Você está na página 1de 16

CURSO DE JORNALISMO DA UFSC - FLORIANÓPOLIS, ABRIL DE 2017 - ANO XXXVI, NÚMERO 1

UFSC VIGIADA
Nova proposta para segurança do
campus violaria o direito à privacidade Páginas 8 e 9

MEIA ENTRADA EBSERH ECONOMIA COLABORATIVA


Nova lei obriga alunos O resultado do primeiro Tecnologia facilita cultura
a adquirir carteirinha ano da nova gestão do de compartilhar e trocar
padronizada Pág 6 e 7 HU Pág 11, 12 e 13 serviços Pág 14 e 15
EDITORIAL

A
o entrarmos no Jornalismo da UFSC, logo ficamos e descobrimos que estudar em universidade pública é,
sabendo sobre o Zero, o jornal laboratório do cur- quase sempre, muito caro. Pedimos licença para entrar
so. No começo, o Zero trata-se apenas de uma porta em mundos que não são nossos, como os de pessoas que
JORNAL LABORATÓRIO ZERO
azul: poderosa, mas distante. O sentimento é de extremo encontram formas de colaborar umas com as outras Ano XXXVI- Nº 1
respeito, desses que a gente sente pelos grandões da pri- pelo compartilhamento de produtos, serviços e, prin- Abril de 2017
meira série quando estamos no jardim dois. Vão passando cipalmente, experiências. Mas acima de tudo, enten-
os semestres e aquela porta azul vai se aproximando, vai demos que fazer Jornalismo é contar história de gente PARTICIPE!
crescendo, cada dia mais, até que um dia, essa porta vem de verdade: como as de seu Alzemiro e dona Zenilda, Mande críticas, sugestões e comentários:
e bate na nossa porta. Entramos no Zero. Agora, quando que encontraram no aluguel de imóveis para estudantes zeroufsc@gmail.com
(48) 3721-4833
olhamos para trás, percebemos que já não somos os mes- uma oportunidade de sustento. /jornalzero
mos. Estudar jornalismo é uma coisa que muda muito a Agora, vendo nossa primeira edição pronta, percebe- @zeroufsc
gente, e essa edição é um reflexo disso. mos que o Zero é exatamente o que é: um laboratório. Departamento de Jornalismo - Centro de
Comunicação e Expressão, UFSC, Trindade,
Aqui aprendemos que algumas meninas tem super- Estamos experimentando como fazer esse tal de jorna- Florianópolis (SC) - CEP: 88040-900
poderes e podem descobrir como se defender sozinhas. lismo, e nosso ponto de partida é sempre a sua vida.
Passamos por professores que nos fazem ver que inte- Nosso desafio é produzir informações que interessem
resses privados nunca devem se sobrepor aos direitos ao público, apresentadas na forma de reportagens de 3º melhor Jornal-Laboratório do Brasil
da população: não importa se estamos falando de saú- qualidade, mas sempre deixando abertura para você EXPOCOM 1994
de ou de meia-entrada no cinema. Aguçamos o olhar formar sua própria opinião. Não tem segredo, tem tra-
para perceber que existe uma linha muito tênue entre balho. Essa tal porta azul foi construída através do es-
vigilância e invasão de privacidade. Acompanhamos a forço de uma equipe que, mesmo reduzida, ficou com- Melhor Jornal Laboratório - I Prêmio Foca
Sindicato dos Jornalistas de SC 2000
rotina de quem precisa se virar para ter uma formação prometida em fazer esse jornal sair. Boa leitura!

OMBUDSMAN Melhor Jornal-Laboratório


EXPOCOM SUL 2015
mais claras, coisa que não aconteceu Quando se fala em entrevista há
nas duas edições anteriores, permi- uma ocorrência comum que envolve
tindo ao leitor uma análise mais or- o fetiche pela pauta e pelo perso- Melhor Jornal-Laboratório do Brasil
ganizada das pautas. nagem, que podem causar uma cer- EXPOCOM 2015
A reportagem de capa, sobre a ta “suavização” das perguntas feitas
questão do aborto, merecia, quem pelo entrevistador. Penso que foi, em
sabe, pelo menos mais uma página, partes, o que aconteceu na entrevista Melhor Peça Gráfica
dada a complexidade do tema. Como com o representante da Mídia Ninja. Set Universitário / PUC-RS
bem sabemos, este é um tema que Há uma série de polêmicas envolven- 1988, 1989, 1990, 1991, 1992 e 1998
desperta paixões e polêmicas, que do o coletivo, em especial desde 2013,
congrega argumentos míticos e cien- que não foram abordadas em mo- EQUIPE
tíficos, e ainda que as repórteres te- mento algum pelas entrevistadoras Aline Dallarosa Lima, Ana Carolina
nham feito a feliz escolha de tornar a e que seriam de interesse do públi- Thomé, Ana Cristina Machado, Camila
história de vida da Bruna como um fio co. Para além do Ninja em si, a mídia Ignácio Geraldo, Clara Comandolli de
Luiza Bodenmüller é formada pela Fa- condutor para problematizar a temá- alternativa pode apresentar padrões Souza, Daiane Lara Nora, Gemyma
culdade Estácio de Sá de Santa Catarina tica, penso que outras argumentações de exploração do trabalhador tal qual Shirley de Souza Medeiros, Larissa
e especialista em Política e Relações Inter- poderiam contribuir para o debate. as estruturas que critica, e isso sem- Ferreira Liz, Linda Inês Pereira Lima,
Luana Meira, Lucas Venceslau Krupakz
nacionais pela FESPSP. Foi editora online Reportagens com um caráter pre deve ser um ponto a ser aborda-
Leal, Maria Fernanda Somenzi Salinet,
na Agência Pública de Reportagem e Jor- mais técnico, como é o caso da re- do em entrevistas como esta. Maria Teresa Mazetto de Carvalho,
nalismo Investigativo, editora de blogs no portagem sobre o ransomware, cor- No mais, fica a sugestão para de- Pablo Mingoti,
HuffPost Brasil, consultora de comuni- rem o risco de tornarem-se incom- dicar uma edição do Zero à temáti- Wagner Roberto Locks Reis.
cação na Rede Justiça Criminal e rela- preensíveis, em certa medida, para ca do racismo, tendo como gancho
ções externas no Centro de Referência o leitor. Boxes explicativos que dei- a matéria apresentada na edição de
DIAGRAMAÇÃO
para Refugiados. xassem mais claras as característi- dezembro. O tema da saúde mental,
Andressa Santa Cruz, Joelson Cardoso
cas de malwares e ransomwares po- como abordada no texto sobre de- e Mariela Cancelier.
A edição de dezembro do Zero deriam ser instrumentos didáticos pressão, já foi tema do Zero, em 2015.
aborda uma gama de assuntos, mos- complementares ao texto. A matéria O racismo, porém, faz tempo que não
trando a capacidade dos alunos em subsequente, sobre como um usu- recebe o destaque devido do jornal e EDIÇÃO
olhar para o jornal e para as pautas ário pode se proteger, foi solução é um assunto cuja problematização Ana Luisa Nascentes, Daniel Bonfim
sob uma perspectiva mais ampla. Tal simples para o fechamento da pauta, e conscientização vão ao encontro e Isadora Vicente.
tratamento do conteúdo permitiu, mas que apresentou um ótimo re- da função social do Jornalismo, que
inclusive, uma maior organização sultado, uma vez que instrumentali- deve ser norteadora a qualquer prá- CAPA
dos textos de acordo com editorias za o leitor de forma clara e objetiva. tica, inclusive à redação do Zero. Andressa Santa Cruz
e Joelson Cardoso

PROFESSORES RESPONSÁVEIS
CRÔNICA Frederico S. M. de Carvalho
SC 01787 JP

O Copo de Leite Puro POR ANA LUISA NASCENTES MONITORIA


Amanda Casemiro
Conta a minha mãe que, mesmo depois de sair da casa Mal sabia eu que aquela era só uma das primeiras colhe- e Rodrigo Silviera Rocha
dos meus avós para casar, o leite com nescau que ela tomava res de nescau tiradas do meu leite. Quantas vieram depois! A
continuava a ser preparado. Na minha casa, o hábito não po- colher de nescau pode ter sido os minutos a menos de inter- IMPRESSÃO
dia ter sido diferente. valo na ida para o ensino médio, o(s) amor(es) deixado(s) no Gráfica Grafinorte
Eu devia ter uns oito anos quando, em uma manhã de fim intercâmbio, a distância da família na ida para a faculdade,
TIRAGEM
de semana, meu pai me chamou na cozinha, olhou fundo nos a (boa) parte do salário que vai para o aluguel. Querendo ou
5 mil exemplares
meus olhos e, como quem tinha uma missão a ser cumprida, não, planejando ou não, a hora do “já estar bem grande” sem-
me falou: Ana, você já está bem grande e a partir de hoje a pre chega. E, no fundo, a gente nunca está completamente DISTRIBUIÇÃO
gente vai colocar só uma colher de nescau no seu leite. Olhei, preparado para os momentos em que nos é exigido crescer. Nacional
já com saudades, para o copo suado de leite gelado e fiquei Com 15, 20 ou 45 anos, a sensação vai sempre ser a mesma
tensa. Como era bom o nescau bem concentradinho antes da dos oito. Quem sabe um dia, eu enfim acorde de manhã, vá FECHAMENTO
carona me pegar para a escola! Me veio um pouco de tristeza, para a cozinha e tome, tranquila, um copo de leite puro. 12 de abril
mas que logo se transformou em noção de responsabilidade, Ou não. Pensei melhor. Vou continuar com a minha colhe-
afinal agora eu era grande! rinha de chá de nescau mesmo.

2 • ABRIL| 2017
EMPODERAMENTO

Mulheres contra-atacam violência diária


Guarda Municipal de Florianópolis oferece aulas gratuitas de defesa pessoal para elas

O
Fotos: Aline Dallarosa Lima/Zero
medo e a insegurança acompanham Judô, e foi adaptada para que
Thamara diariamente no caminho até pessoas possam se proteger na
o trabalho. A designer de moda, de 25 vida cotidiana. A base da autode-
anos, conta que em um dos episódios fesa é o preparo emocional para
em que foi vítima de assédio, um passa- enfrentar possíveis situações de
geiro do ônibus em que estava tirou o celular do bol- perigo aliado às técnicas que en-
so, apontou para o seus seios e tirou uma foto. “Eu volvem o uso da força física. A im-
dei um tapa na mão dele, fiz barraco. Foi a primei- portância do curso de autodefesa
ra vez que me senti assim: preciso me cuidar mais. vai além da insegurança nas ruas:
Não com a roupa que eu uso, preciso me defender é dentro da própria casa onde há
de outras formas”. Além de já ter recebido cantadas, mais registros de violência contra
comentários obscenos e assobios durante esse traje- a mulher. Em Santa Catarina, a
to, Thamara conta que certa vez um homem chegou cada 12 horas uma mulher sofre
a passar a mão no seu corpo enquanto caminhava algum tipo de violência domésti-
na rua. Foi aí que começou a sair de casa com um ca e a cada oito dias uma mulher
spray de gengibre na bolsa, comprado em uma casa morre por causa deste crime,
de pesca. Apesar da sensação de segurança ao portar de acordo com o estudo apre-
o spray - que pode ser usado à distância e impede o sentado pelo Mapa da Violência
agressor de abrir os olhos por pelo menos um minu- de 2015 e dados da Secretaria de
to -, ela também sentiu a necessidade de conhecer Segurança Pública (SSP). Como
técnicas para neutralizar um ataque e estar prepa- no caso de Edna, de 55 anos, que
rada psicologicamente para se defender em uma si- sofreu violência doméstica, física
tuação de risco. e psicológica, durante 17 anos de
A oportunidade surgiu com as oficinas gratuitas de casamento. “Pra mim a violência
defesa pessoal para mulheres, oferecidas pela Guarda maior era quando ele começava a
Municipal de Florianópolis no dia 22 de março como me humilhar, entende? Às vezes
parte da programação do mês das mulheres e do ani- eu desejava que ele me desse logo
versário da capital. Thamara participou das 3 horas de um tapa na cara”, desabafa. Hoje,
oficina teórica e prática com o instrutor Paulo Limas quase 20 anos após o divórcio,
Filho na base da Guarda Municipal, no bairro Coquei- Edna ainda procura formas de se
ros. Os dados da violência contra a mulher em Santa proteger e foi este o motivo pelo
Catarina justificam essa iniciativa: só em fevereiro des- qual se inscreveu no curso.
te ano foram registrados 3.261 casos de lesão corporal, Ainda que casos de violên-
892 roubos e 488 estupros consumados, segundo as es- cia doméstica contra a mulher
tatísticas da Secretaria de Segurança Pública (SSP). As ocorram frequentemente, mui- Preparo físico e psicológico são fundamentais para neutralizar o ataque
700 inscrições para as 150 vagas do curso de autodefesa tas vítimas não procuram o Es-
demonstram que cada vez mais as mulheres sentem tado para a defesa de seus direitos. Para a delegada histórica em que a mulher é vista como proprieda-
que precisam estar preparadas para se defenderem em Patrícia Maria D’Avila, o silêncio é uma condição de do companheiro. “Em muitos casos, a mulher se
caso de violência. auto censura, ela se pergunta
A busca pela independência se a culpa da violência é ela ou
é outro fator pelo qual mulhe- Crimes contra mulheres registrados em não; também tem a questão da
res têm procurado técnicas de vergonha, medo de ser julgada
defesa pessoal. Durante a aula, Santa Catarina no mês de Fevereiro de 2017 pelos outros, medo da exposi-
o comportamento adequado ção pública. Outro desafio que
foi demonstrado por meio de Violência contra mulher 44% 56% Violência doméstica dificulta a atuação dos órgãos
simulações de situações de pe- Qualquer ato cometido contra a mulher Cometida ou omitida dentro da casa competentes na punição do
rigo e estratégias para dominar de aspecto psicológico, sexual, que cau- da vítima. O agressor pode ou não ter crime é em relação à mulher
o agressor, sem que seja neces- se lesões físicas ou danos materiais grau de parentesco que volta a conviver com o
sário o uso de instrumentos que
possam ferir gravemente. Pau-
4.750 registros 6.062 registros agressor por motivo de medo,
questões financeiras, pres-
Dados : Secretaria de Estado da Segurança Pública - SSP/SC
lo mostrou que objetos de uso são da família ou por acredi-
diário, como chaves e canetas, tar que a pessoa irá mudar de
também podem ser instrumentos de autodefesa em Spray de pimenta é proibido comportamento. As denúncias podem ser feitas em
um ataque. Com o psicológico preparado, a vítima duas categorias: 1. violência contra a mulher, que
não será dominada pelo medo e será capaz de agir É comum em filmes norte-americanos cenas é toda e qualquer violação cometida em via pública
corretamente, de forma a neutralizar a agressão ou em que a mulher usa um spray de pimenta para ou privada (exceto dentro da residência da vítima); 2.
conseguir escapar de uma situação de violência. En- se defender de bandidos e agressores. No Brasil, violência doméstica, que é a violação cometida den-
tretanto, se o agressor estiver portando armas letais, o uso e a comercialização do spray de pimenta tro do seu lar. A agressão pode ser sexual (estupro,
a recomendação é tentar manter a calma e não reagir malagueta por pessoas comuns é ilegal. A versão toques, assédio), psicológica (xingamento, manipu-
a fim de preservar a integridade física e evitar danos da arma de bolsa que é permitida por aqui é o lação, ameaça, injúria), física (que traga danos a vida
maiores. A prevenção é importante para evitar a ex- spray de gengibre, que, assim como o spray de da vítima ou material) ou patrimonial (destruição
posição ao risco, já que o agressor procura pela víti- pimenta, possui uma capacidade altamente ir- de bens materiais e objetos pessoais). A denúncia é
ma mais distraída e lugares que favorecem a sua fuga. ritante ao entrar em contato com as mucosas. A anônima e pode ser feita em qualquer delegacia ou
Atitudes que facilitam o elemento surpresa - estraté- pessoa atingida terá dificuldades para respirar e pela Central de Atendimento à Mulher (Ligue 180).
gia mais utilizada por assaltantes -, devem ser evita- não conseguirá abrir os olhos por alguns minu-
das, como por exemplo utilizar o celular na rua ou no tos, tempo suficiente para a vítima se deslocar
trânsito, estacionar o carro em ruas mal-iluminadas para um local seguro e pedir ajuda. Pode ser fa-
e pouco movimentadas, ficar dentro do veículo esta- cilmente comprado em sites de lojas especiali- Aline Dallarosa Lima
cionado, parar para dar informações. zadas em artigos de defesa e em lojas de pesca. adallarosalima@gmail.com
A autodefesa é um conjunto de técnicas com ori- O preço média varia entre R$ 70 a R$ 100. Gemyma Medeiros
gem nas lutas marciais, como Aikido, Krav Magá e gemyma.salmus@gmail.com

ABRIL | 2017 • 3
ENTREVISTA

Websérie pensada
Daniel Bonifm/Zero

por mulheres para


mulheres na UFSC
SUPER foi criada por estudantes do Curso
de Cinema e conta a história de quatro
meninas que descobrem ter superpoderes

C
láudia, Renata, Super e Olívia são mulheres que descobrem ter su-
per-poderes e, juntas, tentam entender melhor suas novas habili-
dades. É sobre elas e suas trajetórias que a micro-websérie SUPER
trata. Criada por Caroline Mariga, Lara Koer, Maria Fernanda Bin e
Viviane Mayumi, a produção foi lançada no Youtube no dia 21 de mar-
ço e terá, ao todo, sete episódios. A ideia surgiu como Trabalho de Conclusão
do Curso de Cinema da UFSC e começou a ser produzida em 2015. Com 80%
da equipe formada por mulheres, a série aborda feminismo e empoderamento.
Além da indicação para melhor roteiro de ação no Festival Rio WebFest, a equipe
concorrerá no Festival Berlim WebFest em categoria a ser divulgada. Carol, Lara
e Bin conversaram com a equipe do Zero e contaram sobre como é ser mulher
no mundo do cinema e os desafios de uma produção independente.

Zero: Super é uma menina comum nhum momento a gente fala exata-
que acorda e descobre que tem a ca- mente o que está acontecendo, mas a
pacidade de se teletransportar sem- gente planta uma sementinha.
pre que espirra. De onde veio essa Bin: É, aí é que tá, todos esses poderes
ideia? e situações são coisas que as mulheres
Lara: Cara, a ideia de um espirro te- têm dentro de si e às vezes a gente se
letransportar surgiu porque alguém esquece, né? Maria Fernanda Bin e Lara Koer foram convidadas para apresentar SUPER em Berlim
fez uma piada dizendo que às vezes a Lara: É, o negócio de ler mentes está
gente espirra e parece que vamos abrir muito relacionado a ser empática com Z: A música-tema da sé- Lara: As super heroínas dos filmes que
o olho e estar em outro lugar. Eu achei outras mulheres. É você estar no meio rie fala que “pra quem é meni- a gente vê normalmente estão alí para
isso muito engraçado e comecei a ima- da rua a noite e… na não se ensina um super-po- o prazer do olhar masculino. Super
ginar as situações esquisitas em que Bin: …e você olhar pra trás e ver uma der”. Que super poder seria esse? é feito de mulheres e para mulheres.
isso podia acontecer. menina, olhar no olho dela e saber que Lara: É no sentido de que você nem Isso vai desde a forma com que elas fa-
Bin: Era quase o primeiro episódio já. ela ta pensando a mesma coisa que sabe que você pode ter um super po- lam, da postura que elas têm, da per-
Lara: É, eu fiquei com isso guardado você. der, você é ensinada que você é fraca, sonalidade de cada uma, até o figurino
e eu pensava “tá mas o que que eu vou Lara: Que ela também tá com medo… que as únicas coisas que você vai fazer e o enquadramento. (Em Super) A gen-
fazer com isso? Pra onde vai essa his- Bin: Sim. é cuidar e ficar quieta. te não vê uma escolha de enquadra-
tória?”. Até que a gente se aproximou Lara: E a invisibilidade a gente acabou Bin: Meninos, desde pequenos, são in- mento que aparece a bunda da mulher,
muito e a gente tava começando a se relacionando muito com a questão da fluenciados a descobrir, a explorar, a enquanto se você vai ver um filme da
envolver com o movimento feminista objetificação do corpo, de você ser vis- se superar, e as mulheres acabam sen- Marvel tá lá a Scarlet Johanson sempre
e eu mostrei o roteiro para Bin e fa- ta pelo seu corpo, então se você desa- do superadas. Os heróis sempre são enquadrada do joelho pra cima.
lei: “Cara, eu acho que essa descoberta parecer… eles. É muito difícil para as mulheres Bin: Tivemos que ter um pensamento
de poder, que é um poder completa- Bin: Aí você pode ser vista pelas suas se verem como super heroínas. ativo para não reproduzir essas coisas
mente aleatório, é um pouco isso que ideias. também. Como enquadrar a mulher de
a gente tá passando, de descobrir nos- Lara: Pelas suas ideias, pela sua fala... Z: E as super-heroínas do cinema ge- uma forma que não seja o olhar mas-
sos poderes no feminismo”. Inclusive, culino? Até a Carol pode falar melhor
uma coisa que a gente se apropriou disso...
para criar a narrativa foi a Jornada do Carol: Por mais que sejamos mulhe-
Herói, que é uma estrutura de rotei- “VOCÊ NEM SABE QUE TEM UM SUPERPODER. res, quando a gente vai tentar fazer
ro para criar histórias usada desde o
épico grego. A gente pensou que seria VOCÊ É ENSINADA QUE É FRACA E QUE SERVE alguma coisa diferente, a gente ainda
tem o olhar muito viciado porque todo
muito interessante se apropriar dessa
ferramenta para fazer a “jornada da
PRA CUIDAR E FICAR QUIETA” o audiovisual que a gente consumiu
até hoje foi feito por homens. Então, a
heroína”. Que não tem nada de novo LARA KOER cada segundo, a gente tem que perce-
nesse sentido (narrativo) mas é com- ber: “ó, isso aqui que eu to fazendo eu
pletamente revolucionário porque... to reproduzindo o machismo de novo”.
Bin: Porque tá tratando da história de Bin: É sobre essa vontade que a gen- ralmente são interpretadas por mu- Era cada minuto, era realmente um
uma mulher. te acaba tendo de sumir às vezes. Por lheres consideradas padrão de beleza pensamento ativo como se tivesse...
causa desse olhar que muitas vezes é e sensualidade, né? Como tomaram a Bin: Se reeducando. Tentamos fazer
Z: Isso quanto a Super, né? E as ou- violento, né? decisão de não seguir esse padrão? aquilo que a gente queria consumir
tras personagens? Como vocês foram Lara: E também tem a super força da Lara: Super heroínas são sempre vis- quando nós éramos o nosso público-
criando as personalidades e o super Claudia, que é uma força física. Uma tas como mulheres sensuais porque -alvo, que são gurias mais novas, de
poder que cada uma ia ter dentro da mulher nunca é vista pela sua força elas sempre são escritas por homens. 13 a 17 anos. Queríamos mostrar como
trama? física. E ela é a personificação disso, Bin: Escritas por homens, filmadas essas meninas se veem também. Que
Lara: Então, a ideia é discutir esses esse é o poder dela. por homens e para homens. não é dessa forma sexualizada que
poderes de forma alegórica, em ne- Carol: ... fotografadas por homens. sempre vemos.

4 • ABRIL | 2017
denar, mas toda a equipe trabalha em no youtube? Como vocês acham que te foi gravar em um bar e usaríamos
Z: E de que outras maneiras o ma- prol do projeto e acreditando no que a internet está afetando o mundo das uma parede que tinha uns grafites ma-
chismo aparece no mundo do cine- estamos fazendo. produções audiovisuais? ravilhosos. Era perfeito. Mas quando
ma? Carol: A gente não chegou a quebrar Lara: Como o nosso público-alvo são fomos gravar, chegamos no bar e eles
Bin: Vai desde uma questão mais bá- o papel que cada um desempenha no meninas jovens e queríamos que che- tinham pintado a parede de branco.
sica, de você ter uma dificuldade de set, porque esse é um modelo que fun- gasse no maior número de meninas, o Lara: Tivemos que repensar tudo, mas
achar mulheres em certas funções, ciona para a “dança do set”. Você tem Youtube foi a primeira resposta. Além ficou a nossa melhor cena. É o meu
como maquinário ou elétrico, até di- aquele dinheiro para gravar naquele disso, a gente sabia que não teria di- episódio favorito.
nâmicas de set mesmo. O cinema é dia, naquela locação, e tudo precisa nheiro para produzir muitos minutos
uma coisa muito hierárquica. ser feito muito rápido, com cada um de filmagem. A gente brinca que, se Z: E agora, segunda temporada? O
Carol: Geralmente o diretor é o “gê- centrado na sua função e afinado com fosse um hambúrguer, seria só a car- que vocês querem pro futuro?
nio”, e o resto das pessoas estão alí a proposta para executar o projeto da ne, um tweet audiovisual. Então é legal Lara: A gente quer, sim, uma segunda
para fazer os desejos dele. Isso vai se melhor forma possível. experimentar isso, sabe? É um risco. A temporada. Temos o projeto de fazer
reproduzindo dentro de cada equi- gente está vendo se vai colar ou não. uma segunda temporada com esse
pe e acaba se tornando um ambiente Z: Além da equipe ser formada em O mercado visual brasileiro e a distri- mesmo tipo de formato, episódios
opressor. maioria por mulheres, muitos dos buição são extremamente centraliza- curtos para o youtube. Ou vender para
Bin: É aquela coisa que a gente escuta homens que participaram são gays... dos em uma rede de pessoas que têm o netflix, por exemplo. Estamos es-
de todas as profissões. O que a gente Lara: São os homens com quem a gen- interesses próprios. Na internet não perando e nos planejando. Podíamos
vê é que homens têm muita dificul- te conseguia dialogar de alguma for- tem isso. fazer a Super para o resto da vida, his-
dade de ouvir as ideias de mulheres, ma. Porque o homem que entrasse na Bin: Dentro das nossas possibilidades, tória para isso tem. Quando as pessoas
né? E até os homens que se dizem equipe precisava estar disposto a bai- era a melhor forma de atingir o maior virem o último episódio (da primeira
“desconstruídos” às vezes só fingem xar a bola e saber a hora de escutar. número de lugares. E ter um produto temporada), ficarão com aquela dúvi-
que escutam. É ser constantemente de fácil acesso vai desde distribuir na da “o que será que vai acontecer?”.
questionada. Ser desrespeitada não só Z: Fazer cinema independente não é internet, até pensar em acessibilidade. Bin: São episódios seriados, mas que,
intelectualmente, mas também fisica- fácil. Quais foram as principais difi- Vimos que precisávamos fazer ver- juntos, funcionam como piloto para
mente com piadas e cantadas. Quan- culdades? sões em libras e com audiodescrição. uma série com episódios maiores de
tas meninas não passam calor em set Carol: A gente não foi no tudo pela Quando todos os episódios forem lan- 20 minutos.
porque vão toda cobertas para não dar arte. Muitas vezes não pegamos a me- çados, vamos liberar as versões aces-
brecha pra assédio, né? lhor câmera para alimentar melhor a síveis para que a nossa prática esteja Ana Luisa Nascentes
equipe e, assim, foi a melhor comida alinhada a nossa proposta. analuisapns@gmail.com
Z: É diferente trabalhar em um am- de set da vida (risos). Lara: Outra vantagem de lançar na in- Daniel Bonfim
biente em que a maioria é mulher? Bin: Todo mundo é voluntário. Come- ternet é que a TV nem sempre acom- danielbonfim@gmail.com
Como foi a experiência? çou com o nosso TCC, mas virou mais panha o nosso discurso. A internet Isadora Vicente
Lara: Foi uma experiência de muito que isso. É claro que a gente queria um permite ter um conteúdo que de re- isadoravicente96@gmail.com
diálogo e muito respeito. Como a série produto de qualidade e que rendes- pente, não vai atingir milhões de pes-
discute justamente um tema feminis- se. Na hora de colocar na balança pe- soas, mas vai chegar nas verdadeiras
b S érie s
ta, todo mundo dialogou sobre isso. A
gente construiu relações para além do
sou mais que a experiência fosse boa
para todo mundo. São escolhas. Boas
consumidoras.
+ We
set e trocou vivências com mulheres condições de trabalho para a equipe Z: Vocês tem alguma história engra-
Divulgação / SUPER çada, alguma coisa divertida de basti-
dores para nos contar?
Bin: Divertida não (risos), mas coisas
desesperadoras que agora a gente ri.
Lara: A Carol entrou no projeto por-
que a gente estava procurando uma
diretora de fotografia. Ela estava fa-
zendo intercâmbio na Bélgica quando Romeu & Romeu adapta a clássica
a gente mandou uma mensagem per- história de amor “Romeu e Julieta”.
guntando se ela voltaria do intercâm- Meninas do Super: “É uma série
bio em agosto (de 2015), explicando o lgbt, eles são incríveis, o roteiro é
projeto e pedindo uma indicação de muito bom e os atores são
outra menina pra fazer a direção de excelentes”.
fotografia caso ela não pudesse. Man-
damos o roteiro e ela só respondeu “e
se eu comprar a passagem pra tal dia,
seria bom?”.
Bin: Em uma das gravações, a gente ti-
nha dois dias pra gravar na locação da
casa da Olívia. No primeiro dia, depois
do almoço, a Celesc resolveu trocar os
O superpoder de cada personagem faz referência à pautas do movimento feminista postes da rua. Eixos retrata Brasília pós-apoca-
Carol: O detalhe é que isso levava cin- líptica no ano de 2060.
que vieram de vários lugares e estavam transparece no resultado final. As pes- co horas. E a gente dependia da luz do Meninas do Super: “É um equipe
em diferentes momentos da vida. soas não estavam ali pela gente, elas sol pra gravar. formada majoritariamente por
Bin: Foi maravilhoso. A gente sabe estavam ali porque elas gostavam do Bin: Não dava para carregar as bate- mulheres, tecnicamente incrível”.
como o processo de produção funcio- projeto, gostavam da ideia e acredi- rias, para ligar as luzes… nada! Mas no
na normalmente e tentamos fazer de tavam que o talento e o tempo delas fim deu tudo certo, e deu tudo certo
outro jeito. Quando a gente fala de set, estavam sendo bem aproveitados. Essa porque todo mundo alí estava a fim de
é 80% masculino. Ninguém questiona era nossa maior preocupação. Con- resolver. Sentamos todos juntos e ten-
isso. Eu já participei de vários projetos tamos com o apoio da universidade. tamos achar uma solução em equipe.
em que a única mulher do set era eu. O Agora o curso já está bem melhor, mas Lara: Também aconteceu de algumas
resto era homem. na época que a gente gravou, não tinha crianças estarem brincando na quadra
Carol: Geralmente, trabalhamos com tanta estrutura assim. Então, a gente do prédio, e a gente pedir pra fazerem
papel de produção e a galera associa precisou alugar. Foi também “choran- silêncio porque estávamos gravando e
com papel de mãe. Vendo a mulher do” bastante, explicando que era pro- eles perguntarem “é pra Globo?”, e a Mulheres em Série desafia o
como aquela que cuida das outras pes- dução universitária. Isso tivemos que gente “é, é pra Globo sim!”. Deu certo, público a desmistificar a figura da
soas e não como uma profissional. bancar. eles ficaram bem quietinhos, pediram “mulher padrão”.
Bin: Com a SUPER não tinha essa de para filmarem eles, a gente filmou. (ri- Meninas do Super: “Discute o
ideia de responder a uma chefia. É cla- Z: Por que vocês optaram por contar sos) assunto mulheres trans, é demais”.
ro que precisa de pessoas para coor- essa história no modelo de websérie Carol: Também teve um dia que a gen-

ABRIL| 2017 • 5
CARTEIRINHA
Fotos: Ana Cristina Machado/Zero

Estudantes, idosos acima de 60 anos, pessoas com deficiência e seus acompanhantes, e professores têm direito ao benefício, mas apenas para o ingresso de valor mais barato

Como funciona a lei da meia entrada


Enquanto empresas se adaptam às novas regras, estudantes confundem procedimentos

O
ingresso do tipo meia centro acadêmico (CA). O documen- Entre os alunos entrevistados, o
Eventos têm que
entrada da estudante de to tem validade até março do ano ponto de maior discussão está nos R$ Eventos têm
Direito Letícia Neves foi subsequente de sua emissão. 20 pagos na carteirinha. Para Flávia, garantir cota
negado em um estádio de A estudante do Curso de Farmácia considerando que o valor precisa ser que garantir cota
futebol em Florianópo- da UFSC, Flávia Kyara, há dois anos dado uma vez por ano, “parece justo”. mínima
lis, por ela não possuir a carteira de encomendava a carteirinha pelo site Mas a estudante reconhece: “sei que mínima
estudante no padrão nacional. Com da União Nacional de Estudantes muita gente passa trabalho para pa-
o comprovante de matrícula assina- (UNE). Ao saber que o DCE estava gar”. A estudante de Jornalismo Dé- Quem tem direito a meia entrada
do, Letícia tentou argumentar com o imprimindo uma com valor menor, bora Baldissera considera um erro o hoje no Brasil são estudantes, ido-
funcionário da entrada, que não acei- ela resolveu cancelar a renovação de estudante precisar pagar pela cartei- sos acima de 60 anos, pessoas com
tou o documento, pois o clube exigia Brasília, e pedir o documento local. rinha. “Acho meio absurdo compro- deficiência e seus acompanhantes,
a carteira de identificação estudantil De acordo com Flávia, poucos cole- var que sou estudante pagando para e professores. Além de exigir a car-
no modelo nacional conforme cons- gas de seu curso sabem sobre a pos- ter uma carteirinha, sendo que não teira padrão, a nova lei determina
ta em lei. O estabelecimento estava sibilidade de se fazer a carteira na pago nem para estudar”, diz Débo- que a venda de pelo menos 40% dos
certo: desde 2015 todos os alunos que UFSC por falta de informação. “As ra, que adquiriu a carteira produzida ingressos seja reservada para meia
desejam ter acesso a meia entrada de- pessoas podem pagar mais barato pelo DCE na primeira semana de aula. entrada. Se o cliente apresentar o
vem possuir a nova Carteira de Iden- fazendo a carteirinha aqui, mas não “Mas achei mais fácil fazer a carteiri- documento necessário e for barra-
tificação Estudantil (CIE), conforme sabem disso. Flávia pediu sua car- nha porque é aceita em todos os luga- do porque a casa não está atenden-
previsto na Lei nº 12.933. teirinha do DCE no dia 6 de março res como comprovante”. do à exigência mínima de ingressos
Na Universidade Federal de San- do tipo, deve procurar o Procon.
ta Catarina (UFSC), os estudantes DCE faz a carteirinha, mas não As reclamações mais frequentes
de gradução e os alunos do Colégio “ACHO ABSURDO responde pergunta recebidas pelo Procon são sobre a
de Aplicação têm a possibilidade de A aluna do Curso de Letras Inglês meia entrada em eventos que pos-
conseguir o documento padrão de COMPROVAR QUE da UFSC, Marília Dagostin, diz que suem divisões de espaços e preços
diferenciados como pista, pista VIP
identificação produzido pelo Dire-
tório Central dos Estudantes Luis
SOU ESTUDANTE não pretende ter a carteirinha. “É
um absurdo. Estamos pagando para e camarote. Nesses casos, o benefí-
Travassos (DCE). Quem faz pós-gra-
duação deve solicitar à Associação
PAGANDO PARA TER usufruir de um direito. E acredito
que os R$ 20 não estejam no custo
cio é válido apenas para o valor de
ingresso mais barato. “Camarote e
Nacional de Pós-Graduandos (ANPG). UMA CARTEIRINHA” de confecção da carteira. Eles estão open bar não se aplica a meia en-
trada, e essa é a questão que causa
A carteira produzida pelo DCE da pagando outras coisas. Mas o que?”,
UFSC custa R$ 20, valor R$ 12 mais DÉBORA BALDISSERA, ESTUDANTE DE JORNALISMO questiona a estudante. maior conflito. Nós entendemos
barato que a identificação impressa A pergunta de Marília não pôde que, se o promotor do evento colo-
pela União Nacional dos Estudantes e o documento só chegou ao centro ser respondida pela reportagem. cou os 40% dos ingressos [comuns,
(UNE), e para adquiri-la é preciso acadêmico do seu curso no dia 3 de Durante a apuração desta matéria, tipo plateia] disponíveis para meia
entrar no site do DCE e acertar o abril. A estudante ficou perdida so- a equipe do Zero procurou o DCE entrada, o número não precisa se
pagamento online. De acordo com bre onde deveria retirar a carteiri- por diversos meios: presencialmen- aplicar para camarotes ou pistas
a atual gestão do diretório, a cartei- nha. “Ficou meio confusa a informa- te, por telefone, email e WhatsApp. VIP”, diz o Secretário de Defesa do
rinha pode ser entregue num prazo ção, disseram que iam entregar para Por duas semanas, a atual gestão não Consumidor, Tiago Silva.
de 10 a 16 dias e deve ser retirada cada centro acadêmico ou que esta- respondeu a todas as perguntas fei-
na sede do DCE, com algum repre- ria na sede, mas ainda não consegui tas por e-mail e desmarcou as en-
sentante do seu centro de ensino ou pegar”, diz Flávia. trevistas pedidas pelas repórteres. A

6 • ABRIL | 2017
resposta veio de Alessandra Baraú- Além das carteirinhas nacionais, carteiras de estudante, que foram da cidade, e também é difícil para
na, assessora de comunicação do di- a Carteira Mundial do Estudante ficando cada vez mais frequentes, e alguns estabelecimentos culturais
retório, por WhatsApp. existe desde 1953, e passou a ser de a falta de controle do acesso à meia reconhecerem o atestado que os es-
“Por motivos financeiros, desde o responsabilidade da Unesco em 1968. entrada fez com que os produtores tudantes levavam, então nós opta-
custo de implementação a até mes- Essa carteirinha é um documento de de eventos culturais, esportivos e mos pela exigência da carteirinha”.
mo de pagamento inicial do pontapé identificação internacional reconhe- artísticos aumentassem o preço dos Segundo o Procon, não há aber-
do projeto da CIE do DCE, o diretó- cido em mais de 130 países e oferece ingressos. Por isso, a instituição viu tura de processos para reclamações
rio não possui recursos financeiros benefícios em serviços de estabele- a necessidade de tomar providências relacionadas a meia entrada, nor-
suficientes para arcar com o custo cimentos do mundo todo. A partir de e passar a produzir a carteirinha no malmente os problemas são solu-
das carteirinhas de estudantes com 2017, e em parceria com a Federação modelo padrão nacional. cionados em contato direto com a
vulnerabilidade socioeconômica. Nacional dos Estudantes Livres, essa O que diferencia a CIE padroni- empresa ou estabelecimento que
Por isso, estamos recomendando a carteirinha internacional também zada do documento disponibilizado está sendo acusado de cometer al-
entrarem e pedirem a mesma pelo terá o benefício da meia entrada ga- anteriormente pelas instituições é o guma irregularidade. Assim como
site da UNE, já que a entidade forne- rantida para eventos culturais. certificado de atributo, um atestado não há dados relacionados ao nú-
ce este mesmo documento sem cus- A Carteira Mundial do Estudante digital no modelo da Infraestrutu- mero de reclamações dos clientes,
to para esse grupo discente, desse pode ser adquiri- ra de Chaves Públi- também não existe um levantamen-
modo garantindo o seu direito”, es- da por estu- cas Brasileiras to nacional ou municipal do possível
creveu Alessandra. Ao receber a per- dantes Espaço para de (ICP-Brasil). número de fraudes na meia entrada,
gunta sobre a distribuição do custo customização da CIE A nova mas mesmo assim os estabelecimen-
da carteirinha, a assessora informou QR-Code deverá remeter a com características tos alegam se sentirem mais seguros
que “não sabia das finanças” e não um endereço na internet que locais contra as irregularidades. A reporta-
respondeu ao questionamento. permitirá acesso ao banco gem procurou o Teatro Álvaro de Car-
De acordo com o advogado Leo- de dados para possibilitar valho e o Teatro do CIC, que afirma-
nardo Busnello, mesmo em ins- a obtenção do certificado ram estarem recebendo somente a
tituições públicas, a carteira de de atributo associado a CIE carteira padronizada. Os cinemas
estudante não possui a obri- emitida do Shopping Iguatemi e do Bei-
gação de ser oferecida gratui- ramar Shopping também passa-
tamente. “A princípio, não há ram, a partir de abril, a aceitar
ilegalidade na cobrança de apenas o documento exigido
taxa para confecção da Car- por lei. O mesmo se aplica para
teira de Identificação Estu- os estádios de futebol da gran-
dantil (CIE), tendo em vista o de Florianópolis.
caráter facultativo da emis- Dados de identificação A Blueticket, empresa de
são do documento”, explica. do estudante vendas de ingressos online,
incentiva seus clientes a te-
Identidade Jovem e rem a CIE no modelo padrão,
Carteira Mundial do mas dizem que cabe ao esta-
Estudante belecimento aceitar ou não ou-
Com a Lei da Meia Entrada, que tros documentos. De acordo com
entrou em vigor em dezembro de Fotografia do rosto do Tiago Silva, “se você comprar seu
2015, também foi instituído em 2016 portador titular dos dados ingresso antecipadamente e for do
o “Programa Identidade Jovem”, que tipo meia entrada, o estabelecimen-
Código de Uso é uma sequência
contempla jovens de 15 a 29 anos com to pode pedir tanto na hora da com-
alfanumérica personalizada para cada
renda social menor que dois salários pra quanto na entrada do evento um
estudante conforme regras da entidade
mínimos e que estejam incluídas no dos documento que comprove que você
emissora da CIE
Cadastro Único para Programas So- últimos carteira tem direito ao benefício. Isso é ou-
ciais do Governo Federal. anos do também tra forma até de evitar fraude, por-
O Programa Identidade Jovem, ensino fundamen- contém um códi- que tem muitos que compram como
além de oferecer 50% de desconto no tal, ensino médio, gradua- go de barras e um QR Code estudante e na hora não apresentam
valor cobrado em eventos esportivos, ção, pós-graduação, mestrado, MBA para que a bilheteria possa receber a carteirinha, aí o ingresso não tem
artísticos e culturais, também oferece (Master of Business Administration), mais informações sobre o estudan- validade”.
duas vagas gratuitas em viagens inte- doutorado e cursos técnicos. Vale te. De acordo com o secretário de
restaduais. Nesse caso, não é neces- ressaltar que essa carteirinha não Defesa do Consumidor, Tiago Silva,
sário ser estudante nem gastar com é válida para alunos de cursos que o novo padrão da carteirinha estu-
a impressão da identidade: é possível não sejam autorizados pelo MEC. dantil ajuda os estabelecimentos a
utilizá-la de forma digital. O período evitar fraudes na comprovação da Ana Cristina Machado
de validade da carteirinha é de 30 dias, Fraudes motivaram mudança meia entrada. “Nós entendemos que anacristinaaamj@gmail.com
que pode ser renovado pela internet A União Nacional de Estudantes a carteirinha da UNE nos dá muito Camila Geraldo
ou pelo aplicativo no smartphone. (UNE) alega que a falsificação das mais acesso aos serviços culturais camilaignaciogeraldo@gmail.com

Como fazer a carteirinha do DCE da UFSC


PASSO 1 PASSO 2 PASSO 3 PASSO 4

acessar o endereço solicitar por meio da autenticação enviar uma realizar o pagamento
www.cie.dce.ufsc.br do IdUFSC que seus dados serão foto 3x4 com por meio do Pagseguro
retirados automaticamente do CAGR rosto visível

A carteirinha ficará pronta em um prazo médio de 10 a 16 dias e poderá ser retirada na sede do DCE, com algum representante
no Centro de Ensino ou no Centro Acadêmico.
Cinemas passam a exigir nova carteirinha

ABRIL | 2017 • 7
SEGURANÇA

UFSC revê sistema de vigilância do campus


Após apuração do Zero, universidade deve cancelar acesso às câmeras de segurança

A
Fotos: Lucas Krupacz/Zero
Secretaria de Segurança pudesse verificar como estaria o tra-
Institucional (SSI) da Uni- jeto. Na ocasião, quando questionado
versidade Federal de Santa sobre uma situação inversa, se a visu-
Catarina (UFSC) prepa- alização dessas imagens servisse para
rou dois novos sistemas quem quisesse praticar algum ato ile-
para auxiliar na segurança do campus: gal, como um assalto, a fim de verificar
os drones, que já estão sobrevoando a onde existisse movimentação, Oliveira
universidade, e o Rota Segura, um pos- argumentou: “Nós podemos ter um
sível aplicativo que permitiria aos es- hacker que acesse as 1300 câmeras da
tudantes acessar as imagens de 15 a 20 UFSC, por exemplo. Se tu for trabalhar
câmeras da UFSC, 24 horas por dia, de com essa perspectiva, não instala câ-
qualquer computador ou smartphone mera nenhuma. Então, vamos arriscar:
através do IDUFSC (registro individu- começou a ter acesso inadequado, a
al acessado com uso de senha). A ideia gente traz isso de volta só para a equi-
inicial era liberar as imagens das câ- pe de segurança da UFSC”.
meras, em tempo real, dos pontos mais
movimentados e iluminados do cam- 29 de março
pus, para estudantes que possuírem o O site de notícias UOL, no início da
cadastro no sistema. Após a repercus- manhã, publicou uma reportagem na
são na mídia e a apuração da equipe qual afirma que “pais poderão vigiar os
do Zero, a possibilidade de acesso das estudantes por meio das câmeras ins-
imagens começou a ser repensada pela taladas no campus”, o que tem, segun-
universidade, pois envolveria o direito do o portal, gerado polêmica. Ao longo
de imagem e de privacidade da comu- do texto, há depoimentos de alunos e
nidade acadêmica. pais a favor e contrários ao novo pro-
As fotografias e os vídeos feitos pe- Drones são eficientes porque são discretos e percorrem longas distâncias rapidamente jeto de segurança. Na mesma reporta-
los drones podem ser vistos em tempo gem, o chefe de gabinete da Reitoria,
real apenas por quem estiver operando Segurança Institucional, o valor inves- Durante uma semana, a equipe Áureo Mafra de Moraes, afirmou que
o equipamento naquele instante e não tido nos drones é baixo se comparado do Zero entrou em contato com os “há muitos pais preocupados que co-
seriam disponibilizados no aplicativo. aos benefícios que esse sistema pode responsáveis pelo desenvolvimento bram ações da Universidade, e têm
Essas imagens, porém, são armaze- trazer. A qualidade da imagem e a mo- do aplicativo Rota Segura. A abertura boas relações com os filhos, que não
nadas no cartão de memória acoplado bilidade seriam outras vantagens da das câmeras à comunidade acadêmi- se importarão de serem vistos. Outros
no dispositivo e, posteriormente, po- nova ferramenta. As grandes áreas de ca, até então, seguia como planejada. alunos criticam porque não querem
derão ser baixadas para outros apare- estacionamento na UFSC e o trânsito Após entrevistas com especialistas em que os pais vejam o que estão fazendo”.
lhos eletrônicos, como o computador. em horário de pico dificultam a mo- direito à privacidade, o projeto foi re- No início da tarde, a reportagem
A ideia é de que os sobrevoos ocorram bilidade da viatura. “Com um drone pensado. Entenda o caso: conversou com o professor de Direi-
todos os dias, ao menos uma vez pela circulando, economiza combustível, to da UFSC e coordenador do Obser-
manhã e outra à tarde, com duração de economiza o estresse do condutor do 27 de março vatório de Direitos da Personalidade
20 a 25 minutos. Os dois drones, mode- veículo e amplia a ação da segurança”. Em entrevista concedida ao Zero e Inovação, Mikhail Cancelier, que
lo Phantom 3, foram apreendidos pela A ideia do Rota Segura existe desde o pela manhã, o diretor da Secretaria de considerou preocupante a abertura
Receita Federal e doados à universida- ano passado. Do total de 1300 câmeras Segurança Institucional afirmou que a das câmeras do aplicativo Rota Segu-
de, por isso o custo será somente de da UFSC, seriam selecionadas de 15 a ideia era de que um aluno, por exem- ra para os estudantes. De acordo com
manutenção. Segundo Leandro Luiz 20, das principais entradas do campus plo, que estivesse trabalhando em al- Cancelier, tanto a Constituição quanto
de Oliveira, diretor da Secretaria de e locais com boa iluminação. gum laboratório durante a madrugada, o Código Civil defendem que se existe

8 • ABRIL | 2017
interesse público nas questões relacio- nobre, mas é preciso atentar que se-
nadas à segurança, a instalação de câ- gurança é algo mais complexo do que
meras é permitida. Porém, a liberação plantar centenas de câmeras e colocar
do acesso para todos que possuem um alguém para ficar vigiando essas telas”,
IDUFSC significaria dar poder de vigi- alertou. O professor destacou que pes-
lância para pessoas não capacitadas. O quisas internacionais mostram que o
professor comentou que, ao tomar co- uso de câmeras pode até coibir alguns
nhecimento do aplicativo pela equipe comportamentos desviantes, mas não
do Zero, conversou rapidamente com resolvem o problema completamente.
Oliveira. Depois dessa conversa, o di- Além disso, argumentou que a visuali-
retor da SSI informou que iria repen- zação das imagens da UFSC por qual-
sar o aplicativo. quer um que tenha acesso ao sistema
de identificação pode ser considerado
1º de abril invasão de privacidade, porque as pes- Qualquer pessoa com IDUFSC teria acesso às imagens de 15 a 20 câmeras do sistema
Os repórteres do Zero conversaram soas têm direito à privacidade e têm
com o chefe de gabinete, para confir- seus direitos de imagem. “A rigor, para antes da minha privacidade.” Stepha- tindo ao operador uma visão privilegia-
mar se o Rota Segura seguiria como colocar um sistema como o Rota Segu- nie Andreon, colega de curso de Por- da. Moretzsohn salientou que a ilumi-
conversado com Oliveira. Moraes, po- ra para funcionar, a UFSC deveria so- to, ressalta que a universidade é um nação seria outra medida eficiente para
rém, disse que pode ter existido um licitar a autorização das mais de 40 mil local público e, por isso, não consi- melhorar a segurança. “O sistema de luz
equívoco por parte da repórter do UOL pessoas de sua comunidade, sem con- dera os novos sistemas como invasão precisava ser realmente potencializado.
ou que Oliveira pode ter se expressado tar o contingente de pessoas externas de privacidade. Também imagina que, Assaltos à noite são mais comuns e mais
mal, mas o acesso às câmeras da UFSC com as medidas, ficaria mais fácil perigosos porque costumam acontecer
pelos alunos nunca foi dado como cer- identificar possíveis crimes que estão com emprego de arma de fogo, que está
to; era apenas uma possibilidade do “Você se sentiria mais prote- prestes a acontecer. Para a estudan- fortemente relacionado ao consumo de
sistema. Ele reiterou que o Rota Segu- gido ou mais vigiado com a li- te de Direito, Bruna Pereira, além de drogas ilícitas e a violência vem a rebo-
ra é sobre caminhos iluminados, aces- considerar invasão de privacidade o que disso”, garantiu.
sibilidade e vigilância. beração do acesso às câmeras acesso às imagens das câmeras por
por meio do IDUFSC?” qualquer estudante com IDUFSC, la- Legislação
3 de abril menta os alunos não terem sido con- A Agência Nacional de Aviação Civil
Oliveira afirmou que, em conver- sultados sobre o aplicativo e o uso (Anac) informou que vem trabalhando
sa com Mikhail Cancelier no dia 29 de dos drones. “A universidade deveria na regulamentação de drones e que a
março, percebeu que a abertura das 27% ter falado conosco. Nós transitamos norma será deliberada nas próximas
imagens poderia violar o direito de mais por esse espaço. É uma relação que semanas. Houve uma audiência pú-
privacidade dos alunos e de quem cir- estabelecemos com eles”, defende. A blica em 2015 e a quantidade de ma-
cula pelo campus. Conforme Oliveira, protegido graduanda do curso de Museologia, nifestações recebidas no período foi
há 90% de chance de o aplicativo ser 73% Sabrina Montino, opina que as câme- grande, tanto da indústria quanto da
revisto e as imagens serem restritas ras não impedem assaltos: “Sentiria- sociedade, motivo pelo qual a legis-
apenas à equipe de segurança da insti- mais me mais segura com um aumento de lação não foi publicada na época. Se-
tuição. A Secretaria de Segurança Ins-
titucional garantiu que vai entrar em
vigiado postes de luz e também de guardas. O
campus é muito escuro”.
gundo a ANAC, quem deseja operar
um drone precisa solicitar à agência
contato com a Procuradoria Federal Na visão do especialista em seguran- um pedido de operação que é avalia-
para esclarecer a legislação e, possi- ça Eugênio Moretzsohn, tanto as câme- do e, então, concedido um Certificado
velmente, decidir pelo cancelamento ras de vigilância quanto o uso de drones de Autorização de Voo Experimental
da ideia inicial. Fonte: Zero são eficazes. Moretzsohn explicou que (Cave) ou uma Autorização Especial de
as câmeras têm dois papéis importan- Voo, permitindo a operação. Enquan-
Segurança? que transitam por ela”, justificou. tes: registrar as imagens, armazenan- to a regulamentação não está vigente,
Para o doutor em Ciências da Co- O uso de drones e o aplicativo Rota do-as para que sirvam como prova em a legalidade de operação é analisada
municação, professor e pesquisador Segura dividiram opiniões dentro do casos de ocorrência e, gerar o alerta caso a caso.
de privacidade e jornalismo do De- campus. Thales Porto, estudante de para a equipe de segurança em situa-
partamento de Jornalismo da UFSC, Engenharia de Controle e Automação, ções anormais. O especialista reforçou Lucas Krupacz
Rogério Christofoletti, a linha que se- sente-se mais seguro com as novida- que drones são eficientes por serem lucas.krupacz@gmail.com
para proteção e vigilância é tênue. “A des. “As câmeras dão mais proteção. discretos e ampliarem a capacidade de Maria Fernanda Salinet
intenção pode ser a melhor, a mais Acredito que minha segurança venha visualização de grandes áreas, permi- mariafernandasalinet@gmail.com

Jair Quint/Agecom

ABRIL | 2017 • 9
FINANÇAS

Custo UFSC pode ultrapassar R$ 2 mil Fotos: Pablo Mingoti/Zero

Para se manter no ensino superior os


estudantes precisam administrar os gastos
e, às vezes, contar com auxilios federais

A
pós serem aprovados em lo, pois qualquer emergência, tem a
um curso superior, os es- quem pedir ajuda. Izi Izumi, estudante
tudantes, principalmen- de Farmácia, teve que ir a um hospi-
te aqueles que vêm de tal particular por causa de um cálculo
outras cidades, precisam renal. “Gastei cerca de R$ 800 e não
adquirir a responsabilidade de con- tinha nem metade disso”, lembra. Izi
trolar as próprias finanças com uma recebe uma pensão de R$ 2.000 do pai
quantia mensal vinda de bolsa auxí- e R$ 400 como estudante de iniciação
lio, estágio, dos pais ou parentes. De científica. Com essa quantia, ela paga
acordo com uma pesquisa feita pelo o aluguel, itens farmacêuticos e ainda
economista Leonardo Alonso Rodri- separa uma quantia para enviar à mãe.
gues em sua monografia, 76% dos Cerca de R$ 500 é dedicado para ali-
alunos da UFSC recebem ajuda fi- mentação e lazer. A estudante come-
nanceira familiar, sendo que a maior çou a morar sozinha aos 16 anos e com Izi Izumi costuma anotar as despesas ao longo do mês para não se perder nas contas
porcentagem do valor da assistência o passar do tempo, aprendeu a anotar
varia entre R$ 800 e R$ 1250. Em re- os gastos em um caderno. “A maior di- O gasto de cada universitário de- mensais em despesas anuais e, fazen-
lação aos benefícios concedidos pela ficuldade é equilibrar as contas até o penderá de vários fatores como a fase do isso, o estudante vai se assustar
Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis final do mês, mas nunca faltou”, des- e o curso de graduação, além da rea- com o excesso de gastos e começará a
(PRAE), as maiores porcentagens são taca. Para economizar, a futura far- lidade de cada aluno. Na pesquisa de poupar com cafezinhos, planos de ce-
da Isenção do Restaurante Universi- macêutica busca alternativas comuns monografia feita em 2015, o economis- lular, vai aprender a negociar compras
tário seguido por Bolsa Permanência como cozinhar em casa e lavar roupa ta Leonardo Alonso Rodrigues faz uma e serviços”, enfoca a professora.
e auxílio moradia. Uma das formas uma vez por semana. análise das despesas de alguns cursos O economista Lino Savian explica
de evitar dívidas e controlar os gas- Quando Camila Haika foi aprovada e percebe que Ciências e Tecnologia que um universitário não necessita ser
tos durante a graduação é trabalhar para o curso de Administração, rece- de Alimentos possui um gasto médio um especialista para o entendimento
com objetivos e planejamentos de bia R$ 1.300 dos pais e era, no início da de R$ 2302,50 ficando na frente de En- de alguns conceitos básicos de finan-
curto, médio e longo prazo. graduação, que faltava dinheiro. “Eu genharia de Produção, Arquitetura e ças. Para os que conseguem economi-
Quando o universitário depende de esquecia que a conta de luz vinha no Urbanismo, Medicina e Odontologia. zar uma quantia mensal, Lino indica
uma bolsa estudantil, o planejamento final do mês e torrava toda grana an- Matemática está em último lugar dos que o universitário invista. “O Crédito
deve ser ainda maior, como é o caso de tes. Era aí que eu precisava de ajuda dos gastos medianos com R$ 835. O estudo de Depósito Bancário (CDB) pode ser
Tamyres Ferri, que saiu de Minas Gerais pais ou negociava com as duas amigas chega a uma conclusão que o custo de uma ótima escolha para investimentos
para cursar Agronomia na UFSC. Ela com quem divido o apartamento”, con- vida médio de um aluno de graduação em médio prazo, aqueles de 3 a 9 anos,
participa do Programa de Apoio à Per- ta. Hoje, Camila recebe R$ 2.000 para da UFSC é de R$ 1417, 04. por render mais que a caderneta de
manência ao Estudante e recebe auxílio aluguel, materiais para a faculdade, Em sua experiência como plane- poupança e ser considerado de baixo
moradia, além de uma bolsa de R$ 610, comida e transporte e, como forma de jadora financeira pessoal e professo- risco. Os Títulos do Tesouro Direto, são
valor que é programado para alimenta- planejamento, utiliza um aplicativo de ra da Fundação Getúlio Vargas (FGV), indicados para a realização dos sonhos
ção, roupas, calçados, lazer e materiais controle de gastos. Camila consegue Myrian Lund percebe que a falta de de médio e de longo prazo”, esclarece.
como impressão de textos, livros e itens fazer com que sobre uma quantia que consciência financeira dos jovens Já para emergências, ele aconselha se-
de papelaria. “Quando falta é compli- é depositada em uma poupança para acontece por não ser uma disciplina parar no mínimo 10% dos rendimentos
cado, pois não tem a quem recorrer. Já um futuro intercâmbio. A estudante se incluída nas escolas e nem um assun- sem ter de recorrer aos valores pou-
passei por situações como não conse- considera consumista quando se trata to discutido frequentemente no âm- pados para os sonhos. “Sabemos que
guir imprimir um trabalho”, descreve a de sua alimentação. “Na Trindade tem bito familiar. Para ela, o universitário o período universitário é financeira-
aluna. Ela distribui a quantia para o mês muitas opções e eu adoro um cafezinho precisa gastar e investir nos sonhos e mente complicado, mas o estudante
inteiro e tenta pesquisar os preços mais da tarde, mas sempre procuro pou- objetivos e, para isso, é necessário re- pode economizar, realizando a elimi-
em conta no supermercado. “É raro so- par”, garante. Apesar de já possuir ex- nunciar uma festa ou um produto que nação completa do desperdício e da
brar. Geralmente dá certinho até cair a periência com finanças desde o ensino deseja comprar. “Por exemplo, é legal otimização de gastos”, adverte.
próxima bolsa. O maior aprendizado, é fundamental, a futura administradora tomar chope todo dia com os amigos,
pensar no dia de amanhã”, admite. diz que ser universitária e ter que mo- mas se você precisa dinheiro, deverá
Quem possui ajuda financeira dos rar longe da família é um aprendizado escolher o dia qua vai tomar chope. Pablo Mingoti
pais está um pouco mais tranqui- enorme sobre o real valor do dinheiro. Uma dica é transformar as despesas pablomingoti@gmail.com

Gastos dos alunos de alguns cursos da UFSC


R$ 2.500,00 R$ 2.302,50

R$ 2.o00,00

R$ 1.500,00

R$ 1000,00 R$ 835,50

R$ 500,00

tos o s a
en gia
uçã
o
taç
ão
ism
o
cin
a a
ogi Camp iais ogi
a ica Fís
ica em
a tic
m olo d u ban
di tol ter vol lóg Cin má
Ali Ge Pro mp Ur Me nto
n d o Ma u i
sB
i o
Ma
te
ad
e
ia d
e Co e O ção ad
e Arq cia
i ar da ra uca nhari ên
log nh as etu d i
cno ge nci uit E ge
C
eT
e En Ciê Arq En
C.
Fonte: Pesquisa IVC-UFSC (2015)
Camila Haika usa aplicativos para controle dos gastos diários

10 • ABRIL | 2017
SAÚDE

Instabilidade marca gestão da Ebserh no HU


Diretoria justifica emergência fechada e poucos leitos pela falta de funcionários

N
Fotos: Ana Carolina Thomé/Zero
o dia 3 de março de 2017, Marcos Pe-
reira estava dentro do ônibus UFSC
semidireto quando começou a passar
mal e ter dificuldades para respirar. O
mestrando de química recebeu auxílio
de outro passageiro e juntos foram para o Hos-
pital Universitário (HU) em busca de ajuda. No
atendimento de emergência, Marcos foi informa-
do de que não havia médicos disponíveis, nem a
possibilidade de qualquer atendimento. O hospi-
tal estava lotado. E sem ambulâncias.
Por sorte, um agente da Polícia Rodoviária Fe-
deral amparou o aluno e o levou até o Centro de
Saúde Trindade. O final dessa história poderia ter
sido trágico, pois a razão do mal-estar foi uma
intoxicação com metanol, um biocombustível al-
tamente inflamável, no laboratório da Universi-
dade no dia anterior. “Qualificaria o atendimen-
to do HU como desumano”, disse o estudante. E
ressaltou que, com a implantação da Empresa
Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), es-
perava uma melhora no atendimento, devido às
promessas favoráveis à mudança de que já havia
escutado. “Me leva a perguntar se alguém com um
caso mais grave que o meu não teria passado por
um mal pior na hora”.
De 50 hospitais universitários no Brasil, a Eb-
serh é responsável pela gestão de 39, em que suas
respectivas Universidades optaram por assinar
contrato com a estatal. A UFSC foi uma das últi-
mas a aderir aos serviços da empresa pública de

“NOS ÚLTIMOS TEMPOS NÓS


REALMENTE CHEGAMOS A
UM PONTO CRÍTICO”
HEDA MARA SCHMIDT

direito privado e, por aqui, a decisão sobre entre-


gar ou não o HU nas mãos da Ebserh foi bastan-
te debatida por conta de discordâncias internas
entre técnicos, alunos e professores. Somente em
dezembro de 2015, quatro anos após ser promul-
gada a Lei Federal nº 12.550 que criou a empresa,
o Conselho Universitário (CUn) da UFSC aprovou Após um ano, EBSERH apresenta bons números, mas atendimentos de emergência contestam eficiência da gestão
a adesão. O contrato foi assinado em 16 março de
2016 e acaba de completar um ano. dante da UFSC, procurou auxílio em razão de es- chutados”, relatou a estudante. Nesse dia, o hos-
No plano de reestruturação do HU, feito em tar com a clavícula quebrada e 40 graus de febre, pital estava prestando serviço de emergência so-
abril de 2016, que tem por objetivo estabelecer no dia 10 de março. “Pediram para que eu procu- mente para crianças.
ações a serem desenvolvidas nos 18 meses ini- rasse outra emergência, porque mesmo com fe- A diretora clínica do HU, Heda Mara Schmidt ex-
ciais de vigência, ficou definido que a Ebserh é bre alta não seria atendida. Somos simplesmente plica que a suspensão do atendimento de casos me-
responsável pela ampliação de leitos no prazo de Larissa Liz/Zero nos complexos e de usuários que poderiam procu-
seis meses e pela ampliação dos procedimentos rar outras unidades básicas acontece para atender,
de emergência e consultas. No entanto, segundo de forma segura, os pacientes em estado grave. “O
o Boletim Estatístico do Movimento Hospitalar objetivo é basicamente que a gente consiga atender
(BEMH), o atendimento de emergência vem di- com qualidade todos os pacientes que estão ali”, dis-
minuindo desde o ano passado. O hospital ter- se a Diretora. No entanto, ela admite: “nos últimos
minou o ano com 11.429 atendimentos feitos em tempos, nós realmente chegamos em um ponto crí-
dezembro, e, em 2017, esse número foi para 7.929 tico”. Os critérios que determinam a suspensão tem-
e 6.554 em janeiro e fevereiro, respectivamente. O porária do atendimento estão previstos no Procedi-
principal motivo da queda é a emergência adulta mento Operacional Padrão (POP) que foi elaborado
constantemente fechada por superlotação. pela administração do Hospital, visando à segurança
Durante o mês de março, o setor emergencial dos pacientes em atendimento. Além da emergência
do HU esteve com cartazes na porta de entrada adulto, o HU possui superlotação na maternidade
dizendo que os casos de emergência envolvendo e na UTI neonatal. No dia 04 de Abril a emergên-
adultos encontravam-se com atendimento sus- cia estava aberta, porém funcionando lentamente,
penso temporariamente. Francielle Cecilia, estu- Aluno da UFSC não recebeu tratamento urgente no HU com prioridade para casos mais graves que são

ABRIL | 2017 • 11
Superlotação na maternidade tação de 28 novos leitos clínicos, sendo 7 para ao nascimento seguro, crescimento e desenvolvi-
afeta outros setores saúde mental. O artigo 16 da Lei Federal 12.550 mento saudáveis.
diz que a partir da assinatura do contrato “a Além disso, a nova estru-
Ebserh disporá de prazo de até 1 ano para re-
ativação de leitos e serviço inativos por falta
de pessoal”. No HU, esse prazo já terminou e
o número de leitos apenas caiu: de 214 em
2014 para 202 em 2016, segundo o BEMH.
A superintendente do HU, Profª Ma-
ria de Lourdes Rovaris, explica que a
abertura de leitos e outros serviços do
hospital será proporcional às vagas li-
beradas do concurso. “Para manter os
leitos abertos precisamos de uma equipe
multiprofissional mínima”, ressalta. O Hospital
tem habilitado 14 leitos de UTI adulto, mas so-
mente de 10 a 12 leitos são mantidos, por falta
avaliados por enfermeiras. Para aqueles de menor de colaboradores. Com as futuras contratações,
gravidade o tempo de espera é bem maior. a prioridade será a abertura de leitos de clínica mé- Sem vagas em UTI neonatal
Outro setor que vivencia uma queda de núme- dica, que darão sustentação à emergência adulto,
ros desde a implantação da Ebserh é o de con- permitindo a transferência de pacientes in- tura organizacional prevê a escolha da chefia do
sultas efetivadas. No plano de reestruturação da ternados nessa unidade para uma unidade de Setor de Regulação e Avaliação em Saúde do HU,
unidade, feito após a assinatura do contrato, uma internação. “Dessa forma, otimizaremos a capaci- proceso que está sendo feito no momento. Este
das metas descritas é a de garantir a realização dade operacional da emergência adulto, que hoje setor constitui a interface com as Centrais de Re-
de 9.863 consultas médicas por mês. Nos dois pri- vivencia superlotação.” gulação para disponibilizar consultas ambulato-
meiros meses de 2017, o HU não conseguiu atingir Segundo a Superintendente, para as soluções riais, serviços de apoio diagnóstico e terapêutico,
esse objetivo. Segundo o Boletim Estatístico do desses problemas, o HU tem realizado reuniões leitos de internação e buscar vagas de internação.
Movimento Hospitalar (BEMH), em janeiro foram Segundo Maria de Lourdes, também está sen-
realizadas 8.979 consultas e, em fevereiro, o nú- do discutida via videoconferências a retoma-
mero subiu para 9.579, mas ainda não alcançan- da do processo de implantação do Aplicati-
do a meta proposta. Em 2014, o HU finalizou o vo de Gestão para Hospitais Universitários
ano com 126.622 consultas e em 2016 com 121.379 (AGHU). Segundo o portal do Ministério da
- uma queda de 4,14%. Educação, o objetivo do aplicativo é “apoiar a
Os principais motivos são de ordem funcional, padronização das práticas assistenciais e ad-
como afastamentos para tratamento da saúde, ministrativas dos HU’s Federais e permitir a
aposentadorias e demissões a pedido que o HU criação de indicadores nacionais, o que facilitará
vem sofrendo. Apenas em 2016 e início de 2017, a adoção de projetos de melhorias comuns para
aposentaram-se 108 trabalhadores e houve 14 de- esses hospitais”.
missões a pedido. Desses trabalhadores, 32 eram Dentre os que criticavam a adesão da Ebserh,
médicos. “É muita gente e isso tem um impacto estava o receio de que o HU perderia sua função
na assistência porque, como não tinha concurso básica de ser um hospital escola e deixasse de
vigente, a gente não tinha como repor esses pro-
fissionais”, explica Heda. A admissão para o HU Cartazes foram colados na porta da emergência
continuará ocorrendo apenas por concurso pú-
blico, e no dia 21 de março de 2017 foi divulgada com a Central de Regulação Estadual sobre a si-
a segunda parte do resultado da prova realizada tuação da Emergência. Essa Central foi implanta-
em dezembro do ano passado. Agora, o Hospital da pela Secretaria de Estado da Saúde (SES) para
aguarda a data de divulgação do resultado final proporcionar o acesso da população aos serviços
para contratação do quadro de funcionários. A de saúde em todos os níveis de atenção, ou seja,
expectativa é o preenchimento de 421 vagas, sen- atenção básica, média e alta complexidade. Já em
do 119 vagas na área médica, 287 vagas na área relação às superlotações da maternidade, foram
assistencial e 15 vagas na área administrativa. “A retomadas reuniões do Grupo Condutor da Rede
ideia é que se chame os trabalhadores justamen- Cegonha da Grande Florianópolis,
te para as áreas mais críticas em que a gente tem já que essa não é uma situação es-
um déficit mais importante e com o principal pecífica do Hospital. Essa rede con- Colaboradores
objetivo da reativação desses leitos como estava templa cobertura do Sistema Úni- 2014: 1.798
planejado. Então ao longo de 2017 a expectativa é co de Saúde (SUS) que assegura às 2016: Serão preenchidas mais
a reabertura dos leitos”, conclui a diretora. mulheres o direito ao planejamento 421 vagas a partir do segundo
Quanto ao número de leitos, a meta no Pla- reprodutivo, atenção humanizada à semestre de 2017 referentes ao
no de Reestruturação é a reativação de 65 leitos, gravidez, parto e puerpério, garan- primeiro concurso público do
sendo 20 de cuidados prolongados, e a implan- tindo também às crianças o direito Hospital Universitário
Mariela Cancelier/Zero

Consultas Leitos Atendimentos Cirurgias Cirurgias


Internações
efetivadas ativos de emergência centro-cirúrgico ambulatoriais

2014 126.622 214 8.746 74.694 2.699 3.980

2016 121.379
Fonte: Boletim Estatístico do Movimento
202 9.519 117.868 3.328 13.361 Hospitalar (BEMH)
e Processo n.23080.061734/2015-11

12 • ABRIL | 2017
atender 100% pelo SUS. Segundo a superinten-
dente, a prestação de serviços de assistência à
saúde permanece 100% no âmbito do Sistema
Único de Saúde (SUS). “Os pacientes que chegam
pelas emergências são atendidos também pelo
SUS”, concluiu. Tanto a lei federal quanto o con-
trato assinado reforçam a assistência ao SUS.
O Hospital também continua subordinado aca-
demicamente à universidade e hoje conta com uma
Gerência de Ensino e Pesquisa que está em pro-
cesso de estruturação, diferente do organograma
antigo onde havia apenas uma assessoria de ensi-
no e pesquisa. Entre as competências da gerência
está a de analisar, fomentar e viabilizar a execução
das propostas de ensino, pesquisa e extensão. “A
gerência tem mais cargos, é mais robusta e pos-
sui esse papel de coordenar o ensino e a pesquisa
dentro da Instituição e interligar os departamen-
tos de ensino com serviços assistenciais”, explica a
diretora clínica do HU, Heda Mara Schmidt.

Ana Carolina Thomé


anacrthome@gmail.com
Larissa Liz
larissafliz@gmail.com
Luana Meira
luanameira@gmail.com Fonte: http://www.ebserh.gov.br/web/portal-ebserh/filiais-ebserh

O HU Repercussão na UFSC
O Hospital Universitário Professor Polydoro Em abril de 2015, o Conselho Universitá-
Ernani de São Thiago, da Universidade Federal rio (CUn) promoveu uma consulta pública para
de Santa Catarina (UFSC), é o único hospital fe- deliberar sobre a possibilidade da adesão da
deral do Estado. Criado para viabilizar as ativi- empresa ao HU/UFSC. De um total de 42.314
dades de ensino, pesquisa e extensão da Uni- eleitores aptos, 8.838 (20,89%) compareceram
versidade, o hospital atende exclusivamente às urnas. Destes, 6.171 votaram contra à ade-
usuários do Sistema Único de Saúde (SUS). são (69,82% do comparecimento e 14,58% do
total geral) e 2.550 a favor à adesão (28,852% do
A Ebserh comparecimento e 6,03% do total geral).
A Ebserh é uma empresa pública vinculada O resultado foi de: 74,44% (não) e 24,90%
ao Ministério da Educação e foi criada em 2011 (sim) entre alunos, 37,94 (não) e 58,51% (sim)
pela Lei Federal nº 12.550, de 15 de dezembro, entre professoras e 63,34% (não) e 28,67% (sim)
com a justificativa de recuperar os hospitais entre os servidores técnico-administrativos.
vinculados à universidades federais. A empresa O documento “Subsídios ao debate sobre a
é o órgão responsável pela gestão do Programa Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares –
de Reestruturação dos Hospitais Universitários Ebserh na UFSC”, elaborado por oito membros
Federais (Rehuf), atuando na modernização da comissão contrários à adesão, reconhece o
da gestão dos hospitais universitários federais e caráter informal da consulta e sua não vincula-
melhorando a prestação de saúde à população. ção com a decisão final.
Pelo menos dois dos 14 leitos de UTI estão fechados

A adesão
Em 1º de dezembro de 2015, os membros do
Conselho Universitário (CUn) da UFSC apro-
varam a adesão do HU à Ebserh. Dos 67 in-
tegrantes do CUn, 37 participaram da votação
nominal, sendo 35 favoráveis e dois contrários
ao parecer que sugeria a adesão.
No dia 16 de março de 2016, a UFSC fir-
mou o contrato com a Empresa Brasileira
de Serviços Hospitalares (Ebserh). A par-
tir da assinatura do contrato, o HU passou
a ser administrado em uma ação conjunta
entre a universidade e a Ebserh, com o ob-
jetivo de modernizar a gestão da estrutura
administrativa, recuperar a infraestrutura
física e tecnológica e recompor o quadro de
profissionais.
Entre as atribuições assumidas pela em-
presa estão a coordenação e avaliação da exe-
cução das atividades dos hospitais, o apoio
técnico à elaboração de instrumentos de me-
lhoria da gestão e a elaboração da matriz de
distribuição de recursos para os hospitais.
A gestão seria responsável pela ampliação dos procedimentos de emergências e consultas no prazo de seis meses

ABRIL| 2017 • 13
SOCIEDADE
Fotos: Daiane Nora/Zero

Hostel familiar no Campeche conta com o trabalho de dois voluntários que vieram conhecer a Ilha de Santa Catarina e trocam hospedagem e trabalho por alimentação

Portas se abrem ao turismo colaborativo


Cultura de colaboração ganha adeptos pelo mundo, mas regulamentação ainda é frágil

C
arros sem passageiros, quartos vazios, suas experiências como positivas ou negativas, o que dos em plataformas como o Airbnb a estarem cadas-
bicicletas enferrujadas no quintal de- permite que a comunidade se comunique e troque trados na prefeitura, e que também proíbe o anúncio
serto, recursos ociosos que podem informações. Foi por meio de um desses sites que de mais de 50% da área do imóvel. A polêmica desse
tomar vida com a colaboração. Já são Camila entrou em contato com Daniela Gué, dona de tipo de plataforma, que permite aos indivíduos alu-
milhares de pessoas que têm se apro- um hostel no Campeche. gar o todo ou parte do imóvel, não é novidade, já que
ximado com a ajuda da tecnologia para fazer um Dos fundos da casa, várias risadas preenchiam os há mais de seis anos a startup foi acusada por autori-
turismo mais sustentável. Foi dessa maneira que a relatos de Daniela. A dona do hostel conta como o dades nos Estados Unidos de evitar impostos e violar
gaúcha Camila Boff conseguiu passar um ano em voluntário tem sede de conhecer e de fazer amiza- códigos locais sobre aluguel de hospedagem.
Florianópolis trocando hospedagem por trabalho. des, como se mostra mais disposto a ajudar, mes- Os modelos de regulamentação da economia co-
À luz de um ralador, que havia sido transforma- mo que às vezes tenha que puxar a orelha de alguns. laborativa, até então, têm tratado de plataformas
do em luminária de teto, repousavam duas canecas Mas ela afirma que funciona, que eles são como uma como o Airbnb, mas para o presidente da Abih (As-
sobre a mesa. Camila e Fernando desenhavam uma grande família, com direito a fofoca e a briga: “Às ve- sociação Brasileira da Indústria de Hotéis), Dilson
tatuagem e o som de François Muleka dava ritmo ao zes vem uma voluntária mais mimada, mas a gente Fonseca, o Airbnb não faz parte da economia cola-
trabalho. Nos horários livres, Camila tatua com a má- ensina, a pessoa aprende e a mãe agradece.” explica borativa. Durante o Seminário sobre o Impacto da
quina que ganhou da amiga e com a habilidade que Gué, “O importante é ter uma carga de horário justa Economia Colaborativa no Turismo, Dilson pontuou
aprendeu durante a estadia no hostel do Campeche. para que o voluntário consiga fazer outras coisas.”. que “Nós temos que definir se a locação de imóvel
Além disso, Camila cuida da recepção, varre e lava Atualmente, não existe nenhuma lei que regula- é amadora ou profissional. Se o cara está usando o
louça, algumas das atividades que ela e outros cinco menta esse tipo de atividade no País, mas já existem quarto dentro do seu apartamento é economia cola-
voluntários fazem durante oito horas, três dias por espaços que estão discutindo essa questão, como o borativa, se o cara tem 20 apartamentos sem pagar
semana, em troca de hospedagem e café da manhã. Seminário sobre o Impacto da Economia Colabora- imposto pro Brasil é atividade irregular”.
A troca de serviços é uma das várias práticas do tiva no Turismo que aconteceu em dezembro. O pre- O desenvolvedor da plataforma Worldpackers,
que se convencionou chamar de economia colabo- sidente da Ctur (Comissão de Turismo), Deputado Ricardo Lima, conta que nunca tiveram problemas
rativa, que somente no turismo já abrange vários se- Herculano Passos (PSD/SP), falou que regulamentar com a fiscalização. Ricardo conheceu Eric em um
tores. Na esfera do transporte, por exemplo, vemos a os negócios que funcionam hostel em San Diego, Estados
colaboração quando alguém oferece ou recebe uma de forma colaborativa é um Unidos, Eric abriu a equipe
carona. Na hospedagem, oferecer seu sofá a um via-
jante ou trocar o quarto de um hostel por trabalho,
grande desafio, pois essa
nova maneira de consumo
“NÃO PODEMOS LUTAR do seu hostel para voluntá-
rios e Ricardo era um deles.
também é colaboração. Além disso, é possível ofere- não se enquadra na maior CONTRA ALGO QUE É Para Ricardo, trocar hospe-
cer seu jardim que está ocioso para quem gosta de parte das previsões do ar- dagem por trabalho era bom,
acampar. A lógica é: ao invés de possuir e acumular, cabouço legal. Para resolver NATURAL E FAZ SENTIDO” pois ele aprendia línguas e
dividir e trocar. essa questão, os deputados HERCULANO PASSOS
se sentia útil no lugar. En-
Esse tipo de compartilhamento sempre existiu, querem criar a Comissão Es- PRESIDENTE DA COMISSÃO DE TURISMO tretanto, Ricardo precisava
a diferença é que, com a tecnologia, encontrar pes- pecial do Marco Regulatório bater de porta em porta para
soas com interesse em comum ficou mais fácil. Já da Economia Colaborativa, com a finalidade de de- procurar acomodação, ele sentia que faltava uma
são inúmeros os aplicativos e sites que propiciam a bater modelos internacionais que vêm dando certo e plataforma que fizesse isso. Os dois, então, resolve-
economia colaborativa. Algumas dessas plataformas que podem servir de diretriz para a regulamentação ram lançar o site que hoje conta com uma comuni-
possuem algoritmos que facilitam o match (combi- no Brasil. dade de quase 500 mil pessoas e que mediou a troca
nação) entre quem oferece e quem busca por um Ano passado, Nova York, Estados Unidos, protesta- de 300 mil noites ano passado.
serviço, ao usar dados como habilidades de trabalho va a favor da regulamentação dos aluguéis informais, Apesar de essa ser uma prática que acontece no
e fluência de línguas que os usuários fornecem. Além quando foi assinado a lei que proíbe a locação de imó- mundo todo, no Brasil, bem como em outros países,
disso, para garantir certa segurança aos usuários, os veis familiares por menos de 30 dias. Algo semelhante trabalhar sem carteira assinada é ilegal. Mesmo se a
aplicativos de carona e hospedagem possuem um aconteceu em Berlim, Alemanha, em 2014, quando foi pessoa for trabalhar por apenas um mês, “todo traba-
espaço de feedback (retorno). Lá, os viajantes relatam decretada a restrição que obriga os imóveis anuncia- lhador precisa de carteira assinada ou um contrato de

14 • ABRIL | 2017
experiência de 30 ou 90 dias”, esclarece o presidente pela localização e pela quantidade de procura pelo serviço prestado para entidade governamental ou
do Sitratuh (Sindicato dos Trabalhadores em Turismo local. E não é qualquer propriedade que consegue privada, sendo que estas devem não ter fim lucrativo
e Hospitalidade), Anésio Schneider. Ele ainda ressal- entrar no site, os donos precisam se submeter a uma e ser voltadas para objetivos públicos.Normalmente,
ta que a regra também vale para os estrangeiros, des- vistoria, onde é checado seu perfil completo, histó- as partes que participam desse tipo de relação (troca
de que estejam legais dentro do país. Os critérios para rico e, muitas vezes, precisam receber uma pessoa de mão de obra por bens e serviços) estão cientes dos
o trabalho regular são carga horária fixa, piso mínimo do Worldpacker para verificar o lugar. riscos, mas as leis dão segurança jurídica às partes,
da categoria, respeitar as leis tra- alerta o presidente da Ctur para
balhistas, ou seja, se enquadrar a necessidade da regulamenta-
às regras da CLT (Consolidação ção, e acrescenta: “É importante
das Leis do Trabalho). Segundo que as pessoas tenham liber-
Anésio, os aspectos negativos de dade para fazer escolhas deste
não estar de acordo com a CLT é tipo, não podemos lutar contra
não contribuir com impostos, ou algo que é natural e faz sentido”.
com o INSS (Instituto Nacional de Camila tem noção dos seus di-
Seguridade Social) e nem contar reitos: “Minha mãe acha que eu
com a garantia de segurança do deveria me preocupar, até falou
trabalhador. Assim, os sites que que eu não ia contribuir com o
mediam as trocas de trabalho por INPS e eu disse: mãe, vou me
hospedagem estão sujeitos a mul- aposentar quando?” riu Camila.
ta e cabe ao Ministério do Traba- Sentado no banco que ele
lho realizar o serviço de fiscalização. mesmo pintou, o colega de Camila,
Segundo a Auditora Fiscal do Minis- Fernando de Moura Lobo toma café
tério do Trabalho em Santa Catarina, e fala sobre sua rotina. Há 5 meses no
Ester Barbosa, ela nunca recebeu uma hostel fazendo Nightshift, cuida do
denúncia relacionada a esse tipo de espaço a noite, faz check in e check
atividade. Contudo. mesmo o trabalho out, dá uma geral, limpa, varre, zela
sendo irregular, é possível buscar aju- pela hora do silêncio. Nos horários li-
da judicial se houver algum abuso por vres, Fernando trabalha em um quios-
parte do superior até 2 anos após o que de açaí: “A grana de reserva tava
ocorrido, o importante é coletar todas chegando ao fim e eu precisei arru-
as provas possíveis da situação, como mar um bico, mas como todo mundo
gravações e testemunhas. A denúncia é uma família, ninguém passa fome,
pode ser realizada através da central só não vai ter grana pra tomar uma
de atendimento Alô Trabalho (número birita.”. É a primeira vez dele fazendo
158), canal de comunicação entre o ci- turismo colaborativo, “Eu queria mo-
dadão e o poder público, onde também rar no litoral já fazia 10 anos, se não
podem ser obtidas informações sobre Experiência positiva faz com que viajantes fiquem mais tempo do que o planejado fosse esse esquema eu estaria em São
os serviços e programas do ministério Paulo até hoje”, conta Fernando. A di-
do Trabalho. Nos hostels, os “voluntários” são assim chama- ficuldade de se morar em um hostel é que aparecem
Existem algumas plataformas que oferecem uma dos devido a compreensão dos participantes de que pessoas de todos os cantos do mundo, explica, cada
espécie de seguro, como é o caso do Worldpackers, o trabalho é informal e de comum acordo. Contudo, um com sua cultura, algumas fáceis e outras mais
que cobre até três dias de hospedagem em outro lu- se tratarmos do termo “voluntariado” pela legisla- difíceis de lidar. O ponto positivo é que é uma for-
gar, caso aconteça algum problema. Apesar disso, o ção, a definição não se encaixa, já que nesse caso as ma de pensar diferente do sistema, relata Fernando:
site não é gratuito, existe uma taxa de até 40 dólares normas da CLT não são aplicáveis. Pela lei de núme- “Você fica mais criativo e mais solto, conhece pesso-
para se inscrever como voluntário, tarifa que varia ro 9.608/1996, o trabalho voluntário é definido como as, troca experiências, abre a cabeça.”.

Plataformas dão fôlego à economia colaborativa


A economia colaborativa é uma atividade que re- mite que os motoristas privados para acampar, como um quintal de casa, na
duz o período de ociosidade de um recurso, de acor- forneçam informações praia ou na montanha.
do com o estudo técnico publicado ano passado pela sobre o trânsito em trocacasa.com Se você precisa de algo emprestado, o Tem Açú-
Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados. tempo real, além de Pessoas oferecem car pode te socorrer. O objetivo da rede é promover
Esse tipo de economia alertar a existência de suas casas para a colaboração entre vizinhos e facilitar o emprésti-
não é nova, na verdade, radares, policiamen- troca, que podem ser mo de objetos. Mas se o objeto que você quer é um
remonta ao primitivo tos e acidentes. O Bora simultâneas ou não. livro, o site Livralivro
temaçucar.com
escambo, que foi sendo Junto auxilia a encon- permite que você tro-
deixado de lado com o Facilita o emprés- trar alguém para divi- que o seu, por qualquer
aumento demográfico e timo de objetos dir um táxi e o Blablacar, com uma comunidade de 35 um dos outros 70 mil
entre vizinhos.
a criação da moeda. Mas milhões de membros, conecta motoristas e passagei- livros disponibilizados campinginmygarden.com
atualmente, com a popu- ros com destinos em comum para racharem o custo pelos usuários. Todavia, Oferece locais privados para
larização dos dispositivos eletrônicos, que permitem da viagem. se a procura é por um acampar como quintais de
a interação entre as pessoas em redes, a economia Para obter hos- serviço, o Bliive é uma casa, fazendas e praias.
colaborativa ganhou fôlego. Mesmo que empresas pedagem de forma plataforma que usa
sejam responsáveis pela criação de interfaces, a via- colaborativa foram bliives como moeda
bilidade do sistema (pessoa-para-pessoa) depende criadas plataformas de troca.
dos integrantes para realizarem a troca de produtos como Couchsurfing, A economia colaborativa é um contraponto ao
ou serviços. TrocaCasa e Cam- blablacar.com consumismo insustentável. De acordo com o rela-
Existem vários apli- ping in my Garden. Conecta motoristas e passagei- tório, esse tipo de atividade pode poupar recursos
cativos para comparti- O Couchsurfing é ros com destinos em comum, naturais, diminuir a poluição ambiental, aumentar
lhar objetos, imóveis, in- uma comunidade de que racham o custo da viagem. a diversificação em qualidade e preço de produtos,
formações, habilidades 14 milhões de pes- trazer mais acesso aos recursos e, assim, reduzir
e até conhecimentos. couchsurfing.com soas, onde morado- as desigualdades sociais.
Em plataformas como Rede de hospeda- res locais oferecem seus sofás a viajantes em mais de
Waze, Bora Junto e Bla- gem onde locais 200 mil cidades. O TrocaCasa possibilita as pessoas a Clara Comandolli
blacar, os usuários ob- oferecem seus sofás trocarem de casa ou de automóveis, além de permitir claracomandolli@gmail.com
tém informações sobre a viajantes. que você combine com alguém o cuidado de animais Daiane Nora
transporte. O Waze per- e plantas. Já o Camping in my Garden oferece locais norajornalista@gmail.com

ABRIL | 2017 • 15
HABITAÇÃO

Quando o joão-de-barro decidiu alugar


Moradores de Florianópolis encontram oportunidade de sustento no aluguel de imóveis

D
Fotos: Wagner Locks/Zero
ona Zenilda e Seu Alzemiro mente, com 75 anos de idade, faz apenas
começam seu dia por volta as manutenções. “Já fiz muita kitnets, as
das 7h da manhã. Morado- primeiras foram todas eu. Hoje quando
res do bairro Pantanal, são tem que construir eu contrato alguém.”
proprietários de um peque- Assim como o joão-de barro, que er-
no complexo residencial, a cinco minu- gue seu abrigo utilizando solo úmido,
tos da UFSC. Enquanto Zenilda faz café esterco, palha e pequenos galhos, divi-
e brinca com a neta, Alzemiro organiza dindo-o em mais de um cômodo para
os materiais de construção que serão chocar seus ovos, Alzemiro e Ademar
usados no dia. Nascidos respectivamen- aprenderam as técnicas de construção
te nos municípios de Campo Belo do Sul ao longo da vida. “Já trabalhei de tudo
e Anita Garibaldi, vieram 34 anos atrás um pouco. Fui peixeiro, comerciante…
em busca de melhores condições de vida Uma época eu via os caras levantando
para Florianópolis, onde se conheceram, tijolos e construindo, fui ajudando e me
casaram e tiveram cinco filhos. Quando aprimorei, daí comecei”. Já Seu Alzemi-
conseguiram seu próprio terreno, cons- ro, trabalhou como auxiliar de obras
truíram não só a casa onde moram, como durante 34 anos, desde antes de vir
também pequenos quartos e kitnets, que para Florianópolis. Ajudou a erguer vá-
atualmente são alugados para cerca de 25 rios prédios na região leste da Capital,
estudantes da universidade. “27 anos alu- onde hoje fica o bairro João Paulo. “Eu
gando casa não são 27 dias. A gente já viu trabalhava na empresa durante a se-
muito professor, engenheiro e promotor mana e quando tinha folga me ocupava
conseguindo se formar e comprar uma construindo a nossa primeira casa, lá
casa própria”, conta Zenilda. na Serrinha”, conta.
Do outro lado de Florianópolis, no
centro da Barra da Lagoa, Seu Ademar Síndrome com efeitos colaterais
conversa com sua filha enquanto varre Diferentemente do joão-de-barro,
o corredor estreito ao lado de sua casa, no entanto, o ser humano pode não
que dá acesso às 11 kitnets alugadas há 43 ter condições de construir sua própria
anos pelo morador do bairro. Manezi- moradia, e a tal síndrome acaba preju-
nho legítimo, viu a cidade crescer pouco dicando os moradores das habitações
a pouco. Começou a investir no ramo de sem regulamentação. Apenas em feve-
aluguéis quando estava morando fora reiro, a Secretaria Municipal do Meio
com a família. “A gente tinha um comér- Ambiente, Planejamento e Desenvolvi-
cio lá em Santos [litoral de São Paulo] e mento Urbano (SMDU) de Florianópolis
fomos juntando dinheiro. Quando deu, realizou 963 vistorias a obras denuncia-
comprei um terreninho na Barra. Dois das como irregulares na cidade. Destas,
anos depois fiquei viúvo, daí voltei para 111 foram embargadas por cometerem Segundo dados do IBGE, Florianópolis tem mais de 38 mil moradias para aluguel
cá e comecei a construir. O pessoal faz algum ato de infração ou estarem cons-
muito isso por aqui.” Hoje em dia, Ade- truindo sem as devidas licenças. cretaria. O protocolo atual estabelece truções são regularizadas, mas os cô-
mar mora num terreno com sua atual Os parâmetros avaliados pela secre- tanto o imóvel denunciado como todos modos novos que vão surgindo acabam
esposa, os dois filhos e os outras 15 pes- taria estão estabelecidos na Lei Muni- os localizados na mesma rua devem ser não sendo chamados para vistoria”, ex-
soas, que alugam os quartos disponíveis. cipal nº 060/2000, que institui o código vistoriados. Seu Ademar admite não ter plica Maiara Abreu, assessora da Secre-
Quem caminha por Florianópolis de obras e edificações de Florianópo- realizado os processos de fiscalização taria. O estudante de Letras-Alemão da
pode observar diversas placas de imó- lis e as medidas punitivas aos imóveis junto à Secretaria: “Não tem vistoria UFSC, Jefferson Michels, por exemplo,
veis para aluguel. Às vezes o contrato é construídos irregularmente. As penali- não, é só chegar e alugar”. mora num cômodo que era uma lavan-
um aperto de mão. Ademar, Alzemiro deria e virou um quarto para três mo-
e Zenilda são apenas alguns dos mo- radores. “Não tinha janela, daí o dono
radores da cidade que viram na falta quebrou as paredes e fez dois buracos.”
de habitações baratas uma oportuni- “O SEU ALZEMIRO QUE CONSTRÓI TUDO, TEM No Brasil, todos os imóveis para mo-
dade de lucro e sustento mensais. Para radia precisam possuir o Habite-se, um
dar lugar ao maior número de pessoas SÍNDROME DE JOÃO-DE-BARRO, ONDE DÁ DE documento concedido pelas prefeituras
possível, moradias de baixo custo são do município onde o edifício está loca-
erguidas, empilhadas e divididas pelos PUXAR UMA PAREDE, ELE PUXA” lizado. Para isso, a edificação passa por
próprios proprietários. “O Seu Alzemi- uma vistoria junto à Vigilância Sanitária.
DONA ZENILDA
ro que constrói tudo, tem síndrome de O início de uma obra precisa de uma
joão-de-barro, onde dá de puxar uma licença para construção e a finalização
parede, ele puxa” , conta Zenilda. Ade- dades para as infrações vão desde ad- Bloqueando sinalizações de trânsito precisa do Habite-se para garantir que a
mar também construiu uma boa parte vertências e multas até o embargo ou ou atrapalhando a manutenção da rede licença inicial foi cumprida e a casa está
das habitações em seu terreno. Atual- mesmo ordem de demolição da cons- elétrica, nem sempre o joão-de-bar- em condições ideais de moradia. Em re-
trução, dependendo do risco que esteja ro escolhe um local conveniente para sidências construídas para mais de uma
causando aos seus moradores. Soma- construir sua moradia. Da mesma for- família, como no caso de prédios com
dos ao código de obras, ainda existem ma, não é incomum que as construções apartamentos, é preciso que seja rea-
os parâmetros para edificações, esta- feitas por pessoas sejam realizadas sem lizada também uma segunda inspeção,
belecidos pela Associação Brasileira de as devidas autorizações, principalmen- desta vez com o corpo de bombeiros.
Normas Técnicas (ABNT), que são de te porque a fiscalização depende de de- Quanto a isso o passarinho não precisa
cumprimento obrigatório e estão em núncias pelo canal de telefone da pre- se preocupar, na casa do joão-de-barro,
constante processo de atualização. feitura e alguns dos atos de infração são mora apenas uma família.
O procedimento de vistoria de obras muito sutis. “A maior dificuldade é que,
irregulares em Florianópolis é reali- como os proprietários constroem nos Wagner Locks
Alzemiro trabalha em toda a construção zado pelo setor de fiscalização da se- próprios terrenos, as primeiras cons- wagnerlocks@gmail.com

16 • ABRIL | 2017

Você também pode gostar