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Bluestone Alley

yoonkook | drama

Capítulo 1:
Primeira fase: Negação
Depois que o mais novo havia aprendido como tocar um piano, nunca mais deixou o
maldito quarto e quem passasse pelo corredor do casarão poderia ouvi-lo tocar.

Recentemente o que mais me intriga não é o fato de que vive confinado num quarto
enorme onde só há um piano e um armário rústico numa casa tão grande, e sim, o motivo dele
só tocar a mesma música.

Melodia essa que estranhamente deixava o ar da casa inteira melancólico, o ritmo


fazia com que as coisas parecessem mais lentas onde a música podia ser ouvida. Parecia trilha
sonora de um momento nostálgico. Era um sentimento inexplicável, um mesclado de tristeza,
leveza e uma ponta de felicidade que palpita de acordo com o bater do coração.

Assim como ele conseguia passar horas e horas tocando aquilo, qualquer um poderia
ouvi-lo por horas. Mas a agonia dentro de mim fez com que eu não mais aguentasse ouvir
aquela música por através da porta e, enfim, abri-la. Minha entrada repentina, como era de se
esperar, fez com que o garoto interrompesse a música, tornando toda aquela casa novamente
um silêncio.

Os olhos dóceis que me encaravam tornava tudo ainda mais difícil. Minha garganta
parecia, por um momento, estrangular; tornava difícil até mesmo o ato de engolir minha
própria saliva. Nossos pais pareciam cada vez menos se importar, então tudo que havia de
mais dificultoso tornava-se minha responsabilidade: contá-lo.

— Jeongguk... – Soltei um suspiro. – Parece que nós vamos ter que nos mudar pra uma
casa menor. – Ele não dizia absolutamente nada, seu rosto apenas tinha uma expressão
confusa e nos seus olhos, claramente, a mágoa. – Eu sei. Parece que as coisas não vão muito
bem à fábrica, então eles decidiram vender esse prédio.

Os seus olhos se enchiam d'água. Ele já entendia, com meias palavras, que toda a sua
paixão iria ser destruída pelo maldito capital que meu pai tanto almejava. Sempre colocando
os valores acima dos sentimentos daqueles com quem deveria se importar.

Não havia mais duvidas de que estava magoado. Fechou a cara, levantou da banqueta
e passou por mim, esbarrando no meu ombro e batendo os pés contra o assoalho. Eu apenas
pude respirar fundo por alguns instantes e encarar aquilo.

Apesar de provavelmente querer o isolamento, eu era o responsável por evitar suas


frustrações. Logo, caminhei em direção ao quarto que teve a porta fechada com uma forte
batida qual podia ser ouvida pelo corredor inteiro. Abri sem permissão e coloquei a cabeça
para dentro do cômodo, observando a situação atual.
Estava jogado na cama, repleto de ódio que lhe escorria pelo rosto como lágrimas. Eu
adentrei cautelosamente e caminhei até onde ele estava, apoiando-me no colchão vestido de
lençóis azuis e deitando-me ao seu lado.

— Ei... – Sussurrei. Em seguida levando minha mão até seus fios castanhos de cabelo,
tirando-os da frente do rosto, com os dígitos passeando pela sua testa, para que eu pudesse
visualizá-lo com clareza. Ele não disse absolutamente nada, bufou e afastou o rosto para que
minha mão não mais pudesse tocá-lo. – Não fica assim, Jeongguk. Olha cá para mim.

Pouco depois de eu pedir, seus olhos ainda furiosos encararam os meus, e seu rosto
novamente pôde ser visto. Eu aproximei-me ainda mais dele, segurei com as mãos o rosto
alheio e depositei um leve selar nos lábios ressecados.

Na manhã seguinte, tudo amanheceu em plena quietude. Os passos no assoalho e o


tiquetaquear do relógio soavam mais alto do que nunca, pareciam quase ensurdecer-me.
Apesar de ter adormecido na cama do mais novo, aquele já não se encontrava ali ao que
despertei. Caminhei pela casa em busca daquele, encontrando-o então na nomeada sala do
pianista — o que não parecia surpreendente na realidade.

Eu adentrei o local em passos leves e cautelosos, apesar da madeira ranger em um


ponto específico do chão. O piso ali não era polido, o amarronzado não brilhava com verniz.
Era uma sala velha e empoeirada, com assoalho gasto e arranhado, com paredes velhas, mas
ainda assim era o seu lugar preferido, seu refúgio.

Assim que tentei dar outro passo adentro, pronunciou-se finalmente:

— Sai daqui, Yoongi. – Em anos, provavelmente, era a primeira vez que ouvia de sua boca algo
com tanta rispidez, o que me assustava um pouco e por reação fez meus pés pararem onde
estavam.

— Jeongg...

— Eu disse pra você sair! – A voz agora alta, falhava graças ao choro que se deu início. Soava
para mim como algo estridente, sua voz nesse tom era uma navalha a cortar-me rapidamente
a pele. Engoli à seco minha própria saliva e apertei brevemente os olhos a fechar.

— Jeongguk, eu só quero conversar. – Eu necessitava soar calmo e pacífico.

— Eu não. – Secou os olhos ainda de costas e finalmente virou-se para mim. Seu rosto estava
vermelho e ele ainda puxava vez ou outra o nariz, mas abriu um sorriso e enfim voltou a
pronunciar-se: – Não tenho nada sobre o que conversar.

Eu sabia o quanto aquela música era importante pra ele. Eu sei como a felicidade dele girava
em torno daquele piano, naquela sala vazia, e talvez eu apenas odiasse tanto ouví-la porque as
memórias que eu tinha do menino, na minha cabeça, reproduzem ao som de Bluestone Alley.

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Jeongguk e eu estávamos sentados sobre o tapete de seu quarto, com uma caixa de metal em
mãos, onde o menino cuidadosamente guardava fotos de sua infância. Ele dizia gostar de ver a
si próprio na infância e lembrar-se da época que morava em Busan. Deveria ser uma tarde
comum, chata, em que eu me trancaria no quarto e evitaria as pessoas, mas tornou-se especial
pelo simples fato do menino abrir-se comigo e querer me mostrar parte de si. Eram raros os
momentos em que eu tinha chance de conhecer um pouco mais da pessoa que vive na mesma
casa que eu há quase quatro anos, se considerar todo o tempo em que nossos pais estão se
envolvendo e nos forçando a convivência.

— Quem é esse? – Apontei para o rapaz em uma das fotos, qual me chamou a atenção.

— Meu pai. – Jeongguk expressou um fino e sutil sorriso nos lábios ao anunciar.

— Vocês se parecem bastante. – Disse após analisar o rosto do menino em minha frente.

— Todo mundo dizia isso. Acabei que desde pequeno dizia que queria ser como ele. Ele era
músico, eu me lembro de o ver apresentar nos teatros das redondezas, era realmente bom no
que fazia.

— O que aconteceu com ele?

Assim que minha indagação fez-se, o ambiente pesou. A expressão harmônica do rapaz em
frações de segundo tornava-se levemente entristecida e um grande silêncio a possuir-nos.

— Ele foi para um concerto e não voltou pra casa.

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Capítulo 2:
Segunda fase: Raiva

Ouvi um forte barulho que surgia do quarto do mais novo. Chamava-me a atenção e
preocupava-me pela instabilidade emocional pela qual está passando ultimamente.

Levantei-me da cama e caminhei em passos rápidos até o local, abrindo a porta com certo
desespero. Encontrei a escrivaninha revirada, suas partituras e mais um monte de coisas
esparramadas no chão e o menino com seu ódio estampado no rosto. Estava cada vez mais
difícil de lidar.

Eu caminhei em sua direção e tentei pará-lo, mas recusava qualquer contato, me empurrava,
afastava-se.

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