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1. Introdução
A busca pela melhoria da educação básica é, sem dúvida, o princípio norteador das
ações de qualificação dos professores. A avaliação realizada pelo Sistema de Avaliação
Básica apontou a deficiência de qualidade da escolarização, servindo de base para uma
série de ações do Governo Federal. A implementação do Programa Pró-Licenciatura,
programa que tem como objetivo a criação de cursos de Graduação (Licenciaturas) na
modalidade a distância para formação e qualificação do professor que atua em sala de aula
na rede pública, sem nível superior (ou quando apresenta nível superior em uma área
diversa da que efetivamente atua), é uma ação voltada para a melhoria da Educação Básica.
Os indicadores educacionais relativos à formação de professores, que se encontram nas
salas de aula das escolas públicas no Brasil, sinalizam para a necessidade de se desenvolver
projetos de formação acadêmica para esse educador, de modo que haja mudanças na
qualidade da educação básica ofertada na rede pública de ensino.
O documento que apresenta as diretrizes conceituais e metodológicas do Programa
Pró-Licenciatura contém elementos que não se restringem somente aos aspectos técnicos da
formação docente. Observamos que vários elementos neste documento apresentam aspectos
estruturados na subjetividade, permeando comportamentos e atitudes docentes que não
seriam possíveis de contemplação em currículos ou conteúdos dissociados dos aspectos
culturais da subjetividade.
Embora a opção pela modalidade a distância seja justificada por aspectos
pragmáticos relacionados aos custos, localização geográfica e inclusão tecnológica, os
aspectos relacionados ao processo de mediação pedagógica através do uso maciço das
novas tecnologias de informação e comunicação (NTIC’s), podem ser usados como um
importante dispositivo na construção de novos paradigmas de formação e atuação dos
professores na Educação Básica. Afinal, no momento em que atingimos níveis bastante
elevados de desenvolvimento tecnológico, devemos capitalizá-los para a educação,
CARVALHO, Ana Beatriz. A Educação a Distância e as Novas Tecnologias na Formação de
Professores na Perspectiva dos Estudos Culturais. In: Colóquio Brasileiro Educação na
Sociedade Contemporânea, Campina Grande, 2008.
conhecimento, pois não basta definir apenas o que estudar, mas também como estudar. Está
relacionado com as estratégias e metodologias propostas para a disseminação da
informação e do conhecimento. Ou, em última análise, como transformar a quantidade de
informações acessíveis com o advento das novas tecnologias da informação e da
comunicação em conhecimento sistematizado, significativo e passível de utilização e de
reestruturações.
A cultura contemporânea é caracterizada por vários autores como uma transição da
modernidade para a pós-modernidade (HARVEY, 1998). A modernidade é o período de
afirmação do indivíduo e da consolidação de uma economia centrada na produção. A pós-
modernidade se caracteriza pela instabilidade conceitual com a passagem da produção
industrial para uma sociedade de serviços, a qual valoriza a heterogeneidade dos segmentos
de consumo e a personalização na relação com o consumidor.
A reflexão sobre o papel e as características da escola dentro deste novo mundo
híbrido, visto como um espaço em mudança nas novas configurações culturais, possibilita a
análise das subjetividades que permeiam e constroem a escola como instituição e as
perspectivas reais de quebra dos seus paradigmas. O foco da aprendizagem contextualizada
até recentemente estava voltado para as particularidades sociais, econômicas e culturais de
um grupo de alunos. Com a globalização este conceito de realidade foi expandido e os
conceitos de comunidade, lugar, espaço e tempo foram redimensionados não comportando
mais um conceito de identidade cultural estável. “Se nos estudos culturais a cultura é uma
arena, um campo de luta em que o significado é fixado e negociado, as escolas, sua
maquinaria, seus currículos e práticas são parte deste complexo” (COSTA, 2003, p.24).
Assim, é preciso investigar as relações de poder que permeiam esta arena, considerando a
produtividade e positividade do poder, sua capacidade de produzir subjetividades e
identidades.
Os estudos recorrentes sobre o desempenho dos alunos nas escolas públicas refletem
sempre os debates sobre a qualidade do ensino. Após a universalização da Educação
Básica, busca-se a melhoria de qualidade no ensino da escola pública e termos como
eficácia, eficiência, aprendizagem e até mesmo, produtividade, são encontrados com
facilidade nos documentos governamentais. Segundo Oliveira (2001),
A ênfase na formação dos conteúdos de sua área está explicitada apenas no primeiro
eixo citado. A formação teórica sólida e consistente está associada de forma direta com os
princípios políticos e éticos que, dependerão, exclusivamente, do ambiente cultural no qual
o professor estiver inserido. A proposta de formar um educador capaz de “propor e efetivar
as transformações político-pedagógicas na escola” é uma afirmação contundente de que as
estruturas organizacionais e pedagógicas das escolas hoje não são adequadas ao que parte
das políticas públicas considera aceitável para uma educação de qualidade.
Ao conectar em seus eixos a compreensão de uma escola (na visão do professor)
como um espaço social, sensível à história e à cultura locais com uma ação afirmativa de
inclusão digital através da viabilização da apropriação dos educados das tecnologias de
comunicação e informação, nos parece que a decisão em formar professores através da
modalidade a distância não é apenas uma opção fundamentada em questões operacionais
(tempo, limites geográficos e custos). Embora estes elementos façam parte da viabilidade
técnica para a implementação de cursos na modalidade a distância (não podemos
menosprezar os aspectos econômicos e jurídicos), a inserção desta metodologia com o forte
agregado tecnológico inerente ao seu desenvolvimento, pode, na verdade, ter sido a
premissa mais importante para a decisão estratégica de sua implementação.
As estratégias para a formação de professores (sempre enunciadas em caráter de
mudança, transformação ou construção), apresentam a estratégia do programa para alcançar
seus objetivos de transformação, através de dois itens intitulados “a escola que queremos e
o professor que queremos”. Ao propor que o professor deverá “viabilizar o
desenvolvimento de novas e mais complexas estruturas e relações com o mundo real e com
o conhecimento”; ou que “para um país justo e igualitário, não se pode reforçar a cultura
do individualismo e da ambição por status econômico, em detrimento dos princípios éticos
e de cidadania”, estão agregados elementos da subjetividade que são complexos para uma
posterior avaliação de sua aplicabilidade.
Esta concepção de aprendizagem implementa o conceito de acessibilidade, tratado
aqui como o obstáculo maior hoje na sociedade do conhecimento: um mundo dividido entre
os que possuem acesso à informação e os que estão excluídos deste processo. A questão é:
uma vez garantindo a acessibilidade aos professores, mudando completamente os
paradigmas de sua formação, conseguiremos transformar sua atuação no ambiente escolar?
Estaremos construindo uma nova forma não apenas de atuação do professor, mas sim de
CARVALHO, Ana Beatriz. A Educação a Distância e as Novas Tecnologias na Formação de
Professores na Perspectiva dos Estudos Culturais. In: Colóquio Brasileiro Educação na
Sociedade Contemporânea, Campina Grande, 2008.
gestão escolar? A opção por uma metodologia a distância garante as transformações nos
processos individuais?
Uma questão central que precisa ser tratada é se a opção governamental pela
modalidade a distância está inserida nas propostas de mudanças paradigmáticas, inclusive
considerando que o ensino presencial não é capaz de realizá-las a contento.
O conceito da Web.2.0 surge pela primeira vez em 2004, com o objetivo de criar uma
sustentabilidade teórica para as mudanças que estavam ocorrendo na rede mundial de
computadores. Em artigo publicado em 2005, O´Reilly inicia uma série de reflexões sobre
um fenômeno que estava acontecendo nos últimos anos, com o surgimento do Napster em
1999, o Blogger no mesmo ano e a criação da Wikipédia em 2001. Podemos afirmar que
com o surgimento destas ferramentas na rede, observamos uma mudança de paradigma que
deram origem ao conceito de escrita colaborativa. Apesar dos inúmeros questionamentos
acerca da terminologia, não resta dúvida que as características da web existente hoje são
muito diferentes da web que existia em 2000. Os espaços para a produção e publicação de
conteúdos, facilmente realizados pelos internautas, eram muito limitados até o surgimento
destas novas ferramentas, existindo de fato, uma necessidade de mudanças para que o
internauta superasse uma atuação passiva, transformando-se em um colaborador ativo do
ciberespaço. Lévy (2001) sintetiza esta necessidade ao afirmar que:
o uso crescente das tecnologias digitais e das redes de comunicação
interativa acompanha e amplifica uma profunda mutação na relação com
o saber. Ao prolongar determinadas capacidades cognitivas humanas
(memória, imaginação, percepção), as tecnologias intelectuais com
suporte digital redefinem seu alcance. E algumas vezes até mesmo sua
natureza. As novas possibilidades de criação coletiva distribuída,
aprendizagem cooperativa e colaboração em rede oferecidas pelo
ciberespaço colocam novamente em questão o funcionamento das
instituições e os modos habituais de divisão do trabalho, tanto na
empresa como nas escolas.(Lévy, 2001, p.98).
Segundo Cobo e Pardo (2007), a educação é uma das disciplinas mais beneficiadas
com o surgimento das novas tecnologias, especialmente as relacionadas com a Web 2.0.
Por esta razão é fundamental conhecer e aproveitar a bateria de novos dispositivos digitais
que abrem inexploradas potencialidades. Alguns autores já usam o termo “aprendizagem
2.0” e um dos principais benefícios destas novas aplicações da web, de uso livre que
simplificam tremendamente a cooperação entre pares, responde ao princípio de não
requerer do usuário uma alfabetização tecnológica avançada. Estas ferramentas estimulam a
experimentação, reflexão e geração de conhecimentos individuais e coletivos, favorecendo
a construção de um ciberespaço de intercriatividade que contribui para criar um espaço de
aprendizagem coletiva.
È interessante observar que as possibilidades de aprendizagem colaborativa com a
Web 2.0 surgem como uma resposta à tradicional estrutura estática da Internet com poucos
CARVALHO, Ana Beatriz. A Educação a Distância e as Novas Tecnologias na Formação de
Professores na Perspectiva dos Estudos Culturais. In: Colóquio Brasileiro Educação na
Sociedade Contemporânea, Campina Grande, 2008.
5. Referências
COBO, C.e PARDO, H. 2007. Planeta Web 2.0. Inteligencia Colectiva o Medios Fast Fo-
od. Grup de Recerca d'Interaccions Digitals,Universitat de Vic.Flacso México. Barcelona / México
DF, 2007.
SILVA, T.(org.) O que é, Afinal, Estudos Culturais? Belo Horizonte: Autêntica, 2000.