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Universidade Federal do Maranhão

Centro de Ciências Humanas

Curso de Psicologia

Filosofia

Felipe Gustavo Costa Cruz

A República

São Luís – MA

27-09-2020
Livro Base: II

Aspecto Destacado: Concepções sobre o homem justo, o injusto e o extremamente injusto que
é visto como justo pela sociedade, sendo este dotado dos privilégios das duas classes.

Autor: Felipe Gustavo Costa Cruz

A discussão trabalhada no livro II de “A República” é focada no exercício da justiça pelos


homens. Nesse viés, as características de um homem justo e injusto são debatidas junto as
consequências sociais, econômicas e individuais que esses modos de vida poderiam ocasionar
em uma comunidade. Além disso, é defendido a ideia de que até o mais justo entre os homens
realizaria alguma infração se seu ato não pudesse ser descoberto – argumento este defendido
por meio do mito do Anel de Giges. Nesse âmbito, o injusto seria justo pela sociedade,
mantendo assim sua reputação de um bom homem e usufruindo dos privilégios da injustiça e
do parecer justo perante a pólis. Logo, por ter condições econômicas e sociais admiráveis,
estaria mais próximo de alcançar a felicidade. Porém, ao negar a utilização da injustiça, o
justo teria que trabalhar muito mais que o injusto para alcançar o mesmo patamar, sendo a
felicidade e o reconhecimento da pólis algo bem mais difícil de ser alcançado, como, por
exemplo na citação retirada do livro supracitado; “Adimanto: (...) se eu for justo sem o
parecer, não tirarei disso nenhum proveito, mas sim aborrecimentos e prejuízos evidentes; se
eu for injusto, mas gozando de uma reputação de justiça, dirão que levo uma vida divina”. No
conto, essas ideias são trabalhadas de forma nítida, porém, ao invés de humanos, animais
exercem esses papeis: há o justo que é injustiçado e o injusto que se sai ileso quanto aos
malefícios de seus atos. Destarte, as implicações provenientes do comportamento
extremamente injusto são aludidas ao final da trama, pois o receio de ser descoberto pela
pólis torna infeliz a vida do injusto.

A Granja do Velho Paulo.

Em um pequeno vilarejo no interior do Maranhão, sendo mais exato, no quintal do


velho Paulo, há uma comunidade de patos composta por oito integrantes, sendo Léle a mais
velha entre eles. Para Paulo, seus animais viviam felizes e sem desavenças, porém, os pobres
patos eram marginalizados pelas galinhas, cuja população era três vezes maior que a dos
patos. As galinhas, pomposas e sínicas por colocarem mais ovos que as patas, que eram
apenas três, desenvolveram a Ditadura do Milho, em que os patos só poderiam comer após
todas as galinhas se saciarem. Mas a história que quero-lhes contar, não focará nas galinhas
ou nos conflitos gerados pela superioridade dessas, e sim nos patos.
Em meados de março, a vizinha de Paulo, Jorgina, deu-lhe uma pata como
recompensa por capturar duas cobras que habitavam em seu quintal. Todavia, nas duas
semanas que se sucederam, boatos sobre o quão Jorgina era descuidada com sua propriedade
não saíram da boca dos vizinhos, o que a fez se arrepender de ter presenteado Paulo, um
grande fofoqueiro, com sua mais esplendida pata, Barbie. Destarte, após levar Barbie para seu
quintal, de imediato Paulo percebeu o quão sua plumagem era bonita, inteiramente preta e
com as pontas das asas avermelhadas, seus olhos tinham um tom âmbar magnífico e seu bico
era lustroso e pontiagudo, o que a diferenciava dos demais, que possuíam bicos retangulares.
Ao soltar Barbie, houve uma comoção no terreno, as galinhas observavam curiosas
com suas cabeças levemente inclinadas para a esquerda, já imaginando as atrocidades que
cometeriam contra a recém-chegada. Já os patos, ludibriados com a beleza com sua beleza,
correram ao seu encontro e a acolheram. Mas o que se passou posteriormente deixou às duas
comunidades estupefatas, pois Barbie, ainda no meio do alvoroço, botou um ovo. Em
qualquer outra granja seria normal uma pata colocar ovos, mas na granja do Velho Paulo isso
era raridade, por isso as galinhas se sentiam superiores. Graças aos pardais, amigos da velha
Léle, os boatos se espalharam rapidamente pela vizinhança. Havia agora uma pata que punha
ovos diariamente na granja de Paulo.
Léle, que possuía oito anos de vida — bem mais do que era esperado para sua
espécie, observava ao longo do dia, de dentro da bacia d’água, Barbie em cima do Morro de
Areia tomando banho de sol, enquanto ouvia as galinhas cochicharem sobre sua magia
obscura e de como ela drenava a energia do sol para dentro da escuridão de suas penas, já que
momentos após o pôr do anoitecer, Barbie colocava seus ovos. Porém, Lelé não dava atenção
aos comentários das galinhas. Por outro lado, as outras duas patas, Rafinha e Carlinha, que
punham um ovo a cada três ou quatro dias, gastavam boa parte do seu tempo aquecendo seus
ovos debaixo da tenda e criticando o descuido de Barbie com os dela, já que nem sequer os
aquecia durante o dia. De modo geral, Paulo não se importava com a venda dos ovos de pata,
visto que ele sonhava com o dia em que teria tantos patos quanto galinhas, e agora esse sonho
poderia se cumprir, afinal, tinha uma pata cheia de disposição.
Na manhã do 18° dia após a chegada de Barbie, surgiram as primeiras intrigas na
comunidade dos patos. Rafinha e Carlinha, ao contarem seus ovos, perceberam a ausência de
três, havendo apenas quatro em cada ninho. Às duas patas, indignadas com suas perdas,
iniciaram uma algazarra na granja, mas mesmo após uma busca severa, nenhum dos ovos foi
encontrado. Essa problemática voltou a se repetir no dia seguinte, dos oito ovos restantes,
sumiram mais três, porém, adverso do ocorrido no dia anterior, um dos ovos foi encontrado
com uma rachadura em sua parte superior e a casca estava próximo ao muro que dividia o
quintal de Paulo e o de Jorgina, coincidentemente, próximo ao Morro de Areia. As galinhas,
que não gostavam de Barbie, cogitaram a ideia de que a nova pata estava roubando os ovos de
suas companheiras, isso estaria relacionado a um de seus rituais obscuros de devoção a Granja
Industrial (local para onde os animais ruins iam após a morte), prova disso seria a rachadura
no ovo, que teria sido feita por seu bico pontiagudo. Contudo, Barbie, ciente de sua inocência,
apenas ignorou os comentários das ditadoras, mantendo sua rotina normalmente. Ademais, o
que as outras patas não sabiam é que, geralmente, o sol é fundamental para a reprodução e a
regulação do metabolismo das aves, o que justificava a recorrência em que ela punha seus
ovos. De qualquer forma, foi apenas durante a tarde em que ocorreu “A Batalha do Morro de
Areia”, pois assim ficou conhecido o evento, que o imbróglio em volta do sumiço dos ovos
fora resolvido.
Com receio de que quando os ovos das patas acabassem os seus seriam os
próximos, as galinhas se reuniram com os patos e patas, para lhes contar sua hipótese, mas foi
apenas com a chegada dos pardais que o alvoroço se iniciou. Energéticos e barulhentos, os
pardais disseram em uníssono: “Barbie, Barbie, sua aparência não engana, até a pobre Jorgina
se espanta, antes de sua expulsão; os ovos de minhas companheiras em pó ficarão”, nesse
momento, galinhas e patos, reunidos debaixo da tenda, não entenderam ao certo o que havia
sido dito pelos pardais, então eles falaram com mais clareza: “Barbie foi expulsa por comer os
ovos de suas companheiras”. Após o pronunciamento dos passarinhos, não se sabe de quem
foi o cacarejo, mas todos, galinhas e patos, sentiram o calor deixar seus corpos, uma das
galinhas chegou até a desmaiar por alguns segundos.
O que se sucedeu foi brutal e decisivo em relação à Ditadura do Milho. Galinhas e
patos, juntos, atacaram Barbie. No fim, ao contemplarem o seu feito, nenhum dos animais se
sentiu orgulhoso, os lindos olhos em tom de âmbar de Barbie foram substituídos por duas
crateras de sangue, haviam penas pretas espalhadas por todo o Morro de Areia. Barbie não era
mais aquela linda pata sob a luz do sol, ela se tornou um cadáver branco, gélido e
ensanguentado. Nesse meio tempo, Léle sentou-se no ninho de Barbie e começou a chocar
seus ovos. Ela os contou, eram 18, poderiam ser 19 se Barbie estivesse viva ao fim do dia,
mas foi morta no meio da tarde. De qualquer forma, estava no lucro, já que, devido à idade,
não conseguia mais pôr ovos. Ao olhar para o céu, Lelé vê seus amigos pardais, os agradece
por mentirem sobre a expulsão de Barbie e promete que lhes dará metade de sua ração por
duas semanas. Ao fim do dia, Léle vai até uma das extremidades do muro que divide os
quintais de Paulo e de Jorgina, há um buraco lá, ela o fecha, pois, não deseja que os filhotes
das cobras mortas por Paulo entrem novamente em seu território e comam os ovos que são
agora seus. Não podemos esquecer de Paulo, que enterrou o corpo de Barbie no próprio
Morro de Areia, já que ela adorava o local. Seus ovos, contudo, foram retirados de Léle no
mesmo dia e entregues para Jorgina.
No fim, devido a união das duas comunidades na batalha, as galinhas decidiram que
a Ditadura do Milho seria suspensa. Nossa vilã se saiu isenta quanto ao assassinato de Barbie,
afinal, Lelé estava na bacia d’água durante o ocorrido. Todavia, a velha pata viveu suas
últimas duas semanas de vida aterrorizada com o que poderia lhe acontecer se descobrissem a
perversidade de seus feitos, temia ter seus olhos e penas arrancados iguais os de Barbie, que
morrerá por sua causa. Em suma, posso afirmar que sua morte foi lenta e bastante agonizante.
Devido à idade, Paulo queria matá-la antes que a mesma morresse por causas naturais, porém,
por ser inexperiente, a machadada, que deveria ser certeira, não a degolou, sua cabeça
permaneceu grudada ao corpo por alguns tendões e assim ficou até sua morte. Há boatos de
que o corpo de Léle, quase sem cabeça, continuou se debatendo por 6 minutos e que isso
demonstrava que o seu espírito seria torturado na Granja Industrial. Fim.

Felipe Cruz, 16 de outubro de 2020.

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