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VI
I
Se as matas estrujo
Aqui na floresta
Co os sons do Boré,
Dos ventos batida,
Mil arcos se encurvam,
Façanhas de bravos
Mil setas lá voam,
Não geram escravos,
Mil gritos reboam,
Que estimem a vida
Mil homens de pé
Sem guerra e lidar.
Eis surgem, respondem
— Ouvi-me, Guerreiros.
Aos sons do Boré!
— Ouvi meu cantar.
— Quem é mais valente,
— Mais forte quem é?
II
VII
Valente na guerra
Quem há, como eu sou?
Lá vão pelas matas;
Quem vibra o tacape
Não fazem ruído:
Com mais valentia?
O vento gemendo
Quem golpes daria
E as malas tremendo
Fatais, como eu dou?
E o triste carpido
— Guerreiros, ouvi-me;
Duma ave a cantar,
— Quem há, como eu sou?
São eles — guerreiros,
Que faço avançar.
III
VIII
Quem guia nos ares
A frecha imprumada,
E o Piaga se ruge
Ferindo uma presa,
No seu Maracá,
Com tanta certeza,
A morte lá paira
Na altura arrojada
Nos ares frechados,
Onde eu a mandar?
Os campos juncados
— Guerreiros, ouvi-me,
De mortos são já:
— Ouvi meu cantar.
Mil homens viveram,
Mil homens são lá.
IV
IX
Quem tantos imigos
Em guerras preou?
E então se de novo
Quem canta seus feitos
Eu toco o Boré;
Com mais energia?
Qual fonte que salta
Quem golpes daria
De rocha empinada,
Fatais, como eu dou?
Que vai marulhosa,
— Guerreiros, ouvi-me:
Fremente e queixosa,
— Quem há, como eu sou?
Que a raiva apagada
De todo não é,
V
Tal eles se escoam (...)
Na caça ou na lide,
Quem há que me afronte?! Na estrutura aparente do poema “O Canto do
guerreiro”, é possível perceber a presença de
nove estrofes divididas por números romanos (I caminho (“Quem tantos imigos / Em guerras
a IX). Seus versos apresentam uma forma preou?”) e quem mais tem energia para
encadeada e não são uniformes, pois seis de derrotar mortalmente seus inimigos em
suas estrofes possuem oito versos, uma possui batalhas.
nove, outra dez e a última doze. Entretanto, o É na quinta estrofe que o índio menciona o fato
poema apresenta uma métrica perfeita na qual de que ninguém é tão corajoso a ponto de
todos os versos contêm a mesma quantidade de enfrentá-lo, “Na caça ou na lide, / Quem há que
sílabas poéticas (5), afigurando-se, assim, uma me afronte?!”. Ele é tão temido naquela
redondilha menor. floresta que, além de seus inimigos, até os
Quanto às rimas, elas são irregulares e, em sua animais que lá habitam têm medo dele: “A onça
maioria, pobres (bravos/escravos/Guerreiros; raivosa / Meus passos conhece, / O imigo
lidar/cantar...). Vale destacar a presença da estremece, / E a ave medrosa / Se esconde no
figura de linguagem hipérbole em: “Mil arcos se céu.”. Após contar mais de suas conquistas, o
encurvam,/ Mil setas lá voam,/ Mil gritos índio questiona novamente seus colegas se há
reboam / Mil homens de pé”. Ainda, evidencia- alguém mais valente do que ele, capaz de fazer
se o paralelismo da expressão “- Guerreiros, tudo o que ele já fez: “- Quem há mais
ouvi-me”. Também, o poema é repleto de valente, / - Mais destro do que eu?”.
anáforas, tais como “Quem” e “Mil”. Na sexta estrofe, o eu-lírico alude que é com a
Quanto à estrutura profunda do poema, o ajuda de sua trombeta que ele chama seus
sujeito poético é um índio guerreiro que está se guerreiros para a guerra; fazendo, assim, a
vangloriando de suas conquistas juntamente floresta inteira estremecer com o som do seu
com seus companheiros de guerra. Como ele é instrumento e da multidão que o segue: “Se as
o líder de sua tribo, seus guerreiros precisam matas estrujo / Co os sons do Boré, / Mil arcos
reconhecê-lo como o mais forte e mais valente se encurvam, / Mil setas lá voam, / Mil gritos
de todos; assim, conta-lhes seus feitos mais reboam, / Mil homens de pé / Eis surgem,
impressionantes para que seja respeitado respondem / Aos sons do Boré!”. Dessa forma,
“como um líder deve ser”. por ser capaz de liderar esses homens e de
Na primeira estrofe, esse índio apresenta ao conquistar tudo o que já conquistou, ele
leitor o local onde ele e sua tribo vivem “Aqui continua pedindo que seu batalhão confirme a
na floresta / Dos ventos batida”. No momento sua bravura: “- Quem é mais valente / - Mais
seguinte, ele menciona que lá todos eles são forte quem é?”.
livres e resistirão à escravidão, se for preciso: Na estrofe seguinte, o sujeito poético cita que
“Façanhas de bravos / Não geram escravos, / seus guerreiros, por terem nascido naquelas
Que estimem a vida / Sem guerra e lidar.” Por matas, conseguem vaguear por lá sem fazerem
fim, ele reafirma a sua liderança através dos barulho algum (“Lá vão pelas matas; / Não
sétimo e oitavo verso, nos quais ele convida os fazem ruído”); permitindo que, no momento
outros guerreiros a ouvirem o seu chamado: “- em que estivessem em uma guerra, os inimigos
Ouvi-me, Guerreiros. / - Ouvi meu cantar.” não soubessem onde eles estariam, já que a
Na segunda estrofe, o índio guerreiro mata e os bichos que lá vivem continuariam
denomina-se como “valente” e desafia seus agindo normalmente com a presença deles: “O
colegas a falarem se há alguém tão temido vento gemendo / E as malas tremendo / E o
quanto ele naquela tribo: “Quem há, como eu triste carpido / Duma ave a cantar”.
sou?”. Ele considera-se o melhor guerreiro Na oitava estrofe, o índio guerreiro menciona
entre os outros, aquele que “vibra o tacape com uma cena de guerra, na qual o pajé de sua tribo
mais valentia” e que dá os “golpes mais fatais” toca o seu maracá para abençoar os guerreiros
em seus inimigos. Em seguida, ele convida e livrá-los da morte: “E o Piaga se ruge / No seu
novamente seus colegas para juntarem-se a si: Maracá”. Nos próximos versos, ele diz que os
“- Guerreiros, ouvi-me; / - Quem há, como eu campos de guerra estão repletos de inimigos
sou?”. mortos; contudo, aduz que todos os guerreiros
Nas próximas estrofes (III e IV), o índio guerreiro comandados por ele continuam vivos: “A morte
continua questionando sua tribo e lá paira / Nos ares frechados, / Os campos
vangloriando-se de seus feitos. É ele quem tem juncados / De mortos são já: / Mil homens
o melhor manejo da “frecha”, “Quem guia nos viveram, / Mil homens são lá.”
ares / A frecha imprumada,/ Ferindo uma
presa,/ Com tanta certeza,/ Na altura arrojada/
Onde eu [ele] a mandar?”. Foi ele quem mais
prendeu os inimigos que sua tribo fizera pelo
Na última estrofe, o sujeito poético, mais uma estampido,
vez, reforça o seu poder como um líder, já que Como a um sopro fatal, rolam esfaceladas.
se acaso ele precisar chamar seus guerreiros E os templos, os museus, o Capitólio erguido
para a guerra novamente, a floresta irá balançar Em mármor frígio, o Foro, as erectas arcadas
ao som de sua trombeta: “E então se de novo / Dos aquedutos, tudo as garras inflamadas
Eu toco o Boré; / Qual fonte que salta / De Do incêndio cingem, tudo esbroa-se partido.
rocha empinada, / Que vai marulhosa, / Longe, reverberando o clarão purpurino,
Fremente e queixosa”. Além do mais, ele deixa Arde em chamas o Tibre e acende-se o
claro que uma nova batalha estará horizonte.
por vir, pois a raiva que sente de seus inimigos Impassível, porém, no alto do Palatino,
não passou mesmo após a sangrenta batalha Nero, com o manto grego ondeando ao ombro,
(“Que a raiva apagada / De todo não é”). Por assoma
fim, ele invoca seus guerreiros a enunciarem Entre os libertos, e ébrio, engrinaldada a fronte,
mais uma vez quem é o mais forte de todos: “- Lira em punho, celebra a destruição de Roma
Guerreiros, dizei-me, / - Tão forte quem é?”. A temática proposta, isto é, a Antiguidade
Como o presente poema faz parte da Primeira Clássica, bem como o cuidado formal, soneto
Geração – Indianista e Nacionalista – do com versos alexandrinos, é inerente ao
Romantismo no Brasil, as características desta Parnasianismo.
podem ser percebidas através da temática da
coragem, da força, das façanhas indígenas, da Acrobata da Dor
resistência à escravidão, e em seu sujeito
poético; pois, há o enaltecimento do índio o Gargalha, ri, num riso de tormenta,
qual é o próprio eu-lírico da obra. O índio, aqui, Como um palhaço, que desengonçado,
tem seus feitos exaltados e é lembrado e Nervoso, ri, num riso absurdo, inflado
tratado como herói, valente, virtuoso e nobre – De uma ironia e de uma dor violenta.
nosso legítimo antepassado nacional –, análogo
ao cavaleiro medieval para o europeu. Ainda, há Da gargalhada atroz, sanguinolenta,
a forte presença da natureza e animais (flora e Agita os guizos, e convulsionado
fauna); manifestando, assim, elementos Salta, gavroche, salta clown, varado
principais das obras de Gonçalves Dias. Pelo estertor dessa agonia lenta ...
Remorso – Olavo Bilac
Às vezes, uma dor me desespera… Pedem-se bis e um bis não se despreza!
Nestas ânsias e dúvidas em que ando. Vamos! retesa os músculos, retesa
Cismo e padeço, neste outono, quando Nessas macabras piruetas d’aço...
Calculo o que perdi na primavera.
Versos e amores sufoquei calando, E embora caias sobre o chão, fremente,
Sem os gozar numa explosão sincera… Afogado em teu sangue estuoso e quente,
Ah! Mais cem vidas! com que ardor quisera Ri! Coração, tristíssimo palhaço.
Mais viver, mais penar e amar cantando! Cruz e Sousa
Sinto o que desperdicei na juventude;
Choro, neste começo de velhice, Gavroche: garotos de Paris, figuradamente
Mártir da hipocrisia ou da virtude, artista.
Os beijos que não tive por tolice, Estertor: respiração anormal própria de
Por timidez o que sofrer não pude, moribundos.
E por pudor os versos que não disse Fremente: vibrante, agitado, violento.
O poema Remorso de Olavo Bilac, expressa o Estuoso: que ferve, ardente, febril.
lamento que o autor sente pelas coisas que ele
deixou de fazer. O poema se caracteriza com a Acrobata da Dor”, em forma de soneto,
era parnasiana por composição de soneto, apresenta a característica preocupação formal
clareza e lógica e por ser descritivo. Além disso, de Cruz e Sousa que o aproxima inclusive dos
o poema é de rimas ricas e raras ‘calando, parnasianos: a utilização de vocabulário
cantando’. requintado e erudito, a força das imagens na
O Incêndio De Roma poética bem como a forma lapidar antecipam a
Raiva o incêndio. A ruir, soltas, desconjuntadas, nobreza destes versos sugestivos, bem ao gosto
As muralhas de pedra, o espaço adormecido A simbologia presente neste poema simbolista
De eco em eco acordando ao medonho é de impressionante intensidade e frequência,
desde o inicio do poema até o seu desfecho
encontramos bastantes evidências lexicais que 02 – Ainda sobre o soneto, assinale a afirmação
construíram sugestões. Aqui neste poema, errônea:
Acrobata da Dor, percebemos uma intenção do a) há uma alusão ao fato de o palhaço,
autor de fazer com que o leitor possa tentar interiormente dilacerado, mascarar seus
identificar quem afinal seria este Acrobata/ sentimentos para transmitir alegria.
Artista, o que só conseguimos descobrir no final b)- a fachada de alegria e o sofrimento interior
do poema, a metáfora do poema se inclina para compõem a natureza conflitante do coração do
o coração. Podemos ver isto em algumas poeta, sensibilizando o público.
evidências que o autor põe no soneto, c) há um vocabulário sugestivo, remetendo ao
“Gargalhada sanguinolenta...” onde o “eu-lírico” coração: “gargalhada sanguinolenta”,
sugere a idéia da cor vermelha do sangue; “convulsionado”, “retesa os músculos”.
“Convulsionado...” que pode representar os d) o poema pode ser visto também como uma
batimentos cardíacos deste coração, etc. metáfora da condição do artista, em que se
O poema exprime a metáfora da convivência do revelam as relações entre arte e poeta.
ser humano com o seu exterior, onde este e) a condição do artista se espelha na do
precisa suportar suas dores cotidianas e, para palhaço, sendo este forçado a rir, numa espécie
driblá-las, o ser deve fazer as “acrobacias” da de tortura interna e eterna.
vida mesmo com o peso de sua dor interior. É
necessário derrubar as barreiras e dificuldades 03 – Assinale o item em que a expressão
com uma alegria mascarada e determinada a utilizada possui uma carga semântica que
seguir em frente. Em outras palavras, se destoa das demais:
enxergarmos o coração numa perspectiva a) “riso de tormenta”
transcendental e espiritual, é possível vermos o b) “gargalhada atroz, sanguinolenta”
coração como uma simbologia do nosso c) “agonia lenta”
interior, do nosso espírito, da nossa mente, ou d-) “Pedem-se bis”
seja, o nosso centro das atenções. e) “macabras piruetas”
Outro ponto interessante neste poema é a linha
lógica das descrições do Acrobata. Através 04 – Assinale a alternativa em que a indicação
destas sugestões, o “eu-lírico” deixa que o leitor entre parênteses não está de acordo com o
guie o texto, só depende dele decifrar o verso:
sentimento gravado no soneto, ou seja, há uma a)- “Gargalha, ri, num riso de tormenta,”
linha cronológica de sugestões que o leitor (pleonasmo vicioso)
precisa captar para que no final o poema se b) “salta, gavroche, salta clown, varado”
encerre. (assonância)
c) “Da gargalhada atroz, sanguinolenta,”
(sinestesia)
Entendendo o soneto: d) “nessas macabras piruetas d’aço...”
(metáfora)
01 – Fazendo uma análise mais detalhada do e) “afogado em teu sangue estuoso e quente,”
soneto, assinale a afirmação incorreta: (aliteração).
a) ao longo do texto, constata-se que o
acrobata da dor, desempenhando o papel de
um triste e sofrido palhaço, é metáfora do
próprio coração.
b) o acrobata precisa acolher a manifestação da
audiência e seguir desempenhando seu papel,
mesmo que o leve à morte.
c) essa espécie de clown, que vive de agradar às
multidões, paga um preço alto: a ocultação de
sua dor interior.
d) cena grotesca, o bis é a sedução da plateia
que acaba conduzindo o acrobata para a
tragédia.
e) -a plateia pedindo bis corresponde à elite
política que exige do cidadão, em sua luta
diária, as maiores acrobacias.