos de perfume. adequada]
Oposição = Esse movimento é contra o que eu [ele: pronome que faz referência à “Roberta” = con-
penso. Preço = Essa roupa sai por cinquenta reais. cordância inadequada]

* Quanto à preposição “trás”: não se usa senão nas lo- Existem seis tipos de pronomes: pessoais, possessivos,
cuções adverbiais (para trás ou por trás) e na locução pre- demonstrativos, indefinidos, relativos e interrogativos.
positiva por trás de.
Pronomes Pessoais
Fontes de pesquisa:
http://www.infoescola.com/portugues/preposicao/ São aqueles que substituem os substantivos, indi-
SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa cando diretamente as pessoas do discurso. Quem fala
Sac- ou escreve assume os pronomes “eu” ou “nós”; usa-se os
coni. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010. pronomes “tu”, “vós”, “você” ou “vocês” para designar a
Português linguagens: volume 2 / Wiliam Roberto quem se dirige, e “ele”, “ela”, “eles” ou “elas” para fazer
Cere- ja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – referência à pessoa ou às pessoas de quem se fala.
São Paulo: Saraiva, 2010. Os pronomes pessoais variam de acordo com as fun-
Português: novas palavras: literatura, gramática, ções que exercem nas orações, podendo ser do caso reto
redação ou do caso oblíquo.
/ Emília Amaral... [et al.]. – São Paulo: FTD, 2000.

Pronome
Pronome é a palavra variável que substitui ou acom-
panha um substantivo (nome), qualificando-o de alguma
forma.
O homem julga que é superior à natureza, por isso o
homem destrói a natureza...
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LÍNGUA PORTUGUESA

Pronome Reto - 1.ª pessoa do plural (nós): nos


- 2.ª pessoa do plural (vós): vos
Pronome pessoal do caso reto é aquele que, na sen-
- 3.ª pessoa do plural (eles, elas): os, as, lhes
tença, exerce a função de sujeito: Nós lhe ofertamos flo-
res. * Observações:
- O “lhe” é o único pronome oblíquo átono que já
Os pronomes retos apresentam flexão de número, gê- se apresenta na forma contraída, ou seja, houve a união
nero (apenas na 3.ª pessoa) e pessoa, sendo essa última a entre o pronome “o” ou “a” e preposição “a” ou “para”.
principal flexão, uma vez que marca a pessoa do discurso. Por acompanhar diretamente uma preposição, o prono-
Dessa forma, o quadro dos pronomes retos é assim con- me “lhe” exerce sempre a função de objeto indireto na
figurado: oração.
Os pronomes me, te, nos e vos podem tanto ser obje-
- 1.ª pessoa do singular: eu tos diretos como objetos indiretos.
- 2.ª pessoa do singular: tu Os pronomes o, a, os e as atuam exclusivamente como
- 3.ª pessoa do singular: ele, ela objetos diretos.
- 1.ª pessoa do plural: nós
- 2.ª pessoa do plural: vós - Os pronomes me, te, lhe, nos, vos e lhes podem com-
- 3.ª pessoa do plural: eles, elas binar-se com os pronomes o, os, a, as, dando origem a
formas como mo, mos, ma, mas; to, tos, ta, tas; lho, lhos,
* Atenção: esses pronomes não costumam ser usados lha, lhas; no-lo, no-los, no-la, no-las, vo-lo, vo-los, vo-la,
como complementos verbais na língua-padrão. Frases vo-las. Observe o uso dessas formas nos exemplos que
como “Vi ele na rua”, “Encontrei ela na praça”, “Trouxe- seguem:
ram eu até aqui”, comuns na língua oral cotidiana, devem Trouxeste o pacote?
ser evitadas na língua formal escrita ou falada. Na língua Sim, entreguei-to ainda há pouco.
formal, devem ser usados os pronomes oblíquos corres- Não contaram a novidade a vocês?
pondentes: “Vi-o na rua”, “Encontrei-a na praça”, “Trouxe- Não, no-la contaram.
ram-me até aqui”.
No Brasil, essas combinações não são usadas; até
* Observação: frequentemente observamos a omis- mesmo na língua literária atual, seu emprego é muito raro.
são do pronome reto em Língua Portuguesa. Isso se dá
porque as próprias formas verbais marcam, através de * Atenção: Os pronomes o, os, a, as assumem formas
suas desinências, as pessoas do verbo indicadas pelo pro- especiais depois de certas terminações verbais.
nome reto: Fizemos boa viagem. (Nós) - Quando o verbo termina em -z, -s ou -r, o pronome
assume a forma lo, los, la ou las, ao mesmo tempo que a
Pronome Oblíquo terminação verbal é suprimida. Por exemplo:
fiz + o = fi-lo
Pronome pessoal do caso oblíquo é aquele que, na fazeis + o = fazei-lo
sentença, exerce a função de complemento verbal (ob- dizer + a = dizê-la
jeto direto ou indireto): Ofertaram-nos flores. (objeto
indireto) - Quando o verbo termina em som nasal, o pronome
assume as formas no, nos, na, nas. Por exemplo:
* Observação: o pronome oblíquo é uma forma va- viram + o: viram-no
riante do pronome pessoal do caso reto. Essa variação in- repõe + os = repõe-nos
dica a função diversa que eles desempenham na oração: retém + a: retém-na
pronome reto marca o sujeito da oração; pronome oblí- tem + as = tem-nas
quo marca o complemento da oração.
Os pronomes oblíquos sofrem variação de acordo Pronome Oblíquo Tônico
com a acentuação tônica que possuem, podendo ser áto-
nos ou tônicos. Os pronomes oblíquos tônicos são sempre precedi-
dos por preposições, em geral as preposições a, para, de
Pronome Oblíquo Átono e com. Por esse motivo, os pronomes tônicos exercem a
função de objeto indireto da oração. Possuem acentuação
São chamados átonos os pronomes oblíquos que não tônica forte.
são precedidos de preposição. Possuem acentuação tôni- Quadro dos pronomes oblíquos tônicos:
ca fraca: Ele me deu um presente. - 1.ª pessoa do singular (eu): mim, comigo
Tabela dos pronomes oblíquos átonos - 2.ª pessoa do singular (tu): ti, contigo
- 1.ª pessoa do singular (eu): me - 3.ª pessoa do singular (ele, ela): si, consigo, ele, ela
- 2.ª pessoa do singular (tu): te - 1.ª pessoa do plural (nós): nós, conosco
- 3.ª pessoa do singular (ele, ela): o, a, lhe - 2.ª pessoa do plural (vós): vós, convosco
- 3.ª pessoa do plural (eles, elas): si, consigo, eles, elas

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LÍNGUA PORTUGUESA

Observe que as únicas formas próprias do pronome


- 2.ª pessoa do singular (tu): te, ti.
tônico são a primeira pessoa (mim) e segunda pessoa (ti).
As demais repetem a forma do pronome pessoal do caso Conhece a ti mesmo.
reto.
- 3.ª pessoa do singular (ele, ela): se, si, consigo.
Guilherme já se
- As preposições essenciais introduzem sempre pro-
preparou. Ela deu a si um
nomes pessoais do caso oblíquo e nunca pronome do
presente.
caso reto. Nos contextos interlocutivos que exigem o uso
da língua formal, os pronomes costumam ser usados des- Antônio conversou consigo mesmo.
ta forma:
- 1.ª pessoa do plural (nós): nos.
Não há mais nada entre mim e ti.
Lavamo-nos no rio.
Não se comprovou qualquer ligação entre ti e ela.
Não há nenhuma acusação contra mim. - 2.ª pessoa do plural (vós): vos.
Não vá sem mim. Vós vos beneficiastes com esta conquista.
* Atenção: Há construções em que a preposição, - 3.ª pessoa do plural (eles, elas): se, si, consigo.
apesar de surgir anteposta a um pronome, serve para in- Eles se conheceram.
troduzir uma oração cujo verbo está no infinitivo. Nesses Elas deram a si um dia de folga.
casos, o verbo pode ter sujeito expresso; se esse sujeito
for um pronome, deverá ser do caso reto. * O pronome é reflexivo quando se refere à mesma
Trouxeram vários vestidos para eu experimentar. pessoa do pronome subjetivo (sujeito): Eu me arrumei e saí.
Não vá sem eu mandar. ** É pronome recíproco quando indica reciprocidade
de ação:
* A frase: “Foi fácil para mim resolver aquela questão!” Nós nos amamos.
está correta, já que “para mim” é complemento de “fácil”. Olhamo-nos
A ordem direta seria: Resolver aquela questão foi fácil para calados.
mim!
Pronomes de Tratamento
- A combinação da preposição “com” e alguns pro-
nomes originou as formas especiais comigo, contigo, con- São pronomes utilizados no tratamento formal, ceri-
sigo, conosco e convosco. Tais pronomes oblíquos tônicos monioso. Apesar de indicarem nosso interlocutor (portan-
frequentemente exercem a função de adjunto adverbial to, a segunda pessoa), utilizam o verbo na terceira pes-
de companhia. soa. Alguns exemplos:
Ele carregava o documento consigo. Vossa Alteza (V. A.) = príncipes, duques
Vossa Eminência (V. E.ma) = cardeais
- A preposição “até” exige as formas oblíquas tônicas: Vossa Reverendíssima (V. Ver.ma) = sacerdotes e
Ela veio até mim, mas nada falou. religio- sos em geral
Mas, se “até” for palavra denotativa (com o sentido Vossa Excelência (V. Ex.ª) = oficiais de patente superior
de) inclusão, usaremos as formas retas: à de coronel, senadores, deputados, embaixadores,
Todos foram bem na prova, até eu! (=inclusive eu) profes- sores de curso superior, ministros de Estado e de
Tribunais, governadores, secretários de Estado, presidente
- As formas “conosco” e “convosco” são substituídas da Repú- blica (sempre por extenso)
por “com nós” e “com vós” quando os pronomes pessoais Vossa Magnificência (V. Mag.ª) = reitores de universi-
são reforçados por palavras como outros, mesmos, pró- dades
prios, todos, ambos ou algum numeral. Vossa Majestade (V. M.) = reis, rainhas e imperadores
Você terá de viajar com nós todos. Vossa Senhoria (V. S.a) = comerciantes em geral,
Estávamos com vós outros quando chegaram as más oficiais até a patente de coronel, chefes de seção e
notícias. funcionários de igual categoria
Ele disse que iria com nós três. Vossa Meritíssima (sempre por extenso) = para juízes
de direito
Pronome Reflexivo Vossa Santidade (sempre por extenso) = tratamento
cerimonioso
São pronomes pessoais oblíquos que, embora fun- Vossa Onipotência (sempre por extenso) = Deus
cionem como objetos direto ou indireto, referem-se ao
sujeito da oração. Indicam que o sujeito pratica e recebe Também são pronomes de tratamento o senhor, a se-
a ação expressa pelo verbo. nhora e você, vocês. “O senhor” e “a senhora” são
Quadro dos pronomes reflexivos: emprega- dos no tratamento cerimonioso; “você” e
- 1.ª pessoa do singular (eu): me, mim. “vocês”, no trata- mento familiar. Você e vocês são
Eu não me lembro disso. largamente empregados no português do Brasil; em
algumas regiões, a forma tu é de uso frequente; em
outras, pouco empregada. Já a forma vós tem uso restrito
à linguagem litúrgica, ultraformal ou literária.

31
LÍNGUA PORTUGUESA

* Observações:
* Note que: A forma do possessivo depende da pes-
* Vossa Excelência X Sua Excelência: os pronomes de
soa gramatical a que se refere; o gênero e o número con-
tratamento que possuem “Vossa(s)” são empregados em
cordam com o objeto possuído: Ele trouxe seu apoio e sua
relação à pessoa com quem falamos: Espero que V. Ex.ª,
contribuição naquele momento difícil.
Se- nhor Ministro, compareça a este encontro.
* Observações:
** Emprega-se “Sua (s)” quando se fala a respeito
da pessoa: Todos os membros da C.P.I. afirmaram que Sua - A forma “seu” não é um possessivo quando resultar
Excelência, o Senhor Presidente da República, agiu com da alteração fonética da palavra senhor: Muito obrigado,
pro- priedade. seu José.

- Os pronomes de tratamento representam uma - Os pronomes possessivos nem sempre indicam pos-
forma indireta de nos dirigirmos aos nossos se. Podem ter outros empregos, como:
interlocutores. Ao tratarmos um deputado por Vossa a) indicar afetividade: Não faça isso, minha filha.
Excelência, por exemplo, estamos nos endereçando à
excelência que esse deputado supostamente tem para b) indicar cálculo aproximado: Ele já deve ter seus 40
poder ocupar o cargo que ocupa. anos.

- 3.ª pessoa: embora os pronomes de tratamento diri- c) atribuir valor indefinido ao substantivo: Marisa tem
jam-se à 2.ª pessoa, toda a concordância deve ser feita lá seus defeitos, mas eu gosto muito dela.
com a 3.ª pessoa. Assim, os verbos, os pronomes
possessi- vos e os pronomes oblíquos empregados em - Em frases onde se usam pronomes de tratamento, o
relação a eles devem ficar na 3.ª pessoa. pronome possessivo fica na 3.ª pessoa: Vossa Excelência
Basta que V. Ex.ª cumpra a terça parte das suas pro- trouxe sua mensagem?
messas, para que seus eleitores lhe fiquem reconhecidos.
- Referindo-se a mais de um substantivo, o possessi-
- Uniformidade de Tratamento: quando escrevemos vo concorda com o mais próximo: Trouxe-me seus livros e
ou nos dirigimos a alguém, não é permitido mudar, ao anotações.
longo do texto, a pessoa do tratamento escolhida
inicialmente. Assim, por exemplo, se começamos a chamar - Em algumas construções, os pronomes pessoais
alguém de “você”, não poderemos usar “te” ou “teu”. O oblíquos átonos assumem valor de possessivo: Vou se-
uso correto exigirá, ainda, verbo na terceira pessoa. guir-lhe os passos. (= Vou seguir seus passos)

Quando você vier, eu te abraçarei e enrolar-me-ei nos - O adjetivo “respectivo” equivale a “devido, seu, pró-
teus cabelos. (errado) prio”, por isso não se deve usar “seus” ao utilizá-lo, para
que não ocorra redundância: Coloque tudo nos respectivos
Quando você vier, eu a abraçarei e enrolar-me-ei lugares.
nos seus cabelos. (correto) = terceira pessoa do singular
ou Pronomes Demonstrativos
Quando tu vieres, eu te abraçarei e enrolar-me-ei
São utilizados para explicitar a posição de certa pala-
nos teus cabelos. (correto) = segunda pessoa do singular
vra em relação a outras ou ao contexto. Essa relação pode
Pronomes Possessivos ser de espaço, de tempo ou em relação ao discurso.
São palavras que, ao indicarem a pessoa gramatical
(possuidor), acrescentam a ela a ideia de posse de algo *Em relação ao espaço:
(coisa possuída). - Este(s), esta(s) e isto = indicam o que está perto da
Este caderno é meu. (meu = possuidor: 1ª pessoa do pessoa que fala:
singular) Este material é meu.

- Esse(s), essa(s) e isso = indicam o que está perto da


NÚMERO PESSOA PRONOME pessoa com quem se fala:
singular primeira meu(s), minha(s) Esse material em sua carteira é seu?
singular segunda teu(s), tua(s)
- Aquele(s), aquela(s) e aquilo = indicam o que está
singular terceira seu(s), sua(s)
distante tanto da pessoa que fala como da pessoa com
plural primeira nosso(s), nossa(s) quem se fala:
plural segunda vosso(s), vossa(s) Aquele material não é nosso.
plural terceira seu(s), sua(s) Vejam aquele prédio!

32
LÍNGUA PORTUGUESA

*Em relação ao tempo:


Elas mesmas fizeram isso.
- Este(s), esta(s) e isto = indicam o tempo presente em Eles próprios cozinharam.
relação à pessoa que fala:
Os próprios alunos resolveram o problema.
Esta manhã farei a prova do concurso!
- semelhante(s): Não tenha semelhante atitude.
- Esse(s), essa(s) e isso = indicam o tempo passado,
- tal, tais: Tal absurdo eu não comenteria.
porém relativamente próximo à época em que se situa a
pessoa que fala: * Note que:
Essa noite dormi mal; só pensava no concurso! - Em frases como: O referido deputado e o Dr. Alcides
eram amigos íntimos; aquele casado, solteiro este. (ou en-
- Aquele(s), aquela(s) e aquilo = indicam um afasta- tão: este solteiro, aquele casado) - este se refere à pessoa
mento no tempo, referido de modo vago ou como tempo mencionada em último lugar; aquele, à mencionada em
remoto: primeiro lugar.
Naquele tempo, os professores eram valorizados.
- O pronome demonstrativo tal pode ter conotação
*Em relação ao falado ou escrito (ou ao que se fala- irônica: A menina foi a tal que ameaçou o professor?
rá ou escreverá):
- Este(s), esta(s) e isto = empregados quando se quer - Pode ocorrer a contração das preposições a, de, em
fazer referência a alguma coisa sobre a qual ainda se com pronome demonstrativo: àquele, àquela, deste, desta,
falará: Serão estes os conteúdos da prova: análise sintática, disso, nisso, no, etc: Não acreditei no que estava vendo. (no
or- = naquilo)
tografia, concordância.
Pronomes Indefinidos
- Esse(s), essa(s) e isso = utilizados quando se pretende
fazer referência a alguma coisa sobre a qual já se falou: São palavras que se referem à 3.ª pessoa do discur-
Sua aprovação no concurso, isso é o que mais so, dando-lhe sentido vago (impreciso) ou expressando
deseja- mos! quantidade indeterminada.
Alguém entrou no jardim e destruiu as mudas recém-
- Este e aquele são empregados quando se quer fazer -plantadas.
referência a termos já mencionados; aquele se refere ao
termo referido em primeiro lugar e este para o referido Não é difícil perceber que “alguém” indica uma pes-
por último: soa de quem se fala (uma terceira pessoa, portanto) de
forma imprecisa, vaga. É uma palavra capaz de indicar um
Domingo, no Pacaembu, jogarão Palmeiras e São ser humano que seguramente existe, mas cuja identidade
Paulo; este está mais bem colocado que aquele. (= este é desconhecida ou não se quer revelar. Classificam-se em:
[São Paulo], aquele [Palmeiras])
ou - Pronomes Indefinidos Substantivos: assumem o
lugar do ser ou da quantidade aproximada de seres na
Domingo, no Pacaembu, jogarão Palmeiras e São frase. São eles: algo, alguém, fulano, sicrano, beltrano,
Paulo; aquele está mais bem colocado que este. (= este nada, ninguém, outrem, quem, tudo.
[São Paulo], aquele [Palmeiras])
Algo o incomoda?
- Os pronomes demonstrativos podem ser variáveis Quem avisa amigo é.
ou invariáveis, observe:
Variáveis: este(s), esta(s), esse(s), essa(s), aquele(s), - Pronomes Indefinidos Adjetivos: qualificam um
aque- la(s). ser expresso na frase, conferindo-lhe a noção de quanti-
Invariáveis: isto, isso, aquilo. dade aproximada. São eles: cada, certo(s), certa(s).

* Também aparecem como pronomes demonstrativos: Cada povo tem seus costumes.
- o(s), a(s): quando estiverem antecedendo o “que” e Certas pessoas exercem várias profissões.
puderem ser substituídos por aquele(s), aquela(s), aquilo.
Não ouvi o que disseste. (Não ouvi aquilo que disseste.) * Note que: Ora são pronomes indefinidos substanti-
Essa rua não é a que te indiquei. (não é aquela que te vos, ora pronomes indefinidos adjetivos:
indiquei.) algum, alguns, alguma(s), bastante(s) (= muito, mui-
tos), demais, mais, menos, muito(s), muita(s), nenhum, ne-
- mesmo(s), mesma(s), próprio(s), própria(s): variam em nhuns, nenhuma(s), outro(s), outra(s), pouco(s), pouca(s),
qualquer, quaisquer, qual, que, quanto(s), quanta(s), tal,
gênero quando têm caráter reforçativo:
tais, tanto(s), tanta(s), todo(s), toda(s), um, uns, uma(s), vá-
Estas são as mesmas pessoas que o procuraram ontem.
rios, várias.
Eu mesma refiz os exercícios.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Menos palavras e mais ações.


Alguns se contentam pouco. Pronomes Relativos

Os pronomes indefinidos podem ser divididos em va- São aqueles que representam nomes já mencionados
riáveis e invariáveis. Observe: anteriormente e com os quais se relacionam. Introduzem
as orações subordinadas adjetivas.
Variáveis = algum, nenhum, todo, muito, pouco, vário, O racismo é um sistema que afirma a superioridade de
tanto, outro, quanto, alguma, nenhuma, toda, muita, um grupo racial sobre outros.
pouca, vária, tanta, outra, quanta, qualquer, quaisquer*, (afirma a superioridade de um grupo racial sobre ou-
alguns, ne- nhuns, todos, muitos, poucos, vários, tantos, tros = oração subordinada adjetiva).
outros, quantos, algumas, nenhumas, todas, muitas,
poucas, várias, tantas, outras, quantas. O pronome relativo “que” refere-se à palavra “siste-
ma” e introduz uma oração subordinada. Diz-se que a pa-
Invariáveis = alguém, ninguém, outrem, tudo, nada, lavra “sistema” é antecedente do pronome relativo que.
algo, cada. O antecedente do pronome relativo pode ser o pro-
nome demonstrativo o, a, os, as.
*
Qualquer é composto de qual + quer (do verbo que- Não sei o que você está querendo dizer.
rer), por isso seu plural é quaisquer (única palavra cujo Às vezes, o antecedente do pronome relativo não vem
plu- ral é feito em seu interior). expresso.
Quem casa, quer casa.
- Todo e toda no singular e junto de artigo significa
in- teiro; sem artigo, equivale a qualquer ou a todas as: Observe:
Toda a cidade está enfeitada. (= a cidade Pronomes relativos variáveis = o qual, cujo, quanto, os
inteira) Toda cidade está enfeitada. (= todas as quais, cujos, quantos, a qual, cuja, quanta, as quais, cujas,
cidades) Trabalho todo o dia. (= o dia inteiro) quantas.
Trabalho todo dia. (= todos os dias) Pronomes relativos invariáveis = quem, que, onde.
São locuções pronominais indefinidas: cada qual, Note que:
cada um, qualquer um, quantos quer (que), quem quer - O pronome “que” é o relativo de mais largo empre-
(que), seja quem for, seja qual for, todo aquele (que), tal go, sendo por isso chamado relativo universal. Pode ser
qual (= certo), tal e qual, tal ou qual, um ou outro, uma ou substituído por o qual, a qual, os quais, as quais, quando
outra, etc. seu antecedente for um substantivo.
Cada um escolheu o vinho desejado. O trabalho que eu fiz refere-se à corrupção. (= o qual)
A cantora que acabou de se apresentar é péssima. (=
Indefinidos Sistemáticos
a qual)
Os trabalhos que eu fiz referem-se à corrupção. (= os
Ao observar atentamente os pronomes indefinidos,
quais)
percebemos que existem alguns grupos que criam oposi-
ção de sentido. É o caso de: algum/alguém/algo, que têm As cantoras que se apresentaram eram péssimas. (=
sentido afirmativo, e nenhum/ninguém/nada, que têm as quais)
sentido negativo; todo/tudo, que indicam uma totalidade
afirmativa, e nenhum/nada, que indicam uma totalidade - O qual, os quais, a qual e as quais são
negativa; alguém/ninguém, que se referem à pessoa, e exclusivamente pronomes relativos, por isso são
algo/nada, que se referem à coisa; certo, que particulariza, utilizados didaticamen- te para verificar se palavras como
e qualquer, que generaliza. “que”, “quem”, “onde” (que podem ter várias
Essas oposições de sentido são muito importantes na classificações) são pronomes rela- tivos. Todos eles são
construção de frases e textos coerentes, pois delas muitas usados com referência à pessoa ou coisa por motivo de
vezes dependem a solidez e a consistência dos argumen- clareza ou depois de determinadas preposições:
tos expostos. Observe nas frases seguintes a força que os Regressando de São Paulo, visitei o sítio de minha tia, o
pronomes indefinidos destacados imprimem às qual me deixou encantado. O uso de “que”, neste caso,
afirmações de que fazem parte: geraria ambiguidade. Veja: Regressando de São Paulo,
Nada do que tem sido feito produziu qualquer visitei o sítio de minha tia, que me deixou encantado (quem
resultado prático. me deixou encantado: o sítio ou minha tia?).
Certas pessoas conseguem perceber sutilezas: não são Essas são as conclusões sobre as quais pairam muitas
pessoas quaisquer. dúvidas? (com preposições de duas ou mais sílabas utili-
za-se o qual / a qual)
*Nenhum é contração de nem um, forma mais
enfática, que se refere à unidade. Repare: - O relativo “que” às vezes equivale a o que, coisa que,
Nenhum candidato foi aprovado. e se refere a uma oração: Não chegou a ser padre, mas
Nem um candidato foi aprovado. (um, nesse caso, é deixou de ser poeta, que era a sua vocação natural.
numeral)

34
LÍNGUA PORTUGUESA

- O pronome “cujo”: exprime posse; não concorda


com o seu antecedente (o ser possuidor), mas com o con- - Numa série de orações adjetivas coordenadas, pode
sequente (o ser possuído, com o qual concorda em gêne- ocorrer a elipse do relativo “que”: A sala estava cheia de
ro e número); não se usa artigo depois deste pronome; gente que conversava, (que) ria, observava.
“cujo” equivale a do qual, da qual, dos quais, das quais.
Existem pessoas cujas ações são nobres. Pronomes Interrogativos
(antecedente) (consequente)
São usados na formulação de perguntas, sejam elas
diretas ou indiretas. Assim como os pronomes indefini-
*interpretação do pronome “cujo” na frase acima:
dos, referem-se à 3.ª pessoa do discurso de modo im-
ações das pessoas. É como se lêssemos “de trás para fren-
preciso. São pronomes interrogativos: que, quem, qual (e
te”. Outro exemplo:
variações), quanto (e variações).
Comprei o livro cujo autor é famoso. (= autor do livro)
Com quem andas?
Qual seu nome?
** se o verbo exigir preposição, esta virá antes do pro-
Diz-me com quem andas, que te direi quem és.
nome:
O autor, a cujo livro você se referiu, está aqui! (referiu-
Sobre os pronomes:
se a)
O pronome pessoal é do caso reto quando tem fun-
- “Quanto” é pronome relativo quando tem por an- ção de sujeito na frase. O pronome pessoal é do caso oblí-
tecedente um pronome indefinido: tanto (ou variações) quo quando desempenha função de complemento.
e tudo: 1. Eu não sei essa matéria, mas ele irá me ajudar.
Emprestei tantos quantos foram necessários. 2. Maria foi embora para casa, pois não sabia se devia
(antecedente) lhe ajudar.
Ele fez tudo quanto havia falado.
(antecedente) Na primeira oração os pronomes pessoais “eu” e “ele”
exercem função de sujeito, logo, são pertencentes ao caso
- O pronome “quem” se refere a pessoas e vem sem- reto. Já na segunda oração, o pronome “lhe” exerce fun-
pre precedido de preposição. ção de complemento (objeto), ou seja, caso oblíquo.
É um professor a quem muito devemos. Os pronomes pessoais indicam as pessoas do discur-
(preposição) so. O pronome oblíquo “lhe”, da segunda oração, aponta
para a segunda pessoa do singular (tu/você): Maria não
- “Onde”, como pronome relativo, sempre possui an- sabia se devia ajudar... Ajudar quem? Você (lhe).
tecedente e só pode ser utilizado na indicação de lugar: A
casa onde morava foi assaltada. Os pronomes pessoais oblíquos podem ser átonos ou
tônicos: os primeiros não são precedidos de preposição,
- Na indicação de tempo, deve-se empregar quando diferentemente dos segundos, que são sempre precedi-
ou em que. dos de preposição.
Sinto saudades da época em que (quando) morávamos - Pronome oblíquo átono: Joana me perguntou o que
no exterior. eu estava fazendo.
- Pronome oblíquo tônico: Joana perguntou para
- Podem ser utilizadas como pronomes relativos as mim o que eu estava fazendo.
palavras:
- como (= pelo qual) – desde que precedida das pala- Fontes de pesquisa:
vras modo, maneira ou forma: http://www.soportugues.com.br/secoes/morf/
Não me parece correto o modo como você agiu sema- morf42.php
na passada. SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa
Sacconi. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010.
- quando (= em que) – desde que tenha como antece- Português linguagens: volume 2 / Wiliam Roberto Ce-
dente um nome que dê ideia de tempo: reja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São
Bons eram os tempos quando podíamos jogar video- Paulo: Saraiva, 2010.
game. Português: novas palavras: literatura, gramática, reda-
ção / Emília Amaral... [et al.]. – São Paulo: FTD, 2000.
- Os pronomes relativos permitem reunir duas ora-
ções numa só frase. Substantivo
O futebol é um esporte. / O povo gosta muito deste
esporte. Substantivo é a classe gramatical de palavras variá-
= O futebol é um esporte de que o povo gosta muito. veis, as quais denominam todos os seres que existem,
sejam reais ou imaginários. Além de objetos, pessoas e
fenômenos, os substantivos também nomeiam:

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LÍNGUA PORTUGUESA

-lugares: Alemanha, Portugal


Por exemplo: a beleza não existe por si só, não pode ser
-sentimentos: amor, saudade
observada. Só podemos observar a beleza numa pes- soa ou
-estados: alegria, tristeza
coisa que seja bela. A beleza depende de outro ser para se
-qualidades: honestidade, sinceridade...
manifestar. Portanto, a palavra beleza é um substantivo
-ações: corrida, pescaria... abstrato.
Os substantivos abstratos designam estados, qualida-
Morfossintaxe do substantivo des, ações e sentimentos dos seres, dos quais podem ser
abstraídos, e sem os quais não podem existir: vida (es-
Nas orações, geralmente o substantivo exerce fun- tado), rapidez (qualidade), viagem (ação), saudade (sen-
ções diretamente relacionadas com o verbo: atua como timento).
núcleo do sujeito, dos complementos verbais (objeto di-
reto ou indireto) e do agente da passiva, podendo, ainda,
Substantivos Coletivos
funcionar como núcleo do complemento nominal ou do
aposto, como núcleo do predicativo do sujeito, do ob- Ele vinha pela estrada e foi picado por uma abelha,
jeto ou como núcleo do vocativo. Também encontramos outra abelha, mais outra abelha.
substantivos como núcleos de adjuntos adnominais e de Ele vinha pela estrada e foi picado por várias abelhas.
adjuntos adverbiais - quando essas funções são desem- Ele vinha pela estrada e foi picado por um enxame.
penhadas por grupos de palavras.
Note que, no primeiro caso, para indicar plural, foi ne-
Classificação dos Substantivos cessário repetir o substantivo: uma abelha, outra abelha,
mais outra abelha. No segundo caso, utilizaram-se duas
Substantivos Comuns e Próprios palavras no plural. No terceiro, empregou-se um substan-
tivo no singular (enxame) para designar um conjunto de
Observe a definição: seres da mesma espécie (abelhas).
Cidade: s.f. 1: Povoação maior que vila, com muitas O substantivo enxame é um substantivo coletivo.
ca- sas e edifícios, dispostos em ruas e avenidas (no Brasil,
toda a sede de município é cidade). 2. O centro de uma
Substantivo Coletivo: é o substantivo comum que,
cidade (em oposição aos bairros).
mesmo estando no singular, designa um conjunto de se-
res da mesma espécie.
Qualquer “povoação maior que vila, com muitas casas
e edifícios, dispostos em ruas e avenidas” será chamada Substantivo coletivo Conjunto de:
cidade. Isso significa que a palavra cidade é um substan-
tivo comum. assembleia pessoas reunidas
Substantivo Comum é aquele que designa os seres de alcateia lobos
uma mesma espécie de forma genérica: cidade, menino, acervo livros
homem, mulher, país, cachorro.
antologia trechos literários selecionados
Estamos voando para Barcelona.
arquipélago ilhas
O substantivo Barcelona designa apenas um ser da banda músicos
espécie cidade. Barcelona é um substantivo próprio –
bando desordeiros ou malfeitores
aquele que designa os seres de uma mesma espécie de
forma particular: Londres, Paulinho, Pedro, Tietê, Brasil. banca examinadores
batalhão soldados
Substantivos Concretos e Abstratos cardume peixes
Substantivo Concreto: é aquele que designa o ser caravana viajantes peregrinos
que existe, independentemente de outros seres. cacho frutas
cancioneiro canções, poesias líricas
Observação: os substantivos concretos designam se-
res do mundo real e do mundo imaginário. colmeia abelhas
Seres do mundo real: homem, mulher, cadeira, cobra, concílio bispos
Brasília. congresso parlamentares, cientistas
Seres do mundo imaginário: saci, mãe-d’água, fantas-
ma. elenco atores de uma peça ou filme
esquadra navios de guerra
Substantivo Abstrato: é aquele que designa seres enxoval roupas
que dependem de outros para se manifestarem ou exis-
tirem.

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LÍNGUA PORTUGUESA

falange soldados, anjos Substantivo Composto: é aquele formado por dois


ou mais elementos. Outros exemplos: beija-flor, passa-
fauna animais de uma região tempo.
feixe lenha, capim
flora vegetais de uma região Substantivos Primitivos e Derivados
frota navios mercantes, ônibus Substantivo Primitivo: é aquele que não deriva de
girândola fogos de artifício nenhuma outra palavra da própria língua portuguesa. O
horda bandidos, invasores substantivo limoeiro, por exemplo, é derivado, pois se ori-
ginou a partir da palavra limão.
médicos, bois, credores,
junta Substantivo Derivado: é aquele que se origina de
examinadores
outra palavra.
júri jurados
legião soldados, anjos, demônios Flexão dos substantivos
leva presos, recrutas
O substantivo é uma classe variável. A palavra é variá-
malta malfeitores ou desordeiros vel quando sofre flexão (variação). A palavra menino, por
manada búfalos, bois, elefantes, exemplo, pode sofrer variações para indicar:
matilha cães de raça Plural: meninos / Feminino: menina / Aumentativo:
meninão / Diminutivo: menininho
molho chaves, verduras
multidão pessoas em geral Flexão de Gênero
insetos (gafanhotos,
nuvem Gênero é um princípio puramente linguístico, não de-
mosquitos, etc.)
penca bananas, chaves vendo ser confundido com “sexo”. O gênero diz respeito
a todos os substantivos de nossa língua, quer se refiram
pinacoteca pinturas, quadros a seres animais providos de sexo, quer designem apenas
quadrilha ladrões, bandidos “coisas”: o gato/a gata; o banco, a casa.
ramalhete flores Na língua portuguesa, há dois gêneros: masculino e
feminino. Pertencem ao gênero masculino os substantivos
rebanho ovelhas que podem vir precedidos dos artigos o, os, um, uns. Veja
repertório peças teatrais, obras musicais estes títulos de filmes:
réstia alhos ou cebolas O velho e o mar
Um Natal inesquecível
romanceiro poesias narrativas
Os reis da praia
revoada pássaros
sínodo párocos Pertencem ao gênero feminino os substantivos que
talha lenha podem vir precedidos dos artigos a, as, uma, umas:
A história sem fim
tropa muares, soldados Uma cidade sem passado
turma estudantes, trabalhadores As tartarugas ninjas
vara porcos
Substantivos Biformes e Substantivos Uniformes
Formação dos Substantivos
Substantivos Simples e Compostos Substantivos Biformes (= duas formas): apresentam
uma forma para cada gênero: gato – gata, homem – mu-
Chuva - subst. Fem. 1 - água caindo em gotas sobre a lher, poeta – poetisa, prefeito - prefeita
terra. Substantivos Uniformes: apresentam uma única forma,
O substantivo chuva é formado por um único elemen- que serve tanto para o masculino quanto para o feminino.
to ou radical. É um substantivo simples. Classificam-se em:

Substantivo Simples: é aquele formado por um úni- - Epicenos: referentes a animais. A distinção de sexo
co elemento. se faz mediante a utilização das palavras “macho” e “fê-
Outros substantivos simples: tempo, sol, sofá, etc. mea”: a cobra macho e a cobra fêmea, o jacaré macho e o
Veja agora: O substantivo guarda-chuva é formado por jacaré fêmea.
- Sobrecomuns: substantivos uniformes referentes a
dois elementos (guarda + chuva). Esse substantivo é pessoas de ambos os sexos: a criança, a testemunha, a
composto. vítima, o cônjuge, o gênio, o ídolo, o indivíduo.

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LÍNGUA PORTUGUESA

- Comuns de Dois ou Comum de Dois Gêneros: in-


Formação do Feminino dos Substantivos Unifor-
dicam o sexo das pessoas por meio do artigo: o colega e
mes
a colega, o doente e a doente, o artista e a artista.
Epicenos:
Saiba que: Substantivos de origem grega termina-
dos em ema ou oma são masculinos: o fonema, o poema, Novo jacaré escapa de policiais no rio Pinheiros.
o sistema, o sintoma, o teorema.
Não é possível saber o sexo do jacaré em questão.
Isso ocorre porque o substantivo jacaré tem apenas uma
- Existem certos substantivos que, variando de gêne-
forma para indicar o masculino e o feminino.
ro, variam em seu significado:
Alguns nomes de animais apresentam uma só for-
o águia (vigarista) e a águia (ave; perspicaz)
ma para designar os dois sexos. Esses substantivos são
o cabeça (líder) e a cabeça (parte do corpo)
o capital (dinheiro) e a capital (cidade) chamados de epicenos. No caso dos epicenos, quando
o coma (sono mórbido) e a coma (cabeleira, juba) houver a necessidade de especificar o sexo, utilizam-se
o lente (professor) e a lente (vidro de aumento) palavras macho e fêmea.
o moral (estado de espírito) e a moral (ética; conclu- A cobra macho picou o marinheiro.
são) A cobra fêmea escondeu-se na bananeira.
o praça (soldado raso) e a praça (área pública)
o rádio (aparelho receptor) e a rádio (estação emis- Sobrecomuns:
sora) Entregue as crianças à natureza.

Formação do Feminino dos Substantivos Bifor- A palavra crianças se refere tanto a seres do sexo
mes masculino, quanto a seres do sexo feminino. Nesse caso,
nem o artigo nem um possível adjetivo permitem identi-
- Regra geral: troca-se a terminação -o por –a: aluno ficar o sexo dos seres a que se refere a palavra. Veja:
- aluna. A criança chorona chamava-se João.
- Substantivos terminados em -ês: acrescenta-se -a A criança chorona chamava-se Maria.
ao masculino: freguês - freguesa
- Substantivos terminados em -ão: fazem o feminino Outros substantivos sobrecomuns:
de três formas: a criatura = João é uma boa criatura. Maria é uma
1- troca-se -ão por -oa. = patrão – patroa boa criatura.
2- troca-se -ão por -ã. = campeão - campeã o cônjuge = O cônjuge de João faleceu. O cônjuge de
3- troca-se -ão por ona. = solteirão - solteirona Marcela faleceu

* Exceções: barão – baronesa, ladrão- ladra, sultão Comuns de Dois Gêneros:


- sultana Motorista tem acidente idêntico 23 anos depois.

- Substantivos terminados em -or: Quem sofreu o acidente: um homem ou uma mulher?


acrescenta-se -a ao masculino = doutor – doutora É impossível saber apenas pelo título da notícia, uma
troca-se -or por -triz: = imperador - imperatriz vez que a palavra motorista é um substantivo uniforme.
A distinção de gênero pode ser feita através da análi-
- Substantivos com feminino em -esa, -essa, -isa: se do artigo ou adjetivo, quando acompanharem o subs-
cônsul - consulesa / abade - abadessa / poeta - poetisa / tantivo: o colega - a colega; o imigrante - a imigrante;
duque - duquesa / conde - condessa / profeta - profetisa um jovem - uma jovem; artista famoso - artista famosa;
repórter francês - repórter francesa
- Substantivos que formam o feminino trocando o -e
final por -a: elefante - elefanta - A palavra personagem é usada indistintamente nos
dois gêneros.
- Substantivos que têm radicais diferentes no mascu- a) Entre os escritores modernos nota-se acentuada
lino e no feminino: bode – cabra / boi - vaca preferência pelo masculino: O menino descobriu nas nu-
vens os personagens dos contos de carochinha.
- Substantivos que formam o feminino de maneira b) Com referência a mulher, deve-se preferir o femi-
especial, isto é, não seguem nenhuma das regras ante-
nino: O problema está nas mulheres de mais idade, que
riores: czar – czarina, réu - ré
não aceitam a personagem.

- Diz-se: o (ou a) manequim Marcela, o (ou a) modelo


fotográfico Ana Belmonte.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Observe o gênero dos substantivos seguintes:


Flexão de Número do Substantivo
Masculinos: o tapa, o eclipse, o lança-perfume, o dó Em português, há dois números gramaticais: o singu-
(pena), o sanduíche, o clarinete, o champanha, o sósia, o lar, que indica um ser ou um grupo de seres, e o plural,
maracajá, o clã, o herpes, o pijama, o suéter, o soprano, o que indica mais de um ser ou grupo de seres. A
proclama, o pernoite, o púbis. característica do plural é o “s” final.
Femininos: a dinamite, a derme, a hélice, a omoplata,
a cataplasma, a pane, a mascote, a gênese, a entorse, a Plural dos Substantivos Simples
libido, a cal, a faringe, a cólera (doença), a ubá (canoa).
- Os substantivos terminados em vogal, ditongo oral e
- São geralmente masculinos os substantivos de ori- “n” fazem o plural pelo acréscimo de “s”: pai – pais; ímã –
gem grega terminados em -ma: o grama (peso), o quilo- ímãs; hífen - hifens (sem acento, no plural). Exceção: cânon
grama, o plasma, o apostema, o diagrama, o epigrama, o - cânones.
telefonema, o estratagema, o dilema, o teorema, o trema,
o eczema, o edema, o magma, o estigma, o axioma, o tra- - Os substantivos terminados em “m” fazem o plural
coma, o hematoma. em “ns”: homem - homens.

* Exceções: a cataplasma, a celeuma, a fleuma, etc. - Os substantivos terminados em “r” e “z” fazem o plu-
ral pelo acréscimo de “es”: revólver – revólveres; raiz -
raízes.
Gênero dos Nomes de Cidades: Com raras exceções,
nomes de cidades são femininos.
* Atenção: O plural de caráter é caracteres.
A histórica Ouro Preto.
A dinâmica São Paulo. - Os substantivos terminados em al, el, ol, ul
A acolhedora Porto Alegre. flexionam- se no plural, trocando o “l” por “is”: quintal -
Uma Londres imensa e triste. quintais; cara- col – caracóis; hotel - hotéis. Exceções: mal
Exceções: o Rio de Janeiro, o Cairo, o Porto, o Havre. e males, cônsul e cônsules.

Gênero e Significação - Os substantivos terminados em “il” fazem o plural de


duas maneiras:
Muitos substantivos têm uma significação no mascu- - Quando oxítonos, em “is”: canil - canis
lino e outra no feminino. Observe: - Quando paroxítonos, em “eis”: míssil - mísseis.
o baliza (soldado que, que à frente da tropa, indica os
movimentos que se deve realizar em conjunto; o que vai Observação: a palavra réptil pode formar seu plural de
à frente de um bloco carnavalesco, manejando um bas- duas maneiras: répteis ou reptis (pouco usada).
tão), a baliza (marco, estaca; sinal que marca um limite ou
proibição de trânsito), o cabeça (chefe), a cabeça (parte do - Os substantivos terminados em “s” fazem o plural de
corpo), o cisma (separação religiosa, dissidência), a cisma duas maneiras:
(ato de cismar, desconfiança), o cinza (a cor cinzenta), a 1- Quando monossilábicos ou oxítonos, mediante o
cinza (resíduos de combustão), o capital (dinheiro), a capi- acréscimo de “es”: ás – ases / retrós - retroses
tal (cidade), o coma (perda dos sentidos), a coma (cabelei- 2- Quando paroxítonos ou proparoxítonos, ficam
inva- riáveis: o lápis - os lápis / o ônibus - os ônibus.
ra), o coral (pólipo, a cor vermelha, canto em coro), a coral
(cobra venenosa), o crisma (óleo sagrado, usado na admi-
- Os substantivos terminados em “ao” fazem o plural
nistração da crisma e de outros sacramentos), a crisma
de três maneiras.
(sacramento da confirmação), o cura (pároco), a cura (ato 1- substituindo o -ão por -ões: ação - ações
de curar), o estepe (pneu sobressalente), a estepe (vasta 2- substituindo o -ão por -ães: cão - cães
planície de vegetação), o guia (pessoa que guia outras), a 3- substituindo o -ão por -ãos: grão - grãos
guia (documento, pena grande das asas das aves), o grama
(unidade de peso), a grama (relva), o caixa (funcionário da - Os substantivos terminados em “x” ficam invariáveis:
caixa), a caixa (recipiente, setor de pagamentos), o lente o látex - os látex.
(professor), a lente (vidro de aumento), o moral (ânimo), a
moral (honestidade, bons costumes, ética), o nascente (lado Plural dos Substantivos Compostos
onde nasce o Sol), a nascente (a fonte), o maria-fumaça
(trem como locomotiva a vapor), maria-fumaça (locomoti- - A formação do plural dos substantivos compostos
va movida a vapor), o pala (poncho), a pala (parte anterior depende da forma como são grafados, do tipo de palavras
do boné ou quepe, anteparo), o rádio (aparelho receptor), a que formam o composto e da relação que estabelecem
rádio (emissora), o voga (remador), a voga (moda). en- tre si. Aqueles que são grafados sem hífen
comportam-se como os substantivos simples:
aguardente/aguardentes, girassol/girassóis,
pontapé/pontapés, malmequer/malme- queres.

39
LÍNGUA PORTUGUESA

O plural dos substantivos compostos cujos elementos


são ligados por hífen costuma provocar muitas dúvidas e Plural dos Diminutivos
discussões. Algumas orientações são dadas a seguir:
Flexiona-se o substantivo no plural, retira-se o “s” fi-
- Flexionam-se os dois elementos, quando forma- nal e acrescenta-se o sufixo diminutivo.
dos de: pãe(s) + zinhos = pãezinhos
substantivo + substantivo = couve-flor e couves-flores
substantivo + adjetivo = amor-perfeito e amores-per- animai(s) + zinhos = animaizinhos
feitos botõe(s) + zinhos = botõezinhos
adjetivo + substantivo = gentil-homem e gentis-ho- chapéu(s) + zinhos = chapeuzinhos
mens
farói(s) + zinhos = faroizinhos
numeral + substantivo = quinta-feira e quintas-feiras
tren(s) + zinhos = trenzinhos
- Flexiona-se somente o segundo elemento, quan- colhere(s) + zinhas = colherezinhas
do formados de:
flore(s) + zinhas = florezinhas
verbo + substantivo = guarda-roupa e guarda-roupas
palavra invariável + palavra variável = alto-falante e mão(s) + zinhas = mãozinhas
alto-falantes papéi(s) + zinhos = papeizinhos
palavras repetidas ou imitativas = reco-reco e reco-re-
nuven(s) + zinhas = nuvenzinhas
cos
funi(s) + zinhos = funizinhos
- Flexiona-se somente o primeiro elemento, quan- túnei(s) + zinhos = tuneizinhos
do formados de:
pai(s) + zinhos = paizinhos
substantivo + preposição clara + substantivo = água-
de-colônia e águas-de-colônia pé(s) + zinhos = pezinhos
substantivo + preposição oculta + substantivo = ca- pé(s) + zitos = pezitos
valo-vapor e cavalos-vapor
substantivo + substantivo que funciona como deter-
minante do primeiro, ou seja, especifica a função ou o Plural dos Nomes Próprios Personativos
tipo do termo anterior: palavra-chave - palavras-chave,
bomba-relógio - bombas-relógio, homem-rã - homens-rã, Devem-se pluralizar os nomes próprios de pessoas
peixe-espada - peixes-espada. sempre que a terminação preste-se à flexão.

- Permanecem invariáveis, quando formados de: Os Napoleões também são derrotados.


verbo + advérbio = o bota-fora e os bota-fora As Raquéis e Esteres.
verbo + substantivo no plural = o saca-rolhas e os sa-
ca-rolhas Plural dos Substantivos Estrangeiros

* Casos Especiais Substantivos ainda não aportuguesados devem ser


escritos como na língua original, acrescentando-se “s”
(exceto quando terminam em “s” ou “z”): os shows, os
o louva-a-deus e os louva-a-deus shorts, os jazz.
o bem-te-vi e os bem-te-vis
o bem-me-quer e os bem-me-queres Substantivos já aportuguesados flexionam-se de
acordo com as regras de nossa língua: os clubes, os cho-
o joão-ninguém e os joões-ninguém.
pes, os jipes, os esportes, as toaletes, os bibelôs, os garçons,
os réquiens.
Plural das Palavras Substantivadas
Observe o exemplo:
As palavras substantivadas, isto é, palavras de outras
Este jogador faz gols toda vez que joga.
classes gramaticais usadas como substantivo, apresen-
O plural correto seria gois (ô), mas não se usa.
tam, no plural, as flexões próprias dos substantivos.
Pese bem os prós e os contras.
O aluno errou na prova dos noves. Plural com Mudança de Timbre
Ouça com a mesma serenidade os sins e os nãos.
Certos substantivos formam o plural com mudança de
timbre da vogal tônica (o fechado / o aberto). É um fato
* Observação: numerais substantivados terminados
fonético chamado metafonia (plural metafônico).
em “s” ou “z” não variam no plural: Nas provas mensais
consegui muitos seis e alguns dez.

40
LÍNGUA PORTUGUESA

Singular Plural - Grau Diminutivo - Indica a diminuição do tamanho


do ser. Pode ser:
Corpo (ô) corpos (ó) Analítico = substantivo acompanhado de um adjeti-
esforço esforços vo que indica pequenez. Por exemplo: casa pequena.
fogo fogos Sintético = é acrescido ao substantivo um sufixo indi-
cador de diminuição. Por exemplo: casinha.
forno fornos
fosso fossos Fontes de pesquisa:
imposto impostos http://www.soportugues.com.br/secoes/morf/
morf12.php
olho olhos
SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa
osso (ô) ossos (ó) Sacconi. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010.
ovo ovos Português linguagens: volume 1 / Wiliam Roberto Ce-
poço poços reja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São
Paulo: Saraiva, 2010.
porto portos
posto postos Verbo
tijolo tijolos
Verbo é a palavra que se flexiona em pessoa, núme-
Têm a vogal tônica fechada (ô): adornos, almoços, ro, tempo e modo. A estes tipos de flexão verbal dá-se o
bolsos, esposos, estojos, globos, gostos, polvos, rolos, soros, nome de conjugação (por isso também se diz que verbo
etc. é a palavra que pode ser conjugada). Pode indicar, entre
outros processos: ação (amarrar), estado (sou), fenômeno
* Observação: distinga-se molho (ô) = caldo (molho (choverá); ocorrência (nascer); desejo (querer).
de carne), de molho (ó) = feixe (molho de lenha).
Estrutura das Formas Verbais
Particularidades sobre o Número dos Substanti-
Do ponto de vista estrutural, o verbo pode apresentar
vos
os seguintes elementos:
- Radical: é a parte invariável, que expressa o sig-
- Há substantivos que só se usam no singular: o sul, o
nificado essencial do verbo. Por exemplo: fal-ei; fal-ava;
norte, o leste, o oeste, a fé, etc.
fal-am. (radical fal-)
- Outros só no plural: as núpcias, os víveres, os pêsa-
- Tema: é o radical seguido da vogal temática que
mes, as espadas/os paus (naipes de baralho), as fezes.
indica a conjugação a que pertence o verbo. Por exemplo:
- Outros, enfim, têm, no plural, sentido diferente do
fala-r. São três as conjugações:
singular: bem (virtude) e bens (riquezas), honra (probida- 1.ª - Vogal Temática - A - (falar), 2.ª - Vogal Temática -
de, bom nome) e honras (homenagem, títulos). E - (vender), 3.ª - Vogal Temática - I - (partir).
- Usamos às vezes, os substantivos no singular, mas - Desinência modo-temporal: é o elemento que de-
com sentido de plural: signa o tempo e o modo do verbo. Por exemplo:
Aqui morreu muito negro. falávamos ( indica o pretérito imperfeito do indicati-
Celebraram o sacrifício divino muitas vezes em cape- vo) / falasse ( indica o pretérito imperfeito do subjuntivo)
las improvisadas. - Desinência número-pessoal: é o elemento que de-
signa a pessoa do discurso (1.ª, 2.ª ou 3.ª) e o número
Flexão de Grau do Substantivo (singular ou plural):
falamos (indica a 1.ª pessoa do plural.) / falavam
Grau é a propriedade que as palavras têm de exprimir (indica a 3.ª pessoa do plural.)
as variações de tamanho dos seres. Classifica-se em:
* Observação: o verbo pôr, assim como seus deriva-
- Grau Normal - Indica um ser de tamanho conside- dos (compor, repor, depor), pertencem à 2.ª conjugação,
rado normal. Por exemplo: casa pois a forma arcaica do verbo pôr era poer. A vogal “e”,
apesar de haver desaparecido do infinitivo, revela-se em
- Grau Aumentativo - Indica o aumento do tamanho algumas formas do verbo: põe, pões, põem, etc.
do ser. Classifica-se em:
Analítico = o substantivo é acompanhado de um ad- Formas Rizotônicas e Arrizotônicas
jetivo que indica grandeza. Por exemplo: casa grande.
Sintético = é acrescido ao substantivo um sufixo in- Ao combinarmos os conhecimentos sobre a estrutura
dicador de aumento. Por exemplo: casarão. dos verbos com o conceito de acentuação tônica, perce-
bemos com facilidade que nas formas rizotônicas o acen-

41
LÍNGUA PORTUGUESA

to tônico cai no radical do verbo: opino, aprendam, amo,


por exemplo. Nas formas arrizotônicas, o acento tônico * Todos os verbos que indicam fenômenos da natureza
não cai no radical, mas sim na terminação verbal (fora do são impessoais: chover, ventar, nevar, gear, trovejar, ama-
radical): opinei, aprenderão, amaríamos. nhecer, escurecer, etc. Quando, porém, se constrói, “Ama-
nheci cansado”, usa-se o verbo “amanhecer” em sentido
figurado. Qualquer verbo impessoal, empregado em sen-
Classificação dos Verbos
tido figurado, deixa de ser impessoal para ser pessoal, ou
seja, terá conjugação completa.
Classificam-se em:
Amanheci cansado. (Sujeito desinencial: eu)
- Regulares: são aqueles que apresentam o radical Choveram candidatos ao cargo. (Sujeito: candidatos)
inalterado durante a conjugação e desinências idênticas Fiz quinze anos ontem. (Sujeito desinencial: eu)
às de todos os verbos regulares da mesma conjugação.
* São impessoais, ainda:
Por exemplo: comparemos os verbos “cantar” e “falar”,
conjugados no presente do Modo Indicativo: - o verbo passar (seguido de preposição), indicando
tempo: Já passa das seis.

canto falo - os verbos bastar e chegar, seguidos da preposição


cantas falas “de”, indicando suficiência:
Basta de tolices.
canta falas
Chega de promessas.
cantamos falamos
cantais falais - os verbos estar e ficar em orações como “Está bem,
Está muito bem assim, Não fica bem, Fica mal”, sem re-
cantam falam
ferência a sujeito expresso anteriormente (por exemplo:
“ele está mal”). Podemos, nesse caso, classificar o sujeito
* Dica: Observe que, retirando os radicais, as desinên-
como hipotético, tornando-se, tais verbos, pessoais.
cias modo-temporal e número-pessoal mantiveram-se
idênticas. Tente fazer com outro verbo e perceberá que se
- o verbo dar + para da língua popular, equivalente de
repetirá o fato (desde que o verbo seja da primeira conju-
“ser possível”. Por exemplo:
gação e regular!). Faça com o verbo “andar”, por exemplo.
Substitua o radical “cant” e coloque o “and” (radical do Não deu para chegar mais cedo.
verbo andar). Viu? Fácil! Dá para me arrumar uma apostila?

- Unipessoais: são aqueles que, tendo sujeito, con-


- Irregulares: são aqueles cuja flexão provoca altera-
jugam-se apenas nas terceiras pessoas, do singular e do
ções no radical ou nas desinências: faço, fiz, farei, fizesse.
plural. São unipessoais os verbos constar, convir, ser (=
* Observação: alguns verbos sofrem alteração no ra-
preciso, necessário) e todos os que indicam vozes de ani-
dical apenas para que seja mantida a sonoridade. É o caso
mais (cacarejar, cricrilar, miar, latir, piar).
de: corrigir/corrijo, fingir/finjo, tocar/toquei, por exemplo.
Tais alterações não caracterizam irregularidade, porque o
* Observação: os verbos unipessoais podem ser usa-
fonema permanece inalterado.
dos como verbos pessoais na linguagem figurada:
Teu irmão amadureceu bastante.
- Defectivos: são aqueles que não apresentam conju-
gação completa. Os principais são adequar, precaver, O que é que aquela garota está cacarejando?
com- putar, reaver, abolir, falir.
Principais verbos unipessoais:
- Impessoais: são os verbos que não têm sujeito e,
1. cumprir, importar, convir, doer, aprazer, parecer, ser
normalmente, são usados na terceira pessoa do singular.
(preciso, necessário):
Os principais verbos impessoais são:
Cumpre estudarmos bastante. (Sujeito: estudarmos
bastante)
* haver, quando sinônimo de existir, acontecer, reali-
Parece que vai chover. (Sujeito: que vai chover)
zar-se ou fazer (em orações temporais).
Havia muitos candidatos no dia da prova. (Havia = É preciso que chova. (Sujeito: que chova)
Existiam)
Houve duas guerras mundiais. (Houve = Aconteceram) 2. fazer e ir, em orações que dão ideia de tempo, se-
Haverá debates hoje. (Haverá = Realizar-se-ão) guidos da conjunção que.
Viajei a Madri há muitos anos. (há = faz) Faz dez anos que viajei à Europa. (Sujeito: que viajei
à Europa)
* fazer, ser e estar (quando indicam tempo) Vai para (ou Vai em ou Vai por) dez anos que não a
Faz invernos rigorosos na Europa. vejo. (Sujeito: que não a vejo)
Era primavera quando o conheci.
Estava frio naquele dia. * Observação: todos os sujeitos apontados são ora-
cionais.

42
LÍNGUA PORTUGUESA

- Abundantes: são aqueles que possuem duas ou mais formas equivalentes, geralmente no particípio, em que, além
das formas regulares terminadas em -ado ou -ido, surgem as chamadas formas curtas (particípio irregular).
O particípio regular (terminado em “–do”) é utilizado na voz ativa, ou seja, com os verbos ter e haver; o irregular é
empregado na voz passiva, ou seja, com os verbos ser, ficar e estar. Observe:

Infinitivo Particípio Regular Particípio Irregular


Aceitar Aceitado Aceito
Acender Acendido Aceso
Anexar Anexado Anexo
Benzer Benzido Bento
Corrigir Corrigido Correto
Dispersar Dispersado Disperso
Eleger Elegido Eleito
Envolver Envolvido Envolto
Imprimir Imprimido Impresso
Inserir Inserido Inserto
Limpar Limpado Limpo
Matar Matado Morto
Misturar Misturado Misto
Morrer Morrido Morto
Murchar Murchado Murcho
Pegar Pegado Pego
Romper Rompido Roto
Soltar Soltado Solto
Suspender Suspendido Suspenso
Tingir Tingido Tinto
Vagar Vagado Vago

* Importante:
- estes verbos e seus derivados possuem, apenas, o particípio irregular: abrir/aberto, cobrir/coberto, dizer/dito, escre-
ver/escrito, pôr/posto, ver/visto, vir/vindo.

- Anômalos: são aqueles que incluem mais de um radical em sua conjugação. Existem apenas dois: ser (sou, sois, fui)
e ir (fui, ia, vades).

- Auxiliares: São aqueles que entram na formação dos tempos compostos e das locuções verbais. O verbo principal
(aquele que exprime a ideia fundamental, mais importante), quando acompanhado de verbo auxiliar, é expresso numa
das formas nominais: infinitivo, gerúndio ou particípio.

Vou espantar todos!


(verbo (verbo auxiliar)
principal no infinitivo) (verbo principal no gerúndio)

Está os verbos auxiliares


* Observação: chegando
mais usados são: ser, aestar, ter
hora!
e haver.
(verbo auxiliar)

43
LÍNGUA PORTUGUESA

Conjugação dos Verbos Auxiliares

SER - Modo Indicativo

Presente Pret.Perfeito Pret. Imp. Pret.mais-que-perf. Fut.do Pres. Fut. Do Pretérito


sou fui era fora serei seria
és foste eras foras serás serias
é foi era fora será seria
somos fomos éramos fôramos seremos seríamos
sois fostes éreis fôreis sereis seríeis
são foram eram foram serão seriam

SER - Modo Subjuntivo

Presente Pretérito Imperfeito Futuro


que eu seja se eu fosse quando eu for
que tu sejas se tu fosses quando tu fores
que ele seja se ele fosse quando ele for
que nós sejamos se nós fôssemos quando nós formos
que vós sejais se vós fôsseis quando vós fordes
que eles sejam se eles fossem quando eles forem

SER - Modo Imperativo

Afirmativo Negativo
sê tu não sejas tu
seja você não seja você
sejamos nós não sejamos nós
sede vós não sejais vós
sejam vocês não sejam vocês

SER - Formas Nominais

Infinitivo Impessoal Infinitivo Pessoal Gerúndio Particípio


ser ser eu sendo sido
seres tu
ser ele
sermos nós
serdes vós
serem eles

44
LÍNGUA PORTUGUESA

ESTAR - Modo Indicativo

Presente Pret. perf. Pret. Imp. Pret.mais-q-perf. Fut.doPres. Fut.doPreté.


estou estive estava estivera estarei estaria
estás estiveste estavas estiveras estarás estarias
está esteve estava estivera estará estaria
estamos estivemos estávamos estivéramos estaremos estaríamos
estais estivestes estáveis estivéreis estareis estaríeis
estão estiveram estavam estiveram estarão estariam

ESTAR - Modo Subjuntivo e Imperativo

Presente Pretérito Imperfeito Futuro Afirmativo Negativo


esteja estivesse estiver
estejas estivesses estiveres está estejas
esteja estivesse estiver esteja esteja
estejamos estivéssemos estivermos estejamos estejamos
estejais estivésseis estiverdes estai estejais
estejam estivessem estiverem estejam estejam

ESTAR - Formas Nominais

Infinitivo Impessoal Infinitivo Pessoal Gerúndio Particípio


estar estar estando estado
estares
estar
estarmos
estardes
estarem

HAVER - Modo Indicativo

Presente Pret. Perf. Pret. Imp. Pret.Mais-Q-Perf. Fut.do Pres. Fut.doPreté.


hei houve havia houvera haverei haveria
hás houveste havias houveras haverás haverias
há houve havia houvera haverá haveria
havemos houvemos havíamos houvéramos haveremos haveríamos
haveis houvestes havíeis houvéreis havereis haveríeis
hão houveram haviam houveram haverão haveriam

45
LÍNGUA PORTUGUESA

HAVER - Modo Subjuntivo e Imperativo

Presente Pretérito Imperfeito Futuro Afirmativo Negativo


ja houvesse houver
hajas houvesses houveres há hajas
haja houvesse houver haja haja
hajamos houvéssemos houvermos hajamos hajamos
hajais houvésseis houverdes havei hajais
hajam houvessem houverem hajam hajam

HAVER - Formas Nominais

Infinitivo Impessoal Infinitivo Pessoal Gerúndio Particípio


haver haver havendo havido
haveres
haver
havermos
haverdes
haverem

TER - Modo Indicativo

Presente Pret. Perf. Pret. Imp. Preté.mais-q-perf. Fut. Do Pres. Fut. Do Preté.
tenho tive tinha tivera terei teria
tens tiveste tinhas tiveras terás terias
tem teve tinha tivera terá teria
temos tivemos tínhamos tivéramos teremos teríamos
tendes tivestes tínheis tivéreis tereis teríeis
têm tiveram tinham tiveram terão teriam

TER - Modo Subjuntivo e Imperativo

Presente Pretérito Imperfeito Futuro Afirmativo Negativo


tenha tivesse tiver
tenhas tivesses tiveres tem tenhas
tenha tivesse tiver tenha tenha
tenhamos tivéssemos tivermos tenhamos tenhamos
tenhais tivésseis tiverdes tende tenhais
tenham tivessem tiverem tenham tenham

- Pronominais: São aqueles verbos que se conjugam com os pronomes oblíquos átonos me, te, se, nos, vos, se, na
mesma pessoa do sujeito, expressando reflexibilidade (pronominais acidentais) ou apenas reforçando a ideia já implícita
no próprio sentido do verbo (pronominais essenciais). Veja:

1. Essenciais: são aqueles que sempre se conjugam com os pronomes oblíquos me, te, se, nos, vos, se. São poucos:
abster-se, ater-se, apiedar-se, atrever-se, dignar-se, arrepender-se, etc. Nos verbos pronominais essenciais a reflexibilidade
já está implícita no radical do verbo. Por exemplo: Arrependi-me de ter estado lá.

46
LÍNGUA PORTUGUESA

A ideia é de que a pessoa representada pelo sujeito


Formas Nominais
(eu) tem um sentimento (arrependimento) que recai so-
bre ela mesma, pois não recebe ação transitiva nenhuma
Além desses três modos, o verbo apresenta ainda for-
vinda do verbo; o pronome oblíquo átono é apenas uma mas que podem exercer funções de nomes (substantivo,
partícula integrante do verbo, já que, pelo uso, sempre é adjetivo, advérbio), sendo por isso denominadas formas
conjugada com o verbo. Diz-se que o pronome apenas nominais. Observe:
serve de reforço da ideia reflexiva expressa pelo radical 1-) Infinitivo
do próprio verbo. 1.1-) Impessoal: exprime a significação do verbo de
Veja uma conjugação pronominal essencial (verbo e modo vago e indefinido, podendo ter valor e função de
respectivos pronomes): substantivo. Por exemplo:
Eu me arrependo Viver é lutar. (= vida é luta)
Tu te arrependes É indispensável combater a corrupção. (= combate à)
Ele se arrepende
Nós nos arrependemos O infinitivo impessoal pode apresentar-se no presen-
Vós vos arrependeis te (forma simples) ou no passado (forma composta). Por
Eles se arrependem exemplo:
É preciso ler este livro.
2. Acidentais: são aqueles verbos transitivos diretos Era preciso ter lido este livro.
em que a ação exercida pelo sujeito recai sobre o objeto
representado por pronome oblíquo da mesma pessoa 1.2-) Infinitivo Pessoal: é o infinitivo relacionado às
do sujeito; assim, o sujeito faz uma ação que recai so- três pessoas do discurso. Na 1.ª e 3.ª pessoas do singular,
bre ele mesmo. Em geral, os verbos transitivos diretos não apresenta desinências, assumindo a mesma forma do
ou transitivos diretos e indiretos podem ser conjugados impessoal; nas demais, flexiona-se da seguinte maneira:
com os pronomes mencionados, formando o que se cha- 2.ª pessoa do singular: Radical + ES = teres (tu)
ma voz reflexiva. Por exemplo: A garota se penteava. 1.ª pessoa do plural: Radical + MOS = termos (nós)
A reflexibilidade é acidental, pois a ação reflexi- 2.ª pessoa do plural: Radical + DES = terdes (vós)
va pode ser exercida também sobre outra pessoa. Por 3.ª pessoa do plural: Radical + EM = terem (eles)
exemplo: A garota penteou-me. Foste elogiado por teres alcançado uma boa colocação.

* Observações: 2-) Gerúndio: o gerúndio pode funcionar como adje-


- Por fazerem parte integrante do verbo, os prono- tivo ou advérbio. Por exemplo:
mes oblíquos átonos dos verbos pronominais não pos- Saindo de casa, encontrei alguns amigos. (função de
suem função sintática. advérbio)
- Há verbos que também são acompanhados de pro- Água fervendo, pele ardendo. (função de adjetivo)
nomes oblíquos átonos, mas que não são essencialmen-
te pronominais - são os verbos reflexivos. Nos verbos Na forma simples (1), o gerúndio expressa uma ação
reflexivos, os pronomes, apesar de se encontrarem na em curso; na forma composta (2), uma ação concluída:
pessoa idêntica à do sujeito, exercem funções sintáticas. Trabalhando (1), aprenderás o valor do dinheiro.
Por exemplo: Tendo trabalhado (2), aprendeu o valor do dinheiro.
Eu me feri. = Eu (sujeito) – 1.ª pessoa do singular;
me (objeto direto) – 1.ª pessoa do singular * Quando o gerúndio é vício de linguagem (gerundis-
mo), ou seja, uso exagerado e inadequado do gerúndio:
1- Enquanto você vai ao mercado, vou estar jogando
Modos Verbais
futebol.
2 – Sim, senhora! Vou estar verificando!
Dá-se o nome de modo às várias formas assumidas
pelo verbo na expressão de um fato certo, real, verdadei-
Em 1, a locução “vou estar” + gerúndio é adequada,
ro. Existem três modos:
pois transmite a ideia de uma ação que ocorre no mo-
mento da outra; em 2, essa ideia não ocorre, já que a lo-
Indicativo - indica uma certeza, uma realidade: Eu
cução verbal “vou estar verificando” refere-se a um futuro
estudo para o concurso. em andamento, exigindo, no caso, a construção “verifica-
Subjuntivo - indica uma dúvida, uma possibilidade: rei” ou “vou verificar”.
Talvez eu estude amanhã.
Imperativo - indica uma ordem, um pedido: Estude, 3-) Particípio: quando não é empregado na formação
colega! dos tempos compostos, o particípio indica, geralmente, o
resultado de uma ação terminada, flexionando-se em gê-
nero, número e grau. Por exemplo: Terminados os exames,
os candidatos saíram.

47
LÍNGUA PORTUGUESA

Quando o particípio exprime somente estado, sem nenhuma relação temporal, assume verdadeiramente a função de
adjetivo. Por exemplo: Ela é a aluna escolhida pela turma.

(Ziraldo)

Tempos Verbais

Tomando-se como referência o momento em que se fala, a ação expressa pelo verbo pode ocorrer em diversos
tempos.

1. Tempos do Modo Indicativo


- Presente - Expressa um fato atual: Eu estudo neste colégio.
- Pretérito Imperfeito - Expressa um fato ocorrido num momento anterior ao atual, mas que não foi completamen-
te terminado: Ele estudava as lições quando foi interrompido.
- Pretérito Perfeito - Expressa um fato ocorrido num momento anterior ao atual e que foi totalmente terminado:
Ele estudou as lições ontem à noite.
- Pretérito-mais-que-perfeito - Expressa um fato ocorrido antes de outro fato já terminado: Ele já estudara as lições
quando os amigos chegaram. (forma simples).
- Futuro do Presente - Enuncia um fato que deve ocorrer num tempo vindouro com relação ao momento atual: Ele
estudará as lições amanhã.
- Futuro do Pretérito - Enuncia um fato que pode ocorrer posteriormente a um determinado fato passado: Se ele
pudesse, estudaria um pouco mais.

2. Tempos do Modo Subjuntivo


- Presente - Enuncia um fato que pode ocorrer no momento atual: É conveniente que estudes para o exame.
- Pretérito Imperfeito - Expressa um fato passado, mas posterior a outro já ocorrido: Eu esperava que ele vencesse
o jogo.

Observação: o pretérito imperfeito é também usado nas construções em que se expressa a ideia de condição ou
desejo. Por exemplo: Se ele viesse ao clube, participaria do campeonato.

- Futuro do Presente - Enuncia um fato que pode ocorrer num momento futuro em relação ao atual: Quando ele
vier à loja, levará as encomendas.

Observação: o futuro do presente é também usado em frases que indicam possibilidade ou desejo. Por exemplo: Se
ele vier à loja, levará as encomendas.
** Há casos em que formas verbais de um determinado tempo podem ser utilizadas para indicar outro.
Em 1500, Pedro Álvares Cabral descobre o Brasil.
descobre = forma do presente indicando passado ( = descobrira/descobriu)

No próximo final de semana, faço a prova!


faço = forma do presente indicando futuro ( = farei)

48
LÍNGUA PORTUGUESA

Modo Indicativo

Presente do Indicativo

1.ª conjugação 2.ª conjugação 3.ª conjugação Desinência pessoal


CANTAR VENDER PARTIR
cantO vendO partO O
cantaS vendeS parteS S
canta vende parte -
cantaMOS vendeMOS partiMOS MOS
cantaIS vendeIS partIS IS
cantaM vendeM parteM M

Pretérito Perfeito do Indicativo

1.ª conjugação 2.ª conjugação 3.ª conjugação Desinência pessoal


CANTAR VENDER PARTIR
canteI vendI partI I
cantaSTE vendeSTE partISTE STE
cantoU vendeU partiU U
cantaMOS vendeMOS partiMOS MOS
cantaSTES vendeSTES partISTES STES
cantaRAM vendeRAM partiRAM RAM

Pretérito mais-que-perfeito

1.ª conjugação 2.ª conjugação 3.ª conjugação Des. temporal Desinência pessoal
1.ª/2.ª e 3.ª conj.
CANTAR VENDER PARTIR
cantaRA vendeRA partiRA RA Ø
cantaRAS vendeRAS partiRAS RA S
cantaRA vendeRA partiRA RA Ø
cantáRAMOS vendêRAMOS partíRAMOS RA MOS
cantáREIS vendêREIS partíREIS RE IS
cantaRAM vendeRAM partiRAM RA M

Pretérito Imperfeito do Indicativo

1.ª conjugação 2.ª conjugação 3ª. conjugação


CANTAR VENDER PARTIR
cantAVA vendIA partIA
cantAVAS vendIAS partAS
CantAVA vendIA partIA
cantÁVAMOS vendÍAMOS partÍAMOS
cantÁVEIS vendÍEIS partÍEIS
cantAVAM vendIAM partIAM

49
LÍNGUA PORTUGUESA

Futuro do Presente do Indicativo

1.ª conjugação 2.ª conjugação 3.ª conjugação


CANTAR VENDER PARTIR
cantar ei vender ei partir ei
cantar ás vender ás partir ás
cantar á vender á partir á
cantar emos vender emos partir emos
cantar eis vender eis partir eis
cantar ão vender ão partir ão

Futuro do Pretérito do Indicativo

1.ª conjugação 2.ª conjugação 3.ª conjugação


CANTAR VENDER PARTIR
cantarIA venderIA partirIA
cantarIAS venderIAS partirIAS
cantarIA venderIA partirIA
cantarÍAMOS venderÍAMOS partirÍAMOS
cantarÍEIS venderÍEIS partirÍEIS
cantarIAM venderIAM partirIAM

Presente do Subjuntivo

Para se formar o presente do subjuntivo, substitui-se a desinência -o da primeira pessoa do singular do presente do
indicativo pela desinência -E (nos verbos de 1.ª conjugação) ou pela desinência -A (nos verbos de 2.ª e 3.ª conjugação).

1.ª conjug. 2.ª conjug. 3.ª conju. Desinên. pessoal Des. temporal Des.temporal
1.ª conj. 2.ª/3.ª conj.
CANTAR VENDER PARTIR
cantE vendA partA E A Ø
cantES vendAS partAS E A S
cantE vendA partA E A Ø
cantEMOS vendAMOS partAMOS E A MOS
cantEIS vendAIS partAIS E A IS
cantEM vendAM partAM E A M

50
LÍNGUA PORTUGUESA

Pretérito Imperfeito do Subjuntivo

Para formar o imperfeito do subjuntivo, elimina-se a desinência -STE da 2.ª pessoa do singular do pretérito perfeito,
obtendo-se, assim, o tema desse tempo. Acrescenta-se a esse tema a desinência temporal -SSE mais a desinência de
número e pessoa correspondente.

1.ª conjugação 2.ª conjugação 3.ª conjugação Des. temporal Desin. pessoal
1.ª /2.ª e 3.ª conj.
CANTAR VENDER PARTIR
cantaSSE vendeSSE partiSSE SSE Ø
cantaSSES vendeSSES partiSSES SSE S
cantaSSE vendeSSE partiSSE SSE Ø
cantáSSEMOS vendêSSEMOS partíSSEMOS SSE MOS
cantáSSEIS vendêSSEIS partíSSEIS SSE IS
cantaSSEM vendeSSEM partiSSEM SSE M

Futuro do Subjuntivo

Para formar o futuro do subjuntivo elimina-se a desinência -STE da 2.ª pessoa do singular do pretérito perfeito, ob-
tendo-se, assim, o tema desse tempo. Acrescenta-se a esse tema a desinência temporal -R mais a desinência de número
e pessoa correspondente.

1.ª conjugação 2.ª conjugação 3.ª conjugação Des. temporal Desin. pessoal
1.ª /2.ª e 3.ª conj.
CANTAR VENDER PARTIR
cantaR vendeR partiR Ø
cantaRES vendeRES partiRES R ES
cantaR vendeR partiR R Ø
cantaRMOS vendeRMOS partiRMOS R MOS
cantaRDES vendeRDES partiRDES R DES
cantaREM vendeREM partiREM R EM

Modo Imperativo

Imperativo Afirmativo

Para se formar o imperativo afirmativo, toma-se do presente do indicativo a 2.ª pessoa do singular (tu) e a segunda
pessoa do plural (vós) eliminando-se o “S” final. As demais pessoas vêm, sem alteração, do presente do subjuntivo. Veja:

Presente do Indicativo Imperativo Afirmativo Presente do Subjuntivo


Eu canto --- Que eu cante
Tu cantas CantA tu Que tu cantes
Ele canta Cante você Que ele cante
Nós cantamos Cantemos nós Que nós cantemos
Vós cantais CantAI vós Que vós canteis
Eles cantam Cantem vocês Que eles cantem

51
LÍNGUA PORTUGUESA

Imperativo Negativo

Para se formar o imperativo negativo, basta antecipar a negação às formas do presente do subjuntivo.

Presente do Subjuntivo Imperativo Negativo

Que eu cante ---


Que tu cantes Não cantes tu
Que ele cante Não cante você
Que nós cantemos Não cantemos nós
Que vós canteis Não canteis vós
Que eles cantem Não cantem eles
Observações:
- No modo imperativo não faz sentido usar na 3.ª pessoa (singular e plural) as formas ele/eles, pois uma ordem, pe-
dido ou conselho só se aplicam diretamente à pessoa com quem se fala. Por essa razão, utiliza-se você/vocês.
- O verbo SER, no imperativo, faz excepcionalmente: sê (tu), sede (vós).

Infinitivo Pessoal

1.ª conjugação 2.ª conjugação 3.ª conjugação


CANTAR VENDER PARTIR
cantar vender partir
cantarES venderES partirES
cantar vender partir
cantarMOS venderMOS partirMOS
cantarDES venderDES partirDES
cantarEM venderEM partirEM

* Observações:
- o verbo parecer admite duas construções:
Elas parecem gostar de você. (forma uma locução verbal)
Elas parece gostarem de você. (verbo com sujeito oracional, correspondendo à construção: parece gostarem de você).

- o verbo pegar possui dois particípios (regular e irregular):


Elvis tinha pegado minhas apostilas.
Minhas apostilas foram pegas.
fontes de pesquisa:
http://www.soportugues.com.br/secoes/morf/morf54.php
SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa Sacconi. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010.
Português linguagens: volume 2 / Wiliam Roberto Cereja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São Paulo:
Saraiva, 2010.
Português: novas palavras: literatura, gramática, redação / Emília Amaral... [et al.]. – São Paulo: FTD, 2000.

Questões sobre Verbo

1-) (TRE/MS - ESTÁGIO – JORNALISMO - TRE/MS – 2014) A assertiva correta quanto à conjugação verbal é:
A) Houveram eleições em outros países este ano.
B) Se eu vir você por aí, acabou.
C) Tinha chego atrasado vinte minutos.
D) Fazem três anos que não tiro férias.
E) Esse homem possue muitos bens.

52
LÍNGUA PORTUGUESA

1-) Correções à frente:


associar alguns comportamentos dos adolescentes ao uso
A) Houveram eleições em outros países este ano =
prolongado desses aparelhos, e TÊM (concorda com o ter-
houve
mo “os especialistas”) alertado os pais para que avaliem a
C) Tinha chego atrasado vinte minutos = tinha che- necessidade de estabelecer limites aos seus filhos.
gado Temos: faz, haver, têm.
D) Fazem três anos que não tiro férias = faz três anos
RESPOSTA: “A”.
E) Esse homem possue muitos bens = possui
RESPOSTA: “B”.
Vozes do Verbo
2-) (POLÍCIA CIVIL/SC – AGENTE DE POLÍCIA – ACA-
Dá-se o nome de voz à maneira como se apresenta a
FE/2014) Complete as lacunas com os verbos, tempos e ação expressa pelo verbo em relação ao sujeito, indicando
modos indicados entre parênteses, fazendo a devida con- se este é paciente ou agente da ação. Importante lembrar
cordância. que voz verbal não é flexão, mas aspecto verbal. São três
• O juiz agrário ainda não no conflito porque as vozes verbais:
surgiram fatos novos de ontem para hoje. (intervir - pre-
térito perfeito do indicativo) - Ativa = quando o sujeito é agente, isto é, pratica a
• Uns poucos convidados -se com os vídeos
ação expressa pelo verbo:
postados no facebook. (entreter - pretérito imperfeito do
indicativo)
Ele fez o tra-
• Representantes do PCRT somente serão aceitos na
balho.
composição da chapa quando se de criticar a
sujeito agente ação objeto
atual diretoria do clube, (abster-se - futuro do subjuntivo)
(paciente)
A sequência correta, de cima para baixo, é:
A-) interveio - entretinham - abstiverem
- Passiva = quando o sujeito é paciente, recebendo a
B-) interviu - entretiveram - absterem
ação expressa pelo verbo:
C-) intervém - entreteram - abstêm
D-) interviera - entretêm - abstiverem
O trabalho foi feito p o r
E-) intervirá - entretenham - abstiveram
ele.
sujeito paciente ação agen-
te da passiva
2-) O verbo “intervir” deve ser conjugado como o
verbo “vir”. Este, no pretérito perfeito do Indicativo fica
- Reflexiva = quando o sujeito é, ao mesmo tempo,
“veio”, portanto, “interveio” (não existe “interviu”, já que
agente e paciente, isto é, pratica e recebe a ação:
ele não deriva do verbo “ver”). Descartemos a alternativa
B. Como não há outro item com a mesma opção, chega-
mos à resposta rapidamente! O menino feriu-se.
RESPOSTA: “A”.
* Observação: não confundir o emprego reflexivo do
3-) (POLÍCIA MILITAR/SP – OFICIAL ADMINISTRATIVO
verbo com a noção de reciprocidade:
– VUNESP/2014) Considere o trecho a seguir.
Os lutadores feriram-se. (um ao outro)
Já alguns anos que estudos a respeito da
utilização abusiva dos smartphones estão sendo desen- Nós nos amamos. (um ama o outro)
volvidos. Os especialistas acreditam motivos
para associar alguns comportamentos dos adolescentes Formação da Voz Passiva
ao uso prolongado desses aparelhos, e alertado
A voz passiva pode ser formada por dois processos:
os pais para que avaliem a necessidade de estabelecer
limites aos seus filhos. analítico e sintético.
De acordo com a norma-padrão da língua portugue-
sa, as lacunas do texto devem ser preenchidas, correta e 1- Voz Passiva Analítica = Constrói-se da seguinte
respectivamente, com: maneira:
(A) faz … haver … têm
(B) fazem … haver … tem Verbo SER + particípio do verbo principal. Por exem-
(C) faz … haverem … têm plo:
(D) fazem … haverem … têm A escola será pintada pelos alunos. (na ativa teríamos:
(E) faz … haverem … tem os alunos pintarão a escola)
O trabalho é feito por ele. (na ativa: ele faz o trabalho)
3-) Já FAZ (sentido de tempo: não sofre flexão) alguns
anos que estudos a respeito da utilização abusiva dos * Observação: o agente da passiva geralmente é
smar- tphones estão sendo desenvolvidos. Os especialistas acompanhado da preposição por, mas pode ocorrer a
acre- ditam HAVER (sentido de existir: não varia) construção com a preposição de. Por exemplo: A casa fi-
motivos para cou cercada de soldados.

53
LÍNGUA PORTUGUESA

- Pode acontecer de o agente da passiva não estar


* Observação: quando o sujeito da voz ativa for inde-
explícito na frase: A exposição será aberta amanhã. terminado, não haverá complemento agente na passiva.
Por exemplo: Prejudicaram-me. / Fui prejudicado.
- A variação temporal é indicada pelo verbo auxiliar
(SER), pois o particípio é invariável. Observe a transforma- ** Saiba que:
ção das frases seguintes:
- com os verbos neutros (nascer, viver, morrer, dormir,
acordar, sonhar, etc.) não há voz ativa, passiva ou reflexiva,
a) Ele fez o trabalho. (pretérito perfeito do Indicativo) porque o sujeito não pode ser visto como agente, pacien-
O trabalho foi feito por ele. (verbo ser no pretérito per-
te ou agente-paciente.
feito do Indicativo, assim como o verbo principal da voz
ativa) Fontes de pesquisa:
http://www.soportugues.com.br/secoes/morf/
b) Ele faz o trabalho. (presente do indicativo)
morf54.php
O trabalho é feito por ele. (ser no presente do indica- SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa
tivo) Sacconi. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010.
Português linguagens: volume 2 / Wiliam Roberto Ce-
c) Ele fará o trabalho. (futuro do presente)
reja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São
O trabalho será feito por ele. (futuro do presente) Paulo: Saraiva, 2010.
Português: novas palavras: literatura, gramática, reda-
- Nas frases com locuções verbais, o verbo SER assu- ção / Emília Amaral... [et al.]. – São Paulo: FTD, 2000.
me o mesmo tempo e modo do verbo principal da voz
ativa. Observe a transformação da frase seguinte:
Questões
O vento ia levando as folhas. (gerúndio)
As folhas iam sendo levadas pelo vento. (gerúndio) 1-) (TRIBUNAL DE JUSTIÇA/GO – ANALISTA JUDICIÁ-
RIO – FGV/2014 - adaptada) A frase “que foi trazida pelo
2- Voz Passiva Sintética = A voz passiva sintética - ou instituto Endeavor” equivale, na voz ativa, a:
pronominal - constrói-se com o verbo na 3.ª pessoa, se- (A) que o instituto Endeavor traz;
guido do pronome apassivador “se”. Por exemplo: (B) que o instituto Endeavor trouxe;
Abriram-se as inscrições para o concurso. (C) trazida pelo instituto Endeavor;
Destruiu-se o velho prédio da escola. (D) que é trazida pelo instituto Endeavor;
(E) que traz o instituto Endeavor.
* Observação: o agente não costuma vir expresso na
voz passiva sintética. 1-) Se na voz passiva temos dois verbos, na ativa te-
remos um: “que o instituto Endeavor trouxe” (manter o
Conversão da Voz Ativa na Voz Passiva tempo verbal no pretérito – assim como na passiva).
RESPOSTA: “B”.
Pode-se mudar a voz ativa na passiva sem alterar
substancialmente o sentido da frase.
2-) (PRODAM/AM – ASSISTENTE – FUNCAB/2014 -
O concurseiro comprou a apostila. (Voz Ativa) adaptada) Ao passarmos a frase “...e É CONSIDERADO por
Sujeito da Ativa objeto Direto muitos o maior maratonista de todos os tempos” para a
voz ativa, encontramos a seguinte forma verbal:
A apostila foi comprada pelo concurseiro.
A) consideravam.
(Voz Passiva) B) consideram.
Sujeito da Passiva Agente da Passi- C) considerem.
va D) considerarão.
E) considerariam.
Observe que o objeto direto será o sujeito da passiva;
o sujeito da ativa passará a agente da passiva, e o verbo
2-) É CONSIDERADO por muitos o maior maratonista
ativo assumirá a forma passiva, conservando o mesmo
de todos os tempos = dois verbos na voz passiva, então
tempo. Observe:
na ativa teremos UM: muitos o consideram o maior mara-
- Os mestres têm constantemente aconselhado os alu-
tonista de todos os tempos.
nos.
RESPOSTA: “B”.
Os alunos têm sido constantemente aconselhados pe-
los mestres.
3-) (TRT-16ª REGIÃO/MA - ANALISTA JUDICIÁRIO –
ÁREA ADMINISTRATIVA – FCC/2014)
- Eu o acompanharei.
Transpondo-se para a voz passiva a frase “vou glosar
Ele será acompanhado por mim. uma observação de Machado de Assis”, a forma verbal
resultante deverá ser

54
LÍNGUA PORTUGUESA

(A) terei glosado


Observação: nesses casos, o uso do verbo no singular
(B) seria glosada
enfatiza a unidade do conjunto; já a forma plural confere
(C) haverá de ser glosada
destaque aos elementos que formam esse conjunto.
(D) será glosada
(E) terá sido glosada 2) Quando o sujeito é formado por expressão que
indica quantidade aproximada (cerca de, mais de, menos
3-) “vou glosar uma observação de Machado de As- de, perto de...) seguida de numeral e substantivo, o verbo
sis” – “vou glosar” expressa “glosarei”, então teremos na concorda com o substantivo.
passiva: uma observação de Machado de Assis será glo- Cerca de mil pessoas participaram do concurso.
sada por mim. Perto de quinhentos alunos compareceram à solenida-
RESPOSTA: “D”.
de.
Mais de um atleta estabeleceu novo recorde nas últi-
mas Olimpíadas.
CONCORDÂNCIA VERBAL E NOMINAL.
Observação: quando a expressão “mais de um” asso-
ciar-se a verbos que exprimem reciprocidade, o plural é
obrigatório: Mais de um colega se ofenderam na discussão.
(ofenderam um ao outro)
Os concurseiros estão apreensivos.
Concurseiros apreensivos. 3) Quando se trata de nomes que só existem no plu-
ral, a concordância deve ser feita levando-se em conta
No primeiro exemplo, o verbo estar encontra-se na a ausência ou presença de artigo. Sem artigo, o verbo
terceira pessoa do plural, concordando com o seu sujeito, deve ficar no singular; com artigo no plural, o verbo deve
os concurseiros. No segundo exemplo, o adjetivo “apreen- ficar o plural.
sivos” está concordando em gênero (masculino) e número Os Estados Unidos possuem grandes universidades.
(plural) com o substantivo a que se refere: concurseiros. Estados Unidos possui grandes universidades.
Nesses dois exemplos, as flexões de pessoa, número e gê- Alagoas impressiona pela beleza das praias.
nero correspondem-se. As Minas Gerais são inesquecíveis.
A correspondência de flexão entre dois termos é a Minas Gerais produz queijo e poesia de primeira.
concordância, que pode ser verbal ou nominal.
4) Quando o sujeito é um pronome interrogativo ou
Concordância Verbal indefinido plural (quais, quantos, alguns, poucos, muitos,
quaisquer, vários) seguido por “de nós” ou “de vós”, o ver-
É a flexão que se faz para que o verbo concorde com bo pode concordar com o primeiro pronome (na terceira
seu sujeito. pessoa do plural) ou com o pronome pessoal.
Quais de nós são / somos capazes?
a) Sujeito Simples - Regra Geral Alguns de vós sabiam / sabíeis do caso?
O sujeito, sendo simples, com ele concordará o verbo Vários de nós propuseram / propusemos sugestões ino-
em número e pessoa. Veja os exemplos: vadoras.
A prova para ambos os cargos será
aplicada às 13h. Observação: veja que a opção por uma ou outra for-
3. ª p. Singular 3.ª p. Singular ma indica a inclusão ou a exclusão do emissor. Quando
alguém diz ou escreve “Alguns de nós sabíamos de tudo e
Os candidatos à vaga chegarão às 12h. nada fizemos”, ele está se incluindo no grupo dos omis-
3.ª p. Plural 3.ª p. Plural sos. Isso não ocorre ao dizer ou escrever “Alguns de nós
sabiam de tudo e nada fizeram”, frase que soa como uma
Casos Particulares denúncia.
Nos casos em que o interrogativo ou indefinido esti-
1) Quando o sujeito é formado por uma expressão ver no singular, o verbo ficará no singular.
partitiva (parte de, uma porção de, o grosso de, metade de, Qual de nós é capaz?
a maioria de, a maior parte de, grande parte de...) seguida Algum de vós fez isso.
de um substantivo ou pronome no plural, o verbo pode
ficar no singular ou no plural. 5) Quando o sujeito é formado por uma expressão
A maioria dos jornalistas aprovou / aprovaram a ideia. que indica porcentagem seguida de substantivo, o verbo
Metade dos candidatos não apresentou / apresentaram deve concordar com o substantivo.
proposta. 25% do orçamento do país será destinado à Educação.
85% dos entrevistados não aprovam a administração
Esse mesmo procedimento pode se aplicar aos casos do prefeito.
dos coletivos, quando especificados: Um bando de vânda- 1% do eleitorado aceita a mudança.
los destruiu / destruíram o monumento. 1% dos alunos faltaram à prova.

55
LÍNGUA PORTUGUESA

Quando a expressão que indica porcentagem não é


10) Verbos Impessoais: por não se referirem a ne-
seguida de substantivo, o verbo deve concordar com o
nhum sujeito, são usados sempre na 3.ª pessoa do sin-
número.
gular. São verbos impessoais: Haver no sentido de existir;
25% querem a mudança.
Fazer indicando tempo; Aqueles que indicam fenômenos
1% conhece o assunto.
da natureza. Exemplos:
Havia muitas garotas na festa.
Se o número percentual estiver determinado por ar- Faz dois meses que não vejo meu pai.
tigo ou pronome adjetivo, a concordância far-se-á com Chovia ontem à tarde.
eles:
Os 30% da produção de soja serão exportados. b) Sujeito Composto
Esses 2% da prova serão questionados.
1) Quando o sujeito é composto e anteposto ao ver-
6) O pronome “que” não interfere na concordância; bo, a concordância se faz no plural:
já o “quem” exige que o verbo fique na 3.ª pessoa do Pai e filho conversavam longamente.
singular. Sujeito
Fui eu que paguei a conta.
Fomos nós que pintamos o muro. Pais e filhos devem conversar com frequência.
És tu que me fazes ver o sentido da vida. Sujeito
Sou eu quem faz a prova.
Não serão eles quem será aprovado. 2) Nos sujeitos compostos formados por pessoas
gramaticais diferentes, a concordância ocorre da seguin-
7) Com a expressão “um dos que”, o verbo deve as- te maneira: a primeira pessoa do plural (nós) prevalece
sumir a forma plural. sobre a segunda pessoa (vós) que, por sua vez, prevalece
Ademir da Guia foi um dos jogadores que mais encan- sobre a terceira (eles). Veja:
taram os poetas. Teus irmãos, tu e eu tomaremos a decisão.
Este candidato é um dos que mais estudaram! Primeira Pessoa do Plural (Nós)

Se a expressão for de sentido contrário – nenhum dos Tu e teus irmãos tomareis a decisão.
que, nem um dos que -, não aceita o verbo no singular: Segunda Pessoa do Plural (Vós)
Nenhum dos que foram aprovados assumirá a vaga.
Nem uma das que me escreveram mora aqui. Pais e filhos precisam respeitar-se.
*Quando “um dos que” vem entremeada de substan- Terceira Pessoa do Plural (Eles)
tivo, o verbo pode:
a) ficar no singular – O Tietê é um dos rios que atra- Observação: quando o sujeito é composto, formado
vessa o Estado de São Paulo. ( já que não há outro rio que por um elemento da segunda pessoa (tu) e um da terceira
faça o mesmo). (ele), é possível empregar o verbo na terceira pessoa do
plural (eles): “Tu e teus irmãos tomarão a decisão.” – no
b) ir para o plural – O Tietê é um dos rios que estão
lugar de “tomaríeis”.
poluídos (noção de que existem outros rios na mesma
condição).
3) No caso do sujeito composto posposto ao verbo,
passa a existir uma nova possibilidade de concordância:
8) Quando o sujeito é um pronome de tratamento, o
em vez de concordar no plural com a totalidade do sujei-
verbo fica na 3ª pessoa do singular ou plural.
to, o verbo pode estabelecer concordância com o núcleo
Vossa Excelência está cansado? do sujeito mais próximo.
Vossas Excelências renunciarão?
Faltaram coragem e competência.
Faltou coragem e competência.
9) A concordância dos verbos bater, dar e soar faz-se Compareceram todos os candidatos e o banca.
de acordo com o numeral. Compareceu o banca e todos os candidatos.
Deu uma hora no relógio da sala.
Deram cinco horas no relógio da sala. 4) Quando ocorre ideia de reciprocidade, a concor-
Soam dezenove horas no relógio da praça. dância é feita no plural. Observe:
Baterão doze horas daqui a pouco. Abraçaram-se vencedor e vencido.
Ofenderam-se o jogador e o árbitro.
Observação: caso o sujeito da oração seja a palavra
relógio, sino, torre, etc., o verbo concordará com esse su- Casos Particulares
jeito.
O tradicional relógio da praça matriz dá nove horas. 1) Quando o sujeito composto é formado por núcleos
Soa quinze horas o relógio da matriz. sinônimos ou quase sinônimos, o verbo fica no singular.
Descaso e desprezo marca seu comportamento.
A coragem e o destemor fez dele um herói.

56
LÍNGUA PORTUGUESA

2) Quando o sujeito composto é formado por núcleos


dispostos em gradação, verbo no singular: 6) Quando os núcleos do sujeito são unidos por ex-
pressões correlativas como: “não só...mas ainda”, “não so-
Com você, meu amor, uma hora, um minuto, um se-
gundo me satisfaz. mente”..., “não apenas...mas também”, “tanto...quanto”, o
verbo ficará no plural.
3) Quando os núcleos do sujeito composto são uni- Não só a seca, mas também o pouco caso castigam o
dos por “ou” ou “nem”, o verbo deverá ficar no plural, de Nordeste.
acordo com o valor semântico das conjunções: Tanto a mãe quanto o filho ficaram surpresos com a
Drummond ou Bandeira representam a essência da notícia.
poesia brasileira.
Nem o professor nem o aluno acertaram a resposta. 7) Quando os elementos de um sujeito composto são
resumidos por um aposto recapitulativo, a concordância
Em ambas as orações, as conjunções dão ideia de é feita com esse termo resumidor.
“adição”. Já em: Filmes, novelas, boas conversas, nada o tirava da apa-
Juca ou Pedro será contratado. tia.
Roma ou Buenos Aires será a sede da próxima Olim- Trabalho, diversão, descanso, tudo é muito importante
píada. na vida das pessoas.

* Temos ideia de exclusão, por isso os verbos ficam Outros Casos


no singular.
1) O Verbo e a Palavra “SE”
4) Com as expressões “um ou outro” e “nem um nem Dentre as diversas funções exercidas pelo “se”, há
outro”, a concordância costuma ser feita no singular. duas de particular interesse para a concordância verbal:
Um ou outro compareceu à festa. a) quando é índice de indeterminação do sujeito;
Nem um nem outro saiu do colégio. b) quando é partícula apassivadora.
Quando índice de indeterminação do sujeito, o “se”
Com “um e outro”, o verbo pode ficar no plural ou no acompanha os verbos intransitivos, transitivos indiretos
singular: Um e outro farão/fará a prova. e de ligação, que obrigatoriamente são conjugados na
terceira pessoa do singular:
5) Quando os núcleos do sujeito são unidos por Precisa-se de funcionários.
“com”, o verbo fica no plural. Nesse caso, os núcleos re- Confia-se em teses absurdas.
cebem um mesmo grau de importância e a palavra “com” Quando pronome apassivador, o “se” acompanha
tem sentido muito próximo ao de “e”. verbos transitivos diretos (VTD) e transitivos diretos e in-
O pai com o filho montaram o brinquedo. diretos (VTDI) na formação da voz passiva sintética. Nes-
O governador com o secretariado traçaram os planos se caso, o verbo deve concordar com o sujeito da oração.
para o próximo semestre. Exemplos:
O professor com o aluno questionaram as regras. Construiu-se um posto de saúde.
Construíram-se novos postos de saúde.
Nesse mesmo caso, o verbo pode ficar no singular, se Aqui não se cometem equívocos
a ideia é enfatizar o primeiro elemento. Alugam-se casas.
O pai com o filho montou o brinquedo.
O governador com o secretariado traçou os planos ** Dica: Para saber se o “se” é partícula apassivado-
para o próximo semestre. ra ou índice de indeterminação do sujeito, tente trans-
O professor com o aluno questionou as regras. formar a frase para a voz passiva. Se a frase construída
for “compreensível”, estaremos diante de uma partícula
Observação: com o verbo no singular, não se pode apassivadora; se não, o “se” será índice de indetermina-
falar em sujeito composto. O sujeito é simples, uma vez ção. Veja:
que as expressões “com o filho” e “com o secretariado” Precisa-se de funcionários qualificados.
são adjuntos adverbiais de companhia. Na verdade, é Tentemos a voz passiva:
como se houvesse uma inversão da ordem. Veja:
Funcionários qualificados são precisados (ou preci-
“O pai montou o brinquedo com o filho.”
sos)? Não há lógica. Portanto, o “se” destacado é índice
“O governador traçou os planos para o próximo semes-
de indeterminação do sujeito.
tre com o secretariado.”
Agora:
“O professor questionou as regras com o aluno.” Vendem-se casas.
Voz passiva: Casas são vendidas. Construção correta!
*Casos em que se usa o verbo no singular:
Então, aqui, o “se” é partícula apassivadora. (Dá para eu
Café com leite é uma delícia!
passar para a voz passiva. Repare em meu destaque. Per-
O frango com quiabo foi receita da vovó. cebeu semelhança? Agora é só memorizar!).

57
LÍNGUA PORTUGUESA

2) O Verbo “Ser”
3) O Verbo “Parecer”
A concordância verbal dá-se sempre entre o verbo e o O verbo parecer, quando é auxiliar em uma locução
sujeito da oração. No caso do verbo ser, essa concordân- verbal (é seguido de infinitivo), admite duas concordâncias:
cia pode ocorrer também entre o verbo e o predicativo
a) Ocorre variação do verbo PARECER e não se fle-
do sujeito. xiona o infinitivo: As crianças parecem gostar do desenho.
Quando o sujeito ou o predicativo for: b) A variação do verbo parecer não ocorre e o infini-
tivo sofre flexão:
a)Nome de pessoa ou pronome pessoal – o verbo SER As crianças parece gostarem do desenho.
concorda com a pessoa gramatical: (essa frase equivale a: Parece gostarem do desenho as
Ele é forte, mas não é dois. crianças)
Fernando Pessoa era vários poetas.
A esperança dos pais são eles, os filhos. Atenção: Com orações desenvolvidas, o verbo PARE-
CER fica no singular. Por Exemplo: As paredes parece que
b)nome de coisa e um estiver no singular e o outro no têm ouvidos. (Parece que as paredes têm ouvidos = oração
plural, o verbo SER concordará, preferencialmente, com o subordinada substantiva subjetiva).
que estiver no plural:
Os livros são minha paixão! Concordância Nominal
Minha paixão são os livros!
A concordância nominal se baseia na relação entre
Quando o verbo SER indicar nomes (substantivo, pronome) e as palavras que a eles
se ligam para caracterizá-los (artigos, adjetivos, pronomes
a) horas e distâncias, concordará com a expressão adjetivos, numerais adjetivos e particípios). Lembre-se:
numérica: normalmente, o substantivo funciona como núcleo de um
É uma hora. termo da oração, e o adjetivo, como adjunto adnominal.
São quatro horas. A concordância do adjetivo ocorre de acordo com as
Daqui até a escola é um quilômetro / são dois quilô- seguintes regras gerais:
metros. 1) O adjetivo concorda em gênero e número quando
se refere a um único substantivo: As mãos trêmulas de-
b) datas, concordará com a palavra dia(s), que pode nunciavam o que sentia.
estar expressa ou subentendida:
Hoje é dia 26 de agosto. 2) Quando o adjetivo refere-se a vários substantivos, a
Hoje são 26 de agosto. concordância pode variar. Podemos sistematizar essa fle-
xão nos seguintes casos:
c) Quando o sujeito indicar peso, medida, quantidade
a) Adjetivo anteposto aos substantivos:
e for seguido de palavras ou expressões como pouco, mui-
- O adjetivo concorda em gênero e número com o
to, menos de, mais de, etc., o verbo SER fica no singular:
substantivo mais próximo.
Cinco quilos de açúcar é mais do que preciso.
Encontramos caídas as roupas e os prendedores.
Três metros de tecido é pouco para fazer seu vestido.
Encontramos caída a roupa e os prendedores.
Duas semanas de férias é muito para mim.
Encontramos caído o prendedor e a roupa.
d) Quando um dos elementos (sujeito ou predicativo) - Caso os substantivos sejam nomes próprios ou de
for pronome pessoal do caso reto, com este concordará parentesco, o adjetivo deve sempre concordar no plural.
o verbo. As adoráveis Fernanda e Cláudia vieram me visitar.
No meu setor, eu sou a única mulher. Encontrei os divertidos primos e primas na festa.
Aqui os adultos somos nós.
b) Adjetivo posposto aos substantivos:
Observação: sendo ambos os termos (sujeito e pre- - O adjetivo concorda com o substantivo mais pró-
dicativo) representados por pronomes pessoais, o verbo ximo ou com todos eles (assumindo a forma masculina
concorda com o pronome sujeito. plural se houver substantivo feminino e masculino).
Eu não sou ela. A indústria oferece localização e atendimento perfeito.
Ela não é eu. A indústria oferece atendimento e localização perfeita.
A indústria oferece localização e atendimento perfeitos.
e) Quando o sujeito for uma expressão de sentido A indústria oferece atendimento e localização perfeitos.
partitivo ou coletivo e o predicativo estiver no plural, o
verbo SER concordará com o predicativo. Observação: os dois últimos exemplos apresentam
A grande maioria no protesto eram jovens. maior clareza, pois indicam que o adjetivo efetivamente
O resto foram atitudes imaturas. se refere aos dois substantivos. Nesses casos, o adjetivo
foi flexionado no plural masculino, que é o gênero predo-
minante quando há substantivos de gêneros diferentes.

58
LÍNGUA PORTUGUESA

- Se os substantivos possuírem o mesmo gênero, o


Casos Particulares
adjetivo fica no singular ou plural.
A beleza e a inteligência feminina(s). É proibido - É necessário - É bom - É preciso - É
O carro e o iate novo(s). permitido
3) Expressões formadas pelo verbo SER + adjetivo: a) Estas expressões, formadas por um verbo mais um
a) O adjetivo fica no masculino singular, se o subs- adjetivo, ficam invariáveis se o substantivo a que se refe-
tantivo não for acompanhado de nenhum modificador: rem possuir sentido genérico (não vier precedido de ar-
Água é bom para saúde. tigo).
É proibido entrada de crianças.
b) O adjetivo concorda com o substantivo, se este for Em certos momentos, é necessário atenção.
modificado por um artigo ou qualquer outro determina- No verão, melancia é bom.
tivo: Esta água é boa para saúde. É preciso cidadania.
Não é permitido saída pelas portas laterais.
4) O adjetivo concorda em gênero e número com os
pronomes pessoais a que se refere: Juliana encontrou-as b) Quando o sujeito destas expressões estiver deter-
muito felizes. minado por artigos, pronomes ou adjetivos, tanto o verbo
como o adjetivo concordam com ele.
5) Nas expressões formadas por pronome indefinido É proibida a entrada de crianças.
neutro (nada, algo, muito, tanto, etc.) + preposição DE + Esta salada é ótima.
adjetivo, este último geralmente é usado no masculino A educação é necessária.
singular: Os jovens tinham algo de misterioso. São precisas várias medidas na educação.

6) A palavra “só”, quando equivale a “sozinho”, tem Anexo - Obrigado - Mesmo - Próprio - Incluso -
função adjetiva e concorda normalmente com o nome a Quite
que se refere:
Cristina saiu só. Estas palavras adjetivas concordam em gênero e nú-
Cristina e Débora saíram sós. mero com o substantivo ou pronome a que se referem.
Seguem anexas as documentações requeridas.
Observação: quando a palavra “só” equivale a “so- A menina agradeceu: - Muito obrigada.
mente” ou “apenas”, tem função adverbial, ficando, por- Muito obrigadas, disseram as senhoras.
tanto, invariável: Eles só desejam ganhar presentes. Seguem inclusos os papéis solicitados.
** Dica: Substitua o “só” por “apenas” ou “sozinho”. Estamos quites com nossos credores.
Se a frase ficar coerente com o primeiro, trata-se de ad-
vérbio, portanto, invariável; se houver coerência com o Bastante - Caro - Barato - Longe
segundo, função de adjetivo, então varia:
Estas palavras são invariáveis quando funcionam
Ela está só. (ela está sozinha) – adjetivo
como advérbios. Concordam com o nome a que se refe-
Ele está só descansando. (apenas descansando) - ad-
rem quando funcionam como adjetivos, pronomes adje-
vérbio
tivos, ou numerais.
As jogadoras estavam bastante cansadas. (advérbio)
** Mas cuidado! Se colocarmos uma vírgula depois Há bastantes pessoas insatisfeitas com o trabalho.
de “só”, haverá, novamente, um adjetivo: (pronome adjetivo)
Ele está só, descansando. (ele está sozinho e descan- Nunca pensei que o estudo fosse tão caro. (advérbio)
sando) As casas estão caras. (adjetivo)
7) Quando um único substantivo é modificado por Achei barato este casaco. (advérbio)
dois ou mais adjetivos no singular, podem ser usadas as Hoje as frutas estão baratas. (adjetivo)
construções:
a) O substantivo permanece no singular e coloca-se Meio - Meia
o artigo antes do último adjetivo: Admiro a cultura espa-
nhola e a portuguesa. a) A palavra “meio”, quando empregada como adjeti-
vo, concorda normalmente com o nome a que se refere:
b) O substantivo vai para o plural e omite-se o ar- Pedi meia porção de polentas.
tigo antes do adjetivo: Admiro as culturas espanhola e
portuguesa. b) Quando empregada como advérbio permanece in-
variável: A candidata está meio nervosa.

** Dica! Dá para eu substituir por “um pouco”, assim


saberei que se trata de um advérbio, não de adjetivo: “A
candidata está um pouco nervosa”.

59
LÍNGUA PORTUGUESA

Alerta - Menos 2-) O verbo “esquecer” pede objeto direto; “gostar”,


indireto (com preposição): Esqueço os filmes dos quais
Essas palavras são advérbios, portanto, permanecem não gosto.
sempre invariáveis.
RESPOSTA: “E”.
Os concurseiros estão sempre alerta.
Não queira menos matéria! 3-) (SABESP – TECNÓLOGO – FCC/2014) Considerada
a substituição do segmento grifado pelo que está entre
* Tome nota!
parênteses ao final da transcrição, o verbo que deverá
Não variam os substantivos que funcionam como ad-
permanecer no singular está em:
jetivos:
(A) ... disse o pesquisador à Folha de S. Paulo. (os pes-
Bomba – notícias bomba
quisadores)
Chave – elementos chave
(B) Segundo ele, a mudança climática contribuiu para
Monstro – construções
a ruína dessa sociedade... (as mudanças do clima)
monstro Padrão – escola
(C) No sistema havia também uma estação... (várias
padrão
estações)
(D) ... a civilização maia da América Central tinha um
Fontes de pesquisa:
método sustentável de gerenciamento da água. (os povos
http://www.soportugues.com.br/secoes/sint/sint49.
que habitavam a América Central)
php
(E) Um estudo publicado recentemente mostra que a
Português linguagens: volume 3 / Wiliam Roberto
civilização maia... (Estudos como o que acabou de ser pu-
Cere- ja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. –
blicado).
São Paulo: Saraiva, 2010.
SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa
3-)
Sac- coni. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010.
Português: novas palavras: literatura, gramática, (A) ... disse (disseram) (os pesquisadores)
redação (B) Segundo ele, a mudança climática contribuiu (con-
/ Emília Amaral... [et al.]. – São Paulo: FTD, 2000. tribuíram) (as mudanças do clima)
(C) No sistema havia (várias estações) = permanecerá
Questões no singular
(D) ... a civilização maia da América Central tinha (ti-
1-) (MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, INDÚSTRIA nham) (os povos que habitavam a América Central)
E COMÉRCIO EXTERIOR – ANALISTA TÉCNICO ADMINIS- (E) Um estudo publicado recentemente mostra (mos-
TRATIVO – CESPE/2014) Em “Vossa Excelência deve estar tram) (Estudos como o que acabou de ser publicado).
satisfeita com os resultados das negociações”, o adjetivo RESPOSTA: “C”.
estará corretamente empregado se dirigido a ministro de
Estado do sexo masculino, pois o termo “satisfeita” deve REGÊNCIA VERBAL E NOMINAL.
concordar com a locução pronominal de tratamento
“Vossa Excelência”.
( ) CERTO ( ) ERRADO

1-) Se a pessoa, no caso o ministro, for do sexo femi- Dá-se o nome de regência à relação de subordinação
nino (ministra), o adjetivo está correto; mas, se for do sexo que ocorre entre um verbo (regência verbal) ou um nome
masculino, o adjetivo sofrerá flexão de gênero: satisfeito. (regência nominal) e seus complementos.
O pronome de tratamento é apenas a maneira de como
tratar a autoridade, não concordando com o gênero (o Regência Verbal = Termo Regente: VERBO
pronome de tratamento, apenas).
RESPOSTA: “ERRADO”. A regência verbal estuda a relação que se estabelece
entre os verbos e os termos que os complementam (obje-
2-) (GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL – CADASTRO tos diretos e objetos indiretos) ou caracterizam (adjuntos
RESERVA PARA O METRÔ/DF – ADMINISTRADOR - IA- adverbiais). Há verbos que admitem mais de uma regên-
DES/2014 - adaptada) Se, no lugar dos verbos destacados cia, o que corresponde à diversidade de significados que
no verso “Escolho os filmes que eu não vejo no elevador”, estes verbos podem adquirir dependendo do contexto
fossem empregados, respectivamente, Esquecer e gostar, em que forem empregados.
a nova redação, de acordo com as regras sobre regência A mãe agrada o filho = agradar significa acariciar,
ver- bal e concordância nominal prescritas pela norma- contentar.
padrão, deveria ser A mãe agrada ao filho = agradar significa “causar
(A) Esqueço dos filmes que eu não gosto no elevador. agrado ou prazer”, satisfazer.
(B) Esqueço os filmes os quais não gosto no elevador. Conclui-se que “agradar alguém” é diferente de
(C) Esqueço dos filmes aos quais não gosto no “agradar a alguém”.
elevador.
(D) Esqueço dos filmes dos quais não gosto no
elevador.
(E) Esqueço os filmes dos quais não gosto no eleva-
dor.

60
LÍNGUA PORTUGUESA

Saiba que:
Na língua culta, esses verbos funcionam exatamente
O conhecimento do uso adequado das preposições é como o verbo amar:
um dos aspectos fundamentais do estudo da regência
Amo aquele rapaz. / Amo-o.
ver- bal (e também nominal). As preposições são capazes
Amo aquela moça. / Amo-a.
de modificar completamente o sentido daquilo que está
Amam aquele rapaz. / Amam-no.
sendo dito.
Ele deve amar aquela mulher. / Ele deve amá-la.
Cheguei ao
metrô. Cheguei
Observação: os pronomes lhe, lhes só acompanham
no metrô.
esses verbos para indicar posse (caso em que atuam como
No primeiro caso, o metrô é o lugar a que vou; no se-
adjuntos adnominais):
gundo caso, é o meio de transporte por mim utilizado.
Quero beijar-lhe o rosto. (= beijar seu rosto)
A voluntária distribuía leite às crianças. Prejudicaram-lhe a carreira. (= prejudicaram sua car-
A voluntária distribuía leite com as crianças. reira)
Conheço-lhe o mau humor! (= conheço seu mau hu-
Na primeira frase, o verbo “distribuir” foi empregado
como transitivo direto (objeto direto: leite) e indireto mor)
(obje- to indireto: às crianças); na segunda, como
transitivo direto (objeto direto: crianças; com as crianças: 3-) Verbos Transitivos Indiretos
adjunto adverbial).
Os verbos transitivos indiretos são complementados
Para estudar a regência verbal, agruparemos os por objetos indiretos. Isso significa que esses verbos exi-
verbos de acordo com sua transitividade. Esta, porém, não gem uma preposição para o estabelecimento da relação
é um fato absoluto: um mesmo verbo pode atuar de de regência. Os pronomes pessoais do caso oblíquo de
diferentes formas em frases distintas. terceira pessoa que podem atuar como objetos indiretos
1-) Verbos Intransitivos são o “lhe”, o “lhes”, para substituir pessoas. Não se uti-
lizam os pronomes o, os, a, as como complementos de
Os verbos intransitivos não possuem complemento. É verbos transitivos indiretos. Com os objetos indiretos que
importante, no entanto, destacar alguns detalhes relativos não representam pessoas, usam-se pronomes oblíquos
aos adjuntos adverbiais que costumam acompanhá-los. tônicos de terceira pessoa (ele, ela) em lugar dos prono-
- Chegar, Ir mes átonos lhe, lhes.
Normalmente vêm acompanhados de adjuntos adver-
biais de lugar. Na língua culta, as preposições usadas para Os verbos transitivos indiretos são os seguintes:
indicar destino ou direção são: a, para. - Consistir - Tem complemento introduzido pela pre-
Fui ao teatro. posição “em”: A modernidade verdadeira consiste em direi-
Adjunto Adverbial de Lugar tos iguais para todos.

Ricardo foi para a Espanha. - Obedecer e Desobedecer - Possuem seus comple-


Adjunto Adverbial de Lugar mentos introduzidos pela preposição “a”:
Devemos obedecer aos nossos princípios e ideais.
- Comparecer Eles desobedeceram às leis do trânsito.
O adjunto adverbial de lugar pode ser introduzido por
em ou a. - Responder - Tem complemento introduzido pela
Comparecemos ao estádio (ou no estádio) para ver o preposição “a”. Esse verbo pede objeto indireto para indi-
úl- timo jogo. car “a quem” ou “ao que” se responde.
Respondi ao meu patrão.
2-) Verbos Transitivos Diretos Respondemos às perguntas.
Respondeu-lhe à altura.
Os verbos transitivos diretos são complementados por
objetos diretos. Isso significa que não exigem preposição Observação: o verbo responder, apesar de transitivo
para o estabelecimento da relação de regência. Ao empre- indireto quando exprime aquilo a que se responde, admi-
gar esses verbos, lembre-se de que os pronomes oblíquos te voz passiva analítica:
o, a, os, as atuam como objetos diretos. Esses pronomes O questionário foi respondido corretamente.
podem assumir as formas lo, los, la, las (após formas Todas as perguntas foram respondidas satisfatoria-
verbais terminadas em -r, -s ou -z) ou no, na, nos, nas mente.
(após formas verbais terminadas em sons nasais),
enquanto lhe e lhes são, quando complementos verbais, - Simpatizar e Antipatizar - Possuem seus comple-
objetos indiretos. mentos introduzidos pela preposição “com”.
São verbos transitivos diretos, dentre outros: aban- Antipatizo com aquela apresentadora.
donar, abençoar, aborrecer, abraçar, acompanhar, acusar, Simpatizo com os que condenam os políticos que go-
admirar, adorar, alegrar, ameaçar, amolar, amparar, vernam para uma minoria privilegiada.
auxiliar, castigar, condenar, conhecer, conservar, convidar,
defender, eleger, estimar, humilhar, namorar, ouvir,
prejudicar, prezar, proteger, respeitar, socorrer, suportar,
ver, visitar.

61
LÍNGUA PORTUGUESA

4-) Verbos Transitivos Diretos e Indiretos Saiba que:


- A construção “pedir para”, muito comum na lin-
Os verbos transitivos diretos e indiretos são acom- guagem cotidiana, deve ter emprego muito limitado na
panhados de um objeto direto e um indireto. Merecem
língua culta. No entanto, é considerada correta quando a
destaque, nesse grupo: agradecer, perdoar e pagar. São
palavra licença estiver subentendida.
verbos que apresentam objeto direto relacionado a coisas
Peço (licença) para ir entregar-lhe os catálogos em casa.
e objeto indireto relacionado a pessoas.
Observe que, nesse caso, a preposição “para” introduz
Agradeço aos ouvintes a audiência. uma oração subordinada adverbial final reduzida de infini-
Objeto Indireto Objeto tivo (para ir entregar-lhe os catálogos em casa).
Direto
Preferir
Paguei o débito ao cobrador. Na língua culta, esse verbo deve apresentar objeto in-
Objeto Direto Objeto Indireto direto introduzido pela preposição “a”:
Prefiro qualquer coisa a abrir mão de meus ideais.
- O uso dos pronomes oblíquos átonos deve ser feito Prefiro trem a ônibus.
com particular cuidado:
Agradeci o presente. / Agradeci-o. Observação: na língua culta, o verbo “preferir” deve
Agradeço a você. / Agradeço-lhe. ser usado sem termos intensificadores, tais como: muito,
Perdoei a ofensa. / Perdoei-a. antes, mil vezes, um milhão de vezes, mais. A ênfase já é
Perdoei ao agressor. / Perdoei-lhe. dada pelo prefixo existente no próprio verbo (pre).
Paguei minhas contas. / Paguei-as.
Paguei aos meus credores. / Paguei-lhes. Mudança de Transitividade - Mudança de Significado
Informar
- Apresenta objeto direto ao se referir a coisas e obje- Há verbos que, de acordo com a mudança de transi-
to indireto ao se referir a pessoas, ou vice-versa. tividade, apresentam mudança de significado. O conheci-
Informe os novos preços aos clientes. mento das diferentes regências desses verbos é um recur-
Informe os clientes dos novos preços. (ou sobre os no- so linguístico muito importante, pois além de permitir a
vos preços) correta interpretação de passagens escritas, oferece pos-
sibilidades expressivas a quem fala ou escreve. Dentre os
- Na utilização de pronomes como complementos, principais, estão:
veja as construções:
Informei-os aos clientes. / Informei-lhes os novos pre- AGRADAR
ços. - Agradar é transitivo direto no sentido de fazer cari-
Informe-os dos novos preços. / Informe-os deles. (ou nhos, acariciar, fazer as vontades de.
sobre eles) Sempre agrada o filho quando.
Aquele comerciante agrada os clientes.
Observação: a mesma regência do verbo informar é
usada para os seguintes: avisar, certificar, notificar, cienti- - Agradar é transitivo indireto no sentido de causar
ficar, prevenir. agrado a, satisfazer, ser agradável a. Rege complemento
introduzido pela preposição “a”.
Comparar O cantor não agradou aos presentes.
Quando seguido de dois objetos, esse verbo admite O cantor não lhes agradou.
as preposições “a” ou “com” para introduzir o comple-
mento indireto: Comparei seu comportamento ao (ou com *O antônimo “desagradar” é sempre transitivo indire-
o) de uma criança. to: O cantor desagradou à plateia.

Pedir ASPIRAR
Esse verbo pede objeto direto de coisa (geralmente - Aspirar é transitivo direto no sentido de sorver,
na forma de oração subordinada substantiva) e indireto inspi- rar (o ar), inalar: Aspirava o suave aroma. (Aspirava-
de pessoa. o)

Pedi-lhe favores. - Aspirar é transitivo indireto no sentido de desejar,


Objeto Indireto Objeto Direto ter como ambição: Aspirávamos a um emprego melhor.
(Aspi- rávamos a ele)
Pedi-lhe que se mantivesse em silêncio.
Objeto Indireto Oração Subordinada Subs- * Como o objeto direto do verbo “aspirar” não é pes-
tantiva Objetiva Direta soa, as formas pronominais átonas “lhe” e “lhes” não são
utilizadas, mas, sim, as formas tônicas “a ele(s)”, “a ela(s)”.
Veja o exemplo: Aspiravam a uma existência melhor. (=
Aspiravam a ela)

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LÍNGUA PORTUGUESA

ASSISTIR
IMPLICAR
- Assistir é transitivo direto no sentido de ajudar, pres-
- Como transitivo direto, esse verbo tem dois senti-
tar assistência a, auxiliar.
dos:
As empresas de saúde negam-se a assistir os idosos.
a) dar a entender, fazer supor, pressupor: Suas atitudes
As empresas de saúde negam-se a assisti-los.
implicavam um firme propósito.
b) ter como consequência, trazer como consequência,
- Assistir é transitivo indireto no sentido de ver, pre-
acarretar, provocar: Uma ação implica reação.
senciar, estar presente, caber, pertencer.
Assistimos ao documentário.
- Como transitivo direto e indireto, significa compro-
Não assisti às últimas sessões. meter, envolver: Implicaram aquele jornalista em questões
Essa lei assiste ao inquilino. econômicas.
*No sentido de morar, residir, o verbo “assistir” é in- * No sentido de antipatizar, ter implicância, é transiti-
transitivo, sendo acompanhado de adjunto adverbial de vo indireto e rege com preposição “com”: Implicava com
lugar introduzido pela preposição “em”: Assistimos numa quem não trabalhasse arduamente.
conturbada cidade.
NAMORAR
CHAMAR - Sempre transitivo direto: Luísa namora Carlos há
- Chamar é transitivo direto no sentido de convocar, dois anos.
solicitar a atenção ou a presença de.
Por gentileza, vá chamar a polícia. / Por favor, vá cha- OBEDECER - DESOBEDECER
má-la. - Sempre transitivo indireto:
Chamei você várias vezes. / Chamei-o várias vezes. Todos obedeceram às regras.
Ninguém desobedece às leis.
- Chamar no sentido de denominar, apelidar pode
apresentar objeto direto e indireto, ao qual se refere pre- *Quando o objeto é “coisa”, não se utiliza “lhe” nem
dicativo preposicionado ou não. “lhes”: As leis são essas, mas todos desobedecem a elas.
A torcida chamou o jogador mercenário.
A torcida chamou ao jogador mercenário. PROCEDER
A torcida chamou o jogador de mercenário. - Proceder é intransitivo no sentido de ser decisivo, ter
A torcida chamou ao jogador de mercenário. cabimento, ter fundamento ou comportar-se, agir. Nessa
segunda acepção, vem sempre acompanhado de adjunto
- Chamar com o sentido de ter por nome é pronomi- adverbial de modo.
nal: Como você se chama? Eu me chamo Zenaide. As afirmações da testemunha procediam, não havia
como refutá-las.
CUSTAR Você procede muito mal.
- Custar é intransitivo no sentido de ter determinado
valor ou preço, sendo acompanhado de adjunto adver- - Nos sentidos de ter origem, derivar-se (rege a prepo-
bial: Frutas e verduras não deveriam custar muito. sição “de”) e fazer, executar (rege complemento introduzi-
do pela preposição “a”) é transitivo indireto.
- No sentido de ser difícil, penoso, pode ser intransiti- O avião procede de Maceió.
vo ou transitivo indireto, tendo como sujeito uma oração Procedeu-se aos exames.
reduzida de infinitivo. O delegado procederá ao inquérito.

Muito custa viver tão longe QUERER


da família. - Querer é transitivo direto no sentido de desejar, ter
Verbo Intransitivo Oração Subordinada vontade de, cobiçar.
Substantiva Subjetiva Reduzida de Infinitivo Querem melhor atendimento.
Queremos um país melhor.
Custou-me (a mim) crer nisso.
Objeto Indireto Oração Subordinada - Querer é transitivo indireto no sentido de ter afei-
Substantiva Subjetiva Reduzida de Infinitivo ção, estimar, amar: Quero muito aos meus amigos.

*A Gramática Normativa condena as construções que VISAR


atribuem ao verbo “custar” um sujeito representado por - Como transitivo direto, apresenta os sentidos de mi-
pessoa: Custei para entender o problema. = Forma rar, fazer pontaria e de pôr visto, rubricar.
correta: Custou-me entender o problema. O homem visou o alvo.
O gerente não quis visar o cheque.

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LÍNGUA PORTUGUESA

- No sentido de ter em vista, ter como meta, ter como objetivo é transitivo indireto e rege a preposição “a”.
O ensino deve sempre visar ao progresso social.
Prometeram tomar medidas que visassem ao bem-estar público.

ESQUECER – LEMBRAR
- Lembrar algo – esquecer algo
- Lembrar-se de algo – esquecer-se de algo (pronominal)

No 1.º caso, os verbos são transitivos diretos, ou seja, exigem complemento sem preposição: Ele esqueceu o livro.
No 2.º caso, os verbos são pronominais (-se, -me, etc) e exigem complemento com a preposição “de”. São, portanto,
transitivos indiretos:
- Ele se esqueceu do caderno.
- Eu me esqueci da chave.
- Eles se esqueceram da prova.
- Nós nos lembramos de tudo o que aconteceu.
Há uma construção em que a coisa esquecida ou lembrada passa a funcionar como sujeito e o verbo sofre leve alte-
ração de sentido. É uma construção muito rara na língua contemporânea, porém, é fácil encontrá-la em textos clássicos
tanto brasileiros como portugueses. Machado de Assis, por exemplo, fez uso dessa construção várias vezes.
Esqueceu-me a tragédia. (cair no esquecimento)
Lembrou-me a festa. (vir à lembrança)
Não lhe lembram os bons momentos da infância? (= momentos é sujeito)

SIMPATIZAR - ANTIPATIZAR

- São transitivos indiretos e exigem a preposição “com”:


Não simpatizei com os jurados.
Simpatizei com os alunos.

Importante: A norma culta exige que os verbos e expressões que dão ideia de movimento sejam usados com a
preposição “a”:
Chegamos a São Paulo e fomos direto ao hotel.
Cláudia desceu ao segundo andar.
Hoje, com esta chuva, ninguém sairá à rua.

Regência Nominal

É o nome da relação existente entre um nome (substantivo, adjetivo ou advérbio) e os termos regidos por esse nome.
Essa relação é sempre intermediada por uma preposição. No estudo da regência nominal, é preciso levar em conta que
vários nomes apresentam exatamente o mesmo regime dos verbos de que derivam. Conhecer o regime de um verbo
significa, nesses casos, conhecer o regime dos nomes cognatos. Observe o exemplo: Verbo obedecer e os nomes corres-
pondentes: todos regem complementos introduzidos pela preposição a. Veja:

Obedecer a algo/ a alguém.


Obediente a algo/ a alguém.

Se uma oração completar o sentido de um nome, ou seja, exercer a função de complemento nominal, ela será com-
pletiva nominal (subordinada substantiva).

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LÍNGUA PORTUGUESA

Regência de Alguns Nomes

Substantivos
Admiração a, por Devoção a, para, com, por Medo a, de
Aversão a, para, por Doutor em Obediência a
Atentado a, contra Dúvida acerca de, em, sobre Ojeriza a, por
Bacharel em Horror a Proeminência sobre
Capacidade de, para Impaciência com Respeito a, com, para com, por
Adjetivos
Acessível a Diferente de Necessário a
Acostumado a, com Entendido em Nocivo a
Afável com, para com Equivalente a Paralelo a
Agradável a Escasso de Parco em, de
Alheio a, de Essencial a, para Passível de
Análogo a Fácil de Preferível a
Ansioso de, para, por Fanático por Prejudicial a
Apto a, para Favorável a Prestes a
Ávido de Generoso com Propício a
Benéfico a Grato a, por Próximo a
Capaz de, para Hábil em Relacionado com
Compatível com Habituado a Relativo a
Contemporâneo a, de Idêntico a Satisfeito com, de, em, por
Contíguo a Impróprio para Semelhante a
Contrário a Indeciso em Sensível a
Curioso de, por Insensível a Sito em
Descontente com Liberal com Suspeito de
Desejoso de Natural de Vazio de

Advérbios
Longe de Perto de

Observação: os advérbios terminados em -mente tendem a seguir o regime dos adjetivos de que são formados:
paralela a; paralelamente a; relativa a; relativamente a.

Fontes de pesquisa:
http://www.soportugues.com.br/secoes/sint/sint61.php
Português linguagens: volume 3 / Wiliam Roberto Cereja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São Paulo:
Saraiva, 2010.
SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa Sacconi. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010.
Português: novas palavras: literatura, gramática, redação / Emília Amaral... [et al.]. – São Paulo: FTD, 2000.

Questões

1-) (PRODAM – AUXILIAR - MOTORISTA – FUNCAB/2014) Assinale a alternativa em que a frase segue a norma culta
da língua quanto à regência verbal.
A) Prefiro viajar de ônibus do que dirigir.
B) Eu esqueci do seu nome.
C) Você assistiu à cena toda?
D) Ele chegou na oficina pela manhã.
E) Sempre obedeço as leis de trânsito.

65
LÍNGUA PORTUGUESA

1-)
d) Pronomes relativos: Venceu o concurseiro que se es-
A) Prefiro viajar de ônibus do que dirigir. = prefiro
forçou.
viajar de ônibus a dirigir
e) Pronomes indefinidos: Poucos te deram a oportu-
B) Eu esqueci do seu nome. = Eu me esqueci do seu
nidade.
nome
C) Você assistiu à cena toda? = correta
f) Pronomes demonstrativos: Isso me magoa muito.
D) Ele chegou na oficina pela manhã. = Ele chegou à
2) Orações iniciadas por palavras interrogativas: Quem
oficina pela manhã
lhe disse isso?
E) Sempre obedeço as leis de trânsito. = Sempre obe-
deço às leis de trânsito
3) Orações iniciadas por palavras exclamativas: Quan-
RESPOSTA: “C”.
to se ofendem!
2-) (POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DE SÃO PAULO/SP –
4) Orações que exprimem desejo (orações optativas):
MÉDICO LEGISTA – VUNESP/2014 - adaptada) Leia o se-
Que Deus o ajude.
guinte trecho para responder à questão.
A pesquisa encontrou um dado curioso: homens com 5) A próclise é obrigatória quando se utiliza o prono-
baixos níveis de testosterona tiveram uma resposta imu- me reto ou sujeito expresso:
nológica melhor a essa medida, similar . Eu lhe entregarei o material amanhã.
A alternativa que completa, corretamente, o texto é: Tu sabes cantar?
(A) das mulheres
(B) às mulheres Mesóclise = É a colocação pronominal no meio do
(C) com das mulheres verbo. A mesóclise é usada:
(D) à das mulheres
(E) ao das mulheres Quando o verbo estiver no futuro do presente ou fu-
turo do pretérito, contanto que esses verbos não estejam
2-) Similar significa igual; sua regência equivale à da precedidos de palavras que exijam a próclise. Exemplos:
palavra “igual”: igual a quê? Similar a quem? Similar à (su- Realizar-se-á, na próxima semana, um grande evento
bentendido: resposta imunológica) das mulheres. em prol da paz no mundo.
RESPOSTA: “D”. Repare que o pronome está “no meio” do verbo “rea-
lizará”:
realizar – SE – á. Se houvesse na oração alguma pa-
lavra que justificasse o uso da próclise, esta prevaleceria.
COLOCAÇÃO PRONOMINAL. Veja: Não se realizará...
Não fossem os meus compromissos, acompanhar-te-ia
nessa viagem.
(com presença de palavra que justifique o uso de pró-
clise: Não fossem os meus compromissos, EU te acompa-
Colocação Pronominal trata da correta colocação dos
nharia nessa viagem).
pronomes oblíquos átonos na frase.
Ênclise = É a colocação pronominal depois do verbo.
* Dica: Pronome Oblíquo é aquele que exerce a fun- A ênclise é usada quando a próclise e a mesóclise não
ção de complemento verbal (objeto). Por isso, memorize: forem possíveis:
OBlíquo = OBjeto!
1) Quando o verbo estiver no imperativo afirmativo:
Embora na linguagem falada a colocação dos pro- Quando eu avisar, silenciem-se todos.
nomes não seja rigorosamente seguida, algumas normas
devem ser observadas na linguagem escrita. 2) Quando o verbo estiver no infinitivo impessoal:
Não era minha intenção machucá-la.
Próclise = É a colocação pronominal antes do verbo.
A próclise é usada: 3) Quando o verbo iniciar a oração. (até porque não
se inicia período com pronome oblíquo).
1) Quando o verbo estiver precedido de palavras que Vou-me embora agora mesmo.
atraem o pronome para antes do verbo. São elas: Levanto-me às 6h.
a) Palavras de sentido negativo: não, nunca, ninguém,
jamais, etc.: Não se desespere! 4) Quando houver pausa antes do verbo: Se eu passo
b) Advérbios: Agora se negam a depor. no concurso, mudo-me hoje mesmo!
c) Conjunções subordinativas: Espero que me expli-
quem tudo! 5-) Quando o verbo estiver no gerúndio: Recusou a
proposta fazendo-se de desentendida.

66
LÍNGUA PORTUGUESA

Colocação pronominal nas locuções verbais


A) Há políticas que a reconhecem.
- após verbo no particípio = pronome depois do ver- B) Há políticas que reconhecem-a.
bo auxiliar (e não depois do particípio): C) Há políticas que reconhecem-na.
Tenho me deliciado com a leitura! D) Há políticas que reconhecem ela.
Eu tenho me deliciado com a leitura!
E) Há políticas que lhe reconhecem.
Eu me tenho deliciado com a leitura!
- não convém usar hífen nos tempos compostos e nas
1-) Primeiramente identifiquemos se temos objeto di-
locuções verbais: reto ou indireto. Reconhece o quê? Resposta: a informali-
Vamos nos unir! dade. Pergunta e resposta sem preposição, então: objeto
Iremos nos direto. Não utilizaremos “lhe” – que é para objeto indire-
manifestar. to. Como temos a presença do “que” – independente de
sua função no período (pronome relativo, no caso!) – a
- quando há um fator para próclise nos tempos com- regra pede próclise (pronome oblíquo antes do verbo):
postos ou locuções verbais: opção pelo uso do pronome que a reconhecem.
oblíquo “solto” entre os verbos = Não vamos nos preocu- RESPOSTA: “A”.
par (e não: “não nos vamos preocupar”).
2-) (SABESP – TECNÓLOGO – FCC/2014) A substitui-
Observações importantes: ção do elemento grifado pelo pronome correspondente
foi realizada de modo INCORRETO em:
Emprego de o, a, os, as (A) que permitiu à civilização = que lhe permitiu
1) Em verbos terminados em vogal ou ditongo oral, os (B) envolveu diferentes fatores = envolveu-os
pronomes: o, a, os, as não se alteram. (C) para fazer a dragagem = para fazê-la
Chame-o agora. (D) que desviava a água = que lhe desviava
Deixei-a mais tranquila. (E) supriam a necessidade = supriam-na

2) Em verbos terminados em r, s ou z, estas consoan- 2-)


tes finais alteram-se para lo, la, los, las. Exemplos: (A) que permitiu à civilização = que lhe permitiu =
(Encontrar) Encontrá-lo é o meu maior sonho. correta
(Fiz) Fi-lo porque não tinha alternativa. (B) envolveu diferentes fatores = envolveu-os = cor-
reta
3) Em verbos terminados em ditongos nasais (am, em, (C) para fazer a dragagem = para fazê-la = correta
ão, õe), os pronomes o, a, os, as alteram-se para no, na, (D) que desviava a água = que lhe desviava = que a
nos, nas. desviava
Chamem-no agora. (E) supriam a necessidade = supriam-na = correta
Põe-na sobre a RESPOSTA: “D”.
mesa.
3-) (TRT/AL - ANALISTA JUDICIÁRIO - FCC/2014)
* Dica: cruzando os desertos do oeste da China − que con-
Próclise – pró lembra pré; pré é prefixo que significa tornam a Índia − adotam complexas providências
“antes”! Pronome antes do verbo! Fazendo-se as alterações necessárias, os segmentos
Ênclise – “en”... lembra, pelo “som”, /Ənd/ (end, em In- grifados acima foram corretamente substituídos por um
glês – que significa “fim, final!). Pronome depois do verbo! pronome, respectivamente, em:
Mesóclise – pronome oblíquo no Meio do verbo (A) os cruzando - que contornam-lhe - adotam-as
Pronome Oblíquo – função de objeto (B) cruzando-lhes - que contornam-na - as adotam
(C) cruzando-os - que lhe contornam - adotam-lhes
Fontes de pesquisa: (D) cruzando-os - que a contornam - adotam-nas
http://www.portugues.com.br/gramatica/colocacao- (E) lhes cruzando - que contornam-a - as adotam
-pronominal-.html
SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa 3-) Não podemos utilizar “lhes”, que corresponde ao
Sacconi. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010. objeto indireto (verbo “cruzar” pede objeto direto: cruzar
Português linguagens: volume 3 / Wiliam Roberto Ce- o quê?), portanto já desconsideramos as alternativas “B” e
reja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São “D”. Ao iniciarmos um parágrafo ( já que no enunciado te-
Paulo: Saraiva, 2010. mos uma oração assim) devemos usar ênclise: (cruzando-
-os); na segunda oração temos um pronome relativo (dá
Questões para substituirmos por “o qual”), o que nos obriga a usar
a próclise (que a contorna); “adotam” exige objeto direto
1-) (IBGE - SUPERVISOR DE PESQUISAS – ADMINIS- (adotam quem ou o quê?), chegando à resposta: adotam-
TRAÇÃO - CESGRANRIO/2014) Em “Há políticas que reco- nas (quando o verbo terminar em “m” e usarmos um pro-
nhecem a informalidade”, ao substituir o termo destacado nome oblíquo direto, lembre-se do alfabeto: jklM – N!).
por um pronome, de acordo com a norma-padrão da lín- RESPOSTA: “D”.
gua, o trecho assume a formulação apresentada em:

67
LÍNGUA PORTUGUESA

CRASE. ** Dica: Use a regrinha “Vou A volto DA, crase HÁ; vou
A volto DE, crase PRA QUÊ?” Exemplo: Vou a Campinas. =
Volto de Campinas. (crase pra quê?)
Vou à praia. = Volto da praia. (crase há!)
ATENÇÃO: quando o nome de lugar estiver especifi-
A crase se caracteriza como a fusão de duas vogais cado, ocorrerá crase. Veja:
idênticas, relacionadas ao emprego da preposição “a” Retornarei à São Paulo dos bandeirantes. = mesmo
com o artigo feminino a(s), com o “a” inicial referente aos que, pela regrinha acima, seja a do “VOLTO DE”
pronomes demonstrativos – aquela(s), aquele(s), aquilo Irei à Salvador de Jorge Amado.
e com o “a” pertencente ao pronome relativo a qual (as
quais). Casos estes em que tal fusão encontra-se demar- * A letra “a” dos pronomes demonstrativos aquele(s),
cada pelo acento grave ( ` ): à(s), àquela, àquele, àquilo, à aquela(s) e aquilo receberão o acento grave se o termo
qual, às quais. regente exigir complemento regido da preposição “a”.
O uso do acento indicativo de crase está condiciona- Entregamos a encomenda àquela menina.
do aos nossos conhecimentos acerca da regência verbal (preposição + pronome demonstrativo)
e nominal, mais precisamente ao termo regente e termo
regido. Ou seja, o termo regente é o verbo - ou nome - Iremos àquela reunião.
que exige complemento regido pela preposição “a”, e o (preposição + pronome demonstrativo)
termo regido é aquele que completa o sentido do termo
regente, admitindo a anteposição do artigo a(s).
Sua história é semelhante às que eu ouvia quando
Refiro-me a (a) funcionária antiga, e não a (a)quela
criança. (àquelas que eu ouvia quando criança)
contratada recentemente.
(preposição + pronome demonstrativo)
Após a junção da preposição com o artigo (destaca-
* A letra “a” que acompanha locuções femininas (ad-
dos entre parênteses), temos:
verbiais, prepositivas e conjuntivas) recebe o acento gra-
Refiro-me à funcionária antiga, e não àquela contrata-
ve:
da recentemente.
- locuções adverbiais: às vezes, à tarde, à noite, às
pressas, à vontade...
O verbo referir, de acordo com sua transitividade,
classifica-se como transitivo indireto, pois sempre nos re- - locuções prepositivas: à frente, à espera de, à procura
ferimos a alguém ou a algo. Houve a fusão da preposição de...
a + o artigo feminino (à) e com o artigo feminino a + o - locuções conjuntivas: à proporção que, à medida que.
pronome demonstrativo aquela (àquela).
* Cuidado: quando as expressões acima não exerce-
Observação importante: Alguns recursos servem de rem a função de locuções não ocorrerá crase. Repare:
ajuda para que possamos confirmar a ocorrência ou não Eu adoro a noite!
da crase. Eis alguns: Adoro o quê? Adoro quem? O verbo “adoro” requer
a) Substitui-se a palavra feminina por uma masculina objeto direto, no caso, a noite. Aqui, o “a” é artigo, não
equivalente. Caso ocorra a combinação a + o(s), a crase preposição.
está confirmada.
Os dados foram solicitados à diretora. Casos passíveis de nota:
Os dados foram solicitados ao diretor.
*a crase é facultativa diante de nomes próprios femi-
b) No caso de nomes próprios geográficos, substitui- ninos: Entreguei o caderno a (à) Eliza.
se o verbo da frase pelo verbo voltar. Caso resulte na ex-
pressão “voltar da”, há a confirmação da crase. *também é facultativa diante de pronomes possessi-
Faremos uma visita à Bahia. vos femininos: O diretor fez referência a (à) sua empresa.
Faz dois dias que voltamos da Bahia. (crase confirma-
da) *facultativa em locução prepositiva “até a”: A loja fica-
rá aberta até as (às) dezoito horas.
Não me esqueço da viagem a Roma.
Ao voltar de Roma, relembrarei os belos momentos ja- * Constata-se o uso da crase se as locuções preposi-
mais vividos. tivas à moda de, à maneira de apresentarem-se implícitas,
mesmo diante de nomes masculinos: Tenho compulsão
Atenção: Nas situações em que o nome geográfico se por comprar sapatos à Luis XV. (à moda de Luís XV)
apresentar modificado por um adjunto adnominal, a crase
está confirmada. * Não se efetiva o uso da crase diante da locução ad-
Atendo-me à bela Fortaleza, senti saudades de suas verbial “a distância”: Na praia de Copacabana, observamos
praias. a queima de fogos a distância.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Entretanto, se o termo vier determinado, teremos


uma locução prepositiva, aí sim, ocorrerá crase: O pedestre Observação: Pelo fato de os pronomes de tratamento
foi arremessado à distância de cem metros. relativos à senhora, senhorita e madame admitirem artigo,
o uso da crase está confirmado no “a” que os antecede,
- De modo a evitar o duplo sentido – a ambiguidade no caso de o termo regente exigir a preposição.
-, faz-se necessário o emprego da crase. Todos os méritos foram conferidos à senhorita Patrícia.
Ensino à distância.
Ensino a distância. *não ocorre crase antes de nome feminino utilizado
em sentido genérico ou indeterminado:
* Em locuções adverbiais formadas por palavras repe- Estamos sujeitos a críticas.
tidas, não há ocorrência da crase. Refiro-me a conversas paralelas.
Ela ficou frente a frente com o agressor.
Eu o seguirei passo a passo. Fontes de pesquisa:
http://www.portugues.com.br/gramatica/o-uso-cra-
Casos em que não se admite o emprego da crase: se-.html
SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa
* Antes de vocábulos masculinos. Sacconi. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010.
As produções escritas a lápis não serão corrigidas. Português linguagens: volume 3 / Wiliam Roberto Ce-
Esta caneta pertence a Pedro. reja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – São
Paulo: Saraiva, 2010.
* Antes de verbos no infinitivo.
Ele estava a Questões
cantar. Começou a
chover. 1-) (POLÍCIA CIVIL/SC – AGENTE DE POLÍCIA – ACA-
FE/2014) Assinale a alternativa que preenche corretamen-
* Antes de numeral. te as lacunas da frase a seguir.
O número de aprovados chegou a cem. Quando três meses disse-me que iria
Faremos uma visita a dez países. Grécia para visitar sua tia, vi-me na obrigação de ajudá-
-la resgatar as milhas quais tinha direito.
Observação: A-) a - há - à - à - às
- Nos casos em que o numeral indicar horas – funcio- B-) há - à - a - a – às
nando como uma locução adverbial feminina – ocorrerá C-) há - a - há - à - as
crase: Os passageiros partirão às dezenove horas. D-) a - à - a - à - às
E-) a - a - à - há – as
- Diante de numerais ordinais femininos a crase está
confirmada, visto que estes não podem ser empregados 1-) Quando HÁ (sentido de tempo) três meses disse-
sem o artigo: As saudações foram direcionadas à primeira me que iria À (“vou a, volto da, crase há!”) Grécia para
aluna da classe. visitar A (artigo) sua tia, vi-me na obrigação de ajudá-la
A (ajudar “ela” a fazer algo) resgatar as milhas ÀS quais
- Não ocorrerá crase antes da palavra casa, quando
tinha direito (tinha direito a quê? às milhas – regência no-
essa não se apresentar determinada: Chegamos todos
minal). Teremos: há, à, a, a, às.
exaustos a casa.
RESPOSTA: “B”.
Entretanto, se vier acompanhada de um adjunto
adnominal, a crase estará confirmada: Chegamos todos
exaustos à casa de Marcela. 2-) (EMPLASA/SP – ANALISTA JURÍDICO – DIREITO –
VUNESP/2014)
- não há crase antes da palavra “terra”, quando essa A ministra de Direitos Humanos instituiu grupo de
indicar chão firme: Quando os navegantes regressaram a trabalho para proceder medidas necessárias
terra, já era noite. exumação dos restos mortais do ex-presidente João Gou-
Contudo, se o termo estiver precedido por um de- lart, sepultado em São Borja (RS), em 1976. Com a exu-
terminante ou referir-se ao planeta Terra, ocorrerá crase. mação de Jango, o governo visa esclarecer se o ex-pre-
Paulo viajou rumo à sua terra natal. sidente morreu de causas naturais, ou seja, devido
O astronauta voltou à Terra. uma parada cardíaca – que tem sido a versão considerada
oficial até hoje –, ou se sua morte se deve envene-
- não ocorre crase antes de pronomes que requerem namento.
o uso do artigo. (http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,-
Os livros foram entregues a mim. governo-cria-grupo-exumar--restos-mortais-de- jan-
Dei a ela a merecida recompensa. go,1094178,0.htm 07. 11.2013. Adaptado)

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LÍNGUA PORTUGUESA

Segundo a norma-padrão da língua portuguesa, as


lacunas da frase devem ser completadas, correta e res- ORTOGRAFIA OFICIAL
pectivamente, por
(A) a ... à ... a ... a
(B) as ... à ... a ... à
(C) às ... a ... à ... a
(D) à ... à ... à ... a A ortografia é a parte da Fonologia que trata da
(E) a ... a ... a ... à correta grafia das palavras. É ela quem ordena qual som
devem ter as letras do alfabeto. Os vocábulos de uma
2-) A ministra de Direitos Humanos instituiu grupo língua são grafados segundo acordos ortográficos.
de trabalho para proceder a medidas (palavra no plural, A maneira mais simples, prática e objetiva de apren-
generalizando) necessárias à (regência nominal pede pre- der ortografia é realizar muitos exercícios, ver as palavras,
posição) exumação dos restos mortais do ex-presidente familiarizando-se com elas. O conhecimento das regras é
João Goulart, sepultado em São Borja (RS), em 1976. Com necessário, mas não basta, pois há inúmeras exceções e,
a exumação de Jango, o governo visa esclarecer se o ex- em alguns casos, há necessidade de conhecimento de eti-
-presidente morreu de causas naturais, ou seja, devido a mologia (origem da palavra).
uma (artigo indefinido) parada cardíaca – que tem sido a
versão considerada oficial até hoje –, ou se sua morte se Regras ortográficas
deve a (regência verbal) envenenamento. A / à / a / a
RESPOSTA: “A”. O fonema s

3-) (SABESP/SP – ADVOGADO – FCC/2014) S e não C/Ç


Para chegar a esta conclusão, os pesquisadores fize-
ram uma escavação arqueológica nas ruínas da antiga ci- palavras substantivadas derivadas de verbos com radi-
dade de Tikal, na Guatemala. cais em nd, rg, rt, pel, corr e sent: pretender - pretensão /
O a empregado na frase acima, imediatamente depois expandir - expansão / ascender - ascensão / inverter -
de chegar, deverá receber o sinal indicativo de crase caso inver- são / aspergir - aspersão / submergir - submersão /
o segmento grifado seja substituído por: divertir
(A) Uma tal ilação. - diversão / impelir - impulsivo / compelir - compulsório /
(B) Afirmações como essa. repelir - repulsa / recorrer - recurso / discorrer - discurso /
(C) Comprovação dessa assertiva. sentir - sensível / consentir – consensual.
(D) Emitir uma opinião desse tipo.
(E) Semelhante resultado. SS e não C e Ç

3-) nomes derivados dos verbos cujos radicais terminem


(A) Uma tal ilação – chegar a uma (não há acento gra- em gred, ced, prim ou com verbos terminados por tir ou
ve antes de artigo) -meter: agredir - agressivo / imprimir - impressão / admitir
(B) Afirmações como essa – chegar a afirmações (an- - admissão / ceder - cessão / exceder - excesso / percutir -
tes de palavra no plural e o “a” no singular) percussão / regredir - regressão / oprimir - opressão / com-
(C) Comprovação dessa assertiva – chegar à compro- prometer - compromisso / submeter – submissão.
vação
(D) Emitir uma opinião desse tipo – chegar a emitir *quando o prefixo termina com vogal que se junta
(verbo no infinitivo) com a palavra iniciada por “s”. Exemplos: a + simétrico -
(E) Semelhante resultado – chegar a semelhante (pa- assimé- trico / re + surgir – ressurgir.
lavra masculina) *no pretérito imperfeito simples do subjuntivo. Exem-
RESPOSTA: “C”. plos: ficasse, falasse.

C ou Ç e não S e SS

vocábulos de origem árabe: cetim, açucena, açúcar.


vocábulos de origem tupi, africana ou exótica: cipó,
Ju- çara, caçula, cachaça, cacique.
sufixos aça, aço, ação, çar, ecer, iça, nça, uça, uçu,
uço: barcaça, ricaço, aguçar, empalidecer, carniça, caniço,
esperança, carapuça, dentuço.
nomes derivados do verbo ter: abster - abstenção /
de- ter - detenção / ater - atenção / reter – retenção.
após ditongos: foice, coice, traição.
palavras derivadas de outras terminadas em -te, to(r):
marte - marciano / infrator - infração / absorto – absorção.

70
LÍNGUA PORTUGUESA

O fonema z
O fonema ch
S e não Z
X e não CH
sufixos: ês, esa, esia, e isa, quando o radical é subs-
palavras de origem tupi, africana ou exótica: abacaxi,
tantivo, ou em gentílicos e títulos nobiliárquicos: freguês,
xucro.
freguesa, freguesia, poetisa, baronesa, princesa.
palavras de origem inglesa e espanhola: xampu,
sufixos gregos: ase, ese, ise e ose: catequese,
lagar- tixa.
metamor- fose.
depois de ditongo: frouxo, feixe.
formas verbais pôr e querer: pôs, pus, quisera, quis,
depois de “en”: enxurrada, enxada, enxoval.
qui- seste.
nomes derivados de verbos com radicais terminados
Exceção: quando a palavra de origem não derive de
em “d”: aludir - alusão / decidir - decisão / empreender -
outra iniciada com ch - Cheio - (enchente)
empresa / difundir – difusão.
CH e não X
diminutivos cujos radicais terminam com “s”: Luís -
Lui- sinho / Rosa - Rosinha / lápis – lapisinho.
palavras de origem estrangeira: chave, chumbo, chassi,
após ditongos: coisa, pausa, pouso, causa.
mochila, espadachim, chope, sanduíche, salsicha.
verbos derivados de nomes cujo radical termina com
“s”: anális(e) + ar - analisar / pesquis(a) + ar – pesquisar.
As letras “e” e “i”
Z e não S Ditongos nasais são escritos com “e”: mãe, põem. Com
“i”, só o ditongo interno cãibra.
sufixos “ez” e “eza” das palavras derivadas de
verbos que apresentam infinitivo em -oar, -uar são
adjetivo:
escritos com “e”: caçoe, perdoe, tumultue. Escrevemos com
macio - maciez / rico – riqueza / belo – beleza. “i”, os verbos com infinitivo em -air, -oer e -uir: trai, dói,
sufixos “izar” (desde que o radical da palavra de ori- possui, contribui.
gem não termine com s): final - finalizar / concreto – con-
cretizar. * Atenção para as palavras que mudam de sentido
consoante de ligação se o radical não terminar com quando substituímos a grafia “e” pela grafia “i”: área
“s”:
(super- fície), ária (melodia) / delatar (denunciar), dilatar
pé + inho - pezinho / café + al - cafezal (expandir)
/ emergir (vir à tona), imergir (mergulhar) / peão (de estân-
Exceção: lápis + inho – lapisinho. cia, que anda a pé), pião (brinquedo).
O fonema j * Dica:
- Se o dicionário ainda deixar dúvida quanto à orto-
G e não J grafia de uma palavra, há a possibilidade de consultar o
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP),
palavras de origem grega ou árabe: tigela, girafa,
ela- borado pela Academia Brasileira de Letras. É uma
ges- obra de referência até mesmo para a criação de
so. dicionários, pois traz a grafia atualizada das palavras (sem
estrangeirismo, cuja letra G é originária: sargento, gim. o significado). Na Internet, o endereço é
terminações: agem, igem, ugem, ege, oge (com pou- www.academia.org.br.
cas exceções): imagem, vertigem, penugem, bege, foge.
Informações importantes
Exceção: pajem. - Formas variantes são formas duplas ou múltiplas,
equivalentes: aluguel/aluguer, relampejar/relampear/re-
terminações: ágio, égio, ígio, ógio, ugio: sortilégio, lampar/relampadar.
litígio, relógio, refúgio. - Os símbolos das unidades de medida são escritos
verbos terminados em ger/gir: emergir, eleger, fugir, sem ponto, com letra minúscula e sem “s” para indicar
mugir. plu- ral, sem espaço entre o algarismo e o símbolo: 2kg,
depois da letra “r” com poucas exceções: emergir, sur- 20km, 120km/h.
gir.
depois da letra “a”, desde que não seja radical Exceção para litro (L): 2 L, 150 L.
termina- do com j: ágil, agente. - Na indicação de horas, minutos e segundos, não
deve haver espaço entre o algarismo e o símbolo: 14h,
J e não G 22h30min, 14h23’34’’(= quatorze horas, vinte e três
minutos e trinta e quatro segundos).
palavras de origem latinas: jeito, majestade, hoje. - O símbolo do real antecede o número sem espaço:
palavras de origem árabe, africana ou exótica: R$1.000,00. No cifrão deve ser utilizada apenas uma barra
jiboia, manjerona. vertical ($).
palavras terminadas com aje: ultraje.

71
LÍNGUA PORTUGUESA

Fontes de pesquisa:
http://www.pciconcursos.com.br/aulas/portugues/or- 9. Na ênclise e mesóclise: amá-lo, deixá-lo, dá-se,
tografia abra- ça-o, lança-o e amá-lo-ei, falar-lhe-ei, etc.
SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa
Sac- coni. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010. 10. Nas formações em que o prefixo tem como se-
Português linguagens: volume 1 / Wiliam Roberto gundo termo uma palavra iniciada por “h”: sub-hepático,
Cere- ja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. – geo--história, neo-helênico, extra-humano, semi-hospitalar,
São Paulo: Saraiva, 2010. super-homem.
Português: novas palavras: literatura, gramática, reda-
ção / Emília Amaral... [et al.]. – São Paulo: FTD, 2000. 11. Nas formações em que o prefixo ou pseudoprefixo
termina com a mesma vogal do segundo elemento:
Hífen micro-
-ondas, eletro-ótica, semi-interno, auto-observação, etc.
O hífen é um sinal diacrítico (que distingue) usado
para ligar os elementos de palavras compostas (como ex- ** O hífen é suprimido quando para formar outros ter-
presi- dente, por exemplo) e para unir pronomes átonos a mos: reaver, inábil, desumano, lobisomem, reabilitar.
verbos (ofereceram-me; vê-lo-ei). Serve igualmente para
fazer a translineação de palavras, isto é, no fim de uma Lembrete da Zê!
linha, se- parar uma palavra em duas partes (ca-/sa; Ao separar palavras na translineação (mudança de li-
compa-/nheiro). nha), caso a última palavra a ser escrita seja formada por
hífen, repita-o na próxima linha. Exemplo: escreverei
Uso do hífen que continua depois da Reforma Or- anti-
tográfica: -inflamatório e, ao final, coube apenas “anti-”. Na próxima
linha escreverei: “-inflamatório” (hífen em ambas as linhas).
1. Em palavras compostas por justaposição que
formam uma unidade semântica, ou seja, nos termos que Não se emprega o hífen:
se unem para formarem um novo significado: tio-avô,
porto-ale- grense, luso-brasileiro, tenente-coronel, 1. Nas formações em que o prefixo ou falso prefixo
segunda- -fei- ra, conta-gotas, guarda-chuva, arco-íris, termina em vogal e o segundo termo inicia-se em “r” ou
primeiro-ministro, azul-escuro. “s”. Nesse caso, passa-se a duplicar estas consoantes:
antir- religioso, contrarregra, infrassom, microssistema,
2. Em palavras compostas por espécies botânicas e minissaia, microrradiografia, etc.
zoológicas: couve-flor, bem-te-vi, bem-me-quer, abóbora-
-menina, erva-doce, feijão-verde. 2. Nas constituições em que o prefixo ou pseudopre-
fixo termina em vogal e o segundo termo inicia-se com
3. Nos compostos com elementos além, aquém, re- vogal diferente: antiaéreo, extraescolar, coeducação,
cém e sem: além-mar, recém-nascido, sem-número, autoes- trada, autoaprendizagem, hidroelétrico, plurianual,
recém- autoes- cola, infraestrutura, etc.
-casado.
3. Nas formações, em geral, que contêm os prefixos
4. No geral, as locuções não possuem hífen, mas algu- “dês” e “in” e o segundo elemento perdeu o “h” inicial: de-
mas exceções continuam por já estarem consagradas pelo sumano, inábil, desabilitar, etc.
uso: cor-de-rosa, arco-da-velha, mais-que-perfeito, pé-
de- 4. Nas formações com o prefixo “co”, mesmo quando
-meia, água-de-colônia, queima-roupa, deus-dará. o segundo elemento começar com “o”: cooperação,
coobriga- ção, coordenar, coocupante, coautor, coedição,
5. Nos encadeamentos de vocábulos, como: ponte Rio- coexistir, etc.
-Niterói, percurso Lisboa-Coimbra-Porto e nas combinações
históricas ou ocasionais: Áustria-Hungria, Angola-Brasil, 5. Em certas palavras que, com o uso, adquiriram
etc. noção de composição: pontapé, girassol, paraquedas,
paraquedis- ta, etc.
6. Nas formações com os prefixos hiper-, inter- e su-
per- quando associados com outro termo que é iniciado 6. Em alguns compostos com o advérbio “bem”:
por “r”: hiper-resistente, inter-racial, super-racional, etc. benfei- to, benquerer, benquerido, etc.
7. Nas formações com os prefixos ex-, vice-: ex- - Os prefixos pós, pré e pró, em suas formas corres-
diretor, ex-presidente, vice-governador, vice-prefeito. pondentes átonas, aglutinam-se com o elemento
seguinte, não havendo hífen: pospor, predeterminar,
8. Nas formações com os prefixos pós-, pré- e pró-: predeterminado, pressuposto, propor.
pré-natal, pré-escolar, pró-europeu, pós-graduação, etc. - Escreveremos com hífen: anti-horário, anti-infeccio-
so, auto-observação, contra-ataque, semi-interno, sobre-
-humano, super-realista, alto-mar.

72
LÍNGUA PORTUGUESA

- Escreveremos sem hífen: pôr do sol,


antirreforma, antisséptico, antissocial, contrarreforma, 3-) (CASAL/AL - ADMINISTRADOR DE REDE -
minirrestaurante, ultrassom, antiaderente, anteprojeto, COPEVE/ UFAL/2014)
anticaspa, antivírus, autoajuda, autoelogio, autoestima,
radiotáxi.

Fontes de pesquisa:
http://www.pciconcursos.com.br/aulas/portugues/or-
tografia
SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa
Sac- coni. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010.

Questões

1-) (TRE/MS - ESTÁGIO – JORNALISMO - TRE/MS –


2014)
De acordo com a nova ortografia, assinale o item em que
todas as palavras estão corretas:
A) autoajuda – anti-inflamatório – extrajudicial.
B) supracitado – semi-novo – telesserviço.
C) ultrassofisticado – hidro-elétrica – ultra-som. Armandinho, personagem do cartunista Alexandre
D) contrarregra – autopista – semi-aberto. Beck, sabe perfeitamente empregar os parônimos “cestas”
“sestas” e “sextas”. Quanto ao emprego de parônimos, da-
E) contrarrazão – infra-estrutura – coprodutor.
das as frases abaixo,
I. O cidadão se dirigia para sua eleitoral.
1-) Correção:
II. A zona eleitoral ficava 200 metros de um
A) autoajuda – anti-inflamatório – extrajudicial = correta
posto policial.
B) supracitado – semi-novo – telesserviço = seminovo
III. O condutor do automóvel a lei seca.
C) ultrassofisticado – hidro-elétrica – ultra-som = hi-
IV. Foi encontrada uma soma de dinheiro no
droelétrica, ultrassom
carro.
D) contrarregra – autopista – semi-aberto = semiaberto
E) contrarrazão – infra-estrutura – coprodutor = V. O policial anunciou o delito.
infraes- trutura
Assinale a alternativa cujos vocábulos preenchem cor-
RESPOSTA: “A”.
retamente as lacunas das frases.
A) seção, acerca de, infligiu, vultosa, fragrante.
B) seção, acerca de, infligiu, vultuosa, flagrante.
2-) (TRE/MS - ESTÁGIO – JORNALISMO - TRE/MS –
C) sessão, a cerca de, infringiu, vultosa, fragrante.
2014)
D) seção, a cerca de, infringiu, vultosa, flagrante.
De acordo com a nova ortografia, assinale o item em que
E) sessão, a cerca de, infligiu, vultuosa, flagrante.
todas as palavras estão corretas:
A) autoajuda – anti-inflamatório – extrajudicial.
3-) Questão que envolve ortografia.
B) supracitado – semi-novo – telesserviço.
I. O cidadão se dirigia para sua SEÇÃO eleitoral. (setor)
C) ultrassofisticado – hidro-elétrica – ultra-som.
II. A zona eleitoral ficava A CERCA DE 200 metros de um
D) contrarregra – autopista – semi-aberto.
posto policial. (= aproximadamente)
E) contrarrazão – infra-estrutura – coprodutor.
III. O condutor do automóvel INFRINGIU a lei seca.
(re- lacione com infrator)
2-) Correção:
IV. Foi encontrada uma VULTOSA soma de dinheiro no
A) autoajuda – anti-inflamatório – extrajudicial = correta
carro. (de grande vulto, volumoso)
B) supracitado – semi-novo – telesserviço = seminovo
V. O policial anunciou o FLAGRANTE delito. (relacione
C) ultrassofisticado – hidro-elétrica – ultra-som = hi- com “pego no flagra”)
droelétrica, ultrassom Seção / a cerca de / infringiu / vultosa / flagrante
D) contrarregra – autopista – semi-aberto = semiaberto
RESPOSTA: “D”.
E) contrarrazão – infra-estrutura – coprodutor =
infraes- trutura
RESPOSTA: “A”.

73
LÍNGUA PORTUGUESA

ACENTUAÇÃO. Regras fundamentais

Palavras oxítonas:
Acentuam-se todas as oxítonas terminadas em: “a”,
“e”, “o”, “em”, seguidas ou não do plural(s): Pará – café(s)
Quanto à acentuação, observamos que algumas pala- – ci- pó(s) – Belém.
vras têm acento gráfico e outras não; na pronúncia, ora se
dá maior intensidade sonora a uma sílaba, ora a outra. Por Esta regra também é aplicada aos seguintes casos:
isso, vamos às regras! - Monossílabos tônicos terminados em “a”, “e”, “o”, se-
guidos ou não de “s”: pá – pé – dó – há
Regras básicas – Acentuação tônica
- Formas verbais terminadas em “a”, “e”, “o” tônicos,
A acentuação tônica está relacionada à intensidade seguidas de lo, la, los, las: respeitá-lo, recebê-lo, compô-lo
com que são pronunciadas as sílabas das palavras. Aquela
que se dá de forma mais acentuada, conceitua-se como Paroxítonas:
sí- laba tônica. As demais, como são pronunciadas com Acentuam-se as palavras paroxítonas terminadas em:
menos intensidade, são denominadas de átonas. - i, is: táxi – lápis – júri
De acordo com a tonicidade, as palavras são - us, um, uns: vírus – álbuns – fórum
classifica- das como: - l, n, r, x, ps: automóvel – elétron - cadáver – tórax –
Oxítonas – São aquelas cuja sílaba tônica recai sobre fórceps
a última sílaba. Ex.: café – coração – Belém – atum – caju – - ã, ãs, ão, ãos: ímã – ímãs – órfão – órgãos
papel - ditongo oral, crescente ou decrescente, seguido ou
não de “s”: água – pônei – mágoa – memória
Paroxítonas – São aquelas em que a sílaba tônica
recai na penúltima sílaba. Ex.: útil – tórax – táxi – leque – ** Dica: Memorize a palavra LINURXÃO. Para quê? Re-
sapato pare que esta palavra apresenta as terminações das paro-
– passível xítonas que são acentuadas: L, I N, U (aqui inclua UM =
Proparoxítonas - São aquelas cuja sílaba tônica está fórum), R, X, Ã, ÃO. Assim ficará mais fácil a
na antepenúltima sílaba. Ex.: lâmpada – câmara – memorização!
tímpano
– médico – ônibus Regras especiais:
Os ditongos de pronúncia aberta “ei”, “oi” (ditongos
Há vocábulos que possuem mais de uma sílaba, mas
abertos), que antes eram acentuados, perderam o acento
em nossa língua existem aqueles com uma sílaba
de acordo com a nova regra, mas desde que estejam em
somente: são os chamados monossílabos.
palavras paroxítonas.
Os acentos ** Alerta da Zê! Cuidado: Se os ditongos abertos
esti- verem em uma palavra oxítona (herói) ou
acento agudo (´) – Colocado sobre as letras “a” e “i”, monossílaba (céu) ainda são acentuados: dói, escarcéu.
“u” e “e” do grupo “em” - indica que estas letras represen-
tam as vogais tônicas de palavras como pá, caí, público. Antes Agora
Sobre as letras “e” e “o” indica, além da tonicidade, timbre
assembléia assembleia
aberto: herói – médico – céu (ditongos abertos).
acento circunflexo (^) – colocado sobre as letras “a”, idéia ideia
“e” e “o” indica, além da tonicidade, timbre fechado: geléia geleia
tâma- ra – Atlântico – pêsames – supôs . jibóia jiboia
acento grave (`) – indica a fusão da preposição “a”
com artigos e pronomes: à – às – àquelas – àqueles apóia (verbo apoiar) apoia
trema ( ¨ ) – De acordo com a nova regra, foi paranóico paranoico
totalmen- te abolido das palavras. Há uma exceção: é
utilizado em palavras derivadas de nomes próprios Acento Diferencial
estrangeiros: mülle- riano (de Müller)
til (~) – indica que as letras “a” e “o” representam vo- Representam os acentos gráficos que, pelas regras de
gais nasais: oração – melão – órgão – ímã acentuação, não se justificariam, mas são utilizados para
diferenciar classes gramaticais entre determinadas
palavras e/ou tempos verbais. Por exemplo:
Pôr (verbo) X por (preposição) / pôde (pretérito perfeito
de Indicativo do verbo “poder”) X pode (presente do Indica-
tivo do mesmo verbo).

74
LÍNGUA PORTUGUESA

Se analisarmos o “pôr” - pela regra das monossílabas:


Repare:
terminada em “o” seguida de “r” não deve ser acentuada,
mas nesse caso, devido ao acento diferencial, acentua-se, 1-) O menino crê em você. / Os meninos creem em você.
para que saibamos se se trata de um verbo ou preposição. 2-) Elza lê bem! / Todas leem bem!
Os demais casos de acento diferencial não são mais 3-) Espero que ele dê o recado à sala. / Esperamos
utilizados: para (verbo), para (preposição), pelo que os garotos deem o recado!
(substanti- vo), pelo (preposição). Seus significados e 4-) Rubens vê tudo! / Eles veem tudo!
classes gramati-
cais são definidos pelo contexto. Cuidado! Há o verbo vir: Ele vem à tarde! / Eles vêm à
Polícia para o trânsito para realizar blitz. = o primeiro tarde!
“para” é verbo; o segundo, preposição (com relação de fi- As formas verbais que possuíam o acento tônico na
nalidade). raiz, com “u” tônico precedido de “g” ou “q” e seguido de
** Quando, na frase, der para substituir o “por” por “e” ou “i” não serão mais acentuadas:
“colocar”, estaremos trabalhando com um verbo,
portanto: “pôr”; nos outros casos, “por” preposição. Ex: Antes Depois
Faço isso por você. / Posso pôr (colocar) meus livros aqui? apazigúe (apaziguar) apazigue
Regra do Hiato: averigúe (averiguar) averigue
argúi (arguir) argui
Quando a vogal do hiato for “i” ou “u” tônicos, for a
se- gunda vogal do hiato, acompanhado ou não de “s”, Acentuam-se os verbos pertencentes a terceira pessoa
haverá acento. Ex.: saída – faísca – baú – país – Luís do plural de: ele tem – eles têm / ele vem – eles vêm (verbo
Não se acentuam o “i” e o “u” que formam hiato vir)
quan- do seguidos, na mesma sílaba, de l, m, n, r ou z. Ra-
ul, Lu-iz, sa-ir, ju-iz A regra prevalece também para os verbos conter,
Não se acentuam as letras “i” e “u” dos hiatos se esti- obter, reter, deter, abster: ele contém – eles contêm, ele
verem seguidas do dígrafo nh. Ex: ra-i-nha, ven-to-i-nha. obtém – eles obtêm, ele retém – eles retêm, ele convém –
Não se acentuam as letras “i” e “u” dos hiatos se eles convêm.
vierem precedidas de vogal idêntica: xi-i-ta, pa-ra-cu-u-ba
Fontes de pesquisa:
Observação importante: http://www.brasilescola.com/gramatica/acentuacao.
htm
Não serão mais acentuados “i” e “u” tônicos, formando SACCONI, Luiz Antônio. Nossa gramática completa
hiato quando vierem depois de ditongo (nas paroxítonas): Sac- coni. 30ª ed. Rev. São Paulo: Nova Geração, 2010.
Português linguagens: volume 1 / Wiliam Roberto
Cere- ja, Thereza Cochar Magalhães. – 7ªed. Reform. –
Antes Agora
São Paulo: Saraiva, 2010.
bocaiúva bocaiuva
feiúra feiura
Sauípe Sauipe

O acento pertencente aos encontros “oo” e “ee” foi


abolido:

Antes Agora
crêem creem
lêem leem
vôo voo
enjôo enjoo

** Dica: Memorize a palavra CREDELEVÊ. São os


verbos que, no plural, dobram o “e”, mas que não
recebem mais acento como antes: CRER, DAR, LER e
VER.

75
LÍNGUA PORTUGUESA

Questões
ANOTAÇÕE
S
1-) (PREFEITURA DE SÃO PAULO/SP – AUDITOR
FISCAL TRIBUTÁRIO MUNICIPAL – CETRO/2014 -
adaptada) Assi-
nale a alternativa que contém duas palavras acentuadas
conforme a mesma regra.
(A) “Hambúrgueres” e “repórter”.
(B) “Inacreditáveis” e “repórter”.
(C) “Índice” e
(D) “Inacreditáveis” e “atribuídos”.
“dólares”.
(E) “Atribuídos” e “índice”.

(A) “Hambúrgueres” = proparoxítona / “repórter” =


pa- roxítona
(B) “Inacreditáveis” = paroxítona / “repórter” = paro-
xítona
(C) “Índice” = proparoxítona / “dólares” = proparoxí-
tona
(D) “Inacreditáveis” = paroxítona / “atribuídos” = regra
do hiato
(E) “Atribuídos” = regra do hiato / “índice” = proparo-
xítona
RESPOSTA: “B”.

2-) (SEFAZ/RS – AUDITOR FISCAL DA RECEITA FEDERAL


– FUNDATEC/2014 - adaptada)
Analise as afirmações que são feitas sobre acentuação
gráfica.
I. Caso o acento das palavras ‘trânsito’ e ‘específicos’
seja retirado, essas continuam sendo palavras da língua
portuguesa.
II. A regra que explica a acentuação das palavras ‘vá-
rios’ e ‘país’ não é a mesma.
III. Na palavra ‘daí’, há um ditongo decrescente.
IV. Acentua-se a palavra ‘vêm’ para diferenciá-la, em
si- tuação de uso, quanto à flexão de número.
Quais estão corretas?
A) Apenas I e III.
B) Apenas II e IV.
C) Apenas I, II e
D)
IV. Apenas II, III e IV.
E) I, II, III e IV.

I. Caso o acento das palavras ‘trânsito’ e ‘específicos’


seja retirado, essas continuam sendo palavras da língua
portuguesa = teremos “transito” e “especifico” – serão
ver-
bos (correta)
II. A regra que explica a acentuação das palavras ‘vá-
rios’ e ‘país’ não é a mesma = vários é paroxítona
terminada em ditongo; país é a regra do hiato (correta)
III. Na palavra ‘daí’, há um ditongo decrescente = há
um hiato, por isso a acentuação (da - í) = incorreta.
IV. Acentua-se a palavra ‘vêm’ para diferenciá-la, em
situação de uso, quanto à flexão de número = “vêm” é uti-
lizado para a terceira pessoa do plural (correta)
RESPOSTA: “C”.

76
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

A educação escolar – atuais tendências e exigências.............................................................................................................................. 01


Currículo e o pleno desenvolvimento do educando............................................................................................................................... 05
A construção de uma escola democrática e inclusiva............................................................................................................................. 16
A qualidade social da educação escolar e a educação para a diversidade numa perspectiva multicultural.......................31
Relação professor-aluno, escola-comunidade........................................................................................................................................... 36
A educação escolar como direito e dever do estado.............................................................................................................................. 54
Financiamento da educação............................................................................................................................................................................. 54
Concepções Filosóficas da Educação......................................................................................................................................... 55
Relação Educação – Sociedade – Cultura. Tendências pedagógicas na prática escolar. Planejamento, metodologia e
ava- liação do processo ensino/aprendizagem......................................................................................................................................... 58

Bibliografia Sugerida:

BRASIL. Secretaria de Educação Especial. Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da educação inclusiva.
Brasília, MEC/SEESP, 2008........................................................................................................................................................... 71
BRASIL. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL –1988. (Artigos 5º, 6º; 205 a 214)..............................71
BRASIL. LEI Nº 8.069, DE 13 DE JULHO DE 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança do Adolescente-ECA..................92
BRASIL. LEI Nº 9.394, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional –
LDB............................................................................................................................................................................................... 147
BRASIL. RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 1, DE 17 DE JUNHO DE 2004...........................................................................................164
Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e
Cul- tura Afro-Brasileira e Africana (anexo o Parecer CNE/CP nº 3/2004)..........................................................................164
BRASIL. RESOLUÇÃO CNE/CEB Nº 4, DE 13 DE JULHO DE 2010. Define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a
Educação Básica (anexo o Parecer CNE/CEB nº 7/2010).......................................................................................................166
BRASIL. RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 1, DE 30 DE MAIO DE 2012. Estabelece Diretrizes Nacionais para a Educação em
Direi- tos Humanos (anexo o Parecer CNE/CP nº 8/2012)...................................................................................................176
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS.................................................................................................................................. 177
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e Protocolo Facultativo. Disponível em: \<http://cape.edunet.
sp.gov.br/cape_arquivos/flash/5Convencao.ONU_2006.pdf\>. Acesso em: 18 jul. 2013.6.949, DE 25 DE AGOSTO DE 2009
Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo,
assina- dos em Nova York, em 30 de março de 2007...........................................................................................................178
PERRENOUD, Philippe. “10 novas competências para ensinar”. Porto Alegre. Artmed....................................................193
PERRENOUD, Philippe. Formando Professores Profissionais, Porto Alegre. Artmed-Artes Médicas Sul, 2001 - Edição
revisada.................................................................................................................................................................................................................. 193
MOREIRA, Antonio Flávio B. (Org.) – Currículo – Questões atuais – Papirus Editora........................................................193
HOFFMANN, Jussara – Avaliação Mediadora – Editora Mediação – 2000..........................................................................198
CARVALHO, Rosita Edler. Educação Inclusiva com os Pingos nos Is. 2. ed. Porto Alegre: Mediação, 2005...................201
CORTELLA, Mário Sérgio. A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológicos e políticos. Ed. São Paulo, Cortez,
2011............................................................................................................................................................................................. 206
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 43. ed., São Paulo: Paz e Terra,
2011............................................................................................................................................................................................. 216
LA TAILLE, Yves. DANTAS, Heloisa e OLIVEIRA, Marta Kohl de, Piaget, Vygotsky, Wallon: teorias psicogenéticas em dis-
cussão. 24. ed., São Paulo: Summus, 1992..............................................................................................................................221
MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. UNESCO/Cortez Editora, cap. III e IV, p. 47-78, e cp.
VI, 93 -104, 2000......................................................................................................................................................................... 226
RIOS, Terezinha Azerêdo. Ética e competência. 20. ed., São Paulo: Cortez, 2011..............................................................226
SACRISTÀN, J. Gimeno; PÉREZ GOMES, A. I. Compreender e transformar o ensino. 4. ed. Porto Alegre: ARTMED,
2000............................................................................................................................................................................................. 229
SAVIANI, Dermeval. Histórias das ideias pedagógicas no Brasil. Campinas; Autores Associados, 2010.........................229
TEIXEIRA, Anísio. A escola pública universal e gratuita. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Rio de Janeiro, v.26,
n.64, out./dez. 1956. p. 3-27..................................................................................................................................................... 231
GROPPA, Julio – Indisciplina na escola (alternativas, teóricas e práticas) Summus Editorial............................................236
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

papel determinante no desempenho dos professores, pois


A EDUCAÇÃO ESCOLAR – ATUAIS TENDÊNCIAS E dependendo de como for a política de trabalho do coor-
EXIGÊNCIAS. denador o professor se sentirá apoiado, incentivado. Esse
deve ser o trabalho do coordenador: incentivar,
reconhecer, e elogiar os avanços e conquistas, em fim o
sucesso alcan- çado no dia a dia da escola e
O papel da escola / função social da escola consequentemente o desen- volvimento do aluno em
todos os âmbitos.
A sociedade tem avançado em vários aspectos, e mais
do que nunca é imprescindível que a escola acompanhe Compromisso social do educador
essas evoluções, que ela esteja conectada a essas transfor-
mações, falando a mesma língua, favorecendo o acesso ao Ao educador compete a promoção de condições que
conhecimento que é o assunto crucial a ser tratado neste favoreçam o aprendizado do aluno, no sentido do mes-
trabalho. mo compreender o que está sendo ministrado, quando o
É importante refletirmos sobre que tipo de trabalho professor adota o método dialético; isso se torna mais fá-
te- mos desenvolvido em nossas escolas e qual o efeito, cil, e essa precisa ser a preocupação do mesmo: facilitar a
que resultados temos alcançado. Qual é na verdade a aprendizagem do aluno, aguçar seu poder de argumenta-
função social da escola? A escola está realmente ção, conduzir ás aulas de modo questionador, onde o alu-
cumprindo ou procurando cumprir sua função, como no- sujeito ativo estará também exercendo seu papel de
agente de inter- venção na sociedade? Eis alguns sujeito pensante; que dá ótica construtivista constrói seu
pressupostos a serem ex- plicitados nesse texto. Para se aprendizado, através de hipóteses que vão sendo
conquistar o sucesso se faz necessário que se entenda ou testadas, interagindo com o professor, argumentando,
e que tenha clareza do que se quer alcançar, a escola questionando em fim trocando ideias que produzem
precisa ter objetivos bem defini- dos, para que possa inferências.
desempenhar bem o seu papel social, onde a maior O planejamento é imprescindível para o sucesso cog-
preocupação – o alvo deve ser o crescimento intelectual, nitivo do aluno e êxito no desenvolvimento do trabalho
emocional, espiritual do aluno, e para que esse avanço do professor, é como uma bússola que orienta a direção a
venha fluir é necessário que o canal (escola) esteja ser seguida, pois quando o professor não planeja o
desobstruído. aluno é o primeiro a perceber que algo ficou a desejar,
por mais experiente que seja o docente, e esse é um dos
A Escola no Passado fatores que contribuem para a indisciplina e o
desinteresse na sala de aula. É importante que o planejar
A escola é um lugar que oportuniza, ou deveria possi- aconteça de forma siste- matizada e contextualizado com
bilitar as pessoas à convivência com seus semelhantes (so- o cotidiano do aluno – fa- tor que desperta seu interesse e
cialização). As melhores e mais conceituadas escolas per- participação ativa.
tenciam à rede particular, atendendo um grupo elitizado, Um planejamento contextualizado com as especifi-
enquanto a grande maioria teria que lutar para conseguir cidades e vivências do educando, o resultado será aulas
uma vaga em escolas públicas com estrutura física e dinâmicas e prazerosas, ao contrário de uma prática em
peda- gógicas deficientes. que o professor cita somente o número da página e
O país tem passado por mudanças significativas no alunos abrem seus livros é feito uma explicação superficial
que se refere ao funcionamento e acesso da população e dá-se por cumprido a tarefa da aula do dia, não houve
brasilei- ra ao ensino público, quando em um passado conversa, dialética, interação.
recente era privilégio das camadas sociais abastadas (elite)
e de pre- ferência para os homens, as mulheres mal Ação do gestor escolar
apareciam na cena social, quando muito as únicas que
tinham acesso à instrução formal recebiam alguma A cultura organizacional do gestor é decisiva para o
iniciação em desenho e música. sucesso ou fracasso da qualidade de ensino da escola, a
maneira como ele conduz o gestionamento das ações é o
Atuação da equipe pedagógica – coordenação foco que determinará o sucesso ou fracasso da escola. De
acordo com Libâneo (2005), características organizacionais
A política de atuação da equipe pedagógica é de positivas eficazes para o bom funcionamento de uma
suma importância para a elevação da qualidade de ensino esco- la: professores preparados, com clareza de seus
na es- cola, existe a necessidade urgente de que os objetivos e conteúdos, que planejem as aulas, cativem os
coordenado- res pedagógicos não restrinjam suas alunos.
atribuições somente à parte técnica, burocrática, elaborar Um bom clima de trabalho, em que a direção
horários de aulas e ainda ficarem nos corredores da escola contribua para conseguir o empenho de todos, em que os
procurando con- ter a indisciplina dos alunos que saem professo- res aceitem aprender com a experiência dos
das salas durante as aulas, enquanto os professores ficam colegas.
necessitados de acompanhamento. A equipe de suporte Clareza no plano de trabalho do Projeto pedagógico-
pedagógico tem -curricular que vá de encontro às reais necessidades da
es- cola, primando por sanar problemas como: falta de
profes- sores, cumprimento de horário e atitudes que
assegurem a seriedade, o compromisso com o trabalho de
ensino e aprendizagem, com relação a alunos e
funcionários.
1
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Quando o gestor, com seu profissionalismo conquista


o respeito e admiração da maioria de seus funcionários e Informar e formar precisa estar entre os objetivos
alunos, há um clima de harmonia que predispõe a reali- explí- citos da escola; desenvolver as potencialidades físicas,
zação de um trabalho, onde, apesar das dificuldades, os cogni- tivas e afetivas dos alunos, e isso por meio da
professores terão prazer em ensinar e alunos prazer em aprendizagem dos conteúdos (conhecimentos, habilidades,
aprender. procedimentos, atitudes e valores), fará com que se tornem
cidadãos partici- pantes na sociedade em que vivem.
Uma escola voltada para o pleno desenvolvimento do
Função Social da Escola
educando valoriza a transmissão de conhecimento, mas
tam- bém enfatiza outros aspectos: as formas de
A escola é uma instituição social com objetivo explíci-
convivência entre as pessoas, o respeito às diferenças, a
to: o desenvolvimento das potencialidades físicas, cogniti-
cultura escolar. (Proges- tão 2001).
vas e afetivas dos alunos, por meio da aprendizagem dos
conteúdos (conhecimentos, habilidades, procedimentos, Ao ouvir depoimentos de alunos que afirmaram que a
maioria das aulas são totalmente sem atrativos,
atitudes, e valores) que, aliás, deve acontecer de maneira
professores chegam à sala cansados, desmotivados, não
contextualiazada desenvolvendo nos discentes a capaci-
há nada que os atraem a participarem, que os desafiem a
dade de tornarem-se cidadãos participativos na sociedade
querer aprender. É importante ressaltar a importância da
em que vivem.
unidade de propostas e objetivos entre os coordenadores e
Eis o grande desafio da escola, fazer do ambiente es-
o gestor, pois as duas par- tes falando a mesma linguagem
colar um meio que favoreça o aprendizado, onde a esco-
o resultado será muito posi- tivo que terá como fruto a
la deixe de ser apenas um ponto de encontro e passe a
elevação da qualidade de ensino.
ser, além disso, encontro com o saber com descobertas
de forma prazerosa e funcional, conforme Libâneo (2005) Contudo, partindo do pressuposto de que a escola
visa explicitamente à socialização do sujeito é necessário
devemos inferir, portanto, que a educação de qualidade é
que se adote uma prática docente lúdica, uma vez que ela
aquela mediante a qual a escola promove, para todos, o
precisa estar em sintonia com o mundo, a mídia que
domínio dos conhecimentos e o desenvolvimento de
oferece: infor- matização e dinamismo.
capa- cidades cognitivas e afetivas indispensáveis ao
atendimen- to de necessidades individuais e sociais dos Considerando a leitura, a pesquisa e o planejamento
fer- ramentas básicas para o desenvolvimento de um
alunos.
trabalho eficaz, e ainda fazendo uso do método dialético,
A escola deve oferecer situações que favoreçam o
o profes- sor valoriza as teses dos alunos, cultivando neles
aprendizado, onde haja sede em aprender e também
a autonomia e autoestima o que consequentemente os
razão, entendimento da importância desse aprendizado
fará ter interesse pelas aulas e o espaço escolar então
no futuro do aluno. Se ele compreender que, muito mais
deixará de ser apenas ponto de encontro para ser também
importante do que possuir bens materiais, é ter uma fonte
lugar de crescimento in- telectual e pessoal.
de segu- rança que garanta seu espaço no mercado
Para que a escola exerça sua função como local de
competitivo, ele buscará conhecer e aprender sempre
opor- tunidades, interação e encontro com o outro e o
mais.
saber, para que haja esse paralelo tão importante para o
Analisando os resultados da pesquisa de campo
sucesso do alu- no o bom desenvolvimento das
(ques- tionário) observamos que os jovens da turma
atribuições do coordenador pedagógico tem grande
analisada não possuem perspectivas definidas quanto à
relevância, pois a ele cabe organizar o tempo na escola
seriedade e im- portância dos estudos para suas vidas
para que os professores façam seus plane- jamentos e
profissional, emocio- nal, afetiva. A maioria não tem
ainda que atue como formador de fato; sugerindo,
hábito de leitura, frequenta pouquíssimo a biblioteca,
orientando, avaliando juntamente os pontos positivos e
outros nunca foram lá. A escola é na verdade um local
nega- tivos e nunca se esquecendo de reconhecer, elogiar,
onde se encontram, conversam e até namoram. Há ainda,
estimular o docente a ir em frente e querer sempre
a questão de a família estar raramente na escola, não
melhorar, ir além.
existe parceria entre a escola e família, co- munidade a
escola ainda tem dificuldades em promover ações que O fato de a escola ser um elemento de grande impor-
tância na formação das comunidades torna o desenvolvi-
tragam a família para ser aliadas e não rivais, a família por
mento das atribuições do gestor um componente crucial,
sua vez ainda não concebeu a ideia de que pre- cisa estar
é necessário que possua tendência crítico-social, com visão
incluída no processo de ensino e aprendizagem
de empreendimento, para que a escola esteja
independente de seu nível de escolaridade, de acordo
acompanhando as inovações, conciliando o conhecimento
com Libâneo (2005), “o grande desafio é o de incluir, nos
técnico à arte de dis- seminar ideias, de bons
pa- drões de vida digna, os milhões de indivíduos
relacionamentos interpessoais, sobre- tudo sendo ético e
excluídos e sem condições básicas para se constituírem
democrático. Os coordenadores por sua vez precisam
cidadãos parti- cipantes de uma sociedade em
assumir sua responsabilidade pela qualidade do ensino,
permanente mutação”.
atuando como formadores do corpo docente, promo-
Políticas que fortaleçam laços entre comunidade e es-
vendo momentos de trocas de experiências e reflexão sobre
cola é uma medida, um caminho que necessita ser
a prática pedagógica, o que trará bons resultados na
trilhado, para assim alcançar melhores resultados. O aluno
resolução de problemas cotidianos, e ainda fortalece a
é parte da escola, é sujeito que aprende que constrói seu
qualidade de en- sino, contribui para o resgate da
saber, que direciona seu projeto de vida, assim sendo a
autoestima do professor, pois o mesmo precisa se libertar
escola lida com pessoas, valores, tradições, crenças,
de práticas não funcionais, e para isso a contribuição do
opções e precisa estar preparada para enfrentar tudo isso.
coordenador será imprescindível, o que resultará no
crescimento intelectual dos alunos.
2
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

A FUNÇÃO DA EDUCAÇÃO
Conforme Cardoso (2003) os médicos passaram a de-
dicar-se ao estudo dos deficientes, nomenclatura adotada.
A função da Educação é possibilitar condições para a
Com esta institucionalização especializada dá se início o
atualização e uso pleno das potencialidades pessoais em
período de segregação, onde a política era separar, isolar
direção ao autoconhecimento e auto-realização pessoal.
e proteger a sociedade do convívio social, do contato com
A Educação não deve destruir o homem concreto e sim
estas pessoas anormais, inválidas, incapazes de exercer
apoiar-se neste ser concreto. Não deve ir contra o homem
qualquer atividade.
para formar o homem. A Educação deve realizar-se a
Espera-se que a escola tenha um papel complementar
partir da própria vida e experiência do educando, apoiar-
ao desempenhado pela família no processo de socializa-
se nas necessidades e interesses naturais, expectativas do
ção das crianças com necessidades educacionais especiais.
edu- cando, e contribuir para seu desenvolvimento
É uma tarefa difícil e delicada, que envolve boas doses de
pessoal. Os três princípios básicos da Educação liberalista:
atitudes pessoais e coletivas, caracterizadas principalmen-
liberdade, subjetividade, atividade.
te pelo diálogo, pela compreensão, pelo respeito às di-
ferenças e necessidades individuais, pelo compromisso e
Principais características das escolas inclusivas pela ação.
As escolas inclusivas, portanto, propõem a constitui-
Nesse texto, atenção especial é dada à teoria de Vy-
ção de um sistema educacional que considera as neces-
gotsky e suas implicações para o debate sobre inclusão
sidades de todos os alunos e que é estruturado em razão
nos campos da educação na escola e na sociedade. O
dessas necessidades. A inclusão gera uma mudança de
artigo fo- caliza também as relações que definem a
perspectiva educacional, pois não se limita a ajudar so-
política inclusiva e a complexidade que caracteriza este
mente os alunos que apresentam dificuldades na escola;
processo.
mas apoia a todos: professores, alunos e pessoal adminis-
Segundo a educadora Mantoan (2005) afirma que na
trativo para que obtenham sucesso na escola
escola inclusiva professores e alunos aprendem uma lição
convencional (MANTOAN, 1997).
que a vida dificilmente ensina: respeitar as diferenças.
Na inclusão, as escolas devem reconhecer e respon-
Res- salta ainda, que a inclusão é a nossa capacidade de
der às diversas necessidades de seus alunos, considerando
reco- nhecer o outro e ter o privilégio de conviver com
tanto os estilos como ritmos diferentes de aprendizagem
pessoas diferentes. Diferentemente do que muitos
e assegurando uma educação de qualidade a todos, por
possam pensar, inclusão é mais do que rampas e
meio de currículo apropriado, de modificações organiza-
banheiros adaptados.
cionais, de estratégias de ensino, de uso de recursos e de
Na perspectiva de Mantoan, um professor sem capa-
parcerias com a comunidade.
citação pode ensinar alunos com deficiência. O papel do
Os dois modelos de escola regular e especial podem
professor é ser regente de classe e não especialista em
ter características inclusivas e ser o melhor para determi-
de- ficiência, essa responsabilidade é da equipe de
nado aluno, o processo de avaliação é que vai identificar a
atendimen- to especializado, uma criança surda, por
melhor intervenção, o mais importante salientar que mui-
exemplo, aprende com especialista em libras e leitura
tos alunos têm passagens rápidas e eficientes pela escola
labial.
especial, o que acaba garantindo uma entrada tranquila
Questionam-se os valores e padrões pré-
e bem assessorada no ensino fundamental convencional,
estabelecidos, os critérios de avaliação e discriminação
evitando uma série de transtornos para o aluno, para os
que prejudicam o desenvolvimento e a aprendizagem das
pais e para a escola.
habilidades e a independência destas crianças.
Segundo Coll (1995) a igualdade educacional não
Neste sentido, observamos que Vygotsky, psicólogo
pode ser obtida quando se oferece o mesmo cardápio a
russo e estudioso do tema desenvolvimento e aprendiza-
todos os alunos; a integração escolar das crianças com
gem, ao falar sobre deficiências educacionalmente consi-
deficiências torna-se possível quando se oferece a cada
deradas como uma das necessidades educacionais espe-
aluno aquilo de que ele necessita.
ciais mostra a interação existente entre as características
biológicas e as relações sociais para o desenvolvimento da
Deficiência
pessoa. Segundo Vygotsky o conceito de Zona de Desen-
volvimento proximal, conhecida como ZDP, que é a
As crianças no século XV portadores de deficiência
distân- cia entre o desenvolvimento real e o potencial.
eram deformadas e atiradas nos esgotos de Roma na Ida-
Abordando mais especificamente as questões da edu-
de Média. Porém os portadores de deficiências eram abri-
cação inclusiva temos um histórico amplo de várias
gados nas igrejas e passaram a ganhar a função de bobo
signifi- cações no decorrer da história, que assinala
da corte. Segundo Martinho Lutero, as pessoas com defi-
registros de re- sistência à aceitação social dos portadores
ciências eram seres diabólicos que mereciam castigos para
de necessidades educativas especiais. Práticas executadas
serem purificados.
como abandono, afogamentos, sacrifícios eram comuns
até meados do sé- culo XVIII, quando o atendimento
passa das famílias e da igreja, para a ciência, passando das
instituições residenciais às classes especiais no século XX.

3
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

A partir do século XVI e XIX as pessoas com deficiên-


cias continuavam isoladas em asilos, conventos albergues, As mudanças da Inclusão a partir do século XXI
ou até mesmo em hospitais psiquiátricos como na Europa
que não passava de uma prisão sem qualquer tipo de No Brasil a parir do ano 2000 Segundo os dados do
trata- mento especializado. No entanto a partir do século Cen- so realizado pelo IBGE existem cerca de 25 milhões
XX, os portadores de deficiências começaram a ser de pes- soas portadoras de algum tipo de deficiência.
considerados cidadãos com direitos e deveres da Premida pela urgência de garantir o exercício pleno da
participação da socie- dade, mas com a Declaração cidadania a essa imensa população, a sociedade brasileira
Universal dos Direitos Huma- nos começaram a surgir os vai ganhando, pou- co a pouco, a sensibilidade requerida
movimentos organizadores por familiares com críticas à para tratar do tema, ainda que seja bastante longo o
discriminação, para a melhorias de vida para os mutilados caminho a percorrer.
na guerra em 1970 só então começa a mudar a visão da A Constituição de 1988 dedicou vários artigos às
sociedade nos anos 80, 90 onde passam a defender a pessoas com deficiência, de que é exemplo o artigo 7º,
inclusão. XXXI; artigo 23, II; artigo 24, XIV; artigo 37, VIII; artigo 203,
V; artigo 227, p. 2º e o artigo 244. Eles tratam de pontos
Segundo Silva (1987): anomalias físicas ou mentais,
de- formações congênitas, amputações traumáticas, tão variados como a proibição da discriminação no tocante
doenças graves e de consequências incapacitantes, sejam a salários e a admissão ao trabalho, saúde e assistência
elas de natureza transitória ou permanente, são tão pública, proteção e integra- ção social, o acesso a cargos e
antigas quanto à própria humanidade. empregos públicos, garantia de salário mínimo mensal à
pessoa com deficiência carente de recursos financeiros e a
Nas escolas de Anatomia da cidade de Alexandria, Se-
adaptação de logradouros, edifí- cios e veículos para
gundo a afirmação de Silva (1987) existiu no período de
transporte coletivo.
300 a. C, nela ficam registro da medicina egípcia utilizada
para o tratamento de males que afetavam os ossos e os O primeiro documento que merece menção é o decreto
olhos das pessoas adulas. Pois havia passagem histórica n. 3298, de 20 de dezembro de 1999. Ele regulamentou a Lei
sobre os cegos do Egito que faziam atividades artesanais. n. 7853, de 24 de outubro de 1989, que consolidou as
regras de proteção à pessoa portadora de deficiência.
Gugel (2008) expõe que na era primitiva, as pessoas
com deficiência não sobreviviam, devido ao ambiente Segundo a Secretária de Direitos Humanos da Presidência
des- favorável. Afinal, para seu sustento, o homem da República
primitivo ti- nha que caçar e colher frutos, além de - SDH/PR Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos
produzir vestuário com peles de animais. Com as da Pessoa com Deficiência - SNPD.
mudanças climáticas, os ho- mens começam a se agrupar Art. 17. O Poder Público promoverá a eliminação de
e juntos irem à busca de sus- tento e vestimenta. No bar- reiras na comunicação e estabelecerá mecanismos e
entanto, somente os mais fortes re- sistiam e segundo alternati- vas técnicas que tornem acessíveis os sistemas de
pesquisadores, era comum nesta época desfazerem de comunicação e sinalização às pessoas portadoras de
crianças com deficiência, pois representava um fardo para deficiência sensorial e com dificuldade de comunicação,
o grupo. para garantir-lhes o direito de acesso à informação, à
comunicação, ao trabalho, à educa- ção, ao transporte, à
Segundo Gugel (2008), no Egito Antigo, as múmias e
cultura, ao esporte e ao lazer.
os túmulos nos mostram que a pessoa com deficiência in-
teragia com toda sociedade. Já na Grécia, as deficiências Art. 18. O Poder Público programará a formação de
eram tratadas pelo termo “disformes.” Devido à pro- fissionais intérpretes de escrita em braile, linguagem
necessida- de de manter um exército forte, os gregos de sinais e de guias-intérpretes, para facilitar qualquer tipo
eliminavam as pessoas com deficiências. de comuni- cação direta à pessoa portadora de deficiência
sensorial e com dificuldade de comunicação.
As famosas múmias do Egito, que permitiam a conser-
vação dos corpos por muitos anos, possibilitaram o Art. 19. Os serviços de radiodifusão sonora e de sons e
estudo dos restos mortais de faraós e nobres do Egito que imagens adotarão plano de medidas técnicas com o
apre- sentavam distrofias e limitações físicas, como objetivo de permitir o uso da linguagem de sinais ou outra
Sipthah (séc. XIII a.C.) e Amon (séc. XI a.C.). subtitulação, para garantir o direito de acesso à informação
às pessoas por- tadoras de deficiência auditiva, na forma e
A construção da escola inclusiva exige mudanças
no prazo previsto em regulamento.
nessa cultura e nas suas consequentes práticas. Segundo
Perrenoud (2000) aponta alguns fatores que dificultam a Para se ter a dimensão do entendimento que a
construção de um coletivo, no contexto educacional, na socieda- de tem sobre o indivíduo deficiente precisamos
limitação histórica da autonomia política e alternativa do nos reportar ao passado, e localizar nas diferenças épocas,
profissional da educação. o retrato que se fixou, culturalmente, sobre a ideia das
diferenças individuais e que se converteu no atual modelo
O significado da inclusão escolar e que ela vem se de-
de atendimento a este sujeito nas várias instituições,
senvolvendo em todos os setores sociais, não somente na
principalmente no ensino regu- lar. (ROCHA, 2000).
escola, mas em todos âmbitos sociais:
- Educação como direito de todos; Gugel (2008) expõe que na era primitiva, as pessoas
- Igualdade de oportunidades; com deficiência não sobreviviam, devido ao ambiente
- Convívio social; desfavorá- vel. Afinal, para seu sustento, o homem
- Cidadania; primitivo tinha que caçar e colher frutos, além de produzir
- Valorização da Diversidade; vestuário com peles de animais. Com as mudanças
climáticas, os homens começam a se agrupar e juntos irem
- Transformação Social.
à busca de sustento e vestimenta. No entanto, somente os
mais fortes resistiam e segundo pes- quisadores, era
comum nesta época desfazerem de crianças com
deficiência, pois representava um fardo para o grupo.
4
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Segundo Gugel (2008), no Egito Antigo, as múmias e


os túmulos nos mostram que a pessoa com deficiência Como se vê atualmente, as dificuldades no ensino
interagia com toda sociedade. Já na Grécia, as deficiências aumen- tam, principalmente, caso a organização do
eram tratadas pelo termo “disformes” e devido à currículo escolar contraste com a realidade vivenciada pelo
necessidade de se manter um exército forte os gregos aluno, impossibili- tando-lhe de participar dela de forma
mais crítica.
eliminavam as pessoas com defi- ciências.
Relação entre o Currículo e a Construção do
Considerações Finais
Conheci- mento
Embora seja um dos elementos mais importantes, se
O Brasil é hoje uma referência mundial na reparação
não o mais importante da escola, o currículo ainda vem
de vítimas da hanseníase que foram segregadas do convívio
sendo en- carado como um elemento de pouca relevância,
social no passado. E aprovou em 2008 a Convenção da
no que diz respeito à prática educativa. A organização
ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, pela
curricular norteia a prática educativa do professor, e embora
primeira vez com força de preceito constitucional, fato que
não ofereça soluções prontas, deve priorizar a melhoria da
balizará toda a discus- são em torno de um possível
qualidade de ensino.
estatuto dos direitos da pessoa com deficiência.
Para Teixeira (1976, p. 58), a escola tem de se fazer
O termo deficiência para denominar pessoas com
prática e ativa, e não passiva e expositiva, formadora e não
deficiên- cia tem sido considerado por algumas ONGs e
formalista. Não será a instituição decorativa pretensamente
cientistas sociais inadequados, pois o termo leva consegue
destinada á ilustração dos seus alunos, mas a casa que
uma carga negativa depreciativa da pessoa, fato que foi ao
ensine a ganhar a vida e a participar inteligente e
longo dos anos se tor- nando cada vez mais rejeitado pelos
adequadamente da sociedade. O papel concebido à escola
especialistas da área e em especial pelos próprios indivíduos é muito diversificado e im- portante, pois este ambiente,
a quem se refira. Muitos, en- tretanto, consideram que essa além de atender às necessidades educacionais das crianças,
tendência politicamente correta tende a levar as pessoas deve garantir-lhes um lugar especial, oferecendo todas as
com deficiência a uma negação de sua própria situação e a condições necessárias ao seu aprendiza- do, além disso,
sociedade ao não respeito da diferença. pode também contribuir na formação de com- petências e
Atualmente, porém, esta palavra está voltando a ser habilidades consideradas essenciais para o desen-
uti- lizada, visto que a rejeição do termo, por si só, volvimento de sua criticidade.
caracteriza um preconceito de estigmatizarão contra a
A estrutura e organização do currículo é muito
condição do indivíduo revertida pelo uso de um eufemismo, importante para a aprendizagem da criança, uma vez que
o que pode ser observa- do em sites voltados aos possibilita a pro- moção de meios que facilitam o processo
“deficientes” é que o termo deficiente é utilizado de maneira de ensino, tendo em vista a reciprocidade e a integridade da
não pejorativa. mesma com relação às atividades envolvidas. O problema é
que na maioria das vezes os métodos e os conteúdos de
Referência: ensino são pensados fora do ambiente escolar.
NOQUELE, A.; SILVA, A. P. da. SILVA, R. Educação Para Traldy (1984), um bom currículo escolar, é aquele
Inclusiva e o Processo de Ensino-Aprendizagem. que se fundamenta numa concepção de educação que:
Pressupõe que o aluno seja sujeito de seu processo de
aprendizagem; privilegia principalmente o saber que deve
CURRÍCULO E O PLENO DESENVOLVIMENTO DO ser produzido, sem relegar a segundo plano o saber que o
EDUCANDO. aluno já possui; as ati- vidades de currículo e ensino não
são separadas da totalida- de social e visam à transformação
crítica e criativa do contexto escolar, e mais especificamente
de sua forma de se organizar; essa transformação ocorre
através do acirramento das contra- dições e da elaboração
Currículo de propostas de ação, tendo em vista a superação das
questões apresentadas pela prática pedagógica.
A escolha dos conteúdos deve partir da realidade
São vários os conceitos que se tem de currículo, concreta do aluno, considerando desde a essência dos
dentre eles, temos o referido por Traldi (1984, p. 25) de que dados ao contex- to em que está inserida a escola, dando
“currículo é um plano para a aprendizagem, em que tudo o mais ênfase à intera- ção professor-aluno, valorizando a
que se conheça sobre o processo da aprendizagem terá participação de ambos nas tomadas de decisões,
aplicação para a sua elaboração”, considerando o mesmo, promovendo a integração do conteúdo, selecionando-o
como um aspecto a ser reproduzido, modificado e conforme as necessidades das partes envolvi- das.
reconstruído no decorrer do tempo. O processo de Há, porém, que se levantar fatores definitivos na
compreensão do conceito de currículo, não pode ser dado constru- ção do currículo, tal como podemos observar nas
através de conceitos anteriormente formados, à medida que palavras de Moreira (1990, p. 49): No nível da teoria
no mundo ocorrem constantes transformações, a construção curricular, um interesse em controle é claro quando as
do conhecimento e do campo do currículo precisa ser tarefas curriculares correspon- dem à
repensada, sem desconsiderar o espaço e o tempo em que a) definição dos elementos ou variáveis relevantes
se inserem, tornando, assim, necessário criar novas envolvi- dos no currículo; e
perspectivas b) criação de um sistema de tomada de decisões para
para que se forme um próprio conceito. o planejamento curricular.

5
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Ao chegar à escola, a criança já traz de casa um con-


junto de habilidades e competências que precisam ser de- preender e verificar, que o currículo escolar é um elemen-
senvolvidas, e por sua vez, definidas pelo professor. Além to de suma importância no âmbito escolar e no planeja-
de promover o desenvolvimento dessas habilidades, o mento concreto das atividades elaboradas pelo professor/
professor precisa aprender a interagir, perguntar e fazer educador. Certamente, é o currículo escolar que permite
bons questionamentos, sendo flexível para mudanças me- uma melhor organização dos conteúdos e das atividades
todológicas que surgirem no decorrer de sua prática, em a serem trabalhadas pelo docente de forma ética e demo-
todas as áreas curriculares, fazendo com que o currículo crática. Desde então, deve-se haver o entendimento por
se torne mais próximo da identidade do aluno. De acordo parte daqueles que compõem a equipe escolar, que o cur-
com Moreira (1990, p. 54): “paralelamente às mudanças na rículo vai além da compreensão de disciplinas isoladas, de
vida social, a escola deveria transformar-se e organizar-se conteúdos, conhecimentos passivos e fragmentados. Não
cientificamente de modo a compensar os problemas da se pode negar, que os conhecimentos fragmentados estão
so- ciedade mais ampla e contribuir para o alcance de inseridos em muitas escolas da atualidade, onde muitas
justiça social”. ve- zes, escolas antidemocráticas buscam oferecer esse
saber manipulável aos seus discentes.
O aluno deve participar ativamente do processo de
ensino realizado pela escola, sendo entendido não apenas É importante repensar, a função socializadora que o
como objeto, mas como sujeito da prática de ensino. O currículo escolar deve exercer no âmbito educacional.
professor em consideração a individualidade de cada um, Ana- lisa-se contemporaneamente, que o currículo escolar
tendo em vista o contexto cada vez mais diversificado da não pode ser visto e nem compreendido, como, um
sala de aula, no qual cada aluno possui características dis- “acúmu- lo” de disciplinas isoladas, fragmentadas, com
tintas. conteúdos apresentados de modo tradicional, e
transmitidos sem re- flexão pelo professor/educador em
Outro aspecto básico que merece destaque na orga-
nização curricular é a forma de como se avalia a apren- sala de aula. Verifica-se, que o currículo escolar é histórico,
dizagem do aluno. A avaliação deve estar incorporada ao e vai além de conteúdos e disciplinas, sendo que o
currículo a partir do momento que se faz presente na sala currículo deve que ser elaborado de forma a oportunizar
de aula. São muitas as escolas que não permitem que haja condições de conhecimentos para os educandos, na busca
uma melhoria nos métodos de avaliação, permanecendo de abranger e atender as diversas realidades sociais
conservadoras, embora vivamos em constantes transfor- existentes, de maneira ampla, real, sig- nificativa, reflexiva,
mações. dinâmica, democrática, inclusiva, ética
Traldy (1984) acrescenta que em uma proposta de e moral.
educação transformadora e de currículo com um enfoque Discutir sobre o currículo escolar na contemporanei-
crítico, só se pode falar em um processo de avaliação que dade, é de fato, analisar profundamente o sistema edu-
seja compatível com essa concepção de educação e de cacional, como também, o que o ser humano produziu e
cur- rículo. contínua produzindo ao longo do tempo, tempo esse,
O processo de avaliação na sala de aula deve estar de cha- mado história. Portanto, é necessário buscar
acordo com as particularidades de cada sujeito presente compreender os conhecimentos elaborados e
em tal processo, respeitando as diferenças no currículo es- apropriados por todos os membros da sociedade, assim
colar, e, por sua vez, na sala de aula. Avaliar, não significa como, as diversas culturas existentes, ampliadas
dar todo o conteúdo até o final do ano e cobrar o que gradativamente ou até mesmo modi-
foi ensinado, por meio de inúmeras provas, que acabam ficadas de geração em geração.
se tornando quase o único instrumento, termômetro a O currículo é transformação, não apenas no que se re-
medir o que os alunos e alunas aprenderam (OLIVEIRA, fere a mudar o sentido, de ir por outro caminho, mas de
2003). A partir dessa reflexão teórica, percebemos o buscar novas alternativas, novas soluções, novas metas e
currículo, como um parâmetro que norteia a prática novas conquistas. O currículo consiste em transformar o
educativa, o qual preci- sa ser planejado de acordo com a impreciso em conhecido, e tal fato, envolve um ensino-
realidade de cada escola e dos sujeitos nela envolvidos, e -aprendizagem qualitativo.
atualizado devido às cons- tantes transformações sociais.1 O currículo nunca é simplesmente uma montagem
neutra de conhecimentos, que de alguma forma aparece
Currículo e processo de aprendizagem nos livros e nas salas de aula de um país. Sempre parte
de uma tradição seletiva, da seleção feita por alguém, as
Define-se o currículo, um conjunto benéfico de sabe-
res/conhecimentos, os quais devem ser analisados etica- visões que algum grupo tem do que seja o conhecimento
mente no contexto escolar, como também, a influência do legítimo. Ele é produzido pelos conflitos, tensões e com-
currículo na concretização de objetivos no ensino- promissos culturais, políticos e econômicos que
aprendi- zagem dos discentes. É necessário que a escola, organizam e desorganizam um povo. (APLLE, 2000, p. 53)
juntamen- te com os professores/educadores, pais e a O currículo representa a caminhada que o sujeito irá
comunidade escolar em geral, sejam capazes de refletir, fazer ao longo de sua vida escolar, tanto em relação aos
analisar, com- conteúdos apropriados, quanto ás atividades realizadas
sob a sistematização da escola. Nesse sentido, Sácristán e
1 Por Mayane Ferreira de Farias Gómez (1998, p. 125), afirmam que “a escolaridade é um
percurso para alunos/as, e o currículo é seu recheio, seu
conteúdo, o guia de seu progresso pela escolaridade”.

6
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

No contexto escolar, o currículo deve ter uma função


formativa, educativa, social e cultural. O currículo escolar, Observa-se, que o currículo escolar é um instrumen-
como prática de transformação da realidade e do to indispensável na organização do trabalho pedagógico
conheci- mento concreto, precisa ser debatido e refletido (formativo). Nota-se ainda, que não há uma compreensão
constante- mente, por todos aqueles que compõem a exata em relação ao currículo escolar, pois, quando
equipe escolar, onde, todos os profissionais da escola falamos em currículo em qualquer ambiente educacional,
devem estar prepa- rados para entenderem, que o ou, por exemplo, em uma reunião, muitas pessoas têm em
currículo é essencial na prá- xis pedagógica e na vida mente, que currículo significa a grade de disciplinas que
escolar, social e cultural de todos os alunos que chegam devem ser estudadas, isto é, os conteúdos a serem
até a escola em busca de conheci- mentos significativos. repassados aos discentes em sala de aula, mas, se
De acordo com Krug (2001, p. 56). analisarmos melhor a verdadeira função curricular,
O currículo surge, então, em uma dimensão ampla veremos que não é bem isso, há um equívoco nesse
que o entende em sua função socializadora e cultural, pensamento que, (o currículo é gra- de de disciplinas
bem como forma de apropriação da experiência social escolares), pois o currículo é o alicerce da escola, e não
acumu- lada e trabalhada a partir do conhecimento apenas conteúdos há serem ensinados, trans- mitidos e
formal que a escola escolhe, organiza e propõe como memorizados. No entanto, a escola como função social,
centro as ativida- des escolares. deve fornecer base necessária para o entendimento, para
Atualmente, verifica-se que ainda há professores/edu- a reflexão, para a apropriação do currículo de forma
cadores, que demostram compreender o currículo escolar, sensibilizada e adequada.2
como, uma área meramente técnica, passiva/ neutra. Se-
gundo Moreira e Silva (1994, p. 7), o currículo tem que O currículo e as tendências pedagógicas
pos- suir uma “tradição” crítica, pois: As Tendências nasceram da influencia da sociedade.
O currículo há muito tempo deixou de ser apenas uma Como é o caso da Tendência Tecnicista que começou por
área meramente técnica, voltada para questões relativas a influencia do golpe militar dos anos 60, como diz
procedimentos, técnicas, métodos. Já se pode falar agora Demerval Saviani.
em uma tradição crítica de currículo, guiada por questões (...) “As reformas do ensino preparadas pelo governo
sociológicas, políticas e epistemológicas. Embora mi- litar decorrente do golpe de 1964 começam a ser
questões relativas ao currículo continuem importantes, implanta- das em 1969 sob a égide da pedagogia
elas só ad- quirem sentido dentro de uma perspectiva tecnicista, que se tor- na a orientação oficial. Esta enfrenta,
que as conside- re em sua relação com questões que porém, a resistência de lideranças intelectuais expressivas
perguntem pelo “por que” das formas de organização do que passam a elaborar e difundir a crítica à pedagogia
conhecimento escolar. Na estruturação do currículo é oficiais fortemente inspiradas nas ideias constitutivas das
importante a apropria- teorias crítico-reprodutivistas”. (Saviani 2008, pag. 16)
da administração do tempo: da escola, no que diz respei- Essa Tendência foi e continua sendo a mais marcante
to ao cumprimento do ano letivo, do aluno, otimizando a historicamente, conforme o autor descreve acima ela foi
utilização de sua permanência no ambiente escolar; e do preparada pelo governo militar, para atender seus
professor, para o correto aproveitamento da carga horá- próprios interesses. Hoje essa Tendência é muito utilizada
ria de seu contrato de trabalho. Além disso, é necessário nos cur- sos preparatórios, também para atender os
distribuir, ao longo dos diferentes anos letivos – seja qual interesses des- sa sociedade capitalista. Mas disso
for a organização adotada na escola, em séries semestrais, falaremos a seguir.
anuais, por ciclos, etapas ou módulos – os conteúdos pro- Historicamente falando a Tendência Liberal
gramáticos, a planejada complexificação de atividades e a Tradicional foi à primeira tendência a aparecer, seu início
crescente autonomia dos alunos no desenvolvimento de se deu, jun- to com as primeiras instituições de ensino. No
tarefas, aquisição de habilidades e demonstração de com- Brasil ela surgiu, junto com a colonização, época em que
petências (BRASIL, 2006). os jesuítas catequizavam os índios, pois foi ali que tudo
As escolas, juntamente com os professores/educado- começou, a catequização dos índios foi nada mais, nada
res, precisam rever práticas pedagógicas e reverter alguns menos que impor a eles a educação dos burgueses, era o
modelos tradicionais de ensino e conteúdos baseados em papel da escola, preparar os alunos intelectualmente e
métodos de memorização, decoreba, alienação e sem re- moralmen- te, para tanto, os conteúdos de ensino eram
lação nenhuma com a vida dos discentes. Percebe-se, a basicamente conhecimento sobre valores sociais,
necessidade de adequar o currículo escolar á realidade acumulados ao longo dos anos pelos adultos, que eram
sócio-histórica dos educandos que chegam até a escola, passados de geração para geração.
na busca de valorizar as diferenças culturais e sociais de O método que o professor usava era de exposição
tais alunos. A adaptação curricular é essencial, sendo que ver- bal, e o aluno tinha que memorizar ao invés de
a mesma favorece a compreensão das diferenças no âm- aprender. O professor era a autoridade máxima dentro da
bito educacional, onde se analisa, que as escolas quando sala de aula e transmitia os conteúdos como se fosse
buscam adquirir tais adaptações curriculares, de fato, são verdade absoluta, o aluno por sua vez era obrigado a
escolas capazes de contemplar e respeitar a multiplicidade acatar tudo em silêncio.
de sujeitos que compõem ou não a sala de aula, de forma
democrática, inclusiva, ética e moral.
2 Por Rosane Machado de Oliveira
(www.nucleo- doconhecimento.com.br)

7
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Na tendência tradicional a avaliação era elaborada


O método de ensino na tendência liberal renovada
pelo professor com o objetivo único e exclusivo de
pro- gressivista traz a ideia do aprender fazendo,
classificar o aluno em bom ou ruim, pior do que isso,
valorizarem-se as tentativas experimentais, a pesquisa, a
classifica em “burro” ou inteligente. descoberta, o estudo do meio natural e social, o método
De acordo com Saviani (2009) a avaliação é considera- de solução de problemas. Se, muda o método de ensino,
da pelos pais e pelo sistema de ensino como meio de pro- muda-se também a rela-
moção, quando na verdade deveria ser de diagnóstico, a ção do professor com o aluno, que antes era de
avaliação deveria ser para verificar o que o aluno autoridade por parte do professor, agora passa a ser
conseguiu aprender, e para o professor poder melhorar auxiliar no desen- volvimento livre e espontâneo da
sua maneira de ensinar ou o seu modo de lidar com criança, a interferência do professor aqui só se da para
aquele aluno. moldar o raciocínio da criança, essa forma de
Ainda, Saviani (2009) relata que os professores utilizam relacionamento entre professor e aluno passa a dar valor
as provas como instrumentos de ameaça e tortura, dessa também às relações de respeito ao outro, que é
fundamental para se viver em sociedade.
forma pode-se notar que o modo tradicional ainda preva- Para essa tendência a aprendizagem depende da vontade
lece até os dias de hoje, ou seja, poucas mudanças aconte- do aluno. A passagem da tradicional para a renovada progres-

ceram na forma de avaliar, embora já tenham ocorrido al- sivista foi um marco para a história da educação, e o
gumas mudanças significativas, mas ainda há muito, o que começo de uma nova forma de ver e sentir a escola, pena
fazer para melhorar o sistema de avaliação escolar. que nem todos os profissionais da educação (gestores e
Toda
com essa pressão que o professor causa no aluno professores) adotam essa mudança.
relação à avaliação acaba influenciando o aluno, pois a
a Tendência liberal renovada não diretiva essa é até agora
mesma não vê a prova como avaliação do conhecimento mais radical de todas, fruto da inspiração do psicólogo
e sim como promoção, toda a atenção dele está voltada Carl Rogers, sua proposta é que a escola valorize o lado
para promoção. psicológi- co do aluno, que ela estabeleça um clima
Discutir as tendências pedagógicas tem uma impor- favorável para uma mudança dentro do individuo, ou seja,
tância na pratica de ensino, da maior relevância, pois aju- para a formação de atitudes, ao invés de ficar valorizando
da o professor a situar-se teoricamente sobre suas opções os livros e as aulas, ela da ênfase no “ser” humano (o
articulando-se e auto definindo se (Libâneo 1985). E clas- aluno).
sificar as tendências e prescreve-las funciona como um Os conteúdos de ensino nesta tendência se dão, nos
ins- trumento de análise para o professor avaliar a sua pro- cessos de desenvolvimento das relações e da
comunicação, a transmissão de conteúdo como era nas
prática na sua aula.
tendências anteriores se tornam secundários. Os alunos
Os nomes dessas tendências são: Liberal, que de
aqui é quem escolhem o que querem aprender.
liberal não tem nada, esses termos não tem o sentido de
A relação professor- aluno na pedagogia não diretiva
avan- çado, democrático, ou aberto como costuma ser não condiz com a verdade, aqui todos os professores
usado. Segundo Libâneo, essa doutrina apareceu para deverão ser psicólogos, pois a proposta de Carl Rogers é
justificar o sistema capitalista, de classes. que o professor seja um especialista em relações humanas
A tendência pedagógica “liberal” tradicional ainda “ausentar-se” e a melhor forma de respeito e aceitação
con- tinua nas escolas atualmente, sobre a permanência plena do aluno, essa tendência considera que toda
dessas pedagogias tradicionais nas nossas escolas intervenção é ameaçadora da aprendizagem (Libâneo
Libâneo diz: “Manifestações na pratica escolar a pedagogia 1985) radical não?
liberal tra- dicional é viva e atual em nossas escolas” Depois de passar pela proposta da tendência não
(Libâneo, 1985, pág. 67). diretiva, surge a tendência “liberal” tecnicista que é uma
E como tendências são mudanças que ocorrem de volta ao mo- delo tradicional, só que desta vez, não para
acordo com as exigências da sociedade, logo veio mais formar indivíduos modelos moralmente iguais mais sim
um modelo de educação. para formar indivíduos mecanicamente iguais, essa
A tendência “liberal” renovada progressista. Essa ten- tendência surge para formar mão de obra qualificada,
dência veio complementar a tendência tradicional, pois a papel que a escola teve que assumir na segunda metade
tradicional não assumia os problemas sociais, já a tendên- dos anos 50 e 60 durante o regime militar.
cia “liberal” renovada progressista tem como finalidade Nessa época não tinha preocupação com a moral,
através da escola adequar as necessidades individuais dos como era na Tradicional e nem com o psicológico, como na
não di- retiva, aqui o objetivo era adequar o sistema
alunos ao meio social.
educacional a orientação política do regime militar, para o
Ela propõe que a escola comece a ver o aluno como
sistema capitalista que surgia. Então os conteúdos de
“ser” que precisa interagir com meio para aprender, então
ensino eram sistematiza- dos, sobre os conteúdos de
para conseguir tal feitio, os conteúdos de ensino é esta- ensino Libâneo diz:
belecido, em função de experiências que o sujeito viven- (...) “Conteúdos de ensino – são as informações e
cia frente a desafios, cognitivos e situações problemáticas. princípios científicos, leis, etc., estabelecidos e ordenados
Há supervalorização dos processos mentais e habilidades numa sequência lógica e psicológica por um especialista. E
cognitivas, e deixa um pouco de lado, os conteúdos orga- a matéria de ensi- no era apenas o que é redutível ao
nizados. conhecimento observável e mensurável; os conteúdos
decorrem, assim, da ciência objeti- va, eliminando-se
qualquer sinal de subjetividade. O material instrucional
encontra-se sistematizado nos manuais nos livros didáticos,
nos módulos de ensino, nos dispositivos audiovisuais etc.”. ( Libâneo, 1985, pág. 61)

8
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Se os conteúdos de ensinos eram sistematizados, os


Já a tendência progressista Libertária – essa é talvez a,
métodos de ensino seguiriam então essa mesma linha, era
mais abrangente de todas, pois espera que a escola exer-
na verdade técnicas e procedimentos que assegurem a
ça uma transformação na personalidade do aluno, num
transmissão e recepção de informações, as respostas eram
sentido libertário e auto gestionário (Libâneo, 1985) toda
modeladas pelo professor para atender os objetivos ins-
transformação se darão por meio de assembleias, conse-
trucionais e conseguir um comportamento adequado pelo
lhos, eleições, reuniões, associações etc., para que o aluno
controle do ensino, daí a importância da tecnologia edu- se socialize fora e dentro da escola.
cacional. Ela acredita que a aprendizagem é fruto da interação,
A tendência liberal tecnicista é muito usada hoje nas por isso os conteúdos de ensino não são exigidos embo-
escolas técnicas, onde são oferecidos cursos técnicos a ra sejam colocados à disposição dos alunos, fala-se muito
cur- to prazo, para formação de profissionais. em autonomia dos alunos, esquecendo que para ser autô-
O relacionamento professor-aluno nessa tendência nomo é preciso ter maturidade e responsabilidade, talvez
é objetivo, com papéis definidos: O professor administra essa manifestação não funcione com o ensino
as condições de transmissão de matéria e o aluno recebe, fundamental I que é formado por crianças menores de 12
aprende e fixa. anos, por isso não foi inteiramente acatada pelos
O professor é apenas um elo de ligação, entre a ver- professores.
dade cientifica e o aluno. Essa tendência não se aplica ás Os professores costumam ver as tendências pedagó-
séries iniciais, sua proposta é profissionalizante. gicas como a última moda, mas parece não se preocupar
Depois de passar por mudanças na estrutura por in- muito com os resultados que elas podem deixar.
fluencia política, nasce mais um novo termo para designar A última manifestação pedagógica a acontecer até
as tendências, que é termo progressista esse termo parte agora, foi a progressista sócio-critica dos conteúdos que
para uma análise crítica, das realidades sociais, sustenta embora não tenha sido assumida como modelo total de
implicitamente as finalidades sociopolíticas da educação, educação, parece estar mais de acordo com as exigências
segundo Libâneo essa pedagogia não tem como institu- da sociedade atual, pois valoriza a escola como
cionalizar-se numa sociedade capitalista, para ele, ela é instrumen- to de apropriação do saber. Aqui a escola
apenas um instrumento de luta dos professores ao lado também é con- siderada, parte integrante das sociedades.
de outras praticas sociais. Pressupostos de aprendizagem dessa Tendência segundo
A pedagogia progressista assim como a liberal, tam- Libâneo são:
bém é um grande marco na história da educação, e se (...) “Por um esforço próprio, o aluno se reconhece nos
ma- nifesta em três tendências; são elas: Libertadora, conteúdos e modelos sociais apresentados pelo professor;
Libertaria e Sócio- crítica dos conteúdos. Essas assim pode ampliar sua própria experiência. O grau de en-
manifestações vêm lutar por uma escola sem volvimento na aprendizagem depende tanto da prontidão e
autoritarismo, ela vem romper com o conceito de disposição do aluno, quanto do professor e do contexto de
educação proposto pela tendência tra- dicional. sala de aula.” (Libâneo 1985, pag. 72).
Nessa fala do autor observa-se que a Tendência só-
Um exemplo disso é a progressista libertadora que cio critica dos conteúdos tem como objetivo transformar
tem buscado valorizar o ensino de forma geral, essa o papel da escola a partir das condições existentes
tendência dá valor ao contexto social do aluno, onde o passadas através de conteúdos culturais e universais, ela
mais impor- tante é que o professor trabalhe com o aluno admiti os conhecimentos autônomo construído pela
aquilo que condiz com cotidiano dele. Divulgada e humanidade, mas que não se trata de um conhecimento
inspirada pelo bra- sileiro Paulo Freire, essa tendência vem artificial.
caindo no gosto dos professores, que tentam coloca-la O que essa tendência quer representar não são pos-
em prática. turas antidemocráticas, nem autoritarismo, e muito menos
Mas, embora muito se tenha feito com relação às submissão, ela quer garantir aos alunos a aquisição de
ideias pedagógicas para que aconteçam mudanças, nada con- teúdos e análise de modelos sociais, que vão lhes
se tem feito pelo sistema de avaliação escolar que parece fornecer instrumentos para lutar por seus direito.
ter fica- do esquecido lá na tendência tradicional, Luckesi Enfim, as tendências pedagógicas se manifestam con-
fez essa crítica em seu livro sobre a avalição escolar: forme mudanças que ocorrem na sociedade apesar des-
(...) “A atual prática de avaliação estipulou como sas manifestações terem recebido nomes como Liberal,
função do ato de avaliar a classificação e não o Libertaria e Libertadora, por seus ideadores recebe. Alguns
diagnóstico, como deveria ser constitutivamente. Ou seja, profissionais, mais precisamente, os professores tentam
colocar em prática a última tendência surgida, porem não
seja o julgamento de valor, sobre o objeto avaliado, passa a
conseguem, porque tem dificuldades de, se desprender
ter a função estática de classificar um objeto ou um ser
do modelo tradicional. O que se vê atualmente no
humano num padrão de- finitivamente determinado”.
cotidiano escolar, embora ninguém assuma, é que a
(Luckesi, 2009, pag. 34)
Tendência Pe- dagógica Tradicional ainda predomina em
É evidente que nos dias de hoje a função da avaliação
grande porcen- tagem.3
seja classificar, pois essa visão crítica do autor sobre o sis-
tema de avaliação nada mais é que um grito por
mudanças na forma de avaliação do sistema de educação.
3 Por Ironete Alves

9
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Pleno desenvolvimento do educando Enquanto a lógica burocrática define e impõe proce-


dimentos de trabalho em vista dos objetivos fixados, a ló-
Os estabelecimentos escolares constituem formas gica profissional limita o trabalho prescrito em função da
organi- zacionais que sobrevivem a muitas mudanças em
complexidade de situações singulares. A lógica
sua missão, seu meio, seus recursos e, na renovação
profissional na escola permaneceu por muito tempo
permanente dos alu- nos, dos professores e dirigentes.
limitada ao rela- cionamento professores/alunos. Os
Quando a busca de estabili- dade passa a ser a lógica de
professores inventam, menos do que pensam, seus gestos
uma organização, suas caracterís- ticas positivas têm um
profissionais, muito mais se apropriam da trama fornecida
custo elevado em rigidez, protecionis- mo territorial e
pela cultura profis- sional e pela organização escolar. O
medo da desordem.
impacto de tais fatores é diferente segundo o grau
Os trabalhos sobre inovação mostram que a escolar: na escola de ensino fundamental, os docentes
organização burocrática e hierárquica do trabalho, não é o
desempenham um papel impor- tante, ao passo que a
único freio a mudança. Nenhuma organização é tributária
partir do ensino médio a ideologia própria de cada
de uma só lógica, e a escola se situa na confluência da
disciplina dita as regras de funcionamento. A lógica
lógica burocrática e da lógica profissional.
profissional representa a via menos explícita e for-
Existem organizações do trabalho mais abertas que malizada da mudança, é um lento processo de adaptação
outras à mudança? Como conseguem encontrar um meio
durante o qual as novas práticas se instauram conforme as
termo en- tre a necessidade de abertura e a tendência
necessidades. As novas políticas educacionais levam a
natural dos atores em querer preservar equilíbrios estáveis?
uma ampliação da lógica profissional, quando os
Há lógicas organiza- cionais que favorecem a mudança, não
professores são convidados a participar mais em todo o
como resposta a uma situação excepcional, nem porque
processo de inovação.
seriam mais permeáveis do que outras às injunções das
autoridades, mas por integrarem-
Entretanto, há o risco de, através da maior autonomia,
-na sem crise e sem pressa?
se reforçar o isolamento e o individualismo dos diversos
Os novos paradigmas organizacionais convidam a atores envolvidos no processo de inovação. Uma lógica
ultra- passar o pensamento científico clássico. À visão de
profissional não harmonizada com um bom nível técnico
um univer- so como um mecanismo de relojoaria opõe-se
leva os atores a confiarem mais em suas experiências pes-
àquela de um sistema vivo, instável e imprevisível, mais
soais do que nas informações que derivam da pesquisa
aberto e criador. Vis- tos sob esse ângulo, os processos de
em educação. Alguns sistemas percebem os laços dos
mudança correspondem, inversamente, a uma dinâmica
novos princípios da gestão pública e os integram em seu
instável, expressão de uma multiplicidade de forças em
discurso oficial, nem por isso passando ao ato no plano
interação que ora convergem, ora se defrontam. Essa
das práticas. Em alguns sistemas, essa orientação torna-se
imagem está mais próxima da realidade do que os modelos
progressiva- mente da ordem do possível. A organização
clássicos. Este primeiro capítulo tenta descre- ver tal
profissional valoriza o funcionamento colegial e
evolução, confrontará lógica burocrática e lógica profis-
participativo, os pro- cessos de decisão são pesados,
sional, apresentará os novos princípios organizadores.
lentos e ineficientes só o que se busca é um amplo
consenso. Daí o número limitado de decisões inovadoras.
A lógica burocrática constrói a organização do Em nome da colegiatura os atores estabelecem a lógica
trabalho sobre uma regulamentação bastante estrita dos da confiança.
papéis e das funções a serem preenchidas. O organograma
Priva-se então de um motor essencial da mudança: a
estabelece rela- ções de autoridade e cadeias hierárquicas
análise lúcida dos funcionamentos, dos êxitos e fracassos
explícitas, os mem- bros da organização sabem quem
de uns e de outros. A lógica profissional aplica-se para
concebe e quem executa. A ideia do estabelecimento
apa- gar as hierarquias. É mais agradável confessar que
escolar como estrutura local-padrão, é uma resposta
todos são pares, graças a esse igualitarismo, o clima de
burocrática à questão da educação escolar; em um sistema
trabalho é mais agradável, mas é possível haver inovação
unificado apenas variam o tamanho e, o modo de direção
na negação da heterogeneidade das competências e na
dos estabelecimentos. A lógica burocrática é interio- rizada
recusa de re- conhecer uma liderança? Uma organização
pelos atores, eles percebem seu papel e seu estatuto, sua
dominada pela lógica profissional é tão conservadora
zona de autonomia, a divisão do trabalho, as relações de
quanto o conjunto de seus membros.
poder, a gestão dos processos da mudança, os
As duas lógicas estruturam o sistema escolar e as es-
mecanismos de controle, os atores não imaginam poder
colas. Elas influenciam tanto com a ordem quanto com a
funcionar de outro modo. Os conteúdos das lições são
complexidade e garantem a estabilidade. Ao reunir as
definidos, não de acordo com as necessidades dos alunos,
duas lógicas organizacionais, a escola dotou-se de um
mas em função de um nú- mero global de horas
funcio- namento irreversível que a encerra em um círculo
disponíveis. Tais parâmetros gestioná- rios representam
vicioso difícil de romper.
uma matriz organizacional que condiciona a vida escolar,
Este círculo vicioso leva tanto as autoridades escolares
reduz fortemente o desenvolvimento das com- petências
quanto os diversos atores a uma estranha dança que só
correspondentes, que se incumbem da elaboração e da
pode resultar no fechamento e no contrassenso.
introdução dos novos programas. Esse modelo permitiu
É preciso, voltar-se para uma lógica mais flexível e
ajustar as modalidades de gestão e controle das escolas,
adaptativa, capaz de ultrapassar o saber prático, tácito e
as- segurando uma certa coerência e uma igualdade
ar- tesanal de cada um, que é da ordem da consciência
formal de tratamento. Ele somente provocará mudanças
prática.
das práticas se a prescrição for traduzida de forma clara, for
imposta de cima, for compatível com as práticas já em vigor,
etc.
10
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Atualmente, concebemos o excesso das lógicas orga-


nizacionais existentes como uma evolução incerta e local. A gestão por redes oferece um meio não apenas de
Os atores devem inventar novas formas de organização assegurar a informação e o confronto entre os diversos
sem poder referirem-se a um modelo claramente grupos de atores, mas, de permitir-lhes uma compreensão
estabelecido. É preciso considerar estruturas flexíveis onde sistêmica das dinâmicas implicadas; o sentido é construído
tudo se atenue e se adapte à evolução, cada um toma por intermédio desta compreensão, ao sabor das contro-
iniciativas que permitem garantir a qualidade. Tanto a vérsias empreendidas e das experiências feitas por uns e
coordenação e a codificação es- trita das atividades quanto outros.
o isolamento e o “consenso frou- xo” deixam o campo livre Isso pode permitir que se veja mais longe e que se
a uma lógica de arranjo, que permite a realização de conscientize que, outros colegas, trabalhando em outras
acordos locais não previstos. Existe, pois, uma relação entre escolas, encontram problemas semelhantes, mas os perce-
a organização do trabalho e a mudança. Quanto mais a bem e resolvem de maneiras distintas, o que pode gerar
escola esteja submetida a injunções de inovação, me- nos novas idéias.
ela poderá regulamentar sua atividade. Nenhuma pessoa ou instituição é completamente au-
tônoma, é importante, particularizar com muita clareza o
Os atores do sistema escolar tentam satisfazer duas terreno de autonomia buscado pelas escolas. Diante da
ne- cessidades: estabilidade e mudança. A mudança os grande diversidade das realidades e das necessidades do
levará a valorizar a flexibilidade e a negociação, não campo, a atitude predominante consiste em não mais in-
poderão, entre- tanto, renunciar a um mínimo de vestir energia para produzir uma aparência de
estabilidade. Todo sistema escolar à procura de homogenei- dade, ao contrário, aceitar que possam existir
estabilidade proporcionar-se á uma or- ganização de modalidades organizacionais diferentes dentro de um
trabalho que lhe permita limitar os riscos. Nossa experiência quadro comum aceito pelos parceiros. As escolas
mostra que a mudança se desenvolve nos espaços ainda assumem a responsabili- dade de desenvolver os
não programados, a partir de novas combinações entre os dispositivos de ensino-aprendiza- gem apropriados em
diferentes recursos existentes, em um contexto que reco- função das necessidades locais. Tra- ta-se, da vontade
nhece a divergência da maneira de pensar e fazer. Essas explícita de uma flexibilização em favor de uma maior
com- binações organizam-se a partir da intuição, do liberdade de ação e decisão concedida aos indivíduos
engajamento e da “ousadia”, dos atores do sistema escolar. e/ou escolas. Alguns esperam que a descentra- lização
A maneira pela qual eles construirão o - sentido da leve os atores a resolverem os problemas com mais
mudança – depende da flexibilidade organizacional que criatividade e responsabilidade, assim como a desenvol-
lhes permitirá ou impedirá de integrar os novos conceitos. verem soluções menos caras. Imaginam que a diversidade
Transposto ao sistema escolar e à escola, isso leva a um de soluções introduzirá uma certa competição e, aumen-
modelo de organização do trabalho que fica menos tará a busca de qualidade nas escolas. Outros temem que
burocrático e mais centrado nos funcionamentos informais. a competição acarrete consequências nefastas, em função
As regras de organização são definidas em função da de egoísmos e disputas de poder.
natureza das questões a resolver, a destinação de tarefas é
variável e modulável conforme a quantidade e a natureza A escola é um lugar de exercício do poder,
dos problemas, a capacidade e a vontade dos atores de estruturado pelas estratégias de atores e seus jogos de
mobiliza- rem-se para um projeto. Isso também significa poder. Dessas relações de poder depende, a autonomia
que as escolas variarão no plano de seu nível de da qual cada um dispõe. As relações de poder nunca se
desempenho, enquanto se adaptarem a seu meio e estabilizam, qual- quer novo acontecimento pode
explorarem novas vias para melhorar seu processo ameaçar os equilíbrios es- tabelecidos.
pedagógico. A inovação é sempre suspeita de provocar uma
ruptura nesta relação de poder pré-existente. Portanto a
Tais configurações são novas, algumas equipes de questão de saber quem se beneficia com a mu dança é
pro- fessores tentam, há anos, romper com a forma sempre per- tinente.
escolar tradi- cional, tais tentativas isoladas estiveram, na As relações sociais são arranjos que permitem viver
maioria das vezes, destinadas ao fracasso, pois em paz relativa com os outros, a mudança pode ameaçar
permaneceram confinadas em um espaço muito limitado esse arranjo, dividindo grupos, marginalizando
de flexibilidade para “irem ao fim de sua lógica”. Por professores, etc. A inovação modifica os dados do
conseguinte, é lícito esperar que os esta- belecimentos problema e os arranjos que permitam o modus vivendi,
escolares que se voltam para esse tipo de nova que deve às vezes ser re- construído integralmente. É
configuração desenvolvam uma série de características nesse sentido que os proble- mas produzidos devem levar
que modifica favoravelmente a construção do sentido de os atores a se empenharem na busca constante de
mudan- ça. coerência, é uma questão de justiça e de justeza. A
Quando as escolas funcionam de acordo com uma ló- construção do sentido de mudança é forte- mente
gica flexível, os professores são levados a desenvolver influenciada por esse mecanismo.
uma série de competências que lhes permitem Diante dos problemas de poder, de princípios de justi-
transformar a pe- dagogia. Em termos de organização do ça e de território, a inovação leva os atores a
trabalho, significa que os professores se libertem das empenharem-
coações internas, que eles se concedem o direito de se -se na negociação e no regateio, a fim de construir novos
organizarem de outro modo. Uma organização flexível acordos e convenções.
introduz uma visão diferente da divisão do trabalho, as
tarefas são analisadas e designadas de modo flexível, e não
de acordo com regras e prerrogativas estabele- cidas pela
tradição.
11
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Autonomia parcial significa: projeto coletivo original,


explícito e negociado entre os parceiros no âmbito de um Não se trata de distribuir boas ou más notas, nem de
conjunto de direitos e obrigações, relativamente ao ceder à última moda, mas sim a construção de um sistema
Estado e suas leis. A autonomia das escolas deve ser escolar que permita a reflexão permanente sobre a
concedida com um equilíbrio entre regulamentos eficácia das práticas, este é o objetivo principal de uma
centralizadores e iniciativas locais. avaliação externa.
O sistema limita-se a prescrever os eixos de O sistema educativo só confiará na autoavaliação dos
orientação e os regulamentos, e pede às escolas para professores, se a sua lucidez estiver acima de qualquer
explicarem como trabalham nos campos que acabam de sus- peita, tendo sido feita com total profissionalismo.
ser evocados, se es- tabelece um sistema de A mudança bem-sucedida não é consequência da
acompanhamento e de avaliação externo que permite sim- ples substituição de um modelo de gestão antigo por
controlar a qualidade e a coerência da aplicação nos um novo. Trata-se sim do resultado de um processo de
diversos estabelecimentos. cons- trução coletiva que tem sentido quando os atores
A autonomia parcial levará, professores e diretores de se mo- bilizam, conseguem ultrapassar os jogos
escolas, a afinarem os meios de autorregulação para estratégicos e as relações de poder habituais para criarem
alcan- çar os objetivos fixados, não só para eles mesmos e desenvolverem novos recursos e capacidades que
como também para prestarem contas a seus parceiros permitirão ao sistema guiar-se ou tornar a se orientar
externo. como um conjunto humano e não como uma máquina.
Após a primeira fase de concepção e de elaboração
do projeto, o exame da realidade obriga, a redimensionar
A cooperação profissional
as exigências de uns e outros, o que exigirá negociações
para clarificarem as representações, e as novas
A cooperação profissional não corresponde ao funcio-
responsabilida- des que estas acarretam.
Uma gestão que conceda mais autonomia às escolas namento da maior parte dos professores e dos estabeleci-
faz emergir um novo problema: como se vai, como se mentos escolares, o individualismo permanece no âmago
pode administrar a diversidade? Tais questões, tornam-se da identidade profissional.
cen- trais quando a ação de projeto confronta os diversos Entretanto, na maioria das escolas, já se verificam mu-
par- ceiros com o indispensável controle de qualidade. danças. Na busca de dispositivos de ensino – aprendiza-
gem, os professores trabalham mais em equipe, por outro
No contexto de uma organização do trabalho, a lado a maioria dos sistemas educacionais aplica-se em re-
avalia- ção baseia-se na maneira como os atores formas que incitam uma maior cooperação entre os pro-
obedecem às re- gras. Um dos grandes equívocos que fessores.
espreitam as escolas consiste em crer que a autonomia O modo de cooperação profissional inscrito na cultura
concedida lhes permitirá fugir de toda obrigação de de um estabelecimento escolar influencia na maneira
prestar contas, no entanto, mais autonomia implica como os professores reagem em face de uma mudança.
também em mais responsabilidade e transparência. Para Os mo- dos de cooperação profissional seguem algumas
que o sistema escolar permaneça ad- ministrável ele é tendên- cias mais ou menos comuns, a saber:
levado a estabelecer anteparos capazes de garantir a Individualismo – oferece aos professores uma esfera
coerência da ação pedagógica, visando a: defi- nir a quase “privada” contra os julgamentos e as intervenções
qualidade dos serviços realizados; observar e avaliar os externas. O professor operando sozinho introduz mudan-
processos e condições básicas que determinam esses ças eficazes em suas classes.
serviços realizados; colocar o resultado desse processo de
Balcanização: em algumas escolas os professores têm
avaliação a serviço dos desenvolvimentos ulteriores.
a tendência de associarem-se, mais, a determinados
colegas criando grupos, cada grupo defende suas
A avaliação interna começa com um diagnóstico em-
preendido, pelos professores e a direção da escola, a posições em de- trimento das idéias de outros, o
forma mais simples consiste em conduzir uma análise do consenso é praticamente impossível.
funcio- namento do estabelecimento escolar, consegue-se Grande família: um modo dentro do qual os membros
assim recolher um conjunto de dados que permitirão do corpo docente chegam a uma forma de coexistência
compreen- der melhor como a escola reage em face da pa- cífica, que garante o respeito e o reconhecimento do
mudança, an- tecipar problemas, compilar as estratégias outro, conquanto que cada qual se submeta a um
de resolução, definir prioridades e os critérios de êxito determinado conjunto de regras explícitas ou implícitas.
para avaliar a efi- cácia dos procedimentos, prestando
contas de seu funcio- namento, uma equipe de Colegiatura forçada: este modo de relacionamento
professores, se conscientiza de suas forças e fraquezas. ocorre onde a direção impõe procedimentos, cuja finalida-
Esse passo não é fácil. Exige uma capacidade de de é levar os professores a concederem mais tempo e
descentração e vontade de mudança que não prosperam aten- ção à planificação e a execução de uma inovação,
por si. Eis porque a avaliação interna só é realizável tende a provocar desconfiança e estratégias defensivas.
quando é acompanhada pelo desenvolvimento de um
clima de confiança dentro da escola sua construção deve
preceder o estabelecimento de uma avaliação interna. A
avaliação interna constitui uma condição básica da trans-
parência e da avaliação externa.

12
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Cooperação profissional: pode ser conceituada como


um certo número de atitudes que devem ser construídas a jeto de estabelecimento escolar, aumentando a oportunidade
fim de criar: o hábito da ajuda e do apoio mútuo; um de uma aplicação das reformas. Essa visão da mudança
capital de confiança e franqueza mútuas; a participação de dos sistemas escolares oferece uma perspectiva dinâmica.
cada um nas decisões coletivas. Essas atitudes representam Nessa perspectiva, o desenvolvimento escolar é percebido
uma clara evolução em relação aos funcionamentos mais como um processo que permite às escolas assimilarem as
individualistas. Convém lembrar que a cooperação mudanças ex- teriores a seus próprios objetivos.
profissional só se torna possível pela vontade obstinada de Nos interrogaremos, aqui, mais sobre o
voltar o essencial do pro- cesso para a perseguição de um estabelecimento escolar em projeto, do que sobre o
objetivo comum que vise à ampliação das competências “projeto de estabelecimen- to escolar” desenvolvido por
individuais e coletivas que garan- tam o bom resultado dos administrações centrais que de tanto normatizarem a ação
alunos. de projeto correm o risco de esva- ziá-la de seu sentido.
A realidade da escola é feita de urgências, e muitas
deci- sões são tomadas na incerteza. Diante de tal
A relação com a mudança na cultura do estabeleci-
mento escolar realidade, uma parte dos atores investe em um processo de
projeto para lutar contra a desmotivação e a avareza
mental, fixando-se metas coletivas. Muitos sistemas
Cada escola tem sua própria atmosfera, como reflexo
de cultura, exerce uma forte influência sobre aqueles que escolares incentivam os estabeleci- mentos a colocarem o
ali tra- balham. A cultura de uma escola é construída pelos seu projeto por escrito, os estabeleci- mentos veem-se,
atores, mesmo que essa construção permaneça, em grande assim, levados a explicitar o que, habitual- mente,
parte, in- consciente. Ela é a soma das soluções que permanece implícito. Mas, afinal, o que é exatamente um
funcionaram bem para acabarem prosperando e serem processo de projeto? O projeto é a imagem de uma situa-
transmitidas aos recém- ção, de um estado pensado que se tem a intenção de
alcançar. Nas sociedades modernas, a ideia de projeto
-chegados. A mudança é uma categoria básica do
pensamen- to, até os professores mais conservadores tornou-se inse- parável de nossa visão da ação e do
formam projetos de mudança. A maneira como cada um sentido da ação seja ela individual ou coletiva.
pensa a mudança, funda-se em uma história pessoal e na As novas modalidades de gestão transformam
integração a diversos grupamentos sociais, a cultura necessida- de em virtude; já que não se pode impedir os
inerente a cada escola contribui também para influenciar indivíduos e os grupos de terem uma identidade, um
cada um, ela é um código comum, que permite ficar no projeto e estratégias é melhor reconhecê-lo e integrar,
mesmo comprimento de onda quando sobrevém uma transformando-o em vanta- gem gestionária, propiciando
reforma. maior controle. Essa abordagem constitui os membros de
um mesmo estabelecimento escolar como ator coletivo, o
De acordo com a situação do estabelecimento escolar
e de suas culturas, pode-se prever que algumas reformas que os obriga a se colocarem em busca de um projeto
esta- riam destinadas ao fracasso antes mesmo de terem comum. Quem pensa são indivíduos que con- verterão o
começado, a cultura local determinará as necessidades processo de projeto em ilusão ou ferramenta para a ação.
sentidas, a maneira como os professores irão julgar o valor Sobre essa base, parece-nos possível apostar no proces- so
da mudança, interagir, tentar e confrontar suas de projeto na escala dos estabelecimentos escolares, visto
experiências. A cultura não tem che- fe, mas os dirigentes e que ele contribui para a construção cooperativa da mudança.
os professores que exercem liderança podem modificá-la O projeto educativo corresponde ao projeto visada sim-
progressivamente. Frente a uma inovação prescrita pelo bólica, como orientação global. Se ele existe e os
sistema, a cultura da escola sugere prioridades que professores a
ele aderem, embasa o projeto de estabelecimento.
influenciam a interpretação do programa.
Quanto à eficácia, é objeto de diferentes percepções, O projeto de estabelecimento escolar está mais
uma vez que, nem todos têm a mesma ideia do que torna a próximo de um programa de ação que envolve o ator
escola eficaz. coletivo, cons- tituído pelos professores que trabalham
A evolução da cultura depende da maneira como o naquele estabeleci- mento escolar e que, se tornou pessoa
corpo docente consegue manter uma reflexão e moral. É importante que a maioria dos professores se
comunicação em torno dos problemas profissionais. Cria-se associe a um projeto de esta- belecimento escolar para que
uma dinâmica pela qual os atores conciliam seus objetivos, ele seja digno desse nome.
negociando em rela- ção aos objetivos visados, construindo A preocupação de clarificar o projeto educativo
o sentido da mudança. comum leva uma comunidade pedagógica a indagar-se
sobre sua identidade. Isso leva a enunciar valores que vão
inspirar a ação. Um projeto educativo ao qual os
Um estabelecimento escolar em projeto
professores aderem convocará, uma mudança organizada
que chamaremos aqui de projeto de estabelecimento
As escolas que produzem efeitos notáveis sobre as
escolar como progra- ma de ação, cujas componentes
apren- dizagens dos alunos se apoiam nas mudanças que
definiremos do seguinte modo: uma fixação na história
o sistema educativo introduz, aproveitam-se das reformas
da organização e seu meio; um objetivo ambicioso a
do sistema educativo, a não ser que as orientações de fora
médio e longo prazo; um código de valores; cenários
estejam em forte contradição com sua cultura. Tal atitude
para realizar o objetivo principal; um plano a médio
supõe que as escolas desenvolvam as competências e
prazo e um plano de ação; dimensões eco- nômicas,
posturas necessárias para definirem seus objetivos e
sociais, culturais e pedagógicas; uma intenção de
construírem um projeto co- mum. A existência de um
comunicar-se e de avaliar; uma vontade explícita de
projeto local poderia constituir um fator favorável às
capita-
reformas de conjunto, substituídas pelo pro-
lizar e teorizar a experiência.
13
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Um projeto de estabelecimento pode fixar-se em um


pro- jeto educativo explícito ou implícito. A ação inovadora Estando a cultura de cooperação e a do projeto de-
corre o risco de esvaziar-se de seu sentido se o projeto não sabrochando, grande parte dos projetos nasce na mente
se trans- formar em um processo. O processo de projeto de algumas pessoas conquistadas pela ideia, é verdadeiro
não é um fim em si, mas, um dos componentes do para os projetos “espontâneos” e também para os
estabelecimento escolar que contribui para tornar os projetos “solicitados” pelas autoridades escolares. Em
professores atores da construção do sentido da mudança. ambos os ca- sos, a questão é saber como passar da
O projeto de estabelecimento escolar é levado a iniciativa de alguns a um consenso tão amplo quanto
funcio- nar com três dimensões: capacidade individual e possível sobre o princípio, o conteúdo, e as orientações de
coletiva de se projetar (lançar) em um futuro incerto, um projeto de estabele- cimento escolar. Durante o
identidade dos sig- natários do projeto representação período em que a maioria vai aderindo a um “projeto de
coletiva, já que se trata de um processo de exploração projeto”, manifestam-se oposi- ções, agravos, tomadas de
cooperativa. Quando o projeto de estabelecimento escolar poder, alianças e clivagens sem grande relação com o
leva em conta essas três dimensões, ele passa a ser uma conteúdo. Procurar obter a adesão entusiasta de 99% dos
ferramenta de mudança, de aprendizagem organizacional. professores da escola condenaria, qualquer projeto a ser
Evocamos várias vezes a importância decisiva da rapidamente abandonado, em geral dá-se a partida com
coerência interna entre valores e ações, quando é o caso, é uma minoria ativa. Quais os fatores que determinam a
visível, para os alunos, que seus professores perseguem os adesão?
mesmos objeti- vos e os acompanham em um percurso de A adesão só ocorrerá se os interlocutores puderem
aprendizagem cuja meta é partilhada por todos. Não se en- trever a manutenção de suas experiências ou a
deve confundir projeto com plano de ação, um projeto abertura de demais caminhos de acesso a vantagens
deve evitar a definição de um plano de estudos demasiado simbólicas ou materiais é durante esta delicada passagem,
estreito e rígido, deve permitir ajustes tanto nas estruturas da concepção por uma minoria à adesão coletiva, que se
quanto nas práticas. O importante é que subsista um executa uma das etapas decisivas do projeto. Administrar
quadro estável, que protegerá da dispersão e de um essa etapa com atenção garante uma saída melhor para o
ativismo extenuante, mais ainda, não seja utilizado por projeto, ba- seada em confiança relativa, garantindo sua
alguns para fins de tomada de poder. O essencial con- razão de ser, tanto no presente quanto na continuidade. A
siste em estabelecer alguns princípios organizadores do mobilização geral da maioria, o consenso na análise prévia
pen- samento e da ação. Um projeto de estabelecimento das necessi- dades e a identificação coletiva dão lugar às
escolar terá maiores chances de êxito quando os objetivos divergências e à dispersão das forças nos momentos
visados forem realistas. Para que um projeto possa fazer a difíceis e precipitam os atores em uma fase de
diferença, é necessário que ele se inscreva na “zona de turbulências que pode repre- sentar um simples vazio do
desenvolvimento proximal” dos atores e seja capaz de processo de implementação. Numerosas equipes desistem
penetrar em seus campos de consciência, é indispensável diante da ausência de efeitos a curto ou médio prazo, ou
determinar tal “zona” a fim de saber a quais desafios é mesmo diante da resistência dos principais interessados:
possível se exporem, para chegarem a transformações da os alunos. Mesmo um projeto de estabelecimento escolar
identidade coletiva que permitam a utiliza- ção dos novos que obtenha a concordância e o apoio de grande maioria
saberes de forma duradoura. dos parceiros não tem garantia de sua longevidade. Um
projeto de longa duração nunca será totalmente aplicado
Os projetos garantem um desenvolvimento das por aqueles que o elaboraram. É necessário concebe-lo
compe- tências profissionais que baste para produzir efeitos de maneira que seja possível fazê-
duráveis? Os projetos estão fundados em uma avaliação -lo durar, e utilizá-lo como instrumento de integração de
suficientemen- te sutil da pertinência das práticas em recém-chegados. O projeto como explicação de uma
curso e garantem um acréscimo de valor? iden- tidade coletiva não significa fechamento sobre si
Se essas possibilidades forem mal avaliadas é provável mesmo, mas sim, abertura para o futuro e para fora.
que o aluno não obtenha o benefício esperado da
situação com que se acha confrontado. Para que a Liderança e modos de exercício do poder
situação seja por- tadora de sentido, a mudança prevista
deve estar próxima de suas preocupações, oferecendo, Os processos de mudança não se desenvolvem por si
uma impressão de ruptura com as rotinas. mesmos. Necessitam de uma orquestração ativa, a
Entre investimentos a longo prazo, e resultados mudan- ça choca-se com ações igualmente deliberadas
imediatos, a ação educativa muitas vezes hesita. A lógica para blo- queá-las. As influências não provêm unicamente
“asseguradora” pode assim, parecer a única em condições daqueles que detêm uma autoridade formal.
de criar a calma para encarar ações inovadoras. As noções de líder e de liderança referem-se mais a
A multiplicação dos projetos de estabelecimento uma influência real sobre o curso das coisas do que ao es-
escolar fez evoluir a maneira de trabalhar em conjunto. Ao tatuto dos que a exercem. Qualquer membro de uma co-
projeto como forma social, associam-se diversas práticas, munidade exerce, de vez em quando, alguma influência.
reconhecidas como características. Não é pequeno o risco Alguns com mais frequência do que outros, o que carac-
de ver a adoção dessas práticas fazer as vezes de projeto terizará uma liderança se esta se mostrar regularmente so-
de estabelecimento escolar. É importante associar os bre as decisões de um grupo. A noção de liderança como
processos de projeto a uma avaliação interna que verifique influência regular define o líder, como “aquele que exerce
a coerência entre os objetivos visados e as ações uma liderança em um determinado contexto”.
empreendidas.

14
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Os estabelecimentos escolares que se engajam em


um processo de mudança deverão construir uma nova Já, o desenvolvimento profissional ressalta as necessidades
visão da gestão das relações de força e, se possível, e apostas das pessoas que coexistem e cooperam dentro de
substituir a liderança autoritária por uma liderança um es- tabelecimento escolar, esboçando e realizando um
cooperativa. A ideia de liderança cooperativa designa uma projeto coletivo. Tal interpretação da formação contínua coloca
os atores do es- tabelecimento escolar no centro do processo
liderança assumida de modo cooperativo por um
de desenvolvimento
conjunto de atores, nenhum dos quais é líder formal ou
e o liga à mudança.
informal o tempo todo, mas está abertamente voltado
para a ação comum. A liderança cooperativa rompe com a De acordo com esse modelo, os professores são percebidos
como membros de uma organização social, corresponsáveis por
organização clássica do traba- lho dentro de um
seu desenvolvimento ulterior. Visto que são responsáveis de seu
estabelecimento escolar, os membros do grupo acham-se
desenvolvimento profissional, os atores transformam suas
investidos de tarefas ou de funções que eles assumem
necessi- dades, formulando projetos coletivos e investindo-se
sem monopolizá-las duradouramente. A liderança
em sua apli- cação.
cooperativa não reconhece hierarquias estáveis nem líder
Para aumentar a eficácia da ação organizada dentro de uma
permanente. A liderança é entendida como uma força de
instituição, é necessário compreender sua cultura, é indispensável
transformação cultural e de desenvolvimento. Ela não
que os atores meçam a dinâmica e a complexidade do funciona-
suprime a função de diretor de escola, mas redefine, o
mento coletivo para depois decidirem e colocarem em prática
papel consistiria em tornar-se aquele que faz as compe-
no- vos funcionamentos.
tências emergirem, facilita a concepção e a aplicação de
A ação organizada não é redutível às aprendizagens indi-
novas modalidades organizacionais, ele orquestra a ação
viduais, trata-se de um sistema de aprendizagens coordenadas,
coletiva para que esta possa tender para a transformação
sendo suficiente para fazer funcionar o conjunto, porque é de
das práticas.
sua capacidade de transformar-se em organização aprendente
A liderança cooperativa produz para cada pessoa uma
que de- pende o resultado de uma maior eficácia da ação
sobrecarga de trabalho, daí a necessidade de estabelecer
coletiva.
uma instância de coordenação responsável por: acompa-
nhar os esforços de colocação em prática; informar todas
Conclusão
as partes envolvidas sobre o processo em curso;
aproximar e ligar os diferentes grupos de trabalho;
O estabelecimento escolar é um nível determinante do
organizar e animar as sessões; instituir instâncias de destino reservado aos projetos de mudança, porque é ali que
conversa; criar lugares de decisão e de regulação. O papel os professo- res trabalham e constroem o sentido de suas
dos líderes leva-os a veri- ficar constantemente se os práticas profissionais, bem como as transformações que lhes
diferentes membros do grupo conseguem aderir aos são propostas, venham elas de dentro ou de fora.
objetivos visados, se estão conven- cidos de que as
Seu resultado será coerente relativamente à cultura e às rela-
apostas valem a pena e pensam que eles têm mais a ções sociais instituídas, nas quais as conversações se
ganhar do que a perder. estabelecerão em torno desse novo objeto, a partir das
tentativas e das reposi- ções em discussão que uns e outros
O estabelecimento escolar como organização devam ou queiram permitir.
aprendente Na verdade, a mudança leva tempo e só se realiza por eta-
pas, conforme as quais os profissionais criam vínculos entre seus
Um estabelecimento escolar pode ou não favorecer a saberes de experiência e as novas idéias. O processo de
mudança. É sua capacidade de adquirir experiência que o mudança é, pois, um assunto de evolução conjunta dos
torna uma organização aprendente; adota uma valores, crenças, con- ceitos e práticas.
abordagem mais positiva e profissionalizante, centrada na Ao começar este trabalho, já estávamos convencidos de que
obrigação de competências, visando à evolução tanto das o sentido da mudança não é imposto, não é dado de antemão
represen- tações da profissão quanto das práticas nem é imutável. A mudança é construída na regulação interativa
pedagógicas e à transformação da dinâmica do entre atores.
estabelecimento escolar, em uma coesão essencialmente Se a hipótese construtivista é válida não apenas para os
pedagógica, constituindo este último em organização indiví- duos, mas para as coletividades, como conseguir
aprendente. comprometê-las em um processo de construção coletiva de
O estabelecimento escolar é definido como um grupo longa duração?
de professores que assumem a responsabilidade de de- Numerosos fóruns, publicações e debates são dedicados a
senvolver os dispositivos de ensino e aprendizagem mais essa problemática. Apesar dos debates, parece-nos que, nos en-
eficazes. contramos atualmente, bem no início de um longo processo de
No desenvolvimento organizacional, os projetos de “profissionalização” das práticas de inovação, seja na escala do
formação comum se limitam a alguns seminários durante sis- tema, do estabelecimento escolar ou da classe. Tal
os quais os professores têm a ilusão de construir uma cul- processo levará todos os atores a conduzirem a escola na
tura comum em relação a um tema que lhes parece aventura de uma “or- ganização aprendente”. Nessa aventura, o
central, eles imaginam que realmente conseguirão estabelecimento escolar pode e deve representar um nó
modificar suas práticas, enquanto observadores externos estratégico.
notam apenas mudanças insignificantes.
Referência
TRURLER, M. G. Inovar no interior da escola.
THURLER, Mônica Gather e MAULINI, Olivier (org.). A
organiza-
ção do trabalho escolar: uma oportunidade para repensar a
escola. Porto Alegre: Penso, 2012.
15
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

A CONSTRUÇÃO DE UMA ESCOLA DEMOCRÁTICA E Compreender e buscar o contraponto dessa discussão


INCLUSIVA. “parece” ser o caminho a ser percorrido pela comunida-
de escolar a ser construído pelo PPP. Esse caminho passa,
necessariamente, pela organização do espaço escolar,
pelo trabalho diário realizado por cada um dos sujeitos da
co- munidade escolar, considerando-se os aspectos de
A GESTÃO DEMOCRÁTICA tempo, espaço, formação, legislação, administração,
políticas edu- cacionais, recursos financeiros e humanos, o
As mudanças, atualmente refletidas no espaço escolar que define a complexidade da educação vivenciada em
têm suas origens num processo mais amplo e complexo seu espaço mais específico que é a escola.
que antecede os anos 90. Destarte, para compreender o Essa complexidade não pode significar o impedimen-
quadro atual, precisamos buscar na história os elementos to de mudanças no espaço escolar; uma visão crítica tem
constitutivos do processo de mudança nos aspectos eco- exatamente o objetivo de denunciar e de buscar caminhos
nômicos, sociais e políticos. alternativos.
De acordo com Silva Jr, a escola desenvolve seu tra- A gestão democrática vista como uma forma dife-
balho no interior de uma sociedade capitalista; nela se rente de encaminhar o trabalho pedagógico na escola
manifestam as contradições e determinações; da mesma deve articular todos os responsáveis pelo PPP de
forma, são variadas e, frequentemente, conflitantes as in- forma a interagirem com toda a comunidade escolar.
terpretações sobre a função da escola e/ou organização A partir do momento em que se busca uma nova
do trabalho pedagógico. Essas contradições impostas pelo organização, também as relações de trabalho no
capitalismo permeiam a luta ideológica das ideias e con- espaço escolar de- verão ser ressignificadas. Esta
vicções, assim, a escola tende a reproduzir as tensões e ressignificação deve ter como base a possibilidade de
forças nas relações de poder e na própria organização do real participação dos di- ferentes segmentos, com
trabalho pedagógico. ênfase no coletivo com espaços para trocas de
Com base no pressuposto de que a organização do conhecimentos e de responsabilidades.
trabalho pedagógico traduz, na sua prática, esse movi- Essa mudança exige uma ruptura com a cultura auto-
mento das políticas educacionais, da legislação, dos mo- ritária que perpassa a história da escola que, instalada em
delos de gestão, da formação inicial e continuada e das nossos hábitos, exige que se entenda a participação como
formas de participação, os profissionais da educação con- um princípio da democracia. Portanto, a participação não
sideram relevante a gestão democrática para a organiza- pode ser privilégio de uns poucos, mas uma possibilida-
ção do trabalho na escola. Mas não estão descartados os de para todos, oportunizada de forma efetiva e acessível a
interesses ideológicos que este trabalho traz consigo no toda a comunidade escolar.
bojo das discussões e na prática.
Uma análise crítica a respeito da gestão democrática, Um Pouco de História: Buscando As Origens da Gestão
da participação e do coletivo revelou os dois lados de Democrática
uma mesma situação. Se, no aspecto ideológico, a gestão
de- mocrática tem sido usada para concretização das Vivemos numa sociedade capitalista cujo princípio é
políticas educacionais de forma desvirtuada, visando a a produção de mercadorias e serviços através do trabalho
utilização da Associação de Pais e Mestres e Funcionários que depende das diferenças socioeconômicas entre aque-
– APMF, e dos colegiados escolares para os interesses les que detêm ou controlam os meios de produção. Nesse
hegemônicos, por outro, é inegável a necessidade da sistema o objetivo é aumentar o capital, isto é, lucrar. O
participação de toda a comunidade escolar e as benesses sistema capitalista passou por diversas fases desde as suas
dessa prática. origens até os dias atuais.
O que passa a caracterizar as teorias modernas da Tomaremos como base as mudanças da década de
administração não são mais a coerção e a manipulação noventa, na qual a globalização representa uma reestru-
características da teoria Clássica e de relações Humanas, turação econômica em âmbito mundial, tendo como apa-
mas o dirigismo calcado nas práticas da motivação, coo- rato ideológico o neoliberalismo fundamentado em um
peração e integração. discurso que privilegia a esfera econômica. Assim, temos a
Procurou-se aqui relacionar a gestão democrática na globalização como processo de integração mundial, via
organização do trabalho pedagógico, tendo como refe- in- ternacionalização do capital, ou seja, a
rência as políticas educacionais e apresentar o Projeto Po- transnacionalização. Esse processo de reestruturação
lítico Pedagógico – PPP como colaborador nesse processo econômica inclui a re- dução do papel do Estado na
de gestão democrática. O PPP aponta um caminho pos- diminuição do investimento do setor público, reformas
sível para uma gestão democrática. Nesse sentido, nossa administrativas, estabilização fiscal e redução do crédito
preocupação é analisar as possibilidades de práticas de interno e das barreiras de mer-
participação no espaço escolar, buscando uma cado.
abordagem crítica. Bruno explica que é praticamente impossível haver
de- senvolvimento fora deste quadro de economia
internacio- nalizada.

16
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Completa ainda a autora: [...] Entretanto, a integração


O quadro das mudanças atuais tem o seu “gérmen”,
das várias economias numa estrutura global não implica
a partir da crise capitalista dos anos setenta no Brasil e a
em homogeneização das condições econômicas e sociais
difusão da ideologia neoliberal. Essa ideologia postulava
exis- tentes em cada uma delas. Antes, o que ocorre é a
que o Estado de Bem Estar estaria reduzindo a poupança
reprodu- ção generalizada das desigualdades em escala
e os investimentos do setor público, sendo responsável
mundial. Isto porque a divisão internacional do trabalho foi
pelo fraco desenvolvimento da economia, aliada às
profundamen- te alterada e o que se observa é que esta políticas so- ciais que canalizavam investimentos de
integração não se dá em termos de nação, mas de setores setores produtivos para os improdutivos.
da economia. Diante disto, o neoliberalismo propôs alterações para
o papel do Estado, de acordo com as quais o mercado
Esse processo aponta para um movimento de subs- tituiria a política e um Estado Mínimo substituiria o
mudanças sem precedentes; soma-se a ordem econômica, Esta- do de Bem Estar. Para realizar essas medidas
a reestrutu- ração do trabalho, as inovações tecnológicas propostas, a privatização foi um dos caminhos
e das próprias estruturas de poder, entre as quais os apresentados, pois teo- ricamente diminuiria os gastos do
organismos multila- terias que têm expandido cada vez Estado e incentivaria a livre competição do mercado,
mais as suas ações, via empréstimos e financiamentos. garantindo os interesses dos setores privados da
É dentro desse contexto de mudanças que se faz ne- economia.
cessário reconhecer o papel que o Banco Internacional de Essa reorganização do capitalismo, em fase de desen-
Reconstrução e Desenvolvimento – BIRD, conhecido como volvimento desde os anos setenta apresentou-se de for-
Banco Mundial, tem desempenhado, especialmente em ma mais clara nos últimos anos, através da globalização
re- lação à educação. É a partir dos anos noventas, que o da economia, da transnacionalização das estruturas de
Banco adquire expressiva importância no âmbito das poder e da reestruturação produtiva.
políticas pú- blicas brasileiras. “Com a crescente Seguindo a tese da autora, esta reorganização do
mobilidade do capital, a educação deixou de ser uma capi- talismo constitui-se um processo vasto e complexo e
questão nacional. Daí a interfe- rência cada vez mais mos- tra as tendências de dois processos simultâneos,
incisiva dos organismos transnacionais”. quais se- jam: a nova fase de internacionalização do
Dentro desse quadro de mudanças, a educação passa capital e a reor- ganização produtiva que, por sua vez,
a ter função primordial, pois, enquanto política pública é altera as estruturas de poder do capitalismo. Nesse
con- siderada como serviço essencial que o Estado deve mesmo sentido, a autora esclarece:
garantir. De acordo com a ideologia neoliberal, as
políticas edu- cacionais também tomam forma adequada Assim, a novidade da forma atual de internacionaliza-
à lógica do mer- cado. O modelo de gestão administrativo ção do capital, comumente designada globalização, reside
empresarial será transferido para a gestão da escola. A no fato de se constituir um processo de integração
racionalização custo/ benefício, a descentralização e a mundial que já não integra nações ou economias
busca por uma maior par- ticipação da comunidade é o nacionais, mas conjuga a ação dos grandes grupos
modelo a ser alcançado. “Os conceitos de produtividade, econômicos entre si e no interior de cada um deles, não
eficácia, excelência e eficiência serão importados das só ultrapassando, mas ig- norando, em suas ações e
teorias administrativas para as teorias decisões, as fronteiras nacionais. A partir dos anos
pedagógicas”. noventa, a questão da qualidade já incorporada aos
Esse modelo tem como meta final a qualidade que, a discursos políticos educacionais alia-se ao modelo
partir dos anos noventa, já está incorporada aos discursos neoliberal. “A qualidade educativa, nesta década de 90, é
políticos educacionais aliando-se ao modelo neoliberal. requerida numa perspectiva mercadológica, neo-
Para Lima, essa qualidade preza o resultado, e a escola é o cientificista, neoconservadora, orientada para implantar-se
instru- mento de efetivação das políticas educacionais de nos países em desenvolvimento, como o Brasil”.
adequa- ção dos alunos à sociedade capitalista. Para o
autor, a escola tem servido aos interesses do Estado Portanto, a educação no que concerne ao mercado
capitalista. pode ser vista sob dois aspectos concretos:
Essas mudanças representam o solo fecundo para o - 1º, em relação à gestão da escola, com ênfase na
movimento das reformas implantadas tanto nos aspectos reorganização das funções administrativas, da
legais, quanto nos ideológicos e de políticas educacionais. participação coletiva, das parcerias, do voluntariado;
- 2º, na busca da qualidade total.
A LDB 9394/96 torna a gestão democrática um princípio,
além da criação dos Conselhos Escolares. Em relação ao primeiro aspecto, Bruno aponta para a
necessidade de promover formas consensuais de tomada
As diretrizes educacionais respondem a uma política
de decisões, com a participação dos sujeitos envolvidos, o
educacional, que, dentro de uma sociedade capitalista,
que constitui uma estratégia para prevenir conflitos e
traz suas contradições e a luta pela superação de classes
resis- tências que possam obstruir a implementação das
sociais e do poder hegemônico. Discutir políticas
medidas consideradas necessárias. O segundo aspecto,
educacionais “im- plica, na verdade, em trazer
transplan- tado do setor privado para o setor público, diz
informações sobre o passado (organização do capital) e, respeito ao modelo de qualidade total e busca a eficiência
com elas, cotejar a forma de ser do presente dos resulta- dos com a redução de custos, enfatizando a
(reorganização do mesmo sistema produtivo)”. Ainda, relação entre consumidor e cliente.
segundo a autora, não é possível analisar a educação sem
relacioná-la às mudanças da base produtiva e às exi-
gências de reorganização do capital.
17
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Analisar as políticas educacionais requer a compreen-


PPP: Contribuições
são de um novo panorama na forma de organização das
sociedades, do modo de produção e de relações entre as
O PPP representa a escola, ou seja, expõe, exibe, re-
pessoas.
vela, mostra a sua organização, a sua prática pedagógica
Nessa ótica, impossível pensar a educação sem
e administrativa num movimento contínuo que envolve
pensar nas alterações da base produtiva, nas exigências
diversos profissionais da educação e suas relações com a
de reorga- nização do capital, sempre explicitadas pela
comunidade escolar inserida num dado tempo num dado
constante mo- dernização do sistema. Nesse sentido,
local, como sujeitos históricos e críticos, revelando, ainda,
impossível pensar a educação fora do espectro da
as contradições presentes na função social da escola.
contradição que põe lado a lado a mudança e a
Portanto, a construção do PPP revela os interesses da
permanência, que impõe novas formas de trabalho no
comunidade escolar, suas expectativas dentro da esfera
interior da mesma relação de produção, que aciona velhas
do coletivo, buscando uma gestão democrática na
atitudes, apenas maquiadas pelo velho dog- ma do
definição da ação de cada um e das ações conjuntas.
mercado.
Nesse sentido, a sua construção terá sempre o caráter
político. “Por isso, todo projeto pedagógico da escola é,
O processo histórico como caminho para o entendi-
também, um projeto político por estar intimamente
mento da educação, enquanto prática social construída
articulado ao compromisso sociopolítico com os
materialmente, nos auxilia a perceber que os fatos não
interesses reais e coletivos da popu- lação majoritária”.
acontecem por acaso e, sim que estão ligados por um
Para efeito deste artigo, o PPP será entendido como
con- junto de fatores materiais, que alteram nosso modo
elemento colaborador no processo de gestão democrática
de vida e produção conforme os interesses hegemônicos
nas práticas diárias no trabalho pedagógico e na organi-
do mo- mento histórico.
zação. Essa colaboração só poderá ser efetivada se o PPP
O pressuposto básico é que a educação é impactada
representar, de fato, um projeto emancipador e não um
pela lógica do capital, ou seja, os processos educacionais
simples documento organizado de forma a atender as exi-
e os processos sociais mais abrangentes de reprodução
gências burocráticas.
estão intimamente interligados. Portanto, limitar uma
Veiga explicita a diferença na construção do PPP en-
mudança educacional radical às margens corretivas
quanto inovação regulatória ou inovação emancipatória.
interesseiras do capital significa abandonar de uma só vez,
Enquanto o primeiro está voltado para a burocratização,
conscientemen- te ou não, o objetivo de uma
cumprindo normas técnicas, de cunho político-adminis-
transformação social qualita- tiva. Do mesmo modo,
trativo, que geram um produto, no caso, um documento
contudo, procurar margens de re- forma sistêmica na
pronto e acabado, no segundo, a opção pela inovação
própria estrutura do sistema do capital é uma contradição
com a participação dos diferentes atores, em um contexto
em termos. É por isso que é necessário romper com a
his- tórico e social, propicia a argumentação, a
lógica do capital se quisermos contemplar a criação de
comunicação e a solidariedade.
uma alternativa educacional significativamente diferente.
Nesse aspecto, o PPP permite a realização de um
trabalho mais comprometido com as ações definidas no
A clareza da relação entre educação e capital nos
conjunto dos participantes, podendo e devendo provocar
impe- le a buscar caminhos através da inter-relação das
mudanças na organização do trabalho pedagógico e rom-
políticas educacionais e das mudanças na prática. Uma
pendo com um modelo de trabalho isolado e
das formas de materializar as mudanças propostas pelas
fragmentado.
políticas edu- cacionais é a legislação. A LDB 9394/96
traduz as orien- tações dos organismos internacionais,
Sob esta ótica, o projeto é um meio de engajamento
apontando para os princípios de produtividade, eficiência
coletivo para integrar ações dispersas, criar sinergias no
e qualidade total.
sentido de buscar soluções alternativas para diferentes
A LDB trouxe para a escola a questão da gestão de-
mo- mentos do trabalho pedagógico-administrativo,
mocrática, tratando-a de forma específica nos artigos que
desenvol- ver o sentimento de pertença, mobilizar os
se seguem, bem como a forma dessa construção coletiva
protagonistas para a explicitação de objetivos comuns
através do PPP e da participação da comunidade em Con-
comum, definin- do o norte das ações a serem
selhos Escolares ou Colegiados.
desencadeadas, fortalecer a construção de uma coerência
comum, mas indispensável, para que a ação coletiva
Art. 14 – Os sistemas de ensino definirão as normas
produza seus efeitos.
de gestão democrática do ensino público na educação
A atuação efetiva dos Conselhos Escolares, além de
básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme
colaborar com a gestão democrática permite, concomitan-
os se- guintes princípios:
temente, a construção de um PPP graças ao qual propicia
I- Participação dos profissionais da educação na
espaço de participação nos processos decisórios da
elabo- ração do projeto político-pedagógico da escola;
escola, evitando o corporativismo.
II- Participação das comunidades escolar e local em
conselhos escolares ou equivalentes.

18
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Gestão e Organização do Trabalho Pedagógico O professor não é vítima nem culpado pela situação
vivenciada. Também não é o único profissional afetado
É necessário avançar e explicar o que entendemos por
por esse sistema, apesar de fazer parte da maioria na
gestão democrática no espaço da escola pública, como
escola. O pedagogo dividido entre o administrativo e o
prática cotidiana na organização do trabalho pedagógico.
pedagógi- co, exercendo funções burocráticas, entre
Para efeito deste ensaio, gestão, administração e coorde-
outras atividades “corriqueiras”, próprias do pedagogo
nação serão utilizadas como sinônimos visando ampliar a
tarefeiro, desvia-se da sua real função. Aliada a essa
perspectiva do entendimento sobre o tema porquanto a
situação, a complexidade da escola e a falta de pessoal,
organização e a gestão constituem o conjunto das condi-
impede o desenvolvimen- to de um trabalho voltado para
ções e dos meios utilizados para assegurar a qualidade da
as questões pedagógicas específicas e o próprio
instituição escolar, buscando alcançar os objetivos
acompanhamento do PPP. Outra necessidade é o
propos- tos a partir das discussões de toda a comunidade
pedagogo posicionar-se, de fato, como articulador do
escolar.
trabalho pedagógico, exigindo pessoal para cumprir as
Conforme Paro, a administração de uma escola não
atividades tarefeiras e emergenciais na escola, como
pode estar reduzida a métodos, técnicas e aparato buro-
inspetor de alunos, porteiro. É necessário observar se:
crático, como já foi dito anteriormente. A escola é A ênfase no “administrativo” apresenta-se assim, ao
portado- ra de uma especificidade na sua organização, o mesmo tempo, como opção preferencial face às peculia-
que a torna diferente da administração de uma empresa. ridades da disciplina e também como “proteção” face ao
Portanto, a administração escolar, ou gestão escolar, complexo universo teórico-metodológico em que a
diferencia-se da administração de organizações particula- discus- são sobre a educação se desenvolve.
res, pois não visa o lucro, mas sim o interesse público, É impossível fazer o Conselho de Classe de vinte tur-
asse- gurando o caráter democrático da escola pública. mas em um único sábado, exceto se destinarmos todos os
Compreendendo que não apenas a gestão democráti- sábados de um mês para concretizar esse objetivo. Logo,
ca se configura como princípio na LDB 9394/96, mas tam- o calendário é burlado para dar conta de atender a
bém que o PPP é elemento aglutinador, ou seja, ambos demanda posta pelo número de alunos e turmas que
re- presentam a legalidade a ser implementada nas exige tempo para discussões e busca de
unidades escolares, não é intuito nosso fazer apologia do encaminhamentos para cada caso.
PPP como salvador da escola, mas apenas utilizá-lo de
fato como ele- mento legal para colaborar com a escola. Considerações Finais:
A comunidade escolar, ou seja, professores, alunos,
pais, direção e equipe pedagógica são considerados como A complexidade dos temas permitiu novos questio-
sujeitos ativos de todo o processo, de forma que a partici- namentos que respostas, a busca por uma análise crítica
pação de cada um implica em clareza e conhecimento do revelou os aspectos que devem ser observados na prática
seu papel, em relação ao papel dos demais, como corres- e na necessidade de um aprofundamento teórico. Com a
ponsáveis. Além da participação, a autonomia constitui-se esperança de uma escola melhor, ousamos apontar alguns
um princípio básico da gestão democrática. Para que os encaminhamentos possíveis para a construção de um PPP
membros da comunidade escolar possam ser coletivo ou, pelo menos, para a discussão desses temas.
considerados sujeitos ativos do processo é necessário - Analisar o Projeto Político Pedagógico implica em
refletirmos sobre a forma de organização do trabalho considerar a gestão democrática para a sua construção;
escolar e as relações de poder neste espaço. - Discutir o Projeto Político Pedagógico significa
Para Dourado, a gestão democrática constitui-se discu- tir, concomitantemente, a organização do trabalho
como um processo de aprendizado e de luta política, escolar;
possibili- tando a criação e efetivação de canais de - O pedagogo como articulador das questões peda-
participação, de aprendizado do “jogo democrático”, e gógicas necessita do coletivo para encaminhar o trabalho
tendo como resulta- do a reflexão das estruturas na escola;
autoritárias, com vistas à sua transformação. - Não é possível propor intervenção na escola, sem,
Apesar de partirmos do pressuposto de que há uma primeiramente, analisar de forma crítica a participação da
construção coletiva, de fato essa construção não passa comunidade escolar;
de um agrupamento de ideias que busca um consenso. - O Colegiado Escolar pode representar um caminho
As discussões para a elaboração do PPP não conta com a para a discussão da gestão democrática, como uma forma
presença de todos os professores. Neste item, poderíamos de participação coletiva;
citar muitos motivos, mas indicaremos o que julgamos ser - Há necessidade da revisão dos “papéis” de cada um
o principal, que é a divisão da carga horária do professor e o compromisso com metas comuns;
em diversas e diferentes escolas e sua rotatividade. Essa - É necessário, ainda, compreender a “lógica” das
situação gera a sensação de que ele não pertence àquela políti- cas educacionais e suas perspectivas para a escola
comunidade, e a escola se torna apenas mais um local de pública.
trabalho. Essa situação tende a descomprometer o profes-
sor com os rumos da instituição e com a própria constru- Fonte
ção do PPP. OLIVEIRA, S. B. Disponível em http://www.pucpr.br/

19
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

A construção de uma escola inclusiva.


As escolas inclusivas, portanto, propõem a
constituição de um sistema educacional que considera as
Nesse texto, atenção especial é dada à teoria de Vy-
necessidades de todos os alunos e que é estruturado em
gotsky e suas implicações para o debate sobre inclusão
razão dessas necessidades. A inclusão gera uma mudança
nos campos da educação na escola e na sociedade. O
de perspectiva educacional, pois não se limita a ajudar
artigo fo- caliza também as relações que definem a
somente os alunos que apresentam dificuldades na escola;
política inclusiva e a complexidade que caracteriza este
mas apoia a todos: professores, alunos e pessoal
processo.
administrativo para que ob- tenham sucesso na escola
Segundo a educadora Mantoan (2005) afirma que na
convencional (MANTOAN, 1997).
escola inclusiva professores e alunos aprendem uma lição
Na inclusão, as escolas devem reconhecer e responder
que a vida dificilmente ensina: respeitar as diferenças.
às diversas necessidades de seus alunos, considerando
Res- salta ainda, que a inclusão é a nossa capacidade de
tan- to os estilos como ritmos diferentes de aprendizagem
reco- nhecer o outro e ter o privilégio de conviver com
e as- segurando uma educação de qualidade a todos, por
pessoas diferentes. Diferentemente do que muitos
meio de currículo apropriado, de modificações
possam pensar, inclusão é mais do que rampas e
organizacionais, de estratégias de ensino, de uso de
banheiros adaptados.
recursos e de parcerias com a comunidade.
Na perspectiva de Mantoan, um professor sem capa-
Os dois modelos de escola regular e especial podem
citação pode ensinar alunos com deficiência. O papel do
ter características inclusivas e ser o melhor para determi-
professor é ser regente de classe e não especialista em
nado aluno, o processo de avaliação é que vai identificar a
de- ficiência, essa responsabilidade é da equipe de
melhor intervenção, o mais importante salientar que mui-
atendimen- to especializado, uma criança surda, por
tos alunos têm passagens rápidas e eficientes pela escola
exemplo, aprende com especialista em libras e leitura
especial, o que acaba garantindo uma entrada tranquila
labial.
e bem assessorada no ensino fundamental convencional,
Questionam-se os valores e padrões pré-
evitando uma série de transtornos para o aluno, para os
estabelecidos, os critérios de avaliação e discriminação
pais e para a escola.
que prejudicam o desenvolvimento e a aprendizagem das
Segundo Coll (1995) a igualdade educacional não
habilidades e a independência destas crianças.
pode ser obtida quando se oferece o mesmo cardápio a
Neste sentido, observamos que Vygotsky, psicólogo
todos os alunos; a integração escolar das crianças com
russo e estudioso do tema desenvolvimento e aprendiza-
deficiências torna-se possível quando se oferece a cada
gem, ao falar sobre deficiências educacionalmente consi-
aluno aquilo de que ele necessita.
deradas como uma das necessidades educacionais espe-
ciais mostra a interação existente entre as características
Deficiência
biológicas e as relações sociais para o desenvolvimento da
pessoa. Segundo Vygotsky o conceito de Zona de Desen-
As crianças no século XV portadores de deficiência
volvimento proximal, conhecida como ZDP, que é a
eram deformadas e atiradas nos esgotos de Roma na
distân- cia entre o desenvolvimento real e o potencial.
Idade Média. Porém os portadores de deficiências eram
Abordando mais especificamente as questões da edu-
abriga- dos nas igrejas e passaram a ganhar a função de
cação inclusiva temos um histórico amplo de várias
bobo da corte. Segundo Martinho Lutero, as pessoas com
signifi- cações no decorrer da história, que assinala
deficiên- cias eram seres diabólicos que mereciam
registros de re- sistência à aceitação social dos portadores
castigos para se- rem purificados.
de necessidades educativas especiais. Práticas executadas
A partir do século XVI e XIX as pessoas com deficiên-
como abandono, afogamentos, sacrifícios eram comuns
cias continuavam isoladas em asilos, conventos albergues,
até meados do sé- culo XVIII, quando o atendimento
ou até mesmo em hospitais psiquiátricos como na Europa
passa das famílias e da igreja, para a ciência, passando das
que não passava de uma prisão sem qualquer tipo de
instituições residenciais às classes especiais no século XX.
trata- mento especializado. No entanto a partir do século
Conforme Cardoso (2003) os médicos passaram a de-
XX, os portadores de deficiências começaram a ser
dicar-se ao estudo dos deficientes, nomenclatura adotada.
considerados cidadãos com direitos e deveres da
Com esta institucionalização especializada dá se início o
participação da socie- dade, mas com a Declaração
período de segregação, onde a política era separar, isolar
Universal dos Direitos Huma- nos começaram a surgir os
e proteger a sociedade do convívio social, do contato com
movimentos organizadores por familiares com críticas à
estas pessoas anormais, inválidas, incapazes de exercer
discriminação, para a melhorias de vida para os mutilados
qualquer atividade.
na guerra em 1970 só então começa a mudar a visão da
Espera-se que a escola tenha um papel complementar sociedade nos anos 80, 90 onde passam a defender a
ao desempenhado pela família no processo de socializa-
inclusão.
ção das crianças com necessidades educacionais especiais.
Segundo Silva (1987): anomalias físicas ou mentais,
É uma tarefa difícil e delicada, que envolve boas doses de de- formações congênitas, amputações traumáticas,
atitudes pessoais e coletivas, caracterizadas doenças graves e de consequências incapacitantes, sejam
principalmente pelo diálogo, pela compreensão, pelo elas de natureza transitória ou permanente, são tão
respeito às diferen- ças e necessidades individuais, pelo antigas quanto à própria humanidade.
compromisso e pela ação.

20
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Nas escolas de Anatomia da cidade de Alexandria, Se-


gundo a afirmação de Silva (1987) existiu no período de O primeiro documento que merece menção é o
300 decre- to n. 3298, de 20 de dezembro de 1999. Ele
a. C, nela ficam registro da medicina egípcia utilizada para regulamentou a Lei n. 7853, de 24 de outubro de 1989,
o tratamento de males que afetavam os ossos e os olhos que consolidou as regras de proteção à pessoa portadora
das pessoas adulas. Pois havia passagem histórica sobre os de deficiência. Se- gundo a Secretária de Direitos
cegos do Egito que faziam atividades artesanais. Humanos da Presidência da República - SDH/PR
Gugel (2008) expõe que na era primitiva, as pessoas Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa
com deficiência não sobreviviam, devido ao ambiente com Deficiência - SNPD.
desfavorá- vel. Afinal, para seu sustento, o homem Art. 17. O Poder Público promoverá a eliminação de
primitivo tinha que caçar e colher frutos, além de produzir bar- reiras na comunicação e estabelecerá mecanismos e
vestuário com peles de animais. Com as mudanças alter- nativas técnicas que tornem acessíveis os sistemas de
climáticas, os homens começam a se agrupar e juntos irem comu- nicação e sinalização às pessoas portadoras de
à busca de sustento e vestimenta. No entanto, somente os deficiência sensorial e com dificuldade de comunicação,
mais fortes resistiam e segundo pesqui- sadores, era para garantir-
comum nesta época desfazerem de crianças com -lhes o direito de acesso à informação, à comunicação, ao
deficiência, pois representava um fardo para o grupo. trabalho, à educação, ao transporte, à cultura, ao esporte e
Segundo Gugel (2008), no Egito Antigo, as múmias e ao lazer.
os túmulos nos mostram que a pessoa com deficiência Art. 18. O Poder Público programará a formação de
interagia com toda sociedade. Já na Grécia, as deficiências profissionais intérpretes de escrita em braile, linguagem de
eram trata- das pelo termo “disformes.” Devido à sinais e de guias-intérpretes, para facilitar qualquer tipo de
necessidade de manter um exército forte, os gregos comunicação direta à pessoa portadora de deficiência
eliminavam as pessoas com de- ficiências. senso- rial e com dificuldade de comunicação.
As famosas múmias do Egito, que permitiam a Art. 19. Os serviços de radiodifusão sonora e de sons e
conserva- ção dos corpos por muitos anos, possibilitaram o imagens adotarão plano de medidas técnicas com o
estudo dos restos mortais de faraós e nobres do Egito que objetivo de permitir o uso da linguagem de sinais ou outra
apresentavam distrofias e limitações físicas, como Sipthah subtitula- ção, para garantir o direito de acesso à
(séc. XIII a.C.) e Amon (séc. XI a.C.). informação às pes- soas portadoras de deficiência auditiva,
A construção da escola inclusiva exige mudanças na forma e no prazo previsto em regulamento.
nessa cultura e nas suas consequentes práticas. Segundo Para se ter a dimensão do entendimento que a so-
Perrenoud (2000) aponta alguns fatores que dificultam a ciedade tem sobre o indivíduo deficiente precisamos nos
construção de um coletivo, no contexto educacional, na reportar ao passado, e localizar nas diferenças épocas, o
limitação histórica da autonomia política e alternativa do retrato que se fixou, culturalmente, sobre a ideia das dife-
profissional da educação. renças individuais e que se converteu no atual modelo de
O significado da inclusão escolar e que ela vem se atendimento a este sujeito nas várias instituições,
desen- volvendo em todos os setores sociais, não somente principal- mente no ensino regular. (ROCHA, 2000).
na escola, mas em todos âmbitos sociais: Gugel (2008) expõe que na era primitiva, as pessoas
- Educação como direito de todos; com deficiência não sobreviviam, devido ao ambiente des-
- Igualdade de oportunidades; favorável. Afinal, para seu sustento, o homem primitivo ti-
- Convívio social; nha que caçar e colher frutos, além de produzir vestuário
- Cidadania; com peles de animais. Com as mudanças climáticas, os
- Valorização da Diversidade; ho- mens começam a se agrupar e juntos irem à busca de
- Transformação Social. sus- tento e vestimenta. No entanto, somente os mais
fortes re- sistiam e segundo pesquisadores, era comum
As mudanças da Inclusão a partir do século XXI nesta época desfazerem de crianças com deficiência, pois
representava um fardo para o grupo.
No Brasil a parir do ano 2000 Segundo os dados do Segundo Gugel (2008), no Egito Antigo, as múmias e
Censo realizado pelo IBGE existem cerca de 25 milhões de os túmulos nos mostram que a pessoa com deficiência in-
pessoas portadoras de algum tipo de deficiência. Premida teragia com toda sociedade. Já na Grécia, as deficiências
pela urgên- cia de garantir o exercício pleno da cidadania eram tratadas pelo termo “disformes” e devido à necessi-
a essa imensa população, a sociedade brasileira vai dade de se manter um exército forte os gregos
ganhando, pouco a pou- co, a sensibilidade requerida para eliminavam as pessoas com deficiências.
tratar do tema, ainda que seja bastante longo o caminho a
percorrer. Considerações Finais
A Constituição de 1988 dedicou vários artigos às
pessoas com deficiência, de que é exemplo o artigo 7º, O Brasil é hoje uma referência mundial na reparação
XXXI; artigo 23, II; artigo 24, XIV; artigo 37, VIII; artigo 203, de vítimas da hanseníase que foram segregadas do conví-
V; artigo 227, p. 2º e o artigo 244. Eles tratam de pontos vio social no passado. E aprovou em 2008 a Convenção da
tão variados como a proibição da discriminação no tocante ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, pela
a salários e a admissão ao trabalho, saúde e assistência primeira vez com força de preceito constitucional, fato
pública, proteção e integra- ção social, o acesso a cargos que balizará toda a discussão em torno de um possível
e empregos públicos, garantia de salário mínimo mensal à estatuto dos direitos da pessoa com deficiência.
pessoa com deficiência carente de recursos financeiros e a
adaptação de logradouros, edifícios e veículos para
transporte coletivo.
21
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

O termo deficiência para denominar pessoas com


defi- ciência tem sido considerado por algumas ONGs e Marcos históricos e normativos
cientis- tas sociais inadequados, pois o termo leva
A escola historicamente se caracterizou pela visão da
consegue uma carga negativa depreciativa da pessoa, fato
educação que delimita a escolarização como privilégio de
que foi ao lon- go dos anos se tornando cada vez mais
um grupo, uma exclusão que foi legitimada nas políticas
rejeitado pelos es- pecialistas da área e em especial pelos
e práticas educacionais reprodutoras da ordem social. A
próprios indivíduos a quem se refira. Muitos, entretanto,
partir do processo de democratização da escola,
consideram que essa tendência politicamente correta evidencia-
tende a levar as pessoas com deficiência a uma negação -se o paradoxo inclusão/exclusão quando os sistemas de
de sua própria situação e a sociedade ao não respeito da ensino universalizam o acesso, mas continuam excluindo
diferença. indivíduos e grupos considerados fora dos padrões ho-
Atualmente, porém, esta palavra está voltando a ser mogeneizadores da escola. Assim, sob formas distintas, a
utilizada, visto que a rejeição do termo, por si só, exclusão tem apresentado características comuns nos pro-
caracteri- za um preconceito de estigmatizarão contra a cessos de segregação e integração, que pressupõem a se-
condição do indivíduo revertida pelo uso de um leção, naturalizando o fracasso escolar.
eufemismo, o que pode
ser observado em sites voltados aos “deficientes” é que o A partir da visão dos direitos humanos e do conceito
de cidadania fundamentado no reconhecimento das dife-
termo deficiente é utilizado de maneira não pejorativa.
renças e na participação dos sujeitos, decorre uma
identifi- cação dos mecanismos e processos de
Referência:
hierarquização que operam na regulação e produção das
NOQUELE, A.; SILVA, A. P. da. SILVA, R. Educação Inclu- desigualdades. Essa problematização explicita os
siva e o Processo de Ensino-Aprendizagem. processos normativos de dis- tinção dos alunos em razão
de características intelectuais, físicas, culturais, sociais e
POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO ESPECIAL NA linguísticas, entre outras, estrutu- rantes do modelo
PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA tradicional de educação escolar.
A educação especial se organizou tradicionalmente
Documento elaborado pelo Grupo de Trabalho como atendimento educacional especializado substituti-
nomea- do pela Portaria Ministerial nº 555, de 5 de junho vo ao ensino comum, evidenciando diferentes compreen-
de 2007, prorrogada pela Portaria nº 948, de 09 de sões, terminologias e modalidades que levaram à criação
outubro de 2007. de instituições especializadas, escolas especiais e classes
especiais. Essa organização, fundamentada no conceito de
Introdução normalidade/anormalidade, determina formas de atendi-
mento clínico-terapêuticos fortemente ancorados nos tes-
O movimento mundial pela educação inclusiva é uma tes psicométricos que, por meio de diagnósticos, definem
ação política, cultural, social e pedagógica, desencadea- as práticas escolares para os alunos com deficiência.
da em defesa do direito de todos os alunos de estarem No Brasil, o atendimento às pessoas com deficiência
juntos, aprendendo e participando, sem nenhum tipo de teve início na época do Império, com a criação de duas
discriminação. A educação inclusiva constitui um paradig- instituições: o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, em
ma educacional fundamentado na concepção de direitos 1854, atual Instituto Benjamin Constant – IBC, e o Instituto
humanos, que conjuga igualdade e diferença como dos Surdos Mudos, em 1857, hoje denominado Instituto
valores indissociáveis, e que avança em relação à ideia de Nacional da Educação dos Surdos – INES, ambos no Rio
equida- de formal ao contextualizar as circunstâncias de Janeiro. No início do século XX é fundado o Instituto
históricas da produção da exclusão dentro e fora da Pestalozzi (1926), instituição especializada no atendimento
escola. às pessoas com deficiência mental; em 1954, é fundada a
Ao reconhecer que as dificuldades enfrentadas nos primeira Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais –
sis- temas de ensino evidenciam a necessidade de APAE; e, em 1945, é criado o primeiro atendimento edu-
confrontar as práticas discriminatórias e criar alternativas cacional especializado às pessoas com superdotação na
para superá- Sociedade Pestalozzi, por Helena Antipoff.
-las, a educação inclusiva assume espaço central no Em 1961, o atendimento educacional às pessoas com
debate acerca da sociedade contemporânea e do papel deficiência passa a ser fundamentado pelas disposições da
da escola na superação da lógica da exclusão. A partir dos Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN,
referen- ciais para a construção de sistemas educacionais Lei nº 4.024/61, que aponta o direito dos “excepcionais”
à educação, preferencialmente dentro do sistema geral de
inclusivos, a organização de escolas e classes especiais
ensino.
passa a ser re- pensada, implicando uma mudança
A Lei nº 5.692/71, que altera a LDBEN de 1961, ao de-
estrutural e cultural da escola para que todos os alunos
finir “tratamento especial” para os alunos com
tenham suas especificida- des atendidas.
“deficiências físicas, mentais, os que se encontram em
Nesta perspectiva, o Ministério da Educação/Secreta-
atraso conside- rável quanto à idade regular de matrícula
ria de Educação Especial apresenta a Política Nacional de
e os superdota- dos”, não promove a organização de um
Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva,
sistema de ensino capaz de atender às necessidades
que acompanha os avanços do conhecimento e das lutas educacionais especiais e acaba reforçando o
sociais, visando constituir políticas públicas promotoras de encaminhamento dos alunos para as classes e escolas
uma educação de qualidade para todos os alunos. especiais.

22
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Em 1973, o MEC cria o Centro Nacional de Educação


Es- pecial – CENESP, responsável pela gerência da Em 1999, o Decreto nº 3.298, que regulamenta a Lei
educação es- pecial no Brasil, que, sob a égide nº 7.853/89, ao dispor sobre a Política Nacional para a
integracionista, impulsionou ações educacionais voltadas Inte- gração da Pessoa Portadora de Deficiência, define a
às pessoas com deficiência e às pessoas com superdotação, edu- cação especial como uma modalidade transversal a
mas ainda configuradas por cam- panhas assistenciais e todos os níveis e modalidades de ensino, enfatizando a
iniciativas isoladas do Estado. atuação complementar da educação especial ao ensino
Nesse período, não se efetiva uma política pública de regular.
acesso universal à educação, permanecendo a concepção Acompanhando o processo de mudança, as Diretrizes
de “políticas especiais” para tratar da educação de alunos Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica,
com deficiência. No que se refere aos alunos com Resolução CNE/CEB nº 2/2001, no artigo 2º, determinam
superdotação, apesar do acesso ao ensino regular, não é que:
organizado um atendimento especializado que considere as “Os sistemas de ensino devem matricular todos os
suas singularida- des de aprendizagem. alunos, cabendo às escolas organizarem-se para o aten-
A Constituição Federal de 1988 traz como um dos dimento aos educandos com necessidades educacionais
seus objetivos fundamentais “promover o bem de todos, especiais, assegurando as condições necessárias para uma
sem pre- conceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e educação de qualidade para todos.”
quaisquer outras formas de discriminação” (art.3º, inciso As Diretrizes ampliam o caráter da educação especial
IV). Define, no artigo 205, a educação como um direito de para realizar o atendimento educacional especializado
todos, garantindo o ple- no desenvolvimento da pessoa, o complementar ou suplementar à escolarização, porém, ao
exercício da cidadania e a qualificação para o trabalho. No admitir a possibilidade de substituir o ensino regular, não
seu artigo 206, inciso I, esta- belece a “igualdade de potencializam a adoção de uma política de educação
condições de acesso e permanência na escola” como um inclu- siva na rede pública de ensino, prevista no seu
dos princípios para o ensino e garante, como dever do artigo 2º.
Estado, a oferta do atendimento educacional especializado, O Plano Nacional de Educação – PNE, Lei nº
preferencialmente na rede regular de ensino (art. 208). 10.172/2001, destaca que “o grande avanço que a década
O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, Lei nº da educação deveria produzir seria a construção de uma
8.069/90, no artigo 55, reforça os dispositivos legais escola inclusiva que garanta o atendimento à diversidade
supraci- tados ao determinar que “os pais ou responsáveis humana”. Ao estabelecer objetivos e metas para que os
têm a obri- gação de matricular seus filhos ou pupilos na sis- temas de ensino favoreçam o atendimento às
rede regular de ensino”. Também nessa década, necessidades educacionais especiais dos alunos, aponta
documentos como a Decla- ração Mundial de Educação um déficit refe- rente à oferta de matrículas para alunos
para Todos (1990) e a Declaração de Salamanca (1994) com deficiência nas classes comuns do ensino regular, à
passam a influenciar a formulação das políticas públicas formação docente, à acessibilidade física e ao
da educação inclusiva. atendimento educacional espe- cializado.
Em 1994, é publicada a Política Nacional de Educação
Especial, orientando o processo de “integração A Convenção da Guatemala (1999), promulgada no
instrucional” que condiciona o acesso às classes comuns Brasil pelo Decreto nº 3.956/2001, afirma que as pessoas
do ensino regu- lar àqueles que “(...) possuem condições com deficiência têm os mesmos direitos humanos e liber-
de acompanhar e desenvolver as atividades curriculares dades fundamentais que as demais pessoas, definindo
programadas do ensi- no comum, no mesmo ritmo que os como discriminação com base na deficiência toda diferen-
alunos ditos normais” (p.19). Ao reafirmar os pressupostos ciação ou exclusão que possa impedir ou anular o
construídos a partir de padrões homogêneos de exercício dos direitos humanos e de suas liberdades
participação e aprendizagem, a Polí- tica não provoca uma fundamentais. Este Decreto tem importante repercussão
reformulação das práticas educacionais de maneira que na educação, exigindo uma reinterpretação da educação
sejam valorizados os diferentes potenciais de aprendizagem especial, com- preendida no contexto da diferenciação,
no ensino comum, mas mantendo a responsa- bilidade da adotado para pro- mover a eliminação das barreiras que
educação desses alunos exclusivamente no âmbi- to da impedem o acesso à escolarização.
educação especial. Na perspectiva da educação inclusiva, a Resolução
A atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, CNE/CP nº 1/2002, que estabelece as Diretrizes Curricula-
Lei nº 9.394/96, no artigo 59, preconiza que os sistemas de res Nacionais para a Formação de Professores da
ensi- no devem assegurar aos alunos currículo, métodos, Educação Básica, define que as instituições de ensino
recursos e organização específicos para atender às suas superior devem prever, em sua organização curricular,
necessidades; assegura a terminalidade específica àqueles formação docente voltada para a atenção à diversidade e
que não atingi- ram o nível exigido para a conclusão do que contemple co- nhecimentos sobre as especificidades
ensino fundamental, em virtude de suas deficiências; e dos alunos com ne- cessidades educacionais especiais.
assegura a aceleração de estudos aos superdotados para A Lei nº 10.436/02 reconhece a Língua Brasileira de Si-
conclusão do programa esco- lar. Também define, dentre nais – Libras como meio legal de comunicação e
as normas para a organização da educação básica, a expressão, determinando que sejam garantidas formas
“possibilidade de avanço nos cursos e nas séries mediante institucionali- zadas de apoiar seu uso e difusão, bem
verificação do aprendizado” (art. 24, inciso V) e “[...] como a inclusão da disciplina de Libras como parte
oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as integrante do currículo nos cursos de formação de
características do alunado, seus interesses, condições de professores e de fonoaudiologia.
vida e de trabalho, mediante cursos e exames” (art. 37).

23
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

A Portaria nº 2.678/02 do MEC aprova diretrizes e


nor- mas para o uso, o ensino, a produção e a difusão do b) As pessoas com deficiência possam ter acesso ao
siste- ma Braille em todas as modalidades de ensino, ensino fundamental inclusivo, de qualidade e gratuito, em
compreen- dendo o projeto da Grafia Braille para a Língua igualdade de condições com as demais pessoas na comu-
Portuguesa e a recomendação para o seu uso em todo o nidade em que vivem (Art.24).
território na- cional. Neste mesmo ano, a Secretaria Especial dos Direitos
Em 2003, é implementado pelo MEC o Programa Edu- Humanos, os Ministérios da Educação e da Justiça, junta-
cação Inclusiva: direito à diversidade, com vistas a apoiar a mente com a Organização das Nações Unidas para a Edu-
transformação dos sistemas de ensino em sistemas cação, a Ciência e a Cultura – UNESCO, lançam o Plano
educa- cionais inclusivos, promovendo um amplo Nacional de Educação em Direitos Humanos, que objetiva,
processo de for- mação de gestores e educadores nos dentre as suas ações, contemplar, no currículo da educa-
municípios brasileiros para a garantia do direito de acesso ção básica, temáticas relativas às pessoas com deficiência
de todos à escolariza- ção, à oferta do atendimento e desenvolver ações afirmativas que possibilitem acesso e
educacional especializado e à garantia da acessibilidade. permanência na educação superior.
Em 2004, o Ministério Público Federal publica o docu- Em 2007, é lançado o Plano de Desenvolvimento da
mento O Acesso de Alunos com Deficiência às Escolas e Educação – PDE, reafirmado pela Agenda Social, tendo
Classes Comuns da Rede Regular, com o objetivo de dis- como eixos a formação de professores para a educação
seminar os conceitos e diretrizes mundiais para a inclusão, es- pecial, a implantação de salas de recursos
reafirmando o direito e os benefícios da escolarização de multifuncionais, a acessibilidade arquitetônica dos prédios
alunos com e sem deficiência nas turmas comuns do en-
escolares, acesso e a permanência das pessoas com
sino regular.
deficiência na educação superior e o monitoramento do
Impulsionando a inclusão educacional e social, o De-
acesso à escola dos favore- cidos pelo Benefício de
creto nº 5.296/04 regulamentou as Leis nº 10.048/00 e nº
10.098/00, estabelecendo normas e critérios para a Prestação Continuada – BPC.
promo- ção da acessibilidade às pessoas com deficiência No documento do MEC, Plano de Desenvolvimento da
ou com mobilidade reduzida. Nesse contexto, o Educação: razões, princípios e programas é reafirmada a
Programa Brasil Acessível, do Ministério das Cidades, visão que busca superar a oposição entre educação
é desenvolvido com o objetivo de promover a regular e educação especial.
acessibilidade urbana e apoiar ações que garantam o Contrariando a concepção sistêmica da transversali-
acesso universal aos espaços públicos. dade da educação especial nos diferentes níveis, etapas e
O Decreto nº 5.626/05, que regulamenta a Lei nº modalidades de ensino, a educação não se estruturou na
10.436/2002, visando ao acesso à escola dos alunos perspectiva da inclusão e do atendimento às necessidades
surdos, dispõe sobre a inclusão da Libras como disciplina educacionais especiais, limitando, o cumprimento do prin-
curricular, a formação e a certificação de professor, cípio constitucional que prevê a igualdade de condições
instrutor e tra- dutor/intérprete de Libras, o ensino da para o acesso e permanência na escola e a continuidade
Língua Portuguesa como segunda língua para alunos nos níveis mais elevados de ensino (2007, p. 09).
surdos e a organização da educação bilíngue no ensino Para a implementação do PDE é publicado o Decreto
regular. nº 6.094/2007, que estabelece nas diretrizes do
Em 2005, com a implantação dos Núcleos de Compromisso Todos pela Educação, a garantia do acesso
Atividades de Altas Habilidades/Superdotação – NAAH/S e permanência no ensino regular e o atendimento às
em todos os estados e no Distrito Federal, são necessidades educa- cionais especiais dos alunos,
organizados centros de referência na área das altas
fortalecendo seu ingresso nas escolas públicas.
habilidades/superdotação para o atendimento
educacional especializado, para a orienta- ção às famílias
e a formação continuada dos professores, constituindo a Diagnóstico da Educação Especial
organização da política de educação inclu- siva de forma a
garantir esse atendimento aos alunos da rede pública de O Censo Escolar/MEC/INEP, realizado anualmente em
ensino. todas as escolas de educação básica, possibilita o acom-
A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Defi- panhamento dos indicadores da educação especial:
ciência, aprovada pela ONU em 2006 e da qual o Brasil é acesso à educação básica, matrícula na rede pública,
signatário, estabelece que os Estados-Partes devem asse- ingresso nas classes comuns, oferta do atendimento
gurar um sistema de educação inclusiva em todos os educacional espe- cializado, acessibilidade nos prédios
níveis de ensino, em ambientes que maximizem o escolares, municípios com matrícula de alunos com
desenvolvi- mento acadêmico e social compatível com a necessidades educacionais especiais, escolas com acesso
meta da plena participação e inclusão, adotando medidas ao ensino regular e formação docente para o atendimento
para garantir que: às necessidades educacionais especiais dos alunos.
a) As pessoas com deficiência não sejam excluídas Para compor esses indicadores no âmbito da
do sistema educacional geral sob alegação de deficiência educação especial, o Censo Escolar/MEC/INEP coleta
e que as crianças com deficiência não sejam excluídas do dados referen- tes ao número geral de matrículas; à oferta
ensino fundamental gratuito e compulsório, sob alegação da matrícula nas escolas públicas, escolas privadas e
de deficiência; privadas sem fins lucrativos; às matrículas em classes
especiais, escola es-

24
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

pecial e classes comuns de ensino regular; ao número de


Aponta também o aumento do número de escolas
alunos do ensino regular com atendimento educacional
com matrícula, que em 1998 registra apenas 6.557 esco-
especializado; às matrículas, conforme tipos de deficiência,
las e, em 2006 passa a registrar 54.412, representando um
transtornos do desenvolvimento e altas crescimento de 730%. Das escolas com matrícula em 2006,
habilidades/super- dotação; à infraestrutura das escolas 2.724 são escolas especiais, 4.325 são escolas comuns com
quanto à acessibilida- de arquitetônica, à sala de recursos classe especial e 50.259 são escolas de ensino regular com
ou aos equipamentos específicos; e à formação dos matrículas nas turmas comuns.
professores que atuam no atendimento educacional O indicador de acessibilidade arquitetônica em
especializado. prédios escolares, em 1998, aponta que 14% dos 6.557
A partir de 2004, são efetivadas mudanças no instru- estabele- cimentos de ensino com matrícula de alunos
mento de pesquisa do Censo, que passa a registrar a sé- com neces- sidades educacionais especiais possuíam
rie ou ciclo escolar dos alunos identificados no campo da sanitários com acessibilidade. Em 2006, das 54.412 escolas
educação especial, possibilitando monitorar o percurso com matrículas de alunos atendidos pela educação
escolar. Em 2007, o formulário impresso do Censo Escolar especial, 23,3% pos- suíam sanitários com acessibilidade e
foi transformado em um sistema de informações on-line, 16,3% registraram ter dependências e vias adequadas
o Censo Web, que qualifica o processo de manipulação e (dado não coletado em 1998). No âmbito geral das
tratamento das informações, permite atualização dos da- escolas de educação básica, o índice de acessibilidade dos
dos dentro do mesmo ano escolar, bem como possibilita prédios, em 2006, é de apenas 12%.
o cruzamento com outros bancos de dados, tais como os Com relação à formação inicial dos professores que
das áreas de saúde, assistência e previdência social. atuam na educação especial, o Censo de 1998, indica
Também são realizadas alterações que ampliam o que 3,2% possui ensino fundamental, 51% ensino médio
e 45,7% ensino superior. Em 2006, dos 54.625 professores
universo da pes- quisa, agregando informações
nessa função, 0,62% registram ensino fundamental, 24%
individualizadas dos alunos, das turmas, dos professores e
ensino médio e 75,2% ensino superior. Nesse mesmo ano,
da escola.
77,8% desses professores, declararam ter curso específico
Com relação aos dados da educação especial, o Censo nessa área de conhecimento.
Escolar registra uma evolução nas matrículas, de 337.326
em 1998 para 700.624 em 2006, expressando um cresci- Objetivo da Política Nacional de Educação Especial
mento de 107%. No que se refere ao ingresso em classes na Perspectiva da Educação Inclusiva
comuns do ensino regular, verifica-se um crescimento de
640%, passando de 43.923 alunos em 1998 para 325.316 A Política Nacional de Educação Especial na Perspec-
em 2006. tiva da Educação Inclusiva tem como objetivo o acesso, a
Quanto à distribuição dessas matrículas nas esferas participação e a aprendizagem dos alunos com
pública e privada, em 1998 registra-se 179.364 (53,2%) deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e
alu- nos na rede pública e 157.962 (46,8%) nas escolas altas habilida- des/superdotação nas escolas regulares,
privadas, principalmente em instituições especializadas orientando os sis- temas de ensino para promover
filantrópicas. Com o desenvolvimento das ações e respostas às necessidades educacionais especiais,
políticas de educação inclusiva nesse período, evidencia- garantindo:
se um crescimento de 146% das matrículas nas escolas - Transversalidade da educação especial desde a edu-
públicas, que alcançaram cação infantil até a educação superior;
441.155 (63%) alunos em 2006. - Atendimento educacional especializado;
Com relação à distribuição das matrículas por etapa - Continuidade da escolarização nos níveis mais eleva-
de ensino em 2006: 112.988 (16%) estão na educação dos do ensino;
infan- - Formação de professores para o atendimento edu-
cacional especializado e demais profissionais da educação
til, 466.155 (66,5%) no ensino fundamental, 14.150 (2%) no
para a inclusão escolar;
ensino médio, 58.420 (8,3%) na educação de jovens e
- Participação da família e da comunidade;
adul- tos, e 48.911 (6,3%) na educação profissional. No
- Acessibilidade urbanística, arquitetônica, nos mobi-
âmbito da educação infantil, há uma concentração de liários e equipamentos, nos transportes, na comunicação e
matrículas nas escolas e classes especiais, com o registro informação; e
de 89.083 alunos, enquanto apenas 24.005 estão - Articulação intersetorial na implementação das polí-
matriculados em turmas comuns. ticas públicas.
O Censo da Educação Especial na educação superior
registra que, entre 2003 e 2005, o número de alunos pas- Alunos atendidos pela Educação Especial
sou de 5.078 para 11.999 alunos, representando um cres-
cimento de 136%. A evolução das ações referentes à edu- Por muito tempo perdurou o entendimento de que a
cação especial nos últimos anos é expressa no educação especial, organizada de forma paralela à educa-
crescimento de 81% do número de municípios com ção comum, seria a forma mais apropriada para o atendi-
matrículas, que em 1998 registra 2.738 municípios (49,7%) mento de alunos que apresentavam deficiência ou que
e, em 2006 alcança não se adequassem à estrutura rígida dos sistemas de
4.953 municípios (89%). ensino.

25
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Essa concepção exerceu impacto duradouro na


A partir dessa conceituação, considera-se pessoa com
história da educação especial, resultando em práticas que
deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo,
enfati- zavam os aspectos relacionados à deficiência, em
de natureza física, mental ou sensorial que, em interação
contra- posição à sua dimensão pedagógica. O
com diversas barreiras, podem ter restringida sua partici-
desenvolvimento de estudos no campo da educação e
pação plena e efetiva na escola e na sociedade. Os alunos
dos direitos humanos vêm modificando os conceitos, as
com transtornos globais do desenvolvimento são aqueles
legislações, as práticas educacionais e de gestão,
que apresentam alterações qualitativas das interações so-
indicando a necessidade de se promover uma
ciais recíprocas e na comunicação, um repertório de inte-
reestruturação das escolas de ensino regu- lar e da
resses e atividades restrito, estereotipado e repetitivo. In-
educação especial.
cluem-se nesse grupo alunos com autismo, síndromes do
Em 1994, a Declaração de Salamanca proclama que as
espectro do autismo e psicose infantil. Alunos com altas
escolas regulares com orientação inclusiva constituem os
habilidades/superdotação demonstram potencial elevado
meios mais eficazes de combater atitudes discriminatórias
em qualquer uma das seguintes áreas, isoladas ou combi-
e que alunos com necessidades educacionais especiais
nadas: intelectual, acadêmica, liderança, psicomotricidade
devem ter acesso à escola regular, tendo como princípio
e artes, além de apresentar grande criatividade, envolvi-
orientador que “as escolas deveriam acomodar todas as
mento na aprendizagem e realização de tarefas em áreas
crianças independentemente de suas condições físicas, in-
de seu interesse.
telectuais, sociais, emocionais, linguísticas ou outras”.
O conceito de necessidades educacionais especiais,
Diretrizes da Política Nacional de Educação
que passa a ser amplamente disseminado a partir dessa
Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva
Declaração, ressalta a interação das características indi-
viduais dos alunos com o ambiente educacional e social.
A educação especial é uma modalidade de ensino que
No entanto, mesmo com uma perspectiva conceitual que
perpassa todos os níveis, etapas e modalidades, realiza o
aponte para a organização de sistemas educacionais
atendimento educacional especializado, disponibiliza os
inclu- sivos, que garanta o acesso de todos os alunos e os
recursos e serviços e orienta quanto a sua utilização no
apoios necessários para sua participação e aprendizagem,
processo de ensino e aprendizagem nas turmas comuns
as po- líticas implementadas pelos sistemas de ensino não
do ensino regular.
alcan- çaram esse objetivo.
O atendimento educacional especializado tem como
Na perspectiva da educação inclusiva, a educação es-
função identificar, elaborar e organizar recursos pedagó-
pecial passa a integrar a proposta pedagógica da escola
gicos e de acessibilidade que eliminem as barreiras para a
regular, promovendo o atendimento às necessidades edu-
plena participação dos alunos, considerando suas necessi-
cacionais especiais de alunos com deficiência, transtornos
dades específicas. As atividades desenvolvidas no atendi-
globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdo-
mento educacional especializado diferenciam-se daquelas
tação. Nestes casos e outros, que implicam em
realizadas na sala de aula comum, não sendo substitutivas
transtornos funcionais específicos, a educação especial
à escolarização. Esse atendimento complementa e/ou su-
atua de forma articulada com o ensino comum,
plementa a formação dos alunos com vistas à autonomia
orientando para o aten- dimento às necessidades
e independência na escola e fora dela.
educacionais especiais desses alunos.
Dentre as atividades de atendimento educacional es-
pecializado são disponibilizados programas de enriqueci-
A educação especial direciona suas ações para o aten-
mento curricular, o ensino de linguagens e códigos espe-
dimento às especificidades desses alunos no processo
cíficos de comunicação e sinalização e tecnologia assistiva.
educacional e, no âmbito de uma atuação mais ampla na
Ao longo de todo o processo de escolarização esse aten-
escola, orienta a organização de redes de apoio, a forma-
dimento deve estar articulado com a proposta pedagógica
ção continuada, a identificação de recursos, serviços e o
do ensino comum. O atendimento educacional
desenvolvimento de práticas colaborativas.
especializa- do é acompanhado por meio de instrumentos
Os estudos mais recentes no campo da educação es-
que possi- bilitem monitoramento e avaliação da oferta
pecial enfatizam que as definições e uso de classificações
realizada nas escolas da rede pública e nos centros de
devem ser contextualizados, não se esgotando na mera
atendimento edu- cacional especializados públicos ou
especificação ou categorização atribuída a um quadro de
conveniados.
deficiência, transtorno, distúrbio, síndrome ou aptidão.
O acesso à educação tem início na educação infantil,
Considera-se que as pessoas se modificam
na qual se desenvolvem as bases necessárias para a
continuamente, transformando o contexto no qual se
constru- ção do conhecimento e desenvolvimento global
inserem. Esse dina- mismo exige uma atuação pedagógica
do aluno. Nessa etapa, o lúdico, o acesso às formas
voltada para alterar a situação de exclusão, reforçando a
diferenciadas de comunicação, a riqueza de estímulos nos
importância dos am- bientes heterogêneos para a
aspectos físicos, emocionais, cognitivos, psicomotores e
promoção da aprendizagem de todos os alunos.
sociais e a convi- vência com as diferenças favorecem as
relações interpes- soais, o respeito e a valorização da
criança.

26
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Do nascimento aos três anos, o atendimento educa-


cional especializado se expressa por meio de serviços de avaliação os aspectos qualitativos que indiquem as inter-
estimulação precoce, que objetivam otimizar o processo venções pedagógicas do professor. No processo de ava-
de desenvolvimento e aprendizagem em interface com os liação, o professor deve criar estratégias considerando
serviços de saúde e assistência social. Em todas as etapas que alguns alunos podem demandar ampliação do tempo
e modalidades da educação básica, o atendimento educa- para a realização dos trabalhos e o uso da língua de sinais,
cional especializado é organizado para apoiar o desenvol- de textos em Braille, de informática ou de tecnologia
vimento dos alunos, constituindo oferta obrigatória dos assistiva como uma prática cotidiana.
sistemas de ensino. Deve ser realizado no turno inverso ao Cabe aos sistemas de ensino, ao organizar a educação
da classe comum, na própria escola ou centro especializa- especial na perspectiva da educação inclusiva, disponibi-
do que realize esse serviço educacional. lizar as funções de instrutor, tradutor/intérprete de Libras
Desse modo, na modalidade de educação de jovens e guia intérprete, bem como de monitor ou cuidador dos
e adultos e educação profissional, as ações da educação alunos com necessidade de apoio nas atividades de higie-
especial possibilitam a ampliação de oportunidades de es- ne, alimentação, locomoção, entre outras, que exijam
colarização, formação para ingresso no mundo do auxí- lio constante no cotidiano escolar.
trabalho e efetiva participação social. Para atuar na educação especial, o professor deve ter
A interface da educação especial na educação indíge- como base da sua formação, inicial e continuada, conhe-
na, do campo e quilombola deve assegurar que os cimentos gerais para o exercício da docência e conheci-
recursos, serviços e atendimento educacional mentos específicos da área. Essa formação possibilita a
especializado estejam presentes nos projetos sua atuação no atendimento educacional especializado,
pedagógicos construídos com base nas diferenças apro- funda o caráter interativo e interdisciplinar da
socioculturais desses grupos. atuação nas salas comuns do ensino regular, nas salas de
recursos, nos centros de atendimento educacional
Na educação superior, a educação especial se efetiva especializado, nos nú- cleos de acessibilidade das
por meio de ações que promovam o acesso, a permanên- instituições de educação supe- rior, nas classes
cia e a participação dos alunos. Estas ações envolvem o hospitalares e nos ambientes domiciliares, para a oferta
planejamento e a organização de recursos e serviços para dos serviços e recursos de educação especial.
a promoção da acessibilidade arquitetônica, nas Para assegurar a intersetorialidade na implementação
comunica- ções, nos sistemas de informação, nos das políticas públicas a formação deve contemplar conhe-
materiais didáticos e pedagógicos, que devem ser cimentos de gestão de sistema educacional inclusivo, ten-
disponibilizados nos proces- sos seletivos e no do em vista o desenvolvimento de projetos em parceria
desenvolvimento de todas as atividades que envolvam o com outras áreas, visando à acessibilidade arquitetônica,
ensino, a pesquisa e a extensão. aos atendimentos de saúde, à promoção de ações de
Para o ingresso dos alunos surdos nas escolas assis- tência social, trabalho e justiça.
comuns, a educação bilíngue – Língua Portuguesa/Libras Os sistemas de ensino devem organizar as condições
desenvol- ve o ensino escolar na Língua Portuguesa e na de acesso aos espaços, aos recursos pedagógicos e à co-
língua de sinais, o ensino da Língua Portuguesa como municação que favoreçam a promoção da aprendizagem
segunda lín- gua na modalidade escrita para alunos e a valorização das diferenças, de forma a atender as
surdos, os serviços de tradutor/intérprete de Libras e neces- sidades educacionais de todos os alunos. A
Língua Portuguesa e o ensino da Libras para os demais acessibilidade deve ser assegurada mediante a eliminação
alunos da escola. O atendi- mento educacional de barreiras arquitetônicas, urbanísticas, na edificação –
especializado para esses alunos é ofer- tado tanto na incluindo ins- talações, equipamentos e mobiliários – e
modalidade oral e escrita quanto na língua de sinais. nos transportes escolares, bem como as barreiras nas
Devido à diferença linguística, orienta-se que o aluno comunicações e in- formações.
surdo esteja com outros surdos em turmas comuns na
escola regular. Referência:
O atendimento educacional especializado é realizado http://peei.mec.gov.br/arquivos/politica_nacional_
mediante a atuação de profissionais com conhecimentos educacao_especial.pdf
específicos no ensino da Língua Brasileira de Sinais, da
Língua Portuguesa na modalidade escrita como segunda ÉTICA: OS DESAFIOS E CONTRADIÇÕES
língua, do sistema Braille, do Soroban, da orientação e NA PROFISSÃO DOCENTE
mo- bilidade, das atividades de vida autônoma, da
comunica- ção alternativa, do desenvolvimento dos As várias transformações ocorridas no processo histó-
processos mentais superiores, dos programas de rico nos exigem mudanças de modelos, de ações, de ati-
enriquecimento curricular, da adequação e produção de tudes, de postura, enfim, de atuação pessoal e social. São
materiais didáticos e pedagó- gicos, da utilização de muitas e significativas mudanças, vivemos um tempo em
recursos ópticos e não ópticos, da tecnologia assistiva e que as informações e a comunicação, essenciais para a
outros. compreensão e a participação no mundo, se processam
A avaliação pedagógica como processo dinâmico ra- pidamente. Os avanços tecnológicos nos impulsionam
considera tanto o conhecimento prévio e o nível atual de até mesmo para novas formas de viver e sentir o mundo,
desenvolvimento do aluno quanto às possibilidades de novas formas de ver o próprio homem.
aprendizagem futura, configurando uma ação pedagógica
processual e formativa que analisa o desempenho do
aluno em relação ao seu progresso individual,
prevalecendo na
27
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Em meio a tantas mudanças, questionamo-nos sobre


o que fazer com elas, sobre sua validade, sua essência, A ética trata da conduta humana diante do bem e do
sobre nosso fazer diário no processo de educar. Tantos mal. Ou, “daquilo que tem valor, do que realmente tem
avanços e tantas exigências, muitas vezes extemporâneos, impor- tância, do sentido da vida, do que torna a vida
digna de ser vivida ou da maneira correta de viver”.
que geram dúvidas, questionamentos, insegurança. O
mundo nos pede rapidez, capacidade, conhecimento, mas Uma educação em sintonia com a prática da ética
deve pressupor ação afetiva, que liga, toca, desperta,
não nos mostra o como utilizar tudo isso de maneira
compreende, encaminha, partilha. Deve buscar apreender
correta, de forma a pro- mover maior equilíbrio e
conceitos, técni- cas, saberes, que sejam significativos,
felicidade para as pessoas.
transformadores, cons- trutores de pessoas, através de
Desvelar o processo de construção e aplicação dos
procedimentos relacionais, desafiadores, geradores de
co- nhecimentos sempre foi a meta de vários estudos ao
seres humanos e não apenas de pessoas. O conhecer
longo da história, que mesmo hoje, diante de tantos
assim transforma-se em uma atividade volitiva, que deve
avanços e de um grande número de pesquisas, constitui-se
levar ao transcender, ao aperfeiçoar, ao ser e não apenas ao
como algo em constante interrogação. O que e para que
fazer, um instrumento de consciência do nosso agir no
aprendemos? Por que a escola ainda tem tanta dificuldade
mundo.
em formar também para a dimensão ética?
O processo de educar precisa fazer com que saibamos
uti- lizar as informações e os conhecimentos na efetivação
Quando se fala em ética na educação, precisamos
de pes- soas melhores e mais responsáveis por si mesmas e
con- siderar que as implicações educacionais desse fazer
pelo mun- do em que vivem. De nada adianta acumular
se dão a partir do apelo à humanidade advindo de outrem
saberes e infor- mações, se estes não nos tornam melhores
e a pos- sibilidade de uma resposta incondicionalmente
e mais capazes de agir e melhorar o meio em que
responsável. Uma pedagogia da ética começa pelo convivemos e em que atuamos. Educar é acreditar na
respeito ao outro, à humanidade que se mostra a partir de perfeição humana, na capacidade inata de aprender sobre
outrem. coisas, valores, memórias, fatos, que podem ser sabidos e
Se nos preocupamos com a construção de uma merecem ser, e que nós, homens e mu- lheres, precisamos
socieda- de ética, devemos reconhecer que o alicerce para e podemos com aquilo que conhecemos, encontrar meios
um futuro digno é a educação, portanto, se faz necessária de melhorar a nós mesmos e o mundo em que vivemos. É
uma constan- te reflexão sobre as implicações educacionais um fazer de risco, um processo de ação e rea- ção, rupturas
a partir do ape- lo à humanidade advinda de e com o e tecimentos, erros e acertos, dúvidas e certezas. É oferecer
outro e a possibilidade de uma resposta conhecimentos que transcendem e se transformam em
incondicionalmente responsável. sabedoria, e assim, nos faz querer o aperfeiçoar constante, na
Acredita-se na educação como espaço de encontro, intenção de ser melhor e ajudar o outro a ser também, num
de acolhida, de resposta ao outro em sua diferença, despertar interno para uma vida produtiva, destinada a
portanto a educação é concebida de modo buscar
eminentemente ético. Pen- sar a educação a partir de seu os desígnios do bem.
fundamento ético implica em pensá-la na perspectiva do Temos enxergado tanta destruição não só do meio, como
encontro e da acolhida. também de nós mesmos. Vivemos momentos de
Assim, conhecer e educar para a ética ultrapassa as perplexidade, de dúvidas provocadas pelas profundas
linhas da objetividade, da personalidade, das técnicas, da transformações cultu- rais, científicas, tecnológicas, políticas,
subjetivi- dade, num processo dialético de ir e vir ao morais, que atestam a decadência dos povos, a ausência de
mundo e ao ser. É um definir o mundo e um definir-se liberdade moral. Estamos carentes do humano, nos
diário, já que o conheci- mento supõe, em primeiro lugar, o encontramos diante de situações-li- mite que nos envolvem
“conhecer-se a si mesmo”, buscando algo que possa nos e nos questionam sobre o que temos sido e o que temos
definir por dentro, interligando a humanidade ao seu feito a nós mesmos e ao mundo. É como se nos dissessem:
destino e à sua busca pela felicidade. “Vivam o presente, porque não há futuro”. Reflexo disso é
A necessidade de revigorar a reflexão ética se dá pela esse imediatismo, esse consumismo, esse indi- vidualismo,
percepção de uma grande banalização quanto aos essa falta de respeito pelo outro, pela própria vida. Estamos
conceitos da ética nas relações interpessoais, sejam elas vivendo o “social conformismo”.
formais ou in- formais. Vivemos uma enorme lacuna, nos
sentimos profun- damente distantes de interação com as Sentimos falta de valores, como respeito, temperança,
pessoas, o que nos dá margem para o surgimento de co- ragem, solidariedade, amor. Valores que concretizam o
posturas e condutas que se aproximam do caráter que é a nossa marca profunda, valores que nos
descompromisso em suas várias dimensões. tornam depen- dentes e responsáveis com e pelo mundo,
que nos faz aderidos a uma causa humana, ao sentimento
Segundo Vázquez (1996), “ética é a ciência do e opinião do e para o outro, da cultura da tolerância e do
comporta- mento moral dos homens em sociedade”. É uma humano, do transcender a esfera do comum.
ciência, pois tem objeto próprio, leis próprias e método “Valores que continuam sendo cada vez mais
próprio. Assim, o objeto da Ética é a moral. A moral é um desejados pela humanidade, e tratar deles constitui uma
dos aspectos do com- portamento humano. A expressão necessidade que deve ser assumida por todas as instituições
deriva da palavra romana mores, com o sentido de que educam”. No entanto, esta não é uma tarefa fácil e
costumes, conjunto de normas adqui- ridas pelo hábito para que este trabalho seja efetivo na formação das
reiterado de sua prática. Portanto, “a moral se edifica com virtudes, é imprescindível levar em conta a dimensão da
o bom exemplo, não com palavras. Nutre-se e afirma-se manifestação dos sentimentos e emo- ções, da afetividade
numa atitude que surge do ser interno como impe- rativo contida nas relações entre as pessoas, tão em falta nos dias
da consciência”. atuais.
28
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Diante desse cenário é que reconhecemos a dimensão


do papel da educação, como também podemos observar A escola hoje tem dedicado pouco tempo ao
que muito se tem inovado nas análises epistemológicas e problema da ética nas atividades escolares. A escola tem
metodológicas, mas ainda são poucas as ações sido instru- tiva e pouco formadora. Vejamos o que nos
educativas, que realmente efetivam teorias éticas em fala Chalita:
prática. Sabe-se que a educação é a socialização das A disposição científica nos permite explicar os
fenôme- nos da natureza, a disposição técnica possibilita
gerações e, uma possi- bilidade de impulso à
que aja- mos de modo a transformar o ambiente para
transformação. “A sociedade contem- porânea tem na
torná-lo mais favorável aos nossos desejos, o
escola um lugar privilegiado para a concre- tização do
discernimento nos possi- bilita o conhecimento do bem e
ideal de humanidade construído em torno dos valores da
do mal, a inteligência nos permite apreender os
democracia, da justiça, da paz e da solidariedade”. Neste
fundamentos dos diferentes conhe- cimentos e a
universo de diferenças, de complexidades e de paradoxos,
sabedoria, por último, mas não menos impor- tante,
a dimensão axiológica se impõe por se tratar de uma ação
permite saber nosso lugar no mundo e em relação às
de sujeitos sobre o contexto que os cerca e por se
outras pessoas, é ela o que possibilita nosso crescimento
dar em um espaço de vida de educandos e de educadores.
como pessoas e abre caminho para agirmos com justiça
Sendo assim, toda ação educativa deveria estar impli-
rumo à felicidade.
cada com a construção de uma consciência ética e social,
Portanto, superar esta relação muitas vezes linear e
sendo imperativa a reflexão sobre as virtudes no cotidiano
mecânica entre o conhecimento teórico e as práticas hu-
escolar e a discussão e efetivação de propostas
manas se torna fundamental, almejando um perfil de
pedagógicas que levem em conta a formação de um
esco- la, que tenha por objetivo formar para a cidadania e
ambiente sociomoral cooperativo e participativo.
con- tribuir para socializar os valores e as práticas
democráticas baseadas em valores que promovam a
Em muitas situações, temos percebido que o tema das dignidade humana. Ética é mais do que apenas o dever, é
virtudes desapareceu das escolas. Casos de desrespeito, eu me comover com o outro e me sentir feliz de poder
de falta de limites, de assédio têm sido comuns, mas a ajudar o outro.
radica- lidade da crise ética nos impõe o desafio de
reinserir temas morais da formação humana nos
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (2000) apresen-
processos educacionais em todas as suas dimensões.
tam a educação comprometida com o desenvolvimento
Conhecer e viver nossos limi- tes nos leva a aprender o total da pessoa. Aprender supõe a preparação do indiví-
sentido da vida, de pertença, de conviver duo para elaborar pensamentos autônomos e críticos e
verdadeiramente. para formular seus próprios juízos de valor, de modo a
O resgate das virtudes na educação implica conceber poder decidir por si mesmo, frente às diferentes circuns-
a construção da personalidade de pessoas com valores tâncias da vida. Portanto, é através de práticas educativas
mo- rais. As virtudes “são nossos valores morais, se comprometidas, que o conhecimento sobre ética poderá
quiserem, mais encarnados, tantos quanto quisermos, mas ser reforçado, criando-se assim, condições que preparem
vividos, mas em ato”. as pessoas para assumir suas responsabilidades e
Vejamos o que nos fala Silva sobre a importância de construir ou reconstruir uma sociedade mais igualitária,
educar para os valores: mais justa, mais humana. Acreditamos que esta é a mais
Somente uma educação pautada em sólidos valores bela missão do processo educativo.
al- truístas poderá fazer surgir uma nova ética social que Também o artigo 2º da LDB (1996) considera que, ins-
seja capaz de conciliar direitos individuais com pirada nos princípios da liberdade e nos ideais de solida-
responsabilidades interpessoais e coletivas. A riedade humana, é finalidade da educação nacional o
aprendizagem altruísta é o único caminho possível para pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o
combatermos a cultura (...) pautada na insensibilidade exercí- cio da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
interpessoal e na ausência da solidarie- dade coletiva. A LDB institui que a escola é um espaço de formação
Conforme alguns estudiosos, existem hoje três de cidadãos e de difusão de valores que expressem a
preocu- pações que devem orientar nossa reflexão sobre a cida- dania e a ética, mas não considera que a ideia da
educação para o século XXI: a ética, a política e a educação como formação do homem e do cidadão
epistemológica, ou seja, precisamos de uma reflexão sobre pressupõe que a escola também deva ser pensada como
a construção de uma pedagogia que compreenda um espaço no qual estes valores estejam presentes. Para
aspectos cognitivos, morais e afetivos. Pergunta-se então, que a escola seja ins- piradora de valores éticos, é preciso
como esta questão está sendo vivida dentro das escolas e que ela também seja um espaço ético, operando por
se existe uma formação que ob- jetiva a qualidade meios éticos.
formativa e humana. É possível então, que através de um processo educati-
São várias as teorias de produção e prática de conhe- vo contínuo e integrado com várias instâncias sociais, uti-
cimentos analisadas por autores como Zabala, Coll, Morin, lizando de todos os recursos humanos e técnicos disponí-
entre outros, afirmando que a educação se faz e se veis, na constante perseguição de tornar possível o
constrói através da inter-relação do conteúdo com a amanhã impossível de hoje, possamos vivenciar esta
prática, sendo necessária a atribuição de significados ao aprendizagem contextualizada, como também formar
que se aprende e que, no processo de práticas educativas pessoas cientes da importância da prática e exercício ético
é preciso incorporar uma visão crítica e questionadora em todos os am- bientes em que se convive. Esta prática
quanto à prática das virtu- des, que não aceita a realidade educativa da e na escola é certamente um projeto de
como estável e determinada. ‘criação histórica’, pois visa transformar processos e
práticas educativas tão arrai- gadas em técnicas e
informações.
29
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Analisando a História da educação brasileira, através


O acesso e uso do conhecimento consciente, o viver
de Romanelli (2001), percebemos que os sistemas educa-
a educação em todos os meios e níveis, a prática da ética
cionais no país ainda possuem estruturas muito frágeis e
no ambiente da escola, reforçam nossa responsabilidade
são alvos de frequentes reformas superficiais que pouco
em assumir o que somos, nos possibilitando usar nossa li-
le- vam a mudar positivamente. Já Gadotti (1995) afirma
berdade, através da prática do livre-arbítrio, buscando o
que é por esse motivo que precisamos tornar-nos agentes
resgate cotidiano da vida em todas as suas instâncias. “O
dessa transformação necessária e sonhada, enxergando na
conhecimento pode e deve ser transformador e a sabedo-
edu- cação um campo fértil para mudanças e práticas dos
ria é exatamente essa capacidade de utilizá-lo a serviço do
valo- res já que a escola é uma das mais importantes
bem”.
instituições, com capacidade de atingir um grande
Já se disse que “fica sempre um pouco de perfume
número de pessoas.
nas mãos que oferecem rosas”. A busca pelo resgate e
práti- ca dos valores através do processo de educar
A educação assim, poderá ser vista como uma ativi-
contribui, de maneira significativa, para a construção da
dade humana participante da totalidade da organização
paz pessoal e social, afinal, como humanos, recebemos
social. Por outro lado, poderá também transformar cada
dons especiais que nos tornam capazes de dividir, trocar,
um em agente, não só pelo que realiza, mas também
buscar o ser no lugar do ter, liberar nossas energias
pelos resultados e consequências da ação.
infinitas, nossa cria- tividade ilimitada, aplicar aquilo que
Educação e ética, desta forma, se imbricam
somos capazes para alguma forma de bem comum. Uma
necessaria- mente, e quanto a isso Saviani nos diz:
das coisas mais nobres da vida é saber doar-se ao outro, é
Podemos, pois, dizer que a natureza humana não é
viver a generosidade, a solidariedade, a justiça, a
dada ao homem, mas é por ele produzida sobre a base da
tolerância, a temperança e tan- tos outros valores que nos
natureza biofísica. Consequentemente, o trabalho educati-
são essenciais, e nessa dialogi- cidade vivida no processo
vo é o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada
do educar, ao invés de perder, acrescentamos, cada vez
indivíduo singular, a humanidade que é produzida
mais, naquilo que estamos nos tornando como gente.
histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens.
Esta prática educativa provavelmente possibilitará a
Queremos uma escola, onde a ideia não amarre, mas
todos os envolvidos, a capacidade de conviver com ética
liberte. Escola oficina da vida, que se faz saber do bem
e viver como cidadãos, substituindo o conceito distorcido
que- rer. Escolas que assumam, mesmo com tantas
de que a função da escola tem sido o de apenas preparar
adversidades sociais e governamentais, não só a
quadros para o mercado de trabalho. A escola, em todos
dimensão técnica, mas acima de tudo a de formação
os níveis, tem uma função, acima de tudo, civilizatória,
humana, pois estes são os sa- beres levados por toda a
ampla e profunda. Ela não existe apenas para informar,
vida. Quem educa tem um papel muito mais amplo do
mas tam- bém para formar pessoas não só como homens,
que simplesmente transmitir saberes. A cultura e a prática
mas como civilizados, verdadeiros seres humanos.
ética levar-nos-ão a perceber que, efetivamente, vida é
Para que tudo isso se efetive e se faça cumprir é
uma obra de arte aberta, que os pre- ceitos éticos são
neces- sário o comprometimento dos professores. É
como técnicas de uma arte de viver me- lhor a vida, uma
preciso que eles acreditem que é possível ensinar a
arte que envolve sempre a própria vida e a vida dos que
virtude, que é pos- sível ensinar ética para a vivência da
estão ao lado, voluntária ou involuntaria-
cidadania.
mente.
Contudo, ainda percebemos que “a educação foi
Ainda temos muito que caminhar, muito que transfor-
quase inteiramente identificada com escolarização”. Desta
mar, mas acreditamos que os caminhos têm sido construí-
forma, a questão do papel do professor ganha uma
dos, pois as relações entre as condições históricas, episte-
relevância ain- da maior porque será a partir dele, de suas
mológicas e pedagógicas, têm condicionando-nos a esta
atitudes, da maneira como organiza os conteúdos, como
mudança e levando-nos a reformar a educação brasileira,
elabora suas aulas, como se relaciona com seus alunos, da
construindo um modelo que se baseia na formação inte-
forma como lida com seus preconceitos e conceitos que
gral do ser humano, afinal, nós professores conjugamos o
outros valores e virtudes poderão ser definidos.
verbo fundamental e essencial que está acima de qualquer
Diante de tantos desafios que nos são postos a todo
gramática, de qualquer moeda e de qualquer política, o
instante, o acesso ao conhecimento é um forte
verbo amar, razão de ser e de viver. É como já disse
instrumento na capacitação e na formação de consciência
Fernan- do Pessoa: “Para ser grande é preciso ser inteiro”.
humana, já que a sua ausência limita e dificulta a maneira
Educar, se educar, dividir, acrescentar, fazer, ter
de viver e os meios de atuação. Só que este conhecimento
coragem, seguir, ir até o fim. Mas, não há fim, tudo termina
só é prolífico quando utilizado de maneira fecunda,
no eterno
através de princípios éticos, na busca do aperfeiçoamento
recomeçar, com cada um de nós e, com o outro.
humano. A arte de educar, de aprender, de ensinar,
encontra sua máxima ex- pressão na alma daqueles que
Fonte
têm consciência do seu pa- pel como pessoas, que vivem
LODI, I. G. M. Disponível em http://www.uniaraxa.edu.
e praticam os valores.
br/

30
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Nesse sentido, o negociante ou comerciante, por meio


A QUALIDADE SOCIAL DA EDUCAÇÃO ESCOLAR E A dos códigos comerciais, oferece um produto, um artefato,
EDUCAÇÃO PARA A DIVERSIDADE NUMA uma coisa aos consumidores e evidencia as qualidades e
PERSPECTIVA MULTICULTURAL. atributos do objeto em apreço, com a finalidade de sobre-
por-se aos concorrentes e assegurar constantes negócios
na praça, feira ou mercado. Um dos aspectos da relação
direta entre produtores e comerciantes com os consumi-
As questões sociais estão imbricadas no modo de dores é a capacidade de se avaliar o objeto ou a coisa,
pro- dução e distribuição dos bens materiais produzidos acionando os atributos de utilidade, qualidade e compa-
pelos sujeitos na sociedade, em espaços e tempos rabilidade. Com efeito, no campo econômico, as relações
históricos. Elas constituem parte de um todo e as são mediadas por alguns parâmetros de qualidade que re-
separamos com a fina- lidade de apreender o social- gulam compra, venda e troca, enfim, o valor monetário do
histórico construído e deter- minado pelo movimento objeto ou produto. Alguns deles são:
econômico. Os movimentos cons- titutivos da vida
econômica e política produzem práticas e relações a) o bem-estar pessoal ou coletivo, conforto do objeto
ou da coisa;
sociais e, ao fazê-lo, evidenciam características que a
acumulação de capital assume em um tempo his- tórico
b) a utilidade e a praticidade que indicam a
específico (Vieira, 1992). Assim, ao constituir-se um todo,
possibilida- de de melhorar as condições de vida;
uma unidade, o econômico e o social imbricam-se, e são
distinguidos para delimitar a apreciação a ser realizada c) a eficácia e a economia de tempo ou um melhor
com uma parte desse todo. aproveitamento do tempo pessoal;

Então, como somos sujeitos constituídos no social e d) a marca do produto que expressa status social e o
produtores desse social, a natureza humana desenvolve a seu reconhecimento pelos consumidores.
capacidade de atribuir valores, significados, e emitir juízos
a objetos, artefatos, coisas e símbolos. Socialmente, so- Nesse cenário comercial, poderíamos alongar muito
mos seres dotados da capacidade de estabelecer relações mais a lista. No entanto, o objetivo é demonstrar que, no
com os outros, de nos comunicarmos e de fazer opções. campo econômico, o conceito de qualidade dispõe de pa-
Ao fazer as escolhas, avaliamos, acionamos valores, visões râmetros de utilidade, praticidade e comparabilidade, uti-
de mundo, de sociedade e de educação, além de critérios lizando medidas e níveis mensuráveis, padrões, rankings,
que maximizam ou minimizam os benefícios individuais e testes comparativos, hierarquização e estandardização
coletivos. pró- prias do âmbito mercantil. De acordo com essa
perspecti- va, a qualidade de um produto, objeto, artefato
Todavia, a vida na sociedade capitalista, ao tornar-se ou coisa pode ser aferida com o uso de tabelas, gráficos,
mais complexa, gerou outras necessidades que impulsio- opiniões, medidas e regras previamente estabelecidas.
naram as práticas comerciais, evoluindo das feiras locais Portanto, apreender a qualidade significa aferir padrões
ou mode- los exigidos, conforto individual e coletivo,
para compras realizadas pela internet, ao mesmo tempo
praticidade e utilidade que apontem melhoria de vida
em que cresce consideravelmente o número de consumi-
do consumidor. O conceito de qualidade construído na
dores e compradores. No mercado real ou virtual,
relação entre ne- gociantes e consumidores modifica-se
fabrican- tes e comerciantes constroem desejos e criam de acordo com as circunstâncias econômicas e sociais. Na
expectativas, com o propósito de atrair consumidores, seja relação mercantil, o produto, o objeto, o artefato, o
por neces- sidade, eficiência, utilidade ou praticidade do símbolo, a coisa une os interesses de ambos e, ao mesmo
objeto, seja pela inculcação construída por meio de tempo, os distingue de outros produtos pelas suas
técnicas midiáticas e artifícios de propaganda do objeto características. A qualidade é negociada, dinâmica,
ou da coisa a ser ad- quirida. transitória e contém as marcas histó- ricas da opinião
pública, o que estimula o ato comparativo.
Do ponto de vista econômico, desde a infância somos
inseridos nas práticas comerciais e fazemos opções. Não Nas políticas sociais do país, ocorre uma transposição
se trata de analisar como fazemos escolhas. No entanto, direta do conceito de qualidade própria dos negócios co-
um dos elementos que acionamos é a qualidade da coisa merciais para o campo dos direitos sociais e, nestes, a
a ser adquirida. É neste momento, então, que elegemos os edu- cação pública. A participação ativa e constante de
elementos que expressam qualidade, segundo valores e técnicos dos organismos financeiros internacionais e
vi- sões de mundo. Assim, relacionar-se no mundo- nacionais na definição de políticas sociais, especialmente a
mercado exige compreender e decodificar os códigos dos educação, objeto deste estudo, demonstra a adoção do
atos de comprar, vender, permutar e revender objetos. conceito de qualidade, do âmbito da produção
Trata-se de fazer escolhas, competir! econômica, em ques- tões da educação e da escola, em
um processo de desca- racterização da educação pública
como um direito social (Souza & Oliveira, 2003).

31
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Nos anos de 1990, acelerou-se a transposição de me-


didas, níveis e índices próprios das relações mercantis desenvolvimento do capitalismo e podem gerar ameaças
para quantificar e aferir a quantidade e qualidade dos à estabilidade econômica e à ordem social dos países ri-
conteú- dos disciplinares de séries/anos escolares cos. Nessa perspectiva, a educação visa a contribuir com a
materializada no Sistema Nacional de Avaliação da composição da força de trabalho, com a formação de con-
Educação Básica (SAEB), criado para mensurar o sumidores e com a preservação da ordem social (Fonseca
desempenho dos alunos do ensino fundamental (3ª e 4ª & Oliveira, 2005).
séries) e médio (3ª série), por meio de testes aplicados em
âmbito nacional. Qual a intenção im- plícita desse Essa lógica gerencialista, ao preconizar a qualidade
sistema? Introduzir os princípios de qualidade e econômica, segundo a qual, para garantir
competitividade entre escolas? Alterar o currículo escolar, desenvolvimento econômico e social, basta a intervenção
ajustando-o aos conteúdos a serem cobrados nos testes do livre mercado, ou melhor, uma sociedade global livre
de aferição de desempenho? Hierarquizar as escolas e regida pelas regras e sinais de mercado, evidencia duas
punir aqueles que fracassam por não terem alcançado os situações dentro da escola (Souza & Oliveira, 2003). Uma
níveis e índices aceitáveis? inibe os esforços da instituição para definir coletivamente
o seu projeto políti- co-pedagógico, pois é conhecida a
luta histórica em defesa do direito da escola de construir
A avaliação quantitativista constituiu um dos instru-
mentos para adaptar o sistema educacional brasileiro à seu projeto, de fazer suas escolhas, num movimento em
nova ordem global instituída nos anos de 1990. Fonseca que todos se educam. Outra fortalece os instrumentos de
e Oliveira (2005) mostram que foram implementadas mu- controle, de fiscalização e de pressão externa nas decisões
danças de cunho gerencial, voltadas para a modernização da escola. Pouco importa os saberes, se a escola como um
do aparato burocrático, cujo objetivo central era impri- todo desenvolve valores hu- manos, se caminha para o
mir eficiência ao desempenho do Estado. Integravam-se entendimento da qualidade no sentido social, se
ao movimento conhecido como Reforma do Estado, sob desenvolve projeto com aqueles que têm limitações. O
a orientação de Bresser Pereira, à frente do Ministério da que conta são os números e não a forma ou o processo
Administração e Reforma do Estado (MARE), no primeiro de como os números foram gerados.
mandato do governo Fernando Henrique Cardoso (1995-
1998). Entre as ações prioritárias, destacam-se (i) a Articulados com a noção de administração racional, o
descen- tralização administrativa, pela qual foram Banco Mundial e parte dos técnicos da equipe brasileira
transferidas fun- ções da burocracia central para estados e imprimem uma visão também mercadológica, econômica,
municípios e para as denominadas organizações sociais, na estrutura dos sistemas de educação, com o objetivo de
que se configuram como entidades “de direito privado legitimar critérios de qualidade e produtividade, bem
públicas, não-estatais”; e (ii) a avaliação classificatória de como a forma de medi-los sob a frágil aparência de
desempenho serve ao Es- tado descentralizado, como eficácia.
forma de permitir a sua regu- lação. Portanto,
descentralizar e avaliar tornaram-se eixos estruturantes na Desse modo, programas como: Melhoria da Qualida-
educação. de da Educação Básica em Minas Gerais (1995); Qualidade
do Ensino Público no Paraná (1995); FUNDESCOLA (1998)
É preciso levar em conta que, às questões que envol- e Programa de Expansão e Melhoria do Ensino Médio
vem domínio de conhecimentos, códigos, linguagens e ra- (1998) expressam uma modalidade de qualidade a ser
ciocínio lógico, próprios da natureza da formação escolar, implemen- tada na estrutura do sistema de educação com
somam-se outras, como vida familiar, ambiência cultural, impactos na gestão, no currículo e na avaliação em todo o
condições de transporte, de alimentação, acessibilidade país. Na pro- posta de governo de Fernando Henrique
a livros diversos, hábitos de leitura, acesso a equipamen- Cardoso - “Mãos à obra Brasil” - afirma-se:
tos tecnológicos, que, juntos, constituem a amplitude da
formação. Por opção política, esses últimos elementos não A prioridade fundamental da política educacional con-
são considerados nos critérios de avaliação. sistirá em incentivar a universalização do acesso ao
primei- ro grau e melhorar a qualidade do atendimento
Em consonância com o projeto neoliberal vigente, os escolar, de forma a garantir que as crianças tenham
organismos multilaterais trataram, inicialmente, de efetivamente a oportunidade de, pelo menos, completar
promo- ver novas formas de controle da produção do as oito séries do ensino obrigatório (...). No segundo grau,
trabalho es- colar, por meio de mecanismos de avaliação, a política do governo consiste em auxiliar e estimular os
de currículo, de formação, de financiamento e de gestão estados no sen- tido de ampliar o número de escolas,
dos sistemas de ensino e das escolas. Além disso, melhorar a qualidade do ensino e oferecer oportunidades
explicitaram claramen- te o papel da educação no tocante de formação profissio- nal. (Cardoso, 1994, p. 114)
à geração de capital so- cial para o desenvolvimento do A partir de 1996, esse entendimento prescrito pelo
capitalismo, uma vez que a educação poderia contribuir Banco Mundial, em sua proposta de reforma educativa,
para a minimização da exclu- são, da segregação e da reporta-se ao conceito de qualidade formulado por eco-
marginalização social das popula- ções pobres. Isto não se nomistas e atrelado à concepção de qualidade própria dos
deve a uma questão de igualdade de direitos, mas a uma negócios do mercado. No documento intitulado Priorida-
razão também econômica. Tais pro- cessos são des y estrategia para la educación, o Banco afirma:
considerados fatores impeditivos para o pleno

32
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

(...) la calidad de la educación es difícil de definir y de


medir. En una definición satisfactoria deben incluir los re- Todavia, da condição de súditos da monarquia, passa-
sultados obtenidos por los alumnos (...). Los resultados de mos para a de cidadãos republicanos, sem termos vivido a
la educación se pueden mejorar mediante la adopción de aprendizagem da cidadania. A República moldou os
cuatro importantes medidas: a) el establecimiento de nor- graves problemas sociais não resolvidos - entre eles, a
mas sobre los resultados de la educación; b) la prestación educação pública - segundo a estrutura econômica do
de apoyo a los insumos que, según se sabe, mejoran el país, que já exigia outro tipo de trabalhador urbano. São
ren- dimiento; c) la adopción de estrategias flexibles para exemplos as inúmeras tentativas de reformas educacionais
la ad- quisición y la utilización de los insumos, d) la que busca- vam melhorar o funcionamento e a
vigilancia de los resultados. (1996, p. 51) organicidade do siste- ma, por meio, inclusive, de
Ainda na concepção dos técnicos do Banco Mundial: financiamento mais adequado.

(...) una vez determinados los objetivos de Nas propostas educacionais de católicos e liberais e,
aprendizaje, entra en juego la tecnología del aprendizaje y em seguida, nos embates entre privatistas e publicistas,
requiere cin- co tipos de insumos: la capacidad y es- tava subjacente o binômio quantidade-qualidade, que
motivación del alumno para aprender, la materia que se ha tem sido pendular na formulação das políticas para a
de aprender, un maestro que conoce la asignatura y es educação básica. Em meio às disputas políticas e
capaz de enseñarla, tiempo para el aprendizaje y las
interesses econô- micos, evidenciava-se a necessidade de
herramientas necesarias para la en- señanza y el
educação escolar para a formação social de homens e
aprendizaje. (Idem, p. 81).
mulheres e para os trabalhadores expropriados dos bens
A concepção de qualidade educacional que emana do
Banco fundamenta-se na adoção de “insumos”, que deve- materiais e culturais (Potyara, 2008).
rão conduzir a resultados a serem avaliados por meio de
ín- dices de desempenho e de rendimento escolar dos Passamos, agora, a mostrar como alguns fatores - in-
alunos e das escolas. Seus técnicos preconizam um ternos e externos à escola - se refletem na qualidade da
raciocínio linear, segundo o qual a mera adoção de educação escolar. Nosso objetivo é apresentar alguns ele-
equipamentos gera re- sultados satisfatórios. A concepção mentos indicadores de qualidade social na educação.
de qualidade assentada na racionalidade técnica e nos
critérios econômicos serviu e serve de referência para a Dentre os determinantes externos que contribuem
formulação de políticas para a educação pública no país. para a referência da qualidade da educação escolar,
Assim, a atualização da teoria do capital humano pelos citamos:
técnicos e arautos do Banco Mundial tornou-se, para
alguns governos e gestores, o norte que orienta as a) Fatores socioeconômicos, como condições de mo-
políticas para a educação básica e superior as- sentadas radia; situação de trabalho ou de desemprego dos
no conceito de qualidade advindo das bases de teorias respon- sáveis pelo estudante; renda familiar; trabalho de
econômicas. crianças e de adolescentes; distância dos locais de
moradia e de estudo.
Aproximações e dimensões sinalizadoras da qualidade
social da educação
b) Fatores socioculturais, como escolaridade da
família; tempo dedicado pela família à formação cultural
Ao priorizar os critérios econômicos para atribuir qua-
lidade à educação, os governos e gestores desconsideram dos filhos; hábitos de leitura em casa; viagens, recursos
os limites e as imperfeições geradas pelo mercado e sua tecnológicos em casa; espaços sociais frequentados pela
in- capacidade para corrigir questões sociais, que família; formas de lazer e de aproveitamento do tempo
costumam se agravar quando deixadas à mercê dos livre; expectati- vas dos familiares em relação aos estudos
interesses do capital financeiro e de empresários. A e ao futuro das crianças e dos jovens.
qualidade social na educa- ção não se restringe a
fórmulas matemáticas, tampouco a resultados c) Financiamento público adequado, com recursos
estabelecidos a priori e a medidas lineares des- previstos e executados; decisões coletivas referentes aos
contextualizadas. recursos da escola; conduta ética no uso dos recursos e
transparência financeira e administrativa.
Um olhar crítico direcionado para a trajetória da
socie- dade brasileira revela a distância entre as classes d) Compromisso dos gestores centrais com a boa
sociais, em decorrência de concepções políticas e medidas formação dos docentes e funcionários da educação, pro-
econômicas de privilégio para poucos e um processo de piciando o seu ingresso por concurso público, a sua for-
alargamento constante de exclusão social para a maioria. mação continuada e a valorização da carreira; ambiente e
Foram séculos de omissão e de ocultamento das condições propícias ao bom trabalho pedagógico; conhe-
demandas da sociedade, sendo suas manifestações muitas
cimento e domínio de processos de avaliação que reorien-
vezes tratadas como caso de polícia e de desordem
tem as ações.
pública. No Brasil, ainda que estas manifestações
ocorressem desde o tempo das províncias, o desejo dos
trabalhadores por uma educação de qualidade foi
atendido por meio de escolas precárias e insuficientes
para a magnitude e a expectativa da demanda.

33
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

No interior da escola, outros elementos sinalizam a


MULTICULTURALISMO E EDUCAÇÃO
qualidade social da educação, entre eles, a organização
Introdução
do trabalho pedagógico e gestão da escola; os projetos
escolares; as formas de interlocução da escola com as fa-
O termo multiculturalismo possui uma polissemia de
mílias; o ambiente saudável; a política de inclusão efetiva; significados; com o estudo do artigo de Flávia Pansini e
o respeito às diferenças e o diálogo como premissa Miguel Nenevé que citaram Silva (2007) Entendemos que
básica; o multiculturalismo se refere a estudos voltados para as
o trabalho colaborativo e as práticas efetivas de funciona- dife- rentes culturas espalhadas nos lugares do mundo,
mento dos colegiados e/ou dos conselhos escolares. objeti- vando a partir da aprendizagem a importância de
cada cul- tura a fim de evitar os conflitos sociais. Podendo
Avaliamos que a permanência e o sucesso dos estu- também estar voltado à política, quando os grupos como
dantes dependem de outras atitudes dos profissionais da negros, índios, mulheres e outros reivindicam perante as
escola, como: saber reconhecer as suas potencialidades autorida- des políticas seus direitos e deveres como
individuais; criar mecanismos facilitadores para o desen- cidadãos.
volvimento do espírito público, responsável e colabora-
tivo; preocupar-se com a alimentação e o transporte de O multiculturalismo é um movimento social surgido
estudantes, seja de carro, ônibus, barco, caminhão ou bi- nos estados unidos e tem como objetivos principais: a luta
cicletas; desenvolver a criatividade e a inovação, por meio pelos direitos civis dos grupos dominados, excluídos por
de atividades e projetos voltados para temas atuais; pos- conta de não pertence a uma cultura e classe social con-
sibilitar a criação artística em todas as suas manifestações siderada superior a euro americana, branco, letrado, mas-
(música, dança, teatro, pintura, bordados e esporte); as- culino, heterossexual e cristão. A formação de um
segurar o acesso a livros, revistas, filmes e equipamentos currículo escolar que aborde essa questão ensinando os
alunos a “não terem preconceitos e discriminações, já que
tecnológicos, valorizar o acesso ao cinema.
a escolar e uma espaço de socialização”.
Entendemos que o bom trabalho pedagógico é
O multiculturalismo só ganhou pulso e força a nível
aquela atividade intencional que acontece na escola, que estadunidense e mundial, pois os grupos silenciados num
possibi- lita as relações de aprendizagens entre sujeitos, primeiro momento, não calaram sua voz se uniram nos
orientadas pela ética profissional; é aquele que se alcança movimentos negro, feminista, homossexuais, e a luta dos
por meio de atividades voltadas para produção de ideias, deficientes. Hoje o assunto interressa o currículo escolar e
de con- cepções, conceitos, valores, símbolos, hábitos, aos políticos. Relataremos para exemplificação o que tem
atitudes e habilidades. A educação de qualidade social acontecido de eventos no Brasil e no mundo tratado da
implica, pois, assegurar a redistribuição da riqueza temática e os desafios para a justiça social
produzida e que os bens culturais sejam socialmente
distribuídos entre todos. Ainda falaremos como o currículo escolar e o educa-
dor são fundamentais no assunto e quando se
A qualidade social da educação escolar não se ajus- contradizem quando as praticas curriculares segregam as
ta, portanto, aos limites, tabelas, estatísticas e fórmulas crianças ne- gras e a formação universitária não prepara
numéricas que possam medir um resultado de processos de forma eficaz os profissionais da educação a tratarem
tão complexos e subjetivos, como advogam alguns seto- da diversidade em suas aulas.
res empresariais, que esperam da escola a mera formação
de trabalhadores e de consumidores para os seus produ- O não reconhecimento e respeito a identidades cultu-
tos. A escola de qualidade social é aquela que atenta para rais diferentes das nossas criam atritos; quando olhamos
um conjunto de elementos e dimensões socioeconômicas para determinado grupo social e vemos esses com mais
e culturais que circundam o modo de viver e as expec- direitos do que o nosso, principalmente as questões eco-
nômicas já que precisamos de oportunidades para apren-
tativas das famílias e de estudantes em relação à educa-
der e se desenvolver como ser social e profissional. E por
ção; que busca compreender as políticas governamentais,
isso que Paulo Freire defende que o fim maior da
os projetos sociais e ambientais em seu sentido político,
educação deve ser desenvolvido a partir do diálogo e da
voltados para o bem comum; que luta por financiamento consciência, onde as pessoas podem lutar por sua
adequado, pelo reconhecimento social e valorização dos liberdade, contra a máquina opressora do capitalismo.
trabalhadores em educação; que transforma todos os es-
paços físicos em lugar de aprendizagens significativas e Escolhemos o tema devido à necessidade individual
de vivências efetivamente democráticas. de convivência com o próximo, sabendo das nossas
diferen- ças, buscamos entender o multiculturalismo para
Fonte: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_art- apren- dermos a interagir e respeitar os diferentes grupos
text&pid=S0101-32622009000200005 sociais de forma harmoniosa e influenciar como futuro
educador, nossos alunos a tais práticas, minimizando os
preconcei- tos e conflitos no ambiente escolar e
consequentemente social.

34
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

História do Multiculturalismo O multiculturalismo liberal de esquerda defende a di-


versidade cultural, Pansini e Nenevé quando citam McLa-
O movimento multiculturalista se inicia no final do
ren compreendemos que o fim desse tipo de vertente é
século XIX nos Estados Unidos com a ação principal do
se focar mais nas diferenças e respeita-las esquecendo-se
movimento negro para combater a discriminação racial no
que elas são formadas nas pessoas pela interação do meio
país e lutar pelos seus direitos civis.
social em que convivem sendo negativa a tendência a
eliti- zar outros grupos ao mesmo tempo em que deixa de
Segundo SILVA e BRANDIM (2008:56) “Os precursores
do multiculturalismo foram professores, doutores afro- lado a participação de outros grupos nas discussões
america- nos, docentes universitários na área dos estudos multicul- turais.
sociais que trouxeram por meio de suas obras, questões
sociais, políti- cas e culturais de interesse para os afro- O multiculturalismo critico ou de resistência é o que
descendentes”. Esses precursores foram essenciais para que podemos considerar mais voltados aos anseios dos movi-
no século XX por meio de novos intelectuais o tema se mentos multiculturais conforme Silva e Bradim
voltasse também à educação.
O multiculturalismo critico levanta a bandeira da plu-
Na década de 90 algumas universidades ralidade de identidades culturais,a heterogeneidade como
estadunidenses aderem ao movimento e que com as marca de cada grupo e opõe-se á padronização e unifor-
pressões populares ga- nham força e espaço com a mização definidas pelos grupos dominantes. Celebrar o
criação de políticas publica em todas as esferas do poder di- reito á diferença nas relações sociais como forma de
público no que cocerne a oportu- nidades educacionais asse- gurar a convivência pacifica e tolerante entre os
iguais aos grupos sociais favorecidos daquele país. indivíduos caracteriza o compromisso com a democracia e
a justiça social, em meios às relações de poder em que
O pós-modernismo que defende a valorização da plu- tais diferen- ças são construídas. Conceber, enfim, o
ralidade cultural no seu discurso curricular ajuda o multiculturalismo numa perspectiva critica e de resistência
fortaleci- mento dos estudos multiculturais nos anos 80 e pode contribuir para desencadear e fortalecer ações
90. Hoje na contemporaneidade o tema é influenciado pela articuladas a uma pratica social cotidiana em defesa da
globalização, com os intercâmbios culturais fala-se de uma diversidade cultural, da vida humana, acima de qualquer
hegemonia cul- tural o que tem causado problemas forma discriminatória, preconceituosa ou excludente.
sociais. (2008, p.64)

Segundo McLaren (1997 apud PANSINI E MENEZES, A escola e a Pluralidade Cultural


2008,
P. 35) há pelo menos quatro tendências de A escola é um sistema aberto que faz parte da supe-
multiculturalismo enquanto projeto político: O restrutura social formada por diversas instituições como: a
multiculturalismo conservador, multiculturalismo igreja, família, meios de comunicação; faz parte do
humanista liberal, multiculturalismo liberal de esquerda e ambien- te escolar crianças pertencentes a classes sociais,
multiculturalismo critico e de resistência, visão esta ultima costumes, aspectos físicos,e culturais diferentes que estão
do qual se diz partidário o próprio autor. em proces- so de aprendizagem.

O multiculturalismo conservador ou empresarial e De acordo com Menezes:


aque- le que pretender construir uma cultura comum o que
faz com que apartir desse princípio negue a diversidade (...) Ao contemplarmos as relações raciais dentro do
existente e construída há séculos e que nos leva a entende es- paço escolar questionarmos até que ponto ele está
sua defesa a uma cultura padrão a branca. Nesse contexto sendo coerente com a sua função social quando se
desmotiva os grupos dominados em suas lutas a seu propõe a ser um espaço que preserva a diversidade
capital cultural. cultural, responsá- vel pela promoção da equidade. Sendo
assim, aguardamos mecanismos que devam possibilitar
Esse tipo de visão conservadora (...) “mesmo quando um aprendizado siste- matizado favorecendo a ascensão
reconhece outras culturas assenta-se sempre na profissional e pessoal de todos os que usufruem os seus
incidência, na prioridade a uma língua normalizada- e, serviços.
portanto, é um multiculturalismo que de fato não permite
que haja um re- conhecimento efetivo das outras culturas’’. A escola atende aos padrões dominantes das classes
(SOUZA SANTOS, 2003, P 12). consideradas superiores, os brancos euros americanos
essa cultura e ensinada e os que dela não fazem parte ou
“A vertente Humanista liberal por ingenuidade ou não se adéquam são excluídos vemos isso no dia a dia
idea- lismo ressalta a existência de uma igualdade natural quando os grupos inferiores índios e negros sofrem, são
entre as diversas etnias, sem se preocupar em evidenciar a insultados no espaço escolar, e dificilmente vemos algum
falta de oportunidades iguais em termos sociais e
negro ocupado um posto elevado na sociedade.
educacionais” (SILVA E BRADIN, 2008, P.63). Sem levar a
risca a realidade social do sistema econômico capitalista
se valendo de seus próprios argumentos. Fala-se da criação
de uma organização econômica mais igualitária daí dizer
que todos somos capa- zes de competir e vencer no
mundo.
35
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Como coloca Menezes: “a escola pode ser um espaço


de disseminação quanto um meio eficaz de prevenção e Na escola os educandos não conseguem relacionar ou
diminui- ção do preconceito”. A escola dissemina o praticar os conteúdos ensinados a sua realidade fora da
preconceito quando em seus currículos aplicados, métodos escola, pois a maioria deles fazem parte dos grupos
de ensino, apresenta- ção de imagens caricatas negras em inferio- res, daí a importância do professor ter criatividade
cartazes ou livros didá- ticos e através da linguagem não e levar seus alunos a refletir e investigar as questões
verbal desprezam a cultura dos grupos não dominantes, a relacionadas a vida e cultura dos grupos mais próximos a
exemplo quando falam só da escravidão negra e não sua vida, tendo autonomia em seu ensino e deixando um
valoriza a cultura dessa raça. pouco de lado as praticas colonizadoras.

O docente passa a ser um disseminado do problema Fonte: https://meuartigo.brasilescola.uol.com.br/edu-


quando pela linguagem não verbal não mantém contato cacao/multiculturalismo-educacao.htm
físico com as crianças negras, o que demonstra rejeição a
elas por sua cor e condição social da qual fazem parte RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO, ESCOLA-
causando-lhe sofrimento. “A sua dor não é reconhecida, COMUNIDADE.
havendo uma apa- rente falta de acolhimento por parte de
pessoas autorizadas (educadores), que silenciam ou se
omitem em face de uma situação de discriminação. Tal
postura denuncia a banalização do preconceito e a
conivência dos profissionais com ele” (Ro- mão, 2001) Papel do Professor
Quanto à diminuição do preconceito, o que não e tão do Antes de entrarmos na análise específica do papel
fácil
a exemplo do Brasil aonde a exclusão dos negros, índios professor, devemos nos atentar para a questão da
vem desde a colonização portuguesa. O que pode ser aprendizagem, que é a função a qual o professor se
feito e in- corporar nos currículos das instituições co- loca à disposição para desenvolver, ou seja,
formadoras de profes- sores a temática multicultural seja as proporcio- nar aos alunos a capacidade de aprender,
instituições públicas ou privadas. O educador que tem desenvolver raciocínio, apreender informações, ter
papel na formação de identida- des pode segundo Moreira habilidades de fazer análises e julgamentos, entre
(2001, p. 49 apud PANSINI E NE- NEVÉ, 2008, P.41) a ideia outras. Para tanto, precisamos primeiro analisar as
e que o professor reflexivo preserve a preocupação com os teorias de aprendi- zagem, visto a estreita relação
aspectos políticos, sociais e culturais em que se insere sua dessas com as teorias defendidas e a eficicácia no
pratica, leve em conta todos os silêncios e discriminações papel desenvolvido pelo professor ao colocar em
que se manifestam na sala de aula, bem como amplie o prática essas teorias e meto- dologias.
espaço de discussão de sua atuação. Por teorias de aprendizagem podemos observar três
modalidades gerais: cognitiva, afetiva e psicomotora.
Focalizamos a etnia negra, tendo em vista que o A primeira, cognitiva, pode ser entendida como
multicul- turalismo se iniciou como movimento por esse aquela resultante do armazenamento organizado na
grupo racial. A exclusão deles começa desde a infância mente do ser que aprende. A segunda, afetiva, resulta de
dentro das escolas por possuírem características físicas e experiências e sinais internos, tais como, prazer, satisfação,
costumes diferentes; de acordo com pesquisas, feitas com dor e ansieda- de. Já a terceira, psicomotora, envolve
crianças elas se sentem opri- midas pelos seus colegas, pois respostas muscula- res adquiridas por meio de treino e
são chamadas de “feias, fedo- retas, cabelo duro, preta”, ou prática.
seja, são desvalorizados seus atri- butos individuais o que A teoria de David Ausubel foca a aprendizagem
influencia na sua formação identitária porque nesse período cogni- tiva e, como tal, propõe uma explicação teórica do
da vida seu caráter esta sendo formado. proces- so de aprendizagem.
Ausubel baseia-se na premissa de que existe uma es-
O preconceito racial e a discriminação fazem com que trutura na qual organização e integração de
aos índios e, em especial aos negros se mantenham em aprendizagem se processam. Para ele, o fator que mais
uma situa- ção marginal e excluída sem a assistência influencia a apren- dizagem é aquilo que o aluno já sabe
devida dos órgãos responsáveis, eles tornam-se alheios ao ou o que pode fun- cionar como ponto de ancoragem
exercício de cidadania, sem condições de crescer intelectual para as novas ideias.
e profissionalmente. A aprendizagem significativa, conceito central da
teoria de Ausubel, envolve a interação da nova informação
Nessa direção MENEZES destaca: com uma estrutura de conhecimento específica, a qual
define como conceito subsunçor.
O preconceito racial cria uma ação perversa que As informações no cérebro humano, segundo
desenca- deia estímulos dolorosos e retira do sujeito toda Ausubel, se organizam e formam uma hierarquia
possibilidade de reconhecimento e mérito, levando-o a conceitual, na qual os elementos mais específicos de
utilizar mecanismos defensivos das mais diversas ordens, conhecimento são liga- dos e assimilados a conceitos
contra a identidade ou o pensamento persecutório que o mais gerais.
despersonaliza e o enlou- quece. Nessa perspectiva, é Uma hierarquia de conceitos representativos de expe-
fortalecida a ideia de dominação de grupos que se julgam riências sensoriais de um indivíduo significa, para ele, uma
mais adiantados, legitimando os de- sequilíbrios e estrutura cognitiva.
desintegrando a dignidade dos grupos domi- nados.
36
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Ausubel considera que a assimilação de conhecimen-


tos ocorre sempre que uma nova informação interage A concepção sócioconstrutivista de conhecimento ins-
com outra existente na estrutura cognitiva, mas não com talou o pânico nas salas de aula.
ela como um todo; o processo contínuo da aprendizagem Como abrir mão de um referencial de conhecimento
sig- nificativa acontece apenas com a integração de enquanto poder e desconstruir toda uma perspectiva de
conceitos relevantes. objetividade? Como deixar de ser um bom professor por-
que sabe o conteúdo e passar a ser um bom professor
Para contrapor essa teoria, Piaget não considera o
progresso cognitivo consequência da soma de pequenas por- que sabe facilitar a aprendizagem? Como aprender
aprendizagens pontuais, mas sim um processo de equili- uma postura transcultural, fenomenológica e dialógica
bração desses conhecimentos. Assim, a aprendizagem diante do aluno? Como conjugar na prática o verbo
seria produzida quando ocorresse um desequilíbrio ou um interagir? Es- sas questões estão na base da construção
con- flito cognitivo. do real papel do professor diante de uma aprendizagem
significativa.
No entanto, Piaget não enfatiza o conceito de
aprendi- zagem. Sua teoria é de desenvolvimento Alguns comportamentos essenciais marcam essa pos-
cognitivo, não de aprendizagem. Nesta perspectiva, Piaget tura e colaboram para garantir uma aprendizagem signifi-
considera que só há aprendizagem (aumento de cativa. Vamos analisá-los:
conhecimento) quando o esquema de assimilação sofre Pare de dar aulas!
acomodação. Por mais estranho que possa parecer, esse é o princi-
A aprendizagem significativa desenvolvida por pal comportamento a ser adquirido. Paulo Afonso Caruso
Ausubel propõe-se a explicar o processo de assimilação Ronca (1996) faz o questionamento perfeito sobre essa si-
que ocorre com a criança na construção do conhecimento tuação: “Se o papel do professor é dar aulas, enquanto ele
a partir do seu conhecimento prévio. dá a sua aula, o aluno faz o quê?” A expressão “dar aula” é
Dessa forma, para que ocorra uma aprendizagem sig- fruto da era do “mundo pronto”. Num contexto de mundo
nificativa é necessário: disposição do sujeito para inacabado e em constante mudança nós não temos
relacionar o conhecimento; material a ser assimilado com nenhu- ma aula a “dar”, mas sim a construir, junto com
“potencial significativo”; e existência de um conteúdo o aluno. O aluno precisa ser o personagem principal dessa
mínimo na es- trutura cognitiva do indivíduo, com novela chamada aprendizagem. Já não tem mais sentido
subsunçores em sufi- ciência para suprir as necessidades conti- nuarmos a escrever, dirigir e atuar nessa novela
relacionadas. unilateral, na qual o personagem principal fica sentado no
Na teoria de Ausubel, o processo de assimilação é sofá, está- tico e passivo, assistindo, na maioria das vezes,
fun- damental para a compreensão do processo de a cenas que ele não entende. As novelas “de verdade” já
aquisição e organização de significados na estrutura estão incluin- do o telespectador em seus enredos, basta
cognitiva. observarmos a frequência de pesquisas populares que
Basta o educador primeiramente sondar o repertório norteiam o autor na composição de personagens e
do aluno para provocar na criança uma aprendizagem sig- definição dos rumos da estória.
nificativa. As assimilações podem ser simples, como dosar Dar aula cansa, frustra e adoece. Cansa porque preci-
os ingredientes para fazer um bolo e utilizar essa mesma samos manter os alunos quietos e prestando atenção em
experiência com os conceitos de cálculos, grandezas e algo que eles, geralmente, não sentem a mínima necessi-
me- didas da matemática. dade de aprender. Para que eles supostamente aprendam
Com isso, os modos de ensinar desconectados dos (leia-se fiquem quietos, olhando para o professor), muitas
alunos podem ser modificados para a articulação de seus vezes desprendemos uma energia sobre-humana, que
conhecimentos, no uso de linguagens diferenciadas, signi- vem geralmente acompanhada de frustração e desespero.
ficativas, com a finalidade de compreender e relacionar os A doença, é consequência direta dessa situação.
fenômenos estudados.4 Pare de dar respostas!
Dentro desse contexto de aprendizagem significativa, Aprender é fruto de esforço. Esse esforço precisa ser a
temos um professor que faz a diferença no cenário educa- busca de uma solução, de uma resposta que nos satisfaça
cional, pela postura que adota, como veremos abaixo. e nos re-equilibre. Na medida em que nos preocupamos
A ideia de que o mundo está pronto e de que nele mais em dar respostas do que fazer perguntas, estaremos
reside a reserva de conhecimento (igualmente pronto) evitando que o aluno faça o necessário esforço para
que precisamos adquirir construiu e manteve, durante apren- der. Eis o passaporte para a acomodação
séculos, uma escola totalmente adaptada a esse modelo. cognitiva. Dar a resposta é contar o final do filme.
Descre- ver o mundo, seus fenômenos, processos e Poupa o sofrimento de vivenciar a angustia de imaginar
caracterizar os métodos e técnicas de intervenção nesse diferentes e possíveis situações de exercitar o modelo de
mundo sempre foi o principal papel da escola. Tudo ensaio-e-erro, enfim, poupa o aluno do exercício da
sempre esteve muito bem “arrumadinho”: professor aprendizagem significativa. Num contexto de “mundo
ensina algo inquestionável, aluno aprende e reproduz pronto” a resposta fazia sen- tido. Num contexto de
exatamente como aprendeu e todos são felizes para “mundo em construção”, a resposta impede a
sempre, como nos contos de fada. Mas esse conto aprendizagem. Além de que, a perspectiva do vir-a-ser
continua e depois do “final feliz”, tem início um período exige busca constante. Se num mundo dinâmico paramos
sombrio, recheado de incertezas, novos para- digmas e de buscar, saímos da sintonia desse mundo e nos
impulsionado pela mudança cada vez mais inten- sa e desconectamos do processo global de desenvolvimento.
freqüente.
4 Por Eliane da Costa Bruini

37
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Diante dessa realidade, o desejo, a vontade, a curiosi-


Persiga a aprendizagem profunda!
dade e a disponibilidade interna para aprender ganham
Segundo Ausubel (1988), é indispensável para que
es- pecial importância. Segundo Freinet, está fadado ao
haja uma aprendizagem significativa, que os alunos se
fracas- so, todo método que tentar fazer beber água o predis- ponham a aprender significativamente. Vem daí a
cavalo que não tem sede. Essa máxima nos remete à neces- sidade de “despertarmos a sede”. Uma pesquisa
profunda reflexão sobre a importância do papel do sujeito feita na década de oitenta (Marton et alii, 1984) com um
que aprende. Mais ainda. Remete-nos à reflexão sobre o universo de cerca de 800 alunos do Ensino Médio chegou
papel do professor como “provocador da sede”. a con- clusão (nomeada pelos próprios alunos) que dois
Na escola, informações são passadas sem que os alu- tipos de pré-disposição eram presentes entre eles: a
nos tenham necessidade delas, logo, nossa função princi- aprendizagem superficial e a aprendizagem profunda.
pal como professores é de gerar questionamentos, dúvi- A aprendizagem superficial ocorre quando a intenção
das, criar necessidade e não apresentar respostas. limita-se a preencher os requisitos da tarefa; assim, mais
importante do que a compreensão do conteúdo é prever
Procure novas formas de desafiar os alunos! o tipo de perguntas que possam ser formuladas sobre ele,
O nosso principal papel como professores, na promo- aquilo que o professor julgará importante. O foco é trans-
ção de uma aprendizagem significativa é desafiar os con- ferido da importância real do conteúdo para as exigên-
ceitos já aprendidos, para que eles se reconstruam mais cias que serão feitas sobre ele. A aprendizagem superficial
ampliados e consistentes, tornando-se assim mais inclusi- ocorre, então, quando há a intenção principal de cumprir
vos com relação a novos conceitos. Quanto mais os requisitos da tarefa. Como consequência ocorre a me-
elaborado e enriquecido é um conceito, maior morização de informações necessárias para testes e
possibilidade ele tem de servir de parâmetro para a provas. A tarefa é encarada como imposição externa.
construção de novos con- ceitos. Isso significa dizer que Não há reflexão sobre propósitos ou estratégias e o
foco é colocado em elementos soltos, sem integração. O
quanto mais sabemos, mais temos condições de aprender.
aluno sabe que tem que saber como ocorre o processo de
O papel docente de desafiar deve ser insistentemen-
respiração humana, tem que saber descrevê-lo, tem que
te aperfeiçoado. Precisamos construir nossa forma própria saber os nomes dos principais órgãos envolvidos, mas
de “desequilibrar” as redes neurais dos alunos. Essa fun- “não faz contato” com a importância de uma respiração
ção nos coloca diante de um novo desafio com relação ao plena para sua qualidade de vida.
planejamento de nossas aulas: buscar diferentes formas Segundo Solé (2002), é preciso levar em consideração
de provocar instabilidade cognitiva. Logo, planejar uma que esses enfoques se aplicam à forma de abordar a
aula significativa significa, em primeira análise, buscar tarefa e não ao estudante; ou seja, um aluno pode
formas criativas e estimuladoras de desafiar as estruturas modificar seu enfoque de uma tarefa para a outra ou de
concei- tuais dos alunos. Essa necessidade nos poupa da um professor para o outro, embora sejam observadas
tradicio- nal busca de maneiras diferentes de “apresentar tendências para o uso de enfoques profundos e
a matéria”. Na escola, informações são passadas sem que superficiais. O que determina seu empenho é a
os alunos tenham necessidade delas, logo, nossa função disponibilidade interna para a aprendi- zagem.
principal como professores é de gerar questionamentos, A aprendizagem profunda ocorre quando a intenção
dúvidas, criar necessidade e não apresentar respostas. dos alunos é entender o significado do que estudam, o
Quando problematizamos, abrimos as possibilidades que os leva a relacionar o conteúdo com aprendizagens
de aprendizagem, uma vez que os conteúdos não são ante- riores, com suas experiências pessoais, o que, por
tidos como fins em si mesmos mas como meios sua vez, os leva a avaliar o que vai sendo realizado e a
essenciais na busca de respostas. Os problemas têm a perseverarem até conseguirem um grau aceitável de
função de gerar conflitos cognitivos nos alunos compreensão sobre o assunto. A aprendizagem profunda
se torna real, então, quando há a intenção de
(desequilíbrios), que pro- voquem a necessidade de
compreender o conteúdo e, por isso há forte interação
empreender uma busca pessoal.
com o mesmo, através do constante exame da lógica dos
Esse desafio a que nos referimos não precisa ser algo
argumentos apresentados.
de extraordinário, o essencial é cumprir o papel de “cau- O que faz com que um aluno mostre maior ou menor
sar sede”. Podemos promover um desafio com uma sim- disposição para a realização de aprendizagens significati-
ples pergunta: “Por que quanto mais alto, mais frio fica, se vas? Digamos que é um misto de condições que
quanto mais alto, mais perto do sol estamos?”. Outras ve- pertencem ao universo do aluno e questões que
zes uma situação se presta muito bem para promover tal pertencem a própria situação de ensino, ao “contexto
desequilíbrio como o aparecimento de pintinhas coloridas físico” da aprendizagem, que é resultante da pré-
na pétala de uma rosa em cuja jarra tenha sido colocada disposição do professor em pro- mover uma
água colorida. Outras atividades como apresentação de aprendizagem superficial ou profunda. Perse- guir, pois
um recorte de jornal, de uma fotografia, de uma cena de uma aprendizagem profunda significa organizar os
um filme ou de uma pequena estória, igualmente se elementos que compõem a situação de ensino de forma
prestam como excelentes desafios. motivante e desafiadora e cuidar da relação pessoal com
os alunos para que ela possa ser suporte para o despertar
no universo do aluno, um panorama favorável ao
“mergulho necessário”.

38
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Pare de dar tantas instruções!


É claro que não estamos aqui contradizendo nosso
Quanto mais instruções dermos, mais seguidores de pa- pel de formadores de atitudes socialmente aceitas. É
instruções formaremos. Não que as instruções tenham
preci- so ensinar os alunos a equilibrarem o “ser” e o
sido banidas do mundo atual, o uso da tecnologia deixa-
“estar”, sob pena de sermos banidos do mundo. Estamos
nos “atados” aos manuais, por exemplo. Falo da pouca
nos referindo a atitude de fazer isso sem anular o “ser” já
presença da autonomia na sala de aula. Quando um
construído que esse aluno traz.
professor deta- lha minunciosamente as orientações que
Essa atitude exige de nós, professores duas posturas
acompanham uma tarefa e faz um acompanhamento
nada fáceis, porém não impossíveis de serem aprendidas
passo-a-passo de cada etapa para que todos possam
com determinação e persistência:
caminhar juntos, ele está fa- vorecendo a dependência
_ O olhar fenomenológico – que consiste em olhar o
dos alunos e não sua autonomia. Nesses casos, os alunos
aluno e seu comportamento por si só, o mais livre possível
não se preocupam muito em com- preender o que fazem,
de julgamentos estereotipantes.
mas sim em seguirem as instruções do professor, o que
lhes vai garantir êxito. Pedrinho usa expressões que são comuns entre margi-
nais ao invés de Pedrinho é um marginalzinho, com certe-
Desenvolvimento de autonomia na sala de aula está
za!
li- gado à possibilidade dos alunos tomarem decisões
_ A postura transcultural – que consiste em explorar,
racionais sobre o planejamento de seu trabalho.
conhecer, respeitar e entender a cultura do aluno, levan-
Responsabilizando-
do em conta a possibilidade de enriquecer a sua própria
-se por suas tarefas e conhecendo os critérios através dos
cultura.
quais serão avaliados, os alunos poderão regular suas
Elevar a auto-estima do aluno significa fazê-lo sentir-
deci- sões e se apropriar da atividade.
-se capaz, fazê-lo sentir-se digno de ter direitos e possibi-
Cuidado, porém, com os excessos! Não dar muitas
ins- truções não corresponde a adotar a teoria do “toma lidades na vida.
que o filho é teu e te vira”. Precisamos fornecer as
Promova a interação entre os alunos!
instruções ne- cessárias, incentivar as decisões coerentes e
questionar as decisões descabidas. A troca de percepções entre os alunos estimula a am-
Aprendizagem significativa não necessita de proteção, pliação de ideias e a testagem de hipóteses pessoais. O
in- divíduo não nasce pronto nem é cópia do ambiente
mas sim de cuidado.
exter- no. Em sua evolução intelectual há uma interação
Eleve a autoestima do aluno! constan- te e ininterrupta entre processos internos e
Partir daquilo que o aluno já sabe, reforçá-lo e influências do mundo social. A partir dessa afirmação,
valorizá- Vigotsky justifica a necessidade de interação social no
-lo é fazê-lo sentir-se parte do processo de aprender e, processo de aprendiza- gem. Atento à “natureza social”
pa- ralelamente, é elevar sua autoestima. Outras atitudes do ser humano, que des- de o berço vive rodeado por
igual- mente elevadoras da autoestima do aluno são: seus pares em um ambiente impregnado pela cultura,
_ Propor desafios ao seu alcance. Vigotsky (1999) defendeu que o próprio desenvolvimento
_ Monitorar a distância entre a linguagem utilizada na da inteligência é produto dessa convivência. Para ele, “na
aula e a linguagem natural do aluno. ausência do outro, o homem não se constrói homem”.
_ Oferecer as ajudas necessárias diante das Enfim, é através da aprendizagem nas relações com os
dificuldades. outros que construímos os conhecimen- tos que
_ Garantir um ambiente compartilhado de ensino em permitem nosso desenvolvimento mental.
que o aluno sinta-se parte ativa. Essa interação deve se concretizar em sala de aula
_ Implementar o hábito de reconhecimento de peque- através do estímulo para que os alunos troquem ideias e
nos sucessos progressivos. opiniões. Essas trocas devem ser breves e em pequenos
_ Garantir que o aluno possa mostrar-se progressiva- grupos (três alunos é o ideal) para se evitar a dispersão
mente autônomo no estabelecimento de objetivos, no e perda de foco. No momento em que um aluno ouve a
pla- nejamento das ações que o conduzirá a eles. opinião do colega e reflete sobre o que ele diz, ele tem a
Esse conjunto de atitudes compõe o que chamamos oportunidade de ratificar ou retificar sua opinião, através
relação de respeito e confiança mútuos. E é a partir desse de uma síntese dialética, necessária a todo conhecimento
contexto acolhedor que se dá a aprendizagem consistente.
significativa. É preciso ser para aprender. A aprendizagem
significa- tiva é fruto da “permissão de ser”, mais que isso, Uma tentativa de conclusão
é fruto da “sensação de ser”. Estamos falando da maneira O papel do professor na promoção de uma apren-
específica e natural de ser de cada um de nós, que se dizagem significativa tem início na clareza que ele tem a
transforma na me- dida em que interagimos respeito da concepção social da Educação e,
significativamente com o mundo e com os outros. consequente- mente do seu próprio papel social. Somente
Alguém que não tem “permissão de ser” não se habilita a a consciência e o compromisso com esse papel vão dar
aprender, pois não tem referenciais inter- nos para forma a um projeto real de sociedade, no qual se in-
alimentar a interação necessária com o objeto da serem e se inter-relacionam cidadãos mais ou menos crí-
aprendizagem. Nossos alunos precisam sentir que podem ticos, mais ou menos engajados, enfim, mais ou menos
ser o que são na sala de aula e que toda parte de si que conscientes.
não for muito conveniente será fruto de uma negociação
respeitosa que levará a uma adaptação de
comportamento que, por sua vez, será um ganho de
habilidade relacional,
um presente para ser melhor no mundo.
39
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Promover a aprendizagem significativa é parte de um


A educação infantil e a escola tradicional
projeto educacional libertador, que visa à formação de
ho- mens conscientes de suas vidas e dos papéis que Após a chegada dos portugueses em 1500, foi
represen- tam nelas. É impossível ensinar liberdade, fundada pelos padres Jesuítas da Companhia de Jesus, a
cerceando ideias, oprimindo participações e ditando primeira escola no Brasil no ano de 1549. O ensino
verdades. Apercebermo- tradicional, privi- legia a camada mais abastada, tendo
-nos dessas atitudes é essencial para que iniciemos um suas regras pautadas no autoritarismo e em normas
real disciplinares rígidas.
processo de transformação da nossa prática.5 As aulas são centradas no professor, que por sua vez
transmite seus conhecimentos através de exercícios de fi-
Princípios metodológicos xação, e mantém uma relação autoritária onde o aluno é
A educação de crianças em CMEIS e Pré-escolas, cada disciplinado, atento e cumpridor de seus deveres.
vez mais, tem sido vista como um investimento necessário O papel da escola baseia-se em transmitir conheci-
para seu desenvolvimento desde os primeiros meses até a mentos disciplinares para a formação geral do aluno, a fim
idade de ingresso na escolarização obrigatória. A partir da de inseri-lo na sociedade. Também se caracteriza pelo
Lei 9394/96, que estabelece novas diretrizes e bases para pre- paro moral e intelectual do aluno, partindo de um
a educação nacional, o atendimento em CMEIS (até três modelo de postura conservadora que mantém como
anos de idade) e pré-escolas (de quatro a seis anos) compromisso da escola a cultura, os problemas sociais
constitui a Educação infantil, nível de ensino integrante da pertencem a so- ciedade.
educação básica. Os conteúdos são pré-determinados, fixos e indepen-
A educação infantil passa, então, por consideráveis dentes do contexto escolar, são esses os conhecimentos
mu- danças perante o que era reconhecido como sociais e valores acumulados pelas gerações adultas e re-
“educação pré-escolar”, a qual rompe com a tradição passados como verdades acabadas e absolutas. Aos
assistencialista presente na área, tendo por finalidade o alunos são apresentados somente os resultados desse
desenvolvimento integral da criança, complementando a processo, a fim de que sejam armazenados.
ação da família e da comunidade. Considerando que A metodologia utilizada é a de Herbart a qual se
nossas leis perpassam por mudanças constantes, em seis baseia na exposição verbal da matéria e ou
de fevereiro de 2006, a Lei nº 11.274/2006 (Brasil, 2006) demonstração, onde a ênfase se da nos exercícios, na
ampliou o Ensino Funda- mental para nove anos. Com a repetição de conceitos ou fórmulas e na memorização,
referida resolução, houve a antecipação da visando disciplinar a mente e formar hábitos.
obrigatoriedade da matrícula para o Ensino Fundamental A ênfase é dada às situações de sala de aula, onde os
aos seis anos de idade, ampliando assim, sua duração de alunos são “instruídos” e “ensinados” pelo professor. Comu-
oito para nove anos, ocasionando a redução de um ano mente, pois, subordina-se educação à instrução,
na Educação Infantil, a qual passa a atender crianças de consideran- do a aprendizagem do aluno como um fim em
zero a cinco anos de idade. si mesmo:os conteúdos têm que ser adquiridos, os modelos
Pautados nessas Leis entendemos que a organização imitados. (MIZUKAMY, 1986, p.13).
do trabalho pedagógico na Educação Infantil deve ser O processo avaliativo é realizado visando à exatidão
orienta- da pelo princípio básico de procurar proporcionar, de reprodução dos conteúdos, as notas obtidas
à criança, o desenvolvimento da autonomia, isto é, a funcionam perante a sociedade como níveis de aquisição
capacidade de construir as suas próprias regras e meios de do patrimô- nio cultural, sendo esse caracterizado como
ação, que sejam flexíveis e possam ser negociadas com uma avaliação discriminatória.
outras pessoas, sejam eles adultos ou crianças. A análise pontual da Escola Tradicional vai até 1932.
Obviamente, esta construção não se esgota no período de Mesmo com a expulsão dos Jesuítas pelo Marquês de
zero aos cinco anos de idade, de- vido às próprias Pombal de Portugal em 1808 e a proclamação da
características do desenvolvimento infantil, porém se faz República em 1889, a tendência educacional em nosso
necessário que esta construção seja iniciada na Educação país em nada se modificou, a tendência da Escola
Infantil. Contudo o caráter de assistencialismo ainda se faz Tradicional permane- ceu no sistema de ensino por
presente no que diz respeito aos métodos, nas práticas de aproximadamente trezentos e oitenta e três anos.
atendimento e principalmente no perfil dos pro- fissionais Segundo Aroeira, Soares e Mendes (1996), no que se
dessa área, que por vezes são considerados como refere ao ensino voltado para a Educação Infantil até o
monitores e não professores de Educação Infantil. ano de 1889, há pouco a se registrar em termos de
atendimen- to à criança pré-escolar.
Partindo dessas observações, busca-se respaldo
teórico para a sustentação das ideias e conceitos emitidos Somente em 1932 iniciou-se um movimento com in-
em auto- res que abordam essa temática, tais como: tenções declaradas de mudanças na tendência do ensino
Oliveira (2010), Aroeira, Soares e Mendes(1996), Mizukami no Brasil.
(1986), Ferreira, Mello,Vitoria, Gosuen e Chaguri (2009) e Não é novo falar de uma didática pré-escolar; o pró-
Ostetto ( 2010 ). prio aparecimento da pré-escola no Brasil se deu sob as
ba- ses da herança dos precursores europeus que
Portanto, o presente artigo tem como objetivo,
investi- gar como se desenvolve o processo das inauguraram uma tradição na forma de pensar e
metodologias utili- zadas na educação infantil que se apresentar proposições para a educação da criança nos
refere a crianças de zero a cinco anos de idade. [jardins de infância], dife- renciadas das proposições dos
modelos escolares.
5 `Fonte: www.famema.br - Por Júlio César
Furtado dos Santos

40
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

O modelo minuciosamente proposto por Froebel


(1782-1852), orientou muitas das experiências pioneiras Seu principal precursor foi sem dúvidas Rousseau no
no Brasil, a exemplo do Jardim de Infância Caetano de século XVIII, que realizou uma verdadeira revolução na
Cam- pos. Sendo ele considerado o Pedagogo da Infância, educação, colocando categoricamente a criança como
pelo seu grande interesse em conhecer a realidade da cen- tro do processo pedagógico.
criança, seus interesses, suas condições e necessidades a Dentre os principais representantes da escola nova,
fim de adequar a educação as instituições educativas na podemos destacar Dewey, Decroly, Montessori e Freinet
garantia do que ele chamava de afloramento desses seres. (séculoXX), que compreendiam essa proposta como ga-
Segundo Froebel (1782-1852), a criança, ao nascer já traz rantia e fortalecimento dos ideais liberais na formação do
consigo um potencial a ser desenvolvido, como uma indivíduo.
planta que em sua semente traz dentro de si tudo aquilo Com e Estado Novo (1937 a 1945), a Escola Nova
que poderá vir a ser. perde sua força, e somente na década de 50 retorna
pregando uma educação universal, gratuita e democrática,
Modelos como o de Montessori e Decroly (séculoXX),
também integram grande parte das práticas que prolife- mas com objetivo maior de ampliar os ideais do
raram entre nós com o aparecimento das pré-escolas nos liberalismo brasi- leiro.
âmbitos públicos e privados, mesmo já na década de ses- Reproduz assim, a diferença na educação dos filhos de
senta. Porém, como já citado anteriormente, estes mode- operários e na dos filhos da elite. Com a etilização do en-
los, influenciados por uma Psicologia do Desenvolvimen- sino e a ênfase à alta qualificação dos professores e as exi-
to, marcaram uma intervenção pautada na padronização. gências das escolas particulares, acabou desqualificando
Neste sentido, não se diferenciaram da escola tradicional as escolas públicas, que era impossibilitada de introduzir
ao constituírem práticas de homogeneização. Apesar de as novidades didáticas, por falta de estrutura e dinheiro.
suscitarem a busca de uma pedagogia para a criança pré-
-escolar, mantiveram as mesmas intenções A educação infantil e a escola contemporânea ou
disciplinadoras, com vistas a enquadramento social sócio-interacionista
através de práticas e atividades que se propunham mais A partir da LDB 9394/96, principalmente com as di-
adequadas à pouca ida- de das crianças. fusões das ideias de Piaget (1896-1980) Vygotsky (1896-
1934) e Wallon (1889-1962), numa perspectiva sócio-in-
O novo, em relação a esta tradição, apresenta-se por
meio de uma produção recente que resulta de influências teracionista e de abordagem cognitivista, essas teorias
teóricas e contextuais antes não colocadas. Mudam as for- buscam uma aproximação com modernas correntes do
mas de fazer e de pensar a educação da criança de 0 a 6 ensino da língua que consideram a linguagem como for-
anos, que passa a se dar em instituições educativas, esta- ma de atuação sobre o homem e o mundo, ou seja, como
belecendo-se como um novo objeto das Ciências processo de interação verbal que constitui a sua realidade
Humanas e Sociais. A identificação da construção de uma fundamental.
Pedagogia da Educação Infantil como um campo Segundo Mizukami (1986), uma abordagem cogniti-
particular do conhe- cimento pedagógico, revelada pela vista implica, dentre outros aspectos, se estudar cientifica-
trajetória das pesquisas recentes analisadas, situa-se mente a aprendizagem como sendo mais que um produto
inicialmente também no âm- bito da Pedagogia. do ambiente, das pessoas ou de fatores que são externos
ao aluno.
A educação infantil e a escola nova Por sua vez, a tendência pedagógica cognitiva privile-
gia o aspecto cognitivo do desenvolvimento infantil e
Esta tendência é implementada no Brasil no século
con- centra seus principais fundamentos nas ideias do
XX, a partir da década de 20, mas deparamos com seus
episte- mólogo suíço Jean Piaget (1896-1980) e de seus
próprios princípios claramente expostos no Manifesto dos
discípulos, que tem como pressuposto básico o
Pioneiros da Educação publicado em 1932. Nesta época,
interacionismo e seus principais objetivos que consistem
a Escola Nova é fortemente criticada pelos católicos con-
na formação de sujeitos críticos, ativos e autônomos.
servadores os quais detinham o monopólio da educação
etilista e tradicional no país. Na tendência cognitivista, o trabalho na educação in-
fantil é voltado para a criança a fim de que essa seja res-
O movimento educacional conhecido como Escola
ponsável pela construção do seu conhecimento aprenden-
Nova, surge justamente para propor novos caminhos à
do a partir da interação que estabelece com o meio físico
educação, representa o esforço de superação da pedago-
e social desde o seu nascimento, passando por diferentes
gia da essência pela pedagogia da existência que se volta
estágios de desenvolvimento. Ou seja, o conhecimento re-
para a problemática do indivíduo único, diferenciado, que
sulta da interação do sujeito com o ambiente e do
vive e interage em um mundo dinâmico. Destaca-se tam-
controle da própria criança sobre a obtenção e
bém a importância da satisfação das necessidades infantis,
organização de suas experiências com o mundo exterior,
bem como a estimulação de sua própria atividade, sendo
quando acompanha com os olhos os objetos, observa
assim a criança não é mais considerada “inacabada”, ne-
tudo ao seu redor, agarra, solta, empurra, cheira, leva à
cessitando ser atendida segundo as especificidades de sua
boca e prova, etc.
natureza. Ou seja, a criança aprende fazendo, o objeto da
educação é o homem integral, constituído não só da Inicialmente essas ações são apenas maneiras de ex-
plorar o mundo, e aos poucos se integram aos modelos
razão, mas de sentimentos, emoções e ações.
mais elaborados pela criança.

41
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Uma proposta para a escola infantil: reflexões a


par- tir da LDB 9493/96 O impacto maior dessas mudanças foi para o segmen-
A escola hoje possui um caráter formador, to creche, lembrando que por muito tempo, esse esteve
aprimorando valores e atitudes, desenvolvendo desde a vinculado a um sistema se assistencialismo.
educação infantil, o sentido da observação, despertando a A criança da educação infantil não pode ser dividida e
curiosidade intelec- tual das crianças, capacitando-as a deve ser atendida na integralidade de suas necessidades e
serem capazes de buscar informações, onde quer que elas potencialidades físicas, psicológicas, intelectuais, sociais e
estejam a fim de utilizá-las no seu cotidiano. culturais. (FERREIRA, MELLO, VITORIA, GOSUEN, CHAGURI,
2009, p.188).
Dentro dessas perspectivas, a Educação Infantil deve
permitir que as crianças sejam pensadores, aprendam a Mesmo sendo um desafio organizar propostas peda-
re- fletir sobre seus modelos mentais, aprendam a instruir- gógicas que atendam as especificidades dessa faixa etária,
se em equipe e a construir visões compartilhadas com os o mais importante é que se criem ambientes de
outros. acolhimen- to, segurança e confiança para as crianças.
A constituição de 1988, aponta algum avanço com A educação infantil deve garantir essa integralidade,
rela- ção à pré-escola, pelo fato de incluir referências à garantindo oportunidades para que as crianças sejam ca-
educação pré-escolar e apresentar uma concepção de pazes de expressar seus desejos, sentimentos e desagra-
criança integral. A Educação Infantil em creches e pré- dos, familiarizar-se com a própria imagem, conhecer seus
escolas é um dever do Estado e direito da criança limites, executar ações relacionadas à saúde e higiene,
(artigo208, inciso IV). brin- car, socializar e interagir com outras crianças e
Ao invés de dividir a educação em dois períodos, (de professores, identificar seus limites e possibilidades,
zero a 3 anos) que se concentra no assistencialismo e (de identificar e enfren- tar situações de conflitos, respeitar as
4 a 6 anos) pedagógico e voltado para educação, o outras crianças e professores, valorizar ações de
atendi- mento integral associa os dois aspectos, solidariedade e cooperação, respeitar regras básicas de
independente da faixa etária. convívio social.
Mas para que essa proposta fosse colocada em Para que todos esses objetivos se concretizem, é im-
prática, havia a necessidade de uma política que estivesse portante criar situações educativas para que, dentro dos
vinculada a uma transformação social apropriada e que a limites impostos pela vivência da coletividade, cada
redistribui- ção de renda gerasse mais equilíbrio entre as criança possa ter respeitados os seus hábitos, ritmos e
classes sociais. Sendo assim, sem essas políticas básicas de preferên- cias de forma lúdica e prazerosa.
mudança é difícil superar os problemas da educação pré- Partindo dessa concepção vale ressaltar a importância
escolar. da formação de professores de educação infantil, como
Como mostra o documento do Ministério da um dos principais indicadores de qualidade do
Educação, são poucas as escolas que oferecem uma atendimento as crianças de zero a seis anos.
educação pré-es- colar de qualidade, a realidade mostra Cabe mencionar que, embora o Artigo 62 admita a
que para a população menos abastada, se oferecem for- mação mínima de nível médio na modalidade normal,
formas de atendimento não convencionais e restritas a o mesmo artigo indica a formação superior como
aspectos assistenciais. Se todas as crianças tem o mesmos necessária para a atuação na educação infantil, sendo
direitos, todas deveriam receber a mesma forma de assim vale res- saltar que:
atendimento e educação. Nas disposições transitórias da LDB, o Artigo 87, pará-
Quanto menor a criança, mais bem preparado deve grafo 4º, estipula que “até o final da década somente serão
ser o profissional. admitidos professores habilitados em nível superior ou for-
Em decorrência desses programas alternativos de aten- mados por treinamento de serviço”. (FERREIRA, MELLO, VI-
dimento pré-escolar, difunde-se no Brasil a ideia de que TORIA, GOSUEN, CHAGURI, 2009, p.191)
para lidar com criança pequena qualquer pessoa serve.
(AROEIRA, SOARES, MENDES 1996, p.11). Mas se a proposta Vale lembrar que além da necessidade de uma
viabiliza um atendimento educacional e assistencial, que formação adequada para esses profissionais da educação,
atue em todas as necessidades da criança em seu tem-se também uma busca constante de atingir uma meta
desenvolvimento, físi- co, psíquico, social, moral, cultural e que é a ampliação de vagas na educação infantil e o
político, será necessário avaliar também a importância de compromisso do poder público em aumentar os
uma formação profissional adequada para atender essa investimentos nessa área.
faixa etária. As leis que amparam a educação continuam passando
O que se percebe é que mesmo ao definir a criança por mudanças constantes, sendo a mais recente a da data
como um ser em desenvolvimento, na prática, dominam a do dia seis de fevereiro de 2006, a Lei nº 11.274/2006
tendência assistencialista nas creches e a pedagogia na (Brasil, 2006) ampliou o Ensino Fundamental para nove
pré- anos. Enfatizando que a partir da referida resolução,
-escola. Dessa forma não estão atentos na idade nem nas houve a antecipação da obrigatoriedade da matrícula para
necessidades específicas da criança, como a expressão o Ensino Fundamental aos seis anos de idade, ampliando
lúdi- ca, o desenvolvimento cognitivo e afetivo, a assim, sua duração de oito para nove anos, ocasionando
socialização e a interação. a redução de um ano na Educação Infantil, a qual passa a
Com a promulgação da nova Lei de Diretrizes e Bases atender crianças de zero a cinco anos de idade.
da Educação Nacional (LDB) 9.394/96, a Educação Infantil
passa a ser, legalmente, concebida e reconhecida como
etapa ini- cial da Educação Básica. Vale ressaltar que nessa
lei, foram concretizadas algumas conquistas importantes
para essa área.
42
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

A institucionalização do ensino de 9 anos:


Faz-se necessário a elaboração de uma proposta pe-
contribuições e desafios para o professor da educação
dagógica a qual esteja pautada a construção da identida-
infantil
de pessoal da criança e de sociabilidade, o que envolve
Observa-se que as atuais mudanças causaram em um aprendizado de direitos e deveres. Deve também
algumas escolas e profissionais uma antecipação no que priorizar o desenvolvimento da imaginação, do raciocínio
diz respeito a metodologia utilizada na Educação Infantil. e da lingua- gem, como instrumentos básicos para a
De forma que, esses não se atentam ao atual contexto criança se apropriar de conhecimentos elaborados em seu
social, nem que a escola possui hoje um caráter formador, meio social, buscando explicações sobre o que ocorre a sua
aprimorando valores e atitudes, despertando a volta e consigo mesma. Na educação infantil hoje, busca-
curiosidade intelectual, estimulando a ludicidade, se ampliar alguns re- quisitos de fundamental importância
capacitando-as a buscar informações, onde quer que elas a fim de inserir a crian- ça no mundo atual: a sensibilidade,
estejam, utilizando- as no seu cotidiano. a solidariedade e o senso crítico, inserindo ambos em uma
Na verdade nos deparamos com um desencontro de atmosfera de gestão co- letiva, com a finalidade de
informações em relação as propostas e metodologias que superar o modelo individualista
precisam ser elaboradas e postas em prática na Educação presente na sociedade.
Infantil, lembrando que um dos papéis mais importantes Uma importante concepção do conhecimento
e reservados à educação é o de capacitar o indivíduo a segundo Vygotsky (1896-1934), destaca a importância da
dominar o próprio desenvolvimento, compreender e ser interação social na aprendizagem e, nesse processo de
compreendido e estar apto para viver em sociedade. interação, a im- portância da linguagem.
Por tanto para se trabalhar com crianças de educação Partindo dessa concepção, o autor relata que, as fun-
infantil, é importante que o professor considere ções do desenvolvimento da criança aparecem primeiro
no âmbito social e só depois no individual, assim, o
alguns princípios fundamentais, como os processos de
aprendiza- do da criança começa muito antes de ela ir à
desenvolvimento da aprendizagem infantil, que é
escola.
composta de fases ou níveis de construção do
Sendo assim, o importante é que a Educação Infantil
conhecimento. É importante ressaltar também que cada seja de qualidade e reconhecida não só no plano
criança tem seu próprio caminho para o legislativo e nos documentos oficiais, mas pela sociedade
desenvolvimento, e que o conhecimento resulta da prática como um todo.
social. Afinal essa modalidade de ensino, é de
“O papel do educador será, então, agir no sentido de responsabilidade pública e, como tal, deve
contribuir para a conquista da autonomia moral, prioritariamente ser assumida por todos, esse é o nosso
intelectual, social e afetiva da criança, compreendendo-a maior desafio.
na sua totalidade.” (AROEIRA & SOARES & MENDES, 1996,
p.19). Avaliação mediadora – concepção, instrumento de
Desta forma o embasamento teórico auxiliará o acompanhamento da aprendizagem do aluno.
professor a identificar o que a criança já sabe, assim como O ato de ensinar e de aprender está relacionado a
o que ela está apta a aprender. Sabe-se que muito mais realizações de mudanças e aquisições de comportamento,
que o afeto, o conhecimento teórico sólido dos processos tanto motores, cognitivos, quanto afetivos e sociais. Com
da aprendizagem infantil fará com que a ação do base nesses preceitos, a avaliação, ou seja, o ato de avaliar
professor seja ilimitada. consiste em verificar se estes tais comportamentos estão
Por exemplo, o professor que utiliza na sua prática sendo realmente alcançados no grau exigido pelo pro-
pedagógica um embasamento teórico fundamentado na fessor servindo de suporte para que o aluno progrida na
teoria de Piaget, considera o aluno como um sujeito ativo, aprendizagem e na construção do saber. Com isso, avalia-
ção tem o papel de orientar o aluno a tomar consciência
capaz de estabelecer relações lógicas, ou seja, ser capaz
de seus conhecimentos, ter posicionamento crítico e saber
de pensar, raciocinar, imaginar, construindo seu
se está avançando na superação das dificuldades para
conhecimento através de experiências, vivências e
con- tinuar progredindo no processo de ensino
interação com tudo o que ela deseja conhecer. aprendizagem.
Existem, ainda hoje, professores que se preocupam
Sendo assim, além da experiência com o concreto, é em fazer uso da avaliação como instrumento de tortura,
necessário que a criança pense sobre suas ações e estabe- pressão e controle do comportamento prendendo-se em
leça relações lógicas, como por exemplo, atividades de se- respostas “mecânicas” como certo/errado valorizando o
riação e classificação de objetos, através das quais a “produto” final e não compreendem todo o processo que
criança possa ser incentivada a explicar como fez para o aluno chegou para dar aquela resposta. O professor,
chegar a determinado resultado. O que estimula o seu então, tendo observado o “mau comportamento” dos
raciocínio lógico, sua linguagem, percepção e imaginação. alunos, sen- te-se tentado ameaça-los com a arma
Muito mais importante do que uma linguagem ade- poderosa da avalia- ção, dizendo que irá tirar-lhes pontos,
quada, o reconhecimento das cores, formas geométrica, chamará os pais, irá colocá-los para fora da sala,
números e letras, é a metodologia utilizada pelo professor encaminhá-los para a coorde- nação, etc. Nesta
da educação infantil. concepção, o mais comum é o professor, não
conseguindo motivar o aluno para o trabalho, comece a
usar a nota como um instrumento de pressão para obter a
disciplina e participação, contribuindo assim, para a sua
alienação.
43
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Para a mesma autora, muitas vezes as avaliações são


realizadas como julgamento das capacidades, sem nada a Dentro do contexto da avaliação temos o erro, signi-
contribuir para o desenvolvimento do educando, não ficando algo que não ocorreu de maneira correta. No en-
sendo levado em conta, o modo como essa avaliação está tanto, esse erro pode ser útil vindo a ser utilizado como
sendo feita como, por exemplo: trabalhos avaliativos, fonte de virtude para aprendizagem escolar, pois tanto
provas orais ou escritas de dupla ou individual e saber que para o professor quanto para o aluno ao reconhecerem a
cada aluno é diferente no processo de ensino- origem e a constituição dos seus erros passam a superá-
aprendizagem um do outro. Outra forma, que a avaliação -los, tornando assim um “obstáculo vencido” e uma ava-
é utilizada pelo educador é a de uma mera reprodução e liação adequada. Luckesi (2006) afirma quando o
repetição dos conteúdos e co- nhecimentos, assim professor atribui uma atividade a seus alunos e observa
preocupam-se em vencer os conteúdos programáticos. Na que estes não conseguem obter o resultado esperado, o
maioria das vezes, a avaliação é vista pelos olhos dos educador deve conversar com seu aluno e verificar o
alunos como uma promoção e não como parte do porquê desse erro e como foi cometido. Esse autor ainda
processo de ensino-aprendizagem, assim como um ressalta que, na maioria das vezes, é frequente o aluno
castigo, não podendo sair, brincar porque tem prova e dizer que só agora ele percebeu o que era para fazer, ou
pelos olhos da maioria professores um meio de seja, o erro conscien- temente elaborado possibilita o
demonstrar a autoridade. avanço.
Avaliar para Promover
Aspectos Positivos e Negativos da avaliação
Dentro da sala de aula, o termo avaliar está,
intimamen- te relacionado à resolução de provas, exames, Para Hoffmann, o trajeto a ser percorrido, quando
resultado de pra- ticamos a avaliação, é impulsionado pelo inusitado,
pelo
nota, ser aprovado ou reprovado. Em meio a esses fatores,
a sonho, pelo desejo de superação, pela vontade de chegar
prova torna-se instrumento característico de todo ao objetivo/destino que vai sendo traçado, assim como
processo de uma avaliação tradicional, mas pode também quando realizamos o caminho a Santiago de Compostela,
ser de muita utilidade para o professor e aluno saberem na Espanha. Da mesma forma, avaliar necessita da
em que medida o processo de ensino-aprendizagem está conversa uns com os outros, para compartilhar dos
útil para a forma- ção do conhecimento do aluno. Nessa sentimentos de conquista, da compreensão das setas. A
perspectiva, verifica-
ousadia do ato de avaliar, neste caminho, tem o sentido
-se que esse instrumento é adequado especialmente de avançar sempre: promover e a autora nos apresenta as
quando desejamos avaliar procedimentos específicos, a
setas do caminho. Buscando caminhos. A avaliação,
capacidade de organizar ideias, a clareza da expressão e a
compreendida como a avaliação da aprendizagem escolar,
possibilidade de apresentar soluções originais.
deve servir à promo- ção, isto é, acesso a um nível
Assim, a avaliação tem seu lado positivo e negativo. O
primeiro pode ser atribuído ao fato da avaliação admitir superior de aprendizagem por meio de uma educação
uma função de orientadora e cooperativa, sendo assim, digna e de direito de todos os seres humanos. Hoffmann é
realizada de uma forma contínua, cumulativa e ordenada contrária à ideia de que primeiro é preciso mudar a escola
dentro da sala de aula com o objetivo de fazer um e a sociedade para depois mudar a avaliação. Pelo
diagnóstico da si- tuação de aprendizagem de cada contrário, a avaliação, por ser uma atividade de reflexão
educando, em relação aos conteúdos passados pelo sobre os próprios atos, interagida com o meio físico e
professor, desse modo, verificando se o aluno está social, influi e sofre a influência desse próprio ato de
progredindo no processo de ensino-aprendi- zagem. A pensar e agir. Assim, é a avaliação reflexiva que pode
avaliação, dessa forma, tem uma função prognosti- ca que transformar a realidade avaliada.
avalia os conhecimentos prévios dos alunos, conside- rada Para transformar a escola, lugar em que ocorre a ges-
a avaliação de entrada, avaliação de input; uma função tão educacional de um trabalho coletivo, é necessário que
diagnóstica, do dia-a-dia , a fim de verificar quem ocorra uma reflexão conjunta de professores, alunos e co-
absorveu todos conhecimentos e adquiriu as habilidades munidade, pois a partir disso desencadeiam-se processos
previstas nos objetivos estabelecidos. de mudança muito mais amplos do que a simples modifi-
Por outro lado, a avaliação está voltada com a função cação das práticas de ensino. Esse processo, assim como
de classificação, apresentando o lado negativo, pois o no caminho a Santiago de Compostela, gera inquietação
aluno que não alcançou a média fica sob a visão de e incertezas para os professores, as quais devem ser res-
excluído e fracassa- do perante os colegas de classe, peitadas, por meio de oportunidades de expressão desses
professores e escola, ocasio- nando muitas vezes a evasão sentimentos, de compreensão de outras perspectivas e
escolar. De acordo com Luckesi (2006), a avaliação que é de reflexão sobre as próprias crenças. É no confronto de
praticada na escola é sinônimo da avaliação da culpa. As ideias que a avaliação vai se construindo para cada um
notas são usadas para como índices de classificação de dos professores à medida que discutem, em conjunto,
alunos, onde os desempenhos são compara- dos e não valores, princípios e metodologias. Rumos da Avaliação
perspectivas que se desejam atingir. neste sé- culo. O problema da avaliação da aprendizagem
O que significa em termos de avaliação um aluno ter tem sido discutido intensamente neste último século.
ob- tido nota 5,0 ou média 5,0? E o que tirou 4,0? O Nas últimas décadas, adquiriu um enfoque político e
primeiro, na maioria das escolas está aprovado, enquanto social, que intensificou a pesquisa sobre o assunto. A ten-
o segundo, reprovado. O que o primeiro sabe é dência, dentre os principais estudiosos do assunto, é a de
considerado suficiente. Suficiente para quê? E o que ele procurar superar a concepção positivista e classificatória
não sabe? O que ele deixou de “saber” não pode ser mais
importante do que o que ele “sabe”? E o que o aluno que
tirou 4,0 “sabe” não pode ser mais importante do que
aquilo que não “sabe”?
44
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

das práticas avaliativas escolares (baseada em verdades


A organização homogeneizada, classificação e compe-
absolutas, critérios objetivos, medidas padronizadas e es-
tição, desencadeia o respeito às individualidades,
tatísticas) em favor de uma ação consciente e reflexiva so-
confiança na capacidade de todos, na interação e na
bre o valor do objeto avaliado, as situações avaliadas e do
socialização. A finalidade da avaliação mediadora é
exercício do diálogo entre os envolvidos. Dessa maneira,
subsidiar o professor, como instrumento de
assume-se conscientemente o papel do avaliador no pro-
acompanhamento do trabalho, e a escola, no processo de
cesso, dentro de um dado contexto, que confere ao edu-
melhoria da qualidade de ensino, para que possam
cador uma grande responsabilidade por seu compromisso
compreender os limites e as possibili- dades dos alunos e
com o objeto avaliado e com sua própria aprendizagem -
delinear ações que possam favorecer seu
a de como ocorre o processo avaliativo.
desenvolvimento, isto é, a finalidade da avaliação é
Essa reflexão envolve os próprios princípios da demo-
promover a evolução da aprendizagem dos educandos e
cracia, cidadania e direito à educação, que se contrapõem
a promoção da qualidade do trabalho educativo. Regimes
às concepções avaliativas classificatórias, que se funda-
seriados versus regimes não-seriados. Uma das maiores
mentam na competição, no individualismo, no poder, na
dificuldades de compreensão das propostas educacionais
arbitrariedade, que acabam enlaçando tanto os professo-
contemporâneas reside no problema da organização do
res quanto os alunos em suas relações pessoais verticais e
re- gime escolar em ciclos e outras formas não seriadas. A
horizontais. A avaliação a serviço da ação. A contraposição
ra- zão dessa dificuldade reside justamente no apego às
básica estabelecida por este princípio é estabelecida entre
ideias tradicionais às quais se vinculam o processo de
uma concepção classificatória de avaliação da aprendiza-
avaliação classificatória e seletiva.
gem escolar e a concepção de avaliação mediadora. A
Os regimes seriados estabelecem oficialmente uma sé-
ava- liação mediadora, fundada na ação pedagógica
rie de obstáculos aos alunos, por meio de critérios pré-de-
reflexiva, implica necessariamente uma ação que promova
finidos arbitrariamente como requisitos para a passagem
melhoria na situação avaliada. Em se tratando da
à série seguinte. Os desempenhos individuais dos alunos
avaliação da apren- dizagem, sua finalidade não é o
são utilizados para se comparar uns com os outros,
registro do desempenho escolar, mas sim a observação
promo- vendo os “melhores” e retendo os “piores”. As
contínua das manifestações de aprendizagem para
diferenças individuais são reconhecidas, não como
desenvolver ações educativas que visem à promoção, a
riqueza, mas como instrumento de dominação de uns
melhoria das evoluções individuais.
poucos sobre muitos. Os regimes não seriados, ao
Da mesma forma, a avaliação de um curso só terá
senti- contrário, fundamentam-se em concepções
do se for capaz de possibilitar a implementação de desenvolvimentistas e democráticas, foca- lizando o
progra- mas que resultem em melhorias do curso, da processo de aprendizagem, e não o produto. O trabalho
escola ou da instituição avaliada. No entanto, a despeito do aluno, a aprendizagem, é comparado com ele próprio,
das inovações propostas pela nova LDB (9394/ 96), sendo possível observar sua evolução de diversas formas
observa-se na maio- ria das escolas brasileiras, de todos ao longo do processo de ensino-aprendizagem, re-
os níveis, a dificuldade para incorporar e compreender a conhecer suas possibilidades e respeitá-las.
concepção de avaliação mediadora. Em seus regimentos Dessa forma, a avaliação contínua adquire o significado
escolares enunciam-se objetivos de avaliação contínua, de avaliação mediadora do processo de desenvolvimento
mas, ao mesmo tempo, estabelecem-se normas e da aprendizagem de cada aluno, de acordo com suas
classificatórias e normativas, o que revela a manutenção pos- sibilidades e da promoção da qualidade na escola.
das práticas tradicionais e a resistên- cia à implementação Isso está longe de ser menos exigente, rigorosa e mais
de regimes não seriados, ciclos, pro- gramas de permissiva. Pelo contrário, essa organização de trabalho
aceleração, evidenciando o caráter burocrático e seletivo escolar exige à realização de uma prática pedagógica que
que persiste no país. assuma a diver- sidade humana como riqueza, as
É a compreensão e definição da finalidade da facilidades e dificuldades de cada um como parte das
avaliação características humanas, que devem ser respeitadas e, ao
da aprendizagem que deve nortear as metodologias e não fazê-lo, novas formas de rela- ções educativas se
o inverso, como se tem observado até agora. A autora re- constituem a partir da cooperação e não da competição.
sume os princípios básicos – as setas do caminho – a Deste modo, se torna possível acolher a todos os alu-
seguir, apontando para onde vamos: De para avaliação nos, porque não há melhores nem piores, sendo que, num
para clas- sificação, seleção, seriação. Avaliação a serviço processo de avaliação classificatória, estes últimos, “os
da aprendi- zagem, da formação, da promoção da pio- res” estarão predestinados ao fracasso e à exclusão.
cidadania, a atitude reprodutora, alienadora, normativa Provas de recuperação versus estudos paralelos. A ideia
Mobilização em dire- ção à busca de sentido e significado de recu- peração vem sendo concebida como retrocesso,
da ação. A intenção prognóstica, somativa, explicativa e retomo. As provas de recuperação se confundem com a
de desempenho, leva à intenção de acompanhamento recupera- ção das notas já alcançadas, com repetição de
permanente de mediação e intervenção pedagógica conteúdos. Estudos paralelos de recuperação são próprios
favorável à aprendizagem. Vi- são centrada no professor e a uma práti- ca de avaliação mediadora. Neste processo o
em medidas padronizadas de disciplinas fragmentadas. conhecimen- to é construído entre descobertas e dúvidas,
Visão dialógica, de negociação, referenciada em valores, retomadas, obstáculos e avanços.
objetivos e discussão interdisci- plinar.

45
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

A progressão da aprendizagem, nos estudos


paralelos, está direcionada ao futuro do desenvolvimento de prática, ética em seu sentido mais original, porque está
do aluno. Os estudos paralelos precisam acompanhar os embasada em juízo de valor. Não concordamos que deva
percursos individuais de formação dos alunos e considerar haver regra única em avaliação, ainda que elencada no
os princí- pios da pedagogia diferenciada, para a qual nos bojo de diretrizes unificadoras das reformas educacionais,
chama a atenção Perrenoud (2000), que alerta: “o que por- que cada situação envolve a singularidade dos
caracteriza a individualização dos percursos não é a participan- tes do processo educativo. Não encontramos
solidão no trabalho, mas o caráter único da trajetória de mecanismos únicos, classificatórios que deem conta da
cada aluno no conjunto de sua escolaridade”. complexidade do ato avaliativo. É preciso considerar a
Nesse sentido, o reforço e a recuperação (nas suas complexidade ine- rente a tal finalidade.
modalidades contínua, paralela ou final) são considerados
A participação das famílias.
parte integrante do processo de ensino e de
aprendizagem para atendimento à diversidade das Os pais devem participar da escolaridade de seus
características, das ne- cessidades e dos ritmos dos filhos, considerando, entretanto, a natureza do
alunos. Alertamos para o fato de que Hoffman defende envolvimento; a realidade social destes pais; a constituição
que o termo paralelo pressupõe estudos desenvolvidos de suas famílias; a luta pela sobrevivência, etc., nos faz
pelo professor em sua classe e no decorrer natural do ponderar que as difi- culdades de aprendizagem dos
processo. Cada professor estabele- ce uma relação alunos não podem ser atri- buídas às famílias, muito
diferenciada de saber com seus alunos. É compromisso menos o trabalho de superação destas dificuldades não
seu orientá-los na resolução de dúvidas, no pode recair sob a responsabilidade destes, mas dos
aprofundamento das noções, e a melhor forma de fazê-lo profissionais que atuam nas escolas, bem como são de
é no dia-a-dia da sala de aula, contando com a sua responsabilidade a aquisição de atitudes e habilidades
cooperação de toda a turma. Conselhos de classe versus que favoreçam o enriquecimento das relações
“conselhos de classe”. interpessoais no ambiente escolar. É compromisso dos
Os conselhos de classe vêm sendo realizados, em pais acompanhar o processo vivido pelos filhos, dialogar
gran- de parte das escolas, orientados por modelos com a escola, assumir o que lhes é de responsabilidade.
avaliativos classificatórios e com caráter sentencitivo - se Promover o diálogo entre os pais e os professores é
propondo a deferir uma sentença ao aluno. Nestas função da escola, que não significa atribuir a eles a tarefa
sessões, o privilégio ao passado é evidente. Hoffman da escola.
defende que esta deve ser uma ação voltada para o
futuro, de caráter interativo e re- flexivo, deliberadora de A educação inclusiva
novas ações que garantam a aqui- sição de competências Num processo de avaliação mediadora, a promoção
necessárias à aprendizagem dos alunos. Os momentos do se baseia na evolução alcançada pelo aluno, na sua singu-
conselho de classe precisam ser repensados pelas escolas laridade e de acordo com suas possibilidades, desde que
e serem utilizados para a amplia- ção das perspectivas se tenha garantido as melhores oportunidades possíveis à
acerca dos diferentes jeitos de ser e de aprender do aprendizagem e ao desenvolvimento de todos e de cada
educando que interage com outros educa- dores e com um. Nesse contexto, a responsabilidade pelo fracasso não
outros conhecimentos. As questões atitudinais não devem pode ser atribuída ao aluno, às suas dificuldades ou à sua
ocupar um tempo enorme em detrimento das questões incapacidade. A responsabilidade pelo desenvolvimento
do ensino-aprendizagem. da aprendizagem contínua do aluno recai sobre os
Para Hoffman, projetar a avaliação no futuro dos alu- educado- res e sobre a comunidade. Dessa compreensão
nos significa reforçar as setas dos seus caminhos: confiar, decorre o princípio da educação inclusiva: oferecer ao
apoiar, sugerir e, principalmente, desafiá-los a prosseguir aluno opor- tunidade máxima de aprendizagem e de
por meio de provocações significativas. Uma atividade éti- inserção social, em condições de igualdade educativa, isto
ca. Não basta desenvolver a avaliação educacional a é, oferece ao aluno condições adequadas de
serviço de uma ação com perspectiva par o futuro, mas aprendizagem de acordo com suas características, suas
torná-la re- ferência para decisões educativas pautadas possibilidades. Isso significa encontrar meios para
por valores, por posturas políticas, fundamentos favorecer aprendizagem de todos os alunos.
filosóficos e considerações sociais. Os protagonistas da Assim, são professores e escolas que precisam ade-
avaliação precisam ser levados a refletir sobre o que quar-se aos alunos e não os alunos que devem adequar-
fazem e por que fazem. As práticas educacionais exigem, se às escolas e aos professores. A dimensão da exclusão
além de conhecimento, metodologia, trabalho científico, a de muitos alunos da escola pode ser medida:
inclusão da dimensão ética e sensível. Nesse sentido • pela constatação das práticas reprovativas baseadas
programas e projetos desenvolvidos para dar conta de em parâmetros de maturidade e de normalidade;
problemas apresentados para o estudo de uma área de • pela ocorrência dos encaminhamentos de alunos
conhecimento ou para resolver questões de determinadas para classes e escolas especiais por erros na avaliação pe-
escolas, estariam respondendo às dimensões ético- dagógica. A inclusão nas classes regulares de alunos que
políticas neste contexto avaliativo. necessitam de atendimento especializado, sem que haja
As reformas educacionais oriundas de posturas políti- a preparação do professor no desempenho de seu papel,
cas que não devem se sobrepujar aos atos educativos, as priva os alunos com necessidades especiais de uma esco-
novas medidas em avaliação educacional afetam os senti- laridade digna.
mentos dos atores envolvidos, por se tratar de uma
ativida-

46
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Para Hoffman, um sério compromisso irá mobilizar a


Todo o aprendiz está sempre a caminho
escola brasileira deste século: formar e qualificar profis-
Constatamos, no caminho, que há um conjunto de va-
sionais conscientes de sua responsabilidade ética frente
riações de respostas dos alunos de todo os níveis de
à inclusão. Se incluir é fundamental e singular, como no
ensino. Esta variabilidade de manifestações nos aponta
caminho de Santiago, é necessário valorizar cada passo do
que muitas tentativas de acerto são feitas por meio de
processo, sem pressa, vivendo cada dia o inusitado.
ensaios e erros. Essas estratégias são desenhadas por meio
de respostas que chamamos de erro, são comuns e o
Outra concepção de tempo em avaliação
professor precisa com- preender que trata-se de uma
O tempo é um tema recorrente nas discussões sobre resposta incorreta, mas indica- dora de progresso, de
avaliação, principalmente nas séries finais do Ensino avanço em relação a uma fase anterior do aprendizado,
Funda- mental e do Ensino Médio. Os professores do dizendo muito sobre “qualidade”.
Ensino Mé- dio, premidos pelo vestibular, desaguam os É preciso reconhecer que nas práticas atuais, a
conteúdos que têm que dar conta, no afã de estarem padroni- zação dos percursos incorre em sérios prejuízos
sempre concluindo caminhos que, na verdade, são para os alu- nos, porque, notas e conceitos são superficiais
inconclusos. A trajetória a ser percorrida pela avaliação e genéricos em relação à qualidade das tarefas e
requer diálogo, abertura e interação, não havendo como manifestação dos alunos. Notas e conceitos
delimitar tempos fixos. Na última década, as trajetórias da classificatórios padronizam o que é dife- rente,
avaliação se propõem a res- peitar os tempos e percursos despersonalizando as dificuldades de avanços de cada
individuais de formação, no sistema de ensino e na sala de aluno. Superficializam e adulteram a visão da progressão
aula. O aprendiz determina o próprio tempo da das aprendizagens e do seu conjunto tanto em uma única
aprendizagem. tarefa, quanto em um ao letivo, pelo caráter somativo que
É preciso conhecer o aluno enquanto aprendiz, en- anula o processo. Baseiam-se, arbitrariamente, em certos e
quanto pessoa, membro de uma família, de uma comuni- errados absolutos, negando a relativização desses
dade, com o qual interage ativa e continuamente. O parâmetros em di- ferentes condições de aprendizagem.
apren- diz é sujeito de sua história. É preciso respeitar seu Produzem a ficção de um ensino homogêneo pela
tem- po de aprender e de ser, o que implica desagregar- impossibilidade de acompanhar a heterogeneidade do
se do tempo determinado para aprender dado conteúdo. grupo. Reforçam o valor mercadoló- gico das
Tendo oportunidade de confrontar suas ideias com as dos aprendizagens e das relações de autoritarismo em sala de
cole- gas, ou em textos, vivendo situações problema, o aula. Privilegiam a classificação e a competição em
aluno irá progressivamente compreender e evoluir detrimento da aprendizagem. Entravam o diálogo entre os
conceitualmente. Desta forma, o ensino não está centrado professores, entre professores e alunos e da escola com
no professor, nas aulas frontais, pois cada participante do os pais, em termos de avaliação, pela superficialidade do
processo pode co- laborar com a aprendizagem dos acom- panhamento.
outros. Sendo assim, o tempo é determinado pelo Qualidade significa intensidade, profundidade, criação,
aprendiz e o conteúdo pode ser proposto e explorado de perfeição. Como tal, sua magnitude não pode ser medida
diversas formas, tanto pelo professor, como pela turma. em “escalas métricas” ou por recursos de “conversão entre
siste- ma de mensuração”. É importante refletir a cada
Cada passo é uma grande conquista passo. Me- diar é aproximar, dialogar, acompanhar, ajudar,
A autora oferece sugestões e exemplos de sem interferir no direito de escolha do aprendiz sobre os
oportunida- des de aprendizagem que podem ser rumos de sua tra- jetória de conhecimento. Classes
oferecidas, mesmo em condições limitantes (classes numerosas podem dificultar essa aproximação, mas umas
superlotadas, escassez de materiais e outras situações das alternativas é justamente o trabalho em equipe por
apontadas por muitos como justificativa para a má parte dos professores, que podem di- vidir entre si a tarefa
qualidade do ensino). Avaliação me- diadora significa a de acompanhar mais de perto um grupo de alunos
busca de significado para todas as di- mensões do (tutoria). O trabalho em equipe de professores en- volve o
processo por meio de uma investigação séria sobre as compromisso de compartilhamento das experiências,
características próprias dos aprendizes; conhecer para favorecendo a abordagem interdisciplinar, a ampliação das
promover e não para julgar e classificar; convicção de perspectivas acerca da aprendizagem dos alunos.
que as incertezas são parte da educação porque esta é
fruto de relações humanas, fundamentalmente qualitati- A auto-avaliação como processo contínuo
vas. Outro problema passa a se constituir aqui, quando
não se compreende que o processo de aquisição de A auto-avaliação é um processo contínuo que só se
conheci- mentos é não linear e infinito, além de justifica quando se constitui como oportunidade de refle-
impossível de se determinar a priori: a questão dos xão, tomada de consciência sobre a própria aprendizagem
conteúdos acadêmicos e do tempo. Sobre isso, a autora e sobre a própria conduta, para ampliar suas
afirma que uma pedagogia diferenciada pode se possibilidades e favorecer a superação de dificuldades.
desenvolver na experiência coletiva da sala de aula, desde Ao ser solicitado a explicar como chegou a uma dada
que haja a clareza de que o aluno aprende na relação com solução de uma situa- ção, o aluno é levado a pensar e
os outros, interativamente, mas aprende ao seu tempo e explicitar suas próprias estratégias de aprendizagem,
de forma única e singular. ampliando sua consciência sobre seu próprio fazer e
pensar, sobre o seu aprender a aprender. O mesmo
processo se aplica aos próprios pro- fessores, no processo
de orientação e apoio de colegas, supervisor e demais
profissionais de suporte pedagógico.
47
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

As múltiplas dimensões do olhar avaliativo


aprendizes, oferecendo oportunidade para que estabele-
Avaliar, em sua totalidade, implica em prestar atenção çam relações entre conceitos e entre as várias áreas do
aos seus fundamentos. Como um grande iceberg do qual
co- nhecimento. Assim, interdisciplinaridade e
só se percebe os registros, precisamos construir olhares
transversalidade são inerentes ao processo educativo. A
mais profundos, para poder ter acesso às suas dimensões
compreensão que o aluno tem de uma dada disciplina
sobre:
interfere em sua apren- dizagem em outras disciplinas.
- os registros obtidos;
- o processo de avaliação;
Os conteúdos
- as concepções de avaliação;
Cabe ao
- os valores sociais e éticos. professor:
• atentar às concepções prévias dos alunos e seus mo-
Avaliação é controle. No âmbito escolar, isso reverte o
dos de expressarem-se sobre elas para poder organizar
compromisso do profissional do educador: quais os
situações de aprendizagem capazes de envolver esses alu-
princí- pios e valores morais, sociais, educacionais que
nos;
fundamen- tam as tomadas de decisões com base nos
• estar alerta aos desdobramentos dos objetivos tra-
processos de avaliação realizados; quais os critérios
çados inicialmente, que constituirão diversos rumos de
utilizados, até que ponto são claros e transparentes para
prolongamento dos temas em estudo, dentro de uma vi-
todas a comunida- de (escola, família, os próprios alunos);
são interdisciplinar, e diversificação dos procedimentos de
quais os benefícios ou prejuízos que podem advir desse
aprendizagem;
processo de controle outorgado à escola e aos
• organizar momentos de estruturação do pensamen-
professores. Surge aí o compro- misso ético implícito no
to, favorecendo aos alunos oportunidades para
processo de avaliação mediadora. Avaliar para reprovar
objetivação de suas ideias e a consolidação dos conceitos
não é indicador da qualidade da es- cola ou do professor.
e noções de- senvolvidas.
Isso só tem sentido dentro de uma perspectiva
classificatória e seletiva.
O planejamento pedagógico revela múltiplos direcio-
A finalidade do controle deve ser entendida a favor do
namentos e está diretamente vinculado ao processo
aluno e não como obrigação imposta pelo sistema. Os
avalia- tório, uma vez que as decisões metodológicas
tra- jetos de cada aprendiz são únicos, obedecem a ritmos
estabelecem as condições de aprendizagem ampliando ou
e interesses diversos, mesmo vivendo a mesma
restringindo o processo de conhecimento. A intervenção
experiência, cada um a experimenta de uma forma
pedagógica deve estar comprometida com a superação
singular, o que im- plica em aprendizagens diferentes
de desafios que possam ser enfrentados pelos alunos,
dentro de um mesmo contexto.
favorecendo-os avançar sempre. Perguntar mais do que
responder, avaliar é questionar, formular perguntas,
Delineando objetivos.
propor tarefas desafiado- ras em processo
Definir os rumos, delinear o norte, o destino essencial consecutivo/contínuo.
das ações educativas precisa ser o compromisso funda-
A avaliação contínua significa acompanhamento da
mental do educador no processo de avaliação da apren-
construção do conhecimento por parte do aprendiz, exi-
dizagem. “Entretanto, este trabalho se dá em um contexto
gindo alterações qualitativas nas formas registro e
escolar concreto em que” a escola enfrenta muitos limites
tomadas de decisão sobre aprovação. Cabe ao professor
nesse sentido: behaviorismo, taxionomias intermináveis,
perguntar mais do que responder, oferecendo ao aluno
excessivo fracionamento dos objetivos, e permanente ten-
múltiplas oportunidades de pensar, buscar
são no ambiente escolar entre os que querem transmitir
conhecimentos, engajar-
conhecimentos e os que querem desenvolver práticas so-
-se na solução de problemas, repensar, comprometer-se
ciais”(Perrenoud, 2000).
com seus próprios avanços e dificuldades. Transformar
Metas e objetivos não se constituem em pontos de
res- postas em novas perguntas. Cada resposta deve
chegada absolutos, mas pontos de passagem, novos ru-
suscitar mais perguntas, tanto por parte dos aprendizes
mos para a continuidade do trabalho educativo. Avaliar
como do próprio professor.
segundo esses princípios implica refletir sobre as crenças,
A continuidade da ação pedagógica condiciona-se
intenções, ideias, estratégias, a quem se destinam, quais
aos processos vividos, interesses, avançados e necessida-
as condições existentes, quais possibilidades e alternativas
des dos alunos. Assim: experiências coletivas resultam em
que pode ser citadas em favor do aprendiz.
construções individuais (cada aluno aprenderá a seu jeito,
em seu tempo, responderá a sua maneira). A interpretação
O plano epistemológico.
das respostas dos alunos possibilita ao professor perceber
A intervenção pedagógica é determinada pela com- necessidades e interesses individuais de múltiplas dimen-
preensão dos processos realizados pelo aprendiz em sua
sões (análise qualitativa).
relação com o objeto de conhecimento. Aprender exige
Novas experiências educativas, enriquecedoras e com-
engajamento do aprendiz na construção de sentidos o
plementares, articuladas às observações feitas, são pro-
que implica busca de informações pertinentes momen-
postas e/ou negociadas com os alunos (explicações do
tos diversificados de aprendizagem contínua. Isso resulta
professor, atividades que podem ser para todo o grupo,
em que o trabalho do professor acerca dos conceitos que
em pequenos grupos ou específicas para determinados
pretende ensinar consiste em provocar gradativamente os
alunos).Novas tarefas e/ou atividades são propostas para
acompanham o aluno em sua evolução (preferencialmente
tarefas avaliativas individuais).

48
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Avaliação e mediação
condições prévias referem-se a história escolar e de vida
De acordo com a autora, os melhores guias são os de cada aluno, que devem ser conhecidas em favor do
próprios peregrinos, que percorrem o caminho conosco,
alunos e não para fortalecer pré-conceitos sobre ele. A
enfrentando as mesmas dificuldades e provocando-nos a
finalidade da avaliação no que se refere à mobilização é
andar mais depressa. Avaliação mediadora é um proces-
de adequar as propostas e as situações às necessidades e
so interativo, de troca de mensagens e de significados,
possibilida- des dos alunos, para poder fornecer-lhes a
de confronto. A mediação, conforme Vygotsky e Piaget é
aprendizagem significativa.
essencial na construção do conhecimento. Para Vygotsky
Conhecer as concepções prévias do aluno favorece o
a reconstrução é importante porque, no processo de in-
planejamento em termos de pontos de partida, e os possí-
ternalização o aluno atribui sentido à informação criando
veis rumos a seguir, mas estes necessitam ser redimensio-
e recriando significados com o uso e a audição/leitura da
nados continuamente ao longo do processo. Conhecer as
língua falada e escrita.
condições prévias permite planejar tempos de
Para Vygotsky e Piaget, a linguagem é a mediação do descobertas, de diálogos, de encontros, de interação de
pensamento. Note-se ainda que a interação social é
trocas, de ex- pressão, ao longo do período letivo. Os
funda- mental, pois nela se dará a aprendizagem. A
processos de edu- cação e de avaliação exigem do
avaliação é um processo dinâmico e espiralado que
professor a postura inves- tigativa durante todo o
acompanha o proces- so de construção do conhecimento,
percurso educativo. Como mediar o desejo e a
sendo uma interpre- tação que assume diferentes
necessidade de aprender?
significados e dimensões ao longo do processo
O trabalho do professor consiste em:
educacional, tanto por parte do profes- sor como do
• mediar o desejo e a necessidade de aprender;
aluno. A dinâmica do processo avaliativo. A dinâmica da
• mediar as experiências educativas;
avaliação é complexa, uma vez que o processo de
• mediar as estratégias de aprendizagem no meio de
aprendizagem, entendido como construção do conhe-
atividades diversificadas e diferenciadas;
cimento, é ao mesmo tempo individual e coletivo, pois re-
• mediar a expressão do conhecimento ao longo de
sulta da ação do aprendiz sobre o objeto de
tarefas gradativas e articuladas.
conhecimento e da interação social, que o leva a uma
interpretação que necessita, e pode ser reformulada,
Mediar a mobilização significa suscitar o envolvimento
ampliada progressiva- mente, tornando-o capaz de
do aluno no processo de aprendizagem, criando pergun-
pensar sobre seus próprios pensamentos elaborando seus
tas mobilizadoras, experiências interativas e
conceitos e reelaborando outros. Através mobilização,
oportunidades de expressão do pensamento individual,
chegamos à expressão do conhecimento, realizamos a
mesmo que as respostas não sejam ainda corretas.
experiência educativa, o que nos possibilita mobilizar
Mediando a experiên- cia educativa. Mediar as
novas competências adquiridas no processo.
experiências educativas significa acompanhar o aluno em
ação-reflexão-ação, nos proces- sos simultâneos de busca
Mediando a mobilização.
informações, refletir sobre seus procedimentos de
A expressão/construção da “aprendizagem significati-
aprendizagem, interagir com os outros, refletir sobre si
va” pode se realizar de múltiplas formas e em diferentes
próprio enquanto aprendiz. Duas pergun- tas se tornam
níveis de compreensão. A avaliação mediadora destina-se
essenciais na mediação: Qual a dimensão do
a mobilizar, favorecer a experiência educativa e a
envolvimento do aluno com a atividade de aprender?
expressão do conhecimento e a abertura a novas
Como ele interage com os outros? As estratégias de
possibilidades por parte do aprendiz. Não há sentido em
apren- dizagem.
avaliar tarefas cole- tivas atribuindo valores individuais ou
Mediar as estratégias de aprendizagem significa inter-
somar pontos por participação e outras atividades, uma
vir no processo de aprendizagem provocando no
vez que essas ativida- des são oportunidades de interação
aprendiz, e no próprio professor, diferentes graus de
em meio ao processo e não pontos de chegada. Para
compreensão, levando a refletirem sobre seus
Charlot, o conceito de mo- bilização implica a ideia do
entendimentos no diálogo educativo. Significa oferecer
movimento. Qual o papel do educador/ avaliador? É o
aos aprendizes: experiências necessárias e
papel de mediador, exigindo-lhe manter-se flexível,
complementares (diversificadas no tempo), com diversos
atento, crítico sobre seu planejamento. É preciso que ele
graus de dificuldades, de forma individual, em parcerias,
seja propositivo, sem delimitar, consiga questionar e
em pequenos grupos, em grandes grupos para promover
provocar, sem antecipar respostas prontas; articular novas
confronto de ideias entre aprendizes e entre estes e o
perguntas a um processo contínuo de cons- trução do
professor, por meio de diversos recursos didáticos e de
conhecimento. O papel do educador ao desen- cadear
diversas formas de expressão do conhecimento, por meio
processos de aprendizagem é o de mediador da
de diferentes linguagens. Os desafios propostos du- rante
mobilização para aprendê-lo.
a atividade educativa são observados por Hoffmann:
• Nem sempre o que o professor diz ao estudante é
A investigação de concepções prévias.
entendido como ele gostaria;
A análise das concepções prévias dos alunos não
• A estratégia utilizada pelo aluno, ao fazer algo, só
pode ser confundida com as condições prévias do aluno.
pode ser intuída pelo professor e ajudá-lo ou confundi-lo;
O que o aluno já sabe é baseado em elaborações
• O professor sabe onde o aluno poderá chegar, mas
intuitivas so- bre dados da realidade, que necessita ser
não deverá dizê-lo assim suas orientações serão sempre
aperfeiçoado. As
incompletas.

49
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

• O aluno nem sempre expressa suas dúvidas ou as


ex- pressa claramente, uma vez que “são dúvidas” - o Os instrumentos de avaliação, em termos do
professor precisa interpretar perguntas. planejamen- to e análise, definirão a dimensão do diálogo
entre alunos e professor. O principio fundamental da
• Ouvir o aluno antes de intervir assegura melhores
in- terpretações sobre suas estratégias. expressão do conheci- mento: o que ouvimos, vemos ou
lemos não é o pensamento do aluno, mas a sua expressão,
• Posturas afetivas, nessas intervenções, minimizam a
que também evolui, se apri- mora e precisa ser trabalhada.
pressão exercida pelo questionamento do professor. Esses
Os limites no diálogo entre pro- fessores e alunos devem
desafios possibilitam a aquisição de competências neces-
ser considerados como positivos na busca de sintonia.
sárias aos professores/profissionais reflexivos. Atividades
diversificadas ou diferenciadas? Diversificar experiências A interpretação dos sentidos, expressos por ambos,
está sempre sujeita a ambiguidade, inseguranças e
educativas representa alguns princípios importantes em
indefinições. Uma postura reflexiva do aluno e do professor.
avaliação mediadora: diversificá-las em tempo, graus de
As tarefas ava- liativas operam funções de reflexão que
dificuldade, termos de realização individual, termos dos
possibilitam:
re- cursos didáticos e termos da expressão do
• para o professor: elemento de reflexão sobre os
conhecimento. Diferenciar experiências educativas atende
conhe- cimentos expressos pelos alunos x elemento de
aos pressupos- tos básicos da ação docente:
reflexão sobre o sentido da sua ação pedagógica;
• Aprender sobre o aprender;
• para o aluno: oportunidade de reorganização e
• Reconhecer que o processo de conhecimento é qua-
expres- são de conhecimentos x elemento de reflexão
litativamente diferente;
sobre os co- nhecimentos construídos e procedimentos de
• Mediar o desenvolvimento de aprendizagens coleti-
aprendizagem. Mediar a aprendizagem significa, favorecera
vas e de atendimento individual;
tomada de cons- ciência do aluno sobre limites e
• Valorizar a heterogeneidade os grupo no processo possibilidades no processo de conhecimento, possibilitando
de formação a diversidade;
ao educando refletir sobre sua apropria aprendizagem, a
• Oferecer ajuda específica se discriminar; sem desres- partir de ações do cotidiano, origi- nando significativas
peitar; sem subestimar. Mediando a expressão do conhe- práticas de auto-avaliação.
cimento.
Registros em avaliação mediadora
Mediar a expressão do conhecimento implica a reutili- Se estivermos contando uma história, precisamos agir
zação de instrumentos de avaliação como desencadeado- como historiadores, registrando e organizando dados da
res da continuidade da ação pedagógica, sendo o desem- nos- sa memória, para não cairmos no erro do
penho do aluno considerado como provisório, uma vez esquecimento. Os registros em avaliação mediadora
que está em processo de aprendizagem. Nesse sentido, envolvem desde o uso de instrumentos comumente
notas ou conceitos não podem ser consideradas utilizados, tais como: provas (obje- tivas e dissertativas)
definitivas, mas apenas relativas ao conjunto de exercícios, preenchimento de lacunas, es- colha de
aprendizagens ocorridas em um dado período. Implica afirmações verdadeiras ou falsas, itens de múltipla es- colha,
também refletir sobre as condições oferecidas para que tal questões combinadas, etc., pois o que verdadeiramente
conjunto de aprendiza- gem ocorra. Tarefas gradativas e importa é a clareza da tarefa para o aluno e a reflexão do
articuladas.
Para Hoffmann, a avaliação mediadora é mais exigen- pro- fessor sobre a interpretação que será dada as
expressões dos alunos em termos de encaminhamentos
pedagógicos a serem realizados a seguir.
rios A organização de dossiês dos alunos, portfólios, relató-
te e rigorosa para alunos e professores porque suscita a de avaliação envolve meios de registro de um conjunto
permanente análise do pensamento em construção, o de aprendizagem do aluno que permitam ao professor, ao
próprio aluno e a suas famílias uma visão evolutiva do proces-
que significa muitas tarefas individuais e análise imediata
so. Esses instrumentos tornam-se mediadores na medida
do professor. O que o aluno fala, escreve ou faz não é seu em que contribuem para entender a evolução do aluno e
pensamento, mas sua expressão, que também evolui e se apontar ao professor novos rumos para sua intervenção
aprimora progressivamente e necessita ser trabalhada. Os pedagógica sempre o mais favorável possível à
instrumentos de avaliação devem respeitar as diferentes aprendizagem do aluno, de todos os alunos, de acordo
formas de expressão do aluno, ao mesmo tempo em que com suas necessidades e pos- sibilidades.
definem a dimensão do diálogo entre alunos e professor. Os registros escolares precisam refletir com clareza os
A interpretação que o professor faz das expressões princípios de avaliação mediadora delineados, de tal forma
do aluno está sempre sujeita a ambiguidades, inseguran- que registros classificatórios sejam superados em favor de
ças, indefinições, daí a necessidade do diálogo, da troca re- gistros que assumam o caráter de experiências em
de ideias que favoreça a convergência de significados. Na construção, confiantes em sua perspectiva ética e
perspectiva mediadora, toda avaliação, desde um simples humanizadora. Nada, em avaliação, serve como regra geral,
comentário do professor até o uso de instrumentos for- ou vale para todas as si- tuações, em termos de
mais, tem por finalidade a evolução do aluno em termos procedimento. O processo de avaliação precisa ser coerente
de postura reflexiva sobre o que aprende, as estratégias com todo o processo de aprendizagem, desde sua
que utiliza e sua interação com os outros. Isso só ocorre concepção, definição de sua finalidade, planejamen- to de
mediante a postura igualmente reflexiva do educador. estratégias de intervenção, compreensão do processo de
Res- peito às diferentes formas de expressão. construção está atrelado às concepções sobre a finalidade
de educação, as quais determinam as estratégias
metodológicas de ensino. Instrumentos a serviço das
metodologias.
50
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Quando a autora se refere a instrumentos de


avaliação, está falando sobre testes, trabalhos e todas as O conceito é uma formulação abstrata que configura,
formas de ex- pressão do aluno que me permitam no pensamento, as determinações de um objeto ou fenô-
acompanhar o seu pro- cesso de aprendizagem - tarefas meno. No contexto do pensamento marxista, o conceito
avaliativas. Instrumentos de avaliação são registros de equivale a uma categoria explicativa, que ordena, com-
diferentes naturezas. Ora é o aluno que é levado a fazer os preende e expressa uma realidade empírica concreta,
próprios registros, expressando o seu conhecimento em como um “concreto pensado”, “síntese de múltiplas
tarefas, testes, desenhos, trabalhos e outros instrumentos, determina- ções’”. O nosso esforço, ao longo deste texto,
ora é o professor quem registra o que observou do aluno, é expor os elementos do movimento real na prática
fazendo anotações e outros apontamentos. Critérios de escolar, relativos ao tratamento dos resultados da
correção de tarefas. aprendizagem dos alunos, tentando responder à seguinte
Critérios de avaliação podem ser entendidos por pergunta: a configuração formada pelos dados da prática
orienta- ções didáticas de execução de uma tarefa, por escolar, referentes aos re- sultados da aprendizagem dos
seus aspectos formais: número de páginas, organização no educandos, define-se como verificação ou como
papel, itens de resposta, normas de redação técnica, etc. avaliação?
Tarefas avaliativas, numa visão mediadora, são planejadas Da resposta que pudermos dar a esta questão, estare-
tendo como referencia principal a sua finalidade, a clareza mos retirando consequências para a prática docente, acre-
de intenções do profes- sor sobre o uso que fará dos seus
ditando que o esforço científico visa fundamentar a ação
resultados, muito mais do que embasados em normas de
humana de forma adequada. A ciência constitui um ins-
elaboração. O significado dos registros para os professores.
A prática classificatória assumiu “status” de precisão, trumento com o qual se trabalha no desvendamento dos
objetividade e cientificidade, sendo ne- cessário, para sua objetos e, por isso, ela nos permite, com alguma
superação, a reflexão em ação e a reflexão sobre a ação segurança, escolher um caminho de ação. No caso deste
(trocando ideias com outros colegas). Os regis- tros não texto, no limi- te do possível, a análise crítica que
necessitam ser genéricos, nem de ordem atitudinal, nem pretendemos proceder da prática avaliativa, identificando-
devem ser centrados em cumprimento de tarefas quanti- a com o conceito de ve- rificação ou de avaliação, deixa-
tativos ou organização de cadernos e materiais. nos aberta a possibilidade de encaminhamentos, que
cremos serem coerentes e con- sistentes.
A Avaliação da Aprendizagem Escolar
A avaliação da aprendizagem escolar adquire seu
sentido na medida em que se articula com um projeto Fenomenologia da Aferição dos Resultados da
pedagógico e com seu consequente projeto de ensino. A Aprendizagem Escolar
avaliação, tanto no geral quanto no caso específico da Na prática da aferição do aproveitamento escolar, os
aprendizagem, não possui uma finalidade em si; ela professores realizam, basicamente, três procedimentos su-
subsidia um curso de ação que visa construir um resultado cessivos:
previamente definido. No caso que nos interessa, a • medida do aproveitamento escolar;
avaliação subsidia decisões a respeito da aprendi- zagem • transformação da medida em nota ou conceito;
dos educandos, tendo em vista garantir a qualidade do
• utilização dos resultados identificados.
resultado que estamos construindo. Por isso, não pode ser
Iniciaremos nossa análise pela descrição fenomeno-
estudada, definida e delineada sem um projeto que a
articule. lógica dessas três condutas dos professores. Tal descrição
Para os desvendamentos e proposições sobre a delimita um quadro empírico, que nos permitirá,
avaliação da aprendizagem, que serão expostos neste posterior- mente, abstrair características que nos indicarão
texto, teremos sempre presente este fato, assumindo que se os atos de aferição do aproveitamento escolar,
estamos trabalhan- do no contexto do projeto educativo, praticados pelos professores, são de verificação ou de
que prioriza o desenvol- vimento dos educandos - crianças, avaliação.
jovens e adultos - a partir de um processo de assimilação
ativa do legado cultural já pro- duzido pela sociedade: a Transformação da Medida em Nota ou Conceito
filosofia, a ciência, a arte, a literatura, os modos de ser e de Outra conduta do professor no processo de aferição
viver. Deste modo, os encaminhamentos que estaremos do aproveitamento escolar tem sido a conversão da me-
fazendo para a prática da avaliação da aprendi- zagem dida em nota ou conceito. Com o processo de medida, o
destinam-se a servir de base para tomadas de decisões no professor obtém o resultado - por suposto, objetivo - da
sentido de construir com e nos educandos conhecimentos, aprendizagem do educando que, por sua vez, é transfor-
habilidades e hábitos que possibilitem o seu efetivo mado ou em nota, adquirindo conotação numérica, ou em
desen- volvimento, através da assimilação ativa do legado conceito, ganhando conotação verbal. Neste último caso,
cultural da sociedade. o resultado é expresso ou por símbolos alfabéticos, tais
Tendo por base a compreensão exposta neste texto, como SS = superior, MS = médio superior, ME = médio,
abor- daremos a prática da aferição do aproveitamento
MI = médio inferior, IN = inferior, SR = sem rendimento,
escolar, ten- do como matriz de abordagem os conceitos
ou por palavras denotativas de qualidade, tais como
de verificação e avaliação, na perspectiva de, ao final,
Excelente, Muito Bom, Bom, Regular, Inferior, Péssimo.
retirar proveitos para a prática docente. Importa enfatizar
que estaremos trabalhando com os conceitos de verificação
e avaliação, e não com os ter- mos verificação e avaliação.
Isso significa que iremos trabalhar com esses conceitos a
partir de suas “determinações” no movi- mento real da
prática escolar com a qual convivemos.
51
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

A transformação dos resultados medidos em nota ou


Se os dados obtidos revelarem que o educando se
conceito dá-se através do estabelecimento de uma equi-
encontra numa situação negativa de aprendizagem e, por
valência simples entre os acertos ou pontos obtidos pelo
isso, possui uma nota ou um conceito de reprovação,
educando e uma escala, previamente definida, de notas usual- mente tem-se utilizado a primeira e, no máximo, a
ou conceitos. Um exemplo é suficiente para compreender segunda opção; neste caso, no mínimo registram-se os
como se dá esse processo. Para um teste de dez questões, dados em cadernetas e, no máximo, chama-se a atenção
as correspondências entre acertos e notas são simples: do aluno, pedindo-lhe que estude para fazer uma
cada questão equivale a um décimo da nota máxima, que segunda aferição, tendo em vista a melhoria da nota e,
seria dez. Assim, um aluno que acertou oito questões ob- nesta circunstância, deve-se observar que a orientação, no
tém nota oito. A transformação de acertos em conceitos geral, não é para que o educando estude a fim de
poderia ser feita por uma escala como a que segue: SR aprender melhor, mas para que estude “tendo em vista a
(sem rendimento) = nenhum acerto; IN (inferior) = um ou melhoria da nota”.
dois acertos; MI (médio inferior) = três ou quatro acertos; A partir dessa observação, poder-se-á arguir: estudar
ME (médio) = cinco ou seis acertos; MS (médio superior) para melhorar a nota não possibilita uma aprendizagem
= sete ou oito acertos; SS (superior) = nove ou dez efetiva? É possível que sim; contudo, importa observar
acertos. As escalas de conversão poderão ser mais que o que está motivando e polarizando a ação não é a
complexas que estas, mas sem nenhuma grande apren- dizagem necessária, mas sim a nota. E isso, do
dificuldade. ponto de vista educativo, é um desvio, segundo nossa
Para proceder a essa transformação tem-se estabele- concepção. A terceira opção possível de utilização dos
cido variadas tabelas de conversão. Se não há uma tabela resultados da aprendizagem é a mais rara na escola, pois
oficial na escola, cada professor cria a sua, em função do exige que este- jamos, em nossa ação docente,
polarizados pela aprendi- zagem e desenvolvimento do
instrumento de coleta de dados que constrói ou utiliza.
educando; a efetiva aprendi- zagem seria o centro de
Notas e conceitos, em princípio, expressam a qualidade
todas as atividades do educador. Contudo, esta não tem
que se atribui à aprendizagem do educando, medida sob
sido a nossa conduta habitual de educadores escolares;
a forma de acertos ou pontos. Caso o professor, por usualmente, estamos preocupados com a aprovação ou
decisão pessoal ou por norma escolar, multiplique as reprovação do educando, e isso de- pende mais de uma
situações e os momentos de aferição do aproveitamento nota que de uma aprendizagem ativa, inteligível,
escolar, para obter o resultado final de um bimestre ou consistente.
ano letivo, ele se utiliza da média de notas ou conceitos. Em síntese, as observações até aqui desenvolvidas de-
No caso das notas, a média é facilitada pelo fato de monstram que a aferição da aprendizagem escolar é utili-
se estar operando com números, que de símbolos quali- zada, na quase totalidade das vezes, para classificar os
tativos se transformam indevidamente em quantitativos; alu- nos em aprovados ou reprovados. E nas ocasiões
no caso dos conceitos, a média é obtida após a conversão onde se possibilita uma revisão dos conteúdos, em si, não
dos conceitos em números. Por exemplo, pode-se estabe- é para proceder a uma aprendizagem ainda não realizada
lecer a equivalência entre S e a nota dez, entre MS e a ou ao aprofundamento de determinada aprendizagem,
nota oito, e assim sucessivamente. A partir daí, basta fazer mas sim para “melhorar” a nota do educando e, por isso,
uma média simples ou ponderada, conforme a decisão, aprová-lo’.
obten- do-se o que seria a média da aprendizagem do
educando no bimestre ou no semestre letivo. Aqui A Escola Opera Com Verificação e Não Com Avaliação
também ocorre a transposição indevida de qualidade da Aprendizagem
para quantidade, de tal forma que se torna possível, ainda Iniciemos pelos conceitos de verificação e avaliação,
que impropriamente, obter uma média de conceitos para, a seguir, identificarmos se a fenomenologia da afe-
rição do aproveitamento escolar, descrita no item anterior,
qualitativos.
se configura como verificação ou avaliação. O termo veri-
ficar provém etimologicamente do latim - verum facere - e
Utilização dos Resultados
significa “fazer verdadeiro”. Contudo, o conceito verifica-
Com o resultado em mãos, o professor tem diversas ção emerge das determinações da conduta de, intencio-
possibilidades de utilizá-lo, tais como: nalmente, buscar “ver se algo é isso mesmo”, “investigar
- registrá-lo, simplesmente, no Diário de Classe ou Ca- a verdade de alguma coisa”. O processo de verificar con-
derneta de Alunos; figura-se pela observação, obtenção, análise e síntese dos
- oferecer ao educando, caso ele tenha obtido uma dados ou informações que delimitam o objeto ou ato com
nota ou conceito inferior, uma “oportunidade” de melho- o qual se está trabalhando. A verificação encerra-se no
rar a nota ou conceito, permitindo que ele faça uma nova mo- mento em que o objeto ou ato de investigação chega
aferição; a ser configurado, sinteticamente, no pensamento
- atentar para as dificuldades e desvios da aprendiza- abstrato, isto é, no momento em que se chega à
gem dos educandos e decidir trabalhar com eles para que, conclusão que tal objeto ou ato possui determinada
de fato, aprendam aquilo que deveriam aprender, cons- configuração.
truam efetivamente os resultados necessários da aprendi- A dinâmica do ato de verificar encerra-se com a
zagem. obten- ção do dado ou informação que se busca, isto é,
“vê-se” ou “não se vê” alguma coisa. Por si, verificação não
implica que o sujeito retire dela consequências novas e
significati- vas. As entrelinhas do processo descrito no
tópico anterior
52
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

demonstram que, no geral, a escola brasileira opera com


• atribuir uma qualidade a essa configuração da
a verificação e não com a avaliação da aprendizagem. A
aprendiza- gem, a partir de um padrão (nível de expectativa)
partir dessas observações, podemos dizer que a prática
preestabele- cido e admitido como válido pela comunidade
educacional brasileira opera na quase totalidade das dos educadores e especialistas dos conteúdos que estejam
vezes, como verificação. Por isso, têm sido incapaz de sendo trabalhados;
retirar do processo de aferição as consequências mais • a partir dessa qualificação, tomar uma decisão sobre
significativas para a melhoria da qualidade e do nível de as condutas docentes e discentes a serem seguidas, tendo
aprendizagem dos educandos. Ao contrário, sob a forma em vista:
de verificação, tem-se utilizado o processo de aferição da - a reorientação imediata da aprendizagem, caso sua
aprendizagem de uma forma negativa, à medida que tem qua- lidade se mostre insatisfatória e o conteúdo, habilidade
servido para desenvolver o ciclo do medo nas crianças e ou há- bito, que esteja sendo ensinado e aprendido, seja
jovens, através da constante “ameaça” da reprovação. efetivamente essencial para a formação do educando;
Em síntese, o atual processo de aferir a aprendizagem - o encaminhamento dos educandos para passos
escolar, sob a forma de verificação, além de não obter as subse- quentes da aprendizagem, caso se considere que,
mais significativas consequências para a melhoria do ensi- qualitativa- mente, atingiram um nível da satisfatoriedade
no e da aprendizagem, ainda impõe aos educandos no que estava sendo trabalhado.
conse- quências negativas, como a de viver sob a égide Assim, o objetivo primeiro da aferição do aproveitamento es-
do medo, através da ameaça de reprovação - situação que colar não será a aprovação ou reprovação do educando, mas o
nenhum de nós, em sã consciência, pode desejar para si dire- cionamento da aprendizagem e seu consequente
desenvolvimento. Padrão Mínimo de Conduta: Para que se
ou para outrem.
utilize corre- tamente a avaliação no processo ensino-
O modo de trabalhar com os resultados da aprendi-
aprendizagem, no contexto escolar, importa estabelecer
zagem escolar - sob a modalidade da verificação- reifica
um padrão mínimo de conhecimentos, habilidades e hábitos
a aprendizagem, fazendo dela uma “coisa” e não um pro- que o educando deverá adquirir; um padrão mínimo de
cesso. O momento de aferição do aproveitamento escolar conhecimentos, habilidades e hábitos e não uma média
não é ponto definitivo de chegada, mas um momento de mínima de notas, como ocorre hoje
parar para observar se a caminhada está ocorrendo com na prática escolar.
a qualidade que deveria ter. Neste sentido, a verificação Estar interessado que o Educando Aprenda e
transforma o processo dinâmico da aprendizagem em Desenvolva: A prática da avaliação da aprendizagem, em
pas- sos estáticos e definitivos. A avaliação, ao contrário, seu sentido ple- no, só será possível na medida em que se
mani- festa-se como um ato dinâmico que qualifica e estiver efetivamente interessado na aprendizagem do
subsidia o reencaminhamento da ação, possibilitando educando, ou seja, há que se estar interessado em que o
consequências na direção da construção, dos resultados educando aprenda aquilo que está sendo ensinado. Parece
que se deseja. um contra senso essa afirmação, na medida em que
Diante do fato de que, no movimento real da aferição podemos pensar que quem está trabalhando nó ensino está
da aprendizagem escolar, nos deparamos com a prática interessado em que os educandos aprendam. Todavia, não
es- colar da verificação e não da avaliação, e tendo ciência é o que ocorre.
de que o exercício efetivo da avaliação seria mais O sistema social não demonstra estar tão interessado
significati- vo para a construção dos resultados da em que o educando aprenda a partir do momento que
aprendizagem do educando, propomos, neste segmento investe pouco na Educação. Os dados estatísticos
educacionais estão aí para demonstrar o pequeno
do texto, algumas indicações que poderão ser estudadas
investimento, tanto do ponto de vista financeiro quanto do
e discutidas na pers- pectiva de gerar encaminhamentos
pedagógico, na efetiva aprendi- zagem do educando. No
para a melhor forma de condução possível do ensino caso da avaliação da aprendizagem, vale lembrar o baixo
escolar. investimento pedagógico. Nós, professo- res, assim como
normalmente os alunos e seus pais, estamos interessados
Uso da Avaliação na aprovação ou reprovação dos educandos nas séries
Em primeiro lugar, propomos que a avaliação do escolares; porém, estamos pouco atentos ao seu efetivo
apro- veitamento escolar seja praticada como uma desenvolvimento. A nossa prática educativa se expressa
atribuição de qualidade aos resultados da aprendizagem mais ou menos da seguinte forma: “Ensinamos, mas os
dos educandos, tendo por base seus aspectos essenciais alunos não aprenderam; o que é que vamos fazer”?
e, como objetivo final, uma tomada de decisão que De fato, se ensinamos, os alunos não aprenderam e
direcione o aprendizado e, consequentemente, o es- tamos interessados que aprendam, há que se ensinar
desenvolvimento do educando. Com isso, fugiremos ao até que aprendam; há que se investir na construção dos
aspecto classificatório que, sob a forma de verificação, resultados de- sejados. A avaliação só pode funcionar
tem atravessado a aferição do apro- veitamento escolar. efetivamente num tra- balho educativo com estas
Nesse sentido, ao avaliar, o professor deverá: características. Sem esta perspectiva dinâmica de
• coletar, analisar e sintetizar, da forma mais objetiva aprendizagem para o desenvolvimento, a avalia- ção não
possível, as manifestações das condutas cognitivas, afeti- terá espaço; terá espaço, sim, a verificação, desde que ela só
vas, psicomotoras - dos educandos, produzindo uma con- dimensione o fenômeno sem encaminhar decisões. A
figuração do efetivamente aprendido; avaliação implica a retomada do curso de ação, se ele não
tiver sido satisfatório, ou a sua reorientação, caso esteja se
desvian- do. A avaliação é um diagnóstico da qualidade dos
resultados intermediários ou finais; a verificação é uma
configuração dos resultados parciais ou finais. A primeira é
dinâmica, a segunda, estática.
53
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Rigor Científico e Metodológico: Para que a avaliação


se tome um instrumento subsidiário significativo da Objetivou-se garantir uma base legal no estatuto da
prática educativa, é importante que tanto a prática educação brasileira para obrigar as unidades da federação
educativa como a avaliação sejam conduzidas com um a destinarem recursos financeiros diretamente ás suas es-
determinado rigor cien- tífico e técnico. A ciência colas.
pedagógica, hoje, está suficiente- mente amadurecida A esse respeito há algumas siglas, a saber:
para oferecer subsídios à condução de uma prática FUNDEF: Fundo de Manutenção e Desenvolvimento
educativa capaz de levar ã construção de resul- tados de Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério;
significativos da aprendizagem, que se manifestem em prol FUNDEB: Fundo de Manutenção E Desenvolvimento
do desenvolvimento do educando. Não caberia tratar da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da
desta questão neste texto; todavia, não poderíamos deixar Educação;
de menciona-la, pois sem ela a avaliação não alcançará MDE: Manutenção e Desenvolvimento do Ensino;
seu papel significativo na produção de um ensino- SE: Salário Educação;
aprendizagem satisfatório. FNDE: Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educa-
ção;
Fonte: Referencial Curricular Nacional para a Educação PNAE: Programa Nacional de Alimentação Escolar;
Infantil: Volume 1 – Introdução. Volume 2 - Formação PNLD: Programa Nacional de Livros Didáticos;
pessoal e social; Volume 3 - Concepção de mundo (acessíveis PNLEM: Programa Nacional de Livro Didático Para o
no portal. mec.gov.br). Ensino Médio;
PNLA: Programa Nacional do livro didático para alfabe-
tização e de Jovens e Adultos;
PNBE: Programa Nacional Biblioteca da Escola;
A EDUCAÇÃO ESCOLAR COMO DIREITO E DEVER DO PNATE: Programa Nacional de Apoio ao Transporte Es-
ESTADO. colar;
PDDE: Programa Dinheiro Direto na Escola;

Autonomia da gestão financeira na escola


Prezado Candidato o tema acima supracitado já foi Na LDB nº 9. 394/96, em seu Art. 15, estabelece que
abordado em tópicos anteriores. “os sistemas de ensino assegurarão ás unidades escolares
públicas de educação básica que os integram progressivos
graus de autonomia pedagógica e administrativa e de ges-
tão financeira, observadas as normas gerais de direito
FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO. finan- ceiro público.” Ao afirmar que à escola devem ser
atribuídos progressivos graus de autonomia, reconheceu
que não se trata de autonomia absoluta, mas que, mesmo
parcial, deve progredir até um ponto que lhe garanta seu
Para introduzir esse tema, apresentamos a definição pleno funcio- namento, nas suas múltiplas dimensões.
de um Economista, Professor e Consultor de Empresas, O termo “autonomia” significa capacidade do indiví-
Paulo Nunes, sobre gestão financeira no setor duo de analisar e avaliar determinada situação, tomando
empresarial: decisões próprias a seu respeito. Seu conceito traz
“A gestão financeira é uma das tradicionais áreas algumas características especificas, são elas: relacional,
fun- cionais da gestão, encontrada em qualquer relativo e in- terdependente. E nesse sentido, o conselho
organização e à qual cabem as análises, decisões e escolar é um importante instrumento de participação da
atuações relacionados com os meios financeiros comunidade, e deve ser o maior aliado do gestor na
necessários à atividade da orga- nização. Desta forma, a construção da auto- nomia financeira da escola.
função financeira integra todas as tarefas ligadas à A destinação de recursos as escolas deve sujeitar-se a
obtenção, utilização e controlo de recursos financeiros.” um dos dois regimes de realização da despesa previstos
Partindo dessa definição podemos fazer uma na lei nº 4 320/64, ou seja, o regime normal e o regime
aproxima- ção mais especifica na área financeira de adiantamento. Pelo regime normal, que consiste na
educacional, que tem basicamente os mesmos princípios realização da despesa de acordo com os estágios de em-
da citada anteriormente. penho prévio, liquidação e pagamento, é possível se for
adotada pela administração municipal e descentralizada
Financiamento da educação: aspectos legais da execução. O regime de adiantamento é o mecanismo
No que tange ao financiamento da educação, em mais adequado para permitir as escolas municipais
nosso país, temos instrumentos legais que regem essa exerce- rem a autonomia financeira de que trata a LDB.
dimensão da gestão, no que se refere à distribuição de Para se por em pratica essa regime é necessária a
recursos previstos pela Constituição Federal e LDB: existência de uma lei municipal que o regulamente.
“A União aplicará anualmente, nunca menos de Dessa forma propõe-se a criação de uma lei de
dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios adiantamento exclusiva para as es- colas municipais,
vinte e cin- co por cento, no mínimo, da receita resultante caracterizada como o instrumento legal garantidor da
de impostos, compreendida a proveniente de autonomia.
transferências na manuten- ção e desenvolvimento de
ensino.” (CF Art. 212 e LDB Art 69)

54
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Em suma, a gestão financeira, seja na área educacional


ou não, deve seguir alguns princípios para obter êxito, são Educação como transformação da sociedade
eles:
Definição de prioridades; Não há uma pedagogia que esteja isenta de pressu-
Cálculo correto dos gastos; postos filosóficos.
Elaboração do orçamento geral; É possível compreender a educação dentro da
Prestação de contas transparente; socieda- de, com seus determinantes e condicionantes,
mas com a possibilidade de trabalhar pela sua
Comprovação de gastos.
democratização.
Fonte: https://www.infoescola.com/educacao/ges- Para tanto, importa interpretar a educação como uma
tao-financeira-da-educacao/ instância dialética, que serve a um projeto, a um modelo, a
um ideal de sociedade. Ela trabalha para realizar esse
proje- to na prática. Assim, se o projeto for conservador,
medeia a conservação, contudo se o projeto for
CONCEPÇÕES FILOSÓFICAS DA EDUCAÇÃO. transformador, me- deia a transformação; se o projeto for
autoritário, medeia a realização do autoritarismo; se o
projeto for democrático, medeia a realização da
democracia.
Do ponto de vista prático trata-se de retomar
Filosofia é um corpo de conhecimento, constituído a
vigorosa- mente a luta contra a seletividade, a
partir de um esforço que o ser humano vem fazendo de
discriminação e o re- baixamento do ensino das camadas
compreender o seu mundo e dar-lhe um sentido, um sig-
populares. Lutar contra a marginalidade, através da
nificado compreensivo. Corpo de conhecimentos, em Filo-
escola, significa engajar-se no esforço para garantir aos
sofia, significa um conjunto coerente e organizado de en-
trabalhadores um ensino da me- lhor qualidade possível
tendimentos sobre a realidade. Conhecimentos estes que
nas condições históricas atuais. O papel de uma teoria
expressam o entendimento que se tem do mundo, a partir
crítica da educação é dar substância concreta a essa
de desejos, anseios e aspirações.
bandeira de luta, de modo a evitar que ela seja apropriada
Assim, podemos dizer que, a filosofia cria o ideário
e articulada com os interesses dominantes. A educação
que norteia a vida humana em todos os seus momentos e
como transformadora da sociedade recu-
em todos os seus processos.
sa-se tanto ao otimismo ilusório, quanto ao pessimismo
Neste sentido, a filosofia é uma força, é o sustentáculo
imobilizador. Por isso, propõe-se compreender a educa-
de um modo de agir. É uma arma na luta pela vida e pela
ção dentro de seus condicionantes e agir
emancipação humana.
estrategicamente para a sua transformação. Propõe-se
Em síntese, a filosofia é uma forma de conhecimento
desvendar e utilizar das próprias contradições da
que, interpretando o mundo, cria uma concepção coeren-
sociedade, para trabalhar cri- ticamente pela sua
te e sistêmica que possibilita uma forma de ação efetiva.
transformação.
Esta forma de compreender o mundo tanto é
Quando não pensamos, somos pensados e dirigidos
condicionada pelo meio histórico, como também é seu
por outros.
condicionante. Ao mesmo tempo, pois, é uma
interpretação do mundo e é uma força de ação.
Os Sujeitos do Processo Educativo: O Ser Humano
Aplicações da Filosofia da Educação
O ser humano emerge no seu modo de ser dentro de
um conjunto de relações sociais.
A educação dentro de uma sociedade não se
São as ações, reações, os modos de agir, as condutas
manifesta como um fim em si mesma, mas sim como um
normatizadas, as censuras, as convivências sadias ou neu-
instrumento de manutenção ou transformação social.
róticas, as relações de trabalho, de consumo etc. que
Assim sendo, ela necessita de pressupostos, de conceitos
cons- tituem prática, social e historicamente o ser
que fundamentem e orientem os seus caminhos.
humano.
A Filosofia fornece á educação uma reflexão sobre a
O ser humano é prático, pois é através da ação que
sociedade na qual está situada, sobre o educando, o edu-
modifica o ambiente, tornando-o satisfatório ás suas ne-
cador e para onde esses elementos podem caminhar.
cessidades; e enquanto transforma a realidade, constrói a
O educando, quem é, o que deve ser, qual o seu papel
si mesmo no seio das relações sociais determinadas.
no mundo; o educador, quem é, qual o seu papel no mun-
O ser humano é social na medida em que vive e
do; a sociedade, o que é, o que pretende; qual deve ser a
sobre- vive socialmente. A sua prática é dimensionada por
finalidade da ação pedagógica. Esses são alguns
suas relações com os outros.
problemas que exigem a reflexão filosófica.
O ser humano é histórico uma vez que suas caracte-
A Filosofia propõe questionar, a interpretação do
rísticas não são fixas nem eternas, mas determinadas pelo
mun- do que temos, e procura buscar novos sentidos e
tempo, que passa a ser constitutivo de si mesmo.
novas in- terpretações de acordo com os novos anseios
Em síntese, o ser humano é ativo, vive determinadas
que possam ser detectados no seio da vida humana.
relações sociais de produção, num determinado momento
do tempo. Como consequência disso, cada ser humano é
propriamente o conjunto das relações sociais que vive, de
forma prática, social e histórica.

55
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

O ser humano se torna propriamente humano na me-


dida em que, conjuntamente com outros seres humanos, A educação e a sociedade sempre caminham juntas e
pela ação, modifica o mundo externo conforme suas ne- é através dela que os indivíduos aprendem conhecimen-
cessidades ao mesmo tempo, constrói-se a si mesmo. tos e técnicas que serão importantes para a sua vivência
Assim, enquanto ele humaniza a natureza pelo seu em sociedade, aprendem também através desta relação o
tra- balho, humaniza-se a si mesmo. sentimento e pertencimento a cultura de seu povo e
Educador e educando, como seres individuais e outros conhecimentos adquiridos na vivência do
sociais ao mesmo tempo, constituídos na trama cotidiano.
contraditória de consciência crítica e alienação interagem Deste modo a educação é compreendida como uma
no processo edu- cativo. Eles são sujeitos da história na educação formal e informal. A educação informal se carac-
medida em que a constroem ao lado de outros seres teriza por ser a educação que se tem no cotidiano. Já a
humanos, num contexto socialmente definido. (Texto educação formal se caracteriza por ser a educação que a
adaptado de LUCKESI, C.) criança recebe na escola. Lembrando que na escola todo o
conhecimento que a criança traz consigo será sistematiza-
RELAÇÃO EDUCAÇÃO – SOCIEDADE – CULTURA. do, os professores juntamente com a comunidade escolar
proporcionaram ao aluno conhecimentos que são essen-
Quando se pensa em educação logo pensamos a ima- ciais para a sua vivência na sociedade.
gem de uma escola com várias crianças, professores e ou- Entretanto existem conceitos e estudos que permeiam
tros profissionais que trabalham e compõem o ambiente essa relação e nos permite compreender de forma mais
escolar. No entanto, não podemos pensar a educação so- cla- ra como ocorre a influência de uma sobre a outra.
mente no singular, mas sim no plural como “educações”
Inicial- mente o primeiro conceito que temos sobre a
pois ela é muito mais ampla e se estende além do
educação faz referência à escola. A escola é tida como
ambiente escolar. Cada vez que encontramos com alguém
na rua em nosso cotidiano, quando temos um tipo de uma instituição, sendo então considerada como uma
conversa com determinado grupo de amigos ou até instituição da socie- dade é de seu dever que esta
mesmo os primeiros ensinamentos que a criança recebe transmita os valores, regras e também a forma como os
em casa de seus pais ela está tendo uma interação, e a indivíduos dessa sociedade de- vem ser. Constituindo-se
partir dessa interação te- mos uma troca de como uma instituição muitas das vezes a escola e a
conhecimento, de saberes e de valores tornando tudo isso educação torna-se engessada e moldada em um
um processo de educação. determinado modelo tornando-se conservadora.
Quando os portugueses se estabeleceram no Brasil e A educação é compreendida como um fato social.
mantiveram os primeiros contatos e experiências com as Este conceito foi criado por um sociólogo chamado Émile
sociedades indígenas aqui presentes houve de fato uma Dur- kheim (1858-1917), para ele a educação é um fator
troca de cultura, de conhecimento e de saberes. A educa- que surge da sociedade, sendo mais claro, os fatos sociais
ção promove muito mais que o saber aprendido nas esco- são tudo aquilo que é construído pelo homem, formas de
las, ela cria e torna a troca de saberes, o conhecimento agir e pensar. Para ele os fatos sociais são construídos
que é construído com o outro, a formação da cultura e a externa- mente ao indivíduo gerando mudanças na
iden- tidade de determinado povo. Devemos ter sociedade, sen- do a educação um fator social, pois é uma
consciência de que em outros lugares e em outros instituição criada pela sociedade que busca passar os seus
culturas e sociedades a educação difere-se da nossa. valores e regras.
A educação sempre contribuiu para o Outro conceito que estuda a educação e a sociedade
desenvolvimento da sociedade, é com ela que acontece o é a teoria proposta por Karl Marx (1818-1883), Marx
verdadeiro sentido para evolução cultural. A sociedade só
estudou a educação e a relação estabelecida com o meio
se torna moderna com a evolução da educação, e a
social a partir dos estudos sobre as sociedades modernas,
própria sociedade tem seu papel nestas contribuições,
as so- ciedades modernas podem ser consideradas as
porque é com sua intera- ção que a educação tem
assimilado a melhor maneira o que está ao seu redor. A sociedades que surgem durante o período da Revolução
busca de qualidade por parte da educação não é só uma Industrial e que tem como base econômica o capitalismo,
preocupação da educação, mas também uma exigência da dentro dessa sociedade temos duas classes importantes
sociedade. que são a bur- guesia e o proletariado. Entre as duas
Todos os fenômenos que ocorrem dentro de uma de- temos a existência das lutas de classes, as lutas de classes
terminada sociedade influenciarão direto na educação, já existiam antes em outras sociedades na Antiguidade,
tais como as manifestações culturais, os movimentos Idade Média e Moder- na, entretanto na sociedade
políticos e períodos econômicos. Para ficar mais claro capitalista que Marx estuda as suas relações são mais
temos como um marco divisor de águas nas relações intensas.
sociais e educacio- nais que foi a Revolução Industrial. Dessa forma, para Marx a compreensão das relações
A Revolução Industrial ocorreu durante o século XVIII tais como relações sociais, econômicas e demais deve-se
e provocou a mudança nas relações de trabalho e entender primeiramente a base econômica em que ela
também no tempo pois a partir dela o tempo não se está inserida. A relação estabelecida entre a sociedade e a
baseou mais no tempo da natureza (tempo cíclico) mas edu- cação é que na sociedade capitalista a educação é
sim no tempo do relógio da fábrica. Deste modo, até com- preendida como um meio no qual a burguesia
mesmo as relações interpessoais e a própria educação se impõe os seus valores e as técnicas para serem utilizadas
modificaram. nas fábricas pela outra classe que é o proletariado.

56
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Já as ideias desenvolvidas por Max Weber que nasceu


na Alemanha (1864-1920) e viveu no mesmo tempo que Ainda com as transformações, pelas quais já passou e
Marx, apresenta em seus estudos uma nova sociedade vem passando a educação, tem se muito a melhorar,
que surge através da Revolução Industrial. Para ele a espe- cialmente na questão institucional, de acordo com a
educação é um elemento fundamental para a formação LDBEN (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional,
dos valores dos indivíduos, de modo que a educação 1996) a educação é perpendicular a todos os membros de
forma o indivíduo não para entender a sua existência uma so- ciedade, ou seja, a educação não é só para uma
naquela sociedade, mas sim para que ele possa ter meios minoria da sociedade, ela é para todos.
para alcançar privilégios sociais e exercer funções sociais. Na educação da sociedade, o papel fundamental da
Essas funções podem ser interpretadas como funções escola é planejar juntamente com sua comunidade o PPP
compõem o Estado, e a sua burocracia. Logo assim, po- (Projeto Político-Pedagógico) ele serve para trilhar o cami-
demos definir que a sua ideia sobre a educação é que ela nho que a escola quer desenvolver e para formar o aluno
prepara o indivíduo para uma conduta de vida que ele como cidadão para interagir e contribuir com a sociedade,
deve ter e o prepara para um treinamento específico que também deverá ter neste documento os objetivos a serem
será exercido no seu trabalho. alcançados no decorrer do processo de ensino-aprendiza-
A relação existente entre a educação e a sociedade gem e demais planejamentos
permitiu a diversos teóricos e pesquisadores em vários Dessa forma cabe aqueles que fazem e farão parte do
pe- ríodos do tempo ser objeto de estudo com um leque ambiente escolar, ter um pensamento crítico sobre estes
de temas que podem ser pesquisados. Foi abordado fatores e produzir meios e soluções que podem ser aplica-
anterior- mente alguns dos principais teóricos que
dos no ambiente escolar.
escreveram sobre a educação e que analisaram a sua
Na área tecnológica, a educação apresenta muito
relação com a socieda- de, entretanto o estudo da
inte- resse, mas infelizmente a política não faz a sua parte,
educação não se limita a eles.
Acima de tudo a escola não deve se tornar um dei- xando muitas escolas em pleno desenvolvimento
ambien- te no qual aconteça a transmissão de conteúdo tecnoló- gico sem computadores. Além dessa falta de
de uma forma conservadora e que impossibilite os alunos interesse e cuidado por parte da política, aquelas escolas
partici- parem da construção deste conhecimento. A que possuem esses recursos acabam sendo roubadas,
escola deve ter a função social que permite ao aluno ter tomadas pela falta de segurança, através do terror que
a liberdade de se expressar sobre aquilo que ocorre, afeta a sociedade mun- dial, a violência.
criando um espa- ço no qual o aluno possa se expressar, Com a ajuda do avanço tecnológico, atualmente a
criticar. A partir do momento em que há um espaço de educação tem exercitado mais a democracia e a cidadania,
respeito mútuo e de liberdade. pois, computadores estão sendo inseridos no ambiente
A liberdade aqui falada não deve ser entendida como es- colar, alunos estão tendo oportunidades com o
um meio no qual faça tudo o que se quer, a liberdade contato às novas tecnologias, entre estas a internet, a qual
pos- sibilitará aos alunos e professor um ambiente capaz se tornou um recurso imprescindível para alunos e
de cri- ticar, discordar e assim contribuir com indivíduos professores. Os próprios professores utilizam este recurso
capazes e preparados para resolverem desafios e para inovar suas aulas e fazerem com que seus alunos
problemas que os cercarão na sua vivência fora da escola tenham mais interes- se pelos conteúdos e assim a
e no decorrer de sua vida. vantagem de cada vez mais repensar a prática
Assim, a escola deve preparar seus alunos para o pedagógica, fazendo com que as aulas sejam para os
mun- do lá fora. É papel da escola compreender situações alunos mais agradáveis e interessantes.
que ocorrem fora do seu ambiente escolar e que de
Como resultado isso traz novas possibilidades para a
alguma maneira afeta aquilo que está sendo produzido no
sociedade, com mais conhecimento às culturas, uma edu-
meio es- colar as lutas sociais, econômicas e tecnológicas
cação mais democrática e igualitária, onde todos os cida-
são cons- truções da sociedade e que de alguma maneira
interferi- rão no espaço escolar, cabe à escola saber lidar dãos possuem o direito de usufruírem, por exemplo, das
com essas questões e outras que podem aparecer em novas tecnologias.
seus caminhos e permitir a abertura de meios e canais Hoje as novas tecnologias tem sido as maiores fontes
para que possam ser discutidos, debatidos dentro do de transformação da sociedade, porque é partindo des-
ambiente escolar. se pressuposto que a educação tem promovido progres-
A escola deve constituir-se como espaço de fala para sos que eleva a sociedade com inúmeros conhecimentos.
os alunos e um espaço de desenvolvimento crítico. Ligado E esse é o resultado da democratização que a educação
a formação do pensamento crítico do aluno a escola cons- tem passado ao longo dos anos, ao respeito às diferenças
titui-se também como um local no qual traços e costumes e valor às culturas. Ainda existe um longo trabalho para
da cultura local do aluno e a cultura universal são introdu- ser feito em prol da escola e é por isso, que é necessário
zidos, neste sentido deve haver dentro do ambiente valo- riza-la e lutar para a tornar ideal e justa para todos.
escolar a criação de espaços que possibilitem os alunos se
expres- sarem em vários aspectos da arte, como, dança,
literatura, pintura, fotografia e demais. A escola pode
também pro- mover o contato dos alunos com artistas
locais da região e manifestações culturais regionais.

57
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS NA PRÁTICA ESCOLAR. de classes, pois, embora difunda a ideia de igualdade de
PLANEJAMENTO, METODOLOGIA E AVALIAÇÃO DO oportunidades, não leva em conta a desigualdade de con-
PROCESSO ENSINO/ APRENDIZAGEM. dições. Historicamente, a educação liberal iniciou-se com
a pedagogia tradicional e, por razões de recomposição da
hegemonia da burguesia, evoluiu para a pedagogia reno-
vada (também denominada escola nova ou ativa), o que
não significou a substituição de uma pela outra, pois am-
bas conviveram e convivem na prática escolar.
As tendências pedagógicas brasileiras foram muito in- Na tendência tradicional, a pedagogia liberal se carac-
fluenciadas pelo momento cultural e político da teriza por acentuar o ensino humanístico, de cultura ge-
sociedade, pois foram levadas à luz graças aos ral, no qual o aluno é educado para atingir, pelo próprio
movimentos sociais e filosóficos. Essas formaram a prática esforço, sua plena realização como pessoa. Os conteúdos,
pedagógica do país. os procedimentos didáticos, a relação professor-aluno não
Os professores Saviani (1997) e Libâneo (1990) pro- têm nenhuma relação com o cotidiano do aluno e muito
põem a reflexão sobre as tendências pedagógicas. Mos- menos com as realidades sociais. É a predominância da
trando que as principais tendências pedagógicas usadas pa- lavra do professor, das regras impostas, do cultivo
na educação brasileira se dividem em duas grandes linhas exclusi- vamente intelectual.
de pensamento pedagógico. Elas são: Tendências Liberais A tendência liberal renovada acentua, igualmente, o
e Tendências Progressistas. sentido da cultura como desenvolvimento das aptidões
Os professores devem estudar e se apropriar dessas individuais. Mas a educação é um processo interno, não
tendências, que servem de apoio para a sua prática peda- externo; ela parte das necessidades e interesses
gógica. Não se deve usar uma delas de forma isolada em individuais necessários para a adaptação ao meio. A
toda a sua docência. Mas, deve-se procurar analisar cada educação é a vida presente, é a parte da própria
uma e ver a que melhor convém ao seu desempenho aca- experiência humana. A escola renovada propõe um ensino
dêmico, com maior eficiência e qualidade de atuação. De que valorize a autoeducação (o aluno como sujeito do
acordo com cada nova situação que surge, usa-se a ten- conhecimento), a experiência direta sobre o meio pela
dência mais adequada. E observa-se que hoje, na prática atividade; um ensino centrado no aluno e no grupo. A
docente, há uma mistura dessas tendências. tendência liberal renovada apre- senta-se, entre nós, em
Deste modo, seguem as explicações das duas versões distintas: a renovada progressivista, ou
características de cada uma dessas formas de ensino. pragmatista, principalmente na forma di- fundida pelos
Porém, ao analisá- pioneiros da educação nova, entre os quais se destaca
-las, deve-se ter em mente que uma tendência não substi- Anísio Teixeira (deve-se destacar, também a in- fluência
tui totalmente a anterior, mas ambas conviveram e convi- de Montessori, Decroly e, de certa forma, Piaget); a
vem com a prática escolar. renovada não-diretiva orientada para os objetivos de auto
realização (desenvolvimento pessoal) e para as relações
Pedagogia liberal in- terpessoais, na formulação do psicólogo norte-
americano Carl Rogers.
O termo liberal não tem o sentido de “avançado”, “de- A tendência liberal tecnicista subordina a educação à
mocrático”, “aberto”, como costuma ser usado. A doutrina sociedade, tendo como função a preparação de “recursos
liberal apareceu como justificação do sistema capitalista humanos” (mão-de-obra para a indústria). A sociedade in-
que, ao defender a predominância da liberdade e dos in- dustrial e tecnológica estabelece (cientificamente) as
teresses individuais da sociedade, estabeleceu uma forma metas econômicas, sociais e políticas, a educação treina
de organização social baseada na propriedade privada (também cientificamente) nos alunos os comportamentos
dos meios de produção, também denominada sociedade de ajus- tamento a essas metas. No tecnicismo acredita-se
de classes. A pedagogia liberal, portanto, é uma que a realidade contém em si suas próprias leis, bastando
manifestação própria desse tipo de sociedade. aos homens descobri-las e aplicá-las. Dessa forma, o
A educação brasileira, pelo menos nos últimos cin- essencial não é o conteúdo da realidade, mas as técnicas
quenta anos, tem sido marcada pelas tendências liberais, (forma) de descoberta e aplicação. A tecnologia
nas suas formas ora conservadora, ora renovada. Eviden- (aproveitamento or- denado de recursos, com base no
temente tais tendências se manifestam, concretamente, conhecimento científico) é o meio eficaz de obter a
nas práticas escolares e no ideário pedagógico de muitos maximização da produção e ga- rantir um ótimo
professores, ainda que estes não se deem conta dessa in- funcionamento da sociedade; a educação é um recurso
fluência. tecnológico por excelência. Ela “é encarada como um
A pedagogia liberal sustenta a ideia de que a escola instrumento capaz de promover, sem contradi- ção, o
tem por função preparar os indivíduos para o desenvolvimento econômico pela qualificação da mão-de-
desempenho de papéis sociais, de acordo com as obra, pela redistribuição da renda, pela maximiza- ção da
aptidões individuais, por isso os indivíduos precisam produção e, ao mesmo tempo, pelo desenvolvimen- to da
aprender a se adaptar aos valores e às normas vigentes ‘consciência política’ indispensável à manutenção do
na sociedade de classes através do desenvolvimento da Estado autoritário”. Utiliza-se basicamente do enfoque sis-
cultura individual. A ênfa- se no aspecto cultural esconde têmico, da tecnologia educacional e da análise experimen-
a realidade das diferenças tal do comportamento.

58
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Tendência liberal tradicional


Manifestações na prática escolar - A pedagogia liberal
tradicional é viva e atuante em nossas escolas. Na
Papel da escola - A atuação da escola consiste na pre- descrição apresentada aqui se incluem as escolas
paração intelectual e moral dos alunos para assumir sua religiosas ou leigas que adotam uma orientação clássico-
posição na sociedade. O compromisso da escola é com a humanista ou uma orientação humano-científica, sendo
cultura, os problemas sociais pertencem à sociedade. O que esta se aproxima mais do modelo de escola
ca- minho cultural em direção ao saber é o mesmo para predominante em nossa história educacional.
todos os alunos, desde que se esforcem. Assim, os menos
capa- zes devem lutar para superar suas dificuldades e
Tendência liberal renovada progressivista
conquistar seu lugar junto aos mais capazes. Caso não
consigam, de- vem procurar o ensino mais Papel da escola - A finalidade da escola é adequar as
profissionalizante. ne- cessidades individuais ao meio social e, para isso, ela
Conteúdos de ensino - São os conhecimentos e valores deve se organizar de forma a retratar, o quanto possível, a
sociais acumulados pelas gerações adultas e repassados vida. Todo ser dispõe dentro de si mesmo de mecanismos
ao aluno como verdades. As matérias de estudo visam de adapta- ção progressiva ao meio e de uma
prepa- rar o aluno para a vida, são determinadas pela consequente integração dessas formas de adaptação no
sociedade e ordenadas na legislação. Os conteúdos são comportamento. Tal inte- gração se dá por meio de
separados da experiência do aluno e das realidades experiências que devem satisfa- zer, ao mesmo tempo, os
sociais, valendo pelo valor intelectual, razão pela qual a interesses do aluno e as exigências sociais. À escola cabe
pedagogia tradicional é criticada como intelectualista e, às suprir as experiências que permitam ao aluno educar-se,
vezes, como enciclopé- dica. num processo ativo de construção e re- construção do
Métodos - Baseiam-se na exposição verbal da matéria objeto, numa interação entre estruturas cog- nitivas do
e/ou demostração. Tanto a exposição quanto a análise são indivíduo e estruturas do ambiente.
feitas pelo professor, observados os seguintes passos: a) Conteúdos de ensino - Como o conhecimento resulta
preparação do aluno (definição do trabalho, recordação da ação a partir dos interesses e necessidades, os
da matéria anterior, despertar interesse); b) apresentação conteúdos de ensino são estabelecidos em função de
(realce de pontos-chaves, demonstração); c) associação experiências que o sujeito vivencia frente a desafios
(combinação do conhecimento novo com o já conhecido cognitivos e situações pro- blemáticas. Dá-se, portanto,
por comparação e abstração); d) generalização (dos muito mais valor aos processos mentais e habilidades
aspec- tos particulares chega-se ao conceito geral, é a cognitivas do que a conteúdos orga- nizados
exposição sistematizada); e) aplicação (explicação de fatos racionalmente. Trata-se de “aprender a aprender”, ou seja,
adicionais e/ou resoluções de exercícios). A ênfase nos é mais importante o processo de aquisição do saber do
exercícios, na repetição de conceitos ou fórmulas na que o saber propriamente dito.
memorização visa disciplinar a mente e formar hábitos. Método de ensino - A ideia de “aprender fazendo” está
Relacionamento professor-aluno - Predomina a autori- sempre presente. Valorizam-se as tentativas experimentais,
dade do professor que exige atitude receptiva dos alunos a pesquisa, a descoberta, o estudo do meio natural e
e impede qualquer comunicação entre eles no decorrer da social, o método de solução de problemas. Embora os
aula. O professor transmite o conteúdo na forma de métodos va- riem, as escolas ativas ou novas (Dewey,
verda- de a ser absorvida; em consequência, a disciplina Montessori, Decroly, Cousinet e outros) partem sempre de
imposta é o meio mais eficaz para assegurar a atenção e o atividades adequadas à natureza do aluno e às etapas do
silêncio. Pressupostos de aprendizagem - A ideia de que o seu desenvolvimento. Na maioria delas, acentua-se a
ensi- importância do trabalho em grupo não apenas como
no consiste em repassar os conhecimentos para o espírito técnica, mas como condição básica do desenvolvimento
da criança é acompanhada de uma outra: a de que a ca- mental. Os passos básicos do método ativo são: a) colocar
pacidade de assimilação da criança é idêntica à do adulto, o aluno numa situação de experiência que tenha um
apenas menos desenvolvida. Os programas, então, devem interesse por si mesma; b) o problema deve ser desafiante,
ser dados numa progressão lógica, estabelecida pelo como estímulo à reflexão; c) o aluno deve dis- por de
adul- to, sem levar em conta as características próprias de informações e instruções que lhe permitam pesquisar a
cada idade. A aprendizagem, assim, é receptiva e descoberta de soluções; d) soluções provisórias devem ser
mecânica, para o que se recorre frequentemente à coação. incentivadas e ordenadas, com a ajuda discreta do
A retenção do material ensinado é garantida pela professor;
repetição de exercícios sistemáticos e recapitulação da e) deve-se garantir a oportunidade de colocar as soluções
matéria. A transferência da aprendizagem depende do à prova, a fim de determinar sua utilidade para a vida.
treino; é indispensável a reten- ção, a fim de que o aluno Relacionamento professor-aluno - Não há lugar privi-
possa responder às situações novas de forma semelhante legiado para o professor; antes, seu papel é auxiliar o de-
às respostas dadas em situa- ções anteriores. A avaliação senvolvimento livre e espontâneo da criança; se intervém,
se dá por verificações de curto prazo (interrogatórios é para dar forma ao raciocínio dela. A disciplina surge de
orais, exercício de casa) e de prazo mais longo (provas uma tomada de consciência dos limites da vida grupal; as-
escritas, trabalhos de casa). O esforço é, em geral, sim, aluno disciplinado é aquele que é solidário,
negativo (punição, notas baixas, apelos aos pais); às vezes, participante, respeitador das regras do grupo. Para se
é positivo (emulação, classificações). garantir um clima harmonioso dentro da sala de aula é
indispensável um rela- cionamento positivo entre
professores e alunos, uma forma de instaurar a “vivência
democrática” tal qual deve ser a vida em sociedade.
59
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Pressupostos de aprendizagem - A motivação depende


da força de estimulação do problema e das disposições Relacionamento professor-aluno - A pedagogia não di-
in- ternas e interesses do aluno. Assim, aprender se torna retiva propõe uma educação centrada no aluno, visando
uma atividade de descoberta, é uma autoaprendizagem, formar sua personalidade através da vivência de experiên-
sendo o ambiente apenas o meio estimulador. É retido o cias significativas que lhe permitam desenvolver
que se incorpora à atividade do aluno pela descoberta caracterís- ticas inerentes à sua natureza. O professor é
pessoal; o que é incorporado passa a compor a estrutura um especialis- ta em relações humanas, ao garantir o
cognitiva para ser empregado em novas situações. A clima de relaciona- mento pessoal e autêntico. “Ausentar-
avaliação é flui- da e tenta ser eficaz à medida que os se” é a melhor forma de respeito e aceitação plena do
esforços e os êxitos são pronta e explicitamente aluno. Toda intervenção é ameaçadora, inibidora da
reconhecidos pelo professor. aprendizagem.
Manifestações na prática escolar - Os princípios da pe- Pressupostos de aprendizagem - A motivação re-
dagogia progressivista vêm sendo difundidos, em larga sulta do desejo de adequação pessoal na busca da auto
escala, nos cursos de licenciatura, e muitos professores realização; é, portanto um ato interno. A motivação au-
so- frem sua influência. Entretanto, sua aplicação é menta, quando o sujeito desenvolve o sentimento de que
reduzidís- sima, não somente por falta de condições é capaz de agir em termos de atingir suas metas pessoais,
objetivas como também porque se choca com uma isto é, desenvolve a valorização do “eu”. Aprender, portan-
prática pedagógica ba- sicamente tradicional. Alguns to, é modificar suas próprias percepções; daí que apenas
métodos são adotados em escolas particulares, como o se aprende o que estiver significativamente relacionado
método Montessori, o método dos centros de interesse com essas percepções. Resulta que a retenção se dá pela
de Decroly, o método de projetos de Dewey. O ensino rele- vância do aprendido em relação ao “eu”, ou seja, o
baseado na psicologia genética de Pia- get tem larga que não está envolvido com o “eu” não é retido e nem
aceitação na educação pré-escolar. Perten- cem, também, transferido. Portanto, a avaliação escolar perde
à tendência progressivista muitas das esco- las
inteiramente o sentido, privilegiando-se a auto avaliação.
denominadas “experimentais”, as “escolas comunitárias” e
Manifestações na prática escolar - Entre nós, o inspi-
mais remotamente (década de 60) a “escola secundária
moderna”, na versão difundida por Lauro de Oliveira Lima. rador da pedagogia não-diretiva é C. Rogers, na verdade
mais psicólogo clínico que educador. Suas ideias influen-
Tendência liberal renovada não diretiva ciam um número expressivo de educadores e professores,
principalmente orientadores educacionais e psicólogos es-
Papel da escola - Acentua-se nesta tendência o papel colares que se dedicam ao aconselhamento. Menos recen-
da escola na formação de atitudes, razão pela qual deve temente, podem-se citar também tendências inspiradas
estar mais preocupada com os problemas psicológicos do na escola de Summerhill do educador inglês A. Neill.
que com os pedagógicos ou sociais. Todo esforço está em
estabelecer um clima favorável a uma mudança dentro do Tendência liberal tecnicista
indivíduo, isto é, a uma adequação pessoal ás solicitações
do ambiente. Rogers4 considera que o ensino é uma ativi- Papel da escola - Num sistema social harmônico,
dade excessivamente valorizada; para ele os orgâ- nico e funcional, a escola funciona como
procedimentos didáticos, a competência na matéria, as modeladora do comportamento humano, através de
aulas, livros, tudo tem muito pouca importância, face ao técnicas específicas. À educação escolar compete
propósito de favo- recer a pessoa um clima de organizar o processo de aquisi- ção de habilidades,
autodesenvolvimento e reali- zação pessoal, o que implica atitudes e conhecimentos específicos, úteis e necessários
estar bem consigo próprio e com seus semelhantes. O para que os indivíduos se integrem na máquina do
resultado de uma boa educação é muito semelhante ao sistema social global. Tal sistema social é regi- do por leis
de uma boa terapia. naturais (há na sociedade a mesma regularidade e as
Conteúdos de ensino - A ênfase que esta tendência mesmas relações funcionais observáveis entre os fe-
põe nos processos de desenvolvimento das relações e da nômenos da natureza), cientificamente descobertas. Basta
co- municação torna secundária a transmissão de aplicá-las. A atividade da “descoberta” é função da educa-
conteúdos. Os processos de ensino visam mais facilitar ção, mas deve ser restrita aos especialistas; a “aplicação”
aos estudantes os meios para buscarem por si mesmos os
é competência do processo educacional comum. A escola
conhecimentos que, no entanto, são dispensáveis.
atua, assim, no aperfeiçoamento da ordem social vigente
Métodos de ensino - Os métodos usuais são dispensa-
dos, prevalecendo quase que exclusivamente o esforço do (o sistema capitalista), articulando-se diretamente com o
professor em desenvolver um estilo próprio para facilitar sistema produtivo; para tanto, emprega a ciência da mu-
a aprendizagem dos alunos. Rogers explicita algumas das dança de comportamento, ou seja, a tecnologia
características do professor “facilitador”: aceitação da pes- comporta- mental. Seu interesse imediato é o de produzir
soa do aluno, capacidade de ser confiável receptivo e ter indivíduos “competentes” para o mercado de trabalho,
plena convicção na capacidade de autodesenvolvimento transmitindo, eficientemente, informações precisas,
do estudante. Sua função restringe-se a ajudar o aluno a objetivas e rápidas. A pesquisa científica, a tecnologia
se organizar, utilizando técnicas de sensibilização onde os educacional, a análise experimental do comportamento
sentimentos de cada um possam ser expostos, sem amea- garantem a objetividade da prática escolar, uma vez que
ças. Assim, o objetivo do trabalho escolar se esgota nos os objetivos instrucionais (conteúdos) resultam da
processos de melhor relacionamento interpessoal, como aplicação de leis naturais que in- dependem dos que a
condição para o crescimento pessoal. conhecem ou executam.

60
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Conteúdos de ensino - São as informações, princípios


Pressupostos de aprendizagem - As teorias de apren-
científicos, leis etc., estabelecidos e ordenados numa se-
dizagem que fundamentam a pedagogia tecnicista dizem
quência lógica e psicológica por especialistas. É matéria
que aprender é uma questão de modificação do
de ensino apenas o que é redutível ao conhecimento ob- desempe- nho: o bom ensino depende de organizar
servável e mensurável; os conteúdos decorrem, assim, da eficientemente as condições estimuladoras, de modo a
ciência objetiva, eliminando-se qualquer sinal de subjeti- que o aluno saia da situação de aprendizagem diferente
vidade. O material instrucional encontra-se sistematizado de como entrou. Ou seja, o ensino é um processo de
nos manuais, nos livros didáticos, nos módulos de ensino, condicionamento atra- vés do uso de reforçamento das
nos dispositivos audiovisuais etc. respostas que se quer ob- ter. Assim, os sistemas
Métodos de ensino - Consistem nos procedimentos e instrucionais visam ao controle do comportamento
técnicas necessárias ao arranjo e controle nas condições individual face objetivos preestabelecidos. Trata-se de um
ambientais que assegurem a transmissão/recepção de in- enfoque diretivo do ensino, centrado no controle das
formações. Se a primeira tarefa do professor é modelar condições que cercam o organismo que se comporta. O
respostas apropriadas aos objetivos instrucionais, a prin- objetivo da ciência pedagógica, a partir da psicologia, é o
cipal é conseguir o comportamento adequado pelo con- estudo científico do comportamento: des- cobrir as leis
trole do ensino; daí a importância da tecnologia educa- naturais que presidem as reações físicas do organismo
cional. A tecnologia educacional é a “aplicação sistemática que aprende, a fim de aumentar o controle das
de princípios científicos comportamentais e tecnológicos variáveis que o afetam. Os componentes da aprendi-
a problemas educacionais, em função de resultados efe- zagem - motivação, retenção, transferência - decorrem da
tivos, utilizando uma metodologia e abordagem sistêmica aplicação do comportamento operante Segundo Skinner,
abrangente”. Qualquer sistema instrucional (há uma gran- o comportamento aprendido é uma resposta a estímulos
ex- ternos, controlados por meio de reforços que ocorrem
de variedade deles) possui três componentes básicos:
com a resposta ou após a mesma: “Se a ocorrência de um
obje- tivos instrucionais operacionalizados em
(com- portamento) operante é seguida pela apresentação
comportamentos observáveis e mensuráveis,
de um estímulo (reforçador), a probabilidade de
procedimentos instrucionais e avaliação. As etapas básicas reforçamento é aumentada”. Entre os autores que
de um processo ensino-apren- dizagem são: a) contribuem para os estu- dos de aprendizagem destacam-
estabelecimento de comportamentos ter- minais, através se: Skinner, Gagné, Bloon e Mager.
de objetivos instrucionais; b) análise da ta- refa de Manifestações na prática escolar - A influência da
aprendizagem, a fim de ordenar sequencialmente os peda- gogia tecnicista remonta à 2ª metade dos anos 50
passos da instrução; c) executar o programa, reforçando (PABAEE
gradualmente as respostas corretas correspondentes aos - Programa Brasileiro-americano de Auxílio ao Ensino Ele-
objetivos. O essencial da tecnologia educacional é a pro- mentar). Entretanto foi introduzida mais efetivamente no
gramação por passos sequenciais empregada na instrução fi- nal dos anos 60 com o objetivo de adequar o sistema
programada, nas técnicas de microensino, multimeios, edu- cacional à orientação político-econômica do regime
mó- dulos etc. O emprego da tecnologia instrucional na militar: inserir a escola nos modelos de racionalização do
escola pública aparece nas formas de: planejamento em sistema de produção capitalista. É quando a orientação
moldes sistêmicos, concepção de aprendizagem como escolano- vista cede lugar à tendência tecnicista, pelo
mudança de comportamento, operacionalização de menos no nível de política oficial; os marcos de
objetivos, uso de procedimentos científicos (instrução implantação do modelo tecnicista são as leis 5.540/68 e
programada, au- diovisuais, avaliação etc., inclusive a 5.692/71, que reorganizam o ensino superior e o ensino
programação de livros didáticos). de 1º e 2º graus. A despeito da máquina oficial,
Relacionamento professor-aluno - São relações estru- entretanto, não há indícios seguros de que os professores
da escola pública tenham assimilado a pedagogia
turadas e objetivas, com papéis bem definidos: o profes-
tecnicista, pelo menos em termos de ideário. A aplicação
sor administra as condições de transmissão da matéria,
da metodologia tecnicista (planejamento, livros didáticos
conforme um sistema instrucional eficiente e efetivo em
programados, procedimentos de avaliação etc.) não
termos de resultados da aprendizagem; o aluno recebe, configura uma postura tecnicista do professor; antes, o
aprende e fixa as informações. O professor é apenas um exercício profissional continua mais para uma postura
elo de ligação entre a verdade científica e o aluno, caben- eclé- tica em torno de princípios pedagógicos assentados
do-lhe empregar o sistema instrucional previsto. O aluno nas pedagogias tradicional e renovada.
é um indivíduo responsivo, não participa da elaboração
do programa educacional. Ambos são espectadores frente Pedagogia progressista
à verdade objetiva. A comunicação professor-aluno tem
um sentido exclusivamente técnico, que é o de garantir a O termo “progressista”, emprestado de Snyders, é
eficá- cia da transmissão do conhecimento. Debates, usa- do aqui para designar as tendências que, partindo de
discussões, questionamentos são desnecessários, assim uma análise crítica das realidades sociais, sustentam
como pouco importam as relações afetivas e pessoais dos implicita- mente as finalidades sociopolíticas da educação.
sujeitos en- volvidos no processo ensino aprendizagem. Evidente- mente a pedagogia progressista não tem como
institucio- nalizar-se numa sociedade capitalista; daí ser
ela um instru- mento de luta dos professores ao lado de
outras práticas sociais.

61
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

A pedagogia progressista tem-se manifestado em três


Em nenhum momento o inspirador e mentor da peda-
tendências: a libertadora, mais conhecida como pedago-
gogia libertador Paulo Freire, deixa de mencionar o
gia de Paulo Freire; a libertária, que reúne os defensores
caráter essencialmente político de sua pedagogia, o que,
da autogestão pedagógica; a crítico-social dos conteúdos
segundo suas próprias palavras, impede que ela seja posta
que, diferentemente das anteriores, acentua a primazia
em prá- tica em termos sistemáticos, nas instituições
dos con- teúdos no seu confronto com as realidades
oficiais, antes da transformação da sociedade. Daí porque
sociais. sua atuação se dê mais a nível da educação extraescolar.
As versões libertadora e libertária têm em comum o O que não tem impedido, por outro lado, que seus
antiautoritarismo, a valorização da experiência vívida pressupostos sejam adotados e aplicados por numerosos
como base da relação educativa e a ideia de autogestão professores.
pedagógi- ca. Em função disso, dão mais valor ao Métodos de ensino - “Para ser um ato de conhecimen-
processo de aprendi- zagem grupal (participação em to o processo de alfabetização de adultos demanda, entre
discussões, assembleias, vo- tações) do que aos conteúdos educadores e educandos, uma relação de autêntico diálo-
de ensino. Como decorrência, a prática educativa somente go; aquela em que os sujeitos do ato de conhecer se en-
faz sentido numa prática social junto ao povo, razão pela contram mediatizados pelo objeto a ser conhecido” (...) “O
qual preferem as modalidades de educação popular “não diálogo engaja ativamente a ambos os sujeitos do ato de
formal”. conhecer: educador-educando e educando-educador”.
A tendência da pedagogia crítico-social dos Assim sendo, a forma de trabalho educativo é o “gru-
conteúdos propõe uma síntese superadora das po de discussão a quem cabe autogerir a aprendizagem,
pedagogias tradicional e renovada, valorizando a ação definindo o conteúdo e a dinâmico das atividades. O pro-
pedagógica enquanto inseri- da na prática social concreta. fessor é um animador que, por princípio, deve “descer ao
Entende a escola como media- ção entre o individual e o nível dos alunos, adaptando-se às suas características è ao
social, exercendo aí a articulação entre a transmissão dos desenvolvimento próprio de cada grupo. Deve caminhar
conteúdos e a assimilação ativa por parte de um aluno “junto”, intervir o mínimo indispensável, embora não se
concreto (inserido num contexto de rela- ções sociais); furte, quando necessário, a fornecer uma informação mais
dessa articulação resulta o saber criticamente reelaborado. sistematizada.
Os passos da aprendizagem - Codificação-decodifica-
Tendência progressista libertadora ção, e problematização da situação - permitirão aos edu-
candos um esforço de compreensão do “vivido”, até
Papel da escola - Não é próprio da pedagogia chegar a um nível mais crítico de conhecimento e sua
libertado- ra falar em ensino escolar, já que sua marca é a realidade, sempre através da troca de experiência em
atuação “não formal”. Entretanto, professores e torno da prá- tica social. Se nisso consiste o conteúdo do
educadores engajados no ensino escolar vêm adotando trabalho edu- cativo, dispensam um programa
pressupostos dessa pedago- gia. Assim, quando se fala na previamente estruturado, trabalhos escritos, aulas
educação em geral, diz-se que ela é uma atividade onde expositivas assim como qualquer tipo de verificação direta
professores e alunos, mediatizados pela realidade que da aprendizagem, formas essas próprias da “educação
apreendem e da qual extraem o conteú- do de bancária”, portanto, domesticado- ras. Entretanto admite-
aprendizagem, atingem um nível de consciência dessa se a avaliação da pratica vivenciada entre educador-
mesma realidade, a fim de nela atuarem, num sentido de educandos no processo de grupo e, às ve- zes, a auto
transformação social. Tanto a educação tradicional, avaliação feita em termos dos compromissos assumidos
denomi- nada “bancária” - que visa apenas depositar com a pratica social.
informações so- bre o aluno -, quanto a educação Relacionamento professor-aluno - No diálogo, como
renovada - que pretenderia uma libertação psicológica método básico, a relação é horizontal, onde educador e
individual - são domesticadoras, pois em nada contribuem educandos se posicionam como sujeitos do ato de conhe-
para desvelar a realidade social de opressão. A educação cimento. O critério de bom relacionamento é a “total iden-
libertadora, ao contrário, questiona concretamente a tificação com o povo, sem o que a relação pedagógica
realidade das relações do homem com a natureza e com per- de consistência”. Elimina-se, por pressuposto, toda
os outros homens, visando a uma transfor- mação - dai relação de autoridade, sob pena de esta inviabilizar o
trabalho de conscientização, de “aproximação de
ser uma educação crítica.
Conteúdos de ensino - Denominados “temas consciências”. Trata-
geradores”, -se de uma “não-diretividade”, mas não no sentido do pro-
são extraídos da problematização da prática de vida dos fessor que se ausenta (como em Rogers), mas que perma-
educandos. Os conteúdos tradicionais são recusados nece vigilante para assegurar ao grupo um espaço humano
porque cada pessoa, cada grupo envolvido na ação para “dizer sua palavra” para se exprimir sem se neutralizar.
pedagógica dis- põe em si próprio, ainda que de forma Pressupostos de aprendizagem - A própria designação
rudimentar, dos con- teúdos necessários dos quais se de “educação problematizadora” como correlata de edu-
cação libertadora revela a força motivadora da aprendiza-
parte. O importante não é a transmissão de conteúdos
gem. A motivação se dá a partir da codificação de uma si-
específicos, mas despertar uma nova forma da relação
tuação-problema, da qual se toma distância para analisá-
com a experiência vivida. A transmis- são de conteúdos
la criticamente. “Esta análise envolve o exercício da
estruturados a partir de fora é conside- rada como
abstração, através da qual procuramos alcançar, por meio
“invasão cultural” ou “depósito de informação’’ porque
de repre- sentações da realidade concreta, a razão de ser
não emerge do saber popular. Se forem necessários textos
dos fatos”.
de leitura estes deverão ser redigidos pelos próprios
educandos com a orientação do educador”.
62
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Aprender é um ato de conhecimento da realidade


con- creta, isto é, da situação real vivida pelo educando, e dades e às exigências da vida social. Assim, os conteúdos
só tem sentido se resulta de uma aproximação crítica propriamente ditos são os que resultam de necessidades e
dessa reali- dade. O que é aprendido não decorre de uma interesses manifestos pelo grupo e que não são,
imposição ou memorização, mas do nível crítico de necessária nem indispensavelmente, as matérias de
conhecimento, ao qual se chega pelo processo de estudo.
compreensão, reflexão e crítica. O que o educando Método de ensino - É na vivência grupal, na forma de
transfere, em termos de conhe- cimento, é o que foi autogestão, que os alunos buscarão encontrar as bases
incorporado como resposta às situa- ções de opressão - mais satisfatórias de sua própria «instituição», graças à sua
ou seja, seu engajamento na militância política. própria iniciativa e sem qualquer forma de poder. Trata-se
de «colocar nas mãos dos alunos tudo o que for possível:
Manifestações na prática escolar - A pedagogia liber-
tadora tem como inspirador e divulgador Paulo Freire, que o conjunto da vida, as atividades e a organização do
tem aplicado suas ideias pessoalmente em diversos trabalho no interior da escola (menos a elaboração dos
países, primeiro no Chile, depois na África. Entre nós, tem programas e a decisão dos exames que não dependem
exercido uma influencia expressiva nos movimentos nem dos docen- tes, nem dos alunos)”. Os alunos têm
populares e sin- dicatos e, praticamente, se confunde com liberdade de trabalhar ou não, ficando o interesse
a maior parte das experiências do que se denomina pedagógico na dependência de suas necessidades ou das
“educação popular”. Há diversos grupos desta natureza do grupo.
que vêm atuando não so- mente no nível da prática O progresso da autonomia, excluída qualquer direção
popular, mas também por meio de publicações, com de fora do grupo, se dá num “crescendo”: primeiramente
relativa independência em relação às ideias originais da a oportunidade de contatos, aberturas, relações informais
pedagogia libertadora. Embora as for- mulações teóricas entre os alunos. Em seguida, o grupo começa a se organi-
de Paulo Freire se restrinjam à educação de adultos ou à zar, de modo que todos possam participar de discussões,
educação popular em geral, muitos pro- fessores vêm cooperativas, assembleias, isto é, diversas formas de parti-
tentando colocá-las em prática em todos os graus de cipação e expressão pela palavra; quem quiser fazer outra
ensino formal. coisa, ou entra em acordo com o grupo, ou se retira. No
terceiro momento, o grupo se organiza de forma mais
efe- tiva e, finalmente, no quarto momento, parte para a
Tendência progressista libertária
execu- ção do trabalho.
Papel da escola - A pedagogia libertária espera que a Relação professor-aluno - A pedagogia institucional
escola exerça uma transformação na personalidade dos visa “em primeiro lugar, transformar a relação professor-
alunos num sentido libertário e auto gestionário. A ideia aluno no sentido da não-diretividade, isto é, considerar
básica é introduzir modificações institucionais, a partir dos desde o início a ineficácia e a nocividade de todos os
níveis subalternos que, em seguida, vão “contaminando” métodos à base de obrigações e ameaças”. Embora
todo o sistema. A escola instituirá, com base na participa- professor e aluno sejam desiguais e diferentes, nada
ção grupal, mecanismos institucionais de mudança impede que o professor se ponha a serviço do aluno, sem
(assem- bleias, conselhos, eleições, reuniões, associações impor suas concepções e ideias, sem transformar o aluno
etc.), de tal forma que o aluno, uma vez atuando nas em “objeto”. O professor é um orientador e um
instituições “externas”, leve para lá tudo o que aprendeu. catalisador, ele se mistura ao grupo para uma reflexão em
Outra forma de atuação da pedagogia libertária, comum.
correlata á primeira, é - aproveitando a margem de Se os alunos são livres frente ao professor, também
liberdade do sistema - criar grupos de pessoas com este o é em relação aos alunos (ele pode, por exemplo,
princípios educativos autogestio- nários (associações, recusar-
grupos informais, escolas autogestio- nários). Há, -se a responder uma pergunta, permanecendo em silên-
portanto, um sentido expressamente político, à medida cio). Entretanto, essa liberdade de decisão tem um sentido
que se afirma o indivíduo como produto do social e que o bastante claro: se um aluno resolve não participar, o faz
desenvolvimento individual somente se realiza no porque não se sente integrado, mas o grupo tem
coletivo. A autogestão é, assim, o conteúdo e o método; responsa- bilidade sobre este fato e vai se colocar a
resume tanto o objetivo pedagógico quanto o político. A questão; quando o professor se cala diante de uma
pedagogia libertária, na sua modalidade mais conhecida pergunta, seu silêncio tem um significado educativo que
entre nós, a “pedagogia institucional”, pretende ser uma pode, por exemplo, ser uma ajuda para que o grupo
forma de resistência contra a burocracia como assuma a resposta ou a situa- ção criada. No mais, ao
instrumento da ação dominadora do Estado, que tudo professor cabe a função de “conse- lheiro” e, outras vezes,
controla (profes- sores, programas, provas etc.), retirando de instrutor-monitor à disposição do grupo. Em nenhum
a autonomia. momento esses papéis do professor se confundem com o
de “modelo”, pois a pedagogia libertária recusa qualquer
Conteúdos de ensino - As matérias são colocadas à
forma de poder ou autoridade.
dis- posição do aluno, mas não são exigidas.
É um instrumento a mais, porque importante é o co- Pressupostos de aprendizagem - As formas burocrá-
nhecimento que resulta das experiências vividas pelo gru- ticas das instituições existentes, por seu traço de impes-
po, especialmente a vivência de mecanismos de partici- soalidade, comprometem o crescimento pessoal. A ênfase
pação crítica. “Conhecimento” aqui não é a investigação na aprendizagem informal via grupo, e a negação de toda
cognitiva do real, para extrair dele um sistema de forma de repressão visam favorecer o desenvolvimento de
represen- tações mentais, mas a descoberta de respostas pessoas mais livres. A motivação está, portanto, no
as necessi- interes- se em crescer dentro da vivência grupal, pois se
supõe que o grupo devolva a cada um de seus membros a
satisfação de suas aspirações e necessidades.
63
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Somente o vivido, o experimentado é incorporado e


uti- lizável em situações novas. Assim, o critério de Essa maneira de conceber os conteúdos do saber não
relevância do saber sistematizado é seu possível uso estabelece oposição entre cultura erudita e cultura popu-
prático. Por isso mes- mo, não faz sentido qualquer lar, ou espontânea, mas uma relação de continuidade em
tentativa de avaliação da apren- dizagem, ao menos em que, progressivamente, se passa da experiência imediata e
termos de conteúdo. desorganizada ao conhecimento sistematematizado. Não
Outras tendências pedagógicas correlatas - A que a primeira apreensão da realidade seja errada, mas é
pedagogia libertária abrange quase todas as tendências necessária a ascensão a uma forma de elaboração supe-
antiautoritárias em educação, entre elas, a anarquista, a rior, conseguida pelo próprio aluno, com a intervenção do
psicanalista, a dos sociólogos, e também a dos professores professor.
progressistas. Embo- ra Neill e Rogers não possam ser A postura da pedagogia “dos conteúdos” - Ao admitir
considerados progressistas (conforme entendemos aqui), um conhecimento relativamente autônomo - assume o
não deixam de influenciar al- guns libertários, como Lobrot. saber como tendo um conteúdo relativamente objetivo,
Entre os estrangeiros devemos citar Vasquez c Oury entre mas, ao mesmo tempo, introduz a possibilidade de uma
os mais recentes, Ferrer y Guardia entre os mais antigos. reavaliação crítica frente a esse conteúdo. Como sintetiza
Particularmente significativo é o tra- balho de C. Freinet, Snyders, ao mencionar o papel do professor, trata-se, de
que tem sido muito estudado entre nós, existindo inclusive
um lado, de obter o acesso do aluno aos conteúdos,
algumas escolas aplicando seu método.
ligando-os com a experiência concreta dele - a
Entre os estudiosos e divulgadores da tendência
continuidade; mas, de outro, de proporcionar elementos
libertária pode-se citar Maurício Tragtenberg, apesar da
de análise crítica que ajudem o aluno a ultrapassar a
tônica de seus trabalhos não ser propriamente
pedagógica, mas de crítica das instituições em favor de um experiência, os estereótipos, as pres- sões difusas da
projeto autogestionário. ideologia dominante - é a ruptura.
Dessas considerações resulta claro que se pode ir do
Tendência progressista “crítico social dos conteúdos” saber ao engajamento político, mas não o inverso, sob o
risco de se afetar a própria especificidade do saber e até
Papel da escola - A difusão de conteúdos é a tarefa cair-se numa forma de pedagogia ideológica, que é o que
pri- mordial. Não conteúdos abstratos, mas vivos, se critica na pedagogia tradicional e na pedagogia nova.
concretos e, portanto, indissociáveis das realidades sociais. Métodos de ensino - A questão dos métodos se subor-
A valorização da escola como instrumento de apropriação dina à dos conteúdos: se o objetivo é privilegiar a
do saber é o melhor serviço que se presta aos interesses aquisição do saber, e de um saber vinculado às realidades
populares, já que a própria escola pode contribuir para sociais, é preciso que os métodos favoreçam a
eliminar a seletividade social e torná-la democrática. Se a correspondência dos conteúdos com os interesses dos
escola é parte integrante do todo social, agir dentro dela alunos, e que estes pos- sam reconhecer nos conteúdos o
é também agir no rumo da transformação da sociedade. auxílio ao seu esforço de compreensão da realidade
Se o que define uma pedago- gia crítica é a consciência (prática social). Assim, nem se trata dos métodos
de seus condicionantes histórico-
dogmáticos de transmissão do saber da pedagogia
-sociais, a função da pedagogia “dos conteúdos” é dar um
tradicional, nem da sua substituição pela desco- berta,
passo à frente no papel transformador da escola, mas a
investigação ou livre expressão das opiniões, como se o
partir das condições existentes. Assim, a condição para que
a esco- la sirva aos interesses populares é garantir a todos saber pudesse ser inventado pela criança, na concep- ção
um bom ensino, isto é, a apropriação dos conteúdos da pedagogia renovada.
escolares básicos que tenham ressonância na vida dos Os métodos de uma pedagogia crítico-social dos con-
alunos. Entendida nesse sentido, a educação é “uma teúdos não partem, então, de um saber artificial, deposita-
atividade mediadora no seio da prática social global”, ou do a partir de fora, nem do saber espontâneo, mas de
seja, uma das mediações pela qual o aluno, pela uma relação direta com a experiência do aluno,
intervenção do professor e por sua própria parti- cipação confrontada com o saber trazido de fora. O trabalho
ativa, passa de uma experiência inicialmente confusa e docente relaciona a prática vivida pelos alunos com os
fragmentada (sincrética) a uma visão sintética, mais organi- conteúdos propostos
zada e unificada.
Em síntese, a atuação da escola consiste na preparação pelo professor, momento em que se dará a “ruptura” em
do aluno para, o mundo adulto e suas contradições,
fornecen- relação à experiência pouco elaborada. Tal ruptura apenas
do-lhe um instrumental, por meio da aquisição de
conteúdos é possível com a introdução explícita, pelo professor, dos
e da socialização, para uma participação organizada e ativa elementos novos de análise a serem aplicados
na democratização da sociedade. criticamente à prática do aluno. Em outras palavras, uma
Conteúdos de ensino - São os conteúdos culturais uni- aula começa pela constatação da prática real, havendo,
versais que se constituíram em domínios de em seguida, a consciência dessa prática no sentido de
conhecimento relativamente autônomos, incorporados referi-la aos ter- mos do conteúdo proposto, na forma de
pela humanidade, mas permanentemente reavaliados face um confronto entre a experiência e a explicação do
às realidades sociais. Embora se aceite que os conteúdos professor. Vale dizer: vai-se da ação à compreensão e da
são realidades exteriores ao aluno, que devem ser compreensão à ação, até a síntese, o que não é outra
assimilados e não simplesmente re- inventados eles não
coisa senão a unidade entre a teoria e a prática.
são fechados e refratários às realidades sociais. Não basta
que os conteúdos sejam apenas ensinados, ainda que bem
ensinados, é preciso que se liguem, de forma indissociável,
à sua significação humana e social.
64
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Relação professor-aluno - Se, como mostramos ante-


riormente, o conhecimento resulta de trocas que se esta- Resulta com clareza que o trabalho escolar precisa ser
belecem na interação entre o meio (natural, social, avaliado, não como julgamento definitivo e dogmático do
cultural) e o sujeito, sendo o professor o mediador, então professor, mas como uma comprovação para o aluno de
a relação pedagógica consiste no provimento das seu progresso em direção a noções mais sistematizadas.
condições em que professores e alunos possam colaborar Manifestações na prática escolar - O esforço de elabo-
para fazer progredir essas trocas. O papel do adulto é ração de uma pedagogia “dos conteúdos” está em propor
insubstituível, mas acen- tua-se também a participação do modelos de ensino voltados para a interação conteúdos-
aluno no processo. Ou seja, o aluno, com sua experiência -realidades sociais; portanto, visando avançar em termos
imediata num contex- to cultural, participa na busca da de uma articulação do político e do pedagógico, aquele
verdade, ao confrontá- como extensão deste, ou seja, a educação “a serviço da
-la com os conteúdos e modelos expressos pelo transformação das relações de produção”. Ainda que a
professor. Mas esse esforço do professor em orientar, em curto prazo se espere do professor maior conhecimento
abrir pers- pectivas a partir dos conteúdos, implica um dos conteúdos de sua matéria e o domínio de formas de
envolvimento com o estilo de vida dos alunos, tendo transmissão, a fim de garantir maior competência técnica,
consciência inclusive dos contrastes entre sua própria sua contribuição “será tanto mais eficaz quanto mais seja
cultura e a do aluno. Não se contentará, entretanto, em capaz de compreender os vínculos de sua prática com a
satisfazer apenas as necessi- dades e carências; buscará prática social global”, tendo em vista (...) “a
despertar outras necessidades, acelerar e disciplinar os democratização da sociedade brasileira, o atendimento
métodos de estudo, exigir o esfor- ço do aluno, propor aos interesses das camadas populares, a transformação
conteúdos e modelos compatíveis com suas experiências estrutural da socieda- de brasileira”.
vividas, para que o aluno se mobilize para uma Dentro das linhas gerais expostas aqui, podemos citar
participação ativa. a experiência pioneira, mas mais remota do educador e
Evidentemente o papel de mediação exercido em es- critor russo, Makarenko. Entre os autores atuais
torno da análise dos conteúdos exclui a não-diretividade citamos B. Charlot, Suchodolski, Manacorda e, de maneira
como forma de orientação do trabalho escolar, por que o especial, G. Snyders, além dos autores brasileiros que vem
diálo- go adulto-aluno é desigual. O adulto tem mais desenvol- vendo investigações relevantes, destacando-se
experiência acerca das realidades sociais, dispõe de uma Demerval Saviani. Representam também as propostas aqui
formação (ao menos deve dispor) para ensinar, possui apresen- tadas os inúmeros professores da rede escolar
conhecimentos e a ele cabe fazer a análise dos conteúdos pública que se ocupam, competentemente, de uma
em confronto com as realidades sociais. A não- pedagogia de con- teúdos articulada com a adoção de
diretividade abandona os alu- nos a seus próprios desejos, métodos que garan- tam a participação do aluno que,
como se eles tivessem uma tendência espontânea a muitas vezes sem saber avançam na democratização do
alcançar os objetivos esperados da educação. Sabemos ensino para as camadas populares.
que as tendências espontâneas e natu- rais não são
“naturais”, antes são tributárias das condições de vida e Em favor da pedagogia crítico-social dos conteúdos
do meio. Não são suficientes o amor, a aceitação, para
que os filhos dos trabalhadores adquiram o desejo de Haverá sempre objeções de que estas considerações
estudar mais, de progredir: é necessária a intervenção do levam a posturas antidemocráticas, ao autoritarismo, à
professor para levar o aluno a acreditar nas suas possibi- cen- tralização no papel do professor e à submissão do
lidades, a ir mais longe, a prolongar a experiência vivida. aluno.
Pressupostos de aprendizagem - Por um esforço pró- Mas o que será mais democrático: excluir toda forma
prio, o aluno se reconhece nos conteúdos e modelos so- de direção, deixar tudo à livre expressão, criar um clima
ciais apresentados pelo professor; assim, pode ampliar sua amigável para alimentar boas relações, ou garantir aos
própria experiência. O conhecimento novo se apoia numa alu- nos a aquisição de conteúdos, a análise de modelos
estrutura cognitiva já existente, ou o professor provê a es-
sociais que vão lhes fornecer instrumentos para lutar por
trutura de que o aluno ainda não dispõe. O grau de envol-
seus di- reitos? Não serão as relações democráticas no
vimento na aprendizagem dependa tanto da prontidão e
estilo não-
disposição do aluno, quanto do professor e do contexto
-diretivo uma forma sutil de adestramento, que levaria a
da sala de aula.
reivindicações sem conteúdo? Representam a as relações
Aprender, dentro da visão da pedagogia dos conteú-
não-diretivas as reais condições do mundo social adulto?
dos, é desenvolver a capacidade de processar informações
e lidar com os estímulos do ambiente, organizando os da- Seriam capazes de promover a efetiva libertação do ho-
dos disponíveis da experiência. Em consequência, admite- mem da sua condição de dominado?
-se o princípio da aprendizagem significativa que supõe, Um ponto de vista realista da relação pedagógica não
como passo inicial, verificar aquilo que o aluno já sabe. O recusa a autoridade pedagógica expressa na sua função
professor precisa saber (compreender) o que os alunos di- de ensinar. Mas não deve confundir autoridade com
zem ou fazem, o aluno precisa compreender o que o pro- autorita- rismo. Este se manifesta no receio do professor
fessor procura dizer-lhes. A transferência da em ver sua autoridade ameaçada; na falta de
aprendizagem se dá a partir do momento da síntese, isto consideração para com o aluno ou na imposição do medo
é, quando o alu- no supera sua visão parcial e confusa e como forma de tornar mais cômodo e menos estafante o
adquire uma visão mais clara e unificadora. ato de ensinar.

65
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Além do mais, são incongruentes as dicotomias,


difun- didas por muitos educadores, entre “professor- Hoje existem várias formas de ensinar e aprender e
policial” e “professor-povo”, entre métodos diretivos e umas delas é o currículo oculto. Para Silva, o currículo
não-diretivos, entre ensino centrado no professor e ensino oculto é “o conjunto de atitudes, valores e
centrado no es- tudante. Ao adotar tais dicotomias, comportamentos que não fa- zem parte explícita do
amortece-se a presença do professor como mediador currículo, mas que são implicitamente ensinados através
pelos conteúdos que explicita, como se eles fossem das relações sociais, dos rituais, das práticas e da
sempre imposições dogmáticas e que nada trouxessem de configuração espacial e temporal da escola”.
novo. Ao pensarmos no homem como um ser histórico,
Evidentemente que ao se advogar a intervenção do tam- bém refletiremos em um currículo que atenderá em
pro- fessor, não se está concluindo pela negação da épocas di- ferentes a interesses, em certo espaço e tempo
relação pro- fessor-aluno. A relação pedagógica é uma histórico. Existe uma diferença conceitual entre currículo,
relação com um grupo e o clima do grupo é essencial na que é o conjunto de ações pedagógicas e a matriz
pedagogia. Nesse sentido, são bem-vindas as curricular, que é a lista de disci- plinas e conteúdos do
considerações formuladas pela “dinâmica de grupo”, que currículo.
ensinam o professor a relacionar-se com a classe; a O Currículo, não é imparcial, é social e culturalmente
perceber os conflitos; a saber, que está lidan- do com uma de- finido, reflete uma concepção de mundo, de
coletividade e não com indivíduos isolados, a adquirir a sociedade e de educação, implica relações de poder, sendo
confiança dos alunos. Entretanto, mais do que res- tringir- o centro da ação educativa. A visão do currículo está
se ao malfadado “trabalho em grupo”, o cair na ilusão da associada ao conjunto de atividades intencionalmente
igualdade professor-aluno, trata-se de encarar o grupo desenvolvidas para o processo formativo.
classe como uma coletividade onde são trabalhados O currículo é um instrumento político que se vincula à
mode- los de interação como a ajuda mútua, o respeito ideologia, à estrutura social, à cultura e ao poder. A cultura
aos outros, os esforços coletivos, a autonomia nas é o conteúdo da educação, sua essência e sua defesa, e
decisões, a riqueza da vida em comum, e ir ampliando currículo é a opção realizada dentro dessa cultura. As teorias
progressivamente essa noção (de coletividade) para a críticas nos informam que a escola tem sido um lugar de
escola, a cidade a sociedade toda. subordinação e reprodução da cultura da classe
dominante, das elites, da burguesia. Porém, com a
Por fim, situar o ensino centrado no professor e o
ensi- no centrado no aluno em extremos opostos é quase pluralidade cultural, aparece o mo- vimento de exigência
negar a relação pedagógica porque não há um aluno, ou dos grupos culturais dominados que lu- tam para ter suas
grupo de alunos, aprendendo sozinho, nem um professor raízes culturais reconhecidas e representadas na cultura
ensinando para as paredes. Há um confronto do aluno nacional, pois por trás das nossas diferenças, há a mesma
entre sua cultu- ra e a herança cultural da humanidade, humanidade.
entre seu modo de viver e os modelos sociais desejáveis Há várias formas de composição curricular, mas os
para um projeto novo de sociedade. E há um professor Parâ- metros Curriculares Nacionais indicam que os
que intervém, não para se opor aos desejos e necessidades modelos domi- nantes na escola brasileira, multidisciplinar
ou a liberdade e autonomia do aluno, mas para ajudá-lo a e pluridisciplinar, marcados por uma forte fragmentação,
ultrapassar suas necessidades e criar outras, para ganhar devem ser substituí- dos, na medida do possível, por uma
autonomia, para ajudá-lo no seu esforço de distinguir a perspectiva interdiscipli- nar e transdisciplinar.
verdade do erro, para ajudá-lo a com- preender as Para elaboração de um currículo escolar devemos levar
realidades sociais e sua própria experiência. em consideração as vertentes caracterizadas pela: ontologia
(trata da natureza do ser); epistemologia (define a natureza
O currículo escolar é um elemento importante para o
planejamento do professor, pois pode organizar os dos co- nhecimentos e o processo de conhecer); axiologia
conteú- dos e as atividades, com tudo é um recurso para (preocupa-
um educa- dor e não uma lei rígida ou um mandamento a -se com a natureza do bom e mau, incluindo o estético).
ser seguido metodologicamente, podendo ser usado As ciências nos mostram que não há desenvolvimento
como um norte para a prática pedagógica, com sustentado sem o capital social, gerador de inovação, de
flexibilidade de ajustes para melhor atender as res- ponsabilidade e de participação cívica. E que a
necessidades do educando. escolarização é a condição fundamental de acesso à cultura,
ao sentido crítico, à participação cívica, ao reconhecimento
A escola, não é apenas um espaço social
emancipatório ou libertador, mas também é um cenário do belo, e ao respeito pelo outro.
de socialização da mudança. Sendo um ambiente social,
tem um duplo currí- culo, o explicito e o formal, o oculto e Currículo
informal. A prática do currículo é geralmente acentuada na
vida dos alunos estando associada às mensagens de Em todo o projeto de formação, o currículo adquire
natureza afetiva e às atitudes e valores. O Currículo cen- tralidade, pois não só é conhecimento, como
educativo representa a composição dos conhecimentos e também é um processo que adquire forma e sentido, de
valores que caracterizam um processo so- cial. Ele é acordo com a or- ganização em que se realiza e em função
proposto pelo trabalho pedagógico nas escolas. do espaço e tempo em que se materializa. Dado o seu peso
histórico (Baker, 2009), já que não é uma retórica do
Atualmente, o currículo é uma construção social, na
presente, mas uma construção social e cultural ligada a
acep- ção de estar inteiramente vinculada a um momento
propósitos políticos e económicos (Goodson, 2001), o
histórico, à determinada sociedade e às relações com o
currículo tem conhecido uma reconcep- tualização teórica,
conhecimento. Nesse sentido, a educação e currículo são
marcada, primeiro, pelo primado da edu- cação e/ou
vistos intimamen- te envolvidos com o processo cultural,
instrução, depois pela formação vocacional e, por último,
como construção de identidades locais e nacionais.
pela aprendizagem.
66
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

A mudança de paradigma, preconizada pelas orga-


nizações trans-e-supranacionais, que consiste na passa- por outro, contribui para a diversidade das práticas de for-
gem do ensino à aprendizagem (Pacheco, 2009), faz par- mação. Deste modo, Anderson-Levitt (2008) observa que,
te dos referentes das políticas de educação e formação embora exista uma vaga comum no currículo a nível mun-
que configuram o sistema educativo mundial, instituindo dial, “o currículo difere quando é realizado nas salas de
um “sistema de mundo globalizado” (Lipovetsky & Serroy, aula”. Além disso, a hibridação curricular é um processo
2010:15), largamente responsável pelas decisões político- que se reconhece a nível nacional como sendo a
-administrativas que introduzem a homogeneização curri- expressão de diferenças, assumidas em função das lógicas
cular, no âmbito de um processo de legitimação das po- da comu- nidade e dos autores.
líticas nacionais, pelas referidas agendas globais (Teodoro De fato, a globalização é um processo de convergên-
& Estrela, 2010). cia de propósitos que usa um vocabulário comum acerca
Como refere Anderson-Levitt (2008:356), a globaliza- das reformas curriculares (Ibid.), caracterizado, acima de
ção origina um diálogo comum sobre as reformas, “tor- tudo, pela centralidade do conhecimento, pelo reforço da
nando, aparentemente, mais uniforme o currículo a nível identidade do currículo nacional e pela existência de qua-
mundial” através de consensos em torno dos mesmos dros de referência para a qualificação, cuja visibilidade é
con- teúdos. É neste sentido que se argumenta que o bem patente nas agendas transnacionais (Teodoro & Es-
principal contributo das políticas de educação e formação, trela, 2010). Esta asserção, aparentemente contraditória, é
oriundas dos organismos trans-e-supranacionais, reside alimentada pelos governos nacionais porque “a ideia de
na mudan- ça conceitual que introduzem, pois tais conteúdos comuns parece óbvia e inevitável”, prevale-
organismos “glo- balizados” e “globalizantes” são o rosto cendo, entre eles, a “convergência quanto à existência de
macropolítico de decisões curriculares, agindo como um core curriculum” (Anderson-Levitt, 2008).
“centros de produção de significado” (Bauman,1999), Apesar da existência de uma mesma estrutura, tanto
cujas faces se escondem atrás de máscaras, protegidas na escola como nas salas de aula e noutros espaços infor-
por conceitos económicos. mais e não formais de educação, existe uma diversidade
A mudança paradigmática, estimulada pela sociedade naquilo que é decidido no “currículo-em-ação pelos pro-
de conhecimento, traz uma ressignificação quer do que fessores e alunos em contextos específicos, já que o que
se entende por currículo (mais centrado em quem apren- atualmente acontece nas salas de aula varia amplamente
de e não tanto em quem ensina, alterando-se, desde já, no mundo” (Ibid.). Torna-se, assim, óbvio que a homoge-
a relação com o conhecimento e que se passa a enten- neização opera ao nível do currículo intencional (prescrito,
der por conhecimento), quer novas (ou velhas) formas de oficial, escrito), enquanto que, ao nível da sala de aula
organização curricular, com destaque para a organização exis- te a diversidade.
modular metodologia ativa, currículo nacional enroupado Esta análise pode ser ainda mais potencializada pela
em competências/metas de aprendizagem e qualificação noção de cultura-mundo, que de modo algum pode ser
dos que estão aprendendo. perspectivada como sendo una e unificada, como reco-
nhecem Lipovetsky e Serroy (2010):
Para além da mudança de autores e da reformula-
ção de saberes, o novo paradigma, bastante determina- “Ao mesmo tempo em que o mercado e as indústrias
do pela engenharia social (Pinar, 2007), a que se chama, culturais fabricam uma cultura mundial caracterizada por
também, lógica ou cultura de mercado (Pacheco, 2002), uma forte corrente de homogeneização, assiste-se tam-
reformula o conceito de aprendizagem, que deixa de ser bém á multiplicação das solicitações comunitárias de di-
lenta e profunda e passa a ser apressada, fazendo com ferença: quanto mais o mundo se globaliza, mais alguns
que os professores e formadores se tornem em meros particularismos culturais aspiram a afirmar-se nele. Uni-
funcio- nários do ato pedagógico que acontece na sala de formização globalitária e fragmentação cultural caminham
aula, como sublinham Hargreaves e Fink (2007): par a par”.
“Vivemos em países com escolas apressadas [e tam- Para além da diversidade curricular, que existe ao nível
bém noutros espaços de formação]. As grandes das salas de aula e dos espaços de formação, observa-se
finalidades são transformadoras em metas de curto prazo” que a noção de aprendizagem ao longo da vida contribui,
(…) “conse- quentemente, o currículo é abarrotado com de uma forma substantiva, para que o currículo seja con-
mais conteú- dos, fazem-se mais testes, os conceitos são siderado pela dinâmica do sujeito, fazendo-se com que o
transmitidos a grupos de idade mais novos, dedica-se étimo latino currere esteja na base da sua definição, tal
mais tempo aos aspectos básicos que serão testados, os como foi argumentado pelo movimento da reconceptuali-
professores dão menos tempo aos alunos para zação, iniciado na década de 1970 (Pinar, 1975). Porém, há
responderem a questões nas aulas e as perguntas e a uma diferença marcante: o currere é um processo de
curiosidade começam a eva- porar-se”. fabri- cação da subjetivação do sujeito sem que esteja
dominado por uma racionalidade técnica e por uma lógica
Analisando-se o efeito das políticas de educação e
for- mação nas práticas de organização curricular, de merca- do, que torna mais concreta a uniformização
constata-se que a homogeneização, definida ao nível das práticas, apesar da diversidade e heterogeneidade das
macro, não tem uma necessária correspondência com ofertas, já que o princípio pelo qual se regula o mercado
decisões tomadas aos níveis meso e micro. Se, por um baseia-se na performatividade dos resultados em função
lado, a globalização é um referente para as políticas de das escolhas e preferências dos indivíduos.
homogeneização do currículo, especialmente ao nível
do currículo prescrito,

67
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Aprendizagem ao longo da vida


Por isso, a temporalidade social é compatível com
uma aprendizagem ao longo da vida que se reconhece
Se o currículo e o seu processo de desenvolvimento
curricu- larmente em formas diversas, sempre com a
forem considerados como uma construção social e
cultural em torno do conhecimento e suas formas de finalidade da certificação e que passam por conferir à
organização em contextos educativos formais, informais e aprendizagem ao longo da vida uma dimensão mais
não formais, a aprendizagem ao longo da vida formal, com um vertente académica (Rothes, 2007),
corresponde a um efei- to educacional que tem sido reconhecendo-se que, pela aná- lise de dados
perspectivado de modo dife- rente ao longo das gerações documentais sobre a realidade portuguesa, tal
e que, de modo algum, pode tornar-se num conceito aprendizagem “esteja a ser entendida, no quadro das
exclusivo da educação de adul- tos. Sendo um conceito- orientações políticas estratégicas, de acordo com uma vi-
chave dos documentos da OCDE (Charlot, 2007) e da são bastante escolarizada” (Alves, 2010), naquilo que é de-
União Europeia (Alves, 2010; Pacheco, 2009), em estreita signado pela prevalência da “ortopedia social” sobre
ligação com a globalização e o neolibe- ralismo (Pacheco, outras lógicas (de “animação/ocupação de tempos livres”
2001; Teodoro, 2010), a aprendizagem é um processo em e de “in- tervenção comunitária”).
devir, pois a educação é sempre propo- sicional e torna-se Quando a aprendizagem ao longo da vida se torna
elo de ligação entre gerações, fazendo parte dos numa lógica ortopédica de qualificação, a instrumentali-
desígnios sociais, culturais, económicos, políticos e zação curricular dessa aprendizagem, presente nas tem-
ideológicos do currículo, ainda que subordinado a tradi- poralidades e espacialidades sociais e normativas, vira-se
ções diferentes. para o cumprimento de metas estatísticas e para uma
Neste sentido, a aprendizagem ao longo da vida é tra- visão redutora do que é uma aprendizagem ao longo da
duzida, hoje em dia, por noções que reforçam a formação vida, deixando de valorizar as temporalidades e
para a empregabilidade e a responsabilização individual.
espacialidades pessoais ou biográficas.
Tendo-se tornado numa retórica da sociedade de
Numa sobreposição do social sobre o pessoal, obser-
informa- ção, a aprendizagem ao longo da vida não deixa
va-se que a “organização do conhecimento reconhecido
de ter uma certa confusão terminológica (Lima, 2010),
originando um léxico pedagógico variado que visa tornar como provido de relevância é o conhecimento que, “qua-
mais competiti- vo o mercado da educação e formação. lificando” os indivíduos, visa, igualmente, a qualificação do
Sendo devir, a aprendizagem não pode ter um marca- trabalho por via da formação, sendo esta pensada hoje
dor temporal determinado, mesmo que se diga que, em ex- clusivamente em termos de acesso ao mundo do
termos de balizamento, vai do ensino pré-escolar até à trabalho”, silenciando, ao mesmo tempo, a atividade a
pós-reforma (“do berço ao túmulo”), abrangendo também autoria dos su- jeitos implicados na produção de sentido”
qualquer tipo de educação (formal, informal ou não for- (Silva, 2007:308). Trata-se, com efeito, de discutir, tal como
mal). Neste caso, a aprendizagem ao longo da vida, abar- argumenta Pinar (2007), a construção do currículo como
cando “todos os espaços e tempos” da vida do indivíduo uma intersecção da esfera pública com a esfera privada,
não constitui, então, uma novidade recente (Alves, 2010), de modo que o espaço e o tempo de formação sejam
respondendo a “aprendizagens úteis e eficazes, uma realidade que diz respeito ao sujeito e que não
instrumen- talizando-a e amputando-a das suas estejam, como relembra Touraine (2009), subordinados ao
dimensões menos mercadorizáveis, esquecendo ou discurso interpretativo dominante. Tal discurso, pelo
recusando, a substantivi- dade da vida ao longo das menos ao nível das políticas de educação e formação da
aprendizagens” (Lima, 2010), cuja orientação deve ser União Europeia, significa que a aprendizagem é uma
procurada na reedição do valor educacional da formação aquisição contínua de “conhecimen- tos, aptidões e
vocacional, agora filtrada curricu- larmente pelas habilidades”, com vista a promover a mo- bilidade dos
competências que habilitam para a qualifi- cação exigida trabalhadores no interior da comunidade, em função da
em termos de padrões de empregabilidade. Enquadrar a sua qualificação.
aprendizagem ao longo da vida nas po- líticas de
Por conseguinte, a valorização da educação/forma-
educação e formação, cada vez mais globaliza- das
ção não formal e informal como espaço de aprendizagem,
(Pacheco, Morgado & Moreira, 2007) significa discu- tir,
como o faz Silva (2007) as temporalidades sociais e as mesmo que direcionada para tendências de qualificação
temporalidades biográficas, que se concretizam quer orientada pela empregabilidade, contribui para ressigni-
pelos “discursos da importância e da necessidade da ficação do currículo como projeto contínuo de formação,
aprendiza- gem ao longo da vida - que convoca os deixando de ser complementar na perspectiva de uma
sujeitos individuais a tornarem-se sujeitos aprendentes formação entendida como reciclagem da formação inicial.
(Dubar, 2000), respon- sabilizando-os nas suas Porém, o lado mais estruturante da aprendizagem ao lon-
aprendizagens e na rentabilização em go da vida, tal como se podem observar pela análise da
competitividade/empregabilidade no mercado de tra- iniciativa governamental Novas Oportunidades, inserida
balho e do emprego”-, “quer pela “constatação da (in) no Plano Nacional de Emprego e no Plano Tecnológico
visi- bilidade de aprendizagens particulares e significativas (AAVV, 2010) consiste na qualificação de jovens e
e re- levantes em contextos de (inter) ação (sociais, qualificação de adultos num contexto de competitividade
lúdicos, pro- fissionais…) mais ou menos informais ou não social e no qua- dro de uma “economia de
diretamente conhecimento /serviços” (Gid- dens (2007), onde as
intencionais enquanto espaços-tempos de formação”. credenciais (certificados, diplomas, graus) são de
importância acrescida). Se sobre este qua-

68
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

dro de competição não temos muito a dizer, aceitando-se


Avaliação
como uma realidade resultante da globalização, a mesma
aceitabilidade não pode ser afirmada quando, na apren-
Na relação currículo, aprendizagem ao longo da vida/
dizagem ao longo da vida, e, sobretudo nos indicadores avaliação não há lugar a uma sobre determinação de
que são propostos (Ferreira & Tenório, 2010), os qual- quer um dos conceitos, pois se entenderá que as
resultados imediatos de certificação são substituídos pela políticas de educação e formação direcionadas para a
qualidade dos processos de aprendizagem. performativi- dade seguem determinados princípios
Perante esta lógica curricular, aliás, bem patente com organizadores - para Lipovetsky & Serroy, 2010:40, seriam
os princípios do neoliberalismo (Pacheco, 2001), em que a o mercado, a tecno- ciência e o indivíduo - que impõem
mudança de paradigma não se opera somente pela passa- o receio da avaliação por parte dos sujeitos
gem do ensino para a aprendizagem, mas, de igual modo, transformados em responsáveis pelo seu sucesso ou
na passagem dos objetivos para os resultados, com a rea- fracasso: Destacando-se como dispositivo configurador
firmação das competências como padrão do de uma nova identidade, a avaliação é uma técnica de
conhecimento e dos padrões de qualificação, as novas biopoder, ou de subjugação, no sentido que Fou- cault
modalidades de aquisição e domínio de conhecimento (2010) atribui às políticas educativas e de saúde, con-
tendem para a “des- valorização do processo de tribuindo para a afirmação do medo: “num contexto em
aprendizagem em detrimento do resultado [que] pode ser que aumentam as pressões do curto prazo, os indivíduos
entendido como um sinal de influência da ideologia da vivem no receio da avaliação permanente e de não
racionalização de da “performa- tividade” na educação, estarem á altu- ra das exigências da empresa” (Lipovetsky
subvertendo princípios e finalidades educativas mais & Serroy, 2010). É neste sentido que Gil (2009) assere que
amplas” (Pires, 2007). nas socieda-
Porém, e contrariamente ao que o conceito de apren- des contemporâneas “pode-se apontar a avaliação
enquan- to método universal de formação de identidades
dizagem ao longo da vida implica, a medida Novas Opor-
necessá- rias à modernização”, sobretudo se esta
tunidades visa “dotar os cidadãos das competências
avaliação for de- terminada pelo “discurso da
essen- ciais à moderna economia do conhecimento”, competência e da redução da subjetividade a perfis
através de duas estratégias fundamentais: “fazer do numéricos de competências” (Ibid.), pois “a avaliação dará
ensino profissio- nalizante de nível secundário uma e medirá o mérito e a recompensa” (Ibid.) e “em todos
verdadeira e real opção”; “elevar a formação de base dos campos avaliados, o ser homem mede-se pela sua posição
ativos” pelo sistema de re- conhecimento, validação e nas escalas das performances a que in- cessantemente é
certificação de competências”. Quando o sentido deveria submetido” (Ibid.). Ainda segundo o autor, o indivíduo “é
ser o da valorização das aprendi- zagens não formais e submetido a uma grelha geral em que se comparam, se
informais, o que se verifica, em Portu- gal, é o quantificam e se qualificam competências. A avaliação
redimensionamento da formação escolar, colocada ao aplica-se a grupos, populações, em que o indiví- duo se
serviço da educação de adultos e, acima de tudo, dos integra, enquanto “ser avaliado”, como uma entidade
objetivos relativos à qualificação estatística. comparável. Homogeneizada por padrões que valem para
As estratégias de implementação do conceito de todos. Estes padrões marcam o grau máximo de poder e
aprendizagem ao longo da vida são muito diversas de saber. Como tal, induzem no indivíduo a convicção de
(Pache- co, 2009, Canário 2007a; 2007b; Cavaco, 2009, que está sempre numa situação (a que corresponde um
Silva, 2003) e todas elas pretendem que os indivíduos não senti- mento) de inferioridade e de impoder face ao
só concluam o ensino secundário (aumentando, por isso, avaliador e à imagem ideal do avaliado (que vai esforçar-
o ensino profis- sionalizante em substituição do ensino se por a atingir” (Ibid.).
tecnológico), como também completem os seus percursos Sem a existência de um efetivo contrapeso ao
escolares interrom- pidos e possam ver as suas domínio absoluto do mercado, os sistemas de educação e
formação, tal como outros, são “cada vez mais redefinidos,
competências certificadas. Nas modalidades de educação
reestrutu- rados e invadidos pelas lógicas da concorrência,
de jovens e adultos sobressaem mais a escolarização e a
da compe- tição e da obtenção de resultados, que se
certificação do que a qualificação (Melo, 2007; Fragoso, impõem como a matriz, a pedra angular, da organização
2007), sem que se registe uma me- lhoria curricular ao do nosso universo social” (Lipovetsky & Serroy, 2010:48).
nível do conhecimento e das metodo- logias, já que Daí que a compara- bilidade se tenha tornado no
muitos destes cursos funcionam nos padrões curriculares referente principal da cultura de avaliação de prestação de
das escolas dos ensinos básico e secundário. Neste contas e responsabilização do individuo pelo seu
sentido, Canário (2007a) afirma que “a educação e sucesso/insucesso, pelo que as políticas curriculares e as
formação de adultos têm vindo a ser marcadas por uma avaliações são espelho e reflexo (Teodoro & Montané,
orientação triplamente redutora: privilegia a formação de 2009).
recursos humanos, assume modalidades escolarizadas e Quando o currículo e aprendizagem ao longo da vida
dirige-se à capacitação individual. O sucesso deste pro- são abordados em função do indivíduo e da sociedade, a
grama depende da capacidade de ultrapassar esta prática produção científica das últimas décadas em avaliação
redutora”. (Sta- ke, 2006; Figari, 1996, Alves & Machado, 2009;
Fernandes, 2010) tem discutido os paradigmas, os
modelos e as teorias de uma forma dicotómica, como se
fosse possível privilegiar só o indivíduo ou só a sociedade,
reiterando-se a sustenta- bilidade das funções formativa e
sumativa da avaliação.
69
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Neste caso, como sublinha Santos (2008), na relação


que se estabelece entre educação e formação em função O questionamento do currículo e da avaliação pela
do indivíduo ou do coletivo social, “devemos refletir se ela aprendizagem ao longo da vida faz-se, atualmente, pela
é feita em função do indivíduo ou do coletivo social, ou, premência de uma teoria da avaliação de competências,
ainda, se da natureza da educação e formação de adultos, cujas práticas são fortalecidas pela noção de qualificação
ou, também, dada a sua singularidade, se ela se dá em em função de padrões, cada vez mais generalizados pelos
fun- ção de projetos pessoais, ou dos projetos político- organismos transnacionais e supranacionais.
sociais de desenvolvimento, ou até mesmo de ambos”. Se avaliar é atribuir o mérito ou o valor de algo (Stake,
Sendo possível argumentar que, apesar da retórica 2006), com vista a um processo de melhoria (Stufflebeam
po- lítica que se encontra no conceito (Lima, 2010; Silva, & Shinkfield, 1985), não esquecendo que também é uma
2010; Canário & Rummert, 2007; Santos, 2008), a ação educativa, como relembra Figari (1996), por que mo-
aprendizagem ao longo da vida, tal como tem sido tivo a educação e formação reforçam, em meios escolares
valorizada na recupe- ração da formação vocacional e da e não escolares, processos e práticas edumétricas?
avaliação contextualiza- da, com ênfase na aquisição, Por mais discernimento pragmático que exista em
domínio e desenvolvimento de competências e na avaliação, como advoga Fernandes (2010), o avaliador é
resposta estratégica a problemas de competitividade confrontado com práticas de regulação produtivistas, em
económica, torna a avaliação mais funcio- nalista, que o currículo, definido sob a pressão de instrumentos
esperando-se dela efeitos funcionais positivos na relação de resposta a imposições exteriores, deve contribuir para
indivíduo-sociedade, conquanto que o indivíduo detenha uma aprendizagem ao longo da vida subordinada a parâ-
a responsabilidade de adquirir conhecimento e criar as
metros de qualificações (e.g., o Quadro europeu de quali-
condições para as corridas de produtividade em que está
ficação da aprendizagem ao longo da vida) e à realização
envolvido.
de metas (e.g., Propostas de Metas 2021- Organização
“Pela sistematização de algumas políticas e práticas
de accountability (Afonso, 2010; Taubman, 2009), a dos Estados Ibero-americanos para a Educação, a Ciência
responsa- bilidade transfere-se dos sistemas de educação e a Cultura e, ainda, Desafios da União Europeia para
e formação para o indivíduo, isto é, o sistema passa a ser 2020).
“controlado individualmente pelos que estão aprendendo” O estabelecimento de metas de aprendizagem (men-
(Lima, 2010), o que pressupõe a existência de sujeitos suráveis por níveis, ciclos e anos), o que está em sintonia
autónomos, mas também dotados de racionalidade com as políticas de educação que têm vindo a ser imple-
estratégica (…) para desenhar rotas individuais óptimas de mentadas, serve de referencial para a validação de mo-
aprendizagem, de- tendo os recursos indispensáveis à dalidades de avaliação ligadas às classificações (avaliação
construção dos agora denominados portfólios de sumativa), aos critérios (avaliação aferida) e à comparabili-
competências” (Lima, 2010). dade nacional e internacional (avaliação normativa).
É neste sentido que a avaliação, na sociedade de co- Tal lógica não só é uma faceta visível da política de
nhecimento, deixa de ter uma componente sumativa (na prestação de contas - em que o resultado vale mais que o
busca de resultados a partir de objetivos) ou uma com- processo e onde os resultados da aprendizagem, opera-
ponente formativa (no desenvolvimento de estratégias de cionalizáveis em metas de aprendizagem, representam um
apoio e exploração) e se converte num projeto inacabado, regresso aos objetivos curriculares de nível/ciclo/ano e
flexível e itinerante, respondendo mais diretamente a uma aos objetivos mínimos, só que agora trabalhados no
avaliação baseada em standards do que a uma avaliação sentido da avaliação de competências (Joannaert, 2009;
compreensiva, para seguir a terminologia de Stake (2006), Scallon, 2009, Audigier & Tutiaux-Guillon, 2008) -, bem
sendo esta a lógica presente na avaliação de
como faz parte de um processo de valorização social da
competências, essencialmente quando se valoriza quer a
educação e formação, essencialmente na perspectiva da
dimensão pes- soal (avaliação por si) e a dimensão social
teoria do capital humano.
(avaliação pelo outro) (Cavaco, 2009).
Sendo o currículo e aprendizagem ao longo da vida
um itinerário de conhecimento, a avaliação deveria ser, Nota: ibid./ ibidem: No mesmo lugar, na mesma obra,
em primeiro lugar, a avaliação centrada no conhecimento, na obra já citada.
ain- da que no contexto histórico das políticas de
educação e formação, se fale de práticas avaliativas
centradas nos con- teúdos, nos objetivos específicos, nas
redes conceptuais, nas atividades e nas competências (De
Ketele, 2008).
Reduzir o currículo, a aprendizagem ao longo da vida
e a avaliação a uma abordagem de competências signi-
fica aceitar opções quanto a procedimentos a seguir nos
contextos de educação e formação. Uma delas é que “a
avaliação é um processo complexo e quando se trata de
avaliar competências o processo ainda se apresenta mais
delicado, o que constitui um domínio de dificuldade no
reconhecimento e validação de adquiridos experienciais”
(Cavaco, 2007).

70
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

e) Inviolabilidade: direitos fundamentais não podem


BIBLIOGRAFIASUGERIDA:BRASIL.SECRETARIA DE deixar de ser observados por disposições infraconstitucio-
EDUCAÇÃO ESPECIAL. POLÍTICA NACIONAL DE nais ou por atos das autoridades públicas, sob pena de
EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO nu- lidades.
INCLUSIVA. BRASÍLIA, MEC/SEESP, 2008. f) Indivisibilidade: os direitos fundamentais
compõem um único conjunto de direitos porque não
podem ser ana- lisados de maneira isolada, separada.
g) Imprescritibilidade: os direitos fundamentais não
se perdem com o tempo, não prescrevem, uma vez que
são sempre exercíveis e exercidos, não deixando de existir
Prezado Candidato , o tema acima supracitado já pela falta de uso (prescrição).
foi abordado em tópicos anteriores . h) Relatividade: os direitos fundamentais não po-
dem ser utilizados como um escudo para práticas ilícitas
ou como argumento para afastamento ou diminuição da
BRASIL. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA responsabilidade por atos ilícitos, assim estes direitos não
DO BRASIL –1988. (ARTIGOS 5º, 6º; 205 A 214) são ilimitados e encontram seus limites nos demais
direitos igualmente consagrados como humanos.

Vale destacar que a Constituição vai além da proteção


dos direitos e estabelece garantias em prol da preservação
destes, bem como remédios constitucionais a serem utili-
O título II da Constituição Federal é intitulado zados caso estes direitos e garantias não sejam preserva-
“Direitos e Garantias fundamentais”, gênero que abrange dos. Neste sentido, dividem-se em direitos e garantias as
as seguin- tes espécies de direitos fundamentais: direitos previsões do artigo 5º: os direitos são as disposições de-
individuais e coletivos (art. 5º, CF), direitos sociais claratórias e as garantias são as disposições
(genericamente pre- vistos no art. 6º, CF), direitos da assecuratórias.
nacionalidade (artigos 12 e 13, CF) e direitos políticos O legislador muitas vezes reúne no mesmo dispositivo
(artigos 14 a 17, CF). o direito e a garantia, como no caso do artigo 5º, IX: “é
Em termos comparativos à clássica divisão tridimen- livre a expressão da atividade intelectual, artística,
sional dos direitos humanos, os direitos individuais (maior científica e de comunicação, independentemente de
parte do artigo 5º, CF), os direitos da nacionalidade e os censura ou licença”
direitos políticos se encaixam na primeira dimensão (direi- – o direito é o de liberdade de expressão e a garantia é a
tos civis e políticos); os direitos sociais se enquadram na vedação de censura ou exigência de licença. Em outros ca-
se- gunda dimensão (direitos econômicos, sociais e sos, o legislador traz o direito num dispositivo e a garantia
culturais) e os direitos coletivos na terceira dimensão. em outro: a liberdade de locomoção, direito, é colocada
Contudo, a enu- meração de direitos humanos na no artigo 5º, XV, ao passo que o dever de relaxamento da
Constituição vai além dos direitos que expressamente prisão ilegal de ofício pelo juiz, garantia, se encontra no
constam no título II do texto constitucional. artigo 5º, LXV6.
Os direitos fundamentais possuem as seguintes carac- Em caso de ineficácia da garantia, implicando em vio-
terísticas principais: lação de direito, cabe a utilização dos remédios constitu-
a) Historicidade: os direitos fundamentais possuem cionais.
antecedentes históricos relevantes e, através dos tempos, Atenção para o fato de o constituinte chamar os
adquirem novas perspectivas. Nesta característica se en- remé- dios constitucionais de garantias, e todas as suas
quadra a noção de dimensões de direitos. fórmulas de direitos e garantias propriamente ditas
b) Universalidade: os direitos fundamentais perten- apenas de di- reitos.
cem a todos, tanto que apesar da expressão restritiva do
caput do artigo 5º aos brasileiros e estrangeiros residentes Direitos e deveres individuais e coletivos
no país tem se entendido pela extensão destes direitos, na
perspectiva de prevalência dos direitos humanos. O capítulo I do título II é intitulado “direitos e deveres
c) Inalienabilidade: os direitos fundamentais não individuais e coletivos”. Da própria nomenclatura do capí-
possuem conteúdo econômico-patrimonial, logo, são in- tulo já se extrai que a proteção vai além dos direitos do
transferíveis, inegociáveis e indisponíveis, estando fora do indivíduo e também abrange direitos da coletividade. A
comércio, o que evidencia uma limitação do princípio da maior parte dos direitos enumerados no artigo 5º do
autonomia privada. texto constitucional é de direitos individuais, mas são
d) Irrenunciabilidade: direitos fundamentais não po- incluídos alguns direitos coletivos e mesmo remédios
dem ser renunciados pelo seu titular devido à constitucionais próprios para a tutela destes direitos
fundamenta- lidade material destes direitos para a coletivos (ex.: manda- do de segurança coletivo).
dignidade da pessoa humana.
6 FARIA, Cássio Juvenal. Notas pessoais
tomadas em teleconferência.

71
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

1) Brasileiros e estrangeiros
- Direito à igualdade
O caput do artigo 5º aparenta restringir a proteção
con- ferida pelo dispositivo a algumas pessoas, Abrangência
notadamente, “aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
Observa-se, pelo teor do caput do artigo 5º, CF, que o
no País”. No entanto, tal restrição é apenas aparente e tem
constituinte afirmou por duas vezes o princípio da
sido interpretada no sen- tido de que os direitos estarão
igualdade:
protegidos com relação a todas as pessoas nos limites da
soberania do país.
Artigo 5º, caput, CF. Todos são iguais perante a lei,
Em razão disso, por exemplo, um estrangeiro pode sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
ingres- sar com habeas corpus ou mandado de segurança,
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
ou então in- tentar ação reivindicatória com relação a imóvel
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
seu localizado no Brasil (ainda que não resida no país).
segurança e à propriedade, nos termos seguintes [...].
Somente alguns direitos não são estendidos a todas
as pessoas. A exemplo, o direito de intentar ação popular
Não obstante, reforça este princípio em seu primeiro
exige a condição de cidadão, que só é possuída por
in- ciso:
nacionais titulares de direitos políticos.
Artigo 5º, I, CF. Homens e mulheres são iguais em
2) Relação direitos-deveres
direitos e obrigações, nos termos desta Constituição.
O capítulo em estudo é denominado “direitos e
garantias deveres e coletivos”, remetendo à necessária
Este inciso é especificamente voltado à necessidade
relação direitos-
de igualdade de gênero, afirmando que não deve haver
-deveres entre os titulares dos direitos fundamentais. Acima nenhu- ma distinção sexo feminino e o masculino, de
de tudo, o que se deve ter em vista é a premissa modo que o homem e a mulher possuem os mesmos
reconhecida nos direitos fundamentais de que não há direito direitos e obriga- ções.
que seja absoluto, correspondendo-se para cada direito um
Entretanto, o princípio da isonomia abrange muito
dever. Logo, o exer- cício de direitos fundamentais é
mais do que a igualdade de gêneros, envolve uma
limitado pelo igual direito de mesmo exercício por parte de
perspectiva mais ampla.
outrem, não sendo nunca abso- lutos, mas sempre relativos.
O direito à igualdade é um dos direitos norteadores
Explica Canotilho7 quanto aos direitos fundamentais: “a de interpretação de qualquer sistema jurídico. O primeiro
ideia de deveres fundamentais é suscetível de ser
enfo- que que foi dado a este direito foi o de direito civil,
entendida como o ‘outro lado’ dos direitos fundamentais.
enqua- drando-o na primeira dimensão, no sentido de que
Como ao titular de um direito fundamental corresponde um
a todas as pessoas deveriam ser garantidos os mesmos
dever por parte de um outro titular, poder-se-ia dizer que o
direitos e deve- res. Trata-se de um aspecto relacionado à
particular está vincu- lado aos direitos fundamentais como
igualdade enquanto liberdade, tirando o homem do arbítrio
destinatário de um dever fundamental. Neste sentido, um
dos demais por meio da equiparação. Basicamente, estaria
direito fundamental, enquanto protegido, pressuporia um
se falando na igualdade perante a lei.
dever correspondente”. Com efeito, a um direito
No entanto, com o passar dos tempos, se percebeu
fundamental conferido à pessoa corresponde o dever de
que não bastava igualar todos os homens em direitos e
respeito ao arcabouço de direitos conferidos às outras
deveres para torná-los iguais, pois nem todos possuem as
pessoas.
mesmas condições de exercer estes direitos e deveres.
Logo, não é su- ficiente garantir um direito à igualdade
3) Direitos e garantias em espécie
formal, mas é preciso buscar progressivamente a
Preconiza o artigo 5º da Constituição Federal em seu igualdade material. No sentido de igualdade material que
caput: aparece o direito à igualdade num segundo momento,
pretendendo-se do Estado, tanto no mo- mento de legislar
Artigo 5º, caput, CF. Todos são iguais perante a lei, sem quanto no de aplicar e executar a lei, uma postura de
dis- tinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros promoção de políticas governamentais voltadas a grupos
e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do vulneráveis.
direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à Assim, o direito à igualdade possui dois sentidos
propriedade, nos ter- mos seguintes [...]. notá- veis: o de igualdade perante a lei, referindo-se à
aplicação uniforme da lei a todas as pessoas que vivem
O caput do artigo 5º, que pode ser considerado um em sociedade; e o de igualdade material, correspondendo
dos principais (senão o principal) artigos da Constituição à necessidade de discriminações positivas com relação a
Federal, consagra o princípio da igualdade e delimita as grupos vulneráveis da sociedade, em contraponto à
cinco esferas de direitos individuais e coletivos que igualdade formal.
merecem proteção, isto é, vida, liberdade, igualdade,
segurança e propriedade. Os in- cisos deste artigos Ações afirmativas
delimitam vários direitos e garantias que se enquadram em Neste sentido, desponta a temática das ações
alguma destas esferas de proteção, podendo se falar em afirmati- vas,que são políticas públicas ou programas
duas esferas específicas que ganham também des- taque no privados criados temporariamente e desenvolvidos com a
texto constitucional, quais sejam, direitos de acesso à justiça finalidade de reduzir as desigualdades decorrentes de
e direitos constitucionais-penais. discriminações ou de uma hipossuficiência econômica ou
7 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito cons- física, por meio da concessão de algum tipo de vantagem
titucional e teoria da constituição. 2. ed. Coimbra: Almedi- compensatória de tais condições.
na, 1998, p. 479.
72
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Quem é contra as ações afirmativas argumenta que,


em uma sociedade pluralista, a condição de membro de Vedação à tortura
um gru- po específico não pode ser usada como critério De forma expressa no texto constitucional destaca-se
de inclusão ou exclusão de benefícios. Ademais, afirma-se a vedação da tortura, corolário do direito à vida, conforme
que elas des- privilegiam o critério republicano do mérito previsão no inciso III do artigo 5º:
(segundo o qual o indivíduo deve alcançar determinado
cargo público pela sua capacidade e esforço, e não por Artigo 5º, III, CF. Ninguém será submetido a tortura
pertencer a determina- da categoria); fomentariam o nem a tratamento desumano ou degradante.
racismo e o ódio; bem como ferem o princípio da
isonomia por causar uma discriminação reversa. A tortura é um dos piores meios de tratamento de-
Por outro lado, quem é favorável às ações afirmativas sumano, expressamente vedada em âmbito internacional,
defende que elas representam o ideal de justiça como visto no tópico anterior. No Brasil, além da
compensa- tória (o objetivo é compensar injustiças disciplina constitucional, a Lei nº 9.455, de 7 de abril de
passadas, dívidas his- tóricas, como uma compensação aos 1997 define os crimes de tortura e dá outras providências,
negros por tê-los feito escravos, p. ex.); representam o destacando-
ideal de justiça distributiva (a preocupação, aqui, é com o -se o artigo 1º:
presente. Busca-se uma concre- tização do princípio da
igualdade material); bem como pro- movem a Art. 1º Constitui crime de tortura:
diversidade. I - constranger alguém com emprego de violência ou
Neste sentido, as discriminações legais asseguram a grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental:
ver- dadeira igualdade, por exemplo, com as ações a) com o fim de obter informação, declaração ou
afirmativas, a proteção especial ao trabalho da mulher e confis- são da vítima ou de terceira pessoa;
do menor, as garantias aos portadores de deficiência, b) para provocar ação ou omissão de natureza
entre outras medi- das que atribuam a pessoas com crimi- nosa;
diferentes condições, iguais possibilidades, protegendo e c) em razão de discriminação racial ou religiosa;
respeitando suas diferenças8. Tem predominado em II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autori-
doutrina e jurisprudência, inclusive no Supremo Tribunal dade, com emprego de violência ou grave ameaça, a
Federal, que as ações afirmativas são válidas. intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar
castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.
- Direito à Pena - reclusão, de dois a oito anos.
vida § 1º Na mesma pena incorre quem submete pessoa
Abrangência presa ou sujeita a medida de segurança a sofrimento
O caput do artigo 5º da Constituição assegura a físico ou mental, por intermédio da prática de ato não
proteção do direito à vida. A vida humana é o centro previsto em lei ou não resultante de medida legal.
gravitacional em torno do qual orbitam todos os direitos § 2º Aquele que se omite em face dessas condutas,
da pessoa humana, possuindo reflexos jurídicos, políticos, quando tinha o dever de evitá-las ou apurá-las, incorre na
econômicos, morais e religiosos. Daí existir uma pena de detenção de um a quatro anos.
dificuldade em conceituar o vocá- bulo vida. Logo, tudo § 3º Se resulta lesão corporal de natureza grave ou
aquilo que uma pessoa possui deixa de ter valor ou sentido gravíssima, a pena é de reclusão de quatro a dez anos; se
se ela perde a vida. Sendo assim, a vida é o bem principal resulta morte, a reclusão é de oito a dezesseis anos.
de qualquer pessoa, é o primeiro valor moral inerente a § 4º Aumenta-se a pena de um sexto até um terço:
todos os seres humanos9. I - se o crime é cometido por agente público;
No tópico do direito à vida tem-se tanto o direito de II – se o crime é cometido contra criança, gestante, por-
nascer/permanecer vivo, o que envolve questões como tador de deficiência, adolescente ou maior de 60 (sessenta)
pena de morte, eutanásia, pesquisas com células-tronco e anos;
aborto; quanto o direito de viver com dignidade, o que III - se o crime é cometido mediante sequestro.
engloba o respeito à integridade física, psíquica e moral, § 5º A condenação acarretará a perda do cargo,
in- cluindo neste aspecto a vedação da tortura, bem como função ou emprego público e a interdição para seu
a ga- rantia de recursos que permitam viver a vida com exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada.
dignidade. Embora o direito à vida seja em si pouco § 6º O crime de tortura é inafiançável e insuscetível de
delimitado nos incisos que seguem o caput do artigo 5º, graça ou anistia.
trata-se de um dos direitos mais discutidos em termos § 7º O condenado por crime previsto nesta Lei, salvo a
jurisprudenciais e socio- lógicos. É no direito à vida que se hipótese do § 2º, iniciará o cumprimento da pena em regi-
encaixam polêmicas dis- cussões como: aborto de me fechado.
anencéfalo, pesquisa com células
tronco, pena de morte, eutanásia, etc. - Direito à liberdade
8 SANFELICE, Patrícia de Mello. Comentários aos O caput do artigo 5º da Constituição assegura a pro-
artigos I e II. In: BALERA, Wagner (Coord.). Comentários teção do direito à liberdade, delimitada em alguns incisos
à Declaração Universal dos Direitos do Homem. Brasília: que o seguem.
Fortium, 2008, p. 08.
9 BARRETO, Ana Carolina Rossi; IBRAHIM, Fábio
Zambitte. Comentários aos Artigos III e IV. In: BALERA,
Wag- ner (Coord.). Comentários à Declaração Universal
dos Di- reitos do Homem. Brasília: Fortium, 2008, p. 15.

73
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Liberdade e legalidade
Tem-se, ainda, a seguinte previsão no artigo 5º, IX, CF:
Prevê o artigo 5º, II, CF:
Artigo 5º, IX, CF. É livre a expressão da atividade
Artigo 5º, II, CF. Ninguém será obrigado a fazer ou dei-
inte- lectual, artística, científica e de comunicação,
xar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.
indepen- dentemente de censura ou licença.
O princípio da legalidade se encontra delimitado nes-
te inciso, prevendo que nenhuma pessoa será obrigada a Consolida-se outra perspectiva da liberdade de
fazer ou deixar de fazer alguma coisa a não ser que a lei expres- são, referente de forma específica a atividades
assim determine. Assim, salvo situações previstas em lei, intelectuais, artísticas, científicas e de comunicação.
a pessoa tem liberdade para agir como considerar conve- Dispensa-se, com relação a estas, a exigência de licença
niente. para a manifestação do pensamento, bem como veda-se a
Portanto, o princípio da legalidade possui estrita rela- censura prévia.
ção com o princípio da liberdade, posto que, a priori, tudo A respeito da censura prévia, tem-se não cabe impe-
à pessoa é lícito. Somente é vedado o que a lei expres- dir a divulgação e o acesso a informações como modo de
samente estabelecer como proibido. A pessoa pode fazer controle do poder. A censura somente é cabível quando
tudo o que quiser, como regra, ou seja, agir de qualquer necessária ao interesse público numa ordem democrática,
maneira que a lei não proíba. por exemplo, censurar a publicação de um conteúdo de
exploração sexual infanto-juvenil é adequado.
Liberdade de pensamento e de expressão O direito à resposta (artigo 5º, V, CF) e o direito à in-
O artigo 5º, IV, CF prevê: denização (artigo 5º, X, CF) funcionam como a contrapar-
tida para aquele que teve algum direito seu violado (no-
Artigo 5º, IV, CF. É livre a manifestação do tadamente inerentes à privacidade ou à personalidade)
pensamen- to, sendo vedado o anonimato. em decorrência dos excessos no exercício da liberdade de
expressão.
Consolida-se a afirmação simultânea da liberdade de
pensamento e da liberdade de expressão. Liberdade de crença/religiosa
Em primeiro plano tem-se a liberdade de Dispõe o artigo 5º, VI, CF:
pensamento. Afinal, “o ser humano, através dos processos
internos de reflexão, formula juízos de valor. Estes Artigo 5º, VI, CF. É inviolável a liberdade de consciên-
exteriorizam nada mais do que a opinião de seu emitente. cia e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos
Assim, a regra constitucional, ao consagrar a livre cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção
manifestação do pensa- mento, imprime a existência aos locais de culto e a suas liturgias.
jurídica ao chamado direito de opinião”10. Em outras
palavras, primeiro existe o direito de ter uma opinião, Cada pessoa tem liberdade para professar a sua fé
depois o de expressá-la. como bem entender dentro dos limites da lei. Não há uma
crença ou religião que seja proibida, garantindo-se que a
No mais, surge como corolário do direito à liberdade
de pensamento e de expressão o direito à escusa por con- profissão desta fé possa se realizar em locais próprios.
Nota-se que a liberdade de religião engloba 3 tipos
vicção filosófica ou política:
distintos, porém intrinsecamente relacionados de liberda-
Artigo 5º, VIII, CF. Ninguém será privado de direitos des: a liberdade de crença; a liberdade de culto; e a
por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica liberda- de de organização religiosa.
ou política, salvo se as invocar para eximir-se de Consoante o magistério de José Afonso da Silva11,
obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir entra na liberdade de crença a liberdade de escolha da
prestação al- ternativa, fixada em lei. religião, a liberdade de aderir a qualquer seita religiosa, a
liberdade (ou o direito) de mudar de religião, além da
Trata-se de instrumento para a consecução do direito liberdade de não aderir a religião alguma, assim como a
assegurado na Constituição Federal – não basta permitir liberdade de descrença, a liberdade de ser ateu e de
que se pense diferente, é preciso respeitar tal posiciona- exprimir o agnos- ticismo, apenas excluída a liberdade de
mento. embaraçar o livre exercício de qualquer religião, de
Com efeito, este direito de liberdade de expressão é qualquer crença. A liber- dade de culto consiste na
limitado. Um destes limites é o anonimato, que consiste liberdade de orar e de praticar os atos próprios das
na garantia de atribuir a cada manifestação uma autoria manifestações exteriores em casa ou em público, bem
cer- ta e determinada, permitindo eventuais como a de recebimento de contribuições para tanto. Por
responsabilizações por manifestações que contrariem a fim, a liberdade de organização religiosa refere-se à
lei. possibilidade de estabelecimento e organização de igrejas
e suas relações com o Estado.
10 ARAÚJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vi-
dal Serrano. Curso de direito constitucional. 10. ed. São 11 SILVA, José Afonso da. Curso de direito
Paulo: Saraiva, 2006. constitu- cional positivo. 25. ed. São Paulo: Malheiros,
2006.

74
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Como decorrência do direito à liberdade religiosa, as-


segurando o seu exercício, destaca-se o artigo 5º, VII, CF: Primeiramente, prevê o artigo 5º, XXXIII, CF:

Artigo 5º, VII, CF. É assegurada, nos termos da lei, a Artigo 5º, XXXIII, CF. Todos têm direito a receber dos
pres- tação de assistência religiosa nas entidades civis órgãos públicos informações de seu interesse particular,
e mili- tares de internação coletiva. ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no
pra- zo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas
O dispositivo refere-se não só aos estabelecimentos aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da
prisionais civis e militares, mas também a hospitais. sociedade e do Estado.
Ainda, surge como corolário do direito à liberdade
reli- giosa o direito à escusa por convicção religiosa: A respeito, a Lei nº 12.527, de 18 de novembro de
2011 regula o acesso a informações previsto no inciso
Artigo 5º, VIII, CF. Ninguém será privado de direitos XXXIII do art. 5º, CF, também conhecida como Lei do
por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica Acesso à Infor- mação.
ou po- lítica, salvo se as invocar para eximir-se de Não obstante, estabelece o artigo 5º, XXXIV, CF:
obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir
prestação alterna- tiva, fixada em lei. Artigo 5º, XXXIV, CF. São a todos assegurados,
indepen- dentemente do pagamento de taxas:
Sempre que a lei impõe uma obrigação a todos, por a) o direito de petição aos Poderes Públicos em
exemplo, a todos os homens maiores de 18 anos o alis- defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder;
tamento militar, não cabe se escusar, a não ser que tenha b) a obtenção de certidões em repartições públicas,
fundado motivo em crença religiosa ou convicção filosó- para defesa de direitos e esclarecimento de situações de in-
fica/política, caso em que será obrigado a cumprir uma teresse pessoal.
prestação alternativa, isto é, uma outra atividade que não
contrarie tais preceitos. Quanto ao direito de petição, de maneira prática,
cum- pre observar que o direito de petição deve resultar
Liberdade de informação em uma manifestação do Estado, normalmente dirimindo
O direito de acesso à informação também se liga a (resol- vendo) uma questão proposta, em um verdadeiro
uma dimensão do direito à liberdade. Neste sentido, exercí- cio contínuo de delimitação dos direitos e
prevê o ar- tigo 5º, XIV, CF: obrigações que regulam a vida social e, desta maneira,
quando “dificulta a apreciação de um pedido que um
Artigo 5º, XIV, CF. É assegurado a todos o acesso à in- cidadão quer apresen- tar” (muitas vezes, embaraçando-
formação e resguardado o sigilo da fonte, quando neces- lhe o acesso à Justiça); “demora para responder aos
sário ao exercício profissional. pedidos formulados” (admi- nistrativa e, principalmente,
judicialmente) ou “impõe res- trições e/ou condições para
Trata-se da liberdade de informação, consistente na a formulação de petição”, traz a chamada insegurança
liberdade de procurar e receber informações e ideias por jurídica, que traz desesperança e faz proliferar as
quaisquer meios, independente de fronteiras, sem interfe- desigualdades e as injustiças.
rência. Dentro do espectro do direito de petição se insere, por
A liberdade de informação tem um caráter passivo, ao exemplo, o direito de solicitar esclarecimentos, de solicitar
passo que a liberdade de expressão tem uma caracterís- cópias reprográficas e certidões, bem como de ofertar de-
tica ativa, de forma que juntas formam os aspectos ativo núncias de irregularidades. Contudo, o constituinte, talvez
e passivo da exteriorização da liberdade de pensamento: na intenção de deixar clara a obrigação dos Poderes
não basta poder manifestar o seu próprio pensamento, é Públi- cos em fornecer certidões, trouxe a letra b) do
preciso que ele seja ouvido e, para tanto, há necessidade inciso, o que gera confusões conceituais no sentido do
de se garantir o acesso ao pensamento manifestado para direito de obter certidões ser dissociado do direito de
a sociedade.
petição.
Por sua vez, o acesso à informação envolve o direito Por fim, relevante destacar a previsão do artigo 5º, LX,
de todos obterem informações claras, precisas e
CF:
verdadeiras a respeito de fatos que sejam de seu
interesse, notadamente pelos meios de comunicação
Artigo 5º, LX, CF. A lei só poderá restringir a
imparciais e não monopoli- zados (artigo 220, CF). No
publicida- de dos atos processuais quando a defesa da
entanto, nem sempre é possível que a imprensa divulgue
intimidade ou o interesse social o exigirem.
com quem obteve a informação divulgada, sem o que a
segurança desta poderia ficar pre- judicada e a
informação inevitavelmente não chegaria ao público. Logo,o processo, em regra, não será sigiloso. Apenas
Especificadamente quanto à liberdade de informação o será quando a intimidade merecer preservação (ex: pro-
no âmbito do Poder Público, merecem destaque algumas cesso criminal de estupro ou causas de família em geral)
previsões. ou quando o interesse social exigir (ex: investigações que
pos- sam ser comprometidas pela publicidade). A
publicidade é instrumento para a efetivação da liberdade
de informação.

75
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Liberdade de locomoção
Pessoas podem ir às ruas para reunirem-se com de-
Outra faceta do direito à liberdade encontra-se no ar- mais na defesa de uma causa, apenas possuindo o dever
tigo 5º, XV, CF:
de informar tal reunião. Tal dever remonta-se a questões
de segurança coletiva. Imagine uma grande reunião de
Artigo 5º, XV, CF. É livre a locomoção no território pes- soas por uma causa, a exemplo da Parada Gay, que
nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos chega a aglomerar milhões de pessoas em algumas
termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com capitais: seria absurdo tolerar tal tipo de reunião sem o
seus bens. prévio aviso do poder público para que ele organize o
policiamento e a as- sistência médica, evitando algazarras
A liberdade de locomoção é um aspecto básico do di- e socorrendo pessoas que tenham algum mal-estar no
reito à liberdade, permitindo à pessoa ir e vir em todo o local. Outro limite é o uso de armas, totalmente vedado,
território do país em tempos de paz (em tempos de assim como de substâncias ilícitas (Ex: embora a Marcha
guerra é possível limitar tal liberdade em prol da da Maconha tenha sido autori- zada pelo Supremo
segurança). A liberdade de sair do país não significa que Tribunal Federal, vedou-se que nela tal substância ilícita
existe um direito de ingressar em qualquer outro país, fosse utilizada).
pois caberá à ele, no exercício de sua soberania, controlar
tal entrada. Liberdade de associação
Classicamente, a prisão é a forma de restrição da No que tange à liberdade de reunião, traz o artigo 5º,
liber- dade. Neste sentido, uma pessoa somente poderá XVII, CF:
ser pre- sa nos casos autorizados pela própria
Constituição Federal. A despeito da normativa específica Artigo 5º, XVII, CF. É plena a liberdade de associação
de natureza penal, re- força-se a impossibilidade de se para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar.
restringir a liberdade de locomoção pela prisão civil por
dívida. A liberdade de associação difere-se da de reunião por
Prevê o artigo 5º, LXVII, CF: sua perenidade, isto é, enquanto a liberdade de reunião é
exercida de forma sazonal, eventual, a liberdade de
Artigo 5º, LXVII, CF. Não haverá prisão civil por dívi- associa- ção implica na formação de um grupo
da, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário organizado que se mantém por um período de tempo
e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário considerável, dotado de estrutura e organização próprias.
infiel. Por exemplo, o PCC e o Comando vermelho são
associa- ções ilícitas e de caráter paramilitar, pois possuem
Nos termos da Súmula Vinculante nº 25 do Supremo armas e o ideal de realizar sua própria justiça
Tribunal Federal, “é ilícita a prisão civil de depositário paralelamente à estatal.
infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”. Por O texto constitucional se estende na regulamentação
isso, a única exceção à regra da prisão por dívida do da liberdade de associação.
ordenamento é a que se refere à obrigação alimentícia. O artigo 5º, XVIII, CF, preconiza:
Liberdade de trabalho
O direito à liberdade também é mencionado no artigo Artigo 5º, XVIII, CF. A criação de associações e, na
forma da lei, a de cooperativas independem de
autorização, sendo v estatal em seu funcionamento.
edada a interferência
5º, XIII, CF:
Neste sentido, associações são organizações resultantes
Artigo
balho, 5º, XIII,
ofício ou CF. É livre oatendidas
profissão, exercício de
as qualquer tra-
qualificações da reunião legal entre duas ou mais pessoas, com ou sem

profissionais que a lei estabelecer. personalidade jurídica, para a realização de um objetivo


co- mum; já cooperativas são uma forma específica de
O livre exercício profissional é garantido, respeitados associa- ção, pois visam a obtenção de vantagens comuns
os limites legais. Por exemplo, não pode exercer a em suas atividades econômicas.
profissão de advogado aquele que não se formou em Ainda, tem-se o artigo 5º, XIX, CF:
Direito e não foi aprovado no Exame da Ordem dos
Advogados do Brasil; não pode exercer a medicina aquele Artigo 5º, XIX, CF. As associações só poderão ser
que não fez faculdade de medicina reconhecida pelo MEC compul- soriamente dissolvidas ou ter suas atividades
e obteve o cadastro no Conselho Regional de Medicina. suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro
caso, o trânsito em julgado.
Liberdade de reunião
Sobre a liberdade de reunião, prevê o artigo 5º, XVI, O primeiro caso é o de dissolução compulsória, ou
CF: seja, a associação deixará de existir para sempre.
Obviamente, é preciso o trânsito em julgado da decisão
Artigo 5º, XVI, CF. Todos podem reunir-se judicial que assim determine, pois antes disso sempre há
pacificamen- te, sem armas, em locais abertos ao possibilidade de re- verter a decisão e permitir que a
público, independen- temente de autorização, desde associação continue em funcionamento. Contudo, a
que não frustrem outra re- união anteriormente convocada decisão judicial pode suspender atividades até que o
para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à trânsito em julgado ocorra, ou seja, no curso de um
autoridade competente. processo judicial.
76
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Em destaque, a legitimidade representativa da


associa- ção quanto aos seus filiados, conforme artigo 5º, Inviolabilidade de domicílio e sigilo de correspon-
XXI, CF: dência
Correlatos ao direito à privacidade, aparecem a invio-
Artigo 5º, XXI, CF. As entidades associativas, quando labilidade do domicílio e o sigilo das correspondências e
ex- pressamente autorizadas, têm legitimidade para comunicações.
represen- tar seus filiados judicial ou extrajudicialmente. Neste sentido, o artigo 5º, XI, CF prevê:

Trata-se de caso de legitimidade processual extraordi- Artigo 5º, XI, CF. A casa é asilo inviolável do
nária, pela qual um ente vai a juízo defender interesse de indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem
outra(s) pessoa(s) porque a lei assim autoriza. consentimento do mo- rador, salvo em caso de flagrante
A liberdade de associação envolve não somente o di- delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o
reito de criar associações e de fazer parte delas, mas tam- dia, por determinação judicial.
bém o de não associar-se e o de deixar a associação, con-
forme artigo 5º, XX, CF: O domicílio é inviolável, razão pela qual ninguém
pode nele entrar sem o consentimento do morador, a não
Artigo 5º, XX, CF. Ninguém poderá ser compelido a ser EM QUALQUER HORÁRIO no caso de flagrante delito
as- sociar-se ou a permanecer associado. (o morador foi flagrado na prática de crime e fugiu para
seu domicílio) ou desastre (incêndio, enchente,
- Direitos à privacidade e à terremoto...) ou para prestar socorro (morador teve
ataque do coração, está sufocado, desmaiado...), e
personalidade Abrangência SOMENTE DURANTE O DIA por determinação judicial.
Prevê o artigo 5º, X, CF: Quanto ao sigilo de correspondência e das comunica-
ções, prevê o artigo 5º, XII, CF:
Artigo 5º, X, CF. São invioláveis a intimidade, a vida
privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o Artigo 5º, XII, CF. É inviolável o sigilo da
direito a indenização pelo dano material ou moral correspondência e das comunicações telegráficas, de dados
decorren- te de sua violação. e das comunica- ções telefônicas, salvo, no último caso, por
ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei
O legislador opta por trazer correlacionados no estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução
mesmo dispositivo legal os direitos à privacidade e à processual penal.
personalida- de.
Reforçando a conexão entre a privacidade e a O sigilo de correspondência e das comunicações está
intimida- de, ao abordar a proteção da vida privada – que, melhor regulamentado na Lei nº 9.296, de 1996.
em resu- mo, é a privacidade da vida pessoal no âmbito
do domicílio e de círculos de amigos –, Silva 12 entende que Personalidade jurídica e gratuidade de registro
“o segredo da vida privada é condição de expansão da Quando se fala em reconhecimento como pessoa pe-
personalidade”, mas não caracteriza os direitos de rante a lei desdobra-se uma esfera bastante específica dos
personalidade em si. direitos de personalidade, consistente na personalidade
A união da intimidade e da vida privada forma a pri- ju- rídica. Basicamente, consiste no direito de ser
vacidade, sendo que a primeira se localiza em esfera mais reconhecido como pessoa perante a lei.
estrita. É possível ilustrar a vida social como se fosse um Para ser visto como pessoa perante a lei mostra-se
grande círculo no qual há um menor, o da vida privada, e necessário o registro. Por ser instrumento que serve como
dentro deste um ainda mais restrito e impenetrável, o da pressuposto ao exercício de direitos fundamentais, asse-
intimidade. Com efeito, pela “Teoria das Esferas” (ou gura-se a sua gratuidade aos que não tiverem condição
“Teoria dos Círculos Concêntricos”), importada do direito de com ele arcar.
alemão, quanto mais próxima do indivíduo, maior a Aborda o artigo 5º, LXXVI, CF:
proteção a ser conferida à esfera (as esferas são
representadas pela intimi- dade, pela vida privada, e pela Artigo 5º, LXXVI, CF. São gratuitos para os reconheci-
publicidade). damente pobres, na forma da lei: a) o registro civil de
“O direito à honra distancia-se levemente dos dois an- nas- cimento; b) a certidão de óbito.
teriores, podendo referir-se ao juízo positivo que a pessoa
tem de si (honra subjetiva) e ao juízo positivo que dela fa- O reconhecimento do marco inicial e do marco final
zem os outros (honra objetiva), conferindo-lhe respeitabi- da personalidade jurídica pelo registro é direito individual,
lidade no meio social. O direito à imagem também pos- não dependendo de condições financeiras. Evidente, seria
sui duas conotações, podendo ser entendido em sentido absurdo cobrar de uma pessoa sem condições a elabora-
objetivo, com relação à reprodução gráfica da pessoa, por ção de documentos para que ela seja reconhecida como
meio de fotografias, filmagens, desenhos, ou em sentido viva ou morta, o que apenas incentivaria a indigência dos
subjetivo, significando o conjunto de qualidades menos favorecidos.
cultivadas pela pessoa e reconhecidas como suas pelo
grupo social”13.
12 SILVA, José Afonso da. Curso de direito reito constitucional. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.
constitu- cional positivo. 25. ed. São Paulo: Malheiros,
2006.
13 MOTTA, Sylvio; BARCHET, Gustavo. Curso de di-
77
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Direito à indenização e direito de resposta


- Direito à segurança
Com vistas à proteção do direito à privacidade, do di- O caput do artigo 5º da Constituição assegura a pro-
reito à personalidade e do direito à imagem, asseguram- teção do direito à segurança. Na qualidade de direito in-
se dois instrumentos, o direito à indenização e o direito de dividual liga-se à segurança do indivíduo como um todo,
resposta, conforme as necessidades do caso concreto. desde sua integridade física e mental, até a própria segu-
Com efeito, prevê o artigo 5º, V, CF: rança jurídica.
No sentido aqui estudado, o direito à segurança pes-
Artigo 5º, V, CF. É assegurado o direito de resposta, soal é o direito de viver sem medo, protegido pela soli-
proporcional ao agravo, além da indenização por dano dariedade e liberto de agressões, logo, é uma maneira de
ma- terial, moral ou à imagem. garantir o direito à vida.
Nesta linha, para Silva16, “efetivamente, esse conjunto
“A manifestação do pensamento é livre e garantida de direitos aparelha situações, proibições, limitações e
em nível constitucional, não aludindo a censura prévia em pro- cedimentos destinados a assegurar o exercício e o
diversões e espetáculos públicos. Os abusos porventura gozo de algum direito individual fundamental (intimidade,
ocorridos no exercício indevido da manifestação do liberda- de pessoal ou a incolumidade física ou moral)”.
pensa- mento são passíveis de exame e apreciação pelo Especificamente no que tange à segurança jurídica,
Poder Ju- diciário com a consequente responsabilidade tem-se o disposto no artigo 5º, XXXVI, CF:
civil e penal de seus autores, decorrentes inclusive de
publicações inju- riosas na imprensa, que deve exercer Artigo 5º, XXXVI, CF. A lei não prejudicará o direito
vigilância e controle da matéria que divulga”14. ad- quirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.
t O direito de resposta é o direito que uma pessoa Pelo inciso restam estabelecidos limites à retroativida-
em de se defender de críticas públicas no mesmo
de da lei.
meio em que foram publicadas garantida exatamente
Define o artigo 6º da Lei de Introdução às Normas do
a mes- ma repercussão. Mesmo quando for garantido
Direito Brasileiro:
o direito de resposta não é possível reverter
plenamente os da- nos causados pela manifestação Artigo 6º, LINDB. A Lei em vigor terá efeito imediato e
ilícita de pensamento, razão pela qual a pessoa inda geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido
fará jus à indenização.
A manifestação ilícita do pensamento geralmente cau- e a coisa julgada.
sa um dano, ou seja, um prejuízo sofrido pelo agente, que § 1º Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado
pode ser individual ou coletivo, moral ou material, econô-
segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou.
mico e não econômico.
§ 2º Consideram-se adquiridos assim os direitos que o
Dano material é aquele que atinge o patrimônio (ma-
seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como
terial ou imaterial) da vítima, podendo ser mensurado fi-
aqueles cujo começo do exercício tenha termo pré-fixo,
nanceiramente e indenizado.
ou condi- ção pré-estabelecida inalterável, a arbítrio de
“Dano moral direto consiste na lesão a um interesse
outrem.
que visa a satisfação ou gozo de um bem jurídico extrapa-
§ 3º Chama-se coisa julgada ou caso julgado a
trimonial contido nos direitos da personalidade (como a decisão judicial de que já não caiba recurso.
vida, a integridade corporal, a liberdade, a honra, o
decoro, a intimidade, os sentimentos afetivos, a própria - Direito à propriedade
imagem) ou nos atributos da pessoa (como o nome, a O caput do artigo 5º da Constituição assegura a
capacidade, o estado de família)”15. prote- ção do direito à propriedade, tanto material quanto
Já o dano à imagem é delimitado no artigo 20 do intelec- tual, delimitada em alguns incisos que o seguem.
Có- digo Civil:
Função social da propriedade material
Artigo 20, CC. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à O artigo 5º, XXII, CF estabelece:
administração da justiça ou à manutenção da ordem públi-
ca, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a Artigo 5º, XXII, CF. É garantido o direito de proprie-
publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma dade.
pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem
pre- juízo da indenização que couber, se lhe atingirem a A seguir, no inciso XXIII do artigo 5º, CF estabelece o
honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se principal fator limitador deste direito:
destinarem a fins comerciais.
Artigo 5º, XXIII, CF. A propriedade atenderá a sua fun-
14 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito ção social.
constitucio- nal. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2011.
15 ZANNONI, Eduardo. El daño en la responsabili-
dad civil. Buenos Aires: Astrea, 1982. 16 SILVA, José Afonso da. Curso de direito
constitu- cional positivo... Op. Cit., p. 437.

78
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

A propriedade, segundo Silva17, “[...] não pode mais


ser considerada como um direito individual nem como A Constituição Federal prevê a possibilidade de desa-
institui- ção do direito privado. [...] embora prevista entre propriação por desatendimento à função social:
os direitos individuais, ela não mais poderá ser
considerada puro direi- to individual, relativizando-se seu Artigo 182, § 4º, CF. É facultado ao Poder Público mu-
conceito e significado, es- pecialmente porque os nicipal, mediante lei específica para área incluída no plano
princípios da ordem econômica são preordenados à vista diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do
da realização de seu fim: assegurar a todos existência solo urbano não edificado, subutilizado ou não utiliza-
digna, conforme os ditames da justiça social. Se é assim, do, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena,
então a propriedade privada, que, ademais, tem que sucessivamente, de:
atender a sua função social, fica vinculada à consecução I - parcelamento ou edificação compulsórios;
daquele princípio”. II - imposto sobre a propriedade predial e territorial ur-
Com efeito, a proteção da propriedade privada está li- bana progressivo no tempo;
mitada ao atendimento de sua função social, sendo este o III - desapropriação com pagamento mediante títulos
requisito que a correlaciona com a proteção da dignidade da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo
da pessoa humana. A propriedade de bens e valores em Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em
geral é um direito assegurado na Constituição Federal e, parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor
como todos os outros, se encontra limitado pelos demais real da indenização e os juros legais19.
princípios con- forme melhor se atenda à dignidade do
ser humano. Artigo 184, CF. Compete à União desapropriar por in-
A Constituição Federal delimita o que se entende por teresse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural
função social: que não esteja cumprindo sua função social, mediante
prévia e justa indenização em títulos da dívida
Art. 182, caput, CF. A política de desenvolvimento agrária, com cláusula de preservação do valor real,
urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do
diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida
pleno desen- volvimento das funções sociais da cidade e em lei20.
garantir o bem-es- tar de seus habitantes.
Artigo 184, § 1º, CF. As benfeitorias úteis e necessárias
Artigo 182, § 1º, CF. O plano diretor, aprovado pela serão indenizadas em dinheiro.
Câma- ra Municipal, obrigatório para cidades com mais de
vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de No que tange à desapropriação por necessidade ou
desenvolvi- mento e de expansão urbana. utilidade pública, prevê o artigo 5º, XXIV, CF:

Artigo 182, § 2º, CF. A propriedade urbana cumpre sua Artigo 5º, XXIV, CF. A lei estabelecerá o procedimento
função social quando atende às exigências fundamentais para desapropriação por necessidade ou utilidade pública,
de ordenação da cidade expressas no plano diretor18. ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização
em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constitui-
Artigo 186, CF. A função social é cumprida quando a ção.
pro- priedade rural atende, simultaneamente, segundo
critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos Ainda, prevê o artigo 182, § 3º, CF:
seguintes requi- sitos:
I - aproveitamento racional e adequado; Artigo 182, §3º, CF. As desapropriações de imóveis
II - utilização adequada dos recursos naturais urba- nos serão feitas com prévia e justa indenização em
disponíveis e preservação do meio ambiente; dinheiro.
III - observância das disposições que regulam as
relações de trabalho;
IV - exploração que favoreça o bem-estar dos 19 Nota-se que antes de se promover a desapropria-
proprietá- rios e dos trabalhadores. ção de imóvel urbano por desatendimento à função social é
necessário tomar duas providências, sucessivas: primeiro, o
Desapropriação parcelamento ou edificação compulsórios; depois, o estabe-
No caso de desrespeito à função social da lecimento de imposto sobre a propriedade predial e territorial
propriedade cabe até mesmo desapropriação do bem, de urbana progressivo no tempo. Se ambas medidas restarem
modo que po- de-se depreender do texto constitucional ineficazes, parte-se para a desapropriação por
duas possibilida- des de desapropriação: por desrespeito à desatendimen- to à função social.
função social e por necessidade ou utilidade pública. 20 A desapropriação em decorrência do desatendimen-
17 SILVA, José Afonso da. Curso de direito to da função social é indenizada, mas não da mesma
constitu- cional positivo. 25. ed. São Paulo: Malheiros, maneira que a desapropriação por necessidade ou utilidade
2006. pública, já que na primeira há violação do ordenamento
18 Instrumento básico de um processo de constitucional pelo proprietário, mas na segunda não. Por
planejamen- to municipal para a implantação da política de isso, indeniza-se em títulos da dívida agrária, que na prática
desenvolvimen- to urbano, norteando a ação dos agentes não são tão valori- zados quanto o dinheiro.
públicos e privados (Lei n. 10.257/2001 - Estatuto da cidade).

79
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Tem-se, ainda o artigo 184, §§ 2º e 3º, CF:


Outra questão reside na chamada tredestinação, pela
qual há a destinação de um bem expropriado
Artigo 184, §2º, CF. O decreto que declarar o imóvel (desapropria- ção) a finalidade diversa da que se
como de interesse social, para fins de reforma agrária, planejou inicialmente. A tredestinação pode ser lícita ou
auto- riza a União a propor a ação de desapropriação. ilícita. Será ilícita quan- do resultante de desvio do
propósito original; e será líci- ta quando a Administração
Artigo 184, §3º, CF. Cabe à lei complementar Pública dê ao bem finalidade diversa, porém preservando
estabelecer procedimento contraditório especial, de rito a razão do interesse público.
sumário, para o processo judicial de desapropriação.
Política agrária e reforma agrária
A desapropriação por utilidade ou necessidade Enquanto desdobramento do direito à propriedade
pública deve se dar mediante prévia e justa indenização imóvel e da função social desta propriedade, tem-se ainda
em dinhei- ro. O Decreto-lei nº 3.365/1941 a disciplina, o artigo 5º, XXVI, CF:
delimitando o procedimento e conceituando utilidade
pública, em seu artigo 5º: Artigo 5º, XXVI, CF. A pequena propriedade rural, as-
sim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não
Artigo 5º, Decreto-lei n. 3.365/1941. Consideram-se será objeto de penhora para pagamento de débitos decor-
ca- sos de utilidade pública: rentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os
a) a segurança nacional; meios de financiar o seu desenvolvimento.
b) a defesa do Estado;
c) o socorro público em caso de calamidade; Assim, se uma pessoa é mais humilde e tem uma pe-
d) a salubridade pública; quena propriedade será assegurado que permaneça com
e) a criação e melhoramento de centros de população, ela e a torne mais produtiva.
seu abastecimento regular de meios de subsistência; A preservação da pequena propriedade em detrimento
f) o aproveitamento industrial das minas e das jazidas dos grandes latifúndios improdutivos é uma das diretrizes-
minerais, das águas e da energia hidráulica; -guias da regulamentação da política agrária brasileira, que
g) a assistência pública, as obras de higiene e tem como principal escopo a realização da reforma agrária.
decoração, casas de saúde, clínicas, estações de clima e Parte da questão financeira atinente à reforma agrária
fontes medici- nais; se encontra prevista no artigo 184, §§ 4º e 5º, CF:
h) a exploração ou a conservação dos serviços públicos;
i) a abertura, conservação e melhoramento de vias ou Artigo 184, §4º, CF. O orçamento fixará anualmente
logradouros públicos; a execução de planos de o volume total de títulos da dívida agrária, assim como o
urbanização; o parcelamento do solo, com ou sem montante de recursos para atender ao programa de
edificação, para sua melhor utilização econômica, higiênica reforma agrária no exercício.
ou estética; a cons- trução ou ampliação de distritos
industriais; Artigo 184, §5º, CF. São isentas de impostos federais,
j) o funcionamento dos meios de transporte coletivo; es- taduais e municipais as operações de transferência de
k) a preservação e conservação dos monumentos imó- veis desapropriados para fins de reforma agrária.
históri- cos e artísticos, isolados ou integrados em
conjuntos urbanos ou rurais, bem como as medidas Como a finalidade da reforma agrária é transformar
necessárias a manter-lhes e realçar-lhes os aspectos mais terras improdutivas e grandes propriedades em atinentes
valiosos ou característicos e, ainda, a proteção de à função social, alguns imóveis rurais não podem ser
paisagens e locais particularmente do- tados pela natureza; abran- gidos pela reforma agrária:
l) a preservação e a conservação adequada de
arquivos, documentos e outros bens moveis de valor Art. 185, CF. São insuscetíveis de desapropriação para
histórico ou ar- tístico; fins de reforma agrária:
m) a construção de edifícios públicos, monumentos co- I - a pequena e média propriedade rural, assim
memorativos e cemitérios; definida em lei, desde que seu proprietário não possua
n) a criação de estádios, aeródromos ou campos de outra;
pou- so para aeronaves; II - a propriedade produtiva.
o) a reedição ou divulgação de obra ou invento de Parágrafo único. A lei garantirá tratamento especial à
natu- reza científica, artística ou literária; propriedade produtiva e fixará normas para o cumprimento
p) os demais casos previstos por leis especiais. dos requisitos relativos a sua função social.

Um grande problema que faz com que processos que Sobre as diretrizes da política agrícola, prevê o artigo
tenham a desapropriação por objeto se estendam é a in- 187:
devida valorização do imóvel pelo Poder Público, que ge-
ralmente pretende pagar valor muito abaixo do devido, Art. 187, CF. A política agrícola será planejada e exe-
ne- cessitando o Judiciário intervir em prol da correta cutada na forma da lei, com a participação efetiva do setor
avaliação. de produção, envolvendo produtores e trabalhadores rurais,
bem como dos setores de comercialização, de armazena-
mento e de transportes, levando em conta, especialmente:

80
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

I - os instrumentos creditícios e fiscais;


Além dos requisitos gerais (animus e posse que seja
II - os preços compatíveis com os custos de produção e públi- ca, pacífica, ininterrupta e contínua), são exigidos os
a garantia de comercialização;
seguintes requisitos específicos:
III - o incentivo à pesquisa e à tecnologia;
a) Área urbana – há controvérsia. Pela teoria da
IV - a assistência técnica e extensão
localiza- ção, área urbana é a que está dentro do perímetro
rural; V - o seguro agrícola;
urbano. Pela teoria da destinação, mais importante que a
VI - o cooperativismo;
localização é a sua utilização. Ex.: se tem fins
VII - a eletrificação rural e irrigação;
agrícolas/pecuários e estiver dentro do perímetro urbana, o
VIII - a habitação para o trabalhador rural.
imóvel é rural. Para fins de usucapião a maioria diz que
§ 1º Incluem-se no planejamento agrícola as prevalece a teoria da localização.
atividades agroindustriais, agropecuárias, pesqueiras e
b) Imóveis até 250 m² – Pode dentro de uma posse
florestais.
maior isolar área de 250m² e ingressar com a ação? A
§ 2º Serão compatibilizadas as ações de política
jurisprudência é pacífica que a posse desde o início deve
agríco- la e de reforma agrária.
ficar restrita a 250m². Predomina também que o terreno
deve ter 250m², não a área construída (a área de um
As terras devolutas e públicas serão destinadas
sobrado, por exemplo, pode ser maior que a de um terreno).
confor- me a política agrícola e o plano nacional de
c) 5 anos – houve controvérsia porque a Constituição
reforma agrá- ria (artigo 188, caput, CF). Neste sentido, “a
Fe- deral de 1988 que criou esta modalidade. E se antes de
alienação ou a concessão, a qualquer título, de terras
05 de outubro de 1988 uma pessoa tivesse há 4 anos dentro
públicas com área superior a dois mil e quinhentos
do limite da usucapião urbana? Predominou que só corria o
hectares a pessoa física ou jurídica, ainda que por
prazo a partir da criação do instituto, não só porque antes
interposta pessoa, dependerá de prévia aprovação do
não existia e o pra- zo não podia correr, como também não
Congresso Nacional”, salvo no caso de alienações ou
se poderia prejudicar o proprietário.
concessões de terras públicas para fins de reforma agrária
d) Moradia sua ou de sua família – não basta ter posse,
(artigo 188, §§ 1º e 2º, CF).
é preciso que a pessoa more, sozinha ou com sua família, ao
Os que forem favorecidos pela reforma agrária (ho-
lon- go de todo o prazo (não só no início ou no final). Logo,
mens, mulheres, ambos, qualquer estado civil) não pode-
não cabe acessio temporis por cessão da posse.
rão negociar seus títulos pelo prazo de 10 anos (artigo
e) Nenhum outro imóvel, nem urbano, nem rural, no
189, CF).
Brasil. O usucapiente não prova isso, apenas alega. Se
Consta, ainda, que “a lei regulará e limitará a aquisição
alguém não qui- ser a usucapião, prova o contrário. Este
ou o arrendamento de propriedade rural por pessoa física
requisito é verificado no momento em que completa 5 anos.
ou jurídica estrangeira e estabelecerá os casos que depen-
Em relação à previsão da usucapião especial rural, destaca-
derão de autorização do Congresso Nacional” (artigo 190,
-se o artigo 191, CF:
CF).
Art. 191, CF. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel
Usucapião
ru- ral ou urbano, possua como seu, por cinco anos
Usucapião é o modo originário de aquisição da pro-
ininterruptos, sem oposição, área de terra, em zona rural, não
priedade que decorre da posse prolongada por um lon-
superior a cinquenta hectares, tornando-a produtiva por seu
go tempo, preenchidos outros requisitos legais. Em outras
trabalho ou de sua famí- lia, tendo nela sua moradia,
palavras, usucapião é uma situação em que alguém tem a
adquirir-lhe-á a propriedade.
posse de um bem por um tempo longo, sem ser incomo-
Parágrafo único. Os imóveis públicos não serão
dado, a ponto de se tornar proprietário.
adquiridos por usucapião.
A Constituição regulamenta o acesso à propriedade
mediante posse prolongada no tempo – usucapião – em
Além dos requisitos gerais (animus e posse que seja
casos específicos, denominados usucapião especial
públi- ca, pacífica, ininterrupta e contínua), são exigidos os
urbana e usucapião especial rural.
seguintes requisitos específicos:
O artigo 183 da Constituição regulamenta a usucapião a) Imóvel rural
especial urbana:
b) 50 hectares, no máximo – há também legislação que
es- tabelece um limite mínimo, o módulo rural (Estatuto da
Art. 183, CF. Aquele que possuir como sua área urbana
Terra). É possível usucapir áreas menores que o módulo rural?
de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco
Tem pre- valecido o entendimento de que pode, mas é
anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para
assunto muito controverso.
sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio,
c) 5 anos – pode ser considerado o prazo antes 05 de
desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou
outu- bro de 1988 (Constituição Federal)? Depende. Se a
rural.
área é de até 25 hectares sim, pois já havia tal possibilidade
§ 1º O título de domínio e a concessão de uso serão
antes da CF/88. Se área for maior (entre 25 ha e 50 ha) não.
conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, indepen-
d) Moradia sua ou de sua família – a pessoa deve morar na
dentemente do estado civil.
área rural.
§ 2º Esse direito não será reconhecido ao mesmo pos- e) Nenhum outro imóvel.
suidor mais de uma vez.
f) O usucapiente, com seu trabalho, deve ter tornado a
§ 3º Os imóveis públicos não serão adquiridos por
área produtiva. Por isso, é chamado de usucapião “pro
usu- capião.
labore”. De- penderá do caso concreto.

81
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Uso temporário
Artigo 48, ADCT. O Congresso Nacional, dentro de cento
No mais, estabelece-se uma terceira limitação ao di- e vinte dias da promulgação da Constituição, elaborará código
reito de propriedade que não possui o caráter definitivo
de defesa do consumidor.
da desapropriação, mas é temporária, conforme artigo 5º,
XXV, CF:
A elaboração do Código de Defesa do Consumidor foi um
grande passo para a proteção da pessoa nas relações de
Artigo 5º, XXV, CF. No caso de iminente perigo públi- consu- mo que estabeleça, respeitando-se a condição de
co, a autoridade competente poderá usar de propriedade
hipossuficiente técnico daquele que adquire um bem ou faz
particular, assegurada ao proprietário indenização
uso de determinado serviço, enquanto consumidor.
ulterior, se houver dano.
Propriedade intelectual
Se uma pessoa tem uma propriedade, numa situação
Além da propriedade material, o constituinte protege tam-
de perigo, o poder público pode se utilizar dela (ex:
bém a propriedade intelectual, notadamente no artigo 5º, XXVII,
montar uma base para capturar um fugitivo), pois o
XXVIII e XXIX, CF:
interesse da coletividade é maior que o do indivíduo
proprietário.
Artigo 5º, XXVII, CF. Aos autores pertence o direito
exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas
Direito sucessório
obras, transmis- sível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar;
O direito sucessório aparece como uma faceta do
direi- to à propriedade, encontrando disciplina Artigo 5º, XXVIII, CF. São assegurados, nos termos da lei:
constitucional no artigo 5º, XXX e XXXI, CF:
a) a proteção às participações individuais em obras
cole- tivas e à reprodução da imagem e voz humanas,
Artigo 5º, XXX, CF. É garantido o direito de herança; inclusive nas atividades desportivas;
b) o direito de fiscalização do aproveitamento
Artigo 5º, XXXI, CF. A sucessão de bens de econômico das obras que criarem ou de que participarem aos
criadores, aos intérpretes e às respectivas representações
estrangei- sindicais e associativas;
ros situados no País será regulada pela lei brasileira em
be- nefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, sempre que Artigo 5º, XXIX, CF. A lei assegurará aos autores de inventos
não lhes seja mais favorável a lei pessoal do de cujus. industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como
proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos
O direito à herança envolve o direito de receber – seja no- mes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em
devido a uma previsão legal, seja por testamento – bens vista o in- teresse social e o desenvolvimento tecnológico e
de uma pessoa que faleceu. Assim, o patrimônio passa econômico do País.
para outra pessoa, conforme a vontade do falecido e/ou
a lei determine. A Constituição estabelece uma disciplina
Assim, a propriedade possui uma vertente intelectual
específica para bens de estrangeiros situados no Brasil, as- que deve ser respeitada, tanto sob o aspecto moral quanto
segurando que eles sejam repassados ao cônjuge e filhos sob o pa- trimonial. No âmbito infraconstitucional brasileiro, a
brasileiros nos termos da lei mais benéfica (do Brasil ou Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, regulamenta os
do país estrangeiro). direitos autorais, isto é, “os direitos de autor e os que lhes são
conexos”.
Direito do consumidor
O artigo 7° do referido diploma considera como obras
Nos termos do artigo 5º, XXXII, CF: inte- lectuais que merecem a proteção do direito do autor os
textos de obras de natureza literária, artística ou científica; as
Artigo 5º, XXXII, CF. O Estado promoverá, na forma da conferências, sermões e obras semelhantes; as obras
lei, a defesa do consumidor. cinematográficas e tele- visivas; as composições musicais;
fotografias; ilustrações; progra- mas de computador;
O direito do consumidor liga-se ao direito à coletâneas e enciclopédias; entre outras.
proprieda- de a partir do momento em que garante à Os direitos morais do autor, que são imprescritíveis, inalie-
pessoa que irá adquirir bens e serviços que estes sejam náveis e irrenunciáveis, envolvem, basicamente, o direito de rei-
entregues e pres- tados da forma adequada, impedindo vindicar a autoria da obra, ter seu nome divulgado na utilização
que o fornecedor se enriqueça ilicitamente, se aproveite desta, assegurar a integridade desta ou modificá-la e retirá-la
de maneira indevida da posição menos favorável e de de circulação se esta passar a afrontar sua honra ou imagem.
vulnerabilidade técnica do consumidor. Já os direitos patrimoniais do autor, nos termos dos artigos
O Direito do Consumidor pode ser considerado um 41 a 44 da Lei nº 9.610/98, prescrevem em 70 anos contados
ramo recente do Direito. No Brasil, a legislação que o re- do primeiro ano seguinte à sua morte ou do falecimento do
gulamentou foi promulgada nos anos 90, qual seja a Lei último coautor, ou contados do primeiro ano seguinte à
nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, conforme divulgação da obra se esta for de natureza audiovisual ou
determinado pela Constituição Federal de 1988, que fotográfica. Estes, por sua vez, abrangem, basicamente, o
também estabele- ceu no artigo 48 do Ato das direito de dispor sobre a reprodução, edição, adaptação,
Disposições Constitucionais Transitórias: tradução, utilização, inclusão em bases de dados ou qualquer
outra modalidade de utilização; sendo que estas modalidades
de utilização podem se dar a título oneroso ou gratuito.

82
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

“Os direitos autorais, também conhecidos como co-


pyright (direito de cópia), são considerados bens móveis, Assim, dentro da noção de acesso à justiça, diversos
podendo ser alienados, doados, cedidos ou locados. Res- aspectos podem ser destacados: de um lado, deve criar-se
salte-se que a permissão a terceiros de utilização de cria- o Poder Judiciário e se disponibilizar meios para que todas
ções artísticas é direito do autor. [...] A proteção consti- as pessoas possam buscá-lo; de outro lado, não basta ga-
rantir meios de acesso se estes forem insuficientes, já que
tucional abrange o plágio e a contrafação. Enquanto que
para que exista o verdadeiro acesso à justiça é necessário
o primeiro caracteriza-se pela difusão de obra criada ou
que se aplique o direito material de maneira justa e célere.
produzida por terceiros, como se fosse própria, a segunda
Relacionando-se à primeira onda de acesso à justiça,
configura a reprodução de obra alheia sem a necessária
permissão do autor”21. prevê a Constituição em seu artigo 5º, XXXV:

- Direitos de acesso à justiça Artigo 5º, XXXV, CF. A lei não excluirá da apreciação
do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.
A formação de um conceito sistemático de acesso à
justiça se dá com a teoria de Cappelletti e Garth, que
O princípio da inafastabilidade da jurisdição é o
apon- taram três ondas de acesso, isto é, três
princí- pio de Direito Processual Público subjetivo,
posicionamentos básicos para a realização efetiva de tal
também cunha- do como Princípio da Ação, em que a
acesso. Tais ondas foram percebidas paulatinamente com
Constituição garante a necessária tutela estatal aos
a evolução do Di- reito moderno conforme
conflitos ocorrentes na vida em sociedade. Sempre que
implementadas as bases da onda anterior, quer dizer,
uma controvérsia for levada ao Poder Judiciário,
ficou evidente aos autores a emergên- cia de uma nova
preenchidos os requisitos de admissibili- dade, ela será
onda quando superada a afirmação das premissas da
resolvida, independentemente de haver ou não previsão
onda anterior, restando parcialmente imple- mentada específica a respeito na legislação.
(visto que até hoje enfrentam-se obstáculos ao pleno
Também se liga à primeira onda de acesso à justiça,
atendimento em todas as ondas).
no que tange à abertura do Judiciário mesmo aos menos
Primeiro, Cappelletti e Garth22 entendem que surgiu favorecidos economicamente, o artigo 5º, LXXIV, CF:
uma onda de concessão de assistência judiciária aos po-
bres, partindo-se da prestação sem interesse de
Artigo 5º, LXXIV, CF. O Estado prestará assistência
remunera- ção por parte dos advogados e, ao final, jurí- dica integral e gratuita aos que comprovarem
levando à criação de um aparato estrutural para a insuficiên- cia de recursos.
prestação da assistência pelo Estado.
Em segundo lugar, no entender de Cappelletti e O constituinte, ciente de que não basta garantir o
Garth23, veio a onda de superação do problema na aces- so ao Poder Judiciário, sendo também necessária a
representação dos interesses difusos, saindo da efeti- vidade processual, incluiu pela Emenda
concepção tradicional de processo como algo restrito a Constitucional nº 45/2004 o inciso LXXVIII ao artigo 5º da
apenas duas partes indivi- dualizadas e ocasionando o Constituição:
surgimento de novas institui- ções, como o Ministério
Público. Artigo 5º, LXXVIII, CF. A todos, no âmbito judicial e ad-
Finalmente, Cappelletti e Garth24 apontam uma ministrativo, são assegurados a razoável duração do pro-
terceira onda consistente no surgimento de uma cesso e os meios que garantam a celeridade de sua trami-
concepção mais ampla de acesso à justiça, considerando o tação.
conjunto de ins- tituições, mecanismos, pessoas e
procedimentos utilizados: “[...] esse enfoque encoraja a Com o tempo se percebeu que não bastava garantir
exploração de uma ampla variedade de reformas, o acesso à justiça se este não fosse célere e eficaz. Não
incluindo alterações nas formas de procedimento, significa que se deve acelerar o processo em detrimento
mudanças na estrutura dos tribunais ou a criação de de direitos e garantias assegurados em lei, mas sim que é
novos tribunais, o uso de pessoas leigas ou pa- preciso proporcionar um trâmite que dure nem mais e
raprofissionais, tanto como juízes quanto como nem menos que o necessário para a efetiva realização da
defensores, modificações no direito substantivo justiça no caso concreto.
destinadas a evitar li- tígios ou facilitar sua solução e a
utilização de mecanismos privados ou informais de - Direitos constitucionais-penais
solução dos litígios. Esse enfoque, em suma, não receia
inovações radicais e compreensivas, que vão muito além Juiz natural e vedação ao juízo ou tribunal de ex-
da esfera de representação judicial”. ceção
Quando o artigo 5º, LIII, CF menciona:
21 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fun-
damentais: teoria geral, comentários aos artigos 1º a 5º da Artigo 5º, LIII, CF. Ninguém será processado nem sen-
Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e ju- tenciado senão pela autoridade competente”, consolida o
risprudência. São Paulo: Atlas, 1997. princípio do juiz natural que assegura a toda pessoa o
22 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à direito de conhecer previamente daquele que a julgará no
Justiça. Tradução Ellen Grace Northfleet. Porto Alegre: Sér- processo em que seja parte, revestindo tal juízo em
gio Antônio Fabris Editor, 1998, p. 31-32. jurisdição com- petente para a matéria específica do caso
23 Ibid., p. 49-52 antes mesmo do fato ocorrer.
24 Ibid., p. 67-73

83
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Por sua vez, um desdobramento deste princípio


Ainda no que tange ao princípio da anterioridade, tem-se
encon- tra-se no artigo 5º, XXXVII, CF:
o artigo 5º, XL, CF:
Artigo 5º, XXXVII, CF. Não haverá juízo ou tribunal de
Artigo 5º, XL, CF. A lei penal não retroagirá, salvo para be-
ex- ceção.
neficiar o réu.
Juízo ou Tribunal de Exceção é aquele especialmente
criado para uma situação pretérita, bem como não O dispositivo consolida outra faceta do princípio da
reconhe- cido como legítimo pela Constituição do país. ante- rioridade: se, por um lado, é necessário que a lei tenha
definido um fato como crime e dado certo tratamento penal
Tribunal do júri a este fato (ex.: pena de detenção ou reclusão, tempo de
pena, etc.) antes que ele ocorra; por outro lado, se vier uma
A respeito da competência do Tribunal do júri, prevê o
artigo 5º, XXXVIII, CF: lei posterior ao fato que o exclua do rol de crimes ou que
confira tratamento mais benéfico (diminuindo a pena ou
alterando o regime de cumpri- mento, notadamente), ela
Artigo 5º, XXXVIII. É reconhecida a instituição do júri,
com a organização que lhe der a lei, assegurados: será aplicada. Restam consagrados tanto o princípio da
a) a plenitude de defesa; irretroatividade da lei penal in pejus quanto
b) o sigilo das votações; o da retroatividade da lei penal mais benéfica.
c) a soberania dos veredictos;
Menções específicas a crimes
d) a competência para o julgamento dos crimes
dolosos contra a vida. O artigo 5º, XLI, CF estabelece:

Artigo 5º, XLI, CF. A lei punirá qualquer discriminação


O Tribunal do Júri é formado por pessoas do povo,
que julgam os seus pares. Entende-se ser direito atentatória dos direitos e liberdades fundamentais.
fundamental o de ser julgado por seus iguais, membros da
sociedade e não magistrados, no caso de determinados Sendo assim confere fórmula genérica que remete ao
crimes que por sua natureza possuem fortes fatores de prin- cípio da igualdade numa concepção ampla, razão
influência emocional. pela qual práticas discriminatórias não podem ser aceitas. No
entanto, o constituinte entendeu por bem prever tratamento
Plenitude da defesa envolve tanto a autodefesa quanto
a defesa técnica e deve ser mais ampla que a denominada específico a certas práticas criminosas.
am- pla defesa assegurada em todos os procedimentos Neste sentido, prevê o artigo 5º, XLII, CF:
judiciais e administrativos.
Sigilo das votações envolve a realização de votações Artigo 5º, XLII, CF. A prática do racismo constitui crime
se- cretas, preservando a liberdade de voto dos que inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão,
compõem o conselho que irá julgar o ato praticado. nos termos da lei.
A decisão tomada pelo conselho é soberana. Contudo,
a soberania dos veredictos veda a alteração das decisões A Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989 define os
dos jurados, não a recorribilidade dos julgamentos do crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor. Contra
Tribunal do Júri para que seja procedido novo julgamento eles não cabe fiança (pagamento de valor para deixar a
uma vez cas- sada a decisão recorrida, haja vista preservar prisão provisó- ria) e não se aplica o instituto da prescrição
o ordenamento jurídico pelo princípio do duplo grau de (perda de pretensão de se processar/punir uma pessoa pelo
jurisdição. decurso do tempo).
Por fim, a competência para julgamento é dos crimes Não obstante, preconiza ao artigo 5º, XLIII, CF:
do- losos (em que há intenção ou ao menos se assume o
risco de produção do resultado) contra a vida, que são: Artigo 5º, XLIII, CF. A lei considerará crimes
homicídio, aborto, induzimento, instigação ou auxílio a inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática
suicídio e infan- ticídio. Sua competência não é absoluta e da tortura, o tráfi- co ilícito de entorpecentes e drogas afins,
é mitigada, por vezes, pela própria Constituição (artigos o terrorismo e os de- finidos como crimes hediondos, por
29, X / 102, I, b) e c) eles respondendo os man- dantes, os executores e os que,
podendo evitá-los, se omitirem.
/ 105, I, a) / 108, I).

Anterioridade e irretroatividade da lei Anistia, graça e indulto diferenciam-se nos seguintes


ter- mos: a anistia exclui o crime, rescinde a condenação e
O artigo 5º, XXXIX, CF preconiza:
extingue totalmente a punibilidade, a graça e o indulto
apenas extin- guem a punibilidade, podendo ser parciais; a
Artigo5º, XXXIX, CF. Não há crime sem lei anterior que
o defina, nem pena sem prévia cominação legal. anistia, em regra, atinge crimes políticos, a graça e o
indulto, crimes comuns; a anistia pode ser concedida pelo
Poder Legislativo, a graça e o indulto são de competência
É a consagração da regra do nullum crimen nulla
poena sine praevia lege. Simultaneamente, se assegura o exclusiva do Presidente da Repú- blica; a anistia pode ser
princípio da legalidade (ou reserva legal), na medida em concedida antes da sentença final ou depois da
que não há crime sem lei que o defina, nem pena sem condenação irrecorrível, a graça e o indulto pressu- põem o
prévia cominação legal, e o princípio da anterioridade, trânsito em julgado da sentença condenatória; graça e
posto que não há crime sem lei anterior que o defina. o indulto apenas extinguem a punibilidade, persistindo os
efei- tos do crime, apagados na anistia; graça é em regra
individual e solicitada, enquanto o indulto é coletivo e
espontâneo.
84
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Não cabe graça, anistia ou indulto (pode-se


considerar que o artigo o abrange, pela doutrina Pelo princípio da individualização da pena, a pena
majoritária) contra crimes de tortura, tráfico, terrorismo deve ser individualizada nos planos legislativo, judiciário e
(TTT) e hediondos (previstos na Lei nº 8.072 de 25 de exe- cutório, evitando-se a padronização a sanção penal.
julho de 1990). Além disso, são crimes que não aceitam A in- dividualização da pena significa adaptar a pena ao
fiança. conde- nado, consideradas as características do agente e
Ainda, prevê o artigo 5º, XLIV, CF: do delito. A pena privativa de liberdade é aquela que
restringe, com maior ou menor intensidade, a liberdade
Artigo 5º, XLIV, CF. Constitui crime inafiançável e im- do condena- do, consistente em permanecer em algum
prescritível a ação de grupos armados, civis ou estabelecimento
militares, contra a ordem constitucional e o Estado prisional, por um determinado tempo.
Democrático. A pena de multa ou patrimonial opera uma diminuição
do patrimônio do indivíduo delituoso.
Por fim, dispõe a CF sobre a possibilidade de extradi- A prestação social alternativa corresponde às penas
ção de brasileiro naturalizado caso esteja envolvido com restritivas de direitos, autônomas e substitutivas das penas
tráfico ilícito de entorpecentes: privativas de liberdade, estabelecidas no artigo 44 do Có-
digo Penal.
Artigo 5º, LI, CF. Nenhum brasileiro será extraditado, Por seu turno, a individualização da pena deve
salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado também se fazer presente na fase de sua execução,
antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento conforme se de- preende do artigo 5º, XLVIII, CF:
em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na
for- ma da lei. Artigo 5º, XLVIII, CF. A pena será cumprida em estabe-
lecimentos distintos, de acordo com a natureza do
Personalidade da pena delito, a idade e o sexo do apenado.
A personalidade da pena encontra respaldo no artigo
5º, XLV, CF: A distinção do estabelecimento conforme a natureza
do delito visa impedir que a prisão se torne uma
Artigo 5º, XLV, CF. Nenhuma pena passará da pessoa faculdade do crime. Infelizmente, o Estado não possui
do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e aparato sufi- ciente para cumprir tal diretiva,
a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, diferenciando, no máximo, o nível de segurança das
es- tendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o prisões. Quanto à idade, desta- cam-se as Fundações
limite do valor do patrimônio transferido. Casas, para cumprimento de medida por menores
infratores. Quanto ao sexo, prisões costumam ser
O princípio da personalidade encerra o comando de o exclusivamente para homens ou para mulheres.
crime ser imputado somente ao seu autor, que é, por seu Também se denota o respeito à individualização da
turno, a única pessoa passível de sofrer a sanção. Seria fla-
pena nesta faceta pelo artigo 5º, L, CF:
grante a injustiça se fosse possível alguém responder
pelos atos ilícitos de outrem: caso contrário, a reação, ao
Artigo 5º, L, CF. Às presidiárias serão asseguradas
invés de restringir-se ao malfeitor, alcançaria inocentes.
con- dições para que possam permanecer com seus filhos
Contudo, se uma pessoa deixou patrimônio e faleceu, este
duran- te o período de amamentação.
patrimônio responderá pelas repercussões financeiras do
ilícito.
Preserva-se a individualização da pena porque é
Individualização da pena toma- da a condição peculiar da presa que possui filho no
A individualização da pena tem por finalidade concre- perío- do de amamentação, mas também se preserva a
tizar o princípio de que a responsabilização penal é dignidade da criança, não a afastando do seio materno de
sempre pessoal, devendo assim ser aplicada conforme as maneira precária e impedindo a formação de vínculo pela
peculia- ridades do agente. amamen- tação.
A primeira menção à individualização da pena se en-
contra no artigo 5º, XLVI, CF: Vedação de determinadas penas
O constituinte viu por bem proibir algumas espécies
Artigo 5º, XLVI, CF. A lei regulará a individualização de penas, consoante ao artigo 5º, XLVII, CF:
da pena e adotará, entre outras, as seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade; Artigo 5º, XLVII, CF. não haverá penas:
b) perda de bens; a) de morte, salvo em caso de guerra declarada,
c) multa; nos termos do art. 84, XIX;
d) prestação social alternativa; b) de caráter perpétuo;
e) suspensão ou interdição de direitos. c) de trabalhos forçados;
d) de banimento;
e) cruéis.

85
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Em resumo, o inciso consolida o princípio da humani-


Devido processo legal, contraditório e ampla defesa
dade, pelo qual o “poder punitivo estatal não pode aplicar
sanções que atinjam a dignidade da pessoa humana ou Estabelece o artigo 5º, LIV, CF:
que lesionem a constituição físico-psíquica dos
condenados”25 . Quanto à questão da pena de morte, Artigo 5º, LIV, CF. Ninguém será privado da liberdade
percebe-se que o constituinte não estabeleceu uma total ou de seus bens sem o devido processo legal.
vedação, autorizan- do-a nos casos de guerra declarada.
Obviamente, deve-se respeitar o princípio da Pelo princípio do devido processo legal a legislação
anterioridade da lei, ou seja, a le- gislação deve prever a deve ser respeitada quando o Estado pretender punir al-
pena de morte ao fato antes dele ser praticado. No guém judicialmente. Logo, o procedimento deve ser livre
ordenamento brasileiro, este papel é cumpri- do pelo de vícios e seguir estritamente a legislação vigente, sob
Código Penal Militar (Decreto-Lei nº 1.001/1969), que pena de nulidade processual.
prevê a pena de morte a ser executada por fuzilamento Surgem como corolário do devido processo legal o
nos casos tipificados em seu Livro II, que aborda os crimes contraditório e a ampla defesa, pois somente um procedi-
militares em tempo de guerra. mento que os garanta estará livre dos vícios. Neste
Por sua vez, estão absolutamente vedadas em quais- sentido, o artigo 5º, LV, CF:
quer circunstâncias as penas de caráter perpétuo, de
traba- lhos forçados, de banimento e cruéis. Artigo 5º, LV, CF. Aos litigantes, em processo judicial ou
No que tange aos trabalhos forçados, vale destacar administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o
que o trabalho obrigatório não é considerado um trata- contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a
mento contrário à dignidade do recluso, embora o ela inerentes.
trabalho forçado o seja. O trabalho é obrigatório, dentro
das condi- ções do apenado, não podendo ser cruel ou O devido processo legal possui a faceta formal, pela
menosprezar a capacidade física e intelectual do qual se deve seguir o adequado procedimento na aplica-
condenado; como o trabalho não existe independente da ção da lei e, sendo assim, respeitar o contraditório e a am-
educação, cabe in- centivar o aperfeiçoamento pessoal; pla defesa. Não obstante, o devido processo legal tem sua
até mesmo porque o trabalho deve se aproximar da faceta material que consiste na tomada de decisões justas,
realidade do mundo exter- no, será remunerado; além que respeitem os parâmetros da razoabilidade e da pro-
disso, condições de dignidade e segurança do porcionalidade.
trabalhador, como descanso semanal e equi- pamentos
de proteção, deverão ser respeitados. Vedação de provas ilícitas
Conforme o artigo 5º, LVI, CF:
Respeito à integridade do preso
Prevê o artigo 5º, XLIX, CF: Artigo 5º, LVI, CF. São inadmissíveis, no processo, as
pro- vas obtidas por meios ilícitos.
Artigo 5º, XLIX, CF. É assegurado aos presos o respeito
à integridade física e moral.
Provas ilícitas, por força da nova redação dada ao arti-
go 157 do CPP, são as obtidas em violação a normas
Obviamente, o desrespeito à integridade física e mo-
cons- titucionais ou legai, ou seja, prova ilícita é a que
ral do preso é uma violação do princípio da dignidade da
viola regra de direito material, constitucional ou legal, no
pessoa humana.
Dois tipos de tratamentos que violam esta integridade momento da sua obtenção. São vedadas porque não se
estão mencionados no próprio artigo 5º da Constituição pode aceitar o descumprimento do ordenamento para
Federal. Em primeiro lugar, tem-se a vedação da tortura e fazê-lo cumprir: seria paradoxal.
de tratamentos desumanos e degradantes (artigo 5º, III,
CF), o que vale na execução da pena. Presunção de inocência
No mais, prevê o artigo 5º, LVIII, CF: Prevê a Constituição no artigo 5º, LVII:

Artigo 5º, LVIII, CF. O civilmente identificado não será Artigo 5º, LVII, CF. Ninguém será considerado culpado
submetido a identificação criminal, salvo nas hipóteses até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.
previstas em lei.
Consolida-se o princípio da presunção de inocência,
Se uma pessoa possui identificação civil, não há por- pelo qual uma pessoa não é culpada até que, em
que fazer identificação criminal, colhendo digitais, fotos, definitivo, o Judiciário assim decida, respeitados todos os
etc. Pensa-se que seria uma situação constrangedora des- princípios e garantias constitucionais.
necessária ao suspeito, sendo assim, violaria a integridade
moral. Ação penal privada subsidiária da pública
Nos termos do artigo 5º, LIX, CF:
25 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito
penal. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. v. 1.

86
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Artigo 5º, LIX, CF. Será admitida ação privada nos


Por isso mesmo, o auto de prisão em flagrante e a ata
cri- mes de ação pública, se esta não for intentada no
do depoimento do interrogatório são assinados pelas au-
prazo legal.
toridades envolvidas nas práticas destes atos procedimen-
tais.
A chamada ação penal privada subsidiária da pública Ainda, a legislação estabelece inúmeros requisitos
encontra respaldo constitucional, assegurando que a para que a prisão seja validada, sem os quais cabe
omis- são do poder público na atividade de persecução relaxamento, tanto que assim prevê o artigo 5º, LXV, CF:
criminal não será ignorada, fornecendo-se instrumento
para que o interessado a proponha. Artigo 5º, LXV, CF. A prisão ilegal será imediatamente
relaxada pela autoridade judiciária.
Prisão e liberdade
O constituinte confere espaço bastante extenso no ar- Desta forma, como decorrência lógica, tem-se a previ-
tigo 5º em relação ao tratamento da prisão, notadamente são do artigo 5º, LXVI, CF:
por se tratar de ato que vai contra o direito à liberdade.
Obviamente, a prisão não é vedada em todos os casos, Artigo 5º, LXVI, CF. Ninguém será levado à prisão ou
por- que práticas atentatórias a direitos fundamentais nela mantido, quando a lei admitir a liberdade
implicam na tipificação penal, autorizando a restrição da provisória, com ou sem fiança.
liberdade daquele que assim agiu.
No inciso LXI do artigo 5º, CF, prevê-se: Mesmo que a pessoa seja presa em flagrante, devido
ao princípio da presunção de inocência, entende-se que
Artigo 5º, LXI, CF. Ninguém será preso senão em fla- ela não deve ser mantida presa quando não preencher os
grante delito ou por ordem escrita e fundamentada de requisitos legais para prisão preventiva ou temporária.
autoridade judiciária competente, salvo nos casos de trans-
Indenização por erro judiciário
gressão militar ou crime propriamente militar, definidos em
A disciplina sobre direitos decorrentes do erro judiciá-
lei.
rio encontra-se no artigo 5º, LXXV, CF:
Logo, a prisão somente se dará em caso de flagran- Artigo 5º, LXXV, CF. O Estado indenizará o condenado
te delito (necessariamente antes do trânsito em julgado), por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do
ou em caráter temporário, provisório ou definitivo (as tempo fixado na sentença.
duas primeiras independente do trânsito em julgado,
preenchi- dos requisitos legais e a última pela Trata-se do erro em que incorre um juiz na apreciação
irreversibilidade da condenação). e julgamento de um processo criminal, resultando em
Aborda-se no artigo 5º, LXII o dever de comunicação con- denação de alguém inocente. Neste caso, o Estado
ao juiz e à família ou pessoa indicada pelo preso: inde- nizará. Ele também indenizará uma pessoa que ficar
presa além do tempo que foi condenada a cumprir.
Artigo 5º, LXII, CF. A prisão de qualquer pessoa e o lo-
cal onde se encontre serão comunicados imediatamente 4) Direitos fundamentais implícitos
ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por Nos termos do § 2º do artigo 5º da Constituição Fe-
ele indicada. deral:

Não obstante, o preso deverá ser informado de todos Artigo 5º, §2º, CF. Os direitos e garantias expressos
os seus direitos, inclusive o direito ao silêncio, podendo nesta Constituição não excluem outros decorrentes do
entrar em contato com sua família e com um advogado, regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados
conforme artigo 5º, LXIII, CF: internacio- nais em que a República Federativa do Brasil
seja parte.
Artigo 5º, LXIII, CF. O preso será informado de seus di-
Daí se depreende que os direitos ou garantias podem
reitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe
estar expressos ou implícitos no texto constitucional. Sen-
assegurada a assistência da família e de advogado. do assim, o rol enumerado nos incisos do artigo 5º é ape-
nas exemplificativo, não taxativo.
Estabelece-se no artigo 5º, LXIV, CF:
5) Tratados internacionais incorporados ao
Artigo 5º, LXIV, CF. O preso tem direito à ordena- mento interno
identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu Estabelece o artigo 5º, § 2º, CF que os direitos e
interrogatório policial. garan- tias podem decorrer, dentre outras fontes, dos
“tratados internacionais em que a República Federativa
do Brasil seja parte”.

87
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Para o tratado internacional ingressar no ordenamen-


Logo, a partir da alteração constitucional, os tratados
to jurídico brasileiro deve ser observado um
de direitos humanos que ingressarem no ordenamento ju-
procedimento complexo, que exige o cumprimento de
rídico brasileiro, versando sobre matéria de direitos huma-
quatro fases: a ne- gociação (bilateral ou multilateral, com nos, irão passar por um processo de aprovação
posterior assinatura do Presidente da República), semelhante ao da emenda constitucional.
submissão do tratado assina- do ao Congresso Nacional Contudo, há posicionamentos conflituosos quanto à
(que dará referendo por meio do decreto legislativo), possibilidade de considerar como hierarquicamente cons-
ratificação do tratado (confirmação da obrigação perante titucional os tratados internacionais de direitos humanos
a comunidade internacional) e a pro- mulgação e que ingressaram no ordenamento jurídico brasileiro ante-
publicação do tratado pelo Poder Executivo 26. riormente ao advento da referida emenda. Tal discussão
Notadamente, quando o constituinte menciona os se deu com relação à prisão civil do depositário infiel,
tratados internacionais no §2º do artigo 5º refere-se prevista como legal na Constituição e ilegal no Pacto de
àqueles que tenham por fulcro ampliar o rol de direitos São José da Costa Rica (tratado de direitos humanos
do artigo 5º, ou seja, tratado internacional de direitos aprovado antes da EC nº 45/04), sendo que o Supremo
humanos. Tribunal Federal firmou o entendimento pela
O §1° e o §2° do artigo 5° existiam de maneira supralegalidade do tratado de direitos humanos anterior à
originá- ria na Constituição Federal, conferindo o caráter Emenda (estaria numa posição que paralisaria a eficácia da
de prima- zia dos direitos humanos, desde logo lei infraconstitucional, mas não revogaria a Constituição
consagrando o prin- cípio da primazia dos direitos no ponto controverso).
humanos, como reconhecido pela doutrina e
jurisprudência majoritários na época. “O princípio da 6) Tribunal Penal Internacional
primazia dos direitos humanos nas relações internacionais Preconiza o artigo 5º, CF em seu § 4º:
implica em que o Brasil deve incorporar os tratados
Artigo 5º, §4º, CF. O Brasil se submete à jurisdição de
quanto ao tema ao ordenamento interno brasilei- ro e
Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifes-
respeitá-los. Implica, também em que as normas vol-
tado adesão.
tadas à proteção da dignidade em caráter universal
devem ser aplicadas no Brasil em caráter prioritário em O Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional
relação a outras normas”27. foi promulgado no Brasil pelo Decreto nº 4.388 de 25 de
Regra geral, os tratados internacionais comuns ingres- se- tembro de 2002. Ele contém 128 artigos e foi
sam com força de lei ordinária no ordenamento jurídico elaborado em Roma, no dia 17 de julho de 1998, regendo
brasileiro porque somente existe previsão constitucional a competência e o funcionamento deste Tribunal voltado
quanto à possibilidade da equiparação às emendas às pessoas res- ponsáveis por crimes de maior gravidade
consti- tucionais se o tratado abranger matéria de direitos com repercussão internacional (artigo 1º, ETPI).
huma- nos. Antes da emenda alterou o quadro quanto “Ao contrário da Corte Internacional de Justiça, cuja
aos trata- dos de direitos humanos, era o que acontecia, ju- risdição é restrita a Estados, ao Tribunal Penal
mas isso não significa que tais direitos eram menos Internacional compete o processo e julgamento de
importantes devido ao princípio da primazia e ao violações contra indi- víduos; e, distintamente dos
reconhecimento dos direitos implícitos. Tribunais de crimes de guerra da Iugoslávia e de Ruanda,
Por seu turno, com o advento da Emenda Constitucio- criados para analisarem crimes cometidos durante esses
nal nº 45/04 se introduziu o §3º ao artigo 5º da Consti- conflitos, sua jurisdição não está restrita a uma situação
tuição Federal, de modo que os tratados internacionais de específica”28.
direitos humanos foram equiparados às emendas consti- Resume Mello29: “a Conferência das Nações Unidas
tucionais, desde que houvesse a aprovação do tratado em so- bre a criação de uma Corte Criminal Internacional,
reunida em Roma, em 1998, aprovou a referida Corte. Ela
cada Casa do Congresso Nacional e obtivesse a votação
é perma- nente. Tem sede em Haia. A corte tem
em dois turnos e com três quintos dos votos dos
personalidade inter- nacional. Ela julga: a) crime de
respectivos membros:
genocídio; b) crime contra a humanidade; c) crime de
guerra; d) crime de agressão. Para o crime de genocídio
Art. 5º, § 3º, CF. Os tratados e convenções interna- usa a definição da convenção de 1948. Como crimes
cionais sobre direitos humanos que forem aprovados, contra a humanidade são citados: assassinato, escravidão,
em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por prisão violando as normas inter- nacionais, violação
três quintos dos votos dos respectivos membros, serão tortura, apartheid, escravidão sexual, prostituição forçada,
equivalen- tes às emendas constitucionais. esterilização, etc. São crimes de guer- ra: homicídio
internacional, destruição de bens não justifi- cada pela
guerra, deportação, forçar um prisioneiro a servir nas
26 VICENTE SOBRINHO, Benedito. Direitos forças inimigas, etc.”.
Fundamentais e Prisão Civil. Porto Alegre: Sérgio
28 NEVES, Gustavo Bregalda. Direito Internacional
An- tonio Fabris Editor, 2008. Público & Direito Internacional Privado. 3. ed. São Paulo:
27 PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Atlas, 2009.
Direito Internacional Público e Privado. Salvador: 29 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de
JusPodi- vm, 2009. Direito Internacional Público. 14. ed. São Paulo: Saraiva,
2000.

88
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Direitos sociais
Há se ressaltar também que o Estado não possui ape-
A Constituição Federal, dentro do Título II, aborda no nas um papel direto na promoção dos direitos
capítulo II a categoria dos direitos sociais, em sua maioria
econômicos, sociais e culturais, mas também um indireto,
normas programáticas e que necessitam de uma postura
quando por meio de sua gestão permite que os indivíduos
interventiva estatal em prol da implementação.
adquiram condições para sustentarem suas necessidades
Os direitos assegurados nesta categoria encontram pertencen- tes a esta categoria de direitos.
menção genérica no artigo 6º, CF:
2) Reserva do possível e mínimo existencial
Artigo 6º, CF. Art. 6º São direitos sociais a educação, a
Os direitos sociais serão concretizados gradualmente,
saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o
notadamente porque estão previstos em normas progra-
transpor- te, o lazer, a segurança, a previdência social,
máticas e porque a implementação deles gera um ônus
a proteção à maternidade e à infância, a assistência
para o Estado. Diferentemente dos direitos individuais,
aos desampa- rados, na forma desta Constituição.
que dependem de uma postura de abstenção estatal, os
direi- tos sociais precisam que o Estado assuma um papel
Trata-se de desdobramento da perspectiva do Estado ativo em prol da efetivação destes.
Social de Direito. Em suma, são elencados os direitos
A previsão excessiva de direitos sociais no bojo de
huma- nos de 2ª dimensão, notadamente conhecidos
uma Constituição, a despeito de um instante bem-
como direi- tos econômicos, sociais e culturais. Em
intencionado de palavras promovido pelo constituinte,
resumo, os direitos sociais envolvem prestações positivas
pode levar à ne- gativa, paradoxal – e, portanto,
do Estado (diferente dos de liberdade, que referem-se à
inadmissível – consequên- cia de uma Carta Magna cujas
postura de abstenção estatal), ou seja, políticas estatais
finalidades não condigam com seus próprios prescritos,
que visem consolidar o princípio da igualdade não apenas
fato que deslegitima o Poder Público como determinador
formalmente, mas ma- terialmente (tratando os desiguais
de que particulares respeitem os direitos fundamentais, já
de maneira desigual).
que sequer eles próprios, os administradores, conseguem
Por seu turno, embora no capítulo específico do Título cumprir o que consta de seu Estatuto Máximo30.
II que aborda os direitos sociais não se perceba uma
Tecnicamente, nos direitos sociais é possível invocar
intensa regulamentação destes, à exceção dos direitos
a cláusula da reserva do possível como argumento para a
trabalhistas, o Título VIII da Constituição Federal, que
não implementação de determinado direito social – seja
aborda a ordem social, se concentra em trazer normativas
pela absoluta ausência de recursos (reserva do possível fá-
mais detalhadas a respeitos de direitos indicados como
tica), seja pela ausência de previsão orçamentária nos ter-
sociais.
mos do artigo 167, CF (reserva do possível jurídica).
O Ministro Celso de Mello afirmou em julgamento
1) Igualdade material e efetivação dos direitos so- que os direitos sociais “não pode converter-se em
ciais
promessa constitucional inconsequente, sob pena de o
Independentemente da categoria de direitos que Poder Públi- co, fraudando justas expectativas nele
este- ja sendo abordada, a igualdade nunca deve aparecer
depositadas pela co- letividade, substituir, de maneira
num sentido meramente formal, mas necessariamente
ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por
material. Significa que discriminações indevidas são
um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao
proibidas, mas existem certas distinções que não só
que determina a própria Lei Fundamental do Estado”31.
devem ser aceitas, como também se mostram essenciais.
Sendo assim, a invocação da cláusula da reserva do
No que tange aos direitos sociais percebe-se que a possível, embora viável, não pode servir de muleta para
igualdade material assume grande relevância. Afinal, esta
que o Estado não arque com obrigações básicas. Neste
categoria de direitos pressupõe uma postura ativa do Es-
viés, geralmente, quando invocada a cláusula é afastada,
tado em prol da efetivação. Nem todos podem arcar com
entendendo o Poder Judiciário que não cabe ao Estado se
suas despesas de saúde, educação, cultura, alimentação e
eximir de garantir direitos sociais com o simples argumen-
moradia, assim como nem todos se encontram na posição
to de que não há orçamento específico para isso – ele de-
de explorador da mão-de-obra, sendo a grande maioria
veria ter reservado parcela suficiente de suas finanças para
da população de explorados. Estas pessoas estão numa
atender esta demanda.
clara posição de desigualdade e caberá ao Estado cuidar
Com efeito, deve ser preservado o mínimo existencial,
para que progressivamente atinjam uma posição de
que tem por fulcro limitar a discricionariedade político-ad-
igualdade real, já que não é por conta desta posição
ministrativa e estabelecer diretrizes orçamentárias básicas
desfavorável que se pode afirmar que são menos dignos,
a serem seguidas, sob pena de caber a intervenção do
menos titulares de direitos fundamentais.
Poder Judiciário em prol de sua efetivação.
Logo, a efetivação dos direitos sociais é uma meta a
ser alcançada pelo Estado em prol da consolidação da
30 LAZARI, Rafael José Nadim de. Reserva do
igual- dade material. Sendo assim, o Estado buscará o
possí- vel e mínimo existencial: a pretensão de eficácia da
crescente aperfeiçoamento da oferta de serviços públicos
norma constitucional em face da realidade. Curitiba: Juruá,
com quali- dade para que todos os nacionais tenham 2012, p. 56-57.
garantidos seus direitos fundamentais de segunda
31 RTJ 175/1212-1213, Rel. Min. CELSO DE MELLO.
dimensão da maneira mais plena possível.

89
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

3) Princípio da proibição do retrocesso


VII - garantia de padrão de qualidade.
Proibição do retrocesso é a impossibilidade de que
VIII - piso salarial profissional nacional para os
uma conquista garantida na Constituição Federal sofra um
profissio- nais da educação escolar pública, nos termos de
retrocesso, de modo que um direito social garantido não
lei federal.
pode deixar de o ser.
Parágrafo único. A lei disporá sobre as categorias de
Conforme jurisprudência, a proibição do retrocesso
tra- balhadores considerados profissionais da educação
deve ser tomada com reservas, até mesmo porque segun-
básica e sobre a fixação de prazo para a elaboração ou
do entendimento predominante as normas do artigo 7º,
adequação de seus planos de carreira, no âmbito da União,
CF não são cláusula pétrea, sendo assim passíveis de alte-
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
ração. Se for alterada normativa sobre direito trabalhista
assegurado no referido dispositivo, não sendo o prejuízo
Art. 207. As universidades gozam de autonomia didá-
evidente, entende-se válida (por exemplo, houve alteração
tico-científica, administrativa e de gestão financeira e pa-
do prazo prescricional diferenciado para os trabalhadores
trimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade
agrícolas). O que, em hipótese alguma, pode ser aceito é
entre ensino, pesquisa e extensão.
um retrocesso evidente, seja excluindo uma categoria de
§ 1º É facultado às universidades admitir professores,
direitos (ex.: abolir o Sistema Único de Saúde), seja dimi-
técnicos e cientistas estrangeiros, na forma da lei.
nuindo sensivelmente a abrangência da proteção (ex.: ex-
§ 2º O disposto neste artigo aplica-se às instituições
cluindo o ensino médio gratuito).
de pesquisa científica e tecnológica.
Questão polêmica se refere à proibição do retrocesso:
se uma decisão judicial melhorar a efetivação de um
Art. 208. O dever do Estado com a educação será efeti-
direito social, ela se torna vinculante e é impossível ao
vado mediante a garantia de:
legislador alterar a Constituição para retirar este avanço?
I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4
Por um lado, a proibição do retrocesso merece ser
(quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada
tomada em conceito amplo, abrangendo inclusive
inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não
decisões judiciais; por outro lado, a decisão judicial não
tiveram acesso na idade própria;
tem por fulcro alterar a norma, o que somente é feito pelo
II - progressiva universalização do ensino médio gratui-
legislador, e ele teria o direito de prever que aquela
to;
decisão judicial não está incorporada na proibição do
III - atendimento educacional especializado aos porta-
retrocesso. A questão é polêmica e não há entendimento
dores de deficiência, preferencialmente na rede regular de
dominante.
ensino;
IV - educação infantil, em creche e pré-escola, às crian-
ças até 5 (cinco) anos de idade;
CAPÍTULO III
V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da
DA EDUCAÇÃO, DA CULTURA E DO DESPORTO pesqui- sa e da criação artística, segundo a capacidade de
cada um; VI - oferta de ensino noturno regular, adequado
Seção I
às con-
DA EDUCAÇÃO dições do educando;
VII - atendimento ao educando, em todas as etapas da
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado educação básica, por meio de programas suplementares de
e da família, será promovida e incentivada com a colabo- material didático escolar, transporte, alimentação e
ração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da assistên- cia à saúde.
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua § 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é
qua- lificação para o trabalho. direito público subjetivo.
§ 2º O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo
Art. 206. O ensino será ministrado com base nos Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabi-
seguin- tes princípios: lidade da autoridade competente.
I - igualdade de condições para o acesso e § 3º Compete ao Poder Público recensear os educan-
permanência na escola; dos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar,
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar junto aos pais ou responsáveis, pela frequência à escola.
o pensamento, a arte e o saber;
III - pluralismo de ideias e de concepções Art. 209. O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas
pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e as seguintes condições:
privadas de ensino; I - cumprimento das normas gerais da educação nacio-
IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos nal;
oficiais;
II - autorização e avaliação de qualidade pelo Poder
V - valorização dos profissionais da educação escolar, Pú- blico.
garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com
ingresso exclusivamente por concurso público de provas e
Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensi-
títulos, aos das redes públicas; no fundamental, de maneira a assegurar formação básica
VI - gestão democrática do ensino público, na forma da
comum e respeito aos valores culturais e artísticos,
lei; nacionais e regionais.

90
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§ 1º O ensino religioso, de matrícula facultativa, cons-


tituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas Art. 213. Os recursos públicos serão destinados às
de ensino fundamental. escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas
§ 2º O ensino fundamental regular será ministrado em comunitárias, confes- sionais ou filantrópicas, definidas em
língua portuguesa, assegurada às comunidades indígenas lei, que:
também a utilização de suas línguas maternas e processos I - comprovem finalidade não-lucrativa e apliquem
próprios de aprendizagem. seus excedentes financeiros em educação;
II - assegurem a destinação de seu patrimônio a outra
es- cola comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao
Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os
Mu- nicípios organizarão em regime de colaboração seus Poder Pú- blico, no caso de encerramento de suas
siste- mas de ensino. atividades.
§ 1º A União organizará o sistema federal de ensino e § 1º - Os recursos de que trata este artigo poderão ser
o dos Territórios, financiará as instituições de ensino pú- destinados a bolsas de estudo para o ensino fundamental
blicas federais e exercerá, em matéria educacional, função e médio, na forma da lei, para os que demonstrarem
redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização insuficiên- cia de recursos, quando houver falta de vagas e
de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qua- cursos regula- res da rede pública na localidade da
lidade do ensino mediante assistência técnica e financeira residência do educando, ficando o Poder Público obrigado
aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios; a investir prioritariamente na expansão de sua rede na
§ 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino localidade.
fundamental e na educação infantil. § 2º As atividades de pesquisa, de extensão e de
estímulo e fomento à inovação realizadas por
§ 3º Os Estados e o Distrito Federal atuarão
universidades e/ou por instituições de educação profissional
prioritaria- mente no ensino fundamental e médio.
e tecnológica poderão re- ceber apoio financeiro do Poder
§ 4º Na organização de seus sistemas de ensino, a
Público.
União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios
defini- rão formas de colaboração, de modo a assegurar a
univer- salização do ensino obrigatório. Art. 214. A lei estabelecerá o plano nacional de
educação, de duração decenal, com o objetivo de articular o
§ 5º A educação básica pública atenderá prioritaria-
mente ao ensino regular. sistema na- cional de educação em regime de colaboração
e definir dire- trizes, objetivos, metas e estratégias de
implementação para assegurar a manutenção e
Art. 212. A União aplicará, anualmente, nunca menos
desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e
de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios
modalidades por meio de ações inte- gradas dos poderes
vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de
públicos das diferentes esferas federativas que conduzam a:
impostos, compreendida a proveniente de transferências,
I - erradicação do analfabetismo;
na manutenção e desenvolvimento do ensino.
§ 1º A parcela da arrecadação de impostos transferida II - universalização do atendimento
pela União aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municí- escolar; III - melhoria da qualidade do
pios, ou pelos Estados aos respectivos Municípios, não é ensino;
IV - formação para o trabalho;
considerada, para efeito do cálculo previsto neste artigo,
receita do governo que a transferir. V - promoção humanística, científica e tecnológica do
§ 2º Para efeito do cumprimento do disposto no País. VI - estabelecimento de meta de aplicação de recursos
pú- blicos em educação como proporção do produto interno
«caput» deste artigo, serão considerados os sistemas de
ensino federal, estadual e municipal e os recursos bruto.
aplicados na forma do art. 213.
§ 3º A distribuição dos recursos públicos assegurará O artigo 6º da Constituição Federal menciona o
prioridade ao atendimento das necessidades do ensino direito à educação como um de seus direitos sociais. A
obrigatório, no que se refere a universalização, garantia de educação proporciona o pleno desenvolvimento da pessoa,
padrão de qualidade e equidade, nos termos do plano na- não apenas capacitando-a para o trabalho, mas também
cional de educação. para a vida so- cial como um todo. Contudo, a educação
tem um custo para o Estado, já que nem todos podem
§ 4º Os programas suplementares de alimentação e
as- sistência à saúde previstos no art. 208, VII, serão arcar com o custeio de ensino privado.
financia- dos com recursos provenientes de contribuições No título VIII, que aborda a ordem social, delimita-se a
sociais e outros recursos orçamentários. questão da obrigação do Estado com relação ao direito à
educação, assim como menciona-se quais outros agentes
§ 5º A educação básica pública terá como fonte
adicio- nal de financiamento a contribuição social do responsáveis pela efetivação deste direito.
salário-edu- cação, recolhida pelas empresas na forma da Neste sentido, o artigo 205, CF, prevê: “A educação,
lei. direito de todos e dever do Estado e da família, será
§ 6º As cotas estaduais e municipais da arrecadação promovida e in- centivada com a colaboração da sociedade,
da contribuição social do salário-educação serão visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo
distribuídas proporcionalmente ao número de alunos para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
matriculados na educação básica nas respectivas redes trabalho”.
públicas de ensino. Resta claro que a educação não é um dever exclusivo
do Estado, mas da sociedade como um todo e,
principalmente, da família. Depreende-se que educação
vai além do mero aprendizado de conteúdos e envolve a
educação para a cida- dania e o comportamento ético em
sociedade – a educação da qual o constituinte fala não é
apenas a formal, mas tam- bém a informal.
91
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Por seu turno, o artigo 206 da Constituição estabelece


Interessante notar, em primeira análise, que o Estado
os princípios que devem guiar o ensino:
se exime da obrigatoriedade no fornecimento de
- “igualdade de condições para o acesso e
educação superior, no art. 208, V, quando assegura,
permanência na escola”, que significa a compreensão de apenas, o “aces- so” aos níveis mais elevados de ensino,
que a educação é um direito de todos e não apenas dos pesquisa e criação artística. Fica denotada ausência de
mais favorecidos, cabendo ao Estado investir para que os comprometimento orçamentário e infraestrutural estatal
menos favorecidos ingressem e permaneçam na escola; com um número su- ficiente de universidades/faculdades
- “liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar públicas aptas a re- cepcionar o maciço contingente de
o pensamento, a arte e o saber”, de forma que o ensino alunos que saem da camada básica de ensino, sendo, pois,
tem um caráter ativo e passivo, indo além da clarividente exemplo de aplicação da reserva do possível
compreensão de conteúdos dogmático se abrangendo dentro da Constituição. Ainda, é preciso observar que se
também os pro- cessos criativos; utiliza a expressão “se- gundo a capacidade de cada um”,
- “pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, de forma que o critério para admissão em
e coexistência de instituições públicas e privadas de universidades/faculdades públicas é, so- mente, pelo
ensino”, de modo que não se entende haver um único preparo intelectual do cidadão, a ser testado em
método de ensino, uma única maneira de aprender, avaliações com tal fito, como o vestibular e o exame
permitindo a ex- ploração das atividades educacionais nacional do ensino médio.
também por institui- nos O ensino básico possui conteúdos mínimos, fixados
moldes do artigo 210, CF. A menção do ensino religio-
ções privadas. A respeito das instituições privadas, o artigo so como facultativo remete à laicidade do Estado, ao passo
209, CF prevê que “o ensino é livre à iniciativa privada,
aten-
didas as seguintes condições: I - cumprimento das normas que a menção ao ensino de línguas de povos indígenas
gerais da educação nacional; II - autorização e avaliação remete ao pluralismo político, fundamento da República
de qualidade pelo Poder Público”; Federativa.
- “gratuidade do ensino público em estabelecimentos O artigo 211, CF trabalha com a organização e colabo-
oficiais”, sendo esta a principal vertente de ração dos sistemas de ensino entre os entes federativos.
implementação do direito à educação pelo Estado; Por sua vez, os artigos 212 e 213 da Constituição
- “valorização dos profissionais da educação escolar, traba- lham com aspectos orçamentários:
garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com Encerrando a disciplina da educação, o artigo 214 tra-
ingres- so exclusivamente por concurso público de provas balha com o plano nacional de educação, de duração de-
e títu- los, aos das redes públicas”, bem como “piso cenal (na atualidade, estamos no início da implementação
salarial pro- fissional nacional para os profissionais da do PNE cuja duração se estende até o ano de 2024 32), que
tem metas ali descritas.
educação escolar pública, nos termos de lei federal”, pois
sem a valorização dos profissionais responsáveis pelo
ensino será inatingível o seu aperfeiçoamento. Além disso, BRASIL. LEI Nº 8.069, DE 13 DE JULHO DE 1990.
“a lei disporá sobre as categorias de trabalhadores DISPÕE SOBRE O ESTATUTO DA CRIANÇA DO
considerados profissionais da educação básica e sobre a ADOLESCENTE-ECA.
fixação de prazo para a elabora- ção ou adequação de
seus planos de carreira, no âmbito da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios” (artigo 206,
parágrafo único, CF);
- “gestão democrática do ensino público, na forma da Noções introdutórias e disciplina constitucional
lei”, remetendo ao direito de participação popular na
toma- da de decisões políticas referentes às atividades de Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Es-
ensino; e tado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com
- “garantia de padrão de qualidade”, posto que sem absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimenta-
qualidade de ensino é impossível atingir uma melhoria na ção, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
qualificação pessoal e profissional dos nacionais. dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar
O ensino universitário encontra respaldo no artigo e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma
207 da Constituição, tendo autonomia didático-científica, de negligência, discriminação, exploração, violência,
ad- ministrativa e de gestão financeira e patrimonial, e crueldade e opressão.
sendo baseado na tríade ensino-pesquisa-extensão, § 1º O Estado promoverá programas de assistência
disciplina que se estende a instituições de pesquisa integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem,
científica e tec- nológica. Com vistas ao aperfeiçoamento ad- mitida a participação de entidades não
desta tríade, au- toriza-se a contratação de profissionais governamentais, mediante políticas específicas e
estrangeiros. obedecendo aos seguintes preceitos:
I - aplicação de percentual dos recursos públicos desti-
Enquanto que os artigos 205 e 206 da Constituição
nados à saúde na assistência materno-infantil;
possuem uma menor densidade normativa, colacionando
princípios diretores e ideias basilares, o artigo 208 volta-se 32 http://pne.mec.gov.br/
à regulamentação do modo pelo qual o Estado efetivará o
direito à educação.

92
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

II - criação de programas de prevenção e


§ 8º A lei estabelecerá:
atendimen- to especializado para as pessoas portadoras
de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de I - o estatuto da juventude, destinado a regular os di-
integração social do adolescente e do jovem portador reitos dos jovens;
de deficiência, me- diante o treinamento para o trabalho II - o plano nacional de juventude, de duração dece-
e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e nal, visando à articulação das várias esferas do poder
serviços coletivos, com a eli- minação de obstáculos públi- co para a execução de políticas públicas.
arquitetônicos e de todas as formas de discriminação.
§ 2º A lei disporá sobre normas de construção dos No caput do artigo 227, CF se encontra uma das prin-
lo- gradouros e dos edifícios de uso público e de cipais diretrizes do direito da criança e do adolescente
fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de que é o princípio da prioridade absoluta. Significa que
garantir acesso adequado às pessoas portadoras de cada criança e adolescente deve receber tratamento
deficiência. especial do Estado e ser priorizado em suas políticas
§ 3º O direito a proteção especial abrangerá os públicas, pois são o futuro do país e as bases de
seguin- tes aspectos: construção da sociedade.
I - idade mínima de quatorze anos para admissão A Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 dispõe sobre o
ao trabalho, observado o disposto no art. 7º, XXXIII; Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras
II - garantia de direitos previdenciários e trabalhis- providên- cias, seguindo em seus dispositivos a ideologia
tas; do princí- pio da absoluta prioridade.
III - garantia de acesso do trabalhador adolescente e No §1º do artigo 227 aborda-se a questão da
jovem à escola; assistên- cia à saúde da criança e do adolescente. Do
IV - garantia de pleno e formal conhecimento da inciso I se de- preende a intrínseca relação entre a
atribuição de ato infracional, igualdade na relação proteção da criança e do adolescente com a proteção da
pro- cessual e defesa técnica por profissional maternidade e da infân- cia, mencionada no artigo 6º, CF.
habilitado, se- gundo dispuser a legislação tutelar Já do inciso II se depreen- de a proteção de outro grupo
específica; vulnerável, que é a pessoa portadora de deficiência,
V - obediência aos princípios de brevidade, excepcio- valendo lembrar que o Decreto nº 6.949, de 25 de agosto
nalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em de 2009, que promulga a Convenção Internacional sobre
de- senvolvimento, quando da aplicação de qualquer os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo
medida privativa da liberdade; Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de
VI - estímulo do Poder Público, através de assistência 2007, foi promulgado após aprovação no Congresso
jurídica, incentivos fiscais e subsídios, nos termos da lei, Nacional nos moldes da Emenda Constitucional nº
ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou 45/2004, tendo força de norma constitucional e não de lei
ado- lescente órfão ou abandonado; ordinária. A preocupação com o direito da pessoa porta-
VII - programas de prevenção e atendimento dora de deficiência se estende ao §2º do artigo 227, CF: “a
especia- lizado à criança, ao adolescente e ao jovem lei disporá sobre normas de construção dos logradouros
dependente de entorpecentes e drogas afins. e dos edifícios de uso público e de fabricação de
§ 4º A lei punirá severamente o abuso, a violência e veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso
a exploração sexual da criança e do adolescente. adequado às pessoas portadoras de deficiência”.
§ 5º A adoção será assistida pelo Poder Público, na A proteção especial que decorre do princípio da prio-
forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua ridade absoluta está prevista no §3º do artigo 227. Liga-se,
efe- tivação por parte de estrangeiros. ainda, à proteção especial, a previsão do §4º do artigo
§ 6º Os filhos, havidos ou não da relação do casa- 227: “A lei punirá severamente o abuso, a violência e a
mento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qua- explora- ção sexual da criança e do adolescente”.
lificações, proibidas quaisquer designações
Tendo em vista o direito de toda criança e
discriminatórias relativas à filiação.
adolescente de ser criado no seio de uma família, o §5º do
§ 7º No atendimento dos direitos da criança e do ado-
artigo 227 da Constituição prevê que “a adoção será
lescente levar-se-á em consideração o disposto no art.
assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que
20433.
estabelecerá casos e condi- ções de sua efetivação por
33 Art. 204. As ações governamentais na área da parte de estrangeiros”. Neste sentido, a Lei nº 12.010, de 3
as- sistência social serão realizadas com recursos do de agosto de 2009, dispõe sobre a adoção.
orça- mento da seguridade social, previstos no art. 195,
além de outras fontes, e organizadas com base nas
seguintes diretrizes: I - descentralização político- todos os níveis. Parágrafo único. É facultado aos Estados
administrativa, cabendo a coordenação e as normas e ao Distrito Federal vincular a programa de apoio à in-
gerais à esfera fede- ral e a coordenação e a execução clusão e promoção social até cinco décimos por cento de
dos respectivos progra- mas às esferas estadual e sua receita tributária líquida, vedada a aplicação desses
municipal, bem como a entida- des beneficentes e de recursos no pagamento de: I - despesas com pessoal e
assistência social; II - participação da população, por encargos sociais; II - serviço da dívida; III - qualquer outra
meio de organizações representativas, na formulação despesa corrente não vinculada diretamente aos investi-
das políticas e no controle das ações em mentos ou ações apoiados.

93
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

A igualdade entre os filhos, quebrando o paradigma


Nesta frequência, o direito à proteção especial abran-
da Constituição anterior e do até então vigente Código
gerá os seguintes aspectos (art. 227, §3º, CF):
Civil de 1916 consta no artigo 227, § 6º, CF: “os filhos,
- A idade mínima de dezesseis anos para admissão ao
havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, trabalho, salvo a partir dos quatorze anos, na condição de
terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas aprendiz (inciso I de acordo com o art. 7º, XXXIII, CF, pós-
quaisquer de- signações discriminatórias relativas à al- teração promovida pela Emenda Constitucional nº
filiação”. 20/98);
Quando o artigo 227 dispõe no § 7º que “no atendi- - A garantia de direitos previdenciários e trabalhistas
mento dos direitos da criança e do adolescente levar-se-á (inciso II);
em consideração o disposto no art. 204” tem em vista a - A garantia de acesso ao trabalhador adolescente e
adoção de práticas de assistência social, com recursos da jovem à escola (inciso III);
seguridade social, em prol da criança e do adolescente. - A garantia de pleno e formal conhecimento da atri-
Por seu turno, o artigo 227, § 8º, CF, preconiza: “A lei buição do ato infracional, igualdade na relação processual
es- tabelecerá: I - o estatuto da juventude, destinado a e defesa técnica por profissional habilitado, segundo dis-
regular os direitos dos jovens; II - o plano nacional de puser a legislação tutelar específica (inciso IV);
juventude, de duração decenal, visando à articulação das - A obediência aos princípios de brevidade, excepcio-
várias esferas do poder público para a execução de nalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em de-
políticas públicas”. A Lei nº 12.852, de 5 de agosto de senvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida
2013, institui o Estatuto da Juventude e dispõe sobre os privativa de liberdade (inciso V);
direitos dos jovens, os princí- pios e diretrizes das políticas - O estímulo do Poder Público, através de assistência
públicas de juventude e o Sis- tema Nacional de jurídica, incentivos fiscais e subsídios, nos termos da lei, ao
acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou
Juventude - SINAJUVE. Mais informações sobre a Política
adoles- cente órfão ou abandonado (inciso VI);
mencionada no inciso II e sobre a Secretaria e o Conselho
- Programas de prevenção e atendimento especializa-
Nacional de Juventude que direcionam a im- plementação
do à criança, ao adolescente e ao jovem dependente de
dela podem ser obtidas na rede34. entorpecentes e drogas afins (inciso VII).
Aprofundando o tema, a cabeça do art. 227, da Lei Prosseguindo, o parágrafo sexto, do art. 227, da Cons-
Fun- damental, preconiza ser dever da família, da tituição, garante o “Princípio da Igualdade entre os Filhos”,
sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente ao dispor que os filhos, havidos ou não da relação do ca-
e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à samento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à quali- ficações, proibidas quaisquer designações
profissionalização, à cultura, à dig- nidade, ao respeito, à discriminatórias relativas à filiação.
liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de Assim, com a Constituição Federal, os filhos não têm
colocá-los a salvo de toda forma de negligência, mais “valor” para efeito de direitos alimentícios e suces-
discriminação, exploração, violência, cruelda- de e sórios. Não se pode falar em um filho receber metade da
opressão. parte que originalmente lhe cabia por ser “bastardo”, en-
A leitura do art. 227, caput, da Constituição Federal quanto aquele fruto da sociedade conjugal receber a
permite concluir que se adotou, neste país, a chamada quan- tia integral. Aliás, nem mesmo a expressão “filho
“Doutrina da Proteção Integral da Criança”, ao lhe assegu- bastardo” pode mais ser utilizada, por representar uma
rar a absoluta prioridade em políticas públicas, medidas forma de dis- criminação designatória.
sociais, decisões judiciais, respeito aos direitos humanos, Também, o art. 229 traz uma “via de mão dupla” entre
e observância da dignidade da pessoa humana. Neste pais e filhos, isto é, os pais têm o dever de assistir, criar e
sen- tido, o parágrafo único, do art. 5º, do “Estatuto da educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever
de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfer-
Crian- ça e do Adolescente”, prevê que a garantia de
midade. Tal dispositivo, inclusive, permite que os filhos
prioridade compreende a primazia de receber proteção
pe- çam alimentos aos pais, e que os pais peçam
e socorro em quaisquer circunstâncias (alínea “a”), a alimentos aos filhos.
precedência de atendimento nos serviços públicos ou de Por fim, há se mencionar o acrescentado parágrafo oi-
relevância pública (alínea “b”), a preferência na formulação tavo (pela Emenda Constitucional nº 65/2010), ao art. 227,
e na execução das políticas sociais públicas (alínea “c”), e a da Constituição Federal, segundo o qual a lei estabelecerá
destinação privi- legiada de recursos públicos nas áreas o estatuto da juventude, destinado a regular os direitos
relacionadas com a proteção à infância e à juventude dos jovens (inciso I), e o plano nacional de juventude, de
(alínea “d”). du- ração decenal, visando à articulação das várias esferas
Ademais, a proteção à criança, ao adolescente e ao jo- do poder público para a execução de políticas públicas
vem representa incumbência atribuída não só ao Estado, (inciso II). Nada obstante a exigência constitucional desde
mas também à família e à sociedade. Sendo assim, há se 2010, somente bem recentemente o Estatuto da
prestar bastante atenção nas provas de concurso, tendo Juventude foi aprovado (Lei nº 12.852/2013), como visto
em vista que só se costuma colocar o Estado como acima, carecen- do, ainda, o Plano Nacional de Juventude
observador da “Doutrina da Proteção Integral”, sendo que de maior regula- mentação infraconstitucional.
isso também compete à família e à sociedade.

34 http://www.juventude.gov.br/politica

94
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Evolução histórica No Brasil, no final do século XIX e início do século XX,


foi instituído no Rio de Janeiro o Instituto de Proteção e
Na Grécia antiga, a criança era colocada numa posição Assis- tência à Infância, primeiro estabelecimento público
de inferioridade, tida como um ser irracional, sem capaci- nacional de atendimento a crianças e adolescentes. Em
dade de tomar qualquer tipo de decisão. Trata-se de seguida, veio a Lei nº 4.242/1921, que autorizou o governo a
marco da cultura grega, que enxergava apenas poucos organizar o Serviço de Assistência e Proteção à Infância
homens de posses como cidadãos. Estes homens Abandonada e Dellinquente. Em 1927 foi aprovado o primeiro
concentravam para si o pátrio poder, isto é, o poder do Código de Menores. Em 1941, du- rante o governo Vargas,
pai. Devido ao pátrio poder, o pai de família concentrava foi criado o Serviço de Assistência ao Me- nor, cujo fim era
em suas mãos plena possibilidade de gerir a vida das dar tratamento penal teoricamente diferenciado aos menores
crianças e adolescentes e estes não tinham nenhuma (na prática, eram tratados como criminosos co- muns). Em
possibilidade de participar destas decisões. Na Idade 1964 surge a Política Nacional do Bem-estar do Menor (Lei nº
Média se manteve o sistema do “pátrio poder”. As 4.513/1964), que criou a FUNABEM. Surge novo Código de
crianças eram submetidas ao absoluto poder do pai e Menores em 1979 (Lei nº 6.697), cujo objeto era a proteção e
seus destinos seguiam a mesma sorte. vigi- lância de crianças e adolescentes em situação irregular.
A partir da Idade Moderna, com o Renascimento e o Na década de 80 começa um movimento de reelaboração da
Iluminismo, as crianças e os adolescentes saíram ligeira- concepção de infância e juventude. O destaque repercute na
mente da margem social. A moral da época passa a impor Constituição Fede- ral de 1988 e no Estatuto da Criança e do
aos pais o dever de educar seus filhos. Entretanto, a Adolescente de 1990, que revogou o Código de Menores e
educa- ção costumava ser oferecida apenas aos homens. substituiu a doutrina da situação irregular pela doutrina da
Aqueles que possuíam melhores condições enviavam seus proteção integral35.
filhos para estudarem nas universidades que começavam
a des- pontar na Europa, aqueles que possuíam condições Relações jurídicas no direito da criança e do
piores ao menos passavam a ensinar seus ofícios a estes adolescente
jovens. Já as meninas permaneciam marginalizadas das
atividades educacionais e profissionalizantes, apenas lhes “As relações jurídicas são formas qualificadas de relações
era ensina- do como desempenhar atividades domésticas. in- terpessoais, indicando, assim, a ligação entre pessoas, em
Desde o final da Revolução Francesa e, com destaque, razão de algum objeto, devidamente regulada pelo direito.
a partir da Revolução Industrial, que alterou substancial- Desta for- ma, o Direito da Criança e do Adolescente, sob o
aspecto objetivo e formal, representa a disciplina das relações
mente os modos e métodos de produção, a criança e o
jurídicas entre Crian- ças e Adolescentes, de um lado, e de
adolescente passam a ocupar papel central na sociedade,
outro, a família, a comunida- de, a sociedade e o próprio
desempenhando atividades trabalhistas de caráter equiva-
Estado. [...] Percebemos que a inten- ção dos doutrinadores e
lente a dos adultos. Foram vítimas de inúmeros acidentes do próprio legislador foi, sempre, criar uma doutrina da
de trabalho, morriam em meio à insalubridade das proteção integral não somente para a Criança, como, ainda,
fábricas, então movidas predominantemente a carvão. Foi para o Adolescente, ambos ainda em desenvolvi- mento,
apenas com a emergência da Organização Internacional posto que, somente com o término da adolescência é que o
do Traba- lho – OIT, em 1919, que aos poucos se menor completará o processo de aquisição de mecanismos
consolidou uma consciência a respeito da necessidade de mentais relacionados ao pensamento, percepção,
se limitar a parti- cipação das crianças e adolescentes no reconhecimen- to, classificação etc. [...] Com isso, o Estatuto
espaço de trabalho. Este foi o estopim para o da Criança e do Ado- lescente, sabiamente, se preocupou em
reconhecimento da condição es- pecial da criança e do envolver não somente a família, mas, ainda, a comunidade, a
adolescente. sociedade e o próprio Esta- do, para que todos, em conjunto,
Internacionalmente, a proteção efetiva da criança e exerçam seus direitos e deveres sem oprimir aqueles que, em
do adolescente começa a tomar corpo com o reconheci- condição inferior, viviam a mercê da sociedade. Mas, qual a
mento internacional dos direitos humanos e a fundação razão dessa inclusão tão abrangente? Pois bem, a intenção do
da UNICEF. A UNICEF, inicialmente conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente foi conferir ao menor,
Fundo Internacional de Emergência das Nações Unidas de forma integral, todas as condições para que o mesmo
para as Crianças, foi criada em dezembro de 1946 para possa desenvolver-se plenamente, evitando-se, com isso, que
ajudar as crianças da Europa vítimas da II Guerra Mundial. haja alguma deficiência em sua formação. Desta forma, a
No início da década de 50 o seu mandato foi alargado melhor solução apresentada pelo legislador foi incluir todos os
para respon- der às necessidades das crianças e das segmentos da sociedade, para que ninguém ficasse isento
mães nos países em desenvolvimento. Em 1953, torna-se de qualquer responsabilidade, uma vez que a doutrina da
uma agência per- manente das Nações Unidas, e passa a proteção integral apresentada pelo Estatuto da Criança e do
ocupar-se especial- mente das crianças dos países mais Adolescen- te exige a participação de todos, sem qualquer
pobres da África, Ásia, América Latina e Médio Oriente. exceção”36. Com efeito, o objeto formal do direito da criança e
do adolescente é a proteção jurídica especial da criança e do
Passa então a designar-se Fundo das Nações Unidas para
adolescente. Já o objeto material é a própria criança ou
a Infância, mas mantém a sigla que a tornara conhecida
adolescente.
em todo o mundo – UNICEF. Desde então, sobrevieram no
âmbito das Nações Unidas documentos bastante 35 DEZEM, Guilherme Madeira; AGUIRRE, João
relevantes sobre a condição jurídica peculiar da criança, já Ri- cardo Brandão; FULLER, Paulo Henrique Aranda.
estudados neste material. Estatu- to da Criança e do Adolescente. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2009. (Coleção Elementos do
Direito)
36 MENDES, Moacyr Pereira. As relações jurídicas
decorrentes do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Âmbito Jurídico, Rio Grande, XII, n. 70, nov. 2009.
95
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Princípios Sem pretender estabelecer uma definição fechada ou


plena, é possível conceituar dignidade da pessoa humana
Não se pode olvidar que os princípios sempre desem- como o principal valor do ordenamento ético e, por con-
penharam um importante papel social, mas foi somente
sequência, jurídico que pretende colocar a pessoa humana
na atual dogmática jurídica que eles adquiriram
como um sujeito pleno de direitos e obrigações na or-
normativida- de. Hoje em dia, os princípios servem para
dem internacional e nacional, cujo desrespeito acarreta a
condensar va- lores, dar unidade ao sistema e condicionar
própria exclusão de sua personalidade.
a atividade do intérprete. Os princípios são normas
Aponta Barroso39: “o princípio da dignidade da pessoa
jurídicas, não meros conteúdos axiológicos, aceitando
humana identifica um espaço de integridade moral a ser
aplicação autônoma37.
assegurado a todas as pessoas por sua só existência no
Em resumo, a teoria dos princípios chega à presente mundo. É um respeito à criação, independente da crença
fase do Pós-positivismo com os seguintes resultados já
que se professe quanto à sua origem. A dignidade rela-
consolidados: a passagem dos princípios da especulação
ciona-se tanto com a liberdade e valores do espírito como
metafísica e abstrata para o campo concreto e positivo do
com as condições materiais de subsistência”.
Direito, com baixíssimo teor de densidade normativa; a
O Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira,
transição crucial da ordem jusprivatista (sua antiga inser-
do Tribunal Superior do Trabalho, trouxe interessante
ção nos Códigos) para a órbita juspublicística (seu
conceito numa das decisões que relatou: “a dignidade
ingresso nas Constituições); a suspensão da distinção
consiste na percepção intrínseca de cada ser humano a
clássica entre princípios e normas; o deslocamento dos
respeito dos direitos e obrigações, de modo a assegurar,
princípios da es- fera da jusfilosofia para o domínio da
sob o foco de condições existenciais mínimas, a
Ciência Jurídica; a proclamação de sua normatividade; a
participação saudável e ativa nos destinos escolhidos, sem
perda de seu cará- ter de normas programáticas; o
que isso importe des- tilação dos valores soberanos da
reconhecimento definitivo de sua positividade e
democracia e das liber- dades individuais. O processo de
concretude por obra sobretudo das Constituições; a
valorização do indivíduo articula a promoção de escolhas,
distinção entre regras e princípios, como espécies
posturas e sonhos, sem olvidar que o espectro de
diversificadas do gênero norma, e, finalmente, por
abrangência das liberdades in- dividuais encontra
expressão máxima de todo esse desdobramento doutriná-
limitação em outros direitos fundamen- tais, tais como a
rio, o mais significativo de seus efeitos: a total hegemonia
honra, a vida privada, a intimidade, a ima- gem. Sobreleva
e preeminência dos princípios38.
registrar que essas garantias, associadas ao princípio da
No campo do direito da criança e do adolescente, al- dignidade da pessoa humana, subsistem como conquista
guns princípios assumem destaque, entre eles: da humanidade, razão pela qual auferiram pro- teção
a) Princípio da prioridade absoluta: previsto nos ar- especial consistente em indenização por dano moral
tigos 227, CF e 4º, ECA preconiza que é dever de todos – decorrente de sua violação”40.
Estado, sociedade, comunidade e família – assegurar com
Para Reale41, a evolução histórica demonstra o
absoluta prioridade direitos fundamentais às crianças e
domínio de um valor sobre o outro, ou seja, a existência
adolescentes. Por isso, estabelece-se com primazia a ado-
de uma ordem gradativa entre os valores; mas existem os
ção de políticas públicas, a destinação de recursos e a
valores fundamentais e os secundários, sendo que o
pres- tação de serviços essenciais àqueles que se
valor fonte é o da pessoa humana. Nesse sentido, são os
encontram na faixa etária inferior a 18 anos.
dizeres de Reale42: “partimos dessa ideia, a nosso ver
b) Princípio da proteção integral: previsto no artigo básica, de que a pessoa humana é o valor-fonte de todos
1º, ECA estabelece que a proteção da criança e do adoles-
os valores. O ho- mem, como ser natural biopsíquico, é
cente não pode se restringir às situações de
apenas um indivíduo entre outros indivíduos, um ente
irregularidade, o que teria um caráter estigmatizante, mas
animal entre os demais da mesma espécie. O homem,
deve abranger todas as situações de vida pelas quais
considerado na sua obje- tividade espiritual, enquanto ser
passa a criança e o adolescente, mesmo as regulares.
que só realiza no sentido de seu dever ser, é o que
Neste sentido, ao se as- segurar direitos na regularidade,
chamamos de pessoa. Só o ho- mem possui a dignidade
evita-se que a criança e o adolescente caiam em
originária de ser enquanto deve ser, pondo-se
irregularidade.
essencialmente como razão determinante do processo
c) Princípio da dignidade da pessoa humana: A dig- histórico”.
nidade da pessoa humana é o valor-base de interpretação
de qualquer sistema jurídico, internacional ou nacional, 39 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e
que possa se considerar compatível com os valores éticos, aplicação da Constituição. 7. ed. São Paulo: Saraiva,
no- tadamente da moral, da justiça e da democracia. 2009, p. 382.
Pensar em dignidade da pessoa humana significa, acima 40 BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho.
de tudo, co- locar a pessoa humana como centro e norte Recurso de Revista n. 259300-59.2007.5.02.0202.
para qualquer processo de interpretação jurídico, seja na Relator: Alber- to Luiz Bresciani de Fontan Pereira.
elaboração da norma, seja na sua aplicação. Brasília, 05 de setem- bro de 2012j1. Disponível em:
www.tst.gov.br. Acesso em: 17 nov. 2012.
37 Ibid., p.327. 41 REALE, Miguel. Filosofia do direito. 19. ed.
38 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito São Paulo: Saraiva, 2002, p. 228.
42 Ibid., p. 220.
consti- tucional. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2011,
p. 294.

96
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Quando a Constituição Federal assegura a dignidade


da pessoa humana como um dos fundamentos da No entender de Kopelman, para que toda esta legislação
República, faz emergir uma nova concepção de proteção fos- se realmente válida seria necessário definir melhor, de
de cada membro do seu povo. Tal ideologia de forte maneira bem precisa, o que se entende por um padrão
fulcro humanista guia a afirmação de todos os direitos mínimo de benefí- cio ou o que é ‘o melhor’ para os
fundamentais e confere a eles posição hierárquica superior interesses da criança ou do ado- lescente, de modo que a
às normas organizacionais do Estado, de modo que é o definição não fique em aberto para a interpretação de quem
Estado que está para o povo, de- vendo garantir a detém o poder de decidir em nome deles. Além disso, estas
dignidade de seus membros, e não o inverso. d) Princípio definições deveriam estar em constante revisão, para que não
da participação popular: previsto no artigo 227, §§ 3º e 7º acabem sendo ultrapassadas, frente à evolução his- tórico-
e no artigo 204, II, CF, assegura a participação popular, social dos fatos que geraram a necessidade de sua criação.
através de organizações representativas, na elabora- ção de Superados estes dois pontos, que apesar de potencialmente
políticas públicas direcionadas à infância e à juventude. e) limitantes do processo de discussão da autonomia da criança
Princípio da excepcionalidade: previsto no artigo 227, e do adolescente não podem ser simplesmente ignorados,
§3º, V, CF assegura que quando da imposição de medida como se não existissem, chega-se ao terceiro e mais
privativa de liberdade esta não será imposta a não ser que importante: a in- terpretação do conceito de autonomia à luz
se trate de um caso excepcional, em que nenhuma outra do momento de de- senvolvimento em que uma determinada
medida criança ou adolescente
sócio-educativa possa ser utilizada. se encontra.
f) Princípio da brevidade: previsto no artigo 227, Nesse sentido, diversas características do desenvolvimento
§3º, V, CF assegura que quando da aplicação de medida devem ser levadas em consideração:
privativa de liberdade esta não se estenderá no tempo, 1. Trata-se de um processo que evolui continuamente à
devendo ser a mais breve possível, perdurando apenas me- dida que habilidades se aperfeiçoam, novas capacidades
pelo prazo necessá- rio para a ressocialização do são ad- quiridas, novas vivências são acumuladas e integradas
adolescente. No caso, o ECA li- mita a aplicação de e, portan- to, passível de rápidas e extremas mudanças no
medidas desta natureza ao prazo máximo de 3 anos. tempo;
g) Princípio da condição peculiar da pessoa em 2. A aquisição das competências é progressiva, não se dá
desen- volvimento: a criança e o adolescente estão em sal- tos, como se se tratasse de compartimentos estanques, e
processo de formação e de transformação física e psíquica, segue sempre uma ordem preestabelecida, sendo, portanto,
logo, possuem uma condição peculiar que deve ser razoavel- mente previsível;
respeitada quando da aplicação da lei. 3. Os tempos e o ritmo em que o desenvolvimento se pro-
cessa são muito individualizados, fazendo com que dois indiví-
duos de uma mesma idade possam estar em momentos
Autonomia da criança e do adolescente
diferen- tes de desenvolvimento;
Coloca-se o trecho do trabalho de Cláudio Leone43 em 4. No caso específico da inteligência, o desenvolvimento é
extremamente influenciável por fatores extrínsecos ao indivíduo:
que reflete sobre a construção da autonomia do infante:
as experiências, os estímulos, o ambiente, a educação, a cultura,
“Conceitualmente, a análise do respeito à autonomia
etc., o que também acaba por reforçar sua evolução
de uma criança ou de um adolescente só tem sentido se
extrema- mente individualizada.
for conduzida a partir do conhecimento da evolução de
Segundo Piaget, a capacidade de operar o pensamento
suas competências nas diferentes idades. É de
concreto estendendo-o à compreensão do outro e às possíveis
conhecimento de todos que a criança nasce totalmente
consequências de boa parte dos seus atos se aperfeiçoa na
dependente de cuida- dos alheios e que passa por um
idade escolar, entre os 6 e os 11 anos de vida. Este
processo de desenvolvimento progressivo que a leva a
amadurecimento se completa na adolescência, com a
alcançar a completa independência na maturidade, o que,
capacidade crescente de abs- tração que a criança desenvolve
nas sociedades modernas, se situa por volta dos vinte anos
nesta fase da existência. Como consequência, é possível admitir
de idade.
que é na segunda fase da ado- lescência, em geral a partir dos
Entretanto, para que este processo de análise de sua
15 anos, que o indivíduo atingiria as competências necessárias
au- tonomia transcorra de maneira isenta,
para o exercício de sua autonomia, competências estas que
fundamentalmente centrado nas peculiaridades do
necessitariam apenas serem lapidadas ao longo das vivências
desenvolvimento do ser hu- mano, o primeiro ponto a ser
e de uma maior experiência de vida.
considerado é a necessidade de abdicar de alguns
conceitos preestabelecidos, como é o caso da atitude Entretanto, isto não significa que a autonomia da criança
e do adolescente só possa (ou deva) ser respeitada a partir
paternalista. [...]
desta fase.
O segundo ponto a considerar neste percurso, em
Compete ao pediatra e aos demais profissionais de saúde,
geral decorrente do primeiro, é a própria legislação que,
utilizando suas competências profissionais, definir já desde os
mesmo tendo o melhor dos intuitos, praticamente nivela
primeiros anos de vida em que etapa a criança se encontra
todos os menores a uma mesma condição: a de
ao longo do seu processo evolutivo, tentando diferenciar se se
incapacidade, criando a necessidade de se ter figuras aptas
está diante de uma tomada de decisão ditada apenas pelo
a decidir e responder por eles, como se estas figuras
receio do desconhecido, por um capricho ou vontade
fossem sempre e inevitavelmente imbuídas das melhores
decorrente apenas de sua visão egocêntrica, natural em
intenções em relação à criança e ao adolescente.
determinadas idades, ou se a mesma já é o resultado de uma
43 LEONE, Cláudio. A criança, o adolescente e a reflexão mais amadurecida. São estes extremos que dão a
au- tonomia. Revista Bioética, v. 6, n. 1. entender a ampla gama de estágios de desenvolvimento,
portanto de autonomia, que entre eles podem se apresentar.
[...]
97
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Novamente, cabe enfatizar que o risco que se corre ao


se utilizar definições bastante precisas como estas é o de Comentários à lei
acabar classificando um indivíduo de maneira dicotômica,
no caso específico da autonomia, como sendo capaz ou Parte geral
in- capaz, desistindo assim de uma possível análise de sua
Título I
real capacidade.
Das Disposições Preliminares
Consequentemente, a ausência de uma ou de mais
das características anteriormente citadas não deve ser
Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à
utilizada para qualificar a criança ou o adolescente como
criança e ao adolescente.
incapaz. Deve, isto sim, servir de embasamento para que
O princípio da proteção integral se associa ao princípio
se possa tentar entender como suas decisões se
da prioridade absoluta, colacionado no artigo 4º do ECA e
originaram.
no ar- tigo 227, CF. “Com a positivação desse princípio
Em face de situações específicas, individualizadas,
tem-se tam- bém a positivação da proteção integral, que se
como ocorre no dia-a-dia da prática pediátrica, esta é a
opõe à antiga e superada doutrina da situação irregular,
única for- ma que o profissional tem de realmente
que era prevista no antigo Código de Menores e
respeitar a autono- mia da criança ou do adolescente.
especificava que sua incidência se restringia aos menores
A interpretação adequada da legislação e o dimensio- em situação irregular, apresentando um conjunto de
namento correto da decisão dos pais ou responsáveis de- normas destinadas ao tratamento e preven- ção dessas
penderão fundamentalmente deste tipo de análise da situações”44.
auto- nomia da criança ou adolescente. Deste modo,
Basicamente, tinha-se na doutrina da situação
mesmo que resulte em situações de conflito entre as
irregular que era necessário disciplinar um estatuto jurídico
posições, servirá de embasamento para um trabalho, da criança e do adolescente que apenas abordasse
muitas vezes exaustivo, de apresentação, de reflexão e de situações em que ele estivesse irregular, seja por uma
discussão de argumentos e fatos, capaz de conduzir a desproteção, como no caso de abandono, ou pela violação
uma decisão amadurecida e o mais isenta possível, que, da lei, como nos casos de atos infracionais.
respeitando a posição da criança ou do adolescente,
Entretanto, o direito evoluiu e passou a contemplar
poderá efetivamente redundar em seu benefício. uma noção de proteção mais ampla da criança e do
No leque das diferentes situações da prática adolescente, que não apenas abordasse situações de
pediátrica, que se estende desde o recém-nascido no irregularidade (em- bora ainda o fizesse), mas que
limite de viabi- lidade ao qual se quer prestar cuidados abrangesse todo o arcabouço jurídico protetivo da criança
intensivos de vali- dade questionável naquelas e do adolescente.
circunstâncias, passando pelas pesquisas científicas que
envolvem crianças e adolescentes, até a criança cujo pátrio Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a
poder pertence a pais adolescentes, portanto autônomos pessoa até doze anos de idade incompletos, e
nas decisões que lhes dizem respei- to, todas estas adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.
situações, onde nem sempre o real interesse que está em Parágrafo único. Nos casos expressos em lei, aplica-se
jogo é o da criança, mas sim o dos responsá- veis por ela, ex- cepcionalmente este Estatuto às pessoas entre dezoito e
clarificam que não há uma única resposta ou solução vinte e um anos de idade.
mágica, perfeita, para a questão da autonomia da criança O Estatuto da Criança e do Adolescente opta por
e do adolescente. cate- gorizar separadamente estas duas categorias de
Na realidade, o que deve existir é a construção con- menores. Criança é aquele que tem até 12 anos de idade
junta de uma verdade para aquele momento, (na data de aniversário de 12 anos, passa a ser
amadurecida no crescimento e evolução de todos: juízes e adolescente), adolescente é aquele que tem entre 12 e 18
legisladores, pais ou responsáveis, médicos e profissionais anos (na data de aniversário de 18 anos, passa a ser
de saúde e, principalmente, a criança ou o adolescente, maior). Em situações excepcionais o ECA se aplica ao
como parte de um processo de interação franco, sincero, maior de 18 anos, até os 21 anos de idade, por exemplo,
isento e realmen- te participativo que de fato respeite a no caso do menor infrator sujeito a internação em
autonomia, qualquer que seja o nível de competência que fundação CASA que tenha 17 anos e 11 meses na data do
a criança ou o adoles- cente estejam apresentando para ato infracional poderá ficar detido até o limite de seus 20
tal”. anos e 11 meses (eis que 3 anos é o tempo máximo de
internação).
Imputabilidade penal
Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os
Art. 228, CF. São penalmente inimputáveis os direi- tos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem
menores de dezoito anos, sujeitos às normas da prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei,
legislação especial. assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as
oportunidades e facili- dades, a fim de lhes facultar o
O artigo 228, CF dispõe: “são penalmente desenvolvimento físico, men- tal, moral, espiritual e
inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às social, em condições de liberdade e de dignidade.
normas da legis- lação especial”. Percebe-se que a
normativa não está no rol de cláusulas pétreas, razão pela 44 DEZEM, Guilherme Madeira; AGUIRRE, João
qual seria possível uma emenda constitucional que Ri- cardo Brandão; FULLER, Paulo Henrique Aranda.
alterasse a menoridade penal. Inclusive, há projetos de lei Estatu- to da Criança e do Adolescente. São Paulo:
neste sentido. Revista dos Tribunais, 2009. (Coleção Elementos do
Direito)
98
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Parágrafo único. Os direitos enunciados nesta Lei apli-


A leitura dos artigos 4º e 5º, em conjunto com outros
cam-se a todas as crianças e adolescentes, sem discrimi-
dispositivos do ECA, por sua vez, permite detectar a pre-
nação de nascimento, situação familiar, idade, sexo, raça,
sença de um tríplice sistema de garantias.
etnia ou cor, religião ou crença, deficiência, condição
Assim, o Estatuto da Criança e do Adolescente adota
pessoal de desenvolvimento e aprendizagem, condição
uma estrutura que contempla três sistemas de garantia –
econômica, ambiente social, região e local de moradia ou
primário, secundário e terciário.
outra condição que diferencie as pessoas, as famílias ou a
a) Sistema primário – artigos 4º e 87, ECA – aborda
comunidade em que vivem.
políticas públicas de atendimento de crianças e
O artigo 3º volta-se à concretização dos direitos da
adolescen- tes.
criança e do adolescente. Concretização significa viabiliza-
ção prática, consecução real dos fins que a lei descreve.
Art. 4º É dever da família, da comunidade, da socie-
Como se percebe pela leitura até o momento, o legislador
dade em geral e do poder público assegurar, com abso-
brasileiro preocupou-se em elaborar uma legislação cujo
luta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida,
objetivo é concretizar estes direitos da criança e do
à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao
adoles- cente. Entretanto, a lei é apenas uma carta de
lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
intenções. É necessário colocar seu conteúdo em prática,
respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
porque sozi- nha ela nada faz.
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreen-
A implementação na prática dos direitos da criança e
de:
do adolescente depende da adoção de posturas por parte
a) primazia de receber proteção e socorro em
de todos aqueles colocados como responsáveis para
quais- quer circunstâncias;
tanto: Estado, sociedade, comunidade e família.
b) precedência de atendimento nos serviços
Especificamente no que se refere ao Estado, mostra-se
públicos ou de relevância pública;
essencial que ele desenvolve políticas públicas adequadas
c) preferência na formulação e na execução das
em respeito à pe- culiar condição do infante.
po- líticas sociais públicas;
“O Direito da Criança e do Adolescente deve ter con-
d) destinação privilegiada de recursos públicos nas
dições suficientemente próprias de promoção e concreti-
áreas relacionadas com a proteção à infância e à
zação de direitos. Para isso deve-se desvencilhar do dog-
juventude. O artigo 4º do ECA colaciona em seu caput
matismo e do mero positivismo jurídico acrítico. O Direito
teor idênti-
da Criança e do Adolescente enquanto ramo autônomo
co ao do caput do artigo 227, CF, onde se encontra uma
do direito é responsável por ressignificar a atuação estatal,
das principais diretrizes do direito da criança e do
principalmente no campo das políticas públicas e impõe
adolescente que é o princípio da prioridade absoluta.
corresponsabilidades compartilhadas” 45.
Significa que cada criança e adolescente deve receber
Vale ressaltar que às crianças e aos adolescentes são
tratamento especial do Estado e ser priorizado em suas
garantidos os mesmos direitos fundamentais que aos
políticas públicas, pois são o futuro do país e as bases de
adul- tos, entretanto, o ECA aprofunda alguns direitos
construção da sociedade.
funda- mentais em espécie, abordando-os na vertente da
Explica Liberati46: “Por absoluta prioridade, devemos
condi- ção especial dos que pertencem a este grupo.
entender que a criança e o adolescente deverão estar em
As crianças e adolescentes gozam de igualdade de
primeiro lugar na escala de preocupação dos governantes;
direitos em relação às demais pessoas, podendo usufruir
devemos entender que, primeiro, devem ser atendidas to-
de todos eles. O próprio estatuto contempla em seu títu-
das as necessidades das crianças e adolescentes [...]. Por
lo II os direitos fundamentais da criança e do adolescen-
absoluta prioridade, entende-se que, na área administra-
te, entre eles incluindo-se: vida, saúde, liberdade, respeito,
tiva, enquanto não existirem creches, escolas, postos de
dignidade, convivência familiar e comunitária, educação,
saúde, atendimento preventivo e emergencial às
cultura, esporte, lazer, profissionalização e proteção no
gestantes dignas moradias e trabalho, não se deveria
tra- balho. Não se trata de rol taxativo de direitos
asfaltar ruas, construir praças, sambódromos monumentos
fundamentais garantidos à criança e ao adolescente, eis
artísticos etc., porque a vida, a saúde, o lar, a prevenção
que ele possui todos os direitos humanos e fundamentais
de doenças são importantes que as obras de concreto que
que as demais pessoas. O título II do ECA tem por
ficam par a demonstrar o poder do governante”.
objetivo aprofundar es- pecificidades acerca de algumas
O parágrafo único do artigo 4º especifica a abrangência
das categorias de direitos fundamentais assegurados à da absoluta prioridade, esclarecendo que é necessário
criança e ao adolescente. con- ferir atendimento prioritário às crianças e aos
Deste artigo 3º do ECA é possível, ainda, extrair o des-
adolescentes diante de situações de perigo e risco (como
taque ao princípio da igualdade, no sentido de que há
no salvamento em incêndios e enchentes, etc.), bem como
ple- na igualdade na garantia de direitos entre todas as
nos serviços públicos em geral (chegada aos hospitais, por
crianças e adolescentes, não sendo permitido qualquer
exemplo). Além disso, devem ser priorizadas políticas
tipo de dis- criminação.
públicas que favoreçam a criança e o adolescente e
também devem ser reservados recursos próprios
prioritariamente a eles.

45 http://t.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto. 46 LIBERATI, Wilson Donizeti. O Estatuto da


asp?id=2236 Crian- ça e do Adolescente: Comentários. São Paulo:
IBPS.

99
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Art. 87. São linhas de ação da política de O artigo 5º ressalta o verdadeiro objetivo geral do
to atendimen- ECA: proteger a criança de qualquer forma de negligência,
: discri- minação, exploração, violência, crueldade e
I - políticas sociais básicas; opressão. Neste sentido, coloca-se a possibilidade de
II - serviços, programas, projetos e benefícios de as- responsabilização de to-
sistência social de garantia de proteção social e de preven- dos que atentarem contra esse propósito. A responsabilização
ção e redução de violações de direitos, seus agravamentos poderá se dar em qualquer uma das três esferas, isolada
ou reincidências; ou cumulativamente: penal, respondendo por crimes e
III - serviços especiais de prevenção e atendimento contra- venções penais todo aquele que praticá-lo contra
médico e psicossocial às vítimas de negligência, maus-tra- criança e adolescente, bem como respondendo por atos
tos, exploração, abuso, crueldade e opressão; infracionais as crianças e adolescentes que atentarem um
IV - serviço de identificação e localização de pais, contra o outro; civil, estabelecendo-se o dever de indenizar
responsável, crianças e adolescentes desaparecidos; por danos causados a crianças e a adolescentes, que se
estende a toda e qualquer pessoa física ou jurídica que o
V - proteção jurídico-social por entidades de defesa
faça, inclusive o próprio Estado; e administrativa, impondo-se
dos direitos da criança e do adolescente.
penas disciplinares a funcionários sujeitos a regime jurídico
VI - políticas e programas destinados a prevenir ou administrativo em trabalhos privados ou em cargos,
abreviar o período de afastamento do convívio empregos e funções públicos.
familiar e a garantir o efetivo exercício do direito à
convivência familiar de crianças e adolescentes; Art. 6º Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta
VII - campanhas de estímulo ao acolhimento sob os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem
forma de guarda de crianças e adolescentes afastados do comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a
convívio familiar e à adoção, especificamente inter- condição peculiar da criança e do adolescente como
racial, de crianças maiores ou de adolescentes, com pessoas em desen- volvimento.
necessidades específicas de saúde ou com deficiências e de
grupos de ir- mãos. É pacífico que o processo de interpretação hoje faz
O artigo 87 descreve linhas de ação na política de parte do Direito, principalmente se considerada a constante
atendimento, que compõem a delimitação do princípio da evolução da sociedade, demandando diariamente por novos
prioridade absoluta na vertente da priorização na adoção modos de aplicação das normas. Como a sociedade é
de políticas públicas e na delimitação de recursos dinâmica e o Direito existe para servi-la, cabe a ele adequar-
financei- ros para execução de tais políticas. se às novas exigências sociais, aplicando-se da maneira
mais justa à vasta gama de casos concretos. Sobre a
b) Sistema secundário – artigos 98 e 101, ECA – interpretação, explica Gonçalves47: “Quando o fato é típico
e se enquadra perfeitamente no con- ceito abstrato da
abor- da as medidas de proteção destinadas à criança e
norma, dá-se o fenômeno da subsunção. Há casos, no
ao ado- lescente em situação de risco pessoal ou social.
entanto, em que tal enquadramento não ocorre, não
Obs.: as medidas de proteção são estudadas adiante encontrando o juiz nenhuma norma aplicável à hipótese
neste material. sub judice. Deve, então, proceder à integração normativa,
c) Sistema terciário – artigo 112, ECA – aborda as mediante o emprego da analogia, dos costumes e dos
medidas socioeducativas, destinadas à responsabilização princípios gerais do direito. [...] Para verificar se a norma é
penal do adolescente infrator, isto é, àquele entre 12 e 18 aplicável ao caso em julgamento (subsunção) ou se deve
anos que comete atos infracionais. proceder à integração nor- mativa, o juiz procura descobrir
Obs.: as medidas socioeducativas são estudadas o sentido da norma, interpre- tando-a. Interpretar é
adian- te neste material. descobrir o sentido e o alcance da norma jurídica”.
O sistema tríplice deve operar de forma harmônica, A hermenêutica possui 3 categorias de métodos.
com o acionamento gradual de cada um deles. Nas situa- Quanto às fontes ou origem, a interpretação pode ser
ções em que a criança ou adolescente escape ao sistema autêntica ou le- gislativa, jurisprudencial ou judicial e
primário de prevenção, ou seja, nos casos de ineficácia doutrinária. Quanto aos meios, pode ser gramatical ou literal,
das políticas públicas específicas, deve ser acionado o examinando o texto nor- mativo linguísticamente; lógica ou
sistema secundário, operado predominantemente pelo racional, apurando o sentido e a finalidade da norma;
Conselho Tutelas. Por sua vez, em casos extremos, é sistemática, analisando a lei de manei- ra comparativa com
necessário partir para a adoção de medidas outras leis pertencentes à mesma provín- cia do Direito (livro,
socioeducativas, operadas pre- dominantemente pelo título, capítulo, seção, parágrafo); histórica, baseando-se na
Ministério Público e pelo Judiciário. verificação dos antecedentes do processo le- gislativo;
sociológica, adaptando o sentido ou finalidade da norma
às novas exigências sociais (artigo 5°, LINDB). Quanto aos
Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto resultados pode ser declarativa, quando o texto legal cor-
de qualquer forma de negligência, discriminação, responde ao pensamento do legislador; extensiva ou
explora- ção, violência, crueldade e opressão, punido ampliati- va, quando o alcance da lei é mais amplo que o
na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, indicado pelo seu texto; e restritiva, na qual se limita o
aos seus direitos fundamentais. campo de aplicação da lei. Nenhum destes métodos se
opera isoladamente48.
47 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil
Bra- sileiro. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, v. 1.
48 Ibid.
100
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

O artigo 6º do ECA, tal como o artigo 5º da LINDB, ex-


pressa o método de interpretação sociológico, chamando § 9º A atenção primária à saúde fará a busca ativa da
atenção à interpretação da lei levando em conta os seus gestante que não iniciar ou que abandonar as consultas
fins sociais, as exigências do bem comum, os direitos e de pré-natal, bem como da puérpera que não comparecer
de- veres individuais e coletivos, e vai além: exige que se às consultas pós-parto.
leve em conta a condição peculiar da criança e do § 10. Incumbe ao poder público garantir, à gestante e
adolescente. Logo, ao se interpretar o ECA não se pode à mulher com filho na primeira infância que se encontrem
nunca perder de vista que o seu objeto material, a criança sob custódia em unidade de privação de liberdade, am-
e o adolescente, é extremamente peculiar, dotado de biência que atenda às normas sanitárias e assistenciais do
especificidades as quais sempre se deve atentar. Sistema Único de Saúde para o acolhimento do filho, em
articulação com o sistema de ensino competente, visando
Título II ao desenvolvimento integral da criança.
Dos Direitos Fundamentais
Art. 9º O poder público, as instituições e os emprega-
Capítulo I dores propiciarão condições adequadas ao aleitamento
Do Direito à Vida e à Saúde materno, inclusive aos filhos de mães submetidas a
me- dida privativa de liberdade.
Art. 7º A criança e o adolescente têm direito a § 1º Os profissionais das unidades primárias de saúde
proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de desenvolverão ações sistemáticas, individuais ou coletivas,
políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o visando ao planejamento, à implementação e à avaliação
desenvolvimen- to sadio e harmonioso, em condições de ações de promoção, proteção e apoio ao aleitamento
dignas de existência. materno e à alimentação complementar saudável, de for-
ma contínua.
Art. 8º É assegurado a todas as mulheres o acesso aos § 2º Os serviços de unidades de terapia intensiva neo-
programas e às políticas de saúde da mulher e de pla- natal deverão dispor de banco de leite humano ou
nejamento reprodutivo e, às gestantes, nutrição adequa- unidade de coleta de leite humano.
da, atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao
puerpé- rio e atendimento pré-natal, perinatal e pós- Art. 10. Os hospitais e demais estabelecimentos de
natal integral no âmbito do Sistema Único de Saúde. atenção à saúde de gestantes, públicos e particulares, são
§ 1º O atendimento pré-natal será realizado por obrigados a:
profis- sionais da atenção primária. I - manter registro das atividades desenvolvidas,
§ 2º Os profissionais de saúde de referência da através de prontuários individuais, pelo prazo de dezoito
gestan- te garantirão sua vinculação, no último trimestre anos;
da ges- tação, ao estabelecimento em que será realizado II - identificar o recém-nascido mediante o registro
o parto, garantido o direito de opção da mulher. de sua impressão plantar e digital e da impressão
§ 3º Os serviços de saúde onde o parto for realizado digital da mãe, sem prejuízo de outras formas
assegurarão às mulheres e aos seus filhos recém-nascidos normatizadas pela autoridade administrativa competente;
alta hospitalar responsável e contrarreferência na atenção III - proceder a exames visando ao diagnóstico e tera-
primária, bem como o acesso a outros serviços e a grupos pêutica de anormalidades no metabolismo do recém-nasci-
de apoio à amamentação. do, bem como prestar orientação aos pais;
§ 4º Incumbe ao poder público proporcionar assis- IV - fornecer declaração de nascimento onde
tência psicológica à gestante e à mãe, no período pré e constem necessariamente as intercorrências do parto e do
pós-natal, inclusive como forma de prevenir ou minorar as desenvol- vimento do neonato;
consequências do estado puerperal. V - manter alojamento conjunto, possibilitando ao
§ 5º A assistência referida no § 4º deste artigo deverá neo- nato a permanência junto à mãe.
ser prestada também a gestantes e mães que manifestem VI - acompanhar a prática do processo de
interesse em entregar seus filhos para adoção, bem como amamen- tação, prestando orientações quanto à técnica
a gestantes e mães que se encontrem em situação de pri- adequada, enquanto a mãe permanecer na unidade
vação de liberdade. hospitalar, utili- zando o corpo técnico já existente.
§ 6º A gestante e a parturiente têm direito a 1 (um)
acompanhante de sua preferência durante o período do Art. 11. É assegurado acesso integral às linhas de
pré-natal, do trabalho de parto e do pós-parto imediato. cuidado voltadas à saúde da criança e do
§ 7º A gestante deverá receber orientação sobre alei- adolescen- te, por intermédio do Sistema Único de
tamento materno, alimentação complementar saudável e Saúde, observado o princípio da equidade no acesso a
crescimento e desenvolvimento infantil, bem como sobre ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da
formas de favorecer a criação de vínculos afetivos e de es- saúde.
timular o desenvolvimento integral da criança. § 1º A criança e o adolescente com deficiência serão
§ 8º A gestante tem direito a acompanhamento sau- atendidos, sem discriminação ou segregação, em suas
dável durante toda a gestação e a parto natural necessidades gerais de saúde e específicas de habilitação e
cuidadoso, estabelecendo-se a aplicação de cesariana e reabilitação.
outras inter- venções cirúrgicas por motivos médicos.

10
1
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§ 2º Incumbe ao poder público fornecer


gratuitamente, àqueles que necessitarem, medicamentos, Capítulo II
órteses, próteses e outras tecnologias assistivas relativas Do Direito à Liberdade, ao Respeito e à Dignidade
ao tratamento, habilita- ção ou reabilitação para crianças e
adolescentes, de acordo com as linhas de cuidado voltadas às Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liber-
suas necessidades específicas. dade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas
§ 3º Os profissionais que atuam no cuidado diário ou em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos
fre- quente de crianças na primeira infância receberão civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas
formação específica e permanente para a detecção de sinais leis.
de risco para o desenvolvimento psíquico, bem como para Entre os direitos fundamentais garantidos à criança e
o acompanha- mento que se fizer necessário. ao adolescente que são especificados e aprofundados no
ECA estão os direitos à liberdade, ao respeito e à
Art. 12. Os estabelecimentos de atendimento à saúde, dignidade.
in- clusive as unidades neonatais, de terapia intensiva e de
cuidados intermediários, deverão proporcionar condições Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes
para a perma- nência em tempo integral de um dos aspectos:
pais ou responsável, nos casos de internação de criança ou I - ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços
adolescente. comunitários, ressalvadas as restrições legais;
II - opinião e expressão;
Art. 13. Os casos de suspeita ou confirmação de III - crença e culto religioso;
castigo físico, de tratamento cruel ou degradante e de IV - brincar, praticar esportes e divertir-se;
maus-tratos contra criança ou adolescente serão
obrigatoriamente comuni-
cados
pre- ao Conselho Tutelar da respectiva localidade, sem V - participar da vida familiar e comunitária, sem
di
s criminação;
juízo de outras providências legais. VI - participar da vida política, na forma da
§ 1º As gestantes ou mães que manifestem interesse em lei; VII - buscar refúgio, auxílio e orientação.
entregar seus filhos para adoção serão obrigatoriamente O artigo 16 aborda diversas facetas do direito de
en- caminhadas, sem constrangimento, à Justiça da liber- dade: locomoção, opinião e expressão, religiosa e
Infância e da Juventude. política. Cria, ainda, duas facetes específicas deste direito:
§ 2º Os serviços de saúde em suas diferentes portas liberdade para brincar e divertir-se e liberdade para
de entrada, os serviços de assistência social em seu buscar refúgio, auxílio e orientação, processos estes
componente especializado, o Centro de Referência essenciais para o de- senvolvimento do infante.
Especializado de Assis- tência Social (Creas) e os demais
órgãos do Sistema de Garan- tia de Direitos da Criança e
Art. 17. O direito ao respeito consiste na
do Adolescente deverão conferir máxima prioridade ao
inviolabilida- de da integridade física, psíquica e
atendimento das crianças na faixa etária da primeira infância
moral da criança e do adolescente, abrangendo a
com suspeita ou confirmação de violência de qualquer
preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos
natureza, formulando projeto terapêutico singular que inclua
valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.
intervenção em rede e, se necessário, acompanha- mento
domiciliar.
Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da
criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer
Art. 14. O Sistema Único de Saúde promoverá
tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexató-
programas de assistência médica e odontológica para a
rio ou constrangedor.
prevenção das enfermidades que ordinariamente afetam a
Os direitos ao respeito e à dignidade abrangem a pro-
população infantil, e campanhas de educação sanitária para
teção da criança e do adolescente em todas facetas de sua
pais, educadores e alu- nos.
integridade: física, psíquica e moral.
§ 1º É obrigatória a vacinação das crianças nos casos
reco- mendados pelas autoridades sanitárias.
Art. 18-A. A criança e o adolescente têm o direito de
§ 2º O Sistema Único de Saúde promoverá a atenção
ser educados e cuidados sem o uso de castigo físico ou
à saúde bucal das crianças e das gestantes, de forma
de tratamento cruel ou degradante, como formas de
transversal, integral e intersetorial com as demais linhas de
cor- reção, disciplina, educação ou qualquer outro
cuidado direcio- nadas à mulher e à criança.
pretexto, pelos pais, pelos integrantes da família ampliada,
§ 3º A atenção odontológica à criança terá função
pelos res- ponsáveis, pelos agentes públicos executores de
edu- cativa protetiva e será prestada, inicialmente, antes de
medidas so- cioeducativas ou por qualquer pessoa
o bebê nascer, por meio de aconselhamento pré-natal, e,
encarregada de cuidar deles, tratá-los, educá-los ou
posteriormen- te, no sexto e no décimo segundo anos de vida,
com orientações sobre saúde bucal. protegê-los.
Parágrafo único. Para os fins desta Lei, considera-se:
§ 4º A criança com necessidade de cuidados
odontológi- cos especiais será atendida pelo Sistema Único I - castigo físico: ação de natureza disciplinar ou
de Saúde. pu- nitiva aplicada com o uso da força física sobre a
§ 5º É obrigatória a aplicação a todas as crianças, nos criança ou o adolescente que resulte em:
seus primeiros dezoito meses de vida, de protocolo ou outro a) sofrimento físico; ou
instru- mento construído com a finalidade de facilitar a b) lesão;
detecção, em consulta pediátrica de acompanhamento da
criança, de risco para o seu desenvolvimento psíquico.
102
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

II - tratamento cruel ou degradante: conduta ou for-


Capítulo III
ma cruel de tratamento em relação à criança ou ao adoles-
cente que: Do Direito à Convivência Familiar e Comunitária
a) humilhe; ou
b) ameace gravemente; ou Seção I
c) ridicularize. Disposições
Gerais
Art. 18-B. Os pais, os integrantes da família ampliada,
os responsáveis, os agentes públicos executores de medidas Quando se aborda o direito à convivência familiar e
so- cioeducativas ou qualquer pessoa encarregada de comunitária no ECA confere-se destaque à distinção entre
cuidar de crianças e de adolescentes, tratá-los, educá- família natural e substituta e aos procedimentos que
los ou pro- tegê-los que utilizarem castigo físico ou carac- terizam a inserção e a retirada da criança e do
tratamento cruel ou degradante como formas de correção, adolescente destes ambientes.
disciplina, educação ou qualquer outro pretexto estarão
sujeitos, sem prejuízo de outras sanções cabíveis, às Art. 19. É direito da criança e do adolescente ser
seguintes medidas, que serão aplicadas de acordo com a criado e educado no seio de sua família e,
gravidade do caso: excepcional- mente, em família substituta, assegurada
I - encaminhamento a programa oficial ou a convivência familiar e comunitária, em ambiente que
comunitá- rio de proteção à família; garanta seu desen- volvimento integral.
II - encaminhamento a tratamento psicológico ou § 1o Toda criança ou adolescente que estiver inserido
psiquiátrico; em programa de acolhimento familiar ou institucional
III - encaminhamento a cursos ou programas de terá sua situação reavaliada, no máximo, a cada 3
orientação; (três) me- ses, devendo a autoridade judiciária
IV - obrigação de encaminhar a criança a competente, com base em relatório elaborado por
tratamento especializado; equipe interprofissional ou multidisciplinar, decidir de
V - advertência. forma fundamentada pela pos- sibilidade de reintegração
Parágrafo único. As medidas previstas neste artigo se- familiar ou pela colocação em família substituta, em
rão aplicadas pelo Conselho Tutelar, sem prejuízo de quaisquer das modalidades previs- tas no art. 28 desta Lei.
outras providências legais. § 2o A permanência da criança e do adolescente em
pro- grama de acolhimento institucional não se
Os artigos 18-A e 18-B foram incluídos no ECA pela prolongará por mais de 18 (dezoito meses), salvo
Lei nº 13.010, de 26 de junho de 2014, que estabelece o comprovada necessida- de que atenda ao seu superior
direito da criança e do adolescente de serem educados e interesse, devidamente funda- mentada pela autoridade
cuidados sem o uso de castigos físicos ou de tratamento judiciária.
cruel ou de- gradante. Também ficou conhecida como § 3º A manutenção ou a reintegração de criança ou
“Lei do Menino Bernardo”49 e “Lei da Palmada”. adolescente à sua família terá preferência em relação
Em que pesem as aparentes boas intenções da lei no a qualquer outra providência, caso em que será esta
sentido de evitar situações extremas como a do menino incluí- da em serviços e programas de proteção, apoio e
Bernardo, assassinado após incontáveis ameaças e agres- promoção, nos termos do § 1o do art. 23, dos incisos I e IV
sões físicas por parte de seus responsáveis, seu conteúdo do caput do art. 101 e dos incisos I a IV do caput do art.
é bastante criticado. Afinal, é claro que a lei coloca todo e 129 desta Lei.
qualquer tipo de agressão física no mesmo patamar. Con-
§ 4º Será garantida a convivência da criança e do
siderado o teor da lei, mesmo uma palmada numa criança
adolescente com a mãe ou o pai privado de liberdade,
é proibida.
por meio de visitas periódicas promovidas pelo responsável
Os críticos da “Lei da Palmada” apontam que ela
ou, nas hipóteses de acolhimento institucional, pela
adota uma posição extrema e impõe uma indevida
entidade responsável, independentemente de autorização
intervenção do Estado nos ambientes familiares, retirando
judicial.
o poder dis- ciplinar garantido aos pais na educação de
seus filhos. § 5o Será garantida a convivência integral da crian-
Os defensores da “Lei da Palmada” utilizam estudos ça com a mãe adolescente que estiver em acolhimento
de psicólogos e educadores para argumentar que não é institucional.
ne- cessário utilizar qualquer tipo de agressão física, § 6o A mãe adolescente será assistida por equipe
mesmo a mais leve, para educar uma criança. espe- cializada multidisciplinar.
Como se depreende do artigo 19, a família natural é a
regra e a família substituta é a exceção. A criança e o ado-
49 O nome da lei é uma homenagem ao menino lescente podem ser inseridos em programa de
Bernardo Boldrini, morto em abril de 2014, aos 11 acolhimento familiar ou institucional, pelo limite temporal
anos, em Três Passos (RS). Os acusados são o pai e de 18 meses, cujo caráter é o de permitir a sua retirada de
a ma- drasta do menino, com ajuda de uma amiga e potencial ou efetiva situação de risco. Durante este
do irmão dela. Segundo as investigações, Bernardo programa, reavalia- do a cada 3 meses, se verificará se é
procurou ajuda para denunciar as ameaças que sofria. possível a reinserção no ambiente da família natural (o
que é preferencial) ou se é o caso de colocação definitiva
em família substituta.

103
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Art. 19-A. A gestante ou mãe que manifeste


§ 3o Pessoas jurídicas podem apadrinhar criança ou
interesse em entregar seu filho para adoção, antes ou
adolescente a fim de colaborar para o seu
logo após o nascimento, será encaminhada à Justiça
desenvolvimento.
da Infância e da Juventude.
§ 4o O perfil da criança ou do adolescente a ser apa-
§ 1o A gestante ou mãe será ouvida pela equipe
drinhado será definido no âmbito de cada programa de
inter- profissional da Justiça da Infância e da Juventude,
apadrinhamento, com prioridade para crianças ou ado-
que apre- sentará relatório à autoridade judiciária, lescentes com remota possibilidade de reinserção
considerando in- clusive os eventuais efeitos do estado familiar ou colocação em família adotiva.
gestacional e puerperal. § 5o Os programas ou serviços de apadrinhamento
§ 2o De posse do relatório, a autoridade judiciária apoiados pela Justiça da Infância e da Juventude poderão
poderá determinar o encaminhamento da gestante ou ser executados por órgãos públicos ou por
mãe, mediante sua expressa concordância, à rede pública organizações da sociedade civil.
de saúde e assistência social para atendimento § 6o Se ocorrer violação das regras de
especializado. apadrinhamen- to, os responsáveis pelo programa e pelos
§ 3o A busca à família extensa, conforme definida nos serviços de aco- lhimento deverão imediatamente notificar
termos do parágrafo único do art. 25 desta Lei, a autoridade judiciária competente.
respeitará Os programas de apadrinhamento visam permitir a
o prazo máximo de 90 (noventa) dias, prorrogável por convivência comunitária da criança e do adolescente que
igual período. estão no sistema de adoção, especialmente com relação
§ 4o Na hipótese de não haver a indicação do genitor àqueles que dificilmente sairão dele.
e de não existir outro representante da família extensa
apto a receber a guarda, a autoridade judiciária Art. 20. Os filhos, havidos ou não da relação do
competen- te deverá decretar a extinção do poder casa- mento, ou por adoção, terão os mesmos direitos
familiar e deter- minar a colocação da criança sob a e qua- lificações, proibidas quaisquer designações
guarda provisória de quem estiver habilitado a adotá- discrimina- tórias relativas à filiação.
la ou de entidade que desenvolva programa de O artigo 20 destaca a igualdade entre todos os filhos,
acolhimento familiar ou insti- tucional. sejam eles havidos dentro ou fora do casamento, sejam
§ 5o Após o nascimento da criança, a vontade da mãe eles inseridos em família natural ou substituta.
ou de ambos os genitores, se houver pai registral ou pai
in- dicado, deve ser manifestada na audiência a que se A disciplina sobre a perda e suspensão do poder de
refere fa- mília no ECA se encontra em dois blocos, o primeiro
o § 1o do art. 166 desta Lei, garantido o sigilo sobre a do ar- tigo 21 ao 24, que aborda questões materiais, e o
entrega. segundo do artigo 155 a 163, que foca em questões
§ 6o (VETADO). procedimentais:
§ 7o Os detentores da guarda possuem o prazo de
15 (quinze) dias para propor a ação de adoção, Art. 21. O poder familiar será exercido, em igualda-
contado do dia seguinte à data do término do estágio de de de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que
convivência. dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o
§ 8o Na hipótese de desistência pelos genitores - ma- direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade
nifestada em audiência ou perante a equipe judiciária competente para a solução da divergência.
interprofissional
- da entrega da criança após o nascimento, a criança Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guar-
será mantida com os genitores, e será determinado pela da e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no
Justiça da Infância e da Juventude o acompanhamento interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as
familiar pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias. determinações judiciais.
§ 9o É garantido à mãe o direito ao sigilo sobre o Parágrafo único. A mãe e o pai, ou os responsáveis,
nas- cimento, respeitado o disposto no art. 48 desta Lei. têm direitos iguais e deveres e responsabilidades
§ 10. (VETADO). comparti- lhados no cuidado e na educação da criança,
O artigo 19-A trata do procedimento aplicável nos ca- devendo ser resguardado o direito de transmissão familiar
sos em que a família biológica pretenda entregar recém- de suas cren- ças e culturas, assegurados os direitos da
-nascido para adoção, assegurando-se o criança estabele- cidos nesta Lei.
acompanhamento por equipe multidisciplinar e também a
tomada de provi- dências de busca de pessoa da família Art. 23. A falta ou a carência de recursos materiais
não constitui motivo suficiente para a perda ou a sus-
extensa apta a assu- mir o encargo.
pensão do poder familiar.
Art. 19-B. A criança e o adolescente em programa de § 1º Não existindo outro motivo que por si só autorize
acolhimento institucional ou familiar poderão participar de a decretação da medida, a criança ou o adolescente será
mantido em sua família de origem, a qual deverá
programa de apadrinhamento.
obrigato- riamente ser incluída em serviços e programas
§ 1o O apadrinhamento consiste em estabelecer e
oficiais de proteção, apoio e promoção.
propor- cionar à criança e ao adolescente vínculos
externos à ins- tituição para fins de convivência
familiar e comunitária e colaboração com o seu
desenvolvimento nos aspectos social, moral, físico,
cognitivo, educacional e financeiro.
§ 2o (VETADO).
104
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§2º A condenação criminal do pai ou da mãe não


im- plicará a destituição do poder familiar, exceto na Artigo 1.634, CC. Compete aos pais, quanto à pessoa
hipótese de condenação por crime doloso, sujeito à pena dos filhos menores:
de reclu- são, contra o próprio filho ou filha. I – dirigir-lhes a criação e educação;
II – tê-los em sua companhia e guarda;
Art. 24. A perda e a suspensão do poder familiar serão III – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para
decretadas judicialmente, em procedimento casarem;
contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem IV – nomear-lhes tutor por testamento ou documento
como na hipótese de descumprimento injustificado dos autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o
deveres e obrigações a que alude o art. 22. sobre- vivo não puder exercer o poder familiar;
V – representá-los, até aos dezesseis anos, nos atos da
O instituto do poder familiar surgiu no direito romano vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que fo-
e era conhecido naquela época como pátrio poder, pois rem partes, suprindo-lhes o consentimento;
o pai exercia mais poderes sobre os filhos do que a mãe, VI – reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;
o que vinha a representar um poder absoluto por parte VII – exigir que lhes prestem obediência, respeito e os
do genitor, inclusive sobre a vida e a morte dos próprios serviços próprios de sua idade e condição.
filhos50.
O Código Civil de 1916 atribuiu o poder familiar ao Em relação às suas características, o poder familiar é
pai, que era considerado o chefe da sociedade conjugal, e indisponível e decorre da paternidade natural ou legal,
a mãe possuía um papel secundário, conforme apontava o por isso, não há a possibilidade de seu titular o transfe-
artigo 380 do Código Civil de 1916 que dizia que “durante rir a terceiros por iniciativa própria, tampouco existindo a
o casamento compete o pátrio poder aos pais, exercendo- viabilidade de ocorrer a sua prescrição pelo desuso. O po-
-o o marido com a colaboração da mulher [...]”. der familiar é indelegável, sendo, em regra, irrenunciável e
De acordo com Santos Neto51: “[...] o exercício da sempre intransferível. Logo, não sendo possível ao titular
auto- ridade parental pela mãe era admitido apenas em do poder familiar abrir mão de seu dever, a renúncia é in-
caráter excepcional. Ao homem era dada, em condições viável, existindo apenas uma exceção, qual seja, a decor-
normais, a titularidade exclusiva do direito em pauta. Sua rente da adoção.
vontade prevalecia e contra ela não havia remédio Existe apenas uma exceção, que é o caso do pedido
previsto, salvo, é claro, no caso de comportamento de colocação do menor em família substituta,
abusivo e contrário aos interesses dos menores”. disponibilizan- do o filho para a adoção, caso em que os
O Código Civil de 2002, por seu turno, seguindo a direitos e deveres decorrentes do poder familiar serão
toa- da da Constituição Federal de 1988, trouxe exercidos por novos titulares, ou seja, pelos pais adotivos.
significativas modificações ao instituto em análise, A esse respeito, os direitos e deveres dos pais
surgindo então o chamado poder familiar, onde ambos os dispostos nos artigos 1.630 a 1.638 do Código Civil
pais exercem de forma igualitária o poder sobre os filhos regulam, dentre os deveres e poderes decorrentes do
menores, equili- brando dessa forma a relação familiar. poder familiar, tam- bém os de ordem pessoal, ou seja, o
O artigo 1.630 do atual Código Civil, sem definir o po- cuidado existencial do menor, a educação, a correição, e
der familiar, dispõe que “os filhos estão sujeitos ao poder os de ordem material, que envolvem a administração dos
familiar enquanto menores”, ou seja, enquanto não com- bens dos filhos. Os prin- cipais atributos do poder familiar
pletarem dezoito anos ou não alcançarem a maioridade são a guarda, a criação e a educação, que se refletem nos
civil por meio de uma das formas previstas no artigo 5º, deveres dos pais para com os filhos; tanto que, não
parágrafo único e seus incisos, do mesmo diploma legal. cumprindo algum desses atribu- tos, o detentor do poder
No mesmo sentido, o citado artigo 21, ECA. poderá sofrer sanções cíveis e até criminais.
O poder familiar, conhecido também como O poder familiar, conforme disposição do próprio or-
autoridade parental, é um conjunto de direitos e deveres denamento civil, não é um instituto irrevogável e pode ser
que são atri- buídos aos pais para que esses administrem extinto, suspenso ou destituído a qualquer tempo. Basica-
de forma legal a pessoa dos filhos e também de seus mente, as formas de extinção se aplicam quando o exercí-
bens. cio do poder familiar não é mais necessário; ao passo que
“O poder familiar pode ser definido como um as regras de perda e suspensão constituem casos de
conjunto de direitos e obrigações, quanto às pessoas e priva- ção do exercício do poder familiar pelo
bens do filho menor não emancipado, exercido, em descumprimento de seus deveres.
igualdade de condi- ções, por ambos os pais, para que Sendo assim, o Estado poderá interferir na relação fa-
possam desempenhar os encargos que a norma jurídica miliar, com o objetivo de resguardar os interesses do me-
lhes impõe, tendo em vista o interesse e a proteção do nor, sendo que a lei disciplina os casos em que o titular do
filho”52. poder familiar ficará privado de exercê-lo, seja de forma
temporária ou até mesmo definitiva.
50 AKEL, Ana Carolina Silveira. Guarda
Compar- tilhada: um Avanço para a Família. 2. ed.
São Paulo: Atlas, 2010. Brasileiro: Direito de Família. 22. ed. São Paulo:
51 SANTOS NETO, José Antônio de Paula. Do Sarai- va, 2007. v. 5.
Pátrio Poder. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994.
52 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil

105
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Artigo 1.637, CC. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua


Por seu turno, pelo que se verifica na análise da legis-
auto- ridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou
lação, quando o legislador estabeleceu as hipóteses de
arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo
ex- tinção do poder familiar, em regra, o fez por perceber
algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que a pessoa que a ele se encontrava sujeita adquiriu
que lhe pareça re- clamada pela segurança do menor e maturidade o suficiente para guiar a sua vida, não havendo
seus haveres, até sus- pendendo o poder familiar, quando razão para que permaneça tal vínculo. Há casos,
convenha. entretanto, que a violação aos direitos inerentes ao poder
Parágrafo único. Suspende-se igualmente o exercício familiar tornou irreversível o seu restabelecimento, como
do poder familiar ao pai ou à mãe condenados por ocorre na adoção.
sentença ir- recorrível, em virtude de crime cuja pena
exceda a dois anos de prisão. Artigo 1.635, CC. Extingue-se o poder familiar: I – pela
morte dos pais ou do filho; II – pela emancipação, nos
Nestes casos, a suspensão não será definitiva, é termos do artigo 5º, parágrafo único; III – pela maioridade;
apenas uma sanção imposta pelo Poder Judiciário visando IV – pela adoção; V – por decisão judicial, na forma do
preser- var os interesses dos filhos, assim, diante da artigo 1.638.
comprovação de que os problemas que levaram à
suspensão desapare- ceram, o poder familiar poderá A extinção do poder familiar é mais complexa, pois
retornar aos genitores. nesta situação os pais, extintos do poder, não poderão
Assim sendo, os pais podem ser suspensos de exercer requerer a reintegração do poder familiar se houve
interferência deles para sua extinção. Na maioria dos casos,
os direitos e deveres decorrentes do poder familiar quan-
é possível identificar facilmente a existência da extinção do
do ficar evidenciado perante a autoridade competente o
poder familiar, por se tratarem de hipóteses objetivas.
abuso. Como visto, existe, também, a probabilidade de se
decretar a suspensão do poder familiar, caso um dos pais Seção II
seja condenado por crime cuja pena exceda a dois anos Da Família Natural
de prisão.
Há, ainda, as hipóteses de perda ou destituição do Dos artigos 25 a 27 o ECA aborda a família natural,
po- der familiar, que é a sanção mais grave imposta aos nos seguintes termos:
pais que faltarem com os deveres em relação aos filhos:
Art. 25. Entende-se por família natural a comunidade
Artigo 1.638, CC. Perderá por ato judicial o poder fami- formada pelos pais ou qualquer deles e seus
liar o pai ou a mãe que: descenden- tes.
I – castigar imoderadamente o Parágrafo único. Entende-se por família extensa ou
filho; II – deixar o filho em ampliada aquela que se estende para além da unidade
abandono; pais e filhos ou da unidade do casal, formada por
III – praticar atos contrários à moral e aos bons parentes próximos com os quais a criança ou adolescente
costu- mes; convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade.
IV – incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no A família natural é composta por pais e filhos que for-
arti- go antecedente. mam vínculo entre si desde o nascimento, por questão
bio- lógica.
O conceito de família pode ser visto de uma maneira
Nessa linha de pensamento, os artigos 24 e 22 do Es-
mais ampla, o que se denomina família extensa ou
tatuto da Criança e do Adolescente, citados ampliada. Por exemplo, avós e tios que sejam muito
anteriormente, além de preverem a suspensão e próximos e parti- cipem diretamente do convívio familiar,
destituição do poder fa- miliar, trazem também os formando para com a criança e o adolescente vínculos de
motivos que poderão acarretá- afinidade e afetividade.
-las.
São bastante frequentes nos casos de pais que Art. 26. Os filhos havidos fora do casamento
perdem o poder familiar os atos de violência e poderão ser reconhecidos pelos pais, conjunta ou
espancamento; as- separadamente, no
sim como o de abandono, no qual os menores, ao se ve-
próprio termo de nascimento, por testamento,
rem abandonados, começam a relacionar-se com pessoas
mediante escritura ou outro documento público,
delinquentes e usuárias de drogas, que não vão colaborar
qualquer que seja a origem da filiação.
em nada com seu desenvolvimento e crescimento. Nessas
Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o
situações, os detentores do poder familiar podem sofrer a nas- cimento do filho ou suceder-lhe ao falecimento, se
perda do poder familiar. deixar descendentes.
Cabe aqui consignar que, no caso da perda do poder Como o artigo 20 estabelece a igualdade entre os fi-
familiar, se no decorrer do tempo o menor não vier a ser lhos havidos dentro ou fora do casamento, sentido em
adotado por outra família e as causas que levaram a perda que se compreende que tanto os filhos inseridos no
do poder desaparecerem, os genitores poderão requerer matrimônio quanto os que não o estão fazem parte da
judicialmente a reintegração do poder familiar, desde que família natural, o artigo 26 tece detalhes sobre a
comprovem realmente que o motivo que os levou a possibilidade de reconheci- mento do vínculo de filiação,
perder esse poder já não existe mais. que pode se dar antes mesmo do nascimento do filho ou
extrapolar a sua vida, devendo ser feito em documento
público.
106
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Art. 27. O reconhecimento do estado de filiação é


di- reito personalíssimo, indisponível e imprescritível, III - a intervenção e oitiva de representantes do órgão
po- dendo ser exercitado contra os pais ou seus herdeiros, federal responsável pela política indigenista, no caso de
sem qualquer restrição, observado o segredo de Justiça. crianças e adolescentes indígenas, e de antropólogos, pe-
O direito à filiação é personalíssimo, indisponível e rante a equipe interprofissional ou multidisciplinar que irá
im- prescritível. Mesmo que um filho passe a vida toda ou acompanhar o caso.
boa parte de sua vida sem buscar o seu reconhecimento,
ele não se perde. Logo, a ação de investigação de Art. 29. Não se deferirá colocação em família substituta
paternidade é imprescritível, pois também o é o vínculo a pessoa que revele, por qualquer modo, incompatibilida-
que ela reco- nhece em caso de procedência. de com a natureza da medida ou não ofereça
ambiente familiar adequado.
Seção III
Da Família Substituta Art. 30. A colocação em família substituta não
admitirá transferência da criança ou adolescente a
terceiros ou a entidades governamentais ou não-
Subseção I
Disposições governamentais, sem autorização judicial.
Gerais
Art. 31. A colocação em família substituta estrangei-
ra constitui medida excepcional, somente admissível na
Dos artigos 28 a 32 aborda-se a família substituta, nos
seguintes termos: modalidade de adoção.

Art. 28. A colocação em família substituta far-se-á Art. 32. Ao assumir a guarda ou a tutela, o
mediante guarda, tutela ou adoção, independentemente responsável prestará compromisso de bem e fielmente
da situação jurídica da criança ou adolescente, nos termos desempenhar o encargo, mediante termo nos autos.
desta Lei.
§ 1o Sempre que possível, a criança ou o adolescen- Existem três formas de colocação em família
te será previamente ouvido por equipe interprofissional, substituta: guarda, tutela e adoção. Neste sentido, a
respeitado seu estágio de desenvolvimento e grau de com- criança é retirada da esfera do poder familiar de ambos os
preensão sobre as implicações da medida, e terá sua pais (o que pode acontecer na tutela e na adoção), ou
opinião devidamente considerada. então permanece vinculado ao poder familiar de ambos
genitores enquanto apenas um ou um terceiro exerce a
§ 2o Tratando-se de maior de 12 (doze) anos de
idade, será necessário seu consentimento, colhido em guarda (o que ocor- re apenas na guarda). Trata-se de
audiência. situação excepcional, eis que em regra a criança deve
§ 3o Na apreciação do pedido levar-se-á em conta o permanecer na família natural, vinculada ao poder familiar
grau de parentesco e a relação de afinidade ou de atribuído a ambos os pais.
afeti- vidade, a fim de evitar ou minorar as consequências Neste tipo de circunstância, deve-se buscar sempre
decor- rentes da medida. ouvir a criança ou o adolescente. Caso já possua 12 anos
§ 4o Os grupos de irmãos serão colocados sob ado- completos, a oitiva é obrigatória. Trata-se de respeito à
ção, tutela ou guarda da mesma família substituta, au- tonomia da criança e do adolescente.
res- salvada a comprovada existência de risco de abuso ou Os irmãos devem permanecer unidos em qualquer cir-
outra situação que justifique plenamente a cunstância, sendo a separação de irmãos medida excep-
excepcionalidade de solução diversa, procurando-se, em cional. Por exemplo, se um casal estiver disposto a adotar
qualquer caso, evitar o rompimento definitivo dos vínculos 4 filhos e existirem 4 irmãos, será dada prioridade a ele,
fraternais. passando na frente dos demais candidatos à adoção.
§ 5o A colocação da criança ou adolescente em família
substituta será precedida de sua preparação gradativa e Subseção
acompanhamento posterior, realizados pela equipe II Da
inter- profissional a serviço da Justiça da Infância e da Guarda
Juventude, preferencialmente com o apoio dos técnicos
responsáveis pela execução da política municipal de Art. 33. A guarda obriga a prestação de assistência
garantia do direito à convivência familiar. material, moral e educacional à criança ou
§ 6o Em se tratando de criança ou adolescente indí- adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-
gena ou proveniente de comunidade remanescente de qui- se a terceiros, inclusive aos pais.
lombo, é ainda obrigatório: § 1º A guarda destina-se a regularizar a posse de
I - que sejam consideradas e respeitadas sua fato, podendo ser deferida, liminar ou incidentalmente, nos
identidade social e cultural, os seus costumes e procedimentos de tutela e adoção, exceto no de adoção por
tradições, bem como suas instituições, desde que não estrangeiros.
sejam incompatíveis com os direitos fundamentais § 2º Excepcionalmente, deferir-se-á a guarda, fora dos
reconhecidos por esta Lei e pela Cons- tituição Federal; casos de tutela e adoção, para atender a situações pecu-
II - que a colocação familiar ocorra prioritariamente liares ou suprir a falta eventual dos pais ou
no seio de sua comunidade ou junto a membros da responsável, podendo ser deferido o direito de
mes- ma etnia; representação para a práti- ca de atos determinados.

107
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§ 3º A guarda confere à criança ou adolescente a con-


Logo, a dissolução do vínculo conjugal não exclui o poder
dição de dependente, para todos os fins e efeitos de
familiar, mas pode excluir a guarda de um dos pais,
direito, inclusive previdenciários.
reservando-
§ 4o Salvo expressa e fundamentada determinação em
contrário, da autoridade judiciária competente, ou quando -o apenas o direito de visitas, dependendo da modalidade
de guarda adotada. Com a dissolução da união conjugal,
a medida for aplicada em preparação para adoção, o de-
hoje se estabeleceu que a prole poderá ficar com o genitor
ferimento da guarda de criança ou adolescente a terceiros
que tiver melhor condições de assistir o filho.
não impede o exercício do direito de visitas pelos pais,
assim como o dever de prestar alimentos, que serão objeto “Mesmo que a mãe seja considerada culpada pela
sepa- ração, pode o juiz deferir-lhe a guarda dos filhos
de regulamentação específica, a pedido do interessado ou
menores, se estiver comprovado que o pai, por exemplo, é
do Ministério Público.
alcoólatra e não tem condições de cuidar bem deles. Não se
indaga, portanto, quem deu causa à separação e quem é o
Art. 34. O poder público estimulará, por meio de as-
cônjuge inocente, mas qual deles revela melhores condições
sistência jurídica, incentivos fiscais e subsídios, o acolhi-
para exercer a guarda dos filhos menores, cujos interesses
mento, sob a forma de guarda, de criança ou adolescente
foram colocados em primeiro plano. A solução será,
afastado do convívio familiar.
portanto, a mesma se ambos os pais fo- rem culpados pela
§ 1o A inclusão da criança ou adolescente em pro-
separação e se a hipótese for de ruptura da vida em comum
gramas de acolhimento familiar terá preferência a seu
ou de separação por motivo de doença mental. A regra
acolhimento institucional, observado, em qualquer caso, o
amolda-se ao princípio do melhor interesse da criança,
caráter temporário e excepcional da medida, nos termos identificado como direito fundamental na Constituição Federal
desta Lei. (art. 5º, §2º), em razão da ratificação pela Convenção
§ 2o Na hipótese do § 1o deste artigo a pessoa ou casal Internacio- nal sobre os Direitos da Criança – ONU/89”55.
cadastrado no programa de acolhimento familiar poderá
O juiz antes de decidir o mérito de uma ação de
receber a criança ou adolescente mediante guarda, obser-
guarda, separação ou divórcio, tem que determinar a guarda
vado o disposto nos arts. 28 a 33 desta Lei.
provisória do menor a um dos pais, o qual não se trata de
§ 3º A União apoiará a implementação de um modelo de guarda, mas de definir uma situação
serviços de acolhimento em família acolhedora como momentânea em que a prole se encontra. Somente com o
política pública, os quais deverão dispor de equipe que julgamento do mérito será estabelecida a guarda definitiva,
organize o acolhimento temporário de crianças e de que deverá adotar um dos mo- delos de guarda permitida
adolescentes em residências de famílias selecionadas, no ordenamento jurídico brasileiro.
capacitadas e acompa- nhadas que não estejam no
A guarda definitiva expressa o modelo de guarda
cadastro de adoção. adotado pelos pais. Porém, mesmo tratando-se de guarda
§ 4º Poderão ser utilizados recursos federais, esta- definitiva, tal modelo poderá ser alterado a qualquer tempo,
duais, distritais e municipais para a manutenção dos pois o que re- gula o instituto da guarda é o melhor
ser- viços de acolhimento em família acolhedora, interesse do menor e, não sendo isso possível, a guarda é
facultando-se o repasse de recursos para a própria família passível de modificação.
acolhedora. a) Guarda Comum ou Guarda Originária
A guarda comum ou guarda originária não é uma
Art. 35. A guarda poderá ser revogada a qualquer guarda judicial, existindo quando os genitores possuem
tem- po, mediante ato judicial fundamentado, ouvido o vínculo matri- monial ou vivem em união estável e moram
Ministério Público. juntos com seus filhos, situação na qual exercem plenamente
e simultaneamente todos os poderes inerentes do poder
Na definição de Santos Neto53 a guarda trata-se de familiar e, consequente- mente, a guarda. Não existe a
um “direito consistente na posse de menor oponível a figura do guardião e nem arbi- tramento judicial sobre a
terceiros e que acarreta deveres de vigilância em relação a questão. Ambos pais exercem juntos a guarda em plenitude.
este”. b) Guarda Unilateral ou Guarda Única
No entender de Ishida54, a guarda é vinculada ao Observando-se sempre o princípio do melhor interesse do
poder familiar, “todavia, pode ocorrer a separação dos menor, a guarda excepcionalmente poderá ser atribuída de
dois ins- titutos, por exemplo, com a separação judicial for- ma unilateral a uma terceira pessoa quando os
do marido e da mulher, onde o poder familiar continua genitores não estiverem em condições de exercê-la, pois,
pertencendo aos dois, no entanto um só poderá ficar com conforme determina o artigo 1.583, §1º, do Código Civil,
a guarda da prole”. ou seja, tanto o pai como a mãe são “compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só
detentores do poder familiar mesmo após a separação, dos genitores ou a alguém que o substitua”. Neste viés,
mas nos tipos de guarda comum, apenas um terá a dispõe o artigo 1.584, §5º, do mesmo diploma legal: “Se o
guarda do filho. juiz verificar que o filho não deve permane- cer sob a guarda
do pai ou da mãe, deferirá a guarda à pessoa que revele
compatibilidade com a natureza da medida, consi- derados,
de preferência, o grau de parentesco e as relações de
53 SANTOS NETO, José Antônio de Paula. Do Pá- afinidade e afetividade”. Vale ressaltar que a guarda
trio Poder. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994. unilateral também é possível quando nenhum dos pais tem
54 ISHIDA, Valter Kenji. Estatuto da Criança e do condições de exercê-la, por exemplo, atribuindo a guarda
Adolescente: Doutrina e Jurisprudência. 9. ed. São aos avós ou aos tios.
Paulo: Atlas, 2008. 55 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil
Bra- sileiro: Direito de Família. 6. ed. São Paulo: Saraiva,
2009.
v. 6.
108
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Usualmente, nesse contexto, podemos constatar a


e) Guarda por Aninhamento ou Nidação
exis- tência da guarda unilateral, que é atribuída somente
A guarda por aninhamento, conhecida também como
a um dos genitores, e da guarda compartilhada, que é
guarda por nidação, ocorre quando a prole possui um lar
atribuída a ambos, sendo que a previsão das duas
fixo e os pais se revezam, mudando-se para a casa do(s)
modalidades de guarda encontra-se no artigo 1.583, da
filho(s) em períodos alternados de tempo, para conviver e
Lei n. 11.698/2008, que constitui que “a guarda será atender as suas necessidades. Basicamente, os pais se
unilateral ou comparti- lhada”. revezam na residência do filho.
A Lei alterou a redação do artigo 1.583 e passou a es- f) Guarda Compartilhada
tabelecer nos incisos do §2º do dispositivo algumas das Considerando a evolução da família, especialmente a
situações que deverão ser consideradas pelo magistrado da mulher na sociedade, bem como o grande número de
ao atribuir a guarda a um dos genitores: afeto nas separa- ções ocorridas nos últimos anos, o ordenamento
relações com o genitor e com o grupo familiar; saúde e jurídico bus- ca com o instituto da guarda compartilhada
segurança; e educação. evitar prejuízos ainda maiores aos filhos de casal separado,
Na guarda unilateral atribuída a apenas um dos pais, que, além de não terem o convívio diário com um dos
apesar de um dos genitores não ser o guardião, genitores, têm que viven- ciar os problemas conjugais de
continuam ambos a exercerem a guarda jurídica. A seus pais e ainda se tornarem, em muitos casos, vítimas da
diferença é que, em virtude da guarda, o genitor guardião Síndrome da Alienação Parental.
tem o poder de decisão, enquanto o genitor não guardião Segundo Akel57, “a guarda compartilhada surgiu da
tem o poder de fiscalização, podendo contestar a decisão neces- sidade de se encontrar uma maneira que fosse capaz
do genitor guar- dião e até mesmo recorrer à justiça, caso de fazer com que os pais, que não mais convivem, e seus
entenda que a decisão tomada não seja a melhor para a filhos man- tivessem os vínculos afetivos latentes, mesmo
prole, conforme prevê o artigo 1.583, §3º, do Código Civil: após o rompi- mento”.
“a guarda unila- teral obriga o pai ou a mãe que não a Com esse propósito, a recente Lei nº 11.698/2008
detenha a supervi- sionar os interesses dos filhos”. instituiu expressamente no ordenamento jurídico o instituto
c) Guarda Alternada ou Guarda Partilhada da guarda compartilhada. Embora tenha sido sancionada
Nesse modelo de guarda, cada um dos genitores terá em 13 de ju- nho de 2008 e publicada no Diário Oficial da
a possibilidade de ter sobre sua guarda o menor ou ado- União em 16 de junho do mesmo ano, por força da vacatio
lescente de forma alternada e exclusiva, ou seja, o casal legis instituída no artigo 2º, a lei somente entrou em vigor
de- terminará o período em que o menor ficará com o pai no país 60 (sessenta) dias após a sua publicação, ou seja,
ou com a mãe, existindo dessa forma sempre uma em 16 de agosto de 2008 (vide anexo).
alternância na guarda jurídica do menor. O período em A nova lei trás em seu bojo o conceito de guarda
que a guarda ficará com o pai ou com a mãe na guarda compar- tilhada nos seguintes termos: “compreende-se por
alternada, po- derá ser de um dia, uma semana, uma parte [...] guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o
da semana, um mês, um ano, ou até mais, dependendo do exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não
acordo dos genitores, sendo que, ao término desse vivam sob o mes- mo teto, concernentes ao poder familiar
período, os papéis se invertem. Os direitos e deveres dos filhos comuns”.
deste modelo de guarda ficarão sempre com o cônjuge Assim, de acordo com o novo diploma legal, pode-se
que estiver com a guarda do menor, cabendo ao outro os ve- rificar que na guarda compartilhada os pais terão os
direitos inerentes do não guardião, ou seja, o de visita e o mesmos direitos e deveres com relação ao filho, ou seja, as
tarefas serão divididas de forma igualitária, não
de fiscalização56.
d) Guarda Dividida sobrecarregando somente um dos genitores.
Na guarda dividida, são os próprios pais que contes-
tam e procuram novos meios de garantir uma maior parti- Subseção
III Da
cipação na vida da prole, pois neste modelo o menor vive
Tutela
em um lar fixo e determinado e recebe periodicamente a
visita do pai ou da mãe que não tem a guarda.
Art. 36. A tutela será deferida, nos termos da lei civil, a
Na guarda dividida o filho tem um lar fixo e recebe pessoa de até 18 (dezoito) anos incompletos.
nele a visita de ambos os genitores em tempos diferentes,
Parágrafo único. O deferimento da tutela pressupõe a
sendo que a guarda é exercida por aquele que estiver pré- via decretação da perda ou suspensão do poder
com a criança, o que é diferente da guarda unilateral, pois familiar e implica necessariamente o dever de guarda.
nela a guarda é de um dos genitores e o infante vai, em
dias determinados, receber a visita do outro não guardião. Art. 37. O tutor nomeado por testamento ou
qualquer documento autêntico, conforme previsto no
parágrafo único do art. 1.729 da Lei no 10.406, de 10 de
56 COSTA, Luiz Jorge Valente Pontes. Guarda
janeiro de 2002 - Códi- go Civil, deverá, no prazo de 30
Conjunta: em busca do maior interesse do menor. (trinta) dias após a abertura da sucessão, ingressar com
Dis- ponível em: pedido destinado ao controle judicial do ato, observando o
<http://jus.uol.com.br/revista/texto/13965/ guarda- procedimento previsto nos arts. 165 a 170 desta Lei.
conjunta-em-busca-do-maior-interesse-do-me- nor/2>.
Acesso em: 16 out. 2010. 57 AKEL, Ana Carolina Silveira. Guarda
Compar- tilhada: um Avanço para a Família. 2. ed.
São Paulo: Atlas, 2010.

109
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Parágrafo único. Na apreciação do pedido, serão ob-


servados os requisitos previstos nos arts. 28 e 29 desta Lei, Art. 42. Podem adotar os maiores de 18 (dezoito)
somente sendo deferida a tutela à pessoa indicada na anos, independentemente do estado civil.
dispo- sição de última vontade, se restar comprovado que a § 1º Não podem adotar os ascendentes e os irmãos do
medida é vantajosa ao tutelando e que não existe outra adotando.
pessoa em melhores condições de assumi-la. § 2o Para adoção conjunta, é indispensável que os
ado- tantes sejam casados civilmente ou mantenham
Art. 38. Aplica-se à destituição da tutela o disposto no união es- tável, comprovada a estabilidade da família.
art. 24. § 3º O adotante há de ser, pelo menos, dezesseis anos
mais velho do que o adotando.
A tutela é forma de colocação de criança e § 4o Os divorciados, os judicialmente separados e os
adolescente em família substituta. Pressupõe, ao ex-companheiros podem adotar conjuntamente, contanto
contrário da guarda, a prévia destituição ou suspensão do que acordem sobre a guarda e o regime de visitas e desde
poder familiar dos pais (família natural). Visa que o estágio de convivência tenha sido iniciado na cons-
essencialmente a suprir carên- cia de representação legal, tância do período de convivência e que seja comprovada
assumindo o tutor tal munus na ausência dos genitores. a existência de vínculos de afinidade e afetividade com
Na hipótese de os pais serem fale- cidos, tiverem sido aque- le não detentor da guarda, que justifiquem a
destituídos ou suspensos do poder fa- miliar, ou excepcionali- dade da concessão.
houverem aderido expressamente ao pedido de colocação § 5o Nos casos do § 4o deste artigo, desde que de-
em família substituta, este poderá ser formulado monstrado efetivo benefício ao adotando, será
diretamente em cartório, em petição assinada pelos pró- assegurada a guarda compartilhada, conforme previsto no
prios requerentes, dispensada a assistência por advogado art. 1.584 da Lei no10.406, de 10 de janeiro de 2002 -
(art. 166, ECA). Em outras circunstâncias, deve passar pelo Código Civil.
crivo do Judiciário. § 6o A adoção poderá ser deferida ao adotante que,
após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer
Subseção IV no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença.
Da Adoção
Art. 43. A adoção será deferida quando apresentar
A disciplina do ECA a respeito da adoção também se reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos
divide em dois blocos, um voltado a aspectos materiais, legíti- mos.
do artigo 39 ao 52-D, e outro voltado a aspectos procedi-
mentais, notadamente no que se refere à habilitação para Art. 44. Enquanto não der conta de sua
a adoção, do artigo 197-A a 197-D. administração e saldar o seu alcance, não pode o tutor
ou o curador ado- tar o pupilo ou o curatelado.
Art. 39. A adoção de criança e de adolescente reger-se- Art. 45. A adoção depende do consentimento dos pais
s á
egundo o disposto nesta Lei.
§ 1o A adoção é medida excepcional e irrevogável, à ou do representante legal do adotando.
qual se deve recorrer apenas quando esgotados os recursos § 1º O consentimento será dispensado em relação à
de manutenção da criança ou adolescente na família criança ou adolescente cujos pais sejam desconhecidos ou
natural ou extensa, na forma do parágrafo único do art. 25 tenham sido destituídos do poder familiar.
desta Lei. § 2º Em se tratando de adotando maior de doze anos
§ 2o É vedada a adoção por procuração. de idade, será também necessário o seu consentimento.
§ 3o Em caso de conflito entre direitos e interesses do
adotando e de outras pessoas, inclusive seus pais Art. 46. A adoção será precedida de estágio de convi-
biológicos, devem prevalecer os direitos e os interesses do vência com a criança ou adolescente, pelo prazo máxi-
adotando. mo de 90 (noventa) dias, observadas a idade da criança
ou adolescente e as peculiaridades do caso.
Art. 40. O adotando deve contar com, no máximo, de- § 1o O estágio de convivência poderá ser dispensado
zoito anos à data do pedido, salvo se já estiver sob a se o adotando já estiver sob a tutela ou guarda legal do
guar- da ou tutela dos adotantes. adotante durante tempo suficiente para que seja possível
avaliar a conveniência da constituição do vínculo.
Art. 41. A adoção atribui a condição de filho ao § 2o A simples guarda de fato não autoriza, por si só, a
adotado, com os mesmos direitos e deveres, inclusive dispensa da realização do estágio de convivência.
sucessórios, desligando-o de qualquer vínculo com pais e § 2o-A. O prazo máximo estabelecido no caput deste
parentes, salvo os impedimentos matrimoniais. artigo pode ser prorrogado por até igual período, mediante
§ 1º Se um dos cônjuges ou concubinos adota o filho decisão fundamentada da autoridade judiciária.
do outro, mantêm-se os vínculos de filiação entre o § 3o Em caso de adoção por pessoa ou casal residente
adota- do e o cônjuge ou concubino do adotante e os ou domiciliado fora do País, o estágio de convivência será
respectivos parentes. de, no mínimo, 30 (trinta) dias e, no máximo, 45 (quarenta
§ 2º É recíproco o direito sucessório entre o adotado, e cinco) dias, prorrogável por até igual período, uma única
seus descendentes, o adotante, seus ascendentes, descen- vez, mediante decisão fundamentada da autoridade
dentes e colaterais até o 4º grau, observada a ordem de judiciária.
vocação hereditária.

11
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§ 3o-A. Ao final do prazo previsto no § 3 o deste artigo,


deverá ser apresentado laudo fundamentado pela equipe Art. 49. A morte dos adotantes não restabelece o
mencionada no § 4o deste artigo, que recomendará ou não poder familiar dos pais naturais.
o deferimento da adoção à autoridade judiciária.
§ 4o O estágio de convivência será acompanhado pela Art. 50. A autoridade judiciária manterá, em cada co-
equipe interprofissional a serviço da Justiça da Infância e marca ou foro regional, um registro de crianças e ado-
lescentes em condições de serem adotados e outro de
da Juventude, preferencialmente com apoio dos técnicos
pessoas interessadas na adoção.
res- ponsáveis pela execução da política de garantia do
direito à convivência familiar, que apresentarão relatório § 1º O deferimento da inscrição dar-se-á após prévia
consulta aos órgãos técnicos do juizado, ouvido o Minis-
minucioso acerca da conveniência do deferimento da
tério Público.
medida.
§ 2º Não será deferida a inscrição se o interessado não
§ 5o O estágio de convivência será cumprido no terri-
satisfazer os requisitos legais, ou verificada qualquer das
tório nacional, preferencialmente na comarca de residência
hipóteses previstas no art. 29.
da criança ou adolescente, ou, a critério do juiz, em cidade
§ 3o A inscrição de postulantes à adoção será prece-
limítrofe, respeitada, em qualquer hipótese, a competência
dida de um período de preparação psicossocial e jurídica,
do juízo da comarca de residência da criança.
orientado pela equipe técnica da Justiça da Infância e da
Juventude, preferencialmente com apoio dos técnicos res-
Art. 47. O vínculo da adoção constitui-se por
ponsáveis pela execução da política municipal de garantia
sentença judicial, que será inscrita no registro civil
do direito à convivência familiar.
mediante manda- do do qual não se fornecerá certidão.
§ 4o Sempre que possível e recomendável, a prepa-
§ 1º A inscrição consignará o nome dos adotantes
ração referida no § 3o deste artigo incluirá o contato com
como pais, bem como o nome de seus ascendentes.
crianças e adolescentes em acolhimento familiar ou insti-
§ 2º O mandado judicial, que será arquivado, cancelará
tucional em condições de serem adotados, a ser realizado
o registro original do adotado.
sob a orientação, supervisão e avaliação da equipe técnica
§ 3o A pedido do adotante, o novo registro poderá ser da Justiça da Infância e da Juventude, com apoio dos téc-
lavrado no Cartório do Registro Civil do Município de sua nicos responsáveis pelo programa de acolhimento e pela
residência. execução da política municipal de garantia do direito à
§ 4o Nenhuma observação sobre a origem do ato po- convivência familiar.
derá constar nas certidões do registro.
§ 5o Serão criados e implementados cadastros esta-
§ 5o A sentença conferirá ao adotado o nome do ado- duais e nacional de crianças e adolescentes em condições
tante e, a pedido de qualquer deles, poderá determinar a de serem adotados e de pessoas ou casais habilitados à
modificação do prenome. adoção.
§ 6o Caso a modificação de prenome seja requerida § 6o Haverá cadastros distintos para pessoas ou casais
pelo adotante, é obrigatória a oitiva do adotando, residentes fora do País, que somente serão consultados na
observado o disposto nos §§ 1o e 2o do art. 28 desta Lei. inexistência de postulantes nacionais habilitados nos ca-
§ 7o A adoção produz seus efeitos a partir do trânsito dastros mencionados no § 5o deste artigo.
em julgado da sentença constitutiva, exceto na hipótese § 7o As autoridades estaduais e federais em matéria de
prevista no § 6o do art. 42 desta Lei, caso em que terá força adoção terão acesso integral aos cadastros, incumbindo-
retroativa à data do óbito. -lhes a troca de informações e a cooperação mútua, para
§ 8o O processo relativo à adoção assim como outros a melhoria do sistema.
ele relacionados serão mantidos em arquivo, admitindo-se § 8o A autoridade judiciária providenciará, no prazo
seu armazenamento em microfilme ou por outros meios, de 48 (quarenta e oito) horas, a inscrição das crianças e
garantida a sua conservação para consulta a qualquer adolescentes em condições de serem adotados que não
tem- po. tiveram colocação familiar na comarca de origem, e das
§ 9º Terão prioridade de tramitação os processos de pessoas ou casais que tiveram deferida sua habilitação à
adoção em que o adotando for criança ou adolescente adoção nos cadastros estadual e nacional referidos no §
com deficiência ou com doença crônica. 5o deste artigo, sob pena de responsabilidade.
§ 10. O prazo máximo para conclusão da ação de ado- § 9o Compete à Autoridade Central Estadual zelar pela
ção será de 120 (cento e vinte) dias, prorrogável uma manutenção e correta alimentação dos cadastros, com
única vez por igual período, mediante decisão pos- terior comunicação à Autoridade Central Federal
fundamentada da autoridade judiciária. Brasileira.
§ 10. Consultados os cadastros e verificada a ausência
Art. 48. O adotado tem direito de conhecer sua origem de pretendentes habilitados residentes no País com perfil
biológica, bem como de obter acesso irrestrito ao processo compatível e interesse manifesto pela adoção de criança
no qual a medida foi aplicada e seus eventuais incidentes, ou adolescente inscrito nos cadastros existentes, será
após completar 18 (dezoito) anos. realiza- do o encaminhamento da criança ou adolescente
Parágrafo único. O acesso ao processo de adoção à adoção internacional.
pode- rá ser também deferido ao adotado menor de 18 § 11. Enquanto não localizada pessoa ou casal interes-
(dezoito) anos, a seu pedido, assegurada orientação e sado em sua adoção, a criança ou o adolescente, sempre
assistência jurí- dica e psicológica. que possível e recomendável, será colocado sob guarda
de família cadastrada em programa de acolhimento
familiar.

11
1
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§ 12. A alimentação do cadastro e a convocação crite-


riosa dos postulantes à adoção serão fiscalizadas pelo Minis- II - se a Autoridade Central do país de acolhida consi-
tério Público. derar que os solicitantes estão habilitados e aptos para
§ 13. Somente poderá ser deferida adoção em favor de ado- tar, emitirá um relatório que contenha informações
can- didato domiciliado no Brasil não cadastrado sobre a identidade, a capacidade jurídica e adequação dos
previamente nos termos desta Lei quando: solicitantes para adotar, sua situação pessoal, familiar e
I - se tratar de pedido de adoção unilateral; médica, seu meio social, os motivos que os animam e sua
II - for formulada por parente com o qual a criança ou aptidão para assumir uma adoção internacional;
adoles- cente mantenha vínculos de afinidade e afetividade; III - a Autoridade Central do país de acolhida enviará o
III - oriundo o pedido de quem detém a tutela ou guarda relatório à Autoridade Central Estadual, com cópia para a
legal de criança maior de 3 (três) anos ou adolescente, desde Au- toridade Central Federal Brasileira;
que o lapso de tempo de convivência comprove a fixação de IV - o relatório será instruído com toda a
laços de afinida- de e afetividade, e não seja constatada a documentação necessária, incluindo estudo psicossocial
ocorrência de má-fé ou qualquer das situações previstas nos elaborado por equipe interprofissional habilitada e cópia
arts. 237 ou 238 desta Lei. autenticada da legislação pertinente, acompanhada da
§ 14. Nas hipóteses previstas no § 13 deste artigo, o respectiva prova de vigência;
candi- dato deverá comprovar, no curso do procedimento, que V - os documentos em língua estrangeira serão devida-
preen- che os requisitos necessários à adoção, conforme mente autenticados pela autoridade consular, observados
previsto nesta Lei. os tratados e convenções internacionais, e acompanhados
§ 15. Será assegurada prioridade no cadastro a pessoas da respectiva tradução, por tradutor público juramentado;
inte- ressadas em adotar criança ou adolescente com VI - a Autoridade Central Estadual poderá fazer
deficiência, com doença crônica ou com necessidades exigên- cias e solicitar complementação sobre o estudo
específicas de saúde, além de grupo de irmãos. psicossocial do postulante estrangeiro à adoção, já
Art. 51. Considera-se adoção internacional aquela na qual realizado no país de acolhida;
C VII - verificada, após estudo realizado pela Autoridade
o pretendente possui residência habitual em país-parte da entral Estadual, a compatibilidade da legislação estrangeira
Con- venção de Haia, de 29 de maio de 1993, Relativa à com a nacional, além do preenchimento por parte dos pos-
Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de tulantes à medida dos requisitos objetivos e subjetivos
Adoção Internacional, promulgada pelo Decreto no 3.087, de neces- sários ao seu deferimento, tanto à luz do que dispõe
21 junho de 1999, e deseja adotar criança em outro país-parte esta Lei como da legislação do país de acolhida, será
da Convenção. expedido laudo de habilitação à adoção internacional, que
§ 1o A adoção internacional de criança ou adolescente terá validade por, no máximo, 1 (um) ano;
bra- sileiro ou domiciliado no Brasil somente terá lugar quando VIII - de posse do laudo de habilitação, o interessado
restar comprovado: será autorizado a formalizar pedido de adoção perante o
I - que a colocação em família adotiva é a solução Juízo da Infância e da Juventude do local em que se
adequada ao caso concreto; encontra a criança ou adolescente, conforme indicação
II - que foram esgotadas todas as possibilidades de efetuada pela Autoridade Central Estadual.
coloca- ção da criança ou adolescente em família adotiva § 1o Se a legislação do país de acolhida assim o autori-
brasileira, com a comprovação, certificada nos autos, da zar, admite-se que os pedidos de habilitação à adoção
inexistência de adotan- tes habilitados residentes no Brasil inter- nacional sejam intermediados por organismos
com perfil compatível com a criança ou adolescente, após credenciados.
consulta aos cadastros mencionados nesta Lei; § 2o Incumbe à Autoridade Central Federal Brasileira o
III - que, em se tratando de adoção de adolescente, este credenciamento de organismos nacionais e estrangeiros
foi consultado, por meios adequados ao seu estágio de en- carregados de intermediar pedidos de habilitação à
desenvolvi- mento, e que se encontra preparado para a adoção internacional, com posterior comunicação às
medida, mediante pa- recer elaborado por equipe Autoridades Centrais Estaduais e publicação nos órgãos
interprofissional, observado o disposto nos §§ 1o e 2o do art. 28 oficiais de im- prensa e em sítio próprio da internet.
desta Lei. § 3o Somente será admissível o credenciamento de or-
§ 2o Os brasileiros residentes no exterior terão preferência ganismos que:
aos estrangeiros, nos casos de adoção internacional de criança
I - sejam oriundos de países que ratificaram a
ou adolescente brasileiro.
Convenção de Haia e estejam devidamente credenciados
§ 3o A adoção internacional pressupõe a intervenção
pela Autoridade Central do país onde estiverem sediados e
das Autoridades Centrais Estaduais e Federal em matéria de
no país de acolhida do adotando para atuar em adoção
adoção internacional.
internacional no Brasil;
II - satisfizerem as condições de integridade moral,
Art. 52. A adoção internacional observará o procedimento
previsto nos arts. 165 a 170 desta Lei, com as seguintes com- petência profissional, experiência e responsabilidade
adaptações: I - a pessoa ou casal estrangeiro, interessado em exigidas pelos países respectivos e pela Autoridade Central
adotar crian- Federal Brasileira;
ça ou adolescente brasileiro, deverá formular pedido de III - forem qualificados por seus padrões éticos e sua
habilita- ção à adoção perante a Autoridade Central em for- mação e experiência para atuar na área de adoção
matéria de adoção internacional no país de acolhida, assim interna- cional;
entendido aquele onde está situada sua residência habitual;

11
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

IV - cumprirem os requisitos exigidos pelo


ordenamento jurídico brasileiro e pelas normas § 11. A cobrança de valores por parte dos organismos
estabelecidas pela Autori- dade Central Federal Brasileira. credenciados, que sejam considerados abusivos pela
§ 4o Os organismos credenciados deverão ainda: Auto- ridade Central Federal Brasileira e que não estejam
devida- mente comprovados, é causa de seu
I - perseguir unicamente fins não lucrativos, nas condi-
ções e dentro dos limites fixados pelas autoridades compe- descredenciamento.
tentes do país onde estiverem sediados, do país de acolhida § 12. Uma mesma pessoa ou seu cônjuge não podem
e pela Autoridade Central Federal Brasileira; ser representados por mais de uma entidade credenciada
para atuar na cooperação em adoção internacional.
II - ser dirigidos e administrados por pessoas qualifica-
das e de reconhecida idoneidade moral, com comprovada § 13. A habilitação de postulante estrangeiro ou domi-
formação ou experiência para atuar na área de adoção in- ciliado fora do Brasil terá validade máxima de 1 (um) ano,
ternacional, cadastradas pelo Departamento de Polícia Fe- podendo ser renovada.
deral e aprovadas pela Autoridade Central Federal § 14. É vedado o contato direto de representantes de
Brasileira, mediante publicação de portaria do órgão organismos de adoção, nacionais ou estrangeiros, com
federal compe- tente; dirigentes de programas de acolhimento institucional ou
familiar, assim como com crianças e adolescentes em
III - estar submetidos à supervisão das autoridades
com- petentes do país onde estiverem sediados e no país de condi- ções de serem adotados, sem a devida autorização
aco- lhida, inclusive quanto à sua composição, judicial.
funcionamento e situação financeira; § 15. A Autoridade Central Federal Brasileira poderá
limitar ou suspender a concessão de novos credenciamen-
IV - apresentar à Autoridade Central Federal Brasilei-
ra, a cada ano, relatório geral das atividades desenvolvidas, tos sempre que julgar necessário, mediante ato
bem como relatório de acompanhamento das adoções administra- tivo fundamentado.
inter- nacionais efetuadas no período, cuja cópia será
encaminha- da ao Departamento de Polícia Federal; Art. 52-A. É vedado, sob pena de responsabilidade e
V - enviar relatório pós-adotivo semestral para a descredenciamento, o repasse de recursos provenientes de
Autori- dade Central Estadual, com cópia para a organismos estrangeiros encarregados de intermediar pe-
Autoridade Central Federal Brasileira, pelo período mínimo didos de adoção internacional a organismos nacionais
de 2 (dois) anos. O envio do relatório será mantido até a ou a pessoas físicas.
juntada de cópia au- tenticada do registro civil, Parágrafo único. Eventuais repasses somente poderão
estabelecendo a cidadania do país de acolhida para o ser efetuados via Fundo dos Direitos da Criança e do
adotado; Adoles- cente e estarão sujeitos às deliberações do
VI - tomar as medidas necessárias para garantir que os respectivo Conse- lho de Direitos da Criança e do
adotantes encaminhem à Autoridade Central Federal Brasi- Adolescente.
leira cópia da certidão de registro de nascimento
estrangeira e do certificado de nacionalidade tão logo lhes Art. 52-B. A adoção por brasileiro residente no ex-
sejam con- cedidos. terior em país ratificante da Convenção de Haia, cujo pro-
§ 5o A não apresentação dos relatórios referidos no § cesso de adoção tenha sido processado em conformidade
o
4 deste artigo pelo organismo credenciado poderá com a legislação vigente no país de residência e atendido o
acarre- tar a suspensão de seu credenciamento. disposto na Alínea “c” do Artigo 17 da referida Convenção,
§ 6o O credenciamento de organismo nacional ou es- será automaticamente recepcionada com o reingresso
trangeiro encarregado de intermediar pedidos de adoção no Brasil.
internacional terá validade de 2 (dois) anos. § 1o Caso não tenha sido atendido o disposto na
§ 7o A renovação do credenciamento poderá ser con- Alínea “c” do Artigo 17 da Convenção de Haia, deverá a
cedida mediante requerimento protocolado na sentença ser homologada pelo Superior Tribunal de Justiça.
Autoridade Central Federal Brasileira nos 60 (sessenta) § 2o O pretendente brasileiro residente no exterior em
dias anteriores ao término do respectivo prazo de país não ratificante da Convenção de Haia, uma vez rein-
validade. gressado no Brasil, deverá requerer a homologação da
§ 8o Antes de transitada em julgado a decisão que sen- tença estrangeira pelo Superior Tribunal de Justiça.
con- cedeu a adoção internacional, não será permitida a
§ 9o Transitada em julgado a decisão, a autoridade ju- Art. 52-C. Nas adoções internacionais, quando o
diciária determinará a expedição de alvará com autoriza- Brasil for o país de acolhida, a decisão da autoridade
ção de viagem, bem como para obtenção de passaporte, competente do país de origem da criança ou do adolescen-
constando, obrigatoriamente, as características da criança te será conhecida pela Autoridade Central Estadual que
ou adolescente adotado, como idade, cor, sexo, eventuais tiver processado o pedido de habilitação dos pais ado-
sinais ou traços peculiares, assim como foto recente e a tivos, que comunicará o fato à Autoridade Central Fe-
aposição da impressão digital do seu polegar direito, ins- deral e determinará as providências necessárias à
truindo o documento com cópia autenticada da decisão e expedição do Certificado de Naturalização Provisório.
certidão de trânsito em julgado. § 1o A Autoridade Central Estadual, ouvido o
§ 10. A Autoridade Central Federal Brasileira poderá, a Ministério Público, somente deixará de reconhecer os
qualquer momento, solicitar informações sobre a situação efeitos daquela decisão se restar demonstrado que a
das crianças e adolescentes adotados. adoção é manifesta- mente contrária à ordem pública ou
não atende ao interes- se superior da criança ou do
adolescente.

11
3
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§ 2o Na hipótese de não reconhecimento da adoção,


prevista no § 1o deste artigo, o Ministério Público deverá O interessado em adotar deve juntar atestados de
imediatamente requerer o que for de direito para resguar- saú- de física onde a pessoa vai demonstrar ser capaz de
dar os interesses da criança ou do adolescente, cuidar e garantir uma boa vida para o adotando e
comunican- do-se as providências à Autoridade Central atestado de saúde mental, comprovando que a pessoa é
Estadual, que fará a comunicação à Autoridade Central capaz legalmente.
Federal Brasileira e à Autoridade Central do país de Nos aspectos judiciais inerentes ao caso devem ser
origem. jun- tados Certidão de antecedentes criminais, que
demostra conduta legal do indivíduo perante a sociedade,
Certidão negativa de distribuição civil, além da
Art. 52-D. Nas adoções internacionais, quando o Brasil
for o país de acolhida e a adoção não tenha sido deferida manifestação do M.P (Ministério Público) apresentando
no país de origem porque a sua legislação a delega ao país quesitos a serem respon- didos pela equipe
de acolhida, ou, ainda, na hipótese de, mesmo com decisão, interdisciplinar, designação de audiência para oitiva de
a criança ou o adolescente ser oriundo de país que não testemunhas e requerentes, solicitar juntada de
tenha aderido à Convenção referida, o processo de documentos complementares que sejam necessários.
adoção segui- rá as regras da adoção nacional. Deve ser obrigatório o estudo psicossocial onde se testa
a capacidade dos indivíduos para se tornarem pai ou mãe,
o de incluir mais um membro junto aos filhos já existente.
A adoção no Código Civil de 1916 era tratada em seu
capítulo V. A adoção seguia um critério de ter um filho Os programas de capacitação também devem ser aderido
para que a família tivesse sucessão e para configurar a fa- a este sistema, levando esclarecimentos aos pretendentes
mília da época que só tinha uma configuração costumeira a adoção além, de manter contato com a criança em
se houvesse pai, mãe e filhos. A idade de 30 (trinta) anos regime de acolhimento familiar.
para que as pessoas pudessem não se arrepender do Sendo os adotantes inscritos são chamados por
feito. Quando se falava do casamento criava-se o critério ordem cronológica de acordo com a habilitação, e que só
de que tenha se passado 05 (cinco) anos de matrimônio poderá ser dispensada se for pelo melhor interesse do
para que o casal possa adotar, pois o ideal era que os adotando.
filhos fossem consanguíneos. A adoção poderia se Os seguintes princípios e diretrizes devem guiar a
dissolver por vontade das partes. Caso houvessem filhos deci- são pela adoção:
naturais reconhecidos ou legitimados os filhos adotivos - Condição da criança e do adolescente como ser de
direitos: As crianças são detentoras de direitos previstos
não participavam da su- cessão além de não se desfazer o
na lei 8.069/90 e na Constituição Federal de 1988;
vínculo com os parentes naturais, somente no que dizia
respeito ao pátrio poder. - Proteção integral e prioritária: Toda e qualquer
norma contida dentro da lei 8.069/90 deve ser voltada a
Houve um grande salto no que concerne a adoção
proteção integral dos interesses do menor;
que foi a letra trazida pela Constituição Federal de 1988
em seu artigo 227 e com o ECA, que versa sobre todas as - Responsabilidade primária e solidaria do poder pú-
blico: tanto nos casos ressalvados pelo E.C.A (Estatuto da
garantias constitucionais e no que tange a adoção vem
Criança e do Adolescente) quanto nos casos que a CF/88
dos artigos 39 ao 52-D falando sobre a regularização da
(Constituição Federal de 1988) e demais objetos legais es-
adoção e traz como princípio basilar o melhor interesse
pecíficos, é, dever dos três poderes atuarem no que for
da criança, além de ter como fundamento o afeto de pai
ne- cessário para a proteção do menor;
para filho sem que haja qualquer diferenciação para com
os filhos biológicos. Ainda no que concerne a adoção, foi - Interesse superior da criança e do adolescente: me-
diante a necessidade da intervenção estatal é necessário
criada para dar efetividade ao ECA a Lei nº 12.010 de 03
que se dê privilégio ao interesse do que for melhor para a
de agosto de 2009, que tem o intuito de alterar o direito à
criança e/ou adolescente. O primeiro interesse a ser
convivência familiar
obser- vado é o que trouxer melhor benefício a estes;
mostrando com clareza como deve ocorrer a adoção.
- Privacidade: A promoção dos direitos deve ser
Para ser candidato a adoção deve ter cumprido uma
sempre feita respeitando a privação e o direito da
série de requisitos para se tornar hábil, estes requisitos
imagem, a sua vida privada e a intimidade;
são elencados na lei. O primeiro deles é a qualificação
- Intervenção precoce: Ao primeiro sinal de perigo e
comple- ta: da pessoa que deseja adotar ou das pessoas
ris- co ao menor, o Estado deve intervir para reverter a
que dese- jam no caso de casais juntamente com os
situação presente;
dados familiares, dados que vão completar não só a ficha
- Intervenção mínima;
do casal ou pessoa que deseja adotar, mais da família
- Proporcionalidade e atualidade: Ser a atitude
onde o menor vai residir e ter sua formação os
tomada de acordo com a proporção de perigo existente
documentos pessoais como cópias de certidão de
no momen- to, evitando e revertendo o risco de morte;
nascimento (quando solteiros), de certidão de casamento
- Responsabilidade parental: a intervenção deve ser a
(quando casados), cópias de declaração de período de
princípio para que os pais tomem responsabilidade sobre
união estável, Cópias de Certidão de identidade (RG),
seus filhos;
Comprovante da renda da pessoa ou casal, compro- vante
- Prevalência da família: Primeiro se dará a preferên-
que demostre que as condições vão suprir a neces- sidade
cia a família natural para que a criança continue com seus
de se incluir mais um membro naquele lar, compro- vante
pais depois a preferência vai ser da família contínua
de moradia em que prove a pessoa ter sua residência que
(família natural a primeira e extensa a segunda), em último
acolherá o novo integrante.
caso a criança/adolescente vai ser direcionada a família
substituta.

11
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

- Obrigatoriedade da informação: respeitando o es-


tágio de desenvolvimento e compreensão da criança ou Art. 54. É dever do Estado assegurar à criança e ao
adolescente, além de seus pais e responsáveis devem ser ado- lescente:
informados o motivo em que se dá a intervenção e como I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito,
esta se processou; inclu- sive para os que a ele não tiveram acesso na idade
- Oitiva obrigatória e participação: a criança ou própria;
adoles- cente separados ou na companhia de seus pais, II - progressiva extensão da obrigatoriedade e gra-
responsá- veis ou pessoas por ela indicados; bem como tuidade ao ensino médio;
seus pais e responsáveis, tem o direito de serem ouvidas e III - atendimento educacional especializado aos por-
sua opinião deve ser considerada pelas autoridades do tadores de deficiência, preferencialmente na rede regular
judiciário. de ensino;
- Afastamento da criança e do adolescente do IV - atendimento em creche e pré-escola às crianças
convívio familiar: É um processo contencioso que de zero a cinco anos de idade;
importara aos pais o direito do contraditório e da ampla V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da
defesa, este procedi- mento é de competência do pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de
judiciário (procedimento judi- cial) artigo 28 §§ 1° e 2° do cada um;
E.C.A; VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às
- Acolhimento familiar: medida de proteção criada condições do adolescente trabalhador;
para o amparo da criança até que seja resolvida a VII - atendimento no ensino fundamental, através de
situação; programas suplementares de material didático-escolar,
- Guia de acolhimento: será elaborado pelo poder Ju- transporte, alimentação e assistência à saúde.
diciário um guia para encaminhar à criança a entidade de § 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é di-
acolhimento (guia deve conter a causa da retirada e reito público subjetivo.
perma- nência do menor fora da sua família natural além § 2º O não oferecimento do ensino obrigatório pelo
de todos os dados) poder público ou sua oferta irregular importa
- Plano individual de atendimento: cada criança vai ter responsabi- lidade da autoridade competente.
um plano a ser desenvolvido visando sua adaptação a § 3º Compete ao poder público recensear os educan-
nova família; dos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar,
- Destituição do poder familiar: Promovida pelo M.P junto aos pais ou responsável, pela frequência à escola.
(Ministério público) sendo para isto necessário prévio
aviso a entidade de acolhimento familiar, ou, responsáveis Art. 55. Os pais ou responsável têm a obrigação de ma-
pela execução da política municipal de garantia do direito tricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino.
a con- vivência familiar.
- Cadastro de crianças a adolescentes à regime Art. 56. Os dirigentes de estabelecimentos de ensino
institu- cional e familiar: é um cadastro para crianças e fundamental comunicarão ao Conselho Tutelar os casos
adolescentes que necessitem de acolhimento familiar ou de:
institucional de- vido a algum registro de maus tratos. I - maus-tratos envolvendo seus alunos;
A Lei no 13.509 de 22 de novembro de 2017 surgiu II - reiteração de faltas injustificadas e de evasão
com o propósito de maximizar a efetividade das es- colar, esgotados os recursos escolares;
disposições do ECA, inclusive no âmbito da adoção, III - elevados níveis de repetência.
possuindo a peculiari- dade de ser mais rigorosa no que
tange ao cumprimento de prazos para maior celeridade Art. 57. O poder público estimulará pesquisas,
do processo. experiên- cias e novas propostas relativas a calendário,
seriação, currículo, metodologia, didática e avaliação,
Capítulo IV com vistas à inserção de crianças e adolescentes excluídos
Do Direito à Educação, à Cultura, ao Esporte e ao do ensino fundamental obrigatório.
Lazer
Art. 58. No processo educacional respeitar-se-ão os va-
Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à lores culturais, artísticos e históricos próprios do contexto
educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua social da criança e do adolescente, garantindo-se a estes a
pessoa, preparo para o exercício da cidadania e liberdade da criação e o acesso às fontes de cultura.
qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes:
I - igualdade de condições para o acesso e perma- Art. 59. Os municípios, com apoio dos estados e da
nência na escola; União, estimularão e facilitarão a destinação de
II - direito de ser respeitado por seus educadores; recursos e espaços para programações culturais,
III - direito de contestar critérios avaliativos, esportivas e de lazer voltadas para a infância e a
podendo recorrer às instâncias escolares superiores; juventude.
IV - direito de organização e participação em
entida- des estudantis;
V - acesso à escola pública e gratuita próxima de sua
residência.
Parágrafo único. É direito dos pais ou responsáveis
ter ciência do processo pedagógico, bem como participar
da de- finição das propostas educacionais.

11
5
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Capítulo V
Art. 65. Ao adolescente aprendiz, maior de quatorze
Do Direito à Profissionalização e à Proteção no
anos, são assegurados os direitos trabalhistas e
Trabalho previden- ciários.
Uma vez que o adolescente está autorizado a
Art. 60. É proibido qualquer trabalho a menores de trabalhar, mesmo que na condição de menor aprendiz,
quatorze anos de idade, salvo na condição de aprendiz. possui direi- tos trabalhistas e previdenciários.
Preconiza o artigo 7º, XXXIII, CF a “proibição de tra-
balho noturno, perigoso ou insalubre a menores de Art. 66. Ao adolescente portador de deficiência é
dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis asse- gurado trabalho protegido.
anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de O adolescente que possui deficiência não pode ser ex-
quatorze anos”. posto a uma situação de risco em decorrência da
Portanto, em decorrência da própria norma constitu- atividade laboral.
cional, nenhuma criança ou adolescente pode trabalhar
an- tes dos 14 anos de idade. Evidentemente que há Art. 67. Ao adolescente empregado, aprendiz, em regi-
algumas exceções a esta regra, devidamente fiscalizadas me familiar de trabalho, aluno de escola técnica, assistido
pelo Con- selho Tutelar, como é o caso dos artistas mirins. em entidade governamental ou não-governamental, é ve-
Entre 14 anos e 16 anos de idade somente será dado trabalho:
possível o trabalho na condição de menor aprendiz, cuja I - noturno, realizado entre as vinte e duas horas de
natureza é de ensino técnico-profissional, viabilizando a um dia e as cinco horas do dia seguinte;
futura inser- ção do adolescente no mercado de trabalho. II - perigoso, insalubre ou penoso;
A partir dos 16 anos, o menor pode trabalhar, mas não III - realizado em locais prejudiciais à sua formação e
no período noturno ou em condições de periculosidade e ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social;
insalubridade. IV - realizado em horários e locais que não permitam a
frequência à
Art. 61. A proteção ao trabalho dos adolescentes é re- O menor aprendiz está proibido de trabalhar no
escola.
gulada por legislação especial, sem prejuízo do perío- do noturno, em trabalho que o coloque exposto a
disposto pericu-
nesta Lei. losidade (ex.: em andaimes, em áreas com risco de incêndio
ou choques), insalubridade (ex.: em freezers de frigoríficos,
expostos a radiação) ou penosidade (ex.: excesso de força
Art. 62. Considera-se aprendizagem a formação téc-
física exigida).
nico-profissional ministrada segundo as diretrizes e bases
da legislação de educação em vigor.
Art. 68. O programa social que tenha por base o tra-
balho educativo, sob responsabilidade de entidade
Art. 63. A formação técnico-profissional obedecerá aos
governa- mental ou não-governamental sem fins
seguintes princípios:
lucrativos, deverá assegurar ao adolescente que dele
I - garantia de acesso e frequência obrigatória ao participe condições de capacitação para o exercício de
en- sino regular; atividade regular remu- nerada.
II - atividade compatível com o desenvolvimento § 1º Entende-se por trabalho educativo a atividade
do adolescente; laboral em que as exigências pedagógicas relativas ao
III - horário especial para o exercício das atividades. desenvolvimento pessoal e social do educando prevalecem
Aquele que trabalha na condição de menor aprendiz sobre o aspecto produtivo.
é
as condiçõesa para
obrigado frequentar
que o afaça,
escola, devendo ser
notadamente facilitadas
pelo estabe- b § 2º A remuneração que o adolescente recebe pelo tra-
lecimento de horário especial de trabalho. Além disso, a alho efetuado ou a participação na venda dos produtos de
atividade laboral deve ser compatível com as atividades seu trabalho não desfigura o caráter educativo.
de ensino, até mesmo por se tratar de ensino técnico- Os programas sociais voltados à capacitação dos ado-
profis- sionalizante. lescentes devem sempre ter por objetivo educá-lo para
Ex.: um jovem pode trabalhar no período matutino, que ele adquira condições de inserir-se no mercado de
fre- quentar o SENAI na parte da tarde e ir ao colégio no traba- lho. Deve ser ensinado, logo, dele não se deve
ensino médio noturno. cobrar tanta produtividade, mas sim deve ser avaliado
pelo seu apren- dizado. O fato do trabalho ser
Art. 64. Ao adolescente até quatorze anos de idade é remunerado não desvirtua este propósito.
assegurada bolsa de aprendizagem.
Toda criança e adolescente que necessitar receberá Art. 69. O adolescente tem direito à
fo- mento para que não se desvincule das atividades de profissionalização e à proteção no trabalho, observados
ensi- no. Trata-se de incentivo àquele que sem auxílio os seguintes aspec- tos, entre outros:
acabaria entrando em situação irregular e trabalhando. I - respeito à condição peculiar de pessoa em desen-
volvimento;
II - capacitação profissional adequada ao mercado de
trabalho.

11
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Com efeito, profissionalização e proteção no trabalho


são direitos fundamentais garantidos ao adolescente, exi- Art. 70-B. As entidades, públicas e privadas, que atuem
gindo-se neste campo que sua condição peculiar inerente nas áreas a que se refere o art. 71, dentre outras, devem
ao processo de aprendizado seja respeitada e que o contar, em seus quadros, com pessoas capacitadas a
trabalho sirva para permitir a sua inserção no mercado de re- conhecer e comunicar ao Conselho Tutelar
trabalho. suspeitas ou casos de maus-tratos praticados contra
crianças e adoles- centes.
Título III Parágrafo único. São igualmente responsáveis pela co-
Da municação de que trata este artigo, as pessoas encarrega-
Prevenção das, por razão de cargo, função, ofício, ministério, profissão
ou ocupação, do cuidado, assistência ou guarda de crianças
e adolescentes, punível, na forma deste Estatuto, o injustifi-
Capítulo I
Disposições Gerais cado retardamento ou omissão, culposos ou dolosos.

Art. 70. É dever de todos prevenir a ocorrência de Art. 71. A criança e o adolescente têm direito a infor-
ameaça ou violação dos direitos da criança e do mação, cultura, lazer, esportes, diversões, espetáculos
adoles- cente. e produtos e serviços que respeitem sua condição peculiar
de pessoa em desenvolvimento.
Art. 70-A. A União, os Estados, o Distrito Federal e os
Mu- nicípios deverão atuar de forma articulada na Art. 72. As obrigações previstas nesta Lei não excluem
elaboração de políticas públicas e na execução de da prevenção especial outras decorrentes dos princípios
ações destinadas a coibir o uso de castigo físico ou de por ela adotados.
tratamento cruel ou degradante e difundir formas não
violentas de educação de crianças e de adolescentes, Art. 73. A inobservância das normas de prevenção im-
tendo como principais ações: I - a promoção de portará em responsabilidade da pessoa física ou jurídica,
campanhas educativas permanentes para a divulgação do nos termos desta Lei.
direito da criança e do adolescente de serem educados e
Capítulo II
cuidados sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel
ou degradante e dos instrumentos de prote- Da Prevenção Especial
ção aos direitos humanos;
Seção I
II - a integração com os órgãos do Poder Judiciário, do
Ministério Público e da Defensoria Pública, com o Conselho Da informação, Cultura, Lazer, Esportes, Diversões
Tutelar, com os Conselhos de Direitos da Criança e do Ado- e Espetáculos
lescente e com as entidades não governamentais que
atuam na promoção, proteção e defesa dos direitos da Art. 74. O poder público, através do órgão competente,
criança e do adolescente; regulará as diversões e espetáculos públicos,
III - a formação continuada e a capacitação dos profis- informan- do sobre a natureza deles, as faixas etárias
sionais de saúde, educação e assistência social e dos a que não se recomendem, locais e horários em que sua
demais agentes que atuam na promoção, proteção e defesa apresentação se mostre inadequada.
dos di- reitos da criança e do adolescente para o Parágrafo único. Os responsáveis pelas diversões e es-
desenvolvimento das competências necessárias à petáculos públicos deverão afixar, em lugar visível e de fácil
prevenção, à identificação de evidências, ao diagnóstico e acesso, à entrada do local de exibição, informação
ao enfrentamento de todas as formas de violência contra a destacada sobre a natureza do espetáculo e a faixa etária
criança e o adolescente; especificada no certificado de classificação.
IV - o apoio e o incentivo às práticas de resolução pací-
fica de conflitos que envolvam violência contra a criança e Art. 75. Toda criança ou adolescente terá acesso às di-
o adolescente; versões e espetáculos públicos classificados como ade-
V - a inclusão, nas políticas públicas, de ações que quados à sua faixa etária.
visem a garantir os direitos da criança e do adolescente, Parágrafo único. As crianças menores de dez anos so-
desde a aten- ção pré-natal, e de atividades junto aos pais mente poderão ingressar e permanecer nos locais de apre-
e responsáveis com o objetivo de promover a informação, sentação ou exibição quando acompanhadas dos pais ou
a reflexão, o de- bate e a orientação sobre alternativas ao responsável.
uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante
no processo educativo; VI - a promoção de espaços Art. 76. As emissoras de rádio e televisão somente exi-
intersetoriais locais para a articulação de ações e a birão, no horário recomendado para o público infanto ju-
elaboração de planos de atuação conjunta focados nas venil, programas com finalidades educativas,
famílias em situação de violência, com participação de artísticas, culturais e informativas.
profissionais de saúde, de assistência social e de educação e Parágrafo único. Nenhum espetáculo será apresentado
de órgãos de promoção, proteção e defesa dos ou anunciado sem aviso de sua classificação, antes de sua
direitos da criança e do adolescente. transmissão, apresentação ou exibição.
Parágrafo único. As famílias com crianças e
adolescentes com deficiência terão prioridade de
atendimento nas ações e políticas públicas de prevenção e
proteção.

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7
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Art. 77. Os proprietários, diretores, gerentes e funcioná-


rios de empresas que explorem a venda ou aluguel de a) tratar-se de comarca contígua à da residência da
fitas de programação em vídeo cuidarão para que não criança, se na mesma unidade da Federação, ou incluída
haja venda ou locação em desacordo com a na mesma região metropolitana;
b) a criança estiver acompanhada:
classificação atribuída pelo órgão competente.
Parágrafo único. As fitas a que alude este artigo 1) de ascendente ou colateral maior, até o terceiro
grau, comprovado documentalmente o parentesco;
deverão exibir, no invólucro, informação sobre a natureza
da obra e a faixa etária a que se destinam. 2) de pessoa maior, expressamente autorizada
pelo pai, mãe ou responsável.
§ 2º A autoridade judiciária poderá, a pedido dos pais ou
Art. 78. As revistas e publicações contendo material
responsável, conceder autorização válida por dois anos.
impróprio ou inadequado a crianças e adolescentes de-
verão ser comercializadas em embalagem lacrada, com
Art. 84. Quando se tratar de viagem ao exterior, a
a advertência de seu conteúdo.
auto- rização é dispensável, se a criança ou
Parágrafo único. As editoras cuidarão para que as
adolescente:
capas que contenham mensagens pornográficas ou
I - estiver acompanhado de ambos os pais ou
obscenas se- jam protegidas com embalagem opaca.
respon- sável;
II - viajar na companhia de um dos pais, autorizado
Art. 79. As revistas e publicações destinadas ao pú-
expressamente pelo outro através de documento com
blico infanto-juvenil não poderão conter ilustrações, fo-
fir- ma reconhecida.
tografias, legendas, crônicas ou anúncios de bebidas al-
coólicas, tabaco, armas e munições, e deverão respeitar
Art. 85. Sem prévia e expressa autorização judicial, ne-
os valores éticos e sociais da pessoa e da família. nhuma criança ou adolescente nascido em território
na- cional poderá sair do País em companhia de
Art. 80. Os responsáveis por estabelecimentos que estrangeiro residente ou domiciliado no exterior.
explo- rem comercialmente bilhar, sinuca ou congênere
ou por casas de jogos, assim entendidas as que realizem
Parte Especial
apostas, ainda que eventualmente, cuidarão para que não
seja per- mitida a entrada e a permanência de Título I
crianças e adoles- centes no local, afixando aviso para Da Política de Atendimento
orientação do público.
Capítulo I
Seção II Disposições
Dos Produtos e Serviços Gerais
Art. 81. É proibida a venda à criança ou ao adoles- Art. 86. A política de atendimento dos direitos da
cente de: criança e do adolescente far-se-á através de um conjunto
I - armas, munições e articula- do de ações governamentais e não-
explosivos; II - bebidas governamentais, da União, dos estados, do Distrito
alcoólicas; Federal e dos municípios.
III - produtos cujos componentes possam causar
depen- dência física ou psíquica ainda que por Art. 87. São linhas de ação da política de
utilização indevi- da; atendimen-
IV - fogos de estampido e de artifício, exceto to:
aqueles que pelo seu reduzido potencial sejam incapazes I - políticas sociais básicas;
de provocar qualquer dano físico em caso de utilização II - serviços, programas, projetos e benefícios de
indevida; as- sistência social de garantia de proteção social e de
V - revistas e publicações a que alude o art. preven- ção e redução de violações de direitos, seus
78; VI - bilhetes lotéricos e equivalentes. agravamentos ou reincidências;
III - serviços especiais de prevenção e atendimento
Art. 82. É proibida a hospedagem de criança ou médico e psicossocial às vítimas de negligência, maus-
ado- lescente em hotel, motel, pensão ou tra- tos, exploração, abuso, crueldade e opressão;
estabelecimento congênere, salvo se autorizado ou IV - serviço de identificação e localização de pais,
acompanhado pelos pais ou responsável. res- ponsável, crianças e adolescentes desaparecidos;
V - proteção jurídico-social por entidades de defesa
Seção III dos direitos da criança e do adolescente;
Da Autorização para Viajar VI - políticas e programas destinados a prevenir ou
abreviar o período de afastamento do convívio
Art. 83. Nenhuma criança poderá viajar para fora familiar e a garantir o efetivo exercício do direito à
da comarca onde reside, desacompanhada dos pais ou convivência familiar de crianças e adolescentes;
responsável, sem expressa autorização judicial. VII - campanhas de estímulo ao acolhimento sob
§ 1º A autorização não será exigida quando: forma de guarda de crianças e adolescentes afastados do
convívio familiar e à adoção, especificamente inter-racial,
de crianças maiores ou de adolescentes, com necessidades
específicas de saúde ou com deficiências e de grupos de
irmãos.
11
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Art. 88. São diretrizes da política de


III - colocação familiar;
atendimento: I - municipalização do
atendimento; IV - acolhimento institucional;
II - criação de conselhos municipais, estaduais e V- prestação de serviços à
nacional dos direitos da criança e do adolescente, órgãos comunidade; VI - liberdade assistida;
deliberativos e controladores das ações em todos os níveis, VII - semiliberdade;
assegurada a participação popular paritária por meio de e VIII - internação.
or- ganizações representativas, segundo leis federal, § 1o As entidades governamentais e não governamen-
estaduais e municipais; tais deverão proceder à inscrição de seus programas, es-
III - criação e manutenção de programas pecificando os regimes de atendimento, na forma definida
específicos, observada a descentralização político- neste artigo, no Conselho Municipal dos Direitos da Crian-
administrativa; ça e do Adolescente, o qual manterá registro das
IV - manutenção de fundos nacional, estaduais e inscrições e de suas alterações, do que fará comunicação
mu- nicipais vinculados aos respectivos conselhos dos ao Conselho Tutelar e à autoridade judiciária.
direitos da criança e do adolescente; § 2o Os recursos destinados à implementação e ma-
V - integração operacional de órgãos do Judiciário, nutenção dos programas relacionados neste artigo serão
Ministério Público, Defensoria, Segurança Pública e previstos nas dotações orçamentárias dos órgãos públicos
As- sistência Social, preferencialmente em um mesmo encarregados das áreas de Educação, Saúde e Assistência
local, para efeito de agilização do atendimento inicial a Social, dentre outros, observando-se o princípio da priori-
adoles- cente a quem se atribua autoria de ato infracional; dade absoluta à criança e ao adolescente preconizado
VI - integração operacional de órgãos do pelo caput do art. 227 da Constituição Federal e pelo
Judiciário, Ministério Público, Defensoria, Conselho caput e parágrafo único do art. 4o desta Lei.
Tutelar e en- carregados da execução das políticas sociais § 3o Os programas em execução serão reavaliados
básicas e de assistência social, para efeito de agilização do pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do
atendimento de crianças e de adolescentes inseridos em Adoles- cente, no máximo, a cada 2 (dois) anos,
programas de acolhimento familiar ou institucional, com constituindo-se critérios para renovação da autorização de
vista na sua rá- pida reintegração à família de origem ou, funcionamento: I - o efetivo respeito às regras e princípios
se tal solução se mostrar comprovadamente inviável, sua desta Lei, bem como às resoluções relativas à modalidade
colocação em famí- lia substituta, em quaisquer das de atendimento prestado expedidas pelos Conselhos de
modalidades previstas no art. 28 desta Lei; Direitos da Criança e
VII - mobilização da opinião pública para a do Adolescente, em todos os níveis;
indispen- sável participação dos diversos segmentos da II - a qualidade e eficiência do trabalho desenvolvido,
sociedade; atestadas pelo Conselho Tutelar, pelo Ministério Público e
VIII - especialização e formação continuada dos pela Justiça da Infância e da Juventude;
pro- fissionais que trabalham nas diferentes áreas da III - em se tratando de programas de acolhimento insti-
atenção à primeira infância, incluindo os conhecimentos tucional ou familiar, serão considerados os índices de
sobre direitos da criança e sobre desenvolvimento infantil; sucesso na reintegração familiar ou de adaptação à família
IX - formação profissional com abrangência dos substitu- ta, conforme o caso.
di- versos direitos da criança e do adolescente que
favoreça a intersetorialidade no atendimento da criança e Art. 91. As entidades não-governamentais somente
do adoles- cente e seu desenvolvimento integral; poderão funcionar depois de registradas no Conselho
X - realização e divulgação de pesquisas sobre de- Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, o
senvolvimento infantil e sobre prevenção da violência. qual comunicará o registro ao Conselho Tutelar e à autori-
dade judiciária da respectiva localidade.
Art. 89. A função de membro do conselho nacional e § 1o Será negado o registro à entidade que:
dos conselhos estaduais e municipais dos direitos da a) não ofereça instalações físicas em condições
criança e do adolescente é considerada de interesse adequa- das de habitabilidade, higiene, salubridade e
público relevante e não será remunerada. segurança;
b) não apresente plano de trabalho compatível com os
Capítulo II
princípios desta Lei;
Das Entidades de Atendimento c) esteja irregularmente constituída;
d) tenha em seus quadros pessoas inidôneas.
Seção I
e) não se adequar ou deixar de cumprir as resoluções e
Disposições
deliberações relativas à modalidade de atendimento pres-
Gerais
tado expedidas pelos Conselhos de Direitos da Criança e do
Adolescente, em todos os níveis.
Art. 90. As entidades de atendimento são respon-
sáveis pela manutenção das próprias unidades, assim § 2o O registro terá validade máxima de 4 (quatro)
como pelo planejamento e execução de programas de anos, cabendo ao Conselho Municipal dos Direitos da
prote- ção e socioeducativos destinados a crianças e Criança e do Adolescente, periodicamente, reavaliar o
adolescentes, em regime de: cabimento de sua renovação, observado o disposto no §
I - orientação e apoio sociofamiliar; 1o deste artigo.
II - apoio socioeducativo em meio aberto;

11
9
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Art. 92. As entidades que desenvolvam programas de


acolhimento familiar ou institucional deverão adotar os se- Art. 93. As entidades que mantenham programa de
guintes princípios: acolhimento institucional poderão, em caráter
I - preservação dos vínculos familiares e promoção excepcional e de urgência, acolher crianças e adolescentes
da reintegração familiar; sem prévia determinação da autoridade competente,
II - integração em família substituta, quando esgo- fazendo comuni- cação do fato em até 24 (vinte e quatro)
tados os recursos de manutenção na família natural ou ex- horas ao Juiz da Infância e da Juventude, sob pena de
tensa; responsabilidade.
III - atendimento personalizado e em pequenos Parágrafo único. Recebida a comunicação, a
gru- pos; autoridade judiciária, ouvido o Ministério Público e se
IV - desenvolvimento de atividades em regime de necessário com o apoio do Conselho Tutelar local, tomará
coeducação; as medidas neces- sárias para promover a imediata
V - não desmembramento de grupos de irmãos; reintegração familiar da criança ou do adolescente ou, se
VI - evitar, sempre que possível, a transferência para por qualquer razão não for isso possível ou recomendável,
outras entidades de crianças e adolescentes abrigados; para seu encaminhamento a programa de acolhimento
VII - participação na vida da comunidade local; familiar, institucional ou a família substituta, observado o
VIII - preparação gradativa para o disposto no § 2o do art. 101 desta Lei.
desligamento;
IX - participação de pessoas da comunidade no Art. 94. As entidades que desenvolvem programas
pro- cesso educativo. de internação têm as seguintes obrigações, entre outras:
§ 1o O dirigente de entidade que desenvolve progra- I - observar os direitos e garantias de que são titula-
ma de acolhimento institucional é equiparado ao res os adolescentes;
guardião, para todos os efeitos de direito. II - não restringir nenhum direito que não tenha
§ 2o Os dirigentes de entidades que desenvolvem pro- sido objeto de restrição na decisão de internação;
gramas de acolhimento familiar ou institucional remeterão III - oferecer atendimento personalizado, em
à autoridade judiciária, no máximo a cada 6 (seis) meses, peque- nas unidades e grupos reduzidos;
relatório circunstanciado acerca da situação de cada crian- IV - preservar a identidade e oferecer ambiente
ça ou adolescente acolhido e sua família, para fins da rea- de respeito e dignidade ao adolescente;
valiação prevista no § 1o do art. 19 desta Lei. V - diligenciar no sentido do restabelecimento e da
§ 3o Os entes federados, por intermédio dos Poderes preservação dos vínculos familiares;
Executivo e Judiciário, promoverão conjuntamente a per- VI - comunicar à autoridade judiciária, periodica-
manente qualificação dos profissionais que atuam direta mente, os casos em que se mostre inviável ou impossível
ou indiretamente em programas de acolhimento o reatamento dos vínculos familiares;
institucio- nal e destinados à colocação familiar de VII - oferecer instalações físicas em condições ade-
crianças e adoles- centes, incluindo membros do Poder quadas de habitabilidade, higiene, salubridade e segu-
Judiciário, Ministério Público e Conselho Tutelar.
rança e os objetos necessários à higiene pessoal;
§ 4o Salvo determinação em contrário da autorida-
VIII - oferecer vestuário e alimentação suficientes e
de judiciária competente, as entidades que desenvolvem
adequados à faixa etária dos adolescentes atendidos;
programas de acolhimento familiar ou institucional, se ne-
IX - oferecer cuidados médicos, psicológicos,
cessário com o auxílio do Conselho Tutelar e dos órgãos
odonto- lógicos e farmacêuticos;
de assistência social, estimularão o contato da criança ou
X - propiciar escolarização e profissionalização;
adolescente com seus pais e parentes, em cumprimento
ao disposto nos incisos I e VIII do caput deste artigo. XI - propiciar atividades culturais, esportivas e de
§ 5o As entidades que desenvolvem programas de lazer;
aco- lhimento familiar ou institucional somente poderão XII - propiciar assistência religiosa àqueles que
rece- ber recursos públicos se comprovado o atendimento deseja- rem, de acordo com suas crenças;
dos princípios, exigências e finalidades desta Lei. XIII - proceder a estudo social e pessoal de cada caso;
§ 6o O descumprimento das disposições desta Lei XIV - reavaliar periodicamente cada caso, com inter-
pelo dirigente de entidade que desenvolva programas de valo máximo de seis meses, dando ciência dos resultados
acolhimento familiar ou institucional é causa de sua desti- à
tuição, sem prejuízo da apuração de sua responsabilidade autoridade competente;
administrativa, civil e criminal. XV - informar, periodicamente, o adolescente
§ 7o Quando se tratar de criança de 0 (zero) a 3 (três) interna- do sobre sua situação processual;
anos em acolhimento institucional, dar-se-á especial aten- XVI - comunicar às autoridades competentes todos os
ção à atuação de educadores de referência estáveis e quali- casos de adolescentes portadores de moléstias
tativamente significativos, às rotinas específicas e ao infectocon- tagiosas;
atendi- mento das necessidades básicas, incluindo as de XVII - fornecer comprovante de depósito dos perten-
afeto como prioritárias. ces dos adolescentes;
XVIII - manter programas destinados ao apoio e
acompanhamento de egressos;
XIX - providenciar os documentos necessários ao
exercício da cidadania àqueles que não os tiverem;

120
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

XX - manter arquivo de anotações onde constem


data e circunstâncias do atendimento, nome do Título II
adolescente, seus pais ou responsável, parentes, endereços, Das Medidas de
sexo, idade, acom- panhamento da sua formação, relação
de seus pertences e demais dados que possibilitem sua Proteção Capítulo I
identificação e a in- dividualização do atendimento. Disposições Gerais
§ 1o Aplicam-se, no que couber, as obrigações cons- Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adoles-
tantes deste artigo às entidades que mantêm programas cente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos
de acolhimento institucional e familiar. nesta Lei forem ameaçados ou violados:
§ 2º No cumprimento das obrigações a que alude este I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;
artigo as entidades utilizarão preferencialmente os recur- II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou
sos da comunidade. respon-
sável;
Art. 94-A. As entidades, públicas ou privadas, que abri- III - em razão de sua conduta.
guem ou recepcionem crianças e adolescentes, ainda que
em caráter temporário, devem ter, em seus quadros, Capítulo II
profissio- nais capacitados a reconhecer e reportar ao Das Medidas Específicas de Proteção
Conselho Tutelar suspeitas ou ocorrências de maus-tratos.
Art. 99. As medidas previstas neste Capítulo poderão
Seção II
ser aplicadas isolada ou cumulativamente, bem como
Da Fiscalização das Entidades substituídas a qualquer tempo.
Art. 95. As entidades governamentais e não-governa-
Art. 100. Na aplicação das medidas levar-se-ão em
mentais referidas no art. 90 serão fiscalizadas pelo Judi-
con- ta as necessidades pedagógicas, preferindo-se
ciário, pelo Ministério Público e pelos Conselhos Tute-
aquelas que visem ao fortalecimento dos vínculos
lares.
familiares e co- munitários.
Parágrafo único. São também princípios que regem a
Art. 96. Os planos de aplicação e as prestações de
aplicação das medidas:
contas serão apresentados ao estado ou ao município,
conforme a origem das dotações orçamentárias. I - condição da criança e do adolescente como sujeitos
de direitos: crianças e adolescentes são os titulares dos
Art. 97. São medidas aplicáveis às entidades de aten- direi- tos previstos nesta e em outras Leis, bem como na
dimento que descumprirem obrigação constante do art. 94, Constitui- ção Federal;
sem prejuízo da responsabilidade civil e criminal de II - proteção integral e prioritária: a interpretação e
seus dirigentes ou prepostos: apli- cação de toda e qualquer norma contida nesta Lei
I - às entidades governamentais: deve ser voltada à proteção integral e prioritária dos
a) advertência; direitos de que crianças e adolescentes são titulares;
b) afastamento provisório de seus dirigentes; III - responsabilidade primária e solidária do poder pú-
c) afastamento definitivo de seus dirigentes; blico: a plena efetivação dos direitos assegurados a
d) fechamento de unidade ou interdição de progra- crianças e a adolescentes por esta Lei e pela Constituição
ma. Federal, salvo nos casos por esta expressamente
II - às entidades não-governamentais: ressalvados, é de responsabilidade primária e solidária das
a) advertência; 3 (três) esferas de governo, sem prejuízo da
b) suspensão total ou parcial do repasse de municipalização do atendimento e da possibilidade da
verbas públicas; execução de programas por entidades não governamentais;
c) interdição de unidades ou suspensão de progra- IV - interesse superior da criança e do adolescente: a
ma; in- tervenção deve atender prioritariamente aos interesses
d) cassação do registro. e di- reitos da criança e do adolescente, sem prejuízo da
§ 1o Em caso de reiteradas infrações cometidas por conside- ração que for devida a outros interesses legítimos
entidades de atendimento, que coloquem em risco os di- no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso
reitos assegurados nesta Lei, deverá ser o fato concreto;
comunicado ao Ministério Público ou representado V - privacidade: a promoção dos direitos e proteção da
perante autoridade judiciária competente para as criança e do adolescente deve ser efetuada no respeito
providências cabíveis, inclu- sive suspensão das atividades pela intimidade, direito à imagem e reserva da sua vida
ou dissolução da entidade. privada; VI - intervenção precoce: a intervenção das
§ 2o As pessoas jurídicas de direito público e as autoridades competentes deve ser efetuada logo que a
organi- zações não governamentais responderão pelos situação de perigo
danos que seus agentes causarem às crianças e aos seja conhecida;
adolescentes, ca- racterizado o descumprimento dos VII - intervenção mínima: a intervenção deve ser
princípios norteadores das atividades de proteção exerci- da exclusivamente pelas autoridades e instituições
específica. cuja ação seja indispensável à efetiva promoção dos
direitos e à prote- ção da criança e do adolescente;

12
1
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

VIII - proporcionalidade e atualidade: a intervenção


deve ser a necessária e adequada à situação de perigo em § 3o Crianças e adolescentes somente poderão ser
que a criança ou o adolescente se encontram no momento encaminhados às instituições que executam programas
em que a decisão é tomada; de acolhimento institucional, governamentais ou não, por
IX - responsabilidade parental: a intervenção deve ser meio de uma Guia de Acolhimento, expedida pela autori-
efe- tuada de modo que os pais assumam os seus deveres dade judiciária, na qual obrigatoriamente constará, dentre
para com a criança e o adolescente; outros:
X - prevalência da família: na promoção de direitos e I - sua identificação e a qualificação completa de seus
na proteção da criança e do adolescente deve ser dada pais ou de seu responsável, se conhecidos;
prevalência às medidas que os mantenham ou reintegrem II - o endereço de residência dos pais ou do
na sua família natural ou extensa ou, se isso não for possível, responsável, com pontos de referência;
que promovam a sua integração em família adotiva; III - os nomes de parentes ou de terceiros interessados
em tê-los sob sua guarda;
XI - obrigatoriedade da informação: a criança e o
adoles- cente, respeitado seu estágio de desenvolvimento e IV - os motivos da retirada ou da não reintegração ao
capacidade de compreensão, seus pais ou responsável convívio familiar.
devem ser informa- dos dos seus direitos, dos motivos que § 4o Imediatamente após o acolhimento da criança ou
determinaram a inter- venção e da forma como esta se do adolescente, a entidade responsável pelo programa de
processa; acolhimento institucional ou familiar elaborará um plano
individual de atendimento, visando à reintegração familiar,
XII - oitiva obrigatória e participação: a criança e o
adoles- cente, em separado ou na companhia dos pais, de ressalvada a existência de ordem escrita e fundamentada
responsável ou de pessoa por si indicada, bem como os seus em contrário de autoridade judiciária competente, caso
pais ou res- ponsável, têm direito a ser ouvidos e a em que também deverá contemplar sua colocação em
participar nos atos e na definição da medida de promoção família substituta, observadas as regras e princípios desta
dos direitos e de proteção, sendo sua opinião devidamente Lei.
considerada pela autoridade judiciária competente, § 5o O plano individual será elaborado sob a responsa-
observado o disposto nos §§ 1o e 2o do art. 28 desta Lei. bilidade da equipe técnica do respectivo programa de
aten- dimento e levará em consideração a opinião da
criança ou do adolescente e a oitiva dos pais ou do
Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no
responsável.
art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre
§ 6o Constarão do plano individual, dentre outros:
outras, as seguintes medidas:
I - os resultados da avaliação interdisciplinar;
I - encaminhamento aos pais ou responsável,
mediante termo de responsabilidade; II - os compromissos assumidos pelos pais ou responsá-
II - orientação, apoio e acompanhamento vel; e
temporários; III - matrícula e frequência III - a previsão das atividades a serem desenvolvidas
obrigatórias em estabeleci- com a criança ou com o adolescente acolhido e seus pais
mento oficial de ensino fundamental; ou res- ponsável, com vista na reintegração familiar ou,
caso seja esta vedada por expressa e fundamentada
IV - inclusão em serviços e programas oficiais ou
co- munitários de proteção, apoio e promoção da determinação ju- dicial, as providências a serem tomadas
família, da criança e do adolescente; para sua colocação em família substituta, sob direta
V - requisição de tratamento médico, psicológico supervisão da autoridade judiciária.
ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; § 7o O acolhimento familiar ou institucional ocorrerá
VI - inclusão em programa oficial ou comunitário no local mais próximo à residência dos pais ou do
de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e responsável e, como parte do processo de reintegração
toxicôma- nos; familiar, sempre que identificada a necessidade, a família
VII - acolhimento institucional; de origem será in- cluída em programas oficiais de
orientação, de apoio e de promoção social, sendo
VIII - inclusão em programa de acolhimento
familiar; IX - colocação em família substituta. facilitado e estimulado o contato com a criança ou com o
§ 1o O acolhimento institucional e o acolhimento adolescente acolhido.
familiar são medidas provisórias e excepcionais, utilizáveis § 8o Verificada a possibilidade de reintegração familiar,
como for- ma de transição para reintegração familiar ou, o responsável pelo programa de acolhimento familiar ou
não sendo esta possível, para colocação em família institucional fará imediata comunicação à autoridade judi-
substituta, não implicando privação de liberdade. ciária, que dará vista ao Ministério Público, pelo prazo de
§ 2o Sem prejuízo da tomada de medidas 5 (cinco) dias, decidindo em igual prazo.
emergenciais para proteção de vítimas de violência ou § 9o Em sendo constatada a impossibilidade de reinte-
abuso sexual e das providências a que alude o art. 130 gração da criança ou do adolescente à família de origem,
desta Lei, o afastamento da criança ou adolescente do após seu encaminhamento a programas oficiais ou comu-
convívio familiar é de competência exclusiva da autoridade nitários de orientação, apoio e promoção social, será
judiciária e importará na deflagração, a pedido do Ministério envia- do relatório fundamentado ao Ministério Público,
Público ou de quem tenha legítimo inte- resse, de no qual conste a descrição pormenorizada das
procedimento judicial contencioso, no qual se garanta aos providências toma- das e a expressa recomendação,
pais ou ao responsável legal o exercício do contraditório e subscrita pelos técnicos da entidade ou responsáveis pela
da ampla defesa. execução da política munici- pal de garantia do direito à
convivência familiar, para a des- tituição do poder familiar,
ou destituição de tutela ou guarda.

122
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§ 10. Recebido o relatório, o Ministério Público terá o


pra- zo de 15 (quinze) dias para o ingresso com a ação de O art. 101 do ECA traz um rol das medidas protetivas
destitui- ção do poder familiar, salvo se entender necessária diante da situação de risco. Essas medidas poderão ser
a realização de estudos complementares ou de outras aplicadas tanto para a criança quanto para o adolescente.
providências indis- pensáveis ao ajuizamento da demanda. São elas:
§ 11. A autoridade judiciária manterá, em cada - encaminhamento da criança e do adolescente aos
comarca ou foro regional, um cadastro contendo pais ou responsáveis, mediante termo ou
informações atuali- zadas sobre as crianças e adolescentes responsabilidade;
em regime de acolhi- mento familiar e institucional sob sua - orientação, apoio e acompanhamentos temporários
responsabilidade, com informações pormenorizadas sobre a por pessoa nomeada pelo Juiz;
situação jurídica de cada um, bem como as providências - matrícula e frequência obrigatória em
tomadas para sua reintegração familiar ou colocação em estabelecimen- to oficial de ensino fundamental (o Juiz
família substituta, em qualquer das modalidades previstas determina aos pais a obrigação);
no art. 28 desta Lei. - inclusão em programa comunitário ou oficial de
§ 12. Terão acesso ao cadastro o Ministério Público, o auxí- lio à família, à criança e ao adolescente;
Con- selho Tutelar, o órgão gestor da Assistência Social e - requisição de tratamento médico, psicológico ou
os Con- selhos Municipais dos Direitos da Criança e do psi- quiátrico em regime hospitalar (internação) ou
Adolescente e da Assistência Social, aos quais incumbe ambulato- rial (consultas periódicas);
deliberar sobre a implementação de políticas públicas que - abrigo em entidade (não se fala em orfanato). A
permitam reduzir o número de crianças e adolescentes dou- trina chama de “Tutela de Estado” quando a criança
afastados do convívio fa- miliar e abreviar o período de está em abrigo sob a proteção do Estado;
permanência em programa de acolhimento. - colocação em família substituta (é utilizada somente
em situações muito graves).
Art. 102. As medidas de proteção de que trata este O Juiz pode aplicar essas medidas isolada ou
Capítulo serão acompanhadas da regularização do registro cumulati- vamente. Pode, também, substituir uma medida
civil. pela outra a qualquer tempo (art. 99 do ECA). Antes de
§ 1º Verificada a inexistência de registro anterior, o aplicar qual- quer uma dessas medidas, o Juiz deverá
assen- to de nascimento da criança ou adolescente será ouvir os pais ou responsáveis, realizar estudo social do
feito à vista dos elementos disponíveis, mediante requisição caso e ouvir o MP. Essa oitiva do MP é obrigatória, sob
da autoridade judiciária. pena de nulidade (art. 204 do ECA). Esse rol do art. 101 é
§ 2º Os registros e certidões necessários à taxativo.
regularização de que trata este artigo são isentos de
multas, custas e emolu- mentos, gozando de absoluta Título III
prioridade. Da Prática de Ato Infracional
§ 3o Caso ainda não definida a paternidade, será
deflagra- do procedimento específico destinado à sua Capítulo I
averiguação, con- forme previsto pela Lei no 8.560, de 29 de Disposições
dezembro de 1992. Gerais
§ 4o Nas hipóteses previstas no § 3o deste artigo, é
dispen- sável o ajuizamento de ação de investigação de Art. 103. Considera-se ato infracional a conduta des-
paternidade pelo Ministério Público se, após o não crita como crime ou contravenção penal.
comparecimento ou a recusa do suposto pai em assumir a
paternidade a ele atribuí- da, a criança for encaminhada Art. 104. São penalmente inimputáveis os menores
para adoção. de dezoito anos, sujeitos às medidas previstas nesta Lei.
§ 5º Os registros e certidões necessários à inclusão, a Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, deve ser con-
qual- quer tempo, do nome do pai no assento de
siderada a idade do adolescente à data do fato.
nascimento são isentos de multas, custas e emolumentos,
gozando de absoluta prioridade. Art. 105. Ao ato infracional praticado por criança
§ 6º São gratuitas, a qualquer tempo, a averbação reque-
corresponderão as medidas previstas no art. 101.
rida do reconhecimento de paternidade no assento de
nasci- mento e a certidão correspondente.
Capítulo II
As normas de prevenção do ECA são destinadas a Dos Direitos Individuais
crian- ças e adolescentes em situação de risco. Existirá
situação de risco quando a criança ou o adolescente Art. 106. Nenhum adolescente será privado de sua
estiverem privados de assistência. Essa assistência pode ser liberdade senão em flagrante de ato infracional ou por
material (quando não se tem onde dormir, o que comer, ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária
vestir etc.), moral (quando a criança ou o adolescente competente.
permanece em local inadequado, como locais de prática Parágrafo único. O adolescente tem direito à identifi-
de jogo, prostituição etc.) ou jurídica (quando não tem cação dos responsáveis pela sua apreensão, devendo
quem o represente). ser informado acerca de seus direitos.
O menor que pratica ato infracional está em situação
de risco por estar privado de assistência moral. A situação
de risco pode decorrer de ação ou omissão do Poder
Público; ação ou omissão dos pais ou dos responsáveis; por
conduta própria.
123
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Art. 107. A apreensão de qualquer adolescente e o local


Capítulo IV
onde se encontra recolhido serão incontinenti comunicados
Das Medidas Socioeducativas
à autoridade judiciária competente e à família do
apreendi- do ou à pessoa por ele indicada.
Seção I
Parágrafo único. Examinar-se-á, desde logo e sob pena Disposições
de responsabilidade, a possibilidade de liberação Gerais
imedia- ta.
Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a
Art. 108. A internação, antes da sentença, pode ser autori- dade competente poderá aplicar ao adolescente as
de- terminada pelo prazo máximo de quarenta e cinco seguintes medidas:
dias. Parágrafo único. A decisão deverá ser fundamentada I - advertência;
e basear-se em indícios suficientes de autoria e II - obrigação de reparar o dano;
materia- III - prestação de serviços à
lidade, demonstrada a necessidade imperiosa da medida. comunidade; IV - liberdade assistida;
V - inserção em regime de semi-liberdade;
Art. 109. O adolescente civilmente identificado não VI - internação em estabelecimento
será submetido a identificação compulsória pelos ór- educacional; VII - qualquer uma das previstas no
gãos policiais, de proteção e judiciais, salvo para efeito art. 101, I a VI.
de confrontação, havendo dúvida fundada. § 1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta
a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a
O adolescente não é preso, é apreendido. gravi- dade da infração.
A internação é a medida mais gravosa para o adoles- § 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será
ad- mitida a prestação de trabalho forçado.
cente. O ECA permite a internação provisória durante o
§ 3º Os adolescentes portadores de doença ou
processo. É fixado o prazo máximo de 45 dias. Os funda-
deficiên- cia mental receberão tratamento individual e
mentos para que o Juiz decrete essa internação provisória
especializa- do, em local adequado às suas condições.
são: indícios suficientes de autoria e materialidade e
neces- sidade da medida. Art. 113. Aplica-se a este Capítulo o disposto nos arts.
Esse prazo de internação provisória será descontado 99 e 100.
na internação definitiva. Em nenhuma hipótese a criança
poderá ser internada. Criança, que é todo aquele menor Art. 114. A imposição das medidas previstas nos incisos II
de 12 anos, não se sujeita a medida sócio-educativa, mas a VI do art. 112 pressupõe a existência de provas
apenas a medida de proteção. suficientes da autoria e da materialidade da infração,
ressalvada a hipó- tese de remissão, nos termos do art. 127.
Capítulo III Parágrafo único. A advertência poderá ser aplicada
Das Garantias Processuais sem- pre que houver prova da materialidade e indícios
suficientes da autoria.
Art. 110. Nenhum adolescente será privado de sua
liber- dade sem o devido processo legal. As medidas socioeducativas dependem de um proce-
dimento judicial, só podendo ser aplicadas pelo Juiz. O
Art. 111. São asseguradas ao adolescente, entre outras, ECA apresenta dois critérios genéricos para a aplicação de
as seguintes garantias: medida socioeducativa:
I - pleno e formal conhecimento da atribuição de - capacidade do adolescente para cumprir a medida;
ato infracional, mediante citação ou meio equivalente; - circunstâncias e gravidade da infração.
II - igualdade na relação processual, podendo con- A internação é uma exceção, existindo hipóteses legais
para sua aplicação.
frontar-se com vítimas e testemunhas e produzir todas as
A medida de segurança não poderá ser aplicada ao
provas necessárias à sua defesa;
ado- lescente, tendo em vista ser medida para maior de
III - defesa técnica por advogado;
idade que apresenta periculosidade. No caso de
IV - assistência judiciária gratuita e integral aos adolescente doente mental, será aplicada medida de
ne- cessitados, na forma da lei; proteção, podendo ser re- quisitado tratamento médico.
V - direito de ser ouvido pessoalmente pela O Juiz poderá cumular medidas socioeducativas,
autoridade competente; desde que sejam compatíveis (ex.: prestação de serviço à
VI - direito de solicitar a presença de seus pais comunida- de cumulada com reparação de danos). Com
ou responsável em qualquer fase do procedimento. exceção da in- ternação, o Juiz poderá substituir as
medidas socioeducativas de acordo com o caso concreto,
visto não haver taxatividade. Se o Promotor discordar com
a medida socioeducativa aplicada, deverá entrar com
recurso de apelação. Essa ape- lação do ECA possui juízo
de retratação, ou seja, o Juiz pode voltar atrás na decisão.
O Tribunal competente para julgar
essa apelação é o TJ.

124
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Seção II
Como a medida é mais gravosa, a lei fixa um prazo
Da Advertência máximo de 6 meses para essa prestação e um máximo de
8 horas semanais. Essas 8 horas poderão ser estabeleci-
Art. 115. A advertência consistirá em admoestação das discricionariamente, desde que não prejudiquem a
verbal, que será reduzida a termo e assinada. fre- quência ao trabalho e à escola. Deverá ser levada em
conta a aptidão do adolescente para a aplicação da
Disposta no art. 115 do ECA, é uma medida sócio-e- medida.
ducativa que consiste em uma admoestação verbal que é
aplicada pelo Juiz ao adolescente e que é reduzida a ter- Seção V
mo. É destinada a atos de menor gravidade. Da Liberdade Assistida
Para a aplicação da advertência, o Juiz deve levar em
consideração a prova da materialidade e indícios suficien- Art. 118. A liberdade assistida será adotada sempre
tes de autoria. É a única medida que o Juiz poderá aplicar que se afigurar a medida mais adequada para o fim
fundamentando-se somente em indícios de autoria. de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente.
§ 1º A autoridade designará pessoa capacitada para
Seção III acompanhar o caso, a qual poderá ser recomendada por
Da Obrigação de Reparar o Dano entidade ou programa de atendimento.
§ 2º A liberdade assistida será fixada pelo prazo míni-
Art. 116. Em se tratando de ato infracional com re- mo de seis meses, podendo a qualquer tempo ser prorro-
flexos patrimoniais, a autoridade poderá determinar, se gada, revogada ou substituída por outra medida, ouvido o
for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o orientador, o Ministério Público e o defensor.
ressarcimento do dano, ou, por outra forma, compense o
prejuízo da vítima. Art. 119. Incumbe ao orientador, com o apoio e a su-
Parágrafo único. Havendo manifesta impossibilidade, a pervisão da autoridade competente, a realização dos
medida poderá ser substituída por outra adequada. seguin- tes encargos, entre outros:
I - promover socialmente o adolescente e sua família,
Obrigação de reparar o dano (art. 116 do ECA). Há um fornecendo-lhes orientação e inserindo-os, se necessário,
pressuposto: o ato infracional deve ter causado um dano em programa oficial ou comunitário de auxílio e assistência
à vítima. Essa reparação é para a vítima que sofreu o dano. so- cial;
É uma medida voltada para o adolescente, então deve ser II - supervisionar a frequência e o aproveitamento es-
estabelecida de acordo com a possibilidade de cumpri- colar do adolescente, promovendo, inclusive, sua matrícula;
mento pelo adolescente (ex.: devolução da coisa furtada, III - diligenciar no sentido da profissionalização do
pequenos serviços a título de reparação etc.). ado- lescente e de sua inserção no mercado de trabalho;
A jurisprudência admite que essa reparação de dano IV - apresentar relatório do caso.
pode ser aplicada à criança (ex.: devolução da coisa fur-
tada). É a última medida em que o adolescente permanece
com sua família. O Juiz irá determinar um
Seção IV acompanhamen- to permanente ao adolescente,
Da Prestação de Serviços à Comunidade designando, para isso, um orientador, que poderá ser
substituído a qualquer tempo. A lei fixa um prazo mínimo
Art. 117. A prestação de serviços comunitários consiste de 6 meses para a duração dessa medida. O orientador
na realização de tarefas gratuitas de interesse geral, terá as seguintes obrigações legais:
por período não excedente a seis meses, junto a entida- - promover socialmente o adolescente, bem como a
des assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimen- sua família, inserindo-os em programas sociais. Promover
tos congêneres, bem como em programas comunitários ou socialmente é fazer com que o adolescente realize ativida-
des valorizadas socialmente (teatro, música etc.);
governamentais.
- supervisionar a frequência e o aproveitamento esco-
Parágrafo único. As tarefas serão atribuídas conforme
lar do adolescente;
as aptidões do adolescente, devendo ser cumpridas durante
- profissionalizar o adolescente (nos termos da EC n. 20);
jornada máxima de oito horas semanais, aos sábados, do-
- apresentar relatório do caso ao Juiz.
mingos e feriados ou em dias úteis, de modo a não prejudi-
car a frequência à escola ou à jornada normal de trabalho.
Seção VI
Do Regime de Semiliberdade
Disposta no art. 117 do ECA, o adolescente será obri-
gado a prestar serviços em benefício da coletividade. São
Art. 120. O regime de semiliberdade pode ser determi-
tarefas gratuitas de interesse geral junto a entidades as-
nado desde o início, ou como forma de transição para o
sistenciais, hospitais, escolas ou estabelecimentos congê-
meio aberto, possibilitada a realização de atividades exter-
neres. nas, independentemente de autorização judicial.
§ 1º São obrigatórias a escolarização e a profissio-
nalização, devendo, sempre que possível, ser utilizados os
recursos existentes na comunidade.

125
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§ 2º A medida não comporta prazo determinado


aplicando-se, no que couber, as disposições relativas à in- Art. 123. A internação deverá ser cumprida em entida-
ternação. de exclusiva para adolescentes, em local distinto daquele
destinado ao abrigo, obedecida rigorosa separação por cri-
térios de idade, compleição física e gravidade da infração.
Disposta no art. 120 do ECA, é uma medida que
impor- ta em privação de liberdade ao adolescente que Parágrafo único. Durante o período de internação,
pratica um ato infracional mais grave. O adolescente é inclu- sive provisória, serão obrigatórias atividades
retirado de sua família e colocado em um estabelecimento pedagógicas.
apropriado de semiliberdade, podendo realizar atividades
externas (estu- dar, trabalhar etc.) somente com Art. 124. São direitos do adolescente privado de
autorização do diretor do estabelecimento, não havendo liberda- de, entre outros, os seguintes:
necessidade de autorização judicial. Pode ser usada tanto I - entrevistar-se pessoalmente com o representante do
como medida principal quan- to como medida Ministério Público;
progressiva ou regressiva. II - peticionar diretamente a qualquer
autoridade; III - avistar-se reservadamente com
A semiliberdade não tem prazo fixado em lei, nem
mínimo nem máximo. A doutrina e a jurisprudência deter- seu defensor;
minam a aplicação da medida por analogia dos prazos da IV - ser informado de sua situação processual, sempre
internação, tendo como prazo máximo 3 anos. Há a obri- que solicitada;
V - ser tratado com respeito e dignidade;
gatoriedade de escolarização e profissionalização na
semi- liberdade. VI - permanecer internado na mesma localidade ou
na- quela mais próxima ao domicílio de seus pais ou
responsá- vel;
Seção VII
VII - receber visitas, ao menos, semanalmente;
Da
VIII - corresponder-se com seus familiares e amigos;
Internação
IX - ter acesso aos objetos necessários à higiene e
asseio pessoal;
Art. 121. A internação constitui medida privativa da
liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcio- X - habitar alojamento em condições adequadas de hi-
nalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em giene e salubridade;
XI - receber escolarização e profissionalização;
desenvolvimento.
§ 1º Será permitida a realização de atividades XII - realizar atividades culturais, esportivas e de
externas, a critério da equipe técnica da entidade, salvo lazer: XIII - ter acesso aos meios de comunicação
expressa de- terminação judicial em contrário. social;
§ 2º A medida não comporta prazo determinado, de- XIV - receber assistência religiosa, segundo a sua
vendo sua manutenção ser reavaliada, mediante decisão crença, e desde que assim o deseje;
fundamentada, no máximo a cada seis meses. XV - manter a posse de seus objetos pessoais e dispor
de local seguro para guardá-los, recebendo comprovante
§ 3º Em nenhuma hipótese o período máximo de
inter- nação excederá a três anos. da- queles porventura depositados em poder da entidade;
§ 4º Atingido o limite estabelecido no parágrafo ante- XVI - receber, quando de sua desinternação, os docu-
rior, o adolescente deverá ser liberado, colocado em regi- mentos pessoais indispensáveis à vida em sociedade.
me de semiliberdade ou de liberdade assistida. § 1º Em nenhum caso haverá incomunicabilidade.
§ 5º A liberação será compulsória aos vinte e um anos § 2º A autoridade judiciária poderá suspender tem-
de idade. porariamente a visita, inclusive de pais ou responsável, se
existirem motivos sérios e fundados de sua
§ 6º Em qualquer hipótese a desinternação será
prece- dida de autorização judicial, ouvido o Ministério prejudicialidade aos interesses do adolescente.
Público.
§ 7o A determinação judicial mencionada no § 1o pode- Art. 125. É dever do Estado zelar pela integridade
física e mental dos internos, cabendo-lhe adotar as
rá ser revista a qualquer tempo pela autoridade judiciária.
medidas ade- quadas de contenção e segurança.
Art. 122. A medida de internação só poderá ser
aplicada quando: Disposta no art. 121 e seguintes do ECA, é a medida
re- servada para os atos infracionais de natureza grave. O
I - tratar-se de ato infracional cometido mediante
ECA estabelece princípios específicos para a internação,
grave ameaça ou violência a pessoa;
pois é medida de privação de liberdade sempre
II - por reiteração no cometimento de outras
infrações graves; excepcional.
III - por descumprimento reiterado e injustificável A internação deve durar o menor tempo possível
da (prin- cípio da brevidade), é uma medida de exceção que
medida anteriormente imposta. só de- verá ser utilizada em último caso (princípio da
§ 1o O prazo de internação na hipótese do inciso III excepcio- nalidade) e deve seguir o princípio do respeito à
deste artigo não poderá ser superior a 3 (três) meses, de- condição peculiar do adolescente como pessoa em
vendo ser decretada judicialmente após o devido desenvolvimen- to. Em nenhuma hipótese pode ser
processo legal. aplicada à criança.
O ECA estabelece hipóteses de internação para:
§ 2º Em nenhuma hipótese será aplicada a internação,
havendo outra medida adequada. - prática de ato infracional mediante grave ameaça ou
violência à pessoa;
- reiteração de infrações graves;
126
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

- descumprimento reiterado e injustificado da medi-


Tem por conceito o perdão, a indulgência ao menor.
da anteriormente imposta (é uma hipótese de regressão).
Podem conceder remissão tanto o MP quanto o Juiz. São
Neste caso, a internação não pode ultrapassar o prazo de
hipóteses de natureza jurídica diferentes. A remissão ju-
3 meses.
dicial é forma de extinção ou de suspensão do processo
Nas duas primeiras hipóteses, o prazo máximo para
(portanto, pressupõe o processo em curso). Já a remissão
in- ternação é de 3 anos. Por força desse prazo, o ECA
ministerial é forma de exclusão do processo (logo, deve
poderá atingir o maior de 18 anos. Em rigor, todas as ser concedida antes do processo - administrativamente).
medidas só- cio-educativas poderão atingir o maior de 18 Quando a remissão é concedida pelo MP, segue-se o se-
anos. guinte procedimento:
A medida só poderá ser aplicada com o devido pro- - o menor é ouvido pelo Promotor que concederá a
cesso legal e em nenhuma hipótese poderá ser aplicada à remissão;
criança. Quando o adolescente completar 21 anos, a libe- - o Promotor encaminha a remissão para
ração será obrigatória. Caso o adolescente tenha passado homologação pelo Juiz;
por internação provisória, esses dias serão computados na - se o Juiz não aceitar a remissão, deverá remeter para
internação (detração). A diferença entre semi-liberdade e o Procurador de Justiça, que poderá insistir na remissão
internação é que, nesta, o adolescente depende de auto- ou designar outro representante do MP para apresentar
rização expressa do juiz para praticar atividades externas, repre- sentação contra o menor. Essa remissão concedida
ou seja, o adolescente internado somente se ausentará do pelo MP é causa de exclusão do processo, visto que, ao
estabelecimento em que se achar se autorizado pelo juiz. conceder a remissão, inexiste o processo.
O art. 123 dispõe que o local para a internação deve Quando a remissão é concedida pelo Juiz, segue-se o
ser distinto do abrigo, devendo-se obedecer a separação seguinte procedimento:
por idade, composição física (tamanho), sexo e gravidade - o Promotor oferece a representação;
do ato infracional. Há, também, a obrigatoriedade de - na audiência de apresentação, o menor será ouvido
reali- zação de atividades pedagógicas. pelo Juiz, que poderá decidir pela remissão;
O art. 124 dispõe sobre direitos específicos dos ado- - o representante do MP deverá, obrigatoriamente, ser
lescentes: ouvido sobre a possibilidade da remissão antes de ela ser
- entrevista pessoal com o representante do MP; aplicada. A remissão concedida pelo Juiz causa extinção
- entrevista reservada com seu defensor, dentre do processo. Havendo discordância por parte do MP, este
outros. As visitas podem ser suspensas pelo juiz, sob o de- verá ingressar com uma apelação para reformar a
funda- mento de segurança e proteção do menor, decisão do Juiz.
entretanto, em Tanto a doutrina quanto a jurisprudência admitem a
nenhuma hipótese o menor poderá ficar incomunicável. cumulação da remissão com uma medida sócio-educativa
que seja compatível (ex.: reparação do dano, advertência
Capítulo V etc.). Neste caso, a remissão é causa de suspensão do pro-
Da cesso.
Remissão O ECA traz quatro requisitos genéricos para a
aplicação da remissão, devendo ficar a critério do membro
Art. 126. Antes de iniciado o procedimento judicial do MP ou do Juiz a sua concessão. São eles:
para apuração de ato infracional, o representante do - circunstâncias e conseqüências do fato;
Ministério Público poderá conceder a remissão, como - contexto social em que o fato foi praticado;
- personalidade do agente;
forma de exclusão do processo, atendendo às
- maior ou menor participação no ato infracional.
circunstâncias e consequências do fato, ao contexto social,
A remissão, quer concedida pelo MP quer pelo Juiz,
bem como à per- sonalidade do adolescente e sua maior
não implica confissão de culpa. Existe uma divergência na
ou menor participa- ção no ato infracional.
doutrina em considerar a remissão como um acordo ou
Parágrafo único. Iniciado o procedimento, a concessão
não. A posição majoritária entende que a remissão não é
da remissão pela autoridade judiciária importará na um acordo, tendo em vista a lei falar em concessão e, ain-
suspen- são ou extinção do processo. da, pelo fato de não haver nenhum prejuízo para o
adoles- cente, não possuindo a remissão nenhum efeito,
Art. 127. A remissão não implica necessariamente o podendo ser concedida quantas vezes forem necessárias.
reconhecimento ou comprovação da responsabilidade,
nem prevalece para efeito de antecedentes, podendo in- Título IV
cluir eventualmente a aplicação de qualquer das medidas Das Medidas Pertinentes aos Pais ou Responsável
previstas em lei, exceto a colocação em regime de semi-li-
berdade e a internação. Art. 129. São medidas aplicáveis aos pais ou responsá-
vel:
Art. 128. A medida aplicada por força da remissão I - encaminhamento a serviços e programas oficiais
pode- rá ser revista judicialmente, a qualquer tempo, ou comunitários de proteção, apoio e promoção da família;
mediante pedido expresso do adolescente ou de seu
representante le- gal, ou do Ministério Público.

127
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

II - inclusão em programa oficial ou comunitário de


auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos; Art. 135. O exercício efetivo da função de conselheiro
III - encaminhamento a tratamento psicológico ou constituirá serviço público relevante e estabelecerá presun-
psiquiá- trico; ção de idoneidade moral.
IV - encaminhamento a cursos ou programas de
orientação; Capítulo II
V - obrigação de matricular o filho ou pupilo e Das Atribuições do Conselho
acompanhar sua frequência e aproveitamento escolar;
VI - obrigação de encaminhar a criança ou adolescente Art. 136. São atribuições do Conselho Tutelar:
a tratamento especializado; I - atender as crianças e adolescentes nas hipóteses
VII - advertência; pre- vistas nos arts. 98 e 105, aplicando as medidas
VIII - perda da guarda; previstas no art. 101, I a VII;
IX - destituição da II - atender e aconselhar os pais ou responsável,
tutela; aplican- do as medidas previstas no art. 129, I a VII;
X - suspensão ou destituição do poder familiar. III - promover a execução de suas decisões, podendo
Parágrafo único. Na aplicação das medidas previstas para tanto:
nos incisos IX e X deste artigo, observar-se-á o disposto nos a) requisitar serviços públicos nas áreas de saúde, edu-
arts. 23 e 24. cação, serviço social, previdência, trabalho e segurança;
b) representar junto à autoridade judiciária nos casos
Art. 130. Verificada a hipótese de maus-tratos, opressão de descumprimento injustificado de suas deliberações.
ou abuso sexual impostos pelos pais ou responsável, a IV - encaminhar ao Ministério Público notícia de fato
autoridade judiciária poderá determinar, como medida que constitua infração administrativa ou penal contra os
cautelar, o afasta- mento do agressor da moradia comum. di- reitos da criança ou adolescente;
Parágrafo único. Da medida cautelar constará, ainda, a
fi- xação provisória dos alimentos de que necessitem a
criança ou
V - encaminhar à autoridade judiciária os casos de sua
o adolescente dependentes do agressor. competência;
VI - providenciar a medida estabelecida pela
Capítulo I autoridade judiciária, dentre as previstas no art. 101, de I a
Disposições
VI, para o adolescente autor de ato infracional;
Gerais VII - expedir notificações;
Art. 131. O Conselho Tutelar é órgão permanente e
autô-
nomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de VIII - requisitar certidões de nascimento e de óbito
zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do de criança ou adolescente quando necessário;
adolescente, de-
finidos nesta Lei. IX - assessorar o Poder Executivo local na elaboração da
proposta orçamentária para planos e programas de atendi-
Art. 132. Em cada Município e em cada Região mento dos direitos da criança e do adolescente;
Adminis-
trativa do Distrito Federal haverá, no mínimo, 1 (um) X - representar, em nome da pessoa e da família, contra
Conselho a
Tutelar como órgão integrante da administração pública formação continuada dos conselheiros tutelares.
local, composto de 5 (cinco) membros, escolhidos pela
população local para mandato de 4 (quatro) anos,
permitida 1 (uma) recondução, mediante novo processo de
escolha.

Art. 133. Para a candidatura a membro do Conselho


Tute- lar, serão exigidos os seguintes requisitos:
I - reconhecida idoneidade moral;
II - idade superior a vinte e um
anos; III - residir no município.

Art. 134. Lei municipal ou distrital disporá sobre o


lo- cal, dia e horário de funcionamento do Conselho
Tutelar, inclusive quanto à remuneração dos respectivos
membros, aos quais é assegurado o direito a:
I - cobertura previdenciária;
II - gozo de férias anuais remuneradas, acrescidas de
1/3 (um terço) do valor da remuneração mensal;
III - licença-
maternidade; IV -
licença-paternidade; V -
gratificação natalina.
Parágrafo único. Constará da lei orçamentária municipal
e da do Distrito Federal previsão dos recursos necessários ao
fun- cionamento do Conselho Tutelar e à remuneração e
violação dos direitos previstos no art. 220, § 3º, inciso Parágrafo único. Se, no exercício de suas atribuições, o
II, da Constituição Federal; Conselho Tutelar entender necessário o afastamento do
XI - representar ao Ministério Público para efeito con- vívio familiar, comunicará incontinenti o fato ao
das ações de perda ou suspensão do poder familiar, Ministério Público, prestando-lhe informações sobre os
após esgota- das as possibilidades de manutenção da motivos de tal entendimento e as providências tomadas
criança ou do ado- lescente junto à família natural; para a orientação, o apoio e a promoção social da família.
XII - promover e incentivar, na comunidade e nos
gru- pos profissionais, ações de divulgação e Art. 137. As decisões do Conselho Tutelar somente po-
treinamento para o reconhecimento de sintomas de derão ser revistas pela autoridade judiciária a pedido de
maus-tratos em crianças e adolescentes. quem tenha legítimo interesse.

128
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Capítulo III
Da Parágrafo único. A autoridade judiciária dará curador
Competência especial à criança ou adolescente, sempre que os interes-
ses destes colidirem com os de seus pais ou responsável, ou
Art. 138. Aplica-se ao Conselho Tutelar a regra de quando carecer de representação ou assistência legal ainda
com- petência constante do art. 147. que eventual.

Capítulo IV Art. 143. E vedada a divulgação de atos judiciais,


Da Escolha dos Conselheiros po- liciais e administrativos que digam respeito a
crianças e adolescentes a que se atribua autoria de ato
Art. 139. O processo para a escolha dos membros do infracional.
Conselho Tutelar será estabelecido em lei municipal e Parágrafo único. Qualquer notícia a respeito do fato
rea- lizado sob a responsabilidade do Conselho não poderá identificar a criança ou adolescente, vedando-
Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, e se fotografia, referência a nome, apelido, filiação,
a fiscalização do Ministério Público. parentesco, residência e, inclusive, iniciais do nome e
§ 1o O processo de escolha dos membros do Conse- sobrenome.
lho Tutelar ocorrerá em data unificada em todo o
território nacional a cada 4 (quatro) anos, no primeiro Art. 144. A expedição de cópia ou certidão de atos a
domingo do mês de outubro do ano subsequente ao da que se refere o artigo anterior somente será deferida pela
eleição pre- sidencial. autoridade judiciária competente, se demonstrado o
§ 2o A posse dos conselheiros tutelares ocorrerá no dia interes- se e justificada a finalidade.
10 de janeiro do ano subsequente ao processo de escolha.
§ 3o No processo de escolha dos membros do Conse-
O homem necessita do convívio social, não é um ser
lho Tutelar, é vedado ao candidato doar, oferecer,
prometer ou entregar ao eleitor bem ou vantagem capaz de viver de maneira autônoma e totalmente des-
pessoal de qual- quer natureza, inclusive brindes de vinculada dos demais. Neste sentido, a imposição de re-
pequeno valor. gramentos e normas permitiu que a sociedade atingisse o
atual grau de evolução.
Capítulo V Obviamente, no ambiente social surgem conflitos de
Dos interesses. Afinal, nem sempre os bens e valores existem
Impedimentos em quantidade suficiente para atender a todas as pessoas.
Inicialmente, estes conflitos eram solucionados pelos pró-
Art. 140. São impedidos de servir no mesmo Conse- prios envolvidos, na denominada fase da autotutela.
lho marido e mulher, ascendentes e descendentes, Contudo, a solução possibilidade pela autotutela era
sogro e genro ou nora, irmãos, cunhados, durante o bastante insatisfatória e fazia com que prevalecesse a lei
cunhadio, tio e sobrinho, padrasto ou madrasta e do mais forte. Então, surgiu o Estado apresentando um
enteado. melhor sistema para a solução dos conflitos.
Parágrafo único. Estende-se o impedimento do conse- O Estado assumiu para si o poder-dever de dizer o Di-
lheiro, na forma deste artigo, em relação à autoridade judi- reito, de solucionar os conflitos, conhecido como jurisdi-
ciária e ao representante do Ministério Público com ção. Assim, o Estado irá elaborar as leis (direito material)
atuação na Justiça da Infância e da Juventude, em exercício e prever como elas serão aplicadas (direito processual). A
na co- marca, foro regional ou distrital. autotutela para a ser punida como regra geral e o Estado
exerce a heterotutela por meio da atividade jurisdicional.
Título VI
Jurisdição é o poder-dever do Estado de dizer o
Do Acesso à Justiça
Direito. Sendo assim, trata-se de atividade estatal exercida
por in- termédio de um agente constituído com
Capítulo I
Disposições Gerais competência para exercê-la, o juiz.
Nos primórdios da humanidade não existia o Direito e
Art. 141. É garantido o acesso de toda criança ou nem existiam as leis, de modo que a justiça era feita pelas
adolescente à Defensoria Pública, ao Ministério próprias mãos, na denominada autotutela. Com a
Público e ao Poder Judiciário, por qualquer de seus evolução das instituições, o Estado avocou para si o
órgãos. poder-dever de solucionar os litígios, o que é feito pela
§ 1º. A assistência judiciária gratuita será prestada aos jurisdição.
que dela necessitarem, através de defensor público ou ad- O poder-dever de dizer o direito é uno, apenas
vogado nomeado. existin- do uma separação de funções: o Legislativo
§ 2º As ações judiciais da competência da Justiça da regulamenta normas gerais e abstratas (função legislativa)
Infância e da Juventude são isentas de custas e emolu- e o Judiciário as aplica no caso concreto (função
mentos, ressalvada a hipótese de litigância de má-fé. jurisdicional).
Entretanto, vale destacar que na sociedade contempo-
Art. 142. Os menores de dezesseis anos serão repre- rânea, devido às inúmeras mazelas que se apresentaram
sentados e os maiores de dezesseis e menores de vinte envolvendo o abarrotamento de processos pelo Judiciário,
e um anos assistidos por seus pais, tutores ou curadores, passou-se a incentivar a adoção de métodos de autocom-
na forma da legislação civil ou processual. posição, como conciliação, mediação e arbitragem.
129
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Tradicionalmente, são enumerados pela doutrina os


Art. 147. A competência será
seguintes princípios inerentes à jurisdição: investidura,
determinada: I - pelo domicílio dos pais
porque somente exerce jurisdição quem ocupa o cargo de
ou responsável;
juiz; aderência ao território, posto que juízes somente têm
II - pelo lugar onde se encontre a criança ou
autoridade no território nacional e nos limites de sua
adolescente, à falta dos pais ou responsável.
com- petência; indelegabilidade, não podendo o Poder
§ 1º. Nos casos de ato infracional, será competente a
Judiciário delegar sua competência; inafastabilidade, pois autoridade do lugar da ação ou omissão, observadas as
a lei não pode excluir da apreciação do Poder Judiciário regras de conexão, continência e prevenção.
nenhuma lesão ou ameaça a direito. § 2º A execução das medidas poderá ser delegada à
Embora a jurisdição seja una, em termos doutrinários autoridade competente da residência dos pais ou respon-
é possível classificá-la: a) quanto ao objeto – penal, traba- sável, ou do local onde sediar-se a entidade que abrigar a
lhista e civil (a civil é subsidiária, envolvendo todo direito criança ou adolescente.
material que não seja penal ou trabalhista, não somente § 3º Em caso de infração cometida através de trans-
questões inerentes ao direito civil); b) quanto ao missão simultânea de rádio ou televisão, que atinja mais
organismo que a exerce – comum (estadual ou federal) ou de uma comarca, será competente, para aplicação da pe-
especial (trabalhista, militar, eleitoral); c) quanto à nalidade, a autoridade judiciária do local da sede estadual
hierarquia – su- perior e inferior. da emissora ou rede, tendo a sentença eficácia para todas
Neste sentido, com vistas a instrumentalizar a jurisdi- as transmissoras ou retransmissoras do respectivo estado.
ção,
ela éimpedindo que ela seja exercida de maneira caótica,
Art. 148. A Justiça da Infância e da Juventude é compe-
tente para:
distribuída entre juízos e foros (órgãos competentes I - conhecer de representações promovidas pelo Minis-
em localidades determinadas). A esta distribuição das par-
tério Público, para apuração de ato infracional atribuído
a
celas de jurisdição dá-se o nome de competência.
adolescente, aplicando as medidas cabíveis;
As tutelas jurisdicionais diferenciadas, por sua vez,
são aquelas que apresentam procedimentos diversos do II - conceder a remissão, como forma de suspensão ou
extinção do processo;
comum. Possuem procedimentos ditos especiais, os quais
III - conhecer de pedidos de adoção e seus incidentes;
buscam garantir um processo mais rápido e compatível
IV - conhecer de ações civis fundadas em interesses
com as necessidades específicas do direito em discussão.
indi- viduais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao
No âmbito do direito da criança e do adolescente, tem-se
adolescen- te, observado o disposto no art. 209;
o estabelecimento de uma tutela jurisdicional
V - conhecer de ações decorrentes de irregularidades
diferenciada, eis que existem inúmeras regras específicas
em entidades de atendimento, aplicando as medidas
aplicáveis aos processos que envolvem de algum modo cabíveis;
criança ou ado- lescente. VI - aplicar penalidades administrativas nos casos de
A noção de jurisdição inclusiva também se aplica à in- frações contra norma de proteção à criança ou
tu- tela jurisdicional da criança e do adolescente. adolescente; VII - conhecer de casos encaminhados pelo
Basicamente, refere-se à propiciação de uma jurisdição Conselho Tu-
que esteja atenta às peculiaridades das minorias e dos telar, aplicando as medidas cabíveis.
grupos vulneráveis. No caso, as crianças e adolescentes Parágrafo único. Quando se tratar de criança ou ado-
são considerados um grupo vulnerável devido à condição lescente nas hipóteses do art. 98, é também competente a
especial que ocupam. Justiça da Infância e da Juventude para o fim de:
a) conhecer de pedidos de guarda e tutela;
Capítulo II b) conhecer de ações de destituição do poder familiar,
Da Justiça da Infância e da Juventude perda ou modificação da tutela ou guarda;
c) suprir a capacidade ou o consentimento para o casa-
Seção I mento;
Disposições d) conhecer de pedidos baseados em discordância
Gerais pater- na ou materna, em relação ao exercício do poder
familiar;
Art. 145. Os estados e o Distrito Federal poderão criar e) conceder a emancipação, nos termos da lei civil,
varas especializadas e exclusivas da infância e da quando faltarem os pais;
juventude, cabendo ao Poder Judiciário estabelecer sua f) designar curador especial em casos de apresentação
proporcionali- dade por número de habitantes, dotá-las de de queixa ou representação, ou de outros procedimentos
infra-estrutura e dispor sobre o atendimento, inclusive em ju- diciais ou extrajudiciais em que haja interesses de
plantões. criança ou adolescente;
g) conhecer de ações de alimentos;
Seção h) determinar o cancelamento, a retificação e o supri-
II Do mento dos registros de nascimento e óbito.
Juiz
Art. 149. Compete à autoridade judiciária disciplinar,
Art. 146. A autoridade a que se refere esta Lei é o Juiz através de portaria, ou autorizar, mediante alvará:
da Infância e da Juventude, ou o juiz que exerce essa I - a entrada e permanência de criança ou adolescente,
função, na forma da lei de organização judiciária local. desacompanhado dos pais ou responsável, em:
130
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

a) estádio, ginásio e campo desportivo; § 2º Os prazos estabelecidos nesta Lei e aplicáveis aos
b) bailes ou promoções dançantes; seus procedimentos são contados em dias corridos, ex-
c) boate ou congêneres; cluído o dia do começo e incluído o dia do vencimento,
d) casa que explore comercialmente diversões eletrôni- veda- do o prazo em dobro para a Fazenda Pública e o
cas Ministério Público.
; e) estúdios cinematográficos, de teatro, rádio e
televisão. II - a participação de criança e adolescente Art. 153. Se a medida judicial a ser adotada não cor-
em: responder a procedimento previsto nesta ou em outra lei, a
a) espetáculos públicos e seus ensaios; autoridade judiciária poderá investigar os fatos e
b) certames de beleza. ordenar de ofício as providências necessárias, ouvido o
§ 1º Para os fins do disposto neste artigo, a autoridade Ministé-
judiciária levará em conta, dentre outros fatores: rio Público.
a) os princípios desta Lei; Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica
b) as peculiaridades locais; para o fim de afastamento da criança ou do adolescente de
c) a existência de instalações adequadas; sua família de origem e em outros procedimentos necessa-
d) o tipo de freqüência habitual ao local; riamente contenciosos.
e) a adequação do ambiente a eventual participação
ou freqüência de crianças e adolescentes; Art. 154. Aplica-se às multas o disposto no art. 214.
f) a natureza do espetáculo.
§ 2º As medidas adotadas na conformidade deste ar- A tutela sócio-individual abrange aspectos do direito
tigo deverão ser fundamentadas, caso a caso, vedadas as da criança e do adolescente voltado à criança e ao adoles-
determinações de caráter geral. cente individualmente concebidos, isto é, pensados como
sujeitos de direitos individuais que possam ser por eles
Seção III exercidos.
Dos Serviços Auxiliares A tutela sócio-educativa abrange aspectos do direito
da criança e do adolescente voltados às atividades de en-
Art. 150. Cabe ao Poder Judiciário, na elaboração de sino e aprendizagem, tanto no que se refere à educação
sua proposta orçamentária, prever recursos para formal quanto em relação à educação informal.
manutenção de equipe interprofissional, destinada a A tutela coletiva volta-se à proteção de direitos difu-
assessorar a Justiça da Infância e da Juventude. sos e coletivos da criança e do adolescente. Aos direitos
difusos e coletivos são conferidos mecanismos de tutela
Art. 151. Compete à equipe interprofissional dentre ou- específicos para sua proteção, bem como atribuída com-
tras atribuições que lhe forem reservadas pela legislação petência para tanto a órgãos determinados que exercerão
lo- cal, fornecer subsídios por escrito, mediante laudos, ou um papel representativo. No Brasil, destacam-se institui-
ver- balmente, na audiência, e bem assim desenvolver ções como o Ministério Público e a Defensoria Pública.
trabalhos de aconselhamento, orientação, Sem prejuízo, como visto, há remédios constitucionais que
encaminhamento, preven- ção e outros, tudo sob a se voltam à proteção de interesses desta categoria, como
imediata subordinação à autoridade judiciária, assegurada o mandado de segurança coletivo e a própria ação
a livre manifestação do ponto de vista técnico. popular, sem falar na ação civil pública, também
Parágrafo único. Na ausência ou insuficiência de servi- mencionada no texto constitucional.
dores públicos integrantes do Poder Judiciário responsáveis Considerados os diferentes tipos de tutelas inseridas
pela realização dos estudos psicossociais ou de quaisquer no direito da criança e do adolescente, justifica-se a tutela
outras espécies de avaliações técnicas exigidas por esta Lei jurisdicional diferenciada, adaptada à condição em desen-
ou por determinação judicial, a autoridade judiciária volvimento da criança e do adolescente, que deve ser ágil,
poderá proceder à nomeação de perito, nos termos do art.
efetiva, atenta às peculiaridades do caso concreto.
156 da Lei no 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de
Os procedimentos especiais do ECA se referem a: per-
Processo Civil).
da e suspensão de poder familiar, destituição de tutela,
co- locação em família substituta, apuração de ato
Capítulo III infracional atribuído a adolescente, apuração de
Dos
irregularidades em atendimento, apuração de infração
Procedimentos
administrativa às nor- mas de proteção da criança e do
adolescente e habilitação em adoção.
Seção I
Disposições
Seção II
Gerais
Da Perda e da Suspensão do Poder Familiar
Art. 152. Aos procedimentos regulados nesta Lei apli-
Art. 155. O procedimento para a perda ou a
cam-se subsidiariamente as normas gerais previstas na
suspensão do poder familiar terá início por provocação do
legislação processual pertinente.
Ministério Público ou de quem tenha legítimo
§ 1o É assegurada, sob pena de responsabilidade, prio-
interesse.
ridade absoluta na tramitação dos processos e proce-
dimentos previstos nesta Lei, assim como na execução dos
atos e diligências judiciais a eles referentes.

13
1
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Art. 156. A petição inicial indicará:


Art. 160. Sendo necessário, a autoridade judiciária re-
I - a autoridade judiciária a que for dirigida;
quisitará de qualquer repartição ou órgão público a apre-
II - o nome, o estado civil, a profissão e a residência do
sentação de documento que interesse à causa, de ofício ou
requerente e do requerido, dispensada a qualificação em se
a requerimento das partes ou do Ministério Público.
tratando de pedido formulado por representante do Minis-
tério Público;
Art. 161. Se não for contestado o pedido e tiver sido
III - a exposição sumária do fato e o pedido;
concluído o estudo social ou a perícia realizada por equi-
IV - as provas que serão produzidas, oferecendo, desde
pe interprofissional ou multidisciplinar, a autoridade judi-
logo, o rol de testemunhas e documentos.
ciária dará vista dos autos ao Ministério Público, por 5
(cinco) dias, salvo quando este for o requerente, e decidirá
Art. 157. Havendo motivo grave, poderá a autoridade
em igual prazo.
judiciária, ouvido o Ministério Público, decretar a suspensão
§ 1º A autoridade judiciária, de ofício ou a
do poder familiar, liminar ou incidentalmente, até o
requerimen- to das partes ou do Ministério Público,
julga- mento definitivo da causa, ficando a criança ou
determinará a oi- tiva de testemunhas que comprovem a
adolescente confiado a pessoa idônea, mediante termo de
responsabili- dade. presença de uma das causas de suspensão ou destituição
do poder familiar previstas nos arts. 1.637 e 1.638 da Lei
§ 1o Recebida a petição inicial, a autoridade judiciária
no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), ou no
determinará, concomitantemente ao despacho de citação e
independentemente de requerimento do interessado, a art. 24 desta Lei.
reali- zação de estudo social ou perícia por equipe § 2o (Revogado).
interprofissional ou multidisciplinar para comprovar a § 3o Se o pedido importar em modificação de guarda,
presença de uma das causas de suspensão ou destituição será obrigatória, desde que possível e razoável, a oitiva da
do poder familiar, ressal- vado o disposto no § 10 do art. criança ou adolescente, respeitado seu estágio de desen-
101 desta Lei, e observada a Lei no 13.431, de 4 de abril de volvimento e grau de compreensão sobre as implicações da
2017. medida.
§ 2o Em sendo os pais oriundos de comunidades indíge- § 4º É obrigatória a oitiva dos pais sempre que eles
nas, é ainda obrigatória a intervenção, junto à equipe forem identificados e estiverem em local conhecido,
inter- profissional ou multidisciplinar referida no § 1o deste ressal- vados os casos de não comparecimento perante a
artigo, de representantes do órgão federal responsável pela Justiça quando devidamente citados.
política indigenista, observado o disposto no § 6o do art. 28 § 5o Se o pai ou a mãe estiverem privados de liberda-
desta Lei. de, a autoridade judicial requisitará sua apresentação para
a oitiva.
Art. 158. O requerido será citado para, no prazo de
dez dias, oferecer resposta escrita, indicando as provas a Art. 162. Apresentada a resposta, a autoridade judi-
serem produzidas e oferecendo desde logo o rol de ciária dará vista dos autos ao Ministério Público, por
testemunhas e documentos. cinco dias, salvo quando este for o requerente, designando,
§ 1º A citação será pessoal, salvo se esgotados todos desde logo, audiência de instrução e julgamento.
os § 1º (Revogado).
meios para sua realização. § 2o Na audiência, presentes as partes e o Ministério
§ 2º O requerido privado de liberdade deverá ser Pú- blico, serão ouvidas as testemunhas, colhendo-se
citado oralmen- te o parecer técnico, salvo quando apresentado
pessoalmente. por escrito, manifestando-se sucessivamente o requerente,
§ 3o Quando, por 2 (duas) vezes, o oficial de justiça o requerido e o Ministério Público, pelo tempo de 20 (vinte)
hou- ver procurado o citando em seu domicílio ou minutos cada um, prorrogável por mais 10 (dez) minutos.
residência sem o encontrar, deverá, havendo suspeita de § 3o A decisão será proferida na audiência, podendo a
ocultação, infor- mar qualquer pessoa da família ou, em autoridade judiciária, excepcionalmente, designar data
sua falta, qualquer vizinho do dia útil em que voltará a fim para sua leitura no prazo máximo de 5 (cinco) dias.
de efetuar a citação, na hora que designar, nos termos do § 4o Quando o procedimento de destituição de poder
art. 252 e seguintes da Lei no 13.105, de 16 de março de fa- miliar for iniciado pelo Ministério Público, não haverá
2015 (Código de Processo Civil). neces- sidade de nomeação de curador especial em favor
§ 4o Na hipótese de os genitores encontrarem-se em lo- da criança ou adolescente.
cal incerto ou não sabido, serão citados por edital no prazo
de 10 (dez) dias, em publicação única, dispensado o envio Art. 163. O prazo máximo para conclusão do proce-
de ofícios para a localização. dimento será de 120 (cento e vinte) dias, e caberá ao
juiz, no caso de notória inviabilidade de manutenção do
Art. 159. Se o requerido não tiver possibilidade de poder familiar, dirigir esforços para preparar a criança ou o
cons- tituir advogado, sem prejuízo do próprio sustento e adoles- cente com vistas à colocação em família substituta.
de sua família, poderá requerer, em cartório, que lhe seja Parágrafo único. A sentença que decretar a perda ou
nomea- do dativo, ao qual incumbirá a apresentação de a suspensão do poder familiar será averbada à margem do
resposta, contando-se o prazo a partir da intimação do registro de nascimento da criança ou do adolescente.
despacho de nomeação.
Parágrafo único. Na hipótese de requerido privado de
liberdade, o oficial de justiça deverá perguntar, no
momento da citação pessoal, se deseja que lhe seja
nomeado defensor.
132
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Seção III
§ 5o O consentimento é retratável até a data da reali-
Da Destituição da Tutela zação da audiência especificada no § 1o deste artigo, e os
pais podem exercer o arrependimento no prazo de 10 (dez)
Art. 164. Na destituição da tutela, observar-se-á o pro- dias, contado da data de prolação da sentença de extinção
cedimento para a remoção de tutor previsto na lei proces- do poder familiar.
sual civil e, no que couber, o disposto na seção anterior. § 6o O consentimento somente terá valor se for dado
após o nascimento da criança.
A destituição da tutela pode, assim, ser decretada ju- § 7o A família natural e a família substituta receberão
dicialmente, em procedimento contraditório, nos casos a devida orientação por intermédio de equipe técnica inter-
previstos na legislação civil, bem como na hipótese de profissional a serviço da Justiça da Infância e da Juventude,
des- cumprimento injustificado dos deveres e obrigações. preferencialmente com apoio dos técnicos responsáveis
pela execução da política municipal de garantia do direito
Seção IV à con- vivência familiar.
Da Colocação em Família Substituta
Art. 167. A autoridade judiciária, de ofício ou a reque-
Dos artigos 165 a 170 estão descritos procedimentos rimento das partes ou do Ministério Público, determinará a
adotados na colocação em família substituta: realização de estudo social ou, se possível, perícia por
equi- pe interprofissional, decidindo sobre a concessão de
Art. 165. São requisitos para a concessão de pedidos guarda provisória, bem como, no caso de adoção, sobre o
de colocação em família substituta: estágio de convivência.
I - qualificação completa do requerente e de seu Parágrafo único. Deferida a concessão da guarda pro-
even- tual cônjuge, ou companheiro, com expressa visória ou do estágio de convivência, a criança ou o ado-
anuência deste; lescente será entregue ao interessado, mediante termo de
II - indicação de eventual parentesco do requerente e responsabilidade.
de seu cônjuge, ou companheiro, com a criança ou
adolescente, especificando se tem ou não parente vivo; Art. 168. Apresentado o relatório social ou o laudo pe-
III - qualificação completa da criança ou adolescente e ricial, e ouvida, sempre que possível, a criança ou o adoles-
de seus pais, se conhecidos; cente, dar-se-á vista dos autos ao Ministério Público,
IV - indicação do cartório onde foi inscrito nascimento, pelo prazo de cinco dias, decidindo a autoridade judiciária
anexando, se possível, uma cópia da respectiva certidão; em igual prazo.
V - declaração sobre a existência de bens, direitos ou
rendimentos relativos à criança ou ao adolescente. Art. 169. Nas hipóteses em que a destituição da tutela,
Parágrafo único. Em se tratando de adoção, observar- a perda ou a suspensão do poder familiar constituir
se- pressupos- to lógico da medida principal de colocação em
-ão também os requisitos específicos. família subs- tituta, será observado o procedimento
contraditório previsto nas Seções II e III deste Capítulo.
Art. 166. Se os pais forem falecidos, tiverem sido Parágrafo único. A perda ou a modificação da guarda
destituídos ou suspensos do poder familiar, ou houve- poderá ser decretada nos mesmos autos do procedimento,
rem aderido expressamente ao pedido de colocação em observado o disposto no art. 35.
família substituta, este poderá ser formulado diretamente
em cartório, em petição assinada pelos próprios Art. 170. Concedida a guarda ou a tutela, observar-se-
requerentes, dispensada a assistência de advogado. á o disposto no art. 32, e, quanto à adoção, o contido no
§ 1o Na hipótese de concordância dos pais, o juiz: art. 47.
I - na presença do Ministério Público, ouvirá as partes, Parágrafo único. A colocação de criança ou adolescen-
devidamente assistidas por advogado ou por defensor te sob a guarda de pessoa inscrita em programa de acolhi-
públi- co, para verificar sua concordância com a adoção, mento familiar será comunicada pela autoridade judiciária
no prazo máximo de 10 (dez) dias, contado da data do à entidade por este responsável no prazo máximo de 5
protocolo da petição ou da entrega da criança em juízo, (cinco) dias.
tomando por ter- mo as declarações; e
II - declarará a extinção do poder familiar. Seção V
§ 2o O consentimento dos titulares do poder familiar Da Apuração de Ato Infracional Atribuído a Ado-
será precedido de orientações e esclarecimentos prestados lescente
pela equipe interprofissional da Justiça da Infância e da
Juventu- de, em especial, no caso de adoção, sobre a Art. 171. O adolescente apreendido por força de ordem
irrevogabilidade da medida. judicial será, desde logo, encaminhado à autoridade
§ 3o São garantidos a livre manifestação de vontade judiciá- ria.
dos detentores do poder familiar e o direito ao sigilo das
informações. Art. 172. O adolescente apreendido em flagrante de ato
§ 4o O consentimento prestado por escrito não terá va- infracional será, desde logo, encaminhado à autoridade po-
lidade se não for ratificado na audiência a que se refere o § licial competente.
1o deste artigo.

133
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Parágrafo único. Havendo repartição policial especiali-


Art. 178. O adolescente a quem se atribua autoria de
zada para atendimento de adolescente e em se tratando de
ato infracional não poderá ser conduzido ou transportado
ato infracional praticado em co-autoria com maior,
em compartimento fechado de veículo policial, em
prevale- cerá a atribuição da repartição especializada, que,
condições atentatórias à sua dignidade, ou que impliquem
após as providências necessárias e conforme o caso,
risco à sua integridade física ou mental, sob pena de
encaminhará o adulto à repartição policial própria. responsabilidade.
Art. 173. Em caso de flagrante de ato infracional come- Art. 179. Apresentado o adolescente, o
tido mediante violência ou grave ameaça a pessoa, a auto- representante do Ministério Público, no mesmo dia e à vista
ridade policial, sem prejuízo do disposto nos arts. 106, do auto de apreensão, boletim de ocorrência ou relatório
pará- grafo único, e 107, deverá: policial, devi- damente autuados pelo cartório judicial e
I - lavrar auto de apreensão, ouvidos as testemunhas e com informação sobre os antecedentes do adolescente,
o adolescente; procederá imediata e informalmente à sua oitiva e, em
II - apreender o produto e os instrumentos da infração; sendo possível, de seus pais ou responsável, vítima e
III - requisitar os exames ou perícias necessários à testemunhas.
com- Parágrafo único. Em caso de não apresentação, o
provação da materialidade e autoria da infração. repre- sentante do Ministério Público notificará os pais ou
Parágrafo único. Nas demais hipóteses de respon- sável para apresentação do adolescente, podendo
flagrante, a lavratura do auto poderá ser substituída por requisitar o concurso das polícias civil e militar.
boletim de ocorrência circunstanciada.
Art. 180. Adotadas as providências a que alude o artigo
Art. 174. Comparecendo qualquer dos pais ou anterior, o representante do Ministério Público poderá:
responsá- vel, o adolescente será prontamente liberado I - promover o arquivamento dos
pela autorida- autos; II - conceder a remissão;
de policial, sob termo de compromisso e responsabilidade III - representar à autoridade judiciária para aplicação
de sua apresentação ao representante do Ministério de medida sócio-educativa.
Público, no mesmo dia ou, sendo impossível, no primeiro Art. 181. Promovido o arquivamento dos autos ou con-
dia útil ime-
diato, exceto quando, pela gravidade do ato infracional e
cedida a remissão pelo representante do Ministério Público,
sua repercussão social, deva o adolescente permanecer sob
mediante termo fundamentado, que conterá o resumo dos
internação para garantia de sua segurança pessoal ou ma-
fatos, os autos serão conclusos à autoridade judiciária para
nutenção da ordem pública.
homologação.
§ 1º Homologado o arquivamento ou a remissão, a
Art. 175. Em caso de não liberação, a autoridade poli-
au- toridade judiciária determinará, conforme o caso, o
cial encaminhará, desde logo, o adolescente ao cum- primento da medida.
representan- te do Ministério Público, juntamente com § 2º Discordando, a autoridade judiciária fará remessa
cópia do auto de apreensão ou boletim de ocorrência. dos autos ao Procurador-Geral de Justiça, mediante des-
§ 1º Sendo impossível a apresentação imediata, a au- pacho fundamentado, e este oferecerá representação, de-
toridade policial encaminhará o adolescente à entidade de signará outro membro do Ministério Público para
atendimento, que fará a apresentação ao representante apresen- tá-la, ou ratificará o arquivamento ou a remissão,
do Ministério Público no prazo de vinte e quatro horas. que só então estará a autoridade judiciária obrigada a
§ 2º Nas localidades onde não houver entidade de homologar.
atendimento, a apresentação far-se-á pela autoridade po-
licial. À falta de repartição policial especializada, o adoles- Art. 182. Se, por qualquer razão, o representante do
cente aguardará a apresentação em dependência Mi- nistério Público não promover o arquivamento ou
separada da destinada a maiores, não podendo, em conceder a remissão, oferecerá representação à autoridade
qualquer hipóte- se, exceder o prazo referido no judiciária, propondo a instauração de procedimento para
parágrafo anterior. aplicação da medida sócio-educativa que se afigurar a
mais adequada.
Art. 176. Sendo o adolescente liberado, a autoridade § 1º A representação será oferecida por petição, que
po- licial encaminhará imediatamente ao representante do conterá o breve resumo dos fatos e a classificação do ato
Mi- nistério Público cópia do auto de apreensão ou boletim infracional e, quando necessário, o rol de testemunhas,
de ocorrência. po- dendo ser deduzida oralmente, em sessão diária
instalada pela autoridade judiciária.
Art. 177. Se, afastada a hipótese de flagrante, houver § 2º A representação independe de prova pré-consti-
in- dícios de participação de adolescente na prática de ato tuída da autoria e materialidade.
infra- cional, a autoridade policial encaminhará ao
representante do Ministério Público relatório das Art. 183. O prazo máximo e improrrogável para a con-
investigações e demais documentos. clusão do procedimento, estando o adolescente internado
provisoriamente, será de quarenta e cinco dias.
134
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Art. 184. Oferecida a representação, a autoridade judi-


Art. 188. A remissão, como forma de extinção ou sus-
ciária designará audiência de apresentação do adolescente,
pensão do processo, poderá ser aplicada em qualquer fase
decidindo, desde logo, sobre a decretação ou manutenção
do procedimento, antes da sentença.
da internação, observado o disposto no art. 108 e
parágrafo.
Art. 189. A autoridade judiciária não aplicará qualquer
§ 1º O adolescente e seus pais ou responsável serão
medida, desde que reconheça na sentença:
cientificados do teor da representação, e notificados a
I - estar provada a inexistência do fato;
comparecer à audiência, acompanhados de advogado.
II - não haver prova da existência do
§ 2º Se os pais ou responsável não forem localizados,
fato; III - não constituir o fato ato
a autoridade judiciária dará curador especial ao
infracional;
adolescente.
IV - não existir prova de ter o adolescente concorrido
§ 3º Não sendo localizado o adolescente, a autoridade
para o ato infracional.
judiciária expedirá mandado de busca e apreensão, deter-
Parágrafo único. Na hipótese deste artigo, estando o
minando o sobrestamento do feito, até a efetiva apresen-
adolescente internado, será imediatamente colocado em li-
tação.
berdade.
§ 4º Estando o adolescente internado, será requisitada
a sua apresentação, sem prejuízo da notificação dos pais
Art. 190. A intimação da sentença que aplicar medida
ou responsável.
de internação ou regime de semi-liberdade será feita:
I - ao adolescente e ao seu defensor;
Art. 185. A internação, decretada ou mantida pela au-
toridade judiciária, não poderá ser cumprida em estabeleci- II - quando não for encontrado o adolescente, a seus
pais ou responsável, sem prejuízo do defensor.
mento prisional.
§ 1º Sendo outra a medida aplicada, a intimação far-se-
§ 1º Inexistindo na comarca entidade com as carac-
-á unicamente na pessoa do defensor.
terísticas definidas no art. 123, o adolescente deverá ser
imediatamente transferido para a localidade mais § 2º Recaindo a intimação na pessoa do adolescente,
próxima. deverá este manifestar se deseja ou não recorrer da sen-
tença.
§ 2º Sendo impossível a pronta transferência, o
adoles- cente aguardará sua remoção em repartição
Seção V-A
policial, desde que em seção isolada dos adultos e com
instalações apro- priadas, não podendo ultrapassar o Da Infiltração de Agentes de Polícia para a
Investi- gação de Crimes contra a Dignidade Sexual de
prazo máximo de cinco dias, sob pena de
Criança
responsabilidade.
e de Adolescente
Art. 186. Comparecendo o adolescente, seus pais ou
res- ponsável, a autoridade judiciária procederá à oitiva Art. 190-A. A infiltração de agentes de polícia na inter-
dos mes- mos, podendo solicitar opinião de profissional net com o fim de investigar os crimes previstos nos arts.
qualificado. 240, 241, 241-A, 241-B, 241-C e 241-D desta Lei e nos arts.
§ 1º Se a autoridade judiciária entender adequada a 154- A, 217-A, 218, 218-A e 218-B do Decreto-Lei nº 2.848,
remissão, ouvirá o representante do Ministério Público, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), obedecerá às
proferindo decisão. seguin- tes regras:
§ 2º Sendo o fato grave, passível de aplicação de I – será precedida de autorização judicial devidamente
medi- da de internação ou colocação em regime de semi- circunstanciada e fundamentada, que estabelecerá os
liberda- de, a autoridade judiciária, verificando que o limites da infiltração para obtenção de prova, ouvido o
adolescente não possui advogado constituído, nomeará Ministério Público;
defensor, de- signando, desde logo, audiência em II – dar-se-á mediante requerimento do Ministério Pú-
continuação, podendo determinar a realização de blico ou representação de delegado de polícia e conterá a
diligências e estudo do caso. demonstração de sua necessidade, o alcance das tarefas
§ 3º O advogado constituído ou o defensor nomeado, dos policiais, os nomes ou apelidos das pessoas
no prazo de três dias contado da audiência de apresenta- investigadas e, quando possível, os dados de conexão ou
ção, oferecerá defesa prévia e rol de testemunhas. cadastrais que per- mitam a identificação dessas pessoas;
§ 4º Na audiência em continuação, ouvidas as teste- III – não poderá exceder o prazo de 90 (noventa) dias,
munhas arroladas na representação e na defesa prévia, sem prejuízo de eventuais renovações, desde que o total
cumpridas as diligências e juntado o relatório da equipe não exceda a 720 (setecentos e vinte) dias e seja
in- terprofissional, será dada a palavra ao representante demonstrada sua efetiva necessidade, a critério da
do Mi- nistério Público e ao defensor, sucessivamente, autoridade judicial.
pelo tempo de vinte minutos para cada um, prorrogável § 1º A autoridade judicial e o Ministério Público pode-
por mais dez, a critério da autoridade judiciária, que em rão requisitar relatórios parciais da operação de infiltração
seguida proferirá decisão. antes do término do prazo de que trata o inciso II do § 1º
deste artigo.
Art. 187. Se o adolescente, devidamente notificado, não § 2º Para efeitos do disposto no inciso I do § 1º deste
comparecer, injustificadamente à audiência de apresenta- artigo, consideram-se:
ção, a autoridade judiciária designará nova data, determi-
nando sua condução coercitiva.
135
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

I – dados de conexão: informações referentes a hora,


data, início, término, duração, endereço de Protocolo de In- Parágrafo único. Havendo motivo grave, poderá a
ternet (IP) utilizado e terminal de origem da conexão; auto- ridade judiciária, ouvido o Ministério Público,
II – dados cadastrais: informações referentes a nome e decretar limi- narmente o afastamento provisório do
endereço de assinante ou de usuário registrado ou autenti- dirigente da entidade, mediante decisão fundamentada.
cado para a conexão a quem endereço de IP, identificação
de usuário ou código de acesso tenha sido atribuído no Art. 192. O dirigente da entidade será citado para, no
mo- mento da conexão. prazo de dez dias, oferecer resposta escrita, podendo juntar
§ 3º A infiltração de agentes de polícia na internet não documentos e indicar as provas a produzir.
será admitida se a prova puder ser obtida por outros
meios. Art. 193. Apresentada ou não a resposta, e sendo
neces- sário, a autoridade judiciária designará audiência de
Art. 190-B. As informações da operação de infiltração instru- ção e julgamento, intimando as partes.
serão encaminhadas diretamente ao juiz responsável pela § 1º Salvo manifestação em audiência, as partes e o
autorização da medida, que zelará por seu sigilo. Ministério Público terão cinco dias para oferecer
Parágrafo único. Antes da conclusão da operação, o alegações finais, decidindo a autoridade judiciária em
acesso aos autos será reservado ao juiz, ao Ministério igual prazo.
Públi- co e ao delegado de polícia responsável pela § 2º Em se tratando de afastamento provisório ou de-
operação, com o objetivo de garantir o sigilo das finitivo de dirigente de entidade governamental, a auto-
investigações. ridade judiciária oficiará à autoridade administrativa ime-
diatamente superior ao afastado, marcando prazo para a
Art. 190-C. Não comete crime o policial que oculta a substituição.
sua identidade para, por meio da internet, colher indícios
de
autoria e materialidade dos crimes previstos nos arts. § 3º Antes de aplicar qualquer das medidas, a autorida-
de judiciária poderá fixar prazo para a remoção das irregu-
240, 241, 241-A, 241-B, 241-C e 241-D desta Lei e nos arts.
154-
A, 217-A, 218, 218-A e 218-B do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 laridades verificadas. Satisfeitas as exigências, o processo
será extinto, sem julgamento de mérito.
de dezembro de 1940 (Código Penal).
Parágrafo único. O agente policial infiltrado que deixar § 4º A multa e a advertência serão impostas ao
dirigen-
de observar a estrita finalidade da investigação responderá te da entidade ou programa de atendimento.
pelos excessos praticados.
Seção VII
Art. 190-D. Os órgãos de registro e cadastro público Da Apuração de Infração Administrativa às
po- derão incluir nos bancos de dados próprios, mediante Nor- mas de Proteção à Criança e ao
pro- cedimento sigiloso e requisição da autoridade Adolescente
judicial, as
Art. 194. O procedimento para imposição de
penalidade
informações necessárias à efetividade da identidade fictícia
criada. administrativa por infração às normas de proteção à
Parágrafo único. O procedimento sigiloso de que trata criança e ao adolescente terá início por representação do
esta Seção será numerado e tombado em livro específico. Ministério Público, ou do Conselho Tutelar, ou auto de
infração elabo- rado por servidor efetivo ou voluntário
Art. 190-E. Concluída a investigação, todos os atos ele- credenciado, e assi- nado por duas testemunhas, se
trônicos praticados durante a operação deverão ser possível.
registra- dos, gravados, armazenados e encaminhados ao § 1º No procedimento iniciado com o auto de
juiz e ao Ministério Público, juntamente com relatório infração, poderão ser usadas fórmulas impressas,
circunstancia- do. especificando-se a natureza e as circunstâncias da
Parágrafo único. Os atos eletrônicos registrados citados infração.
no caput deste artigo serão reunidos em autos apartados e § 2º Sempre que possível, à verificação da infração se-
apensados ao processo criminal juntamente com o inquéri- guir-se-á a lavratura do auto, certificando-se, em caso
to policial, assegurando-se a preservação da identidade do con- trário, dos motivos do retardamento.
agente policial infiltrado e a intimidade das crianças e dos
adolescentes envolvidos. Art. 195. O requerido terá prazo de dez dias para apre-
sentação de defesa, contado da data da intimação, que
Seção VI será feita:
Da Apuração de Irregularidades em Entidade de I - pelo autuante, no próprio auto, quando este for
Atendimento lavra- do na presença do requerido;
II - por oficial de justiça ou funcionário legalmente
Art. 191. O procedimento de apuração de irregularida- habi- litado, que entregará cópia do auto ou da
des em entidade governamental e não-governamental terá representação ao requerido, ou a seu representante legal,
início mediante portaria da autoridade judiciária ou repre- lavrando certidão;
sentação do Ministério Público ou do Conselho Tutelar, III - por via postal, com aviso de recebimento, se não
onde conste, necessariamente, resumo dos fatos. for encontrado o requerido ou seu representante legal;
IV - por edital, com prazo de trinta dias, se incerto ou
não sabido o paradeiro do requerido ou de seu
representante legal.
136
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Art. 196. Não sendo apresentada a defesa no prazo le-


gal, a autoridade judiciária dará vista dos autos do Ministé- § 2o Sempre que possível e recomendável, a etapa obri-
rio Público, por cinco dias, decidindo em igual prazo. gatória da preparação referida no § 1o deste artigo incluirá
o contato com crianças e adolescentes em regime de aco-
Art. 197. Apresentada a defesa, a autoridade judiciária lhimento familiar ou institucional, a ser realizado sob
procederá na conformidade do artigo anterior, ou, sendo orien- tação, supervisão e avaliação da equipe técnica da
ne- cessário, designará audiência de instrução e Justiça da Infância e da Juventude e dos grupos de apoio à
julgamento. adoção, com apoio dos técnicos responsáveis pelo
Parágrafo único. Colhida a prova oral, manifestar-se- programa de aco- lhimento familiar e institucional e pela
ão sucessivamente o Ministério Público e o procurador do execução da política municipal de garantia do direito à
re- querido, pelo tempo de vinte minutos para cada um, convivência familiar.
prorro- gável por mais dez, a critério da autoridade § 3o É recomendável que as crianças e os adolescentes
judiciária, que em seguida proferirá sentença. acolhidos institucionalmente ou por família acolhedora se-
jam preparados por equipe interprofissional antes da inclu-
Seção VIII são em família adotiva.
Da Habilitação de Pretendentes à Adoção
Art. 197-D. Certificada nos autos a conclusão da par-
Art. 197-A. Os postulantes à adoção, domiciliados no ticipação no programa referido no art. 197-C desta Lei, a
Brasil, apresentarão petição inicial na qual conste: autoridade judiciária, no prazo de 48 (quarenta e oito) ho-
I - qualificação ras, decidirá acerca das diligências requeridas pelo Ministé-
completa; II - dados rio Público e determinará a juntada do estudo psicossocial,
familiares; designando, conforme o caso, audiência de instrução e jul-
III - cópias autenticadas de certidão de nascimento ou gamento.
casamento, ou declaração relativa ao período de união es- Parágrafo único. Caso não sejam requeridas diligên-
tável; cias, ou sendo essas indeferidas, a autoridade judiciária de-
IV - cópias da cédula de identidade e inscrição no Ca- terminará a juntada do estudo psicossocial, abrindo a
dastro de Pessoas Físicas; seguir vista dos autos ao Ministério Público, por 5 (cinco)
V - comprovante de renda e domicílio; dias, de- cidindo em igual prazo.
VI - atestados de sanidade física e mental;
VII - certidão de antecedentes criminais; Art. 197-E. Deferida a habilitação, o postulante será
VIII - certidão negativa de distribuição inscrito nos cadastros referidos no art. 50 desta Lei, sendo
cível. a sua convocação para a adoção feita de acordo com
ordem cronológica de habilitação e conforme a
Art. 197-B. A autoridade judiciária, no prazo de 48 disponibilidade de crianças ou adolescentes adotáveis.
(quarenta e oito) horas, dará vista dos autos ao Ministério § 1o A ordem cronológica das habilitações somente
Público, que no prazo de 5 (cinco) dias poderá: poderá deixar de ser observada pela autoridade judiciária
I - apresentar quesitos a serem respondidos pela nas hipóteses previstas no § 13 do art. 50 desta Lei, quan-
equipe interprofissional encarregada de elaborar o estudo do comprovado ser essa a melhor solução no interesse do
técnico a que se refere o art. 197-C desta Lei; adotando.
II - requerer a designação de audiência para oitiva dos § 2o A habilitação à adoção deverá ser renovada no mí-
postulantes em juízo e testemunhas; nimo trienalmente mediante avaliação por equipe interpro-
III - requerer a juntada de documentos fissional.
complementares e a realização de outras diligências que § 3o Quando o adotante candidatar-se a uma nova
entender necessá- rias. ado- ção, será dispensável a renovação da habilitação,
bastando a avaliação por equipe interprofissional.
Art. 197-C. Intervirá no feito, obrigatoriamente, equi- § 4o Após 3 (três) recusas injustificadas, pelo habilitado,
pe interprofissional a serviço da Justiça da Infância e da
à adoção de crianças ou adolescentes indicados dentro do
Juventude, que deverá elaborar estudo psicossocial, que
perfil escolhido, haverá reavaliação da habilitação conce-
con- terá subsídios que permitam aferir a capacidade e o
dida.
prepa- ro dos postulantes para o exercício de uma
§ 5o A desistência do pretendente em relação à guar-
paternidade ou maternidade responsável, à luz dos
da para fins de adoção ou a devolução da criança ou do
requisitos e princípios desta Lei.
adolescente depois do trânsito em julgado da sentença de
§ 1o É obrigatória a participação dos postulantes em
programa oferecido pela Justiça da Infância e da Juventu- adoção importará na sua exclusão dos cadastros de
de, preferencialmente com apoio dos técnicos responsáveis adoção.
pela execução da política municipal de garantia do
Art. 197-F. O prazo máximo para conclusão da habili-
direito à convivência familiar e dos grupos de apoio à
tação à adoção será de 120 (cento e vinte) dias, prorrogável
adoção devi- damente habilitados perante a Justiça da
Infância e da Ju- ventude, que inclua preparação por igual período, mediante decisão fundamentada da au-
psicológica, orientação e es- tímulo à adoção inter-racial, toridade judiciária.
de crianças ou de adolescentes com deficiência, com
doenças crônicas ou com necessidades específicas de saúde,
e de grupos de irmãos.

137
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Capítulo IV
Art. 199-E. O Ministério Público poderá requerer a ins-
Dos
tauração de procedimento para apuração de responsabili-
Recursos
dades se constatar o descumprimento das providências e
do prazo previstos nos artigos anteriores.
Art. 198. Nos procedimentos afetos à Justiça da
Infância e da Juventude, inclusive os relativos à execução
Capítulo V
das me- didas socioeducativas, adotar-se-á o sistema
recursal da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código Do Ministério Público
de Processo Ci- vil), com as seguintes adaptações: (Redação
Art. 200. As funções do Ministério Público previstas
dada pela Lei nº 12.594, de 2012)
nesta Lei serão exercidas nos termos da respectiva lei
I - os recursos serão interpostos independentemente de
orgânica.
preparo;
II - em todos os recursos, salvo nos embargos de decla-
Art. 201. Compete ao Ministério Público:
ração, o prazo para o Ministério Público e para a defesa
I - conceder a remissão como forma de exclusão do
será sempre de 10 (dez) dias; (Redação dada pela Lei nº
pro- cesso;
12.594, de 2012)
II - promover e acompanhar os procedimentos relativos
III - os recursos terão preferência de julgamento e dis-
às infrações atribuídas a adolescentes;
pensarão revisor;
III - promover e acompanhar as ações de alimentos e
VII - antes de determinar a remessa dos autos à
os procedimentos de suspensão e destituição do poder
superior instância, no caso de apelação, ou do instrumento,
familiar, nomeação e remoção de tutores, curadores e
no caso de agravo, a autoridade judiciária proferirá
guardiães, bem como oficiar em todos os demais
despacho funda- mentado, mantendo ou reformando a
procedimentos da compe- tência da Justiça da Infância e
decisão, no prazo de cinco dias;
da Juventude;
VIII - mantida a decisão apelada ou agravada, o escri-
vão remeterá os autos ou o instrumento à superior IV - promover, de ofício ou por solicitação dos interes-
sados, a especialização e a inscrição de hipoteca legal e a
instância dentro de vinte e quatro horas,
prestação de contas dos tutores, curadores e quaisquer ad-
independentemente de novo pedido do recorrente; se a
ministradores de bens de crianças e adolescentes nas hipó-
reformar, a remessa dos autos dependerá de pedido
teses do art. 98;
expresso da parte interessada ou do Ministério Público, no
V - promover o inquérito civil e a ação civil pública
prazo de cinco dias, contados da in- timação.
para a proteção dos interesses individuais, difusos ou
Art. 199. Contra as decisões proferidas com base no art. coletivos re- lativos à infância e à adolescência, inclusive os
149 caberá recurso de apelação. definidos no art. 220, § 3º inciso II, da Constituição Federal;
VI - instaurar procedimentos administrativos e, para
Art. 199-A. A sentença que deferir a adoção produz ins- truí-los:
efei- to desde logo, embora sujeita a apelação, que será a) expedir notificações para colher depoimentos ou es-
recebida exclusivamente no efeito devolutivo, salvo se se clarecimentos e, em caso de não comparecimento injusti-
tratar de adoção internacional ou se houver perigo de dano ficado, requisitar condução coercitiva, inclusive pela polícia
irrepará- vel ou de difícil reparação ao adotando. civil ou militar;
b) requisitar informações, exames, perícias e documen-
Art. 199-B. A sentença que destituir ambos ou qualquer tos de autoridades municipais, estaduais e federais, da
dos genitores do poder familiar fica sujeita a apelação, que admi- nistração direta ou indireta, bem como promover
deverá ser recebida apenas no efeito devolutivo. inspeções e diligências investigatórias;
c) requisitar informações e documentos a particulares e
Art. 199-C. Os recursos nos procedimentos de adoção e instituições privadas;
de destituição de poder familiar, em face da relevância das VII - instaurar sindicâncias, requisitar diligências inves-
questões, serão processados com prioridade absoluta, de- tigatórias e determinar a instauração de inquérito policial,
vendo ser imediatamente distribuídos, ficando vedado que para apuração de ilícitos ou infrações às normas de
aguardem, em qualquer situação, oportuna distribuição, e proteção à infância e à juventude;
serão colocados em mesa para julgamento sem revisão e VIII - zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias
com parecer urgente do Ministério Público. legais assegurados às crianças e adolescentes, promovendo
as medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis;
Art. 199-D. O relator deverá colocar o processo em IX - impetrar mandado de segurança, de injunção e
mesa para julgamento no prazo máximo de 60 (sessenta) ha- beas corpus, em qualquer juízo, instância ou tribunal,
dias, contado da sua conclusão. na de- fesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis
Parágrafo único. O Ministério Público será intimado da afetos à criança e ao adolescente;
data do julgamento e poderá na sessão, se entender neces- X - representar ao juízo visando à aplicação de penali-
sário, apresentar oralmente seu parecer. dade por infrações cometidas contra as normas de proteção
à infância e à juventude, sem prejuízo da promoção da res-
ponsabilidade civil e penal do infrator, quando cabível;

138
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

XI - inspecionar as entidades públicas e particulares de


atendimento e os programas de que trata esta Lei, Art. 207. Nenhum adolescente a quem se atribua a
adotando de pronto as medidas administrativas ou judiciais prá- tica de ato infracional, ainda que ausente ou foragido,
necessárias à remoção de irregularidades porventura será processado sem defensor.
verificadas; § 1º Se o adolescente não tiver defensor, ser-lhe-á no-
meado pelo juiz, ressalvado o direito de, a todo tempo,
XII - requisitar força policial, bem como a colaboração
dos serviços médicos, hospitalares, educacionais e de constituir outro de sua preferência.
assistência social, públicos ou privados, para o desempenho § 2º A ausência do defensor não determinará o adia-
de suas atri- buições. mento de nenhum ato do processo, devendo o juiz
nomear substituto, ainda que provisoriamente, ou para o
§ 1º A legitimação do Ministério Público para as ações
cíveis previstas neste artigo não impede a de terceiros, só efeito do ato.
nas mesmas hipóteses, segundo dispuserem a Constituição § 3º Será dispensada a outorga de mandato, quando
e esta Lei. se tratar de defensor nomeado ou, sido constituído, tiver
sido indicado por ocasião de ato formal com a presença
§ 2º As atribuições constantes deste artigo não
excluem outras, desde que compatíveis com a finalidade do da autoridade judiciária.
Ministério Público.
Capítulo VII
§ 3º O representante do Ministério Público, no
exercício de suas funções, terá livre acesso a todo local Da Proteção Judicial dos Interesses Individuais,
onde se encon- tre criança ou adolescente. Difusos e Coletivos
§ 4º O representante do Ministério Público será
respon- sável pelo uso indevido das informações e Art. 208. Regem-se pelas disposições desta Lei as ações
documentos que requisitar, nas hipóteses legais de sigilo. de responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à
§ 5º Para o exercício da atribuição de que trata o inciso criança e ao adolescente, referentes ao não oferecimento
VIII deste artigo, poderá o representante do Ministério ou oferta irregular:
Público: I - do ensino obrigatório;
a) reduzir a termo as declarações do reclamante, II - de atendimento educacional especializado aos por-
instau- rando o competente procedimento, sob sua tadores de deficiência;
presidência; III - de atendimento em creche e pré-escola às crianças
b) entender-se diretamente com a pessoa ou de zero a cinco anos de idade;
autoridade reclamada, em dia, local e horário previamente IV - de ensino noturno regular, adequado às condições
notificados ou acertados; do educando;
c) efetuar recomendações visando à melhoria dos V - de programas suplementares de oferta de material
serviços públicos e de relevância pública afetos à criança e didático-escolar, transporte e assistência à saúde do
ao adoles- cente, fixando prazo razoável para sua perfeita educan- do do ensino fundamental;
adequação. VI - de serviço de assistência social visando à proteção
à família, à maternidade, à infância e à adolescência, bem
Art. 202. Nos processos e procedimentos em que não como ao amparo às crianças e adolescentes que dele
for parte, atuará obrigatoriamente o Ministério Público na neces- sitem;
defesa dos direitos e interesses de que cuida esta Lei, VII - de acesso às ações e serviços de saúde;
hipótese em que terá vista dos autos depois das partes, VIII - de escolarização e profissionalização dos adoles-
podendo juntar docu- mentos e requerer diligências, usando centes privados de liberdade.
os recursos cabíveis. IX - de ações, serviços e programas de orientação,
apoio e promoção social de famílias e destinados ao pleno
Art. 203. A intimação do Ministério Público, em exercício do direito à convivência familiar por crianças e
qualquer caso, será feita pessoalmente. adolescentes. X - de programas de atendimento para a
execução das medidas socioeducativas e aplicação de
Art. 204. A falta de intervenção do Ministério Público medidas de prote-
acar- reta a nulidade do feito, que será declarada de ofício ção. (Incluído pela Lei nº 12.594, de 2012)
pelo juiz ou a requerimento de qualquer interessado. § 1o As hipóteses previstas neste artigo não excluem
da proteção judicial outros interesses individuais, difusos
Art. 205. As manifestações processuais do representante ou coletivos, próprios da infância e da adolescência,
do Ministério Público deverão ser fundamentadas. protegi- dos pela Constituição e pela Lei.
§ 2o A investigação do desaparecimento de crianças
ou adolescentes será realizada imediatamente após noti-
Capítulo VI
Do ficação aos órgãos competentes, que deverão comunicar
Advogado o fato aos portos, aeroportos, Polícia Rodoviária e compa-
nhias de transporte interestaduais e internacionais, forne-
cendo-lhes todos os dados necessários à identificação do
Art. 206. A criança ou o adolescente, seus pais ou
responsá- vel, e qualquer pessoa que tenha legítimo desaparecido.
interesse na solução da lide poderão intervir nos
procedimentos de que trata esta Lei, através de advogado,
o qual será intimado para todos os atos, pessoalmente ou
por publicação oficial, respeitado o se- gredo de justiça.
Parágrafo único. Será prestada assistência judiciária
inte- gral e gratuita àqueles que dela necessitarem.
139
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Art. 209. As ações previstas neste Capítulo serão


propos- tas no foro do local onde ocorreu ou deva ocorrer a Art. 214. Os valores das multas reverterão ao fundo ge-
ação ou omissão, cujo juízo terá competência absoluta rido pelo Conselho dos Direitos da Criança e do
para proces- sar a causa, ressalvadas a competência da Adolescente do respectivo município.
Justiça Federal e a competência originária dos tribunais § 1º As multas não recolhidas até trinta dias após o
superiores. trânsito em julgado da decisão serão exigidas através de
execução promovida pelo Ministério Público, nos mesmos
autos, facultada igual iniciativa aos demais legitimados.
Art. 210. Para as ações cíveis fundadas em interesses
coletivos ou difusos, consideram-se legitimados concorren- § 2º Enquanto o fundo não for regulamentado, o di-
temente: nheiro ficará depositado em estabelecimento oficial de
I - o Ministério Público; cré- dito, em conta com correção monetária.
II - a União, os estados, os municípios, o Distrito
Federal e os territórios; Art. 215. O juiz poderá conferir efeito suspensivo aos
re- cursos, para evitar dano irreparável à parte.
III - as associações legalmente constituídas há pelo me-
nos um ano e que incluam entre seus fins institucionais a
defesa dos interesses e direitos protegidos por esta Lei, dis- Art. 216. Transitada em julgado a sentença que
pensada a autorização da assembleia, se houver prévia au- impuser condenação ao poder público, o juiz determinará a
torização estatutária. remessa de peças à autoridade competente, para apuração
§ 1º Admitir-se-á litisconsórcio facultativo entre os da res- ponsabilidade civil e administrativa do agente a
Mi- nistérios Públicos da União e dos estados na defesa que se atri- bua a ação ou omissão.
dos interesses e direitos de que cuida esta Lei.
§ 2º Em caso de desistência ou abandono da ação por Art. 217. Decorridos sessenta dias do trânsito em
associação legitimada, o Ministério Público ou outro julgado da sentença condenatória sem que a associação
legiti- mado poderá assumir a titularidade ativa. autora lhe promova a execução, deverá fazê-lo o Ministério
Público, fa- cultada igual iniciativa aos demais legitimados.
Art. 211. Os órgãos públicos legitimados poderão
tomar dos interessados compromisso de ajustamento de Art. 218. O juiz condenará a associação autora a pagar
sua con- duta às exigências legais, o qual terá eficácia de ao réu os honorários advocatícios arbitrados na conformi-
título exe- cutivo extrajudicial. dade do § 4º do art. 20 da Lei n.º 5.869, de 11 de janeiro de
1973 (Código de Processo Civil), quando reconhecer que a
Art. 212. Para defesa dos direitos e interesses pretensão é manifestamente infundada.
protegidos por esta Lei, são admissíveis todas as espécies Parágrafo único. Em caso de litigância de má-fé, a as-
de ações per- tinentes. sociação autora e os diretores responsáveis pela
§ 1º Aplicam-se às ações previstas neste Capítulo as propositura da ação serão solidariamente condenados ao
normas do Código de Processo Civil. décuplo das custas, sem prejuízo de responsabilidade por
§ 2º Contra atos ilegais ou abusivos de autoridade pú- perdas e danos.
blica ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribui-
ções do poder público, que lesem direito líquido e certo Art. 219. Nas ações de que trata este Capítulo, não ha-
previsto nesta Lei, caberá ação mandamental, que se verá adiantamento de custas, emolumentos, honorários pe-
rege- rá pelas normas da lei do mandado de segurança. riciais e quaisquer outras despesas.

Art. 213. Na ação que tenha por objeto o cumprimento Art. 220. Qualquer pessoa poderá e o servidor público
de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tute- deverá provocar a iniciativa do Ministério Público, prestan-
la específica da obrigação ou determinará providências que do-lhe informações sobre fatos que constituam objeto de
assegurem o resultado prático equivalente ao do adimple- ação civil, e indicando-lhe os elementos de convicção.
mento.
§ 1º Sendo relevante o fundamento da demanda e ha- Art. 221. Se, no exercício de suas funções, os juízos e
vendo justificado receio de ineficácia do provimento final, tribunais tiverem conhecimento de fatos que possam
é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após jus- ensejar a propositura de ação civil, remeterão peças ao
tificação prévia, citando o réu. Ministério Público para as providências cabíveis.
§ 2º O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior
ou na sentença, impor multa diária ao réu, independente- Art. 222. Para instruir a petição inicial, o interessado
mente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível poderá requerer às autoridades competentes as certidões e
com a obrigação, fixando prazo razoável para o cumpri- informações que julgar necessárias, que serão fornecidas
mento do preceito. no prazo de quinze dias.
§ 3º A multa só será exigível do réu após o trânsito em
julgado da sentença favorável ao autor, mas será devida Art. 223. O Ministério Público poderá instaurar, sob sua
desde o dia em que se houver configurado o descumpri- presidência, inquérito civil, ou requisitar, de qualquer pes-
mento. soa, organismo público ou particular, certidões,
informações, exames ou perícias, no prazo que assinalar, o
qual não pode- rá ser inferior a dez dias úteis.

140
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§ 1º Se o órgão do Ministério Público, esgotadas


todas as diligências, se convencer da inexistência de Art. 229. Deixar o médico, enfermeiro ou dirigente de
fundamento para a propositura da ação cível, promoverá estabelecimento de atenção à saúde de gestante de
o arquivamen- to dos autos do inquérito civil ou das identifi- car corretamente o neonato e a parturiente, por
peças informativas, fazendo-o fundamentadamente. ocasião do parto, bem como deixar de proceder aos exames
§ 2º Os autos do inquérito civil ou as peças de referidos no art. 10 desta Lei:
informa- ção arquivados serão remetidos, sob pena de se Pena - detenção de seis meses a dois anos.
incorrer em falta grave, no prazo de três dias, ao Conselho Parágrafo único. Se o crime é culposo:
Superior do Ministério Público. Pena - detenção de dois a seis meses, ou multa.
§ 3º Até que seja homologada ou rejeitada a
promoção de arquivamento, em sessão do Conselho Art. 230. Privar a criança ou o adolescente de sua liber-
Superior do Mi- nistério público, poderão as associações dade, procedendo à sua apreensão sem estar em flagrante
legitimadas apre- sentar razões escritas ou documentos, de ato infracional ou inexistindo ordem escrita da autorida-
que serão juntados aos autos do inquérito ou anexados às de judiciária competente:
peças de informa- ção. Pena - detenção de seis meses a dois anos.
§ 4º A promoção de arquivamento será submetida a Parágrafo único. Incide na mesma pena aquele que
exame e deliberação do Conselho Superior do Ministério pro- cede à apreensão sem observância das formalidades
Público, conforme dispuser o seu regimento. legais.
§ 5º Deixando o Conselho Superior de homologar a
promoção de arquivamento, designará, desde logo, outro Art. 231. Deixar a autoridade policial responsável pela
órgão do Ministério Público para o ajuizamento da ação. apreensão de criança ou adolescente de fazer imediata co-
municação à autoridade judiciária competente e à família
Art. 224. Aplicam-se subsidiariamente, no que couber, do apreendido ou à pessoa por ele indicada:
as disposições da Lei n.º 7.347, de 24 de julho de 1985. Pena - detenção de seis meses a dois anos.

Título VII Art. 232. Submeter criança ou adolescente sob sua au-
Dos Crimes e Das Infrações Administrativas toridade, guarda ou vigilância a vexame ou a constrangi-
mento:
Capítulo I Pena - detenção de seis meses a dois anos.
Dos Crimes
Art. 234. Deixar a autoridade competente, sem justa
causa, de ordenar a imediata liberação de criança ou ado-
Seção I
lescente, tão logo tenha conhecimento da ilegalidade da
apreensão:
Disposições Gerais
Pena - detenção de seis meses a dois anos.
Art. 225. Este Capítulo dispõe sobre crimes praticados
contra a criança e o adolescente, por ação ou omissão, sem Art. 235. Descumprir, injustificadamente, prazo fixado
prejuízo do disposto na legislação penal. nesta Lei em benefício de adolescente privado de liberdade:
Pena - detenção de seis meses a dois anos.
Art. 226. Aplicam-se aos crimes definidos nesta Lei as
normas da Parte Geral do Código Penal e, quanto ao pro- Art. 236. Impedir ou embaraçar a ação de autoridade
cesso, as pertinentes ao Código de Processo Penal. judiciária, membro do Conselho Tutelar ou representante
do Ministério Público no exercício de função prevista nesta
Lei:
Art. 227. Os crimes definidos nesta Lei são de ação pú-
blica incondicionada. Pena - detenção de seis meses a dois anos.

Seção II Art. 237. Subtrair criança ou adolescente ao poder de


quem o tem sob sua guarda em virtude de lei ou ordem
Dos Crimes em Espécie
judi- cial, com o fim de colocação em lar substituto:
Art. 228. Deixar o encarregado de serviço ou o Pena - reclusão de dois a seis anos, e multa.
dirigente de estabelecimento de atenção à saúde de
gestante de man- ter registro das atividades desenvolvidas, Art. 238. Prometer ou efetivar a entrega de filho ou pu-
na forma e prazo referidos no art. 10 desta Lei, bem como pilo a terceiro, mediante paga ou recompensa:
de fornecer à par- turiente ou a seu responsável, por Pena - reclusão de um a quatro anos, e multa.
ocasião da alta médica, declaração de nascimento, onde Parágrafo único. Incide nas mesmas penas quem
constem as intercorrências do parto e do desenvolvimento oferece ou efetiva a paga ou recompensa.
do neonato:
Pena - detenção de seis meses a dois Art. 239. Promover ou auxiliar a efetivação de ato des-
anos. Parágrafo único. Se o crime é tinado ao envio de criança ou adolescente para o exterior
culposo: com inobservância das formalidades legais ou com o fito de
obter lucro:
Pena - detenção de dois a seis meses, ou multa.
Pena - reclusão de quatro a seis anos, e multa.

14
1
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Parágrafo único. Se há emprego de violência, grave


ameaça ou fraude: § 2o Não há crime se a posse ou o armazenamento
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 8 (oito) anos, além da tem a finalidade de comunicar às autoridades
pena correspondente à violência. competentes a ocorrência das condutas descritas nos arts.
240, 241, 241- A e 241-C desta Lei, quando a comunicação
for feita por:
Art. 240. Produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar
ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo explícito ou I – agente público no exercício de suas funções;
pornográfica, envolvendo criança ou adolescente: II – membro de entidade, legalmente constituída, que
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. inclua, entre suas finalidades institucionais, o recebimento,
o processamento e o encaminhamento de notícia dos cri-
§ 1o Incorre nas mesmas penas quem agencia, faci-
lita, recruta, coage, ou de qualquer modo intermedeia a mes referidos neste parágrafo;
participação de criança ou adolescente nas cenas referidas III – representante legal e funcionários responsáveis
no caputdeste artigo, ou ainda quem com esses contrace- de provedor de acesso ou serviço prestado por meio de
na. rede de computadores, até o recebimento do material
relativo à notícia feita à autoridade policial, ao Ministério
§ 2o Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se o agente
comete o crime: Público ou ao Poder Judiciário.
§ 3o As pessoas referidas no § 2o deste artigo deverão
I – no exercício de cargo ou função pública ou a
pretexto de exercê-la; manter sob sigilo o material ilícito referido.
II – prevalecendo-se de relações domésticas, de
coabita- ção ou de hospitalidade; ou Art. 241-C. Simular a participação de criança ou
III – prevalecendo-se de relações de parentesco consan- adoles- cente em cena de sexo explícito ou pornográfica
güíneo ou afim até o terceiro grau, ou por adoção, de tu- por meio de adulteração, montagem ou modificação de
tor, curador, preceptor, empregador da vítima ou de fotografia, vídeo ou qualquer outra forma de representação
quem, a qualquer outro título, tenha autoridade sobre ela, visual:
ou com seu consentimento. Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem ven-
Art. 241. Vender ou expor à venda fotografia, vídeo ou de, expõe à venda, disponibiliza, distribui, publica ou
outro registro que contenha cena de sexo explícito ou divulga por qualquer meio, adquire, possui ou armazena o
porno- gráfica envolvendo criança ou adolescente: material produzido na forma do caput deste artigo.
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.
Art. 241-D. Aliciar, assediar, instigar ou constranger,
Art. 241-A. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, por qualquer meio de comunicação, criança, com o fim de
distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive com ela praticar ato libidinoso:
por meio de sistema de informática ou telemático, fotogra- Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
fia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo ex- Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem:
plícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente: I – facilita ou induz o acesso à criança de material
Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. con- tendo cena de sexo explícito ou pornográfica com o
§ 1o Nas mesmas penas incorre quem: fim de com ela praticar ato libidinoso;
I – assegura os meios ou serviços para o II – pratica as condutas descritas no caput deste
armazenamento das fotografias, cenas ou imagens de que artigo com o fim de induzir criança a se exibir de forma
trata o caput deste artigo; pornográ- fica ou sexualmente explícita.
II – assegura, por qualquer meio, o acesso por rede de
computadores às fotografias, cenas ou imagens de que Art. 241-E. Para efeito dos crimes previstos nesta Lei,
trata o caput deste artigo. a expressão “cena de sexo explícito ou pornográfica” com-
§ 2o As condutas tipificadas nos incisos I e II do § preende qualquer situação que envolva criança ou adoles-
o
1 deste artigo são puníveis quando o responsável legal cente em atividades sexuais explícitas, reais ou simuladas,
pela prestação do serviço, oficialmente notificado, deixa ou exibição dos órgãos genitais de uma criança ou
de desabilitar o acesso ao conteúdo ilícito de que trata adoles- cente para fins primordialmente sexuais.
o caput deste artigo.
Art. 242. Vender, fornecer ainda que gratuitamente ou
Art. 241-B. Adquirir, possuir ou armazenar, por qual- entregar, de qualquer forma, a criança ou adolescente
quer meio, fotografia, vídeo ou outra forma de registro arma, munição ou explosivo:
que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos.
envolven- do criança ou adolescente:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. Art. 243. Vender, fornecer, servir, ministrar ou entregar,
§ 1o A pena é diminuída de 1 (um) a 2/3 (dois ter- ainda que gratuitamente, de qualquer forma, a criança ou
ços) se de pequena quantidade o material a que se refere a adolescente, bebida alcoólica ou, sem justa causa, outros
o caput deste artigo. produtos cujos componentes possam causar dependência
fí- sica ou psíquica:
Pena - detenção de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa,
se o fato não constitui crime mais grave.

142
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Art. 244. Vender, fornecer ainda que gratuitamente ou


entregar, de qualquer forma, a criança ou adolescente Pena - multa de três a vinte salários de referência, apli-
fogos de estampido ou de artifício, exceto aqueles que, pelo cando-se o dobro em caso de reincidência.
seu reduzido potencial, sejam incapazes de provocar § 1º Incorre na mesma pena quem exibe, total ou par-
qualquer dano físico em caso de utilização indevida: cialmente, fotografia de criança ou adolescente envolvido
Pena - detenção de seis meses a dois anos, e multa. em ato infracional, ou qualquer ilustração que lhe diga
res- peito ou se refira a atos que lhe sejam atribuídos, de
Art. 244-A. Submeter criança ou adolescente, como tais forma a permitir sua identificação, direta ou
definidos no caput do art. 2o desta Lei, à prostituição ou à indiretamente.
exploração sexual: § 2º Se o fato for praticado por órgão de imprensa ou
Pena – reclusão de quatro a dez anos e multa, além da emissora de rádio ou televisão, além da pena prevista
perda de bens e valores utilizados na prática criminosa em neste artigo, a autoridade judiciária poderá determinar a
favor do Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente apreen- são da publicação ou a suspensão da
da unidade da Federação (Estado ou Distrito Federal) em programação da emis- sora até por dois dias, bem como da
que foi cometido o crime, ressalvado o direito de terceiro de publicação do periódico até por dois números. (Expressão
boa-fé. declarada inconstitucional pela ADIN 869-2).
§ 1o Incorrem nas mesmas penas o proprietário, o ge-
rente ou o responsável pelo local em que se verifique a Art. 248. Deixar de apresentar à autoridade judiciária
submissão de criança ou adolescente às práticas referidas de seu domicílio, no prazo de cinco dias, com o fim de
no caputdeste artigo. regula- rizar a guarda, adolescente trazido de outra
§ 2o Constitui efeito obrigatório da condenação a cas- comarca para a prestação de serviço doméstico, mesmo
sação da licença de localização e de funcionamento do es- que autorizado pe- los pais ou responsável:
tabelecimento. Pena - multa de três a vinte salários de referência, apli-
cando-se o dobro em caso de reincidência, independente-
Art. 244-B. Corromper ou facilitar a corrupção de mente das despesas de retorno do adolescente, se for o
menor de 18 (dezoito) anos, com ele praticando infração caso.
penal ou induzindo-o a praticá-la:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. Art. 249. Descumprir, dolosa ou culposamente, os deve-
§ 1o Incorre nas penas previstas no caput deste arti- res inerentes ao poder familiar ou decorrente de tutela ou
go quem pratica as condutas ali tipificadas utilizando-se de guarda, bem assim determinação da autoridade judiciária
quaisquer meios eletrônicos, inclusive salas de bate-papo ou Conselho Tutelar:
da internet. Pena - multa de três a vinte salários de referência, apli-
§ 2o As penas previstas no caput deste artigo são au- cando-se o dobro em caso de reincidência.
mentadas de um terço no caso de a infração cometida ou
induzida estar incluída no rol do art. 1 o da Lei no 8.072, de Art. 250. Hospedar criança ou adolescente desacompa-
25 de julho de 1990. nhado dos pais ou responsável, ou sem autorização escrita
desses ou da autoridade judiciária, em hotel, pensão, motel
Capítulo II ou congênere:
Das Infrações Administrativas Pena – multa.
§ 1º Em caso de reincidência, sem prejuízo da pena de
Art. 245. Deixar o médico, professor ou responsável por multa, a autoridade judiciária poderá determinar o fecha-
estabelecimento de atenção à saúde e de ensino mento do estabelecimento por até 15 (quinze) dias.
fundamen- tal, pré-escola ou creche, de comunicar à § 2º Se comprovada a reincidência em período inferior
autoridade com- petente os casos de que tenha a 30 (trinta) dias, o estabelecimento será definitivamente
conhecimento, envolvendo suspeita ou confirmação de fechado e terá sua licença cassada.
maus-tratos contra criança ou adolescente:
Pena - multa de três a vinte salários de referência, apli- Art. 251. Transportar criança ou adolescente, por qual-
cando-se o dobro em caso de reincidência. quer meio, com inobservância do disposto nos arts. 83, 84 e
85 desta Lei:
Art. 246. Impedir o responsável ou funcionário de enti-
Pena - multa de três a vinte salários de referência, apli-
dade de atendimento o exercício dos direitos constantes
cando-se o dobro em caso de reincidência.
nos incisos II, III, VII, VIII e XI do art. 124 desta Lei:
Pena - multa de três a vinte salários de referência, apli-
Art. 252. Deixar o responsável por diversão ou espetá-
cando-se o dobro em caso de reincidência.
culo público de afixar, em lugar visível e de fácil acesso, à
entrada do local de exibição, informação destacada sobre a
Art. 247. Divulgar, total ou parcialmente, sem autoriza-
natureza da diversão ou espetáculo e a faixa etária
ção devida, por qualquer meio de comunicação, nome, ato
ou documento de procedimento policial, administrativo ou especifi- cada no certificado de classificação:
judicial relativo a criança ou adolescente a que se atribua Pena - multa de três a vinte salários de referência, apli-
ato infracional: cando-se o dobro em caso de reincidência.

143
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Art. 253. Anunciar peças teatrais, filmes ou quaisquer


Art. 258-B. Deixar o médico, enfermeiro ou dirigente de
re- presentações ou espetáculos, sem indicar os limites de
estabelecimento de atenção à saúde de gestante de efetuar
idade a que não se recomendem:
imediato encaminhamento à autoridade judiciária de caso
Pena - multa de três a vinte salários de referência, du- de que tenha conhecimento de mãe ou gestante
plicada em caso de reincidência, aplicável, separadamente, interessada em entregar seu filho para adoção:
à casa de espetáculo e aos órgãos de divulgação ou publi- Pena - multa de R$ 1.000,00 (mil reais) a R$ 3.000,00
cidade. (três mil reais).
Parágrafo único. Incorre na mesma pena o funcionário
Art. 254. Transmitir, através de rádio ou televisão, de programa oficial ou comunitário destinado à garantia
espe- táculo em horário diverso do autorizado ou sem do direito à convivência familiar que deixa de efetuar a
aviso de sua classificação: comu- nicação referida no caput deste artigo.
Pena - multa de vinte a cem salários de referência; du-
plicada em caso de reincidência a autoridade judiciária po- Art. 258-C. Descumprir a proibição estabelecida no in-
derá determinar a suspensão da programação da emissora ciso II do art. 81:
por até dois dias. Pena - multa de R$ 3.000,00 (três mil reais) a R$
10.000,00 (dez mil reais);
Art. 255. Exibir filme, trailer, peça, amostra ou congêne-
c Medida Administrativa - interdição do estabelecimento
re classificado pelo órgão competente como inadequado às omercial até o recolhimento da multa aplicada.
crianças ou adolescentes admitidos ao espetáculo:
Pena - multa de vinte a cem salários de referência; na Disposições Finais e Transitórias
reincidência, a autoridade poderá determinar a suspensão
do espetáculo ou o fechamento do estabelecimento por até Art. 259. A União, no prazo de noventa dias contados
quinze dias. da publicação deste Estatuto, elaborará projeto de lei
dispondo sobre a criação ou adaptação de seus órgãos às
Art. 256. Vender ou locar a criança ou adolescente fita diretrizes da política de atendimento fixadas no art. 88 e ao
de programação em vídeo, em desacordo com a que estabele- ce o Título V do Livro II.
Parágrafo único. Compete aos estados e municípios
classificação atribuída pelo órgão competente:
pro- moverem a adaptação de seus órgãos e programas às
Pena - multa de três a vinte salários de referência; em
dire- trizes e princípios estabelecidos nesta Lei.
caso de reincidência, a autoridade judiciária poderá deter-
minar o fechamento do estabelecimento por até quinze Art. 260. Os contribuintes poderão efetuar doações aos
dias. Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente nacional,
distrital, estaduais ou municipais, devidamente comprova-
Art. 257. Descumprir obrigação constante dos arts. 78 e das, sendo essas integralmente deduzidas do imposto de
79 desta Lei: renda, obedecidos os seguintes limites:
Pena - multa de três a vinte salários de referência, du- I - 1% (um por cento) do imposto sobre a renda devido
plicando-se a pena em caso de reincidência, sem prejuízo apurado pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lu-
de apreensão da revista ou publicação. cro real; e
II - 6% (seis por cento) do imposto sobre a renda apu-
Art. 258. Deixar o responsável pelo estabelecimento ou rado pelas pessoas físicas na Declaração de Ajuste Anual,
o empresário de observar o que dispõe esta Lei sobre o observado o disposto no art. 22 da Lei n o 9.532, de 10 de
acesso de criança ou adolescente aos locais de diversão, ou dezembro de 1997.
sobre sua participação no espetáculo: § 1º - (Revogado)
Pena - multa de três a vinte salários de referência; em § 1o-A. Na definição das prioridades a serem atendidas
caso de reincidência, a autoridade judiciária poderá deter- com os recursos captados pelos fundos nacional,
minar o fechamento do estabelecimento por até quinze estaduais e municipais dos direitos da criança e do
dias. adolescente, serão consideradas as disposições do Plano
Nacional de Promo- ção, Proteção e Defesa do Direito de
Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e
Art. 258-A. Deixar a autoridade competente de provi-
Comunitária e as do Plano Nacio- nal pela Primeira
denciar a instalação e operacionalização dos cadastros pre-
Infância.
vistos no art. 50 e no § 11 do art. 101 desta Lei:
§ 2o Os conselhos nacional, estaduais e municipais
Pena - multa de R$ 1.000,00 (mil reais) a R$ 3.000,00 dos direitos da criança e do adolescente fixarão critérios de
(três mil reais). utilização, por meio de planos de aplicação, das dotações
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas a autori- subsidiadas e demais receitas, aplicando necessariamen-
dade que deixa de efetuar o cadastramento de crianças e te percentual para incentivo ao acolhimento, sob a forma
de adolescentes em condições de serem adotadas, de de guarda, de crianças e adolescentes e para programas de
pessoas ou casais habilitados à adoção e de crianças e atenção integral à primeira infância em áreas de maior ca-
adolescentes em regime de acolhimento institucional ou rência socioeconômica e em situações de calamidade.
familiar.

144
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§ 3º O Departamento da Receita Federal, do Ministé-


rio da Economia, Fazenda e Planejamento, regulamentará II - do imposto devido mensalmente e no ajuste anual,
a comprovação das doações feitas aos fundos, nos termos para as pessoas jurídicas que apuram o imposto anualmen-
deste artigo. te.
§ 4º O Ministério Público determinará em cada Parágrafo único. A doação deverá ser efetuada dentro
comarca a forma de fiscalização da aplicação, pelo Fundo do período a que se refere a apuração do imposto.
Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, dos
incentivos fiscais referidos neste artigo. Art. 260-C. As doações de que trata o art. 260 desta Lei
§ 5o Observado o disposto no § 4 o do art. 3o da Lei no podem ser efetuadas em espécie ou em bens.
9.249, de 26 de dezembro de 1995, a dedução de que Parágrafo único. As doações efetuadas em espécie de-
trata o inciso I do caput: vem ser depositadas em conta específica, em instituição fi-
I - será considerada isoladamente, não se submetendo nanceira pública, vinculadas aos respectivos fundos de que
a limite em conjunto com outras deduções do imposto; e trata o art. 260.
II - não poderá ser computada como despesa operacio-
nal na apuração do lucro real. Art. 260-D. Os órgãos responsáveis pela administração
das contas dos Fundos dos Direitos da Criança e do Adoles-
Art. 260-A. A partir do exercício de 2010, ano-calen- cente nacional, estaduais, distrital e municipais devem
dário de 2009, a pessoa física poderá optar pela doação de emitir recibo em favor do doador, assinado por pessoa
que trata o inciso II do caput do art. 260 diretamente em competente e pelo presidente do Conselho correspondente,
sua Declaração de Ajuste Anual. especifican- do:
§ 1o A doação de que trata o caput poderá ser I - número de ordem;
deduzida até os seguintes percentuais aplicados sobre o II - nome, Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ)
imposto apu- rado na declaração: e endereço do emitente;
I - (VETADO); III - nome, CNPJ ou Cadastro de Pessoas Físicas (CPF)
II - (VETADO); do doador;
III - 3% (três por cento) a partir do exercício de 2012. IV - data da doação e valor efetivamente recebido;
§ 2o A dedução de que trata o caput: e V - ano-calendário a que se refere a doação.
I - está sujeita ao limite de 6% (seis por cento) do § 1o O comprovante de que trata o caput deste artigo
impos- to sobre a renda apurado na declaração de que pode ser emitido anualmente, desde que discrimine os
trata o inciso II do caput do art. 260; valo- res doados mês a mês.
II - não se aplica à pessoa física que: § 2o No caso de doação em bens, o comprovante
a) utilizar o desconto simplificado; deve conter a identificação dos bens, mediante descrição
b) apresentar declaração em formulário; ou em campo próprio ou em relação anexa ao comprovante,
informando também se houve avaliação, o nome, CPF ou
c) entregar a declaração fora do prazo;
CNPJ e endereço dos avaliadores.
III - só se aplica às doações em espécie;
e
Art. 260-E. Na hipótese da doação em bens, o doador
IV - não exclui ou reduz outros benefícios ou deduções
deverá:
em vigor.
I - comprovar a propriedade dos bens, mediante docu-
§ 3o O pagamento da doação deve ser efetuado até a
mentação hábil;
data de vencimento da primeira quota ou quota única do
imposto, observadas instruções específicas da Secretaria II - baixar os bens doados na declaração de bens e
direi- tos, quando se tratar de pessoa física, e na
da Receita Federal do Brasil.
escrituração, no caso de pessoa jurídica; e
§ 4o O não pagamento da doação no prazo estabeleci-
III - considerar como valor dos bens doados:
do no § 3o implica a glosa definitiva desta parcela de dedu-
ção, ficando a pessoa física obrigada ao recolhimento da a) para as pessoas físicas, o valor constante da última
declaração do imposto de renda, desde que não exceda o
di- ferença de imposto devido apurado na Declaração de
valor de mercado;
Ajuste Anual com os acréscimos legais previstos na
b) para as pessoas jurídicas, o valor contábil dos bens.
legislação.
Parágrafo único. O preço obtido em caso de leilão não
§ 5o A pessoa física poderá deduzir do imposto apu-
será considerado na determinação do valor dos bens
rado na Declaração de Ajuste Anual as doações feitas, no
doados, exceto se o leilão for determinado por autoridade
respectivo ano-calendário, aos fundos controlados pelos
judiciária.
Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente mu-
nicipais, distrital, estaduais e nacional concomitantemente
com a opção de que trata o caput, respeitado o limite pre- Art. 260-F. Os documentos a que se referem os arts.
visto no inciso II do art. 260. 260-D e 260-E devem ser mantidos pelo contribuinte por
um prazo de 5 (cinco) anos para fins de comprovação da
dedu- ção perante a Receita Federal do Brasil.
Art. 260-B. A doação de que trata o inciso I do art. 260
poderá ser deduzida:
I - do imposto devido no trimestre, para as pessoas Art. 260-G. Os órgãos responsáveis pela administração
jurí- dicas que apuram o imposto trimestralmente; e das contas dos Fundos dos Direitos da Criança e do Adoles-
cente nacional, estaduais, distrital e municipais devem:

145
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

I - manter conta bancária específica destinada exclusi-


vamente a gerir os recursos do Fundo; Art. 261. A falta dos conselhos municipais dos direitos
II - manter controle das doações recebidas; e da criança e do adolescente, os registros, inscrições e
alterações a que se referem os arts. 90, parágrafo único, e
III - informar anualmente à Secretaria da Receita Fede-
91 desta Lei serão efetuados perante a autoridade
ral do Brasil as doações recebidas mês a mês, identificando
judiciária da comarca a que pertencer a entidade.
os seguintes dados por doador:
Parágrafo único. A União fica autorizada a repassar
a) nome, CNPJ ou CPF;
aos estados e municípios, e os estados aos municípios, os
b) valor doado, especificando se a doação foi em recur- sos referentes aos programas e atividades previstos
espécie ou em bens. nesta Lei, tão logo estejam criados os conselhos dos direitos
da criança e do adolescente nos seus respectivos níveis.
Art. 260-H. Em caso de descumprimento das
obrigações previstas no art. 260-G, a Secretaria da Receita Art. 262. Enquanto não instalados os Conselhos Tute-
Federal do lares, as atribuições a eles conferidas serão exercidas pela
Brasil dará conhecimento do fato ao Ministério Público.
autoridade judiciária.
Art. 260-I. Os Conselhos dos Direitos da Criança e do
Art. 263. O Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de
Adolescente nacional, estaduais, distrital e municipais
1940 (Código Penal), passa a vigorar com as seguintes
divul- garão amplamente à comunidade:
alte- rações:
I - o calendário de suas reuniões; 1) Art. 121 (...)
II - as ações prioritárias para aplicação das políticas § 4º No homicídio culposo, a pena é aumentada de um
de atendimento à criança e ao adolescente; terço, se o crime resulta de inobservância de regra técnica
III - os requisitos para a apresentação de projetos a se- de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de
prestar
rem beneficiados com recursos dos Fundos dos Direitos da imediato socorro à vítima, não procura diminuir as conse-
Criança e do Adolescente nacional, estaduais, distrital ou quências do seu ato, ou foge para evitar prisão em
municipais; flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada
IV - a relação dos projetos aprovados em cada ano-ca- de um terço, se o crime é praticado contra pessoa menor de
lendário e o valor dos recursos previstos para implementa- catorze anos.
ção das ações, por projeto; 2) Art. 129 (...)
V - o total dos recursos recebidos e a respectiva § 7º Aumenta-se a pena de um terço, se ocorrer qual-
destina- ção, por projeto atendido, inclusive com quer das hipóteses do art. 121, § 4º.
cadastramento na base de dados do Sistema de § 8º Aplica-se à lesão culposa o disposto no § 5º do
Informações sobre a Infância e a Adolescência; e art. 121.
VI - a avaliação dos resultados dos projetos 3) Art. 136 (...)
beneficiados com recursos dos Fundos dos Direitos da § 3º Aumenta-se a pena de um terço, se o crime é
Criança e do Ado- lescente nacional, estaduais, distrital e prati- cado contra pessoa menor de catorze anos.
municipais. 4) Art. 213 (...)
Parágrafo único. Se a ofendida é menor de catorze
Art. 260-J. O Ministério Público determinará, em cada anos: Pena - reclusão de quatro a dez anos.
Comarca, a forma de fiscalização da aplicação dos incenti- 5) Art. 214 (...)
vos fiscais referidos no art. 260 desta Lei. Parágrafo único. Se o ofendido é menor de catorze anos:
Parágrafo único. O descumprimento do disposto nos Pena - reclusão de três a nove anos.”
arts. 260-G e 260-I sujeitará os infratores a responder por
ação judicial proposta pelo Ministério Público, que poderá Art. 264. O art. 102 da Lei n.º 6.015, de 31 de
atuar de ofício, a requerimento ou representação de qual- dezembro de 1973, fica acrescido do seguinte item:
quer cidadão. “Art. 102 (...)
6º) a perda e a suspensão do pátrio poder.”
Art. 260-K. A Secretaria de Direitos Humanos da Pre-
sidência da República (SDH/PR) encaminhará à Secretaria Art. 265. A Imprensa Nacional e demais gráficas da
da Receita Federal do Brasil, até 31 de outubro de cada União, da administração direta ou indireta, inclusive funda-
ano, arquivo eletrônico contendo a relação atualizada dos ções instituídas e mantidas pelo poder público federal pro-
moverão edição popular do texto integral deste Estatuto,
Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente nacional,
que será posto à disposição das escolas e das entidades de
distrital, estaduais e municipais, com a indicação dos
aten- dimento e de defesa dos direitos da criança e do
respectivos nú- meros de inscrição no CNPJ e das contas
adolescente.
bancárias especí- ficas mantidas em instituições financeiras
públicas, destina- das exclusivamente a gerir os recursos
Art. 265-A. O poder público fará periodicamente am-
dos Fundos. pla divulgação dos direitos da criança e do adolescente nos
meios de comunicação social.
Art. 260-L. A Secretaria da Receita Federal do Brasil ex- Parágrafo único. A divulgação a que se refere o caput
pedirá as instruções necessárias à aplicação do disposto será veiculada em linguagem clara, compreensível e ade-
nos arts. 260 a 260-K. quada a crianças e adolescentes, especialmente às crianças
com idade inferior a 6 (seis) anos.

146
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Art. 266. Esta Lei entra em vigor noventa dias após sua
disciplina apenas a educação escolar, ou seja, a educação
publicação.
formal, que não exclui o papel das famílias e das comuni-
Parágrafo único. Durante o período de vacância
dades na educação informal.
deverão ser promovidas atividades e campanhas de
divulgação e es- clarecimentos acerca do disposto nesta TÍTULO II
Lei. Dos Princípios e Fins da Educação Nacional

Art. 267. Revogam-se as Leis nº 4.513, de 1964, e Art. 2º A educação, dever da família e do Estado,
6.697, de 10 de outubro de 1979 (Código de Menores), e ins- pirada nos princípios de liberdade e nos ideais de
as demais disposições em contrário. solida- riedade humana, tem por finalidade o pleno
desenvolvi- mento do educando, seu preparo para o
Brasília, 13 de julho de 1990; 169º da Independência e exercício da cidada- nia e sua qualificação para o trabalho.
102º da República.
Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes
princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e
BRASIL. LEI Nº 9.394, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1996. permanência na escola;
ESTABELECE AS DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar
NACIONAL – LDB.
a cultura, o pensamento, a arte e o saber;
III - pluralismo de ideias e de concepções
pedagógicas; IV - respeito à liberdade e apreço à
tolerância;
V - coexistência de instituições públicas e privadas
A lei estudada neste tópico, provavelmente a mais re- de ensino;
levante deste edital, tanto que é repetida em dois outros VI - gratuidade do ensino público em
tópicos, “estabelece as diretrizes e bases da educação estabelecimentos oficiais;
nacional”. Data de 20 de dezembro de 2016, tendo sido VII - valorização do profissional da educação escolar;
promulgada pelo ex-presidente Fernando Henrique Car- VIII - gestão democrática do ensino público, na
doso, mas já passou por inúmeras alterações desde então. forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino;
Partamos para o comentário em bloco de seus IX - garantia de padrão de qualidade;
dispositivos: X - valorização da experiência extraescolar;
XI - vinculação entre a educação escolar, o trabalho e
TÍTULO I as práticas sociais.
Da Educação XII - consideração com a diversidade étnico-racial.
XIII - garantia do direito à educação e à aprendizagem
Art. 1º A educação abrange os processos formativos ao longo da vida.
que se desenvolvem na vida familiar, na convivência
hu- mana, no trabalho, nas instituições de ensino e A educação escolar deve permitir a formação do cida-
pesqui- sa, nos movimentos sociais e organizações da dão e do trabalhador: uma pessoa que consiga se inserir
sociedade civil e nas manifestações culturais. no mercado de trabalho e ter noções adequadas de
§ 1º Esta Lei disciplina a educação escolar, que se de- cidada- nia e solidariedade no convívio social. Entre os
senvolve, predominantemente, por meio do ensino, em ins- princípios, trabalha-se com o direito de acesso à educação
tituições próprias. de quali- dade (gratuita nos estabelecimentos públicos), a
§ 2º A educação escolar deverá vincular-se ao mundo liberdade nas atividades de ensino em geral (tanto para o
do trabalho e à prática social. educador quanto para o educado), a valorização do
professor, o in- centivo à educação informal e o respeito
O primeiro artigo da LDB estabelece que a educação às diversidades de ideias, gêneros, raça e cor.
é um processo que não se dá exclusivamente nas escolas.
Trata-se da clássica distinção entre educação formal e não TÍTULO III
formal ou informal: “A educação formal é aquela desen- Do Direito à Educação e do Dever de Educar
volvida nas escolas, com conteúdos previamente
demarca- dos; a informal como aquela que os indivíduos Art. 4º O dever do Estado com educação escolar
aprendem durante seu processo de socialização - na pública será efetivado mediante a garantia de:
família, bairro, clube, amigos, etc., carregada de valores e I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4
cultura própria, de pertencimento e sentimentos (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, organizada
herdados; e a educação não formal é aquela que se da seguinte forma:
aprende ‘no mundo da vida’, via os processos de a) pré-escola;
compartilhamento de experiências, princi- palmente em b) ensino fundamental;
espaços e ações coletivas cotidianas”58. A LDB c) ensino médio;
pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v. 14, n. 50, p. 27-38, jan./mar. 2006.
58 GOHN, Maria da Glória. Educação não-formal,
participação da sociedade civil e estruturas colegiadas nas escolas.
Ensaio: aval.

147
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

II - educação infantil gratuita às crianças de até 5


(cinco) anos de idade; § 5º Para garantir o cumprimento da obrigatoriedade
III - atendimento educacional especializado gratuito de ensino, o Poder Público criará formas alternativas de
aos educandos com deficiência, transtornos globais do acesso aos diferentes níveis de ensino, independentemen-
desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, te da escolarização anterior.
trans- versal a todos os níveis, etapas e modalidades,
preferencial- mente na rede regular de ensino; Art. 6º É dever dos pais ou responsáveis efetuar a
IV - acesso público e gratuito aos ensinos fundamen- matrícula das crianças na educação básica a partir dos 4
tal e médio para todos os que não os concluíram na idade (quatro) anos de idade.
própria;
V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da Art. 7º O ensino é livre à iniciativa privada,
pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de atendidas as seguintes condições:
cada um; I - cumprimento das normas gerais da educação nacio-
nal e do respectivo sistema de ensino;
c VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às II - autorização de funcionamento e avaliação de quali-
ondições do educando;
dade pelo Poder Público;
VII - oferta de educação escolar regular para jovens e
adultos, com características e modalidades adequadas às III - capacidade de autofinanciamento, ressalvado o
suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se aos pre- visto no art. 213 da Constituição Federal.
que forem trabalhadores as condições de acesso e
permanência na escola; Conforme se percebe pelo artigo 4º, divide-se em eta-
VIII - atendimento ao educando, em todas as etapas da pas a formação escolar, nos seguintes termos:
educação básica, por meio de programas suplementares - A educação básica é obrigatória e gratuita. Envolve
de material didático-escolar, transporte, alimentação a pré-escola, o ensino fundamental e o ensino médio. A
e assistência à saúde; educação infantil deve ser garantida próxima à residência.
IX - padrões mínimos de qualidade de ensino, defini- Com efeito, existe a garantia do direito à creche gratuita.
dos como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de No mais, pessoas fora da idade escolar que queiram com-
insumos indispensáveis ao desenvolvimento do processo de pletar seus estudos têm direito ao ensino fundamental e
ensino-aprendizagem. médio.
X - vaga na escola pública de educação infantil ou de - A educação superior envolve os níveis mais elevados
ensino fundamental mais próxima de sua residência a do ensino, da pesquisa e da criação artística, devendo ser
toda criança a partir do dia em que completar 4 (quatro) acessível conforme a capacidade de cada um.
anos de idade. - Neste contexto, devem ser assegurados programas
suplementares de material didático-escolar, transporte,
Art. 5º O acesso à educação básica obrigatória é direi- ali- mentação e assistência à saúde.
to público subjetivo, podendo qualquer cidadão, grupo de O artigo 5º reitera a gratuidade e obrigatoriedade do
cidadãos, associação comunitária, organização sindical, en-
ensino básico e assegura a possibilidade de se buscar
tidade de classe ou outra legalmente constituída e, ainda, o
judi- cialmente a garantia deste direito em caso de
Ministério Público, acionar o poder público para exigi-lo.
negativa pelo poder público. Será possível fazê-lo por
§ 1º O poder público, na esfera de sua competência
federativa, deverá: meio de mandado de segurança ou ação civil pública.
I - recensear anualmente as crianças e adolescentes Além da judicialização para fazer valer o direito na esfera
em idade escolar, bem como os jovens e adultos que não cível, cabe em caso de negligência o acionamento na
con- cluíram a educação básica; esfera penal, buscando-se a punição por crime de
II - fazer-lhes a chamada pública; responsabilidade.
III - zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela Adiante, coloca-se o dever dos pais ou responsáveis
frequência à escola. efetuar a matrícula da criança.
Por fim, o artigo 7º estabelece a possibilidade do en-
sino particular, desde que sejam respeitadas as normas da
§Públi-
2º Em todas as esferas administrativas, o Poder
educação
der públiconacional, autorizado
e que tenha o funcionamento
possibilidade peloinde-
de se manter po-
co assegurará em primeiro lugar o acesso ao ensino obri-
gatório, nos termos deste artigo, contemplando em segui-
da os demais níveis e modalidades de ensino, conforme as pendentemente de auxílio estatal, embora exista previsão
prioridades constitucionais e legais. de tais auxílios em circunstâncias determinadas descritas
§ 3º Qualquer das partes mencionadas no caput deste no artigo 213, CF.
artigo tem legitimidade para peticionar no Poder
Judiciário, na hipótese do § 2º do art. 208 da Constituição TÍTULO IV
Federal, sendo gratuita e de rito sumário a ação judicial Da Organização da Educação Nacional
correspon- dente.
§ 4º Comprovada a negligência da autoridade compe- Art. 8º A União, os Estados, o Distrito Federal e os
tente para garantir o oferecimento do ensino obrigatório, Municípios organizarão, em regime de colaboração, os
poderá ela ser imputada por crime de responsabilidade. respectivos sistemas de ensino.

148
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§ 1º Caberá à União a coordenação da política


II - definir, com os Municípios, formas de colaboração
nacional de educação, articulando os diferentes níveis e
na oferta do ensino fundamental, as quais devem assegurar
sistemas e exercendo função normativa, redistributiva
a distribuição proporcional das responsabilidades, de
e supletiva em relação às demais instâncias educacionais. acordo com a população a ser atendida e os recursos
§ 2º Os sistemas de ensino terão liberdade de organi- financeiros disponíveis em cada uma dessas esferas do
zação nos termos desta Lei. Poder Público;
III - elaborar e executar políticas e planos educacio-
Art. 9º A União incumbir-se-á de: nais, em consonância com as diretrizes e planos nacionais
I - elaborar o Plano Nacional de Educação, em cola- de educação, integrando e coordenando as suas ações e as
boração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; dos seus Municípios;
II - organizar, manter e desenvolver os órgãos e IV - autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e
institui- ções oficiais do sistema federal de ensino e o dos avaliar, respectivamente, os cursos das instituições de
Territórios; III - prestar assistência técnica e financeira edu- cação superior e os estabelecimentos do seu sistema
aos Es- tados, ao Distrito Federal e aos Municípios para de en- sino;
o desen- volvimento de seus sistemas de ensino e o V - baixar normas complementares para o seu
atendimento prioritário à escolaridade obrigatória, sistema de ensino;
exercendo sua função VI - assegurar o ensino fundamental e oferecer, com
redistributiva e supletiva; prioridade, o ensino médio a todos que o
IV - estabelecer, em colaboração com os Estados, o demandarem, respeitado o disposto no art. 38 desta Lei;
Dis- trito Federal e os Municípios, competências e VII - assumir o transporte escolar dos alunos da rede
diretrizes para a educação infantil, o ensino fundamental estadual.
e o ensino médio, que nortearão os currículos e seus Parágrafo único. Ao Distrito Federal aplicar-se-ão as
conteúdos míni- mos, de modo a assegurar formação competências referentes aos Estados e aos Municípios.
básica comum;
IV-A - estabelecer, em colaboração com os Estados, o Art. 11. Os Municípios incumbir-se-ão de:
Distrito Federal e os Municípios, diretrizes e procedimen- I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e insti-
tos para identificação, cadastramento e atendimento, na tuições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os
educação básica e na educação superior, de alunos com al- às políticas e planos educacionais da União e dos Estados;
tas habilidades ou superdotação; II - exercer ação redistributiva em relação às suas es-
V - coletar, analisar e disseminar informações sobre a colas;
educação; III - baixar normas complementares para o seu siste-
VI - assegurar processo nacional de avaliação do ma de ensino;
rendimento escolar no ensino fundamental, médio e supe- IV - autorizar, credenciar e supervisionar os
rior, em colaboração com os sistemas de ensino, objetivan- estabele- cimentos do seu sistema de ensino;
do a definição de prioridades e a melhoria da qualidade do V - oferecer a educação infantil em creches e pré-
ensino; -escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, per-
VII - baixar normas gerais sobre cursos de mitida a atuação em outros níveis de ensino somente
graduação e pós-graduação; quan- do estiverem atendidas plenamente as necessidades
VIII - assegurar processo nacional de avaliação das de sua área de competência e com recursos acima dos
instituições de educação superior, com a cooperação dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal
sistemas que tiverem responsabilidade sobre este nível de à manuten- ção e desenvolvimento do ensino.
ensino; VI - assumir o transporte escolar dos alunos da rede
IX - autorizar, reconhecer, credenciar, municipal.
supervisionar e avaliar, respectivamente, os cursos das Parágrafo único. Os Municípios poderão optar, ainda,
instituições de educação superior e os estabelecimentos do por se integrar ao sistema estadual de ensino ou compor
seu sistema de ensino. com ele um sistema único de educação básica.
§ 1º Na estrutura educacional, haverá um Conselho
Na- cional de Educação, com funções normativas e de Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas
supervi- são e atividade permanente, criado por lei. as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a
§ 2° Para o cumprimento do disposto nos incisos V a in- cumbência de:
IX, a União terá acesso a todos os dados e informações I - elaborar e executar sua proposta pedagógica;
necessários de todos os estabelecimentos e órgãos edu- II - administrar seu pessoal e seus recursos materiais e
cacionais. financeiros;
§ 3º As atribuições constantes do inciso IX poderão III - assegurar o cumprimento dos dias letivos e horas-
ser delegadas aos Estados e ao Distrito Federal, desde que -aula estabelecidas;
mantenham instituições de educação superior. IV - velar pelo cumprimento do plano de trabalho de
cada docente;
Art. 10. Os Estados incumbir-se-ão de:
V - prover meios para a recuperação dos alunos de
I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e menor rendimento;
institui- ções oficiais dos seus sistemas de ensino;

149
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

VI - articular-se com as famílias e a


comunidade, criando processos de integração da III - as instituições de ensino fundamental e médio cria-
sociedade com a escola; VII - informar pai e mãe, das e mantidas pela iniciativa privada;
conviventes ou não com seus filhos, e, se for o caso, os IV - os órgãos de educação estaduais e do Distrito
responsáveis legais, sobre a fre- quência e rendimento Fede- ral, respectivamente.
dos alunos, bem como sobre a exe- Parágrafo único. No Distrito Federal, as instituições de
cução da proposta pedagógica da escola; educação infantil, criadas e mantidas pela iniciativa
privada, integram seu sistema de ensino.
VIII - notificar ao Conselho Tutelar do Município, ao
juiz competente da Comarca e ao respectivo representante
do Ministério Público a relação dos alunos que Art. 18. Os sistemas municipais de ensino compreen-
apresentem quantidade de faltas acima de cinquenta dem:
por cento do percentual permitido em lei. I - as instituições do ensino fundamental, médio e de
educação infantil mantidas pelo Poder Público municipal;
IX - promover medidas de conscientização, de
prevenção e de combate a todos os tipos de violência, II - as instituições de educação infantil criadas e
especialmente a intimidação sistemática (bullying), no manti- das pela iniciativa privada;
âmbito das escolas; III - os órgãos municipais de educação.
X - estabelecer ações destinadas a promover a cultura
de paz nas escolas. Art. 19. As instituições de ensino dos diferentes ní-
veis classificam-se nas seguintes categorias
Art. 13. Os docentes incumbir-se-ão de: administrativas: I - públicas, assim entendidas as criadas
ou incorpora-
I - participar da elaboração da proposta pedagógica
do estabelecimento de ensino; das, mantidas e administradas pelo Poder Público;
II - elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a II - privadas, assim entendidas as mantidas e adminis-
proposta pedagógica do estabelecimento de ensino; tradas por pessoas físicas ou jurídicas de direito privado.
III - zelar pela aprendizagem dos alunos;
IV - estabelecer estratégias de recuperação para os Art. 20. As instituições privadas de ensino se enqua-
alunos de menor rendimento; drarão nas seguintes categorias:
V - ministrar os dias letivos e horas-aula I - particulares em sentido estrito, assim entendidas as
estabelecidos, além de participar integralmente dos que são instituídas e mantidas por uma ou mais pessoas fí-
períodos dedicados ao planejamento, à avaliação e ao sicas ou jurídicas de direito privado que não apresentem as
desenvolvimento profissio- nal; características dos incisos abaixo;
VI - colaborar com as atividades de articulação da es- II - comunitárias, assim entendidas as que são insti-
cola com as famílias e a comunidade. tuídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais
pessoas jurídicas, inclusive cooperativas educacionais, sem
fins lucrativos, que incluam na sua entidade mantenedora
Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas da
gestão democrática do ensino público na educação bá- representantes da comunidade;
sica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os III - confessionais, assim entendidas as que são insti-
seguintes princípios: tuídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais
pessoas jurídicas que atendem a orientação confessional e
I - participação dos profissionais da educação na
elabo- ração do projeto pedagógico da escola; ideologia específicas e ao disposto no inciso anterior;
II - participação das comunidades escolar e local em IV - filantrópicas, na forma da lei.
conselhos escolares ou equivalentes.
A LDB estabelece um regime de colaboração entre as
Art. 15. Os sistemas de ensino assegurarão às unidades entidades de ensino nas esferas federativas diversas, no
escolares públicas de educação básica que os integram en- tanto, coloca competência à União de encabeçar e
pro- gressivos graus de autonomia pedagógica e coorde- nar os sistemas de ensino. Tal papel de liderança,
administra- tiva e de gestão financeira, observadas as descrito no artigo 9º, envolve poderes de regulação e de
normas gerais de direito financeiro público. controle, autorizando funcionamento ou suspendendo-o,
realizando avaliação constante de desempenho, entre
Art. 16. O sistema federal de ensino outros deveres. Uma nota interessante é reparar que o
compreende: I - as instituições de ensino mantidas artigo 10 esta- belece o dever dos Estados de garantir a
pela União; educação no en- sino fundamental e priorizar a educação
II - as instituições de educação superior criadas e no ensino médio, ao passo que o artigo 11 coloca o
manti- das pela iniciativa privada; dever dos municípios de garantir a educação infantil e
priorizar a educação fun- damental. É possível, ainda,
III - os órgãos federais de educação.
integrar educação municipal e
estadual em um sistema único.
Art. 17. Os sistemas de ensino dos Estados e do
Dis- trito Federal compreendem: Quanto às questões pedagógicas e de gestão dos es-
I- as instituições de ensino mantidas, tabelecimentos de ensino, incumbe a eles próprios, em in-
respectivamente, pelo Poder Público estadual e pelo tegração com seus docentes. Este processo de interação
Distrito Federal; entre instituição e docente, bem como destes com a co-
II - as instituições de educação superior mantidas munidade local, é conhecido como gestão democrática.
pelo Poder Público municipal;

150
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

TÍTULO V
IV - poderão organizar-se classes, ou turmas, com alu-
Dos Níveis e das Modalidades de Educação e nos de séries distintas, com níveis equivalentes de adianta-
Ensino mento na matéria, para o ensino de línguas estrangeiras,
artes, ou outros componentes curriculares;
CAPÍTULO I
V - a verificação do rendimento escolar observará os
Da Composição dos Níveis Escolares se- guintes critérios:
a) avaliação contínua e cumulativa do desempenho
Art. 21. A educação escolar compõe-se de:
do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre
I - educação básica, formada pela educação
os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre
infantil, ensino fundamental e ensino médio;
os de eventuais provas finais;
II - educação superior.
b) possibilidade de aceleração de estudos para alunos
CAPÍTULO II com atraso escolar;
DA EDUCAÇÃO BÁSICA c) possibilidade de avanço nos cursos e nas séries me-
diante verificação do aprendizado;
Seção I d) aproveitamento de estudos concluídos com êxito;
Das Disposições Gerais e) obrigatoriedade de estudos de recuperação, de pre-
ferência paralelos ao período letivo, para os casos de baixo
Art. 22. A educação básica tem por finalidades desen- rendimento escolar, a serem disciplinados pelas instituições
volver o educando, assegurar-lhe a formação comum de ensino em seus regimentos;
indis- pensável para o exercício da cidadania e fornecer- VI - o controle de frequência fica a cargo da escola,
lhe meios para progredir no trabalho e em estudos conforme o disposto no seu regimento e nas normas do
posteriores. res- pectivo sistema de ensino, exigida a frequência mínima
de setenta e cinco por cento do total de horas letivas para
Art. 23. A educação básica poderá organizar-se em sé- aprovação;
ries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância re- VII - cabe a cada instituição de ensino expedir histó-
gular de períodos de estudos, grupos não-seriados, ricos escolares, declarações de conclusão de série e di-
com base na idade, na competência e em outros critérios, plomas ou certificados de conclusão de cursos, com as
ou por forma diversa de organização, sempre que o especificações cabíveis.
interesse do pro- cesso de aprendizagem assim o § 1º A carga horária mínima anual de que trata o inci-
recomendar. so I do caput deverá ser ampliada de forma progressiva,
§ 1º A escola poderá reclassificar os alunos, inclusi- no ensino médio, para mil e quatrocentas horas, devendo
ve quando se tratar de transferências entre os sistemas de ensino oferecer, no prazo máximo de cinco
estabelecimentos situados no País e no exterior, tendo anos, pelo menos mil horas anuais de carga horária, a
como base as normas curriculares gerais. partir de 2 de março de 2017.
§ 2º O calendário escolar deverá adequar-se às pecu- § 2º Os sistemas de ensino disporão sobre a oferta de
liaridades locais, inclusive climáticas e econômicas, a educação de jovens e adultos e de ensino noturno regular,
crité- rio do respectivo sistema de ensino, sem com isso adequado às condições do educando, conforme o inciso
reduzir o número de horas letivas previsto nesta Lei. VI do art. 4º.
Art. 25. Será objetivo permanente das autoridades res-
Art. 24. A educação básica, nos níveis fundamental e
ponsáveis alcançar relação adequada entre o número de
médio, será organizada de acordo com as seguintes regras
alunos e o professor, a carga horária e as condições
comuns:
ma- teriais do estabelecimento.
I - a carga horária mínima anual será de oitocen-
tas horas para o ensino fundamental e para o ensino Parágrafo único. Cabe ao respectivo sistema de ensino,
médio, distribuídas por um mínimo de duzentos dias de à vista das condições disponíveis e das características regio-
efetivo tra- balho escolar, excluído o tempo reservado aos nais e locais, estabelecer parâmetro para atendimento do
exames finais, quando houver; ; disposto neste artigo.
II - a classificação em qualquer série ou etapa, exceto
a primeira do ensino fundamental, pode ser feita: Art. 26. Os currículos da educação infantil, do ensino
a) por promoção, para alunos que cursaram, com fundamental e do ensino médio devem ter base nacional
apro- veitamento, a série ou fase anterior, na própria comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino
escola; e em cada estabelecimento escolar, por uma parte
b) por transferência, para candidatos procedentes de diversifica- da, exigida pelas características regionais e
outras escolas; locais da socie- dade, da cultura, da economia e dos
c) independentemente de escolarização anterior, me- educandos.
diante avaliação feita pela escola, que defina o grau de § 1º Os currículos a que se refere o caput devem
desenvolvimento e experiência do candidato e permita sua abran- ger, obrigatoriamente, o estudo da língua
inscrição na série ou etapa adequada, conforme portuguesa e da matemática, o conhecimento do
regulamen- tação do respectivo sistema de ensino; mundo físico e na- tural e da realidade social e
III - nos estabelecimentos que adotam a progressão re- política, especialmente da República Federativa do Brasil,
gular por série, o regimento escolar pode admitir formas de observado, na educação in- fantil, o disposto no art. 31, no
progressão parcial, desde que preservada a sequência do ensino fundamental, o dis- posto no art. 32, e no ensino
currículo, observadas as normas do respectivo sistema de médio, o disposto no art. 36.
ensino;

15
1
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§ 2º O ensino da arte, especialmente em suas expres-


sões regionais, constituirá componente curricular § 2o Os conteúdos referentes à história e cultura afro-
obrigató- rio da educação básica. -brasileira e dos povos indígenas brasileiros serão ministra-
§ 3º A educação física, integrada à proposta pedagó- dos no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas
áreas de educação artística e de literatura e história brasi-
gica da escola, é componente curricular obrigatório da
leiras.
edu- cação infantil e do ensino fundamental, sendo sua
prática facultativa ao aluno:
Art. 27. Os conteúdos curriculares da educação básica
I - que cumpra jornada de trabalho igual ou superior a observarão, ainda, as seguintes diretrizes:
seis horas; I - a difusão de valores fundamentais ao interesse so-
II - maior de trinta anos de idade; cial, aos direitos e deveres dos cidadãos, de respeito ao
III - que estiver prestando serviço militar inicial ou que, bem comum e à ordem democrática;
em situação similar, estiver obrigado à prática da educação II - consideração das condições de escolaridade dos
física; alunos em cada estabelecimento;
IV - amparado pelo Decreto-Lei n o 1.044, de 21 de ou- III - orientação para o trabalho;
tubro de 1969; IV - promoção do desporto educacional e apoio às
V - (VETADO); prá- ticas desportivas não-formais.
VI - que tenha prole.
§ 4º O ensino da História do Brasil levará em conta as Art. 28. Na oferta de educação básica para a
contribuições das diferentes culturas e etnias para a população rural, os sistemas de ensino promoverão as
forma- ção do povo brasileiro, especialmente das adaptações ne- cessárias à sua adequação às
matrizes indí- gena, africana e europeia. peculiaridades da vida rural e de cada região,
§ 5o No currículo do ensino fundamental, a partir do especialmente:
sexto ano, será ofertada a língua inglesa. I - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas
§ 6o As artes visuais, a dança, a música e o teatro às reais necessidades e interesses dos alunos da zona rural;
são as linguagens que constituirão o componente II - organização escolar própria, incluindo adequação
curricular de que trata o § 2o deste artigo. do calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às
condições climáticas;
§ 7º A integralização curricular poderá incluir, a
III - adequação à natureza do trabalho na zona rural.
critério dos sistemas de ensino, projetos e pesquisas
Parágrafo único. O fechamento de escolas do campo,
envolvendo os temas transversais de que trata o caput.
indígenas e quilombolas será precedido de manifestação do
§ 8º A exibição de filmes de produção nacional órgão normativo do respectivo sistema de ensino, que
cons- tituirá componente curricular complementar consi- derará a justificativa apresentada pela Secretaria de
integrado à proposta pedagógica da escola, sendo a sua Educa- ção, a análise do diagnóstico do impacto da ação e
exibição obriga- tória por, no mínimo, 2 (duas) horas a mani- festação da comunidade escolar.
mensais.
§ 9o Conteúdos relativos aos direitos humanos e A educação básica tem por papel a formação da base
à prevenção de todas as formas de violência contra a do educado.
criança e o adolescente serão incluídos, como temas Os critérios para mudança de série podem ser promo-
trans- versais, nos currículos escolares de que trata o caput ção (aprovação em etapa anterior), transferência (candida-
deste artigo, tendo como diretriz a Lei n o 8.069, de 13 de tos de outras escolas) e avaliação (análise da experiência e
julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), desenvolvimento do candidato). O ensino poderá ser ace-
observada a produção e distribuição de material didático lerado caso necessário. Nas situações de alunos que não
adequado. acompanhem seu ritmo, deverá ser garantida
§ 10. A inclusão de novos componentes curriculares recuperação. Exige-se, além do desempenho, a
de caráter obrigatório na Base Nacional Comum Curricular frequência de 75%,
de- penderá de aprovação do Conselho Nacional de no mínimo, para aprovação.
Educação e de homologação pelo Ministro de Estado da O currículo da educação básica segue uma base na-
Educação. cional comum. Devem abranger língua portuguesa e da
matemática, o conhecimento do mundo físico e natural e
da realidade social e política. A educação física deve ser
Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino
oferecida obrigatoriamente, mas é facultativa ao aluno em
fundamental e de ensino médio, públicos e privados, torna-
certas situações, como de trabalho, serviço militar, idade
se obrigatório o estudo da história e cultura afro-
superior a 30 anos. Em respeito ao pluralismo, deve consi-
brasileira e indígena. derar as matrizes indígena, africana e europeia como
§ 1o O conteúdo programático a que se refere este ar- temas transversais. Ainda em tal condição, cabe o
tigo incluirá diversos aspectos da história e da cultura que aprendizado de Conteúdos relativos aos direitos humanos
caracterizam a formação da população brasileira, a partir e à prevenção de todas as formas de violência contra a
desses dois grupos étnicos, tais como o estudo da história criança e o ado- lescente. É obrigatório o estudo da
da África e dos africanos, a luta dos negros e dos povos história e cultura afro-
indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e -brasileira e indígena. Ainda, a educação deve considerar
o negro e o índio na formação da sociedade nacional, res- as peculiaridades da zona rural quando nela for ministrada.
gatando as suas contribuições nas áreas social, econômica
e política, pertinentes à história do Brasil.

152
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Seção II
§ 3º O ensino fundamental regular será ministrado em
Da Educação Infantil língua portuguesa, assegurada às comunidades indígenas
a utilização de suas línguas maternas e processos próprios
Art. 29. A educação infantil, primeira etapa da educa-
de aprendizagem.
ção básica, tem como finalidade o desenvolvimento inte-
gral da criança de até 5 (cinco) anos, em seus aspectos § 4º O ensino fundamental será presencial, sendo o
físico, psicológico, intelectual e social, complementando a en- sino a distância utilizado como complementação da
ação da família e da comunidade. apren- dizagem ou em situações emergenciais.
§ 5º O currículo do ensino fundamental incluirá, obri-
Art. 30. A educação infantil será oferecida em: gatoriamente, conteúdo que trate dos direitos das
I - creches, ou entidades equivalentes, para crianças crianças e dos adolescentes, tendo como diretriz a Lei nº
de até três anos de idade; 8.069, de 13 de julho de 1990, que institui o Estatuto da
II - pré-escolas, para as crianças de 4 (quatro) a 5 Criança e do Adolescente, observada a produção e
(cin- co) anos de idade. distribuição de material didático adequado.
§ 6º O estudo sobre os símbolos nacionais será
Art. 31. A educação infantil será organizada de acordo incluído como tema transversal nos currículos do ensino
com as seguintes regras comuns: fundamen- tal.
I - avaliação mediante acompanhamento e registro do
desenvolvimento das crianças, sem o objetivo de promoção, Art. 33. O ensino religioso, de matrícula
mesmo para o acesso ao ensino fundamental; facultativa, é parte integrante da formação básica do
II - carga horária mínima anual de 800 (oitocentas) cidadão e cons- titui disciplina dos horários normais das
ho- ras, distribuída por um mínimo de 200 (duzentos) dias
escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o
de trabalho educacional;
respeito à diversida- de cultural religiosa do Brasil, vedadas
III - atendimento à criança de, no mínimo, 4 (quatro)
horas diárias para o turno parcial e de 7 (sete) horas para a quaisquer formas de proselitismo.
jornada integral; § 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os
IV - controle de frequência pela instituição de procedi- mentos para a definição dos conteúdos do
educação pré-escolar, exigida a frequência mínima de 60% ensino religioso e estabelecerão as normas para a
(sessenta por cento) do total de horas; habilitação e admissão dos professores.
V - expedição de documentação que permita atestar os § 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil,
processos de desenvolvimento e aprendizagem da criança. cons- tituída pelas diferentes denominações religiosas,
para a de- finição dos conteúdos do ensino religioso.
A educação infantil é ministrada em creches até os 3
anos de idade e em pré-escolas dos 3 aos 5 anos de Art. 34. A jornada escolar no ensino fundamental
idade. inclui- rá pelo menos quatro horas de trabalho efetivo
em sala de aula, sendo progressivamente ampliado o
Seção III período de permanência na escola.
Do Ensino Fundamental § 1º São ressalvados os casos do ensino noturno e das
formas alternativas de organização autorizadas nesta Lei.
Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com dura-
§ 2º O ensino fundamental será ministrado progres-
ção de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública,
sivamente em tempo integral, a critério dos sistemas de
iniciando-
-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a ensino.
formação básica do cidadão, mediante:
I - o desenvolvimento da capacidade de aprender, O ensino fundamental inicia-se aos 6 anos de idade e
tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da tem duração de 9 anos. Além de objetivar a alfabetização,
escrita e do cálculo; também incentiva a formação do cidadão, da pessoa em
II - a compreensão do ambiente natural e social, do sis- contato com o mundo que o cerca estabelecendo vínculos
tema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que de solidariedade e amizade. O ensino fundamental deve
se fundamenta a sociedade; ser presencial, em regra. O ensino religioso é facultativo. A
III - o desenvolvimento da capacidade de carga horária diária é de no mínimo 4 horas.
aprendizagem, tendo em vista a aquisição de
conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e Seção IV
valores; Do Ensino Médio
IV - o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços
de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que Art. 35. O ensino médio, etapa final da educação bá-
se assenta a vida social. sica, com duração mínima de três anos, terá como finali-
§ 1º É facultado aos sistemas de ensino desdobrar o
dades:
ensino fundamental em ciclos.
I - a consolidação e o aprofundamento dos
§ 2º Os estabelecimentos que utilizam progressão re-
gular por série podem adotar no ensino fundamental o conhecimen- tos adquiridos no ensino fundamental,
re- gime de progressão continuada, sem prejuízo da possibilitando o pros- seguimento de estudos;
avaliação do processo de ensino-aprendizagem,
observadas as nor- mas do respectivo sistema de ensino.

153
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

II - a preparação básica para o trabalho e a cidadania


do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser Art. 36. O currículo do ensino médio será composto
capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de pela Base Nacional Comum Curricular e por itinerários
ocupa- ção ou aperfeiçoamento posteriores; formativos, que deverão ser organizados por meio da
ofer- ta de diferentes arranjos curriculares, conforme a
III - o aprimoramento do educando como pessoa hu-
relevância para o contexto local e a possibilidade dos
mana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da
sistemas de en- sino, a saber:
autonomia intelectual e do pensamento crítico;
I - linguagens e suas tecnologias;
IV - a compreensão dos fundamentos científico-
II - matemática e suas
tecnoló- gicos dos processos produtivos, relacionando a
tecnologias;
teoria com a prática, no ensino de cada disciplina. III - ciências da natureza e suas
tecnologias; IV - ciências humanas e sociais
Art. 35-A. A Base Nacional Comum Curricular defi- aplicadas;
nirá direitos e objetivos de aprendizagem do ensino médio, V - formação técnica e profissional.
conforme diretrizes do Conselho Nacional de Educação, nas § 1º A organização das áreas de que trata o caput e
seguintes áreas do conhecimento: das respectivas competências e habilidades será feita de
I - linguagens e suas tecnologias; acor- do com critérios estabelecidos em cada sistema de
II - matemática e suas ensino.
tecnologias; § 2º (Revogado)
III - ciências da natureza e suas § 3º A critério dos sistemas de ensino, poderá ser
tecnologias; IV - ciências humanas e sociais composto itinerário formativo integrado, que se traduz na
aplicadas. composição de componentes curriculares da Base Nacio-
§ 1º A parte diversificada dos currículos de que trata nal Comum Curricular - BNCC e dos itinerários formativos,
o caput do art. 26, definida em cada sistema de ensino, considerando os incisos I a V do caput.
de- § 4º (Revogado)
§ 5º Os sistemas de ensino, mediante disponibilidade
verá estar harmonizada à Base Nacional Comum Curricu- de vagas na rede, possibilitarão ao aluno concluinte do en-
lar e ser articulada a partir do contexto histórico,
econômico, sino médio cursar mais um itinerário formativo de que trata
social, ambiental e cultural. o caput.
§ 2º A Base Nacional Comum Curricular referente ao § 6º A critério dos sistemas de ensino, a oferta de for-
ensino médio incluirá obrigatoriamente estudos e mação com ênfase técnica e profissional considerará:
práti- cas de educação física, arte, sociologia e I - a inclusão de vivências práticas de trabalho no se-
filosofia. tor produtivo ou em ambientes de simulação,
§ 3º O ensino da língua portuguesa e da estabelecendo parcerias e fazendo uso, quando aplicável,
matemática será obrigatório nos três anos do ensino de instrumentos estabelecidos pela legislação sobre
médio, assegurada às comunidades indígenas, também, a aprendizagem profissio- nal;
utilização das respec- tivas línguas maternas. II - a possibilidade de concessão de certificados
§ 4º Os currículos do ensino médio incluirão, obriga- interme- diários de qualificação para o trabalho, quando a
toriamente, o estudo da língua inglesa e poderão ofertar formação for estruturada e organizada em etapas com
outras línguas estrangeiras, em caráter optativo, preferen- terminalidade.
cialmente o espanhol, de acordo com a disponibilidade de § 7º A oferta de formações experimentais relacionadas
oferta, locais e horários definidos pelos sistemas de ensino. ao inciso V do caput, em áreas que não constem do Catá-
§ 5º A carga horária destinada ao cumprimento da logo Nacional dos Cursos Técnicos, dependerá, para sua
Base Nacional Comum Curricular não poderá ser continuidade, do reconhecimento pelo respectivo Conse-
superior a mil e oitocentas horas do total da carga lho Estadual de Educação, no prazo de três anos, e da
inser- ção no Catálogo Nacional dos Cursos Técnicos, no
horária do ensino médio, de acordo com a definição dos
prazo de cinco anos, contados da data de oferta inicial da
sistemas de ensino.
§ 6º A União estabelecerá os padrões de desempenho formação.
esperados para o ensino médio, que serão referência § 8º A oferta de formação técnica e profissional a que
nos processos nacionais de avaliação, a partir da Base se refere o inciso V do caput, realizada na própria insti-
Nacional
Comum Curricular. tuição ou em parceria com outras instituições, deverá ser
aprovada previamente pelo Conselho Estadual de Educa-
§ 7º Os currículos do ensino médio deverão ção, homologada pelo Secretário Estadual de Educação e
considerar a formação integral do aluno, de maneira a certificada pelos sistemas de ensino.
adotar um trabalho voltado para a construção de seu § 9º As instituições de ensino emitirão certificado com
projeto de vida e para sua formação nos aspectos físicos, validade nacional, que habilitará o concluinte do ensino
cognitivos e socioe- mocionais. médio ao prosseguimento dos estudos em nível superior
§ 8º Os conteúdos, as metodologias e as formas de ou em outros cursos ou formações para os quais a conclu-
avaliação processual e formativa serão organizados nas são do ensino médio seja etapa obrigatória.
re- des de ensino por meio de atividades teóricas e § 10. Além das formas de organização previstas no art.
práticas, provas orais e escritas, seminários, projetos e 23, o ensino médio poderá ser organizado em módulos e
atividades on-line, de tal forma que ao final do ensino adotar o sistema de créditos com terminalidade específica.
médio o edu- cando demonstre: § 11. Para efeito de cumprimento das exigências cur-
I - domínio dos princípios científicos e tecnológicos que riculares do ensino médio, os sistemas de ensino poderão
presidem a produção moderna; reconhecer competências e firmar convênios com institui-
II - conhecimento das formas contemporâneas de lin- ções de educação a distância com notório
guagem. reconhecimento, mediante as seguintes formas de
comprovação:
154
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

I - demonstração prática;
Art. 36-B. A educação profissional técnica de nível mé-
II - experiência de trabalho supervisionado ou outra ex- dio será desenvolvida nas seguintes formas:
periência adquirida fora do ambiente escolar;
I - articulada com o ensino médio;
III - atividades de educação técnica oferecidas em
outras instituições de ensino credenciadas; II - subsequente, em cursos destinados a quem já
IV - cursos oferecidos por centros ou programas ocupa- tenha concluído o ensino médio.
cionais; Parágrafo único. A educação profissional técnica de ní-
V - estudos realizados em instituições de ensino nacio- vel médio deverá observar:
nais ou estrangeiras; I - os objetivos e definições contidos nas diretrizes cur-
VI - cursos realizados por meio de educação a distância riculares nacionais estabelecidas pelo Conselho Nacional
ou educação presencial mediada por tecnologias. de Educação;
§ 12. As escolas deverão orientar os alunos no II - as normas complementares dos respectivos
processo de escolha das áreas de conhecimento ou de sistemas de ensino;
atuação pro- fissional previstas no caput. III - as exigências de cada instituição de ensino, nos
ter- mos de seu projeto pedagógico.
A etapa final do ensino médio tem a duração de três
anos e busca fornecer a consolidação e o Art. 36-C. A educação profissional técnica de nível mé-
aprofundamento dos conhecimentos transmitidos no dio articulada, prevista no inciso I do caput do art. 36-B
ensino fundamental, com a devida atenção a desta Lei, será desenvolvida de forma:
conhecimentos que permitam o ingresso do aluno no I - integrada, oferecida somente a quem já tenha con-
ensino universitário e na carreira de trabalho. Neste cluído o ensino fundamental, sendo o curso planejado de
ponto, a LDB sofreu alterações recentes pela Medida
modo a conduzir o aluno à habilitação profissional técnica
Provisória nº 746/2016, convertida na Lei nº 13.415, de
de nível médio, na mesma instituição de ensino, efetuando-
2017, que foi alvo de inúmeras críticas, nota- damente por
estabelecer como facultativos conhecimen- tos que antes -se matrícula única para cada aluno;
eram tidos como obrigatórios. Para entender melhor esta II - concomitante, oferecida a quem ingresse no
questão, percebe-se que na verdade a pro- posta é a ensino médio ou já o esteja cursando, efetuando-se
especificação de matrizes ainda durante o ensino médio: o matrículas dis- tintas para cada curso, e podendo ocorrer:
aluno poderá escolher em quais áreas de conheci- mento a) na mesma instituição de ensino, aproveitando-se as
pretende se concentrar. Por exemplo, um aluno que não oportunidades educacionais disponíveis;
queira se especializar em ciências humanas, não teria a b) em instituições de ensino distintas, aproveitando-se
obrigação de cursar matérias como história e geografia. as oportunidades educacionais disponíveis;
Um aluno que não tenha interesse em ir para a c) em instituições de ensino distintas, mediante convê-
universida- de e já queira ingressar no mercado de nios de intercomplementaridade, visando ao planejamento
trabalho, terá aulas concentradas em formação técnica e e ao desenvolvimento de projeto pedagógico unificado.
profissional, apren- dendo marcenaria, mecânica,
administração, entre outras questões. As áreas que podem Art. 36-D. Os diplomas de cursos de educação profis-
ser optadas são as seguin- tes: linguagens e suas sional técnica de nível médio, quando registrados, terão
tecnologias; matemática e suas tec- nologias; ciências da validade nacional e habilitarão ao prosseguimento de
natureza e suas tecnologias; ciências humanas e sociais estudos na educação superior.
aplicadas; formação técnica e profissio- nal. As únicas
Parágrafo único. Os cursos de educação profissional
matérias estabelecidas como obrigatórias são: português,
técnica de nível médio, nas formas articulada concomitante
matemática, artes, educação física, filosofia e sociologia –
estas quatro últimas inicialmente seriam fa- cultativas, e subsequente, quando estruturados e organizados em eta-
mas devido a pressões sociais foram colocadas como pas com terminalidade, possibilitarão a obtenção de certifi-
obrigatórias. Ainda é cedo para dizer se realmente este cados de qualificação para o trabalho após a conclusão,
será o rumo conferido pela reforma, eis que a Base com aproveitamento, de cada etapa que caracterize uma
Nacional Comum Curricular que detalhará estas questões qualifi- cação para o trabalho.
ainda está em discussão.
A educação profissional e técnica pode se dar durante
Seção IV-A o Ensino Médio, notadamente se o estudante fizer a op-
Da Educação Profissional Técnica de Nível Médio ção por esta categoria de ensino (o ensino médio pode
ser voltado à formação técnico-profissional, preparando o
Art. 36-A. Sem prejuízo do disposto na Seção IV deste jovem para o ingresso no mercado de trabalho indepen-
Capítulo, o ensino médio, atendida a formação geral do dentemente de ensino universitário), quanto após o
edu- cando, poderá prepará-lo para o exercício de Ensino Médio, em instituições próprias de ensino técnico-
profissões técnicas. profis- sionalizante (neste sentido, há cursos técnicos-
Parágrafo único. A preparação geral para o trabalho profissio- nais com menor duração que os cursos de
e, facultativamente, a habilitação profissional poderão ser ensino superior e que são equiparados a este).
desenvolvidas nos próprios estabelecimentos de ensino mé-
dio ou em cooperação com instituições especializadas em
educação profissional.

155
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Seção V
§ 3º Os cursos de educação profissional tecnológica
Da Educação de Jovens e Adultos de graduação e pós-graduação organizar-se-ão, no que
con- cerne a objetivos, características e duração, de
Art. 37. A educação de jovens e adultos será desti- acordo com as diretrizes curriculares nacionais
nada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade
estabelecidas pelo Con- selho Nacional de Educação.
de estudos nos ensinos fundamental e médio na idade
própria e constituirá instrumento para a educação e a
Art. 40. A educação profissional será desenvolvida
aprendizagem ao longo da vida.
em articulação com o ensino regular ou por diferentes
§ 1º Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente
estratégias de educação continuada, em instituições es-
aos jovens e aos adultos, que não puderam efetuar os es-
pecializadas ou no ambiente de trabalho.
tudos na idade regular, oportunidades educacionais apro-
priadas, consideradas as características do alunado, seus
interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cur- Art. 41. O conhecimento adquirido na educação profis-
sos e exames. sional e tecnológica, inclusive no trabalho, poderá ser
§ 2º O Poder Público viabilizará e estimulará o acesso objeto de avaliação, reconhecimento e certificação para
e a permanência do trabalhador na escola, mediante prossegui- mento ou conclusão de estudos.
ações integradas e complementares entre si.
§ 3º A educação de jovens e adultos deverá articular- Art. 42. As instituições de educação profissional e tec-
-se, preferencialmente, com a educação profissional, na nológica, além dos seus cursos regulares, oferecerão cursos
forma do regulamento. especiais, abertos à comunidade, condicionada a
matrícula à capacidade de aproveitamento e não
Art. 38. Os sistemas de ensino manterão cursos e necessariamente ao nível de escolaridade.
exames supletivos, que compreenderão a base nacional
comum do currículo, habilitando ao prosseguimento de A educação profissional e tecnológica pode se dar
estudos em ca- ráter regular. não apenas no ensino médio, mas também em
§ 1º Os exames a que se refere este artigo realizar-se- instituições pró- prias, que podem conferir inclusive
-ão: diploma de formação em nível superior. Exemplos:
I - no nível de conclusão do ensino fundamental, para FATEC, SENAI, entre outros. O acesso a este tipo de
os maiores de quinze anos; ensino não necessariamente exige conclusão dos níveis
II - no nível de conclusão do ensino médio, para os prévios de educação, eis que seu prin- cipal objetivo não é
maiores de dezoito anos. o ensino de conteúdos típicos, mas sim a capacitação
§ 2º Os conhecimentos e habilidades adquiridos pelos profissional.
educandos por meios informais serão aferidos e reconhe-
cidos mediante exames. CAPÍTULO IV
DA EDUCAÇÃO SUPERIOR
A educação de jovens e adultos objetiva permitir a
Art. 43. A educação superior tem por finalidade:
conclusão do ensino fundamental e médio para aqueles I - estimular a criação cultural e o desenvolvimento
que já ultrapassaram a idade regular em que isso deveria do espírito científico e do pensamento reflexivo;
ter acontecido. II - formar diplomados nas diferentes áreas de co-
nhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais
CAPÍTULO III e para a participação no desenvolvimento da sociedade
Da Educação Profissional e Tecnológica bra- sileira, e colaborar na sua formação contínua;
III - incentivar o trabalho de pesquisa e
Art. 39. A educação profissional e tecnológica, no investigação científica, visando o desenvolvimento da
cumprimento dos objetivos da educação nacional, integra- ciência e da tec- nologia e da criação e difusão da cultura,
se aos diferentes níveis e modalidades de educação e às e, desse modo, de- senvolver o entendimento do homem e
dimen- sões do trabalho, da ciência e da tecnologia. do meio em que vive; IV - promover a divulgação de
§ 1º Os cursos de educação profissional e tecnológica conhecimentos cultu- rais, científicos e técnicos que
poderão ser organizados por eixos tecnológicos, possibi- constituem patrimônio da humanidade e comunicar o
litando a construção de diferentes itinerários formativos, saber através do ensino, de pu-
observadas as normas do respectivo sistema e nível de blicações ou de outras formas de comunicação;
en- sino. V- suscitar o desejo permanente de
§ 2º A educação profissional e tecnológica abrangerá aperfeiçoamento cultural e profissional e possibilitar a
os seguintes cursos:
correspondente concre- tização, integrando os
I – de formação inicial e continuada ou
conhecimentos que vão sendo adqui- ridos numa estrutura
qualificação profissional;
intelectual sistematizadora do conhe- cimento de cada
II – de educação profissional técnica de nível
geração;
médio; III – de educação profissional tecnológica
VI - estimular o conhecimento dos problemas do
de gra-
mundo presente, em particular os nacionais e regionais,
duação e pós-graduação.
prestar serviços especializados à comunidade e estabelecer
com esta uma relação de reciprocidade;

156
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

VII - promover a extensão, aberta à participação da


população, visando à difusão das conquistas e benefícios § 2º No caso de instituição pública, o Poder Executivo
re- sultantes da criação cultural e da pesquisa científica e responsável por sua manutenção acompanhará o
tecno- lógica geradas na instituição. processo de saneamento e fornecerá recursos adicionais,
se necessá- rios, para a superação das deficiências.
VIII - atuar em favor da universalização e do
aprimo- ramento da educação básica, mediante a
Art. 47. Na educação superior, o ano letivo regular, in-
formação e a capacitação de profissionais, a realização de dependente do ano civil, tem, no mínimo, duzentos dias
pesquisas peda- gógicas e o desenvolvimento de atividades de trabalho acadêmico efetivo, excluído o tempo
de extensão que aproximem os dois níveis escolares. reservado aos exames finais, quando houver.
§ 1º As instituições informarão aos interessados, antes
Art. 44. A educação superior abrangerá os seguintes de cada período letivo, os programas dos cursos e demais
cur- sos e programas: componentes curriculares, sua duração, requisitos, qualifi-
I - cursos sequenciais por campo de saber, de diferen- cação dos professores, recursos disponíveis e critérios de
tes níveis de abrangência, abertos a candidatos que avaliação, obrigando-se a cumprir as respectivas
atendam aos requisitos estabelecidos pelas instituições de condições, e a publicação deve ser feita, sendo as 3 (três)
ensino, des- de que tenham concluído o ensino médio ou primeiras formas concomitantemente:
equivalente; I - em página específica na internet no sítio eletrônico
II - de graduação, abertos a candidatos que tenham oficial da instituição de ensino superior, obedecido o
concluído o ensino médio ou equivalente e tenham sido seguinte:
clas- sificados em processo seletivo; a) toda publicação a que se refere esta Lei deve ter
III - de pós-graduação, compreendendo programas de como título “Grade e Corpo Docente”;
b) a página principal da instituição de ensino superior,
mestrado e doutorado, cursos de especialização,
bem como a página da oferta de seus cursos aos
aperfeiçoa- mento e outros, abertos a candidatos ingressantes sob a forma de vestibulares, processo seletivo
diplomados em cursos de graduação e que atendam às e outras com a mesma finalidade, deve conter a ligação
exigências das instituições de ensino; desta com a página específica prevista neste inciso;
IV - de extensão, abertos a candidatos que atendam c) caso a instituição de ensino superior não possua sítio
aos requisitos estabelecidos em cada caso pelas instituições eletrônico, deve criar página específica para divulgação das
de ensino. informações de que trata esta Lei;
§ 1º. Os resultados do processo seletivo referido no d) a página específica deve conter a data completa de
inciso II do caput deste artigo serão tornados públicos sua última atualização;
pelas instituições de ensino superior, sendo obrigatória a II - em toda propaganda eletrônica da instituição de
divulgação da relação nominal dos classificados, a respec- en- sino superior, por meio de ligação para a página
tiva ordem de classificação, bem como do cronograma referida no inciso I;
das chamadas para matrícula, de acordo com os critérios III - em local visível da instituição de ensino superior e
para preenchimento das vagas constantes do respectivo de fácil acesso ao público;
edital. IV - deve ser atualizada semestralmente ou
§ 2º No caso de empate no processo seletivo, as ins- anualmente, de acordo com a duração das disciplinas de
cada curso ofere- cido, observando o seguinte:
tituições públicas de ensino superior darão prioridade de
a) caso o curso mantenha disciplinas com duração
matrícula ao candidato que comprove ter renda familiar dife- renciada, a publicação deve ser semestral;
inferior a dez salários mínimos, ou ao de menor renda fa- b) a publicação deve ser feita até 1 (um) mês antes do
miliar, quando mais de um candidato preencher o critério início das aulas;
inicial. c) caso haja mudança na grade do curso ou no corpo
§ 3º O processo seletivo referido no inciso II docente até o início das aulas, os alunos devem ser
considerará as competências e as habilidades definidas na comuni- cados sobre as alterações;
Base Nacio- nal Comum Curricular. V - deve conter as seguintes informações:
a) a lista de todos os cursos oferecidos pela instituição
Art. 45. A educação superior será ministrada em de ensino superior;
ins- tituições de ensino superior, públicas ou privadas, b) a lista das disciplinas que compõem a grade
com variados graus de abrangência ou especialização. curricular de cada curso e as respectivas cargas horárias;
c) a identificação dos docentes que ministrarão as au-
Art. 46. A autorização e o reconhecimento de las em cada curso, as disciplinas que efetivamente
cursos, bem como o credenciamento de instituições de ministrará naquele curso ou cursos, sua titulação,
educação superior, terão prazos limitados, sendo abrangendo a qualifi- cação profissional do docente e o
renovados, pe- riodicamente, após processo regular de tempo de casa do docente, de forma total, contínua ou
avaliação. intermitente.
§ 2º Os alunos que tenham extraordinário aproveita-
§ 1º Após um prazo para saneamento de deficiências
mento nos estudos, demonstrado por meio de provas e
eventualmente identificadas pela avaliação a que se refere
outros instrumentos de avaliação específicos, aplicados
este artigo, haverá reavaliação, que poderá resultar, con-
por banca examinadora especial, poderão ter abreviada a
forme o caso, em desativação de cursos e habilitações, em du- ração dos seus cursos, de acordo com as normas dos
intervenção na instituição, em suspensão temporária de sis- temas de ensino.
prerrogativas da autonomia, ou em descredenciamento.

157
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§ 3º É obrigatória a frequência de alunos e


Art. 53. No exercício de sua autonomia, são assegura-
professores, das às universidades, sem prejuízo de outras, as seguintes
salvo nos programas de educação a distância. atribuições:
§ 4º As instituições de educação superior oferecerão, I - criar, organizar e extinguir, em sua sede, cursos e
no período noturno, cursos de graduação nos mesmos programas de educação superior previstos nesta Lei, obede-
padrões de qualidade mantidos no período diurno, sendo cendo às normas gerais da União e, quando for o caso, do
obrigatória a oferta noturna nas instituições públicas, ga- respectivo sistema de ensino;
rantida a necessária previsão orçamentária. II - fixar os currículos dos seus cursos e programas, ob-
servadas as diretrizes gerais pertinentes;
Art. 48. Os diplomas de cursos superiores reconheci- III - estabelecer planos, programas e projetos de
dos, quando registrados, terão validade nacional como pesqui- sa científica, produção artística e atividades de
prova da formação recebida por seu titular. extensão;
§ 1º Os diplomas expedidos pelas universidades serão IV - fixar o número de vagas de acordo com a
por elas próprias registrados, e aqueles conferidos por capacida- de institucional e as exigências do seu meio;
ins- tituições não-universitárias serão registrados em V - elaborar e reformar os seus estatutos e regimentos
universi- dades indicadas pelo Conselho Nacional de em consonância com as normas gerais atinentes;
Educação. VI - conferir graus, diplomas e outros
§ 2º Os diplomas de graduação expedidos por univer- títulos; VII - firmar contratos, acordos e
sidades estrangeiras serão revalidados por universidades convênios;
públicas que tenham curso do mesmo nível e área ou VIII - aprovar e executar planos, programas e projetos
equi- valente, respeitando-se os acordos internacionais de de investimentos referentes a obras, serviços e aquisições
reci- procidade ou equiparação. em geral, bem como administrar rendimentos conforme
§ 3º Os diplomas de Mestrado e de Doutorado expe- dispo- sitivos institucionais;
didos por universidades estrangeiras só poderão ser reco- IX - administrar os rendimentos e deles dispor na
nhecidos por universidades que possuam cursos de pós- forma prevista no ato de constituição, nas leis e nos
-graduação reconhecidos e avaliados, na mesma área de respectivos es- tatutos;
conhecimento e em nível equivalente ou superior. X - receber subvenções, doações, heranças, legados e
cooperação financeira resultante de convênios com entida-
Art. 49. As instituições de educação superior des públicas e privadas.
aceitarão a transferência de alunos regulares, para Parágrafo único. Para garantir a autonomia didático-
cursos afins, na hipótese de existência de vagas, e mediante -científica das universidades, caberá aos seus colegiados de
processo sele- tivo. ensino e pesquisa decidir, dentro dos recursos
Parágrafo único. As transferências ex officio dar-se-ão orçamentários disponíveis, sobre:
na forma da lei. I - criação, expansão, modificação e extinção de
cursos; II - ampliação e diminuição de vagas;
Art. 50. As instituições de educação superior, III - elaboração da programação dos cursos;
quando da ocorrência de vagas, abrirão matrícula nas IV - programação das pesquisas e das atividades de ex-
disciplinas de seus cursos a alunos não regulares que tensão;
demonstrarem capacidade de cursá-las com proveito, V- contratação e dispensa de
mediante processo seletivo prévio. professores; VI - planos de carreira
docente.
Art. 51. As instituições de educação superior credencia-
das como universidades, ao deliberar sobre critérios e nor- Art. 54. As universidades mantidas pelo Poder Público
mas de seleção e admissão de estudantes, levarão em gozarão, na forma da lei, de estatuto jurídico especial
conta os efeitos desses critérios sobre a orientação do para atender às peculiaridades de sua estrutura, organiza-
ensino mé- dio, articulando-se com os órgãos normativos ção e financiamento pelo Poder Público, assim como dos
dos sistemas de ensino. seus planos de carreira e do regime jurídico do seu pessoal.
§ 1º No exercício da sua autonomia, além das atribui-
Art. 52. As universidades são instituições ções asseguradas pelo artigo anterior, as universidades
pluridiscipli- nares de formação dos quadros profissionais pú- blicas poderão:
de nível supe- rior, de pesquisa, de extensão e de I - propor o seu quadro de pessoal docente, técnico e
domínio e cultivo do saber humano, que se caracterizam administrativo, assim como um plano de cargos e salários,
por: atendidas as normas gerais pertinentes e os recursos dispo-
I- produção intelectual institucionalizada níveis;
mediante o estudo sistemático dos temas e problemas mais II - elaborar o regulamento de seu pessoal em
relevantes, tanto do ponto de vista científico e cultural, conformi- dade com as normas gerais concernentes;
quanto regional e nacional; III - aprovar e executar planos, programas e projetos de
II - um terço do corpo docente, pelo menos, com investimentos referentes a obras, serviços e aquisições em
titu- lação acadêmica de mestrado ou doutorado; geral, de acordo com os recursos alocados pelo respectivo
III - um terço do corpo docente em regime de Poder mantenedor;
tempo integral. IV - elaborar seus orçamentos anuais e plurianuais;
Parágrafo único. É facultada a criação de universidades V - adotar regime financeiro e contábil que atenda às
especializadas por campo do saber. suas peculiaridades de organização e funcionamento;

158
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

VI - realizar operações de crédito ou de financiamen-


to, com aprovação do Poder competente, para aquisição de É possível que uma pessoa assista aulas nas
bens imóveis, instalações e equipamentos; instituições públicas independentemente de vínculo com
o curso, des- de que haja vagas disponíveis.
VII - efetuar transferências, quitações e tomar outras
providências de ordem orçamentária, financeira e patrimo- Para propiciar o desenvolvimento institucional, exige-
nial necessárias ao seu bom desempenho. -se que pelo menos 1/3 do corpo docente da instituição
§ 2º Atribuições de autonomia universitária poderão possua mestrado ou doutorado, bem como que 1/3 do
ser estendidas a instituições que comprovem alta corpo docente se dedique exclusivamente à docência.
qualifica- ção para o ensino ou para a pesquisa, com base Em que pesem as regras mínimas acerca do ensino
em avalia- ção realizada pelo Poder Público. su- perior, as instituições de ensino superior são dotadas
de autonomia para se organizarem.
Art. 55. Caberá à União assegurar, anualmente, em seu As universidades públicas gozam de estatuto jurídico
Orçamento Geral, recursos suficientes para manutenção e especial.
desenvolvimento das instituições de educação superior por As instituições públicas devem obedecer ao princípio
ela mantidas. da gestão democrática, assegurado pela existência de ór-
gãos colegiados deliberativos que mesclem membros da
Art. 56. As instituições públicas de educação superior comunidade, do corpo docente e do corpo discente.
obedecerão ao princípio da gestão democrática,
assegu- rada a existência de órgãos colegiados CAPÍTULO V
deliberativos, de que participarão os segmentos da
DA EDUCAÇÃO ESPECIAL
comunidade institucional, local e regional.
Parágrafo único. Em qualquer caso, os docentes ocupa-
rão setenta por cento dos assentos em cada órgão Art. 58. Entende-se por educação especial, para os efei-
colegiado e comissão, inclusive nos que tratarem da tos desta Lei, a modalidade de educação escolar oferecida
elaboração e mo- dificações estatutárias e regimentais, preferencialmente na rede regular de ensino, para educan-
bem como da escolha de dirigentes. dos com deficiência, transtornos globais do
desenvolvi- mento e altas habilidades ou
Art. 57. Nas instituições públicas de educação superior, superdotação.
o professor ficará obrigado ao mínimo de oito horas § 1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio es-
sema- nais de aulas. pecializado, na escola regular, para atender às
peculiarida- des da clientela de educação especial.
A educação superior se funda no tripé: ensino, pesqui- § 2º O atendimento educacional será feito em classes,
sa e extensão. No viés do ensino, objetiva-se propiciar o escolas ou serviços especializados, sempre que, em função
acesso ao conhecimento técnico e científico, tanto dentro das condições específicas dos alunos, não for possível a
do ambiente acadêmico quanto fora dele; no aspecto pes- sua integração nas classes comuns de ensino regular.
quisa, busca-se desenvolver os conhecimentos já existen- § 3º A oferta de educação especial, nos termos
tes; no aspecto extensão, pretende-se atingir a comunida- do caput deste artigo, tem início na educação infantil e
de por meio de atividades que possam ir além dos
estende-se ao longo da vida, observados o inciso III do
ambien- tes acadêmicos, inserindo-se no cotidiano da
vida social. art. 4º e o parágrafo único do art. 60 desta Lei.
Classicamente, a educação superior se dá nos níveis Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educan-
de graduação, cujo acesso se dá por meio dos dos com deficiência, transtornos globais do
vestibulares, e pós-graduação, cujo acesso também se dá desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação:
por processos seletivos próprios, funcionando como I - currículos, métodos, técnicas, recursos educativos
complementação ao ensino superior. Entretanto, o ensino e organização específicos, para atender às suas necessida-
superior também pode se dar em cursos sequenciais e em des;
cursos de exten- são, de menor duração e complexidade. II - terminalidade específica para aqueles que não
O ensino superior pode ser ministrado em instituições puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino
públicas ou privadas. Independentemente da natureza da fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração
instituição, é necessário respeitar as regras mínimas sobre para concluir em menor tempo o programa escolar para os
duração do ano letivo, programas de curso, componentes superdotados;
curriculares, etc. III - professores com especialização adequada em
O diploma faz prova da formação. ní- vel médio ou superior, para atendimento especializado,
É possível a transferência entre instituições. A transfe- bem como professores do ensino regular capacitados para
rência a pedido está condicionada a número de vagas e a
a inte- gração desses educandos nas classes comuns;
processo seletivo. As transferências de ofício se sujeitam a
IV - educação especial para o trabalho, visando a
critérios próprios. Um exemplo de transferência de ofício
sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive
se dá no caso de remoção de servidor público de ofício no
condições adequadas para os que não revelarem
interesse da Administração (caso o servidor ou seu depen-
dente estude em instituição pública na cidade onde capacidade de inser- ção no trabalho competitivo,
estava lotado, tem o direito de ser transferido para a mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem
instituição pública da nova lotação). como para aqueles que apresen- tam uma habilidade
superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora;

159
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

V - acesso igualitário aos benefícios dos programas


sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do Parágrafo único. A formação dos profissionais da edu-
ensino regular. cação, de modo a atender às especificidades do exercício de
suas atividades, bem como aos objetivos das diferentes eta-
pas e modalidades da educação básica, terá como funda-
Art. 59-A. O poder público deverá instituir cadastro na-
mentos:
cional de alunos com altas habilidades ou
I – a presença de sólida formação básica, que propi-
superdotação matriculados na educação básica e na
cie o conhecimento dos fundamentos científicos e sociais de
educação superior, a fim de fomentar a execução de suas competências de trabalho;
políticas públicas destinadas ao desenvolvimento pleno das II – a associação entre teorias e práticas, mediante
potencialidades desse aluna- do. estágios supervisionados e capacitação em serviço;
Parágrafo único. A identificação precoce de alunos com III – o aproveitamento da formação e
altas habilidades ou superdotação, os critérios e experiências anteriores, em instituições de ensino e em
procedimen- tos para inclusão no cadastro referido no outras atividades. IV - profissionais com notório saber
caput deste artigo, as entidades responsáveis pelo reconhecido pe-
cadastramento, os mecanis- mos de acesso aos dados do los respectivos sistemas de ensino, para ministrar
cadastro e as políticas de desen- volvimento das conteúdos de áreas afins à sua formação ou experiência
potencialidades do alunado de que trata o caput serão profissional, atestados por titulação específica ou prática de
definidos em regulamento. ensino em unidades educacionais da rede pública ou
privada ou das corporações privadas em que tenham
Art. 60. Os órgãos normativos dos sistemas de ensino atuado, exclusivamen- te para atender ao inciso V do caput
estabelecerão critérios de caracterização das instituições do art. 36;
privadas sem fins lucrativos, especializadas e com atuação V - profissionais graduados que tenham feito com-
exclusiva em educação especial, para fins de apoio técnico plementação pedagógica, conforme disposto pelo Conse-
e financeiro pelo Poder Público. lho Nacional de Educação.
Parágrafo único. O poder público adotará, como alter-
Art. 62. A formação de docentes para atuar na educa-
nativa preferencial, a ampliação do atendimento aos edu-
ção básica far-se-á em nível superior, em curso de licencia-
candos com deficiência, transtornos globais do desenvolvi-
tura plena, admitida, como formação mínima para o
mento e altas habilidades ou superdotação na própria rede
exercí- cio do magistério na educação infantil e nos cinco
pública regular de ensino, independentemente do apoio às primeiros anos do ensino fundamental, a oferecida em
instituições previstas neste artigo. nível médio, na modalidade normal.
§ 1º A União, o Distrito Federal, os Estados e os Mu-
A educação especial volta-se a educandos com de- nicípios, em regime de colaboração, deverão promover a
ficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas formação inicial, a continuada e a capacitação dos profis-
habilidades ou superdotação. Para que ela seja efetivada, sionais de magistério.
exige-se a especialização das instituições de ensino e de § 2º A formação continuada e a capacitação dos pro-
seus profissionais. fissionais de magistério poderão utilizar recursos e tecno-
logias de educação a distância.
TÍTULO VI § 3º A formação inicial de profissionais de magisté-
Dos Profissionais da Educação rio dará preferência ao ensino presencial,
subsidiariamente fazendo uso de recursos e tecnologias
Art. 61. Consideram-se profissionais da educação es- de educação a dis- tância.
colar básica os que, nela estando em efetivo exercício e § 4º A União, o Distrito Federal, os Estados e os Mu-
ten- do sido formados em cursos reconhecidos, são: nicípios adotarão mecanismos facilitadores de acesso e
I – professores habilitados em nível médio ou permanência em cursos de formação de docentes em
superior para a docência na educação infantil e nos nível superior para atuar na educação básica pública.
ensinos funda- mental e médio; § 5º A União, o Distrito Federal, os Estados e os Mu-
nicípios incentivarão a formação de profissionais do ma-
II – trabalhadores em educação portadores de di-
gistério para atuar na educação básica pública mediante
ploma de pedagogia, com habilitação em administração,
programa institucional de bolsa de iniciação à docência a
planejamento, supervisão, inspeção e orientação educacio-
estudantes matriculados em cursos de licenciatura, de
nal, bem como com títulos de mestrado ou doutorado nas gra- duação plena, nas instituições de educação superior.
mesmas áreas; § 6º O Ministério da Educação poderá estabelecer
III - trabalhadores em educação, portadores de diplo- nota mínima em exame nacional aplicado aos concluintes
ma de curso técnico ou superior em área pedagógica do ensino médio como pré-requisito para o ingresso em
ou afim; e cursos de graduação para formação de docentes, ouvido
IV - profissionais com notório saber reconhecido o Conselho Nacional de Educação - CNE.
pelos respectivos sistemas de ensino para ministrar § 7º (VETADO).
conteúdos de áreas afins à sua formação para atender § 8º Os currículos dos cursos de formação de
o disposto no inciso V do caput do art. 36. docentes terão por referência a Base Nacional Comum
Curricular.

160
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Art. 62-A. A formação dos profissionais a que se refere


§ 2º Para os efeitos do disposto no § 5º do art. 40 e
o inciso III do art. 61 far-se-á por meio de cursos de
no § 8º do art. 201 da Constituição Federal, são conside-
conteúdo técnico-pedagógico, em nível médio ou
radas funções de magistério as exercidas por professores
superior, incluindo habilitações tecnológicas.
e especialistas em educação no desempenho de ativida-
Parágrafo único. Garantir-se-á formação continuada
des educativas, quando exercidas em estabelecimento de
para os profissionais a que se refere o caput, no local de
educação básica em seus diversos níveis e modalidades,
trabalho ou em instituições de educação básica e superior,
incluídas, além do exercício da docência, as de direção de
incluindo cursos de educação profissional, cursos superiores
unidade escolar e as de coordenação e assessoramento
de graduação plena ou tecnológicos e de pós-graduação.
pe- dagógico.
§ 3º A União prestará assistência técnica aos Estados,
Art. 63. Os institutos superiores de educação manterão:
ao Distrito Federal e aos Municípios na elaboração de
I - cursos formadores de profissionais para a edu-
con- cursos públicos para provimento de cargos dos
cação básica, inclusive o curso normal superior,
profissio- nais da educação.
destinado à formação de docentes para a educação
infantil e para as
Os profissionais da educação devem possuir formação
primeiras séries do ensino fundamental;
específica, notadamente possuir habilitação para a docên-
II - programas de formação pedagógica para
cia, que pode se dar pelas licenciaturas e magistérios em
portado- res de diplomas de educação superior que
geral, bem como pela pedagogia, ou ainda por formação
queiram se dedi- car à educação básica;
e área afim que habilite para o ensino de matérias
III - programas de educação continuada para os
específicas (ex.: profissional do Direito pode lecionar
pro- fissionais de educação dos diversos níveis.
português, filoso- fia e sociologia). Além disso, devem
possuir experiência em atividades de ensino. Quanto ao
Art. 64. A formação de profissionais de educação para
ensino superior, exige-se pós-graduação, que pode ser
administração, planejamento, inspeção, supervisão e orien-
uma simples especialização, embora deva
tação educacional para a educação básica, será feita em
preferencialmente se possuir mestrado ou doutorado. No
cursos de graduação em pedagogia ou em nível de pós-
âmbito do ensino público, exige-se valori- zação do
gra- duação, a critério da instituição de ensino, garantida,
profissional, criando-se plano de carreira e aper-
nesta formação, a base comum nacional.
feiçoando-se as condições de trabalho.
Art. 65. A formação docente, exceto para a educação
TÍTULO VII
su- perior, incluirá prática de ensino de, no mínimo,
Dos Recursos financeiros
trezentas horas.
Art. 68. Serão recursos públicos destinados à educa-
Art. 66. A preparação para o exercício do
ção os originários de:
magistério superior far-se-á em nível de pós-
I - receita de impostos próprios da União, dos Estados,
graduação, prioritaria- mente em programas de
do Distrito Federal e dos Municípios;
mestrado e doutorado.
II - receita de transferências constitucionais e outras
Parágrafo único. O notório saber, reconhecido por uni-
transferências;
versidade com curso de doutorado em área afim, poderá
III - receita do salário-educação e de outras
su- prir a exigência de título acadêmico.
contribui- ções sociais;
IV - receita de incentivos fiscais;
Art. 67. Os sistemas de ensino promoverão a valori-
V - outros recursos previstos em lei.
zação dos profissionais da educação, assegurando-lhes,
inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de
Art. 69. A União aplicará, anualmente, nunca menos
carreira do magistério público:
de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios,
I - ingresso exclusivamente por concurso público de
vinte e cinco por cento, ou o que consta nas respectivas
pro- vas e títulos;
Constituições ou Leis Orgânicas, da receita resultante de
II - aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive
impostos, compreendidas as transferências constitucionais,
com licenciamento periódico remunerado para esse fim;
na manutenção e desenvolvimento do ensino público.
III - piso salarial profissional;
§ 1º A parcela da arrecadação de impostos transferida
IV - progressão funcional baseada na titulação ou
pela União aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municí-
habi- litação, e na avaliação do desempenho;
pios, ou pelos Estados aos respectivos Municípios, não
V - período reservado a estudos, planejamento e
será considerada, para efeito do cálculo previsto neste
avalia- ção, incluído na carga de trabalho;
VI - condições adequadas de trabalho. artigo, receita do governo que a transferir.
§ 2º Serão consideradas excluídas das receitas de im-
§ 1º A experiência docente é pré-requisito para o
postos mencionadas neste artigo as operações de crédito
exer- cício profissional de quaisquer outras funções de
por antecipação de receita orçamentária de impostos.
magisté- rio, nos termos das normas de cada sistema de
ensino.

16
1
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§ 3º Para fixação inicial dos valores correspondentes


V - obras de infraestrutura, ainda que realizadas para
aos mínimos estatuídos neste artigo, será considerada a
beneficiar direta ou indiretamente a rede escolar;
re- ceita estimada na lei do orçamento anual, ajustada,
VI - pessoal docente e demais trabalhadores da educa-
quan- do for o caso, por lei que autorizar a abertura de
ção, quando em desvio de função ou em atividade alheia à
créditos adicionais, com base no eventual excesso de
manutenção e desenvolvimento do ensino.
arrecadação.
§ 4º As diferenças entre a receita e a despesa previstas
Art. 72. As receitas e despesas com manutenção e de-
e as efetivamente realizadas, que resultem no não atendi-
senvolvimento do ensino serão apuradas e publicadas nos
mento dos percentuais mínimos obrigatórios, serão apu-
radas e corrigidas a cada trimestre do exercício financeiro. balanços do Poder Público, assim como nos relatórios a que
§ 5º O repasse dos valores referidos neste artigo do se refere o § 3º do art. 165 da Constituição Federal.
caixa da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Mu-
nicípios ocorrerá imediatamente ao órgão responsável Art. 73. Os órgãos fiscalizadores examinarão,
pela educação, observados os seguintes prazos: prioritaria- mente, na prestação de contas de recursos
I - recursos arrecadados do primeiro ao décimo dia de públicos, o cum- primento do disposto no art. 212 da
cada mês, até o vigésimo dia; Constituição Federal, no art. 60 do Ato das Disposições
II - recursos arrecadados do décimo primeiro ao vigési- Constitucionais Transitórias e na legislação concernente.
mo dia de cada mês, até o trigésimo dia;
III - recursos arrecadados do vigésimo primeiro dia ao Art. 74. A União, em colaboração com os Estados, o
final de cada mês, até o décimo dia do mês subsequente. Dis- trito Federal e os Municípios, estabelecerá padrão
§ 6º O atraso da liberação sujeitará os recursos a cor- mínimo de oportunidades educacionais para o ensino
reção monetária e à responsabilização civil e criminal das fundamen- tal, baseado no cálculo do custo mínimo por
autoridades competentes. aluno, capaz de assegurar ensino de qualidade.
Art. 70. Considerar-se-ão como de manutenção e tigo Parágrafo único. O custo mínimo de que trata este ar-
desenvolvimento do ensino as despesas realizadas com
v será calculado pela União ao final de cada ano, com

vistas à consecução dos objetivos básicos das instituições alidade para o ano subsequente, considerando variações
educacionais de todos os níveis, compreendendo as que se regionais no custo dos insumos e as diversas modalidades
destinam a: de ensino.
I - remuneração e aperfeiçoamento do pessoal docente
e demais profissionais da educação; Art. 75. A ação supletiva e redistributiva da União e
II - aquisição, manutenção, construção e conservação dos Estados será exercida de modo a corrigir, progressiva-
de instalações e equipamentos necessários ao ensino; mente, as disparidades de acesso e garantir o padrão mí-
III – uso e manutenção de bens e serviços vinculados nimo de qualidade de ensino.
ao ensino; § 1º A ação a que se refere este artigo obedecerá a
fórmula de domínio público que inclua a capacidade de
s IV - levantamentos estatísticos, estudos e pesquisas vi- atendimento e a medida do esforço fiscal do respectivo
ando precipuamente ao aprimoramento da qualidade e à
Estado, do Distrito Federal ou do Município em favor da
expansão do ensino;
manutenção e do desenvolvimento do ensino.
V - realização de atividades-meio necessárias ao
§ 2º A capacidade de atendimento de cada governo
funcio- namento dos sistemas de ensino;
será definida pela razão entre os recursos de uso constitu-
VI - concessão de bolsas de estudo a alunos de
escolas públicas e privadas; cionalmente obrigatório na manutenção e desenvolvimen-
VII - amortização e custeio de operações de crédito to do ensino e o custo anual do aluno, relativo ao padrão
des- tinadas a atender ao disposto nos incisos deste artigo; mínimo de qualidade.
VIII - aquisição de material didático-escolar e § 3º Com base nos critérios estabelecidos nos §§ 1º e
manuten- ção de programas de transporte escolar. 2º, a União poderá fazer a transferência direta de recursos
a cada estabelecimento de ensino, considerado o número
Art. 71. Não constituirão despesas de manutenção de alunos que efetivamente frequentam a escola.
e desenvolvimento do ensino aquelas realizadas com: § 4º A ação supletiva e redistributiva não poderá ser
I - pesquisa, quando não vinculada às instituições de exercida em favor do Distrito Federal, dos Estados e dos
en- sino, ou, quando efetivada fora dos sistemas de ensino, Municípios se estes oferecerem vagas, na área de ensino
que não vise, precipuamente, ao aprimoramento de sua de sua responsabilidade, conforme o inciso VI do art. 10
qualida- de ou à sua expansão; e o inciso V do art. 11 desta Lei, em número inferior à sua
II - subvenção a instituições públicas ou privadas de capacidade de atendimento.
ca- ráter assistencial, desportivo ou cultural;
III - formação de quadros especiais para a Art. 76. A ação supletiva e redistributiva prevista no
administração pública, sejam militares ou civis, inclusive artigo anterior ficará condicionada ao efetivo cumprimento
diplomáticos; pelos Estados, Distrito Federal e Municípios do disposto
IV - programas suplementares de alimentação, nesta Lei, sem prejuízo de outras prescrições legais.
assistên- cia médico-odontológica, farmacêutica e
psicológica, e ou- tras formas de assistência social;

162
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Art. 77. Os recursos públicos serão destinados às esco-


§ 2º Os programas a que se refere este artigo, incluí-
las públicas, podendo ser dirigidos a escolas
dos nos Planos Nacionais de Educação, terão os seguintes
comunitárias, confessionais ou filantrópicas que:
objetivos:
I - comprovem finalidade não-lucrativa e não
I - fortalecer as práticas socioculturais e a língua
distri- buam resultados, dividendos, bonificações, mater- na de cada comunidade indígena;
participações ou parcela de seu patrimônio sob nenhuma II - manter programas de formação de pessoal especia-
forma ou pretexto; II - apliquem seus excedentes lizado, destinado à educação escolar nas comunidades in-
financeiros em educação; dígenas;
III - assegurem a destinação de seu patrimônio a outra III - desenvolver currículos e programas específicos,
escola comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao neles incluindo os conteúdos culturais correspondentes às
Poder Público, no caso de encerramento de suas atividades; respec- tivas comunidades;
IV - prestem contas ao Poder Público dos recursos IV - elaborar e publicar sistematicamente material
rece- bidos. didá- tico específico e diferenciado.
§ 1º Os recursos de que trata este artigo poderão ser § 3º No que se refere à educação superior, sem
destinados a bolsas de estudo para a educação básica, na prejuízo de outras ações, o atendimento aos povos
forma da lei, para os que demonstrarem insuficiência de indígenas efe- tivar-se-á, nas universidades públicas e
recursos, quando houver falta de vagas e cursos regulares privadas, mediante a oferta de ensino e de assistência
da rede pública de domicílio do educando, ficando o estudantil, assim como de estímulo à pesquisa e
Poder Público obrigado a investir prioritariamente na desenvolvimento de programas especiais.
expansão da sua rede local.
§ 2º As atividades universitárias de pesquisa e Art. 79-A. (VETADO).
extensão poderão receber apoio financeiro do Poder
Público, inclu- sive mediante bolsas de estudo. Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de no-
vembro como ‘Dia Nacional da Consciência Negra’.
No aspecto orçamentário, merece destaque a exigên-
Art. 80. O Poder Público incentivará o desenvolvi-
cia de dedicação de parcela mínima dos impostos da mento e a veiculação de programas de ensino a
União (18%) e dos Estados e Distrito Federal (25%) voltada distân- cia, em todos os níveis e modalidades de
à edu- cação. Ainda, coloca-se o papel de suplementação ensino, e de educação continuada.
e redis- tribuição da União em relação aos Estados e § 1º A educação a distância, organizada com
Municípios e dos Estados com relação aos Municípios, abertura e regime especiais, será oferecida por instituições
repassando-se verbas para permitir que estas unidades especifica- mente credenciadas pela União.
federativas consi- gam lograr êxito em oferecer parâmetro § 2º A União regulamentará os requisitos para a reali-
mínimo de quali- dade no ensino que é de sua zação de exames e registro de diploma relativos a cursos
incumbência. de educação a distância.
§ 3º As normas para produção, controle e avaliação de
TÍTULO VIII programas de educação a distância e a autorização para
Das Disposições Gerais sua implementação, caberão aos respectivos sistemas de
ensino, podendo haver cooperação e integração entre os
Art. 78. O Sistema de Ensino da União, com a colabo- diferentes sistemas.
ração das agências federais de fomento à cultura e de as- § 4º A educação a distância gozará de tratamento
sistência aos índios, desenvolverá programas integrados de diferenciado, que incluirá:
ensino e pesquisa, para oferta de educação escolar bilín- I - custos de transmissão reduzidos em canais comer-
gue e intercultural aos povos indígenas, com os ciais de radiodifusão sonora e de sons e imagens e em
seguintes objetivos: outros meios de comunicação que sejam explorados
mediante au- torização, concessão ou permissão do poder
I - proporcionar aos índios, suas comunidades e povos,
público;
a recuperação de suas memórias históricas; a reafirmação
II - concessão de canais com finalidades
de suas identidades étnicas; a valorização de suas exclusivamente educativas;
línguas e ciências; III - reserva de tempo mínimo, sem ônus para o Poder
II - garantir aos índios, suas comunidades e povos, o Público, pelos concessionários de canais comerciais.
acesso às informações, conhecimentos técnicos e científicos
da sociedade nacional e demais sociedades indígenas e Art. 81. É permitida a organização de cursos ou insti-
não- tuições de ensino experimentais, desde que obedecidas as
-índias. disposições desta Lei.

Art. 79. A União apoiará técnica e financeiramente os Art. 82. Os sistemas de ensino estabelecerão as normas
sistemas de ensino no provimento da educação de realização de estágio em sua jurisdição, observada a lei
intercultural às comunidades indígenas, desenvolvendo federal sobre a matéria.
programas inte- grados de ensino e pesquisa.
§ 1º Os programas serão planejados com audiência
das
comunidades indígenas.

163
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Art. 83. O ensino militar é regulado em lei específica,


admitida a equivalência de estudos, de acordo com as nor- § 1º As instituições educacionais adaptarão seus esta-
mas fixadas pelos sistemas de ensino. tutos e regimentos aos dispositivos desta Lei e às normas
dos respectivos sistemas de ensino, nos prazos por estes
Art. 84. Os discentes da educação superior poderão ser estabelecidos.
aproveitados em tarefas de ensino e pesquisa pelas § 2º O prazo para que as universidades cumpram o
respecti- vas instituições, exercendo funções de monitoria, dis- posto nos incisos II e III do art. 52 é de oito anos.
de acordo com seu rendimento e seu plano de estudos.
Art. 89. As creches e pré-escolas existentes ou que ve-
Art. 85. Qualquer cidadão habilitado com a titula- nham a ser criadas deverão, no prazo de três anos, a contar
ção própria poderá exigir a abertura de concurso da publicação desta Lei, integrar-se ao respectivo sistema
públi- co de provas e títulos para cargo de docente de de ensino.
instituição pública de ensino que estiver sendo ocupado por
professor não concursado, por mais de seis anos, Art. 90. As questões suscitadas na transição entre o re-
ressalvados os direi- tos assegurados pelos arts. 41 da gime anterior e o que se institui nesta Lei serão resolvidas
Constituição Federal e 19 do Ato das Disposições pelo Conselho Nacional de Educação ou, mediante delega-
Constitucionais Transitórias. ção deste, pelos órgãos normativos dos sistemas de ensino,
preservada a autonomia universitária.
Art. 86. As instituições de educação superior
constituídas como universidades integrar-se-ão, também, Art. 91. Esta Lei entra em vigor na data de sua
na sua condi- ção de instituições de pesquisa, ao Sistema
Nacional de Ciência e Tecnologia, nos termos da publicação. Art. 92. Revogam-se as disposições das
legislação específica.
Leis nºs 4.024,
TÍTULO IX de 20 de dezembro de 1961, e 5.540, de 28 de novembro de
Das Disposições Transitórias 1968, não alteradas pelas Leis nºs 9.131, de 24 de
novembro de 1995 e 9.192, de 21 de dezembro de 1995 e,
Art. 87. É instituída a Década da Educação, a iniciar- ainda, as Leis nºs 5.692, de 11 de agosto de 1971 e 7.044,
se um ano a partir da publicação desta Lei. de 18 de outubro de 1982, e as demais leis e decretos-lei
§ 1º A União, no prazo de um ano a partir da publica- que as modificaram e quaisquer outras disposições em
ção desta Lei, encaminhará, ao Congresso Nacional, o Pla- contrário.
no Nacional de Educação, com diretrizes e metas para os BRASIL. RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 1, DE 17 DE JUNHO
dez anos seguintes, em sintonia com a Declaração DE 2004. INSTITUI DIRETRIZES CURRICULARES
Mundial sobre Educação para Todos.
NACIONAIS PARA A
§ 2º (Revogado).
EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS E PARA O
§ 3º O Distrito Federal, cada Estado e Município, e, su-
ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA E
pletivamente, a União, devem:
AFRICANA (ANEXO O PARECER CNE/CP Nº 3/2004)
I - (Revogado).
BRASIL.
II - prover cursos presenciais ou a distância aos jovens
e adultos insuficientemente escolarizados;
III - realizar programas de capacitação para todos os
professores em exercício, utilizando também, para isto, os
recursos da educação a distância;
IV - integrar todos os estabelecimentos de ensino CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO CONSELHO
funda- mental do seu território ao sistema nacional de PLENO
avaliação do rendimento escolar.
§ 4º (Revogado). RESOLUÇÃO Nº 1, DE 17 DE JUNHO DE 2004. (*)
§ 5º Serão conjugados todos os esforços objetivando Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educa-
a progressão das redes escolares públicas urbanas de ção das Relações Étnico- Raciais e para o Ensino de
ensino fundamental para o regime de escolas de tempo História e Cultura Afro-Brasileira e Africana..
integral.
§ 6º A assistência financeira da União aos Estados, ao O Presidente do Conselho Nacional de Educação, ten-
Distrito Federal e aos Municípios, bem como a dos do em vista o disposto no art. 9º, § 2º, alínea “c”, da Lei nº
Estados aos seus Municípios, ficam condicionadas ao 9.131, publicada em 25 de novembro de 1995, e com fun-
cumprimen- to do art. 212 da Constituição Federal e damentação no Parecer CNE/CP 3/2004, de 10 de março
dispositivos legais pertinentes pelos governos de 2004, homologado pelo Ministro da Educação em 19
beneficiados. de maio de 2004, e que a este se integra, resolve:

Art. 87-A. (VETADO). Art. 1° A presente Resolução institui Diretrizes Curricu-


lares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Ra-
Art. 88. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Mu- ciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e
nicípios adaptarão sua legislação educacional e de ensino Africana, a serem observadas pelas Instituições de ensino,
às disposições desta Lei no prazo máximo de um ano, a que atuam nos níveis e modalidades da Educação
Brasileira e, em especial, por Instituições que desenvolvem
partir da data de sua publicação.
progra- mas de formação inicial e continuada de
professores.

164
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§ 1° As Instituições de Ensino Superior incluirão nos


§ 3° O ensino sistemático de História e Cultura Afro-
conteúdos de disciplinas e atividades curriculares dos cur-
sos que ministram, a Educação das Relações Étnico- -Brasileira e Africana na Educação Básica, nos termos da
Raciais, bem como o tratamento de questões e temáticas Lei 10639/2003, refere-se, em especial, aos componentes
que di- zem respeito aos afrodescendentes, nos termos curriculares de Educação Artística, Literatura e História do
explicita- dos no Parecer CNE/CP 3/2004. Brasil.
§ 2° O cumprimento das referidas Diretrizes Curricula- § 4° Os sistemas de ensino incentivarão pesquisas so-
res, por parte das instituições de ensino, será considerado bre processos educativos orientados por valores, visões de
na avaliação das condições de funcionamento do estabe- mundo, conhecimentos afro-brasileiros, ao lado de
pesqui- sas de mesma natureza junto aos povos
lecimento.
indígenas, com o objetivo de ampliação e fortalecimento
Art. 2° As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Edu-
de bases teóricas para a educação brasileira.
cação das Relações Étnico- Raciais e para o Ensino de His-
tória e Cultura Afro-Brasileira e Africanas constituem-se de Art. 4° Os sistemas e os estabelecimentos de ensino
poderão estabelecer canais de comunicação com grupos
orientações, princípios e fundamentos para o planejamen-
do Movimento Negro, grupos culturais negros,
to, execução e avaliação da Educação, e têm por meta,
instituições formadoras de professores, núcleos de
pro- mover a educação de cidadãos atuantes e
estudos e pesqui- sas, como os Núcleos de Estudos Afro-
conscientes no seio da sociedade multicultural e
Brasileiros, com a finalidade de buscar subsídios e trocar
pluriétnica do Brasil, bus- cando relações étnico-sociais
experiências para planos institucionais, planos
positivas, rumo à construção de nação democrática.
pedagógicos e projetos de ensino.
§ 1° A Educação das Relações Étnico-Raciais tem por
Art. 5º Os sistemas de ensino tomarão providências
objetivo a divulgação e produção de conhecimentos, bem
no sentido de garantir o direito de alunos
como de atitudes, posturas e valores que eduquem cida-
afrodescendentes de freqüentarem estabelecimentos de
dãos quanto à pluralidade étnico-racial, tornando-os ca-
ensino de qualidade, que contenham instalações e
pazes de interagir e de negociar objetivos comuns que
equipamentos sólidos e atua- lizados, em cursos
ga- rantam, a todos, respeito aos direitos legais e
ministrados por professores competen- tes no domínio de
valorização de identidade, na busca da consolidação da
conteúdos de ensino e comprometidos com a educação
democracia brasileira.
de negros e não negros, sendo capazes de corrigir
§ 2º O Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e posturas, atitudes, palavras que impliquem desres- peito e
Africana tem por objetivo o reconhecimento e valorização
discriminação.
da identidade, história e cultura dos afro-brasileiros, bem
Art. 6° Os órgãos colegiados dos estabelecimentos de
como a garantia de reconhecimento e igualdade de
ensino, em suas finalidades, responsabilidades e tarefas,
valori- zação das raízes africanas da nação brasileira, ao
in- cluirão o previsto o exame e encaminhamento de
lado das indígenas, européias, asiáticas.
solução para situações de discriminação, buscando-se
§ 3º Caberá aos conselhos de Educação dos Estados, criar situa- ções educativas para o reconhecimento,
do Distrito Federal e dos Municípios desenvolver as Dire- valorização e res- peito da diversidade.
trizes Curriculares Nacionais instituídas por esta
§ Único: Os casos que caracterizem racismo serão tra-
Resolução, dentro do regime de colaboração e da
tados como crimes imprescritíveis e inafiançáveis, confor-
autonomia de entes federativos e seus respectivos me prevê o Art. 5º, XLII da Constituição Federal de 1988.
sistemas.
Art. 7º Os sistemas de ensino orientarão e supervisio-
Art. 3° A Educação das Relações Étnico-Raciais e o narão a elaboração e edição de livros e outros materiais
estu- do de História e Cultura Afro- Brasileira, e História e didáticos, em atendimento ao disposto no Parecer
Cultura Africana será desenvolvida por meio de CNE/CP 003/2004.
conteúdos, com- petências, atitudes e valores, a serem
Art. 8º Os sistemas de ensino promoverão ampla di-
estabelecidos pelas Instituições de ensino e seus vulgação do Parecer CNE/CP 003/2004 e dessa Resolução,
professores, com o apoio e supervisão dos sistemas de em atividades periódicas, com a participação das redes
ensino, entidades mantenedo- ras e coordenações das escolas públicas e privadas, de exposição, avaliação e
pedagógicas, atendidas as indicações, recomendações e divul- gação dos êxitos e dificuldades do ensino e
diretrizes explicitadas no Parecer CNE/ CP 003/2004. aprendizagens de História e Cultura Afro-Brasileira e
§ 1° Os sistemas de ensino e as entidades mantenedo- Africana e da Educa- ção das Relações Étnico-Raciais.
ras incentivarão e criarão condições materiais e § 1° Os resultados obtidos com as atividades mencio-
financeiras, assim como proverão as escolas, professores e nadas no caput deste artigo serão comunicados de forma
alunos, de material detalhada ao Ministério da Educação, à Secretaria Especial
(*) CNE/CP Resolução 1/2004. Diário Oficial da União, de Promoção da Igualdade Racial, ao Conselho Nacional
Brasília, 22 de junho de 2004, Seção 1, p. 11. de Educação e aos respectivos Conselhos Estaduais e
bibliográfico e de outros materiais didáticos necessá- Munici- pais de Educação, para que encaminhem
rios para a educação tratada no “caput” deste artigo. providências, que forem requeridas.
§ 2° As coordenações pedagógicas promoverão o Art. 9º Esta resolução entra em vigor na data de sua
apro- fundamento de estudos, para que os professores publicação, revogadas as disposições em contrário.
concebam e desenvolvam unidades de estudos, projetos e
programas, abrangendo os diferentes componentes Roberto Cláudio Frota Bezerra Presidente do Conselho
curriculares. Nacional de Educação

165
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

III - orientar os cursos de formação inicial e continua-


RESOLUÇÃO CNE/CEB Nº 4, DE 13 DE JULHO DE 2010.
da de docentes e demais profissionais da Educação Básica,
DEFINE DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS
os sistemas educativos dos diferentes entes federados e
GERAIS PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA (ANEXO O
as escolas que os integram, indistintamente da rede a que
PARECER CNE/CEB Nº 7/2010)
pertençam.
Art. 3º As Diretrizes Curriculares Nacionais específicas
para as etapas e modalidades da Educação Básica devem
evidenciar o seu papel de indicador de opções políticas,
sociais, culturais, educacionais, e a função da educação,
na sua relação com um projeto de Nação, tendo como re-
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO CONSELHO NACIONAL ferência os objetivos constitucionais, fundamentando-se
DE EDUCAÇÃO CÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA na cidadania e na dignidade da pessoa, o que pressupõe
igualdade, liberdade, pluralidade, diversidade, respeito,
RESOLUÇÃO Nº 4, DE 13 DE JULHO DE 2010 (*) justiça social, solidariedade e sustentabilidade.

Define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a (*) Resolução CNE/CEB 4/2010. Diário Oficial da União,
Educação Básica. Brasília, 14 de julho de 2010, Seção 1, p. 824.

O Presidente da Câmara de Educação Básica do Con-


selho Nacional de Educação, no uso de suas atribuições TÍTULO II
legais, e de conformidade com o disposto na alínea “c” do REFERÊNCIAS CONCEITUAIS
§ 1º do artigo 9º da Lei nº 4.024/1961, com a redação
dada pela Lei nº 9.131/1995, nos artigos 36, 36- A, 36-B, Art. 4º As bases que dão sustentação ao projeto
36-C, 36-D, 37, 39, 40, 41 e 42 da Lei nº 9.394/1996, com a nacio- nal de educação responsabilizam o poder público,
reda- ção dada pela Lei nº 11.741/2008, bem como no a família, a sociedade e a escola pela garantia a todos os
Decreto nº 5.154/2004, e com fundamento no Parecer educandos de um ensino ministrado de acordo com os
CNE/CEB nº 7/2010, homologado por Despacho do princípios de:
Senhor Ministro de Estado da Educação, publicado no I - igualdade de condições para o acesso, inclusão,
DOU de 9 de julho de 2010. permanência e sucesso na escola;
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e
RESOLVE: divul- gar a cultura, o pensamento, a arte e o saber;
III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógi-
Art. 1º A presente Resolução define Diretrizes Curricu- cas; IV - respeito à liberdade e aos direitos;
lares Nacionais Gerais para o conjunto orgânico, V - coexistência de instituições públicas e privadas de
sequencial e articulado das etapas e modalidades da ensino; VI - gratuidade do ensino público em estabeleci-
Educação Básica, baseando-se no direito de toda pessoa mentos oficiais; VII - valorização do profissional da educa-
ao seu pleno de- senvolvimento, à preparação para o ção escolar;
exercício da cidadania e à qualificação para o trabalho, VIII - gestão democrática do ensino público, na forma
na vivência e convivên- cia em ambiente educativo, e da legislação e das normas dos respectivos sistemas de
tendo como fundamento a responsabilidade que o en- sino;
Estado brasileiro, a família e a sociedade têm de garantir a IX - garantia de padrão de qualidade;
democratização do acesso, a inclusão, a permanência e a X - valorização da experiência extraescolar;
conclusão com sucesso das crianças, dos jovens e adultos XI - vinculação entre a educação escolar, o trabalho e
na instituição educacional, a aprendizagem para as práticas sociais.
continuidade dos estudos e a extensão da
Art. 5º A Educação Básica é direito universal e alicerce
obrigatoriedade e da gratuidade da Educação Básica.
indispensável para o exercício da cidadania em plenitude,
da qual depende a possibilidade de conquistar todos os
TÍTULO I demais direitos, definidos na Constituição Federal, no Es-
OBJETIVOS tatuto da Criança e do Adolescente (ECA), na legislação
ordinária e nas demais disposições que consagram as
Art. 2º Estas Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais prer- rogativas do cidadão.
para a Educação Básica têm por objetivos:
Art. 6º Na Educação Básica, é necessário considerar as
I - sistematizar os princípios e as diretrizes gerais dimensões do educar e do cuidar, em sua inseparabilida-
da Educação Básica contidos na Constituição, na Lei de
de, buscando recuperar, para a função social desse nível
Diretri- zes e Bases da Educação Nacional (LDB) e demais
da educação, a sua centralidade, que é o educando,
disposi- tivos legais, traduzindo-os em orientações que
pessoa em formação na sua essência humana.
contribuam para assegurar a formação básica comum
nacional, tendo como foco os sujeitos que dão vida ao
currículo e à escola; II - estimular a reflexão crítica e
propositiva que deve subsidiar a formulação, a execução e
a avaliação do projeto
político-pedagógico da escola de Educação Básica;

166
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

TÍTULO III
VII - integração dos profissionais da educação, dos
SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO estudantes, das famílias, dos agentes da comunidade inte-
ressados na educação;
Art. 7º A concepção de educação deve orientar a ins- VIII - valorização dos profissionais da educação, com
titucionalização do regime de colaboração entre União, programa de formação continuada, critérios de acesso,
Estados, Distrito Federal e Municípios, no contexto da es- permanência, remuneração compatível com a jornada de
trutura federativa brasileira, em que convivem sistemas trabalho definida no projeto político-pedagógico;
educacionais autônomos, para assegurar efetividade ao IX - realização de parceria com órgãos, tais como os
projeto da educação nacional, vencer a fragmentação das de assistência social e desenvolvimento humano, cidada-
políticas públicas e superar a desarticulação institucional. nia, ciência e tecnologia, esporte, turismo, cultura e arte,
§ 1º Essa institucionalização é possibilitada por um saúde, meio ambiente.
Sis- tema Nacional de Educação, no qual cada ente Art. 10. A exigência legal de definição de padrões mí-
federativo, com suas peculiares competências, é chamado nimos de qualidade da educação traduz a necessidade de
a colaborar para transformar a Educação Básica em um reconhecer que a sua avaliação associa-se à ação planeja-
sistema orgâni- co, sequencial e articulado. da, coletivamente, pelos sujeitos da escola.
§ 2º O que caracteriza um sistema é a atividade inten- § 1º O planejamento das ações coletivas exercidas
cional e organicamente concebida, que se justifica pela pela escola supõe que os sujeitos tenham clareza quanto:
realização de atividades voltadas para as mesmas finalida- I - aos princípios e às finalidades da educação,
des ou para a concretização dos mesmos objetivos. além do reconhecimento e da análise dos dados indicados
§ 3º O regime de colaboração entre os entes pelo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
federados pressupõe o estabelecimento de regras de (IDEB) e/ou outros indicadores, que o complementem ou
equivalência entre as funções distributiva, supletiva, substituam;
normativa, de su- pervisão e avaliação da educação II - à relevância de um projeto político-pedagógico
nacional, respeitada a au- tonomia dos sistemas e concebido e assumido colegiadamente pela comunidade
valorizadas as diferenças regionais. educacional, respeitadas as múltiplas diversidades e a plu-
ralidade cultural;
TÍTULO IV III - à riqueza da valorização das diferenças manifes-
ACESSO E PERMANÊNCIA PARA A CONQUISTA DA tadas pelos sujeitos do processo educativo, em seus diver-
QUALIDADE SOCIAL sos segmentos, respeitados o tempo e o contexto
sociocul- tural;
Art. 8º A garantia de padrão de qualidade, com pleno IV - aos padrões mínimos de qualidade (Custo Alu-
acesso, inclusão e permanência dos sujeitos das no-Qualidade Inicial – CAQi);
aprendiza- gens na escola e seu sucesso, com redução da § 2º Para que se concretize a educação escolar, exige-
evasão, da retenção e da distorção de idade/ano/série, -se um padrão mínimo de insumos, que tem como base
resulta na qua- lidade social da educação, que é uma um investimento com valor calculado a partir das
conquista coletiva de todos os sujeitos do processo despesas es- senciais ao desenvolvimento dos processos e
educativo. procedimen- tos formativos, que levem, gradualmente, a
Art. 9º A escola de qualidade social adota como cen- uma educação integral, dotada de qualidade social:
tralidade o estudante e a aprendizagem, o que pressupõe I - creches e escolas que possuam condições de in-
atendimento aos seguintes requisitos: fraestrutura e adequados equipamentos;
I - revisão das referências conceituais quanto aos
diferentes espaços e tempos educativos, abrangendo es- II - professores qualificados com remuneração ade-
paços sociais na escola e fora dela; quada e compatível com a de outros profissionais com
igual nível de formação, em regime de trabalho de 40
II - consideração sobre a inclusão, a valorização das
(quarenta) horas em tempo integral em uma mesma
diferenças e o atendimento à pluralidade e à diversidade
escola;
cultural, resgatando e respeitando as várias manifestações
III - definição de uma relação adequada entre o nú-
de cada comunidade;
mero de alunos por turma e por professor, que assegure
III - foco no projeto político-pedagógico, no gosto
aprendizagens relevantes;
pela aprendizagem e na avaliação das aprendizagens
IV - pessoal de apoio técnico e administrativo que
como instrumento de contínua progressão dos responda às exigências do que se estabelece no projeto
estudantes; político-pedagógico.
IV - inter-relação entre organização do currículo, do
trabalho pedagógico e da jornada de trabalho do profes- TÍTULO V
sor, tendo como objetivo a aprendizagem do estudante; ORGANIZAÇÃO CURRICULAR: CONCEITO, LIMITES,
V - preparação dos profissionais da educação, ges- POSSIBILIDADES
tores, professores, especialistas, técnicos, monitores e ou-
tros; Art. 11. A escola de Educação Básica é o espaço em
VI - compatibilidade entre a proposta curricular e a que se ressignifica e se recria a cultura herdada,
infraestrutura entendida como espaço formativo dotado reconstruindo-
de efetiva disponibilidade de tempos para a sua utilização -se as identidades culturais, em que se aprende a valorizar
e acessibilidade; as raízes próprias das diferentes regiões do País.

167
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Parágrafo único. Essa concepção de escola exige a su-


peração do rito escolar, desde a construção do currículo I - concepção e organização do espaço curricular
até os critérios que orientam a organização do trabalho e físico que se imbriquem e alarguem, incluindo espaços,
escolar em sua multidimensionalidade, privilegia trocas, ambientes e equipamentos que não apenas as salas de
acolhimento e aconchego, para garantir o bem-estar de aula da escola, mas, igualmente, os espaços de outras
crianças, adoles- centes, jovens e adultos, no escolas e os socioculturais e esportivo- recreativos do
relacionamento entre todas as pessoas. entorno, da cidade e mesmo da região;
Art. 12. Cabe aos sistemas educacionais, em geral, II - ampliação e diversificação dos tempos e
definir o programa de escolas de tempo parcial diurno espaços curriculares que pressuponham profissionais da
(matutino ou vespertino), tempo parcial noturno, e tempo educação dispostos a inventar e construir a escola de
integral (turno e contra-turno ou turno único com jornada qualidade so- cial, com responsabilidade compartilhada
escolar de 7 horas, no mínimo, durante todo o período com as demais autoridades que respondem pela gestão
letivo), tendo em vista a amplitude do papel dos órgãos do poder público, na busca de parcerias
socioeducativo atribuído ao conjunto or- gânico da possíveis e necessá- rias, até porque educar é
Educação Básica, o que requer outra organização e gestão responsabilidade da família, do Estado e da sociedade;
do trabalho pedagógico. III - escolha da abordagem didático-pedagógica
§ 1º Deve-se ampliar a jornada escolar, em único ou dis- ciplinar, pluridisciplinar, interdisciplinar ou
di- ferentes espaços educativos, nos quais a permanência transdisciplinar pela escola, que oriente o projeto
do es- tudante vincula-se tanto à quantidade e qualidade político-pedagógico e resulte de pacto estabelecido entre
do tempo diário de escolarização quanto à diversidade de os profissionais da escola, conselhos escolares e
atividades de aprendizagens. comunidade, subsidiando a organização da matriz
curricular, a definição de eixos temá-
§ 2º A jornada em tempo integral com qualidade implica ticos e a constituição de redes de aprendizagem;
a necessidade da incorporação efetiva e orgânica, no currí- IV - compreensão da matriz curricular entendida
culo, de atividades e estudos pedagogicamente
como propulsora de movimento, dinamismo curricular e
planejados e acompanhados.
educacional, de tal modo que os diferentes campos do
§ 3º Os cursos em tempo parcial noturno devem esta-
co- nhecimento possam se coadunar com o conjunto de
belecer metodologia adequada às idades, à maturidade e
ativi- dades educativas;
à experiência de aprendizagens, para atenderem aos
jovens e adultos em escolarização no tempo regular ou na V - organização da matriz curricular entendida
modalida- de de Educação de Jovens e Adultos. como alternativa operacional que embase a gestão do
currículo escolar e represente subsídio para a gestão da
CAPÍTULO I escola (na organização do tempo e do espaço curricular,
distribuição e controle do tempo dos trabalhos docentes),
FORMAS PARA A ORGANIZAÇÃO CURRICULAR
passo para uma gestão centrada na abordagem
Art. 13. O currículo, assumindo como referência os interdisciplinar, orga- nizada por eixos temáticos,
prin- cípios educacionais garantidos à educação, mediante interlocução entre os diferentes campos do
assegurados no artigo 4º desta Resolução, configura-se conhecimento;
como o conjunto de valores e práticas que proporcionam a VI - entendimento de que eixos temáticos são uma
produção, a socializa- ção de significados no espaço social forma de organizar o trabalho pedagógico, limitando a
e contribuem intensa- mente para a construção de dis- persão do conhecimento, fornecendo o cenário no
identidades socioculturais dos educandos. qual se constroem objetos de estudo, propiciando a
§ 1º O currículo deve difundir os valores fundamentais concretização da proposta pedagógica centrada na visão
do interesse social, dos direitos e deveres dos cidadãos, interdisciplinar, superando o isolamento das pessoas e a
do respeito ao bem comum e à ordem democrática, compartimentali- zação de conteúdos rígidos;
conside- rando as condições de escolaridade dos VII - estímulo à criação de métodos didático-peda-
estudantes em cada estabelecimento, a orientação para o gógicos utilizando-se recursos tecnológicos de
trabalho, a promoção de práticas educativas formais e informação e comunicação, a serem inseridos no
não-formais. cotidiano escolar, a fim de superar a distância entre
§ 2º Na organização da proposta curricular, deve-se estudantes que aprendem a receber informação com
assegurar o entendimento de currículo como experiências rapidez utilizando a linguagem digital e professores que
escolares que se desdobram em torno do conhecimento, dela ainda não se apropriaram;
permeadas pelas relações sociais, articulando vivências e VIII - constituição de rede de aprendizagem, entendi-
sa- beres dos estudantes com os conhecimentos da como um conjunto de ações didático-pedagógicas,
historicamente acumulados e contribuindo para construir com foco na aprendizagem e no gosto de aprender,
as identidades dos educandos. subsidiada pela consciência de que o processo de
§ 3º A organização do percurso formativo, aberto e comunicação entre estudantes e professores é efetivado
con- textualizado, deve ser construída em função das por meio de práticas e recursos diversos;
peculiarida- des do meio e das características, interesses e IX - adoção de rede de aprendizagem, também,
necessidades dos estudantes, incluindo não só os como ferramenta didático-pedagógica relevante nos pro-
componentes curricula- res centrais obrigatórios, previstos gramas de formação inicial e continuada de profissionais
na legislação e nas normas educacionais, mas outros, da educação, sendo que esta opção requer planejamento
também, de modo flexível e variá- vel, conforme cada sistemático integrado estabelecido entre sistemas educati-
projeto escolar, e assegurando: vos ou conjunto de unidades escolares;

168
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§ 4º A transversalidade é entendida como uma forma


de organizar o trabalho didático- pedagógico em que te- § 1º A parte diversificada pode ser organizada em te-
mas e eixos temáticos são integrados às disciplinas e às mas gerais, na forma de eixos temáticos, selecionados co-
áreas ditas convencionais, de forma a estarem presentes legiadamente pelos sistemas educativos ou pela unidade
em todas elas. escolar.
§ 5º A transversalidade difere da interdisciplinaridade § 2º A LDB inclui o estudo de, pelo menos, uma língua
e ambas complementam-se, rejeitando a concepção de estrangeira moderna na parte diversificada, cabendo sua
co- nhecimento que toma a realidade como algo estável, escolha à comunidade escolar, dentro das possibilidades
pron- to e acabado. da escola, que deve considerar o atendimento das
§ 6º A transversalidade refere-se à dimensão didático- caracte- rísticas locais, regionais, nacionais e
transnacionais, tendo em vista as demandas do mundo do
-pedagógica, e a interdisciplinaridade, à abordagem epis-
temológica dos objetos de conhecimento. trabalho e da interna- cionalização de toda ordem de
relações.
CAPÍTULO II § 3º A língua espanhola, por força da Lei nº
FORMAÇÃO BÁSICA COMUM E PARTE DIVERSIFI- 11.161/2005, é obrigatoriamente ofertada no Ensino
Médio, embora fa- cultativa para o estudante, bem como
CADA
possibilitada no En- sino Fundamental, do 6º ao 9º ano.
Art. 16. Leis específicas, que complementam a LDB,
Art. 14. A base nacional comum na Educação Básica
de- terminam que sejam incluídos componentes não
constitui-se de conhecimentos, saberes e valores produzi-
discipli- nares, como temas relativos ao trânsito, ao meio
dos culturalmente, expressos nas políticas públicas e gera-
ambiente e à condição e direitos do idoso.
dos nas instituições produtoras do conhecimento
Art. 17. No Ensino Fundamental e no Ensino Médio,
científico e tecnológico; no mundo do trabalho; no
destinar-se-ão, pelo menos, 20% do total da carga horá-
desenvolvimento das linguagens; nas atividades
ria anual ao conjunto de programas e projetos interdisci-
desportivas e corporais; na produção artística; nas formas
plinares eletivos criados pela escola, previsto no projeto
diversas de exercício da ci- dadania; e nos movimentos
pedagógico, de modo que os estudantes do Ensino Fun-
sociais.
damental e do Médio possam escolher aquele programa
§ 1º Integram a base nacional comum nacional:
ou projeto com que se identifiquem e que lhes permitam
a) a Língua Portuguesa;
melhor lidar com o conhecimento e a experiência.
b) a Matemática;
§ 1º Tais programas e projetos devem ser desenvolvi-
c) o conhecimento do mundo físico, natural, da
dos de modo dinâmico, criativo e flexível, em articulação
reali- dade social e política, especialmente do Brasil,
com a comunidade em que a escola esteja inserida.
incluindo-se o estudo da História e das Culturas Afro-
§ 2º A interdisciplinaridade e a contextualização
Brasileira e Indíge- na,
devem assegurar a transversalidade do conhecimento de
d) a Arte, em suas diferentes formas de expressão,
diferen- tes disciplinas e eixos temáticos, perpassando
incluindo-se a música;
todo o cur- rículo e propiciando a interlocução entre os
e) a Educação Física;
saberes e os diferentes campos do conhecimento.
f) o Ensino Religioso.
§ 2º Tais componentes curriculares são organizados
TÍTULO VI
pelos sistemas educativos, em forma de áreas de conhe-
ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA
cimento, disciplinas, eixos temáticos, preservando-se a es-
pecificidade dos diferentes campos do conhecimento, por
Art. 18. Na organização da Educação Básica, devem-se
meio dos quais se desenvolvem as habilidades
observar as Diretrizes Curriculares Nacionais comuns a to-
indispensá- veis ao exercício da cidadania, em ritmo
das as suas etapas, modalidades e orientações temáticas,
compatível com as etapas do desenvolvimento integral do
respeitadas as suas especificidades e as dos sujeitos a que
cidadão.
se destinam.
§ 3º A base nacional comum e a parte diversificada
§ 1º As etapas e as modalidades do processo de es-
não podem se constituir em dois blocos distintos, com
colarização estruturam-se de modo orgânico, sequencial e
discipli- nas específicas para cada uma dessas partes, mas
articulado, de maneira complexa, embora permanecendo
devem ser organicamente planejadas e geridas de tal
individualizadas ao logo do percurso do estudante, apesar
modo que as tecnologias de informação e comunicação
das mudanças por que passam:
perpassem transversalmente a proposta curricular, desde
I - a dimensão orgânica é atendida quando são
a Educação Infantil até o Ensino Médio, imprimindo
ob- servadas as especificidades e as diferenças de cada
direção aos proje- tos político-pedagógicos.
sistema educativo, sem perder o que lhes é comum: as
Art. 15. A parte diversificada enriquece e complemen-
semelhan- ças e as identidades que lhe são inerentes;
ta a base nacional comum, prevendo o estudo das carac-
II - a dimensão sequencial compreende os proces-
terísticas regionais e locais da sociedade, da cultura, da
sos educativos que acompanham as exigências de apren-
economia e da comunidade escolar, perpassando todos
dizagens definidas em cada etapa do percurso formativo,
os tempos e espaços curriculares constituintes do Ensino
contínuo e progressivo, da Educação Básica até a
Fun- damental e do Ensino Médio, independentemente
Educação Superior, constituindo-se em diferentes e
do ciclo da vida no qual os sujeitos tenham acesso à
insubstituíveis momentos da vida dos educandos;
escola.

169
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

III - a articulação das dimensões orgânica e sequen-


cial das etapas e das modalidades da Educação Básica, e § 1º As crianças provêm de diferentes e singulares
destas com a Educação Superior, implica ação coordenada con- textos socioculturais, socioeconômicos e étnicos, por
e integradora do seu conjunto. isso devem ter a oportunidade de ser acolhidas e
§ 2º A transição entre as etapas da Educação Básica respeitadas pela escola e pelos profissionais da educação,
e suas fases requer formas de articulação das dimensões com base nos princípios da individualidade, igualdade,
orgânica e sequencial que assegurem aos educandos, sem liberdade, diversi- dade e pluralidade.
tensões e rupturas, a continuidade de seus processos § 2º Para as crianças, independentemente das
pecu- liares de aprendizagem e desenvolvimento. diferentes condições físicas, sensoriais, intelectuais,
Art. 19. Cada etapa é delimitada por sua finalidade, linguísticas, étnico-
seus princípios, objetivos e diretrizes educacionais, funda- -raciais, socioeconômicas, de origem, de religião, entre
mentando-se na inseparabilidade dos conceitos referen- ou- tras, as relações sociais e intersubjetivas no espaço
ciais: cuidar e educar, pois esta é uma concepção escolar requerem a atenção intensiva dos profissionais da
norteado- ra do projeto político-pedagógico elaborado e educação, durante o tempo de desenvolvimento das
executado pela comunidade educacional. atividades que lhes são peculiares, pois este é o momento
Art. 20. O respeito aos educandos e a seus tempos em que a curio- sidade deve ser estimulada, a partir da
mentais, socioemocionais, culturais e identitários é um brincadeira orientada pelos profissionais da educação.
princípio orientador de toda a ação educativa, sendo res- § 3º Os vínculos de família, dos laços de solidariedade
ponsabilidade dos sistemas a criação de condições para humana e do respeito mútuo em que se assenta a vida so-
que crianças, adolescentes, jovens e adultos, com sua di- cial devem iniciar-se na Educação Infantil e sua
versidade, tenham a oportunidade de receber a formação intensificação deve ocorrer ao longo da Educação Básica.
que corresponda à idade própria de percurso escolar. § 4º Os sistemas educativos devem envidar esforços
promovendo ações a partir das quais as unidades de Edu-
CAPÍTULO I cação Infantil sejam dotadas de condições para acolher as
ETAPAS DA EDUCAÇÃO BÁSICA crianças, em estreita relação com a família, com agentes
so- ciais e com a sociedade, prevendo programas e
Art. 21. São etapas correspondentes a diferentes mo- projetos em parceria, formalmente estabelecidos.
mentos constitutivos do desenvolvimento educacional: § 5º A gestão da convivência e as situações em que se
I - a Educação Infantil, que compreende: a Creche, torna necessária a solução de problemas individuais e co-
englobando as diferentes etapas do desenvolvimento da letivos pelas crianças devem ser previamente
criança até 3 (três) anos e 11 (onze) meses; e a Pré-Escola, programadas, com foco nas motivações estimuladas e
com duração de 2 (dois) anos; orientadas pelos professores e demais profissionais da
II - o Ensino Fundamental, obrigatório e gratuito, educação e outros de áreas pertinentes, respeitados os
com duração de 9 (nove) anos, é organizado e tratado em limites e as potencialidades de cada criança e os vínculos
duas fases: a dos 5 (cinco) anos iniciais e a dos 4 (quatro) desta com a família ou com o seu responsável direto.
anos finais;
III - o Ensino Médio, com duração mínima de 3 (três) Seção II
anos. Ensino Fundamental
Parágrafo único. Essas etapas e fases têm previsão de
idades próprias, as quais, no entanto, são diversas quan- Art. 23. O Ensino Fundamental com 9 (nove) anos de
do se atenta para sujeitos com características que fogem à du- ração, de matrícula obrigatória para as crianças a
norma, como é o caso, entre outros: partir dos 6 (seis) anos de idade, tem duas fases sequentes
I - de atraso na matrícula e/ou no percurso escolar; com carac- terísticas próprias, chamadas de anos iniciais,
II - de retenção, repetência e retorno de quem havia com 5 (cinco) anos de duração, em regra para estudantes
abandonado os estudos; III - de portadores de deficiência de 6 (seis) a 10 (dez) anos de idade; e anos finais, com 4
limitadora; (quatro) anos de duração, para os de 11 (onze) a 14
IV - de jovens e adultos sem escolarização ou com (quatorze) anos.
esta incompleta; V - de habitantes de zonas rurais; Parágrafo único. No Ensino Fundamental, acolher sig-
VI - de indígenas e quilombolas; nifica também cuidar e educar, como forma de garantir a
VII - de adolescentes em regime de acolhimento ou aprendizagem dos conteúdos curriculares, para que o
internação, jovens e adultos em situação de privação de estu- dante desenvolva interesses e sensibilidades que lhe
liberdade nos estabelecimentos penais. permi- tam usufruir dos bens culturais disponíveis na
comunidade, na sua cidade ou na sociedade em geral, e
Seção I que lhe possibi- litem ainda sentir-se como produtor
Educação Infantil valorizado desses bens. Art. 24. Os objetivos da formação
básica das crianças, definidos para a Educação Infantil,
Art. 22. A Educação Infantil tem por objetivo o desen- prolongam-se durante os anos iniciais do Ensino
volvimento integral da criança, em seus aspectos físico, Fundamental, especialmente no pri- meiro, e completam-
afetivo, psicológico, intelectual, social, complementando a se nos anos finais, ampliando e inten- sificando,
ação da família e da comunidade. gradativamente, o processo educativo, mediante: I -
desenvolvimento da capacidade de aprender, ten-
do como meios básicos o pleno domínio da leitura, da
escri- ta e do cálculo;

170
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

II - foco central na alfabetização, ao longo dos 3 (três)


Seção I
pri- meiros anos;
III - compreensão do ambiente natural e social, do sistema Educação de Jovens e Adultos
político, da economia, da tecnologia, das artes, da cultura e dos
Art. 28. A Educação de Jovens e Adultos (EJA) destina-
va- lores em que se fundamenta a sociedade;
IV - o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, -se aos que se situam na faixa etária superior à
tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a considerada própria, no nível de conclusão do Ensino
for- mação de atitudes e valores; Fundamental e do Ensino Médio.
V - fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de § 1º Cabe aos sistemas educativos viabilizar a oferta
soli- dariedade humana e de respeito recíproco em que se de cursos gratuitos aos jovens e aos adultos,
assenta a vida social. proporcionando-
Art. 25. Os sistemas estaduais e municipais devem -lhes oportunidades educacionais apropriadas,
estabelecer especial forma de colaboração visando à oferta do consideradas as características do alunado, seus interesses,
Ensino Funda- mental e à articulação sequente entre a primeira condições de vida e de trabalho, mediante cursos, exames,
fase, no geral as- sumida pelo Município, e a segunda, pelo ações integra- das e complementares entre si,
Estado, para evitar obstá- culos ao acesso de estudantes que se estruturados em um projeto pedagógico próprio.
transfiram de uma rede para outra para completar esta § 2º Os cursos de EJA, preferencialmente tendo a Edu-
escolaridade obrigatória, garantindo a organicidade e a cação Profissional articulada com a Educação Básica,
totalidade do processo formativo do escolar. devem pautar-se pela flexibilidade, tanto de currículo
quanto de tempo e espaço, para que seja(m):
Seção III I - rompida a simetria com o ensino regular para
Ensino crianças e adolescentes, de modo a permitir percursos in-
Médio dividualizados e conteúdos significativos para os jovens e
adultos;
Art. 26. O Ensino Médio, etapa final do processo formativo II - providos o suporte e a atenção individuais às
da Educação Básica, é orientado por princípios e finalidades que dife- rentes necessidades dos estudantes no processo de
pre- veem: apren- dizagem, mediante atividades diversificadas;
I - a consolidação e o aprofundamento dos III - valorizada a realização de atividades e vivências
conhecimentos adquiridos no Ensino Fundamental, socializadoras, culturais, recreativas e esportivas,
possibilitando o prosseguimen- to de estudos; geradoras de enriquecimento do percurso formativo dos
estudantes;
II - a preparação básica para a cidadania e o trabalho,
to- mado este como princípio educativo, para continuar IV - desenvolvida a agregação de competências
aprendendo, de modo a ser capaz de enfrentar novas para o trabalho;
condições de ocupação e aperfeiçoamento posteriores; V - promovida a motivação e a orientação
III - o desenvolvimento do educando como pessoa permanen- te dos estudantes, visando maior participação
humana, incluindo a formação ética e estética, o nas aulas e seu melhor aproveitamento e desempenho;
desenvolvimento da autono- mia intelectual e do pensamento VI - realizada, sistematicamente, a formação
crítico; continua- da, destinada, especificamente, aos educadores
de jovens e adultos.
IV - a compreensão dos fundamentos científicos e
tecnoló- gicos presentes na sociedade contemporânea,
relacionando a teoria com a prática. Seção II
Educação Especial
§ 1º O Ensino Médio deve ter uma base unitária sobre a
qual podem se assentar possibilidades diversas como preparação
geral para o trabalho ou, facultativamente, para profissões Art. 29. A Educação Especial, como modalidade trans-
técnicas; na ciência e na tecnologia, como iniciação científica e versal a todos os níveis, etapas e modalidades de ensino, é
tecnológica; na cultura, como ampliação da formação cultural. parte integrante da educação regular, devendo ser
prevista no projeto político-pedagógico da unidade
§ 2º A definição e a gestão do currículo inscrevem-se em
uma lógica que se dirige aos jovens, considerando suas escolar.
singularidades, que se situam em um tempo determinado. § 1º Os sistemas de ensino devem matricular os estu-
dantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvi-
§ 3º Os sistemas educativos devem prever currículos flexíveis,
com diferentes alternativas, para que os jovens tenham a mento e altas habilidades/superdotação nas classes
oportuni- dade de escolher o percurso formativo que atenda comuns do ensino regular e no Atendimento Educacional
seus interesses, necessidades e aspirações, para que se assegure Especiali- zado (AEE), complementar ou suplementar à
a permanência dos jovens na escola, com proveito, até a escolarização, ofertado em salas de recursos
conclusão da Educação Básica. multifuncionais ou em centros de AEE da rede pública ou
de instituições comunitárias, con- fessionais ou
filantrópicas sem fins lucrativos.
CAPÍTULO II
MODALIDADES DA EDUCAÇÃO BÁSICA § 2º Os sistemas e as escolas devem criar condições
para que o professor da classe comum possa explorar as
poten- cialidades de todos os estudantes, adotando uma
Art. 27. A cada etapa da Educação Básica pode corresponder
uma ou mais das modalidades de ensino: Educação de Jovens e peda- gogia dialógica, interativa, interdisciplinar e
Adultos, Educação Especial, Educação Profissional e Tecnológica, inclusiva e, na interface, o professor do AEE deve
Educação do Campo, Educação Escolar Indígena e Educação a identificar habilidades e necessidades dos estudantes,
Dis- tância. organizar e orientar sobre os serviços e recursos
pedagógicos e de acessibilidade para a participação e
aprendizagem dos estudantes.
17
1
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§ 3º Na organização desta modalidade, os sistemas de


ensino devem observar as seguintes orientações funda- Art. 33. A organização curricular da Educação
mentais: Profissio- nal e Tecnológica por eixo tecnológico
I - o pleno acesso e a efetiva participação dos fundamenta-se na identificação das tecnologias que se
estudan- tes no ensino regular; II - a oferta do encontram na base de uma dada formação profissional e
atendimento educa- cional especializado; dos arranjos lógicos por elas constituídos.
III - a formação de professores para o AEE e para o Art. 34. Os conhecimentos e as habilidades adquiridos
desenvolvimento de práticas educacionais inclusivas; tanto nos cursos de Educação Profissional e Tecnológica,
IV - a participação da comunidade escolar; como os adquiridos na prática laboral pelos trabalhadores,
V - a acessibilidade arquitetônica, nas comunica- podem ser objeto de avaliação, reconhecimento e
ções e informações, nos mobiliários e equipamentos e nos certifica- ção para prosseguimento ou conclusão de
transportes; estudos.
VI - a articulação das políticas públicas intersetoriais.
Seção IV
Seção III Educação Básica do Campo
Educação Profissional e Tecnológica
Art. 35. Na modalidade de Educação Básica do
Art. 30. A Educação Profissional e Tecnológica, no Campo, a educação para a população rural está prevista
cum- primento dos objetivos da educação nacional, com ade- quações necessárias às peculiaridades da vida
integra-se aos diferentes níveis e modalidades de no campo e de cada região, definindo-se orientações para
educação e às di- mensões do trabalho, da ciência e da três aspectos essenciais à organização da ação
tecnologia, e articu- la-se com o ensino regular e com pedagógica:
outras modalidades edu- cacionais: Educação de Jovens e I - conteúdos curriculares e metodologias
Adultos, Educação Especial e Educação a Distância. apropria- das às reais necessidades e interesses dos
Art. 31. Como modalidade da Educação Básica, a Edu- estudantes da zona rural;
cação Profissional e Tecnológica ocorre na oferta de II - organização escolar própria, incluindo adequa-
cursos de formação inicial e continuada ou qualificação ção do calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às
profissio- nal e nos de Educação Profissional Técnica de condições climáticas;
nível médio. III - adequação à natureza do trabalho na zona rural.
Art. 32. A Educação Profissional Técnica de nível Art. 36. A identidade da escola do campo é definida
médio é desenvolvida nas seguintes formas: pela vinculação com as questões inerentes à sua realidade,
I - articulada com o Ensino Médio, sob duas com propostas pedagógicas que contemplam sua diver-
formas: sidade em todos os aspectos, tais como sociais, culturais,
a) integrada, na mesma instituição; ou políticos, econômicos, de gênero, geração e etnia.
b) concomitante, na mesma ou em distintas institui- Parágrafo único. Formas de organização e metodolo-
ções; gias pertinentes à realidade do campo devem ter
II - subsequente, em cursos destinados a quem já acolhidas, como a pedagogia da terra, pela qual se busca
tenha concluído o Ensino Médio. um traba- lho pedagógico fundamentado no princípio da
§ 1º Os cursos articulados com o Ensino Médio, orga- sustenta- bilidade, para assegurar a preservação da vida
nizados na forma integrada, são cursos de matrícula única, das futuras gerações, e a pedagogia da alternância, na
que conduzem os educandos à habilitação profissional qual o estu- dante participa, concomitante e
téc- nica de nível médio ao mesmo tempo em que alternadamente, de dois ambientes/situações de
concluem a última etapa da Educação Básica. aprendizagem: o escolar e o labo- ral, supondo parceria
§ 2º Os cursos técnicos articulados com o Ensino Mé- educativa, em que ambas as partes são corresponsáveis
dio, ofertados na forma concomitante, com dupla pelo aprendizado e pela formação do estudante.
matrícu- la e dupla certificação, podem ocorrer:
I - na mesma instituição de ensino, aproveitando- Seção V
se as oportunidades educacionais disponíveis; Educação Escolar Indígena
II - em instituições de ensino distintas, aproveitan-
do-se as oportunidades educacionais disponíveis; Art. 37. A Educação Escolar Indígena ocorre em uni-
III - em instituições de ensino distintas, mediante dades educacionais inscritas em suas terras e culturas, as
convênios de intercomplementaridade, com planejamento quais têm uma realidade singular, requerendo pedagogia
e desenvolvimento de projeto pedagógico unificado. própria em respeito à especificidade étnico-cultural de
§ 3º São admitidas, nos cursos de Educação Profissio- cada povo ou comunidade e formação específica de seu
nal Técnica de nível médio, a organização e a estruturação quadro docente, observados os princípios constitucionais,
em etapas que possibilitem qualificação profissional inter- a base nacional comum e os princípios que orientam a
mediária. Edu- cação Básica brasileira.
§ 4º A Educação Profissional e Tecnológica pode ser Parágrafo único. Na estruturação e no funcionamen-
desenvolvida por diferentes estratégias de educação con- to das escolas indígenas, é reconhecida a sua condição de
tinuada, em instituições especializadas ou no ambiente de possuidores de normas e ordenamento jurídico próprios,
trabalho, incluindo os programas e cursos de aprendiza- com ensino intercultural e bilíngue, visando à valorização
gem, previstos na Consolidação das Leis do Trabalho plena das culturas dos povos indígenas e à afirmação e
(CLT). ma- nutenção de sua diversidade étnica.

172
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Art. 38. Na organização de escola indígena, deve ser


CAPÍTULO I
considerada a participação da comunidade, na definição
do modelo de organização e gestão, bem como: O PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO E O REGIMEN-
I - suas estruturas sociais; TO ESCOLAR
II - suas práticas socioculturais e religiosas;
III - suas formas de produção de conhecimento, Art. 43. O projeto político-pedagógico, interdepen-
pro- cessos próprios e métodos de ensino-aprendizagem; dentemente da autonomia pedagógica, administrativa e
IV - suas atividades econômicas; de gestão financeira da instituição educacional, representa
V - edificação de escolas que atendam aos interes- mais do que um documento, sendo um dos meios de
ses das comunidades indígenas; viabi- lizar a escola democrática para todos e de
VI - uso de materiais didático-pedagógicos produzi- qualidade social.
dos de acordo com o contexto sociocultural de cada povo § 1º A autonomia da instituição educacional baseia-se
indígena. na busca de sua identidade, que se expressa na constru-
ção de seu projeto pedagógico e do seu regimento
Seção VI escolar, enquanto manifestação de seu ideal de educação
Educação a Distância e que permite uma nova e democrática ordenação
pedagógica das relações escolares.
Art. 39. A modalidade Educação a Distância caracteri- § 2º Cabe à escola, considerada a sua identidade e a
za-se pela mediação didático- pedagógica nos processos de seus sujeitos, articular a formulação do projeto
de ensino e aprendizagem que ocorre com a utilização de político-pe- dagógico com os planos de educação –
meios e tecnologias de informação e comunicação, com nacional, estadual, municipal –, o contexto em que a
estudantes e professores desenvolvendo atividades escola se situa e as neces- sidades locais e de seus
educa- tivas em lugares ou tempos diversos. estudantes.
Art. 40. O credenciamento para a oferta de cursos e § 3º A missão da unidade escolar, o papel socioeduca-
programas de Educação de Jovens e Adultos, de Educação tivo, artístico, cultural, ambiental, as questões de gênero,
Especial e de Educação Profissional Técnica de nível mé- etnia e diversidade cultural que compõem as ações educa-
dio e Tecnológica, na modalidade a distância, compete tivas, a organização e a gestão curricular são
aos sistemas estaduais de ensino, atendidas a componentes integrantes do projeto político-pedagógico,
regulamentação federal e as normas complementares devendo ser previstas as prioridades institucionais que a
desses sistemas. identificam, definindo o conjunto das ações educativas
próprias das etapas da Educação Básica assumidas, de
Seção VII acordo com as especificidades que lhes correspondam,
preservando a sua articulação sistêmica.
Educação Escolar Quilombola
Art. 44. O projeto político-pedagógico, instância de
construção coletiva que respeita os sujeitos das
Art. 41. A Educação Escolar Quilombola é
aprendiza- gens, entendidos como cidadãos com direitos
desenvolvida em unidades educacionais inscritas em suas
à proteção e à participação social, deve contemplar:
terras e cul- tura, requerendo pedagogia própria em
respeito à espe- cificidade étnico-cultural de cada I - o diagnóstico da realidade concreta dos sujeitos
do processo educativo, contextualizados no espaço e no
comunidade e formação específica de seu quadro
tempo;
docente, observados os princípios constitucionais, a base
nacional comum e os princípios que orientam a Educação II - a concepção sobre educação, conhecimento,
avaliação da aprendizagem e mobilidade escolar;
Básica brasileira.
III - o perfil real dos sujeitos – crianças, jovens e
Parágrafo único. Na estruturação e no funcionamento
adultos – que justificam e instituem a vida da e na escola,
das escolas quilombolas, bem com nas demais, deve ser
do ponto de vista intelectual, cultural, emocional, afetivo,
reconhecida e valorizada a diversidade cultural.
socioeconômico, como base da reflexão sobre as relações
TÍTULO VII vida-conhecimento-cultura- professor-estudante e
institui- ção escolar;
ELEMENTOS CONSTITUTIVOS PARA A ORGANI-
IV - as bases norteadoras da organização do
ZAÇÃO DAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS
trabalho pedagógico;
GERAIS PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA
V - a definição de qualidade das aprendizagens e,
por consequência, da escola, no contexto das desigualda-
Art. 42. São elementos constitutivos para a
des que se refletem na escola;
operaciona- lização destas Diretrizes o projeto político-
VI - os fundamentos da gestão democrática, com-
pedagógico e o regimento escolar; o sistema de avaliação;
partilhada e participativa (órgãos colegiados e de repre-
a gestão demo- crática e a organização da escola; o
sentação estudantil);
professor e o programa de formação docente.
VII - o programa de acompanhamento de acesso, de
permanência dos estudantes e de superação da retenção
escolar;
VIII - o programa de formação inicial e continuada
dos profissionais da educação, regentes e não regentes;

173
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

IX - as ações de acompanhamento sistemático dos


resultados do processo de avaliação interna e externa (Sis- § 3º A avaliação na Educação Infantil é realizada me-
tema de Avaliação da Educação Básica – SAEB, Prova diante acompanhamento e registro do desenvolvimento
Brasil, dados estatísticos, pesquisas sobre os sujeitos da da criança, sem o objetivo de promoção, mesmo em se
Educação Básica), incluindo dados referentes ao IDEB e/ou tra- tando de acesso ao Ensino Fundamental.
que com- plementem ou substituam os desenvolvidos § 4º A avaliação da aprendizagem no Ensino Funda-
pelas unida- des da federação e outros; mental e no Ensino Médio, de caráter formativo predo-
X - a concepção da organização do espaço físico da minando sobre o quantitativo e classificatório, adota uma
instituição escolar de tal modo que este seja compatível estratégia de progresso individual e contínuo que
com as características de seus sujeitos, que atenda as nor- favorece o crescimento do educando, preservando a
mas de acessibilidade, além da natureza e das finalidades qualidade ne- cessária para a sua formação escolar, sendo
da educação, deliberadas e assumidas pela comunidade organizada de acordo com regras comuns a essas duas
educacional. etapas.
Art. 45. O regimento escolar, discutido e aprovado
Seção II
pela comunidade escolar e conhecido por todos,
constitui-se em um dos instrumentos de execução do Promoção, aceleração de estudos e classificação
projeto político- pedagógico, com transparência e
responsabilidade. Art. 48. A promoção e a classificação no Ensino Funda-
Parágrafo único. O regimento escolar trata da mental e no Ensino Médio podem ser utilizadas em qual-
natureza e da finalidade da instituição, da relação da quer ano, série, ciclo, módulo ou outra unidade de
gestão demo- crática com os órgãos colegiados, das percurso adotada, exceto na primeira do Ensino
atribuições de seus órgãos e sujeitos, das suas normas Fundamental, alicer- çando-se na orientação de que a
pedagógicas, incluindo os critérios de acesso, promoção, avaliação do rendimento escolar observará os seguintes
mobilidade do estudante, dos direitos e deveres dos seus critérios:
sujeitos: estudantes, profes- sores, técnicos e funcionários, I - avaliação contínua e cumulativa do
gestores, famílias, represen- tação estudantil e função das desempenho do estudante, com prevalência dos aspectos
suas instâncias colegiadas. qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao
longo do perío- do sobre os de eventuais provas finais;
CAPÍTULO II II - possibilidade de aceleração de estudos para es-
AVALIAÇÃO tudantes com atraso escolar;
III - possibilidade de avanço nos cursos e nas séries
Art. 46. A avaliação no ambiente educacional com- mediante verificação do aprendizado;
preende 3 (três) dimensões básicas: I - avaliação da apren- IV - aproveitamento de estudos concluídos com êxi-
dizagem; to;
II - avaliação institucional interna e externa; III - avalia- V - oferta obrigatória de apoio pedagógico destina-
ção de redes de Educação Básica. do à recuperação contínua e concomitante de aprendiza-
gem de estudantes com déficit de rendimento escolar, a
Seção I ser previsto no regimento escolar.
Avaliação da aprendizagem Art. 49. A aceleração de estudos destina-se a estudan-
tes com atraso escolar, àqueles que, por algum motivo,
en- contram-se em descompasso de idade, por razões
Art. 47. A avaliação da aprendizagem baseia-se na
con- cepção de educação que norteia a relação professor- como ingresso tardio, retenção, dificuldades no processo
estu- dante-conhecimento-vida em movimento, devendo de en- sino-aprendizagem ou outras.
ser um ato reflexo de reconstrução da prática pedagógica Art. 50. A progressão pode ser regular ou parcial,
avalia- tiva, premissa básica e fundamental para se sendo que esta deve preservar a sequência do currículo e
questionar o educar, transformando a mudança em ato, obser- var as normas do respectivo sistema de ensino,
acima de tudo, político. requerendo o redesenho da organização das ações
pedagógicas, com previsão de horário de trabalho e
§ 1º A validade da avaliação, na sua função
diagnóstica, liga-se à aprendizagem, possibilitando o espaço de atuação para professor e estudante, com
aprendiz a recriar, refazer o que aprendeu, criar, propor e, conjunto próprio de recursos didático- pedagógicos.
nesse contexto, aponta para uma avaliação global, que vai Art. 51. As escolas que utilizam organização por série
além do aspecto quantitativo, porque identifica o podem adotar, no Ensino Fundamental, sem prejuízo da
desenvolvimento da auto- nomia do estudante, que é avaliação do processo ensino-aprendizagem, diversas for-
indissociavelmente ético, social, intelectual. mas de progressão, inclusive a de progressão continuada,
jamais entendida como promoção automática, o que su-
§ 2º Em nível operacional, a avaliação da aprendiza-
gem tem, como referência, o conjunto de conhecimentos, põe tratar o conhecimento como processo e vivência que
habilidades, atitudes, valores e emoções que os sujeitos não se harmoniza com a ideia de interrupção, mas sim de
do processo educativo projetam para si de modo construção, em que o estudante, enquanto sujeito da
integrado e articulado com aqueles princípios definidos ação, está em processo contínuo de formação,
para a Educa- ção Básica, redimensionados para cada uma construindo sig- nificados.
de suas eta- pas, bem assim no projeto político-
pedagógico da escola.

174
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Seção III
Avaliação institucional I - a compreensão da globalidade da pessoa, enquanto
ser que aprende, que sonha e ousa, em busca de uma
Art. 52. A avaliação institucional interna deve ser convivên- cia social libertadora fundamentada na ética cidadã;
previs- ta no projeto político- pedagógico e detalhada no II - a superação dos processos e procedimentos
plano de gestão, realizada anualmente, levando em burocrá- ticos, assumindo com pertinência e relevância: os
consideração as orientações contidas na regulamentação planos peda- gógicos, os objetivos institucionais e
vigente, para rever o conjunto de objetivos e metas a educacionais, e as ativida- des de avaliação contínua;
serem concretizados, me- diante ação dos diversos III - a prática em que os sujeitos constitutivos da
segmentos da comunidade educa- tiva, o que pressupõe comuni- dade educacional discutam a própria práxis
delimitação de indicadores compatíveis com a missão da pedagógica impreg- nando-a de entusiasmo e de
escola, além de clareza quanto ao que seja qualidade compromisso com a sua própria comunidade, valorizando-a,
social da aprendizagem e da escola. situando-a no contexto das relações sociais e buscando
soluções conjuntas;
Seção IV IV - a construção de relações interpessoais solidárias,
Avaliação de redes de Educação Básica ge- ridas de tal modo que os professores se sintam
estimulados a conhecer melhor os seus pares (colegas de
Art. 53. A avaliação de redes de Educação Básica trabalho, estudantes, famílias), a expor as suas ideias, a traduzir
ocorre periodicamente, é realizada por órgãos externos à as suas dificuldades e expectativas pessoais e profissionais;
escola e engloba os resultados da avaliação institucional, V - a instauração de relações entre os estudantes,
sendo que os resultados dessa avaliação sinalizam para a pro- porcionando-lhes espaços de convivência e situações de
sociedade se a escola apresenta qualidade suficiente para apren- dizagem, por meio dos quais aprendam a se
continuar funcio- nando como está. compreender e se organizar em equipes de estudos e de
práticas esportivas, artísti- cas e políticas;
CAPÍTULO III VI - a presença articuladora e mobilizadora do gestor no
GESTÃO DEMOCRÁTICA E ORGANIZAÇÃO DA cotidiano da escola e nos espaços com os quais a escola
inte- rage, em busca da qualidade social das aprendizagens
ESCOLA
que lhe caiba desenvolver, com transparência e
responsabilidade.
Art. 54. É pressuposto da organização do trabalho pe-
dagógico e da gestão da escola conceber a organização e
CAPÍTULO IV
a gestão das pessoas, do espaço, dos processos e
O PROFESSOR E A FORMAÇÃO INICIAL E
procedimen- tos que viabilizam o trabalho expresso no
CONTINUA-
projeto político-pe- dagógico e em planos da escola, em
que se conformam as condições de trabalho definidas DA
pelas instâncias colegiadas.
Art. 56. A tarefa de cuidar e educar, que a
§ 1º As instituições, respeitadas as normas legais e as
fundamentação da ação docente e os programas de formação
do seu sistema de ensino, têm incumbências complexas e
inicial e continuada dos profissionais da educação instauram,
abrangentes, que exigem outra concepção de organização
reflete- se na eleição de um ou outro método de
do trabalho pedagógico, como distribuição da carga
aprendizagem, a partir do qual é determinado o perfil de
horária, remuneração, estratégias claramente definidas
docente para a Educação Básica, em atendimento às
para a ação didático-pedagógica coletiva que inclua a
dimensões técnicas, políticas, éticas e estéticas.
pesquisa, a criação de novas abordagens e práticas
metodológicas, incluindo a produção de recursos § 1º Para a formação inicial e continuada, as escolas de for-
didáticos adequados às condições da escola e da mação dos profissionais da educação, sejam gestores,
comunidade em que esteja ela inserida. professores ou especialistas, deverão incluir em seus currículos
e programas:
§ 2º É obrigatória a gestão democrática no ensino
a) o conhecimento da escola como organização
público e prevista, em geral, para todas as instituições de
complexa que tem a função de promover a educação para e
ensino, o que implica decisões coletivas que pressupõem a
na cidadania;
participação da comunidade escolar na gestão da escola e
a observância dos princípios e finalidades da educação. b) a pesquisa, a análise e a aplicação dos resultados de
in- vestigações de interesse da área educacional;
§ 3º No exercício da gestão democrática, a escola
c) a participação na gestão de processos educativos e na
deve se empenhar para constituir-se em espaço das
organização e funcionamento de sistemas e instituições de
diferenças e da pluralidade, inscrita na diversidade do
ensino;
processo tornado possível por meio de relações
d) a temática da gestão democrática, dando ênfase à
intersubjetivas, cuja meta é a de se fundamentar em
construção do projeto político- pedagógico, mediante trabalho
princípio educativo emancipador, ex- presso na liberdade
coletivo de que todos os que compõem a comunidade escolar
de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o
são responsáveis.
pensamento, a arte e o saber.
Art. 57. Entre os princípios definidos para a educação
Art. 55. A gestão democrática constitui-se em
nacio- nal está a valorização do profissional da educação, com
instrumen- to de horizontalização das relações, de vivência
a com- preensão de que valorizá-lo é valorizar a escola, com
e convivência colegiada, superando o autoritarismo no
qualidade gestorial, educativa, social, cultural, ética, estética,
planejamento e na concepção e organização curricular,
ambiental.
educando para a con- quista da cidadania plena e
§ 1º A valorização do profissional da educação escolar
fortalecendo a ação conjunta que busca criar e recriar o
vin- cula-se à obrigatoriedade da garantia de qualidade e
trabalho da e na escola mediante:
ambas se associam à exigência de programas de formação
inicial e conti- nuada de docentes e não docentes, no
contexto do conjunto de múltiplas atribuições definidas para
os sistemas educativos, em que se inscrevem as funções do professor.

175
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

§ 2º Os programas de formação inicial e continuada


dos profissionais da educação, vinculados às orientações CONSIDERANDO o que dispõe a Declaração Universal
destas Di- retrizes, devem prepará-los para o desempenho dos Direitos Humanos de 1948; a Declaração das Nações
de suas atribui- ções, considerando necessário: Unidas sobre a Educação e Formação em Direitos Huma-
nos (Resolução A/66/137/2011); a Constituição Federal de
a) além de um conjunto de habilidades cognitivas,
1988; a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei
saber pesquisar, orientar, avaliar e elaborar propostas, isto é,
nº 9.394/1996); o Programa Mundial de Educação em Di-
interpre- tar e reconstruir o conhecimento coletivamente;
reitos Humanos (PMEDH 2005/2014), o Programa
b) trabalhar cooperativamente em equipe;
Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3/Decreto nº
c) compreender, interpretar e aplicar a linguagem e
7.037/2009); o Plano Nacional de Educação em Direitos
os instrumentos produzidos ao longo da evolução
Humanos (PNE- DH/2006); e as diretrizes nacionais
tecnológica, econômica e organizativa;
emanadas pelo Conse- lho Nacional de Educação, bem
d) desenvolver competências para integração com a
como outros documentos nacionais e internacionais que
co- munidade e para relacionamento com as famílias.
visem assegurar o direito à educação a todos(as),
Art. 58. A formação inicial, nos cursos de licenciatura,
não esgota o desenvolvimento dos conhecimentos, saberes
e ha- bilidades referidas, razão pela qual um programa de RESOLVE:
formação continuada dos profissionais da educação será
Art. 1º A presente Resolução estabelece as Diretrizes
contemplado no projeto político-pedagógico.
Nacionais para a Educação em Direitos Humanos (EDH) a
Art. 59. Os sistemas educativos devem instituir orientações
serem observadas pelos sistemas de ensino e suas institui-
para que o projeto de formação dos profissionais preveja:
ções.
a) a consolidação da identidade dos profissionais da
Art. 2º A Educação em Direitos Humanos, um dos ei-
educação, nas suas relações com a escola e com o
xos fundamentais do direito à educação, refere-se ao uso
estudante;
de concepções e práticas educativas fundadas nos Direitos
b) a criação de incentivos para o resgate da imagem
Humanos e em seus processos de promoção, proteção,
so- cial do professor, assim como da autonomia docente
de- fesa e aplicação na vida cotidiana e cidadã de sujeitos
tanto indi- vidual como coletiva;
de direitos e de responsabilidades individuais e coletivas.
c) a definição de indicadores de qualidade social da
§ 1º Os Direitos Humanos, internacionalmente
edu- cação escolar, a fim de que as agências formadoras de
reconhe- cidos como um conjunto de direitos civis,
profissio- nais da educação revejam os projetos dos cursos
políticos, sociais, econômicos, culturais e ambientais,
de formação inicial e continuada de docentes, de modo que
sejam eles individuais, coletivos, transindividuais ou
correspondam às exigências de um projeto de Nação.
difusos, referem-se à necessi- dade de igualdade e de
Art. 60. Esta Resolução entrará em vigor na data de sua defesa da dignidade humana.
pu- blicação.
§ 2º Aos sistemas de ensino e suas instituições cabe a
efetivação da Educação em Direitos Humanos, implicando
FRANCISCO APARECIDO CORDÃO a adoção sistemática dessas diretrizes por todos(as) os(as)
envolvidos(as) nos processos educacionais.
BRASIL. RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 1, DE 30 DE MAIO DE Art. 3º A Educação em Direitos Humanos, com a fina-
2012. ESTABELECE DIRETRIZES NACIONAIS PARA A lidade de promover a educação para a mudança e a trans-
EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS (ANEXO O formação social, fundamenta-se nos seguintes princípios:
PARECER CNE/CP Nº I - dignidade humana;
8/2012) II - igualdade de direitos;
III - reconhecimento e valorização das diferenças e
das diversidades; IV - laicidade do Estado;
V - democracia na educação;
(*) Resolução CNE/CP 1/2012. Diário Oficial da União,
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO CONSELHO NACIONAL Brasília, 31 de maio de 2012 – Seção 1 – p. 48.
DE EDUCAÇÃO CONSELHO PLENO VI - transversalidade, vivência e globalidade; e VII -
sustentabilidade socioambiental.
RESOLUÇÃO Nº 1, DE 30 DE MAIO DE 2012 (*) Art. 4º A Educação em Direitos Humanos como
proces- so sistemático e multidimensional, orientador da
Estabelece Diretrizes Nacionais para a Educação em formação integral dos sujeitos de direitos, articula-se às
Di- reitos Humanos. seguintes dimensões:
I - apreensão de conhecimentos historicamente
O Presidente do Conselho Nacional de Educação, no construídos sobre direitos humanos e a sua relação com
uso de suas atribuições legais e tendo em vista o disposto os contextos internacional, nacional e local;
nas Leis nos 9.131, de 24 de novembro de 1995, e 9.394, II - afirmação de valores, atitudes e práticas sociais
de 20 de dezembro de 1996, com fundamento no Parecer que expressem a cultura dos direitos humanos em todos
CNE/CP nº 8/2012, homologado por Despacho do Senhor os espaços da sociedade;
Ministro de Estado da Educação, publicado no DOU de 30 III - formação de uma consciência cidadã capaz de
de maio de 2012, se fazer presente em níveis cognitivo, social, cultural e
políti- co;

176
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

IV - desenvolvimento de processos metodológicos


participativos e de construção coletiva, utilizando lingua- Art. 12. As Instituições de Educação Superior estimu-
gens e materiais didáticos contextualizados; e larão ações de extensão voltadas para a promoção de Di-
V - fortalecimento de práticas individuais e sociais reitos Humanos, em diálogo com os segmentos sociais em
que gerem ações e instrumentos em favor da promoção, situação de exclusão social e violação de direitos, assim
da proteção e da defesa dos direitos humanos, bem como como com os movimentos sociais e a gestão pública.
da reparação das diferentes formas de violação de Art. 13. Esta Resolução entrará em vigor na data de
direitos. Art. 5º A Educação em Direitos Humanos tem sua publicação.
como objetivo central a formação para a vida e para a
convivên- cia, no exercício cotidiano dos Direitos ANTONIO CARLOS CARUSO RONCA
Humanos como for- ma de vida e de organização social,
política, econômica e ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS.
cultural nos níveis regionais, nacionais e planetário.
§ 1º Este objetivo deverá orientar os sistemas de en-
sino e suas instituições no que se refere ao planejamento
e ao desenvolvimento de ações de Educação em Direitos
Humanos adequadas às necessidades, às características ONU é a sigla para Organização das Nações Unidas,
biopsicossociais e culturais dos diferentes sujeitos e seus que é uma organização internacional com o objetivo de
contextos. facilitar a cooperação em termos de direito e segurança
in- ternacional, desenvolvimento econômico, progresso
§ 2º Os Conselhos de Educação definirão estratégias
de acompanhamento das ações de Educação em Direitos social, direitos humanos e da paz mundial.
Humanos.
Art. 6º A Educação em Direitos Humanos, de modo A ONU foi fundada em 1945, logo após a Segunda
transversal, deverá ser considerada na construção dos Guerra Mundial, com o objetivo de deter as guerras entre
Pro- jetos Político-Pedagógicos (PPP); dos Regimentos os países e para facilitar diálogo entre os mesmos.
Escola- res; dos Planos de Desenvolvimento Institucionais A ONU é formada por 192 estados-membros,
(PDI); dos Programas Pedagógicos de Curso (PPC) das incluindo quase todos os soberanos do mundo, e está
Institui- ções de Educação Superior; dos materiais dividida em diversas instâncias administrativas:
didáticos e pe- dagógicos; do modelo de ensino, pesquisa
e extensão; de gestão, bem como dos diferentes Assembleia Geral;
processos de avaliação. Conselho de Segurança, que tem o objetivo de decidir
resoluções de paz e segurança;
Art. 7º A inserção dos conhecimentos concernentes à
Educação em Direitos Humanos na organização dos currí- Conselho Econômico e Social, que auxilia na
culos da Educação Básica e da Educação Superior poderá promoção da cooperação econômica, social e no
ocorrer das seguintes formas: desenvolvimento mundial;
Secretariado, que fornece estudos e informações;
I - pela transversalidade, por meio de temas rela-
Tribunal Internacional de Justiça, que é o órgão judicial
cionados aos Direitos Humanos e tratados interdisciplinar-
principal.
mente;
II - como um conteúdo específico de uma das Além das instâncias administrativas, a ONU também é
formada por um grande sistema, chamado Sistema das
disci- plinas já existentes no currículo escolar;
Na- ções Unidas, formado pela Organização Mundial de
III - de maneira mista, ou seja, combinando
Saúde (OMS), o Programa Alimentar Mundial (PAM) e o
transver- salidade e disciplinaridade.
Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF).
Parágrafo único. Outras formas de inserção da Educa-
ção em Direitos Humanos poderão ainda ser admitidas na
organização curricular das instituições educativas desde A UNICEF é uma agência das Nações Unidas que tem
que observadas as especificidades dos níveis e modalida- como objetivo promover a defesa dos direitos das
des da Educação Nacional. crianças, ajudar a dar resposta às suas necessidades
básicas e contri- buir para o seu desenvolvimento.
Art. 8º A Educação em Direitos Humanos deverá
orien- tar a formação inicial e continuada de todos(as) A ONU é financiada por contribuições de todos os
os(as) pro- fissionais da educação, sendo componente seus Estados membros, e tem seis idiomas oficiais: Árabe,
curricular obri- gatório nos cursos destinados a esses Chi- nês, Inglês, Francês, Russo e Espanhol.
profissionais.
ONU no Brasil
Art. 9º A Educação em Direitos Humanos deverá es-
tar presente na formação inicial e continuada de todos(as) Desde 1947 o Brasil tem uma representação fixa da
ONU em seu território.
os(as) profissionais das diferentes áreas do conhecimento.
Art. 10. Os sistemas de ensino e as instituições de pes-
quisa deverão fomentar e divulgar estudos e experiências As Organizações Unidas, em parceria com o governo
bem sucedidas realizados na área dos Direitos Humanos e federal brasileiro, os estados e municípios, ajudam a
da Educação em Direitos Humanos. plane- jar e executar projetos de desenvolvimento social e
huma- no para o país.
Art. 11. Os sistemas de ensino deverão criar políticas
de produção de materiais didáticos e paradidáticos, tendo Fonte: https://www.significados.com.br/onu/
como princípios orientadores os Direitos Humanos e, por
extensão, a Educação em Direitos Humanos.

177
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

g. Ressaltando a importância de trazer questões


CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM relativas à deficiência ao centro das preocupações da
DEFICIÊNCIA E PROTOCOLO FACULTATIVO. sociedade como parte integrante das estratégias relevantes
DISPONÍVEL EM: \<HTTP:// de desenvolvimento sustentável;
CAPE.EDUNET.SP.GOV.BR/CAPE_ARQUIVOS/ h. Reconhecendo também que a discriminação
FLASH/5CONVENCAO.ONU_2006.PDF\>. contra qualquer pessoa, por motivo de deficiência, configura
ACESSO EM: 18 JUL. 2013.6.949, DE 25 DE AGOSTO DE violação da dignidade e do valor inerentes ao ser humano;
2009 PROMULGA A CONVENÇÃO INTERNACIONAL i. Reconhecendo ainda a diversidade das pessoas
SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA E com deficiência;
SEU PROTOCOLO FACULTATIVO, ASSINADOS EM j. Reconhecendo a necessidade de promover e
NOVA YORK, EM 30 DE MARÇO DE 2007. prote- ger os direitos humanos de todas as pessoas com
deficiência, inclusive daquelas que requerem maior apoio;
k. Preocupados com o fato de que, não obstante
esses diversos instrumentos e compromissos, as pessoas
com defi- ciência continuam a enfrentar barreiras contra sua
participação como membros iguais da sociedade e violações
de seus direi- tos humanos em todas as partes do mundo;
l. Reconhecendo a importância da cooperação
CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DE-
interna- cional para melhorar as condições de vida das
FICIÊNCIA PREÂMBULO
pessoas com deficiência em todos os países,
particularmente naqueles em desenvolvimento;
Os Estados Partes da presente Convenção, m. Reconhecendo as valiosas contribuições existentes
e potenciais das pessoas com deficiência ao bem-estar
a. Relembrando os princípios consagrados na Carta comum e à diversidade de suas comunidades, e que a
das Nações Unidas, que reconhecem a dignidade e o valor promoção do pleno exercício, pelas pessoas com deficiência,
inerentes e os direitos iguais e inalienáveis de todos os de seus direitos humanos e liberdades fundamentais e de
membros da família humana como o fundamento da sua plena participa- ção na sociedade resultará no
liberdade, da justiça e da paz no mundo; fortalecimento de seu senso de pertencimento à sociedade
b. Reconhecendo que as Nações Unidas, na Declaração e no significativo avanço do desen- volvimento humano,
Universal dos Direitos Humanos e nos Pactos Internacionais social e econômico da sociedade, bem como na
sobre Direitos Humanos, proclamaram e concordaram que erradicação da pobreza;
toda pessoa faz jus a todos os direitos e liberdades ali n. Reconhecendo a importância, para as pessoas
estabelecidos, sem distin- ção de qualquer espécie; com deficiência, de sua autonomia e independência
c. Reafirmando a universalidade, a indivisibilidade, a inter- individuais, in- clusive da liberdade para fazer as próprias
dependência e a inter-relação de todos os direitos humanos e escolhas;
li- berdades fundamentais, bem como a necessidade de o. Considerando que as pessoas com deficiência
garantir que todas as pessoas com deficiência os exerçam devem ter a oportunidade de participar ativamente das
plenamente, sem discriminação; decisões rela- tivas a programas e políticas, inclusive aos que
d. Relembrando o Pacto Internacional dos Direitos lhes dizem res- peito diretamente
Econô- micos, Sociais e Culturais, o Pacto Internacional dos p. Preocupados com as difíceis situações enfrentadas
Direitos Civis e Políticos, a Convenção Internacional sobre a por pessoas com deficiência que estão sujeitas a formas
Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, a múlti- plas ou agravadas de discriminação por causa de raça,
Convenção sobre a Elimina- ção de todas as Formas de cor, sexo, idioma, religião, opiniões políticas ou de outra
Discriminação contra a Mulher, a Con- venção contra a Tortura natureza, origem nacional, étnica, nativa ou social,
e Outros Tratamentos ou Penas Crueis, Desumanos ou propriedade, nascimento, ida- de ou outra condição;
Degradantes, a Convenção sobre os Direitos da Criança e a q. Reconhecendo que mulheres e meninas com defi-
Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de ciência estão frequentemente expostas a maiores riscos, tanto
Todos os Trabalhadores Migrantes e Membros de suas no lar como fora dele, de sofrer violência, lesões ou abuso,
Famílias; des- caso ou tratamento negligente, maus- tratos ou
e. Reconhecendo que a deficiência é um conceito em exploração;
evo- lução e que a deficiência resulta da interação entre pessoas r. Reconhecendo que as crianças com deficiência
com deficiência e as barreiras devidas às atitudes e ao devem gozar plenamente de todos os direitos humanos e
ambiente que impedem a plena e efetiva participação dessas liberdades fundamentais em igualdade de oportunidades
com as outras crianças e relembrando as obrigações
pessoas na socie- dade em igualdade de oportunidades com
assumidas com esse fim pelos Estados Partes na Convenção
as demais pessoas;
sobre os Direitos da Criança;
f. Reconhecendo a importância dos princípios e das
s. Ressaltando a necessidade de incorporar a
di- retrizes políticas contidas no Programa de Ação Mundial
perspec- tiva de gênero aos esforços para promover o
para as Pessoas Deficientes e nas Normas sobre a Equiparação
pleno exercício dos direitos humanos e liberdades
de Opor- tunidades para Pessoas com Deficiência, para fundamentais por parte das pessoas com deficiência;
influenciar a promo- ção, a formulação e a avaliação de t. Salientando o fato de que a maioria das pessoas
políticas, planos, programas e ações em níveis nacional, com deficiência vive em condições de pobreza e, nesse
regional e internacional para possibilitar maior igualdade de sentido, re- conhecendo a necessidade crítica de lidar com
oportunidades para pessoas com deficiência; o impacto ne- gativo da pobreza sobre pessoas com de-
ficiência;
178
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

u. Tendo em mente que as condições de paz e


segu- rança baseadas no pleno respeito aos propósitos e “Língua” abrange as línguas faladas e de sinais e outras
for- mas de comunicação não falada;
princípios consagrados na Carta das Nações Unidas e a
“Discriminação por motivo de deficiência” significa
observância dos instrumentos de direitos humanos são
qual- quer diferenciação, exclusão ou restrição baseada em
indispensáveis para a total proteção das pessoas com deficiên- cia, com o propósito ou efeito de impedir ou
deficiência, particu- larmente durante conflitos armados e impossibilitar o re- conhecimento, o gozo ou o exercício, em
ocupação estrangeira; igualdade de oportu- nidades com as demais pessoas, de
v. Reconhecendo a importância da acessibilidade todos os direitos humanos e liberdades fundamentais nos
aos meios físico, social, econômico e cultural, à saúde, à âmbitos político, econômico, social, cultural, civil ou
edu- cação e à informação e comunicação, para qualquer outro. Abrange todas as for- mas de
possibilitar às pessoas com deficiência o pleno gozo de discriminação, inclusive a recusa de adaptação razoável;
todos os direitos humanos e liberdades fundamentais; “Adaptação razoável” significa as modificações e os ajustes
w. Conscientes de que a pessoa tem deveres para necessários e adequados que não acarretem ônus
com outras pessoas e para com a comunidade a que despropor- cional ou indevido, quando requeridos em cada
pertence e que, portanto, tem a responsabilidade de caso, a fim de assegurar que as pessoas com deficiência
esforçar-se para a promoção e a observância dos direitos possam gozar ou exercer, em igualdade de oportunidades
reconhecidos na Carta Internacional dos Direitos com as demais pes-
Humanos; soas, todos os direitos humanos e liberdades fundamentais;
x. Convencidos de que a família é o núcleo natural e “Desenho universal” significa a concepção de produtos,
fundamental da sociedade e tem o direito de receber a ambientes, programas e serviços a serem usados, até onde
pro- teção da sociedade e do Estado e de que as pessoas for possível, por todas as pessoas, sem necessidade de
com deficiência e seus familiares devem receber a adaptação ou projeto específico. O “desenho universal” não
proteção e a assistência necessárias para tornar as famílias excluirá as ajudas técnicas para grupos específicos de
capazes de contribuir para o exercício pleno e equitativo pes- soas com deficiência, quando necessárias.
dos direitos das pessoas com deficiência;
y. Convencidos de que uma convenção Artigo 3
internacional geral e integral para promover e proteger os Princípios gerais
direitos e a dignidade das pessoas com deficiência
Os princípios da presente Convenção são:
prestará significativa contribuição para corrigir as
profundas desvantagens sociais das pessoas com
a. O respeito pela dignidade inerente, a autonomia
deficiência e para promover sua participa- ção na in- dividual, inclusive a liberdade de fazer as próprias
vida econômica, social e cultural, em igualdade de escolhas, e a independência das pessoas.
opor- tunidades, tanto nos países em desenvolvimento b. A não-discriminação;
como nos desenvolvidos. c. A plena e efetiva participação e inclusão na sociedade;
d. O respeito pela diferença e pela aceitação das
Acordaram o seguinte: pessoas com deficiência como parte da diversidade
humana e da hu- manidade;
Artigo 1 e. A igualdade de oportunidades;
Propósit f. A acessibilidade;
o g. A igualdade entre o homem e a mulher; e
O propósito da presente Convenção é promover, pro- h. O respeito pelo desenvolvimento das capacidades
teger e assegurar o exercício pleno e equitativo de todos das crianças com deficiência e pelo direito das crianças
os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas com deficiência de preservar sua identidade.
as pessoas com deficiência e promover o respeito pela
sua dignidade inerente. Artigo 4
Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedi- Obrigações gerais
mentos de longo prazo de natureza física, mental,
intelectual ou sensorial, os quais, em interação com 1. Os Estados Partes se comprometem a assegurar e
diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena promover o pleno exercício de todos os direitos humanos
e efetiva na socieda- de em igualdades de condições com e liberdades fundamentais por todas as pessoas com
as demais pessoas deficiência, sem qualquer tipo de discriminação por causa de
sua deficiên- cia. Para tanto, os Estados Partes se
Artigo 2 comprometem a:
Definições a. Adotar todas as medidas legislativas, administrativas
e de qualquer outra natureza, necessárias para a realização
dos direitos reconhecidos na presente Convenção;
Para os propósitos da presente Convenção:
b. Adotar todas as medidas necessárias, inclusive
“Comunicação” abrange as línguas, a visualização de legis- lativas, para modificar ou revogar leis, regulamentos,
textos, o Braille, a comunicação tátil, os caracteres amplia- costumes e práticas vigentes, que constituírem discriminação
dos, os dispositivos de multimídia acessível, assim como a contra pes- soas com deficiência;
linguagem simples, escrita e oral, os sistemas auditivos e c. Levar em conta, em todos os programas e políticas,
os meios de voz digitalizada e os modos, meios e a proteção e a promoção dos direitos humanos das pessoas
formatos au- mentativos e alternativos de comunicação, com deficiência;
inclusive a tecno- logia da informação e comunicação
acessíveis;

179
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

d. Abster-se de participar em qualquer ato ou prática


in- compatível com a presente Convenção e assegurar que Artigo 5
as au- toridades públicas e instituições atuem em Igualdade e não-discriminação
conformidade com a presente Convenção;
e. Tomar todas as medidas apropriadas para eliminar 1. Os Estados Partes reconhecem que todas as pes-
a discriminação baseada em deficiência, por parte de soas são iguais perante e sob a lei e que fazem jus, sem
qualquer pessoa, organização ou empresa privada; qualquer discriminação, a igual proteção e igual benefício
f. Realizar ou promover a pesquisa e o desenvolvimen- da lei.
to de produtos, serviços, equipamentos e instalações com 2. Os Estados Partes proibirão qualquer discrimina-
de- senho universal, conforme definidos no Artigo 2 da ção baseada na deficiência e garantirão às pessoas com
presente Convenção, que exijam o mínimo possível de deficiência igual e efetiva proteção legal contra a discrimi-
adaptação e cujo custo seja o menor possível, destinados a nação por qualquer motivo.
atender às necessi- dades específicas de pessoas com 3. A fim de promover a igualdade e eliminar a dis-
deficiência, a promover sua disponibilidade e seu uso e a criminação, os Estados Partes adotarão todas as medidas
promover o desenho universal quando da elaboração de apropriadas para garantir que a adaptação razoável seja
normas e diretrizes; oferecida.
g. Realizar ou promover a pesquisa e o desenvolvimen- 4. Nos termos da presente Convenção, as medidas
to, bem como a disponibilidade e o emprego de novas específicas que forem necessárias para acelerar ou
tecno- logias, inclusive as tecnologias da informação e alcançar a efetiva igualdade das pessoas com deficiência
comunicação, ajudas técnicas para locomoção, dispositivos e não serão consideradas
tecnologias as- sistivas, adequados a pessoas com discriminatórias.
deficiência, dando priorida- de a tecnologias de custo
acessível; Artigo 6
h. Propiciar informação acessível para as pessoas Mulheres com deficiência
com deficiência a respeito de ajudas técnicas para
locomoção, dis- positivos e tecnologias assistivas, incluindo 1. Os Estados Partes reconhecem que as mulheres
novas tecnologias bem como outras formas de e meninas com deficiência estão sujeitas a múltiplas for-
assistência, serviços de apoio e instalações; mas de discriminação e, portanto, tomarão medidas para
i. Promover a capacitação em relação aos direitos assegurar às mulheres e meninas com deficiência o pleno
reco- nhecidos pela presente Convenção dos profissionais e e igual exercício de todos os direitos humanos e
equipes que trabalham com pessoas com deficiência, de liberdades fundamentais.
forma a me- lhorar a prestação de assistência e serviços 2. Os Estados Partes tomarão todas as medidas
garantidos por es- ses direitos. apro- priadas para assegurar o pleno desenvolvimento, o
2. Em relação aos direitos econômicos, sociais e avanço e o empoderamento das mulheres, a fim de
cultu- rais, cada Estado Parte se compromete a tomar garantir-lhes o exercício e o gozo dos direitos humanos e
medidas, tanto quanto permitirem os recursos disponíveis e, liberdades fun- damentais estabelecidos na presente
quando necessá- rio, no âmbito da cooperação Convenção.
internacional, a fim de assegurar progressivamente o pleno
exercício desses direitos, sem prejuí- zo das obrigações Artigo 7
contidas na presente Convenção que forem imediatamente Crianças com deficiência
aplicáveis de acordo com o direito internacio- nal.
3. Na elaboração e implementação de legislação e 1. Os Estados Partes tomarão todas as medidas
polí- ticas para aplicar a presente Convenção e em outros necessárias para assegurar às crianças com deficiência o
processos de tomada de decisão relativos às pessoas com pleno exercício de todos os direitos humanos e liberdades
deficiência, os Estados Partes realizarão consultas estreitas e fundamentais, em igualdade de oportunidades com as de-
envolverão ati- vamente pessoas com deficiência, inclusive mais crianças.
crianças com defi- ciência, por intermédio de suas 2. Em todas as ações relativas às crianças com defi-
organizações representativas. ciência, o superior interesse da criança receberá
4. Nenhum dispositivo da presente Convenção considera- ção primordial.
afetará quaisquer disposições mais propícias à realização 3. Os Estados Partes assegurarão que as crianças
dos direitos das pessoas com deficiência, as quais possam com deficiência tenham o direito de expressar livremen-
estar contidas na legislação do Estado Parte ou no direito te sua opinião sobre todos os assuntos que lhes disserem
internacional em vigor para esse Estado. Não haverá respeito, tenham a sua opinião devidamente valorizada
nenhuma restrição ou derroga- ção de qualquer dos direitos de acordo com sua idade e maturidade, em igualdade de
humanos e liberdades fundamen- tais reconhecidos ou oportunidades com as demais crianças, e recebam atendi-
vigentes em qualquer Estado Parte da presente Convenção, mento adequado à sua deficiência e idade, para que pos-
em conformidade com leis, convenções, regulamentos ou sam exercer tal direito.
costumes, sob a alegação de que a presente Convenção não
reconhece tais direitos e liberdades ou que os reconhece em
menor grau.
5. As disposições da presente Convenção se aplicam,
sem limitação ou exceção, a todas as unidades
constitutivas dos Estados federativos.

180
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Artigo 8
Conscientização a. Desenvolver, promulgar e monitorar a
implementa- ção de normas e diretrizes mínimas para a
acessibilidade das instalações e dos serviços abertos ao
1) Os Estados Partes se comprometem a adotar me-
público ou de uso públi- co;
didas imediatas, efetivas e apropriadas para:
a) Conscientizar toda a sociedade, inclusive as famí- b. Assegurar que as entidades privadas que
oferecem instalações e serviços abertos ao público ou de
lias, sobre as condições das pessoas com deficiência e fo-
uso público levem em consideração todos os aspectos
mentar o respeito pelos direitos e pela dignidade das pes-
relativos à acessi- bilidade para pessoas com deficiência;
soas com deficiência;
c. Proporcionar, a todos os atores envolvidos,
b) Combater estereótipos, preconceitos e práticas
formação em relação às questões de acessibilidade com as
nocivas em relação a pessoas com deficiência, inclusive
quais as pes- soas com deficiência se confrontam;
aqueles relacionados a sexo e idade, em todas as áreas da
d. Dotar os edifícios e outras instalações abertas ao
vida;
pú- blico ou de uso público de sinalização em Braille e em
c) Promover a conscientização sobre as capacidades
forma- tos de fácil leitura e compreensão;
e contribuições das pessoas com deficiência.
e. Oferecer formas de assistência humana ou animal
2) As medidas para esse fim incluem:
e serviços de mediadores, incluindo guias, ledores e
a) Lançar e dar continuidade a efetivas campanhas
intérpretes profissionais da língua de sinais, para facilitar o
de conscientização públicas, destinadas a:
acesso aos edifícios e outras instalações abertas ao
i) Favorecer atitude receptiva em relação aos
público ou de uso público;
direitos das pessoas com deficiência;
f. Promover outras formas apropriadas de
ii) Promover percepção positiva e maior consciência
assistência e apoio a pessoas com deficiência, a fim de
social em relação às pessoas com deficiência;
assegurar a essas pessoas o acesso a informações;
iii) Promover o reconhecimento das habilidades, dos
g. Promover o acesso de pessoas com deficiência a
méritos e das capacidades das pessoas com deficiência e
novos sistemas e tecnologias da informação e
de sua contribuição ao local de trabalho e ao mercado la-
comunicação, inclusive à internet;
boral;
h. Promover, desde a fase inicial, a concepção, o de-
b) Fomentar em todos os níveis do sistema
senvolvimento, a produção e a disseminação de sistemas
educacio- nal, inclusive em todas as crianças desde tenra
e tecnologias de informação e comunicação, a fim de que
idade, uma atitude de respeito para com os direitos das
esses sistemas e tecnologias se tornem acessíveis a custo
pessoas com deficiência; mínimo.
c) Incentivar todos os órgãos da mídia a retratar as
pessoas com deficiência de maneira compatível com o
Artigo 10
pro- pósito da presente Convenção; Direito à vida
d) Promover programas de formação em sensibili-
zação a respeito das pessoas com deficiência e sobre os
Os Estados Partes reafirmam que todo ser humano tem
direitos das pessoas com deficiência. o direito inerente à vida e tomarão todas as medidas
necessá- rias para assegurar o efetivo exercício desse direito
Artigo 9 pelas pes- soas com deficiência, em igualdade de
Acessibilidade oportunidades com as demais pessoas.
1. A fim de possibilitar às pessoas com deficiência Artigo 11
viver de forma independente e participar plenamente de Situações de risco e emergências humanitárias
todos os aspectos da vida, os Estados Partes tomarão as
medidas apropriadas para assegurar às pessoas com defi- Em conformidade com suas obrigações decorrentes
ciência o acesso, em igualdade de oportunidades com as do direito internacional, inclusive do direito humanitário
demais pessoas, ao meio físico, ao transporte, à inter- nacional e do direito internacional dos direitos
informação e comunicação, inclusive aos sistemas e humanos, os Estados Partes tomarão todas as medidas
tecnologias da in- formação e comunicação, bem como a necessárias para as- segurar a proteção e a segurança das
outros serviços e instalações abertos ao público ou de uso pessoas com deficiência que se encontrarem em situações
público, tanto na zona urbana como na rural. Essas de risco, inclusive situações de conflito armado,
medidas, que incluirão a identificação e a eliminação de emergências humanitárias e ocorrência de desastres
obstáculos e barreiras à acessibilidade, serão aplicadas, naturais.
entre outros, a:
a. Edifícios, rodovias, meios de transporte e outras Artigo 12
instalações internas e externas, inclusive escolas, residên- Reconhecimento igual perante a lei
cias, instalações médicas e locais de trabalho;
b. Informações, comunicações e outros serviços, in- 1. Os Estados Partes reafirmam que as pessoas com
clusive serviços eletrônicos e serviços de emergência; deficiência têm o direito de ser reconhecidas em todos os
2. Os Estados Partes também tomarão medidas lu- gares como pessoas perante a lei.
apropriadas para: 2. Os Estados Partes reconhecerão que as pessoas
com deficiência gozam de capacidade legal em igualdade
de con- dições com as demais pessoas em todos os
aspectos da vida.

18
1
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

3. Os Estados Partes tomarão medidas apropriadas para


prover o acesso de pessoas com deficiência ao apoio de Artigo 15
que necessitarem no exercício de sua capacidade legal. Prevenção contra tortura ou tratamentos ou penas
4. Os Estados Partes assegurarão que todas as cruéis, desumanos ou degradantes
medidas relativas ao exercício da capacidade legal incluam
salvaguardas apropriadas e efetivas para prevenir abusos, em 1. Nenhuma pessoa será submetida à tortura ou a
conformidade com o direito internacional dos direitos tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes.
humanos. Essas salva- guardas assegurarão que as medidas Em especial, nenhuma pessoa deverá ser sujeita a experi-
relativas ao exercício da capacidade legal respeitem os mentos médicos ou científicos sem seu livre consentimen-
direitos, a vontade e as preferên- cias da pessoa; sejam to.
isentas de conflito de interesses e de in- fluência indevida; 2. Os Estados Partes tomarão todas as medidas
sejam proporcionais e apropriadas às circuns- tâncias da efeti- vas de natureza legislativa, administrativa, judicial ou
pessoa, se apliquem pelo período mais curto possível e outra, para evitar que pessoas com deficiência, do mesmo
sejam submetidas à revisão regular por uma autoridade ou modo que as demais pessoas, sejam submetidas à tortura
órgão judiciário competente, independente e imparcial. As ou a tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou
sal- vaguardas serão proporcionais ao grau em que tais degradantes.
medidas afetarem os direitos e interesses da pessoa.
5. Os Estados Partes, sujeitos ao disposto neste Artigo 16
Artigo, tomarão todas as medidas apropriadas e efetivas Prevenção contra a exploração, a violência e o abu-
para assegurar às pessoas com deficiência o igual direito de so
possuir ou herdar bens, de controlar as próprias finanças e
de ter igual acesso a empréstimos bancários, hipotecas e 1. Os Estados Partes tomarão todas as medidas
outras formas de crédito financeiro, e assegurarão que as apropriadas de natureza legislativa, administrativa, social,
pessoas com deficiência não sejam arbitrariamente educacional e outras, para proteger as pessoas com defi-
destituídas de seus bens. ciência, tanto dentro como fora do lar, contra todas as for-
mas de exploração, violência e abuso, incluindo aspectos
Artigo 13 relacionados a gênero.
Acesso à justiça 2. Os Estados Partes também tomarão todas as me-
didas apropriadas para prevenir todas as formas de explo-
1. Os Estados Partes assegurarão o efetivo acesso ração, violência e abuso, assegurando, entre outras coisas,
das pessoas com deficiência à justiça, em igualdade de formas apropriadas de atendimento e apoio que levem
condições com as demais pessoas, inclusive mediante a em conta o gênero e a idade das pessoas com deficiência
provisão de adap- tações processuais adequadas à idade, a e de seus familiares e atendentes, inclusive mediante a
fim de facilitar o efetivo papel das pessoas com deficiência provisão de informação e educação sobre a maneira de
como participantes diretos ou indiretos, inclusive como evitar, reco- nhecer e denunciar casos de exploração,
testemunhas, em todos os procedi- mentos jurídicos, tais violência e abuso. Os Estados Partes assegurarão que os
como investigações e outras etapas preli- minares. serviços de proteção levem em conta a idade, o gênero e
a deficiência das pes- soas.
2. A fim de assegurar às pessoas com deficiência o 3. A fim de prevenir a ocorrência de quaisquer for-
efeti- vo acesso à justiça, os Estados Partes promoverão a mas de exploração, violência e abuso, os Estados Partes
capacitação apropriada daqueles que trabalham na área de as- segurarão que todos os programas e instalações
administração da justiça, inclusive a polícia e os funcionários destina- dos a atender pessoas com deficiência sejam
do sistema peni- tenciário. efetivamente monitorados por autoridades
independentes.
Artigo 14 4. Os Estados Partes tomarão todas as medidas
Liberdade e segurança da pessoa apropriadas para promover a recuperação física, cognitiva
e psicológica, inclusive mediante a provisão de serviços de
1. Os Estados Partes assegurarão que as pessoas proteção, a reabilitação e a reinserção social de pessoas
com deficiência, em igualdade de oportunidades com as com deficiência que forem vítimas de qualquer forma de
demais pessoas: exploração, violência ou abuso. Tais recuperação e rein-
(a) Gozem do direito à liberdade e à segurança da serção ocorrerão em ambientes que promovam a saúde, o
pessoa; bem-estar, o auto respeito, a dignidade e a autonomia da
(b) Não sejam privadas ilegal ou arbitrariamente de pessoa e levem em consideração as necessidades de
sua liberdade e que toda privação de liberdade esteja em gêne- ro e idade.
conformi- dade com a lei, e que a existência de deficiência 5. Os Estados Partes adotarão leis e políticas efeti-
não justifique a privação de liberdade; vas, inclusive legislação e políticas voltadas para mulheres
2. Os Estados Partes assegurarão que, se pessoas e crianças, a fim de assegurar que os casos de exploração,
com deficiência forem privadas de liberdade mediante violência e abuso contra pessoas com deficiência sejam
algum pro- cesso, elas, em igualdade de oportunidades com identificados, investigados e, caso necessário, levados à
as demais pes- soas, façam jus a garantias de acordo com o justiça.
direito internacional dos direitos humanos e sejam tratadas
em conformidade com os objetivos e princípios da presente
Convenção, inclusive me- diante a provisão de adaptação
razoável.

182
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Artigo 17
Artigo 20
Proteção da integridade da pessoa Mobilidade pessoal
Toda pessoa com deficiência tem o direito a que sua
Os Estados Partes tomarão medidas efetivas para as-
integridade física e mental seja respeitada, em igualdade
segurar às pessoas com deficiência sua mobilidade
de condições com as demais pessoas.
pessoal com a máxima independência possível:
Artigo 18 a. Facilitando a mobilidade pessoal das pessoas
com deficiência, na forma e no momento em que elas
Liberdade de movimentação e nacionalidade
quiserem, e a custo acessível;
b. Facilitando às pessoas com deficiência o acesso a
1. Os Estados Partes reconhecerão os direitos das
tecnologias assistivas, dispositivos e ajudas técnicas de
pessoas com deficiência à liberdade de movimentação, à
qua- lidade, e formas de assistência humana ou animal e
liberdade de escolher sua residência e à nacionalidade, em
de me- diadores, inclusive tornando-os disponíveis a custo
igualdade de oportunidades com as demais pessoas,
inclu- sive assegurando que as pessoas com deficiência: acessível;
c. Propiciando às pessoas com deficiência e ao pes-
a. Tenham o direito de adquirir nacionalidade e mu-
dar de nacionalidade e não sejam privadas soal especializado capacitação em técnicas de mobilidade;
arbitrariamente de sua nacionalidade em razão de sua d. Incentivando entidades que produzem ajudas
deficiência. téc- nicas de mobilidade, dispositivos e tecnologias
assistivas a levarem em conta todos os aspectos relativos
b. Não sejam privadas, por causa de sua deficiên-
cia, da competência de obter, possuir e utilizar documento à mobilidade de pessoas com deficiência.
comprovante de sua nacionalidade ou outro documento
de identidade, ou de recorrer a processos relevantes, tais Artigo 21
como procedimentos relativos à imigração, que forem ne- Liberdade de expressão e de opinião e acesso à in-
cessários para facilitar o exercício de seu direito à formação
liberdade de movimentação.
c. Tenham liberdade de sair de qualquer país, Os Estados Partes tomarão todas as medidas
inclusi- ve do seu; apropria- das para assegurar que as pessoas com
d. Não sejam privadas, arbitrariamente ou por causa deficiência possam exercer seu direito à liberdade de
de sua deficiência, do direito de entrar no próprio país. expressão e opinião, in- clusive à liberdade de buscar,
2. As crianças com deficiência serão registradas receber e compartilhar infor- mações e idéias, em
ime- diatamente após o nascimento e terão, desde o igualdade de oportunidades com as demais pessoas e por
nascimen- to, o direito a um nome, o direito de adquirir intermédio de todas as formas de co- municação de sua
nacionalidade e, tanto quanto possível, o direito de escolha, conforme o disposto no Artigo 2 da presente
co- Convenção, entre as quais:
nhecer seus pais e de ser cuidadas por eles. a. Fornecer, prontamente e sem custo adicional, às
pessoas com deficiência, todas as informações destinadas
Artigo 19 ao público em geral em formatos acessíveis e tecnologias
Vida independente e inclusão na comunidade apropriadas aos diferentes tipos de deficiência;
b. Aceitar e facilitar, em trâmites oficiais, o uso de
Os Estados Partes desta Convenção reconhecem o lín- guas de sinais, Braille, comunicação aumentativa e
igual direito de todas as pessoas com deficiência de viver alternati- va, e de todos os demais meios, modos e
na comunidade, com a mesma liberdade de escolha que formatos acessíveis de comunicação, à escolha das
as demais pessoas, e tomarão medidas efetivas e pessoas com deficiência;
apropriadas para facilitar às pessoas com deficiência o c. Urgir as entidades privadas que oferecem
pleno gozo des- se direito e sua plena inclusão e serviços ao público em geral, inclusive por meio da
participação na comunida- de, inclusive assegurando que: internet, a for- necer informações e serviços em formatos
a. As pessoas com deficiência possam escolher seu acessíveis, que possam ser usados por pessoas com
local de residência e onde e com quem morar, em igual- deficiência;
dade de oportunidades com as demais pessoas, e que não d. Incentivar a mídia, inclusive os provedores de in-
sejam obrigadas a viver em determinado tipo de moradia; formação pela internet, a tornar seus serviços acessíveis a
b. As pessoas com deficiência tenham acesso a uma pessoas com deficiência;
variedade de serviços de apoio em domicílio ou em insti- e. Reconhecer e promover o uso de línguas de sinais.
tuições residenciais ou a outros serviços comunitários de
apoio, inclusive os serviços de atendentes pessoais que Artigo 22
forem necessários como apoio para que as pessoas com Respeito à privacidade
deficiência vivam e sejam incluídas na comunidade e para
evitar que fiquem isoladas ou segregadas da comunidade; 1. Nenhuma pessoa com deficiência, qualquer que
c. Os serviços e instalações da comunidade para a seja seu local de residência ou tipo de moradia, estará
população em geral estejam disponíveis às pessoas com sujei- ta a interferência arbitrária ou ilegal em sua
deficiência, em igualdade de oportunidades, e atendam às privacidade, fa- mília, lar, correspondência ou outros tipos
suas necessidades. de comunicação, nem a ataques ilícitos à sua honra e
reputação. As pessoas com deficiência têm o direito à
proteção da lei contra tais interferências ou ataques.

183
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

2. Os Estados Partes protegerão a privacidade dos


dados pessoais e dados relativos à saúde e à reabilitação Artigo 24
de pessoas com deficiência, em igualdade de condições Educação
com as demais pessoas.
1. Os Estados Partes reconhecem o direito das pes-
Artigo 23 soas com deficiência à educação. Para efetivar esse direito
sem discriminação e com base na igualdade de oportuni-
Respeito pelo lar e pela família
dades, os Estados Partes assegurarão sistema educacional
inclusivo em todos os níveis, bem como o aprendizado ao
1. Os Estados Partes tomarão medidas efetivas e
longo de toda a vida, com os seguintes objetivos:
apropriadas para eliminar a discriminação contra pessoas
com deficiência, em todos os aspectos relativos a a. O pleno desenvolvimento do potencial humano e
do senso de dignidade e auto- estima, além do fortaleci-
casamen- to, família, paternidade e relacionamentos, em
mento do respeito pelos direitos humanos, pelas liberda-
igualdade de condições com as demais pessoas, de modo
des fundamentais e pela diversidade humana;
a assegurar que:
b. O máximo desenvolvimento possível da perso-
a. Seja reconhecido o direito das pessoas com defi-
nalidade, dos talentos e da criatividade das pessoas com
ciência, em idade de contrair matrimônio, de casar-se e
deficiência, assim como de suas habilidades físicas e inte-
es- tabelecer família, com base no livre e pleno
lectuais;
consentimento dos pretendentes;
c. A participação efetiva das pessoas com deficiência
b. Sejam reconhecidos os direitos das pessoas com
em uma sociedade livre.
deficiência de decidir livre e responsavelmente sobre o
nú- mero de filhos e o espaçamento entre esses filhos e 2. Para a realização desse direito, os Estados Partes
de ter acesso a informações adequadas à idade e a assegurarão que:
educação em matéria de reprodução e de planejamento a. As pessoas com deficiência não sejam excluídas
familiar, bem como os meios necessários para exercer do sistema educacional geral sob alegação de deficiência
esses direitos. e que as crianças com deficiência não sejam excluídas do
ensino primário gratuito e compulsório ou do ensino se-
c. As pessoas com deficiência, inclusive crianças,
conservem sua fertilidade, em igualdade de condições cundário, sob alegação de deficiência;
com as demais pessoas. b. As pessoas com deficiência possam ter acesso ao
ensino primário inclusivo, de qualidade e gratuito, e ao
2. Os Estados Partes assegurarão os direitos e res-
ponsabilidades das pessoas com deficiência, relativos à en- sino secundário, em igualdade de condições com as
guarda, custódia, curatela e adoção de crianças ou de- mais pessoas na comunidade em que vivem;
c. Adaptações razoáveis de acordo com as necessi-
institui- ções semelhantes, caso esses conceitos constem
dades individuais sejam providenciadas;
na legis- lação nacional. Em todos os casos, prevalecerá o
superior interesse da criança. Os Estados Partes prestarão d. As pessoas com deficiência recebam o apoio ne-
a devida assistência às pessoas com deficiência para que cessário, no âmbito do sistema educacional geral, com vis-
essas pes- soas possam exercer suas responsabilidades na tas a facilitar sua efetiva educação;
criação dos filhos. e. Medidas de apoio individualizadas e efetivas se-
3. Os Estados Partes assegurarão que as crianças jam adotadas em ambientes que maximizem o
com deficiência terão iguais direitos em relação à vida fa- desenvolvi- mento acadêmico e social, de acordo com a
miliar. Para a realização desses direitos e para evitar meta de inclu- são plena.
oculta- ção, abandono, negligência e segregação de 3. Os Estados Partes assegurarão às pessoas com
crianças com deficiência, os Estados Partes fornecerão de- ficiência a possibilidade de adquirir as competências
prontamente in- formações abrangentes sobre serviços e prá- ticas e sociais necessárias de modo a facilitar às
apoios a crianças com deficiência e suas famílias. pessoas com deficiência sua plena e igual participação no
sistema de ensino e na vida em comunidade. Para tanto,
4. Os Estados Partes assegurarão que uma criança
não será separada de seus pais contra a vontade destes, os Estados Partes tomarão medidas apropriadas, inclusive:
exceto quando autoridades competentes, sujeitas a con- a. Tornando disponível o aprendizado do Braille, es-
trole jurisdicional, determinarem, em conformidade com crita alternativa, modos, meios e formatos de
as leis e procedimentos aplicáveis, que a separação é comunicação aumentativa e alternativa, e habilidades de
necessá- ria, no superior interesse da criança. Em nenhum orientação e mobilidade, além de facilitação de apoio e
caso, uma criança será separada dos pais sob alegação de aconselhamento de pares;
deficiência da criança ou de um ou ambos os pais. b. Tornando disponível o aprendizado da língua de
sinais e promoção da identidade linguística da
5. Os Estados Partes, no caso em que a família ime-
diata de uma criança com deficiência não ter condições de comunidade surda;
cuidar da criança, farão todo esforço para que cuidados c. Garantindo que a educação de pessoas, em parti-
al- ternativos sejam oferecidos por outros parentes e, se cular crianças cegas, surdocegas e surdas, seja ministrada
isso não for possível, dentro de ambiente familiar, na nas línguas e nos modos e meios de comunicação mais
comuni- dade. adequados ao indivíduo e em ambientes que favoreçam
ao máximo seu desenvolvimento acadêmico e social.

184
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

4. A fim de contribuir para o exercício desse direi-


to, os Estados Partes tomarão medidas apropriadas para f. Prevenirão que se negue, de maneira
empregar professores, inclusive professores com deficiên- discriminató- ria, os serviços de saúde ou de atenção à
cia, habilitados para o ensino da língua de sinais e/ou do saúde ou a ad- ministração de alimentos sólidos ou
Braille, e para capacitar profissionais e equipes atuantes líquidos por motivo de deficiência.
em todos os níveis de ensino. Essa capacitação
Artigo 26
incorporará a conscientização da deficiência e a utilização
de modos, meios e formatos apropriados de comunicação Habilitação e reabilitação
aumentati- va e alternativa, e técnicas e materiais
1. Os Estados Partes tomarão medidas efetivas e
pedagógicos, como apoios para pessoas com deficiência.
apro- priadas, inclusive mediante apoio dos pares, para
5. Os Estados Partes assegurarão que as pessoas
possibilitar que as pessoas com deficiência conquistem e
com deficiência possam ter acesso ao ensino superior em
conservem o máximo de autonomia e plena capacidade
geral, treinamento profissional de acordo com sua
física, mental, so- cial e profissional, bem como plena
vocação, educação para adultos e formação continuada,
inclusão e participação em todos os aspectos da vida. Para
sem discri- minação e em igualdade de condições. Para
tanto, os Estados Partes organizarão, fortalecerão e
tanto, os Esta- dos Partes assegurarão a provisão de
ampliarão serviços e programas completos de habilitação
adaptações razoáveis para pessoas com deficiência.
e reabilitação, particularmente nas áreas de saúde,
emprego, educação e serviços sociais, de modo que esses
Artigo 25 serviços e programas:
Saúde
a. Comecem no estágio mais precoce possível e
sejam baseados em avaliação multidisciplinar das
Os Estados Partes reconhecem que as pessoas com necessidades e pontos fortes de cada pessoa;
de- ficiência têm o direito de gozar o melhor estado de
b. Apoiem a participação e a inclusão na comunida-
saúde possível, sem discriminação baseada na deficiência.
de e em todos os aspectos da vida social, sejam
Os Es- tados Partes tomarão todas as medidas oferecidos voluntariamente e estejam disponíveis às
apropriadas para assegurar às pessoas com deficiência o pessoas com defi- ciência o mais próximo possível de suas
acesso a serviços de saúde, incluindo os serviços de comunidades, inclu- sive na zona rural.
reabilitação, que levarão em conta as especificidades de
2. Os Estados Partes promoverão o desenvolvimen-
gênero. Em especial, os Es- tados Partes: to da capacitação inicial e continuada de profissionais e
a. Oferecerão às pessoas com deficiência progra- de equipes que atuam nos serviços de habilitação e
mas e atenção à saúde gratuitos ou a custos acessíveis da reabilita- ção.
mesma qualidade, variedade e padrão que são oferecidos 3. Os Estados Partes promoverão a disponibilidade,
às demais pessoas, inclusive na área de saúde sexual e re- o conhecimento e o uso de dispositivos e tecnologias
produtiva e de programas de saúde pública destinados à assisti- vas, projetados para pessoas com deficiência e
população em geral; relacionados com a habilitação e a reabilitação.
b. Propiciarão serviços de saúde que as pessoas
com deficiência necessitam especificamente por causa de Artigo 27
sua deficiência, inclusive diagnóstico e intervenção Trabalho e emprego
precoces, bem como serviços projetados para reduzir ao
máximo e prevenir deficiências adicionais, inclusive entre 1. Os Estados Partes reconhecem o direito das pes-
crianças e idosos; soas com deficiência ao trabalho, em igualdade de
c. Propiciarão esses serviços de saúde às pessoas oportuni- dades com as demais pessoas. Este direito
com deficiência, o mais próximo possível de suas comuni- abrange o direito à oportunidade de se manter com um
dades, inclusive na zona rural; trabalho de sua livre escolha ou aceitação no mercado
d. Exigirão dos profissionais de saúde que laboral, em ambiente de trabalho que seja aberto, inclusivo
dispensem às pessoas com deficiência a mesma qualidade e acessível a pessoas com deficiência. Os Estados Partes
de serviços dispensada às demais pessoas e, salvaguardarão e promoverão a realização do direito ao
principalmente, que obte- nham o consentimento livre e trabalho, inclusive daqueles que tiverem adquirido uma
esclarecido das pessoas com deficiência concernentes. deficiência no emprego, adotando medidas apropriadas,
Para esse fim, os Estados Partes realizarão atividades de incluídas na legislação, com o fim de, entre outros:
formação e definirão regras éticas para os setores de a. Proibir a discriminação baseada na deficiência
saúde público e privado, de modo a conscientizar os com respeito a todas as questões relacionadas com as
profissionais de saúde acerca dos direitos humanos, da formas de emprego, inclusive condições de recrutamento,
dignidade, autonomia e das necessidades das pessoas contratação e admissão, permanência no emprego,
com deficiência; ascensão profissional e condições seguras e salubres de
e. Proibirão a discriminação contra pessoas com de- trabalho;
ficiência na provisão de seguro de saúde e seguro de vida, b. Proteger os direitos das pessoas com deficiência,
caso tais seguros sejam permitidos pela legislação nacio- em condições de igualdade com as demais pessoas, às
nal, os quais deverão ser providos de maneira razoável e con- dições justas e favoráveis de trabalho, incluindo iguais
justa; e opor- tunidades e igual remuneração por trabalho de
igual valor, condições seguras e salubres de trabalho, além
de reparação de injustiças e proteção contra o assédio no
trabalho;

185
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

c. Assegurar que as pessoas com deficiência


Artigo 29
possam exercer seus direitos trabalhistas e sindicais, em
condições de igualdade com as demais pessoas; Participação na vida política e pública
d. Possibilitar às pessoas com deficiência o acesso
efetivo a programas de orientação técnica e profissional e a Os Estados Partes garantirão às pessoas com
serviços de co- locação no trabalho e de treinamento deficiência direitos políticos e oportunidade de exercê-los
profissional e continuado; em condições de igualdade com as demais pessoas, e
deverão:
e. Promover oportunidades de emprego e ascensão
pro- fissional para pessoas com deficiência no mercado de a. Assegurar que as pessoas com deficiência
trabalho, bem como assistência na procura, obtenção e possam participar efetiva e plenamente na vida política e
manutenção do emprego e no retorno ao emprego; pública, em igualdade de oportunidades com as demais
pessoas, direta- mente ou por meio de representantes
f. Promover oportunidades de trabalho autônomo, em-
preendedorismo, desenvolvimento de cooperativas e livremente escolhidos, incluindo o direito e a oportunidade
estabeleci- mento de negócio próprio; de votarem e serem vo- tadas, mediante, entre outros:
g. Empregar pessoas com deficiência no setor público; (i) Garantia de que os procedimentos, instalações e
h. Promover o emprego de pessoas com deficiência materiais e equipamentos para votação serão apropriados,
no setor privado, mediante políticas e medidas apropriadas, acessíveis e de fácil compreensão e uso;
que po- derão incluir programas de ação afirmativa, incentivos (ii) Proteção do direito das pessoas com deficiência
e outras medidas; ao voto secreto em eleições e plebiscitos, sem
i. Assegurar que adaptações razoáveis sejam feitas para intimidação, e a candidatar-se nas eleições, efetivamente
pessoas com deficiência no local de trabalho; ocupar cargos ele- tivos e desempenhar quaisquer
j. Promover a aquisição de experiência de trabalho funções públicas em todos os níveis de governo, usando
por pessoas com deficiência no mercado aberto de trabalho; novas tecnologias assistivas, quando apropriado;
k. Promover reabilitação profissional, manutenção do (iii) Garantia do livre arbítrio das pessoas com
em- prego e programas de retorno ao trabalho para pessoas deficiên- cia como eleitores e, para tanto, sempre que
com de- ficiência. necessário e a seu pedido, permissão para que elas sejam
2. Os Estados Partes assegurarão que as pessoas com auxiliadas na vo- tação por uma pessoa de sua escolha;
de- ficiência não serão mantidas em escravidão ou servidão b. Promover ativamente um ambiente em que as
e que serão protegidas, em igualdade de condições com as pes- soas com deficiência possam participar efetiva e
demais pessoas, contra o trabalho forçado ou compulsório. plenamente na condução das questões públicas, sem
discriminação e em igualdade de oportunidades com as
Artigo 28 demais pessoas, e enco- rajar sua participação nas
Padrão de vida e proteção social adequados questões públicas, mediante:
i) Participação em organizações não
1. Os Estados Partes reconhecem o direito das governamentais relacionadas com a vida pública e política
pessoas com deficiência a um padrão adequado de vida do país, bem como em atividades e administração de
para si e para suas famílias, inclusive alimentação, vestuário e partidos políticos; e
moradia adequa- dos, bem como à melhoria contínua de suas ii) Formação de organizações para representar
condições de vida, e tomarão as providências necessárias para pessoas com deficiência em níveis internacional, regional,
salvaguardar e pro- mover a realização desse direito sem nacional e local, bem como a filiação de pessoas com
discriminação baseada na deficiência. deficiência a tais organizações.
2. Os Estados Partes reconhecem o direito das
pessoas com deficiência à proteção social e ao exercício Artigo 30
desse direito sem discriminação baseada na deficiência, e Participação na vida cultural e em recreação, lazer
tomarão as medidas apropriadas para salvaguardar e e esporte
promover a realização desse di- reito, tais como:
a. Assegurar igual acesso de pessoas com deficiência 1. Os Estados Partes reconhecem o direito das
a serviços de saneamento básico e assegurar o acesso aos pessoas com deficiência de participar na vida cultural, em
serviços, dispositivos e outros atendimentos apropriados para igualdade de oportunidades com as demais pessoas, e
as necessi- dades relacionadas com a deficiência; tomarão todas as medidas apropriadas para que as
pessoas com deficiência possam:
b. Assegurar o acesso de pessoas com deficiência,
particu- larmente mulheres, crianças e idosos com deficiência, a a. Ter acesso a bens culturais em formatos acessíveis;
progra- mas de proteção social e de redução da pobreza; b. Ter acesso a programas de televisão, cinema,
c. Assegurar o acesso de pessoas com deficiência e suas teatro e outras atividades culturais, em formatos
famílias em situação de pobreza à assistência do Estado em acessíveis; e
rela- ção a seus gastos ocasionados pela deficiência, inclusive c. Ter acesso a locais que ofereçam serviços ou
treina- mento adequado, aconselhamento, ajuda financeira even- tos culturais, tais como teatros, museus, cinemas,
abrigamento; bibliotecas e pontos turísticos, bem como, tanto quanto
d. Assegurar o acesso de pessoas com deficiência a possível, ter o acesso a monumentos e locais de
programas habitacionais públicos; e importância cultural nacio- nal.
e. Assegurar igual acesso de pessoas com 2. Os Estados Partes tomarão medidas apropriadas
deficiência a programas e benefícios de aposentadoria. para que as pessoas com deficiência tenham a
oportunida- de de desenvolver e utilizar seu potencial
criativo, artístico e intelectual, não somente em benefício
próprio, mas também para o enriquecimento da
sociedade.
186
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

3. Os Estados Partes deverão tomar todas as


Artigo 32
providên- cias, em conformidade com o direito
internacional, para asse- gurar que a legislação de proteção Cooperação internacional
dos direitos de proprieda- de intelectual não constitua
barreira excessiva ou discrimina- tória ao acesso de 1. Os Estados Partes reconhecem a importância da
pessoas com deficiência a bens culturais. cooperação internacional e de sua promoção, em apoio
4. As pessoas com deficiência farão jus, em aos esforços nacionais para a consecução do propósito e
igualdade de oportunidades com as demais pessoas, a dos objetivos da presente Convenção e, sob este aspecto,
que sua iden- tidade cultural e linguística específica seja adotarão medidas apropriadas e efetivas entre os Estados
reconhecida e apoiada, incluindo as línguas de sinais e a e, de maneira adequada, em parceria com organizações
cultura surda. in- ternacionais e regionais relevantes e com a sociedade
5. Para que as pessoas com deficiência participem, civil e, em particular, com organizações de pessoas com
em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, defi- ciência. Estas medidas poderão incluir, entre outras:
de ati- vidades recreativas, esportivas e de lazer, os a. Assegurar que a cooperação internacional,
Estados Partes tomarão medidas apropriadas para: incluin- do os programas internacionais de
a. Incentivar e promover a maior participação desenvolvimento, sejam inclusiva e acessível para pessoas
possível das pessoas com deficiência nas atividades com deficiência;
esportivas co- muns em todos os níveis; b. Facilitar e apoiar a capacitação, inclusive por meio
b. Assegurar que as pessoas com deficiência tenham do intercâmbio e compartilhamento de informações,
a oportunidade de organizar, desenvolver e participar em expe- riências, programas de treinamento e melhores
ati- vidades esportivas e recreativas específicas às práticas;
deficiências e, para tanto, incentivar a provisão de c. Facilitar a cooperação em pesquisa e o acesso a
instrução, treinamento e recursos adequados, em conhecimentos científicos e técnicos;
igualdade de oportunidades com as demais pessoas; d. Propiciar, de maneira apropriada, assistência téc-
c. Assegurar que as pessoas com deficiência nica e financeira, inclusive mediante facilitação do acesso
tenham acesso a locais de eventos esportivos, recreativos e a tecnologias assistivas e acessíveis e seu
turísticos; compartilhamento, bem como por meio de transferência
d. Assegurar que as crianças com deficiência de tecnologias.
possam, em igualdade de condições com as demais 2. O disposto neste Artigo se aplica sem prejuízo
crianças, partici- par de jogos e atividades recreativas, das obrigações que cabem a cada Estado Parte em
esportivas e de lazer, inclusive no sistema escolar; decorrência da presente Convenção.
e. Assegurar que as pessoas com deficiência
tenham acesso aos serviços prestados por pessoas ou Artigo 33
entidades en- volvidas na organização de atividades Implementação e monitoramento nacionais
recreativas, turísticas, esportivas e de lazer.
1. Os Estados Partes, de acordo com seu sistema or-
Artigo 31 ganizacional, designarão um ou mais de um ponto focal
Estatísticas e coleta de dados no âmbito do Governo para assuntos relacionados com a
implementação da presente Convenção e darão a devida
1. Os Estados Partes coletarão dados apropriados, consideração ao estabelecimento ou designação de um
in- clusive estatísticos e de pesquisas, para que possam mecanismo de coordenação no âmbito do Governo, a fim
formular e implementar políticas destinadas a pôr em de facilitar ações correlatas nos diferentes setores e níveis.
prática a pre- sente Convenção. O processo de coleta e 2. Os Estados Partes, em conformidade com seus
manutenção de tais dados deverá: sis- temas jurídico e administrativo, manterão,
a. Observar as salvaguardas estabelecidas por lei, fortalecerão, de- signarão ou estabelecerão estrutura,
in- clusive pelas leis relativas à proteção de dados, a fim incluindo um ou mais de um mecanismo independente,
de as- segurar a confidencialidade e o respeito pela de maneira apropriada, para promover, proteger e
privacidade das pessoas com deficiência; monitorar a implementação da presente Convenção. Ao
b. Observar as normas internacionalmente aceitas designar ou estabelecer tal me- canismo, os Estados
para proteger os direitos humanos, as liberdades Partes levarão em conta os princípios relativos ao status e
fundamen- tais e os princípios éticos na coleta de dados e funcionamento das instituições nacio- nais de proteção e
utilização de estatísticas. promoção dos direitos humanos.
2. As informações coletadas de acordo com o 3. A sociedade civil e, particularmente, as pessoas
disposto neste Artigo serão desagregadas, de maneira com deficiência e suas organizações representativas serão
apropriada, e utilizadas para avaliar o cumprimento, por envolvidas e participarão plenamente no processo de mo-
parte dos Estados Partes, de suas obrigações na presente nitoramento.
Convenção e para identificar e enfrentar as barreiras com
as quais as pessoas com deficiência se deparam no Artigo 34
exercício de seus direitos. Comitê sobre os Direitos das Pessoas com Deficiên-
3. Os Estados Partes assumirão responsabilidade cia
pela disseminação das referidas estatísticas e assegurarão
que elas sejam acessíveis às pessoas com deficiência e a 1. Um Comitê sobre os Direitos das Pessoas com
outros. De- ficiência (doravante denominado “Comitê”) será
estabele- cido, para desempenhar as funções aqui
definidas.
187
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

2. O Comitê será constituído, quando da entrada em


vi- gor da presente Convenção, de 12 peritos. Quando a 13. Os membros do Comitê terão direito aos privilé-
presente Convenção alcançar 60 ratificações ou adesões, o gios, facilidades e imunidades dos peritos em missões das
Comitê será acrescido em seis membros, perfazendo o total Nações Unidas, em conformidade com as disposições per-
de 18 membros. tinentes da Convenção sobre Privilégios e Imunidades das
3. Os membros do Comitê atuarão a título pessoal e Nações Unidas.
apresentarão elevada postura moral, competência e
Artigo 35
experiência reconhecidas no campo abrangido pela
presente Convenção. Relatórios dos Estados Partes
Ao designar seus candidatos, os Estados Partes são
instados a dar a devida consideração ao disposto no 1. Cada Estado Parte, por intermédio do Secretário-
Artigo -Geral das Nações Unidas, submeterá relatório abrangente
4.3 da presente Convenção. sobre as medidas adotadas em cumprimento de suas
4. Os membros do Comitê serão eleitos pelos obri- gações estabelecidas pela presente Convenção e
Estados Partes, observando-se uma distribuição geográfica sobre o progresso alcançado nesse aspecto, dentro do
equitativa, representação de diferentes formas de civilização e período de dois anos após a entrada em vigor da presente
dos princi- pais sistemas jurídicos, representação equilibrada Convenção para o Estado Parte concernente.
de gênero e participação de peritos com deficiência. 2. Depois disso, os Estados Partes submeterão re-
5. Os membros do Comitê serão eleitos por votação latórios subsequentes, ao menos a cada quatro anos, ou
se- creta em sessões da Conferência dos Estados Partes, a quando o Comitê o solicitar.
partir de uma lista de pessoas designadas pelos Estados 3. O Comitê determinará as diretrizes aplicáveis ao
Partes entre seus nacionais. Nessas sessões, cujo quorum teor dos relatórios.
será de dois terços dos Estados Partes, os candidatos eleitos 4. Um Estado Parte que tiver submetido ao Comitê
para o Comitê serão aque- les que obtiverem o maior um relatório inicial abrangente não precisará, em relató-
número de votos e a maioria absolu- ta dos votos dos rios subsequentes, repetir informações já apresentadas.
representantes dos Estados Partes presentes e votantes. Ao elaborar os relatórios ao Comitê, os Estados Partes são
6. A primeira eleição será realizada, o mais tardar, até instados a fazê-lo de maneira franca e transparente e a le-
seis meses após a data de entrada em vigor da presente var em consideração o disposto no Artigo 4.3 da presente
Convenção. Pelo menos quatro meses antes de cada eleição, Convenção.
o Secretário- 5. Os relatórios poderão apontar os fatores e as difi-
-Geral das Nações Unidas dirigirá carta aos Estados Partes, culdades que tiverem afetado o cumprimento das obriga-
con- vidando-os a submeter os nomes de seus candidatos no ções decorrentes da presente Convenção.
prazo de dois meses. O Secretário-Geral, subsequentemente,
prepa- rará lista em ordem alfabética de todos os candidatos Artigo 36
apresen- tados, indicando que foram designados pelos Consideração dos relatórios
Estados Partes, e submeterá essa lista aos Estados Partes da
presente Convenção. 1. Os relatórios serão considerados pelo Comitê,
7. Os membros do Comitê serão eleitos para que fará as sugestões e recomendações gerais que julgar
mandato de quatro anos, podendo ser candidatos à pertinentes e as transmitirá aos respectivos Estados Partes.
reeleição uma única vez. Contudo, o mandato de seis dos O Estado Parte poderá responder ao Comitê com as in-
membros eleitos na pri- meira eleição expirará ao fim de formações que julgar pertinentes. O Comitê poderá pedir
dois anos; imediatamente após a primeira eleição, os nomes informações adicionais ao Estados Partes, referentes à im-
desses seis membros serão sele- cionados por sorteio pelo plementação da presente Convenção.
presidente da sessão a que se refere o parágrafo 5 deste 2. Se um Estado Parte atrasar consideravelmente a
Artigo. entrega de seu relatório, o Comitê poderá notificar esse
8. A eleição dos seis membros adicionais do Comitê Es- tado de que examinará a aplicação da presente
será realizada por ocasião das eleições regulares, de acordo Convenção com base em informações confiáveis de que
com as disposições pertinentes deste Artigo. disponha, a menos que o relatório devido seja
9. Em caso de morte, demissão ou declaração de apresentado pelo Esta- do dentro do período de três
um membro de que, por algum motivo, não poderá meses após a notificação. O Comitê convidará o Estado
continuar a exercer suas funções, o Estado Parte que o Parte interessado a participar
tiver indicado de- signará um outro perito que tenha as desse exame. Se o Estado Parte responder entregan-
qualificações e satisfaça aos requisitos estabelecidos pelos do seu relatório, aplicar-se-á o disposto no parágrafo 1 do
dispositivos pertinentes deste Artigo, para concluir o presente artigo.
mandato em questão. 3. O Secretário-Geral das Nações Unidas colocará os
10. O Comitê estabelecerá suas próprias normas de relatórios à disposição de todos os Estados Partes.
pro- cedimento. 4. Os Estados Partes tornarão seus relatórios ampla-
11. O Secretário-Geral das Nações Unidas proverá o mente disponíveis ao público em seus países e facilitarão
pes- soal e as instalações necessários para o efetivo o acesso à possibilidade de sugestões e de
desempenho das funções do Comitê segundo a presente recomendações gerais a respeito desses relatórios.
Convenção e convocará sua primeira reunião.
12. Com a aprovação da Assembleia Geral, os
membros do Comitê estabelecido sob a presente
Convenção receberão emolumentos dos recursos das
Nações Unidas, sob termos e condições que a Assembleia
possa decidir, tendo em vista a importância das
responsabilidades do Comitê.
188
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

5. O Comitê transmitirá às agências, fundos e pro-


Artigo 40
gramas especializados das Nações Unidas e a outras orga-
nizações competentes, da maneira que julgar apropriada, Conferência dos Estados Partes
os relatórios dos Estados Partes que contenham
demandas ou indicações de necessidade de consultoria 1. Os Estados Partes reunir-se-ão regularmente em
Conferência dos Estados Partes a fim de considerar
ou de assis- tência técnica, acompanhados de eventuais
matérias relativas à implementação da presente Convenção.
observações e sugestões do Comitê em relação às
referidas demandas ou indicações, a fim de que possam 2. O Secretário-Geral das Nações Unidas convocará,
dentro do período de seis meses após a entrada em vigor
ser consideradas.
da presente Convenção, a Conferência dos Estados Partes.
As re- uniões subsequentes serão convocadas pelo
Artigo 37
Secretário- Geral das Nações Unidas a cada dois anos ou
Cooperação entre os Estados Partes e o Comitê
conforme a decisão da Conferência dos Estados Partes.
1. Cada Estado Parte cooperará com o Comitê e au-
Artigo 41
xiliará seus membros no desempenho de seu mandato.
Depositário
2. Em suas relações com os Estados Partes, o
Comitê dará a devida consideração aos meios e modos de O Secretário-Geral das Nações Unidas será o depositário
aprimo- rar a capacidade de cada Estado Parte para a
da presente Convenção.
implementa- ção da presente Convenção, inclusive
mediante coopera- ção internacional.
Artigo 42
Assinatura
Artigo 38
Relações do Comitê com outros órgãos A presente Convenção será aberta à assinatura de
todos os Estados e organizações de integração regional na
A fim de promover a efetiva implementação da sede das Nações Unidas em Nova York a partir de 30 de
presen- te Convenção e de incentivar a cooperação março de 2007
internacional na esfera abrangida pela presente
Convenção: Artigo 43
a. As agências especializadas e outros órgãos das Consentimento em comprometer-se
Nações Unidas terão o direito de se fazer representar
quan- do da consideração da implementação de A presente Convenção será submetida à ratificação
disposições da presente Convenção que disserem respeito pelos Estados signatários e à confirmação formal por
aos seus res- pectivos mandatos. O Comitê poderá organizações de integração regional signatárias. Ela estará
convidar as agências especializadas e outros órgãos aberta à adesão de qualquer Estado ou organização de
competentes, segundo jul- gar apropriado, a oferecer integração regional que não a houver assinado.
consultoria de peritos sobre a implementação da
Convenção em áreas pertinentes a seus respectivos Artigo 44
mandatos. O Comitê poderá convidar agências Organizações de integração regional
especializadas e outros órgãos das Nações Unidas a apre-
sentar relatórios sobre a implementação da Convenção 1. “Organização de integração regional” será entendida
em áreas pertinentes às suas respectivas atividades como organização constituída por Estados soberanos de deter-
b. No desempenho de seu mandato, o Comitê con- minada região, à qual seus Estados membros tenham
sultará, de maneira apropriada, outros órgãos pertinentes delegado competência sobre matéria abrangida pela presente
instituídos ao amparo de tratados internacionais de direi- Convenção. Essas organizações declararão, em seus
tos humanos, a fim de assegurar a consistência de suas documentos de confir- mação formal ou adesão, o alcance de
respectivas diretrizes para a elaboração de relatórios, su- sua competência em rela- ção à matéria abrangida pela
gestões e recomendações gerais e de evitar duplicação e presente Convenção. Subsequen- temente, as organizações
superposição no desempenho de suas funções. informarão ao depositário qualquer alteração substancial no
âmbito de sua competência.
Artigo 39 2. As referências a “Estados Partes” na presente
Relatório do Comitê Con- venção serão aplicáveis a essas organizações, nos
limites da competência destas.
A cada dois anos, o Comitê submeterá à Assembleia 3. Para os fins do parágrafo 1 do Artigo 45 e dos
Geral e ao Conselho Econômico e Social um relatório de pa- rágrafos 2 e 3 do Artigo 47, nenhum instrumento
suas atividades e poderá fazer sugestões e depositado por organização de integração regional será
recomendações gerais baseadas no exame dos relatórios computado.
e nas informações recebidas dos Estados Partes. Estas 4. As organizações de integração regional, em maté-
sugestões e recomen- dações gerais serão incluídas no rias de sua competência, poderão exercer o direito de voto
relatório do Comitê, acom- panhadas, se houver, de na Conferência dos Estados Partes, tendo direito ao mesmo
comentários dos Estados Partes. nú- mero de votos quanto for o número de seus Estados
membros que forem Partes da presente Convenção. Essas
organizações não exercerão seu direito de voto, se qualquer
de seus Estados membros exercer seu direito de voto, e
vice-versa.
189
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Artigo 45
Entrada em Artigo 48
vigor Denúncia

1. A presente Convenção entrará em vigor no Qualquer Estado Parte poderá denunciar a presente
trigési- mo dia após o depósito do vigésimo instrumento Convenção mediante notificação por escrito ao
de ratifi- cação ou adesão. Secretário-
2. Para cada Estado ou organização de integração -Geral das Nações Unidas. A denúncia tornar- se-á efetiva
regional que ratificar ou formal- mente confirmar a um ano após a data de recebimento da notificação pelo
presen- te Convenção ou a ela aderir após o depósito do Secretário- Geral.
referido vigésimo instrumento, a Convenção entrará em
Artigo 49
vigor no trigésimo dia a partir da data em que esse Estado
ou orga- nização tenha depositado seu instrumento de Formatos acessíveis
ratificação, confirmação formal ou adesão
Artigo 46 O texto da presente Convenção será colocado à
Reservas dispo- sição em formatos acessíveis.
1. Não serão permitidas reservas incompatíveis com
o objeto e o propósito da presente Convenção. Artigo 50
2. As reservas poderão ser retiradas a qualquer mo- Textos autênticos
mento.
Os textos em árabe, chinês, espanhol, francês, inglês e
Artigo 47 russo da presente Convenção serão igualmente
Emendas autênticos. Em testemunho disso, os plenipotenciários
abaixo assi- nados, sendo devidamente autorizados para
1. Qualquer Estado Parte poderá propor emendas à tanto por seus
presente Convenção e submetê-las ao Secretário-Geral respectivos Governos, firmaram a presente Convenção.
das Nações Unidas. O Secretário-Geral comunicará aos
Estados Partes quaisquer emendas propostas, solicitando- Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direi-
lhes que o notifiquem se são favoráveis a uma tos das Pessoas com Deficiência
Conferência dos Esta- dos Partes para considerar as
propostas e tomar decisão a respeito delas. Se, até quatro Os Estados Partes do presente Protocolo acordaram o
meses após a data da referida comunicação, pelo menos seguinte:
um terço dos Estados Partes se manifestar favorável a essa
Conferência, o Secretário-Geral das Nações Unidas ARTIGO 1
convocará a Conferência, sob os aus- pícios das Nações
Unidas. Qualquer emenda adotada por maioria de dois 1. Qualquer Estado Parte do presente Protocolo
terços dos Estados Partes presentes e vo- tantes será (“Es- tado Parte”) reconhece a competência do Comitê
submetida pelo Secretário-Geral à aprovação da sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (“Comitê”)
Assembleia Geral das Nações Unidas e, posteriormente, à para rece- ber e considerar comunicações submetidas por
aceitação de todos os Estados Partes. pessoas ou grupos de pessoas, ou em nome deles,
2. Qualquer emenda adotada e aprovada conforme sujeitos à sua juris- dição, alegando serem vítimas de
o disposto no parágrafo 1 do presente artigo entrará em violação das disposições da Convenção pelo referido
vigor no trigésimo dia após a data na qual o número de Estado Parte.
instrumentos de aceitação tenha atingido dois terços do 2. O Comitê não receberá comunicação referente a
número de Estados Partes na data de adoção da emenda. qualquer Estado Parte que não seja signatário do presente
Posteriormente, a emenda entrará em vigor para todo Protocolo.
Esta- do Parte no trigésimo dia após o depósito por esse
Estado do seu instrumento de aceitação. A emenda será ARTIGO 2
vinculante somente para os Estados Partes que a tiverem
aceitado. O Comitê considerará inadmissível a comunicação
3. Se a Conferência dos Estados Partes assim o de- quando:
cidir por consenso, qualquer emenda adotada e aprovada a. A comunicação for anônima;
em conformidade com o disposto no parágrafo 1 deste b. A comunicação constituir abuso do direito de
Artigo, relacionada exclusivamente com os artigos 34, 38, sub- meter tais comunicações ou for incompatível com as
39 e 40, entrará em vigor para todos os Estados Partes no dispo- sições da Convenção;
trigésimo dia a partir da data em que o número de instru- c. A mesma matéria já tenha sido examinada pelo
mentos de aceitação depositados tiver atingido dois Comitê ou tenha sido ou estiver sendo examinada sob ou-
terços do número de Estados Partes na data de adoção da tro procedimento de investigação, ou resolução
emen- da. internacio- nal;
d. Não tenham sido esgotados todos os recursos
internos disponíveis, salvo no caso em que a tramitação
desses recursos se prolongue sem justificativa, ou seja im-
provável que se obtenha com eles solução efetiva;

190
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

e. A comunicação estiver fundamentada


ARTIGO 7
precariamente
ou não for suficientemente substanciada; ou
1. O Comitê poderá convidar o Estado Parte concer-
f. Os fatos que motivaram a comunicação tenham nente a incluir em seu relatório, submetido em
ocor- rido antes da entrada em vigor do presente Protocolo conformidade com o disposto no Artigo 35 da Convenção,
para o Es- tado Parte em apreço, salvo se os fatos continuaram pormenores a respeito das medidas tomadas em
ocorrendo após aquela data. consequência da investi- gação realizada em conformidade
com o Artigo 6 do presente Protocolo.
ARTIGO 3 2. Caso necessário, o Comitê poderá, encerrado o
pe- ríodo de seis meses a que se refere o parágrafo 4 do
Sujeito ao disposto no Artigo 2 do presente Protocolo, o Artigo 6, convidar o Estado Parte concernente a informar o
Co- mitê levará confidencialmente ao conhecimento do Comitê a respeito das medidas tomadas em consequência
Estado Parte concernente qualquer comunicação submetida da referida investigação.
ao Comitê. Den- tro do período de seis meses, o Estado
concernente submeterá ao Comitê explicações ou declarações
ARTIGO 8
por escrito, esclarecendo a matéria e a eventual solução
adotada pelo referido Estado.
Qualquer Estado Parte poderá, quando da assinatura
ou ratificação do presente Protocolo ou de sua adesão a
ARTIGO 4 ele, de- clarar que não reconhece a competência do
Comitê, a que se referem os Artigos 6 e 7.
1. A qualquer momento após receber uma comunicação
e antes de decidir o mérito dessa comunicação, o Comitê
ARTIGO 9
poderá transmitir ao Estado Parte concernente, para sua
urgente consi- deração, um pedido para que o Estado Parte O Secretário-Geral das Nações Unidas será o
tome as medidas de natureza cautelar que forem necessárias depositário do presente Protocolo.
para evitar possíveis danos irreparáveis à vítima ou às vítimas
da violação alegada. ARTIGO 10
2. O exercício pelo Comitê de suas faculdades O presente Protocolo será aberto à assinatura dos Es-
discricionárias em virtude do parágrafo 1 do presente Artigo tados e organizações de integração regional signatários
não implicará prejuízo algum sobre a admissibilidade ou sobre da Convenção, na sede das Nações Unidas em Nova York, a
o mérito da comunicação. par- tir de 30 de março de 2007.
ARTIGO 5 ARTIGO 11
O Comitê realizará sessões fechadas para examinar O presente Protocolo estará sujeito à ratificação pelos
comuni- cações a ele submetidas em conformidade com o Estados signatários do presente Protocolo que tiverem ra-
presente Pro- tocolo. Depois de examinar uma comunicação, tificado a Convenção ou aderido a ela. Ele estará sujeito à
o Comitê enviará suas sugestões e recomendações, se confirmação formal por organizações de integração
houver, ao Estado Parte concernente e ao requerente. regional signatárias do presente Protocolo que tiverem
formalmente confirmado a Convenção ou a ela aderido. O
ARTIGO 6 Protocolo ficará aberto à adesão de qualquer Estado ou
organização de inte- gração regional que tiver ratificado
1. Se receber informação confiável indicando que um ou formalmente confir- mado a Convenção ou a ela
Esta- do Parte está cometendo violação grave ou sistemática aderido e que não tiver assinado o Protocolo.
de direitos estabelecidos na Convenção, o Comitê convidará o
referido Estado Parte a colaborar com a verificação da
ARTIGO 12
informação e, para tanto, a submeter suas observações a
respeito da informação em pauta. 1. “Organização de integração regional” será
2. Levando em conta quaisquer observações que entendida como organização constituída por Estados
tenham sido submetidas pelo Estado Parte concernente, soberanos de de- terminada região, à qual seus Estados
bem como quaisquer outras informações confiáveis em membros tenham dele- gado competência sobre matéria
poder do Comitê, este poderá designar um ou mais de seus abrangida pela Convenção e pelo presente Protocolo. Essas
membros para realizar investigação e apresentar, em caráter organizações declararão, em seus documentos de
de urgência, relatório ao Comitê. Caso se justifique e o confirmação formal ou adesão, o alcan- ce de sua
Estado Parte o consinta, a investi- gação poderá incluir uma competência em relação à matéria abrangida pela
visita ao território desse Estado. Convenção e pelo presente Protocolo. Subsequentemente,
3. Após examinar os resultados da investigação, o as organizações informarão ao depositário qualquer
Comitê os comunicará ao Estado Parte concernente, alteração substancial no al- cance de sua competência.
acompanhados de eventuais comentários e recomendações. 2. As referências a “Estados Partes” no presente Pro-
z Dentro do período de seis meses após o recebimento tocolo serão aplicáveis a essas organizações, nos limites
dos resultados, comentários e recomendações transmitidos da competência de tais organizações.
pelo Comitê, o Estado Parte concernente submeterá suas
observa- ções ao Comitê.
5. A referida investigação será realizada confidencial-
mente e a cooperação do Estado Parte será solicitada em
todas as fases do processo.
19
1
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

3. Para os fins do parágrafo 1 do Artigo 13 e do


pará- grafo 2 do Artigo 15, nenhum instrumento ARTIGO 16
depositado por organização de integração regional será
computado. Qualquer Estado Parte poderá denunciar o presente
4. As organizações de integração regional, em Protocolo mediante notificação por escrito ao Secretário-
maté- rias de sua competência, poderão exercer o direito -Geral das Nações Unidas. A denúncia tornar-se-á efetiva
de voto na Conferência dos Estados Partes, tendo direito um ano após a data de recebimento da notificação pelo
ao mes- mo número de votos que seus Estados membros Secretário-Geral.
que fo- rem Partes do presente Protocolo. Essas
organizações não exercerão seu direito de voto se ARTIGO 17
qualquer de seus Estados membros exercer seu direito de
voto, e vice-versa. O texto do presente Protocolo será colocado à
disposi- ção em formatos acessíveis.
ARTIGO 13
ARTIGO 18
1. Sujeito à entrada em vigor da Convenção, o pre-
sente Protocolo entrará em vigor no trigésimo dia após o Os textos em árabe, chinês, espanhol, francês, inglês e
depósito do décimo instrumento de ratificação ou adesão. russo do presente Protocolo serão igualmente autênticos.
2. Para cada Estado ou organização de integração Em testemunho disso, os plenipotenciários abaixo
regional que ratificar ou formalmente confirmar o assi- nados, sendo devidamente autorizados para tanto
presente Protocolo ou a ele aderir depois do depósito do por seus respectivos governos, firmaram o presente
décimo instrumento dessa natureza, o Protocolo entrará Protocolo.
em vigor no trigésimo dia a partir da data em que esse
Estado ou organização tenha depositado seu instrumento Protocolo aprovado, juntamente com a Convenção
de ratifica- ção, confirmação formal ou adesão. so- bre os Direitos da Pessoa com Deficiência,
pela Assembleia Geral das Nações Unidas no dia 6 de
ARTIGO 14 dezembro de 2006, através da resolução A/61/61
DECRETO LEGISLATIVO Nº 186, DE 9 DE JULHO DE 2008
1. Não serão permitidas reservas incompatíveis com
o objeto e o propósito do presente Protocolo. Faço saber que o Congresso Nacional aprovou, e eu,
2. As reservas poderão ser retiradas a qualquer mo- Garibaldi Alves Filho, Presidente do Senado Federal, con-
mento. forme o disposto no art. 5º, § 3º, da Constituição Federal e
nos termos do art. 48, inciso XXVIII, do Regimento Interno,
ARTIGO 15 promulgo o seguinte

1. Qualquer Estado Parte poderá propor emendas DECRETO LEGISLATIVO Nº 186, DE 2008
ao presente Protocolo e submetê-las ao Secretário-Geral
das Nações Unidas. O Secretário-Geral comunicará aos Aprova o texto da Convenção sobre os Direitos das
Estados Partes quaisquer emendas propostas, solicitando- Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo,
lhes que o notifiquem se são favoráveis a uma as- sinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007.
Conferência dos Es- tados Partes para considerar as
propostas e tomar decisão a respeito delas. Se, até quatro O Congresso Nacional decreta:
meses após a data da refe- rida comunicação, pelo menos
um terço dos Estados Partes se manifestar favorável a Art. 1º Fica aprovado, nos termos do § 3º do art. 5º da
essa Conferência, o Secretário- Constituição Federal, o texto da Convenção sobre os
-Geral das Nações Unidas convocará a Conferência, sob os Direi- tos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo
auspícios das Nações Unidas. Qualquer emenda adotada Facul- tativo, assinados em Nova Iorque, em 30 de março
por maioria de dois terços dos Estados Partes presentes e de 2007. Parágrafo único. Ficam sujeitos à aprovação do
votantes será submetida pelo Secretário-Geral à Con- gresso Nacional quaisquer atos que alterem a
aprovação da Assembleia Geral das Nações Unidas e, referida Con- venção e seu Protocolo Facultativo, bem
posteriormente, à aceitação de todos os Estados Partes como quaisquer outros ajustes complementares que, nos
2. Qualquer emenda adotada e aprovada conforme termos do inciso I do caput do art. 49 da Constituição
o disposto no parágrafo 1 do presente artigo entrará em Federal, acarretem en- cargos ou compromissos gravosos
vigor no trigésimo dia após a data na qual o número de ao patrimônio nacional.
instrumentos de aceitação tenha atingido dois terços do Art. 2º Este Decreto Legislativo entra em vigor na data
número de Estados Partes na data de adoção da emenda. de sua publicação.
Posteriormente, a emenda entrará em vigor para todo
Esta- do Parte no trigésimo dia após o depósito por esse Senado Federal, em 9 de julho de 2008. Senador
Estado do seu instrumento de aceitação. A emenda será GARI- BALDI ALVES FILHO
vinculante somente para os Estados Partes que a tiverem
aceitado. Presidente do Senado Federal

192
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Diário Oficial da União - Ano CXLV - nº 131 – 10 de


julho de 2008 Atos do Congresso Nacional PERRENOUD, PHILIPPE. “10 NOVAS COMPETÊNCIAS
DECRETO Nº 6.949, DE 25 DE AGOSTO DE 2009 PARA ENSINAR”. PORTO ALEGRE. ARTMED.

Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos


das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo,
assinados em Nova York, em 30 de março de 2007

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição Prezado Candidato, devido a complexibilidade e


que lhe confere o art. 84, inciso IV, da Constituição, e formato do conteúdo em questão , disponibilizaremos
o PDF em nosso para que assim não haja prejuízos em
Considerando que o Congresso Nacional aprovou, por seus estudos site
meio do Decreto Legislativo no 186, de 9 de julho de
2008, conforme o procedimento do § 3º do art. 5º da www.novaconcursos.com.br/retificacoes, para con-
Constitui- ção, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas sulta.
com De- ficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados
em Nova York, em 30 de março de 2007;
Considerando que o Governo brasileiro depositou PERRENOUD, PHILIPPE. FORMANDO
o instrumento de ratificação dos referidos atos junto ao PROFESSORESPROFISSIONAIS,PORTOALEGRE.
Secretário-Geral das Nações Unidas em 1o de agosto de ARTMED-ARTES MÉDICAS SUL, 2001 - EDIÇÃO
2008; REVISADA. MOREIRA, ANTONIO FLÁVIO B. (ORG.) –
Considerando que os atos internacionais em apreço CURRÍCULO – QUESTÕES ATUAIS – PAPIRUS EDITORA.
entraram em vigor para o Brasil, no plano jurídico externo,
em 31 de agosto de 2008;

DECRETA:

Art. 1o A Convenção sobre os Direitos das Pessoas


com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, apensos por INTRODUÇÃO
cópia ao presente Decreto, serão executados e cumpridos
tão in- teiramente como neles se contém.
Art. 2o São sujeitos à aprovação do Congresso Nacio- A análise do livro Formando Professores Profissionais,
nal quaisquer atos que possam resultar em revisão dos re- Quais estratégias?, Quais competências? de Léopolf PA-
feridos diplomas internacionais ou que acarretem QUAY, Philippe PERRENOUD, Marguerite ALTET e Évelyne
encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio CHARLIER, 2001, foi feita com base nas concepções de es-
nacional, nos termos do art. 49, inciso I, da Constituição. cola, ensino e aprendizagem.
Art. 3o Este Decreto entra em vigor na data de sua
pu- blicação. Formar profissionais capazes de organizar situações
de aprendizagem do maternal à universidade, sem limitar-
Brasília, 25 de agosto de 2009; 188o da Independência se ao uso de estereótipos e truques tão comuns é, ou
e 121o da República. deveria ser, a principal preocupação dos programas de
formação e formação continuada de professores.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA Vamos falar de professores profissionais e das com-
Celso Luiz Nunes Amorim petências que esses profissionais devem desenvolver para
exercer bem o ofício de ensinar.
Diário Oficial da União de 26.8.2009 1. Qual a natureza das competências do professor
especialista?
Consulte o texto do documento oficial do Governo 2. Como essas competências são adquiridas?
Fe- deral sobre a Convenção na página abaixo, acessada 3. Como organizar o aprendizado dessas compe-
em 11/04/2013. tências profissionais?
Doze pesquisadores e educadores belgas, canadenses,
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007- franceses e suíços, procuraram responder as três questões
2010/2009/decreto/d6949.htm enunciadas. Cada autor respondeu, a sua maneira, as três
questões a partir de seus próprios trabalhos de pesquisa
e experiências profissionais. Como conclusão, citaremos as
principais linhas que permeiam o debate, assim como as
incertezas que ainda permanecem.

193
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

1) AS COMPETÊNCIAS DO PROFESSOR
PROFISSIONAL: ENTRE CONHECIMENTOS, ESQUEMAS DE UMA FORMAÇÃO BASEADA NA ANÁLISE DAS PRÁTI-
AÇÃO E ADAP- TAÇÃO, SABER ANALISAR CAS E NA REFLEXÃO
Marguerite Altet
Análise das práticas está centrada num processo de
análise e reflexão das práticas vivenciadas. Em suas
Na França, com a nova Lei de Orientação para a Edu-
pesqui- sas e estudos, Altet construiu modelos que
cação, de 1989, o aluno passou a ser o centro do sistema
ajudam a ex- plicitar os conhecimentos empíricos
educacional. Fez-se necessário, segundo a autora, buscar
transformando-o em saberes pedagógicos que
os modelos sobre os quais se apoiam a profissão de edu-
contribuem na formatação das competências necessárias
cador. Após inúmeras pesquisas, a autora define o profis-
à formação docente.
sionalismo como um “processo de racionalização dos co-
nhecimentos postos em prática, somados às práticas que
2) TRABALHO DAS REPRESENTAÇÕES NA FORMAÇÃO
se mostraram eficazes em cada situação”. Para que isso
DOS PROFESSORES
ocorra, é necessário que a formação profissional una três
Simone Baillauqués
processos diferentes e suas respectivas lógicas: formação,
ação e pesquisa.
Simone Baillauqués estudou as competências profis-
sionais a partir do trabalho das representações dentro do
A ESPECIFICIDADE DA PROFISSÃO DE PROFESSOR ambiente de prática e formação de professores. Segundo
a autora, se por um lado diversos trabalhos causam
O professor profissional é um articulador do processo impacto sobre as competências exercidas ou adquiridas
de ensino aprendizagem. O ensino é um processo inter- pelos pro- fessores, por outro, não se sabe até que ponto
pessoal e intencional que utiliza a comunicação verbal e o essas com- petências encontram aderência junto à classe
discurso dialógico finalizado como meios para provocar, profissional. Dessa forma, aponta para a necessidade de
fa- vorecer e levar ao êxito a aprendizagem em dada se questionar as relações existentes entre pessoa e
situação; é uma prática relacional finalizada (Altet, 1994). profissão.
O que torna a tarefa do ensino específica é a necessi- Seu trabalho representa o professor como profissio-
dade de domínio, por parte do professor, da Didática e da nal crítico capaz de se auto avaliar e de tomar decisões de
Pedagogia. Enquanto a Didática trata da gestão da infor- acordo com preceitos éticos.
mação e sua transmissão ao aluno, a Pedagogia ocupa-se Baillauqués levanta algumas questões que devem ser
da transformação do Saber através de trocas cognitivas e consideradas no estudo das competências profissionais e
sócio afetivas. seus impactos reais na vida acadêmica.

AS COMPETÊNCIAS E OS CONHECIMENTOS DO PRO- Sobre o “Modelo” de Ensino e de Competências


FESSOR PROFISSIONAL
Até que ponto o modelo do profissional é explicitado,
Competência profissional está relacionada ao questionado, reconhecido e aceito? E por quem? (Hameli-
conjunto formado por conhecimento, habilidade, ne, 1985; Trousson, 1992).
posturas, além de ações e atitudes necessárias ao Segundo estudos recentes, para as séries mais adian-
exercício da profissão de professor. tadas o interesse pela disciplina é a principal motivação,
Para Beillerot (1989 e 1994), Saber é aquilo que para os que detêm maior currículo acadêmico, são os mais
um determinado sujeito é adquirido, construído, elabora- interes- sados, já que o “conhecimento maior” confere um
do, através do estudo ou da experiência. Diante disso, grau de domínio sobre os alunos.
Altet propõe a seguinte tipologia de saberes: Para os demais, resta sempre a dúvida sobre sua
capa- cidade e competência em atingir o modelo
1. OS SABERES TEÓRICOS proposto.
Os saberes a serem ensinados – didáticos.
Os saberes para ensinar – pedagógicos.
O Mestre (Re)Conhecido
2. OS SABERES PRÁTICOS
Os saberes sobre a prática – saberes
procedimen- tais, como fazer. Ensinar, antes de mais nada, é a prática da docência
Os saberes da prática – oriundos das em sala de aula. O professor tem seu estilo e representati-
experiências, vidade naquilo que é.
ações que tiveram êxito, da práxis.
Essa ideia influencia o imaginário do aluno de educa-
ção desde o início de seu aprendizado. Segundo a auto-
ra, outros aspectos que vivem no imaginário do docente,
desde sua formação até a prática em sala de aula, trazem
angustia e conflitos sobra a profissão como - “não vou
fazer história, vou ensinar”; modelo pedagógico aprendido
e aquele que é possível; defasagem de conteúdo a capaci-
dade de atualização.

194
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Diante disso, algumas prioridades na formação são


ne- cessárias: Percebemos no final do capitulo que, tanto o saber
- reforço nos conhecimentos e competências teórico como o pratico são importantes na formação de
adquiridas; professoras o movimento teoria pratica, pratica teoria são
- que respostas poderiam satisfazes as demandas mais fundamentais na formação de professores atuantes e re-
profundas frente à “formulação formal”; flexivos.
- concentrando-se nas competências profissionais, se
es- tão em conformidade com o ofício do professor.
4) FORMAÇÃO PRÁTICA DOS PROFESSORES E
Por fim, conclui-se que, todo investimento possível NASCI- MENTO DE UMA INTELIGÊNCIA PROFISSIONAL
deve ser feito na construção da identidade do profissional
en- quanto “projeto humano” e não apenas na elaboração Michel Carbonneau e Jean-Claude Hétu
de competências.
5) FORMAR PROFESSORES PROFISSIONAIS PARA
3) A FORMAÇÃO PARA A COMPLEXIDADE DO UMA FORMAÇÃO CONTÍNUA ARTICULADA À PRÁTICA
OFÍCIO DE PROFESSOR Évelyne Charlier

Louise Bélair Apesar do autor admitir que a formação de professo-


res profissionais é um tema polêmico, ele defende que o
A autora trata da dificuldade encontrada por alguns saber prático também recorre ao saber acadêmico ou aos
pro- fessores no período de estágio. Segundo eles, a saberes acadêmicos múltiplos, sem falar nos culturais
faculdade não oferece o suporte necessário para atender entre outros, e isso é o que está em discussão, a relação
as demandas no momento da pratica, levando alguns a entre o saber acadêmico e a prática profissional, ciência
concluírem que aprendiam mais no estagio que nas aulas aplicada, que será percebida ao longo da experiência da
teóricas. professora envolvida nesse projeto.
Para solucionar o problema, foi implantado o ensino A cada dia que passa a cada olhar sobre e para a edu-
in- tegrado à prática, tendo como principal objetivo cação, percebe-se que os profissionais do ensino são mais
integrar o ensino a pratica centrado na reflexão na ação, cobrados. São cobranças que derivam desde a eficácia do
onde seriam adquiridas competências gerais de base no seu trabalho, bem como exigências quanto a uma forma-
ensino para po- der apreender uma gestão de classe o ção mais sólida e representada por títulos acadêmicos. As
mais adequado possí- vel, em um tempo relativamente propostas que se reclamam do professor, mais que estar
curto. presente em sala de aula, entretanto, convidado a ver a
sua profissão como algo a ser zelado e adubado com
muito preparo teórico, há uma distinção entre professor e
educa- dor, ao afirmar que, “professor é profissão, não é
Para tanto foram estabelecidos alguns passos:
algo que se define por dentro, por amor. Educador, ao
contrário, não é profissão; é vocação. E toda uma vocação
1° Cada estagiário deveria ter seu próprio estilo para
en- sinar. nasce de um grande amor, de uma grande esperança” . A
2° contrapor teoria e pratica numa ação reflexiva. alternativa de crescimento tanto pessoal quanto
3° Desenvolver a autonomia, responsabilidade, intelectual e profissional do docente abrange perspectivas
tomada individuais e coletivas, quando as primeiras se justificam
pelo posicionamento do próprio “eu”, visando ao bem
de decisão, rapidez de ação e comunicação.
coletivo e as segundas se jus- tificam, mais
especificamente, pelos índices de colaboração e interação
Para tanto, o professor deveria estar aberto a
entre os profissionais da classe e sua flexibili- dade em
concepção de aprendizagem exigidas pelo Ministério da
partilhar experiências, sentimentos, fraquezas, ha-
Educação em seus programas de estudo que remete as
bilidades e competências que favoreçam ao corpo escolar,
teorias construtivis- tas e holística baseadas nas
propriamente dito.
transdisciplinaridade dos saberes transversais. O que se
refere ao ato de APRENDER. As exigências quanto à formação docente, não nas-
cem do acaso, apesar de, às vezes, serem consideradas
O ato de ENSINAR nessa concepção nada mais é do
desumanas, conforme as cobranças conhecidas na voz das
que facilitar o processo estimular, deixando de ser uma
agências internacionais, que datam início e fim para que o
transmis- são autoritária do saber.
processo transcorra, compreende-se a necessidade do
pro- fessor atualizar-se, no sentido de ministrar um ensino
Sendo assim, O SER PEDAGOGO denota um improvi-
que corresponda à formação do cidadão que a evolução
sador na gestão dos conteúdos, um especialista e ao mes-
social aponta. Discutir a questão da mudança e da
mo tempo alguém que respeita e sabe observar os
transformação implica em ver o primeiro termo como uma
conheci- mentos provenientes do censo comum, um
proposta a ser executada e, como toda proposta, está
pesquisador, um prático reflexivo, observando
permeada por me- tas, objetivos e passos que levam a um
competências essenciais para pratica do seu fazer
fim específico, que aqui, poderia ser colocado como o
pedagógico como as competências li- gadas a vida da
processo de graduação
classe, as competências identificadas com os alunos e suas
particularidades, as competências ligadas as disciplinas
ensinadas, as competências exigidas em relação a
sociedade em fim as competências internas a sua pessoa.
195
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

propriamente dito do professor. Para o segundo termo,


se- ria adequado pensar os resultados da ação docente. Philippe reforça outros aspectos discutíveis na esfera
Em linhas gerais, essa análise remete a noção de que educacional, um exemplo é a mentira, que para ele, esse
mudar é preciso, no entanto, deve ser um processo é um instrumento frequentemente usado pelos educan-
moldado pela transformação, que no caso do ensino, dos quando se vêm inquiridos de algo. O autor afirma que
traduz-se pela aqui- sição de um processo mais um espaço restrito como a sala de aula é difícil esconder
interiorizado: a aprendizagem. alguma coisa, principalmente do professor, consequente-
Eu acho que hoje, profissionalmente, em se tratan- mente essa pressão leva com que os alunos a mascararem
do de conhecimento e atualização, nunca se teve um tem- a verdade com falsas desculpas. Outro aspecto relevante
po como este, graças à globalização das informações e as defendido pelo escritor é a invasão do universo pessoal
possibilidades de pesquisa em diversas partes do mundo, do aluno por parte do educador. Relata que muitas vezes
sem sair de seu escritório ou de sua casa. Os educadores por necessidade ou pelo bem da criança o professor
de hoje têm a possibilidade de, cada vez, mais buscarem penetra nesse campo, e esse dilema é tido como normal
aperfeiçoamento de seus conhecimentos aumentando no campo pedagógico. O autor acrescenta que os
suas competências e quem ganha com isto são os alunos, conflitos devem ser dirimidos através da comunicação, no
pelo motivo de estarem diante de professores bem prepa- entanto, geralmente esta é usada para sufocá-los negá-
rados. Financeiramente, ainda há muito que se fazer, des- los. Em síntese, ao autor declara que esses dilemas não
de o ensino primário até o universitário. É impressionante podem ser superados ape- nas por terem sido discutidos,
que nosso governo ainda não tenha notado o poder que mas precisam de uma es- tratégia apropriada a cada caso,
a educação tem na formação de um país melhor e nem o estruturando-se, em uma linha mestra, pedagógica e ética.
quanto economizariam em programas sociais.
Infelizmente os jovens que estão entrando para o O autor questiona esse sistema arbitrário e propõe
Magistério hoje são claros e taxativos: “Não quero morrer análises dos fenômenos do poder e da autoridade. Ele
de fome dando aula”; “Quero trabalhar em museus ou pontua ainda que é problemático envolver os alunos em
laboratórios onde o salário valha a pena” e, pior ainda, um projeto sem privá-los do direito de conversar.
“Dar aulas para ser maltratado por alunos e ter uma Segundo o escritor o professor só aceita a espécie de
profissão totalmente desrespeitada?”. Não acredito que a comunicação dirigida por ele, contudo, Philippe adverte
motivação dos professores é a cau- que o educa- dor não deve dispor de seu poder de forma
sa, nem consequência. Muito mais que isso é um instru- excessiva para não restringir os educandos de liberdade e
mento didático, que torna o professor um elemento edu- emoção. Outro ponto focalizado pelo autor é a falta de
cativo, com capacidade de contagiar através de tempo e espaço para a iteratividade dos saberes do
persuasão. Uma vez que toda informação apresentada, de alunado, para que a comunicação flua de todos os
uma manei- ra que contenha emoção, é mais fácil de ser ângulos sem perder o fio condutor. Ressalta que esse
assimilada e difundida, não só no mercado educacional, processo dificulta a continui- dade do objetivo
mas em todos os contextos de expansão de informação. A pedagógico, reforçando o sentimento de impotência do
motivação é hoje elemento primordial para qualquer professor. Em síntese, ao autor declara que esses dilemas
profissional. Ela tem efeito contagiante, auxilia na não podem ser superados apenas por terem sido
credibilidade, mostra empenho e demonstra carisma, discutidos, mas precisam de uma estratégia apropria- da a
assim como interesse nos alunos. cada caso, estruturando-se, em uma linha mestra, pe-
A formação continuada se faz elo entre a profissão e dagógica e ética.
a construção da identidade do educador a formalizar a
dinâmica social do trabalho docente, especialmente pelo 6) CONDUTA CLÍNICA FORMAÇÃO E ESCRITA
seu caráter conjunto e pela interação da classe educativa Mireille Cifali
com vistas à melhoria da qualidade do ensino, rumo ao
alcance dos seus objetivos, os quais retratam como
função social para a escola a instrumentalização de um Segundo Cifali (2001), o ensino está assim como a clí-
ensino no qual se vivencie a garantia de uma educação nica, incluído entre os ofícios que lidam com o ser
para a vida, ou seja, que o que se aprenda na escola seja humano e o desafio nisso é que o outro, ou seja, o aluno,
útil na vida fora desta instituição. Devemos ter em mente tenha acesso ao saber, cresça, supere uma dificuldade
que os pro- fessores exercem um papel insubstituível no paralisante e cure-se.
processo da transformação social. A formação indenitária
do professor abrange o profissional, pois a docência vai “Hoje, é propriamente clínico aquilo que deseja
mais além do que somente dar aulas, constituiu apreender o sujeito (individual e/ou coletivo) através de
fundamentalmente a sua atuação profissional na prática um sistema de relações (constituído enquanto mecanismo,
social. isto é, no interior do qual o prático ou o pesquisador,
A formação dos educadores não se baseia apenas na assim como seus parceiros, se reconhecem efetivamente
racionalidade técnica , como apenas executores de deci- envolvi- dos, quer se trate de visar à evolução, ao
sões alheias, mas cidadãos com competência e habilidade desenvolvimento, à transformação desse sujeito ou à
na capacidade de decidir, produzindo novos conhecimen- produção de conheci- mento em si, como também para
tos para a teoria e prática de ensinar. ele ou para nós.” (Ardoi- no, 1989, p. 64 apud Cifali, 2001
p. 104)

196
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Para a autora em nossa relação com o outro ou com o


social temos uma relação muito afetiva, passional, na qual -refletidas que se operam na situação. Essa técnica deveria
somos deslumbrados por aquilo que somos. O papel do admitir compreender melhor a natureza das capacidades
profissional consiste, efetiva e continuamente, em se co- profissionais estabelecidas no âmbito de um curso de for-
locar a uma boa distância, sem imaginar estar a princípio mação. (FAINGOLD, 2001)
diferenciado. Ela conta ainda no texto que uma professora, com
Há em toda profissão que lida com o ser humano, um base em um diagnóstico individual conseguido de
trabalho contínuo de colocar luz nas nossas ações e maneira im- plícita, pôde modificar o sentido de sua ação
pensa- mentos, pois, segundo a autora, nada nos protege em plena rota, de maneira a adéqua-se aos novos
de uma derrapagem, por si ou pelo outro. (CIFALI 2001) indicadores de avalia- ção que se apresentavam à sua
percepção embora não pu- desse ter consciência de todo
esse processo. (FAINGOLD, 2001)
Entretanto quando se sugere manter a distância e re-
gulá-la de tempos em tempos, é porque essa atitude leva- Segundo Faingold, (2001) a decisão adotada pela pro-
fessora na experiência, deriva também de uma interpreta-
-nos a trabalhar nosso eu. Já que reconhecer nossos en-
volvimentos psíquicos em nosso ofício torna-nos menos ção psicológica muito perspicaz do comportamento, em
nocivos aos outros. (CIFALI 2001) que todo elemento não-habitual é colocado em destaque,
estocado na memória e tratado no período pertinente.
Quando ainda é iniciante no ofício, o professor esta-
Segundo a autora todo ofício possui ferramentas de
giário não dispõe de qualquer esquema de identificação
mediação, proposições indispensáveis. O ofício de profes-
sensorial, de pensamento ou de ação que lhe possibilite
sor exige, sem dúvida nenhuma, uma capacidade de pro-
responder através de ações pontuais à situação,
gramar, de preparar o que deveria ser, de ordenar, de pre-
mantendo a disponibilidade necessária para continuar a
ver as sequências e de esperar seus efeitos. Nos ofícios
levantar as informações pertinentes sobre o meio e sobre
que lidam com o ser humano fazemos apostas,
os efeitos de suas intervenções junto aos alunos.
trabalhamos com a probabilidade e o acaso, com uma
incompreensão crônica. Na incerteza, contudo, tomamos Por isso, é importante estabelecer, durante a
formação do professor, condições protegidas de ação e
sempre uma de- cisão. (CIFALI 2001)
de informa- ção que lhe permita começar e constituir esse
conjunto de esquemas profissionais e estoque de rotinas
Por isso um bom clínico é aquele que é autêntico, que
disponíveis, mas, sobretudo, acolher e tratar de forma
tem visão do todo, que alcança do interior algo que é es-
relacionada toda informação originária de sua turma.
sencialmente manifesto. Contudo a possibilidade de uma
(FAINGOLD, 2001)
formação clínica depende dos formadores. A qualidade de
sua afinidade com os saberes organizados, com os conhe-
cimentos da experiência e da alteridade evidentemente se 8) COMPETÊNCIAS PROFISSIONAIS PRIVILEGIADAS
NOS ESTÁGIOS E NA VIDEOFORMAÇÃO
refletem em sua concepção de formação e nos resultados
disso. (CIFALI 2001). Leópold Paquay e Marie-Cécile Wagner

Na formação de professores , coexistem vários para-


digmas que são relativos ao ofício de professor e a
7) DE ESTAGIARIO A ESPECIALISTA: CONTRUIR AS
nature- za do ensino. São eles: O professor culto é aquele
COMPETÊNCIAS PROFISSIONAIS
que do- mina os saberes (disciplinares e interdisciplinares,
Nadine Faingold
didáticos e epistemológicos, pedagógicos, psicológicos e
filosóficos) neste paradigma os estágios são segundos em
Segundo Faingold,(2001) a prática pedagógica é go-
importân- cia e duração em relação à formação teórica,
vernada pelo habitus do professor. A questão da
quando são realizados em campo vem após uma
explicação dos saberes da experiência, empregada pelos
formação disciplinar aprofundada e uma formação teórica
professores no exercício do seu ofício, está
pedagógica e me- todológica, oportunizam aplicar as
estritamente articulada à problemática da formação.
teorias anteriormente aprendidas. O professor técnico
Trazer à luz os esquemas e os saberes mobilizados em
coloca em prática o saber fazer técnico e aplica as regras
uma prática efetiva é um dos meios de elucidar de outro
formalizadas, a importân- cia dos estágios em campo é
modo a questão das compe- tências profissionais a serem
tida como um complemen- to a uma formação técnica e
adquiridas em um sistema de formação.
teórica. O professor prático artesão é aquele que utiliza
Para Faingold, (2001) é indispensável estabelecer um
rotinas e esquemas de ação contextualizados, neste
questionamento particular que torne possível uma passa-
paradigma a utilização dos está- gios é primordial pois,
gem do vivido para a representação, e depois para a
permitem que aqueles que estão iniciando possam
verba- lização, para que o sujeito tome consciência das
adquirir e automatizar os saberes práti- cos. O professor
operações mentais que atinge e dos conhecimentos que
prático reflexivo constitui para si um saber da experiência
mobiliza du- rante a ação.
através de uma reflexão sobre a prática, e seus efeitos
A autora apresenta no texto a técnica da entrevista de
produzem ferramentas inovadoras para tornar-
explicitação que é uma técnica de ajuda à verbalização
que admite justamente trazer à luz as condutas -se um professor pesquisador, o estágio é tido como um
momento de experimentação e base de uma reflexão. O
intelectuais pré-
professor como ator social analisa os desafios sociais das
situações cotidianas e envolve-se em projetos coletivos. A

197
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

importância dos estágios em campo na formação acon-


tecem como uma oportunidade de envolvimento em um HOFFMANN, JUSSARA – AVALIAÇÃO MEDIADORA –
ofício coletivo. O professor como pessoa está em EDITORA MEDIAÇÃO – 2000.
desenvol- vimento pessoal, na formação profissional
busca relacio- nar-se e comunicar-se com o outro. Os
estágios em campo são importantes como uma
oportunidade de afirmação do eu profissional e de
desenvolvimento pessoal, deve acon- tecer em diversos Esta obra discute a avaliação numa perspectiva cons-
momentos da formação e oportunizam a construção de trutivista que se contraponha à prática de avaliação tra-
uma identidade profissional. As práticas do microensino e dicional, buscando o sentido em direção a uma escola
da videoformação, constituem compe- tências e igualitária e libertadora desde a educação infantil, o
estratégias privilegiadas, pois é possível fazer variadas ensino fundamental, médio, até a universidade.
intervenções nos aprendizados profissionais dos O livro inicia com a discussão da escola de qualidade
professores em diversos momentos ,as funções atribuídas e sobre o compromisso de manter na escola o aluno favo-
a esta ferramenta nos processos de formação variam con- recendo-lhe de fato o acesso ao saber (não simplesmente
forme as concepções do oficio privilegiadas pela por promovê-lo), a outros graus de ensino, de permanên-
instituição de formação. Funcionam como instrumento de cia e continuidade nos estudos. Melhoria da qualidade do
análise efi- cazes , pois o registro em vídeo deixa uma ensino requer: escolaridade para todas as crianças e esco-
marca e permite a auto-observação retransmitida e las que compreendam essas crianças a ponto de auxiliá-
oferecem ao grupo em estágio a possibilidade de análise las a usufruir seu direito ao ensino fundamental no
de uma mesma situação pedagógica. sentido de sua promoção como cidadãos participantes
nesta socieda- de; que perceba a educação como direito
da criança cons- ciente desse direito.
9) O TRABALHO SOBRE O HABITUS NA FORMAÇÃO
DE PROFESSORES: ANÁLISE DAS PRÁTICAS E TOMADA DE Numa perspectiva construtivista da avaliação, a ques-
CONSCIÊNCIA tão da qualidade do ensino deve ser analisada em termos
dos objetivos efetivamente perseguidos no sentido do de-
Philippe Perrenoud
senvolvimento máximo possível dos alunos, à aprendiza-
gem, no seu sentido amplo, alcançada pela criança a par-
A ação pedagógica é constantemente controlada
tir das oportunidades que o meio lhe oferece.
pelos habitus (conjunto de esquemas de percepção,
avaliação, de pensamento e de ação),conforme quatro A qualidade do ensino na concepção classificatória, a
qualidade se refere a padrões preestabelecidos, em bases
mecanismos: a transformação de esquemas de ação em
comparativas: critérios de promoção, gabaritos de respos-
rotinas, ou seja, uma parte dos gestos do ofício são
tas, padrões de comportamento ideal. Uma qualidade que
rotinas que, embora não escapem completamente à
se confunde com quantidade.
consciência do sujeito ,já não exigem mais a mobilização
explícita de saberes e re- gras e mesmo quando se Qualidade, na perspectiva mediadora da avaliação,
sig- nifica desenvolvimento máximo possível, um
aplicam regras ,quando se mo- bilizam saberes ,a
permanente “vir a ser”, sem limites preestabelecidos,
identificação da situação e do momento oportuno
embora com ob- jetivos delineados e aceitação das pré-
depende do habitus, a parte menos consciente do habitus
condições sociocul- turais do educando.
intervém na microrregulação de toda a ação in- tencional
e racional, de toda conduta de projeto. Na gestão da A avaliação apresenta uma importância social e polí-
tica fundamental no fazer educativo vinculando-a a ideia
urgência, a improvisação é regulada por esquemas de
de qualidade. Avaliar qualitativamente significa um julga-
percepção, de decisão e de ação, que mobilizam frequen-
mento mais global e intenso, no qual o aluno é observado
temente o pensamento racional e os saberes explícitos do
como um ser integral, colocado em determinada situação
ator.
relacionada às expectativas do professor e também de-
les mesmos.
A autora pesquisou as causas do fracasso escolar
10) O PROFESSOR COMO “ATOR RACIONAL”: QUE
junto aos professores (30) de escolas estaduais de
RACIONALIDADE, QUE SABER, QUE JULGAMENTO?
educação in- fantil, ensino fundamental e médio, os quais
responderam:
Maurice Tardif e Clemont Gauthier 1. o aluno não se interessa pelo conteúdo da escola.
Fonte: http://umolharnaeducacao2013.blogspot. (10)
com/2013/06/intr-introducao-analise-do-livro.html 2. o aluno apresenta problemas de relacionamento
com professores e colegas. (10)
3. o aluno não apresenta maturidade. (06)
4. o aluno não tem oportunidade de expressar suas
ideias ao professor. (03)
5. o professor apresenta falta de conhecimento
quanto a questões de aprendizagem. (1)

198
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Percebe-se que alguns professores atribuem a


responsa- bilidade a si próprios, porém a maioria atribui a - em vez do certo/errado e da atribuição de pontos,
culpa aos alu- nos, os quais passam a ser um misto de réu fa- zer comentários sobre as tarefas dos alunos,
e vítima. auxiliando-os a localizar as dificuldades, oferecendo-lhes
Quem são os responsáveis pelo fracasso escolar: oportunidades de descobrirem melhores soluções – é
profes- sores, alunos ou sociedade? O compromisso do preciso ultrapassar a sistemática tradicional de buscar
professor diante da criança e do jovem deve proceder certos e errados em re- lação às respostas do aluno e
diante das dife- renças individuais dos alunos em relação a atribuir significado ao que se observa em sua tarefa,
todos os níveis so- cioculturais. Um dos princípios da valorizando ideia e dando im- portância a suas
teoria construtivista é fundamental para avaliação: o dificuldades. O respeito e a valorização de cada tarefa
indivíduo se dá por estágios evolutivos do pensamento a favorecem a expressão de crenças verdadeira- mente
partir de sua maturação e suas vivências. espontâneas.
Neste sentido, deve-se ter uma visão construtivista do - transformar os registros de avaliação em anotações
erro em termos da correção das tarefas feitas pelos alunos significativas sobre o acompanhamento dos alunos em
em todas as situações de aprendizagem. Os erros e as dú- seu processo de construção de conhecimento – os
vidas dos alunos são componentes significativos ao registros do professor devem responder às questões: O
desen- volvimento da ação educacional, pois permitirá ao aluno apren- deu? Ainda não aprendeu? Por que não
docente a observação e investigação de como o aluno se aprendeu? Quais os encaminhamentos feitos ou por fazer
coloca diante da realidade ao construir seu conhecimento. nesse sentido?
A autora distingue o diálogo entre professor e aluno
como indicador de aprendizagem, necessário, à Em relação à correção há duas posturas que se
reformulação de alternativas de solução para que a opõem naturalmente:
construção do saber aconteça. A reflexão do professor
sobre seus próprios posi- cionamentos metodológicos, na Avaliação Classificatória
elaboração de questões e na análise de respostas dos Corrigir tarefas e provas do aluno para verificar
alunos deve ter sempre um ca- ráter dinâmico. respos- tas certas e erradas e, com base nesta verificação
Na avaliação mediadora o professor deve interpretar a periódica, tomar decisões quanto ao seu aproveitamento
prova não para saber o que o aluno não sabe, mas para escolar, sua aprovação em cada série ou grau de ensino
pen- sar nas estratégias pedagógicas que ele deverá (prática Ava- liativa).
utilizar para interagir com esse aluno. Para que isso
aconteça, o desenvol- vimento dessa prática avaliativa Avaliação Mediadora
deverá desvelar a trajetória de vida do aluno durante a qual Analisar Teoricamente as várias manifestações dos
ocorrem mudanças em múltiplas dimensões. alunos em situações de aprendizagem (verbais ou escri-
Em relação ao processo de aprendizagem toda tas, outra produções), para acompanhar as hipóteses que
respos- ta do aluno é ponto de partida para novas vem formulando a respeito de determinados assuntos,
interrogações ou desafios do professor. Devem-se em diferentes áreas de conhecimento, de forma a exercer
oportunizar aos discentes emitir ideias sobre um assunto, uma ação educativa que lhes favoreça a descoberta de
para ressaltar as hipóteses em construção, ou as que já melhores soluções ou reformulação de hipóteses prelimi-
foram elaboradas. São estas atitudes que idealizam, de narmente formuladas. Acompanhamento esse que visa ao
fato, um processo de avaliação contínua e mediadora. acesso gradativo do aluno a um saber competente na es-
A objetividade e a subjetividade em geral refere-se a cola e, portanto, sua promoção a outras séries e graus de
for- ma de elaboração das questões, mas é pela correção ensino.
que as questões se caracterizam em “objetivas” ou As diferentes posturas também se revelam nas expec-
“subjetivas”. tativas dos alunos (pedindo para professor dar nota em
A partir das considerações, apontamos alguns toda atividade; não aceitando que sua tarefa tenha erro),
princípios dos pais ( não aceitando que não se corrija o caderno de
coerentes à ação avaliativa mediadora: seu filho), dos professores (corrijo tudo, não corrijo, o que
- oportunizar aos alunos muitos momentos de fazer?).
expressar suas ideias – as tarefas são elementos essenciais Na concepção mediadora a correção se faz presen-
para a ob- servação das hipóteses construída pelos alunos te pensando na evolução do conhecimento de forma di-
ao longo do processo; nâmica, de descoberta por ensaio e erro, de tomada de
- oportunizar discussões entre os alunos a partir de consciência sobre o fazer, muito mais que a preocupação
situa- ções desencadeadoras - os trabalhos em grupo são com resultados imediatos ou fórmulas definitivas de solu-
“gatilhos” para a reflexão de cada aluno, para o ção apresentadas pelo professor.
desenvolvimento do co- nhecimento em sua perspectiva Não significa aceitar tudo o que a criança faz.
de compreensão; Conside- rar, valorizar, não significa observar e deixar
- realizar várias tarefas individuais, menores e sucessi- como está. Ao contrário exige do professor a reflexão
vas, investigando teoricamente, procurando entender teórica necessária para o planejamento de situações
razões para as respostas apresentadas pelos estudantes – a provocativas ao aluno que favoreçam a sua descoberta. As
avaliação mediadora exige a observação individual, ou seja tarefas de aprendiza- gem são pontos de partida do
uma relação direta com o aluno a partir de muitas tarefas professor no sentido de ge- rar conflitos entre as crianças
(orais ou es- critas), interpretando-as (respeito a pela confrontação entre elas a respeito de diferentes
subjetividade), refletindo e investigando teoricamente soluções pensadas em evolução.
razões para soluções apresen- tadas de acordo com os
estágios e as experiências do aluno;
199
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

A ação mediadora do professor, a sua intervenção pe-


dagógica, desafiadora, não pode ser uniforme em todas 4. acompanhamento individualizado – o diálogo,
as situações de tarefas dos alunos. Os erros que a criança com- preendido como leitura curiosa e investigativa do
apresenta podem ser de natureza diversa. Nenhum extre- professor das tarefas de aprendizagem, poderá se
mo é válido: considerar que sempre devemos dizer a res- estabelecer mes- mo se o educador trabalhar com muitos
posta certa ou no outro extremo, considerar que todo e alunos, no sentido de permitir lhe, senão a proximidade
qualquer erro que o aluno cometa tenha o caráter corpo a corpo com o estudante, o debruçar-se sobre suas
constru- tivo e que ele poderá descobrir todas as ideias e as do gru- po para acompanhar seus argumentos
respostas. e vir a discuti-los ou enriquecê-los.
A tarefa do aluno está presente entre uma tarefa do Portanto, o maior desafio é favorecer a descoberta
aluno e a posterior. A tarefa do professor consiste em pe- los professores do significado da avaliação mediadora
favo- recer a este aluno o alcance de um saber para a formação de um profissional competente.
competente e a aproximação com a verdade científica. Confirmando a hipótese da autora que experiências
O tema correção envolve essencialmente o respeito em avaliação mediadora possam provocar
à criança em suas etapas de desenvolvimento e, por isso espontaneamente um reestudo do currículo, realizou um
é urgente incluir o termo “ainda” no seu vocabulário. Ao trabalho junto a uma universidade e constatou que a
invés de analisar os exercícios dos alunos para responder prática avaliativa foi sendo reformulada e explicitada em
quem errou ou quem acertou, analisá-los para observar seu desenvolvimento através de reflexões constantes e
quem aprendeu e quem “ainda” não aprendeu. ajustes necessários.
Os registros de avaliação refletem a concepção de Os professores participantes do projeto no Ensino
edu- cação do professor. Relatórios de avaliação devem Mé- dio relataram algumas conclusões:
expres- sar avanços, conquistas, descobertas, bem como - o processo de transformação inicia de forma lenta
relatar o processo vivido em sua evolução, em seu com muitas resistências dos alunos. Uma vez compreendi-
desenvolvimento, dirigindose aos encaminhamentos, às do, o processo alcança bons resultados; · a proposta exige
sugestões de coo- peração entre todos que participam do a reflexão permanente do grupo e ajustes frequentes;
processo. Ao rela- tarmos um processo efetivamente - a cooperação entre os alunos e destes com a profes-
vivido, encontraremos as representações que lhes dêem sora é um dos resultados alcançados. Os alunos passam a
verdadeiro sentido. mostrar-se mais interessados em vencer suas dificuldades
Há muitas crenças que a avaliação mediadora é e a refazer seus trabalhos; · a não- atribuição de notas à
restrita aos professores das séries iniciais do ensino ta- refas e situações não-declaradas de “prova” causam
fundamental,
a autora mas
revela o desenvolvimento desta perspectiva menor
no ensino médio e no ensino universitário através de pes- pressão e resultados
- o processo mais favoráveis
provoca de aprendizagem;
naturalmente a revisão do cur-
quisas realizadas.
rículo pelos professores e o repensar de sua metodologia;
O modelo que se instala em cursos de formação, é um
modelo reprodutivista sendo muito mais forte que qual- - percebe-se com maior clareza a dimensão das
quer teoria que o aluno possa adquirir, pois é vivida em dificul- dades dos alunos.
seu cotidiano. Nesta perspectiva, avaliação mediadora é uma postura
Em sua pesquisa no curso universitário a autora de vida e os fundamentos de uma ação avaliativa media-
aponta algumas concepções apresentadas pelos dora ultrapassam estudos sobre teorias de avaliação e exi-
professores re- sistentes à avaliação mediadora e assinala gem o aprofundamento em teorias de conhecimento bem
caminhos para reflexão : como estudos referentes a áreas específicas de trabalho
1. alunos desinteressados e desatentos – observa-se do professor.
, nesta visão, um compromisso do educador alienado de A ação avaliativa mediadora se desenvolve em benefí-
uma relação de aproximação com o pensar do aluno: o cio ao educando e dá-se fundamentalmente pela proximi-
professor “dá” a aula e o aluno “pega” as explicações. Na dade entre quem educa e quem é educado. Pela
avaliação mediadora despertaria, então, o educador para curiosida- de de conhecer a quem educa e conhecendo, a
a relação dialógica da avaliação, buscando alternativas descoberta de si próprio.
para estabelecer sua aproximação e descoberta dos dife- Conhecimento das possibilidades dos educandos de
rentes modos de pensar. contínuo vir a ser, desde que lhe sejam oferecidas as
2. tempos e disponibilidade: entraves do processo – a opor- tunidades de viver muitas e desafiadoras situações
avaliação mediadora opõe-se ao modelo “transmitir-verifi- de vida.
car-registrar” e evolui no sentido de uma ação reflexiva e
desafiadora do educador em termos de contribuir, Texto adaptado: Vivian.
elucidar, favorecer a troca de ideias entre e com seus
alunos.
3. o diálogo professor/aluno – o diálogo entendido a
partir da relação epistemológica, não se processa obriga-
toriamente através da conversa, enquanto comunicação
verbal com o estudante.
Refletir em conjunto com o aluno sobre o objeto do
conhecimento, para encaminhar-se à superação, significa
desenvolver uma relação dialógica, princípio fundamental
da avaliação mediadora.

200
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

CARVALHO, ROSITA EDLER. EDUCAÇÃO INCLUSIVA diferenças individuais como parâmetros para estabelecer
a quantidade e qualidade da educação destinada a cada
COM OS PINGOS NOS IS. 2. ED. PORTO ALEGRE:
pessoa. Nesse contexto é inerente na sociedade, o proces-
MEDIAÇÃO, 2005.
so de exclusão educacional a que são submetidos tantos
alunos, especialmente aqueles que apresentam algum tipo
de deficiência.
De uma visão positivista da educação, na qual cada
CARVALHO, Rosita Edler. Educação Inclusiva com os um deveria ocupar seu devido lugar em função de suas
Pingos nos Is. 2. ed. Porto Alegre: Mediação, 2005. apti- dões pessoais e da classe social a que pertencesse,
Luciana Cristina Salvatti Coutinho passa-
-se, por meio da crítica pedagógica, para o escolanovismo,
movimento que tem como lema o “aprender fazendo”,
Pedagoga pela Faculdade de Educação da Unicamp. des- locando, para o aluno, a centralidade do processo
Mestranda em Filosofia e História da Educação pela educa- tivo.
FE/Uni- camp. Membro do grupo de estudos e pesquisas Da crítica do positivismo e da escola nova surge um
HISTEDBR movimento socialista na e para a educação, iniciando-se
nas camadas populares. Destes, os ideais pedagógicos de
Introdução Paulo Freire são referendados pela autora como referência
de uma educação socialista.
Neste livro, a autora expõe vários textos escritos por Guardadas as diferenças teóricas entre as correntes
ela mesma acerca da temática da educação inclusiva. Estes emergentes no século XX, cabe salientar que elas apresen-
textos foram escritos em momentos diferentes, mas cola- tam um traço comum: a centralidade do educando no
boram, segundo ela, para esclarecimentos sobre a pro- cesso de ensino-aprendizagem.
questão em foco. Para Rosita, é importante colocar os Contrapondo-se a natureza excludente da sociedade e
pingos nos “is”, pois a diversidade de ideias e práticas da educação moderna, desabrocha um movimento de in-
acerca da educa- ção inclusiva gera uma confusão de clusão apoiado por vários segmentos da sociedade. Ainda
significados e sentidos que, consequentemente, acabam em clima de discussão, sobretudo, em fóruns de discus-
por provocar dúvidas e resistências por parte dos são especiais, muitas dúvidas e incertezas acometem pais,
educadores na implantação de processos inclusivos. educadores e comunidade que acabam por criar resistên-
cias na promoção de processos inclusivos. Cabe, portanto,
1. Correntes teóricas e sua influência no processo incluir família, escola e comunidade nas discussões acerca
educacional. da educação inclusiva a fim de elaborar e efetivar projetos
Neste capítulo, Rosita fará uma análise das correntes inclusivos que atendam às diferenças. Para isso, a escola
teóricas e o impacto de cada uma delas na educação, so- não pode ser vista e pensada apartada da sociedade. Deve
bretudo à educação inclusiva, entendendo que, assim, é ser antes de tudo, “espaço da alegria” (p.32) no qual os
possível visualizar o que permaneceu e o que mudou na interesses e necessidades de todos e de cada um são con-
“humanização do Homem” ao longo de sua história. siderados e valorizados.
Em poucas palavras, a autora identifica a origem da
educação à origem da história do próprio homem. Afirma 2. A contribuição da histórica da filosofia da
que na antiguidade primitiva a educação era, essencial- ciên- cia para a proposta de educação inclusiva.
mente, prática, voltada às necessidades cotidianas e era Analisando a história da filosofia da ciência,
transmitida de geração para geração por meio da brevemen- te, a autora identifica que há um processo em
oralidade e de exemplos práticos. Na antiga Grécia, era curso, que emergiu no século XX, da exclusão para a
proclamada a formação integral do homem denominada inclusão.
de Paideia. No entanto, como alerta Rosita, havia uma Do ápice do positivismo, essencialmente excludente,
educação mais prá- tica destinada aos escravos e aos no qual cada um deveria ser educado em função do lugar
social ocupado e das aptidões pessoais, passa-se à crítica
guerreiros e outra do “es- pírito” (intelectual) para os
em meados dos anos 50 chegando até mesmo a “nega-
homens livres, ou seja, que não precisavam prover seu
ção da necessidade de haver método para se fazer
sustento material. Na idade Média, com a influência
ciência” (p.33). Esse movimento crítico evolui para a teoria
massiva do cristianismo, destaca-se a edu- cação do
quântica e o misticismo oriental que apontam para a
espírito voltada, sobretudo, aos nobres e cleros. Com o
necessidade de estudar e compreender o mundo e suas
renascimento, ressurgem os valores Greco- romanos para
relações. Esse processo, segundo Rosita, caminha para a
a educação destinados, mais, aos estudos da nature- za
evolução “...da dimensão do ‘eu’ para a do ‘nós’ e, desta,
(astronomia, matemática, artes, medicina, biologia, etc.).
para a de ‘todos nós’ numa extraordinária dinâmica em
Os conceitos de universalidade e individualidade
espiral...”(p.34).
emergem como fundamentos da educação moderna. A
Assim como no campo da ciência, também no da edu-
universalida- de, contudo, apresenta caráter elitista e
cação percebe-se processo semelhante culminando hoje,
segregacionista já que, segundo Gadotti (1995), citado
nos primórdios do século XXI, no movimento pela educa-
pela autora, aos traba- lhadores deveria ser destinada
ção inclusiva. A educação inclusiva, para a autora, significa
uma educação para o traba- lho e, aos dirigentes, voltada
não oferecer educação igual a todos mas, antes e acima
à arte de governar. Além da diferenciação em função da
de tudo, oferecer a cada um de acordo com seus
classe social acrescentem-se as
interesses e necessidades, a educação que lhe é
adequada. Para ela,

201
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

A palavra da ordem é equidade, o que significa educar


de acordo com as diferenças individuais, sem que qualquer Diante da relação pessoal entre os sujeitos, práticas de
manifestação de dificuldades se traduza em impedimento à inclusão se manifestam. Estas, contudo, são mais de
aprendizagem. (p.35) ordem mecânica, ou seja, natural, que orgânica, consciente
Para caminhar em direção a uma escola efetivamente e delibe- rada. Cabe, na atualidade, alavancar propostas de
inclusiva, Rosita apresenta quatro fatores que devem ser efetiva in- serção sendo necessário, para isso, trabalhar
modificados a fim de se alcançar uma educação inclusiva. num duplo sen- tido: com os próprios excluídos e com os
São eles: demais integrantes da sociedade para que desenvolvam
atitudes de acolhimento. Essas ações de inserção envolvem
As condições sociais e econômicas de nosso país e
que têm acarretado a desvalorização do magistério desde aspectos físicos do ambiente como os simbólicos.
fazendo com que, muitas vezes, as escolas funcionem como Salienta a autora que as repre- sentações simbólicas que se
espaços de abrigar e de cuidar os alunos em vez de serem têm dos deficientes são as mais difíceis de serem
espaços para a construção do conhecimento e de exercício transpostas porque são instituintes, ou seja, o discurso que
da cidadania; se tem da realidade constitui a própria realida- de, pois
representa o sentido que se atribui às coisas, pessoas,
As condições materiais em que trabalham nossos
acontecimentos, gerando um imaginário individual e
professores; Sua formação inicial e continuada;
coletivo sobre o mundo, inclusive sobre os deficientes, que
As condições requeridas para que a aprendizagem
orientam as relações e práticas dos e entre os sujeitos. “O
se efetue em, “clima” prazeroso e criativo. (p.37)
imaginário, mais do que cópia do real, é uma forma de
ligar as coisas ao eu, ou de plasmar visões de mundo,
3. A autorização da diferença de pessoas com de-
ficiência. modelando condutas e estilos de vida” (p.53).
O processo de exclusão dos deficientes/diferentes na so-
Neste capítulo, a autora discute os discursos atribuí-
ciedade atual vem se dando, muitas vezes, pela sua
dos às pessoas com deficiência na contemporaneidade.
inserção nos sistemas regulares de ensino sem, contudo,
De modo geral, os sentidos identificados são fruto de uma
promover as condições necessárias tanto para os
visão médica ou matemática nas quais se estabelece um
deficientes como para os demais membros da escola para
padrão a partir do qual as pessoas estão ou não inseridas
que a inserção educacional seja efetiva. A exclusão, nas
num de- terminado conjunto, da normalidade ou da
escolas, se manifesta no fracasso escolar de várias ordens:
anormalidade. Esses modelos são essencialmente
defasagem idade-série, crianças fora da escola, evasão
excludentes, pois aque- les que não se encaixam nos
escolar, mecanismos de aceleração para compensar os
atributos da “normalidade” são excluídos. Além disso, ao
fracassos, más condições de trabalho dos pro- fissionais da
estabelecer um padrão de norma- lidade, toda e qualquer
educação, formação inicial e continuada deficitá- ria, dentre
atitude de inclusão, nesses modelos, se dá por meio da
tantos outros.
negação das diferenças e do reforço dos comportamentos
considerados dentro dos padrões de nor- malidade. Como se evidencia, há vários mecanismos, na escola,
que podem afetar o processo de ensino-aprendizagem
Contrapondo-se a essas visões que rotulam as
dos alu- nos que não dependem, única e exclusivamente,
pessoas em dois grupos contrários e excludentes, Rosita
dos atores principais desse processo, ou seja, dos
defende que é necessário estabelecer relações de
professores e dos alu- nos. Aos professores cabe o rótulo
alteridade sem tentar classificar ou categorizar as pessoas
de incompetentes e aos alunos de deficientes. Assim,
em função de pa- drões preestabelecidos a partir de uma
ressalta Rosita, cabe conhecer e compreender os
lógica binária (ser ou não ser, normal ou anormal). Para
contextos nos quais ocorre a aprendiza- gem a fim de
tanto, a autora, valendo-
evitarmos, simplesmente, rotular os sujeitos sem levar em
-se de uma análise desenvolvida por um rabino – Bonder consideração as condições nas quais ocorreram os
– acerca da classificação dos frutos, propõe que se adote,
problemas de aprendizagem. Alerta a autora que:
nos estudos e nas práticas, uma visão tetralética na qual
...transformar questões sociais em biológicas tem sido
outras possibilidades são aceitas além de somente duas
chamado de biologização, entender que as dificuldades de
posições opostas.
aprendizagem de inúmeros alunos traduzem um seu
“defeito”, chama-se patologização e a busca de soluções,
4. A exclusão como processo social. fora do eixo de discussão de natureza político-pedagógico, é
O processo de exclusão, na sociedade capitalista, se
denominada medicalização do processo ensino-
dá por meio da inclusão marginal, ou seja, exclui-se para
aprendizagem (Collares e Moysés, 1996 apud Carvalho,
depois reincluir em condições adversas. Os fatores de
2004: 59).
exclusão são de duas ordens: biopsicossiais e sociais; os
Diante dessa trajetória analítica, Rosita esclarece sua
primeiros dizem respeito às deficiências físicas,
po- sição frente à inclusão: é a favor desde que sejam
intelectuais, psicológicas, e o segundo refere-se às
geradas as condições necessárias para que, efetivamente,
desigualdades sociais que geram di- ferenças entre os
se dê a inser- ção dos deficientes nos processos de
indivíduos. Essa classificação tem como parâmetros
ensino- aprendizagem respeitando suas diferenças e lhes
valores, comportamentos, cultura, entre outros, definidos
proporcionando condições de desenvolvimento. É contrária,
como “normais”, como já foi explicado no capí- tulo
portanto, a qualquer projeto e prática dita inclusiva, mas
anterior. Os processos de exclusão se manifestam em
que, de fato, provoca uma exclu- são camuflada de
práticas de hostilidade, rejeição, segregação, humilhação,
inclusão. Nesse sentido, reforça a autora a necessidade de
ocasionando, por sua vez, a organização desses excluídos
não só mudar os discursos referentes à edu- cação
em grupos, através de movimentos sociais, que buscam
inclusiva, mas, além disso, intervir no próprio cotidiano
lutar pelos seus direitos de cidadãos.
escolar, nas práticas pedagógicas, nas relações entre
escola, família, comunidade, na formação inicial e
continuada dos professores, nas suas condições de
trabalho, etc.
202
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

5. Educação inclusiva: alguns aspectos para a re-


flexão. 5) Políticas públicas e sociais para a educação de
qualidade para todos e com todos:
Rosita considera que uma mensagem é passível de
várias interpretações caso as premissas fundamentais não O forte apelo mercadológico que permeia as políticas
sejam objeto de uma reflexão crítica. Por esta razão, a públicas dificulta a organização de uma sociedade e
educa- ção inclusivas. A predominância não deveria ser
pro- posta deste capítulo é, justamente, discutir alguns
econômica e sim social.
aspectos relevantes para uma educação inclusiva,
organizados con- forme itens a seguir:
6) Remoção de barreiras para a aprendizagem e
para a participação:
1) Aspectos denotativos e conotativos de alguns Este é o lema principal da educação inclusiva: derru-
termos frequentemente utilizados em nossas
bar todas as barreiras internas e externas à educação para
narrativas:
garantir o acesso, a permanência e o sucesso de todos os
a) educação: consiste no processo de formação alunos no processo de escolarização.
inte- gral do motor, envolvendo aspectos físicos, motores,
psico- motores, intelectuais, afetivos e político-sociais;
7) Produção sistemática de estudos e pesquisas
b) educação especial: apoiando-se na LDB (1996) e com análise científica dos dados:
nas Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Edu- A autora apela, aqui, para a necessidade de produzir
cação Básica (2001), entende-se por educação especial o pesquisas com metodologia adequada, análise bibliográ-
provimento das condições necessárias especiais, para fica, coletando e analisando dados, de modo sistemático
que as pessoas com necessidades educacionais especiais e rigoroso.
pos- sam desenvolver todas as suas potencialidades no
proces- so de escolarização seja em escolas regulares ou
8) Resistências em relação à proposta de educa-
não; ção inclusiva:
c) integração e inclusão: “No modelo organizacional As resistências para a efetivação de uma proposta de
que se construiu sob a influência do princípio da integra- educação inclusiva são muitas entre vários segmentos da
ção, os alunos deveriam adaptar-se às exigências da sociedade. Devem ser encaradas como barreiras a serem
escola e, no da inclusão, a escola é que deve se adaptar às removidas. A superação das resistências implica
neces- sidades dos alunos.” (p.68); compreen- der suas origens e trabalhar sobre elas.
d) igualdade e equidade: igualdade refere-se à
uni- formização e equidade significa dar a cada um 6. Concepções, princípios e diretrizes de um
segundo suas diferenças e necessidades; siste- ma educacional inclusivo.
e) necessidades especiais e necessidades educacio- Para Rosita, os documentos já produzidos acerca da
nais especiais: a autora considera de suma importância educação, tais como a Constituição, a Declaração
discutir exaustivamente esses conceitos tomando-se o Universal dos Direitos Humanos, a Declaração Mundial
cuidado para não rotular indiscriminadamente as sobre Edu- cação para Todos, Satisfação das Necessidades
pessoas; Básicas de Aprendizagem, a Declaração de Salamanca e
Linha de Ação, dentre tantas outras, apresentam as ideias
2) Quem são os excluídos? fundamentais para que se elaborem propostas de
De modo geral, todas as crianças que não frequentam educação inclusiva.
a escola ou que não são assistidas de forma apropriada A globalização da economia traz em seu bojo uma
para seu desenvolvimento integral, são consideradas maior competitividade e desigualdades entre os países
excluídas. Somem-se a isso, os dados estatísticos que dificultando, ainda mais, a efetivação de projetos educa-
demonstram a distância no atendimento entre a educação cionais inclusivos. Desse modo, somente estar contido nos
básica e o en- sino médio e, mais grave ainda, a textos das leis e documentos oficiais os princípios da
baixíssima oferta àqueles com necessidades especiais. inclu- são, não garante sua concretização. Como afirma
Rosita, “mais que prever há que prover recursos de toda a
3) Fatores que contribuem para a exclusão ordem, permitindo que os direitos humanos sejam
escolar: respeitados, de fato” (p.79).
Alguns fatores são apresentados pela autora, Há de se organizar os meios internos e externos à es-
salientan- do que não são os únicos, mas que estão cola, para implementar propostas inclusivas, já que os
sempre presentes: modelo social e econômico do país, prin- cípios e fundamentos necessários para a elaboração
políticas públicas e so- ciais, prática pedagógica, de projetos de inclusão são os ideários democráticos tão
organização dos sistemas educa- cionais. bem elucidados pela Declaração Universal dos Direitos
Huma- nos. Fundamentado nesse ideal, um sistema de
4) Por que tantas leis? educação inclusivo deve efetivar:
A esta constatação a autora considera que diz O direito à educação; o direito à igualdade de oportu-
respeito ao fato de o Brasil fazer parte de organizações nidades, o que não significa um “modo igual” de educar a
internacio- nais e, por esta razão, deve seguir algumas todos e sim dar a cada um o que necessita, em função de
diretrizes co- muns a todos os que participam desses suas características e necessidades individuais; escolas res-
organismos. Deve- ponsivas e de boa qualidade; o direito de aprendizagem; e
-se, contudo, estudar o modo como os países latino-ame- o direito à participação. (p.81)
ricanos estão implementando essas diretrizes,
colaborando para a organização de nossa educação.

203
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

7. Políticas públicas para a educação inclusiva. Deve-se adotar um outro modelo de planejamento e
Educação inclusiva vem sendo sinônimo para muitos ad- ministração no qual participam, efetivamente,
como a transferência de alunos da educação especial para representantes dos diferentes setores da educação. É
as escolas regulares. Essa ideia pressupõe o “desmonte da necessário que os admi- nistradores disponham de
educação especial” sem, contudo, prover as escolas regu- “autoridade profissional” (p.101), ou seja, que tenham
lares das condições necessárias para assegurar que esses acúmulo de experiências e conhecimentos na área. Além
alunos estarão sendo bem atendidos. disso, uma outra dimensão deve fazer parte do perfil da
A educação inclusiva, destaca a autora, não se administração: a vontade, o ideal de atender o bem
restringe aos alunos com deficiências, ao contrário, ela comum. O papel do administrador é possibilitar a
deve atender as necessidades e diferenças de todas as articulação daqueles que planejam com os que executam e
pessoas indiscri- minadamente. Os recursos, vice versa.
atendimentos, apoio, acompa- nhamento, enfim, todas as As escolas contam com autonomia para elaborar seus
condições necessárias para que os alunos possam projetos político-pedagógicos, mas devem se pautar nas
desenvolver todas as suas potencialida- des, devem ser orientações dadas pelas Secretarias de Educação que, por
asseguradas. sua vez, adotam as diretrizes provenientes do MEC. Este, no
Diante do quadro de exclusão e deficiência da educa- cum- primento de seu papel, inspira-se nas diretrizes
ção, em 1981 a UNESCO elaborou um Projeto Principal no elaboradas pe- los organismos internacionais.
qual foram apontados como objetivos urgentes: erradica- Internamente, mudanças devem ser expressas, com
ção do analfabetismo, melhoria da qualidade e eficiência base nos princípios da educação inclusiva, nas salas de aula,
dos sistemas educacionais e universalização da educação. na prá- tica pedagógica, nos recursos tecnológicos, entre
Foi sugerido o sistema de colaboração intra e entre os outras estra- tégias a fim de ressignificar o trabalho
países para a concretização desses objetivos. Esse Projeto pedagógico.
Principal e seus desdobramentos nos diferentes países do
mundo foram sendo discutidos em encontros periódicos. 9. A função da escola na perspectiva da educação
Destes, o sétimo, ocorrido em 2001 em Cocha bamba, na inclusiva.
Bolívia, teve como resultado a Declaração de Cochabam- A escola que se tem hoje é, pela sua própria natureza,
ba sobre Políticas Educativas para o século XXI. A autora ex- cludente. Este fato é demonstrado pela autora através
destaca algumas orientações contidas nesse documento: de da- dos estatísticos que revelam que 2/3 dos alunos
necessidade de acelerar as mudanças nos sistemas edu- ingressantes no ensino fundamental não chegam ao ensino
cacionais para acompanhar as em curso na sociedade, a médio.
educação é primordial para o desenvolvimento humano, Verificam-se, também, atualmente, projetos em anda-
mento que objetivam a inclusão dos alunos deficientes
nas escolas regulares.
são. Práticas inclusivas em uma escola com práticas de exclu-
E a escola não é inclusiva porque a sociedade não o é. Eis
flexibilização da escola, autonomia pedagógica e de a realidade.
gestão das escolas, participação de outros atores nas Uma educação inclusiva pressupõe, não só a inserção dos
instituições educativas,
alunos independente das diferenças que apresentem, mas
uso de novas tecnologias da informação e comunica- sobretudo, a permanência e a garantia de
ção nos processos pedagógicos. Para Rosita, o desafio, no desenvolvimento de todas as potencialidades de cada um.
Brasil é: Vê-se que a função da escola não é a de selecionar,
A tarefa, nada fácil, por sua extensão e complexidade segregar. A função da escola, numa sociedade e educação
é fazer prevalecer, nas políticas públicas brasileiras, os inclusiva, é o desenvolvimento do próprio ser humano
objeti- vos e diretrizes que atendam às recomendações dos respeitando as diferenças e necessidades de cada um.
organis- mos internacionais aos quais estamos afiliados,
garantindo a todos, o que a letra de nossas próprias leis 10. Removendo barreiras para a aprendizagem e
assegura. (p.91) A autora, para concluir, elenca alguns para a participação na educação inclusiva.
pontos negativos que permeiam as políticas sociais Nas Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na
brasileira, incluindo aí a educação: falta de articulação Edu- cação Básica, de 2001, ampliou-se, significativamente,
entre os ministérios para a promoção efetiva dos o sig- nificado do termo educação especial, incluindo
direitos dos cidadãos (saúde, edu- cação, trabalho), nesse leque, alunos já inseridos nas escolas regulares não
recursos financeiros, falta de valorização do magistério. considerados, até então, deficientes. Alunos com
Os pontos positivos são: instituição dos parâmetros necessidades educacionais es- peciais são aqueles que
curriculares nacionais, programa do livro didá- tico, apresentam, no processo educativo, dificuldades de
capacitação de professores por meio de TV, munici- aprendizagem e, segundo Rosita, analisando as falas de
palização da merenda, reforma do Ensino Médio, reforma alguns educadores, qualquer aluno pode ser con- siderado
do ensino técnico, diretrizes curriculares para os cursos de especial.
graduação, sistema de avaliação. Há um ponto positivo considerado pela autora ao
8. Planejamento e administração escolar para a ampliar o sentido do termo “especial”: requer que o foco
educação inclusiva. seja posto nos alunos, no sentido de os profissionais da
Uma proposta de educação inclusiva deve ser educação serem chamados a responder às necessidades de
entendi- da não só como um direito de todos, mas aprendizagem dos alunos. Para tanto, é necessário
sobretudo, como um dever a ser assumido pelo Estado proporcionar formação conti- nuada aos professores a fim
com a participação efetiva de toda a sociedade em todas de que conheçam os tipos e esti- los de aprendizagem de
as etapas para sua concretização desde o planejamento seus alunos possibilitando a organiza- ção de práticas
até as ações práticas. pedagógicas adequadas ao perfil de cada um.
204
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Há aspectos negativos que devem ser evidenciados a


fim de serem eliminados. A própria representação que os 12. Os pingos nos “is” da proposta de educação
professores têm acerca de trabalhar com crianças com in- clusiva.
defi- ciências é um deles. Esse preconceito tende a ser Após colocar vários pingos nos “is” sobre educação
estendido já que o conceito de especial foi ampliado. in- clusiva, a autora elegeu, neste último capítulo, mais
Normalmente uma parte significativa dos profissionais alguns aspectos que devem ser postos em discussão para
alega despreparo para elaborar e desenvolver processos escla- recimentos.
de aprendizagem com alunos com necessidades especiais Educação inclusiva e o ideal da educação de qua-
sem, contudo, questionar, quais e como as próprias lidade para todos: entende-se, erroneamente, que a De-
práticas pedagógicas podem elevar os índices de fracasso claração Mundial de Educação para Todos, fruto da
escolar aumentando o número de alunos considerados Confe- rência realizada, em 1990, em Jomtien, destina-se
“especiais”. Em geral, são atribuídas aos alunos as causas aos alu- nos do ensino regular e que a oriunda da
por seu fracasso. Conferência de Salamanca, refere-se aos deficientes.
Rosita esclarece que ambas dizem respeito à educação
Além dessas barreiras a serem transpostas, há as
oriun- das das desigualdades sociais e econômicos que inclusiva que tem como foco todos os alunos,
geram outras desigualdades como educacionais e indiscriminadamente.
culturais. A inclusão educacional escolar de alunos com ne-
cessidades educacionais especiais: refere-se não só à
A quem cabe derrubar as barreiras institucionais, pro-
fissionais, sociais, econômicas, políticas, enfim, todas as socialização, mas também ao processo de apropriação
que bloqueiam a prática de uma educação inclusiva? To- de conhecimentos. Para tanto, deve-se atentar para a exi-
dos os membros da sociedade são responsáveis por esse gência de considerar, na elaboração e implementação de
trabalho árduo já que os “culpados” pelo fracasso escolar propostas inclusivas, para as seguintes questões: a indivi-
não são só os profissionais da educação, ao contrário, há dualidade que requer estratégias que atendam as necessi-
vários outros fatores que influenciam no desenvolvimento dades e interesses de cada um, o respeito e valorização
do aluno que fogem ao controle dos professores. das identidades, a busca de equidade e, por fim, a
remoção de todas e quaisquer barreiras que impeçam a
Independente do lócus das barreiras, elas devem ser
identificadas para serem enfrentadas, não como obstáculos aprendizagem e a participação de todos.
intransponíveis e sim como desafios aos quais nos O projeto político-pedagógico da escola sob a
lançamos com firmeza, com brandura e muita ótica da inclusão: o projeto político-pedagógico da
determinação. (p.129) escola exige a clareza dos valores que orientam as ações
da escola, os objetivos a serem alcançados, os meios a
serem utilizados, enfim, é uma verdadeira “carteira de
11. Experiências de assessoramento a sistemas
identidade” (p.158) de cada escola. Para a elaboração de
educativos governamentais na transição para a pro-
um projeto de educação inclusiva, três dimensões devem
posta inclusiva. Para Rosita, vive-se, hoje, um processo
se fazer presentes: cultural (aspectos filosóficos, princípios,
de transição para uma proposta de educação inclusiva da
valores), política (abarcan- do as relações na escola, com a
qual ele vem participando, bem como outros tantos pro-
família, a comunidade) e a prática (prática pedagógica).
fissionais da área, no assessoramento a sistemas governa-
Formação de educadores: mudanças devem ser efe-
mentais ou não. Dessas experiências de assessoria a auto-
tuadas nos projetos de formação inicial com base na edu-
ra levanta, analisa e compila dados para o desenvolvimen-
cação inclusiva. Importante, também, é a formação conti-
to de suas pesquisas na temática em foco, entendendo,
nuada que deve incluir cursos de aperfeiçoamento e espa-
como Demo (1997) que a pesquisa é um valioso princípio
ços de discussão. O foco dos processos formativos deve
de prática educativa. Muitas das análises efetuadas pela
recair sobre a intrínseca relação entre teoria e prática.
autora nas suas pesquisas encontram-se discutidas nos
Adequações na prática pedagógica: a elaboração
capítulos deste livro.
de uma outra proposta de educação requer, consequente-
Do ponto de vista do trabalho mesmo de assesso-
mente, adequações curriculares que devem ser debatidas.
ramento, girava em torno de palestras, visitas às escolas,
O processo de avaliação: no modelo clínico, a avalia-
observação, reuniões com profissionais da educação, es-
ção consiste no diagnóstico visando o tratamento
tudos teóricos, análise da legislação. A participação, nesse
adequa- do. Do ponto de vista de uma educação inclusiva,
processo, incluía gestores, professores do ensino regular e
objetiva repensar as práticas pedagógicas e as políticas
especial.
educacio- nais a fim de se buscar o sucesso de todos na
Ressalta Rosita que os estudos teóricos e a clareza
aprendiza- gem e participação.
con- ceitual é de suma importância no processo de
Estudos e pesquisas como ações indispensáveis aos
elaboração e implementação de uma proposta de
processos educativos: A pesquisa deve ser tomada como
educação inclusiva, mas não depende só de
princípio formativo que possibilita compreender as
fundamentação teórica, depende também e, sobretudo,
práticas e ressignificá-las.
de “competência política” (p.140)
Do mesmo modo, o conhecimento e compreensão
Disponibilizaremos o PDF em nosso para que assim
dos textos legais acerca da educação não garantem, por
não haja prejuízos em seus estudos site
si só, a efetivação da educação inclusiva, mesmo porque
www.novaconcursos.com.br/retificacoes, para con-
há algumas controvérsias oriundas do entendimento ou
sulta.
da omissão da lei como, por exemplo, a questão “a quem
cabe a iniciativa e o financiamento das ações: se à
educação es- pecial ou ao ensino regular” (p.146).

205
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Cortella deixa bem claro que todo profissional que


CORTELLA, MÁRIO SÉRGIO. A ESCOLA E O tra- balha com a educação, antes de tudo, ele trabalho
CONHECIMENTO: FUNDAMENTOS com uma ferramenta chamada conhecimento, que será o
EPISTEMOLÓGICOS E POLÍTICOS. ED. SÃO PAULO, obje- to principal de nossas atividades. Portanto, não
CORTEZ, 2011. podemos olhar para este objeto apenas com um olhar
cientifico. E como diferenciar esta visão? Observando o
conhecimento que é produzido no dia-a-dia no interior da
escola. Obser- ve o que nos diz Cortella “Por isso, e para
AUTOR que possamos pensar o tema do conhecimento e, a
partir dele, produ- zir uma reflexão que nos ofereça mais
Mário Sérgio Cortella - (Londrina, 5 de março de 1954) fundamentos para nossas práticas pedagógicas” (2009, p.
é um filósofo brasileiro, possui Graduação pela Faculdade de 23), é pela prática do conhecimento que proporcionará
Fi- losofia Nossa Senhora Medianeira 1975, mestre em aos profissionais da educação seus valores.
Educação pela Pontifícia Universidade Católica 1989 sob a Tem o cuidado de conceituar de forma muito clara o
orientação do Prof. Dr. Moacir Gadotti e doutor em que é, de onde vem, e como chegar ao conhecimento,
Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo que é uma ferramenta de suma importância para o
1997 sob a orientação do Prof. Dr. Paulo Freire, onde educador, e traça um acompanhamento histórico e
também é professor-titular do De- partamento de Teologia filosófico para tal fi- nalidade, passando por filósofos
e Ciência da Religião e da pós-gradua- ção em Educação importantes como Sócra- tes e Platão. Quando Cortella
(Currículo), além de professor-convidado da Fundação Dom coloca que a Escola é o local do conhecimento,
Cabral e do GVpec da FGV-SP. Foi secretário municipal de subentende que ele está querendo nos deixar bem claro
Educação de São Paulo (1991-1992), durante a que a experiência vivida por cada edu- cador acontece no
administração de Luiza Erundina. Fez o programa “Diálogos campo prática vivenciada, no seu livro Pedagogia da
Im- pertinentes” na TV PUC, no Canal Universitário. autonomia de Paulo Freire coloca que não pode existir
docente sem discente, ou seja, todo professor sempre
SINÓPSE será um eterno aluno.
Ao analisar o conhecimento como algo acabado,
Mário Sérgio Cortella traz uma análise concernente ao pron- to e massificado é um perigo muito grande para
co- nhecimento que é produzido no interior da escola, seu o pro-
livro
é composto por cinco partes muito importantes para a fissional da educação, é justamente dentro deste contexto
com- preensão da sua obra no todo, no primeiro capítulo traz que entra a proposta da escola nova, de colocar o
como tema: Humanidade, cultura e conhecimento; no professor não apenas como um mero transmissor do
segundo: Co- nhecimento e verdade: a matriz da noção de conhecimen- to para os seus alunos, mas como um
descoberta; no terceiro: A escola e a construção do mediador que não apenas leve o conhecimento, mas que
Conhecimento; no quarto: Conhecimento escolar: indique quais os ca- minhos para se alcançar este
epistemologia e política e por fim ele conclui a sua obra conhecimento. Podemos ve- rificar este posicionamento
com um quinto capítulo: Conhecimento, ética e ecologia. Ao nas palavras de Cortella (2009,
iniciar a análise desta obra, achei por bem iniciar o texto p. 95): Não há conhecimento que possa ser apreendido e
chamando para este diálogo o grande escritor Derme- val recriado se não se mexer, inicialmente, nas preocupações
Saviane que na sua obra “Escola e Democracia” nos trás um que as pessoas detêm; é um contrassenso supor que se
grande discurso sobre como deveria ser uma escola possa ensinar crianças e jovens, principalmente, sem partir
democráti- ca e autônoma, conforme podemos verificar nas das preocupações que eles têm, pois, do contrário, só se
suas palavras. conseguirá que decorem (constrangidos e sem interesse)
os conhecimentos que deveriam ser apropriados
“A pedagogia nova começa, pois, por efetuar a crítica da (tornados próprios).
pe- dagogia tradicional, esboçando uma nova maneira de É importante observar que o espaço da escola é um
interpretar a educação e ensaiando implantá-la, primeiro local de aprendizagem em constantes transformações
através de expe- riências restritas; depois, advogando sua sociais, e o professor tem que ter os olhos abertos sem
generalização no âmbito dos sistemas escolares.” (SAVIANI, cercas para observar este ambiente que se chama escola.
2002) Lembrando que as ideias sociológicas provocaram
grandes alterações nas concepções pedagógicas,
Perceba que Saviani coloca que a pedagogia nova tem principalmente do ponto de vista epistemológico, que
esta característica de interpretar a educação através da rejeitam os pressu- postos idealistas, em contrapartida
experiência pessoal e principalmente dentro do ambiente vemos os materialistas tradicionais contrapõem à dialética.
escolar. É perce- ber que o professor não é somente um (ARANHA, 2006).
mero transmissor do conhecimento, mas antes de tudo, ele Para finalizar a sua obra, Cortella traça um paralelo
é o mediador, será aque- le que mostrará ao seu publico muito interessante acerca da ética dentro do processo da
alvo como este conhecimento é construído, é poder construção do conhecimento, quando falamos em ética
trabalhar este ser humano que está em seu interior com logo nos vem à mente um sistema de regras do que po-
cultura e conhecimento. O autor coloca que existe uma luta demos e não podemos fazer sobre as nossas escolhas. É
constante através do tempo para conceituar o que significa importante que a busca pelo conhecimento
ser humano, nos arremetendo aos conceitos filo- sóficos compartilhado venha ser trabalhado de forma ética, para
mais clássicos, como os de Aristóteles, Platão e ate os que o profissio- nal forme alunos integro comprometido
contemporâneos, como é o caso do escrito Fernando com a pesquisa
Pessoa, todos com seus conceitos.
206
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

de forma verdadeiro sem máscaras e sem fingimentos.


Por- tanto, esta obra de Mario Sergio Cortella e sua tese Capítulo 3 - (A Escola e a construção do Conheci-
do co- nhecimento é uma contribuição importantíssima mento) procura-se uma aproximação do cotidiano escolar
no campo social, filosófico, político, cultural e intelectual e, principalmente, enfatiza-se a conexão entre o Conheci-
tomando a escola como lugar de clímax, transporte e um mento e sua produção histórica, ressaltando a necessida-
importante veículo para disseminação de novo conceito de de ruptura da aura mítica que, muitas vezes encobre a
de fazer edu- cação. E, finalizo repetindo as palavras de relação com o saber e quer anular o lugar dos erros, das
Dermeval Saviani, eu acredito no poder da escola e em preocupações, dos prazeres e das intenções.
sua função de equa- lização social.
O livro A escola e conhecimento é resultante da Capítulo 4 - (Conhecimento escolar: epistemologia
última tese de doutoramento orientada por Paulo Freire, e e política) é a conclusão desta reflexão e nele tomamos
sobre ela escreveu o Mestre em março de 1997: “Boa tese o tema do sentido social concreto daquilo que os educa-
nem é a que, com ares de fácil, se entrega, sem nenhum dores fazem. Este resgate temático dá-se a partir de uma
obstáculo ao leitor, nem tampouco é a que, misteriosa em visão sobre algumas compreensões sobre a relação entre
demasia, se fecha à produção de sua compreensão. Boa Sociedade e escola, segue com um alerta contra o peda-
tese é a que, desafiando o leitor, provoca nele a alegria de gocídio e finaliza com a perspectiva de um Conhecimento
lê-la. Esta é assim”. como ferramenta da liberdade e de um poder como amál-
Inspirado na “sedução da esperança”, da qual Paulo gama de convivência igualitária.
Freire é a gênese, este livro de Mário Sérgio Cortella tem
como objetivo central analisar a questão do Texto adaptado de XAVIER, F.
conhecimento no interior da Escola, do ponto de vista de
alguns funda- mentos epistemológicos e políticos, de COMENTÁRIO
modo a subsidiar as educadoras e os educadores na
reflexão sobre o sentido social concreto do que fazem. O É notória sua capacidade de articular uma gama enor-
texto tem quatro capítulos que se agregam em torno da me de informações em uma análise pertinente que, sem
tese fundamental que é a de que o Conhecimento é uma deixar de conter críticas meticulosas, consegue ao mesmo
construção cultural, e a Escola tem um comprometimento tempo ser profundamente otimista. Seu trabalho, pleno
político de caráter conservador e inovador que se de humanismo, rompe com antigas falácias da academia,
expressa também no modo como esse mesmo é entre elas a neutralidade o racionalismo, geralmente, de-
Conhecimento é compreendido, selecionado, transmitido fendidos como se ambos fossem possíveis.
e recriado. Desconstruindo discursos, principalmente jargões e
Segundo o autor, este livro tem como objetivo central repetições automatiza- das - que com força ideológica
analisar a questão do Conhecimento no interior da escola, engendram ações, atribuem valores, assim determinando
do ponto de vista de alguns de seus fundamentos episte- a realidade, vai revelando as fragilidades e,
mológicos e políticos (enquanto produção e apropriação consequentemente, os espaços para trans- formação do
da Cultura), de modo a subsidiar os educadores na que muitas vezes nos parece inabalável. Lo- caliza a
reflexão sobre o sentido social concreto do que fazem, e educação, e sua eterna “crise”, em um panorama amplo,
que as pessoas para as quais são destinadas essas marcado, principalmente, pela injustiça social resul- tante
reflexões são todos aqueles que atuam intensamente no de um eficaz projeto de dominação, elaborado e exe-
dia-a-dia na es- colar (prioritária, mas não exclusivamente cutado por uma minoria gerando, em contraposição, uma
na escola públi- ca) e que não têm oportunidade de um massa de excluídos.
envolvimento mais amiúde com o repensar teórico das Esquerdismo. Simplificação. Ponto de partida. A
próprias práticas. seguir, adverte para a repetição, no microuniverso da
escola, dos equívocos cometidos ao sermos levados pelo
Capítulo 1 - (Humanidade, Cultura e Conhecimento) drama que nos envolve: perdemos o verdadeiro sentido
tem uma natureza mais geral, buscando estabelecer as de nosso tra- balho e desprezamos nossa capacidade de
ba- ses de uma antropologia filosófica na qual se reflita transformar a situação que nos oprime. Na introdução,
sobre a presença do ser humano na realidade e, dentro aponta a urba- nização acelerada, que marca a história
desta, o lugar do conhecimento como produto cultural recente do Brasil, como um dos fatores determinantes dos
(um bem de consumo e produção da vida). descalabros ob- serváveis em nosso sistema educacional.
Associado à ur- banização (e também por ela
Capítulo 2 - (Conhecimento e Verdade: a matriz da responsável), o modelo eco- nômico desenvolvimentista,
no- ção de descoberta) procura-se contrapor à teoria que privilegiou a alocação de recursos para criação de
sobre o conhecimento mais frequente na nossa realidade infraestrutura indispensável à in- dustrialização do país,
escolar: o conhecimento e a verdade como descobertas. contribuiu para a falência do sistema público de ensino.
Para tanto, e a pretexto de se fazer uma certa Por outro lado, lembra que esse modelo também teve seu
“arqueologia” dessa con- cepção, procura-se evidenciar a aspecto positivo pois contribuiu para a ampliação do
articulação sobre o epis- temológico e o político de seu acesso de um grande número de pessoas à escolarização.
contexto geracional, com a finalidade de demonstrar que Diante desse cenário, apresenta a análise do papel do
a própria ideia de verdade como descoberta é, de fato, conhecimento na conservação ou transformação da
uma construção cultural. dinâmica social como objetivo central do livro.

207
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

No capítulo 1, retomando a premissa de que não há


co- nhecimentos no ser humano, faz um interessante Três ideias são particularmente caras e instigadoras de
“passeio” pela história buscando a (artigo bem definido) reflexões fundamentais para a contemporaneidade.
definição do que é ser humano. Durante o “passeio”, vai
coletando e re- lacionando elementos (para a reflexão - A primeira retoma a importância das mídias na cons-
posterior) fundamen- tais, a saber: trução do imaginário social (p. 144): a propaganda pro-
- as origens e a evolução biológica das espécies; move nosso consumo de mercadorias, ou ela mesma nos
- a cultura que produzimos e que nos produz; consome? Onde fica a subjetividade em meio ao duelo
- a ação transformadora do homem sobre a natureza e império das marcas que nos invadem pelos ouvidos e
através do trabalho; olhos, em casa ou fora dela, com ou sem consentimento?
- o conhecimento e os valores como construção - A segunda e a terceira, distanciadas no texto (p. 126
coletiva e balizadores da existência humana; e 156), mas profundamente próximas, tratam da
- a não-neutralidade dos processos educativos. substituição do embate homem versus mundo, pelo
embate homem versus homem e da tão “gasta” e
No capítulo 2, é a história da civilização grega- mais questionada liberdade. No último século, apesar do
especificamente da sua produção de conhecimento, que trauma de duas grandes guer- ras (e, consequentemente,
possibilita a reflexão sobre a construção da ideia de o repúdio a elas), assistiu-se à proliferação de vários
verdade como “descoberta”, e sobre a origem da escola conflitos incompatíveis com qual- quer ideia de civilidade.
dissociada da prática produtiva, pois é fruto do ócio Religião, etnia e economia foram alguns dos motivos
(tempo livre) e riqueza da aristocracia. Sendo assim, a anunciados para o que mais impressio- nava: o embate
vivência e os conhecimen- tos adquiridos na escola/ ócio homem versus homem, resultante de sua ainda
possibilitavam o domínio da arte de falar e argumentar incapacidade de encontrar soluções pacificas e di-
bem, e esse era um fator decisivo nas assembleias e nos plomáticas. Difícil julgar quem tem razão, afinal são tantos
debates políticos, definindo, portanto, com quem ficava o e variados argumentos de ambas as partes... Entretanto, é
poder. Finalmente, situa sua concepção de conhecimento. possível constatar que aceitar, respeitar e conviver com as
Opondo-se a ideia de verdade, como algo a ser diferenças continua sendo um grande desafio.
“descoberto” pelo sujeito sobre o objeto, ela é conce-
bida como uma dimensão fundamental do conhecimento, Ao tratar da liberdade e de nossa capacidade singular
mas com caráter social - constrói-se a partir da relação de dizer não, apresenta uma ideia preciosa: Ser humano é
entre o sujeito e o objeto, na vivência do coletivo - e ser justo (p. 156). A partir dela, constrói um olhar radical
histórico. sobre questões como violência, injustiça e miséria. Ou se
universaliza a determinação de pôr um fim a essas
No capítulo 3, ao tratar da nitificação da ciência e dos mazelas
cientistas - como mundo e seres fantásticos, - independente de religião, etnia ou valor do PIB, ou seja,
respectivamen- te - na atualidade, lembra o quanto os descartando-se qualquer arbitrariedade - ou como acre-
professores contri- buem para tanto quando deixam de ditar que exista humanidade? Sendo assim, pensar, como
situar as reais condi- ções de produção do conhecimento. sugere o autor, talvez ajude a encontrar soluções para os
Essa mitificação atinge vários campos do conhecimento, impasses que afetam desde pequenos grupos até nações
desde a matemática e a física, até a história e a geografia. e a redefinir o papel da escola, uma vez que ela continua
Ela interfere na compreen- são de conceitos e fatos, mas sendo o espaço legítimo de formação do cidadão. Com
mais ainda determina um dis- tanciamento entre o um domínio de conteúdo e de linguagem próprio de
aprendiz e o conhecimento, respaldado pelo senso comum quem vive plenamente os sabores e dissabores da
de que ciência é coisa para “gênios”. Mas o que fazer com educação, o professor Cortella realizou um pequeno livro,
anos de mitificação? E com as estórias de descobertas mas um grande trabalho.
“fantásticas” que nos foram contadas e que, por considerá-
Ias interessantes, contamos aos nossos pupilos? O Texto adaptado de PIMENTA, M. A. de
professor CorteIla sugere: revalorizar o prazer e desvelar a
luta pelo poder que envolve o conhecimento. A. RESUMO

No capítulo 4, mostra um panorama com as concep- Introdução:


ções sobre a relação entre a escola e a sociedade. Chama
atenção para três delas que alteram doses de otimismo, A Educação está em Crise!
pessimismo, ingenuidade e criticidade. Destaca o que de-
nomina otimismo crítico, como a concepção que A crise da Educação tem sido inerente à vida nacional
considera “a natureza contraditória das instituições porque não atingimos ainda patamares mínimos de uma
sociais” (pág. 135). Nela, apesar de estar contida uma justiça social compatível com a riqueza produzida pelo
dimensão conservadora, há também o espaço para país e usufruída por uma minoria. Não é, evidentemente,
inovação. Para que seja possível criar, é necessário “privi- légio” da Educação; todos os setores sociais vivem
revermos nossa maneira de avaliar, nos- sas concepções sucessi- vas e contínua crises. (p. 9)
prévias sobre a criança, nossos métodos e tantas outras
questões que se apresentam cristalizadas. Só assim é
possível vislumbrar o fim do vício do círculo vicioso,
aquela atitude, pouco edificante, de atribuir nosso
fracasso a tudo que está em volta e que vem antes de
nossa ação.
208
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

1. Gênese recente de uma antiga crise e atuação


dos educadores “Criar não é um jogo mais ou menos frívolo. O criador
meteu-se numa aventura terrível que é a de assumir ele
O modelo econômico implantado no país a partir de 1964 pró- prio, até o fim, os perigos que enfrentam as suas
privilegiou a organização de condições para a produção criações”. Jean Genet. (p. 20)
capita- lista industrial e, assim, o poder político central
(atendendo aos interesses das elites) direcionou os Capítulo 1 - Humanidade, cultura e conhecimento
investimentos públicos para grandes obras de infraestrutura:
estradas, hidrelétricas, meios de comunicação etc.; o Todas e todos que atuamos em Educação, porque
financiamento para essa política e para a aquisição de lida- mos com formação e informação, trabalhamos com o
equipamentos e tecnologias foi obtido com em- préstimos co- nhecimento. O conhecimento, objeto da nossa
no exterior (pelo Estado ou por privados com o aval do atividade, não pode, no entanto, ser reduzido à sua
Estado) e levou a um brutal endividamento do país, retirando, modalidade cien- tífica, pois, apesar de ela estar mais
cada dia mais, os recursos necessários para investimentos direta e extensamente presente em nossas ações
nos setores sociais. (p. 11) profissionais cotidianas, outras modalidades (como o
Assim, a educação pública das últimas décadas (com refle- conhecimento estético, o religioso, o afetivo etc.) também
xos no ensino privado) foi um dos desaguadouros do intencio- o estão. P. 21.
nal apartheid social implementado pelas elites econômicas e
é a partir dele que podemos compreender a crise da O que significa o ser humano?
Educação e a atuação político/pedagógica dos educadores. (p.
13) Muitas já foram as definições que procuraram captu-
rar uma essencialidade da natureza humana, a começar da
2. Educação brasileira, epistemologia e política: por mais clássica e conhecida: o Homem é um animal racional.
que Essa sentença, marcada por uma aparência de obviedade
repensar fundamentos dessa articulação? e repetida à exaustão (com um certo ar triunfal), foi
expres- sa por Aristóteles (384-322 a.C.) no século IV a.C.
Desponta mais fortemente hoje uma preocupação: não e, muito embora a maioria das pessoas não conheça sua
bas- ta reafirmar que o aumento da quantidade de cidadãos origem, faz parte do senso comum. Antes dele, seu mestre
na escola pública leva a uma queda da qualidade de ensino Platão (427- 347 a.C.) houvera definido o Homem como
(com as causas já apontadas); é preciso pensar uma nova um bípede im- plume e, no início do século XX, o grande
qualidade para uma nova escola, em uma sociedade que poeta português Fernando Pessoa (1888-1935) elaborou
começa, paulatinamente, a erigir a Educação como um direito uma definição um pouco mórbida, mas tecnicamente bem
objetivo de cidadania. (p. 13) A quantidade na Educação precisa: o Homem é um cadáver adiado!
passa, necessariamente, pela quantidade. Em uma O que há de comum entre essas três ideias? A
democracia plena, quantidade é sinal de qualidade social e, tentativa de identificar o humano, dar-nos uma
se não se tem a quantidade total, não se pode falar em identidade, isto é, nos diferenciar do restante da realidade
qualidade. Afinal, a qualidade não se obtém por índices de de modo que nela nos localizemos; ao mesmo tempo, é a
rendimento unicamente em relação àqueles que frequentam procura de uma de- finição (do latim finis, limite, fronteira)
escolas, mas pela diminuição drástica da evasão e pela daquilo que é nosso contorno, que nos circunscreve, nos
democra- contém, ou seja, marca nosso lugar. (p. 23-24).
tização do acesso. (p. 14) Qual, então, o nível atual de Conhecimento que a
A democratização do saber deve revelar-se, então, Ciên- cia, como forma mais precisa e eficaz de
como objetivo último da escola pública, na educação da classe investigação da realidade, nos aponta quanto ao lugar do
traba- lhadora (agora frequentando-a em maior número) humano? Eis, em termos bastante gerais, uma síntese das
com uma só- lida base científica, formação crítica da conclusões provi- sórias e ainda submetidas a
cidadania e solidariedade de classe social. (p. 15) controvérsias:
Portanto, não é uma escola pública na qual o - estamos em um dos universos possíveis, ele é finito
trabalhador simplesmente aprenda o que iria utilizar no dia e tem provavelmente o formato cilíndrico (em função da
ou semana se- guinte no seu cotidiano (em uma dimensão curvatura do espaço entre si mesmo);
utilitária e redutora), mas aquela que selecione e apresente - esse universo surgiu aproximadamente 15 bilhões de
conteúdos que possibi- litem aos alunos uma compreensão anos, a partir de uma grande explosão inicial apelidada de
de sua própria realidade e seu fortalecimento como cidadãos, “big bang” e se extinguirá daqui a outros tantos bilhões
de modo a serem capazes de transformá-la na direção dos de anos, em função do esvaecimento da matéria e energia
interesses da maioria social. Uma nova realidade social, por nele existentes;
sua vez, exige uma reorientação cur- ricular que preveja o - dessa explosão original resultou uma expansão (que
levar em conta a realidade do aluno. Levar em conta não ainda continua), em escola inimaginável, e que se concen-
significa aceitar essa realidade mas dela partir; par- tir do trou, basicamente, em grandes massas estelares que, por
universo do aluno para que ele consiga compreendê-lo e sua vez, se agruparam em 100 bilhões de galáxias;
modificá-lo. (p. 16) - uma dessas galáxias é a nossa Via Láctea, que
Por isso, a precisão de transmutar os conhecimentos contém 100 bilhões de estrelas;
cientí- ficos em ferramentas de mudanças; o universo - nessa galáxia, há 4,6 bilhões de anos, originou-se o
vivencial da clas- se trabalhadora é extremamente rico em nosso sistema solar;
termos culturais, mas precário em termos de conhecimentos
mais elaborados, que são propriedade quase exclusiva das
elites sociais que dificultam ao máximo o acesso da classe
trabalhadora a esta forma de conhe- cimento eficaz. (p. 16-
17)
209
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

- o sol, uma das 100 bilhões de estrelas da galáxia, é


relativamente pequeno (de 5ª grandeza), e tem, girando à - há 35.000 anos nos tornamos a espécie planetária
sua volta, 9 já conhecidos planetas; do- minante, sem outros rivais que ameaçassem nosso
domínio, exceto outros humanos, a ponto de atualmente
- um desses planetas é a terra, o quinto em tamanho
e distante 150 milhões de quilômetros do Sol; termos ca- pacidade para aniquilar a vida na terra;
- na terra há vida e, até pouco, supunha-se que sé - há 12.000 anos chegamos a 3 milhões de indivíduos
nela; da espécie e, desde então, estamos próximos de aumentar
- estima-se que nosso planeta tenha entre 3 e 30 mi- em
2.000 vezes esse número;
lhões de espécies de vida diferentes, embora apenas 1,4
milhão tenha sido classificada (750.000 insetos, 41.000 - o tempo médio de vida humana individual no
planeta é, hoje, de 60 anos, isto é, 21.900 dias;
ver- tebrados, 250.000 plantas e o restante de outros
inverte- brados, fungos, alga e microrganismos); - cada um de nós, diariamente, alimenta-se e gera
deje- tos, na proporção relativa de um quilo de consumo
- uma dessas espécies é a nossa, em sua forma mais
para um quilo de resíduos rejeitados;
recente (35.000 anos para cá), chamada de Homo Sapiens
sapiens; - assim, a espécie consome a cada dia 5,5 milhões de
toneladas e rejeita o equivalente (ao qual é preciso dar um
- a espécie humana tem, no momento, 5,5 bilhões de
destino);
indivíduos;
- ao longo de sua existência, um ser humano ingere
- um deles sou eu.
quase 22 toneladas das outras formas de vida contidas no
planeta, sem contar aquelas utilizadas para finalidades
De forma caricatural (mas não falsa), assim se poderia
não alimentares (roupas, calçados, objetos, diversão,
responder à questão: Quem sou eu? Sou apenas um indi-
transporte, experimentos etc.);
víduo entre outros 5,5 bilhões, pertencente a uma espécie
- nessa duração de 60 anos, em linhas gerais, os
entre outras 30 milhões diferentes, vivendo em um
primei- ros 20 são dedicados basicamente à “montagem”
planeti- nha, que gira em torno de uma estrelinha entre
de nossas estruturas (psíquicas, comunicacionais,
outras 100 bilhões, que compõem uma mera galáxia em
biológicas, reprodu- tivas, de aprendizagem e trabalho), os
meio a outras 100 bilhões, presentes em um dos universos
20 seguintes ao apro- veitamento concentrado destas (na
existentes... (p. 26-27). geração e cuidado de outros humanos e na produção de
Os 500 anos mais recentes nos “descentraram” meios de sobrevivência). Nos derradeiros 20 anos, se inicia
bastan- te: Copérnico (1473-1543) e Galileu (1564-1642) a “desmontagem” (falhas nas estruturas consolidadas e
derruba- ram a certeza de sermos o centro universal; diminuição da intensidade e eficácia da ação), até a
Darwin (1809- 1882) abalou a convicção de estarmos um falência final de cada conjunto or- gânico;
pouco abaixo
- para complicar, precisamos de, ao menos, 1/3 das ho-
dos “anjos” e nos remeteu para a companhia, superior ra diárias em estado de sono e mais 1/3 delas à busca de
ain- da, de outros primatas; Freud (1856-1939), ao s
identificar
condições para manter o corpo vivo, acumulando-se, assim,
em nós um “porão” desconhecido e colocar sob suspeita 20 anos dormindo e mais 20 trabalhando;
a noção de termos uma “alma” livre a nos dirigir. Isso tudo - ao final, independentemente do local e época de
somente no nível da Ciência, sem apontar a multiplicidade nas- cimento, da condição socioeconômica, do nível de
de interpretações cambiantes das religiões e das artes. (p. escolari- dade, das propriedades acumuladas, do status na
27) comuni- dade... morremos.
Temos vida, sim, e, exatamente por isso, deixamos de
tê-la (pelo menos na forma como a entendemos). A cons- Cruel, não? Colocado dessa forma, sem dúvida. Não é
ciência da vida transporta também a consciência da estranho que muitas vezes nos sintamos perdidos, com
preca- riedade da vida e da transitoriedade da existência uma sensação de angústia e abandono universal. Para que
humana. Todos os seres vivos por nós conhecidos tudo? Para depois acabar? Por isso, Albert Camus (1913-
morrem; é prová- vel que seja o ser humano o único que 1960), que dedicou sua obra a pensar o absurdo da
sabe que vai morrer. Esse fato não nos agrada muito e condição humana, escreveu na introdução do seu
procuramos afastá-lo, se não concretamente, ao menos L’Homme Revolté: “O homem é a única criatura que se
simbolicamente, por inter- médio da Arte, da Religião, recusa a ser o que ela é”. (p. 30-31). Somos, antes de mais
da Linguagem. Afinal, o que é, para nós, a vida? De nada, construtores de sentido, porque,
forma objetiva, sem edulcorar, é o nome que damos ao fundamentalmente, somos construtores de nós mesmos, a
intervalo de tempo entre nascer e morrer. Se o grande partir de uma evolução natural. Um passeio pelas nossas
Guimarães Rosa dizia que viver é muito perigoso, nascer origens. É patente que o animal humano difere dos outros
também o é (morrer nem se fala...). (p. 28) Vários animais; temos uma história peculiar no processo de
estudiosos entendem que a nostalgia do con- forto evolução biológica. No entanto, para facilitar o “passeio”
uterino é o que leva muitos de nós, quando estamos que propomos, esqueçamos um pouco o estágio atual
deprimidos, melancólicos ou com sensação de abandono, atingido pela nossa espécie e façamos um exercício
a ficar deitados quase em posição fetal (encolhidos, com hipotético de nos vermos simplesmente como um animal
os joelhos em direção ao peito), querendo retornar. (p. 29) qualquer em nosso distante passado. Do ponto de vista
Há veredas nesse grande sertão? Vejamos, ainda que da nossa conexão com o meio ambiente, não somos
ludicamente, alguns indicadores técnicos, oferecidos pela especialistas em nada! Nossa estrutura orgânica é débil,
racionalidade mais sequiosa, e que embaçam nosso cami- em relação às outras espécies, e nos habilita para poucas
nhar: das vantagens naturais na luta pela
manutenção da vida. (p.32)
210
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Comparados a outros seres, somos um animal frágil:


possuímos reduzida força física, não temos muita veloci- Veja-se que, por ser Cultura um produto derivado de
dade de deslocamento, nossa pele é pouco resistente ao uma capacidade, é absurdo supor que alguém não tenha
clima e agressões, não nadamos bem e não voamos, não cul- tura; tal concepção, uma discriminação ideológica,
resistimos mais do que alguns dias sem água e alimento, interpreta a noção de cultura apenas no seu aspecto
intelectual mais re- finado e não leva em conta a
nossa infância é muito demorada e temos de ser cuidados
multiplicidade da produção hu- mana coletivamente
por longo tempo. (p. 32-33)
elaborada. Nós humanos somos, igual- mente, um produto
O histórico da evolução biológica tem mostrado que a
cultural; não há humano fora da Cultura, pois ela é o nosso
especialização exclusiva é, muitas vezes, fatal. Os animais
ambiente e nela somos socialmente for- mados (com
que se adaptam perfeitamente ao ser habitat, alcançando
valores, crenças, regras, objetos, conhecimen- tos etc) e
um alto grau de definição (com suas “fronteiras” delimita-
historicamente determinados (com as condições e
das e sem margem de flexibilidade), correm o risco de, ao
concepções da época na qual vivemos). Em suma, o
acontecerem mudanças no ambiente, perecer. (p. 33)
homem não nasce humano e, sim, torna-se humano na
vida social e histórica no interior da Cultura. (p.42)
3. Cultura: o mundo humano
O termo que expressa essa noção do humano produzir-
-se, produzindo Cultura e sendo por ela produzido, é
Somos, como já dito, um ser não-especializado na ori-
homi- nização. (p. 41-42-43)
gem e, portanto, largamente incompatível com a adapta-
É claro que o mais importante bem de produção é o
ção à natureza. Para nós, em última instância, adaptar-se é
pró- prio Humano e, com ele e nele, a Cultura; no entanto,
morrer. Estar adaptado significa estar acomodado,
como a transmissão da Cultura não é por hereditariedade e
circuns- crito a uma determinada situação, recluso em
genética (“ninguém nasce sabendo”), cada geração, não
uma posição específica; adaptar-se é, sobretudo,
podendo li- mitar-se a consumir a Cultura já existente,
conformar-se (acatar a forma), ou seja, submeter-se. (p.
necessita, também, recriá-la e superá-la. Desse ponto de
39) vista, o bem de produ- ção imprescindível para nossa
Temos de enfrentar a realidade natural (que chamare- existência é o Conhecimento, dado que ele, por se
mos mundo), lutar contra ela, romper a adaptação, e isso constituir em entendimento, averigua- ção e interpretação
não é uma questão de gosto ou vontade; essa luta se situa sobre a realidade, é o que nos guia como ferramenta
no campo da liberdade mas no da necessidade! A liberda- central para nela intervir; ao seu lado se coloca a Educação
de será uma conquista paulatina na nossa História à me- (em suas múltiplas formas), que é o veículo que o
dida que vencemos a necessidade. Lutamos com a natu- transporta para ser produzido e reproduzido.
reza e a natureza luta conosco, interferimos nele e ela em
nós; é uma relação de reciprocidade a qual conceituamos
4. Conhecimento e valores: fronteiras da não
como contradição (contrários que se inter-relacionam e se neutra- lidade
interpenetram conflituosamente) humano/mundo. Qual
é, porém, a “ferramenta” para enfrentarmos a realidade? A primeira intenção de todo ser vivo é manter-se vivo,
A tentação inicial seria dizer: a racionalidade. No entanto, mas, para nós, não é suficiente a mera sobrevivência
evidentemente, não basta pensar que as coisas apoiada em conhecimentos sobre o mundo: é fundamental
aconteçam; é preciso agir. que a vida valha a pena. Por isso, um dos produtos ideais
Nossa relação de interferência no mundo se dá por da Cultura são os valores por nós criados para o existir
in- termédio da ação; entretanto, não é uma ação humano pois, quando os inventamos, estruturamos uma
qualquer o que nos distingue, pois todos os animais têm hierarquia para as coisas e acontecimentos, de modo a
ação. Nos- sa ação, porque altera o mundo, é ação estabelecer uma ordem na qual tudo se localize e
transformadora, modificadora, que vai além do que encontre seu lugar apropriado. Só assim a vida ganha
existia; todavia, alguns outros animais também têm ação sentido (na dupla acepção de significado e direção). (p. 45-
transformadora. O que vai nos diferenciar, de fato, é que 46)
só o animal humano é capaz de ação transformadora No entanto, embora valores e conhecimentos sejam
consciente, ou seja, é capaz de agir intencionalmente (e ex- ternados a partir de indivíduos, sua construção é
não apenas instintivamente ou por reflexo condicionado) coletiva, dada a impossibilidade de, como apontamos,
em busca de uma mudança no ambiente que o favoreça. existir algum humano originalmente apartado da vida
Essa ação transformadora cons- ciente é exclusiva de ser social. Aí adentra um outro elemento importante: a vida
humano e a chamamos trabalho ou práxis; é consequência social é, também, vida política, isto é, configura-se como
de um agir intencional que tem por finalidade a alteração espaço de conquista e ma- nutenção de poder sobre os
da realidade de modo a moldá-la às nossas carências e bens e pessoas, não havendo, ainda, sociedades
inventar o ambiente humano. complexas de composição igualitária. (p. 48)
O trabalho é, assim, o instrumento da intervenção do Ora, o principal canal de conservação e inovação dos
humano sobre o mundo e de sua apropriação (ação de valores e conhecimentos são as instituições sociais como a
tor- nar próprio) por nós. Se o trabalho é o instrumento, família e a Igreja, o mercado profissional, a mídia, a escola
qual é o nome de efeito de sua realização? Nós o etc. tal como mencionamos, ao contrário dos outros seres
denominamos Cultura (conjunto dos resultados da ação vivos, nós os humanos, dependemos profundamente de
do humano sobre o mundo por intermédio do trabalho). pro- cessos educativos para nossa sobrevivência, (não
(p.41) carregamos em nosso equipamento genético instruções
suficientes para a produção da existência) e, desse prisma,
a Educação é ins- trumento basilar para nós. (p. 49)

21
1
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

No entanto, a Educação pode ser compreendida em


duas categorias centrais: educação vivencial e espontânea, o Capítulo 2
“vivendo e aprendendo” (dado que estar vivo é uma
Conhecimento e verdade: A matriz da noção de
contínua situação de ensino/aprendizado), e educação
desco- berta
intencional ou propositada, deliberada e organizada em
locais predeterminados e com ins- trumentos específicos
Toda educadora e todo educador tem uma interpretação
(representada hoje majoritariamente pela Escola e, cada vez so- bre o conhecimento: o que é, de onde vem e como
mais, pela mídia). Os processos pedagógicos também não chegar até ele. Ora, essa interpretação nem sempre é
são neutros, estando imersos no tecido social e tendo, consciente e reflexiva e, no mais das vezes, é adotada sem
ainda, a tarefa de elaborar o indispensável amálgama para uma percepção muito clara de suas fontes e consequências.
a vida coletiva, sendo conservadores e inovadores; é como No entanto, como o cerne e a finalidade última dos processos
tal que esses processos devem ser enfocados e educativos em geral é o Conheci- mento (formativo e
compreendidos. É por isso que, principalmente nós que informativo), as concepções pedagógicas de cada um e de cada
lidamos também com processos pedagógicos na sua uma de nós estão em uma estreita conexão com a “teoria
modalidade intencional, precisamos de uma atenção sobre o conhecimento” que, individual ou coletiva- mente,
extremada à compreensão recípro- ca da visão de alteridade. assumimos. (p. 56)
Aquilo que afirma François Laplantine serve muito para nós: Ademais, quando lidamos com um conhecimento
Presos a uma única cultura, somos não apenas cegos às qualquer, sempre nos preocupamos em julgar se ele é válido
dos outros, mas míopes quando se trata da nossa. A ou correto, isto é, qual é seu valor de verdade; por isso, é
experiência da alteridade... leva-nos a ver aquilo que nem parte integrante de uma teoria do Conhecimento refletir sobre
teríamos conseguido imaginar, dada a nossa dificuldade em a verdade. É fundamental notar que a compreensão mais
ficar nossa atenção no que nos é habitual, familiar, cotidia- presente em nosso sistema edu- cacional é aquela que
no, e que consideramos “evidente”. Aos poucos, notamos entende o Conhecimento ou a Verdade como descoberta.
que o menor de nossos comportamentos (gestos, mímicas, Uma noção como essa tem desdobramentos políticos e
posturas, reações afetivas) não tem realmente nada de epistemológicos profundos nas nossas práticas e por isso é
“natural” (Laplan- preciso iluminar sua gênese de modo a permitir maior con-
tine, 1988). sistência e consciência em nossas ações educativas.
Educadoras e educadores necessitamos reforçar a cons- O termo verdade é dos mais complexos para ser
ciência de que valores e conhecimentos, em vez de serem conceituado pois origina-se sempre de um julgamento (habitual,
de- terminações de uma natureza humana imóvel, são consensual ou arbitrário) e, mais ainda, como todo juízo de
resultantes de uma sucessão de ocorrências existenciais. valor (tal como o conhe- cimento que o provoca), é uma
Buscar “enxergar” o outro não implica de forma alguma ocorrência histórica, ou seja, é relativo à Cultura e à Sociedade
aceitá-lo como é; não há prática educativa coerente se não na qual emerge em certo momento. (p.56)
houver inconformidade, dado que a própria palavra O exercício de nossas atividades se dá no Ocidente e, pelo
“educação” significa conduzir para um lugar diferente óbvio, estamos mergulhados na cultura ocidental, com todas as
daquele em que se está. No entanto, a incom- preensão da suas raízes históricas e desenvolvimentos posteriores. São essas
gênese e(p.50) desdobramentos dos valores e co- raízes que devemos visitar, se quisermos perceber a
nhecimentos daqueles com os quais convivemos é um procedência de nossos entendimentos sobre o conhecimento
obstácu- lo brutal para uma relação pedagógica autônoma e e a Verdade. Um caminho possível para iniciar essa visita é
produtiva. buscar o significado etimológico do conceito de Verdade nos
O empenho consistente em uma visão de alteridade idiomas de origem lati- na como o nosso. Em português, a
permi- te identificar nos outros (e em nós mesmos!) o palavra vem do latim veritate, atada ao radical verus (certo,
caráter múltiplo da Humanidade, sem cair na armadilha autêntico, correto). (p. 56-57)
presunçosa de taxar o diferente como sendo esquisito, Desse ponto de vista, o conceito de Verdade carrega em
exc6entrico, esdrúxulo e, por- tanto, assimilar a postura si a ideia de não-esquecível, não-obscurecido, não velado e,
prepotente daqueles que não enten- dem que se por fim, não-coberto; decorrem daí as noções de Verdade
constituem em um dos arranjos possíveis do ser humano, como desvela- mento ou descoberta. (p. 57) ...a ideia de
mas não o único ou, necessariamente, o correto. (p. 49-50- Verdade como desco- berta é uma construção. (p. 58)
51).
No entanto, o conhecimento tem uma especificidade 1. Elos históricos do paradigma grego
ine- rente que o liga à história em sua estrutura e
Os gregos são um povo com uma contribuição histórica
conjunturas e que é, em cada época, manifestado em seu
particularmente especial para o Ocidente: a maioria dos nossos
sentido de diferentes maneiras no interior da Escola. Por
parâmetros linguísticos, estéticos, políticos, filosóficos e científi-
isso, um esforço que é exi- gido hoje da prática em
cos tem como matriz inicial a civilização grega da
Educação é o de relativizar o peso dos conhecimentos
Antiguidade, à qual se(p.58) somou o legado moral e religioso
científicos, não como forma de desqualificá-los (o que seria
judaico-cristão e, ainda, a experiência da Roma Antiga no
abstruso), mas como um rico veio para possibili- tar a campo do Direito e do Estado. A Grécia, situada à beira dos
historização da produção humana e diminuir a presunção mares mediterrâneo, Adriáti- co, Jônico e Egeu, e próxima às
aleatória contra o passado e contra os não escolarizados. (p. passagens para o Oriente asiático e europeu, teve um contato
52). Os filósofos não brotam da terra como cogumelos, eles bastante facilitado com outros povos (menos internamente,
são frutos de seu tempo, de seu povo, cujas forças mais sutis em função de seu relevo montanhoso), tornando-se mais
e mais ocultas se traduzem em ideias filosóficas. O mesmo permeável à absorção de conteúdos de outras culturas e
espírito fabrica as teorias filosóficas na mente dos filósofos, propagando mais facilmente a sua própria. (p. 58-59)
e constrói estradas de ferro com as mãos dos operários. A
filosofia não é
exterior ao mundo. (Karl Marx). (p. 54)
212
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

...as últimas palavras de Sócrates perante o tribunal: “A


hora da partida chegou, e nós seguimos nossos caminhos Capítulo 3
- para mim, morrer; para vocês, viver. Qual é o melhor, só
Deus sabe”. (p. 78) A Escola e a Construção do Conhecimento
...defensores da importância da percepção sensível e
de que todo conhecimento provém da experiência, com Como apontamos no capítulo anterior, uma das
ela deve ser provado, à cata da descoberta das leis questões cruciais para as nossas práticas pedagógicas é a
estáveis da natureza. concepção sobre o Conhecimento dentro da sala de aula; no
mais das vezes, o Co- nhecimento é entendido como algo
Três alemães tentarão resolver o impasse: Kant (1724-
1804), Hegel (1770-1831) e Husserl (1859-1938). Kant pro- acabado, pronto, encerrado em si mesmo, sem conexão com
duziu uma junção das duas linhas em oposição, admitindo sua produção histórica. (p. 101)
a existência de conhecimentos verdadeiros inatos (sobre
os quais não podemos ter certezas e que eventualmente 1. Relativizar: caminho para romper a mitificação
intuímos) e conhecimentos apreendidos com a
experiência (os únicos que de fato, conhecemos, mas que Quando um educador ou uma educadora nega (com
não são a essência da realidade); o impasse ficou mais ou sem intenção) aos alunos a compreensão das condições
forte ainda, porque oscilou entre um ceticismo (nada cultu- rais, históricas e sociais de produção do Conhecimento,
pode ser verda- deiramente sabido) e um racionalismo termina por reforçar a mitificação e a sensação de
baseado na intuição improvável. (p.96) perplexidade, impo- tência e incapacidade cognitiva. (p. 102)
Hegel pega uma via paralela, afirmando que a realida-
de é a Ideia (inicialmente contida no sujeito humano) que, 2. Intencionalidade, erro e pré-ocupação
ao exteriorizar-se em forma de ação no mundo (enfren-
tando a materialidade para impor-se), depura-se e volta Paulo Freire, ao pensar sobre a questão do método,
disse “fazemos, logo pensamos; assim, existimos” e, em
mais aperfeiçoada para o sujeito que, assim, descobre a si
resumo, o fez a partir da seguinte reflexão:
mesmo na autoconsciência; ao supor que a Humanidade,
a Natureza e a História são manifestações de um Espírito - O saber pressupõe uma intencionalidade, ou seja, não há
Absoluto, o pensamento hegeliano recorre novamente ao busca de saber sem finalidade. Dessa forma, o método é,
idealismo. Husserl, procurando evitar o risco de ceticismo sempre, a ferramenta para a execução dessa intencionalidade;
quanto ao conhecimento das essências da realidade (pre- como ferra- menta, o método é uma escolha e, como
sente em Kant) propõe que entendamos os objetos do co- escolha, não é neutro.
nhecimento como fenômenos (sentidos que vêm à tona) - O melhor método é aquele que propuser a melhor
dos quais devemos, em um primeiro momento, abstrair apro- ximação com o objeto, isto é, aquele que propiciar a
tudo que não é essencial e, a seguir, deixemos a razão mais com- pleta consecução da finalidade. No entanto, o
(livre de determinações externas) neles mergulhar, para método não ga- rante a exatidão, pois esta está relacionada
que pos- sam revelar-se em sua pureza verdadeira. (p. 96- à aproximação com a Verdade e o método é apenas garantia
97) de rigorosidade.
- A aproximação com a Verdade depende da
Queremos dizer, em resumo, que a relação de
intenciona- lidade e esta é sempre social e histórica; assim, a
Conheci- mento é uma relação entre sujeito e objeto; tem
exatidão não se coloca nunca como absoluta, eterna e
que haver um sujeito que conhece e um objeto que é
universal, pois a inten- cionalidade também não o é. A
conhecido, mas a verdade não está nem no polo do
intencionalidade está inserida no processo de as mulheres e
sujeito, nem no polo do objeto e sim na relação entre
os homens produzirem o mundo e serem por ele
eles. Esta relação se dá no tempo humano que chamamos
produzidas e produzidos, com seus corpos e consci6encias
de história. Portanto, a Ver- dade é histórica, não sendo
e nos seus corpos e consciências. (p.111)
nem absoluta nem eterna. Mais ainda: essa relação não é
somente entre mim e o mundo, pois eu não sou sozinho e - Assim, cada uma e cada uma de nós é também
a história é feita coletivamente. A relação com o mundo método, pois corpos e consciências são ferramentas de
não é individual, mas coletiva, social. Assim, a verdade não intencionalida- de (conscientes ou não). É por isso que o
apenas é histórica como também é social porque a anunciado, para vir, tem de ser feito por nós como
relação com o mundo é social. (p. 98) geradores de intenção e também como métodos que
somos; se não, não virá.
Cabe enfatizar: o Conhecimento e, nele, a Verdade,
- Assim existimos: fazendo. E, porque fazemos, pensamos.
são construções históricas, sociais e culturais. São
E, porque pensamos, fazemos nossa existência. É por isso
resultantes do esforço de um grupo determinado de
que a prática de pensar a prática - o que fazemos - é a única
homens e mu- lheres (com os elementos disponíveis na
maneira de pensar - e de fazer - com exatidão.
sua cultura e no tempo em que vivem) para construir
referências que orien- tem o sentido da ação humana e o
sentido da existência. Por isso, é crucial produzirmos uma Essa é a única razão básica pela qual o ensino do
conhe- cimento científico precisa reservar um lugar para
reflexão em torno da relação entre a Educação e o
falar sobre o erro; o conhecimento é resultado de processo
Conhecimento como constru- ção. (p. 99)
e este não está isento de equívocos, isto é, não fica imune
aos embaraços que o próprio ato de investigar a realidade
“A distinção entre o verdadeiro e o falso aplica-se às
acarreta. O erro não ocupa um lugar externo ao processo
ideias, não aos sentimentos. Um sentimento pode ser su-
de conhecer; investigar é bem diferente de receber uma
perficial, mas não, mentiroso”. (Arthur Koestler). (p. 100)
revelação límpida, transparente e per- feita. O erro é parte
integrante do conhecer não porque “erra é humano”, mas
porque nosso conhecimento sobre o mundo dá-se em uma
relação viva e cambiante (sem o controle de toda e qualquer
interveniência) com o próprio mundo. (p. 111-112)
213
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

O escrito brasileiro Millôr Fernandes (1924) tem um


pen- samento para opor-se aos que, por exemplo, Não são poucos os momentos em que o ambiente
afirmam que o “computador não erra”. Diz ele: “Erra, e físico e simbólico da sala de aula se assemelha, para eles, a
muito, e gravemente. Mas, admitindo-se que não erra, esse um local de culto religioso não voluntário ou de teatro
é seu erro maior. A hu- manidade, o pouco que avançou, desinteressante; até a distribuição espacial lembra
circunstâncias anacrônicas (mesmo com a entrada em cena
avançou porque o cérebro humano não tem certezas;
de novos equipamentos ele- trônicos). (p. 117-118)
experiência e erro é seu destino” (Fernandes, 1994).
(p.113-114) Para uma infinidade de educadores, a sala de aula é
um lugar de culto, com as seguintes características:
Não há conhecimento que possa ser apreendido e
recria- do se não se mexer, inicialmente, nas preocupações - A sala é lugar de uma cerimônia com rituais quase
reli- giosos: a aula. Como o interior de um templo, requer
que as pessoas detêm; é um contrassenso supor que se
silêncio obsequioso, um celebrante que domine os
possa ensinar crianças e jovens, principalmente, sem partir
instrumentos do culto e fiéis conscientes de sua
das preocupações que eles têm, pois, do contrário, só se
fragilidade na produção da cerimônia.
conseguirá que decorem (constrangidos e sem interesse) os
- Como em um culto, nesse lugar a disposição
conhecimentos que deve- riam ser apropriados (tornados
espacial obedece à hierarquia: o celebrante à frente, no
próprios). (p 115-116)
lugar principal, com espaço para movimentar-se e um
Entretanto, fica cada vez mais evidente que parte
mobiliário diferente e destacado dos demais da sala, com
substan- cial do desinteresse (e da “indisciplina”) encontrado
dimensões amplas para poder espalhar os instrumentos,
em muitos dos nossos alunos pode ser atribuído ao
aos fiéis cabe arrumarem-se ordenadamente, em filas ou
distanciamento dos conteúdos programáticos em relação às
círculos, nos móveis menores.
preocupações que os alunos trazem para a escola. Essas
- É o celebrante que dá início ao culto, quem o dirige
preocupações raramente são conhecidas por nós,
e quem tem poder de interrompê-lo ou encerrá-lo; há
educadores; com frequência supomos que qualquer
muitas partes da cerimônia que são recorrentes, repetitivas
conteúdo, a priori, é valido e deve interessar aos
até, e isso propicia segurança a todos os presentes. (p.120)
aprendizes, pois, afinal, foi por nós escolhido e “sabemos
- O que dá legitimidade maior ou menor ao celebrante
o que é bom para eles”. (p. 116)
é sua capacidade de operar as ferramentas do culto
(fórmulas escritas, procedimentos, enunciados espontâneos
3. Ritualismos, encantamentos e princípios e domínio vocálico apropriado), instaurando, assim, uma
ponte de as- cendência sobre os participantes, que devem
O resultado mais forte desse apartamento entre o estar conven- cidos da necessidade de alguém que os
univer- so vivencial dos alunos e os conteúdos escolares dá- guie no mundo do desconhecido.
se na de- ferente avaliação sobre a escola que é feita por - Deve também o celebrante ser dotado de algumas
docentes e dis- centes. Dizemos nós: “eles não querem ca- racterísticas pessoais, além do domínio dos
saber de nada”; dizem eles: “as aulas não têm nada a ver instrumentos: ser paciente e compreensivo com as
comigo”. Conclusão nossa: “eles não gostam da escola”. dificuldades inatas aos par- ticipantes - afinal, por tê-las é
Não é verdade; quase todas as crianças gostam da escola. que estão ali; manifestar uma bondade segura e uma
Do que, talvez, não gostem muito, é das nossas aulas. assepsia moral - sinais de distinção em meio a todos - e,
Vamos enxergar um pouco para obter um efeito reflexivo: é por fim, ser severo quando preciso, pois é marca da
só observar a alegria com a qual chegam, a algazarra no autoridade e meio de correção.
portão, os gritos no pátio; de repente, toca o sinal e vão, - Dos demais participantes é esperado que se
cabisbaixas, para a sala de aula, onde ficarão, quietinhas (à pronun- ciem quando avocados, preparem-se previamente
força?). Toca o sinal do intervalo, saem correndo, esfuzian- para pre- senciar a exposição de mistérios, confessem e
tes, colocando em risco até a própria segurança; acabado reconheçam seus erros, submetam-se às provações
o intervalo, retornam melancólicas. Hora de ir embora indispensáveis para se corrigirem e, finalmente,
porque terminaram as aulas ou faltou um professor? Não compreendam que esse é o único meio de ultrapassar as
querem; fi- cam pelos corredores e portões rindo, limitações.
brincando, conversan- do. Precisamos despachá-los, pois
adoram a escola. (p.117) Para outros tantos em Educação, a sala de aula é um
E das nossas aulas? Nem tanto. Já pensou: os jovens am- biente teatral, marcado por situações como as que se
têm 13, 14, 15 anos de idade, estão com os hormônios seguem:
fervendo, o mundo para explorar, os corpos se - A sala é o lugar de um espetáculo com cenas quase
modificando e... nós os colocamos por quatro horas ou teatrais: a aula. Como o interior de um teatro, requer
mais dentro de uma sala, em móveis desconfortáveis de atenção contínua, um ator principal que saiba interpretar e
madeira, sem se mexer muito e silenciosos. Estando ali catalisar os sentidos, e uma plateia disposta a viver
reclusos, passamos a ensinar coisas “interessantíssimas” voluntariamente emoções. (p.121)
para eles: a diferença entre um adjunto adnominal e um - Nessa sala, a distribuição do espaço é orientada, no
complemento nominal; a capital da Tanzânia; os afluentes mais das vezes, para situar o ator em um nível de altura
da margem esquerda e direita do rio Amazonas; o nome acima da plateia, de modo a ser visto por todos e também
dos sete primeiros reis de Roma (os quatro latinos e os três destacar-
etruscos); o que é uma mitocôndria; como se calcula a tra- -se, ocupando o sítio de honra; o espaço do ator é
jetória de um projétil disparado por um canhão; como se bastante amplo em relação ao restante, permitindo a ele
extrai a raiz quadrada; e por coroar, mandamos que leiam uma liberdade de movimentação que avança, inclusive, pelo
Amor de Perdição do Camilo Castelo Branco (com sua lugar destinado à plateia. Essa, por sua vez, encontra-se
passionalidade trágica do século XIX). E eles não gostam disposta em fileiras ou em formato de arena, desde que o
muito; preferem, se conseguirem escapar, ir namorar, ponto de referência seja o ator.
passear etc.
214
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

- A plateia, quando vem para o lugar, já tem alguma


no- ção do tema da peça, mas desconhece o enredo; em Seriedade não é, e nem pode ser, sinônimo de
algu- mas peças aí representadas a plateia é chamada tristeza. O ambiente alegre é propício à aprendizagem e à
também a participar ativamente sem, no entanto, criativi- dade, desde que não se ultrapasse a sutil fronteira
determinar o quê nem quando o fará. entre a alegria e a desconcentração improdutiva. A alegria
- É muito difícil nesse lugar a apresentação de vem, em grande parte, da leveza com a qual se ensina e se
enredos produzidos pelo ator; frequentemente ele aprende; vem da atenção àquelas perguntas que parecem
desempenha um papel ensaiado, recorrendo, quando fora do assunto, mas que vão capturar o aluno para um
preciso, ao ponto. Con- tudo, nas oportunidades em que o outro pas- seio pelos conteúdos; vem da percepção de
ator também é o autor, ou quando dá a sua própria que aquilo que se está estudando tem um sentido e uma
interpretação ao enredo, a re- presentação torna-se uma aplicabilidade (mesmo não imediata). (p.124)
apresentação e as emoções ficam muito mais verdadeiras. A alegria, em suma, é resultante de um processo de
encantamento recíproco, no qual a transação de conheci-
Nem sempre a peça é adequada para o tipo de plateia mentos e preocupações não unilateral. A sala de aula é,
ou tem para ela uma significação explícita; porém, ela a simbolicamente, um lugar de amorosidade; mas a
as- siste, por hábito ou apatia, até o final (os que saem amorosi- dade não é um símbolo, é um sentir. Não pode
antes são olhados com reprovação pelos outros e pelo ser anulada (como o símbolo pode); só ausentar-se. Partir
artista). Muitos que não entendem a peça até imaginam das preocu- pações dos alunos não é o mesmo que nelas
que a responsabili- dade pela não-compreensão é deles permanecer indefinidamente; ademais, levar em contar é
mesmos. (p.122) bem diverso de acatar passivamente. Partir das
Pode parecer estranho invadir uma reflexão sobre a preocupação dos alunos não é o mesmo que nelas
construção do construção do conhecimento com essas permanecer indefinidamente; ademais, levar em conta é
con- siderações, mas um dos componentes fulcrais do bem diverso de acatar passiva- mente. Em outras palavras,
comporta- mento infantil e adolescente é o lúdico (que nós, educadores, precisamos ter o universo discente como
nós, os adultos, parcialmente represamos em nós, e neles) princípio (ponto de partida), de maneira a atingir a meta
e a amorosidade, e a sala de aula deve ser, portanto, (ponto de chegada) do pro- cesso pedagógico; afinal de
antes de todo o mais, o lugar de uma situação com contas, a prática educacional tem como objetivo central
contornos amorosos: a aula. Como o interior de uma fazer avançar a capacidade de compreender e intervir na
relação afetiva, a aula impõe de- dicação, confiança realidade para além do estágio presente, gerando
mútua, maleabilidade e prazer compar- tilhado. No lugar autonomia e humanização.
dessa relação, o tamanho, arranjo e loca- lização dos Muita confusão já foi gerada nessa relação entre o
móveis não têm muita importância, desde que a partilha levar em conta e o acatar. Quantas vezes o pensamento
seja agradável e justa. Cada um dos envolvidos nessa de Paulo Freire não foi, equivocadamente, acusado de
situação traz o que já tinha para trocar, só que a troca não desprazer os conteúdos científicos no processo de
deve levar a perdas; por ser uma repartição de bens, to- escolarização, dando um destaque ao universo vivencial
dos precisam esforçar-se para que cada um fique com dos educandos? (p.125) Muitos, inclusive, caem na
tudo. armadilha de afirmar que,
Por ser um lugar de relações afetivas, a sala de aula é se desejamos colaborar na formação política e
um espaço para confrontos, conflitos, rejeições, antipatias, educacional das classes populares, não podemos com elas
paixões, adesões, medos e sabores. Por isso, essa sala trabalhar a “ciência burguesa”; ora, a Ciência pode estar
exala humanidade e precariedade; a tensão contínua do sob controle da classe dominante, mas não é inútil (tanto
compartir conduz, às vezes, a rupturas emocionadas ou a que é difícil arrancá-la de seus circunstanciais
dependên- cias movidas pelo temor da solidão; afinal, ser proprietários). Ela resulta de uma produção cultural
humano é ser junto, e ser junto implica um custo sensível. coletiva, cuja apropriação parti- cularizada e restrita é uma
(p.123) situação a ser socialmente der- rotada. Paulo Freire
Por isso, é claro que aqueles conteúdos (defensor extremado de uma educação globalmente
aparentemente fúteis (que ironizamos quando falamos do libertadora) não seria ingênuo a ponto de su- gerir um
gostar da esco- la/não gostar das aulas) podem ser “sequestro” do caráter energicamente ferramental do
ensinados, desde que se faça partindo das ocupações conhecimento científico, de modo a tornar os oprimidos
prévias que alunas e alunos carregam, contextualizando- “reféns” de um saber tipicamente empírico e menos eficaz
os e inserindo os temas em um cenário não esotérico e no embate político pela igualdade social. (p. 120-121-122-
marcado pela alegria. A busca do prazer e do gostar do 123-124-125-126)
que está fazendo integra prioritaria- mente o universo O fato é que,, por uma questão de sobrevivência, o
discente e o universo da criatividade. É difícil imaginar que ho- mem é obrigado a enfrentar, a lutar com o mundo,
Newton, Mozart, Fernando Pessoa, Mi- chelangelo, Tom alteran- do este e sendo alterado por ele. Ocorre que, no
Jobim, por exemplo, não tivessem no pra- zer uma das desenrolar da história da humanidade e, hoje, em quase a
suas fontes de animação, sem por isso deixar de envolver- totalidade das sociedades, a luta principal Homem versus
se com atividades que exigem concentração e esforço. Mundo foi substituída por um embate secundário, que é
Assim, a criação e recriação do conhecimento na es- cola Homem ver- sus Homem. Se o conhecimento não só não
não está apenas em falar sobre coisas prazerosas, mas, é neutro, como também é político, ou seja, produzido a
principalmente, em falar prazerosamente sobre as coisas; partir de um inte- resse, ele está certamente presente
ou seja, quando o educador exala gosto pelo que está nesse confronto Ho- mem versus Homem. (p.126)
ensinan- do, ele interessa nisso também o aluno. Não
necessariamen- te o aluno vai apaixonar-se por aquilo, mas
aprender o gosto é parte fundamental para passar a
gostar.
215
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

O conhecimento não interessa mais tanto por uma


ques- tão de sobrevivência, como ocorria na relação Nosso tempo, o dos educadores, é esse hoje em que
Homem versus Mundo, mas na oposição entre os homens; já se encontra, em gestação, o amanhã. Não um qualquer,
ele tem relevância sobretudo na luta pelo poder. mas um amanhã intencional, planejado, provocado agora.
Reafirmaremos uma questão bási- ca: se o Conhecimento é Um amanhã sobre o qual não possuímos certezas, mas
relativo à história e à sociedade, ele não é neutro; todo que sabemos possibilidades. (p. 158-159)
conhecimento está úmido de situações histórico- É nessa paixão pelo humano que habita, de forma
-sociais; não há Conhecimento absolutamente puro, sem con- vulsiva, a tensão articulada entre o epistemológico e
nódoa. Todo Conhecimento está impregnado (ou, com o polí- tico, onde se dá o encontro do sonho de um
sotaque italiano, emprenhado) de história e sociedade, Conhecimento como ferramenta de Liberdade e de um
portanto, de mudança cultural. A escola está grávida de Poder como amál- gama da convivência igualitária. Há um
história e sociedade, e, sendo esse processo marcado pela ditado chinês que diz que, se dois homens vêm andando
relações de poder, o Conhecimento é também político, isto é, por uma estrada, cada um carregando um pão, e, ao se
articula-se com as relações de poder. Sua transmissão, encontrarem, eles trocam os pães, cada homem vai
produção e reprodução no espaço educativo escolar decorre embora com um; porém, se dois homens vêm andando
de uma posição ideológica (consciente ou não), de uma por uma estrada, cada um carregando uma ideia, e, ao se
direção deliberada e de um conjunto de técnicas que lhes encontrarem, eles trocam as ideias, cada homem vai
são adequadas. Desta forma, é preciso que recoloquemos o embora com duas. Quem sabe é esse mesmo o sentido do
problema de seu sentido social concreto. (p. 126-127) nosso fazer: repartir ideias, para todos terem pão... (p. 159)

“Acontece que um homem não atinge a condição de Galileu “Não lhe perguntem mais nada. O mestre falou. Agora,
simplesmente por ter sido perseguido; ele também precisa é interpretá-lo, nas nuanças chinesas do seu falar murado.
estar certo”. (Stephen Jay Gould) Ele não tem obrigação de ser claro. Muitas reputações de
mestre faleceriam, submetidas à prova da clareza”. (Carlos
Capítulo 4 Drummond de Andrade). (p. 160)

Conhecimento escolar: epistemologia e política FREIRE, PAULO. PEDAGOGIA DA AUTONOMIA:


SABERESNECESSÁRIOSÀPRÁTICAEDUCATIVA.
1. A relação sociedade/escola: alguns apelidos
43. ED., SÃO PAULO: PAZ E TERRA, 2011.
circuns- tanciais
A atenção aguda à realidade social circunstante dos alunos
é elemento basilar para a construção coletiva de uma
escolariza- ção que conduza à autonomia e à cidadania livre.
Quando anali- samos o fracasso escolar (epidemia terrível
entre nós e que pre- firo chamar de pedagocídio), sustentado FREIRE, PAULO. PEDAGOGIA DA AUTONOMIA:
pelos pilares da evasão e da repetência, é usual serem SABERES NECESSÁRIOS À PRÁTICA EDUCATIVA
apontadas causas extraescolares: precárias condições
econômicas e sociais da população, forma- ção histórica Capítulo l - Não Há Docência Sem Discência
colonizada, poderes públicos irresponsáveis ou atrelados aos
interesses de uma elite predatória etc. Todas essas são causas Ensinar não é transferir conhecimentos e conteúdos,
reais e impactantes, mas não são as únicas. (p. 141) nem formar é a ação pela qual um sujeito criador dá
A Educação e a Escola são os lugares nos quais forma, estilo ou alma a um corpo indeciso e acomodado.
podemos dizer e exercer mais fortemente o nosso não. Não Não há docência sem discência, as duas se explicam, e
à miséria; não a injustiça; não à contradição humano versus seus sujei- tos, apesar das diferenças, não se reduzem à
humano; não à Ciência exclusivista; não ao poder opressor. condição de objeto um do outro. Quem ensina aprende
Tenho uma suspeita: por causa da paixão. Paixão pelo quê? ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender. Ensinar
Por ganhar pouco, tra- balhar muito, e toda noite querer exige rigorosi- dade metodológica. Ensinar não se esgota
desistir, e no dia seguinte, de manhãzinha, estar, de novo, na no tratamento do objeto ou do conteúdo,
escola? Vinte, trinta (aposenta e volta) quarenta ou mais anos superficialmente feito, mas se alonga à produção das
na profissão, alimentando o corpo docente nas reuniões condições em que aprender criti- camente é possível. E
movidas a café, chá e bolacha? Não. Paixão por uma ideia estas condições exigem a presença de educadores e de
irrecusável: gente foi feita para ser feliz! E nesse é o nosso educandos criadores, investigadores, inquietos, curiosos,
trabalho; não só nosso, mas também nosso. Paixão pela humildes e persistentes. Faz parte das condições em que
inconformidade de as coisas serem como são; paixão pela der- aprender criticamente é possível a pres- suposição, por
rota da desesperança; paixão pela ideia de, procurando tornar parte dos educandos, de que o educador já teve ou
as pessoas melhores, melhorar a si mesmo ou mesma; paixão, continua tendo experiência da produção de sa- beres, e
em suma, pelo futuro. (p. 157) que estes, não podem ser simplesmente transfe- ridos a
A nova realidade social a ser parida também por nós eles. Pelo contrário, nas condições de verdadeira
edu- cadores é mais do que uma espera (nostalgia do futuro); aprendizagem, tanto educandos quanto educadores
é um escavar no hoje de nossas prática à procura daquilo trans- formam-se em sujeitos do processo de
que hoje pode ser feito. Esse hoje é uma das pontas do nó aprendizagem. Só assim podemos falar realmente de
do futuro a ser desatado, fruto de situações que não se saber ensinado, em que
alteram por si mesmas nem se resolvem com um “ah! Se eu
pudesse...” “ah!, no meu tempo”. (p.158)

216
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

o objeto ensinado é aprendido na sua razão de ser. Perce-


be-se, assim, a importância do papel do educador, com a parte igualmente do pensar certo a rejeição mais decidida
certeza de que faz parte de sua tarefa docente não apenas a qualquer forma de discriminação. A prática
ensinar os conteúdos, mas também ensinar a pensar certo preconceituo- sa de raças, de classes, de gênero ofende a
- um professor desafiador, crítico. Ensinar exige pesquisa. substantividade do ser humano e nega radicalmente a
Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Hoje democracia. Ensi- nar exige reflexão crítica sobre a prática.
se fala muito no professor pesquisador, mas isto não é A prática docente crítica, implicante do pensar certo,
uma qualidade, pois faz parte da natureza da prática envolve o movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e
docente a indagação, a busca, a pesquisa. o pensar sobre o fa- zer. É fundamental que, na prática da
Precisamos que o professor se perceba e se assuma formação docente, o aprendiz de educador assuma que o
como pesquisador. Pensar certo é uma exigência que os indispensável pensar certo não é presente dos deuses
momentos do ciclo gnosiológico impõem à curiosidade nem se acha nos guias de professores que, iluminados
que, tornando-se mais e mais metodologicamente rigoro- intelectuais, escrevem desde o centro do poder. Pelo
sa, transforma-se no que Paulo Freire chama de “curiosi- contrário, o pensar certo que supera o ingênuo tem de ser
dade epistemológica”. Ensinar exige respeito aos saberes produzido pelo próprio aprendiz, em comunhão com o
dos educandos. A escola deve respeitar os saberes dos professor formador. É preciso possibilitar que a
educandos – socialmente construídos na prática comuni- curiosidade ingênua, através da reflexão sobre a prá- tica,
tária - discutindo, também, com os alunos, a razão de ser vá tornando-se crítica. Na formação permanente dos
de alguns deles em relação ao ensino dos conteúdos. Por professores, o momento fundamental é o da reflexão
que não aproveitar a experiência dos alunos que vivem crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática
em áreas descuidadas pelo poder público para discutir a de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima
polui- ção dos riachos e dos córregos e os baixos níveis prática. O discurso teórico, necessário à reflexão crítica,
de bem- tem de ser de tal modo concreto que quase se confunda
-estar das populações, os lixões e os riscos que oferecem à com a prática. Ensinar exige o reconhecimento e a
saúde? Por que não associar as disciplinas estudadas à assunção da identidade cultural. A questão da identidade
rea- lidade concreta, em que a violência é a constante e a cultural, com sua dimen- são individual e da classe dos
con- vivência das pessoas com a morte é muito maior do educandos, cujo respeito é absolutamente fundamental
que com a vida? Ensinar exige criticidade. A superação, ao na prática educativa progres- sista, é problema que não
invés da ruptura, se dá na medida em que a curiosidade pode ser desprezado. Tem a ver diretamente com a
ingênua, associada ao saber comum, se criticiza, assunção de nós por nós mesmos. É isto que o puro
aproximando-se de forma cada vez mais treinamento do professor não faz, perdendo-se na estreita
metodologicamente rigorosa do ob- jeto cognoscível, e pragmática visão do processo.
tornando-se curiosidade epistemológica. Muda de
qualidade, mas não de essência, e essa mu- dança não se Capítulo 2 – Ensinar Não É Transferir Conhecimento
dá automaticamente. Essa é uma das princi- pais tarefas
do educador progressista - o desenvolvimen- to da Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as
curiosidade crítica, insatisfeita, indócil. Ensinar exige possibilidades para a sua própria construção. Quando o
estética e ética. A necessária promoção da ingenuidade à educador entra em uma sala de aula, deve estar aberto a
criticidade não pode ser feita sem uma rigorosa formação indagações, curiosidade e inibições dos alunos: um ser crí-
ética e estética. Decência e boniteza andam de mãos tico e inquiridor, inquieto em face da tarefa que tem - a
dadas. Mulheres e homens, seres histórico-sociais, de ensinar e não a de transferir conhecimento. Pensar
tornamo-nos capazes de comparar, de valorar, de intervir, certo é uma postura exigente, difícil, às vezes penosa, que
de escolher, de decidir, de romper. Por tudo isso nos temos de assumir diante dos outros e com os outros, em
fizemos seres éticos. Só somos porque estamos sendo. face do mundo e dos fatos, ante nós mesmos. É difícil,
Estar sendo é a condição, entre nós, para ser. Não é entre outras coisas, pela vigilância constante que temos
possível pensar os seres humanos longe da ética. Quanto de exercer so- bre nós mesmos para evitar os simplismos,
mais fora dela, maior a transgres- são. Ensinar exige a as facilidades, as incoerências grosseiras. É difícil porque
corporificação das palavras pelo exem- plo. Quem pensa nem sempre te- mos o valor indispensável para não
certo está cansado de saber que palavras sem exemplo permitir que a raiva que podemos ter de alguém vire
pouco ou nada valem. Pensar certo é fazer raivosidade, gerando um pen- sar errado e falso. É
certo (agir de acordo com o que pensa). cansativo, por exemplo, viver a humil- dade, condição sine
Não há pensar certo fora de uma prática testemunhal, qua non do pensar certo, que nos faz proclamar o nosso
que o rediz em lugar de desdizê-lo. Não é possível ao próprio equívoco, que nos faz reconhe- cer e anunciar a
pro- fessor pensar que pensa certo (de forma superação que sofremos. Sem rigorosidade metódica não
progressista), e, ao mesmo tempo, perguntar ao aluno se há pensar certo. Ensinar exige consciência do
“sabe com quem está falando”. Ensinar exige risco, inacabamento. Na verdade, a inconclusão do ser é própria
aceitação do novo e rejei- ção a qualquer forma de de sua experiência vital. Onde há vida, há inconclusão,
discriminação. É próprio do pen- sar certo a em- bora esta só seja consciente entre homens e
disponibilidade ao risco, a aceitação do novo que não mulheres. A invenção da existência envolve
pode ser negado ou acolhido só porque é novo, assim necessariamente a lingua- gem, a cultura, a comunicação
como critério de recusa ao velho não é o cronológi- co. O em níveis mais profundos e complexos do que ocorria e
velho que preserva sua validade encarna uma tradi- ção ocorre no domínio da vida, a espiritualização do mundo, a
ou marca uma presença no tempo continua novo. Faz possibilidade não só de em- belezar, mas também de
enfear o mundo; tudo isso inscre-

217
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

veria mulheres e homens como seres éticos. Só os seres


que se tornaram éticos podem romper com a ética. É ne- com que chegam à escola. Isto exige de mim uma reflexão
cessário insistir na problematização do futuro e recusar crítica permanente sobre minha prática. O ideal é que se
sua inexorabilidade. Ensinar exige o reconhecimento de invente uma forma pela qual os educandos possam
ser condicionado “Gosto de ser gente, inacabado, sei que partici- par da avaliação. E que o trabalho do professor
sou um ser condicionado, mas, consciente do deve ser com os alunos e não consigo mesmo. O
inacabamento, sei que posso ir mais além dele. Esta é a professor tem o dever de realizar sua tarefa docente. Para
diferença profunda entre o ser condicionado e o ser isso, precisa de condições favoráveis, sem as quais se
determinado... Afinal, mi- nha presença no mundo não é a move menos eficaz- mente no espaço pedagógico. O
de quem se adapta, mas a de quem nele se insere”. E a desrespeito a este espaço é uma ofensa aos educandos,
posição de quem luta para não ser apenas objeto, mas aos educadores e à prática pedagógica. Ensinar exige
também sujeito da história. Históri- co-sócio-culturais, humildade, tolerância e luta em defesa dos direitos dos
tornamo-nos seres em quem a curiosi- dade, educadores. Como ser educador sem aprender a conviver
ultrapassando os limites que lhe são peculiares no com os diferentes? Como posso respeitar a curiosidade do
domínio vital, torna-se fundante da produção do conheci- educando se, carente de humil- dade e da real
mento. Mais ainda, a curiosidade é já o conhecimento. compreensão do papel da ignorância na busca do saber,
Como a linguagem que anima a curiosidade e com ela se temo revelar o meu desconhecimento? A luta dos
anima, é também conhecimento e não só expressão dele. professores em defesa de seus direitos e de sua dignidade
Na verdade, seria uma contradição se, inacabado e cons- deve ser entendida como um momento impor- tante de
ciente do inacabamento, o ser humano não se inserisse sua prática docente, enquanto prática ética. Ainda que a
em tal movimento. É neste sentido que, para mulheres e prática pedagógica seja tratada com desprezo, não tenho
ho- mens, estar no mundo necessariamente significa estar por que desamá-la e aos educandos. Não tenho por que
com o mundo e com os outros. É na inconclusão do ser, exercê-la mal. Minha resposta à ofensa à educação é a
que se sabe como tal, que se funda a educação como luta política consciente, crítica e organizada dos professo-
processo permanente. Mulheres e homens se tornaram res. Os órgãos de classe deveriam priorizar o empenho de
educáveis na medida em que se reconheceram formação permanente dos quadros do magistério como
inacabados. O ideal é que, na experiência educativa, tarefa altamente política, e reinventar a forma de lutar. En-
educandos e educadores, juntos, transformem este e sinar exige apreensão da realidade. Como professor,
outros saberes em sabedoria. Algo que não é estranho a preci- so conhecer as diferentes dimensões que
nós, educadores. Ensinar exige respeito à autonomia do caracterizam a essência da minha prática. O melhor ponto
ser educando. O professor, ao desrespeitar a curiosidade de partida para estas reflexões é a inconclusão do ser
do educando, o seu gosto esté- tico, a sua inquietude, a humano. Aí radica a nossa educabilidade, bem como a
sua linguagem, ao ironizar o aluno, minimizá-lo, mandar nossa inserção num per- manente movimento de busca. A
que “ele se ponha em seu lugar” ao mais tênue sinal de nossa capacidade de aprender, de que decorre a de
sua rebeldia legítima, ao se eximir do cumprimento de seu ensinar, implica a nossa ha- bilidade de apreender a
dever de propor limites à liberdade do aluno, ao se furtar substantividade de um objeto. So- mos os únicos seres
do dever de ensinar, de estar respei- tosamente presente que, social e historicamente, nos tor- namos capazes de
à experiência formadora do educando, transgride os aprender. Por isso aprender é uma aven- tura criadora,
princípios fundamentalmente éticos de nossa existência. É muito mais rica do que meramente repetir a lição dada.
neste sentido que o professor autoritário afo- ga a Aprender é construir, reconstruir, constatar para mudar, o
liberdade do educando, amesquinhando o seu direito de que não se faz sem abertura ao risco e à aventura do
ser curioso e inquieto. Qualquer discriminação é imoral e espírito. Toda prática educativa demanda:- a existência de
lutar contra ela é um dever, por mais que se reconheça a sujeitos - um que, ensinando, aprende, e outro que,
força dos condicionamentos a enfrentar. A beleza de ser aprendendo, ensina (daí seu cunho gnosiológico); - a exis-
gente se acha, entre outras coisas, nessa possibilidade e tência de objetos, conteúdos a serem ensinados e
nesse dever de brigar. Saber que devo respeito à autono- aprendi- dos;- o uso de métodos, de técnicas, de
mia e à identidade do educando exige de mim uma materiais. Esta prá- tica também implica, em função de
prática em tudo coerente com este saber. Ensinar exige seu caráter diretivo, objetivos, sonhos, utopias, ideais. Daí
bom senso O exercício do bom senso, com o qual só sua politicidade, daí não ser neutra, ser artística e moral.
temos a ganhar, se faz no corpo da curiosidade. Neste Exige uma competên- cia geral, um saber de sua natureza
sentido, quanto mais colocamos em prática, de forma e saberes especiais, li- gados à atividade docente. Como
metódica, a nossa capaci- dade de indagar, de comparar, professor, se a minha opção é progressista e sou coerente
de duvidar, de aferir, tanto mais eficazmente curiosos nos com ela, meu papel é contribuir para que o educando,
podemos tornar e mais crí- tico se torna o nosso bom seja o, artífice de sua for- mação. Devo estar atento à
senso. O exercício do bom senso vai superando o que há difícil caminhada da heterono- mia para a autonomia. “É
nele de instintivo na avaliação que fazemos dos fatos e assim que venho tentando ser professor, assumindo
dos acontecimentos em que nos en- volvemos. O meu minhas convicções, disponível ao sa- ber, sensível à
bom senso não me diz o que é, mas dei- xa claro que há boniteza da prática educativa, instigado por seus
algo que precisa ser sabido. É ele que, em primeiro lugar, desafios...” Ensinar exige alegria e esperança. O meu
me diz não ser possível o respeito aos edu- candos, se envolvimento com a prática educativa jamais deixou de
não se levar em consideração as condições em que eles ser feito com alegria, o que não significa dizer que tenha
vêm existindo, e os conhecimentos experienciais podi- do criá-la nos educandos. Parece-me uma
contradição que uma pessoa que não teme a novidade,
que se sente mal

218
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

com as injustiças, que se ofende com as discriminações,


que luta contra a impunidade, que recusa o fatalismo a generosidade. Não há nada que inferiorize mais a tarefa
cínico e imobilizante não seja criticamente esperançosa. formadora da autoridade do que a mesquinhez, a
Ensinar exige a convicção de que a mudança é possível. A arrogân- cia ao julgar os outros e a indulgência ao se
realidade não é inexoravelmente esta. E esta agora, e para julgar, ou aos seus. A arrogância que nega a generosidade
que seja outra, precisamos lutar, viver a história como nega também a humildade. O clima de respeito que nasce
tempo de possibilidade, e não de determinação. O de relações justas, sérias, humildes, generosas, em que a
amanhã não é algo pré-dado, mas um desafio. Não posso, autoridade docente e as liberdades dos alunos se
por isso, cruzar os braços. Esse é, aliás, um dos saberes assumem eticamen- te, autentica o caráter formador do
primeiros, indispen- sáveis a quem pretende que sua espaço pedagógico. A autoridade, coerentemente
presença se torne convi- vência. O mundo não é. O democrática, está convicta de que a disciplina verdadeira
mundo está sendo. O meu papel no mundo não é só o de não existe na estagnação, no silêncio dos silenciados, mas
quem constata o que ocorre, mas também o de quem no alvoroço dos inquietos, na dúvida que instiga, na
intervém como sujeito de ocorrências. Constato, não para esperança que desperta. Um esforço sempre presente à
me adaptar, mas para mudar. No fundo, as resistências prática da autoridade coerentemente democrática é o que
orgânicas e culturais são manhas necessá- rias à a torna quase escrava de um sonho fundamental - o de
sobrevivência física e cultural dos oprimidos. É preci- so, persuadir ou convencer a liberdade para a construção da
porém, que tenhamos na resistência fundamentos para a própria autonomia, ainda que reela- borando materiais
nossa rebeldia e não para a nossa resignação em face das vindos de fora de si. É com a autonomia, penosamente
ofensas. Não é na resignação que nos afirmamos, mas na construída e fundada na responsabilidade, que a liberdade
rebeldia em face das injustiças. A rebeldia é ponto de par- vai preenchendo o espaço antes habita- do pela
tida, é deflagração da justa ira, mas não é suficiente. A re- dependência. O fundamental no aprendizado do
beldia, enquanto denúncia, precisa se alongar até uma conteúdo é a construção da responsabilidade da liberdade
po- sição mais radical e crítica, a revolucionária, que se assume. O essencial nas relações entre autoridade
fundamental- mente anunciadora. Mudar é difícil, mas é e liberdade é a reinvenção do ser humano no aprendizado
possível. Ensinar exige curiosidade. Como professor, devo de sua autonomia. Nunca me foi possível separar dois
saber que, sem a curiosidade que me move, não aprendo mo- mentos - o ensino dos conteúdos da formação ética
nem ensino. A construção do conhecimento implica o dos educandos. O saber desta impossibilidade é
exercício da curiosi- dade, o estímulo à pergunta, a fundamen- tal à prática docente. Quanto mais penso
reflexão crítica sobre a pró- pria pergunta. O fundamental sobre a prática educativa, reconhecendo a
é que professor e alunos sai- bam que a postura deles é responsabilidade que ela exige de nós, mais me convenço
dialógica, aberta, curiosa, inda- gadora e não apassivada. do nosso dever de lutar para que ela seja realmente
A dialogicidade, no entanto, não nega a validade de respeitada: Ensinar exige compro- metimento. Não posso
momentos explicativos, narrativos. O bom professor faz ser professor sem me pôr diante dos alunos, sem revelar
da aula um desafio. Seus alunos cansam, não dormem. com facilidade ou relutância minha maneira de ser, de
Um dos saberes fundamentais à prática edu- cativo-crítica pensar politicamente. Não posso esca- par à apreciação
é o que me adverte da necessária promoção da dos alunos. E a maneira como eles me percebem tem
curiosidade espontânea para a curiosidade epistemoló- importância capital para o meu desempe- nho. Daí, então,
gica. Resultado do equilíbrio entre autoridade e liberdade, que uma de minhas preocupações centrais deva ser a de
a disciplina implica o respeito de uma pela outra, expresso procurar a aproximação cada vez maior entre o que digo e
na assunção que ambas fazem de limites que não podem o que faço, entre o que pareço ser e o que realmente
estou sendo. Isto aumenta em mim os cuidados com o
ser transgredidos.
meu desempenho. Se a minha opção é democrá- tica,
progressista, não posso ter uma prática reacionária,
Capítulo 3 - Ensinar É Uma Especificidade Humana
autoritária, elitista. Minha presença de professor é, em si,
política. Enquanto presença, não posso ser uma omissão,
Creio que uma das qualidades essenciais que a auto-
mas um sujeito de opções. Devo revelar aos alunos a
ridade docente democrática deve revelar em suas relações
minha capacidade de analisar, de decidir, de optar e de
com as liberdades dos alunos é a segurança em si mesma.
romper, minha capacidade de fazer justiça, de não falhar à
É a segurança que se expressa na firmeza com que atua,
verda- de. Ético, por isso mesmo, tem que ser o meu
com que decide, com que respeita as liberdades, com que
testemunho. Ensinar exige compreender que a educação é
discute suas próprias posições, com que aceita rever-se.
uma forma de intervenção no mundo. Outro saber de que
Ensinar exige segurança, competência profissional e gene-
‘não posso duvidar na minha prática educativo-crítica é
rosidade - A segurança com que a autoridade docente se
que, como ex- periência especificamente humana, a
move implica uma outra, fundada na sua competência
educação é uma for- ma de intervenção no mundo.
pro- fissional. Nenhuma autoridade docente se exerce
Intervenção esta que, além do conhecimento dos
ausente desta competência. O professor que não leva a
conteúdos, bem ou mal ensinados e/ou aprendidos,
sério sua formação, que não estuda, que não se esforça
implica tanto o esforço da reprodução da ideologia
para estar à altura de sua tarefa não tem força moral para
dominante quanto o seu desmascaramento. Nem somos
coordenar as atividades de sua classe. A incompetência
seres simplesmente determinados nem tam- pouco livres
profissional des- qualifica a autoridade do professor.
de condicionamentos genéticos, culturais, so- ciais,
Outra qualidade indis- pensável à autoridade, em suas
históricos, de classe, de gênero, que nos marcam e a que
relações com a liberdade, é
nos achamos referidos. Continuo aberto à advertência

219
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

de Marx, a da necessária radicalidade, que me faz sempre


desperto a tudo o que diz respeito à defesa dos interesses ser de opção, de decisão. Um ser ligado a interesses e em
humanos. Interesses superiores aos de grupos ou de clas- relação aos quais tanto pode manter-se fiel à ética quanto
ses de pessoas. Não posso ser professor se não percebo pode transgredi-la. Se a educação não pode tudo, pode
cada vez melhor que, por não poder ser neutra, minha alguma coisa fundamental. Se a educação não é a chave
prá- tica exige de mim uma definição, uma tomada de das mudanças, não é também simplesmente reprodutora
posição, uma ruptura. Exige que eu escolha entre isto e da ideologia dominante.
aquilo. Não posso ser professor a favor de quem quer que O que quero dizer é que a educação nem é uma for-
seja e a favor de não importa o quê. Não posso ser ça imbatível a serviço da transformação da sociedade nem
professor a favor sim- plesmente da Humanidade, frase de tampouco é a perpetuação do status quo.
uma vaguidade dema- siado contrastante com a
concretude da prática educativa. Sou professor a favor da Ensinar exige saber escutar
decência contra o despudor, a fa- vor da liberdade contra
o autoritarismo, da autoridade con- tra a licenciosidade, Se, na verdade, o sonho que nos anima é democrático
da democracia contra a ditadura. Sou professor a favor da e solidário, não é falando aos outros, de cima para baixo,
luta constante contra qualquer forma de discriminação, sobretudo, como se fôssemos os portadores da Verdade a
contra a dominação econômica dos indi- víduos ou das ser transmitida aos demais, que aprendemos a escutar,
classes sociais, contra a ordem vigente que inventou a mas é escutando que aprendemos & falar com eles. Os
aberração da miséria na fartura. Sou professor a favor da sistemas de avaliação pedagógica de alunos e de
esperança que me anima, apesar de tudo. Contra o professores vêm se assumindo cada vez mais como
desengano que consome e imobiliza e a favor da boniteza discursos verticais, de cima para baixo, mas insistindo em
de minha própria prática. Tão importante quanto o ensino passar por democráticos. A questão que se coloca a nós é
dos conteúdos é a minha coerência na classe. A coerência lutar em favor da compreen- são e da prática da avaliação,
entre o que digo, o que escrevo e o que faço. Ensinar exi- enquanto instrumento de apreciação do que fazer, de
ge liberdade e autoridade. O problema que se coloca para sujeitos críticos a serviço, por isso mesmo, da libertação e
o educador democrático é como trabalhar no sentido de não da domesticação. Avalia- ção em que se estimule o
fazer possível que a necessidade do limite seja assumida falar a como caminho para o falar com. Quem tem o que
eticamente pela liberdade. Sem os limites, a liberdade se dizer, tem igualmente o direito e o dever de dizê-lo. É
perverte em licença e a autoridade em autoritarismo. Por preciso, porém, que o sujeito saiba não ser o único a ter
outro lado, faz parte do aprendizado a assunção das con- algo a dizer. Mais ainda, que esse algo, por mais
sequências do ato de decidir. Não há decisão que não seja importante que seja, não é a verdade alvissareira por
seguida de efeitos esperados, pouco esperados ou ines- todos esperada.
perados. Por isso a decisão é um processo responsável. É Por isso é que acrescento, quem tem o que dizer deve
decidindo que se aprende a decidir. Não posso aprender a assumir o dever de motivar, de desafiar quem escuta, para
ser eu mesmo se não decido nunca, porque há sempre a que este diga, fale, responda. É preciso enfatizar - ensinar
sabedoria e a sensatez de meu pai e de minha mãe a de- não é transferir a inteligência do objeto ao educando, mas
cidir por mim. Ninguém é autônomo primeiro para depois instigá-lo no sentido de que, como sujeito cognoscente,
decidir. A autonomia vai se construindo na experiência. torne-se capaz de inteligir e comunicar o inteligido. É
Ninguém é sujeito da autonomia de ninguém. Por outro neste sentido que se impõe a mim escutar o educando
lado, ninguém amadurece de repente. A gente vai amadu- em suas dúvidas, em seus receios, em sua incompetência
recendo todo dia, ou não. A autonomia é um processo, provisória. E ao escutá-lo, aprendo a falar com ele. Aceitar
não ocorre em data marcada. É neste sentido que uma e respeitar a diferença é uma das virtudes sem a qual a
pedago- gia da autonomia tem de estar centrada em escuta não pode acontecer. Tarefa essencial da escola,
experiências estimuladoras da decisão e da como centro de produção sistemática de conhecimento, é
responsabilidade, ou seja, que respeitam a liberdade. trabalhar critica- mente a i das coisas e dos fatos e a sua
Ensinar exige tomada conscien- te de decisões. Voltemos comunicabilidade. Ensinar exige reconhecer que a
à questão central desta parte do texto - a educação, educação é ideológica Sa- ber igualmente fundamental à
especificidade humana, como um ato de intervenção no prática educativa do profes- sor é o que diz respeito à
mundo. força, às vezes, maior do que pen- samos da ideologia. É
Quando falo em educação como intervenção me o que nos adverte de suas manhas,
refiro tanto a que aspira a mudanças radicais na das armadilhas em que nos faz cair.
sociedade, no campo da economia, das relações humanas, A ideologia tem a ver diretamente com a ocultação da
da proprie- dade, do direito ao trabalho, à terra, à verdade dos fatos, com o uso da linguagem para penum-
educação, à saúde, quanto a que, reacionariamente, brar ou opacizar a realidade, ao mesmo tempo em que
pretende imobilizar a His- tória e manter a ordem injusta. nos torna míopes. No exercício crítico de minha
E que dizer de educadores que se dizem progressistas, resistência ao poder da ideologia, vou gerando certas
mas de prática pedagógica- qualidades que vão virando sabedoria indispensável à
-política eminentemente autoritária? A raiz mais profunda minha prática docente. A necessidade desta resistência
da politicidade da educação se acha na educabilidade do crítica, por exemplo, me pre- dispõe, de um lado, a uma
ser humano, que se funda em sua natureza inacabada e atitude sempre aberta aos de- mais, aos dados da
da qual se tornou consciente. Inacabado e consciente realidade; de outro, a uma desconfian- ça metódica que
disso, necessariamente o ser humano se faria um ser me defende de tornar-me absolutamente certo das
ético, um certezas. Para me resguardar das artimanhas da

220
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

ideologia não posso nem devo me fechar aos outros, nem


tampouco me enclausurar no ciclo de minha verdade. Pelo gera a necessária disciplina intelectual. Estou convencido
contrário, o melhor caminho para guardar viva e desperta de que a rigorosidade, a séria disciplina intelectual, o exer-
a minha capacidade de pensar certo, de ver com acuidade, cício da curiosidade epistemológica não me fazem neces-
de ouvir com respeito, por isso de forma exigente, é me sariamente um ser mal-amado, arrogante, cheio de mim
deixar exposto às diferenças, é recusar posições dogmáti- mesmo. Nem a arrogância é sinal de competência nem
cas, em que me admita como dono da verdade. a competência é causa de arrogância. Certos arrogantes,
Ensinar exige disponibilidade para o diálogo Nas mi- pela simplicidade, se fariam gente melhor. (Texto
nhas relações com os outros, que não fizeram necessaria- adaptado: PAIVA, C. R.).
mente as mesmas opções que fiz, no nível da política, da
ética, da estética, da pedagogia, nem posso partir do
pres- suposto que devo conquistá-los, não importa a que
LA TAILLE, YVES. DANTAS, HELOISA E OLIVEIRA,
custo, nem tampouco temer que pretendam conquistar-
MARTA KOHL DE, PIAGET, VYGOTSKY, WALLON:
me. É no respeito às diferenças entre mim e eles, na
TEORIAS PSICOGENÉTICAS EM DISCUSSÃO. 24. ED.,
coerência entre o que faço e o que digo, que me encontro
SÃO PAULO: SUMMUS, 1992.
com eles. O sujeito que se abre ao mundo e aos outros
inaugura, com seu gesto, a relação dialógica em que se
confirma como in- quietação e curiosidade, como
inconclusão em permanen- te movimento na história.
Como ensinar, como formar sem estar aberto ao contorno
geográfico, social, dos educan- dos? Com relação a meus
alunos, diminuo a distância que me separa de suas PARTE I - FATORES BIOLÓGICOS E SOCIAIS
condições negativas de vida na medida em que os ajudo a
aprender não importa que saber, o do torneio ou do O lugar da interação na concepção de Jean Piaget
cirurgião, com vistas à mudança do mundo, à superação Yves de La
das estruturas injustas, jamais com vistas à sua Taille La Taille considera que nada há de mais injusto que
imobilização. Debater o que se diz e o que se mostra e a crítica feita a Piaget de desprezar o papel dos fatores
como se mostra na televisão me parece algo cada vez so- ciais no desenvolvimento humano. O máximo que se
mais importante. pode dizer é que Piaget não se deteve sobre a questão,
Como educadores progressistas não apenas não po- mas, o
demos desconhecer a televisão, mas devemos usá-la, so- pouco que levantou é de suma importância.
bretudo, discuti-la. Não podemos nos pôr diante de um Para o autor, o postulado de Wallon de que o homem
aparelho de televisão entregues ou disponíveis ao que é “geneticamente social” (impossível de ser pensado fora
vier. Ensinar exige querer bem aos educandos. O que do contexto da sociedade) também vale para a teoria de
dizer e o que esperar de mim, se, como professor, não me Piaget, pois são suas palavras: “desde o nascimento, o de-
acho tomado por este outro saber, o de que preciso estar senvolvimento intelectual é, simultaneamente, obra da so-
aberto ao gosto de querer bem, às vezes, à coragem de ciedade e do indivíduo” (p. 12).
querer bem aos educandos e à própria prática educativa Para Piaget, o homem não é social da mesma manei-
de que participo. Na verdade, preciso descartar como ra aos seis meses ou aos vinte anos. A socialização da in-
falsa a se- paração radical entre seriedade docente e teligência só começa a partir da aquisição da linguagem.
afetividade. A afetividade não se acha excluída da Assim, no estágio sensório-motor a inteligência é essen-
cognoscibilidade. cialmente individual, não há socialização. No estágio pré-
O que não posso, obviamente, permitir é que minha -operatório, as trocas intelectuais equilibradas ainda são
afetividade interfira no cumprimento ético de meu dever limitadas pelo pensamento egocêntrico (centrado no eu):
de professor no exercício de minha autoridade. Não posso as crianças não conseguem seguir uma referência única
condicionar a avaliação do trabalho escolar de um aluno (fa- lam uma coisa agora e o contrário daí a pouco),
ao maior ou menor bem querer que tenha por ele. É colocar-se no ponto de vista do outro não são autônomas
preciso, por outro lado, reinsistir em que não se pense no agir e no pensar. No estágio operatório-concreto
que a prática educativa vivida com afetividade e alegria começam a se efe- tuar as trocas intelectuais e a criança
prescinda da for- mação científica séria e da clareza alcança o que Piaget chama de personalidade: indivíduo
política dos educadores. Nunca idealizei a prática se submetendo volun- tariamente às normas de
educativa. Em tempo algum a vi como algo que, pelo reciprocidade e universalidade. A personalidade é o ponto
menos, parecesse com um quefazer de anjos. Jamais foi mais refinado da socialização o eu renuncia a si mesmo
fraca em mim a certeza de que vale a pena lutar contra para inserir seu ponto de vista entre os outros em
os descaminhos que nos obstaculizam de ser mais. oposição ao egocentrismo, e que a criança elege o
Como prática estritamente humana, jamais pude en- próprio pensamento como absoluto. O ser social de mais
tender a educação como uma experiência fria, sem alma, alto nível é aquele que consegue relacionar-se com seus
em que os sentimentos e as emoções, os desejos e os so- semelhantes realizando trocas em cooperação, o que só é
nhos devessem ser reprimidos por uma espécie de dita- possível quando atingido o estágio das operações for-
dura reacionalista. Jamais compreendi a prática educativa mais (adolescência).
como uma experiência a que faltasse o rigor em que se

221
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

O processo de socialização
Há uma forte ligação entre os processos psicológicos
e a inserção do indivíduo num contexto sócio-histórico
A socialização vai do grau zero (recém-nascido) ao
es- pecífico. Instrumentos e símbolos construídos
grau máximo (personalidade). O indivíduo mais evoluído
socialmente é que definem quais possibilidades de
pode usufruir tanto de sua autonomia quanto das contri-
funcionamento ce- rebral serão concretizadas. Vygotsky
buições dos outros.
apresenta a ideia de mediação: a relação do homem com
os objetos é mediada pelos sistemas simbólicos
Para Piaget, “autonomia significa ser capaz de se
(representações dos objetos e situações do mundo real no
situar consciente e competentemente na rede dos diversos
universo psicológico do indiví- duo), que lhe possibilita
pontos de vista e conflitos presentes numa sociedade” (p.
planejar o futuro, imaginar coisas, etc.
17). Há uma “marcha para o equilíbrio”, com bases
Em resumo: operar com sistemas simbólicos permi-
biológicas, que começa no período sensório-motor, com a
te o desenvolvimento da abstração e da generalização e
construção de esquemas de ação, e chega às ações
define o salto para os processos psicológicos superiores,
interiorizadas, isto é, efetuadas mentalmente.
tipicamente humanos. Estes têm origem social, isto é, é a
Embora tudo pareça resumir-se à relação sujeito-
cultura que fornece ao indivíduo o universo de
obje- to, para La Taille, as operações mentais permitem o
significados (representações) da realidade. As funções
conhe- cimento objetivo da natureza e da cultura e são,
mentais superio- res baseiam-se na operação com
portanto, necessidades decorrentes da vida social. Para ele,
sistemas simbólicos e são construídas de fora para dentro
Piaget não compartilha do “otimismo” de que todas as
num processo de interna- lização.
relações sociais favorecem o desenvolvimento. Para La
Taille, a peculiaridade da teoria piagetiana é pensar a
O processo de formação de conceitos
interação da perspectiva da ética (igualdade, respeito
mútuo, liberdade, direitos huma- nos). Ser coercitivo ou
A linguagem é o sistema simbólico fundamental na
cooperativo depende de uma atitude moral, sendo que a
mediação entre sujeito e objeto do conhecimento e tem
democracia é condição para o desenvol- vimento da
duas funções básicas: interação social (comunicação entre
personalidade. Diz ele: “A teoria de Piaget é uma grande
indivíduos) e pensamento generalizante (significado com-
defesa do ideal democrático” (p. 21).
partilhado pelos usuários). Nomear um objeto significa
co- locá-lo numa categoria de objetos com atributos
Vygotsky e o processo de formação de conceitos comuns. Palavras são signos mediadores na relação do
homem com o mundo.
Morto Kohl de
O desenvolvimento do pensamento conceitual segue
um percurso genético que parte da formação de
Oliveira Substratos biológicos e construção cultural no
conjuntos sincréticos (baseados em nexos vagos e
subjetivos), pas- sa pelo pensamento por complexos
desenvol-
(baseado em ligações concretas e factuais) e chega à
vimento humano
formação de conceitos (ba- seados em ligações abstratas
e lógicas).
A perspectiva de Vygotsky é sempre a da dimensão
Esse percurso não é linear e refere-se à formação de
so- cial do desenvolvimento. Para ele, o ser humano
conceitos cotidianos ou espontâneos, isto é,
constitui-se como tal na sua relação com o outro social; a
desenvolvidos no decorrer da atividade prática da criança
cultura torna-
em suas inte- rações sociais imediatas e são, portanto,
-se parte da natureza humana num processo histórico que
impregnados de experiências. Já os conceitos científicos
molda o funcionamento psicológico do homem ao longo
são os transmiti- dos em situações formais de ensino-
do desenvolvimento da espécie (fïlogenética) e do
aprendizagem e ge- ralmente começam por sua definição
indivíduo (ontogenética). O ser humano tem, assim, uma
verbal e vão sendo expandidos no decorrer das leituras e
dupla natu- reza: membro de uma espécie biológica que
dos trabalhos esco- lares. Assim, o desenvolvimento dos
só se desenvol- ve no interior de um grupo cultural.
conceitos espontâ- neos é ascendente (da experiência
Vygotsky rejeitou a ideia de funções fundamentais
para a abstração) e o de conceitos científicos é
fixas e imutáveis, “trabalhando com a noção do cérebro
descendente (da definição para um nível mais elementar e
como um sistema aberto, de grande plasticidade, cuja
concreto). A partir do exposto, duas conclusões são
estrutura e mo- dos de funcionamento são moldados ao
fundamentais:
longo da história da espécie e do desenvolvimento
1 - diferentes culturas produzem modos diversos de
individual” (p. 24). Para ele, o cérebro é formado por
fun- cionamento psicológico;
sistemas funcionais complexos, isto é, as funções não se
2 - a instrução escolar é de enorme importância nas
localizam em pontos específicos, mas se organizam a
so- ciedades letradas.
partir da ação de diversos elementos que atuam de forma
articulada. O cérebro tem uma estrutura bá- sica,
resultante da evolução da espécie, que cada membro traz
consigo ao nascer. Essa estrutura pode ser articulada de
diferentes formas pelo sujeito, isto é, um mesmo
problema pode ser solucionado de diferentes formas e
mobilizar dife- rentes partes do cérebro.
222
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Do ato motor ao ato mental: a gênese da


2a fase: sensório-motor e projetivo (de um a três anos).
inteligência Aprendendo a andar a criança ganha mais autonomia e
segundo Wallon vol- ta-se para o conhecimento do mundo. Surge uma
nova fase de orientação diversa, voltada para a exploração
Heloysa Dantas da realidade externa. Com a linguagem, inicia-se o domínio
do simbólico.
Wallon tem uma preocupação permanente com a infraes- 3a fase: personalismo (três a seis anos). Novamente
trutura orgânica de todas as funções psíquicas. Seus volta- da para dentro de si, a preocupação é agora
estudos partem de pessoas com problemas mentais, construir-se como ser distinto dos demais (individualidade
portanto, seu pon- to de partida é o patológico, isto é, utiliza diferenciada). Com o aperfeiçoamento da linguagem,
a doença para enten- der a normalidade. desenvolve-se o pensamen- to discursivo. Sucedem-se uma
etapa de rejeição (atitudes de oposição), outra de sedução
Para Wallon, o ser humano é organicamente social, isto do outro e conciliação (idade da graça) e outra de imitação
é, sua estrutura orgânica supõe a intervenção da cultura. A (toma o outro como modelo).
me- todologia do seu trabalho ancora-se no materialismo 4a fase: categorial (seis a onze anos). Voltada para o
dialético, concebendo a vida dos organismos como uma cog- nitivo, é a fase escolar. Ao seu final, há a superação do
pulsação per- manente, uma alternância de opostos, um ir e sincre- tismo do pensamento em direção à maior
vir permanente, com avanços e recuos. objetividade e abs- tração. A criança torna-se capaz de
A motricidade: do ato motor ao ato mental. diferenciações intelectuais (pensamento por categorias) e
volta-se para o conhecimento do mundo.
A questão da motricidade é o grande eixo do trabalho 5a fase: puberdade e adolescência (a partir dos onze
de Wallon. Para ele, o ato mental se desenvolve a partir do anos). Nesta fase, caracterizada pela autoafirmação e pela
ato mo- tor. Ao longo do desenvolvimento mental, a am- bivalência de atitudes e sentimentos, a criança volta-se
motricidade cinéti- ca (de movimento) tende a se reduzir, nova- mente para a construção da pessoa. Há uma
dando lugar ao ato men- tal. Assim, mesmo imobilizada no reconstrução do esquema corporal e o jovem tem a tarefa
esforço mental, a musculatura permanece em atividade de manter um eu diferenciado (dos outros) e, ao mesmo
tônica (músculo parado, atitude). A ti- pologia de movimento tempo, integrado (ao mundo), o que não é fácil.
que Wallon adota parte de atos reflexos, passa pelos
movimentos involuntários e chega aos voluntários ou práxis,
PARTE II - AFETIVIDADE E COGNIÇÃO
só possíveis graças à influência ambiental aliada ao
amadurecimento cerebral. Desenvolvimento do juízo moral e afetividade na teoria
Ao nascer, é pela expressividade mímica que o ser de Jean Piaget
humano atua sobre o outro. A motricidade disponível
consiste em refle- xos e movimentos impulsivos, Yves de La Taille
incoordenados. A exploração da realidade exterior só é
possível quando surgem as capacidades de fixar o olhar e A obra “O julgamento moral da criança”(1932) traz im-
pegar. A competência no uso das mãos só se completa ao plícita a relação que existe entre afetividade e cognição
final do primeiro ano de vida, quando elas chegam a uma para Piaget, bem como a importância que ele atribui à
ação complementar (mão dominante e auxiliar). A etapa autonomia moral.
dominantemente práxica da motricidade ocorre paralelamente a) As regras do jogo
ao surgimento dos movimentos simbólicos ou ideativos. O Segundo Piaget, toda moral consiste num sistema de
mo- vimento, a princípio, desencadeia o pensamento. Por re- gras, sendo que a essência da moralidade deve ser
exemplo, uma criança de dois anos, que fala e gesticula, procurada no respeito que o indivíduo tem por elas. Piaget
tem seu fluxo mental atrofiado se imobilizada. O controle do utilizou o jogo coletivo de regras como campo de pesquisa
gesto pela ideia inverte-se ao longo do desenvolvimento. Há por considerá-lo paradigmático para a moralidade humana
uma transição do ato motor para o mental. porque: é atividade interindividual regulada por normas
que podem ser modifi- cadas e que provêm de acordos
As fases da inteligência - as etapas de construção do eu mútuos entre os jogadores, sendo que o respeito às
normas tem um caráter moral (justiça, honestidade.).
No processo de desenvolvimento da inteligência há Piaget dividiu em três etapas a evolução da prática e
pre- ponderância (a cada período mais marcado pelo afetivo da consciência de regras:
segue- 1a - anomia (até 5/6 anos): as crianças não seguem
-se outro mais marcado pelo cognitivo) e alternância de ativi- dades com regras coletivas;
funções (a criança ora está mais voltada para a realidade das 2a - heteronomia (até 9/10 anos): as crianças vêm as
coisas/co- nhecimento do mundo - fases centrípetas, ora re- gras como algo de origem imutável e não como
mais voltada para a edificação da pessoa/conhecimento de si - contrato fir- mado entre os jogadores; ao mesmo tempo,
fases centrífugas). 1a fase: impulsivo-emocional (de zero a quando em jogo, introduzem mudanças nas regras sem
um ano). Volta- prévia consulta aos de- mais; as regras não são elaboradas
da para o desenvolvimento motor e para a construção do pela consciência e não são entendidas a partir de sua
eu. No recém-nascido, os movimentos impulsivos que função social;
exprimem desconforto ou bem-estar são interpretados pelos 3a - autonomia: é a concepção adulta de jogo; o
adultos e se transformam em movimentos comunicativos respeito às regras é visto como acordo mútuo em que
através da media- ção social; até o final do primeiro ano a cada jogador vê-se como possível “legislador”.
relação com o ambiente é de natureza afetiva e a criança
estabelece com a mãe um “diá- logo tônico” (toques, voz,
contatos visuais).
223
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

b) O dever moral
O problema da afetividade em Vygotsky
O ingresso da criança no universo moral se dá pela
apren- dizagem dos deveres a ela impostos pelos pais e
Morta Kohl de Oliveira
demais adul- tos, o que acontece na fase de heteronomia
e se traduz pelo “realismo moral” que tem as seguintes
Vygotsky pode ser considerado um cognitivista (inves-
características:
tigou processos internos relacionados ao conhecimento
- a criança considera que todo ato de obediência às
e sua dimensão simbólica), embora nunca tenha usado o
re- gras impostas é bom;
termo cognição, mas função mental e consciência. Para
- as regras são interpretadas ao pé da letra e não se-
ele há uma distinção básica entre funções mentais
gundo seu espírito;
elementa- res (atenção involuntária) e superiores (atenção
- há uma concepção objetiva de responsabilidade: o
julgamento é feito pela consequência do ato e pela inten- voluntária, memória lógica). É difícil compreender cada
cionalidade. função men- tal isoladamente, pois sua essência é ser
c) A justiça inter-relaciona- da com outras funções. Sua abordagem é
globalizante. Ele utiliza o termo consciência para explicar a
A noção de justiça engloba todas as outras noções
morais e envolve ideias matemáticas (proporção, peso, relação dinâmica (interfuncionalidade) entre afeto e
igualdade). Quanto menor a criança mais forte a noção de intelecto e, portanto, questiona a divisão entre as
justiça imanente (todo crime será castigado, mesmo que dimensões cognitiva e afetiva do funcionamento
seja por força da natureza), mais ela opta por sanções ex- psicológico. Para ele, não dá para disso- ciar interesses e
piatórias (o castigo tem uma qualidade estranha ao delito) inclinações pessoais (aspectos afetivo-voli- tivos) do ser
e mais severa ela é (acha que quanto mais duro o castigo, que pensa (aspectos intelectuais).
mais justo ele é). A partir dos 8/9 anos a desobediência já
é vista como ato legítimo quando há flagrante injustiça. Consciência
As duas morais da criança e os tipos de relações sociais
Vygotsky concebe a consciência como “organização
Mesmo concordando que a moral é um ato social, objetivamente observável do comportamento, que é im-
para Piaget o sujeito participa ativamente de seu posta aos seres humanos através da participação em prá-
desenvolvi- mento intelectual e moral e detém uma ticas socioculturais”(p.78). É evidente a fundamentação em
autonomia possível perante os ditames da sociedade. postulados marxistas: a dimensão individual é considerada
As relações interindividuais são divididas em duas ca- secundária e derivada da dimensão social, que é a essen-
tegorias: cial. Carrega ainda um fundamento sócio-histórico, isto é,
- coação: derivada da heteronomia, é uma relação a consciência humana, resultado de uma atividade
assi- métrica, em que um dos polos impõe suas verdades, complexa, formou-se ao longo da história social do
sendo contraditória com o desenvolvimento intelectual; homem durante a qual a atividade manipuladora e a
coopera- ção: é uma relação simétrica constituída por linguagem se desen- volveram.
iguais, regida pela reciprocidade; envolve acordos e exige As impressões que chegam ao homem, vindas do
que o sujeito se descentre para compreender o ponto de mundo exterior são analisadas de acordo com categorias
vista alheio; com ela o desenvolvimento moral e que ele adquiriu na interação social. A consciência seria a
intelectual ocorre, pois ele pressupõe autonomia e própria essência da psique humana, o componente mais
superação do realismo moral. elevado das funções psicológicas humanas e envolve a in-
Em resumo: para Piaget, a coerção é inevitável no ter-relação dinâmica e em transformação entre: intelecto e
início da educação, mas não pode permanecer exclusiva afeto, atividade e representação simbólica, subjetividade e
para não encurralar a criança na heteronomia. Assim, para interação social.
favore- cer a conquista da autonomia, a escola precisa
respeitar e aproveitar as relações de cooperação que Subjetividade e intersubjetividade
espontaneamen- te, nascem das relações entre as
crianças. As funções psicológicas superiores, tipicamente
huma- nas, referem-se a processos voluntários, ações
Afetividade e inteligência na teoria piagetiana do consciente- mente controladas, mecanismos intencionais.
desen- volvimento do juízo moral Apresentam alto grau de autonomia em relação a fatores
biológicos, sendo, portanto, o resultado da inserção do
Para La Taille, o notável na teoria piagetiana é que homem em determinado contexto sócio-histórico.
nela “não assistimos a uma luta entre afetividade e O processo de internalização de formas culturais de
moral”(p.70). Afeto e moral se conjugam em harmonia: o comportamento, que corresponde à própria formação da
sujeito autôno- mo não é reprimido, mas um homem livre, consciência, é um processo de constituição da subjetivi-
convencido de que o respeito mútuo é bom e legítimo. A dade a partir de situações de intersubjetividade. Assim, a
afetividade ade- re espontaneamente aos ditames da passagem do nível interpsicológico para o
razão. Ele considera que na obra «O juízo moral na intrapsicológico envolve relações interpessoais e a
criança» intui-se um Piaget movido por alguma construção de sujeitos únicos, com trajetórias pessoais
«emoção», que sustenta um grande otimismo em relação singulares e experiências particulares em sua relação com
ao ser humano. No entanto, para ele, o estudo sobre o o mundo e, fundamental- mente, com as outras pessoas.
juízo moral poderia ter sido completado por outros que se
detivessem mais nos aspectos afetivos do problema.

224
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Sentido e significado
A opção metodológica adotada por Wallon é o mate-
rialismo dialético. Isso quer dizer que não dá para pensar
Para Vygotsky, os processos mentais superiores são
o desenvolvimento como um processo linear, continuista,
mediados por sistemas simbólicos, sendo a linguagem o
que só caminha para a frente. Pelo contrário, é um
sistema simbólico básico de todos os grupos humanos. O
processo com idas e vindas, contraditório, paradoxal.
significado é componente essencial da palavra, o filtro
Assim, sua teo- ria da emoção é genética (para
atra- vés do qual o indivíduo compreende o mundo e age
acompanhar as mudanças funcionais) e dialética.
sobre ele. Nele se dá a unidade de duas funções básicas A origem da conduta emocional depende de centros
da lin- guagem: a interação social e o pensamento subcorticais (de expressão involuntária e incontrolável) e
generalizante. Na concepção sobre o significado há uma tor- na-se susceptível de controle voluntário com a
conexão entre os aspectos cognitivos e afetivos: maturação cortical. Para Wallon, as emoções podem ser de
significado é núcleo estável de compreensão e sentido é o natureza hi- potônica ou redutora do tônus (como o susto
significado da palavra para cada indivíduo, no seu e a depressão) e hipertônica ou estimuladora do tônus
contexto de uso e relacionado às suas vivências afetivas. (como a cólera e a ansiedade).
A linguagem é, assim, polissêmica: requer interpreta- Características do comportamento emocional
ção com base em fatores linguísticos e extralinguísticos.
Para entender o que o outro diz, não basta ‘entender suas A longa fase emocional da infância tem
palavras, mas também seu pensamento e suas correspondên- cia na história da espécie humana: é a
motivações. emoção que garante a solidariedade afetiva e a
sobrevivência do indivíduo.
O discurso interior Da função social da emoção resultam seu caráter con-
tagioso (a ansiedade infantil pode provocar irritação ou
O discurso interior corresponde à internalização da an- gústia no adulto, por exemplo) e a tendência para
lin- guagem. Ao longo de seu desenvolvimento, a pessoa nutrir-se com a presença do outro (uma plateia alimenta
passa de uma fala socializada (comunicação e contato uma chama emocional entre os participantes, por
exemplo). Devido a seus efeitos desorganizadores,
social) a uma fala internalizada (instrumento de
anárquicos e explosivos, a emoção pode reduzir o
pensamento, sem vocalização), correspondente a um
funcionamento cognitivo, se a ca- pacidade cortical da
diálogo consigo mes- ma.
ação mental ou motora para retomar o controle da
situação for baixa. Se a capacidade cortical for alta,
A afetividade e a construção do sujeito na psicoge- soluções inteligentes poderão ser encontradas.
nética de Wallon Para Wallon não existe estado não emocional. Até a
serenidade exprime emoção. Assim, a educação da
Heloysa Dantas emoção deveria ser incluída entre os propósitos da ação
pedagógi- ca para evitar a formação do “circuito perverso
A teoria da emoção de emoção”: a emoção surge num momento de
incompetência do sujei- to e, não conseguindo
Para Wallon a dimensão afetiva ocupa lugar central, transformar-se em atividade racio- nal, provoca mais
tanto do ponto de vista da construção da pessoa quanto incompetência. O efeito desorganizador da emoção
do conhecimento. A emoção é instrumento de sobrevi- concentra a sensibilidade no próprio corpo e diminui a
vência típico da espécie humana. O bebê humano, frágil percepção do exterior.
como é, pereceria não fosse sua capacidade de mobilizar
poderosamente o ambiente para atender suas necessida- Afetividade e inteligência
des. A função biológica do choro, por exemplo, é atuar
for- temente sobre a mãe, fornecendo o primeiro e mais O ser humano é afetivo por excelência. É da
forte vínculo entre os humanos. Assim, a emoção tem afetividade que se diferencia a vida racional. No início da
raízes na vida orgânica e também a influência, um estado vida, afetivi- dade e inteligência estão sincreticamente
emocional intenso, por exemplo, provoca perda de misturadas. Ao longo do desenvolvimento, a
reciprocidade se mantém de tal forma que as aquisições
lucidez.
de uma repercutem sobre a outra. A pessoa se constitui
Segundo Wallon, a atividade emocional é simultanea-
por uma sucessão de fases com predomínio, ora do
mente social e biológica. Através da mediação cultural afetivo, ora do cognitivo. Cada fase in- corpora as
(so- cial), realiza a transição do estado orgânico para a aquisições do nível anterior.
etapa cognitiva e racional. A consciência afetiva cria no ser Para evoluir, a afetividade depende da inteligência e
huma- no um vínculo com o ambiente social e garante o vi- ce-versa. Dessa forma, não é só a inteligência que
acesso ao universo simbólico da cultura - base para a evolui, mas também a emoção. Com o desenvolvimento, a
atividade cognitiva - elaborado e acumulado pelos afetivi- dade incorpora as conquistas da inteligência e
homens ao longo de sua história. Dessa forma, para tende a se racionalizar. Por isso, as formas adultas de
Wallon, o psiquismo é uma síntese entre o orgânico e o afetividade são diferentes das infantis. No início a
social. Daí sua natureza contraditória de participar de dois afetividade é somática, tônica, pura emoção. Alarga seu
mundos. raio de ação com o sur- gimento da função simbólica. Na
adolescência, exigências racionais são colocadas: respeito
recíproco, justiça, igual- dade de direitos.

225
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Inteligência e pessoa
Os Sete Saberes indispensáveis enunciados por Mo-
rin — As cegueiras do conhecimento: o erro e a ilusão; Os
O processo que começa com a simbiose fetal tem por princípios do conhecimento pertinente; Ensinar a condição
horizonte; individualização. Para Wallon, não há nada mais humana; Ensinar a identidade terrena; Enfrentar as incerte-
social do que o processo pelo qual o indivíduo se singu- zas; Ensinar a compreensão; e A ética do gênero humano
lariza, em que o eu se constrói alimentando-se da cultura,
— constituem eixos e, ao mesmo tempo, caminhos que se
sendo que o destino humano, tanto no plano individual abrem a todos os que pensam e fazem educação, e que
quanto no social, é uma obra sempre inacabado. es- tão preocupados com o futuro das crianças e
adolescentes. Os Sete Saberes abrem uma perspectiva sem
Fonte: http://www.professorefetivo.com.br/resumos/ preceden-
Piaget-Vygotsky-e-Wallon-Teorias-Psicogeneticas-em-Dis- tes. Estou seguro de que a Unesco, ao editar este livro,
cussao.html cum- pre, mais uma vez, sua missão ética e seu
compromisso com uma educação integral e de qualidade.

Jorge Werthein Representante da UNESCO no


Brasil Coordenador do Programa
MORIN, EDGAR. OS SETE SABERES NECESSÁRIOS À UNESCO/Mercosul
EDUCAÇÃO DO FUTURO. UNESCO/CORTEZ EDITORA,
CAP. III E IV, P. 47- 78, E CP. VI, 93 -104, 2000.
RIOS, TEREZINHA AZERÊDO. ÉTICA E COMPETÊNCIA.
20. ED., SÃO PAULO: CORTEZ, 2011.

Prezado Candidato, devido a complexibilidade e


formato do conteúdo em questão , disponibilizaremos
um breve resumo para que assim não haja prejuízo em RIOS, Terezinha Azerêdo. Ética e competência. 20. ed.,
seus estudos, disponibilizaremos o PDF em nosso site São Paulo: Cortez, 2011.
www.novaconcursos.com.br/retificacoes, para
consulta. A educação está envolvida no contexto social ao qual
ela está inserida. Enquanto fenômeno histórico e social, a
Apresentação educação é a transmissão de cultura, é o estabelecimento.
A cultura é a relação da educação e a sociedade, o mundo
Em 1998, as Edições Unesco Brasil editou Educação: transformado pelo homem, porque o homem é um ser-
Um Tesouro a Descobrir. Relatório da Comissão no-
Internacio- nal sobre a Educação para o Século XXI, -mundo, o mundo está dentro do homem, há uma
coordenado por Jacques Delors.As teses desse importante reciproci- dade, pois o homem dele se resulta. O mundo
documento não somente foram acolhidas existe para o homem na medida do conhecimento que o
com entusiasmo pela comunidade educacional brasi- homem te dele e da ação que exerce sobre ele. O mundo
leira, como também passaram a integrar os eixos nortea- se apresenta ao homem num aspecto de natureza, onde o
dores da política educacional. mundo indepen- de do homem para existir e que os
Sem dúvida, o Relatório Delors foi muito feliz ao es- próprios homens fazem parte em seus aspectos
tabelecer os quatro pilares da educação contemporânea. biológicos, fisiológicos. Existe um outro aspecto que é o
Aprender a ser, a fazer, a viver juntos e a conhecer consti- da cultura, o mundo transformado pelo homem. Os
tuem aprendizagens indispensáveis que devem ser perse- homens fazem a cultura por necessidade, por
guidas de forma permanente sobrevivência, para satisfazer essas necessidades eles Poe
pela política educacional de todos os países. Como em ação sua razão e sua criatividade. O homem é um ser
diz Basarab Nicolescu, Presidente do Centro Internacional de desejos colados às necessidades. Os desejos se ma-
de Estudos e Pesquisas Transdisciplinares (CIRET), há uma nifestam como fonte do humano, propulsores da
transrelação que ligamos quatro pilares do novo sistema passagem do estabelecimento para o inventado. O
de educação e que tem sua origem em nossa própria conceito de desejo indicara a presença da liberdade
cons- tituição como seres humanos. Uma educação só associada à necessidade.
pode ser viável se for uma educação integral do ser O senso comum identifica a cultura como erudição,
humano. Uma educação que se dirige à totalidade aberta acúmulo de conhecimentos, atividade intelectual. Os cien-
do ser humano e não apenas a um de seus componentes. tistas sociais, antropólogos, conceituam cultura como
Foi com o objetivo, entre outros, de aprofundar a tudo o que resulta da interferência dos homens no mundo
visão transdisciplinar da educação, que a Unesco solicitou que os cerca e do qual fazem parte. Ela se constitui no ato
a Ed- gar Morin que expusesse suas idéias sobre a pelo qual ele vai de homo sapiens a ser humano. Assim,
educação do amanhã. Edgar Morin aceitou o desafio e todos os homens são cultos, na medida em que participa,
nos brindou com um texto da mais profunda reflexão, que de algum modo da criação cultura, estabelecem certas
sabiamente intitu- lou de Os Sete Saberes Necessários à normas para sua ação, partilham, valores e crenças. Tudo
Educação do Futuro. isso é resultado do trabalho. Por isso não se fala em
cultura sem falar em trabalho, intervenção intencional e
consciente dos homens rna realidade. É o trabalho que faz
os homens saberem, se- rem. O trabalho é a essência do
homem. A idéia de trabalho
226
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

não se separa da idéia de sociedade, na medida em que é


com os outros que o homem trabalha e cria a cultura. No A função da educação tem uma dimensão técnica e
política. O pedagogo realiza a dimensão política na prá-
trabalho o homem começa a produzir a si mesmo, os ob-
tica educativa, preparando o cidadão para a vida na polis,
jetos e as condições de que precisa para existir. A primeira
transmitindo saber acumulado e levando a novos saberes;
coisa que o homem produz é o mundo, mas o mundo tor-
tecnicamente significa dizer, que a criação de conteúdos e
nado humano pela presença do homem e pela
técnicas que possam garantir a apreensão do saber pelos
organização social que, pelo trabalho, lhe impõe.
sujeitos e a atuação no sentido da descoberta e da inven-
Qualquer sociedade se organiza como base na pro- ção. Conteúdos e técnicas são selecionados, transmitidos
dução da vida material de seus membros e das relações e transformados em função de determinados interesses
decorrentes. A cultura precisa ser preservada e transmitida exis- tentes na sociedade. O papel político da educação se
exatamente porque não está incorporada ao patrimônio revela na medida em que se cumpre as perspectiva de
natural. A educação, no sentido amplo, está definida determina- do interesse, está sempre servindo as forças
como processo de transmissão de cultura, está presente que lutam para perpetuar e / ou transformar a sociedade.
em to- das as instituições, ou seja, escolas. Escola é o A escola da socie- dade capitalista não tem caráter
espaço de transmissão sistemática do saber democrático, socializando o saber e recurso para
historicamente acumula- do pela sociedade, com o apreendê-lo e transformá-lo, porque ela tem estado a
objetivo de formar indivíduos, capacitando-os a participar serviço da classe dominante, veiculando a ideologia dessa
como agentes na construção dessa sociedade. classe. A escola quer formar o cidadão dócil e o operário.
A sociedade capitalista se caracteriza por ter sua orga- É necessário refletir e encontrar caminhos para sua
nização sustentada numa contradição básica –aquela que transformação.
se dá entre capital e trabalho - e que provoca a divisão Os papeis sociais do educado são definidos levando-
de seus membros em duas classes antagônicas, a classe -se em consideração as instituições onde esse desenvolve
burguesa e a trabalhadora. Na sociedade capitalista, a es- a prática dos sujeitos. O educador desenvolve sua prática
cola, enquanto instituição, tem sido o espaço de inserção no espaço da instituição que é a escola. É tarefa da escola
dos sujeitos nos valores e crenças da classe dominante. A a transmissão / criação sistematizada da cultura entendida
ideologia liberal é o elemento de sustentação do sistema como resultado da intervenção dos homens na realidade
transformando-a e transformando a si mesmos. A escola
capitalista, este conjunto de idéias, crenças, valores, ganha
tem características específicas e cumpre uma função
corpo e solidifica, dissimulando a realidade por interesses
deter- minada que resulta do trabalho e das relações
da classe dominante. Assim, as diferenças sociais, as
estabeleci- das em seu interior e na prática desses
discri- minações, são justificadas com base em princípios sujeitos. O educador exerce sua função tem que realizar
conside- rados um contexto histórico especifico. Isso é suas obrigações e uma maneira especifica usando-se de
evidente na escola brasileira. Ela é transmissora do saber competência, saber fazer bem, técnica e politicamente. Isto
sistematizado acumulado historicamente, mas deveria ser na prática significa, ter do- mínio no saber escolar,
fonte de apro- priação da herança social pelos que estão habilidade de organizar e transmitir esse saber, organizar
no seu interior. Entretanto, a população está excluída do os períodos de aula, desde o momento da matrícula,
processo educa- tivo formal, a maioria que freqüenta a agrupamento de classes, currículo, e métodos de ensino,
escola está não tem oferecido condições para aquela saber relacionar o preparo técnico da escola e os
apropriação. A relação es- cola-sociedade, a escola é resultados de sua ação, e compreender a relação escola e
parte da sociedade e tem com o todo uma relação sociedade.
dialética, uma interferência recíproca e social. E O sentido político da prática docente se realiza pela
contraditória, pois é um fator de manutenção e que me- diação da competência técnica. Fazer bem é ir de
transforma a cultura. Ela tem um conjunto de práticas que encontro daquilo que é desejável, está vinculado às
mantêm e transforma a estrutura social. aspectos técnicos e políticos da atuação do educador. A
A ação dos homens em sociedade é uma ação de ca- ética é a mediação, pois defini a organização do saber que
ráter político, que onde o poder é um elemento presente será vinculado na ins- tituição escolas e na direção que
como constituinte do social. A idéia de política esta asso- será dada a esse saber na sociedade. A qualidade da
ciada ao poder, e a medida a organização da vida material educação tem sido prejudicada por educadores
preocupados em fazer o bem, sem ques- tionar
determina a organização das idéias e relações de poder.
criticamente sua ação. O maior problema que se en-
Não há vida social que não seja política, pois se toma par-
frenta no que diz respeito as dimensões técnica e política
tido, de situações, não ficar indiferente em face das alter-
da competência do educador, é a desarticulação na
nativas sociais, participar e produzir em relação com toda realidade. O saber fazer técnico constitui condições
a vida civil e social, é ter um conjunto de intenções como necessária porque é a base do querer político, ainda que a
programa de ação. dimensão política da tarefa docente não seja percebida
É preciso refletir sobre os objetivos específicos da como tal.
edu- cação, para distinguirmos da prática política, mas Com respeito à relação existente dentre moral e
vemos esta pratica, na ação educativa. política, se percebe que os educadores não têm clareza da
dimensão política de seu trabalho. Ao interpretarem
política como en- volvimento partidário, ou mesmo
sindical, alguns até negam que tenham algo a ver com
isso. Não podem se recusar a admitir a presença da
moralidade em sua ação. Essa morali- dade aparece de
forma extremada – o moralismo.
227
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

A idéia de responsabilidade que se encontra


articulada com a de liberdade, conceito que representa o É preciso que o educador competente seja um educa-
eixo cen- tral da reflexão ética está ligada à noção de dor comprometido com a construção de uma sociedade
compromisso político e moral. Os professores não têm justa, democrática interferindo no real e na organização
clareza quanto a implicação política de seu de relações de solidariedade e não de dominação entre os
comprometimento, vêem como parte de uma essência do homens.
educador. As mulheres educa- doras dão-se ênfase a A escola deve ser um espaço de predominância do
afetividade. Ao desconhecimento na presença político na consenso e da persuasão. Onde o consenso resultaria de
ação educativa e ético, aparece mistu- rado com o aproveitar o espaço existente na sociedade civil para seu
sentimento e essa mistura contribui para refor- çar o fortalecimento e para a transformação necessária na
espontaneismo e para manter as falhas da instituição estru- tura social.
escolar. A dimensão técnica carrega a ética, onde a ética é a
mediação da técnica e da política expressando a escolha
É necessário evitar o moralismo, mas não é possí-
vel desvincular moral e política, buscar discutir os valores técnica e política dos conteúdos, dos métodos, dos siste-
morais dominantes na sociedade. A ética da competência mas de avaliação e os desvendando-os.
pode ajudar-nos a desvelar elementos da ideologia que Técnica, ética, política são referências que devemos
permeia nossa educação. Não há como afastar a subjetivi- descobrir na nossa vivência real em nossa prática. É a
dade que está presente na valorização, na refle- xão que transforma o processo social educativo em
intencionalidade que se confere a prática social. busca de uma significação mais profunda para a vida e o
para o trabalho.
É preciso distinguir subjetividade de singularidade ou
individualidade. O singular é o que diz respeito ao indi- O educador competente terá de ser exigente, sua for-
viduo, as pessoas de sua atuação que o distinguem dos mação deverá ser a formação de um intelectual atuante
demais e é na vida em sociedade que ele adquire essa in- no processo de transformação de um sistema autoritário
dividualidade. e repressivo: o rigor será uma exigência para sua prática.
O educador se contribuirá da filosofia para a educação e
O comportamento do homem é político enquanto ra-
zão e palavra. E a moralidade são as escolhas exigências reflexão crítica a busca de sua compreensão.
de caráter social no que se chama de técnico no ensino, A visão do professor e de educação é de mediar a
no trabalho educativo. Essas escolhas têm implicações ação mediadora. A relação professor-aluno. Educador-
ético- educan- do, é a aquisição do conhecimento, onde ambos
são su- jeitos conhecedores. O professor estabelece o
-política. Vontade, liberdade, conseqüência são conceitos
do terreno ético político. A articulação entre esses concei- diálogo do aluno como o real. O objeto que é o mundo é
tos é que nos auxilia na busca da compreensão da com apreendido, compreendido e alterado, numa relação que
po- tência do educador, pois não basta levar em conta o é fundamental
saber, mas é preciso querer. O saber e a vontade nada – a relação aluno-mundo. O professor é quem especifica a
valem sem a explicitação do dever e a presença do pocer mediação do saber entre o aluno e a cultura e a realidade.
desvinculado da dominação. Mas no poder na conjugação Há fatores intra e extra-escolares que interferem na
de possibili- dades e limites representando pelas normas prática dos educadores. É no cotidiano de nossas práticas
que regem a prática dos homens em sociedade. Deveres que estamos construindo a educação, que estamos fazen-
que se combi- nam com direitos e estão ligados à do a história da educação brasileira. E é o educador que
consciência e a vontade dos sujeitos. vai encaminhar o educador que queremos ter. O desafio
está na necessidade de se superarem os problemas e se
Ao lado do saber que se identifica com o domínio dos
conteúdos e das técnicas para a transmissão temos o encontrarem / criarem recursos para a transformação. Isso
saber que sabe, a consciência de percepção da realidade se concretiza na elaboração de projetos de ação.
crítica e reflexiva. Ao organizar projetos, planejamos o trabalho que te-
A visão crítica é um primeiro passo a ter um compro- mos a intenção de realizar, lançamos-nos para diante,
misso político. Depois a vontade e a intencionalidade do olha- mos para frente, projetar é relacionar-se com o
gesto do educador. futuro, é começar a fazê-lo. O presente traz no seu bojo o
A necessidade presente no contexto socioeconômico passado, enquanto vida incorporada e memória. É isso
é o primeiro motor de ação do educador, a vontade de que garante a significação do processo histórico.
arti- cular a consciência é essencial a prática político moral Começamos a escola do futuro no presente. Quando se
do educador a liberdade responsável. O educador deve projeta, tem-se que em mente um ideal. O ideal é utópico,
asso- ciar a coletividade rompendo com a idéia mas é preciso recuperar o sentido autentico de utopia,
dominante do pensamento burguês que é a de que é algo ainda não reali- zado.
individualismo. A escola deve desenvolver um trabalho coletivo e par-
A idéia de promessa dá-se a noção de compromisso, ticipante, tendo como pressuposto que o trabalho que se
o empenho da prática e envolvimento com a realização realiza com a participação responsável de cada um dos
do prometido. Na maioria das situações é preciso criar su- jeitos envolvidos é o que atende de forma mais efetiva
essas circunstâncias. O gesto de compreensão e a ética no as necessidades concretas da sociedade em que vivemos.
envol- vimento com aquilo que se tem por objetivo. É preciso que ele seja possível . O que ainda não é pode
Compreen- são é saber aprofundado e envolvimento vir a ser. O possível ainda não está pronto, deve ser
ético-politico do saber. construído.

228
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

A idéia de projeto e a de utopia está ligada à idéia de


esperança, movimento, que é alimentada pela ação do SAVIANI, DERMEVAL. HISTÓRIAS DAS IDEIAS
ho- mem. A organização de projetos utópicos é uma PEDAGÓGICAS NO BRASIL. CAMPINAS; AUTORES
forma de se enfrentar as crises. ASSOCIADOS, 2010.
A história se faz na contraposição de valores, na des-
coberta e instituição de novas significações para as ações
e relações humanas. Mas a crise pode configurar-se como
uma ruptura, uma negação de a própria dinâmica da
cultu- ra, uma ameaça de imobilidade, sob a forma de um Resenha
supos- to movimento de desordem.
SAVIANI, Dermeval
Cada momento histórico apresenta aos homens um
História das Idéias Pedagógicas no Brasil.
desafio. A crise ética em nossa sociedade contemporânea
é o grande desafio da competência. A crise moral é o Campinas: Autores Associados, 2007. 472 p.
desafio a ética, porque significa uma indiferença diante de
valores. A atitude cínica nos provoca na medida em que é Aline Perazzoli* Maristela Ferreira da
Rocha** Sandino Hoff***
uma atitude de desconsideração das normas e dos
valores que
A interrogação sobre a história da educação no Bra-
as sustentam.
sil, as idéias educacio- nais componentes e o lugar a ela
Na ação competente, haverá sempre um componente
conferida na pesquisa e no ensino universitário constitui-
utópico no dever, no compromisso, na responsabilidade.
-se no tema central do livro História das idéias
A competência é construída cotidianamente e se propõe
Pedagógicas no Brasil, elaborado a partir dos resultados
como um ideal a ser alcançado, ela é também comparti-
da investigação conduzida pelo autor com Bolsa de
lhada, por outras pessoas, a qualidade de seu trabalho
Produtividade em Pes- quisa do CNPq. Cobre o conjunto
não depende só de uma pessoa. A competência do
de idéias pedagógicas no Brasil desde 1549 até nossos
profissional e na articulação dessa competência com os
dias.
outros e com as circunstâncias.
O professor Saviani é formado em Filosofia pela PUC
Na direção do bem comum, da ampliação do poder − SP, é doutor em Filosofia da Educação (PUC − SP) e livre-
de todos como condição de participação na construção
-docente em História da Educação (UNICAMP, 1986),
cole- tiva da sociedade e da histórica, apresenta-se ao
tendo realizado “estágio sênior” na Itália em 1994–1995.
educador, como profissional, em meio a crise,. A Autor de grande número de trabalhos publicados,
necessidade de res- ponder ao desafio. Ele o fará tanto atualmente é pro- fessor emérito da Unicamp e
mais competentemente quanto mais garantir em seu Coordenador Geral do Grupo Nacional de Pesquisas
trabalho, no entre cruzamen- to das dimensões que o “História, Sociedade e Educação no Brasil – Histedbr”.
constituem. A dimensão utópica. Esperança a caminho. Ancorado em ampla pesquisa documental – 351 refe-
Fonte: http://paraosprofessores.blogspot. rências bibliográficas
com/2013/09/resumo-do-livro-rios-terezinha-etica-e.html − o autor entende que o livro, pela sua grande perio-
dização, incidiu mais “sobre a síntese do que sobre a aná-
SACRISTÀN, J. GIMENO; PÉREZ GOMES, A. I. lise. Assim, em lugar de se dar precedência à descoberta
COMPREENDER E TRANSFORMAR O ENSINO. 4. de fontes ainda não exploradas visando a produzir
ED. PORTO ALEGRE: ARTMED, 2000. análises de momentos especí- ficos da história da
educação brasi- leira, buscou-se, a partir das fontes
disponíveis, construir sínteses explicativas de amplo
alcance” (Prefácio, p. XVI).O conjunto de fontes referidas
no trabalho de elaboração do texto, trabalhado com rigor
Prezado Candidato, devido a complexibilidade e cien- tífico, pretende propor- cionar aos educadores e
formato do conteúdo em questão, disponibilizaremos professores um instrumento útil na montagem da
o PDF em nosso site para que assim não haja prejuízos programação das respectivas disciplinas. Num curso geral
em seus estudos www.novaconcursos.com.br/retifica- sobre história da educação brasileira, o professor pode
coes, para consulta. tomar o livro como texto-base.

* Mestranda em Educação da Unoesc.


** Mestranda em Educação da Unoesc.
*** Professor do Mestrado em Educação da Unoesc.

Roteiro, Unoesc, v. 30, n. 2, p. 231-232, jul./dez. 2005


231
Na introdução, o prof. Saviani expõe a configuração
do projeto, as ques- tões teóricas relativas ao conceito de
his- tória das idéias pedagógicas e a questão da
periodização seguida em seu texto. Os quatro períodos
vêm organizados da seguinte maneira.

229
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

No primeiro, constam as idéias pedagógicas entre


dos e compreendidos qualitativamente. De acordo com a
1549 e 1759, no qual ocorreu o monopólio da vertente re-
autora, isso ocorre em virtude da dificuldade dos educa-
ligiosa da pedagogia tradicional. No segundo, abordam-
dores em lidar com dados demográficos e com medidas
se as idéias pedagógicas entre 1759 e 1932; esse é o
em geral, bem como na dificuldade de leitura crí- tica e
período denomina- do como coexistência entre as
consciente dos trabalhos que os utilizam. Tais dificuldades
vertentes reli- giosa e leiga da pedagogia tradicio- nal. No
levam à crença ou rejeição em quaisquer dados citados.
terceiro perío- do (1932 a 1969), é estudado o predomínio
Gatti aponta dois aspectos essenciais dos métodos
da pedagogia nova. No último, período que vai de 1969 a
quantitativos, cuja descon- sideração pode implicar no
2001, o autor configurou a concep- ção pedagógica
uso indevido dos dados ou na não-obtenção de interpre-
produtivista.
tações qualitativamente significativas a partir destes: os
O professor Saviani adverte que, durante os quatro
dados – números, medidas, freqüências etc. – possuem
primeiros séculos cro- nológicos, as atividades educativas
algumas propriedades que delimitam as operações que se
foram restritas. Somente com a instalação dos grupos es-
podem fazer com eles, deixando claro o seu alcance; e as
colares, a partir de 1890, no regime republicano, começam
boas análises dependem da qualidade teórica e da pers-
uma educação escolar leiga e um ideário renovador da es-
pectiva epistêmica na abordagem do problema. Em outras
cola pública.
palavras, ressalta a importância do estofo teórico do pes-
Ao cotejar a educação atual com a da década de 1970,
quisador na significação e re- flexão em relação aos dados
quando o autor redigiu as principais tendências da educa-
quantitativos levantados, ou seja, as duas metodologias
ção brasileira, em quatro fases, o livro mostra como “essas
– qualitativa e quantitativa – enriquecem a compreensão
tendências se cruzam marcando o modo como os profes-
dos eventos, fatos e processos.
so- res, de modo geral, se situam no campo pedagógico”
A autora destaca que, embora seja comum se encon-
(p. 444). Com a ascensão do governo, ligado aos movi-
trar a afirmação de que até meados do século passado
mentos populares, ficou claro que “[...] as linhas básicas
predominavam no Brasil estudos quantitativos, a utilização
da ação governamental [...] não seriam alteradas.” (p. 449).
destes nunca foi ampla ou teve uma tradição sólida. Tal
Por isso, o autor conclui, considerando “bem-vinda a
atitude, segun-
reorganização do mo- vimento dos educadores que per-
mitisse [...] arregimentar forças para uma grande mobiliza-
* Mestrando em Educação da Unoesc.
ção nacional capaz de traduzir em propostas concretas a
** Mestranda em Educação da Unoesc.
defesa de uma educação pública de qualidade acessível a
*** Mestranda em Educação da Unoesc.
toda a população brasileira.” (p. 449).
Construindo a história das idéias pedagógicas no Bra-
Roteiro, Unoesc, v. 30, n. 2, p. 233-236, jul./dez. 2005
sil, essa obra traz efe- tivas contribuições para se com-
233
preender a educação brasileira, desde seu nasci- mento
do afirmações da autora, dificultou o uso mais con-
até 2001, e realiza uma ponte com os processos de esco-
sistente desses instrumentais analíticos e a construção de
larização do país. A análise do texto resulta extremamente
uma perspectiva mais fundamentada e crítica do que eles
positiva, pois, com a edição do livro, os professores e os
podem ou não oferecer, e a construção de uma perspec-
educadores dispõem de um proveitoso instrumento de
tiva consistente diante dos limites desses métodos – exis-
acesso aos conhecimentos das idéias educacionais em sua
tentes também na metodologia qualitativa.
trajetória histórica no Brasil. 232 Roteiro, Unoesc, v. 30, n.
Gatti considera, ainda, que muitos dos estudos quan-
2, p. 231-232, jul./dez. 2005
titativos na área da educação são realizados por pesqui-
sadores de outras áreas (economistas, sociólo- gos, psi-
Resenha
cólogos etc.). A autora contempla em suas considerações
que os métodos quantitativos de análise são recursos para
GATTI, Bernadete A.
o pesquisador realizar suas reflexões e não instrumentos
Estudos quantitativos em educação. Educação e Pes-
sobre os quais deve submeter-se cegamente; tais dados
quisa.
ofere- cem indícios sobre as questões tratadas e não-ver-
São Paulo, 30, n. 1, p. 11-30, jan./abr. 2004.
dades; levam, portanto, a proxi- midades ou plausibilida-
des e não a certezas.
Arnaldo Telles Ferreira*
A fim de que o método quantitativo seja visto dessa
Flávia Dalla Costa**
forma, Gatti aponta para a necessidade de o pesquisador
Filomena Lucia Gossler Rodrigues da Silva***
ter conhecimento do contexto em que os dados foram
produzidos e de seus procedimentos de medida e cole-
Bernadete Gatti inicia as reflexões de seu texto: “Estu-
ta, além do do- mínio de teorizações e o conhecimento
dos quantitativos em educação”, destacando que, atual-
de seus contornos epistêmicos. Caso não haja esses do-
mente, as pesquisas realizadas na área da educação es-
mínios, o pesquisador poderá incorrer no uso mecânico
tão deixando de lado a metodologia quantitativa, embora
de técnicas de análise quantitativa e distorções de análise.
existam problemas educacionais que necessitem dos da-
dos quantitativos, para que pos- sam ser contextualiza-

230
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

As quantificações podem ser obtidas de diversas for-


essas modelagens, permitindo a visão clara dos limites
mas; Gatti, no entanto, destaca três tipos de dados: os ca-
desses estudos. A autora conclui, utilizando um comentá-
tegóricos (referem-se àqueles que apenas se podem colo-
rio de Ferra- ri: “temo que, com o argumento de livrar-se
car em classificações – classes – e verificar suas
do quantitativismo e dos problemas relacionados com a
freqüências nas clas- ses. Exemplo: feminino e masculino);
utilização das estatísticas educacionais, tenha-se acaba-
os ordena- dos (quando estão numa forma que mostra
do por jogar fora a criança junto com a água do banho.
sua posição relativa segundo alguma característica, mas
Se assim foi, talvez se possa ainda recuperá-la.” (FERRARI,
que não há associação de um valor numérico para essa
2004 apud GATTI, 2004, p. 26). Portanto, o ar- tigo revela-
característi- ca, nem um intervalo re- gular entre uma
-se simples e agradável, com certa leveza, apesar de tra-
posição e outra. Exemplo: primeiro, segundo etc.); e os
balhar com um assunto bastante complexo, e é de grande
métricos (consis- te de observações relativas às
contribuição, principalmente, àqueles que desenvolvem
características que podem ser mensuradas e expressas em
trabalhos acadêmicos no campo da educação.
escala numérica. Exemplo: graus da temperatura).
Para ilustrar essa diversidade de formas de análise,
Roteiro, Unoesc, v. 30, n. 2, p. 233-236, jul./dez. 2005
Gatti comenta alguns trabalhos realizados com aborda-
gens quantitativas nos últimos 30 anos. Confor- me a au-
Disponibilizaremos o PDF em nosso site para que
tora, a seleção desses trabalhos ocorreu por meio de um
assim não haja prejuízos em seus estudos www.nova-
levantamento em todos os números publicados de 1970
concursos.com.br/retificacoes, para consulta.
para cá dos seguintes periódicos: Revista Brasileira de
Estudos Pedagógicos (Inep/MEC); Cadernos de Pesquisa
(Funda- ção Carlos Chagas); Educação e Realidade (UFRS); TEIXEIRA, ANÍSIO. A ESCOLA PÚBLICA UNIVERSAL E
Educação e Sociedade (Ce- des/Unicamp); Revista Brasi- GRATUITA. REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS
leira de Educação (ANPEd); Estudos em Avaliação Educa- PEDAGÓGICOS. RIO DE JANEIRO, V.26, N.64,
cional (Fundação Carlos Chagas); Ensaio (Fundação Ces- OUT./DEZ. 1956. P. 3-27.
granrio). Além desses periódicos, o levantamento foi feito
em fontes bibliográficas indexadas, para detectar livros ou
relatórios contendo esses tipos de abordagem.

234 Roteiro, Unoesc, v. 30, n. 2, p. 233-236, jul./dez.


2005
TEIXEIRA, Anísio. Uma experiência de educação primá-
ria integral no Brasil. Revista Brasileira de Estudos Pedagó-
Gatti apresenta os trabalhos por subconjuntos temáti-
gicos. Rio de Janeiro, v.38, n.87, jul./set. 1962. p.21-33.
cos, os quais são ci- tados: analfabetismo, percurso
escolar e fracasso escolar; fluxo escolar/análise de coortes:
UMA EXPERIÊNCIA DE EDUCAÇÃO PRIMÁRIA
outra metodologia; a questão do letramento: uma
INTEGRAL NO BRASIL
discussão re- cente; políticas de educação básica;
financiamento da edu- cação/municipalização; fa- tores
ANÍSIO TEIXEIRA
sociais e educação; os jo- vens e a educação; avaliação
Diretor do I.N.E.P.
educacional; temas variados/ estudos amostrais menores.
Após abordar como algumas temáticas de pesquisa
Educação primária para poucos e educação primária
foram estudadas, Gatti conclui seu artigo destacando que
para todos: experiência brasileira.
as análises com base em dados quantificados, contextua-
lizados por perspectivas teóricas, com escolhas metodo-
O problema da escola primária para todos, visando à
lógicas cuida- dosas, trazem subsídios concretos para a
integração de tôda a população no contexto da sociedade
compreensão de fenômenos educacio- nais, contribuindo
moderna: o Centro de Educação, Primária na Bahia, como
para a produção e enfrentamento de políticas educacio-
ensaio de solução.
nais, para o planejamento e gestão da educação,
podendo, também, orientar as ações pedagógicas.
Será possível generalizar a experiência?
Ao final do artigo, a autora destaca que, sem os dados
de natureza quan- titativa, muitas questões sociais/edu-
Educação primária para poucos e educação primária
cacionais não poderiam ser dimensionadas, equacionadas
para todos: a experiência brasileira
e compreendidas, além de outras nem serem levantadas.
Cabe se estar atento ao fato de que os processos necessá-
rios à quantificação podem levar às mistificações do fenô-
meno, demonstrar domínio sobre esses condicionantes e
levá-los em conta, como não se pode deixar de trabalhar
com apoio de sólido referencial teórico transcendendo a

231
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

A experiência brasileira - e possìvelmente latino-


ameri- cana - de escola primária foi, até agora, uma Não sendo frequentada pelo povo propriamente dito,
experiência de escola primária para uma parcela e não mas pela classe média, a escola primária manteve-se
para tôda a popula- ção escolar. Mesmo que acalentasse a assim restrita e com padrões bastante razoáveis até a
aspiração de ser uma educação para todos, não logrou década de 20 a 30, quando teve início a segunda fase.
atingir senão uma parcela maior ou menor das crianças Nesta segunda fase buscou-se democratizá-la, esten-
em idade escolar. dendo-se o seu alcance a todos e não apenas aos poucos
Este fato determina que a escola primária, a despeito então beneficiados com a cultura escolar. O recurso ado-
das proclamações de ser escola para todos, adaptada, tado para isto foi o de reduzir-lhe a duração. Tratava-se
por- tanto, no seu conteúdo, métodos e processos, ao de alfabetizar o povo brasileiro. O Estado de São Paulo,
aluno - e não êste à escola - seja uma escola para os que liderou o movimento, chegou a sugerir uma escola de
poucos, ainda que cresçam e tenham crescido êstes dois anos, e com esforço é que alguns educadores
poucos. conseguiram elevá-la a quatro anos de estudo, no meio
A escola para poucos caracteriza-se por ser uma urbano, e a três, na zona rural.
escola cujo rendimento e qualidade depende sobretudo Dado este passo, estava aberto o caminho para uma
do aluno e não apenas do programa, do método e do evolução a que não faltariam impressionantes distorções.
professor. O aluno é que tem de ser capaz de aprender e Primeiro, rompeu-se, desde então, o nítido dualismo
adaptar-se ao programa, ao método ou ao professor. O educa- cional de dois sistemas separados, um para a
método de se lhe apurar a eficiência é o das reprovações. pequena classe média e outro para as classes dominantes.
Quanto mais repro- var tanto mais será considerado A escola primá- ria passou a constituir uma escola popular
eficiente. de alfabetização, sem articulação nem com as escolas
Tal escola, chamada escola seletiva, é aceita, de forma vocacionais nem com as escolas acadêmicas. Umas e
generalizada, nos níveis secundário e superior, em que outras passaram a exigir exa- mes de admissão para
do- mina a idéia de que a educação não é para todos mas ingresso em seus cursos, a se inicia- rem aos onze anos, os
para aquêles que se mostrem capazes de recebê-la, sendo quais, embora destinados a clientelas diferentes, já não
assim sua função a de preparar os chamados quadros da traziam a marca de sistemas autônomos e, mais tarde,
cultura média e superior do país, naturalmente compostos iriam coalescer em um sistema de ensino médio com
de nú- mero limitado de membros. equivalência entre si dos respectivos cursos.
À medida que essa educação média e até a superior E a escola primária, reduzida na sua duração e no seu
começam a ter a ambição de se estender a muitos, senão programa, e isolada das demais escolas do segundo nível,
a todos - como nos Estados Unidos - passam elas por entrou em um processo de simplificação e de expansão de
modifi- cações estruturais de programa e, sobretudo, de qualquer modo. Como já não era a escola da classe média,
métodos, processos e professorado. mas verdadeiramente do povo, que passou a buscá-la em
No Brasil, a escola primária, embora ainda para pou- uma verdadeira explosão da matrícula, logo se fêz de dois
cos, conheceu duas fases. Primeiro organizou-se, segundo turnos, com matrículas independentes pela manhã e pela
o modelo então reinante na Europa, como um sistema de tarde e, nas cidades maiores, chegou aos três turnos e até,
educação paralelo ao propriamente preparatório para a em alguns casos, a quatro.
es- cola superior e formador da elite dominante. O seu Seria, assim, uma escola de alfabetização. Como, po-
curso compreendia sete ou oito anos de estudos, rém, a alfabetização pura e simples não chega a constituir
completados os quais o aluno encerrava a sua vida um completo objetivo escolar; e como a formação do pro-
escolar, ou a conti- nuava nas escolas chamadas fessor pelas escolas normais não se alterou, continuando a
vocacionais. Reproduzia-se o dualismo educacional recrutar na classe média os seus contingentes e a prepará-
corrente na Europa e, sobretudo, na França, onde se -los para o antigo ensino semi-acadêmico da velha escola
buscava inspiração. primária, a nova escola primária nem se tornou a escola
A escola primária, a escola normal e as escolas de de educação de base que se poderia ter feito, nem
artes e ofícios constituíam o sistema da classe média, conservou a sua anterior e razoável eficiência da escola
então pe- quena e reduzida; o ginásio e a escola superior, preparatória ao acesso às escolas vocacionais do nível
o sistema escolar da elite dominante. médio.
A escola primária tinha condigna instalação e não se Nem por isto, entretanto, deixou de ser uma escola
expandia senão quando havia recursos e condições para preparatória. Passou a ser preparatória ao exame de ad-
ser adequadamente mantida. O professor ou professora missão às escolas médias e secundárias. Como este exa-
recebia formação na escola normal, geralmente de quatro me conservou o seu caráter de exame acadêmico seletivo,
ou cinco anos de estudos, depois dos sete anos dos a escola primária, sem propósitos nem planos para isto e
cursos elementar e complementar da escola primária. com o seu reduzido horário, fez-se estritamente uma
Como os candidatos ao magistério eram até certo esco- la de ensino formal e acadêmico, no sentido de
ponto selecionados, os professores primários, divididos catálogo de conhecimento para o exame de admissão.
em dois grupos, o das classes elementares e o das classes Recrutando-se a sua matrícula em toda a massa po-
complementares, recebiam preparo médio apreciável, não pular e não se achando esta massa preparada para tal tipo
se constituindo membros da intelligentsia nem da classe de ensino, o índice de reprovação cresceu enormemente,
dominante, mas respeitáveis representantes do que os a evasão escolar se fez avultada e a escola nem bem
franceses chamavam “o espírito primário”, ou seja o cumpre os objetivos populares nem se constitui uma boa
espírito prático e não “desinteressado”. escola preparatória.

232
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Restaria dizer que, com essa drástica redução de sua


funcionalidade, cresceu a necessidade da escola secundá- Nesses centros, o dia escolar é dividido em dois perío-
ria, sem a qual os poucos sobreviventes da escola primária dos, um de instrução em classe e outro de trabalho,
nada poderiam fazer com a cultura formal ali recebida, educa- ção física, atividades propriamente sociais e
de- correndo daí a expansão tumultuária das escolas de atividades artís- ticas. O Centro funciona como um semi-
internato, recebendo os alunos às 7,30 da manhã e
nível secundário de tipo acadêmico e eficiência mais do
devolvendo-se às famílias às 4,30 da tarde.
que du- vidosa.
Não há neste quadro exagero, senão o que decorre A fim de tornar esse tipo de escola mais econômico,
pro- jetou-se cada conjunto para 4.000 alunos,
de se desejar marcar mais nitidamente as tendências e
compreendendo quatro escola-classe, para mil alunos cada
distor- ções. Bem sei que muitas escolas conseguem seu
uma, em dois tur- nos de 500 - ou seja, com doze salas
grau de eficiência, mas isto será sempre devido ou à
de aula, no mínimo
seleção dos alunos, ou à seleção dos professores, o que
- e uma escola-parque, com pavilhão de trabalho, ginásio,
sempre permi- tiu que algo se ensinasse bem, fosse qual
pavilhão de atividades sociais, teatro e biblioteca para os
fosse a organiza- ção ou a filosofia da escola.
re- feridos 4.000 alunos em turnos de 2.000 pela manhã e
Quando, na década de 20 a 30, teve início a chamada
2.000 à tarde, e ainda edifícios de restaurante e de
democratização da escola primária, devia-se cuidar, não
administração.
de reduzir o currículo e a duração da escola, mas de
O conjunto lembra assim uma universidade infantil,
adaptá-la à educação para todos os alunos em idade
com os alunos distribuindo-se pelos edifícios das escolas-
escolar. Para tal, seria indispensável: 1) manter e não
classe (atividades convencionais de instrução intelectual) e
reduzir o número de séries escolares; 2) prolongar e não
pelas oficinas de trabalho, pelo ginásio e campo de
reduzir o dia leti- vo; 3) enriquecer o programa, com
esportes, pelo edifício de atividades sociais (loja, clubes,
atividades educativas, independentes do ensino
organizações infan- tis), pelo teatro e pela biblioteca.
propriamente intelectual; e 4) preparar um novo professor
A filosofia da escola visa a oferecer à criança um
ou novos professores para as funções mais amplas da
retrato da vida em sociedade, com as suas atividades
escola.
diversificadas e o seu ritmo de “preparação” e “execução”,
E isto, por quê? Porque a escola já não poderia ser a
dando-lhe as ex- periências de estudo e de ação
escola parcial de simples instrução dos filhos das famílias
responsáveis. Se na escola-
de classe média que ali iam buscar a complementação à
-classe predomina o sentido preparatório da escola, na
educação recebida em casa, em estreita afinidade com o
esco- la-parque, nome que se conferiu ao conjunto de
programa escolar, mas instituição destinada a educar, no
edifícios de atividades de trabalho, sociais, de educação
sentido mais lato da palavra, as crianças de todas as clas- física e de arte, predomina o sentido de atividade
ses, desde as de classe média e superior até as muito mais completa, com as suas fa- ses de preparo e de
numerosas das classes populares, às vezes não tendo se- consumação, devendo o aluno exercer em sua totalidade
quer casas e quase nunca trazendo da família a o senso de responsabilidade e ação práti- ca, seja no
experiência e os hábitos da instrução que iam receber. trabalho, que não é um exercício mas a fatura de algo
Por isto mesmo a escola já não poderia ser a escola completo e de valor utilitário, seja nos jogos e na recrea-
do- minantemente de instrução de antigamente, mas ção, seja nas atividades sociais, seja no teatro ou nas salas
fazer as vezes da casa, da família, da classe social e por de música e dança, seja na biblioteca, que não é só de
fim da esco- la propriamente dita, oferecendo à criança estudo mas de leitura e de fruição dos bens do espírito.
oportunidades completas de vida, compreendendo Trata-se de escola destinada não somente a
atividades de estudo, de trabalho, de vida social e de reproduzir a comunidade humana mas de erguê-la a nível
recreação e jogos. Para esta escola, precisava-se, assim, de superior ao existente no país.
um novo currículo, um novo programa e um novo Bem sei que a experiência tradicional da escola é a de
professor. A escola popular para uma sociedade manter a sociedade existente. Num país, entretanto,
subdesenvolvida e com acentuada estratificação social, marcado por uma rígida estrutura semifeudal, em que o
longe de poder ser mais simples, faz-se a mais com- plexa povo propria- mente dito não constitui uma classe mas
e a mais difícil das escolas. volumoso resíduo a ser erguido até à estrutura de classes
Sejam lá quais forem as dificuldades, esta terá de ser móveis da sociedade democrática, é necessário reconhecer
a escola primária com que resolveremos os problemas da à escola primária fun- ção bem mais ampla do que a da
rígida estratificação social e dos graves desníveis escola primária tradicional da sociedade já desenvolvida.
econômi- cos da sociedade brasileira e com que criaremos A escola tem pois de se fazer, verdadeiramente, uma
a igual- dade de oportunidades, que é a essência do co- munidade socialmente integrada. A criança aí irá
regime de- mocrático. encontrar as atividades de estudo, pelas quais se prepare
O problema da escola primária para todos, visando a nas artes pro- priamente escolares (escola-classe), as
integração de toda a população no contexto da sociedade atividades de traba- lho e de ação organizatória e prática,
moderna: o Centro de Educação Primária na Bahia, como visando a resultados exteriores e utilitários, estimuladores
ensaio de solução. da iniciativa e da res- ponsabilidade, além de atividades de
Foi com o objetivo de oferecer um modelo para esse expressão artística e de fruição de pleno e rico exercício de
tipo de escola primária que se projetaram, na Bahia, os vida. Deste modo, prati- cará na comunidade escolar tudo
Centros de Educação Primária, de que o Centro Carneiro que na comunidade adulta de amanhã terá de ser: o
Ribeiro, em Salvador, constituiu a primeira demonstração. estudioso, o operário, o artista, o sportsman, o cidadão,
enfim, útil, inteligente, responsável e feliz. Tal escola não é
suplemento à vida que já leva a criança, mas a experiência
da vida que vai levar a criança em uma sociedade em
acelerado processo de mudança.
233
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Os conjuntos escolares assim organizados deverão ser utili-


zados como centros de treinamento do magistério, pelo Do ponto-de-vista das construções, o programa
método de aprendizado. Deste modo, justificam-se o seu custo consti- tuiu um desafio aos arquitetos de Brasília,
elevado, bem como o caráter experimental do projeto, oferecendo-lhes a oportunidade para a concepção de
destinado a servir de modelo para a reconstrução da novos e complexos con- juntos escolares. Em esquema, o
educação primária e à forma- ção do novo magistério plano foi o seguinte:
requerido pela escola assim ampliada.
A experiência em curso na Bahia, embora já conte com I - Educação primária a ser oferecida em Centros de
al- guns anos de funcionamento, somente neste ano de Edu- cação Elementar, compreendendo:
1962 terá as suas instalações completadas com a biblioteca,
o teatro e o pavilhão de atividades sociais. Antes 1. “Jardins de infância” - destinados à educação de
funcionavam os pavilhões de atividades de trabalho, de crian- ças nas idades de 4, 5 e 6 anos;
educação física e de teatro ao ar livre, além das escolas- 2. “Escolas-classe” - para a educação intelectual
classe. sistemá- tica de menores na idades de 7 a 14 anos, em
Com a extensão da escolaridade a seis anos, devem curso completo de seus anos ou séries escolares;
ins- talar-se agora as classes de quinto e sexto anos, com o 3. “Escolas-parque” - destinadas a completar a tarefa
que se elevará o ensino ao nível dos doze e treze anos. das “escolas-classe”, mediante o desenvolvimento artístico,
Devido, entre- tanto, ao fato de achar-se a escola em um físico e recreativo da criança e sua iniciação no trabalho,
dos bairros mais po- bres, na cidade do Salvador, contou numa rêde de prédios ligados entre si, dentro da mesma
sempre o Centro com mui- tos alunos dessa idade área e assim constituída:
retardados em sua escolaridade regular. O magistério para
as novas atividades desse Centro re- crutou-se entre os a) biblioteca infantil e museu;
professores normalistas do Estado para as escolas-classe de b) pavilhão para atividades de artes industriais;
ensino convencional, recebendo os desti- nados às demais c) conjunto para atividades de recreação;
atividades treinamento especial, nos cursos especiais de d) conjunto para atividades sociais (música, dança,
formação organizados pelo Instituto Nacional de teatro, clubes, exposições);
Estudos Pedagógicos. e) dependências para refeitório e administração;
Existe a intenção de completar o plano do Centro f) pequenos conjuntos residenciais para menores de 7
Carneiro Ribeiro com a construção de residência para 200 a 14 anos, sem família, sujeitos às mesmas atividades
alunos, ou seja, cinco por cento da matrícula total. Êste educati- vas que os alunos externos.
pavilhão de resi- dência abrigará as crianças órfãs ou
abandonadas, que exijam educação com internamento. Tais Como a nova capital é constituída de quadras, e cada
crianças participarão de to- das as atividades escolares quadra abrigará população variável de 2.500 a 3.000
como as demais, residindo, entre- tanto, no próprio Centro. habitan- tes, foi calculada a população escolarizável para os
Espera-se que não se sintam, assim, segregadas, mas níveis ele- mentar e médio, ficando estabelecido o
elevadas à categoria de hospedeiras das de- mais crianças, seguinte:
que o Centro recebe em regime de semi-inter- nato.
Quando possível, receberão elas encargos e responsabi- 1. Para cada quadra:
lidades na organização e distribuição das atividades do a) 1 jardim de infância, com 4 salas, para, em 2 turnos
Centro, a fim de que possam ter plena consciência da de funcionamento, atender a 160 crianças (8 turmas de 20
confiança que merecem dos diretores e professores. crianças);
Baseado no modelo deste Centro, de Salvador, Bahia, b) 1 escola-classe, com 8 salas, para, em 2 turnos,
foi organizado o sistema escolar de Brasília, cujo plano atender a 480 meninos (16 turmas de 30 alunos).
traçamos, com o propósito de abrir oportunidades para a
Capital do país oferecer à nação um conjunto de escolas que 2. Para cada grupo de 4 quadras:
constituísse exemplo e demonstração para o sistema a) 1 “escola-parque” - destinada a atender, em 2 turnos,
educacional brasileiro. Ao fundamentá-lo, acentuamos que a cêrca de 2 mil alunos de “4 escolas-classe”, em atividades
as necessidades da civilização moderna cada vez mais de iniciação ao trabalho (para meninos de 7 a 14 anos) nas
impõem obrigações à es- cola, aumentando-lhe as “ofi- cinas de artes industriais” (tecelagem, tapeçaria,
atribuições e funções, devendo assim as escolas, em cada encaderna- ção, cerâmica, cartonagem, costura, bordado e
nível de ensino, desde o primário até o superior ou trabalhos em couro, lã, madeira, metal, etc.), além da
terciário - como hoje já se está este a chamar - ser participação dirigida dos alunos de 7 a 14 anos, em
organizadas tendo em vista constituírem-se verdadeiras atividades artísticas, sociais e de recreação (música, teatro,
comu- nidades, com as suas diversas funções e considerável pintura, exposições, grêmios, educação física).
variedade de atividades, a serem distribuídas por um
conjunto de edifícios e locais a lembrar, tanto no nível Os alunos frequentarão diariamente a “escola-parque”
primário, como no secundário e as “escolas-classe”, em turnos diferentes, passando 4
ou no superior, verdadeiros conjuntos universitários. horas nas classes de educação intelectual e outras quatro
Daí falar-se antes em Centro do que em Escola. O Centro horas nas atividades da “escola-parque”, com intervalo
de Educação Elementar compreende pavilhões de “jardim de para almoço, à maneira do que se faz no Centro de
infân- cia”, de “escola-classe”, de “artes industriais”. de Salvador, Bahia.
“educação física”, de atividades sociais”, de “biblioteca escolar” Não cabe aqui referência ao plano de escolas secun-
e de serviços gerais”. O Centro de Educação Média dárias e à Universidade, que também foram devidamente
também possui progra- desenvolvidos. Tratamos neste artigo apenas do programa
ma consideravelmente diversificado, destinando-se a ofe- de educação para todos, isto é, a elementar. Buscamos aí,
recer a cada adolescente real oportunidade para cultivar
os seus talentos e aí se preparar diretamente para o
trabalho ou para prosseguir a sua educação no nível
superior.
234
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

dentro do plano do Centro Carneiro Ribeiro, juntar o ensi-


no propriamente dito da sala de aula com a auto- Para que a ideia se realize, será necessário amadurecer
educação resultante de atividades de que os alunos o sentimento de que a justiça social somente será efetiva,
participem com plena responsabilidade. Por isto a escola num regime livre, com a igualdade de oportunidade
se estende por oito horas, divididas entre atividades de educativa, e que esta somente se há de concretizar com
estudo e trabalho, de arte e de convivência social. No uma escola que ofereça ao pobre ou ao rico uma
“centro de educação elementar”, a criança, além das educação que os ponha no mesmo nível ante as
quatro horas de educação convencional, no edifício da perspectivas da vida. A aceleração do de- senvolvimento
“escola-classe”, onde aprende a “estudar”, conta com econômico e social, a difusão do conhecimento pelo rádio e
outras quatro horas de atividades de trabalho, de pela televisão, e o que vem chamando a explosão do
educação física e de educação social, ativi- dades em que próprio conhecimento, sobretudo científico, põem todos,
se empenha, individualmente ou em grupo, aprendendo, ricos e pobres, na necessidade de encontrar na escola
portanto, a trabalhar e a conviver. muito mais do que ela esperavam as crianças do século
Pode-se bem compreender que modificações não de- dezenove ou mesmo do nosso século, até a Segunda
verão ser introduzidas na arquitetura escolar para aten- Guerra Mundial.
der a programa dessa natureza. Já não se trata de escolas Se as nações desenvolvidas disto precisam, que não
e salas de aula, mas de todo um conjunto de locais, em dizer das nações subdesenvolvidas, que, além de tudo,
que as crianças se distribuem, entregues às atividades de precisam erguer as crianças de baixíssimos níveis de
“estudo”, de “trabalho”, de “recreação”, de “reunião”, de pobreza e de con- dições quase neolíticas de cultura até
“administração”, de “decisão” e de vida e convívio no mais ao nível da moderna civilização tecnológica?
amplo sentido dêsse têrmo. A arquitetura escolar deve as- Tudo isto seria utópico se não tivessem já sido
sim combinar aspectos da “escola tradicional” com os da despertadas as expectativas das massas confusamente
“oficina”, do “clube” de esportes e de recreio, da “casa”, conscientes de que é possível a sua ascensão e a realização
do “comércio”, do restaurante”, do “teatro”, de suas aspirações.
compreendendo, talvez, o programa mais complexo e Os recursos para esta batalha, que será a batalha da paz,
mais diversificado de tôdas as arquiteturas especiais. O hão de surgir, como surgiram, no passado, os recursos para
esquema que acompa- nha o presente artigo busca todas as batalhas de sobrevivência com que se defrontou a
mostrar como os arquitetos estão abordando as novas espécie.
necessidades e funções dessa ambiciosa escola moderna. Para que não se julgue, contudo, em face destas
palavras, que ignoramos as dificuldades de se generalizar o
Será possível generalizar-se a experiência? modelo que vimos comentando, teçamos algumas
considerações finais so- bre a situação da educação entre as
A primeira objeção ao plano de escola primária aí nações subdesenvolvidas. Até antes da Segunda Guerra
esboçado é o do custo do empreendimento. As constru- Mundial considerava-se que o desenvolvimento era um
ções necessárias para 4.000 alunos compreendem mais de acidente histórico e a educa- ção uma consequência da
20.000 metros quadrados de construção, e o pessoal ne- riqueza. Embora nenhuma nação rica deixasse de possuir
cessário para fazê-lo funcionar sobre a cerca de 200 pro- sistema educativo mais ou menos adequado à sua
fissionais, à razão de 1 para cada 20 alunos. Além disto, riqueza, admitia-se tal situação como sub-
como a escola fornece lanche gratuito, todo o material protudo mais ou menos automático da própria riqueza.
escolar e ainda uniformes, o custo por aluno sobre con- Foi necessária a destruição pela guerra da riqueza das
sideravelmente. pode- rosas nações da Europa e do próprio Japão, e a rígida
Como poderia uma nação pobre arcar com tal ônus? recupera- ção econômica após a guerra destas mesmas
Está claro que não pelos métodos convencionais. Mas se nações, para nos darmos conta de quanto a educação podia
atentarmos que são exatamente as nações pobres que constituir-se fator essencial - e não apenas consequência -
hoje não podem dar-se ao luxo de não educar plenamen- do desenvolvimento.
te os seus filhos, temos de reconhecer que havemos de No mundo chamado livre - ou seja, não compulsoria-
acabar educando-os, sejam lá quais forem os sacrifícios. mente planejado - a demonstração ocorreu com países,
em virtude de sua riqueza anterior, já educados e depois
A necessidade de construir e operar um modelo de devas- tados pela guerra. O desafio às nações pobres é o
es- cola desse tipo não pode ser contestada e este foi o de saber se elas podem organizar a educação antes de ser
prin- cipal objetivo do Centro de Educação Primária de ricas, ou, pelo menos, simultaneamente com o processo de
Salvador, Bahia. Ideamo-lo, como Secretário de Educação enriquecimento. Para responder a este desafio, há que
daquele Estado, ainda antes de 1950. Somente agora, enfrentar duas di- ficuldades. Primeiro, a das prioridades
graças a au- xílio federal, concedido por intermédio do no uso dos recursos escassos das nações pobres.
Instituto Nacio- nal de Estudos Pedagógicos, está ele em Conseguirão elas o consenso de suas populações, ou
vias de conclusão. Não se trata, pois, de algo já melhor, de suas elites, para dar à educa- ção a prioridade
definitivamente aceito e em processo de generalização, no uso daqueles recursos, pelo menos igual à que se dá à
mas de programa, de aspiração em vias de experiência e industrialização? Até agora, salvo o caso especia- líssimo e
concretização. único de Israel, não me parece que nação alguma o tenha
O próprio plano de Brasília não está funcionando em conseguido no volume e na proporção adequadas. Há,
contudo, esforços em marcha e o trabalho de persuasão
condições adequadas. O crescimento da matrícula já co-
para
meça a pôr em perigo o programa em sua integridade e a
isso começa a ser apreciável.
instaurar a escola de tempo parcial e semi -parcial.
A segunda dificuldade é igualmente grande, e de cer-
to modo explica as resistências para que a primeira seja
removida. No processo de desenvolvimento acidental das
nações, a educação, como processo consequente, é domi-
nantemente uma educação para o consumo da riqueza
ad- quirida, ou em vias de aquisição. Educam-se os
indivíduos para participar da riqueza em expansão e,
secundariamen-

235
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

te, para ajudar e consolidar a expansão. A escola passa a


desen- volver-se, às vezes, com aceleração considerável, GROPPA, JULIO – INDISCIPLINA NA ESCOLA
para atender às pressões de mudança de status social, que a (ALTERNATIVAS, TEÓRICAS E PRÁTICAS) SUMMUS
riqueza provoca e causa, a fim de que maior número de EDITORIAL.
pessoas fiquem em condições de consumi-la. Este tipo de
educação, que o desen- volvimento acidental promove,
embora não seja primariamen- te destinado a preparar o
produtor, concorre indiretamente para facilitar o preparo
do produtor, quando ministrada com eficiência. Ora, sucede
nas nações pobres que mesmo esse tipo de educação para AQUINO, Julio Groppa (org.). Indisciplina na Escola:
o consumo, ordinariamente mais econômico do que o alternativas teóricas e práticas. São Paulo: Summus, 1996.
processo de educação para a produção, não chega a
poder ser dado com eficiência e, deste modo, nem sequer O que é Indisciplina?
secundariamente ajuda o aumento da produtividade. Entende-se por indisciplina os comportamentos
Tal fato, embora raramente formulado, está na base graves que supõem uma disfunção da escola. Os
de toda a descrença generalizada de economista e homens comportamentos indisciplinados simplesmente obedecem
prá- ticos na eficácia da escola para o processo de a uma tentativa de impor a própria vontade sobre a do
desenvolvimen- to. E daí a resistência à distribuição dos restante da comunidade. [...] Também se entende por
recursos necessários para a aceleração do processo indisciplina as atitudes ou comportamentos que vão
educativo. contra as regras estabelecidas, as normas do jogo, o
A segunda dificuldade que, resolvida, removeria esta código de conduta adotado pela escola para cumprir sua
re- sistência é, pois, a da modificação estrutural do principal missão: educar e instruir. Então, muitas vezes, o
processo edu- cativo, no sentido de criar-se uma escola problema consiste em que não existem tais normas, a
capaz de introduzir as novas técnicas de produção escola funciona de acordo com um código não-escrito,
requeridas pelo desenvolvi- mento em ser, e não apenas conhecido somente por poucos, o qual não é divulgado
habilitar o indivíduo a delas apro- veitar-se para fruição e entre a comunidade escolar”. (CASAMAYOR apud
gozo mais ou menos inteligentes. Tal modificação de AQUINO, 2006, pg. 15)
estrutura educacional não é fácil, importando em escolas O que se sabe e sobre a Indisciplina Escolar?
muito mais caras em instalações, equipamento e tempo Sabe-se claramente que a Indisciplina constitui uma
letivo e, sobretudo, servidas por um novo professor, cujo das queixas reinantes quanto ao cotidiano não apenas de
preparo, para se fazer aceleradamente, exigiria esforços professores, mas também de pais.
equivalentes aos do preparo dos quadros de um exército Se trata de um fenômeno escolar que ultrapassa
mo- derno, ante uma guerra em curso. fronteiras socioculturais e também econômicas.
A segunda dificuldade é, talvez, assim, maior que a Deixaram de ser encarados como eventos esporádicos
pri- meira. Decorre daí estarem as nações subdesenvolvidas para se tornarem, uma das razões nucleares do alegado
ape- nas em processo de expansão, mais ou menos desgaste ocupacional dos profissionais da Educação.
desordenada, dos seus velhos sistemas educativos, ante as Parece ter relação imediata com o estilo de ação
pressões sociais montantes e decorrentes das novas do professor, mostrando-se como resposta a falta de
expectativas geradas pelo estado de fé generalizado na autoridade ou ao seu excesso.
viabilidade do desenvolvimento. Para corrigir os possíveis - Em todos os casos o que parece estar em pauta é a
e ao meu ver óbvios - peri- gos dessa expansão de escolas afronta – declarada ou não – aos códigos normativos em
com objetivos inadequados à fase de produtividade em vigor na Instituição.
que temos de entrar para atender ao processo do Não se trata de um fenômeno exclusivo da Escola
enriquecimento, dois remédios, melhor diria, duas Pública.
esperanças se acalentam: o aperfeiçoamento progressivo O ápice do fenômeno parece se dar, na maioria das
das escolas em geral, para que sejam, pelos menos, boas vezes, entre a etapa final do ensino Fundamental e o início
es- colas, do tipo de educação para o consumo (dêste do ensino Médio.
modo, po- dendo concorrer para o preparo de certas Temática, que tomou entre nós, maior visibilidade a
condições básicas da produção), e a intensificação do partir dos anos 1990.
preparo dos quadros de operários qualificados e de A maioria dos educadores não sabe ao certo como
técnicos de nível médio e superior. O plano do Centro administrar o ato indisciplinado (dialogar? Punir?
Carneiro Ribeiro compreende algo mais do que êsses dois Encaminhar? Ignorar?)
objetivos atualmente em curso. Caso o permitam as O que se suspeita sobre a Indisciplina escolar?
circunstâncias, a experiência em desenvolvi- mento em Suspeita-se que a Indisciplina discente seja um
Salvador, Bahia, poderá constituir o passo inicial de um fenômeno típico da adolescência, e esta caracterizada
esfôrço que não seja apenas um remédio circunstan- cial, pelo questionamento e dos valores impingidos pelo
mas a própria solução do problema de educação primária mundo adulto.
comum do Brasil, ou seja a necessária mudança estrutural Manifestação de uma agressividade latente dirigida
da escola primária, para atender aos objetivos da socie- contra as figuras de autoridade, agressividade gerada pela
dade nova que o desenvolvimento econômico acelerado “desestruturação” do ambiente familiar (prejuízos
virá inevitàvelmente trazer, e que, só por meio do agente psíquicos difusos).
catalítico dêsse novo tipo de educação, deixará de ser Más influências a que as novas gerações foram
uma convulsão para ser uma solução. expostas (o excesso de televisão, de internet, etc.)

Fonte: http://www.bvanisioteixeira.ufba.br/artigos/
uma.html

236
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

Supõe-se que, centrando os esforços em torno dos


“casos graves”, poder-se-ia livrar os alunos medianos da Numa perspectiva genericamente psicológica, a
ameaça de serem corrompidos por hábitos avessos aos questão da indisciplina estará inevitavelmente associada à
bons costumes. ideia de uma carência psíquica.
A escola poderia fazer muito pouco, ou quase nada, O reconhecimento da autoridade externa (do
contra a degradação da sociedade contemporânea, professor no caso) pressupõe uma infra-estrutura
simbolizada pela indisciplina generalizada das novas psicológica, moral mais precisamente, anterior à
gerações. escolarização.
O que estaria acontecendo com a educação brasileira Permeabilidade de regras comuns; partilha
atualmente? Qual é o papel da Escola para a sua clientela de responsabilidades, cooperação, reciprocidade,
e seus agentes? Afinal de contas, sua função primordial solidariedade, etc.
seria a de veicular os conteúdos classicamente O aluno atual carece de tais parâmetros, pois nota-se:
preconizados ou tão-somente conformar moralmente os agressividade/rebeldia; ou apatia/indiferença, ou, ainda,
sujeitos a determinadas regras de conduta? desrespeito/falta de limites.
Que se trata, supostamente, de um sintoma de
O papel essencial da escolarização é atender a relações desagregadoras, incapazes de realizar a contento
dimensão epistêmica do ensino. sua parcela no trabalho educacional das crianças e
Dimensão socializante da escola adolescentes. Um esfacelamento do papel clássico da
Dimensão profissionalizante??? instituição familiar, enfim.

O olhar sócio-histórico: a Indisciplina como força


Relação professor-aluno como recorte
legítima de resistência
O que deve regular a relação é uma proposta de
Iniciemos examinando um texto bastante curioso de
trabalho fundamentada intrinsecamente no
1922, intitulado Recomendações Disciplinares:
conhecimento. Por meio dela, pode-se fundar e/ou
[...] A disciplina é fator essencial do aproveitamento
dos alunos e indispensável ao homem civilizado. [...] Os resgatar a moralidade discente na medida em que o
alunos devem apresentar minutos antes das 10 horas, trabalho do conhecimento pressupõe a observância de
observando-se em ordem no corredor da entrada, para regras, de semelhanças e diferenças, de regularidades e
dali descerem ao patio onde entoarão o cântico. [...] Em exceções.
classe a disciplina deverá ser severa: - os alunos manterão Este trabalho de incessante indagação, no trabalho
entre si silêncio absoluto; não poderá estar de pé mais de científico, não requer que o aluno seja estático, calado,
um aluno; não deverão ser atirados no chão papeis ou obediente. O trabalho do conhecimento, pelo contrário,
quaisquer cousas que prejudiquem o asseio da sala; [...] implica a inquietação, o desconcerto, a desobediência.
serão retirados do recreio ou sofrerão a pena necessária A questão fundamental está na transformação desta
os alunos que gritarem, fizerem correrias, danificarem as turbulência em ciência.
plantas ou prejudicarem o asseio do pátio com papeis,
cascas de frutas, etc. Por uma nova ordem pedagógica
Tempos antigos para uma demanda diferente... È preciso, pois, reinventar continuamente os conteúdos,
Esta escola do passado é, ainda para muitos, o modelo as metodologias, a relação.
almejado... Esta guinada na compreensão e no manejo
Medo, coação, subserviência. É isto que devemos disciplinares vai requere enfim, uma conduta dialógica por
saudar? parte do educador, pois é ele quem inaugura a
A estrutura e o funcionamento escolar então intervenção pedagógica.
espelhavam o quartel, e o professor, um superior O ofício docente exige a negociação constante, quer
hierárquico. Uma espécie de militarização difusa parecia,
com relação às estratégias de ensino ou avaliação, quer
assim, definir as relações institucionais como um todo.
com relação aos objetivos e até mesmo aos conteúdos
Ora, com a crescente democratização do país e, em
tese, a desmilitarização das relações sociais, uma nova preconizados – sempre com vistas à flexibilização das
geração se criou. delegações institucionais e das formas relacionais.
Os parâmetros que regem a escolarização ainda são
regidos por um sujeito abstrato, idealizado e desenraizado Quesitos principais dessa relação:
dos condicionantes sócio-históricos. Investimento nos vínculos concretos (onde essa
Ela (a Indisciplina) pode estar indicando o impacto relação é foco principal)
do ingresso de um novo sujeito histórico, com outras Fidelidade ao contrato pedagógico – que este seja
demandas e valores, numa ordem arcaica e despreparada razoável para ambas as partes.
para absorvê-la plenamente. Permeabilidade para mudança e para a invenção
Olhar psicológico: Indisciplina como carência psíquica – reaprender seu ofício e reinventar seu campo de
infra-estrutural conhecimento a cada encontro.

Fonte: http://deacoordenacao.blogspot.com/2013/08/
aquino-julio-groppa-org-indisciplina-na.html

237
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

EXERCÍCIOS aprendiz.

1. (FCC/2014 - Prefeitura de Recife/PE -


Procurador) Nos termos do art. 226 da Constituição
Federal, “a família, base da sociedade, tem especial
proteção do Estado”. Entre os as- pectos abrangidos pelo
direito à proteção especial, segundo o texto constitucional,
encontram-se os seguintes:
a) garantia de direitos previdenciários e trabalhistas; e obe-
diência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e
respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento,
quando da aplicação de qualquer medida privativa da
liberdade.
b) garantia de direitos previdenciários e trabalhistas; e
acesso universal à educação infantil, em creche e pré-escola,
às crianças até 5 (cinco) anos de idade.
c) erradicação do analfabetismo; e estímulo do Poder
Pú- blico, através de assistência jurídica, incentivos fiscais e
subsí- dios, nos termos da lei, ao acolhimento, sob a forma
de guarda, de criança ou adolescente órfão ou abandonado.
d) punição severa ao abuso, à violência e à exploração
se- xual da criança e do adolescente; e garantia às
presidiárias de condições para que possam permanecer
com seus filhos du- rante o período de amamentação.
e) punição severa ao abuso, à violência e à exploração
se- xual da criança e do adolescente; e estímulo do Poder
Público, através de assistência jurídica, incentivos fiscais e
subsídios, nos termos da lei, ao acolhimento, sob a forma de
guarda, de crian- ça ou adolescente órfão ou abandonado.

R: A. O artigo 227, §3º, CF fixa os aspectos que


abrangem a proteção especial da criança e do adolescente: “I
- idade mínima de quatorze anos para admissão ao trabalho,
observado o dis- posto no art. 7º, XXXIII; II - garantia de
direitos previdenciários e trabalhistas; III - garantia de acesso
do trabalhador adolescente e jovem à escola; IV - garantia de
pleno e formal conhecimento da atribuição de ato
infracional, igualdade na relação processual e defesa técnica
por profissional habilitado, segundo dispuser a legislação
tutelar específica; V - obediência aos princípios de brevidade,
excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa
em desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer
medida privativa da liberdade; VI - estímulo do Poder
Público, através de assistência jurídica, incentivos fiscais e
subsídios, nos termos da lei, ao acolhimento, sob a forma de
guarda, de crian- ça ou adolescente órfão ou abandonado;
VII - programas de prevenção e atendimento especializado à
criança, ao adolescen- te e ao jovem dependente de
entorpecentes e drogas afins”.

2. (Alternative Concursos/2017 - Prefeitura de Sul


Bra- sil/SC - Agente Educativo) De acordo com o Estatuto
da Crian- ça e do Adolescente, Lei n.º 8.069/90, art. 60, é
proibido qual- quer trabalho a menores:
a) De quatorze anos de idade, inclusive na condição de
aprendiz.
b) De quatorze anos de idade, salvo na condição de
apren-
diz.
c) De dezesseis anos de idade, salvo na condição de
apren-
diz.
d) De dezesseis anos de idade, inclusive na condição
de
aprendiz.
e) De dezessete anos de idade, inclusive na condição
de
R: B. Em que pese o teor do art. 64 do ECA, que o adotado e possuir pelo menos 18 anos (art. 42, § 3º, ECA);
poderia dar a entender que um menor de 14 anos pode a alternativa “b” está incorreta porque é vedada a adoção por
trabalhar, pre- valece o que diz o texto da Constituição pro- curação, pois a adoção é ato personalíssimo (art. 39, § 2º,
Federal: “Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e ECA); a alternativa “d” está incorreta porque é possível a
rurais, além de outros que visem à melhoria de sua adoção conjunta desde que preencha os requisitos de serem
condição social: [...] XXXIII - proibição de trabalho casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada
noturno, perigoso ou insalubre a menores de de- zoito e a estabilidade da família (art. 42, § 1º, ECA); e a alternativa “e”
de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo está incorreta porque pode ser dispensado o estágio de
na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos”. convivência quando o adotando já estiver sob a tutela ou
Logo, o menor pode trabalhar em qualquer serviço, desde guarda do adotante (art. 46, § 1º, ECA).
que não seja noturno, perigoso e insalubre, dos 16 aos 18
anos; e entre 14 e 16 anos apenas pode trabalhar como 4. (FCC/2016 - AL-MS - Agente de Polícia
aprendiz. Legislativo) Sobre a prática de ato infracional à luz do
Estatuto da Criança e do Adolescente, é INCORRETO afirmar
3. (FCC/2016 - AL-MS - Agente de Polícia que a
Legislativo) Sobre a adoção, nos termos preconizados a) medida socioeducativa de internação pode ser determi-
pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, nada por descumprimento reiterado e injustificável da medida
a) o adotante deve ser, no mínimo, 18 anos mais velho anteriormente imposta.
que b) internação, antes da sentença, poderá ser determinada
o adotando. pelo prazo máximo de quarenta e cinco dias.
b) é permitida a adoção por procuração. c) medida socioeducativa de internação não poderá
c) se um dos cônjuges adota o filho do outro, exce- der em nenhuma hipótese três anos, liberando-se
mantêm-se os vínculos de filiação entre o adotado e o compulsoria- mente o menor infrator aos vinte e um anos de
cônjuge do adotante e os respectivos parentes. idade.
d) é vedada a adoção conjunta pelos divorciados, d) medida socioeducativa de liberdade assistida será
separa- dos judicialmente e pelos ex-companheiros. fixada pelo prazo mínimo de trinta dias, podendo a
e) o estágio de convivência que precede a adoção não qualquer tempo ser prorrogada, revogada ou substituída por
poderá, em nenhuma hipótese, ser dispensado pela outra medida, ou- vido o orientador, o Ministério Público e o
autoridade judiciária. defensor.
e) remissão não implica necessariamente o
R: C. Neste sentido, disciplina o art. 41, § 1º, ECA: “Se reconhecimento ou comprovação da responsabilidade, nem
um dos cônjuges ou concubinos adota o filho do outro, prevalece para efei- to de antecedentes, podendo incluir
mantêm-se os vínculos de filiação entre o adotado e o eventualmente a aplicação de qualquer das medidas
cônjuge ou concubino do adotante e os respectivos previstas em lei, exceto a colocação em regime de
parentes”. A alternativa “a” está errada porque o adotante semiliberdade e a internação.
deve ser, pelo menos, 16 anos mais velho que

238
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

R: D. A lei exige como prazo mínimo de medida


socioe- ducativa o período de 6 meses, conforme art. 118, ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade
§ 2º, ECA, não 30 dias conforme a alternativa “d”, razão física, psíquica e moral da criança e do adolescente,
pela qual está incorreta. A alternativa “a” está prevista no abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da
art. 122, § 1º, ECA; a alternativa “b” está prevista no art. autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e
108 do ECA; a alterna- tiva “c” está prevista no art. 121, §§ objetos pessoais”. A alternativa “d” está errada porque o
3º e 5º, ECA; a alternativa “e” está prevista no art. 127 ECA. artigo 18 do ECA assegura que “é direito da criança e do
adolescente ser criado e edu- cado no seio de sua família
e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a
5. (COMPERVE/2016 - Câmara de Natal/RN - Guar-
da Legislativo) As crianças e os adolescentes, qualificados convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta
pelo direito hoje vigente como pessoas em seu desenvolvimento integral”.
desenvolvimen- to, receberam do direito positivo
brasileiro, tutela especial através da Lei nº 8.069, de 13 de 6. (FUNRIO/2016 - IF-PA - Assistente de Alunos)
julho de 1990, mais conhe- cida como Estatuto da Criança Se- gundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei
e do Adolescente. Seguindo as diretrizes traçadas pela 8.069/90), é considerado criança
Constituição de 1988, o Estatuto da Criança e do a) a pessoa até seis anos incompletos de idade.
Adolescente trouxe a previsão normativa da absoluta b) a pessoa até oito anos incompletos de idade.
prioridade e de variados direitos fundamentais. Em tal c) a pessoa até 12 anos incompletos de idade.
seara, foi determinado que as crianças e os adolescentes d) a pessoa até 18 anos incompletos de idade.
têm direito, e) a pessoa até 14 anos incompletos, desde que não
tenha cometido nenhum crime.
a) à liberdade, de forma a compreender a liberdade
de ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços
comunitá- rios, ressalvadas as restrições legais; a liberdade R: C. O Estatuto da Criança e do Adolescente opta por
de opinião e de expressão; a liberdade de brincar e de categorizar separadamente estas duas categorias de me-
praticar esportes, a liberdade de participar da vida familiar nores. Criança é aquele que tem até 12 anos de idade (na
e comunitária; a liber- dade de buscar refúgio, auxílio e data de aniversário de 12 anos, passa a ser adolescente),
orientação, excetuadas dessa tutela a liberdade de crença e adolescente é aquele que tem entre 12 e 18 anos (na data
culto religioso e de participar da vida política. de aniversário de 18 anos, passa a ser maior), conforme o
b) ao respeito, consistente na inviolabilidade da sua artigo 2º do ECA.
inte- gridade física, psíquica e moral, abrangendo a
preservação da imagem, da identidade, da autonomia, de 7. (FUNRIO/2016 - IF-PA - Assistente de Alunos) A
seus valores, ideias e crenças, excluída a tutela dos seus intenção principal do Estatuto da Criança e do
espaços e objetos pessoais. Adolescente (Lei nº 8.069/90) é
c) de serem educados e cuidados sem o uso de a) prover uma boa escola para que crianças e adoles-
castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante, como centes possam trabalhar o mais cedo possível.
formas de correção, disciplina, educação ou a qualquer b) questionar políticas sociais que venham a proteger
outro pretexto, por parte dos pais, de integrantes da quem não merece.
família ampliada, dos responsáveis, dos agentes públicos c) distribuir renda entre os mais empobrecidos da po-
executores de medidas so- cioeducativas ou por qualquer pulação.
pessoa encarregada de cuidar deles, tratá-los, educá-los ou d) proteger integralmente crianças e adolescentes, ga-
protegê-los. rantindo políticas públicas neste sentido.
d) de serem criados e educados no seio de sua família e) proteger crianças e adolescentes da prisão.
bio- lógica, não se admitindo a sua inserção em família
substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, R: D. Conforme o artigo 1º do ECA, “esta Lei dispõe
em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral. sobre a proteção integral à criança e ao adolescente”. O
princípio da proteção integral se associa ao princípio da
R: C. Nestes termos, preconiza o artigo 18-A do ECA: prioridade absoluta, colacionado no artigo 4º do ECA e no
“A criança e o adolescente têm o direito de ser educados e artigo 227, CF. De uma doutrina da situação irregular, o
cui- dados sem o uso de castigo físico ou de tratamento di- reito evoluiu e passou a contemplar uma noção de
cruel ou degradante, como formas de correção, disciplina, prote- ção mais ampla da criança e do adolescente, que
educação ou qualquer outro pretexto, pelos pais, pelos não ape- nas abordasse situações de irregularidade
integrantes da família ampliada, pelos responsáveis, pelos (embora ainda o fizesse), mas que abrangesse todo o
agentes públicos executores de medidas socioeducativas ou arcabouço jurídico protetivo da criança e do adolescente,
por qualquer pes- soa encarregada de cuidar deles, tratá- que é a doutrina da proteção integral.
los, educá-los ou prote- gê-los”. A alternativa “a” está errada
porque o artigo 16 do ECA fixa que o direito à liberdade 8. (Prefeitura de Cruzeiro - SP - Auxiliar de Desen-
envolve os seguintes aspectos: “I - ir, vir e estar nos volvimento Infantil - Instituto Excelência/2016) O Esta-
logradouros públicos e espaços comuni- tários, ressalvadas tuto da Criança e do Adolescente em seu art. 4º, parágrafo
as restrições legais; II - opinião e expressão; III - crença e único fixa a garantia de prioridade. Assinale a alternativa
culto religioso; IV - brincar, praticar esportes e divertir-se; CORRETA que compreende uma dessas prioridades:
V - participar da vida familiar e comunitária, sem
discriminação; VI - participar da vida política, na forma
da lei; VII - buscar refúgio, auxílio e orientação”. A
alternativa “b” está errada porque o artigo 17 do ECA
prevê que “o direito
239
LEGISLAÇÃO E CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

a) Nenhuma criança ou adolescente será objeto de


qualquer forma de negligência, descriminação e explora- R: D. Dispõe o ECA em seu artigo 15: “A criança e o
ção. adolescen- te têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade
como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e
b) É assegurado atendimento integral á saúde da
crian- ça e do adolescente por intermédio do sistema como sujeitos de di- reitos civis, humanos e sociais garantidos
na Constituição e nas leis”.
único de saúde.
c) Precedência de atendimento, nos serviços públicos
ou de relevância pública. 11. (TRT - 1ª REGIÃO - Juiz do Trabalho Substituto -
FCC/2016) Sobre o trabalho da criança e do adolescente, é cor-
d) Manter alojamento conjunto, possibilitando ao
reto afirmar:
neo- nato a permanência junto á mãe.
a) É proibido o trabalho de adolescentes em atividades lúdicas.
b) É proibido para os menores de 16, salvo na condição de
R: C. Conforme o artigo 4º, parágrafo único, ECA, “a
aprendizes.
garantia de prioridade compreende: [...] b) precedência de
c) É proibido o trabalho noturno de menores de 16 anos,
atendimento nos serviços públicos ou de relevância públi-
sal- vo na condição de aprendizes.
ca”.
d) É proibido o trabalho de adolescentes em hospitais, salvo
na condição de aprendizes de enfermagem.
9. (FUNDAÇÃO CASA - Agente Administrativo -
e) É proibido o trabalho de crianças em peças teatrais e
VU- NESP/2010) Relativamente às Disposições Preliminares
ativi- dades cinematográficas.
do Es- tatuto da Criança e do Adolescente, assinale a
R: B. Nos termos do artigo 60, ECA, “é proibido
alternativa correta.
qualquer trabalho a menores de quatorze anos de idade,
a) Considera-se criança a pessoa com até doze anos completos, e
salvo na condição de aprendiz”. Aceita-se o trabalho como
adolescente aquela entre treze e dezoito anos de idade
aprendiz entre 14 e 16 anos. A partir dos 16 anos, o
incompletos.
adolescente pode trabalhar, não ne- cessariamente como
b) Nos casos em que a lei determinar, deverá ser
aprendiz, embora a lei fixe outras restrições.
constante- mente aplicado o Estatuto da Criança e do
Adolescente às pes- soas entre dezenove e vinte anos de
12. (TRT - 1ª REGIÃO - Juiz do Trabalho Substituto
idade.
- FCC/2016) A formação técnico-profissional do adolescente
c) A garantia de prioridade para o adolescente
NÃO deverá obedecer a
compreende a primazia na formulação das políticas sociais
a) horário especial, estabelecido em lei.
públicas para o lazer.
b) horário especial, de acordo com a atividade.
d) Na aplicação dessa Lei, deverão ser levados em conta
c) peculiaridades do seu desenvolvimento pessoal.
os fins políticos a que ela se destina.
d) adequação ao mercado de trabalho.
e) Destinação privilegiada de recursos públicos nas
e) prevalência das atividades educativas sobre as produtivas.
áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.
R: A. Dispõe o ECA: “Art. 63. A formação técnico-
R: E. Conforme o artigo 4º, parágrafo único, ECA, “a
profissional obedecerá aos seguintes princípios: [...] III - horário
ga- rantia de prioridade compreende: [...] d) destinação
especial para o exercício das atividades”. Especificamente, o
privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com
horário deve ser fixado sem prejudicar a frequência à escola
a proteção à infância e à juventude”.
(artigo 67, IV, ECA) e é proibido o trabalho noturno.
Entretanto, a lei não fixa com preci- são o horário de trabalho
10. (Prefeitura de Cruzeiro - SP - Auxiliar de
permitido ao adolescente.
Desenvol- vimento Infantil - Instituto Excelência/2016)
Assinale a alter- nativa CORRETA conforme o artigo 15 do
13. (IDECAN/2016 - UFPB - Auxiliar em Assuntos Educa-
ECA:
cionais) Considerando a prática de ato infracional por
a) na dignidade da criança e do adolescente, pondo-os
adolescentes e os direitos individuais assegurados, nessa
a salvo de qualquer tratamento desumano, violento,
situação, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA),
aterrorizante, vexatório ou constrangedor.
assinale a alternativaato
a) Considera-se correta.
infracional a conduta descrita como cri-
b) no direito de ser educados e cuidados sem o uso de
tigo cas-
físico ou de tratamento cruel ou degradante, como
formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro me eb)não a estabelecida
O adolescente nãocomo
podecontravenção penal.
ser privado de sua liberdade se-
pretexto,
pelos pais, pelos integrantes da família ampliada, pelos
respon- sáveis, pelos agentes públicos executores de não em flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e
medidas socioe- ducativas ou por qualquer pessoa funda- mentada da autoridade judiciária competente.
encarregada de cuidar deles, tratá-los, educá-los ou protegê- c) O adolescente que comete ato infracional perde o direito
los. à identificação dos responsáveis pela sua apreensão, devendo,
c) no direito à liberdade, ao respeito e à dignidade contudo, ser informado acerca de seus direitos.
como pessoas humanas em processo de desenvolvimento d) O adolescente civilmente identificado será submetido à
e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais identificação compulsória pelos órgãos policiais, de proteção e
garantidos na Cons- tituição e nas leis. judiciais, independente se para efeito de confrontação em
d) na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral caso
da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da de dúvida fundada.
ima- gem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e
crenças, dos espaços e objetos pessoais. R: B. Conforme preconiza o art. 106, “nenhum adolescente
será privado de sua liberdade senão em flagrante de ato
infracio- nal ou por ordem escrita e fundamentada da
autoridade judiciária competente”.
240
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da educação e da pedagogia: geral e Brasil- 3a ed. São Paulo: Moderna 2006......01
BOURDIEU, Pierre. A Escola Conservadora: as desigualdades frente à escola e à cultura. In NOGUEIRA, M. A.; CATANI, A.
Escritos de Educação. 2 ed. Petrópolis: Vozes, 1999.................................................................................................................................... 01
FERREIRA, Naura Syria Carapeto (org). Gestão democrática da educação: atuais tendências, novos desafios. 8ª ed. São Paulo:
Cortez, 2013............................................................................................................................................................................................................. 02
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 57a ed. São Paulo: Paz e Terra, 2014....................................................................................03
LIBÂNEO, José Carlos; OLIVEIRA, José Ferreira de Toschi; SEABRA, Mirza. Educação escolar: política, estrutura e organização.
10a ed. São Paulo: Cortez, 2012........................................................................................................................................................................ 10
LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1983............................................................................................................12
LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem escolar. 17a ed. São Paulo: Cortez, 2005..................................................21
PARO, Vitor. A educação, a política e a administração: reflexões sobre a prática do diretor de escola In: Educação e
Pesquisa, São Paulo, v. 36, n.3, p. 763-778, set./dez, 2010.........................................................................................................25
PARO, Vitor. Diretor Escolar: educador ou gerente?. São Paulo: Cortez, 2015.....................................................................................25
PARO, Vitor. Gestão Democrática da Escola Pública. 4a ed. São Paulo: Cortez, 2016..............................................................26
VYGOTSKY, L. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2001..........................................................................................26
VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Inovações e Projeto Político-Pedagógico: uma relação regulatória ou emancipatória? In:
Cader- no Cedes, Campinas, v. 23, n. 61, p. 267-281..................................................................................................................27
VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Projeto Político Pedagógico da escola: uma construção possível. São Paulo: Papirus, 1998.....28
MARSIGLIA, Ana Carolina Galvão. A prática pedagógica histórico-crítica na educação infantil e no ensino fundamental.
Campi- nas, SP: Autores Associados, 2011..................................................................................................................................................... 32
MARTINS, Lígia Márcia. O desenvolvimento do psiquismo e a educação escolar: contribuições a luz da Psicologia Histórico-
-Cultural e da Pedagogia Histórico-Crítica. Campinas, SP: Autores Associados, 2013......................................................................32
SAVIANI, Dermeval. Escola e Democracia. São Paulo: Cortez; Campinas, SP: Autores Associados, 1983................................32
SAVIANI, Dermeval. O papel do diretor de escola numa sociedade em crise. IN: Educação: do Senso Comum à Consciência
Filosófica. Coleção Educação Contemporânea. 11a edição. São Paulo: Editora Autores Associados,1996, p.206 a 209........34
SAVIANI, Dermeval. Pedagogia Histórico-Crítica: primeiras aproximações. Campinas, SP: Autores Associados, 2011...........35
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola

ARANHA, MARIA LÚCIA DE ARRUDA. no poder do estado, na supervalorização de seus sistemas


HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO E DA PEDAGOGIA: GERAL E políticos; enquanto a Escola Nova trabalha com um ensi-
BRASIL- 3A ED. SÃO PAULO: no para liberdade, construção da sociedade democrática,
a escola nesses governos investia no inverso, em
MODERNA 2006.
retrocesso. A autora termina seu texto alertando-nos para
um en- sino hoje, defendo um ensino que desperte o
senso criti- co e consciente. Nos mostra também o
quadro do ensino pós-moderno onde educação e
tecnologia andam de mãos
Esse texto é o capitulo10 do livro “Historia da dadas. Esse texto de Arruda nos leva a reflexão do cami-
educação nhar da formas de educação que encontramos hoje, seus
e da pedagogia” de Maria Lucia de Arruda Aranha. Em seu pontos positivos e seus pontos negativos, e nos alerta a
livro ela traz uma perspectiva da educação e da to- marmos mais cuidado e prestarmos mais atenção, a
pedagogia na historia da humanidade, e com isso nos da escola não é só um ambiente de aprendizagem de um
uma visão geral de como os sistemas educacionais vieram conteúdo programático e teórico, mais um local onde se
a ser o que são hoje. molda a so- ciedade que nos substituirá em futuro
O texto, que tem por titulo “educação para próximo.
democracia”, fala sobre a educação e seus sistemas na Fonte: https://www.recantodasletras.com.br/rese-
contemporaneida- de, aborda também como ela recebeu nhasdelivros/3392880
influencia de varias correntes políticas e ideológicas
nesse período histórico. A autora traz, logo de inicio, um
apanhado histórico para descrever como estava se
BOURDIEU, PIERRE. A ESCOLA
comportando a sociedade nesse período, que ela
CONSERVADORA: AS DESIGUALDADES FRENTE À
identifica a partir de 1789 ate a atualidade. Segundo a
ESCOLA E À CULTURA. IN
autora o contexto histórico, neste perío-
do chamado de contemporâneo, é marcado por grandes NOGUEIRA, M. A.; CATANI, A. ESCRITOS DE
conflitos, como por exemplo, 1ª e 2ª guerra mundial, EDUCAÇÃO. 2 ED. PETRÓPOLIS: VOZES, 1999.
guer- ra fria e os movimentos de contracultura; esses
aconteci- mentos caracterizam uma sociedade complexa e
cada vez mais diversificada. Essa sociedade, com crescente
grau de complexidade, exige um novo tipo de escola que Nesse artigo, Bourdieu procura identificar e detalhar a
supra a necessidade de um ensino menos universal e com ação dos mecanismos objetivos de seleção cultural e so-
muita singularidade. cial utilizados pela escola, instituição vista como uma ins-
Maria Lucia fala sobre a que uma das grandes mudan- tância cuja finalidade implícita seria a de manter o “status
ças na forma de se pensar educação nessa época, foi de quórum” e legitimar as desigualdades sociais e culturais
uma “rede” tecida entre educação e sociedade, mostrando existentes fora dela. Tal legitimação se daria mediante um
que a educação não só é um lugar para transmissão de processo no qual as desigualdades sociais e culturais entre
conteúdo, mas uma ambiente para socialização do aluno, as classes viriam a ser convertidas na escola em desigual-
formação e manutenção de ideologias. Outro fator foi da dades de desempenho. escolar.
dicotomia que existi ate hoje, entre a orientação Segundo o autor, a herança cultural dos alunos oriun-
educacio- nal para o trabalho e a humanista e a relação dos das classes sociais dominantes teria um papel prepon-
que criada entre a pedagogia com a psicologia, a derante no que tange a seu “sucesso escolar”, na medida
sociologia, a antro- pologia, a linguística e outras ciências em que suas práticas (“habitus”) e concepções (“ethos”)
moderna. a respeito da cultura escolar (as quais incluiriam também
A proposta de uma escola publica leiga, gratuita e um conhecimento privilegiado a respeito dos rituais e da
obri- gatória é tomada com, mas vigor na era dinâmica de funcionamento da escola) viriam a constituir
contemporânea, devido a grande exigência das indústria e um “capital cultural” específico (escolar), o qual, median-
do crescimento demográfico. Aranha também nos fala te o contato com a cultura escolar viria a aumentar pro-
sobre o surgimento da escola nova, que vem com a gressivamente em função do tempo de permanência na
proposta de superar a es- cola tradicional excessivamente escola, pois tais alunos seriam submetidos a uma “dupla
rígida, “magistrocêntrica” e que ainda utilizava o sistema imersão” (nos âmbitos familiar e escolar) em sua própria
de memorização dos conteú- dos. O escolanovismo cultura, considerada legítima pela escola dada a afinidade
focava em um ensino integral, e va- loriza jogos, exercícios entre sua cultura e a cultura das classes dominantes. De
físicos, praticas de desenvolvimento da motricidade em maneira inversa, os alunos oriundos de classes sociais
fim pretendendo desenvolver diversas atividades. não-
Maria Lucia nos mostra também em sua obra, que -dominantes encontrariam vários obstáculos as eu sucesso
mui- tos sistemas políticos percebendo também essa escolar (chegando em alguns casos até a se constituírem
integração educação sociedade utilizaram a educação em impedimentos), pois devido ao fato de não terem fa-
para estrutura e consolidar suas ideologias e seus miliaridade com a cultura escolar em seu contexto familiar
sistemas sociais. Como destaque nesse quadro tem o e não possuírem o “habitus” valorizado pela escola, teriam
governo soviético, o os de- mais países socialistas; e nada muito menos possibilidades de obter tal sucesso na medi-
mais nada menos que os governos totalitários do nazismo da em que a escola viria a selecionar justamente os alunos
e fascismo. Esses gover- nos investiram em um foco detentores de maior similaridade com sua cultura.
educacional, que se baseava

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
Todo esse processo contaria com a adesão (nem sem-
pre tácita) dos educadores à cultura aristocrática, na a teoria do governo sobrecarregado. A territorialização é
medi- da em que estes elaborariam e implementariam concebida como “um fenômeno essencialmente político
métodos pedagógicos voltados para “o desenvolvimento e que implica um conjunto de opções que têm por pano
dos dons” (dons estes que consistiriam numa combinação de fundo um conflito de legitimidade entre o Estado e a
entre o “ethos” da valorização da prática escolar e o sociedade, entre o público e o privado, entre o interesse
“habitus” con- dizente com as práticas culturais escolares comum e os interesses individuais, entre o central e o lo-
encontrado nas classes dominantes), tornando assim cal” (p. 14). Nessa perspectiva, é também entendida como
possível o reconhe- cimento dos “mais aptos”, os quais processo de apropriação, por uma determinada
devido às vantagens anteriormente mencionadas, comunida- de, de diversos espaços sociais objetivando:
geralmente pertenceriam às classes dominantes. contextualizar e localizar políticas e ação educativas em
Tensionando essa questão no sentido da avaliação contraposição à homogeneidade das normas e dos
escolar, Bourdieu entende os procedimentos avaliativos processos; conciliar in- teresses públicos e privados;
como sendo estruturados em torno de: “(...)uma cultura redefinir no processo de ela- boração e execução das
aristocrática e sobretudo uma relação aristocrática com a políticas a participação do atores na perspectiva da lógica
cultura, que o sistema de ensino transmite e exige (p. 55)”. de implicação; transpor a relação de autoridade baseada
Concluindo, com base nos elementos indicados ao no “controlo vertical”, exercido de maneira monopolista e
longo do artigo, o autor indica que a escola, ao contrário hierárquica pelo Estado, para uma relação contratual,
do que é afirmado pelas ideologias defensoras da negociada e fundamentada no processo de “...
igualda- de de oportunidades mediada pela escola, essa desmultiplicação e ‘horizontalização’ dos controlos
instituição teria na realidade um papel de suma (centrais e locais)”. (p. 16). Com base nesses pressupostos
importância na ma- nutenção das desigualdades sociais e Barroso elabora um programa de reforço da autonomia
culturais, na medida em que, mesmo ampliando o acesso das escolas portuguesas, entendendo a autonomia como
das classes não-domi- nantes à escola, devido aos um conceito relacional.
mecanismos de seleção social e cultural contidos em seu
interior, esta continuaria a frustrar o êxito desse alunos, O segundo capítulo aborda as mudanças no mundo
enquanto consagraria os esforços da- queles pertencentes do trabalho e os novos desafios para a gestão da educa-
às classes dominantes. ção. Acácia Zeneida Kuenzer contempla-nos com um estu-
do sobre os impactos da globalização da economia e das
novas estratégias da gestão sobre a educação, especifica-
mente, versa sobre os impactos nas políticas educacionais
FERREIRA, NAURA SYRIA CARAPETO (ORG). GESTÃO e curriculares. Com base nas pesquisas desenvolvidas na
DEMOCRÁTICA DA EDUCAÇÃO: região metropolitana de Curitiba/PR e em alguns parques
ATUAIS TENDÊNCIAS, NOVOS DESAFIOS. 8ª produtivos direcionados ao ramo eletromecânico busca
ED. SÃO PAULO: CORTEZ, 2013. identificar as correlações/mediações entre as mudanças
ocorridas no mundo do trabalho e as novas demandas
para a educação e para gestão das instituições escolares.
Argu- menta ser possível estabelecer os primeiros
delineamentos de uma pedagogia do trabalho que se
GESTÃO DEMOCRÁTICA DA EDUCAÇÃO desenvolve no cerne das novas relações econômico-
ATUAIS TENDÊNCIAS, NOVOS produtivas e socais visando à compreensão desta nova
DESAFIOS pedagogia escolar determinada pelas mudanças no
mundo do trabalho. Nessa perspectiva Kuenzer (p. 56)
O livro “Gestão Democrática da Educação: atuais ten- incita-nos à reflexão e à construção de uma “escola
dências, novos desafios”, sob a organização de Naura comprometida com os trabalhadores e os excluí- dos”,
Syria Carapeto Ferreira, atinge com destaque a sua sexta tomando “como referência as positividades presentes nas
edição, constituindo-se em um importante referencial de mudanças que ocorrem no mundo do trabalho” rom-
leitura no campo da política e gestão da educação. É pendo-se com a racionalidade meramente financeira, a
resultante da contribuição de seis renomados autores, fim de construir um novo projeto pedagógico na
que abordam com propriedade questões candentes da perspectiva emancipatória.
educação na con- temporaneidade, especificamente, os O terceiro capítulo aborda os conceitos de
desafios e as atuais tendências do processo de participação e da gestão escolar, discutindo suas
democratização da gestão es- colar e das políticas de potencialidades. Os autores Gustavo Luis Gutierrez e
formação. Afrânio Catani objetivam apresentar um panorama atual
O primeiro capítulo versa sobre a autonomia e a flexi- das questões emergentes no campo da gestão
bilização da gestão escolar em Portugal. João Barroso democrática, da participação e da au- togestão. Nesse
con- templa-nos com o estudo que apresenta a texto, primeiramente focalizam a questão conceitual
fundamentação de propostas para a implementação de apresentando-nos uma descrição aprofundada sobre as
um programa de re- forço da autonomia escolar. Neste alternativas organizacionais participativas nos di- ferentes
texto discute o conceito de “territorialização das políticas contextos. Em seguida apresentam reflexões sobre a
educativas” situando-o no contexto da crise de gestão participativa das universidades públicas paulistas
governabilidade do sistema de ensino, ocorrida em (USP, Unesp e Unicamp), mencionando suas especificida-
muitos países europeus, e enquadrada como des e as correlações entre as formas de participação e a

2
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
democratização do ambiente escolar. Gutierrez e Catani
(p. 74) destacam que a gestão dessas universidades revela profissionais “exige sólida formação humana e que esta
um processo de adoção de instrumentos de consulta aos re- lacionase diretamente com a sua emancipação como
di- versos segmentos e sujeitos escolares, bem como indi- víduo social, sujeito histórico em nossa sociedade.”
ilustra os entraves e conflitos ocorridos no anseio de (p. 110). Em síntese, podemos afirmar que esta coletânea
vivenciar uma prática autogestionária. é ex- pressão da sólida fundamentação teórico-
O quarto capítulo versa sobre as políticas e gestão da metodológica das pesquisas a que se reportam, e
educação no Brasil focalizando o processo de escolha de também do efetivo trabalho coletivo a que se destinaram
dirigentes escolares. Luiz Fernandes Dourado concebe as seus autores. Dessa forma alcança com grande destaque
políticas educacionais como expressão dos embates tra- o seu maior objeti- vo: estimular à reflexão e à
vados no âmbito do Estado e dos seus desdobramentos. problematização de questões candentes da educação
Embates esses situados no contexto das mudanças tec- contemporânea, especificamente das políticas
nológicas e no reordenamento das relações sociais sob educacionais, da formação de profissionais e da
a égide ideológica da globalização da economia (p.78). democratização da gestão escolar oferecendo subsídios
Neste artigo o autor apresenta-nos um mapeamento das teóricos para análises aprofundadas e necessárias
modalidades de escolha de dirigentes escolares no Brasil, interven-
destacando-se a relevância da eleição direta. Diante dos ções na realidade educacional brasileira.
embates e perspectivas das diversas formas de
provimento objetiva situar elementos para a rediscussão
das políticas educacionais, bem como estabelecer as
FREIRE, PAULO. PEDAGOGIA DO OPRIMIDO. 57A ED.
correlações entre as políticas e a democratização da
gestão escolar. Dourado (p. 79) concebe a gestão SÃO PAULO: PAZ E TERRA, 2014.
democrática como:
Processo de aprendizado e de luta política que não se
circunscreve aos limites da prática educativa, mas vislum-
bra, nas especificidades dessa prática social e de sua re- Mais uma vez os homens, desafiados pela
lativa autonomia, a possibilidade de criação de canais de dramaticida- de da hora atual, se propõem a si mesmos
efetiva participação e de aprendizado do “jogo” democrá- como problema. Descobrem que pouco sabem de si
tico e, consequentemente, do repensar das estruturas de mesmos como proble- ma. Descobrem que pouco sabem
poder autoritário que permeiam as relações sociais e, no de si, de seu “posto no cosmos”, e se inquietam por saber
seio dessas, as práticas educativas. mais. Estará, aliás, no reconhecimento do seu pouco saber
Nas suas considerações argumenta que o tipo e a de si uma das razões desta procura. Ao se instalarem na
defi- nição das modalidades de acesso ao cargo de quase, senão trágica descoberta do seu pouco saber de si,
dirigente es- colar devem resultar das definições e se fazem problemas a eles mesmos. Indagam.
orientações contidas no projeto político-pedagógico, bem Respondem, e sua resposta as levam as novas perguntas.
como nos embates travados no âmbito das relações O problema de sua humanização deve haver sido, de
sociais e políticas. Explicita ainda que a forma de um ponto de vista axiológico, o seu problema central, as-
provimento ao cargo de dirigente escolar pode não sume, hoje caráter de preocupação iniludível.”
definir o tipo de gestão, mas necessaria- mente interfere “Pág 30. “A desumanização, que não se verifica
no seu curso. apenas nos que tem sua humanidade roubada, mas
também ain- da que forma diferença nos que a roubam, é
O quinto capítulo contempla com uma vigorosa distorção da vocação do ser mais. É distorção possível na
análise sobre a gestão escolar e os desafios das políticas história, mas não vocação histórica. Na verdade, se
de forma- ção dos profissionais da educação na admitíssemos que a desumanização é vocação histórica
contemporaneidade. Naura Syria Carapeto Ferreira, autora dos homens, nada mais teríamos que fazer a não ser
desse capítulo e or- ganizadora da coletânea, incita-nos a adotar uma atitude cínica ou de total desespero. A luta
refletir sobre a com- plexidade dos “nexos entre a pela humanização , pelo trabalho livre, pela desalienação,
administração da educação e as políticas de formação dos pela afirmação dos homens como pessoa, como”seres
profissionais de educação” no contexto de transformações para si”, não teria significação. Esta so- mente é possível
que vêm ocorrendo no mundo. A autora reflete sobre as porque a desumanização, mesmo que um fato concreto
questões fundamentais contem- porâneas (imagens na história, não é porém, destino dado, mas resultado de
desestabilizadoras) que se constituem em desafios no uma “ordem”injusta que gera violência dos opressores e
processo de elaboração e implementação das políticas está, ser o menos.”
públicas, em especial, das políticas educacio- nais, e para
a gestão escolar e formação de profissionais da educação. A contradição opressores-oprimidos. Sua superação.
Ressalta a importância da “direção” construída e A violência dos opressores, que os faz também de-
legitimada na participação e no exercício da democracia. sumanizados, não instaura uma outra vocação – a do ser
Ao delinear o cenário atual Ferreira reporta-se às reflexões menos. Como distorção do ser mais, o ser menos leva os
de Einstein, à análise da Schaff sobre a nova Revolução In- oprimidos, cedo ou tarde, a lutar contra que os fez menos.
dustrial; e à proposta emancipatória e solidária de E esta luta somente tem sentido quando os oprimidos, ao
Boaven- tura S. Santos. Nessa perspectiva, afirma que a buscarem recuperar sua humanidade, que é uma forma de
formação de cria-la, não se sentem idealistamente opressores, nem se

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
tornam, de fato, opressores dos opressores, mas restaura-
dores da humanidade em ambos. E aí está a grande tarefa os opressores de ontem não se reconheçam em
humanista e histórica dos oprimidos – libertar-se a si e libertação. Pelo contrário, vão sentir-se como se realmente
aos opressores. Estes, que oprimem, exploram e estivessem sendo oprimidos. É que, para eles, “formados”
violentam, em razão de seu poder, não podem ter, neste na experiên- cia de opressores, tudo o que não seja o seu
poder, a força da libertação dos oprimidos nem de si direito antigo de oprimir significa opressão a eles.
mesmos.” Vão sentir-se agora, na nova situação, como
oprimidos porque, se antes podiam comer, vestir, calçar,
PUBLICIDADE educar-se… qualquer restrição a tudo isso, em nome do
Pág.31. ” Quem, melhor que os oprimidos, se direito de to- dos, lhes parecem uma profunda violência a
encontra- rá preparado para entender o significado seu direito de pessoa. Direito de pessoa que, na situação
terrível de uma sociedade opressora? Quem sentirá, anterior, não respeitava nos milhões de pessoas que
melhor que eles, os efeitos da opressão? Quem, mais que sofriam e morriam de fome, de dor, de tristeza, de
eles, para ir com- preendendo a necessidade da
desesperança.
libertação? Libertação a que não chegarão pelo acaso,
mas pela práxis de sua busca; pelo conhecimento e É que, para eles, pessoa humana são apenas eles. Os
reconhecimento da necessidade de lutar por ela. Luta que, outros são coisas. Para eles, há um só direito – o direito de
pela finalidade que lhe derem os oprimidos, será um ato viverem em paz, ante o direito de sobreviverem, que
de amor, com o qual se oporão ao desamor contido na talvez nem sequer reconheçam, mas somente admitam
violência dos opressores, até mesmo quando esta se aos opri- midos. E isto ainda, porque, afinal, é preciso que
revista da falsa generosidade referida.” os oprimi- dos existam, para que eles existam e sejam
Pág.36. ” o opressor só se solidariza com os oprimidos “generosos”…
quando o seu gesto deixa de ser um gesto sentimental, de Esta violência, como um processo, passa de geração
caráter individual, e passa a ser um ato de amor àqueles. a geração de opressores, que se vão fazendo legatários
Quando, para ele, os oprimidos deixam de ser uma desig- dela e formando-se no seu clima geral. Este clima cria nos
nação abstrata e passam a ser os homens concretos, injus- opressores uma consciência fortemente possessiva. Pos-
tiçados e roubados. Roubados na sua palavra, por isto no sessiva do mundo e dos homens. Fora da posse direta,
seu trabalho comprado, que significa a sua pessoa concreta, material, do mundo e dos homens, os
vendida. Só na plenitude deste ato de amar, na sua opressores não se podem entender a si mesmos.”
existenciação, na sua práxis, se constitui a solidariedade A situação concreta de opressão e os oprimidos
verdadeira. Dizer que os homens são pessoas e, como Pág.48. “Há em certo momento da experiência
pessoas, são livres, e nada concretamente fazer para que
existen- cial dos oprimidos, uma irresistível atração pelo
esta afirmação se ob- jetive, é uma farsa.”
opressor. Pelos seus padrões de vida. Participar destes
Pág.40.” A pedagogia do oprimido que, no fundo, é a
pedagogia dos homens empenhando-se na luta por sua padrões cons- titui uma incontida aspiração. Na sua
libertação, tem suas raízes aí. E tem que ter nos próprios alienação querem, a todo custo, parecer com o opressor.
oprimidos, que se saibam ou comecem criticamente a sa- Imita-lo. Segui-lo. Isto se verifica, sobretudo, nos
ber-se oprimidos, um dos seus sujeitos. oprimidos de “classe média”, cujo anseio é serem iguais
Nenhuma pedagogia realmente libertadora pode ficar ao “homem ilustre” da chamada “classe superior”.
distante dos oprimidos, quer dizer, pode fazer deles seres De tanto ouvirem de si mesmos que são incapazes,
desditados, objetos de um “tratamento” humanitarista, que não sabem nada, que não podem saber, que são
para tentar, através de exemplos retirados de entre os enfermos, indolentes, que não produzem em virtude de
opressores, modelos para a sua “promoção”. Os oprimidos tudo isso, ter- minam por se convencer de sua
hão de ser o exemplo para si mesmos, na luta por sua “incapacidade”. Falam de si como os que não sabem e do
redenção. “doutor” como o que sabe e a quem devem escutar. Os
A pedagogia do oprimido, como pedagogia huma- critérios de saber que lhe são impostos são os
nista e libertadora, terá dois momentos. Distintos. O pri- convencionais.
meiro, em que os oprimidos vão desvelando o mundo da A te o momento em que os oprimidos não tomem
opressão e vão se comprometendo, na práxis, com a sua
consciência das razões de seu estado de opressão “acei-
transformação; segundo, em que, transformada a realida-
tam” fatalistamente a sua exploração. Mais ainda, prova-
de opressora, esta pedagogia deixa de ser do oprimido e
passa a ser a pedagogia dos homens em processo de per- velmente assumam posições passivas, alheadas, com rela-
manente libertação. ção à necessidade de sua própria luta pela conquista da
Daí a afirmação anteriormente feita, de que a supera- liberdade e de sua afirmação no mundo. Nisto reside sua
ção autêntica da contradição opressores-oprimidos não “conivência” com o regime opressor.”
está na pura troca de lugar, na passagem de um pólo a Ninguém liberta ninguém, ninguém liberta sozinho:
outro. Mais ainda: não está em que os oprimidos de hoje, Os homens se libertam em comunhão.
em nome de sua libertação, passem a ter novos Pág. 52. “Somente quando os oprimidos descobrem,
opressores. nitidamente, o opressor, e se engajam na luta organizada
por sua libertação, começam a crer em si mesmos, supe-
A situação concreta de opressão e os opressores. rando, assim, sua “convivência” com o regime opressor.
Pág.44. ” Mas o que ocorre, ainda quando a superação Se esta descoberta não pode ser feita em nível puramente
da contradição se faça em termos autênticos, com a insta- intelectual, mas da ação, o que nos parece fundamental é
lação de uma nova situação concreta, de uma nova reali- que esta não se cinja a mero ativismo, mas esteja
dade inaugurada pelos oprimidos que se libertam, é que associada a sério empenho de reflexão, para que seja
práxis.
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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
A ação política junto aos oprimidos tem de ser, no
fun- do, “ação cultural” para a liberdade, por si mesmo, papel que não o de disciplinar a entrada do mundo nos
ação com eles. A sua dependência emocional, fruto da educandos. Seu trabalho será, também, o de imitar o
situação concreta de dominação em que se acham e que mun- do. O de ordenar o que já se faz espontaneamente.
gera tam- bém a sua visão inautêntica do mundo, não O de encher os educandos de conteúdos. É o de fazer
pode ser apro- veitada a não ser pelo opressor. Este é que depósitos de comunicados – falso saber – que ele
se serve desta dependência para criar mais dependência. considera como verdadeiro saber.
A ação libertadora, pelo contrário, reconhecendo esta Não pode perceber que somente na comunicação
dependência dos oprimidos como ponto vulnerável, deve tem sentido a vida humana. Que o pensar do educador só
tentar, através da reflexão e da ação, transforma-la em ganha autenticidade na autenticidade do pensar dos edu-
independência. Esta, porém, não é doação que uma lide- candos, mediatizados ambos pela realidade, portanto, na
rança, por mais bem-intencionada que seja, lhes faça. Não intercomunicação. Por isso, o pensar daquele não pode
podemos esquecer que a libertação dos oprimidos é liber- ser um pensar para estes nem a estes imposto. Daí que
tação de homens e não de “coisas”. Por isto, se não é au-
não deva ser um pensar no isolamento, na torre de
tolibertação – ninguém se liberta sozinho -, também não é
marfim, mas na e pela comunicação, em torno, repitamos,
libertação de uns feita por outros.”
de uma rea- lidade.”
A concepção “bancária” da educação como instru-
mento da opressão. Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mes-
Seus pressupostos, sua crítica mo. Os homens se educam entre si, mediatizados pelo
Pag. 57.” A narração, de que o educador é o sujeito, mundo
conduz os educandos à memorização mecânica do con- Pag.68. ” Em verdade, não seria possível à educação
teúdo narrado. Mais ainda, a narração os transforma em problematizadora, que rompe com os esquemas verticais
“vasilhas”, em recipientes a serem enchidos pelo característicos da educação bancária, realizar-se como
educador. Quanto mais vai se enchendo os recipientes, prá- tica da liberdade, sem superar a contradição entre o
com seus “de- pósitos”, tanto melhor educador será. educa- dor e os educandos. Como também não lhe seria
Quanto mais se dei- xem docilmente encher, tanto possível faze-lo fora do diálogo.
melhores educandos serão. Desta maneira, o educador já não é o que apenas
Em lugar de comunicar-se, o educador faz “comunica- edu- ca, mas o que, enquanto educa, é educado, em
dos” e depósitos que os educandos, meras incidências, re- diálogo com o educando que, ao ser educado, também
cebem pacientemente, memorizam e repetem. Eis aí a educa. Ambos, assim, se tornam sujeitos do processo em
con- cepção “bancária” da educação, em que a única que crescem jun- tos e em que os “argumentos de
margem de ação que se oferece aos educandos é a de autoridade” já não valem. Em que, para ser-se,
receberem os depósitos, guardá-los e arquiva-los. funcionalmente autoridade, se neces- sita de estar sendo
Na visão “bancária” da educação, o “saber” é uma com as liberdades e não contra eles.”
doa- ção dos que se julgam sábios aos que julgam nada
saber. Doação que se funda numa das manifestações
O homem como um ser inconcluso, consciente de
instrumen- tais de ideologia da opressão – a
sua inconclusão, e seu permanente movimento de bus-
absolutização da ignorân- cia, que constitui o que
chamamos de alienação da igno- rância, segundo a qual ca do ser mais
esta se encontra sempre no outro.” Pag. 72. “A concepção e a prática “bancárias”,
imobilis- tas, “fixistas”, terminam por desconhecer os
A concepção problematizadora e libertadora da homens como seres históricos, enquanto a
educação problematizadora parte exata- mente do caráter histórico
Seus pressupostos e da historicidade dos homens. Por isto mesmo é que os
Pag.62.”A educação “bancária”, em cuja prática se dá a reconhece como seres que estão sendo, como seres
inconciliação educador- educandos, rechaça este compa- inacabados, inconclusos, em e com uma realidade que,
nheirismo. E é lógico que seja assim. No momento em sendo histórica também, é igualmente ina- cabada.
que o educador “bancário” vivesse a superação da Na verdade, diferentemente dos outros animais, que
contradição já não seria “bancário”. Já não faria depósitos. são apenas inacabados, mas não são históricos, os
Já não tenta- ria domesticar. Já não prescreveria. Saber homens se sabem inacabados. Têm a consciência de sua
com os educan- dos, enquanto estes soubessem com ele, inconclu- são. Aí se encontram as raízes da educação
seria sua tarefa. Já não estaria a serviço da mesma, como manifestação exclusivamente humana. Isto
desumanização. A serviço da opressão, mas a serviço da é, na inconclu- são dos homens e na consciência que
libertação.” dela têm. Daí que seja a educação um fazer permanente.
Permanente, na ra- zão da inconclusão dos homens e do
A concepção “bancária” e a contradição educador- devenir da realidade. Em busca do ser mais, porém, não
-educando pode realizar-se no isolamento, no individualismo, mas na
Pag.63. ” Se para a concepção “bancária” a comunhão, na soli- dariedade dos existires, daí que seja
consciência é, em sua relação com o mundo, esta “peça”
impossível dar-se nas
passivamente escancarada a ele, à espera de que entre
nela, coerente- mente concluirá que ao educador não relações antagônicas entre opressores e oprimidos.”
cabe nenhum outro

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
A dialogicidade – essência da educação como prá-
tica da liberdade. a ser depositado nos educandos -, mas a devolução or-
Pag.77. ” Esta busca nos leva a surpreender, nela, duas ganizada, sistematizada e acrescentada ao povo daqueles
dimensões: ação e reflexão, de tal forma solidárias, em elementos que este lhe entregou de forma
uma interação tão radical que, sacrificada, ainda que em desestruturada. Por isto é que não podemos, a não ser
parte, uma delas, se ressente, imediatamente, a outra. Não ingenuamente, esperar resultados positivos de um
há pa- lavra verdadeira que não seja práxis. programa, seja edu- cativo num sentido mais técnico ou
Esta é a razão porque não é possível o diálogo entre de ação política, se, desrespeitando a particular visão do
os que querem a pronúncia do mundo e os que não a mundo que tenha ou esteja tendo o povo, se constitui
que- rem; entre os que negam aos demais o direito de numa espécie de invasão cultural, ainda que feita com a
dizer a palavra e os que se acham negados deste direito. É melhor das intenções. Mas
preciso primeiro que, os que assim se encontram negados “invasão cultural” sempre.
no direi- to primordial de dizer a palavra, reconquistem As relações homens-mundo, os temas geradores e o
esse direito, proibindo que este assalto desumanizante conteúdo programático desta educação
constitui. Será a partir da situação presente, existencial,
concreta, refletindo o conjunto de aspirações do povo,
Educação dialógica e diálogo
que podere- mos organizar o conteúdo programático da
Não há diálogo, porém, se não há um profundo amor educação ou da ação política.
ao mundo e aos homens. Não é possível a pronúncia do
mundo, que é um ato de criação e recriação, se não há O que temos a fazer, na verdade, é propor ao povo,
amor que a infunda. através de certas contradições básicas, sua situação exis-
Sendo fundamento do diálogo, o amor é, também, tencial, concreta, presente, como problema que, por sua
diálo- go. Daí que seja essencialmente tarefa de sujeitos e vez, o desafia e, assim, lhe exige resposta, não só no nível
que não possa verificar-se na relação de dominação. Nesta, intelectual, mas no nível da ação.
o que há é patologia de amor: sadismo em quem domina; Nosso papel não é falar ao povo a nossa visão do
masoquismo nos dominados. Amor, não. Porque é um ato mun- do, ou tentar impo-la a ele, mas dialogar com ele
de coragem, nunca de medo, o amor é compromisso com sobre a sua e a nossa. Temos de estar convencidos de que
os homens. Onde que estejam estes, oprimidos, o ato de a sua visão do mundo, que se manifesta na várias formas
amor está em comprometer-se com sua causa. A causa de de sua ação, reflete a sua situação no mundo, em que se
sua libertação. Mas, este compromisso, porque é amoroso, consti- tui. A ação educativa e política não podem
é dialógico. prescindir do conhecimento crítico dessa situação, sob
Somente com a supressão da situação opressora é pena de se fazer “bancária” ou de pregar no deserto.
possível restaura o amor que nela estava proibido Os homens, ao terem consciência de sua atividade e
Se não amo o mundo, se não amo a vida, se não amo do mundo em que estão, ao atuarem em função de
os homens, não me é possível o diálogo. finalidades que propõem e se propõem, ao terem o ponto
Não há, por outro lado, diálogo, se não há humildade. de decisão de sua busca em si e em suas relações em
A pronúncia do mundo, com que os homens o recriam mundo, e com os outros, ao impregnarem o mundo de
per- manentemente, não pode ser um ato arrogante. sua presença criadora através da transformação que
Como posso dialogar, se me admito como um realizam nele, na medida em que dele podem separar-se
homem diferente, virtuoso por herança, diante dos outros, e, separando-se, podem com ele ficar, os homens, ao
meros “isto”, em que não reconheço outros eu? contrário do animal, não somente vivem, mas existem, e
A auto-suficiência é incompatível com o diálogo. Os sua existência é histórica.”
homens que não têm humildade ou a perdem, não
podem aproximar-se do povo. Não podem ser seus A investigação dos temas geradores e sua
companheiros de pronúncia do mundo. Se alguém não é metodologia Pag.95. ” A questão fundamental, neste
capaz de sen- tir-se e saber-se tão homem quanto os caso, está em que, faltando aos homens uma
outros, é que lhe falta ainda muito que caminhar, para compreensão critica da to- talidade em que estão,
chegar ao lugar de encontro com eles, Neste lugar de
captando-a em pedaços nos quais não reconhecem a
encontro, não há igno- rantes absolutos, nem sábios
interação constituinte da mesma totali- dade, não podem
absolutos: há homens que, em comunhão, buscam saber
conhece-la. E não o podem porque, para conhece-la, seria
mais.
necessário partir do ponto inverso. Isto é, lhes seria
Sem o diálogo, não há comunicação e sem esta não
há verdadeira educação. A que, operando a superação da indispensável ter antes a visão totalizada do contexto
con- tradição educador-educandos, se instaura como para, em seguida, separarem ou isolarem os ele- mentos
situação gnosiológica, em que os sujeitos incidem seu ato ou as parcialidades do contexto, através de cuja cisão
cognos- cente sobre o objeto cognocível que os voltariam com mais claridade à totalidade analisada. Este
mediatiza.” é um esforço que cabe realizar, não apenas na me-
todologia da investigação temática que advogamos, mas,
O diálogo começa na busca do conteúdo progra- também, na educação problematizadora que defendemos.
mático O esforço de propor aos indivíduos dimensões significa-
Pag.83. ” A inquietação em torno do conteúdo do diá- tivas de sua realidade, cuja análise crítica lhes possibilite
logo é a inquietação em torno do conteúdo programático reconhecer a interação de suas partes.
da educação. Para o educador-educando, dialógico, pro- É preciso que nos convençamos de que as aspirações,
blematizador, o contudo programático da educação não é os motivos, as finalidades que se encontram implicitados
uma doação ou uma imposição – um conjunto de na temática significativa são aspirações, finalidades, mo-
informes tivos humanos. Por isto, não estão aí, num certo espaço,

6
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
como coisas petrificadas, mas estão sendo. São tão
históri- cos quanto os homens. Não podem ser captados O diálogo com as massas não é concessão, nem pre-
fora de- les, insistamos. sente, nem muito menos uma tática a ser usada, como a
Captá-los e entende-los é entender os homens que os sloganização o é, para dominar. O diálogo, como encontro
encarnam e a realidade a eles referida. Mas, precisamen- dos homens para a “pronúncia” do mundo, é uma
te porque não é possível entende-los fora dos homens, é condição fundamental para a sua real humanização.”
preciso que estes também os entendam. A investigação
te- mática se faz, assim, um esforço comum de A teoria da ação antidialógica e suas
consciência da realidade e de autoconsciência, que a características: a conquista. Dividir para manter a
inscreve como ponto de partida do processo educativo, opressão, a manipu- lação e a invasão cultural.
ou da ação cultural de caráter libertador.” Conquista:
Pag.135. “.O primeiro caráter que nos parece pode ser
A significação conscientizadora da investigação surpreendido na ação antidialógica é a necessidade da
dos temas geradores. Os vários momentos da conquista”.
investigação. Pag. 100.” A investigação temática, que se A conquista crescente do oprimido pelo opressor apa-
dá no domí- rece, pois como um traço marcante da ação antidialógi-
nio do humano e não no das coisas, não pode reduzir-se ca. Por isto é que, sendo a ação libertadora dialógica em
a um ato mecânico. Sendo processo de busca, de conheci- si, não pode ser o diálogo uma a posteriori seu, mas um
mento, por isto tudo, de criação, exige de seus sujeitos concomitante dela. Mas, como os homens estarão sempre
que vão descobrindo, no encadeamento dos temas libertando-se, o diálogo se torna um permanente da ação
significati- vos, a interpenetração dos problemas. libertadora.
Por isto é que a investigação se fará tão mais pedagó- O desejo de conquista, talvez mais que o desejo, a ne-
gica quanto mais crítica e tão mais crítica quanto, cessidade da conquista, acompanha a ação antidialógica
deixando de perder-se nos esquemas estreitos das em todos os seus momentos.”
visões parciais da realidade, das visões “focalistas” da
realidade, se fixe na compreensão da totalidade. Dividir, para manter a opressão:
Não posso investigar o pensar dos outros, referido ao Esta é uma outra dimensão fundamental da teoria da
mundo, se não penso. Mas, não penso autenticamente se ação opressora, tão velha quanto a opressão mesma.
os outros também não pensam. Simplesmente, não posso Na medida em que, as minorias, submetendo as a
pensar pelos outros nem para os outros, nem sem os ou- maio- rias a seu domínio, as oprimem, dividi-las e mantê-
tros. A investigação do pensar do povo não pode ser feita las dividi- das são condição indispensável à continuidade
sem o povo, mas com ele, como sujeito de seu pensar, na de seu poder. Não se pode dar ao luxo de consentir na
ação, que ele mesmo se superará. E a superação não se unificação das massas populares, que significaria,
faz no ato de consumir idéias, mas no de produzi-las e de indiscutivelmente, uma
transforma-las na ação e na comunicação.” séria ameaça à sua hegemonia.
O que interessa ao poder opressor é enfraquecer os
A teoria da ação antidialógica oprimidos mais do que já estão, ilhando-os, criando e
Pag.121. “Começaremos reafirmando que os homens aprofundando cisões entre eles, através de uma gama va-
são seres da práxis. São seres do quer fazer, diferentes, riada de métodos e processos.
por isto mesmo, dos animais, seres do puro fazer. Os Desde os métodos repressivos da burocratização es-
animais não “ad-miram” o mundo. Imergem nele. Os tatal, à sua disposição, até as formas de ação cultural por
homens, pelo con- trário, como seres do quefazer meio das quais maneja as massas populares, dando-lhes a
“emergem” dele e, objetivan- do-o, podem conhece-lo e impressão de que as ajudam.”
transforma-lo com seu trabalho. Manipulação
Mas, se os homens são seres do quefazer é Pag.144. “Através da manipulação, as elites
exatamente porque seu fazer é ação e reflexão. É práxis. É dominado- ras vão tentando conformar as massas
transforma- ção do mundo. E, na razão mesma em que o populares a seus objetivos. E, quanto mais imaturas,
quefazer é práxis, todo fazer do quefazer tem de ter uma politicamente, estejam elas ( rurais ou urbanas), tanto mais
teoria que necessariamente o ilumine. O quefazer tem de facilmente se deixam manipular pelas elites dominadora
ter uma teo- ria e prática. É reflexão e ação. Não pode que não podem querer que se esgote seu poder.
reduzir-se, à pala- vra, nem ao verbalismo, nem ao A manipulação aparece como necessidade imperiosa
ativismo.” das elites dominadoras, com o fim, através dela, conseguir
Pag. 134. ” Se não é possível o diálogo com as massas um tipo inautêntico de “organização”, com que evite o seu
populares antes da chegada ao poder, porque falta a elas contrário, que é a verdadeira organização das massas po-
experiência do diálogo, também não lhes é possível pulares emersas e emergindo.
chegar ao poder, porque lhes falta igualmente experiência Estas, inquietas ao emergir, têm duas possibilidades:
dele. Precisamente porque defendemos uma dinâmica ou são manipuladas pelas elites para manter a dominação
perma- nente no processo revolucionário, entendemos ou se organizam verdadeiramente para sua libertação. É
que é nesta dinâmica, na práxis das massas com a óbvio, então, que a verdadeira organização não possa ser
liderança revolucio- nária, que elas e seus líderes mais estimulada pelos dominadores. Isto é tarefa da liderança
representativos apren- derão tanto o diálogo quanto o revolucionária.”
poder. Isto nos parece tão óbvio quanto dizer que um
homem não aprende a nadar numa biblioteca, mas na
água.

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
Invasão cultural
Pag. 149.” Desrespeitando as potencialidades do ser Desta forma, ao buscar a unidade, a liderança já bus-
a que condiciona, a invasão cultural é a penetração que ca, igualmente, a organização das massas populares, o
fazem os invasores no contexto cultural dos invadidos, im- que implica o testemunho que deve dar a elas de que o
pondo a estes sua visão do mundo, enquanto lhes freiam esforço de libertação é uma tarefa comum a ambas.
a criatividade, ao inibirem sua expansão. Na teoria da ação dialógica, portanto, a organização,
Neste sentido, a invasão cultural, indiscutivelmente implicando autoridade, não pode ser autoritária; implican-
alienante, realizada maciamente ou não, é sempre uma do liberdade, não pode ser licenciosa.
violência ao ser da cultura invadida, que perde sua Pelo contrário, é o momento altamente pedagógico,
origina- lidade ou se vê ameaçado de perde-la. em que a liderança e o povo fazem juntos o aprendizado
Por isto é que, na invasão cultural, como de resto em da autoridade e da liberdade verdadeira que ambos,
todas as modalidades da ação antidialógica, os invasores como um só corpo, buscam instaurar, com a
são os autores e os atores do processo, seu sujeito; os in-
transformação da realidade que os mediatiza.”
vadidos, seus objetos. Os invasores modelam; os
Pag.183. *
invadidos são modelados. Pelo menos é esta a expectativa
daque- les. Os invasores atuam; os invadidos têm a ilusão Síntese cultural:
de que atuam, na atuação dos invasores. ” Em todo o corpo deste capítulo se encontra firmado,
A invasão cultural tem uma dupla face. De um lado, é ora implícita, ora explicitamente, que toda ação cultural é
já sempre uma forma sistematizada e deliberada de ação
dominação; de outro, é a tática de dominação. que incide sobre a estrutura social, ora no sentido de
Na verdade, toda dominação implica uma invasão, mantê-la como está ou mais ou menos como está, ora no
não apenas física, visível, mas às vezes camuflada, em que de trans- forma-la.
o invasor se apresenta como se fosse o amigo que ajuda. “Finalmente, a invasão cultural, na teoria antidialógica
No fundo, invasão é uma forma de dominar econômica e da ação, serve de manipulação que, por sua vez, serve à
cul- turalmente o invadido. conquista e esta à dominação, enquanto a síntese serve à
Pag. 165. A teoria da ação dialógica e sua organização e sesta à libertação.”
característica: Este livro quer nos transmitir que: assim como o
opres- sor, para oprimir, precisa de uma teoria de ação
A colaboração, a união, a organização e a síntese opressora, os oprimidos, para se libertarem, igualmente
cultural. necessitam de uma teoria de sua ação.”
” A colaboração, como característica da ação FREIRE, Paulo, Pedagogia do Oprimido Editora Paz e
dialógica, que não pode dar-se a não ser entre sujeitos,
Terra – 29ª edição – 1987
ainda que tenham níveis distintos de função, portanto, de
responsa- bilidade, somente pode realizar-se na ]
comunicação. Aprender a dizer a sua palavra
O diálogo, que é sempre comunicação, funda a cola- A mudança só pode acontecer através da Educação Li-
boração. Na teoria da ação dialógica, não há lugar para a bertadora.
conquista das massas aos ideais revolucionários, mas para O homem deve conhecer todo o mundo em sua volta,
a sua adesão. assim a antropologia deveria fazer parte integrante do
A comunhão provoca a colaboração que leva con- texto da educação de jovens e adultos.
liderança e massas àquela fusão a que se refere a um líder. Alfabetizar é conscientizar, o educando deve refletir
Fusão que só existe se a ação revolucionária é realmente suas próprias palavras desta forma cria-se a cultura.
humana, por isto, simpática, amorosa, comunicante, “Não teme enfrentar, não teme ouvir, não teme o des-
humilde, para ser libertadora.” nivelamento do mundo. Não teme o dialogo com ele, de
que resulta o crescente saber de ambos”.
União O “medo da liberdade”, não significa que o poder do
“Seria uma inconseqüência da elite dominadora se dialogo possa trazer desordem, o que o homem tem
consentisse na organização das massas populares oprimi- medo é de enfrentar novas situações, transformações, isso
das, pois que não existe aquela sem a união destas entre
faz com que o mesmo se acomode.
si e destas com a liderança. Enquanto que, para a elite
domi- nadora, a sua unidade interna, que lhe reforça e A justificativa da “Pedagogia do oprimido” mostra a
organiza o poder, implica a divisão das massas populares, busca e o empenho dos homens por uma libertação.
para a li- derança revolucionária, a sua unidade só existe Essa luta só tem sentido quando os oprimidos busca-
na unidade das massas entre si e com ela.” rem recuperar sua humildade e libertar-se dos opressores.
A união dos oprimidos é um quefazer que se dá no Em um primeiro momento do descobrimento os opri-
domínio do humano e não no das coisas. Para que os midos tendem a ser opressores, o que dificulta uma práxis
opri- midos se unam entre si, é preciso que cortem o libertadora, por terem uma visão individualista.
cordão umbilical, de caráter mágico e mítico, através do A liberdade é uma busca permanente .é uma
qual se encontram ligados ao mundo da opressão.” conquista que exige força, responsabilidade e espirito de
Pag. 175 . * luta.
Organização: Libertar-se de sua força exige, a imersão dela, a volta
” A organização não apenas está diretamente ligada à sobre ela. .É essencial que a práxis seja autentica para que
sua unidade, mas é um desdobramento natural desta uni- exista a açao e reflexão sobre o mundo para transforma-
dade das massas populares. lo.

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
Para que haja o oprimido .é necessário que exista o
opressor. A dialogicidade – essência da educação como pra-
Os opressores tem uma ânsia de posse, onde o poder tica da liberdade
de compra transforma tudo em sua volta, possuem uma A essência do dialogo é a palavra. Mas, ao encontrar-
concepção materialista de existência. mos a palavra, na análise do dialogo, como algo mais que
Os oprimidos são considerados como coisas, não pos- um meio para que ele se faça, se nos impõe buscar, tam-
suindo direitos apenas deveres. bém, seus elementos construtivos.
Os oprimidos dificilmente lutam , aceitam tudo o que Esta busca nos leva a surpreender, nela duas dimen-
lhe é imposto, são dependentes emocionais. sões : ação e reflexão, de tal forma solidaria, em uma inte-
Ninguém se liberta , ninguém se liberta sozinho, os ração tão radical que, sacrificada, ainda que em parte,
ho- mens se libertam em comunhão. uma delas, se ressente, imediatamente a outra. Não há
Quando os oprimidos descobrem a opressor só então palavra verdadeira que não seja práxis.
se engajam na luta por sua libertação, superando seus A palavra inautêntica por outro lado, com que não se
limites. pode transformar a realidade, resulta da dicotomia aliena-
É necessário que a ação política junto aos oprimidos da e alienante, pois não há denúncia verdadeira sem com-
se faça pela reflexão . promisso de transformação.
Para que haja uma transformação faz-se necessário Se é dizendo a palavra com que, “pronunciando” o
que o indivíduo (oprimido) tenha em mente sua responsa- mundo, os homens o transformam, o dialogo se impõe
bilidade só assim será liberto para criar, construir. como caminho pelo qual os homens ganham significação
A concepção bancaria da Educação como instrumento enquanto homens. O dialogo é a exigência existencial que
da opressão. Seus pressupostos – sua crítica. se solidarizam o refletir e o agir de sujeitos endereçados
A educação bancaria tem como denominador o pro- ao mundo a ser transformado e humanizado.
cesso do depositante do saber (educador) e depositário Não há dialogo se não há amor, não há dialogo se
do mesmo (educandos passivos). não há humildade, não há dialogo se não há uma intensa
A relação professor-aluno é baseada nos falsos fé, não existe diálogo sem esperança ,finalmente não há
valores de que um sabe tudo e o outro nada sabe, dia- logo verdadeiro se não há nos seus sujeitos um
cultivando-se assim o silencio e tolhendo-se a pensar ver- dadeiro, um pensar crítico.
criatividade, estimulando assim o interesse dos
opressores. Sem ele não há comunicação e sem esta não há
A conscientização problematizadora e libertadora da ver- dadeira educação.
“educação” e seus pressupostos esta principalmente no O diálogo começa na busca do conteúdo programá-
educador e educando para que haja relação de compa- tico em uma concepção como prática da liberdade, a sua
nheirismo entre ambos. dialogicidade comece, não quando o educador-educando
Somente assim a vivência bancária, deixaria sua forma se encontra em situações pedagógicas, mas antes, quando
inicial para atingir a libertação. aquele se pergunta em torno do que vai dialogar com
A concepção bancária e a contradição educador- estes. As relações homens-mundo, os temas geradores e
educando. O âmbito da concepção bancaria é o de o conteúdo programático será a partir da situação
controlar pen- samentos e ações. Se hoje pretende-se a presente, existencial, concreta, refletindo o conjunto de
humanização em processo, necessita-se da reflexão dos aspirações do povo, que podemos organizar o conteúdo
homens sobre o programáti-
mundo para transforma-lo. ca da educação ou de ação política.
Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, Nunca apenas dissertar sobre ela e jamais doar-lhe
os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo. conteúdos que pouco ou nada tenham haver com seus
A práxis educacional passa a ser a maior fonte de rom- an- seios, com suas duvidas, com suas esperanças, com
pimento com as características da Educação Bancaria. seus temores.
O professor é o ser, que não mais educa, mas sim Nosso papel não é falar ao povo sobre a nossa visão
aquele que aprende no processo da aprendizagem. do mundo, ou tentar impô-la a ele ,mas dialogar com ele
Ele .é educado em dialogo com o educando, para que sobre a sua e a nossa.
ambos tornem-se sujeitos do mesmo processo. E na realidade mediatizadora, na consciência que dela
Na educação com pratica de liberdade, quanto mais tenhamos, educadores e povo, que iremos buscar o con-
se problematizam os educandos como seres no mundo , teúdo programático da educação, neste momento se faz
mais se sentirão desafiados e responderão. necessária a investigação que chamamos de conjunto de
O homem como ser incluso, consciente de sua temas geradores que proporcione a tomada de
inclusão consciência dos indivíduos em torno dos mesmos.
e seu permanente movimento de busca em ser mais. A investigação dos temas geradores e sua
Na historia, percebe-se a historicidade do homem metodologia tem como objetivo propor aos indivíduos
com ser inacabado e incluso. Esta concepção ,é dimensões signi- ficativas de sua realidade, cuja analise
desconhecida para a pratica bancaria. crítica lhes possibilite reconhecer a interação de suas
Desta forma percebesse que Educação refaz-se na partes, neste sentido é que a investigação do tema
prá- tica, onde a problematização é uma constante, onde gerador, que se encontra contido no “universo temático
o alu- nos passam a estar interagindo no processo mínimo”, se realiza por meio de uma
educacional, para seu verdadeiro crescimento intelectual e
cognitivo.

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
metodologia conscientizadora, além de nos possibilitar LIBÂNEO, JOSÉ CARLOS; OLIVEIRA, JOSÉ FERREIRA DE
sua apreensão, insere ou começa a inserir os homens TOSCHI; SEABRA, MIRZA.
numa forma crítica de pensarem seu mundo. EDUCAÇÃO ESCOLAR: POLÍTICA, ESTRUTURA E
Os temas em verdade, existem nos homens, em suas ORGANIZAÇÃO. 10A ED. SÃO PAULO: CORTEZ, 2012
relações com o mundo, referidos a fatos concretos.
A significação conscientizadora da investigação dos
temas geradoras e os vários momentos da investigação
tem que se tornar um processo de busca, de conhecimen-
to, de compreensão da totalidade que deve estar presente
a preocupação pela problematização dos próprios temas . EDUCAÇÃO ESCOLAR: POLÍTICAS, ESTRUTURAS E
ORGANIZAÇÃO
A investigação da temática envolve a investigação do
próprio pensar do povo, assim toda investigação temática
O sistema educativo e as escolas estabelecem relações
de caráter conscientizador se faz pedagógica e toda
entre si e existem duas importantes razões para conhecer
autên- e analisá-las. A primeira faz referência às políticas
tica educação se faz investigação do pensar. educacio- nais e as diretrizes organizacionais e
A coleta de dados da investigação apresentará um curriculares que são as ideias, valores, atitudes e práticas
marco no qual se encontrará uma temática de percepção capazes de influenciar as escolas e seus profissionais no
crítica da realidade, a investigação temática se vai expres- que diz respeito às práticas formativas dos alunos. A
sando como um que fazer educativo, como ação cultural. segunda está pautada aos profis- sionais das escolas os
Após esta primeira investigação os investigadores estarão quais podem aceitar ou rejeitar essas políticas e diretrizes
capacitados para organizar o conteúdo programático da educacionais, ou até mesmo, dialogar com elas e então
ação educativa. formular, de modo coletivo, práticas for- mativas e
Segunda fase da investigação começa precisamente inovadoras.
quando os investigadores, com os dados que recolheram Para tanto, é preciso conhecer e analisar como se inter-
chegam à apreensão daquele conjunto de contradições. -relacionam as políticas educacionais, a organização e
A partir deste momento, sempre em equipe, escolhe- ges- tão das escolas e as práticas pedagógicas na sala de
rão algumas desta contradições, com que serão aula. O professor não pode se contentar apenas em
elaboradas as codificações que vão servir à investigação desenvolver saberes e competências para ter uma boa
temática. As codificações consistem entre o “contexto atuação em sala de aula, é preciso tomar consciência do
concreto ou real”, em que se dão os fatos, e o “contexto sistema escolar e enxergar além.
teórico”. Outra razão torna esses estudos importantes que é o
Os indivíduos imersos na realidade, com a pura sen- fato de que as normas, leis e diretrizes da educação, es-
sibilidade de suas necessidades, emergem dela e , assim, tão sujeitas a decisões políticas. Cabe ao sistema de
ganham a razão das necessidades. ensino e as escolas contribuírem de maneira significativa
Terceira fase da investigação são nos “círculos de para a construção de um projeto de nação e, para a
investigação temática” formação de sujeitos capazes de participar ativamente
desse processo.
Do ponto de vista metodológico, a investigação que
As políticas educacionais e organizacionais que vemos
desde seu inicio, se baseia na relação simpática até sua
hoje estão diretamente relacionadas às transformações
fase final, a da analise da temática encontrada, que se
econômicas, políticas, culturais e geográficas que quali-
prolonga na organização do conteúdo programático da ficam o mundo atual. A exemplo disso nós temos as vá-
ação educa- tiva, como ação cultural. rias reformas educativas realizadas nos países da Europa e
Além do investigador, assistirão mais dois América durante os últimos 20 anos.
especialistas, um psicólogo e um sociólogo, cuja tarefa é Tais reformas se justapõem com a recomposição do
registar as rea- ções mais significativas ou aparentemente sistema capitalista mundial que trouxe consigo a doutri-
pouco significa- tivas dos sujeitos descodificados.. na neoliberal, caracterizada por três traços particulares:
Os participantes do “circulo de investigação temáti- mudanças no processo de produção (avanços científicos
ca” vão extrojetando , pela força catártica da metodologia, e tecnológicos), superioridade do livre funcionamento do
uma série de sentimentos, de opiniões, de si , do mundo e mercado e redução do papel do Estado que por sua vez,
dos outros. afetam diretamente a educação tendo em vista que para o
A sua ultima etapa se inicia quando os investigadores, neoliberalismo, o desenvolvimento econômico fomentado
terminadas as descodificações nos círculos, dão começo pelo desenvolvimento técnico-científico garante, por si só,
ao estudo sistemático e interdisciplinar de seus achados. o desenvolvimento social.
Feita a delimitação temática, caberá a cada Essa falta de consideração com as implicações sociais
especialista, dentro de seu campo, apresentar à equipe e humanas geram vários problemas sociais como desem-
interdisciplinar o projeto de “redução” de seu tema. prego, fome e desigualdade entre países, classes e grupos
Com o mínimo de conhecimento da realidade, podem sociais. E também, problemas globais como a devastação
os educadores escolher alguns temas básicos que funcio- ambiental, o desequilíbrio ecológico, o esgotamento dos
nariam como codificações de investigação. recursos naturais e problemas atmosféricos.
Fonte: https://pedagogiaaopedaletra.com/resumo-do- Progredindo na mesma proporção, mudanças signifi-
-livro-pedagogia-do-oprimido-de-paulo-freire/ cativas nos processos de produção e transformações nas
condições de vida e de trabalho devido à associação entre

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
ciência e técnica, proporcionou uma necessidade de se ter
conhecimento e informação a tal ponto que influenciaram Já nos anos 80, propostas curriculares alternativas sur-
a economia e seu desenvolvimento. Os países industriali- giram com conteúdos semelhantes à Administração Esco-
zados então viram a necessidade de se rever o lugar das lar e à Estrutura e Funcionamento do Ensino do 2º Grau,
instituições encarregadas de produzir conhecimento e in- mas como denominações diferentes: Educação Brasileira,
formação, tornando-se prioridade, a reforma dos sistemas Políticas Educacionais, Organização do Trabalho Pedagó-
gico (ou Escolar).
educacionais os quais giram em quatro pontos: o currícu-
As Resoluções 2/69 e 9/69 foram as primeiras a apre-
lo nacional, a profissionalização dos professores, a gestão sentarem a denominação Estrutura e Funcionamento do
educacional e a avaliação institucional. Ensino. Está fixava os mínimos de conteúdos das discipli-
No Brasil, também houve algumas transformações, nas e a duração do curso de Pedagogia, aquela,
no que diz respeito ao sistema educacional. Que ocorreu estabelecia os mínimos de conteúdos e a duração dos
a partir do ano de 1990, início do governo Collor, e tam- cursos para a formação pedagógica em nível de
bém ano em que se realizou a Conferência Mundial sobre licenciatura.
Educação para Todos, ocasião em que se estabeleceram Segundo a Resolução 9/69, os currículos de licenciatu-
prioridades para a educação, entre elas, a universalização ra deveriam abranger as seguintes matérias: Psicologia da
do ensino fundamental. Em 1993, no governo de Itamar Educação, Didática, Estrutura e Funcionamento do Ensino
Franco, cria-se o Plano Decenal de Educação para Todos e de 2º Grau e Prática de Ensino, sob forma de estágio su-
em 1995, no governo de Fernando Henrique Cardoso, es- pervisionado, mas em conformidade com a Lei 5.692/71,
tabeleceram-se metas pontuais, que são: descentralização na qual instituiu o ensino de primeiro e segundo graus, a
denominação alterou-se para Estrutura e Funcionamento
da administração das verbas federais, elaboração do currí-
do Ensino de 1º e 2º graus.
culo nacional, educação à distância, avaliação nacional das
De acordo com a legislação, há dois elementos bási-
escolas, incentivo a formação de professores, parâmetros cos na disciplina: a escola e o ensino, onde,
de qualidade para o livro didático, entre outras. Já essas, primeiramente, apresenta-se a organização e o
acompanham as tendências internacionais se alinhando à funcionamento da escola e em seguida, o ensino.
política neoliberal e às orientações dos organismos finan- Contudo, essas abordagens mostram a escola e o
ceiros como o Banco Mundial e o FMI. ensi- no como elementos prontos e acabados no interior
Nesse mesmo âmbito, se deu a elaboração e promul- de um sistema educacional racionalmente organizado e
gação da LDB, do PNE, das diretrizes curriculares, normas de uma sociedade organicamente constituída e
e resoluções do Conselho Nacional de Educação. funcional fazen- do com que se torna evidente a
No entanto, essas políticas e diretrizes demonstram importância da legislação como eixo básico da disciplina.
ser, salvo raras exceções, intenções declaradas ao invés de Obrigatória em algumas habilitações do curso de
me- didas efetivas. Ocorre então um impasse, de um Pedagogia, a disciplina Legislação do Ensino de 1º e 2º
lado, po- líticas educativas que expressam intenções de se Graus tornou-se base da Estrutura e Funcionamento do
Ensino. Já na organização do ensino es- colar, se tem a
aumentar a autonomia e a participação das escolas e dos
descrição dos órgãos e seu funcionamento e, a análise de
professores, do outro, há a questão da crise de seus componentes administrativos e curricu- lares, através
legitimidade dos esta- dos que dificulta a efetivação de de textos legais.
investimentos em salários, carreira e formação do Os currículos de Pedagogia e das licenciaturas, atual-
professorado, com o pretexto de que o Estado requer mente, apresentam várias denominações, entre elas, as
redução de despesas, transmitindo uma lógica contábil e mais corriqueiras são: Estrutura e Funcionamento do En-
economista ao sistema educacional. Desde a estruturação sino Fundamental e Médio – oferecida no segundo ou no
do curso de Pedagogia, em 1939, sempre houve a terceiro ano do curso de Pedagogia, com carga anual que
preocupação com os aspectos legais e administrativos varia entre 60 128 horas e ministrada em um ano ou seis
da escola, geralmente vistos na disciplina meses – e, Didática e Prática de Ensino de Estrutura e Fun-
Administração Escolar. cionamento do Ensino Fundamental e Médio – disciplina
Está mencionado, no Parecer 292/62 – do Conselho em forma de estágio supervisionado, geralmente com car-
Federal de Educação – a disciplina Elementos de Adminis- ga anual de 128 horas, no último ano do curso de Peda-
gogia. Em geral, os conteúdos e objetivos dessa disciplina,
tração Escolar a qual tinha como finalidade proporcionar o
assumem três abordagens distintas:
conhecimento, por parte do licenciado, da escola em que Abordagem legalista e formal: Os textos legais e os
iria atuar (seus objetivos, estrutura e seus aspectos de seu do- cumentos são apresentados e analisados sistêmica e
funcionamento), além de proporcionar uma visão única do fun- cionalmente. Essa abordagem acosta-se à letra, linhas
aspecto escola-sociedade. e ao texto legal. O estudo aí acaba por se tornar árido,
Em 1968, houve a homologação dos Pareceres 252/69 insípido e aversivo.
e 672/69 como forma de se adequar os currículos de Abordagem político-ideológica: Dá ênfase aos textos
Pedago- gia e das licenciaturas à Lei 5.540/68. Esses críticos, procura-se mostrar o real com base em uma pos-
pareceres incluí- ram a disciplina Estrutura e tura e visão político-ideológica. Essa abordagem
Funcionamento do Ensino de 2º Grau, substituindo a aproxima-
disciplina Administração Escolar. O motivo pelo qual se -se mais ao contexto, ao espírito e às entrelinhas dos
deu essa substituição foi o fato de que com a textos legais. O estudo aí acaba por se tornar parcial e
denominação Administração Escolar, se fazia ressal- tar o partidário. Abordagem histórico-crítica: Os textos legais
aspecto administrativo, não levando em conta aspec- tos são usa- dos como referencial para a análise crítica da
organização escolar e como forma de confrontar a
referente à estrutura e ao funcionamento do ensino.
situação proclamada (ideal) com a situação real. O estudo
aí acaba por se tornar
mais fértil, dinâmico, investigativo e crítico-reflexivo.

11
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
O desenvolvimento dos conteúdos, por uma ótica me-
todológica, deve estar alinhado à articulação de três ele- É apropriado adotar então a denominação Estrutura e
mentos, segundo Monteiro (1995): visão oficial (conheci- Organização da Educação Escolar – Políticas Educacionais
mento da legislação educacional, programas e planos de e Funcionamento da Escola, tendo como ideia principal a
governo); visão da realidade (comparação da visão oficial possibilidade em aprender as imbricações entre decisões
com o que realmente acontece no funcionamento do en- centrais e decisões locais, a fim de articular, em torno da
sino) e visão crítica (após o conhecimento das anteriores, escola, as abordagens mais gerais de cunho sociológico,
pratica-se a leitura fundamentada, para geração de novos político e econômico e os processos escolares internos de
conhecimentos. cunho pedagógico, curricular, psicológico e didático.
Para Saviani (1987), há três etapas no exame crítico da A partir da leitura da obra, é possível fazer uma
legislação de ensinos: contato com a lei (análise textual, reflexão a respeito da educação escolar como um todo,
para captar a estrutura do texto); exame das razões mani- bem como as suas políticas educacionais e educativas. No
festas (leitura da exposição de motivos, dos pareceres, dos decorrer da leitura do livro os autores trazem informações
relatórios, etc.) e busca das razões reais (exame do importan- tes relacionadas à história das políticas
contex- to – processo histórico socioeconômico e político educacionais, como surgiram, porque surgiram e como
– exame da gênese da lei – processo de elaboração da lei, foram transformadas para atenderem as necessidades que
os autores e seus papéis). se apresentaram.
Textos legais, documentos e textos críticos, também Percebe-se a dedicação dos autores em levar ao co-
podem ser usados como auxilio ao estudo de alguns te- nhecimento do leitor os processos pelos quais ocorre a
mas da disciplina (municipalização do ensino, organização formação de professores, as disciplinas que são
formal e informal da escola, financiamento do ensino, oferecidas, as leis que regulam essa formação e também
etc.), servindo de fundamento para elucidar uma as mudanças que essas leis trouxeram ao longo do tempo.
situação/ques- tão norteadora de investigação, aliando Recomenda-se a leitura e a apreciação dessa obra a
assim, ensino e pesquisa, tornando o método de ensino e estudantes de pedagogia e das licenciaturas, para que
aprendizagem mais dinâmico e reflexivo, desenvolvendo pos- sam entender melhor o seu futuro ambiente de
também, a habi- lidade de investigação, proporcionando, trabalho, a escola – seus objetivos e estruturas e
assim, que o tra- balho acadêmico seja um momento em professores, para que possam conhecer ainda mais o seu
que o aluno possa procurar, investigar e produzir local de trabalho e as- sim, se tornar um agente ativo no
conhecimento, orientado pelo professor. processo de construção da educação e das políticas
As abordagens identificadas e os aspectos educacionais.
metodológi- cos de tratamento dos conteúdos se
relacionam ao conhe- cimento do objeto de estudo, tendo
em vista que refletem a trajetória da disciplina. Contudo,
percebe-se que houve uma significativa evolução na LIBÂNEO, JOSÉ CARLOS. DIDÁTICA. SÃO PAULO:
abordagem da disciplina, em sua ampliação e CORTEZ, 1983.
diversificação, o mesmo não ocorreu com objeto de
estudo, não com clareza. Qual é e qual era ele?
Vemos que houve uma mudança na ênfase da disci-
plina, de aspectos estruturais e formais do ensino para as APRESENTAÇÃO
questões de funcionamento onde o foco saiu do ensino Na abertura, o autor determina os princípios que nor-
de primeiro e segundo graus para a concreta escola de teiam a narrativa durante a obra, da importância da didáti-
primeiro e segundo graus. Proporcionando assim que a ca e seu caráter aglutinador dos conteúdos e procedimen-
perspectiva legalista, descontextualizada e limitada fosse tos, da sua característica de englobar conhecimentos da
modificada com a finalidade de se privilegiar a discussão área da psicologia da educação, sociologia da educação,
de alternativas para a reconstrução da escola e do sistema filosofia da educação, entre outras áreas a fim para
educacional brasileiro. explicar o ato e a forma do aprender. Logo no início, o
Houve assim uma transformação democrática de um autor mostra
ensino genérico para uma abordagem de uma escola e o que irá falar: Percepção e compressão reflexiva e crítica
en- sino concretos, todavia, cabe-se questionar se a das situações didáticas; compreensão crítica do processo
mudança ocorreu somente na abordagem/compreensão de ensino; a unidade objetivos-conteúdos-métodos como
do objeto; se o objeto de estudo da disciplina continuou a a espinha dorsal das tarefas docentes e o domínio de mé-
ser a escola e a organização do ensino e até mesmo se a todos e procedimentos para usar em situações de
legislação e os documentos constituem o eixo básico da didáticas concretas.
apreensão da escola e do ensino. Verifica-se a intenção do autor de construir um
A escola e o ensino ainda continuam como foco da conteú- do e organizar uma discussão que tenha um
dis- ciplina, mas agora contextualizados de maneira caráter prático no processo educativo. Isto também se
concreta, crítica e histórica. Dá ótica sistêmica/tecnicista demonstra da di- visão dos capítulos que contemplam as
para a ótica histórico-crítica, onde as políticas de diversas áreas de abrangência da didática.
educação são trata- das com maior intensidade, uma vez
em que são elas as responsáveis por definirem, em grande CAPÍTULO 01 – Prática educativa, Pedagogia e
parte, a legislação educacional, a escola e o ensino. Didática O autor começa o tema situando a didática no
con- junto dos conhecimentos pedagógicos,
demonstrando a fundamental importância do ato de
ensinar na formação
12
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
humana para vivermos em sociedade. Neste capítulo, o
au- tor aborda a prática educativa em sociedade, a Educação escolar, Pedagogia e Didática
diferença entre a educação, instrução e ensino; a A educação escolar é um sistema de instrução e
educação, o escolar, pedagogia e didática, e a didática e ensino de objetivos intencionais, sistematizados e com
sua importância na for- mação dos professores. alto grau de organização, dando a importância da mesma
para uma democratização maior dos conhecimentos. O
Prática educativa e sociedade autor coloca que as práticas educativas é que
Os professores são parte integrante do processo edu- verdadeiramente podem determinar as ações da escola e
cativo, sendo importantes para a formação das gerações seu comprometimento so- cial com a transformação.
e para os padrões de sociedade que buscamos. Neste Afirma que a pedagogia inves- tiga estas finalidades da
subtítulo, o autor situa a educação como fenômeno social educação na sociedade e a sua inserção na mesma, diz
universal determinando o caráter existencial e essencial da que a Didática é o principal ramo de estudo da pedagogia
mesma. Estuda também os tipos de educação, a não para poder estudar melhor os mo- dos e condições de
inten- cional, refere-se a influências do contexto social e realizarmos o ensino e instrução. Ainda coloca a
do meio ambiente sobre os indivíduos. Já a intencional importância da sociologia da educação, psicologia da
refere-se àquelas que têm objetivos e intenções definidos. educação nestes processos de relação aluno-professor.
A educa- ção pode ser também, formal ou não-formal,
dependen- do sempre dos objetivos. A educação não- A Didática e a formação profissional do professor
formal é aquela realizada fora dos sistemas educacionais Determina, o autor, que as duas dimensões da forma-
convencionais, e a educação formal é a que acontece nas ção profissional do professor para o trabalho didático em
escolas, agências de instrução e educação ou outras. sala de aula. A primeira destas dimensões é a teórico-
Libâneo também relata o papel social da educação e cien- tífica formada de conhecimentos de filosofia,
como seus conteúdos objetivos são determinados pelas sociologia, história da educação e pedagogia.
sociedades, política e ideologia predominantes. Fala desta A segunda é a técnico–prática, que representa o
relação importante da educação com os processos forma- traba- lho docente incluindo a didática, metodologias,
dores da sociedade “desde o início da historia da huma- pesquisa e outras facetas práticas do trabalho do
nidade, os indivíduos e grupos travavam relações recípro- professor. Neste subtítulo, Libâneo define a didática como
cas diante da necessidade de trabalharem conjuntamente a mediação entre as dimensões teórico-científica e a
para garantir sua sobrevivência” (Libâneo, 1994, p.19).O prática docente.
autor considera estas influencias como fatores fundamen-
tais das desigualdades entre os homens, sendo um traço
CAPÍTULO 02 – Didática e Democratização do Ensino
fundamental desta sociedade. Coloca as ideologias como
Neste capítulo, continua a discussão colocada no ca-
valores apresentados pela minoria dominante, politizando
pítulo anterior, sobre a democratização do ensino e a im-
a prática educativa e demonstrando o seu envolvimento
portância de oferecer este de qualidade e a toda socieda-
com o social.
de. Inicia com a colocação que a participação ativa na vida
Ele afirma que escola é o campo específico de atuação
social é o objetivo da escola pública, o ensino é colocado
po- lítica do professor, politizando ainda mais o ambiente
como ações indispensáveis para ocorrer à instrução.
escolar.
Levan- ta e responde algumas perguntas envolvendo a
Educação, instrução e ensino escolariza- ção, qualidade do ensino do povo e o fracasso
Neste subtítulo, o autor define as três palavras cha- escolar, fala também da Ética como compromisso
ves, suas diferenças e sentidos diversos. A educação que é profissional e social.
apresentada com um conceito amplo, que podemos sinte-
tizar como uma modalidade de influências e inter-relações A Escolarização e as lutas democráticas
que convergem para a formação da personalidade social e Realmente a escolarização é o processo principal para
o caráter, sendo assim uma instituição social. oferecer a um povo sua real possibilidade de ser livre e
Já a instrução está relacionada à formação e ao de- buscar nesta mesma medida participar das lutas democrá-
senvolvimento das capacidades cognoscitivas, mediante o ticas, o autor endente democracia como um conjunto de
domínio de certos conhecimentos. O ensino por sua vez conquistas de condições sociais, políticas e culturais, pela
é conceituado aqui como as ações, meios, condições para maioria da população para participar da condução de de-
que aconteça a instrução. cisões políticas e sociais. Libâneo, (1994, 35) cita Guiomar
Observa-se que a instrução esta subordinada à edu- Namo de Mello: “A escolarização básica constitui instru-
cação. Estas relações criam uma relação intrincada destes mento indispensável à construção da sociedade democrá-
três conceitos que são responsáveis pelo educar. Destaca tica“, fala também dos índices de escolarização no Brasil,
que podemos instruir sem educar ou vice-versa, pois a mostrando a evasão escolar e a repetência como graves
real educação depende de transformarmos estas problemas advindos da falta de uma política pública, de
informações em conhecimento, tendo nos objetivos igualdade nas oportunidades em educação, deixando
educativos uma forma de alcançarmos esta educação. como resultado um enorme número de analfabetos na fai-
Coloca que a educa- ção escolar pode ser chamada xa de 5 a 14 anos. A transformação da escola depende da
também de ensino. transformação da sociedade, afirma Libâneo, e continua
di- zendo que a escola é o meio insubstituível de
contribuição para as lutas democráticas.

13
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
O Fracasso escolar precisa ser derrotado
Nessa parte, o autor fala mais detalhadamente deste assim a didática como mediação escolar entre objetivos e
grave problema do nosso sistema escolar, detalha gráficos conteúdos do ensino. Define, o autor, mais alguns termos
que apontam para um quadro onde a escola não fundamentais nesta estruturação escolar, a instrução
consegue reter o aluno no sistema escolar. Aponta muitos como processo e o resultado da assimilação sólida de
motivos para isto, mas considera, como principal, a falta conheci- mentos; o currículo como expressão dos
de pre- paro da organização escolar, metodológica e conteúdos de ins- trução; e a metodologia como conjunto
didática de procedimentos adequados ao trabalho com as dos procedimen- tos de investigação quanto a
crianças po- bres. Isto acontece devido aos planejamentos fundamentos e validade das diferentes ciências, sendo as
serem feitos prevendo uma criança imaginada e não a técnicas recursos ou meios de ensino seus complementos.
criança concreta, aquela que esta inserida em um contexto Sintetizando, os temas fundamentais da didática são:
único. Somente o ingresso na escola pode oferecer um 1. Os objetivos sócio pedagógicos;
ponto de partida no processo de ensino aprendizagem. 2. Os conteúdos escolares;
Levanta, também, neste capítulo, outros fatores como 3. Os princípios didáticos;
dificuldades emocionais, falta de acompanhamento dos 4. Os métodos de ensino aprendizagem;
pais, imaturidade, entre outros. Cita aqui David Ausubel As formas organizadas do ensino;
que afirma que o fator isolado mais importante que in- Aplicação de técnicas e recursos;
fluencia a aprendizagem é aquilo que o aluno já conhece, Controle e avaliação da aprendizagem.
complementa dizendo que o professor deve descobri-lo e Objetivo de estudo: o processo de ensino
basear-se nisto em seus ensinamentos. Sem dúvida, o objetivo do estudo da didática é o pro-
cesso de ensino. Podemos definir, conforme o autor, o
As tarefas da escola pública democrática processo de ensino como uma sequência de atividades do
Todos sabemos da importância do ensino de primei- professor e dos alunos tendo em vista a assimilação de
ro grau para formação do indivíduo, da formação de suas co- nhecimentos e habilidades. Destaca a importância da
capacidades, habilidades e atitudes, além do seu preparo na- tureza do trabalho docente como a mediação da
para as exigências sociais que este indivíduo necessita, relação cognoscitiva entre o aluno e as mateiras de
dando a ele esta capacidade de poder estudar e aprender ensino. Libâneo ainda coloca que ensinar e aprender são
o resto da vida. O autor lista as tarefas principais das duas facetas do mesmo processo, que se realiza em torno
escolas públicas, entre elas, destacam-se: das matérias de ensino sob a direção do professor.
Proporciono escola gratuita pelos primeiros oito anos
Os componentes do processo didático
de escolarização;
Assegurar a transmissão e assimilação dos conheci- O ensino, por mais simples que pareça, envolve uma
mentos e habilidades; atividade complexa, sendo influenciado por condições in-
ternas e externas. Conhecer estas condições é fator fun-
Assegurar o desenvolvimento do pensamento crítico e
damental para o trabalho docente. A situação didática em
independente;
sala de aula esta sujeita também a determinantes
Oferecer um processo democrático de gestão escolar
econômi- co-sociais e sócio–culturais, afetando assim a
com a participação de todos os elementos envolvidos
ação didática diretamente.
com a vida escolar.
O compromisso social e ético dos professores
Assim sendo, o processo didático está centrado na re-
O primeiro compromisso da atividade profissional de
lação entre ensino e aprendizagem.
ser professor (o trabalho docente) é certamente de pre-
Podemos daí determinar os elementos constitutivos
parar os alunos para se tornarem cidadãos ativos e parti-
da Didática:
cipantes na família, no trabalho e na vida cultural e políti-
1. Conteúdos da matérias;
ca. O trabalho docente visa também a mediação entre a
2. Ação de ensinar;
sociedade e os alunos. Libâneo afirma que, como toda a
Ação de aprender.
profissão, o magistério é um ato político porque se realiza
Desenvolvimento histórico da Didática e tendências
no contexto das relações sociais.
pedagógicas
O autor afirma que a didática e sua história estão liga-
CAPÍTULO 03 – Didática: Teoria da Instrução e do
das ao aparecimento do ensino.
Ensino
Desde a Antiguidade clássica ou no período medieval
Neste capítulo, o autor aborda, em especial, os víncu- já temos registro de formas de ação pedagógicas em
los da didática com os fundamentos educacionais, esco- las e mosteiros. Entretanto, a didática aparece em
explicita seu objetivo de estudar e relacionar os principais obra em meados do século XVII, com João Amos
temas da didática indispensáveis para o exercício Comenio, ao es- crever a primeira obra sobre a didática “A
profissional. didática Magna”, estabelecendo na obra alguns princípios
A didática como atividade pedagógica escolar com:
Sabedores que a pedagogia investiga a natureza das A finalidade da educação é conduzir a felicidade eterna
finalidades da educação como processo social, a didática com Deus.
coloca-se para assegurar o fazer pedagógico na escola, na O homem deve ser educado de acordo com o seu de-
sua dimensão político, social e técnica, afirmando daí o senvolvimento natural, isto é de acordo com suas caracte-
ca- ráter essencialmente pedagógico desta disciplina. rísticas de idade e capacidade.
Define

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
A assimilação dos conhecimentos não se da de forma
imediata. Conhecer as características sócio culturais e
O ensino deve seguir o curso da natureza infantil; por individuais dos alunos.
isto as coisas devem ser ensinadas uma de cada vez. Domínio de métodos de ensino.
Já mais adiante, Jean Jacques Rousseau (1712-1778) Conhecimento dos programas oficias.
propôs uma nova concepção de ensino, baseado nas ne- Manter-se bem informado sobre livros e artigos liga-
cessidades e interesses imediatos da criança. Porém, este dos a sua disciplina e fatos relevantes.
autor não colocou suas idéias em prática, cabendo mais Já a direção do ensino e aprendizagem requer outros
adiante a outro pesquisador faze-lo, Henrique Pestalozzi procedimentos do professor:
(1746-1827), que trabalhava com a educação de crianças Conhecimento das funções didáticas
pobres. Estes três teóricos influenciaram muito Johann Compatibilizar princípios gerais com conteúdos e mé-
Friedrich Herbart (1776-1841), que tornou a verdadeira todos da disciplina
ins- piração para pedagogia conservadora, determinando Domínio dos métodos e de recursos tauxiares
que o fim da educação é a moralidade atingida através da Habilidade de expressar idéias com clareza
ins- trução de ensino. Estes autores e outros tantos Tornar os conteúdos reais
formam as bases para o que chamamos modernamente Saber formular perguntas e problemas
de Pedagogia Tradicional e Pedagogia Renovada. Conhecimento das habilidades reais dos alunos
Oferecer métodos que valorizem o trabalho intelectual
Tendências pedagógicas no Brasil e a Didática independente
Nos últimos anos, no Brasil, vêm sendo realizados Ter uma linha de conduta de relacionamento com os
muitos estudos sobre a história da didática no nosso país alunos
e suas lutas, classificando as tendências pedagógicas em Estimular o interesse pelo estudo
duas grandes correntes: as de cunho liberal e as de cunho Para a avaliação os procedimentos são outros por par-
progressivista. Estas duas correntes têm grandes te do professor:
diferenças entre si. A tradicional vê a didática como uma Verificação continua dos objetivos alcançados e do
disciplina normativa, com regras e procedimentos rendimento nas atividades
padrões, centran- do a atividade de ensinar no professor e Dominar os meios de avaliação diagnóstica
usando a palavra (transmissão oral) como principal Conhecer os tipos de provas e de avaliação qualitativa
recurso pedagógico. Já a didática de cunho progressivista Estes requisitos são necessários para o professor poder
é entendida como direção da aprendizagem, o aluno é o exercer sua função docente frente aos alunos e institutos
sujeito deste processo e o professor deve oferecer em que trabalha. Por isto, o professor, no ato profissional,
condições propícias para estimu- lar o interesse dos deve exercitar o pensamento para descobrir constante-
alunos por esta razão os adeptos desta tendência dizem mente as relações sociais reais que envolvem sua
que o professor não ensina; antes, ajuda o aluno a disciplina e a sua inserção nesta sociedade globalizada,
prender. desconfiando do normal e olhando sempre por traz das
Também temos aqui colocado pelo autor as aparências, seja
tendências principais desta evolução e suas principais do livro didático ou mesmo de ações pré-estabelecidas.
publicações na época. Vimos também que as tendências
progressivas só tomaram força nos anos 80, com as CAPÍTULO 04 -O Processo de Ensino na Escola
denominadas “teorias críticas da educação”. O autor lista O magistério se caracteriza nas atividades de ensino
também as várias divi- sões destas duas tendências e das matérias escolares criando uma relação recíproca
explica suas diferenças vitais. entre a atividade do professor (ensino) e a atividade de
estudo dos alunos (aprendizagem). Criar esta unidade
A Didática e as tarefas do professor entre o en- sino-aprendizagem é o papel fundamental dos
O modo de fazer docente determina a linha e a qua- processos de ensino na escola, pois as relações entre
lidade do ensino, traça-se aqui, pelo autor, os principais alunos, profes- sores e matérias são dinâmicas.
objetivos da atuação docente:
Assegurar ao aluno domínio duradouro e seguro dos As características do processo de ensino
conhecimentos. Inicia-se analisando as características do ensino tradi-
Criar condições para o desenvolvimento de capacida- cional e suas principais limitações pedagógicas: o
des e habilidades visando a autonomia na aprendizagem professor só passa a matéria e o aluno recebe e reproduz
e independência de pensamento dos alunos. mecanica- mente o que absorve; é dada uma excessiva
Orientar as tarefas do ensino para a formação da per- importância a matéria do livro sem dar a ele um caráter
sonalidade. vivo; o ensino é somente transmitido com dificuldades
Estes três itens se integram entre si, pois a aprendiza- para detectar o ritmo de cada aluno no aprender; o
gem é um processo. Depois, o autor levanta os principais trabalho docente está restrito às paredes da sala de aula.
pontos do planejamento escolar: O autor propõe que entendamos o processo de en-
Compressão da relação entre educação escolar e sino como visando alcançar resultados tendo com ponto
obje- tivo sócio-políticos. de partida o nível de conhecimentos dos alunos e deter-
Domínio do conteúdo e sua relação com a vida minando algumas características como: o ensino é um
prática. Capacidade de dividir a matéria em módulos ou processo, por isto obedece a uma direção, este processo
unidades.

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
visa alcançar determinados resultados como domínio de
conhecimentos, hábitos, habilidades, atitudes, convicções resolver esta contradição entre ensino e aprendizagem,
e desenvolvimento das capacidades cognoscitivas, dando em outras palavras, esta contradição acontece entre o
ao ensino este caráter bilateral, combinando as atividades saber sistematizado e o nível de conhecimento esperado.
do professor com as do aluno. Existem algumas condições para que a contradição se
transforme em forca motriz:
Processos didáticos básicos: ensino e aprendizagem 1. Dar ao aluno consciência das dificuldades que apa-
O livro mostra novamente a importância de garantir a recem no confronto com um conhecimento novo que não
unidade didática entre ensino e aprendizagem e propõe conhecem.
que analisemos cada parte deste processo 2. O volume de atividades, conhecimento e exercícios
separadamente. A aprendizagem esta presente em devem considerar o preparo prévio do aluno.
qualquer atividade humana em que possamos aprender 3. Estas condições devem constar do planejamento.
algo. A aprendizagem pode ocorrer de duas formas: A estruturação do trabalho docente
casual, quando for espontâ- nea ou organizada quando O autor reflete sobre este entendimento errôneo de
for aprender um conhecimento que o trabalho docente na escola é o de “passar” a
específico. matéria de acordo, geralmente, com o livro didático. E
Com isto defini-se a aprendizagem escolar como um mostra que a estrutura da aula deve ter um trabalho ativo
processo de assimilação de determinados conhecimentos e conjunto entre professor e aluno, ligado estreitamente
e modos de ação física e mental. Isto significa que com a meto- dologia específica das matérias, porém, não
podemos aprender conhecimentos sistematizados, se identifica com leia. A cinco momentos da metodologia
hábitos, atitudes e valores. Neste sentido, temos o de ensino na sala de aula:
processo de assimilação ativa que oferece uma Orientação inicial dos objetivos de ensino
percepção, compreensão, reflexão e aplicação que se aprendizagem; Transmissão /assimilação da matéria
desenvolve com os meios intelectuais, motivacionais e nova; Consolidação e aprimoramento dos
atitudes do próprio aluno, sob a direção e orientação do conhecimentos,
professor. Podemos ainda dizer que existem dois níveis de habilidades e hábitos;
aprendizagem humana: o reflexo e o cogniti- vo. Isto Aplicação de conhecimentos, habilidades e hábitos;
determina uma interligação nos momentos da assi- Verificação e avaliação dos conhecimentos e habilidades.
milação ativa, implicando nas atividades mental e práticas. O caráter educativo do processo de ensino e o ensino
O livro coloca a aprendizagem escolar como uma ativi- crítico
dade planejada, intencional e dirigida, não sendo em
Este caráter educativo do processo de ensino está inti-
hipó- tese alguma casual ou espontânea. Com isto, pode
mamente ligado com o ensino crítico, dando a ele uma
pensar
ca- racterística mais ampla, determinada social e
que o conhecimento se baseia em dados da realidade.
pedagogica- mente. Este ensino é critico por estar
De início, é importante definir o ensino e o autor co-
engajamento social, político e pedagogicamente,
loca-o como o meio fundamental do processo intelectual
determinando uma postura frente às relações sociais
dos alunos, ou seja, o ensino é a combinação entre a con-
vigentes e à prática social real.
dução do processo de ensino pelo professor e a assimila-
ção ativa do aluno. O ensino tem três funções
inseparáveis: CAPÍTULO 05 – O Processo de Ensino e o Estudo Ativo
Organizar os conteúdos para transmissão, oferecendo Neste capítulo, entende-se melhor a relação entre o
ao aluno relação subjetiva com os mesmos. processo de ensino (falado no capítulo anterior) e o estu-
Ajuda os alunos nas suas possibilidade de aprender. do ativo, este definido aqui como uma atividade cujo fim
Dirigir e controlar atividade do professor para os direto e específico é favorecer a aprendizagem ativa. Nes-
obje- ta medida, o capítulo discutirá também como o professor
tivos da aprendizagem. pode dirigir, estimular e orientar as condições internas e
Mostra-se também a unidade necessária entre ensino externas do ensino.
e a aprendizagem, afinal o processo de ensino deve es-
tabelecer apenas exigências e expectativas que os alunos O estudo ativo e o ensino
possam cumprir para poder realmente envolve-los neste É necessário ter presente que os conteúdos represen-
processo e mobilizar as suas energias. tam o elemento em torno do qual se realiza a atividade de
estudo. O estudo ativo é por consequência uma postura
Estrutura, componentes e dinâmica do processo de do aluno e do professor frente ao conteúdo, pois as
ensino A estrutura e componentes explica o processo atividades deste estudo ativo se baseiam nas atividades
didático como a ação recíproca entre três componentes; do aluno de observação e compreensão de fatos ligados a
os con- teúdos, o ensino e a aprendizagem. Já o processo matéria, da atenção na explicação do professor,
de ensi- no realizado no trabalho docente é um sistema favorecendo o desen- volvimento das capacidades
articulado, formado pelos objetivos, conteúdos, métodos cognitivas do aluno. Não exis- te ensino ativo sem o
e condições, sendo, como sempre, o professor o trabalho docente.
responsável por esta condução. Neste quadro, o autor A atividade de estudo e o desenvolvimento intelectual
diz que o processo de ensino consiste ao mesmo tempo Neste subtítulo, o autor declara algo muito
na condução do estudo e na auto atividade do aluno, e importante e já dito em outros momentos humanos “O
levanta a contradição deste fato. Deixa clara a dificuldade objetivo da escola e do professor é formar pessoas
de execução da tarefa docen- te e afirma que a Didática inteligentes…”
contribui justamente para tentar
16
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
Neste aspecto, o professor deve se satisfazer se o alu-
no compreende a matéria e tem possibilidade de pensar determinação de propósitos definidos e explícitos quanto
de forma independente e criativa sobre ela. Levanta às qualidades humanas que precisam ser adquiridas. Os
dificulda- des do trabalho docente para estimular aos objetivos têm pelo menos três referências fundamentais
alunos, princi- palmente porque o professor usa um para a sua formulação.
estilo convencional de aula, igual para todas as matérias, Os valores e ideias ditos na legislação educacional.
com falta de entusias- mo e sem adequação com o Os conteúdos básicos das ciências, produzidos na his-
mundo prático e real do aluno. tória da humanidade.
Porém, estas dificuldades podem ser superadas com As necessidades e expectativas da maioria da
um domínio maior do conteúdo por parte do professor, sociedade. Ë importante destacar que estas três
eleger mais do que um livro de referência, estar atualiza- referências não devem ser tomadas separadamente, pois
do com as notícias, conhecer melhor as características dos devem se apre- sentar juntos no ambiente escolar.
seus alunos, dominar técnicas, didáticas e metodologias. Devemos ter claro que o trabalho docente é uma
Com isto, cada tarefa didática será uma tarefa de pensa- atividade que envolve opções so- bre nosso conceito de
mento para o aluno. sociedade, pois isto vai determinar a relação com os
alunos. Isto prova que sempre consciente-
Algumas formas de estudo ativo mente ou não, temos ou traçamos objetivos.
O estudo ativo envolve inúmeros procedimentos para
despertar no aluno hábitos, habilidades de caráter perma- Objetivos gerais e objetivos específicos
nente. Para isto temos várias tarefas e exercícios Os objetivos são o marco inicial do processo pedagó-
específicos para este fim, listados aqui como pelo autor: gico e social, segundo Libâneo. Os objetivos gerais expli-
Exercícios de reprodução – testes rápidos para cam-se a partir de três níveis de abrangência. O primeiro
verificar assimilação e domínio de habilidades.
nível é o sistema escolar que determina as finalidades
Tarefa de preparação para o estudo – Diálogo estabe-
edu- cativas de acordo com a sociedade em que está
lecido entre o professor/aluno, aluno/aluno e observa e
inserido; o segundo é determinado pela escola que
re- visão de matérias anteriores.
estabelece as diretrizes e princípios do trabalho escolar; o
Tarefas de fases de assimilação de matérias – Ativida-
des que favoreçam o confronto entre os conhecimentos terceiro nível é o professor que concretiza tudo isto em
sistematizados e a realidade dos alunos. ações práticas na sala de aula.
Tarefas na fase de consolidação e aplicação – com- Alguns objetivos educacionais podem auxiliar os pro-
põem-se de exercícios e revisão de fixação. fessores a determinar seus objetivos específicos e conteú-
Fatores que influenciam no estudo dos de ensino. Entre estes objetivos educacionais desta-
ativo cam-se: a) colocar a educação no conjunto de lutas pela
Há vários fatores que influenciam no ato de estudar e democratização da sociedade; b) oferecer a todos as
aprender, entre estes fatores destacam-se alguns que in- crian- ças, sem nenhum tipo de discriminação cultural,
fluenciam de sobremaneira no estudo ativo. racial ou política, uma preparação cultural e científica a
1. O incentivo ao estudo – conjunto de estímulos que partir do ensino das materiais; c) assegurar a estas
estimulam no aluno sua motivação para aprender. crianças o desen- volvimento máximo de suas
2. As condições de aprendizagem – para oferecermos potencialidades; d) formar nos alunos a capacidade crítica
condições mínimas de aprendizagem, temos que e criativa em relação a matérias e sua aplicação; e) formar
conhecer muito bem as condições sócio-culturais dos convicções para a vida futura; f) institucionalizar os
alunos. processos de participação envolvendo todas as partes
3. A influência do professor e do ambiente escolar – formadoras da realidade escolar.
certamente o professor e o meio exercem uma influencia
muito forte no aluno. Os conteúdos de Ensino
O autor reitera aqui também a necessidade de uma Desde o início do livro, o autor vem reiterando a ideia
só- lida assimilação de conhecimentos para ocorrer uma que as escolas têm, como tarefa fundamental, a democra-
ver- dadeira aprendizagem. tização dos conhecimentos, garantindo uma base cultural
para jovens e crianças. Sob este aspecto, muitos professo-
CAPÍTULO 06 – Os Objetivos e Conteúdos de Ensino res fazem a ideia que os conteúdos são o conhecimento
Neste capítulo, o autor aborda a relação entre s com- corresponde a cada matéria, ou mesmo, que são a matéria
ponentes do processo de ensino, determina a unidade en- do livro didático. O autor fala que esta visão não é com-
tre objetivos-conteúdos e destes com os métodos. plemente errada, pois há sempre três elementos no ensi-
Os objetivos determinam de antemão os resultados no: matéria, professor e o aluno. Neste aspecto, devemos
esperados do processo entre o professor e aluno, deter- estudar o ensino dos conteúdos como uma ação recíproca
minam também a gama de habilidades e hábitos a serem entre a matéria, o ensino e o estudo dos alunos. Por isto é
adquiridos. Já os conteúdos formam a base da instrução. muito importante que os conteúdos tenham em si
O método por sua vez é a forma com que estes objetivos momen- tos de vivências práticas para dar significado aos
e conteúdos serão ministrados na prática ao aluno. mesmos. Definindo os conteúdos, eles são o conjunto de
A importância dos objetivos educacionais conhe- cimentos, habilidades, hábitos, modos valorativos
A prática educacional baseia-se nos objetivos por e atitu- des, organizados pedagógica e didaticamente,
meio de uma ação intencional e sistemática para oferecer
buscando
apren- dizagem. Desta forma os objetivos são
a assimilação ativa e aplicação prática na vida dos alunos.
fundamentais para

17
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
Agora uma questão importante, apresentada no livro,
é a de quem deve escolher os conteúdos de ensino? Tem-se, assim, que as características dos métodos de
Certa- mente, deve-se considerar que cabe ao professor, ensi- no: estão orientados para os objetivos, implicam
em últi- ma instancia, esta tarefa. Nesta tarefa o professor numa su- cessão planejada de ações, requerem a
enfrenta pelo menos dois questionamentos fundamentais: utilização de meios.
Que con- teúdos e que métodos?
Para responder a primeira pergunta, o autor diz que Conceito de métodos de ensino
há três fontes para o professor selecionar os seus Um conceito simples de método é ser o caminho para
conteúdos do plano de ensino, a primeira é a atingir um objetivo. São métodos adequados para realizar
programação oficial para cada disciplina; a segunda, os objetivos. É importante entender que cada ramo do co-
conteúdos básicos das ciências transformados em nhecimento desenvolve seus próprios métodos, observa-
matérias de estudo; a terceira, exigên- cias teóricas se então métodos matemáticos, sociológicos,
práticas colocadas na vida dos alunos e sua inserção pedagógicos, entre outros. Já ao professor em sala de aula
social. cabe estimu- lar e dirigir o processo de ensino utilizando
Porém, a escolha do conteúdo vai além destas três um conjunto de ações, passos e procedimentos que
exigências, para entendermos, tem-se que observá-las em chamamos também de método. Agora não se pode
outros sentidos. Um destes sentidos é a participação na pensar em método como apenas um conjunto de
prática social; outro sentido fundamental é a prática da procedimentos, este é apenas um detalhe do método.
vida cotidiano dos alunos, da família, do trabalho, do meio Portanto, o método corresponde à se- quência de
cultural, fornecendo fatos a serem conectados ao estudo atividades do professor e do aluno.
das matérias. O terceiro destes sentidos refere-se à
própria condição de rendimento escolar dos alunos. A relação objetivo-conteúdo-método
Nesta visão, há uma dimensão crítico-social dos con- Um entendimento global sobre esta relação é que os
teúdos, e esta se manifesta no tratamento científico dado
métodos não têm vida sem os objetivos e conteúdos,
ao conteúdo, no seu caráter histórico, na intenção de vín-
dessa forma a assimilação dos conteúdos depende dos
culo dos conteúdos com a realidade da vida dos alunos.
métodos de ensino e aprendizagem. Com isto, a maior
Em síntese, esta dimensão crítica-social dos conteúdos
nada mais é do que uma metodologia de estudo e característica deste processo é a interdependência, onde o
interpretação dos objetivos do ensino. conteúdo de- termina o método por ser a base
Na atual sociedade, apesar do que foi visto anterior- informativa dos objetivos, porém, o método também
mente, tem-se conteúdos diferentes para diversas esferas pode ser conteúdo quando for objeto da assimilação.
e classes sociais, estas diferenças ratificam os privilégios O que realmente importa é que esta relação de unida-
existentes na divisão de classes já estabelecida pelo siste- de entre objetivo-conteúdo–método constitua a base do
ma capitalista. Neste sentido, os livros didáticos processo didático.
oferecidos no ensino das disciplinas, além de sistematizar
e difundir conhecimentos, servem também para encobrir Os princípios básicos do ensino
estas di- ferenças, ou mesmo, escamotear fatos da Estes princípios são os aspectos gerais do processo de
realidade para evitar contradições com sua orientação ensino que fundamentam teoricamente a orientação do
sócio cultural polí- tica. Com isto, o professor deve trabalho docente. Estes princípios também e fundamental-
sempre analisar os textos e livros que vai usar com os mente indicam e orientam a atividade do professor rumo
alunos, no sentido de oferecer um ensino igualitário que aos objetivos gerais e específicos. Estes princípios básicos
possa olhar criticamente estas máscaras da sociedade. de ensino são:
Conhecer o conteúdo da matéria e ter uma Ter caráter científico e sistemático – O professor deve
sensibilida- de crítica pode facilitar esta tarefa por parte buscar a explicação científica do conteúdo; orientar o
do professor. estu- do independente, utilizando métodos científicos;
certificar-
Critérios de seleção -se da consolidação da matéria anterior antes de
Aqui, o autor propõe uma forma mais didática de re- introduzir as matérias novas; organizar a sequência entre
solver esta difícil tarefa de selecionar os conteúdos a conceitos e habilidades; ter unidade entre objetivos-
serem ministrados em sala de aula. Abaixo, coloca-se esta conteúdos-méto- dos; organizar a aula integrando seu
forma ordenada de elaborar os conteúdos de ensino: conteúdo com as de- mais matérias; favorecer a formação,
Correspondência entre os objetivos gerais e os con- atitudes e convicções. Ser compreensível e possível de ser
teúdos. assimilado – Na prática, para se entender estes conceitos,
Caráter científico. deve-se: dosar o grau de dificuldade no processo de
Caráter sistemático. ensino; fazer um diag- nóstico periódico; analisar a
Relevância social. correspondência entre o nível de conhecimento e a
Acessibilidade e solidez. capacidade dos alunos; proporcionar
o aprimoramento e a atualização constante do professor.
CAPÍTULO 07 – Os Métodos de Ensino Assegurar a relação conhecimento-prática – Para
Como já se viu anteriormente, os métodos são deter- ofere-
minados pela relação objetivo-conteúdo, sendo os meios cermos isto aos alunos deve-se: estabelecer vínculos entre
para alcançar objetivos gerais e específicos de ensino. os conteúdos e experiências e problemas da vida prática;
pedir para os alunos sempre fundamentarem aquilo que
realizam na prática; mostrar a relação dos conhecimentos
com o de outras gerações.
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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
Assentar-se na unidade ensino-aprendizagem – ou
seja, na prática: esclarecer os alunos sobre os objetivos São todos os meios e recursos materiais utilizados
das aulas, a importância dos conhecimentos para a pelo professor ou alunos para organizar e conduzir o
sequência do estudo; provocar a explicitação da ensino e a aprendizagem. Os equipamentos usados em sala
contradição entre ideias e experiências; oferecer de aula (do quadro-negro até o computador) são meios de
condições didáticas para o aluno aprender ensino gerais possíveis de serem usados em todas as
independentemente; estimular o aluno a defender seus matérias. É importan- te que os professores saibam e
pontos de vista e conviver com o diferen- te; propor dominem estes equipamen- tos para poderem usá-los em
tarefas que exercitem o pensamento e soluções criativas; sala de aula com eficácia.
criar situações didáticas que ofereçam aplicar conteúdos
em situações novas; aplicar os métodos de so- luções de CAPÍTULO 08 – A Aula como Forma de Organização
problemas. do Ensino
A aula é a forma predominante de organização do
Garantir a solidez dos conhecimentos pro- cesso de ensino. Neste capítulo, o professor Libâneo
Levantar vínculos para o trabalho coletivo-particula- expli- ca o conjunto de meios e condições necessárias
ridades individuais, deve-se adotar as seguintes medidas para rea- lizarmos um conjunto de aulas, estruturando sua
para isto acontecer: explicar com clareza os objetivos; de- relação entre tipos de aulas e métodos de ensino.
senvolver um ritmo de trabalho que seja possível da tur-
ma acompanhar; prevenir a influência de particularidades Características gerais da aula
desfavoráveis ao trabalho do professor; respeitar e saber Abaixo, o autor determina algumas exigências a serem
diferenciar cada aluno e seus ritmos específicos. seguidas nas aulas:
Ampliação do nível cultural e científico dos alunos.
Classificação dos métodos de ensino Seleção e organização das atividades para prover um
Sabe-se que existem vários tipos de classificação de ensino criativo e independente.
métodos, seguindo determinados autores, no nosso estu- Empenho na formação dos métodos e hábitos de estudo.
do, o autor define os métodos de ensino como estando Formação de hábitos, atitudes e convicções ligadas à
intimamente ligados com os métodos de aprendizagem, vida prática dos alunos.
sob este ponto de vista o eixo do processo é a relação Valorização da sala de aula como meio educativo.
cog- noscitiva entre o aluno e professor. Pode-se Formação do espírito de coletividade, solidariedade e
diferenciar es- tes métodos segundo suas direções, ajuda mútua sem esquecer o individual.
podendo ser externo e interno. A partir disto, o autor lista
todos os métodos mais conhecidos de atividade em sala Estruturação didática da aula
de aula por parte do professor. A estruturação da aula deve ser indicada por etapas,
Método de exposição pelo professor – Este método é pla- nejadas e organizadas para favorecer o ensino e
o mais usado na escola, onde o aluno assume uma aprendiza- gem. Portanto, é importante no planejamento
posição passiva perante a matéria explanada. Ele pode ser da aula que este processo seja criativo e flexível por parte
de vá- rios tipos de exposição: verbal, demonstração, do professor. Estes passos ou etapas didáticas da aula são
ilustração, exemplificação. os seguintes:
Método de trabalho independente – consiste em ta- Preparação e introdução da matéria – visa criar as con-
refas dirigidas e orientadas pelo professor para os alunos dições de estudo, motivacionais e de atenção.
resolverem de maneira independente e criativa. Este Tratamento didático da matéria nova – se os passos
méto- do tem, na atitude mental do aluno, seu ponto do ensino não são mais que funções didáticas, este
forte.Tem também a possibilidade de apresentar fases tratamen- to já esta sendo feito. Tem-se que entender que
com a tarefa preparatória, tarefa de assimilação de a assimi- lação da matéria nova é um processo de
conteúdos, tarefa de elaborarão pessoal. Uma das formas interligação entre percepção ativa, compreensão e
mais conhecidas de trabalho independente é o estudo reflexão, sendo o proces- so de transmissão-assimilação a
dirigido individual ou em duplas. base metodológica para o tratamento didático da matéria
Método de elaboração conjunta – é um método de nova.
in- teração entre o professor e o aluno visando obter Consolidação e aprimoramento dos conhecimentos e
novos conhecimentos. habilidades – este é um importante momento de ensino
Método de trabalho de grupo – consiste em distribuir e muitas vezes menosprezado ou diminuído na escola. A
tarefas iguais ou não a grupos de estudantes, o autor cita consolidação pode acontecer em qualquer etapa do pro-
de três a cinco pessoas. Têm-se também formas cesso didático, podendo ser reprodutiva, de generalização
específicas de trabalhos de grupos comuns: debate, e criativa.
Philips 66, tem- pestade mental, grupo de verbalização, A aplicação – esta fase é a culminância do processo de
grupo de observa- ção (GV-GO), seminário. ensino. Seu objetivo é estabelecer vínculos entre os
Atividades especiais – são aquelas que complementam conhe- cimentos e a vida.
os métodos de ensino. Controle e avaliação dos resultados escolares – esta
Meios de ensino função percorre todas as etapas de ensino, cumprindo
três funções: a pedagógica, diagnóstica e de controle. A
inte- gração destas funções dá à avaliação um caráter
mais geral e não isolado.

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
Tipos de aulas e métodos de ensino
Neste estudo, o autor coloca que, na concepção de Instrumentos de verificação do rendimento escolar
ensino, as tarefas docentes visam a organização e assimi- Uma das funções da avaliação é com certeza a de de-
lação ativa. Isto significa que as aulas podem ser prepara- terminar em que nível de qualidade está sendo atendido
das em correspondência com os passos do processo de os objetivos; para este fim, são necessários instrumentos
ensino. Neste sentido, pode-se ter aulas de preparação e e procedimentos. Alguns destes procedimentos ou instru-
introdução, início de uma unidade, aula de tratamento sis- mentos já são conhecidos, mas, neste subtítulo, o autor
tematizado da matéria nova, consolidação, verificação da re- visa e cita muitos deles ou os mais usados para
aprendizagem. Conforme o tipo de aula escolhe-se o mé- verificar o rendimento escolar:
todo de ensino. Prova escrita dissertativa.
Prova escrita de questões objetivas.
A tarefa de casa Questões certo-errado (C ou E).
Esta tarefa é um importante complemento das ati- Questões de lacunas (para completar).
vidades didáticas de sala de aula. O autor considera que Questões de correspondência.
esta tarefa cumpre também uma função social integran- Questões de múltipla escolha.
do a família às atividades escolares, integrando os pais Questões do tipo “teste de respostas curtas” ou de
aos professores. Estas tarefas não devem ser apenas evocação simples.
exercícios, devem ser também preparatórias ou de Questões de interpretação de texto.
aprofundamento da matéria. Questões de ordenação.
Questões de identificação.
CAPÍTULO 09 – A Avaliação Escolar Procedimentos auxiliares de avaliação
A avaliação escolar é abordada em minúcias neste ca-
pitulo pelo autor. A avaliação é em última análise uma re- 11.1 A Observação;
flexão do nível qualitativo do trabalho escolar do A Entrevista;
professor e do aluno. Sabe-se também que ela é Ficha sintética de dados dos alunos.
complexa e não envolve apenas testes e provas para Atribuição de notas ou conceitos
determinar uma nota.
As notas demonstram de forma abreviada os resulta-
dos do processo de avaliação. Esta avaliação tem também
Uma definição de avaliação escolar
uma função de controle, expressando o resultado em no-
Segundo o professor Cipriano C. Luckesi, a avaliação é
tas e conceitos. O autor fala também da importância de se
uma análise quantitativa dos dados relevantes do
processo de ensino aprendizagem que auxilia o professor valorizar todas as formas de avaliação, ou instrumentos, e
na tomada de decisões. Os dados relevantes aqui se não apenas a prova no fim do bimestre como grande nota
referem às ações didáticas. Com isto, nos diversos absoluta, que não valoriza o processo. Propõe uma escala
momentos de ensino a avaliação tem como tarefa: a de pontos ensinando como utilizar médias aritméticas
verificação, a qualificação e a apreciação qualitativa. Ela para pesos diferentes, por fim, mostra como se deve
também cumpre pelo menos três funções no processo de aproximar notas decimais.
ensino: a função pedagógica didática, a função de
diagnóstico e a função de controle. CAPÍTULO 10 – O Planejamento Escolar
O autor começa este capítulo dizendo que o planeja-
Avaliação na prática escolar mento, ensino e a avaliação são atividades que devem su-
Lamentavelmente a avaliação na escola vem sido re- por conhecimento do processo de ensino e
sumida a dar e tirar ponto, sendo apenas uma função de aprendizagem. O planejamento escolar propõe uma
controle, dando a ela um caráter quantitativo. Certamente, tarefa ao profes-
com isto, os professores não conseguem efetivamente sor de previsão e revisão do processo de ensino
usar os procedimentos de avaliar. Com estas ações, completa- mente. Há três modalidades de planejamento:
quando a avaliação se resume a provas, professores com o plano da escola, o plano de ensino e o plano de aulas.
critérios onde décimos às vezes reprovam alunos, há a
exclusão do professor do seu papel docente, que é de Importância do planejamento escolar
fornecer os meios pedagógico-didáticos para os alunos O planejamento do trabalho docente é um processo
aprenderem sem intimidação. de racionalização, organização e coordenação da ação do
Características da avaliação escolar professor, tendo as seguintes funções: explicar princípios,
Agora, o autor sintetiza as principais características da diretrizes e procedimentos do trabalho; expressar os
avaliação escolar. víncu- los entre o posicionamento filosófico, político,
Reflete a unidade objetivos-conteúdos- pedagógico e profissional das ações do professor;
métodos. Possibilita a revisão do plano de assegurar a racio- nalização, organização e coordenação
ensino. do trabalho; prever objetivos, conteúdos e métodos;
Ajuda a desenvolver capacidades e habilidades. assegurar a unidade e a coerência do trabalho docente;
Volta-se para a atividade dos alunos. atualizar constantemente o conteúdo do plano; facilitar a
Ser objetiva. preparação das aulas.
Ajuda na auto percepção do professor. Tem-se que entender o plano como um guia de orien-
Reflete valores e expectativas do professor em relação tação devendo este possuir uma ordem sequencial, objeti-
aos alunos. vidade e coerência entre os objetivos gerais e específicos,
Esta frase marca este subtítulo “A avaliação é um ato sendo também flexível.
pedagógico”. (Libâneo, 1994, p.203).

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
Requisitos para o planejamento
Os principais requisitos para o planejamento são os Aspectos cognoscitivos da interação
objetivos e tarefas da escola democrática; as exigências O autor define como cognoscitivo o processo ou mo-
dos planos e programas oficiais; as condições prévias dos vimentos que transcorre no ato de ensinar e no ato de
alunos para a aprendizagem; e as condições do processo aprender. Sob este ponto de vista, o trabalho do professor
de transmissão e assimilação ativa dos conteúdos. é um constante vai e vem entre as tarefas cognoscitivas e
o nível dos alunos. Para se ter um bom resultado de
O plano da escola interação nos aspectos cognoscitivo deve-se: manejar os
O plano de escola é um plano pedagógico e adminis- recursos de linguagem; conhecer o nível dos alunos; ter
trativo que serve como guia de orientação para o planeja- um bom plano de aula; objetivos claros; e claro, é
mento e trabalho docente. O autor descreve os passos indispensável o uso cor- reto da língua Portuguesa.
para a realização de um plano da escola, as principais
premissas e perguntas que devemos formular para sua Aspectos sócio emocionais
elaboração são: posicionamento da educação escolar na Estes aspectos são os vínculos afetivos entre o profes-
sociedade; bases teórico-metodológicas da organização sor e os alunos. É preciso aprender a combinar a
didática e administrativa; características econômicas, severidade e o respeito. Deve-se entender que neste
social, política e cultural do contexto em que a escola está processo peda- gógico a autoridade e a autonomia
inserida; carac- terísticas sócio-culturais dos alunos; devem conviver juntas, a autoridade do professor e a
diretrizes gerais sobre sistema de matérias, critério de autonomia do aluno, não de forma contraditória comum
seleção de objetivos e con- teúdos; diretrizes pode parecer mais de forma complementar.
metodológicas, sistemáticas de avaliação; diretrizes de
organização e administração. A disciplina na classe
Uma das grandes dificuldades em sala de aula é a
O plano de ensino cha- mado “controle da disciplina”.
O autor afirma o plano de ensino como o roteiro de- Não existe uma fórmula mágica para esta tarefa, mas
talhado das unidades didáticas. Podemos chamar também o autor coloca que a disciplina na classe está tão
de plano de curso ou plano e unidades didáticas. diretamente ligada à prática docente, quanto à autoridade
profissional, moral e técnica do professor. Este conjunto
Este plano de ensino é formado das seguintes compo- de característi- cas é que vai determinar a disciplina na
nentes: classe.
Justificativa das disciplinas; Autor: Max Gunther Haetinger
Delimitação dos conteúdos;
Os objetivos gerais;
Os objetivos específicos; LUCKESI, CIPRIANO CARLOS. AVALIAÇÃO DA
Desenvolvimento metodológico; APRENDIZAGEM ESCOLAR. 17A ED. SÃO PAULO:
Conteúdos;
CORTEZ, 2005.
Tempo provável;
Desenvolvimento metodológico.

O plano de aula
O plano de aula é certamente um detalhamento do O QUE É MESMO O ATO DE AVALIAR A APRENDI-
plano de ensino, é uma especificação do mesmo. O deta- ZAGEM?
lhamento da aula é fundamental para obtermos uma
quali- dade no ensino, sendo assim o plano de aula torna- Cipriano Carlos Luckesi
se indis- pensável. Em primeiro lugar, deve-se considerar
que a aula é um período de tempo variável, sendo assim, A avaliação da aprendizagem escolar se faz presente
as unidades devem ser distribuídas sabendo-se que às na vida de todos nós que, de alguma forma, estamos
vezes é preciso bem mais do que uma aula para finalizar compro- metidos com atos e práticas educativas. Pais,
uma unidade ou fase de ensino. Nesta preparação, o educadores, educandos, gestores das atividades
professor deve reler os objetivos gerais das matérias e a educativas públicas e particulares, administradores da
sequência dos conteúdos; desdobrar as unidades a serem educação, todos, estamos comprometidos com esse
desenvolvidas; redigir obje- tivos específicos por cada fenômeno que cada vez mais ocupa espaço em nossas
tópico; desenvolver a metodolo- gia por assunto; avaliar preocupações educativas.
sempre a própria aula. O que desejamos é uma melhor qualidade de vida. No
caso deste texto, compreendo e exponho a avaliação da
CAPÍTULO 11 – Relações Professor-Aluno na Sala de Aula aprendizagem como um recurso pedagógico útil e neces-
Um fator fundamental do trabalho docente trata da sário para auxiliar cada educador e cada educando na
re- bus- ca e na construção de si mesmo e do seu melhor
lação entre o aluno e o professor, da forma de se modo de ser na vida.
comunicar, se relacionar afetivamente, as dinâmicas e A avaliação da aprendizagem não é e não pode con-
observações são fundamentais para a organização e tinuar sendo a tirana da prática educativa, que ameaça e
motivação do trabalho docente. O autor chama isto de submete a todos. Chega de confundir avaliação da apren-
“situação didática” para al- cançarmos com sucesso os dizagem com exames. A avaliação da aprendizagem, por
objetivos do processo de ensino.

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
ser avaliação, é amorosa, inclusiva, dinâmica e construtiva,
diversa dos exames, que não são amorosos, são excluden- uma melhor qualidade de vida se estiver assentada sobre
tes, não são construtivos, mas classificatórios. A avaliação a disposição para acolher, pois é a partir daí que podemos
inclui, traz para dentro; os exames selecionam, excluem, construir qualquer coisa que seja.
marginalizam.
No que se segue, apresento aos leitores alguns enten- Por uma compreensão do ato de avaliar
dimentos básicos para compreender e praticar a avaliação
da aprendizagem como avaliação e não, Assentado no ponto de partida acima estabelecido, o
equivocadamente, como exames. ato de avaliar implica dois processos articulados e indisso-
Antes de mais nada, uma disposição psicológica ciáveis: diagnosticar e decidir. Não é possível uma decisão
neces- sária ao avaliador sem um diagnóstico, e um diagnóstico, sem uma decisão
O ato de avaliar, devido a estar a serviço da obtenção é um processo abortado.
do melhor resultado possível, antes de mais nada, implica Em primeiro lugar, vem o processo de diagnosticar,
a disposição de acolher. Isso significa a possibilidade de que constitui-se de uma constatação e de uma
tomar uma situação da forma como se apresenta, seja ela qualificação do objeto da avaliação. Antes de mais nada,
satisfatória ou insatisfatória agradável ou desagradável, portanto, é preciso constatar o estado de alguma coisa
bonita ou feia. Ela é assim, nada mais. Acolhê-la como (um objeto, um espaço, um projeto, uma ação, a
está é o ponto de partida para se fazer qualquer coisa que aprendizagem, uma pes- soa...), tendo por base suas
pos- sa ser feita com ela. Avaliar um educando implica, propriedades específicas. Por exemplo, constato a
antes de mais nada, acolhe-lo no seu ser e no seu modo existência de uma cadeira e seu esta- do, a partir de suas
de ser, como está, para, a partir daí, decidir o que fazer. propriedades ‘físicas’ (suas caracterís- ticas): ela é de
madeira, com quatro pernas, tem o assento estofado, de
A disposição de acolher está no sujeito do avaliador, e cor verde... A constatação sustenta a configu- ração do
não no objeto da avaliação. O avaliador é o adulto da ‘objeto’, tendo por base suas propriedades, como estão
rela- ção de avaliação, por isso ele deve possuir a no momento. O ato de avaliar, como todo e qualquer ato
disposição de acolher. Ele é o detentor dessa disposição. de conhecer, inicia-se pela constatação, que nos dá a
E, sem ela, não há avaliação. Não é possível avaliar um garantia de que o objeto é como é. Não há possibilidade
objeto, uma pessoa ou uma ação, caso ela seja recusada de avaliação sem a constatação.
ou excluída, desde o início, ou mesmo julgada A constatação oferece a ‘base material’ para a segun-
previamente. Que mais se pode fazer com um objeto, da parte do ato de diagnosticar, que é qualificar, ou seja,
ação ou pessoa que foram recusados, desde o primeiro atribuir uma qualidade, positiva ou negativa, ao objeto
momento? Nada, com certeza! que está sendo avaliado. No exemplo acima, qualifico a
Imaginemos um médico que não tenha a disposição cadeira como satisfatória ou insatisfatória, tendo por base
para acolher o seu cliente, no estado em que está; um em- as suas propriedades atuais. Só a partir da constatação, é
presário que não tenha a disposição para acolher a sua que qua- lificamos o objeto de avaliação. A partir dos
em- presa na situação em que está; um pai ou uma mãe dados consta- tados é que atribuímos-lhe uma qualidade.
que não tenha a disposição para acolher um filho ou uma
fi- lha em alguma situação embaraçosa em que se Entretanto, essa qualificação não se dá no vazio. Ela é
encontra. Ou imaginemos cada um de nós, sem estabelecida a partir de um determinado padrão, de um
disposição para nos acolhermos a nós mesmos no estado determinado critério de qualidade que temos, ou que es-
em que estamos. As doenças, muitas vezes, não podem tabelecemos, para este objeto. No caso da cadeira, ela
mais sofrer qualquer intervenção curativa adequada está sendo qualificada de satisfatória ou insatisfatória em
devido ao fato de que a pessoa, por vergonha, por medo fun- ção do quê? Ela, no caso, será satisfatória ou
social ou por qualquer outra razão, não pode acolher o insatisfatória em função da finalidade à qual vai servir. Ou
seu próprio estado pes- soal, protelando o momento de seja, o objeto da avaliação está envolvido em uma
procurar ajuda, chegando ao extremo de ‘já não ter muito tessitura cultural (teó- rica), compreensiva, que o envolve.
mais o que fazer!’. Mantendo o exemplo acima, a depender das
A disposição para acolher é, pois, o ponto de partida circunstâncias onde esteja a cadeira, com suas
para qualquer prática de avaliação. É um estado psicoló- propriedades específicas, ela será qualificada de positiva
gico oposto ao estado de exclusão, que tem na sua base ou de negativa. Assim sendo, uma mesma cadeira poderá
o julgamento prévio. O julgamento prévio está sempre na ser qualificada como satisfatória para um determi- nado
defesa ou no ataque, nunca no acolhimento. A disposição ambiente, mas insatisfatória para um outro ambiente,
para julgar previamente não serve a uma prática de avalia- possuindo as mesmas propriedades específicas. Desde
ção, porque exclui. que diagnosticado um objeto de avaliação, ou seja,
Para ter essa disposição para acolher, importa estar configu- rado e qualificado, há algo, obrigatoriamente, a
atento a ela. Não nascemos naturalmente com ela, mas ser feito, uma tomada de decisão sobre ele. O ato de
sim a construímos, a desenvolvemos, estando atentos ao qualificar, por si, implica uma tomada de posição –
modo como recebemos as coisas. Se antes de ouvirmos positiva ou negativa –, que, por sua vez, conduz a uma
ou ver- mos alguma coisa já estamos julgando, positiva tomada de decisão. Caso um objeto seja qualificado como
ou nega- tivamente, com certeza, não somos capazes de satisfatório, o que fazer com ele? Caso seja qualificado
acolher. A avaliação só nos propiciará condições para a como insatisfatório, o que fazer com ele? O ato de avaliar
obtenção de não é um ato neutro que

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
se encerra na constatação. Ele é um ato dinâmico, que im-
plica na decisão de ‘o que fazer’ Sem este ato de decidir, o A recusa pode se manifestar de muitos modos, desde
ato de avaliar não se completa. Ele não se realiza. Chegar os mais explícitos até os mais sutis. A recusa explícita se
ao diagnóstico é uma parte do ato de avaliar. A situação dá quando deixamos claro que estamos recusando
de ‘diagnosticar sem tomar uma decisão’ assemelha-se à alguém. Porém, existem modos sutis de recusar, tal como
situação do náufrago que, após o naufrágio, nada com to- no exem- plo seguinte. Só para nós, em nosso interior,
das as suas forças para salvar-se e, chegando às margens, sem dizer nada para ninguém, julgamos que um aluno X
morre, antes de usufruir do seu esforço. Diagnóstico sem ‘é do tipo que dá trabalho e que não vai mudar’. Esse
tomada de decisão é um curso de ação avaliativa que não juízo, por mais silencioso que seja em nosso ser, está lá
se completou. colocando esse educando de fora. E, por mais que pareça
Como a qualificação, a tomada de decisão também que não, estará interferindo em nossa relação com ele. Ele
não se faz num vazio teórico. Toma-se decisão em função sempre estará fora do nosso círculo de relações. Acolhê-lo
de um objetivo que se tem a alcançar. Um médico toma significa estar aberto para recebê-lo como é. E só vendo a
decisões a respeito da saúde de seu cliente em função de situação como é podemos compreendê-la para,
melhorar sua qualidade de vida; um empresário toma dialogicamente, ajudá-lo.
deci- sões a respeito de sua empresa em função de
melhorar seu desempenho; um cozinheiro toma decisões Isso não quer dizer aceitar como certo tudo que vem
a respeito do alimento que prepara em função de dar-lhe do educando. Acolher, neste caso, significa a possibilida-
o melhor sabor possível, e assim por diante. de de abrir espaço para a relação, que, por si mesma, terá
Em síntese, avaliar é um ato pelo qual, através de uma confrontos, que poderão ser de aceitação, de negociação,
disposição acolhedora, qualificamos alguma coisa (um ob- de redirecionamento. Por isso, a recusa
jeto, ação ou pessoa), tendo em vista, de alguma forma, consequentemente impede as possibilidades de qualquer
tomar uma decisão sobre ela. relação dialógica, ou seja, as possibilidades da prática
Quando atuamos junto a pessoas, a qualificação e a educativa. O ato de aco- lher é um ato amoroso, que traz
decisão necessitam ser dialogadas. O ato de avaliar não ‘para dentro’, para depois (e só depois) verificar as
é um ato impositivo, mas sim um ato dialógico, amoroso possibilidades do que fazer.
e construtivo. Desse modo, a avaliação é uma auxiliar de Assentados no acolhimento do nosso educando, po-
uma vida melhor, mais rica e mais plena, em qualquer de demos praticar todos os atos educativos, inclusive a
seus setores, desde que constata, qualifica e orienta pos- avalia- ção. E, para avaliar, o primeiro ato básico é o de
sibilidades novas e, certamente, mais adequadas, porque diagnos- ticar, que implica, como seu primeiro passo,
assentadas nos dados do presente. coletar dados relevantes, que configurem o estado de
aprendizagem do educando ou dos educandos. Para
Avaliação da aprendizagem escolar tanto, necessitamos instrumentos. Aqui, temos três pontos
básicos a levar em consideração: 1) dados relevantes; 2)
Vamos transpor esse conceito da avaliação para a instrumentos; 3) utili- zação dos instrumentos.
com- preensão da avaliação da aprendizagem escolar. Cada um desses pontos merece atenção.
Tomando as elucidações conceituais anteriores, vamos Os dados coletados para a prática da avaliação da
aplicar, passo a passo, cada um dos elementos à avaliação aprendizagem não podem ser quaisquer. Deverão ser co-
da aprendiza- gem escolar. letados os dados essenciais para avaliar aquilo que esta-
Iniciemos pela disposição de acolher. Para se proces- mos pretendendo avaliar. São os dados que caracterizam
sar a avaliação da aprendizagem, o educador necessita especificamente o objeto em pauta de avaliação. Ou seja,
dispor-se a acolher o que está acontecendo. Certamente a avaliação não pode assentar-se sobre dados secundários
o educador poderá ter alguma expectativa em relação a do ensino-aprendizagem, mas, sim, sobre os que efetiva-
possíveis resultados de sua atividade, mas necessita estar mente configuram a conduta ensinada e aprendida pelo
disponível para acolher seja lá o que for que estiver acon- educando. Caso esteja avaliando aprendizagens
tecendo. Isso não quer dizer que ‘o que está acontecendo’ específicas de matemática, dados sobre essa
seja o melhor estado da situação avaliada. Importa estar aprendizagem devem ser coletados e não outros; e, assim,
disponível para acolhê-la do jeito em que se encontra, de qualquer outra área do conhecimento. Dados
pois só a partir daí é que se pode fazer alguma coisa. essenciais são aqueles que estão de- finidos nos
Mais: no caso da aprendizagem, como estamos traba- planejamentos de ensino, a partir de uma teoria
lhando com uma pessoa – o educando –, importa acolhê- pedagógica, e que foram traduzidos em práticas educati-
lo como ser humano, na sua totalidade e não só na vas nas aulas.
aprendi- zagem específica que estejamos avaliando, tais Isso implica que o planejamento de ensino necessita
como lín- gua portuguesa, matemática, geografia.... ser produzido de forma consciente e qualitativamente sa-
Acolher o educando, eis o ponto básico para proceder tisfatória, tanto do ponto de vista científico como do
atividades de avaliação, assim como para proceder toda e ponto de vista políticopedagógicos.
qualquer prática educativa. Sem acolhimento, temos a re- Por outro lado, os instrumentos de avaliação da
cusa. E a recusa significa a impossibilidade de estabelecer apren- dizagem, também, não podem ser quaisquer
um vínculo de trabalho educativo com quem está sendo instrumentos, mas sim os adequados para coletar os
recusado. dados que estamos necessitando para configurar o estado
de aprendizagem do nosso educando. Isso implica que os
instrumentos: a) sejam adequados ao tipo de conduta e
de habilidade que estamos avaliando (informação,
compreensão, análise, sín-

23
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
tese, aplicação...); b) sejam adequados aos conteúdos es-
senciais planejados e, de fato, realizados no processo de entre nossos educandos ou pesaroso e ameaçador?
ensino (o instrumento necessita cobrir todos os Aplicar instrumentos de avaliação exige muitos cuidados
conteúdos que são considerados essenciais numa para que não distorçam a realidade, desde que nossos
determinada unida- de de ensino-aprendizagem; c) educandos são seres humanos e, nessa condição, estão
adequados na linguagem, na clareza e na precisão da submetidos às múltiplas variáveis intervenientes em
comunicação (importa que o educando compreenda nossas experiências de vida.
exatamente o que se está pedindo dele); adequados ao Coletados os dados através dos instrumentos, como
processo de aprendizagem do edu- cando (um nós os utilizamos? Os dados coletados devem retratar o
instrumento não deve dificultar a aprendizagem do estado de aprendizagem em que o educando se encontra.
educando, mas, ao contrário, servir-lhe de reforço do que Isto feito, importa saber se este estado é satisfatório
já aprendeu. Responder as questões significativas sig- ou não. Daí, então, a necessidade que temos de qualificar
nifica aprofundar as aprendizagens já realizadas.). a aprendizagem, manifestada através dos dados coleta-
Um instrumento de coleta de dados pode ser dos. Para isso, necessitamos utilizar-nos de um padrão de
desastro- so, do ponto de vista da avaliação da qualificação. O padrão, ao qual vamos comparar o estado
aprendizagem, como em qualquer avaliação, na medida de aprendizagem do educando, é estabelecido no plane-
em que não colete, com qualidade, os dados necessários jamento de ensino, que, por sua vez, está sustentado em
ao processo de avalia- ção em curso. Um instrumento uma teoria do ensino. Assim, importa, para a prática da
inadequado ou defeituo- so pode distorcer qualificação dos dados de aprendizagem dos educandos,
completamente a realidade e, por isso, oferecer base tanto a teoria pedagógica que a sustenta, como o planeja-
inadequada para a qualificação do objeto da avaliação e, mento de ensino que fizemos.
consequentemente, conduzir a uma decisão também A teoria pedagógica dá o norte da prática educativa
distorcida. e o planejamento do ensino faz a mediação entre a teoria
Será que nossos instrumentos de avaliação da apren- pedagógica e a prática de ensino na aula. Sem eles, a
dizagem, utilizados no cotidiano da escola, são suficien- práti- ca da avaliação escolar não tem sustentação.
temente adequados para caracterizar nossos educandos? Deste modo, caso utilizemos uma teoria pedagógica
Será que eles coletam os dados que devem ser coletados? que considera que a retenção da informação basta para o
Será que eles não distorcem a realidade da conduta de desenvolvimento do educando, os dados serão qualifica-
nossos educandos, nos conduzindo a juízos distorcidos? dos diante desse entendimento. Porém, caso a teoria pe-
Quaisquer que sejam os instrumentos – prova, teste, dagógica utilizada tenha em conta que, para o desenvolvi-
redação, monografia, dramatização, exposição oral, argui- mento do educando, importa a formação de suas
ção, etc. – necessitam manifestar qualidade satisfatória habilida- des de compreender, analisar, sintetizar, aplicar...,
como instrumento para ser utilizado na avaliação da os dados coletados serão qualificados, positiva ou
apren- dizagem escolar, sob pena de estarmos negativamente, diante dessa exigência teórica.
qualificando ina- dequadamente nossos educandos e, Assim, para qualificar a aprendizagem de nossos edu-
consequentemente, praticando injustiças. Muitas vezes, candos, importa, de um lado, ter clara a teoria que utili-
nossos educandos são competentes em suas habilidades, zamos como suporte de nossa prática pedagógica, e, de
mas nossos instrumen- tos de coleta de dados são outro, o planejamento de ensino, que estabelecemos
inadequados e, por isso, os jul- gamos, incorretamente, como guia para nossa prática de ensinar no decorrer das
como incompetentes. Na verdade, o defeito está em unida- des de ensino do ano letivo. Sem uma clara e
nossos instrumentos, e não no seu de- sempenho. Bons consistente teoria pedagógica e sem um satisfatório
instrumentos de avaliação da aprendiza- gem são planejamento de ensino, com sua consequente execução,
condições de uma prática satisfatória de avaliação na os atos avaliativos serão praticados aleatoriamente, de
escola. forma mais arbitrária do que o são em sua própria
constituição. Serão praticados sem vínculos com a
Ainda uma palavra sobre o uso dos instrumentos. realidade educativa dos educandos.
Realizados os passos anteriores, chegamos ao diag-
Como nós nos utilizamos dos instrumentos de avalia- nóstico. Ele é a expressão qualificada da situação, pessoa
ção, no caso da avaliação da aprendizagem? Eles são utili- ou ação que estamos avaliando.
zados, verdadeiramente, como recursos de coleta de Temos, pois, uma situação qualificada, um
dados sobre a aprendizagem de nossos educandos, ou diagnóstico. O que fazer com ela? O ato avaliativo, só se
são utili- zados como recursos de controle disciplinar, de completará, como dissemos nos preliminares deste estudo,
ameaça e submissão de nossos educandos aos nossos com a toma- da de decisão do que fazer com a situação
desejos? Po- demos utilizar um instrumento de avaliação diagnosticada.
junto aos nos- sos educandos, simplesmente, como um Caso a situação de aprendizagem diagnosticada seja
recurso de coletar dados sobre suas condutas aprendidas satisfatória, que vamos fazer com ela? Caso seja insatisfa-
ou podemos utilizar esse mesmo instrumento como tória, que vamos fazer com ela? A situação diagnosticada,
recurso de disciplinamen- to externo e aversivo, através seja ela positiva ou negativa, e o ato de avaliar, para se
da ameaça da reprovação, da geração do estado de completar, necessita da tomada de decisão A decisão do
medo, da submissão, e outros. Afinal, aplicamos os que fazer se impõe no ato de avaliar, pois, em si mesmo,
instrumentos com disposição de aco- lhimento ou de ele contém essa possibilidade e essa necessidade. A
recusa dos nossos educandos? Ao aplicar- mos os avalia- ção não se encerra com a qualificação do estado
instrumentos de avaliação, criamos um clima leve em que está o educando ou os educandos ela obriga a
decisão, não

24
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
é neutra. A avaliação só se completa com a possibilidade
de indicar caminhos mais adequados e mais satisfatórios teóricos para se discutir como se configura a ação admi-
para uma ação, que está em curso. O ato de avaliar nistrativa do diretor de escola básica (com enfoque espe-
implica a busca do melhor e mais satisfatório estado cial no ensino fundamental) diante dos fins da educação e
daquilo que está sendo avaliado. da especificidade do processo de produção pedagógico.
A avaliação da aprendizagem, deste modo, nos pos- Tendo por base a literatura científica sobre administração
sibilita levar à frente uma ação que foi planejada dentro escolar, o trabalho traz à discussão uma concepção
de um arcabouço teórico, assim como político. Não será conser- vadora, mais identificada com o senso comum
qualquer resultado que satisfará, mas sim um resultado educacional, que advoga métodos e princípios idênticos
compatível com a teoria e com a prática pedagógica que aos aplicados na administração empresarial capitalista, e
estejamos utilizando. a confronta com uma concepção de cunho progressista,
Em síntese, avaliar a aprendizagem escolar implica es- que leva em conta a condição cultural e histórica do
tar disponível para acolher nossos educandos no estado trabalho pedagó- gico. Ao adotar o ponto de vista desta
em que estejam, para, a partir daí, poder auxiliá-los em última concepção, o texto examina a direção escolar
sua trajetória de vida. Para tanto, necessitamos de cuida- tanto em sua condição técnica, ligada à condição de
dos com a teoria que orienta nossas práticas educativas, utilização racional de meios, que precisa ser consentânea
assim como de cuidados específicos com os atos de com o caráter educativo de seu produto, quanto em sua
avaliar que, por si, implicam em diagnosticar e renegociar condição política, ligada (do mesmo modo) a seu
perma- nentemente o melhor caminho para o produto, mas principalmente à forma de relação social,
desenvolvimento, o melhor caminho para a vida. Por que se impõe como relação democrática. Fonte:
conseguinte, a avaliação da aprendizagem escolar não http://www.scielo.br/scielo.php?pi-
implica aprovação ou repro- vação do educando, mas sim d=S1517-97022010000300008&script=sci_abstrac-
orientação permanente para o seu desenvolvimento, t&tlng=pt
tendo em vista tornar-se o que o seu SER pede.

Concluindo
PARO, VITOR. DIRETOR ESCOLAR:
A qualidade de vida deve estar sempre posta à nossa EDUCADOR OU GERENTE?. SÃO PAULO: CORTEZ,
frente. Ela é o objetivo. Não vale a pena o uso de tantos 2015.
atalhos e tantos recursos, caso a vida não seja alimenta-
da tendo em vista o seu florescimento livre, espontâneo
e criativo. A prática da avaliação da aprendizagem, para
manifestar-se como tal, deve apontar para a busca do me- O professor titular da Faculdade de Educação da Uni-
lhor de todos os educandos, por isso é diagnóstica, e não versidade de São Paulo (USP), Vitor Henrique Paro, tem
voltada para a seleção de uns poucos, como se muito bem definido o objetivo da escola. “Ela tem o papel
comportam os exames. Por si, a avaliação, como dissemos, de fazer crianças e adolescentes se apropriarem daquilo
é inclusiva e, por isso mesmo, democrática e amorosa. Por que o homem produziu historicamente, ou seja, ela tem
ela, por onde quer que se passe, não há exclusão, mas sim um compromisso com a formação desse ser humano
diagnóstico e construção. Não há submissão, mas sim histórico”.
liberdade. Não há medo, mas sim espontaneidade e
busca. Não há chegada definitiva, mas sim travessia É desse lugar que o educador e pesquisador lança
permanente, em busca do me- lhor. Sempre! suas análises, reflexões e provocações sobre o sistema
educacio- nal e seu funcionamento. Em mais de uma
dezena de livros publicados, Vitor já se encontrou com
PARO, VITOR. A EDUCAÇÃO, A POLÍTICA E A temas como gestão democrática, qualidade do ensino,
ADMINISTRAÇÃO: REFLEXÕES SOBRE A PRÁTICA DO reprovação escolar e es- trutura das escolas, entre outros.
DIRETOR DE ESCOLA IN: Na obra “Diretor Escolar: educador ou gerente?”, o
au- tor se debruça sobre a prática do principal dirigente
EDUCAÇÃO E PESQUISA, SÃO PAULO, V. 36, N.3, P.
esco- lar, buscando examinar como a sua atuação técnica
763-778, SET./DEZ, 2010.
e po- lítica pode ser promotora de uma educação de
qualidade. Em entrevista concedida ao Centro de
Referências em Educação Integral, Vitor Paro reconhece
que o diretor é um administrador, uma vez que precisa
À luz de um conceito de administração (ou gestão) gerir recursos para al- cançar um fim educacional. No
como mediação para a realização de fins e de uma con- entanto, reforça que essa atuação em nada tem a ver com
cepção de política como convivência (conflituosa ou não) pensar a escola dentro de uma lógica empresarial. Pelo
entre sujeitos, e tendo presente o caráter necessariamente contrário, o diretor será capaz de gerir melhor os seus
democrático da educação para a formação de personali- recursos à medida em que for um
dades humano-históricas, este artigo apresenta subsídios bom educador.
Alinhando conceitos
Já nas primeiras linhas de seu livro, o pesquisador es-
clarece porque traz o conceito da administração para falar
sobre a prática do diretor escolar.

25
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
“Tradicionalmente, os estudos sobre a atuação do PARO, VITOR. GESTÃO DEMOCRÁTICA DA ESCOLA
dire- tor costumam ater-se a uma concepção de PÚBLICA. 4A ED. SÃO PAULO: CORTEZ, 2016.
administração diversa do conceito amplo utilizado neste
livro, razão pela qual restringem a ação administrativa dos
diretores apenas às atividades-meio, dicotomizando,
assim, as atividades es- colares em administrativas e
pedagógicas”, relata em tre- cho da obra.
Segundo Paro, essa abordagem acaba por tornar as A escola básica, sua gestão, a educação pública e de
atividades administrativas e pedagógicas mutuamente ex- qualidade como alvo supremo: eis os temas centrais que
clusivas, como se elas não pudessem coexistir. consagraram este verdadeiro clássico da gestão escolar no
Reconhecendo o diretor como um administrador Brasil, que agora aparece em edição revista e atualizada.
O pesquisador explica que administrar é utilizar Nos sete ensaios aqui reunidos são discutidas questões
recursos de maneira racional para atingir um determinado re- lacionadas à organização e funcionamento da escola
fim. Na escola, segundo ele, isso também se aplica, já que bási- ca e ao desenvolvimento das atividades de ensino
o objetivo da instituição deve ser o fim educativo,
em seu interior. Sempre na perspectiva da gestão escolar
garantindo o direito dos estudantes a terem acesso a
como como mediação para a realização de fins
diversas aprendizagens.
educativos, Vitor Henrique Paro examina problemas
Em sua análise, no contexto educacional, os recursos
que devem ser administrados pelo diretor se classificam relacionados à efetiva participação de alunos, professores,
em objetivos e subjetivos. Os objetivos se referem a ele- pais, e demais sujeitos envolvidos no trabalho da escola,
mentos fundamentais no processo do trabalho, como o buscando formas demo- cráticas de realização de uma
prédio escolar, o mobiliário, o material escolar e livros, en- educação verdadeiramente emancipadora de cidadãos
tre outros componentes. humano-históricos.
Os subjetivos, por sua vez, referem-se à força de tra- Fonte: http://www.cortezeditora.com.br/gestao-
balho, à energia daqueles que trabalham dentro da -democratica-da-escola-publica-1614.aspx/p
escola. Aqui, são colocados os diversos atores escolares –
coor- denadores, professores, demais funcionários e os
próprios estudantes, “já que eles também depositam
nesse ambien- te sua personalidade, seus
conhecimentos, habilidades e desejos”, explica. VYGOTSKY, L. PENSAMENTO E LINGUAGEM. SÃO
Administração ou gestão escolar? PAULO: MARTINS FONTES, 2001.
Para o pesquisador, não há uma diferença conceitual
entre os termos, embora reconheça que existam correntes
que defendam uma ou outra nomenclatura. “Você pode
falar em administração ou gestão escolar, desde que se Vygotsky, um gênio da Psicologia. Quanto não poderia
entenda que ambas pressupõem uma mediação”, explica.
legar-nos se não tivesse partido tão jovem?
Em relação ao termo administração, no entanto, Paro
reforça que é necessário compreendê-lo para além do Agradeço ao Odair Furtado, professor de Psicologia
sen- so comum e de seu uso empresarial, que veem o ato da PUC-SP que, há vários anos, indicou-me esta obra
de administrar como uma prática centralizadora e de como de leitura quase obrigatória. Aprendi a entender
mando. “Nesse caso, o que se tem é uma confusão entre minha filha, criança ainda, compreendi melhor os adultos
o caráter técnico – de utilizar os recursos da maneira mais e a mim pró- prio inclusive.
adequada Vygotsky estava preocupado em entender a relação
– com o político, que se refere ao poder de fazer com que entre as ideias que as pessoas desenvolvem e o que dizem
os outros hajam sob a sua vontade”, argumenta. ou escrevem. Não o fez apenas especulando em uma
O elemento mediação mesa de escritório, mas foi a campo, pesquisou, fez
Segundo Paro, para o gestor chegar a determinados experiências. Extraiu conclusões como:
fins, precisa lançar mão de alguns meios, o que ele chama “A estrutura da língua que uma pessoa fala influencia
de trabalho de mediação. “Em uma empresa, por exemplo, a maneira com que esta pessoa percebe o universo ...”
a mediação também está presente, pois é o meio que essa Para aqueles que veem na linguagem apenas um
companhia vai encontrar para chegar ao seu objetivo final, códi- go aleatório, o autor responderia:
no caso, obter lucro”, coloca. “Uma palavra que não representa uma ideia é uma
“Na escola é diferente”, avalia, já que o objetivo dela é coi- sa morta, da mesma forma que uma ideia não
garantir o pleno desenvolvimento dos estudantes,
incorporada em palavras não passa de uma sombra.”
forman- do cidadãos críticos capazes de atuar na nossa
sociedade. Vygotsky desenvolveu inúmeros conceitos fundamen-
É essa tarefa de gerir uma escola na qual no centro de tais para que compreendamos a origem de nossas
tudo estão os estudantes é que faz do diretor uma concep- ções e a forma como as exprimimos:
educador. “A criança só aprende se ela quiser”, atesta “pensamento egocên- trico”, “pensamento socializado”,
Vitor Paro. “conceito espontâneo”, “conceito científico”, “discurso
Por isso, o processo de aprendizagem só se efetiva interior”, “discurso exterio- rizado”, e tantos outros.
quando a criança ou o jovem é cativado. “O que só é Para quem se interessa por entender as ideologias,
possível atra- vés do diálogo, democraticamente”, aponta. co- municação, aprendizagem, doutrinação, persuasão
Fonte: https://jornalggn.com.br/blog/centro-de-refe- esta é uma obra básica e indispensável.
rencias-em-educacao-integral/diretor-escolar-educador-
-ou-gerente

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
Prefácio (2) descobrimos a forma singular como se desenvol-
Este livro aborda o estudo de um dos mais complexos vem os conceitos “científicos” das crianças, em compara-
problemas da psicologia — a inter-relação entre o pensa- ção com os conceitos espontâneos e formulamos as leis
mento e a linguagem. Tanto quanto sabemos esta ques- que regem o seu desenvolvimento,
tão não foi ainda estudada experimentalmente de forma (3) demonstramos a natureza psicológica específica e
sistemática. Tentamos operar, pelo menos, uma primeira a função lingüística do discurso escrito na sua relação com
abordagem desta tarefa, levando a cabo estudos experi- o pensamento e
mentais sobre um certo número de aspectos isolados do (4) clarificamos por via experimental a natureza do
problema de conjunto. Os resultados conseguidos forne- dis- curso interior e as suas relações com o pensamento.
cem-nos uma parte do material sobre que se baseiam as Não é do pelouro do autor fazer uma avaliação das
nossas análises. suas próprias descobertas e da forma como as
As análises teóricas e críticas são uma condição pré- interpretou: isso caberá aos leitores e aos críticos.
via necessária e um complemento da parte experimental O autor e os seus associados têm vindo a investigar os
e, por isso, ocupam uma grande parte do nosso livro. domínios da linguagem e do pensamento há já quase dez
Houve que basear as hipóteses de trabalho que serviram anos, durante os quais as hipóteses de que partiram foram
de ponto de partida ao nosso estudo nas raízes genéticas revistas ou abandonadas por falsas. No entanto, a linha
do pensa- mento e da linguagem. Com vista a fundamental da nossa investigação não se desviou da
desenvolvermos este quadro teórico, revimos e dire- ção tomada desde início. Compreendemos
analisamos acuradamente os da- dos existentes na perfeitamente o quanto o nosso estudo é imperfeito, pois
literatura psicológica pertinentes para o estudo. não é mais do que o primeiro passo numa nova via. No
Simultaneamente, sujeitamos a uma análise crítica as entanto senti- mos que, ao descobrirmos o problema do
teorias mais avançadas do pensamento e da linguagem, pensamento e da linguagem como questão central da
na esperança de superarmos as suas insuficiências e psicologia humana demos algum contributo para um
evitar- mos os seus pontos fracos na nossa busca de um progresso essencial. As nossas descobertas apontam o
caminho teórico por onde enveredar. caminho a seguir por uma nova teoria da consciência,
Como seria inevitável, a nossa análise invadiu alguns nova teoria essa que afloramos apenas no fim do nosso
domínios que lhe eram chegados, tais como a linguística livro.
e a psicologia da educação Na análise que realizamos do Fonte; http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/vigo. html
desenvolvimento dos conceitos científicos nas crianças,
utilizamos a hipótese de trabalho relativa à relação entre
o processo educacional e o desenvolvimento mental que VEIGA, ILMA PASSOS ALENCASTRO. INOVAÇÕES E
havíamos elaborado noutra oportunidade fazendo uso de PROJETO POLÍTICO-
um corpo de dados diferente. PEDAGÓGICO: UMA RELAÇÃO REGULATÓRIA OU
A estrutura deste livro é forçosamente complexa e EMANCIPATÓRIA? IN: CADERNO CEDES, CAMPINAS,
multifacetada. No entanto, todas as suas partes se orien- V. 23, N. 61, P. 267-281.
tam para uma tarefa central: a análise genética das
relações entre o pensamento e a palavra falada. O
primeiro capitulo põe o problema e discute o método.
Os segundo e ter- ceiro capítulos são análises críticas
das duas mais influen- tes teorias da linguagem e do Neste artigo a autora demonstra a necessidade de um
pensamento, a de Piaget e a de Stern. No quarto projeto político inovador, que envolva tanto a educação
capítulo tenta-se detectar as raízes genéticas do básica quanto a superior, de modo a garantir o acesso e
pensamento e da linguagem; este capítulo serve de desenvolvimento de crianças, jovens e adultos na socieda-
introdução teórica à parte principal do livro, as duas de, como parte fundamental no exercício da cidadania. Ela
investigações experimentais descritas nos dois capí- tulos discute a inovação e projeto político-pedagógico fazendo
capítulos seguintes. O primeiro estudo (capítulo 5o.) trata a distinção entre ação regulatória ou técnica e ação eman-
da evolução genérica geral dos significados durante a cipatória ou edificante.
infância; o segundo (capítulo 6o.) é um estudo A inovação regulatória significa assumir o projeto po-
comparativo do desenvolvimento dos conceitos lítico-pedagógico como um conjunto de atividades que
“científicos” e espontâ- neos da criança. O último capítulo vão gerar um produto: um documento pronto e acabado,
tenta congregar os fios das nossas investigações e deixando de lado o processo de produção coletiva, além
apresentar o processo total do pensamento verbal tal de negar a diversidade de interesses e de atores que es-
como surge à luz dos nossos dados. Pode ser útil tão presentes. Na emancipatória, há uma articulação entre
enumerar brevemente os aspectos da nossa obra que inovação e projeto político, integrando o processo com o
julgamos serem novos, exigindo, por con- seguinte, uma produto, onde o resultado final é um produto inovador
nova e mais cuidada verificação. Além da nova que provocará também ruptura epistemológica.
formulação que demos ao problema e da parcial no- Veiga ressalta que a grande preocupação do sistema
vidade do nosso método, o nosso contributo pode ser re- educativo está relacionada à melhoria na qualidade da
sumido como se segue: educação pública, a qual se expressa na educação da pes-
(1) fornecemos provas experimentais de que os soa em si, enquanto cidadã, e na sua preparação para o
signifi- cados das palavras sofrem uma evolução durante a mercado de trabalho.
infância e definimos os passos fundamentais dessa
evolução;

27
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
A inovação regulatória ou técnica tem bases VEIGA, ILMA PASSOS ALENCASTRO. PROJETO
epistemo- lógicas no caráter regulador e normativo da POLÍTICO PEDAGÓGICO DA
ciência conser- vadora, deixando de lado os que inovam, ESCOLA: UMA CONSTRUÇÃO POSSÍVEL. SÃO PAULO:
ou aqueles que se interessam em introduzir algo PAPIRUS, 1998.
efetivamente diferente dentro do sistema. Essa inovação
tem o critério de provo- car mudanças, porém não produz
um projeto pedagógico novo, faz parte do mesmo
sistema, modificado temporária
e parcialmente. São diretrizes, formulários, fichas, parâme- PROJETO POLÍTICOPEDAGÓGICO DA ESCOLA:
tros, critérios etc., um conjunto de ferramentas propostos UMA CONSTRUÇÃO POSSÍVEL.
em nível nacional sem a participação de todos os interes-
sados. Nesse sentido, o projeto político-pedagógico está O Projeto Políticopedagógico é uma forma de organi-
voltado para a burocratização da instituição educativa, zação do trabalho pedagógico da escola que facilita a
apenas como cumpridora de normas técnicas e mecanis- bus- ca de melhoria da qualidade do ensino. Esta
mos reguladores. organização se dá em dois níveis: no da escola como um
Referindo-se ao projeto político-pedagógico como todo, o que envolve sua relação com o contexto social
imediato; e no da sala de aula, incluindo as ações do
inovação emancipatória ou edificante a autora assinala
professor na dinâmi- ca com seus alunos.
que não se pode confundi-lo com reforma, evolução ou
A implantação do Projeto Pedagógico, no contexto da
mudança, pois suas bases epistemológicas estão alicerça- gestão colegiada e de processos participativos de tomada
das no caráter emancipador e argumentativo da ciência de decisões, deve considerar os seguintes aspectos:
emergente, a qual procura uma maior comunicação com 1) a análise dos conflitos (abrindo espaço para gerenciá-
os saberes locais e diferentes atores, realizando-se num -los, pois são oportunidades de se exercer criatividade e inovar);
contexto histórico e social. Sendo de natureza ético-so- 2) a neutralização das relações corporativas e autoritá-
cial e cognitivo-instrumental, visa à eficácia dos processos rias (abrindo espaço à participação e colaboração);
formativos sob a exigência da ética, trazendo consigo a 3) o rompimento da burocracia excessiva que permeia
possibilidade de alunos, professores, servidores técno-ad- as relações na escola, tanto as técnico-administrativas
ministrativos unirem-se e separarem-se de acordo com as como as de ordem técnico-pedagógicas;
necessidades do processo. Dessa forma, é um processo de 4) a reformulação da divisão do trabalho, reduzindo o
dentro para fora, além de lutar contra os mecanismos de modelo fragmentado, que reforça as diferenças e hierar-
poder e as formas pré-estabelecidas. quiza os poderes de decisão, em favor de responsabilida-
des compartilhadas e direcionadas a resultados de
interes- se para todos.
Assim como Gadotti, Vasconcelos; Azevedo; Corte;
A construção do Projeto Políticopedagógico passa
Cunha; Ribeiro e Gusmão, a autora enfatiza a necessida- pela autonomia da escola e pela sua capacidade de
de de um projeto político-pedagógico bem estruturado, delinear sua própria identidade. Assim, deve ficar claro
participativo, inovador, construído em bases éticas onde a que a escola é um espaço público, lugar de debate e
preocupação maior seja a formação do cidadão. Os diálogo, fundado na reflexão coletiva.
autores têm em conjunto o ideal de um projeto político
compro- missado com a sociedade, buscando modificar a A elaboração do Projeto Políticopedagógico necessi-
realidade cultural com uma gestão democrática ta de um referencial que o fundamente: Os alicerces estão
potencializada pelo trabalho colaborativo, construindo nos pressupostos de uma teoria pedagógica viável, que
novos valores e novos caminhos, com perspectivas de parta da prática social e do compromisso de solucionar as
uma educação de melhor qualidade para todos. deficiências institucionais.
Fonte: http://serounaosereducarparaaprender. Há necessidade, também, de domínio dos aspectos
blogspot.com/2010/01/inovacoes-e-projeto-politico- metodológicos indispensáveis à concretização das
concep- ções assumidas coletivamente:
-pedagogico_21.html
As novas formas de trabalho têm que ser pensadas
em um contexto de tensão, de correlações de forças - às
vezes favoráveis, às vezes desfavoráveis. Terão que nascer
do pró- prio “chão da escola” e ser construídas
coletivamente. Não se trata de simplesmente adotar um
modelo pronto e aca- bado. Compete, assim, à
administração da escola viabilizar inovações pedagógicas
planejadas em conjunto e imple- mentadas através da
ação de cada membro da escola, sejam alunos,
professores, funcionários ou comunidade externa.
Para que isto ocorra, poderá haver necessidade de
mudanças na própria lógica de organização e de com-
portamento das instâncias superiores (SME´s), em relação

28
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
às escolas. É essencial que sejam propiciadas condições
aos alunos, professores e funcionários que lhes permitam - Avaliação das condições de viabilidade dessa escola
aprender a pensar e a realizar o fazer pedagógico da ideal com definição de etapas e meios para concretizá-la;
forma mais efetiva e crítica. C - Gestão democrática - é um princípio consagrado
O Projeto Políticopedagógico visa a qualidade em na Constituição e abrange as dimensões pedagógica, ad-
todo o processo vivido pela escola. Não é um rearranjo ministrativa e financeira.
formal da instituição escolar. A busca da gestão democrática inclui a ampla
A organização do trabalho pedagógico da escola tem participa- ção dos representantes da comunidade escolar
também a ver com a organização da sociedade. A escola nas decisões
deve ser vista como uma instituição social, inserida na so- / ações administrativo-pedagógicas nela desenvolvidas.
ciedade, e sujeita às determinações e contradições dessa Implica a construção de um projeto de enfrentamento
sociedade. da exclusão social, da reprovação e da não permanência
na sala de aula. A socialização do poder pela prática da
Por meio do Projeto Político- Pedagógico da Escola participação coletiva atenua o individualismo; alimenta a
buscamos: reciprocidade, eliminando discriminações; e reforça a
- Democratização do processo de planejamento; auto- nomia, reduzindo a passividade e dependência de
- Melhoria da qualidade de ensino; órgãos intermediários que tornam a escola uma mera
- Incentivo às atividades culturais; executora de determinações alheias.
- Desenvolvimento da avaliação institucional da escola; A gestão democrática envolve a participação crítica e
- qualificação E desenvolvimento funcional do pessoal ampla na construção do Projeto Políticopedagógico e no
técnico-administrativo e técnicopedagógico; seu desenvolvimento, assegurando a transparência das
- Agilização da prática administrativo-pedagógica e de- cisões, fortalecendo as pressões para que elas sejam
- Provimento de condições facilitadoras para o efetivo legíti- mas, garantindo o controle sobre os acordos
cumprimento dos fins da escola. estabelecidos e, sobretudo, contribuindo para que sejam
contempladas questões que de outra forma não entrariam
PRINCÍPIOS NORTEADORES DO PROJETO em cogitação. D - Liberdade - é um outro princípio
PEDAGÓGICO consagrado na Constituição e está necessariamente
associado à idéia de autonomia. Liberdade e autonomia
O Projeto Políticopedagógico, como forma de fazem parte da própria
organi- zação do trabalho da escola, fundamenta-se nos natureza do ato pedagógico.
princípios que norteiam a escola democrática, pública e A liberdade, é algo que se experimenta, individual e
gratuita: coletivamente, e que envolve uma articulação de limites e
A - Igualdade - de condições para acesso e perma- possibilidades. É uma experiência que se constrói na
nência na escola. Sabemos que há grandes desigualdades vivên- cia coletiva, interpessoal.
de natureza socioeconômica, cultural e de cor entre as A liberdade é sempre liberdade para algo e não
crianças, antes mesmo de chegarem à escola. Os alunos já apenas liberdade de algo, em si. Se interpretamos a
são desiguais no ponto de partida. Sabemos também que liberdade ape- nas como o fato de sermos livres de
a escola é permeável aos mecanismos de discriminação e alguma coisa, encon- tramo-nos no estado de arbítrio. Ela
exclusão que existem na sociedade. é uma relação e, como tal, deve ser continuamente
construída.
No entanto, a igualdade no ponto de chegada (per- A liberdade na escola deve ser pensada na relação
manência do aluno na escola) deve ser garantida pela entre os seus diferentes segmentos em um contexto
mediação da escola. Igualdade das condições de acesso e participativo, onde todos têm liberdade para influir nas
permanência na escola requer muito mais do que a decisões e, por- tanto, têm também responsabilidades
simples expansão quantitativa da oferta de vagas. É sobre elas e, particu- larmente, sobre a construção do
necessário a ampliação do atendimento de boa qualidade. Projeto Políticopedagógico. E - Valorização do
B - Qualidade - não pode ser exclusiva a um magistério - é um princípio cen-
professor ou a alunos pertencentes às minorias sociais. O tral na discussão do Projeto - Pedagógico. A qualidade de
desafio do Projeto Pedagógico da escola é viabilizar ensino e o sucesso na tarefa de educar estão intimamente
qualidade para todos, o que vai muito além da meta relacionadas à:
quantitativa do aces- so global. Qualidade implica - Formação - inicial e continuada;
consciência crítica e capacida- de de ação, de saber e de - Às condições de trabalho - recursos didáticos, físicos,
mudar. humanos e materiais, número de alunos na sala de aula etc; e
A qualidade que desejamos e necessitamos conjuga - À remuneração docente.
caráter formal ou técnico (enfatiza os instrumentos, os
mé- todos e as técnicas), com o político (voltado para fins, Implementar e desenvolver o Projeto Políticopedagó-
va- lores e conteúdos). gico exige a qualificação dos profissionais da Escola, tanto
O Projeto Políticopedagógico exige: os técnicopedagógicos quanto os técnico-administrativos,
- Definição clara do tipo de escola que os educadores, buscando a interação das equipes de modo a haver uma
funcionários, alunos e pais desejam; ação em benefício do aluno.
- Definição dos fins a serem alcançados pela escola; A formação continuada deve ser um direito de todos
- Definição do perfil de cidadão que a escola formará. os profissionais que trabalham na escola e, portanto, deve
fazer parte do Projeto Pedagógico.

29
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
CONSTRUINDO O PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO
Estrutura pedagógica
O Projeto políticopedagógico organiza o trabalho pe-
dagógico da Escola, sem perder de vista sua interação Determina a ação das estruturas administrativas.
com o trabalho administrativo. Organiza as funções educativas para que a escola
É um instrumento de conquista de espaços, que serve atin- ja de forma efetiva as suas finalidades.
para: Refere-se às interações políticas, às questões de ensino
1) evitar a fragmentação do trabalho pedagógico; -aprendizagem e às de currículo.
2) minimizar a rotinização de tarefas improdutivas;
A análise da estrutura organizacional da escola ser-
3) contrapor-se à dependência e aos efeitos negativos
da burocracia e do poder autoritário /centralizador dos ve para identificar quais estruturas são valorizadas e por
se- tores da administração superior. quem, verificando as relações funcionais entre elas. Isso
significa indagar sobre suas características, seus polos de
Na construção do Projeto Políticopedagógico, deve- poder, seus conceitos e orientar os questionamentos:
se levar em consideração os sete elementos constitutivos
da organização do trabalho pedagógico: O que sabemos da estrutura pedagógica?
A - Finalidade da escola; Que tipo de gestão está sendo praticada?
B - Estrutura organizacional; O que queremos e precisamos mudar na Escola?
C - Currículo;
Qual o organograma previsto e qual está sendo pra-
D - Tempo / Calendário da escola;
E - Processo decisório; ticado?
F - Relações de trabalho; Quem constitui o organograma previsto e qual é a sua
G - Avaliação. lógica interna?
Quais as funções educativas predominantes?
A - Finalidades da escola Como são vistas a constituição e a distribuição da au-
toridade nessa área?
Referem-se aos efeitos pretendidos e almejados: Quais são os fundamentos regimentais e como estão
- Finalidade cultural: como a escola prepara, cultural- sendo praticados?
mente, os indivíduos para uma melhor compreensão da
sociedade em que vivem?
C - Currículo
- Finalidade política e social: como a escola forma o
indivíduo para a participação política que abrange direitos
e deveres da cidadania? É um importante elemento constitutivo da
- Finalidade de formação profissional: como a escola organização do conhecimento transmitido na escola e
pre- para os alunos para uma vida produtiva, capaz de se envolve, neces- sariamente, a interação entre sujeitos que
valer efetivamente das oportunidades econômicas e têm um mesmo objetivo e a opção por um referencial
ocupacionais? teórico que o susten- te. É uma construção social do
- Finalidade humanística: como a escola promove o conhecimento, que abrange as formas de transmissão e
desenvolvimento intelectual, emocional, integral do de assimilação.
aluno? A análise conjunta pela comunidade escolar dessas
Vale ressaltar que o currículo expressa uma dada cul-
dimensões levará à identificação das finalidades que pre-
cisam ser reforçadas, das que estão relegadas a segundo tura, não sendo um instrumento neutro. Por essa razão, a
plano e de como elas poderão ser detalhadas segundo sua definição requer reflexão crítica, que interprete tanto
as áreas, os cursos, as diversas disciplinas, e os conteúdos as suas implicações no âmbito da cultura dominante,
programáticos. quanto no da cultura popular.
O importante é decidir, coletivamente, o que se quer O currículo não pode ser separado do contexto social,
reforçar dentro da escola, detalhando as finalidades para uma vez que ele é historicamente situado e culturalmente
se conseguir um processo ensino-aprendizagem bem- determinado.
sucedi- do e se formar o cidadão desejado. O currículo formal está explícito e “decodificado” em
conteúdos, metodologias e recursos de ensino, avaliação
B - Estrutura organizacional
e relação pedagógica, de tal forma que permita controle
A escola dispõe de dois tipos básicos de estrutura: a e avaliações pelas autoridades. O currículo formal convi-
administrativa e a pedagógica ve com o currículo oculto, entendido como as mensagens
Estrutura administrativa transmitidas na sala de aula e no ambiente escolar.
Nossas escolas têm sido orientadas para a
Realiza a alocação e gestão dos recursos humanos, fí- organização hierárquica e fragmentada do conhecimento
sicos e financeiros. escolar. No entanto, a escola deve buscar uma nova forma
Abrange todos os elementos de natureza física, tais de orga- nização curricular na qual o conhecimento
como o estado de manutenção do prédio e das sistematizado para cada disciplina (o conteúdo),
instalações e equipamentos; os materiais didáticos, estabeleça uma relação aberta e inter-relacionada em
mobiliário, distri- buição das dependências e espaços
torno de uma idéia integra- dora - o currículo integração -
livres, limpeza, ventila- ção e iluminação.
com o objetivo de reduzir o isolamento entre as
disciplinas curriculares.

30
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
D - Tempo escolar
- Processos coletivos de avaliação continuada dos ser-
O calendário ordena o tempo: determina o início e o viços escolares.
fim do ano letivo, prevê os dias letivos, as férias, os perío-
dos em que o ano se divide, os feriados cívicos e F - Relações de trabalho
religiosos, as datas reservadas à avaliação, os períodos
para reuniões técnicas e colegiadas etc. Um aspecto básico a ser considerado, na concretiza-
O horário fixa o número de horas por semana, que va- ção do Projeto Político - Pedagógico da Escola, é a
ria em razão das disciplinas constantes da grade curricu- existên- cia, ou não, de relações de trabalho apoiadas em
lar. Estipula, também, o mínimo de aulas por professor. Há atitudes de: solidariedade, reciprocidade, e participação
disciplinas que se tornam equivalentes porque ocupam o coletiva; em oposição a relações regidas pelos princípios
mesmo número de horas por semana, e são vistas como de divisão do trabalho, fragmentação e controle
tendo menor prestígio se ocuparem menos tempo que as hierárquico.
demais. O que deve orientar a equivalência é a análise do Em qualquer ambiente de trabalho há confrontos de
conteúdo de modo a se concretizar a proposta de uma interesses ou opiniões dentro e, especialmente, entre os
idéia integradora. diferentes segmentos que compõem a organização. No
Quanto mais compartimentado for o tempo, mais hie- nosso caso, estamos falando de alunos, professores e fun-
rarquizadas e ritualizadas serão as relações sociais, e mais cionários.
reduzidas serão as possibilidades de se institucionalizar o Desses embates podem resultar conflitos, tensões e
currículo integração. rupturas e/ou negociações, acertos e amadurecimento
A sucessão de períodos muito breves dedicados a dis- sobre os problemas em questão. Podem também resultar
ciplinas muito diferentes entre si, sem necessidade de se- mudanças qualitativas, inovações. É muito importante não
quência lógica entre elas, sem atender à adequação de fugir dos atritos e encará-los como oportunidades que
seu conteúdo a períodos mais longos ou mais curtos e via- bilizam a construção de novas relações de trabalho
sem prestar atenção à cadência do interesse e do trabalho que fa- voreçam o diálogo entre os diferentes segmentos.
dos estudantes, tem o efeito de ensinar aos alunos que o
im- portante não é a qualidade de seu trabalho, mas a G - Avaliação
duração do curso.
Para elevar a qualidade do trabalho pedagógico tor- Acompanhar e avaliar as atividades escolares são ati-
na-se necessário que a instituição educacional reformule vidades que levam à reflexão sobre como a escola está
seu tempo, estabelecendo períodos de estudo e reflexão organizada para colocar o Projeto Político - Pedagógico
de equipes de educadores, fortalecendo a instituição em ação. A avaliação crítica do projeto é aquela que bus-
como instância de educação continuada. ca explicar e compreender as causas das insuficiências e
É preciso tempo para que os educadores troquem ex- problemas conhecidos, as relações entre essas causas e as
periências, trabalhem em conjunto e aprofundem seu co- necessidades de atuar nessas causas, buscando ações al-
nhecimento sobre os alunos e sobre o que estão apren- ternativas criadas coletivamente.
dendo, para acompanhar e avaliar o Projeto Políticopeda- A autocrítica exige que se analise o Projeto Políticope-
gógico em ação, e, para os estudantes se organizarem e dagógico, não como algo estanque, desvinculado dos as-
criarem seus espaços para além da sala de aula. pectos políticos e sociais, mas como um projeto que
aceita, reconhece e reflete as contradições e conflitos.
E - O processo de decisão Acompanhar e avaliar o Projeto Políticopedagógico é
avaliar os resultados da própria organização do trabalho
Na organização formal das nossas escolas, o fluxo pedagógico.
das tarefas é orientado por procedimentos formalizados, O processo de avaliação envolve três momentos:
pre- valecendo relações hierárquicas de mando e - Descrição e a problematização da realidade escolar;
submissão. - Compreensão crítica da realidade descrita e proble-
Para minimizar isso, a escola deve prever mecanismos matizada;
que estimulem a participação comprometida de todos no - Proposição das alternativas de ação - momento de
processo de decisão e promovam a revisão periódica das criação coletiva.
atribuições específicas e gerais. Para tal, é necessário
haver uma distribuição de responsabilidades e um A avaliação deve, portanto:
processo de decisão participativo. - Ser democrática;
Nesse sentido, há necessidade de mecanismos institu- - Favorecer o desenvolvimento da capacidade de apro-
cionais de participação de todos os envolvidos com o pro- priar os conhecimentos científicos, sociais e tecnológicos;
cesso educativo da instituição escolar. Para tanto, sugere- - Ser resultante de um processo coletivo de avaliação
-se a instalação de: diagnóstica.

- Processos eletivos de escolha de dirigentes e regras Resenha da obra.


de rotatividade nos cargos; Disponível em: http://www.race.nuca.ie.ufrj.br/ceae/
- Colegiados com representação dos diversos segmen- m2/texto2.htm
tos da comunidade interna e externa;

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
Referência: da psicologia histórico-cultural e da pedagogia histórico-
VEIGA, Ilma Passos A. Projeto Políticopedagógico da -crítica. Essa tese tem uma importância pedagógica incon-
escola: uma construção coletiva. In Projeto Políticopeda- testável, mas tem também um significado político da
gógico da escola: uma construção possível. Campinas: Pa- maior relevância. O que está em tela é a relação entre a
pirus, 1995. organiza- ção coletiva da classe trabalhadora com vistas à
superação revolucionária da sociedade capitalista e a
formação de um tipo de psiquismo sem o qual se torna
quase impossível a compreensão da realidade social para
MARSIGLIA, ANA CAROLINA GALVÃO. A além das aparências cotidianas.
PRÁTICA PEDAGÓGICA HISTÓRICO-CRÍTICA NA Fonte: https://www.autoresassociados.com.br/o-
EDUCAÇÃO INFANTIL E NO ENSINO -desenvolvimento-do-psiquismo-e-a-educac-o-esco-
FUNDAMENTAL. CAMPINAS, SP: AUTORES lar-contribuicoes-a-luz-da-psicologia-historico-cultu-
ASSOCIADOS, 2011. ral-e-da-pedagogia-historico-critica.html

O livro A prática pedagógica histórico-crítica na educa- SAVIANI, DERMEVAL. ESCOLA E


ção infantil e ensino fundamental, escrito por Ana Carolina
DEMOCRACIA. SÃO PAULO: CORTEZ; CAMPINAS, SP:
Galvão Marsiglia, trata da pedagogia histórico-crítica apli-
AUTORES ASSOCIADOS,
cada à educação infantil e séries iniciais do ensino funda-
mental. Além da apresentação dos fundamentos teóricos, 1983.
são relatadas experiências realizadas na área de
linguagem, matemática e ciências naturais.
Este livro pretende colaborar com o avanço da pers-
pectiva teórica histórico-crítica. Longe de esgotar o tema, Saviani inicia o seguinte texto apresentando sua pro-
a intenção é contribuir com a reflexão sobre práticas pe- blemática por meio de um questionamento motivador:
dagógicas fundamentadas neste referencial, apresentan- Como as teorias da educação se posicionam mediante a
do trabalhos desenvolvidos na educação infantil e séries situação de precariedade e marginalidade na educação?
iniciais do ensino fundamental. Ao divulgar tais práticas, Assim, o autor destaca que essas teorias se
espera-se que elas possam ser discutidas, analisadas, am- posicionam em dois grupos principais, de acordo com o
pliadas e assim participar do movimento de consolidação entendimento que elas têm da relação entre educação e
da pedagogia histórico-crítica, que, comprometida com a sociedade.
classe trabalhadora, busca oferecer referencial de Um primeiro grupo de teorias, chamado por Saviani
educação de qualidade àqueles que têm tido esse direito de teorias não-críticas, seria aquelas que entendem a
negado. educa- ção como instrumento de equalização social e de
Fonte: https://www.autoresassociados.com.br/ supera- ção da marginalidade, caracterizando assim o
educacao-contemporanea/a-pratica-pedagogica-his- problema da marginalidade como resultado da ignorância,
torico-critica.html um fenôme- no acidental que deve ser corrigido. Nesse
grupo de teo- rias encontram-se a Escola Tradicional, a
Escola Nova e a Tecnicista.
Já o segundo grupo de teorias, ditas como as crítico-
MARTINS, LÍGIA MÁRCIA. O reprodutivistas seriam às que compreendem a educação
DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO E A EDUCAÇÃO como um instrumento de discriminação social, um fator
ESCOLAR: CONTRIBUIÇÕES A de marginalização. Esse grupo entende que a sociedade
LUZ DA PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL E DA é essencialmente marcada pela divisão de classes, sendo
PEDAGOGIA HISTÓRICO-CRÍTICA. a marginalidade inerente à própria estrutura da sociedade,
CAMPINAS, SP: AUTORES ASSOCIADOS, 2013. logo, a educação é aqui vista como inteiramente depen-
dente da estrutura social, servindo como fator de margi-
nalização. Assim, a função da escola consiste somente na
reprodução da sociedade em que está inserida.
Compondo esse grupo de teorias destacam-se:
A teoria do sistema de ensino enquanto violência sim-
Este livro indica de maneira clara e, ao mesmo tem-
bólica: considera que toda sociedade se constitui como
po, aprofundada o que são as funções psicológicas su-
um sistema de relações de força material entre grupos ou
periores, como elas se formam e se desenvolvem. Mais
classes. Sobre a base da força material surge um sistema
do que isso, a autora formula e comprova a tese de que
de relações de força simbólica cujo objetivo é reforçar as
o desenvolvimento das funções psicológicas superiores
relações de força materiais. Assim, a dominação
não prescinde de uma educação escolar que proporcione
econômica acaba por determinar a dominação cultural. A
o ensino sistemático do conhecimento científico, artísti-
ação peda- gógica seria assim entendida como uma
co e filosófico em suas formas mais desenvolvidas, numa
imposição arbitrá- ria da cultura dos dominantes para os
análise que evidencia a unidade entre os pressupostos
dominados, que se materializaria pelo trabalho
pedagógico.

32
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
Teoria da escola enquanto aparelho ideológico de
estado (AIE): Essa teoria entende a escola como o instru- de uma teoria denominada crítica seria preciso,
mento mais acabado de reprodução das relações sociais sobretudo, de acordo com o autor, lutar contra a
da sociedade capitalista. Nesse contexto os seletividade, a discri- minação e o rebaixamento do ensino
marginalizados são considerados os próprios das camadas popu- lares. Lutar contra a marginalidade
trabalhadores. Ao invés de instrumento de equalização nessa perspectiva seria garantir aos trabalhadores um
social, a escola, constituída pela própria burguesia tem a ensino da melhor qualidade possível nas condições
função de garantir o funcio- namento do sistema burguês históricas atuais.
de produção. Na busca da síntese de uma nova teoria, Saviani, utili-
Teoria da escola dualista: A escola estaria dividida em za-se da Teoria da Curvatura da Vara, abordando o
duas grandes redes: a burguesa e a proletária, explicada conflito histórico travado entre a Pedagogia Tradicional e
pela divisão da sociedade em duas classes opostas. a Peda- gogia Nova. De acordo com essa teoria é preciso
Nessa perspectiva o papel da escola não é mais o de que a vara seja curvada para o lado oposto para que tome
reforçar a marginalidade, mas sim, impedir o desenvolvi- uma direção não-tendenciosa. Logo, entendendo que a
mento da ideologia dos trabalhadores e a, consequente vara es- teja historicamente sendo curvada para a direção
luta revolucionária. Saviani considera assim, que a escola da Esco- la Nova, o autor levanta questionamentos e
se assume como duplo fator de marginalização críticas a essa pedagogia.
convertendo os trabalhadores em marginais, colocando à Posteriormente, Saviani, inicia suas considerações so-
lado do movi- mento proletário todos aqueles que bre a formulação de uma nova teoria. Destacando que a
ingressam nas escolas. Pode-se concluir com essa teoria historicidade seria uma das principais características de
que a escola serve como aparelho ideológico apenas à uma pedagogia superadora das discutidas.
burguesia na luta con- Uma nova pedagogia não precisaria negar a essên-
tra o operariado. cia (escola tradicional) para admitir o caráter dinâmico
da realidade e também não vê a necessidade de negar o
Saviani destaca que as teorias críticoreprodutivistas ti- movimento para entender a essência. A pedagogia revo-
veram como ponto positivo evidenciar a ligação da escola lucionária é crítica, entendendo assim a educação como
e os interesses capitalistas, no entanto, não têm uma pro- condicionada e não como a redentora da sociedade como
posta pedagógica porque se preocupam apenas em expli-
as pedagogias Nova e Tradicional. Logo, Saviani destaca
car o mecanismo da escola atual.
ainda que um método novo não seria a soma da
Outra teoria abordada nesse texto é a da educação
Pedagogia Tradicional e da Pedagogia Nova, porque o
compensatória, que promove uma valorização da pré-es-
método que Saviani preconiza relaciona educação e
cola. Essa, segundo Saviani, se configura como uma res-
sociedade.
posta não crítica às dificuldades educacionais trazidas à
tona pelas teorias críticoreprodutivistas. De acordo com a Para uma nova pedagogia, a educação relaciona-se
teoria da educação compensatória, a educação dialeticamente com a sociedade, assim ela é sim determi-
continuaria tendo função de equalização social, porém, nada pela sociedade, porém, também influencia a socie-
para que ela pudesse concretizar tal função, seria dade.
necessário compensar suas deficiências. Logo se busca Uma pedagogia que supere as anteriores teria de
resolver problemas de or- dem: de saúde e nutrição, estar articulada aos interesses populares, sendo assim,
familiares, dentre muitas outras, como se a escola tivesse estaria empenhada na valorizaria da escola, para que
o poder de resolver todos esses problemas. Como funcione da melhor maneira possível.
resultado, tem-se uma pulverização de esforços e recursos O primeiro passo para nessa nova pedagogia seria a
que acabam por defasar ainda mais o setor educacional. prática social, sendo essa atividade comum ao professor
Ainda sobre essa teoria, Saviani considera que se o e ao aluno. O segundo passo seria a problematização. Já
objetivo é compensar as deficiências escolares, devem-se o terceiro estaria pautado na apropriação dos instrumen-
atentar-se para as deficiências que são de campo estrita- tos teóricos e práticos para a resolução desse problema. O
mente educacional, caracterizando então uma compensa- quarto passo é denominado de catarse e trata-se da
ção educacional. efetiva incorporação dos instrumentos culturais,
Nesse sentido, ficou claro, mediante análise dos dois transformando-
grupos de teorias que a escola é materialmente determi- -os em elementos ativos de transformação sociais. O quin-
nada pelos interesses da classe dominante. Assim, Savia- to e último passo constituiria-se na própria prática social.
ni levanta a seguinte questão: é possível articular a escola A compreensão dessa prática social ao longo desses
com os interesses dominados? É possível uma teoria da passos passaria por alterações qualitativas.
educação que capte criticamente a escola como um Em busca da democracia, a educação deveria ter
instru- mento capaz de contribuir para a superação do como ponto de partida a desigualdade (realidade social) e
problema da marginalidade? ter a igualdade no ponto de chegada (em busca de uma
Esses seriam os questionamentos básicos para a cons- trans- formação social). O processo educacional constitui-
trução de uma teoria crítica. Tal teoria teria de superar o se as- sim na passagem da desigualdade para a igualdade.
poder ilusório posto à escola pelas teorias não-críticas, Para Saviani a educação não deve ter relações demo-
bem como superar o ar de impotência dada a essa cráticas ou autoritárias, mas sim, deve articular o trabalho
institui- ção pelas teorias criticoreprodutivistas. Para a desenvolvido nas escolas com o processo de democratiza-
construção ção da sociedade.

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
A nova pedagogia apresentada no texto, que supere a
Nova e a Tradicional, indica para uma sociedade que Fonte
tenha superado a divisão do saber, diferentemente de BARBIERI, A. F.
nossa rea- lidade social. Bibliografia
Porém, para Saviani, cada professor pode dar sua con- SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia: teorias da
tribuição para uma transformação estrutural da sociedade. educação, curvatura da vara, onze teses sobre educação e
Essa contribuição se daria na medida em que o professor política. Campinas-SP: Autores Associados, 2008
enfatiza a transmissão e assimilação de conhecimentos,
do conteúdo o qual constituí sua especificidade, sempre
apre- sentando esse conteúdo relacionando-o com a SAVIANI, DERMEVAL. O PAPEL DO DIRETOR DE
sociedade, com seus determinantes. O professor deve ESCOLA NUMA SOCIEDADE EM CRISE.
impedir a ten- dência de dissolução dos conteúdos IN: EDUCAÇÃO: DO SENSO COMUM À CONSCIÊNCIA
escolares. FILOSÓFICA. COLEÇÃO EDUCAÇÃO
No último tópico do livro, que tem como título Onze CONTEMPORÂNEA. 11A
teses sobre educação e política o autor afirma que se cos- EDIÇÃO. SÃO PAULO: EDITORA AUTORES
tumou socialmente considerar a educação como sempre ASSOCIADOS,1996, P.206 A 209.
sendo um ato político. Tal afirmação, salienta o autor,
surge da necessidade de contraposição à educação
técnica peda- gógica (Escola Tecnicista). Do mesmo modo
como deu-se na teoria da curvatura da vara, tentou-se Para Vigotski, a cultura é uma instância mediadora en-
curvar a vara para a outra direção e assim, por muitas tre as pessoas e o mundo em que vivem bem como entre
vezes, a educação foi considerada como sendo sinônimo as pessoas e elas mesmas, e possui tanto a função de de-
de política, desconfigu- rando-se nesse sentido a terminante quanto de produto das relações humanas. O
especificidade da educação. desenvolvimento filogenético e ontogenético do ser hu-
Para o autor, educação e política são práticas mano é mediado pela cultura, e a impregnação social e
distintas, porém inseparáveis e com íntima relação. São cultural do psiquismo possibilitou a diferenciação humana
modalidades especificas da prática social, integrando uma ao longo da História. A humanidade tornou-se o que é
mesma totali- dade. Se educação e política forem vistas por- que cria, assimila e reconstrói a cultura, que é
como iguais, uma vez que a política exerce uma certa formada por elementos materiais e simbólicos. O
superioridade em nossa sociedade de classes, a desenvolvimento da criança se encontra inevitavelmente
especificidade e a função educacio- nal desapareceriam. vinculado à incorpora- ção mais ou menos criativa da
As reflexões expostas nesse momento por Saviani podem cultura de sua comunidade (Pérez Gómez, 1998).
ser ordenadas e sintetizadas nas onze teses que se Brandão (1983) define a relação da cultura com a edu-
seguem: cação como um processo de transformação daquilo que
já foi anteriormente transformado por meio do trabalho e
Tese 1: Não existe identidade entre educação e da consciência. O processo de socialização do indivíduo
política; na sua cultura é um processo de ensino e de
Tese 2: Toda prática educativa contém, aprendizagem que ocorre implicitamente, sendo anterior
inevitavelmente, uma dimensão política; ao surgimento do ensino formal. Na medida em que as
Tese 3: Toda prática política contém, por sua vez, organizações so- ciais se tornam mais complexas, as
inevi- tavelmente uma dimensão educativa. formas e os processos envolvidos na transmissão do
Tese 4: A explicitação da dimensão política da prática saber são vistos como um problema a ser pensado, que
educativa está condicionada à explicitação da dá origem à educação formal. A teoria das organizações
especificida- de da prática educativa; diferencia cultura organi- zacional de estrutura
Tese 5: A explicitação da dimensão educativa da organizacional (Nóvoa, 1995). Nes- sa perspectiva, a
prática política está, por sua vez, condicionada à escola como organização social pode ser vista como
explicitação da especificidade da prática política. possuidora de uma cultura própria, na qual o
pesquisador focaliza sua atenção para compreender o
Tese 6: A especificidade da prática educativa define-se
ato educativo que ocorre nesse contexto. A cultura esco-
pelo caráter de uma relação que se trava entre contrários
lar pode ainda ser caracterizada pelo chamado currículo
não-antagônicos.
oculto, ou seja, pelas diretrizes tácitas que atuam de
Tese 7: A especificidade da prática política define-se modo importante no funcionamento da escola e nas
pelo caráter de uma relação que se trava em contrários práticas dos seus profissionais. Tais diretrizes afetam a
antagônicos. aprendizagem dos alunos e o trabalho dos professores,
Tese 8: As relações entre educação e política dão-se na configurando os valores e os significados vivenciados na
forma de autonomia relativa e dependência recíproca; própria escola. O currículo está oculto, porque ele não é
Tese 9: As sociedades de classes caracterizam-se pelo prescrito, embora se
primado da política, o que determina a subordinação real constitua em importante fator de aprendizagem.
da educação à prática política; Não se deve esquecer também que a escola está inse-
Tese 10: Superada a sociedade de classes, cessa o rida em um contexto sociocultural e político mais amplo,
primado cuja influência é determinante na sua organização, daí a
da política e, em consequência, a subordinação da educação. importância de se considerar os valores e as
Tese 11: A função política da educação cumpre-se na medida interpretações
em que ela se realiza como prática especificamente pedagógica.
34
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
das pessoas em relação aos objetivos e propósitos sociais
da organização escolar dentro da realidade sociocultural De minha parte, venho dedicando-me a uma pesquisa de
e política (Libâneo, 2001). A escola, portanto, não divulga longo alcance que se desenvolve com ritmo variável e sem
simplesmente o conhecimento acumulado pela prazo para sua conclusão, por meio da qual se pretende
humanida- de, mas o seu recorte, contextualizado social e rastrear o percurso da educação desde suas origens remo-
historica- mente nas práticas de formação do indivíduo, tas, tendo como guia o conceito de ‘modo de produção’.
de sociali- zação do conhecimento e de reprodução social Trata-se de explicitar como as mudanças das formas
(Silva Jr. & Ferretti, 2004). de produção da existência humana foram gerando histori-
Decorre daí que a principal questão não é investigar camente novas formas de educação, as quais, por sua vez,
como a criança se socializa, mas como a sociedade sociali- exerceram influxo sobre o processo de transformação do
za a criança (Miranda, 2004, p. 131). Por meio de modo de produção correspondente. [...] Pretende-se, as-
processos de socialização vividos na escola, a criança sim, revelar as bases sobre as quais se assenta a
pedagogia histórico-crítica para viabilizar a configuração
internaliza valo- res e comportamentos da sua cultura,
consistente do sistema educacional em seu conjunto do
sendo fundamental compreender como se dá esse
ponto de vista dessa concepção educacional.”
processo. A escola pode ser vista, portanto, como uma
Fonte: https://www.autoresassociados.com.br/educa-
organização social dotada de uma cultura própria, e, ao cao-contemporanea/pedagogia-historico-critica.html
mesmo tempo, como parte de uma cultura mais ampla,
que reflete em suas ações os con- dicionantes e QUESTÕES
contradições ali presentes.
Fica patente a importância que o processo de 01- (FUNDEP – PEDAGOGO Contagem) São princí-
escolari- zação exerce na vida da criança, por ser a escola o pios da educação libertadora (Paulo Freire) EXCETO:
espaço de socialização mais legitimado na sociedade atual, (A)Acreditar na igualdade fundamental entre os seres
onde se re- cria um conhecimento específico, diferente da humanos, independentemente de quaisquer diferenças.
educação in- formal ou familiar. Excluir a criança com (B)Buscar a transformação social, constituindo-se
deficiência da escola significa, portanto, negar-lhe o acesso como meio de contribuir para a justiça social e para a
a essa forma de aqui- sição cultural específica e participação. (C)Conceber a participação como um
fundamental em uma sociedade em que a educação processo que fa- voreça cada vez mais a centralização
escolar é altamente valorizada. O fato de o indivíduo não das decisões tendo
ter acesso à escola significa um impedimen- to da em vista a unidade institucional.
apropriação do saber sistematizado, de instrumentos de (D)Organizar-se como um processo em que as
atuação no meio social e de condições para a construção pessoas sejam sujeitos de sua própria formação.
de novos conhecimentos (Rego, 2002, p. 48).
Nessa perspectiva, a escola desempenha papel impor- 2- (FUMARC - PROFESSOR GOV.VALADARES) “Não
tante não só na aquisição sistematizada de há docência sem discência”. Em seu texto, Freire (2000)
conhecimentos mas também no desenvolvimento das dis- cute a importância de uma reflexão envolvendo a
funções psicológicas superiores, isso porque as atividades formação docente e a prática educativo-crítica em favor
educativas na escola, diferentemente do cotidiano extra- da autono- mia dos educandos.
escolar, são sistemáti- cas, têm uma intencionalidade
deliberada e um compro- misso explícito em tornar Avalie as afirmativas abaixo:
acessível o conhecimento for- malmente organizado. Em
I. A temática abordada incorpora a análise de saberes
tal contexto, os estudantes são desafiados a entender as
fundamentais, apresentando elementos constitutivos para
bases dos sistemas de concep- ções científicas, a realizar
a compreensão da prática docente enquanto dimensão
abstrações e generalizações mais amplas acerca da so- cial da formação humana.
realidade e, ainda, a tomar consciência de seus próprios II. A tarefa do educador não se resume apenas em
processos mentais (metacognição), modi- ficando a en- sinar os conteúdos, mas ensinar a pensar certo,
relação cognitiva com o mundo. exigindo rigorosidade metódica. Ensinar, aprender e
Fonte: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=s- pesquisar en- volvem dois momentos do ciclo
ci_arttext&pid=S1414-98932009000300006 gnosiológico.
III. O ato de ensinar exige a corporeificação das pala-
vras através do exemplo. Uma vez que, não há pensar
certo fora de uma prática testemunhal que o re-diz em
SAVIANI, DERMEVAL. PEDAGOGIA HISTÓRICO-
lugar de desdizê-lo.
CRÍTICA: PRIMEIRAS
IV. Na formação permanente dos professores, ensinar
APROXIMAÇÕES. CAMPINAS, SP: AUTORES exige reflexão crítica a respeito da prática, é pensando cri-
ASSOCIADOS, 2011. ticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode me-
lhorar a próxima prática.

Verifica-se que estão CORRETAS as afirmativas:


“[...] este livro constitui uma primeira aproximação ao (A) Apenas I, II e III
significado da pedagogia histórico-crítica. Isto porque (B) Apenas I, III e IV
está em curso o processo de elaboração desta corrente (C) Apenas I, II e IV
peda- gógica, através da contribuição de diferentes (D) I, II, III, IV
estudiosos.

35
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
3- (FUMARC - PROFESSOR GOV.VALADARES) Leia
atentamente o trecho extraído do livro “Pedagogia da Au- (D) visões distorcidas do mundo do trabalho.
tonomia: Saberes necessários à prática educativa”: (E) novas formas de ordenação da experiência
O ato de cozinhar, por exemplo, supõe alguns sabe- humana, com múltiplos reflexos positivos na cognição dos
res concernentes ao uso do fogão, como acendê-lo, como estudantes. 6- Os pedagogos e demais profissionais e
equilibrar para mais, para menos, a chama, como lidar pessoas que circulam na escola pública devem considerar,
com certos riscos mesmo remotos de incêndio, como har- segundo Paulo Freire, a importância das relações entre
educador e educando, entre autoridade e liberdade,
monizar os diferentes temperos numa síntese gostosa e
entre pais, mães,
atraente. A prática de cozinhar vai preparando o novato,
filhos e filhas o que contribui para a:
ratificando alguns daqueles saberes, retificando outros, e
(A) reinvenção do ser humano no aprendizado de sua
vai possibilitando que ele vire cozinheiro. A prática de autonomia.
vele- jar coloca a necessidade de saberes fundantes, como (B) elaboração do calendário escolar que marca as li-
o do domínio do barco, das partes que o compõem e da ções de vida e deve inibir as liberdades dos alunos na ava-
função de cada uma delas, como o conhecimento dos liação da escola.
ventos, de sua força, de sua direção, os ventos e as velas, (C) elaboração de um regimento escolar apenas por
a posição das velas, o papel do motor e da combinação quem entende de legislação de ensino.
entre motor e velas. Na prática de velejar se confirmam, se (D) elaboração das diretrizes escolares por pessoas que
modificam ou se ampliam esses saberes. de- tém o saber pedagógico e encontram-se fora de sala de
FREIRE, 2000, P. 23 e 24 aula.
(E) produção de documentos e registros escolares ex-
O texto acima permite analisar que: clusivamente pelos pedagogos.
(A) Ensinar é um processo que pode tornar o aprendiz
mais e mais criador. Quanto mais criticamente se exerça a 7- De acordo com a Pedagogia defendida por Paulo
capacidade de aprender, mais se constrói e se desenvolve Freire, a autonomia, enquanto amadurecimento do ser
o que pode ser chamado de “curiosidade epistemológica. para si, é processo, é vir a ser. Não ocorre em data
(B) Existe uma relação entre o ato de ensinar e a marcada. É nesse sentido que os pedagogos devem
prática de cozinhar, mostrando que o professor precisa estimular refle- xões centradas em experiências
diversificar sua prática, promovendo atividades fora do estimuladoras da decisão e da responsabilidade, o que
ambiente escolar. pressupõe:
(C) Na prática pedagógica, é importante estabelecer (A) experiências respeitosas da liberdade.
atividades que relacionem com o cotidiano dos alunos, (B) o receio às críticas mesmo construtivas.
(C) a espera para saber onde as pessoas podem ir e em
uti- lizando receitas familiares e atraentes.
seguida mostrar o caminho certo.
(D) Com o objetivo de criar “espaços inovadores”, cabe
(D) a licenciosidade que hipertrofia a decisão coletiva.
aos professores utilizarem com frequência todo o espaço
(E) o espontaneísmo.
escolar.
8- A pedagoga Cláudia respalda a sua prática na Pe-
4- Segundo Paulo Freire ensinar exige segurança, dagogia da Autonomia coordena o planejamento escolar
com- petência profissional e generosidade. Assim o clima lembrando a necessidade de elevar os índices de apren-
de respeito que nasce de relações justas, sérias, humildes, dizagem do/as alunos/as e a importância das ferramentas
ge- nerosas em que a autoridade docente e as liberdades básicas para que eles/elas circulem na sociedade letrada.
dos alunos se assumem eticamente deve contribuir para: Reconhece a importância dos saberes e dos conhecimen-
(A) reforçar o autoritarismo na escola pública. tos de experiência que chegam à escola. Nesse sentido o
(B) reforçar o medo que os pais tem dos professores e saber ingênuo deve ser:
os conduz a afastar-se da escola. (A) preservado.
(C) os alunos reagirem negativamente ao exercício do (B) considerado como produto final do ensino e
comando. apren- dizagem escolar.
(D) fortalecer o caráter formador do espaço (C) superado pelo saber produzido através do exercício
pedagógico. da curiosidade epistemológica.
(E) estabelecer na escola o mandonismo que tolhe a (D) considerado como ponto de partida e de chegada
criatividade do educando. na aprendizagem assistemática escolar.
(E) motivo de exclusão no processo de ensinar e aprender.
5- A escola X vem trabalhando na construção coletiva
do PPP escolar que tem como base a Pedagogia da Auto- 9- O pedagogo Joaquim dá testemunho de respeito
nomia. Um dos pontos elencados e operacionalizados ao seu aluno pelo exercício cotidiano de responsabilidade,
pelo grupo foi a formação continuada dos docentes, pontualidade, assiduidade e cumprimento dos seus
partindo do entendimento de ser essa a forma de deveres como educador. Segundo Paulo Freire as
favorecer: características des- sa prática pedagógica docente
especificamente humana é:
(A) uma prática pedagógica neutra que reflete positi-
(A) incoerente pela realidade educacional e antiética.
vamente no meio social.
(B) profundamente formadora, por isso, ética.
(B) o desenvolvimento de experiências que só servem (C) esteticamente assistemática.
para cada profissional do ensino. (D) espontânea e assistencialista.
(C) o desenvolvimento de atividades pragmáticas que (E) assistemática e escapa ao juízo que dele fazem os
centram o ensino em atividades descontextualizadas.
alunos.

36
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
10- Segundo Paulo Freire os homens e mulheres são
os únicos seres que socialmente são capazes de aprender. 13- A partir do saber fundamental “mudar é difícil,
Assim toda prática educativa demanda processos inte- mas é possível” é que se deve programar a ação político-
rativos que favorecem: peda- gógica. Com base nesse pressuposto e
(A) a constatação que para mudar, é necessário práti- considerando, ain- da, o texto de Paulo Freire, assinale a
cas assistemáticas. opção correta.
(B) o espírito negativo e o fechamento ao risco. (A) O educador deve assumir uma postura neutra
(C) a construção, reconstrução, a constatação que dian- te do real, pois a função da educação é estudar e
para mudar é necessário abertura ao risco. constatar a realidade, para compreendê-la e admirá-la
(D) o nível de adestramento dos outros animais ou do como obra da construção humana.
cultivo das plantas. (B) O educador deve tomar consciência de que não é
(E) a construção dos saberes do senso comum e a apenas objeto da história, mas também sujeito. No
constatação que para mudar é necessário apenas do mé- mundo da história, da cultura e da política, deve constatar
rito individual. a reali- dade não para se acomodar, mas para mudar.
Leia o texto abaixo para responder às questões 11, 12 e (C) Para que se possa transformar o mundo por meio
13 da educação é preciso pregar a rebelião e instigar a
revolta nas camadas populares, pelo fato de estas serem
A questão da formação docente, ao lado da reflexão profun- damente injustiçadas.
sobre a prática educativo-progressista em favor da auto- (D) O educador deve respeitar o saber dos grupos
nomia do ser dos educadores, é a temática central em tor- com que trabalha. Porém, não pode permitir que estes
no da qual gira este texto. É também temática a que se predomi- nem, por ter consciência de que aquilo que
incorpora a análise de saberes fundamentais àquela pensa, em face de sua formação, é melhor para o grupo.
prática e aos quais espero que o leitor crítico acrescente
alguns que me tenham escapado ou cuja importância não 14- Considere as três afirmativas abaixo:
tenha percebido. I - A finalidade do currículo crítico é o inverso da do
Paulo Freire. Pedagogia da autonomia: currículo tradicional: este último tende a naturalizar’ acon-
saberes necessários à prática tecimentos; aquele tenta obrigar o aluno a que questione
educativa. as atitudes e comportamentos que considera naturais. O
São Paulo: Paz e Terra, 1996, p. 13 (com currículo crítico oferece uma visão da realidade como um
adaptações). processo mutante e descontínuo, cujos agentes são os se-
res humanos, os quais, portanto, estão em condições de
11- De acordo com o pensamento predominante no realizar sua transformação.
texto, o ato de ensinar exige: II - O currículo comum é um meio para ajudar na
igual- dade de oportunidades; pois “numa sociedade
I rigorosidade metódica, pesquisa e criticidade.
em que a cultura de procedência dos indivíduos
II respeito aos saberes dos educandos, estética e ética. condiciona suas capacidades, interesses e aspirações, o
III corporeificação das palavras pelo exemplo.
currículo comum da escolaridade deve ser entendido
IV risco, aceitação do novo e rejeição a qualquer forma
como o conjunto de conhecimentos, competências e
de discriminação.
valores para aqueles que sem a sua aquisição seriam mais
discriminados fora da es- cola. Esses conteúdos são a
A quantidade de itens certos é igual a
oportunidade para que todos aqueles que, por sua cultura
(A) 1.
de procedência ou origem so- cial, teriam menos
(B) 2.
oportunidades de ter acesso ao conhe- cimento e às
(C) 3.
distintas formas de expressão cultural.
(D) 4.
III - A determinação de um currículo básico comum
tem um papel essencial, já que condiciona horários,
12- Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar
as possibilidades para sua própria produção ou sua sistemas de especialização do professorado, disposição de
própria construção, o que exige que o professor pense recursos, dotação mínima das escolas, etc. Algo que é
certo. Com relação aos pressupostos filosóficos imprescindível num sistema educativo complexo e
subjacentes a essa afirmativa e ao texto, assinale a opção universal para garantir a igualdade de condições e a
correta. homologação dos resultados e certificados que fornece.
(A) Pensar certo é uma postura exigente, difícil e
peno- sa que o professor tem de assumir diante dos A partir da compreensão das ideias expressas por Gi-
outros e com os outros, em face do mundo e dos fatos. meno Sacristán sobre a teoria curricular, estão corretas as
(B) Pensar certo é ter a certeza de que todas as ações afirmativas:
humanas estão predeterminadas pelo destino, que a inter- a) I e II
ferência do indivíduo pouco mudará a realidade. b) II e III
(C) Pensar certo é agir com espontaneidade, a ponto c) I e III
de todas as ações serem pautadas pelo espontaneísmo. d) I, II e III
(D) Pensar certo é fácil, pouco exigente e e) Apenas II.
complementa a atitude autoritária do professor, que cada
vez menos ne- cessita da rigorosidade metódica.

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
15- Segundo Sacristán, interferem no processo de se-
leção, elaboração e realização do currículo uma série de a) defende grupos homogêneos na organização do
forças. As alternativas abaixo trazem alguns exemplos ensi- no, mas adverte que essa prática, se for mal gerida,
des- sas forças, EXCETO a alternativa: acaba não distinguindo os estudantes por competência ou
a) As forças sociais e econômicas que brigam por he- nível de capa- cidade e rendimento e sim por outros
gemonia e fazem com que o currículo tenha determinada critérios mais subjetivos
tendência; b) defende grupos homogêneos na organização do
b) Decisões administrativas sobre como desenvolver o ensino e argumenta que os alunos aprendem melhor e
mais rapidamente e podem ser agrupados por nível de
ensino (políticas públicas)
rendimento e capacidade
c) Elaboração e mercado de distribuição de livros e
c) defende a desconstrução da lógica homogeneiza-
ma- teriais didáticos
dora da escola, propondo a superação da tendência de se
d) O pertencimento racial dos estudantes organizar sempre grupos homogêneos, defendendo que
e) Influência de determinados grupos acadêmicos que os interesses de “melhor funcionamento” ou de melhor
pressionam para que sua especialização esteja representa- manejo de classe devem ser rediscutidos à luz dos valores
da no sistema escolar éticos contra a segregação dos alunos
d) defende a desconstrução da lógica homogeneiza-
16- Leia o trecho abaixo: dora da escola, pois a igualdade absoluta não existe, já
“A sequência mecânica de estímulos, respostas e de que os estudantes chegam à escola em pontos de partida
re- forços não funciona na escola, é um esquema di- ferentes. Por isso, propõe que, ao invés de
demasiado simplista e não reflete a riqueza das trocas na homogeneizar grupos dentro da sala de aula, sejam
aula. Estímu- los e reforços similares provocam reações costuradas turmas que aproximem estudantes com o
bem diferentes e inclusive contraditórias em diferentes mesmo grau de desen- volvimento, criando salas
indivíduos, e também nos próprios sujeitos em situações e homogêneas e não grupos ho- mogêneos nas salas de
contextos diferentes. Por outro lado, quando funciona, aula
escapa do professor a complexidade dos efeitos e) defende a homogeneização das turmas como
secundários, não previstos e não desejáveis que pode forma de ajudar os professores no manejo de sala de aula
provocar o condicionamento mecâni- co de uma resposta e de me- lhorar o funcionamento e a qualidade do ensino
ou linha de comportamento. O aluno pode aprender oferecido.
mecanicamente uma conduta e ao mesmo tempo se
18- É muito importante que o educador propicie um
tornar incapacitado para desenvolver estratégias de busca
ensino que instigue o educando a pensar, a refletir, ela-
nesse mesmo âmbito ou desencadear aversões emotivas borar suas próprias ideias e, também, possibilite que ele
em relação à mesma.” adquira conceitos e conhecimentos básicos: até porque os
conhecimentos se desenvolvem a cada dia, sendo impos-
Neste trecho, Gimeno Sacristán tece criticas a um dos sível à apreensão de todo saber na escola. Os educandos,
conjuntos de teorias de ensino e aprendizagem que quando estimulados a enfrentar novos problemas, por
analisa em seu livro COMPREENDER E TRANSFORMAR O meio de pesquisas e reflexões, estarão conquistando sua:
ENSINO. (A) autonomia
A que teorias o autor se refere? (B) cidadania
a) Teorias Construtivistas (C) inteligência emocional
b) Teorias do Processamento da Informação (D) habilidade de pensar
c) Teorias da Gestalt ou do Campo (E) honestidade intelectual
d) Teorias do Condicionamento
e) Teorias de fundamentação psicanalítica. 19- O pensamento pedagógico parte de alguns prin-
cípios que marcam de forma clara e objetiva o modo de
17- Leia o trecho abaixo: entender o ato educativo.
As práticas de homogeneizar para manejar com mais
Considerando as características do pensamento desse
facilidade o grupo foram legitimadas com a ideia de que
autor, analise as afirmações que se seguem:
os alunos aprendem melhor e mais rapidamente em
I – ensinar é um ato que envolve a reflexão sobre a
grupos homogêneos; o que não deixa de ocultar certo própria prática;
darwinis- mo social sob a ideia de ordem e de rendimento II – modificar a cultura originária é parte do processo
que seria necessário discutir, já que ao fazer grupos educativo;
homogêneos se acaba distinguindo os alunos com III – superar a consciência ingênua é tarefa da ação
diferentes níveis de ca- pacidade e rendimento. educativa;
IV – educar é um ato que acontece em todos os espa-
Considerando as ideias defendidas por Gimeno Sa- ços da vida;
cristán em seu livro COMPREENDER E TRANSFORMAR O V – educar é transmitir o conhecimento erudito e uni-
ENSINO, podemos dizer que, no que tange à organização versalmente reconhecido.
didática dos grupos de estudantes, o autor:
Estão de acordo com este pensamento APENAS as
afir- mações:
(A) I e II

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
Diretor de Escola, Supervisor de Ensino e Vice-Diretor de Escola
(B) II e V
(C) I, III e IV ANOTAÇÕES
(D) I, IV e V
(E) I, II, III e
IV
20- Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar
as possibilidades para sua própria produção ou sua
própria construção, o que exige que o professor pense
certo. Com relação aos pressupostos filosóficos
subjacentes a essa afirmativa, assinale a opção correta.
(A) Pensar certo é uma postura exigente, difícil e
peno- sa que o professor tem de assumir diante dos
outros e com os outros, em face do mundo e dos fatos;
(B) Pensar certo é ter a certeza de que todas as ações
humanas estão predeterminadas pelo destino, que a inter-
ferência do indivíduo pouco mudará;
(C) Pensar certo é agir com espontaneidade, a ponto
de todas as ações serem pautadas pelo espontaneísmo;
(D) Pensar certo é fácil, pouco exigente e
complementa a atitude autoritária do professor, que cada
vez menos ne- cessita da rigorosidade metódica;
(E) Pensar certo é seguir as orientações das propostas
curriculares.

21- A partir do saber fundamental “mudar é difícil,


mas é possível” é que se deve programar a ação político-
peda- gógica. Com base nesse pressuposto e
considerando, assi- nale a opção correta.
(A) o educador deve assumir uma postura neutra
dian- te do real, pois a função da educação é estudar e
constatar a realidade, para compreendê-la e admirá-la
como obra da construção humana;
(B) o educador deve tomar consciência de que não é
apenas objeto da história, mas também sujeito. Num
mun- do de história, da cultura e da política, deve
constatar a realidade não para se acomodar, mas para
mudar;
(C) para que se possa transformar o mundo por meio
da educação é preciso pregar a rebelião e instigar a
revolta nas camadas populares, pelo fato de estas serem
profun- damente injustiçadas;
(D) o educador deve respeitar o saber dos grupos
com que trabalho. Porém, não pode permitir que estes
predo- minem, por ter consciência de que aquilo que
pensa, em face de sua formação, é melhor para o grupo;
(E) o educador deve estar consciente de que para mu-
dar necessita do apoio da direção da escola.

22- O modelo piagetiano de desenvolvimento


cogniti- vo aponta que o adolescente é capaz de formar
esquemas conceituais abstratos dos 12 anos em diante.
Trata-se do período
(A) pré-operacional.
(B) das operações formais.
(C) das operações concretas.
(D) sensório-motor.
(E) epistemofílico.

Respostas: 01-C / 02-D / 03-A / 04-D / 05-E / 06-A /


07-A / 08-C / 09-B / 10-C / 11-D / 12-A / 13-B / 14-D /
15-D
/ 16-D / 17-C / 18-A / 19-C / 20-A / 21-B / 22-B

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS
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ANOTAÇÕES

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