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Sobre a crise de 1929 e a Grande Depressão -


esclarecendo causa e consequência
por Leandro Roque, sexta-feira, 16 de junho de 2017

Este Instituto é pródigo em artigos detalhados sobre a Grande Depressão (confira a lista completa ao
final deste artigo). Temos inclusive um livro extremamente detalhado a respeito.

No entanto, vários leitores sempre nos pediram para apresentarmos um artigo sucinto que
condensasse os principais aspectos do crash de 1929 e a subsequente Grande Depressão que teria sido
supostamente gerada por esse crash.

Aqui vai, portanto, um artigo bastante sucinto, porém completo, sobre o tema.

A depressão já esquecida

No ano de 1921, houve uma profunda depressão na economia americana. O desemprego saltou de 5
para quase 12%. A economia se contraiu em incríveis 17% e os preços desabaram mais de 10%.

O que fez o governo americano à época, liderado pelo presidente Warren G. Harding?

De um lado, ele permitiu que os salários caíssem livremente, de modo a acompanharem os preços em
queda. Isso fez com que os custos de produção das empresas rapidamente se estabilizassem. Harding,
ao contrário dos presidentes de hoje, em momento algum disse que a queda dos salários seria ruim
para a economia.

De outro, ele cortou profundamente os gastos do governo (em incríveis 50%), diminuiu o imposto de
renda para todas as classes sociais e, de quebra, ainda reduziu a dívida do governo americano em
33%.

Por sua vez, o Federal Reserve -- o Banco Central americano -- nenhuma iniciativa tomou para
contrabalançar a crise. Quando ele reduziu os juros de 6% para 5%, a depressão já havia acabado.

A liberdade de ajuste de preços e salários, em conjunto com a redução do fardo do estado sobre a
economia privada, fez com que aquela profunda depressão de 1921 estivesse já totalmente superada
em 1923.

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Hoje, são raros os livros de história que sequer a mencionam. É como se ela não houvesse existido. O
fato de o governo americano nada ter feito para contrabalançá-la -- e por isso mesmo ela ter sido
rapidamente solucionada pelo livre mercado -- certamente é algo que abala a crença dos
intervencionistas. Por isso mesmo sua diligência em escondê-la. Pode-se dizer que a depressão de
1921 foi a última na qual um governo não se intrometeu. Por isso mesmo, foi também a mais rápida.

Para quebrar esse silêncio, o economista James Grant, um dos mais respeitados economistas dos EUA
e do mundo, escreveu um livro inteiro dedicado a esse assunto.

A robusta recuperação da economia americana em 1923 deu início aquele período de prosperidade
que se tornou conhecido como "os loucos anos 20".

Mas aí a história foi diferente.

Os "loucos anos 20"

Durante o resto da década 1920, o Banco Central americano reverteu sua postura até então
conservadora e adotou uma política monetária muito mais expansionista: em 1920, os juros estavam
em 6% ao ano. Ao final de 1927, eles já haviam caído para 3,5%. Uma redução de 42%.

Essa política monetária expansionista foi a principal responsável por sustentar a febre especulativa
dos "loucos anos 20". A contínua criação de dinheiro pelo Federal Reserve permitia que os bancos
concedessem, de forma contínua e aparentemente sem limites, empréstimos fartos e baratos para
especuladores, os quais utilizavam esse dinheiro barato para comprar ações e, em seguida, revendê-
las a preços muito maiores. A expansão monetária feita pelo Fed garantia que os preços das ações
subissem continuamente. (Tudo isso está documentado em detalhes neste livro).

Vale ressaltar que é impossível preços de ativos subirem continuamente sem que esteja havendo uma
grande expansão monetária, que dê sustentação a esse processo de alta nos preços. Sem expansão
monetária é impossível preços subirem eternamente. E quem controla o processo de expansão
monetária de um país é o seu Banco Central.

E assim foram os loucos anos 1920.

Até que, em fevereiro de 1928, o Fed, assustado com toda aquela febre especulativa, reverteu sua
postura e, contrariamente às expectativas, começou a subir os juros. E o fez por três vezes seguidas.
Em um período de 5 meses, ele elevou os juros de 3,50% para 5%. Pode parecer pouco, mas esse
aumento de 43% em 5 meses bastou para interromper toda a farra especulativa.

Com o crédito mais caro, os especuladores começaram a ter dificuldades em auferir lucros em suas
ações. Pegar dinheiro emprestado para comprar ações (um processo conhecido como "alavancagem")
tornou-se 43% mais caro em 5 meses. Com menos empréstimos sendo tomados, a quantidade de
dinheiro na economia parou de aumentar. (De novo, todas essas estatísticas estão documentadas neste
livro). Com essa interrupção no crescimento da quantidade de dinheiro na economia, a própria
atividade especulativa perdeu a potência. Os preços das ações pararam de subir.

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Uma correção na bolsa de valores era inevitável.

O empurrão

E essa correção veio, mas de uma maneira inusitada.

No dia 29 de outubro de 1929, já com praticamente toda a atividade especulativa paralisada, a bolsa
de valores americana desabou 12% em um único dia. Esse fenômeno, que ficou conhecido como a
"terça-feira negra", é do conhecimento de todos. Mas o que não é muito bem conhecido é o que
realmente precipitou essa correção tão súbita e tão substantiva.

Sim, a política monetária do Fed -- que subitamente reverteu quase uma década de expansão
monetária e dinheiro barato -- criou as bases para que essa correção ocorresse, mas houve um outro
detalhe: a história já revelou que, naquele dia 29 de outubro, correu a notícia de que o então
presidente Herbert Hoover iria implantar a Tarifa Smoot-Hawley, que elevaria as tarifas de
importação de mais de 20 mil produtos a níveis jamais vistos na história. Alem de encarecer
substantivamente as importações, isso geraria uma guerra comercial e representaria um golpe fatal ao
livre comércio.

Imediatamente os preços das ações das empresas desabaram.

Sobre essa tarifa, Thomas Lamont, alto executivo do J.P. Morgan, disse que "Eu quase me prostrei de
joelhos perante Hoover para implorar que ele vetasse a asinina tarifa Smoot-Hawley". Já o presidente
da GM européia, Graeme K. Howard, enviou um telegrama a Washington alertando que a aprovação
da Smoot-Hawley levaria "à mais severa depressão jamais vivenciada pelo mundo".

Os mercados nunca precificam o presente; eles sempre miram o futuro. Os preços presentes são
apenas os preços futuros descontados. Uma legislação criada para reduzir o comércio global
inevitavelmente afetaria os mercados e os preços das ações das empresas. Com um comércio global
muito mais restringido, os lucros das empresas exportadoras e importadoras seriam severamente
afetados. A Bolsa de Valores apenas antecipou essa queda.

Uma queda na Bolsa gera uma depressão de 15 anos?

Até aqui a narrativa é bastante convencional. Quedas abruptas e inesperadas na Bolsa de Valores
estão longe de ser um fato atípico. Isso já havia acontecido em 1920. E voltaria a acontecer
novamente em 1987 -- uma queda, aliás, muito maior, de 22%.

Por que nenhuma dessas duas quedas gerou uma grande depressão? Por que apenas a queda de 1929
teve esse potencial?

Essa é a pergunta que tem de ser respondida.

Para isso, entra em cena Herbert Hoover.

Pesquisas históricas conduzidas sem paixões ideológicas e sem panfletagens políticas revelam o

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básico: Herbert Hoover sempre fora um político incessantemente intervencionista.

Hoover, um homem bem intencionado e de instintos apurados, havia sido um bem-sucedido


engenheiro de minas antes de entrar para o setor público. Por ser muito intelectualmente capacitado,
ele acreditava que praticamente tudo podia ser manipulado e controlado como se fosse um projeto de
engenharia. Essa sua filosofia foi trazida à tona durante o crash da bolsa em 1929.

Para começar, Hoover era abertamente contrário ao livre mercado. E por um motivo: ele sabia,
corretamente, que uma livre concorrência desregulamentada forçaria as empresas a reduzir seus
preços. Tendo sido ele próprio um homem da iniciativa privada, ele via uma queda de preços como
algo inerentemente ruim. Pior: ele acreditava que preços menores levavam a salários menores.

Em novembro de 1929, pouco depois da queda da bolsa, Hoover convocou uma reunião com os
presidentes das principais indústrias americanas. Henry Ford, da Ford Motor Company; Alfred Sloan,
da GM; e Pierre Dupont, da Dupont Chemicals, lideraram o grupo que se encontrou com Hoover.

O presidente, então, impôs algumas diretivas sem precedentes: 1) Apesar da economia fraca e abalada
pela queda da Bolsa e pelo fim da atividade especulativa (vale relembrar que especular na bolsa havia
se tornado uma febre entre os americanos de todas as classes durante quase toda a ultima década),
salários não deveriam em hipótese alguma ser reduzidos; 2) As demissões deveriam ser evitadas ao
máximo. Se a empresa realmente tivesse de reduzir mão-de-obra, que o fizesse por meio da redução
da carga horária -- ou seja, dois trabalhadores deveriam, cada um, trabalhar apenas meio expediente,
ou apenas dia sim, dia não.

Em troca da manutenção dos empregos e da não-redução dos salários, Hoover prometeu aos
industriais que ele convenceria trabalhadores e sindicatos a não fazerem greves e a não exigirem
benefícios e pagamentos adicionais.

E ele cumpriu a promessa. Os trabalhadores não fizeram greves. E as indústrias não reduziram os
salários. Com efeito, Henry Ford chegou a aumentar os salários como um gesto de solidariedade.

O engenheiro Hoover, ao que tudo indicava, havia conseguido engenheirar a solução perfeita. Só que
ela não funcionou.

Com o Fed tendo subido os juros e parado de expandir a oferta monetária, pessoas que haviam pedido
empréstimos para especular com ações não mais conseguiam revender suas ações a preços maiores e,
consequentemente, não mais conseguiam quitar suas dívidas. Elas começaram a dar calotes nos
bancos. Os bancos então começaram a restringir empréstimos e a pedir a quitação de empréstimos
pendentes. As pessoas se assustaram com a situação e correram para sacar seu dinheiro dos bancos.

Como os bancos praticam reservas fracionárias, isso gerou uma série de falências bancárias. Essas
falências bancárias geraram uma forte contração na oferta monetária -- consequentemente, uma
recessão.

Tal recessão não precisaria durar mais de um ano caso o governo americano permitisse ampla

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