REDAÇÃO

Prof. Me. RIBAMAR OLIVEIRA

HOMO CIBERNETICUS telégrafo ainda hoje serve de base para as redes físicas de
dados, mesmo as de fibras ópticas, e que toda estrutura
E O NOVO ETHOS de telefonia
onia celular, comunicação por satélites, Wi-Fi, Wi
Por Alberto Cabral
Cabral. Bluetooth etc. continua usando ondas on de rádio.
Tenhamos em mente que são as combinações de ciências
entrelaçadas
das com diferentes inovações tecnológicas
tec anteriores
que viabilizam o surgimento da maioria
maiori das novas tecnologias
revolucionárias. Sem os avanços em áreas como eletro- eletro
magnetismo, metalurgia, química e tantas outras não seria
possível criar algo simples como um fio de cobre, componente
mais básico de toda invenção elétrica ou eletrônica, eletrôni
tecnologias
ogias estas que permeiam hoje praticamente todas
outras áreas, por meio da integração de informações,
controles e processos automatizados.
Combinações tecnológicas se tornaram a chave da atual
etapa que estamos vivenciando, alguns nomeando-a nomeando por
"antropoceno", focando no ponto de vista de que a civilização
A jovem cibercultura está imersa em valores humana seria o fator dominante das mudanças planetárias plane
conservadores ditados por uma sociedade depois da revolução industrial,
trial, outros chamando-a
chamando de "era da
parcialmente analógica. Para onde caminhamos informação", focando no elementomento predominantemente trans- trans
com essa combinarão? formador do modo de pensar, sucedendosu as eras nomeadas
como "atômica" e "espacial" segundo alguns especialistas.
Respostas pontuais para a maioria desses A denominação predominante
predominan para o período em que
questionamentos só deverão se apresentar no futuro, por vivemos também só poderá ser atribuída com melhor
meio do olhar observador e retrospectivo
trospectivo de historiadores propriedade no futuro, sob a lente da visitação histórica, h
talvez ainda por nascer. Ainda assim, tais reflexões nos mas por enquanto poderíamos chamar a
parecem merecedoras de atenção imediata. O ponderar a contemporaneidade também bém de "era cibernética", quando
respeito das possibilidades diante de nós poderá nos a humanidade estaria começando a incorporar elementos
munir, pelo menos,
nos, do repertório necessário para escolher de tecnologiagia não orgânica à vida cotidiana dè modo
como tentar contribuir para uma eventual conciliação, em contínuo, sem uma necessidadecessidade fisiológica preemptiva
pre
vez de sermos cúmplices do potencial
tencial cismático de alguns
al como a perda de uma parte do corpo cor (i.e. perna, dente,
desses conflitivos tópicos. olho etc.) que leva ao uso de uma prótese, ou um mal
A História nos mostra que inovações vações técnicas e funcionamento sistêmico que leve à necessidade de um
tecnológicas tendem
dem a promover transformações em implante (i.e. marca-passo,
passo, lente intraocular,
intraocu injetor de
praticamente todas as áreas da existência humana. Desde insulina etc.) ou do uso de adereços semipermanentes,
as inferidas mudanças atribuídas à descoberta
coberta do uso, e como óculos, muletas e similares. De modo diferenciado
eventualmente
ualmente do domínio, do fogo pelos nossos em relação a essas exemplares situações impositivas, im a
ancestrais pré-históricos, até as incipientes
cipientes tecnologias de cibernese que caracteriza riza a presente "era" ocorre predo- predo
telefonia móvel 5G e do WiFi6, passando por marcos minantemente por livre escolha, estimulada por, por
tecnocriativos, desde a invenção da roda até a onipresen
onipresença exemplo, comodidade,
modidade, curiosidade ou simples desejo,
dos smartphones, que colocam as inteligências
inteligênc artificiais entre outras razões nem sempre prementes.
(IAs) dos mais diversos graus e tipos em nossa vida, cada O exemplo mais onipresente de cibernese que
inovação teve seu campo de influência e muitas delas podemos observar var em andamento é o uso que a maioria
alcançaram escalas gigantescas de alcance revolucionário. das pessoas faz de seus smartfones e o modo como
esses aparelhos se tornaram
ornaram não apenas onipresentes,
O fogo, dominado
minado e domado, transformou a percepção da
mas integrados ao cotidiano de maneira quase orgânica orgâ
duração da vida, iluminou a noite, defendeu territórios,
em algumas situações, a despeito des de serem compostos
destruiu ameaças e propriedades, cozinhou alimentos,
inteiramente
mente de componentes sintéticos. E a relação é
transformou materiais, inspirou confiança e impôsim medo,
demasiado íntima: esses dispositivos estão alterando alteran a
promovendo tantas mudanças
danças que, sem ele, nosso mundo
maneira
ira como usamos nossa própria memória,
não seria reconhecível para nós. transformando a linguagem, mudando referências e
Inovações mais recentes e, aparentemente,
rentemente, menos incitando a revisão de valores e práticas em quase todos
basilares do que o domínio ígneo ou a criação da roda, aspectos de nossa vida. Tenhamos em perspectiva pers que
como a invenção do telégrafo
grafo no começo do século XIX e memória e linguagem são pilares fundamentais da for- for
do rádio na virada deste para o século culo XX, mudaram mação da cultura e da própria sociedade
so civilizada.
nossas percepções
ções de espaço e de tempo ao tornar possível Mas vamos por partes...
a comunicação instantâneanea a distância. Nossa maneira de Os telefones começaram a permear a vida cotidiana
pensar foi forçada a se atualizar ao testemunharmos na como grandes caixotes em paredes ou balcões das
prática algo tão simples quando as diferenças de fusos agências de telégrafo, depois em órgãos públicos e esta- esta
horários, conhecidas e entendidas
tendidas em termos matemáticos ções ferroviárias ou rodoviárias, eventualmente
em um momento muito anterior, mas impossíveis de serem aparecendo nas farmácias
mácias para então chegar à casa das
experienciadas
rienciadas antes dessas maravilhas da tecnologia pessoas, onde eram fixados à parede pare ou ocupavam um
serem concebidas. Vale mencionar que o paradigma do móvel próprio em um local nobre da residência. (...)
 REDAÇÃO
ÇÃO – Prof. Me. RIBAMAR OLIVEIRA
Ao longo dos anos, a estrutura da telefonia fixa vem
sendo, e deverá rá continuar a ser, substituída pela malha
de telefonia móvel - inicialmente
mente analógica, depois digital
- que passou a oferecer também a possibilidade de
combinar mensagens gens de texto e recados de voz di- di
gitalizados para os usuários, mesmo mo quando não
poderiam atender uma ligação convencional, possi- possi
bilitando a essas pessoas recuperar tais informações a
qualquer hora e em qualquer local com sinal de sua rede
telefônica.
A praticidade e o caráter individualista
dividualista desse sistema
mudaram a maneira como omo as pessoas se comunicavam até
então, transformando
formando o valor do tempo e alte
alterando o uso do
espaço. Além de o indivíduo poder escolher quando interagir
com mensagens de texto to ou voz, passou a ser possível
assumir papéis sociais diferentes daqueles espe
esperados no local
físico
co em que o indivíduo estivesse, ao escolher atender
ligações em qualquer lugar ou situação. Resolver
Resol assuntos
profissionais fora do ambiente de trabalho e tratar de coisas
particulares durante o expediente
pediente se tornaram possibilidades
a ser exploradas, tornando-se se parte da rotina de muitas
pessoas.
Desenvolvendo-se em paralelo lo às telecomunicações, a
tecnologia
logia da informação avançava a passos largos, com a
integração miniaturização progressiva dos circuitos
eletrônicos, o surgimento
ento dos microprocessadores, a redução
dos custos dos chips de silício e os avanços em metalurgia
ciências dos materiais. Microcomputadores
computadores foram inventados,
entraram na rotina das empresas depois dos lares, tornaram
tornaram-
se núcleos de entretenimento, estudo do e trabalho,
conectaram-se se uns aos outros por meio da internet. Vimos
então suas funções serem gradualmente imitadas e depois
transferidas para dispositivos móveis cada vez mais potentes
e com maior velocidade de acesso direto à rede mundial.
A mescla dos computadores pessoais com os telefones
móveis, ou celulares, passou por várias etapas até o
surgimento dos primeiros
meiros smartfones. Esses equipamentos
equipa
multiuso, desenvolvidos por empresas ávidas por conquistar
con
para si as maiores fatias possíveis de mercado,rcado, superaram
com rapidez a capacidade de meros ros telefones ou
computadores, e mesmo da simples combinação de ambos -
a exemplo dos netbooks, PCs ultraportáteis com conexão
nativa às redes de telefonia móvel que, consorte tantas
outras hibridações mais conservadoras,
onservadoras, falharam em seus
esforços. (...)
Entre essas funções, muitas das necessidades
cotidianas dos usuários passaram a ser abran abrangidas.
Tarefas como aquisição e reprodução de músicas, acesso
seguro
guro a serviços governamentais, consultas a acervosacer
bibliotecas, utilização de serviços bancários, compras de
produtos, entre tantas outras, passaram a ser feitas de
maneira
neira personalizada. Começando pela seleção de
aplicativos instalados
dos pelo usuário, a personalização é
complementada pelos elementoss de IA presentes na rede
mundial, que analisam de maneira contínua os
comportamentos de cada operador
dor do sistema,
reconhecendo padrões drões e facilitando o acesso às in- in
formações, produtos e serviços que mais pareçam
interessar ao perfil de cada um. (...)
Nesse contexto, a relação com informação muda não
apenas no método de acesso mas também com relação
ao valor de sua disponibilidade.
ponibilidade. Para aqueles que en en-
traram em contato com a internet depois de já
socialmente formados — e que foram rotulados por M Marc
Prensky [autor do livro Aprendizagem zagem baseada em jogos
digitais (2012), entre outros] como "imigrantes
grantes digitais" —,
essa tecnologia gia pode representar várias coisas:
oportunidades de negócio, entretenimento,
entrete curiosidades,
facilidades, dificuldades, distrações,
strações, desafios... mas não
como parte integral de seu modo de pensar, sendo sempre
um adendo, um adereço.
Já os "nativos digitais", aqueles que — também
segundo Prensky — já nasceram imersos em uma cultura
de tecnologias integradas com a internet e que tiveram
os dispositivos de tecnologia de informação
in incorporados
em sua experiência lúdica na infância, veem os
smartfones como parte de sua vida de maneira muito na-
tural; a utilização dos dispositivos lhes é tão natural como
beber água ou andar de um lado para outro. Se estes
dois últimos exemplos atendem respectivamente a sentir
sede e a precisar se deslocar de A para B, o uso do
smartfone é ainda da mais íntimo e complexo, pois não
atende apenas à necessidade de encontrar informações
ou de telefonar para alguém (ação esta, aliás, em
progressivo desuso pelas gerações atuais), mas também
ao desejo de ouvir música, de se entreter
en assistindo a
alguém
guém fazendo algo que lhe interesse em um dos
aplicativos de vídeo, de conversar
conver coletivamente com
diversas pessoas ao mesmo tempo, criando um senso
comunitário no mundo virtual, quer estejam os interlocu-
interlocu
tores sentados na mesma sala ou em pontos distantes
distante do
planeta.
Para esses jovens ciborgues, o valor do dispositivo
em si não é implicado em seu custo financeiro ou em sua
complexidade tecnológica,
gica, mas sim na sua capacidade de
proporcionar a experiência mais natural e orgânica
possível para realizar aquilo que é desejado, de
preferência de maneira não intrusiva.
in Do mesmo modo
como a maioria de nós (salvo os pesquisadores pesquisa
especializados) não costuma questionar rotineiramente
como nossos olhos funcionam, apenas olhamos, nem
questionamos qual o valor de nossos cabelos e unhas,
apenas cuidamos das unhas e penteamos
pen os cabelos,
esses jovens apenas usam os dispositivos como se
fossem parte deles mesmos. E isso caracteriza um
aspecto importante
portante de sua cibernese.
O valor da informação em si também vem sendo
revisto por essa nova geração. Se para os imigrantes
imigran
digitais parece imperativo que se detenha o máximo
possível de dados na própria memória ou armazenados
ar
em sua posse exclusiva, os nativos digitais defendem a
livre difusão da informação e focam seus talentos em
saber encontrar aquilo de que precisam, no momento
mo em
que precisam, utilizando preferencialmente um smartfone
como plataforma para acionar seus apps preferidos,
de exercitando sua cibernese com a internet. (...)
Quando o conflito geracional extrapola o aspecto social
e alcançaça o econômico, modos de vida são afetados e
surgem focos de resistência
tência conservadora bastante no- no
táveis, criando situações tensas e, por vezes, lamentáveis.
A intensidade das tensões geradas
ge nesse tipo de conflito
pode ser exemplificada pelos atritos bastante reais entre os
motoristas de táxi e os motoristas que usam aplicativos de
transporte,
te, situação ainda sem solução definitiva
de e que
persiste em muitos centros urbanos no planeta.
Por fim, observemos de perto as transformações que
os nativos digitais estão trazendo ao mundo, focando em
decodificar a nova éticaca que parece surgir desse insur-
insur
gente homo ciberneticus, sabendo que desfrutamos da
liberdade de escolher como faremos parte das próximas
"batalhas" da revolução cibernética, seja como protagonis-
protagonis
tas, como espectadores, ou como autoproclamadas vítimas
da reestruturação
estruturação tecnocultural que se desenrola em nossa
realidade.