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XXIX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO

A Engenharia de Produção e o Desenvolvimento Sustentável: Integrando Tecnologia e Gestão.


Salvador, BA, Brasil, 06 a 09 de outubro de 2009

SISTEMA DE ELETRICIDADE PARA UM


LOTEAMENTO POPULAR DE BAIXA
RENDA
Rafael Santacatterina de Souza (UCS)
santacatterina@terra.com.br
Maria Fernanda de Oliveira Nunes (UCS)
mfonunes@ucs.br

Ao passo que a população humana cresce de forma descontrolada, o


acesso aos recursos naturais e à qualidade de vida torna-se cada vez
mais restrito. A disponibilidade fica ao alcance das classes econômicas
mais favorecidas e das populações que habitam áreas ainda não
impactadas. Até o crescimento populacional não ser controlado, talvez
a solução mais viável seja adotar medidas que garantam a
sustentabilidade ambiental. Atualmente, existem diversas tecnologias
com o intuito de melhorar a qualidade ambiental, além de uma gama
de resultados de pesquisas aplicadas. No entanto, o principal problema
está em atender as populações menos favorecidas economicamente.
Neste trabalho foi verificada a viabilidade de implantação de medidas
estruturais para um sistema de eletricidade em um loteamento popular
de baixa renda, considerando-se diretrizes técnicas, econômicas e
ambientais de quatro modalidades construtivas (casa, sobrados,
apartamentos de dois dormitórios e apartamentos de três dormitórios).
Para o desenvolvimento da pesquisa foram adotados procedimentos
fundamentados em análises comparativas de sistemas atualmente
disponíveis no mercado brasileiro, com a realização de um estudo de
viabilidade econômica, considerando-se os recursos financeiros
disponíveis. Os resultados indicam que nem todos os sistemas podem
ser economicamente viáveis em loteamentos populares, e dependem do
tipo de organização condominial e acesso a recursos financeiros por
parte da comunidade a ser beneficiada.

Palavras-chaves: loteamentos urbanos; habitação de interesse social;


sustentabilidade ambiental.
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A Engenharia de Produção e o Desenvolvimento Sustentável: Integrando Tecnologia e Gestão
Salvador, BA, Brasil, 06 a 09 de outubro de 2009

1. Introdução
Ao passo que a população humana cresce de forma descontrolada, os acessos aos recursos
naturais e à qualidade de vida tornam-se cada vez mais restringidos. A disponibilidade fica à
mercê das classes econômicas mais favorecidas e das populações que habitam áreas ainda não
impactadas.
Até o crescimento populacional não ser controlado de forma eficiente e segura, talvez a
solução mais viável seja adotar medidas que garantam a sustentabilidade ambiental.
Atualmente existem diversas tecnologias consolidadas com o intuito de melhorar a qualidade
ambiental, além de uma gama de pesquisas inovadoras. No entanto, estas alternativas nem
sempre estão acessíveis ou disponíveis as populações menos favorecidas economicamente.
Dado o problema, entende-se que mediante políticas ambientais seja possível atender medidas
mais sustentáveis às populações de baixa renda.
Este trabalho tem como objetivo principal verificar a viabilidade de implantação de medidas
estruturais para um sistema de eletricidade em um loteamento popular de baixa renda,
considerando-se diretrizes técnicas, econômicas e ambientais de quatro modalidades
construtivas (casas, sobrados, apartamentos de dois dormitórios e apartamentos de três
dormitórios).
2. Descrição do objeto de estudo
Em virtude dos problemas rodoviários no principal acesso norte da cidade, a Prefeitura
Municipal de Caxias do Sul desenvolveu um projeto de melhorias para o local, com recursos
do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do Governo Federal, que consiste em
melhorias do sistema viário e o reassentamento de uma população residente em área de risco
em um novo loteamento denominado Victorio Trez.
O projeto urbanístico do Loteamento consiste, basicamente, na construção de 346 unidades
habitacionais, e compreende o uso e ocupação de uma área de 80.252,90 m², sendo parcelada
em: 36 lotes com quatro tipos de habitações, áreas verdes de caráter institucional e de
preservação, área destinada ao sistema viário, área de reserva técnica e área correspondente à
faixa de domínio da empresa Rio Grande Energia (RGE). Da área total dos lotes, 4.620,49 m²
(15,81%) não serão ocupados de imediato, servindo como reserva para uma possível
ampliação do loteamento de uso residencial ou comercial.
São propostos para o loteamento quatro modelos de habitação: casas, sobrados, apartamentos
com dois dormitórios e apartamentos com três dormitórios.

Potência
Modalidade No. de Unidades no
Área (m2) Nominal a ser
Habitacional cômodos Loteamento
Atendida (kW)
Casas 36,00 5 55 6,6
Sobrados 41,10 5 51 8,6
Apartamentos 2
45,60 6 120 7,0
dormitórios
Apartamentos 3
53,45 7 120 7,0
dormitórios
Tabela 1– Demanda de energia elétrica por modalidade habitacional.

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3. Levantamento de dados
Em relação ao consumo elétrico, as habitações foram projetadas para famílias de baixa renda.
É considerada consumidora de baixa renda aquela que demanda uma energia mensal entre 80
e 200 kWh, conforme Resolução da ANEEL nº 485 de 29 de agosto de 2002 (BRASIL,
2002). Já para a companhia Rio Grande Energia (RGE), é considerada unidade de baixa renda
aquela com consumo mensal inferior a 160 kWh. Segundo anteprojeto de eletrificação urbana
(CAXIAS DO SUL, 2008) as casas e os sobrados são projetados para o consumo mensal de
150 kWh. Já os prédios de 2 dormitórios e 3 dormitórios foram superdimensionados conforme
Regulamento de Instalações Consumidoras de Baixa Tensão – RIC/BT (RGE, 2008) para
atender uma demanda de 23,40 e 29,94 kVA, respectivamente. Tais demandas equivalem ao
consumo mensal máximo de 842 kWh e 1.078 kWh.
Segundo o relatório da Matriz Energética Nacional do Ministério de Minas e Energia
(BRASIL, 2007), as energias renováveis, consideradas como eólica, solar e geotérmica, em
2002 representaram apenas a 0,7% da geração de eletricidade mundial. Considerando-se a
hídrica e a biomassa também como energias renováveis, o percentual das cinco fontes passa
para 18,2%, sendo 16,2% da primeira e 1,3% da segunda. O relatório supõe ainda que para o
ano de 2030 o percentual passe de 18,2% para 19,3% e que diminua para 15,4% até o ano
2050. Ou seja, um retrocesso na matriz energética quanto ao uso de energias renováveis.
Desta maneira, faz-se necessária a adoção de medidas com o intuito de mudar o prognóstico,
através de políticas que incentivem o uso racional e eficiente de energias renováveis. Em nível
nacional já existem alguns programas que visam o melhor uso. A título de exemplificação, o
Plano Nacional de Energia 2030 do Ministério de Minas e Energia (BRASIL, 2007) propõe o
fomento às energias renováveis de forma a aumentar a participação destas fontes na Matriz
Energética Nacional. Ressalta-se ainda que conforme prevê artigo 4º da Lei Federal nº 10.295
de 17 de outubro de 2001, que dispõe sobre a Política Nacional de Conservação e Uso
Racional de Energia, cabe ao Poder Executivo desenvolver mecanismos que promovam a
eficiência energética das edificações construídas no território nacional (BRASIL, 2001).
O Loteamento Victório Trez tem a previsão de atendimento a demanda energética suprida
pela rede elétrica pública, através da distribuição da companhia RGE. Tal suprimento
energético provém de usinas hidrelétricas, as quais utilizam a energia potencial das águas
represadas nos rios, para a transformação em energia elétrica.
Apesar de a energia hidráulica ser considerada renovável para muitos autores, deve-se
ressaltar que a mesma apresenta muitas desvantagens, sobretudo referente aos impactos ao
meio ambiente (aspectos físicos, bióticos e antrópicos), tanto pelo represamento de um rio
como pela transmissão e distribuição. Apresenta riscos de acidentes operacionais e
ambientais, requer manutenção mais freqüente, além de possuir perdas consideráveis durante
a transmissão e distribuição. Tem como principal vantagem o fornecimento contínuo e estável
de uma carga superior em relação a fotovoltaica. Mesmo assim, a infra-estrutura existente
pode não suprir as necessidades de uma demanda populacional, como já ocorreu em algumas
grandes cidades brasileiras entre os anos 2001 e 2002.
Para sistemas fotovoltaicos, as principais desvantagens referem-se à baixa eficiência
energética das células fotovoltaicas e ao elevado custo da implantação do sistema. No entanto,
é considerada muito menos impactante ao meio ambiente em relação à energia hidráulica,
além de apresentar menos riscos de acidentes, manutenções e perdas energéticas.
Desta forma, propõe-se que os doze prédios com apartamentos de dois e três dormitórios

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tenham sistema fotovoltaico instalado na cobertura. Já para as casas e sobrados, propõe-se que
o suprimento energético seja complementado por sistema fotovoltaico instalado na área
institucional do loteamento e não nos telhados. Isto porque algumas unidades de tipologia de
habitação seriam prejudicadas pela sombra projetada pelos prédios.
A distribuição de energia elétrica proposta aos quatro modelos de unidades familiares do
loteamento, por consumo e demanda em relação à fonte de energia pode ser visualizada na
Tabela 2. Tais porcentagens foram determinadas em função do espaço físico na cobertura dos
prédios e na área institucional, bem como em relação aos custos e eficiência dos sistemas.

Porcentagem (%)
Consumidor Consumo / Demanda
Hidráulica Fotovoltaica
Casas térreas e sobrados 150 kWh/mês 59 41
Apartamentos com dois dormitórios 150 kWh/mês 60 40
Apartamentos com três dormitórios 210 kWh/mês 58 42

TABELA 2 – Distribuição de eletricidade por consumo/demanda em relação a fonte de energia.

Segundo Roaf et al (2006), para se obter melhor perpendicularidade entre as células


fotovoltaicas e os raios solares, os painéis devem estar inclinados conforme a estação do ano,
sendo aumentados 10º no inverno e diminuídos 10º no verão em relação a latitude da
localidade. Para a latitude de 29º10' de Caxias do Sul, recomenda-se uma inclinação de 39º no
inverno, 29º na primavera e outono e 19º no verão. Por motivos operacionais, será
considerada apenas uma inclinação para os sistemas. Opta-se pela inclinação do verão, na
qual se estima uma produção fotovoltaica maior, conforme recomenda Roaf et al (2006).
As condições climáticas, como a intensidade e duração da radiação solar são os fatores
responsáveis pelo bom desempenho dos sistemas fotovoltaicos. Através de séries históricas de
dados climatológicos é possível supor o comportamento futuro de determinado parâmetro.
Mesmo assim, as variações diárias implicam em variações na produção de energia elétrica. Ou
seja, nem sempre a eletricidade pode estar disponível no momento do consumo, e uma
maneira de garantir a demanda em diferentes períodos do dia é através do armazenamento de
cargas, feito comumente por um banco de baterias. (BOYLE, 2004)
As baterias têm a função de ajustar a oferta e a demanda. Devem permitir a descarga e a
recarga, sendo que a porcentagem de descarga, conhecida como profundidade de descarga, é
determinada pelo fabricante. A associação das baterias se dá assim como nos painéis
fotovoltaicos, ou seja, em série, em paralelo ou de forma mista.
A corrente elétrica produzida em sistemas fotovoltaicos é contínua, no entanto, normalmente,
os equipamentos eletrônicos das habitações utilizam corrente alternada. Desta forma, corrente
contínua deverá ser convertida em alternada, e o equipamento responsável por tal
transformação denomina-se inversor de freqüência. Consiste, basicamente, em um sistema
composto por dois transformadores capazes de mudar a freqüência nula da corrente contínua
para 50 ou 60 Hz da corrente alternada. São constituídos ainda por proteções capazes de filtrar
baixas e altas correntes.
Outro equipamento fundamental ao sistema é o controlador de carga, o qual tem por objetivo
principal proteger o banco de baterias de curtos circuitos, sobrecargas, sobreaquecimento e
inversão de polaridade. O mesmo regula as variações da tensão e a corrente de entrada em

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tensão e corrente estáveis.

4. Dimensionamento do sistema fotovoltaico


O sistema foi dimensionado para as quatro modalidades habitacionais, considerando-se a
potência demendada e as características climáticas da região.
A potência de pico a ser produzida (PP) pelos módulos é calculada pelas Equações 1 e 2
propostas por Blázquez (2006):
PD
PP = (1)
H × f ×V
sendo PD a potência demandada (kWh/d); f o fator de correção da inclinação dos painéis; V o coeficiente de perdas do
sistema; H quantidade de horas diárias de insolação (h/d).

O coeficiente de perdas do sistema, dado pela Equação 2, refere-se ao produto das fugas
existentes nas conexões e cabos (VCON) com as perdas por temperatura (VTEMP) e eficiências
dos equipamentos (VINV e VBAT).
V = VTEMP × VINV × VBAT × VCON (2)

Visto que a média anual da temperatura em Caxias do Sul (16,9 ºC) é inferior à temperatura
ideal de trabalho dos painéis fotovoltaicos (25 ºC) as perdas por temperatura serão
desprezadas. Conforme propõe Blázquez (2006), será considerado 8% de perdas nas conexões
elétricas, deixando o sistema com uma eficiência de 92%. Para o inversor e bateria com 96 e
90% de eficiência, respectivamente, tem-se um fator de perdas igual a 0,7949 calculado pela
Equação 2.
Sabe-se pelo projeto arquitetônico que o telhado do prédio foi projetado para uma inclinação
de 12º; no entanto, para viabilizar um melhor aproveitamento da incidência solar, dimensiona-
se a disposição dos painéis fotovoltaicos para uma inclinação de 19º. Considerando-se que
não ocorram mudanças nas inclinações dos módulos conforme as estações do ano, espera-se
75% de eficiência na captação da radiação nos painéis.
Pela Equação 1, considerando-se ainda a insolação diária média de seis horas e o coeficiente
de perdas calculado, a potência estimada a ser produzida no telhado, diariamente, será 11,18
kW ou 5,59 kW para cada subsistema fotovoltaico.
Para painéis fotovoltaicos policristalinos, medindo 1.425 mm de altura e 652 mm de
comprimento, capazes de gerar uma potência de pico igual a 130 W (PI), calcula-se a
quantidade de módulos (Np) necessários pela Equação 3, para as diferentes modalidades
habitacionais.

Quantidade de
Modalidade Habitacional
Painéis
Casas e Sobrados 444
Prédios com ap. 2 dormitórios 86
Prédios com ap. 3 dormitórios 120
Tabela 3 – Quantidade de painéis fotovoltaícos calculados por modalidade habitacional.

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5. Análise de viabilidades
Dada a abrangência deste projeto, entende-se que se faz necessário a análise de viabilidades
sócio-econômica, técnica e ambiental para cada sistema dimensionado.
Sabe-se que são muitos os fatores que interferem no comportamento do mercado econômico.
A título de exemplificação, através do histórico de metas para a inflação nacional, publicado
pelo Banco Central do Brasil (BRASIL, 2008), percebe-se um grau elevado de discordância
entre as metas, previstas em resoluções, em relação aos valores efetivos.
O comportamento do valor do dólar, em um intervalo de tempo curto, é outro exemplo da
oscilação do mercado que pode ser facilmente visualizado, pois em um período menor que um
ano, a variação do dólar foi de aproximadamente 30%. Valor o qual pode inviabilizar a
execução de um empreendimento, ou de forma análoga, trazer receitas e benefícios
econômicos.
Assim, propõem-se três cenários de investimentos, um pessimista, um realista e um otimista.
Para o primeiro, considera-se um incremento de 20% nos valores cotados no orçamento e nas
despesas, bem como uma redução de 20% nos benefícios. Já para o último, propõem-se, de
forma análoga, redução e incrementos de igual porcentagem. A tabela 4 apresenta os três
cenários para os investimentos iniciais dos sistemas projetados, considerando-se a
implantação do sistema completo, com os cabeamentos, casas de máquinas e de baterias.

Cenários Pessimista Realista Otimista


Investimentos R$ 3.957.528,00 R$ 3.297.940,00 R$ 2.638.352,00

Tabela 4 – Resumo dos investimentos iniciais em três cenários.

Propõe-se que todos os investimentos dos sistemas sejam arcados de forma similar ao custeio
do Loteamento Victório Trez, ou seja, 25% pela Prefeitura de Caxias do Sul e 75% por outro
investidor. Para este, seja público ou privado, espera-se que a contribuição seja a fundo
perdido, ou seja, sem expectativa de retorno do montante investido. Apesar de parecer uma
medida economicamente inviável, esta modalidade de investimento é factível a grandes
entidades privadas que buscam: a redução de impostos, a melhoria da imagem da empresa, o
estímulo a iniciativa privada, entre outros fins.
Na iniciativa pública, estes investimentos se mostram mais presentes. A título de
exemplificação, visualizam-se o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), programas
do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social (BNDES), bem como o resgate de
multas ambientais do Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA).
Existe também a possibilidade do investimento ser de caráter internacional. Um exemplo
comum, são as empresas internacionais que, através do Protocolo de Quioto, utilizam o
critério poluidor-pagador na redução de poluição atmosférica. Ou seja, são empresas
potencialmente poluidoras que preferem investir em programas ambientais ao invés de tratar
suas próprias poluições. No caso do sistema de abastecimento complementar e sistema de
tratamento de resíduos sólidos domésticos, entende-se que a contrapartida da Prefeitura deva
ser parcialmente ressarcida, a longo prazo, pelos moradores do loteamento. Isto porque o
mesmo tem caráter mais privado do que público, em relação aos demais, ou seja, o sistema
não requer gerenciamento público.
Atualmente, as questões sociais são muito mais consideradas do que no passado; no entanto,

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as diferenças ainda persistem. Nos últimos anos, o governo brasileiro iniciou alguns
programas com o intuito de reduzir as desigualdades entre as classes. Muitos deles consistiam
e consistem em subsidiar totalmente um benefício ou necessidade de uma classe
desfavorecida. Entende-se que, desta maneira, a população sempre estará à mercê do
Governo, sem capacidade de se auto-sustentar; assim, a desigualdade social não será
resolvida.
Neste projeto, será considerado que a população de baixa renda do loteamento não seja
subsidiada completamente. Ou seja, propõe-se que a mesma contribua parcialmente com as
despesas, manutenções e operações dos sistemas, garantindo assim sua função social e seu
próprio desenvolvimento.
5.1 Análise de viabilidade sócio-econômica
As baterias e os módulos fotovoltaicos representam, aproximadamente, 84% do valor dos
sistemas. O resumo dos investimentos iniciais, para os três cenários, é mostrado na Tabela 5.

Modalidade Cenário Pessimista Cenário Realista Cenário Otimista


Habitacional
FP (R$) M (R$) FP (R$) M (R$) FP (R$) M (R$)
Prédios com aptos. com
901.387 300.462 751.156 250.385 600.925 200.308
dois dormitórios
Prédios com aptos. com
1.249.560 416.520 1.041.300 347.100 833.040 277.680
três dormitórios
Casas e sobrados 817.199 272.400 680.999 227.000 544.799 181.600
Total 2.968.146 989.382 2.473.455 824.485 1.978.764 659.588
FP: investimento a fundo perdido; M: investimento pelo município.

Tabela 5 – Contrapartidas do investimento inicial dos sistemas elétricos complementares.

Neste caso, entende-se que os sistemas fotovoltaicos devam ser gerenciados por entidade
pública, ou concessionária, não cabendo contrapartida no investimento inicial dos moradores
do Loteamento. Atualmente, a RGE é a empresa responsável pela distribuição da energia
elétrica no município de Caxias do Sul. A mesma compra a energia elétrica e revende o
fornecimento aos consumidores de baixa renda, por um valor de R$ 0,322/kWh para
consumos até 160 kWh e R$ 0,358/kWh para maiores que 160 kWh.
Entende-se que para os sistemas fotovoltaicos do loteamento, a empresa não necessitará pagar
pela geração. Os custos envolvidos no sistema serão de mera manutenção e administração,
assim, estima-se, uma despesa mensal de R$ 800,00, referente aos salários de dois eletricistas
plantonistas, ou o equivalente R$ 9.600,00 por ano.

Consumo médio mensal de 150 kWh de casas térreas e sobrados

Fornecimento
Economia
Convencional Projetado

100% Hidrelétrica (A) 59% Hidrelétrica (B) 41% Fotovoltaica (C) (D=A-(B+C)) (E=(D/A)*100)
R$ 48,30 R$ 29,38 R$ 12,42 R$ 6,50 13,45%
Consumo médio mensal de 150 kWh de apartamentos com dois dormitórios

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Fornecimento
Economia
Convencional Projetado

100% Hidrelétrica (A) 60% Hidrelétrica (B) 40% Fotovoltaica (C) (A-(B+C)) (E=(D/A)*100)
R$ 48,30 R$ 29,88 R$ 12,12 R$ 6,30 13,04%
Consumo médio mensal de 210 kWh de apartamentos com três dormitórios

Fornecimento
Economia
Convencional Projetado

100% Hidrelétrica (A) 58% Hidrelétrica (B) 42% Fotovoltaica (C) (A-(B+C)) (E=(D/A)*100)
R$ 75,18 R$ 43,60 R$ 20,46 R$ 11,11 14,78%

Tabela 6 – Simulação de economia para as unidades familiares do loteamento

Propõe-se que o valor do kWh fotovoltaico a ser pago pelos consumidores seja de R$ 0,202
para consumos até 160 kWh e R$ 0,232 para consumos maiores que 160 kWh. Assim,
visualiza-se uma redução de 13% a 14,8% no valor da conta elétrica dos moradores, conforme
mostra a Tabela 6. Na mesma, é feita uma simulação para dois fornecimentos, o convencional
e projetado. Esta redução econômica proporciona mais condições a população de baixa renda
do loteamento, diminuindo as chances da informalidade, como por exemplo, a inadimplência
nos pagamentos de energia elétrica, as ligações clandestinas de eletricidade e a falta de
energia.
Considerando-se a quantidade de unidades familiares do loteamento, espera-se um consumo
mensal de 17,7 MWh entre casas e sobrados, 18 MWh para apartamentos de dois dormitórios,
bem como, 25,2 MWh para apartamentos de três dormitórios. Assim, para as porcentagens de
fornecimentos fotovoltaicos e os preços dos kWh fotovoltaicos, espera-se uma receita mensal
de R$ 5.388, ou o equivalente a R$ 64.658,00 por ano, conforme descreve a Tabela 7.

Geração Fotovoltaica
Consumo Tarifa Receita
Unidade Familiar
(kWh) (R$/kWh) (R$/mês)
% kWh
Casas e sobrados 17.700 41 7257 0,202 1.465,91
Apto. 2D 18.000 40 7200 0,202 1.454,4
Apto. 3D 25.200 42 10584 0,232 2.455,49
Total 5.375,8

Tabela 7 – Receita fotovoltaica mensal estimada no loteamento

Desta maneira, gera-se o fluxo de caixa com os benefícios econômicos tangíveis e as despesas
do sistema fotovoltaico do loteamento, referentes aos investimentos e custos de operação,
conforme mostra a Figura 1.

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R$ 64.658

R$ 9.600

R$ 1.228.993

R$ 1.754.245

Investimentos Custos de Operação Benefícios Tangíveis


R$ 3.297.940
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29

FIGURA 1 – Fluxo de Caixa do sistemas complementares fotovoltaícos.

Para garantir que, após a vida útil dos painéis fotovoltaicos e das baterias, seja possível a
aquisição de novos equipamentos, propõe-se a aplicação das receitas anuais no mercado
econômico.
Assim, visualizam-se dois investimentos de baixo risco e com retornos atrativos, o Certificado
de Depósito Bancário (CDB) e Títulos da Dívida Pública. Neste projeto, será considerado o
segundo, o qual utiliza a taxa SELIC. Conforme série histórica diária entre as datas 21 de
novembro de 1999 e 21 de novembro de 2008, a taxa média anual SELIC é 16,96%.
Com o intuito de verificar a viabilidade econômica do investimento, será utilizado a técnica
do Valor Presente Líquido (VPL) para duas situações para cada cenário: (a) uma com o
investimento inicial quitado por investidores a fundo perdido e, (b) outra com o investimento
inicial quitado através de empréstimo. Segundo Gitman (2002), se VPL for maior que zero,
aceita-se o projeto; de forma análoga, se for menor que zero, rejeita-se. Ou seja, se VPL>0, o
retorno esperado é maior que o investimento inicial.
Para o cálculo do VPL, considerou-se investimentos conforme a vida útil dos equipamentos e
a taxa SELIC de 16,96% por um período de 30 anos. As tabelas para os diferentes cenários e
situações são apresentadas no Apêndice A. Já o resumo dos resultados e as análises de
viabilidade econômica são descritos na Tabela 8.

Investimento a Fundo Perdido Investimento por Empréstimo


CP CR CO CP CR CO
R$ 1.911.679 R$ 4.536.818 R$ 7.161.957 R$ (2.045.849) R$ 1.238.878 R$ 4.523.605
VPL>0 VPL>0 VPL>0 VPL<0 VPL>0 VPL>0
Viável Viável Viável Inviável Viável Viável
CP: cenário pessimista; CR: cenário realista; CO: cenário otimista.
Tabela 8 – Resumo do VPL para os sistemas complementares fotovoltaicos.

Percebe-se que a quitação do investimento inicial, conforme proposto anteriormente, ou seja


25% pela Prefeitura de Caxias do Sul e 75% por outra entidade, sem a necessidade de retorno,

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é a situação mais segura e viável para a implantação do sistema fotovoltaico no loteamento,


não sendo geradas dívidas.
Ao contrário, caso o investimento inicial seja quitado mediante empréstimo ou financiamento,
o projeto se mostra inviável economicamente para o cenário pessimista. No cenário realista e
otimista, os períodos de retorno são 20 e 12 anos, respectivamente.
5.2 Análise de viabilidades técnica e ambiental
Tecnicamente, o sistema projetado se mostra bastante factível e com muito menos
complexidade em relação aos convencionais. Sistemas fotovoltaicos, normalmente, não
requerem transmissão e distribuição sofisticadas, isto porque a geração elétrica encontra-se
mais próximo da fonte de consumo.
O uso dos sistemas fotovoltaicos complementares no loteamento aumenta a vida útil dos
sistemas convencionais. Isto significa uma disponibilidade de, aproximadamente, 40% de
energia elétrica convencional.
Conforme já discutido, em termos de eficiência, o sistema fotovoltaico é muito menos
eficiente que uma usina hidrelétrica, assim como a forma de armazenamento de eletricidade.
Contudo, espera-se grandes avanços na produção de eletricidade através de tecnologias mais
eficientes, além de células de hidrogênio capazes de substituir as baterias atuais.
Nos sistemas convencionais de eletricidade, pode-se citar alguns impactos significativos
durante a distribuição, entre eles, podas e corte de árvores, uso de veículos automotores, uso
de recursos naturais e geração de resíduos.
Outros impactos significativos dos sistemas convencionais referem-se aos sistemas de geração
de energia elétrica. No caso de usinas hidrelétricas pode-se citar: inundação de extensas áreas;
desequilíbrio dos ecossistemas; alteração do regime hídrico dos rios e seus afluentes, bem
como das águas subterrâneas; carreamento e erosão dos solos marginais a jusante da usina;
sedimentação a montante da usina. Salienta-se também, que a construção está associada com
impactos sociais; originados, geralmente, pela necessidade da retirada dos habitantes da área a
ser inundada ou por conflitos sócio-econômicos e ambientais.
No caso dos sistemas fotovoltaicos, os impactos acima descritos e citados, normalmente, não
são presenciados na mesma magnitude. De fato, existe a geração de resíduos e consumo de
recursos naturais, no entanto, em proporções muito menores. Em resumo, pode-se dizer que
tecnicamente e ambientalmente, os sistemas elétricos complementares projetados são muito
mais viáveis do que os convencionais.
6. Considerações finais
A análise sócio-econômica considerou duas situações para o investimento inicial do projeto,
uma com auxílio financeiro total ou parcial e outra sem auxílio. Para cada uma e para cada
sistema foi considerado três cenários, um pessimista, um realista e um otimista.
Através dos sistemas complementares de energia elétrica, espera-se um fornecimento de
aproximadamente 40% a partir da geração fotovoltaica. Ou seja, uma redução de significativa
no fornecimento convencional. Ainda, considerando-se que o gerenciamento seja através de
empresa concessionária ou entidade governamental, propõe-se que a população do loteamento
pague menos pela energia fotovoltaica produzida, proporcionando uma economia mensal de
13 a 14,8% por unidade habitacional.
Através da análise econômica, na situação onde o investimento inicial é quitado mediante

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XXIX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
A Engenharia de Produção e o Desenvolvimento Sustentável: Integrando Tecnologia e Gestão
Salvador, BA, Brasil, 06 a 09 de outubro de 2009

empréstimo ou financiamento, percebe-se que a implantação é inviável economicamente para


o cenário pessimista; no entanto, viável economicamente para os cenários realista e otimista,
com períodos de retorno de 20 e 12 anos, respectivamente. De uma maneira muito mais
confortável e segura, caso a quitação do investimento inicial seja sem a necessidade de
retorno, ou seja, caso a Prefeitura de Caxias do Sul arque com 25% e outra entidade com
restante, visualiza-se que todos os cenários são viáveis.
Em relação aos aspectos sociais, entende-se que a população de baixa renda do loteamento
não deva ser subsidiada completamente. Ou seja, propõe-se que a mesma contribua
parcialmente com as despesas, manutenções e operações dos sistemas, garantindo assim sua
função social e seu próprio desenvolvimento.
Apesar dos investimentos iniciais serem consideráveis, entende-se que os sistemas propostos
são viáveis e factíveis para a maioria dos cenários. Como já era esperado, caso haja auxílio no
pagamento do investimento inicial, parcialmente ou totalmente sem necessidade de retorno, a
viabilidade é muito mais segura e confortável.
Entende-se que através da implantação de todos os sistemas propostos, os impactos diretos e
indiretos são mitigados, proporcionando mais sustentabilidade ao loteamento Victório Trez.
Ou seja, visualiza-se que o projeto é ambientalmente viável.

Referências
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