Você está na página 1de 12

RELAÇÕES INTERPESSOAIS NA

SOCIEDADE MODERNA E O PAPEL DA


PSICOLOGIA
PARTE II
Conteudista
ME. ANA CRISTINA ALVES LIMA

1
Os relacionamentos na sociedade pós-moderna

Fonte: http://educacaoesexualidadeprofclaudiabonfim.blogspot.com.br/

Quando se fala em modernidade, é importante lembrar que as mudanças


provocadas ao longo do tempo influenciam o ser humano como sujeito e
objeto, que, por sua vez, abordam o tema em pesquisas de diversas áreas,
como as áreas de ciências humanas, sociais, políticas e até econômicas.
Falar em modernidade não é pensar em ser ou não moderno, mas sim em
como e o que é ser moderno. A palavra modernidade vem do latim hadiernus,
que significa “dos nossos dias, recente, atual”. Está intimamente ligada a
concepção de futuro, do que está para vir a ser, quais serão as intenções e
ferramentas a serem utilizadas para a construção do futuro.
Pode-se pensar que o que é moderno exclui a tradição. No entanto, a
modernidade, a cada dia que passa, vem para dar atualidade à tradição e
mesclar o velho com o novo. Com tamanha velocidade de informações e
transformações, os costumes e crenças não têm tempo suficiente para serem
cristalizados. Com isso, novas ideias e novos conceitos ocupam o espaço dos
antigos. Uma "nova cultura", centrada nas tecnologias da informação, pode

2
provocar mudanças num nível macro (sistema social global), bem como num
nível micro (as organizações) e no ser humano, individualmente.
A sociedade, dita globalizada, pode ser caracterizada como a “época da
eletrônica”, na qual toda comunicação está pautada em um processo digital no
qual as mensagens, signos, símbolos, lugares e atividades são virtuais. A
diversidade está inserida na sociedade e toda a complexidade e diversidade
são resultado das ações do homem, bem como da história escrita por ele.
Os homens fazem parte da história, mas nem tudo é construído como
eles querem, pois estão vinculados aos processos de herança, unindo passado
e presente. A dialética da modernidade reflete um conjunto de ações humanas
que, agindo e reagindo ao mesmo tempo, constituem a sociedade moderna.
As relações sociais na contemporaneidade sofrem grande influência da
tecnologia, que, por sua vez, vêm modificando as estruturas, baseadas no
sistema capitalista, e as relações, que estão cada vez mais individualistas. As
relações estão cada vez mais fragilizadas e repensar as novas formas de se
relacionar faz parte de uma nova psicologia que se preocupa em atender a
novas demandas.
Segundo Tedesco,
Diferentemente do que ocorria no século XIX, o
individualismo atual envolve esferas mais amplas, relacionadas
especialmente ao estilo de vida. A nova forma de
individualismo dá ênfase sobretudo à auto-expressão, ao
respeito à liberdade interna, à expansão da personalidade. O
credo de nossa época é que cada pessoa é única, cada pessoa
é ou deveria ser livre, cada um de nós tem ou deveria ter o
direito de criar ou construir uma forma de vida para si, e de
fazê-lo por meio de uma escolha livre, aberta e sem restrições.
(TEDESCO, 2002, p 33).

As mudanças nas relações familiares, em sua composição, bem como no


seu funcionamento, sofreram grande influência de fenômenos não só no Brasil,
mas também em outras culturas, como a incorporação da mulher ao mercado
de trabalho, o que, consequentemente, fez com que a mulher adiasse a
realização de conquistas familiares como o casamento e a quantidade de
3
filhos. A individualização, característica dessa época, reflete-se nas escolhas
tanto do homem quanto da mulher que, antes de pensar em formar uma
família, devotarão tempo e esforços para uma formação profissional.
Como reflexo de uma sociedade cada vez mais individualizada, os índices
de divórcios nunca foram tão altos, aumentando, por sua vez, o número de
filhos que vivem sozinhos ou com apenas um dos genitores. Hoje em dia
instituições como escolas e creches acabam sendo responsabilizadas pela
educação devido à diminuição da dedicação de tempo dos pais em educar e
passar um tempo significativo com seus filhos.
Para Tedesco, esses fenômenos acabaram provocando mudanças
realmente significativas no papel socializador da família:
Para dizê-lo em poucas palavras, estamos assistindo a
um processo pelo qual os conteúdos da formação cultural
básica, da socialização primária, começam a ser transmitidos
com uma carga afetiva diferente da do passado, seja porque os
adultos significativos para a formação das novas gerações
tendem a diferenciar-se, seja porque o ingresso nas instituições
é cada vez mais precoce, seja porque num sentido mais geral e
profundo, os adultos perderam a segurança e a capacidade de
definir o que querem oferecer como modelo às novas
gerações. (TEDESCO, 2002, p. 34).

A família continua sendo uma instituição importante, uma vez que cumpre
o papel de informar e “treinar” o indivíduo para vivência em sociedade, bem
como a escola, que cumpre um segundo papel no desenvolvimento do cidadão.
Mas como estão as famílias hoje em dia? Qual o papel da escola?

4
Sociabilidade e sociedade: as relações na modernidade

Fonte: http://pt.slideshare.net/

A convivência em grupo é de fundamental importância para o


desenvolvimento do ser humano. Mesmo em constante evolução, por mais que
os seres humanos caminhem para um individualismo e até um egocentrismo,
achando-se autossuficientes, dependem da convivência em grupo para
sobreviver e se desenvolver como indivíduos. A formação do caráter depende
dessa convivência, em que regras e limites serão pautados a fim de que não se
invadam os direitos de cada indivíduo. A socialização permite que o ser
humano seja capacitado para a sociabilidade, que nada mais é do que a
capacidade para se relacionar a partir de regras estabelecidas em um
determinado grupo (a própria sociedade).
O conjunto de hábitos, costumes e regras é transmitido geralmente pelo
grupo ao qual se pertence ao grupo em que se nasceu, e esses valores serão
absorvidos com a ideia de que haja integração do novo membro ao grupo. A
participação da vida em sociedade constitui elemento importante para a
assimilação de regras e valores que conduzirão o indivíduo a ser mais ou
menos sociável.

5
O agrupamento em tribos ou gangues, que nada mais são do que grupos
de pessoas que têm interesses e afinidades comuns para um determinado
assunto, é um fenômeno antigo na sociedade. Hoje em dia, conforme a
evolução da sociedade e da tecnologia, as comunidades virtuais dão origem a
um novo tipo de sociabilidade. Sentir-se pertencente a um grupo é uma
necessidade vital para o ser humano, tanto é que para entrar nas comunidades
virtuais você precisa de um convite, e ao convidar outros “amigos”, você
precisa ser aceito por eles. A aceitação e a rejeição fazem parte desse
processo de sociabilidade.
Perrenoud (2000) destaca, ainda, que o processo de aprendizagem
prescinde da vivência grupal e, para que isso seja possível é primordial que se
garantam: a necessidade de pertencer ao grupo, ancoragem da identidade; a
socialização, aprendizagem de vida em grupo; e a importância das interações
na construção dos saberes e das relações.
A ideia de pensar em um bem comum, em um interesse pelo outro, faz da
socialização uma aspecto importante a ser preservado e estimulado, mesmo
nos dias atuais, em que a individualização toma lugar de características
importantes do ser humano como a empatia. Na Revolução Francesa, em
1789, os franceses lutavam por “Liberté, Egalité, Fraternité”, traduzindo,
“Liberdade, Igualdade, Fraternidade”, mas o que eles realmente queriam? De
que liberdade, igualdade e fraternidade estavam falando? Se levarmos em
consideração que as pessoas possuem necessidades diferentes, fica difícil
delimitar os espaços para a liberdade, igualdade e fraternidade sem sofrer
injustiças.
Ser aceito ou não e sofrer injustiças fazem parte do treino para vivência
em sociedade e, considerando que a sociedade atual apresenta um quadro de
inversão de valores, em que a sexualidade, a violência explícita e a capacidade
dos adultos de dirigirem o mundo, segundo Tedesco (2002) são segredos que
hoje em dia a telvisão tem revelado cada vez mais cedo para as crianças. Sem
os pais em casa para mediar a maneira pela qual essas informações chegam à
criança, a escola se faz importante em discutir assuntos que antes não eram de
sua alçada. Assim, a escola tem a difícil missão de despertar nos alunos um

6
senso crítico, pensando em uma sociedade plural, que seja tolerante às
diferenças e fraterna, pautada em princípios éticos, estéticos e morais.
Outro aspecto a ser considerado é a preferência de muitos jovens por
relacionar-se virtualmente do que na vida real. É mais fácil criar um perfil, seja
ele verdadeiro ou fictício, do que enfrentar as situações de aceitação ou
rejeição do dia-a-dia.

Fonte: http://sociedadedeinformacaoetecnologias.blogspot.com.br/

Segundo Tedesco, é inegável que a tecnologia da comunicação, base da


sociedade atual, provoque mudanças nos padrões de conduta do ser humano:
A acumulação de informação, a velocidade na
transmissão, a superação das limitações espaciais, a utilização
simultânea de múltiplos meios (imagem, som, texto) são entre
outros, os elementos que explicam a enorme fertilidade de
mudança que apresentam essas novas tecnologias. Sua
utilização obriga a modificar conceitos básicos como os de
tempo e espaço. (TEDESCO, 2006, p. 27)

A realidade acaba sendo repensada a partir dessas mudanças e uma


realidade virtual passa a ser considerada nas relações sociais. Por isso, faz-se
necessário, também, repensar uma organização familiar, bem como social. As

7
mudanças na família e na sociedade não deixam de ser uma demanda social
por adaptar-se e integrar as novidades advindas da revolução tecnológica.
Como o fenômeno é novo, muitas são as dúvidas em relação às novas formas
de se relacionar, porém a compreensão é de extrema importância segundo
Morin (2005, p 99): “a compreensão mútua entre os seres humanos é vital para
que as relações saiam de seu estado bárbaro de incompreensão. A antropo-
ética deve trabalhar para a humanização, a solidariedade, o respeito e a
tolerância às diferenças. "A ética da compreensão pede que se compreenda a
incompreensão".

Relações amorosas na atualidade

Fonte: http://mulher.uol.com.br/comportamento

As relações amorosas não ficaram isentas das transformações


decorrentes da influência da tecnologia na sociedade. As relações estão cada
vez mais superficiais e a modernidade promove esse conceito de contato
breve.
Em um século (do século XX para o século XXI), a humanidade evoluiu
mais do que em qualquer outra época de sua existência, por isso é importante
compreender a influência da tecnologia, tanto em ferramentas quanto em ritmo,
sobre as relações na sociedade. O homem faz uso da tecnologia no seu dia-a-
dia e cada vez mais é influenciado em seu processo evolutivo pela velocidade
de renovação que essas tecnologias adquirem. Quando se lança no Brasil um
8
novo modelo, ele já é considerado obsoleto em países desenvolvidos como
EUA e Japão.
Mas até que ponto o uso da tecnologia não nos permite enxergarmo-nos
como seres em desenvolvimento e evolução? Como ficam as relações a partir
de toda essa tecnologia? De início, todos os aparatos tecnológicos, como
telefone, televisão e computador, foram criados com uma função específica e
repensados a partir das mudanças na relação interacional entre homem e
tecnologia. O que vai definir a importância da tecnologia é o significado que
atribuímos a ela, explicando o porquê das relações sociais virem sendo cada
vez mais influenciadas pela internet, por exemplo. Telefones celulares, internet
e televisão digital são ferramentas que podem oferecer muitas possibilidades e
recursos, porém nos oferecem relações, cada vez mais, virtuais.
O encurtamento de distâncias que a internet possibilita, fazendo com que
nos comuniquemos com pessoas de todo o mundo, torna-se, muitas vezes, a
única forma de se relacionar. Hoje, o recado de parabéns no perfil do amigo
substitui, ou até “perdoa”, a não ida à comemoração presencial: “ao menos ele
me deixou um recado”. Não acessar o perfil na página de relacionamentos ou
esquecer o celular em casa nos faz sentir que falta alguma coisa. as atitudes
no ambiente virtual não superam as reação, comportamentos reais, que a cada
dia estão sendo substituídos por atitudes virtuais.
Até pouco tempo atrás, vivíamos (e muito bem) sem esses artifícios.
Apesar de toda a facilidade que eles nos trazem, definitivamente mudaram a
forma de entender as relações, principalmente as amorosas. As relações entre
marido e mulher, pais e filhos, patrões e empregados sofreram grande impacto
das tecnologias, modificando o funcionamento de acordo com a manipulação,
agora também virtual, do interesse do dominante. A globalização tem um efeito
massificante e invade nossas formas de pensar, agir e relacionar-se também.
Essa globalização incentiva, cada vez mais, um individualismo, no qual, antes
de se relacionar com o outro, o indivíduo deve desenvolver-se
profissionalmente, ter autonomia e ser bem sucedido.

9
Fonte: http://www.artigonal.com/

E onde fica o amor? Pode-se dizer que, ao invés do amor, a competição


por um “lugar ao sol” o substitui como novo propósito nas relações humanas,
gerando tamanha pressão que impede o indivíduo de apenas relacionar-se. Em
função dessa constante pressão, e do ritmo frenético do dia-a-dia nos grandes
centros urbanos, as doenças psicológicas crescem junto com a modernidade.
Trata-se da síndrome da pressa, uma doença que ataca pessoas que só
sabem agir sob pressão — real ou imaginária — para resolver tudo o mais
rápido possível.
O estresse foi considerado a “doença do século XX” e a depressão, a
doença do século XXI. A depressão tende a aumentar, pois, entre outros
fatores, se dá à medida em que as relações estão se tornando cada vez mais
virtuais e cada vez menos humanas, tornando-se um grande risco diante de
muitas possibilidades “prometidas”, seja em sites de relacionamentos, seja em
sites que fazem apologias ao suicídio (mas isso é um assunto que exigiria uma
discussão mais ampla).
O artigo intitulado “Relações amorosas na contemporaneidade e indícios
do colapso do amor romântico (solidão cibernética?)”, escrito por Dilcio Guedes
e Larissa Assunção, traz uma reflexão sobre as mudanças da concepção do
amor romântico como reflexo de mudanças na sociedade. Leiam-no para
complementar as informações do texto da semana.

Papel da psicologia
Tentar compreender de que tipo de psicologia essa nova sociedade
necessita é um desafio. Se considerarmos a tecnologia como algo
10
complementar à história do homem, torna-se necessário refletir sobre as
contribuições da tecnologia na evolução do ser humano, bem como descrever
ao longo do processo evolutivo como o homem se reconhece diante de tais
avanços.
Cabe refletirmos de que maneiras a psicologia pode intervir diante da
nova demanda das relações, cada vez mais breves e instáveis, em função do
significado atribuído às tecnologias e às relações. A significação do mundo faz
parte do desenvolvimento do ser humano, que tenta explicar tudo o que está à
sua volta, inclusive as relações e o meio no qual está inserido.
Acredito que a Psicologia tenha muito a contribuir no pensar sobre o
caminho que a sociedade, bem como as relações, estão seguindo e quais as
possíveis consequências. O futuro é incerto, porém, é nosso papel discutir e
refletir sobre essas e outras questões que tanto nos consume, uma vez que
com o avanço da internet, uma polêmica se cria em segundos.

11
Referências

MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 10 ed.


São Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNESCO, 2005.

PERRENOUD, Philippe. Dez novas competências para ensinar. Porto


Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.

TEDESCO, Juan Carlos. O novo pacto educativo: educação,


competitividade e cidadania na sociedade moderna. São Paulo: Editora Ática,
2002.

_________________ . Educar na sociedade do conhecimento. São Paulo:


Junqueira & Marins Editores, 2006.

12

Você também pode gostar