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FORA DA AMAZÔNIA: HOLOCENO TARDIO MUDANÇAS CLIMÁTICAS E OS TUPI-GUARANI

EXPANSÃO TRANSCONTINENTAL

Autores: José Iriarte, Richard J Smith, Jonas Gregório de Souza, Francis Edward Mayle,
Bronwen Whitney, Macarena Lucia Cárdenas, Joy Singarayer, John F Carson, Shovonlal Roy e
Paul Valdes

Resumo

A expansão do Holoceno tardio das línguas Tupi-Guarani do sul da Amazônia para o Sudeste da
América do Sul constitui uma das maiores expansões de qualquer família linguística no mundo,
abrangendo ~4000 km entre as latitudes 0°S e 35°S a cerca de 2,5k cal. ano BP. No entanto, as
razões subjacentes a esta expansão são uma questão de debate. Aqui, comparamos conjuntos
de dados paleoecológicos, paleoclimáticos e arqueológicos em escala continental, para
examinar o papel da mudança climática para facilitar a expansão dessa cultura florestal.
Porque essa expansão está dentro do caminho do Baixo Nível Sul-Americano Jet, o principal
mecanismo para o transporte de umidade nas terras baixas da América do Sul, fomos capazes
de explorar a relação entre mudança climática, florestas expansão e Tupi-Guarani. Nossa
síntese de dados mostra uma ampla sincronia entre o aumento da precipitação do Holoceno
tardio e a expansão ao sul de floresta tropical e sítios arqueológicos Guarani – o ramo mais
meridional dos Tupi-Guarani. Concluímos que a mudança climática provavelmente facilitou a
expansão agrícola da cultura agroflorestal Guarani, aumentando a área de paisagem florestal
que eles poderiam explorar, mostrando um exemplo de oportunismo ecológico.

Palavras-chave

Amazônia, ecologia humana, expansão linguística, mudanças climáticas do Holoceno tardio,


paleoclima, Tupi-Guarani

A expansão dos agricultores e suas línguas é, sem dúvida, um dos processos mais
importantes que ocorreram durante a história humana no Holoceno (Ammerman e Cavalli-
Sforza, 2014; Anthony, 2009; Bellwood e Renfrew, 2002; Kirch, 2000). Este processo trouxe
mudanças significativas em tecnologias e estruturas sociais e políticas, bem como novas
práticas de gestão da paisagem para as novas regiões que foram colonizadas. Em todo o
mundo, várias expansões culturais têm sido associadas às mudanças climáticas, onde o clima
exerceu um controle sobre a extensão das paisagens favorecido por grupos culturais
particulares (por exemplo, Büntgen et al., 2016; Kuper e Kröpelin, 2006). Por exemplo, a seca
induzida, a redução da cobertura florestal e o surgimento de corredores de savana durante o
Holoceno Médio permitiu que os bantos colonizassem o que já foi floresta densa do Congo e
outras regiões da África (Grollemund et al., 2015; Oslisly et al., 2013). Na Ásia Central, o povo
horse-riding Scythian capitalizou a transformação do deserto hostil em floresta de estepe,
causado por chuvas mais altas no milênio aC (Van Geel et al., 2004). Da mesma forma, o início
das condições mais úmidas nas estepes da Eurásia central no AD. O século XIII parece ter
desencadeado a expansão do maior império terrestre contíguo da história mundial, o império
mongol (Pederson et al., 2014). Semelhante à expansão Arawak (Heckenberger, 2002), o Tupi-
Guarani é uma das maiores expansões de um povo antigo nas terras baixas da América do Sul,
estendendo-se por 4.000 km e se estendendo do sudoeste (SW) da Amazônia até o Atlântico
subtropical costa sudeste (SE) da América do Sul (Figura 1). A causa desta expansão humana
em massa continua a ser um tema debatido no Novo Mundo, arqueologia, bioarqueologia,
genética e linguística (Brochado, 1989; Eriksen e Galucio, 2014; Heckenberger et al., 1998;
Marrero et al., 2007; Miller, 2009; Neves, 2011; Neves et al., 2011; Noelli, 1998; Rodrigues e
Cabral, 2012; Walker et al., 2012). Semelhante a outros casos de linguagem difundida com os
agricultores de difusão demica (Diamond e Bellwood, 2003), a explicação para a dispersão
Tupi-Guarani para fora da Amazônia tem sido crescimento demográfico impulsionado pela
agricultura, aliado a uma forte territorialidade, redes políticas de longo alcance e uma
ideologia guerreira expansionista (Brochado, 1989; Noelli, 1998). No entanto, uma explicação
baseada apenas em fatores sócio-políticos e causas econômicas não levam em conta nem o
momento nem a rota de a expansão Tupi-Guarani (Scheel-Ybert et al., 2014). Tentativas de
vincular as mudanças climáticas com a expansão Tupi- Guarani baseiam-se em limitadas e
agora ultrapassadas reconstruções. Baseando-se na teoria do refúgio (Haffer, 1974; Prance,
1982) e os registros paleoecológicos disponíveis (por exemplo, Ab’Saber, 1977; Absy, 1979),
Meggers (1982) e Migliazza (1982) sugerem que a expansão tupi-guarani para fora do sudoeste
da Amazônia foi uma resposta ao aparecimento de episódios climáticos mais secos que
reduziram a floresta em torno de 2mil cal. anos AP forçando grupos Tupi-Guarani a migrar para
outras regiões. Este esquema foi seguido por vários Arqueólogos brasileiros (por exemplo,
Schmitz, 1991) em sua interpretação das migrações tupi-guarani. Em recente revisão de dados
paleoecológicos, Neves (2013) chamou a atenção para a correlação entre uma tendência de
aumento da umidade em torno de 3,5k cal. anos AP e a disseminação de estratégias
econômicas tradicionalmente denominadas “padrão de floresta tropical” em toda a Amazônia.
Neves (2013) sugere que as mudanças climáticas que ocorreram entre o médio e final do
Holoceno provavelmente "desencadearam uma dependência mais forte a esses diversos
sistemas agroflorestais e o estabelecimento de grandes assentamentos sedentários em toda a
área”. No entanto, este estudo restrito à Amazônia não vinculou o aumento das condições de
umidade climática com a migração de populações dentro ou fora da Amazônia. Mais
recentemente, Bonomo et al. (2015) realizou a mais recente síntese da natureza e ritmo do
Guarani expansão para o sudeste da América do Sul. Com base em alguns estudos
geomorfológicos (Iriondo e Garcia, 1993; Stevaux, 2000), esses autores minimizaram o papel
do clima na expansão do Guarani no sudeste da América do Sul afirmando que “as oscilações
climáticas durante este período não parecem ter uma forte influência nos pulsos identificados
de expansão Guarani, que transcende momentos secos, quentes e úmidos”. Além disso, não
vinculam a expansão dos Guarani na bacia do Rio da Prata à sua terra natal no sudoeste da
Amazônia.

Apesar da relativa riqueza de paleoclima, paleoecológica e dados arqueológicos desta


região de terras baixas da América do Sul que se acumularam nas últimas três décadas, até
agora, a relação entre a expansão dessa família linguística de agricultores florestais e as
mudanças climáticas para fora da Amazônia não foi explorada adequadamente à luz dos dados
recentes. Como resultado, embora o padrão de escala fina do assentamento Tupi-Guarani no
sudeste do Sul da América está entrando em foco mais nítido (Bonomo et al., 2015), o papel
potencial das mudanças climáticas como causa raiz da expansão Tupi-Guarani em escala
continental nunca foi devidamente avaliado.

Materiais e métodos

Avaliar o papel do clima na expansão do Tupi-Guarani da Amazônia, reunimos


conjuntos de dados arqueológicos, paleoclimáticos e paleoecológicos para testar nossa
hipótese de que o aumento da precipitação no final do Holoceno impulsionou a expansão da
floresta, o que, por sua vez, facilitou a expansão da cultura Tupi-Guarani do sudoeste da
Amazônia em todo o sudeste da América do Sul. Fazemos isso sintetizando dados de 197 sítios
arqueológicos Guarani datados, que representam o ramo mais meridional dos Tupi da Família
Guarani (Figura 2, Seção S1, Tabelas S1 e S2, disponíveis online), 3 registros representativos de
paleoprecipitação (Figura 2, Seção S2, disponível online) e 73 registros paleoecológicos (Figura
2, Seção S3, Tabelas S3–S6, disponíveis online). Porque todos esses registros estão dentro da
trajetória do Jato de Baixo Nível Sul-Americano (SALLJ) (Figura S1, disponível online), o
mecanismo chave para o transporte de umidade nas terras baixas da América do Sul, capaz de
explorar a relação entre as mudanças climáticas, expansão e expansão Guarani.

Resultados

Evidencias da expansão Guarani

O estoque linguístico tupi é um dos maiores da planície sul América. É composto por
cerca de 60 línguas agrupadas em 10 famílias linguísticas, das quais a família Tupi-Guarani é a
mais amplamente dispersa – sendo a única que se estende além da Amazônia (Rodrigues e
Cabral, 2012) (Figura 1 e Figura S2, disponíveis online). No momento da chegada dos
portugueses ao Brasil costa (1500 dC), falantes tupi-guarani estavam contados na casa dos
milhões (Viveiros de Castro, 1992). Na Bacia do Prata e na toda a costa atlântica brasileira,
ocuparam uma área ribeirinha e costeira com mais de 4.000 km, e línguas francas de base tupi-
guarani ainda eram amplamente utilizadas no Brasil tão recentemente quanto século XIX
(Noelli, 1998; Walker et al., 2012).

No sudeste da América do Sul, os registros históricos dos grupos Tupi-Guarani foram


organizados em chefias regionais constituídas por confederações de aldeias sob a influência de
um político proeminente ou líder espiritual (Milheira e DeBlasis, 2014; Noelli, 1998). As
expedições de guerra viajaram centenas de quilômetros por grandes hidrovias para atacar
inimigos, conquistar territórios, capturar mulheres, e, em alguns casos, escravizar os vencidos
(Brochado, 1989; San tos-Granero, 2009). O forte ethos belicoso e a cosmologia predatória dos
Tupi-Guarani incluíam o ritual antropofágico festa, que tinha um grande significado social
como meio de status até a época colonial (Brochado, 1989; Fausto, 2012; Milheira e DeBlasis,
2014; Viveiros de Castro, 1992). Diferente outras expansões linguísticas amazônicas que
parecem ter se espalhado através do comércio em um ethos pacífico (por exemplo, Arawak),
histórico Tupi– Os grupos Guarani há muito são percebidos como inclinados a expansão e
conquista (Hornborg et al., 2005).

Os Tupi-Guarani viviam em grandes aldeias paliçadas (Figura 3), com quase todos os
sítios arqueológicos situados em florestas próximas rios navegáveis (Scheel-Ybert et al., 2014).
O manejo das florestas foi um componente-chave da economia tupi-guarani, incluindo a
introdução de plantas para preparar o ambiente, antes sua anexação definitiva de uma área
recém-assentada (Noelli, 1998). Eles praticavam a policultura agroflorestal, complementada
com pesca, caça e coleta (Noelli, 1998; Scheel-Ybert et al.,2014) e sua expansão marca a ampla
adoção da agricultura no sudeste da América do Sul, trazendo consigo 24 variedades de
mandioca (Manihot esculenta), 13 variedades de milho (Zea mays), 15 variedades de feijão
(Phaseolus vulgaris) e 21 variedades de batata (Ipomoea batatas), entre muitas outras plantas
cultivadas (Brochado, 2001; Noelli, 1993). A distribuição dos sítios indica que os Tupi-Guarani
não selecionaram um determinado tipo de floresta, mas se expandiram e em uma variedade
de tipos de floresta, incluindo floresta tropical de dossel fechado, floresta seca e floresta de
galeria. Parece que o fator determinante para a colonização Tupi-Guarani é a presença de uma
cobertura arbórea para a prática agroflorestal. Evidências linguísticas indicam a presença de
reflexos do mesmo nome para ‘pedaço de terra cultivado’, 9 das 10 famílias linguísticas do
estoque tupi sugere que os falantes da língua proto-tupi praticavam a ideia de que se pretende
reforçar uma expansão agrícola (Rodrigues, 2010). Este argumento é ainda forte pela presença
de nomes semelhantes para produtos agrícolas ferramentas como pau de cavar e machado,
bem como as principais culturas, incluindo mandioca, batata-doce e inhame em quase todas as
famílias linguísticas do estoque (Rodrigues, 2010).
Apesar da escassez de dados arqueológicos no sudoeste da Amazônia (Macario et al.,
2009), esta região é considerada o centro de origem do tronco tupi, com base na linguística
(Miller, 2009; Rodrigues e Cabral, 2012; Walker et al., 2012), dados morfológicos cranianos
(Hubbe et al., 2014; Neves et al., 2011) e dados genéticos (Marrero et al., 2007; Santos et al.,
2015). Cinco das 10 famílias do estoque tupi se restringem ao moderno estado de Rondônia,
Brasil (Eriksen e Galucio, 2014). Há muito tempo é reconhecido que tal profundidade de
diversidade etnolinguística aponta para o sudoeste da Amazônia como a pátria do estoque tupi
(Eriksen e Galucio, 2014; Rodrigues e Cabral, 2012; Walker et al., 2012). Linguistas estimam
que o estoque tupi inicialmente se dividiu entre 5mil e 3mil cal. anos AP, após o que a família
Tupi-Guarani se dividiu em torno de 3 mil–2 mil cal. ano BP (Migliazza, 1982; Rodrigues e
Cabral, 2012; Walker e outros, 2012). Da mesma forma, os dados genéticos apoiam o sudoeste
da Amazônia como o suposto local de origem dos grupos tupi (Marrero et al., 2007; Santos e
outros, 2015). Análise da variabilidade em doenças autossômicas e marcadores genéticos
uniparentais (cromossomo Y e mtDNA) mostram concordância com os modelos linguísticos,
evidenciando uma expansão precoce a partir da bacia Madeira-Guaporé e uma posterior
expansão continental dispersão populacional associada aos Tupi-Guarani (Santos et al., 2015)
ca. 2,8 mil cal. ano AP (Amorim et al., 2013). Dados morfológicos cranianos também
demonstram que indivíduos de Tupi-Guarani contextos arqueológicos no sudeste da América
do Sul são agrupados mais intimamente com as séries amazônicas do que com as populações
locais (Neves et al., 2011).

Arqueologicamente, a expansão dos grupos tupi-guarani em toda a planície oriental da


América do Sul coincide com a distribuição da cerâmica policromada, que é muito distinta das
tradições locais, mas tem protótipos na Amazônia (Bonomo et al., 2015; Brochado, 1989; Noel,
1998). Apesar de sua expansão ao longo de milhares de quilômetros, os sítios Tupi-Guarani
mostram notavelmente uma cultura material homogênea e padrões de assentamento
caracterizados pela ocorrência de terra escura antropogênica localizada ao longo principais
cursos d'água associados a florestas ribeirinhas (Bonomo et al., 2015; Scheel-Ybert et al.,
2014). Em tempos históricos, Tupi-Guarani grupos do sudeste da América do Sul eram
excelentes navegadores de canoa, o que facilitou sua dispersão ao longo dos principais cursos
d'água (Brochado, 1989). A Amazônia Central foi inicialmente pensada para ser o berço da
cerâmica policromada (Brochado, 1989), mas dados arqueológicos recentes mostram que a
cerâmica policromada é uma dispersão recente nessa área, e tarde demais para se relacionar
com a expansão Tupi-Guarani (Heckenberger et al., 1998). O Alto Madeira, sudoeste da
Amazônia, é atualmente a área com as primeiras cerâmicas policromadas e terras escuras
antropogênicas (Neves, 2011), com datas de 5 mil –3 mil cal. anos AP para sítios cerâmicos
nesta região (Tabela S1, disponível online), coincidindo com as estimativas glotocronológicas
para o desdobramento do estoque Tupi. Além da Amazônia, cerâmicas reconhecíveis como
tupi-guarani aparecem de 3k a 2k cal. ano BP (Bonomo et al., 2015; Brochado, 1989; Macário
et al., 2009; Noelli, 1998) (Tabela S2, disponível online), de acordo com estimativas linguísticas.
Essa expansão ocorreu em um momento de ampla expansão cultural de mudança para
sociedades cada vez mais complexas e a disseminação de famílias linguísticas nas planícies
tropicais da América do Sul, incluindo os Arawak (Clement et al., 2015; Heckenberger, 2002) e
o Jê (Noelli, 2005). Este também é um momento em que as sociedades das terras baixas
começaram a transformar a paisagem em uma escala nunca vista antes. Extensas paisagens
agrícolas, como sistemas de campos elevados em savanas sazonalmente inundadas,
começaram a ser construídas desde a Guiana Francesa até os Llanos de Moxos na Bolívia,
enquanto a as terras da Amazônia, possivelmente associadas ao sedentarismo e à agricultura
intensiva, surgiram principalmente ao longo das falésias dos principais rios da Amazônia
(Arroyo-Kalin, 2010; Heckenberger e Neves, 2009; Neves, 2011).

É claro que, apesar da falta de dados arqueológicos cruciais no alto rio Guaporé e no
Cerrado ligando SW Amazônia ao sudeste da América do Sul, correntes linguísticas, genéticas,
cranianas. Dados morfológicos e arqueológicos disponíveis sugerem que a família tupi-guarani
se separou e começou a se espalhar para o sul a partir da Amazônia para o sudeste da América
do Sul (Figuras 2 e 4) em cerca de 3 mil –2 mil cal. anos AP (Bonomo et al., 2015; Noelli, 1998;
Rodrigues e Cabral, 2012). Os dados arqueológicos (Figuras 2 e 6c) mostram que os Tupi-
Guarani se expandiram para além da “zona do mosaico” (Bell wood e Renfrew, 2002) do
sudoeste da Amazônia para alcançar a “zona de expansão” zona” (Figura 1) desta família
linguística no sudeste da América do Sul por cerca de 2,5k cal. ano AP, dando origem à
Tradição Guarani ao sul de o paralelo 17°S (Bonomo et al., 2015; Noelli, 1998)

Rotas de expansão

Ao contrário de seus ancestrais, que ocupavam áreas interfluviais, a expansão dos


Guarani para fora da Amazônia seguiu exclusivamente grandes rios (Almeida e Neves, 2015). A
arqueologia começa a mostrar que grupos tupi-guarani na bacia amazônica viviam em aldeias
interfluviais menores, possivelmente menos permanentes, voltadas para a competição de
colonos Arawak nas várzeas. É somente quando o Tupi-guarani se expandem para fora da
Amazônia em direção à bacia do paraná e a costa atlântica que o padrão de grandes aldeias
fortificadas ao longo das principais vias navegáveis, guerras expansivas e conquistas parecem
se consolidaram (Almeida, 2015; Almeida e Neves, 2015).

Independentemente dos debates sobre os caminhos específicos tomados pelo vários


grupos tupi-guarani em sua expansão pelo sul América, há um consenso geral de que o alto
Paraguai e os rios Paraná serviram como as principais vias fluviais para a expansão sul dos
Guarani de sua terra natal no sudoeste da Amazônia (Brochado, 1989; Noelli, 1998). A rota
fluvial mais aceita para a expansão para o sul das passagens Tupi-Guarani pelo alto rio
Madeira–Guaporé, margeando os Llanos de Moxos, para chegar ao alto rio Paraguai nas
proximidades da Pantanal, de onde os Guarani poderiam se espalhar, via grandes cursos
fluviais, para toda a Bacia do Prata e a costa adjacente (Brochado, 1989; Noelli, 1998). Esta
rota proposta é suportada pela proximidade do Guarani com as línguas da Bolívia (Guarayu e
Siriono) (Brochado, 1989; Noelli, 1998) e porque as cerâmicas Guarani arqueológicas incluem
formas e decorações (cônicas potes de papelão ondulado?) adquiridos de tradições orientais
bolivianas (Brochado, 1989). Infelizmente, embora vários sítios Guarani tenham sido
documentados no alto e médio rio Paraguai, eles ainda não foram datados (Bonomo et al.,
2015) e atualmente o Alto Paraná detém as primeiras datas. Pesquisas futuras na região entre
a fronteira oeste do Pantanal e o Alto Guaporé serão fundamentais para preencher a lacuna
entre a pátria tupi SW Amazônia e o início da tradição Guarani no Alto Paraguai (Noelli, 1998).

As matas de galeria ribeirinhas da savana de Llanos de Moxos e o cerrado do Gran


Chaco também podem ter servido como rotas chave para expansão dos Guarani para fora da
Amazônia em direção ao Sistema Paraguai-Paraná. Assim como o sistema do rio Amazonas, a
Bacia do Prata compreende uma rede de grandes rios que constituíam uma principal via de
comunicação entre os diferentes povos pré-colombianos grupos que tinham embarcações.
Não há dados geográficos com importantes barreiras que separam esses dois grandes sistemas
fluviais. Portanto, a inundação anual das bacias de Llanos de Moxos e Pantanal funde as bacias
hidrográficas do Rio Madeira e do Rio Paraguai em um vasto "mar de água doce", abrindo uma
rede de vias navegáveis estendendo-se ao sul até o estuário do Rio de la Plata.

Outra rota potencial de expansão pode ter sido através do Cerrado. Pode-se esperar
que o extenso Cerrado (savana) bioma do centro-sul do Brasil (cobrindo cerca de 2.000.000
km2), que separa os biomas Amazônia e Mata Atlântica (Figuras 2 e 4), apresentaria uma
grande barreira ambiental para a cultura Guarani atingir o bioma Mata Atlântica do SE do
Brasil. No entanto, quando considerado em escalas espaciais mais finas, o bioma Cerrado não
é uma extensão uniforme de savana, mas sim uma área altamente heterogênea mosaico
floresta-savana. A savana está confinada a áreas de solos altamente inférteis e é intercalada
com ilhas de espécies tropicais semidecíduas floresta em solos mesotróficos e extensas faixas
de mata de galeria ribeirinha que se conectam com a Mata Amazônica e a Mata Atlântica
biomas. Mais recentemente, Almeida e Neves (2015) levantaram a hipótese de uma origem
amazônica oriental para os Tupi-Guarani; Contudo, as datas Tupi-Guarani no leste da
Amazônia são contemporâneas às datas Guarani no Alto Paraná, portanto, refutando esta
hipótese até que mais pesquisas sejam realizadas. Por último mas não menos importante, não
devemos descartar a possibilidade de que algumas populações fundadoras ‘leapfrog’ (sensu
Fiedel e Anthony, 2003) do sudoeste da Amazônia a Mata Atlântica, onde encontraram o nicho
perfeito e começaram sua expansão a partir daí.

Essa hipótese é apoiada pela cronologia relativamente precoce do sítio Morro Grande
no estado do Rio de Janeiro, que pertence à Tradição Tupinambá e data de volta para cerca de
2,9 mil cal. anod AP (Macario et al., 2009; Scheel-Ybert et al., 2008). A probabilidade de que
esse salto inicial de longa distância também foram seguidos por episódios posteriores de
expansão subsequentes desta região à medida que a floresta se expandia pelo sudeste da
América do Sul também deve ser tomado como uma hipótese testável para estudos futuros.
No entanto, no momento, esse argumento deixa sem explicação como os primeiros sítios
Guarani aparecem no Alto Rio Paraná e não na Mata Atlântica como este cenário poderia
prever.

Independentemente do mecanismo ou rota particular que tomaram, uma vez


chegaram ao alto da Bacia do Prata, várias ondas de expansão dos Guarani pelo sudeste da
América do Sul podem ser claramente identificadas com dados atuais: (1) ca. 2,5 mil –2 mil cal.
anos AP, início de colonização do alto rio Paraná; (2) cerca de 2 mil –1,5 mil cal. anos AP,
assentamento ao longo do rio Uruguai; (3) cerca de 1,5 mil –1 mil cal. anos AP, início de
colonização do litoral sul brasileiro; e (4) após ca. 1 mil cal. anos AP, estabelecimento dos
assentamentos Guarani mais ao sul no Delta do Paraná (Bonomo et al., 2015) (Figuras 2 e 4,
Filme S1, disponível online). Essa expansão obedece a um padrão dendrítico, pelo qual os
primeiros assentamentos em uma área recém-colonizada sempre ocorreram ao longo das
principais vias navegáveis florestais. Foi só depois da ocupação desses ambientes preferenciais
se consolidou que se seguiu a colonização de pequenos afluentes (Bonomo et al., 2015). O
movimento para o sul da Amazônia através do sudeste da América do Sul representa um
processo de expansão, ao invés de migração, porque as aldeias filhas se ramificaram de aldeias
superpovoadas, mantendo a interação e os laços sociais com elas, os antigos territórios nunca
foram abandonados. Este processo resultou em um raio de expansão das redes de aldeias
através de ondas populacionais graduais seguindo os principais cursos de rios florestais (Noelli,
1998). Tem sido bem documentado no vale do rio Pardo, Rio Grande do Sul, onde ficou
claramente demonstrado que os primeiros e locais maiores ocupam a planície de inundação
fértil, enquanto os locais mais recentes são menores e localizados em altitudes mais elevadas
(Rogge, 2005).

Registros paleoclimáticos nas regiões influenciadas pelo SALLJ – Lago Titicaca (o


Altiplano) (Baker et al., 2001), Laguna La Gaiba (a baixada central) (Whitney e Mayle, 2012) e
Botuverá Caverna (sul do Brasil) (Cruz et al., 2005) – demonstram uma tendência consistente
de longo prazo de aumento da precipitação a partir do meados do Holoceno (~6 mil cal. ano
AP), mostrando um rápido aumento até 4 mil cal. Ano AP e, em seguida, continuou a aumentar
ligeiramente em direção ao presente (Figura 6a, Seção S2, disponível online). Essa tendência
foi atribuída a um fortalecimento progressivo das monções durante este período, o
forçamento orbital (ciclo de precessão) aumenta a insolação de verão austral (Figura S1,
disponível online) (Berger e Loutre, 1991). Precipitação modificada do modelo climático do
Hadley Center (HadCM3) simulações cobrindo as últimas 6 mil cal. anos AP (Seção S2 e Figura
S4, disponível online) estão de acordo com essas reconstruções paleoclimáticas e demonstram
que os dados proxy paleoclimáticos refletem as mudanças climáticas em toda a nossa área de
estudo como um todo. Nossa paleovegetação sínteses de dados (Figura 6b) mostram que,
apesar de alguma variabilidade no padrão espaço-temporal da dinâmica florestal entre os
sítios – devido a um uma série de fatores, como a diversidade de tipos de vegetação (Figura 2),
distância de um ecótono (Mayle et al., 2000), tamanho da captação de pólen (Carson et al.,
2014), geomorfologia, condições edáficas, grau de impacto humano (Carson et al., 2014) – a
proporção de locais com a captação dominada por florestas aumenta consistentemente no
meio- final do Holoceno, entre cerca de 5 mil e 1 mil cal. anos AP (Figuras 4-6b, Filme S1,
disponível online). Isso é exemplificado por (1) a expansão da margem sul da floresta
amazônica (Carson et al., 2014; Flantua et al., 2015; Mayle et ai., 2000); (2) expansão da
sazonalidade margens de floresta tropical seca na região de Chiquitanía de planície Bolívia e na
margem sul do bioma Cerrado (savana) (Ledru, 1993; Oliveira-Filho e Ratter, 1995), a expansão
das matas de galeria nas savanas brasileiras centrais (Silva et al., 2008); (3) o desenvolvimento
da floresta seca na região de Misiones do sul Brasil (Zech et al., 2009); e (4) o desenvolvimento
e expansão de Florestas de araucárias no planalto sul do Brasil (Behling e Pilar, 2007). Esse
padrão temporal de expansão florestal segue a tendência de aumento das chuvas ao longo do
Holoceno médio-final, apontando a uma relação causal (Figuras 4 e 5). Como sugerido
anteriormente por outros autores como Behling (2002) e Marchant e Hooghiemstra (2004),
inferimos que o fortalecimento progressivo da monção de verão austral (e consequente
redução na duração/severidade da estação seca) durante este período permitiu a expansão da
floresta no à custa de ecossistemas de savana/pastagem mais tolerantes à seca. Além disso, o
recente estudo de Spracklen et al. (2012) com base em sensoriamento remoto e padrões de
vegetação pantropical tem mostrado que o ar que passa sobre a vegetação extensa produz
pelo menos duas vezes tanta chuva quanto o ar que passava sobre pouca vegetação. Portanto,
a expansão da floresta sobre áreas mais abertas também deve ter tido um retorno positivo
sobre o aumento da precipitação.
Discussão

O período de expansão florestal influenciada pelo clima no sudoeste da Amazônia e SE


da América do Sul (ca. 5 mil –1 mil cal. anos AP) abrange o período de expansão Tupi-Guarani
(~2,5 mil -1 mil cal. anos AP) em todo nesta região (Figuras 4 e 5). Dados paleoclimáticos de
alta qualidade do Lago Titicaca pode ser considerado como um 'medidor de chuva' para o
sudoeste da Amazônia, porque a maior parte da precipitação que atinge este alto andino local
é derivado da umidade amazônica advectada fornecida via o SALJ. Fortalecimento progressivo
da monção e o aumento da entrega de umidade através do SALLJ fez com que o nível do lago
subir 90 m de sua cal 6k. ano BP nível baixo para atingir quase moderno níveis por 3k cal. ano
BP (Figura 6a, Figura S4, disponível online). Por 2,5k cal. ano BP, a expansão da floresta tropical
no sudoeste da Amazônia (Mayle et al., 2000) pode ter sido suficiente para facilitar a onda
inicial de expansão dos Tupi-Guarani para fora da Amazônia. É provável que o aumento da
precipitação durante o Holoceno médio-final (Figura 6a, Figura S4, disponível online) teria
aumentado o nível dos rios (tornando-os ainda mais navegáveis pelo cultura Guarani) que, por
sua vez, teria levado à expansão da matas de galeria dentro das quais novas aldeias tupi-
guarani poderiam ser estabelecidas. Ondas subsequentes de expansão Guarani a partir de 2
mil cal. ano AP até a conquista europeia (0,5k cal. ano BP) ocorrem em fase com a contínua
expansão florestal impulsionada pelo clima (Figura 5, Figura S5 e Filme S1, disponíveis online).
Uma comparação do tempo do primeiro aumento na pontuação de vegetação e a
idade dos sítios arqueológicos no sudeste da América do Sul claramente mostra que a floresta
se expandiu imediatamente antes ou concomitantemente com a chegada dos Guarani, dentro
dos limites da resolução cronológica de nossos dados. A tendência geral mostra que, à medida
que a floresta se expande para o sul, segue-se a colonização Guarani. Por exemplo, no médio
Paranapanema (22°S), a expansão florestal começa em torno de 4 mil –3,5 mil cal. anos AP e a
vegetação converte-se totalmente em floresta em 3 mil –2,5 mil cal. anos AP (Figura 6). A
chegada dos Guarani no Alto Paraná e a expansão posterior para o Paranapanema logo
seguem em 2,5 mil –2 mil cal. anos AP. Ocorrem aumentos na pontuação de vegetação mais
tarde, à medida que se avança mais ao sul, datando de 2,5 mil –2 mil cal. ano AP médio Paraná
(27°S) (Figuras 4 e 5). Essa tendência é imediatamente acompanhada pela expansão Guarani
pelo Paraná cerca de 2k-1,5k cal. ano BP. Por fim, no rio Ibicuí (30°S), o primeiro aumento na
pontuação de vegetação ocorre em 1,5k–1k cal. ano BP, precedendo o movimento mais
meridional dos Guarani em direção ao Delta do Paraná (35°S) a 1k–0,5k cal. ano PA (Figura 5)

Conclusão

Embora as migrações leste-oeste sejam em geral mais comuns do que movimentos


norte-sul porque os primeiros são menos propensos a encontrar variação no clima e habitat
(Diamond and Bell wood, 2003), a expansão Guarani do sudoeste da Amazônia para o Delta do
Rio Paraná constitui uma notável mudança latitudinal. Indiscutivelmente, é a ligação climática
entre essas duas regiões finais, criado pelo SALLJ (Figura S1, disponível online), e ampliação do
ambiente Guarani preferencial (mata ribeirinha) em um direção norte-sul, que permitia um
deslocamento latitudinal tão expansão dos Guarani. A complexa organização política, rede de
aldeias de longa distância e ethos belicosa dos Guarani (Noelli, 1998; Viveiros de Castro, 1992)
foram fatores sociopolíticos que certamente desempenharam um papel significativo e próximo
na expansão do povo Guarani, mas nossa análise de dados sugere que as mudanças climáticas
podem ter sido a causa raiz que desencadeou a expansão Guarani ao longo do amplo temporal
(milenar) e espacial (subcontinental) escalas do nosso estudo. Nossos achados mostram que,
ao aumentar a área de paisagem florestal que os Guarani poderiam explorar, a expansão da
floresta impulsionada pelo clima criou uma oportunidade ecológica que facilitou a expansão da
cultura agroflorestal Guarani sobre sua paisagem familiar preferida. Nossos resultados
sugerem que a explicação mais provável para o momento da expansão Guarani, cerca de 3k–
2k cal. ano BP, é a expansão florestal impulsionada pelo clima em todo hemisfério sul América
do Sul neste momento.

Outros agricultores tropicais que sofreram grande expansão, como os agricultores


bantos na África, parecem ter evitado floresta tropical, preferindo corredores de savana e
aberturas florestais que provavelmente foram causadas por uma mudança do meio-final do
Holoceno para condições climáticas progressivamente mais secas (Grollemund et al., 2015;
Oslisly et al., 2013). Em contraste, os Guarani parecem ter tomado vantagem total da expansão
florestal impulsionada pelo clima para se espalhar ao longo dos principais rios que ligam o
sudeste da América do Sul com sua pátria ancestral no sudoeste da Amazônia. Como foi
sugerido para outros eventos climáticos de aumento da guerra e disseminação de povoados
fortificados (Field e Lape, 2010), a oportunidade ecológica oferecida pela expansão florestal
também pode ter nutrido a ethos expansivo tupi-guarani. Além disso, o Holoceno tardio
expansão de florestas sazonalmente secas ao sul da Amazônia provavelmente facilitou a
propagação Guarani porque (1) solos abaixo da estação seca floresta são geralmente menos
intemperizados e, portanto, mais férteis do que as de florestas sempre verdes úmidas e (2)
florestas sazonalmente secas são mais fáceis de limpar para agrossilvicultura, a estação seca
prolongada permitindo que os primeiros agricultores limpem a vegetação com eficiência e
preparem parcelas para plantio com o simples uso do fogo.

Em conclusão, nossos resultados contrastam com (1) hipótese tradicional baseada em


interpretações paleoecológicas agora desatualizadas, que sugerem que a redução da floresta
durante o suposto período seco que ocorreu por volta de 2mil cal. ano AP teria empurrado os
agricultores tupi-guarani dependentes dos recursos florestais para migrar (Meggers, 1982;
Migliazza, 1982) e (2) revisões recentes que minimizam o papel do clima na expansão do
Guarani (Bonomo et al., 2015). Ao contrário, mostram que o clima úmido do final do Holoceno
promoveu a expansão da floresta fora da Amazônia, que por sua vez, permitiu que o
continente expansão dos agricultores da floresta tupi-guarani da Amazônia. Nossa investigação
interdisciplinar mostra que a interação de e fatores ambientais tem sido importante na
formação dispersão pela América do Sul.

Financiamento

As ideias e temas desenvolvidos neste artigo derivam de um projeto do European


Research Council ‘Pre-Columbian Amazon-Scale Transformações' (ERC-CoG 616179) para JI. A
Universidade do ‘Centro para Mudanças Climáticas Passadas’ de Reading financiou uma
redação oficina para este trabalho. O RS foi financiado por um 'Cenário' do NERC Prêmio DTP
de Doutorado. JGS foi financiado por uma bolsa de doutorado CAPES (Ministério da Educação,
Brasil). JFC e MLC receberam financiamento de pós-doutorado da University of Reading and
the Arts and Conselho de Pesquisa em Humanidades, respectivamente.

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