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EDUCAÇÃO, CURRÍCULO E
CULTURA
Formação e Prática Docente
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
CONSELHO EDITORIAL
Presidente
Henrique dos Santos Pereira
Membros
Antônio Carlos Witkoski
Domingos Sávio Nunes de Lima
Edleno Silva de Moura
Elizabeth Ferreira Cartaxo
Spartaco Astolfi Filho
Valeria Augusta Cerqueira Medeiros Weigel
Reitor
Sylvio Mário Puga Ferreira
Vice-Reitor
Jacob Moysés Cohen
Editor
Sérgio Augusto Freire de Souza
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Aldair Oliveira de Andrade
Elrismar Auxiliadora Gomes Oliveira
Eulina Maria Leite Nogueira
Renato Abreu Lima
Valmir Flores Pinto
(Organizadores)
EDUCAÇÃO, CULTURA
E PRÁTICA DOCENTE
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© by Alexa Cultural
Direção
Gladys Corcione Amaro Langermans
Nathasha Amaro Langermans
Editor
Karel Langermans
Capa
K Langer
Imagens de capa
Elrismar Auxiliadora Gomes Oliveira, Zilda Gláucia Elias Franco e Pixerview
Revisão Técnica
Aldair Oliveira de Andrade e Michel Justamand
Revisão de língua
Vânia Cristina C. de Andrade
Editoração Eletrônica
Alexa Cultural
CDD - 370
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PREFÁCIO
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lizacional” contribui para pensarmos o processo de formação in-
dígena no Brasil e no Amazonas, não apenas expõe um panorama
desse processo, mas conclama a uma educação intercultural crítica,
decolonizadora e intercivilizacional. Corrobora com essa percepção
a discussão que propõe refletir a “Educação e diversidade cultural
numa perspectiva da pedagogia crítica e decolonial”. Essa asserti-
va, potencializa interlocuções com a pedagogia Decolonial e Crítica,
retoma o conceito de interculturalidade crítica como possibilidade
de produção de uma educação centrada nas diferenças. Contribui
para pesarmos processos de emancipação social e educacional com
vistas a ética e respeito as matrizes culturais e identitárias dos sujei-
tos escolares.
Outro destaque que intensifica a articulação entre educação,
cultura e currículo é visualizado no manuscrito “Nossas relações
com o mundo e com o outro – culturas” texto que permite dilatar
nossa percepção de escola, cultura e currículo. A partir de reflexões
e ampla pesquisa junto ao povo indígena Parintintin, demostra o pro-
cesso astronômico, cosmogônico e cultural pelos quais os céus indí-
genas são conhecidos e significados. Não menos importante, são as
pesquisas que pensam a educação das populações tradicionais ama-
zônicas, destacando, por exemplo, a “Trajetória de uma pesquisa
em uma escola ribeirinha no sudoeste do amazonas”. Tendo como
principal interlocução a perspectiva da teoria da complexidade, os
autores mostram os modos como os saberes tradicionais etnobotâni-
cos em forma de utilização e conhecimento sobre as plantas medici-
nais de uma população ribeirinha amazônica se integram e contribui
para a educação científica na escola da comunidade.
Como observado, o tema do currículo em suas múltiplas re-
lações perpassa os textos escolhidos e são intensificados em “Prin-
cípios epistemológicos das teorias do currículo”. Nesta reflexão, o
leitor encontrará densas reflexões sobre o currículo como território
de contestação, isto é, como espaço que articula o saber – poder em
suas diferentes manifestações. Ao reconstruírem a história de como
as teorias curriculares foram/são produzidas, os autores entendem
que o currículo é uma máquina de produção de sujeitos, viabiliza a
construção de modelos operatórios da sociedade, interpõe-se como
mecanismos de produção de políticas e práticas pedagógicas, sus-
tentam, fazem aparecer e desaparecer ideologias.
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Em “Ensino de ciências da natureza e interculturalidade: um
olhar para a Base Nacional Comum Curricular” tem-se a ideia de
que a educação intercultural crítica na perspectiva decolonial articu-
lada a reflexões sobre a Base Nacional Comum Curricular urge de
reflexão e atualização. Neste contexto, mostra, a partir de reflexões
interculturais, o modus como a BNCC produz avanços e também
desafios para as elaborações de aprendizagens que considera a astro-
nomia cultural como importante campo de formação.
Para pensar a “Formação continuada no âmbito das políticas
públicas: possibilidades e desafios na adesão do PNAIC no municí-
pio de Humaitá- AM”, um conjunto de pressupostos são elaborados,
entre eles, destaca-se a ideia de que a “formação é primordial para
o exercício da carreira docente, fazendo-se necessário formá-lo em
sua totalidade e não dispor apenas de momentos pontuais e fragmen-
tados para atender aspectos tecnicistas”.
Esse modo de pensar a formação é ampliado com a ideia de
que a ética constitui ponto de equilíbrio e necessidade premente em
todo processo educativo. Ampliando a noção de “Cidadania e ética:
fundamentos para uma reflexão no ensino médio técnico”, impõe-
-se a analítica de que a “Ética e justiça na escola devem sempre se
fundamentar em valores de igualdade e equidade” e que os docentes
devem estar preparados para transpor desafios de promover espaços
de convívio em sociedade.
O mundo da vida, desafiados pelas múltiplas formas de como
se organiza a sociedade, requer reflexões constantes, com esse in-
tuito, torna-se importante conhecer a “a percepção dos professores
de filosofia sobre sua prática docente no ensino técnico do IFRO”.
Os professores entendem que a “Filosofia não é restrita ao intelecto
lógico, mas, avança para as relações com o mundo da vida do aluno
valorizando sentimentos, atualidade, trabalho, profissão”. Neste con-
texto, a escola é um espaço de complexidades, isto é, espaço em que
múltiplos conhecimentos se cruzam e interconectam. A matemática
não é diferente, se constrói e se articula a prática e a formação dos
professores e professoras. Indagações sobre o conhecimento escolar
impõe refletir sobre “o lugar dos saberes na formação e prática de
professores que ensinam matemática”. Pode-se dizer que esse lugar
aparece em “disciplinas específicas relacionadas aos conhecimentos
dessa área de estudo, a disciplina Matemática na Educação Infantil
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e Séries Iniciais do Ensino Fundamental e Metodologia e Prática de
Ensino de Matemática”. Estes são lugares de práticas e aprendiza-
gens professorais.
Tomando como prática pedagógica, um conjunto de ações
voltadas a orientar a sistemática de ensino, as múltiplas modalida-
des educacionais impõem necessidades de articulação entre a forma-
ção permanente e a ação reflexiva. Em “prática pedagógica na EJA
e o desafio para a efetivação da função qualificadora”, múltiplos
desafios são evidenciados, entre os quais se destacam as “questões
relacionadas ao tempo abreviado, espaço físico inadequado e
recursos pedagógicos insuficientes não voltados para esse tipo de
clientela”. Destaca-se a ideia de que essa modalidade educacional
requer atenção, na medida em que se ponta a necessidade de efetivar
melhorias pedagógicas e institucionais que deem conta de uma
educação equitativa e com políticas educacionais fortes.
Pensando no processo de constituição de uma educação qua-
litativa, encontra-se posto nesta obra, múltiplas reflexões que consi-
dera a “Abordagem do ciclo de políticas na análise dos indicadores
da qualidade na educação infantil: delineamento metodológico de
uma pesquisa de campo”. A questão da qualidade educacional pas-
sa pela perspectiva de que são necessárias boas políticas públicas
que integre espaços públicos e privados. O estudo alude a dimensão
entre “legisladores e interpretes” (BAUNAN, 2010), ao construir
a trajetória de lutas por políticas públicas escolares em termos de
Ciclo de Políticas.
Por fim, entendemos ser esta obra, um capítulo necessário
às reflexões teóricas, práticas, éticas e políticas que entrelaçam os
temas da cultura, do currículo, da identidade, da formação de pro-
fessores e professoras, do ensino de ciências naturais, da filosofia,
da matemática, dos etnosaberes, das populações tradicionais ribeiri-
nhas, indígenas, do ensino EJA, das cosmologias, etnoastronomias,
da reflexibilidade e criatividade do aprender e ensinar na fronteira
entre Educação, Currículo e Cultura/ Formação e Prática Docente.
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APRESENTAÇÃO
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todologias e perspectivas que tomam o diálogo e o direcionamento
deste livro.
Os organizadores
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SUMÁRIO
PREFÁCIO
Prof. Dr. Genivaldo Frois Scaramuzza
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APRESENTAÇÃO
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PRINCÍPIOS EPISTEMOLÓGICOS DAS TEORIAS DO
CURRÍCULO
Luciane Rocha Paes; Eulina Maria Leite Nogueira
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CIDADANIA E ÉTICA:
Fundamentos para uma reflexão no ensino médio técnico
Rodrigo Monteiro e Valmir Flores Pinto
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ABORDAGEM DO CICLO DE POLÍTICAS NA ANÁLISE DOS
INDICADORES DA QUALIDADE NA EDUCAÇÃO INFANTIL:
delineamento metodológico de uma pesquisa de campo.
Romilson Brito de Azevedo e Valmir Flores Pinto
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SEÇÃO I
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A RESSIGNIFICAÇÃO DO ENSINO NO SUL DO
AMAZONAS: CONTINGÊNCIAS, PERSPECTIVAS
E O DISCURSO COMO CONFIGURAÇÃO
DO CURRÍCULO INTERCULTURAL/
INTERCIVILIZACIONAL
Alcioni da Silva Monteiro
Suely Aparecida do Nascimento Mascarenhas
Renato Abreu Lima
Luis Ernesto Solano Becerril
1. Introdução
Nas últimas décadas, a nação indígena conquistou direitos
significativos e efetivados, no entanto, ainda existem lacunas nos
campos educacionais necessários de reinvindicações a fim de propi-
ciar a eficácia da ressignificação educacional indígena.
A escola deve estar de acordo com as especificidades e dife-
renças culturais e vivências de cada povo. Sobre isso, o Referencial
Curricular Nacional para as Escolas Indígenas – RCNEI (BRASIL,
1998), aborda as características da escola indígena, sendo elas a ser
bilíngue, intercultural-intercivilizacional, específica e diferenciada.
Sobre isso, se faz necessário e importante, a formação dos pro-
fessores indígenas já preconizada em lei. Mas, para o reconhecimen-
to total da autonomia de um ensino diferenciado, o protagonismo
dos indígenas, precisa estar pautado no asseguramento da prepara-
ção e formação do profissional a qual atua com a educação escolar
indígena (MONTEIRO & MASCARENHAS, 2019).
Com as caracterizações para uma nova escola consolidadas e
ressaltadas na Constituição de 1988, estabelecer-se-á relações de re-
vitalização e ressignificação dos princípios dos povos indígenas fren-
te à confrontação analítica crítica social. Para isso, compreender e as-
segurar o processo intercultural e o reconhecimento identitários do
professor indígena como mediador das perspectivas de apropriação
do pensamento étnico político, se torna imprescindível nos interio-
res das universidades e instituições as quais fomentas as formações
implementadas e ofertadas.
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Os limites e as possibilidades para a compreensão e aborda-
gem no cenário educativo e formativo aos povos indígenas, ainda
traz consigo, resultados das tensões conflituosas do colonialismo, e
por isso, as condições de valorizações e promoção do pensamento de
reafirmações diante das perspectivas dos próprios professores indí-
genas, são consideradas nos discursos por muitos índios, um desafio,
não obstante de suas realidades.
Neste trabalho, os discursos e perspectivas dos professores in-
dígenas entrevistados demonstra nitidez, o quão é necessário ouvir e
compreender as reivindicações e resistências das abordagens de va-
lorização frente à própria existência indígena pautadas nas contradi-
ções da contemporaneidade.
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Para fortalecer o contexto de emancipação dos índios, os je-
suítas implantaram projetos escolares na tentativa evangelizar e es-
colarizar os povos que segundo Grupioni (2006), a escola foi imposta
para os índios com modelos representativos dos objetivos do poder
colonial e subsecutivo dos interesses das superestruturas do Estado.
Gradativamente as imposições aos índios foram tomando
proporções de exploração e violência extrema ainda mais frequente.
Documentos surgiram como alternativa a submissão dos povos indí-
genas, e assim posteriormente. Conforme Grupioni (2004), a igreja,
na época, também revelou suas contribuições para tentar minimizar
os atos de violência. Porém, de nada adiantou, as lutas e dominação
continuavam a resistir, mesmo com as ameaças de excomungação
dos religiosos.
É importante ressaltar que, as elaborações dos direitos aos ín-
dios, foram sancionadas diante de reinvindicações e lutas, conquis-
tadas no processo de redemocratização da promulgação da Consti-
tuição Federal em 1988. Foi a partir desse asseguramento em lei, que,
os indígenas iniciaram seu ingresso na perspectiva de uma possível
autonomia na escola.
Assim, a formação do professor indígena, deve estar atrelada
na capacidade de preparar o profissional educacional para exercer
o papel de um professor capaz de atuar na organização curricular
intercultural da escola bem como, mediar e articular as informações
que norteiam o desenvolvimento escolar, sequenciando habilidades,
a história de seu povo e contextos de valorização da língua e cultu-
ra indígena nos espaços escolares e concomitante em sua prática de
atuação no processo de ensino e aprendizagem.
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fato é que, a pertinência das constituições curriculares das escolas
indígenas, só se destacou a partir da Constituição de 1988.
Com o ato de conquista à visibilidade para um ensino próprio,
diferenciado e bilíngue, o ensino escolar dos índios passa a exigir,
uma concepção de currículo de acordo com as necessidades e reali-
dades dos povos originários do Brasil. Contudo, essa abordagem, se-
gundo Monte (2000, p.50), já era discorrida desde 1953 pela UNES-
CO, que manifestava “a importância para o uso da língua materna”
nas formulações próprias da educação escolar indígena e “reformu-
lações nos paradigmas e fundamentos políticos e técnicos” a fim de
assegurar, um olhar de respeito e a salvaguarda dos direitos para a
sociedade indígena.
Contudo, para se conceber um currículo norteado em proje-
ções interculturais, é necessário pensar na formação dos professores
indígenas atreladas à compreensão e importância de se atuar com
base nas caracterizações dos saberes tradicionais para a revitalização
e reconstrução da significação dos conhecimentos tradicionais como
identidade da nação indígena.
Para tanto, o currículo deve estar assegurado na construção
coletiva e ocorrido ao longo prazo, como enfatiza Monte (2000). Tal
concepção, também é assegurada nos preceitos da Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional de 1996, na qual discorre no Art. 26
– A, em seu §1º:
O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá diver-
sos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação da
população brasileira, a partir desses dois grupos étnicos, tais como o
estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros e dos
povos indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e o
negro e o índio na formação da sociedade nacional, resgatando as
suas contribuições nas áreas social, econômica e política, pertinen-
tes à história do Brasil (2018, p. 20).
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indígena devem contribuir e contemplar as tarefas para a construção
do currículo juntamente com as contribuições da secretaria de edu-
cação.
É um processo em conjunto e paulatino, onde se construirá
novos caminhos para novos significados e práticas escolares. O que
ainda dificulta essas ocorrências, não somente nas formulações dos
currículos, mas nas realizações e normatizações dos aspectos legais
das formações superiores e educação escolar como um todo. Segun-
do Grupioni (2006) é, a falta de interesse político, a qual dificulta a
efetivação dos direitos conquistados.
Assim, é necessário que a valorização da identidade, cultura e
os valores dos índios sejam compreendidos com novos reposiciona-
mentos contemporâneos acerca dos contextos educacionais. Fazen-
do com que seja considerado nas esferas sociais e políticas, a garantia
e efetivação de espaços e processos igualitários sem a negação da
importância da nação indígena para a construção de novos conhe-
cimentos e interações proveitosas para a sociedade como um todo.
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dizagem dos alunos indígenas e a prática da língua materna com
a alfabetização, como está garantida na Constituição de 1988. Isso
sem contar que o professor indígena não conta com estímulos para
a sua prática pedagógica (KAINGANG, 2006, p. 201-202).
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GRÁFICO 11
1 Este gráfico foi elaborado pela autora MONTEIRO, Alcioni da Silva. (2021), em conso-
nância com os dados fomentados na dissertação de Mestrado: “Programa Saberes Indíge-
nas na Escola: avaliação de possibilidades e limites na construção de uma formação do-
cente para um ensino diferenciado, intercultural e bilíngue”, Lábrea-AM. 2019 da própria
autora. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências e Humanidades) - Universidade
Federal do Amazonas, Humaitá, 2019.
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Art. 62. A formação de docentes para atuar na educação básica far-
-se-á em nível superior, em curso de licenciatura plena, admitida,
como formação mínima para o exercício do magistério na educação
infantil e nos cinco primeiros anos do ensino fundamental, a ofere-
cida em nível médio, na modalidade normal (BRASIL, 2018, p. 41).
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As diferenças culturais e o tratamento de alienação e violência
foram reconhecidos, e isso foi considerado na promulgação de direi-
tos especiais. Entretanto, reconhecer não é suficiente quando,
Após séculos de um processo de homogeneização destruidora,
como resultado da conquista, colonização, escravidão e dominação,
o Brasil ensaia um novo descobrimento e um novo processo: in-
corporar sua diversidade. É apenas uma tendência, mas certamente
uma vigorosa manifestação de vida e possibilidades, intimamente
associada a resistências e lutas que, nas últimas décadas, vêm ali-
mentando a própria democratização do Brasil. Dado o vigor da
ideologia civilizatória que presidiu a nossa contraditória formação
histórica, temos dificuldades de nos reconhecer como uma socie-
dade multiétnica, multicultural e multilinguística. Os povos indíge-
nas e a questão indígena têm um lugar fundamental nesse processo
(GRZYBOWSKI, 2004, p.07).
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Essas condutas, são resultado da história de conflitos e lutas
ocorridos desde os primórdios da colonização do Brasil. O discurso
como produção de um momento histórico ou da realidade em que se
insere, produz sentido contraditório ao cerne da estrutura curricular
intercultural frente as conquistas em que se propaga, a educação es-
colar indígena do século atual.
Para Hall (2016, p. 80),
É importante notar que o conceito de discurso nesse uso não é
puramente um conceito “linguístico”. Tem a ver com linguagem e
prática, tenta superar a tradicional distinção entre o que uma diz
(linguagem) e o que a outra faz (prática). O discurso, argumenta
Foucalt, constrói o assunto. Ele define e produz os objetos do nosso
conhecimento, governa a forma com que o assunto pode ser signifi-
cativamente falado e debatido, e também influência como ideias são
postas em prática e usadas para regular a conduta dos outros. Assim
como o discurso “rege” certas formas de falar sobre um assunto, de-
finindo um modo de falar, escrever ou se dirigir a esse tema de for-
ma aceitável e inteligível, então também, por definição, ele “exclui”,
limita e restringe outros modos.
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pela esfera educacional do município de Lábrea, como um espaço
de transmissão do conhecimento. Pois, quando é instituído um cur-
rículo pronto e acabado, a proposta ainda é de ato de negação e im-
posição.
De acordo com Monteiro (2019, p.101 - 102), isso ocorre por-
que são resultados de conflitos contraditórios na qual advém das
[...] considerações da formação humana para as atuações no pla-
no concreto. Nesse efeito pode ocorrer que a formação do homem
ocorra como uma deformidade em seu pensamento e forma de
posicionar na sociedade. Como consequência, o processo ensino e
aprendizagem se torna um círculo vicioso e deficiente quando os
professores apenas produzem aquilo que aprenderam, sem cami-
nhar em análises e reflexões acerca do processo da educação formal
que estão promovendo. É necessário que os próprios professores
percebam sua cidadania diferenciada, mesmo que ainda em cons-
trução está sendo conquistada mesmo com diversas dificuldades e
resistências.
Esse enfoque toma como base conforme Hall (2016, p.86) “as
relações entre conhecimento, poder e corpo na sociedade moderna”.
Dessa forma, o que difere os discursos abordados até aqui, são os
interesses e o posicionamento em que se inserem e atuam.
A verdade em sentido total, não existe sem a estatística da ver-
dade das relações sociais com poder e fora do poder. Desse modo,
as configurações da ressignificação do ensino neste novo cenário de
2 Este discurso foi desenvolvido por meio de uma entrevista com base em uma pergunta
ao coordenador indígena da educação escolar indígena da Secretaria Municipal de Edu-
cação e Cultura – SEMEC, concedida à uma das autoras deste artigo em: 01 de março
de 2021.
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lutas e conquistas, tomaram impactos relevantes, mas que ainda de-
pendem de ordenamentos dos currículos, formação coerentes dos
professores e autonomia das escolas indígenas.
6. Considerações finais
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7.Referências
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para professores de 1° e 2° graus. Brasília: 2004, p. 481 – 525.
GRZYBOWSKI, Cândido. Educação Escolar indígena em terra bra-
silis, tempo de novo descobrimento. Ibase, Rio de Janeiro, 2004.
HALL, Stuart. Cultura e representação. Rio de Janeiro: Ed. PUC –
Rio: Apicuri, 2016.
MONTE, L. N. Diário de classe: a construção do currículo in-
dígena. 1993. Disponível em: http://portal.inep.gov.br/docu-
ments/186968/486324. Acesso em: 05/03/2021.
MONTE, L. N. Textos para o currículo escolar indígena. In: SILVA,
L. A. e FERREIRA, L.K.M. (org). Práticas Pedagógicas na Escola In-
dígenas. São Paulo. p.47 – 69, 2000.
MONTEIRO, A. da S.; MASCARENHAS, S. A. do N. Educação es-
colar diferenciada, formação de professores indígenas e currículo.
São Paulo, n. 54, p. 1-15, set. 2021.
MONTEIRO, A. da S; MASCARENHAS, S. A. do N. Educação In-
tercivilizacional, Formação de Professores e Justiça Currícular, Re-
vista Educamazônia, nº 12, Vol XXIII, Número 2, Jul - Dez , 2019,
p.522- 536. Disponível em: https://periodicos.ufam.edu.br/index.
php/educamazonia/article/view/6741.
MONTEIRO, A. da S. Programa Saberes Indígenas na Escola: avalia-
ção de possibilidades e limites na construção de uma formação do-
cente para um ensino diferenciado, intercultural e bilíngue, Lábrea-
-AM. 2019. 146 p. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências e
Humanidades), Universidade Federal do Amazonas, Humaitá, 2019.
SCHMELKES, Sylvia. La Interculturalidad en la Educa-
ción Basica. Conferencia presentada en el Encuentro In-
ternacional de Educación Preescolar, 2005. Disponível em:
https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&q=SCHMEL-
KES%2C+Sylvia. Acesso em: 05/03/2021.
SEMEC. Secretaria Municipal de Educação e Cultura. Lábrea-AM,
2019.
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EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE CULTURAL NUMA
PERPECTIVA DA PEDAGOGIA CRÍTICA E
DECOLONIAL
Kellyane Lisboa Ramos
Eulina Maria Leite Nogueira
1. Introdução
O presente artigo trata de uma pesquisa bibliográfica, que de
acordo com Silva e Menezes (2001, p. 21) nos explicam que a mesma
ocorre “Quando elaborada a partir de material já publicado, consti-
tuído principalmente de livros, artigos de periódicos e atualmente
com material disponibilizado na Internet”. O artigo faz parte de um
dos capítulos da dissertação de mestrado1, defendida no ano de 2020,
no qual teve por objetivo, refletir sobre a perspectiva da Pedagogia
Decolonial e Crítica utilizando da interculturalidade crítica como
instrumento e ou projeto de emancipação educacional e social para
uma educação critica diante da diversidade cultural.
Tal proposta partiu da seguinte inquietação: considerando
que as diferenças e diversidades culturais sempre existiram na socie-
dade, falar ou discutir sobre cultura nunca foi uma tarefa fácil, pois,
geralmente, existem tabus e representações negativas sobre tudo que
é diferente, o que acaba gerando preconceitos, discriminação e into-
lerância. Diante disso porque não utilizar a interculturalidade crítica
como instrumento de emancipação para tentar diminuir essas amar-
ras que foram criadas por um paradigma excludente e eurocêntrico?
Proveniente dos estudos de teóricos pós-coloniais, numa concepção
de decolonização do conhecimento, temos uma alternativa de cons-
trução de diálogos interculturais que possam promover a descentra-
lização da colonialidade em relação à educação.
Todavia, sem desvincular de uma perspectiva materialista,
defendemos também a relação da Pedagogia Decolonial de forma
conjunta com a Pedagogia Crítica, uma vez que, a construção de
diálogos interculturais voltados para a emancipação do ser social,
político, cultural e humano, só poderiam se dar no instante em que a
emancipação alcançasse todos os níveis, entre eles, o da consciência.
1 Dissertação Intitulada “A Representação Social dos Acadêmicos de Pedagogia do
IEAA/UFAM acerca da Questão Indígena”, defendida no início de 2020.
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O que somente a educação, a ciência e a extensão do conhecimento,
o desenvolvimento da razão podem conseguir tal objetivo, emanci-
pando assim os indivíduos das condições opressoras (MARX; EN-
GELS, 2011).
A interculturalidade crítica como instrumento pedagógico em
consonância com a educação intercultural, na tentativa de possibili-
tar conscientização social atrelada a emancipação humana de docen-
tes e alunos, implicando em práxis que possam respeitar e valorizar
as diversidades culturais e, assim, contribuir para uma sociedade
com menos desigualdades. Apontada como uma alternativa, cami-
nho e até mesmo projeto contra-hegemônico, a interculturalidade
crítica que não reflete somente na questão indígena, mas também
na sociedade como forma de nos tornamos sujeitos críticos e eman-
cipados. O que pode acontecer a partir de uma educação que possa
construir uma conscientização crítica, proporcionando uma deco-
lonização do conhecimento como princípio de reconhecimento da
diversidade cultural.
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Com isso, a educação intercultural e interculturalidade crítica,
além de possibilitar o reconhecimento das diversas culturas, constrói
um caminho de emancipação, no qual o indivíduo pode se tornar
um sujeito social que respeite as identidades diferentes da sua, con-
seguindo estabelecer relações e diálogos interculturais, consideran-
do o seu conhecimento não mais ou menos importante do que dos
outros, ao contrário se permite problematizar e dialogar em uma
postura ética.
Contudo, a grande mudança que a interculturalidade crítica
pode promover para a educação está no fato de que ela possibili-
tar ao indivíduo sair de uma perspectiva educacional monocultural
e construir, através da Pedagogia Decolonial e Pedagogia Crítica a
perspectiva de decolonização do conhecimento, promovendo, assim,
o respeito e dialogicidade acerca da diversidade cultural e rompendo
com a reprodução de um modelo de ensino dominante e excludente.
Para a concretização da decolonização não é suficiente que as
instituições de ensino apenas,
[...] inclua os grupos sociais mais desfavorecidos do ponto de vista
social e econômico; não basta, também, para que seja intercultu-
ral, incorpore outras culturas diferentes da cultura hegemônica, em
seus preceitos pedagógicos somente nas datas comemorativas. É
necessário, isso sim, que se decolonize em todas as suas dimensões
(poder, conhecimento, estruturas de dominação, gênero, sexuali-
dade, economia, gestão) e que assuma princípios emancipatórios
promotores de uma justiça social e cognitiva (ESTERMANN, et al.
2017, p. 27).
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implica a necessidade de o proletariado superar a exploração exis-
tente do homem pelo homem, o que culminaria na eliminação de
uma sociedade dividida em classes e a educação crítica nesse sentido
seria um instrumento essencial.
Deste modo, é possível compreender, a partir do que foi en-
fatizado, que existe a possibilidade de construção de uma educação
emancipadora e libertadora que poderá ofertar aos educandos uma
formação para além do mercado de trabalho, pois, pensar a emanci-
pação humana a partir da decolonialidade do conhecimento possi-
bilita a oportunidade de descontruir representações negativas acerca
da diversidade cultural e se propor a olhar e compreender o outro
em suas várias dimensões, resultando, assim, em uma representação
positiva e livre de atitudes excludentes e discriminatórias.
A emancipação, nesse sentido, é uma construção diária que
acontece também na busca pelo conhecimento, pois, não somos es-
táticos, o que faz do homem um sujeito sempre em construção. Por
isso, construir conhecimentos pautados no rompimento da aliena-
ção,
[...] focaliza a interculturalidade como um dos componentes cen-
trais dos processos de transformação das sociedades latino-ameri-
canas, assumindo um caráter ético e político, orientando a cons-
trução de democracias em que redistribuição e reconhecimento
cultural sejam assumidos como imprescindíveis pra a realização da
justiça social (CANDAU; RUSSO, 2011, p. 71).
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do assim em suas práticas pedagógicas, a fim de reconstruir o saber
fazer educacional numa proposta de interculturalidade crítica.
O que implica, a priori, que haja a necessidade de reconstru-
ção da própria história, para que ocorra a compreensão das relações
de poder. Como as mesmas exercem legitimidade nas ações e repre-
sentações dos indivíduos, com isso,
[...] é necessário que se faça uma discussão ampla sobre a função
social da escola para que se torne possível considerar e praticar al-
ternativas educacionais emancipatórias e, junto a tudo isso, propor-
cionar uma reflexão sobre o sistema escolar, o currículo, o material
didático e a formação de professores (ROMANI; RAJOBAC, 2011,
p.69).
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3. A pedagogia crítica e decolonial e seus aportes teóricos
- 40 -
lidade, ou seja, serem “[...] capazes de realizar uma leitura de mundo
que lhes permita compreender e denunciar a realidade opressora e
anunciar a sua superação, com a construção de um novo projeto de
sociedade e mundo a ser efetivado pela ação política” (MOREIRA,
2010, p.98).
Nesse sentido, nos postulados de Freire ressalta-se que é preci-
so romper com as amarras de um ensino opressor e alienante, dando
vez à dialogicidade e criticidade, o que se torna possível através da
conscientização e reflexão da própria realidade. No entanto,
[...] esta tomada de consciência não é ainda a conscientização, por-
que esta consiste no desenvolvimento crítico da tomada de cons-
ciência. A conscientização implica, pois, que ultrapassemos a esfera
espontânea de apreensão da realidade para chegarmos a uma esfera
crítica na qual a realidade se dá como objeto cognoscível e na qual o
homem assume uma posição epistemológica (FREIRE, 1979, p.15).
- 41 -
conscientização ao compreendermos as dualidades existentes, e é
justamente isso que é proposto por Paulo Freire, que é fomentar uma
educação voltada para o processo de emancipação. É, pois, a neces-
sidade de tornar “[...] as formas de conhecimento, habilidades e rela-
ções sociais que promovam as condições para a emancipação social
e, portanto, a auto emancipação” (GIROUX, 1997, p.146).
Além de possibilitar que a ação educativa esteja pautada numa
construção crítica do conhecimento que vá de encontro com todas
as formas de opressão, bem como de superação de indiferenças. Des-
se modo, o que Freire recomenda em seus escritos é,
[...] uma pedagogia planetária que propõe o surgimento de uma
consciência ético-crítica. Sua ação educadora tende, então, não só
a uma melhoria cognitiva, até das vítimas sociais, ou afetivo-pulsio-
nal, mas à produção de uma consciência ético-crítica que se origina
nas próprias vítimas, por serem os sujeitos históricos privilegiados
de sua própria libertação (Dussel, 2000, p.443).
- 42 -
capacita os povos subalternos para uma luta de resistência contra
a lógica opressiva da modernidade/colonialidade” (PEREIRA et al,
2017, p. 20). Com isso, a proposta da interculturalidade crítica pode
e deve ser considerada como um ideal a ser concretizado, o que cul-
minará na transformação do ser social e histórico, constituindo a
possibilidade de emancipação e, assim, proporcionará que diálogos
interculturais possam ocorrer de forma significativa.
Assim, entende-se que a interculturalidade crítica pauta-
da numa perspectiva decolonial e crítica do conhecimento pode
se tornar uma proposta de emancipação no que tange os conflitos
que envolvem as diversidades culturais, implicando, dessa forma, na
construção de uma proposta curricular vinculada à diversidade, que
possa estabelecer relações importantes com a perspectiva crítica e
pós-crítica, com intuito de se construírem diálogos e ações voltadas
para a alteridade.
4. Emancipação a partir da educação intercultural e inter-
culturalidade crítica
Na busca por explanações teóricas acerca da educação inter-
cultural atreladas a Pedagogia Crítica e Decolonial, os autores men-
cionados nesses escritos como Freire (1979), Giroux (1997) e Walsh
(2001), enfatizam em suas análises que acerca da diversidade cul-
tural, não cabe apenas ou somente explicitar que haja o reconhe-
cimento das diferenças culturais ou que isso possa impedir que as
culturas sejam excluídas ou discriminadas. É necessário promover a
conscientização e também a compreensão sobre as relações de poder
que se tornaram hegemônicas, o que reflete nas constantes discri-
minações e preconceitos que são vivenciadas pelas diversas culturas
existentes na sociedade.
Nesse sentido, para romper com a alienação e representações
negativas acerca das diversidades existentes, cabe uma formação que
vá de encontro com essas divisões pautadas em uma educação inter-
cultural, que
[...] não pode ser reduzida a uma mera incorporação de alguns te-
mas no currículo e no calendário escolar. Trata-se, de modo especial
na perspectiva crítica, que consideramos ser a que melhor responde
à problemática atual do continente latino-americano, de uma abor-
dagem que abarca diferentes âmbitos, ético, epistemológico e polí-
tico, orientada à construção de democracias em que justiça social e
- 43 -
cultural sejam trabalhadas de modo articulado (CANDAU; RUSSO,
2011, p.75).
- 44 -
A educação tem um papel importante na busca pela emanci-
pação humana. A partir de uma construção educacional vinculada
à interculturalidade crítica, tem-se a possibilidade de construir uma
sociedade mais justa e igualitária. Ou seja, “[...] a interculturalidade
tem um significado intimamente ligado a um projeto social, cultural,
educacional, político, ético e epistêmico em direção à decoloniza-
ção e à transformação” (OLIVEIRA; CANDAU, 2010, p. 27). Para
superar as contradições existentes e ressignificar a forma como se
compreende as diversidades, é importante que a educação desenvol-
va ações voltadas para o reconhecimento das diferenças, a fim de
propor a constituição emancipadora.
Considerado um desafio a vencer, a intenção da Pedagogia
Decolonial, bem como a Pedagogia Crítica junto a interculturalidade
crítica e Educação Intercultural é que se possa criar uma nova práti-
ca pedagógica, vinculada à intencionalidade ética e política que, de
alguma forma, descontrua paradigmas de exclusão e discriminação,
o que, todavia, sabemos que leva um certo tempo para se ocorrer.
Todavia, é essencial que a educação promova condições ao pensar
crítico, pois não podemos ignorar os conflitos existentes, estabele-
cidos através das relações de poder. Sendo que, no atual cenário, os
diálogos interculturais não acontecem, pois há uma imposição do
discurso que, ao invés de promover um ensino crítico e emancipa-
dor, mantém o status quo, o que deve ser repensando.
Sendo que, “se o meu compromisso é realmente com o homem
concreto, com a causa de sua humanização, de sua libertação, não posso
por isso mesmo prescindir da ciência, nem da tecnologia, com as quais
me vou instrumentando para melhor lutar por esta causa” (FREIRE,
2007, p. 22). Então, entendemos que, na busca pela emancipação hu-
mana, todos os conhecimentos são importantes, mas ressaltamos a
necessidade de decolonização do conhecimento, como forma de ala-
vancar a construção da alteridade, no sentido de compreendermos o
outro numa postura ética
Pois “permanecer numa consciência ingênua é terminar cola-
borando com a injustiça, direta ou indiretamente, fazendo-se cúm-
plice dos processos de dominação” (PINEDA, 2009, p. 109). Assim,
essa proposta de educação tem muitos desafios para poder se concre-
tizar, visto que necessita, ainda, que a sociedade possa problematizar
as questões que afligem as culturas subalternizadas, para possibilitar
- 45 -
diálogos e discussões, a fim de construir uma consciência crítica e
humanamente emancipada.
4. Considerações finais
5. Referências
- 46 -
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- 48 -
NOSSAS RELAÇÕES COM O MUNDO E COM O
OUTRO – CULTURAS
Márdila Alves Bueno
Elrismar Auxiliadora Gomes Oliveira
Eulina Maria Leite Nogueira
1. Conceito de cultura
- 49 -
Assim, surge a divisão e a elitização da cultura, onde algumas
pessoas e sociedades acreditam ter hierarquicamente uma cultura
superior. Esse pensamento está diretamente relacionado ao conceito
de colonialidade1 e também ao terceiro significado: desenvolvimento
social. Para pesquisadores como Maldonado-Torres (2007) e Quija-
no (2005), a colonialidade é herança das relações de poder decor-
rentes do mercado capitalista mundial e da ideia de raça. Portanto,
a colonialidade emerge de um contexto sócio-histórico e é o que
sobreviveu do colonialismo, influenciando diretamente a identidade
moderna. Segundo ele, a colonialidade
[...] se mantiene viva en manuales de aprendizaje, en el criterio para
el buen trabajo académico, en la cultura, el sentido común, em la
auto-imagen del los pueblos, em las aspiraciones de los sujetos, y en
tantos otros aspectos de nuestra experiencia moderna (MALDO-
NADO-TORRES, 2007, p. 131).
- 50 -
na antropologia social e evidencia a “[...] dimensão simbólica, o que
a cultura faz, em vez de acentuar o que a cultura é. Nessa mudança,
efetua-se um movimento do que para o como. Concebe-se, assim, a
cultura como prática social, não como coisa (artes) ou estado de ser
(civilização)” (MOREIRA; CANDAU, 2007, p. 27).
Na antropologia, em que o termo cultura é o principal foco de
estudo, também não há um consenso sobre esta definição. Marconi e
Presotto (2010) afirmam que
Para alguns, cultura é comportamento apreendido; para outros, não
é comportamento, mas abstração do comportamento; e para um
terceiro grupo, a cultura consiste em ideias. Há os que consideram
como cultura apenas os objetos imateriais, enquanto outros, ao con-
trário, aquilo que se refere ao material. Também se encontram estu-
diosos que entendem por cultura tanto as coisas materiais quanto as
não materiais (MARCONI; PRESOTTO, 2010, p. 22).
- 51 -
por exemplo: culturas africanas, culturas ribeirinhas e culturas in-
dígenas.
As culturas indígenas, especificamente, são muito presentes
no estado do Amazonas, visto que segundo dados do IBGE (2010)
é o estado com maior número de indígenas no país. Ainda assim,
como afirma Bessa Freire (2010), as pessoas, no Brasil e no mundo,
imaginam as sociedades indígenas congeladas no tempo.
Sabemos pouco sobre as culturas indígenas e o que pensamos
saber, na maioria das vezes, está equivocado. No ambiente escolar,
por exemplo, é comum comemorações do dia do índio. Essas ativi-
dades, em muitos casos, se resumem a se “fantasiar de índio” – co-
locar uma pena na cabeça e fazer uma dança para atrair chuva. A
escola não contextualiza que muitos indígenas se vestem com roupas
caracterizadas somente em eventos específicos e que não vivem mais
em ocas. Essas abordagens não contribuem para desconstruir essa
visão romantizada, apresentada em um modelo genérico do indí-
gena, vestido de penas, cocar e morando em ocas. As diferenças,
as lutas, o reconhecimento e a valorização dessas culturas não são
problematizadas no ambiente escolar, contribuindo para manter a
desinformação e o preconceito.
- 52 -
De acordo com Bessa Freire (2010) muitos brasileiros consi-
deram erroneamente as culturas indígenas como atrasadas e primi-
tivas. Esse segundo equívoco sobre as culturas indígenas, cria uma
espécie de hierarquização cultural. Das relações de poder que surgi-
ram no processo de colonização criou-se erroneamente uma suposta
divisão biológica – ideia de raça (índios, negros, mestiços, brancos,
etc.) –, colocando em situação de inferioridade os povos coloniza-
dos, e por consequência seus trejeitos, características físicas, conhe-
cimentos e culturas. Assim, segundo o autor, as culturas nativas aca-
baram taxadas de inferiores, pobres e atrasadas, relacionando o que
há de moderno e contemporâneo às culturas europeias.
Desde então, associar desenvolvimento e qualidade de vida à
ciência e à tecnologia naturalizou-se. A concepção de que o modo
de viver de uma sociedade é mais apropriado do que à dos outros é
muito comum, e está associada a ideia de etnocentrismo. Marconi
e Presotto (2010) definem como etnocentrismo a supervalorização
da própria cultura em detrimento das demais, julgando a cultura do
outro sob suas próprias referências. Esses pesquisadores apontam
consequências positivas e negativas do etnocentrismo. O indivíduo
etnocêntrico reconhece e valoriza a sua própria cultura, porém essa
supervalorização pode ser manifestada de forma agressiva “ou em
atitudes de superioridade e até hostilidade. A discriminação, o pro-
selitismo, a violência, a agressividade verbal são outras formas de
expressar o etnocentrismo” (Idem, p.32).
Em contrapartida ao etnocentrismo, ao racismo e à ideia de
sociedades que percorrem obrigatoriamente um único caminho
evolutivo, Boas (2010) desenvolveu uma concepção de cultura ba-
seada “[...] no reconhecimento de que cada ser humano vê o mundo
sob a perspectiva da cultura em que cresceu” (BOAS, 2010).
Por meio dessa concepção surgiu posteriormente o relativis-
mo cultural, que Freitas (2012) define como o movimento em que
se acredita que toda “[...] cultura possui uma lógica interna própria
e explica-se e reproduz-se a partir dos parâmetros dela mesma”
(FREITAS, 2012, p. 37). Segundo o autor, o relativismo cultural con-
tribui para rompermos com concepções equivocadas, como culturas
homogêneas, alta cultura ou baixa cultura.
A hierarquização cultural ligada ao etnocentrismo abrange a
arte, a língua, a religião e também os conhecimentos científicos e
tradicionais. Dessa forma,
- 53 -
As ciências indígenas também foram tratadas de forma preconcei-
tuosa pela sociedade brasileira. Os conhecimentos indígenas foram
desprezados e ridicularizados, como se fossem a negação da ciência
e da objetividade [...]. Esses conhecimentos, no entanto, não foram
apropriados pela atual sociedade brasileira, por causa da nossa ig-
norância, do nosso despreparo e do nosso desprezo em relação aos
saberes indígenas, os quais desconhecemos. O preconceito não nos
tem permitido usufruir desse legado cultural acumulado durante
milênios (BESSA FREIRE, 2010, p. 21 - 22).
- 54 -
Os indígenas que fogem à regra romantizada, falam portu-
guês, usam celulares, dentre outros, são enquadrados em uma cate-
goria que Bessa Freire (2010), por meio de uma crítica à sociedade
ocidentalizada, denomina de ex-índios. Devido a essas transforma-
ções, a sociedade acaba por não os reconhecer mais como indígenas.
Esse pensamento, que algumas culturas ficaram congeladas,
acaba desconsiderando também a interculturalidade que, para Can-
dau (2016),
[...] promove a deliberada inter-relação entre diferentes sujeitos
e grupos socioculturais de uma determinada sociedade [...]. Por
outro lado, rompe com uma visão essencialista das culturas e das
identidades culturais, concebendo-as em contínuo processo de
construção, desestabilização e reconstrução. Está constituída pela
afirmação de que, nas sociedades em que vivemos, os processos de
hibridização cultural são intensos e mobilizadores da construção de
identidades abertas, o que supõe que as culturas não são puras, nem
estáticas (CANDAU, 2016, p. 20).
- 56 -
tes nas cinco regiões do Brasil. Sem considerar os grupos isolados
(em torno de 77 povos), representam 0,4% da população brasileira,
enriquecendo a diversidade cultural brasileira. Dados estes que po-
dem corroborar com a correção do quarto equívoco citado por Bessa
Freire (2010), de que os índios fazem parte do passado.
Por fim, o quinto equívoco, segundo Bessa Freire (2010), é a
errônea ideia de que o brasileiro não é índio, isto é, não considerar a
cultura indígena como fundamental na formação da identidade bra-
sileira. Como já mencionamos, com o processo de colonização, o
Brasil teve sua cultura influenciada pelos indígenas, pelos africanos
e pelas matrizes europeias, com destaque para a portuguesa.
No entanto, com as imposições coloniais, a maioria dos bra-
sileiros acabou por privilegiar somente as matrizes europeias, mi-
nimizando a participação dos povos indígenas e africanos, visando
a uma hegemonia cultural baseada no eurocentrismo. “Portanto, o
eurocentrismo não é a perspectiva cognitiva somente dos europeus,
mas torna-se também do conjunto daqueles educados sob sua hege-
monia” (OLIVEIRA; CANDAU, 2010, p. 19).
A presença desses equívocos na sociedade contribui para o
preconceito e a discriminação contra os povos indígenas e reforça es-
tereótipos reproduzidos por aparelhos ideológicos do Estado, como,
por exemplo, a escola.
No âmbito escolar concordamos que o entendimento de cul-
tura se entrelaça no processo educacional e no cotidiano das pessoas,
como aponta Moreira e Candau (2007). Acreditamos que as institui-
ções de ensino podem atuar com ferramentas para a valorização e
luta por reconhecimento da cultura indígena, por meio de currículos
interculturais em uma perspectiva crítica.
3. Cultura escolar e currículo
Juliá (2001) define cultura escolar como
[...] um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar
e condutas a inculcar, e um conjunto de práticas que permitem a
transmissão desses conhecimentos e a incorporação desses compor-
tamentos; normas e práticas coordenadas a finalidades que podem
variar segundo as épocas (finalidades religiosas, sociopolíticas ou
simplesmente de socialização) (JULIÁ, 2001, p. 10).
- 57 -
ferenças são invisibilizadas, negadas e silenciadas. “As culturas ou
vozes dos grupos sociais minoritários e/ou marginalizados que não
dispõem de estruturas importantes de poder costumam ser silencia-
das, quando não estereotipadas ou deformadas […]” (SANTOMÉ,
1995, p. 161).
Entrelaçado à cultura escolar está o currículo. Forquin (1992)
explica que o currículo é construído a partir das seleções culturais
realizadas no ambiente escolar. O autor, aponta que, nem tudo aquilo
que constitui cultura é considerado importante e, por conta do tem-
po limitado dado pelas determinações oficiais, uma seleção do que
ensinar é necessária.
Para Silva (2011)
O texto curricular, entendido aqui de forma mais ampla – o livro
didático e paradidático, as lições orais, as orientações curriculares
oficiais, os rituais escolares, as datas festivas e comemorativas – está
recheado de narrativas nacionais, étnicas e raciais. Em geral, essas
narrativas celebram os mitos de origem nacional, confirmam o pri-
vilégio das identidades dominantes e tratam as identidades domi-
nadas como exóticas ou folclóricas. Em termos de representação
racial, o texto curricular conserva, de forma evidente, as marcas da
herança colonial (SILVA, 2011, p. 101-102).
- 58 -
O autor também apresenta outro lado do currículo oculto: a
possibilidade de existir “[...] um produto de um trabalho permanen-
te de ocultação, de dissimulação ou de mistificação, [...] contribuin-
do para a perpetuação de certas formas de alienação cultural ou de
dominação social” (FORQUIN, 1996, p. 193).
Silva (2011) apresenta teorias do currículo: tradicionais, críti-
cas e pós-críticas. Segundo o autor, as teorias tradicionais limitam-
-se às questões de conteúdo (o que ensinar), defendem uma espécie
de neutralidade pedagógica, o ensino tecnicista e a fragmentação e
reprodução dos saberes. Enquanto as teorias críticas e pós-críticas
do currículo apontam que pensar sobre seleção de conhecimentos
é também refletir sobre qual cidadão queremos formar. O autor cita
que, nas reflexões sobre essas escolhas, deve constar o que o currí-
culo faz; por que determinados conteúdos estão presentes e outros
não; quais interesses estão por trás dessas escolhas, quais grupos se
beneficiam e quais são prejudicados pela forma como o currículo
está organizado.
As teorias pós-críticas englobam nas discussões temas como:
gênero, raça, etnia, cultura, sexualidade e multiculturalismo crítico.
Porém é importante salientar que as teorias pós-críticas não são uma
evolução das teorias críticas. Ambas devem se combinar “[...] para
nos ajudar a compreender os processos pelos quais, por meio de re-
lações de poder e controle, nos tornamos aquilo que somos. Ambas
nos ensinam, de diferentes formas, que o currículo é uma questão de
saber, identidade e poder” (SILVA, 2011, p. 147).
A escola, assim como a religião, a mídia e a família, atuam
como aparelho ideológico do estado. Ela atinge grande parte da po-
pulação por um longo intervalo de tempo e transmite sua ideologia
por meio do currículo. Ideologia esta muitas vezes discriminatória
e diretamente ligada ao capitalismo. A escola, representando quase
exclusivamente as culturas dominantes, nos leva a admitir somente
essa seleção cultural como boa e aceitável (SILVA, 2011).
A escola contribui também para o aumento das desigualda-
des sociais ao colocar em seu funcionamento as relações sociais de
trabalho. Assim, é comum que nas escolas destinadas aos educandos
filhos dos operários, se aprendam à subordinação, enquanto que, na-
quelas destinadas aos filhos dos trabalhadores situados nos níveis
mais altos da escala ocupacional, atitudes de comando e autonomia
(SILVA, 2011).
- 59 -
O processo de exclusão social está diretamente ligado à re-
produção das culturas das classes dominantes, considerada ‘a cultu-
ra’. Esse processo desconsidera valores e hábitos das demais classes
e impõe uma de dominação cultural por meio da força econômica.
Silva (2011), ao tratar da teoria crítica do currículo de Bourdieu e
Passeron, afirma que:
O currículo da escola está baseado na cultura dominante: ele se ex-
pressa na linguagem dominante, ele é transmitido através do código
cultural dominante. […] as crianças e jovens das classes dominantes
veem seu capital cultural reconhecido e fortalecido. As crianças e
jovens das classes dominadas têm sua cultura nativa desvalorizada
[…] (Silva, 2011, p. 35).
- 61 -
Outro aspecto relevante da pedagogia de Paulo Freire é o
olhar para os grupos excluídos, os oprimidos, que sofrem o que o
autor chama de “invasão cultural”, “antidialógica”, de tal maneira
que os invasores impõem a sua visão de mundo (FREIRE, 2016). A
aprendizagem é resultado de ações de um sujeito, não o resultado de
qualquer ação: ela só se constrói em uma interação entre esse sujeito
e o meio circundante, natural e social (DELIZOICOV; ANGOTTI;
PERNAMBUCO, 2016).
Nesse contexto, é importante analisar as relações entre currí-
culo e interculturalismo funcional (não crítico), também chamando
de multiculturalismo, que obriga “[...] diferentes culturas raciais, ét-
nicas e nacionais a viverem no mesmo espaço” (Silva, 2011, p. 85).
O interculturalismo funcional privilegia apenas a convivência, o res-
peito e a tolerância entre essas diferentes culturas. Porém,
[...] a ideia de tolerância, por exemplo, implica também uma certa
superioridade por parte de quem mostra tolerância. Por outro lado,
a noção de “respeito” implica um certo essencialismo cultural, pelo
qual as diferenças culturais são vistas como fixas, como já definitiva-
mente definidas, restando apenas “respeitá-las” (SILVA, 2011, p.88).
- 62 -
Para esses autores, muitos currículos se limitam a apresentar a
existência da diversidade. Silva (2011) aponta que a presença do in-
terculturalismo no currículo sofre críticas em relação à possibilidade
de fragmentar uma cultura nacional única e comum. Entretanto, o
autor salienta que essas críticas acabam por não perceber que essa
cultura nacional comum se entrelaça com a cultura dominante.
Diferentemente das teorias críticas, que relacionam as desi-
gualdades sociais e as relações de poder no currículo às diferenças
de classes sociais, as teorias pós-críticas consideram também as re-
lações de raça, etnia e gênero. Silva (2011) discute o fato de que a
identidade étnica e racial é uma questão de saber e poder, de acordo
com o autor:
O texto curricular, entendido aqui de forma ampla – o livro didático
e paradidático, as lições orais, as orientações curriculares oficiais, os
rituais escolares, as datas festivas e comemorativas – está recheado
de narrativas nacionais, étnicas e raciais. Em geral, essas narrativas
celebram os mitos da origem nacional, confirmam o privilégio das
identidades dominantes e tratam as identidades dominadas como
exóticas ou folclóricas (SILVA, 2011, p. 101 - 102).
- 63 -
De acordo com Jafelice (2015),
A formação que recebemos desconsidera o local e, portanto, não
nos habilita a tratá-lo com a relevância que tem; os livros que adota-
mos tratam de uma realidade que, com frequência, é muito distinta
daquela cotidiana, de nossos alunos; com isso, nossa rica e especí-
fica realidade local, ou regional, fica excluída daqueles compêndios
e das escolas. E achamos isso natural, marca de universalização e
progresso. Não é. Pode servir para fins ideológicos, mas não para
exercitarmos a valorização do que temos de próprio e autêntico
(JAFELICE, 2015, p. 60).
- 64 -
FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/198053143455.
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TRAJETÓRIA DE UMA PESQUISA EM UMA
ESCOLA RIBEIRINHA NO SUDOESTE DO
AMAZONAS
Paula Regina Humbelino de Melo
Eliane Regina Martins Batista
1. Introdução
- 69 -
Desde os primórdios da civilização, a humanidade utiliza as
plantas medicinais para tratamento de prevenção de doenças, em
muitas localidades este é o único recurso disponível, tendo em vista
que muitas comunidades ficam localizadas em áreas de difícil acesso
e condições limitadas de infraestruturas.
As instituições de ensino exercem papel fundamental na pre-
servação de saberes em comunidades tradicionais, sendo uma forma
de preservação desses conhecimentos imateriais a contextualizados
nos conteúdos escolares com os saberes passados entre as gerações.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) de Ciências Naturais
destacam a necessidade da contextualização e interdisciplinaridade,
onde os conhecimentos precisam ser dialogados, possibilitando uma
educação científica de qualidade, assim, é “necessário considerar
o conhecimento cognitivo dos estudantes, relacionar com suas ex-
periências diárias, sua identidade cultural e social, e os diferentes
significados e valores que as Ciências Naturais podem ter para eles”
(BRASIL, 1998, p. 27).
Ao produzir à dissertação buscamos contribuir com pesquisas
na educação ribeirinha e no ensino de Ciências Naturais, entenden-
do que no espaço escolar existe a necessidade de contextualização e
interdisciplinaridade no cenário da educação; principalmente, quan-
do se trata de áreas temáticas que priorizem regiões geográficas ricas
em saberes tradicionais, como a Região Amazônica.
2. Teoria da Complexidade
- 70 -
diferentes “lentes” conceituais e multidirecionais, não se pode deixar
para trás as diferentes epistemologias que deram suporte as ciências
no passado, mas é preciso compreender suas contribuições e limita-
ções para o presente e o futuro da humanidade, além de olhar o co-
nhecimento da natureza, da sociedade em suas múltiplas interações,
estas peculiaridades conceituais direcionaram nosso trabalho para a
epistemologia da complexidade.
O pensamento complexo surge quando o simples apresenta
falhas, ou seja, a complexidade apresenta sua parte integrante no
pensamento simples, mas renuncia qualquer pensamento que seja
responsável pela mutilação da mente humana, como os aspectos
unidimensionais que almeja controlar e dominar o real existente no
pensamento simples. A palavra complexidade, “[...] um tecido (com-
plexus: o que é tecido junto) de constituintes heterogêneas insepa-
ravelmente associadas: ela coloca o paradoxo do uno e do múltiplo.
Num segundo momento, a complexidade é efetivamente o tecido
dos acontecimentos, ações, interações, retroações, determinações,
acasos, que constituem nosso mundo fenomênico” (MORIN, 2007,
p. 13).
No geral, a complexidade é difícil de se exprimir de forma
simples, explicando Morin que “é complexo o que não é possível re-
sumir em uma palavra-chave, o que não pode ser reduzido a uma lei
nem a uma ideia simples, a complexidade é palavra-problema e não
palavra-solução” (2007, p. 6).
Com essa breve contextualização sobre o pensamento com-
plexo, entende-se a relevância desta epistemologia na medida em
que valoriza a multidimensionalidade do conhecimento e propõem
aprofundar/diversificar os métodos para conhecer diferentes obje-
tos. Além disso, compreende-se a necessidade de aprofundar a uti-
lização do pensamento complexo como uma das possibilidades na
pesquisa em educação que possam integrar diferentes conhecimen-
tos, a cultura, os saberes das comunidades locais, a criatividade, a
inventividade e a subjetividade.
Outro ponto a considerar na epistemologia de Morin (2000),
está relacionado a educação, para o autor existem sete saberes para
almejar uma educação de qualidade para o futuro de crianças e ado-
lescentes. Os quais apresentam prioritariamente aspectos multidi-
mensionais; neste sentindo, destaca-se a essência das questões so-
ciais e culturais para a integração curricular.
- 71 -
Estes saberes foram assim descritos: as cegueiras do conheci-
mento, o erro e a ilusão; os princípios do conhecimento pertinente;
ensinar a condição humana; ensinar a identidade terrena; enfrentar
as incertezas; ensinar a compreensão e a ética do gênero humano. Ao
considerar estes saberes, entendemos que na educação escolar é ne-
cessário articular vários conhecimentos e saberes que potencializem
a aprendizagem da criança de forma integrada no currículo na pers-
pectiva de entender o mundo e suas interpelações e, principalmente,
a valorização do contexto social e cultural no ambiente escolar.
- 72 -
fico, sendo uma forma de contextualização, o que significa que estes
conhecimentos necessitam ser integrados e valorizados na vida das
pessoas. Além disso, Guarim Neto e Pasa (2009) consideram que ao
inserir conhecimentos tradicionais nas investigações etnobotânica
é necessário compreender e respeitar que o conhecimento humano
que se manifesta é repassado de geração para geração.
Na educação escolar, a inclusão da etnobotânica é caracteri-
zada como um instrumento viável no ensino fundamental e médio,
pois permite resgatar e valorizar conhecimentos tradicionais de di-
ferentes contextos regionais. De acordo com Siqueira et al. (2011) o
conhecimento etnobotânico quando estudado em sala de aula, per-
mite valorizar os conhecimentos que os alunos trazem de casa para a
escola, refinando o conhecimento científico.
Para Silva e Marisco (2013) o tema plantas medicinais é con-
siderado uma ferramenta eficaz no processo de ensino, uma vez que
aprimora o conhecimento prévio dos alunos. Vale ressaltar que, o
papel do professor ao trabalhar com este tema gerador é indispensá-
vel, cabe a esse profissional construir um elo entre o conhecimento
popular e científico do aluno, buscando contribuir para melhoria
na qualidade de vida. Neste pressuposto, Dill (2015) destaca que as
plantas medicinais carregam conhecimentos significativos de popu-
lações, possibilitando articulações de conhecimentos e consequen-
temente possibilidade para trabalhar com a Inter e a transdiscipli-
naridade:
De acordo com Guarim Neto e Carniello (2007) existe um
triângulo ao caracterizar os estudos etnobotânicos, poia há uma re-
lação de interdependência entre a humanidade, o ambiente e a base
interdisciplinar, sendo esses essenciais para a compreensão dos co-
nhecimentos locais passados de geração para geração.
- 73 -
cipais atividades econômicas, estão: a pesca artesanal, a agricultura
familiar e os benefícios do governo.
Figura 1.0 – Área de estudo
- 74 -
Foram realizadas visitas à comunidade para levantar dados
sobre a temática com os professores e com moradores, além de pos-
sibilitar compreender as relações que se estabelecem entre os dife-
rentes sujeitos (moradores, professore e alunos dos 7 º, 8º e 9º anos
do Ensino Fundamental da escola São Miguel). A pesquisa envolveu
dois níveis, configura-se como exploratória e descritiva (GIL, 2006;
CALIL, 2009) e para análise dos dados optou-se pela análise temática
que, além de considerar os objetivos, referenciais e achados da pes-
quisa, foram organizados tendo como base temas (MINAYO, 2001).
Para coleta de dados utilizou-se entrevista semiestruturadas
com a professora de ciências Naturais da escola e pais dos estudantes
de 7ª, 8ª e 9ª ano do ensino fundamental. Com os estudantes reali-
zaram-se atividades participativas, incluindo aulas práticas, lúdicas
e teóricas, priorizando abordagens contextualizadas e interdiscipli-
nares.
- 75 -
30 anos foi de 8%, entre 31 a 40 anos foi de 54%, 41 a 50 represen-
taram15%, entre 51 a 60 anos foi de 15% e 8% com idade entre 71 a
81 anos.
A maioria dos informantes (84,6%), nasceram no município
de Humaitá, mais especificamente em comunidades que fazem parte
do município. Sobre o tempo de residência na comunidade, obser-
vou-se que 46% dos entrevistados residem na comunidade há mais
de trinta anos, 8% dos moradores é residente há trinta anos, 23% até
vinte anos e 23% até dez anos.
É imprescindível corroborar esses dados com o Decreto nº.
6.040 que define povos e comunidades tradicionais como sendo [...]
grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais,
que possuem formas próprias de organização social, ocupam e usam
territórios e os recursos naturais como condição para sua reprodução
cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando
conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos
pela tradição (BRASIL, 2007). Nesse contexto, os moradores da
comunidade são tradicionais pelas características apresentadas e que
corroboram com o descrito no decreto.
Ao questionarmos sobre as plantas medicinais, todos afirma-
ram utilizar as plantas para esta finalidade, além de citarem a im-
portância para a saúde da comunidade na utilização desse recurso,
pois vivem em localidades com deficiência de atendimento médico
e farmacêutico.
Foram citadas 48 (quarenta e oito) espécies indicadas pelos
moradores por apresentarem propriedades medicinais. Essas espé-
cies são pertencentes a 26 (vinte e seis) famílias botânicas, assim,
se evidencia um conhecimento amplo sobre a temática proposta,
abrindo um leque de possibilidades para futuras pesquisas na área
da Etnobotânica.
A caracterização da comunidade como tradicional e os seus
saberes sobre plantas, torna-se imprescindível na ligação da temáti-
ca nas escolas, uma vez que as instituições de ensino são berços de
preservações de conhecimentos imateriais, além de permitir o de-
senvolvimento de conhecimento integrado que contribui significati-
vamente com a educação científica dos estudantes.
- 76 -
5.2. Contextualizando a escola ribeirinha de São Miguel
Algumas questões são importantes a serem levantadas para
subsidiar discussões sobre a real situação das escolas do campo, em
particular nessa comunidade localizada na comunidade de São Mi-
guel, verificamos que as principais são: a falta do Projeto Político
Pedagógico (PPP), o acesso e permanência, a formação e prática do-
cente.
A falta do PPP na escola foi um ponto que gera grandes dis-
cussões, pois se trata de um documento fundamental. Para Vas-
concelos (2002) o PPP é “uma tentativa, no âmbito da educação, de
resgatar o sentido humano, científico e libertador do planejamento”
(p.169). Este documento é fundamental para o processo educativo,
sendo participativo, de construção coletiva do conhecimento, aper-
feiçoado e concretizado com o percurso a ser realizado.
O acesso e permanência dos alunos na escola é um ponto im-
portante nessa discussão, pois muitos estudantes não concluem o
ano letivo. O transporte escolar também dificulta o processo, pois os
estudantes dependem do transporte e muitas vezes o barco apresenta
problema e acaba na ausência de aulas. Quanto a infraestrutura, a
escola não conta com espaço para secretaria, e passou a depender da
sede, ou seja, da SEMED.
Porém, o ponto que merece destaque ao apresentar a situação
da escola é a formação de professores, uma vez que existem institui-
ções públicas no município que formam profissionais para atuarem
em áreas especificas.
De acordo com quadro de lotação e área de atuação se ob-
servou que professores atuam em áreas diferentes da sua formação,
como professores formados em pedagogia lecionando disciplinas es-
pecíficas e educação física exercendo outras disciplinas. Também se
observou, um profissional exercendo a docência sem formação no
ano de 2017, estando em desacordo com a LDB 9394/96, que deter-
mina que é a obrigatoriedade de todos os professores tenham a for-
mação em nível superior, ou seja, graduação nas áreas específicas da
Educação Básica. Entretanto, observou-se apenas uma docente com
formação e atuação única trabalhando na sua área de formação, mi-
nistrando a disciplina escolar de Matemática do 6º ao 9º ano naquela
escola nos anos de 2017 e 2018. Sobre a formação, Freire (1996) a do-
cência exige dos profissionais as competências em saberes especiais
ligados a atividade docente.
- 77 -
A entrevista com a professora de Ciências Naturais permitiu
visualizar quão necessário é a formação e atuação na área especifica,
pois, a professora que participou da entrevista semiestruturada tinha
formação em Educação Física.
Nessa etapa da pesquisa buscou-se compreender e conhecer
quais os saberes tradicionais e sua integração no Ensino de Ciências,
porém observamos o desconhecimento da professora sobre saberes
tradicionais e sobre a etnobotânica, assim como a falta de contex-
tualização e interdisciplinaridade dos conteúdos com os saberes dos
estudantes.
Para Morin (2000) os conhecimentos precisam ser multidi-
mensionais, permitindo que todos os fenômenos sejam levados em
consideração para tentar compreender problemas e os fenômenos
diários, sendo o principal erro do processo educativo a separação do
conhecimento, sendo importante praticar a ligação. De acordo com
a teoria da complexidade, não se pode separar a realidade histórica,
social, cultural, econômica das ciências, tendo em vista que temos
fenômenos ambivalentes (MORIN, 2005).
Sobre a metodologia adotada, a professora deixou claro na en-
trevista que suas aulas são tradicionais, com a utilização de quadro
e do livro, pois a escola não disponibiliza outros recursos. Assim, é
imprescindível mudança no cenário da utilização apenas de méto-
dos tradicionais para ensinar Ciências Naturais, umavez que os es-
tudantes não precisam somente compreender métodos científicos.
Ademais, os estudantes de escolas do campo contam com ambien-
tes ricos em saberes historicamente construídos, tornando essencial
uma investigação do cidadão frente à natureza e as interações que
ocorrem.
No geral, pode-se dizer que não se apresenta uma metodo-
logia própria para ensinar ciências naturais, mas sim, um método
que exclui a utilização de conceitos formados e que pensa em valo-
rizar a multidimensionalidade do pensamento, tendo em vista que a
complexidade é a “junção de conceitos que lutam entre si” (MORIN,
2005, p. 192).
Após a pesquisa com a professora, foi necessário redimensionar
a coleta de dados para envolver os estudantes, buscando compreender
quão é primordial e necessário as articulações de conhecimentos. Nes-
ta etapa, utilizou-se uma metodologia participativa de intervenção.
- 78 -
Os estudantes pesquisados, em sua maioria (67%) afirmaram
nunca ter estudado o conteúdo do reino vegetal e 33% estudaram
este conteúdo. É imprescindível realçar a importância das plantas
para humanidade em processos vitais, na alimentação, uso fitoterá-
pico, produção de medicamentos farmacêuticos e moradia. Morin
(2000) discorre que a cegueira do conhecimento precisa enfrentar
problemas de erro e de ilusão, fato este também ausente em nossa
pesquisa, pois os alunos, em sua maioria, relataram desconhecer na
prática educativa formal o conhecimento dos vegetais, o que deveria
estar diretamente ligado à vida social e cultural dos alunos.
Sobre a forma de abordagem dos conteúdos sobre o reino ve-
getal para os estudantes que já estudaram o conteúdo, houve a pre-
sença significativa do livro didático, seguida da cópia do conteúdo
quadro. Para Morin (2000), o conhecimento não deve ser apenas es-
pelho do mundo, assim se destaca que existem outros conhecimen-
tos sociais e culturais que são aliados ao processo de ensino.
No ensino de botânica existe uma rica diversidade de vegetais,
entretanto o principal desafio é a falta de contextualização. Neste
sentido, Morin (2000) destaca a contextualização como um princí-
pio pertinente quando se fala em conhecimentos, pois dados isola-
dos e sem conexão são extremamente ineficientes.
Ao questionarmos sobre as plantas medicinais, todos os es-
tudantes afirmaram conhecer e que os pais fazem a utilização delas
em casa, segundo eles, são importantes para a saúde e prevenção de
doenças. Foi citado pelos estudantes um número expressivo de plan-
tas utilizadas em casa com a finalidade curativa. Assim, reforça-se a
necessidade desses conhecimentos etnobotânicos serem integrados
no currículo de Ciências Naturais, principalmente quando se trata
de estudantes de comunidades ribeirinhas, com conhecimentos ri-
cos sobre a temática, possibilitando a valorização do conhecimento.
Para Guarim Neto et al. (2012), a etnobotânica permite resgatar co-
nhecimentos entre as gerações e vislumbra compartimento de co-
nhecimento.
Com a deficiência nos conteúdos sobre os vegetais no ensino
de Ciências Naturais da escola São Miguel, se optou por uma inter-
venção. Destaca-se aqui, que os alunos apresentavam rica bagagem
de conhecimentos tradicionais sobre as plantas, relacionando as suas
características medicinais, os quais foram passados pela tradição fa-
- 79 -
miliar, tornando-se primordial e necessário que esses conhecimen-
tos seja integrado e contextualizado no Ensino de Ciências Naturais.
As atividades de intervenções iniciaram com uma aula exposi-
tiva e participativa com a finalidade de contribuir com a aprendiza-
gem dos discentes, onde se trabalhou os conhecimentos tradicionais
que apresentaram sobre plantas com base no diálogo e respeito. As
aulas práticas e de campo, que foram propostas para contribuir com
a aprendizagem dos estudantes, foram realizadas com as seguintes
atividades: coletas de materiais botânicos ao redor da escola para a
elaboração de decalque, exsicatas, aulas de microscopia, atividades
lúdicas, desenhos representativos sobre a relação desses estudantes
ribeirinhos com as plantas e atividades de degustação com a pro-
posta intitulada “ chá medicinal”. Os estudantes trouxeram plantas
medicinais trazidas de suas casas para contribuir com a discussão e
permitindo troca de saberes.
De forma geral, atividades permitem aproximação com a rea-
lidade do seu cotidiano possibilitam despertar a curiosidade nos
alunos em ampliar seus conhecimentos, norteando os processos de
ensino e de aprendizagem, e, fortalecendo a ideia de que nem sempre
é necessário recursos e materiais sofisticados para desenvolver ativi-
dades que possibilitem contribuam com a educação escolar de crian-
ças e jovens. Para Morin (2000), o processo de ensino é parte integra-
dora da educação, considera que encontramos um mundo voltado
para técnica, ou melhor, uma era planetária que dificilmente prioriza
a transformação do pensamento na perspectiva de transformação.
6. Considerações finais
- 80 -
tos para envolver os saberes tradicionais sobre plantas medicinais
e sua presença no ensino educativo dos estudantes da comunidade
São Miguel, destaca-se ainda, que as barreiras do isolamento entre
os conhecimentos e saberes podem ser quebradas, sobretudo, é per-
tinente estreitar a relação entre saberes tradicionais e escolares, fato
esse que poderá possibilitar a formação de indivíduo alfabetizado
cientificamente.
A articulação de conhecimentos tradicionais no Ensino de
Ciências Naturais torna-se essencial e necessário, visto que ensinar
conceitos científicos para crianças e adolescentes requer uma abor-
dagem integrada. A escola desempenha um papel indispensável na
preservação de saberes tradicionais e na vida dos estudantes que são
moradores de comunidades tradicionais, assim, é preciso trabalhar
na perspectiva da interação entre conhecimentos escolares e tradi-
cionais para o desenvolvimento da educação cientifica, tendo em
vista, que o ensino de Ciências Naturais nas escolas ribeirinhas seja
contextualizado, que as disciplinas não estejam em disjunções umas
com as outras, para que os estudantes compreendam os conceitos e
as aplicabilidade do conhecimento que lhes são ensinados e viven-
ciados.
A integração precisa pautada em aspectos da cultura dos es-
tudantes, do cotidiano, assim, será possível a construção de uma
educação que conduza a formação cidadã, proporcionando a apren-
dizagem do significado da ciência que os cerca, dos saberes que ne-
cessitam estar presente nas escolas.
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PRINCÍPIOS EPISTEMOLÓGICOS DAS TEORIAS
DO CURRÍCULO
Luciane Rocha Paes
Eulina Maria Leite Nogueira
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trabalhar nas grandes indústrias, consequentemente, fazendo-se ne-
cessário “educar” essa massa trabalhadora, que é mão de obra para
as grandes indústrias. Neste contexto, foi institucionalizada a esco-
larização para as massas, assim surgem os primeiros estudos sobre o
currículo nos Estados Unidos.
- 86 -
As respostas de Bobbit eram claramente conservadoras embora sua
intervenção buscasse transformer radicalmente o sistema educa-
cional, Bobbit propunha que a escola funcionasse da mesma forma
que qualquer outra empresa comercial ou industrial. Tal como uma
indústria Bobbit queria que o sistema educacional fosse capaz de
especificar precisamente que resultados pretendiam obter que pu-
dessem estabecer metódos para obtê-los de forma precisa e formas
de mensuração que permitissem saber com precisão realmente al-
cançados […] o modelo de Bobbit estava claramente voltado para
a economia. Sua palavra chave “eficiência”. O sistema educacional
deveria ser tão eficiente quanto qualquer outra empresa econômica.
Bobbit queria transferir para a escola o modelo de organização pro-
posto pelo Frederik Taylo (SILVA, 1999, p.22-23).
- 87 -
em grande parte das sociedades. A ênfase da escolarização por meio
da teoria tradicional do currículo postula inúmeros condicionantes
que neutralizam o pensamento reflexivo-crítico e mantém o status
quo2; o projeto de educação tradicional perdura a educação como
padronização nos processos pedagógicos pautados nos princípios da
administração e racionalidade técnica onde os alunos são meros re-
ceptores de informação.
Numa perspectiva de educação bancária, o currículo como
prática pedagógica apenas se sustenta como prática para manuten-
ção da escolarização das massas para o mercado de trabalho em
que o sujeito é condicionado para receber conhecimentos técnicos
e cumprir tarefas sem poder questionar ou refletir sobre nenhum
posicionamento político.
Outro autor expoente que emerge nesta perspectiva tradicio-
nal é Ralf Taylor, que traz em seus escritos, a teoria tradicional do
currículo, cujos objetivos são claros em que a educação das massas
precisa ter a constituição de um currículo com base na organiza-
ção e no desenvolvimento (SILVA, 1999). O centro da perspectiva de
Taylor e Bobbit era a manutenção do desenvolvimento da educação
como técnica, conduzir a escolarização das massas para a formação
técnica, neutra e fundamentalmente consolidada na alienação po-
lítica, uma busca num condicionamento ideológico embasada nas
relações de poder entre uma classe dominante e a classe operária
alienada, onde a classe dominante determina as condições de vida e
de conhecimento da classe operária.
O currículo tradicional se tornou epistemologicamente um
caminho a ser seguido, culturalmente aceito em grande parte do
mundo, contendo um método pedagógico que seleciona conteúdo
específico com base na formação para o trabalho, possui uma avalia-
ção para seleção natural, uma educação que dá ênfase ao professor e
aos conteúdos a serem absorvidos pelos alunos, uma educação auto-
- 88 -
ritária com base na descontextualizarão social dos alunos. A escola-
rização por meio da produção do currículo tradicional se faz a partir
de uma luta de classes explícita sobre as relações de poder que uma
classe tem sobre a outra, o currículo como teoria constituída para
um único fim que é a manutenção do poder das classes dominantes
para manter o processo de industrialização. Prática esta que funcio-
na como controle e padrão hegemônico a ser seguido.
A ênfase desta teoria e prática do currículo tradicional, co-
mentada pelos teóricos acima citados, é desenvolvida pela avaliação
e pelos objetivos a serem atingidos, que é a formação técnica da clas-
se operária para atender ao mercado de trabalho. Em conformidade
a esta estrutura curricular, a escola acaba se tornado um espaço de
reprodução de conhecimentos, assemelhando-se a uma fábrica, e os
alunos, como matérias-primas, estão prontos para serem transfor-
mados de acordo com as exigências do mercado capitalista, confor-
me a classe dominante exige. Assim, gera uma cadeia de reprodução
e, por consequência, a alienação. Como funcionalidade deste siste-
ma, os sujeitos são manipulados para pensar apenas o desenvolvi-
mento do trabalho e aprendem especificamente sobre as técnicas
necessárias para desenvolverem este trabalho, ou seja, a força braçal
dos operários.
- 89 -
marxista que é uma epistemologia substanciada pela teoria social de
Marx, conforme seu estudo sobre a burguesia e o modo de produção
capitalista.
Desse modo, muitos autores irão subsidiar esta nova forma
de pensar os paradigmas das teorias curriculares em muitos países
a partir da década de 1960. No Brasil com Paulo Freire, na Inglater-
ra com Michael Young, na França com Bourdieu e Althusser e nos
Estados Unidos com Michael Apple, que é um dos principais auto-
res da teoria crítica do currículo. A ideia central da teoria crítica do
currículo surge da inquietação sobre como a sociedade dimensiona
a formação das suas classes, tanto a classe dominante — os burgueses
—, quanto da classe trabalhadora. Essa luta de classes perpassa pelo
currículo escolar, fazendo um questionamento teórico e prático so-
bre qual é o papel central da escola e a manutenção da exploração de
uma classe sobre a outra dentro da sociedade capitalista.
Portanto, as teorias críticas do currículo visam entender teo-
ricamente como deve se desenvolver um currículo profundo e dinâ-
mico dentro da sua estrutura, com bases que desenvolvam os sujeitos
a pensar de maneira integral sobre a sociedade. O currículo passa a
ter um novo viés epistemológico e não a pensar como antes, consi-
derado e utilizado como técnica para atingir objetivos operacionais
econômicos.
É importante entender que o processo de escolarização das
massas e a construção curricular da educação perpassam exatamente
por um viés político e, por isso, torna-se tão importante para o estado,
para o sistema econômico e para a política como funcionalidade de
manutenção de uma ordem já estabelecida pela classe dominante.
Por sua vez, o espaço escolar se tornou um espaço tão discutido
politicamente pelos teóricos, assim como o currículo que se
estabeleceu neste espaço, pois dentro deste espaço são produzidas
ações que irão refletir diretamente na sociedade como um todo.
Althusser (1979), em seu livro A Ideologia e o Aparelho ideoló-
gico do Estado, construiu argumentos a partir da ideologia marxista
que versa sobre as concepções teóricas e os conhecimentos cientí-
ficos desenvolvidos por Karl Marx para entender como funciona o
sistema da sociedade capitalista e, dessa maneira, faz uma análise
sobre o sistema de exploração e de dominação. Uma das conclusões
sobre a luta de classes é que o espaço escolar é aparelho ideológico do
- 90 -
Estado, pois ele entende que há um distanciamento entre o processo
de escolarização que é oferecido para a massa trabalhadora e a escola
oferecida para os da classe dominante. Além de acrescentar que a
forma com que as práticas educacionais acontecem é totalmente dis-
tinta; dessa maneira, a escola padroniza o pensamento condiciona-
do que a classe dominante quer para a operária, mantendo a escola
como aparelho ideológico em que o Estado sustenta o status quo e
condiciona a permanência alienada de toda uma classe. Por isso,
É bom lembrar que os AIE e o próprio Estado apenas têm sentido
de um ponto de vista da luta de classes, enquanto aparelho da luta
de classes, mantenedor das condições de exploração e de sua repro-
dução. “Não há luta de classes sem classes antagônicas”. É por isso
que os AIE não são a realização da ideologia em geral, ou mesmo
a realização sem conflitos da ideologia dominante. A ideologia da
classe dominante não se torna dominante por ato ou graça divina,
ou pela simples tomada do poder de Estado. É pelo estabelecimento
dos AIE, onde esta ideologia é realizada que ela se torna dominante
(MARQUES, 2007, p.07).
- 91 -
alunos, os conteúdos selecionados e descontextualizados, a forma
bancária que se ensina, assim como a avaliação e tudo que gira em
torno desse processo político-pedagógico. Toda essa ordem educa-
cional para o único fim que é a sujeição para manutenção de ordem
político-econômica, a escola inculca em seus alunos valores que le-
vam os sujeitos a se tornarem passivos diante da reprodução social.
A ideologia, que se consolida de modo hegemônico, viabiliza
a separação das pessoas pelo desenvolvimento intelectual. É impor-
tante entendermos que há uma justificativa para todo esse processo
político acontecer; a relação de poder entre as classes é uma delas,
a manutenção da exploração pelo trabalho é outra dela. Esse ciclo
vicioso mantém uma classe livre e outra totalmente explorada. A ex-
ploração é o condicionamento político e o grande fator pelo qual
acontece todo o sistema de funcionamento da escola como aparelho
ideológico do estado, consequentemente, os aparelhos ideológicos
são mecanismos, meios formais para que este processo aconteça.
A problemática central da análise Marxista da educação e da escola
consiste como mostra o exemplo de Althusser, em buscar estabele-
cer qual é a ligação entre a escola e a economia, entre a educação e a
produção. Uma vez que, na análise Marxista a economia e a produ-
ção estão no centro da dinâmica social. Qual é o papel da educação
e da escola nesse processo? Como a escola e a educação contribuem
para que a sociedade continue sendo capitalista, para que a socie-
dade sendo dividida entre capitalistas “proprietários dos meios de
produção”, de uma lado e trabalhadores “proprietários unicamente
da sua capacidade de trabalho”, de outro? Althusser nos deu, como
vimos, um tipo de respostas; a escola contribui para a reproducação
da sociedade capitalista ao transmitir, através das matérias escola-
res, as crenças que nos fazem ver os arranjos sociais existentes como
bons e desejáveis (SILVA, 2000, p.32).
- 92 -
Bourdieu escreveu, em 1970, um livro chamado A Reprodu-
ção e faz grandes observações sobre o papel importante que a escola
tem para a manutenção do sistema de exploração social. Ele estuda o
sistema de ensino e visualiza a escola como mantenedora da repro-
dução social a partir da sua perspectiva de desenvolvimento escolar
dos sujeitos. Existem diferenças e indiferenças que se efetivam como
símbolos representativos composto no espaço social, alimentando
uma posição das classes e a desigualdade social, dentro da sociedade
capitalista.
Dentro da análise social de Bourdieu existe um ciclo que é vi-
cioso no sistema capitalista que a própria classe dominante mantém.
Eles possuem capital cultural e, neste sentido, a dominação simbóli-
ca falada por Bourdieu surge e é por este modo que há uma violên-
cia também denominada de simbólica. Logo, a violência simbólica
é representada pelas distorções e desigualdades sociais, através do
poder que a classe dominante tem sobre a classe operária, causando
um estranhamento social que perpassa o capital econômico, cultural
e social. Portanto,
Na realidade, devido ao fato de que elas correspondam aos interes-
ses materiais e simbólicos de grupo ou classes diferentemente situa-
da nas relações de força essa ações pedagógicas tendem sempre a
reproduzir a estrutura da distribuição do capital cultural entre esses
grupos ou classes contribuindo do mesmo modo para a reprodu-
ção da estrutura social; com efeito, as ações do mercado em que
se forma o valor econômico ou simbólico, isto é enquanto capital
cultural, os arbitrários culturais produzidos pelas diferenças das
ações pedagógicas e, por esse meio, dos produtos dessas ações pe-
dagógicas (indivíduos educados), constituem um dos mecanismos
mais ou menos determinantes segundo os tipos de formações so-
ciais, pelos quais se encontra assegurada a produção social definido
como reprodução da estrutura das relações de forças entre as classes
(BOURDIEU; PASSERON, 2008, p. 32).
- 93 -
omnilateral, que é desenvolvimento integral do homem. Este reco-
nhecimento passa pelos processos educacionais da escola privada
que este sujeito frequenta.
Existe, pois, um processo de exclusão do capital cultural do
sujeito da classe pobre, afinal, esta cultura contextualizada na clas-
se trabalhadora não é reconhecida dentro da escola que tem como
perspectiva de trabalho o currículo tradicional, cujo interesse é pro-
duzir sujeitos tecnicamente formados para o mercado de trabalho e
não para desenvolverem ações politicamente ativas e críticas dentro
do contexto social. Dessa maneira,
A violência no âmbito escolar pode ser verificada de várias manei-
ras: desde o tratamento diferenciado dispensado a determinados
alunos até ao conteúdo pragmático que faz parte do plano pedagó-
gico. Ressaltando-se que, este, não leva em consideração a amplitu-
de das variadas formas de se aprender, compreender, fixando apenas
um plano de ensino para toda a extensão dos alunos e suas singu-
laridades, o que, em grande parte das vezes favorece àqueles que já
possuem vantagem, qual sejam, os alunos de classe dominante. A
escola, neste turno, porta-se como instrumento para manipulação
desse modo de “aprender”, impulsionando os alunos a serem meros
reprodutores de conhecimento, desprezando suas peculiaridades e
especificidades. (TIRADENTES, 2015, p.38).
- 95 -
rections for the Sociology of Education, o livro reuniu textos de di-
versos autores que compunham o denominado movimento da Nova
Sociologia da Educação (NSE), entre eles Pierre Bourdieu, Geoffrey
Esland, Neil Keddie, Basil Bernstein e o próprio Michael Young. A
perspectiva a que se opunham esses autores era aquela que defen-
dia uma concepção técnica do currículo, centrada em questões tais
como: quais os melhores métodos ou as melhores estratégias para
garantir que se atinjam os resultados esperados em relação ao pro-
cesso de escolarização e quais as melhores formas de organizar o
ensino e o currículo para esse mesmo fim (GALIAN; LOUZANO,
2014, p. 1111).
- 96 -
Para Young, a única maneira de levar o conhecimento cientí-
fico aos sujeitos da classe trabalhadora é através do currículo escolar
crítico, dentro do processo de escolarização emancipatória das mas-
sas. Dessa maneira, é indispensável fazer uma reflexão e reconstru-
ção sobre o que os conteúdos, que se fazem necessários aprender
para que esses sujeitos possam compreender o seu lugar no mundo, e
estejam disponíveis para aqueles que ficaram à margem do processo.
Vale salientar que o currículo é como se fosse uma passagem, uma
possiblidade capaz de levar o sujeito à libertação do condicionamen-
to social.
Para Young o conhecimento é visto como algo poderoso no
sentido desse conhecimento poder tirar o sujeito do status quo que
ele está condicionado, e mais poderoso no sentido de libertação da
alienação social. Portanto, se faz necessário legitimar a construção
de um currículo que leve em consideração o contexto social e as prá-
ticas curriculares a que se propõem, ou seja, o currículo como meca-
nismo de compartilhamentos de conhecimentos científicos, social e
político para a emancipação social.
O que Young, ao conceber um conhecimento poderoso, parece
não compreender é que a questão do conhecimento eleito para ser
transmitido às gerações futuras está sempre vinculada ao poder e
a circulação deste conhecimento é parte da distribuição de poder.
O próprio conhecimento selecionado, portanto, já é revelador do
empoderamento ou do apoderamento e do destaque (ou não) que
sua cultura ou seu modo de vida possui na sociedade ou na escola
(ZANARDI, 2013, p.9).
- 98 -
riência construída no transcorrer da sua vida pessoal e profissional,
pois, como professor, faz sua formação inicial e, logo depois, com a
migração para uma Universidade maior e mais elitizada, dá conti-
nuidade à sua formação. O estudo de Apple é separado em períodos,
no primeiro período é basicamente construída na década de 1970 e
1980 quando ele aborda em seus estudos a sistematização da cultura
e do poder. Logo em 1979 Michael Apple escreve Ideologia e Currí-
culo, onde explicitará em seu estudo uma reflexão sobre hegemonia
social e a reprodução cultural, ele traz grandes e profundas questões
sobre o porquê da educação e o currículo serem feitos de uma ma-
neira, não de outra e como as relações hegemônicas substancializam
a reprodução social. Em vista disso, Apple esclarece,
Acho que estamos começando a enxergar mais claramente coisas
que antes eram obscuras. A medida que aprendemos a entender a
maneira pela qual a educação atua no sentido econômico de uma
sociedade, reproduzindo aspectos importantes de sua desigualda-
de, também aprendemos a desvendar uma segunda esfera em que
a escolarização opera. Não há apenas a propriedade econômica; há
também a propriedade simbólica-capital cultural, que as escolas
preservam e distribuem(APPLE, 2016, p. 37).
- 99 -
Nesse sentido, o estudo de Apple (2016) vislumbra um novo
mecanismo com fundamento central da educação que está de acor-
do com a justiça social, um currículo que seja para o interesse do
desenvolvimento do homem como ser social independentemente da
sua classe, uma educação que não seja hegemônica de acordo com
a classe dominante, ao contrário, que ela emancipe e leve o sujeito a
olhar os espaços sociais como verdadeiramente são, que leve o sujei-
to a compreender o poder que a contracultura possui para contrapor
a hegemonia social estabelecida.
2. Considerações finais
- 100 -
o abismo social entre o contexto da classe operária e a classe do-
minante que busca refletir cientificamente a construção escolar para
a manutenção do sistema que a sociedade capitalista se estabelece
naquele momento, levando consigo essas grandes reflexões sobre o
papel político que a educação possui.
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- 102 -
ENSINO DE CIÊNCIAS DA NATUREZA E
INTERCULTURALIDADE: UM OLHAR PARA A
BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR
Érica de Oliveira
Marta de Souza Rodrigues
Cristina Leite
- 103 -
de multiculturalismo para contextualizar as relações entre escola e
cultura, apresentando suas diferentes facetas. A autora aponta para a
necessidade do despertar da consciência a respeito da questão mul-
ticultural no Brasil, principalmente no que se refere aos grupos que
estão diretamente relacionados com a nossa bagagem histórica-so-
cial-cultural.
Nossa formação histórica está marcada pela eliminação física do
“outro” ou por sua escravidão, que também é uma forma violenta
de negação de sua alteridade. Os processos de negação do “outro”
também se dão no plano das representações e do imaginário social.
(CANDAU, 2013, p.17)
- 104 -
Esta perspectiva assimilacionista pode ser aproximada do que
Peter McLaren (1997) chamou de multiculturalismo conservador,
em que os grupos étnicos são caracterizados como “acréscimos” à
cultura dominante. O autor complementa que “um pré-requisito
para ‘juntar-se à turma’ é desnudar-se, desracializar-se e despir-se de
sua própria cultura” (MCLAREN, 1997, p.115), ressaltando o quanto
a perspectiva multicultural de natureza assimilacionista é problemá-
tica.
Em se tratando da abordagem diferencialista, Candau (2013)
propõe que sejam consideradas as diferentes características de cada
grupo de acordo com sua historicidade, suas raízes e sua cultura,
defendendo a necessidade de espaços onde esses grupos possam se
manifestar de forma a manter suas matrizes culturais. O problema
desta visão é que, apesar de haver um reconhecimento das diferen-
ças, essa concepção tende à criação de um “apartheid sociocultural”,
segundo a autora.
Ambas as abordagens, a assimilacionista e a diferencialista,
encontram-se, segundo Candau (2013), fortemente presentes nas
sociedades contemporâneas. Por essa razão, busca-se uma terceira
concepção, definida como multiculturalismo interativo ou intercul-
tural. Nesta abordagem, a ideia central é a interculturalidade que
visa, por meio do diálogo, um intercâmbio cultural com o objetivo
de se construir uma sociedade mais democrática, inclusiva e plu-
ral. Desta forma, a perspectiva intercultural seria aquela capaz de
promover uma educação para o reconhecimento do “outro” e para o
diálogo entre os diferentes grupos culturais e sociais. Nas palavras de
Freire (2019, p. 216):
“É preciso reenfatizar que a multiculturalidade como fenômeno que
implica a convivência num mesmo espaço de diferentes culturas
não é algo natural e espontâneo. É uma criação histórica que implica
decisão, vontade pública, mobilização, organização de cada grupo
cultural com vistas a fins comuns. Que demanda, portanto, certa
prática educativa coerente com esses objetivos. Que demanda uma
nova ética fundada no respeito às diferenças.”
- 105 -
proposto por Candau (2013), a cultura é tomada como um processo
de construção e reconstrução contínuo, preservando sua historicida-
de e mantendo-se em constante reelaboração. Além disso, as relações
culturais são vistas, nesta perspectiva, de maneira entrelaçada com
questões de poder, de preconceitos e com relações duramente hie-
rarquizadas.
A proposta do multiculturalismo intercultural também chama
a atenção para a necessidade de se articular as políticas de identidade
e de igualdade, valorizando o diálogo e o reconhecimento do “outro”,
que possibilita a construção de uma formação mais democrática. Por
conta disso, é de grande importância que essa perspectiva de multi-
culturalismo seja levada para os mais diversos espaços de interação
social, incluindo a escola.
O multiculturalismo interativo ou intercultural apresentado
por Candau (2013) possui paralelos com a proposta de McLaren
(1997), quando o autor define sua concepção de multiculturalismo
crítico. Ambas as visões compartilham a posição de que as culturas
são construídas a partir de aspectos sociais, econômicos, históricos,
ideológicos e, além disso, ambos defendem a necessidade de atua-
ção e intervenção na sociedade a favor da democracia. Para McLa-
ren (1997, p.122): “O multiculturalismo sem uma agenda política de
transformação pode apenas ser outra forma de acomodação de uma
ordem social maior.”.
O multiculturalismo crítico ou intercultural também propor-
ciona o diálogo entre conhecimentos e saberes de diversas culturas.
Vera Candau (2011) salienta que, apesar de muitos autores usarem
ambos os termos como sinônimos, se deve diferenciá-los de modo
a incentivar o diálogo entre os diferentes conhecimentos e saberes.
O que chamamos conhecimentos estaria constituído por conceitos,
idéias e reflexões sistemáticas que guardam vínculos com as dife-
rentes ciências. Estes conhecimentos tendem a ser considerados
universais e científicos, assim como a apresentar um caráter mono-
cultural. Quanto aos saberes, são produções dos diferentes grupos
socioculturais, estão referidos às suas práticas cotidianas, tradições
e visões de mundo. São concebidos como particulares e assistemáti-
cos. Considero que o mais relevante, deixando aberta esta discussão,
é considerar a existência de diferentes saberes e conhecimentos e
descartar qualquer tentativa de hierarquizá-los. (CANDAU, 2011,
p.247)
- 106 -
O trabalho com as tensões entre os conhecimentos e saberes
oriundos de diferentes tradições é um possível caminho para a cons-
trução de um intercâmbio cultural, visando dar voz aos grupos me-
nos valorizados socialmente, discriminados muitas vezes por seus
saberes e conhecimentos.
Dialogando com Catherine Walsh (2001, apud CANDAU,
2013, p.23-24) no que a autora promove como interculturalidade,
temos:
• Um processo dinâmico e permanente de relação, comuni-
cação e aprendizagem entre culturas em condições de res-
peito, legitimidade mútua, simetria e igualdade.
• Um intercâmbio que se constrói entre pessoas, conheci-
mentos, saberes e práticas culturalmente diferentes, bus-
cando desenvolver um novo sentido entre elas na sua di-
ferença.
• Um espaço de negociação e de tradução onde as desigual-
dades sociais, econômicas e políticas, e as relações e os
conflitos de poder da sociedade não são mantidos ocultos
e sim reconhecidos e confrontados.
• Uma tarefa social e política que interpela ao conjunto da
sociedade, que parte de práticas e ações sociais concretas e
conscientes e tenta criar modos de responsabilidade e so-
lidariedade.
• Uma meta a alcançar.
- 107 -
explícita imposição da cultura dominante europeia (hegemônica)
sobre os povos indígenas. Na segunda, há o surgimento das primei-
ras escolas estatais bilíngues para os povos indígenas. O bilinguismo,
nesta etapa, adquire o papel de “civilizar” de maneira mais rápida
esses povos. Esta concepção é mantida até meados dos anos 70 em
toda a América Latina, quando, em uma terceira etapa, por meio de
experiências alternativas lideradas por comunidades, universidades,
setores progressistas e a igreja católica, o bilinguismo deixa de ter um
caráter civilizatório e passa a ser de grande valia para se manter viva
as identidades dos povos latinos.
Neste novo período foram produzidos materiais didáticos alterna-
tivos e programas de educação bilíngue que, apesar de ainda busca-
rem uma melhor “integração” dos grupos às sociedades nacionais,
reconheciam o direito desses povos de fortalecer e manter a cultura
local. (CANDAU; RUSSO, 2010, p. 156)
- 109 -
pensar as relações de poder, de mercado e capital que permeiam
todo o cenário político e social.
A compreensão mais aprofundada sobre a noção de intercul-
turalidade (crítica) envolve considerar a origem dos processos que
levaram à opressão e exploração das populações originárias de nosso
continente. A colonialidade tem sido utilizada para indicar: “uma
lógica global de desumanização e que é capaz de existir até mesmo
na ausência de colônias formais” (MALDONADO-TORRES, 2019,
p. 36). É importante diferenciá-la do conceito de colonialismo. Ví-
vian Santos (2018) indica que este último deve ser pensado como
a dominação exercida em diversos campos pelos europeus sobre os
demais continentes, destacando o aspecto político. Já a noção de co-
lonialidade está relacionada ao fato de que a independência formal
das nações colonizadas não é o suficiente para impor um fim ao do-
mínio colonial. Isto porque essas estruturas de poder se enraízam em
diversos âmbitos e mantêm a continuidade de variados mecanismos
de opressão. A colonialidade vem a ser esta permanência colonial.
Catherine Walsh (2009), entre outros autores, discute a exis-
tência de diferentes tipos ou dimensões para a colonialidade, que
perpassam as esferas do poder, do ser e do saber. Em se tratando da
“colonialidade do poder”, “o lugar central da raça, do racismo e da ra-
cialização como elementos constitutivos e fundantes das relações de
dominação” (WALSH, 2009, p.16). Outro aspecto fundamental nes-
te cenário diz respeito ao desenvolvimento do capitalismo mundial,
devido ao seu papel decisivo na constituição de processos históricos
relacionados à exploração de diversas populações em toda a América
Latina. A “colonialidade do poder” estabelece uma hierarquia fixa na
sociedade, uma classificação social pautada na desumanização dos
povos não europeus.
A “colonialidade do saber” se sustenta no eurocentrismo
como a única perspectiva válida e, por isso, hegemônica; esta visão
de mundo determina os conhecimentos tomados como científicos e
que devem ser valorizados, em detrimento dos que são considerados
inválidos. Tal dimensão tem impacto nos conhecimentos que che-
gam às escolas, seja por meio de parâmetros curriculares ou livros
didáticos, uma vez que, ambos são responsáveis por selecionar quais
saberes devem ser vinculados e ensinados para uma determinada
formação do educando. No Brasil, os livros didáticos de Ciências
- 110 -
da Natureza, por exemplo, foram um dos elementos de difusão de
racismo, por apresentar estereótipos e estigmatizar os personagens
negros e indígenas. (SANTIAGO; AKKARI; MARQUES, 2013).
A “colonialidade do ser” se estrutura na inferiorização do ou-
tro, como consequência da invisibilidade do poder e do saber. Este
conjunto de colonialidade constrói um quadro de violência colonial,
que inclui processos de genocídio, espoliação e epistemidício (morte
e apagamento dos saberes que não são oriundos da tradição euro-
peia) sobre a natureza e as populações dos territórios coloniais (OLI-
VEIRA; SALGADO; QUEIROZ, 2019).
A legislação que orienta a construção dos currículos escolares
configura-se, juntamente com os livros didáticos, como um impor-
tante elemento que pode reafirmar a colonialidade do saber ou pro-
por novos caminhos, pautados na interculturalidade crítica.
- 111 -
Art. 7º Os currículos escolares relativos a todas as etapas e modali-
dades da Educação Básica devem ter a BNCC como referência obri-
gatória e incluir uma parte diversificada, definida pelas instituições
ou redes escolares de acordo com a LDB, as diretrizes curriculares
nacionais e o atendimento das características regionais e locais, se-
gundo normas complementares estabelecidas pelos órgãos normati-
vos dos respectivos Sistemas de Ensino. (BRASIL, 2017, p. 6)
- 112 -
universais quanto dos conhecimentos indígenas, bem como o ensi-
no da língua indígena como primeira língua. (BRASIL, 2017, p.17)
- 113 -
pológico e não sob a perspectiva “das imbricações da astronomia,
enquanto área científica, com a cultura ocidental contemporânea”,
como destacou Luiz Jafelice (2011, p.11).
Em termos da produção acadêmica nesta área, sob a denomi-
nação da etnoastronomia, Lima (2004) afirma que as primeiras pu-
blicações específicas relacionadas à área surgiram a partir da década
de 1980, entretanto, os primeiros trabalhos de natureza quantitativa
são bem mais antigos, datando as últimas décadas do século XIX e
consistindo em estudos sobre alinhamentos astronômicos de sítios
arqueológicos.
Neste texto, quando nos referimos à “astronomia”, temos im-
plícita uma concepção mais ampla do que comumente é usada no
meio acadêmico. Partimos da ideia de que os saberes sobre o céu
incluem uma perspectiva mais completa, incorporando diversas ou-
tras áreas do saber, de forma a se obter uma “astronomia mais plural”,
com um “afastamento do etnocentrismo cabedal teórico-metodoló-
gico fundamental” (MELLO, SOARES, KERBER, 2011).
Hoje, se se quer abordar astronomia - ou melhor, uma relação au-
têntica com “os céus”- desde uma perspectiva antropológica, que
englobe elementos que desde sempre estiveram naturalmente con-
templados pelo que se entendia por astronomia - como conteúdos
típicos de história, filosofia, religião, etc. - então convém deixar
claro que se está interessado em astronomia cultural. (JAFELICE,
2010, p. 249).
- 114 -
2. A astronomia cultural na bncc e a interculturalidade
- 115 -
natureza de forma ampla. Contudo, por ser a BNCC um documento
recentemente implementado em todo o território brasileiro, consi-
derando as dimensões de nosso país, sua diversidade regional e a
extensão da rede de ensino, é bastante complexa a estimativa ou ava-
liação acerca da abordagem às habilidades indicadas anteriormente.
Outro aspecto agravante a respeito das dificuldades atuais no traba-
lho com a interculturalidade se relaciona ao cenário político, tendo
em vista a atuação do governo federal junto à políticas neoliberais e
de compactuação da lógica hegemônica, descomprometido com as
mudanças que exigem implementação de políticas voltadas à diver-
sidade cultural.
Repensar o currículo e ter a inserção deste tipo de temática na
área é um importante avanço e uma porta aberta para que as escolas
tragam à tona as diferentes concepções e saberes sobre o céu, poden-
do ser um primeiro passo – ainda que pequeno – para a prática da
interculturalidade na educação brasileira.
3. Considerações finais
- 116 -
inicial em dar visibilidade à diversidade. Tal abordagem é compatí-
vel com a astronomia cultural, considerando a ênfase aos diferentes
olhares na construção de conhecimentos sobre o céu.
Ainda assim, a astronomia cultural na BNCC pode ser pensa-
da como um horizonte a ser ampliado no ensino de ciências da natu-
reza, aprofundando as discussões para que o tema não seja abordado
a partir de discursos simplificados ou genéricos, buscando valorizar
o que de mais importante esta abordagem pode nos trazer: dar voz
àqueles que não têm reconhecimento de seus saberes e fortalecer a
democracia na escola, garantindo lugar para a diferença.
Considerar as riquezas que envolvem os saberes sobre o céu
compõem uma perspectiva completa, que não se limita à astrono-
mia “convencional-ocidental”, mas se colocar de maneira holística,
incorpora diversas outras áreas do saber, de forma a se obter uma
astronomia mais plural, um “afastamento do etnocentrismo cabedal
teórico-metodológico fundamental” (MELLO, SOARES, KERBER,
2011).
É importante que o multiculturalismo permeie todo o currí-
culo e esteja presente em diversas áreas do conhecimento, inclusi-
ve o das ciências naturais, tornando a astronomia cultural um tema
importante a ser explorado no âmbito escolar, que entrelaça várias
áreas do conhecimento, enriquecendo a compreensão das diferentes
relações entre o ser humano e o cosmos (JAFELICE, 2010).
4. Referências
- 117 -
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- 120 -
SEÇÃO 2
- 121 -
- 122 -
FORMAÇÃO CONTINUADA NO ÂMBITO
DAS POLÍTICAS PÚBLICAS: POSSIBILIDA-
DES E DESAFIOS NA ADESÃO DO PNAIC NO
MUNICÍPIO DE HUMAITÁ- AM
Neila Gonçalves Vinente
Eliane Regina Martins Batista
1. Introdução
- 123 -
O PNAIC, refere-se a uma política educacional, que tem como
finalidade a busca da melhoria da educação, promovendo a forma-
ção continuada dos professores, visando contribuir com a prática
destes. Portanto, este trabalho tem como finalidade explanar resulta-
dos parciais das possíveis limitações e desafios na adesão e desenvol-
vimento da política educacional, neste caso, o PNAIC, no município
de Humaitá-AM.
Para realização deste estudo utilizou-se como referencial teó-
rico e metodológico o Ciclo de Políticas (Ball, 2001, 2002). Onde
exploramos ao contexto de influência, em que buscamos textos pro-
duzidos em âmbito internacional e local relacionados à formação
continuada. Como, as portarias, as Leis e o documento orientador,
bem como, todo material produzido especificamente para criação do
PNAIC.
Para maior compreensão recorremos também ao contexto da
prática, cuja imersão no processo formativo via PNAIC, neste con-
texto, foi possível vivenciar a sua recontextualização no município
de Humaitá-AM e na prática das professoras alfabetizadoras (MAI-
NARDES, 2006).
O procedimento de coleta de dados, foi a entrevista semies-
truturada, realizada com a Coordenadora Local e com cinco (5) For-
madoras Locais, que para preservar o sigilo das envolvidas, os nomes
foram alterados. Onde utilizamos a letra inicial dos cargos exercido
juntamente com um numeral, vale ressaltar, que não foi o caso da
coordenadora local, visto que, só havia uma pessoa exercendo este
cargo. A partir disso, os codinomes ficaram da seguinte maneira: CL
(Coordenadora Local), PA-1; PA-2; PA-3; PA-4 e PA-5 (Professoras
Alfabetizadoras.
- 124 -
Então, a política educacional, segundo Akkari (2011, p. 12),
configura-se em um “conjunto de decisões tomadas antecipadamen-
te, para indicar as expectativas e orientações da sociedade em rela-
ção à escola, a qual visa assegurar a adequação entre as necessidades
sociais de Educação”. Nesse contexto, as políticas educacionais são
produzidas nas ações governamentais, mas nem sempre as deman-
das são reconhecidas e validadas nos textos oficiais, que exprimem
o compromisso efetivo com a qualidade da educação e da formação
docente.
Percebemos que, embora as políticas de formação continuada
para os professores perpassem por impasses para o seu desenvolvi-
mento, ela vem ganhando espaço significativo, considerando os de-
safios, as mudanças e as realidades vivenciadas nas escolas. O que
implica que os professores necessitam estar em constante processo
de formação, conforme destacam Gatti, Barreto e André (2011, p.
25).
Cada vez mais, os professores trabalham em uma situação em que
a distância entre a idealização da profissão e a realidade de trabalho
tende a aumentar, em razão da complexidade e da multiplicidade
de tarefas que são chamados a cumprir nas escolas. A nova situação
solicita, cada vez mais, que esse (a) profissional esteja preparado (a)
para exercer uma prática contextualizada, atenta às especificidades
do momento, à cultura local, ao alunado diverso em sua trajetória
de vida e expectativas escolares.
- 125 -
Vários programas de capacitação de professores para o ensino de
ciências, matemática, língua portuguesa foram implementados no
país por setores de governo ou por grupos de professores universitá-
rios especialistas envolvidos com questões de ensino. Alguns desses
programas duraram mais de uma década, com repercussões pon-
tuais na melhoria do trabalho nas escolas. Verificou-se nesse tempo
que alguns projetos interessantes muitas vezes estavam acima da
capacidade de apropriação pelos alunos professores, exigindo dos
docentes formadores um investimento muito maior em termos de
diagnóstico, planejamento e desenvolvimento que os orçamentos,
os tempos previstos e a disponibilidade permitiam.
- 126 -
e Distrito Federal na alfabetização e no letramento dos estudantes até
o final do 3º ano do ensino fundamental, em escolas rurais e urba-
nas (BRASIL, 2012, grifos nossos). Observam-se responsabilidades
que devem ser efetivadas por meio de ações prevista pelo Pacto em
parceria com outras instituições, de modo a alfabetizar as crianças
na idade considerada ideal, até oito anos, nas comunidades rurais e
urbanas.
Para que possamos entender a dimensão e finalidade do pro-
grama é necessário conhecermos os seus objetivos, os quais definem
os caminhos para alcançar a alfabetização dos estudantes. Está deter-
minado na Portaria acima citada, especificamente no art. 5º (BRA-
SIL, 2012) que o Pacto tem como objetivos:
I - garantir que todos os estudantes dos sistemas públicos de ensino
estejam alfabetizados, em Língua Portuguesa e em Matemática, até
o final do 3º ano do ensino fundamental;
II - reduzir a distorção idade-série na Educação Básica;
III - melhorar o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
(IDEB);
IV - contribuir para o aperfeiçoamento da formação dos professores
alfabetizadores;
V - construir propostas para a definição dos direitos de aprendi-
zagem e desenvolvimento das crianças nos três primeiros anos do
ensino fundamental (BRASIL, 2012).
- 127 -
no tempo considerado ideal, sendo trabalhada no percurso conside-
rado para a alfabetização na idade certa, buscando assim, a melho-
ria na aprendizagem em Matemática e Língua Portuguesa no En-
sino Fundamental. Diante desse cenário, encontrou-se necessidade
também estabelecer ligação com a Educação Infantil, com intuito
de reforçar o trabalho da escrita e leitura, respeitando o tempo de
aprendizagem de cada criança (BRASIL, 2017).
Todavia, torna-se necessário visionar que somente a formação
continuada posta como essencialidade ao que se refere a melhoria
da prática alfabetizadora não é o suficiente para promover a alfa-
betização das crianças, afinal para uma aprendizagem satisfatória se
necessita de um conjunto de elementos como, materiais, acompa-
nhamento escolar e infraestrutura adequada e tantos outros. Sendo
estes fatores cooperativos (ou não) com o processo de aprendizagem,
conforme é abordado no Documento Orientador (BRASIL, 2017, p.
7):
O fortalecimento da governança, por meio das estruturas estaduais,
regionais e locais de formação e gestão, direcionadas pelo Comitê
Gestor Estadual para a Alfabetização e o Letramento, com estru-
tura paritária de decisão entre Undime e Estado, busca incentivar
o diálogo e a colaboração entre os entes públicos e garantir que as
atividades formativas cheguem à sala de aula, respeitando as neces-
sidades dos alunos de toda a rede de ensino.
- 128 -
[...] estratégias de acompanhamento especial, com atendimentos
personalizados de recuperação e aceleração de estudos. As institui-
ções formadoras poderão mobilizar profissionais para dar respostas
concretas a desafios enfrentados pelos professores, tais como espe-
cialistas em fonoaudiologia, literatura infantil, iniciação científica,
psicologia, teatro, dança, educação física e outros que contribuam
para aprofundar e consolidar a alfabetização, em uma perspectiva
interdisciplinar que traduza a complexidade e a intencionalidade
pedagógica desse processo (BRASIL, 2017, p. 14).
- 129 -
zadores, em busca da concretização do direito de aprendizagem das
crianças e a melhorar o índice de alfabetização.
A formação continuada via PNAIC pauta-se nos princípios
estabelecidos na Resolução nº. 02/2015, art. 16 do Conselho Nacio-
nal de Educação (CNE):
I. os sistemas e as redes de ensino, o projeto pedagógico das institui-
ções de educação básica, bem como os problemas e os desafios da
escola e do contexto onde ela está inserida;
II. a necessidade de acompanhar a inovação e o desenvolvimento
associados ao conhecimento, à ciência e à tecnologia;
III. o respeito ao protagonismo do professor e a um espaço-tempo
que lhe permita refletir criticamente e aperfeiçoar sua prática;
IV. o diálogo e a parceria com atores e instituições competentes, ca-
pazes de contribuir para alavancar novos patamares de qualidade ao
complexo trabalho de gestão da sala de aula e da instituição educa-
tiva (BRASIL, 2015, p. 15).
- 130 -
apesar de ser relevante, também não oferece o suporte necessário
para esta função, ferindo o disposto na Portaria nº 1.458, de 14 de
dezembro de 2012, que explicita os critérios de seleção dos coorde-
nadores. Para exercer essa função o profissional deve possuir forma-
ção em Pedagogia, estar atuando na sala de aula e ter especialização
(inclusive stricto sensu), em áreas afins.
Nesse processo de escolha, infelizmente, nem sempre é consi-
derado o disposto nos documentos oficiais, porque os critérios polí-
ticos clientelistas são tomados como base, ou seja, muitas atividades
da secretaria que exigem a função de especialistas em educação são
ocupadas por pessoas que pertencem ao ciclo político partidário do
chefe do executivo, neste caso do prefeito. Inclusive, algo que nos
chamou à atenção é o fato de profissionais concursados para a vaga
de professor estar exercendo a função de pedagogo e outros celetistas
ocupando essas funções de docente, o que fica evidente na seleção
das FL’s, em que apenas uma professora atende todos os critérios.
Em busca de compreendermos como ocorreu o processo de
adesão em Humaitá, indagamos à Coordenadora Local, como ocor-
reu tal procedimento. Segundo ela,
- 131 -
inserção das formadoras, professores no sistema, foi o período de or-
ganização e preparação para realização da formação no final do ano.
- 132 -
que não houvesse transferência, pois, a data fixada deveria atender
a todos, sendo escolhida com base na disponibilidade de todos os
envolvidos. No entanto, já com os professores e coordenadores foi
necessário a transferência de data, devido a alguns entraves, como a
falta de local para realização à formação.
Esta situação causou alguns transtornos, principalmente, para
os professores da zona rural, devido à logística destes profissionais,
visto que algumas comunidades são distantes e de difícil comunica-
ção, fato já mencionado durante o período de observação dos módu-
los de formação. Os profissionais que atuam no campo realizam sua
locomoção via embarcações, uma vez que as escolas se localizam em
comunidades ribeirinhas, e também por ônibus, para aquelas escolas
localizadas nas BR’s. A depender da localidade, o percurso de viagem
pode demorar de um (01) até cinco (05) dias, se for pelo rio, deve-se
considerar a época de cheia e de seca. Com relação às BR’s são horas
de viagem, precisando considerar se o dia está ensolarado ou chuvoso, pois
algumas não possuem asfaltamento, dificultando ainda mais o percurso dos
professores.
Diante do exposto, indagamos da CL se houve aceitação da
proposta do PNAIC por parte da administração e dos envolvidos, a
mesma relatou que sim, acrescentando que:
CL: Por parte do prefeito e da secretária tivemos total apoio, na
questão de nos fornece tudo aquilo que nós precisávamos. Como
material didático pedagógico porque para a realização das forma-
ções era preciso comprar material. Eu fazia a lista do que a gente
ia precisar, levava para secretária e ela sempre articulando com o
prefeito para comprar todos os materiais necessários. Já por parte
dos professores, eu acredito assim como alguns relataram durante a
formação, devido ao corte de bolsa houve alguns que não quiseram
participar. A maioria que participaram da formação foram os pro-
fessores na Zona Rural.
- 133 -
O investimento para com a educação seja no âmbito escolar
ou formação continuada de professores são mínimos, como pude-
mos perceber. Os professores são desvalorizados, não apenas no
salário, mas nos cursos, pois não são fornecidos os recursos e ma-
teriais necessários para o desenvolvimento de uma formação com
qualidade. O professor não faz “milagre”, por isso, o investimento
financeiro precisa acontecer de fato, não apenas em pequenas “miga-
lhas”, porque todos tendem a ganhar com a realização de um curso
de formação.
Diante do exposto pela CL, ocorreram diversos entraves que
foram desde a adesão e participação até o cumprimento do progra-
ma. É necessária organização e preparação por parte da Coordena-
ção, pois, quando o município adere a um programa, assume um
compromisso como ente responsável. Por isso, é preciso de uma
equipe engajada, comprometida e que, acima de tudo, acredite no
benefício deste programa para o desenvolvimento da educação no
município.
Diante do exposto pela CL, ocorreram diversos entraves que
foram desde a adesão e participação até o cumprimento do progra-
ma. É necessária organização e preparação por parte da Coordena-
ção, pois, quando o município adere a um programa, assume um
compromisso como ente responsável. Por isso, é preciso de uma
equipe engajada, comprometida e que, acima de tudo, acredite no
benefício deste programa para o desenvolvimento da educação no
município.
Desta forma, foi necessário estabelecer uma coordenação para
o PNAIC, no município de Humaitá, sendo questionado à Coorde-
nadora e às Formadoras Locais como ocorreu o processo de seleção
para tal cargo, o que resultou nas seguintes respostas.
Cl: Bom, o processo é o seguinte: é enviado para o Secretário de
Educação que ele indique alguém de sua confiança e que seja ca-
pacitada para função de Coordenador Local do PNAIC, a Senhora
Secretária me chamou e conversou comigo, perguntou se eu tinha
algum impedimento, se tinha como eu assumir esse cargo de Coor-
denador Local, aí eu plenamente aceitei, aceitei e aí já me inserir no
sistema, como ela já passou automaticamente meu nome pra lá com
os números dos meus documentos, aí eles já liberaram a página do
SIMEC para que eu começasse a inserir os professores e logo em
seguida também fazer a seleção dos formadores locais.
- 134 -
FL - 1: A seleção dos formadores foi feita assim, o professor tinha
que ter a disponibilidade e o compromisso para participar da forma-
ção do PNAIC, retendo seu tempo seu tempo apenas para formação
e como estou trabalhando no setor administrativo da Secretária de
Educação, fico com tempo livre para a preparação da formação, di-
ferente dos professores que estão atuando dentro da sala de aula.
FL - 2: A secretaria de Educação nas suas atribuições me fez o
convite. Foi uma surpresa para mim, no primeiro momento fiquei
apreensiva, mas foi de grande importância e relevância, uma expe-
riência que levarei para vida toda.
Nas falas das professoras fica evidente que a escolha para tal
cargo foi realizada através de indicação. Este é um problema que
recaí não somente para quem aplica a formação, mas para que as
recebe, pois, esta escolha deveria ser realizada conforme descrita
na proposta do próprio programa. Assim, para que se obtenha uma
formação de qualidade social, sólida e eficaz, é preciso de pessoas
“preparadas” para exercer tal cargo.
A forma de como o ocorreu a seleção dos Formadores difere
do que se estabeleca no art. 24 da Portaria nº. 826/2017, em que os
mesmos deveriam ser escolhidos pela Coordenadora Local de acor-
do os seguintes requisitos:
I – ser professor da rede pública de ensino que promove a seleção;
II – ter participado de programas de formação continuada de pro-
fessores nos últimos 3 anos ou ser coordenador pedagógico, profes-
sor da pré-escola ou ciclo de alfabetização com resultados reconhe-
cidos na escola e na rede de ensino onde atua; e
III – ter disponibilidade para dedicar-se ao curso e à multiplicação
junto aos coordenadores pedagógicos, professores e articuladores
da escola do PNME.
- 135 -
As profissionais indicadas para o cargo de Formadora Local
não cumprem os requisitos estabelecidos pela portaria, já mencio-
nada. Embora, as FL-1, FL-2, FL-3 possuam disponibilidade de tem-
po, nunca atuaram no contexto de sala de aula e também não par-
ticiparam do curso de formação em edições anteriores, ou seja, não
possuem experiência enquanto professora, não conhecem a rotina e
nem a vivência escolar, além de não saberem como se desenvolve um
programa de formação continuada.
Estas são experiências essenciais para exercer o cargo de For-
madora, pois permite ao profissional a segurança/propriedade ao ex-
por os conteúdos e ao realizar comentários com bases nas vivências.
Isto talvez justifique um dos motivos de muitos professores que não
reconhecem a autoridade de algumas Formadoras para ocupar esta
função no PNAIC.
Soma-se a estas questões, a necessidade de as Formadoras
compreenderem melhor os anseios dos professores e pedagogos,
visto que os profissionais ao exporem o seu ponto vista acerca das
dificuldades em trabalhar de forma lúdica ou interdisciplinar, a for-
madora além de possuir argumentos teóricos para concordar ou
contrapor tal anseio, também terá base em suas vivências, seja na
sala de aula ou no desenvolvimento de projetos, ou oficinas, ou ex-
periências de outros encontros de formação continuada.
Assim, no município de Humaitá a realidade vem mostrando
que ainda prevalece no processo de seleção de algumas pessoas para
determinados cargos é a indicação, que não permeia apenas o setor
da Educação, mas de outros também. Esclarecemos que este não é
uma prerrogativa desta cidade, mas uma tradição política que vem
se desenvolvendo em vários setores em nosso país.
Por ser município pequeno, as famílias tradicionais ainda to-
mam espaço nesses setores e quando há um evento de grande porte,
geralmente, são chamadas pessoas com algum grau de parentesco ou
que executam algo tipo de trabalho no setor responsável pela efeti-
vação. Na maioria das vezes, são sempre as mesmas pessoas que rea-
lizam eventos distintos e vale ressaltar que o município possui uma
grande parcela de professores preparados, com cursos de mestrado
e especialização lato sensu para exercer tais cargos, porém são des-
considerados porque a administração já tem “os que vão preencher
a vaga”.
- 136 -
4. Considerações finais
- 137 -
do seu trabalho docente, com suportes didático-pedagógicos para al-
cançar a alfabetização e o letramento matemático. Entendemos com
Freire (1996), que a formação deve ser um processo permanente,
em que o momento mais importante seja o da reflexão crítica sobre
a própria prática, possibilitando o professor a análise crítica da sua
docência, bem como, a compreensão dos interesses políticos e ideo-
lógicos que são legitimados na produção de políticas de formação
continuada dos professores.
Aspecto que também é reforçado por Imbernón (2009), ao es-
clarecer que a formação permanente tem como base a reflexão dos
sujeitos sobre sua prática docente, de modo a permitir que exami-
nem suas teorias implícitas, seus esquemas de funcionamento e suas
atitudes na sua trajetória de vida e formação.
5. Referências
- 138 -
GATTI, Bernardete Angelina; BARRETO, Elba Siqueira de Sá; AN-
DRÉ, Marli Elizia Dalmazo de Afonso. Políticas docentes no Brasil:
um estado da arte. Brasília: UNESCO, 2011.
IMBERNÓN, Francisco. Formação docente e profissional: forma-se
para a mudança e a incerteza. 7 ed. São Paulo, Cortez, 2009.
MAINARDES, Jefferson. Abordagem do ciclo de políticas: uma con-
tribuição para análise de políticas educacionais. Educ. Soc., v. 27
n.94, p. 47-69. Campinas, 2006.
MOUFFE, Chantal. Democracia, cidadania e a questão do pluralis-
mo. Política & Sociedade: Revista de Sociologia Política. v. 2. n. 3, p.
11-26, outubro de 2003.
- 139 -
- 140 -
CIDADANIA E ÉTICA: FUNDAMENTOS PARA
UMA REFLEXÃO NO ENSINO MÉDIO TÉCNICO
Rodrigo Monteiro
Valmir Flores Pinto Rodrigo
1. Introdução
- 141 -
a abordagem da ética nas salas de aula em atenção aos Parâmetros
Curriculares Nacionais? Essa indagação faz-se imprescindível, prin-
cipalmente quando se consideram as peculiaridades de uma forma-
ção técnica que pressupõe a inserção do aluno na condição de cida-
dão.
Tem-se que o Ensino Médio Técnico, especialmente no que
concerne aos Institutos Federais possui uma proposta de preparar
os jovens estudantes para o mercado de trabalho, no entanto, é im-
portante que a reflexão ética seja estimulada com relação às práticas
e limites de atuação do estudante, o qual caminha para a condição
de cidadão emancipado, com isso, deve ser conhecedor de seu papel
social. Para tanto, é determinante a atuação da filosofia que possibi-
lita reflexões sobre as próprias atitudes profissionais, favorecendo a
abordagem da dimensão ética (ROTOLO, 2016).
A pesquisa proporcionou uma observação acerca do aprendi-
zado quanto aos preceitos éticos no intuito de verificar sobre a neces-
sidade de estimular os estudantes ao pensamento crítico quanto ao
tema, importando ao necessário reconhecimento do imprescindível
contato com os conceitos e fundamentação relativos à ética.
O próprio programa pressupõe como foco direto o ensino, por
isso foi possível identificar nos docentes, pedagogos e demais servi-
dores diretamente vinculados ao Ensino no IFAM/campus Humaitá,
os resultados práticos que eles podiam observar por intermédio dos
estudantes quanto ao estímulo da discussão relativa aos elementos
de ética com sua relação à condição de formação de cidadão.
- 142 -
Assim mesmo, lembramo-nos dos ensinamentos em que Rousseau
convida-nos a enxergar o Contrato Social, de forma que cada um
põe em comum sua pessoa e toda a sua autoridade, sob o supre-
mo comando da vontade geral, e recebe em conjunto cada membro
como parte indivisível do todo. A escola, assim como a família é uma
sociedade e por isso um local de convívio, para tanto se deve apreço
às regras vigentes. (BRASIL, 2000).
O filósofo Brito (2005) descreve a necessidade dos homens
em definirem suas leis, conforme às necessidades e peculiaridades
de suas respectivas culturas, mas resta clara em sua definição a ne-
cessidade do direito e das leis sociais, as quais devem caminhar ao
lado da significação moral. Sob esse prisma o estudo pode ser orien-
tado quanto à relação professor e aluno, com possibilidade de inferir
que na formação do caráter há sede de conceitos, de exemplos, de
envolvimento e comprometimento com a excelência na formação do
estudante.
A ética na educação, segundo apontamentos de Arroyo (2007),
identifica a existência de farta teorização no pensamento educacio-
nal no que diz respeito ao conhecimento e sobre os processos de en-
sinar-aprender, entretanto, demonstra escassez de reflexão sobre sua
própria etimologia, necessariamente sobre ética. O autor trata em
tom preocupante a carência do estímulo da utilização do senso críti-
co no que diz respeito à ética.
As escolas se defrontam no dia-a-dia com a presença cons-
tante de um conjunto de dimensões que fazem parte do campo da
formação do sujeito ético, quando relaciona a ordem, a disciplina,
as normas, a justiça, o bem, os sentimentos, os afetos, a liberdade, o
fazer escolhas, a responsabilidade, o trabalho, a assiduidade, o com-
panheirismo, a amizade, o cuidado, a sociabilidade, os valores, a ver-
dade, as condutas, a felicidade, a culpabilidade, o castigo, a reprova-
ção-aprovação, a consciência, os direitos e deveres como dimensões
que fazem parte da reflexão ética no ambiente estudantil. (ARROYO,
2007).
Embora haja diferenciação entre os conceitos de ética e mo-
ral, ambos fazem menção ao conjunto de princípios ou padrões de
conduta que regulam as relações humanas no âmbito de seu habitat.
A educação deve ser fundamentada nesses princípios, pois auxilia
na análise crítica da realidade cotidiana e das normas sócio morais
vigentes, de modo que contribua para idealizar formas mais justas e
adequadas de convivência (ARAÚJO, 2007).
- 143 -
Johann (2009) na apresentação da obra Ética e Cidadania rea-
liza considerações acerca de ética e educação:
Educação e Ética analisa e fundamenta a possibilidade de se redu-
zir as contradições em que se movimentam os seres humanos em
todo o mundo. A Educação não será o único caminho de solução
dos problemas atuais. Porém, o espaço educativo se constitui em
um espaço de excelência para que a semente de uma nova realidade
seja plantada e possa germinar. Impõe-se, assim, aos profissionais
da educação a tarefa histórica de se aperceberem da ambiguidade de
suas práticas e assumirem o seu papel transformador. Somente um
compromisso ético verdadeiramente assumido fará com que a es-
cola cumpra o seu papel na construção da esperança de um mundo
melhor para toda a humanidade. (JOHANN, 2009, p. 9).
- 144 -
de um objeto qualquer, a disponibilidade ou posse de uma técnica
semelhante, conforme enuncia Abbagnano (2007). Ao fazer um pa-
râmetro do ensino com a ética o desdobramento filosófico a retrata
como ciência da conduta, que deduz tanto o fim quanto os meios da
natureza do homem, traduz o conhecimento como fruto de motivos
ou causas da conduta e da força que a determina (ABBAGNANO,
2007),
A ética é imprescindível à sociedade, pois motiva o compor-
tamento razoável em meio à coletividade, é um conceito que tem a
obrigatoriedade de buscar de maneira objetiva e racional consolidar
a sua sistematização teórica, seus métodos e suas mínimas compro-
vações.
É cediço que os contextos vinculados ao comportamento éti-
co devem ser apresentados, em primeiro plano, em sentido teórico
no âmbito da educação, pois, tem por finalidade aguçar a discussão
do assunto, principalmente no que concerne ao conceito filosófico,
entretanto, a prática pressupõe que, principalmente o docente se
constitua como um exemplo. Torna-se imperioso, não só evidenciar
um conjunto de normas que regulam o comportamento da socie-
dade, mas aplicá-las, e isso depende, necessariamente, da educação.
As normas de conduta visam fundamentar o entender filosófico de
ética.
Por um lado é necessário o reconhecimento do professor de
que a evolução, especialmente tecnológica, emerge consideravel-
mente a ponto de quase impossibilitar acompanhá-la em todos os
termos. Mas, é evidente que deve haver constante aperfeiçoamento
do docente para tornar possível o implemento das mudanças neces-
sárias à melhoria do processo ensino-aprendizagem, e isso pressupõe
um reconhecimento ético. Carvalho e Ribas (2003) destacam que a
sala de aula é lugar de debater sobre a evolução do mundo e não uma
mera apresentação do conteúdo sistematizado do saber.
Ligado ao entendimento da compreensão, entendemos como
condição imprescindível elucidar acerca da necessidade em conside-
rar o protagonismo do estudante no processo ensino-aprendizagem.
Deve-se dar apreço ao meio social em que vive e as suas diferenças
culturais, assim será possibilitada a construção de conhecimentos. O
professor tem a tarefa de estimular a reflexão, pois a participação dos
estudantes no processo ensino-aprendizagem estimula a interação,
- 145 -
fortalece o ensino, e o torna mais efetivo. E essa interação possui
enfoques diferentes, como aluno – aluno e aluno – professor, quando
devem extrair os pontos factíveis, o que permite uma comparação de
valores, o favorecimento da ética de colaboração, e principalmente, o
incremento da aprendizagem, inteligência, capacidade de argumen-
tação e de análise (IMBERNÓN, 2012).
Ao longo da história do ensino, notadamente o universitário,
foi difundido o sistema baseado no pensamento newtoniano-carte-
siano, onde para conhecer o todo era necessário fragmentá-lo em
seus componentes e estudar cada um deles separadamente, entretan-
to, os avanços tecnológicos induzem a um repensar do modelo de
educação (BEHRENS, 2011). Imbernón (2012) relaciona as benesses
do modelo de construção do conhecimento quando conclui:
[...] Refletir é aprender a pensar, analisar, comparar, sintetizar, a ti-
rar conclusões, a tomar decisões, enfim, o pensamento reflexivo é
toda uma série de capacidades. [...] Essa troca de ideias através do
diálogo e da cooperação leva o sujeito a mergulhar em processos
de reflexão e de construção de seu próprio conhecimento. [...] (IM-
BERNÓN, 2012, p. 90-91).
Ser professor requer não mais uma formação pontual, técnica, ra-
cional, mas uma formação de deve acontecer ao longo da vida pro-
fissional; isso significa dizer que a formação inicial, de nível médio
e/ou superior, já não responde às necessidades econômicas, políti-
cas e sociais e passa a ser vista como apenas um dos momentos do
processo formativo do educador. O tempo limitado e pontual de
formação, 3 ou 4 anos, já não permite contemplar as demandas de
uma sociedade em constante mudança. (MARZARI, 2016, p. 66)
- 146 -
Saviani (2000), por sua vez, entende que dentre os valores afe-
tos à formação do homem a ética é parte de uma trilogia junto aos
conceitos de educação e cidadania. Compreende-se ética e cidadania
como sustentáculos à educação, e esta é entendida como conceito
central desta trilogia. Dar-se-á a plenitude do homem quando ele se
apropria da cultura, da sua produção humana historicamente acu-
mulada, isso vem por intermédio da educação.
Ética e justiça na escola devem sempre se fundamentar em
valores de igualdade e equidade. O tema Ética está presente nas rela-
ções dos agentes participantes do ambiente escolar, como os alunos,
pais, professores e demais funcionários. Ocorre que, o tema também
está inserido em algumas disciplinas componentes da matriz curri-
cular, como filosofia, sociologia e nos casos dos cursos técnicos nas
respectivas disciplinas de ética profissional.
É imponderável que, o conhecimento não é único, nem inerte
a valores de todo tipo constante nas demais disciplinas componentes
do currículo. Daí a necessidade de tratar a ética como tema transver-
sal. Em suma, a reflexão sobre as diversas faces das condutas huma-
nas deve fazer parte dos objetivos maiores da escola comprometida
com a formação para a cidadania. (BRASIL, 1997):
Partindo dessa perspectiva, o tema Ética traz a proposta de que a
escola realize um trabalho que possibilite o desenvolvimento da
autonomia moral, condição para a reflexão ética. Para isso foram
eleitos como eixos do trabalho quatro blocos de conteúdo: Respeito
Mútuo, Justiça, Diálogo e Solidariedade, valores referenciados no
princípio da dignidade do ser humano, um dos fundamentos da
Constituição brasileira. (BRASIL, 1997, p. 26).
- 147 -
II - a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando,
para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com
flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento
posteriores;
III - o aprimoramento do educando como pessoa humana, in-
cluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia inte-
lectual e do pensamento crítico;
IV - a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos
processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensi-
no de cada disciplina. (BRASIL, 1996, grifo nosso).
- 148 -
uma classe que julga importante. Um grupo trabalha a questão de
que a gente tem que ser mais prático e trabalhar disciplinas ditas
práticas e úteis e descartar disciplinas que sejam de formação da
cidadania e aí temos um exemplo claro de escola sem partido que
certa forma vai trabalhando nessa linha, juntamente com outros
grupos sociais que dizem que as disciplinas humanas como filosofia
e sociologia e alguns até história, colocam elas em segundo plano e
que acham mais importante trabalhar disciplinas mais práticas que
seriam úteis de alguma forma na vida profissional [...] A impor-
tância? Bom! Eu acredito que seja fundamental você trabalhar, por
mais que todo mundo que vem já pra escola já tem uma formação
de valores e princípios que já vem da família [...] Eles já vêm como
uma base que digamos que podemos chamar de ética, de como de-
vemos nos comportar na sociedade. E aí, no Ensino Médio a gente
trabalha algumas fundamentações teóricas que podem ajuda-los a
encarar melhor o seu dia a dia e tentar conjugar, pois você pode ser
um excelente profissional, mas nem por isso você precisa ser uma
pessoa chula, baixa, né? (Professor de filosofia)
- 149 -
deixam em aberto quanto à necessidade de se estimular a discussão
acerca do assunto, haja vista compreenderem que ainda é mínimo
o espaço para discussão deste tema na escola. Outros entrevistados
também abordam o seguinte:
Acho importante, uma vez que os nossos discentes do curso técni-
co já sairão diretamente para o mercado de trabalho e por serem
profissionais inseridos no mercado de trabalho deverão utilizar-se
da ética no seu local de trabalho, bem como seu convívio junto aos
seus colegas de trabalho, bem como seus demais colegas na vida
cotidiana, uma vez que a ética está presente em tudo. (Professor de
matemática)
Bem, eu penso que é um tema bem relevante, mediante as circuns-
tâncias que a gente está vivenciando atualmente, é um tema bastante
pertinente a ser trabalhado para tentar resgatar e até contribuir para
a formação integral do ser humano que ela está a desejar, estamos
aí num processo de formação de pessoas que já estão atuando nos
sistemas e que estão demonstrando que têm formação intelectual,
mas a formação humana, a formação social está aquém desse nível
intelectual que nós estamos hoje, penso que em virtude até dessa
ausência desse trabalho da questão ética, penso que é muito perti-
nente. E assim, a gente trabalhar com os alunos, eu penso assim que
a educação tem a importância de trabalhar essa questão ética, que
acho muito relevante. (Professor de pedagogia)
- 150 -
Podemos perceber na fala do docente que a ausência da abor-
dagem do tema ética pode ocasionar prejuízo à própria formação
humana. Reforça-se o papel do homem na história, quando enaltece
que há uma construção de modos, formas de viver que se baseia em
conceitos, valores, costumes, que possuem um fim em si mesmos, os
homens são seres em constante transformação histórica.
É nítida a relevância da abordagem técnica para estimular o
desenvolvimento da competência e habilidade dos alunos nos cursos
técnicos profissionais, entretanto, há de ser reconhecida a importância
do enfoque relativo ao incentivo quanto à aplicação de princípios e
práticas que estimulem o resgate de bons valores humanitários, pois,
o contexto atual exige sobremaneira essa reflexão.
Outros dois questionamentos voltados aos aspectos relacio-
nados à ética e cidadania também foram abordados em outras duas
perguntas, as quais mantém relação, e por conta disso foram anali-
sadas em conjunto, vejamos: “Qual a importância da ética na matriz
curricular?”; e “Existem elementos de ética no material didático do
IFAM?” Foi realizada uma análise mista quanto a essas duas pergun-
tas, sob os discursos de alguns dos respondentes, conforme dados
abaixo:
Olha, a questão da matriz curricular, aonde eu presenciei no cur-
so de administração, o que acontece, nós temos essa disciplina no
primeiro ano do curso de ADM, aqui no IFAM campus Humaitá.
A ética em si eu defendo da seguinte maneira, não somente a ética,
mas outras disciplinas são importantes, então no momento que eu
falo ou que defendo a saída da ética como disciplina eu posso estar
falando de maneira equivocada, porque eu acredito que a disciplina
direito é para estar inserida na educação desde a 5ª série só que não
é bom para a sociedade ser informada, ser atualizada, saber seus
direitos e isso serve como forma de controle. Então eu falo assim,
vou falar agora nesse contexto que falei, eu acho que hoje na nossa
grade curricular no campus Humaitá eu não concordo que a disci-
plina ética associada com relações interpessoais ela seja inserida no
primeiro ano do curso, ela poderia estar dentro de uma disciplina
fragmentada para você ressuscitar os princípios éticos da sociedade,
porque nós trabalhamos no curso técnico de administração e existe
dentre o perfil do técnico alguns requisitos e a ética não poderia
entrar, na minha concepção, como disciplina. (Professor de ética e
relações interpessoais)
É, na minha disciplina o material didático contempla um capítulo
lá sobre ética, na ética profissional eu também já vi o material que
ele segue, então tem um aparato didático que ajuda a trabalhar
obviamente, mas acredito que falta algumas coisas também, pois
- 151 -
você vai trabalhar sobre indígenas, negros e tal e você olha o livro
e não tem praticamente nada, no meu livro didático não tem nada
sobre indígena e negro e obviamente é uma questão ética nossa
trabalhar isso, pois é uma minoria discriminada que a gente acabou
pisando e que de certa forma continua pisando ainda dentro do
Estado brasileiro, pois, ainda continua cometendo injustiças com
esses grupos minoritários e não contempla indígenas, negros e
a questão dos grupos sexuais, pelo menos no meu material não
contempla que são obviamente conteúdos transversais o que é uma
questão de ética tratar. (Professor de filosofia)
[...] Seria muito relevante, pois seria um complemento a mais para
o currículo do aluno, uma vez que esse conceito de ética, a mim
parece subjetivo, não sei se estou certo, seria uma disciplina a mais,
discutir as questões éticas dentro da educação, do nosso dia a dia, do
nosso fazer pedagógico. [...] Existem bastante critérios, por exem-
plo, no núcleo onde trabalho, que desempenho o meu fazer peda-
gógico têm as questões éticas. [...] Dentro do material didático do
aluno existe e no meu fazer tem. Exemplo: eu trabalho com alunos
com deficiência, mas quando eu vou trabalhar com esses alunos,
falar desses alunos numa reunião, eu não posso citar o nome do
aluno, só cito o nome da turma e a deficiência que tem ali, não posso
citar o nome do aluno nem nos relatórios que encaminhamos para
Manaus, são várias questões éticas que temos que seguir, são rigoro-
sas. (Professor de língua portuguesa)
- 152 -
mente quando se refere às minorias, pois, segundo a opinião dele, os
materiais devem ser mais aprofundados, conquanto menciona acer-
ca da transversalidade do tema. Este docente, de certa forma, acabou
se abstendo quanto a considerar a importância do tema na matriz
curricular, mas implicitamente demonstrou que considera relevante,
haja vista que a disciplina que leciona já propõe a reflexão sobre o
assunto, além da forma transversal abordada pela legislação.
Já o professor de língua portuguesa deixou cristalina a sua
opinião favorável quanto a ética constar na matriz curricular e refor-
çou quanto à importância do tema, inclusive nas atividades pedagó-
gicas planejadas pelos docentes, quando também evidenciou que os
elementos de ética estão presentes nos materiais didáticos utilizados
pelo IFAM.
Pelas análises expostas, foi possível verificar que os colabora-
dores entrevistados consideram extremamente relevante a aborda-
gem da ética para a formação e/ou aperfeiçoamento da cidadania do
aluno, embora o tema possua complexa subjetividade, deve ser leva-
do em consideração na formação crítica do jovem, o qual deverá se
valer de comportamentos os quais guardem apreço aos bons valores,
ressaltando-se virtudes compatíveis com o perfeito convívio social,
sob o fundamento da própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDBEN):
Art. 35. O ensino médio, etapa final da educação básica, com dura-
ção mínima de três anos, terá como finalidades:
[...]
II - a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando,
para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com
flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento
posteriores;
III - o aprimoramento do educando como pessoa humana, in-
cluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia inte-
lectual e do pensamento crítico. (BRASIL, 1996, grifo nosso).
- 153 -
dizagem, que denota os atributos intelectuais, os quais conduzem o
aluno a trabalhar a si mesmo por intermédio dos conhecimentos ad-
quiridos em sala de aula.
4. Considerações finais
5. Referências
- 154 -
temáticos da ética e da democracia. In Lucia Helena Lodi. Ética e
cidadania: construindo valores na escola e na sociedade. Brasília:
Ministério da Educação, 2007.
ARROYO, Miguel G. Conhecimento, Ética, Educação, Pesquisa. v. 2,
n. 2. São Paulo: Revista E-Curriculum, 2007. Disponível em http://
www.pucsp.br/ecurriculum.
BEHRENS, Marilda Aparecida. O paradigma emergente e a prática
pedagógica. 5.ed. Petrópolis/RJ: Vozes, 2011.
BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dez. de 1996. Estabelece as diretrizes
e bases da educação nacional. Brasília, DF, 1996.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricu-
lar. Documento homologado pela Portaria n° 1.570, publicada no
D.O.U. de 21/12/2017, Seção 1, Pág. 146.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Se-
cretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e In-
clusão. Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica. Conselho
Nacional da Educação. Câmara Nacional de Educação Básica. Dire-
trizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica / Ministério
da Educação. Secretaria de Educação Básica. Diretoria de Currículos
e Educação Integral. Brasília: MEC, SEB, DICEI, 2013.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curricu-
lares nacionais: introdução aos parâmetros curriculares nacionais /
Secretaria de Educação Fundamental. – Brasília: MEC/SEF, 1997.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curricu-
lares nacionais: apresentação dos temas transversais, ética / Secreta-
ria de Educação Fundamental. – Brasília: MEC/SEF, 1997.
BRASIL. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros
curriculares nacionais: Ensino Médio. – Brasília, 2000.
BRASIL. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros
curriculares nacionais +: Ensino Médio: orientações educacionais
complementares. Linguagens, códigos e suas tecnologias – Brasília,
2007.
BRITO, Raimundo de Farias. A verdade como regra das ações: en-
saio de filosofia moral como introdução ao estudo do direito. Brasí-
lia: Senado Federal, Conselho Editorial, 2005.
- 155 -
Carvalho, M. A.; Ribas, M. H. O caráter emancipatório de uma práti-
ca pedagógica possível. In: Queluz & Alonso, M. (Org.). O Trabalho
Docente: Teoria & Prática. São Paulo, 2003.
IMBERNÓN, Francisco. Inovar o ensino e a aprendizagem na Uni-
versidade. Tradução Silvana Cobucci Leite. São Paulo: Cortez, 2012.
JOHANN, Jorge Renato. Educação e ética: em busca de uma aproxi-
mação. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2009.
LOPES, Alice Ribeiro Cassimiro. Bachelard: O filósofo da desilusão.
Ensino de Física. v. 13, n. 3. Rio de Janeiro, 1996. p. 248-273
MARZARI, Marilene. Ensino e Aprendizagem de Didática no Cur-
so de Pedagogia: Contribuições da teoria desenvolvimental de V. V.
Davydov. Jundiaí: Paco Editorial, 2016.
ROTOLO, Tatiana de Macedo Soares . Ética para cursos técnicos. 1.
ed. Brasília: Editora do IFB, 2016.
SAVIANI, Dermeval. Educação: do senso comum à consciência filo-
sófica. 13ª ed. São Paulo: Autores Associados, 2000.
- 156 -
A PERCEPÇÃO DOS PROFESSORES DE FILOSO-
FIA SOBRE SUA PRÁTICA DOCENTE NO ENSI-
NO TÉCNICO DO IFRO
Euliene da Silva Gonçalves
Carmen Tereza Velanga
Clarides Henrich de Barba
1. Introdução
- 157 -
tes de Filosofia na EPTM concomitante/subsequente do IFRO sobre
sua prática? Tendo presente a relevância da questão norteadora, o
objetivo geral da pesquisa é analisar as percepções dos docentes de
Filosofia na EPTM concomitante/subsequente do IFRO sobre sua
própria prática.
A partir das reflexões de Ramos (2008) entendemos as moda-
lidades de curso Técnico no qual se encontra a questão norteadora
e nisto a sua relevância social. Segundo a autora, os cursos técnicos
subsequentes devem ser para formação permanente dos trabalha-
dores. Os cursos concomitantes só possuem significado quando os
sistemas de ensino não têm condições de ofertar o Ensino Médio
integrado. Estas duas modalidades atendem a necessidade imediata
da população que precisa ter renda o mais rápido possível para so-
breviver.
Essas pessoas buscam a sobrevivência em uma sociedade que
possui como uma de suas características marcantes o capitalismo
tecnocrático, informacional. Esse possui como modelo a ciência, a
técnica, o utilitarismo e exclui problemas indispensáveis para a rea-
lização do ser humano. Dimensões relacionadas ao lúdico, à arte, ao
prazer nas relações humanas, a gratuidade, ao senso crítico, a felici-
dade, a mística, ao sentido da vida que são menosprezadas em detri-
mento do útil, imediato e eficiente. O atrofiamento dessas dimensões
pode levar o homem ao fracasso existencial, pois, não favorece a sua
realização de forma integral.
Os trabalhadores e seus filhos que buscam a EPTM concomi-
tante/subsequente possuem o direito de participarem de um proces-
so que não os reduzam à condição de objeto para alcançar o lucro,
cada vez maior. Devido à situação de vulnerabilidade econômica
elas, resgatando o princípio da dignidade humana, não podem ser
tratadas como meio, sempre como fim (KANT, 1980).
Ensinar Filosofia é um problema filosófico e atualmente no
Brasil há um mestrado profissional em Filosofia2 em rede nacional
voltado para esta problemática. Cientificamente o ensino de Filoso-
fia é enquadrado na Ciência da Educação em especial nas pesquisas
sobre didática e currículo.
Resumindo, no presente capítulo pressupomos o Brasil con-
temporâneo marcado pela sociedade tecnológica de economia ca-
2 Maiores informações sobre este mestrado ver http://www.humanas.ufpr.br/portal/
prof-filo/
- 158 -
pitalista. Identificamos a inexistência de literatura aprofundando o
problema do ensino da Filosofia na EPTM concomitante e subse-
quente. Objetivamos analisar as percepções dos docentes de Filo-
sofia na EPTM concomitante/subsequente do Instituo Federal de
Rondônia (IFRO) sobre sua prática. Para tal utilizamos o método
fenomenológico de abordagem qualitativa para apresentar alguns
resultados de campo por meio da coleta de dados via questionário
online e de grupo focal com os professores.
Para nossa reflexão, primeiro apresentamos uma seção de
caracterização metodológica, seguida da terceira seção nomeada de
a questão da finalidade do ensino de Filosofia; da quarta seção inti-
tulada a questão dos fatores que interferem no ensino de Filosofia; e
encerramos com nossas considerações finais.
2. Caracterização metodológica
A pesquisa tem como intencionalidade primordial analisar as
percepções dos docentes de Filosofia na EPTM concomitante/sub-
sequente do IFRO sobre sua própria prática. Ela busca sentidos de
vivências pessoais, portanto, visando a seriedade dos resultados em
harmonia com a condição humana, é caracterizada como qualitati-
va. A escolha por essa abordagem é uma exigência do objeto investi-
gado que necessita de coleta e análise de dados, de forma possibilitar
descrevê-lo o mais adequadamente possível.
O eixo teórico-metodológico da Fenomenologia transparece
como possibilidade ímpar de elucidar e compreender os complexos
processos de constituição da subjetividade, transcendendo precon-
ceitos e descrições fechadas. Para tanto “[...] parte da compreensão
de nosso viver – não de definições ou conceitos – da compreensão
que orienta a atenção para aquilo que se vai investigar. Percebermos
novas características do fenômeno [...] surge para nós uma nova in-
terpretação que levará a outra compreensão”. (MASINI, 2000, p. 63).
Sendo assim, há três etapas contínuas e dinâmicas para aplicar o
método fenomenológico: a primeira é ter consciência crítica da com-
preensão que já existe e suspender, temporariamente, para dar conti-
nuidade à pesquisa; a segunda é voltar as coisas mesmas descrevendo
reflexivamente suas manifestações; a terceira é essa outra compreen-
são a que se chega, fruto de uma nova interpretação do fenômeno.
- 159 -
Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa
da Universidade Federal de Rondônia, conforme o Protocolo da Re-
solução 196/96, registrado na Plataforma Brasil em 18 de dezembro
de 2018, sob o registro CAAE 02747318.8.0000.5300, e aprovado em
20 de dezembro de 2018.
Realizamos a etapa da pesquisa de campo no período de 16 de
abril de 2019 a 11 de julho de 2019. Realizamos grupo focal e ques-
tionário online com questões abertas e fechadas.
Inicialmente realizamos contatos informais, individuais com
todos os professores de Filosofia do IFRO, solicitamos que volun-
tariamente participassem da pesquisa via questionário online com
questões abertas e fechadas e/ou do grupo focal.
Dos 18 professores de Filosofia do IFRO em 2018 que atuaram
no ensino técnico concomitante e/ou subsequente 16 responderam o
questionário, sendo que um não respondeu aos contatos e o outro é
o pesquisador. Para realização do questionário utilizamos o software
de pesquisa e inquéritos online Survio no qual os 16 professores que
aceitaram respondê-lo tiveram acesso via link enviado por e-mail
institucional.
Dos 16 professores, convidamos, e aceitaram, 6 para parti-
cipar do grupo. O critério foi a identificação da maior quantidade
de docentes filósofos que estavam residindo em uma mesma cidade
e assim minimizar o ônus para a pesquisa e para os participantes.
O grupo focal foi realizado em duas reuniões de aproximadamente
quarenta e cinco minutos e três participantes cada. A primeira reu-
nião foi no dia 22 de maio de 2019 e a segunda reunião no dia 29 do
mesmo mês. Ambas as reuniões foram guiadas por um roteiro para
o grupo focal com os professores.
O grupo focal e o questionário online, com questões abertas
e fechadas, tiveram como finalidade norteadora identificar como os
docentes de Filosofia percebem sua prática pedagógica no ensino
técnico concomitante e subsequente no IFRO. Para o registro das
duas reuniões dos grupos focais foi utilizado gravação em áudio.
Para organizar os dados coletados foram seguidas as orien-
tações de Bardin (2002) acerca da Análise de Conteúdo. Didati-
camente, o processo de análise do conteúdo passa por três etapas:
pré-análise (organização do material), descrição analítica dos dados
(codificação, classificação, categorização), interpretação referencial
(tratamento e reflexão).
- 160 -
Desta forma identificamos o posicionamento do professor de
Filosofia da EPTM concomitante/subsequente do IFRO 2018 quanto
às finalidades do ensino de Filosofia e os fatores que facilitam e difi-
cultam sua prática pedagógica. O que possibilitaram emergir, após a
pré-análise, as categorias: concepção de ensino de Filosofia; e fatores
que interferem na prática docente.
Na análise das respostas das técnicas de questionário online e
grupo focal, substituímos os nomes dos professores pela letra grega
“φ” e “Φ”3 acompanhada de um número: de 1 a 16 no questionário.
Exemplo: φ1, φ2, φ3... A letra “Φ” quando for regra padrão da língua
portuguesa iniciar com letra maiúscula e a letra “φ” quando for re-
gra iniciar com letra minúscula; para identificar as contribuições dos
participantes do grupo focal retiramos o número e acrescentamos
após as letras gregas as seis primeiras letras do alfabeto português,
sendo: φA, φB, φC para os sujeitos participantes da primeira reunião
do grupo focal; e φD, φE, φF para os participantes da segunda reu-
nião. Dessa forma atendemos ao critério de na publicidade manter o
sigilo das identidades dos sujeitos voluntários.
Explicitamos nosso método de pesquisa e seguimos para a
finalidade do ensino de Filosofia, não a partir dos livros, mas das
percepções do próprio professor sobre sua prática.
3 “φ” e “Φ” são as letras “f ’ e “F” na língua portuguesa. Foram escolhidas, pois normal-
mente são adotadas como símbolos da Filosofia.
- 161 -
Quadro 01 - Objetivo do ensino de qualquer disciplina com viés
filosófico no ensino técnico concomitante e/ou subsequente
Objetivos
“Apresentação da teoria filosófica, relacioná-la a uma
Φ1. realidade e inseri-la na prática”
“Tornar o cidadão mais crítico e consciente de sua real
Φ2. situação no mundo atual”
“Desenvolver o potencial humano, a reflexão crítica e o
Φ3. compromisso com o desenvolvimento da potencialida-
de humana (social e moral).”
“A Filosofia deve buscar conhecer profundamente a
objetividade da técnica moderna, através da reflexão
crítica, e moderar a racionalidade calculista da vida,
Φ4. buscando compreender a técnica como algo que joga o
sujeito para fora de si, o conformando ao modelo eco-
nômico e, tentando resgatar a relação do sujeito con-
sigo mesmo, permitindo-lhe construir-se forma ética.”
“Acredito que formar um profissional ético deve ser o
foco principal, porém noções de cidadania e urbani-
Φ5. dade se dão ao entender o homem. Abordo muito em
minhas aulas temas que envolvam o sentido da vida, do
trabalho, do estudo.”
“colaborar com a capacidade de interpretar o que não
Φ6. está escrito e nas falas das “autoridades” para se posi-
cionar melhor na sua prática.”
“Criar consciência crítica no aluno e contribuir para a
Φ7. capacidade de análise;”
“Acredito que o objetivo das disciplinas que integram
a grade curricular do ensino técnico tem como base,
ou deveriam ter, uma formação integral do sujeito do
Φ8. processo de ensino-aprendizagem. Ou seja, uma for-
mação que possibilite não apenas o desenvolvimento
técnico, mas sim artístico-cultural, social, emocional,
intelectual e habilidade técnica.”
“Promover a reflexão crítica, associando-a ao mundo
Φ9. do trabalho.”
“Ensinar a pensar o mundo, a vida com/nas ações do
Φ10. trabalho e nas experiências cotidiana.”
“Ajudar o futuro profissional a ter consciência crítica e
Φ11. ética em sua atividade profissional”
- 162 -
“Estimular a análise crítica dos conteúdos abordados,
Φ12. as aplicabilidades prática e social, bem como seus im-
pactos nos indivíduos afetados.”
“Desenvolver uma atitude crítica e reflexiva frente à
Φ13. realidade.”
“Formar cidadãos com uma mentalidade crítica, capaz
Φ14. de conseguir entender a realidade que esta a sua volta e
saber se posicionar frente a elas”
“Deve ficar claro em seu objetivo que a técnica não é
um fim em si mesmo. A técnica deve ser assenhorada
Φ15. da reflexão que em seu fim conduza a felicidade hu-
mana.”
“auxiliar no pensamento crítico e ampliar os limites de
Φ16. reconhecimento dos saberes.”
Fonte: Coleta de dados 2019 segundo questionário online, O Ensino da Filosofia no Curso
Técnico do IFRO.
- 163 -
Essa postura é que pode tirar do automático os estudantes que estão
numa situação acrítica com sua realidade imediata.
Repare que os φ1, φ2, φ4, φ5,φ6, φ9, φ10, φ11, φ12, φ13 e φ14
enfatizam diretamente a necessidade de vincular a crítica à realidade
social, trabalhista, cotidiana ou de vida interior do estudante. Essa
necessidade aparece indiretamente no discurso: do φ15, pois, para
refletir em relação à felicidade humana é problematizar o mundo da
técnica, específico da EPTM; e do φ8 ao destacar outras dimensões
além da técnica que precisam ser trabalhadas. Equivale sintetizar-
mos que 81,25% dos sujeitos defendem a relevância de valorização
da realidade do estudante no processo de ensino e aprendizagem de
Filosofia.
Freire (1996) ao refletir sobre os saberes necessários à prática
docente destaca a relevância de valorizar a realidade do estudante. Se
o conteúdo não estiver vinculado ao mundo do estudante será ape-
nas uma educação bancária, transmissão mecânica de informações.
Rocha (2014) observa que as aulas de Filosofia possuem vá-
rias etapas que não são separadas, mas, estão imbricadas umas nas
outras. Uma delas é a etapa de transição da cotidianidade para a di-
mensão filosófica. Não é uma sensibilização, mas o fato de levar o
estudante desde a dimensão do cotidiano para o espaço reflexivo crí-
tico da Filosofia. Os discursos dos sujeitos demonstram exatamente
essa preocupação em ajudar o estudante.
Destacamos também a ênfase no currículo centrado em temas
no desenvolvimento de habilidades e atitudes uma vez que apenas
o φ1 destaca a importância de apresentar as teorias filosóficas para
compreender a realidade. O φ11 responde que o objetivo é “ajudar o
futuro profissional a ter consciência crítica e ética em sua atividade
profissional”. Em sintonia com os demais sujeitos, demonstrando, as-
sim, estar centrando a docência num ensino preocupado mais com
a aprendizagem que na transmissão de informações pelo professor.
Ao centrarem nas habilidades e atitudes os sujeitos estão ali-
nhados com a proposta dos PCN+ (BRASIL, 2006) para desenvolver
a interdisciplinaridade, pois, a habilidade e atitude desenvolvida nas
aulas de Filosofia são necessárias para diferentes conteúdos traba-
lhados em sala por outras disciplinas. Isso demonstra que os sujeitos
em suas aulas não caem no erro denunciado por Rocha (2015), de
se posicionarem como donos da consciência crítica, mas, que estão
abertos ao trabalho em parceria com outros professores.
- 164 -
O sujeito φC na primeira reunião do grupo focal conclui uma
de suas falas mostrando o objetivo desafiador da Filosofia na EPTM
concomitante/subsequente dizendo que “[…] então veja, a Filosofia
tem o compromisso de formar cidadãos que concretamente vão para
o mercado de trabalho. Cidadãos que consigam apertar parafuso,
mas que consigam ter a possibilidade de dialogar e fazer a diferença
nesse mundo folclórico. Se nós filósofos não conseguirmos fazer isso
[suspiro] nós teremos simplesmente pessoas apertando o parafuso.”
Esse discurso reforça a importância que Severino (2002), dá para a
Filosofia ao afirmar que ela é indispensável em todos os espaços da
vida, pois, é um meio para superar os limites impostos pela realidade
tecnicista denunciada por Adorno e Horkheimer (1996).
O sujeito φF na segunda reunião do grupo focal sintetiza um
diálogo com o sujeito φD mostrando o principal objetivo da Filoso-
fia dentro da EPTM concomitante/subsequente “[…] a gente vive, o
curso técnico é elaborado para o fazer automático, se você consegue
ao menos romper o automático, sensibilizando o questionamento,
já é uma grande vitória […] isso não deixa de ser Filosofia […] pois
é a primeira grande etapa de todo o sistema filosófico […]”. Dessa
maneira a primeira grande etapa é despertar o filósofo presente em
todos os seres humanos segundo Gramsci (1999). Esse é um prin-
cípio curricular mínimo de uma educação concreta, “[…] na qual
se realiza um currículo básico igual para todos, fazendo esforços na
formação do professorado, adaptação metodológica e na organiza-
ção escolar, pra que todos os alunos possam obter um mínimo de
rendimento” (SACRISTÁN, 2000, p. 63).
Dessa maneira alicerçamos a Filosofia a uma educação real-
mente compreensiva, pois, como defende o sujeito φF, o ponto cru-
cial do objetivo da Filosofia (tirar do automático, sensibilizando o
questionamento) no ensino técnico concomitante/subsequente é o
de que os estudantes conseguirem ter a possibilidade de dialogar, e,
segundo a fala do φC, não se restringir a apertar parafusos no auto-
mático, ou seja, sem consciência crítica.
Para atingir um objetivo é mister ter consciência dos aspec-
tos que estão atrapalhando para minimizá-los ou elimina-los, e dos
aspectos que ajudam na consecução dos próprios objetivos para po-
tencializá-los. Desta forma a necessidade de pensar sobre a questão
dos fatores que interferem no ensino de Filosofia.
- 165 -
4. A questão dos fatores que interferem no ensino de filosofia
Com as respostas dos sujeitos acerca do questionamento sobre
o que, na percepção deles, mais atrapalha e o que mais colabora com
a prática docente ao lecionarem na EPTM concomitante/subsequen-
te do IFRO emergiu a categoria de análise fatores que interferem no
ensino de Filosofia.
O Gráfico 01 mostra os fatores, com maior ocorrência, se-
gundo as percepções dos sujeitos, que mais atrapalham a prática do-
cente ao lecionarem na EPTM concomitante/subsequente do IFRO.
Fonte: Coleta de dados 2019 segundo questionário online, O Ensino da Filosofia no Curso
Técnico do IFRO.
- 166 -
ções dos sujeitos sobre sua própria prática, é a inadequação da for-
mação universitária frente aos desafios encontrados na escola.
Isso parece confrontar com o fato de 87% dos sujeitos mani-
festarem segurança frente aos conteúdos da disciplina. Se há segu-
rança é porque houve uma formação relevante, entretanto, precisa
melhorar exatamente no aspecto de trazer o chão da escola para den-
tro da academia de formação de professores (ROCHA, 2015).
O fator que mais interfere negativamente nas aulas é justa-
mente o fato dos sujeitos perceberem que possuem muitas ativida-
des além das próprias aulas, ou seja, atividades de assessoramento à
direção, coordenações de cursos, departamentos, eventos.
Quatro sujeitos complementaram por escrito a questão dos
fatores que mais atrapalham a prática docente ao lecionarem alguma
disciplina com viés filosófico na EPTM concomitante/subsequen-
te do IFRO: φ3 escreveu que é a “dificuldade de aceitabilidade de
disciplinas filosóficas como parte da formação profissional. Preciso
sempre fazer um esforço a mais para que os alunos compreendam
a importância delas para seu desenvolvimento profissional. Quase
sempre exige uma conversão a uma Filosofia mais prática do que
teórica”; φ6 destacou a “interdisciplinaridade”; φ7 enfatizou a “a falta
de base dos alunos que chegam no ensino médio ou superior sem
ter estudado Filosofia”; e o φ16 trouxe presente o “desinteresse dos
alunos e a falta de reconhecimento da instituição”. Desta forma eles
reforçaram os fatores que mais atrapalham.
Apesar de no gráfico 01 o salário e a estrutura não serem
expostos como dificuldade relevante no trabalho desenvolvido no
IFRO, os sujeitos apresentam o excesso de atividades alheias ao
acompanhamento direto do estudante como um aspecto claro de
precarização do próprio trabalho docente. Nisso, o φ16 reforça afir-
mando a “[…] falta de reconhecimento da instituição.” Pois, a preca-
rização não se dá apenas em relação aos salários, condições prediais
ou materiais didáticos disponíveis para o trabalho, também, ao não
priorizar a prática docente, ensino, pesquisa e extensão, em detri-
mento as outras atividades que sobrecarregam o professor.
Quando o sujeito φ6 expressa sinteticamente que a interdis-
ciplinaridade é uma dificuldade, isso expõe uma preocupação com
uma das características principais de ensino de Filosofia no nível
médio de ensino, segundo Gallo (2006), que reflete sobre o ensino
- 167 -
de Filosofia e suas relações com as outras disciplinas. Essa relação
com os demais conhecimentos é também enfatizado pelo sujeito φ3
quando destaca a dificuldade de aceitação da contribuição da Filoso-
fia no processo formativo do estudante de nível técnico.
A este respeito Fazenda (2008, p. 13): afirma:
O primeiro passo para a aquisição conceitual interdisciplinar seria
o abandono das posições acadêmicas prepotentes, unidirecionais e
não rigorosas que fatalmente são restritivas, primitivas e “tacanhas”,
impeditivas de aberturas novas, camisas-de-força que acabam por
restringir alguns olhares, tachando-os de menores. Necessitamos,
para isso, exercitar nossa vontade para um olhar mais comprometi-
do e atento às práticas pedagógicas rotineiras menos pretensiosas e
arrogantes em que a educação se exerce com competência.
- 168 -
filosofar. Destacou o aspecto interdisciplinar do conhecimento: “[…]
nós temos ainda uma visão muito fragmentada, tudo dividido […]
isso dificulta até para o próprio aluno que vem com essa bagagem,
esse histórico escolar. Quando você chegar e propõe para nós trabalhar-
mos[…] com uma disciplina da área técnica. Nós ficamos sem com-
preender de fato. […] o que eu quero te explicar é essa forma que eu
vejo o princípio da Filosofia […] que em uma formação, a formação do
sujeito, não vai ser apresentar por parte não vai se apresentar em um
só momento, só matemática, só história, só geografia. Nas relações que
a gente estabelece tudo está junto […]”.
Com essa fala, o sujeito está em sintonia com Severino (2011),
que defende a interdisciplinaridade como uma dimensão da Filoso-
fia e que, por isso, não pode deixar de buscar a integração dos sabe-
res. De acordo com o sujeito φA não se pode abdicar dessa dimensão
nem na relação com as áreas de conhecimento mais técnico, mesmo
que haja dificuldade de compreender as relações.
Apesar da importância de identificarmos os fatores que mais
precisam de atenção, pois atrapalham os objetivos da filosofia no
ensino técnico, e precisamos atentar quanto ao que colabora para
atingir estes objetivos.
O Gráfico 02 apresenta os fatores que mais facilitam a práti-
ca docente ao lecionarem alguma disciplina com viés filosófico na
EPTM concomitante/subsequente do IFRO, segundo a percepção
dos sujeitos.
Gráfico 02 - Os fatores que mais facilitam a prática docente ao
lecionarem alguma disciplina com viés filosófico na EPTM conco-
mitante/subsequente do IFRO
Fonte: Coleta de dados 2019 segundo questionário online, O Ensino da Filosofia no Curso
Técnico do IFRO.
- 169 -
Identificamos no Gráfico 02 que os fatores que mais facilitam
a prática docente no IFRO foi o interesse e dinamismo profissional
para lecionar Filosofia, a boa formação acadêmica realizada na gra-
duação e o interesse e participação dos estudantes.
Os dois primeiros fatores reforçam a responsabilidade do pro-
fessor em se motivar no interesse e na sua capacidade didática e de
formação acadêmica. Dessa maneira estão em sintonia com as re-
flexões de Saviani (2008) acerca da importância da autoridade do
professor na relação pedagógica. O último mostra que a aula não
é propriedade do professor e exige envolvimento do estudante. De-
monstrando que se está em harmonia com a ideia de igualdade assi-
métrica na relação professor estudante Rocha (2015).
Demonstra também que os sujeitos desenvolveram saberes,
que segundo Freire (1996), não são indispensáveis à prática docen-
te progressista. Entre eles, a segurança e a competência profissional,
produto de uma boa formação. Outrossim, o comprometimento com
o processo educativo do estudante trazendo para si a responsabilida-
de de dinamizar e ter interesse pelo processo de ensino e aprendiza-
gem nas aulas de Filosofia. Notamos ainda mais o comprometimento
dos sujeitos ao não delegarem a responsabilidade da prática docente
a elementos externos econômicos.
A pressão sobre sua própria responsabilidade é amenizada
quando no gráfico percebemos que os sujeitos não são autoritaristas,
pois, eles reconhecem que a aula não é sua – concepção de domínio
típica de uma postura autoritária – mas que depende também dos
estudantes, ou seja, “[...] não há docência sem discência [...]” (FREI-
RE, 1996, p. 12).
A auto exigência do dinamismo profissional demonstra pro-
fissionais abertos à diversidade e devir dos estudantes. Numa educa-
ção tradicional não seria necessário ser dinâmico, basta o estudante
se adaptar. Os sujeitos da pesquisa reconhecem a necessidade de se
adaptarem, mostrando o reconhecimento da realidade inacabada e
condicionada na qual está inserido o estudante e o processo educa-
cional.
5. Considerações finais
- 170 -
sequente. Dessa maneira em espaços não explorados pela literatura
científica e legislação. Para realizarmos a pesquisa objetivamos anali-
sar as percepções dos docentes de Filosofia na EPTM concomitante/
subsequente do IFRO sobre sua prática, pois, eles refletem acerca
de sua realidade docente no ensino de Filosofia no ensino técnico,
mesmo que individualmente.
Alcançamos o objetivo de analisar as percepções dos docentes
de Filosofia na EPTM concomitante/subsequente do Instituo Federal
de Rondônia sobre sua prática através da postura fenomenológica de
deixar o fenômeno das percepções dos sujeitos sobre sua prática se
manifestar para serem analisados sem preconceitos. Condigno a essa
atitude ampliamos o conhecimento encontrando novas compreen-
sões oriundas do analisar as percepções dos docentes de Filosofia na
EPTM concomitante/subsequente do IFRO sobre sua prática.
Uma dessas novas compreensões e, ao mesmo tempo, respon-
dendo à questão de qual a finalidade da Filosofia na EPTM conco-
mitante/subsequente, é a de que o mínimo que a Filosofia deve pro-
porcionar é o de retirar o estudante de um emaranhado de ideias
automáticas não refletidas e simplesmente obedecidas cegamente.
Isso significa, favorecer com que ele seja capaz de compreender a
própria realidade além dos limites técnicos que lhe são impostos
para se adaptar e sobreviver. Esse mínimo pode ser realizado de
várias maneiras: favorecendo debates, auto-reflexão, construção de
textos, seminários, trabalhos em grupos, filmes, músicas... O que
não pode é a Filosofia não conseguir realizar essa façanha nobre de
humanizar mais o próprio ser humano que luta pela sobrevivência.
Logo, percebe-se que a Filosofia objetiva favorecer o início de um
processo de reflexão sobre a realidade circundante.
Perante as categorias emergidas a partir das percepções dos
sujeitos é razoável compreendermos que a concepção de ensino de
Filosofia presente em seus discursos é de um ensino crítico, pois nas
várias manifestações acerca dos objetivos da Filosofia no ensino téc-
nico há presente, implícita ou explicitamente a questão de provocar
o pensamento filosófico estagnado no cotidiano do senso comum
dos estudantes.
É um ensino de Filosofia que não é restrito ao intelecto lógico,
mas, avança para as relações com o mundo da vida do aluno valo-
rizando sentimentos, atualidade, trabalho, profissão. Dessa forma,
- 171 -
concebem a Filosofia como um ensino eminentemente interdiscipli-
nar e não isolado em um fragmento fora da realidade dos estudantes.
Ao refletirmos sobre a categoria dos fatores que interferem
na prática docente é admissível compreendermos que a interdisci-
plinaridade deve ser prioridade, pois, é característica fundante da
Filosofia e paradigma na educação contemporânea. Também, é con-
cebemos que a estrutura física e a política salarial não atrapalham as
práticas educativas, todavia, a organização do IFRO em desviar os
sujeitos para outras atividades que não sejam o cuidado direto com
a aprendizagem dos estudantes é o que mais atrapalha a prática de
ensino de Filosofia na EPTM concomitante/subsequente do IFRO.
Ao refletirmos sobre os fatores que facilitam a prática docente
é razoável afirmarmos que os professores de Filosofia do IFRO são
comprometidos com o papel de Filósofo Educador, pois, trazem para
si a responsabilidade do ensino de Filosofia atingir seus objetivos
com os estudantes. Os sujeitos assumem como fator que mais facilita
a prática docente é o próprio interesse e dinamismo ao lecionarem
Filosofia. Outro fator que demonstra esse compromisso é os sujeitos
destacarem à relevância da formação acadêmica para lecionarem.
Em sintonia com a concepção de ensino de Filosofia crítica que os
sujeitos possuem, há o reconhecimento da importância do interesse
e da participação dos estudantes como um fator que contribui para
prática docente.
Ao considerarmos a categoria dos fatores que interferem na
prática docente admitimos que a unidade de estrutura material e for-
mação profissional dos docentes é uma fórmula a ser copiada pela na-
ção, pois transforma a educação concreta da sala de aula. As estruturas
físicas organizadas para favorecerem o processo de aprendizagem, ins-
trumentos tecnológicos, subsídios didáticos, remuneração digna mul-
tiplicados pelo investimento na formação stricto sensu dos professores,
resulta em compromisso concreto com a melhoria da educação. Não
é necessário copiar modelos autoritaristas e tecnicistas que determi-
nam regras disfarçadas de disciplina e de avanço tecnológico, o medo
disfarçado de respeito. Mesmo que as aulas sejam em ambientes inex-
plorados pela produção científica, mas necessárias para o estudante
se realizar na sociedade contemporânea, o professor, devidamente va-
lorizado, se torna a solução de problemas concretos que refletem na
aprendizagem, na qualidade do processo educacional.
- 172 -
Enfatizarmos ainda que o IFRO é uma instituição nova assim
como os seus docentes de Filosofia. Esse fator abre a possibilidade
concreta de esperança numa educação profissional que possa real-
mente favorecer à adaptação dos trabalhadores a realidade circun-
dante para sobreviverem e, simultaneamente, potencializar a eman-
cipação, a autonomia do sujeito numa contramão ao que está sendo
imposto com as novas DCN/EPT.
6. Referências
- 173 -
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KANT, Immanuel. Textos Selecionados. Coleção Os Pensadores. Tra-
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- 174 -
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- 175 -
- 176 -
O LUGAR DOS SABERES NA FORMAÇÃO E
PRÁTICA DE PROFESSORES QUE ENSINAM
MATEMÁTICA
Ilmaçara Pereira Neves
Eliane Regina Batista Martins
1. Introdução
- 177 -
cipalmente, quanto ao trabalho dos conteúdos da disciplina de Ma-
temática, o que deu origem ao problema da pesquisa: Como vem se
desenvolvendo o processo de constituição dos saberes docentes do
(a) professor (a) de Matemática dos Anos Iniciais do Ensino Funda-
mental? Significa que tentamos compreender os modos pelos quais
os saberes de conteúdos e saberes pedagógicos referentes à disciplina
de Matemática são produzidos e mobilizados nas práticas dos pro-
fessores na dissertação desenvolvida no Programa de Pós-Gradua-
ção em Ensino de Ciências e Humanidades, no Instituto de Educa-
ção, Agricultura e Ambiente da Universidade Federal do Amazonas.
Neste artigo apresentamos um recorte da pesquisa em que
buscamos responder a questão: Quais os saberes matemáticos e pe-
dagógicos que estruturam a formação inicial dos professores que en-
sinam Matemática? Especificamente buscamos analisar por meio da
narrativa dos docentes que ensinam Matemática nos Anos Iniciais
do Ensino Fundamental os saberes que permeiam seus conhecimen-
tos na prática da sala de aula.
Este estudo foi realizado a partir da entrevista narrativa reali-
zada com três docentes que lecionam a disciplina de matemática nos
Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Apresentamos ao longo do
texto as contribuições dos saberes docentes para a prática pedagó-
gica a partir do olhar de alguns teóricos, em seguida a metodologia,
análise e reflexões feitas a partir dos dados coletados.
- 178 -
aumentando com isso a responsabilidade do docente que trabalha
com essa disciplina.
A importância do professor que trabalha nos Anos Iniciais
com a Matemática vai além da transmissão de conteúdo. O ensino
e a aprendizagem da Matemática, neste período, constituem o pro-
cesso de formação do cidadão, pelo desenvolvimento de capacidades
relativas à estruturação do raciocínio lógico para apreender seu en-
torno e possibilitar uma participação social mais consciente confor-
me expresso nos Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática
(BRASIL, 1997).
Concebemos a função docente como essencial para a constru-
ção não somente dos saberes relativos aos conteúdos, mas também
para a formação cidadã do discente e desenvolvimento de habili-
dades e competências matemáticas necessárias para a vida na atual
sociedade da informação e da comunicação. Além disso, o compro-
misso do professor com a formação do aluno é ressaltado por D’Am-
brósio U. (2012, p.13) que:
[...] deve ter como objetivo maior a mensagem de que o conheci-
mento é importante, mas deve estar subordinado a uma profun-
da responsabilidade de humanidade, que é a verdadeira missão
do educador. Todo educador matemático deve utilizar aquilo que
aprendeu como matemático para realizar a missão do educador. Em
termos muitos claros e diretos: o aluno é mais importante que pro-
gramas e conteúdo.
- 179 -
[...] uma área de conhecimentos, investigações e propostas teóricas
e práticas que, no âmbito da Didática e da Organização Escolar, es-
tuda os processos por meio dos quais os professores se implicam,
individualmente ou em equipe, em experiências de aprendizagem,
pelas quais adquirem ou melhoram os seus conhecimentos, compe-
tências e que lhes permitem intervir profissionalmente no desen-
volvimento do ensino, do currículo e da escola, com o objetivo de
melhorar a qualidade da educação que os alunos recebem.
- 180 -
(2010) e Saviani (2009) os cursos de formação inicial não têm ofe-
recido os conhecimentos necessários à prática educativa, os quais
demonstram preocupação com as fragilidades da formação inicial.
Lorenzato (2008, p. 03) afirma que não se pode ensinar o que
não se conhece, além disso, declara que todo professor tem o dever
de conhecer o que irá ensinar a seus alunos, considerando que não é
possível ensinar o que não se sabe.
Dessa forma, reconhecemos que o aluno tem direito de rece-
ber um conteúdo de forma clara e que precisa ser entendido, para
isto é fundamental que o professor conheça a Matemática e sua di-
dática.
A respeito disso, Gaio e Duarte (2003) esclarecem que uma
falha no processo de formação do professor dos Anos Iniciais está no
fato de os conteúdos matemáticos a serem trabalhados nessa etapa
de escolarização ser considerados fáceis e simples, deixando de lado
a formação docente para a Matemática básica.
As pesquisas citadas indicam que ainda existem docentes que
não constroem em seu processo formativo o suporte necessário para
desempenhar suas atividades pedagógicas no âmbito de sua prática,
considerando que o processo formativo muitas vezes é deficiente,
pois muito do que o professor sabe ou precisa saber para desempe-
nhar sua função, termina não aprendendo nos cursos de formação.
(LORENZATO, 2008; GHEDIN, 2008).
Outro autor que se preocupa com esta problemática é D’Am-
brósio U. (2012) ao explicar que “dentre os grandes problemas que a
educação tem enfrentado o mais grave afeta particularmente a edu-
cação matemática de hoje, é a maneira deficiente como se forma o
professor”.
Diante disso, há de se repensar as condições e as demandas
para as licenciaturas tanto com relação a sua dinâmica curricular
quanto sua forma de institucionalização para que se efetivem mu-
danças significativas no processo educacional. D’Ambrósio U. (2012)
corrobora com esta questão ao alertar que já é tempo de os cursos de
licenciatura perceberem que é possível organizar um currículo ba-
seado na realidade atual e nas necessidades formativas dos docentes.
Não é difícil notar que a formação docente é vista como um
grande desafio em todos os aspectos, conforme exposto e discutidos
pelos pesquisadores citados.
- 181 -
3. Metodologia
Ao dar início à pesquisa os primeiros passos trilhados atenta-
ram para a escolha dos participantes e o local onde seria desenvolvi-
da a investigação.
Foi necessário um levantamento prévio a fim de selecionar às
escolas que atendessem as exigências desse estudo. A partir dessa
sondagem e catalogação foram definidas três escolas municipais e,
respectivamente, selecionados três participantes que tiveram como
critérios para sua escolha: a) Ser licenciado no Curso Normal Supe-
rior; b) Lecionar nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental; c) Atuar
especificamente com a disciplina de Matemática.
O nosso estudo se voltou para os aspectos subjetivos que ca-
racterizam os saberes dos professores e amparamo-nos na perspecti-
va da entrevista narrativa que valorizou a subjetividade dos conheci-
mentos dos professores, permitindo que os mesmos se expressassem
e narrassem sua trajetória pessoal e profissional. Esse tipo de pes-
quisa configura-se como uma forma de compreender a experiência
humana conforme proposto por Clandinin e Connelly (2011), sendo
entendida como uma forma de compreender a experiência do pro-
fessor por meio do estudo de suas histórias vividas e contadas, para
interpretar as falas, expressões e emoções obtidas no caminhar da
pesquisa.
As narrativas são essenciais à compreensão dos processos que
possibilitam a mobilização dos saberes dos professores, o que para
Delgado (2006, p. 44) é carregado de significações:
As narrativas são traduções dos registros das experiências retidas,
contêm a força da tradição e muitas vezes relatam o poder das trans-
formações. História e narrativa, tal qual história e memória, alimen-
tam-se. […] Narrativa, sujeitos, memórias, histórias e identidades.
É a humanidade em movimento. São olhares que permitem tempos
heterogêneos. É a história em construção. São memórias que falam.
- 182 -
Por fim, acreditamos que a opção metodológica adotada para
a problemática desse estudo foi adequada, tendo em vista os obje-
tivos descritos e a contextualização dessa investigação. A narração
das vivências e experiências empreendidas pelos sujeitos da pesquisa
abriu caminhos para a compreensão do seu processo de formação e
construção de seus saberes a partir de seus percursos formativos em
diferentes tempos e espaços.
4. Análise e discussão de dados
Apresentamos neste capítulo os resultados obtidos acerca do
nosso objeto de investigação: Quais são os saberes matemáticos e
pedagógicos que estruturam a formação inicial dos professores que
ensinam Matemática?
A fim de garantir o anonimato dos quatro protagonistas da
pesquisa, os denominamos com nomes de grandes educadores, per-
sonalidades que tem nome de peso nos estudos da área educacional e
deram grandes contribuições para pensar e transformar a educação,
sendo: Paulo Freire, Maria Montessori e Emília Ferreiro.
4.1. Caracterização inicial dos protagonistas da pesquisa
As informações aqui presentes fazem parte da entrevista nar-
rativa que possibilitou delinear o perfil pessoal e profissional dos
protagonistas desta investigação. Dentre os três professores dois per-
tenciam ao sexo feminino e um ao sexo masculino.
Professora Montessori 1- A professora tem 39 anos, sexo fe-
minino, leciona horário vespertino no 3º, 4º e 5º ano com a disci-
plina de Matemática. É graduada no Curso Normal Superior pela
Universidade do Estado do Amazonas - UEA, no município de Hu-
maitá, teve sua formação inicial através da oferta do Programa PRO-
FORMAR que concluiu no ano de 2005, a professora possui 16 anos
de experiência no magistério.
Professor Freire - O professor tem 55 anos, sexo masculino,
leciona no turno vespertino nas turmas de 4º e 5º anos com a disci-
plina de Matemática. Formou-se no ano de 2008 no Curso Normal
Superior pela Universidade do Estado do Amazonas em parceria
com a Secretaria de Educação através do PROFORMAR e traz con-
sigo a bagagem de 22 anos de experiência no magistério.
1 As falas dos protagonistas da pesquisa estão em itálico para diferenciar dos autores do
texto.
- 183 -
Professora Ferreiro - A professora tem 40 anos, é do sexo
feminino, nos dias atuais trabalha com 3º ano com a disciplina de
Matemática, no turno vespertino. Licenciada em Normal Superior,
formou-se pela Universidade do Estado do Amazonas - UEA, pelo
PROFORMAR no ano de 2005 e atua como professora há 18 anos.
4.2. Primeiras reflexões acerca das informações iniciais
A partir da análise feita sobre as narrativas, assim como da
percepção do pesquisador diante dos gestos, expressões e sentimen-
tos que se deixaram transparecer no decorrer da entrevista narrativa,
foi possível delinear uma visão qualitativa sobre o nosso objeto de
pesquisa.
No mapeamento dos saberes matemáticos e pedagógicos que
estruturam a formação inicial dos professores de ensinar Matemá-
tica, trabalhamos com o eixo “Construção dos conhecimentos ma-
temáticos e pedagógicos na formação inicial” que ficou dividido nas
seguintes questões:
- Saberes aprendidos na formação inicial
- Saberes pedagógicos na percepção docente
As narrativas dos protagonistas da pesquisa trouxeram uma
vasta riqueza de detalhes, com a intenção de trabalhar as peculia-
ridades e os significados presentes nos discursos obtidos, além de
acentuar as experiências vividas no percurso da história de vida pes-
soal e profissional de cada um, optou-se pela análise individual dos
dados coletados.
- 184 -
O curso em si foi muito cansativo para todos e, no final acabei engra-
vidando do meu filho …, no ano de 2004, eu estava grávida quando
comecei a fazer o TCC, estava com três a quatro meses, ficava sentada
escrevendo, era na caneta naquele tempo, não tinha computador, eu
ficava até de madrugada e quando eram oito horas da manhã tinha
que estar na faculdade novamente, sentia muita dor na barriga, fi-
cava muito cansativo, de manhã e de tarde na faculdade, e às vezes
ainda no sábado até meio dia.
Os saberes aprendidos na formação inicial fundamentam o
trabalho docente, no tocante a essa questão a professora relata que
em seu processo formativo umas das disciplinas que considera ter
permitido vasta contribuição para a construção dos seus saberes
pedagógicos foi a disciplina Metodologia do Ensino da Matemáti-
ca, essa disciplina tinha como propósito a reflexão, discussão e pro-
blematização em tornos de temas fundamentais para o ensino de
Matemática, além disso, segundo seu relato trazia também opções
pedagógicas para o exercício da atividade docente.
Tivemos duas disciplinas voltadas para a área de Matemática, uma
delas era específica para o ensino dos conteúdos matemáticos das sé-
ries iniciais e educação infantil, a outra disciplina tratava de apresen-
tar ao professor opções pedagógicas, nesse sentido trazia muitos jogos
matemáticos, técnicas de ensino e reflexões sobre o ensino da matemá-
tica. Essas disciplinas trouxeram muitos conhecimentos novos, apesar
de ser corrida com relação ao tempo.
- 185 -
disciplinas foram corridas, possibilitando um espaço de tempo re-
duzido para a aquisição de conhecimentos, percebemos que a pro-
fessora constituiu saberes relativos às ciências da educação e aos sa-
beres pedagógicos em sua formação inicial, e que a prática em sala
de aula seguida da reflexão permitiu que fossem produzidos em seu
reservatório de conhecimentos, como denomina Gauthier (1998), os
saberes da experiência.
Na percepção da docente os saberes que ela possui acerca dos
conteúdos matemáticos foram se delineando gradativamente em
seus diferentes níveis de escolarização e mesmo nas atividades diá-
rias que nos rodeia no dia a dia.
Os conhecimentos que possuo acerca dos conteúdos matemáticos, fo-
ram sendo construídos enquanto eu estava estudando, quando aluna
dos anos iniciais, do Ensino Fundamental II, do ensino médio, e na
faculdade, fui adquirindo ao longo do tempo e, do processo de for-
mação escolar, outra contribuição fundamental são as atividades do
cotidiano que estão repletas de situações matemáticas.
- 186 -
do e fui aprimorando meus conhecimentos, participei de cursos como
o Pró-letramento em Matemática e Português, do curso PNAIC, que
enfatizou o trabalho com os conteúdos matemáticos e diversas meto-
dologias de ensino, mas acredito que colocando na balança a expe-
riência foi a maior aliada, porque às vezes na formação você aprende
de uma forma e quando chega na realidade na sala é de outra.
- 187 -
mudanças percebidas durante sua trajetória pessoal. Percebemos que
essa etapa da entrevista narrativa causou no professor um momento
de reflexão sobre sua prática, o protagonista navega no passado, em
sua ação dos primeiros anos de docência e adentra na realidade dos
dias atuais.
E toda essa experiência do dia a dia tem contribuído com a minha
prática, você trabalha hoje um conteúdo e pensa na forma que você
ensinou no passado, e isso faz com que você se aperfeiçoe, quando
adentrei a carreira do magistério eu não sabia como ensinar os alunos
e hoje com o passar do tempo me sinto seguro no que faço.
- 188 -
ção docente foram sendo construídos paulatinamente, em meio às
dificuldades do início da carreira, a ausência de uma base de conhe-
cimentos sólidos e de didática para o ensino nos Anos Iniciais do En-
sino Fundamental, as formações presenciadas e o desejo de crescer.
Os conhecimentos que fazem parte de meus saberes hoje, se delinea-
ram a partir de minha experiência no magistério e, também após a
formação acadêmica, acredito também que continuo construindo
através da troca de experiência com colegas de trabalho no dia a dia.
As metodologias utilizadas foram se delineando a partir da minha ex-
periência de trabalho, da formação superior e dos cursos de formação
continuada, como o Pró-letramento e outros que tive a oportunidade
de participar.
2 Segundo Tardif (2012) a ideia de temporalidade significa dizer que ensinar supõe
aprender a ensinar, ou seja, aprender a dominar progressivamente os saberes necessários
a realização do trabalho docente.
- 189 -
em sala de aula, e isso não fizemos em nossa formação. Preciso dizer
que não gosto muito desse nome “Normal Superior”, nós deveríamos
ter a Pedagogia, a pior invenção do governo esse negócio de Normal
Superior.
- 190 -
No que se refere aos saberes de conteúdos identificamos que
de acordo com a Professora Ferreiro a escola não foi exclusivamente
o lócus de sua formação, a vivência e suas experiências sociais corro-
boraram para a constituição de seus conhecimentos.
Meus conhecimentos sobre Matemática foram se aprimorando aos
poucos, desde que comecei a estudar, por meio das formações e das
experiências sociais e profissionais. Posso dizer que foram se cons-
truindo desde o início de minha vida escolar e do contato com o meio
social, profissionalmente acho que quando trabalhava na educação
infantil não coloquei em prática o conhecimento que eu tinha, porque
era turma de jardim e você fica limitado aos conteúdos dessa fase, já
quando trabalhei com 5º ano foi muito bom, pude rever conteúdos
que não lembrava mais.
- 191 -
5. Considerações finais
- 192 -
forma unanime na fala de nossos sujeitos, que as formações conti-
nuadas aliadas às experiências cotidianas são de suma importância
para fortalecer a prática pedagógica do professor.
Embora eles tenham tido acesso a duas disciplinas voltadas di-
retamente para o ensino da matemática, são enfáticos ao afirmar que
enriqueceram seus conhecimentos, mas não foram suficientes para o
domínio dos conteúdos matemáticos e para o desempenho didático
e pedagógico na sua profissão.
6. Referências
- 194 -
A PRÁTICA PEDAGÓGICA NA EJA E O
DESAFIO PARA A EFETIVAÇÃO DA FUNÇÃO
QUALIFICADORA
Rogério Feitosa Barros
Rosângela de Fátima Cavalcante França
1. Introdução
O Brasil, no compasso da globalização, principalmente nos
campos econômico e de comunicação, vê a crescente necessidade de
formar trabalhadores que atendam às exigências dos avanços tecno-
lógicos e, em sua decorrência, dos meios de produção. Nesse sentido,
houve a necessidade de se pensar tanto na formação dos que futura-
mente iriam ingressar no mercado de trabalho, como na formação
dos que já estavam em plena idade produtiva, porém, não possuíam
conhecimento formal suficiente para dar conta das transformações
que vinham ocorrendo, no início dos anos 2000, em todos os cam-
pos da sociedade. No contexto dos que necessitavam de qualificação
profissional encontravam-se os jovens e adultos que fazem parte da
massa trabalhadora e, portanto, precisavam de propostas pedagó-
gicas mais aproximadas da realidade destes, pois conforme Lemos
(1999, p.19):
A LDB (Lei 9394/96), em seu artigo 1º, refere-se aos princípios
norteadores da educação e estimula a criação de propostas alternati-
vas para promover a igualdade de condições para o acesso e perma-
nência do aluno no processo educativo, a utilização de concepções
pedagógicas que valorizem a experiência extraescolar e a vinculação
da educação com o trabalho e com as práticas sociais.
A interlocução da autora com a LDB (Lei 9394/96), nos per-
mite ratificar a necessidade de desenvolvimento de práticas pedagó-
gicas articuladas com a realidade sócio cultural real dos alunos, onde
suas demandas poderão ser problematizadas e novos conhecimentos
poderão ser agregados.
É ainda Lemos (1999, p.19) que citando Libâneo ( 1994, p.35)
diz:
A inserção dos jovens e adultos no processo de desenvolvi-
mento como cidadãos produtivos demanda ações educativas
- 195 -
que considerem que a escolarização constitui instrumento
indispensável à construção da sociedade democrática, por-
que tem como função a socialização daquela parcela de saber
sistematizado que constitui o indispensável à formação e ao
exercício da cidadania.
- 196 -
invés disso, as abstracções são construídas à medida que os dados
particulares que foram recolhidos se vão agrupando.
- 197 -
comporta dentro de si realidades tão desiguais que fazem com que as
possibilidades e os desafios da educação permanente também este-
jam colocados para extensas parcelas de nossa população.
Nesse contexto, com a homologação do Parecer CNE/CEB
11/2000, a EJA ganhou uma base legal que orienta, de forma ampla,
os caminhos que devem ser considerados nas ações de formação de
jovens e adultos: “O referido parecer significou um avanço no cam-
po democrático da elaboração de políticas para a EJA [...]” (FARIA,
2009, p. 21).
Segundo o Parecer CNE/CEB 11/2000, a construção do texto
se deu de forma democrática; por esse motivo:
[...] iniciativas e encontros, intermediados por sessões regulares da
CEB, sempre com a presença de representantes do MEC, foram fun-
damentais para pensar e repensar os principais tópicos da estrutura
do parecer. As sugestões, as críticas e as propostas foram abundan-
tes e cobriram desde aspectos pontuais até os de fundamentação
teórica (BRASIL, 2000, p. 02).
- 198 -
do país, dentro dos mais diferentes estratos sociais, desenvolveram
uma rica cultura baseada na oralidade da qual nos dão prova, entre
muitos outros, a literatura de cordel, o teatro popular, o cancioneiro
regional, os repentistas, as festas populares, as festas religiosas e os
registros de memória das culturas afro-brasileira e indígena (BRA-
SIL, 2000, p. 05).
- 199 -
pesada quanto a iníqua distribuição da riqueza e da renda é a brutal
negação que o sujeito iletrado ou analfabeto pode fazer de si mesmo
no convívio social” (BRASIL, 2000, p. 08).
Para fundamentar essa reflexão nos ancoramos no pensamen-
to de Freire (1987, p. 29) o qual argumenta que:
Os oprimidos, nos vários momentos de sua libertação, precisam
reconhecer-se como homens, na sua vocação ontológica e histórica
de Ser Mais. A reflexão e a ação se impõem, quando não se pretende,
erroneamente, dicotomizar o conteúdo da forma histórica de ser do
homem.
- 200 -
[...] os desfavorecidos frente ao acesso e permanência na escola
devem receber proporcionalmente maiores oportunidades que os
outros. Por esta função, o indivíduo que teve sustada sua formação,
qualquer tenha sido a razão, busca restabelecer sua trajetória escolar
de modo a readquirir a oportunidade de um ponto igualitário no
jogo conflitual da sociedade (BRASIL, 2000, p.10).
- 201 -
Em uma perspectiva de materialização das ações discutidas
para a EJA, mudanças cada vez mais aceleradas não dão espaço para
que o cidadão atento a essas transformações possa se omitir no seu
próprio desenvolvimento, tanto no campo dos avanços tecnológicos,
quanto no modo de participação social.
Avançando no debate sobre a constante necessidade de quali-
ficação, o Parecer 11/200 ratifica que:
Esta tarefa de propiciar a todos a atualização de conhecimentos por
toda a vida é a função permanente da EJA que pode se chamar de
qualificadora. Mais do que uma função, ela é o próprio sentido da
EJA. Ela tem como base o caráter incompleto do ser humano cujo
potencial de desenvolvimento e de adequação pode se atualizar em
quadros escolares ou não escolares (BRASIL, 2000, p. 11).
- 202 -
O autor ratifica a relevância do Parecer, que é ressaltado como
um meio que poderá promover o protagonismo dos jovens e adultos
atendidos pela EJA. Nessa perspectiva, valorizar o ser humano e suas
especificidades, considerá-lo um ser social com suas experiências
de vida, interesses e objetivos, conduz às reflexões sobre a formação
ampla e integral pretendida para essa modalidade de ensino. É com
o intento de verificar o legal e o real efetivado na educação , que tra-
taremos na seção a seguir.
4. Desafios para materialização da função qualificadora
Considerando a proposta pedagógica desenvolvida para os
alunos da EJA, em que medida esta contribui para a materialização
da função Qualificadora, haja vista, que objetiva a formação perma-
nente?
Considero o tempo e o espaço físico e os recursos pedagógi-
cos incompatíveis para oferecer o complemento necessário para dar
múltiplas oportunidades de aprendizagem ao aluno (P2).
Contribui simplesmente para que o aluno aprenda o básico,
uma vez que estes estão bem atrasados e assim não permanecerem
na escuridão do conhecimento. (P3)
Os alunos da EJA com a carga horária reduzida é pouco pro-
vável que a qualificação chegue para todos, já que muitos desistem
dos estudos (P5).
Verificamos, nas respostas destacadas, que a ênfase quanto às
dificuldades para a materialização da função qualificadora recai so-
bre questões relacionadas ao tempo abreviado, espaço físico inade-
quado, recursos pedagógicos insuficientes e não voltados para esse
tipo de clientela, o que poderá implicar na desmotivação docente
frente às condições de trabalho no âmbito da EJA. Tais dificuldades
nos levam ao entendimento de uma precarização relacionada a essa
modalidade de ensino, conforme afirmam Di Pierro, Joia e Ribeiro
(2001, p. 72-73):
De um lado, a precariedade material e pedagógica em que os
programas se desenvolvem e onde as escolas funcionam sequer asse-
gura a base formativa científico-tecnológica comum; de outro, a insis-
tente referência ao ensino regular infanto-juvenil, a rigidez da seriação
e das grades curriculares obrigatórias limitam a criatividade e dificul-
tam a combinação de processos de formação geral e profissional.
- 203 -
Di Pierro, Joia e Ribeiro (2001) descrevem as condições em
que se trabalha na EJA, destacando os desafios para a superação das
barreiras enfrentadas por todos os que participam dessa modalidade,
a qual possui características próprias. Portanto, sua estrutura mate-
rial e pedagógica deve atender às especificidades de seu público alvo.
Seguindo essa reflexão, podemos dialogar com o pensamento
de Rummert (2006, p. 128) que, ao tratar de aspectos relacionados à
realidade da EJA, assevera:
O que verificamos, nos dias atuais, é o fato de que os profissionais
da categoria docente vivenciam o aviltamento de seu trabalho seja
no que diz respeito à remuneração, seja naquilo que se refere às con-
dições de trabalho, marcadas pela necessidade de alargamento cada
vez maior da jornada, pela terceirização ou precarização [...].
- 204 -
tada para o aprendizado do conhecimento produzido pela humani-
dade, com procedimentos pedagógicos que possibilitem ao aluno a
construção de novos saberes.
Complementando, Silva (2006, p. 206) expõe que:
A função qualificadora da EJA tem por referência o potencial
humano de se qualificar e de se requalificar, permanentemente; e o
de descobrir novos campos de atuação, como realização de si. Em
atenção a isso, vale salientar, todavia, que a realização da pessoa não
se dá fechada no indivíduo, ela se realiza num universo que inclui o
convívio com outras pessoas e com as exigências sociais postas por
determinada conjuntura cultural, social e política. Destarte, o traba-
lho da escola, em sua tarefa de qualificar a pessoa para a vida, faz-se
em sintonia ao mundo, atento à complexidade existente nele.
Ao explicar a função qualificadora da EJA, SILVA (2006) res-
salta a capacidade humana de construir e reconstruir conhecimentos
ao longo da vida. O autor destaca, ainda, a influência do meio social
e suas interações, como fatores que contribuem na formação de cada
indivíduo. Essas questões são elementos a serem considerados no
processo educativo.
Portanto, reconhecendo a necessidade humana de apren-
dizado por toda a vida, no percurso escolar formal, a escola deve
proporcionar situações de ensino e aprendizagem que fortaleçam a
autonomia, para que os alunos possam dar continuidade em sua for-
mação ao longo da vida de acordo com seus interesses e demandas
da sociedade.
5. Considerações finais
- 205 -
crianças e adolescentes. Em relação à formação docente, reserva-se
uma carga horária insuficiente para que os professores possam dar
conta das exigências para a atuação na Educação para Jovens e Adul-
tos. Nesse sentido, evidencia-se uma precarização dessa modalida-
de e, como consequência, a desmotivação dos professores. Assim,
a função qualificadora, que estabelece como princípios a formação
por toda a vida, o desenvolvimento de múltiplas competências e ha-
bilidades e a preparação do indivíduo para as exigências do mercado
de trabalho depara com inúmeros desafios para sua materialização.
6. Referências
- 206 -
dagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1987.
FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. Rio de Janei-
ro: Paz e Terra, 1967.
FARIA, Wendell Fiori de. Educação de jovens e adultos. São Paulo:
Pearson Education do Brasil, 2009.
HADDAD, Sérgio; DI PIERRO, Maria Clara. Escolarização de Jo-
vens e Adultos. Revista Brasileira de Educação, n. 14, 2000.
LEMOS, Marlene Emilia Pinheiro de . Proposta Curricular. In: Salto
para o Futuro- Educação de Jovens e Adultos – Secretaria de Edu-
cação a Distância . Brasília: Ministério da Educação, SEED, 1999.
SILVA, José Barbosa da. Valorização dos saberes docentes na for-
mação de professores da EJA: Desafios e perspectivas. In: SOARES,
Leôncio (Org.). Formação de educadores de jovens e adultos. Belo
Horizonte: Autêntica, SECAD/MEC/UNESCO, 2006.
RUMMERT, Sonia Maria. Formação continuada dos educadores
de jovens e adultos: Desafios e perspectivas. In: SOARES, Leôncio
(Org.). Formação de educadores de jovens e adultos. Belo Hori-
zonte: Autêntica, SECAD/MEC/UNESCO, 2006.
- 207 -
- 208 -
ABORDAGEM DO CICLO DE POLÍTICAS NA
ANÁLISE DOS INDICADORES DA QUALIDADE
NA EDUCAÇÃO INFANTIL: DELINEAMEN-
TO METODOLÓGICO DE UMA PESQUISA DE
CAMPO.
Romilson Brito de Azevedo
Valmir Flores Pinto
1. Introdução
- 209 -
em Ensino de Ciências e Humanidades no Instituto de Educação,
Agricultura e Ambiente (IEAA) da Universidade Federal do Ama-
zonas (UFAM).
A política pública pode ser considerada como um grupo de
ações projetadas e programadas que vai muito além do empenho go-
vernamental. Ou seja, os interesses envolvidos não recaem apenas
aos anseios de governos/governantes. Com isso, a política educacio-
nal avaliada na dissertação foi a proposta de avaliação institucional
dos Indicadores da Qualidade na Educação Infantil (IQUEI).
Os IQUEI são uma iniciativa do Ministério da Educação
(MEC), de caráter orientador, compõem uma das diversas ações para
avaliar, dente outras, a aplicabilidade de prescrições legais dispostas
em documentos como as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil (DCNEI) e Parâmetros Nacionais de Qualidade
da Educação Infantil (PNQEI).
A escolha de pressupostos teóricos para compor o referencial
de um trabalho acadêmico não é tarefa tão fácil. Sobretudo, daqueles
que fundamentam a coleta, tabulação e tratamentos de dados que ,
no geral, subsidiam, por exemplo, estudos descritivos. Afinal, a mo-
ral intelectual e científica, bem como a validação do corpus de dados
elencado ao longo de um trabalho acadêmico é o que de fato vai
ratificar ou não a consistência metodológica da pesquisa.
Nesse sentido, ao analisar as políticas educacionais quase sem-
pre somos levados a entender que a formulação destas acontece de
forma impositiva, e, que, o Estado é o único protagonista desse pro-
cesso. Com isso, ao fazer uso das prescrições produzidas no texto
oficial publicado, os destinatários das políticas educacionais enfati-
zam apenas os interesses levantados na dimensão macropolítica. O
mesmo acontece com professores pesquisadores que em seus cursos
de qualificação profissional destinam-se à análise de políticas edu-
cacionais.
Diante do exposto, justifica-se a socialização do escopo meto-
dológico proposto neste trabalho e a relevância desse texto para es-
tudantes e pesquisadores que majoram suas investigações na análise
de políticas públicas, incluso, as políticas educacionais.
Em suma, o Ciclo de políticas é um referencial teórico-meto-
dológico utilizado para analisar as políticas educacionais, conside-
rando que estas são formuladas e reformuladas em campos de nego-
- 210 -
ciação de interesses que compreendem a indissociabilidade entre as
dimensões macro e micropolítico. Desse modo, o Estado não é pen-
sado como protagonista na formulação das políticas públicas, bem
como que a implementação destas não acontece em um exercício
que respeite apenas a hierarquia governamental.
A ideia desta publicação surgiu da dificuldade em selecionar
um referencial de análise para compor o projeto de pesquisa de uma
dissertação. Diante do leque de teorias sobre análises de dados, e,
após algumas disciplinas específicas do curso de mestrado, optou-se
pelo Ciclo de Políticas de Stephen Ball e colaboradores.
Depois disso, percebemos que não são muitos os autores que
tratam especificamente dessa bibliografia, inclusive, poucas obras
de Ball foram traduzidas para o português. Então, com o intuito de
colaborar com a necessidade acadêmica de outros estudantes pes-
quisadores resolvemos submeter este trabalho como sendo mais um
pressuposto teórico-metodológico para ajudar na elaboração de fu-
turos projetos de pesquisas.
Este trabalho tem como objetivo apresentar a integra de uma
proposta metodológica de análise de política educacional mediante
a abordagem do Ciclo de Políticas de Stephen Ball e colaboradores.
Refere-se também a outros autores que ao rigor de uma pesquisa
científica contribuíram para a composição do percurso teórico e me-
todológicos que na ocasião foi delineado. O texto traz ideias que
podem, dentre outros, ajudar na exequibilidade de um projeto de
pesquisa de caráter stricto sensu.
- 211 -
que nos levaram à realização desta proposta investigativa. Igualmen-
te, discorremos acerca dos elementos que antecederam a disposição
teórico-metodológica da pesquisa propriamente dita. Enfatizamos,
também, os fatores que nos levaram à escolha da temática abordada.
Posterior a isso, trazemos algumas considerações e as referências uti-
lizadas na elaboração da proposta que se segue.
- 212 -
mensões e os fatores internos e externos, uma vez que o propósito da
delimitação da temática deve considerar a disponibilidade de tempo
e de espaço de todos os envolvidos no universo da pesquisa, prin-
cipalmente daqueles que estarão fazendo o papel de pesquisadores.
Segundo Marconi e Lakatos (2003):
Após a escolha do assunto, o passo seguinte é a sua delimitação. É
necessário evitar a eleição de temas muito amplos que ou são como
objeto de pesquisa aprofundada ou conduzem a divagações, discus-
sões intermináveis, repetições de lugares comuns ou “descobertas”
já superadas. (MARCONI; LAKATOS, 2003, p. 45).
- 213 -
pesquisado sobre a temática em um estudo monográfico ao final de
minha formação inicial. Em segundo, por ser licenciado em Pedago-
gia, vejo, neste trabalho, perspectivas importantes de complementa-
ção para a minha formação inicial.
Ademais, as duas experiências citadas ajudaram-me a enten-
der a Educação Infantil como um objeto de estudo que mereça re-
correntes investigações, ao mesmo tempo que, como dito, estudar
e pesquisar sobre essa temática me fez discernir que este projeto de
pesquisa, da forma como delimitamos sua temática, possui alto grau
de exequibilidade.
Como fatores externos, cito as disponibilidades de tempo para
realizar as etapas da pesquisa, de estudos globais e locais que agre-
garam referenciais teóricos específicos sobre a temática que pude-
ram embasar minhas inferências e interpretações acerca da relação
discursiva que tive com os autores que anteciparam esta pesquisa.
Outrossim, a possibilidade de consultar in loco doutores que fazem
parte do programa de Pós-Graduação ao qual este projeto de pes-
quisa foi submetido, bem como ser orientado por um profissional de
igual formação.
4. Amostra
- 214 -
pregatício com a SEMED-Humaitá-AM mediante concurso público,
com fins de manter a assiduidade dos participantes durante o perío-
do em que estiverem colaborando com a pesquisa.
Para entender o comportamento dos receptores da política de
avaliação dos IQUEI no contexto da prática da escola pesquisada o
recorte amostral foi de 12 profissionais inerentes ao corpo funcional
da mesma instituição de ensino, sendo: 12 graduados e 09 pós-gra-
duações (especialistas), compreendendo às áreas funcionais de ges-
tão escolar, coordenação e docência.
5. Metodologia
Pensando na dimensão stricto sensu desta pesquisa, optamos,
por seu delineamento, em tratar o objeto de estudo a partir do Ci-
clo de políticas proposto por Ball e Bowe, conforme estudos de Mai-
nardes (2006, 2007), Mainardes e Marcondes (2009) Zanetti et al.
(2014), Lima e Gandin (2012) e Lopes e Macedo (2011).
Buscamos maior profundidade do contexto da prática no qual
a instituição de ensino pesquisada e os participantes da pesquisa se
encontram. Nesse sentido, enfatizamos os embates e as disputas que
permearam os contextos macro e micropolíticos de formulação dos
IQUEI como ação da política educacional de avaliação da Educação
Infantil em caráter institucional. Contudo, consideramos os contex-
tos do processo de formulação de políticas educacionais elaborados
por Ball e colaboradores conforme as contribuições dos autores an-
teriormente citados.
A proposta metodológica desta pesquisa aborda pressupostos
teóricos considerando as contribuições de diversos estudiosos, ao
passo que os caminhos sugeridos para a realização desta investiga-
ção contemplaram elementos necessários a realização de uma pes-
quisa de cunho científico. Segundo Gerhardt e Silveira (2009):
Methodos significa organização, e logos, estudo sistemático, pesqui-
sa, investigação; ou seja, metodologia é o estudo da organização,
dos caminhos a serem percorridos, para se realizar uma pesquisa
ou um estudo, ou para se fazer ciência. Etimologicamente, significa
o estudo dos caminhos, dos instrumentos utilizados para fazer uma
pesquisa científica. (GERHARDT; SILVEIRA, 2009, p. 12)
- 215 -
direcionamento deste trabalho. Marconi e Lakatos (2003), diferen-
ciando método de métodos, explicam que o método de abordagem
de uma pesquisa se caracteriza, de certa forma, pelo grau de distan-
ciamento que possui em relação ao objeto de estudo na realidade na
qual está inserido.
A princípio, o método de abordagem de uma pesquisa dire-
ciona um olhar decrescente que configura buscar os objetivos da
pesquisa partindo de uma dimensão mais extensa do problema le-
vantado para as particularidades vividas, observadas e/ou levantadas
no campo de pesquisa.
Esse movimento decrescente possibilita uma “[...] ligação
entre Estado e processo micropolíticos ou macro e microanálise”
(MAINARDES, 2006), sendo o “Método do Ciclo de políticas” um
referencial teórico que incorpora ambas as dimensões (MAINAR-
DES; MARCONDES, 2009).
De fato, o sentido restrito circunstanciado pela perspectiva
teórico-metodológica de um produto de projeção stricto sensu (dis-
sertação) certamente não vislumbra abordagens muito abrangentes
do objeto de estudo. Entretanto, não podemos desconsiderar, neste
caso, a conjuntura de acontecimentos que precederam o contexto da
prática da política educacional que estudamos.
Do mesmo modo, procuramos responder às questões nortea-
doras de maneira a sustentá-las ou não, contemplando, neste estudo,
as principais características das pesquisas que apresentam a busca de
seus dados a partir da natureza qualitativa, como se apresenta nesta
investigação, compondo, com isso, os nexos para os procedimentos
que foram utilizados.
Com efeito, utilizamos, neste estudo, argumentos do Ciclo de
políticas na análise do processo de formulação dos Indicadores da
Qualidade na Educação Infantil como política educacional de avalia-
ção dos Parâmetros Nacionais da Qualidade para a Educação Infantil
nos contextos macro e micropolíticos que decorrem as influências
e a elaboração do texto da política estudada, bem como a tradução
desta pelos participantes da pesquisa no contexto da instituição de
ensino eleita como local de análise.
Ao optarmos pelo método do Ciclo de políticas, surgiu a ne-
cessidade de esclarecermos sobre os métodos procedimentais utili-
zados para tratar dos contextos na análise dos indicadores de quali-
dade da instituição de ensino lócus da pesquisa.
- 216 -
Ressaltamos que o processo analítico considerou as dimensões
macro e micropolíticos que compõem o processo de formulação das
políticas educacionais, configurando, com isso, um movimento que
perpassa pela “[...] política proposta (intenção do governo), a polí-
ticas de fato (texto legislativos/lei) e as políticas de uso (prática ins-
titucional)” (MAINARDES, 2006, p. 49), retomando os primórdios
do pensamento de Ball e Bowe, quando da elaboração do Ciclo de
políticas. De acordo com Marconi e Lakatos (2003),
[...] os métodos de procedimento seriam etapas mais concretas da
investigação, com finalidade mais restrita em termos de explicação
geral dos fenômenos e menos abstratas. Pressupõem uma atitude
concreta em relação ao fenômeno e estão limitados a um domínio
particular. (MARCONI; LAKATOS, 2003, p. 106).
- 217 -
A partir daí, os estudos descritivos propostos colaboraram
para situar as inferências/interpretações das análises, das descrições
e das compreensões dos fatos e das variáveis levantadas pelo referen-
cial teórico e participantes envolvidos na pesquisa.
Analisar a política educacional de avaliação dos indicadores
da qualidade da Educação Infantil em seus pressupostos legais e es-
truturais, como dito, é o principal objetivo desta investigação. Para a
materialização deste objetivo, abordamos a articulação macro e mi-
cropolítica dos contextos propostos no Ciclo de políticas de Stephen
Ball e Richard Bowe na análise da política educacional de avaliação
dos Indicadores da Qualidade na Educação Infantil. Segundo Mai-
nardes (2006):
Essa abordagem destaca a natureza complexa e controversa da po-
lítica educacional, enfatiza os processos micropolíticos e a ação dos
profissionais que lidam com as políticas no nível local e indica a
necessidade de se articularem os processos macro e micro na análise
de políticas educacionais. (MAINARDES, 2006, p. 49).
- 218 -
realização de entrevista semiestruturada com os receptores da polí-
tica educacional (gestores, pedagogos e professores) no contexto da
prática escolar. O objetivo foi analisarmos as influências e os fatores
que ocasionaram a implementação dos indicadores da qualidade da
Educação Infantil como proposta de avaliação dos PNQEI.
Conforme aponta Mainardes (2006):
O contexto da produção de texto está normalmente articulado com
a linguagem do interesse público mais geral. Os textos políticos,
portanto, representam a política. Essas representações podem to-
mar várias formas: textos legais oficiais e textos políticos, comentá-
rios formais ou informais sobre os textos oficiais, pronunciamentos
oficiais, vídeos etc. Os textos políticos são o resultado de disputas e
acordos, pois os grupos que atuam dentro dos diferentes lugares da
produção de textos competem para controlar as representações da
política. (MAINARDES, 2006, p. 52).
- 219 -
com o gestor escolar, professores e pedagogos, os quais compuseram
o corpus de dados de 12 profissionais; e questionário de perguntas
abertas e fechadas dos IQUEI. O objetivo foi avaliarmos as dimen-
sões e os indicadores de qualidade da Educação Infantil em uma es-
cola pública do município de Humaitá-AM.
No âmbito dos contextos abordados, analisamos as relações
de poder, de disputas e de negociações nas dimensões macro e mi-
cropolíticos, considerando, com isso, um movimento interpretativo
não linear que vai do Estado aos receptores das políticas no cotidia-
no das escolas de Educação Infantil; neste caso, profissionais da ins-
tituição de Educação Infantil investigada: gestor(a), professores(as)
e pedagogo(a).
Como vimos, as respostas aos objetivos específicos desta pes-
quisa remetem-nos à necessidade não apenas de subsídios quantita-
tivos isoladamente, mas, ao mesmo tempo, de verificarmos o quanto
a análise dos contextos de formulação de políticas educacionais pode
mostrar a interferência direta e/ou indireta da qualidade do ensino
das instituições e na condição de trabalho dos profissionais nelas in-
seridos. Isso ratifica a necessidade de um estudo de campo, o qual,
[...] possibilita uma aproximação e um entendimento da realidade
a investigar como um processo permanentemente inacabado. Ela se
processa através de aproximações sucessivas da realidade, fornecen-
do subsídios para uma intervenção no real. (GERHARDT; SILVEI-
RA, 2009, p. 36).
- 220 -
[...] é a fase da pesquisa em que indaga a realidade e se obtêm dados
pela aplicação de técnicas. Em pesquisa de campo, é comum o uso
de questionário e entrevista. A escolha do instrumento de pesquisa,
porém, dependerá do tipo de informação que se deseja obter ou do
tipo de objeto de estudo. (SEVERINO, 2007, p. 105).
- 221 -
fornecer dados ou sugerir possíveis fontes de informações úteis. As
duas tarefas, pesquisa bibliográfica e de campo, podem ser execu-
tadas concomitantemente” (MARCONI; LAKATOS, 2003, p. 159).
As entrevistas e a aplicação dos questionários aconteceram
com as visitas/encontros realizadas na instituição de ensino onde
ocorreu a pesquisa. Na tentativa de agilizar e evitar ao máximo os
contratempos entre os envolvidos no processo de investigação, cria-
mos uma rede de contato para aludir as atividades que envolveriam
a pesquisa. As transcrições das entrevistas e dos formulários foram
realizadas por meio do software Google Docs e processadas por meio
de digitação por voz.
6. Considerações finais
7. Referências
- 222 -
BRASIL. Ministério da Educação. Indicadores da Qualidade na Edu-
cação Infantil. Brasília: MEC/SEB, 2009. Disponível em: <http://
portal.mec.gov.br/dmdocuments/indic_qualit_educ_infantil.pdf>.
Acesso em: 12 mar. 2018.
GERHARDT, Tatiana Engel; SILVEIRA, Denise Tolfo. Métodos de
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GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 5. ed. São
Paulo: Atlas, 2010
Godoy, A. S. (1995). Introdução à pesquisa qualitativa e suas possi-
bilidades. RAE-Revista de Administração de Empresas, 35(2), 57-
63. Disponível em: < https://rae.fgv.br/sites/rae.fgv.br/files/38183-
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LIMA, Iana Gomes de; GANDIN, Luís Armando. Ciclo de políticas:
focando o contexto da prática na análise de políticas educacionais.
In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 35., 2012, Porto de Galinhas.
Anais eletrônicos [...]. Porto de Galinhas: Convention Center 2,
2012. Disponível em: http://www.anped.org.br/sites/default/files/
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LOPES, Alice Casimiro; MACEDO, Elizabeth. Contribuições de Ste-
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MARCONI, Maria de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Fundamen-
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SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico.
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MINÁRIO DE GRUPOS DE PESQUISA SOBRE CRIANÇAS E IN-
FÂNCIAS, 4., 2014, Goiânia. Anais eletrônicos [...]. Goiânia: UFG,
2014. Disponível em: https://grupeci.fe.ufg.br/up/693/o/RE08.PDF.
Acesso em: 10 set. 2018.
- 224 -
Sobre os (as) autores (as)
ALCIONI DA SILVA MONTEIRO
Possui Mestrado no Programa de Pós-Graduação em Ensi-
no de Ciências e Humanidades - PPGECH (2019), Pós-graduação
em Gestão Pública (2014), Licenciatura em Artes Visuais (2013) e
Pedagogia (2006), ambas pela Universidade Federal do Amazonas
(UFAM). Atualmente é Professora Municipal - SEMEC e Professora
Substituta de Artes e Metodologia do Trabalho Científico no IFAM
Campus Lábrea (2021). Tem experiência como Formadora Pesquisa-
dora no Programa Saberes Indígenas pelo IFAM (2017), Coordena-
ção pedagógica municipal com ênfase na docência do Ensino Fun-
damental e Educação Infantil e professora da Educação do Campo.
CRISTINA LEITE
Professora Dra do Instituto de Física da USP. Orientadora do
Programa de Pós-graduação Interunidades em Ensino de Ciências
da USP. Licenciada em Física pela USP, mestre em Ensino de Ciên-
cias pela USP e doutora em Educação pela USP (2006). Foi professo-
- 225 -
ra em Escolas Públicas (efetiva) e Privadas da Cidade de São Paulo.
Integrou a equipe de redatores da Base Nacional Comum Curricular
(BNCC) de Ciências da Natureza para o Ensino Fundamental e Mé-
dio. Atualmente é a coordenadora da Licenciatura em Física da USP
e vice-coordenadora da CAPEF (Comissão de Pesquisa em Ensino
de Física da SBF). Principal área de atuação: Pesquisas em Ensino de
Ciências, Física e Astronomia, com enfoque em currículo, propostas
e materiais didáticos e na abordagem multicultural.
ÉRICA DE OLIVEIRA
Mestre pelo Programa de Pós-Graduação Interunidades em
Ensino de Ciências, com área de concentração em Ensino de Físi-
ca, e licenciada em Física, ambas as titulações pela Universidade de
- 226 -
São Paulo (USP). Atuou como bolsista do Programa Institucional de
Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) e atualmente é professora de
Física do SENAC São Paulo. Possui experiência de colaborações em
editoras na produção de materiais didáticos de Ciências. Principais
áreas de atuação: Astronomia Cultural; Material didático; Ensino de
Física.
- 227 -
Ensino de Ciências e Humanidades pela UFAM-Universidade Fe-
deral do Amazonas..Licenciatura em Pedagogia; Pós Graduação em
Psicopedagogia Clínica e Institucional; Pós Graduação em Ensino de
História. Mestrado em Ensino de Ciências e Humanidades. Vínculo:
Pedagoga na rede estadual de ensino SEDUC/AM.
- 228 -
MÁRDILA ALVES BUENO
Licenciada em Ciências: Matemática e Física pela Universida-
de Federal do Amazonas (2015) e possui especialização em Tradução
e Interpretação da Língua Brasileira de Sinais pela Faculdade Santo
André (2016). Cursou mestrado em Ensino de Ciências e Huma-
nidades pela Universidade Federal do Amazonas com enfoque em
Fundamentos e Metodologias para o ensino das Ciências Naturais
e Matemática (2020). É professora de Matemática pela Secretaria
de Estado de Educação e Qualidade de Ensino do Amazonas desde
2016.
- 229 -
perior da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) atuando nas
áreas de Ciências, Ensino de Botânica e Ciências Ambientais. Mem-
bro da Sociedade Botânica do Brasil (SBB). CRBio-6 sob nº 073096/
AM-D.
RODRIGO MONTEIRO
Mestre em Ensino de Ciências e Humanidades pela Universi-
dade Federal do Amazonas (2018); graduação em Direito pela Uni-
versidade Vila Velha - UVV (2005); e graduação em Letras - Portu-
guês pela Universidade Paulista (2020). Atua na Direção Geral no
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas /
Campus Humaitá. Atua principalmente nos seguintes temas: ética,
formação, ensino e gestão escolar. E-mail: monteiros.adv@hotmail.
com
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SUELY APARECIDA DO NASCIMENTO MASCARENHAS
Possui graduação em Pedagogia - Supervisão escolar e magis-
tério pela Universidade Federal de Rondônia (1987) e doutorado em
Diagnóstico e avaliação educativa-psicopedagogia pela Universida-
de da Coruña (2004, revalidado e registrado pela UNB). Concluiu
estágio de pós-doutoramento com ênfase em Psicologia Escolar
pela Universidade do Minho (2005), Universidade Autônoma Na-
cional do México-UNAM (2019), Universidade de La Salle, Bajío,
León, México (2019). É professora DE na Universidade Federal do
Amazonas- Campus do Vale do Rio Madeira - Instituto de Educação,
Agricultura e Ambiente - IEAA - Humaitá (2006). Coordena grupos
de pesquisas UFAM/CNPq (2006), dirige periódicos vinculados aos
grupos de pesquisa que lidera:Revistas Educamazônia (2008-atual)
e Revista Amazônica (2008-atual). Coordenou diversos projetos
de pesquisas apoiados pelo CNPq/CAPES e FAPEAM, colabora
com programas de pós-graduação da UFAM, núcleos de estudos e
pesquisas da UFAM, eventos científicos, projetos de extensão uni-
versitária e outras atividades acadêmicas. Ao abrigo do PROCAD/
AMAZÔNIA (PPGE-UFAM/PPGE-UFPA-PPGE-/UFMT, 2019),
exerceu atividades no exterior (México) como professora visitante
convidada, junto às Universidades De La Salle Bajío e Autonôma Na-
cional do México, onde coordena projeto internacional longitudinal
na área da educação superior com a participação de diversos países.
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