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CARVALHO, Ana Beatriz.

O Curso de Licenciatura em Geografia no Âmbito do Pró-Licenciatura e a Mudança de


Paradigma na Formação dos Professores. In: VII Encontro Nacional da Anpege – Espacialidades
Contemporâneas, o Brasil, a América Latina e o Mundo, 2007, Niterói.

O CURSO DE LICENCIATURA EM GEOGRAFIA A DISTÂNCIA NO ÂMBITO


DO PRÓ-LICENCIATURA E A MUDANÇA DE PARADIGMA NA FORMAÇÃO
DOS PROFESSORES

Ana Beatriz Gomes Carvalho


Universidade Estadual da Paraíba
anabeatrizuepb@gmail.com

1. Introdução
Este trabalho é resultado de uma pesquisa mais ampla, desenvolvida na
Universidade Estadual da Paraíba no período de agosto de 2006 a Maio de 2007, com o
objetivo de analisar o impacto das políticas públicas em Educação a Distância na formação
de professores da rede pública do Estado, especificamente em municípios distantes dos
principais eixos econômicos com maior acessibilidade ao Ensino Superior. A criação e
implementação de um curso de Licenciatura em Geografia, na modalidade a distância,
provocam mudanças na estrutura da formação do professor que vivencia em seu processo
de formação o impacto de conceitos como globalização, flexibilidade tempo/espaço,
construção de rede de informações, entre outros processos.
Vygotsky (1991) afirma que a aprendizagem se realiza sempre em um contexto de
interação, através da internalização de instrumentos e signos levando a uma apropriação do
conhecimento. Esse processo promove o desenvolvimento e a aprendizagem precede o
desenvolvimento. Ao compreender desta forma as relações entre aprendizagem e
desenvolvimento Vygotsky confere uma grande importância à escola (lugar da
aprendizagem e da produção de conceitos científicos); ao professor (mediador desta
aprendizagem); às relações interpessoais (através das quais este processo se completa). A
aprendizagem é um processo de construção compartilhada, uma construção social. Assim, a
alternativa que nos parece válida para o nosso objeto de estudo é uma perspectiva sócio-
histórica para a prática de nossa pesquisa que foi desenvolvida em dois eixos: a análise da
construção e implementação do projeto político-pedagógico do Curso de Geografia na
modalidade a distância desenvolvido pela Universidade Estadual da Paraíba e a
Universidade Federal do Rio Grande do Norte no âmbito do Pró-Licenciatura. O outro eixo
está centrado na prática e na aprendizagem do professor, entendido agora como sujeito e
principal agente com a possibilidade de uma reflexão que parte do que o professor faz, para
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uma reconstrução do que pode ser feito, confrontando-o com o seu contexto social e
político.
2. Referencial Teórico
O sistema de organização da EAD é espelhado na organização do modelo fordista e
conseqüentemente sofre o impacto das transformações ocorridas nele, incorporando sua
reestruturação muito mais rapidamente de que outros segmentos da educação (muito mais
complexos, rígidos e resistentes as mudanças).
Belloni (2003) ressalta que os modelos industriais de produção já penetraram em
todas as esferas sociais e o setor educacional não é uma exceção. A idéia é que com o
avanço tecnológico e as transformações no processo de trabalho, a tendência em longo
prazo é que a educação como um todo; incluindo EAD e o ensino convencional, vá se
transformando num complexo organismo de educação aberta. Mas que transformações
seriam essas neste modelo de acumulação?
O fato de existir articulação sincronizada com a sociedade é um dos elementos
chaves que contribuiu para a solidez do regime fordista durante todos estes anos. Nesse
regime, todos os segmentos sociais estavam vinculados à base, e muitas vezes o regime
controlava as insatisfações de um determinado grupo, cedendo em um ponto menos
importante a fim de que o modelo continuasse funcionando. Embora não haja uma
harmonia no funcionamento, a existência de um equilíbrio é fundamental, mesmo que o
regime seja sacudido por algumas crises periodicamente.
A idéia de progresso está profundamente arraigada ao modelo fordista: o progresso
da técnica (que permite aumento de produtividade), o progresso da melhoria de vida (e
conseqüente aumento do consumo) e o progresso do Estado, que cada vez mais deveria
desenvolver sua capacidade de prover e garantir o pleno-emprego e o aumento do consumo.
A “quebra” deste modelo aconteceu pela ocorrência de diversos fatores simultâneos. A
baixa produtividade, a revolta dos trabalhadores em relação à alienação, a
internacionalização dos mercados, o surgimento de uma nova forma de produção mais
eficiente (o modelo japonês). Esses foram fatores determinantes que comprometeram a
vigência do modelo.
A mudança no padrão de acumulação está estreitamente vinculada não apenas a uma
mudança no setor produtivo, mas em mudanças na própria sociedade e em todos os
elementos a ela ligados. Surge nesse momento a expressão flexibilidade que parece resumir
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o conceito essencial desse novo paradigma de acumulação. A flexibilidade está relacionada
com as alternativas encontradas pelas firmas para a superação dos problemas que a rigidez
do fordismo não conseguiu resolver. É a flexibilidade na versatilidade dos produtos
fabricados, em sua quantidade, em seus estoques, nos projetos, etc. Trabalha-se com
estoques menores, produtos segmentados e diferenciados, o que faz com que a qualidade e
a versatilidade desses produtos sejam primordiais.
A introdução das novas tecnologias pode ser caracterizada pela revolução
tecnológica com novos produtos que “redefinem o próprio significado de automação”
(Lipietz, 1990). A conceituação desse novo paradigma tecnológico faz-se necessária para
entendimento do que realmente mudou com a introdução dessas tecnologias no processo de
produção e desenvolvimento do trabalho. A introdução das inovações tecnológicas
transforma o processo de trabalho, tornando-o incompatível com o fordismo. O taylorismo
separou o desenvolvimento do trabalho intelectual do manual, mas como se operariam
esses métodos quando são introduzidas máquinas sofisticadas para serem operadas por
trabalhadores desqualificados? Obviamente, a inserção das novas tecnologias tem de ser
acompanhada de um mínimo de capacitação do empregado que será o usuário do sistema.
Trata-se de juntar o que o taylorismo separou, ou seja, os aspectos manuais e intelectuais do
trabalho (Leborgne e Lipietz, 1990). A única alternativa viável para permitir esta
reunificação seria uma reeducação da força de trabalho.
As novas tecnologias não são simplesmente substituidoras da força de trabalho. Se
assim o fossem, não haveria muitas dificuldades na análise desse processo. Para Castells
(1999), a designação de alta tecnologia não se refere a uma indústria, a uma atividade ou a
um invento. É preciso entender que é um processo, uma forma específica de produzir, a
partir da base fundamental, que é a informação. As inovações traduzidas em produtos de
ponta de microeletrônica processam as informações muito mais velozmente, reduzindo o
custo de transmissão e permitindo descentralização e personalização no modo de trabalho e
produção.

3. As Políticas Públicas em Educação a Distância


As inovações tecnológicas provocaram um impacto sem precedentes em nossa
sociedade na segunda metade do século XX. Chamamos a sociedade em que vivemos hoje
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de sociedade de informação, conceito que define bem a existência de fluxos tão complexos
de idéias, produtos, dinheiro, pessoas, que estabeleceu uma nova forma de organização
social. O fato é que verificamos claramente as transformações na organização do trabalho,
na produção, nos mecanismos de relacionamento social, no acesso à informação. O
fenômeno da globalização provocou mudanças profundas nas relações econômicas e sociais
nas mais distantes localidades do mundo, provocando um curioso paradoxo entre o global e
local, constituindo-se uma disputa entre a influência exercida pelo mundo globalizado
através da mídia e da nova ordem econômica e o local, com sua expressão máxima na
historicidade e importância do visto e experimentado para os indivíduos.
Segundo Oliveira (2001), os debates sobre educação e desenvolvimento travados na
década de 90 pautaram-se pela exigência em responder ao padrão de qualificação
emergente no contexto de reestruturação produtiva e globalização da economia. Neste
momento, tornou-se urgente pensar em alternativas para os problemas estruturais da
educação brasileira, sobretudo na reforma dos sistemas públicos de ensino. A preocupação
central, contudo, não estava limitada à formação da força de trabalho para lidar com as
inovações tecnológicas e organizacionais, incluiu também questões políticas como
financiamento, controle e gestão da educação pública.
Provavelmente um dos maiores entraves ao processo de adaptação do sistema
público de educação ao novo padrão de acumulação e produção esteja vinculado aos
processos lentos de mudança dos paradigmas para a construção efetiva de um novo modelo
de educação. O Brasil assumiu o compromisso com outros nove países em 1990 para
garantir a melhoria e universalização da educação básica, e para tanto, uma série de
medidas foram tomadas neste período.
Percebe-se claramente a preocupação não apenas com a duração do período de
escolarização como também com a qualidade. Nesse sentido, a universalização precisa ser
acompanhada de um aproveitamento efetivo do que é oferecido pela escola. Trata-se de
colocar a escola pública (que apresenta estrutura e práticas do século XIX), em um contexto
de inovação tecnológica e flexibilidade de uma sociedade de informação no mundo
globalizado.
Dentro desta perspectiva, o Governo Federal implementou uma ação que
pretendia articular vários setores da esfera federal, os diferentes níveis de
esfera pública (Estados e Municípios), e as universidades públicas na
criação e implementação de um programa de formação de docentes na
modalidade a distância. O programa Pró-Licenciatura tem como objetivo
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a criação de cursos de Graduação (Licenciaturas) na modalidade a
distância para formação e qualificação do professor que atua em sala de
aula na rede pública, sem nível superior (ou quando apresenta nível
superior em uma área diversa da que efetivamente atua). Esta distorção
existente nos quadros da Educação Básica pública ocorre principalmente
em localidades distantes dos grandes centros. Segundo documento do
MEC: Trata-se de um Programa de formação inicial voltado para
professores que atuam nos sistemas públicos de ensino, nos anos/séries
finais do Ensino Fundamental e/ou no Ensino Médio e não têm habilitação
legal para o exercício da função (licenciatura). O Pró-Licenciatura -
Programa de Formação Inicial para Professores dos Ensinos Fundamental
e Médio se insere no esforço pela melhoria da qualidade do ensino na
Educação Básica realizado pelo Governo Federal por meio do Ministério
da Educação (MEC), com a coordenação das Secretarias de Educação
Básica (SEB) e de Educação a Distância (SEED) e com o apoio e
participação das Secretarias de Educação Especial (SEESP) e Educação
Superior (SESu). (SEED/MEC, 2005).

A implementação destes cursos através da parceria entre os Consórcios Regionais e


o MEC, coordenado por diversas secretarias, já aponta por uma diferenciação na própria
concepção da construção das licenciaturas. Ao invés de convocar o Banco Mundial para
definir as políticas públicas que são mais adequadas ao sistema educacional brasileiro,
agregaram-se as principais universidades públicas, respeitando suas diferenças regionais,
para a construção de cursos de licenciatura na modalidade a distância.
Esta concepção de aprendizagem implementa o conceito de acessibilidade, tratado
aqui como o obstáculo maior hoje na sociedade do conhecimento: um mundo dividido entre
os que possuem acesso à informação e os que estão excluídos deste processo. A questão é:
uma vez garantindo a acessibilidade aos professores, mudando completamente os
paradigmas de sua formação, conseguiremos transformar sua atuação no ambiente escolar?
Estaremos construindo uma nova forma não apenas de atuação do professor, mas sim de
gestão escolar? A opção por uma metodologia a distância garante as transformações nos
paradigmas individuais?
É de extrema importância para a compreensão da prática de EAD como uma
modalidade de ensino, entender as mudanças ocorridas na produção que são um reflexo da
transformação no padrão de acumulação econômica. Vários autores já escreveram sobre a
relação intrínseca entre o padrão de acumulação vigente e as práticas de EAD. Segundo
Belloni (2003), este debate é crucial já que estes modelos têm influenciado não apenas a
elaboração dos modelos teóricos, mas as próprias políticas e práticas de EAD, no que diz
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respeito tanto às estratégias desenvolvidas como a organização do trabalho acadêmico e de
produção de materiais pedagógicos.
O próprio surgimento da EAD teve suas bases consolidadas no modelo fordista de
produção que buscava produzir em larga escala para atender o consumo de massa. No
campo da educação, essa lógica vai evidenciar-se na expansão da oferta de educação,
especificamente na universalização do ensino fundamental e médio e nas estratégias
implementadas, fazendo parte deste quadro o surgimento de uma nova disciplina: a
tecnologia educacional. (EVANS E NATION, 1992).
Ainda segundo Oliveira (2001), nos anos 1990 procurou-se perceber em que medida
as reformas educacionais que tiveram como objetivo garantir a oferta de educação básica
para todos não estaria respondendo às exigências de adequação das condições gerais de
produção impostas pelo atual processo de reestruturação capitalista. Embora se procure
estabelecer uma conexão entre o as necessidades de mudança na educação e as mudanças
no paradigma de produção globalizada, traduzida pela empregabilidade, nos parece que a
política de Estado mais pertinente seria a busca de uma educação para a cidadania. Para
realizar uma educação plena neste aspecto, precisamos de professores autônomos, críticos e
com uma percepção clara da constituição da sociedade em que vivemos hoje.
A busca pela melhoria da educação básica é, sem dúvida, o princípio norteador das
ações de qualificação dos professores. A avaliação realizada pelo Sistema de Avaliação
Básica apontou a deficiência de qualidade da escolarização, servindo de base para uma
série de ações do Governo Federal. A implementação de programas de formação de
professoras na modalidade a distância, objeto do nosso estudo, é uma delas e caracteriza-se
por uma ação que reuniu elementos diversos em sua concepção, formando uma verdadeira
rede de colaboração entre diversas instituições, dos mais diferentes níveis, enriquecendo a
construção de um programa de formação de professores da rede pública.

4. A Proposta do Curso de Licenciatura em Geografia a Distância


O projeto pedagógico para o curso de Licenciatura em Geografia a distância foi
elaborado em parceria entre a UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte) e a
UEPB (Universidade Estadual da Paraíba), para atuar nos dois estados. A justificativa para
a implementação do curso de Geografia foi estruturada nos dados sobre a situação da
formação dos professores em exercício. O público-alvo do curso está focado nos
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professores em exercício nas redes públicas de ensino nos anos/ séries finais do Ensino
Fundamental e/ou no Ensino Médio sem licenciatura na disciplina em que estejam
exercendo a docência, classificados em processo seletivo específico. O professor deverá
estar trabalhando há pelo menos um ano na função docente em rede pública. O acesso dos
professores em serviço à formação superior oportuniza a reflexão sistemática sobre a
produção do conhecimento em Geografia, tanto quanto sobre as competências e habilidades
indispensáveis à formação docente nessa área.
Os indicadores educacionais relativos à formação de professores, que se encontram
nas salas de aula das escolas públicas no Brasil, sinalizam para as disparidades de formação
em nível regional dos professores em exercício na rede pública nas séries finais do Ensino
Fundamental e Médio; como também para a necessidade de se desenvolver projetos de
formação acadêmica para esse educador, de modo que haja mudanças na qualidade da
educação básica ofertada na rede pública de ensino.
Os dados apresentam a seguinte configuração: de um total de 87.770 professores do
ensino fundamental, 44,07% ainda não possuem formação superior. No que diz respeito ao
ensino médio, de um contingente de 22.257 docentes ainda tem-se 24,14% sem a referida
formação. A carência de professores licenciados em áreas específicas é um dado por demais
conhecido e comprovado na região nordeste do Brasil. Segundo dados do INEP, baseado no
Censo Escolar de 2003, ainda é possível encontrar professores lecionando no ensino médio
e dispondo apenas de formação no nível fundamental.
A carência de professores licenciados em áreas específicas é um dado por demais
conhecido e comprovado na região nordeste do Brasil. Segundo dados do INEP, baseados
no Censo Escolar de 2003, ainda é possível encontrar professores lecionando no ensino
médio e dispondo apenas de formação no nível fundamental. Na região nordeste oriental, o
estado do Rio Grande do Norte tem uma população de quase 3 milhões de habitantes, sendo
que destes, mais de 2.700.000 estão no meio urbano, logo, potencialmente com acesso a
espaços escolares. Dos 46.959 docentes, 37.142 estão em escolas públicas, estaduais ou
municipais (dados da SEC/RN). Segundo dados do INEP, baseados no Censo Escolar de
2002, o estado possui cerca de 9.000 professores com formação superior, mas sem
licenciatura, lecionando no ensino médio e/ou nas últimas séries do ensino fundamental.
Possui, ainda, quase 5.000 professores lecionando nessas mesmas séries, sem nenhuma
formação superior, sendo que destes, 42 possuem apenas a formação fundamental. Outro
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aspecto preocupante é a atuação de professores sem a formação específica na área. Apesar
de graduados, os professores que estão em salas de aulas lecionando essas matérias
possuem formação bastante diversa.No Estado da Paraíba, a questão é mais séria. Dos
professores que atuam nos cursos de Geografia, 292 não têm qualquer curso de licenciatura.
A Geografia em sua trajetória como saber científico problematiza a relação
natureza/sociedade para compreender a dimensão espacial, caracterizando-se por realizar
interfaces com diversas áreas do conhecimento. Hoje, essa característica demarca uma
condição especial. Diante de um mundo em constantes transformações, a busca por saberes
mais amplos e integrados é uma exigência para a formação de um profissional capaz de
atuar nesse contexto. Se a Geografia tem passado por avanços significativos, tanto nas
condições de representação do espaço quanto no desenvolvimento de pesquisa básica, e
mesmo em nível de pesquisa aplicada, as questões sobre o que ensinar, como ensinar, para
que ensinar, continua sendo a referência para a estruturação de uma ação pedagógica capaz
de desenvolver competências e habilidades, formando cidadãos para enfrentar e resolver
problemas durante toda a vida.
Nenhum conhecimento tem sentido separado do contexto que o produziu. Portanto,
o Curso de Geografia na modalidade EaD leva em consideração em sua proposta
pedagógica, o contexto social, econômico, político, cultural e ambiental, tanto em nível
global quanto local. O contexto geral aponta para um universo cortado por mudanças
tecnológicas e informacionais, impondo transformações significativas na produção e
compreensão do espaço, o que aprofunda a complexidade das relações entre local e global.
O redimensionamento das práticas cotidianas entre as pessoas, os lugares, as regiões impõe
à Geografia repensar conceitos, teorias e metodologias na leitura do espaço, como uma
dimensão que produz e é produzida na relação natureza/sociedade.
Para alicerçar uma formação profissional mais ampliada e complexa, é necessário
identificar, explicar, reconhecer, articular, interligar, compreender e comparar os
fenômenos espaciais, ancorados em diálogos abertos com os variados domínios do saber. É
importante construir e consolidar reflexões e práticas na direção da interdisciplinaridade.
Devemos considerar, nessa perspectiva, que para além do domínio dos conteúdos da área, é
necessário que o professor tenha uma visão ampla dos problemas e do lugar em que está
inserido.
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A formação em Geografia deve primar pela concepção de espaço como a
imbricação entre a natureza e a humanidade que ao se enraizar no solo define feições,
simultaneamente, singulares e universais. Assim, veicula-se o compromisso ético e
epistemológico para compreender a Terra como um grande organismo complexo, que ao
apresentar formas variadas, exige do sujeito cognoscente a necessidade de ampliar as lentes
de interpretação e compreensão do espaço religando saberes múltiplos e diferenciados.
A Licenciatura em Geografia na modalidade EaD se propõe a formar professores
para atuar no Ensino Fundamental e Médio, preferencialmente, para aqueles profissionais
que atuam na rede pública de ensino sem a formação exigida. Essa formação requer o
contato com equipamentos, idéias, conteúdos, metodologias que permitam a leitura e
representação do espaço, de forma abrangente. Essa condição qualifica o profissional com
dispositivos científicos e técnicos para interferir ética e criticamente, construindo um
conhecimento que leva em consideração a preservação e a transformação da vida
planetária, respeitando a diversidade sócio-espacial e ambiental existente.

5. As Categorias Tempo-Espaço e a Aprendizagem na Educação a Distância


É possível afirmar que a criação dos cursos de graduação em diversas áreas permite
um processo de inclusão de indivíduos que não teriam outra possibilidade de realizar um
curso em nível superior. A flexibilidade dos horários, a não obrigatoriedade da freqüência
diária, a utilização do computador como ferramenta, entre outros elementos, amplia
consideravelmente o leque de pessoas que podem incluir-se em um processo de formação
institucional. A compressão da distância e a ampliação do tempo de estudos provocam um
movimento que é uma característica interessante na Educação a Distância. A distância
física é encurtada pelas tecnologias de comunicação que conectam professores, alunos e
tutores fisicamente distantes, A ampliação do tempo de estudo está diretamente relacionada
com a “quebra” da temporalidade, já que o aluno pode acessar o material em diversos
momentos, inclusive de madrugada e aos domingos. As orientações e aulas estão no ar
ininterruptamente e cabe ao aluno aproveitar o momento mais adequado para interagir com
o material.
A questão mais inquietante é que a maior vantagem da Educação a Distância é
também a razão do insucesso dos alunos. A flexibilidade propiciada pela metodologia, que
é o principal atrativo para os alunos que almejam estudar em seu tempo livre ou não ter a
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obrigação de freqüentar a sala de aula todos os dias, acaba por tornar-se o maior obstáculo
no desenvolvimento da aprendizagem. A compressão espaço-tempo ou a redefinição destas
duas categorias tão essenciais ao ser humano provoca uma dificuldade em lidar com o
tempo (que sempre parece mais longo do que é de fato) e com as distâncias (a não
exigência presencial provoca o isolamento e sensação de abandono no aluno). Harvey
(1989) já sinalizava para o impacto das mudanças destas duas categorias em nossas vidas
quando afirmava que “ compressão o tempo-espaço sempre cobra o seu preço da nossa
capacidade de lidar com as realidades que se revelam à nossa volta”. (HARVEY, 1989 p.275).
Podemos considerar a evasão como o maior problema na Educação a Distância,
independente do segmento ou tipo de curso implementado. Os percentuais também não se
alteram diante da diversidade de mídias utilizadas, e vários elementos podem explicar as
causas da evasão, variando desde a falta de condições financeiras até a dificuldade de
construção da autonomia no processo de aprendizagem. A diversidade de fatores que
contribuem para a evasão provoca uma certa imobilidade nos gestores da Educação a
Distância que não conseguem reunir elementos suficientes para reverter o quadro de evasão
em seus cursos.
O aluno busca na flexibilidade da Educação a Distância encontrar uma solução
imediata para conciliar seu trabalho e demais afazeres com o estudo. Acredita que realizar
um curso na modalidade a distância será mais fácil do que no ensino presencial regular e
imagina que a tecnologia será um importante aliado no desenvolvimento de sua
aprendizagem. O maior problema neste momento é que, independente das expectativas
criadas por este aluno, sua história escolar é dentro de uma escola tradicional, com todos os
elementos característicos de um padrão fordista de produção, onde a ênfase estava centrada
nos processos mecânicos de memorização, repetição e padronização. Não existe no
histórico deste aluno incentivo algum para a construção do conhecimento crítico e
autônomo. Ao se deparar com a responsabilidade de sua própria aprendizagem, que inclui
gerenciar a quantidade de tempo destinada aos estudos, a realização das atividades e o tom
das relações com os tutores/professores, invariavelmente o aluno leva algum tempo
confuso, com muitas dificuldades no processo de adaptação.
Esta angústia provocada pelos mecanismos internos de adaptação poderia ser
minimizada com a realização de transição do aluno para um processo de aprendizagem
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novo, disponibilizando elementos essenciais para a (re)estruturação dos processos
individuais de sistematização do conhecimento e gerenciamento da aprendizagem.

6. A Mudança de Paradigma na Formação dos Professores


No momento em que atingimos níveis bastante elevados de desenvolvimento
tecnológico, devemos capitalizá-los para a educação, melhorando o perfil acima
apresentado no que tange à formação dos educadores, e conseqüentemente, contribuindo
para o desenvolvimento econômico, social e cultural do país. A utilização de tecnologias da
informação pode ser aliada no processo de reversão do quadro existente, sendo a
modalidade a distância um instrumento que possivelmente é capaz de viabilizar essa
reversão.
No caso específico da Paraíba, são ofertados cursos na modalidade a distância em
diversas licenciaturas, onde 85% dos alunos são oriundos de municípios do interior do
Estado. Deste universo de alunos apenas 9% não estão exercendo atividades docentes na
Educação Básica. Os demais exercem uma ou mais atividades relacionadas com educação.
Isso significa, concretamente, que estes professores continuam exercendo suas atividades
em sala de aula, freqüentando a comunidade onde estão inseridos, deslocando-se para
realizar suas atividades acadêmicas na Universidade, esporadicamente. A proposta
pedagógica destes cursos possibilita ao aluno realizar suas atividades a distância, utilizando
a Internet como importante ferramenta de comunicação. Os alunos se dirigem ao pólo
apenas para receber o material impresso, tirar suas dúvidas ou resolver questões
burocráticas.
A conquista da autonomia no processo de aprendizagem não é tarefa fácil,
principalmente quando mediado por uma tecnologia desconhecida por grande parte do
grupo. Observa-se então, a necessidade de novas estratégias onde o estudo coletivo ganha
uma força e importância muito maior do que no processo de aprendizagem regular. Os
alunos, por si só, criam uma rede de conhecimento e compartilhamento de informações, que
dificilmente existiria em um curso presencial.
Essas mudanças na condução de um processo de formação docente desdobram-se na
prática educativa individual, e a medida que são multiplicadas, podemos ter uma amplitude
ainda maior no impacto destas práticas. Constatamos que as escolas, sobretudo nos bolsões
de exclusão distantes dos grandes centros, ainda não absorveram os elementos inerentes a
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um novo modelo de sociedade informacional. São modelos educativos que ainda
privilegiam a memorização, que praticam avaliações quantitativas e excluem o aluno muito
cedo do ambiente escolar. São propostas de educação baseadas no principio fordista da
massificação e reprodução da força de trabalho. Os professores e alunos desta realidade
social e econômica não percebem em seu cotidiano os efeitos da globalização e da
sociedade de informação. O pouco que conseguem absorver desta realidade não é
apropriado em seu benefício, mas sim utilizado como mais um elemento de exclusão.
A modalidade a distância, por sua concepção e estrutura, já absorve o aluno dentro
desta sociedade informacional. No caso do curso Geografia da UEPB, o aluno já entra no
curso obrigatoriamente como usuário das ferramentas tecnológicas, que vão sendo
aprimoradas ao longo de sua aprendizagem. Ao contrário do professor da escola pública
que pode escolher utilizar ou não as tecnologias disponíveis, ao estar como aluno do curso
de graduação, ele é obrigado a familiarizar-se com estas ferramentas, sendo condição básica
para o avanço em seus estudos.

7. Conclusão
A necessidade de consonância entre os processos produtivos da economia moderna
e o processo de formação na educação brasileira, vem originando a criação de programas
específicos para a melhoria da qualidade da Educação Básica, especificamente na formação
do professor.A disseminação da informação é o elemento essencial para o entendimento das
transformações ocorridas no trabalho. Estas mudanças se traduziram em um modelo de
organização do trabalho e da produção que acabaram por impactar a educação aberta.
As demandas na formação inicial e continuada mudam substancialmente, apontando
para duas grandes tendências, a reformulação radical dos currículos e métodos de educação
privilegiando a multidisciplinaridade e a aquisição de habilidades de aprendizagem e oferta
de formação continuada ligada aos ambientes de trabalho, numa perspectiva de
aprendizagem ao longo da vida. Lévy (2001) sintetiza esta necessidade ao afirmar que “o
uso crescente das tecnologias digitais e das redes de comunicação interativa acompanha e
amplifica uma profunda mutação na relação com o saber”.
A formação do professor em uma modalidade com inserção tecnológica embutida
na própria metodologia do curso será capaz de fazer uma diferença significativa em sua
atuação na Educação Básica. Ao fazer o curso de Licenciatura na disciplina em que
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efetivamente atua, o professor que já exerce essa atividade, possivelmente acumulará não
apenas o conteúdo específico que leciona, mas também inúmeras possibilidades
pedagógicas que permitam uma atuação mais efetiva, inserida realmente em uma sociedade
de informação e conhecimento. Assim, os professores atuantes no mais remoto município
do interior da Paraíba, por exemplo, travarão conhecimento com a Internet, software livre,
descobrindo as inúmeras possibilidades que o acesso à informação permite, ao mesmo
tempo em que desenvolvem um conceito de autonomia na aprendizagem na construção de
sua própria aprendizagem.
O que se discute aqui é ainda mais profundo, a escola não precisa modificar-se para
acompanhar o novo modo de produção, e sim porque as formas de aprendizagem se
modificaram, e todos os paradigmas anteriores não funcionam mais e quando aplicados
dificultam a ação fim da escola: possibilitar a aprendizagem.

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